Download PDF
ads:
MARCOS AURÉLIO MAEYAMA
ESTILOS DE PENSAMENTO NA ODONTOLOGIA SOCIAL E PREVENTIVA
Um estudo da disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de
Odontologia da UNIVALI
Itajaí
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
MARCOS AURÉLIO MAEYAMA
ESTILOS DE PENSAMENTO NA ODONTOLOGIA SOCIAL E PREVENTIVA
Um estudo da disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de
Odontologia da UNIVALI
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Saúde e Gestão do Trabalho da
Universidade do Vale do Itajaí, como requisito
parcial à obtenção do titulo de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Luiz Roberto Agea Cutolo
Itajaí
2006
ads:
Maeyama, Marcos Aurélio
Estilos de Pensamento na Odontologia Social
e Preventiva - Um estudo da disciplina de
Odontologia Social e Preventiva do curso de
Odontologia da UNIVALI / Marcos Aurélio Maeyama
– Itajaí, SC, 2006.
191p.
Orientador: Dr. Luiz Roberto Agea Cutolo.
Dissertação (Mestrado) Universidade do
Vale do Itajaí.
1. Educação em Odontologia. 2. Ensino. 3.
Sistema Único de Saúde.
MARCOS AURÉLIO MAEYAMA
ESTILOS DE PENSAMENTO NA ODONTOLOGIA SOCIAL E PREVENTIVA
Um estudo da disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de
Odontologia da UNIVALI
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Saúde e Gestão do Trabalho da
Universidade do Vale do Itajaí, como requisito
parcial à obtenção do titulo de Mestre.
COMISSÃO EXAMINADORA
______________________________________
Prof. Dr. Luiz Roberto Agea Cutolo
Universidade do Vale do Itajaí
______________________________________
Prof. Dr. Mario Uriarte Neto
Universidade do Vale do Itajaí
______________________________________
Profª Drª. Águeda Lenita Wendhausen
Universidade do Vale do Itajaí
______________________________________
Prof. Dr. Marco Aurélio da Ros
Universidade Federal de Santa Catarina
Itajaí, ____ de _______________ de 2006.
A todos os brasileiros que dependem do
sistema público de saúde, e que merecem
uma atenção digna e de qualidade.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a DEUS, meu Estilo de Pensamento maior, guia de todos os momentos
da minha vida.
Aos meus pais, que proporcionaram minha formação como odontólogo, e
principalmente minha formação como ser-humano. A eles, meu amor e carinho eternos.
Aos meus irmãos, amigos de todas as horas, meu alento das horas difíceis.
Aos professores do curso de mestrado, que contribuíram para minha formação nesta
jornada.
Aos professores da disciplina de Odontologia Social e Preventiva que participaram das
entrevistas, todos eles muito atenciosos.
As funcionárias da biblioteca de Odontologia, sempre muito prestativas e pacientes.
Ao Prof. Marinho, coordenador do curso de odontologia, que em muito me facilitou o
acesso a todos os documentos necessários para esta pesquisa, incluo aqui as
funcionárias Nádia e Valéria.
As queridíssimas Vania, Rosélia e Thaís, por toda ajuda, atenção e carinho que tiveram
comigo.
E especialmente ao meu orientador, Prof. Cutolo, pelos ensinamentos, pela paciência,
pela compreensão, pelos almoços e jantares, e principalmente pela sua amizade. Um
exemplo de profissional e ser-humano. Alguém para guardar eternamente no lado
esquerdo do peito.
MAEYAMA, Marcos Aurélio. Estilos de Pensamento na Odontologia Social e
Preventiva - um estudo da disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de
Odontologia da UNIVALI. 2006. Dissertação (Mestrado em Saúde e Gestão do
Trabalho) – Universidade do Vale do Itajaí.
RESUMO
Partindo do pressuposto de que a forma de conceber o processo saúde-doença
determina as ações de saúde de forma dirigida, e que a escola exerce papel
fundamental na formação deste conceito através de suas práticas curriculares, foi
realizado um estudo de caso Curso de Graduação em Odontologia da Universidade
do Vale do Itajaí – com vistas a identificar as possíveis concepções existentes e de que
forma exercem influência na formação do aluno. Foi realizado um recorte, para o estudo
da disciplina de Odontologia Social e Preventiva (OSP), uma vez que a disposição da
matriz curricular demonstrou que as demais disciplinas se estruturavam em bases
biologicistas, portanto, carregando a referida disciplina a responsabilidade da formação
integral frente às novas demandas educacionais para o setor. A investigação foi
realizada em três etapas: 1. análise do projeto pedagógico do curso, incluindo a sua
matriz curricular; 2. análise dos planos de ensino da disciplina de OSP, incluindo toda a
literatura básica recomendada; 3. entrevistas com amostra intencional de oito docentes
responsáveis pelas disciplinas de OSP. As categorias epistemológicas de Ludwik Fleck
(1896-1961) foram utilizadas como referencial de análise, sobretudo a categoria Estilo
de Pensamento. Os resultados possibilitaram encontrar as concepções biologicista e
higienista-preventivista como predominantes, quase sempre aparecendo em conjunto.
Desta forma, caracterizamos estas concepções como um único estilo, a qual chamamos
de Estilo de Pensamento Biologicista com matizes Higienistas-Preventivistas. Este
estilo demonstrou-se hegemônico nos oito planos de ensino analisados e nas
entrevistas com os docentes, aparecendo apenas um professor com uma tendência de
Estilo de Pensamento Social. Possíveis alternativas foram apontadas considerando os
resultados, com bases nas diretrizes contemporâneas que orientam a formação na área
da saúde.
Palavras-chave: educação em odontologia; ensino; sistema único de saúde.
MAEYAMA, Marcos Aurélio. Thought Styles in Social and Preventive Dentistry a Study
on the subject of Social and Preventive Dentistry, of the Dentistry Program, at UNIVALI.
2006. Dissertation (MSc in Health and Labor Management) Universidade do Vale do
Itajaí. 2006. Dissertation (Master’s Degree in Health and Labor Management)
University of Vale do Itajaí.
ABSTRACT
Based on the assumption that the way in which the health-disease process is conceived
can govern actions taken in the health area, and the fact that educational institutions
play a vital role in developing this notion through their curricular practices, a case study
was carried out Dentistry Graduate Program at University of Vale do Itajai - aiming to
identify possible concepts that exist, and how these concepts influence students’
development. A cross section was made, for the study of the discipline Social and
Preventive Dentistry (SPD), since the arrangement of the syllabus showed that the other
disciplines were all structured on biological bases, while SPD was the only one which
was responsible for a holistic training, faced with new educational demands within the
sector. The investigation was divided into three main stages: 1. pedagogical project
analysis, including its syllabus; 2. analysis of the SPD teaching plans; including all the
recommended basic reading; 3. interviews with eight teachers responsible for the SPD
subject. Ludwik Fleck’s (1896-1961) epistemological categories were adopted as a
reference for the analysis, in particular, the category of Thought Style. The results show
that biological and hygiene/prevention concepts were predominant, almost always
appearing together. These concepts are therefore characterized as a single style, which
we call the Biological Thought Style, with a hygiene/preventive bias. This style proved to
be hegemonic in the analysis of the eight teaching plans and in the interviews with the
teachers, with only one teacher revealing a tendency towards the Social Thought Style.
Possible alternatives were indicated, based on the contemporary guidelines that inform
education in the area of health.
Key Words: Education in dentistry; teaching; national health system.
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO ...............................................................................................................11
CAPÍTULO 2
EDUCAÇÃO NA ÁREA DA SAÚDE E OS MODELOS DE ATENÇÃO À SAÚDE .......15
2.1. Relatório Flexner .....................................................................................................15
2.2. Modelo Biomédico no Brasil ....................................................................................17
2.3. Reforma Sanitária ....................................................................................................17
2.4. Sistema Único de Saúde (SUS) ..............................................................................19
2.5. Odontologia no Brasil ..............................................................................................22
2.6. Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Odontologia ...................................28
CAPÍTULO 3
A EPISTEMOLOGIA DE LUDWIK FLECK ....................................................................33
3.1. Estilo de Pensamento e Coletivo de Pensamento ..................................................33
3.2. Estilo de Pensamento como referencial de análise e o objeto desta pesquisa ......36
CAPÍTULO 4
CONCEPÇÃO SAÚDE-DOENÇA - AS GRANDES CATEGORIAS ..............................42
4.1. Visão Higienista .......................................................................................................42
4.2. Visão Social .............................................................................................................43
4.3. Visão Biológica ........................................................................................................44
4.4. Visão Integral ...........................................................................................................45
4.5. Algumas ações conseqüentes .................................................................................46
4.5.1. Promoção da Saúde e Prevenção ........................................................................47
4.5.2. Recuperação da Saúde e Reabilitação da Saúde ...............................................50
4.5.2. Prática Educativa em Saúde ................................................................................50
4.5.3. Epidemiologia .......................................................................................................52
CAPÍTULO 5
O CURSO DE GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA DA UNIVALI E A DISCIPLINA DE
ODONTOLOGIA SOCIAL PREVENTIVA – UM ESTUDO DE CASO ...........................56
5.1. Pesquisa Documental e seus Resultados ...............................................................58
5.1.1. O Curso de Graduação de Odontologia da UNIVALI e seu Projeto Pedagógico..58
5.1.2. Os Planos de Ensino das Disciplinas de Odontologia Social e Preventiva ..........65
5.1.2.1. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
1º período ............................................................................................................65
5.1.2.2. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
2º período ............................................................................................................70
5.1.2.3. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
3º período ............................................................................................................77
5.1.2.4. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
4º período ............................................................................................................82
5.1.2.5. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
5º período ............................................................................................................87
5.1.2.6. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
6º período ...........................................................................................................92
5.1.2.7. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
7º período ............................................................................................................97
5.1.2.8. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva –
8º período ..........................................................................................................101
5.1.3. Entrevistas com os professores e seus resultados ............................................104
CAPÍTULO 6
POSSÍVEIS MUDANÇAS NA FORMAÇÃO EM ODONTOLOGIA - SÍNTESE E
PROPOSIÇÃO .............................................................................................................146
REFERÊNCIAS ............................................................................................................166
DOCUMENTOS ANALISADOS ...................................................................................175
APÊNDICES .................................................................................................................177
11
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
A busca por um trabalho de qualidade sempre foi uma meta, ao longo de
minha vida como odontólogo, iniciada no final do ano de 1989. No ano de 1990,
ingressei no serviço público e desde então, este tem sido o espaço que desenvolvo
minhas atividades profissionais.
Apesar desta busca pela qualidade, uma coisa sempre me chamava a
atenção, apesar de sempre procurar “fazer a minha parte”, notava a incapacidade de
forma geral de resolver os problemas da clientela a qual me era destinada, relacionada
principalmente com a questão do acesso ao tratamento curativo, e nesta questão me
isentava desta culpa, uma vez que considerava que o sistema de saúde era o
responsável direto pela falta de estrutura, sendo que “a minha parte” eu realizava
atendendo dentro de minha capacidade da melhor maneira que me era possível. O
olhar para o tratamento curativo, de certa forma, me limitava a enxergar minha
responsabilidade enquanto profissional, e a qualidade do atendimento era no sentido de
realizar procedimentos tecnicamente perfeitos e ter um bom relacionamento
interpessoal com os pacientes, e desta forma acreditava ser um bom profissional.
Por duas vezes recusei convites de realizar uma especialização em saúde
coletiva, por considerar que minha experiência era suficiente para dar conta de minhas
responsabilidades e por achar realmente que o sistema de saúde tinha muitos
problemas e que a mudança seria uma utopia. Porém, a possibilidade de fazer um
mestrado profissionalizante me atraiu bastante e decidi ingressar nesta empreitada,
mais com vistas à possibilidade de futuramente me ingressar na docência, e confesso
secundariamente com o intuito de me instrumentalizar para o trabalho no serviço
público de saúde, e insisto, porque acreditava ser um bom profissional.
12
Uma das primeiras disciplinas do curso de Mestrado foi sobre
Epistemologia, e minha formação biologicista me fez pensar se de fato tinha feito a
escolha adequada quanto ao curso, uma vez que as temáticas não eram as que
esperava encontrar e também eram no início de difícil entendimento. Esta dificuldade
me fez demandar um esforço redobrado, e a medida que o ver confuso inicial ia se
sistematizando num ver formativo, fui me apaixonando pela disciplina e me despertou
um interesse muito grande pela possibilidade da utilização da epistemologia em
questões práticas.
Juntamente eram desenvolvidas outras disciplinas que tratavam sobre a
concepção saúde-doença e com o surgimento de novas informações e fazendo uma
relação com minha prática profissional, comecei a passar por um período de
complicação do que até então considerava como “verdade” única. Este olhar reduzido e
muitas vezes absoluto, talvez explique o porque da hegemonia do modelo biomédico,
na qual os próprios profissionais consideram-se bons profissionais dentro da formação
que lhes foram dadas.
As temáticas sobre o Sistema Único de Saúde e incorporação da
determinação social do processo saúde-doença foram exercendo em mim uma suave
coerção, e determinou uma mudança de Estilo de Pensamento. Entender o processo
saúde-doença a partir de uma visão ampliada, me fez refletir que o “fazer a minha
parte” era muito mais do que fazer bons procedimentos, e que minhas competências
profissionais deveriam ter como foco a mudança e a melhoria das condições de vida e
de saúde dos indivíduos.
Uma reflexão sobre esta experiência pessoal me fez entender que o
principal problema para a implementação das mudanças das práticas de saúde, está
relacionado com a formação de recursos humanos. As práticas de saúde estão
condicionadas a formação do profissional, ou melhor, a forma de ver, entender e
conceber saúde. E neste próprio exemplo pessoal, me utilizei da categoria
epistemológica Estilo de Pensamento (Fleck, 1986), primeiro para entender e
13
posteriormente para tentar explicar mesmo que preliminarmente sua importância para o
entendimento de como se processa a formação e o trabalho em saúde, uma vez que o
simples ordenamento legal determinado pelo SUS e pelas próprias Diretrizes
Curriculares Nacionais, não foram suficientes para inverter a lógica de atenção à saúde.
Partindo desta reflexão iniciei meu projeto tendo como meta:
Identificar os Estilos de Pensamento das diferentes concepções
saúde-doença das práticas curriculares da disciplina de Odontologia Social e
Preventiva do curso de graduação em Odontologia da UNIVALI. A opção de recorte
pela disciplina se deve a uma análise preliminar que apontou através da matriz
curricular, uma estruturação em disciplinas com bases biologicistas, carregando desta
forma, a disciplina de Odontologia Social e Preventiva da responsabilidade pela
formação da visão integral do processo saúde-doença.
Meu pressuposto básico é de que a forma de ver a concepção
saúde/doença determina uma ação de saúde dirigida, ou seja, toda ação em
saúde, está relacionada com uma concepção saúde-doença, e esta está
intimamente ligada com a formação da graduação.
O desenvolvimento da dissertação ocorreu da seguinte forma:
Primeiro capítulo: a trajetória do modelo hegemônico, a contra-hegemonia, e a
necessidade de mudança através da formação.
Segundo capítulo: apresentação do referencial teórico, e sua justificativa para
utilização na pesquisa.
Terceiro capítulo: apresentação das principais categorias da concepção saúde-
doença e práticas a elas relacionadas.
Quarto capítulo: análise das práticas curriculares da disciplina de Odontologia
Social e Preventiva do curso de graduação em Odontologia da UNIVALI,
realizado através de tratamento dos documentos e de entrevistas com os
14
professores, utilizando a categoria Estilo de Pensamento. Apresentação dos
resultados e discussão.
Quinto capítulo: Síntese e Proposição com articulação às novas propostas de
formação na área da saúde.
Como se pode observar, o trabalho possui limitações. Ele o pretende
através de sua análise propor uma mudança curricular, ele se limita a no máximo
trabalhar numa possível proposta de reforma curricular, entendendo que a integralidade
deve ser estar presente transversalmente em todo o curso e não somente na disciplina
que se direciona para o serviço público. Porém, também infiro que a reforma curricular
pode possibilitar a abertura para uma futura mudança curricular, é neste sentido a
contribuição do trabalho.
15
CAPÍTULO 2
EDUCAÇÃO NA ÁREA DA SAÚDE E OS MODELOS DE ATENÇÃO À SAÚDE
O capítulo inicial procura demonstrar os fatos que influenciaram a
formação na área da saúde no Brasil, bem como seus reflexos na organização dos
serviços de saúde, e talvez este próprio exemplo da história nos revele que o caminho
para a mudança das práticas de saúde esteja na formação durante a graduação.
A publicação do relatório Flexner (1910) nos Estados Unidos, e sua
posterior “importação” marcadamente influenciou a formação na área de saúde no
Brasil e a conseqüência deste fato foi a construção de um modelo biologicista que se
tornou hegemônico nos serviços de saúde. Os movimentos de contra-hegemonia
iniciaram na cada de 70 com o Movimento Sanitário e seu marco mais importante foi
a criação do Sistema Único de Saúde em 1988, determinando a mudança do modelo de
atenção à saúde, tendo como eixo a integralidade. O simples ordenamento legal não foi
suficiente para tanto. A Odontologia, não diferente de outros setores da área da saúde,
continua reproduzindo em sua prática, o modelo hegemônico. A mudança no modelo
formador é um dos pontos centrais a serem trabalhados, e neste sentido a criação das
Diretrizes Curriculares Nacionais aponta o norte a ser seguido.
2.1. Relatório Flexner
O avanço da medicina científica, especialmente no final do século XIX,
com a proeminência da visão cartesiana, levou algumas escolas européias e
americanas a adotarem o modelo de ensino científico, e sua principal repercussão foi a
publicação de um livro nos Estados Unidos, em 1910, que ficou conhecido como
Relatório Flexner (BRASIL, 1986).
O objetivo do Relatório Flexner era a padronização do ensino médico,
que naquela época a situação das escolas médicas nos Estados Unidos era caótica.
16
Além disso, havia um forte interesse do complexo Médico-Industrial, financiador do
movimento, para o desenvolvimento tecnológico com vistas a grande possibilidade de
lucros no setor.
O relatório foi dividido em duas grandes partes: a primeira, que é a que
interessa para este estudo, o autor discorre entre seus pontos principais sobre os
princípios da nova ordem proposta, procurando esgotar as justificativas para o
empreendimento laboratorial e hospitalar (ciclos básico e clínico), reitera a necessidade
de reconstrução do modelo de ensino médico. Sobre o ciclo básico chamado de
laboratorial, propõe que as disciplinas das ciências básicas, tais como, anatomia,
incluindo histologia e embriologia, fisiologia, incluindo bioquímica, sejam ministradas no
primeiro ano e para o segundo ano, farmacologia, patologia, bacteriologia e diagnóstico
físico (FLEXNER apud CUTOLO, 2001). Note-se que o uma única disciplina que
insira o homem dentro da sociedade. Nesta proposta, o enfoque biologicista deixa de
ser predominante para tornar-se único. E no ciclo clínico, desenvolvido em hospital,
comporta duas fases: uma, na qual são desenvolvidas as disciplinas sistêmico-
topográficas e outra chamada de internato, destinada ao cumprimento de um estágio
prático (CUTOLO, 2001). Este segundo ciclo do curso teria como propósito claro o
estudo das doenças com suas implicações clínicas (CUTOLO, 2001). As disciplinas
clínicas são colocadas de forma sistemática relacionando-se com as do ciclo básico,
reforçando a ambientação biologicista do entendimento de doença (CUTOLO, 2001)
Não constam como temas de preocupação na formação do médico a
Saúde Pública, Medicina Preventiva, Medicina Social e Saúde Comunitária (CUTOLO,
2001). Portanto, o Relatório Flexner baseava-se num modelo mecanicista para a
compreensão da estrutura e do funcionamento do corpo humano, onde os sistemas e
os órgãos isolados do corpo destes indivíduos passam a ser o objeto de estudo,
excluindo a visão de totalidade do indivíduo e a causalidade social das doenças
(SANTOS, 1986).
17
A medicina flexneriana ou modelo biomédico baseava-se no mecanicismo,
biologismo, individualismo, especialização, exclusão de práticas alternativas,
tecnificação do ato médico, ênfase na medicina curativa, hospitalocêntrica e
concentração de recursos (MENDES, 1984).
2.2. Modelo Biomédico no Brasil
Define-se por Modelo de Atenção à Saúde, a maneira pela qual estão
organizados os serviços de saúde em um determinado local, resultando em processos
de trabalho que são distribuídos a população (WESTPHAL, 2001).
Na década de 50, o relatório Flexner começou a ser aplicado
integralmente em algumas universidades no Brasil e seu modelo é adotado até hoje na
formação de uma grande maioria das escolas de medicina e outros cursos da área da
saúde. Apesar de sua chegada na década de 50, somente após o golpe militar de
1964, o Brasil entra definitivamente na era Flexneriana, com grande desenvolvimento
do Complexo Médico-Industrial, marcada pela explosão na construção de hospitais,
super-especialização médica, equipamentos desnecessários, aspectos fortemente
influenciados pelo interesse comercial americano e apoiados principalmente pelo
Governo Militar que privilegiava recursos públicos para a assistência médica
previdenciária, em especial para o setor privado financiando a construção destes
hospitais e prestação de serviços médicos (DA ROS, 1991).
Com a reforma flexneriana, os médicos passam a olhar a saúde pública
como atividade fora da prática médica, marcando desta forma o foco individualista e
curativista da assistência (DA ROS, 1991).
2.3. Reforma Sanitária
18
Na década de 70, contra a política do governo militar que privilegiava o
setor privado, em detrimento ao setor público, inicia-se um movimento de intelectuais da
saúde nas universidades, defendendo um modelo democrático e socializado e que não
privilegiasse o capital; um movimento estudantil que reivindicava o fim da ditadura
militar e o fim da ingerência do setor privado no recurso público; um movimento popular
de saúde trabalhando junto com a igreja progressista, reivindicando a utilização de
medicina natural e por último, a partir de 1976, um movimento chamado de saúde
comunitária, defendendo um modelo que integrasse a medicina curativa com a
preventiva (DA ROS, 1991).
O governo militar que apostava cada vez mais no privilegiamento do
complexo médico-industrial, resistiu até 1974, com a crise mundial do petróleo. A partir
daí, verifica a insustentabilidade do modelo e propõe inclusive, de forma contraditória,
alternativas defendidas pelo modelo contra-hegemônico, como tentativa de manter sua
legitimidade no poder, e a partir daí iniciam-se os embates entre o complexo Médico-
Industrial e o Movimento Sanitário (DA ROS, 1991).
As primeiras tentativas institucionais de implantação de um modelo contra-
hegemônico de saúde originam-se a partir de 1976, como o Plano de Interiorização de
Ações de Saúde e Saneamento (PIASS), numa tentativa de integrar ações dicas
com sanitárias. Em 1982, surge o programa denominado Ações Integradas de Saúde
(AIS), com a proposta de repasse de recursos do Ministério da Saúde e da Previdência
para os municípios, fazendo do município um espaço de consolidação do processo de
construção da contra-hegemonia do movimento sanitário (DA ROS, 1991).
O grande marco do movimento de Reforma Sanitária acontece com a
realização da VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, que pela primeira vez conta
com a participação popular, marcando o período de redemocratização do país (BRASIL,
1986). O relatório desta conferência culmina na criação do Sistema Único de Saúde
(SUS), promulgado na nova Constituição de 1988 (BRASIL, 1988), e regulamentado em
1990 por leis complementares (BRASIL, 1990).
19
É importante salientar que a Reforma Sanitária é um processo que ainda
está em construção, com o objetivo de mudar o modelo de atenção à saúde
hegemônico biologicista.
2.4. Sistema Único de Saúde (SUS)
A Constituição estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do
Estado” (BRASIL, 1988). De acordo com a nova legislação, compete ao SUS prestar
assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação
da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades
preventivas (BRASIL, 1988).
O SUS tem como princípios doutrinários e organizativos (BRASIL, 1988):
- Universalidade: através dela, deve ser garantido o acesso às ações e serviços de
saúde a todos os brasileiros (BRASIL, 1988);
- Equidade: trata-se de um princípio de justiça social, na qual a atenção deve ser
maior para pessoas ou grupos em situação de riscos, condições de vida e de
saúde (BRASIL, 1988);
- Regionalização e hierarquização de serviços: os serviços devem ser organizados
em níveis crescentes de complexidade, circunscritos a determinada área
geográfica, com definição e conhecimento da clientela, e garantidos através do
sistema de referência e contra-referência (BRASIL, 1988);
- Descentralização: é a redistribuição de poder e responsabilidades entre os três
níveis de governo, dotando principalmente o município para tomada de decisões
quanto às ações necessárias à saúde de sua população (BRASIL, 1988);
- Participação Social: participação representativa da população no processo
decisório e no controle dos serviços. A participação se efetivamente através
das Conferências de Saúde e dos Conselhos de Saúde (BRASIL, 1988);
20
- Integralidade: na constituição não é utilizado o termo integralidade, mas sim
“atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízo dos serviços assistenciais (BRASIL, 1988), diz ainda “acesso universal
e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação
(BRASIL, 1988). Porém apenas com as práticas assistenciais não seria possível
reduzir a magnitude da maioria das doenças, por isso a integralidade deve estar
presente nas práticas de atenção à saúde, na gestão e no direcionamento das
políticas de saúde (BRASIL, 2005a). As discussões acerca do tema, por se tratar
de um termo polissêmico, não param por aí, além do sentido expresso no trecho
constitucional, outros sentidos já foram descritos. O detalhamento deste
princípio, torna-se necessário, uma vez que a integralidade passa ser o eixo
norteador da estruturação dos serviços e da própria formação na área da saúde.
É importante registrar que não existe uma classificação de importância dos
princípios e diretrizes do SUS, uma vez que eles são complementares entre si,
somente foi dada ênfase neste princípio pelo recorte do estudo.
MATTOS (2001), aponta para três pontos de discussão sobre os sentidos
da integralidade:
1) Integralidade como um traço de boa medicina
Desde a criação e adoção do Relatório Flexner, como já apontado, a prática em
saúde reflete atitudes fragmentárias, tecnicistas, biologicistas, portanto
reducionistas, uma vez que desconsidera aspectos psicológicos, sociais e
culturais. Contrário a esta visão relaciona-se um movimento que ficou conhecido
como Medicina Integral, que propunha reformas curriculares, onde as instituições
formadoras deveriam ser capazes de formar médicos que fossem capazes de
aprender seus pacientes e suas necessidades de modo mais integral,
conhecendo aspectos sociais e de sua cultura, integrando estes conhecimentos
à prática médica. Fazer uma prática integral em saúde significa buscar atender a
necessidade real do indivíduo ou coletividade, em seus contextos culturais,
sociais e psicológicos.
21
2) Integralidade como modo de organizar as práticas
Este conjunto relaciona-se com a organização dos serviços e das práticas de
saúde, que historicamente apresentavam e apresentam uma dicotomia quanto à
assistência e serviços de saúde pública. Esta separação inicialmente era
institucional com a existência do Ministério da Saúde (necessidades de saúde
pública) e do Ministério da Previdência Social (assistência), o que tornava muito
difícil à integração das ações. Com a criação do SUS e a extinção do INAMPS, o
Ministério da Saúde incorpora todas as ações relativas à saúde, mas permanece
a dicotomia, agora interna, com práticas de assistência em hospitais e serviços
tipicamente preventivos realizados pelos Centros de Saúde. A tentativa de
integração das ações deu-se principalmente através da transformação das
antigas unidades de saúde pública, que incorporou práticas assistenciais ao seu
serviço, e trabalhou na superação da fragmentação de atividades em sua própria
unidade (por exemplo, paciente possuía vários prontuários, um para cada tipo de
programa ou especialidade).
A proposta atual de organização do trabalho e práticas, permeados pela
integralidade, é uma integração das ações e dos serviços de saúde, de forma
horizontal, respondendo a necessidade da população, trabalhando com a
epidemiologia (porém existem situações as quais as necessidades não podem
ser percebidas através da epidemiologia), identificação de situações de risco,
sempre com participação conjunta da comunidade.
3) Integralidade e políticas especiais
Trata-se de respostas governamentais frente a determinados problemas de
saúde, ou às necessidades de certos grupos específicos. Um exemplo bem claro
é a resposta governamental frente ao problema da AIDS. Contrariando as
recomendações de agências internacionais, que recomendavam oferta de
intervenções preventivas, consideradas eficazes e de baixo custo, o governo
bancou o fornecimento gratuito de anti-retrovirais, considerados de alto custo,
22
sem descuido de práticas preventivas, aplicando o princípio da integralidade das
ações através de uma política de governo.
Nos exemplos de Mattos (2001), a questão da promoção da saúde não
fica explícita, mas colocamos aqui sua importância no princípio da integralidade.
A produção do cuidado, com utilização de tecnologias de diferentes
naturezas, sejam elas leves, leve-duras ou duras, combinadas ou não, adequadas para
a resolução dos problemas de saúde, também permeiam a integralidade da assistência
(BRASIL, 2005a). Cabe aqui também a ampliação do desenvolvimento da dimensão
cuidadora no sentido de responsabilização profissional pelos resultados das práticas de
atenção, mais capazes de acolhimento e vínculo com os usuários (BRASIL, 2004a).
A integralidade também implica em reconhecimento da limitação da ação
uniprofissional para resolução dos problemas de saúde. Isso implica em mudanças na
relação de poder entre os profissionais (para trabalho interdisciplinar), e entre
profissionais e usuários (com o fomento da autonomia do usuário sobre sua própria
saúde) (BRASIL, 2004a).
Um outro ponto que o termo integralidade pressupõe são ações
intersetoriais entre as diferentes áreas que tenham repercussão na saúde e qualidade
de vida dos indivíduos, principalmente relacionadas com as ações de promoção da
saúde.
Como se trata de um princípio em construção, inclusive quanto a sua
definição, sua discussão não se esgota nos eixos abordados. O princípio da
integralidade implica na superação de reducionismos (MATTOS, 2001).
2.5. Odontologia no Brasil
23
A exemplo do que ocorreu com a medicina, os cursos de odontologia no
Brasil seguiram o modelo de ensino flexneriano, formando profissionais para o trabalho
com bases no Modelo Biomédico.
A Odontologia no Brasil apresenta uma técnica elogiável, com alto nível
de qualidade e sofisticação nas diversas especialidades, cientificamente discutível, por
não demonstrar competência de expandir esta qualidade para a maioria da população,
e pela inexistência de impacto social ante programas e iniciativas públicas
implementados, pode ser considerada socialmente caótica (GARRAFA, 1993),
caracterizando a influência da formação nas práticas de saúde.
Analisando propostas e ações relativas a prática odontológica no Brasil,
entre 1952 e 1994, Narvai (1994) descreve que o movimento do capital direcionou a
odontologia no Brasil para o mercado, caracterizado pela produção-consumo privado de
bens e serviços.
Esta Odontologia hegemônica, de natureza liberal e privada, inicia uma
crise nas últimas décadas do século XX, com oscilações de oferta de emprego e renda,
contribuindo para isso a incipiente participação da Odontologia no SUS (MOYSÉS,
2004). A inserção dentro do sistema público se limitava à atenção básica (gestantes e
crianças) e à atenção ao trauma (FEUERWERKER, 2003).
Moysés (2004), afirma que a Odontologia parece estar caminhando
rapidamente para um esgotamento do modelo que alimentou o ensino e a prática até
meados dos anos de 1990, com uma crescente “canibalização” profissional. Este limite
do mercado privado, e com acirrada concorrência, faz com que a especialização e a
incorporação de tecnologia sejam utilizadas como estratégias de vantagens dentro do
mercado (FEUERWERKER, 2003), de certa forma ainda favorecendo e fortalecendo o
modelo biomédico.
O panorama é de brasileiros sem respostas para seus problemas de
saúde bucal, mutilação bucal, falta de acesso à serviços de qualidade, ou seja, total
24
exclusão social. O modelo dominante baseado na competência técnica, de ão
curativista e voltado para o mercado privado, não produz sujeitos políticos capazes de
protagonizar novas aberturas para a sociedade e para a profissão (MOYSÉS, 2004).
O mercado e a própria sociedade tem influenciado a lógica da formação e
da assistência, colocando em risco a razão de ser e de existir da universidade em
relação à produção do conhecimento (LEMOS, 2005). Os cursos de graduação da área
da saúde têm privilegiado a profissionalização, treinamento de técnicas e repasses de
novidades tecnológicas em detrimento a construção do saber (BRASIL, 2004b; LEMOS,
2005).
Os cursos de graduação em Odontologia do Brasil expressam uma
formação tecnicista, elitista e descontextualizada da realidade sócio-econômica do país
(LEMOS, 2005).
Os currículos dos cursos de Odontologia sempre foram estruturados
privilegiando o “paradigma” curativo, nas quais o ensino não se orientava pela situação
epidemiológica, social, cultural e econômica da população (GARBIN, 2006). Paula e
Bezerra (2003), estudando a estrutura curricular de 89 cursos de Odontologia no Brasil,
verificou que existe uma proeminência dada a formação técnica e uma separação entre
as áreas básica e profissionalizante, e que o tratamento dado as áreas de formação em
Saúde Coletiva, Ética e Cidadania é bastante irregular e aponta uma necessidade de
reorientação dos cursos para se adequarem com as Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCN).
A área técnico-científica do ensino-aprendizagem deve ser apenas um dos
elementos da qualificação profissional e não o seu foco central, pois a formação
engloba também aspectos de produção de subjetividade, de habilidades técnicas e de
pensamento, e conhecimento do Sistema Único de Saúde (BRASIL, 2004a).
25
Existe um consenso entre os atores que defendem a Reforma Sanitária
Brasileira de que a formação de recursos humanos é um dos maiores problemas na
consolidação do SUS, na qual impera o despreparo do profissional recém-formado para
atuar na complexidade do sistema (BRASIL, 2004b). Torna-se necessária uma
reformulação na formação para que os futuros profissionais estejam aptos para o
trabalho dentro do novo modelo de atenção à saúde proposto pelo SUS, e esta
mudança deve ser estruturada por um currículo integrador, com projetos pedagógicos
dinâmicos, críticos, flexíveis e transdisciplinares (MOYSÉS, 2004).
Com a criação do SUS, a universalidade traz consigo um aumento da
oferta de trabalho e acesso da população aos serviços odontológicos, sendo, portanto,
necessário um profissional capaz de trabalhar na perspectiva da integralidade das
ações, tanto individual quanto coletivamente.
Com o avanço da descentralização do SUS e a expansão das equipes de
saúde da família se fez evidente esta falta de perfil profissional para atuação no SUS
(PELISSARI et al, 2005).
O relatório da 3ª Conferência Nacional de Saúde Bucal (2004), aponta que
o sistema de ensino superior o está cumprindo o seu papel na formação de
profissionais, comprometidos com o SUS e com o controle social, não se orientando
pela compreensão crítica das necessidades sociais, conduzida sem debates com os
organismos de gestão e participação social, resultando em autonomização do Ministério
da Educação e instituições formadoras para definição da formação profissional,
cristalizando barreiras para o cumprimento constitucional de ordenação na formação de
recursos humanos para o setor saúde por parte do SUS (BRASIL, 2005b). Com
exceção de alguns esforços pontuais para a mudança desse quadro, o sistema de
ensino superior está, de maneira geral, quase que totalmente alienado da realidade
sócio-epidemiológica da população brasileira, com conivência inclusive de dirigentes e
docentes da área (BRASIL, 2005b).
26
As discussões e mudanças no modelo formador em Odontologia
começam com um atraso histórico, frente aos cursos de Medicina e Enfermagem,
exigindo, portanto, esforço redobrado para a integração da saúde bucal e de seus
profissionais, dentro deste novo contexto de modelo de atenção proposto pelo SUS
(MORITA; KRIGER, 2004).
Werneck et al (2001), relatam uma experiência de estágio supervisionado
baseado na metodologia do “aprender-fazendo”, com uma integração entre a
universidade e o serviço público, na qual o aluno participa ativamente dos programas
de saúde locais, vivenciando e aprendendo dentro da realidade. Experiência
semelhante também foi relatada por Batista et al (2005), que descreve o estágio sob a
ótica do Programa de Saúde da Família, com o objetivo de superar a prática docente
tradicional, com a participação em reuniões conjuntas com os profissionais, visitas
domiciliares à comunidade, participação nos grupos e atendimento clínico. Outros
relatos de estágio extra-muros também foram descritos por Uriarte Neto (2003), Busato
et al (2005), Rocha et al (2002) e Mendes et al (2006).
Um outro enfoque de estágios extra-muros, além da vivência na realidade
do sistema de saúde, foram descritos por Watanabe et al (2002) e Lucas et al (2002)
que relatam a experiência de trabalho multiprofissional com acadêmicos de outros
cursos da área da saúde.
Uriarte Neto (2002) descreve em seu artigo, uma experiência de formação
continuada para os professores, abordando temas sobre a prática pedagógica e
docência em odontologia, visando a construção de competência docente para a
qualificação do processo de ensino-aprendizagem.
Moysés et al (2003) relatam uma experiência de construção de práticas
pedagógicas desenvolvidas no Programa de Aprendizagem em Saúde Coletiva do
curso de Odontologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, baseados nas
DCN e no projeto pedagógico institucional, destacando a importância de diversidade
27
dos cenários de ensino-aprendizagem como forma de integração à realidade social, e
desenvolvimento de temas sobre saúde e sociedade, políticas de saúde, sistemas de
saúde, promoção da saúde, planejamento, gerenciamento, trabalho coletivo, familiar e
individual, com vistas a humanização da educação em odontologia.
Coelho et al (2002) apresenta uma proposta de integração curricular do
curso de Odontologia da Universidade de Severino Sombra, baseada na distribuição
dos conteúdos em disciplinas macro-programáticas, buscando uma aprendizagem no
método “aprender-fazendo”, visando a obtenção de respostas multi-especialidades
sobre as questões trabalhadas. Noro (2005) faz uma reflexão semelhante sobre a
integração curricular apontando ainda que a aprendizagem deve ter como eixo
estruturante o SUS e as DCN.
Cristino (2005) em seu estudo aponta para a importância do perfil docente
na construção de um projeto integrador, colocando em discussão a formação de
generalistas através de professores especialistas. Propõe a antecipação da clínica
integrada, compatível com as habilidades e competências adquiridas pelos alunos,
como forma antecipar a integração de conhecimentos.
A experiência de implantação das DCN da Universidade Estadual de
Maringá, talvez seja a mais concreta na área de formação em Odontologia. O curso
possui no seu projeto pedagógico um currículo multidisciplinar integrado, e integração
entre as áreas básica e profissionalizante, clínicas integradas, estágio extra-muro
supervisionado, num total de 900 horas, com a integração docente-assitencial como
estratégia na resolução dos problemas de saúde da coletividade (TERADA et al, 2004).
Ainda assim, os autores relatam dificuldades processuais na consolidação do projeto,
na qual destacamos o perfil dos docentes, geralmente super-especialistas.
A literatura demonstra que existe muita discussão sobre a mudança na
formação, porém existem poucas experiências concretas, a grande maioria dos relatos
28
são ainda propostas de mudanças, baseadas numa tentativa de cumprimento das DCN.
2.6. Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Odontologia
Historicamente, o Ministério da Educação privilegiava uma estrutura
curricular compatibilizada com o Modelo Biomédico, com atenção à saúde voltada para
o biologicismo (CUTOLO, 2003), contrário, portanto, ao modelo proposto pela Reforma
Sanitária/SUS.
A determinação da reorganização do modelo de atenção à saúde no
Brasil, inicia-se legalmente em 1988, a partir da aprovação Constitucional do relatório
da VIII Conferência Nacional de Saúde (1986). A integralidade mostra-se como eixo
principal das ações em seus vários sentidos, influenciando também, indiretamente as
mudanças nas diretrizes de formação na área da saúde, iniciadas pela Lei das
Diretrizes e Bases da Educação (1996) e posteriormente, no caso do curso de
Odontologia, pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Odontologia
(2002).
A lei 9.394/96, que dispõe sobre as Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, no seu art. 43º, afirma que a formação deve ter por finalidade:
I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do
pensamento reflexivo;
II - formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a
inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da
sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua (BRASIL, 1996, p. 16,
meus grifos).
Apesar de não serem específicas, as diretrizes apontam para um novo
perfil profissional, além de descrever sua responsabilidade para com a sociedade,
permitindo com isso uma maior flexibilização nos currículos (BRASIL, 1996).
29
O avanço das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, com
envolvimento do Ministério da Educação e do Movimento da Reforma Sanitária, culmina
nas Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em saúde, que
aprovadas em sua grande maioria entre 2001 e 2002 (exceto medicina veterinária,
psicologia, educação física e serviço social) estabelecem o redirecionamento da
formação na área da saúde. E através do Parecer CNE/CES 1.300/01, define como
objetivo:
Levar os alunos dos cursos de graduação em saúde a aprender a aprender que
engloba aprender a ser, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender
a conhecer, garantindo a capacitação de profissionais com autonomia e
discernimento para assegurar a integralidade da atenção e a qualidade e
humanização do atendimento prestado aos indivíduos, famílias e comunidades
(BRASIL, 2001a, p.3, grifo do MEC).
Restrinjo-me aqui a pontuar os principais fatos que marcaram até então, o
processo de formação na área da saúde, porém vale salientar que as mudanças vão
acontecendo frente a muita luta, negociação e pacto entre os diversos atores que
envolvem o Ministério da Educação e progressistas do Ministério da Saúde e outros
setores ligados a Reforma Sanitária.
A Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação,
através da Resolução CNE/CES 3, de 19 de fevereiro de 2002, institui as Diretrizes
Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Odontologia. No Art. define o
perfil desejado do egresso/profissional cirurgião dentista:
Formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, para atuar em todos os
níveis de atenção à saúde, com base no rigor técnico e científico. Capacitado ao
exercício de atividades referentes à saúde bucal da população, pautado em
princípios éticos, legais e na compreensão da realidade social, cultural e
econômica do seu meio, dirigindo sua atuação para a transformação da realidade
em benefício da sociedade (BRASIL, 2002, p.1).
E atribui no seu art. que a formação do cirurgião dentista deve
contemplar, entre outras, um profissional com as seguintes competências:
30
1- atuar em todos os níveis de atenção à saúde, integrando-se em programas
de promoção, manutenção, prevenção, proteção e recuperação da saúde,
sensibilizados e comprometidos com o ser humano, respeitando-o e
valorizando-o (Inciso II);
2- atuar multiprofissionalmente, interdisciplinarmente e transdisciplinarmente
com extrema produtividade na promoção da saúde baseado na convicção
científica, de cidadania e de ética (Inciso III);
3- reconhecer a saúde como direito e condições dignas de vida e atuar de
forma a garantir a integralidade da assistência, entendida como conjunto
articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos,
individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos osveis de
complexidade do sistema (Inciso IV);
4- exercer sua profissão de forma articulada ao contexto social, entendendo-o
como uma forma de participação e contribuição social (Inciso V);
5- desenvolver assistência odontológica individual e coletiva (Inciso VII);
6- identificar em pacientes e em grupos populacionais as doenças e distúrbios
buco-maxilo-faciais e realizar procedimentos adequados para suas
investigações, prevenção, tratamento e controle (Inciso VIII);
7- promover a saúde bucal e prevenir doenças e distúrbios bucais (Inciso X);
8- participar em educação continuada relativa a saúde bucal e doenças como
um componente da obrigação profissional e manter o espírito crítico, mas
aberto a novas informações (Inciso XVII);
9- buscar melhorar a percepção e providenciar soluções para os problemas de
saúde bucal e áreas relacionadas e necessidades globais da comunidade
(Inciso XIX);
10- trabalhar em equipes interdisciplinares e atuar como agente de promoção
de saúde (Inciso XXVIII);
11- propor e executar planos de tratamento adequados (Inciso XXV)(BRASIL,
2002, p. 2-3, meus grifos).
Este perfil desejado expresso nas DCN, com definição de competências
(conhecimentos, habilidades e atitudes), implica em uma formação baseada
principalmente na integralidade em seu sentido mais amplo.
Além do perfil e das competências profissionais, as Diretrizes Curriculares
estabelecem ainda alguns fundamentos quanto ao projeto pedagógico e estruturação
do curso de Odontologia, pelas quais as Instituições de Ensino Superior devem nortear-
se. Dois artigos da resolução em questão merecem destaque devido a sua importância
no processo de mudança proposto pelas Diretrizes.
31
Art. 9º. O Curso de Odontologia deve ter um projeto pedagógico, construído
coletivamente, centrado no aluno como sujeito de aprendizagem e apoiado no
professor como facilitador e mediador no processo ensino-aprendizagem. Este
projeto pedagógico deverá buscar a formação integral e adequada do estudante
através de uma articulação entre o ensino, a pesquisa e a extensão/assistência.
Art. 13º . A estrutura do curso de graduação em Odontologia deverá:
I- estabelecer com clareza aquilo que se deseja obter como um perfil profissional
integral; na sua elaboração, substituir a decisão pessoal pela coletiva.;
II- Aproximar o conhecimento básico da sua utilização clínica; viabilização pela
integração curricular; e
III- Utilizar metodologias de ensino/aprendizagem, que permitam a participação
ativa dos alunos neste processo de integração dos conhecimentos das ciências
básicas com os das ciências clínicas e, instituir programas de iniciação científica
como método de aprendizagem (BRASIL, 2002, p. 3-4).
A Constituição Federal de 1988 estabelece, no Título VIII, Capítulo II,
Seção II da Saúde, artigo 200, inciso III, que, compete ao SUS ordenar a formação de
recursos humanos na área da saúde (BRASIL, 1988), e é enfatizada na lei 8080/90
(BRASIL, 1990). Não cabe ao setor da saúde o disciplinamento de educação por meio
do ensino em instituições educacionais; entretanto, é sua tarefa contribuir para que a
educação se vincule ao mundo do trabalho e às práticas sociais em saúde, como
requer a legislação educacional.
E as DCN confirmam este novo delineamento na formação quando
determinam que:
A formação do cirurgião dentista deverá contemplar o sistema de saúde vigente
no país, a atenção integral da saúde num sistema regionalizado e hierarquizado
de referência e contra-referência e o trabalho em equipe (BRASIL, 2002, p. 3,
meu grifo).
Mais recentemente o Ministério da Saúde, através de sua Secretaria de
Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES) de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP) do Ministério da Educação, em conjunto com a
Secretaria de Educação Superior (SESu) e o Instituto, elaboraram o Programa Nacional
de Reorientação da Formação Profissional em Saúde Pró-Saúde, visando uma
aproximação entre a formação de graduação no país e as necessidades da atenção
básica, que se traduzem no Brasil pela Estratégia Saúde da Família, procurando
favorecer a geração de perfis profissionais mais ajustados às perspectivas da atenção
32
básica (BRASIL, 2005c). Confirmando as competências descritas nas DCN como
necessárias para o futuro profissional, o P-saúde aponta que as Instituições de
Ensino Superior devem incorporar à sua missão institucional a formação integral e
terminal (BRASIL, 2005c).
Em resumo, isto significa dizer que a formação na graduação deve
preparar o futuro profissional para o trabalho na atenção sica do SUS.
33
CAPÍTULO 3
A EPISTEMOLOGIA DE LUDWIK FLECK
3.1. Estilo de Pensamento e Coletivo de Pensamento
Em um artigo (Zur Krise der “Wirklichkeit” - Sobre a Crise da Realidade) de
1929, Fleck introduz as categorias Coletivo de Pensamento e Estilo de Pensamento,
aprofundadas em sua monografia de 1935.
O primeiro designa a unidade social da comunidade de cientistas de um campo
determinado; o segundo, as pressuposições de acordo com um estilo sobre o
que o coletivo constrói seu edifício teórico (SCHÄFER; SCHNELLE, 1986, p. 23).
Na categoria epistemológica de Fleck, a relação cognoscitiva não se
restringe apenas a relação cognoscente e objeto a conhecer; o processo de
conhecimento se constitui também, condicionado por fatores sociais, históricos e
culturais, desta forma, os fatos científicos, interdependem-se historicamente. As
experiências do presente estão ligadas às do passado e estas, ligar-se-ão às do futuro
(FLECK, 1986). o as chamadas protoidéias ou pré-idéias, esboços históricos
evolutivos das teorias atuais, que apesar das variações dos Estilos de Pensamento,
mantém algumas concepções surgidas no passado (FLECK, 1986). Porém, é preciso
lembrar que nem todo fato científico atual é proveniente de uma protoidéia e nem
toda protoidéia será materializada em fato científico (FLECK, 1986).
O Estilo de Pensamento tem como raiz uma disposição para ver,
observar ou perceber de forma dirigida. A construção do fato científico está
intrinsecamente relacionada com esta forma de ver (FLECK, 1986; LÖWY, 1994a;
SCHÄFER; SCHNELLE, 1986).
Portanto, as “verdades” e os fatos científicos, pertencem a Estilos de
Pensamento, que da sua instauração até o final de seu ciclo, passam por algumas
fases assim descritas por Fleck: 1) fase de instauração: ver confuso, pouco
34
desenvolvido e articulado; 2) ver formativo: estilizado, onde se inicia a construção do
fato científico; 3) fase de extensão: ela pode ser representado por dois períodos, o
primeiro denominado de classismo, na qual a manutenção das idéias, os fatos
observados são adaptados e explicados pelo Estilo de Pensamento e compartilhado
por seu Coletivo de Pensamento, e num segundo período tornam-se conscientes as
exceções e nesta fase o Coletivo luta de forma heróica para a manutenção de seu
Estilo de Pensamento, chamado por Fleck de harmonia das ilusões; 4)
Complicação: surgimento de novos fatos, que o Estilo de Pensamento não
consegue explicar ou encaixar em sua teoria (neste momento, o aparecimento de novas
idéias, tenta explicar os fatos novos, propiciando o surgimento da mudança de Estilo
de Pensamento, reiniciando um novo ciclo).
Desta forma, as “verdades” e os fatos científicos devem ser
contextualizados e compreendidos como transitórios (CUTOLO, 1999). A relativização
dos fatos torna as relações entre os diferentes Estilos de Pensamento
incomensuráveis
1
, porém, quando as diferenças entre os Estilos de Pensamento não
apresentam limites precisos de distanciamentos ou proximidades, eles são chamados
de matizes de Estilo de Pensamento (FLECK, 1986).
Os fatos científicos construídos pelos Coletivos de Pensamento são
assimilados por um outro Coletivo de Pensamento, que realizam uma tradução em
seu próprio estilo, transformando-os num outro fato científico (LOWY, 1994a).
A instauração de um novo Estilo de Pensamento geralmente implica
numa perda da capacidade de observar certos aspectos, muitas vezes relevantes, do
estilo anterior (LÖWY, 1994b). Portanto, as complicações de determinado Estilo de
Pensamento podem tornar-se ferramentas preciosas, para que se processe a
mudança de Estilo de Pensamento.
Pode-se de certa forma, compreender Estilo de Pensamento como:
1
Ou incongruentes.
35
1. modo de ver, entender e conceber; 2. processual, dinâmico, sujeito a
mecanismos de regulação; 3. determinado psico/sócio/histórico/culturalmente;
4. que leva a um corpo de conhecimentos e práticas; 5. compartilhado por um
coletivo com formação específica (CUTOLO, 2001, p, 56).
Torna-se importante a explicação de alguns itens que serão utilizados,
dentro do recorte deste estudo, para contextualizar o processo de formação com Estilo
de Pensamento (EP).
Em relação à primeira característica (modo de ver, entender e conceber);
compreendo que seja o “ver formativo” estilizado, uma das condições sine qua
non para o entendimento de EP (CUTOLO, 2001, p. 56)
A inclusão de uma característica geral de agrupamento no que se refere “...
processual, dinâmico, sujeito a mecanismos de regulação... justifica-se, no
sentido de que o Estilo de Pensamento não é estático, dinamiza-se e processa-
se. Tem um movimento, instaura-se, estende-se, vivencia um período de
classismo e complicação, modifica-se. Durante este processo produz
mecanismos de regulação intrínseca, um eficaz sistema de idéias que regula a
harmonia das ilusões e promove coerção de pensamento (CUTOLO, 2001, p.56)
Em relação a outro aspecto, o da determinação sócio-histórico-cultural, Fleck
acredita que o conhecer representa a atividade mais condicionada socialmente, e
que o conhecimento é uma criação social por excelência (FLECK, 1986). Chega
a afirmar que as relações culturais, históricas e sociais constituem o terceiro
fator, o “estado do conhecimento” do tripé da relação cognoscitiva (FLECK,
1986); (CUTOLO, 2001, p. 56)
Segundo Fleck (1986) a disposição para um sentir seletivo leva a uma ação
conseqüentemente dirigida e uma elaboração correspondente do percebido.
Teorias, modelos, métodos, técnicas, instrumentos são alguns dos produtos e
meios para a ação dirigida. Isto, de certa forma, poderia justificar a terceira
característica da definição (...que leva a um corpo de conhecimentos e práticas);
(CUTOLO, 2001, p.56, meu grifo).
A quinta característica empregada no exercício foi a cumplicidade e
compartilhamento do ideal de verdade por um coletivo. A unidade social da
comunidade de cientistas de um campo determinado, a que SCHÄFER &
SCHNELLE (1986, p, 23) se referem, constituem a grande legitimação do EP.
Não existe EP se não houver um coletivo de pensamento que o sustente
(CUTOLO, 2001, p. 57).
Em um trabalho mais recente Cutolo (2005) desdobra o 5º elemento
constitutivo do Estilo de Pensamento, fracionando em “compartilhado por um coletivo
e “com formação específica” (que passa a ser considerado o elemento).
36
3.2. Estilo de Pensamento como referencial de análise e o objeto desta pesquisa
A utilização da categoria Estilo de Pensamento, depende do recorte do
estudo, só podendo ser definido com a escolha do objeto a ser investigado (DA ROS,
2000; CUTOLO, 2001).
Cutolo (2001), investigando a concepção de causalidade saúde/doença
encontradas dentro de um Curso de Graduação em Medicina, e utilizando a categoria
Estilo de Pensamento, afirma:
O que se entende por Estilo de Pensamento deve ser especialmente
considerado e contextualizado a um campo determinado. Assim, o uso da
categoria deve estar subordinado a um enfoque previamente escolhido pelo
investigador (CUTOLO, 2001, p.52).
Existem determinações legais que expressam o direcionamento para
mudança das práticas de saúde no sentido da integralidade, tanto na formação de
profissionais, representados pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, quanto pelas
próprias diretrizes do Sistema Único de Saúde, porém, o simples ordenamento legal
não foi capaz de transformar as práticas de saúde. Entender todo este processo de
manutenção ou mudança de práticas de saúde es intimamente relacionado com a
forma de ver o processo saúde-doença de um determinado grupo. Portanto, entender o
processo saúde-doença, através da categoria Estilo de Pensamento e seus elementos
constituintes, pode explicitar os verdadeiros sentidos do “fazer” saúde, demonstrando
os pontos reais e necessários para a implementação da mudança para uma prática
integral de saúde, como propõe o Sistema Nacional de Saúde.
A utilização das categorias Estilos de Pensamento e Coletivos de
Pensamento, não se mostrou conveniente, mas foi de fundamental importância
neste estudo, auxiliando o entendimento dos dados explícitos e implícitos que envolvem
o processo de formação do aluno na graduação.
37
O objetivo principal da pesquisa foi, portanto, identificar os Estilos de
Pensamento das práticas curriculares do curso de graduação em Odontologia da
UNIVALI, em especial da disciplina de Odontologia Social e Preventiva. E mais
especificamente:
1. Identificar os Estilos de Pensamento dos Professores da Disciplina de
Odontologia Social e Preventiva do Curso de Graduação de Odontologia da
UNIVALI;
2. Identificar os Estilos de Pensamento dos Planos de Ensino da Disciplina de
Odontologia Social e Preventiva do Curso de Graduação de Odontologia da
UNIVALI;
3. Correlacionar os Estilos de Pensamento das práticas curriculares da
Disciplina de Odontologia Social e Preventiva do Curso de Graduação de
Odontologia da UNIVALI com as determinações legais sobre a formação na área
da saúde;
4. Apontar as possíveis inconsistências das práticas curriculares quanto aos seus
objetivos;
5. Propor possíveis caminhos para reforma curricular de acordo com as
determinações legais, tendo como eixo a integralidade.
A pesquisa parte de três pressupostos básicos:
1. O núcleo da questão da educação em odontologia está relacionado com a
concepção saúde-doença que a escola e seus integrantes docentes
possuem;
2. A forma de ver a concepção saúde/doença determina uma ação de saúde
dirigida, ou seja, toda ação em saúde, está relacionada com uma concepção
saúde-doença;
3. O processo de formação de um aluno dentro de uma disciplina de graduão
é uma introdução dentro de um Estilo de Pensamento.
38
Para Fleck (1986), toda introdução didática é, literalmente um conduzir-
dentro” ou uma suave coerção (FLECK, 1986).
Cutolo em sua tese de Doutorado destaca:
A escola desempenha um papel fundamental na introdução a um novo Estilo de
Pensamento. É durante o treinamento que o futuro componente de um coletivo
de pensamento aprende como perceber a realidade de acordo com seu
específico Estilo de Pensamento (LOWY, 1986 apud CUTOLO, 2001, p. 59).
Ainda segundo Cutolo:
Ensinar é introduzir em um Estilo de Pensamento e aprender é entrar em um
Estilo de Pensamento. A coerção de pensamento exercida pelos professores
direcionada à aquisição do conhecimento pelo aluno, através de um olhar
estilizado (o ver formativo), dá-se através de suas práticas didáticas, ou, melhor
dizendo, através do currículo em seu sentido mais amplo (CUTOLO, 2001, p.59).
Quando Cutolo refere-se ao currículo em seu sentido mais amplo,
descreve-o como um conjunto de práticas, com execução através de sua grade
curricular, ementas e conteúdos das disciplinas, da literatura recomendada, dos
espaços de atuação utilizados, dos discursos dos professores, das práticas
assistenciais (CUTOLO, 2001). Essas informações podem ser substanciais para
definição do Estilo de Pensamento de uma disciplina ou de um próprio curso de
graduação, portanto, o currículo em seu sentido mais amplo ou mesmo uma disciplina
do curso, através de suas práticas curriculares, podem ser considerados como uma
estratégia de introdução dentro de um Estilo de Pensamento.
O processo de formação num curso de graduação é uma “suave coerção
para um ver formativo, que inicialmente apresenta um ver confuso e durante o
desenvolvimento dos conteúdos disciplinares vai se estilizando, levando o aluno a um
corpo de conhecimentos e práticas, inserindo-o dentro de um Estilo de Pensamento
e Coletivo de Pensamento com formação específica. As ações praticadas são
condizentes com o Estilo de Pensamento deste coletivo, e no caso da formação na
graduação, se aplica o que se aprendeu, portanto, as práticas curriculares de uma
39
determinada disciplina determinam o tipo olhar e conseqüentemente a futura prática
profissional do aluno (figura 1).
Caracterizando Estilo de Pensamento, Fleck (1986) ressalta que o estilo
de argumentação pode se apresentar tanto no discurso oral quanto no escrito, com a
utilização de técnicas de linguagem e uso de termos específicos, e que esta linguagem
é o elemento mais importante da comunicação científica, porém deixa claro que a
mesma não é suficiente para assegurar a cooperação por coletivo de pensamento, mas
a experiência prática também é necessária.
Figura 1 – Inserção no Estilo de Pensamento através da formação.
ESTILO DE PENSAMENTO
Processo de formação
(modo de ver,
entender e conceber)
Prática profissional
(que leva a um
corpo de
conhecimentos e
práticas)
Direcionamento
através da formação
(compartilhado por
um coletivo de
formação específica)
40
A falta de sincronismo entre a organização das práticas curriculares e o
Estilo de Pensamento desejado para a formação do aluno, pode levar a ocorrência do
currículo oculto, que pode ser definido como:
Normas, valores e crenças imbricadas e transmitidas aos alunos através de
regras subjacentes que estruturam as rotinas e relações sociais na escola e na
vida da sala de aula (GIROUX, 1983, p. 71).
Considerando que a mudança das práticas de saúde estão condicionadas
principalmente a formação de recursos humanos, as graduações devem ter seu
enfoque voltado para a introdução dos alunos dentro do Estilo de Pensamento
condizente com as propostas da Reforma Sanitária, tendo a integralidade como eixo.
A graduação deve ser o principal foco da mudança, uma vez que o aluno
possui um olhar caótico sobre os conteúdos disciplinares, e através de uma suave
coerção, a introdução num Estilo de Pensamento se de uma forma muito mais
tranqüila se compararmos com a de mudança de Estilo de Pensamento, na qual o
profissional deve passar por um processo de complicação, refletir sobre as
inconsistências de seu Estilo de Pensamento, para então iniciar a mudança para um
novo Estilo de Pensamento, isso tudo dificultado pelo que Fleck denominou de
harmonia das ilusões.
O termo competência é bastante utilizado nas Diretrizes Curriculares
Nacionais, cabe aqui, portanto, um esclarecimento e uma aproximação com o
referencial teórico.
Competência pode ser definida por um conjunto de conhecimentos (que
muitos denominam de saberes), habilidades (saber-fazer relacionado à prática do
trabalho, indo além da mera ação motora) e atitudes (saber-ser, ou seja, uma série de
aspectos inerentes a um trabalho ético e de qualidade, realizado por meio de
cooperação, solidariedade, participação na tomada de decisões) (BRASIL, 2001b).
41
O desenvolvimento de competências pode ser relacionado com o
elemento constitutivo do Estilo de Pensamento, que leva a um corpo de
conhecimentos e práticas, uma vez que este elemento do EP está relacionado com
teorias e modelos (conhecimentos), métodos, técnicas e instrumentos (habilidades),
produtos e meios para a ação dirigida (atitudes).
A partir destas considerações foi estruturada a coleta dos dados que
consideramos relevantes no ver formativo do aluno para um Estilo de Pensamento,
tendo como referência a concepção saúde-doença.
42
CAPÍTULO 4
CONCEPÇÃO SAÚDE-DOENÇA - AS GRANDES CATEGORIAS
4.1. Visão Higienista
Os séculos XVII e XVIII foram palco de muitas transformações políticas e
econômicas na Europa, marcadas principalmente pela disputa entre a burguesia e a
nobreza. Com o crescimento do comércio, houve um aumento da população urbana,
porém isto aconteceu de maneira desordenada e sem a mínima infra-estrutura sanitária,
o que gerou uma série de epidemias. O adoecer era entendido como uma
conseqüência de condições multifatoriais, como por exemplo, o acúmulo de cadáveres
na cidade, a qualidade da água e do ar, o destino dos dejetos, a higiene, etc
(FOUCAULT, 1993). Este condicionamento da doença ficou conhecido como “Teoria
Miasmática”, na qual as más condições sanitárias geravam um estado atmosférico,
causador de doenças infecciosas e epidemias (GUTIERREZ, 2001).
Aparece aqui a noção de meio”, segundo Foucault (1993), as más
condições dos locais onde viviam as pessoas eram causadoras das doenças (modo de
ver ou sentir seletivo) e a atuação médica era baseada sobre as condições ambientais
em que viviam as pessoas (corpo de práticas ou ação dirigida). Um exemplo
marcante dessa atuação foi o da Polícia Médica, surgida na Alemanha entre o final do
século XVIII e o início do século XIX, que utilizando dados epidemiológicos, executava
políticas com objetivo de controlar e prevenir doenças, interferindo nas condições
multifatoriais do adoecer (FOUCAULT, 1993; ROSEN, 1994). Na França, a
preocupação era eminentemente na área urbana, onde as grandes concentrações
trouxeram conseqüências para a saúde das pessoas, e foram tomadas medidas como
deslocamento dos cemitérios para fora da cidade, mudança na arquitetura das cidades
e das casas com melhor circulação de ar, distribuição de água potável, tratamento de
dejetos humanos (CUTOLO, 2001).
43
O caráter de intervenção desta época era fortemente
higienista/preventivista, atuando em medidas locais, sobre os fatores determinantes
(CUTOLO, 2001), que de certa forma, pode ser considerado como uma protoidéia,
para o que hoje chamamos de proteção da saúde.
4.2. Visão Social
No final do século XVIII, em meio à industrialização, o contexto era de
crescente urbanização, e em função da escassa oferta, as moradias eram oferecidas
sem as mínimas condições sanitárias (ROSEN, 1994), e as condições de trabalho eram
muito ruins, com jornadas excessivas de até dezesseis horas, em ambientes insalubres
e perigosos (BARBEIRO, 1977). A explicação do processo saúde-doença estava
relacionada com as condições de trabalho e de vida das populações (GUTIERREZ,
2001). A doença e a saúde são expressões das relações mutáveis entre vários
componentes do corpo, e sua interação com o ambiente externo, sendo mediada e
modificada pela atividade social e pelo ambiente cultural que tal atividade cria (ROSEN,
1980).
Considerado por muitos como o pai da Medicina Social, Virchow, em
1847, investigando uma epidemia muito severa de tifo numa região rural da Prússia,
conclui em seu relatório, que as origens de má saúde estavam relacionadas com
problemas sociais (modo de ver) e apontava soluções como aumento de oferta de
empregos, melhores salários, criação de cooperativas agrícolas (corpo de práticas) e
não mencionava soluções estritamente médicas como, por exemplo, criação de clínicas
e hospitais (WAITZKIN, 1980). As soluções propostas por Virchow, podem ser
consideradas como protoidéias do conceito atual de promoção da saúde.
Com a repressão aos movimentos de transformação e o desenvolvimento
da bacteriologia, a idéia de conectar o processo saúde-doença à forma com que se
44
organiza a sociedade, determinada em última análise pela estrutura econômica, fica
adormecida por quase cem anos (BREILH, 1986).
A medicina social na América Latina é resgatada a partir da década de 70
do século XX, como um posicionamento científico e político, estudando as relações
entre saúde e sociedade, caracterizando processos econômicos e políticos, como a
origem de perfis epidemiológicos complexos, próprios a situações de intensa
desigualdade (CZERESNIA; FREITAS, 2003).
O conceito atual de Medicina Social não está restrito ao seu aspecto
genético (relação pobreza/doença), mas que o processo saúde-doença é mediado e
determinado socialmente, com aspectos culturais, antropológicos, históricos, políticos e
econômicos (CUTOLO, 2001).
4.3. Visão Biológica
No final do século XIX, quando Pasteur desenvolve a “teoria do germe”
como causa biológica das enfermidades infecciosas (modo de ver) as teorias
anteriores, que explicam o processo saúde-doença são refutadas, e a unicausalidade
biológica torna-se a explicação para o aparecimento de doenças (BARATA, 1985;
WAITZKIN, 1980). Portanto os laboratórios e os microscópios tornaram-se fortes armas
médicas (PINTO, 1986). Nesta mesma época, outras áreas como a genética, a
parasitologia, os raios-X, também se desenvolvem, fortalecendo ainda mais este modo
de ver e entender doenças (PINTO, 1986), e a partir destes pressupostos, ocorre o
desenvolvimento da infectologia, vacinação, assepsia e cirurgia (PINTO, 1986). A
inovação da prática médica, levada por Pasteur, inaugura a fundação da chamada
Medicina Científica (BERNAL, 1977).
Com a Medicina Científica (modo de ver) desenvolve-se o “Complexo
Médico-Industrial”, ocorrendo um “endeusamento” da tecnologia médica diagnóstica e
45
terapêutica, dando um poder aos procedimentos, instrumentos, técnicas e pílulas
(corpo de práticas) maior do que eles podem ter (CUTOLO, 2001).
Behring, em 1893, chega a afirmar que graças a descoberta das bactérias,
a medicina não precisaria mais perder tempo com questões sociais, sintetizando a
ruptura com o movimento de medicina social (ROSEN, 1980).
A visão de que as doenças eram causadas simplesmente pela presença
de bactérias, reduz a intervenções simplesmente curativistas, ou seja, de recuperação
da saúde.
4.4. Visão Integral
As propostas da Reforma Sanitária/SUS apresentam um nova visão do
processo saúde-doença, na qual seu entendimento deve incorporar elementos das
concepções biologicista, social e higienista/preventivista (modo de ver), portanto,
integradora como descreve Cutolo (2001) em sua tese de Doutorado.
Esta forma integral de ver o processo saúde doença deve entender o ser
humano sadio ou doente, em seus contextos histórico, social e psíquico, e que está
sujeito a condicionamentos multicausais que podem levá-lo ao adoecimento (CUTOLO,
2001), portanto as ações devem contemplar a promoção, proteção, recuperação e
reabilitação da saúde (corpo de práticas).
Outros elementos que se incorporam a esta forma integral de ver o
processo saúde-doença, já foram descritos no capítulo 2, referente à integralidade.
Neste rápido resgate histórico, pode-se observar que a forma de ver o
processo saúde-doença, determina as ações e soluções propostas para resolução dos
problemas de saúde, ou seja, o modo de ver, entender e conceber o processo saúde-
46
doença, leva a um corpo de conhecimentos e de praticas, próprias de um
determinado Estilo de Pensamento. Desta forma, a concepção saúde-doença implícita
nas práticas curriculares, introduz o aluno em um Estilo de Pensamento, pré-
determinando suas futuras ões e soluções para os problemas de saúde, condizentes
com este Estilo de Pensamento.
O quadro abaixo demonstra como a partir da concepção saúde/doença, as
ações de saúde são determinadas:
Quadro 1 – A concepção saúde-doença e suas ações conseqüentes.
CONCEPÇÃO SAÚDE / DOENÇA AÇÕES DE SAÚDE
Visão Social Promoção da saúde
Visão Higienista/Preventivista Prevenção de agravos e proteção da saúde
Visão Biologicista Recuperação e reabilitação da saúde
Visão Integral Promoção, prevenção, recuperação e
reabilitação da saúde
Importante salientar que a visão integral não é a soma das outras três, ou
melhor, não se trata de uma cooperação de Estilos de Pensamento, mas sim de um
novo Estilo de Pensamento. As teorias de determinação social, multicausalidade e da
própria causação biológica, podem ser chamadas aqui de protoidéias deste novo
Estilo de Pensamento.
4.5. Algumas ações conseqüentes
O entendimento dos temas relacionados neste sub-capítulo, tornou-se
imperioso, uma vez que a filiação a um determinado Estilo de Pensamento mostra-se
mais claramente nas questões práticas, como já alertava Fleck, e em particular as
ações abaixo descritas são comumente confundidas em sua teoria e prática e possuem
47
uma raiz quanto a concepção saúde-doença, ou seja fazem parte das ações próprias
de um Estilo de Pensamento.
4.5.1. Promoção da Saúde e Prevenção
Talvez um dos motivos que leve a esta falta de clareza dos conceitos de
promoção da saúde e prevenção, venha em decorrência da antiga classificação feita
por Leavell e Clark (1976) em 1965, que ao desenvolverem um esquema de medidas
preventivas baseado na história natural da doença, a promoção da saúde e a proteção
específica, foram agrupadas no nível de atuação, chamado de prevenção primária.
Além deste nível, a classificação continha a prevenção secundária (diagnóstico e
tratamento precoce; limitação da invalidez) e a prevenção terciária (reabilitação)
(LEAVELL; CLARK, 1976). A promoção da saúde nesta classificação era baseada em
medidas adotadas para aumentar a saúde e o bem-estar gerais, com destaque para a
educação e motivação sanitárias, incluindo um bom padrão de nutrição, moradia
adequada, recreação e condições agradáveis no lar e no trabalho, mas o enfoque era
individual com extensão para suas famílias (BUSS, 2003).
O conceito moderno de promoção da saúde vem da Primeira Conferência
Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em 1986 na cidade de Ottawa, na
qual foi elaborada a Carta de Ottawa (1986), o relatório descreve:
Promoção da saúde é o nome dado ao processo de capacitação da comunidade
para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior
participação no controle deste processo. Para atingir um estado de completo
bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e grupos devem saber identificar
aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente
(OPAS, 1986, p.1).
A Promoção da saúde o é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai
para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global
(OPAS, 1986, p.1).
48
A Carta de Ottawa (1986), considera ainda como pré-requisitos para a
saúde, a paz, habitação, educação, alimentação, renda, ecossistema estável, recursos
sustentáveis, justiça social e equidade. Portanto, reconhece que fatores econômicos,
sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos podem influenciar favorável
ou desfavoravelmente a saúde. As ações de promoção da saúde objetivam tornar
estas condições as mais favoráveis possíveis. A equidade em saúde é um dos focos da
promoção da saúde.
Para tanto a Carta de Ottawa (1986) propõe cinco eixos de ação para a
promoção da saúde:
1) estabelecimento de políticas públicas saudáveis: com enfoque voltado
para a eqüidade em saúde e a justiça social;
2) criação de ambientes favoráveis: através da proteção do meio ambiente
e conservação dos recursos naturais, além da criação de ambientes
que favoram a saúde, como o local de trabalho, o lar, a escola, o
lazer, etc;
3) fortalecimento da ação comunitária: participação comunitária concreta e
efetiva no desenvolvimento de prioridades, na tomada de decisão, na
definição de estratégias e na implementação das ações de promoção
da saúde, visando a melhoria das condições de saúde;
4) desenvolvimento de habilidades pessoais, através da socialização da
informação e da educação em saúde, aumentando as opções para que
as populações possam exercer maior controle sobre sua própria saúde;
5) reorientação dos serviços de saúde, na direção da promoção da saúde,
além do provimento de serviços assistenciais. Além disso, é colocada a
importância da mudança na formação profissional na área da saúde.
Promoção e Prevenção – algumas diferenças conceituais
49
As ões preventivas orientam-se para evitar o surgimento de doenças
específicas, reduzindo sua incidência e prevalência, através do conhecimento
epidemiológico. Estruturam-se através de projetos de educação sanitária, com
divulgação de informação científica e recomendações normativas de mudanças de
hábitos (CZERESNIA, 2003). Já a promoção da saúde refere-se a medidas visando
aumentar a saúde e o bem-estar geral, não se dirigindo especificamente a uma doença
ou desordem (CZERESNIA, 2003), utilizando estratégias para a transformação das
condições de vida e de trabalho que influenciam nos problemas de saúde, demandando
uma abordagem intersetorial (TERRIS apud CZERISNIA, 2003). Esta última definição,
demonstra a ligação existente entre a promoção da saúde e o entendimento de
determinação social do processo saúde-doença.
A promoção da saúde busca modificar positivamente as condições de
vida; aponta para a transformação do processo individual de tomada de decisão em
busca de uma melhor qualidade de vida e saúde; orienta para o fortalecimento
comunitário com decisões coletivas visando o favorecimento das condições de bem-
estar e saúde (BUSS, 2003). a prevenção, orienta-se para as ações de detecção,
controle e enfraquecimento dos fatores de risco de uma determinada enfermidade
(BUSS, 2003), portanto, as ações de prevenção têm sua explicação a partir do
conceito de mutlicausalidade do processo-saúde-doença.
De certa maneira, o objetivo geral das ações de promoção e de
prevenção, podem ser assim resumidos:
Para a prevenção, evitar a enfermidade é o objetivo final e, portanto, a ausência
de doenças seria um objetivo suficiente. Para a promoção da saúde, o objetivo
contínuo é um nível ótimo de vida e de saúde; portanto, a ausência de doenças
não é suficiente, já que perante qualquer nível de saúde registrado em um
indivíduo sempre haverá algo a ser feito para promover um nível de saúde
melhor e condições de vida mais satisfatórias (GUTIERREZ et al apud BUSS,
2003, p. 33).
A parte conceitual das diferenças parece estar bem definida, porém esta
clareza não é tão precisa quando o enfoque é a parte prática das ações de promoção e
50
prevenção, principalmente no que tange a educação em saúde, que pode ter um fim
específico de prevenção ou pode ser uma prática com objetivo claro do
empoderamento individual ou das comunidades, mudando seu foco para a promoção
da saúde, como veremos adiante.
4.5.2. Recuperação da Saúde e Reabilitação da Saúde
As diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal (2004) descrevem a
recuperação da saúde como um grupo de ações que envolvem o diagnóstico e o
tratamento de doenças. Apontam ainda que o diagnóstico e o tratamento devem ser
realizados o mais precocemente quanto for possível, evitando a progressão da doença
e impedindo o surgimento de eventuais incapacidades e danos decorrentes (BRASIL,
2004c).
A reabilitação da saúde consiste na recuperação parcial ou total das
capacidades perdidas como resultado da doença, objetivando a reintegração do
indivíduo no seu ambiente social e em sua atividade profissional (BRASIL, 2004c).
4.5.3. Prática Educativa em Saúde
A caracterização de uma prática educativa em saúde, no que se refere ao
tipo de ação realizada, deve ser analisada sob o ponto de vista pedagógico e de saúde,
ou seja, que tipo de metodologia de ensino é utilizada, e de qual pressuposto do
processo saúde-doença se concebe. Contextualizando a prática educativa em saúde
com as propostas de atenção à saúde, podemos classificar de um modo preliminar, em
duas categorias: educação sanitária e educação em saúde.
Educação Sanitária
51
Tradicionalmente, desde o início do século XX, com o sanitarismo
campanhista, as práticas educativas no Brasil têm sido marcadas pelo estilo “autoritário”
de educar, na qual o educador é o conhecedor da “verdade científica” e deve transmitir
seu conhecimento, geralmente de conteúdos pré-determinados, a uma determinada
população (DA ROS, 2000). A pedagogia deste tipo de prática é descrita como
educação bancária, na qual o educador deposita as informações no educando, que
deve recebê-las, arquivá-las e guardá-las (FREIRE, 2005). Neste tipo de prática, o
educador em lugar de comunicar-se, faz “comunicados”, o “saber” é uma doação dos
que se julgam sábios aos que julgam nada saber, baseado na prescrição do educador
para o educando que deve seguí-las (FREIRE, 2005).
Da Ros (2000), identificou em seu estudo um tipo de prática educativa em
saúde, que a classificou como educação sanitária, que se baseava em atitudes
prescritivas e normativas, partindo de uma concepção biologicista (enfoque em
doenças), e com ações preventivistas para evitar doenças, na qual os indivíduos
(educandos) são os únicos responsáveis pelo eventual fracasso frente ao aparecimento
de um determinado problema de saúde (DA ROS, 2000); neste exemplo, nota-se a falta
de limites precisos entre o biologismo e o higienismo-preventivismo, por esta razão, em
no decorrer da pesquisa foram utilizadas a categoria matizes de Estilo de
Pensamento, pois o higienismo-preventivismo se utiliza também do entendimento
biológico para a explicação de suas ações. Esta prática de educação sanitária é
utilizada inclusive pelo Ministério da Saúde, como por exemplo, na campanha contra o
tabagismo, na qual claramente a mensagem embutida nas propagandas é “pare de
fumar ou morra de câncer de pulmão”. Apesar da enorme utilização de recursos
financeiros nestas campanhas e de sua divulgação massiva, milhares de pessoas ainda
fazem uso do tabaco. Um outro exemplo são as campanhas anti-AIDS através da
divulgação do uso de preservativos, inclusive com sua doação, porém sua eficácia pode
ser colocada em dúvida pelo crescente número de gravidez na adolescência (MACCARI
apud DA ROS, 2000).
52
Educação em Saúde
Uma nova forma de realizar a educação tem início, no Movimento da
Reforma Sanitária Brasileira, no final dos anos 70 (DA ROS, 2000). Estudando os
Estilos de Pensamento em Saúde Pública, Da Ros (2000), caracteriza que um tipo de
educação que chama de educação em saúde, na qual a relação é biúnivoca, baseada
numa prática libertadora, trabalhando com o conceito de saúde da determinação
social.
O objetivo das práticas educativas é o alcance da autonomia dos
indivíduos, para que eles sejam capazes de realizar suas escolhas, portanto, trabalha
no sentido da promoção da saúde descrito na Carta de Ottawa (1986). Esse processo
se realiza numa prática baseada no diálogo e no companheirismo, ou seja, numa troca
entre o educador e educando, na qual ambos se educam, e um novo saber é construído
através da problematização, gerando um conhecimento crítico e reflexivo, inclusive
utilizando as palavras, educador-educando e educando-educadores, referindo-se a esta
troca e construção de novos saberes (FREIRE, 2005). Paulo Freire (2005) ainda diz que
o diálogo começa na busca do conteúdo programático, quando o educador-educando
se pergunta em torno do que vai dialogar com o educando-educador.
4.5.4. Epidemiologia
Epidemiologia Clínica
A epidemiologia clínica segundo os esquemas didáticos de Sackett,
apresenta as seguintes características: a) teoria do diagnóstico clínico, baseada na
avaliação de validade e confiabilidade dos procedimentos de identificação do caso; b)
metodologia para construção do conhecimento da etiologia baseado em estratégias
53
observacionais de investigação em pequenos grupos; c) metodologia correspondente
para estudos de eficácia e efetividade de procedimentos terapêuticos; d) proposição de
uma certa propedêutica quantitativa denominada de “clinimetria”, estruturada através de
modelos probabilísticos de tomada de decisão para o estabelecimento de prognóstico
clínico (ALMEIDA, 2000).
O próprio nome por si já define a clínica como objetivo desta
epidemiologia, e os pontos descritos por Almeida (2000) no parágrafo anterior
demonstram as bases biológicas do processo saúde-doença por ela utilizada.
Epidemiologia Clássica
A epidemiologia clássica tem suas bases firmadas no entendimento de
multicausalidade do processo saúde/doença, e se utiliza principalmente da
matemática/estatística (distribuição, freqüência, padrões de distribuição) para
quantificar e entender a ocorrência das doenças (portanto de base biológicas) em
uma determinada população, tendo seu marco teórico assentado no positivismo,
assumindo uma posição reducionista frente ao processo saúde/doença (DA ROS,
2000).
Sua característica básica é de estudar um evento sanitário, tentando
estabelecer uma relação entre as variáveis (fatores) com o evento estudado, que
podem enfatizar mais ou menos o biológico (DA ROS, 2000), dependendo da escolha
destes fatores, portanto, parte de uma explicação de multicausalidade do processo
saúde-doença.
Com a teoria da história natural das doenças e com o chamado
modelo da tríade ecológica de Leavell e Clark, plasmados na multicausalidade,
54
ocorre uma cristalização desta forma de investigação, na qual o social é uma variável a
ser examinada (BREILH; GRANDA, 1986).
Epidemiologia Crítica
A epidemiologia crítica adota a concepção de saúde como determinada
socialmente e, a partir daí, contempla a multicausalidade (mas como subordinada à
determinação) (DA ROS, 2000).
A investigação epidemiológica é realizada a partir de alguns enfoques:
ênfase no entendimento das condições de reprodução da força de trabalho; condições
do processo de trabalho; em como o capitalismo, enquanto processo econômico e
social determina as doenças (TESTA, 1989).
Desta forma, a investigação parte de um pressuposto diferente, como
exemplifica Moysés (1997) sobre a pergunta inicial da ocorrência de um evento
sanitário: qual a causa da distribuição desigual de doenças entre populações”
(epidemiologia crítica) e “qual a causa dos casos” (epidemiologia clássica).
Considerando que as soluções para um determinado problema de saúde, são
determinadas a partir das conclusões de uma investigação epidemiológica, este
pressuposto inicial adquire importância central, uma vez que as respostas estão
diretamente relacionadas ao tipo de pergunta realizada, ou seja, se a investigação partir
da relação entre variáveis, a solução será uma ação sobre os fatores causadores de um
determinado problema, porém se a pergunta inicial estiver relacionada com a
determinação social do processo saúde/doença, as soluções serão baseadas nas
condições de vida das pessoas.
O quadro 2 relaciona as ações descritas neste seção, segundo o Estilo de
Pensamento sobre a concepção saúde-doença.
55
Quadro 2 Ações de saúde, segundo o Estilo de Pensamento (EP) sobre a concepção saúde-
doença.
EP Biologicista EP Higienista-
Preventivista
EP Social
Visão do processo
saúde-doença
Causação biológica
Multicausalidade Determinação
social
Tipo de ação de
saúde
Recuperação e
reabilitação da
saúde
Proteção da saúde Promoção da
Saúde
Prática educativa Educação sanitária Educação sanitária Educação em
saúde
Epidemiologia Epidemiologia
clínica
Epidemiologia
clássica
Epidemiologia
crítica ou social
Esta é uma classificação didática, porém nas questões práticas, o
biologicismo e a multicausalidade não apresentam limites precisos, uma vez que a
própria multicausalidade utiliza o conhecimento da causação biológica para as
investigações epidemiológicas, para a prática educativa e no próprio controle das
doenças. Desta forma, se torna necessária a utilização de matizes para a
caracterização de Estilos de Pensamento, podendo uma determinada visão das
concepções de saúde-doença, aparecer mais fortemente que uma outra, ou seja, ela
pode ser mais biologicista ou mais higienista-preventivista.
56
CAPÍTULO 5
O CURSO DE GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA DA UNIVALI E A DISCIPLINA DE
ODONTOLOGIA SOCIAL PREVENTIVA – UM ESTUDO DE CASO
Trata-se de um estudo de caso histórico-organizacional, segundo a
classificação de Bogdan, na qual a unidade de estudo pode ser uma universidade
(TRIVIÑOS, 1987). A pesquisa utilizou-se de abordagens qualitativas de investigação e
análise, buscando os conteúdos manifestos e latentes, dentro dos contextos histórico,
cultural e social que envolve o processo de formação na área da saúde.
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa,
nas ciências sociais, com um vel de realidade que não pode ser quantificado.
Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das
relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à
operacionalização de variáveis. (MINAYO, 1993, p. 21)
Com o objetivo de alcançar a maior amplitude possível, na descrição,
explicação e compreensão do foco em estudo, foi utilizada a técnica da triangulação
(TRIVIÑOS, 1987), na qual a coleta de dados foi realizada através de uma pesquisa
documental do projeto pedagógico do curso de Odontologia da UNIVALI e dos planos
de ensino da disciplina de Odontologia Social e Preventiva, e posteriormente
entrevistas com os professores, buscando a caracterização dos Estilos de
Pensamento presentes nas práticas curriculares do curso, em especial na referida
disciplina.
Para a análise dos dados, foi utilizada a Análise de Conteúdo Temático
(MINAYO, 1998), buscando os significados manifestos e latentes das entrevistas e
documentos investigados nesta pesquisa. Para pesquisas qualitativas, o emprego do
método é recomendável, porque ele se presta para o estudo das motivações, atitudes,
valores, crenças e tendências (BARDIN apud TRIVIÑOS, 1987).
57
Definindo a análise de conteúdo Bardin apud Trivinõs caracteriza o
método como sendo para a utilização no estudo das “comunicações” entre homens,
enfatizando o conteúdo “das mensagens”. Apesar de limitar, mas não excluir outros
meios de comunicação, o método privilegia as formas de linguagem escrita e oral
(TRIVIÑOS, 1987), portanto muito apropriada para esta pesquisa.
A análise de conteúdo foi realizada, segundo as etapas descritas por
Minayo (1998):
1ª) Pré-análise: consiste na escolha do material a ser analisado, retomando
hipóteses e objetivos e reformulando-os frente ao material coletado, e pode ser
decomposto por:
- Leitura flutuante: leitura exaustiva do material para melhor entendimento frente
as teorias relacionadas ao tema;
- Constituição do corpus: organização do material para que responda as normas
de validade: exaustividade (aspectos levantados no roteiro), representatividade
(representação do universo pretendido), homogeneidade (critérios dos temas,
técnicas e interlocutores), pertinência (os documentos devem analisados devem
ser adequados ao objetivo do trabalho);
- Formulação de hipóteses e objetivos: estabelecimento de hipóteses iniciais e
flexíveis, que permitam inclusão de hipóteses emergentes a partir dos
procedimentos exploratórios.
Nesta fase determinam-se também a unidade de registro (palavra-chave ou
frase), a unidade de contexto (delimitação do contexto de compreensão da unidade de
registro), os recortes, a categorização, a modalidade de codificação e os conceitos
teóricos que irão orientar a análise.
2ª) Exploração do material: transformação dos dados brutos visando alcançar o
núcleo da compreensão do texto. Após a determinação da unidade de registro, faz-
58
se a escolha das regras de contagem, através da construção de índices, permitindo
alguma forma de quantificação. Realiza-se então a classificação e agregação dos
dados, através das categorias teóricas definidas.
3ª) Tratamento dos resultados Obtidos e Interpretação: Através dos dados obtidos, o
analista propõe inferências e realiza interpretações previstas no seu quadro teórico
e abre outras pistas em torno de dimensões teóricas surgidas no material.
5.1. Pesquisa Documental e seus Resultados
As palavras das autoras abaixo, talvez justifiquem a importância da
análise documental, inclusive na triangulação de dados como desenvolvido nesta
pesquisa.
Embora pouco explorada não na área de educação como em outras áreas de
ação social, a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de
abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas
por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema.
(LUDKE; ANDRÉ, 1986, p.38)
5.1.1. O Curso de Graduação de Odontologia da UNIVALI e seu projeto
pedagógico
Para se entender o contexto em que a disciplina de Odontologia Social e
Preventiva se localiza dentro do curso de graduação de Odontologia da UNIVALI,
inicialmente foi realizada uma pesquisa no projeto pedagógico do respectivo curso.
O Curso de Graduação em Odontologia da UNIVALI teve sua autorização
concedida, através da resolução 05/89/CUN de 16 de novembro de 1989, e seu
reconhecimento oficial se deu através da Portaria Ministerial 272/94 de 01 de
59
fevereiro de 1994, publicada no Diário Oficial da União em 21 de fevereiro do mesmo
ano.
O currículo curso foi estruturado segundo a Resolução nº 04/82/CFE de 03
de setembro de 1982, com uma carga horária total de 4.050 horas/aula, distribuídas ao
longo de 09 (nove) semestres, em período integral.
A resolução 04/82 do Conselho Federal de Educação estabeleceu um
currículo mínimo para os cursos de Odontologia, com composição em matérias básicas
(ciências morfológicas, fisiológicas, patológicas e sociais) e profissionalizantes
(propedêutica clínica, clínica odontológica, clínica odontopediátrica, odontologia social e
clínica integrada). Esta forma de organização curricular é semelhante ao modelo
proposto por Flexner (1910), e apesar da inclusão das ciências sociais e da odontologia
social na composição das disciplinas, a própria resolução orienta para que na
Odontologia Social sejam estudados os aspectos sociais, deontológicos, legais e os de
orientação profissional.
O curso de Odontologia da UNIVALI apresenta como objetivos
específicos:
Sensibilizar o acadêmico para as questões que envolvem as condições de vida
das pessoas e suas implicações na saúde.
Desempenhar, na prática, ações que privilegiem o paradigma de promoção da
saúde.
Contribuir para o desenvolvimento de uma atitude crítica e de investigação
científica, fundamentada em princípios éticos, de acordo com as necessidades
emergentes da sociedade e/ou profissão.
Estimular para o comprometimento do acadêmico enquanto consciente e
participante nas questões sociais.
Capacitar para o trabalho conjunto com equipes multidisciplinares e
interdisciplinares.
Sustentar a prática profissional em princípios éticos (UNIVALI, 2004, p. 07, meus
grifos).
E em concordância com seus objetivos apresenta como perfil desejado do
egresso:
60
O profissional formado pela escola deverá ser generalista com sólida formação
técnico-científica, humanística e ética, orientado para atuar em todos os níveis de
atenção à saúde bucal, buscando a melhoria da qualidade de vida da população,
e consciente da necessidade de formação continuada (UNIVALI/CCS, 2004, p.
08, meus grifos).
Os objetivos do curso de Odontologia da UNIVALI e o próprio perfil
desejado para o egresso apontam para uma formação condizente com o trabalho para
o Sistema Único de Saúde e das próprias Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de
graduação em Odontologia, demonstrando uma aproximação para o entendimento de
determinação social do processo saúde-doença quando cita as palavras “promoção da
saúde”, “condições de vida”, “necessidades emergentes da sociedade”, “questões
sociais”, aparecendo ainda outros temas diretamente relacionados com as propostas do
SUS, como por exemplo, a própria “promoção da saúde”, “equipes multidisciplinares e
interdisciplinares” e “todos os níveis de atenção à saúde bucal”. A partir destes
achados, podemos fazer uma síntese preliminar de que o curso tem a intenção de
formar um aluno para um Estilo de Pensamento acordado com as propostas do SUS,
portanto, tendo a integralidade com eixo norteador.
Segundo o projeto pedagógico a atual matriz curricular do curso de
graduação em Odontologia da UNIVALI, segue as Diretrizes Curriculares dos Cursos de
Odontologia da SESu/MEC de 1998, classificando as disciplinas em formação básica,
profissionalizante e social.
As disciplinas de formação básica incluem: biologia, histologia,
embriologia, anatomia, bioquímica, fisiologia, patologia geral e bucal, parasitologia,
microbiologia e imunologia, farmacologia, metodologia científica e ergonomia, além de
prática desportiva.
As disciplinas de formação social compreendem: sociologia, antropologia,
ética e cidadania, e psicologia.
61
As disciplinas de formação profissionalizante estão assim divididas:
patologia bucal, semiologia, radiologia, materiais dentários, oclusão, dentística,
endodontia, periodontia, implantodontia, prótese, cirurgia e traumatologia buço-maxilo-
faciais, odontopediatria, ortodontia, clínica integrada, pacientes com necessidades
especiais e odontologia social (saúde coletiva, odontologia legal, profissional, ética e
deontologia). Podemos observar na tabela 1 a distribuição das disciplinas nos períodos
do curso, com suas respectivas cargas-horárias.
Tabela 1 - Distribuição das disciplinas com suas respectivas cargas horárias, do curso de
graduação em Odontologia da UNIVALI.
Período
Disciplina Hora/aula
Biologia 60
Anatomia 75
Antropologia e Sociologia 60
Bioquímica 60
Histologia 75
Odontologia Social e Preventiva 30
Ética e Cidadania 30
Prática Desportiva 30
Anatomia 120
Histologia 60
Fisiologia 90
Biologia 45
Odontologia Social e Preventiva 30
Parasitologia 30
Metodologia Científica 30
Prática Desportiva 30
Microbiologia e Imunologia 90
Farmacologia 60
Psicologia 45
Patologia Geral 60
Desenho e Escultura Dental 60
Odontologia Social e Preventiva 30
Ética e Cidadania 30
Bioestatística 45
Radiologia 75
Materiais Dentários 75
62
Período
Disciplina Hora/aula
Patologia Bucal 75
Terapêutica 45
Microbiologia e Imunologia 45
Patologia Geral Aplicada 30
Ergonomia 30
Odontologia Social e Preventiva 30
Oclusão 45
Radiologia 60
Anestesiologia e Cirurgia 90
Dentística 90
Endodontia 90
Oclusão 45
Odontologia Social e Preventiva 30
Semiologia 45
Prótese Removível 60
Periodontia 60
Dentística 75
Endodontia 60
Anestesiologia e Cirurgia 60
Odontologia Social e Preventiva 45
Prótese Fixa 60
Metodologia Científica 45
Prótese Removível 60
Periodontia 60
Dentística 75
Endodontia 60
Odontopediatria 45
Odontologia Social e Preventiva 60
Ortodontia 60
Prótese fixa 60
Odontopediatria 75
Ortodontia 45
Cirurgia e Traumatologia 60
Metodologia Científica 30
Odontologia Social e Preventiva 30
Clínica Integrada 180
Odontologia para Pacientes Especiais 30
Clínica Integrada 360
Deontologia 30
63
Período
Disciplina Hora/aula
Odontologia Social e Preventiva (Odontologia Legal e
Orientação Profissional)
60
Odontologia para Pacientes Especiais 30
TOTAL GERAL 4050
Fonte: UNIVALI, 2004.
Durante o curso são oferecidas 67 disciplinas, que poderíamos dividir
segundo seus objetivos, separando de um lado as disciplinas voltadas para a formação
e aprendizado das estruturas e funcionamento do corpo humano, bem como as
disciplinas voltadas para a prática clínica, e por outro lado, as disciplinas direcionadas
para a formação ética e social do aluno, representados pela antropologia, sociologia,
ética e cidadania, psicologia, e odontologia social e preventiva. Nesta gica a
distribuição do curso teria a divisão como mostra a tabela 2.
Tabela 2 - Distribuição das disciplinas do curso de graduação em Odontologia da UNIVALI,
segundo seus objetivos.
Distribuição das disciplinas segundo seus objetivos Quantidade de disciplinas %
Formação biológica/clínica 55 82,09
Formação ética e social 12 17,91
Fonte: UNIVALI, 2004.
Existe uma predominância na estruturação do curso de disciplinas
voltadas para a formação biológica/clínica, e ela aparece mais fortemente na
distribuição de carga horária destinada a cada uma delas, como demonstra a tabela 3.
Tabela 3: Distribuição das disciplinas do curso de graduação em Odontologia da UNIVALI,
segundo seus objetivos, considerando as respectivas cargas horárias.
Distribuição das disciplinas segundo seus objetivos Quantidade de horas %
Formação biológica/clínica 3600 88,89
Formação ética e social 450 11,11
Fonte: UNIVALI, 2004.
64
Outro ponto interessante que a organização da matriz curricular
demonstra é o fato da disciplina de Odontologia Social e Preventiva, apesar de estar
presente em todos os períodos do curso, é a disciplina que apresenta sempre a menor
carga horária dos respectivos períodos, com exceção do nono período, justamente
quando a disciplina se destina a desenvolver os conteúdos de Odontologia Legal e
Orientação Profissional. Esta distribuição transversal, num primeiro momento, nos leva
a imaginar uma grande preocupação para uma formação social, porém a carga horária
destinada a cada uma delas, deixa dúvidas quanto a este propósito. As novas diretrizes
de formação determinam este novo foco de perfil profissional, e essa transversalidade
demonstra uma tentativa de adequação a estas novas demandas, porém a carga
horária destinada a elas pode estar relacionado com um mascaramento e uma tentativa
de manutenção do modelo hegemônico, é a harmonia das ilusões.
A organização das disciplinas, analisadas seja sob o enfoque da
quantidade ou de carga horária oferecidas, apresenta uma forte predominância do
modo de ver da causação biológica, portanto mesmo que preliminarmente, nos
indícios de uma hegemonia do Estilo de Pensamento biologicista, demonstrando
através desta estruturação uma coerção de pensamento direcionada para esse estilo.
A pergunta que fica é se com este tipo de estruturação é possível atingir o objetivo geral
do curso que determina:
Formar cirurgião-dentista com uma postura sócio-humanística e consciência
social, visão de sociedade e cidadania sob o enfoque da ética, desempenho
profissional sob o paradigma de promoção de saúde, adequação aos avanços
tecnológicos, preparo para trabalhar o coletivo com leitura abrangente e crítica da
estrutura sócio-econômica, utilizando critérios de biossegurança em suas ações e
capacitação para o desenvolvimento da investigação científica (UNIVALI, 2004, p.
07, meus grifos).
Existe uma ênfase muito forte no perfil desejado para uma formação
social, contraditória com a estruturação geral do curso. Preliminarmente podemos dizer
que esta forma de organização do curso não favorece o cumprimento de seus objetivos.
65
5.1.2. Os planos de ensino das disciplinas de Odontologia Social e Preventiva
Para uma caracterização dos Estilos de Pensamento dos planos de
ensino das disciplinas de Odontologia Social e Preventiva do curso de Odontologia da
UNIVALI, foram analisados os objetivos, ementário, conteúdos programáticos e
bibliografia básica recomendada pela disciplina, como exceção da disciplina do nono
período, que por desenvolver conteúdos referentes a deontologia e orientação
profissional, foi suprimido da análise, uma vez que, estes conteúdos não interessam
diretamente para o recorte do estudo.
5.1.2.1. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 1º período
A disciplina apresenta no seu plano de ensino como objetivo geral:
Analisar, elaborar e aplicar técnicas educativas para a promoção da saúde e
prevenção em saúde bucal (UNIVALI, 2006, meus grifos).
Apesar de encontrarmos explícitos os objetivos quanto à promoção da
saúde e prevenção, que demonstram tendências de Estilos de Pensamento de visão
Social e Higienista/Preventivista respectivamente, a promoção da saúde é citada, e
relacionada apenas no contexto da educação. A prática educativa em saúde quando
visa o empoderamento e a autonomia dos indivíduos, é apenas um dos cinco eixos da
promoção da saúde propostos na Carta de Ottawa (1986).
E no ementário da disciplina:
Etiologia e Prevenção das doenças Cárie e Periodontal. Tendências pedagógicas
aplicadas à educação em saúde. Promoção e educação em saúde. Estratégias e
material educativo sobre educação em saúde (UNIVALI, 2006, meus grifos).
66
No ementário são citadas a etiologia e a prevenção das principais doenças
bucais, sugerindo que a prática educativa deverá ser desenvolvida nesta lógica de
entendimento, e novamente a promoção da saúde é citada relacionada com a
educação em saúde.
Os conteúdos programáticos do plano de ensino da disciplina foram
divididos em dois grupos de categorias. No primeiro grupo, encontramos as categorias
“etiologia”, “cárie”, doença periodontal”, placa bacteriana”, cujo modo de ver o
processo saúde-doença é o da causação biológica, na qual a abordagem é realizada
sobre o mecanismo de funcionamento das doenças. Um segundo grupo representado
por categorias relacionadas à “prevenção de doenças”, “dieta”, “fluoretos”,
“higienização”, demonstram um modo de ver característico do Estilo de Pensamento
Higienista/Preventivista, com abordagem sobre as medidas de controle das doenças,
resultando em ações preventivistas; como o enfoque é voltado para a doença (não
ocorrência), consideraremos o modo de ver higienista/preventivista, como uma matiz
do Estilo de Pensamento Biologicista. A abordagem baseada nestas temáticas, numa
disciplina que desenvolve práticas educativas, pode levar o aluno à associação entre
educação e preventivismo, inclusive reforçado pela estratégia utilizada em aula prática,
com utilização de macro modelo, macro escova, dentifrício, fio dental, revelador de
placa, na “sala de higienização” da universidade, podendo ocorrer o que Fleck (1986)
chamava de coerção de pensamento para um ver dirigido, e isto pode ter uma
grande influência no aluno recém-iniciado no curso de odontologia, que está sendo
introduzido em um Estilo de Pensamento, e que, portanto, ainda apresenta um ver
inicial confuso, pouco sistematizado.
Os conteúdos explícitos relacionados à educação em saúde e as
diferentes técnicas pedagógicas apresentadas nos conteúdos programáticos da
disciplina não permitiram uma análise que pudesse confirmar sua tendência
pedagógica, portanto, não foi possível a caracterização de um Estilo de Pensamento.
Essa resposta se deu na entrevista com o professor responsável pela elaboração do
plano de ensino da disciplina.
67
O tema “promoção da saúde” como já foi dito anteriormente, pode fornecer
informações sobre um possível Estilo de Pensamento social, porém é discorrido de
forma conceitual na disciplina. Portanto, também foi melhor explorado na entrevista com
o professor.
Chama a atenção o fato de o constar a temática sobre o processo
saúde/doença nos conteúdos programáticos da disciplina, uma vez que o tema é de
fundamental importância para a realização de uma prática educativa em saúde e do
próprio entendimento sobre promoção da saúde.
A análise inferencial da bibliografia básica recomendada nos permite uma
possível caracterização dos Estilos de Pensamento através dos conteúdos implícitos
dos livros, que acaba por influenciar o aluno através da coerção de pensamento. Além
disso, a bibliografia pode ser uma fonte utilizada pelo professor para o desenvolvimento
de suas atividades em sala de aula.
A disciplina apresenta quatro referências básicas.
O primeiro livro de título “O que é educação”
2
, traz a discussão sobre qual
é o verdadeiro papel da educação, e aponta que não existe apenas a educação formal
(na escola), mas que a educação é a própria prática social de um grupo, com suas
formas de poder, cultura, família, ética, economia, em um dado momento histórico. Mas
a discussão central é sobre o ensino formal. Aponta ainda que a educação teria a
missão de diminuir as desigualdades sociais e realizar o exercício da cidadania. Em um
dos capítulos o autor descreve que atualmente a educação deve ser um dos principais
meios de realização de mudança social. Porém afirma que a educação da sociedade
capitalista reproduz e consagra a desigualdade social, pois ela é excludente no acesso
ao ensino de qualidade, dotando de poder, os que pelo “conhecimento”, pertencem a
uma categoria de sujeitos que possuem a sua posse. O livro não faz qualquer tipo de
2
BRANDÃO, C. R. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1981.
68
comentário sobre técnicas pedagógicas, ou mesmo qualquer tipo de analogia com a
prática educativa em saúde, portanto, o objeto é distinto desta investigação, não nos
permitindo fazer qualquer tipo de inferência quanto a um Estilo de Pensamento
relacionado à concepção saúde-doença.
A segunda bibliografia que consta nas referências é o livro “Onde não
dentista”
3
, o autor apresenta seu livro da seguinte forma:
“Onde o dentista” tem duas partes. A primeira parte fala sobre prevenção
(DICKSON, 1985, pág. 4, meus grifos).
A segunda parte ensina como diagnosticar e tratar de problemas dentários
comuns (DICKSON, 1985, pág. 4, meus grifos).
Isso nos permite dizer, que na sua introdução o autor demonstra sua
tendência para um modo de ver biologicista e higienista/preventivista do processo
saúde/doença, quando cita o diagnóstico, o tratamento e a prevenção.
Nos capítulos constam temáticas sobre as estruturas dentárias, problemas
bucais, exame, diagnóstico, tratamento dos principais problemas bucais, anestesia,
restaurações, extrações, que demonstram uma visão biológica sobre os problemas e as
soluções compatíveis com este modo de ver, ou seja, baseadas na recuperação da
saúde. Além disso, apresenta também conteúdos sobre dieta, higienização, flúor,
educação em saúde bucal na comunidade e escola, materiais e técnicas de educação,
que representam o higienismo/preventivismo com ações de proteção da saúde.
Portanto, o desenvolvimento dos conteúdos do livro reforçam a idéia inicial apresentada
pelo autor, caracterizando um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo. O livro, segundo seu autor, destina-se a agentes de saúde,
professores, pais e dentistas, isto de certa forma, poderia ser entendido como objetivo
de socialização de informações, porém como o foco neste caso é o futuro dentista, não
cabe este entendimento.
3
DICKSON, M. Onde não há dentista.edição. São Paulo: Edições Paulinas, 1986.
69
O livro “Métodos preventivos na saúde bucal do escolar”
4
, é a terceira
bibliografia recomendada pela disciplina, e no próprio título demonstra sua tendência
por um Estilo de Pensamento. No seu prefácio discorre sobre a importância da atitude
preventiva na saúde bucal do país, principalmente nos espaços escolares com ênfase
para a higiene bucal, reforçando a idéia inicial do título. Trata-se de um manual para
que o professor desenvolva em sala de aula, atividades sobre saúde bucal, na qual os
roteiros são pré-estabelecidos, quanto às temáticas, tipo de abordagem e seqüência de
desenvolvimento, bem semelhante a uma “receita de bolo”, demonstrando uma prática
característica de educação sanitária. Nos conteúdos programáticos encontramos
noções sobre higiene bucal, importância dos dentes e estruturas bucais, dieta,
escovação, avaliação bucal, processo da cárie dental, mau hálito, gengivites. A
sugestão dos autores é para que os temas sejam desenvolvidos de acordo com o nível
cognitivo dos alunos da pré-escola até a série. Apesar de aparecerem temas como
cárie e gengivite, eles são apresentados como suporte para os temas relacionados à
prevenção. Portanto, neste manual predomina o Estilo de Pensamento
higienista/preventivista.
O quarto e último livro da referência básica é “Saúde Bucal ao alcance de
todos”
5
. O objetivo do livro pode ser definido pela sua apresentação.
“Saúde bucal ao alcance de todos” é um manual sobre promoção da saúde bucal.
Surgido em função da crença de que a educação é a mais eficiente forma de
atingir um melhor nível de saúde, visa orientar, de forma clara e concisa, sobre os
métodos, técnicas e cuidados rotineiros para a manutenção da saúde e a
prevenção de doenças bucais, além de abordar alguns conceitos básicos
necessários para um melhor conhecimento de uma parte importante do
organismo – a cavidade bucal (SILVA; SILVA, 1997, contra-capa, meus grifos).
A autora demonstra a intenção de promover saúde através da educação,
porém quando fala de “orientar de forma clara e concisa”, indícios de utilizar uma
4
SALGADO, M. I.; SANTOS, M. C. Métodos preventivos na saúde bucal do escolar. Belo Horizonte:
Klir, 1989.
5
SILVA, H. C.; SILVA, R. H. H. Saúde Bucal ao alcance de todos. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1997.
70
metodologia bancária de educação, e quando se reporta como objetivo a “manutenção
da saúde e a prevenção de doenças bucais”, demonstra uma afinidade com o
higienismo/preventivismo.
Os temas vão se desenvolvendo ao longo dos capítulos com a
apresentação da boca, dentes (dentição, erupção, configuração, funções), importância
da saliva no processo de cárie, placa bacteriana, rtaro, cárie, doença periodontal,
halitose, conseqüências das doenças bucais, tratamento curativo das doenças bucais,
baseando-se no conhecimento anatômico e no mecanismo de funcionamento das
doenças, portanto se utilizando de bases biológicas para seu entendimento, e quando
propõe soluções, estas são compatíveis com este modo de ver, ou seja, de
recuperação da saúde. Numa segunda parte, apresenta temas sobre tratamento
preventivo das doenças bucais, higiene bucal, materiais de higienização, dieta, flúor,
selantes, centradas, portanto, na proteção da saúde, demonstrando também, uma
afinidade para o higienismo/preventivismo. Desta forma, o livro pode ficar melhor
caracterizado como pertencente a um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes
do Higienismo/Preventivismo.
Apesar do tema promoção da saúde constar nos objetivos da disciplina e
no seu ementário, não existe nas quatro referências básicas recomendadas, um
capítulo específico que conceitue e discorra sobre o tema em questão.
5.1.2.2. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 2º período
O objetivo geral da disciplina é:
Instrumentalizar o aluno para a realização de ações educativas/preventivas em
saúde bucal, com aplicabilidade num grupo infantil (UNIVALI, 2006, meus grifos).
E na ementa da disciplina:
71
Educação para a saúde. Planejamento de ações educativas e preventivas em
saúde bucal. Ações coletivas (UNIVALI, 2006, meus grifos).
Existe uma tendência no objetivo geral da disciplina de associação do
educativo com preventivo, que pode sugerir um Estilo de Pensamento
Higienista/Preventivista, e esta associação é reforçada no ementário da disciplina.
O desenvolvimento da disciplina se em 3 unidades, sendo a primeira
basicamente conceitual com o título central “Educação para a saúde”, na qual pela
primeira vez o aluno recebe conteúdos sobre o histórico do Sistema Único de Saúde e
Programa Saúde da Família, porém a carga horária total da unidade é de 10 horas, e o
tema é dividido com outros quatro assuntos (saúde / saúde bucal / promoção da saúde;
historicidade do uso de fluoretos na odontologia; método de aplicação sistêmico e
tópico de flúor; toxicidade do flúor). Apesar da temática da unidade levar o título
“Educação para a saúde”, três dos cinco sub-títulos estão relacionados ao uso de
fluoretos, isto de certa forma, reforça a associação entre o educativo e o preventivo
descrito no objetivo geral e no ementário. A unidade 2 é estruturada para o
desenvolvimento de estratégias educativas para ações em saúde bucal, que deve ser
elaborada de acordo com a necessidade de um grupo, demonstrando uma
preocupação em partir da realidade, podendo estar relacionada com uma pedagogia
educativa problematizadora, que pode produzir autonomia nos indivíduos, e desta
forma caracterizar um dos eixos da promoção da saúde. Porém no seguimento da
unidade, que apresenta também como objetivo a organização de conteúdos para serem
ministrados à um grupo de crianças são apresentados conteúdos pré-determinados
para o desenvolvimento das atividades educativas (educação sanitária), que
evidenciam os dentes (forma, estrutura, função), a placa bacteriana, a doença
periodontal, a cárie, reforçando e repetindo o que anteriormente foi discutido no
período da disciplina, e na seqüência a higiene oral, evidenciadores de placa, flúor e
fluoretos. Esta repetição de conteúdos e a forma de organização das atividades
exercem uma forte coerção de pensamento para um ver dirigido, ou seja, isso pode
determinar que o aluno desenvolva uma prática educativa bancária e baseada em
temáticas pré-determinadas. Na unidade 3 são desenvolvidas as atividades coletivas
72
num grupo infantil, na qual a atividade educativa é desenvolvida com o entendimento
dente-cárie-higiene oral (educação sanitária), além da realização de escovação
supervisionada com evidenciação de placa bacteriana e aplicação tópica de flúor no
grupo (proteção da saúde), portanto, o corpo de práticas, representado pela unidade
3, é condizente com o modo de ver da unidade 2, caracterizando um Estilo de
Pensamento Biologicista com matizes Higienistas-Preventivistas, confirmando esta
lógica do Estilo de Pensamento, Fleck (1986) afirmava que o sentir seletivo leva a uma
ação conseqüentemente dirigida e uma elaboração correspondente do percebido.
A referência básica é composta por 3 livros.
No primeiro livro recomendado pela disciplina, intitulado de
“Odontopediatria na primeira infância”
6
, a autora justifica os capítulos do livro com a
seguinte frase:
Nós odontopediatras como profissionais de saúde, devemos conhecer a filosofia
de trabalho de todas estas áreas e, por mais que algumas idéias sejam
divergentes, a intenção interdisciplinar deve ocorrer.
que o nosso objetivo primordial é a prevenção de doenças, é fundamental que
tenhamos a visão do paciente como um todo e, para isso, todas estas áreas
devem estar interligadas, falando a “mesma língua”, visando o bem estar geral do
pequeno paciente (CORREA, 1998, p. de apresentação, meus grifos)
No discurso inicial, apesar de não utilizar a terminologia, demonstra a
preocupação com a integralidade quando se refere à prática interdiscisplinar e a visão
do paciente como um todo, porém quando fala do objetivo, descreve a prevenção de
doenças, não se reportando a promoção da saúde, reduzindo este entendimento de
integralidade.
O livro apresenta 46 capítulos, com uma predominância maciça de
conteúdos para a assistência clínica e individual, discorrendo sobre questões de
anatomia, desenvolvimento oro-facial, fisiologia, anestesia, farmacologia, radiologia,
6
CORREA, M. S. N. P. Odontologia na primeira infância. São Paulo: Santos, 1998.
73
cariologia, tratamento, periodontia, prevenção na clínica, materiais dentários,
endodontia, prótese dental, cirurgia, traumatismo, patologia, sempre relacionadas ao
atendimento em odontopediatria. O capítulo que trata de psicologia é dedicado para os
aspectos psicológicos que envolvem o atendimento clínico da criança. Os capítulos
destinados a higienização, dieta, uso de fluoretos são direcionados para o atendimento
individual, o se reportando ao coletivo. Um único capítulo dedicado à educação faz
uma tentativa de abordagem coletiva, mas ainda o foco central é o individual, e faz uso
do termo “promoção da saúde bucal” provavelmente relacionando-o com a educação
em saúde bucal. Os aspectos biológicos, clínicos, individuais explícitos no conteúdo
deste livro, demonstram uma forte coerção de pensamento para um Estilo de
Pensamento Biologicista, apresentando matizes do Higienismo/Preventivismo.
O livro que chama mais atenção pelo próprio título é “Promoção de saúde
bucal”
7
, inclusive quando apresenta seu primeiro capítulo com o tema “A construção do
Paradigma de Promoção da Saúde”. Este capítulo inicial propõe a mudança de atenção
da Odontologia de prática hegemônica de cunho curativista, restaurador, mutilador e
individual, incapaz de melhorar o nível de saúde bucal dos pacientes, para uma prática
que o autor chama de Odontologia de Promoção da Saúde, e faz o seguinte
comentário:
A Odontologia começou a transitar de uma filosofia fortemente concentrada em
procedimentos mecânicos e artesanais, para uma outra forma de atenção
referendada pelas bases científicas que dão suporte aos seus métodos
preventivos, de diagnóstico, de tratamento específico e de controle das principais
doenças bucais (KRIGER, 1997, p, 20, meus grifos)
Apesar de demonstrar a complicação do modelo biologicista
hegemônico, e de propor uma nova odontologia tendo a promoção da saúde como
bandeira de mudança, as ações propostas concentram-se na proteção da saúde
(métodos preventivos e controle das doenças bucais) e na própria recuperação da
saúde (diagnóstico e tratamento específico), é o que Fleck (1986) descrevia como
harmonia das ilusões, mesmo diante da complicação e através de um novo discurso,
7
KRIGER, L. ABOPREV. São Paulo: Artes Médicas, 1997.
74
os integrantes de um Estilo de Pensamento, lutam pela manutenção de suas idéias e
teorias, representadas aqui pelas ações propostas centradas na proteção e
recuperação da saúde, demonstrando ainda sua filiação por um Estilo de Pensamento
Biologicista com matizes do Higienismo/Preventivismo. Fleck (1986) aponta que o
discurso (verbal e literário) não é suficiente para assegurar a filiação a um determinado
Estilo de Pensamento, e que a experiência prática também é necessária, e neste
caso, a incorporação da promoção da saúde é apenas no sentido de um novo discurso,
porém, as atividades práticas ainda se relacionam com o “velho” Estilo de
Pensamento. É inegável a importância da incorporação da prevenção na prática
odontológica, porém não existe o avanço real para a promoção da saúde, que neste
caso é relacionada como sinônimo de prevenção, e o grande problema desta
contradição é que o aluno vai incorporando estas informações em seu ver formativo,
estilizando-o com este modo de ver.
Os capítulos se seguem numa seqüência que enfatizam este modo de
ver inicial, discorrendo sobre epidemiologia das doenças bucais, dieta e cárie, cárie
(diagnóstico, tratamento, controle da placa bacteriana), flúor, doença periodontal,
ortodontia preventiva, prevenção de doenças, enfatizando sempre os aspectos
biológicos da doença e suas formas de tratamento, prevenção e controle. No capítulo
“Promoção de saúde bucal em Odontopediatria” o autor descreve que o tratamento da
cárie no Modelo de Promoção de Saúde,
Está vinculado à teoria da placa específica e nestas condições pode-se controlar
a infecção tanto por métodos invasivos (remoção dos fatores retentivos de placa)
em combinação com os de natureza o invasiva (controle químico-mecânico de
placa e fluorterapia), ou somente por estes últimos quando os estágios de perda
mineral forem predominantemente lesões brancas (KRIGER, 1997, p. 285, meus
grifos).
O modelo é baseado no entendimento de causação biológica (placa
específica) da cárie, na qual o tratamento é recuperador (remoção dos fatores
retentivos de placa) e de proteção (controle químico-mecânico de placa e fluorterapia),
demonstrando um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes
higienistas/preventivistas. Mais uma vez, podemos caracterizar os elementos do Estilo
75
de Pensamento descrito por Fleck (1986), na qual o sentir seletivo leva a uma ação
conseqüentemente dirigida e uma elaboração correspondente do percebido. O
entendimento de promoção da saúde segue como na discussão inicial do livro, na qual
é relacionada com a prevenção, exercendo uma coerção de pensamento no leitor
neste sentido.
Um outro capítulo, “A filosofia de promoção de saúde na clínica privada”; o
autor coloca a importância do conhecimento do paciente na sua integralidade e aponta
a educação como importante estratégia para a promoção da saúde, e a abordagem
clínica avalia os riscos e a atividade da doença, sendo que o tratamento é baseado
sobre estes achados, ou seja, sobre os fatores da doença, partindo de uma perspectiva
de entendimento da multicausalidade, portanto, pertencentes a um Estilo de
Pensamento Higienista/Preventivista.
