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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: FILOSOFIA, SAÚDE E SOCIEDADE
MODALIDADE INTERINSTITUCIONAL
UFSC/UCS/UNIVATES/FEEVALE
ILSE MARIA KUNZLER
O CUIDADO ÀS MULHERES NO PUERPÉRIO DE ALTO RISCO:
Aplicando o Modelo de Cuidado de Carraro, fundamentado em Florence
Nightingale
FLORIANÓPOLIS
2006
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© Copyright 2006 – Ilse Maria Kunzler.
Ficha Catalográfica
K96c Kunzler, Ilse Maria
O cuidado às mulheres no purpério de alto risco: aplicando o Modelo de
Cuidado de Carraro, fundamentado em Florence Nightingale [dissertação] / Ilse
Maria Kunzler. – Florianópolis: UFSC/PEN, 2006.
130 p.; il.
Inclui bibliografia.
1. Enfermagem – Modelo de Cuidado. 2. Saúde da Mulher. 3. Mulher -
Puerpério. I. Título.
CDD 22ª ed. – 618.202 31
Catologado na fonte por Lidyani Mangrich dos Passos – CRB14/697 – ACB439.
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ILSE MARIA KUNZLER
O CUIDADO ÀS MULHERES NO PUERPÉRIO DE ALTO RISCO:
Aplicando o Modelo de Cuidado de Carraro, fundamentado em Florence
Nightingale
Dissertação apresentada ao programa de Pós-
graduação em Enfermagem da Universidade
Federal de Santa Catarina como requisito para
obtenção do título de Mestre em Enfermagem –
Área de concentração: Filosofia, Saúde e
Sociedade
Orientadora: Dra. Telma Elisa Carraro
FLORIANÓPOLIS
2006
Dedico este trabalho a todas as mulheres que venham a
vivenciar o puerpério de alto risco e a seus cuidadores.
AGRADECIMENTO
A Deus, que, com sua infinita sabedoria, sempre me mostrou o caminho a seguir.
A meu esposo, Astério, a meus filhos, Jéferson e Juliana,
Pelo apoio, compreensão e amor incondicional.
Vocês são especiais.
A meus pais, Remundo e Tecla, pelo amor e carinho com que me preparam para a
vida.
À minha orientadora, Telma Elisa Carraro,
pelo carinho e sabedoria a mim dedicados. A sua luz foi muito importante nesta
trajetória.
A todas as pessoas que, de uma forma ou outra, contribuíram
- cuidando-me, confortando-me, fortalecendo-me -,
para que este trabalho se tornasse uma realidade.
Às integrantes da banca, tanto da qualificação, quanto da sustentação, pela
contribuição para a qualidade deste trabalho.
KUNZLER, Ilse Maria. O cuidado às mulheres no puerpério de alto risco:
aplicando o Modelo de Cuidado de Carraro, fundamentado em Florence Nightingale.
2006. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) - Universidade federal de Santa
Catarina, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Florianópolis. 130 p.
Orientadora: Dra. Telma Elisa Carraro
RESUMO
Este estudo caracteriza-se por uma abordagem qualitativa, do tipo convergente
assistencial, objetivando cuidar as mulheres que vivenciam o puerpério de alto-risco e
analisar a ampliação do cuidado com a aplicação do Modelo de Cuidado de Carraro,
fundamentado nos escritos de Florence Nightingale. Considerando a mulher como um
ser humano integral, reforçou-se a atenção à mulher puérpera. Procurou-se conhecer as
mulheres e deixar-se conhecer; reconhecer a situação de puerpério de alto risco
vivenciada por estas mulheres, as situações de educação em saúde e a reação do poder
vital; selecionar e implementar estratégias para as ações da enfermagem quanto à
mulher e à sua família, de acordo com o trajeto desenhado; acompanhar a trajetória,
observando e comparando as informações, buscando subsídios para a seqüência do
caminho e introduzir inovações para ampliar o cuidado. A partir do cuidado prestado,
emergiram os temas da pesquisa convergente assistencial: atenção da mulher voltada
para o bebê e a atenção da mulher voltada para o cuidado de si. Considerando a mulher
como um ser humano indivisível, utilizou-se a arte e ciência para um cuidado integral
à mulher no puerpério de alto risco, buscando reforçar suas energias, potencializando o
seu poder vital e direcionando-o para um viver saudável. Foi possível gerar uma
tomada de consciência da realidade vivida e o desejo de mudança, através da reflexão
da prática do cuidado e do cuidar de si, em relação à mulher puérpera de alto risco, sua
família e à equipe de enfermagem.
Palavras chave: Cuidado, Mulher Puérpera, Modelo de Cuidado.
ABSTRACT
This study is characterized by a qualitative approach of the convergent-care
type, which aims to care for women who experience high-risk puerperium, and to
analyze the extended care with the use of Carraro’s Care Model, based on the writings
by Florence Nightingale. Considering the integrality of the woman as a human being,
attention to the puerperal woman was reinforced. During the study, we sought to
achieve a number of goals, such as: to get to know these women and let ourselves be
known, to gain awareness of the high-risk puerperium experienced by them, to learn
about the situations involving health education and the reaction of the vital power, to
select and implement strategies for the nursing care actions intended for the women
and their families pursuant to the designed plan. In addition, we set out to follow up all
the developments, observing and comparing information, seeking elements to help in
the continuation of the project and in the introduction of innovations to enhance the
care. From the care provided, the themes for the convergent-care research emerged,
namely: attention to the woman targeted at her baby, as well as attention to the woman
targeted at the care of herself. Considering the woman as an indivisible human being,
art and science were used for the integral care of the women who experience high-risk
puerperium, seeking to reinforce their energies, thus enhancing their vital power and
directing it towards a healthy life. Through a reflection on the practice of care and care
of oneself, it was possible to raise awareness concerning the existing reality and the
desire for changes, as regards the woman in high-risk puerperium, her family , and the
nursing team.
Key Words: Care, Puerperal Woman, Care Model
RESUMÉN
Este estudio se caracteriza por un enfoque cualitativo, del tipo convergente
asistencial, con el fin de cuidar a mujeres durante el puerperio de alto riesgo y analizar
la ampliación del cuidado con la aplicación del Modelo de Cuidado de Carraro, basado
en los escritos de Florence Nightingale. Considerando la integralidad de la mujer como
ser humano, reforzamos la atención a la mujer puérpera. Buscamos conocer a las
mujeres y darnos a conocer; reconocer la situación de puerperio de alto riesgo
experimentada por estas mujeres, las situaciones de educación en salud y la reacción
del poder vital; seleccionar e implementar estrategias para las acciones de enfermería
con respecto a la mujer y a su familia, según el trayecto diseñado; seguir la trayectoria,
observando y comparando las informaciones, buscando elementos que ayuden en la
continuación del proyecto e introducir innovaciones para ampliar el cuidado. A partir
del cuidado prestado, emergieron los temas de investigación convergente asistencial:
la atención a la mujer dirigida al bebé y la atención a la mujer dirigida al cuidado de si
misma. Como la mujer es un ser humano indivisible, se utilizaron el arte y la ciencia
para un cuidado integral a la mujer en el puerperio de alto riesgo, buscando reforzar
sus energías, potencializando su poder vital y dirigiéndolo hacia una vida saludable.
Fue posible generar una toma de conciencia de la realidad vivida y del deseo de
cambios, a través de la reflexión de la práctica del cuidado y del cuidado de si, con
respecto a la mujer puérpera de alto riesgo, a su familia y al equipo de enfermería.
Palabras clave: Cuidado, Mujer Puérpera, Modelo de Cuidado.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Modelo de Cuidado de Carraro (CARRARO, 1994) .......................................40
Figura 2: Modelo de Cuidado de Carraro adaptado por Kunzler para este estudo ...........41
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS........................................................................................................ 9
1 MINHA TRAJETÓRIA ATÉ A MULHER QUE VIVENCIA O PUERPÉRIO DE
ALTO RISCO
...................................................................................................................13
2 APRESENTANDO A MULHER E O PUERPÉRIO DE ALTO RISCO.............19
2.1. A mulher puérpera. Quem é esta mulher?............................................................19
2.2 Puerpério....................................................................................................................20
2.3 Puerpério de alto risco .............................................................................................25
3 DE FLORENCE NIGHTINGALE AO MODELO DE CUIDADO DE
CARRARO
........................................................................................................................32
3.1 O cuidado à mulher no puerpério de alto-risco, a partir de Florence.................34
3.2 Modelo de Cuidado de Carraro ...............................................................................38
3.3 Marco Conceitual .....................................................................................................44
3.3.1 Pressupostos...............................................................................................................44
3.3.2 Conceitos...................................................................................................................45
4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA ........................................................................49
4.1 Local e sujeitos...........................................................................................................49
4.2 Coleta de dados.........................................................................................................51
4.3 Questões éticas ...........................................................................................................52
4.4 Análise de dados.........................................................................................................52
5 APRESENTANDO AS TRAJETÓRIAS COM AS MULHERES PUÉRPERAS.54
5.1 O início da trajetória Formando os grupos.............................................................54
5.2 Trajetando com as mulheres ...................................................................................55
6 CUIDANDO AS MULHERES NO PUERPÉRIO DE ALTO RISCO..................69
6.1 Atenção da mulher voltada para bebê....................................................................70
6.1.1 Preocupação com o bem-estar do bebê ...................................................................71
6.1.2 Ansiedade frente aos alarmes ...................................................................................75
6.1.3 Afastamento do bebê................................................................................................77
6.1.4 Impossibilidade de cuidar do bebê ...........................................................................79
6.1.5 Preocupação com a alimentação do bebê.................................................................81
6.2 Atenção da mulher voltada para o cuidado de si..................................................85
6.2.1 Cuidado com o ambiente..........................................................................................85
6.2.2 Cuidado com a nutrição............................................................................................92
6.2.3 Cuidado com o repouso............................................................................................95
6.2.4 Desconhecimento sobre puerpério de alto risco.......................................................97
6.2.5 Dificuldades na amamentação ................................................................................99
6.2.6 Sentindo-se cuidada................................................................................................100
7 ANALISANDO A AMPLIAÇÃO DO CUIDADO.................................................102
7.1 Conhecendo-nos.......................................................................................................103
7.2 Reconhecendo a situação .......................................................................................106
7.3 Desenhando o trajeto e selecionando estratégias.................................................109
12
7.4 Seguindo e agindo...................................................................................................111
7.5 Acompanhando a trajetória...................................................................................115
8 CONSIDERAÇÕES REFLEXIVAS .......................................................................117
REFERÊNCIAS..............................................................................................................121
APÊNDICES...................................................................................................................125
1 MINHA TRAJETÓRIA ATÉ A MULHER QUE VIVENCIA O
PUERPÉRIO DE ALTO RISCO
Quando se pensa na própria trajetória profissional, sempre se atém àquelas
situações ou vivências mais marcantes. Após atuar em várias áreas a nível hospitalar,
iniciei o trabalho em unidade obstétrica. Minha experiência atuando em obstetrícia foi
permeada por uma busca constante de qualificação profissional. Preocupada em
realizar um atendimento humanizado, alicerçado no conhecimento técnico-científico,
procurei sustentação teórica acerca de gestação, parto e puerpério e também sobre as
patologias obstétricas, como conceitos, causas, fisiopatologias, tratamentos, e
principalmente suas repercussões maternas e fetais, pois era considerável a freqüência
de internação de mulheres apresentando uma gestação considerada de risco. A partir
destes estudos e, devido à especialização em obstetrícia, estava cada vez mais evidente
a importância da atuação do profissional enfermeiro e equipe de enfermagem no
cuidado à mulher gestante e puérpera, sendo necessário o conhecimento sobre a
especificidade dos casos, bem como a avaliação e clareza nos registros básicos para o
sucesso do tratamento.
Após alguns anos na assistência, iniciei minha trajetória na docência, atuando
como docente na disciplina prática de saúde da mulher. As atividades práticas eram
exercidas na Unidade Básica de Saúde (UBS) e numa instituição hospitalar vinculada
ao Sistema Único de Saúde (SUS). Tanto na UBS, quanto no hospital, deparava-me
com mulheres apresentando gestação de alto risco e me inquietava profundamente o
fato de que, na grande maioria das vezes, a mulher gestante era despida de sua
integralidade, para a ser tratada apenas como “Trabalho de Parto Prematuro”
1
, uma
“Pré-Eclâmpsia”
2
ou até mesmo uma “Rupreme”
3
; além disso, observava a preocu-
1
Contrações uterinas freqüentes e modificações cervicais entre 22 e 37 semanas de gravidez (BRASIL, 2000)
2
Patologia da gestação que ocorre após a 20ª semana caracterizada por hipertensão arterial associada a
proteinúria (BRASIl, 2000)
3
Ruptura da bolsa amniótica antes do trabalho de parto (BRASIL, 2000)
14
pação da equipe e dos próprios alunos em passar todas as informações e orientações
para a mulher da forma mais clara e completa possível, assumindo a educação como
parte das ações de saúde.
Analisando esse conjunto, começaram as minhas inquietações sobre o reflexo,
na mulher, dessa maneira de cuidar, com uma ação educativa em que os profissionais
detinham o poder do conhecimento, ou seja, unidirecional, ocorrendo, freqüentemente,
que palavras equivocadas acabavam por influenciar significativamente as ações dos
sujeitos desse cuidado.
Ainda enquanto docente, fui convidada a atuar em um hospital privado na
implementação do serviço assistencial em obstetrícia. Essa instituição foi fundada
para o atendimento materno-infantil, com o objetivo de resgatar a excelência no
atendimento obstétrico, referencial que foi se perdendo com a implantação de outros
serviços. Dentro daquela concepção, foi implantado um projeto intitulado “Referência
para Atendimento de Gestação de Alto-Risco”.
Tendo em vista a preocupação com a “excelência” do atendimento pregado pela
instituição, detive-me na organização do ambiente, bem como no cuidado às mulheres,
tanto na assistência, como na prática médica. Em tal cuidado, estava embutida a idéia
de se falar (pacientes e profissionais) a mesma linguagem, ou seja, manter uma
conduta uniforme, devendo os profissionais em saúde envolver-se com a elaboração de
todos os protocolos de assistência. Também houve preocupação com o atendimento
dos bebês em um Centro de Terapia Intensiva Neonatal (CTINeo) com toda estrutura
física e técnica.
Além de todos esses cuidados na elaboração do projeto, também foi proposto
um protocolo de assistência à mulher no puerpério contendo toda a descrição dos
“cuidados”, com uma abordagem biomédica. Mesmo que outras dimensões do cuidado
estivessem presentes nos objetivos da nossa atuação não havia discussão e reflexão
sobre o tema. Como a discussão formal não acontecia, eu me perguntava qual era
realmente a essência do cuidado utilizado na prática e, principalmente, a que cuidado
se fazia referência; dever-se-ia prestar atenção àquele considerado importante pelos
profissionais ou àquele que a paciente demonstrava ser necessário e importante e se
estaria ela sendo entendida e atendida.
15
E veio o Mestrado! Mais uma etapa no meu crescimento profissional.
Empolgada com o tema puerpério após uma gestação de alto risco, fui em busca de
leituras para embasar o meu estudo. Essas leituras, associadas a reflexões acerca do
meu discurso, propiciaram as mudanças no meu modo de pensar. Fazia-se necessário
enxergar primeiramente a mulher que vivenciou a gestação de alto risco, para, então,
enxergar o puerpério após uma gestação de alto risco.
Levando-se em conta as repercussões que a gestação de alto risco provocam na
mulher - cuja duração exata não se conhece, mas que, certamente, não desaparecem
em poucos instantes após o nascimento -, inquieta-me a questão: será que o puerpério
após uma gestação de alto risco também não pode ser considerado um puerpério de
alto risco?
Falar em puerpério lembra mudanças, e estas ocorrem na vida da mulher em
decorrência da transição quanto ao papel materno. E isto significa não só alterações
físicas, mas também um novo momento de vida, isto é, o deixar de ser somente mulher
para ser mãe, sem deixar o “ser mulher” de lado. Pensando-se na mulher como um ser
integral, indivisível, vivenciando transitoriamente um momento de estresse, torna-se
difícil determinar a duração e a adaptação particular a essa condição.
Segundo Freitas (2002), o puerpério é o período de tempo de seis semanas, e se
inicia após o parto normal ou cesariana, indo até a expulsão da placenta. Nesse
período, ocorrem o retorno dos órgãos reprodutivos à situação pré-gravídica e a
readaptação do organismo alterado pela gestação e pelo parto.
As mudanças que acontecem com o parto são bruscas. Em um momento, há
uma mulher grávida e um feto em seu ventre; no outro, há uma mulher-mãe e um bebê.
Segundo Ziegel (1985), embora não estando mais grávida, o corpo da mulher ainda
não voltou à condição anterior. Seu útero ainda ocupa parte do abdômen, ela ainda
parece grávida. É uma fase de transição. O puerpério ocorre nas seis primeiras
semanas após o parto, ao passo que o desenvolvimento e ajustamento psicossocial
perdura de 3 a 4 meses após o nascimento.
Após meses de gestação, que exigiram da mulher, de maneira gradual, sua
particular adaptação, repentinamente surge outra novidade: o bebê já nasceu. Este
novo momento, desconhecido, causador de ansiedades, fantasias, temores, entre outros
16
sentimentos, além das alterações orgânico-fisiológicas características desta fase,
implica em capacidades individuais de transição. É ainda mais individual e com
características próprias na mulher após uma gestação de alto risco. Essa particular
adaptação pode provocar uma diminuição da força ou energia interior, diminuindo
também, segundo Florence (1989), o poder vital e a capacidade de restaurar a saúde.
A gestação de alto risco, de acordo com Freitas (2002), é aquela em que a vida e
a saúde da mãe e/ou do feto e/ou recém-nascido tem maiores chances de serem
atingidas do que as da média da população considerada, que, nas estatísticas, somam
em torno de 10 a 15% do total de gestações.
Tal visão, no contexto saúde-doença, fundamenta-se no fato de que nem todas
as gestantes têm a mesma probabilidade de adoecer ou morrer, sendo esta
probabilidade maior para umas do que para outras, denominando-se essa situação,
segundo o Ministério da Saúde, de enfoque de risco (BRASIL, 2000).
Um aspecto importante a ser lembrado, é que já existe, durante a gestação, um
desafio de adaptação emocional, que se manifesta através da ansiedade, que é causada
pela ambivalência, negação, medo, introspecção (LOWDELMILK, 2002).
Na gestação de alto risco, que pode ir de uma ameaça de parto prematuro até a
ameaça de morte mãe/bebê, as adaptações emocionais podem ter características
individuais, a começar pelo rótulo “alto risco”; portanto, diferente das demais. Deve-se
considerar, quanto a nesse aspecto, tanto a hospitalização, as reações do parceiro e da
família, quanto o papel da equipe assistencial sob a ótica da paciente.
Partindo-se das referências à gestação de alto risco, com todas as alterações que
ocasiona à mulher, associados ao conceito e alterações do puerpério nas mais diversas
dimensões, é necessário repensar a prática do cuidado nesse contexto, ressignificando
essa vivência puerperal após a gestação de alto risco como um período também de alto
risco, ou seja, como puerpério de alto-risco.
Tratando-se de cuidado de enfermagem em geral, Waldow (2001) associa a
idéia de execução de algum procedimento a listas de ações denominadas normalmente
de cuidados de enfermagem, em que os planos ou prescrições de enfermagem
descrevem o tipo de ação a ser executada. As intervenções de ordem social e
psicológica são, normalmente, vagas, ficando a critério de um membro da equipe
17
executá-la na forma que lhe convém, ou como entende ser a mais apropriada.
Leopardi (1997, p. 57) nos diz que o “cuidar é mais que um trabalho, é um valor
preservado pelos profissionais de enfermagem”, defendendo uma nova definição de
cuidado, para além de sua caracterização técnica, buscando o sentido humano da
Enfermagem, que não se satisfaz com a imposição científica na qual as profissões da
saúde procuraram imergir. Entre os objetivos do cuidar, segundo Waldow (2001),
incluem-se aliviar, confortar, ajudar, favorecer, promover, restabelecer, restaurar, dar,
fazer, entre outros. Sendo assim, o cuidado é imprescindível em todas as enfermidades
ou na ausência delas.
Em minha vivência, tenho observado que, durante uma gestação de alto risco,
todas as atenções e cuidados técnicos e assistenciais são voltados para a mulher, em
função de sua condição de risco. Quando o bebê nasce, e tem necessidade de
permanecer na unidade de terapia intensiva, a atenção principal passa a ser direcionada
para o bebê, e as informações que a mulher recebe são, na grande maioria das vezes,
relacionadas somente ao bebê, passando a mulher, em poucos instantes, de atriz
principal para coadjuvante, ou até figurante, com uma mudança brusca de
direcionamento da atenção e cuidado. Este estudo visa a resgatar a importância da,
antes, atriz principal, para a vivência do seu papel de mulher e mãe nesse período de
vulnerabilidade.
A meu ver, mesmo que não claramente especificado, o cuidado deve ir muito
além do modelo biomédico, porém, na prática de Enfermagem, o que mais se faz sentir
é o “fazer” alicerçado em conhecimento técnico-científico do paradigma biomédico,
de indiscutível importância, pois as preocupações com as alterações biológicas
representam a manutenção da vida da mulher e recém-nascido. No entanto,
considerando a situação de que a mulher-puérpera é um ser capaz, dotada de
percepções, sentimentos e de conhecimentos próprios, inserida em um contexto social
e vivenciando uma condição de estresse momentâneo, percebi que era preciso
conhecer mais sobre a percepção da mulher quanto ao cuidado prestado à ela no
puerpério, ou seja, quais são as suas necessidades, bem como conhecer a visão da
equipe de saúde sobre o cuidado prestado.
A partir de várias leituras sobre o cuidado, um arsenal de questionamentos foi
18
se formando, inclusive porque o puerpério é um período de mudanças, transições e
medos. Isso, associado à ansiedade da mulher – que, muitas vezes, não pode
permanecer com o bebê em tempo integral – porque este se encontra na CTI –,
despertou-me o interesse de ampliar o cuidado às mulheres que vivenciam o puerpério
de alto-risco. Tal ampliação do cuidado, contudo, deveria extrapolar o cuidado
biomédico, ou seja, deveria considerar, além das questões fisiopatológicas, o ser e
estar com a mulher e sua família nessa vivência, cuidando-se das mulheres em suas
necessidades no puerpério de alto risco inseridas em seus contextos, seja hospitalar ou
domiciliar. Além disso, esse cuidar deveria estar alicerçado em um referencial teórico
e metodológico que respondesse não só às necessidades das mulheres cuidadas, mas
também da cuidadora.
Nessa busca pela essência do cuidado no puerpério, surgiram algumas lacunas:
Onde está a mulher puérpera?; Como é vivido o puerpério após uma gestação de
risco?; De que cuidados ela necessita ou deseja?
Com base em tais questionamentos, busquei no Modelo de Cuidado de Carraro,
sustentado pela teoria de Florence Nightingale, o suporte para realizar a ampliação
desse cuidado. Os modelos de cuidado, segundo Carraro (2001), são representações do
mundo vivido e direcionam o cuidado de enfermagem, oferecendo ao enfermeiro
subsídios para a sua atuação.
Considerando-se que os modelos acima referidos oferecem subsídios para a
atuação do enfermeiro, inclusive para ampliar o cuidado, surgiu o problema de
pesquisa para este estudo: Como se dá a ampliação do cuidado às mulheres que
vivenciam o puerpério de alto risco com a aplicação do modelo de cuidado de
Carraro?
Dessa questão, surgiram os seguintes objetivos:
- Aplicar o Modelo de Cuidado de Carraro junto a mulheres que vivenciam o
puerpério de alto-risco;
- Analisar a ampliação do cuidado às mulheres que vivenciam o puerpério de
alto-risco com a aplicação do Modelo de Cuidado de Carraro.
2 APRESENTANDO A MULHER E O PUERPÉRIO DE ALTO RISCO
Neste capítulo, enfoca-se a mulher puérpera sob uma perspectiva histórica e o
seu contexto atual, fazendo-se também uma breve revisão sobre o puerpério biológico,
apontando o puerpério de alto-risco.
2.1. A mulher puérpera. Quem é esta mulher?
Tratando-se da mulher puérpera, não se poderia deixar de enfocar a importância
dessa mulher na família e sociedade, pois, em geral, é essa sociedade que, com seus
costumes e valores, define o “ser mulher”.
Na evolução da história, segundo Moraes (2002), as mulheres eram iniciadas na
vida prática pelo aprendizado de tarefas dosticas, que consumiam grande parte do
seu tempo, talento e vitalidade. Esse aprendizado incluía habilitação manual e
intelectual, como prendas manuais e economias domésticas, e, ainda, o favorecimento
de características psicológicas que as tornassem mais aptas para o cumprimento de
“suas tarefas”. A mulher era então educada para maternar e cuidar dos outros.
Mesmo que na família tradicional o homem fosse designado como o “chefe da
família”, ao qual cabia zelar pelo sustento material, enquanto o cuidado com os filhos
e afazeres domésticos era realizado pelas mulheres, estas, nas camadas mais pobres,
sempre trabalharam, especialmente na agricultura, e igualmente em serviços de
vendedoras ambulantes, serviçais domésticas e professoras de ensino primário, além
de arcarem com as tarefas relacionadas ao cuidar dos filhos, da casa, dos parentes
doentes e dos mais velhos (MORAES, 2002).
Carraro (1999) também aborda o papel da mulher no seio da família, onde esta
sempre agiu agregando, unindo e articulando; essa atuação ocorria no âmbito privado
e, mesmo com tantas obrigações, ela quis ser reconhecida e foi para o público (fora do
20
lar) buscar satisfação pessoal e sustento. Ao longo da história, ela vem conseguindo
mostrar o seu potencial e sair da sombra do homem, passando por conquistas difíceis,
como a igualdade de direitos políticos e o reconhecimento do trabalho fora do lar.
Em 2001, realizou-se uma pesquisa intitulada “A mulher Brasileira nos Espaços
Públicos e Privados”, a qual confirmou a crescente participação das mulheres no
sustento das famílias. Essa pesquisa ressalta que, apesar da importância da
contribuição financeira das mulheres nas despesas da casa, o trabalho doméstico
continua sendo realizado principalmente por elas. Do total de mulheres entrevistadas,
70% concorda com a necessidade de divisão mais igualitária de trabalho com os
homens. Mesmo reconhecendo o acúmulo de tarefas relacionadas à maternidade, 85%
das mulheres acham que o ideal é que a mãe possa cuidar dos filhos pequenos.
Também um número expressivo das entrevistadas (35%) considerou que o homem não
sabe fazer o serviço da casa, o que, muitas vezes, é verdade, pois não foram
preparados para tal (Fundação Perceu Abramo, 2001).
A mulher torna-se o eixo da família quando faz o seu papel de esposa, mãe,
dona de casa e educadora dos filhos. É articuladora da família, pois todas essas
atribuições lhe dão um poder e uma enorme força, trazendo o respeito da família e da
sociedade. Nesta posição de articuladora de sua família, é a mulher quem estrutura,
organiza e dirige o cotidiano familiar, fazendo o elo entre a esfera do privado e do
social (CARRARO, 1999).
Nessa contextualização na família e na sociedade, a mulher que vivencia o
puerpério, com uma série de adaptações que ocorrem num processo acelerado,
defronta-se com uma sobreposição de papéis: mulher, mãe, esposa, dona de casa,
profissional, dentre outros. Se ela estiver vivenciando o puerpério de alto risco,
acrescenta-se a tudo isto o ser, nesse momento, uma paciente, com necessidade de
fortalecer o seu poder vital para um viver saudável.
2.2 Puerpério
O puerpério, normalmente citado como um “fenômeno” fisiológico em que são
21
descritas alterações, tanto físicas como emocionais, submete à idéia de pensar nesse
período como um pacote, com conteúdo pré-determinado, dentro do qual as mulheres
se enquadram. Assim sendo, o que dizer sobre a individualidade e unicidade do ser
humano? Tal reflexão nos remete a uma constatação: o puerpério não é igual para
todas as mulheres, como também não é igual entre uma gestação e outra, entre um
parto e outro de uma mesma mulher, uma vez que o seu momento de vida é outro.
De acordo com Carraro:
O puerpério é um tempo de restauração, de mudanças, de encontro, de
interação, de troca... É um tempo que traz consigo uma grande carga cultural,
quando várias crenças, costumes e mitos se salientam. Esta carga cultural, que
muitas vezes colide com o conhecimento científico, precisa ser considerada e
respeitada a fim de que o cuidado seja efetivo (1998, p. 38).
No entanto, mesmo pensando nessa mulher como um ser integral e único, com
uma vivência individual do puerpério, as alterações fisiológicas descritas são as
mesmas que caracterizam o puerpério em geral. Conforme citado por Ziegel (1985) e
Lowdermilk (2002), o puerpério corresponde às seis primeiras semanas de pós-parto,
reunindo o puerpério imediato e tardio, quando os principais fenômenos involutivos do
corpo e colo do útero, vagina e trato urinário ocorrem.
Nesse período, a mulher pode apresentar alguns sinais e sintomas aos quais
devemos estar alerta, a fim de detectar precocemente as complicações e,
principalmente, aliviar o desconforto desencadeado. Segundo Ziegel (1985) e
Lowdermilk (2002), os sinais e sintomas a serem observados são os seguintes:
Dor – O útero se contrai vigorosamente nas primeiras horas para expelir
sangue, provoca dores tipo cólicas cíclicas, por vezes, de forte intensidade, requerendo
analgesia. A liberação de ocitocina durante a amamentação provoca aumento da
atividade uterina e cólica. A intensidade da dor diminui gradativamente e, ao final do
terceiro dia, a dor é pouco perceptível.
Lóquios – Consiste na eliminação vaginal de hemácias, decídua, células
epiteliais e bactérias. Nas primeiras horas após o parto, a presença de sangue torna a
22
secreção avermelhada (lóquia rubra). Entre três a quatro dias de pós-parto, assume cor
amarela (lóquia flava) e, após 10 dias, pela grande quantidade de leucócitos, apresenta
coloração amarelo-esbranquiçada (loquia alba). A lóquia rubra por mais de duas
semanas é sugestivo de retenção de restos placentários e o odor fétido sugere infecção.
Apojadura – De três a quatro dias após o parto, ocorre a apojadura, início da
produção láctea, que provoca ingurgitamento e desconforto mamário.
Temperatura corporal – É freqüente o surgimento de hipertermia
acompanhada de calafrios, três a quatro dias após o parto, o que, no geral, não dura
mais que 24 horas. É achado fisiológico que decorre de possível bacteremia e grande
congestão vascular e linfática, verificada quando da apojadura. Cabe lembrar que a
presença de hipertermia (> 38ºC) com duração superior a 24 horas sugere infecção.
Hemograma – Observa-se leucocitose (até 25.00/ml), com aumento de
granulócitos e relativa diminuição de linfócitos e eosinófilos, números que retornam
aos níveis pré-gravídicos, em torno de sete dias de pós-parto. A série vermelha não
sofre alterações significantes.
Trato urinário – A sobredistensão, o esvaziamento incompleto da bexiga e o
excessivo volume residual - que acometem o trato urinário no período pós-parto –,
somada à hipotonia decorrente da anestesia de condução e dilatação dos ureteres –,
e aos traumatismos da bexiga e da uretra, propicia o surgimento de infecção urinária.
A dilatação da pelve renal e dos ureteres – achados característicos do final da gestação
–, retorna ao normal no prazo de duas a oito semanas.
Segundo Edwards (2002, p. 466), são evidenciadas três fases no período do
puerpério, sendo elas:
Fase Dependente – Relacionada à habilidade de adaptar-se - o que leva em
média de 24h a 2 dias -, cujo enfoque é em si mesmo o preenchimento das
necessidades básicas de conforto, repouso, proximidade e nutrição do filho; constitui
um período de grande excitação em que a mulher necessita explicar a experiência da
gestação e parto.
Fase dependente/interdependente – Inicia-se no segundo dia e dura de dez
dias a várias semanas. O enfoque está no cuidado com o bebê e na competência em
desempenhar e direcionar esse cuidado. Tem relação com a vivência da gestação e o
23
preparo para o parto, bem como o contato precoce com o filho. A mulher tem
necessidade de aceitação, ânsia em aprender e praticar lidar com desconfortos físicos,
mudanças emocionais, podendo ela também experimentar melancolia.
Fase interdependente – Concretiza-se quando a mulher e sua família
movimentam-se sob a forma de uma unidade, como membros em interação. O
movimento estabelece-se envolvendo toda a família com a chegada de um novo
membro, que se inicia com o nascimento e prossegue no domicílio.
Estas fases, citadas por Edwards, são evidenciadas no puerpério em geral, mas
no puerpério após uma gestação de alto-risco em que o bebê está internado na
CTINeo, há alterações significativas, uma vez que a recém-mãe consegue realizar
poucos cuidados com o seu bebê, às vezes limitando-se a observá-lo e tocá-lo com
delicadeza e de envolvê-lo com o som de sua voz.
Dal Sasso (1994, p. 56-57) explica que:
o que faz surgir uma situação de crise no ser humano não é meramente a
exacerbação de uma causa específica, mas principalmente uma combinação de
sentimentos, reações e significados no momento em que está sendo
vivenciado.
Após uma gestação de alto-risco, vivenciar o puerpério com suas características
próprias e, além disso, conviver com o fato de não poder permanecer o tempo integral
com o próprio bebê e, principalmente, não poder cuidar integralmente do mesmo
quando este estiver na CTINeo, são fatores suficientes para que a mãe chegue à
situação de crise, conforme ressalta Dal Sasso, diminuindo o poder vital, de acordo
com Florence (1989).
Toda gestante sonha com o bebê, com as visitas no hospital, com os elogios,
com os presentes, com o carinho da família e do companheiro. Após o nascimento, as
ansiedades de confusão vividas no transcurso do parto tendem a se resolver, através
dos mecanismos maníacos, que exacerbam esses desejos de reverência; quando não se
produz essa situação, a depressão é intensa. Há casos em que a mulher não consegue
trabalhar com tais situações de estresse e de cobrança e acabam surgindo as
24
somatizações, como a febre, a constipação e a anúria, dores gerais, sofrimento pela
episiotomia e sua infecção, abscessos por injeções e abscessos mamários (SOIFER,
1992).
Soifer (1992) discorre sobre o momento após o parto em que a mulher encontra
o filho pela primeira vez, quando ela se depara entre o imaginário de tantos meses e o
real, que pode ser tocado, sendo reconhecido, sendo que, para esse reconhecimento,
ela pede ajuda ao ambiente.
Para Maldonado (1997), na maioria das vezes a primeira reação da mãe frente
ao bebê é positiva. É possível um pequeno desapontamento com o sexo, mas nada que
seja expresso com grande frustração; em geral, o vínculo vai sendo criado e, aos
poucos, aquele “ intenso sentimento materno”vai aparecendo lentamente. Ocorre que a
mãe se assusta com o fato de não sentir tais sentimentos previamente, e, se estes não
são bem trabalhados, acabam misturando-se com as dificuldades dos cuidados a um
recém nascido, originando a depressão.
Existem inúmeras expectativas no puerpério vivido pela mulher, o que,
conseqüentemente, nos leva a crer que os dias subseqüentes ao parto não são nada
fáceis, devido aos seguintes fatores: o estar em um meio desconhecido (hospital), com
pessoas estranhas (enfermeira, técnicos, colegas de quarto...); os cuidados especiais
impostos pela assepsia; a perplexidade frente ao bebê; as intensas ansiedades sobre a
sua condição de saúde, entre outros (SOIFER, 1992).
Carraro e Radünz (1996) incitam nos profissionais de saúde uma reflexão sobre
o processo de cuidar ao fazerem questionamentos sobre o relacionamento desses
mesmos profissionais com as pessoas com as quais vivem no dia-a-dia profissional:
Como são essas pessoas? Serão elas iguais umas as outras por estarem em condições
de clientes? São todos seres humanos, mas cada um se apresenta em sua singularidade.
Elas continuam pessoas singulares que chegam até esses profissionais acrescidas de
um problema de saúde, trazendo consigo suas crenças, seus valores, seus conceitos,
seus objetivos de vida.
As colocações acima induzem à reflexão de que essa singularidade dos seres
humanos, aqui representados pela puérperas, devido à internação de seus bebês em
unidades neonatológicas, interfere na adpatação das mães à maternidade.
25
A busca de dados básicos da história pessoal, as condições ambientais e a
assistência que as mulheres puérperas recebem, fornecem subsídios para um
diagnóstico situacional, que ultrapassa as fronteiras do diagnóstico clínico e
psicopatológico. Dessa forma, pode-se avaliar melhor quais são as possibilidades e
limitações, os recursos e as carências da assistência, na busca da ampliação do
cuidado.
A partir das fases de adaptação ao puerpério relacionadas à situação de crise
vivida pela mulher na gestação de alto risco, mostra-se necessário um novo pensar
sobre a implementação de um modelo de cuidado voltado às reais necessidades da
mulher/família, inovando, através da implementação de novas tecnologias de cuidado,
delineando um modelo adequado a essa mulher na sua realidade singular.
2.3 Puerpério de alto risco
O puerpério é um tempo de riscos, quando se deve estar alerta, especialmente
nos primeiros dias, à reação do organismo da mulher. Esta atenção subsidiará a
atuação da Enfermagem, especialmente no sentido de potencializar o seu poder vital. É
necessário conhecer a mulher puérpera e suas reais necessidades, propiciando-lhe
melhores condições para que seu poder vital possa ser potencializado, para um viver
saudável (CARRARO, 1998).
Não se encontrou, na literatura, cuidados específicos no puerpério para a mulher
que apresentou uma gestação de alto-risco. Assim, restringiu-se a buscar
conhecimentos sobre a fisiopatologia e suas repercussões clínicas e sobre os efeitos
psicossomáticos no organismo materno para, a partir daí, traçar-se um plano de
cuidado integral a essa mulher-mãe.
É impossível determinar quais as gestações que irão se complicar; mesmo
trabalhando-se com o conceito de risco gravídico, nem sempre se consegue detectar
precocemente uma alteração da gestação, e estas alterações, muitas vezes súbitas,
causam dano à saúde da mulher, do concepto, ou de ambos, sendo alguns deles
irreversíveis (TANAKA, 1995)
26
As patologias obstétricas ou gestação de alto risco, como o termo já diz, são
entendidas como causadas pela gestação, e, se esta não mais existir, a patologia
também não mais existirá, com exceção daquelas pré-existentes e que se agravam com
a gestação. É importante destacar que os efeitos clínicos e emocionais não se
modificam em segundos, necessitando de um período de recuperação, que difere para
cada mulher, sendo, assim, necessário que se conheça não só a patologia obstétrica e
suas repercussões no organismo materno, mas também a capacidade individual dessa
mulher em restaurar a saúde.
Quando a mulher submete-se e entrega-se ao sistema de saúde, por ocasião do
nascimento de um filho, até por estar exposta aos riscos de morte materna, necessita de
cuidados singularizados, sendo vista como um ser humano integral e indivisível,
participativo no seu processo de ter um filho (CARRARO, 1998). Tendo a mulher
vivenciado uma gestação de alto-risco, essa situação desencadeia um período
puerperal diferenciado, o qual reflete as conseqüências dessa vivência e exige cuidados
ainda mais singulares.
Dessa forma, a gestação de alto-risco desencadeia, para a mulher, um período
puerperal diferenciado, o qual reflete as conseqüências dessa vivência. O período
puerperal após a gestação de alto-risco foi denominado, para a elaboração desta
pesquisa, puerpério de alto-risco.
Para se compreender a dimensão de tais conseqüências, faz-se necessário
conhecer-se as patologias obstétricas e os danos provocados no organismo materno,
para que, a partir desse conhecimento, sejam programados cuidados específicos para a
mulher-puérpera. Dentre as referidas patologias, destacam-se a pré-eclâmpsia;
sangramentos na gestação, como o deslocamento prematuro de placenta, ou placenta
prévia; patologias endócrinas da gestação ou agravadas por ela, como diabete
gestacional; infecções; cardiopatias agravadas pela gestação; trabalho de parto pré-
termo.
Pré-eclâmpsia – Caracteriza-se por uma adaptação inadequada da circulação
uteroplacentária, provocando hipertensão, proteinúria e edema. A característica
primaz é o vasoespasmo, danos ao endotélio vascular e agregação plaquetária
aumentada produzem hipóxia tecidual em órgãos alvo (placenta, rins, fígado, cérebro),
27
que gerarão a expressão clínica da pré-eclâmpsia, podendo, em maior gravidade, levar
a eclâmpsia, com implicações graves para a vida da mãe e do bebê. (FREITAS, 2002).
Segundo Baptista (2003), os níveis pressóricos podem ser influenciados
diretamente por fatores psicológicos, dependendo do estresse e do estilo de vida da
mulher. Essa é uma patologia grave, havendo a necessidade de internação; associado a
isso, o desconhecimento da forma de controle desencadeia crise de ansiedade da
mulher frente ao diagnóstico da doença.
Mesmo que a causa dessa patologia seja obstétrica, o efeito dos danos teciduais
ainda se mantém no puerpério, exigindo atenção especial e conhecimento técnico-
científico da equipe de saúde, no sentido de evitar ou minimizar maiores danos.
Sangramentos durante a gestaçãoPodem levar a um quadro de emergência
obstétrica, exigindo intervenção imediata, hipotensão e choque. Além de todos os
riscos maternos de hipovolemia e choque, existem ainda a hipóxia e anóxia fetal, por
diminuição ou ausência de fluxo placentário, podendo seguir-se de anemia aguda
materna, bem como as lesões fetais decorrentes desta hipóxia ou anóxia (FREITAS,
2002). É importante uma atenção especial ao cuidado no puerpério, exigindo
acompanhamento das conseqüências fisiopatológicas da hipovolemia e choque. Além
disso, devem haver cuidados específicos relacionados à recuperação dos níveis de
hematócrito e hemoglobina, importantes para a recuperação da mulher após o parto.
Patologias endócrinas – A diabete gestacional ou agravada pela gestação é
uma alteração no metabolismo dos carboidratos (CHs). Apresenta-se como uma
condição de intolerância aos carboidratos, em variados graus de intensidade,
caracterizados pelo seu início ou seu primeiro reconhecimento durante a gestação,
podendo ou não persistir após o parto. É a doença mais comumente encontrada durante
a gestação, sendo responsável por índices elevados de morbimortalidade perinatal, a
mortalidade neonatal, especialmente devido aos fetos muito grandes (macrossômicos)
e a presença de malformações fetais. A diabete gestacional coloca o neonato em maior
risco de hipoglicemia neonatal, de hipocalcemia, de policitemia e de
hiperbilirrubinemia. As mulheres com diabete gestacional correm maior risco de pré-
eclâmpsia, de infecções do trato urinário e de parto operatório, incluindo a cesariana e
o fórceps (ZIEGEL, 1985; FREITAS, 2002)
28
As alterações na placenta de gestantes com diabete indicam a insuficiência
crônica na oxigenação fetal que pode chegar até 40% menos que na gestação normal.
A normalização de glicemias maternas é o fator mais importante na prevenção das
hipóxias fetais (FREITAS, 2002).
A descoberta do diagnóstico e os cuidados que ele requer, juntamente com as
restrições alimentares, de atividades e o risco fetal, provocam, segundo Baptista
(2003), um alto grau de ansiedade e medo nas gestantes.
Esses sentimentos se prolongam até o pós-parto e, mesmo que a causa ou o
agravamento da diabete seja a gestação, as conseqüências no organismo se fazem
presentes por mais tempo, dependendo da gravidade da manifestação da patologia,
exigindo cuidados específicos no puerpério.
Trabalho de parto pré-termo ou prematuro – Ocorre após a 20ª e antes da
37ª semana de gestação e poderá ter repercussões clínicas se ocasionado por processos
infecciosos, sendo que as repercussões fetais estão diretamente ligadas ao grau de
prematuridade e à existência de patologias maternas, provocando diminuição da
vitalidade fetal ou patologias congênitas (BRASIL, 2000).
A referida alteração na duração da gestação gera muita ansiedade para a vida
da paciente, sentimentos de revolta e a busca por respostas em outros fatores. Baptista
(2003) esclarece que a mulher pode sentir-se culpada e buscar respostas para o que
ocorreu, chegando a acreditar que não é uma e suficientemente boa para segurar seu
filho e que ela é culpada por ter colocado a vida do seu bebê em risco.
Esses sentimentos estão, em geral, presentes com maior intensidade no
puerpério, necessitando do cuidado singularizado. Existem também situações em que a
mulher, após permanecer em repouso absoluto ou relativo por tempo prolongado,
encara o nascimento com alívio, pois devolve a ela a possibilidade de movimentar-se
livremente.
Ruptura Prematura de Membranas (Rupreme) Caracteriza-se pela
ruptura do âmnio que ocorre antes do início do trabalho de parto, independente da
idade gestacional, e que, quanto mais precoce, se caracteriza como gestação de alto
risco quando adotada uma conduta expectante. O risco materno e fetal está relacionado
à infecção ascendente, podendo inclusive levar a sepsis. (FREITAS, 2002).
29
Tal alteração normalmente provoca muita ansiedade na mulher, pois, como não
tem uma causa específica, ela geralmente busca identificar fatores que poderiam ter
desencadeado a ruptura das membranas, como o excesso de esforço físico. Angustia-
se com sentimentos de culpa, e, tal qual ocorre no parto pré-termo, pode achar que
colocou a vida do bebê em risco (BAPTISTA, 2003).
Os cuidados no puerpério estão baseados na avaliação e alerta referente ao
processo infeccioso e à condição emocional no sentido de fortalecer o poder vital.
As mulheres portadoras de cardiopatias exigem uma atenção especial no
puerpério, uma vez que a brusca diminuição do volume e alteração no débito cardíaco
pode descompensar o equilíbrio circulatório com repercussões hemodinâmicas.
A gravidez e o parto também são eventos estressantes que podem, por si só,
contribuir para o surgimento da depressão. A depressão puerperal pode aparecer sem
nenhuma causa, mas existem alguns fatores predisponentes, como falta de suporte
emocional, familiar e social; eventos de vida negativos durante a gravidez ou próximos
ao parto; problemas pessoais, emocionais da mãe com relação à maternidade; gravidez
não planejada ou não desejada; dificuldades conjugais; existência de fases depressivas
anteriores; existência de doenças psiquiátricas durante a gravidez; existência de
depressão em pessoas da família; ataques de pânico após a gravidez; bulimia ou
anorexia (MALDONADO, 1997).
Assim como a gravidez e o parto, as patologias obstétricas constituem um
evento muito estressante, o que significa um maior risco para a mulher puérpera que
vivenciou uma gestação de alto-risco de desenvolver a depressão puerperal.
Alguns sintomas caracterizam um estado de depressão maior, como desânimo,
insônia ou aumento do sono, apatia, falta de apetite ou aumento de apetite, ausência de
desejo sexual, pensamentos pessimistas e repetitivos, perda de interesse por coisas que
gostava de fazer ou por pessoas com as quais gostava de conviver. Às vezes, aparecem
momentos de ansiedade com sudorese, palpitações e tremor (MALDONADO, 1997).
Como isso ocorre numa época especialmente trabalhosa, com a chegada do
bebê, toda essa sensação de insuficiência e incapacidade é canalizada para
pensamentos fixos de que a mulher não está apta para cuidar da criança. Ela sente-se
culpada por estar dando trabalho a outras pessoas da família e faz auto-recriminações
30
por não conseguir gostar do bebê como deveria. Outro fator para aumentar a sensação
de culpa, é que as pessoas esperam que a jovem mãe esteja muito feliz nessa fase de
sua vida e acabam acusando a mulher com depressão de ser temperamental, mimada,
imatura ou despreparada para ser mãe (MALDONADO, 1997).
Stites & Terr (1991) já citaram a relação ou efeito do stress sobre a resposta
imunológica, em que o stress é definido como a resposta do hospedeiro a um estímulo
ou evento desfavorável do meio ambiente e os efeitos se relacionam à incapacidade de
competir com o agente estressante. Sendo assim, a gestação de alto-risco e o stress no
puerpério podem interferir na resposta imunológica.
Segundo Stites & Terr (1991), uma pesquisa feita com estudantes de medicina,
mostrou que o stress de testes provocou decréscimo nas células CD4 circulantes e na
atividade de célula NK, sendo que o efeito foi mais intensificado nos alunos que
sentiam solidão. Mesmo que tais pesquisas tenham mostrado que a ansiedade e
depressão possam inibir as respostas imunológicas, os indivíduos que enfrentaram bem
o estresse, mostraram um aumento significativo na atividade das células NK.
Assim como o stress afetou os sujeitos desta pesquisa, também afetará as
mulheres que vivenciam o puerpério de alto-risco.
No segundo século depois de Cristo, Galeno, citado por Mello Filho (1992),
observou que mulheres melancólicas pareciam mais susceptíveis a desenvolver um
câncer do que aquelas que ele chamava de sangüíneas. Do mesmo modo, através de
suas experiências práticas, clínicos de todos os tempos aprenderam sobre a
importância do estado emocional dos pacientes na evolução de doenças infecciosas e
neoplásicas. Maldonado (1997) aponta para os mecanismos psicossomáticos,
ressaltando que deve haver uma compreensão mais abrangente das disfunções,
doenças e perturbações do curso de etapas da vida como o puerpério, caso se pretenda
ampliar a visão no contexto existencial da mulher.
A partir das alterações ocasionadas pelas patologias obstétricas, associadas às
situações de stress e todas as suas implicações vivenciadas pela mulher na gestação,
este caso de puerpério pode ser caracterizado como “Puerpério de Alto-Risco”.
O puerpério é um tempo de restauração, de mudanças, de encontro, de
interação, de troca, trazendo consigo uma grande carga cultural - que, muitas vezes,
31
colide com o conhecimento técnico-científico -, que precisa ser considerada e
respeitada para um cuidado efetivo (CARRARO, 1999).
Esse período de mudanças faz refletir sobre a necessidade de potencializar o
poder vital da mulher puérpera, contribuindo para que ela não perca energia, de modo
a manter ou recuperar sua saúde, evitando também, como afirma Carraro (1998), que
mulheres, ao trazerem à vida uma nova vida, paradoxalmente, morram por falta de
cuidados puerperais.
O poder vital, que também podemos chamar de capacidade vital, significa a
energia interior, intrínseca e latente no ser humano, que pode ser direcionada para a
vida ou para a morte. É direcionada para a vida, quando o ser humano mantém uma
atitude de equilíbrio entre o ambiente interno e externo, em que as suas energias são
direcionadas para um viver saudável; as atitudes em contrário produzem a perda dessa
energia vital, direcionando-a ou para a morte, ou para a impossibilidade de recuperar e
manter a saúde.
3 DE FLORENCE NIGHTINGALE AO MODELO DE CUIDADO DE
CARRARO
A essência do cuidado está diretamente relacionada à história da Enfermagem,
que foi entendida como ciência e arte com a proposta de Florence Nightingale, cujos
escritos são utilizados como referencial teórico desta prática.
Um dos primeiros momentos da história da Enfermagem institucionalizada foi
marcado por uma diferenciação do ato médico, quando Florence Nightingale pretendia
estabelecer o fortalecimento das forças do próprio doente, afirmando que a natureza
deste promoveria a cura. Para conseguir seu intento, lutou para mudar, desde o
comportamento dos enfermeiros, até a estrutura do hospital. Para ela, o cuidado das
pessoas tinha fundamento no conhecimento e no calor humano. O cuidado passou a ter
um valor em si mesmo, como condição para a cura (LEOPARDI, 1997).
Florence nasceu em Florença (origem do seu nome), na Itália, no dia 12 de maio
de 1820, durante as freqüentes viagens de seus pais ao exterior. Era descendente de
uma rica e educada família vitoriana. Foi-lhe proporcionada uma educação ampla, com
conhecimento de vários idiomas, sendo também conhecedora de temas relacionados a
ciências, matemática, literatura e artes. Além do mais, teve boa formação em filosofia,
história, política e economia. Assim, conhecia o trabalho do governo nessa área,
situação essa não comum para as mulheres naquela época. Tal educação diversificada
foi proporcionada por seu pai, William Edward Nightingale, um senhor inglês muito
culto. Ela almejava outras realizações em sua vida, não apenas tornar-se esposa
desocupada de um aristocrata (GEORGE, 2000).
Nightingale tornou-se heroína na Grã-Bretânha, como resultado de seu trabalho
na guerra da Criméia. Lutou para que o soldado tivesse condições dignas de vida.
Demonstrava grande preocupação com o soldado sadio, ferido ou enfermo. É
conhecida até hoje como a Dama da Lâmpada e encarada como a mãe da Enfermagem
Moderna. Sintetizou informações reunidas em muitas de suas experiências de vida
33
para auxiliar o doente e no desenvolvimento da Enfermagem (GEORGE, 2000).
Para compreender suas atitudes, faz-se necessário contextualizar a época em
que Florence iniciou suas atividades na chamada enfermagem moderna. Na saúde, a
corrente dominante da época de atuação de Florence era a de Hipócrates, com enfoque
no “estado de equilíbrio” entre as influências ambientais, modos de vida e os vários
componentes da natureza humana. Hipócrates não se preocupava apenas com o físico
do paciente, mas também com as perturbações mentais. No que se refere à cura, ele
reconheceu as forças curativas inerentes ao ser humano. Procurava ver o ser humano
na sua totalidade, com inter-relação fundamental entre o corpo, mente e o meio
ambiente (CARRARO, 2001).
Dentro dessa concepção hipocrática, Florence desenvolveu sua formação e
atuação, conforme apresentado nos seus escritos, “Notes on nursing” (1859). O
principal enfoque de Nightingale era o controle do ambiente dos indivíduos e das
famílias, tanto dos sadios, como dos enfermos (GEORGE, 2000).
Florence não tinha a intenção de criar uma teoria, apenas deixar registros que
fundamentassem um cuidado planejado, alicerçado no conhecimento. No livro “Notas
sobre Enfermagem” (1989), contemplou vários aspectos do cuidado, como arejamento
e iluminação, condições sanitárias das moradias, controle das atividades menores,
ruídos, alimentação, higiene das pessoas e do ambiente, esperanças e conselhos e
observação do paciente.
A observação tem um valor especial no cuidado e, conforme Florence (1989,
p.137), “Ao tratar da vital importância da observação minunciosa, nunca se pode
perder de vista o seu valor intrínseco. Não se trata de coletar uma pilha de informações
variadas ou fatos curiosos, mas de salvar vidas e melhorar a saúde e o conforto”.
Nesse contexto, faz-se necessário observar a mulher no puerpério de alto risco,
para de conhecer, reconhecer e entender as suas necessidades, com a finalidade de
auxiliá-la no processo de recuperar e fortalecer suas energias, potencializando o seu
poder vital.
Florence Nightingale, considerada a precursora da Enfermagem Científica,
dizia que a Enfermagem é uma ciência progressiva, na qual ficar parado é
retroceder. A ciência a que ela se referia se evidencia por meio da aplicação de
conhecimentos sistematizados e instrumentalizados pela arte. Para ela a
Enfermagem era ambos, uma arte e uma ciência, e requeria organização
34
científica e educação formal para cuidar das pessoas (CARRARO, 1998, p.
35)
O modelo de Cuidado de Carraro, ao sistematizar conhecimentos, fornece
instrumentos para o cuidado da mulher puérpera, no sentido de oferecer as melhores
condições para que seu poder vital seja potencializado e, conseqüentemente, para que
essa mulher possa vivenciar de modo mais saudável sua passagem pela vivência do
puerpério de alto risco.
3.1 O cuidado à mulher no puerpério de alto-risco, a partir de Florence
Tendo-se por base a ótica de Florence e repensando-se a trajetória da
Enfermagem, a partir dessa autora, pode-se percorrer o caminho do resgate do ser
humano na sua integralidade, através do estudo do cuidado. Com referência a este
estudo, partiu-se do cuidado à pessoa dentro do ambiente externo o contexto e o
interno referente às forças interiores, caminhando-se para o enfoque das patologias.
Para isso, foram consideradas a evolução e as descobertas científicas num paradigma
biomédico. A seguir, passou-se ao cuidado, em si, fundamentado na percepção da
integralidade do ser humano, esta amparada pelo conhecimento técnico científico.
Partindo-se desse contexto, foi, no presente estudo, reforçada a atenção à mulher
puérpera e não no puerpério.
Na Enfermagem, Florence mostrou a possibilidade e a necessidade de uma
preparação formal e sistemática, para a aquisição de conhecimento de natureza
distinta e cujos fundamentos permitissem manter o organismo em condições de não
adoecer ou de se recuperar de doenças. Florence percebia a doença como um esforço
da natureza para restaurar a saúde, dando à Enfermagem a dimensão original de
favorecer o processo reparativo. Ela se preocupou em manter um ambiente em que a
35
natureza pudesse agir sobre as condições do paciente, com o mínimo de dispêndio de
suas forças vitais (CASTRO, 1989).
Florence estabelece algumas estratégias para um viver saudável, para a
prevenção de doenças, a manutenção e a recuperação da saúde, conforto e bem-estar,
apoio, educação à saúde e mobilização do meio ambiente. Ela diz que cada uma de nós
possui um
poder vital, e que este pode ser potencializado, ou seja, o mesmo pode ser
usado no processo saúde-doença, levando a pessoa para a vida ou para a morte. É um
poder interior, que usamos para vivenciar o processo saúde-doença. E a equipe de
saúde deverá sempre buscar estratégias de fortalecimento desse poder, respeitando
cada indivíduo como um ser singular (CARRARO, 1999).
Ela entende a doença como um processo restaurador, instituído pela natureza e
que pode ser retardado pela falta de conhecimento ou de atenção na manutenção do
poder vital. Recomenda o cuidado com o ambiente externo, salientando também a
preocupação com o ambiente interno do ser humano, com as suas forças interiores
(poder vital) e com a reação à doença (CARRARO, 2001).
Ghiorzi (2004, p.184), por sua vez, escreve sobre esse sentimento, dizendo que
“Não dar atenção ao que se sente internamente, no momento exato em que o
sentimento floresce, gera um ruído no processo relacional, o que acaba por alimentar
sentimentos negativos”. A pessoa pode imergir passivamente nesses sentimentos,
piorando-os cada vez mais.
Alimentar sentimentos negativos, como medo e ansiedade, que podem estar
presentes no puerpério de alto risco, diminuem o poder vital; sendo assim, é necessário
ficar atento às reações, subsidiando a atuação da Enfermagem, no sentido de
potencializar o poder vital para um viver saudável.
Cuidar, prestar cuidados, tomar conta é, antes de tudo, um ato de vida, no
sentido de que visa a manter, sustentar a vida, permitindo que o indivíduo continue a
se reproduzir. Cuidar é um ato individual que se presta a si próprio, desde que se
adquira autonomia, mas é, igualmente, um ato de reciprocidade que se presta a toda
pessoa que, temporária ou definitivamente, tem necessidade de ajuda para assumir as
suas necessidades vitais (COLLIÉRE, 1999).
O cuidar sempre esteve presente nas diferentes dimensões do processo de viver,
36
adoecer e morrer. Independente do pouco, ou nenhum valor a ele atribuído, continuará
sendo essencial para a sobrevida das espécies (NEVES, 2002).
Com a ameaça da segurança, a cuidadora, papel em geral atribuído à mulher,
além de prover a atenção, o afeto e o conforto, cuida de desempenhar as demais
atividades que possibilitem o bem-estar, a restauração do corpo e da alma e a
dignidade (WALDOW, 2001).
Na história da Enfermagem, antes mesmo de ela ser considerada uma profissão,
é possível identificar ações direcionadas para a manutenção da vida. Apesar de não ter-
se aprofundado no conceito de cuidar, é indiscutível a contribuição de Florence na
definição do papel do enfermeiro no cuidado com a promoção da saúde das pessoas. O
desenvolvimento teórico do cuidado em Enfermagem iniciou na década de 50, com
Madeleine Leininger, quando passou a defender que o cuidado é uma necessidade
humana essencial.- é a essência da Enfermagem, como um modo de alcançar a saúde e
a sobrevida das culturas e da civilização -, liderando um grupo de estudiosas nos
Estados Unidos, na discussão sobre as dimensões filosóficas, teóricas e
epistemológicas do cuidar. Esse trabalho resultou na realização, em 1978, da I
Conferência Nacional de Pesquisa sobre o Cuidado Humano, a qual passou a se repetir
anualmente (NEVES, 2002).
Se todo o ser humano tem uma necessidade natural de se sentir cuidado e
confortado, essa realidade é ainda mais intensa no puerpério de alto-risco. Embora não
seja expressa verbalmente na maioria das situações, observa-se, na prática, essa
necessidade expressa no semblante ou demonstrada nas atitudes das mulheres
puérperas.
Collière (1999) trata da natureza dos cuidados ligados às funções vitais,
divididos em cuidados quotidianos, habituais e cuidados de reparação, o que também
está expresso nos escritos de Florence.
Cuidados quotidianos e habituais Estão ligados às funções de manutenção,
de continuidade da vida. Não tem outra função, além de sustentar a vida,
reabastecendo energia, seja de natureza alimentar a necessidade de água, calor, luz ,
ou de natureza afetiva, psico-social, entre outros aspectos que interferem entre si e se
fundamentam em hábitos, costumes e crenças. Constituindo-se a vida de um grupo,
37
nasce um ritual, uma cultura, que determina o que se considera bom ou mau para
manter a vida (COLLIÈRE, 1999).
Cuidados de reparação Estão associados à necessidade de reparar o que
constitui obstáculo à vida, como a fome, a doença, o acidente, a guerra; os cuidados de
reparação têm como fim limitar a doença, lutar contra ela e atacar suas causas
(COLLIÈRE, 1999)
Ainda, segundo Collière (1999), devido à ruptura entre o corpo e o espírito,
entre o homem e o meio, a multiplicação das técnicas de investigação e de reparação
centradas na doença, abandonaram-se os questionamentos sobre a maneira de viver, as
condições de vida, o desejo de existir. O estudo dos cuidados de reparação faz-se
isolando cada vez mais o indivíduo de seu ambiente. O mesmo autor ressalta que,
“sem o acompanhamento dos cuidados habituais com seu suporte relacional, assiste-se
à estabilização ou agravamento do processo de degenerência: a vida retira-se cada vez
que a preocupação com o que morre é maior do que a preocupação com o que vive”
(p. 238).
A reflexão sobre esses pensamentos de Collière, com respeito às necessidades
de cuidado no puerpério de alto-risco, resultam noutra reflexão: a dimensão do
cuidado prestado. Com a profunda preocupação com o biológico afetado, ou seja,
preocupando-se mais com o que pode morrer do que com o que mantém a vida,
perdemos o sentido de assegurar a continuidade da vida e a sua razão de existir,
criando um “abismo” na prática do cuidado de Enfermagem.
O cuidado, visto como a essência da Enfermagem, vem seguindo diferentes
trajetórias. Há quem veja o cuidado estabelecendo uma ponte de interesse no tocar; há
os que imaginam a utilização das teorias, materializada nos marcos que se impõe na
prática profissional; outros acreditam que os caminhos do cuidado residem no interior
dos seres, sendo que a esperança, o amor, a responsabilidade, o respeito e
conhecimento se adaptam na relação de quem cuida e de quem é cuidado (BAUER,
PINHEIRO, 1998) -.
As colocações aqui registradas, que vão ao encontro dos escritos de Florence,
conduzem à reflexão sobre as amplas dimensões do cuidar a mulher no puerpério de
alto-risco, levando-se em conta que, freqüentemente, situações em que essa mulher
38
demonstra sensibilidade e necessidade, aos olhos dos profissionais em saúde, são
percebidas apenas como desconfortos ou algo insignificante.
Ao se tomar o desconforto como um fator que provoca o dispêndio de energia, é
necessário que se pense em “conforto”; confortar com o significado de motivar,
fortalecer e conforto como efeito desejado após receber os cuidados. Segundo Boykin
(1998), a experiência do conforto é vivenciada em relações fundamentadas no respeito
pela pessoa, estando a enfermeira
4
interessada em ouvir as histórias, reconhecendo-as
como essenciais à totalidade da pessoa, utilizando múltiplas formas de percepção
como pessoas - empírica, intuitiva, ética e espiritual -, para criar o artístico do
momento, pondo em evidência a promoção do conforto.
Essa promoção do conforto, através do cuidado, já amplamente detalhada por
Florence (1859), com atenção às roupas de cama macias, cheirosas, limpas, ao ar puro,
à iluminação adequada, à eliminação de ruídos desnecessários, faz pensar sobre a real
importância que se dá a isso, muitas vezes entendido como cuidados de pouco ou
menor valor, frente aos cuidados técnicos, amplamente complexos, atualmente
realizados.
Pela instabilidade que o puerpério de alto-risco provoca na mulher, tanto em seu
ambiente interno como externo, cuidar e confortar se faz necessário, para o menor
dispêndio de energia vital e restauração da saúde.
3.2 Modelo de Cuidado de Carraro
Este modelo, desenvolvido por Carraro em 1994, por ocasião da sua
Dissertação de Mestrado em Assistência de Enfermagem no Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e
utilizado para implementar, desenvolver e direcionar sua prática junto ao paciente
cirúrgico e sua família, foi intitulado “A Trajetória da Enfermagem junto ao Ser
humano e sua Família na Prevenção de Infecções”.
4
Enfermeira, neste estudo, refere-se tanto ao gênero masculino quanto feminino.
39
O modelo de Cuidado de Carraro, definido como um processo dinâmico, aberto
e contínuo, foi desenvolvido por Telma Elisa Carraro como metodologia da assistência
ao paciente cirúrgico, sua família e atuação junto às equipes de saúde das Unidades de
Internação Cirúrgica, Centro Cirúrgico e ainda do Controle de Infecção, sendo agora
adaptado para este estudo.
Segundo Carraro (1994), a utilização do modelo proporciona estar com o ser
humano e sua família, englobando o cuidado direto, o diálogo, bem como o
planejamento e o desenvolvimento de ações no decorrer da trajetória. A articulação
com os membros da equipe, procurando desenvolver essa proposta de acordo com os
interesses e necessidades do cliente, sua família e as unidades afins, ocorre em todas as
etapas deste Modelo de Cuidado.
Conforme seus escritos, Florence não utilizava terminologia para definir o
método assistencial. Seu modelo retrata a metodologia empírica, fundamentada na
lógica, valorizando práticas como observação, experiências e o registro de dados,
fundamentais para o planejamento das ações, para desenvolvimento de uma
metodologia de trabalho que acentue a possibilidade de resolução (CARRARO,
MADUREIRA E RADÜNZ, 1999)
O Modelo de Cuidado de Carraro compreende várias etapas articuladas entre si,
que se complementam e que ocorrem simultaneamente ou não. Essas etapas,
representadas na figura nº 1, são as seguintes: Conhecendo-nos, Reconhecendo a
Situação, Desenhando o Trajeto e Selecionando Estratégias, Seguindo e Agindo e
Acompanhando a Trajetória.
As etapas do modelo original são apresentadas na figura a seguir:
40
1 - CONHECENDO-NOS:
- Conhecer o ser humano, sua família
e a situação por eles vivenciada;
- Deixando-me conhecer.
2 - RECONHECENDO A
SITUAÇÃO:
- Reconhecendo os riscos de
infecção hospitalar;
- Identificado os recursos
disponíveis;
- Percebendo a reação do
poder vital.
4 - SEGUINDO E
AGINDO:
- Seguindo com o ser
humano e sua família pelo
trajeto desenhado;
- Implementando as
estratégias selecionadas.
3 - DESENHANDO O TRAJETO E SELECIONANDO
AS ESTRATÉGIAS:
- Desenhando o trajeto a ser percorrido com base no que
foi reconhecido;
- Selecionar estratégias para as ações da enfermagem, do
ser humano e da sua família, de acordo com o trajeto
desenhado.
5 - ACOMPANHANDO A
CAMINHADA:
- Apreciando as etapas da trajetória;
- Observando o decorrer da trajetória e
comparando-o com as observações
prévias;
- Estimando a implementação das
estratégias;
- Retroalimentando a trajetória.
2 - RECONHECENDO A
SITUAÇÃO:
- Reconhecendo os riscos de
infecção hospitalar;
- Identificado os recursos
disponíveis;
- Percebendo a reação do
poder vital.
4 - SEGUINDO E
AGINDO:
- Seguindo com o ser
humano e sua família pelo
trajeto desenhado;
- Implementando as
estratégias selecionadas.
3 - DESENHANDO O TRAJETO E SELECIONANDO
AS ESTRATÉGIAS:
- Desenhando o trajeto a ser percorrido com base no que
foi reconhecido;
- Selecionar estratégias para as ações da enfermagem, do
ser humano e da sua família, de acordo com o trajeto
desenhado.
5 - ACOMPANHANDO A
CAMINHADA:
- Apreciando as etapas da trajetória;
- Observando o decorrer da trajetória e
comparando-o com as observações
prévias;
- Estimando a implementação das
estratégias;
- Retroalimentando a trajetória.
1 - CONHECENDO-NOS:
- Conhecer o ser humano, sua família
e a situação por eles vivenciada;
- Deixando-me conhecer.
Figura 1: Modelo de Cuidado de Carraro (CARRARO, 1994)
A seguir, apresenta-se o diagrama adaptado para este estudo:
41
1 - CONHECENDO-NOS:
-Conhecer a mulher e a situação de
puerpério vivenciado;
-Deixando-se conhecer.
2-RECONHECENDO A
SITUAÇÃO:
-Reconhecendo a adaptação
ao puerpério e as situações de
risco;
-Reconhecendo as situações
de educação em saúde;
-Percebendo a reação do
poder vital.
5 - ACOMPANHANDO A
TRAJETÓRIA:
-Apreciando cada etapa,
p
roporciona subsídios para a
seqüência do caminho;
-Observação e comparação de
informações;
-Retroalimentando o trajeto,
introduzindo inovações para ampliar
o cuidado.
4 - SEGUINDO E
AGINDO:
-Seguindo com a mulher
pelo trajeto desenhado;
-Implementando as
estratégias selecionadas.
3-DESENHANDO O TRAJETO E
SELECIONANDO ESTRATÉGIAS:
Desenhando o trajeto a ser percorrido com base
no que foi reconhecido junto a mulher puérpera;
Selecionar as estratégias de ação da enfermeira e
mulher puérpara de acordo com o trajeto
desenhado.
Figura 2: Modelo de Cuidado de Carraro, adaptado por Kunzler para este estudo
A seguir é apresentada cada etapa do Modelo de Cuidado de Carraro, conforme
sua adaptação para este estudo.
Conhecendo-nos
Nesta etapa, procurei conhecer a mulher dentro de seu contexto de vida, a
situação de puerpério de alto risco por ela vivenciada e suas necessidades de cuidado.
Para tal, foram utilizadas algumas questões norteadoras, tais como: Quem é esta
mulher? Qual a sua expectativa nesse momento? Além de conhecer a mulher e de as
mulheres se conheceram entre si, também me fiz conhecer, falando um pouco sobre a
42
trajetória profissional, o que estava fazendo, como pretendia atuar, e também falando
um pouco de mim e sobre o meu modo de pensar o cuidado, criando, assim, um
ambiente de interação. Segundo Florence (1859), é preciso conhecer para buscar
subsídios para melhorar a saúde.
Reconhecendo a situação
Nesta etapa, busquei reconhecer a adaptação da mulher ao puerpério e as
situações de risco, estando atenta à situação de transição de mulher gestante para
puérpera de alto risco, inclusive frente às modificações que essa transição desencadeia.
Este é o momento de estar atenta e refletir sobre as situações de educação em saúde,
valorizando o conhecimento que cada mulher possui e, partindo desse saber, trajetar
5
com o grupo. Nesta etapa, também busquei perceber a reação do poder vital, com
atenção à maneira como cada mulher estava vivenciando o puerpério de alto-risco.
O poder vital, citado por Florence(1859), é conceituado por Carraro(1994)
como força interior direcionada para a vida.
Desenhando o trajeto e selecionando estratégias
Aqui foi desenhado o trajeto a ser percorrido, com base no que foi reconhecido
junto à mulher puérpera. O trajeto, ou a programação, foi desenhado com as mulheres
puérperas, ou proposto por mim (enfermeira), e, posteriormente, complementada pelo
grupo de mulheres. Em alguns momentos, o trajeto foi desenhado junto com a mulher
(uma por vez), tendo também a participação da família, por se referir a uma situação
muito particular e não compartilhada com as outras mulheres.
Quando Florence, em seu livro “Notes on nursing” trata do controle de
atividades menores, discorre sobre a impossibilidade da presença permanente do
enfermeiro ao lado do enfermo, afirmando que o este pode ser cuidado na presença ou
ausência daquele, com igual eficiência. Para tal, no contexto da mulher puérpera,
torna-se imprescindível o envolvimento da família, para que, conhecendo suas
necessidades, possa atuar, juntamente com essa mulher, na satisfação de suas
5
Trajetar: Trata-se de um neologismo. Derivado do substantivo trajetória ( passagem em latim), assume o
significado de estar caminhando com e conduzir-se por (CARRARO, 2001 p. 23)
43
necessidades de cuidado e conforto para, desse modo, auxiliar na restauração e
manutenção da saúde. Carraro (2001) também nos fala da importância da presença da
família na recuperação da saúde, sendo esta incluída, juntamente com a mulher, como
atuantes no cuidado.
O número de encontros referentes a esta pesquisa foi definido, conforme as
necessidades das mulheres puérperas, ocorrendo, além de encontros em grupo,
também encontros individuais e a visita domiciliar, após a alta do bebê, quando
solicitado pela mulher.
As estratégias do cuidado dessas mulheres puérperas de alto-risco foram
selecionadas por mim e por cada mulher, de acordo com o trajeto desenhado,
contando-se com a participação da enfermeira da Unidade que contribuiu com seu
conhecimento e cuja participação foi importante, no sentido de sensibilizar a equipe
assistencial frente às estratégias selecionadas e aproveitando-se as possibilidades
relacionadas à realidade da instituição onde foi realizado o estudo.
Seguindo e Agindo
Trilhando com as mulheres o caminho desenhado, foram implementadas as
estratégias selecionadas. As ações foram desenvolvidas por mim, pela enfermeira, pela
equipe de enfermagem da Unidade, pela família e pelas mulheres-puérperas
integrantes do grupo, de acordo com a competência de cada um.
Acompanhando a trajetória
Neste ínterim, foi apreciada cada etapa, o que proporcionou subsídios para a
seqüência da trajetória. A observação e a comparação de informações foram
direcionadas para a avaliação do processo educativo, da escolha das estratégias e de
sua implantação.
Houve aqui a retroalimentação da trajetória, tendo-se procurado introduzir
inovações, embasadas nas avaliações realizadas, para, então, poder-se ampliar o
cuidado.
44
3.3 Marco Conceitual
Marco Conceitual caracteriza-se como uma construção mental que deve
comportar uma estrutura lógica de inter-relação entre vários conceitos que o
compõe. Serve para direcionar ou guiar o cuidado de enfermagem
(MONTICELLI, 1997)
Apresentam-se, a seguir, os pressupostos e conceitos deste estudo, para os quais
busquei sustentação nos escritos de Florence Nightingale e de Carraro:
3.3.1 Pressupostos
Algo que se toma previamente estabelecido com base ou ponto de partida para
um raciocínio ou argumento (JAPIASSU &MARCONDES)
1. A mulher, como um ser humano indivisível, dotada de conhecimento
próprio, vivencia o puerpério de alto-risco de modo individual,
relacionado a suas crenças, valores e ambiente;
2. A Enfermagem deve utilizar a arte e a ciência para potencializar o poder
vital da mulher puérpera, canalizando-o para um viver saudável;
3. A vivência do puerpério de alto-risco desequilibra o ambiente interno,
enfraquecendo o poder vital da mulher;
4. A atuação da equipe de enfermagem, junto à mulher puérpera, necessita
estar fundamentada em ações de cuidado e conforto, bem como em co-
nhecimento técnico-científico voltado para as necessidades individuais;
5. A mulher que vivencia o puerpério de alto-risco necessita ser cuidada e
confortada.
45
3.3.2 Conceitos
Conceitos são abstrações ou imagens de objetos, propriedades ou eventos que
simbolizam a realidade...Um conceito pode ter diferentes significados
(TRENTINI, 1987, p. 136).
Mulher puérpera
De acordo com Carraro (1994), o ser humano interage com o meio ambiente,
onde são expressas crenças e valores que permeiam suas ações. As mulheres puérperas
são seres humanos diferentes entre si e necessitam ser vistas como um ser indivisível e
que possui, segundo Florence (1989), uma “capacidade vital”, aqui chamada de “poder
vital”, usado para vivenciar o processo saúde-doença.
Nesse contexto, o “poder vital” é conceituado como força interior, direcionada
para a vida saudável.
Neste estudo, entendo a mulher puérpera como um ser capaz, dotado de
percepção e conhecimento próprio, integral, indivisível, insubstituível, inserida em um
contexto social. A mulher puérpera de alto risco traz as alterações fisiopatológicas da
gestação de alto risco, que exigem cuidados diferenciados, acrescido do estresse
momentâneo, permeado de sentimentos de culpa, por não ter conseguido levar a
gestação com segurança e/ou a termo; de cansaço e dor, pelo parto ou cesariana; tendo
sensação de impotência, por não poder cuidar e amamentar o seu bebê; sentindo
preocupação e medo em relação às condições do bebê. Por tudo isto, às vezes, a
mulher esquece de si mesma, das suas necessidades de ser cuidada. Por outro lado,
vivencia também a emoção e a satisfação pela maternidade, sentindo-se aliviada pelo
término da condição de gestação de alto-risco, bem como necessitando e querendo ser
cuidada e confortada.
Enfermagem
Profissão que articula ciência e arte. Ciência, porque utiliza metodologia
própria, baseada em conhecimentos organizados e validados. Arte, por usar os recursos
46
disponíveis e criados, para aplicar a ciência a sua prática, que canaliza para a
potencialização da capacidade (poder) vital. Segundo Carraro (1994), enquanto
profissão integrante da equipe multiprofissional, que atua junto à mulher no tempo do
puerpério, necessita estar apoiada em conhecimentos amplos, no sentido identificar os
riscos a que a mulher puérpera está exposta.
Nesse contexto, o enfermeiro é um ser humano, com formação universitária,
que possui direitos e deveres diante da lei e da ética e que mantém, na sua essência, a
sensibilidade para a percepção integral do outro, reconhecendo suas necessidades
emocionais, físicas, clínicas, bem como habilidades e domínio técnico-científico, de
modo a canalizar o poder vital para um viver saudável. Para tal, ele utiliza estratégias
de cuidado e conforto, para prevenção de doenças, manutenção, recuperação e
promoção da saúde, além, de utilizar também estratégias de educação em saúde.
Meio Ambiente
É o contexto que permeia e afeta a vida do ser humano e sua família. Envolve
condições e influências internas e externas e apresenta infinita diversidade
(CARRARO, 1994)
Este estudo abrange o ambiente externo e interno. O externo caracteriza-se pelo
ambiente hospitalar (físico), com as suas particularidades, como ruídos, cheiros,
pessoas, procedimentos, envolvendo, enfim, todo o contexto hospitalar, o contexto
familiar e social. O ambiente interno da mulher puérpera, por sua vez, caracteriza-se
pelas suas crenças, valores, medos, expectativas, ou seja, pela bagagem de vida
modificada pela condição de estar vivenciando o puerpério, após uma gestação de alto
risco.
O ambiente externo, de acordo com Florence (1989), deve assegurar a higiene,
através dos cinco pontos essenciais - ar puro, água pura, rede de esgoto eficiente,
limpeza e iluminação - e o ambiente interno necessita manter o equilíbrio necessário
para a potencialização do poder vital.
Puerpério de Alto Risco
O puerpério é um período, sem definição exata de tempo, que se inicia com o
nascimento do bebê, a partir do qual ocorrem as adaptações entre o esperado, o
47
sonhado e o concreto, permeado por uma labilidade emocional, em que a mulher
vivencia a transição de mulher gestante a mulher puérpera.
O puerpério é um tempo de riscos, período em que se deve estar alerta,
especialmente nos primeiros dias, às reações da mulher, propiciando-lhe melhores
condições para que o seu poder vital possa ser potencializado, para um viver saudável
(CARRARO, 1999).
Esse é também considerado um período de alterações fisiológicas, que, segundo
Freitas (2002), corresponde ao espaço de tempo de seis semanas, que se inicia após o
parto normal ou cesariana e a expulsão da placenta. Nesse período, ocorre o retorno
dos órgãos reprodutores e a readaptação do organismo, alterado pela gestação e pelo
parto, à situação pré-gravídica.
O puerpério de alto-risco corresponde ao puerpério influenciado pela patologia
da gestação, com todas as suas implicações e também pelas situações que colocam a
vida da mulher em risco. É um tempo carregado de sentimentos, inclusive o de culpa
(da mãe) por não ter conseguido levar a gestação com segurança e/ou a termo; de
cansaço e dor, devido ao parto ou cesariana; de sensação de impotência, pelo fato de a
mão não poder cuidar e amamentar o seu bebê; de preocupação e medo, em relação às
condições do bebê.
É tido ainda como um período de emoção e satisfação, pela maternidade e
sensação de alívio, pelo término da condição de “gestação de alto risco”. Por tudo isto,
a mulher, muitas vezes, esquece de si mesma e de suas necessidades de ser cuidada e
confortada, fato este que pode interferir na sua capacidade de restaurar o seu poder
vital.
Cuidado
O cuidar de pessoas deve estar fundamentado no conhecimento e no calor
humano (Florence, 1989) O cuidado à saúde é uma atitude frente à vida, atitude esta
que vem acompanhando a humanidade, configurando-se de modo distinto em diversas
épocas e culturas (CARRARO, 1998).
No presente estudo, o cuidado se caracteriza por uma atitude de atenção integral
à mulher que vivencia o puerpério de alto risco, permeado por estratégias e ações de
48
conforto e educação em saúde, tendo como objetivo ampará-la e apoiá-la, no sentido
de despertá-la para o cuidar de si, a fim de fortalecer suas energias para um viver mais
saudável.
4 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
A presente pesquisa caracteriza-se por uma abordagem qualitativa, do tipo
convergente assistencial, cujos sujeitos foram mulheres que vivenciaram uma gestação
de alto risco.
Víctora (2000) refere que o método qualitativo é útil para quem busca entender
o contexto em que algum fenômeno ocorre, permitindo a observação de vários
elementos simultaneamente em um pequeno grupo, possibilitando um conhecimento
aprofundado de um evento. Uma das implicações de um estudo qualitativo é o número
reduzido da amostra, não sendo possível fazer generalizações.
A pesquisa convergente assistencial sempre requer participação ativa dos
sujeitos de pesquisa, estando orientada para resolução ou minimização de problemas
na prática, ou para a realização de mudanças, ou, ainda introdução de inovações. A
pesquisa convergente é compreendida e realizada em articulação com as ações que
envolvem pesquisadores e demais pessoas representativas da situação a ser pesquisada,
numa relação de cooperação mútua” (TRENTINI E PAIM, 2004 p. 24)
Os profissionais de saúde atuam no fazer assistencial, que exige reflexão, para
discernir e decidir a aplicação do conhecimento, que não deve ser confundido com
execução de tarefas. Para realizar o cuidado das pessoas, os profissionais necessitam
obter informações sobre o cliente a ser cuidado. O tipo de informação a ser obtida e o
seu registro visa à adequação da assistência, para uma situação específica e imediata,
obedecendo às necessidades manifestadas pelo cliente, centralizando as atividades na
implementação sistematizada do processo de cuidar (TRENTINI E PAIM, 2004).
4.1 Local e sujeitos
O estudo foi desenvolvido em um hospital privado, no interior do Rio Grande
50
do Sul. Essa instituição está se instrumentalizando, para tornar-se referência no
atendimento da gestação e puerpério de alto risco. É um hospital de pequeno porte,
cuja área materno-infantil é composta por um Centro Obstétrico, Unidade de
Internação Obstétrica e Alojamento Conjunto, além do Centro de Terapia Intensiva
Neonatal (CTINeo). Como recursos humanos, conta com enfermeira em todos os
turnos, médicos plantonistas, equipe de técnicos de enfermagem, nutricionista e
serviços de apoio para diagnóstico.
Os sujeitos da pesquisa foram mulheres que estavam vivenciando um puerpério
de alto-risco e cujos bebês permaneciam internados no Centro de Terapia Intensiva
Neonatal (CTINeo). Segundo Wall (2001), tais mulheres formam um grupo de seres
singulares, cada qual com sua história de vida, experiências e conhecimentos, os quais
são valorizados e potencializados mutuamente.
Para a seleção dos sujeitos, buscou-se, nos dados dos histórico dos bebês que
estavam internados, as mães que haviam vivenciado uma gestação de alto risco.
Dos oito bebês que estavam internados na Unidade, apenas cinco – dos quais
duas meninas gêmeas – tinham nascido de mães que apresentaram gestação de alto
risco. Sendo assim, apenas quatro mulheres se enquadravam nos meus critérios de
inclusão. Munida dos nomes, fui buscar dados sobre a história da gestação nos
prontuários das mulheres, ainda internadas, e resgatar os prontuários daquelas que já
haviam tido alta hospitalar. A partir da lista de nomes e de um resumo da história da
gestação de alto-risco, fui até a CTINeo, para contatar as mulheres que estavam
acompanhando seus bebês.
Todas as mulheres que estavam com os bebês internados na CTINeo e que
tinham vivenciado uma gestação de alto risco, foram convidadas a participar do
grupo, sendo que todas as que estavam de acordo com os critérios de inclusão,
aceitaram participar da pesquisa.
Tanto os encontros em grupo, como os individuais foram realizados dentro da
própria instituição, em locais previamente definidos com a participação das mulheres,
sendo que a freqüência dos encontros e o horário dos mesmos eram definidos pelas
participantes a cada encontro.
51
4.2 Coleta de dados
Para a coleta de dados, foi utilizado o Modelo de Cuidado de Carraro (2001),
adaptado para este estudo e do qual emergiram os dados desta pesquisa. A aplicação
do Modelo de Cuidado de Carraro propiciou o cuidar e pesquisar simultaneamente, ou
seja, o desenvolvimento da pesquisa convergente assistencial.
O modelo de Cuidado de Carraro foi utilizado através da tecnologia de grupos
que, segundo Wall (2001), proporciona a sensibilização para aprender a conhecer, a
fazer, a ser, a viver juntos, com a finalidade de impulsionar a mulher para um viver
mais saudável, potencializando seu poder vital. Além de grupos, houve encontros
individuais com duas mulheres e também com familiares. Foram ainda realizadas
visitas domiciliares, após a alta do bebê.
Mesmo que a proposta original do estudo tenha sido a realização de grupos,
houve necessidade de adaptação para a realidade, considerando-se a individualidade
das mulheres, ou seja, sempre que eu entrava na Unidade e uma ou mais mulheres
estavam presentes, estas mostravam vontade de conversar. Como existia entre nós
maior intimidade, observei que elas se dirigiam a mim para esclarecer algumas
dúvidas, ou, ainda, devido à necessidade de dividir com alguém suas ansiedades,
buscando apoio, cuidado e conforto. Sendo assim, a coleta de dados foi realizada a
partir dos encontros programados em grupo e ocasionais com uma, duas ou três
mulheres.
Os registros dos dados foram realizados durante os encontros, em forma de
diário de campo, utilizando-se a planilha com os cinco passos do Modelo de Cuidado
de Carraro (Apêndice 1). Para tal, pude contar com o auxílio da enfermeira da Unidade
Neonatal, que foi minha companheira em alguns encontros, participando desse
processo de reflexão sobre a prática do cuidado.
Na pesquisa convergente-assistencial, as observações e entrevistas informais
são registradas sob a forma de palavras-chave e, assim que possível, o pesquisador
escreve os detalhes das observações e falas dos participantes; para isto, deve observar
um período de tempo que possibilite manter, na memória, as informações importantes.
52
4.3 Questões éticas
Quanto aos cuidados éticos, para este estudo, foi solicitada autorização à
instituição (Apêndice 2), sendo o texto apreciado e autorizado formalmente pela
instituição onde foi feita a coleta dos dados, e aprovado pelo Comitê de Ética da
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Conforme resolução 196/96 do
Conselho Nacional de Saúde, as mulheres foram informadas sobre os objetivos e a
metodologia do trabalho, assinando, a seguir, o Termo de Consentimento Livre
Esclarecido (Apêndice 3).
4.4 Análise de dados
Na pesquisa convergente-assistencial, os processos de coleta e análise de dados
deverão ocorrer simultaneamente, facilitando a imersão do pesquisador nos relatos,
refletindo, interpretando e descobrindo os vazios que poderão ser preenchidos, ao
longo do processo.
Segundo Trentini e Paim (2004, p. 92),
Na pesquisa convergente-assistencial, entende-se que a situação em estudo não
se mantém estável durante o período de estudo; neste caso, o pesquisador
intervém, a pesquisa por si intervém; assim, esse tipo de pesquisa sempre
envolve ações de Assistência, mesmo que o enfoque seja de entender ou
descrever algum aspecto da experiência do paciente.
Assim como qualquer outra pesquisa qualitativa, Trentini e Paim (2004)
apontam que a análise de informações consta de quatro processos genéricos:
Apreensão, Síntese, Teorização e Transferência, conforme a descrição a seguir.
A apreensão inicia com a coleta de informações, cujos relatos devem ser
organizados. Neste estudo, foram empregadas expressões-chave, denominadas na
planilha de registros de “relato da mulher”.
53
A síntese consiste em analisar subjetivamente as associações e variação das
informações.
A teorização envolve o desenvolvimento de um esquema teórico a partir das
relações reconhecidas durante o processo de síntese, descobrindo os valores contidos
nas informações, originando pressupostos e novos conceitos.
A transferência de resultados pressupõe a possibilidade de dar significado a
determinados achados e procurar contextualizá-los em situações similares, sem que
haja generalização desse processo.
Tais processos de análise foram sistematizados a partir dos eixos temáticos
surgidos com a utilização do Modelo de Cuidado de Carraro.
5 APRESENTANDO AS TRAJETÓRIAS COM AS MULHERES
PUÉRPERAS
A partir da seleção das mulheres que estavam vivenciando o puerpério de alto-
risco, conforme salientado anteriormente, passei a realizar o contato com as mesmas
mulheres, para formar os grupos e trajetar com elas.
5.1 O início da trajetória Formando os grupos
Inicialmente, realizei contato com duas (2) mulheres que estavam com os bebês
na CTINeo e que vivenciaram uma gestação de alto risco. Enquanto estávamos
conversando em uma sala da Unidade, chegou outra mulher, que veio ver o seu bebê e
a quem eu havia acompanhado na primeira visita à CTINeo, no dia anterior. Depois
que ela viu e acariciou o seu bebê, permaneceu sentada perto deste, para participar da
nossa conversa. Expliquei rapidamente a minha idéia de prática e a convidei a
participar do grupo. Todas aceitaram. Destas três mulheres, duas já haviam tido alta
hospitalar e a outra ainda estava internada. Marcamos um encontro, levando em
consideração a facilidade de seus horários.
Deixei para realizar o contato com a quarta mulher selecionada para participar
do grupo no dia seguinte, pois esta, ainda internada, estava dormindo, quando fui
visitá-la. No outro dia, conversei com a mulher, enquanto ela estava visitando as filhas
(gêmeas) na CTINeo. Apresentei-me e fiz um breve relato da minha proposta para,
logo a seguir, convidá-la a participar do grupo, e ela confirmou sua participação.
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5.2 Trajetando com as mulheres
No dia agendado para o encontro, no auditório da instituição, preparei o
ambiente com antecedência, utilizando poltronas confortáveis, dispostas em círculo,
deixando o ambiente arejado e com temperatura agradável; havia trazido chá e biscoito
integral; por fim, coloquei, como fundo, uma música suave. Aguardei a chegada das
mulheres. As duas primeiras chegaram juntas; em seguida, chegaram as outras duas,
separadamente. À medida que chegavam ao auditório, sentavam-se e conversavam
entre si e também comigo. Dispensei a apresentação dos nomes, pois todas já se
conheciam, da CTINeo.
Ao observá-las, percebi um ar de companheirismo entre três das mulheres. A
outra se manteve em silêncio, limitando-se apenas a responder as perguntas. Agradeci
a presença de todas e iniciei o encontro, falando um pouco das minhas atividades
profissionais e do trabalho a ser realizado. Expliquei que o mesmo era uma prática do
cuidado para com elas, salientei os objetivos e como o trabalho seria desenvolvido.
Deixei claro também que, a partir da concordância delas, os relatos seriam utilizados
para o trabalho acadêmico do mestrado. Falei do cuidado ético e entreguei para cada
uma o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (apêndice 2). Li o Termo em voz
alta, expliquei sobre o seu conteúdo e me coloquei à disposição para mais
esclarecimentos. Todas concordaram, assinando o documento.
Surgiram entre elas os comentários sobre a proposta do grupo, momento em que
três delas se manifestaram, muito satisfeitas com a iniciativa, e uma falou: “Que bom
que alguém está se preocupando conosco”. Uma das mulheres não se manifestou,
permanecendo o tempo todo em silêncio.
Após a explanação do trabalho, propus uma dinâmica, para confirmar a
manutenção do anonimato. Partimos para o primeiro passo da metodologia:
Conhecendo-nos. Observei que este passo da metodologia não ocorria em um único
momento, pois, em cada encontro sendo os mesmos em grupo ou individuais ,
precisaria retornar a este passo, para melhor reconhecer as situações vivenciadas por
cada mulher no puerpério de alto risco.
Para esse primeiro momento em grupo, entreguei a todas papel e caneta
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hidrocor, e solicitei que desenhassem uma flor e que relacionassem a mesma com o
momento que estavam vivendo. Comuniquei ainda que, nos meus relatos, elas seriam
citadas com o nome da flor que escolhessem. Esclareci que a idéia de escolher flores
se devia ao fato de eu gostar muito de flores e de adorar cultivá-las.
Após cada uma ter desenhado a flor, iniciei a fala, contando um pouco de mim,
da minha trajetória na obstetrícia, da minha família, número de filhos, idade, e solicitei
que todas fizessem o mesmo, ressaltando também o que conheciam sobre sua condição
de risco obstétrico. Cada uma delas falou um pouco sobre a relação da flor escolhida
com o período que estava vivendo e como estava se sentindo no momento. As flores
escolhidas foram Jasmim, Rosa, Violeta e Margarida.
Relataram gostar do encontro em forma de grupo, pois, no momento que
alguma dúvida surgisse, ela seria esclarecida, ou, então, seria sugerida pelo grupo uma
maneira de lidar com a situação. Jasmin não se manifestou, apenas prestou atenção.
Tentei integrá-la ao grupo, porém tive dificuldades nisso.
A seguir, apresentei as mulheres da pesquisa.
Violeta Era técnica em enfermagem, casada há 9 anos, tinha um filho de 7
anos que não aceitava o mano. Com 28 semanas de gestação, fez apendicectomia
(apêndice roto). Relatou ter sentido muito medo da cirurgia e estar preocupada com os
efeitos da anestesia sobre o feto. Após a cirurgia, começou a apresentar trabalho de
parto prematuro, e foi sedada com medicação, devendo ficar em repouso. Realizando
os controles de rotina, foi observado, com 32 semanas de gestação, a diminuição do
fluxo placentário, quando o obstetra optou por realizar a cesariana. No dia do primeiro
encontro, estava no 10º dia pós-cesariana.
Era bastante extrovertida, ativa e falante. Como técnica de enfermagem,
apresentava um nível de conhecimento técnico diferenciado. Relatou sentir medo e
insegurança em relação às condições do bebê, sentindo-se muito cobrada pela família e
pouco amparada. Estava incomodada com a insistência da família sobre informações,
dizendo que essa busca era direcionada sempre a ela, mas poderia ser para o marido.
O filho não aceitava o mano, queria a companhia da mãe, e não estava mais
aceitando ir para a escola. O marido, para lidar com a situação, estava punindo o filho
com castigos, como não jogar vídeo game.
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Margarida Era secretária de uma empresa, casada, e tinha uma filha de 12
anos. Até a 20ª semana, a gestação evoluiu normalmente (conforme ecografia). Com
25 semanas, repetiu a ecografia e foi visualizada uma imagem na cabeça do feto que
ela denominou como “mancha escura”.. Fez eco repetidas vezes e, por fim, realizou
amniocentese. Após o exame, apresentou ruptura de membranas e trabalho de parto
prematuro, com sangramento importante, tendo sido realizada cesariana de urgência. O
bebê tinha face sindrômica, e estava sendo investigada possível síndrome. O dia do
encontro era o 7º dia pós-cesariana.
Referiu ser bastante introvertida, mas estava gostando da possibilidade de
participar do grupo e estava ansiosa por esclarecer muitas dúvidas. Sentiu-se
desamparada, nesse período, e disse não saber como trabalhar a situação. Relatou
sentir-se cobrada a deixar tudo pronto em casa, achava que eles (marido e filha) não
sabiam fazer as atividades domésticas da maneira que ela queria que fossem feitas.
Desconhecia o significado de puerpério e o que acontecia nesse período.
Não sabia das condições em que o bebê iria para casa, e disse que o marido não
acredita na recuperação do mesmo.
Rosa Professora de pré-escola, era casada, já tinha um filho de 5 anos.
Apresentou pré-eclâmpsia grave. Iniciou com hipertensão com 26 semanas, evoluindo
para edema cada vez mais acentuado e proteinúria elevada a cada exame. Relatou que,
na consulta com 28 semanas, internou para controle, permanecendo no hospital 24
horas, e, após o resultado de exames, o médico falou que “precisava fazer cesariana de
urgência, pelo risco de vida dela e do bebê”. Era o 4º dia pós-cesariana, ainda
apresentando edema acentuado, hipertensão, e, nesse período, percebendo retorno da
função renal, com aumento do volume de diurese. Referiu não ter pensado em si
própria, na sua segurança, e sim nas condições do bebê. Não recebeu muita informação
sobre o que estava acontecendo no pré-natal, apenas que era uma doença provocada
pela gravidez, sendo necessário a realização de exames e, possivelmente, cesariana
dentro dos dias ou horas subseqüentes.
Achava que, naquele momento, não era importante saber mais da patologia,
pois isto certamente a deixaria mais nervosa e preocupada. Dizia não ter tido tempo
para elaborar a situação da patologia, pois se preocupava muito com o bebê. Salientou
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o apoio recebido do marido, que se manteve tranqüilo e tomou conta da situação, fato
este que lhe trouxe bastante segurança. Demonstrou tranqüilidade quando falou.
Não tinha informações sobre a adaptação ao puerpério e sobre a condição de
risco. Em relação ao bebê, sentia medo e insegurança em tocá-lo e achava que as
técnicas sabiam cuidar bem e ela não. Gostaria de ver o bebê com mais freqüência
durante a noite. Estava preocupada em não conseguir produzir leite o suficiente para
alimentar o seu bebê.
Jasmin Exercia atividades “do lar”. Tinha 17 anos. Eram as primeiras filhas.
Vive com o pai do bebê, que tem 16 anos, na casa de familiares, numa cidade vizinha.
Relatou que vinha sentindo “dores na barriga” há alguns dias, mas que a cunhada dizia
ser normal. Havia feito apenas uma consulta de pré-natal e realizado os exames
solicitados.
A dor se intensificou num domingo, aumentando gradativamente e, na segunda
pela manhã, foi à unidade de saúde, onde foi avaliada e encaminhada ao hospital da
cidade em que mora. Disse não ter recebido informações sobre o caso, apenas que os
profissionais falaram entre si e ela não entendia o que diziam.
No hospital, fez ecografia, sendo então informada que era uma gestação
gemelar de 25 semanas, e que “os bebes estavam querendo nascer antes do tempo”.
Ficou internada para sedação do trabalho de parto prematuro.
Por se tratar de prematuridade e por não ter havido sucesso na tentativa de sedar
o trabalho de parto, foi transferida para essa instituição, por ser referência no alto
risco, sendo admitida em fase ativa de trabalho de parto, com 8 cm de dilatação. Os
bebês nasceram de parto normal, após 2 horas.
Essa mulher tinha o primeiro grau incompleto, e percebi que tinha muitas
duvidas, porém não se sentia à vontade para falar sobre elas. Referiu fraqueza, que
achava ser pela anemia. Ao ser questionada sobre a alimentação, disse “comer de
tudo”.
O esclarecimento sobre o trabalho, a leitura e assinatura do Termo e a
apresentação demoraram bastante. O encontro já durava1h e 30 min.
Observei cansaço de Rosa. Propus, então, que se estabelecesse a data e horário
do nosso próximo encontro, que foi marcado para a segunda-feira, às 13h e 30 min;.
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Preferiram não marcar os outros encontros, pois achavam mais fácil marcar
apenas o seguinte. Sugeri que se realizassem encontros individuais, ou em duplas, sem
que se agendassem os horários, poderia ser quando estivéssemos no hospital.
Após o encontro inicial, que foi o primeiro grupo, seguiu-se a trajetória de
cuidado com as mulheres como seres humanos, dentro da sua individualidade e
unicidade. Para tal, foram realizados encontros com o grupo, com três mulheres, duas
mulheres, individualmente e também com familiares. Para diferenciar os encontros em
grupo com as quatro mulheres e os encontros com apenas uma ou algumas das
mulheres do grupo, ou ainda com seus familiares, optei pela denominação de grupo
quando participassem as quatro mulheres e, de encontro, quando apenas uma ou
algumas das mulheres ou seus familiares participassem.
Apresentei, a seguir, a súmula dos encontros que se seguiriam, descritos na
seqüência como 2º, 3º e 4º grupo e 1º e 2º encontro, e, assim, sucessivamente.
Segundo Grupo
O grupo se reuniu na sala do auditório. Após os cumprimentos, apresentei a
enfermeira que atua na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal e Internação, que não
esteve presente no primeiro encontro, mas que ia me acompanhar nos grupos para
auxiliar nos registros e posterior discussão.
As mulheres estavam bem integradas, conversando sobre sua vivência do
puerpério, dificuldades, medos, alegrias. Senti-me parceira delas nessa caminhada.
Em algumas falas das mulheres, observei a necessidade de privacidade; mesmo que
elas tivessem dividido alguma coisa com o grupo, observei a necessidade de contatos
individuais. Ainda tinha dificuldades com a Jasmim; ela respondeu apenas o que lhe
era perguntado, mesmo assim, com reservas. Precisei retornar à primeira etapa do
Modelo de Cuidado “Conhecendo”, tentando me fazer conhecer mais. Marcou-se o
próximo grupo para sexta-feira, às 13h e 30 min, e, enquanto isto, aconteciam
encontros individuais ou com as mulheres que estavam na CTINeo.
Primeiro Encontro
Conversei individualmente com a Jasmim, dentro da CTINeo, enquanto ela
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estava sentada ao lado das filhas. Ela apenas as olhava, sem tocá-las. Tentei me
aproximar mais, senti que ela queria e precisava se sentir cuidada. Quanto tentei
abraçá-la, percebi que se retraiu. Comecei, então, a falar de assuntos diversos, sem
questionamentos; falei um pouco mais sobre minhas próprias dificuldades quando
meus filhos eram bebês, bem como sobre as dificuldades relatadas por outras mulheres
recém-mães. Observei que ela estava ficando mais à vontade; começou a conversar um
pouco mais, até sorriu. Senti que estava conseguindo me aproximar. Estava lutando
comigo mesma. Tinha tantas coisas para conversar com a Jasmim, queria cuidar dela,
mas eu precisava que ela permitisse que eu me aproximasse mais, que a conhecesse
mais a fim de cuidá-la.
Segundo Encontro
Conversei com Margarida e Rosa, enquanto elas estavam com os bebês dentro
da Unidade Neonatal. Elas permaneceram sentadas ao lado das incubadoras, enquanto
conversávamos. Nesse momento, preferi não priva-las de estarem com os bebês.
Percebi que, quando elas estavam no hospital, elas queriam ficar o tempo todo
próximo dos filhos. Respeitei essa opção e conversamos. Observei que o fato de
estarem perto de seus bebês não interferia na nossa conversa, estando elas à vontade.
Realizei o registro apenas dos tópicos abordados, para que eu pudesse prestar
mais atenção às falas das mulheres e seu semblante, o que também evidenciou o
cuidado, pois elas se sentiam ouvidas e valorizadas. Nesse contexto, desenvolver a
percepção de conhecer e reconhecer a necessidade de cuidado, que se evidenciou por
palavras, gestos e expressões, dariam subsídios para a ampliação do cuidado à mulher
no puerpério de alto risco.
Falaram da sua vivência do puerpério e suas dúvidas. Rosa questionou bastante
sobre a sua capacidade de produzir mais leite. Margarida demonstrava tristeza em não
poder amamentar. Procurei responder aos questionamentos e dúvidas, bem como
selecionei estratégias para conduzir situações vivenciadas.
Observei que as funcionárias da Unidade prestavam bastante atenção à nossa
conversa, e, como as mulheres estavam se sentindo tranqüilas em conversar, não
interferi naquele momento, pois percebi o quanto era importante para as colaboradoras
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da Unidade conhecerem as dúvidas e necessidades de cuidado daquelas mulheres.
Terceiro Encontro
Conversei individualmente com Jasmin. Quando a cumprimentei, ela permitiu
que a abraçasse, sorriu, e eu percebi que ela “abriu a porta” para que eu me
aproximasse mais um pouco. Ela disse não ter dúvidas, mas durante a conversa,
percebi que ela sequer sabia que dúvida poderia ter. Estava transitando por aquele
período de sua vida meio perdida, sem ter com quem dividir. Conseguimos falar um
pouco sobre a sua adaptação ao puerpério de alto risco. Ela não estava tocando nos
bebês, e, quando lhe perguntei se não queria acariciar as filhas, ela disse que não.
Identifiquei uma situação de crise. Conversei um pouco sobre o assunto, tentando
descobrir a causa de sua resistência, para trabalhar esta situação. Obtive sucesso, e
Jasmim começou a acariciar os bebês. A técnica de enfermagem que estava cuidando
das meninas permaneceu comigo, enquanto eu conversava. Percebi que, após
selecionarmos as estratégias, a funcionária mostrou-se bastante envolvida em auxiliar
Jasmim. Deixei Jasmim acariciando as filhas, ainda de forma muito tímida. Despedi-
me, reforçando o convite para o encontro com o grupo no dia seguinte, e ela confirmou
a presença.
Rosa foi para casa. Encontrei-a rapidamente na Unidade, depois de conversar
com Jasmim. Percebi que estava triste por ir embora sem a filha. Como estava com
pressa, relembrei do grupo no dia seguinte.
Terceiro Grupo
O grupo se reuniu no auditório, por ser mais confortável. Estavam presentes,
além de mim, a enfermeira, Jasmin, Margarida, Rosa e Violeta. Preparei o ambiente
com uma música suave e um lanche com sucos e biscoitos integrais para depois do
encontro.
Percebi que, nos encontros em grupo, elas conseguiam falar mais das suas
necessidades individuais e menos sobre o bebê. Margarida estava mais falante,
dividindo suas necessidades com o grupo. Violeta se encontrava feliz com a evolução
do bebê, porém com desconfortos relacionados ao puerpério, como dor e cansaço,
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demonstrando a necessidade de sentir-se mais amparada. Rosa estava mais tranqüila e
conseguiu expressar claramente suas necessidades. Jasmim ainda se mostrava
introvertida e parecia deslocada.
Conversou-se sobre o puerpério de alto risco, as modificações do corpo, a
adaptação de cada uma a vivência do puerpério, associado às ansiedades relacionadas
às condições do bebê. Observei algumas situações específicas, tais como: cada uma
das mulheres procurou esclarecer suas dúvidas e contribuir para a seleção de
estratégias, individuais e do grupo.
Falou-se sobre as visitas à CTINeo, sobre o horário, momentos em que não
podiam entrar. Além disso, elas receberam orientações. Foi muito importante a
participação da enfermeira, no sentido de selecionar as estratégias para essas situações.
Marcamos o próximo grupo para quarta feira, às 13h e 30 min..
Quarto Encontro
Conversei com o marido e a filha da Margarida. O encontro foi na sala de
espera do hospital. Apresentei-me, dizendo que era enfermeira. A filha de Margarida
já foi dizendo que a mãe tinha comentado a meu respeito. Busquei saber como eles
estavam se adaptando àquela fase de ausência da Margarida, já que esta vinha todos os
dias ao hospital, ficando longo tempo ausente de casa. Eles se mostraram perdidos,
sem saber o que era normal no puerpério, especialmente no puerpério de alto risco;
estavam perdidos em casa, pois era sempre a Margarida que tomava conta de tudo e,
repentinamente, eles se viram sozinhos, sem saber como agir ou o que esperar.
Conversou-se sobre o puerpério de alto-risco e como eles poderiam auxiliar e cuidar
da Margarida, naquele momento.
Quinto Encontro
Estava preocupada com Jasmim, que não veio ao hospital durante o final de
semana. Os bebês pioraram. Fui tentado contato telefônico, sem sucesso. Realizei
contato com a assistência social do município de origem, que se comprometeu em
tentar localizá-la, a partir do endereço fornecido.
Conversei com Violeta e Margarida. Violeta estava feliz com a evolução do
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bebê, mas muito preocupada com o ambiente doméstico. Observei que ela estava
cansada. Ela relatou que estava dormindo pouco e sentindo dores abdominais. Foram
combinas algumas estratégias para que ela pudesse ter o seu período de repouso em
casa , bem como a acomodação adequada e confortável, enquanto estava ao lado do
bebê, na CTINeo. Conversou-se sobre a questão alimentar, e a encaminhei para
avaliação médica, em função das queixas de dor abdominal. Afinal, ela teve duas
cirurgias em curto intervalo de tempo e não havia feito nenhum repouso, depois da alta
hospitalar, caminhando e dirigindo para poder vir ver o filho. O cansaço e a dor
também estavam diminuindo o seu poder vital e retardaando a restauração da saúde.
Neste encontro, observei Margarida muito preocupada com as condições do
bebê. Ela queria respostas para suas perguntas, porém elas ainda não existiam.
Encontrava-se acompanhada da filha. Observei uma maior interação entre as duas.
Sexto Encontro
Conversei rapidamente com Jasmin. Inicialmente a expressão do seu rosto não
demonstrava sentimentos; no entanto, quando a cumprimentei e abracei, ela se deixou
abraçar. Percebi que algo a estava incomodando, e, enquanto conversávamos, ela foi
deixando transparecer que tinha sido cobrada pela assistente social do seu município,
para que estivesse sempre perto das filhas. Não foi investigado o porquê de ela não ter
vindo ao hospital e sim salientado a “obrigação” que ela tinha, enquanto mãe, de estar
perto das filhas. Este fato a havia deixado triste.
Tal constatação me assustou, porque eu própria e a equipe de enfermagem
estávamos fazendo um julgamento precipitado de que talvez ela não quisesse
estabelecer o vínculo afetivo com as filhas e não tivesse tanto interesse em vir visitá-
las. Também, segundo a nossa maneira de pensar, ela, como mãe, tinha “obrigação” de
querer estar sempre perto das filhas, sem questionar suas razões.
Procurei resgatar a minha proposta de conhecer a mulher e cuidá-la dentro de
suas necessidades, como um ser humano individual e integral. Conversou-se sobre as
razões de ela não ter vindo ao hospital e sobre as suas possibilidades de vinda nos
próximos dias. Ela se interessou, participou ativamente das combinações e agradeceu o
auxílio. Ela pareceu tão solitária e desprotegida, tão necessitada de cuidado, mas eu
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sabia que precisava ir conhecendo-a cada vez mais, para poder cuidá-la.
Quarto Grupo
Houve a reunião do grupo. Estavam presentes Rosa, Violeta, Margarida.
Jasmim chegou um pouco mais tarde. A outra enfermeira não pôde estar por
problemas na Unidade. Conversou-se sobre o cuidar de si e como cada mulher poderia
restaurar, manter a saúde e potencializar o poder vital, para um viver saudável.
Conversou-se sobre as necessidades de repouso, nutrição, a participação da família.
Margarida estava bastante ansiosa, aguardando resultados de exames do filho.
Percebi que, em alguns momentos, ela estava distante; em outros, ela falava sobre seus
receios de como cuidar do bebê, no momento em que este fosse para casa.
Jasmim ouviu atentamente; todavia, não falou muito, apenas respondeu quando
envolvida na conversa.
Violeta estava mais cuidadosa em relação às suas condições de saúde. Seu bebê
estava evoluindo bem, ganhando peso e, provavelmente, poderia ir para casa nos dias
seguintes. Rosa estava se sentindo mais forte e procurou esclarecer suas dúvidas,
participando ativamente da seleção de estratégias para o cuidar de si.
Sétimo Encontro
Conversei com o marido e a filha da Margarida, enquanto esta estava com o
bebê. Eles estavam mais tranqüilos em relação às atividades domésticas, embora
muitas coisas ainda precisassem ser resolvidas entre eles. Estavam em um constante
aprendizado. O modo de viver em família não consegue ser modificado em um curto
espaço de tempo, mas estavam evoluindo. Após um breve momento, chegou
Margarida e conversamos juntos. A família estava bastante ansiosa quanto às
condições do bebê.
Oitavo Encontro
O bebê da Violeta foi para casa na sexta-feira. Conversei com Rosa e
Margarida. Jasmin estava no hospital, porém não na Unidade naquele momento.
Rosa estava feliz com a melhora de sua filha, que estava ganhando peso e
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sugando bem no seio materno. A produção do leite estava aumentando. Estávamos
tendo resultados com as manobras de estímulo realizadas. Ela também estava se
sentindo mais fortalecida. O edema resultante da pré-eclâmpsia já havia desaparecido
e, mesmo tendo que continuar a utilizar medicação anti-hipertensiva, sua pressão já
estava mais controlada.
Margarida conseguiu dividir suas angústias conosco, estava triste, pois o esposo
lhe dissera achar que não conseguiriam levar o bebê vivo para casa. Tudo o que
Margarida queria ouvir era que o bebê estivesse tendo melhoras, porém o que
observávamos era que seu quadro de saúde estava cada vez mais grave. Não sabia o
que dizer. Vi uma mulher-mãe ansiosa e angustiada, esperando por boas notícias,
entretanto, as que eu tinha não eram nada encorajadoras. Precisei trabalhar o meu lado
sentimental, pois, como enfermeira, parecia que tinha a obrigação de fazer alguma
coisa, de dizer algo que a confortasse. Queria cuidá-la e não sabia bem como. Senti-me
impotente diante da situação e com dificuldades de lidar com os limites, com a finitude
da vida. Optei por não ser a “enfermeira profissional” naquele momento e sim por
ficar ao seu lado como mulher, como amigas que nos tornamos.
Rosa, já fortalecida, também estava ao lado de Margarida. Procuramos estar
juntas para potencializar as energias de cada uma individualmente e do grupo, para que
tivéssemos forças para enfrentar as dificuldades, de modo que acontecesse o melhor
para o bebê da Margarida.
Nono Encontro
Tive encontro com a Jasmim. Ela estava conseguindo vir para o hospital, graças
ao apoio da secretaria de saúde do seu município de origem, que providenciou o
transporte para Jasmim. Ela já conversava sem restrições. Conseguiu falar de suas
dúvidas, à medida que eu fui questionando. Eu estava preocupada com a sua palidez.
Ela relatou sentir-se cansada e muito sonolenta, diznedo que estava conseguindo
esgotar pouco leite. Relatou ter sentido tonturas. Como ela estava com anemia
importante durante a gestação, pensei que aquele quadro não estava tendo melhoras.
Conversou-se um pouco sobre as manobras para aumentar a produção do leite e sobre
a sua alimentação. Novamente observei aquele receio de falar.
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Procurei saber o que ela havia almoçado, para ter uma idéia de sua dieta, mas
ela ainda não havia almoçado. Eram 15h e 30 min. Apenas havia feito um lanche em
casa. Percebi que ela não tinha condições financeiras para almoçar no restaurante do
hospital. Esta era uma questão urgente. Convidei-a para me fazer companhia em um
lanche, que foi bastante nutritivo. Tomei cuidado para que aquele convite não desse a
impressão de esmola. Enquanto lanchávamos, selecionamos as estratégias para
conseguir o auxílio à alimentação, em um programa do município, que podia ser
fornecido às mulheres enquanto nutrizes.
Décimo Encontro
Conversei individualmente com a Jasmin. Ela estava conseguindo almoçar no
hospital. Pareceu sentir-se mais forte. Estava acompanhada da cunhada e do
companheiro. Conversou-se sobre os cuidados com a Jasmim, naquele período de
puerpério de alto-risco, e selecionamos algumas estratégias relacionadas às
necessidades de cuidado no puerpério de alto risco e como elas poderiam fortalecer o
poder vital e restaurar a saúde.
Décimo Primeiro Encontro
Os bebês de Jasmin foram transferidos. Ela iria ficar na casa dos pais e sair do
grupo. Visitei Violeta em casa, conheci sua família, conversei com o marido, o filho e
a irmã. Encontrei Violeta com aspecto de muito cansada. Ela me relatou, que durante
todo o final de semana e ainda nestes últimos dias, estava com visitas durante todo o
dia. Estava se sentindo irritada, o filho maior estava fazendo de tudo para chamar sua
atenção, e não estava tendo o apoio para lidar com aquele fato.
Ao conversar com o esposo da Violeta, percebi que ele não sabia o que se
caracteriza como puerpério, especialmente o de alto risco. Ele se mostrou muito
interessado e fez várias perguntas. Expliquei como acontecem as transformações do
corpo nesse período e a situação específica de cuidado necessário, para que Violeta se
restaurasse e mantivesse suas energias.
Como ela sempre assumiu toda a administração da casa e da família, além do
trabalho fora do lar, naquele momento, ela continuava assumindo todas aquelas
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responsabilidades. Violeta estava vivenciando uma sobreposição de papéis: o de mãe,
esposa, mulher, dona de casa e como tal, “devia” receber as visitas com alegria e
satisfação. No entanto, ela estava se sentindo exausta, o que diminuía o seu poder vital,
deixando-a mais exposta a doenças e com dificuldades de restaurar a saúde, enquanto
vivenciava o puerpério de alto risco.
Conseguiu-se selecionar várias estratégias sobre a necessidade de repouso,
alimentação e cooperação da família, para que Violeta pudesse ter mais equilíbrio
entre o ambiente interno e externo e, assim, viesse a ter suas energias fortalecidas.
Décimo Segundo Encontro
Realizou-se o término oficial da pesquisa. Neste momento, Violeta a quem eu
mesma fui buscar em casa , se fez presente, assim como Margarida e Rosa. Preparei
um ambiente acolhedor, com um chá e lanche. Entreguei, como mimo para cada uma
delas, um cartão, agradecendo a participação na pesquisa e flores, tomando o cuidado
de entregar para cada uma a flor que havia escolhido como codinome. Dessa forma,
entreguei violetas, rosas e margaridas. Infelizmente, não pudemos contar com a
presença de Jasmim, pois ela estava acompanhando os seus bebês, agora internados em
outra instituição.
Como no primeiro encontro, em que solicitei que elas escolhessem a flor como
codinome, solicitei que elas falassem um pouco sobre o que significou o grupo para
elas, buscando saber como o modelo de Cuidado de Carraro teria influenciado na
potencialização do poder vital e restauração da saúde de cada uma.
Todas elas falaram da sua percepção dos encontros. Eu realmente me senti
importante na vida daquelas mulheres, através da prática do cuidado voltada para suas
necessidades e não àquilo que eu ou a equipe de enfermagem considerasse importante.
Percebi que se pode melhorar a qualidade dessa atividade profissional e ampliar o
cuidado com medidas simples, fáceis de executar, mas que, para outras pessoas,
tomam proporções muito grandes, fortalecendo suas energias, ou poder vital, como foi
o caso das mulheres que vivenciaram o puerpério de alto risco e fizeram parte deste
estudo.
Quando nos despedimos, foi apenas um “até logo”, pois, mesmo que
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oficialmente e, por questões metodológicas, eu precisasse encerrar a pesquisa, os
nossos encontros continuariam. Fiz uma visita domiciliar para Rosa; fiquei ao lado de
Margarida, quando esta perdeu seu bebê. Com certeza, aprendi muito essas mulheres,
devido à sua força de vontade e sua capacidade de amar incondicionalmente, a ponto
de esquecerem de suas necessidades, preocupando-se com o bem-estar do seu bebê.
O Modelo de Cuidado de Carraro foi importante na implementação e no
direcionamento da prática de cuidar dessas mulheres no puerpério de alto risco, com a
finalidade de potencializar o seu poder vital e restaurar sua saúde.
Mesmo que o enfoque deste estudo tenha sido cuidar dessas mulheres, a
aplicação do Modelo de Cuidado de Carraro possibilitou a ampliação desse cuidado
para a família, o ambiente, envolvendo tudo o que influenciava na vivência do
puerpério de alto risco de tais mulheres.
6 CUIDANDO AS MULHERES NO PUERPÉRIO DE ALTO RISCO
Ao cuidar das mulheres com a aplicação do Modelo de Cuidado de Carraro, na
pesquisa convergente assistencial, passou-se a conhecer, não apenas o que essas
mulheres vivenciavam nesse etapa tão singular de suas vidas, como também o que
mais desejavam ou necessitavam. A opção por esse modelo de cuidado favoreceu o
reconhecimento das situações de cuidado, tendo também favorecido a ação de
programar e selecionar os cuidados que melhor se adequariam para cada mulher, a
partir do conhecimento das vivências e das necessidades de cada uma delas.
Vale lembrar que:
o período puerperal pode ser considerado relativamente curto se ponderarmos
que a evolução da gestação levou nove meses, e então, repentinamente a
criança nasce, esvaziando o útero materno; nesse espaço de tempo o
organismo da mulher, teoricamente, volta ao estado anterior (Carraro, 1998,
p.38).
Assim, os dados que emergiram durante essa trajetória de cuidado, apresentados
neste capítulo, refletem essa dicotomia de sentimentos que a mulher-mãe vivencia:
cuidar de seu filho e/ou cuidar de si? Se, antes, as atenções eram para ela,
principalmente por ter passado por uma gestação de alto risco, agora a mulher não está
mais grávida, seu filho está fora de seu corpo, ela precisa cuidar dessa criança, e ela
própria ainda necessita de cuidados.
Visando a facilitar a compreensão, os temas e sub-temas estão apresentados no
quadro a seguir:
70
Tema Sub-tema
ATENÇÃO DA MULHER VOLTADA AO
BEBÊ
1. Preocupação com o bem-estar do bebê;
2. Ansiedade frente aos alarmes;
3. Afastamento do bebê;
4. Impossibilidade de cuidar do bebê;
5. Preocupação com a alimentação do bebê.
ATENÇÃO DA MULHER VOLTADA
PARA O CUIDADO DE SI
1. Cuidado com o ambiente;
2. Cuidado com a nutrição;
3. Cuidado com o repouso;
4. Desconhecimento sobre puerpério;
5. Dificuldades na amamentação;
6. Sentindo-se cuidada.
Em determinados momentos, os temas evidenciados eram comuns a duas ou
mais mulheres, conforme apresentado nos relatos. Porém, em outras situações, as
necessidades eram relacionadas a apenas uma mulher, o que foi tão valorizado quanto
as necessidades coletivas, e os dados foram apresentados de modo a refletir esse
movimento, pois partiu-se da proposta de cuidar da MULHER, em sua
individualidade, e cada fala refletiu a aplicação do Modelo de Cuidado. Desse modo,
nesta etapa, são apresentados os dados coletados junto às mulheres que participaram
deste estudo.
6.1 Atenção da mulher voltada para bebê
Ao trajetar com as mulheres que vivenciavam o puerpério de alto risco e que
necessitavam ser cuidadas, percebeu-se que elas direcionavam grande parte de sua
atenção e preocupação para os filhos.
Esse fato já havia sido muitas vezes comentado pela equipe de enfermagem,
quando se observava que algumas mulheres, mesmo tendo feito cesariana ou tido um
parto difícil, superavam as dificuldades para poderem estar ao lado do seu bebê na
CTINeo, enquanto outras mulheres que estavam com o bebê ao seu lado, no
alojamento conjunto, mostravam-se mais sensíveis à dor e menos ativas.
Szejer e Stewart (1997) conduz à reflexão de que, com essa postura, a mulher
demonstra que o próprio corpo passou ao segundo plano em relação ao do filho, que,
71
então, toma o seu lugar e quase a oculta, fazendo com que ela viva uma espécie de
fusão, segundo a qual, cuidar do bebê equivaleria a cuidar de si própria.
A preocupação voltada para o bebê se expressa nas constantes buscas, por parte
da mãe, de informações sobre o seu estado, revelando as ansiedades frente aos
alarmes, a tristeza pelo afastamento e pela impossibilidade de cuidar do seu bebê e a
preocupação com a alimentação do bebê.
6.1.1 Preocupação com o bem-estar do bebê
O período gravídico, o tempo de espera, culmina com a chegada do bebê, até
porque este é o “produto” da gestação, é o ser esperado, não apenas pela mulher-mãe,
mas por todos os que acompanharam a vivência da gestação da mãe. O esperado seria
que esse bebê estivesse ali, a seu lado, mas o mesmo vai para a CTINeo, e as
preocupações das mulheres-mães voltam-se para o bem-estar dos bebês, como se pode
ver a seguir:
Conhecendo
Foi observado, na prática, que a preocupação acima referida é
muito grande, a ponto de, em algumas vezes, as mulheres esquecerem totalmente de
suas necessidades, como demonstram os relatos de Rosa e Margarida:
.... Gosto muito de rosas. Mesmo que tenha espinhos, ela é linda. Me vejo
assim, os espinhos são os medos, as preocupações, mas o bebê é lindo como
uma rosa e precisa ser cuidado. (Rosa)
Estou muito preocupada com o bebê. Preciso saber que ele vai ficar bem
(Margarida)
Reconhecendo
A insegurança e o medo frente à patologia do bebê
desequilibram o ambiente interno da mãe, diminuindo suas energias, enfraquecendo
seu poder vital.
Selecionando as Estratégias
A presença e o apoio, tanto da equipe de
enfermagem, quanto da família, é importante e necessário. Aconteceu, em algumas
72
situações, que as mães queriam ouvir que o bebê iria ficar bem, e, frente a cujos fatos
nem sempre os profissionais de saúde sabiam qual atitude tomar ou o que dizer.
Seguindo e Agindo Conversou-se um pouco sobre os cuidados prestados aos
bebês, para que eles se fortalecessem. Falou-se sobre a questão espiritual, fazendo-se
também orações em conjunto.
Acompanhando a Trajetória
O apoio mútuo entre o grupo promoveu conforto
e segurança, o que é necessário para reforçar as energias, potencializando o poder
vital.
Considerou-se, enquanto profissional e ser humano, ser difícil lidar com
situações como as situações referidas anteriormente, pelo sentimento de impotência,
por se querer ajudar a cuidar, fazendo alguma coisa, sem, no entanto, saber o quê.
Ao se deparar com situações de patologias graves, o sentimento de impotência
frente ao quadro interfere na questão profissional, pois o enfermeiro se preparou para
atuar e resolver, esperando resultados, sem ser, no entanto, sempre bem sucedido.
Conforme Radünz (1999), não saber o que dizer ou fazer frente aos problemas
vivenciados pelo cliente, pode provocar, no enfermeiro, profunda tristeza e frustração,
aumentando a sensação de impotência frente a situações de finitude ou de seqüelas
permanentes.
Ao cuidar dessas mulheres em sua integralidade, é preciso estar presente
também como um todo, conforme descrito por Remen (1993), porque é possível,
sendo pessoa inteira, interessar-se pelo outro como um todo. E é preciso que os
profissionais estejam presentes como pessoas completas, respondendo às necessidades
do paciente com todos os aspectos da sua própria natureza: com a mente, intuição,
sabedoria, sentimento e compaixão.
Ainda, segundo Radünz (1999, p.131), para poder cuidar das pessoas, nesse
caso, das mulheres puérperas de alto risco, o enfermeiro também precisa cuidar de si e
também deixar-se cuidar, o que faz lembrar a lamparina, símbolo da Enfermagem, que
também irradia calor e luz.. E “A lamparina, contudo, apresenta um reservatório para
reabastecimento, o que pode ser traduzido num cuidar dos outros sem se consumir,
cuidando de si mesmo”. Por outro lado, assim como o enfermeiro precisa cuidar de si
para poder cuidar do outro, é necessário que a mulher puérpera cuide de si, para poder
73
cuidar de seu bebê.
Conhecendo
Margarida e Violeta questionaram o fato de não poderem entrar
na CTI, quando está sendo realizado um procedimento com um bebê, evidenciando
ansiedade com o bem-estar do mesmo, como se observa no seguinte relato:
Quando chego aqui e não posso entrar, acho logo que o problema é com o
meu bebê, e isso me deixa com medo. (Margarida)
Fico nervosa quando preciso esperar do lado de fora. Penso que pode ser com
o meu filho. (Violeta)
Reconhecendo
O medo relacionado com as condições do bebê.
Selecionando as Estratégias Sugeriu-se à equipe assistencial que, quando as
mães necessitassem esperar fora da sala da CTI, deveriam ser informadas quando o
procedimento não era com o seu bebê, pois isto as tranqüiliza. Quando o procedimento
fosse com o seu bebê, devia-se explicar, de forma simples, o que estava sendo feito.
Seguindo e Agindo
Fez-se necessário conversar com a enfermeira da Unidade
para trabalhar essa situação com a equipe de enfermagem.
Acompanhando a Trajetória Observou-se que, mesmo sem a rotina definida,
alguns enfermeiros e técnicos já estavam avisando as mães quando o procedimento
não era com o bebê de determinada mãe. E isto as estava tranqülizando..
Os procedimentos técnicos realizados na CTINeo, como aspiração, instalação
de cateteres ou sondas, mostram-se agressivos para as pessoas leigas, e, para não gerar
ansiedade, algumas instituições adotam a rotina de não permitir a presença de
familiares. Entretanto, o fato de saber que algum procedimento está sendo realizado
com o filho, gera um quadro de ansiedade na mulher-mãe.
A ansiedade pode ser compreendida como uma reação emocional, evidenciada
por manifestações latentes, ou manifestas em determinado no momento, e por
alterações fisiológicas, relacionadas ao funcionamento endócrino. A ansiedade
flutuante, ou seja, a que se manifesta em determinado momento pode, conforme sua
74
intensidade, ultrapassar as capacidades de adaptação da pessoa, resultando em
problemas de ajustamento, com conseqüências graves, especialmente no que se refere
ao sistema endócrino (MALDONADO, 1997)
Conhecendo Violeta também sentiu medo e insegurança em relação às
condições do bebê e às respostas a seus questionamentos:
O que me deixava mais ansiosa era o fato de não receber respostas claras e
objetivas sobre o estado dele. Parecia que estavam me enrolando (Violeta).
Reconhecendo Violeta vivenciou uma situação de ansiedade e estresse, o
que pode ocorrer no puerpério de risco, sendo, nesse caso, agravada pela condição de
saúde do bebê. Tal alteração no quadro emocional pode provocar desequilíbrio no
ambiente interno, fragilizando o poder vital da mulher.
Selecionando a Trajetória Definiu-se (a enfermeira e eu) algumas pessoas de
referência (enfermeiros e médicos), com as quais essa mulher-mãe poderia conversar
e esclarecer mais suas dúvidas. Essa situação é reforçada pelo grupo, que também
passa a usar essas mesmas pessoas (os enfermeiros e os médicos) como referência.
Seguindo a Agindo Fez-se uma reflexão com a equipe da Unidade sobre
quem e como deveria responder as perguntas das mulheres. Resolveu-se que, quando
lhes fosse solicitada alguma informação, os técnicos, se não tivessem respostas
seguras, iriam chamar a enfermeira de referência, para conversar com a mulher-mãe.
Acompanhando a Trajetória Observou-se que Violeta sentia-se mais tranqüila
com o modo como as dúvidas passaram a ser esclarecidas. Estava se sentindo mais
amparada. Percebeu-se vivacidade na voz, o que representou um indicativo
potencialização de seu poder vital.
O papel terapêutico do médico papel também da equipe de enfermagem no
se refere à comunicação com o paciente ou familiares, conforme descrito por Zanon
(2001), consiste em evitar a sobrecarga de ansiedade, por meio de atitudes, gestos e
expressões; deve-se dizer a verdade de forma clara, acessível e solidária, para obter
compreensão. O paciente, nesse caso, a mulher-mãe, tem o direito de exigir
75
informações e esclarecimentos que julgar necessários, até sentir completa e total
satisfação, para que, assim, tenha melhores condições de cuidar de sua saúde.
6.1.2 Ansiedade frente aos alarmes
Os alarmes dos monitores são importantes e necessários para alertar
imediatamente a equipe sobre alterações com os sinais vitais do bebê no tocante a
isso, até pouco tempo antes, ela mesma vivenciava essa situação, pois eram os seus
próprios sinais vitais que estavam sendo monitorados . Sempre que o sensor instalado
junto a um bebê capta uma alteração, disparando o sinal de alarme, gera preocupação e
ansiedade em sua mãe.
Conhecendo O relato de Jasmin sobre os alarmes, abaixo transcrito, fez com
que se refletisse com o grupo sobre a maneira de interpretar ou julgar as atitudes das
mulheres.
As minhas filhas não gostam de mim, quando encosto nelas, o alarme
apita”(Jasmim)
Reconhecendo Com o relato acima, conseguiu-se reconhecer a situação
vivenciada e entendeu-se por que Jasmim não tocava nas filhas.
Selecionando as Estratégias Observou-se a necessidade de informações sobre
o porquê do disparo do alarme, sobre a importância do toque da mãe no bebê e de
auxílio à mãe no momento de tocar nas filhas.
Seguindo e Agindo Explicou-se para a Jasmim, de uma forma simples, por
que o alarme dispara, sobre a instabilidade do bebê prematuro em relação à saturação e
sobre o fato de que o reconhecimento (por parte do bebê) do seu toque (da mãe) pode
reduzir a intensidade da saturação. Combinou-se que ela seria auxiliada para acariciar
as filhas.
Acompanhando a Trajetória Recebendo auxílio, a mãe Jasmim conseguiu
tocar nos bebês, porém ainda com bastante insegurança. Por isso, refletiu-se com a
76
equipe assistencial sobre a importância do apoio e incentivo.
Os bebês com necessidades de cuidados intensivos devem permanecer com
vigília constante, conforme descrito por Jiménez, Figueras e Botet (1995). Esses
controles são realizados através de equipamentos que realizam monitoração contínua
dos sinais vitais, com a fixação de parâmetros dentro dos quais é aceita a oscilação, e
qualquer alteração para além de tais parâmetros leva ao alarme, em forma de sinal
sonoro. O fato de tocar no bebê pode provocar um estímulo, frente ao qual o bebê se
movimenta, e esse movimento pode alterar ou dificultar a captação do sinal pelo
sensor, o que leva ao sinal de alarme.
Nos bebês extremamente prematuros, como os filhos de Jasmim, a imaturidade
do sistema respiratório pode levar a quedas de saturação, causadas pelo estresse
provocado pelo estímulo do manuseio ou toque, levando, também à emissão do sinal
de alarme.
Violeta e Margarida também referiram preocupação com os alarmes do
monitor.
Conhecendo Violeta e Margarida também sentiam medo em relação aos
alarmes, o que evidenciou que desconheciam o motivo de, toda vez que o bebê se
movimentar ou ser movimentado, soar o alarme.
Fico muito angustiada com os alarmes (Violeta)
Me preocupo com os alarmes (Rosa)
Reconhecendo
Há necessidade de informação, pois a desinformação leva à
ansiedade com relação ao bem-estar do bebê.
Selecionando as Estratégias Explicou-se à mulher-mãe as questões referentes
ao alarme. A enfermeira explicou por que o alarme dispara tanto, qual sua importância
para o cuidado com o bebê e o motivo da presença da equipe, que fazia o controle.
Seguindo e Agindo A enfermeira explicou por que o alarme disparava tanto,
qual a importância do alarme para o cuidado do bebê. Um bebê prematuro apresenta
77
instabilidade na manutenção da saturação de oxigênio e o seu movimento ou a resposta
a algum estímulo podem provocar uma ligeira diminuição dessa saturação, o que
provoca o sinal de alarme no monitor. A profissional ainda explicou que a equipe ali se
encontrava com a finalidade de fazer o controle da situação.
Discutiu-se, com a equipe assistencial, sobre o modo de explicar e tranqüilizar a
mulher-mãe a respeito do disparo do alarme.
Acompanhando a Trajetória Observou-se melhora na condução da orientação,
pela equipe, porém alguns ajustes ainda precisariam ser feitos. Algumas pessoas mais
integradas ao cuidado conseguem passar mais segurança para as mulheres-mães.
Combinou-se que essas situações seriam mais trabalhadas na Unidade junto à equipe
de enfermagem..
A instabilidade na manutenção dos sinais vitais, em função da prematuridade ou
da situação crítica do quadro de saúde do bebê internado em cuidados intensivos, exige
a monitoração completa e contínua da vitalidade. Os sensores ou aparatos, que
permanecem ligados ao bebê para monitorar as suas funções vitais, registram qualquer
alteração através do alarme (JIMÉNEZ, FIGUERAS E BOTET,1995). Como existe
uma preocupação da equipe assistencial com os valores registrados quando dispara o
sinal de alarme, esse fato gera ansiedade na mulher-mãe, que se preocupa com as
condições de saúde do seu bebê.
6.1.3 Afastamento do bebê
Mesmo que exista a liberdade da presença dos pais ao lado do bebê, enquanto
este estiver internado em Unidade de Terapia Intensiva, existem orientações
específicas de cada instituição em limitar, por meio de horários, a livre entrada dos
pais. Esse limite no acesso está relacionado com as rotinas da Unidade e também com
a necessidade da recém-mãe em se alimentar e descansar. O fato de a mãe não poder,
ou, ainda, não conseguir estar durante todo o período ao lado do seu bebê, também
gera ansiedades, o que pode ser relacionado ao que Soifer declara (1992, p.64): “Toda
a gestante sonha com os belos dias em que terá nos braços o bebê, e receberá visitas e
78
presentes”.
Conhecendo
Não poder permanecer com o bebê em tempo integral, é um fator
de ansiedade para a mãe que, às vezes, esbarra nas rotinas da Unidade, conforme relato
de Rosa, que queria ver o bebê com mais freqüência:
Gostaria de entrar de madrugada. Quando fico muito tempo sem vir aqui, fico
ansiosa. Sei que dormirei melhor depois. (Rosa)
Reconhecendo
A ansiedade e dificuldade em conseguir dormir deixam a mãe
mais cansada, o que diminui suas energias, enfraquecendo seu poder vital.
Selecionando as Estratégias Definiu-se, com a enfermeira, uma maneira de
conduzir a situação acima referida, revendo-se e adaptando-se, dentro do possível, as
normas e rotinas, conforme as necessidades das mulheres.
Seguindo e Agindo Em relação às visitas noturnas, combinou-se permitir e
auxiliar a visita rápida ao bebê de madrugada, voltando a mãe, depois, a descansar.
Rosa passou, então, a ir de madrugada ver a filha, voltando, depois, a descansar.
Acompanhando a Trajetória
Em seu relato, a mãe (Rosa) disse que conseguiu
dormir melhor depois de ter ido se certificar de que o bebê estava bem.
Para organização dos serviços nas instituições hospitalares, algumas normas e
rotinas são instituídas. Precisou-se, contudo, refletir sobre o objetivo básico de tais
normas, ou seja, tratar pessoas doentes e não doenças. É necessário dar mais ênfase ao
ser humano. Devido a isso, as rotinas devem ser adaptadas às necessidades da pessoa.
Conforme citado por Zanon (2001, p.21), o hospital tem como objetivo fundamental
“receber o ser humano quando por alguma razão, se tornou doente ou ferido e cuidar
dele de modo a restaurá-lo ao normal, ou tão próximo quanto possível”. Sendo assim,
o hospital é uma empresa cuja única razão de ser é o homem ou o ser humano.
Florence (1989), em suas notas, escreve sobre o hospital, detalhando cuidados
com o ambiente hospitalar, mas a sua preocupação com os ruídos, iluminação, ar puro,
79
entre outros, é direcionada para o cuidado e o conforto do ser humano doente, e não
para as belezas arquitetônicas da estrutura hospitalar.
6.1.4 Impossibilidade de cuidar do bebê
Cabe considerar que, em nossa cultura, as mulheres se preparam para cuidar de
seus bebês assim que estes nasçam; até os serviços de saúde são organizados para
auxiliá-la nesse novo papel em sua vida. O fato de as mulheres participantes deste
estudo terem vivenciado uma gestação de alto risco e de, no momento de efetivação
deste estudo, estarem vivenciando o afastamento de seu filho, impossibilitando-as de
assumirem os cuidados diretos com os mesmos, gera uma zona de desconforto, ao
sentirem-se impossibilitadas de exercer esse cuidado.
Conhecendo
Devido à complexidade de cuidados em relação ao bebê
enquanto este estiver na CTINeo, a mulher sente medo e insegurança em encostar no
bebê. Acha que as técnicas sabem cuidar bem e ela não, o que se observa pelo relato
de Rosa:
[...] Às vezes, não consigo encostar nela, me sinto com medo, por todos estes
tubos (Rosa).
Reconhecendo Foi observado, por meio da fala, o sentimento de culpa da
mãe.
Selecionando as estratégias
O grupo expôs suas impressões a esse respeito,
e as mães disseram que também tinham medo, decidindo, por fim, que iriam tentar
respeitar suas limitações individuais, para não gastar energia vital com esse
sentimento (de culpa).
Seguindo e Agindo Cada mulher, à sua maneira trabalhou, essa situação.
Acompanhando a Trajetória Observou-se que, com o fato de terem dividido o
80
sentimento de culpa entre as integrantes do grupo, passaram , especialmente Rosa, a
lidar com mais serenidade frente a esse sentimento.
Szejer e Stewart (1997) abordam esse contexto difícil de ser vivido pelos pais,
quando o bebê está internado em uma unidade onde os serviços são altamente
especializados, pois os pais tendem a se sentir incompetentes frente ao profissional.
Esse retraimento representa um reflexo natural de defesa do pai e/ou da mãe,
protegendo-se inconscientemente, evitando, assim, envolver-se muito e investir nessa
relação, que corre o risco de não atingir o enlace desejado.
A exigência da mulher-mãe em cuidar bem do seu bebê pode gerar medos e
ansiedades, especialmente se o bebê exige cuidados especiais.
Conhecendo O medo de não saber cuidar também pode estar relacionado ao
cuidado pós-alta, como relatado por Margarida:
Não sei se vou conseguir cuidar direito do meu bebê em casa. (Margarida)
Reconhecendo Devido ao medo e à insegurança para cuidar do filho, por ser
um bebê com aspecto sindrômico, Margarida não sabia em que condições o bebê iria
para casa.
Selecionando as Estratégias Definiu-se o modo como as mulheres iriam se
preparar para cuidar do seu bebê em casa, especialmente no caso de Margarida.
Esclareceu-se que cada mãe cuidaria do seu bebê, dentro das possibilidades
individuais, ainda na CTINeo, com o auxílio da enfermeira e das técnicas.
Seguindo e Agindo A enfermeira da Unidade passou a acompanhar Margarida
em alguns cuidados que esta já poderia realizar com o bebê, como a troca de fraldas,
higiene e algumas massagens de relaxamento.
Acompanhando a Trajetória Observou-se que as pequenas coisas que a mãe
(Margarida) estava conseguindo fazer, traziam-lhe momentos de alegria.
O medo de não saber cuidar do bebê, relatado por Margarida, além da sensação
de incompetência frente à complexidade dos cuidados, conforme descrito
81
anteriormente, pode também estar relacionado com a exigência social, de origem
histórica, conforme descrito por Maldonado (1997). No século XX, especialmente sob
a influência da psicanálise, reforçava-se a tendência a responsabilizar a mãe pelas
dificuldades e problemas que surgissem nos filhos, enfatizando a importância da
relação mãe-filho e acentuando a imagem da devoção e do sacrifício.
6.1.5 Preocupação com a alimentação do bebê
A preocupação com o aleitamento materno também foi evidenciada, o que
provocou uma reflexão sobre o modo como isto é abordado com a recém-mãe, pois
existe uma exigência da própria mulher em amamentar, conforme escrito por Silva
(2003, p.139): “...o papel de mãe lhe confere a responsabilidade de cuidar da criança.
No conjunto de elementos que constituem o significado de cuidar do filho incluem-se
as ações destinadas a garantir a alimentação e a nutrição da criança”.
Além disso, os profissionais também apresentam nas falas a constante exigência
na produção do leite, situações essas que podem gerar na mulher um sentimento de
culpa quando esta não consegue amamentar.
Conhecendo Percebeu-se a preocupação de Rosa em não conseguir o leite
necessário para o seu bebê, conforme seu relato:
Fiquei muito preocupada quando cheguei aqui na Neo. O médico olhou para
mim e disse: “Oi Mãe, preciso do teu leite. (Rosa)
Reconhecendo Pela maneira como o relato foi feito e pela reação
momentânea de Rosa, observou-se que ela sentiu-se incomodada com a perda da
identidade, pois foi abordada apenas como a mãe, a dona dos seios que produzem o
leite.
Selecionando as Estratégias Conversou-se sobre a preocupação da equipe
com o leite materno para o bebê prematuro e sobre a importância deste leite,
combinando-se com Rosa que ela esgotaria o leite que conseguisse esgotar, sem que
82
isso se tornasse uma tortura e que teria todo o auxílio da equipe para tal procedimento.
Salientou-se para a mãe que o amor que ela transmitia em relação ao bebê era tão
importante quanto o seu leite.
Seguindo e Agindo Refletiu-se, com a equipe assistencial, sobre a maneira e o
momento de falar sobre o aleitamento materno, incentivando e respeitando as
condições individuais de cada mulher.
Acompanhando a Caminhada
Observou-se que, com as orientações e auxílio
prestados quanto ao modo de estimular a mama, houve aumento da quantidade de leite
esgotado. Destaca-se que Rosa demonstrou satisfação por estar conseguindo produzir
o alimento para o seu bebê.
A preocupação dos profissionais da saúde com o bem-estar do bebê se reflete
nessa “exigência” da mãe em produzir leite, pela importância do leite materno na
evolução do bebê. Segundo Lamounier (1996), o leite humano, além de seus
componentes nutritivos, contém, em sua composição, uma complexidade de células,
membranas e moléculas que atuam na proteção do recém nascido, especialmente do
bebê prematuro. Alguns autores são bastante radicais em relação à responsabilidade
da mulher em amamentar, conforme observado nos escritos de Jacobson, citado por
Chodorow (1990): é destino biológico da mulher gerar e dar à luz, amamentar e criar
seus filhos.
A amamentação, no entanto, vai além do fenômeno biológico, sendo muito mais
do que um processo fisiológico de produção de leite: existe um ser atuando nesse
processo, que deve ser considerado em todo o seu aspecto emocional, social e cultural.
Desde há muito tempo, já é conhecido, tanto no meio científico, quanto popular,
que a dor, a preocupação e os distúrbios emocionais, causam transtornos ao processo
de amamentação. O hipotálamo participa, tanto do controle das emoções, quanto da
amamentação. Sendo assim, as emoções maternas influenciam na amamentação. Há
evidências de que o estresse, além de cessar a ejeção do leite, também pode inibir a sua
secreção, quer diretamente pela liberação de prolactina, pela ingestão menor de
nutrientes ou pela alteração no fluxo sangüíneo da mama (CARVALHO E TAMEZ,
2002).
83
Conhecendo Jasmim também estava preocupada em aumentar a quantidade de
leite. Queria amamentar, mas faltava informação.
Não sei como fazer para ter bastante leite. Eles sempre me pedem. Sempre
tiro quando venho aqui, com a máquina. Não tenho uma em casa. (Jasmim)
Reconhecendo
Havia necessidade de informação sobre aleitamento materno e
sobre a maneira de estimular o aumento da produção de leite;
Selecionando as estratégias: Definiu-se o conteúdo e modo de orientação.
Seguindo e Agindo Conversou-se sobre a lactação e explicou-se, com o
auxílio de desenhos e mostrando na mama, como fazer para manter e aumentar a
produção de leite, bem como foram apontados os fatores que interferem nessa
produção.
Acompanhando a Caminhada
Observou-se que Jasmim estava realizando a
esgota manual das mamas também com o auxílio do tira leite (que foi conseguido no
hospital). Achava que estava aumentando a quantidade de leite. As mamas estavam
mais túrgidas. O incentivo e o auxílio devem ser mantidos enquanto a mãe estiver no
hospital.
Após o nascimento do bebê, ocorre a diminuição brusca dos hormônios
estrogênio e progesterona da mãe, o que desencadeia a liberação de prolactina na
hipófise anterior. A prolactina, um dos dois hormônios necessários para a produção de
leite, é sintetizada, mais tarde, em resposta à sucção do bebê, ou estímulo de esgota
manual e mecânica, esvaziando as mamas. Existe uma produção conforme a demanda,
ou seja, à medida que o leite é removido da mama, a produção cresce, e o
esvaziamento incompleto ou o não esvaziamento freqüente leva à redução na produção
do leite (LOWDERMILK, 2002).
Carvalho e Tamez (2002) também salientam que, para uma amamentação
tranqüila e sadia, há o condicionamento do reflexo, bastando a mãe ouvir, tocar ou
mesmo pensar no bebê, que ocorre a descida do leite. Mesmo nos casos em que não
haja a possibilidade da amamentação e necessita-se da retirada do leite por esgota
84
manual ou mecânica, é importante manter o contato da mãe com a criança, facilitando
tal processo.
Com a ênfase dada ao aleitamento materno, as dificuldades ou, ainda, o fato de
a mulher não poder amamentar, podem gerar um sentimento de culpa.
Conhecendo Margarida mostrava tristeza por não poder amamentar.
Não consigo amamentar porque fiz cirurgia plástica na mama e fiquei com
problema. Fico triste, porque acho que o meu bebê poderia estar mais forte se
eu conseguisse amamentar. (Margarida)
Reconhecendo Margarida demonstrava preocupação, culpando-se, de certo
modo, por não estar amamentando.
Selecionando as Estratégias
Conversou-se com as mulheres no sentido de não
se fazerem cobranças sobre assuntos que estavam além da sua capacidade de
resolução, e que trabalhassem com as ferramentas que tinham, ou seja, aquelas que
estivessem impossibilitadas de amamentar, iriam administrar o leite, envolvendo nessa
atividade muito carinho e amor.
Seguindo e Agindo
Margarida passou a auxiliar a técnica de enfermagem, no
momento da administração da dieta por sonda.
Acompanhando a Caminhada Observou-se a satisfação da Margarida em
poder administrar a dieta do seu bebê e verificou-se que ela se mostrou mais tranqüila
quanto à impossibilidade de amamentar.
Percebeu-se, através dos relatos, o quanto a atenção da mulher está direcionada
ao próprio bebê. Por outro lado, a mulher traz um apelo, que, mesmo de maneira
velada e, às vezes, não expresso verbalmente, indica que quer e necessita ser cuidada e
confortada, no sentido de que suas energias sejam fortalecidas e mantidas.
85
6.2 Atenção da mulher voltada para o cuidado de si
Nos relatos das mulheres, foi observada, em alguns momentos de modo
explícito, a necessidade que sentiam de serem cuidadas. Em vista disso, foram feitas
reflexões e selecionadas estratégias para “se cuidar e cuidar de si”. Segundo Radünz
(1999, p 123), cuidar-se diz respeito às estratégias de cuidado para consigo mesmo e o
cuidar de si, às atitudes para com a vida, com o modo de viver; aos cuidados que
abrangem a totalidade do ser e à vontade e decisão próprias em cuidar de si.
Durante a gestação de alto risco, pela sua necessidade especial, a mulher é o
centro das atenções. Tais atenções, após o nascimento, são normalmente direcionadas
ao bebê. As mulheres-mães que participaram deste estudo, no entanto, estavam
vivenciando o puerpério de alto risco e, com ele, a impotência frente ao cuidado com
seu bebê. Essa situação pode gerar, na mulher, um conflito, por ter sido cuidada antes
e agora precisar demonstrar que continua precisando e querendo ser cuidada, além de
ter de tomar a decisão de se cuidar, e, cuidando de si, poder cuidar de seu filho, assim
que isso for possível.
A atenção voltada ao cuidado de si revelou que as mulheres-mães se voltavam
para o cuidado com o ambiente, com sua nutrição e repouso, buscando informações
sobre puerpério e verbalizando suas dificuldades quanto à amamentação, com o intuito
de encontrar soluções. Enfim, quando elas se deixavam cuidar, cuidavam de si e
sentiam-se cuidadas.
6.2.1 Cuidado com o ambiente
O cuidado com o ambiente refere-se, conforme conceito encontrado na
literatura, ao ambiente hospitalar (físico) com as suas particularidades, como ruídos,
cheiros, pessoas, procedimentos, enfim, todo o contexto hospitalar, o contexto familiar
e social, bem como ao ambiente interno da mulher, caracterizado por suas crenças,
valores, medos, expectativas, ou seja, toda a sua bagagem de vida, modificada pela
condição de estar vivenciando o puerpério, após uma gestação de alto risco.
Foi evidenciado, nos relatos de Violeta, Margarida e Jasmim, a necessidade de
86
cuidado e conforto frente à vivência de uma situação de estresse, o que desequilibra o
ambiente interno da mulher.
Conhecendo Violeta e Margarida sinalizavam a necessidade de se sentirem
cuidadas e de cuidar de si, quando relacionaram o nome da flor com o momento que
estavam vivendo, como se verifica nas seguintes falas:
No outro parto eu estava mais chorona, agora tenho que me manter mais forte
para poder cuidar do nenê. Só agora no grupo é que eu tenho falado um
pouco de mim. .(Violeta)
Porque a violeta tem a ver com o momento delicado que estou vivendo, pois
eu e o bebê estamos precisando de um cuidado especial. Sinto-me frágil e o
meu bebe precisa de muitos cuidados. (Violeta)
Acho que o momento que estou passando se assemelha a esta flor. A mãe é
como uma margarida. Depende do que dizem ou fazem com ela, há sempre
algo que magoa ou alegra, e, então, uma pétala cai ou outra desabrocha.
(Margarida)
Reconhecendo Violeta, apesar de demonstrar força e segurança, sentia e
verbalizava a necessidade de se sentir cuidada. Também Margarida – mais
introvertida, de fala baixa e pausada, apresentando um olhar de tristeza e preocupação–
necessitava de apoio e cuidado – pela sua condição de risco, pela potencialização da
possibilidade de depressão, por suas próprias características e pela situação do bebê –.
Selecionando as Estratégias Refletiu-se com o grupo sobre as necessidades
individuais dessas mulheres e sobre e o que poderia ser feito em conjunto, para que
essas necessidades de cuidado fossem atendidas, ou seja, como cada uma poderia
cuidar de si. Percebeu-se que era preciso acompanhar algumas necessidades dessas
mulheres, de modo individual e com bastante atenção.
Seguindo e Agindo Passou-se a realizar encontros individuais com as
mulheres, de acordo com as suas necessidades e a oportunidade do momento, enquanto
estavam no hospital. Ficou-se mais atento às queixas verbais e expressões não verbais
dessas mulheres. Procurou-se “estar presente”, às vezes, num apoio mudo, associado a
pequenos gestos, como um aperto da mão e um abraço. Procurou-se reforçar o modo
87
como cada mulher poderia cuidar mais de si.
Acompanhando a Trajetória
Observou-se, pelas reações individuais um
sorriso, um suspiro, a mudança na expressão da face , a satisfação que estes pequenos
gestos estariam trazendo a essas mulheres, o que também me fortaleceu como ser
humano.
Nesse estar presente, compartilham-se espaços, mundos privados e um cuidado
natural, amoroso, protetor, emergindo dessa relação de cuidado o mais verdadeiro
sentido do cuidado mútuo, da troca (RADÜNZ, 1999).
Ainda, quanto ao ambiente interno, são, a seguir, apresentadas outras situações:
Conhecendo Margarida apresentou uma labilidade emocional e um quadro
depressivo que pode ser freqüente no puerpério de alto risco, agravado pelas condições
de saúde do bebê. Pareceu que buscava potencializar o seu poder vital, com a
finalidade de ter energias para cuidar do filho, conforme seu relato:
Fico triste, o meu marido acha que o “nenê” não vai para casa. Sinto muita
vontade de chorar, mas tento segurar, preciso ser forte (Margarida).
Reconhecendo
A necessidade de mais informações sobre a adaptação
psicológica ao puerpério de alto risco. A mulher necessita do suporte da família para
potencializar o seu poder vital, e o fato de o marido de Margarida pensar e dizer que o
bebê não iria para casa, estava deixando-a fragilizada.
Selecionando as Estratégias Todas as mulheres falavam que tinham vontade
de chorar, mas que se apegavam às coisas boas que existiam em suas vidas para
fortalecerem o seu lado emocional.
Seguindo e Agindo Conversou-se individualmente com Margarida sobre suas
tristezas. Procurou-se fazer-se mais presente, ouvindo-a e apoiando-a.
Acompanhando a Trajetória Margarida sentia-se bem quando durante as
conversas. Parece que se sentia um pouco mais revitalizada, ao menos por alguns
instantes.
88
A dificuldade do “pai” em acreditar na melhora das condições de saúde do
bebê, pode estar relacionada à sua reação de autoproteção, conforme descrito por
Szejer e Stewart (1997). Essa reação se inscreve numa lógica de decepção que o pai ou
a mãe pode assumir em relação ao nascimento de um filho doente, o que é mais difícil
do que se prevê, intensificando a manifestação de mecanismos reacionais de defesa.
De acordo com Viscott (1982), eventualmente, o ser humano age de maneira
excessiva em relação a sentimentos dolorosos, construindo defesas impenetráveis. A
finalidade dessas defesas é proteger contra danos interiores que consomem nossa
energia, causando exaustão.
Conhecendo
Jasmin também evidenciava a necessidade de ser cuidada,
apresentando um quadro depressivo, que faz parte do puerpério de alto risco, agravado
pela condição de saúde das filhas na CTINeo. Relatava vontade de chorar:
...Eles sempre me dizem para não chorar, então eu vou no banheiro e choro
muito. Não tenho com quem conversar sobre o que está acontecendo comigo e
com as minhas filhas (Jasmim).
Reconhecendo Há necessidade de mais informações sobre a adaptação ao
puerpério, bem como sobre o amparo e apoio. A mulher, nesse caso, necessita da
presença de um familiar – preferencialmente de alguém que esteja orientado sobre o
que se passa no puerpério –, precisando também de apoio para manter o poder vital.
Selecionando as Estratégias com o Grupo Todas as mulheres falavam que
tinham vontade de chorar, mas se apegavam às coisas boas que existiam em suas
vidas, para fortalecerem o seu lado emocional. Além disso, precisavam de encontros
individuais.
Seguindo e Agindo
Conversou-se individualmente com essas mulheres sobre
suas tristezas . Procurou-se valorizar um pouco a espiritualidade e a fé durante as falas.
Elas sentiam-se bem durante as conversas.
Acompanhando a Trajetória Percebeu-se que se sentiam mais à vontade para
89
conversar individualmente comigo própria, permitindo que eu me aproximasse mais,
que as abraçasse, e pareceu que isso as revitalizava.
O ambiente familiar também tem interferido na adaptação e vivência do
puerpério de alto risco. Relatando a necessidade de se sentirem cuidadas, as mulheres
sujeitos deste estudo evidenciaram a ausência ou a pouca valorização desse cuidado,
conforme relatos de Violeta e Margarida.
Conhecendo Violeta estava incomodada com a insistência da família sobre a
necessidade de busca de informações, especialmente porque essa tarefa era
direcionada sempre a ela, ao passo que, segundo ela, o próprio marido também teria
responsabilidade sobre isso. Ela sentia a necessidade de ser mais amparada pela
família e menos cobrada, o que está claro em seu relato:
Sinto-me sozinha e cobrada pela família para estar sempre perto do bebê. O
marido não apóia, deixa e espera que eu tome as decisões. Sinto-me cansada
e preciso dar satisfação aos familiares e amigos sobre o estado do bebê.
(Violeta)
Reconhecendo A vivência de uma situação de estresse e autocobrança. O
marido de Violeta e a família dela desconheciam o que se passa no puerpério. Devido
à profissão dela (técnica em enfermagem), a família imaginava que ela teria todas as
explicações.
Selecionando as Estratégias O grupo sugeriu que uma pessoa mais
esclarecida e mais próxima da família fizesse o intercâmbio com a família de Violeta.
Conversou-se sobre algumas estratégias para que Violeta dividisse as
responsabilidades com o marido. Falou-se um pouco no grupo sobre as questões de
gênero e sobre a necessidade de o marido ser informado do que acontecia nessa fase,
para poder auxiliar a companheira.
Seguindo e Agindo
A enfermeira responsabilizou-se por conversar com a irmã
de Violeta, para que esta mantivesse esse cuidado. Conversou-se com o marido dela
para saber como ele estava se adaptando à situação, e ele apresentou sua lista de
90
dúvidas, que foram esclarecidas. A enfermeira conversou com a irmã da Violeta na
presença desta. Constatou-se que Violeta teve uma sensação de alívio.
Acompanhando a Trajetória Verificou-se que, tendo mais conhecimento
sobre a adaptação da mulher ao puerpério e sobre a necessidade de cuidado, o marido
de Violeta mostrou-se mais presente. Aprendendo a dividir as tarefas, repousando mais
e sentindo-se mais cuidada, essa mulher passou a potencializar o seu poder vital.
Enfatizando a importância da relação mãe-filho, muitos teóricos da psicologia,
segundo Maldonado (1997), acabam tendo uma atitude de acusação e incutindo
sentimentos de culpa na mulher, acentuando a imagem da devoção e de sacrifício que
caracterizaria a “boa mãe”, que se torna, desta maneira, o personagem central da
família.
Nas orientações sobre os cuidados com o bebê, para haver a interação mãe-
bebê, principalmente nos primeiros dias de vida, é constantemente enfatizado,
conforme orientações de Freitas (2002, p. 318), que “a mãe deve ser orientada a
responder prontamente as necessidades de seu bebê, não temendo que isto vá deixá-lo
manhoso ou superdependente mais tarde”.
Florence já se preocupava com os cuidados em relação à repetição das falas,
conforme esclarece em Notas sobre Enfermagem (1989, p.57): “Nunca faça o enfermo
repetir uma mensagem ou um pedido, especialmente algum tempo depois de tê-lo
feito”.
Conhecendo Violeta, como demonstra o relato a seguir, também estava com
dificuldades em relação ao filho mais velho, que não aceitava o irmão recém-nascido,
queria a companhia dela, e o esposo não sabia como lidar com a situação:
O meu filho não aceita o mano, não quer mais ir para a escola, quer que eu o
leve para passear, e grita quando digo que venho ver o mano. O pai dele está
colocando de castigo direto, proibiu até o videogame (Violeta).
Reconhecendo O filho de Violeta tentava chamar a atenção da mãe para si,
pois sabia que perdera a exclusividade.
91
Selecionando as Estratégias Dialogou-se sobre a situação acima referida, e
Rosa, que trabalhava com educação infantil, sugeriu que os pais passeassem durante
tempo possível com o menino, que o integrassem nas conversas, que explicassem a ele
o que estava acontecendo e que substituíssem o castigo por momentos de conversa e
cumplicidade.
Seguindo e Agindo
Violeta, junto com o marido, tentou conduzir a situação
conforme a sugestão de Rosa..
Acompanhando a Trajetória
Os resultados começavam a surgir, a criança (o
filho mais velho de Violeta) já se mostrava mais tranqüila e queria ir ver o mano no
hospital.
O ambiente familiar também estava interferindo na vivência do puerpério de
alto- risco, conforme relatos de Margarida.
Conhecendo
Margarida também relatou as dificuldades domésticas. Sentia-se
cobrada a deixar tudo pronto em casa, achava que eles (marido e filha) não sabiam
fazer as atividades domésticas da maneira que ela queria que fosse feito, segundo seu
relato:
Os maridos deveriam participar destes encontros, [...] Sinto-me sozinha para
fazer tudo, eles (marido e filha) não sabem fazer nada em casa, não vale a
pena falar nada (Margarida).
Reconhecendo Margarida queria ser cuidada, mas não conseguia se permitir
isso. Queria que tudo seja feito a sua maneira. Ainda pensava que somente ela sabia e
podia cuidar da casa. Percebeu-se que ela nunca ensinara o marido e filha ou até
mesmo nunca teria permitido que eles fizessem alguma coisa em casa. Ela incorporara
a super-rmulher, que dava conta de tudo e agora tinha dificuldades de delegar, ou até
mesmo de admitir que precisava de ajuda.
Selecionando as Estratégias Conversou-se sobre algumas estratégias para que
Margarida dividisse as responsabilidades com o marido e filha. Viu-se a possibilidade
de conversar-se com o marido e a filha dela e explicar o que estava acontecendo com
92
ela naquele momento e falar sobre a necessidade de cuidado dessa mulher.
Seguindo e Agindo Houve uma conversa individualmente com o marido e a
filha de Margarida. Observou-se como estavam se adaptando àquela situação. A filha
respondeu prontamente: “Estamos “perdidos”, a mãe sempre fazia tudo e agora não
sabemos como cuidar dela”. O marido ouviu atentamente. Foi explicado a eles o que
era puerpério e quais seriam os cuidados nesse período, especialmente quando
relacionado à condição de risco materno.
Acompanhando a Trajetória
Houve a continuação do contato com o marido e
principalmente com a filha de Margarida, dando-lhes suporte para auxiliar a mãe. Viu-
se que Margarida estava mais segura e madura. Ela relatou que o ambiente doméstico
havia melhorado com a divisão das tarefas e que estava aprendendo a não ser tão
exigente com detalhes. O repouso necessário, bem como o fato de sentir-se mais
cuidada, estava potencializando o poder vital dessa mulher, o que auxilia na
restauração da saúde.
Carraro (1999) nos fala da mulher como o eixo da família, com papéis de
esposa, mãe, dona de casa e educadora dos filhos. É articuladora da família, pois todas
essas atribuições lhe dão um poder e uma enorme força, promovendo o respeito da
família e da sociedade. Nessa posição de articuladora de sua família, é a mulher quem
estrutura, organiza e dirige o cotidiano familiar, fazendo o elo entre a esfera do privado
e do social.
6.2.2 Cuidado com a nutrição
O puerpério é um tempo de restauração, de mudanças. É também um tempo de
riscos, quando se deve estar alerta, especialmente nos primeiros dias, que são críticos
(CARRARO, 1998). Esse alerta deve contemplar também a questão alimentar das
mulheres puérperas, pois o fator nutricional, tão importante para o equilíbrio das
funções corporais, nem sempre é atendido. Se, por um lado as mulheres vivenciam a
transição de gestantes para puérperas, com suas funções vitais modificadas, adaptando-
se aos poucos com o estado não gestacional, por outro, são exigidas no sentido de
estarem bem e produzir alimento para seu filho. Os cuidados com a nutrição surgem
93
como preocupação nas falas das mulheres, conforme relatos de Margarida, Jasmim e
Violeta.
Conhecendo: Margarida não estava atendendo à necessidade nutricional.
Não me alimento direito, às vezes não consigo almoçar porque não dá tempo
(Margarida).
Reconhecendo: A necessidade de informações sobre a importância e os
nutrientes necessários.
Selecionando as Estratégias: Definiu-se a necessidade de esclarecimento de
dúvidas a respeito das necessidades nutricionais.
Seguindo e Agindo: Em grupo, conversou-se sobre as necessidades nutricionais,
considerando-se, especialmente, a condição de puerpério de alto risco.
Acompanhando a Trajetória: Margarida estava tentando substituir alguns
alimentos de que não gostava por outros com o mesmo poder nutricional.
Conhecendo: Alimentação insuficiente e inadequada.
Ainda não almocei, não tenho dinheiro para comprar almoço (Jasmin).
Reconhecendo
Nutrição inadequada. A falta de energia diminui as defesas do
organismo, deixando a mulher mais exposta a infecções.
Selecionando as Estratégias
Pensou-se na possibilidade de que Jasmim
pudesse almoçar no hospital, a despesa referente a isso poderia ser incluída na conta
dos bebês. Falou-se da necessidade de alimentação adequada e discutiu-se, juntamente
com essa mulher, algumas possibilidades de aquisição dos alimentos, indicando-se os
mais indicados dentro das suas possibilidades.
Seguindo e Agindo Falou-se com a direção do hospital e com a assistência
94
social do município de Jasmin, para se conseguir liberar o almoço enquanto ela
estava com as filhas. E isso foi trabalhado como um direito da mãe e não como
“esmola”.
Acompanhando a Trajetória Em conseqüência do que foi exposto acima,
observou-se uma vivacidade no olhar de Jasmim. Ela almoçou em minha companhia,
com muita disposição, sempre lembrando o que tinha sido conversado sobre o valor
nutricional. O seu físico estava debilitado, também por falta de nutrição. Não era
necessário “dar medicamentos”, e, sim, providenciar comida.
A nutrição é um componente importante na recuperação e manutenção da
saúde, especialmente no puerpério de alto-risco. Segundo Saunders, Neves a Accioly
(2003), os alimentos são essenciais para a vida. Sem um adequado suprimento de
nutrientes, um organismo vivo não pode crescer e se desenvolver adequadamente,
podendo chegar à morte. No caso da gestação e puerpério, as proteínas, vitaminas e
sais minerais são de extrema importância na dieta.
As proteínas, com função estrutural, fornecem aminoácidos essenciais para
construção e manutenção epitelial. Sua função diz respeito também à formação
enzimática, hormonal e de vários líquidos e secreções corpóreas. Estão também
envolvidas no sistema imune, como anticorpos, contribuem para a homeostase e
equilíbrio ácido-base no sangue e tecidos.
As vitaminas e sais minerais igualmente têm inúmeras funções na vitalidade e
funcionamento do organismo, destacando-se, dentre estas, sua ação no sistema imune.
Conhecendo A preocupação de Violeta em relação aos resultados esperados
da alimentação
Sinto-me inchada, não consigo ir aos pés, como bastante fibras e retenho
gases (Violeta).
Reconhecendo Constatou-se ocorrência de diminuição do peristaltismo, o que
estava relacionado à nutrição, à condição pessoal e a pouca ingesta de líquidos (fibras
95
e pouco líquido).
Selecionando as Estratégias Definiu-se a necessidade de rever a função dos
alimentos para o peristaltismo intestinal e da ingesta hídrica e a ação das fibras
Seguindo e Agindo: Dialogou-se sobre como cada uma poderia se organizar
para lembrar da ingesta hídrica.
Acompanhando a Trajetória Violeta referiu pequena melhora com o aumento
do líquido, porém, como já tinha história de constipação, foi buscar também
acompanhamento médico.
O trânsito intestinal pode estar prejudicado no período puerperal. A tendência à
constipação intestinal é atribuída à súbita perda de pressão intra-abdominal, pelo
nascimento do bebê, devido ao relaxamento dos músculos abdominais e à diminuição
do peristaltismo intestinal adquirida durante a gravidez (ZIEGEL, 1985).
No período de convalescença, deve-se prestar muita atenção à dieta, e a equipe
de enfermagem deve estar atenta não apenas ao apetite do enfermo, mas também à
falta deste (FLORENCE, 1989). Assim, nessa fase de vida, é importante orientar a
mulher puérpera sobre os cuidados necessários quanto a sua alimentação.
6.2.3 Cuidado com o repouso
Nightingale (1989) priorizava o conforto e bem-estar dos pacientes, orientava a
atenção às suas necessidades. Para ela, a doença nem sempre era a causa dos
sofrimentos que a acompanham, mas os sintomas e ou sofrimentos, muitas vezes,
decorrem da falta de cuidados adequados às necessidades do ser humano.
Proporcionar o repouso necessário nesse período que a mulher puérpera vive,
faz parte do cuidado que o enfermeiro deve dispensar, a fim de que haja um mínimo de
dispêndio do seu poder vital, inclusive porque as inúmeras idas e vindas para o
hospital (CTINeo) e a sobreposição de papéis como mãe, dona de casa, esposa,
mulher, dificultam o repouso, levando-a ao estresse.
Conhecendo Violeta não conseguia conciliar o repouso por causa das
freqüentes visitas, e a falta de descanso estava diminuindo suas energias, conforme o
96
seu relato:
Estou muito cansada, não consigo dormir ou descansar durante o dia. Não
param de chegar visitas e eu me sinto constrangida em não atendê-los
(Violeta).
Reconhecendo A vivência de uma situação de estresse e autocobrança
atrapalha a restauração da saúde e fortalecimento do poder vital.
Selecionando as Estratégias
Foram estipuladas algumas formas de diminuir
as visitas e permitir o repouso de Violeta, explicando-lhe como poderia comunicar às
pessoas que ficava muitas horas acordada, precisando dormir, por estar ainda em fase
de recuperação da saúde, e devendo descansar.
Seguindo e Agindo
Conversou-se com a ajudante do lar e também com a irmã
da Violeta sobre como elas poderiam auxiliá-la.
Acompanhando a Trajetória
Conseguindo repousar mais, essa mulher passou
a se sentir mais fortalecida.
Proporcionar um repouso adequado para as mulheres, sem haver interrupções
nesse repouso, parece ser uma meta difícil de atingir, tanto no puerpério normal,
quanto no de alto risco. Esse repouso pode estar prejudicado pelos desconfortos físico,
como dor, edema e contrações uterinas após o parto, bem como pelo próprio ambiente
hospitalar, com seus ruídos, uma cama diferente, os horários das rotinas, as
necessidades do bebê e as visitas dos profissionais e familiares (ZIEGEL, 1985).
Ainda, de acordo com Ziegel (1985), o repouso é essencial para a saúde da mãe.
Lidar com tantas mudanças pode ser quase impossível para uma mulher cansada que
raramente reivindica tempo para suas necessidades. Sendo assim, é obrigação da
equipe de enfermagem modificar o ambiente e promover o repouso.
Florence (1989) expressava sua preocupação com o repouso para a restauração
da saúde, ao escrever sobre a interferência do ruído desnecessário, o que prejudica o
sono e descanso, fragilizando a capacidade vital.
97
6.2.4 Desconhecimento sobre puerpério de alto risco
Quando se trabalha com mulheres que vivenciam o puerpério, especialmente o
de alto risco, o profissional de saúde precisa compreender a dimensão educativa de sua
atividade, estar consciente de seu papel enquanto educador em saúde e estar ciente da
dimensão da influência que pode exercer com relação à evolução da mulher nesse
período. Existe uma tendência em voltar-se a educação em saúde desenvolvida entre as
puérperas para o aleitamento materno; entretanto, as necessidades educativas das
mulheres não se restringem apenas a essa questão (CARRARO, 1998).
As mulheres sujeitos desta pesquisa não evidenciavam diretamente suas dúvidas
sobre o puerpério de alto risco. Na verdade, sequer haviam pensado sobre quais
dúvidas poderiam ter. Estavam tão envolvidas com o bebê e sua condição de saúde,
que somente evidenciaram seu desconhecimento em relação ao que estavam sentindo
ou às transformações por que estavam passando, quando foram questionadas
diretamente.
Conhecendo Considerando o cuidado com suas necessidades físicas e
fisiológicas, foi observado que as mulheres não tinham conhecimento sobre o que
estavam vivenciando, o que era normal, necessitando, porém, que isso fosse
investigado.
Ainda não parei para pensar o que está acontecendo comigo, o que estou
sentindo. Sinto muitas tonturas. Sinto dor e ardência na barriga quando faço
limpeza em casa (Margarida).
Lembro um pouco do que aconteceu depois que tive o meu outro filho, mas
agora é tudo diferente, não sei se o que está acontecendo comigo é normal. A
minha barriga ainda está tão inchada. Será que a minha pressão vai
melhorar? Ela ainda está alta (Rosa).
....ainda sai sangue e os meus seios doem.. Não tenho com quem conversar
sobre o que está acontecendo comigo e com as minhas filhas (Jasmin).
Tenho sentido dor na incisão e acho minha barriga muito grande (Violeta).
Acho que estou fazendo uma hérnia porque eu não parei quieta depois que o
nenê nasceu. Quando fui para casa, logo comecei a dirigir para vir para o
Hospital (Violeta).
98
Reconhecendo
Havia desconhecimento, por parte dessas mulheres, do que
acontecia com seu organismo no período do puerpério, mesmo sendo esse um
puerpério de risco.
Selecionando as Estratégias Verificou-se que as mulheres referidas neste
estudo tinham necessidades e que suas dúvidas precisavam ser esclarecidas.
Seguindo e Agindo Conversou-se sobre a adaptação do organismo às
mudanças que ocorrem no puerpério, especialmente no puerpério de alto risco.
Conseguiu-se articular, com parcerias, as necessidades individuais de repouso e de
avaliação médica, no caso de Violeta. Discutiu-se com a equipe sobre o modo de
adaptar o ambiente para haver mais conforto enquanto as mulheres permanecessem na
Unidade Neonatal, como cadeiras confortáveis e posição da mulher, enquanto esta
estivesse ao lado do seu bebê.
Acompanhando a Caminhada
Retomou-se, nos encontros seguintes, a
discussão sobre os cuidados no puerpério, como também uma reflexão e reavaliação,
com a enfermeira, das ações e processo educativo implementado. Observou-se que as
mulheres demonstravam-se satisfeitas por se sentirem mais cuidadas.
O puerpério é considerado o período das seis primeiras semanas pós-parto,
reunindo o puerpério imediato e tardio, em que ocorrem os principais fenômenos
involutivos do corpo e colo do útero, vagina e trato urinário. Nesse período, a mulher
pode apresentar alguns sinais e sintomas aos quais devemos estar alertas, a fim de
detectar precocemente as complicações e, principalmente, aliviar o desconforto
desencadeado (ZIEGEL,1985; LOWDERMILK, 2002). A esse puerpério, somam-se
as alterações e cuidados específicos exigidos em função da patologia obstétrica,
caracterizando o puerpério de alto-risco.
Tendo em vista esse momento, é fundamental que os profissionais em saúde
esclareçam as mulheres puérperas sobre as alterações ocorridas em sua vida,
lembrando-se que “Educar em saúde é fomentar a responsabilidade individual,
subsidiando o ser humano com os conhecimentos necessários para que ele possa
reivindicar seus direitos e ampliar seus horizontes de saúde” (CARRARO, 1998, p.
124).
99
6.2.5 Dificuldades na amamentação
Mesmo que exista uma produção adequada de leite e a mulher consiga
amamentar, algumas dificuldades podem surgir em relação à amamentação. A ênfase
dada por Violeta a esse fato, que estava lhe trazendo desconfortos muito intensos,
justificou o seu apontamento como sub-tema.
Conhecendo: Dificuldades de amamentar relacionadas à dor no mamilo,
conforme relato de Violeta.
Sinto dor no mamilo. Os dois mamilos estão machucados. (Violeta).
Reconhecendo: Fissuras nos mamilos por posição e pega inadequada para
amamentar. Isso estava provocando um grande desconforto, podendo estar relacionado
à diminuição da produção de leite, fatos esses que estavam fragilizando o poder vital
de Violeta. Reconheceu-se também a necessidade de educação em saúde.
Selecionando as Estratégias: Combinou-se que Violeta seria auxiliada durante a
amamentação.
Seguindo e Agindo A equipe assistencial passou a atuar mais no sentido de
auxiliar Violeta no aleitamento materno e nos cuidados com o mamilo, implementando
também as ações de educação em saúde relacionadas à posição do bebê, pega
adequada e proteção do mamilo.
Acompanhando a Trajetória
Observou-se melhora na integridade do mamilo
e diminuição da sensibilidade. Violeta também achou que havia aumentado a produção
do leite, sentindo, por isso, mais feliz.
Nos dias de hoje, costuma-se dar ênfase à técnica correta da amamentação, pois
isso previne traumas nos mamilos e garante à criança a retirada de mais leite,
conforme assinala Oliveira (2005), que também descreve a posição confortável da
mulher e a pega correta para sucção. O autor ainda esclarece que o próprio leite
materno é cicatrizante, ajudando, assim, na prevenção e no tratamento das fissuras nos
mamilos.
100
Mesmo diante das dificuldades em amamentar devido à dor, a decisão de
continuar amamentando o bebê, segundo Silva (2003), tem relação com a prioridade
percebida pela mãe, que estabelece a sua decisão em continuar amamentando, e isso a
auxilia a superar dificuldades.
6.2.6 Sentindo-se cuidada
Quando há a proposição de cuidar do ser humano, nesse caso, as mulheres que
vivenciaram o puerpério de alto risco, o que mais se quer é que o cuidado realizado
seja efetivo, ou seja, que as mulheres realmente se sintam cuidadas.
Conhecendo A mulher e a situação de puerpério de alto risco vivenciada.
Reconhecendo: A adaptação ao puerpério de alto risco, as situações de educação
em saúde evidenciadas. A revitalização do poder vital ficou evidenciada nos relatos
realizados no último encontro, o que se verifica pelas seguintes falas:
Me senti cuidada por todas no grupo, isto me deixou mais tranqüila e à
vontade para esclarecer as dúvidas. Achei muito bom o fato de podermos
conversar e as dúvidas já serem esclarecidas na hora, e o que estava nos
incomodando, era esclarecido ou providenciado. Foi muito bom podermos
conversar, sem rigidez de horário, tu não estavas nos avaliando ou julgando,
estavas do nosso lado, nos cuidando (Rosa).
O grupo foi muito importante para mim. Me deram muita força, quero
agradecer a todas (chora). Queria te dizer que o carinho que tens conosco,
ajuda a nos sentirmos mais fortes (Margarida).
Fiquei feliz em dividir minhas angústias com alguém que estivesse pronto a
me ajudar, sem cobrar que eu fosse perfeita [...] não sei o que conversaste
com meu marido, mas ele está me ajudando mais, meu filho voltou a ir para a
escola e está mais tranqüilo (Violeta).
Constatou-se que as estratégias selecionadas vieram ao encontro das
necessidades dessas mulheres.
Seguindo e Agindo Nesta etapa, observou-se que as estratégias selecionadas e
implementadas de acordo com o que foi conhecido e reconhecido, nem sempre
conduziram à resolução de todos os problemas, mas conseguiram fortalecer as energias
101
da mulher puérpera, de modo que ela própria buscasse se cuidar e cuidar de si.
Acompanhando a Trajetória Constatou-se, ao cuidar dessas mulheres, que
pequenas atitudes, orientações, apoio e carinho, assumiram dimensões grandiosas na
potencialização do poder vital, e os relatos das mesmas mulheres subsidiaram o
pensar-fazer-pensar na prática do cuidado às mulheres em puerpério de alto-risco.
Ao cuidar das mulheres no puerpério de alto risco, ouvir o seu relato, afirmando
que sentiram cuidadas, representou, para mim, um fortalecimento e me deu mais
razões para um constante repensar, no sentido de ampliar esse cuidado.
O puerpério é considerado um tempo de restauração, de mudanças, de
encontros, de interação, de troca, trazendo consigo uma carga cultural, com valores,
mitos, crenças. E, ainda que essa carga cultural possa colidir com o conhecimento
científico, precisa ser respeitada e considerada, para haver um cuidado efetivo. Nesse
contexto, é necessário observar atentamente as reações da mulher, atenção esta que
subsidiará a ação de cuidado a ser prestada. Deste modo, a Enfermagem consegue
atingir o seu objetivo, que, segundo Nightingale (1989), é propiciar ao ser humano as
melhores condições para que seu poder vital possa ser potencializado, para um viver
saudável.
7 ANALISANDO A AMPLIAÇÃO DO CUIDADO
Quando iniciei este estudo, sob muitos aspectos, cuidar das mulheres
considerando suas reais necessidades, já fazia parte de minhas atividades profissionais;
isso já havia sido delineado, através de leituras e das próprias vivências profissionais.
Assim, muitas vezes, a ação de cuidar era exercida a partir da minha ótica, da minha
vivência e das minhas próprias necessidades.
Propus-me a desenvolver um cuidado diferenciado às mulheres que estavam
vivenciando um período/tempo, também diferenciado, em suas vidas, qual seja, o
puerpério de alto risco. Portanto, eu não precisava somente da minha experiência, ou
vivência profissional; precisava introjetar essa nova maneira de cuidar e confortar a
que eu me propunha. Precisava ser para poder estar com elas. Isso fez com que
houvesse uma transformação no meu modo de conceber o ser humano mulher
enquanto ser cuidado, pois, como enfatizam Carraro e Radünz (1996, p.51), “Muitas
vezes é disso que o ser humano precisa: sentir que estamos com ele, junto dele!”.
A frase “vamos cuidar do ser humano dentro de suas reais necessidades e
valorizar o seu saber” nos diz muito, é tão bonita, que nos faz parecer importantes,
enquanto também seres humanos. Entretanto, na prática, no dia-a-dia, isso tem muito
mais significados do que se pode imaginar. Exige um envolvimento muito maior em
um número também muito maior de situações e necessidades do que as questões
técnicas, que tão bem são conhecidas. Dessa maneira, valorizar o próprio saber passa a
ter um significado diferente quando entramos no mundo da pessoa que estamos
cuidando, porque, em muitos casos, o nosso saber técnico-científico não é o suficiente
para o cuidado, pois, conforme escreveu Florence (1989), o cuidar das pessoas deve
estar fundamentado no conhecimento e no calor humano.
Até este ponto do presente trabalho, foi fundamentada e apresentada a proposta
de cuidado, relatando-se as trajetórias com as mulheres. Neste capítulo, depois de
visualizar toda essa trajetória e refletir sobre a mesma, busca-se registrar a ampliação
103
do cuidado à mulher no puerpério de alto-risco, a partir da aplicação do Modelo de
Cuidado de Carraro.
Para atingir esse objetivo, tanto o meu olhar, quanto a reflexão, estão
sistematizados a partir das etapas do modelo. Todavia, a fundamentação teórica,
especialmente os escritos de Florence e o marco conceitual deste estudo servem como
sustentação para a ampliação do cuidado proposta.
Vale registrar que o meu desabrochar nesse processo de cuidar, alicerçado em
um modelo de cuidado, leva a identificar-me com Carraro e Radünz (1996, p.51), que
salientam que o “estar com” pode tomar diversas formas: o segurar as mãos, o sorrir,
o secar o suor, um olhar, o ouvir. Sim! Nem sempre é preciso falar! Muitas vezes é
preciso ouvir e demonstrar “estou aqui!”. Enfim, faz-se necessário, além da
competência técnico-científica, colocar em prática a arte de ser enfermeira, para poder
promover o fortalecimento do poder vital das mulheres puérperas de alto risco.
7.1 Conhecendo-nos
1-CONHECENDO-NOS:
-Conhecer a mulher e a situação de puerpério vivenciado;
-Deixando-se conhecer.
Segundo Carraro(1994), sendo esta a primeira etapa da trajetória, configura-se o
início do relacionamento com o ser humano, sua família e a situação por eles
vivenciada. Tem por finalidade conhecer e obter informações que possibilitem a
continuidade do processo.
Esta etapa, adaptada para este estudo, caracteriza-se por conhecer a mulher e a
situação de puerpério vivenciada e deixando-se conhecer.
Conhecer a mulher e a situação de puerpério vivenciada
Considerando os conceitos do Marco Conceitual que emergiram nesta trajetória,
a mulher puérpera foi vista como “um ser capaz, dotado de uma percepção e
104
conhecimento próprio, integral, indivisível, insubstituível...”
6
A convivência com as
mulheres deste estudo revelou o quanto elas eram diferentes entre si e, ao mesmo
tempo, tinham tantas aspectos em comum naquele período. Cada uma delas, com o seu
conhecimento e percepção, vivenciou o puerpério de alto risco de forma ímpar, cada
qual com as suas expectativas, evidenciando que, mesmo de forma oculta, cada uma
delas não era somente mãe ou somente mulher: era e é um ser integral, indivisível, e,
dentro de seu contexto, insubstituível.
A mulher puérpera, “[...] inserida em um contexto social...”, evidencia a
necessidade de conhecer também a família, partindo do princípio de que esta também
tem expectativas relacionadas à situação vivenciada por essa mulher, tendo uma
influência direta no modo como essa mulher vivencia o puerpério de alto risco, como
se cuida e cuida de si. Segundo Carraro (1994), paciente e família não são
consideradas receptores, mas atuantes no cuidado. Conforme essa perspectiva, é
necessário, além de conhecer a família e o ambiente familiar, conhecer igualmente a
maneira como estes influenciam no modo de potencializar ou fragilizar o poder vital.
Urge saber-se quem é esta mulher e quais são suas singularidades na vivência
do puerpério de alto risco. Bricêño Leon (1996), quando escreveu as Sete Teses de
Educação Popular, partiu de dois princípios básicos: é preciso conhecer o ser humano
para poder contar com ele, ou seja, somente conhecendo o indivíduo, suas crenças,
seus hábitos, suas circunstâncias de vida pessoal na família, na comunidade e na
sociedade, será possível uma ação de cuidado que desenvolva na mulher puérpera o
sentimento de cuidar de si. Ninguém pode cuidar da saúde do outro, se este não quiser
fazê-lo por si mesmo.
Salienta-se que é preciso também conhecer o meio ambiente – “[...] que
abrange o ambiente externo e interno [...] e que é evidenciado na convivência com as
mulheres do grupo – , saber o quanto este ambiente, tanto interno, quanto externo,
interfere no modo como a mulher vivencia o puerpério de alto risco. É necessário que,
tanto o enfermeiro, quanto a mulher puérpera, conheça o ambiente desta e como ele
pode interferir na melhora das condições de saúde de ambos, mãe e bebê.
Por isso, recomenda-se à Enfermagem e ao enfermeiro, que “mantenham na
6
Neste capítulo, as expressões que estão em itálico são recortes do marco conceitual deste trabalho.
105
sua essência a sensibilidade na percepção integral do outro”. É necessário que se
perceba e se procure conhecer a mulher puérpera na totalidade do seu ser, para poder
cuidá-la.
Segundo Boykin(1998), o enfermeiro entra no mundo daqueles a quem cuida
com a intenção de conhecê-los como pessoas cuidadoras e de atendê-las nesse
processo de vivenciar o cuidado.
Sendo assim, o enfermeiro que pretende ser uma presença autêntica e
intencional junto à mulher que vivencia o puerpério de alto risco – sendo percebida
como uma pessoa que pode cuidar de si, mas também necessita ser cuidada –, busca
compreender como ela pode ser apoiada, mantida e fortalecida.
Deixando-se conhecer
Para que esse processo se efetive, não é apenas a mulher que precisa ser
conhecida; é necessário que o enfermeiro também se faça conhecer, não havendo,
porém, para isso, uma receita pronta, como a elaboração de um currículo. O
enfermeiro deve se deixar conhecer dentro de suas atividades no contexto hospitalar,
falando de suas vivências e experiências pessoais e do seu modo de pensar, na medida
em que tais aspectos possam trazer subsídios para que cada mulher puérpera consiga
vivenciar o puerpério de alto risco de maneira saudável.
No caso desta pesquisa, a etapa “deixando-se conhecer” foi vivenciada durante
todo o período de convívio da mulher com a equipe de saúde .
Conhecer a mulher não é, em conformidade com Florence(1989), apenas uma
coleta de informações variadas ou fatos curiosos, mas exige que se busquem subsídios
para salvar vidas e melhorar a saúde e o conforto.
A respeito desta etapa, considero que conhecer a mulher e deixar-me conhecer,
foi fundamental, no sentido de formar um elo de cumplicidade, para implementar as
ações de cuidado necessárias, de modo que, tanto a mulher puérpera quanto eu,
pudesse me cuidar e cuidar de mim, no sentido de fortalecer as próprias energias.
106
7.2 Reconhecendo a situação
2-RECONHECENDO A SITUAÇÃO:
-Reconhecendo a adaptação ao puer
p
ério e as situações
de risco
-Reconhecendo as situações de educação em saúde
-Percebendo a reação do poder vital
Esta etapa da trajetória, de acordo com Carraro(1994), caracteriza-se pela
reflexão sobre as informações obtidas na etapa anterior, fazendo “uma ponte entre o
teórico apreendido, o prático vivido, o teórico a apreender e prático a viver”(p.33).
Enfatiza ainda que essa reflexão conduz ao reconhecimento de como a situação
vivenciada se desenvolve.
No presente estudo, esta etapa caracteriza-se por reconhecer a adaptação ao
puerpério de alto risco, reconhecendo as situações de educação em saúde e percebendo
a reação do poder vital.
A adaptação ao puerpério e as situações de risco
Reconhecendo o puerpério de alto risco como “[...] período que inicia com o
nascimento do bebê, a partir do qual ocorrem as adaptações entre o esperado,
sonhado e o concreto, [...] alterado pela patologia da gestação e todas as suas
implicações [...]”. Nesse caso, reconhecer as necessidades de cuidado das mulheres,
mesmo quando não expressas verbalmente, mas evidenciadas pelo seu modo de agir
ou subentendidas através das falas, além dos cuidados técnico-científicos inerentes à
patologia da gestação, foi importante para embasar a seleção de estratégias, a fim de
fortalecer as energias dessas mulheres, contribuindo para que elas vivessem esse
período de forma mais harmoniosa e saudável.
Salienta-se ainda a importância de reconhecer a interferência da patologia
obstétrica que caracterizou a gestação de alto risco na vivência desse puerpério, tais
como restrição da locomoção, alteração das funções vitais, necessidades nutricionais
especiais, suporte medicamentoso, dentre outros.
Destaca-se também o valor de reconhecer a capacidade de adaptação da mulher
como um ser integral à condição de mulher-mãe cujo bebê não está em seus braços,
107
sob seus cuidados, e sim na CTINeo, lembrando que essa mulher-mãe apresenta
necessidades de cuidado específicas, pois está passando por vivências dicotomizadas
entre o sonhado, o desejado e o concreto.
O puerpério, segundo Carraro (1999), é um tempo de riscos, em que se deve
estar alerta à reação do organismo da mulher. Nesse contexto, o estresse pode interferir
na vivência do puerpério de alto risco, expondo a mulher, segundo Mello Filho (1992),
a uma alteração do sistema imunológico, diminuindo sua resistência, ou, ainda,
conforme Soifer(1992), levar a uma situação de crise que provoque uma depressão
puerperal e somatizações, como febre, constipação e anúria, dores gerais, entre outras.
A mulher puérpera deve ser vista como “[...] um ser capaz, dotado de uma
percepção e conhecimento próprio [...] vivendo uma condição de stress momentâneo
[...] e sua adaptação ao puerpério de alto risco. Neste estudo, além de reconhecer o
modo como a mulher estava vivenciando o puerpério de alto risco, também foi
importante reconhecer os diferentes significados que o puerpério de alto risco tinha
para cada mulher em particular, e o quanto isso interferiam na reação do poder vital.
Ressalta-se ainda o valor de reconhecer também as necessidades de educação em
saúde de cada mulher em particular e do grupo.
Além disso, evidencia-se o meio ambiente “interno caracterizado pelas suas
crenças, valores, medos, expectativas [...]” e externo “[...] caracterizado pelo
ambiente hospitalar (físico) com as suas particularidades como ruídos, cheiros,
pessoas, procedimentos, enfim, todo o contexto hospitalar, o contexto familiar e social
[...], considerando-se o quanto ele interfere na vivência do puerpério de alto risco,
ou seja, como cada mulher consegue interagir com o seu ambiente, de forma a
canalizar suas energias para um viver saudável.
As situações de educação em saúde
A Enfermagem deve reconhecer a necessidade de utilizar “[...] estratégias
educativas de prevenção de doenças, manutenção e recuperação da saúde”,
reconhecendo ainda as situações de educação em saúde, o que a mulher puérpera quer
e necessita saber, tendo como referencial a valorização dos seus (da mulher) saberes e
de seu modo de pensar, e não o que o profissional poderia determinar. É preciso
108
também haver conhecimento sobre a situação vivenciada, qual seja, o puerpério de
alto risco, destacando-se as necessidades dessa mulher e as maneiras de cuidar de si.
É imperioso também reconhecer as situações de educação em saúde em relação
à família, para que seus membros também tenham conhecimento da situação de
puerpério e das necessidades de cuidado vivenciadas no puerpério de alto risco, sendo
ainda necessário reconhecer o quanto as questões familiares podem contribuir, no
sentido de fortalecer essa mulher, restaurando a saúde, com o menor dispêndio de
energia. Por outro lado, a família não esclarecida, que não consegue compreender as
necessidades de cuidado como respeitar a convalescença, o repouso , que não
entende as limitações da mulher na realização das atividades diárias, e não a auxilia na
organização do ambiente doméstico, entre aspectos, provocará o aumento do estresse,
fragilizando o poder vital dessa mulher.
Salienta-se ainda que o reconhecimento de situações de educação em saúde se
fez presente em todos os encontros referentes a este estudo, tanto os individuais, em
grupo, quanto com os membros da família.
Perceber a reação do poder vital
A mulher puérpera possui um poder vital, que “é conceituado como força
interior, direcionada para a vida saudável”. Desse modo, faz-se necessário
reconhecer também as estratégias que cada mulher usa, com base em sua vivência,
contexto cultural, senso comum, entre outros, para que ela própria possa promover a
reação do seu poder vital, direcionando-o para um viver saudável.
Cabe também salientar a necessidade de reconhecer as situações vivenciadas,
relacionando-as ao ambiente interno e externo, ao puerpério de alto risco, à presença
da enfermagem e às situações de cuidado e conforto recebidas, reconhecendo também
o quanto cada situação vivenciada interfere na capacidade dessa mulher em provocar a
reação do próprio poder vital. Florence (1989), em seus escritos, valoriza as
condições ambientais no favorecimento da reação do poder vital, conforme a
sustentação do marco conceitual “Ambiente externo deve assegurar a higiene através
dos cinco pontos essenciais (ar puro, água pura, rede de esgoto eficiente, limpeza e
iluminação) e o Ambiente interno necessita manter o equilíbrio necessário para a
potencialização do poder vital”.
109
Na convivência com as mulheres puérperas deste estudo, reconhecer o modo
como estavam vivenciando esse momento, suas necessidades de cuidado e educação
em saúde, foi fator importante para poder fortalecer o poder vital dessas mulheres,
bem como para auxiliá-las a restaurarem e manterem a saúde.
Para esse reconhecer, o profissional precisa se despir de pré-conceitos,
percebendo, assim o que realmente a mulher evidencia. Cabe citar uma estória,
relatando a fala de uma senhora idosa, escrita em forma de poema por Boykin (1998,
p. 41): “[...] então abra bem os teus olhos, enfermeira, vamos abra os teus olhos,
chegue mais perto e veja, veja sim, além desta criatura velha e rabugenta, -VEJA A
MIM”.
Nesta etapa do reconhecer, muitas surpresas surgiram. A principal delas foi
reconhecer realmente as situações vivenciadas pela mulher puéroera, a partir do que
foi possível conhecê-la, precisando repensar algumas idéias prévias sobre os cuidados
por mim definidos como necessários e nem sempre evidenciados nas necessidades por
elas demonstradas. Nesse sentido, houve uma transformação no meu modo de pensar,
ver e reconhecer as situações e as necessidades de cuidado evidenciadas e as não
demonstradas, mas necessárias, devido ao puerpério de alto risco. Em vários
momentos, também foi preciso reconhecer, de forma muito clara, aquilo a que eu
havia me proposto fazer e o modo como eu estava conduzindo essa prática. Foi
importante retomar, com freqüência, o meu marco conceitual, para me auxiliar e
direcionar nessa trajetória.
7.3 Desenhando o trajeto e selecionando estratégias
3 - DESENHANDO O TRAJETO E SELECIONANDO
ESTRATÉGIAS:
-Desenhando o trajeto a ser percorrido, com base no que foi
reconhecido junto à mulher puérpera.
-Selecionar as estratégias de ação da enfermeira e mulher puérpera, de
acordo com o trajeto desenhado.
Esta etapa caracterizou-se pelo desenho do trajeto a ser percorrido, tendo como
110
base o conhecimento e o reconhecimento da situação em que “ciência e arte
salientaram-se e complementaram-se” (CARRARO, 2001, p.34).
Após conhecer a mulher e deixar-se conhecer, bem como reconhecer a sua
particular adaptação ao puerpério de alto risco, as situações de educação em saúde e
perceber as reações de seu poder vital, foi necessário desenhar o trajeto a ser
percorrido e selecionar as estratégias, junto à mulher puérpera.
Desenhando o trajeto
Para desenhar o trajeto com o grupo ou com a mulher puérpera
individualmente, considerou-se:
As mulheres puérperas como “diferentes entre si”; portanto, o trajeto a ser
desenhado também foi individual, sendo que os encontros e a forma como estes
aconteceram foram únicos para cada mulher, envolvendo ou não sua família, de acordo
com a vontade expressa por aquela. Os encontros em grupo são necessários e
importantes para acompanhar as situações que são vivenciadas ou expressas por todas
as mulheres e que, conforme Wall (2001), proporcionem a sensibilização para
aprender a conhecer, a fazer, a ser, a viver juntos, com a finalidade de impulsionar a
mulher para um viver mais saudável, potencializando o seu poder vital.
O ambiente “interno e externo” e o quanto este interfere na vivência do
puerpério de alto risco, bem como na reação do poder vital. Este ambiente também tem
influência em relação a desenhar o trajeto, sendo o número de encontros, o momento e
o período em que estes ocorrem definidos por essa influência.
O enfermeiro, que tem “direitos e deveres diante da lei e da ética e que
mantenha na sua essência a sensibilidade e percepção integral do outro”, utiliza o
conhecimento e o reconhecimento da situação para, junto à mulher puérpera, desenhar
o trajeto a ser percorrido, observando o respeito e os preceitos éticos.
Selecionando as estratégias
A seleção das estratégias de ação do enfermeiro e da mulher puérpera é
realizada em consonância com o trajeto desenhado.
Em relação ao presente estudo, a seleção das estratégias teve como ponto de
111
partida as necessidades de cuidado, conforto e ações educativas evidenciadas pela
mulher que vivencia o puerpério de alto risco, que, enquanto ser humano, precisa e
quer ser cuidada e confortada”, nessa fase de sua vida. Esta seleção de estratégias
também teve por base as competências da Enfermagem fundamentadas na “percepção
integral do outro, reconhecendo suas necessidades de cuidado”.
Para desenhar o trajeto e selecionar as estratégias, algumas modificações na
proposta inicial fizeram-se necessárias. Inicialmente, a minha proposta era realizar
encontros em grupo para cuidar dessas mulheres, e o fato de conhecê-las e reconhecer
a adaptação ao puerpério de alto risco, evidenciou a necessidade de encontros
individuais, de envolvimento com a família, com outras instâncias do hospital e com
comunidade onde tais mulheres residiam; ou seja, para poder cuidá-las, foi necessário
trajetar a seu lado.
Pelo fato de que alguns encontros com as mulheres ocorreram na própria
Unidade Neonatal, a seleção de estratégias também foi compreendida, introjetada e
complementada pela equipe de enfermagem.
7.4 Seguindo e agindo
4 - SEGUINDO A AGINDO:
- Seguindo com o grupo pelo trajeto desenhado;
- Implementando as estratégias selecionadas.
Esta etapa, segundo Carraro (1997), proporcionou à Enfermagem seguir com o
ser humano e sua família na vivência da situação, sendo que é neste momento que
ocorre a implementação das estratégias. As ações são “executadas pelo enfermeiro,
pela equipe, pelo paciente e por sua família, de acordo com a habilidade de cada um e
coma competência exigida para a estratégia escolhida”(Carraro (1997, p.35).
Este foi o momento de seguir com a mulheres pelo trajeto desenhado,
implementando as estratégias selecionadas. Tais ações foram desenvolvidas por mim,
pela enfermeira que me acompanhou nesse processo, pela equipe de enfermagem da
Unidade, pela família e pelas mulheres-puérperas integrantes do grupo, de acordo com
112
a competência de cada um.
Seguindo com as mulheres puérperas pelo trajeto desenhado
O número de encontros, o local e o horário dos encontros, a necessidade de
envolver a família e o modo de fazê-lo, as estratégias de cuidado e educação em saúde
a serem implementadas foram sendo definidas ao longo do trajeto desenhado,
conforme se foi conhecendo, reconhecendo, desenhando o trajeto e selecionando as
estratégias de maneira muito interligada, contínua, retornando-se à etapa anterior
sempre que isto se fazia necessário.
Implementando as estratégias
Considerando-se que a mulher puérpera é “um ser capaz, dotado de uma
percepção e conhecimento próprio”, ela é, por conseguinte, também capaz de
implementar estratégias selecionadas que sejam de sua competência, no sentido de se
cuidar e cuidar de si.
Cuidar é entendido no sentido de se alimentar, dormir até conseguir se sentir
mais descansada, realizar a atividade física de acordo com as suas possibilidades em
cada momento, manter a adesão ao tratamento proposto.
Já cuidar de si é considerado no sentido de cuidar de sua atitude frente à vida no
seu ambiente interno, envolvendo ainda, conforme Radünz (1999), os cuidados que
abrangem a totalidade do ser, sendo a responsabilidade de cuidar de si da própria
pessoa. Se cuidar e cuidar de si também são entendidos no sentido de fortalecer suas
energias, para que essa mulher tenha condições de cuidar do seu bebê.
Considera-se que a Enfermagem e o enfermeiro têm a capacidade de
percepção integral do outro, reconhecendo suas necessidades de cuidado”,
possuindo também “[...] habilidades e domínio técnico-científico [...]” para definir e
implementar os cuidados necessários a serem prestados de acordo com a sua
competência profissional, utilizando as estratégias de educação em saúde de acordo
com as necessidades de cada mulher e/ou família.
Igualmente, evidencia-se, nesse contexto, a necessidade e importância do
conhecimento técnico-científico, no sentido de implementar cuidados relacionados às
113
alterações fisiopatológicas provocados pela gestação de alto risco vivenciada. Na
implementação desse cuidado, durante o desenvolvimento do presente estudo, (???)a
interligação das etapas foi evidenciada, indicando a necessidade de se retornar
constantemente, ao se conhecer a situação de risco vivenciada por essas mulheres,
reconhecendo seu modo de se adaptar a tais situações, para selecionar e implementar
as estratégias.
Não foi o suficiente reconhecer qual a patologia que levou ao puerpério de alto
risco, medicando-se conforme a prescrição médica: houve necessidade de conhecer e
reconhecer o quanto as alterações fisiopatológicas da gestação continuavam
interferindo nas funções vitais durante esse puerpério. Houve uma necessidade de
cuidado peculiar mesmo que não claramente especificada, por não ter sido
verbalizada pelas mulheres deste estudo , cujo atendimento constituiu-se em
controlar e avaliar, não apenas os efeitos, no organismo da mulher, da alteração da
função renal, pressão arterial e vaso-espasmo de órgãos vitais provocada pela pré-
eclâmpsia , mas também os efeitos e conseqüências provocados pela anemia
originada da situação de hemorragia por descolamento prematuro da placenta e
também por anemia severa e processo infeccioso gestacional.
As estratégias de educação em saúde implementadas permearam todos os
encontros relativos a esta pesquisa, procurando-se identificar as dúvidas, por vezes
verbalizadas pelas mulheres puérperas, pela família e também pela equipe de
enfermagem.
Em outros momentos, as dúvidas não eram verbalizadas pelas mulheres
puérperas nem família, pois sequer sabiam sobre o que questionar, isto por não terem
conhecimento sobre a situação de puerpério de alto risco vivenciada. A partir disso, foi
importante para a enfermeira conhecer a situação, reconhecer as situações de educação
em saúde, para selecionar e implantar as estratégias ou ações de sua competência.
A respeito do ambiente, foi necessário amparar e auxiliar a mulher quanto à
familiarização com o ambiente hospitalar onde ela se encontrava e onde também se
encontrava o seu bebê, pela importância desse ambiente, para que a saúde dessa
mulher e a de seu bebê fosse recuperada ou mantida.
A preocupação da mulher com o próprio bebê e o fato de o ambiente em que
114
este se encontrava ser tão cheio de particularidades como equipamentos, ruídos,
sons, rotinas, normas, pessoas podem ter sido um fator gerador de ansiedades,
podendo ter fragilizado a capacidade vital da referida mulher. Segundo Jiménez,
Figueras e Bottet (1995), todos os recém-nascidos de risco, quer de modo geral, quer
com medidas terapêuticas individuais, devem ser submetidos à vigilância intensiva,
sendo obrigatório que o hospital disponha de uma unidade bem equipada, de pessoal
altamente especializado e em quantidade suficiente, para identificar precocemente as
alterações e implementar a terapêutica adequada para manter o bebê o mais próximo
possível de suas funções fisiológicas.
Ao se implementarem as estratégias de cuidado, as mesmas devem ser
consideradas como “[...].uma atitude de atenção integral à mulher que vivencia o
puerpério de alto risco, permeado por estratégias e ações de educação em saúde, para
ampará-la e apoiá-la no sentido de se cuidar e cuidar de si a fim de fortalecer suas
energias para um viver mais saudável”.
Durante a efetivação do presente estudo, contar com a presença, o apoio,
percebendo também a curiosidade da equipe de enfermagem, ao questionar a minha
proposta de cuidar das mulheres do grupo, considerando ainda as reflexões que a
equipe e eu fazíamos sobre a necessidade de repensar a prática do cuidado, e
observando que, aos poucos, algumas mudanças no cuidado estavam sendo
implementadas pela equipe de enfermagem, me fortalecia e me impulsionava a
continuar nessa trajetória.
Nesta etapa, por vários momentos, precisei repensar minha prática. Por mais
que eu tivesse conhecimentos técnico-científicos para cuidar das mulheres em
situações muito complexas, e reconhecesse a importância desses conhecimentos na
ação de cuidar dessas mulheres, que estavam vivenciando o puerpério de alto risco,
eventualmente houve dificuldade de encontrar a resolução para o problema Isto se
deveu ao fato de que a necessidade de cuidado evidenciada por elas não era apenas de
educação em saúde relacionada ao puerpério e aos cuidados com o bebê, havendo,
principalmente, a necessidade de apoio, conforto e presença.
Percebi que, para essas mulheres, o meu sorriso, o aperto de mão, o estar
presente era uma forma de cuidar, fortaleciam suas energias. Mas, para que fossem
115
possíveis a implementação e a manutenção dessa prática de cuidar, tanto eu, quanto a
equipe de enfermagem, necessitava me cuidar e cuidar de mim mesma, para, então,
poder cuidar da mulher que vivenciava um puerpério de alto risco.
7.5 Acompanhando a trajetória
5 - ACOMPANHANDO A TRAJETÓRIA:
- Apreciar cada etapa proporciona subsídios para a seqüência
do caminho;
- Observação e comparação de informações;
- Retroalimentando o trajeto, introduzindo inovações para
ampliar o cuidado.
A presente etapa desenvolveu-se de maneira dinâmica, interligada e contínua,
através do acompanhamento da trajetória, em conformidade com Carraro (1997). Foi
didaticamente dividida em quatro fases: apreciando as etapas da trajetória; observando
o decorrer da trajetória e comparando-a com observações prévias; estimando a
implementação das estratégias e retroalimentando a trajetória”(p.36).
Apreciando cada etapa
As etapas, em alguns encontros, tinham uma seqüência, ou seja, era possível
acompanhar as cinco etapas do modelo. Em outros, ao se implementar as estratégias,
era necessário retornar ao conhecer e reconhecer, pois as etapas anteriores não haviam
sido suficientemente exploradas, ou seja, o modelo proporcionou a flexibilidade de ir e
vir entre as etapas, num processo dinâmico.
Apreciar cada etapa proporcionou um novo olhar sobre o cuidado prestado
antes da realização deste estudo, fornecendo subsídios para a ampliação do cuidado na
prática do enfermeiro. O modelo permitiu que a mulher puérpera se deixasse conhecer
e que eu, igualmente, me deixasse conhecer. Esse conhecimento mútuo resultou numa
relação de cumplicidade, o que favoreceu o reconhecimento das situações de cuidado
vivenciadas no puerpério de alto risco e a reação do poder vital, tendo, assim, sido
possível selecionar e implantar as estratégias de cuidado. Dessa forma, cada uma das
etapas foi necessária para estabelecer um cuidado efetivo, correspondendo a um dos
116
objetivos deste estudo: “Cuidar de mulheres que vivenciam o puerpério de alto-risco
com a aplicação do Modelo de Cuidado de Carraro”.
Observação e comparação de informações
Estimar as ações de cuidado implementadas para as mulheres do grupo deste
estudo e também para outras mulheres que vivenciarem o puerpério de alto risco.
Ao observar e comparar as informações, verifiquei o quanto o encontro em
grupo, as conversas individuais e com os familiares estavam auxiliando essas mulheres
a vivenciarem o puerpério de alto risco de maneira mais saudável.
Por outro lado, no decorrer da trajetória, em várias situações, as ações
implementadas não foram suficientes, em determinados momentos em que foram
implementadas, para atingir o objetivo estabelecido de fortalecer as energias vitais da
mulher, necessitando, então, um novo desenho, uma nova seleção de estratégias. Em
alguns momentos, também, foi necessário lidar com os meus limites para agir, quando
foi preciso refletir sobre o cuidado necessário e o que era possível ser prestado, e, a
partir disso, repensei as estratégias, redirecionando competências, sempre que isso foi
possível.
Retroalimentando o trajeto para ampliar o cuidado
A partir da apreciação de cada etapa do modelo, observação e comparação das
informações, adquiriu-se embasamento para modificações e ajustes, ou, então, para a
manutenção dos cuidados já prestados, sendo esses cuidados como ocorreu nesta
prática e daí para frente amparados por um modelo de cuidado, fundamentação
teórica e um marco conceitual, podendo-se propor a ampliação do cuidado para além
deste estudo.
De acordo com esse contexto, cuidar da mulher no puerpério de alto risco exige
[...] habilidade técnica e conhecimentos amplos no sentido de identificar os riscos a
que esta mulher está exposta”, exigindo, ainda, atenção e respeito pelo ser humano,
tanto em relação ao nosso ser interior, quanto ao que estiver a nosso lado necessitando
de cuidado e conforto nessa fase da vida, para poder potencializar sua força interior,
com um mínimo de dispêndio de energia, para recuperar a saúde.
8 CONSIDERAÇÕES REFLEXIVAS
Durante o dia-a-dia dessa atividade profissional, sempre foi observado que a
mulher, mesmo tendo vivenciado uma gestação de alto risco, com internações
hospitalares e até mesmo risco de vida, ignora esse fato quando olha para o seu bebê.
Após o nascimento do filho, seus questionamentos e ansiedades são direcionados a ele,
como se ela não existisse. Ela torna-se apenas a mãe que se preocupa com o seu bebê.
Em decorrência disso, ela não se permite fragilidades ou queixas, numa tentativa de
ser forte para cuidar do filho(a).
Por outro lado, o sistema de saúde está estruturado de tal forma, que reforça
essa situação. A mulher, enquanto gestante, é merecedora de todas as atenções
necessárias para que a sua gestação chegue a termo, gerando uma criança o mais
saudável possível. Quando o bebê nasce, todas as atenções se voltam para ele e a
mulher puérpera é deixada de lado. Deixa de ser o foco do cuidado, para ser alvo de
cobranças para com o bem-estar do bebê. Este enfoque voltado para o bebê já conduz
ao descuidado da mulher para consigo mesma, o que se reflete na própria literatura
sobre o puerpério, a qual, na sua maioria, registra as alterações fisiopatológicas, sem
voltar-se para a mulher na sua integralidade.
Na literatura, foram escassas as abordagens sobre o cuidado à mulher após uma
gestação, e, sobre após a gestação de alto risco, não foi encontrada uma sequer. O que
se encontra é a descrição de patologias obstétricas; no entanto, sendo a patologia uma
causa obstétrica, assim que essa patologia não mais existir, a causa também não mais
existirá. Entretanto, muitas alterações patológicas persistem por um período após o
nascimento, e são diferentes de acordo com cada patologia e cada mulher, pois
dependem do risco pré-gestacional e das condições individuais da própria mulher, bem
como da relação com o ambiente em que essa mulher vive. Dessa maneira, ao se
iniciar este trabalho, considerou-se que o puerpério após uma gestação de alto risco
seria também um puerpério de alto risco.
118
Nesta prática, mesmo que muitos questionamentos fossem direcionados a
conhecer as condições do bebê, foi evidenciada, em vários relatos, a necessidade
dessa mulher de se sentir cuidada. Foram também apresentados os momentos e
maneiras como ela sentia falta desse cuidado. Tal apresentação foi feita de maneira
indireta, chamando a atenção para situações em que se sentiam desamparadas e não
compreendidas no seu ambiente, sendo que até por meio de uma frase não
pronunciada, percebia-se um desabafo: “estou fragilizada, preciso e quero ser
cuidada”.
A necessidade e desejo de serem cuidadas e confortadas surgem nessas
vivências de maneira velada, seguindo o curso do sistema cultural aí posto e imposto
às mulheres puérperas, a ponto de as necessidades de cuidados específicos não serem
referenciadas pelas mulheres na prática. Apenas uma situação em que, após a vivência
de uma pré-eclâmpsia grave, em que a mulher se mantinha hipertensa e com edema
acentuado, houve o questionamento sobre o tempo em que sua pressão retornaria aos
níveis normais. Era como se o risco que vivenciavam não tivesse mais importância,
diante do fato de o bebê estar vivo e necessitando dos seus cuidados. Era como se, no
momento mágico do nascimento do filho, a mulher-mãe deixasse para trás todas as
suas fragilidades.
Olhar as mulheres puérperas e conhecê-las, sem conclusões ou avaliações
precipitadas, dar-lhe importância e procurar entender o que é expresso por elas ou seus
familiares, no sentido de alertar para a necessidade do cuidado, faz com que se consiga
estabelecer e implementar estratégias que reforcem suas energias e potencializem sua
capacidade vital.
A prática do cuidado voltado às reais necessidades das mulheres, e não ao que a
equipe assistencial julga importante, considerado apenas sob a visão fisiopatológica,
mostrou que se pode ampliar o cuidado nessa atividade profissional voltada à saúde, na
grande maioria das vezes, com medidas simples, mas que apresentam resolutividade.
A partir das reflexões com as colegas e com a equipe de enfermagem, para
implementar as estratégias, conseguiu-se, por assim dizer, contagiá-los com uma visão
científica da prática do cuidado, assim como a palavra cuidar assumiu outras
dimensões, antes não percebidas. Essas reflexões também foram compartilhadas pela
119
equipe de médicos que integram o grupo especializado em atender as mulheres com
gestação de alto risco, e eles começaram a repensar sua prática, olhando a
integralidade do SER mulher, no puerpério de alto risco.
O referencial teórico-metodológico serviu de alicerce para o desenvolvimento
da prática, e, através dele, foi possível construir um caminho dinâmico do cuidado,
educação em saúde, análise e reflexão sobre as necessidades de cuidado dessas
mulheres, no sentido de potencializar sua capacidade vital.
A partir desta trajetória de cuidar, da reflexão com a equipe de enfermagem,
que gerou uma tomada de consciência da realidade vivida e que trouxe consigo um
desejo de mudança, acredita-se que este estudo venha a contribuir, no sentido de
ampliar a prática do cuidado à mulher no puerpério de alto risco para além do enfoque
fisiopatológico, levando a um cuidado à mulher, considerando-a um ser humano
integral, indivisível e insubstituível, em um contexto social e familiar, reconhecendo-a
como possuidora de um poder vital, que deve ser direcionado para um viver saudável.
O cuidado sistematizado a partir de um modelo para direcionar as atividades
práticas, sustentado por um referencial teórico e amparado por um marco conceitual
que alerta para o puerpério de alto risco, foi fundamental para que o cuidado às
mulheres atingisse os objetivos propostos para este estudo, quais sejam, cuidar e
analisar a ampliação do cuidado. Além disso, esse cuidado sistematizado pode auxiliar
a Enfermagem e os enfermeiros para um novo olhar à mulher que vivencia essa
condição de puerpério.
Considerando os resultados obtidos com este estudo, onde se procurou
conceituar e sustentar o puerpério de alto risco a partir, ou como conseqüência da
gestação de alto risco, faz-se necessário repensar esse conceito como proveniente
apenas dessa gestação. Isto porque, mesmo que a situação de gestação de alto risco
tenha influenciado na vivência do puerpério das mulheres que participaram desta
pesquisa, tal influência não se mostrou limitada às questões determinadas pela
gestação de alto risco, o que leva a se pensar que uma mulher, mesmo não tendo
vivenciado uma gestação de alto risco, pode vir a vivenciar um puerpério de alto risco,
caso suas necessidades de cuidado não sejam atendidas, seja pela sua particular
adaptação ao puerpério, ou pela influência familiar, circunstancial, social e/ou
120
hospitalar.
Para a realização deste estudo, algumas limitações surgiram, dentre estas, o fato
de que poucas mulheres participarem do grupo, mesmo que esse tenha sido o total de
mulheres que se enquadravam nos critérios de inclusão naquele período. Além desta,
citam-se, como outras limitações, as situações de gestação de alto risco e a variedade
de alterações causadas no puerpério e também a situação de não poder contar com
todas as mulheres do grupo até o final do estudo. Além destes fatores, a falta de
literatura para fundamentar as situações de puerpério vivenciadas limitou a sustentação
de puerpério de alto risco, desafio este lançado para os próximos estudos.
O cuidado realizado, mesmo dentro dessas limitações, conduziu aos resultados
vivenciados nesta prática junto às mulheres puérperas de alto risco, e pode servir de
embasamento para a ampliação do cuidado no cotidiano da Enfermagem, despertando,
também, para um novo enfoque, mais amplo e humanístico na formação dos
profissionais.
Conhecer, reconhecer a situação vivenciada e sua relação com o ambiente; as
necessidades de cuidado; as questões de educação em saúde e a reação do poder vital
das mulheres puérperas; a seleção e implementação de estratégias que proporcionem o
apoio e atuação da família dentro de suas competências; a importância e necessidade
de o enfermeiro servir de referência para essa mulher, formando o elo entre a mulher, a
situação vivenciada, a família e todo contexto que permeia a vivência do puerpério de
alto risco, são fatores que auxiliam a mulher puérpera de alto risco a, conforme as
orientações de Florence (1989), fortalecer o poder vital, direcionando-o para um viver
saudável.
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Científica Ltda.,2001
ZIEGEL, Erna, CRANLEY, Mecca S. Enfermagem obstétrica. Rio de Janeiro:
Interamericana, 1985.
APÊNDICES
APÊNDICE 1
Planilha utilizada para registro em diário de campo, contemplando os 5 passos do
Modelo de Cuidado de Carraro
Relato da
Mulher
Conhecendo-
nos
Reconhecendo
a Situação
Selecionando
as Estratégias
Seguindo e
Agindo
Acompanhando
a Trajetória
Elaborado a partir de Carraro (1994)
APENDICE 2
DECLARAÇÃO
Declaro, para os devidos fins e efeitos legais, que, objetivando a atender as exigências
para a obtenção de parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, e, como
representante legal da Instituição, tomei conhecimento do projeto de pesquisa Cuidando das
Mulheres no Puerpério de Alto Risco, e cumprirei os termos da Resolução CNS 196/96 e
suas complementares, sendo que, como esta Instituição apresenta condições para o
desenvolvimento desse projeto, autorizo a sua execução nos termos propostos.
Local, /......./.........
ASSINATURA
CARIMBO DO/A RESPONSÁVEL
APÊNDICE 3
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
CURDO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM SAÚDE E SOCIEDADE
Projeto de Pesquisa
O CUIDADO ÀS MULHERES NO PUERPÉRIO DE ALTO RISCO
CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
1 Esclarecimento sobre as pesquisadoras
ILSE MARIA KUNZLER é enfermeira, especialista em Enfermagem Obstétrica, atualmente
atuando como docente no curso de graduação em Enfermagem no Centro Universitário
Feevale, na cidade de Novo Hamburgo, RS. É aluna do Curso de Mestrado em Enfermagem,
Saúde e Sociedade, do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC, além de atuar
como Assessora Técnica da área materno-infantil do Hospital São Rafael.
DRA. TELMA ELISA CARRARO é enfermeira, pós-doutora, docente adjunto IV do
departamento de Enfermagem e do programa de Pós-Graduação em Enfermagem da
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC; é Coordenadora do Grupo de Pesquisa
Cuidando e Confortando do PEN/UFSC. e Orientadora deste estudo.
Objetivos e justificativa da pesquisa
Falar em puerpério lembra mudança. Mudança essa que ocorre na vida da mulher em
decorrência da transição ao papel materno.
Esse período de mudanças conduz à reflexão sobre a necessidade de potencializar,
segundo Florence (1989), o poder vital, protegendo essa mulher de tudo que a faça perder
energia, de modo a manter ou recuperar a saúde.
Por se tratar de um puerpério após uma de gestação de alto risco razão pela qual é
tratado neste estudo como “Puerpério de Alto Risco” é necessário conhecer a patologia
obstétrica presente, bem como suas repercussões no puerpério e todas as dimensões de
cuidado. É necessário repensar o cuidado, ou seja, quais os cuidados de que essa mulher
necessita.
Tendo em vista a fundamentação acima, você está sendo convidado a participar, como
voluntário/a, deste estudo, que tem os seguintes objetivos: Aplicar o Modelo de Cuidado de
Carraro junto a mulheres que vivenciam o puerpério de alto-risco e analisar a ampliação do
cuidado às mulheres que vivenciam o puerpério de alto-risco, com a aplicação do Modelo de
Cuidado de Carraro.
129
2 Procedimento
Ao concordar em participar desta pesquisa, estou ciente de que:
a) Participarei de encontros em grupo, cujos horários e datas serão definidos pelas
mulheres participantes do grupo, conforme disponibilidades individuais;
b) Nesses encontros, onde serão definidas estratégias de cuidar, utilizando a
metodologia do cuidado de Carraro, serei cuidada através de troca de conhecimentos;
c) Os encontros poderão ser realizados em grupo e também individualmente, de
acordo com as necessidades de cada integrante do grupo;
d) Poderei realizar contato via telefônico ou por e-mail com a pesquisadora, a
qualquer momento, durante a pesquisa, se isso for necessário;
e) As informações deste estudo serão de conhecimento apenas da pesquisadora e
sua orientadora. Estarão arquivadas em documentos particulares daquela, com acesso
restrito. Para haver segurança em relação aos dados, estes serão copiados em
disquetes, sendo, a seguir, arquivados;
f) A pesquisadora manterá a mim e aos demais membros da minha família e
outras pessoa envolvidos no anonimato.
2) Riscos e benefícios aos participantes
a) Riscos
Estou esclarecida de que sou livre para desistir da pesquisa em qualquer momento, sem que
corra o risco de ser discriminado com relação ao atendimento na Instituição.
b) Benefícios
Estou esclarecida de que minha participação nesta pesquisa poderá me auxiliar na vivência do
puerpério de alto risco, de acordo com as minhas necessidades, potencializando
minhas energias vitais (poder vital).
Estou ciente de que não terei ônus com a participação nesta pesquisa.
Dúvidas e comentários
Caso eu, futuramente, tenha outras dúvidas, poderei solicitar esclarecimentos com a
própria Enfa. Ilse Maria Kunzler, pelos telefones 051-99899471 ou 051-35936701, bem como
por
Caso eu, por alguma razão, não queira contatar com a Enfa. Ilse, poderei entrar em
contato com o Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina,
através do endereço abaixo:
Comitê de Ética em Pesquisa
Universidade Federal de Santa Catarina
Caixa Postal; 476 – Florianópolis – SC
CEP: 88010-970
Ou pelo Telefone: 3331-9320
3) Consentimento
Eu consinto, voluntariamente, a participar desta pesquisa. Tenho uma cópia deste
consentimento sob minha guarda e a segunda está sob a guarda da pesquisadora responsável.
MINHA PARTICIPAÇÃO NESTA PESQUISA É VOLUNTÁRIA. Eu sou livre para recusar
130
a participar desta pesquisa ou desistir dela a qualquer momento, sem que essa situação venha
a me trazer problemas.
____/_____/_____ ________________________
Assinatura do Participante
Nome
Assinatura das Pesquisadoras:
________________________________
Enfª Ilse Maria Kunzler
__________________________________
Enfa. Dra. Telma Elisa Carraro
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