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Surge também a crítica dos magistrados à linguagem jurídica: o
jargão jurídico-formal, repleto de expressões latinas e de forte influência
normativista (...) é visto como mais um entrave a uma desejável
aproximação do Judiciário dessas camadas, pois torna as peças de trabalho
e manifestações dos juízes como verdadeiros oráculos, inacessíveis aos
profanos ou não-iniciados nesse código, o que inclui também os que não
possuem graduação acadêmica em Direito.
137
A linguagem é, sem dúvida, um instrumento de poder. E o autor acrescenta
ainda:
(...) a condição fundamental subentendida na posse do certificado
(diploma) ou do registro é de natureza mais sutil, embora determinante
quanto às possibilidades de ‘ascensão’ do agente dentro do campo: o
domínio da linguagem jurídica. Desse modo, é possível observar que a
linguagem jurídica cumpre a dupla função de tornar mais específica a
linguagem técnica do direito, que efetivamente necessita se referir a dados
específicos para estabelecer as nuances da interpretação legal, mas
tembém, e principalmente, a função de afastar os profanos, quer dizer,
excluir das discussões oficiais aqueles que não são reconhecidos no campo
pelas vias autorizadas. A linguagem jurídica ajuda, em sua dimensão
excludente, a legitimar a existência e manutenção de uma complexa
hierarquia de intérpretes da lei.
(...) O ponto de vista aqui manifestado é muito claro e se reforça
na tentativa de muitos juízes de utilizarem construções frasais pouco
comuns, recorrendo freqüentemente a vocabulário em desuso. A utilização
de uma linguagem diferenciada da comum busca emprestar ao texto
interpretativo um caráter sacro, impessoal, como se não partisse
efetivamente de uma única pessoa, sujeita às mesmas condições que os
demais.
138
No mesmo sentido é a declaração do desembargador Carlos Aberto Bencke,
Presidente do Conselho de Comunicação Social do TJ em 1999:
O Direito sempre foi considerado ciência hermética, reservada
para os iniciados nas suas lides. Nenhuma novidade em se tratando de
especialização em um ramo do conhecimento humano, como também o são
a Medicina, a Engenharia ou a Economia. No entanto, à medida que estas
ciências passaram a trabalhar rente à população, abriram-se e
democratizaram sua linguagem àqueles que dela necessitam.
Com o Direito deve acontecer o mesmo, mas com um grau de
dificuldade maior. Os advogados peticionam para o juiz que assim os
entende; o promotor exara parecer e o direciona também para o juiz; e,
finalmente, o juiz decide para os advogados, para o promotor e para o
Tribunal. Enfim, as palavras ficam num mesmo círculo e, de rigor, ninguém
137
ROCHA, Álvaro Filipe Oxley da. Sociologia do Direito: a Magistratura no Espelho. São
Leopoldo, RS: Ed. Unisinos, 2002. p.22.
138
Idem, p. 42-43.