Dois capítulos, do total de vinte, demonstram um modo de ver
diferenciado dos demais capítulos, o primeiro com o título de “O conceito de promoção
da saúde na construção de sistemas de atenção em saúde bucal coletiva”, propõe uma
atenção à saúde bucal baseada na promoção da saúde, organizada em territórios,
universal no seu acesso, com planejamento através da epidemiologia buscando a
legitimidade social, contemplando ainda ações educativas em saúde bucal coletiva,
mas não se aprofunda na discussão conceitual e prática da promoção da saúde. Faz
ainda, um resgate histórico sobre os marcos da promoção da saúde, cita a I
Conferência Internacional de Promoção da Saúde de Ottawa, mas não descreve sobre
seu relatório e os eixos de ação da promoção da saúde propostas na conferência;
existe ainda neste capítulo uma discussão sobre os tipos de olhares da epidemiologia,
e quando descreve a epidemiologia social, cita autores como Juan César Garcia, Mario
Testa, Jaime Breilh, Giovani Berlinguer, George Rosen, Engels, Virchow e Waitzkin,
todos eles, grandes representantes do Estilo de Pensamento Social, mas novamente
volto a apontar, trata-se apenas de um capítulo do total de vinte do livro, e escrito por
um autor diferente. Outro capítulo muito interessante é o que trata de educação e
motivação em saúde bucal. O autor aponta que a educação em saúde deve ser capaz
76
de desenvolver nas pessoas uma consciência crítica das causas reais dos seus
problemas, que implique em mudanças, neste sentido, um entendimento de
produção de autonomia, apontando para a promoção da saúde. Faz uma crítica sobre
as práticas educativas hegemônicas com característica autoritária e bancária (educação
sanitária), e cita Paulo Freire como proposta de uma educação problematizadora,
fundamentada na criatividade e no diálogo, estimulando a ação e reflexão sobre a
realidade, valorizando os sentimentos do educando. Coloca ainda que é condição
indispensável no processo de educação em saúde, uma atenção integrada sobre os
aspectos preventivos, curativos, biopsicossociais e ambientais do processo saúde-
doença, portanto, concebe saúde na sua forma ampliada, caracterizando um Estilo de
Pensamento Integral. Ainda assim, a promoção da saúde é apenas relacionada com a
educação em saúde, e volto a insistir, para o aluno que está sendo introduzido em um
Estilo de Pensamento, estas informações farão parte de seu ver formativo e
conseqüentemente a elaboração de uma ação será correspondente ao percebido,
reforçando a coerção de pensamento para este entendimento de promoção da saúde.
A terceira referência é o livro “Crescendo sem cárie”
8
, e o autor no seu
prefácio faz o seguinte comentário:
Eu e meus colegas acreditamos muito, mais do que nunca, que a doença cárie é
totalmente possível de ser prevenida. Seus filhos podem ter dentes firmes, fortes
e alinhados, e isso é muito mais fácil de ser alcançado do que você pode
imaginar (MOSS, 1996, p. 1, meus grifos).
As palavras do autor por si só, demonstram sua afinidade com o Estilo
de Pensamento Higienista/Preventivista, e os capítulos vão confirmando esta
tendência, na qual são descritos os principais problemas bucais do nascimento à
adolescência e os cuidados relativos aos mesmos. O enfoque central é a prevenção da
cárie dental, com informações sobre higienização, dieta, uso de flúor e visitas regulares
ao dentista.
8
MOSS, S. J. Crescendo sem cárie. São Paulo: Quintessence books, 1996.
77
5.1.2.3. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 3º período
O objetivo geral da disciplina é:
Valorizar a epidemiologia na promoção, prevenção, tratamento e reabilitação da
saúde geral e bucal da população (UNIVALI, 2006, meus grifos).
Apresenta ainda como objetivos específicos:
Identificar os fatores de causalidade no processo saúde-doença através dos
tempos;
Entender os conceitos de níveis de prevenção e aplicação e as possibilidades de
intervenção na história natural das doenças (UNIVALI, 2006, meus grifos).
O discurso do objetivo geral é de conceber saúde em seu sentido
ampliado, trabalhando com ações integradas de saúde, sugerindo um modo de ver
integral do processo saúde-doença, porém de forma contraditória, quando descreve um
de seus objetivos específicos fala sobre história natural das doenças e níveis de
prevenção e aplicação, referindo-se ao modelo proposto em 1965 por Leavell & Clark
(1976), que apesar de introduzir a aplicação da promoção da saúde, estas ações
tinham como objetivo melhorar a situação biológica e ambiental das pessoas,
trabalhando na perspectiva da muticausalidade do processo saúde-doença, enfocando
principalmente a prevenção de doenças, portanto pertencentes a um Estilo de
Pensamento Higienista/Preventivista.
Portanto, as ações integradas de saúde e os níveis de prevenção,
possuem marcos teóricos distintos, baseados na integralidade e na multicausalidade
respectivamente.
E no seu ementário:
Epidemiologia. Processo saúde/doença. Indicadores e índices de saúde geral
(UNIVALI, 2006).
78
Os conteúdos programáticos da disciplina apresentam na unidade 1 a
epidemiologia descritiva, a analítica e a experimental não sendo possível uma pré-
análise de um possível Estilo de Pensamento, e apesar de aparecem palavras como
“freqüência”, “incidência”, “prevalência”, “risco atribuível”, “risco relativo”, e coeficientes
de morbi-mortalidade, temas que apresentam como foco a ocorrência de doença e a
distribuição de variáveis, que poderiam dar indícios de um modo de ver o processo
saúde-doença baseado na multicausalidade, de se considerar que quando o tema
central é epidemiologia estes termos são bastante usuais. Na unidade 2 a temática
central é o processo saúde-doença, na qual são descritos os conceitos de causa, níveis
de prevenção e níveis de aplicação, que como discutido na análise deste livro, tem
sua base na multicausalidade. O conceito saúde-doença é desenvolvido posterior aos
métodos epidemiológicos. Talvez a inversão destas temáticas no desenvolvimento da
disciplina fosse apropriada, uma vez que o entendimento prévio do processo saúde-
doença pode propiciar um olhar diferenciado sobre o aprendizado das investigações
epidemiológicas, relacionando-as com a causalidade. A unidade 3 é baseada em
estudos de indicadores de saúde, interpretando-os e comparado-os com os modos de
vida das coletividades, dando indícios de associação de variáveis, que podem sugerir
um entendimento do processo saúde-doença baseado na multicausalidade.
O plano de ensino da disciplina pode ser caracterizado como pertencente
a um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do Higienismo/Preventivismo.
A referência bibliográfica recomendada pela disciplina foi analisada sob
dois prismas: o conceito saúde-doença e o tipo de epidemiologia utilizados para as
investigações.
O livro “Epidemiologia Básica”
9
na sua introdução apresenta uma
contradição quanto aos seus propósitos em duas frases distintas; aponta a “aplicação
da epidemiologia na prevenção das doenças e na promoção da saúde” e propõe
9
BEAGLEHOLE, R.; BONITA, R.; KJELLSTROM, T. Epidemiologia Básica. edição atualizada. São
Paulo: Santos, 2003.
79
“explicar os princípios de causalidade das doenças com particular ênfase nos fatores
modificáveis do ambiente”. Entender o processo saúde-doença na perspectiva do
condicionamento ambiental, é negar a determinação social, e as ações de promoção da
saúde, partem desta perspectiva de entendimento do processo saúde-doença, portanto
atuar sobre os fatores modificáveis do ambiente determina ações de proteção da
saúde.
No capítulo que trata do conceito de saúde-doença, o autor inicia
afirmando que a definição proposta pela Organização Mundial de Saúde em 1948, na
qual “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas
mera ausência de doença”, permanece ainda sendo um ideal, porém descreve ainda no
mesmo capítulo que as definições dos estados de saúde usadas pelos epidemiologistas
tendem a ser simples: “doença presente” e “doença ausente”, e o critério para
determinar este estado é de “normalidade” e “anormalidade”, e que, portanto, o
diagnóstico “clínico” é fundamental para tanto. O capítulo segue descrevendo medidas
de ocorrência da doença (prevalência, incidência, mortalidade, morbidade). Segundo o
autor, no capítulo que discorre sobre os tipos de estudos epidemiológicos classifica a
epidemiologia em epidemiologia observacional descritiva (limita-se a descrever a
ocorrência de uma doença em uma população), baseada no biologicismo;
epidemiologia observacional analítica (aborda com mais profundidade as relações entre
o estado de saúde e outras variáveis), baseada na multicausalidade; e epidemiologia
experimental (envolvem uma tentativa de mudar um determinante de doença, tais como
exposição ou comportamento), também baseada na multicausalidade; o autor utiliza
exemplos confirmando seu olhar sobre fatores ambientais, como descrito na introdução
do livro. Em outro capítulo, quando se refere à causalidade das doenças, coloca a
condição social como fator de exposição excessiva a agentes infecciosos, reforçando o
entendimento de condicionamento ambiental do processo saúde-doença. O livro traz
ainda capítulos sobre “Epidemiologia e Prevenção”, “Epidemiologia Ambiental e
Ocupacional”. Existe uma forte tendência através das temáticas e dos exemplos
utilizados pelo autor, de uma coerção de pensamento para um Estilo de Pensamento
Biologicista com matizes higienistas-preventivistas.
80
“Epidemiologia”
10
é a segunda referência básica da disciplina. No seu
capítulo inicial faz uma introdução ao tema, relatando o processo histórico da
epidemiologia e suas vertentes, e ao final deste capítulo, aponta como tendência atual,
a epidemiologia clínica (baseada no conhecimento do ambiente imediato em que vive o
paciente) e a epidemiologia social (entender a situação de saúde da população através
da premissa de determinação social da doença). Porém, o autor ao conceituar o termo
“saúde”, aponta-a como “ausência de doença” e considera o inverso verdadeiro,
descreve também o conceito de saúde da Organização Mundial de Saúde, apontando-a
como figura de retórica, mas que na prática a saúde é quase sempre quantificada em
termos de presença ou ausência de algum sinal, sintoma ou diagnóstico de doença, e
segue discorrendo sobre a história natural da doença, níveis de prevenção e aplicação.
Apesar de apontar como tendência atual a Epidemiologia Social, trabalha na
perspectiva da epidemiologia descritiva, com variáveis relativas às pessoas, ao lugar
(região geográfica) e ao tempo, reforçando o entendimento de multicausalidade do
processo saúde-doença; na variável relativa às pessoas referencia entre outros a
renda, a ocupação, a instrução, e explicando-as, afirma que as famílias de menor
renda, em geral, tem baixo nível de instrução e exercem ocupações, na qual o ambiente
de trabalho pode conter riscos apreciáveis para a saúde, colocando a condição social,
apenas como mais um fator de exposição na ocorrência da doença. Podemos notar que
a ação proposta (ação dirigida), ou seja, o tipo de epidemiologia utilizada pelo autor, é
conseqüente à forma como se concebe o processo saúde-doença (sentir seletivo),
elementos de um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo.
A terceira referência bibliográfica recomendada pela disciplina é o livro
“Epidemiologia & Saúde”
11
. Conceitua a Epidemiologia como eixo da saúde pública, na
qual proporciona as bases para avaliação de medidas de profilaxia, fornece pistas de
10
PEREIRA, M. G. Epidemiologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1995.
11
ROUQUAYROL, M. Z.; ALMEIDA FILHO, N. Epidemiologia & Saúde. edição. Rio de Janeiro:
MEDSI, 2003.
81
diagnósticos das doenças e realiza a verificação de causalidade, demonstrando uma
afinidade com o biologicismo e também com o higienismo/preventivismo. Aponta ainda
como objetivo da epidemiologia proporcionar dados essenciais para planejamento,
execução e avaliação das ações de prevenção, controle e tratamento de doenças,
reforçando o entendimento de causação biológica e de multicausalidade através das
ações propostas. Descreve a história natural da doença, e classifica como fatores pré-
patogênicos, os processos sociais e os fatores ambientais, e se utiliza do esquema de
níveis de prevenção proposto por Leavell & Clark (1976), talvez isso explique porque no
capítulo que discute sobre “Análise de dados epidemiológicos”, se refira a sua
importância (a análise de dados) na utilização para a prevenção e a promoção da
saúde, provavelmente neste caso, se referindo a promoção da saúde proposta pelo
esquema dos referidos autores, que como discutido tinha como objetivo a prevenção
de doenças e afinidade com a teoria da multicausalidade. Apesar de citar fatores
sociais, as propostas de ação o baseadas na prevenção, reforçando a utilização dos
níveis de prevenção e aplicação. O autor trabalha na perspectiva da abordagem
descritiva em epidemiologia e afirma que a epidemiologia moderna deve identificar
associações estatísticas entre os eventos de saúde-doença e suas possíveis causas,
distribuindo-as em variáveis relacionadas ao tempo, lugar e à pessoa (características
gerais, familiares, endógenas, étnicas, nível sócio-econômico, ocorrências na vida intra-
uterina e acidentais, hábitos e atividades), reforçando a visão de multicausalidade do
processo saúde-doença, caracterizando um Estilo de Pensamento
Higienista/Preventivista. Um capítulo sobre saúde materno-infantil e padrões de
morbimortalidade, quando descreve sobre mortes por diarréia, aponta como possíveis
intervenções, a melhora no manejo dos casos, a suplementação com vitamina A,
imunizações, a promoção do aleitamento materno e alimentos complementares
seguros, a melhora na nutrição, a promoção da higiene pessoal e doméstica e a
melhora da qualidade da água e do saneamento, ou seja, ações baseadas na proteção
da saúde. Podemos notar que o corpo de conhecimentos e práticas está relacionado
com o modo de ver, entender e conceber o processo saúde-doença, próprias de seu
estilo.
82
5.1.2.4. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 4º período
A disciplina apresenta no seu plano de ensino como objetivo geral:
Planejar tratamentos odontológicos para adequação bucal, considerando os
fatores de risco e atividade das doenças mais freqüentes da cavidade oral (cárie
dentária e doença periodontal) (UNIVALI, 2006, meus grifos).
Segundo Basting (2003) a adequação bucal pode ser entendida como
uma fase de preparação do meio bucal do paciente, anterior ao tratamento restaurador
e/ou reabilitador, buscando identificar o risco de cárie de cada paciente para evitar a
recorrência da doença. A adequação bucal pode ser dividida em duas fases: uma
educativa, que visa a conscientização do paciente sobre a doença e a alteração dos
hábitos de higiene e/ou dieta; a segunda fase que visa a eliminação de nichos
retentivos de placa bacteriana, que incluem procedimentos de remoção de tártaro
supragengival, remoção de placa com jatos de bicarbonato ou pastas profiláticas,
remoção dos excessos de restaurações, selamento marginal de fendas entre
restauração e dente, escariação e posterior selamento com material provisório de
lesões cariosas, impedindo sua progressão, e utilização de fluoretos. O profissional
inicia o tratamento restaurador e reabilitador definitivo quando o paciente se encontra
capaz de controlar seus fatores de risco (BASTING, 2003).
Partindo desta definição, e considerando as ações realizadas (educação,
prevenção clínica, recuperação) e o ambiente em que se dão estas ações (clínica e
individual), a adequação bucal é uma técnica que por si demonstra uma tendência
para um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo, podendo desta forma, sugerir este Estilo de Pensamento
para a disciplina. O objetivo geral reforça esta sugestão quando descreve a adequação
bucal, as principais “doenças” bucais, “tratamento” e “fatores de risco”.
E no ementário os aspectos biológicos são enfatizados:
83
Apresentação e discussão do plano de ensino. Diagnóstico da doença cárie
dentária. Decisões no tratamento da doença cárie dentária. Doença Periodontal.
Clínica de adequação bucal (UNIVALI, 2006, meus grifos).
A análise dos conteúdos programáticos da disciplina demonstrou dois
grandes grupos de categorias. O primeiro grupo é representado por categorias que
discorrem sobre as doenças cárie e periodontal (etiologia, anamnese, exames,
diagnóstico, índices de qualificação e quantificação da placa supra gengival, padrão
dietético, terapêutica curativa, escariação, selamento, medicamentos, adequação
bucal), técnicas (tratamento restaurador atraumático, técnica erosão-abrasão, técnica
de prescrição de fluoretos, técnicas de adequação bucal, técnica de uso de cariostático,
técnica de uso de selantes), materiais dentários (materiais provisórios, cimento de
ionômero de vidro, IRM
12
, cariostático e selantes), tendo a causação biológica como
modo de ver e a recuperação da saúde como corpo de práticas. Já no segundo
grupo, as categorias identificadas foram, risco (nível sócio-econômico e cultural, fatores
de risco, fatores modificadores, grupos de risco) e prevenção (evidenciação de placa
bacteriana, higiene oral, compostos fluoretados, terapêutica preventiva, profilaxia
profissional, selantes, biossegurança) e estão relacionadas com o modo de ver da
multicausalidade com práticas de proteção da saúde. Na unidade que se refere a
decisões no tratamento da doença cárie, existe o tópico “prática de promoção de saúde
abordando os fatores comuns de risco”, como ele não possuía elementos para uma
análise, foi melhor explorado na entrevista com o professor. Um fato interessante é que
não consta explicitamente no plano de ensino qualquer tópico sobre prática educativa
em saúde, podendo exercer uma coerção de pensamento no sentido de importância
dos procedimentos clínicos em relação à parte educativa.
A disciplina apresenta três referências básicas. O primeiro livro “Promoção
da Saúde Bucal”, já foi analisado anteriormente no período do curso, apresenta
hegemonicamente um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo, porém existem alguns capítulos que se relacionam
12
Material restaurador provisório.
84
diretamente com os objetivos da disciplina, portanto, passíveis de citação. No capítulo
que trata do diagnóstico da cárie o autor aponta que a nova odontologia deve estar
baseada no diagnóstico da atividade da doença cárie e que:
Novos conhecimentos sobre a etiologia e possibilidades de controle da doença,
associados ao fracasso da odontologia restauradora na promoção de saúde dos
indivíduos, ocasionaram uma necessidade de revisão da estratégia de manejo da
doença cárie (MALTZ; CARVALHO, 1997, p. 71, meus grifos).
Existe na frase do autor uma proposta de mudança de postura, com a
incorporação das ações de proteção da saúde, através do conhecimento da doença.
Entretanto, apesar da importância desta mudança, não existem elementos que
caracterizem a promoção da saúde.
O texto descreve que a odontologia hegemônica restauradora não foi
capaz de diminuir os índices de cáries e de pessoas edêntulas, relacionando com o
sobretratamento (tratamento de lesões desnecessárias) e a substituição desnecessária
de restaurações, pois a cada novo preparo cavitário vai aumentando a fragilidade do
dente, aumentando o risco para futuros tratamentos endodônticos e extrações,
demonstrando a complicação do modelo hegemônico. A proposta é de uma nova
Odontologia incorporando a promoção da saúde, baseada na visão de diagnóstico da
atividade da doença, através do conhecimento de sua etiologia, que permita a
possibilidade de inativar lesões através do uso de fluoretos e outras medidas
preventivas, evitando que restaurações desnecessárias sejam executadas. A promoção
da saúde é colocada como forma de incorporar a prevenção na prática odontológica,
aliada a procedimentos o menos mutiladores quanto forem possíveis, não apresentando
qualquer relação com os conceitos de promoção da saúde da Carta de Ottawa (1986).
Propõe que o diagnóstico deve se iniciar com uma boa anamnese, sobre o estado geral
de saúde, hábitos alimentares e de higiene bucal, e exposição a fluoretos. No exame
clínico devem ser verificados: presença de placa bacteriana e gengivite; experiência
anterior de cárie; presença e tipo de lesões de cárie; e atividade e local destas lesões.
Acrescenta também os exames de saliva e bacteriológicos como métodos auxiliares
85
importantes para o diagnóstico. Nesta proposta, podemos notar que as tecnologias e
conhecimentos utilizados se relacionam com o biologicismo, porém a proposta de um
diagnóstico preciso é com o objetivo de controlar a doença, afinadas, portanto, com a
proteção da saúde. Isso de certa forma justifica a utilização de matizes quando nos
reportamos ao higienismo/preventivismo e ao biologicismo, que neste exemplo, seus
limites são imprecisos e se “confundem”.
O tratamento da cárie dentária proposto é baseado na avaliação de cada
caso e determinado pela atividade da doença, individualizando a escolha do material
restaurador, a terapia com flúor, o aconselhamento dietético, o tratamento
antimicrobiano para o controle da doença. As ações estão baseadas na recuperação e
proteção da saúde. Descreve também a necessidade de uma profilaxia básica para o
controle da doença, que inclui informação teórica, instrução sobre auto-cuidado bucal,
uso de dentifrício fluorado, orientação dietética e controle profissional. As próprias
palavras do autor definem seu objetivo de controlar a doença, o que demonstra sua
tendência higienista/preventivista, inclusive quando se reporta da parte educativa,
utilizando os termos “informação teórica”, “instrução” e “orientação”, terminologias
próprias da educação sanitária, caracterizando o Estilo de Pensamento Biologicista
com matizes Higienistas/Preventivistas.
Talvez o pensamento desta proposta de abordagem de diagnóstico e
tratamento, justifique o conteúdo da Unidade 3 do plano de ensino “Prática de
promoção de saúde abordando os fatores comuns de risco”, provavelmente com um
entendimento relacionado com este modo de ver.
Vale lembrar que no mesmo livro existe um capítulo que versa sobre a
educação em saúde, que demonstra um Estilo de Pensamento Integral, já discutido na
análise do plano de ensino do 2º período.
86
O segundo livro tem como título “Cariologia”
13
, como o próprio nome
sugere, os temas são desenvolvidos tendo a cárie como elemento central sobre o olhar
da bioquímica, epidemiologia, histopatologia, imunologia, microbiologia, nutrição,
fisiologia e prevenção. O autor inicia o livro fazendo um resgate histórico da etiologia da
cárie, chegando ao conceito atual, descrevendo os fatores locais (saliva, imunização,
morfologia dentária) e gerais (presença de microorganismos e dieta cariogênica) que
interferem no processo. Posteriormente descreve o mecanismo de formação da placa
bacteriana, os tipos de cárie, os testes de atividade de cárie, e no final, reserva
capítulos para a descrição de dentifrícios (função e composição), selantes oclusais
(indicação, materiais, técnica), controle e prevenção da cárie (individual e coletivo).
Predominam hegemonicamente os temas relacionados a compreensão biológica da
cárie dental, representando um Estilo de Pensamento Biologicista, e também
aparecem temas sobre prevenção e higienização numa quantidade pequena, mas que
podemos considerar como matizes para o Higienismo/Preventivismo, direcionados para
o atendimento clínico individual.
O terceiro livro, “Cariologia clínica”
14
, apresenta os mesmos picos
discutidos no livro “Cariologia”, e acrescenta outras temáticas envolvendo a aplicação
do flúor na prevenção individual e sua importância na fluoretação das águas, controle
químico da placa bacteriana, demonstrando uma atenção maior ao aspecto preventivo.
Quando fala sobre a determinação do risco a cárie, faz a seguinte consideração:
Aceitando a cárie dentária como uma doença mutifatorial, uma das técnicas é
obter informações relevantes sobre os fatores etiológicos selecionados
(THYLSTRUP e FEJERSKOV, 1995, pág. 334).
O autor se utiliza da explicação de multicausalidade para a ocorrência da
cárie dentária, caracterizada quando a considera como uma doença multifatorial e
enfatiza sobre os conhecimento de seus “fatores” etiológicos.
13
NEWBRUN, E. Cariologia. 2ª edição. São Paulo: Santos, 1990.
14
THYLSTRUP, A.; FEJERSKOV, O. Cariologia Clínica. 2ª edição. São Paulo: Santos, 1995.
87
Classifica como fatores a serem utilizados na avaliação de risco, a
estrutura dentária (forma e química), fatores biológicos e bioquímicos (presença e
composição de placa bacteriana), fatores salivares, dieta alimentar, condições
sistêmicas, e epidemiologia e demografia (experiência de cárie, lesões de cáries,
experiência familiar, idade, nível sócio-econômico), caracterizando um Estilo de
Pensamento Biologicista com matizes Higienistas/Preventivistas.
Um capítulo reservado a epidemiologia chama a atenção; além de
descrever os passos de uma investigação epidemiológica, aponta a importância de
conhecer a ocorrência de um determinado problema de saúde de uma população, como
forma de possibilitar o planejamento de diretrizes para a saúde pública, como forma
determinar a necessidade de treinamento e desenvolvimento de programas de saúde
pública e cita o exemplo da fluoretação das águas de abastecimento. De certa forma,
isso pode ser entendido como formulação de políticas públicas, podendo ser entendido
como um dos eixos de ão da promoção da saúde, sugerindo um Estilo de
Pensamento Social, porém não se aprofunda nas discussões e o tema aparece isolado
frente às temáticas voltadas para o biológico e para a prevenção.
5.1.2.5. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 5º período
A disciplina apresenta como objetivo geral:
Planejar e executar tratamentos odontológicos de acordo com o diagnóstico,
levando em consideração os fatores de risco e atividade das doenças mais
freqüentes da cavidade oral (cárie dentária e doença periodontal) (UNIVALI,
2006, meus grifos).
E como ementário:
Apresentação e discussão do plano de ensino. Programa de promoção de saúde
bucal. Ações clínicas individuais educativo-preventivas e reabilitadoras (UNIVALI,
2006, meus grifos).
88
Comparando os objetivos gerais e o ementário das disciplinas do e 5º
períodos, notamos uma semelhança de proposta muito grande, e apesar de não
aparecer o termo adequação bucal, a confirmação se deu na entrevista com o professor
responsável que trata-se de uma disciplina de clínica de adequação bucal, e se repete
como no período anterior, a abordagem sobre as doenças, seus tratamentos e fatores
de risco, ou seja, com base no biologismo e na multicausalidade, tudo isso
desenvolvido em ambiente clínico, reforçando este modo de ver o processo saúde-
doença.
Como mostra o ementário, a disciplina está distribuída em três unidades, a
primeira voltada apenas para apresentação da disciplina e discussão do plano de
ensino, a segunda com uma carga teórica e a terceira voltada para a clínica, cabem
aqui, algumas considerações. A unidade 2 apresenta como objetivo de aprendizagem,
identificar, interpretar e aplicar os preceitos norteadores de um programa de promoção
de saúde bucal em ações clínicas, e desenvolve seus conteúdos em: fundamentos da
promoção de saúde bucal, motivação do paciente, protocolo terapêutico, planejamento
de caso clínico, biossegurança e bioética. Estes conteúdos não demonstram uma
ligação com o conceito de promoção da saúde, aqui referenciado pela Carta de Ottawa
(1986), sugerindo muito mais uma ligação com ações de proteção e recuperação da
saúde. A unidade 3 confirma este pensamento, na qual a proposta, segundo o plano de
ensino, é para que os alunos desenvolvam em clínica, ações individuais educativo-
preventivas e reabilitadoras (educação e motivação do paciente para higiene oral,
controle de placa bacteriana, teste salivar, diário alimentar, aconselhamento dietético,
adequação do meio bucal, fluorterapia), trabalhando com os fatores de risco à doença.
A prática educativa sugere um estilo bancário, quando utiliza o “aconselhamento”. O
Estilo de Pensamento Biologicista com matizes Higienistas/Preventivistas pode ser
caracterizado através do modo de ver identificado na unidade 2 e posteriormente
reproduzido através de corpo de práticas desenvolvido na unidade 3.
A disciplina apresenta quatro referências quanto a bibliografia
recomendada.
89
O primeiro livro “Risco de cárie”, demonstra já em seu prefácio a afinidade
do autor com o Estilo de Pensamento Biologicista com matizes higienistas-
preventivistas, em suas próprias palavras:
As análises microbianas e salivareso coadjuvantes valiosos na avaliação
clínica e radiográfica do risco de cárie, também ajudam a acompanhar a
eficiência das medidas preventivas (KRASSE, 1988, p. 8, meus grifos).
Ainda segundo o autor, a descrição completa do estado da cárie dentária
é a base para um diagnóstico adequado. O livro pode ser dividido em três partes. A
primeira que a temática é sobre o mecanismo de ação da cárie dental, descrevendo
principalmente a patogenia, portanto, focado no entendimento de causação biológica.
Um segundo bloco é destinado ao diagnóstico da cárie, através da análise dietética, do
exame salivar e microbiológico, e apesar dos temas estarem relacionados com os
aspectos biológicos, existe uma conotação dos “fatores” que influenciam o
aparecimento da cárie, sugerindo o entendimento a partir da multicausalidade,
justificando a utilização de matizes para a caracterização do Estilo de Pensamento. E
a parte final se destina ao tratamento, de acordo com os problemas diagnosticados,
com capítulos específicos para tratamento dietético, tratamento de saliva deficiente,
redução de microorganismos cariogênicos e prevenção com fluoretos, que representam
o corpo de práticas com ações de recuperação e proteção da saúde, caracterizando
um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes higienistas-preventivistas. O autor
classifica os grupos de risco, segundo avaliação clínica, de acordo com o padrão
dietético e a presença de microorganismos, confirmando seu olhar inicial.
O segundo livro “Promoção de Saúde Bucal”, discutido no plano de
ensino do e períodos, demonstrou hegemonicamente um Estilo de Pensamento
Biologicista com Matizes do Higienismo/Preventivismo, e como os objetivos das
disciplinas do e períodos são muito semelhantes, a análise deve seguir a mesma
ótica, não sendo necessário qualquer outro tipo de consideração.
90
A terceira referência recomendada é “Prevenção na clínica
odontológica”
15
, no seu capítulo inicial, o autor destaca que a prevenção é ensinada na
graduação de odontologia quase que exclusivamente na disciplina de saúde pública, e
que existe a necessidade de desenvolver uma filosofia de prevenção no atendimento
clínico e faz menção aos níveis de prevenção e aplicação de Leavell & Clark, dando
indícios de um Estilo de Pensamento Higienista/Preventivista, que vai se confirmando
pelo desenvolvimento dos temas. Apresenta os problemas cárie e doença periodontal
quanto a sua etiopatogenia. Muito interessante o capítulo que relaciona o diagnóstico
precoce com a promoção de saúde bucal, na qual a explicação consiste no sentido de
uma terapêutica imediata as primeiras alterações dentárias ou gengivais, prevenindo e
mantendo a saúde bucal, e desta forma, promovendo a saúde geral. A promoção da
saúde é colocada como sinônimo de prevenção. Um outro capítulo que chama muito a
atenção é Prevenção e motivação na clínica odontológica” que praticamente resume o
objetivo do livro, cuja proposta é baseada no esquema de níveis de prevenção e
aplicação e exemplifica à partir da doença periodontal. Propõe na prevenção primária a
promoção da saúde (educação de saúde, motivação do paciente, exame bucal
periódico, instrução de higiene oral, nutrição adequada, planejamento de dieta e
condições de vida saudável) e a proteção específica (profilaxia periódica, higiene bucal
efetiva, correção de restaurações e hábitos nocivos, restauração da morfologia gengival
e óssea, correção de desarmonias oclusais grosseiras e fluoretação da água pelo poder
público). Apesar da utilização do termo promoção da saúde, as ações relativas
possuem elementos ligados ao biologicismo e ao higienismo/preventivismo. Quando se
refere à motivação do paciente, explicita um enfoque individual; quando se reporta ao
exame bucal periódico, ênfase à clínica, quando propõe um planejamento de dieta e
fala de instrução de higiene oral, indícios de uma educação bancária e autoritária.
Nesta forma de entendimento, estas ações estariam muito mais afinadas com a
recuperação e proteção da saúde, é a harmonia das ilusões, mesmo incorporando a
promoção da saúde no discurso, as ações propostas se baseiam em ações que
representam o modo de ver hegemônico. Confirmando esta filiação de Estilo de
15
LASCALA, N. T. Prevenção na clínica odontológica. São Paulo: Artes Médicas, 1997.
91
Pensamento, apresenta um capítulo específico sobre higienização bucal, com
considerações sobre motivação, técnicas de escovação, materiais de higienização e
controle de placa bacteriana, cujas características, “bebem” na educação sanitária.
Reserva ainda um capítulo para cada especialidade (odontopediatria, ortodontia,
radiologia, dentística e prótese) destacando a filosofia preventiva que deve permear a
clínica odontológica, nos permitindo uma caracterização por um Estilo de Pensamento
Biologicista com matizes Higienistas/Preventivista.
O último livro recomendado pela referência básica da disciplina é
“Odontologia em Saúde Coletiva”
16
. No prefácio destaca que a publicação soma os
princípios do campo da saúde bucal coletiva aos conteúdos necessários para
prevenção em Odontologia, mergulhando numa reflexão que vai da microbiologia à vida
e ao trabalho em sociedade. O livro é dividido em duas grandes partes: Odontologia em
Saúde Coletiva e Prevenção em Odontologia. Como a disciplina se concentra em
atendimento clínico para adequação bucal, portanto individual, faremos a análise
utilizando apenas a segunda parte do livro (Prevenção em Odontologia), suprimindo da
análise, a parte destinada à saúde coletiva. Utilizaremos a mesma lógica na disciplina
do período que também é destinada à clínica de adequação bucal e que novamente
apresenta o livro em sua referência básica. O mesmo livro é recomendado na referência
bibliográfica do período, na qual utilizaremos a primeira parte do livro (Odontologia
em Saúde Coletiva) para a análise, uma vez que a aprendizagem está destinada às
políticas de saúde, odontologia e sociedade, qualidade de vida, entre outros. Esta
segunda parte do livro apresenta a etiologia e diagnóstico da cárie dental, métodos de
utilização de flúor sistêmico e tópico, uso de selantes, considerações sobre dieta e
cárie, fatores de risco (inclui a condição sócio-econômica como fator), prevenção das
doenças periodontais. A promoção da saúde aparece em dois capítulos deste segundo
bloco. No capítulo “Promoção de saúde em dentística”, a promoção da saúde é
colocada no sentido de um tratamento com diagnóstico precoce da cárie, no
conhecimento de medidas preventivas que paralisem ou regridam as lesões ativas,
utilizando técnicas não invasivas ou o menos invasivas quanto forem possíveis, além da
16
PEREIRA, A. C. Odontologia em saúde coletiva. São Paulo: ArtMed, 2003.
92
“transmissão” de conhecimentos básicos sobre dieta e controle de placa, ou seja,
promoção da saúde é prevenir ou “evitar um mal maior”, não apresentando relação com
o conceito da Carta de Ottawa. O capítulo “Alicerce para a promoção de saúde bucal: o
início precoce” demonstra uma visão de que a promoção da saúde é uma filosofia que
deve estar presente na prevenção e no tratamento da cárie propiciando uma
intervenção precoce com abordagem preventivo-educativa, e apesar de não negarmos
a importância desta intervenção precoce, a promoção da saúde é colocada no sentido
de que evitando a doença, se promove saúde. Nestas duas situações as ações são
representadas pela recuperação e proteção da saúde. Desta forma, as temáticas e os
conteúdos implícitos dos capítulos nos permitem uma caracterização por um Estilo de
Pensamento Biologicista com matizes do Higienismo/Preventivismo.
5.1.2.6. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 6º período
A disciplina apresenta em seu objetivo geral:
Reconhecer os determinantes biológicos e sociais do processo cárie dental,
fluorose dentária e anomalias dento-faciais, exercitando os índices ceo e CPO-D
e anomalias dento-faciais (UNIVALI, 2006, meus grifos).
O objetivo inicialmente demonstra uma afinidade com o modo de ver
integral, explicitando o entendimento de causação biológica e da determinação social
do processo saúde-doença. Porém, os índices ceo e CPO-D citados são utilizados em
levantamentos epidemiológicos, e medem a incidência e a prevalência da cárie dental
em diferentes faixas etárias, ou seja, medem apenas a ocorrência da doença,
demonstrando uma certa contradição quanto à determinação social do processo cárie
descrita no objetivo.
A ementa da disciplina contém os seguintes conteúdos temáticos:
Cárie dentária. Índice CPO-D e ceo-d. Fluorose dentária e anomalias dento-
faciais. Projeto para aplicação em Odontologia Coletiva (UNIVALI, 2006, meus
grifos).
93
De acordo como o ementário, a disciplina está dividida em quatro
unidades. Na primeira aparecem como conteúdos programáticos, a evolução do
conceito do processo saúde-doença, a evolução do conceito de cárie dentária, e o
ordenamento vital e social da cárie, mas não explicita de qual conceito de saúde-
doença e de cárie dentária se refere, não sendo possível uma análise quanto ao Estilo
de Pensamento pertencente, porém quando se refere ao ordenamento vital e social da
cárie, dá indícios de um modo de ver da determinação social.
A unidade 2 é desenvolvida sobre os índices CPO-D e ceo-d,
apresentando as normas do Ministério da Saúde para realização destes exames,
fazendo a comparação destes índices no Brasil e no Estado; apresenta ainda uma parte
prática, na qual os alunos realizam um levantamento epidemiológico em escolares
utilizando os referidos índices, para posteriormente os dados serem tabulados e
analisados; como discutido anteriormente, estes índices demonstram a incidência e a
prevalência da cárie dental, trabalhando na perspectiva da epidemiologia descritiva, que
neste caso, só mede a ocorrência da cárie não utilizando as variáveis de dieta,
higienização, saliva, etc, portanto, com bases bem biologicistas, e de certa forma, em
contradição com o objetivo geral da disciplina quando aponta para o reconhecimento
dos determinantes biológicos e sociais do processo cárie dental, caracterizando mais
uma vez a afirmativa de Fleck (1986), que apontava a necessidade da experiência
prática, e que a linguagem, apesar de importante, não assegura a cooperação
estilizada por um Coletivo de Pensamento.
A unidade 3 apresenta a fluorose dentária, em seu histórico, etiologia,
graus de fluorose, índice e formas de tratamento, além das normas de classificação de
anomalias dento-faciais aplicadas pelo Ministério da Saúde, na qual o enfoque central
são as doenças e tratamento.
A unidade 4, segundo o plano de ensino, tem como objetivo específico a
elaboração de um projeto de Odontologia Coletiva, com ações que visem a redução da
94
incidência e prevalência das principais doenças bucais em conformidade com a
realidade social estudada, e como já discutido, o diagnóstico é baseado em uma
investigação descritiva, e em conformidade com este tipo de avaliação a proposta de
intervenção é centrada na prevenção de doenças ou na diminuição delas, portanto
apresenta características de um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes
Higienistas/Preventivistas.
A disciplina apresenta duas referências básicas. A primeira é o clássico
livro de Leavell & Clark “Medicina Preventiva”
17
, que foi escrito em 1965, e apesar de ter
trazido contribuições importantes para a época, alguns temas desenvolvidos neste livro,
apresentam diferenças conceituais importantes para o nosso entendimento atual sobre
promoção da saúde. Na sua apresentação o autor demonstra sua visão descrevendo
que “A medicina preventiva é conceituada, modernamente, como uma atitude
(LEAVELL; CLARK, 1976, p. 5). E que “Qualquer que seja a especialidade ou campo de
ação do profissional, ele pode e deve agir preventivamente” (LEAVELL; CLARK, 1976,
p. 5). E enfatiza “Evitar a doença, sua transmissão ou seu agravamento. Minorar o
inevitável” (LEAVELL; CLARK, 1976, p. 5). Seu olhar preventivista é bem marcante
sobre as ações de saúde, que pode ser reforçado quando descreve sobre saúde e
doença:
Pode-se pensar sobre a saúde, assim como sobre a doença e a invalidez, em
uma escala graduada. Ela pode ser afetada por agentes patológicos animados e
inanimados, pelas características inerentes ou adquiridas pelo homem e pelos
muitos fatores do meio ambiente em que o homem vive (LEAVELL; CLARK,
1976, p. 12, meus grifos).
Desta forma, considera que o processo saúde-doença tem como
determinantes o agente biológico e o meio, cujo modo de ver é biologicista e
higienista-preventivista, respectivamente.
17
LEAVELL, H. R.; CLARK, E. G. Medicina Preventiva. São Paulo: McGraw Hill do Brasil, 1976
95
Leavell & Clark, de certa forma, revolucionaram a prática médica e
odontológica na época, com a introdução do esquema de níveis de prevenção e
aplicação na história natural da doença, apresentado neste livro, que data de 1965.
Os autores descreviam que qualquer processo mórbido no homem,
apresenta um período de pré-patogênese (antes do homem adoecer), que representa a
exposição do homem aos fatores ambientais que produzem estímulo à doença, e
período de patogênese (curso da doença no homem), que é a própria interação
hospedeiro-estímulo, cuja evolução caminha para a convalescença, podendo levar o
homem a morte, estado crônico, invalidez ou a própria recuperação, considerando este
processo como história natural da doença. Ao meio ambiente na definição dos autores,
também estavam relacionados os fatores sociais, econômicos e biológicos. O ambiente
social aqui engloba o tipo de vida da comunidade, os estilos de vida, a religião, a
distribuição de bens, o efeito dos períodos de depressão e desemprego, a oportunidade
de emprego para os mais fracos fisicamente e idosos, a deficiência nutricional, as
condições higiênicas. Esta visão para a época foi um avanço muito importante, porém a
consideração do ambiente social como fator de exposição não tem a mesma base
conceitual da determinação social do processo saúde-doença.
O conhecimento da história natural das doenças, ou seja, o percurso das
doenças, bem como seus elementos causais, permitiria uma aplicação de ações em
qualquer período, seja ele na pré-patogênese ou na patogênese. O Período de pré-
patogênese apresentava a prevenção primária como nível de aplicação das medidas
preventivas e o período de patogênese a prevenção secundária e terciária. A prevenção
primária era composta de ações de promoção da saúde e proteção específica. Na
prevenção secundária, as ações eram baseadas no diagnóstico precoce e pronto
atendimento, e na limitação da invalidez. a prevenção terciária era representada por
ações de reabilitação. O termo prevenção é utilizado no sentido de realizar uma
atuação pontual em qualquer um destes níveis, evitando um mal maior.
96
A grande contribuição dos autores foi a inclusão da promoção da saúde
no cardápio de ões da saúde, que eram representadas pela educação sanitária, bom
padrão nutricional de acordo com o desenvolvimento da vida, atenção ao
desenvolvimento da personalidade, moradia adequada, recreação, condições
agradáveis no trabalho, aconselhamento matrimonial e educação sexual, genética e
exames seletivos periódicos, um avanço para a época. Porém se analisarmos e
classificarmos as ações propostas, com os referenciais atuais, elas têm um enfoque
preventivista com vistas a evitar algum problema futuro e não de elevar o nível de
saúde e as condições de vida dos indivíduos, com exceção da questão da moradia
adequada e recreação.
Após a I Conferência Internacional de Promoção da Saúde, que produziu
a Carta de Ottawa (1986), este entendimento de promoção da saúde sustentado por
Leavell e Clark foi superado, ou pelo menos deveria ter sido superado. Porém,
passados vinte anos após a criação deste documento, ainda existe muita confusão
sobre o tema promoção da saúde, ainda relacionada com a prevenção, como proposto
por Leavell & Clark.
O livro traz ainda exemplos práticos sobre determinadas doenças, com
sua história natural e seus níveis de aplicação e prevenção. Quando se refere à cárie
dentária, o autor propõe como ações de promoção da saúde a “educação de saúde na
higiene oral”, “bom padrão de nutrição”, “planejamento dietético” e “exames seletivos
periódicos”, confirmando seu modo de ver com ações de proteção da saúde,
caracterizando o Estilo de Pensamento Higienista-Preventivista. Este olhar para a
doença determina ações específicas, enquanto a atual promoção da saúde pede ações
inespecíficas, focando sim para os determinantes de saúde.
A segunda referência é o livro “Saúde bucal coletiva”
18
. No capítulo inicial
o autor apresenta as bases para uma saúde bucal de caráter coletivo, propondo níveis
de atenção odontológica num esquema semelhante aos níveis de prevenção e
18
PINTO, V. G. Saúde bucal coletiva. 4ª edição. São Paulo: Santos, 2000.
97
aplicação de Leavell & Clark. O capítulo referente à epidemiologia demonstra o método
epidemiológico e apresenta os principais índices e levantamentos em saúde bucal
utilizados pela Organização Mundial de Saúde, que basicamente limitam-se a medir a
incidência e prevalência, enfocando desta forma, apenas a ocorrência da doença (tipo
CPO-D). O capítulo sobre promoção da saúde e a prevenção das doenças bucais, inicia
descrevendo a usual utilização dos níveis de prevenção e faz uma crítica quanto à
abordagem insatisfatória no campo da promoção da saúde, e segue fazendo um relato
histórico da promoção da saúde passando pelo Informe Lalonde (1974), Carta de
Ottawa (1986), inclusive descrevendo seus eixos de ação. Quando se refere à
prevenção das doenças bucais com base na estratégia populacional (amplitude do
problema), descreve que os fatores de risco ambientais (consumo exagerado de
açúcar, higiene oral deficiente) relacionados com as doenças bucais são quase todos
determinados por comportamentos, que por usa vez são determinados por normas
sociais, e enfatiza este pensamento quando faz menção a fatores de risco comuns às
doenças, citando a privação econômico-social e desigualdades. Aponta ainda que para
prevenir as doenças bucais, o trabalho intersetorial deve ser fomentado. Apresenta um
modo de ver da determinação social. Vale ressaltar que este capítulo foi escrito por um
autor distinto dos demais capítulos. O capítulo referente à educação em saúde bucal é
de suma importância, pois apresenta um projeto educacional (que é a proposta da
unidade 4 da disciplina) baseado em cinco passos: reconhecimento do problema,
análise da situação, prescrição educacional, ação, revisão dos resultados e avaliação,
num modelo pré-formatado, na qual as estratégias estão definidas, condizentes com
o que classificamos de educação sanitária. Os capítulos demonstram uma hegemonia
do Estilo de Pensamento Higienista-Preventivista, porém existe uma contra-
hegemonia de um Estilo de Pensamento Social em um dos capítulos.
5.1.2.7. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 7º período
O objetivo geral da disciplina é:
98
Realizar ões clínicas individuais educativo-preventivas e de adequação do
meio bucal em clínica odontológica (UNIVALI, 2006, meus grifos).
E no seu ementário:
Adequação bucal. Protocolo de adequação bucal. Clínica de adequação bucal
(UNIVALI, 2006, meu grifo).
Seguindo a mesma descrição dos períodos anteriores que tratam da
adequação bucal, o ambiente é a clínica, a atenção é individual, e os procedimentos
são proteção e recuperação da saúde.
A disciplina está dividida em uma parte teórica (16 horas), voltada para
uma revisão do protocolo de adequação bucal e planejamento de casos clínicos para
sua aplicação, e uma parte prática (44 horas) de atividades clínicas para realização dos
procedimentos de adequação bucal, na qual podemos caracterizar o modo de ver e o
corpo de práticas do Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo.
A disciplina recomenda cinco referências básicas, sendo que três delas
foram analisadas anteriormente, pois também aparecem nos outros períodos da
disciplina, mas para melhor caracterizar o Estilo de Pensamento desta disciplina, elas
serão nominalmente descritas.
A primeira referência é o livro “Risco de cárie”
19
, que também aparece no
período do curso, como comentado, o livro enfatiza a importância de uma
investigação quanto ao fator desencadeador ou fator de risco individual, atuando sobre
estes determinantes (dieta, presença de microorganismos, saliva) da cárie, que para a
adequação do meio bucal, pode ser uma importante “ferramenta”, no controle dos
fatores de risco individuais, demonstrando uma visão de multicausalidade do problema.
Como mencionado, demonstra um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes
Higienistas/Preventivistas.
19
KRASSE, B. Risco de Cárie. 2ª edição. São Paulo: Quintessence, 1988.
99
A segunda referência é o livro “Promoção da Saúde Bucal”, que consta na
bibliografia sica recomendada de mais três períodos (2º, e 8º), cuja análise está
melhor detalhada no período, porém especificamente para este período e de acordo
com o objetivo geral da disciplina vale ressaltar alguns pontos discutidos. A proposta
inicial do livro é a mudança paradigmática para uma Odontologia mais conservadora em
seus procedimentos, menos invasiva quanto for possível, trabalhando na perspectiva da
prevenção, podendo ser um ponto importante na construção do corpo de
conhecimentos do iniciado. Apesar de não ser absoluto, o Estilo de Pensamento
Biologicista como matizes para o Higienismo/Preventivismo é hegemônico nesta
referência.
“Cárie Dental”
20
é o terceiro livro recomendado. Escrito por um professor
de microbiologia e imunologia, através do enfoque dado aos capítulos, demonstra o que
Fleck (1986) chamava de “sistema fechado de crenças”.
O Estilo de Pensamento tem como raiz uma disposição para ver, observar ou
perceber de forma dirigida. A construção do fato científico está intrinsecamente
relacionada com esta forma de ver (FLECK apud CUTOLO, 2001, pág, 38, grifo
do autor).
Isto de certa forma pode explicar o fato do autor explicitar em seu livro, o
seu olhar microbiológico e imunológico sobre a cárie dental. Os capítulos que explicam
o mecanismo de formação da cárie dental demonstram este modo de ver
microbiológico (“Isolamento de bactérias da placa”, “Taxonomia”, “Ecologia da mucosa”,
“A flora oral”, “Adesão microbiana e placa”, “Metabolismo dos carboidratos pelos
microrganismos da placa”, “Produção de ácido na placa”, “Cárie Humana os fatores
bacterianos”), que pode ser considerado uma matiz do Estilo de Pensamento
Biologicista. Quando propõe tratamentos, a ênfase é baseada nos fatores
antimicrobianos, confirmando este olhar. Um outro capítulo também discorre sobre
mecanismos imunológicos possíveis na cárie dental, caracterizando também seu olhar
para a imunologia, também condizente com seu sistema de crenças. Os temas estão
20
LOESCHE, W. J. Cárie dental. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1993.
100
relacionados com um entendimento de causação biológica do processo saúde-doença.
Além destes capítulos aparecem outros relacionados à dieta, higienização e prevenção.
A caracterização deste livro é por um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes
do Higienismo/Preventivismo.
A quarta referência básica da disciplina é uma monografia produzida em
1995 como o titulo “Adequação bucal de pacientes especiais em rotina clínica”
21
, que
inicialmente já sugere um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo. Na introdução as autoras destacam que os pacientes
especiais, por as vezes apresentarem desvios morfológicos, biológicos e de
discernimento, podem apresentar um ambiente bucal propício para a progressão do
processo carioso, sendo, portanto, um grupo de risco à cárie, e que a estabilidade do
quadro de saúde bucal, deve ser realizada através da adequação bucal destes
pacientes, com procedimentos preventivos/curativos. Faz um resgate dos conceitos e
das etiologias das doenças cárie e periodontal. Cita autores diferentes que propõem
uma mudança na prática odontológica, balizados por procedimentos altamente
eficientes e eficazes, para a promoção da saúde bucal. Quando fala em procedimentos,
faz uma relação com a clínica, representados por ações curativas e preventivas
individuais, não tendo qualquer tipo de relação com a promoção da saúde. Conceitua a
adequação bucal como um conjunto de medidas restauradoras provisórias, preventivas
e educativas que visam à redução da flora bucal patogênica, para que o paciente possa
receber e manter o tratamento restaurador definitivo, demonstrando a preocupação com
a proteção da saúde. Quando se refere aos procedimentos preventivos, aponta que os
mesmos visam preservar e promover a saúde através de ações preventivas-educativas,
e que existe a necessidade de interação entre profissional e paciente para prevenir a
doença antes do aparecimento dos sintomas, sugere desta forma, que promover saúde
é o mesmo que prevenir doenças. E seguindo a lógica deste modo de ver, o corpo de
práticas do trabalho foi realizado com alunos da APAE de Itajaí, na qual os trabalhos
foram divididos em três etapas, sendo inicialmente a parte educativa com uma palestra
21
MAURER, A. C. F. Adequação bucal de pacientes especiais em rotina clínica. Trabalho de
conclusão de curso – Odontologia UNIVALI. Itajaí, 1995.
101
clássica (educação sanitária) sobre dieta, revelação de placa bacteriana, métodos de
escovação e utilização do flúor, e concomitantemente foram realizadas as etapas
restauradora (recuperação da saúde) e preventiva, com ações de fluorterapia semanal,
escovação semanal com flúor-fosfato-acidulado, profilaxia profissional (proteção da
saúde). Condizente com a temática proposta pelo título, a monografia em sua parte
conceitual e prática, demonstra um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes
Higienistas/Preventivistas.
O quinto livro “Odontologia em Saúde Coletiva”, também analisado no
período da disciplina, que tem o mesmo objetivo de trabalhar na adequação bucal
(em níveis de complexidades diferentes), reforça o pensamento de diagnóstico e
intervenção precoce com procedimentos o menos invasivos quanto forem possíveis,
caminhando para a prevenção dos problemas bucais, demonstrando como
caracterizado, um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do
Higienismo/Preventivismo.
5.1.2.8. Plano de Ensino da disciplina Odontologia Social e Preventiva - 8º período
A disciplina apresenta como objetivo geral:
Propiciar aos alunos reflexão sobre a odontologia e a sociedade brasileira com
referência ao mercado de trabalho, analisando a qualidade de vida, a política de
saúde, e os aspectos relacionados ao mercado de trabalho (UNIVALI, 2006).
E no seu ementário:
Qualidade de vida e saúde. Projeto de carreira profissional. Sistema Único de
Saúde (UNIVALI, 2006).
Uma primeira análise não nos permite fazer qualquer tipo de inferência
sobre os objetivos, uma vez que o conteúdo explícito não nos fornece pistas sobre um
possível Estilo de Pensamento.
102
Os conteúdos programáticos da disciplina estão divididos em três
unidades. A primeira está relacionada com a discussão sobre a odontologia brasileira e
a qualidade de vida dos profissionais e pacientes. A unidade 2 é destinada a discussão
e formulação de projeto de carreira profissional. Na unidade 3, com carga horária de 12
horas, o objetivo é analisar e discutir o Sistema Único de Saúde (normas e
constituição), relacionando-o com as políticas de saúde. Como não existe qualquer tipo
de posicionamento explícito dos conteúdos programáticos que permitam uma
caracterização de Estilo de Pensamento, eles foram tratados na entrevista com o
professor responsável pela elaboração do plano de ensino da disciplina.
O que pode nos fornecer algumas pistas sobre um possível Estilo de
Pensamento, são as bibliografias recomendadas pela disciplina, num total de três.
O primeiro livro é “Promoção de Saúde Bucal”, que foi anteriormente
analisado em outros três períodos. De acordo com os objetivos da disciplina, dois
capítulos do livro nos interessam para tecer comentários. O capítulo “A construção do
paradigma de promoção da saúde um desafio para as novas gerações”, que também
foi discutido anteriormente, faz uma retrospectiva das doenças bucais comparando o
Brasil com países desenvolvidos, descreve a prática hegemônica curativista que se
mostrou incapaz de melhorar os níveis de saúde bucal da população brasileira e propõe
uma mudança baseada na prevenção, e não na promoção da saúde como sugere o
título, demonstrando um modo de ver higienista/preventivista. no capítulo “O
conceito de promoção da saúde na construção de sistemas de atenção em saúde bucal
coletiva”, a proposta é baseada em distritos, trabalhando o individual e o coletivo com
critérios de risco, utilizando a epidemiologia, com ações de recuperação e educação em
saúde, mediados ainda pelos princípios do SUS. Quando cita a promoção da saúde, se
limita a relacioná-la com ações de educação em saúde bucal coletiva. Mas talvez o
grande viés desta proposta seja o de sugerir a construção de um sistema de atenção
em saúde bucal, que de certa forma isola a odontologia da totalidade do sistema de
saúde, dificultando a integração do odontólogo no trabalho em equipe multiprofissional,
103
que pode inclusive justificar o reduzido papel da odontologia na promoção da saúde,
relacionando-a com a educação em saúde, dificultando a atuação em outros eixos da
promoção que pedem o trabalho interdisciplinar e intersetorial. Não se trata de julgar o
entendimento que o autor tem sobre a promoção da saúde, mas sim de analisar o
entendimento que o leitor (aluno) pode ter na construção de seu conhecimento. Vale
ressaltar inclusive, que fica muito claro, o modo de ver integral do autor sobre o
processo saúde-doença, durante o desenvolvimento de todo o capítulo.
O segundo livroOdontologia em saúde coletiva” no seu capítulo inicial faz
uma reflexão sobre a prática de saúde, em especial a odontológica, apontando para um
modelo hegemônico voltado para o mercado privado, altamente tecnicista, com práticas
recuperadoras e individuais, sem “sensibilidade social”, incapaz inclusive de produzir
sentidos da sua existência enquanto prática social e de responder as demandas
sociais, demonstrando a complicação deste modelo de atenção à saúde. Descreve a
Reforma Sanitária com fruto de um movimento social e coloca a VIII Conferência
Nacional de Saúde como marco na história das políticas de saúde no país. Faz
consideração ainda, que não faz sentido um profissional de saúde realizar um trabalho,
seja de investigação ou de assistência, sem considerar as diferenças sociais, eqüidade,
justiça, direito, acesso, capacidade de informação e decisão, autonomia. Um outro
capítulo que se relaciona diretamente aos objetivos do plano de ensino da disciplina
discorre sobre o desenvolvimento das políticas públicas de saúde no Brasil e a
construção do Sistema Único de Saúde. Faz um resgate histórico a partir do surgimento
da Previdência Social como prática de assistência à saúde, passando pelo início do
Movimento pela Reforma Sanitária, chegando a VIII Conferência Nacional de Saúde
(1986), culminando na criação do Sistema Único de Saúde (1988). Posteriormente
sintetiza cada um dos princípios doutrinários e organizativos do SUS e termina o
capítulo apresentando o Programa de Saúde da Família como estratégia reestruturante
para a consolidação de um modelo de atenção integral. Os capítulos apresentados
sugerem uma mudança de Estilo de Pensamento, demonstrando uma forte afinidade
com um modo de ver integral do processo saúde-doença, pelas idéias que os temas
representam.
104
Relacionando o terceiro livro recomendado “Saúde Bucal Coletiva” com os
objetivos da disciplina, o livro apresenta um capítulo que descreve alguns pontos sobre
o mercado de trabalho, sempre evidenciando o público e o privado, e que esse
mercado de trabalho é dependente da estrutura sócio-econômica e da organização da
sociedade. E conclui o capítulo dizendo que a odontologia deve ser exercida por um
conjunto distinto de recursos humanos adaptados às características epidemiológicas,
sociais e econômicas da comunidade.
5.1.3. Entrevistas com os professores e seus resultados
O objetivo desta fase foi promover uma análise dos conteúdos das falas
dos professores, relacionadas com o desenvolvimento dos conteúdos dos planos de
ensino das disciplinas as quais estão vinculadas, com vistas à identificação de suas
concepções do processo saúde-doença que permeiam seus Estilos de Pensamento,
que por sua vez exercem uma influência direta no ver formativo do aluno.
Foi realizada uma amostra intencional constituída pelos professores
responsáveis pela elaboração dos planos de ensino da disciplina.
A utilização de amostra intencional busca dentro de um grupo, uma
representatividade maior dos sujeitos frente ao problema investigado, e pode ser
definida sob o ponto de vista do investigador (TRIVIÑOS, 1987), coletando através
deles informações essenciais para a pesquisa.
A escolha foi pela entrevista semi-estruturada, que valoriza tanto a
presença do investigador, quanto à do informante, enriquecendo a investigação,
favorecendo a descrição, explicação e compreensão dos fenômenos sociais em sua
totalidade (TRIVIÑOS, 1987) e segundo o mesmo autor:
105
Podemos entender por entrevista semi-estruturada, em geral, aquela que parte
de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que
interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de
interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se
recebem as respostas do informante. Desta maneira, o informante, seguindo
espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do
foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do
conteúdo da pesquisa (TRIVIÑOS, 1987, p. 146).
Os roteiros foram individualizados segundo os planos de ensino de cada
período, uma vez que cada período lida com questões distintas, e nosso interesse
efetivo é propriamente a influência que o professor exerce sobre o aluno no
desenvolvimento específico de seus temas, uma vez que ensinar é introduzir em um
Estilo de Pensamento.
Foram realizadas oito entrevistas, sendo que o professor responsável pela
disciplina do período foi excluído da amostra, pelo fato dos conteúdos desenvolvidos
na disciplina não estarem relacionados com o objeto da pesquisa, como já explicado
anteriormente.
Professor 1 – Estilo de Pensamento cuja concepção hegemônica é Social
Quando perguntado sobre os componentes preventivos da disciplina:
Preparar o aluno pra conhecer os meios de prevenção e saber aplicar esses
meios de prevenção e orientar seus pacientes. Os alunos vão ter conhecimentos
desde uso de flúor, toxicidade de flúor, modos de aplicação, uso de flúor
sistêmico, uso de flúor tópico, conteúdos relacionados com escovação, formas de
escovação, uso de fio dental, também acaba tendo um componente de educação
porque você acaba tendo que fazer um trabalho educativo com as pessoas para
que utilizem estes meios de prevenção (meus grifos).
Encontramos na fala inicial do professor, palavras muito utilizadas pelo
Coletivo de Pensamento Higienista/Preventivista, que apresenta um estilo de
106
argumentação próprio ao descrever os elementos clássicos da odontologia preventiva,
traz uma associação entre trabalho educativo e prevenção, que pode demonstrar como
objetivo da educação a prevenção de doenças, relacionada com a educação sanitária,
de certa forma, caracterizada, quando se utiliza do termo “orientar” pacientes.
Sobre os componentes sociais da disciplina:
Conhecer as diversas realidades de vida, as diferenças culturais, sócio-
econômicas, dos modos de vida, as diferenças sociais, primeiro conhecer a
realidade, que tem pessoas que às vezes não tem o que comer, então não tem
como a gente dizer pra essas pessoas que tem que escovar os dentes após as
refeições, precisam conhecer a realidade das famílias, das escolas, tanto
públicas quanto privadas, tem que conhecer a forma de enfrentamento dessas
realidades, do SUS, como ele funciona, qual é a filosofia de atenção à saúde
(meus grifos).
O professor demonstra uma afinidade com o modo de ver da
determinação social, quando relata a importância de considerar os aspectos culturais,
econômicos, sociais e os próprios modos de vida, no trabalho em saúde, e esta idéia é
reforçada quando fala sobre o conhecimento da realidade das famílias e escolas,
demonstrando uma preocupação ou uma aproximação com o trabalho com base
territorial, e também sobre o enfrentamento das realidades, quando cita o SUS, que em
suas propostas, carrega o ideal de uma concepção ampliada do processo saúde-
doença.
Sobre as tendências pedagógicas:
Mesmo eu que sou claramente tendenciosa, para uma forma mais participativa,
mais problematizadora de educação, eu mesmo sei, que tem momentos que você
acaba tendo que trabalhar educação de uma forma mais tradicional, tem
momentos que você tem que trabalhar de uma forma mais tecnicista, e tem
momentos que você consegue trabalhar de uma forma mais problematizadora
(meu grifo).
O professor demonstra sua preferência por uma prática educativa
problematizadora, que está relacionada com a busca da autonomia dos indivíduos,
sugerindo uma prática baseada na educação em saúde, mas ressalta também que
existem situações em que existe a necessidade da utilização de outras formas de
107
pedagogia na prática educativa. De certa forma, o professor tem razão, utilizando o
exemplo da higienização, que é um ponto importante quando nos reportamos à
odontologia, ela deve ser dotada de técnica para a real efetividade, e neste caso, para
se atingir este objetivo, a utilização de uma forma tecnicista de educação, talvez seja
necessária, porém a autonomia do indivíduo deve ser um eixo transversal da educação
em saúde.
Sobre a prática educativa em saúde:
Educar para a saúde é capacitar o indivíduo, para que o indivíduo possa ter o
controle da própria saúde (meus grifos).
A afirmação do professor demonstra como objetivo da educação a busca
da autonomia, caracterizando o conceito de promoção da saúde descrito na Carta de
Ottawa (1986).
Eu não vou conseguir, eu como educadora, dar conhecimento ao paciente, e
esperar que ela melhore a vida dele, porque eu não tenho esse poder, talvez eu
consiga sensibilizá-lo, para ele buscar não o conhecimento, mas os
comportamentos, as atitudes, pra ele estar pré-disposto à saúde (meus grifos).
A frase demonstra a preocupação do professor em não realizar uma
educação do tipo bancária ou sanitária, mas sim trabalhar na sensibilização, e com
mudança de comportamentos e atitudes, que pode também estar relacionada com a
busca da autonomia, de certa forma, reforçando o entendimento inicial do professor.
Eu posso buscar saber o conhecimento da população e a partir disso ver o que
eu posso aproveitar o saber e ir inserindo coisas novas e motivando mais essa
população para a saúde bucal (meu grifo).
Partir do conhecimento prévio do indivíduo ou da coletividade numa
prática educativa, é uma ação dirigida, que se constrói à partir de um sentir seletivo
característico de quem concebe a educação de uma forma problematizadora, que aqui
classificamos de educação em saúde.
Na medida que eles percebem que eu respeito o conhecimento deles, e que
valorizo esse conhecimento
, essa pessoas também vão respeitar o que eu vou
108
estar trazendo pra elas e vão valorizar o que eu estou fazendo, vão se sentir
motivados também pra aquilo que eu estou trazendo na medida que eu respeito o
que eles estão trazendo pra mim (meus grifos).
O respeito e a valorização descritos reforçam o tipo de prática educativa
em saúde concebida pelo professor, baseada na educação em saúde.
Sobre a promoção da saúde:
O conceito de promoção que eles basicamente tem é da Carta de Ottawa, com
aquelas estratégias para promoção, sobre desenvolvimento de aptidões
pessoais, desenvolvimento de políticas públicas saudáveis, a proteção do meio
ambiente, a participação popular, a social, trabalhar a promoção no sentido de
fazer com que o indivíduo adquira o poder e o controle sobre sua saúde (meus
grifos).
O professor demonstra conhecer as bases conceituais da promoção da
saúde, quando descreve a Carta de Ottawa e seus eixos de ação. Porém quando
descreve o papel do odontólogo nas atividades práticas de promoção da saúde, fez o
seguinte comentário:
Dentro da Odontologia eu procuro fazer com que eles entendam que promoção
de saúde não é fazer palestra ou fazer educação em saúde, não é fazer
prevenção, eu acredito que a prevenção faz parte da promoção da saúde, mas
não é fazer aplicação de flúor, escovação.Que promoção é mais amplo. Que
promoção é a atuação do profissional, por exemplo, dentro de um conselho local
de saúde, ou um conselho de saúde municipal, é a atuação do profissional junto
com uma comunidade, buscando estimular a participação popular que essa
comunidade se organize pra poder reinvindicar melhorias, por exemplo, de
saneamento básico, é a atuação de um profissional de uma unidade de saúde
junto com a gestão, buscando que a gestão também promova melhorias, e faça
com que aquela comunidade tenha um melhor acesso a bens de saúde, a
atuação do profissional mais ampla, que o profissional não se limitar com
aquela atuação individual, ou atuação específica de educação em saúde (meus
grifos).
De forma contraditória a sua descrição anterior sobre educação, o
professor descreve como uma prática de promoção da saúde a prática educativa em
saúde realizada em forma de palestra, mais afinada com a educação sanitária. Além
disso, faz a associação da promoção da saúde com a prevenção. Em seguida descreve
papéis importantes de um profissional de saúde na promoção da saúde. Isto de certa
forma pode ser explicado pelo fato do professor apesar de incorporar a promoção da
109
saúde em seu discurso, ainda possui um ver confuso sobre o assunto. E isto fica
melhor evidenciado na frase abaixo:
Pra mim a promoção da saúde vai envolver a promoção mesmo, o que está lá na
Carta de Ottawa, mas também vai envolver no caso do indivíduo doente, também
a promoção de saúde no momento em que a cura para aquele indivíduo, em que
ele tem cárie, eu também posso fazer promoção da saúde, com ele, recuperando
a saúde, tratando a carie, buscando a prevenção pra que ele não tenha mais
cárie, ou num individuo que seja desdentado total e no momento em que eu
reabilito, utilizando a prótese eu também estou fazendo a promoção (meus
grifos).
O professor além de incluir a prevenção na promoção da saúde, descreve
que recuperar ou reabilitar o indivíduo, é uma forma de promover saúde, da mesma
forma que se prevenindo doenças também se promove saúde. Apesar de citar os tipos
de ações de saúde, isso não pode ser entendido como uma visão integral do processo
saúde-doença, que apresenta bases conceituais diferentes desta explicação do
professor. Nos parece uma aproximação de um entendimento de senso comum sobre a
promoção da saúde, que é facilitada pela própria terminologia, cujas palavras são de
domínio público, porém a própria classificação das ações de saúde, por si só, já
diferencia uma categoria de outra, ou seja, ações de promoção, proteção, recuperação
e reabilitação da saúde, as quais possuem uma raiz quanto ao entendimento do
processo saúde-doença em sua essência.
Mas eu acredito que o tratamento da doença também é uma forma de promoção
da saúde, até pelo “promoção” de saúde, eu não vou me focar no tratamento,
claro, mas eu não posso me focar no desenvolvimento de aptidões pessoais,
meio ambiente saudável, eu tenho que também reabilitar, tratar, eu tenho
também que fazer o diagnóstico precoce, então pra mim a promoção es
também no diagnóstico precoce (meu grifo).
Este ver confuso sobre a promoção da saúde e sobre as próprias ações
de saúde, aparece mais uma vez quando demonstra uma preocupação quanto à
atuação profissional frente às necessidades do paciente. Não se trata de escolher o tipo
de ão a ser realizada; elas não podem ser entendidas como dicotômicas ou
sinônimas, mas sim complementares uma das outras. Relaciona também a intervenção
110
precoce com a promoção da saúde, no sentido de que evitando um mal maior é uma
forma de promover saúde.
Eu procuro passar pros alunos, que dentro da odontologia eles podem fazer
promoção também, fazendo uma restauração bem feita, bem adaptada, em
condições técnicas perfeitas, fazendo uma prótese total bem feita, que o
machuque o paciente e que não poder desenvolver uma lesão de mucosa,
que não vá pré-dispor uma leucoplasia, uma lesão que possa afetar a saúde
desse paciente (meu grifo).
Descreve ainda que evitando a iatrogenia, também se promove saúde.
Desta forma, nos parece que qualquer ato de saúde passa pela promoção de saúde,
segundo o entendimento do professor, e fazendo uma analogia bem preliminar,
podemos relacionar com o esquema de Leavell e Clark (1965) que se utilizavam da
prevenção como ponto central das ações, ou seja, todas as ações de saúde pertenciam
a um nível de prevenção, e neste caso, o professor se utiliza num entendimento
semelhante, da promoção da saúde, classificando as ações de saúde sempre dentro de
uma esfera maior que é a promoção de saúde.
Talvez o grande problema desta forma de entendimento, seja o fato
destes valores estarem sendo incorporados na formação do aluno, que recém iniciado
no curso, e possuindo um ver confuso, pouco sistematizado e nada crítico sobre o
assunto, assimila o conteúdo como “verdade”, exercendo-se desta forma uma coerção
de pensamento no ver formativo do aluno, que terá reflexos na sua prática
profissional, ou seja, o sentir seletivo levará a uma ação dirigida.
Apesar de não ser absoluto e em algumas situações até confuso, a
caracterização por um Estilo de Pensamento Social do professor, se deu pelo fato da
disciplina tratar da prática educativa, e neste aspecto, o professor exerce uma coerção
de pensamento para uma pedagogia problematizadora, afinada com a educação em
saúde, que tem suas raízes na determinação social do processo saúde-doença. Fica a
restrição quanto ao entendimento de promoção da saúde do professor, que apesar de
descrever os eixos de ação da promoção da saúde da Carta de Ottawa, incorpora a ela
outros sentidos. Não se trata de reduzir o entendimento sobre a promoção da saúde,
111
mas sim de sistematizar de forma clara para que o aluno possa incorporar de fato a
prática da promoção da saúde, com uma base teórica que a sustente, não a reduzindo
ao entendimento do senso comum atribuído a palavra.
Professor 2 Estilo de Pensamento cuja concepção hegemônica é biologicista
com matizes higienistas-preventivistas.
Quando perguntado sobre os componentes preventivos da disciplina fez o
seguinte comentário:
Pelo preventivo parece que a Odontologia, a disciplina de OSP, se preocupa
com as questões de prevenção. que não é, a gente trabalha promoção de
saúde, então a prevenção vem dentro da promoção de saúde. Pra trabalhar
prevenção, é uma coisa mais simples, tecnicamente fazer prevenção em saúde
bucal é mais simples, outras disciplinas técnicas também fazem isso, a dentística
trabalha prevenção, todas as disciplinas técnicas tem que trabalhar (meu grifo).
O professor aponta que a prevenção deve estar presente em todas as
disciplinas que envolvem procedimentos técnicos na odontologia, e o uma
exclusividade da Odontologia Social e Preventiva, e relaciona a prevenção com a
promoção da saúde, considerando, portanto, as ações preventivas como parte da
promoção da saúde, reforçando o entendimento dado anteriormente em outro período,
exercendo uma coerção de pensamento no aluno. Não se trata de julgar a importância
das ações preventivas e de promoção da saúde, porém o entendimento conceitual
sobre o assunto (modo de ver), pode definir as futuras ações (corpo de
conhecimentos e de práticas) dos futuros profissionais, que nesta forma de
entendimento acaba por realizar somente ações preventivas, sem o efetivo avanço para
as ações de promoção da saúde.
Sobre os componentes sociais da disciplina:
Acho que a parte social não vai mudar, o que a gente vem trabalhando, que é a
primeira oportunidade que os alunos m de se deparar de uma situação
diferente do mundo que o aluno da odonto vive. A gente sempre trabalha em
112
escolas públicas, onde existe uma necessidade social, normalmente. Trabalhou
no CAU
22
, mas eles têm uma realidade social diferente, uma aproximação. Na
disciplina a gente não trabalha a parte teórica, mas a gente tem a
oportunidade de vivenciar a situação de vida de muitos, uma situação diferente
da realidade deles
.
O entendimento sobre o componente social da disciplina é de apresentar e
preparar os alunos para o trabalho com uma realidade social, de grupos menos
favorecidos, porém o professor não faz qualquer relação entre o processo saúde-
doença e sua determinação social.
Sobre a organização de atividades práticas da disciplina:
É passar informações em relação à saúde bucal, então são aqueles aí, as aulas
normalmente elas envolvem a questão das estruturas fisiológicas normais da
boca, dente, gengiva, depois vem placa bacteriana, o que é, em seguida as
doenças principais, cárie, gengivite, e depois as formas de controlar, a higiene
oral, a escovação, são esses os temas repassados para as crianças, são esses
os temas (meus grifos).
Podemos notar que as temáticas para o trabalho com grupos, são pré-
determinadas pela disciplina, dando indícios de uma prática de educação sanitária, e
são centradas em estruturas e doenças (boca, dente, gengiva, placa bacteriana, cárie,
gengivite), baseadas, portanto, no entendimento biológico, além de discorrer sobre suas
formas de controle e prevenção (formas de controlar, higiene oral, escovação). Este
modo de ver o processo saúde-doença pode ser confirmado nas atividades práticas
desenvolvidas pela disciplina como relata o professor:
Pode ser palestra ou outra coisa. Eles utilizam vários recursos, vídeos, vários
recursos para transmitir a informação. Eles trabalham essa parte educativa
durante uma meia hora, em seguida as crianças normalmente fazem lanche,
no retorno é feito escovação supervisionada, revelação de placa, aplicação de
flúor, parte prática de higiene bucal, tudo depois do horário de lanche das
crianças (meus grifos).
O corpo de práticas desenvolvido no grupo infantil é representado por
um tipo de prática de educação sanitária que fica caracterizada quando o professor
utiliza os termos passar informações”, temas repassados”, “palestra”, “vídeos”,
22
Colégio de Aplicação da UNIVALI.
113
“transmitir informação. Repetidas vezes, aparecem o estilo de argumentação, próprio
de um Coletivo de Pensamento que realiza uma educação sanitária em odontologia,
sempre evidenciando a transmissão de informações, a escovação, a higiene. Além
desta atividade são desenvolvidas a escovação supervisionada, a revelação de placa, a
aplicação tópica de flúor, que se relacionam com as ações de proteção da saúde,
reforçando seu olhar higienista-preventivista.
Sobre a prática educativa em saúde:
É fundamental hoje. A Odontologia sempre veio com aquela idéia de que o
profissional conseguia restabelecer através de um procedimento técnico a saúde
do indivíduo e historicamente percebeu que não, que isso o ocorria. Se o
profissional não conseguir fazer com que o paciente, que ele tenha essa visão de
que ele é responsável pela saúde, então todo o tratamento, toda atividade
técnica, muitas vezes, não se tem um sucesso à longo prazo (meu grifo).
Apesar de considerar a prática educativa em saúde como pilar
fundamental para o sucesso do tratamento, o professor reforça o entendimento de
educação sanitária, aparecendo aqui, a responsabilização única do paciente pela sua
própria saúde, cujo sucesso do tratamento depende diretamente de sua postura frente
ao problema, indiretamente culpabilizando-o por um eventual fracasso.
Sobre a promoção da saúde:
No início a gente discute o que é promoção de saúde. A gente apresenta que
existe uma relação entre saúde, que está voltada às condições de vida do
indivíduo. Tudo interfere, as condições sócio-econômicas, culturais, isso tudo tem
a ver com o que ele apresenta em saúde ou doença. Então assim, de uma
maneira prática, a criança tem um monte de problema bucal, não
responsabilizá-la por esse problema, ou então, o paciente apresenta isso, então
tem que ver o porque ele apresenta essa situação, então a promoção da saúde
relaciona as questões de vida com a determinação da saúde e doença dele
(meus grifos).
De forma contraditória à frase anterior, aparece aqui a não
responsabilização do indivíduo pelos problemas de saúde. Num primeiro momento,
numa abordagem teórica sobre a promoção da saúde, o professor demonstrou uma
certa afinidade com a determinação social do processo saúde-doença quando
114
relacionou a saúde com as condições de vida do indivíduo. Porém, quando foi abordado
para as questões práticas da promoção da saúde, fez o seguinte comentário:
A função do odontólogo na promoção da saúde é orientar. A relação profissional-
paciente, pode ser paciente individual ou paciente coletivo, a primeira função é
buscar instrumentalizar nesse paciente, nesse indivíduo, ou essa coletividade,
para que eles possam identificar os fatores que possam beneficiar ou determinar
a ocorrência de uma doença, eles verificarem os fatores determinantes no
processo saúde/doença e eles controlarem esses fatores pra poderem obter
aquela saúde que eles desejarem. Além da atividade específica, do dentista, em
termos de promoção é fazer isso, fazer com que o indivíduo seja capaz de
manter, perceber o problema, de procurar recuperar e manter o padrão de saúde
que ele conseguiu (meus grifos).
Um ponto interessante que aparece nesta fala do professor é a relação da
promoção da saúde com a educação, não citando qualquer outro eixo de ação da
promoção da saúde da Carta de Ottawa (1986) como competência do odontológo. A
prática educativa está relacionada no sentido de “orientar” os indivíduos, característica
de uma educação sanitária, reforçando sua filiação quanto a este tipo de prática
educativa. Quando fala sobre o processo saúde-doença, descreve a intrumentalização
de indivíduos e comunidade, no sentido de identificar e o controlar os fatores
determinantes, demonstrando uma certa afinidade com o conceito de promoção da
Carta de Ottawa (1986), apesar de não fazer qualquer citação direta sobre a Carta e
seus eixos de ação. na seqüência, relaciona a promoção da saúde com a
recuperação e manutenção da saúde, que como já discutido anteriormente, apresentam
bases conceituais diferentes quanto à concepção saúde-doença. Encontramos aqui
elementos contraditórios sobre a promoção da saúde, quando a abordagem é mais
conceitual, o professor demonstrou conhecimento e uma certa tendência para a
determinação social, porém quando descreve as questões mais práticas do trabalho do
odontólogo, ainda as relaciona com ações de recuperação e proteção da saúde, cujo
modo de ver é biologicista e higienista-preventivista respectivamente. Fleck (1986),
sugere que uma afirmativa, não necessariamente estabelece filiação a um Estilo de
Pensamento, sendo que este é melhor caracterizado nas práticas. Estas contradições
podem demonstrar que o professor vive um momento de complicação de seu Estilo
de Pensamento e ainda possui um ver confuso sobre o novo Estilo de Pensamento.
115
Apesar do professor demonstrar alguma afinidade com a determinação
social, aparece mais fortemente a visão biologicista e higienista-preventivista,
principalmente nas questões ligadas à prática educativa que estão relacionadas com a
educação sanitária, que é o objetivo de aprendizagem do período. Desta forma, a
coerção de pensamento exercida pelo professor nas atividades da disciplina são
marcadamente por um Estilo de Pensamento com matizes do Higienismo-
Preventivismo
Professor 3 Estilo de Pensamento cuja concepção hegemônica é biologicista
com matizes higienistas-preventivistas.
O professor descreve a disciplina que ministra da seguinte forma:
Ela prepara o aluno pra utilizar esta ferramenta, a epidemiologia, para buscar
informações, dados, fazer o planejamento de ações, basicamente é isso. Eu tento
relacionar isso também com a clínica, tentar aproximar uma disciplina específica
para dentro da clínica também, pra tornar a disciplina um pouco mais agradável
pros alunos (meus grifos).
E enfatiza:
Sim, a apresentação dela, toda ela é focada na saúde pública. Essa é a parte
fácil porque a epidemiologia é uma ferramenta pra saúde pública. Isso é o
natural, o difícil é conseguir trazer a epidemiologia como um instrumento para
clínica privada, não pro serviço público, pro serviço particular. É a parte mais
complicada.
Epidemiologia enquanto uma ferramenta, que pode produzir informações, dados
e conhecimento de uma determinada situação. Se aplica no próprio consultório
particular, de conhecer a clientela, de conhecer uma situação, a importância de
se conhecer os índices (meus grifos).
O professor descreve os objetivos da epidemiologia, na busca de dados,
porém não descreve as ações de saúde que podem ser realizadas a partir do
conhecimento epidemiológico. Existe uma preocupação para a relação entre
epidemiologia e clínica, provavelmente se referindo a epidemiologia clínica, inclusive
relacionando-a com o serviço privado, que de certa forma demonstra um olhar
biologicista.
116
Quando descreve os conteúdos programáticos da disciplina, faz a
seguinte afirmativa:
Na segunda parte a gente trabalha com saúde/doença, tentamos montar conceito
de saúde/doença eé trabalhado mais aí a questão do que é promoção, do que
é prevenção, os níveis de prevenção, os níveis de aplicação das medidas
preventivas (meus grifos).
Descreve a promoção da saúde e a prevenção e faz relação com os níveis
de prevenção e aplicação, descritos por Leavell e Clark (1976), que como discutido,
tinham como entendimento do processo saúde-doea, a multicausalidade.
E confirma a utilização dos níveis de prevenção e aplicação, através de
exemplos:
Qual é o impacto que eu posso ter com um determinado procedimento. Então eu
vou agir, se vou atender em determinado momento do processo saúde/doença,
onde é que eu estou agindo? Em que momento eu estou agindo? E como isso é
caracterizado pela epidemiologia? Em que nível que eu estou atuando? E que
impacto isso pode dar? (meu grifo).
Apesar de não citar explicitamente, o conceito de saúde e doença utilizado
pelo professor, sugere um entendimento a partir da história natural da doença, quando
fala em atuação em um determinado momento do processo saúde-doença e pela
própria utilização de níveis de prevenção e aplicação, que é baseado na história natural
da doença.
Quando perguntado sobre a promoção da saúde descrita no plano de
ensino, deu a seguinte resposta: “A promoção da saúde é ampla, é com este conceito,
primeiro nível”, referindo-se a prevenção primária dos níveis de prevenção de Leavell e
Clark, e como discutido na análise dos planos de ensino, trabalha na perspectiva de
fatores de exposição à doença e para este Coletivo de Pensamento, o fato “promoção
da saúde” é representado por ações de proteção da saúde, condizentes com seu modo
117
de ver o processo saúde-doença à partir da multicausalidade, ou seja, o sentir seletivo
leva a uma ação dirigida com uma elaboração correspondente do percebido.
Sobre a concepção saúde doença:
A gente passa os diferentes tipos de determinar o processo saúde-doença, então
a questão do determinismo social da doença, entra também ali, o biologicismo,
processo saúde-doença enquanto resultado da situação sócio-cultural do
indivíduo.
Eu tento apresentar que a determinação social do indivíduo é responsável pela
situação de saúde/doença. A questão biológica dele tem menos importância do
que a situação social dele (meus grifos).
Numa pergunta objetiva sobre o conceito de saúde, o professor demonstra
um entendimento conceitual de integralidade, partindo dos aspectos biológicos e sociais
como determinantes. O discurso aqui, não garante sua filiação a este Estilo de
Pensamento, uma vez que existe uma contradição relacionada com a prática do
trabalho, descrita através dos níveis de prevenção e aplicação, e Fleck, afirma que é
necessária a vivência prática para a cooperação por um Estilo de Pensamento.
Sobre os métodos epidemiológicos:
Depende do que vai se estudar. Por exemplo, se eu chego numa determinada
comunidade, eu sou dentista ali, eu preciso saber a situação de saúde-doença da
comunidade, aí eu posso fazer um estudo descritivo, faço uma coleta de dados, e
eu vejo o que ocorre de mais prevalente, mais urgente. Ou então, eu sei se
que uma determinada doença é mais prevalente e eu quero saber a causa do por
quê está acontecendo isso, quais são os fatores; faz outro tipo de estudo
(meus grifos).
Os estudos descritivos partem de uma lógica biologicista de investigação,
para a análise da ocorrência da doença. O professor descreve ainda uma investigação
fazendo referência à causalidade e fatores, que pode estar relacionada com a
determinação social ou mesmo com a multicausalidade.
Ainda sobre os métodos epidemiológicos, quando indagado da
epidemiologia social ou crítica, deu a seguinte resposta:
118
A epidemiologia social? Acho que tu estás falando..... assim, quando eu passo os
desenhos de estudos, é aquele desenho estruturado. Os estudos
epidemiológicos basicamente se dividem em descritivos ou analíticos. Os
analíticos têm várias subdivisões. Ou então os estatísticos, que a gente nem
trabalha (meu grifo).
De certa forma, a resposta do professor demonstra sua filiação por um
Estilo de Pensamento, que possui um estilo literário próprio, e as palavras
relacionadas com outro Estilo de Pensamento são incomensuráveis com seu estilo.
Quando fala de um exercício prático desenvolvido em sala de aula sobre
mortalidade infantil:
Quais são os fatores que levam a óbito logo depois que a criança nasce? Então o
período gestacional é que interfere. Ou então, a mortalidade é mais elevada lá no
período do vigésimo nono dia do nascimento até um ano? Então a mortalidade
tem mais a ver com as condições de vida da criança. O que tem que ser
mudado? O que tem que ser investigado em relação a isso? Quais são as
condições de vida daquela criança ou daquela família? (meus grifos).
Inicialmente o professor aponta fatores na ocorrência do problema,
demonstrando uma tendência para uma investigação partindo de variáveis. Descreve o
período gestacional, apontando-o como um fator. A indagação sobre “quais” as
condições de vida da família, pode sugerir uma preocupação de investigação sobre os
fatores, ou mesmo, demonstrar um entendimento de determinação social, quando se
reporta as condições de vida.
Pudemos notar nas várias falas do professor o aparecimento de três
modos distintos de ver o processo saúde-doença em situações também distintas, e
talvez este seja um bom exemplo de que individualmente os olhares distintos não
formam o todo, ou seja, o fato de aparecerem a visão biologicista, a visão higienista-
preventivista e a visão social, não caracteriza a visão integral sobre o processo saúde-
doença. Fica muito mais sugestivo a idéia de um ver confuso para o processo, com
idéias pouco sistematizadas, e de certa forma, contraditórias em alguns momentos.
119
Na parte mais conceitual sobre a abordagem do processo saúde-doença,
o professor demonstrou uma tendência para a visão social, porém, quando abordado
nas questões mais práticas sobre a epidemiologia e sua utilização posterior,
exemplificou à partir de uma investigação baseada em variáveis e fez menção ao uso
dos níveis de prevenção e aplicação, que tem como base a multicausalidade para a
explicação do processo saúde-doença, portanto, existe uma predominância deste do
Estilo de Pensamento Biologicista com matizes Higienistas-Preventivistas,
considerando que a filiação aparece de forma mais efetiva nas questões práticas.
Professor 4 Estilo de Pensamento cuja concepção hegemônica é Biologicista
com matizes Higienistas-Preventivistas
Quando perguntado sobre a disciplina que ministra, deu a seguinte
resposta:
Dentro da odontologia preventiva nós organizamos as clinicas de adequação
bucal, de adequar a boca do individuo, de devolver e manter a saúde para
receber tratamento restaurador... mostrar para ele (aluno) uma radiografia,
imagens radiolúcidas, imagens radiopacas, mostrar as características de um
dente que tem cárie ativa, cárie inativa, isso eu vou mostrar, a dentística vai
mostrar, talvez com mais proeza do que eu, mas o que eu busco, é que eles
tentem investigar, descubram, por que aquele dente esta doendo? Por que
aquele dente esta doente? Não só em função da dieta, do uso de flúor, do
consumo de açúcar, da escovação irregular, mas da onde vem este individuo?
Qual é a escolaridade desse individuo? Qual o nível sócio econômico cultural? É
uma criança, é um adolescente, é um idoso... que tipo de idoso? O idoso que é
dono de suas funções ou o idoso acamado que é dependente? Que tipo de
criança? Que é criada pela avó, pelo pai, pela mãe... que tem casa bonitinha
estruturada, ou uma criança que vem de um orfanato, de uma casa de abrigo,
aonde esta inserida essa casa de abrigo? Que merenda tem nessa escola?
(meus grifos).
Apesar de demonstrar qual é o papel clássico da adequação bucal, o
professor demonstra uma preocupação em investigar a causalidade do problema, não
restrita aos aspectos biológicos e multifatoriais da cárie, mas sugere uma ampliação
quando se refere à escolaridade e ao nível sócio econômico e cultural, além de fazer
120
menção às condições de vida do indivíduo, podendo estar relacionado com um modo
de ver integral.
Ainda sobre a disciplina e comentando sobre a promoção da saúde:
Para a clinica eu procuro fazer uma coisa mais ampla com esses alunos e
trabalho o tempo todo o conceito de promoção de saúde no mais amplo possível,
é muito comum no primeiro dia de aula até...eu fiz essa pergunta para eles, o que
seria promoção de saúde? E todos eles resumem em educação e prevenção e
ficam muito assustados que eu falo que promoção em saúde é botar uma prótese
nova, é fazer uma estética em um dente, fazer um clareamento dental, tudo isso
é promoção de saúde, e eles ficam um pouco assustados de falar que promoção
de saúde é ver se a escola que as crianças esta estudando tem alvará sanitário,
isso é promoção de saúde, então, eu procuro trabalhar com eles dessa forma
mais ampla, não ficar ali na boca do individuo, mas o indivíduo como um todo
e do seu meio também (meus grifos).
Primeiro fato interessante nesta fala do professor é o seu relato quanto à
percepção do aluno sobre a promoção da saúde, restrita a educação e a prevenção,
demonstrando uma certa inconsistência na formação inicial deste aluno sobre o tema,
inclusive com sua equivocada associação com a prevenção. Quando amplia o
entendimento do conceito de promoção de saúde, sugere ações de recuperação
(restauração estética, clareamento dental) e reabilitação da saúde (prótese). A
“preocupação” em devolver a função e a estética para o paciente pode demonstrar uma
visão de integralidade sobre o paciente, porém estas ações não podem ser entendidas
como ações de promoção da saúde. A relação com o alvará sanitário demonstra uma
preocupação com o meio, porém também pode ser considerada como uma
preocupação para a criação de um ambiente saudável, sendo este um eixo da
promoção da saúde descrita pela Carta de Ottawa (1986). Mas o grande problema é a
coerção de pensamento, no sentido de um ver dirigido de que promoção da saúde,
além de educar e prevenir, também é recuperar e reabilitar, enfatizando a mesma visão
dos outros períodos. Não se trata de julgar a importância de cada uma destas ações,
mas de classificá-las e principalmente de conceituar a promoção da saúde em sua
teoria e prática. Esta “sedutora” ampliação da promoção da saúde, relacionada com
procedimentos clínicos, pode ainda exercer uma forte coerção de pensamento no
aluno, e fazê-lo imaginar que em sua prática profissional, realiza a promoção da saúde,
121
através das ações de proteção e recuperação da saúde. Portanto, esta “promoção da
saúde”, não apresenta relação com as bases conceituais da promoção da saúde, que
tem como referencial a Carta de Ottawa (1986).
Sobre os componentes sociais da disciplina:
Eu coloco para eles assim, se você tiver uma clinica maravilhosa, em um bairro
maravilhoso, com o consultório top de linha e você só faz próteses maravilhosas,
com o melhor material que tem, chega um paciente teu com os primeiros molares
completamente destruídos e você faz as próteses lindas, e na mesma
comunidade chega um outro com esse mesmo molar completamente destruídos,
você olha, uma mancha escurecida, enegrecido, não é cárie, mas você fica
olhando aquilo, passa mais algum tempo e chega outro e em um mês você tenha
feito 10 coroas maravilhosas, em 10 dentes destruídos da mesma forma, você
tem que levantar do seu consultório e descobrir o que é que essa comunidade
esta fazendo? O que ela esta comendo? O que ela esta bebendo? Como ela esta
se organizando? O que esta acontecendo? Por que tantas lesões semelhantes
estão aparecendo no seu consultório? Então, eu acho que o papel social é o
papel do cidadão mesmo, do ser diferente dentro da sua comunidade (meus
grifos).
Fato interessante é que o professor inicia seu exemplo fazendo alusão ao
serviço privado, e apesar de considerar que a atuação deve partir de uma investigação
sobre a comunidade, sugere fatores como critério de causalidade do processo saúde-
doença, não fazendo qualquer relação com a determinação social. E finaliza a sua fala,
afirmando que o componente social da disciplina, é preparar o aluno para sua
responsabilidade social enquanto cidadão.
Quando indagado sobre a relação do componente social com o serviço
público, responde através de um exemplo:
Eu recebo as crianças da creche e eu tenho observado que de algum tempo para
todas as crianças apresentam uma velocidade de formação de placa muito
grande, eu verifico que as crianças não estão fazendo uma boa escovação,
verifico que a escovação piorou. Meu dever é levantar do consultório e ir
conversar, ver o que esta acontecendo, se tem alguma equipe que esta fazendo
algum trabalho, se tem uma agente de saúde visitando, se tem alguém na escola
responsável por isso, se as crianças tem a escovinha, se não tem e daí chamar a
responsabilidade para o serviço público se precisar, chamar as políticas públicas,
chamar a responsabilidade para a agente de saúde, me responsabilizar por o
estar tendo esta assistência com as crianças, então, eu acho assim e volto a
falar, é o papel social do cidadão inserido na sua comunidade (meus grifos).
122
Não faz qualquer tipo de comentário quanto à formação do aluno para o
entendimento da determinação social do processo saúde-doença, e utiliza um exemplo
tipicamente biologicista-higienista-preventivista, relacionando a formação de placa e a
escovação, e finaliza confirmando a afirmativa anterior sobre o papel social do cidadão.
Sobre a adequação bucal:
A gente volta no conceito de promoção da saúde, entendendo promoção da
saúde como, englobando, educação, ai entra as orientações de motivações, as
formas de prevenção e todas as parafernálias da odontologia, reabilitação,
continuidade, auto-cuidado, o que a gente fala mais do empoderamento do ser
humano, de ele mesmo cuidar de si, então eu entendendo a adequação bucal
como um dos passos dessa promoção de saúde, onde você consegue orientar o
paciente.
Na adequação bucal a gente consegue sugerir pelo menos o uso racional de
alguns açucares, de escovação, de motivação, então, eu consigo ver a
adequação bucal como um dos passos dentro da promoção. Talvez a gente
consiga até alguns pacientes sensibilizar com o auto-cuidado, mas, eu não
consigo ver isso, uma meta tão bem atingida, mas seria mais um passo de
promoção de saúde, diminuir risco, diminuir microorganismos (meus grifos).
Reforçando o entendimento anterior, o professor relaciona a promoção da
saúde com a educação, prevenção e reabilitação. Cita também o “auto-cuidado” e o
“empoderamento”, porém, fica a dúvida se através do tipo de educação descrita, pode-
se atingir o empoderamento, quando utiliza as palavras “orientar” e “sugerir”, dando um
tom prescritivo e normativo, afinado com a educação sanitária. Faz ainda uma relação
da promoção da saúde com a diminuição de risco e de microorganismos, sugerindo
uma atuação sobre os fatores da doença, demonstrando um entendimento do processo
saúde-doença à partir da multicausalidade.
Sobre a anamnese do paciente da clínica de adequação bucal:
O aluno faça uma boa anamnese desse paciente num todo de conhecimento
desse indivíduo, não quero que ficar fazendo “Xzinho”, eu quero que ele
escute esse indivíduo com todas as queixas, com todas as lamurias, suas
histórias, que ele escute, que ele consiga identificar os fatores todos, que ele
verifique a saliva desse paciente, como é que ele esta, que faça índice de placa,
observando clinicamente lesões incipientes, cavidades, se teve contato com a
cárie
e agora não tem mais, se tem restaurações, como estão estas
123
restaurações, se fez algum outro procedimento mais invasivo, se usa prótese,
ou não usa prótese, se usa aparelho, se não usa aparelho, conhecer este
indivíduo no todo e a partir daí aprender a prescrever o que lhe falta. A gente se
preocupou muito em mostrar ao aluno a importância dos fatores de risco locais e
sistêmicos que levam a cárie dentária e que ele consiga identificar isso no
individuo (meus grifos).
Inicialmente a fala do professor descreve considerar o paciente como um
todo, através de uma escuta qualificada, sugerindo um dos sentidos da integralidade.
Porém, quando descreve os pontos a serem observados, descreve a saliva, o índice de
placa, as lesões e cavidades, restaurações, prótese, aparelho, todos eles relacionados
com os aspectos biológicos, não aparecendo qualquer comentário sobre a condição
psico-social do indivíduo. Os “fatores” mencionados nesta fala são explicados quando
fala especificamente de risco.
No próprio plano de ensino o professor utiliza a terminologia “fatores de
risco” para a rie dental, sugerindo um entendimento a partir da multicausalidade, e
esclarece da seguinte forma:
Quando eu falo em ordem sistêmica, eu falo do organismo em si, eu falo de
idade, expectativa de vida, falo de doença sistêmica, falo do uso de
medicamentos, eu falo de meio ambiente, eu falo de água encanada, eu falo de
rede de esgoto, eu falo de tipo de moradia, eu falo de regionalização, de cultura,
de nível sócio-econômico, então, o sistêmico é muito abrangente. E o locais ai
são específicos da doença mesmo. Na verdade, eu pego os últimos diagramas
que foram publicados e exploro aquela forma de cárie, doença multifatorial, de
uso de flúor, acesso ao serviço publico, e no local eu fico bem na doença mesmo,
a bactéria, a saliva, a dieta, bem específico (meus grifos).
O professor parte de uma gama muita ampla de fatores. Porém apesar de
considerar o tratamento de água e esgoto, a moradia, a cultura, o nível sócio-
econômico, eles são colocados como fatores, ou seja, variáveis para a ocorrência ou
não da doença, e esta perspectiva de entendimento do processo saúde-doença, tem
suas bases na multicausalidade, e na própria descrição dos fatores locais, existe uma
ênfase deste entendimento incluindo o biológico.
Sobre a relação entre diagnóstico de cárie e nível sócio-econômico
descrito no plano de ensino:
124
A gente está falando de condição clínica. Até eu conversei com eles na aula
passada...eu perguntei para eles: onde é que tem mais cárie? Na população
pobre ou na população rica? Na quem tem condições ou na quem não tem
condições? Claro! Cárie é de pobre! Lógico! Então vamos pensar quem tem mais
dentes restaurados, quem é pobre ou quem é rico? Quem é rico! Destruição tem
igual dos dois lados. O que a gente tem é condição clínica diferente. Aí, eles
entraram em choque, não sabiam o que responder, então, o que eu discuto muito
com eles em termo de diagnóstico de cárie e condição sócio-econômico. Então, é
nesse sentido que eu trabalho diagnóstico de cárie e condição sócio-econômica
em termos de acesso, em termos de informação, em termos de atitude
profissional, nesse sentido (meus grifos).
De forma contraditória a afirmação da frase anterior, o professor faz uma
consideração que a doença cárie tem sua incidência independente da condição sócio-
econômica do indivíduo, e o que diferencia as classes sociais é o acesso ao tratamento
e não sua ocorrência, de certa forma demonstrando a complicação do modelo
hegemônico que historicamente privilegiou a recuperação e a reabilitação, excluindo a
prevenção e a promoção da saúde. Porém, esta afirmativa de certa forma, também
exclui o entendimento de determinação social do processo saúde-doença, apesar de
citar a questão do acesso aos serviços de saúde e de informações.
De forma hegemônica predomina na fala do professor um Estilo de
Pensamento Biologicista com matizes Higienistas-Preventivistas do processo
saúde-doença. Talvez o ponto central, não seja o de questionar o Estilo de
Pensamento do professor, mas sim, se seria possível a identificação de um outro estilo
numa disciplina que tem seu foco voltado pra o atendimento clínico e individual.
Professor 5 Estilo de Pensamento cuja concepção é Biologicista com matizes
do Higienistas/Preventivistas
Perguntado sobre as ações que envolvem a adequação bucal, o professor
deu a seguinte resposta:
125
A gente vai ter medidas de ordem local, em clínica mesmo, fazer escariações,
restaurações provisórias, selamento de cavidade, extrações, raspagem supra
gengival, para que aquele paciente possa iniciar a receber o tratamento definitivo,
remover excesso de restaurações, e também as outras ações que vão ser
tomadas, de motivação do paciente, que daí eu não vou trabalhar no meio
bucal, mas vou trabalhar o paciente integralmente, motivar, educar e orientar,
para que ele ache importante manter a saúde bucal, e se sinta motivado pra isso
e que tenha meios de saber fazer (meus grifos).
O interessante da fala do professor neste parágrafo, não é quanto à
descrição das ações, que confirmam os achados do plano de ensino, mas sim a forma
de abordagem sobre estes procedimentos, que pode demonstrar seu Estilo de
Pensamento. Quando se refere à abordagem integral sobre o paciente, demonstra
uma afinidade com os princípios da reforma sanitária, e no aspecto de educação,
apesar de utilizar a palavra “orientar”, demonstra como objetivo, dar autonomia ao
paciente, quando utiliza o termo “saber fazer”, sugerindo uma prática de educação em
saúde.
Porém quando perguntado especificamente sobre a forma de realização
da prática educativa, faz o seguinte comentário:
São realizadas orientações individuais, e no caso, acaba sendo prescritiva.
“Ah, você tem que fazer assim, escovar em tal horário”. A gente faz
aconselhamento dietético também, assim, aconselha evitar comer doces, balas,
procurar escovar os dentes após as refeições, ou ingerir qualquer alimento. A
gente não tem tempo pra fazer uma educação mais participativa, acaba sendo
uma coisa muito pontual, e muito de orientações específicas e orientações
preventivas (meus grifos).
As afirmações demonstram uma forma prescritiva de educação, na qual
repetidas vezes o professor utiliza a palavra “orientação” e também o
“aconselhamento”, e mais fortemente esta forma prescritiva aparece na frase exemplo
do professor “tem que fazer assim”, caracterizando a educação sanitária.
No plano de ensino, consta um programa de promoção de saúde bucal,
que apresenta como sub-itens seus fundamentos, a motivação do paciente, o protocolo
126
terapêutico, o planejamento de caso clínico e a biossegurança. Sobre os fundamentos
deste programa esclareceu da seguinte forma:
É mais pro aluno perceber a diferença de uma abordagem de um paciente que é
baseada em fazer simplesmente o tratamento, na verdade paliativo, porque
vai tratar não a doença cárie, mas a seqüela da doença, abrir, remover o tecido
cariado e fechar a cavidade, é uma forma de abordagem, ou a forma de
abordagem de tratar a doença, com a educação em saúde, com a evidenciação
de placa bacteriana, prescrição de flúor, orientação, motivação e também a
reabilitação, que ai seria mais completo (meus grifos).
A promoção de saúde bucal descrita pelo professor é baseada em ações
educativas, que foram caracterizadas como uma educação sanitária e de certa forma
confirmadas novamente nesta fala, além de ações preventivas com a evidenciação e o
uso de fluoretos, e ações de reabilitação da saúde. Desta forma, a promoção de saúde
bucal aqui descrita, não tem qualquer relação com o conceito de promoção da saúde da
Carta de Ottawa (1986), e é representada por um olhar do biologicismo e do
higienismo-preventismo, que atribui a ela um sentido baseado em ações de proteção e
reabilitação, próprias de seus estilos, ou seja, o modo de ver determina uma ão
conseqüente, transformando ou gerando um novo fato.
A relação entre promoção de saúde bucal e motivação:
A motivação do paciente é ter a colaboração do paciente, é questão da educação
em saúde, como sendo um componente essencial para a promoção de saúde, e
de fazer que esse paciente seja nosso parceiro e colabore, e seja assim,
empoderado de manter, recuperar, manter a própria saúde, de evitar o
determinante de adoecimento (meus grifos).
Nesta relação, o professor descreve o empoderamento como eixo da
promoção de saúde, desenvolvido através da educação em saúde, demonstrando
conhecimento sobre a parte conceitual da promoção da saúde. Porém anteriormente no
seu relato sobre a prática educativa realizada na clínica de adequação bucal afirmou
utilizar uma forma prescritiva de educação.
127
A relação entre promoção de saúde bucal e planejamento/protocolo
terapêutico:
O profissional de saúde também pode fazer promoção de saúde ao paciente
doente, de procurar dar uma qualidade de vida melhor pro paciente, no caso, não
ter mais dor, a partir disso, começar pelo que espior, em piores condições, o
dente que pode vir a doer, ou aquele cálculo que ta acumulando muita placa, que
vai fazer com que o paciente tenha mais dificuldade do controle de placa,
então é assim, começar pelo pior, mas seu eu falar isso pro aluno, ele ainda vai
ficar perdido.
Pro paciente doente você pode fazer promoção da saúde, na medida em que
você vai melhorando as condições de vida deste paciente (meus grifos).
O professor descreve a relação entre promoção da saúde e
planejamento/protocolo terapêutico, associada à melhoria da qualidade de vida, e esta
no sentido de eliminar ou prevenir a dor, ou mesmo melhorar as condições bucais do
paciente através de procedimentos clínicos. Estas ações, apesar de não descritas na
fala do professor, sugerem práticas de recuperação da saúde, e não de promoção da
saúde, é a harmonia das ilusões, numa tentativa de manter o Estilo de Pensamento
hegemônico, com a incorporação da promoção da saúde no discurso, porém com o
corpo de práticas representado pela recuperação. Não se trata de julgar a importância
destes procedimentos ou sua forma de abordagem, apenas é uma questão de
classificação quanto ao tipo de ação de saúde realizada.
A relação entre promoção da saúde bucal e biossegurança/bioética:
Biossegurança na verdade tem tudo a ver. Porque você respeitar todas as
normas de biossegurança e bioética, você está sendo ético com seus colegas,
com seus pacientes e contigo mesmo, você está evitando de se transformar num
promotor de doença, porque se você não tem os cuidados todos de
biossegurança, você acaba sendo o vetor das doenças, levando contaminações
do seu paciente pros seus colegas, pras pessoas que estão trabalhando ali
contigo, então da importância, e mesmo pra tua família, porque acaba levando
contaminação do consultório para tua casa, então tem tudo a ver com promoção
de saúde (meus grifos).
Seguir as normas de biossegurança como o próprio nome diz, é uma
norma. As barreiras de proteção e os métodos de assepsia são procedimentos de
proteção da saúde, como fica evidente inclusive na fala do professor quando se refere a
128
evitar doença, portanto a relação da biossegurança está intimamente relacionada com o
higienismo-preventivismo, e como já discutido, prevenir doenças não é sinônimo de
promover saúde.
Sobre a relação entre promoção da saúde e promoção da saúde bucal:
Promoção de saúde é promoção de saúde, pra mim não existe promoção de
saúde bucal, porque saúde bucal é saúde, então na verdade, esse termo
promoção de saúde bucal seria mais teórico, mais didático pra explicar pro aluno.
Mas pra mim, na clínica a gente usa muito o termo promoção de saúde bucal
porque a gente acaba atuando muito no meio bucal, atuando muito em nível local
mesmo, então seria no caso promoção de saúde bucal, as ações específicas de
promoção de saúde, voltadas para o meio bucal (meus grifos).
A fala inicial do professor de certa forma é contraditória quando nega a
terminologia e posteriormente fala de sua utilização na clínica. Caracteriza a promoção
de saúde bucal, como ações específicas de promoção da saúde voltadas para o meio
bucal, e descreve como cenário a clínica, portanto, baseada no individualismo e em
procedimentos, desta forma, incongruentes com os princípios de promoção da saúde
que pede um olhar coletivo e inespecífico.
Sobre a classificação de risco para a cárie dental:
O que vai diferenciar se ele é alto risco ou baixo risco? Isso é muito específico,
fluxo salivar, microbiota bucal, capacidade tampão da saliva, fatores retentivos de
placa, quantidade de placa bacteriana, então se o paciente tiver, dois ou mais
fatores que vão influenciar diretamente no aparecimento de cárie, por exemplo,
ele é considerado de alto risco, se ele tiver menos de dois fatores, ele é
considerado de baixo risco (meus grifos).
O critério de risco utilizado para a cárie dental é baseado em fatores, com
ênfase nos aspectos biológicos, ou seja, a explicação do processo saúde-doença é
baseado no biologicismo e na multicausalidade. Os aspectos sociais não aparecem
nem como fatores nesta classificação.
O Estilo de Pensamento Biologicista com matizes Higienistas-
preventivistas é muito marcante na fala do professor, e como discutido na entrevista
129
anterior, a própria dinâmica da disciplina de adequação bucal direciona para este estilo.
Talvez, o problema não seja simplesmente a coerção de pensamento exercida para
este estilo, mas sim a coerção de pensamento relacionada à promoção da saúde, que
aqui é representada pelo programa de promoção da saúde bucal, baseado em ações
de recuperação e proteção da saúde, reafirmando a idéia já desenvolvida em outros
períodos do curso.
Professor 6 – Estilo de Pensamento cuja concepção é Higienista-Preventivista
O professor faz a seguinte afirmativa sobre a disciplina que ministra:
A gente exercita com os alunos a questão bem prática. Levantamentos
epidemiológicos, com a utilização deles como instrumento, ferramenta para a
gestão, para a administração, para organização, para planejamento do serviço de
saúde, seja ele público ou privado, particular (meus grifos).
Nesta fala inicial do professor, não é possível a identificação por uma
tendência de investigação epidemiológica, que poderia demonstrar um possível Estilo
de Pensamento. Porém, quando inclui a utilização da epidemiologia no “privado” no
“particular”, em uma disciplina que se destina ao estudo e ao preparo para a saúde
pública coletiva, sugere uma tentativa da manutenção por uma atenção privatista e
individual, podendo caracterizar a harmonia das ilusões pelo modelo hegemônico.
Sobre os componentes sociais da disciplina:
Como uma ferramenta para o acompanhamento, entendimento dos eventos de
saúde a nível coletivo na comunidade, então a odontologia como uma área
especifica, ela também tem as suas especificidades dentro destes próprios
conceitos de prevenção e de promoção de saúde (meus grifos).
O professor situa os componentes preventivos e sociais da disciplina,
através da citação da prevenção e da promoção da saúde, porém, fala em
especificidades da promoção da saúde na odontologia, podendo reduzir seu campo de
atuação, sugerindo uma atuação nos problemas bucais.
130
Sobre o desenvolvimento da temática do processo saúde-doença:
A gente trata através da história mesmo, como isso acontece na cultura, e a
gente traça um paralelo entre a cultura oriental e a nossa ocidental, o modo de
pensar capitalista e o modo de pensar de outras culturas, e aí os povos do
oriente, enfim, resgatando esses valores de e lá, e traçando um comparativo,
assim.
O professor sugere que o entendimento sobre o processo saúde-doença
está relacionado com a forma de organização da sociedade, mas não nos dá elementos
para afirmar que seus pressupostos partem da determinação social do processo saúde-
doença.
E quando abordado sobre a tendência final adotada pela disciplina sobre o
processo saúde-doença, se posiciona da seguinte forma:
Não, não se tem isso. A idéia que os alunos entendam, percebam que a nossa
história ela foi capaz de apresentar uma estrutura, uma organização à nível de
serviços de saúde de tal maneira em função deste resgate histórico, da nossa
história de exploração, de colonização.
O professor não se posiciona oficialmente por um Estilo de Pensamento.
Os documentos oficiais determinam uma formação que integre as visões biologicista,
multicausal e principalmente que incorpore a determinação social do processo saúde-
doença, ou seja, uma visão integral. O modelo hegemônico vigente no país, através da
formação na área da saúde, foi diretamente influenciado pela lógica norte-americana
baseada no modelo flexneriano e não do período colonial.
No plano de ensino aparece um tópico sobre ordenamento vital e social da
cárie. O professor esclarece da seguinte forma:
É numa visão mais abrangente do entendimento da doença, a nossa visão ainda
ela esta muito calcada numa unicausalidade ou restrita apenas ao meio, ao nicho
ecológico da boca, no campo da boca, então, a gente tenta abranger este
conceito trazendo também outros fatores que estão relacionados direta ou
indiretamente (meus grifos).
131
O professor quando faz crítica a visão focal de unicausalidade e de fatores
relacionados ao meio bucal, sugere uma visão ampliada da concepção saúde-doença,
porém quando propõe esta ampliação, relaciona com fatores diretos e indiretos, nos
parecendo uma ampliação no sentido da multicausalidade.
Isto pode ser confirmado na fala seguinte do professor, que quando
perguntado especificamente sobre o componente social deste ordenamento, fez o
seguinte comentário:
As condições de cultura, de educação, de saneamento e relacionando como esses
fatores interferem realmente, porque como a doença se comporta em determinadas
comunidades com determinadas características e tem comportamento diferenciado e
outras que por semelhança talvez geográficas, mas enfim, por cultura, por valores, por
crenças, elas tem um comportamento diferenciado então associar, relacionar esses
fatores como eles são capazes de determinar um adoecimento maior ou menor (meus
grifos).
O professor amplia para o meio externo a visão de determinação de saúde
e doença, considerando as variantes (cultura, educação, saneamento, valores, crenças
e comportamento), como fatores de exposição para um maior ou menor adoecimento,
numa explicação do processo saúde-doença através da multicausalidade. O
entendimento à partir da visão social, parte da premissa de que a condição social do
indivíduo é a causa ou o determinante do processo saúde-doença e não um fator de
exposição.
De certa forma, o fato de aparecer uma contradição em relação a fala do
professor com o plano de ensino, que descreve “os determinantes biológicos e sociais”,
pode ser explicado pelo fato deste plano de ensino ter sido elaborado por uma
professor anterior ao atual responsável, que em sua fala revelou ter recebido os
conteúdos programáticos prontos.
Sobre o desenvolvimento teórico e prático da epidemiologia aplicada,
relacionada nos planos de ensino com levantamentos do tipo CPO-D através das
normas do Ministério da Saúde, o professor faz o seguinte comentário:
132
É exatamente o que foi preconizado, inclusive a gente usa o mesmo manual de
capacitação que foi o do examinador, usado no SB 2000, então a gente usa
aquelas mesmas normas, e depois a gente leva os alunos para a escola, então, a
gente faz uma atividade bem prática que seria bem na verdade uma calibração
dos alunos assim para que aquelas normas estejam em comum acordo com
todos os alunos.
A gente seleciona na faixa etária de 7 a 12 anos eles fazem o registro, anotação,
exame clínico e depois nós tabulamos estes dados então, como se realmente nós
tivéssemos feito um levantamento (meu grifo).
Os levantamentos tipo CPO-D, como discutido anteriormente, medem a
incidência e a prevalência da cárie dental, através do número de dentes afetados pela
cárie, sejam eles cariados, perdidos ou obturados, portanto de natureza descritiva, e às
vezes se utilizam de variáveis quanto a gênero, idade e região. O SB-2000
23
, foi o
último levantamento epidemiológico de escala nacional, realizado pelo Ministério da
Saúde, e seguiu esta lógica de investigação. Apesar de trabalhar com o padrão adotado
pelo Ministério da Saúde, estes levantamentos descritivos partem de uma lógica de
investigação à partir do entendimento de multicausalidade do processo saúde-doença,
isto de certa forma, exerce uma coerção de pensamento no aluno, uma vez que lida
com questões práticas relacionadas ao futuro trabalho, podendo ser determinante no
ver formativo do aluno.
Sobre os objetivos de uma atividade prática na elaboração de um projeto
de aplicação em Odontologia Coletiva:
Estabelecer atividades que visa promoção de saúde, prevenção, atividades
educativas, embora em alguns casos alguns alunos sugerem ainda que se preste
atendimento clínico-ambulatorial, embora, a gente discuta que isso ainda não
reduz CPO-D (meus grifos).
O professor demonstra uma visão ampliada ao propor as ões de
promoção da saúde e prevenção, além das atividades educativas. Na mesma frase
ainda aparece a força do modelo hegemônico embutida na formação do aluno, quando
o professor relata a sugestão proposta por alguns alunos, para o atendimento clínico-
ambulatorial.
23
Levantamento epidemiológico de saúde bucal realizado pelo Ministério da Saúde no ano 2000.
133
Sobre o papel do odontólogo na promoção da saúde:
Eu vejo agora com a perspectiva do PSF, é uma nova abordagem, eu vejo na
estruturação de serviços de saúde pública, como talvez nesse sentido de
integração maior, onde o profissional da área da odontologia, não o dentista,
mas também o ACD, THD, técnicos da nossa área vão ter a capacidade de se
integrar aos demais profissionais e discutir problemas realmente locais para as
questões de saúde num trabalho integrado (meus grifos).
A fala do professor demonstra uma nova perspectiva de trabalho, partindo
do Programa de Saúde da Família, trabalhando no território com uma integração da
equipe nas questões de saúde, afinados com as propostas do SUS. As afirmações do
professor carregam pontos importantes da promoção da saúde, como a
transdisciplinaridade, o trabalho em território, e a própria inespecificidade quando se
refere as “questões de saúde”.
Sobre a utilização do livro “Medicina Preventiva” de Leavell & Clark na
disciplina:
Eu utilizo, eu falo principalmente da história natural das doenças, que são
abordagens preconizadas por eles em 1976, mas, eu apresento agora,
inclusive eu pedia para eles fazerem uma pesquisa bibliográfica também a cerca
do que falam eles em vel de atuação, em níveis de prevenção baseado nessa
visão do curso natural das doenças.
Esses dois são médicos, sanitaristas americanos, para mim eles vieram
acrescentar e bastante nessa mudança dessa visão, focando para outros fatores,
principalmente sociais como relevantes também no adoecimento da população
(meus grifos).
O livro acima já foi discutido nos planos de ensino, e como apontado, os
níveis de prevenção e aplicação na história natural das doenças, partem do
entendimento de multicausalidade do processo saúde-doença. E na segunda frase do
professor, explicita o entendimento desenvolvido pelos autores que consideram a
condição social como um dos fatores de exposição para problemas de saúde e não o
seu determinante.
134
As falas demonstram uma certa contradição quanto à filiação de um Estilo
de Pensamento. Isso pode ser caracterizado como um momento de complicação de
seu Estilo de Pensamento, porém ainda possui um ver confuso do novo estilo, com
idéias pouco sistematizadas. Fleck ainda diz que o discurso não garante uma filiação a
um determinado estilo, que ele aparece mais efetivamente em questões práticas, e
quando abordado para as questões mais práticas o professor ainda demonstra sua
filiação ao Estilo de Pensamento Higienista-Preventivista, como no caso dos
levantamentos epidemiológicos, e sem efetivamente descrever seu conceito de saúde-
doença, reforçado ainda pela utilização da história natural da doença e níveis de
prevenção e aplicação de Leavell e Clark.
Professor 7 – Estilo de Pensamento cuja concepção é Biologicista
Sobre a disciplina que ministra, dentro do contexto da Odontologia Social
e Preventiva, o professor faz a seguinte afirmativa:
Ela tem uma importância fundamental porque ela é efetivamente o momento em
que o aluno trabalha a questão da adequação bucal, a questão de tratar primeiro
aspectos referentes à doença, para depois efetivamente, ou seja, primeiro
adequar o meio, fazer a adequação bucal, para depois fazer o tratamento
restaurador (meus grifos).
O professor demonstra inicialmente concordar que a adequação bucal
deve ser competência da disciplina de Odontologia Social e Preventiva, ao afirmar a
sua importância. E descreve a adequação bucal fazendo menção a “doença” e ao
“tratamento restaurador”, que fazem parte de um estilo de argumentação próprio do
Estilo de Pensamento Biologicista, sem mencionar a parte educativa que deve estar
presente nesta técnica.
Quando indagado sobre a competência da Odontologia Social e
Preventiva pelo preparo do aluno para a adequação bucal, deu a seguinte resposta:
135
A adequação bucal pode ser feita em todas as disciplinas, mas como a OSP tem
esse enfoque de cuidados com a doença, previamente ao tratamento definitivo,
então se incorporou na OSP esse conteúdo, mas se fossemos ver efetivamente
poderia ser colocado em todas as disciplinas, qualquer tratamento que seja feito
deveria ter uma boca saudável, saudável numa questão do conceito saúde-
doença, quanto a presença de placa dental, cálculo, enfim, a doença cárie, pode
ter cavitacão mas sem exatamente ser uma boca doente (meus grifos).
O professor utiliza uma justificativa quanto à competência pela adequação
bucal afirmando que a disciplina tem seu foco na doença, sugerindo seu estilo de
pensamento e podendo estar relacionado com a harmonia das ilusões, numa
tentativa de manter numa disciplina que deve estar voltada para as questões
preventivas e sociais que envolvem o trabalho em saúde, a importância dos
componentes voltados para o biológico. Este modo de ver fica mais característico
quando faz referência aos órgãos (boca), e não as pessoas, de certa forma suprimindo
a integralidade do indivíduo, e quando através da doença cárie exemplifica saúde-
doença com a presença de placa dental e cálculo, sugerindo saúde com ausência de
doença, utilizando um estilo de argumentação próprio do Estilo de Pensamento
Biologicista.
Quando perguntado sobre os componentes preventivos e sociais da
Odontologia Social e Preventiva, fez a seguinte afirmativa:
A disciplina de OSP vai se chamar Saúde Coletiva, ela tem esse referencial
teórico bastante diversificado, a parte que nos compete aqui é trabalhar com a
questão da adequação bucal, adequação do meio e também vamos fazer uma
revisão com os alunos dessa questão toda, também de materiais dentários
especialmente utilizados em clínicas de unidades públicas e aspectos referentes
então a todo esse curso voltado para de adequação bucal (meus grifos).
Apesar de fazer uma citação do serviço público, existe uma ênfase
relacionada à adequação bucal, clínica e materiais dentários, que apresentam uma forte
relação com o biologicismo.
Sobre a adequação bucal:
A disciplina entende que a adequação bucal é fundamental dentro do processo
todo de saúde-doença do paciente, não adianta um paciente fazer um tratamento
136
bucal definitivo, não procede sem que seja feito uma adequação do meio, ou
seja, se o paciente chega em condições de fazer um tratamento curativo que o
tenha evidências de excesso de placa bacteriana, cálculo, excesso de
restaurações, raízes radiculares, pode ser feito todo tratamento restaurador se
ele apresentar relativa saúde bucal, ou seja, amálgama, resina composta,
ionômero de vidro para restauração, caso o paciente necessite desses aspectos
relacionados a adequação do meio, ajustes de próteses, ajustes de restaurações,
remoção de cálculo supra, tratamento expectante, restauração com ionômero de
vidro, e aspectos de educação em saúde. Então é necessário que inicialmente
seja feito esses procedimentos e daí partir para diversas clínicas, esse é o
seguimento da adequação bucal, é uma forma de primeiro fazer os
procedimentos que venham retornar a saúde da boca do paciente para dfazer
o tratamento restaurador (meus grifos).
Descreve a técnica de adequação bucal, com ênfase nos aspectos
biológicos, de doença, procedimentos curativos e nos materiais utilizados para tal, e cita
rapidamente a educação em saúde. Ao final sintetiza o papel da adequação bucal,
utilizando o termo “retornar” dando a palavra o sentido de recuperar a saúde.
Quando perguntado especificamente sobre a parte educativa da
adequação bucal e a motivação descritas no plano de ensino:
Normalmente é na primeira consulta, mas o que nós temos estimulado é que os
alunos façam sistematicamente isso para que dessa forma o paciente consiga
gravar melhor as orientações, quer seja com relação à escovação ou em relação
ao uso de fio dental, o uso do fluoretos.
Ela é feita com os pacientes sentados nas próprias cadeiras odontológicas, e
com orientação com o macro modelo, enfim, com vidas mais especificas, ela
não é feita com o mesmo formato que é feito no inicio do curso, com escovagem,
os pacientes tem a obrigação de passar a escovar os dentes, mas é feita
diretamente do aluno mostrando, tirando as dúvidas na forma pergunta e
resposta, informalmente com o paciente (meus grifos).
Nestas duas frases do professor, encontramos elementos ligados ao tipo
de educação bancária, tais como “orientação”, “gravar” informações, e com a
culpabilização do indivíduo quando se refere a “obrigação” da escovação,
caracterizando a educação sanitária.
Sobre o planejamento dos casos:
Obviamente tem que ser visto o paciente com emergência, posteriormente é que
vai ser ver a questão de remoção de cálculos, exodontia, cálculos supra,
137
tratamento de cavitações, tratamento expectantes, preenchimento de cavitações
com cimento de ionômero de vidro. Na verdade o tratamento é um pouco flexível,
o que teríamos que dar prioridade seria a questão de dor e realmente a presença
muito grande de cálculo que contamina a boca, posteriormente cavitações desde
que não haja dor ao menos com cimento provisório para procurar adequar a
boca do paciente (meus grifos).
No planejamento dos casos, aparecem somente os procedimentos clínicos
de recuperação da saúde. A parte educativa não foi relacionada como parte integrante
do planejamento dos casos. Isto de certa forma pode exercer uma coerção de
pensamento no aluno, no sentido de uma hierarquia de importância entre os
procedimentos clínicos e educativos.
Sobre o critério de risco de cárie:
O risco de cárie é dado mais pela situação que o paciente chega, cálculos,
cavitações, presença de grande volume de placa bacteriana, em função disso
que é analisado o risco do paciente para daí articularmos um plano de tratamento
(meus grifos).
Os critérios utilizados para avaliar o risco são exclusivamente voltados
para os aspectos biológicos, não fazendo qualquer referência à determinação social do
processo saúde-doença, ou mesmo sobre os fatores relacionados a dieta, higienização,
fluoretação, etc.
O mais marcante desta entrevista é o estilo de argumentação utilizado
pelo professor, que repetidas vezes utiliza as terminologias e palavras próprias do
Estilo de Pensamento Biologicista.
Professor 8 Estilo de Pensamento cuja concepção hegemônica é Biologicista
com matizes Higienistas-Preventivistas
Sobre a disciplina que ministra:
Eu trato de projeto de carreira profissional e mercado de trabalho. É lógico que eu
vou focar o assunto principalmente o mercado de trabalho, para o lado da
138
Odontologia Social e Preventiva. Ainda mais que o gerador de emprego hoje pra
classe, é o SUS, então eles têm aulas especificas, três tardes, isso dá um total de
9 horas/aula, sobre SUS (meus grifos).
O professor destaca os conteúdos desenvolvidos na disciplina com um
direcionamento para o Sistema Único de Saúde, que poderia ser considerado uma
tentativa de coerção de pensamento para um Estilo de Pensamento Integral, mas
isto não garante sua filiação que está condicionada a forma de desenvolvimento da
temática, que deve ser baseada na mudança para o cumprimento dos princípios
doutrinários do SUS, e não uma reprodução do modelo hegemônico ainda vigente nos
serviços de saúde. A restrição fica por conta da carga horária destinada a uma temática
de grande complexidade, talvez insuficiente para “ver, entender e conceber” e acima
de tudo materializar em “um corpo de conhecimentos e de práticas” um novo Estilo
de Pensamento que incorpore uma visão integral do processo saúde-doença, como
propõe o SUS.
Sobre os componentes preventivos e sociais da Odontologia Social e
Preventiva:
Eu acompanho a disciplina, e eu sei que no quinto período, as professoras
faziam uma clínica, que era mais uma clínica de orientação, de pequenos
trabalhos ultra-conservadores, era mais uma parte de higienização, de
orientação, de mudança de consciência das pessoas, no sétimo período nessa
clínica que nós trabalhamos, de adequação bucal, já se trabalha, já se produz em
todas as especialidades algum tipo de trabalho, embora sejam coisas, pra esse
período do sétimo. Então tem uma parte importante socialmente, que essa parte
de extensão, de atendimento, hoje os alunos do nono período fazem estágios
extra-muros, nos ambulatórios da prefeitura, e é um trabalho que deu certo,
porque eles vão conhecer o que é a realidade fora daqui (meus grifos).
A parte preventiva na fala do professor pode ser caracterizada sobre
aspectos relativos a higienização, e a própria prática educativa, que se baseia em
orientações, característica de uma educação sanitária. Apesar de citar a “mudança de
consciência das pessoas”, a “conscientização” segundo Paulo Freire (2005), pode ser
alcançada através de uma educação problematizadora, que gere um pensar crítico e
reflexivo, e isto só é possível, através de uma investigação temática prévia, e neste
caso, a orientação parte de uma educação bancária e de temáticas pré-determinadas
139
pelo educador. Aparece ainda como ambiente de desenvolvimento das atividades
práticas, a “clínica” e os “ambulatórios”, cujas raízes nascem do biologicismo,
reforçados na fala do professor, quando cita a realização de “procedimentos ultra-
conservadores”, “adequação bucal” e produção de trabalho em todas as
“especialidades”. A parte social descrita pelo professor refere-se aos trabalhos de
extensão e de atendimento realizados para a população, portanto, relacionados com a
função social da universidade, além disso, descreve-a com forma de oportunizar o
conhecimento do aluno através de estágios extra-muros de uma realidade social
diferente. Não se trata de julgar a importância desta função social ou do próprio
aprendizado do aluno na realidade dos serviços públicos de saúde, porém o ponto
central do componente social deve ser o entendimento do processo saúde-doença na
perspectiva da determinação social e suas ações conseqüentes.
Sobre a qualidade de vida descrita nos planos de ensino o professor
afirmou que o tema é desenvolvido com um olhar para o futuro profissional dentista,
portanto, como não faz referência para o trabalho com a população, não foi realizada
qualquer tipo de inferência ou análise sobre o assunto.
Sobre o conceito de saúde:
Eu faço uma revisão histórica daqueles conceitos, desde daquele conceito triste,
que era ausência de doença, até chegarmos nos conceitos mais modernos ou
mais completos disso . Envolve conceito de saúde, que envolve o lado psico-
social, o lado físico, o lado espiritual, emocional dele, e fica relacionado com a
qualidade de saúde e eu junto isso aí (meus grifos).
O professor demonstra um modo ver a concepção saúde-doença numa
perspectiva ampliada, quando considera os aspectos físicos, psicológicos, espirituais e
sociais.
Sobre a promoção da saúde:
140
Nós temos aqui na disciplina um conceito próprio de promoção de saúde que foi
feito pela disciplina, que não é tão diferente do conceito de promoção de saúde
da Carta de Ottawa.
Na frase do professor podemos observar um ponto interessante descrito
por Fleck (1986), que afirmava que os fatos científicos construídos pelos coletivos de
pensamento são assimilados por outros coletivos e estilizados em seu próprio estilo,
implicando desta forma em modificação, portanto os fatos não são mais os mesmos. O
professor afirma que existe um conceito de promoção da saúde próprio do coletivo de
pensamento dos professores da disciplina, confirmando a mudança do fato científico.
Nós fizemos uma reunião da disciplina, e levamos esse conceito de promoção de
saúde como um modelo de prática odontológica. Em que haja uma necessidade
de parceria entre o paciente e o profissional. Em que haja uma parte de
educação, de esclarecimento, depois uma parte curativa e depois ainda uma
parte proservação desse paciente e estabelecendo pra ele, um plano de
tratamento, totalmente direcionado pro caso dele (meus grifos).
Podemos notar as traduções do coletivo, relacionando a promoção da
saúde com uma prática educativa baseada em esclarecimentos, sugerindo que o
conhecimento pertence ao profissional, portanto uma prática bancária e autoritária, e de
certa forma sendo contraditório quando descreve a parceria entre profissional e
paciente. As traduções implicam ainda em relacionar a promoção da saúde com plano
de tratamento, procedimentos de cura e de proservação, demonstrando sua filiação de
Estilo de Pensamento. Esta tradução do coletivo pode indicar uma tentativa de
incorporação do discurso contemporâneo sobre as ações integradas de saúde, porém
as explicações dos fatos ou das ões são direcionadas para a manutenção de seu
estilo, é a harmonia das ilusões.
Sobre os pontos desenvolvidos na temática SUS, o professor faz o
seguinte esclarecimento:
Desde um histórico do SUS, de como funcionava o atendimento odontológico
anterior ao SUS, e se apresentava pros alunos, até a constituição de 88, quando
foi criado o SUS, naquela constituição cidadã, e depois desse histórico são
abordados os princípios dos quais o SUS se baseia, e são apresentados
números também, sobre o atendimento municipal, o atendimento nas escolas, a
141
extensão que existe, os municípios vizinhos aqui, a gente coleta os dados pra
apresentar, e em termos também nacionais, o que funciona e como funciona.
Esse projeto Brasil sorridente também é discutido em perspectivas futuras, tem
uma abordagem bem ampla.
A fala do professor demonstra uma abordagem muito geral, mas não
ampla, e sugestiva de pouca profundidade, justificada pela pequena carga horária
destinada aos temas, não sendo possível caracterizar elementos de um Estilo de
Pensamento.
Sobre uma possível ênfase em algum dos princípios do SUS:
É uma apresentação geral, mas eu pretendo fazer isso, fazer uma discussão
partindo da visão que os alunos tem. Exatamente o que representa a palavra
SUS pra eles. Com uma única palavra, fazemos uma coleta coletiva ali, pra
sabermos exatamente o que os alunos pensam daquilo ali. Coloca-se isso no
quadro e a partir disso, começa a serem discutidos os princípios, e é lógico que
os alunos sempre comentam, e a gente como profissional também teve essa
experiência, e aparece normalmente o acesso a esse atendimento, como uma
das visões que se tem. Depois aparece muito também a palavra igualdade, e o
princípio é eqüidade, então, não tem um princípio assim, eu não me arriscaria a
dizer que tem um que aparece ou que a gente vai tocar mais no assunto (meus
grifos).
De certa forma, o professor confirma a superficialidade de discussão dos
temas, e demonstra uma certa imparcialidade no seu desenvolvimento. Não se trata de
julgar a metodologia utilizada pelo professor, mas sendo a integralidade o eixo que
deve permear a formação e os serviços de saúde, este princípio é merecedor de uma
atenção especial, sem desmerecimento dos outros princípios do SUS. Porém volto a
insistir, o grande problema é relativo a pequena carga horária para discussão dos
temas.
O professor foi abordado sobre a formação do aluno para atuação no
SUS, relacionada com a quantidade de horas teóricas e vivência prática:
Hoje com o estágio extra-muros
24
, melhorou. Não é o ideal ainda, porque é pouco
tempo. (estágio extra-muros desenvolvido na disciplina de clínica integrada)
24
Estágio realizado na clínica integrada nas unidades de saúde do município, basicamente restritas às
atividades clínicas, com carga horária de aproximadamente 60 horas. Estão sendo estudadas mudanças
142
Essas 9 horas são muito pouco
25
(meus grifos).
O tempo dedicado ao aprendizado teórico e prático do SUS é muito
pequeno, revelado pelas palavras do professor, e de certa forma, justificando o não
aprofundamento dos temas e demonstrando a necessidade de mudança, e a própria
complicação do modelo formador, que privilegia a formação técnica, incongruente com
os objetivos de seu próprio projeto pedagógico e das diretrizes de formação na área da
saúde.
O fato de não existir nos conteúdos programáticos da disciplina temas
relacionados com o processo de trabalho no SUS, e a pouco profundidade dada aos
seus princípios, de certa forma, descaracteriza o que poderia ser uma sugestão para
um modo de ver integral.
O discurso do professor quando abordado diretamente sobre o conceito
de saúde demonstrou inicialmente uma tendência pra um modo de ver integral, porém
quando as perguntas estavam relacionadas às questões práticas, demonstrou
predominantemente um modo de ver biologicista e higienista-preventivista. Recorrendo
mais uma vez à Fleck, o discurso aqui não garante a filiação a um estilo, e nas
questões práticas, as quais se nota mais claramente o estilo de pensamento, ficando
caracterizado um Estilo de Pensamento Biologicista com matizes do Higienismo-
Preventivismo.
A Tabela 4 demonstra, palavras e expressões utilizadas pelos professores
nos trechos mais importantes de suas entrevistas. As palavras com o mesmo sentido,
foram colocadas num mesmo bloco de categoria.
As palavras que apareceram numa única fala foram suprimidas, uma vez
que os aspectos individuais de cada professor foram analisados e caracterizados
para a implementação de atividades preventivas em escolas e de prática educativa nas unidades. Os
profissionais que recebem os alunos não passaram por uma capacitação prévia. Estas informações foram
fornecidas pelo professor supervisor dos estágios.
25
Tempo dedicado para o desenvolvimento da parte teórico sobre o SUS.
143
segundo seu Estilo de Pensamento. O objetivo aqui foi demonstrar o estilo de
argumentação comum dos professores, que através de uma mesma linguagem pode
de certa forma exercer uma coerção de pensamento através da repetição de palavras,
conceitos e idéias, lembrando que as disciplinas pertencem a Odontologia Social e
Preventiva.
Tabela 4: Palavras e expressões utilizadas pelos professores nos trechos mais importantes de
suas entrevistas
Visão Biologicista Visão Higienista-
Preventivista
Visão Social
Clínica (5) Prevenção (5) Realidades de vida (4)
Promoção da saúde
(recuperar a saúde) (5)
Flúor (5) Diferenças culturais (4)
Boca (4) Promoção da saúde
(prevenção) (5)
Condições sócio-
econômicas (4)
Placa bacteriana (4) Escovação (4) Acesso à bens de saúde
(3)
Adequação bucal (4) Orientação (4) Promoção da saúde (3)
Doenças (4) Fatores de risco (3) Comunidade (3)
Tratamento restaurador
(3)
Atividades educativas (3) SUS (3)
Cárie (3) Identificar fatores (3) PSF (2)
Cavidades (3) História natural das
doenças (2)
Empoderamento (2)
Saliva (2) Saneamento básico (2) Organização da
comunidade (2)
Dente (2) Níveis de prevenção e
aplicação (2)
Indivíduo como todo (3)
Bactéria (2) Fio dental (2) Desenvolvimento de
políticas públicas (2)
Promoção da saúde
(reabilitar) (2)
Transmitir informações
(2)
Extração (2) Higiene oral (2)
Raspagem (2) Revelação de placa (2)
Restaurações (2) Dieta (2)
Promoção da saúde
(manter a saúde) (2)
Biologicismo (2)
Clínico-ambulatorial (2)
Prótese (2)
Obs. em parênteses o número de vezes que as palavras se repetem nas diferentes falas.
144
A primeira coisa que chama a atenção é o fato de nesta simples
classificação as palavras da visão biologicista terem o maior número de componentes,
seguida da higienista-preventivista.
A palavra “clínica” aparece em cinco falas, já o SUS em três delas e o PSF
em duas. Não negando a importância da clínica, mas existe uma ênfase muito forte a
ela relacionada, e de certa forma contraditória as diretrizes de formação, que
determinam uma formação condizente com o sistema nacional de saúde vigente,
quando as temáticas sobre SUS e PSF aparecem com uma menor intensidade,
lembrando que a disciplina é a Odontologia Social e Preventiva.
Outro ponto que merece destaque é o fato da palavra “determinação
social” aparecer de forma direta numa única fala. A palavra “integralidade” não é citada
uma única vez, porém de forma indireta ela é mencionada quando por três vezes
aparece o sentido de considerar o paciente como um todo e em uma única fala, o
trabalho integrado também é citado, lembrando que a integralidade já foi descrita em
vários sentidos, como demonstrado no capítulo II.
Três eixos da promoção da saúde descrita na Carta de Ottawa (1986) são
citados por duas falas, representados pelo “empoderamento”, “organização da
comunidade” e políticas públicas”, sentidos diretos da promoção da saúde. Porém, a
promoção da saúde aparece mais fortemente com outros sentidos. Por cinco falas
diferentes ela é citada no sentido de recuperação da saúde e com o mesmo número de
vezes ela é associada à prevenção. Esta forma de ver a promoção da saúde pode
exercer uma forte coerção de pensamento no aluno. Vale destacar aqui, que para
cada Estilo de Pensamento, um mesmo objeto, neste caso a promoção da saúde,
gera um fato diferente condizente ao seu modo ver o processo saúde-doença.
145
Portanto, a promoção da saúde não é o mesmo fato para os diferentes Estilos de
Pensamento, eles são incongruentes.
A prática educativa em saúde pode ter uma tendência para a educação
sanitária, na qual a palavra “orientação” aparece em quatro falas, em contra-partida o
“empoderamento” em apenas duas falas.
Volto a frisar, esta é uma análise muito superficial e geral, apenas
servindo como indicativo de possíveis reflexões.
146
CAPÍTULO 6
POSSÍVEIS MUDANÇAS NA FORMAÇÃO EM ODONTOLOGIA - SÍNTESE E
PROPOSIÇÃO
Síntese
Esta síntese parte do pressuposto, de que segundo a estruturação da
matriz curricular do curso de graduação de Odontologia da UNIVALI, cabe a disciplina
de Odontologia Social e Preventiva, dar conta de preparar o aluno para um
entendimento integral do processo saúde-doença, e mais especificamente, prepará-lo
para as ações de promoção e proteção da saúde, e em paralelo para o trabalho no
Sistema Único de Saúde, uma vez que as disciplinas clínicas, preparam o aluno para as
ações de recuperação e reabilitação da saúde, portanto, a ênfase deve ser sobre os
temas que sensibilizem o aluno para uma visão do processo saúde-doença que integre
a visão biológica, higienista-preventivista e social, além de conteúdos que preparem
para o processo de trabalho dentro do SUS. De certa forma, isto é confirmado pelo
artigo das DCN do curso de Odontologia, que descreve os conteúdos essenciais
para o curso de Odontologia, dividindo-os nas ciências biológicas e da saúde, ciências
odontológicas e quando descreve as ciências humanas e sociais, determina:
Ciências Humanas e Sociais - incluem-se os conteúdos referentes às diversas
dimensões da relação indivíduo/sociedade, contribuindo para a compreensão dos
determinantes sociais, culturais, comportamentais, psicológicos, ecológicos,
éticos e legais nos níveis individual e coletivo, do processo saúde-doença
(BRASIL, 2002, p. 3, meus grifos).
O entendimento integral do processo saúde-doença deve estar presente
em todo o curso, porém as ciências sociais devem carregar a responsabilidade de
iniciar este processo de mudança e ser o seu eixo integrador.
Os Estilos de Pensamento foram classificados segundo a linguagem
(oral e escrita) mais predominante. Para efeito de categorização foram considerados
147
principalmente os fatos que exercem uma maior coeão de pensamento na formação
do aluno, ou melhor, na sua introdução dentro de um Estilo de Pensamento, segundo
a concepção saúde-doença. Porém, vale destacar que nem sempre estes limites são
tão precisos, que por vezes na linguagem (oral ou escrita) aparecem momentos de
contra-hegemonia ou da própria complicação de Estilo de Pensamento e uma
tentativa de um novo modo de ver. O objetivo não é julgar o Estilo de Pensamento do
professor ou mesmo dos planos de ensino, mas sim de caracterizar a coerção de
pensamento exercida no aluno, em paralelo com as novas demandas para a formação.
Síntese 1 A concepção saúde-doença é predominantemente biologicista e
higienista/preventivista
A análise dos planos de ensino, incluindo aqui os conteúdos
programáticos das disciplinas e as referências básicas por elas recomendadas,
demonstram uma predominância de conteúdos cujo entendimento do processo saúde-
doença se baseia no biologicismo e na multicausalidade.
Os períodos da disciplina que tratam diretamente da causalidade da
doença, se utilizam do esquema de níveis de prevenção e de aplicação na história
natural da doença, exercendo uma coerção de pensamento no aluno para este Estilo
de Pensamento. A parte prática desenvolvida por estas disciplinas, que poderíamos
chamar de ação dirigida, seja através dos exemplos ou de uma própria investigação
epidemiológica, confirmam o sentir seletivo sobre o processo saúde-doença.
Todos os livros analisados reforçam maciçamente este enfoque sobre as
doenças e suas formas de controle, com exceção de alguns capítulos, de alguns
poucos livros. As disciplinas de OSP recomendam na sua referência básica um total de
27 livros, sendo que eles correspondem a 19 livros diferentes, uma vez que existem
livros que são recomendados por vários períodos, inclusive um deles aparece em 5
148
planos de ensino. Destes 19 livros, apenas cinco não são escritos por dentistas (três de
epidemiologia), isso talvez possa ser explicado pelo fato do olhar (modo de ver) estar
muito restrito a questão técnica, mesmo em uma disciplina que possuiu objetos comuns
às outras profissões da área da saúde, é um estilo literário próprio de um coletivo de
pensamento.
Proposição 1
O Pró-Saúde (2005) descreve como um de seus objetivos específicos:
Incorporar, no processo de formação da medicina, enfermagem e odontologia, a
abordagem integral do processo saúde-doença e da promoção da saúde
(BRASIL, 2005c, p. 17, meus grifos).
Esta abordagem integral do processo saúde-doença parte da integração
das visões biologicista, higienista-preventivista e social. A formação, como
demonstrado, contempla o entendimento biológico e de multicausalidade, que talvez
seja um reflexo de muitas universidades da área da saúde, pois o próprio Pró-Saúde
destaca como orientação teórica, aspectos relativos aos determinantes de saúde e de
determinação social da doença, com avaliação crítica do processo saúde-doença
(BRASIL, 2005c). Porém, a determinação social não deve ser simplesmente
incorporada ao entendimento hegemônico biológico-ambiental, podendo levar a uma
agregação de aspectos sociais, considerando-os como fatores e não o determinante do
processo saúde-doença. Este entendimento é baseado na multicausalidade, como
descrito por Leavell e Clark (1976) através da história natural das doenças, inclusive
aparecendo em algumas entrevistas. Esta simples incorporação pode ainda levar a uma
“falsa” impressão de uma visão integral do processo saúde-doença.
Esta forma de ver pode ser melhor entendida através do esquema da
figura (2):
149
Figura 2 - Explicação biológico-ambiental do processo saúde-doença.
O novo modo de ver o processo saúde-doença deve ter sua explicação
como no esquema demonstrado por Cutolo (2005), na qual a causação biológica e o
condicionamento ambiental, estão subordinados a determinação social do processo
saúde-doença, como demonstra a figura 3, portanto, trata-se de um novo Estilo de
Pensamento.
As reformas devem se iniciar pelo corpo docente da disciplina, uma vez
que a elaboração dos conteúdos programáticos, a referência básica recomendada,
seus posicionamentos frente às questões práticas, são definidas por seu Estilo de
Pensamento. Desta forma, mudar o Estilo de Pensamento dos professores implica
também em mudar o foco da coerção de pensamento por eles exercida nos alunos.
Como apontado anteriormente, não se trata aqui de simplesmente
apresentar a determinação social do processo saúde-doença e incorporá-la ao seu
Estilo de Pensamento, mas sim de trabalhar na complicação de seus estilos e
fatores
biológicos
processo
saúde-doença
fatores
ambientais
fatores
sociais
150
fomentar a mudança de Estilo de Pensamento, com vistas a uma visão integral do
processo saúde-doença. Isto não é tarefa fácil, porém este novo estilo carrega como
protoidéias as visões biologicista, higienista-preventivista e social, e isto pode ser
utilizado de forma positiva, portanto, não se trata de negá-las, mas sim de demonstrar
que elas fazem parte de um único entendimento que determina a saúde e o
adoecimento das pessoas.
Figura 3 - Modelo da relação causal do processo saúde-doença, baseado na integralidade.
Fonte: CUTOLO, L. R. A. A Pediatria e a Educação Pediátrica nos Cursos de Graduação em
Medicina. Florianópolis, 2005.
151
A complicação ou a problematização deve ser um ponto importante neste
processo. Em algumas falas, aparece o discurso da determinação social ou da própria
visão integral, porém ela não se mostra nas questões práticas. O modo de ver,
entender e conceber descrito por Cutolo (2001), talvez nos algumas pistas sobre
esta questão. Recorrendo ao dicionário Aurélio, a palavra “conceber” esrelacionada
com “sentir em si o germe de”, explicar”, “considerar”. Portanto, insisto que o trabalho
com o corpo docente deve ir além de simplesmente incorporar a determinação social
como forma complementar de explicação do processo saúde-doença, o ver e o
entender não necessariamente levam ao conceber, e talvez o conceber seja de fato o
momento da mudança de Estilo de Pensamento. Portanto, as mudanças, que
notadamente estão relacionadas com as questões práticas, se materializarão
quando o conceber estiver incorporado num Coletivo de Pensamento, e neste caso,
implica dizer que além do ver e do entender, é necessário de fato que a integralidade
em seu sentido mais amplo esteja dentro de si.
Podem ser utilizadas como estratégias para este objetivo:
• Oficinas específicas;
• Incentivo a cursos de pós-graduação na área de saúde coletiva;
• Educação permanente do corpo docente.
Síntese 2 O discurso da promoção da saúde não tem relação com as bases
conceituais contemporâneas
Existe um discurso comum dos professores sobre a promoção da saúde
como uma espécie de filosofia de prática profissional e não especificamente como uma
ação de saúde. Desta forma, a promoção da saúde é relacionada com algumas ações
da própria promoção da saúde, com ões de proteção da saúde, com a intervenção
precoce, com a recuperação e a reabilitação da saúde. De certa forma, sugere um
152
esquema semelhante ao de Leavell & Clark, que se utilizavam de uma filosofia
preventiva para explicar a intervenção em um determinado momento da história natural
da doença com níveis de prevenção e de aplicação. A proposta, porém, é baseada
numa filosofia da promoção da saúde, entendendo que qualquer ação de saúde
permeia a promoção da saúde. A filosofia preventiva de Leavell & Clark é baseada no
entendimento de que a atuação em um determinado nível da história natural da doença
se previne um mal maior, inclusive utiliza a frase “minorar o inevitável”. Já neste
entendimento da disciplina de Odontologia Social e Preventiva, se prevenindo a
doença, atuando precocemente num determinado problema, recuperando ou
reabilitando o paciente, são formas de promover a saúde.
O conceito de promoção da saúde proposto em 1965 por Leavell & Clark
(1976) foi superado após a elaboração da Carta de Ottawa (1986), que ainda é o nosso
referencial contemporâneo da promoção da saúde. Fleck (1986) afirma que as relações
culturais, históricas e sociais, constituem o terceiro fator da relação cognoscitiva,
utilizando a expressão “estado de conhecimento”. Desta forma, os fatos científicos
devem ser relativizados como “verdades” transitórias por esta atividade sócio-histórica
do ser-humano (CUTOLO, 2001).
O coletivo de professores da disciplina de Odontologia Social e
Preventiva, fez uma tradução do fato científico promoção da saúde, traduzindo à sua
linguagem (no caso a odontológica), estilizando-a, gerando um novo fato, diferente do
fato científico promoção da saúde. Porém, não existe uma base teórica para este novo
fato.
A promoção da saúde, a proteção da saúde, a recuperação da saúde e a
reabilitação da saúde pertencem a categorias diferentes de ações de saúde, portanto,
elas não podem ser apontadas como sinônimas ou dicotômicas, mas sim
complementares uma das outras, as chamadas ações integradas de saúde, desta
forma entendida com um dos sentidos da integralidade.
153
O que talvez possa ser considerado é o fato do próprio coletivo ainda
estar num momento de complicação de seu Estilo de Pensamento e ainda possuir
um ver confuso para o novo Estilo de Pensamento, ou numa outra forma de
entendimento o Coletivo de Pensamento pode estar vivenciando a harmonia das
ilusões, incorporando o discurso da promoção da saúde, e justificando-as com ações
de proteção, recuperação e reabilitação da saúde, condizentes com seu Estilo de
Pensamento.
Proposição 2
Da mesma forma que a determinação social, o Pró-Saúde descreve como
um de seus objetivos, a incorporação da promoção da saúde no processo de formação
da odontologia (BRASIL, 2005c). Porém, ela deve ser realizada de forma criteriosa
como define as DCN no seu artigo 5º:
Atuar multiprofissionalmente, interdisciplinarmente e transdisciplinarmente com
extrema produtividade na promoção da saúde baseado na convicção científica,
de cidadania e de ética (BRASIL, 2002, p. 2, meu grifo).
Portanto, é necessário se buscar as bases conceituais da promoção da
saúde e seus eixos de ação tendo como referência a Carta de Ottawa (1986), relacioná-
las com as questões práticas do processo de trabalho em saúde e proporcionar a
vivência prática de suas ações.
A proposta para a mudança de concepção da promoção da saúde na
graduação pode basear-se nas seguintes estratégias:
• Oficinas específicas para o corpo docente;
• Tratamento histórico, teórico e epistemológico da promoção da saúde, em
consonância com a discussão contemporânea;
154
Integração com outros cursos da área da saúde, pois a promoção da saúde
pede a inespecificidade disciplinar;
• Integração entre a universidade e os serviços públicos de saúde e outros
setores que interferem na saúde das comunidades;
• Incentivo à projetos de pesquisa e extensão sobre o tema promoção da saúde.
Síntese 3 – A prática educativa é baseada na educação sanitária
Existe nos planos de ensino que tratam da prática educativa uma coerção
de pensamento para uma relação existente entre educação e preventivismo,
caracterizadas por uma repetição de temas, com estruturas de assuntos pré-
determinados para a prática dos alunos. A parte conceitual descreve as principais
técnicas pedagógicas, porém a parte ptica é caracterizada por uma educação
bancária, reforçada pela literatura básica recomendada, cujas práticas seguem este
modelo de educação.
As entrevistas confirmaram esta prática de educação baseada na
instrução e orientação, que é reproduzida no trabalho em grupo e na clínica de
adequação bucal, porém é importante destacar que um dos professores se mostrou
bastante afinado com uma pedagogia problematizadora, mas ela aparece apenas no
discurso. Fleck (1986) afirma que o discurso não garante uma cooperação a um Estilo
de Pensamento, que é necessária a vivência prática, e as atividades práticas durante o
curso exercem uma forte coerção pensamento no sentido da educação sanitária.
Proposição 3
155
A prática educativa em saúde, ganha relevos importantes após a
elaboração da Carta de Ottawa (1986) que define como um dos eixos de ação da
promoção da saúde, o desenvolvimento de habilidades pessoais para que indivíduo
possa exercer um maior controle sobre sua saúde, apontando a educação em saúde
como uma das ferramentas para este objetivo.
A prática educativa em saúde deve ser analisada sob os pontos de vistas
pedagógico e de saúde, ou seja, que tipo de metodologia de ensino é utilizada, e de
qual pressuposto do processo saúde-doença se concebe (MAEYAMA; CUTOLO, 2006).
Portanto, para se fomentar a educação em saúde, propomos:
• Trabalhar com o entendimento integral do processo saúde-doença;
• Trabalhar com uma pedagogia problematizadora;
• Ter como foco a promoção da saúde e não a prevenção de doenças;
• Privilegiar as atividades coletivas;
Realizar oficinas de capacitação específicas sobre o tema para o corpo
docente.
Síntese 4 Os conteúdos estão desconectados para uma formação que
contemple o sistema nacional de saúde
Os oito períodos estudados se dividem basicamente em 4 blocos:
• Prática educativa em saúde (1º e 2º períodos);
• Epidemiologia geral e específica (3º e 6º períodos);
• Adequação bucal (4º, 5º e 7º períodos);
• Mercado de trabalho e políticas públicas de saúde (8º período)
156
A adequação bucal está presente em três períodos, que como
demonstrado, apresenta uma parte educativa relacionada com a educação sanitária, e
uma outra parte relacionada com a assistência em clínica, representada por ações
preventivas e curativas, portanto com enfoque individual. Não se trata de julgar a
importância destes procedimentos, mas fica a dúvida se a adequação bucal deve ser
competência da Odontologia Social e Preventiva. Isso demonstra de certa forma, a
harmonia das ilusões do Coletivo de Pensamento, que mesmo inserido dentro de
uma disciplina que tem como objetivo principal a incorporação dos aspectos sociais que
envolvem o trabalho na saúde, ainda reluta para a manutenção de seu Estilo de
Pensamento, através da estruturação em três períodos, de práticas essencialmente
pertencentes ao Estilo de Pensamento Biologicista, contrárias portanto, às propostas
da Reforma Sanitária, e pode ainda exercer uma coerção de pensamento no aluno,
relacionando a odontologia social e preventiva com a clínica e o atendimento individual,
apesar de não estarmos aqui, negando sua importância.
Talvez, a adequação bucal esteja mais afinada com a clínica integrada,
uma vez que ela deve preceder qualquer tratamento definitivo, ou melhor, talvez ela
deva estar em todas as disciplinas com atividades clínicas.
Durante o curso, são dedicados para a discussão sobre o Sistema Único
de Saúde aproximadamente 14 horas, que representam 4,9% da carga horária total dos
oito períodos da disciplina de Odontologia Social e Preventiva que somam um total de
285 horas, sendo que não constam quaisquer tópicos sobre o processo de trabalho que
envolve o trabalho no SUS, apenas são apresentados superficialmente seus princípios.
Considerando a carga horária total do curso que corresponde a 4.050 horas, este índice
cai para 0,34%. Isto demonstra uma tentativa de manutenção do modelo vigente,
caracterizando mais uma vez a harmonia das ilusões, e conseqüentemente uma forte
coerção de pensamento para um ver dirigido na formação do aluno, ou melhor, na
introdução do aluno em um Estilo de Pensamento.
157
Proposição 4
As diretrizes de formação apontam que a formação deve contemplar o
sistema nacional de saúde vigente, com ênfase para a atenção básica, hoje
representada pela Estratégia Saúde da Família. Partindo deste pressuposto, os
conteúdos devem se orientar para o conhecimento do SUS e de seu processo de
trabalho.
Isto nos sugere um primeiro bloco de temas. A primeira consideração é
sobre o processo saúde-doença. Toda a base conceitual e o processo de trabalho do
SUS estão estruturados partindo de um entendimento integral do processo saúde-
doença, e considerando que o sentir seletivo leva a uma ação conseqüentemente
dirigida e uma elaboração correspondente do percebido, está temática deve ser
desenvolvida no período do curso, pois à partir deste entendimento inicial é que
serão elaboradas e realizadas as ações de saúde.
A Política Nacional de Atenção Básica (2006) aponta a Saúde da Família
como estratégia prioritária e abaixo o destaque para alguns dos fundamentos descritos
para a Atenção Básica que pode nos sugerir alguns conteúdos:
I- possibilitar o acesso universal e contínuo a serviços de saúde de
qualidade e resolutivos, caracterizados como a porta de entrada
preferencial do sistema de saúde, com território adscrito de forma a
permitir o planejamento e a programação descentralizada, e em
consonância com o princípio da eqüidade;
II- efetivar a integralidade em seu vários aspectos, a saber: integração de
ações de promoção à saúde, prevenção de agravos, vigilância à saúde,
tratamento e reabilitação, trabalho de forma interdisciplinar e em equipe,
e coordenação do cuidado na rede de serviços;
III- estimular a participação popular e o controle social (BRASIL, 2006, p. 11,
meus grifos)
O primeiro destaque fica pela confirmação dos princípios doutrinários e
organizativos do SUS, enfatizando a universalidade, a integralidade, a eqüidade, a
descentralização, a participação popular e o próprio sistema de referência e contra-
158
referência quando cita a coordenação do cuidado na rede de serviços. Portanto os
conhecimentos relativos ao funcionamento do SUS o fundamentais para a
compreensão do próprio processo de trabalho.
Trabalhar com território adscrito, e com planejamento e programação,
implica em conhecimento de territorialização e planejamento e programação estratégica
em saúde. A promoção da saúde e a prevenção também aparecem como ações do
âmbito da atenção básica, além do trabalho interdisciplinar e em equipe.
Um outro indicativo de temas pode estar relacionado com as próprias
competências atribuídas aos profissionais da Estratégia Saúde da Família, as quais
destacamos algumas:
I – realizar o cuidado em saúde da população adscrita, prioritariamente no âmbito
da unidade de saúde, no domicílio e nos demais espaços comunitários (escolas,
associações, entre outros), quando necessário;
II realizar a escuta qualificada das necessidades dos usuários em todas as
ações, proporcionando atendimento humanizado e viabilizando o
estabelecimento do vínculo;
III – promover a mobilização e a participação da comunidade, buscando efetivar o
controle social (BRASIL, 2006, p. 42, meus grifos).
O item I nos indica o conhecimento sobre aspectos relativos a visita
domiciliar e também sugere um trabalho com grupos e educação em saúde. O item II se
relaciona diretamente com o acolhimento descrito por Merhy (1997), apontado como
uma diretriz operacional para a mudança do processo de trabalho de forma usuário-
centrado. E finalmente o item III pressupõe o conhecimento sobre a participação social,
incluindo a formação e funcionamento de Conselhos de Saúde, porém esta participação
não deve ser restrita aos Conselhos de Saúde, mas sim em todas as relações que
envolvem o trabalho em saúde.
E define ainda nas competências específicas do cirurgião dentista
“Realizar diagnóstico com a finalidade de obter o perfil epidemiológico para o
planejamento e a programação em saúde bucal” (BRASIL, 2006, p, 46), que pressupõe
também o conhecimento sobre as investigações epidemiológicas.
159
Diante do pressuposto inicial desta proposição, podem ser apontados
como conteúdos indispensáveis:
• Abordagem integral do processo saúde-doença;
• Princípios doutrinários e organizativos do SUS;
• Territorialização;
• Planejamento e programação estratégica em saúde;
• Promoção da saúde;
• Prevenção de doenças (neste caso relacionada com a saúde bucal);
• Vigilância à saúde;
• Interdisciplinaridade;
• Trabalho em equipe;
• Visita domiciliar;
• Trabalho com grupos;
• Educação em saúde;
• Acolhimento;
• Participação social;
• Conselhos de saúde;
• Epidemiologia.
Para uma formação terminal, estes conteúdos não podem ser
simplesmente descritos, eles devem ser aprofundados, entendidos, concebidos e
vivenciados. A reforma curricular deve caminhar no sentido do curso remanejar a
quantidade de carga horária necessária para o cumprimento de todos os conteúdos da
nova proposta e não no sentido da disciplina se adequar com seu novo conteúdo a uma
carga horária pré-determinada. A articulação entre a teoria e prática torna-se
fundamental neste processo de ensino-aprendizagem, portanto o item seguinte deve ter
íntima relação com esta proposição.
160
Síntese 5 Os cenários das atividades práticas são predominantemente em
clínica
As atividades práticas são desenvolvidas em quatro períodos. Uma
atividade de educação e prevenção em escolares (10 horas), um levantamento
epidemiológico de cárie dental (10 horas), e duas clínicas de adequação bucal (20 e 44
horas). As atividades clínicas têm uma carga horária três vezes maior se comparadas
com as atividades coletivas. Isto tem um peso importante, uma vez que a disciplina
deveria estar realizando um papel de contra-hegemonia do modelo biomédico, que
privilegia o atendimento clinico e individual, de certa forma, esta estruturação reforça
este modelo hegemônico, caracterizando a harmonia das ilusões. Outro ponto de
destaque é o fato destas atividades clínicas serem realizadas nas clínicas da própria
universidade.
As atividades clínicas realizadas no SUS não diferem das desenvolvidas
em um consultório privado, ou seja, a formação técnica deve ser a mesma, e esta deve
ser competência das disciplinas como a dentística, a periodontia, a endodontia, a
prótese, a cirurgia entre outras. Portanto, os cenários das atividades práticas das
disciplinas de Odontologia Social e Preventiva, devem privilegiar a vivência e
experiências relacionadas com o processo de trabalho no SUS, com ênfase nos
trabalho coletivos e comunitários.
Proposição 5
O Pró-Saúde aponta como um de seus objetivos “ampliar a duração da
prática educacional na rede pública de serviços básicos de saúde” (BRASIL, 2005c, p.
17). A integração docente-assitencial pode ser a ferramenta para a concretização deste
161
objetivo, caminhando no sentido de uma formação sintonizada com as necessidades
sociais.
A quantidade de horas não deve ser o parâmetro avaliativo da mudança,
sem dúvida nenhuma existe uma necessidade de um aumento quantitativo, porém a
qualidade desta vivência deverá ser o diferencial.
Sobre o cenário de práticas, o Pró-Saúde infere que:
A interação ativa do aluno com a população e profissionais de saúde deverá
ocorrer desde o início do processo de formação, proporcionando ao estudante
trabalhar sobre problemas reais, assumindo responsabilidades crescentes como
agente prestador de cuidados compatíveis com seu grau de autonomia (BRASIL,
2005c, p. 27, meus grifos).
A interação ativa com a população trabalhando com problemas reais
remete ao próprio processo de trabalho, portanto, os cenários de práticas devem ser
definidos, seguindo esta lógica. Outro ponto que merece comentários é relativo aos
profissionais de saúde que deverão receber os alunos nas unidades públicas de saúde.
Anteriormente à formalização da parceria universidade e serviço público de saúde, os
profissionais da rede deverão ser capacitados e deverá existir uma mútua ajuda, no
sentido de materializar as propostas do SUS e da própria Estratégia Saúde da Família
nestes espaços, caso contrário, corre-se o risco de através desta vivência de ocorrer
uma coerção de pensamento no ver formativo do aluno, que pode assimilar a prática do
processo de trabalho do modelo biomédico, uma vez que este modelo de atenção ainda
permanece soberano nos serviços de saúde.
A partir destas considerações, o entendimento é de que os cenários de
práticas devem se organizar da seguinte forma:
• Num determinado território adscrito (territorialização e planejamento);
• Na unidade básica de saúde (atendimento da demanda e trabalho em equipe);
• Nos domicílios (visita domiciliar);
162
• Nos conselhos de saúde (participação popular);
• Nas escolas, creches, asilos, associações (trabalho com grupos e educação em
saúde);
• Na comunidade (promoção da saúde e epidemiologia).
Síntese 6 Não existem momentos multiprofissionais interdisciplinares
26
ou
transdisciplinares
27
Nas atividades práticas não existem momentos de integração com os
outros cursos do Centro de Ciências da Saúde. A formação é estritamente
uniprofissional. Este fato pode reforçar ou mesmo explicar o olhar restrito aos
problemas bucais, dificultando inclusive um olhar integral para a saúde.
O processo de trabalho na atenção básica, hoje representado pela Estratégia
Saúde da Família, é totalmente baseado num trabalho em equipe, e considerando que
a formação deve ser terminal, isto deve ser vivenciado na própria graduação.
Proposição 6
O Pró-Saúde aponta como desejável, porém não obrigatória a articulação
interprogramática com outras profissões (BRASIL, 2005c).
26
Segundo Rosenfield apud Perini et al (2001), interdisciplinaridade pode ser entendida como uma forma
de trabalho conjunto na busca de soluções, respeitando-se as bases disciplinares específicas.
27
Segundo Rosenfield apud Perini et al (2001), transdisciplinaridade é baseada no trabalho coletivo que
compartilha estruturas conceituais e teorias para tratar de problemas comuns, não havendo limites
precisos nas identidades disciplinares.
163
O desenvolvimento das atividades teóricas com a participação de
diferentes olhares pode proporcionar uma visão mais crítica e real do processo de
trabalho, inclusive considerando os próprios corpos docentes dos diferentes cursos,
“descentralizando” este olhar para a boca do indivíduo, de certa forma, proporcionando
a ampliação da visão do processo saúde-doença.
A proposição está relacionada com os conteúdos temáticos e os próprios
cenários de práticas, tendo como possíveis espaços multiprofissionais:
No desenvolvimento dos conteúdos teóricos sobre o SUS e o processo de
trabalho da Estratégia Saúde da Família, uma vez que a abordagem é
inespecífica (perspectiva transdisciplinar);
• No desenvolvimento das atividades prático-assistenciais e de planejamento
numa unidade de saúde (perspectiva interdisciplinar);
No desenvolvimento de projetos de promoção da saúde e educação em saúde
(perspectiva transdisciplinar e interdisciplinar);
• nos projetos de pesquisa e extensão;
Síntese 7 Não existe uma integração formal entre os períodos da disciplina de
Odontologia Social e Preventiva
Na fala de alguns professores, pode-se evidenciar que a carga horária não
permite um momento em comum para discussão sobre as disciplinas, sendo restritas as
atividades práticas e de sala de aula. Isto talvez explique algumas repetições de
conteúdos existentes durante o desenvolvimento dos períodos.
Outro fato que chama a atenção é em relação aos planos de ensino,
muitos deles não foram elaborados pelos atuais professores responsáveis pelas
164
disciplinas e permanecem inalterados, o que pode justificar a ausência de alguns
conteúdos importantes para as novas demandas de formação.
Proposição 7
A reforma curricular da disciplina deve ser realizada pelo coletivo de
professores da disciplina e coordenação que devem trabalhar com os mesmos
objetivos. A capacitação do corpo docente no sentido da mudança por um Estilo de
Pensamento Integral, deve ser anterior a este processo, para que o corpo docente seja
de fato um Coletivo de Pensamento, que pressupõe a utilização de uma linguagem
comum, facilitando a introdução do aluno neste estilo.
Porém esta integração não deve se restringir ao momento de construção
da reforma, mas deve ser permanente, pois a perfeita sintonia entre os períodos pede
momentos formais de discussão e planejamento.
Síntese 8 – A estratégia de ensino utilizada é de aulas expositivas
A metodologia de ensino utilizada em sala de aula não era objeto desta
pesquisa, porém o fato de todas as disciplinas descreverem em seus planos de ensino,
que se utilizam como estratégia de ensino a aula expositiva chamou a atenção, porém
ela não foi analisada e está sendo colocada apenas para uma reflexão ou uma possível
investigação futura, uma vez que as Diretrizes Curriculares Nacionais e o Pró-Saúde
indicam a problematização como forma de orientar a busca do conhecimento e de
habilidades para o trabalho. Inferem que esta forma de orientação pedagógica facilita o
aprender a aprender, que é um dos objetivos de aprendizagem no curso de graduação.
165
Este trabalho teve o intuito de demonstrar a importância da conceão
saúde-doença adotada nas práticas curriculares de um curso de graduação,
caracterizada, através da própria estruturação do curso, da concepção de seu corpo
docente, dos conteúdos desenvolvidos, da literatura recomendada, dos cenários de
práticas, exercendo em todas as situações algum tipo de coerção de pensamento no
aluno.
Portanto, um empreendimento de reforma curricular deve trabalhar no
conjunto de ações, especialmente no seu corpo docente, que de fato é quem exerce de
forma direta o processo de ensino-aprendizagem, para evitar a ocorrência do currículo
oculto.
Este pesquisa não teve a pretensão de demonstrar “o” caminho, mas sim,
um possível caminho para a mudança na graduação, e sobretudo, um caminho
possível, contemplando profissionais capazes de dar respostas concretas aos
problemas e necessidades de saúde da população brasileira, fortalecendo e
consolidando o Sistema Único de Saúde.
166
REFERÊNCIAS
ALMEIDA FILHO, N. A ciência da saúde. São Paulo: Hucitec, 2000.
BARATA, R. C. B. A Historicidade do Conceito de Causa. In: Textos de Apoio -
Epidemiologia I. Rio de Janeiro: Ed. ABRASCO, 1985.
BARBEIRO, H. História Geral. São Paulo: Ed. Moderna, 1977.
BATISTA, L. R. V.; MOREIRA, E. A. M.; ROSSI, A.; SILVA, C. M. Estágio
supervisionado sob a ótica do Programa de Saúde da Família: Integração entre
Universidade e Comunidade. Revista da ABENO, São Paulo, v. 5, nº 2, p. 171, 2005.
BERNAL, J. D. Ciência na História - Volume III. Lisboa: Livros Horizonte, 1977.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Ministério da Educação. Parecer CNE/CES
1.300/01. Brasília, 2001a.
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Ministério da Educação. Resolução
CNE/CES 3. Brasília, 2002.
BRASIL. Constituição Federal. Brasília, 1988.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996.
BRASIL. Lei Orgânica da Saúde. Brasília, 1990.
BRASIL. Ministério da Educação. Comissão de Ensino Médico. Ensino Médico: Bases e
Diretrizes para sua Reformulação. Rev. Brasileira de Educação Médica, Rio de
Janeiro, v. 10 (2), p. 67-74, 1986.
167
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional de Educação.
Câmara de Educação Básica. Relatório sobre as diretrizes curriculares nacionais
para a educação profissional de nível técnico. Brasília, 2001b.
BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Conferência Nacional
de Saúde Bucal: acesso e qualidade superando a exclusão social, Brasília, DF, de
29 de julho a de agosto de 2004 / Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde.
Brasília: Ministério da Saúde, 2005b.
BRASIL. Ministério da Saúde. Pró-Saúde: Programa Nacional de Reorientação
Profissional em Saúde / Ministério da Saúde, Ministério da Educação. Brasília, 2005c.
BRASIL. Ministério da Saúde. Departamento de Atenção Básica. Diretrizes da Política
Nacional de Saúde Bucal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde,
Departamento de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2004c.
BRASIL. Ministério da Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política nacional de
atenção básica / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento
de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na
Saúde. Curso de formação de facilitadores de educação permanente em saúde:
unidade de aprendizagem – análise do contexto da gestão e das práticas de
saúde. Rio de Janeiro: Brasil. Ministério da Saúde / FIOCRUZ, 2005a.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na
Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. AprenderSUS: o SUS e os
cursos de graduação da área da saúde. Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão
do Trabalho e da Educação na Saúde, Departamento de Gestão da Educação na
Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2004b.
168
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria No 198/GM/MS Anexo II (Orientações e
Diretrizes para a Operacionalização da Política Nacional de Educação Permanente
em Saúde como estratégia do SUS para a formação e o desenvolvimento dos
trabalhadores para o setor). Brasília, 2004a.
BREILH, J.; GRANDA, E. Saúde na Sociedade. São Paulo: Instituto de Saúde/ Rio de
Janeiro ABRASCO, 1986.
BUSATO, C. A.; CAVAZZOLA, A. S.; AMPESSAN, F. B.; SCHÜLTZ, I. Estágio
supervisionado da UNIPLAC: um compromisso social com a realidade. Revista da
ABENO, São Paulo, v. 5, nº 2, p. 198-199, 2005.
BUSS, P. M. Uma introdução ao Conceito de Promoção da Saúde. In. CZERESNIA, D.;
FREITAS, C. M. (orgs). Promoção da Saúde: conceitos, reflexões, tendência. Rio de
Janeiro: Editora Fiocruz, 2003.
COELHO, A. J. M.; FERREIRA, S. Z.; SABOIA, C. Implantação da nova grade
curricular. IV Seminário “Ensinando e Aprendendo em Odontologia”. Revista da
ABENO, São Paulo, v. 2, nº 1, p. 27, 2002.
CRISTINO, P. S. Clínicas integradas antecipadas: limites e possibilidades. Revista da
ABENO, São Paulo, v. 5, nº 1, p. 12-18, 2005.
CUTOLO, L. R. A. Algumas Considerações Sobre os Primeiros estudos na Disciplina.
Disciplina Sociogênese do Conhecimento. PPGE/CED-UFSC, mimeo, 1999.
CUTOLO, L. R. A. Estilo de Pensamento em Educação Médica Um estudo do
currículo do curso de graduação em Medicina da UFSC. Tese de Doutorado
CED/USFC . Florianópolis, 2001.
169
CUTOLO, L. R. A. O SUS e a formação de recursos humanos. Revista On-line da
Associação Catarinense de Medicina, Florianópolis, v.32, n.2, p.49-59, 2003.
CUTOLO, L. R. A. A Pediatria e a Educação Pediátrica nos Cursos de Graduação
em Medicina. Florianópolis, 2005.
CZERESNIA, D.; FREITAS, C. M. (orgs). Promoção da Saúde: conceitos, reflexões,
tendência. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003.
CZERESNIA, D. O conceito de Saúde e a diferença entre Prevenção e Promoção. In.
CZERESNIA, D.; FREITAS, C. M. (orgs). Promoção da Saúde: conceitos, reflexões,
tendência. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003.
DA ROS, M. A. Um drama estratégico - O movimento sanitário e sua expressão em
um município de SC. Dissertação de mestrado. ENSP/ FIOCRUZ. Rio de Janeiro,
1991.
DA ROS, M. A. Estilo de Pensamento em Saúde Pública. Tese de Doutorado,
CED/UFSC. Florianópolis, 2000.
FEUERWERKER, L. C. M. Educação dos profissionais de Saúde hoje problemas,
desafios, perspectivas e as propostas do Ministério da Saúde. Revista da ABENO, São
Paulo, v. 3, nº 1, p. 24-27, 2003.
FLECK, L. La Génesis y el Desarrollo de un Hecho Científico. Madrid: Alianza
Editorial, 1986.
FOUCAULT, M. A Microfísica do Poder. 11
a
edição. Rio de Janeiro: Edições Graal,
1993.
170
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.
GARBIN, C. A. S; SALIBA, N. A.; MOIMAZ, S. A. S.; SANTOS, K. T. O papel das
universidades na formação de profissionais. Revista da ABENO, São Paulo, v. 6, 1,
p. 6-10, 2006.
GARRAFA, V. Saúde Bucal e Cidadania. Saúde em Debate, São Paulo, nº 41, p.50-57,
1993.
GIROUX, H. Teoria Crítica e Resistência em Educação. Petrópolis: Ed. Vozes, 1983.
GUTIERREZ, P. R. Concepções sobre saúde e doença. In: ANDRADE, S. M.;
SOARES, D. A.; CORDONI JR, L. Bases da Saúde Coletiva. Londrina: co-edição
Editora da Universidade Estadual de Londrina – ABRASCO, 2001.
LEAVELL, H. R.; CLARK, E. G. Medicina Preventiva. São Paulo: McGraw Hill do
Brasil, 1977.
LEMOS, C. L. S. A implantação das Diretrizes Curriculares dos cursos de graduação
em Odontologia no Brasil: algumas reflexões. Revista da ABENO, São Paulo, v. 5,
1, p. 80-85, 2005.
WY, I. Fleck e a Historiografia Recente da Pesquisa Biomédica. In:
PORTOCARRERO, V.: Filosofia, História e Sociologia das Ciências. Rio de Janeiro:
Editora Fiocruz, p. 233-249, 1994a.
WY, I. Ludwik Fleck e a Presente História das Ciências. In: Manguinhos - História,
Ciências, Saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, p. 7-18, 1994b.
LUCAS, R. S. C. C.; CASTRO, M. I. M. S.; SA, L. O. P. D.; COLAÇO, T. M. J. M. C.
Estágio Multidisciplinar Interiorizado (EMI): a experiência do curso de Odontologia da
171
UEPB. Trabalho apresentado na XXXVII Reunião da ABENO 2002. Revista da
ABENO, São Paulo, v. 2, nº 1, p.19, 2002.
LUDKE, M.; ANDRE, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas.
São Paulo: EPU, 1986.
MAEYAMA, M. A.; CUTOLO, L. R. A. Prática Educativa em Saúde: Promoção ou
Prevenção. In: VII Congresso Nacional da Rede Unida, 2006, Curitiba. Anais, Curitiba,
2006. 1 CD
MATTOS, R. A. Os sentidos da integralidade: algumas reflexões acerca de valores que
merecem ser definidos. In: PINHEIRO, R.; MATTOS, R. A. Os sentidos da
Integralidade na atenção e no cuidado à saúde. Rio de Janeiro: co-edição
UERJ/IMS/ABRASCO, 2001.
MENDES, E. V. A evolução histórica da prática médica: suas implicações no
ensino, na pesquisa e na tecnologia médicas. Belo Horizonte: PUC-MG/FINEP,
1984.
MENDES, R. F; MOURA, M. S.; PRADO JR, R. R.; MOURA, L. F. A. D.; LAGES, G. P.;
GONÇALVES, M. P. R. Contribuição do Estágio Supervisionado da UFPI para a
formação humanística, social e integrada. Revista da ABENO, São Paulo, v. 6, 1, p.
61-65, 2006.
MERHY, E. E. Em busca do tempo perdido: a micro política do trabalho vivo em saúde,
in: MERHY, E. E.; ONOCKO, R. (org). Agir em Saúde: um desafio para o blico.
São Paulo: Editora Hucitec, 1997.
MINAYO, M. C. S. O Desafio do Conhecimento. 5ª edição. São Paulo - Rio de
Janeiro: Hucitec / ABRASCO, 1998.
172
MORITA, M. C. e KRIGER, L. Mudanças nos cursos de Odontologia e a interação com
o SUS. Revista da ABENO, São Paulo, v. 4, nº 1, p. 17-21, 2004.
MOYSÉS, S. J. O conceito de promoção da saúde na construção de sistemas de
atenção em saúde bucal coletiva. In: KRIGER, L. ABOPREV. São Paulo: Artes
Médicas, 1997.
MOYSÉS, S. J. Políticas de saúde e formação de recursos humanos em Odontologia.
Revista da ABENO, São Paulo, v. 4, nº 1, p. 30-37, 2004.
MOYSES, S. T.; MOYSES, S. J.; KRIGER, L.; SCHMITT, E. J.; - Humanizando a
educação em Odontologia. Revista da ABENO, São Paulo, v. 3, nº 1, p. 58-64, 2003.
NARVAI, P. C. Odontologia e Saúde Bucal Coletiva. Hucitec. São Paulo, 1994.
NORO, L. R. A. Construir conhecimento, integrar vidas. Revista da ABENO, São Paulo,
v. 5, nº 2, p. 156-157, 2005.
OPAS. Carta de Ottawa. Ottawa, 1986.
PAULA, L. M.; BEZERRA, A. C. B. A Estrutura Curricular dos cursos de Odontologia no
Brasil. Revista da ABENO, São Paulo, v. 3, nº 1, p. 7-14, 2003.
PELISSARI, L. D.; BASTING, R. T.; FLORIO, F. M. Vivência da realidade: o rumo da
saúde para a odontologia. Revista da ABENO, São Paulo, v. 5, nº 1, p. 32-39, 2005.
PERINI, E.; PAIXÃO, H. H.; MODENA, C. M.; RODRIGUES, R. N. O Individuo e o
coletivo: alguns desafios da epidemiologia e da medicina social. Interface
Comunicação, Saúde, Educação, v. 5, n. 8, p. 101-118, 2001.
173
PINTO, S. T. Breve História de la Medicina Universal. Segunda edição. Santiago,
Chile: Editorial Universitária, 1986.
ROCHA, C. R.; DOCKHORN, D.; CECCIN, R. B. Política de ensino odontológico para
Saúde Coletiva: compromisso de uma escola de Saúde Pública com a gestão do SUS,
o caso de ESP/RS. Trabalho apresentado na XXXVII Reunião da ABENO – 2002.
Revista da ABENO, São Paulo, v. 2, nº 1, p.24, 2002.
ROSEN, G. Da Polícia Médica à Medicina Social. Rio de Janeiro: Editora Graal, 1980.
ROSEN, G. Uma História da Saúde Pública. São Paulo / Rio de Janeiro: co-edição
Hucitec / Unesp / Abrasco, 1994.
SANTOS, J. O. Filosofia da Educação dica: Interpretação da Praxis. Revista
Brasileira de Educação Médica, Rio de Janeiro, v. 10 (2), p. 82-86, maio/agosto, 1986.
SCHÄFER, L.; SCHNELLE, T. Los Fundamentos de la Visión Sociológica de Ludwik
Fleck de la Teoría de la Ciência. In: FLECK, L.: La Genesis y el Desarrollo de un
Hecho Científico. Madrid: Alianza Editorial, 1986. p. 9-42.
TERADA, R. S. S.; NAKAMA, L. – Organizadoras. A implantação das Diretrizes
Curriculares Nacionais de Odontologia: a experiência de Maringá. São Paulo:
Hucitec, Londrina: Rede Unida; Brasília: ABENO, 2004.
TESTA, M. Pensar en salud. Buenos Aires: Lugar Editorial, 1993.
TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa
qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.
174
URIARTE NETO, M. Estágio Supervisionado – papel da coordenação e do corpo
docente na aplicação das Diretrizes Curriculares Nacionais. Revista da ABENO, São
Paulo, v. 3, nº 1, p. 41-44, 2003.
URIARTE NETO, M. Programa de Formação Continuada no curso de odontologia da
Universidade do Vale do ItajUNIVALI. IV Seminário “Ensinando e Aprendendo em
Odontologia”. Revista da ABENO, São Paulo, v. 2, nº 1, p.29, 2002.
WAITZKIN, H. Uma Visão Marxista Sobre Atendimento Médico. São Paulo: Editora
Avante, 1980.
WATANABE, M. G. C.; MATTOS, M. G. C.; SEMPRINI, M. Estágio curricular extra-muro
supervisionado da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto USP junto aos
núcleos distritais do Programa de Saúde da Família (PSF) do Centro de Saúde Escola
da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto USP. Trabalho apresentado na XXXVII
Reunião da ABENO – 2002. Revista da ABENO, São Paulo, v. 2, nº 1, p.15, 2002.
WERNECK, M. A. F.; PALMIER, A. C.; SENNA, M. I. B.; LUCAS, S. D. Estágio
Supervisionado em Odontologia: uma proposta metodológica do “aprender-fazendo” na
Faculdade de Odontologia da UFMG. III Seminário “Ensinando e Aprendendo em
Odontologia”. Revista da ABENO, São Paulo, v 1, nº 1, p.75, 2001.
WESTPHAL, M. F.; ALMEIDA, E. S. Gestão de serviços de saúde: descentralização,
municipalização do SUS. Cap. 4. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2001.
175
DOCUMENTOS ANALISADOS
BEAGLEHOLE, R.; BONITA, R.; KJELLSTROM, T. Epidemiologia Básica. edição
atualizada. São Paulo: Santos, 2003.
BRANDÃO, C. R. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1981.
CORREA, M. S. N. P. Odontologia na primeira infância. São Paulo: Santos, 1998.
DICKSON, M. Onde não há dentista. 2ª edição. São Paulo: Edições Paulinas, 1986.
KRASSE, B. Risco de Cárie. 2ª edição. São Paulo: Quintessence, 1988.
KRIGER, L. ABOPREV. São Paulo: Artes Médicas, 1997.
LASCALA, N. T. Prevenção na clínica odontológica. São Paulo: Artes Médicas, 1997.
LEAVELL, H. R.; CLARK, E. G. Medicina Preventiva. São Paulo: McGraw Hill do
Brasil, 1977.
LOESCHE, W. J. Cárie dental. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1993.
MAURER, A. C. F. Adequação bucal de pacientes especiais em rotina clínica.
Trabalho de conclusão de curso – Odontologia UNIVALI. Itajaí, 1995.
MOSS, S. J. Crescendo sem cárie. São Paulo: Quintessence books, 1996.
NEWBRUN, E. Cariologia. 2ª edição. São Paulo: Santos, 1990.
PEREIRA, A. C. Odontologia em saúde coletiva. São Paulo: ArtMed, 2003.
176
PEREIRA, M. G. Epidemiologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1995.
PINTO, V. G. Saúde bucal coletiva. 4ª edição. São Paulo: Santos, 2000.
ROUQUAYROL, M. Z.; ALMEIDA FILHO, N. Epidemiologia & Saúde. edição. Rio
de Janeiro: MEDSI, 2003.
SALGADO, M. I.; SANTOS, M. C. Métodos preventivos na saúde bucal do escolar.
Belo Horizonte: Klir, 1989.
SILVA, H. C.; SILVA, R. H. H. Saúde Bucal ao alcance de todos. Florianópolis: Ed. da
UFSC, 1997.
THYLSTRUP, A.; FEJERSKOV, O. Cariologia Clínica. edição. São Paulo: Santos,
1995.
UNIVALI/CCS. Planos de Ensino das disciplinas de Odontologia Social e
Preventiva. Centro de Ciências da Saúde. Itajaí, 2006.
UNIVALI/CCS. Projeto Pedagógico do curso de Odontologia da UNIVALI. Centro de
Ciências da Saúde. Itajaí, 2004.
177
APÊNDICES
178
APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Convite à participação em uma pesquisa sobre “Estilos de Pensamento na disciplina de
Odontologia Social e Preventiva do curso de graduação em Odontologia da UNIVALI”.
Através deste instrumento, estamos convidando o sr(a), para participar de uma pesquisa sobre a
“Estilos de Pensamento na Disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de graduação em
Odontologia da UNIVALI”, que tem como objetivo identificar os Estilos de Pensamento das práticas
curriculares da disciplina de Odontologia Social e Preventiva do curso de graduação em Odontologia da
UNIVALI.
A justificativa para esta pesquisa se apóia nas possíveis contribuições que o estudo pode trazer,
em prol da melhoria da formação em odontologia, balizadas pelas diretrizes do Ministério da Educação e
da Saúde, refletindo diretamente sobre a qualidade nas práticas de saúde.
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, cuja metodologia apresentará as seguintes etapas: coleta,
análise e interpretação dos dados.
Sinta-se completamente livre para decidir participar ou não deste estudo, mas ressaltamos a
importância de sua contribuição. Queremos esclarecer que seu anonimato estará garantido; que as
informações prestadas serão sigilosas; que, caso não tenha desejo de participar, não acarretará nenhum
prejuízo a sua pessoa; que os resultados obtidos ficarão a sua disposição; que sua participação não lhe
causará nenhum desconforto, risco, dano ou ônus; que os benefícios esperados com este estudo tragam
reflexões positivas para a formação na Odontologia.
Os dados coletados serão utilizados para fins acadêmicos de pesquisa e divulgação de
conhecimento sobre o tema. Caso concorde com estes termos, solicitamos o preenchimento e assinatura
neste documento, conforme segue:
Eu, _____________________________________________________________,
documento nº _________________________________ declaro que consinto, de forma livre e esclarecida,
participar do estudo sobre a “Estilos de Pensamento na disciplina de Odontologia Social e Preventiva
do curso de graduação em Odontologia da UNIVALI” desenvolvido sob responsabilidade do
Odontólogo Marcos Aurélio Maeyama, aluno do curso de Mestrado em Saúde e Gestão do Trabalho
Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Vale do Itajaí/SC, conforme objetivos e metodologia
expostos.
Itajaí, ______/______/ 2006.
_____________________________________________
Assinatura
179
Apêndice B - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 1º período
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Qual o propósito da temática desenvolvida na unidade 1?
Na unidade 2, qual a relação que é feita entre educação e saúde?
Por quê educar para a saúde?
Como ensinar saúde?
Entre as tendências pedagógicas aplicadas à educação em saúde citadas no plano de
ensino (tradicional, tecnicista e problematizadora), existe uma recomendada pela
disciplina ou o aluno tem a liberdade de escolher?
E sobre a importância do saber popular e saber científico no processo saúde-doença,
que aspectos são apontados?
Na unidade 3 que conceitos sobre a promoção da saúde são debatidos?
O que o aluno deve saber sobre o tema?
Segundo o plano de ensino, na unidade 3 “Promoção e Educação em saúde” os alunos
devem realizar um seminário sobre promoção e educação em saúde. Quais as
referências que são dadas aos alunos para que elaborem tal seminário?
No objetivo geral da disciplina a educação aparece relacionada com a promoção da
saúde (aplicar técnicas educativas para a promoção da saúde), que relação existe entre
elas?
180
Sobre a seleção de técnicas educativas de acordo com as características da população,
como o aluno é orientado para fazê-la?
Na unidade 4, sobre a elaboração e demonstração de estratégias e material sobre
educação em saúde, qual são as temáticas abordadas nestes seminários?
181
Apêndice C - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 2º período
Qual o objetivo da disciplina?
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Por quê educar para a saúde?
A unidade 1 “Educação para a saúde” apresenta 5 temáticas (Educação para a saúde e
SUS: saúde, saúde bucal e promoção da saúde; Introdução ao SUS; Historicidade do
uso de fluoretos; Método de aplicação de flúor; toxicidade do flúor). Como o tempo é
dividido entre elas?
Qual a relação existente entre educação para a saúde e SUS apontada pela disciplina?
Ainda sobre este primeiro tópico, educação para a saúde e SUS, ele é subdividido em
saúde, saúde bucal e promoção da saúde. Quais são os aspectos discutidos neste
pequeno bloco?
Que conceito de saúde é discutido? Que perspectiva do processo saúde-doença é
passada para os alunos?
E sobre a saúde bucal?
Como a promoção da saúde é discutida na disciplina? Qual o papel da odontologia na
promoção da saúde?
Em relação ao histórico do SUS e do PSF, o que é apresentado aos alunos nestas __
horas?
182
Em algum outro momento o PSF é discutido na OSP?
Na unidade 2, cujo objetivo segundo o plano de ensino é desenvolver estratégias
educativas para ações em saúde bucal para um grupo infantil, existem conteúdos
quanto à forma e função dos dentes, placa bacteriana, doença periodontal, cárie,
higiene oral, evidenciadores de placa. São sobre estas temáticas que são programadas
as ações educativas?
Quais são as estratégias educativas desenvolvidas?
Quais são as ações preventivas executadas?
Qual a relação da promoção da saúde nas atividades práticas da disciplina?
183
Apêndice D - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 3º período
Quais são os objetivos da disciplina?
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Os conteúdos são desenvolvidos seguindo a seqüência proposta no plano de ensino?
Dentre os métodos epidemiológicos discutidos na disciplina, existe algum recomendado
pela disciplina como tendência?
Nas atividades da unidade 1, uma das estratégias é trabalhar com a epidemiologia na
interpretação de situações problema. A partir de que exemplos? Como é realizado o
seminário?
Na unidade 2, sobre o processo saúde-doença, a historicidade do conceito de causa é
desenvolvida com que tipo de classificação?
Ainda na unidade 2, quando são apresentados os conceitos de níveis de prevenção e
aplicação e a história natural das doenças, é na perspectiva de utilização através da
epidemiologia?
A promoção da saúde, colocada como uma das aplicações da epidemiologia, no
objetivo geral da disciplina, é trabalhada no entendimento de níveis de prevenção?
Na unidade 3, o apresentados vários indicadores de saúde e os alunos fazem
práticas de exercícios de interpretação. Como isso é realizado?
A disciplina faz alguma relação entre a epidemiologia e seu uso na odontologia? (no
objetivo geral fala-se em valorizar a epidemiologia na promoção, prevenção, tratamento
184
e reabilitação da saúde geral e bucal da população. Segundo o objetivo, qual a relação
entre epidemiologia/promoção da saúde/saúde bucal).
185
Apêndice E - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 4º período
Qual é o entendimento que a disciplina tem sobre adequação bucal?
A disciplina é basicamente sobre adequação bucal, qual a relação existente entre
adequação bucal e Odontologia Social e Preventiva?
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Na unidade 2, na qual a temática central é o diagnóstico da doença cárie dentária,
existe um item sobre nível sócio-econômico e cultural; qual é a relação existente entre
eles desenvolvida na disciplina?
Na unidade 3, reservada para as decisões no tratamento da doença cárie dentária,
quais são os fatores de risco de ordem local e geral apontados? Como se classificam os
grupos de risco?
Ainda na unidade 3, existe um tópico sobre os fatores comuns de risco descritos por
Grabauskas, e em seguida uma prática de promoção da saúde abordando tais fatores.
Você pode explicá-los fazendo esta relação?
Qual a relação que existe entre a Odontologia e a promoção da saúde?
A unidade 4 apresenta como temática central a doença periodontal, ainda sobre fatores
de risco, quais são eles para a doença periodontal?
Que tipo de terapêutica preventiva é recomendada para a doença periodontal?
Quais são as informações que contém o odontograma?
186
Qual é o protocolo de adequação bucal utilizado? É desta forma e nesta seqüência que
o aluno é orientado para o atendimento do paciente?
Como é realizada a parte educativa?
Das 3 referências básicas da disciplina, 2 livros são sobre cariologia e o outro mais
relacionado com a prevenção, a ênfase é para que os alunos tenham um conhecimento
sobre o mecanismo da cárie dentária e a partir daí utilizem este conhecimento nas
práticas educativas, preventivas e curativas?
187
Apêndice F - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 5º período
Qual é o conceito que a disciplina tem sobre adequação bucal?
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Por que a adequação bucal é competência da Odontologia Social e Preventiva?
A unidade 2, fala sobre a identificação de um programa de promoção de saúde bucal.
No que se baseia este programa? (fundamentos, motivação do paciente, protocolo
terapêutico, planejamento de caso clínico, biossegurança e bioética)
Qual a relação existente entre promoção da saúde, motivação, protocolo terapêutico,
planejamento de caso clínico, biossegurança e bioética?
Como você contextualiza a promoção da saúde bucal dentro da promoção da saúde? A
aproximação é possível? Qual a sua base teórica?
O que compreende o diagnóstico?
Como é realizada a motivação do paciente?
O que compreende o protocolo terapêutico?
No plano de ensino, fala-se de planejamento dos casos de acordo com seu risco a
doença. Como são classificados os pacientes quanto ao risco?
Como são realizados os atendimentos aos pacientes?
Como é realizada a parte educativa na adequação bucal?
188
Como você classifica a disciplina quanto às ações realizadas?
189
Apêndice G - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 6º período
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Na unidade 1, sobre a evolução do processo saúde-doença, como é desenvolvida esta
temática? Quais as concepções abordadas? Em que perspectiva a disciplina trabalha?
Em relação à evolução do conceito de cárie dentária, qual é a perspectiva atual?
Na unidade 1, existe um tópico sobre ordenamento vital e social da cárie dentária. Você
poderia explicar o tema?
Na unidade 2, que é desenvolvida com a temática dos índices CPO-D e ceo-d, você
apresenta as normas do Ministério da Saúde para realização destes exames. E eles
também realizam um levantamento em escolares. Neste levantamento eles seguem as
mesmas normas adotadas pelo MS? Onde o levantamento é realizado? Estas normas
seguem o padrão utilizado no SB Brasil 2000?
Existe alguma relação entre a unidade 2 e a unidade 4?
Esta realidade é uma simulação ou é de fato uma atividade de campo?
Como os projetos são construídos?
Na referência básica da disciplina, é recomendado o livro Medicina Preventiva de
Leavell e Clark. De que forma ela é contextualizado no desenvolvimento da disciplina?
190
Apêndice H - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável
pela disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 7º período
Qual o entendimento que a disciplina tem sobre adequação bucal?
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Por que a adequação bucal é competência da Odontologia Social e Preventiva?
Quais são os pontos ressaltados no protocolo de adequação bucal?
Onde são realizadas as aulas práticas?
Este protocolo é reproduzido na atividade prática?
Como é realizada a parte de motivação do paciente?
Como são planejados os casos clínicos?
Como é realizada a parte educativa?
O diagnóstico sobre o risco de cárie, quais são os pontos investigados?
Como você classifica a disciplina quanto às ações realizadas?
191
Apêndice I - Roteiro de entrevista semi-estruturada do professor responsável pela
disciplina de Odontologia Social e Preventiva do 8º período
Quais os critérios utilizados para a escolha dos temas desenvolvidos na disciplina?
Que conceito de qualidade de vida é desenvolvido? Qual é o referencial teórico?
Qual a relação entre a odontologia e a qualidade de vida apontada na unidade 1?
Ainda na unidade 1, existe um tópico sobre conceito de saúde. Como o tema é
desenvolvido? A disciplina se posiciona com alguma concepção?
Sobre a relação paciente-profissional, o que é abordado?
Quais os pontos discutidos sobre o SUS?
Sobre o projeto de carreira profissional formulado pelos alunos, existe no geral, o
desejo de trabalhar no serviço público?
O aluno sai com preparo para atuar no SUS?
Como deveria se estruturar o curso que deseja essa formação pro aluno?
Quais as temáticas que deveriam ser desenvolvidas?
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo