Download PDF
ads:
Universidade Federal de Uberlândia
Faculdade de Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação
GERALDO GONÇALVES DE LIMA
O GRUPO ESCOLAR HONORATO BORGES EM
PATROCÍNIO – MINAS GERAIS (1912 – 1930): ENSAIOS DE
UMA ORGANIZAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO PRIMÁRIO.
Uberlândia – MG
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
Universidade Federal de Uberlândia
Faculdade de Educação
Programa de Pós-Graduação em Educação
GERALDO GONÇALVES DE LIMA
O GRUPO ESCOLAR HONORATO BORGES EM
PATROCÍNIO – MINAS GERAIS (1912 – 1930): ENSAIOS DE
UMA ORGANIZAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO PRIMÁRIO.
Dissertação apresentada à Banca
Julgadora do Programa de Pós-
Graduação em Educação da
Universidade Federal de
Uberlândia, como exigência parcial
para obtenção do Título de Mestre
em Educação, na linha de pesquisa
História e Historiografia da
Educação, sob a orientação do Prof.
Dr. Décio Gatti Júnior.
Uberlândia – MG
2006
ads:
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UFU / Setor de Catalogação e Classificação
L732g
Lima, Geraldo Gonçalves de, 1977 -
O Grupo Escolar Honorato Borges em Patrocínio –
Minas
Gerais (1912 -1930) : ensaios de uma organização do ensino
público primário / Geraldo Gonçalves de Lima. - Uberlândia,
2006.
163f.
Orientador: Décio Gatti Júnior.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de
Uberlândia, Programa de Pós-Graduação em Educação.
Inclui bibliografia.
1. Educação - História - Teses. 2. Escolas públicas - Teses.
I. Gatti Júnior, Décio. II. Universidade Federal de Uberlândia.
Programa de Pós-
Graduação em Educação. III. Título.
CDU:
37 (091)
Dedico este trabalho à minha família, em especial,
à Elaine, esposa, companheira e fiel,
que durante estes anos
me estimulou a nunca desistir
e a seguir firme na caminhada.
Agradecimentos
Primeiramente
a Deus, força maior;
aos meus professores do Mestrado,
em especial ao meu orientador, Décio;
a todos os meus amigos e familiares, que de
uma forma ou de outra souberam me estimular;
às instituições que contribuíram para a
fundamentação deste trabalho, em especial,
à Universidade Federal de Uberlândia,
à Fundação Casa da Cultura de Patrocínio,
à 29.ª SRE de Patrocínio e
à Escola Municipal Honorato Borges.
“A escola como instância central dos sistemas educativos modernos e contemporâneos,
estatais ou não, assumiu funções de produção e reprodução sócio-cultural, funções de
controle e conformação ao nível dos comportamentos, ideologias, representações e
expectativas, mas também funções de mobilidade, libertação, construção. Uma história muito
rica e diversificada, nos planos estrutural e conjuntural, marcada por grandes investimentos
teóricos e práticos, nos planos macro, micro e meso e sob abordagens comparadas e
abordagens específicas.
(Justino Magalhães)
“Entre eles se privilegia o da escolarização, em muitos espíritos transformado no único e
grave problema da nacionalidade.”
(Jorge Nagle)
“Nesse contexto, a criação dos grupos escolares era defendida não apenas para “organizar”
o ensino, mas principalmente, como uma forma de “reinventar” a escola, objetivando tornar
mais efetiva a sua contribuição aos projetos de homogeneização cultural e política da
sociedade (e dos sujeitos sociais), pretendidos pelas elites mineiras. Reinventar a escola
significava, dentre outras coisas, organizar o ensino, suas metodologias e conteúdos; formar,
controlar e fiscalizar a professora; adequar espaços e tempos ao ensino; repensar a relação
com as crianças, famílias e com a própria cidade.“
(Luciano Mendes de Faria Filho)
“Vitória das luzes e da razão sobre as trevas e a ignorância. “Alicerce das sociedades
modernas, garantia de paz, de liberdade, da ordem e do progresso social”; elemento de
regeneração da nação. Instrumento de moralização e civilização do povo. Eis algumas das
representações sobre a educação em vigor no Brasil no fim do século XIX.”
(Rosa Fátima Souza)
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE QUADROS
LISTA DE TABELAS
INTRODUÇÃO.....................................................................................................................................................01
1. POLÍTICA E SOCIEDADE NA PRIMEIRA REPÚBLICA....................................................................19
1.1. Contexto histórico-brasileiro (1889 – 1930): a República Velha............................................................22
1.2. A questão educacional na Primeira República: ideário e discurso Liberal...................... ......................31
1.3. O Estado de Minas Gerais na República Velha.......................................................................................41
1.4. Município de Patrocínio – M. G.: origens até os anos 1920...................................................................46
1.5. Considerações Parciais............................................................................................................................61
2. A QUESTÃO DA MODERNIZAÇÃO DO ENSINO PRIMÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
NA REPÚBLICA VELHA............................................................................................................................68
2.1. Reforma João Pinheiro (1906): a escola como instituição civilizatória..................................................70
2.2. Implementação dos Grupos Escolares: expressão educacional do Republicanismo...............................78
2.3. Reforma Francisco Campos (1927/8): tentativas de modernização do ensino primário.........................85
2.4. Considerações Parciais.............................................................................................................................95
3. RACIONALIZAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO PRIMÁRIO EM PATROCÍNIO MINAS GERAIS:
O GRUPO ESCOLAR HONORATO BORGES (1912 – 1930).................................................................98
3.1. Criação (1912) e instalação (1914) do Grupo Escolar Honorato Borges em Patrocínio – M. G...........101
3.2. A importância do Grupo Escolar Honorato Borges e a construção (1928 – 1930) da nova sede..........107
3.3. A questão do tempo e o currículo escolar: a normatização do processo ensino-aprendizagem............118
3.4. Corpo docente e corpo discente: perfil e identidade..............................................................................132
3.5. Considerações Parciais...........................................................................................................................143
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................................................147
MATERIAIS HISTÓRICOS:............................................................................................................................155
Referências Bibliográficas......................................................................................................................155
Impressos.................................................................................................................................................158
Manuscritos.............................................................................................................................................158
Iconografia..............................................................................................................................................159
Depoimentos...........................................................................................................................................159
APÊNDICES:......................................................................................................................................................160
A. Termo de posse do primeiro Diretor: Professor Modesto de Mello Ribeiro............................161
B. Termo de posse da Professora Amelia Angelica do Nascimento.............................................162
C. Termo de posse da Professora Leticia Marra...........................................................................163
RESUMO
O presente trabalho refere-se a uma investigação realizada sobre a História das Instituições
Escolares e está relacionada à criação, implantação e organização do Grupo Escolar Honorato
Borges, localizado na cidade de Patrocínio – M.G. Este grupo escolar é considerado a
primeira escola da rede oficial implantada na cidade. O recorte temporal utilizado no
desenvolvimento da pesquisa abrange a criação do grupo escolar, ocorrida em 1912 e vai até
1930, quando é concluída a obra do atual prédio. A investigação foi desenvolvida por meio da
seguinte problemática: as implicações em torno do ensino público na cidade patrocinense e da
criação do Grupo Escolar Honorato Borges, pelos membros da oligarquia rural de Patrocínio,
ligado ao processo de escolarização promovido em Minas Gerais no decorrer da Primeira
República (1889 – 1930). A hipótese elaborada consiste no fato de que o processo de
escolarização de Patrocínio, através da criação de uma escola primária pertencente à rede
oficial de ensino, se manifesta como expressão direta de uma tentativa de modernização do
ensino, influenciada pelos ideais republicanos e positivistas de educação. A presente pesquisa
teve como objetivo geral compreender os fatores históricos relacionados à criação do Grupo
Escolar Honorato Borges, bem como sua finalidade enquanto instituição escolar no contexto
histórico da cidade. Além disso, objetiva também apreender os elementos das teorizações
sobre representações sociais vinculadas à História das Instituições Escolares, investigando as
especificidades relacionadas à fundação e organização do Grupo Escolar Honorato Borges,
instituição influente no universo social patrocinense, além do resgate dos elementos de sua
história. Em termos de metodologia, os procedimentos primeiros consistem no levantamento e
tratamento de bibliografia geral pertinente acerca da História e da Historiografia da Educação
nacional e estrangeira. Foi realizado um levantamento também de materiais históricos, no
sentido de fundamentar evidências ligadas à história do Grupo Escolar, bem como através da
imprensa local, cujos discursos proferidos referentes às questões políticas, sociais e
econômicas, servem de base para a compreensão dos ideários e modelos. Por outro lado,
também buscou-se evidências ligadas à História Oral, mas apenas como metodologia
acessória. Dessa forma, o grupo escolar é criado em torno do projeto republicano, liberal e
positivista, na tentativa de democratização do ensino, bem como da modernização estrutural
do Estado de Minas Gerais e do país. Além do mais, a oligarquia rural patrocinense, à frente
do poder executivo municipal, também se preocupava em proporcionar condições para a
formação escolar primária necessária para os membros das famílias patrocinenses. Além de
proporcionar a formação básica para o exercício profissional em alguns segmentos da
produção econômica e da burocracia nas repartições públicas, dava condições também para o
prosseguimento dos estudos em outros níveis da escolarização. Assim, a preocupação básica
do presente trabalho foi desenvolver uma investigação no sentido de buscar e resgatar a
história de uma importante instituição escolar tanto para a cidade de Patrocínio – M. G., como
para a região do Alto Paranaíba, bem como para o próprio Estado. Dessa forma, reconstituiu-
se parcela da história das instituições escolares, principalmente a que se refere aos Grupos
Escolares em geral, e especificamente, o Grupo Escolar Honorato Borges, voltada para o
processo de modernização e escolarização, pelo qual passa Minas Gerais no interior do
projeto republicano de progresso humano.
PALAVRAS-CHAVE: História da Educação; Grupos Escolares; Educação Pública.
ABSTRACT
The present paper refers to a carried out investigation about the History of School Institutions
and it’s related to the creation, introduction and organization of Honorato Borges Elementary
School, located in the city of Patrocínio – M.G.. This elementary school is considered the first
of the official chain introduced in the city. The timing approach used in the development of
the research reaches the creation of the elementary school, occurred in 1912 and up to 1930,
when the current building is concluded. The investigation was developed through the
following problem: the implications concerning the public learning in Patrocínio city and the
creation of Honorato Borges Elementary School ,by the members of rural oligarchy from
Patrocínio, connected to the process of schooling promoted in Minas Gerais along the First
Republic (1889- 1930). The elaborated hypothesis consists in the fact that the process of
Patrocínio schooling through the creation of a primary school belonging to the official
learning net, presents like direct expression of a trial of modernizing the learning influenced
by the republican and positivist ideals of education. The present research had as a general
objective to comprehend the historical factors related to the creation of Honorato Borges
Elementary School, as well as its purpose as school institution in the historical context of the
city. Besides this, it also has as an objective to apprehend the elements of theorizations about
social representations linked to the History of the School Institutions, investigating the
speficities related to the foundation and organization of Honorato Borges Elementary School,
influencing institution in the social universe of Patrocínio, besides the rescue of elements
from its history. In terms of methodology, the first procedures consist in a survey and
treatment of general bibliography belonging to the History and Historiography of and foreign
education. It was also made a survey of historical materials, in a sense of grounding evidences
linked to the history of the Elementary School, as well as through the local press, which given
speeches referring to political, social and economic matters, serve as basis for the
comprehension of ideals and models. On the other hand, evidences connected to the Oral
History were also searched, but only as an acessorial methodology. This way, the elementary
school is created around a republican liberal and positivist project, in the trial of the
democratization of learning, as well as the structural modernization of Minas Gerais state and
the country. What’s more, the rural oligarchy from Patrocínio, in charge of the city executive
power, also worried in providing conditions to the necessary elementary school formation for
the members of Patrocínio’s families. Besides supplying the basic formation for the
professional practice in some segments of economic production and the burocracy in public
departments, it gave conditions to the sequence of studies in other levels of schooling too.
Therefore, the basic concern of the present paper was to develop an investigation in the
meaning of getting and rescuing the history of an important school institution for the city of
Patrocínio and Alto Paranaíba region too, as well as for the very state. Thus, a part of the
school institutions’ history was reconstructed, mainly the one which refers to the Elementary
Schools in general, and specifically, the Honorato Borges Elementary School, turned to the
modernization and schooling process, by which Minas Gerais goes through inside a
republican project of human progress.
KEYWORDS: History of Education, Elementary Schools, Public Education.
LISTA DE FIGURAS:
01 – Mapa político de Minas Gerais com principais cidades..............................................47
02 – Jornal CIDADE DO PATROCÍNIO (Primeira Edição).............................................53
03 – Coronel Honorato Martins Borges e sua esposa, d. Perciliana de Aguiar................54
04 – Família do Coronel Honorato Martins Borges.............................................................55
05 – Sistema ferroviário atual de Minas Gerais...................................................................56
06 – Estação Ferroviária de Patrocínio, 1930.......................................................................56
07 – Dom Antônio de Almeida Lustosa.................................................................................58
08 – Funeral do Coronel Honorato Martins Borges, 1929..................................................59
09 – Local da primeira sede de funcionamento Grupo Escolar Honorato Borges.........104
10 – Antigo prédio do Grupo Escolar Honorato Borges...................................................105
11 – Novo prédio do Grupo Escolar Honorato Borges, concluído em 1930....................119
12 – Folheto comemorativo do Centenário de Nascimento do Professor Modesto.........135
13 – Professora Amélia Angélica do Nascimento...............................................................139
14 – Professora Letícia de Faria Machado.........................................................................139
15 – Foto turma formandos 1930.........................................................................................142
LISTA DE QUADROS:
01 – Horário do primeiro ano..............................................................................................
02 – Horário do segundo ano...............................................................................................123
03 – Horário do terceiro ano................................................................................................125
04 – Horário do quarto ano..................................................................................................125
05 – Programa de ensino da disciplina de Leitura (1.º ANO)...........................................130
06 – Diretores empossados Grupo Escolar Honorato Borges (1912 – 1930)...................136
07 – Professores nomeados para o Grupo Escolar Honorato Borges (1912 – 1930).......138
08 – Formandos do Grupo Escolar Honorato Borges – 1930...........................................141
LISTA DE TABELAS:
01 – População do Brazil por Estados (1872, 1890, 1900 e 1910)......................................44
02 – Relação do número de alunos por turma e professoras, 1922.................................111
03 – Tabela de vencimentos (Reforma João Pinheiro)......................................................134
INTRODUÇÃO
O desenho da dissertação:
O presente trabalho refere-se ao desenvolvimento de uma investigação sobre o
Grupo Escolar Honorato Borges, escola situada na cidade de Patrocínio, região do Alto
Paranaíba, Estado de Minas Gerais.
Consiste em uma análise acerca da História das Instituições Escolares,
especificamente sobre a Educação Pública, ligada à criação, instalação e ensaios da
sistematização do ensino público, através do Grupo Escolar Honorato Borges. Este grupo
escolar é considerado a primeira escola oficial em funcionamento no município patrocinense,
estando em atividade até os dias atuais. A proposta deste objeto específico de pesquisa se
demonstra pela relevância que o Grupo Escolar Honorato Borges tem, ainda hoje, para a
cidade de Patrocínio Minas Gerais e região do Alto Paranaíba, desde sua criação em 1912.
Por 34 anos, foi a única escola pública de ensino primário da cidade.
O nome do grupo escolar consiste em uma homenagem a Honorato Martins
Borges, nascido na fazenda do Caxambu, município de Santo Antônio do Amparo Minas
Gerais, a 14 de julho de 1853, sendo vereador, no tempo da monarquia. É um dos
responsáveis pela fundação do Ginásio Dom Lustosa (escola voltada inicialmente para a
formação masculina e mantida pela Congregação dos Padres dos Sagrados Corações de Jesus
e de Maria, de origem francesa), em Patrocínio Minas Gerais. Também contribuiu para a
criação da Escola Normal Nossa Senhora do Patrocínio (voltada a princípio para a educação
especificamente feminina e ligada à Congregação das Irmãs do Sagrado Coração de Maria de
Berlaar, de origem belga), também na mesma cidade. Além do mais, trouxe também para a
cidade a estrada de ferro Goyáz, em 1918. Proprietário e diretor do primeiro jornal de
Patrocínio, intitulado CIDADE DO PATROCÍNIO fundado e lançado em 1909. É
considerado, por muitos patrocinenses, um dos maiores chefes políticos, senão o maior, que a
cidade acolheu em seus longos anos. Foi Presidente do Diretório do Partido Republicano
Mineiro, em Patrocínio, desde 1904. Faleceu na cidade de Araxá, a 8 de maio de 1929, aos 76
anos de idade.
A escolha do objeto específico de estudo está diretamente relacionada com o fato
de ter nascido em Patrocínio – M. G. e aqui ter vivido boa parte da minha vida. Assim, através
da abordagem da História das Instituições Escolares de Patrocínio, especificamente do Grupo
Escolar Honorato Borges, encontro a possibilidade de estar contribuindo para o resgate da
memória de parte significativa da vida cultural e social da cidade, especialmente do início do
século XX.
O processo investigativo tem por justificativa o fato de se tornar possível a
compreensão das questões relacionadas à história e desenvolvimento da educação escolar
brasileira, buscando relacioná-la com aspectos da macro-estrutura (indicadores sociais,
cultura, economia, política, etc).
O interesse de implementar o processo de escolarização e sistematização do ensino
na cidade de Patrocínio se dá em torno do projeto republicano, liberal e positivista, de
promoção e de democratização do ensino, bem como da modernização do Estado de Minas
Gerais e, conseqüentemente, do país.
A oligarquia rural patrocinense (Coronéis Honorato Martins Borges, João Cândido
de Aguiar, Elmiro Alves do Nascimento, e outros mais), cujos representantes estão à frente
dos poderes executivo e legislativo municipais, também se preocupava em proporcionar
condições para a formação escolar primária, necessária para os membros das famílias
patrocinenses. Neste aspecto, o sentido de elite política pode ser assim compreendido:
Por teoria das Elites ou elitista de onde também o nome de elitismo se tende a
teoria segundo a qual, em toda a sociedade, existe, sempre e apenas, uma minoria
que, por várias formas, é detentora do poder, em contraposição a uma maioria que
dele está privada. Uma vez que, entre todas as formas de poder (entre aquelas que,
socialmente ou estrategicamente, o mais importantes estão o poder econômico, o
poder ideológico e o poder político), a teoria das Elites nasceu e se desenvolveu por
uma especial relação com o estudo das Elites políticas, ela pode ser redefinida
como a teoria segundo a qual, em cada sociedade, o poder político pertence sempre
a um restrito círculo de pessoas: o poder de tomar e de impor decisões válidas para
todos os membros do grupo, mesmo que tenha de recorrer à força, em última
instância. (BOBBIO, 2004: 387)
A abordagem investigativa se refere à seguinte questão: Quais as implicações em
torno da educação pública em Patrocínio M. G., referindo-se especificamente à criação
(1912), à instalação (1914) e da construção do novo prédio (1928 a 1930) do Grupo Escolar
Honorato Borges, através dos esforços dos membros da oligarquia rural de Patrocínio,
concernentes ao processo de escolarização promovido em Minas Gerais, no decorrer da
Primeira República (1889 – 1930)?
O recorte temporal, utilizado no desenvolvimento da pesquisa, compreende o
período entre a criação do grupo escolar, ocorrida em 1912 (através do Decreto n.° 3401, 09
de janeiro de 1912) até 1930, quando é concluída a obra do atual prédio da escola. Esta obra
foi possível devido aos políticos locais, junto ao governo do Estado de Minas Gerais, a fim de
construir um prédio mais apropriado para o funcionamento do Grupo Escolar Honorato
Borges.
A hipótese mais evidente a ser verificada é a de que o processo de escolarização do
município de Patrocínio, através da criação de uma escola de ensino primário pertencente à
rede estadual oficial de ensino, manifesta-se como expressão dos interesses da oligarquia rural
de Patrocínio em torno da tentativa de se fortalecer o ensino público oferecido na cidade.
Além de proporcionar a formação básica para o exercício profissional em alguns
segmentos da produção econômica e da burocracia nas repartições públicas, dava condições
também para o prosseguimento dos estudos em outros níveis de ensino.
Aspectos teóricos da História das Instituições Escolares:
A educação consiste no processo complexo capaz de ser promovido em diversos
setores e ambientes da sociedade. Contudo, a escola se manifesta como uma instância
privilegiada para a difusão, reprodução e assimilação de determinados valores e atitudes
frente à sociedade. A escolarização se torna um instrumento necessário para a efetivação de
determinados padrões sociais,
Mas, para além dos limites da escola, pode-se buscar identificar, em um sentido
mais amplo, modos de pensar e de agir largamente difundidos no interior de nossas
sociedades, modos que não concebem a aquisição de conhecimentos e de
habilidades senão por intermédio de processos formais de escolarização. (JULIA,
2001: p. 11)
O Grupo Escolar Honorato Borges é compreendido como expressão de uma
tentativa de se promover a escolarização institucionalizada na cidade, nos primórdios do
século XX, numa tentativa de superação do lastimável estado da educação pública,
acompanhando uma tendência não só estadual, mas também nacional.
Evidentemente, é importante perceber o quanto um determinado estudo pode
contribuir para a elucidação de aspectos históricos e se tornar um poderoso mecanismo na
reestruturação social, atuando como elemento de transformação.
A História e a Historiografia da Educação passam por um processo de renovação
em que a subjetividade é resgatada e busca ocupar lugar de destaque no processo de pesquisa
e da historiografia.
Há, dessa forma, uma ampliação das possibilidades de abordagem de objetos de
pesquisa referentes à História da Educação: a História das Instituições Escolares, num sentido
particular, bem como a questão da Cultura Escolar, num sentido mais global. Essas tendências
reforçam o interesse atual da historiografia em valorizar aspectos ligados às singularidades e
especificidades regionais e locais, antes descartadas ou ignoradas. Por isso,
[...] podemos dizer que, de modo geral, o processo de criação de instituições
coincide com o processo de institucionalização de atividades que antes eram
exercidas de forma não institucionalizada, assistemática, informal, espontânea. A
instituição corresponde, portanto, a uma atividade de tipo secundário, derivada da
atividade primária que se exerce de modo difuso e inintencional. Tendo em vista as
características indicadas, as instituições necessitam, também, se auto-reproduzir,
repondo constantemente suas próprias condições de produção, o que lhes confere
uma autonomia, ainda que relativa, em face das condições sociais que
determinaram o seu surgimento e que justificam o seu funcionamento. (SAVIANI,
2005: 29)
A orientação epistêmica se concentra na necessidade de se promover um diálogo
entre as concepções teóricas e as evidências históricas no processo de construções
interpretativas por parte dos pesquisadores em História da Educação. Por isso,
A História das Instituições Educacionais almeja dar conta dos vários atores
envolvidos no processo educativo, investigando aquilo que se passa no interior das
escolas, gerando um conhecimento mais aprofundado destes espaços sociais
destinados aos processos de ensino e de aprendizagem. Parece-nos que a ênfase
dada às análises mais sistêmicas cedeu lugar às análises que privilegiam uma visão
mais profunda dos espaços sociais destinados aos processos de ensino-
aprendizagem. (GATTI JR, 2001: 136)
Enfatiza-se também a importância de se realizar todo um trabalho de síntese e
reflexão sobre a questão das evidências das fontes históricas. O trabalho de pesquisa exige do
pesquisador uma postura interpretativa frente ao objeto de estudo, reavaliado em torno das
evidências. A Historiografia se desenvolve a partir do momento em que sujeito é afirmado
enquanto objeto e sujeito da pesquisa.
Através da Historiografia da Educação atual, percebe-se uma ampliação das
possibilidades de se realizar um trabalho de pesquisa em que a compreensão do papel das
instituições escolares é garantida. Neste sentido,
É importante salientar que o conhecimento do campo conceitual e das categorias de
análise, bem como o esforço de aglutinação de evidências históricas (a qualidade de
sua catalogação e conservação), caso tomado separadamente, o é suficiente para
a construção de interpretações históricas consistentes. De fato, o diálogo promovido
pelo pesquisador entre a teoria e as evidências impõe-se como condição importante
para a operação histórica, para a escrita de uma história da educação capaz de levar
em consideração a ação dos sujeitos em torno dos processos de escolarização
levados a termo pelo menos três séculos na cultura ocidental, com a marca das
disputas e acordos entre a confessionalidade, o Estado e a sociedade civil. (GATTI
JR e PESSANHA, 2005: 86)
A instituição escolar pode ser encarada como espaço privilegiado em que uma
série de valores é incorporada pelos sujeitos e as normas de conduta, praticadas em seu
interior, contribuem literalmente para a (con)formação aos padrões ideológicos em vigor.
Em qualquer segmento do conhecimento científico, as atividades desenvolvidas
devem ter um direcionamento capaz de garantir as necessárias condições de abordagem da
realidade. Assim, é preciso compreender primeiramente que
A história da educação é um discurso científico sobre o passado educacional, nas
suas diversas dimensões e acepções, tendendo para uma história total, mas é
também memória e paradigma. É memória educacional enquanto preservação,
organização e comunicação de materiais museológicos e arquivísticos, e enquanto
repositório de recordações e representações verbais (orais e escritas), emocionais,
afetivas, fisiológicas, organizadas, quer em quadros biográficos e grupais, quer
tomando por base referentes institucionais e sócio-comunitários. A história da
educação é também paradigma quanto ao pensar, ao dizer, ao escrever, ao projetar e
ao agir em educação, facultando uma informação coerente, evolutiva e explicativa,
mas constituindo-se também como um dos principais argumentos e conteúdos da
racionalidade e da ação educativa. (MAGALHÃES, 2005: 97 – 8)
De acordo com os pressupostos do investigador, várias possibilidades de se
realizar a pesquisa sobre a realidade escolar, constituída como elemento central da maior parte
do processo de educação ocorrido na sociedade.
A atitude do pesquisador se revela como a de um sujeito responsável pela
interpretação sobre os elementos reais da intricada realidade ligada à escolarização. A partir
dos dados captados, o historiador tem o papel de reinterpretar a história ao apropriar-se do
objeto examinado e, posteriormente, realizar-se-á uma síntese das dimensões da realidade
escolar. Além do mais,
A história das instituições educativas é um domínio do conhecimento em renovação
e em construção a partir de novas fontes de informação, de uma especificidade
teórico-metodólogica e de um alargamento do quadro de análise da história da
educação, conciliando e integrando os planos macro, meso e micro. É uma história,
ou melhor, são histórias que se constroem numa convergência interdisciplinar.
(MAGALHÃES, 2005: 98)
De acordo com a orientação teórica do autor, as categorias sicas de análise da
historiografia atual podem variar, com a intenção de se adequar às necessidades de
investigação próprias às ciências da educação.
São consideradas algumas categorias teóricas mais importantes e imprescindíveis
no delineamento das atividades investigativas em relação às instituições escolares. Deste
modo, na Historiografia da Educação atual, conforme Justino Magalhães, são utilizadas e
consideradas as mais importantes:
O espaço (local/lugar, edifício, topografia); o tempo (calendário, horário, agenda
antropológica), o currículo (uma acepção estreita, que resulta de uma justaposição
de categorias analíticas e objetos instituintes da realidade escolar, correspondendo
ao conjunto das matérias lecionadas e respectivos métodos, tempos, etc. (esta a
acepção adotada no Colóquio sobre Currículo que teve lugar em Granada em 1996),
ou uma acepção transversal à cultura e à realidade escolar, visão sintética de
influência anglo-saxônica e norte-americana, em que currículo corresponde a
racionalidade da prática (desenvolvimento curricular), uma verdadeira política
educativa; o modelo pedagógico escolar, a construção de uma racionalidade
complexa que articula a lógica estruturante interna com as categorias externas que a
informam e constituem um tempo, um lugar, uma ação; os professores, formas de
recrutamento, profissionalização, organização, formação, mobilização, por um lado,
suas histórias de vida, itinerários, expectativas, decisões, compensações,
representações espaços de liberdade do professor; manuais escolares, sua
construção e apropriação, por outro; públicos, culturas, formas de estimulação e
resistências; dimensões, veis da apropriação, transferências da cultura escolar,
escolarização, alfabetização, destinos de vida. (MAGALHÃES, 1998: p. 56)
Salienta-se a importância atual desse processo de renovação que vem atingindo a
História e a Historiografia da Educação, no sentido de garantir a sua eficácia na construção de
todo um referencial (teórico e metodológico) que possibilite a compreensão do fenômeno
educacional, sobretudo o promovido nas instituições de ensino escolar.
Percebe-se que nas últimas décadas, a pesquisa investigativa relacionada à
produção de conhecimentos no campo da História da Educação está passando por um intenso
processo de reformulação teórico-metodológico, ampliando as possibilidades paradigmáticas
de atuação.
Há a oportunidade de se realizar um trabalho de descrição, análise e reflexão
buscando as razões e os efeitos da implantação da Educação Escolar no Brasil, especialmente
aquela oriunda do poder político público, seguindo as tendências de valorização (pelo menos
idealizada) deste tipo de educação características da Primeira República: tal ideário era
formado por bandeiras liberais que propunham a liberdade de ensino, a gratuidade, a
obrigatoriedade e a laicidade para a instrução, além da adoção nas escolas do método
pedagógico intuitivo.
A história de uma instituição educativa não constitui uma abordagem descritiva ou
justificativa da aplicação de uma determinada política educativa, como também se
não confina à relação das instituições com o seu meio envolvente. A construção
deste objeto do conhecimento a instituição educativa como totalidade em
organização e desenvolvimento, na sua internalidade e na sua relação ao exterior
opera-se através de um marco teórico interdisciplinar e de uma hermenêutica
cruzada entre memórias, arquivos e museus, no âmbito de uma projeção e de uma
regressão investigativas um percurso metodológico indutivo/dedutivo.
(MAGALHÃES, 2005: 102)
Acompanhando as atuais alterações historiográficas, as pesquisas que se iniciam
voltadas para o estudo das instituições escolares demonstram-se extremamente relevantes,
pois surgem num contexto de profundas alterações no campo do processo educacional em
seus diversos âmbitos, ora no sentido de mudanças evolutivas em todo o sistema, ora na
permanência de elementos tradicionais e conservadores.
evidentes sinais de novos rumos na historiografia da educação: ampliação dos
objetos de estudos, tanto qualitativa como quantitativa; profunda reforma metodológica;
resgate da memória, enquanto receptáculo de tradições, reproduções ideológicas e
experiências de vida; ênfase no presente, mesmo manifestado como pretérito; abordagem
interdisciplinar para uma compreensão central dos fenômenos educacionais.
Percebe-se também a presença de novas orientações epistêmicas, fundamentando a
renovação historiográfica: uma centrada na questão especificamente escolar, procurando
esclarecer sua complexidade interna e, simultaneamente, sua relação com o exterior; a outra
estaria centrada apenas em quadros explicativos exteriores à realidade educativa. Isto é,
Quando consideramos a instituição educativa, isto é, quando tomamos a educação
na sua especificidade, como ação propriamente pedagógica, cuja forma mais
conspícua se expressa na escola, observamos que esse destacar-se da atividade
educativa em relação aos demais tipos de atividade o implica necessariamente
que as instituições propriamente educativas passem a deter o monopólio exclusivo
do exercício do trabalho pedagógico secundário. (SAVIANI, 2005: 29)
Essa valorização da instituição escolar, enquanto instância por excelência do
processo de assimilação de conhecimentos, da vivência de valores e da (con)formação aos
padrões de comportamento se explica-se pela centralidade que a escola vem assumindo na
constituição da formação pública. Por isso,
Com a afirmação dos estados modernos, a escola passa a ocupar um lugar central
como instância instrutiva e de formação. Se a historiografia da escola tem estado
sujeita a abordagens de sentido mais estreito, focalizadas a partir de olhares
externos, constituindo um paradigma de natureza essencialmente acadêmica e
enciclopédica, estruturado a partir de oposições / complementaridades e da busca de
fatores de permanência, também a ela se tem contraposto um outro paradigma mais
acentuadamente interno ao fenômeno escolar, com objetivos descritivos e
explicativos da realidade escolar, na sua multidimensionalidade e sua internalidade
como instituição, organização e comunidade marcada por uma racionalidade
pedagógica, uma cultura e uma autarquia de recursos públicos e serviços. Uma
corrente historiográfica que visa ir ao encontro da pedagogia institucional, sua
história e sua renovação. (MAGALHÃES, 1998: 58)
Conforme a nova Historiografia, esta focalização e multidimensionalidade
ressaltam a valorização do processo de escolarização como forma importante e notável de
estruturação da modernidade e da contemporaneidade.
A escola passa a ocupar um lugar de destaque no campo de pesquisa da História e
Historiografia da Educação, no sentido de fundamentar a formação de novas categorias
conceituais: o tempo, o calendário escolar, o currículo, o(s) espaço(s), a instituição educativa,
os professores, os manuais escolares.
Percebe-se, então, um intenso movimento de aproximação com o cotidiano
escolar, abrindo perspectivas de diálogo no âmbito das ciências educacionais. Neste sentido,
A escola ora é tomada em si mesma como um todo em organização, instituído num
contexto, ora é tomada como o principal referente e como eixo de estruturação de
uma racionalidade pedagógica e formativa, estando reservada à abordagem
historiográfica uma explicação e a inscrição da realidade educativa em quadros
sócio-culturais e político-ideológicos mais amplos. (MAGALHÃES, 1998: 55)
uma grande tendência atual de valorização das instituições escolares como
marco referencial para uma possível compreensão dos processos relacionados à educação
realizada no interior da sociedade.
A escola torna-se alvo de uma análise voltada para a compreensão do estatuto, da
natureza e do papel da escola enquanto forma de padronização de comportamento social e
individual, de coação e ordenação, como mecanismo de fortalecimento da ação estatal ou
ainda como meio de transformação e fortalecimento da autonomia pessoal.
E, a partir disso, torna-se possível o entendimento de toda a formação das gerações
no interior das comunidades:
Os sujeitos educacionais o o tão somente os alunos, como os atores não o
apenas os professores e os gestores, uma interação educativa, em que uns e
outros o simultaneamente emissores e receptores. A história desta interação, suas
processualidade e repercussão no tempo constituem um desafio fundamental da
história da educação e a história das instituições educativas é uma aproximação
fundamental. (MAGALHÃES, 1998: 64)
Tendo a recente renovação teórico-metodológica observada no interior da História
da Educação como marco referencial e seguindo a atual inclinação para a abordagem da
Educação Pública no Brasil, a presente pesquisa procura trazer uma contribuição para o
enriquecimento dos trabalhos realizados nesta temática relacionada à História das
Instituições Escolares. Assim sendo,
A centralidade da escola e a necessidade de corresponder a requisitos acadêmicos,
num período de grande expansão da formação de professores e de outros
profissionais de educação, têm favorecido o desenvolvimento de sínteses
historiográficas mais envolventes, procurando esboçar quadros sistêmicos,
interpretativos e de enquadramento, nem sempre de forma regular e equilibrada.
(MAGALHÃES, 1998: 56)
Fica evidente a importância de se desenvolver uma investigação acerca da História
das Instituições Escolares, enquanto categoria de análise para a condução de um entendimento
das variáveis em torno da educação pública na cidade de Patrocínio Minas Gerais, no
período da República Velha.
Dessa forma, nas últimas décadas, houve um movimento de intensificação da
produção de pesquisas acerca das instituições escolares. Em sentido mais restrito, destacam-se
as pesquisas realizadas sobre a criação, a implantação e o desenvolvimento de Grupos
Escolares pelo país, em especial no Estado de São Paulo, pioneiro na implementação dos
Grupos Escolares como paradigma escolar, bem como Minas Gerais, estudado neste trabalho
em questão.
Alguns trabalhos podem ser citados para ilustrar essa nova tendência no âmbito da
historiografia escolar, específica dos Grupos Escolares: a pesquisa realizada por Rosa Fátima
de Souza, numa obra intitulada Templos de civilização: a implantação da escola primária
graduada no Estado de São Paulo (1890-1910). Em São Paulo, a implantação dos grupos
escolares representou um movimento de tentativa de tornar a escola um mecanismo de
moralização e civilização do povo. Acreditava-se que, através da escola, fosse possível
também a transformação do indivíduo, atrelando a educação à cidadania. Um amplo projeto
civilizatório havia sido idealizado e a educação popular foi considerada frente imprescindível
de transformação social. A partir daí, questões relevantes como uma equiparação estadual das
escolas, a questão do tempo escolar, a formação dos professores compõem critérios e etapas
de uma ampla reforma do ensino, buscando sua racionalização.
Em Minas Gerais, também há um interessante trabalho realizado por Luciano
Mendes de Faria Filho, intitulado Dos pardieiros aos palácios: cultura escolar e urbana em
Belo Horizonte na Primeira República. Nesta obra, o autor investiga a educação pública
primária na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais. A perspectiva sugerida pelo próprio
título é a de que o processo de implementação dos grupos escolares está diretamente
relacionada com a organização anterior da instrução pública as escolas isoladas. Assim,
também esta obra conclui que o processo de escolarização levado adiante em Minas Gerais,
no decorrer da Primeira República, demonstra-se intimamente ligado ao processo de
racionalização do ensino público, bem como a urbanização da sociedade brasileira.
também outros trabalhos que poderiam ser enumerados e que refletem essa
tendência por estudar os Grupos Escolares: um estudo realizado por Ana Maria Beraldo
Crespo e Dalva Carolina de Menezes Yazbeck, da UFJF, intitulado Os primeiros grupos
escolares em Juiz de Fora. A implantação dos primeiros grupos escolares, em Juiz de Fora,
ocorre também nas primeiras décadas do século XX, no contexto da consolidação da Primeira
República, quando ocorreram as medidas no sentido de promover a racionalização
administrativa e burocrática do Estado. Por isso, havia dois intentos básicos: a consolidação
do regime republicano e a necessidade de se modificar as condições do ensino público no
estado mineiro, desde a precariedade do espaço físico das escolas até o alto índice de
analfabetismo.
Outro trabalho desenvolvido nesta perspectiva se intitula As singularidades do
Grupo Escolar Júlio Bueno Brandão no processo de construção da modernidade
(Uberabinha MG 1911 1929), realizado por Carlos Henrique de Carvalho e Luciana
Beatriz de Oliveira Bar de Carvalho. A criação da Escola Bueno Brandão teve como intento
propagar e desenvolver o ideal republicano na atual conhecida cidade de Uberlândia Minas
Gerais. Esta afirmação pode ser comprovada através das idéias divulgadas pelo primeiro
diretor da escola, professor Honório Guimarães, pois possibilitam afirmar um verdadeiro
movimento em prol da criação de uma escola pública na cidade e numa postura secularizada,
anticlerical.
Uma pesquisa realizada também sobre a escolarização mineira na Primeira
República intitula-se Grupo Escolar Gonçalves Chaves: um novo projeto escolar na cidade
de Montes Claros/MG, (1906 1927), de Fátima Rita Santana Aguiar e Sarah Jane Alves
Durães. Nesta investigação, compreende-se que a criação e a implantação deste grupo escolar
específico também estão de acordo com a tendência estadual de funcionamento num prédio
provisório e, depois de alguns anos, a construção de um prédio próprio para o
desenvolvimento do ensino, conforme previam os regulamentos. Isso demonstra que, embora
expresso nas legislações de ensino, a organização e a racionalização do ensino público seguia
na realidade um processo lento e gradual, não sendo possível a prática efetiva da expansão do
ensino, capaz de satisfazer a demanda real de escolarização.
E, por fim, mais um trabalho investigativo intitulado Cultura e vida escolar: o
Grupo Escolar de Lavras (1907 1925), de Jardel Costa Pereira e Tarcísio Mauro Vago, da
UFMG. A investigação vincula também o processo de racionalização do ensino com o
processo de urbanização da cidade de Lavras Minas Gerais. Isto demonstra o quanto a
tentativa de solidificar o ensino mineiro, através da Reforma João Pinheiro, de 1906, es
intimamente ligado também ao desejo de implementar o projeto de modernização do estado.
Todos esses trabalhos citados anteriormente foram apresentados no II Congresso
de Pesquisa e Ensino em História da Educação em Minas Gerais, realizado nos dias 6 a 9 de
maio de 2003, em Uberlândia – M. G..
Seguindo a tendência de renovação teórico-metodológica em torno da História da
Educação, o objeto específico em questão (Grupo Escolar Honorato Borges) precisa ser
abordado em vários sentidos, a fim de obter uma visão mais profunda sobre as diversas
variantes que o compõem.
Em conformidade com a renovação historiográfica pela qual a História das
Instituições Escolares vem sofrendo, indispensavelmente a necessidade de se realizar uma
reavaliação dos procedimentos metodológicos em torno do processo investigativo. Isso
garante a busca e a consolidação de um novo paradigma capaz de responder aos novos
desafios da pesquisa historiográfica educacional.
Aspectos metodológicos e fontes
Afim de efetuar o processo de investigação a respeito do Grupo Escolar Honorato
Borges, o levantamento e o tratamento das fontes de pesquisa foi realizado em várias frentes,
de modo a garantir a multiplicidade de evidências que proporcionem a reconstrução do
presente objeto de estudo.
O procedimento primeiro consistiu no levantamento e tratamento de bibliografia
geral pertinente sobre a História e a Historiografia da Educação, elaborada por autores
estrangeiros tanto como brasileiros. No sentido de acompanhar as atuais tendências, foi
realizada uma revisão bibliográfica e a mesma serve de pressuposto teórico e histórico para a
elaboração do presente trabalho investigativo.
Contudo, ainda percebe-se que a produção bibliográfica referente às realidades
locais e regionais ainda precisa passar por um processo de reavaliação intenso, buscando o
resgate da história local e reconstituir parte da historiografia do processo educacional do país,
sobretudo escolar.
Em relação à existência de obras referentes à contextualização histórica do
município de Patrocínio M. G., não esforços no sentido de um trabalho que realmente
conseguiria oferecer subsídios para reconstrução efetiva da evolução histórica do município.
As obras e manuais a respeito da história patrocinense se restringem a oferecer um panorama
evolutivo, cronológico e meramente descritivo de alguns dos fatos considerados importantes
frente à história local.
também alguns livros elaborados por memorialistas, por exemplo, a obra
Patrocínio no final da década de 20, de Flávio José de Almeida, uma espécie de compilação
de alguns dos principais artigos do jornal CIDADE DO PATROCÍNIO. Apesar de
interessados em resgatar parte da história de Patrocínio, os mesmos não utilizam de textos em
que haja referências às fontes documentais ou orais detalhadas ou claras, dificultando o
trabalho em termos de busca de evidências históricas.
Devido à escassa produção bibliográfica acerca da história do município de
Patrocínio Minas Gerais, a contextualização histórica do mesmo se baseia num
levantamento publicado no “Anuário de Patrocínio - Histórico, turístico e estatístico - 1999”
(Ano 03 n.º 03), sob responsabilidade do economista, historiador e jornalista Eustáquio
Amaral, com complementos de Alberto Sanarelli, jornalista e radialista. Consiste numa
descrição cronológica e pormenorizada de fatos considerados relevantes da história do
município, no que diz respeito aos principais eventos.
em relação à História da Educação, recentemente, houve significativa produção
de textos monográficos (sobretudo dissertações de mestrado) acerca de algumas das principais
instituições de ensino do município, dada sua importância para a escolarização da região do
Alto Paranaíba, principalmente.
As mesmas são utilizadas também como referenciais para a presente pesquisa e
servem no sentido de fazer um paralelo entre os fatores de gênese e consolidação das mesmas
e relacioná-los com os fatores ligados ao surgimento e consolidação do Grupo Escolar
Honorato Borges, por se referirem a um recorte temporal que, em partes, coincide com o do
Grupo Escolar.
Dentre estas pesquisas, pode ser citada, por exemplo, um estudo realizado por
Hedmar de Oliveira Ferreira (2000) sobre o Colégio Dom Lustosa História da Educação
Católica Masculina em Patrocínio (MG) – 1927 1952, tratando sobre a presença dos Padres
dos Sagrados Corações de Jesus e Maria e de sua atuação no município, no sentido de
propagar a fé católica.
Existe também um outro estudo realizado no sentido de compreender as disputas
ideológicas no campo educacional e religioso, assumidas tanto pelos padres já citados como
pela missão presbiteriana, fundadora do Patrocínio College. Esta pesquisa foi realizada por
José Filipe e Sousa Pessanha de Brito Ferreira (2004) e se intitula A evangelização pela
educação escolar: embates entre presbiterianos e católicos em Patrocínio, Minas Gerais
(1924 -1933).
O Colégio Berlaar Nossa Senhora do Patrocínio, das irmãs do Sagrado Coração de
Maria de Berlaar, também já foi alvo de pesquisas que se referem à educação católica
feminina em Patrocínio M.G.. Inicialmente, o Colégio tinha o interesse voltado para a
formação de professoras, oriundas das famílias patrocinenses e da região circunvizinha.
Além da pesquisa bibliográfica, foi realizado um levantamento também de fontes
documentais primárias, no sentido de fundamentar evidências ligadas à história do Grupo
Escolar Honorato Borges. Isso se torna importante no sentido de garantir a compreensão de
fatores ligados diretamente ao processo de escolarização da sociedade patrocinense. Neste
sentido,
Em relação a fontes, é possível, ainda, fazer uma outra distinção: as chamadas
fontes primárias e secundárias. As primeiras o o discurso direto, enquanto as
segundas são constituídas pela produção existente a respeito do tema que se estuda.
As fontes documentais de todo tipo têm sido privilegiadas pelos historiadores:
livros, opúsculos, revistas, coletâneas de leis e regulamentos, atas, projetos,
estatutos, artigos, discursos, dados estatísticos, imagens, fotos, desenhos, diários de
classe, cadernos de alunos, livros didáticos, cartas, memórias, biografias etc.
(BUFFA, 2005: 107)
Quanto às fontes documentais, as mesmas foram buscadas em vários locais da
cidade de Patrocínio. Contudo, como não uma preocupação, por parte da maioria das
instituições, em técnicas de conservação e manutenção documental, ou simplesmente por falta
de infra-estrutura predial, as mesmas se demonstraram fragmentadas, algumas em mau estado
ou abandonadas em locais impróprios para arquivo.
Mesmo assim, foram encontrados na 29.ª Superintendência Regional de Ensino as
seguintes fontes, referentes ao recorte cronológico determinado (1912 1930): Ponto diário
de aula (2.º ano misto) Grupo Escolar Honorato Borges (31/07/1915 a 27/11/1916); Termo
de posse Grupo Escolar Honorato Borges (08/07/1913 a 03/02/1997); Pontos de entrada de
professores e empregados (Grupo Escolar Honorato Borges): 15/06/1914 a 06/08/1915,
16/08/1915 a 23/02/1917, 09/02/1925 a 03/11/1925, 15/02/1926 a 13/10/1926, 15/10/1926 a
05/08/1926.
na atual Escola Municipal Honorato Borges (antigo Grupo Escolar Honorato
Borges), foram encontrados as seguintes fontes documentais: Pasta arquivo dados do
prédio; Pasta arquivo: reforma do prédio; Termo de visitas das autoridades do ensino; Livro
de atas para as reuniões do professorado: 04 de maio de 1925 a 21 de novembro de 1935;
Balancete da Caixa Escolar (outubro/1922 a fevereiro/1935); Ponto diário dos alunos (2.º ano
feminino): 1923 / 1924 / 1925; Ponto diário dos alunos (2.º ano misto): 1918 / 1919; Ponto
diário dos alunos (1.º ano misto): 1922 / 1923; uma pasta plástica contendo textos históricos
do Grupo Escolar, fotografias e relatos (compilada em 1975, por D. Clérida Borges Alves
ex-diretora).
No acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio M.G., ligada à Prefeitura
Municipal, encontram-se também algumas fotografias referentes ao recorte temporal da
Primeira República (1889 1930). As mesmas se referem a paisagens urbanísticas, sobretudo
do Largo da Matriz, local de construção de vários casarões e do funcionamento do primeiro
prédio do Grupo Escolar, bem como do Largo do Rosário, onde foram construídos alguns dos
prédios públicos mais importantes da cidade: bancos, fórum, armazéns e outros (inclusive o
novo prédio do Grupo Escolar). Aliadas ao acervo da própria escola, estas fotografias também
permitiram novas evidências ligadas à pesquisa iconográfica, importante como elemento da
reconstituição do objeto histórico em questão.
Foram encontrados também números do Jornal CIDADE DO PATROCÍNIO
(fundado pelo então coronel Honorato M. Borges em 1909 tornado órgão oficial da Câmara
Municipal e de periodicidade semanal). Embora a Casa da Cultura não possua todos os
números do mesmo, o jornal serviu de base para se conhecer e compreender o discurso da
imprensa da época em torno das concepções de mundo, de sociedade e de ser humano
veiculados nas notícias referentes sobretudo à educação. Os números encontrados englobam o
seguinte período, limitado desde o lançamento do jornal (1909) até o término do período por
mim determinado para a pesquisa em questão (1930): 11/12/1909 (1.º número editado);
18/10/1913; 11/01/1925 e 27/12/1925; números de 1926, 1927, 1928,1929; e alguns números
de 1930. Desse modo,
Como fonte primária, é necessário ressaltar que um órgão de imprensa é veiculador
de um ângulo de análise, porém não de somenos importância para nos propiciar o
movimento da história, seja ela local, regional ou nacional. Evidentemente, tal fonte
não é estritamente histórico-educacional, porém amiúde sua problematização incide
particularmente sobre o campo da escolarização, ora a abordando como fruto da
política educacional pública, municipal ou estadual, ora como fruto da iniciativa
particular, ou mesmo como reprodutora das relações sociais. (ARAÚJO e INÁCIO
FILHO, 2005: 177)
O discurso proferido nas páginas da imprensa local referente às questões políticas,
sociais e econômicas serve de base para a compreensão dos ideários e modelos em referência
aos processos de educação e do processo de modernização, bem como de escolarização pelos
quais Patrocínio vinha passando no decorrer de toda a Primeira República.
