cotidianamente os “hábitos, as maneiras de julgar, eleger, sentir e perceber a vida em
sociedade” (ZENHA, 2000, p. 237).
A geração “arte-pop”
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inebriava-se com as inúmeras futilidades que iam sendo
criadas; e, de certa maneira, compartilhavam da necessidade e da vontade de consumi-las,
mesmo que a maioria dessas “novidades” não fosse acessível a todos os segmentos sociais,
conforme demonstrou a crônica; mesmo sabendo-se que essa forma de consumo não se
apresentasse tão superficial, devido às influências criativas, o que tornou a idéia de uma
passividade televisiva pouco provável, embora tenha sido essa a forma ressaltada pela
maioria, segundo se pode observar na seguinte crônica:
[...] Pouco a pouco desaparecem os agradáveis piqueniques de familiares e
amigos, pobres e ricos, substituídos pelos americanizados coquetéis
residenciais ou nos clubes, nos quais só o soçaite se delicia nos salgadinhos
sem gosto, enfeitados de rodelinhas de azeitona e salsicha, o tira-gosto da
moda após cada taleigada (taleigada mesmo) de uísque gelado. Instituiu-se a
civilização dos enlatados. As danças típicas sumiram-se. Só se dança nos
dias que correm, cada homem e cada mulher, separadamente, ou homem
com homem e mulher com mulher, pinotando ou caretando que nem macaco,
na barulheira e histerismo do roquenrol. Não se bebem mais cajuínas, sim
coca-cola., expressão de progresso das coletividades patrícias. A panelada de
bucho e tripa e a mão-de-vaca, comida de sustança na confecção de macho
verdadeiro, cederam lugar aos perfumados estrogonofes. O cinema tem
fundamento na violência. Criança não ouve mais as encantadoras estórias
das vovós bondosas. Educam-se nos xôs da xuxas. O texto é um só, no
Brasil: bumbum de fora, pornografia no ar. A linguagem de gatos e gatas e
até de mestre qualificados vigora, deformada, no ie-iê da nação toda. TU e
VOCÊ são pronomes idênticos. A novela orienta a juventude, a maturidade ,
a velharia para o desrespeito recíproco. Pais e filhos se xingam. O bicheiro
tem “status” – e aos estudantes serve de exemplo a uma carreira de conforto
e de conquista amorosas fáceis. Dinheiro a rodo lucram os profissionais da
esperteza. Muitos homens de variado tipo usam brinco nas orelhas e difunde,
a usança pela tevê.
A televisão brasileira, de propriedade dos espertos, dos tubarões de
publicidade, praticam verdadeiro crime espiritual. UNIFORMIZANDO o
Brasil. Música, cantoria, cozinha, vestuário, usos, hábitos, costumes,
estórias, sexo, brinquedos infantis, livros, teatro, cinema, perfume, linguajar,
lendas, modos de mentir, diversões – tudo, mais alguns anos, estará bitolado.
Educação para comprar, para gastar dinheiro na aquisição de quanta
impostura a indústria fabrique. Afeto um só: presente para a mãe, para o
namorado, para o pai, para cada classe do dia que a inteligência dos
negociantes aponta. As cousas e práticas regionais desaparecem a cada
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A geração “art-pop” desenvolveu-se com o movimento da Pop Art, que tinha um apelo voltado para a cultura
comercial, onde essa era sua fonte inesgotável, com a utilização de materiais fotográficos, publicidade,
ilustrações de revistas e histórias em quadrinhos.