Também se buscou evidências ligadas à História Oral, mas apenas como
metodologia acessória e complementar, devido às dificuldades encontradas quanto ao
pequeno número de pessoas do período abordado ainda vivas, bem como pela questão da
lucidez ou dificuldade de memória. Assim, foram entrevistadas duas pessoas, ex-alunos do
período considerado na pesquisa (1912 – 1930): Geralda Pereira (aluna, 1923 a 1926 /
posteriormente professora e diretora) e Leôncio Afonso da Silva (formando em 1930). Em
outras palavras,
Finalmente, a evidência oral pode conseguir algo mais penetrante e mais
fundamental para a história. Enquanto os historiadores estudam os atores da história
a distância, a caracterização que fazem de suas vidas, opiniões e ões sempre
estará sujeita a ser descrições defeituosas, projeções da experiência e da imaginação
do próprio historiador: uma forma erudita de ficção. A evidência oral,
transformando os objetos” de estudo em “sujeitos”, contribui para uma história
que não só é mais rica, mais viva e mais comovente, mas também mais verdadeira.
(THOMPSON, 1998: 137)
Por fim, percebe-se que o desenvolvimento deste trabalho investigativo foi
realizado em diversas frentes com o intuito de ampliar sua abrangência metodológica e
permitir um diálogo entre diversas fontes e materiais históricos.
* * * * *
A preocupação básica do presente trabalho é desenvolver uma investigação no
sentido de buscar e resgatar a memória histórica de uma importante instituição escolar, tanto
para a cidade de Patrocínio – M. G., quanto para a região do Alto Paranaíba, bem como para o
próprio Estado. O Grupo Escolar se tornou a primeira escola pública da rede oficial de ensino
do Estado de Minas Gerais, criada em Patrocínio. E por isso, tornou-se referência para o
entendimento da história da escolarização da cidade, como uma tentativa de se fortalecer e
organizar o ensino primário na cidade, ainda nos primórdios do século XX.
A presente pesquisa tem como objetivo geral compreender os fatores históricos
responsáveis pela origem e implantação do Grupo Escolar Honorato Borges, bem como pela
construção do atual prédio, entendendo sua finalidade enquanto instituição escolar no
contexto histórico da cidade de Patrocínio – Minas Gerais.
Em primeiro lugar, a investigação dar-se-á em torno da realização de um discurso
em torno da contextualização nacional, estadual e local. o interesse de uma compreensão
em torno dos elementos da política e dos diversos setores da sociedade em torno da
escolarização. Neste sentido, os objetivos específicos da pesquisa consistem em apreender os
elementos das teorizações sobre representações sociais vinculadas à História das
Instituições Educacionais, por meio da realização de pesquisa bibliográfica e documental.
Em segundo lugar, o interesse se efetivar-se-á em torno da busca da compreensão
do processo empreendido pelo governo do Estado em torno das reformas de João Pinheiro e
de Francisco Campos, bem como pela principal ação estabelecida pela Reforma João
Pinheiro, a implementação dos grupos escolares como modelo de organização escolar para a
República. Por isso, procura-se entender o contexto educacional local e suas relações
necessárias com a realidade regional, estadual e nacional, por meio do estudo de obras
histórico-educacionais.
E, finalmente, investigar as especificidades relacionadas à fundação e
implantação do Grupo Escolar Honorato Borges, no período de 1912 (criação) a 1930
(término da construção do atual prédio), enquanto instituição influente no universo social
patrocinense, através da memória do espaço e do tempo escolar; do currículo trabalhado no
processo de ensino-aprendizagem; das motivações e da identidade dos mestres e dos alunos.
Procura-se reconstituir parte da história das instituições escolares, principalmente,
a que se refere aos Grupos Escolares em geral e, especificamente, o Grupo Escolar Honorato
Borges, voltada para o processo de modernização e escolarização, pelo qual passa Minas
Gerais no interior do projeto republicano de progresso humano.
A estrutura lógica da dissertação desenvolvida obedece a uma seqüência contendo
três eixos centrais: uma necessária referência à contextualização histórica ligada à Política e à
Sociedade na Primeira República; à investigação em torno da tentativa de modernização da
educação pública do Estado de Minas Gerais na Primeira República, através das Reformas de
Ensino João Pinheiro e Francisco Campos; e, por último, uma referência à tentativa de
racionalização do ensino primário público em Patrocínio M. G., através da implantação do
Grupo Escolar Honorato Borges.
O primeiro capítulo, intitulado Política e Sociedade na Primeira República,
ocupar-se-á da reconstituição do contexto histórico brasileiro, em termos das principais
realizações históricas relativas à política, à sociedade e à economia. Serão descritas as
principais questões em torno do desenvolvimento da sociedade brasileira, especificamente a
questão educacional, sob a influência do ideário e do discurso liberal. Seguindo este
pressuposto, haverá também a verificação do papel do Estado de Minas Gerais em âmbito
nacional e como este influencia as cidades que o compõem, inclusive a cidade de Patrocínio,
na região do Alto Paranaíba. Por isso, será realizada uma descrição histórica da evolução da
cidade, numa tentativa de entendimento das principais questões referentes às necessidades da
implementação de um projeto de modernização da educação pública da cidade de Patrocínio.
O segundo capítulo, A questão da modernização do ensino primário do Estado de
Minas Gerais na República Velha, tem a intenção de discutir o processo de tentativa de
modernização do ensino em Minas Gerais, posto em prática, através da Reforma João
Pinheiro, decretada em 1906. Além do mais, apesar de haver outras normatizações entre
ambas as reformas, a Reforma Francisco Campos (1927/1928) também constitui uma
tentativa de organização do ensino primário, no final da Primeira República, com
perspectivas um pouco diferenciadas em relação à Reforma João Pinheiro. Então, há a
intenção de se promover um paralelo entre ambas as reformas, na tentativa de compreensão
dos interesses que as nortearam em sua respectiva época. Assim, a principal ação norteadora
da Reforma João Pinheiro se com a implementação dos Grupos Escolares, considerados
modelos capazes de promover a tão desejada consolidação do Republicanismo, através da
educação do povo. Esta questão será, então, discutida logo em seguida.
E, finalmente, o terceiro capítulo Racionalização do ensino público primário em Patrocínio
Minas Gerais: o Grupo Escolar Honorato Borges (1912 – 1930) ater-se-á às questões
relativas aos esforços do poder público de Patrocínio, buscando a criação (1912) e a
implantação (1914) do primeiro Grupo Escolar da cidade, visando à adequação do ensino
público da cidade à Reforma proposta por João Pinheiro. Contudo, com o transcorrer dos
anos, um novo prédio para o funcionamento do Grupo Escolar se tornou necessário para
atender às necessidades de infra-estrutura e, neste sentido, a construção do mesmo se inicia
em 1928 e, em 1930, o Grupo Escolar Honorato Borges passa a funcionar num novo prédio.
Este processo de busca de recursos e de apoio político para a construção do novo prédio se
alvo de estudos logo em seguida. Por outro lado, haverá também uma descrição e discussão
em torno das questões restritas ao tempo escolar e ao currículo desenvolvido no interior do
Grupo Escolar, expressando uma tentativa de racionalizar o processo de ensino-
aprendizagem. E, enfim, a preocupação girará em torno do resgate da memória em torno do
corpo docente e do corpo discente, buscando estabelecer parte de seu perfil e de sua
identidade.
1. POLÍTICA E SOCIEDADE NA PRIMEIRA REPÚBLICA
O presente capítulo tem por objetivo realizar uma análise da sociedade brasileira
ao longo da trajetória dos acontecimentos mais importantes e fecundos da República Velha
(1889 1930). O país passa por uma série de transformações em diversos setores, tanto
qualitativa quanto quantitativamente. Por isso, é fundamental a realização de um exame dos
pontos centrais que compõem o contexto estrutural a nível nacional, regional e local, a fim de
melhor compreender os fatores determinantes da realidade socioeconômica e cultural.
A fim de compreender a história do Brasil no período republicano, torna-se
necessário buscar os motivos da sua gênese ainda no período posterior à obtenção da
autonomia política frente à metrópole lusitana em 1822, quando permanece no país o regime
monárquico.
Em outras palavras, isto equivale a perceber um momento muito peculiar frente à
política de outros países latino-americanos, também tornados independentes frente às
respectivas metrópoles européias, sobretudo Espanha. Porém, vivem outra experiência
política, no sentido de fazerem um opção distinta daquela feita pelo Brasil.
O Brasil é o único país, imediatamente após a independência política, a
experimentar um longo período monárquico, cuja dinastia era descendente direta da família
real portuguesa, mantendo praticamente todas as tradições do poder imperial português. Os
demais países da América Latina optam pelo regime republicano, em consonância com os
ideais liberais propagados inicialmente em países europeus, decorrentes do movimento
iluminista do século XVIII.
Percebe-se que o processo de autonomia política acontece imposto por grupos
privilegiados econômica e politicamente e que visavam defender interesses neocoloniais da
nova potência mundial (Inglaterra), não se importando ou interessando pela conquista da
autonomia econômica de fato. O povo, de fato, nada sabia ou tinha conhecimento sobre o que
estava acontecendo em termos de mudança de regime político. Inclusive,
Ao analisar a situação sociopolítica da população do país, Couty concluiu que
poderia resumi-la em uma frase: “O Brasil não tem povo”. Seus olhos franceses não
20
conseguiam ver no Brasil aquela população ativa e organizada a que estava
acostumado em seu país de origem. (CARVALHO, 2004: 9 – 10)
Muitos segmentos da sociedade civil o aceitavam este modelo político imposto
pela elite brasileira e ainda lutavam pelos ideais propostos por movimentos políticos do
período colonial, tendo como principal exemplo a Inconfidência Mineira, liderada pelo alferes
Joaquim José da Silva Xavier, conhecido como o Tiradentes (1746-1792). Inclusive, na obra
de CARVALHO (2004), uma discussão em torno dos elementos simbólicos e ideológicos
que influenciaram a formação do universo ideário da República no Brasil, em que Tiradentes
é visto como um dos maiores ícones da luta pela liberdade de fato.
Há a tendência pela implantação dos ideais republicanos e liberais na política
nacional brasileira, estes segmentos defendiam ser este o verdadeiro caminho através do qual
o Brasil finalmente se tornaria uma nação moderna e autônoma, capaz de direcionar seus
projetos visando ao bem comum e atingir os mais altos estágios de desenvolvimento.
A expansão cafeeira, a extinção do tráfico de escravos (1850), bem como a
imigração de mão-de-obra européia, o início do processo de industrialização (1870) e a
urbanização são fatores socioeconômicos que, gradualmente, vão formando um contexto
histórico profundo e propício de contestação do modelo monárquico e agrário-exportador,
imposto por segmentos conservadores. E, simultaneamente, haveria a possibilidade de uma
nova proposta de modelo político: a República, num país em que muitos já desejavam a
urbanização e a industrialização, como sinais de modernidade e de desenvolvimento.
A luta e a busca do poder político pelos liberais prosseguem gradativamente no
decorrer do século XIX aa sua suposta conquista através da Proclamação da República em
15 de novembro de 1889, quando se acreditou, finalmente, ser possível o estabelecimento dos
valores democráticos e federalistas.
O movimento republicano, influenciado pelos ideais positivistas, insere-se numa
tentativa dos principais dirigentes políticos e intelectuais do momento de enquadrar o Brasil
nos rumos do desenvolvimento, do progresso material e da reforma moral, política e social,
num esforço de equiparar a nação ao mais alto nível dos países avançados do mundo,
especialmente a Europa.
Isso demonstra que a realidade é complexa o suficiente para haver transformações
significativas, exigindo novas dinâmicas históricas para uma adaptação às novas exigências
da realidade oriunda dessas mudanças.
21
O modelo liberal, político e econômico é assumido como uma das formas de
possibilitar ao país a chance de finalmente ingressar no mundo aperfeiçoado pelo progresso
do conhecimento humano.
Alguns dos principais intelectuais do país (Rui Barbosa, José Veríssimo, Carneiro
Leão, Alceu Amoroso Lima, e outros) passam a defender, pelo menos no discurso, o
desenvolvimento de uma política de estímulo ao desenvolvimento do conhecimento, obtido,
sobretudo, através da instrução popular.
Estes personagens, na década de 1920, passam a fazer uso de argumentos que
defendem um verdadeiro projeto de educação nacional, como possibilidade de levar o país ao
desenvolvimento. Fazem uso de inúmeros artifícios a fim de garantir a efetivação do projeto
ambicioso de se desenvolver uma revolução na instrução popular e garantir, vinculado ao
aumento gradativo da influência do Estado sobre a sociedade civil. Este controle de um
crescimento cultural do país, seria realizado, sobretudo, através de uma burocracia cada vez
mais articulada e eficiente, bem como através da formação de uma ideologia e simbologia,
arraigadas como valores influenciadores de uma conduta desejável para os cidadãos que
compõem o Estado.
Nas primeiras décadas do século XX, os discursos e as práticas em torno da
difusão do ensino público, a fim de erradicar definitivamente o problema dos altos índices de
analfabetismo do país, passam a ser chamados de “entusiasmo pela educação” e “otimismo
pedagógico”, como assim designou NAGLE (1974). Isso demonstra o quanto a elite brasileira
se interessava gradativamente pelos assuntos relativos à educação, antes considerada um
assunto supérfluo, restrito aos ambientes acadêmicos.
A educação foi discutida e considerada como um dos principais elementos
necessários para a transformação efetiva do país, buscando inculcar novos comportamentos e
ideologias aos membros da nação brasileira. Estas ações estavam em acordo com os interesses
da nova classe emergente, a burguesia industrial, interessada em consolidar sua hegemonia
enquanto classe dominante política e economicamente.
A fim de compreender o atual contexto da educação nacional, é preciso que haja
um retorno consciente e crítico frente às diversas etapas pelas quais o nosso ensino vem
passando ao longo da História do Brasil, destacadamente durante a República Velha, quando
de fato a questão educacional passa a ser valorizada e discutida como assunto de caráter e
estratégia nacional.
As diversas reformas educacionais empreendidas ao longo da História brasileira,
em especial a do período republicano, denotam o quanto vários interesses, de todos os modos
22
e abrangências, m exigindo uma mudança constante e gradativa do caráter institucional da
educação.
O Estado é visto aos poucos como uma instância privilegiada, possuidora de
instrumentos e meios necessários e eficazes para a manutenção ou modernização dos
privilégios de classe, fazendo uso ou não da instrução pública.
Minas Gerais destacar-se-ia como um dos pilares da política nacional, ao lado do
Estado de São Paulo. Os dois representam os principais membros da federação, política e
economicamente; eles se esforçarão por controlar os rumos da política nacional, impondo seus
interesses enquanto unidades federativas majoritárias.
Minas Gerais também se ocupará, através do Partido Republicano Mineiro (PRM),
de levar adiante o projeto de modernização, preocupando-se em divulgar os pontos principais
do ideário liberal, republicano e positivista em seu interior e no restante do país, pelo menos
nos discursos políticos feitos na assembléia legislativa.
Patrocínio (Minas Gerais) impõe-se como uma das principais cidades do Alto
Paranaíba e Triângulo Mineiro, no início do século XX (as outras são Uberaba, Araxá,
Araguari, Uberlândia, Patos de Minas e Ituiutaba), ao buscar a consolidação como cidade em
desenvolvimento estrutural e burocrático. Por isso, Patrocínio não poderia deixar de se
posicionar, ao menos politicamente, em prol dos valores divulgados pela proposta republicana
e se esforçar também por construir uma realidade engajada em sustentar os rumos da Ordem e
do Progresso.
Pertencente a uma região relativamente desenvolvida na prática agrícola e
pecuarista, Patrocínio emerge com o esforço político de sua oligarquia rural, desejosa de
conseguir benefícios que consolidassem a cidade como exemplo para a região e para o
restante do Estado.
A política local, apesar de manter os moldes oriundos do período imperial, com
práticas ainda vigentes ligadas ao coronelismo, impõe chefes políticos engajados na tentativa
de sustentar os interesses do diretório central do Partido Republicano Mineiro, localizado em
Belo Horizonte, capital do estado, em troca de benefícios e recursos para a cidade.
1.1. Contexto histórico-brasileiro (1889 – 1930): a República Velha
Ao buscar a compreensão de um fenômeno social como a educação, é necessário o
entendimento do Brasil enquanto Estado e Nação, composto por diversas dinâmicas,
instituições e processos responsáveis por toda uma formação ideológica, bem como uma
prática social. O Estado se constitui como uma instância privilegiada no sentido de controlar
23
ideologicamente os ideários, sentimentos, posturas e valores a serem inculcados nos membros
da Nação.
A fim de melhor abordar fenômenos específicos como a prática e a concepção
educacionais a serem desenvolvidas, é evidente o quanto é preciso analisá-las inseridas num
contexto macroestrutural, responsável pelos delineamentos e determinantes sociais de maneira
mais efetiva.
Politicamente, o Brasil se consolidara pura e simplesmente durante o processo da
República através de uma forte oligarquia rural, sustentada pela produção monocultora do
café e voltada para a exportação. Nesse sentido,
Liberalismo político casa-se harmoniosamente com a propriedade rural, a ideologia
a serviço da emancipação de uma classe da túnica centralizadora que a entorpece.
Da imunidade do núcleo agrícola expande-se a reivindicação federalista,
empenhada em libertá-lo dos controles estatais. Esse consórcio sustenta a soberania
popular – reduzido o povo aos proprietários agrícolas capazes de falar em seu nome
– , equiparada à democracia, democracia sem tutela e sem peias. A ideologia
articulada aos padrões universais, irradiados da Inglaterra, França e Estados
Unidos, confortando a consciência dos ocidentalizadores, modernizadores da
sociedade e da política brasileiras, muitas vezes enganados com a devoção sem
exame aos modelos. Ser culto, moderno, significa, para o brasileiro do século XIX
e começo do século XX, estar em dia com as idéias liberais, acentuando o domínio
da ordem natural, perturbada sempre que o Estado intervém na atividade particular.
Com otimismo e confiança será conveniente entregar o indivíduo a si mesmo, na
certeza de que o futuro aniquilará a miséria e corrigirá o atraso. No seio do
liberalismo político vibra o liberalismo econômico, com a valorização da livre
concorrência, da oferta e da procura, das trocas internacionais sem impedimentos
artificiais e protecionistas. O produtor agrícola e o exportador, bem como o
comerciante importador, prosperam dentro das coordenadas liberais, favorecidos
com a troca internacional sem restrições e a mão-de-obra abundante, sustentada em
mercadorias baratas. (FAORO, 2004: 501)
A mudança da forma e do sistema político no Brasil, quando da passagem da
Monarquia para a República, definitivamente não alterou profundamente a organização
política e social efetiva, devida à permanência das famílias latifundiárias, constituindo o bem
sucedido coronelismo.
O país passa por uma reformulação apenas no modelo político, através apenas da
intervenção de uma elite interessada no fim do Império, sem se preocupar em alterar
efetivamente a estrutura econômica do país. Neste sentido, no interior do Brasil, a figura do
coronel permanece e se destaca como melhor modelo do chefe político local. O coronelismo,
no Brasil, forma-se através da criação, ainda no Império, da Guarda Nacional. Assim,
A Guarda Nacional, criada em 1831, pra substituição das milícias e ordenanças do
período colonial, estabelecera uma hierarquia, em que a patente de coronel
correspondia a um comando municipal ou regional, por sua vez dependente do
24
prestígio econômico ou social de seu titular, que raramente deixaria de figurar entre
os proprietários rurais. De começo a patente coincidia com um comando efetivo ou
uma direção, que a Regência reconhecia, para a defesa das instituições. Mas, pouco
a pouco, as patentes passaram a ser avaliadas em dinheiro e concedidas a quem se
dispusesse a pagar o preço exigido ou estipulado pelo poder público, o que não
chegava a alterar coisa alguma, quando essa faculdade de comprar a patente não
deixava de corresponder a um poder econômico, que estava na origem das
investiduras anteriores. (LEAL, 1997: 13 – 4)
Com a tradição já fortalecida do coronelismo, o federalismo havia sido implantado
automaticamente com a Proclamação da República. Porém, os estados de São Paulo e Minas
Gerais conseguiam dominar alternadamente a política nacional, constituindo a conhecida
“política do café-com-leite”.
A política nacional, monopolizada pelos interesses desses Estados se sustentava
num implicado complexo de sustentação política de alianças realizadas entre as bases
políticas locais e municipais.
A fim de garantir a coesão política dos poderosos partidos republicanos,
sustentando a política realizada pelo líder partidário, os presidentes de cada Estado realizavam
uma série de acordos, concessão de favores políticos e distribuição de recursos. Isso
proporcionava a garantia do apoio incondicional das bases. Por isso,
Se ainda não temos numerosas classes médias nas cidades do interior, muito menos
no campo, onde os proprietários ou posseiros de ínfimas glebas, os “colonos” ou
parceiros e mesmo pequenos sitiantes estão pouco acima do trabalhador
assalariado, pois eles próprios freqüentemente trabalham sob salário. Ali o binômio
ainda é geralmente representado pelo senhor da terra e seus dependentes.
Completamente analfabeto, ou quase, sem assistência médica, não lendo jornais,
nem revistas, nas quais se limita a ver as figuras, o trabalhador rural, a o ser em
casos esporádicos, tem o patrão na conta de benfeitor. E é dele, na verdade, que
recebe os únicos favores que sua obscura existência conhece. Em sua situação, seria
ilusório pretender que esse novo pária tivesse consciência do seu direito a uma vida
melhor e lutasse por ele com independência cívica. O lógico é o que presenciamos:
no plano político, ele luta com o coronel” e pelo coronel”. estão os votos de
cabresto, que resultam, em grande parte, da nossa organização econômica rural.
(LEAL, 1997: 44)
A União era controlada pelos interesses de ambos os estados e isto conservava os
privilégios de uma classe poderosa a dos grandes produtores rurais , uma das bases de
apoio do novo regime. O sistema implementado através da República consolidaria uma forma
hegemônica de governo imposta por São Paulo e Minas Gerais. Nesse caso,
Qual o sistema de sustentação da estrutura do poder ainda vigente na última
década da Primeira República e origem de imobilismo estrutural que começa a
sofrer os primeiros abalos durante esse tempo? Em resposta breve, pode-se dizer
que o coronelismo foi o formador da base da estrutura do poder no Brasil e que sua
supremacia incontestável permaneceu durante a Primeira República. Originado da
25
distribuição de postos honoríficos da Guarda Nacional, o sistema coronelista não é
interrompido com o advento do regime republicano; ao contrário, é continuamente
alimentado pelo desenvolvimento das formações oligárquicas e atinge um ponto
mais alto com a chamada “política dos Governadores”. (NAGLE, 1974: 3 – 4)
Paralelamente, o setor econômico era caracterizado pela progressiva passagem de
um modelo agrário-exportador para um sistema urbano-industrial no decorrer da Primeira
República, nos principais centros urbanos do sudeste e sul brasileiros.
Durante todo o período colonial, a economia brasileira foi definida pelas suas
características de fornecedora de produtos primários a baixo custo, constituindo-se também
consumidora de produtos manufaturados a alto custo. Isto evidencia, sobretudo, o caráter
extremamente dependente que o Brasil tinha frente à sua metrópole colonial, Portugal, bem
como à potência mundial da época colonial e imperial, a Inglaterra.
No transcorrer da Primeira República, o café já se destaca como o principal
produto econômico nacional e se torna nosso artigo de exportação por excelência. Isso torna o
país extremamente vulnerável às oscilações do mercado mundial e o Estado, tido como
liberal, passa a exercer um papel intervencionista a fim de promover uma defesa dos
interesses dos produtores de café e demais setores da economia, de menor destaque.
Justamente a produção de café se torna o setor responsável, por outro lado, pelo
acúmulo de renda e de capital, os quais serão usados na implementação das tentativas de
industrialização do país, com alguns surtos já nos primeiros anos da República.
Somente na década de 1910, é que se dará o início efetivo do processo de
industrialização no Brasil, garantida por diversos fatores, dentre os quais se pode destacar: a
disposição de mão-de-obra livre e abundante, porém sem muita especialização para o trabalho
técnico-industrial e carente de formação específica para o sistema de produção capitalista; o
alto custo das mercadorias importadas e o expansivo mercado de consumo interno.
Estes fatores, somados a outros de caráter externo, como a I Guerra Mundial,
acabam por perfazer uma mudança significativamente qualitativa na dinâmica econômica
brasileira, demonstrando que
A economia de mercado interno que se expande nas décadas dos anos dez e vinte
deste século principalmente na dos vinte significa alteração qualitativa
importante, pois com ela se inicia passagem do centro dinâmico da economia
brasileira da economia voltada para o mercado externo para a economia voltada
para o mercado interno, ponto fundamental para a superação da estrutura
econômica existente. (NAGLE, 1974: 17)
26
Um dos maiores responsáveis pelas mudanças no campo social evidenciar-se-á
pelo processo de imigração, principalmente, entre os anos de 1888 e de 1914. Como houve a
Abolição da Escravatura e eram necessários novos trabalhadores para determinados setores da
economia, a mão-de-obra estrangeira livre se demonstrava apta a exercer as atividades
trabalhistas exigidas pelo mercado. Além do mais, foi um dos elementos responsáveis pela
difusão, reprodução e formação de novas idéias em diversos setores da sociedade, originando
determinados movimentos sociais, ponto de destaque ao longo da Primeira República. Por
isso,
Algumas delas já tinham sido incorporadas durante o Império, como o liberalismo e
o positivismo; outras foram impulsionadas, como o socialismo; outras ainda foram
somente então importadas, como o anarquismo. Entre os republicanos históricos,
havia os que se ligavam à corrente liberal spenceriana e federalista, à moda de
Alberto Sales e dos paulistas em geral, e os que se inspiravam antes na tradição da
Revolução Francesa, que favorecia uma visão mais rousseauniana do pacto social,
mais popular e centralista, ao estilo de Silva Jardim, Lopes Trovão, Joaquim Serra.
E havia ainda os positivistas, que exultaram com o advento do novo regime,
julgando ter chegado a hora, a que se consideravam destinados, de exercerem a
tutela intelectual sobre a nação. Mas mesmo entre eles houve divisões entre a
ortodoxia da Igreja Positivista e as variantes civil e militar, que da doutrina
retiravam apenas os aspectos que mais interessavam à ação política. (CARVALHO,
2004: 24 – 5)
Outro importante processo de destaque a estar se consolidando neste período
consiste na urbanização. O início do processo de urbanização consiste numa mudança
qualitativa do contexto histórico brasileiro e se origina da mudança qualitativa modo de
produção social no país. Assim,
As inquietações urbanas, as angústias européias da elite, a sede de mando de civis e
militares, a demagogia inquieta e impaciente tudo se amortece e paralisa de uma
muralha apagada e inerte. O senhor da soberania, o povo que vota e decide, cala e
obedece, permanece mudo ao apelo à sua palavra. O bacharel reformista, o militar
devorado de ideais, o revolucionário intoxicado de retórica e de sonhos, todos
modernizadores nos seus propósitos, têm os pés embaraçados pelo lodo secular. Os
extraviados cedem o lugar, forçados pela mensagem da realidade, aos homens
práticos, despidos de teorias e, não raro, de letras. No campo, no distrito, no
município, o chefe político, o coronel tardo e solene, realista e autoritário,
amortece, na linguagem corrente, o francês mal traduzido e o inglês indigerido. Ele
municipaliza a expressão erudita, comunicando-lhe, de seu lado, sentido e
conteúdo, converte o freio jurídico do governo no bucal caboclo. (FAORO, 2004:
620)
Com o processo de urbanização, iniciam-se e consolidam-se novos segmentos
sociais, ampliando o universo social: burguesia comercial e industrial; classes médias urbanas
e o proletariado industrial.
27
Isso evidencia as novas perspectivas de divisão do trabalho social, necessárias para
atender às necessidades e demandas do modo capitalista de produção, recém implantado no
país e em vias de expansão. Por isso,
O desenvolvimento do modo capitalista de produção e de vida, durante a República
Velha, ocasionou o aceleramento da divisão social do trabalho e exigiu nível cada
vez mais crescente de especialização de funções, de que resultou o aparecimento de
novas camadas sociais e a diferenciação das antigas classes dominantes; a história
do período deve ser percebida como a da consolidação do empresariado rural e a da
evolução do proletariado industrial. (NAGLE, 1974: 26)
E, com essa nova dinâmica econômica, de caráter progressivo e gradativamente,
inicia paralelamente uma série de mudanças nos padrões de estratificação social.
Anteriormente, na realidade colonial e imperial, o país possuía um sistema de
divisão social relativamente estável e simplificado, demonstrando uma sociedade
relativamente fixa e impedindo grandes alterações na constituição da mesma.
Com a nova divisão do trabalho social, imposta pelo modelo capitalista de
produção que avançava em algumas partes específicas do país, a sociedade passa a ter uma
mobilidade muito maior em torno das mudanças sociais, bem como a existência de uma nova
dinâmica e novos critérios de seleção na estratificação social, impondo posicionamentos e
funções inéditas no país.
Essa dinamização social permite inclusive o surgimento de inúmeras
manifestações pelo país, dando mostras de que a realidade social tornar-se-ia gradativamente
mais complexa com o passar dos anos na República Velha, principalmente nas três primeiras
décadas do século XX.
Com a entrada maciça de estrangeiros no Brasil, principalmente nas primeiras
décadas da República Velha, aliada às novas classes sociais surgidas com a expansão das
cidades e das indústrias, verifica-se também o início e o desenvolvimento de alguns
movimentos sociais. Estes são caracterizados pelas reivindicações especificamente voltadas
para as condições de trabalho, bem como para outros benefícios sociais, contidos nos
principais discursos do movimento operário, difundido pelo mundo inteiro.
Por isso, “os operários, ou parte deles, acreditaram nas promessas do novo regime,
tentaram organizar-se em partidos, promoveram greves, seja por motivos políticos, seja em
defesa de seu poder aquisitivo erodido pela inflação”. (CARVALHO, 2004: 23)
Percebe-se que o Partido Socialista não terá grande avanço, tanto ideológica
quanto quantitativamente, pois sua propaganda se deu basicamente através de meras
publicações como folhetins e panfletos.
28
Os líderes do movimento anarquista conseguirão maior aceitabilidade por parte
dos trabalhadores urbanos, por ficarem não apenas na difusão do discurso teórico, mas
também no engajamento efetivo, na luta constante, estando à frente, inclusive, de inúmeras
greves realizadas, principalmente na região sudeste, exigindo melhores condições de trabalho.
O movimento anarquista se engajaria permanentemente no combate às más
condições de trabalho a que os operários estariam sendo submetidos nas indústrias dos
principais centros urbanos brasileiros, bem como na reivindicação de maiores salários.
Os anarquistas estariam interessados também pela luta em prol do reconhecimento
de direitos básicos necessários para a dignidade no exercício da atividade trabalhista. Esse
caráter radical do movimento anarquista acabaria provocando uma reação das forças
coercitivas, mantidas pelo Estado, inúmeras vezes. Muitos deles seriam aperseguidos pela
polícia, capturados e até repatriados. Nesse intuito,
Quanto ao anarquismo, a fase principal de difusão deu-se durante os dois primeiros
decênios deste século. Manifestou-se, fundamentalmente, sob a forma de
organizações de beneficência, de socorros mútuos e de resistência, de lutas,
reivindicatórias e de comícios; especificamente, manifestou-se na organização dos
movimentos grevistas pelos quais procurava forçar os grupos capitalistas a
tomarem medidas de melhoria das condições de vida e de trabalho dos operários – e
no exercício de pressões sobre os poderes públicos, federais e estaduais, para que
fossem acolhidos, no Estado liberal brasileiro, determinados itens da legislação
social. (NAGLE, 1974: 36 – 7)
Além dos movimentos ligados ao operariado urbano, nota-se também o
crescimento de movimentos de caráter nacionalista, apresentando o rudimentos teóricos,
mas também planos de prática efetiva, no sentido de valorizar o genuinamente brasileiro,
buscando consolidar as raízes da nação brasileira frente às interferências de ordem
estrangeira, demonstrando uma clara xenofobia. Desse modo, “pequenos proprietários,
empregados, funcionários públicos também se mobilizaram pela primeira vez no bojo da
xenofobia florianista, organizando clubes jacobinos e batalhões patrióticos”. (CARVALHO,
2004: 23)
A I Guerra Mundial (1914 1918) seria o grande elemento motivacional para as
idéias nacionalistas, quando os cidadãos valorizam e reafirmam a nação brasileira frente aos
perigos do inimigo.
Dentre estes movimentos nacionalistas, destaca-se , por exemplo, a Liga de Defesa
Nacional, criada por iniciativa de intelectuais como Olavo Bilac, Pedro Lessa e Miguel
Calmon, cujos princípios giravam em torno de valores como o civismo, o culto à pátria, a
difusão do ensino popular, a disciplina, bem como o combate ao analfabetismo. Sendo assim,
29
[...] o nacionalismo, do ponto-de-vista interno, resulta de um sistema de tensões que
aparece nessa fase de transformação e, por isso mesmo, compromete-se com as
duas modalidades de ordenação da sociedade brasileira do tempo. É tanto um
movimento conservador quanto progressista, embora seja, de um modo geral, mais
conservador que progressista. Do ponto-de-vista externo, o nacionalismo, na sua
maior parte, aparece como manifestação que contraria os propósitos expansionistas
das sociedades mais desenvolvidas, que buscam novos mercados e formas
neocoloniais de dominação. Sob esse aspecto, é interessante notar que apenas no
caso do nacionalismo “liberal” não se manifesta o esforço para combater tal política
de expansão e domínio, ditada pelas novas condições internacionais do após-guerra.
(NAGLE, 1974: 56)
Ao ser implantada a República no Brasil, as idéias liberais e positivistas do
secularismo, conseqüentemente, influenciam os líderes à frente do Estado e a separação
entre este e a Religião.
No caso brasileiro, especificamente, a Igreja Católica Apostólica Romana deixa de
ser uma extensão do Estado e passa agora, oficialmente, a fazer parte da sociedade civil.
Neste sentido, o catolicismo sofre uma das maiores perdas políticas e institucionais de toda a
sua história no país.
Através das ações comandadas por D. Sebastião Leme, arcebispo de Olinda, dá-se
início à organização da reação católica frente à questão da secularização do Estado brasileiro.
Numa mobilização da camada intelectual católica, a Igreja promove uma luta pela
conscientização em favor da cultura e da educação religiosa, como forma de combater os
males sociais que assolam o país e lutar pelo reconhecimento da importância do papel
desempenhado pela Igreja Católica Apostólica Romana junto à sociedade em geral.
No âmbito militar, o tenentismo veio se demonstrando como mais um movimento
a compor o já conturbado contexto social na última década da República Velha.
Os tenentes refletem os principais anseios de uma classe média em formação e
consolidação, reivindicando o retorno e a defesa pelos mais puros ideais liberais, propagados
pelos teóricos republicanos, não tão presentes assim na República brasileira de fato, cujo
governo se demonstra autoritário e opressor. Isso contraria os princípios básicos da liberdade
política, da igualdade de oportunidades e da fraternidade em torno do Progresso. Por esse
motivo,
A situação do tenentismo se alterará, contudo, pela sua participação no processo
revolucionário de 1930. Enquanto nas insurreições de 1922, 1924 e 1926 para
mencionar os principais momentos da rebeldia tenentista os tenentistas foram, ao
mesmo tempo, planejadores e executores ou, por outra, os principais deres, na
revolução de 1930 formaram um dos componentes de um movimento heterogêneo,
organizado e dirigido por homens de partido (“políticos profissionais”): três ex-
presidentes, velhos políticos conservadores, políticos jovens. (NAGLE, 1974: 71)
30
Em outras palavras, a revolução de 1930 irá concentrar setores heterogêneos da
sociedade brasileira, interessados num único objetivo: inserir a nação num novo projeto de
desenvolvimento econômico e novos parâmetros políticos de condução da sociedade
brasileira. Desse modo,
O tenentismo tem sido interpretado como uma ideologia pequeno-burguesa, como
um esforço das nascentes “classes médias” para se incorporarem à ainda pouco
diferenciada estrutura do poder da sociedade brasileira da época. (NAGLE, 1974:
72)
Já se referindo ao campo artístico, um dos movimentos mais controvertidos e
polêmicos que se destacará no final da Primeira República é o Modernismo, voltado para a
valorização dos elementos culturais da própria realidade do país, bem como pela plena
renovação técnica, renovando drasticamente a concepção de obra artística.
Essas defesas teóricas e práticas evidenciam uma clara tendência de cunho
nacionalista, a qual faparte das principais linhas diretrizes do movimento no Brasil. Neste
sentido,
[...] dentre os que conduzirão à realização da Semana da Arte Moderna, em 1922,
“o brado principal” do movimento modernista dois devem ser mencionados: as
exposições de Anita Malfatti, em 1917, e a de Brecheret, em 1919. Significam o
rompimento com as convenções aceitas de arte, no domínio da pintura e da
escultura, bem como constituem o primeiro centro de aglutinação dos ainda
potenciais defensores da renovação literária e cultural. (NAGLE, 1974: 75)
os antecedentes e as fontes inspiradoras do Integralismo no Brasil estão
diretamente ligados às tendências mundiais de formação de movimentos antidemocráticos e
antiliberais, disseminados por diversos países do mundo.
Frutos de uma mentalidade surgida durante a I Guerra Mundial, demonstram-se
como sendo movimentos ultra-direitistas, reacionários, com fortes tendências xenófobas,
eugênicas e de luta pelos interesses oligárquicos. Essa posição assumida por estes grupos
minoritários, evidentemente, posicionam-se de forma contrária aos principais anseios
demonstrados pelo capitalismo em ascensão, de forte tendência liberal e burguesa.
O contexto histórico brasileiro na República Velha (1889 1930) demonstra um
momento de importante sentido e papel dado à escolarização da sociedade, por ser
considerada processo fundamental para a efetivação do processo civilizatório da sociedade
brasileira.
31
O país vivencia um momento intenso de transformações em diversos âmbitos da
sociedade, economia e política. E assim, o Brasil inicia uma nova trajetória histórica, no
sentido de adequar as instâncias que compõem sua dinâmica interior, articulada com as
transformações em níveis mundiais.
1.2. A questão educacional na Primeira República: ideário e discurso liberal
A trajetória das idéias do Liberalismo vem sendo realizada desde os
movimentos em prol da independência política no período colonial brasileiro. A Inconfidência
Mineira, citada anteriormente, representa uma das maiores expressões dessa modalidade de
movimento, tendo como fontes inspiradoras as idéias do Iluminismo, bem como os anseios
das revoluções burguesas, realizadas em alguns países como França, Inglaterra e Estados
Unidos, ao longo dos séculos XVII e XVIII.
O contato com as idéias liberais, republicanas e democráticas ocorre, sobretudo, na
Europa, e são difundidas entre os estudantes brasileiros que para se dirigiam a fim de obter
uma formação superior, em áreas como medicina, engenharia e direito.
Tendo sido duramente reprimidos pela metrópole portuguesa aqui, no Brasil, estes
movimentos, contudo, continuaram inspirando ideologicamente diversos setores da sociedade,
descontentes com a situação do país durante o período colonial, bem como no período
imperial.
A Proclamação da República representa um dos eventos políticos mais
significativos e decisivos da história do país. Representa a primeira manifestação das idéias
liberais na prática, tendo como pressuposto a defesa pelos direitos civis, políticos e alguns dos
direitos considerados sociais, possuidores do caráter de universalidade.
Dentre estes, destacam-se, principalmente, a liberdade de expressão, política,
ideológica e religiosa, bem como a livre iniciativa econômica, isenta das interferências diretas
da instituição estatal. Além do mais, no que se refere à instrução, passou a ser defensora de
uma educação pública, laica, gratuita e universal.
Atentos aos ideais republicanos e positivistas, os membros da primeira
Constituinte Republicana (1891) reservaram, gradativamente, lugar de destaque para as
questões relativas à proposta de uma educação caracterizada pelos seguintes itens
qualificativos: pública, laica, gratuita e democrática.
32
Partindo do pressuposto de que o Estado representa uma das instâncias mais
importantes e poderosas da sociedade, as leis e as normas podem ser e de fato o são, reflexos
do contexto histórico de seu tempo, ao serem propostas, debatidas e, posteriormente,
promulgadas.
Devido aos interesses da camada política que está à frente do poder, as leis são
elaboradas visando efetivar os intuitos das classes hegemônicas economicamente,
solidificando os mecanismos que proporcionam a manutenção do status quo. Por isso,
Neste sistema social natural”, o papel da instrução pública encontra-se
estreitamente vinculado ao papel do Estado. A este é confiada a missão de “garantir
a segurança, essencialmente necessária à propriedade e à liberdade”. O Estado
dispõe da força para manter a ordem natural, cujos princípios não se impõem por si
próprios à consciência dos indivíduos. Mas esta força sozinha é impotente; e a
educação representará então a parte essencial da ação persuasiva e preventiva do
Estado. (PETITAT, 1994: 143)
O Estado, manifestação da sociedade política, consolida-se quando consegue se
impor como uma instância educadora por excelência, empreendendo práticas responsáveis
pela vigilância e inculcação ideológica, baseada nas diversas formas de divulgação dos
símbolos e dos valores cívicos, demonstrada particularmente pelo uso da força coercitiva e
representada pelas forças militares e policiais. Por isso,
A instrução deve necessariamente ser blica, uma vez que representa um
instrumento essencial de legitimação de uma ordem social em que a igualdade, a
liberdade e a justiça, formalmente definidas, aliam-se na realidade à desigualdade, à
dominação e à injustiça. A instrução não é um bem como os outros, uma área em
que se poderia deixar desenvolver-se a concorrência entre proprietários: isto seria
correr o risco de uma desintegração da ordem natural. (PETITAT, 1994: 144)
A proposta republicana passa a ser latente na concepção de educação defendida
para a primeira Constituinte brasileira após o Império, em 1891. A educação passa a ser
considerada não mais como um luxo, privilégio de uma classe especialmente devotada ao
culto das humanidades, ou mero produto de uma cultura humanística jesuítica, desinteressada
frente aos problemas práticos e de caráter essencialmente especulativo, sob a influência do
pensamento medieval.
Contrariamente, a educação passa a desenvolver o caráter de necessidade social,
através da qual, o Brasil, finalmente, poderia ingressar-se num processo seguro e certo de
desenvolvimento socioeconômico, remetendo-o ao grau de país moderno e na vanguarda do
Progresso, garantindo a Ordem estabelecida pelo Estado.
33
Para o Positivismo, movimento filosófico do século XIX e de origem francesa, de
forte influência entre os republicanos, sustenta-se a idéia de que as espécies sociais passavam
por diferentes estágios de desenvolvimento social. Seria possível, então, diferenciá-las entre
bem sucedidas e mal sucedidas. Além do mais, colocava o culto do conhecimento científico a
serviço de uma efetiva reforma social, visando à conservação da ordem estabelecida pela
mesma. Assim,
Essa tendência amadureceu no interior do último terço do século XIX. Nesse lapso,
as transformações materiais apontadas apresentaram perfeita consonância com as
medidas que, a partir de 1870, se estenderam a todos os países mais avançados,
visando à constituição dos sistemas nacionais de educação e à universalização dos
serviços escolares. Foi nesse instante que ganhou novo vigor a proposta burguesa
clássica de escola pública, universal, laica, obrigatória e gratuita, mas, então,
segundo uma formulação que lhe foi dada pelo escolanovismo. Conferiu-lhe
singularidade o fato de a esses atributos ter sido acrescentado o qualificativo única
[...]. (ALVES, 2001: 151)
Os republicanos brasileiros desejavam formar e consolidar a organização nacional
de ensino, buscando acompanhar as principais ações, neste sentido, dos países ditos
avançados, principalmente os da Europa, como a França, Alemanha e Inglaterra.
Até então, o ensino primário, praticamente abandonado, desenvolvia-se através do
modelo das escolas isoladas e das aulas régias, imposto pelo Império português, depois da
expulsão dos jesuítas pelas Reformas Pombalinas, em 1759.
De maneira geral, os republicanos desejavam fortalecer o sistema de ensino,
buscando consolidar a Ordem e o Progresso no país, que acabava de se adentrar num novo
sistema político: a República.
A Constituição de 1891 se demonstra, por sinal, bastante generosa quanto aos
direitos do indivíduo, incrementando a preponderância do privado frente ao público, dos
direitos à propriedade privada e à apologia do não-intervencionismo do Estado sobre o
mercado, considerado instância autônoma. Refletindo claramente os ideais básicos da
doutrina liberal republicana, a seguir, está reproduzido o fragmento da Constituição Federal
de 1891 (aqui reproduzidos mantendo a ortografia original), contendo alguns dos principais
direitos garantidos aos cidadãos (os grifos são meus):
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL
Promulgada a 24 de fevereiro de 1891
Título Primeiro – Da Organização Federal
Capítulo IV – Das Atribuições do Congresso
Art. 35. Incumbe, outrossim, ao Congresso, mas não privativamente:
1º. Velar na guarda da Constituição e das leis, e providenciar sobre as necessidades de caracter federal;
34
2º. Animar, no paiz, o desenvolvimento das lettras, artes, e sciencias, bem como a immigração, a agricultura, a
industria e o commercio, sem privilegios que tolham a acção dos governos locaes;
3º. Crear instituições de ensino superior e secundario nos Estados;
4º. Prover à instrucção secundaria no Districto Federal.
Titulo IV – Dos Cidadãos Brazileiros
Secção II – Declaração de Direitos
Art. 72. A constituição assegura a brazileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos
concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
§ 6º. Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos.
§7º. Nenhum culto ou igreja gozade subvenção official, nem terá relações de dependência ou alliança com o
Governo da União, ou o dos Estados.
Entretanto, a mesma Constituição omite-se diante da questão da gratuidade do
ensino primário como princípio universal e mantém a descentralização do ensino, herdada do
Império, demonstrando claramente os conflitos ideológicos entre os constituintes quanto à
questão educacional. Assim, a União usa o pretexto, por não ter a responsabilidade
constitucional pelos ensinos primário e secundário, concedidos aos Estados, para se manter
alheio às grandes questões ligadas à educação.
As questões relativas à educação acabam-se tornando temática de discussão de
importância secundária. O governo provisório ainda estava efetivamente ligado aos interesses
da tradicional oligarquia rural, latifundiária, e omitiu-se frente às condições defendidas por
grupos específicos de intelectuais, principalmente liberais e positivistas.
Uma das soluções encontradas para a polêmica responsabilidade da União frente à
educação, baseada no princípio da Federação, através do Ato Adicional de 1834. Cada
unidade federativa, o Estado, fica responsável por fornecer as condições básicas para o
funcionamento da educação primária e secundária, enquanto a União assume o ensino
superior. Segundo alguns intérpretes, isso garantiria e preservaria a autonomia política de
cada unidade federativa, no caso os Estados. Essa solução foi um artifício criado para
desresponsabilizar a União frente à educação primária e secundária, deixando-os sob
responsabilidade dos Estados. E, por fim, este artifício também conseguiria assegurar a
qualidade para o ensino superior, acessível somente a uma elite privilegiada e minoritária,
interessadas numa educação como distinção e prestígio social. Por isso,
no terreno específico da educação escolar [...] é possível dizer que a educação
teria sido o único direito social insinuado no campo de direitos civis. Mas, mesmo
isto, com a hegemonia do liberalismo oligárquico, será ancorado na dimensão de
virtus, própria do esforço individual de cada qual. Assim, não haverá educação
obrigatória exatamente porque a oportunidade educacional será vista como
demanda individual. (FÁVERO, 2001: 79)
35
Não podemos afirmar categoricamente que a Constituinte de 1891 tenha omitido a
questão da educação escolar, defendido pelo modelo liberal. Contudo, percebe-se que a forte
tendência individualista, em conjunto com o forte federalismo defendido pelos republicanos,
e, associada à autonomia dos diferentes estados, a educação e outras questões dos direitos
sociais sofreram as conseqüências de um liberalismo excludente e pouco democrático na
prática, em termos de oferecimento de reais oportunidades para todos os membros
componentes da sociedade brasileira.
Durante todo o período da Primeira República, a instrução pública nunca deixará
de ser uma das principais questões sociais ao ser debatida, reivindicada e proclamada como
meio eficaz de promover o desenvolvimento do país e contribuir para a construção e
consolidação de uma identidade nacional, necessária para a solidificação de reais valores da
pátria brasileira. Claramente, percebe-se que a promulgação da Constituição de 1891 não
reflete todos os ideais propostos pelos republicanos, teoricamente abordados e defendidos.
Pensadores como Rui Barbosa, José Veríssimo, Carneiro Leão, Alceu Amoroso
Lima, e outros, de diversas e variadas tendências ideológicas, mas, sobretudo liberais
passaram a discutir a questão educacional no Brasil. A partir desse momento, da Primeira
República, a elaborar discursos pedagógicos e políticos em prol de uma educação efetiva de
toda a sociedade, visando, sobretudo, promover o sentimento de nacionalidade e oferecer ao
país as condições reais e necessárias para se inserir definitivamente na modernidade.
O papel desempenhado pelos intelectuais voltados, de alguma forma, para a
educação é fundamental para compreendermos as variáveis determinantes da realidade sócio-
histórica de uma época determinada. Ao desempenharem um papel ativo na construção e
solidificação dos valores propagados, independentemente da tendência relativa à concepção
do papel do Estado, os intelectuais contribuem efetivamente para a conservação da ordem
estabelecida, ou, por outro lado, podem atuar também alterando consideravelmente a
realidade onde esteja inserido. Pois,
Para a concepção historicista, não existe intelectual social e politicamente solto”
ou neutro. Isso, entretanto, o quer dizer que exista uma forma única de
comprometimento político. duas grandes formas de engajamento social do
intelectual: a tradicional e a orgânica. São duas maneiras importantes e distintas de
fazer política: a tradicional evidencia, em primeiro plano e explicitamente, sua
ligação com a tradição científica e com os grandes mestres da área. Seu método de
trabalho e seu estatuto científico foi definido e é guardado pelo sua corporação.
Essa evidência num primeiro momento pode dar a “ilusão” de que o intelectual
tradicional não está comprometido com determinados interesses econômico-sociais,
mas apenas com as normas “objetivas” tradicionais de seu estatuto científico. Ora,
justamente essa sua fidelidade ao estatuto científico tradicional é o elemento
político mais precioso para a luta pela hegemonia. Ou seja, os grupos econômicos
36
que pretendem dirigir o Estado disputam a adesão dos intelectuais tradicionais cujo
valor político é proporcional à sua fidelidade (competência) ao estudo científico
tradicional. Em suma, o valor político específico do intelectual tradicional
desaparece se esse intelectual deixa de ser tradicional e se torna orgânico.
(NOSELLA, 2004: 163)
Como a Proclamação da República representa uma mudança qualitativa no sistema
de distribuição do poder no Brasil, o Estado passa a representar cada vez mais uma importante
instância para a camada privilegiada economicamente, como expresso. Quando o sistema
capitalista procura se consolidar no Brasil, sobretudo no Estado de São Paulo, principalmente
no decorrer da década de 1920,
O Estado burguês de fato coordena ou solda as funções de seus intelectuais
orgânicos (políticos, empreendedores, administradores, técnicos, operadores etc.)
com as de seus intelectuais tradicionais (eclesiásticos, filósofos, cientistas, artistas
etc.). Trata-se de uma coordenação que ocorre de forma limitada e abstrata, porém
suficiente para seus objetivos. Cabe também ao Partido Político Revolucionário
coordenar seus orgânicos (políticos, sindicalistas, administradores etc.) com os
intelectuais tradicionais que a ele aderem, tornando-se uma grande escola crítica
que solda e funde o especialista com o político. (NOSELLA, 2004: 169)
No decorrer de toda a República Velha, percebemos a presença de determinados
intelectuais, alguns citados anteriormente, em boa parte engajados e declarando-se defensores
do Liberalismo. Ocupados com a defesa teórica de um discurso pedagógico ou, em alguns
casos, de fato, engajados numa prática efetivamente política numa sociedade. Esta
encontrava-se num momento de mudança de caráter qualitativa: o modelo agrário-exportador
passa a ser substituída, gradativamente, para uma outra sociedade de características urbanas e
industriais. Por isso,
O “espírito republicano”, formado no embate ideológico dos fins do Império, se
arrefecera gradualmente durante as três primeiras décadas da implantação do novo
regime. A República idealizada teve que sofrer amputações para se ajustar às
condições objetivas da existência social brasileira dos primeiros trinta anos. Dessa
maneira, da República teoricamente construída, de acordo com determinados veis
de aspiração, restou a República possível, realizada sob a orientação e a pressão das
forças sociais mais ponderáveis da situação histórico-social do período. Daí o
desânimo, mais que o desânimo, as desilusões e as frustrações que dominaram a
mentalidade dos homens públicos, dos pensadores, dos intelectuais e dos
educadores que viveram durante a Primeira República até cerca de 1920. Até
próximo a essa data porque, por esse tempo, das próprias desilusões e frustrações se
liberam as energias acumuladas, que motivam amplo processo de reorientação do
pensamento e da atuação. (NAGLE, 1974: 100 – 1)
O discurso basicamente girava em torno da necessidade de uma consolidação do
pensamento burguês, frente à questão da educação nacional, assumida pelos burgueses como
meio capaz de garantir algumas das condições importantes para a afirmação de certas
37
características da nação brasileira como a língua, a religião e a raça, priorizando a manutenção
de uma ordem nacional.
Os Grupos Escolares cada vez mais são assumidos em São Paulo e Minas Gerais
como o modelo escolar existente mais eficaz e capaz de contribuir de maneira definitiva para
o fim dos problemas ligados à educação pública nacional, considerada fundamental para a
consolidação do modelo capitalista de economia. Os Grupos Escolares se manifestam como o
padrão de escola mais avançado da época da Primeira República (1889 1930) e, aos poucos,
vai sendo assumido pelas reformas estaduais de ensino para fundamentar e contribuir para as
tentativas de sistematização da educação escolar.
Existem alguns fatores que, agora, passam a exercer pressão para que a educação
escolar realmente passe a ser questionada, inicialmente, e discutida politicamente, pelo
menos. Um desses fatores, na verdade o de maior destaque, concentra-se no setor econômico:
com a complexidade crescente da divisão do trabalho social no Brasil, a instrução escolar
passou a ser encarada inclusive como necessidade social, pois através da mesma, pensava-se,
seria possível a qualificação da mão-de-obra atuante sobretudo nas indústrias. A educação
passa a se tornar, aos poucos, condição fundamental a fim de garantir o ingresso das massas
no mercado de trabalho, bem como o fornecimento de mão-de-obra instruída e especializada
para as bricas e indústrias, cada vez mais presentes no cenário nacional, principalmente no
sudeste.
Os diversos intelectuais que passam a usar do discurso de defesa, em torno da
necessidade e do papel da educação, alguns obtiveram grande destaque, devido à grande
questão levantada em torno da situação da educação popular. Assim, Rui Barbosa (1849
1923), um dos pensadores e políticos mais famosos e influentes do Brasil republicano,
destacou-se por inúmeras realizações e vastíssima obra. É considerado um dos principais
responsáveis pela implantação do Regime Republicano no Brasil. Seus pareceres referentes à
educação nacional oferecem uma ampla consciência acerca da situação da instituição escolar,
sobretudo primária, no final do Império. Foi um dos maiores articuladores da Constituição de
1891.
Dentre outros intelectuais de renome, destaca-se também José Veríssimo (1857
1916), jornalista, professor, educador, crítico e historiador literário. Também se destaca por
um forte discurso em defesa dos ideais nacionalistas. Acreditava que a educação seria o
elemento fundamental para a consolidação da cidadania do povo em geral, pois o iletrado
sempre estatotalmente marginalizado das questões ligadas ao discurso e à prática política.
38
Conforme suas obras, a educação seria o elemento, por excelência, na construção de uma
identidade nacional solidificada. Neste sentido,
Não basta, porém, conhecer a Pátria no seu solo, nos seus acidentes naturais, na sua
natureza, no seu clima, nas suas produções, na sua atividade e na sua riqueza; não é
suficiente saber-lhe as origens, como se povoou e se desenvolveu, qual o seu
contingente à civilização ou os seus elementos de progresso, as lutas que teve de
sustentar, os triunfos que obteve ou os reveses que sofre; é necessário mais, é
indispensável, em um país livre principalmente, em especial numa república,
conhecer as suas instituições, em si e nas suas origens, saber-lhe as leis com as
obrigações que impõem e os deveres que garantem, estudar as leis gerais de moral,
de economia e de política que presidem às sociedades e estabelecem e dirigem as
relações entre os seus membros; aprender a solidariedade nacional na solidariedade
escolar, e a noção de dever cívico, do dever humanitário e do dever em geral, no
dever e na disciplina da escola. O conhecimento destes diversos aspectos da tria,
não como região, não como nação, senão como estado, como uma sociedade
cujos fins, conforme os de todo o Estado, o o desenvolvimento das faculdades da
Nação, o aperfeiçoamento da sua vida, constitui a educação vica. (VERÍSSIMO,
1985: 56)
Muitas manifestações favoráveis ao desenvolvimento da educação nacional, sólida
e comprometida com os interesses da nação brasileira, encontrou um grande defensor da
educação pública em Carneiro Leão (1887 – 1966), educador, professor, administrador e
ensaísta. Via o processo educacional não apenas como instrução intelectual ou formação para
o trabalho, mas também comprometida com a formação holística do homem. Por isso,
Educar não é ensinar apenas a escrever e a ler. É formar, desenvolver e dirigir as
aptidões individuais, melhorando-as, dando-lhes possibilidades novas, adaptando-as
às necessidades da época, às exigências do momento e do meio. Ensinar a escrever
e a ler, deixando os indivíduos alheios às necessidades do seu tempo, arredios da
luta que se trava para a supremacia dos povos, ignorantes dos elementos que levam
ao triunfo, incapazes de influírem, com o seu trabalho, a sua capacidade e a sua
ação, no destino da sua nacionalidade, é fazer tudo, menos homens vitoriosos, é
conseguir tudo, menos uma gente forte, uma pátria poderosa. (CARNEIRO LEÃO,
1917: 23 – 4)
Contrariamente, também no âmbito das alas conservadoras do catolicismo, temos a
atuação e a influência de um grande pensador interessado nas questões ligadas às discussões
em torno da questão educacional no Brasil, especificamente, das discussões em torno da
secularização do Estado e, por outro lado, a necessidade do ensino religioso nas escolas.
Alceu Amoroso Lima (1893 – 1983), conhecido pelo pseudônimo Tristão de
Athayde, destacar-se-á por ser uma liderança em diversos movimentos católicos e defender o
ensino religioso como uma das formas eficazes na luta contra o secularismo, o ecletismo e o
ceticismo, tão característicos das sociedades contemporâneas.
Acusava o Estado Republicano de valorizar apenas o instrutivismo utilitário, sem
se preocupar com uma educação global, voltada inclusive para a defesa de elementos
39
essenciais à vida, como o desenvolvimento de uma religiosidade no indivíduo, e isto seria um
dos maiores atributos esperados da escola contemporânea. Nesse sentido,
Esse o regime a que esteve o Brasil submetido por quarenta anos. Se o fora o
esforço dos estabelecimentos privados, onde se mantinha sempre o primado da
educação moral e religiosa, como alma da instrução intelectual e da preparação
física, teríamos visto nesses quarenta anos, não apenas uma decadência moral
patente mas porventura o próprio aniquilamento nacional, como estamos vendo
as mais graves ameaças de separatismo. (ATHAYDE, 1931: 87)
No final da Primeira República, foi instituída em 1924 a ABE (Associação
Brasileira de Educação) reunindo alguns dos mais consagrados educadores brasileiros, como
Fernando de Azevedo e Paschoal Lemme. A ABE estimulou o movimento de renovação da
educação, que atinge seu ápice, através do "Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova"
(1932), o qual defende ensino público, laico, gratuito e obrigatório.
Esse período é também assinalado por inúmeras reformas educacionais que
objetivavam normatizar a estrutura e o funcionamento do ensino primário, secundário e
superior: a Reforma Benjamin Constant (1890), a Reforma Epitácio Pessoas (1901), a
Reforma Rivadávia Correia (1911), a Reforma Carlos Maximiliano (1915) e a Reforma João
Luís Alves (1925).
Também nos Estados foram implementadas várias reformas, dentre as quais
destaca-se a de Sampaio Dória, em São Paulo (1920), a de Lourenço Filho, no Ceará (1923), a
de Anísio Teixeira, na Bahia (1925), a de Francisco Campos, em Minas Gerais (1927/1928) e
a de Fernando de Azevedo, no Distrito Federal (1928).
Essas Reformas, acompanhadas da fundação da ABE e as investigações sobre a
educação promovidas pelo O ESTADO DE S. PAULO, em 1926, dirigido por Fernando de
Azevedo, favoreceram não as discussões teóricas das questões da educação, mas também
para o aprimoramento dessa área.
Portanto, a atuação de inúmeros pensadores e intelectuais foi essencial e
fundamental para a efetiva renovação, mudança ou até mesmo a manutenção de diversas
questões ligadas à educação, no cenário nacional.
Isso evidencia o quanto é imprescindível a participação efetiva e a produção
teórica que ofereça um suporte para as ações, sobretudo do Estado, instância que pode
garantir a prática efetiva da educação pública de maneira mais facilitada e evidente.
A manifestação do ideário liberal pelos republicanos se dava essencialmente por
duas vias: o princípio da representatividade, através do qual um grupo de pessoas era
40
escolhido pelo voto para exercer o papel de governantes e mandatários do Estado; outra, pelo
princípio de justiça, de isonomia, de igualdade de todos os cidadãos perante a lei.
Contudo, a prática tende a ser diferente em relação ao que é defendido
teoricamente, nos quais o sistema esteja inspirado. O Brasil ainda era herdeiro de uma
economia dos moldes próximos ao que foi o feudalismo europeu, com uma sociedade agrária,
patriarcal, estamental e inflexível.
Boa parte da população o tinha seus direitos de cidadania garantidos, vivendo à
margem do oficialmente estabelecido. Portanto, no decorrer da Primeira República (1889
1930), o país passa por grandes transformações, exigindo uma maior flexibilização das suas
instituições e uma revisão constante e gradativa das principais questões sociais, políticas e
econômicas.
Uma das instituições mais urgentes, no sentido da necessidade de ser totalmente
revista e remodelada, é a educação formal, especificamente a escolar. A importância da
escolarização durante a República Velha se mostra como resultado de uma série de fatores, de
necessidades essencialmente ligadas às condições materiais. Com isso,
Uma das maneiras mais diretas de situar a questão consiste em afirmar que o mais
manifesto resultado das transformações sociais mencionadas foi o aparecimento de
inusitado entusiasmo pela escolarização e de marcante otimismo pedagógico: de
um lado, existe a crença de que, pela multiplicação das instituições escolares, da
disseminação da educação escolar, será possível incorporar grandes camadas da
população na senda do progresso nacional, e colocar o Brasil no caminho das
grandes nações do mundo; de outro lado, existe a crença de que determinadas
formulações doutrinárias sobre a escolarização indicam o caminho para a
verdadeira formação do novo homem brasileiro (escolanovismo). (NAGLE, 1974:
99 – 100)
O “entusiasmo pela educação” e o “otimismo pedagógico” são posicionamentos
que começam a ser mais evidentes na década de 10 e, principalmente, nos anos 20, com a
penetração dos ideais da Escola Nova no Brasil.
São também expressão de um número cada vez maior de movimentos sociais que
colocam a questão da educação escolar, como uma das suas maiores reivindicações, por
acreditarem no potencial social que ela pode proporcionar para o aperfeiçoamento do espírito
do povo e do desenvolvimento do país.
A educação passa a ser vista não apenas como uma questão teórica a ser discutida
ou debatida nos bancos acadêmicos ou gabinetes políticos, mas passa a ser tratada como um
41
assunto de ordem prática, evidenciado seu lado utilitário, pragmático, técnico e, sobretudo,
científico.
O processo educacional passa a ser visto não apenas como uma força conservadora
dos ideais coletivos de uma sociedade, mas até mesmo como regeneradora, capaz de reformar
elementos desgastados do universo social.
Estas idéias novas referentes à educação são marcadamente influenciadas pelo
movimento escolanovista, defensor da reestruturação do ensino em seus mais diversos níveis,
para garantir a eficácia do sistema escolar e atender as demandas da sociedade. E, por isso,
Assim é que, utilizando como recurso comparativo as principais etapas do
desenvolvimento histórico da Escola Nova, na sua dimensão universal, observa-se
o seguinte: quatro etapas já se haviam sucedido, no desenvolvimento histórico geral
do escolanovismo, enquanto no Brasil não havia sido atingida nem a primeira. Com
efeito, de 1889 a 1900 primeira fase –, foram criadas as primeiras escolas novas,
o que mostra que o movimento não apareceu como resultado de pura especulação.
A segunda, de 1900 a 1907, é a da formulação do novo ideário internacional, por
meio das diversas correntes teórico-práticas, quando se destaca a atuação de
Dewey, considerado o “pai do movimento ativista na ordem teórica”. De 1907 a
1918 terceira fase ocorrem a criação e a publicação dos primeiros métodos
ativos, ao mesmo tempo que é um período de maturidade das realizações.
Finalmente, a fase que vai de 1918 em diante, de difusão, consolidação e
oficialização das idéias e dos princípios, dos métodos e das técnicas do
escolanovismo. (NAGLE, 1974: 240)
Sumariamente, o Estado se manifesta também ao nível da escolarização como uma
instituição que procura assegurar a estrutura de classes existente. Todas as reformas de ensino,
realizadas até os anos vinte do século XX, são esforços na tentativa de conservação dos
interesses ligados às camadas privilegiadas da economia. A organização do Estado expressa
apenas exigências de uma reduzida parcela da sociedade, à frente do poder político.
Entretanto, as transformações sociais e as inquietações desencadeadas no decorrer da década
dos vinte provocam o fenômeno do entusiasmo pela educação e do otimismo pedagógico,
denunciando um novo processo de relacionamento entre o Estado e a sociedade.
1.3. O Estado de Minas Gerais na República Velha
Acompanhando as tendências republicanas, defensoras da modernização e da
escolarização, Minas Gerais (por ser um dos principais Estados da Federação Republicana e
concentrar boa parte dos políticos, lideranças republicanas e oligárquicas) também efetuará
esforços no sentido de programar a escolarização pública em conciliação com os ideais
positivistas e liberais.
42
Minas Gerais se destaca pelo seu potencial econômico e, sobretudo, pela sua
presença marcante nas questões políticas nacionais. Ao lado do Estado de São Paulo, domina
hegemonicamente o cenário das eleições nacionais. Por isso,
A transição republicana, o realinhamento das forças estaduais e, dentro de Minas, a
articulação negociada entre facções de uma oligarquia em confronto permitiram a
entrada do estado mineiro no cenário político nacional. A mudança da capital,
discussão remota, ganha força de legitimidade no projeto de modernização do
estado, e principalmente, na sua unificação. A mudança da capital da velha Ouro
Preto para a planejada Belo Horizonte, em 1889, faz da Minas dividida, a Minas
preparada para os novos tempos republicanos. (BOMENY, 1994: 24)
Minas Gerais, em seus esforços pela efetivação da escolarização pública, evidencia
a importância dada a esse componente da estrutura social, bem como a consolidação dos
ideais liberais na formação individual. Assim,
[...] a legislação escolar e as reformas dos serviços de instrução funcionaram, ao
longo do século XIX e XX, em Minas Gerais, como conteúdo e forma a partir dos
quais setores, os mais importantes da nossa intelectualidade e elite política,
buscaram apreender e dar inteligibilidade à escolarização, tomando como base as
noções de civilização, ordem e progresso. (FARIA FILHO, 2003: 83)
Apesar de ser considerada a segunda economia do país e de ter presença marcante
no cenário político nacional, os mineiros criticavam a posição do Estado frente ao seu
vizinho, São Paulo. Este progredia em passos largos e o abismo entre ambos aumentava
gradativamente, no decorrer do período abordado.
Comparando-se com outros Estados, principalmente os do Nordeste e Norte,
Minas ainda possuía uma larga vantagem em diversos setores.
Em termos de território, Minas representa um verdadeiro mosaico de diferentes
paisagens e níveis de desenvolvimento. Na República Velha, o Estado é formado por sete
zonas ou sub-regiões geográficas, com suas peculiaridades e relativamente isoladas entre si.
Sendo um mosaico inconstante, então, de diversas sub-regiões ou zonas distintas entre si,
Minas não representa, conseqüentemente, uma unidade econômica.
Por ser desprovido de litoral, não participou direta e efetivamente da fase de
crescimento das exportações durante o período imperial. Seu território foi formado
estrategicamente pelos portugueses, de modo a evitar a entrada indesejável de exploradores
aleatórios das famosas minas de ouro e diamantes.
O povo que compunha o Estado era basicamente formado de trabalhadores rurais,
tendo, por isso, uma população de identidade rural e de baixos veis de participação política
43
nas eleições. Dessa forma, o fenômeno do coronelismo, discutido anteriormente, obteve em
Minas Gerais condições satisfatórias para o seu desenvolvimento e consolidação. Neste, o
coronelismo formou gradativa e firmemente uma rede de apoio entre os chefes locais e as
lideranças estaduais, a chegar às lideranças nacionais. Dentre essas condições, podemos
dizer que até 1920, Minas era considerado o Estado mais populoso da União, sendo
posteriormente ultrapassado por São Paulo.
Durante a fase áurea da imigração (1880 – 1920), não consegue atrair mão-de-obra
estrangeira, apesar dos subsídios oferecidos pelo Estado. Minas Gerais tinha o interesse de
atrair imigrantes para a dinamização da sua economia. No decorrer da Primeira República,
com exceção do Triângulo, do Centro e do Leste, todas as outras sub-regiões haviam quase
parado de crescer economicamente.
Incentivado pela pecuária e a agricultura, o Triângulo manteve sua cota
populacional, assim como o Oeste. O Triângulo era uma das duas novas zonas e a
cidade de Uberaba servia como seu centro comercial e bancário. (WIRTH, 1982:
61)
E, por outro lado,
Também merece destaque o crescimento do Triângulo ativado pelo “boom” do
arroz nas terras mais altas após 1910 e pela integração com o mercado de o
Paulo. Próximos a Uberaba no índice estavam Uberlândia (1923) e Araguari
(1937), esta última um ponto de abastecimento das ferrovias para o sul de Goiás e a
nova capital em Goiânia. (WIRTH, 1982: 64)
O capital obtido com a produção e a venda do café representa sua principal riqueza
orçamentária, mas também, a pecuária (com a criação da raça Zebu), algumas regiões que
conseguem iniciar um desenvolvimento industrial, comercial e bancário. Além do mais,
houve também o início da expansão da rede ferroviária e rodoviária, interligando as diversas
regiões do Estado, antes isoladas entre si. O crescimento econômico costuma também se
demonstrar em níveis inconstantes. Neste sentido,
O crescimento irregular, moderado mas não a estagnação define a economia
mineira de 1889 a 1937. Esse moderamento, porém, não foi proporcional à
população e ao poder político do estado. Enquanto outros grandes estados do
Centro-sul sofreram transformações estruturais, o índice e direção da mudança na
economia de Minas foi menos profunda, favorecendo menos a modernização
baseada nas aspirações e técnicas capitalistas. Estado cercado de montanhas com
difíceis comunicações internas, Minas não participou totalmente nem obteve
grandes benefícios do mercado interno nacional em expansão, resultado do
crescimento baseado na exportação. (WIRTH, 1982: 75)
44
TABELA 01 – População do Brazil por Estados (1872, 1890, 1900 e 1910)
Population du Brésil par État
POPULAÇÃO — POPULATION
RECENSEADA EM — RECENSÉE EM
ESTADOS
ÉTATS
1 872 1 890 1 900
CALCULADA
PARA
Calculée pour
1910
Alagôas...........................................................
348.009
511.440
649.273
814.060
Amazonas.......................................................
57.610
147.915
249.756
358.695
Bahia...............................................................
1.379.616
1.919.802
2.117.956
2.631.989
Ceará...............................................................
721.686
805.687
849.127
1.119.489
Districto
Federal............................................................
274.972
522.651
691.565 (*)
870.475
Espirito
Santo...............................................................
82.137
135.997
209.783
340.805
Goyaz..............................................................
160.395
227.572
255.284
407.405
Maranhão........................................................
360.640
430.854
499.308
657.453
Matto
Grosso.............................................................
60.417
92.827
118.025
185.882
Minas
Geraes............................................................
2.102.689
3.184.099
3.594.471
4.479.689
Pará.................................................................
275.237
328.455
445.356
783.845
Parahyba do
Norte................................................................
376.226
457.232
490.784
604.985
Paraná.............................................................
126.722
249.491
327.136
520.688
Pernambuco....................................................
841.539
1.030.224
1.178.150
1.570.183
Piauhy.............................................................
211.822
267.609
334.328
428.216
Rio de
Janeiro.............................................................
819.604
876.884
926.035
1.266.481
Rio Grande do
Norte................................................................
233.979
268.273
274.317
398.644
Rio Grande do
Sul...................................................................
446.962
897.455
1.149.070
1.594.439
Santa
Catharina.........................................................
159.802
283.769
320.289
441.309
São
Paulo...............................................................
837.354
1.384.753
2.282.279
3.455.030
Sergipe............................................................
234.643
310.926
356.264
409.931
Territorio do
Acre.................................................................
74.484
BRAZIL ......................................
10.112.061
14.333.915
17.318.556
23.414.177
FONTE — Annuario estatistico do Brazil 1908 - 1912. Rio de Janeiro: Directoria Geral de Estatistica, v. 1-3, 1916-1927.
(1) Calculada. (Grifos do autor)
45
Por outro lado,
Apesar de diversos planos e programas, o desempenho global na formulação de
diretrizes econômicas era pouco eficaz. Estão talvez evidenciadas as
inadequações do sistema político de Minas, bem como os persistentes obstáculos a
seu crescimento e desenvolvimento. Mesmo naquela época de relativo “laissez-
faire”, a incapacidade dos mineiros em conduzir recursos disponíveis e potencial
era uma deficiência do governo. Poderiam ter feito mais para reestruturar (mas não
eliminar) a dependência desta região ao litoral. Tentaram quando a economia
cresceu, embora o tenha sido o suficiente. Era de se esperar muito mais. Na
divisão inter-regional de mão-de-obra no Centro-Sul, Minas desempenhou um
papel neocolonial. (WIRTH, 1982: 109)
Devido ao longo período de isolamento provinciano, o imaginário popular do
mineiro se caracteriza pelo caráter introjetado, tradicional, intimista e reservado. Os laços
familiares são extremamente relevantes socialmente e se tornam inclusive critérios de seleção
social, vinculado às lógicas do poder coletivo.
A preservação do poder está na manutenção do sistema oligárquico, cuja expressão
máxima está na prática das elites políticas locais, sustentadoras do sistema do coronelismo.
Com suas escolas, clínicas e serviços burocráticos, as cidades tornaram-se postos
valorizados daquele mundo mais amplo que a elite chamava de civilização. Os
fazendeiros mais importantes, que desde os tempos coloniais, mantinham casas nas
cidades para participarem de festivais religiosos e eventos cívicos, descobriram
novos motivos para manter a residência urbana. Os que podiam pagar,
freqüentemente transferiam suas famílias para a cidade quando as crianças
chegavam à idade escolar. O automóvel acelerou essa tendência de vida urbana.
(WIRTH, 1982: 128)
Paralelamente,
Minas Gerais uma sociedade nova, com valores tradicionais acreditava-se em
processo de evolução, prosseguindo com as tendências modernas, ao mesmo tempo
em que as gerações se interligavam suavemente. O sentido de continuidade, de
mudança o ameaçadora, servia aos mineiros, conhecidos por seu
conservadorismo, hábitos provincianos e forte senso de lugar. (WIRTH, 1982: 203)
Contudo, Minas ficará conhecida em todo o Brasil pela sua forte presença política
no sistema federalista, pela extensão e diversidade de seu território, pelas riquezas e pela
cordialidade e acolhida de seu povo aos forasteiros.
Também em Minas Gerais, haverá o processo de modernização da estrutura
estatal, dos serviços mantidos por ele, bem como pela tentativa específica de promoção do
movimento de racionalização da educação. Neste sentido, acreditava-se que, através da
educação, haveria a possibilidade de ingressar o Estado de Minas Gerais, bem como o país no
processo civilizatório.
46
No decorrer da Primeira República, inicia-se um movimento intenso de promoção
das idéias liberais, voltadas e desejosas de uma ampla reforma social com o intuito de
preservar os ideais de desenvolvimento, progresso e liberdade. Por isso, políticos e
intelectuais passam a discursar a favor do avanço da escolarização, como forma de conduzir o
país rumo ao aperfeiçoamento e ao processo civilizatório. Minas Gerais, enquanto Estado
central no âmbito da política nacional, também se envolverá com estes ideais e passa a
encabeçar ações neste sentido. Dentre estas, percebe-se o desejo de expandir a rede oficial de
ensino.
1.4. Município de Patrocínio – M. G.: origens até os anos 1920
O presente item, acerca de um panorama histórico descritivo do município de
Patrocínio se baseia, essencialmente, devido à escassa produção bibliográfica acerca da
história do município de Patrocínio Minas Gerais, num levantamento publicado no
“Anuário de Patrocínio - Histórico, turístico e estatístico - 1999” (Ano 03 n.º 03). O
mesmo foi elaborado sob a responsabilidade do economista, historiador e jornalista Eustáquio
Amaral, com complementos de Alberto Sanarelli, jornalista e radialista. Basicamente, consiste
numa descrição cronológica de eventos considerados importantes para a consecução da
história do município e sua trajetória. Contudo, como o constam as fontes históricas, bem
como evidências mais claras e objetivas, o presente item tem, primeiramente, o objetivo de
apenas informar alguns detalhes a fim de oferecer uma visão de memorialistas do município,
preocupados em resgatar parte da memória do histórico local.
O território do município de Patrocínio, atualmente considerado componente da
região do Alto Paranaíba, está localizado numa chapada a 972 metros de altitude, sendo
limitada ao norte pela Serra do Cruzeiro.
A história oficial das terras remonta ao século XVII, quando os bandeirantes
liderados por Lourenço Castanho Taques passam pelas futuras terras do município de
Patrocínio, oriundos de São Paulo. Vencem uma batalha contra os índios cataguás, na região
do Rio das Velhas, e os araxás, dirigindo a Paracatu. É o primeiro contato de que se tem
notícia desta terra com os conquistadores. Aliás, até controvérsias entre os historiadores
quanto à data do ocorrido, sendo defendido por alguns como sendo em 1675.
47
Este período é rico em relatos das travessias das bandeiras pela região, em busca
de riquezas pelo interior do país, buscando consolidar a presença dos colonizadores. Aliás, em
1690, o bandeirante Bartolomeu Bueno, Anhanguera”, passa pela região em jornada rumo
aos goiases. Em 1729, com a descoberta de minas em Goiás desde 1725, os mineradores de
Minas Gerais começam um processo de migração para os lugarejos de Goiás, em busca das
recém descobertas minas.
Para facilitar a fiscalização do movimento migratório, o governo português
constrói a estrada conhecida como Picada de Goiás, ligando Pitangui, em Minas, a Goiás. A
mesma passa pelo futuro município de Patrocínio, na altura da Lagoa Seca. A fim de
promover a povoação em torno da estrada Picada de Goiás, começa a haver concessões de
Sesmarias, sendo um dos interessados José Pires Monteiro, cuja sesmaria ia da Lagoa Seca até
o Ribeirão Feio.
Figura 01 – Mapa político do Estado de Minas Gerais com principais cidades
(FONTE — http://www.guianet.com.br/mg/mapamg.htm , acesso 27 de janeiro de 2006.)
48
Contudo, em 1766, a anulação da concessão de sesmarias devido à criação do
Julgado Nossa Senhora do Desterro, espécie de território sob jurisdição dos juízes municipais,
criada pela Capitania de Goiás. Já em 1771, o governador Conde Valadares concede ao
Capitão Inácio de Oliveira Campos a oportunidade de exploração do Bromado e Esmeril,
fundando a Fazenda do Bromado dos Pavões. Dentre suas ações de destaque, está o fato de
perseguição aos índios e aos negros escravos fugidos. inclusive a destruição de um grande
quilombo, localizado na região de Dourados. A criação da Fazenda Bromado dos Pavões
consiste de fato no início da história da futura cidade de Patrocínio.
O grande objetivo, perseguido pelo Capitão Inácio, em 1772, é a fundação de uma
fazenda que serviria de suporte de abastecimento e pousada para os viajantes usuários da
Estrada da Picada de Goiás, sendo também objetivo perseguido torná-la produtora de gêneros
agrícolas e de criação de gado. Assim, por esta fazenda, passam-se todas as bandeiras com
destino a Goiás e vice-versa. Pouco tempo depois, no final do ano, Inácio volta a Pitangui,
devido a volta do Conde Valadares para Portugal.
Dentro de poucos anos posteriores, o Capitão Inácio morre, ficando a fazenda sob
a responsabilidade de sua mulher, a famosa Joaquina do Pompeu, com rica agricultura e
aproximadamente 4.000 cabeças de gado. No ano seguinte, 1773, alguns forasteiros, oriundos
de Pitangui, instalam-se na Fazenda Bromado dos Pavões, ampliando o número de habitantes
da região. Aos poucos, a região vai sendo cada vez mais ocupada por forasteiros, interessados
em aqui se instalar.
Em 1785, a demarcação da Sesmaria do Barreiro do Araxá pela Capitania de
Goiás. Por outro lado, em 1789, é demarcada também a Sesmaria do Bebedouro de Salitre,
quando a região de Patrocínio passa a pertencer oficialmente ao domínio territorial da
Capitania de Goiás. Anos depois, em 1793, já é conhecida a existência de um pequeno
povoado chamado de Salitre, onde será fundada a futura Patrocínio. Em outras palavras, o
processo gradativo de urbanização vai acontecendo.
Cinco anos depois, em 1798, o povoado de Salitre é anexado pela Sesmaria do
Esmeril, de responsabilidade de Antônio Queiroz Teles. Mais tarde, em 1804, os habitantes
recebem a permissão para a construção de uma casa de oração em devoção à Nossa Senhora
do Patrocínio. Assim, em 1807, o povoado de Salitre passa a se chamar Arraial de Nossa
Senhora do Patrocínio. Por essa época, surge o famoso Antônio Rangel Galião, proprietário
de um rancho alegre. Em 1816, pelo Alvará datado em 04 de abril, os julgados de Nossa
Senhora do Desterro do Rio das Abelhas (Desemboque) e São Domingos de Araxá, ao qual
49
pertencia Patrocínio, são separados da Capitania de Goiás e, novamente anexados à Capitania
de Minas Gerais. Nessa época, o pesquisador Eschwegw visita o arraial.
O naturalista francês, Auguste de Saint-Hilaire, também visita a região e a
descreve em seu livro “Viagem às Nascentes do Rio S. Francisco”, onde cita a existência de
uma quarentena de casas dispostas em duas filas, perfazendo uma praça com uma capela no
centro. Posteriormente, em 1820, o fazendeiro Antônio Queiroz Teles doa as terras da
Sesmaria ao patrimônio do povoado. Neste período, os fazendeiros somente iam até o
povoado em datas religiosas e aos domingos. Padre Vicente torna-se o primeiro sacerdote a
realizar uma missa na região.
Em 1829, o arraial é promovido à categoria de curato, permanecendo o nome de
Nossa Senhora do Patrocínio. Então, em 1833, o capelão do curato é o Padre José Ferreira
Estrela. Em 07 de janeiro, é criado o município de Araxá, emancipando-o de Paracatu.
Patrocínio está incluído, nesse momento, ao território do município emancipado. A lei
principal n.º 114, de 9 de março, forma a Paróquia Nossa Senhora do Patrocínio, sendo o
primeiro roco o Pe. José Ferreira Estrela. Este permanece no cargo até 25 de março de
1862.
A emancipação do município em relação à Araxá ocorre pela lei provincial n.º
171, a 23 de março de 1840, quando são criados a vila e o município de Nossa Senhora do
Patrocínio.Em 07 de abril de 1842 é instalada oficialmente a Vila de Nossa Senhora do
Patrocínio, tornando-se esta terra oficialmente um município. O precursor do governo
municipal é o Capitão Francisco de Martins Mundim, presidente da primeira Câmara
Municipal e morador do bonito casarão, situado no Largo da Matriz, hoje a Fundação Casa da
Cultura de Patrocínio.
No vizinho Distrito Diamantino de Bagagem (hoje a cidade de Estrela do Sul) é
descoberto, em 1852, um dos maiores diamantes da história do Brasil, conhecido como o
“Estrela do Sul”. Como o tráfego de pedras preciosas é intenso pela região, acontecem muitos
assaltos nas estradas. Em 1853, voluntários patrocinenses conseguem exterminar o principal
bando de assaltantes.
Em 30 de setembro de 1858, é desmembrado de Patrocínio o município de Estrela
do Sul, incluindo Monte Carmelo e Araguari. A fundação da primeira banda de música, no
município de Patrocínio, acontece em 1860, dirigida pelo músico José Marçal Ribeiro.
em 1868, a 29 de fevereiro, é instalado o município de Patos, sendo
desmembrado de Patrocínio, juntamente com a Vila de Santo Antônio dos Patos, a futura
cidade de Patos de Minas. A elevação da categoria de vila para cidade de Patrocínio somente
50
ocorrerá em 1873, através da Lei Provincial n.º 1995, de 13 de novembro. No dia 12 de
janeiro de 1874 é instalada a cidade, em acatamento à referida lei.
Por volta do ano de 1883, surge um movimento social de caráter fanático, liderado
por José Antônio de Souza, chamado como “Padre Eterno”. A Fazenda do Capão, na região
de Salitre e de São Benedito se torna o reduto dos seguidores. Uma reação, composta por
militares e fazendeiros de Patrocínio, consegue exterminar o movimento, depois de um
conflito sangrento.
A Lei Estadual n.º 11, de 13 de novembro de 1891, institui a Comarca de
Patrocínio. Em 1895, um fato curioso: ocorre a queda de um meteorito de diâmetro de
aproximadamente 10 metros na região do Tejuco, causando, provavelmente, um tremor de
terra nas redondezas. Os moradores o chamam “Pedra de Raio”.
Em 1900, D. Quita e D. Indelece são as primeiras professoras a atuarem na cidade,
no Largo do Rosário (atual Praça Honorato Borges). Nessa época, ainda não há escolas
convencionais. As moças, oriundas de famílias mais abastadas, têm de se dirigir à Franca,
Estado de São Paulo, a fim de prosseguir a realização dos estudos.
A padaria Napoli (local onde funciona atualmente o colégio Dom Lustosa) é a
primeira convencional de Patrocínio. É fundado o primeiro jornal patrocinense, “O
PATROCÍNIO”, em 11 de março. No entanto, a circulação deste jornal tem um caráter muito
efêmero.
o jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO”, de propriedade e direção de Honorato
Martins Borges, um dos políticos mais influentes da história de Patrocínio, surge em 11 de
dezembro de 1909. A edição desse jornal será importante ao contribuir diretamente para a
circulação de idéias em Patrocínio e a divulgação dos projetos políticos da elite patrocinense,
liderada por Honorato Borges. O jornal tem como redator-chefe o Pe. Nicolau Catalan, que
em seu primeiro número, justifica a existência do jornal como veiculador dos princípios
defensores do Estado, da Nação e da Igreja Católica. Além do mais, os números a serem
lançados a partir daquele momento também serviriam como suporte para a moralização da
sociedade patrocinense, contribuindo, de alguma forma para o enobrecimento do indivíduo,
da família e da sociedade como um todo. Os interesses do jornal, então anunciados, estariam
voltados para a busca do progresso humano:
Defendendo sempre, e à medida de nossas forças, os alevantados interesses do
município do Estado e da Nação, conforme reza a nossa divisa, as nossas colunas
estarão ao lado da sublime e sacrosanta causa da Religião Católica, tornando-se
assim supérfluo prevenirmos que no nosso periódico nunca daremos ingresso a
51
escritos perniciosos ou ofensivos da Religião e da sã moral, ou que traduzam
qualquer desdouro ao indivíduo, à família e à sociedade. Cientificando aos nossos
leitores do evoluir da alta política levá-los-emos ao conhecimento dos progressos
da indústria, comércio, agricultura, artes, ciências, de tudo enfim, que lhes possa ser
útil. Tudo pela pátria tudo pelo engrandecimento do Estado, tudo pelos interesses
do nosso município: - eis em concisas palavras, delineada a rota que havemos de
seguir na difícil tarefa que ora empreendemos; eis sucintamente traçado o nosso
programa. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 01 – 11/12/1909)
A fundação do jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO” se demonstra como um dos
fatos mais importantes desse período, início do século XX, pois é através desse meio de
comunicação que também haverá a veiculação das principais reivindicações políticas para o
município frente ao governo estadual, bem como a defesa dos interesses da elite política e
econômica de Patrocínio, composta sobretudo por coronéis e grandes proprietários rurais.
Durante todo o período de publicação do jornal, percebe-se a quantidade de
manifestações de diversas pessoas ligadas à vida social, em prol do crescimento da cidade, da
modernização das vias, praças, enfim de todas as necessidades de infra-estrutura da cidade.
Além do mais, percebe-se também toda uma tentativa de se trabalhar as idéias, divulgando
incessantemente as bases ideológicas do Partido Republicano Mineiro (PRM).
Dentre estes membros da elite patrocinense, um destaque especial para
Honorato Martins Borges, habitante de Patrocínio desde 1885, com sua primeira esposa D.
Maria Felizarda de Aguiar. O destaque se justifica pelo fato de o coronel Honorato Borges ser
considerado o patrono do Grupo Escolar, objeto de estudo desta pesquisa, e um dos
responsáveis pela criação do Grupo.
O Coronel Honorato Martins Borges foi presidente do Diretório do Partido
Republicano Mineiro (PRM), em Patrocínio, de 1904 a 1929, exercendo liderança perante os
políticos da cidade.
Dessa forma, o coronel Honorato Martins Borges se consolida no município de
Patrocínio como o chefe local do diretório do Partido Republicano Mineiro, conduzindo boa
parte das decisões referentes às questões políticas e sociais da cidade.
Em 1911, com a nova divisão administrativa, Serra do Salitre, Cruzeiro da
Fortaleza, Coromandel e Abadia dos Dourados, tornam-se distritos da municipalidade de
Patrocínio.
Em 1914, ocorre um dos fatos mais importantes da história da educação no
município, quando, finalmente, é instalada a primeira escola pública de Patrocínio a 15 de
junho. Trata-se do Grupo Escolar Honorato Borges, criado pelo decreto 3.401 de 09 de janeiro
de 1912, no decorrer do governo do Dr. Delfim Moreira.
52
Também no ano de 1914, chega ao município o primeiro automóvel. Por outro
lado, é aberto, em 1916, o mais antigo estabelecimento comercial, ainda em atividade, as
“Casas Manuel Nunes”.
O município passa, então, por um período de plenas realizações pois, a 12 de
outubro de 1918, é inaugurada a Estrada de Ferro Goiaz (EFG), depois Rede Mineira de
Viação e, atualmente, Ferrovia Centro-Atlântico S.A. FCA. Em 1920, a Estrada de Ferro
Oeste de Minas assume a massa falida da E. F. Goiaz e integra o trecho à sua linha-tronco. A
presença de uma malha ferroviária no município de Patrocínio contribuirá enormemente para
a melhoria das condições de vida da cidade, bem como o aperfeiçoamento da infra-estrutura,
principalmente ligada aos transportes.
A ferrovia se torna a porta de ligação da região de Patrocínio com outras regiões
do país, com destaque para o centro de Minas Gerais, bem como para a capital do país de
então, a cidade do Rio de Janeiro. Isso proporcionará um maior contato da cidade com
viajantes, obtendo, assim, um fluxo de idéias, de comportamentos. Enfim, este evento
histórico em específico se tornou base para a dinamização e a modernização da cidade
patrocinense, iniciando um ciclo de grande prosperidade.
Em 1921, é também inaugurada a energia elétrica, depois de três anos iniciada sua
instalação. Nesse momento, o agente executivo (prefeito) é Osório Afonso da Silva. Em 1923,
os distritos de Coromandel e Abadia dos Dourados conseguem sua emancipação frente à
cidade de Patrocínio.
Outro fato importantíssimo para a história da educação na cidade de Patrocínio é a
fundação do Ginásio masculino Dom Lustosa, em 17 de fevereiro de 1927, sob a coordenação
do padre Matias van Rooy, da Congregação dos Padres dos Sagrados Corações de Jesus e de
Maria e da Adoração Perpétua do Santíssimo Sacramento no Altar, de fundação francesa, no
período pós-Revolução (1789 1798). Porém, os primeiros padres da congregação a virem
para Patrocínio, são de nacionalidade holandesa.
O Ginásio foi criado com o intuito de preservar a integridade da doutrinação e da
educação católica da mocidade em Patrocínio. A Igreja Católica não via com bons olhos a
presença de missões presbiterianas na cidade e passou a estimular movimento de resistência,
bem como ações políticas de fato para barrar o crescimento do trabalho presbiteriano em
Patrocínio.
53
Figura 02 – Primeiro número editado do Jornal CIDADE DO PATROCÍNIO, datado de 11 de dezembro
de 1909, tornado Órgão Oficial da Câmara Municipal. Diretor-proprietário:
HONORATO MARTINS BORGES.
(Acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio)
54
Figura 03 – Coronel Honorato Martins Borges e sua esposa, Dona Perciliana de Aguiar (s/ data).
(Acervo da Escola Municipal Honorato Borges).
55
Figura 04 – Família do Coronel Honorato Martins Borges, em 1918.
(Acervo da Escola Municipal Honorato Martins Borges).
56
Figura 05 Sistema ferroviário atual de Minas Gerais, com destaque para a cidade de Patrocínio por
onde passa a rede Ferrovia Centro-Atlântico S.A. FCA. Quando construída, era conhecida como
Estrada de Ferro Goiaz.
(FONTE — http://www.indi.mg.gov.br/razoes/pdf/ferrovias.pdf, acesso 27 de janeiro de 2006.)
Figura 06 – Estação Ferroviária de Patrocínio, 1930.
(Acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio)
57
Por isso,
O Ginásio “Dom Lustosa”, dirigido pelos padres dos Sagrados Corações,
responsáveis pela educação masculina, atuou como processo de recristianização da
sociedade e contribuiu para a ampliação da rede católica de colégios. Responsáveis
pela formação dentro dos moldes ultramontanos de pessoas de renome na sociedade
patrocinense e região, ainda hoje nos deixa bem viva a sua memória no prédio
situado à Rua Afonso Pena, no fundo da Matriz, em Patrocínio. É inegável que no
período de 1927 a 1962, o “Dom Lustosa” desfrutou de grande prestígio. Era a
referência educacional máxima, hegemônica da educação da cidade e região. Era a
expressão escolar orgânica da oligarquia rural. Seu currículo visava o rigor dos
dirigentes da sociedade tradicional, nos moldes do Colégio Pedro II, no Rio de
Janeiro. Em Patrocínio, o ensino masculino era ministrado por algumas escolas
particulares. Para os que moravam em fazendas próximas, a educação era
transmitida por pessoas contratadas pelos interessados. Em geral, os filhos de
fazendeiros, ainda pequenos, recebiam orientação pedagógica nas casas dos
preceptores, que ensinavam os primeiros elementos para se tornarem, mais tarde,
senhores fazendeiros. (FERREIRA, 2000: 63)
Na verdade, a criação do Ginásio Dom Lustosa se como um dos fatores da
reação da elite oligárquica local, liderada pelo então Bispo diocesano de Uberaba, Dom
Antônio de Almeida Lustosa, à chegada na cidade de uma missão presbiteriana. O campo
missionário presbiteriano é entregue ao Rev. Alva Hardie, primeiro missionário considerado
protestante a residir em Patrocínio a partir de 1924, onde já existia um número significante de
presbiterianos. Sua área de evangelização era o Triângulo Mineiro, Alto Paranaíba e Noroeste
de Minas. O Patrocínio College foi o colégio protestante criado pelos presbiterianos em
Patrocínio, no ano de 1928. Assim,
As implantações de uma escola de formação de obreiros leigos e,
concomitantemente, de uma escola paroquial de alfabetização e, posteriormente, de
um College por parte dos protestantes, foram vistas pela Igreja Católica e pelas
camadas sociais dominantes como um perigo real à sua hegemonia e ao seu poder
de controle social, uma vez que a escola permitiria uma maior disseminação da
doutrina protestante e de sua visão cristã reformada. Por outro lado, a inexistência
de escolas graduadas de ensino médio na cidade potencializava a ameaça da ação
missionária protestante, que trazia em seu bojo uma ação educacional pedagógica
inerente ao trabalho religioso. Assim, a instituição de uma escola de preparação de
obreiros leigos e de uma escola paroquial, que posteriormente viria a se transformar
em um College, maximizavam o “perigo” da disseminação da visão cristã
reformada, que, não tendo os jovens como dar continuidade aos seus estudos,
poderiam os pais católicos cair na “tentação” de matricular seus filhos nas
instituições de ensino protestantes. Assim, os protestantes eram vistos não somente
como uma ameaça ao catolicismo, em razão da sua doutrina, que trazia consigo um
projeto de reestruturação social. (FERREIRA, 2004, 19 – 20)
58
Figura 07 – Bispo de Uberaba – Dom Antônio de Almeida Lustosa.
(s/d – Acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio)
59
Figura 08 – Funeral (1929) do Coronel Honorato Martins Borges, em sua residência oficial.
(Acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio)
60
Paralelamente, no dia 06 de janeiro de 1929, é inaugurado o Colégio Nossa
Senhora do Patrocínio para as meninas, sob responsabilidade de sua primeira diretora, a Irmã
Maria Gislena. O mesmo foi criado a 11 de outubro de 1928.
A Congregação feminina, responsável pelo Colégio, é conhecida como Irmãs do
Sagrado Coração de Maria de Berlaar, originária da Bélgica. A criação do mesmo contou com
o apoio da oligarquia rural local, em favor da consolidação da presença educacional
promovida pela Igreja Católica Apostólica Romana, com o objetivo de garantir sua presença
hegemônica, no imaginário social, e em particular educacional, da cidade de Patrocínio.
O processo de criação, instalação dos Colégios Dom Lustosa e Nossa Senhora do
Patrocínio foi plenamente aclamado e descrito pelo jornal hegemônico “CIDADE DO
PATROCÍNIO”. Em inúmeras edições, o mesmo faz apologia à instalação de ambos os
colégios, no sentido de aprimorar a formação e a instrução patrocinenses, contribuindo para o
progresso da cidade.
Ainda no ano de 1928, por volta de agosto, dá-se início à construção do atual
prédio do Grupo Escolar Honorato Borges, conseguido graças à autorização do Dr. Francisco
Campos, Secretário dos Negócios do Interior, em visita a Patrocínio. Este processo da
construção do prédio atual será alvo de considerações, no capítulo III deste trabalho.
A morte do Coronel Honorato Martins Borges ocorre em 08 de maio de 1929, na
estância hidromineral da cidade de Araxá, local para onde se dirigiu na tentativa de tratamento
da saúde. Sua biografia foi publicada no jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO”, no n.º 822
(publicado em 12 de maio de 1929), como homenagem e reconhecido pelas ações e obras que
Honorato Borges ajudou a conquistar para Patrocínio. Sua morte foi um evento de grandes
proporções para a cidade de Patrocínio. Inúmeras autoridades políticas manifestaram seu
pesar e o seu velório foi marcado pela presença de um grande número de pessoas.
Também neste ano de 1929, é inaugurado, no Largo do Rosário (atual Praça
Honorato Borges), o fórum. Além do mais, é inaugurada também a nova cadeia pública de
Patrocínio, na Praça Tiradentes (a antiga tinha funcionamento no Largo do Rosário).
em 1930, o município de Patrocínio, assim como todos em Minas Gerais, passa a ser
administrado por um prefeito, em substituição ao cargo de agente executivo, que também era
o Presidente da Câmara Municipal. O primeiro prefeito de Patrocínio é Francisco Batista de
Matos. E o último agente executivo foi o jornalista João Pereira de Melo.
61
1.5. Considerações Parciais
O período da República Velha representa para o país um momento de grandes
transformações socioeconômicas pelas quais passa o Estado brasileiro. Historicamente, pode
ser considerado uma fase de transição, pelo menos em algumas partes do país como as regiões
sudeste e sul, do modelo agrário-exportador para o urbano-industrial. Esta transformação
também pode ser verificada em outros países do mundo, os quais procuram se adaptar às
novas exigências do capitalismo mundial, o qual, gradativamente, torna-se essencialmente
financeira ou monopolista.
Mundialmente, a humanidade atravessava momentos de intensa transformação na
ordem estabelecida a então: o imperialismo estabelecido sobretudo pelas potências
européias. A luta por influências em territórios nos continentes africano e asiático provocou o
primeiro dos grandes conflitos mundiais, a I Guerra (1914 – 1918).
Esse evento proporcionou significativas alterações na distribuição geopolítica de
poder, marcando profundamente o contexto histórico. Os Estados Unidos da América se
despontam como a potencial nação a determinar os rumos do sistema capitalista mundial.
Simultaneamente, em 1917, ocorre também a revolução russa, implantando o
modelo socioeconômico socialista. Essas transformações impõem uma nova lógica em torno
dos diversos países espalhados pelo mundo.
No Brasil, então, os processos de industrialização e urbanização eram iniciados em
algumas regiões do país, com a intenção de promover o país ao estágio atingido pelas
principais nações do mundo capitalista, consideradas avançadas.
A burguesia procurava se consolidar enquanto classe hegemônica no país,
participando de um projeto ambicioso de tornar o país uma grande nação. Para isso,
estimulava a produção de idéias que permeassem um sólido projeto de reformulação do
modelo de formação e de inculcação ideológica.
O setor educacional, sobretudo o escolar, é visto como um dos principais meios
pelos quais o projeto de desenvolvimento e aperfeiçoamento social tornar-se-ia realidade.
Em termos políticos, Minas Gerais se tornou um dos sustentáculos da estrutura do
poder ao longo Primeira República, assim como o foi também ao longo do Império. Neste
sentido,
A pressão federal era comum nos estados mais fracos, mas fato novo em Minas,
que cooperara intimamente com todos os presidentes, para controlar o sistema de
federalismo desigual que favorecia os estados grandes e poderosos: Minas Gerais,
São Paulo e Rio Grande do Sul. Comprometido com um governo ordeiro, Minas era
62
um pilar do sistema presidencial, da mesma forma como anteriormente fora um
sustentáculo da monarquia dos Bragança. Adeptos do jogo do legislador, de acordo
e manobra, os mineiros lideraram o congresso na maior parte da República Velha.
Retiveram a presidência por três vezes e puderam designar os sucessores no cargo.
Estava sempre representados no ministério. A coesão interna era a chave desta
influência nacional. Na maior parte do período, a máquina do PRM obteve grande
sucesso de adaptação ao coronelismo, a política de patrão-cliente usada pelos
chefes rurais e regida da câmara estadual. De fato, os movimentos dissidentes,
como a Concentração Conservadora, foram raros. (WIRTH, 1982: 154)
O Estado de Minas Gerais luta por se manter à frente da estrutura política
nacional, na tentativa de consolidar sua posição de estado majoritário, ao lado de São Paulo e
Rio Grande do Sul. Assim,
Os mineiros foram extremamente conspícuos na política nacional durante a
República Velha (1889 1930), uma era de federalismo que favorecia os grandes e
poderosos Estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. Fiel ao
governo bem comportado, Minas era um pilar da democracia limitada e do sistema
presidencial, como fora outrora sustentáculo da monarquia. (WIRTH, 2004: 76 – 7)
Economicamente, Minas Gerais, apesar do esforço, não conseguia acompanhar os
índices alcançados outras unidades da federação, no decorrer do processo de expansão do
mercado interno brasileiro. Mesmo com o avanço das idéias liberais em alguns setores da elite
mineira, o Estado tenta se adaptar às novas realidades, demonstrando interesse em se ingressar
na era da modernização. Dessa forma,
O crescimento irregular, moderado mas não a estagnação define a economia
mineira de 1889 a 1937. Esse moderamento, porém, não foi proporcional à
população e ao poder político do estado. Enquanto outros grandes estados do
Centro-sul sofreram transformações estruturais, o índice e direção da mudança na
economia de Minas foi menos profunda, favorecendo menos a modernização
baseada nas aspirações e técnicas capitalistas. Estado cercado de montanhas com
difíceis comunicações internas, Minas não participou totalmente nem obteve
grandes benefícios do mercado interno nacional em expansão, resultado do
crescimento baseado na exportação. (WIRTH, 1982: 75)
No interior de Minas Gerais, ainda persiste o sistema coronelista de composição
do poder, controlado pelo influente e poderoso PRM (Partido Republicano Mineiro). A elite
política mineira, composta em sua maioria pela oligarquia rural, ainda mantém o sentido de
valorização do Estado, com extrema devoção à ordem estabelecida. Mesmo assim, as relações
estabelecidas entre os membros do Partido ao longo da República Velha demonstra o grande
desafio enfrentado pelos políticos frente à dicotomia entre a preservação da situação
63
prestigiosa obtida desde os tempos do Império, bem como aos novos desafios da estrutura
capitalista imposta em alguns pontos específicos do país.
A modernização necessária perpassa pelo desenvolvimento estrutural de um
mercado interno dinâmico, pela industrialização conseqüente, bem como pela urbanização e
todos os efeitos esperados. Por isso,
A fase seguinte foi o longo apogeu da sua liderança em combinação com o
Paulo, de 1898 a 1929. De fato, o Presidente Campos Sales estabeleceu a famosa
“política dos governadores”, em estreita consultação com o governador Silveira
Brandão. Ambos desejavam o apoio disciplinado dos respectivos legislativos, a fim
de legitimar e pôr em prática orçamentos austeros em decorrência da queda drástica
dos preços do café e das exigências dos credores estrangeiros. Mas desejavam
também aumentar o controle do Executivo às expensas dos Legislativos. Em Minas,
o poder centralizava-se no Palácio da Liberdade acoplado à Comissão Executiva do
PRM. Esse Collegium de intermediários do poder regional comandava os coronéis.
Por seu turno, os chefes locais governavam as muitas cidadezinhas que fizeram a
fama de Minas e carreavam votos para candidatos aprovados pela quina
estadual. Foi o período clássico de Bias Fortes, o taciturno chefe de Barbacena, de
Francisco Sales, credor de uma quantidade de coronéis, e de Francisco Bressane,
secretário do Partido durante muito tempo e famoso por um tique facial,
encarregado de elaborar as listas de votação. O partido do governador controlava as
nomeações políticas, intimidava a imprensa e cooptava clubes cívicos e grupos de
pressão, como, por exemplo, o grupo dos cafeicultores. A dissensão punia-se
rotineiramente nas urnas. A autoridade do governador tinha também a sustentá-la a
violência e a proibição de acesso aos serviços públicos e às oportunidades. Partido
de panelinhas, o PRM era suficientemente coeso para apoiar um governador
inovador como João Pinheiro (1906 1908), suficientemente flexível para
sobreviver às divergências entre os chefes regionais, como, por exemplo, a
rivalidade entre Silviano e Bias Fortes, e suficientemente forte para acomodar
novos chefes que surgiam, como Artur Bernardes e Raul Soares, da Mata. Mas o
PRM estilhou-se na última e mais grave crise sucessória da República Velha. Pela
primeira vez, desde a queda de Alvim, em 1892, Minas entrou violentamente em
choque com o Catete. (WIRTH, 2004: 78)
O PRM se manteve durante praticamente todo o período da Velha República
através do controle dos inúmeros chefes locais, das inúmeras cidades do interior mineiro.
Estas cidades eram, em sua maioria, chefiadas por lideranças locais representantes, em sua
maioria, do sistema coronelista, sobrevivente à Proclamação da República. Ou seja, com a
República, não houve de fato uma transformação efetiva do sistema eleitoral, pois
persistência da influência quase inabalável das chefias locais, capazes de controle da vida
pública, bem como do voto dos eleitores. Nesse intuito,
O CORONELISMO tem sido entendido como uma forma específica de poder
político brasileiro, que floresceu durante a Primeira República, e cujas raízes
remontam ao Império; então os municípios eram feudos políticos que se
transmitiam por herança herança não configurada legalmente, mas que existia de
maneira informal. Uma das grandes surpresas dos republicanos históricos, quase
imediatamente após a proclamação da república, foi a persistência desse sistema,
64
que acreditavam ter anulado com a modificação do processo eleitoral. A
Constituição Brasileira de 1891 outorgou o direito de voto a todo o cidadão
brasileiro ou naturalizado que fosse alfabetizado; assim, pareciam extintas as
antigas barreiras econômicas e políticas, e um amplo eleitorado poderia
teoricamente exprimir livremente sua escolha. Todavia, verificou-se desde logo que
a extensão do direito de voto a todo cidadão alfabetizado não fez mais do que
aumentar o número de eleitores rurais ou citadinos, que continuaram obedecendo
aos mandões políticos já existentes. A base da antiga estrutura eleitoral se alargara,
porém os chefes políticos locais e regionais se mantiveram praticamente os
mesmos, e continuaram elegendo para as Câmaras, para as presidências dos
Estados, para o Senado, seus parentes, seus aliados, seus apaniguados, seus
protegidos. (WIRTH, 2004: 155)
Nas três primeiras décadas do século XX, em plena República Velha, Patrocínio
irá se beneficiar enormemente perante o governo estadual, por representar uma das principais
cidades da região do Triângulo. A estrutura política local, chefiada pelo Coronel Honorato
Martins Borges, é suficientemente coesa e enormemente aclamada por outras lideranças
regionais, bem como pela própria liderança política estadual.
A política local patrocinense ingressa num período de prosperidade, com a
conquista de um sem número de projetos de melhoria da infra-estrutura municipal, dentre os
quais se destacam: a inauguração da Estrada de Ferro Goiaz”, necessária para a ligação da
cidade com outras regiões do país, inclusive com a própria cidade do Rio de Janeiro,
permitindo viagens mais rápidas e eficazes para os habitantes de Patrocínio; a conquista do
telégrafo, aperfeiçoando sensivelmente a comunicação da cidade e aumentando a rapidez nos
contatos mais urgentes; a introdução da energia elétrica, possibilitando um conforto para as
famílias, bem como uma alternativa para os estabelecimentos públicos, comércio e indústria;
a criação, a implementação e o funcionamento da primeira escola de ensino primário regular e
da rede oficial do Estado em Patrocínio, o Grupo Escolar Honorato Borges; a construção de
uma nova cadeia pública; a criação de uma agência bancária, o Banco Comércio, permitindo a
organização das transações financeiras do município com maior eficácia e praticidade; e, por
fim, a construção do Fórum, sede da Comarca de Patrocínio.
Em outros termos, o jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO” foi um dos
mecanismos mais usados pela elite política de Patrocínio, no sentido de veicular concepções
políticas, de mundo, bem como os relatos dos feitos políticos a nível local, regional, estadual,
nacional e internacionalmente. Relata, como exemplo, o resultado de inúmeras viagens que o
agente executivo João Alves do Nascimento, bem como o seu aliado político Coronel
Honorato Borges, fizeram a Belo Horizonte, com o intuito de conseguir retribuições e favores
políticos junto ao Presidente do Estado, Antônio Carlos. A seguir, os termos completos da
matéria, capaz de dar plena idéia dos interesses que preocupavam os políticos patrocinenses
65
de então. Em outras palavras, a matéria consegue sintetizar as principais reivindicações para o
município:
Em prol do município – A viagem do Snr. João Alves e Cel. Honorato Borges a
Belo Horizonte de retorno, na viagem à capital do estado, chegou a esta cidade o
Snr. João Alves do Nascimento, Presidente e Agente Executivo deste Município.
Essa viagem teve por escopo tratar com o Governo Estadual de vários
melhoramentos para Patrocínio e que dependem (uns totalmente, outros em parte)
dos poderes estaduais. Das entrevistas que o nosso Agente Executivo e Cel.
Honorato Borges tiveram com o snr. Presidente do Estado, seus auxiliares de
governo e com os representantes desta zona no Congresso, deviam resultar alguma
coisa de profícuo em benefício de nossa terra, dada a boa vontade dos dirigentes do
Estado em atender aos reclamos políticos, mercê da clarividência, patriotismo e
liberalismo do presidente Antonio Carlos. Assim fomos ouvir o snr. João Alves
sobre os resultados de sua missão, e ele prontificou-se a satisfazer nossa
curiosidade. De um modo geral o esforçado chefe da municipalidade e o cel.
Honorato Borges viram coroado de êxito seus esforços, como era esperado e devia
assim ser. As águas medicinais / A emenda Argemiro - O snr. Antonio Carlos,
coerente com seus patrióticos propósitos de impulsionar o aproveitamento das
riquezas que se acham espalhadas por todo o Estado, mostrou-se inteiramente
favorável ao aproveitamento das fontes medicinais de Salitre Serra Negra. (...) O
empréstimo - O nosso agente executivo tratou também de obter com o governo um
empréstimo com o fim de realizar vários melhoramentos, entre os quais o de água
canalizada. O snr. Presidente do estado, não podendo satisfazê-lo no momento,
afiançou-lhe entretanto que realizaria a operação em janeiro do ano próximo futuro.
Em vista dessa promessa categórica, o snr. Agente executivo desiste de continuar
negociações entaboladas com particulares e com Bancos para realização do
empréstimo. O novo Grupo escolar / Novas escolas - O Dr. Antonio Carlos vai
também expedir as necessárias ordens para a construção do novo prédio para o
Grupo Escolar local e criação de mais cadeiras no mesmo, de modo que, em breve,
teremos em vez do atual e inconveniente casarão do Grupo um prédio à altura
das necessidades do ensino na cidade. Além dessas providências vai o Governo
criar mais três escolas neste Município e que serão localizadas em Serra Negra,
Cocais e Salitre. Ponte do Paranaíba. O Governo do Estado irá entender-se com a
União e o Estado de Goyáz para a construção da ponte sobre o rio Paranaíba, limite
dos dois Estados. Ela será localizada no ponto mais conveniente entre o porto de
João Borges e Saco da Ema. Esse serviço insistentemente reclamado beneficiará
todos os municípios situados aquém e além do grande rio, nos dois Estados. A
Oeste de Minas - O snr. João Alves não esqueceu a Oeste que merece grandes
melhorias e é um dos maiores problemas do Triângulo. Para esse fim procurou o
Dr. Almeida Campos, diretor da via - férrea. Este afirmou-lhe merecer-lhe a maior
atenção os reclamos que esta zona lhe tem dirigido. Nem sempre os tem podido
satisfazer mercê da escassez de verbas com que luta. Está ele à espera de ordem
do snr. Ministro da Viação para começar imediatamente a construção da nova
estação para a cidade. Além disso, começarão a circular ainda este mês os novos
trens noturnos ficando assim as linhas desta zona com três diários. Brevemente o
ilustre diretor da Oeste virá até Patrocínio, verificando por si próprio as
necessidades da Oeste. Visita Presidencial - O snr. João Alves afirmou ao
Presidente Antonio Carlos o grande desejo que esta região tem de receber a sua
visita. O snr. Presidente visitará o Triângulo em Setembro próximo, vinda a
Patrocínio e daqui seguindo para os outros municípios do Triângulo. Eis em
síntese que julgamos ser fiel o resultado de nossa palestra com o snr. João
Alves. Como se vê, seu esforço o foi inútil. Sua viagem será de incalculáveis
benefícios para o município. E foi ela ensejo para mais uma fez aquilatarmos das
qualidades de estadista que é o snr. Dr. Antonio Carlos, em boa hora, elevado a
presidir os destinos de Minas Gerais. Em um dos números anteriores desta folha
demos num rápido escorço a perspectiva do que será o governo do snr. João Alves
do nascimento no município. Pelas linhas acima vê-se que estávamos com a
66
verdade. Novos e largos horizontes abrem-se para Patrocínio, em caminho
ascendente para um progresso contínuo e grande. Para este temos dado e daremos o
nosso esforço, como é nosso dever. Patrocínio, com várias possibilidades para
progredir, não poder ficar preso, manietado, a uma vida vegetativa e lenta.
Procedendo sem saltos, mas continuamente, em breve alcançará o lugar que
merece.” (Os grifos são meus) (CIDADE DO PATROCÍNIO, 737
21/08/1927)
Os anos que compõem a Primeira República, representam para Patrocínio um
período de relativa prosperidade e algumas importantes conquistas para a cidade. A elite
política, composta por membros da oligarquia rural e liderada pelo influente Coronel
Honorato Martins Borges conseguem elevá-la ao nível de uma das mais importantes cidades
do Triângulo Mineiro no período (dentre outras como Uberaba, Araguari, Araxá, Ituiutaba,
Patos de Minas, Uberlândia).
O Grupo Escolar Honorato Borges, criado em 1912, representa um dos ícones
representativos do desejo da elite oligárquica local de inserir Patrocínio numa nova ordem, tão
propagada e defendida pelos ideais republicanos e positivistas, tão caros ao Brasil no decorrer
da Primeira República. Isso se percebe através dos discursos presentes no jornal CIDADE
DO PATROCÍNIO”, defensores de uma nova posição para a cidade de Patrocínio dentre as de
maior destaque do Estado. Em outras palavras, a construção de um novo prédio para o Grupo
Escolar em Patrocínio equivaleria a uma tentativa de modernização do ensino primário na
cidade, aliada à instalação dos colégios Dom Lustosa e Nossa Senhora do Patrocínio. Por
outro lado, fortaleceria, de certa forma, o interesse de sustentar a alfabetização; a fim de
consolidar o sistema eleitoral.
A escola, materialização do processo de sistematização da educação pública
primária em Patrocínio, insere-se num contexto maior, do projeto cultural do governo
republicano, de tornar a educação pública um dos sustentáculos do progresso nacional.
Possibilitando algumas condições necessárias para situar, finalmente, o país entre
as mais avançadas do mundo. Para isso, era necessário, indubitavelmente, um projeto nacional
de instrução pública, aliando as mais modernas concepções pedagógicas do mundo
contemporâneo, com os mais modernos métodos de ensino existentes na época.
Os Grupos Escolares representavam o que de mais moderno acreditava-se existir
no momento. Os mesmos expressavam a opção mais bem sucedida de concentrar em um
único prédio, considerado monumento no interior do universo urbano, diversas etapas do
ensino primário, facilitando, inclusive, o trabalho de fiscalização realizado pela inspetoria de
ensino.
67
O Grupo Escolar Honorato Borges, dessa forma, simboliza, no interior da urbe
patrocinense, a chegada da modernidade à cidade, inserindo-a, finalmente, no que mais
avançado acreditava-se existir em termos de instrução primária. Simultaneamente, contribuía
para a efetivação dos valores defendidos pelo movimento positivista republicano, de incutir,
na sociedade brasileira, os ideais da escola pública, laica e universal. Assim, a presença de um
Grupo Escolar, em Patrocínio, passaria a contribuir para a luta da sociedade brasileira contra o
analfabetismo, tão presente na realidade educacional brasileira do início do século XX.
2. A QUESTÃO DA MODERNIZAÇÃO DO ENSINO PRIMÁRIO DO ESTADO
DE MINAS GERAIS NA REPÚBLICA VELHA
O presente capítulo tem a intenção de estabelecer uma discussão teórica em torno
do projeto republicano mineiro voltado para a educação, empreendida destacadamente através
de determinadas ações do governo estadual. A análise contemplará sobretudo o estudo das
principais reformas relacionadas à educação pública, implantadas no Estado ao longo da
Primeira República: João Pinheiro (1906) e Francisco Campos (1927 / 1928).
A partir deste momento, torna-se relevante o aprofundamento da análise de um dos
principais pontos concernente sobretudo à Reforma João Pinheiro: a implementação das
escolas reunidas ou os conhecidos grupos escolares (considerados modelos capazes de
estabelecer definitivamente uma reviravolta em termos de arquitetura, organização do tempo e
do espaço, procedimentos pedagógicos; enfim, uma tentativa de estabelecer um plano de
modernização da escola pública).
Como foi discutido no primeiro capítulo, Minas Gerais se insere num
movimento marcado pelo “espírito republicano”, pelo menos idealizado. Desse modo, o
desejo estabelecido é o da busca de uma modernização dos serviços mantidos pelo Estado,
inclusive o da educação. Apesar de a propaganda republicana se estender pelo Brasil desde a
época do Império, a Proclamação de 1889 se deu de forma inesperada e abrupta, até mesmo
diante dos mais otimistas republicanos.
Com a mudança de regime, inúmeros problemas de adaptação burocrática e estatal
surgiram. Com isso, a questão educacional demorou alguns anos para ser debatida a nível
estadual, pois aguardava-se, inclusive, as diretrizes de uma reforma nacional do ensino. Por
isso, a escolarização manifestou-se como uma das mais sérias problemáticas em relação ao
69
estabelecimento da nacionalidade brasileira, tão cara a determinados espíritos da liderança
republicana.
Evidentemente, tivemos inúmeras reformas educacionais do ensino estabelecidas
durante a República Velha, tanto a nível nacional como a nível de Minas Gerais. Em termos
estaduais, poderíamos citar algumas mais relevantes, por exemplo: a primeira a ser
estabelecida, três anos após a Proclamação, é a reforma Afonso Pena (lei 41 de 03 de
agosto de 1892), realizando uma reestruturação do ensino em seus mais diversos níveis,
voltada mais para a descentralização dos procedimentos burocráticos (criação de órgão
técnico voltado para o estudo de métodos e processos pedagógicos; empreendimentos da
inspetoria responsável pela fiscalização das escolas do interior, dentre outros procedimentos
práticos).
Uma outra reforma de destaque é a João Pinheiro (1906), considerada, neste
trabalho, marco histórico para a consecução do projeto republicano de educação. Neste
sentido, será dado um enfoque especial para a mesma, ao ser objeto de aprofundamento do
primeiro item deste capítulo. A justificativa desta escolha se baseia na preponderância da
grande novidade da reforma em questão, que consiste no estabelecimento dos grupos
escolares. Estes são escolas consideradas capazes de reunir num prédio escolas isoladas,
bem como permitir uma tentativa de organização do ensino primário em Minas Gerais,
acompanhando inclusive o avanço de determinados países europeus, bem como São Paulo
(estado pioneiro na implantação dos grupos escolares no Brasil, através da Reforma de Ensino
de 1892).
Os Grupos Escolares se tornaram a expressão máxima do modelo educacional
proposto pelo regime republicano, encarnando e expressando a concepção de sociedade rumo
ao progresso e ao estabelecimento da ordem republicana. A construção dos mesmos, num
centro urbano, simbolizava a mudança qualitativa, a superação do velho, do arcaico.
Os grupos escolares serão abordados de forma mais aprofundada num próximo
item deste capítulo, pois estas instituições específicas de ensino se manifestaram como um
lugar pertencente à cidade, expressão maior da modernidade, onde os filhos da sociedade
seriam (con)formados à nova ordem estabelecida. Para isso, seria imprescindível a formação
moral, física, intelectual e cívica do indivíduo, num processo considerado necessário para o
exercício da cidadania.
Após a implantação dos grupos escolares em Minas Gerais, através da Reforma
João Pinheiro (1906), várias outras medidas foram tomadas durante os diversos períodos dos
governos estaduais, dando prosseguimento aos processos de escolarização do Estado. No
70
entanto, a intenção deste trabalho não é o aprofundamento das mesmas, pois a opção de
abordagem dos dois maiores marcos considerados, pertinentes para o objeto específico desta
pesquisa: Reforma João Pinheiro (1906) e Reforma Francisco Campos (1927 / 1928).
nos últimos anos da década de 1930, a Reforma Francisco Campos representará
outro relevante marco histórico, pois a mesma se manifesta como mudança nos rumos da
escolarização, a então em andamento no Estado de Minas Gerais. Por isso, a abordagem
aprofundada desta reforma também se faz necessária, pois começa a haver os primeiros
indícios da influência do ideário escolanovista sobre o ensino dos diversos estados brasileiros,
em especial, Minas Gerais. Dessa forma, a reforma mineira em questão denota ou evidencia
uma tendência simultaneamente reformista e remodeladora, promovendo uma reorientação do
processo de escolarização mineiro.
2.1. Reforma João Pinheiro (1906): a escola como instituição civilizatória
Com a intenção de promover os ideais republicanos, no que se refere à educação, e
ingressar de maneira mais efetiva nos novos rumos da política nacional, relacionados à
tentativa de se consolidar a ordem republicana, Minas Gerais se ocupará de algumas reformas
estruturais, consideradas necessárias para a adequação do estado frente às urgências oriundas
da ordem estabelecida politicamente. Por outro lado, no esforço de estimular e buscar um
crescimento econômico voltado para a garantia da efetivação do processo de modernização,
Minas Gerais promoverá reformas de destaque perante o cenário nacional, destacadamente a
nível educacional. O governo mineiro preocupa-se em manter-se hegemônico nas diretrizes
políticas nacionais e, para isso, busca um respaldo na tentativa de organização da rede
estadual de ensino, através da promoção da escolarização.
Dentre estas reformas educacionais de destaque, promovidas ao longo da
República Velha, uma das mais importantes é a promovida por João Pinheiro (1860 1908),
durante seu governo estadual (exercido no ano de 1890 e, posteriormente, entre 1906 e 1908),
através da lei n.º 439, de 28 de setembro de 1906. Essa relevância se deduz do fato de que a
mesma se efetivará buscando a superação das péssimas condições em que o ensino público
mineiro era ministrado até então. Inúmeros relatos de secretários, como Henrique Diniz (em
1897) e outras autoridades ligadas ao ensino, atestam a precariedade e a fragilidade das
condições em que o ensino vinha sendo promovido.
Na verdade, se realmente houvesse o desejo de levar adiante o projeto
civilizatório, tão desejado pelos republicanos, uma das maiores aspirações necessárias para a
71
consolidação do civismo e da civilidade, da educação em geral, estaria relacionada à
organização do ensino público.
A necessidade atestada de superação da pobreza da rede de ensino seria buscada
pela tentativa de oferecer uma estrutura que melhores condições permitiria para o controle
efetivo do Estado sobre as atividades desenvolvidas no interior da sociedade. No caso
específico da educação, a fim de permitir o desenvolvimento e a integração com o mundo do
trabalho, alguns pontos se tornaram cruciais, conforme Delfim Moreira, quando secretário dos
Negócios do Interior: buscava-se o combate ao analfabetismo, considerado o maior obstáculo
da educação em Minas Gerais e no Brasil; do investimento na formação dos professores; da
expansão fortalecida da rede pública de ensino; da fiscalização constante e gradativa por parte
do Estado; da ênfase no método, no currículo escolar, bem como da estrutura sica das
escolas; da higienização dos ambientes e dos corpos; e de uma boa organização dos recursos
financeiros, disponibilizados para o processo educacional.
Ao se tornar líder político do Estado de Minas, João Pinheiro tinha o claro e
evidente interesse de promover a modernização do ensino, a fim de garantir o cumprimento
dos ideais propostos pelas suas matrizes teórico-políticas, sob influência do republicanismo e
do positivismo. Assim,
A proposta de João Pinheiro pretendia ser uma intervenção na reconstrução de uma
identidade maculada pelo escravismo. Os nossos trabalhadores desconheciam o
valor do trabalho, eram despreparados para a sociedade livre, e, como estavam,
seriam incapazes de integrar o projeto modernizador. Daí a centralidade da
educação. Tratava-se da mudança de uma tradição escravista, iniciada nas relações
de trabalho da mineração, para um sistema de trabalho livre na agricultura, com o
conhecimento e o uso racional dos recursos naturais por trabalhadores treinados
adequadamente. (BOMENY, 1994: 149 – 150)
Em outras palavras, responsável pelas diretrizes políticas do estado, João Pinheiro
buscava a consecução de determinadas ações com o intuito de promover uma ampla reforma
estrutural, a partir da própria estrutura em vigor no estado. Isso se percebe quando da
transição do regime monárquico para o regime republicano, pois
A transição republicana, o realinhamento das forças estaduais e, dentro de Minas, a
articulação negociada entre facções de uma oligarquia em confronto permitiram a
entrada do estado mineiro no cenário político nacional. A mudança da capital,
discussão remota, ganha força de legitimidade no projeto de modernização do
estado, e principalmente, na sua unificação. A mudança da capital da velha Ouro
Preto para a planejada Belo Horizonte, em 1889, faz da Minas dividida, a Minas
preparada para os novos tempos republicanos. E é naquele ambiente urbano e
intelectual que se abrigará três décadas depois a geração de Drummond. Belo
Horizonte é uma cidade que nasce “filha única da República”, sendo construída sob
os auspícios e a força de um projeto positivista” de ampliação e higienização do
espaço urbano. Já está ali, no momento de sua concepção, um ator político, o
72
“modernista de final de século”, João Pinheiro, personagem que retornará ao final
não mais como ator, mas como autor de um projeto político-educacional expressivo
que disputará com outro a permanência no estado e no país. A liderança política de
João Pinheiro é parte integrante do processo de unificação de Minas, e o projeto
educacional que implementa no estado permanece na memória da educação
nacional como alternativa a ser explorada. (BOMENY, 1994: 24 – 25)
A modernização proposta por João Pinheiro se sustentava em três grandes critérios
por ele definidos como prioritários, pois desses dependiam todo o restante da estrutura:
sempre a elite de uma unidade federativa deve corroborar e apoiar um projeto de
desenvolvimento de qualquer setor da sociedade. Sem o apoio da elite, nada pode ser
consumado em termos de reforma; a agricultura é considerada a maior bússola de sucesso ou
insucesso do desenvolvimento econômico, pois é responsável pela sustentação sica da
estrutura; além do mais, uma forte interdependência entre a racionalização, a qualificação
para o trabalho e o desenvolvimento econômico. O país começa a ensaiar sua industrialização,
e conseqüente urbanização, com a necessidade de promoção de uma reeducação dos espaços,
da higienização, enfim, de toda uma mudança de comportamento social, base de qualquer
outra reforma. Portanto, torna-se evidente a necessidade de um repensar da estrutura de
formação dos cidadãos trabalhadores e da elite pensante, componentes de uma sociedade
coesa e integrada. Dessa forma,
O final do século passado assistia ao movimento de parte da elite brasileira
mobilizada pelas causas da degradação moral da população, da degradação sica
dos espaços urbanos, da expansão e descontrole das doenças públicas, morais e
biológicas. Os projetos de engenharia política de saneamento da população, de
ampliação de espaços urbanos, de reformas, vinham ao encontro da reordenação
política do país, segundo normas “civilizadoras” de higienização da sociedade civil.
A mescla com os negros ajudava muito a fortalecer os preconceitos racistas e as
propostas de “branqueamento” da sociedade como solução higienizadora. Havia
muito mais, no entanto. Mesmo a sociedade dos brancos mostrava-se despreparada
técnica, profissional e moralmente para construir o Brasil republicano. Com toda a
ambigüidade de que não se separa ao longo de sua vida pública, entre credo liberal
e prática excludentes, João Pinheiro mantinha como bússola de argumentação a
urgente necessidade de criar elos entre o cidadão e a sociedade, e o elo fundamental
seria respondido com o trabalho livre e educação. Os desafios que o mundo do
mercado impõe ao indivíduo estimulam nele a vontade de se aperfeiçoar, de
melhorar passo a passo sua posição no conjunto da sociedade. Com indivíduos
melhores e mais preparados, provavelmente teríamos um Estado mais fortalecido e
uma nação dignificada. Neste particular, João Pinheiro está finalmente vinculado à
tradição fortemente desenvolvida no século XIX que tem na educação via segura de
realização do progresso. (BOMENY, 1994: 162)
Por outras vias, o projeto inovador político de João Pinheiro passava
necessariamente pelos pressupostos defendidos pelo liberalismo, baseados na formação do
indivíduo capacitado para o trabalho especializado, bem como para o exercício dos deveres de
cidadão. Além do mais, perpassa pelo respeito aos direitos individuais, da liberdade de
73
expressão e do direito ao exercício da propriedade particular, do direito de escolha da própria
profissão e no dever de contribuir para o equilíbrio da sociedade.
Enfim, acreditava ser extremamente necessária a formação do homem, membro de
uma nação, que buscava a manutenção das forças sociais, a fim de programar e garantir a
ordem social estabelecida. O importante é reformar para manter, pois sempre a ordem
depende da manutenção do progresso. Desse modo, estaria garantida a possibilidade do
cidadão, através do seu trabalho, do seu exercício, garantir a dinâmica social e econômica e
satisfazer as necessidades do país, incluindo-o na nova divisão do trabalho internacional,
voltado para a valorização da indústria. Portanto,
O projeto João Pinheiro tinha na utopia liberal americana reforço permanente à
argumentação. O ideal de uma sociedade de pequenos proprietários, de agricultura
racionalizada segundo técnicas produtivas modernas, o que vale dizer, agricultura
capitalizada de forma a fixar o agricultor na terra; e defesa do ensino livre precursor
de uma sociedade de mercado emergente; a secularização do ensino e a defesa da
religiosidade como princípio integrativo da nacionalidade; a defesa da educação
básica e gratuita, orientada segundo padrões liberais de desenvolvimento dos
indivíduos para uma sociedade formada segundo regras de divisão social do
trabalho, este conjunto de princípios compunha a agenda do presidente de Minas
Gerais no início do século. (BOMENY, 1994: 165)
Em menos de um mês após sua posse, João Pinheiro realiza uma ampla reforma do
ensino primário e do ensino normal, já com a preocupação de adaptar a realidade do ensino do
estado de Minas aos interesses de sua concepção de sociedade e de política. Dentre as
diversas modificações e propostas da reforma, levadas adiante, destacam-se: a maior
fiscalização do ensino através dos inspetores escolares; a introdução de componentes
curriculares ligados ao ensino da agricultura; melhorias na formação dos futuros professores;
criação de um espaço próprio para a atividade da instrução, agrupando todas as escolas antes
isoladas em um só prédio, os chamados “Grupos Escolares” ou Escolas Agrupadas.
Este último detalhe da reforma tem como inspiração a reforma realizada em São
Paulo, a Caetano de Campos, de 1892, pouco depois da Proclamação da República. A
Reforma Caetano de Campos é considerada inovadora no país, pois é precursora na expansão
do modelo dos grupos escolares. Todos os demais estados brasileiros se inspiraram na
reforma paulista, ao tentar implantar em seus respectivos territórios a proposta das escolas
reunidas num prédio, a fim de facilitar a promoção da reestruturação escolar, sobretudo a
do ensino primário.
Dentre desses pressupostos, a reforma proposta por João Pinheiro, Minas Gerais,
permitiu que houvesse um ensaio no sentido de promoção da escolarização, pois com a
74
reforma mineira de 1906, “a escola ganhou notável centralidade, sendo conformada, nos
ordenamentos legais, como o lugar específico para uma educação específica “o
desenvolvimento da educação popular sob o tríplice aspecto físico, intelectual e moral””.
(FARIA FILHO e VAGO, 2000: 38) Neste sentido, acreditava-se que através da
escolarização, as mudanças relativas a todo o universo social, finalmente seriam possíveis. O
desenvolvimento individual das capacidades física, intelectual e moral permitiria, por
conseqüência, o desenvolvimento de toda a sociedade mineira e brasileira.
A intenção era que os grupos escolares fossem expandidos, implantados e
fortalecidos em todo o Estado de Minas Gerais, tentando superar definitivamente o modelo
arcaico das escolas isoladas, consideradas incapazes de promover um ensino de qualidade.
O programa proposto pela Reforma João Pinheiro e a ser incorporada pelas escolas
mineiras incluía os estudos de “Leitura, Escrita, Língua Pátria, Aritmética, Geografia, História
do Brasil, Instrução Moral e Cívica, Geometria e Desenho, História Natural, Física e Higiene,
Trabalhos Manuais e Exercícios Físicos”. (FARIA FILHO e VAGO, 2000: 38)
Com isso,
A educação primária em Minas Gerais experimentou, após a reforma de ensino de
1906, um processo de racionalização que atingiu tanto a definição, a divisão e o
controle dos espaços e dos tempos escolares quanto os processos e os métodos de
ensino, impondo, com isso, normas disciplinares sobre os professores e,
notadamente, sobre os (as) alunos (as). Essa racionalização não pretendia diminuir
a abrangência da educação, mas ao contrário visava dar conta de suas tarefas cada
vez mais amplas e complexas. A escola se racionalizava justamente porque tinha
como finalidade última racionalizar o conjunto do social. Deslocava-se de uma
escola em que o conhecimento escolarizado se confundia com o conhecimento da
própria população e que não tinha a preocupação com mudança de bitos,
costumes, sensibilidades, para uma escola que se queria instrumento e mecanismo
exatamente dessa mudança. (FARIA FILHO e VAGO, 2000: 43)
O novo padrão imposto através da expansão e consolidação dos Grupos Escolares
exigia uma organização baseada numa inédita divisão do trabalho pedagógico. Percebe-se a
presença de uma fiscalização permanente do ensino através da inspetoria, bem como a
execução de um programa de ensino legalmente estipulado. Além do mais, pensava-se
também na necessidade de estimular a permanência do aluno no interior da escola.
O processo de modernização do ensino levado adiante pelo então Presidente do
Estado, João Pinheiro, não significou necessariamente a superação das ssimas condições de
ensino, que anteriormente vigoravam no contexto estadual. Inclusive, quando ainda não havia
sido implantado o modelo dos Grupos Escolares, as escolas isoladas eram uma regra geral e,
consequentemente, não existia um modelo consolidado de ensino primário. As condições de
75
ensino eram muito restritas e dependentes da conduta pessoal ou individual dos professores.
Neste sentido,
Ler, escrever e contar eram as preocupações centrais do ensino nessas escolas.
Dos(as) professores(as) que nelas ensinavam eram exigidas, como elementos
fundamentais de sua competência, a capacidade de ensinar e a idoneidade moral.
Nesse contexto, o conhecimento escolarizado era o conhecimento do(a)
professor(a), que em muito confundia-se com a própria cultura da população, da
qual ele(a) era oriundo(a) e participante. (FARIA FILHO e VAGO, 2000: 34)
A partir dessas colocações, o antigo modelo era considerado pernicioso para o
projeto de escolarização implantado no decorrer da República Velha em Minas, pois não
havia uma diretriz eficiente e universal que servisse de modelo para todas as escolas
existentes até então. Assim,
Tais escolas passam a ser duramente criticadas pelos intelectuais e políticas
republicanos pela sua inoperância e precariedade, pela ignorância dos(as)
professores(as) e, ainda, pela falta de controle do Estado sobre elas, registra o autor.
São paulatinamente representadas como um estorvo a ser removido. [...] A idéia de
reuni-las em um só prédio, com nova organização, ganha força e adeptos.
Revelando as influências que circulavam entre os agentes da instrução pública, o
Secretário Wenceslaw Braz chama a atenção para o fato de que os Grupos
Escolares eram adotados pelas nações “mais cultas do velho e novo mundo”, e
por alguns Estados da República, como era o caso de São Paulo. (FARIA FILHO e
VAGO, 2000: 35)
Escolas isoladas continuavam a ser construídas, bem como um parte maciça da
população permanecia fora das escolas e, consequentemente, continuavam analfabetas. O
povo, em geral, ainda não via na escolarização uma possibilidade de ascensão social ou até
mesmo uma real necessidade para a sua integração no meio social.
As dificuldades encontradas no exercício do ensino eram inúmeras, obstruindo a
plena realização da educação escolar popular. porque houve a implantação do modelo dos
grupos escolares (através da Reforma João Pinheiro, em 1906), isso não significaria, por outro
lado, a superação completa das precárias condições de ensino. Percebe-se que a educação,
apesar de ser alvo de amplas reformas estruturais, na prática, não conseguiria efetivamente
realizar as tão sonhadas mudanças previstas legalmente. Assim,
Até então, os professores, em um exaustivo trabalho, ensinavam em aulas
heterogêneas, onde se reuniam crianças das quatro classes, com óbvios
inconvenientes para a aprendizagem e para esses próprios mestres que teriam que
redobrar esforços para manter em atividade todos os alunos, sem poderem
dispensar, ao mesmo tempo, a sua atenção para com todas essas divisões. Ainda
que empregassem auxiliares ou utilizassem os próprios alunos mais adiantados para
dirigirem os das primeiras classes, tal como se fazia no tempo do Império e mesma
na República, a eficiência da aula muito deixava a desejar. (MOURÃO, 1962: 93)
76
Mesmo com o fato de ocorrer uma defesa da modernização da escola, que atenda
aos interesses do Estado em oferecer uma formação básica e eficiente para a população,
preocupada em proporcionar uma profissionalização das crianças, denotava uma característica
singular do modelo liberal, voltado para a preparação de mão-de-obra especializada, pronta
para inseri-los na prática do trabalho.
Os Grupos Escolares também foram implantados no Estado de Minas Gerais
expressando a intenção de permitir às crianças das camadas sociais mais empobrecidas a
oportunidade de se tornarem trabalhadores instruídos e qualificados, representando talvez a
única alternativa no interior do sistema capitalista de relações sociais. Isso não significa, por
outro lado, a tentativa de se superar as desigualdades sociais, econômicas, mas consolidar
uma sociedade em que a mão-de-obra fosse alvo de uma política de formação, não só
profissional, mas também política. Neste intuito,
Essa referência à necessidade de dar uma profissão aos alunos é mais uma
indicação reveladora de que um dos propósitos centrais da reforma de Ensino
Primário era atingir as crianças oriundas de famílias economicamente
empobrecidas. A escola foi produzida com uma possibilidade de prepará-las para
sua inserção nas práticas de trabalho, talvez como única alternativa que se colocava
para elas. (FARIA FILHO e VAGO, 2000: 41)
Como todo processo de mudança, esse período de reformulação do ensino público
em Minas Gerais não de todo harmônico e consensual. A imposição do novo papel social da
educação escolar foi introjetado em meio a tensões, na relação com outros sujeitos sociais. A
adesão da população não se demonstrou imediata e, nem mesmo convicta imediatamente, pois
nem sempre as ões praticadas pelo Estado são acompanhadas simultaneamente pelas outras
instâncias da sociedade. Assim,
Num movimento que contou com a participação não apenas dos profissionais
ligados ao cotidiano escolar, mas do conjunto daqueles implicados na produção e
legitimação política e cultural de uma nova cultura escolar em Minas Gerais nas
primeiras décadas deste século, a criança como sujeito sócio-histórico (como
sujeito participante e portador de uma cultura, de sensibilidades e valores próprios,
possuidor e continuador de uma tradição e/ou sujeito que deseja e busca em razão
não de uma agência de ensino, a escola, mas do sentido de sua própria vida) passa a
ser cada vez mais destituída de sentido e qualidade, dando lugar e apenas um
sujeito que conhece, ou melhor, que aprende a conhecer. (FARIA FILHO e VAGO,
2000: 42)
A intenção da reforma foi a de realizar a consolidação do processo civilizatório das
populações pobres, bem como inserir Minas nos parâmetros da modernidade. O processo de
escolarização levado adiante, através da Reforma João Pinheiro, deve ser compreendido
77
levando-se em conta a inserção do mesmo no processo de urbanização. Isso se na
compreensão de como esse processo contribuiria na formação de um universo de idéias, bem
como de comportamentos, ou até mesmo na consecução de espaços físicos, símbolos e
instrumentos da formação de uma sociedade melhor estruturada e reformulada, para atender
às necessidades impostas pelo novo regime republicano.
Minas Gerais experimentou, através da Reforma João Pinheiro (1906), um
processo de busca da racionalização da educação escolar, preocupada em reformular diversos
aspectos do ensino, atingindo vários aspectos do mesmo: a concepção, a organização e o
domínio dos ambientes e da temporalidade escolar; além do mais, houve também uma
interferência no que se refere às concepções relativas ao currículo ministrado nas escolas, bem
como o método pedagógico adotado nas mesmas; conseqüentemente, houve também uma
preocupação com as normas disciplinares vigentes, sobre os professores, por um lado; e, por
outro, e com maior ênfase, sobre os alunos.
Todo esse processo de racionalização do ensino em Minas Gerais buscava resgatar
o verdadeiro papel da educação, segundo os ideais republicanos e liberais. As tarefas a serem
assumidas pela educação escolar se tornavam, gradativa e continuamente mais complexas. A
racionalização da escola se fazia necessária e urgente, pois justamente a escola era
considerada a instância capaz de racionalizar o universo social existente em Minas Gerais e
adequá-la ao projeto nacional de civilização. Assim, buscava-se a conversão de uma escola
estritamente ligada ao comodismo social para outra, capaz de promover reais e efetivas
mudanças no universo social.
Havia também a preocupação de provocar a superação do modelo abstrato e
alienado de um ensino abstrato, desvinculada da realidade prática, para outro comprometido
com as reais necessidades da sociedade, sobretudo voltada para o mundo do trabalho. Os
alunos e alunas seriam o princípio, o processo e o instrumento da promoção de uma educação
aliada à utopia republicana de modernização.
O ingresso das crianças, sobretudo oriundas das classes sociais menos favorecidas
ao mundo do trabalho, seria possível graças a uma educação do corpo, garantida através do
ensino nos grupos escolares, considerado o modelo capacitado para o mesmo. Por isso, a
escola agrupada é compreendida como a possibilidade de se realizar uma verdadeira inserção
dos alunos no universo social.
78
2.2. Implementação dos Grupos Escolares: expressão educacional do
Republicanismo
Como dito anteriormente, o maior feito da Reforma João Pinheiro (1906) para a
rede de ensino público do Estado de Minas Gerais pode ser resumido no fato de ter
implantado o modelo dos Grupos Escolares como forma considerada mais adequada para a
realização da modernização do processo de escolarização do estado.
Minas Gerais tinha o interesse de estar acompanhando as tendências nacionais,
relativas à reestruturação da rede de ensino, sobretudo primário. Por ser considerado um dos
principais Estados da Federação Republicana, também efetuará esforços no sentido de
programar a escolarização pública em conciliação com os ideais republicanos, positivistas e
liberais, personificados através dos grupos escolares. Por isso,
Apesar de posto desde a segunda do século XVIII, o debate em torno da
constituição de espaços dedicados ao ensino e da fixação de tempos de permanência
na escola teria que esperar até meados da última década do século XIX, primeiro
em São Paulo e, depois, em vários estados brasileiros, para assumir a forma mais
acabada da proposta dos grupos escolares. Neles, e por meio deles, os republicanos
buscaram dar a ver a própria República e seu projeto educativo exemplar e, por
vezes, espetacular. (FARIA FILHO e VIDAL, 2000: 24)
Minas Gerais se destaca pelo seu potencial econômico e, sobretudo, pela sua
presença marcante nas questões políticas nacionais. Ao lado do Estado de São Paulo, domina
hegemonicamente o cenário das eleições nacionais. A fim de manter essa hegemonia e,
simultaneamente, promover a modernização das instituições sociais, com o intuito de
consolidar-se nacionalmente, Minas Gerais efetuará de forma gradativa a busca de uma
disseminação da escola pública em seu território. Assim,
A transição republicana, o realinhamento das forças estaduais e, dentro de Minas, a
articulação negociada entre facções de uma oligarquia em confronto permitiram a
entrada do estado mineiro no cenário político nacional. A mudança da capital,
discussão remota, ganha força de legitimidade no projeto de modernização do
estado, e principalmente, na sua unificação. A mudança da capital da velha Ouro
Preto para a planejada Belo Horizonte, em 1889, faz da Minas dividida, a Minas
preparada para os novos tempos republicanos. E é naquele ambiente urbano e
intelectual que se abrigará três décadas depois a geração de Drummond. Belo
Horizonte é uma cidade que nasce “filha única da República”, sendo construída sob
os auspícios e a força de um projeto positivista” de ampliação e higienização do
espaço urbano. Já está ali, no momento de sua concepção, um ator político, o
“modernista de final de século”, João Pinheiro, personagem que retornará ao final
não mais como ator, mas como autor de um projeto político-educacional expressivo
que disputará com outro a permanência no estado e no país. A liderança política de
João Pinheiro é parte integrante do processo de unificação de Minas, e o projeto
educacional que implementa no estado permanece na memória da educação
nacional como alternativa a ser explorada. (BOMENY, 1994: 24 – 25)
79
Minas, em seus esforços pela efetivação da escolarização pública, evidencia a
importância dada a esse componente da estrutura social, bem como a consolidação dos ideais
liberais na formação individual. A sociedade somente se consolidaria através dos esforços
voltados para a reestruturação de todo o processo civilizatório. Contudo, certamente, este
processo de civilização somente seria possível através da implementação de um novo modelo
escolar, capaz de encerrar todo o interesse de uma racionalização do processo ensino-
aprendizagem.
Nessa perspectiva, os órgãos estatais, em franca expansão e consolidação,
tornaram-se gradativamente a principal origem do conhecimento a respeito do conjunto do
serviço da instrução. É evidente que a burocracia estatal se torna condição essencial para o
projeto republicano de promoção de uma ampla reforma social, baseada num processo de
expansão dos grupos escolares. Assim,
Os grupos escolares resultam de uma concepção adquirida no decorrer do
andamento da escolarização que buscou imprimir racionalização à educação
escolar, abarcando várias dimensões: a) os sujeitos (professor e aluno),
imediatamente envolvidos no processo pedagógico-escolar, se estabelecem em
posições diferenciadas; triunfa o ensino simultâneo a ser exercido pelo professor,
porém com alunos homogêneos, em oposição à heterogeneidade dos mesmos que
estruturava o ensino mútuo; b) é o tempo da ênfase na intuição como faculdade
capaz de revelar o caminho metodológico para o ensino e para a aprendizagem,
anteriormente à emergência dos métodos ativos; c) é o tempo, no Brasil, da
emergência de uma organização espacial diferenciada, expressa em edifícios
arquitetonicamente expressivos, qualificados como palácios em Minas Gerais e em
Goiás; d) é o tempo da centralidade da inspeção escolar e de seu papel fiscalizador
do andamento pedagógico-escolar. (ARAÚJO, 2005: 01)
O fenômeno de criação dos Grupos Escolares não consiste num evento aleatório
ou desvinculado de um contexto educacional maior. Na verdade, a implantação dos Grupos
Escolares, coincidentemente, manifesta-se de maneira paralela e inter-relacional com a
escolarização do social, a fim de buscar a racionalização do ensino público em Minas Gerais.
Focalizar a política educacional levada adiante no período da República Velha
obriga, necessariamente, a pensá-la como parte de um projeto maior, como um movimento a
favor da universalização da escola primária. Todo o universo social, sobretudo o urbano,
encontra-se mobilizada em torno do processo de escolarização. Assim,
[...] a legislação escolar e as reformas dos serviços de instrução funcionaram, ao
longo do século XIX e XX, em Minas Gerais, como conteúdo e forma a partir dos
quais setores, os mais importantes da nossa intelectualidade e elite política,
buscaram apreender e dar inteligibilidade à escolarização, tomando como base as
noções de civilização, ordem e progresso. (FARIA FILHO, 2003: 83)
80
Com a influência do cientificismo positivista, ou seja, da crença no poder absoluto
da razão, bem como da eficácia do conhecimento científico acerca da sociedade, a educação
obtém lugar de destaque como elemento (con)formador dos indivíduos, vinculada à cidadania.
Acredita-se que a reforma da sociedade seja imprescindível para o bom andamento da história
humana, levando o progresso à ordem social.
A escolarização, através da implementação dos grupos escolares, está incluída
num projeto civilizatório mais amplo, de acordo com o desenvolvimento gradativo e contínuo
da sociedade. E a educação é considerada um processo civilizatório capaz de pôr em prática o
almejado projeto tanto político como social para Minas Gerais. Assim, a escola pública
emerge com uma dupla função: ser veículo difusor dos ideais republicanos e garantir a
manutenção da ordem, evoluindo de maneira progressiva. Além do mais,
Os reformadores acreditavam na imprescindibilidade da formação dos professores
para a renovação da escola pública. Essa renovação era concebida especialmente
em termos da adoção de novos processos de ensino consubstanciados no método
intuitivo. A ênfase dada à formação prática como base para a aprendizagem dos
métodos modernos de ensino e experimentação dos alunos-mestres da Escola
Normal. Essa escola foi considerada a base da reforma da instrução blica.
(SOUZA, 1998: 40)
Simultaneamente, um estímulo ao processo de profissionalização do ensino,
buscando a superação lastimável anterior, caracterizada pela ausência de uma classe
harmoniosa ou padronizada do magistério. Conseqüente à profissionalização do magistério, o
professor seria um agente capaz de estimular com maior eficácia o processo didático escolar,
seguindo métodos elaborados com o intuito de consolidar o ensino. Seria possível o
desenvolvimento de uma nova identidade para a figura profissional do professor. Este,
obtendo uma identidade profissional, passaria a ser mais valorizado pela sua atividade do
magistério.
Há também o surgimento de um sujeito, no interior das instituições escolares
agrupadas, o diretor. A figura administrativa centrada na pessoa do diretor possibilitaria,
como pode ser percebido, a consecução de toda uma estrutura burocrático-administrativa no
interior da escola. Este fato, além de inovador, contribui para aprimorar o sentido de
organicidade, dando sentido à estrutura social exterior à escola. Através do diretor, além da
organização burocrática e administrativa, seria possível destacar as relações de poder, dando
sentido à concepção de autoridade. Por outro lado, a valorização dada à autoridade e à figura
do diretor, teve como conseqüências mais imediatas a perda da autonomia do professor,
tornando-o também submisso às diretrizes impostas pelo diretor do grupo escolar. Assim,
81
além do trabalho fiscalizador realizado pelos inspetores de ensino, havia agora também a
presença do diretor no interior da escola, centralizando as decisões mais importantes para o
andamento do processo de ensino-aprendizagem, bem como para as decisões administrativas.
Com isso,
A valorização social do professor e o início da profissionalização do magistério
primário constituem dois aspectos significativos das transformações educacionais
verificadas no final do século XIX, no Estado de São Paulo. A importância dada à
educação popular nesse período propiciou a constituição de representações sobre a
profissão docente nas quais o professor passou a ser responsabilizado pela
formação do povo, o elemento reformador da sociedade, o portador de uma nobre
missão vica e patriótica. Era pelo professor que se poderia reformar a escola e
levá-la a realizar as grandes finalidades da educação pública. (SOUZA, 1998: 61)
Sumariamente, ao professor seria atribuída a nobre missão de assumir parte
relevante da educação pública, contribuindo para o processo civilizatório da sociedade,
auxiliando-a na consolidação do conhecimento. Além de se efetivar como profissional na
execução do magistério, o professor seria o intermédio através do qual o processo de reforma
efetuar-se-ia. Além do mais, sua atividade seria equiparada à de uma missão, considerada
nobre, de fornecer os elementos capazes de levar o povo ao mais alto grau de
desenvolvimento cultural. Neste sentido, de certa forma, através da implementação dos
grupos escolares no Brasil e, em específico, em Minas Gerais, o exercício do magistério
passaria a ser visto com maior seriedade pela sociedade. E assim,
O exercício da docência no grupo escolar foi disputado pelos professores públicos
por vários motivos: os grupos escolares ofereciam melhores salários e melhores
condições de trabalho; além disso, eram considerados escolas de qualidade e de
grande prestígio social que estendia ao corpo docente. Localizados nos centros
urbanos eram ainda mais atrativos que as escolas isoladas. Para muitos professores,
especialmente as mulheres, trabalhar no grupo escolar significava o máximo da
ascensão na carreira do magistério, dado que os cargos superiores estavam
reservados ao sexo masculino. (SOUZA, 1998: 73)
A implementação dos Grupos Escolares representa ainda a criação de uma nova
cultura escolar nos centros urbanos, ao expressar íntima ligação com o processo de
modernização, da busca de superação das condições anteriores do ensino público. A escola,
na forma específica dos grupos escolares, finalmente, passaria a ocupar lugar de destaque no
espaço urbano. Dessa forma,
Apesar de posto desde a segunda do século XVIII, o debate em torno da
constituição de espaços dedicados ao ensino e da fixação de tempos de permanência
na escola teria que esperar até meados da última década do século XIX, primeiro
em São Paulo e, depois, em vários estados brasileiros, para assumir a forma mais
acabada da proposta dos grupos escolares. Neles, e por meio deles, os republicanos
82
buscaram dar a ver a própria República e seu projeto educativo exemplar e, por
vezes, espetacular. (FARIA FILHO e VIDAL, 2000: 24)
Os Grupos Escolares também são conhecidos como escolas-monumentos e
confirmam o interesse do republicanismo, ao expor a escola agrupada como lugar de
civilização e louvor à Pátria. Neste sentido, quase sempre, o grupo escolar ocupa
geograficamente um lugar de destaque na paisagem urbana, denotando seu valor e sua
importância, enquanto lugar primordial e destacado para o cultivo do saber. O aprimoramento
do prédio escolar, através de arrojados projetos urbanísticos, valorizando a arquitetura escolar,
será visto também como um eminente símbolo do papel da educação escolar para a
consecução das reformas sociais como um todo. Por conseguinte,
A cultura escolar elaborada tendo como eixo articulador os grupos escolares
atravessou o século XX, constituindo-se em referência básica para a organização
seriada das classes, para a utilização racionalizada do tempo e dos espaços e para o
controle sistemático do trabalho das professoras, dentre outros aspectos. É, grosso
modo, nesse e com referência a esse caldo de cultura que ainda hoje se elaboram as
reflexões pedagógicas, mesmo aquelas que se representam, mais uma vez, como de
costas para o passado e antecipadoras de um futuro grandioso. (FARIA FILHO e
VIDAL, 2000: 27)
Os grupos escolares tornam-se não símbolos dos ideais republicanos no
ambiente e espaço urbano, mas também o modelo, instrumentos fundamentais para a
realização do projetado processo civilizatório, capaz de estabelecer uma nova lógica não só na
educação escolar, mas também na própria educação pública. Em outras palavras, os grupos
escolares representam as primeiras escolas de ensino primário de fato a utilizarem-se de
padrões administrativos, de programas lecionados no cotidiano escolar, bem como do
aproveitamento do espaço físico, buscando definições consideradas modernas, capazes de
reformarem a fundo o modelo até então estabelecido. Em outras palavras, expressam a
primeira tendência escolar, no Brasil, engajados com a tentativa de sistematização do ensino
primário, baseada em princípios pedagógicos bem estabelecidos.
De maneira geral, no cenário urbano, os grupos escolares estavam sendo
construídos e implantados na região central da cidade, evidenciando a importância atribuída
ao aspecto arquitetônico escolar. Este, por sinal, representa toda uma concepção, muitas vezes
subentendida, de que a escola deveria ser valorizada como prédio público, ocupando lugar de
destaque dentre as diversas construções no complexo espaço da urbe. Assim, a intenção
passou a ser resumida no interesse de reservar um lugar de destaque para que a magnitude e o
83
esplendor do prédio escolar estejam livres e visíveis para todos os cidadãos que compõem o
universo social.
Através desta medida, o grupo escolar foi adotado como modelo mais propício
para expressar e evidenciar os interesses embutidos no empreendimento estabelecido pelo
ideário positivista e republicano, promovendo uma renovação na concepção dos ambientes
escolares, bem como da questão cronológica dos processos pedagógicos. É a definição
específica do espaço e do tempo escolar, de uma nova forma, que vinha obtendo
reconhecimento desde fins do século XIX. Os grupos escolares sugerem um movimento de
superação gradativa da organização do ensino público anterior, fornecendo uma nova
roupagem. Neste sentido,
Esse movimento de afirmação de uma nova forma escolar, que vinha se dando
desde meados do século XIX, produz, como seu símbolo mais acabado, os grupos
escolares, cuja representação, nos documentos analisados, é construída em estreita
relação com a forma de organização anterior da instrução pública – as escolas
isoladas , sugerindo sempre, através da utilização de um “esquema gico”
binário e polarizado, que o movimento se faz do “arcaico” para o “moderno”, do
velho” para o “novo”, dos pardieiros para os palácios, ou ainda, que, nos grupos
escolares, finalmente, a instrução e os diversos outros aspectos da educação
contemporânea lograriam realizar-se numa única e autorizada instituição, num
mesmo tempo e lugar, como educação escolar. (FARIA FILHO, 2000: 21)
O Grupo Escolar, conseqüentemente, passa a ser referência para a sociedade em
termos de lugar definido e próprio para o ensino-aprendizagem. A educação escolar passa a se
manifestar, visivelmente, como critério de aceitabilidade e distinção social, ajudando no
estabelecimento de novas condições de organização social. Com o início da urbanização, a
escola passa a relacionar-se e identificar-se com o movimento interno da própria cidade onde
está localizada e em atividade. Por conseguinte, com a expansão do capitalismo, o grupo
escolar entra em contato com a gestão e a forma específica de direcionar o trabalho, voltado
para a produção econômica. Neste sentido, nas primeiras décadas do século XX,
Assim como a cidade, o grupo escolar impõe-se como cenário e cena, é estrutura e
linguagem de uma cultura escolar que se quer afastada da “casa” e separada da
“rua”. Uma das preocupações que observamos nas diretoras, nos inspetores e nas
professoras, principalmente quando da reunião de escolas isoladas num espaço
“adaptado”, era a dificuldade muitas vezes encontrada de se evitar que os alunos
ficassem “soltos” à porta da escola e, ao mesmo tempo, de se impedir que
“pessoas” estranhas à escola a ela adentrassem abruptamente. Junto a essa
preocupação vinha, quase sempre, a cobrança de que se construísse o muro
separando a escola da rua. Este, além de servir como proteção, serviria como
impedimento à livre-circulação dos alunos. O muro configuraria, simbólica e
materialmente, a delimitação de um espaço próprio, apartado da rua e que se auto-
institui como significativo, ao mesmo tempo em que produz aquela como lugar
maléfico às crianças. (FARIA FILHO, 2000: 63)
84
Em suma, com a implantação dos grupos escolares, a preocupação se voltava
também para a questão da delimitação dos espaços urbanos. Necessário se fazia a clara
distinção entre os diversos prédios presentes na cidade, cada qual com suas funções,
localização ou atribuições. Assim, a escola deveria ser bem distinguida das casas ou das ruas,
pois encerra a honrosa missão de levar adiante o processo educacional, contribuindo para o
aperfeiçoamento da cultura. Além do mais, preocupa-se com a preservação dos alunos, com o
contato externo, com a presença indesejada de estranhos. A arquitetura escolar, imposta pelo
modelo dos grupos escolares, prima pela reeducação dos corpos, valorizando a disciplina e a
clara distinção de espaços. Portanto, a delimitação territorial do grupo escolar é considerada
imprescindível para o bom andamento das atividades pedagógicas. Visto que,
(...) o agrupamento de classes, cada qual com seu professor, permitia um ensino
simultâneo e o mais individualizado; uma nova organização espacial a exibir
beleza arquitetônica; uma nova sistematização do uso do tempo, o tempo do relógio
que marcava a entrada e a saída dos alunos, as horas de aula, os recreios; a adoção
de alguns princípios da pedagogia moderna, em especial o método intuitivo ou
lições de coisas; a institucionalização dos saberes elementares, leitura, escrita,
cálculo, noções rudimentares de ciências sicas e naturais e noções de educação
moral e cívica, os saberes próprios da escola primária que visavam à educação
integral, física, moral e intelectual; a administração racional praticada através de
controle burocrático, inspeção, relatório, diários de classe, mapas de freqüência; os
rituais escolares tais como exames blicos, festas de encerramento do ano letivo,
comemorações cívicas, tais são, em síntese, as características básicas dessas escolas
graduadas. Seus alunos provinham de uma população heterogênea que incluía
setores de classe média, profissionais liberais e também das camadas populares,
filhos de trabalhadores urbanos mais bem inseridos no mercado de trabalho e filhos
de imigrantes. (BUFFA e PINTO, 2002: 54)
A proposta escolar atribuída aos Grupos Escolares, ao longo do século XX, acabou
se tornando referência maior para a constituição de escolas seriadas em classes autônomas,
bem como a racionalizada utilização do tempo escolar e dos espaços onde ocorre o processo
de ensino-aprendizagem. Todas as realizações intrinsecamente envolvidas com o processo de
educação escolar passaram por uma revisão e por uma reformulação. As atividades
pedagógicas são agora mais elaboradas e voltadas para a formação sobretudo física,
intelectual e moral dos alunos. Assim,
Nesse contexto, a criação dos grupos escolares era defendida não apenas para
“organizar” o ensino, mas principalmente, como uma forma de “reinventar” a
escola, objetivando tornar mais efetiva a sua contribuição aos projetos de
homogeneização cultural e política da sociedade (e dos sujeitos sociais),
pretendidos pelas elites mineiras. Reinventar a escola significava, dentre outras
coisas, organizar o ensino, suas metodologias e conteúdos; formar, controlar e
fiscalizar a professora; adequar espaços e tempos ao ensino; repensar a relação com
as crianças, famílias e com a própria cidade. (FARIA FILHO, 2000: 31)
85
Em outras palavras, a organização dos grupos escolares representa não a busca
da organização escolar, mas também uma reviravolta na própria escola, tornando-a forte
instrumento estratégico na adaptação de costumes e hábitos, justificando as competências e
alterando as metodologias colocadas em prática em seu espaço. Assim, o interesse era
promover a renovação das representações sociais acerca da própria escola, reservando um
espaço social mais considerável para a mesma.
2.3. Reforma Francisco Campos (1927/8): tentativas de modernização do ensino
primário
Nos anos de 1920, outra reforma do ensino que também teve destaque no cenário
educacional do Estado de Minas Gerais foi a Reforma Francisco Campos (1927 / 1928),
promovida no decorrer da sua passagem pela Secretaria dos Negócios do Interior, durante o
governo estadual do Presidente Antônio Carlos.
Como já foi dito anteriormente, no capítulo I, o final da Primeira República,
década de 1920, possui peculiaridades que o tornam um momento de emergência de variados
movimentos sociais e de uma efervescência intelectual considerável. Dentre essas
manifestações sociais, se destaca o fato de muitos defendem a escolarização como forma apta
a promover a inserção de um número maior de pessoas na participação política, sobretudo
através do voto.
Todos esses acontecimentos estão diretamente ligados às alterações estruturais
pelas quais o sistema sócio-econômico brasileiro vem passando. Esse movimento sustenta a
necessidade de promover a escolarização como forma de garantir a consecução dos interesses
de forças emergentes no interior da sociedade brasileira, que se encontra numa fase de
transição estrutural: a economia vem cada vez mais expandindo o modelo urbano-industrial,
buscando a consolidação de uma produção para voltada mais para o consumo interno,
enquanto supera gradativamente o antigo modelo agrário-exportador, em vigor desde o
período colonial.
Em outras palavras, algumas dessas organizações sociais vêm se destacando pela
reivindicação crescente da escolarização como meio para a efetivação do voto para toda a
população potencialmente eleitores, a fim de exercerem seus direitos e deveres enquanto
cidadãos de uma nova nação, formada tendo como base os princípios liberais e democráticos.
Seguindo a ideologia liberal, a escola cada vez mais vem se confirmando como
direito de todos. Este princípio liberal norteador, baseada na educação como direito
86
inalienável de todos, na verdade, se insere na tendência de expressão de uma nova classe que
surge no universo social, a burguesia industrial, preocupada em consolidar sua hegemonia
enquanto classe dominante, no interior da sociedade capitalista. A burguesia tem o interesse
de tornar o processo educacional, principalmente o escolar ou formal, garantia da conquista da
hegemonia sobre as classes dominadas, destacadamente o proletariado.
A educação era buscada como meio de garantir a tomada do poder econômico pela
burguesia e, conseqüentemente, garantir também o poder político, superando a hegemonia
antes possuída pelos latifundiários, que, sistematicamente, excluía boa parte da população do
processo de escolarização.
Passa a acontecer também uma passagem gradativa do controle ideológico de
entidades da sociedade civil, especialmente, a família e a religião, para o domínio da
sociedade política, especificamente, o Estado. Com isso, através dessas reformas, é possível
atribuir ao Estado funções, atribuições ou até mesmo competências que antes eram
responsabilidade de setores civis. A partir dessas mudanças, o Estado poderia intervir de
forma mais eficaz nas transformações estruturais da sociedade. Desse modo,
Toda essa agitação é conseqüência (...) do fortalecimento da indústria a partir dos
anos 14 e do correspondente enfraquecimento econômico do grupo agrário-
exportador. No campo político, essa alteração vai ocasionar uma mudança no papel
do Estado. O Estado brasileiro, até então de cunho liberal, passa a intervencionista,
na medida em que vai assumindo as rédeas de nossa economia. A esta guinada de
posição do Estado no campo político-econômico corresponde uma guinada noutros
setores de nossa sociedade. No setor social, especialmente a partir de 1926, o
Estado vai assumir o papel de mediador entre as diferentes classes, utilizando a
educação como elemento estratégico na solução da questão social. (PEIXOTO,
1983: 14)
As diversas reformas do ensino, acontecidas pelos Estados, nada mais são do que
reflexos dessas mudanças referentes ao papel exercido pela máquina estatal no tocante à
inculcação ideológica, como deseja a classe burguesa, bem como a consolidação de sua
hegemonia. De certa forma, as diversas reformas estabelecidas nos mais diferentes estados
brasileiros, no decorrer dos anos 1920 (São Paulo – 1920, Ceará – 1922 / 23, Rio de Janeiro
1922 / 26 e 1928 e Bahia 1928) refletem a tendência de antecipar a mudança na forma de
inculcação ideológica, estabelecida mais tarde na década seguinte (anos 1930). O Estado
brasileiro assumirá, por outro lado, o controle do desenvolvimento econômico do país,
interferindo diretamente sobre os rumos da economia, superando a tendência anterior de
mercado liberal. Portanto,
Esta foi a base educacional estabelecida em Minas Gerais a partir de 1892: uma lei
ambiciosa em seus propósitos, enciclopédica em suas prescrições, reticente quanto
87
à obrigatoriedade do ensino, insegura quanto aos recursos necessários ao
financiamento, mas buscando conjugar o estabelecimento da lei maior do país e a
crença liberal no poder transformador e regenerador da educação. O maior
obstáculo à execução da lei, no entanto, não foi o enciclopedismo, mas a falta de
recursos do estado. (GONÇALVES NETO e CARVALHO, 2005: 273)
Tais reformas estabelecidas naqueles estados, inclusive Minas Gerais, representam
a tomada de um sistema em que a educação escolar assume papel de primordial importância,
contribuindo para as garantias do sucesso do projeto burguês de avanço na ordem social
estabelecida. Além do mais, essas reformas são também conseqüência das influências que o
movimento escolanovista vem exercendo sobre o sistema de ensino, contribuindo para a
disseminação do “entusiasmo pela educação” e do otimismo pedagógico” e, de forma mais
destacada, dos princípios da “escola nova” (em vigor nos países mais avançados, como
Estados Unidos).
A escola assumirá o papel de instância formadora de mentalidades voltadas para o
exercício da cidadania, mas com destaque especial para a divisão do trabalho social,
determinadas pelas relações sociais de produção: tem-se a preocupação de formar elites
pensantes, engajadas com a gestão da produção econômica, bem como voltadas também para
as diretrizes políticas da nação. Por outro lado, a preocupação é também formar uma nova
classe de trabalhadores, cuja formação escolar também se tornou real necessidade, no sentido
de adaptar a mão-de-obra disponível para a execução das atividades, no interior do novo
modelo econômico, que vêm surgindo gradativamente, baseado no processo de
industrialização.
Conseqüentemente, afirma-se que as diferentes reformas estaduais do ensino
realizadas o um destaque especial ao vel primário, demonstrando claramente o objetivo
que o Estado burguês atribui a essa modalidade de ensino: a formação cívica e a instrução
básica de mão-de-obra especializada para as diversas funções exigidas no sistema de
produção, bem como nas atividades burocráticas agora assumidas, gradativamente, pelo
Estado. Com isso,
Realizando-se em Estados com características bastante diversas – São Paulo (1920),
Ceará (1922/23), Rio de Janeiro (1922/26 e 1928), Minas Gerais (1927/28) e Bahia
(1928) essas reformas, embora com alguns traços comuns, apresentam
características bastante específicas, fruto das desigualdades regionais do País e se
manifestam em diversos níveis de realização. (PEIXOTO, 1983: 15)
É neste contexto sócio-histórico que é implementada a Reforma realizada por
Francisco Campos (1891 1968) no Estado de Minas Gerais (anos de 1927/28), durante o
88
governo de Antônio Carlos, quando assume como Secretário dos Negócios do Interior e da
Justiça (órgão executivo responsável pelas questões relativas à instrução escolar na época).
O governo de Antônio Carlos se destaca por algumas medidas voltadas para a
modernização de Minas Gerais, em suas estruturas consideradas mais importantes. Em seu
governo, além da Reforma do Ensino Primário e Normal, ganharam destaque algumas
mudanças como a reforma administrativa, a implantação do voto secreto, a implementação da
Universidade de Minas Gerais, a restauração das relações do governo estadual com a Igreja
Católica. Logo,
Desde o princípio, ficou definido, no Regulamento, que o ensino ministrado pelo
Estado seria de duas categorias: o fundamental e o complementar. O último,
regulamentado a parte, teria o caráter técnico-profissional. A Reforma definia o
ensino primário como livre à iniciativa particular, desde que ministrado em língua
vernácula e não contrariasse disposições legais e regulamentares, os bons costumes,
a ordem pública e a higiene. O ensino fundamental dividia-se em dois graus: escola
infantil, com um curso de três anos e escolas primárias, que teriam curso de três e
de quatro anos. (MOURÃO, 1962: 372 – 3)
Os trabalhos voltados para a implementação da reforma se iniciam ainda nos anos
de 1926, quando é convocado pelo secretário o I Congresso de Instrução, com o interesse e
objetivo de realizar uma sondagem, de fazer um levantamento sobre os problemas relativos à
educação escolar, no Estado de Minas Gerais. Através dos debates realizados no Congresso,
haveria a possibilidade de se realizar um primeiro diagnóstico a respeito da visão do
professorado em relação à educação escolar, empreendida no Estado. O mentor desta reforma,
Francisco Campos, nasceu em Dores de Indaiá, a 18 de novembro de 1891, sendo filho do
magistrado Jacynto Álvares da Silva Campos, Juiz de Direito, e de Azejúlia de Souza e Silva.
Por isso,
Para colaborar no planejamento e na implementação de seu programa de governo,
Antônio Carlos convoca Francisco Luís da Silva Campos, jovem político mineiro,
ligado à ala renovadora do PRM. Em setembro de 1926, Campos é nomeado
Secretário dos negócios do Interior, cargo que ocupa durante todo o período do
governo de Antônio Carlos (1926 1930). À pasta dos Negócios do Interior
competiam os problemas ligados à instância jurídico-política e à inculcação
ideológica. A ela estavam afetos, portanto, os assuntos relativos às eleições em
âmbito estadual e municipal, ao poder judiciário e à educação pública, incluindo-se
nesse setor o Arquivo Público Mineiro, destinado a preservar a memória do Estado.
Sua denominação “Negócios do Interior” reflete a estrutura de poder vigente na
época, em que o poder local era decisivo na manutenção da engrenagem da política
dos governadores. (PEIXOTO, 1983: 74)
A política educacional implantada por Antônio Carlos e Francisco Campos
(representantes da oligarquia mineira e membros do PRM Partido Republicano Mineiro),
89
consiste numa prática conciliatória entre os interesses dos setores urbanos emergentes, bem
como dos membros das frações agrárias dissidentes, sem romper com a ordem estabelecida. A
manutenção da unidade política de Minas Gerais, a nível nacional, dependia de sua principal
artimanha junto ao governo federal. Como possuía forte base política, Minas conseguia
oferecer ao presidente força suficiente para levar adiante seus planos políticos e para manter
esse poder e essa influência, o Partido Republicano Mineiro assumiu uma postura mais
flexível diante das divergências internas (entre Silviano Brandão e Bias Fortes, por exemplo)
ou acomodando novas lideranças regionais (como Artur Bernardes e Raul Soares), atendendo
às reivindicações e aos interesses ora de um setor, ora de outro, a fim de buscar a conciliação.
Francisco Campos também compreendia que a escola, como ponto crucial para a
promoção da reforma social, necessária para a manutenção da ordem pré-estabelecida.
Acredita-se que, através da educação recebida nas escolas, seria possível ao cidadão o
exercício pleno de sua cidadania. Assim,
nesta visão um pressuposto básico, o de que a escola reflete o meio social a que
pertence. Esta asserção Antônio Carlos e Francisco Campos encontram no filósofo
e educador americano John Dewey. Segundo Dewey, a civilização ocidental se
encontra em crise, crise que o autor atribui ás dificuldades de cunho social geradas
pelo desenvolvimento das ciências e pelo modo de produção industrial. Essa crise,
de acordo com o pensador norte-americano, vem se cristalizando através da escola,
na medida em que o ensino reflete e condiciona, pela utilização de métodos e
processos inadequados, as iniqüidades sociais que se verificam na sociedade
moderna. (PEIXOTO, 1983: 80 – 81)
Em outros termos, com as transformações sociais percebidas como conseqüência
do processo de industrialização pelo qual diversas nações vêm passando, nota-se que a escola
acabou incorporando a necessidade de buscar a adaptação aos novos tempos, através da
educação formalizada e especializada das escolas, permitindo, inclusive, a consolidação da
democracia. Pois,
A educação ocupa lugar de destaque no programa de governo de Antônio Carlos.
Isso se explica, de um lado, pelas próprias condições sócio-econômicas do País
naquele momento. Neste novo estágio de desenvolvimento do capitalismo, os
problemas relacionados às necessidades de formação de mão-de-obra, à divisão
social e técnica do trabalho e à aceleração do processo de urbanização tornam
necessária a criação de um sistema de educação comum, capaz de atender às novas
exigências no que diz respeito à formação de mão-de-obra e capaz de incorporar os
novos grupos ao projeto das classes dominantes. Em outras palavras, é preciso
redirecionar o processo educativo, pois não se mostram eficientes as instituições
mantidas com estes objetivos em outras formação da sociedade civil (como a Igreja,
por exemplo) e que desempenharam este papel no estágio anterior. (PEIXOTO,
1983: 71 – 72)
90
Contrariamente, o governo de Antônio Carlos se pressionado diante de duas
grandes tendências ideológicas e é obrigado a buscar a conciliação de ambas: por um lado,
observa-se a pressão do regime federalista, sustentado pelas oligarquias e, inclusive,
responsável pelo governo de Antônio Carlos. Por outro lado, percebe que esse sistema de
poder não consegue incorporar as mudanças estruturais pelas quais passa parte do país,
sobretudo o Estado de São Paulo.
No período de 1898 a 1929, as oligarquias rurais mineiras detêm um forte prestígio
político e consolidam o sistema do coronelismo na prática, como afirmado no I capítulo.
Com isso, O Partido Republicano Mineiro (PRM) consegue um controle de nomeações, uma
censura firme junto à imprensa, agregava clubes de produtores, cívicos. Neste controle,
entrava também a seguinte máxima dirigida aos coronéis: “nunca se opor ao governador”.
Qualquer manifestação contrária ou rebeldia eram punidas nas urnas eleitorais.
Quando Antônio Carlos assume o governo do Estado, houve um apoio muito
expressivo de inúmeras jovens lideranças políticas, favoráveis a uma série de reformas que
proporcionassem uma modernização no nível das superestruturas. Assim,
Ao destacar a educação em seu programa de governo, Antônio Carlos o faz em
sentido estratégico. Em primeiro lugar, sob a aparência de garantir, via
transferência da educação para o Estado, a extensão dos direitos de escolaridade aos
grupos até então marginalizados da política do País, Antônio Carlos coloca sob a
direção dos grupos no poder um importante instrumento de controle e persuasão
social. Em segundo lugar, ao atender a uma importante reivindicação dos grupos
emergentes, ele capta a adesão dos setores médios e dos grupos modernizantes do
País para seu programa de governo. (PEIXOTO, 1983: 72 – 73)
Em suma, Francisco Campos, sendo secretário responsável pelas questões
educacionais, passa a ser um dos sujeitos mais iminentes no processo de modernização,
levado adiante pelo governo estadual de Minas Gerais, acreditando ser possível a superação
da crise através da consecução de uma sociedade harmoniosa, fortalecendo o equilíbrio entre
as classes sociais.
Inclusive, o jornal hegemônico de Patrocínio, “CIDADE DO PATROCÍNIO”,
reflexo e porta-voz do s ideais políticos da oligarquia rural patrocinense (elite política de
Patrocínio) e de propriedade do Coronel Honorato Martins Borges, publicou uma mensagem
com uma proposta firmada pelo então Presidente do governo estadual, Antônio Carlos, acerca
da sua visão defendida sobre o ensino primário e, principalmente, quanto a sua manutenção. A
mesma foi publicada nos seguintes termos:
A mensagem do Presidente Antonio Carlos ENSINO PRIMÁRIO Devo
pedir vossa atenção para o aspecto financeiro do problema do ensino primário. A
91
manutenção dos grupos e escolas existentes, a criação sucessiva, imposta pelo
dever de disseminar o ensino, de novos grupos e de novas escolas, reclamam só por
si avultada quantia, que cresce de ano para ano; leve-se em conta ao lado desse
fator de despesa, a necessidade de instalação condigna de tais estabelecimento de
ensino, e se concluirá que é de grande vulto a soma dos recursos pecuniários
exigidos por esse relevante serviço público. Foi, sem dúvida, por haver meditado
sobre esse assunto, que o Congresso de Ensino Primário suscitou, com interesse, a
idéia da criação e funcionamento de um fundo escolar com auxílio do qual seja
possível preencher as muitas lacunas de que ainda se ressentem a organização e o
funcionamento do ensino primário. Tenho a firme esperança de que da vossa
colaboração com o governo resultará bom êxito para os esforços que devemos
conjugar no sentido da criação e desenvolvimento do fundo escolar. Como subsídio
para a futura instituição, deve ser considerada a contribuição das municipalidades,
cujos orçamentos para o corrente ano consignam, em favor da instrução primária,
verbas na importância de 1.741:888$700; e, em auxílios a caixas escolares,
112:890$000. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 733 – 24/07/1927)
O presidente Antônio Carlos passa a defender o papel do Estado como uma das
instituições mais importantes para o controle dos processos educacionais quanto ao currículo
adotado, à formação de professores, como garantia do sucesso no aprimoramento da
cidadania, entendida como exercício do direito ao voto.
A Reforma Campos atinge tanto o nível primário de formação quanto as escolas
normais, como um estágio na consolidação da democratização social. A preocupação é tomar
uma série de medidas relacionadas à estrutura interna escolar, voltadas para a reestruturação
das instituições escolares, a fim de buscar a adaptação necessária para a modernização de
Minas Gerais. Por isso,
Resumindo, a reforma de Francisco Campos se traduz numa tentativa de completa
modificação no interior das escolas, à luz, dos padrões estabelecidos pela
Psicologia Educacional, reflexo do movimento escolanovista. Através do
Regulamento é estabelecida uma série de medidas de natureza administrativa e
pedagógica, consideradas fundamentais á implantação do novo modelo. Neste
sentido, através dos textos legais se procura cercar todos os fatores que, de maneira
direta ou indireta possam influenciar na dinâmica dos trabalhos escolares. Embora a
natureza da atuação se justifique em nome da qualidade, ela representa, a nosso ver,
de maneira muito mais acentuada, o reconhecimento da educação como importante
instrumento de seletividade, de controle e persuasão social. À luz deste critério é
possível compreender que, embora a vel de discurso se pregue a renovação, o
atendimento às condições individuais do aluno etc., a nível institucional se crie uma
organização em que nada escapa à ação do Estado, desde os princípios mais gerais
e importantes, como, por exemplo, a definição do papel da escola, a detalhes
como dimensão e formato de carteiras. (PEIXOTO, 1983: 129)
Essa disposição de realizar as reformas de todo o processo educativo sob a
responsabilidade do Estado, com a intenção de ajudar na consolidação de uma máquina
burocrática eficiente e moderna, adaptada às exigências dos novos tempos. Neste sentido,
todo esse excessivo controle do Estado sobre as escolas repercutirá, especificamente, sobre o
magistério, como perda da autonomia na execução do trabalho pedagógico. Todos os
92
trabalhadores escolares comporiam, assim, todo um corpo pré-estabelecida de regras, de
normas de comportamento, de padrões transformados em marca oficial de um Estado voltado
para a burocratização e de forte tendência técnica. Com isso,
[...] a reforma educacional do governo Antônio Carlos, de autoria de Francisco
Campos e cuja implantação se deve a Mário Casasanta, reflete o sentido de
“modernização” pleiteado por algumas frações das classes dominantes no
momento. Constitui a reforma um marco do início de um processo de transferência
para o Estado, das formas de controle da inculcação ideológica e da socialização,
vinculadas, aeste momento, a entidades ligadas à esfera da sociedade civil. Esta
guinda no campo da educação, constitui um dos primeiros passos no sentido de se
impor ao País um Estado burocrático desmobilizador”, capaz de gerenciar, em
nome dos princípios da técnica e da eficácia, todos os setores da vida nacional, o
que se explicita no Estado Novo, em 1937. (PEIXOTO, 1983:172)
A reforma aqui abordada (Francisco Campos), objetiva garantir as condições
mínimas para a realização de um processo de modernização da educação em Minas Gerais,
que supõe, inclusive, um teor e um tratamento técnico frente a própria concepção de
educação, influenciada pelas idéias do movimento escolanovista. E, em seguida, garantir parte
das condições necessárias para a implementação da modernidade, no âmbito da sociedade
como um todo. Desse modo,
A posição de Francisco Campos, neste sentido, não é individual. Ela reflete a
influência da Escola Nova e do otimismo pedagógico”, tendência que, na década
de vinte, passa a orientar as discussões dos problemas educacionais brasileiros. O
“otimismo pedagógico” trata o problema da educação sob o enfoque da qualidade e
suas atenções se concentram na eficiência do ensino. Esta tendência surge no País,
em função de uma série de fatores: o declínio da campanha de combate ao
estrangeirismo, que domina a década anterior, em conseqüência do término da
guerra; a tomada de consciência por parte dos políticos, de que a utilização da
educação como instrumento para a conquista do poder tem efeitos relativos e a
muito longo prazo; a atuação do próprio governo, que, receoso em relação aos
possíveis efeitos de uma escolarização maciça, coopera para tornar a educação um
problema “isento” do ponto de vista político, um problema eminentemente técnico,
tratado por profissionais; e, finalmente, à introdução no País das idéias da Escola
Nova. A educação sai então do âmbito de cogitações dos políticos e passa ser
objeto de estudos específicos. Passa a ser considerada um tema eminentemente
técnico. (PEIXOTO, 1983: 89)
Apesar de a Reforma Francisco Campos estar sob a influência de um contexto
extremamente conservador em nível macro-estrutural, a mesma está voltada para o respaldo
do avanço do progresso, como critério de inserção do Estado mineiro na consolidação do
capitalismo em formação no Brasil. Isto é, torna-se necessária a renovação de alguns setores
sociais, destacadamente o da educação, a fim de que permaneçam as estruturas sicas do
exercício do poder político. Por isso,
93
Através de uma intensa campanha de mobilização do professorado e do povo em
geral, o governo procura fazer frente às reações que se sucedem à publicação dos
regulamentos e programas do ensino primário e normal. Estas reações partem dos
setores mais tradicionais da sociedade mineira, em especial da Igreja Católica, que,
temendo os possíveis efeitos de uma escolaridade extensiva, a ameaça de perda do
controle da hegemonia no campo da inculcação ideológica, protesta contra a
desoficialização do ensino particular, contra o caráter materialista com que a lei
aborda o problema da aprendizagem, contra a introdução da Psicologia no currículo
das escolas normais e contra os novos métodos de ensino. (PEIXOTO, 1983: 140)
Reformas como a de Francisco Campos, voltadas para a educação, demonstram
claramente a preocupação em torno da formação de mentalidades, da inculcação ideológica,
bem como a assimilação de uma concepção de mundo, oferecida pela classe dominante, e
imposta às classes menos privilegiadas. A educação é fundamental tanto para a manutenção
de privilégios sociais, como para a possibilidade de se realizar uma superação das
desigualdades. A elite dominante, qualquer que seja seu perfil, sempre se utilizou da educação
para a consecução de seus interesses. Então, através da conformação social, da manutenção da
ordem imposta, a elite pode prosseguir no sentido de consolidar seu projeto de domínio
político.
Ao realizar a reforma, com destaque voltado para o ensino primário e o ensino
normal, havia, por outro lado, o interesse estratégico das elites políticas em promover a
democratização do ensino, garantia da expansão do número de eleitores em exercício. Assim,
seria possível garantir a ampliação do direito ao voto a todos os cidadãos e ampliar o controle
político.
Isso ocorre num momento em que cidadão é entendido como o indivíduo apto ao
exercício da escolha eleitoral, com o pressuposto de que ele seja escolarizado, instruído e
alfabetizado. Neste sentido, o grupo da elite local de Patrocínio, liderado pelo Coronel
Honorato Borges, entra em consenso e um alinhamento ideológico com o pensamento do
Presidente Antônio Carlos, bem como de seu Secretário dos Negócios do Interior Francisco
Campos, na questão de se valorizar a participação cada vez maior de um número efetivo de
eleitores no pleito.
Por isso, a defesa desses chefes políticos patrocinenses (Honorato Borges e
João Alves do Nascimento, por exemplo) em prol da educação pública, primária. Assim, no
Jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO” foi publicado:
Alistamento eleitoral – O nosso povo tem compreendido a alta finalidade do apelo
que os srs. Cel. Honorato M. Borges e João Alves do Nascimento, respectivamente
Presidente do Diretório do P.R.M. e Câmara Municipal deste município têm feito
no sentido de ser aumentado o contingente eleitoral. Falange de moços se alista dia
a dia, dando uma prova irretorquível de elevado civismo e de amor a esta terra. Que
94
cada um se constitua em um verdadeiro fator do progresso desta terra, procurando
alistar-se, porque é pelo voto, só pelo voto livre e consciente, que poderemos elevar
cada vez mais o nível moral e material de nossa pátria. (CIDADE DO
PATROCÍNIO, Nº 820 – 28/04/1929)
Em termos nacionais, a questão eleitoral sempre foi alvo de polêmica. Sempre
houve discussões em torno dos critérios a serem usados para identificar um eleitor, bem como
aqueles que compunham o universo da cidadania. Assim,
Entre o crescimento da sociedade e a participação política, que contar com os
efeitos retardados do sistema, tradicionalmente operantes sobre a realidade. A
população brasileira passou dos 10 milhões de 1872 para 14 milhões em 1889, com
20 milhões em 1905, 27 no ano de 1920 e 34 no começo de 1931. Nas cidades
(mais de 30.000 habitantes) residem 31% em 1872 da população, 24% em 1890,
36% em 1900 e 51% em 1920. Aqui, o engano maior: os homens da cidade o
exercem, na totalidade, funções urbanas. Com o predomínio das atividades da
agricultura e da pecuária, uma faixa instável, rurbana, caracterizando-se o corpo
social pela influência de interesses rurais. Cidades que servem ao campo, embora
isso não expresse o controle financeiro da lavoura pelas próprias unidades
produtivas. No recenseamento de 1840, com melhores critérios de classificação,
havia ainda 68,74% da população consagrada à vida rural, calculando-se que
84,36% dos habitantes radicaram-se nos municípios do interior. A participação
política dependia, no Império, do regime censitário e do regime capacitário. Em
1872, votantes e eleitores, excluída a exigência de alfabetização só imposta pela Lei
Saraiva (1881), atingiram 1 milhão e 100 mil, 11% da população. Na primeira
eleição direta (1881), compareceram 96.411 eleitores, par um eleitorado de
150.000, menos de 1,5% da população e menos de 1%, se considerados os eleitores
comparecentes. O regime republicano extingue o sistema censitário, mas também o
capacitário, com a exclusão, agora definitiva, dos analfabetos (Decreto 200 A, de 8
de fevereiro de 1890). Em 1898, a primeira eleição presidencial com o
comparecimento de todos os Estados, os eleitores sobem a 462 mil, num
incremento de 300% sobre 1886. Ainda assim a proporção será de 2,7% sobre a
população. Daí por diante só a eleição de 1930, a única que leva mais de um milhão
de eleitores às urnas, atingirá o percentual de 5,7%. Entre 1898 e 1926 os números
oscilam entre 3,4% e 2,3%, num ciclo mais descendente que estável. A tendência
impressiona se se tem em conta que a população alfabetizada se projetou de 14,8%
em 1890 para 24,5% em 1920. A República Velha continua, sem quebra, o
movimento restritivo da participação popular, paradoxalmente consangüíneo do
liberalismo federal interrompido no fim do Império. A política será ocupação dos
poucos, poucos e esclarecidos, para o comando das maiorias analfabetas, sem voz
nas urnas. A essa direção política corresponde a liderança econômica e social, em
interações mútuas, onde não se deve excluir, por mero preconceito de escola, o
impulso primário de poderes estatais, em nível federal e local. (FAORO, 2004: 620
– 1)
Enfim, o Período da República consiste na continuidade da prática elitista nas
eleições, pois a maioria das pessoas excluídas do exercício do direito ao voto. Mesmo
havendo a declaração dos direitos políticos individuais, continua a marginalização de
significativa parcela da população frente aos direitos eleitorais.
95
2.4. Considerações Parciais
O Estado de Minas Gerais, no decorrer da Primeira República (1889 1930),
demonstra-se como uma das unidades federativas mais dinâmicas, no sentido de promover um
movimento de adequação das condições do Estado ao projeto republicano e positivista.
As ações políticas levadas adiante, no decorrer dos governos estaduais, visam
consolidar Minas Gerais como o Estado mais influente nas decisões políticas do Governo
Federal. A “política do café-com-leite” é uma das mais fortes expressões do desejo mineiro de
sustentar sua forte presença junto aos ditames nacionais. Minas Gerais e São Paulo
procuravam, cada um ao seu modo, fortalecer sua influência sobre os demais estados, a fim de
garantir sua hegemonia.
Lideranças políticas do Estado de Minas Gerais, concentradas no PRM (Partido
Republicano Mineiro), levaram adiante uma série de medidas com a finalidade de promover a
dinamização do Estado, preservando as forças políticas de sustentação, baseadas no
coronelismo. Além do mais, buscava-se também a reformulação de determinadas estruturas
sociais, com o intuito de adequá-las ao novo regime republicano.
Dentro dessa perspectiva de dinamização, as lideranças políticas republicanas
mineiras passaram a implementar diversas reformas estruturais. Dentre estas, uma das áreas
que atraíram atenção se concentra justamente na área educacional. Isto se justifica devido à
função estratégica que a educação assume com o projeto republicano positivista de sociedade.
Nesse sentido, a escola é encarada como importante projeto civilizatório. Acredita-se que a
questão educacional tenha fundamental importância para consolidar o progresso da sociedade,
sustentada nos ideais positivistas. Considerava-se a educação fator importante no sentido de
aprimorar o sentido de nacionalidade, proporcionando a construção da identidade nacional e
conduzi-la rumo ao desenvolvimento.
Em Minas Gerais, a questão da modernização do ensino primário, no decorrer da
República Velha, tornou-se um elemento essencial no esforço contra o analfabetismo e no
desenvolvimento cultural do Estado. Os governantes, no início da Primeira República,
sintonizados com a ideologia positivista, buscavam modernizar o processo educacional no
âmbito escolar, com o intuito de superar as precárias condições de ensino, pelas quais o
Estado vinha passando.
A Reforma de Ensino João Pinheiro, realizada em 1906, expressando esse desejo
de renovação e de reformulação da rede de ensino oficial do estado mineiro, torna-se marco
histórico no sentido de ser a responsável pela implantação dos grupos escolares no Estado. Os
96
grupos escolares encerram o modelo considerado, naquele momento, o que de mais moderno
existia para a implantação de uma rede de escolas públicas. Com isso, os grupos escolares,
conhecidos também como escolas reunidas, são a partir daí criados e implantados em todo o
Estado de Minas Gerais.
Em outras palavras, a política implícita de funcionamento dos grupos escolares se
resumem na tentativa de racionalização do processo ensino-aprendizagem, contextualizada
por uma série de elementos: busca-se o estabelecimento de uma nova relação entre professor,
com boa formação acadêmica, e alunos, agora homogeneizados por seriações.
Busca-se também uma renovação da metodologia de ensino, baseada na forma
intuitiva. Por outro lado, renova-se também a preocupação com a construção predial das
escolas, consideradas agora, palácios do ensino. Neste sentido, procura-se construir a escola
em locais de destaque no interior da organização espacial das cidades, simbolizando a
renovação, o progresso, o dinamismo.
A escola obtém lugar de destaque no cenário urbano, dividindo espaços com os
prédios administrativos mais importantes. Supera-se também a imagem das escolas isoladas,
muitas vezes adaptadas em casas, ou em precárias condições de instalação. Além disso, era
também a época da inspetoria escolar, como papel fiscalizador do processo de escolarização,
proporcionado pela implantação dos grupos escolares.
Portanto, a implantação dos grupos escolares no Estado de Minas Gerais
representa a fase em que a educação é assumida como parte do projeto republicano de
civilização, buscando incessantemente o progresso humano, construindo uma história baseada
em princípios positivistas. Os grupos escolares são considerados, no interior das cidades,
como sinal visível do novo regime republicano, interessado em proporcionar a escolarização
da sociedade.
Nas cidades do interior mineiro, as elites locais, na intenção de viver em
consonância com os projetos nacionais e estaduais de modernização, também o processo
de criação dos grupos escolares. Isso se deve ao fato de as elites locais também necessitavam
se consolidar como liderança política e, assim, consolidar o sistema de distribuição de poder.
A conquista de melhorias estruturais é usada como meio de propaganda ou a mesmo na
conquista do reconhecimento da população em prol dos interesses políticos. O ensino
primário, por ser a base da escolarização, atinge o universo social, proporcionando um
diferencial na formação da população, até então, em sua maioria, analfabeta e marginalizada
dos processos políticos, sobretudo o das eleições.
97
Desde o início da década de 1910 aa década de 1920, todas as ações educativas
do governo estadual de Minas Gerais tinham como inspiração a Reforma João Pinheiro, de
1906. A partir desta, a rede estadual de ensino vai se configurando, buscando a racionalização
do processo educacional escolar.
Com as mudanças econômicas pelas quais o país vem passando, no decorrer das
três primeiras cadas do século XX, a industrialização vem se consolidando gradativamente
no Brasil. Minas Gerais também sofrerá as conseqüências desta mudança qualitativa da
identidade brasileira: do sistema agrário-exportador para um modelo urbano-industrial. Neste
sentido, algumas mudanças estruturais necessitam ser implementadas a fim de adaptar
novamente a sociedade às novas condições sociais.
A Reforma Francisco Campos (1927 / 28), realizada durante o governo do
presidente Antônio Carlos, representa essa nova tendência de tornar o Estado mais engajado
nas decisões de caráter estrutural. Isso também representa uma inovação no campo da política
social. O Estado passa a assumir responsabilidades que, anteriormente, eram ligadas mais
estritamente à sociedade civil, como a educação. A gestão de Francisco Campos simboliza a
mudança de perspectiva da função do Estado, enquanto instância política responsável pela
estruturação da sociedade mineira.
A Reforma educacional implantada por Francisco Campos tinha o interesse de
consolidar a presença do Estado junto ao processo de escolarização, à consolidação da rede
estadual de ensino, sobretudo primário e normal. Novamente, a escola seria vista como
instituição por excelência capaz de consolidar a formação social de uma população. Por
conseguinte, Minas Gerais tem a possibilidade de trabalhar a conciliação, em seu interior, das
diversas tendências políticas: uma voltada para a manutenção das relações de privilégio,
baseadas nas redes locais de poder; por outro lado, a necessidade de promover a dinamização
e modernização do Estado, buscando sua adaptação às novas condições econômicas do país.
Portanto, situando-se numa tendência estadual, Patrocínio também buscará
implementar e conquistar um grupo escolar, a fim de possuir em seus limites uma expressão
material do modelo escolar proposto pelo republicanismo como mais propício para a o
desenvolvimento social. Assim, a conquista de um grupo escolar representaria não a força
política da elite local junto ao governo estadual, mas também um instrumento na tentativa de
implementar uma organização da escola a nível local.
3. RACIONALIZAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO PRIMÁRIO EM PATROCÍNIO
– MINAS GERAIS: O GRUPO ESCOLAR HONORATO BORGES (1912 – 1930)
Este capítulo tem por finalidade descrever e discutir a tentativa implementada pela
elite patrocinense, composta por latifundiários, de modernização do ensino público primário
em Patrocínio M. G., com a implantação da primeira escola pública da rede estadual e
oficial no município, no ano de 1912, quando é criado o Grupo Escolar Honorato Borges, na
praça da Matriz Nossa Senhora do Patrocínio.
A criação do Grupo Escolar Honorato Borges deve ser vista como resultado de
uma série de reformas estruturais levadas a cabo pelos governos nacional e estadual, inclusive
no campo educacional, sobretudo a partir da Reforma João Pinheiro (1906). O governo
estadual tinha o interesse de promover a modernização do Estado, num esforço gradativo e
constante, no sentido de incluí-lo de forma dinâmica no projeto implantado pelos
republicanos.
A discussão sobre a criação de um grupo escolar em Patrocínio está intimamente
ligada com a postura política assumida pela oligarquia rural patrocinense, nesse momento
específico. Evidentemente, ao se interessarem pela criação e instalação de um Grupo Escolar
em Patrocínio, essa elite política e econômica assumia, na prática, seus valores enquanto
membros de uma classe hegemônica na condução do poder político. Os mesmos,
possivelmente, lideravam um processo de urbanização e melhoria das condições da infra-
estrutura da cidade.
Estes proprietários rurais também tinham um grande interesse na consolidação de
um mecanismo maior de inculcação ideológica conformada com os novos moldes políticos
impostos sobre o país, o modelo republicano, positivista e liberal.
99
A própria elite política de Patrocínio, liderada pelo então Coronel Honorato
Martins Borges, também se engajava no sentido de fornecer ao município os meios
necessários para a implementação de condições básicas para a modernização da cidade,
assimilando uma tendência que vinha sendo divulgada em todo o Estado de Minas Gerais,
bem como em boa parte do país.
Entende-se que a criação do Grupo Escolar Honorato Borges representa a inserção
do Município de Patrocínio no caminho da formação moral e cívica, tão necessárias para o
estabelecimento da ordem defendida pelos ideais republicanos. Assim, todos os esforços em
prol desse projeto foram suficientes para a garantia da instalação do mesmo em 1914.
A partir desse momento, ocorre então em Patrocínio uma série de melhorias dos
serviços oferecidos à população local. A imprensa, representada pelo Órgão Oficial da
Câmara Municipal, o jornal CIDADE DO PATROCÍNIO” empenha-se continuamente em
defender os interesses da oligarquia rural patrocinense. No intuito de levar adiante o projeto
de sustentação do poder político, bem como consolidar a presença da educação pública, na
sua vertente escolar, estabelece-se a criação do grupo escolar como uma das condições
necessárias para a conservação da ordem social estabelecida e garantir os rumos do progresso
espiritual e material da cidade.
A educação pública passa, então, a ser desenvolvida também através do grupo
escolar, destacando-se também o término da construção do prédio definitivo, no Largo do
Rosário (atual Praça Honorato Borges), em 1930. E a partir daí, a escola funciona aos dias
atuais neste mesmo local.
A focalização analítica do capítulo terceiro dar-se-á em torno da criação (1912) e
instalação (1914) do grupo escolar em Patrocínio. Consiste em dois momentos intimamente
ligados à tendência estadual de implementação dos grupos escolares, com o intuito de garantir
a base educacional, capaz de elevar Minas Gerais à categoria de região desenvolvida, cultural
e economicamente. Neste sentido, a preocupação girará em torno de como foram ambos os
processos, dando continuidade ao projeto republicano de modernização do ensino primário. A
elite patrocinense mobilizou forças em torno do fortalecimento da educação escolar,
acreditando estar fazendo com que trilhasse os caminhos do processo civilizatório,
preocupação maior do governo mineiro. O Partido Republicano Mineiro (PRM), através de
seus representantes locais, buscavam a consolidação da educação pública, a fim de possibilitar
o desenvolvimento patrocinense.
Com a presença de um grupo escolar na cidade, a elite política local continua seus
esforços em prol da modernização do município buscando também outras conquistas de infra-
100
estrutura para a cidade. Percebe-se, nesse sentido, que aos poucos, no decorrer destes
aproximados quinze anos de funcionamento após sua criação, a estrutura predial do grupo
escolar não satisfaz as reais necessidades e se torna obsoleto. Torna-se, então, urgente, a
conquista e a construção de um novo prédio para o funcionamento do grupo escolar, dentro
dos parâmetros estabelecidos pela legislação estadual de ensino, bem como torná-lo
equiparável aos demais grupos escolares de outras cidades da região do Alto Paranaíba e
Triângulo Mineiro. Assim, a discussão acontecerá em torno do processo de construção do
atual prédio do grupo escolar, em funcionamento desde 1930.
A fim de aprofundar as especificidades em torno do grupo escolar de Patrocínio, a
preocupação passa a ser expressa em torno do tempo escolar, sobretudo ligada à organização
do mesmo a fim de permitir a execução do currículo escolar. Neste sentido, busca-se a
compreensão de determinadas normatizações em torno da organização curricular do grupo
escolar, realizada através da análise de leis estaduais a respeito da mesma. Isto é
imprescindível para a visualização dos interesses implícitos ao currículo, procurando elucidar
as reais aspirações da rede estadual de ensino.
Será dada uma ênfase à abordagem da identidade e perfil do corpo discente e do
corpo docente do grupo escolar. A compreensão da valorização em torno dos sujeitos se
tornou indispensável para uma melhor abordagem do processo de escolarização. Neste
sentido, professores e alunos são vistos como sujeitos centrais no processo educacional,
realizado no interior da instituição escolar. Portanto, importante para o entendimento do
universo escolar é a busca da identidade dos sujeitos envoltos pelas diversas dimensões
escolares.
O terceiro capítulo prioriza a abordagem do Grupo Escolar Honorato Borges,
manifestado como um elemento da consecução da história da educação de Patrocínio, no
decorrer da República Velha (1889 1930). Neste sentido, esta importante escola pública
patrocinense se manifesta como expressão dos processos de modernização e racionalização do
processo de escolarização do Estado de Minas Gerais.
Essa abordagem consiste numa análise em que o Grupo Escolar Honorato Borges é
tomado como um todo em organização, uma racionalização de práticas pedagógicas, um
posicionamento frente ao mundo social que o circunda. Além disso, também é visto como
escola instituída num contexto histórico-social mais amplo. A construção da identidade do
Grupo Escolar Honorato Borges está intimamente ligada às relações entre exterioridade e a
internalidade ligadas à instituição escolar, bem como entre as influências das tendências
políticas gerais do mundo, do País, do Estado, da Região. Contudo, também se manifesta
101
como expressão peculiar estabelecida frente às tendências locais, no que se refere à cidade de
Patrocínio, bem como ao próprio Grupo Escolar.
Tanto a escola como o processo de escolarização são processos históricos, num
processo dialético de construção e superação de comportamentos, valores e práticas. Com a
modernidade, a escola passa a ocupar lugar central na instrução e formação de sujeitos
sociais. Assim, são necessários os paradigmas de análise que ora refletem os elementos da
exterioridade escolar, ora expressam os elementos internos da própria escola. Neste sentido,
percebe-se a possibilidade do resgate da escola enquanto construção social e histórica.
3.1. Criação (1912) e instalação (1914) do Grupo Escolar Honorato Borges em
Patrocínio – M. G.
Na República Velha, Patrocínio passa por um intenso processo de melhoria nos
serviços públicos oferecidos à população local. A cidade vive um momento de prosperidade,
no sentido de conseguir superar muitas das deficiências de infra-estrutura.
Como Patrocínio é considerado também um dos municípios mineiros mais
importantes da época, e um dos de maior destaque na região do Triângulo Mineiro, as
oligarquias rurais, à frente do poder político, reivindicam a criação e a implantação de uma
escola pública na cidade, com o intuito de suprir as necessidades existentes no campo da
instrução primária. Além disso, é claro, tinham a preocupação de nivelar Patrocínio aos
projetos políticos colocados em prática em termos estaduais, como a busca da racionalização,
bem como da modernização da rede estadual de ensino.
Os membros da oligarquia rural de Patrocínio, favorecidos pela recém lançada
Reforma João Pinheiro (1906), responsável pela introdução da designação e o modelo dos
Grupos Escolares no Estado de Minas Gerais, esforçam-se no sentido de conseguir a
implantação de um grupo escolar em Patrocínio. E, assim, muitos dos municípios mineiros,
aos poucos, também vão buscando e lutando pela criação de grupos em suas cidades ou
território. Na época, a conquista de um grupo escolar seria considerada um indício do
prestígio político da liderança local e, ao mesmo tempo, uma contribuição para o
aperfeiçoamento cultural da cidade.
Em Patrocínio, não escolas graduadas ou pertencentes à rede oficial de ensino.
A educação escolar era realizada através de algumas escolas particulares, normalmente
mantidas por professores, ou através da presença de preceptores, contratados pelas famílias
102
mais abastadas e influentes da cidade. Ou seja, a maioria da população não tinha acesso aos
serviços oferecidos pelas escolas, consideradas luxo ou privilégio para poucos.
Atendendo-se à crescente demanda por instrução no município, ou até mesmo para
buscar o progresso cultural para Patrocínio, a elite oligárquica liderada pelo Coronel Honorato
Borges, consegue a autorização do governo estadual para criar um grupo escolar na cidade.
Pela liderança que conquistou e pelo considerado exemplo junto aos seus aliados
políticos, o líder do PRM em Patrocínio, Coronel Honorato Borges, foi homenageado sendo
declarado patrono do Grupo.
Pode-se perceber, inclusive, pelos discursos veiculados no Jornal “CIDADE DO
PATROCÍNIO”, o quanto o tema da educação nacional se tornou uma constante, sendo
aludida como condição básica para a transformação cultural das cidades brasileiras,
principalmente as interioranas. Em diversas ocasiões a educação é conclamada como uma
questão muito delicada para a modernização do país, do estado e do município. O novo
regime, pelo menos no discurso, elege a educação escolar como fundamental para o
aperfeiçoamento social e econômico.
Em Patrocínio, os discursos políticos, seja na Câmara Municipal, seja no jornal
“CIDADO DO PATROCÍNIO”, ou até mesmo nos círculos informais de amizade, como o
atestam os testemunhos da época, evocam a preocupação da elite patrocinense em torno da
necessidade de se implementar o processo de escolarização pública na cidade.
Os políticos patrocinenses passam a se esforçar, então, em prol da efetiva
escolarização da cidade, através da conquista de um grupo escolar para a mesma, adequando-
se aos rumos educacionais tomados a nível estadual, através da Reforma João Pinheiro
(1906).
A fim de garantir a legalização do funcionamento do prédio do Grupo Escolar
Honorato Borges, realizou-se a confecção de um contrato, contemplando as questões básicas
relativas ao direito de propriedade e direito de usufruto por parte da rede estadual de ensino,
responsável estruturalmente pela implantação dos grupos escolares. Essa era uma das
condições mais importantes para a criação de um grupo escolar, bem como pelo seu
funcionamento, buscando uma organização que atendesse às exigências expressas nas
reformas estaduais.
Como ainda não havia escolas públicas na cidade de Patrocínio, as crianças
recebiam instruções nas residências dos professores, através de aulas ministradas
particularmente. Dentre estes professores, podem ser citados: Professor Olímpio Moraes,
103
Professor Paulo Arantes, Professora Virgínia do Amaral, Professora Quita, Professora
Andalécia Gabriela Lana.
Na resolução n.º 177, de 28 de novembro de 1907, consta a cessão do prédio, em
destaque, pelo município ao estado, enquanto este permanecer responsável pelo ensino
oferecido nas escolas públicas. Isso demonstra o esforço do governo municipal em agilizar a
criação do grupo escolar, esforçando-se, inclusive, em oferecer um prédio próprio para o
funcionamento do mesmo. Com isso, os integrantes da elite política patrocinense se esforçam
no sentido de proporcionar as condições básicas para a organização do ensino primário em
Patrocínio.
A fim de garantir a instalação do Grupo Escolar, no sentido de obter um espaço
específico para seu funcionamento, a municipalidade, através da Câmara Municipal, adquire
um imóvel, em 12 de novembro de 1909, que era a residência oficial do Coronel Marciano
Hilário Ferreira Pires, considerado pelos cidadãos destacado político.
O prédio adquirido pela municipalidade se localiza no Largo da Matriz. Os
políticos locais assumiram a responsabilidade de adequá-lo às condições exigidas para o
funcionamento de um grupo escolar. Com isso, mesmo alegando dificuldades financeiras, a
municipalidade responsabilizar-se-á pela execução das ações necessárias e concernentes para
o funcionamento do prédio, dentro dos padrões determinadas pela legislação vigente. Neste
sentido, a reforma e a adaptação do prédio para o funcionamento efetivo do prédio, como
Grupo Escolar retardaria, ocorrendo somente em 1913.
O Grupo Escolar Honorato Borges foi criado em 09 de janeiro de 1912, através do
Decreto n.º 3.401, durante o governo estadual do Presidente Delfim Moreira. A publicação do
decreto de criação ocorreu no dia seguinte, 10 de janeiro. Contudo, como ainda não tinha
lugar determinado para a condução das aulas, o mesmo funciona mantido por verbas públicas,
autorizadas pela Câmara Municipal de Patrocínio, até julho de 1913.
A instalação do Grupo Escolar Honorato Borges ocorre a 15 de junho de 1914,
sendo completado o processo de criação e instalação do mesmo. E, a partir daí, o Grupo
Escolar assume a tentativa de se implantar na cidade de Patrocínio uma experiência de
racionalização do ensino primário. A presença na cidade de uma instituição de ensino pública
evidencia o anseio dos políticos locais em buscar, através do Grupo Escolar, o progresso
material e intelectual para a cidade.
104
Figura 09 – Largo da Matriz – 1928 – 1.º casarão da direita para a esquerda – Local da
primeira sede de funcionamento Grupo Escolar Honorato Borges.
(Acervo da Escola Municipal Honorato Borges)
105
Figura 10 – Antigo prédio do Grupo Escolar Honorato Borges.
(s/ data - Acervo da Escola Municipal Honorato Borges)
106
Conforme consta depoimentos informais, a Senhora Geny Paula Rocha é
considerada a primeira diretora interina do Grupo Escolar. Contudo, o primeiro diretor a
preencher um cargo nomeado de fato e empossado oficialmente é Modesto de Mello Ribeiro,
como observado no Livro “Termo de Posse” (Termo de Abertura: 8 de julho de 1913, pelo
inspetor escolar Jayme Claudemiro dos Santos), página 2.
No Livro “Termo de Posse”, também encontram-se relatadas as posses dos
primeiros professores contratados: Srta. Letícia Marra (página 2 verso), Sra. Amélia Angélica
do Nascimento (página 3) e o professor Nestório de Paulo Ribeiro (página 4).
Os primeiros funcionários do Grupo Escolar são, também verificados no Livro
“Termo de Posse”, o Sr. Osório Marques Ferreira (primeiro porteiro página 3 verso), bem
como a Sra. Augusta Maria da Porciúncula (primeira servente – página 4 verso).
A “caixa escolar” foi instalada também em 1914, denominando-se “Caixa Escolar
Paula Arantes”, alusão ao culto professor Francisco de Paula Arantes. A caixa escolar” teve
como presidente, desde sua fundação até 1943, o Sr. João Barbosa, o qual sempre se dispôs a
lutar pela formação de uma sociedade mais justa, solidária e igualitária. Com isso, muitos
alunos somente conseguiam permanecer perseverantes e freqüentes no Grupo Escolar com o
auxílio da “caixa escolar”.
Conforme o Decreto n.º 1.969, de 03 de janeiro de 1907, através do qual é
promulgada a aprovação do Regimento Interno dos Grupos Escolares e Escolas Isoladas do
Estado de Minas, o Presidente do Estado João Pinheiro da Silva, bem como seu Secretário dos
Negócios do Interior, estabelecem algumas regras básicas para a permissão do funcionamento
das escolas estaduais em seus vários aspectos. Assim, no que se refere à Caixa Escolar,
esclarece:
A Caixa Escolar era destinada a “ocorrer às pequenas despesas do estabelecimento,
de expediente e auxílios aos alunos pobres.” A sua receita adviria: a) gratificações
não pagas ao pessoal docente e administrativo do Grupo
Escolar, quando em licença ou por faltas não abonadas; b) donativos de
particulares; c) produto de exposições, quermesses e outros, em benefício da Caixa;
d) outras fontes autorizadas pelo Governo e conseguidas pelo diretor. O Regimento
especificava suas despesas em: a) fornecimento de material escolar a alunos pobres;
b) idem de roupa e calçado aos mesmos; c) assistência médica aos alunos sem
recurso; d) compras para o museu e para a biblioteca da escola; e) aplicações de
beneficiamento no prédio da escola, jardim e material escolar. (MOURÃO, 1962:
166 – 7)
Todos estes fatos e disposições legais possibilitaram as condições necessárias para
a criação, instalação e o funcionamento de um Grupo Escolar na cidade de Patrocínio, ainda
na Primeira República. Esta escola é considerada o primeiro estabelecimento oficial de
107
ensino, mantido pelo governo estadual. E, desse modo, a cidade de Patrocínio conseguiria
algumas das condições que possivelmente contribuiria para o avanço do ensino público,
mesmo que ainda não conseguindo atender a toda demanda local. Contudo, a presença de um
Grupo Escolar na cidade possibilitaria, pelo menos, o início de uma reviravolta na
organização do ensino na cidade. Pois, o Grupo Escolar era tido como modelo escolar
avançado e capaz de melhorar as condições de ensino oferecidas.
A criação do Grupo Escolar Honorato Borges compõe um dos elementos da
organização da educação pública em Patrocínio. A presença de um Grupo Escolar na cidade
significava, para alguns, a chegada do avanço e do progresso, não só pedagógico, mas
também, político. A implantação de um grupo significaria também, para a elite local, a
possibilidade de estar preservando a formação de um ambiente social voltado para os ideais
republicanos de civilidade, cidadania e cortesia. Além do mais, contribuiria também
proporcionando a realização de uma reforma dos costumes e a implantação de uma ordem, a
ser inculcada no meio popular e promover a solidariedade social, contribuindo para a coesão
social interna da cidade.
A elite política patrocinense demonstra um claro interesse pelo desenvolvimento
da educação pública, no sentido de estabelecer concepções de vida em acordo com o
republicanismo, positivista e liberal. Os políticos locais também se preocupavam com a
necessidade de estimular a educação pública, buscando contribuir para a consolidação de uma
nova ordem social, com o interesse de fortalecer a identidade e a nacionalidade brasileira.
3.2. A importância do Grupo Escolar Honorato Borges e a construção (1928 1930)
da nova sede
Durante as três primeiras cadas do século XX, Patrocínio passa por um intenso
processo de urbanização e conseqüente melhoria nas mais diversas áreas de infra-estrutura,
dentre as quais podemos destacar avanços na comunicação, nos transportes, na conquista de
novos serviços públicos, bem como na pavimentação de algumas vias urbanas, bem como a
construção de novos prédios. Em outras palavras, a política local consegue aliar os interesses
de uma camada oligárquica, detentores dos poderes político e econômico, com o intuito de
promover o processo de modernização da cidade.
Muitas conquistas já vinham sendo longamente debatidas e requeridas na imprensa
local, representada pelo jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO”, procurando efetivar a
satisfação das necessidades básicas da cidade, em termos de infra-estrutura.
108
Percebe-se que a paisagem urbanística tem uma importância singular no sentido de
ser a forma mais visível do progresso de uma cidade. Neste sentido, a elite política local
buscava implementar uma série de reformas estruturais, demonstrando visivelmente o avanço
material da mesma, no sentido de urbanizar-se.
O interesse se dava no sentido de tomar uma série de medidas cnicas,
administrativas, econômicas e sociais, tão necessárias ao desenvolvimento racional e humano
da cidade.
Patrocínio, na década de 1920, a conquista e a efetivação da Estrada de Ferro
proporcionam à população patrocinense, a agilização do transporte de passageiros.
Anteriormente, as viagens eram realizadas, sobretudo a cavalo, dificultando enormemente o
contato da população da cidade com os centros urbanos de destaque nacional, como São Paulo
e Rio de Janeiro. Com a Estrada de Ferro, então, a população local passa a ter disponibilizado
um acesso mais pido e cômodo a outras regiões do Estado de Minas Gerais, bem como à
própria capital do país, o Rio de Janeiro. Este contato mais imediato e a facilitação do
transporte acabam proporcionando também uma agilização do intercâmbio e da veiculação de
idéias, proporcionando um contato mais efetivo com as principais tendências do país, em
todos os âmbitos sociais. Novas idéias começam a circular mais rapidamente e isto dinamiza a
vida da cidade de Patrocínio, renovando o perfil até mesmo dos viajantes que para se
dirigiam.
O comércio também começa a se fortalecer de maneira destacável, ampliando
inclusive o perfil das atividades econômicas da cidade. Há, ainda, com o intuito de
modernizar e desenvolver a infra-estrutura da cidade, o estabelecimento de um grande número
de instituições burocráticas na cidade, como o fórum, a prefeitura, o posto de profilaxia, bem
como a cadeia pública, e outros, como constam na imprensa local, representada aqui pelo
jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO”.
Assim, paralelamente ao impulso econômico dos anos 1920, Patrocínio continua a
discutir questões relativas à necessidade da promoção da instrução pública, como uma das
formas possíveis para garantir o crescimento ordenado e civilizado da cidade. Desse modo, o
“CIDADE DO PATROCÍNIO”, em inúmeras edições, continua seu trabalho de divulgação
das concepções de mundo propostas pela oligarquia local, em consonância com os ideais
propostos para a modernização do país e a busca da consolidação do desenvolvimento
econômico. Nesse sentido, a educação tende a ser vista como redentora dos valores morais e
cívicos, colaborando com o aperfeiçoamento moral e intelectual da população local. Por
exemplo, na edição n.º 669, publicada no 28 de março de 1926, a seguinte matéria com o
109
título “Influência da Educação nos nossos costumes”. Nela, percebe-se o posicionamento do
colunista em prol da modernização também do ensino público, ambicionando um novo rumo
para a rede escolar. Assim, a educação passa a ser concebida como processo capaz de
moralização e politização dos alunos. Desse modo, sua ação tem efeito sobre o universo
social, no sentido de incutir a verdadeira moral e os valores cívicos, o necessários para o
aprimoramento humano. Assim,
Influência da Educação nos nossos costumes – nunca foi tão preciso, como
agora, que a Educação assuma as mais criteriosas proporções, para que, bem feita,
alicerçada nos sãos princípios de uma robusta moral, enfrente tantos males que
procuram perverter os puros costumes do povo brasileiro. E essa defesa, a que nos
referimos, depende da Educação atual: é a mocidade hodierna que vai servir de
anteparo à perversão dos nossos costumes, repelindo as exóticas extravagâncias das
modas sempre mutáveis, e, cada vez mais, mais indecentes, que o luxo e o pouco
escrúpulo exportam para nós... A pessoa, verdadeiramente educada, é simples nas
suas maneiras, modesta no seu trajar; e, preocupada com as belezas que a Ciência
lhe prodigaliza, o perde tempo com essas futilidades, que servem para
comprometer-lhe o futuro... Em todos os atos da nossa vida, nos mais
insignificantes e nos mais comuns, deve existir um lado prático, algo de proveito,
par que sejam lícitos. O indivíduo culto emancipa-se, mais facilmente que o
ignorante, dos muitos vícios e fraquezas que o assediam, porque sabe avaliar as
funestas conseqüências oriundas desses males. O exagero das modas, mormente por
parte do sexo fraco, é proveniente da falta de experiências das coisas... E esse
exagero é comprometedor, ainda mais quando a pessoa reconhece os seus tantos
inconvenientes, ao qual se entrega, incautamente, por imitação, apenas, para, como
se diz, estar ao lado da maioria. A maldade dos homens que se dá, muito bem,
“com essas modas”, ao invés de censurá-las insistentemente e com critério,
acoroçôa-as, para se extasiar ante à beleza plástica e provocadora da Natureza... As
mulheres, então sabedoras desse prazer que proporcionam, com as suas modas, a
homens sem escrúpulo, é que devem modificar os exageros, vestindo-se com
recato, ocultando, quando possível, as partes do seu corpo, que deve ser um templo
augusto e sacrossanto, guardando preciosidades inestimáveis... Senão por outros
sentimentos mais nobres (perdoem-nos!...), ao menos por este “Amor próprio”,
deve a Mulher ser comedida no seu traje, para que se conserve inacessível aos
olhares perscrutadores e maliciosos dos homens... A regeneração de todos os
costumes, a salvação moral dos nossos dias depende, particularmente, da mulher.
Sabia ela conduzir-se, saiba impor-se, saiba manter a natural ascendência que deve
ter sobre os homens, saiba, afinal, fazer-se respeitada, à vista da sua superioridade
de sentimentos afetivos, de amizade, de amor e de dedicação, mas tudo isso com
um certo orgulho bem compreendido, que reinará, no mundo, aquela tranqüilidade
de costumes, de que tanto precisamos. Ao lado daquilo tudo, abandone as
extravagâncias das modas, e conserve, muito elevadamente, o segredo que tem de
cativar, sem ser preciso, apesar disso, lançar mão de meios menos dignos, com os
quais não deve estar de acordo o seu sexo, que se impõe, arrebata e vence, pelos
predicados que a fazem privilegiada, governando e dirigindo o mundo para as mais
sublimes conquistas do amor, da inteligência e da moral! N. (CIDADE DO
PATROCÍNIO, Nº 669 – 28/03/1926)
Percebe-se a preocupação que o periódico tem em divulgar princípios morais e
atitudes a serem incutidas na mocidade patrocinense, de modo a preservar a ordem
estabelecida pela tradição. A preservação da moral e dos bons costumes é condição
110
considerada primordial no sentido de garantir também a ordem social. A moral individual, se
bem assimilada, conforme os valores propostos socialmente, preserva todo o universo social.
O final da década de 1920, para Patrocínio, também representa um momento muito
fecundo em termos educacionais, pois em 1927, é inaugurado o Ginásio masculino Dom
Lustosa, sob responsabilidade da Congregação dos Padres dos Sagrados Corações de Jesus e
de Maria e da Adoração Perpétua do Santíssimo Sacramento do Altar; também o Colégio
Nossa Senhora do Patrocínio, na época, voltado exclusivamente para meninas, também é
criado em 1928 e fica sob os cuidados da Congregação das Irmãs do Sagrado Coração de
Maria de Berlaar. Ambos são instituições ligadas à Igreja Católica Apostólica Romana e
criadas com a intenção de anular o avanço da missão presbiteriana, também presente aqui em
Patrocínio. A presença presbiteriana inclusive está voltada para a ação educativa escolar,
iniciada em meados da década de 1920 com a fundação do Patrocínio College.
o Grupo Escolar Honorato Borges, único estabelecimento de ensino da rede
pública da cidade, receberá uma nova sede de funcionamento, com instalações arquitetônicas
consideradas mais amplas e modernas. Esse novo prédio a ser construído localizar-se-ia no
Largo do Rosário (atual Praça Honorato Borges), resolvendo o problema da precária estrutura
predial em que vinham sendo ministradas as aulas. A necessidade da construção de um novo
prédio se tornou evidente quando o número de alunos começou a ultrapassar os limites de
acomodação. Além do mais, as condições de funcionamento tinham se tornado precárias
em fins da década de 1920, exigindo uma tentativa de resolver a questão predial, pois o
mesmo já encontrava sérias dificuldades para atender à demanda. Além do mais, com o
interesse de promover a modernização da cidade, os políticos locais também se interessavam
em inaugurar um novo prédio para o grupo escolar, evidenciando a grandeza e a importância
do mesmo, no sentido de ser o local específico para a educação escolar e instrumento da
instrução popular. O Grupo Escolar Honorato Borges representa a consecução de uma
tentativa de modernização do ensino primário oferecido na cidade. Por isso, deveria possuir
um prédio que, realmente, possibilitasse e acomodasse as condições necessárias para a
realização do projeto educacional de moralizar os costumes e aperfeiçoasse a conhecimento.
A cidade de Patrocínio, mesmo na cada de 1920, apesar dos grandes surtos de
desenvolvimento industrial pelo país e em Minas Gerais (sobretudo em Belo Horizonte e Juiz
de Fora), permanece essencialmente dependente de uma economia primária, voltada para a
produção agrária, em especial de grãos, e também voltada para a prática de pecuária
extensiva, bem como a agroindústria.
111
O educandário Grupo Escolar Honorato Borges, em 1922, permanece a única casa
de ensino oficial na cidade, contando com 387 alunos matriculados, distribuídos em 7 classes,
como pode ser verificado no livro “Termos de Visitas Oficiais”, n.º 10, página n.º 01. O
Grupo possui seis cadeiras, mas o funcionamento de 07 classes (Ver quadro 02). em
1924, o Grupo Escolar atende um total de alunos perfazendo um total de 427 alunos.
Tabela 02 – Relação do número de alunos por turma e professora no ano de 1922:
Turma: Alunos matriculados: Professora responsável:
1º ano masculino 83 alunos Dona Amélia Alves
1º ano feminino 61 alunas Dona Amélia Nascimento
1º ano misto 62 alunos Dona Amélia Borges
2º ano feminino 49 alunas Dona Geny de Paula Rocha
2º ano masculino 62 alunos Dona Vera de Paula Rocha
3º ano misto 51 alunos Dona Judith de Paula Rocha
4º ano misto 19 alunos Dona Rita Maria de Oliveira
Fonte: Livro “Termos de Visitas Oficiais”, n.º 10, pág. 01
Em 02 de janeiro de 1927, edição n.º 708, a publicação, no “CIDADE DO
PATROCÍNIO”, de uma reprodução de comunicação do diretor aos pais dos alunos com as
regras a serem seguidas para as matrículas a serem efetuadas no Grupo Escolar Honorato
Borges, no corrente ano de 1927. A seguir, a descrição completa do mesmo:
Grupo Escolar “Honorato Borges” o Diretor do Grupo escolar “Honorato
Borges”, em virtude do § 1 do art. 76 do regulamento que baixou com o decreto n.
6.655, de 19 de agosto de 1924, faz saber a todos os srs. Pais, tutores, ou
responsáveis pelos menores em idade escolar, que se acha aberta a matrícula do
referido estabelecimento, do dia 2 a 14 de janeiro. Os pedidos deverão ser por
escrito e assinados pelo pai, tutor ou responsável pelo menor, com as declarações
do nome, idade, filiação, profissão e residência e se é ou o pobre. ART. 22. O
ensino primário fundamental será obrigatório em qualquer parte do território
mineiro onde haja escolas públicas ou particulares subvencionadas, suficientes para
o número de menores em idade escolar, de 7 a 14 anos, de ambos os sexos,
existentes dentro de cada perímetro escolar. ART. 23. – A obrigatoriedade entende-
se exclusivamente para o ensino primário fundamental que poderá ser recebido nos
estabelecimentos estaduais, municipais, nos particulares, ou nos próprios
domicílios. ART. 24. Excetuam-se da obrigatoriedade: Os menores
impossibilitados de freqüentar escola por falta absoluta de meio de comunicação,
ou por indigência notória; Os que forem incapazes física ou intelectualmente; Os
que contarem menos de 7 anos ou mais de 14; Os que sofrerem moléstias
contagiosas ou incuráveis; § 1. As isenções deverão ser provadas, por meios
idôneos, perante os inspetores locais, dispensada a prova nos casos notórios. ART.
27. – Quem quer que pretenda ser nomeado empregado público, fazer contrato com
o Governo ou repartições blicas, solicitar auxílios e favores liberalizados pelo
Estado, só poderá ser atendido depois que, por atendido, provar que não se acha em
infração do artigo 29 deste regulamento. ART. 29. – A responsabilidade pela
matrícula e freqüência dos indivíduos em idade escolar nos estabelecimentos
públicos ou particulares, subvencionados ou não, de ensino primário fundamental,
cabe aos pais, tutores e a toda e qualquer pessoa que tenha, sob sua guarda,
emprego ou companhia, menores em idade escolar, bem como aos proprietários,
112
administradores ou gerentes de quaisquer estabelecimentos mercantis, industriais
ou agrícolas, a respeito dos seus operários ou empregados menores. Os pedidos, na
falta do diretor do grupo, poderão ser entregues à professora D. Amélia A. do
Nascimento. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 708 – 02/01/1927)
Percebe-se que, gradativamente, a preocupação com as normas e regras de
desenvolvimento das diversas práticas ligadas à condução da instrução pública vem sendo
cada vez mais levada adiante, no sentido de promover cada vez mais uma normatização que,
eficazmente, conduza à modernização da rede pública de instrução.
Com o tempo, o primeiro prédio do Grupo Escolar Honorato Borges, situado no
Largo da Matriz, o comporta mais, em termos de infra-estrutura, um ambiente próprio e
salutar para o exercício das atividades de ensino-aprendizagem. Neste sentido, mais uma vez,
o Jornal CIDADE DO PATROCÍNIO” publica a seguinte matéria, em sua edição n.º 719,
datada de 10 de abril de 1927, onde o articulista relata a situação do prédio do Grupo Escolar,
tida como precária e nociva ao ambiente escolar, de atividades pedagógicas, bem como a
exigência de providências quanto ao problema:
O Grupo Escolar – A quem de direito – Vai se tornando um caso sério o problema a
se resolver sobre a remodelação do prédio escolar do Grupo local. Torna-se
urgente, inadiável mesmo, a resolução sobre esse assunto. Como é sabido, o velho
casarão vai, dia a dia, numa verdadeira derrocada. Com as paredes a se esboroarem,
enegrecidas pelas goteiras, as janelas de vidros partidos e caixilhos empenados; os
muros abertos, dando ingresso aos transeuntes no recinto dos pátios e mesmo no
prédio, com montões de lixo acumulados sob os alicerces, com as instalações
sanitárias inutilizadas pela falta de água, esse estabelecimento de ensino mostra um
aspecto desolador e até repugnante. Como observar os preceitos de higiene
indispensáveis, num prédio onde se reúnem, diariamente, 300 e tantas crianças
obrigadas a se acomodarem dentro de 4 salas, essas mesmas mediocremente
aproveitáveis, e onde até a água potável é carregada para o consumo cotidiano?
Torna-se até irrisório numa aula de higiene ministrada aos alunos, onde se
aconselha ar puro, luz em profusão, etc., dada entre quatro paredes de uma sala mal
iluminada, e cuja ventilação deixa muito a desejar quanto à sua pureza, porquanto
salas que mais se parecem uma enxovia, ou coisa que o valha. Assim, como a
boa ordem, a disciplina, os bons ensinamentos constituem os elementos
indispensáveis na educação moral das crianças, o meio, o conforto material, as
condições higiênicas são igualmente elementos poderosos da educação física. Um
grupo decente, limpo, cheio de luz, bem ventilado, além de sua utilidade
incontestável, é convidativo, alegre, atraente. Finalmente, nem mais é preciso dizer,
para se compreender as reais vantagens que poderão advir de uma intervenção
eficaz para o melhoramento de nossas atuais condições, tão precárias neste ponto de
vista. E acreditamos, esperançosos e convictos, que os preclaros dirigentes da
Instrução Pública não deixarão de tomar na devida consideração o apelo que ora
fazemos. (X. Y.) (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 719 – 10/04/1927)
É bastante clara e perceptível a preocupação do articulista com o estado físico do
Grupo Escolar Honorato Borges, tendo um prédio nestas condições. Certamente, a presença
113
de problemas tão sérios na estrutura e na organização predial contradiz, praticamente, todas as
tendências pedagógicas, defensoras de um ambiente de ensino-aprendizagem digno, saudável
e atraente. Contradiz também todos instrumentos legais, os quais afirmavam a importância do
ambiente escolar para a consolidação de uma educação baseada na higienização e controle
disciplinar dos alunos. Além do mais, as salas permaneciam superlotadas, devido à quantidade
grande de alunos em relação ao número disponível de salas de aula.
Inicia-se, na cidade de Patrocínio, uma campanha em prol da conscientização da
população e dos políticos acerca da necessidade de se tomar uma iniciativa para a solução
deste problema lastimável e, ao mesmo tempo, indicativo de que a situação do ensino
primário no Estado de Minas Gerais ainda permanece em plano secundário de importância, na
prática.
Ainda em outro número do Jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO”, foi publicada a
notícia da liberação da verba para reparos e reformas no prédio do Grupo Escolar. Entretanto,
o articulista tem uma visão contrária a esse tipo de medida, no caso específico do prédio do
Grupo Escolar. O articulista passa a defender literalmente outra solução, a construção de um
novo prédio, com instalações mais adequadas para o fim estabelecido para um Grupo Escolar.
O artigo completo foi publicado no n.º 727 (12/06/1927):
Grupo Escolar Estamos seguramente informados que a secretaria respectiva
ordenou ao snr. Dr. Engenheiro desta circunscrição fazer orçamento para concertos
no casarão em que funciona o Grupo Escolar local. Não podemos negar a boa
vontade com que o snr. Secretário, animado dos melhores propósitos em relação a
tudo o que é benefício coletivo, o que não é de admirar, porque S. Exc. é um
estadista, administrador e patriota, vem corresponder aos apelos reiterados que lhe
tem sido feitos, e dos quais temos sido isso, dentro das normas inflexíveis que
impusemos a nós próprios, para o constante progresso útil da nossa terra. Assim,
exultamos com a providência tomada pelos poderes estaduais. Damos parabéns a
nós mesmos. Entretanto a solução dada, embora melhorando grandemente as
condições do ensino na cidade, não corresponderá totalmente às necessidades dele.
O Grupo funciona com 9 classes e mais a de trabalhos. Ora remodelando-o
comportará, por certo, o elevado mero de alunos que o freqüentam. Mas esse
remodelamento não ficará em menos de quarenta contos. É necessário subdividir o
prédio. As atuais seis salas de aulas são pequenas, o acanhadas. É preciso
aumentar o número de salas e sua capacidade. Entretanto, isso não basta. No
lado direito é preciso fazer uma mudança radical porquanto ele está apoiado em
outro prédio o que lhe suprime a luz e a ventilação. Talvez o problema seria
resolvido com construção de um alpendre desse lado. Será uma reconstrução
dispendiosa... E, daqui alguns anos, nova despesa, com aumentos no prédio
atual, ou mesmo construção de um novo prédio. o nenhuma animosidade nas
linhas que ficam. É simples observação de quem se esforça para uma solução
cabal do problema. É verdade que se pode aumentar com o aconselhado o gasto
de dinheiros públicos. Mas o nosso papel é de pedir, embora esses pedidos possam
parecer impertinentes ou descabidos. Enfim, desejávamos um novo prédio; o snr.
Secretário nos concede uma remodelação do atual: não se pode dizer que ao
estamos de parabéns. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 727 – 12/06/1927)
114
Contudo, a solução para tal problema, da suposta necessidade de um novo local
para ser a sede do Grupo Escolar, começa a ser solucionada, através da previsão no orçamento
estadual de 156:922$694, quando em abril de 1928, há a disponibilização do governo estadual
para o recebimento de propostas para a construção do novo prédio do Grupo Escolar em
Patrocínio. Há, então, a abertura de concorrência para a obra, sendo a mesma arrematada por
uma construtora de Belo Horizonte. Sobre esse certame, foi publicada outra notícia, no n.º
785 (12/08/1928), no “CIDADE DO PATROCÍNIO”, além de uma nova reivindicação: a
necessidade de se construir uma nova estação ferroviária na cidade. Desse modo,
Nova Estação de Patrocínio E. F. Oeste de Minas Um apelo a quem de
direito por várias vezes temos, por esta folha feito sentir a necessidade de se
construir em Patrocínio, uma nova estação que substituía a que nos serve,
construída provisoriamente e acanhada e precária em todos os sentidos.
Novo Grupo Escolar - Posta em concorrência a construção do prédio para o novo
Grupo Escolar de Patrocínio, foi esta arrematada por construtores de Belo
Horizonte. O projeto do prédio que foi posto em hasta pública pelas suas dimensões
e de pendências, não satisfazia ao desenvolvimento desta cidade. Levada esta falha
ao nosso ilustre amigo Dr. Francisco Campos, insigne Secretário do Interior, S.
Excia. Ordenou que se ampliasse o projeto, o que foi feito. Destarte teremos em
breve iniciada a construção do novo prédio destinado a sanar uma grande lacuna
que se fazia sentir na instrução primária de Patrocínio. (CIDADE DO
PATROCÍNIO, Nº 785 – 12/08/1928)
Com a visita a Patrocínio do então Sr. Secretário dos Negócios do Interior, Dr.
Francisco Campos, em maio de 1927, houve um novo respaldo por parte do Secretário a favor
da construção do novo prédio, no Largo do Rosário, atendendo também ao interesse dos
dirigentes políticos de aumentar o projeto inicial do novo prédio, considerado menor que a
capacidade necessária para atender à demanda escolar da cidade.
Posteriormente, em julho de 1927, se encontram na cidade os Srs. Drs. Mario
Maia e Carlos Santos, responsáveis por darem início à obra do novo prédio do Grupo Escolar.
O texto foi publicado no n.º 781 (15/07/1928):
Novo Grupo Escolar encontram-se na cidade os srs. Drs. Mario Maia e Carlos
Santos, respectivamente engenheiro e arquiteto construtor, que aqui vieram a fim de
dar início às obras do novo prédio do Grupo Escolar. Tanto o ilustre engenheiro,
Dr. Maia, como o competente arquiteto, sr. Carlos Santos, são dois nomes já
consagrados na Capital do Estado, onde gozam da melhor reputação. Dentro em
breve Patrocínio terá pois o seu novo Grupo Escolar, construído em estilo moderno
e tendo amplas acomodações, de molde a satisfazer todas as exigências.
Apresentamos a nossa visita. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 781 – 15/07/1928)
Em agosto de 1928, tem início a construção do novo prédio, na Praça Barão do
Rio Branco, onde até hoje funciona a Escola Honorato Borges. O prédio é construído com
115
recursos financeiros do Estado, e este recebe a doação do terreno da municipalidade, no valor
de um conto de réis, onde será construído o prédio. O imóvel doado possui uma área de 2.400
m², situado na Praça Rio Branco, sendo ladeado pela Rua 15 de Novembro (atualmente Rua
Governador Valadares) de um lado, e do outro lado com a Praça Dr. João Nepomuceno e, por
outro lado, com terrenos municipais segundo citado no Livro 3-C, folhas 112 sob o n.º 2675
no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Patrocínio. A notícia da doação foi assim
descrita no Jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO” (Nº 768, 15/04/1928):
Grupo Escolar foi pelo Sr. Presidente e Agente Executivo e demais
vereadores da Câmara Municipal, passada à Secretaria das Finanças, por intermédio
da Coletoria Estadual, a escritura de doação do terreno onde será construído novo
(...) edifício do Grupo Escolar. Por isto estamos absolutamente certos de que, dentre
em dias, será, pelo ilustre titular da Secretaria do Interior Exmo. Sr. Sr. Francisco
Campos aberta a concorrência para apresentação de propostas à construção supra
citada. E Patrocínio recebe do Governo do eminente Antonio Carlos mais este
significativo melhoramento. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 768 – 15/04/1928)
Algumas das famílias mais influentes e abastadas de Patrocínio também acabam
fazendo doações para ajudar a construir o novo prédio, finalizando-o em 1930, quando era
governador o Dr. Melo Viana, bem como prefeito patrocinense, Francisco Batista de Matos.
Em 24 de fevereiro de 1931, têm início as atividades letivas no novo prédio.
Quanto ao prédio antigo do Grupo Escolar, o mesmo foi doado pelo Estado à
Congregação das Irmãs do Sagrado Coração de Maria de Berlaar. Assim, a doação do antigo
prédio ocorreu com o apoio da política local e do Bispo Diocesano de Uberaba Dom Antônio
de Almeida Lustosa, que buscavam condições para a criação e o estabelecimento de um
colégio católico feminino na cidade, bem como somar esforços ao Ginásio Municipal Dom
Lustosa, voltado para a educação de rapazes. Essa ação tinha o intuito de fortalecer a
educação em Patrocínio, bem como auxiliar no combate ao avanço da missão Presbiteriana no
campo escolar, através da criação do Patrocínio College.
A execução da obra de um novo prédio para o funcionamento do Grupo Escolar
Honorato Borges, mesmo considerada mais simples, se comparada com outros prédios da
cidade, ou até mesmo em relação a outros grupos escolares das cidades vizinhas, representou
um marco na história da educação do município. Fatos como a conquista dos recursos para a
construção de um novo prédio para o Grupo Escolar Honorato Borges, bem como a criação de
duas escolas católicas em Patrocínio, vêm demonstrando o esforço dos políticos locais em
torno da modernização da educação escolar em Patrocínio, como condição para o ingresso da
116
cidade nos novos rumos de desenvolvimento. Esse fato foi discutido e expresso também num
artigo do Jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO” (n.º 787, 26/08/1928) nestes termos:
Início do Prédio do Grupo Escolar de Patrocínio Um apelo ao dr. Francisco
Campos, D. D. Secretário do Interior Passávamos em dias desta semana, pela
praça Barão do Rio Branco, quando nos despertou a atenção o movimento de
operários que rasgavam valetas, seguindo o marco de barbantes estendidos,
delimitando uma área, angulada por pequenas estacas. Percebemos de momento que
ali se iniciava a construção do prédio do novo Grupo Escolar. A dirigir os
operários, dois senhores. Um mais moço o dr. Carlos Santos, engenheiro
empreiteiro da obra e o dr. Alberto Borelli, seu auxiliar. Desejosos de colher alguns
informes e transmiti-los ao público, procuramos o dr. Carlos Santos a quem
dissemos o motivo da nossa presença ali. O ilustre engenheiro recebeu-nos com um
sorriso cativante e prontificou-se a nos responder. Disse-nos que está construindo
os Grupos Escolares de Araxá, Carmo do Paranaíba e o nosso. Não é a primeira vez
que se encarrega de obras do Estado, pois foi fiscal das obras do Grupo de
Caxambu, em comissão pelo secretaria do interior, tendo sido sua a prática daquele
estabelecimento, assim como da do Grupo D. Pedro II, de Belo Horizonte, uma e
outra de estilo colonial. A nossa é de estilo normando. O projeto, disse-nos o dr.
Carlos, é para um Grupo de 6 salas, sabendo entretanto sua senhoria que o dr.
Secretário do Interior autorizou a ampliação do projeto para oito salas, não tendo
porém recebido ainda comunicação oficial neste sentido. O dr. Carlos dos Santos
disse-nos também que tem quase todo o material encomendado, de sorte que,
dentro de seis meses, a contar desta data, entregará a obra concluída. Afirmou-nos
que, como sempre procede, tudo fará par fazer um trabalho bem acabado, com
escrúpulo e rigorosa técnica arquitetônica. Entretanto, por nossa observação, vemos
que o atual Grupo é de estilo campestre e que se localiza no centro da cidade, na
principal praça, ficará deslocado contrastando com prédios mais austeros e mais
ricos que ali se estão construindo. A fachada principal é por demais simples e as
fachadas laterais que dão para duas ruas importantes e principais da cidade, dão
mais a idéia de galpão de fábrica de tecidos do que fachadas de uma casa de ensino.
Estamos certos de que o dr. Francisco Campos não concordará que a nossa cidade
que S. Excia. conhece, tenha um Grupo tão simples e mesmo feio, quando em
outras cidades como Araxá, Araguari, Uberaba, o Governo está mandando construir
lindos edifícios, amplos e modernos. Assim apelamos para o dr. Francisco Campos
que tantas provas tem dado de corresponder à estima que o nosso povo tributa,
merecidamente, a S. Excia., afim de que S. Excia. autorize o dr. Carlos dos Santos a
fazer algumas modificações nas fachadas do Grupo, dentro das linhas gerais da
planta, sem grande dispêndio, de maneira a tornar o novo prédio harmonicamente
estilado com outros edifícios que nessa praça se vão construindo. Da mesma
maneira esperamos que seja autorizada a ampliação do projeto de seis para oito
salas o que é reclamado pelo número elevado de nossa população infantil, em idade
escolar. (CIDADE DO PATROCÍNIO, Nº 787 – 26/08/1928)
O Grupo Escolar Honorato Borges se firma como instituição de ensino oficial,
contribuindo para o desenvolvimento cultural da cidade, dando condições de uma melhor
organização da instrução primária da população patrocinense. Neste sentido, o Grupo Escolar
se torna referência na cidade de toda uma expressão educacional, voltada para a formação
física, moral e intelectual.
A construção do Grupo Escolar Honorato Borges em novo prédio, torna-se base
para a formação escolar do cidadão patrocinense, expressando o desejo e o esforço de
descoberta da nacionalidade brasileira, de inspiração, ainda neste momento, republicana.
117
Além do mais, aliada aos interesses de valorização dos valores cívicos, busca-se também a
afirmação de um novo padrão de comportamento para a população, embasado na disciplina e
na boa moral. Efetua-se, assim, o projeto político local patrocinense, de promover a
modernização dos serviços públicos oferecidos na cidade, em especial, o da instrução e da
educação pública em Patrocínio. Por isso, os esforços da imprensa local, da elite oligárquica,
bem como dos políticos, eram impulsionados pelo interesse de proporcionar as condições
mínimas e necessárias para a execução de uma reforma social, inspirada nos ideais
modernizadores em torno da promoção do desenvolvimento geral da nação brasileira, do
Estado de Minas Gerais e da cidade de Patrocínio.
Portanto, a construção de um novo prédio para o Grupo Escolar em Patrocínio
representa uma das facetas da execução de um processo de modernização pelas quais passa a
cidade, em fins da cada de 1920. Ao lado de outras conquistas relativas à infra-estrutura da
cidade, o Grupo Escolar Honorato Borges veio somar esforços em torno da educação pública,
assumindo papel fundamental no sentido de buscar a organização do ensino público.
É fundamental a compreensão de que a presença de uma escola pública de
qualidade, para a elite local, é necessária no sentido de atuar diretamente na formação moral,
intelectual e até mesmo física do povo. E assim, garantido a formação da população local
conforme os moldes estabelecidos pela ordem estatal, a elite oligárquica buscava manter e
fortalecer sua hegemonia social.
Os espaços escolares refletem um conjunto de rituais acadêmicos, possuidores de
sentidos e significados, transmitindo uma quantidade de estímulos, conteúdos e valores de um
chamado currículo oculto, sendo fonte de experiência e aprendizagem.
A separação das salas de aulas por ries, sexo ou características dos alunos, bem
como a disposição das carteiras de forma regular reforçam a tendência moderna de controle
dos tempos, dos movimentos e dos comportamentos sociais e individuais. A estrutura
arquitetônica possui um papel fundamental e relevante que, de certa forma, expressam as
tendências tayloristas de economia de tempo e disciplinarização dos movimentos.
O fato do novo Grupo Escolar Honorato Borges ser construído numa localização
privilegiada no cenário urbano de Patrocínio expressa também o entendimento do espaço
escolar como reflexo de urbanismo, desenvolvimento e racionalização escolar, buscando a
superação de uma situação precária.
A localização do Grupo Escolar no centro de Patrocínio repercute frente aos
habitantes da cidade como indício ou manifestação oculta do papel que a escola agora ocupa
frente às tendências de racionalização e modernização da sociedade em geral.
118
Toda a espacialização de um ambiente escolar repercute nas pessoas, sobretudo
alunos, indiretamente. A presença de símbolos nacionais como a bandeira, fotografias de
políticos influentes, imagens religiosas, alguns imperativos morais alcançam o pensamento e
o comportamento incutindo comportamentos e valores a serviço de uma ideologia nacional,
religiosa ou sócio-moral.
A incorporação desses valores pressupõe que a simbologia, o comportamento
moral e a conscientização política ocorrem apenas pela aprendizagem, sobretudo em
ambientes privilegiados, como a escola.
Enfim, a localização da escola no cenário urbano e suas relações com o universo
urbano, seu perfil arquitetônico, bem como seus elementos simbólicos de sua própria
identidade ou assumidos como seus correspondem a determinados padrões incorporados
cultural e pedagogicamente.
3.3.A questão do tempo e o currículo escolar: a normatização do processo ensino-
aprendizagem
A fim de compreendermos a questão do tempo escolar, torna-se necessário
entendermos que a racionalização do mesmo se tornou característica marcante da escola
moderna. A organização em torno dos períodos, das etapas, das divisões cronológicas visa
sistematizar o processo ensino-aprendizagem, contemplando diversas dimensões do processo
educacional escolar.
O tempo escolar está intimamente ligado ao tempo social do qual faz parte. A
escola se manifesta tanto como instância expressiva da organização social mais ampla, como
também pode combater ou até mesmo destruir a ordem social da qual faz parte.
A criação dos grupos escolares, no Estado de Minas Gerais, representa uma das
manifestações do processo de urbanização pelos quais muitas cidades vinham passando no
decorrer da Primeira República. Localizados no espaço urbano, normalmente, em lugar de
destaque no cenário paisagístico, o grupo escolar simboliza a ordem estabelecida pela
modernidade. O intuito, então, manifesta-se em torno da manifestação de uma tentativa de
modernizar a cidade, e a disciplinarização estabelecida no âmbito dos grupos escolares
repercute no estabelecimento de um movimento que envolve todos os sujeitos sociais. A
escola reflete o social, bem como o social reflete a escola.
119
Figura 11 – Novo prédio do Grupo Escolar Honorato Borges, construído no período de 1928 a 1930.
(s/ data - Acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio)
120
A sistematização do tempo escolar proporciona aos sujeitos envolvidos no
processo educacional escolar o trato com a própria organização social da qual fazem parte.
Isso se torna evidente quando se percebe que há um esforço em torno da consolidação de uma
nova concepção de tempo escolar, estabelecida pelos estatutos legais do governo estadual, no
decorrer da República Velha.
A proposta de uma nova organização escolar, intimamente ligada ao processo
civilizatório, implementado pelos esforços positivistas e tendo como modelo os Grupos
Escolares, pode ser expressa no pioneirismo da implantação do ensino seriado. A proposta
dessa forma específica de ensino seriado sugere o cruzamento entre várias facetas expressivas
do mundo escolar: a questão do espaço e do prédio em funcionamento, a organização do
tempo, os conhecimentos ministrados enquanto currículo, os sujeitos envolvidos no processo
de ensino-aprendizagem, os métodos utilizados como veículos pedagógicos de expressão do
conhecimento, dentre outros elementos.
De certa forma, o modelo estabelecido pelo paradigma dos grupos escolares serve
de modelo para a organização escolar de boa parte do século XX, demonstrando sua real
importância como modelo para a história da organização escolar, bem como para a história do
próprio processo de socialização, tendo como uma das bases mais importantes a
escolarização.
Assim, a análise aqui empreendida priorizará a abordagem do currículo prescrito
pelas normatizações do governo João Pinheiro, responsável pela implementação dos grupos
escolares no Estado de Minas Gerais. Isso se justifica pelo fato de que, em geral, a criação do
Grupo Escolar Honorato Borges em Patrocínio constitui reflexo de uma tendência a nível
estadual, com o intuito de empreender a modernização do ensino primário. Essa
modernização assume o caráter de controle do tempo escolar, bem como dos conteúdos a
serem ministrados nas aulas. Por outro lado, se justifica também pelo fato de que o currículo
em ação o foi possível de ser verificado, devido à ausência de documentos ou indícios que
comprovem sua identidade.
Assim, a fim de agilizar o processo civilizatório implementação pelo avanço do
processo de escolarização, João Pinheiro estabelece, em sua Reforma do Ensino Primário,
uma série de medidas contemplando diversos aspectos ligados ao cotidiano escolar,
estabelecendo inclusive padronizações em termos intrinsecamente envolvidos com o processo
de educação escolar. Então, como já demonstrado anteriormente, as medidas implantadas pela
Reforma João Pinheiro objetivavam a racionalização da dimensão temporal da estrutura
escolar da rede oficial de ensino, sobretudo primário. Por isso,
121
Na escolaridade obrigatória, o currículo costuma refletir um projeto educativo
globalizador, que agrupa diversas facetas da cultura, do desenvolvimento pessoal e
social, das necessidades vitais dos indivíduos para seu desempenho em sociedade,
aptidões e habilidades consideradas fundamentais, etc. Quer dizer, por conteúdos
neste caso se entende algo mais que uma seleção de conhecimentos pertencentes a
diversos âmbitos do saber elaborado e formalizado. Isso é muito importante
conceitualmente, pois, na acepção mais corrente, por conteúdos se consideram
apenas os elementos provenientes de campos especializados do saber mais
elaborado. Os conteúdos dos currículos em níveis educativos posteriores ao
obrigatório, em geral, restringem-se aos clássicos componentes derivados das
disciplinas ou materiais. (SACRISTÁN, 1998: 55)
Neste sentido, o governo de João Pinheiro estabelece, pouco depois da Lei 439
de 28 de setembro de 1906 (Reforma do ensino primário, normal e superior), as normas e
determinações em torno dos horários e programas de ensino elementar. Assim, João Pinheiro
também lança o Decreto nº 1947 de 30 de setembro de 1906, estabelecendo detalhes em torno
da organização temporal das escolas de ensino primário.
A Reforma do ensino, bem como as outras normatizações levadas adiante durante
o governo de João Pinheiro, ansiava a modernização do ensino público primário do Estado de
Minas Gerais. Buscavam, então, delimitar e tecer as normas minuciosas que iriam organizar a
divisão do tempo escolar, juntamente com diretrizes metodológicas oficiais em torno da
execução das atividades pedagógicas, voltadas para a execução dos conteúdos programáticos
propostos. Assim,
Estes horários constituem reflexos dos usos da época, pois são dispostos de forma
que, em termos atuais, nem se caracterizam matutinos, nem exclusivamente da
parte da tarde. Estão de acordo com o costume dos primeiros anos deste século de
se almoçar às nove horas da manhã e jantar pelas quatro da tarde. (MOURÃO,
1962: 99)
Dessa forma, percebe-se o intuito de a escola acompanhar o cotidiano das pessoas,
assistindo inclusive seus hábitos alimentares e disponibilidade em relação ao tempo. Contudo,
a escola também pretende ser uma alternativa quanto à organização cotidiana de suas
atividades, manifestando-se como exemplo a ser seguido pela sociedade, bem como
estabelecer uma realidade voltada para a mudança de comportamentos e de valores. A escola
também tem a capacidade de inovação, propondo imagens e práticas diversas daquelas
cristalizadas no âmbito social. Por isso,
O currículo, então, apenas reflete o caráter de instituição total que a escola, de
forma cada vez mais explícita, está assumindo, num contexto social no qual muitas
das funções de socialização que outros agentes sociais desempenharam agora ela
realiza com o consenso da família e de outras instituições. Assumir esse caráter
global supõe uma transformação importante de todas as relações pedagógicas, dos
122
códigos do currículo, do profissionalismo dos professores e dos poderes de controle
destes e da instituição sobre os alunos. (SACRISTÁN, 1998: 55)
Para tanto, o Decreto 1947 (30 de setembro de 1906) estabelecia a divisão do
tempo escolar por diversas atividades pedagógicas incluindo o ensino de determinados
conteúdos disciplinares, bem como atividades práticas, com destaque para os exercícios
físicos e canto. Por conseguinte,
Para fazer cumprir um horário assim determinado, no qual “contam” os minutos e a
distribuição das disciplinas pelos respectivos horários é realizada para todos os dias
da semana, em todos os anos do curso, pretendeu-se dotar os grupos escolares de
normas e instrumentos de controle do tempo e dos horários escolares. (FARIA
FILHO, 2000: 70)
Assim, os horários foram assim estabelecidos com o intuito de padronizar o ensino
primário em todo o Estado de Minas Gerais, ministrados em grupos escolares, planejando e
impondo uma estrutura que atendesse aos interesses da ordem estabelecida pelos ideais
positivistas:
Quadro 01 – Horário do primeiro ano (Decreto nº 1947 / 30 de setembro de 1906)
Horas Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado
10
Leitura Leitura Leitura Leitura Leitura Leitura
10:25
Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética
10:50 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
11
Língua Pátria Aritmética Língua Pátria Escrita Língua Pátria Língua Pátria
11:25
Geografia Geografia Escrita Geografia Escrita Escrita
11:50 Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
12:15
História do
Brasil
Língua Pátria Instrução Moral
e Cívica
Aritmética História do
Brasil
Aritmética
12:40
Escrita Escrita Aritmética Língua Pátria Aritmética Geografia
13:05 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
13:15
Aritmética Aritmética Leitura Leitura História Natural,
Física e Higiene
Leitura
até 14
Leitura Leitura Trabalhos Escrita Leitura Trabalhos
Fonte: MOURÃO, 1962: 100
Assim, ao analisarmos o conjunto de disciplinas oferecidas, por exemplo, no
primeiro ano do grupo escolar, percebe-se a importância dada aos conteúdos voltados para a
Língua Portuguesa, bem como para os programas de Matemática respectivamente. Em outras
palavras, aproximadamente 30 % do tempo de ensino eram dedicados aos conteúdos
relacionados à Língua Portuguesa, bem como 20 % do tempo eram dedicados aos do
conhecimento matemático. Ou seja, ambos, somados, perfazem praticamente metade do
123
currículo oferecido no primeiro ano do grupo escolar, demonstrando seu caráter introdutório.
Por isso,
Concordando com Hobsbawm, talvez pudéssemos entender a importância atribuída
ao ensino da língua pátria no programa mineiro de educação primária como mais
um momento de afirmação da escola no seio da sociedade. Mas o apenas isso.
Poderíamos, também, buscar compreender a íntima vinculação entre a crescente
racionalização social, da qual a escola participa, e a instituição de signos e
símbolos, cada vez mais presentes na cena social e escolar, que buscam dar
materialidade, homogeneidade, perenidade e sentido ás ações humanas num mundo
cada vez mais marcado pelas divisões diversas, pela perda de identidades
tradicionais, pelo movimento incessante e desnorteador o bem simbolizada na
multidão urbana. O ensino da língua, mas não apenas dela, não pode, pois, ser
desvinculado desse processo de destituição/instituição de identidades coletivas,
sejam elas de uma classe ou de uma nação. (FARIA FILHO, 2000: 202)
Por outro lado, no quadro 02, vem a demonstração de como eram distribuídas
também as disciplinas do segundo ano, conforme os horários. Também percebe-se uma
organização muito semelhante à grade curricular do primeiro ano, quanto ao tempo
disponibilizado para cada disciplina, evidenciando pequenas diferenças entre ambos.
Quadro 02 – Horário do segundo ano (Decreto nº 1947 / 30 de setembro de 1906)
Horas Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado
10
Leitura Leitura Leitura Leitura Leitura Leitura
10:25
Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética
10:50 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
11
Língua Pátria Geografia Língua Pátria Geografia Língua Pátria Língua Pátria
11:25
Geografia Escrita Escrita Escrita Escrita Escrita
11:50 Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
12:15
História do
Brasil
Língua Pátria Instrução Moral
e Cívica
Língua Pátria História do
Brasil
Aritmética
12:40
Escrita Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Geografia
13:05 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
13:15
Aritmética Leitura Leitura Leitura História Natural,
Física e Higiene
Leitura
até 14
Leitura Trabalhos Trabalhos Trabalhos Leitura Trabalhos
Fonte: MOURÃO, 1962: 101
Dando continuidade em sua formação escolar, o aluno depara-se-ria com a
seguinte organização curricular, referente ao terceiro ano do grupo escolar. Aos poucos se
percebe a alteração de algumas disciplinas em termos de distribuição de aulas por semana,
bem como a inserção de novas disciplinas como Geometria e Desenho.
Além disso, enfatiza-se um pouco mais a realização de trabalhos manuais,
sobretudo voltados para a formação das meninas. Gradativamente, percebe-se também o
124
interesse em proporcionar um contato cada vez mais constante em torno da História do Brasil.
Por isso,
É, pois, esse tempo artificial, apropriado e ordenado pela razão humana, que os
regulamentos do ensino vão buscar impor às professoras, às diretoras, aos alunos e,
mesmo, às famílias. Não por acaso, esse processo ocorre no interior de um
movimento social de racionalização do tempo, próprio às relações capitalistas que
se estabeleciam. (FARIA FILHO, 2000: 71)
Por outro lado, a organização temporal da escola, então, visava ser um modelo de
racionalização para as novas exigências da sociedade moderna, a qual buscava a
modernização dos ambientes sociais.
E o tempo executado, no interior de uma escola, demonstrava-se dotado de
racionalização o suficiente para atender proporcionalmente a diversas áreas do conhecimento.
Neste sentido,
[...] a prescrição de mínimos e de diretrizes curriculares para um sistema educativo
ou para um vel do mesmo supõe um projeto de cultura comum para os membros
de uma determinada comunidade, à medida que afeta a escolaridade obrigatória
pela qual passam todos os cidadãos. A idéia do currículo comum na educação
obrigatória é inerente a um projeto unificado de educação nacional. Numa
sociedade autoritária expressa o modela de cultura que o poder impõe. Numa
sociedade democrática tem que aglutinar os elementos de cultura comum que
formam o consenso democrático sobre as necessidades culturais comuns e
essenciais dessa comunidade. Determinar esse núcleo em culturas e sociedades
mais homogêneas é uma tarefa menos conflitiva do que no caso de sistemas que
acolhem culturas heterogêneas ou com minorias culturais de diversos tipos.
(SACRISTÁN, 1998, 111)
Percebe-se que a intenção do ensino oferecido nos grupos escolares se demonstra,
através das necessidades a eles impostas, como o combate ao analfabetismo e a necessidade
da implementação de uma escola que servisse de modelo pedagógico para todas as demais
escolas primárias, sobretudo as singulares.
Por isso, não podemos, no entanto, deixar de reconhecer também que, mais e
mais, a escola foi se impondo como instituição específica, com seu tempo e espaços próprios,
apesar dos costumes, da saúde, da higiene e da cultura daqueles que a freqüentavam”.
(FARIA FILHO, 2000: 77)
O quadro curricular do terceiro ano oferecido também no grupo escolar se
caracterizava da seguinte forma:
125
Quadro 03 – Horário do terceiro ano (Decreto nº 1947 / 30 de setembro de 1906)
Horas Segunda Terça Quarta Quinta Sexta bado
10
Leitura Aritmética Leitura Leitura Leitura Aritmética
10:25
Aritmética Escrita Aritmética Escrita Aritmética Aritmética
10:50 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
11
Geografia Geografia Língua Pátria Geografia ngua Pátria História do
Brasil
11:25
História História do
Brasil
História do
Brasil
História do
Brasil
História Natural,
Física e Higiene
Escrita
11:50 Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
12:15
Língua Pátria Língua
Pátria
Instrução
Moral e Cívica
Língua
Pátria
História do
Brasil
Aritmética
12:40
Geometria e
Desenho
Aritmética Geometria e
Desenho
Aritmética Aritmética Geometria e
Desenho
13:05 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
13:15
até 14
Trabalhos Trabalhos Trabalhos Trabalhos Trabalhos Trabalhos
Fonte: MOURÃO, 1962: 102
Quanto ao quarto ano, percebem-se algumas modificações quanto à distribuição de
aulas de algumas disciplinas específicas, no sentido de dobrar o tempo disponibilizado para o
ensino das mesmas.
Dentre estas, pode-se citar, como exemplo: Instrução Moral e Cívica, História
Natural, Física e Higiene. Neste sentido, em relação à grande curricular do quarto ano do
grupo escolar, assim ela se organizava:
Quadro 04 – Horário do quarto ano (Decreto nº 1947 / 30 de setembro de 1906)
Horas Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado
10
Leitura Leitura Leitura Leitura Leitura Leitura
10:25
Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética Aritmética
10:50 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
11
Geografia Geografia Geografia Geografia Geografia Geografia
11:25
História do
Brasil
Língua Pátria História do
Brasil
História do
Brasil
Língua Pátria História do
Brasil
11:50 Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
Exercícios
Físicos
12:15
Aritmética Geometria e
Desenho
Instrução
Moral e
Cívica
Aritmética Geometria e
Desenho
Aritmética
12:40
Geometria e
Desenho
Escrita Escrita Geometria e
Desenho
Escrita História Natural,
Física e Higiene
13:05 Canto Canto Canto Canto Canto Canto
13:15
Língua Pátria Língua Pátria Língua Pátria
Língua Pátria Língua Pátria Língua Pátria
até 14
Escrita História do
Brasil
Geometria e
Desenho
História Natural,
Física e Higiene
Instrução
Moral e
Cívica
Geometria e
Desenho
Fonte: MOURÃO, 1962: 103
126
Dessa forma, compreende-se que os conteúdos programáticos das disciplinas
oferecidas nos grupos escolares buscavam realizar um processo de ensino que atendesse
sobretudo a algumas questões: as primeiras noções de escrita e leitura, noções básicas de
matemática, bem como a prática de trabalhos manuais, preparando-se também no sentido
prático. Além do mais, visava também satisfazer algumas necessidades de moralização, valor
cívico, bem como a higienização dos corpos. Então
1
,
O tempo e o espaço escolares são dois registros empíricos da memória da educação.
Nos almanaques e horários do passado das instituições docentes tem permanecido
refletidos nos trabalhos e os dias da infância e dos educandos, assim como boa
parte dos parâmetros que definem a cultura escolar e as relações desta com a
comunidade em que se insere. (ESCOLANO BENITO, 2000: 9)
Por isso, cada uma das disciplinas oferecidas ao longo dos anos que compõem o
ensino primário, desenvolvidas nos grupos escolares, possuem determinadas diretrizes de
ação, bem como são motivadas por algum objetivo mais específico. Cada um dos elementos
que compõem o currículo escolar oferecido, nas escolas agrupadas, desempenha uma função
determinada, aliada à metodologia de ação docente.
Um dos maiores diferenciais da tentativa do governo, em reformar o ensino
público primário no Estado de Minas Gerais, consiste na adoção do método intuitivo para a
realização dos trabalhos pedagógicos em torno do processo ensino-aprendizagem. A adoção
de um novo método eficaz de ensino significaria para os reformados um sinal da renovação
pela qual a rede de ensino vinha passando.
O método utilizado no ensino seria considerado um dos maiores marcos das
mudanças qualitativas pelas quais o ensino primário vinha passando. Por sinal, a adoção do
método intuitivo, bem como o valor dado à formação dos professores, refletia os interesses da
burocracia estatal, interessada em consolidar os ideais positivistas. Essa mentalidade, em
torno da valorização do método, deve-se à influência cientificista propagada pelos seguidos
do positivismo francês, movimento intelectual originário do século XIX. Desse modo,
O método intuitivo surgiu na Alemanha, em fins do século XVIII, por iniciativa de
Pestalozzi, principalmente, e era tributário das idéias dos filósofos empiristas
ingleses Bacon, Locke, Hume, bem como de pensadores como Rousseau, e
pedagogos como Comênio, Froebel, entre outros. Tal método valorizava a intuição
como fundamento de todo conhecimento, ou seja, a aquisição de conhecimentos se
faz por meio dos sentidos e da observação. Assim, para ensinar, o professor deveria
1
(original) El tiempo u el espacio escolares son dos registros empíricos de la memória de la educación. Em
los almanaques u horários del pasado de las instituciones docentes han quedado reflejados los trabajos u los
dias de la infância u de los enseñantes, así como buena parte de los parâmetros que definen la cultura de la
escuela u las relaciones de ésta comunidade en que se inserta. (ESCOLANO BENITO, 2000: 9)
127
partir da curiosidade infantil, valorizar a observação e a experiência, e caminhar do
conhecido para o desconhecido, do particular para o geral, do concreto para o
abstrato. Em vez de exercitar a memória, deve o professor desenvolver o raciocínio.
O método intuitivo, embora tenha tido outras denominações, ficou mais conhecido
com o nome de Lições de Coisas. Sua aplicação nas escolas pressupunha uma
enorme quantidade e variedade de materiais didáticos. Como a aquisição desse
material, bem como do mobiliário, dos livros e demais utensílios fosse onerosa, os
grupos escolares ressentiam sua falta. É comum encontrar-se em relatórios de
inspetores escolares a queixa da ausência dos materiais e o pedido de que o Estado
providenciasse sua compra. Tal fato confirma que entre as propostas republicanas
paulistas para a instrução elementar e a sua realização havia uma grande distância.
(BUFFA e PINTO, 2002: 50)
Por sua vez, entende-se também que
É preciso notar que esse método de ensino simultâneo era proposto para substituir,
com enormes vantagens, tanto o todo tradicional individualizado das escolas de
primeiras letras quanto o do ensino mútuo lancasteriano. As classes homogêneas, o
regime seriado, a distribuição do programa detalhado por séries, os horários são
condição de possibilidade e, ao mesmo tempo, decorrências do emprego do método
intuitivo. (BUFFA e PINTO, 2002: 51)
Neste sentido, percebe-se que a metodologia se torna fundamental pois direciona o
processo de ensino-aprendizagem conforme regras que, supostamente, garantiriam o sucesso e
a eficácia da educação escolar. Os gestores buscavam formas capazes de levar o professor ao
bom andamento de um processo que buscava a excelência da prática, bem como a
racionalização dos processos pedagógicos.
O Decreto 1947 (30 de setembro de 1906) também estabelecia algumas
diretrizes detalhadas no tocante à metodologia de ensino, usada no transcorrer das aulas
ministradas no interior dos grupos escolares. O Decreto em questão determinava alguns
procedimentos considerados necessários para um bom andamento das aulas, no que se refere
principalmente a elementos práticos do cotidiano da sala de aula.
Por exemplo, no que se refere à disciplina Leitura, aconselhava-se a abordagem
imediata das combinações silábicas que davam origem ao vocábulo, relacionando a definição
expressa com as letras que a compõem. Por outro lado, aconselhava-se também respeitar a
relevância da seqüência do mais simples e singular para o mais complexo.
Em relação à disciplina Escrita, o Decreto trazia também diretrizes muito
específicas, esclarecendo até mesmo o material a ser utilizado nas primeiras aulas (ardósias ou
lápis e papel, em vez de pena) com a finalidade de facilitar a superação das dificuldades
motoras, bem como sugerindo amesmo o tipo de letra a ser usado pelo professor (vertical
redonda) na lousa.
128
a disciplina Língua Pátria é considerada pelo Decreto a que mais exige do
professor, no sentido de requerer zelo, cuidado e atenção com os pormenores com o ensino da
mesma. Em qualquer que seja o ambiente, em que a criança se encontra, é através do uso da
fala que se mede ou percebe o quanto o ensino da escola tem ou não ajudado em sua
formação.
Outra disciplina, também considerada fundamental pelo Decreto nº 1947, é a
Aritmética, a qual possui como finalidade oferecer aos alunos condições de realizar cálculos
na prática cotidiana, em suas atividades corriqueiras ou até mesmo na execução do trabalho.
Assim, valoriza-se muito o papel da memória no ensino do conhecimento da Matemática.
Por sua vez, Geografia deve ser ministrada, conforme os ditames do Decreto,
obedecendo ao raciocínio intuitivo que, necessariamente, regula-se sempre do conteúdo ou
objeto de estudo particular para outro de caráter universal ou geral. Além do mais, é
necessário que os alunos conheçam profundamente as principais definições do conhecimento
geográfico, a fim de garantir a evolução do seu processo de ensino-aprendizagem.
A História do Brasil tem o objetivo de familiarização dos alunos com os principais
acontecimentos do país, no decorrer de sua trajetória. Neste sentido, também o cuidado de
não somente narrar ou descrever os fatos em si, mas também promover o sentido de
patriotismo e de valor à nação. Nota-se o uso de compêndios apenas no terceiro ano.
O Decreto também contempla a necessidade de estimular a Instrução Moral e
Cívica, oportunizando a inculcação de bons hábitos e costumes, bem como o cumprimento do
dever. Assim, haveria a contribuição para a formação pessoal do aluno, dirigindo-o no sentido
de obter um significação em termos de comportamento, diante de si, do outro, bem como da
sociedade onde se encontra.
Por outro lado, a Geometria e Desenho seriam úteis, no sentido de promover
capacidade criativa e associativa do aluno, ressaltando a oportunidade de relacionar formas
com objetos materiais, além de estimular a reprodução dos objetos através da arte do desenho.
em relação à História Natural, Física e Higiene, aproveita-se a oportunidade
para oferecer aos alunos conceitos básicos em relação ao seu próprio corpo, além de conhecer
também os animais que o cerca, bem como ajudá-lo a consolidar um vocabulário a fim de
proporcionar uma exposição clara de suas próprias idéias.
Os Exercícios Físicos também são vistos como uma possibilidade de estimular os
alunos a conhecerem seu próprio corpo, aprimorando seu desenvolvimento físico.
Nesta perspectiva, também o destaque para a disciplina em torno da realização
de Trabalhos Manuais, que buscam oferecer aos alunos a oportunidade de aprimorarem sua
129
autonomia frente às diversas tarefas práticas, inclusive as domésticas (no caso das meninas).
Como não podia ser diferente, o Decreto n.º 1947 reserva um destaque especial para as
meninas, neste aspecto, ao expressar a necessidade delas, logo cedo, acostumarem-se com o
manuseio de utensílios domésticos.
Em relação aos meninos, os Trabalhos Manuais são muito importantes no que se
referem à questão do ofício material, possibilitando o próprio desenvolvimento da capacidade
motora e de adaptação aos recursos materiais disponíveis em sua realidade de trabalho. Neste
sentido, a formação para a execução do trabalho é destacada.
Por conseguinte, também a disponibilização de uma disciplina voltada para as
artes musicais, em específico o Canto, ensinada em horários também pré-determinados e
oferecida para todos os alunos do grupo escolar simultaneamente. Importante também é
salientar que a disciplina é de responsabilidade, segundo o Decreto n.º 1947, de um artista
especial.
E, por fim, o texto do Decreto também determina que determinadas disciplinas
(Geografia, História do Brasil, História Natural, Física, etc.), ao serem ministradas, deverão
ser demonstradas através de objetos específicos de que se tratam os conteúdos lecionados. Por
isso, é fundamental a implementação de um Museu Escolar, com o intuito de demonstração
prática dos conteúdos específicos em aula.
A Reforma João Pinheiro (1906), por outro lado, também expõe detalhadamente
os programas oficiais de cada disciplina a ser ministrada durante todos os anos em que a
mesma for oferecida ou constar no currículo escolar.
Assim, nesta regulamentação são citados minuciosamente todos os assuntos e
temas a serem abordados durante os diversos anos em que são ministrados, como alguns
procedimento práticos e didáticos, por semestre.
Neste sentido, temos como um exemplo dessa organização, o programa da
disciplina Leitura, em seu primeiro ano, nos grupos escolares, no quadro 05.
Percebe-se que as reformas propostas por João Pinheiro, em seu mandato, refletem
o desejo de modernização do ensino público, sobretudo primário e normal, com o intuito de
aprimorar o desenvolvimento da educação escolar. Neste sentido, a presença de um currículo
prescrito seria considerado importante e necessário para a consecução de um modelo escolar
aliado aos interesses de implantação de uma nova ordem social, capaz de trazer
desenvolvimento e aperfeiçoamento intelectual, moral e físico para a população.
130
Quadro 05 – Programa de ensino da disciplina de Leitura (1.º ANO)
Lei n.º 439 (28 de setembro de 1906)
PRIMEIRO SEMESTRE
SEGUNDO SEMESTRE
PRIMEIRO
ANO
Leitura de vocábulos, no quadro negro, a princípio
pouco extensos e de fácil decomposição em sílabas
simples, depois mais longos e mais difíceis. Os sons
de mais de uma representação serão dados em último
lugar. Leitura de monossilábicos que se prestam à
formação de frases, com as palavras estudadas. Ler,
no quadro negrão, vocábulos novos formados pela
combinação das sílabas em que se decompõem os
estudados. Exercícios de letras maiúsculas com
palavras formadas pela mesma combinação.
Recapitulação, substituindo as letras manuscritas por
impressas. Abecedário: conhecimento das letras
minúsculas e maiúsculas, impressas e manuscritas.
Leitura, em livro próprio, de historietas
e máximas, cuja composição dever ser
de sentenças curtas, onde os alunos se
exercitam nas pausas da pontuação.
Explicitação do significado das
apalavras de cada trecho lido. Nota:
neste período, o aluno deve ter
concluído o livro adotado.
Fonte: MOURÃO, 1962: 144 – 5.
As atividades pedagógicas eram centradas na figura do professor, demonstrando
uma postura centralizadora na autoridade do mesmo. O professor, por sua vez, deveria
obedecer aos procedimentos impostos pelo governo, e fiscalizado pelo diretor do grupo, bem
como pelo inspetor escolar. As atividades escolares se expressam em torno da predominância
de aulas expositivas, com uma disciplina rígida, e com longas lições embasadas no processo
de memorização e repetição de lições.
Contudo, ao mesmo tempo em que esses documentos legais são importantes no
sentido de promoverem uma padronização dos conteúdos a serem lecionados nos grupos
escolares, bem como os procedimentos didáticos e os temas / assuntos de cada semestre, por
disciplina, são dispositivos que impedem a autonomia do professor em sala de aula. Este se
obrigado a seguir, de forma mecanizada e passiva, todos os conteúdos, programas e
procedimentos impostos pela legislação. Inclusive, suas ações, resultados e até mesmo sua
performance como profissional sempre são alvos de fiscalização por parte dos serviços de
inspetoria, realizados de forma contínua e periodicamente.
As demais regulamentações acerca da Reforma João Pinheiro (Lei n.º 439 de 28 de
setembro de 1906) se encontram descritas no Decreto n.º 1960 de 16 de dezembro de 1906. o
Decreto possui a intenção de dar as minúcias em torno dos procedimentos em torno da
efetivação e da manutenção do ensino, sobretudo primário.
Com a intenção de promover a reforma do ensino, o governo de João Pinheiro, no
que se refere aos procedimentos pedagógicos, por mais simples que sejam, são controlados
131
pela máquina estatal, buscando a preservação dos saberes e práticas no âmbito dos grupos
escolares. Sua atuação, enquanto gestor das questões ligadas à escolarização, são expressões
de uma tendência de centralização do processo civilizatório, marca evidente do processo de
escolarização levado adiante em seu governo.
Por outro lado, percebe-se também que, apesar dos esforços do governo João
Pinheiro e de seus sucessores, a realidade em que os grupos escolares, bem como as escolas
singulares são criados e implantados num contexto em que nem sempre é possível,
efetivamente, colocar em prática o que é proposto pelos ditames legais. Um dos problemas
mais sérios, como consta em depoimentos e relatórios, é o caso da falta de material
pedagógico adequado para a realização dos conteúdos sugeridos. O grupo escolar, na maioria
dos casos, não possuía todos os materiais pedagógicos previstos em lei, restringindo-se ao uso
do caderno, lápis, borracha, caneta tinteiro, pena, tinta, quadro-negro e giz. É comum
observar, nos gastos relatados na caixa escolar, despesas com esses tipos de materiais
didáticos.
Até o início da década de 1920, não existiam os Compêndios para a realização das
atividades de Leitura em sala de aula, para as salas de segundo, terceiro e quarto anos do
grupo escolar. Por isso, o diretor usou o livro Cultura de Campos, de Assis Brazil, o único
livro existente no grupo escolar Honorato Borges, e para o primeiro ano, usava-se a cartilha
de Hilário, também o único disponível para venda na cidade. Neste sentido, o material
pedagógico era improvisado muitas vezes através de álbuns, quadros e outros materiais
confeccionados pelos professores, bem como o uso de mapas cedidos pela Secretaria dos
Negócios do Interior.
Enfim, após a Reforma de João Pinheiro (1906), em outros governos estaduais,
inúmeras outras providências foram tomadas no sentido de aprimorar e expandir inclusive
quantitativamente a rede escolar de ensino do Estado. Além do mais, foram promulgadas
outras leis referentes ao ensino primário e ensino normal, além de dispositivos em torno da
organização dos conteúdos curriculares. Contudo, todas elas têm como inspiração os moldes
empreendidos pelo pioneirismo da Reforma João Pinheiro (1906), bem como pelas suas
regulamentações. O ensino público, em Minas Gerais, tem como fundamentação curricular e
pedagógica a Reforma de João Pinheiro, cujo maior destaque é a implantação dos grupos
escolares como modelo escolar característico do republicanismo no Brasil.
Dessa maneira, a organização do tempo escolar, bem como o currículo proposto
pelo Estado, representam a tentativa de racionalização dos procedimentos praticados no
processo de ensino-aprendizagem no âmbito da rede oficial de ensino. Com isso, também os
132
grupos escolares como o Honorato Borges tinham o dever de colocar em prática sobretudo o
currículo proposto pelas regulamentações do ensino primário.
A abordagem do currículo prescrito foi fundamental nesse estudo, pois reflete a
tentativa de compreensão dos conhecimentos propostos pelo governo em sua racionalização
do ensino primário. A centralização em torno de um currículo oficial possibilitava a
construção de um modelo considerado importante e fundamental na construção de uma escola
realmente preparada e adequada para as novas exigências do mundo e da realidade social.
Sendo integrante da rede oficial de ensino primário do Estado de Minas Gerais, o
Grupo Escolar Honorato Borges deve assimilar o currículo prescrito pela reforma João
Pinheiro. Contudo, todo processo de assimilação de um currículo oficial ou prescrito
pressupõe também um currículo em ação, restrito ao âmbito de cada escola. A representação
escolar pode ser considerado um misto de assimilação e negação das propostas inovadores. A
escola constitui, simultaneamente, expressão de uma tradição enraizada, bem como uma
renovação dos processos pedagógicos postos em prática em sua internalidade.
3.4. Corpo docente e corpo discente: perfil e identidade
A efetivação do processo de escolarização pelo qual o Estado de Minas Gerais,
bem como em suas cidades, dependia de um fato fundamental: a participação dos sujeitos
mais destacados e envolvidos em toda e qualquer vida escolar – seus mestres e alunos.
Assim, todas as medidas administrativas, como os pressupostos filosóficos em
torno da educação, dependiam de como os sujeitos sociais se posicionavam frente às questões
impostas pela escolarização, inserida no contexto da cidade.
A Primeira República, mesmo que ainda de forma precária, implementa, em
Estados como São Paulo e Minas Gerais, um processo de escolarização voltada para a
modernização do ensino público, sobretudo o primário.
A implantação dos grupos escolares, de certa forma, irá contribuir também para
uma mudança no perfil dos mestres e dos alunos, estes envoltos pela cultura comprometida
com a efetivação de reformas sociais, desejadas pelos governos republicanos e responsáveis
pela solidificação de uma nova ordem social.
Assim, quanto ao corpo docente, a maioria é composta por mulheres que assumem
as salas de aulas. A profissão do magistério, com a implantação dos grupos escolares, passa a
ser visualizado como uma oportunidade aceitável de profissionalização das mulheres, sendo
talvez a única profissão feminina reconhecida como valorosa pela sociedade. Por outro lado,
133
acreditava-se também que, ao atuar como professoras, as mulheres poderiam contribuir
efetivamente para a consolidação da identidade do povo e da pátria brasileira. Neste sentido,
[...] variados eram os atributos que possibilitavam identificar uma “boa professora”.
Dentre aqueles encontrados nos relatórios de inspetores e diretoras, podemos
destacar: desembaraçada, estudiosa, escrupulosa, assídua, cumpridora de seus
deveres, bem preparada, pontual, inteligente, delicada, bondosa para com os alunos,
trabalhadora, esforçada, caprichosa, bem preparada e conhecedora de todo o
maquinismo escolar; tem, também, vocação para o magistério, aptidão didática e
energia. Em número bem menor, encontramos aquelas características imputadas às
professoras consideradas como o-preparadas: é acanhada, é prolixa, é fraca
intelectualmente, sem prática e sem energia. Além disso, o tem aptidão para o
magistério, falta-lhe vivacidade, amor à profissão e ao cumprimento dos deveres.
(FARIA FILHO, 2000: 124)
O processo de racionalização e modernização pelo qual passara o processo de
escolarização, no decorrer da Primeira República, pressupunha a regulamentação também da
profissão do magistério, a qual se caracterizava, neste sentido, pelo estabelecimento de uma
divisão e controle do exercício profissional. Por outro lado, percebe-se também que fatores
como os baixos salários e o aumento da oferta de outras funções para os homens acabou
afastando os mesmos do magistério no ensino primário. A presença maciça de mulheres no
ensino primário, configurava também, como uma maneira de estabelecer um elo entre o lar, a
família e a escola. Contudo, nota-se que a criação dos grupos escolares trouxe também
consigo uma nova divisão do trabalho escolar, com a presença de uma equipe de
profissionais, homens e mulheres. Assim,
A implantação da escola graduada implicou um duplo processo de redistribuição do
poder na organização escolar. Externamente, tomou melhor forma o serviço de
inspeção escolar, condicionando o funcionamento dos grupos escolares.
Internamente, a redistribuição do poder implicou o estabelecimento de papéis e
regulamentação da vida cotidiana dos diferentes grupos ali existentes: diretor,
professores, alunos, serventes, porteiro. (SOUZA, 1998: 82)
No Estado de Minas Gerais, o Regulamento do Ensino Normal e o Regulamento
do Ensino Primário foram aprovados pelo Decreto n.º 1960 de 16 de dezembro de 1906.
Assim, em seus textos, determinava a seguinte tabela de vencimentos para os profissionais do
ensino primário, vigente em todo o Estado.
134
Tabela 03 – Tabela de vencimentos (Reforma João Pinheiro)
Decreto n.º 1960 (16 de dezembro de 1906)
PROFESSORES PRIMÁRIOS EFETIVOS:
SALÁRIOS:
Colônia 1:200$000
Distrito 1:400$000
Cidade ou Capital 1:800$000
Grupo Escolar de Cidade 1:800$000
Grupo Escolar da Capital 2:000$000
Diretor de Grupo Escolar da Cidade 3:000$000
Diretor de Grupo Escolar da Capital 3:600$000
Porteiro de Grupos Escolares 960$000
Servente de Grupos Escolares 760$000
Professores Técnicos 3:600$000
Auxiliares de Escolas Isoladas 600$000
Fonte: MOURÃO, 1962: 158 – 9.
Aos diretores dos grupos escolares cabiam as seguintes funções: executar as
matrículas dos alunos interessados em ingressar no grupo; fiscalizar as atividades
desenvolvidas no âmbito escolar; servir de intermédio com as demais autoridades de ensino,
bem como a comunidade em geral, em especial os pais dos alunos; responsabilizar-se pela
escrituração e condução da “caixa escolar”; organizar e administrar as questões referentes ao
pessoal e questões disciplinares do corpo docente, bem como a organização da folha de
pagamento, encaminhada ao governo estadual para sua efetuação; supervisar todos os livros
de ponto, diários, boletins e demais documentos elaborados em relação ao cotidiano das
práticas escolares; dentre outras funções.
O primeiro diretor empossado (Livro “Termo de Posse”, página 2, 08 de julho de
1913) do Grupo Escolar Honorato Borges foi Professor Modesto de Mello Ribeiro, nascido
em Patrocínio a 08 de agosto de 1871 e formado professor na Escola Normal de Uberaba.
Residiu em Patos de Minas, cidade onde lecionou na primeira escola pública da cidade,
situada na esquina da Rua Alfredo Borges com Teófilo Otoni. Casou-se com D. Honorina,
filha do Capitão João Gualberto de Amorim.
Dois anos após sua posse, como diretor do Grupo Escolar Honorato Borges,
Professor Modesto voltou a Patos de Minas, onde inaugura o primeiro Grupo Escolar da
cidade, o Grupo Escolar Dr. Marcolino de Barros, sendo diretor do mesmo até sua
aposentadoria em 1927.
135
Figura 12 – Folheto comemorativo do Centenário de Nascimento do
Professor Modesto (08/08/1871 – 08/08/1971).
(Acervo da Escola Municipal Honorato Borges.)
136
Tido como homem de admirável saber erudito, amante das belas artes,
homenageou grandes nomes da história da arte, dando nomes aos seus filhos: Cícero, orador e
político romano; Cecília, padroeira dos músicos e Rubens, renomado pintor flamengo. Morreu
aos 21 de setembro de 1928.
A presença do Professor Modesto como primeiro diretor empossado do Grupo
Escolar Honorato Borges foi fundamental para a implementação do mesmo na cidade de
Patrocínio. O grupo escolar, ainda em fase de implantação, necessitava de uma pessoa
experiente e capacitada para a sua consecução. Assim, vale afirmar que sua ação se
demonstrou no sentido de proporcionar as condições técnicas, administrativas e pedagógicas
para o funcionamento do Grupo Escolar Honorato Borges.
O diretor é uma nova função no interior do grupo escolar. Assume um papel
central nos rumos da estrutura hierárquica e burocrática, dinamizada a partir da
implementação dos grupos escolares em diversas partes do país, em especial nos Estados de
São Paulo e Minas Gerais. Possui o cargo, que é responsável pela intermediação entre a
escolar e o governo estadual, respondendo de forma imediata aos problemas e questões
internas do grupo escolar. A implantação da função ou cargo de diretor está diretamente
relacionada ao processo de racionalização do ensino primário. No quadro a seguir, vem a
descrição dos diretores empossados no Grupo Escolares Honorato Borges, no âmbito da sua
criação, em 1912, até o término da construção do novo prédio, em 1930.
Quadro 06 – Diretores empossados Grupo Escolar Honorato Borges (1912 – 1930)
DIRETOR(A) EMPOSSADO(A):
PERÍODOS DE ATUAÇÃO:
Modesto de Mello Ribeiro 08/07/1913 a 10/01/1917
Leonides de Mello Ribeiro 11/01/1917 a 14/01/1919
Amélia Angélica do Nascimento 15/01/1919 a 18/03/1919
01/09/1923 a 02/10/1923
08/11/1926 a 07/11/1927
03/02/1933 a 07/07/1933
Américo Machado 19/03/1919 a 31/03/1919
Alberto da Costa Matos 01/04/1919 a 11/09/1919
Olympio de Moraes 12/09/1919 a 30/08/1923
Vitalino Martins da Silva 03/10/1923 a 07/11/1926
08/07/1933 a 07/07/1935
José Fábio Vilhena 08/11/1927 a 13/08/1928
Francisco Emiliano Araújo 14/08/1928 a 11/11/1928
Mário Rebello 12/11/1928 a 03/07/1930
Lucas Tavares de Lacerda Filho 04/07/1930 a 13/09/1931
Fonte: Livro “Termo de Posse” – Escola Municipal Honorato Borges
137
Por sua vez, os professores regentes de turmas do grupo escolar tinham por
funções primordiais: manter a ordem de entrada dos alunos em classe e a sua permanente
distribuição; obedecer às diretrizes do programa de ensino primário, estabelecido pelo
governo estadual; zelar pela disciplina durante as aulas; fiscalizar os alunos na prática de
exercícios, bem como durante as aulas de ginástica; dentre outras funções burocráticas, como
a escrituração de diários de classe.
A primeira professora formada a lecionar em Patrocínio – M. G. e a ser nomeada
para o exercício do magistério no Grupo Escolar Honorato Borges é Amélia Angélica do
Nascimento. Nascida em Paracatu, no dia 21 de dezembro de 1876. Morreu no dia 17 de
setembro de 1954, em Belo Horizonte, para onde se transferiu em 1937. Seus pais eram de
origem baiana e se chamavam Bernardino Dias do Nascimento e D. Maria Angélica do
Nascimento. Inclusive, sua mãe era descendente de Mem de Sá, do qual usava o sobrenome.
Sua formação como professora foi realizada na Escolar Normal de Paracatu,
muito famosa na época. Casou-se com a idade de 22 anos, com o professor Leovigildo de
Paula e Sousa. Mudou-se logo em seguida para Patrocínio, onde começa a dar aulas
particulares. Ao ser instalado o Grupo Escolar Honorato Borges, recebe o convite para
lecionar no mesmo, por indicação do Coronel Honorato Borges. E, depois disso, leciona no
grupo escolar, sendo também diretora interina por quatro vezes, até se aposentar.
Demonstrou-se ser professora de alto reconhecimento por parte da população por
sua cultura e conhecimento. Muito admirada pelos seus trabalhos literários, colaborou com a
imprensa de Araguari e de Patrocínio, através de artigos, poesias, além de dedicar-se à arte da
flauta. Por ocasião da morte de sua filha, Dulce, escreveu o seguinte soneto:
RECUERDO DULCE
(Acervo da Escola Municipal Honorato Borges)
Quando eu cismo na enorme desventura
que me alanceia a alma e me definha,
e na intensa aflição dessa amargura
fico a pensar em ti, triste e sozinha...
Como em prisma fugaz se me afigura
que a tua pulcra imagem se avizinha,
e a luz do teu olhar – tão doce e pura
julgo ver, nessa louca ilusão minha.
Sinto aos olhos subir amargo pranto
nesse martírio imenso, sofro tanto
quanto sofreu o Cristo lá no horto.
Nem sei mesmo se vivo nesse instante...
em que – ao peso dessa dor possante –
sinto o tédio, a descrença, o desconforto...
Amélia Angélica do Nascimento
Patrocínio, julho de 1914.
138
Por ter sido uma das professoras que por mais tempo permaneceu no Grupo
Escolar, em seus primeiros anos de funcionamento, sua atuação foi de fundamental
importância para a organização do ensino público em Patrocínio – M. G..
A presença de uma professora normalista na cidade e a sua atuação no Grupo
Escolar contribuiram enormemente para a consecução do projeto local de estabelecer uma
escola pública na cidade. Sua formação e sua experiência foram imprescindíveis para o Grupo
Escolar Honorato Borges, em seus primeiros anos de funcionamento.
Por sua vez, a segunda professora a ser nomeada, para atuar no Grupo Escolar
Honorato Borges, é Letícia de Faria Machado. Atuou, assim como Amélia Angélica do
Nascimento, na fundação do mesmo, ajudando a instalá-lo como estabelecimento de ensino da
rede oficial. Morreu em 1921, quando tinha apenas vinte e cinco anos de idade, vítima de um
disparo de arma de fogo.
Muitos professores foram nomeados para exercerem seus cargos no Grupo
Escolar, conforme consta o Livre “Termo de Posse”. Seguindo a tendência nacional e
estadual, ou seja, no ensino primário é preponderante a presença feminina no magistério, a
maior parte dos professores nomeados para o Grupo Escolar Honorato Borges são mulheres.
Do total de vinte e oito professores, nomeados no período de 1912 a 1930,
somente quatro são homens. Em outras palavras, Patrocínio acompanha a tendência de
feminização do magistério, notável na Primeira República. A seguir, relação dos
professores que atuaram no Grupo Escolar Honorato Borges, desde sua criação (1912) até o
término da construção do prédio atual (1930).
Quadro 07 – Professores nomeados para o Grupo Escolar Honorato Borges
(Período de 1912 – 1930)
1. Amélia Angélica do Nascimento 15. Alice de Melo Ribeiro
2. Letícia Marra 16. Circe Borges
3. Nestório de Paula Ribeiro 17. Adolina Oliveira
4. João Gualberto de Aguiar 18. Benedita Ribeiro
5. Julieta de Castro 19. Benilde Amaral
6. Amélia Augusta Alves 20. Amélia Dias
7. Teodora de Castro 21. Carmem de Paula
8. Felipe Rodrigues Corrêa 22. Ana Maria Laguardia
9. Beneventura Amélia Ferreira 23. Maria Josefina Pinheiro de M. Castro
10. Escolástica da Conceição Vilhena 24. Olegário Pinheiro de Azevedo
11. Geny Amaral 25. Alcina Maria da Cunha
12. Judite de Paula Rocha 26. Nísia Maria da Cunha
13. Jeny de Paula Rocha 27. Amélia Borges
14. Vera de Paula Rocha 28. Olga Guimarães Pereira Borges
Fonte: Livro “Termo de Posse”
139
Figura 13 –
Professora Amélia Angélica do Nascimento.
(s/ data – Acervo da Escola Municipal Honorato Borges.)
Figura 14 –
Professora Letícia de Faria Machado, 1914.
(Acervo da Escola Municipal Honorato Borge
s)
140
Assim, o Grupo Escolar Honorato Borges veio se consolidando como único
estabelecimento de ensino público primário da cidade, através da atuação de seus diretores,
professores e sucessão de alunos que freqüentaram seus bancos escolares.
No que se refere aos sujeitos sociais, diretamente envolvidos nos trabalhos
escolares, indubitavelmente, os alunos são considerados os sujeitos mais importantes, pois
representavam a personificação dos valores enraizados na pessoa humana em formação.
Assim, todas as práticas e saberes escolares visavam o aluno, no sentido de colocar em prática
as ações pedagógicas. Por isso,
A marca desse esforço pode ser encontrada, a um só tempo, nas tentativas, nos
sucessos e nos fracassos de se produzir uma homogeneização, uma uniformização e
um maior controle das crianças e na pretensão de estender essa racionalidade para o
terreno da produção e da apropriação/aprendizagem dos conhecimentos
escolarizados. É preciso perceber também que, se a nova ordem escolar
desdobrava-se, no interior da sala de aula, numa busca por produzir a
homogeneidade, a uniformidade realiza-se também como trabalho de classificação
(por idade, gênero, “adiantamento”, dentre outros) e de controle, ou seja, de
disciplinamento, dos alunos e demais sujeitos da educação. (FARIA FILHO, 2000:
152)
Além do mais, o processo de modernização levado a cabo pelo governo estadual
objetivava a disciplinarização, a homogeneização dos comportamentos dos alunos no interior
da escola, demonstrando a intenção de promover o controle efetivo sobre o comportamento
social. A base do trabalho pedagógico, aos poucos, era transformada de uma postura
magistrocêntrica para uma outra pedocêntrica, centralizando na criança as atividades
pedagógicas. Assim,
Quanto ao papel e ao estatuto dos alunos no interior da instituição escolar, estamos
assistindo aqui não apenas à afirmação de uma forma nunca antes vista da
centralidade das atividades deste para a aprendizagem dos conhecimentos
escolarizados, mas, sobretudo, conforme vimos, à instituição definitiva do “aluno”
como categoria central nas representações e nas práticas pedagógicas escolares.
(FARIA FILHO, 2000: 166 – 167)
O aluno era visto como um sujeito capaz de aprendizagem, mas através de um
rígido controle disciplinar de seu comportamento. A disciplina dos corpos e das mentes era
fundamental para um processo de ensino-aprendizagem ser considerado eficaz na sua
principal finalidade: formação intelectual, moral e física.
Por isso, conforme afirmou Leôncio Afonso da Silva, “a disciplina era enérgica,
professores e diretores eram muito autoritários, exigiam respeito e obediência, caso contrário
ficava-se de joelhos em cima de grãos de milho ou ganhava-se “reguadas””. Em outros
141
momentos, referindo-se, por exemplo, às visitas do inspetores escolares, assim expressou:
“quando chegavam, andavam em todas as salas de aula, e os alunos deviam ficar em ,
alinhados, e às vezes, dar conta de alguma matéria, tipo tabuada, para provar que os
professores estavam trabalhando bem”. Afirmou também que muitos dos alunos do Grupo
Escolar Honorato Borges continuavam seus estudos no “[...] Colégio Dom Lustosa. Seu
diretor era o Padre Matias, que conseguiu na época, trazer o Tiro de Guerra para Patrocínio.
Então, neste tempo, todas as instruções do Tiro de Guerra funcionavam no Colégio Dom
Lustosa. A nossa farda era amarela.” (Depoimentos concedidos por Leôncio Afonso da Silva
em 2006, ex-aluno do grupo escolar e formando de 1930).
Por outro lado, ao se referir aos alunos do Grupo Escolar Honorato Borges, d.
Geralda Pereira afirmou que “o aluno da escola “Honorato Borgesera menino(a) de classe
média, poucos de classe alta e a maioria pobres, da caixa escolar”. Por outro lado, afirmou
também que o maior objetivo dos estudos na escola era alfabetizar e formar pessoas
honestas, felizes e cidadãos dignos”. Quanto ao prosseguimento dos estudos, após o término
do ensino primário, disse que “os ex-alunos que tinham recursos, davam continuidade aos
estudos nas capitais, especialmente B. H.. Tivemos muitos advogados, médicos, dentistas,
engenheiros, comerciantes abastados e outras profissões como marceneiros, pintores,
pedreiros, etc. ex-alunos da escola Honorato Borges, que até sobressaíram em cargos elevados
da política mineira, como os Tavares”. (Depoimentos concedidos por d. Geralda Pereira em
2006, ex-aluna do Grupo Escolar no período de 1923 a 1926)
Quadro 08 – Formandos do Grupo Escolar Honorato Borges – 1930
1. Gulherme de Almeida – Inspetor Escolar
FILA DO MEIO – DA DIREITA PARA ESQUERDA
2. Lucas Tavares de Lacerda Filho – Diretor 1. Francisco Xavier
3. Padre Agostinho Velsen – Homenagen 2. Moacir Barbosa
4. Dona Geny de Paula Rocha – Professora 3. Aldo Chaves
5. Luzia de Oliveira – Oradora 4. Inácio Afonso da Silva
6. Cel. “Honorato Borges” – no Centro
DA DIREITA PARA ESQUERDA – 3.ª FILA
7. Darci Luzia 1. Hilton Gonçalves Dias
8. Laurinda Barbosa 2. José Pessoa Marra
9. Dulce Chaves de Oliveira 3. José Lopes Fernandes
10. Clarice Afonso da Silva 4. Menésio de Oliveira
DA DIREITA PARA ESQUERDA – 1.ª FILA
5. Tobias Alves Machado
1. Benedita Rosalina 6. Sebastião Roque da Silva Filho
2. Maria Mansur 7. Leôncio Afonso da Silva
3. Geraldo Maria Rodrigues 8. Dário de Faria Tavares
4. Amélia de Castro 9. Geraldo Benedito
5. Floripes Ribeiro
6. Grasiela Machado
7. Julia de Jesus
8. Violeta Marques
9. Maria Fernandes de Oliveira
Fonte: RIBEIRO e NASCIMENTO, 2002: 54.
142
Figura 15 – Foto turma formandos 1930.
(Propriedade: Leôncio Afonso da Silva)
143
3.5. Considerações Parciais
O projeto de modernização da educação em Minas Gerais, implantado na Primeira
República, tem o intuito de promover uma reforma na rede escolar e, simultaneamente,
promover uma série de medidas administrativas, estratégicas para o desenvolvimento de todo
o Estado e situá-lo nos rumos do aperfeiçoamento em diversos sentidos, sobretudo intelectual,
político e social.
O governo estadual, sobretudo através da Reforma João Pinheiro, procura
promover a racionalização e a organização do ensino, buscando a superação de males como o
elevado índice de analfabetismo mineiro, bem como superar a desestruturação da rede oficial
de ensino. Isso se justifica pelo fato de acreditarem ser a escola um importante meio ou
instrumento capaz de auxiliar a sociedade na busca do progresso cultural. A racionalização do
ensino segue a tendência empreendida com o intuito de reformar a estrutura escolar e a
instituição do ensino.
Todo esse processo de reorganização do ensino primário e o desejo de ampliar a
rede de ensino primário também quantitativamente têm repercussão no município e na cidade
de Patrocínio. A oligarquia rural local, à frente do poder político, também buscará, em
consonância com os interesses propagados pelo P. R. M. (Partido Republicano Mineiro), a
racionalização do ensino público oferecido na cidade de Patrocínio. Além de ver a
possibilidade de possuir uma escola da rede pública de ensino implantada na cidade, viam
também na mesma a possibilidade de consolidar seu prestígio político frente à população local
e aos aliados políticos da região e do estado. Quanto mais conquistas políticas a oligarquia
local (chefiada pelo Coronel Honorato Martins Borges) obtivesse, maior seria o
reconhecimento e o prestígio político dos mesmos.
A cidade também se encontrava, no início da República Velha, nas mesmas
condições precárias que várias outras cidades mineiras. Inexistência de escolas públicas, ruas
mal planejadas e de terras, enfim, a infra-estrutura urbana ainda se demonstrava muito
precária e sofrível. As escolas que aentão existiam na cidade eram particulares, isoladas e
não tinham as mínimas condições de atender à demanda de ensino da cidade. Por isso, muitas
crianças apenas estudavam em casa, com preceptores e somente em famílias com melhores
condições econômicas e um poder aquisitivo capaz de proporcionar tal benefício. Outras,
ainda, freqüentavam escolas mantidas por professores, os quais abriam escolas em suas
próprias residências, normalmente em ambientes muito insalubres, impróprios para a
execução de atividades de ensino.
144
Com a Reforma de Ensino implantada por João Pinheiro (1906), no que diz
respeito à implantação dos modelos de origem francesa baseados nos grupos escolares, a elite
política patrocinense teve a oportunidade de requerer junto ao governo estadual a criação de
uma escola pública na cidade de Patrocínio. Isso foi possível devido aos interesses locais na
implementação de uma escola que oferecesse condições de ensino para os filhos da elite local,
primordialmente. Percebe-se que a obtenção de favores políticos como a criação de um grupo
escolar está intimamente ligada ainda ao modelo coronelista, tão evidente nas cidades
mineiras. Favores são concedidos em troca de apoio político, com a intenção de fortalecer as
bases locais do governo estadual.
Os políticos locais (liderados pelo então Coronel Honorato Martins Borges)
empreenderam uma série de medidas com a intenção de buscar as condições necessárias para
a criação e a implantação de um Grupo Escolar na cidade. Através desta conquista,
acreditava-se ser possível dar início à tentativa de se organizar o ensino primário oferecido na
cidade, dando feições mais consolidadas ao ensino primário.
Com a aquisição pelo poder público de um casarão situado no Largo da Matriz,
criação do Grupo Escolar Honorato Borges, em 1912. Como as reformas do casarão e sua
conseqüente adequação para um prédio escolar ainda não tinham condições de serem
realizadas, devido às escassas verbas do município, somente depois de dois anos, em 1914, o
Grupo Escolar entra em funcionamento. Todo esse longo espaço de tempo entre a criação e a
implantação do grupo escolar em Patrocínio demonstra que, apesar do desejo do projeto
republicano de empreender a expansão da rede oficial de ensino primário, as condições
materiais para isso ainda não são suficientes para o atendimento a todas as cidades do estado
mineiro. Ou, pelo menos, seguem parâmetros que não condizem com o interesse de todos
aqueles ligados aos processos ou interesses políticos.
O Grupo Escolar Honorato Borges se torna importante ponto de referência em
relação à educação escolar na cidade de Patrocínio. Seguindo as normatizações prescritas pelo
governo estadual, estabelece todo um trabalho pedagógico organizado, conforme uma rígida
divisão do tempo escolar, no tocante às diversas atividades pedagógicas desenvolvidas em seu
interior, bem como referentes aos conteúdos ministrados, consolidando um currículo. A
presença física, não ideal, de um Grupo Escolar na cidade representa também a
materialização de toda uma concepção maior de sociedade, proposta pelo republicanismo. O
Grupo Escolar é expressão visível de uma nova ordem a ser estabelecida na sociedade, como
parte de um projeto civilizatório. Mesmo assim, evidentemente, na prática, rios problemas
continuam a existir em relação ao ensino público. Assim como várias outras cidades do
145
interior mineiro, Patrocínio era uma cidade pequena e desprovida de muitos serviços públicos
básicos, importantes para consolidarem o processo de urbanização, ligados ao processo
nacional de mudança no modelo econômico, assumindo aos poucos o modelo urbano-
industrial.
Durante as três primeiras décadas do século XX, o problema da demanda escolar
se torna evidente não a nível nacional, mas também na própria cidade de Patrocínio. Além
disso, o prédio do Grupo Escolar implantado em 1914 passa a apresentar rios problemas de
infra-estrutura, não mais atendendo de forma satisfatória as condições necessárias para um
sólido processo de ensino-aprendizagem. Por isso, em meio a diversas necessidades públicas,
a imprensa local, sobretudo o jornal “CIDADE DO PATROCÍNIO”, passa a manifestar-se em
favor da urgência da solução dos problemas de infra-estrutura do prédio do Grupo Escolar
Honorato Borges. Num novo movimento de discursos publicados e reivindicações, a elite
política local solicita ao governo estadual a construção de um novo prédio para o
funcionamento do Grupo Escolar, com o intuito de melhorar as condições físicas e espaciais
do Grupo Escolar.
Após a visita à cidade do então Secretário dos Negócios do Interior, Francisco
Campos, em 1927, percebe-se a possibilidade de finalmente a construção do novo prédio para
o Grupo Escolar ser viabilizada. Então, a partir de 1928, -se início à construção do novo
prédio do Grupo Escolar, situado na Praça Rio Branco (atual Praça Honorato Borges). A obra
tem seu término em 1930, quando o Grupo passa a funcionar nas novas dependências.
A trajetória da criação, da implantação e da construção do novo prédio do Grupo
Escolar Honorato Borges em Patrocínio coincide com o movimento de reformulação do
ensino primário público do Estado de Minas Gerais, levado adiante, sobretudo a partir do
governo de João Pinheiro.
Toda a organização do tempo escolar, atividades pedagógicas e o currículo
prescrito pela reforma estadual empreendida por João Pinheiro o assumidos como modelo
para a consecução de nova racionalização do ensino, tentando superar a lastimável situação
prévia.
O Grupo Escolar também atrai professores de outras cidades vizinhas, formando
em Escolas Normais da região, como Uberaba e Paracatu. A presença destes profissionais, na
cidade, também se mostrará de fundamental importância para a consecução do projeto de
racionalização e organização do ensino público na cidade.
Todos esses elementos tomados em conjunto acabaram formando a possibilidade
de acontecer em Patrocínio também uma tentativa de racionalização do ensino: a criação e a
146
implantação de um Grupo Escolar, concernente ao projeto republicano estadual de
reformulação da rede escolar, como modelos distributivos de tempo dedicado às atividades
pedagógicas, com currículo prescrito, organização predial diferenciada, divisão por séries,
bem como a contratação de professores normalistas para o desempenho das atividades do
magistério; também a figura do diretor, responsável pela administração escolar e professor
responsável pelo intermédio entre a escola e o Estado; e agora, percebe-se o trabalho de
inspetoria escolar, com a intenção de fiscalizar os processos ligados ao processo de ensino-
aprendizagem levado adiante no interior do grupo escolar.
E, por fim, no final dos anos 1920, juntamente com o Ginásio Municipal Dom
Lustosa e o Patrocínio College, bem como o Colégio Nossa Senhora do Patrocínio, o Grupo
Escolar Honorato Borges traduz o movimento em torno da escolarização levada adiante na
cidade de Patrocínio, fortalecida com a construção do novo prédio do Grupo Escolar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como interesse promover uma análise da trajetória e da
tentativa de modernização do ensino pública primário na cidade de Patrocínio – Minas Gerais.
Dessa forma, desejava-se compreender as implicações em torno do processo de
regulamentação da educação pública na cidade, baseada na criação e instalação do Grupo
Escolar Honorato Borges. Além disso, analisar também quais os interesses da oligarquia rural
patrocinense em torno da escolarização local, através da presença na urbe de uma escola
pública em nível primário. Afinal, não só aliado ao processo de escolarização implantado pela
reforma João Pinheiro, mas os ensaios em torno da racionalização do ensino público local
refletem também interesses locais, expressos através da hegemonia da elite política local,
membros da oligarquia rural.
A hipótese verificada pelo desenvolvimento deste trabalho consiste na afirmação
de um processo de escolarização local, através da criação (1912) e da implantação (1914) do
Grupo Escolar Honorato Borges, reflete a preocupação em inserir a cidade de Patrocínio nas
tendências estaduais de racionalização dos processos sociais e políticos, numa tentativa de
solidificar a rede estadual de ensino. Isso permitiria a expansão dos valores concernentes com
o novo modelo urbano-industrial nacional, bem como a necessidade de formação de uma
mão-de-obra especializada para o trabalho em repartições públicas e atividades econômicas
(industriais e comerciais, por exemplo), bem como a possibilidade de um embasamento
acadêmico para a continuidade dos estudos em outros veis de ensino (ginasial, colegial e
superior).
Percebe-se que, para isso, seria necessário um entendimento dos fatores históricos
(em nível nacional, estadual e local) ligados à origem, implantação e do Grupo Escolares
Honorato Borges, além da construção do atual prédio, procurando elucidar seu papel enquanto
única instituição pública de ensino da cidade no decorrer da Primeira República.
148
A República Velha representa um momento de revisão de valores em relação à
situação do Brasil, enquanto nacionalidade. As discussões em torno da busca da identidade
brasileira são fundamentais para compreendermos as inovações propostas pelos diversos
governos estaduais, destacadamente São Paulo e Minas Gerais. No âmbito da mentalidade
positivista e republicana, esses governos estaduais buscavam empreender e consolidar no
âmbito de seus domínios uma nova ordem com o intuito de fortalecerem uma sociedade
baseada em princípios modernizantes e racionalistas.
As reformas realizadas em termos de estrutura do Estado, as medidas
administrativas e as iniciativas em torno do debate sobre a nacionalidade brasileira estão
intimamente ligadas ao projeto republicano, inspirado nos moldes do positivismo francês, o
qual defendia uma reforma social, visando atingir o progresso humano. Acreditava-se que o
desenvolvimento de uma cultura em torno do conhecimento científico possibilitasse o
aperfeiçoamento de toda a estrutura social, a fim de consolidar o modelo capitalista de
produção, baseado na divisão social e harmônica do trabalho.
Os novos governantes do país, envoltos pelos interesses republicanos, aliados aos
grandes fazendeiros dos Estados de São Paulo e Minas Gerais, sobretudo, buscam consolidar
uma sociedade em que seus valores vigorem consolidados. A política nacional procura
superar os ranços da monarquia, implementando uma série de reformas estruturais, no sentido
de agilizar e embasar o processo civilizatório, buscando o fortalecimento do país e
proporcionando seu desenvolvimento, equiparando-se às nações mais avançadas do mundo.
Desse modo, finalmente, o Brasil poderia superar sua condição submissa frente às nações
mais avançadas do mundo e também se inserir nos moldes do progresso intelectual e material.
Assim, especificamente relativas à educação, algumas reformas são levadas
adiante por alguns governos estaduais, buscando consolidar um modelo educacional que sirva
de instrumento para a realização das reformas sociais almejadas pelo projeto republicano
positivista. Desse modo, uma das maiores frentes de avanço da escolarização brasileira, neste
momento, consiste na implantação dos grupos escolares, tendo São Paulo como Estado
pioneiro. Modelo considerado desenvolvido e peça fundamental na consecução de um projeto
modernizante também do processo educacional.
O período da Primeira República expressa um momento de grandes
transformações estruturais pelas quais passa o país. Historicamente, pode ser considerada uma
fase transitória, pelo menos em algumas partes do país como as regiões sudeste e sul,
consideradas mais avançadas, do modelo agrário-exportador para o urbano-industrial. Esta
transformação também pode ser verificada em outros países do mundo, os quais procuram se
149
adaptar às novas exigências do capitalismo mundial, o qual, gradativamente, torna-se
essencialmente financeira ou monopolista.
Naquele momento, em fins do século XIX, os grupos escolares são visualizados
como o modelo considerado mais moderno no que se refere ao processo de escolarização que
vinha sendo realizado em alguns países europeus. O fato de se reunir escolas, antes isoladas,
era algo inovador, pois enfatiza e reflete o modelo econômico de divisão do trabalho social, b
em como das funções específicas. Em outras palavras, os grupos escolares possibilitariam
uma racionalização dos processos didático-pedagógicos e expressariam no interior do
processo de escolarização processos de racionalização do ensino. E isto veio consolidar a
idéia de que as escolas agrupadas poderiam ser usadas como meio de combater as precárias
condições pelas quais o ensino brasileiro vinha passando, principalmente após a expulsão dos
jesuítas em 1759, quando houve a reforma levada adiante pelo Marquês de Pombal, primeiro
ministro de Dom José I. Por isso, com a Proclamação da República, em 1889, e após a
reforma estadual do ensino em São Paulo, houve uma identificação entre os grupos escolares
e o projeto civilizatório dos republicanos positivistas, interessados em promover uma
reformulação das bases sociais, a partir da escolarização.
No Estado de Minas Gerais, ainda sobrevive o modelo coronelista de estrutura do
poder, expresso pelo PRM (Partido Republicano Mineiro). A elite política, composta em sua
maioria por membros de uma rica oligarquia rural, ainda mantém o interesse de manter a
estrutura estabelecida, mas com olhos voltados para a novidade e as exigências de um novo
mundo. Assim, as relações políticas entre os membros do Partido ao longo do período da
Velha República demonstram o grande embate enfrentado por estes frente à contradição entre
a preservação da situação política obtida desde os tempos do Império e os novos desafios da
estrutura capitalista imposta em alguns pontos específicos do país.
A modernização necessária perpassa pelo desenvolvimento estrutural de um
mercado interno dinâmico, pela industrialização conseqüente, bem como pela urbanização e
todos os efeitos esperados de um processo renovador, mas que mantenha a situação de
privilégios.
Foi fundamental compreendermos também o papel que as reformas de João
Pinheiro e Francisco Campos tiveram para a consecução de uma nova estrutura escolar
condizente os desafios impostos perante o Estado de Minas Gerais, bem como compreender
também suas repercussões no processo civilizatório dos republicanos mineiros. E, assim,
torna-se imprescindível também compreendermos o processo de implementação dos grupos
150
escolares, principal medida da Reforma João Pinheiro e considerados o modelo escolar
republicano por excelência de escola primária da rede pública de ensino.
Minas Gerais, sendo um dos Estados da federação mais influentes política e
economicamente na Primeira República, logo ingressou também na implementação dos
grupos escolares em suas cidades. No caso mineiro, o início da expansão dos grupos escolares
se com a publicação da Reforma João Pinheiro, ocorrida em 1906, durante o governo
estadual de mesmo nome. Através desta medida, Minas Gerais foi se inserindo
gradativamente no movimento em prol da escolarização, considerada condição necessária
para a modernização das estruturas institucionais que compõem o universo social. Assim,
apesar de em termos de discurso a escolarização obter um espaço muito destacado na Primeira
República, o mesmo não se pode afirmar com as práticas realmente levadas adiante no Estado
de Minas Gerais e em vários outros estados da federação.
Os Grupos Escolares podem ser considerados, então, como as primeiras formas de
escolas públicas estruturadas em torno de uma organização hierárquica, curricular,
metodológica, bem como espacial, propostas paradigmaticamente através de reformas de
ensino mais amplas do que as até então implementadas no Brasil. O conjunto dessas
características os tornava uma alternativa frente às precárias condições das escolas isoladas,
desprovidas de qualquer estrutura que favorecesse o ensino. As reformas que implementaram
o modelo dos grupos escolares são, de fato, as primeiras a também discutirem e expandirem
uma rede diferenciada de escolas voltadas para o ensino público no país.
Os Grupos Escolares encerram uma concepção pedagógica, baseada no paradigma
da modernidade, na materialização da busca da racionalidade em seus trabalhos pedagógicos e
administrativos. O interesse era, através deste modelo, implementar uma prática educativa
centrada na busca da excelência, superando as irregularidades e as discrepâncias que
acompanhavam o modelo anterior de escolarização. Além disso, o país inicia também seu
processo de renovação política, supostamente defensora dos direitos individuais, sobretudo os
políticos e os sociais, como o direito ao voto, o direito a serviços básicos como a educação
escolar.
Esse interesse em buscar uma sistematização das suas práticas e saberes se
manifestava em torno de algumas representações: a mudança das condições de ensino, pois,
com a organização por rie, bem como o ensino simultâneo, os alunos são agora
homogêneos; os sujeitos diretamente envolvidos no processo de ensino-aprendizagem
adquirem novas feições; em termos metodológicos, percebe-se o valor dado à intuição,
enquanto capacidade de gerar conhecimento e de localizar o aluno frente à sua realidade;
151
neste sentido, o aluno é valorizado como sujeito de seu processo de aprendizagem; surge
também a possibilidade de reservar um lugar de destaque no cenário das cidades para os
prédios onde funcionarão os Grupos Escolares. Neste sentido, os Grupos Escolares são
caracterizados como Palácios do Ensino, vislumbrando uma nova concepção arquitetônica
para a educação escolar. E, por outro lado, é o tempo da divisão das tarefas administrativas e
pedagógicas, surgindo novos profissionais da educação, como o inspetor e o diretor.
Por fim, outro objetivo foi o de buscar as especificidades locais da criação e
implantação do Grupo Escolar Honorato Borges, em Patrocínio Minas Gerais. Neste
sentido, fundamental é a percepção dos elementos vinculados ao universo social patrocinense,
recuperando a memória do espaço e tempo escolares, implantados no Grupo Escolar, além de
abordar o currículo prescrito pelo governo estadual e assumido, na prática, pelo magistério.
Por isso, fundamental também foi a abordagem das razões ou interesses dos corpos discente e
docente do Grupo Escolar Honorato Borges.
Atentos às mudanças e às perspectivas do ensino primário tanto em nível nacional
como em nível estadual, os políticos patrocinenses, liderados pelo Coronel Honorato Martins
Borges, iniciam também na cidade de Patrocínio e em seu município, o movimento de
modernização das instituições locais.
Em consonância com o projeto republicano de civilização, a elite oligárquica
patrocinense busca junto ao governo estadual a consecução da criação de um grupo escolar
para a cidade de Patrocínio. Aliada a uma série de medidas administrativas e da luta por
conquistas em termos de infra-estrutura, Patrocínio também tenta se consolidar como cidade
influente na região. Seus políticos, aliados ao governo estadual, procuram estabelecer na
cidade uma nova ordem, baseada nos princípios propostos pelo Partido Republicano Mineiro.
Esse projeto, ambicionado pela elite patrocinense, manifesta-se também na busca
de uma nova organização escolar, procurando superar a situação anterior, precária e difícil.
Patrocínio necessitava de uma reforma social a fim de garantir a hegemonia dos projetos
implementados pela elite local. Buscavam se consolidar como representantes típicos em torno
das alianças políticas, embasadas em chefes locais, que buscavam retorno e apoio financeiro
junto governo estadual. Em outras palavras, a prática do coronelismo permanecia firme,
mesmo com a Proclamação da República. E a implementação dos projetos republicanos
visava justificar e consolidar esse modelo político de trocas de concessões.
A implantação de um Grupo Escolar em Patrocínio representou a confirmação do
interesse da elite local em promover a modernização da cidade, favorecendo a realização de
obras públicas, a melhoria das condições de infra-estrutura, a melhoria dos meios de
152
transporte. Enfim, a conquista de serviços públicos para a população tinha a intenção de
consolidar o grupo hegemônico à frente do poder político. Outra conquista para cidade de
grande destaque, também foi a Estrada de Ferro Goyaz, que permitiu e facilitou a circulação
de mercadorias, de viajantes e, por isso, a circulação de novas idéias.
Por isso, em 1912, a criação do Grupo Escolar Honorato Borges representa para a
cidade de Patrocínio uma grande conquista em termos educacionais. Uma escola pública, na
forma de Grupo Escolar, seria capaz de pelo menos realizar suas atividades pedagógicas
voltadas para o princípio de organização administrativa, curricular e metodológica. por
esses motivos, a atuação do Grupo Escolar superava as precárias condições nas escolas
particulares, mantidas por professores da cidade, bem como de outras formas de educação
popular.
Um estabelecimento de ensino oficial, funcionando nos padrões determinados
pelas legislações representava um avanço em termos de escolarização. Contudo, nem sempre
era possível executar ou promover o ensino dentro de todas as condições previstas na
legislação em vigor. Faltavam muitos materiais didáticos, principalmente livros. Com o passar
dos anos, a estrutura predial foi se deteriorando e sua capacidade não era mais suficiente
para suportar a demanda escolar da cidade patrocinense.
Membros da elite política, bem como outros cidadãos, passaram a reivindicar a
construção de um novo prédio para o funcionamento do Grupo Escolar Honorato Borges
frente ao governo estadual. Em fins da década de 1920, era comum a publicação de artigos
fazendo apologia a tal empreita. E, com a visita do então Secretário dos Negócios do Interior
a Patrocínio, Francisco Campos, confirma-se a liberação de recursos para a construção da
nova sede de funcionamento, posteriormente.
A construção de uma nova sede representou mais uma melhoria para os serviços
públicos oferecidos em Patrocínio. Além do mais, representa ainda o interesse dos políticos
locais em prol da modernização do ensino primário da cidade, a fim de promover a
alfabetização da população urbana, favorecendo inclusive a realização dos pleitos, que
exigiam a alfabetização como um dos critérios necessários para o voto.
Todas as medidas assumidas pelo governo no sentido de aprimorar o ensino
primário estão intimamente ligados com a necessidade de um aperfeiçoamento da formação
do povo brasileiro. Essa formação popular, por sua vez, possui uma finalidade estratégica, no
sentido de promover a ampliação e a participação nos pleitos. Contudo, o interesse não está
numa população consciente, crítica e praticamente, mas apenas como massa de manobra.
153
Todos os ensaios, em torno de uma sistematização do ensino público primária,
assumido pelo modelo dos grupos escolares, perpassam pela remodelação do espaço escolar,
promovendo práticas em acordo com os interesses ideológicos de um modelo político maior.
Também a organização do tempo escolar, levado adiante no âmbito dos grupos escolares, tem
a intenção de inserir os alunos e os mestres numa nova ordem temporal, sendo trabalhado a
idéia de organização da ordem cronológica e psicológica das atividades escolares. Nessa
mesma perspectiva, também o currículo foi prescrito pelo governo estadual com o intuito de
modelar e padronizar os conteúdos a serem ministrados no interior das escolas oficiais. Isso
possibilita também a disciplinarização das próprias atividades pedagógicas em si, pois são
assumidas como obrigação e modelo seguido em todas as escolas, fiscalizado continuamente
pelo serviço de inspetoria escolar.
A implementação dos grupos escolares em Minas Gerais, e conseqüentemente o
Grupo Escolar Honorato Borges, representa a expressão de uma nova mentalidade voltada
para a tentativa de se implantar os valores republicanos, positivistas e liberais no âmbito da
sociedade brasileira. A presença dos grupos escolares como modelos por excelência da
racionalização do ensino pública primário demonstra a preocupação dos políticos
republicanos em proporcionar uma nova mentalidade, baseada nos princípios de
reorganização da vida social, a fim de consolidar a ordem capitalista.
A pesquisa em torno da História das Instituições Escolares, em particular os
Grupos Escolares, representa uma expressão da tentativa de compreender o processo de
escolarização recente pelo qual o país vem passando. Os Grupos Escolares representaram, no
decorrer do século XX, o modelo de seriação, de organização curricular, metodológica e até
mesmo administrativa. Neste sentido, compreender a história da implantação dos Grupos
Escolares corresponde ao entendimento do processo de escolarização no decorrer de todo o
período republicano.
Buscar as origens da escolarização, através do modelo dos grupos escolares,
encerra a tentativa de resgatar parte da História da Educação Brasileira, no sentido de
compreender seus fundamentos e seus fatores de implantação.
Para a historiografia atual, torna-se um desafio realizar uma pesquisa deste porte,
abarcando o período da República Velha, pois muitas das pessoas que participaram
diretamente dos processos de escolarização já faleceram ou, se ainda vivas, não possuem tão
boa memória. Além do mais, boa parte dos documentos da época se perderam, ou estão em
péssimo estão de conservação. Isso apenas confirma a falta de conscientização do povo, dos
154
dirigentes políticos e até mesmo dos membros das escolas em torno da preservação dos
documentos históricos.
É sempre imprescindível buscar as origens do processo de escolarização
empreendido na República Velha, pois as concepções positivistas e republicanas de educação
e de sociedade propiciaram um momento rico na consecução de uma tentativa de
racionalização do ensino público, principalmente o primário. Este é considerado base da
formação escolar, no sentido de propiciar os primeiros contatos com o conhecimento
científico, humanístico e artístico, construídos ao longo da história humana. Portanto, são
considerados imprescindíveis na formação humana, globalmente entendida.
155
MATERIAIS HISTÓRICOS
Referências Bibliográficas:
ALMEIDA, F. J. (2001) Patrocínio no final da década de 20. Patrocínio, Reggraf. 342 p.
ALVES, Gilberto Luiz. (2001) A produção da escola pública contemporânea. Campo
Grande: Ed. UFMS; Campinas: Autores Associados.
ARAÚJO, José Carlos Souza e INÁCIO FILHO, Geraldo. (2005) Inventário e interpretação
sobre a produção histórico-educacional na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. In:
GATTI JR., Décio e INÁCIO FILHO, Geraldo (orgs.). História da educação em perspectiva:
ensino, pesquisa, produção e novas investigações. Campinas, SP: Autores Associados;
Uberlândia, MG: EDUFU.
ARAÚJO, José Carlos Souza. (2005) Os grupos escolares em Minas Gerais como expressão
de uma política pública: uma perspectiva histórica. Universidade Federal de Uberlândia
(mimeo).
ATHAYDE, Tristão de. (1931) Debates Pedagógicos. Rio de Janeiro, Schmidt Editor, p. 67-
106.
BOBBIO, Norberto. (2004) Dicionário de Política. Vol. I. 12. ed. Brasília: Editora
Universidade de Brasília.
BOMENY, Helena. (1994) Guardiães da razão: modernistas mineiros. Rio de Janeiro:
Editora UFRJ/Tempo Brasileiro.
BUFFA, Ester e PINTO, Gelson de Almeida. (2002) Arquitetura e Educação: organização do
espaço e propostas pedagógicas dos Grupos Escolares Paulistas, 1893/1971. São Carlos:
EdUFSCar; Brasília, INEP.
BUFFA, Ester. (2005) Práticas e fontes de pesquisa em História da Educação. In: GATTI JR.,
Décio e INÁCIO FILHO, Geraldo (orgs.). História da educação em perspectiva: ensino,
pesquisa, produção e novas investigações. Campinas, SP: Autores Associados; Uberlândia,
MG: EDUFU.
CARNEIRO LEÃO, A. (1917) O Brazil e a educação popular. Rio de Janeiro, Typ. Jornal do
Commercio, pp. 19-54.
CARVALHO, José Murilo de. (2004) Os bestializados O Rio de Janeiro e a República que
não foi. 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras.
ESCOLANO BENITO, Agustín. (2000) Tiempos y espacios para la escuela ensayos
históricos. Madrid: Biblioteca Nueva.
FAORO, Raymundo. (2004) Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro.
16. ed. São Paulo: Globo.
156
FARIA FILHO, Luciano Mendes de. (2000) Dos pardieiros aos palácios: cultura escolar e
urbana em Belo Horizonte na Primeira República. Passo Fundo, RS: UPF.
FARIA FILHO, Luciano Mendes de. (2003) O processo de escolarização em Minas Gerais:
questões teórico-metodológicas e perspectivas de pesquisa. IN: FONSECA, Thais Nívia de
Lima e. História e Historiografia da Educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica. pp. 77
97.
FARIA FILHO, Luciano Mendes de e VIDAL, Diana Gonçalves. (2000) Os tempos e os
espaços escolares no processo de institucionalização da escola primária no Brasil. Revista
Brasileira de Educação, n. 14, mai/jun/jul/ago, pp. 19 - 33.
FARIA FILHO, Luciano Mendes de e VAGO, Tarcísio Mauro. (2000) A Reforma João
Pinheiro e a modernidade pedagógica. In: Lições de Minas: 70 anos da Secretaria da
Educação. Belo Horizonte: Secretaria da Educação do Estado de Minas Gerais, 2000, p. 33-
47.
FÁVERO, Maria de Lourdes de Albuquerque e BRITTO, Jader de Medeiros (org.). (2002)
Dicionário de educadores no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; MEC INEP
Comped. p. 382 – 387.
FÁVERO, Osmar (org.). (2001) A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988.
Campinas: Autores Associados.
FERREIRA, Hedmar de O. (2000) Colégio Dom Lustosa História da Educação Católica
Masculina em Patrocínio. Dissertação de Mestrado, Franca, UNESP, 162 p.
FERREIRA, José Filipe e Sousa Pessanha de Brito. (2004) A evangelização pela educação
escolar: embates entre presbiterianos e católicos em Patrocínio, Minas Gerais (1924 -1933).
Dissertação de Mestrado, Uberlândia, UFU, 217 p.
GATTI JR, Décio. (2001) A Situação da Pesquisa Histórica sobre as Instituições
Educacionais Brasileiras. Revista de Educação Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, p. 133 140,
jan. – jun.
GATTI JR, Décio e PESSANHA, Eurize Caldas. (2005) História da Educação, instituições e
cultura escolar: conceitos. Categorias e materiais históricos. In: GATTI JR., Décio e INÁCIO
FILHO, Geraldo (orgs.). História da educação em perspectiva: ensino, pesquisa, produção e
novas investigações. Campinas, SP: Autores Associados; Uberlândia, MG: EDUFU.
GONÇALVES NETO, Wenceslau e CARVALHO, Carlos Henrique de. (2005) Princípios
educacionais nos regulamentos de Minas Gerais e Uberabinha (MG) no final do século XIX.
In: GATTI JR., Décio e INÁCIO FILHO, Geraldo (orgs.). História da educação em
perspectiva: ensino, pesquisa, produção e novas investigações. Campinas, SP: Autores
Associados; Uberlândia, MG: EDUFU.
GRAMSCI, Antonio. (1995) Concepção Dialética da História. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora
Civilização Brasileira, 341 pp.
157
JULIA, Dominique. (2001)A Cultura Escolar como Objeto Histórico. Revista Brasileira de
História da Educação. Campinas. Editora Autores Associados. Nº 1, jan./jun. pp. 9 – 43.
LEAL, Victor Nunes. (1997) Coronelismo, enxada e voto. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Nova
Fronteira.
MAGALHÃES, Justino. (2005) A História das instituições educacionais em perspectiva. In:
GATTI JR., Décio e INÁCIO FILHO, Geraldo (orgs.). História da educação em perspectiva:
ensino, pesquisa, produção e novas investigações. Campinas, SP: Autores Associados;
Uberlândia, MG: EDUFU.
MAGALHÃES, Justino. (1999) Contributo para a história das Instituições Educativas – entre
a memória e o arquivo. In: FERNANDES, Rogério e MAGALHÃES, Justino. Para a
História do Ensino Liceal em Portugal. Braga: Universidade do Minho, pp. 63 – 77.
MAGALHÃES, Justino. (1998) Um apontamento metodológico sobre a história das
instituições educativas. In: CATANI, Denice B. et. al. (org.) Práticas Educativas, Culturas
Escolares, Profissão Docente. SP: Escrituras.
MOCHCOVITCH, Luna Galano. (1992) Gramsci e a Escola. Série Princípios. 3. ed. São
Paulo: Editora Ática, 80 pp.
MONTENEGRO, Antonio Torres. (2003) História oral e memória a cultura popular
revisitada. 5. ed. São Paulo: Contexto.
MOURÃO, Paulo K. Corrêa. (1962) O ensino em Minas Gerais no tempo da República
(1889-1930). Belo Horizonte: Edição do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de
Minas Gerais.
NAGLE, Jorge. (1974) Educação e Sociedade na Primeira República. São Paulo, EPU, Rio
de Janeiro, Fundação Nacional de Material Escolar, 1976 (reimpressão). 400 p.
NOSELLA, Paolo. (2004) A escola de Gramsci. 3. ed. São Paulo: Cortez. 208 p.
NOSELLA, Paolo e BUFFA, Ester. (1996) Schola Mater A antiga Escola Normal de São
Carlos (1911 – 1933). São Carlos: EDUFSCar.
PEIXOTO, Anamaria C. (1983) Educação no Brasil: anos 20. São Paulo: Edições Loyola.
PETITAT, André. (1994) Produção da Escola / Produção da Sociedade: Análise sócio-
histórica de alguns momentos decisivos da evolução escolar no ocidente. Porto Alegre: Artes
Médicas, p. 141-192.
REZENDE, J. C. (1986) As ruas de Patrocínio. 2. ed. Patrocínio, Gráfica Real, 39 p.
RIBEIRO, Eliles Regina e NASCIMENTO, Sônia Maria Ferreira. (2002) Escola Honorato
Borges – Sua História e Importância para a Cidade de Patrocínio. Patrocínio: Editora Reggraf.
SACRISTÁN, J. Gimeno. (1998) O currículo: uma reflexão sobre a prática. Trad. Ernani F.
da F. Rosa. 3. ed. Porto Alegre: ArtMed.
158
SAVIANI, Dermeval. (2005) Instituições Escolares: conceito, história, historiografia e
práticas. IN: Cadernos de História da Educação – nº. 4 – jan./dez.
SOUZA, Rosa Fátima de. (1998) Templos de civilização: a implantação da escola primária
graduada no Estado de São Paulo (1890-1910). São Paulo: Fundação Editora da UNESP. pp.
25 – 87.
THOMPSON, Paul. (1998) A Voz do Passado. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 385
p.
VERÍSSIMO, José. (1985) A educação nacional. 3ª edição. Porto Alegre, Mercado Aberto.
VIEIRA, do Pilar de Araújo e PEIXOTO, do Rosário da Cunha e KHOURY, Yara
Maria Aun. (1995) A Pesquisa em História. Série Princípios. 3 ed. São Paulo: Editora Ática,
80 p.
VIÑAO FRAGO, Antonio e ESCOLANO BENITO, Agustín. (1998) Currículo, espaço e
subjetividade – a arquitetura como programa. Rio de Janeiro: DP&A.
WIRTH, John D. Minas e a Nação. (2004) Um Estudo de Poder e Dependência Regional
(1889 1937). In: FAUSTO, Boris (org.) História Geral da Civilização Brasileira - tomo III
– O Brasil Republicano. 8. ed. Vol. 1. São Paulo: Bertrand Brasil. 418 p.
WIRTH, John D. (1982) O fiel da balança: Minas Gerais na Federação Brasileira 1889-
1937. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Impressos:
Jornal CIDADE DO PATROCÍNIO (fundado pelo então coronel Honorato M. Borges em
1909 tornado órgão oficial da mara Municipal e de periodicidade semanal). Os números
encontrados englobam o seguinte período, limitado desde o lançamento do jornal (1909) até o
término do período por mim determinado para a pesquisa em questão (1930): 11/12/1909 (1.º
número editado); 18/10/1913; 11/01/1925 e 27/12/1925; números de 1926, 1927, 1928,1929;
e alguns números de 1930.
Manuscritos:
Ponto diário de aula (2.º ano misto) Grupo Escolar Honorato Borges (31/07/1915 a
27/11/1916);
Termo de posse – Grupo Escolar Honorato Borges (08/07/1913 a 03/02/1997);
Pontos de entrada de professores e empregados (Grupo Escolar Honorato Borges):
15/06/1914 a 06/08/1915, 16/08/1915 a 23/02/1917, 09/02/1925 a 03/11/1925, 15/02/1926 a
13/10/1926, 15/10/1926 a 05/08/1926.
Termo de visitas das autoridades do ensino;
159
Livro de atas para as reuniões do professorado: 04 de maio de 1925 a 21 de novembro de
1935;
Balancete da Caixa Escolar (outubro/1922 a fevereiro/1935);
Ponto diário dos alunos (2.º ano feminino): 1923 / 1924 / 1925;
Ponto diário dos alunos (2.º ano misto): 1918 / 1919;
Ponto diário dos alunos (1.º ano misto): 1922 / 1923;
Uma pasta plástica contendo textos históricos do Grupo Escolar, fotografias e relatos
(compilada em 1975, por D. Clérida Borges Alves – ex-diretora).
Iconografia:
No acervo da Fundação Casa da Cultura de Patrocínio M.G., ligada à Prefeitura Municipal,
encontram-se também algumas fotografias referentes ao recorte temporal da Primeira
República (1889 – 1930). As mesmas se referem a paisagens urbanísticas, sobretudo do Largo
da Matriz, local de construção de vários casarões e do funcionamento do primeiro prédio do
Grupo Escolar, bem como do Largo do Rosário, onde foram construídos alguns dos prédios
públicos mais importantes da cidade: bancos, fórum, armazéns e outros (inclusive o novo
prédio do Grupo Escolar).
Depoimentos:
Geralda Pereira (aluna, 1923 a 1926 / posteriormente professora e diretora);
Leôncio Afonso da Silva (formando em 1930).
160
APÊNDICES
161
APÊNDICE A
Termo de posse do primeiro Diretor: Professor Modesto de Mello Ribeiro
162
APÊNDICE B
Termo de posse da Professora Amelia Angelica do Nascimento
163
APÊNDICE C
Termo de posse da Professora Leticia Marra
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo