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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL
Porto Alegre
2006
CLÁUDIA BROMIRSKY TRINDADE
COMUNICAÇÃO: A CAMPANHA
INSTITUCIONAL DOS 40 ANOS DO JORNAL
ZERO HORA - UMA LEITURA SEMIOLÓGICA
Prof. Dr. Roberto José Ramos
Orientador
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CLÁUDIA BROMIRSKY TRINDADE
COMUNICAÇÃO: A CAMPANHA INSTITUCIONAL
DOS 40 ANOS DO JORNAL
ZERO HORA – UMA LEITURA SEMIOLÓGICA
Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do grau de Mestre, pelo Programa de
Pós-graduação da Faculdade de Comunicação
Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul.
Orientador: Prof. Dr. Roberto José Ramos
Porto Alegre
2006
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
T833c TRINDADE, Cláudia Bromirsky
Comunicação: a campanha institucional dos 40
anos do jornal Zero Hora – uma leitura semiológica.
– Porto Alegre, 2006.
180 f.
Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) –
Faculdade de Comunicação Social, PUCRS.
Orientação: Prof. Dr. Roberto José Ramos.
1. Comunicação. 2. Propaganda. 3. Estereótipo.
4. Imprensa - Semiologia. 5. Poder. 6. Ideosfera.
I. Título.
Ficha elaborada pela bibliotecária Cíntia Borges Greff CRB 10/1437
CLÁUDIA BROMIRSKY TRINDADE
COMUNICAÇÃO: A CAMPANHA INSTITUCIONAL
DOS 40 ANOS DO JORNAL
ZERO HORA – UMA LEITURA SEMIOLÓGICA
Dissertação apresentada como requisito para
obtenção do grau de Mestre, pelo Programa de
Pós-graduação da Faculdade de Comunicação
Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul.
Aprovada em 05 de dezembro de 2006.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Orientador: Prof. Dr. Roberto José Ramos – PUCRS
________________________________________________
Prof. Dr. Flávio Porcello – UFRGS
________________________________________________
Prof. Dra. Beatriz Dorneles – PUCRS
Ao Marco Antonio que sabe quem foi Roland Barthes
e, em sua inocência de criança, deu-me estímulo e inspiração.
Com amor.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, à
Faculdade de Comunicação Social e ao Programa de Pós-Graduação em
Comunicação Social pela qualidade de ensino e oportunidade.
Em especial, agradeço ao meu Orientador Prof. Dr. Roberto Ramos, pela
paciência e pelo conhecimento.
E a todos os amigos, colegas e familiares, que acompanharam este
processo.
Foi-se a maioria dos pontos firmes e solidamente marcados de orientação
que sugeriam uma situação social que era mais duradoura,
mais segura e mais confiável do que o tempo de uma vida individual.
Foi-se a certeza de que “nos veremos outra vez”, de que nos encontraremos
repetidamente e por um longo porvir – e com ela a de que podemos supor
que a sociedade tem uma longa memória e de que o que fazemos aos outros hoje
virá a nos confortar ou perturbar no futuro; de que o que fazemos aos outros tem
significado mais do que episódico, dado que as conseqüências de nossos atos
permanecerão conosco por muito tempo depois do fim aparente do ato –
sobrevivendo nas mentes e feitos de testemunhas que não desaparecerão.
Zygmunt Bauman
RESUMO
Atualmente, a Comunicação, que temos no Brasil, é realizada através dos
Meios de Comunicação, que pertencem a grupos oligopolistas, que parecem
determinar o que deve ou não ser apresentado à população. No país, a Mídia parece
servir como principal fonte de informação, opinião e entretenimento, uma vez que
outras instituições, como a Educação e o Estado, podem não cumprir,
adequadamente, esta função.
O propósito do presente estudo é compreender aspectos relevantes da
Campanha Institucional dos 40 Anos do Jornal Zero Hora, veículo impresso mais
representativo da Rede Brasil Sul de Comunicação (RBS), comandada pela família
Sirotsky e que detém 64% dos Meios de Comunicação do Rio Grande do Sul e de
Santa Catarina, o maior grupo de Comunicação da Região Sul do país.
Nosso objetivo é estudar a Ideosfera da Campanha Institucional dos 40 Anos
do Jornal Zero Hora, intitulada Esta é uma história real, em anúncios de Televisão,
veiculados no ano de 2004, na RBS TV, através dos pressupostos de Roland
Barthes e das categorias, a priori, Estereótipo, Fait Divers, Poder, Cultura, Ideosfera
e Discurso, usando, como método, a Dialética Histórico Estrutural – DHE, tendo,
como técnica, a Semiologia, em uma Pesquisa Semiológica. Buscamos, ainda,
compreender o papel ideológico do Fait Divers, como significante, invariante, do
Discurso Encrático do Grupo RBS, intricado na Cultura e nas relações de Poder, que
mantém a Ideosfera vigente.
Palavras-chave: Comunicação. Propaganda. Estereótipo. Poder. Ideosfera.
ABSTRACT
Over the past years, Communication Media produced in Brazil has mainly
and primarily been conceived and performed by a few oligopolies that, functioning as
strong networks, end up by withholding actual power over what ordinary people
should or should not know. Thus, media seems to have been serving as the only
source for the country’s population is informed, form opinions and be entertained.
This situation results from the fact that other social and political institutions, such as
Education and the State itself, seem not to be adequately and effectively fulfilling
their basic role.
The present paper aims at studying the most relevant aspects of the
Institutional Campaign designed to celebrate the 40
th
Anniversary of the local
newspaper, Zero Hora, the most representative printed matter of the RBS
1
Group.
The largest communication network in the south of Brazil, RBS owns 64% of all
Communication Media in its southernmost states: Rio Grande do Sul and Santa
Catarina.
Our objective is to study the mentioned 40
th
Anniversary Campain’s
Ideosphere, called Esta é uma história real [This is a real story], from the TV
advertisements shown by RBS, in 2004. We have based our analysis on Roland
Barthes’ assumptions, and on the following categories: a priori, Stereotype, Fait
Divers, Power, Culture, Ideosphere and Discourse. In order to proceed to such
analysis, we have used the Structural Historical Dialectics – SHD – method. Our
approach is Semiotic, based on some Semiological Research.
Furthermore, we try to understand the ideological role of Fait Divers, as a
signifier, an invariant from RBS’s Encratic Discourse, found within the basis of the
present Culture and in its Power relation way of functioning, which give support to the
present Ideosphere.
Key-words: Communication. Advertisement/Propaganda. Stereotype.
Power. Ideosphere.
1
RBS = Rede Brasil Sul: South Brazil Network (N. T.)
SUMÁRIO
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ..............................................................................9
2 COMUNICAÇÃO E SOCIEDADE HOJE...........................................................16
2.1 PUBLICIDADE, PROPAGANDA E MEIOS DE COMUNICAÇÃO NO
BRASIL: UM BREVE HISTÓRICO ................................................................25
2.2 O GRUPO RBS..............................................................................................56
2.3 A CAMPANHA INSTITUCIONAL DOS 40 ANOS DE ZERO HORA.............65
2.4 BARTHES E SUAS CATEGORIAS...............................................................69
2.5 ESCOLHAS METODOLÓGICAS...................................................................80
2.5.1 Questões da pesquisa..............................................................................85
2.5.2 Objetivos....................................................................................................85
3 DESNUDANDO A CAMPANHA........................................................................86
3.1 MANOEL FERREIRA DA SILVA...................................................................88
3.1.1 Análise.......................................................................................................91
3.2 IARA SOARES.............................................................................................107
3.2.1 Análise.....................................................................................................109
3.3 ADÃO DE CASTRO JÚNIOR ......................................................................118
3.3.1 Análise.....................................................................................................121
3.4 O APELO COMERCIAL: ASSINE ZERO HORA.........................................127
3.4.1 Jamille Dalla-Nora...................................................................................128
3.4.1.1 Análise.................................................................................................132
3.4.2 Lissandra e Giuliano Gomes..................................................................140
3.4.2.1 Análise.................................................................................................144
3.5 UMA PERSPECTIVA DE SÍNTESE.............................................................150
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................160
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................167
ANEXOS.................................................................................................................175
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A Comunicação, que se estabelece, atualmente, no Brasil, é realizada
através dos Meios de Comunicação,
2
que parecem estar assumindo, cada vez mais,
o papel principal, como fonte de informação, opinião e entretenimento. Esta
atribuição alcançada pela Mídia parece ser fator decisivo, uma vez que outras
instituições, como o estado e a educação, deixam espaços na condução da
informação e no processo de formação dos cidadãos, em especial, na construção da
cidadania e da coletividade.
O modelo capitalista em vigor, a abertura de mercados, os altos gastos com
tecnologia, os grandes investimentos publicitários e os grupos que controlam os
Meios de Comunicação, determinando o que deve ou não ser apresentado,
transmitindo informações repletas de juízo de valores, são os elementos-chave do
padrão comunicativo, que encontramos, hoje, no país.
A Comunicação e a Informação podem tornar-se mecanismos para
expressar a vontade e os interesses de quem detém os Meios de Comunicação e
sua posse aparelho privilegiado de dominação. A verdade e os valores éticos
parecem passar pela mediação da Comunicação, que padroniza os interesses das
classes hegemônicas, de modo cotidiano e sutil, através da Mídia, que forma uma
imagem da realidade ou molda-a em um procedimento de indução.
Neste cenário, a Publicidade e a Propaganda parecem responder, de
maneira eficaz e eficiente, às necessidades do modelo econômico, social e político
em atuação. O desenvolvimento da Publicidade e da Propaganda está relacionado,
de modo direto, ao progressivo avanço dos Meios de Comunicação. A Televisão, em
particular, fascinante aos olhos dos telespectadores, está presente em 98% dos
lares brasileiros (Revista Amanhã, junho de 2006, p. 100), sendo, muitas vezes, a
única fonte de informação e diversão da população.
2
Neste trabalho, ainda que possam existir autores que distinguem Meios de Comunicação e Mídia, os
termos terão sentidos equivalentes.
10
A produção cultural e intelectual, transmitida pela TV, pode ser orientada em
razão de sua possibilidade de consumo no mercado. Os programas e as pesquisas
de audiência reforçam os investimentos publicitários e o caráter econômico orienta o
que deve ou não ser veiculado. A Televisão dá ares de ser uma simulação do saber
e da Comunicação e parece transmitir não conhecimento produtivo, mas ilusões,
imagens de um conhecimento para imposição dos efeitos de organização social,
ditados pela ordem capitalista pós-moderna, é a simulação perfeita do mundo
(SODRÉ, 1994).
Neste contexto, no qual a Comunicação está atrelada aos Meios de
Comunicação, que pertencem a grupos oligopolistas, nosso trabalho buscará
compreender aspectos relevantes da Campanha Institucional dos 40 Anos do Jornal
Zero Hora, periódico diário mais representativo do maior grupo de Comunicação da
Região Sul do país, a Rede Brasil Sul de Comunicação RBS, e contemplar a
produção de sentido nos níveis verbal e não-verbal dos comerciais produzidos para
Televisão.
Em um panorama geral, hoje, os principais mercados da RBS, comandada
pela família Sirotsky, estão no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, onde conta
com 06 jornais; 26 emissoras de rádio AM e FM; a RBS Online, que comporta um
portal de Internet (clicRBS), um portal de serviços (hagah) e um portal de assessoria
ao produtor rural (Agrol); 18 emissoras de TV (RBS TV) afiliadas à Rede Globo, que
juntas constituem a maior rede regional de TV da América Latina, cobrindo 99,7%
dos domicílios com Televisão nos dois estados do Sul; duas emissoras locais de TV
(TVCOM e Canal Rural), produzindo programas e atividades regionais; a Rede
Gaúcha Sat de rádio, com 123 emissoras afiliadas, distribuídas em 10 estados do
país; uma gravadora (Orbeat Music); uma operação orientada para o agronegócio
(RBS Rural e Planejar); uma empresa de logística (viaLOG); uma editora (RBS
Publicações); uma empresa de eventos (RBS Eventos); uma fundação de
responsabilidade social (Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho FMS); uma
emissora de rádio FM em São Paulo, a primeira fora da Região Sul; e a RBS
Participações S.A. (holding do Grupo).
3
3
Informações retiradas do site www.rbs.com.br> Acesso em: 18 out. 2006, e da obra de
GUARESCHI, Pedrinho; BIZ, Osvaldo. Mídia & democracia, 2005.
11
A RBS, em Porto Alegre, tem 29% das concessões de Rádio, sendo 36%
rádios comerciais. Na Mídia televisiva no Rio Grande do Sul, dos concessionários
das 25 emissoras de Televisão, 48% pertencem ao Grupo RBS, sendo que 19
concessões são comerciais e destas 12 pertencem à empresa, representando 64%
dos veículos do estado (GUARESCHI; BIZ, 2005).
Para a Campanha de Propaganda, que iniciou sua veiculação em março de
2004, ano em que o veículo Zero Hora completou 40 anos, foram produzidos 4
(quatro) comerciais de 1 (um) minuto e 4 (quatro) comerciais de 30 (trinta) segundos,
com variações para 10 (dez) e 5 (cinco) segundos, veiculados nos mais diferentes
horários, durante a programação da RBS TV. A campanha teve como tema básico
histórias reais, depoimentos de vida. O trabalho foi desenvolvido pela Agência de
Comunicação Escala e produzido pela Cápsula Cinematográfica.
Os comercias têm, como idéia central da Propaganda, depoimentos que
relatam experiências dos protagonistas com o veículo Zero Hora, em linguagem
simples e coloquial. Cada testemunho ocorre em um palco de teatro e os cenários
reproduzem, de maneira sintética, os locais onde cada situação aconteceu ou
referendam a narrativa. Em todos os comerciais, o aspecto heróico do Jornal Zero
Hora, como solução, alternativa ou transformação da vida dos protagonistas,
aparece nos relatos. A campanha intitula-se: Esta é uma história real.
Nosso objetivo será estudar a Ideosfera da Campanha Institucional dos 40
Anos do Jornal Zero Hora, em anúncios de Televisão, veiculados no ano de 2004,
através dos pressupostos de Roland Barthes e das categorias, a priori, Estereótipo,
Fait Divers, Poder, Cultura, Ideosfera e Discurso, usando, como método, a Dialética
Histórico Estrutural – DHE, tendo, como técnica, a Semiologia, em uma Pesquisa
Semiológica. Buscaremos, ainda, compreender e explicar o papel ideológico do Fait
Divers, como significante, invariante, do Discurso Encrático do Grupo RBS, intricado
na Cultura e nas relações de Poder, que mantém a Ideosfera vigente.
A metodologia, utilizada para realização deste estudo, será o Método
Dialético Histórico Estrutural – DHE por permitir o diálogo interdisciplinar em seu
movimento conflitivo e dinâmico. O propósito não é obter respostas para todas as
12
questões propostas, mas estudar as Condições Objetivas e Subjetivas, que fazem
parte da realidade histórico-social.
As Condições Objetivas são a estrutura, o cenário social e histórico, “a
circunstância dada ou coagulada como dado, que delimita a capacidade de
intervenção subjetiva” (DEMO, 1990, p. 118). As Condições Subjetivas são as
intervenções do ator social, significa o espaço da criação humana histórica, aquilo
que o sujeito pode realizar. O cenário é a própria sociedade, onde tais Condições se
relacionam. Assim, segundo Demo (1990), a DHE é capaz de confluir Condições
Objetivas e Subjetivas na complexidade concreta do fenômeno histórico.
A DHE estuda os eventos históricos, sobretudo, em suas dimensões
culturais e ideológicas, contemplando, assim, os diálogos entre o social e as
subjetividades, procurando compreender a totalidade social, ou seja, não apenas a
teoria, mas a prática, o compromisso ideológico, a estratégia política e a
complexidade da realidade social, propósitos deste trabalho.
A Semiologia de Barthes trata as relações e inter-relações entre o lingüístico
e o translingüístico. A técnica semiológica trabalha com a Semiologia Negativa, na
qual o signo não é absoluto e, sim, relativo, e nega os caracteres positivos, fixos. Na
Semiologia Ativa, trata e imita o signo, buscando compreendê-lo e seu objeto são os
textos do cotidiano. A relativização dos signos é o papel do semiólogo (BARTHES,
1996). Já a Pesquisa Semiológica reconstitui o funcionamento dos sistemas de
significação diversos da língua e, sendo em sua essência qualitativa, é a que melhor
possibilitará uma compreensão mais profunda do objeto apresentado. Assim, é
necessário descrever os fatos reunidos a partir de um ponto de vista e reter os
traços que interessam a este ponto de vista, bem como delimitar a coleção finita de
materiais: o corpus. Neste estudo, tais situações apresentam-se bem definidas.
Nossa intenção não é realizar um trabalho definitivo, mas permitir o
questionamento sobre o objeto proposto e levantar aspectos importantes de nossa
realidade no que tange à função da Publicidade e da Propaganda em nossos dias,
bem como o discurso da empresa RBS que, utilizando o discurso da Propaganda,
manifestado na Campanha Institucional de seu veículo impresso mais importante, o
13
Jornal Zero Hora, e veiculada através da RBS TV, maior empresa de Televisão da
Região Sul do Brasil e afiliada da Rede Globo (quarta maior rede de TV do mundo),
reforça e legitima suas relações com o Poder e a Ideologia dominante, que assume
a condição de uma mercadoria, com valor de troca, legitimadora das estruturas
sociais.
Entre as áreas que compõem a Comunicação Social, compreendemos a
Publicidade e a Propaganda como as que se apresentam menos críticas e reflexivas
sobre sua ação na sociedade e, pelo peso que assumem na conjuntura atual,
necessitam de questionamentos e proposições, para que se coloquem como
instrumentos de transformação positiva no processo de evolução do homem e da
sociedade.
O objeto escolhido, para este estudo, apresenta importantes indícios e
reflexos de nossa sociedade e pode caracterizar a realidade desta sociedade.
Estudar a Campanha Institucional dos 40 Anos de Zero Hora, através das categorias
propostas, perpassando a Mídia, a Publicidade e a Propaganda e os veículos de
Comunicação mais representativos da atualidade, na Região Sul do país, parece
conveniente para a área da Comunicação Social. Neste trabalho aspectos
interessantes e complexos da atualidade podem ser relativizados e, não
pretendendo esgotar o assunto, serem trazidos à discussão por pesquisadores e
interessados pelo tema.
Assim, nosso trabalho será estruturado em dois capítulos: o primeiro,
intitulado Comunicação e Sociedade Hoje, trará um panorama geral destes assuntos
na atualidade e será subdividido em cinco intertítulos, serão eles: Publicidade,
Propaganda e Meios de Comunicação no Brasil: um breve histórico fará uma rápida
retrospectiva da Publicidade e da Propaganda e sua relação com o surgimento e o
desenvolvimento da Mídia no país; O Grupo RBS mostrará informações e dados
referentes ao poder e à abrangência da RBS; A Campanha Institucional dos 40 Anos
de Zero Hora mostrará aspectos da campanha; Barthes e suas Categorias tratará
das categorias propostas para este estudo; Escolhas Metodológicas apresentará o
método, a técnica e o tipo de pesquisa, bem como as questões da pesquisa e os
objetivos deste trabalho. O segundo capítulo, nomeado Desnudando a Campanha,
14
será dedicado às análises, para tanto, faremos a ambientalização e a descrição das
cenas e a transcrição, na íntegra, dos textos. Estará dividido em cinco intertítulos: os
três primeiros farão referência aos comerciais de 1 (um) minuto e levarão os nomes
de cada interveniente que faz seu relato sobre sua relação com Zero Hora, serão:
Manoel Ferreira da Silva, Iara Soares e Adão de Castro Júnior; o quarto intertítulo,
chamado O apelo comercial: Assine Zero Hora, estará relacionado aos comerciais
de 30 (trinta) segundos e, também, terão os nomes dos intervenientes, serão:
Jamille Dalla-Nora e Lissandra e Giuliano Gomes. O último intertítulo, Uma
Perspectiva de Síntese, trará um levantamento geral dos aspectos predominantes da
campanha, explicitados nas análises anteriores.
Como nosso objetivo é compreender os aspectos da Campanha Institucional
dos 40 Anos de Zero Hora, tendo como categorias, a priori, Estereótipo, Fait Divers,
Poder, Cultura, Ideosfera e Discurso, nossas questões da pesquisa serão: como o
Discurso de Zero Hora, manifestado na Campanha Institucional, representa a
filosofia da empresa jornalística e das estruturas ideológicas dominantes? De que
modo o Discurso da Propaganda trabalha ou não o Estereótipo? De que forma se
estabelece o Fait Divers como roteiro do Discurso da Propaganda? De que maneira
o Discurso Encrático mobiliza o Fait Divers, como significante, invariante? Como a
Cultura é particularizada no Discurso da Propaganda? E de que forma está ou não
presente a Ideosfera no Discurso de Zero Hora, através do Discurso da
Propaganda?
Este trabalho não tem pretensão de obter respostas definitivas, mas levantar
a reflexão e a crítica sob aspectos que envolvem a Comunicação, a Publicidade e a
Propaganda, os Meios de Comunicação e a sociedade atual. Questionar o papel dos
comunicadores sociais, em particular, daqueles que consideramos menos críticos,
os publicitários, que, na lógica de mercado que se configura, hoje, ajudam e
reforçam estereótipos, crenças e mitos, que não contribuem para o enriquecimento
do homem, enquanto sujeito e cidadão. A lógica de mercado cria exigências e
distorções sociais graves que configuram a realidade social e, para usar um termo
de Raquel Paiva (2003), instauram o apartheid social, relegando aqueles sem poder
de consumo e lhes negando acesso mínimo ao contento de necessidades
elementares.
15
Utilizaremos no texto, ainda, a primeira pessoa do plural, pela não-
neutralidade proposta pela DHE, já que nos inserimos no processo e não nos vemos
como neutros.
Com todos os recursos disponíveis ao Grupo RBS, com o domínio da Mídia,
da diversidade de Meios e da liberdade de atuação sem controle ou restrição, além
do respaldo de uma das maiores e mais bem conceituadas agências de Publicidade
e Propaganda do Rio Grande do Sul, a Escala Comunicação, com o potencial
criativo conhecido e reconhecido entre os gaúchos, e da utilização dos serviços da
produtora Cápsula Cinematográfica, assegurando qualidade visual e sonora ao
material desenvolvido, não poderíamos deixar de fazer algumas considerações: por
que Zero Hora necessita se apropriar do discurso do outro, um discurso ingênuo,
para legitimar seu próprio discurso hegemônico? Por que utiliza, de modo pejorativo,
depoimentos reais como apelo da Campanha de Propaganda para falar e enaltecer
a si mesma? Pretendemos compreender um pouco estas questões, também.
2 COMUNICAÇÃO E SOCIEDADE HOJE
Discutir a Comunicação e o papel dos Meios de Comunicação, nos dias de
hoje, parece ser uma tarefa contínua que deveria acontecer em diferentes
instâncias, da Universidade ao mercado de trabalho. Enquanto comunicadores
sociais, precisamos pensar em novas formas de fazer Comunicação e em novas
maneiras da Comunicação servir para a transformação do homem e da sociedade.
Na sociedade contemporânea, a Comunicação parece assumir contornos
interessantes e, mesmo em sua origem desvinculada dos Meios de Comunicação,
parece, cada vez mais, dependente e interligada a eles. Atualmente, a Mídia adquire
papéis decisivos, como fonte de informação, opinião e entretenimento.
Em países como o Brasil, a atribuição, rogada aos Meios de Comunicação,
como geradores de informação, opinião e diversão, é quase que exclusiva, visto que
outros setores de nossa sociedade, como a educação e os poderes públicos,
parecem não cumprir, adequadamente, estas funções, na construção da cidadania e
da coletividade. E os brasileiros podem ter na Mídia, em particular na televisiva, seu
canal mais próximo e, muitas vezes, único, para receber, questionar (se é que o
fazem) e repercutir fatos e acontecimentos nacionais e internacionais.
Instituições sociais, como a família, a escola, as igrejas, o estado, os Meios
de Comunicação, entre outros, capazes de transformar, em conjunto, de modo
efetivo a sociedade, tornam-se carentes ou frágeis e criam um espaço aberto, um
vácuo ou lacuna, que possibilita que uma destas instituições assuma o controle
central, este é caso da Mídia.
De acordo com Guareschi (2003, p. 17-8), a média nacional mostra que o
brasileiro passa diante da Televisão 3,9 horas diariamente. Em vilas da periferia de
Porto Alegre, o número de horas destinadas à TV sobe para 6 (seis) horas diárias e
muitas crianças e jovens chegam a assistir 9 (nove) horas de programação ao dia.
Outro dado relevante é que 90% da população brasileira têm na Televisão, entre os
Meios de Comunicação, sua única fonte de informação.
17
A credibilidade, atribuída aos Meios em nosso país, pode suscitar
questionamentos. O poder da Televisão, com sua habilidade de unir sons, imagens,
movimentos e efeitos, em um grandioso e fascinante espetáculo, cria no
telespectador um fascínio, tornando a TV capaz de construir ou suprimir a realidade,
uma realidade moldada dentro de determinados padrões éticos.
O modelo capitalista vigorante, os altos gastos com tecnologia, os amplos
investimentos publicitários e os grupos que detêm os Meios de Comunicação são os
elementos-chave do padrão comunicativo que encontramos no Brasil.
Como vemos Comunicação associada à Mídia, para que esta exista e
mantenha-se em constante atualização, é necessário alto investimento em
tecnologia, fazendo com que uma pequena parcela da sociedade, que possui capital
para manter o processo ativo, seja dona inquestionável dos Meios de Comunicação.
Por conseqüência, da própria Comunicação, determinando o que deve ou não ser
transmitido, repassando informações cheias de juízo de valores.
Aqui se encontra uma grande questão: não deveria a Mídia ajudar a
promover o debate nacional, considerando todas as instâncias da sociedade civil?
Portanto, a possibilidade de pluralizar e expressar pensamentos e opiniões
divergentes, em contextos éticos e ideológicos.
Segundo Guareschi (2000, p. 19), a Comunicação e a Informação tornam-se
alavancas para expressar e universalizar a vontade e os interesses de quem detém
os Meios de Comunicação.
A posse da comunicação e a informação tornam-se instrumento privilegiado
de dominação, pois criam a possibilidade de dominar a partir da
interioridade da consciência do outro, criando evidências e adesões, que
interiorizam e introjetam nos grupos destituídos a verdade e a evidência do
mundo do dominador, condenando e estigmatizando a prática e a verdade
do oprimido como prática anti-social.
Assim, a verdade e os valores éticos parecem passar pela mediação da
Comunicação, que universaliza os interesses das classes hegemônicas de modo
habitual e sutil através dos Meios de Comunicação.
18
A Televisão, em especial, com sua imensa capacidade sedutora de prender
nossa atenção e que parece tornar tudo o que nela é apresentado legitimado,
fascina o observador e reforça as estruturas dominantes.
Segundo Sodré (1994, p. 12), vivemos em uma época em que o olhar é o
sentido mais importante, deixamos os demais em segundo plano. “A imaginação tem
como equivalentes o ato de ver e o fato de ser visto”, traduzindo sobre o olhar toda a
fascinação de entender o mundo. O olho assume o papel de “poder de visão
universal” e a necessidade de ver e ser visto seduz o homem (SODRÉ, 1994, p. 17).
E é este sentido narcísico que pode tornar a TV tão fascinante nos dias atuais.
De acordo com Sodré (1994), o privilegiar do olhar sobre os outros sentidos
surge com a invenção da Imprensa por Gutenberg, ratificando a atenção visual da
escrita e a individualização da leitura (com o surgimento do livro portátil). O
isolamento provocado pela individualização do ato de ler cria um novo modo de
relacionamento entre os homens e uma nova forma de interação social.
As conversas e as histórias passadas oralmente, de geração para geração,
encontram o registro formal, através do impresso, e fazem nascer uma nova maneira
de ver a realidade histórica. Soma-se ao livro, o teatro e a pintura e, em
conseqüência, o aparecimento do ponto de vista particular, conferindo ao olhar o
domínio e ao homem a capacidade de “linealizar e irreversibizar” o tempo e a
visualizar o espaço (SODRÉ, 1994, p. 18).
Este novo modo de ver o mundo, de maneira racionalista e abstrata, pode vir
ao encontro de uma nova realidade social: a cidade, que centraliza a produção (na
fábrica) e o poder político na lógica da produção capitalista e na racionalidade do
cenário urbano. O que é produzido (o utensílio) se destina não mais a um valor de
uso, mas à significação de uma nova ordem de trocas, de novos estilos de vida, a
desejos de consumo com a aspiração de oferta ilimitada de bens materiais, que
estimula a compulsão do olhar.
Neste contexto, a Televisão (reprodução elétrica de informação e imagens e
fruto da tecnologia industrial) fortalece-se, enquanto domínio visual e, como salienta
19
Sodré (1994, p. 25), o “valor de verdade” torna-se referencial da eficácia e do
desempenho.
Criam-se os simulacros industriais – a produção artificial de uma imagem, a
duplicação do real, o apagamento da diferença entre real e Imaginário
4
– e a
Midiatização, através da TV e de suas qualidades de simultaneidade,
instantaneidade, globalidade e novidade, designam a telerrealidade
5
e um novo
modo de gerir a acumulação capitalista, soberana, e na qual a Publicidade é um dos
membros da corte. Assim, salienta Ramonet (1999, p. 79),
a televisão responde às expectativas do maior número de espectadores,
cuja única cultura, na maioria das vezes, vem da tevê. Diante do
agravamento das inquietações coletivas, ela é tentada a transformar em
espetáculo a miséria social (...). As transmissões que dominam hoje em dia
são os telefilmes, o esporte, os jogos e aqueles programas – trash TV – em
que a vulgaridade e a grosseria são explicitamente reivindicadas como
vínculos de comunicação fundamentais com o público.
O capitalismo cria as condições para uma democratização da Cultura,
6
ao
tornar os bens culturais objeto de produção industrial, e a cultura torna-se um
instrumento operador de fluxos sociais e interesses capitalistas.
As estratégias de satisfação quase imediata de desejos, a gratificação
emocional e psicológica e a possibilidade de uma individualidade livre das pressões
das instituições autoritárias e castradoras podem criar uma visão liberatória, a busca
pelo bem-estar privado e a simulação do real-histórico, que se traduzem em
segundos na TV, nos intervalos comerciais e na programação.
4
Para Maffesoli (2001, p. 74-81), o Imaginário é o estado de espírito que caracteriza um povo. É uma
força social de ordem espiritual, uma construção mental, que se conserva ambígua, perceptível,
mas não quantificável. O Imaginário é da ordem da aura: uma atmosfera. Algo que ultrapassa o
indivíduo, que impregna, ou faz parte do coletivo, é uma sensibilidade.
5
Telerrealidade, segundo Sodré (1994, p. 33-40), é um modo de reorganizar, de gerir, o espaço e o
tempo sociais, a partir das novas exigências do processo de acumulação capitalista, no qual o
poder é uma forma reguladora que simula o mundo para melhor reespacializá-lo e administrá-lo e
reside na forma social, um modo novo de estruturar as relações humanas.
6
Cultura, para Barthes (s.d., p. 84-94), envolve o cotidiano e pode ser compreendida como as
conversas, músicas e leituras que rodeiam cada um de nós. A Cultura é o intertexto, materializado
no que se exprime quando se une o evento da linguagem ao evento social. Revela-se através da
linguagem, como instituição social reproduzida em meio aos diferentes grupos que formam a
sociedade, e possui uma abordagem inscrita e circunscrita na subjetividade, que resulta na
repetição, não como cópia absoluta, e, sim, o igual que se reproduz com diferença.
20
A produção cultural e intelectual passa a ser guiada em função de sua
possibilidade de consumo no mercado. Os programas e as pesquisas de audiência
reforçam os investimentos em Publicidade e o caráter econômico dita as regras do
que deve ou não ser veiculado na TV. Homogeneízam-se os interesses e a verdade
cede lugar à credibilidade do enunciado (SODRÉ, 1994).
Esta credibilidade pode tornar-se poderosa, na medida em que os Meios de
Comunicação formam oligopólios de grupos,
7
nas mãos de uma pequena parcela da
sociedade, que detém capital e tecnologia, criando os Estereótipos.
8
A Televisão parece ser uma simulação do saber e da Comunicação e pode
transmitir, ao invés de conhecimento produtivo, imagens de um conhecimento para
imposição dos efeitos de organização social, determinados pela ordem capitalista.
Como salienta Sodré (1994), é a simulação perfeita do mundo.
A TV parece tornar-se estereotipada, na medida em que lhe atribui valores e
poderes além da compreensão humana. O que está na TV parece importante, se foi
apresentado, tem significado e valor. A programação e a Publicidade alimentam esta
premissa quando criam a hiper-realidade, histérica e característica dos Meios de
Comunicação de Massa, na qual não se relata o real, mas se cria uma realidade
mascarada, forjada, que contempla diferentes gostos e olhares. O que vemos na TV,
por vezes, não tem relação direta conosco ou com a nossa realidade, mas
aceitamos porque o que está na Televisão pode ser bom e belo. Nela desfilam os
objetos do progresso técnico e do moderno consumo, ajustando as consciências às
significações que devem ser assimiladas para se obter a gratificação social.
7
Segundo Moraes (1998), nas modalidades de concentração da Mídia, temos: a horizontal –
monopolização ou oligopolização que se produz dentro de uma mesma área; a vertical – integração
das diferentes etapas da cadeia produtiva e distribuição, com um grupo controlando a elaboração
de programas de TV até veiculação, comercialização e distribuição; a propriedade cruzada –
propriedade simultânea de diferentes Meios de Comunicação; e o monopólio em cruz – reprodução,
local e regional, dos oligopólios da propriedade cruzada.
8
Estereótipo, do grego, sterêos (rígido) e tupos (impressão). Imagens fixas. Para Barthes (1973, p.
57) é a palavra repetida como se fosse natural. A palavra que retorna, como se imitar pudesse
deixar de ser sentido como imitação: palavra sem-cerimônia, que pretende a consistência e ignora
sua própria insistência.
21
O real-histórico pode ser simulado pela Televisão e os seus conteúdos são
pautados pela Publicidade e pelas organizações comerciais, que investem quantias
vultosas nas emissoras e buscam o retorno deste investimento no consumismo.
Entre os Meios de Comunicação, a TV é a que possui maior abrangência e
receptividade e, para muitos brasileiros, é a principal ou única fonte de informação
(GUARESCHI; BIZ, 2005).
Os Meios de Comunicação têm influência a médio e longo prazo, a partir
deles, forma-se uma imagem da realidade, muitas vezes, a própria realidade é
moldada por eles, em um procedimento de indução.
A Mídia se abastece da unificação do mercado econômico e da manutenção
da estrutura em vigor. Os conteúdos, apresentados na programação, refletem as
representações sociais, provocadas por instituições vigentes ou pelo senso comum,
e os Meios de Comunicação articulam-se ao modo de organização do cenário social
e a produção dos discursos sociais.
Instituições dos mais variados setores de atuação parecem usar e abusar da
Publicidade e da Propaganda e do Poder
9
de penetração e de credibilidade da
Mídia, para transmitir o valor simbólico do produto, do serviço ou da idéia divulgados
e gastam verbas monumentais para chegar, de modo efetivo, ao cidadão-
consumidor.
Vivemos em um mundo onde impera a lógica capitalista, no qual as leis de
mercado regulam e perpassam as demais relações humanas. A sociedade industrial
contemporânea criou e mantém uma forma de organização tecnoburocrática,
centrada no individualismo e no sujeito-consumidor, que busca satisfazer desejos
que não podem ser satisfeitos. A sociedade pós-industrial, baseada na produção e
no consumo, cria uma relação infinita que mantém a ordem estabelecida. Assim,
observa Sodré (1994, p. 60):
9
Para Barthes (1996, p. 11-2), Poder é uma categoria multifacetada, interdisciplinar, acompanhada
de diferentes enfoques e transcende ao estado. O Poder está presente “nos mais finos mecanismos
do intercâmbio social: não somente no Estado, nas classes, nos grupos, mas ainda nas modas, nas
opiniões correntes, nos espetáculos, (...) nas informações, nas relações familiares e privadas, e até
mesmo nos impulsos liberadores que tentam contestá-lo (...)”.
22
(...) se a finalidade imediata da produção é o consumo, sua mais profunda
disposição, entretanto, corre no sentido de que nenhum consumo possa
satisfazer realmente desejo nenhum, a fim de que não pare jamais a
escalada geométrica da ordem produtiva.
Desta forma, as estratégias de satisfação imediata, a gratificação psicológica
e a mística das relações interpessoais são integrantes deste novo ethos, que se
apresenta libertário, avalizando o consumo como elemento propiciador de tal
sentimento (SODRÉ, 1994). Parece vigorar uma estrutura em que as disposições
econômicas se articulam a partir de uma rede de interesses contratuais e o trabalho
apresenta-se separado da preparação do produto, da apropriação do capital e do
controle do excedente, instaurando-se uma nova possibilidade de posse dos bens e
o consumo parece assumir contornos amplos, distanciando-se de sua ordem
proveniente, a necessidade. O arbítrio seria questionável, considerando as
avançadas técnicas de Publicidade, de Propaganda e de Marketing (PAIVA, 2003).
A racionalidade administrativa, a tecnologia, a apropriação do excedente, o
processo de divisão do trabalho, a urbanização, a secularização dos sistemas de
pensamento, a diferenciação das funções sociais e dos modos de vida são
características da Era Industrial e que se mantêm vivas na realidade atual. A
articulação das desigualdades e a estratificação da sociedade em função do
consumo, assim como a educação e a Comunicação massificada, reforçam o
sistema monopolista vigorante.
Neste contexto, a Publicidade e a Propaganda podem tornar-se referências
importantes da sociedade recente que, a partir da Segunda Guerra Mundial (1939-
1945), e do avanço industrial, econômico e tecnológico resultante, podem ser
utilizadas para transformar tendências em modas, aspirações em consumo e traduzir
a nova realidade social, condicionando os públicos em razão do mercado. A
Publicidade, em especial, parece cumprir um importante papel na difusão de práticas
sociais compatíveis com as novas regras de acumulação.
Segundo Guareschi (2001, p. 136-41), a partir do momento que a
Comunicação, através dos Meios de Comunicação, cria a realidade, algo só existe
quando é comunicado, divulgado para a maioria das pessoas e “deixa de existir”,
23
quando passa a não ser mais noticiado. A apresentação ou a omissão de fatos, de
idéias e de acontecimentos na Mídia parece servir como parâmetro da realidade
para a população em um constante processo de construção da realidade.
A Publicidade e a Propaganda, como instrumentos que se articulam e
respondem às expectativas do modelo econômico, político e social que temos no
país, parecem encontrar, nesta visibilidade e credibilidade da Mídia, espaço para
atuar livremente.
As campanhas publicitárias, as promoções, as Relações Públicas, o
merchandising, a Propaganda, enfim, várias técnicas e ações são desenvolvidas
para chegar ao sujeito-consumidor. As próprias campanhas institucionais, ou de
Propaganda institucional, área em que as atividades de Relações Públicas e
Propaganda interagem e têm como propósito maior preencher necessidades
legítimas da organização, diferentes de vender um produto ou serviço, procuram
condicionar as opiniões.
Assim, as campanhas de Propaganda institucional agem para proteger os
negócios da empresa quando recebe ataque político, para facilitar o processo de
recrutamento de pessoal e para dar assistência aos esforços de venda, bem como
informar, persuadir e predispor, de maneira favorável, as pessoas, em relação ao
produto, ao serviço, à marca ou à instituição, consolidando o posicionamento
corporativo e os objetivos estratégicos da organização (PINHO, 2001). Para
Ramonet (1999, p. 48), “um discurso de propaganda é um discurso que tenta,
criando fatos, ou então ocultando-os, construir um tipo de verdade falsa, o que está
longe de ser o desígnio de nossos próprios sistemas informacionais”.
Já a Publicidade, segundo Lipovetsky (2000, p. 07), não se apresenta como
uma grande vilã, capaz de manipular a vida das pessoas, “a publicidade não
consegue fazer com que se deseje o indesejável”. Para o autor, ela pode promover
abertura e democratização, permitindo libertarmo-nos da racionalidade
argumentativa e da obrigatoriedade de exteriorizar as vantagens de produtos e
serviços para mergulhar no Imaginário puro, aberto à criatividade sem barreiras,
distante da objetividade das coisas.
24
Esta mudança referencial provocou uma revolução perceptiva, na qual o
lúdico, o teatro e o espetáculo foram aguçados. Para ele, o consumidor, seduzido
pela Publicidade, não se sente enganado ou subjugado, mas encantado pelo apelo
mágico, que apenas reforça e amplia quem já está predisposto a ser seduzido. A
Mídia, por outro lado, não atomiza ou isola, mas serve como instrumento para fazer
chegar as informações ao indivíduo, onde quer que ele esteja.
Os valores ideais de um paraíso futuro deixam espaço à busca da satisfação
imediata, o desejo de viver o agora e não esperar compensações futuras. Para
Lipovetsky (2000), isto cria o individualismo, mas, também, não apaga ou sufoca o
humanitarismo ou a preocupação com o outro. A Pós-Modernidade
10
representa
essa sociedade de consumo, de democratização e mercado, que cria a
uniformização dos estilos de vida, a Globalização,
11
o poder das marcas e a
massificação e a libertação da tradição e das instituições e a conquista de maior
autonomia individual.
Não estamos subestimando a capacidade de discernir e avaliar do cidadão
ou consumidor, em particular daquele com bom nível educacional, que acreditamos
ser capaz de reconhecer, criticar e fazer escolhas, baseadas em suas próprias
aspirações e interesses. Na realidade, parecemos dedicar muito pouco de nossa
atenção ao receptor, que pode se tornar um enigma indecifrável. Encontramos um
impasse entre os que acreditam que os Meios de Comunicação criam uma massa
uniforme e amorfa de indivíduos e aqueles que crêem na capacidade de julgamento
e ação independe do sujeito. Mas não podemos negar, pelos índices de audiência,
10
Para Maffesoli (2005), a Pós-Modernidade remete ao fim de uma moral universal e castradora e à
emergência de uma moral plural, um relativismo moral visível, uma moral sem limites ou barreiras,
na qual haverá o encontro da razão abstrata com a razão sensível. Os indivíduos vivenciarão
emoções em comum, na coletividade, e estabelecerão identificações com grupos sociais, usando
símbolos, imagens e signos, que vão integrá-los a certas tribos, apropriando-se de espaços,
estabelecendo territórios de socialidades e construindo relações de poder nos arranjos sociais.
Nada será infinito ou imutável.
Segundo Lipovetsky (2000, p. 10), a Pós-Modernidade rompe com a idéia extrema de moralidade,
fortalecida na modernidade, uma moral heróica ou sacrificial. “Com a pós-modernidade, chegamos
ao pós-moralismo” e com ele a liberdade de viver o presente, com intensidade, sem esperar
gratificações futuras.
11
De acordo com Biz (apud GUARESCHI, 2002), Globalização é um processo de mudanças nos
aspectos econômicos, financeiros, culturais, políticos em uma lógica de redes que funcionam como
uma unidade em tempo real e em escala planetária, no qual a Comunicação ocupa um lugar
principal, pela centralização das telecomunicações na construção da infra-estrutura do novo século
e pelas diferentes formas de Comunicação, como a Internet e a TV segmentada.
25
pelas altas verbas publicitárias e pela satisfação e re-investimento dos anunciantes
na Mídia, em especial a televisiva, que representa 59,8% dos investimentos
publicitários no Brasil (Revista Amanhã, 2006, p. 100), que parece haver uma
interferência no que é visto, lido ou ouvido através dos Meios de Comunicação, nas
interpretações e nas decisões da maioria e na construção da realidade.
Hoje nos deparamos, segundo Lipovetsky (2000), com a liberdade de
decisão que cada indivíduo tem e com as novas possibilidades de escolha que
acompanham o ser humano moderno. Pensamos isto ser possível, lembrando
Guareschi (2001), a partir de uma educação, que ensine a pensar de modo livre,
plural, que respeite e aceite as diferenças; de uma estruturação familiar de igualdade
de posições, amparada na contestação de idéias e no diálogo, e em uma sociedade
que possua interesses maiores que a aquisição material, a individualização
egocêntrica, a fugacidade e as aparências. Compreendemos que, para se ter
liberdade de decisão e de ação, é preciso ter liberdade de pensamento e de escolha
e se reconhecer a pluralidade e a diversidade, em todas as suas instâncias.
Assim, nos dias atuais, para compreendermos melhor o Poder dos Meios de
Comunicação, da Publicidade e da Propaganda, em seus méritos e seus deméritos,
é importante fazermos um breve relato histórico, visto que consideramos que todos
estão interligados e parecem dependentes uns dos outros.
2.1 PUBLICIDADE, PROPAGANDA E MEIOS DE COMUNICAÇÃO NO BRASIL:
UM BREVE HISTÓRICO
O desenvolvimento da Publicidade e da Propaganda, em particular no Brasil,
parece estar diretamente relacionado ao progresso dos Meios de Comunicação.
Assim, a história e a evolução da Publicidade e da Propaganda não podem ser
dissociadas do surgimento e do incremento da Mídia.
26
De maneira referencial, já que os termos Publicidade e Propaganda não são
sinônimos, vale apresentarmos seus significados, suas características e suas
particularidades.
A Propaganda é tão antiga quanto à própria história humana. Uma atividade
de Comunicação que tem como propósito elementar influenciar o comportamento e
as atitudes das pessoas por intermédio da criação, da mudança ou da manutenção
de imagens mentais. Utiliza ações voltadas para a difusão de idéias, através dos
Meios de Comunicação de Massa (PINHO, 2001).
A palavra Propaganda já era utilizada no século XVII para designar a
Congregatio de Propaganda Fide (Congregação para a Propagação da Fé), uma
instituição do Vaticano com a finalidade de organizar e difundir os princípios
católicos romanos, em oposição à Reforma Luterana (PINHO, 2001). O principal
fator que podemos usar para delimitar a Propaganda é seu caráter essencial de
difusão de idéias, de princípios ou de doutrinas, ideológicas, políticas, econômicas
e/ou sociais.
Já a Publicidade é considerada por Malanga (1977), como o conjunto de
técnicas de ação coletiva utilizada para promover o lucro de uma atividade
comercial, conquistando, aumentando e mantendo clientes.
A Publicidade estabelece objetivos de curto a longos prazos e tem, entre
suas tarefas, a divulgação, a promoção, a criação, a expansão, a correção, a
educação, a consolidação e a manutenção de empresas, marcas, produtos e
serviços no mercado comercial. Cada uma destas tarefas desempenha papel
elementar no processo cíclico que a empresa, a Publicidade e o consumo
estabelecem para a manutenção do status quo.
Assim, por divulgação, entendemos tornar uma empresa, uma marca, um
produto e/ou um serviço mais próximos e íntimos dos consumidores reais e
potenciais; por promoção, as estratégias específicas para aumentar a presença da
empresa, da marca, do produto e/ou do serviço junto ao consumidor e em oposição
à concorrência; por criação, criar mercado para a marca na conquista de
27
consumidores; por expansão, a aquisição efetiva de novos consumidores; por
correção, a adequação da imagem/percepção da marca ou da empresa pelo
consumidor; por educação, a formação de atitude ou hábito do consumidor; por
consolidação, o reforço de uma posição já conquistada no mercado; e, por
manutenção de mercados, a reafirmação das vantagens da empresa ou da marca
frente ao consumidor e aos concorrentes (PINHO, 2001).
Tanto a Propaganda como a Publicidade são técnicas de natureza
persuasiva. A persuasão é uma prática comum na vida social dos homens. Desde
que aprendemos a usar os signos, temos tratado de persuadir uns aos outros, o que
implica Comunicação (BERRIO,1983).
A Comunicação seja verbal, gestual, através de imagens e símbolos, é uma
atividade humana elementar, base do fundamento da vida social e, com o advento
dos Meios de Comunicação de Massa, tem sido trabalhada em prol do consumo e
de ideologias, fazendo reinar a lógica dos grupos de poder em nosso país.
Para compreendermos melhor o papel dos Meios de Comunicação e da
própria Comunicação que se estrutura, hoje, no Brasil, uma Comunicação mediada,
e das práticas da Publicidade e da Propaganda, é importante entendermos o que é
Comunicação persuasiva e como ela se estabelece.
Persuasão, essencial ao procedimento comunicativo, pode ser resumida, de
acordo com Roiz (1996), como o processo de transmissão de significado, convencer
alguém, através de razão e de argumentos, para que acredite em algo ou realize
uma ação, que se caracteriza por uma intenção manifesta da fonte, orientada, de
modo claro, a produzir algo no receptor e modificar sua conduta em algum sentido.
Todo processo persuasivo parece ser orientado a diminuir as resistências
psicológicas dos receptores, efetivamente, expostos à Comunicação persuasiva.
Segundo Roiz (1996, p. 09), toda a fonte de Comunicação adota uma
conduta destinada a transmitir uma mensagem a um receptor ou conjunto de
receptores, com a intenção de produzir algum efeito, com o que pode ou não estar
em conformidade o receptor, como corresponde ao sentido dinâmico e transacional
28
de toda a Comunicação humana e social. Sem intenção de algum tipo não há
mensagem, não se cumprem às condições de Comunicação.
Na Comunicação persuasiva, emissor e receptor têm intenção clara de
influenciar e surtir um efeito reconhecível. A Comunicação contém, em maior ou
menor grau e intensidade, elementos de influência, de efeitos psicológicos. Assim,
podemos caracterizar Comunicação persuasiva como deliberada, orientada a
conseguir determinados efeitos, utilizando técnicas de Comunicação e psicológicas.
Toda Comunicação persuasiva está repleta de significado e parece buscar
uma atitude. Por atitude, Roiz (1996) refere-se a certas disposições atribuídas a um
indivíduo, que representam a organização de seus pensamentos, sentimentos e
tendências para ação em relação a um objeto psicológico.
O problema de mudança de atitude se relaciona com as intenções da fonte e
dos efeitos dos processos persuasivos em andamento e que envolvem as condições
físicas e sociais, que se formam e modificam as disposições psicológicas
superficiais, como opiniões, e que afetam sentimentos profundos de base, como
crenças e sistemas de valores; as mudanças que ocorrem com o tempo, próprias da
maturação psicológica e da experiência vivida; e os fatores de personalidade que
vão se modificando, trocando e se transformando, como resultado da Comunicação
persuasiva. Os fatores que podem atuar mais diretamente sobre a formação e a
troca de atitudes são os relacionados com o processo de aprendizagem e com os
efeitos cognitivos dos Meios de Comunicação de Massa.
Assim, para compreendermos persuasão, devemos entender o que é
convicção e o que é sugestão. Segundo Moles (apud ROIZ, 1996, p. 12), convicção
é a impressão que tem o receptor da mensagem, de seu valor e sua veracidade.
Toda a mensagem pode conter uma dose de convicção e se relaciona com a
credibilidade da fonte, com a forma que está codificada a mensagem e o meio
difundido. A convicção da mensagem e sua aceitação se dão por meio de recursos
retóricos, lógicos e argumentativos, que operam sobre as representações prévias
29
dos receptores e que podem modificar total ou parcialmente ou se reforçar, segundo
a intenção do persuasor.
Por outro lado, na Comunicação persuasiva, também, incide um fator de
base psicológica: a sugestão, que pode estar associada ao poder hipnótico de certos
Meios de Comunicação, como a Televisão e o Rádio. Sugestão pode ser
compreendida como a intenção de induzir outros à aceitação de uma crença
específica, sem proporcionar evidência de base lógica, exista ou não esta base
(BROWN apud ROIZ, 1996, p. 12).
Algumas técnicas modernas de persuasão se baseiam em específicas
manifestações individuais e coletivas de sugestão, como crenças condicionadas e
conformidade com os costumes e, dentro da sugestão de massa, do predomínio dos
sentimentos emocionais coletivos sobre os fatores racionais.
A sugestão parece efetiva quando o persuasor tem capacidade de criar a
impressão que as propostas contidas em sua mensagem concordam com as idéias e
as crenças de quem recebe as mensagens persuasivas.
Desta forma, quando um emissor envia uma mensagem por um específico
canal, busca um resultado, mais ou menos previsto, concreto ou difuso, que pode ou
não proceder. Poderíamos, então, dizer que toda a mensagem inclui elementos
vinculados à manipulação persuasiva de significado, que podem produzir certos
efeitos de influência nos receptores.
Para Roiz (1996), manipular pode ser modificar ou trocar os atos em um
sentido determinado, seguindo orientações definidas e com fins de controle de
comportamentos. A freqüente utilização da persuasão, nos meios publicitários, de
Propaganda, de informação e de educação, com objetivos dirigidos para a
manipulação das consciências, implica reconhecer um compromisso ético ou
contrário à ética na prática persuasiva. Em alguns casos se buscam fins positivos
para os receptores, como formar ou informar para a liberdade, em outros, os fins são
a defesa de interesses econômicos e políticos, favoráveis, apenas, aos persuasores.
30
O êxito da Comunicação persuasiva está vinculado a estímulos
comunicativos, segundo Meio de Comunicação, canal e mensagem; predisposições
psicológicas, de acordo com a personalidade; e processos mediadores de caráter
psicológico e sociolingüístico, como atenção e compreensão.
Na mensagem têm grande relevância os fatores que exploram os
sentimentos e os fatores de prestígio e de credibilidade do emissor e fonte. A
eficácia da persuasão pode se realizar através de processos psicológico-sociais
paralelos, que podem ser: conformidade com a mensagem aceita pelo receptor por
considerar que produz efeito social satisfatório; identificação com a idéia ou produto;
e internalização de significado que, além de gratificante, se acredita coerente com o
sistema de valores que se possui (ROIZ, 1996).
Segundo Roiz (1996), entre as regras e os procedimentos gerais para a
persuasão, temos: a exploração dos sentimentos – uso da emoção do público-alvo
para que se produza euforia acrítica e se baseia na dependência que os indivíduos
têm em obter informações e significados; a simplificação dos apelos – tendência de
se perceber e compreender os fatos, os problemas e as soluções de modo simples e
parece depender da perspectiva mental de recepção, das condições de
Comunicação e das características do meio que transmite a mensagem; o exagero e
o desvirtuamento da informação – a informação relevante e significativa que pode
produzir impacto não é oferecida em bruto, nem de maneira objetiva, mas carregada
de conteúdo político, ideológico ou comercial; a repetição de temas e idéias de
maneira articulada – a persuasão utiliza, em maior ou menor grau, a repetição de
juízos de valores ou idéias do emissor; a exploração do contágio psíquico – que
pode tender conformidade, visto que indivíduos que pertencem a um mesmo grupo
são muito sensíveis às reações dos demais; e o apoio de atitudes preexistentes –
busca estreitas associações possíveis das informações com os argumentos
persuasivos selecionados, além de saber explorar gostos, desejos e fantasias dos
públicos, hábitos e costumes tradicionais.
A manipulação pela palavra ou imagem pode implicar, ainda, a busca
deliberada de efeitos de minorias para maiorias sobre decisões, defesa de posições
políticas e econômicas e de valorização de grupos de pressão e de instituições que
31
podem influir na criação de hábitos de aquisição e de consumo, normalização do
consumo cultural, perda do prestígio cultural de classes sociais e homogeneidade de
aspirações.
A manipulação mais extrema parece ser a que determina uma visão de
mundo e de realidade, esta é a manipulação ideológica que tenta destruir o
contrário, os sistemas de conhecimento como a ciência, e os sistemas de convicção
como as crenças. Com o tempo, a manipulação parece tentar impor sobre os grupos
sociais pautas de consumo previstas, orientações de voto e tipo de comportamento.
Da manipulação vamos para outro processo negativo da Comunicação
persuasiva, a violência simbólica, caracterizada por Pierre Bourdieu, que descreve o
processo pelo qual uma classe social se impõe sobre outra, através de suas
representações. Impõe significados culturais dissimulando relações de força,
econômica, política e ideológica, através do controle dos mecanismos de reprodução
educativa e cultural. Segundo Bourdieu (1997), o sistema político pratica a violência
simbólica para manter e reproduzir a ideologia oficial na sociedade e assim garantir
o status quo.
Para Pross (apud ROIZ, 1996, p. 21), violência simbólica se denomina a
pressão institucional que se exerce sobre outras pessoas e grupos sociais por
intermédio de signos e símbolos da Comunicação, para dar validade ou impor a
aceitação de determinados significados aos atos com o resultado que os
destinatários ou receptores se identifiquem com o sentido do que se afirma na fonte
da informação.
Na violência simbólica, os sistemas de valores dos atos, dos
acontecimentos, das pessoas, por parte da fonte, estão plantados verticalmente e
orientados de modo hierárquico, pelo que se impõe o poder da verdade do emissor,
seja ou não uma verdade objetiva, intencionado assegurar a validade de certos
significados constituídos de maneira hierárquica.
Esta forma de pressão tem relação com os processos de representação e de
identificação da realidade. Esta estrutura autoritária se opõe à estrutura horizontal,
32
natural da existência humana, em que a Comunicação interpessoal permite um nível
igualitário e transacional de Comunicação humana.
Os Meios de Comunicação de Massa podem exercer esta violência
simbólica, impondo seu tempo e ritmo, em seus conteúdos, símbolos e mitos. A
violência simbólica parece se reproduzir em série, como espetáculo e sensação, e
pode se articular como instrumento a serviço da Publicidade e da Propaganda, que
tornam possíveis a identificação dos sujeitos receptores com os valores hierárquicos
das instituições de controle e ação sócio-comunicativas, como as empresas e os
partidos políticos.
De acordo com Roiz (1996), existem outras formas de persuasão: os
modelos de conduta, observados nos poemas, nas novelas, nas histórias e nos
relatos, que transmitem exemplos de casos singulares de ação humana e do que
convém ou não fazer em certas situações; e os modelos sentimentais, como as
novelas, que servem como padrões ideais de comportamento laboral e social.
Os modelos simplificados da vida real, como liberdade e bem-estar, podem
ser usados como mecanismos de apoio de argumentos emocionais e com fins
práticos. Os procedimentos persuasivos derivam de regras, operações necessárias
para elaborar mensagens segundo os propósitos desejados. Regras são princípios
que justificam operações formais, postuladas pelas teorias e perspectivas de análise,
compreensão e explicação do comportamento, que fundamentam as técnicas de
persuasão.
12
As técnicas modernas de persuasão compreendem três gêneros
comunicativos: a persuasão cognitiva da informação, relacionada à transmissão de
informações cotidianas – Jornalismo; a persuasão ideológica identificada com a
Propaganda de qualquer natureza; e a persuasão comercial voltada para a
Publicidade de produtos, de serviços e de marcas comerciais.
12
Técnicas são modos e sistemas de Comunicação persuasiva que operam como conjunto de regras
e procedimentos em aplicação a campos específicos da atividade humana, como difundir idéias e
tornar conhecidos produtos e marcas (ROIZ, 1996).
33
A Propaganda parece ter a intenção de utilizar a Comunicação e seus
recursos para nortear grupos e indivíduos, a fim de orientá-los a que ajam em uma
direção esperada, com objetivo pré-fixado. Está calcada sobre a necessidade dos
indivíduos de saberem, de obterem informações e de terem uma opinião, além de
suas necessidades de explicação, de compreensão, de auto-afirmação e de
participação na vida coletiva.
A Propaganda cria a comunidade ideológica e acentua os laços de afiliação,
promete libertação de todas as limitações e dos medos e esperança de uma vida
melhor. Tem como objetivo o ideológico, impondo a explicação de uma ideologia,
visando a uma adesão estável, parece procurar influenciar as atitudes fundamentais
do sujeito, quer, de maneira intencional e consciente, apoderar-se da totalidade do
psiquismo do indivíduo. Pode utilizar valores absolutos como liberdade, justiça e paz.
Os persuasores, independentes de seus fins, utilizam princípios e regras
gerais e, também, alguns outros específicos, para elaborar suas mensagens e suas
campanhas. São eles: o emprego dos Estereótipos ou clichês e do preconceito; a
substituição de nomes comuns e adjetivos por outros de signo positivo ou negativo,
com valores extremos, carregados de intensidade, favorável ou não; a seleção de
fatos, considerados mais adequados, de um conjunto de dados complexos, referidos
a uma realidade determinada; a utilização deliberada da mentira para obter efeitos
positivos; a repetição de palavras-chave e frases feitas; a ênfase em afirmações
fortes e pontuais do programa ou do fato; a apelação à ameaça de alguém externo,
um inimigo real ou em potencial, que permite desviar para os adversários aqueles
problemas internos do grupo ou da instituição persuasora, fortalecendo a coerência
e o nível de integração do grupo emissor, elevando o grau de moral interna e
provocando um maior ou menor estado de entusiasmo e de confiança; o recurso do
uso de alguma autoridade técnica ou moral; e a individualização ou a personalização
dos adversários, portadores de conteúdos políticos ou ideológicos relevantes.
A Propaganda utiliza os Meios de Comunicação de Massa, que podem
exercer poder de influência e de persuasão sobre os receptores. Já a Publicidade,
que, também usa a Mídia, parece oferecer, com a posse dos objetos e dos serviços
de identificação, o meio de modificar a imagem da pessoa, de aumentar o poder
34
pessoal, aumentando o ter. A Publicidade se baseia nas trocas e no comércio,
instiga a participação, a imitação e a identificação e oferece modos, cada vez mais
rápidos e eficazes, para resolver problemas práticos, aumentar e preencher o prazer
e o lazer e facilitar a vida.
A Publicidade tem como ponto principal o comercial e influi na conduta do
consumo, orientando o público para determinada marca, produto/serviço ou
empresa, apelando para a exploração dos sentimentos. Está ligada ao conjunto de
sistemas da sociedade de consumo e pode ou não criar estados de espírito, no qual
os indivíduos podem perder sua autodeterminação. Há, na Publicidade, uma auto-
satisfação narcisista ou de prestígio social, de estar na moda, de sentir-se jovem e
de participar das tendências.
Retomaremos, agora, os aspectos históricos do desenvolvimento da
Publicidade, da Propaganda e dos Meios de Comunicação.
Registros antigos mostram que a Propaganda e a Publicidade eram
utilizadas já no Egito: um fragmento de papiro egípcio relatava a fuga de um escravo
naquele país. O papiro, segundo historiadores, tem em torno de três mil anos e deve
ser o primeiro anúncio escrito que se tem notícia na história da civilização e indício
de Publicidade, visto que o escravo era considerado mercadoria, um bem material
como outro objeto qualquer, naquele período da história (MALANGA, 1977).
Segundo Malanga (1977), na própria Grécia, havia os grandes oradores que
faziam discursos com objetivos políticos e comerciais, registrando os primórdios da
Propaganda e da Publicidade. Assim, estes homens, que sabiam falar bem em
público, tinham facilidade de expressão e apregoavam ideologias e divulgavam
alguns produtos, designando Propaganda, quando tratavam de questões ideológicas
e políticas, e Publicidade, quando apresentavam bens materiais para consumo da
população.
Outras referências de Publicidade eram as tabuletas, encontradas na China
e em Roma, há 2.000 anos, indicando lugarejos e casas, onde se vendiam
mercadorias. Na Roma Imperial, encontramos, ainda, a Publicidade falada. No
35
Fórum Romano, a troca de mercadorias entre os vários comerciantes era feita
oralmente e o apregoador divulgava virtudes e qualidades dos bens oferecidos,
inclusive a venda de escravos, que eram expostos como mercadoria neste momento
histórico (MALANGA, 1977).
Como resultados deste efetivo comércio, apareceram, na praça romana, os
primeiros sinais de Publicidade e de Propaganda escritos, através de tabuletas, que
anunciavam combates de gladiadores, e de pequenos cartazes, que indicavam as
características de escravos fugitivos. Naquela época, a vida social em Roma
permitia apenas o emprego de tabuletas ou da palavra falada.
Através das ruínas de Pompéia, percebemos que a Propaganda política já
era praticada, pois, gravados nas paredes, há sinais de convites ao povo para votar
em determinado candidato. Assim como painéis anunciando combates de
gladiadores, ostentando como complemento os reclames de diversas casas de
banhos e de medicamentos.
Dos primeiros registros à Idade Média não houve realmente evolução: a
palavra falada continuou como forma principal de divulgação ideológica e comercial
e o emprego de tabuletas.
Na Inglaterra, o orador desempenhou papel relevante, como divulgador e,
até hoje, em certas localidades, as notícias governamentais são lidas por arautos,
precedidas por toques de clarins. O arauto, treinado para falar em público, além de
ser utilizado para divulgação de notícias, era chamado para apregoar doutrinas
políticas e produtos comerciais. Já no ano de 1500, ocorreu grande desenvolvimento
no campo das artes. Surgiu William Shakespeare e, em conseqüência, o teatro
(MALANGA, 1977).
O Teatro de Shakespeare – época da Rainha Elizabeth – não tinha teto e
sua arena formava um semicírculo. Na arena do teatro, permaneciam artistas e
espectadores sem qualquer separação entre eles. O público sentava-se no chão ou
permanecia de pé aos gritos. Shakespeare resolveu introduzir prólogos em suas
peças, a fim de acalmar o barulho dos espectadores. Havia um tipo de prólogo, entre
36
dois personagens, que não quebrava a continuidade da peça. Outro tipo, o marcial,
era feito com tremendo barulho, procurando superar a confusão da multidão. Isto
pode nos remeter as atuais vinhetas ou chamadas que separam os programas de
TV dos intervalos comerciais.
Para que o público soubesse que haveria espetáculos, se hasteava uma
bandeira em um mastro. Os interessados em assistir às representações teatrais
mandavam seus escravos verificarem se a bandeira estava ou não hasteada.
De acordo com Malanga (1977), outro simbolismo importante deste período
na Inglaterra era que, como as casas e as ruas não eram numeradas e nem
possuíam quaisquer designações, o comerciante que desejasse identificar sua loja
utilizava um elemento referencial. Assim, uma peruca identificava uma barbearia e
uma cabeça de boi fazia menção a um açougue. Estes emblemas antigos
transformaram-se em marcas de comércio, o que nos mostra uma evolução.
Por 14 séculos, a Publicidade quase desapareceu, não havendo sinais
concretos de desenvolvimento. Somente em 1454, quando Gutenberg inventou a
Imprensa, surge um novo meio que predomina até hoje: a palavra impressa. Isto
alterou o panorama das comunicações. Inicialmente, não como Publicidade, apenas
como divulgação de fatos e uma concepção nova, originada pela palavra impressa.
Outro fator aliado ao surgimento do Jornal foi a produção em massa, uma nova
concepção que nasceu no final do século XVIII e que modificou o cenário mundial
(MARCONDES; RAMOS, 1995).
De Gutenberg até aproximadamente 1770, a evolução foi muito lenta, mas
houve desenvolvimento e não se pode negar que o incremento da Publicidade e da
Propaganda está intimamente relacionado aos Meios de Comunicação.
Segundo Marcondes e Ramos (1995), durante este período, os jornais norte-
americanos e ingleses começavam a aceitar anúncios pagos. No início, o jornal não
precisava de anunciantes. Em pequenos formatos e reduzido número de páginas,
vivia da venda de assinaturas. Mas, quando surge o anúncio, aparece, também, uma
nova fonte de receita. É neste momento que começa a Publicidade moderna, com
37
anúncios pagos e que, de certo modo, ajudavam a manter o jornal e refletir o cenário
da época.
No século XVIII, quando surgiram os primeiros cartazes murais na França,
com artistas renomados como Toulouse-Lautrec e Cheret, e, posteriormente, nos
Estados Unidos, o panorama das grandes cidades não seria mais o mesmo.
Por volta de 1800, período da Revolução Industrial na Inglaterra (1780), os
veículos de divulgação sofreram considerável modificação. Em 1776, James Watt
criou a máquina a vapor que foi rapidamente incorporada à produção. Um novo
cenário surgiu: as fábricas, que aliavam a força humana à força da máquina. Criou-
se uma nova conjuntura, na qual se produziam mercadorias em maior número, para
atender a um mercado consumidor crescente, concentrando a população em
grandes centros urbanos, as cidades. Em virtude desta produção em massa, graças
aos recursos das máquinas e de novos instrumentos de trabalho, tornou-se
necessária a ampliação do mercado consumidor, o que foi possível através da
Publicidade.
Independente das condições sociais e de trabalho geradas pela produção
capitalista, que a própria história nos mostra cruel em diferentes aspectos, como a
exploração da mão-de-obra humana, a desapropriação dos meios de produção, a
perda da aura produtiva, na qual uma pessoa ou família era responsável do início ao
fim pela confecção de um bem e que ganhava por este utensílio o valor real de
produção, e a crescente miséria das massas, este momento histórico serviu como
marco para compreendermos os avanços na necessidade de divulgar produtos e de
reforçar princípios e nas técnicas resultantes disto. Parece ser, neste ponto histórico
marcante, que a Publicidade e a Propaganda se desenvolvem de maneira acelerada
e com o peso social e ideológico que vemos hoje.
No início do século XX, surgiu no contexto comercial os Estados Unidos da
América do Norte, um país forte, mudando a mentalidade da Publicidade. Capitalista
por excelência, os EUA apresentavam-se com técnicas e formatos inovadores,
incrementando o mercado publicitário mundial. Alteraram a mentalidade negativa
que por muito tempo acompanhou a Publicidade de que anunciar é fraudar,
38
reforçada por velhos industriais, que anunciavam produtos com defeito ou
encalhados.
Segundo Marcondes e Ramos (1995), no começo deste mesmo século,
tivemos, ainda, as grandes revistas norte-americanas, francesas e inglesas. Mais um
meio publicitário que apresentava um novo elemento: as cores. Em 1920, surgiu o
Rádio. Nos Estados Unidos, neste mesmo ano, já se começava a ter uma boa
divulgação através do meio radiofônico.
Já no Brasil, como em outros países, os Meios de Comunicação estão
relacionados de maneira íntima ao crescimento da Publicidade e da Propaganda, e
vice-versa. Vivemos séculos de exploração colonialista e somos influenciados por
países industrializados de todo o mundo, em especial, pelos Estados Unidos. Muitos
de nossos meios e formatos de programação refletem a cultura capitalista americana
e a européia, revestida para ser absorvida pela população brasileira. Mesmo as
agências de Publicidade e Propaganda que surgiram no Brasil, na década de 30,
vieram dos Estados Unidos e trouxeram toda a bagagem e a experiência americana
de anunciar.
A Publicidade nacional tem seu início em 1808, quando nasceu o primeiro
Jornal brasileiro
13
(a 10 de setembro), impresso no país e com possibilidade de
exploração comercial, a Gazeta do Rio de Janeiro que, em 1822, transformou-se em
Diário do Governo. Segundo Marcondes e Ramos (1995, p. 09), no periódico,
publicava-se o mais antigo anúncio de que se tem notícia, um anúncio de imóveis:
Quem quiser comprar uma morada de casas de sobrado, com frente para
Santa Rita, fale com Ana Joaquina da Silva, que mora nas mesmas casas,
ou com o Capitão Francisco Pereira de Mesquita, que tem ordem para as
vender.
A linguagem simples e direta dos anúncios da época ecoava velhos pregões
e lembra os atuais vendedores ambulantes. Anúncios de imóveis, de ensino e de
13
O primeiro Jornal brasileiro foi o Correio Braziliense, criado em 1º de junho de 1808, por Hipólito
José da Costa, considerado o fundador da imprensa brasileira. O periódico era impresso em
Londres e circulou no Brasil do ano de seu surgimento até 1822, um período histórico importante
no país, que compreende a fase da presença do rei D. João VI e sua Corte até a proclamação de
nossa Independência (LUSTOSA, 2003).
39
escravos (considerados mercadorias neste período de nossa história) eram os que
protagonizavam as páginas do Jornal.
Em 1821, surgiu outro jornal importante, o Diário do Rio de Janeiro, que se
apresentava como um jornal de anúncios, seguido pelo O Espectador Brasileiro e o
Almanaque dos Negociantes, em 1824. Em 1825, em Pernambuco, nasceu o Diário
de Pernambuco, o mais antigo jornal em circulação na América Latina e, em 1827, o
Jornal do Comércio, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, o Correio Paulistano (1854)
foi o primeiro jornal, seguido pelo Estado de São Paulo (1890), antes chamado de A
Província de S. Paulo (1875).
Nesta época, víamos uma sociedade crescente com o alargamento de um
comércio variado e heterogêneo, o surgimento de livrarias e cafés e,
conseqüentemente, o aumento dos pasquins de política, novelas, classificados,
artigos femininos e de atrações culturais. Nasceram, nos anos posteriores, as
revistas Lanterna Mágica (1844), Minerva Brasileira (1844) e Semana Ilustrada
(1860).
Em torno de 1860, começavam a aparecer as primeiras placas e painéis de
rua (pintados em paredes, madeira e metal), as bulas de remédios e os panfletos de
Propaganda. Os anunciantes prioritários eram as lojas, os hotéis, os artigos
importados e os fabricantes de remédios, que anunciavam em forma de verso e
quadrinha. Em 1875, os jornais O Mequetrefe (1875) e O Mosquito (1869)
inauguraram os anúncios ilustrados e desenhistas e caricaturistas encontraram um
mercado vasto em expansão.
Na seqüência de jornais importantes, encontramos O Mercúrio, em 1898,
jornal trimestral que passa a diário, comercial, impresso a duas cores, com textos de
poetas e desenhos feitos por artistas famosos, imaginativos e ricos em composição.
Em 1900, as revistas transformaram-se no grande fetiche. Semanais,
ilustradas, repletas de crônicas sociais, charges e sonetos (MARCONDES, 2002). A
Revista da Semana (1900) surgiu no Rio de Janeiro e, dois anos mais tarde, O
Malho, seguida por Fon-Fon (1907) e tantas outras.
40
Em São Paulo, revistas menores, que se mantinham com anunciantes locais
e elevado padrão técnico, como Vida Paulista (1903) e Arara (1904), continuaram
por longo tempo. A importação de novas técnicas de impressão fez multiplicar, nas
capitais carioca e paulista, os periódicos ilustrados e os anúncios ganharam mais
cores e novos formatos. As revistas, com fotos de senhorinhas, crônicas, sonetos,
reportagens leves e notas sociais dividiam espaço, com anúncios de cigarros,
teatros, perucas, alfaiates, lojas, moda e produtos de beleza.
De acordo com Marcondes e Ramos (1995), em 1908, surgiram os nossos
primeiros free-lancers de redação, que eram nada menos que escritores, como
Olavo Bilac, Emílio de Meneses e Basílio Viana. O primeiro grande painel ao ar livre,
chamado Reclame Yankee, data de 1910 e difunde o xarope Bromil.
Neste período instalaram-se as noções de profissionalismo, ordenação,
regularidade da Publicidade e a figura do agente (ou agenciador), preconizada por
José Lyra. E, entre 1913 e 1914, surgiu nossa primeira Agência de Publicidade,
chamada A Eclética, em São Paulo (MARCONDES, 2002).
Após a I Guerra Mundial (1914-1918), o número de anúncios em jornais e
revistas vai se avolumando. Quanto mais produtos fossem lançados, mais
Publicidade se fazia, e a qualidade dos anúncios também crescia com novos
formatos, desenhos e cores. Um enorme interesse pela aparência, fazendo com que
beleza e moda estivessem presentes nos anúncios do período, e a marca, em
destaque as americanas, começava a assumir um lugar de evidência. Em 1928, a
Revista O Cruzeiro representava a transição entre as décadas de 20 e 30 e surgiu
com matérias polêmicas, crônicas e variados anúncios (MARCONDES; RAMOS,
1995).
Quanto ao rádio, em 1927, surgiu no Rio de Janeiro nossa primeira estação
regular: a Rádio Educadora que se transformaria em Rádio Tamoio. Em 1930,
Roquete Pinto fundou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, mais tarde dio
Ministério da Educação.
41
A estação de rádio brasileira surgiu como fonte de divulgação cultural e
educativa e não se aceitava anúncios. O criador desta modalidade acreditava que a
rádio no Brasil devia nascer pura, sem influências comerciais e não veiculava
anúncios para não receber pressões de diferentes setores. Entretanto, os programas
começaram a melhorar, os custos ficaram maiores e, três ou quatro anos de seu
surgimento, não era mais possível manter uma estação de rádio no ar sem os
subsídios de alguém. Havia dois caminhos: cobrar do próprio ouvinte uma taxa,
como se faz na Inglaterra; ou permitir ao anunciante o uso da estação sob
pagamento. A escolha nós conhecemos bem.
A década de 30 iniciou-se turbulenta com a quebra da bolsa de valores de
Nova Iorque, em 1929, resultado de crises financeiras e desordem econômica,
atingindo preços, diminuindo o ritmo de produção e provocando desemprego,
afetando os países produtores e exportadores de matérias-primas, bem como
diminuindo a margem de lucro dos países industrializados, desacelerando a
economia, amortecendo o ritmo industrial e aumentando o desemprego nos países
ricos, como nos Estados Unidos, na França, na Inglaterra, entre outros (CARONE,
1991).
No Brasil, país exportador de matérias-primas, como o café, a crise
americana nos afetou, somada à revolução getulista de 30 e à constitucionalista de
32. O descontentamento político das classes agrárias gerou uma crise política, em
1930, que atingiu o governo de Getúlio Vargas e fez com que se aceitasse a
composição governamental entre militares e civis. Com isto, as oligarquias
burguesas nacionais, que lutavam contra o governo getulista e o tenentismo,
defendiam o retorno constitucional ao país, resultando na Revolução de 1932.
Neste período histórico tumultuado, vieram para o Brasil as primeiras
agências de Publicidade americanas, como a Ayer, a Thompson e a McCann-
Erickson. O país vivia um período de pouco desenvolvimento industrial e a principal
atividade econômica brasileira era a produção de café. Assim, a Agência Ayer foi
responsável pela primeira pesquisa de mercado, realizada no Brasil, em 1934,
solicitada pelo Departamento Nacional do Café, que visava a conhecer os hábitos de
consumo do produto e estimular sua venda (BRANCO, 1990).
42
O conhecimento e a experiência americanos em Publicidade contribuíram
para nossa Publicidade nacional e, apenas, em 1951, surgiu a primeira escola de
Propaganda do Brasil, que passava a formar profissionais qualificados e em terreno
pátrio (BRANCO, 1990).
Ainda na década de 30, o Rádio foi o grande atrativo. Da primeira estação,
em 1927, as rádios projetaram-se pelo Rio de Janeiro, São Paulo e Recife. Em um
formato voltado para noticiário e música, permitiam pouca divulgação. Segundo
Marcondes (2002), a Propaganda era restrita e limitava-se a simples locução de
textos. Mas, a partir de 1933, devido à necessidade de manutenção e de ampliação
do meio, apareceram os spots, os programas associados a marcas, os patrocínios e
os jingles.
Neste período, também, surgiram as revistas especializadas em
Propaganda, mostrando o poder que tal área começava a adquirir. Exitus, fundada
por Heitor Sarli, em 1932, foi a primeira revista brasileira no assunto. Teve curta
duração e, cinco anos depois, surgiu Propaganda, dirigida por Jorge Martins. A
Associação Brasileira de Propaganda (1937), com sede no Rio de Janeiro, foi
fundada, tendo como primeiro presidente Aldo Xavier. Este período marcava o início
da maturidade e do profissionalismo que a Propaganda e a Publicidade brasileiras
começavam a assumir.
Os anos entre 40 e 50 foram marcados pela II Guerra Mundial (1939-1945)
que se estendeu pela Europa e afetou o mundo inteiro. Os anunciantes continuaram
a anunciar e as novelas de Rádio no Brasil permaneciam sendo um grande sucesso,
mas a insegurança e os recursos destinados a outros segmentos, como ao
incremento da indústria bélica, refletiram-se na forma de fazer Publicidade e
Propaganda no país e no mundo.
O Rádio permaneceu o meio mais explorado por anunciantes, com novos
slogans. Ampliaram-se os programas com prêmios para o auditório e lançou-se o
Repórter Esso (1941), reverenciando-se como “testemunha ocular da história”. No
cenário turbulento e instável da guerra, a Publicidade adotava temas e palavras que
conduziam ao conflito, como “Piralgina destrói qualquer dor”. Passada a guerra,
43
tivemos uma fase de re-investimento. Grandes patrocinadores, muitos slogans e
rimas. A indústria avançava, o crediário em diversos setores trazia possibilidades de
consumo para diferentes pessoas e novos anunciantes inclinavam-se a anunciar,
como as incorporadoras de edifícios e loteamentos.
Logo após a Segunda Grande Guerra, surgiu outro Meio de Comunicação: a
Televisão. Sob o aspecto da Publicidade, tinha (e, ainda, tem) um grande valor, pois
colocava, dentro de nossa casa, uma pessoa que nos apresentava um produto,
demonstrando a sua importância, para que efetivássemos a compra. A
simultaneidade, a novidade e o glamour que acompanharam a Televisão
transformaram-na em uma fonte inesgotável de experimentos e de lucratividade para
as empresas que anunciavam e para as que detinham o direito de exploração do
meio. O que podemos perceber nos dias de hoje, também.
Assim, em 18 de setembro de 1950, graças aos esforços do empresário
Assis Chateaubriand, inaugurou-se em São Paulo a TV-Tupi (canal 4), a primeira
emissora brasileira da América Latina e, deste modo, tornamo-nos o quarto país do
mundo a transmitir imagens de TV (MARCONDES, 2002).
De acordo com Marcondes e Ramos (1995), esta nova fase ampliava as
possibilidades de se fazer Publicidade. Era a época dos comerciais ao vivo, a
oportunidade de se mostrar e demonstrar o produto em funcionamento para
telespectadores encantados com o novo meio audiovisual.
A industrialização crescia no Brasil, no governo de Juscelino Kubitscheck, e
o espírito desenvolvimentista invadiu as empresas, as cidades, os lares e o
comportamento das pessoas. Vimos a construção de Brasília, símbolo da
modernidade planejada, e o desenvolvimento da indústria automobilística nacional.
Neste cenário, foi fundada a primeira Escola de Propaganda Brasileira
(1951), com orientação ao aspecto prático da área. Entre seus idealizadores e
professores estavam profissionais destacados no mercado, como Rodolfo Lima
Martensen, Ítalo Éboli, Renato Castelo Branco, Antônio Nogueira, Geraldo Souza
Ramos, seguidos por Geraldo Santos, Francisco Gracioso e Roberto Duailibi, entre
44
outros. Segundo Marcondes (2002), tivemos, também, o 1º Congresso Brasileiro de
Propaganda, em 1957, representando o início da institucionalização e da
regulamentação da atividade no país.
Segundo Marcondes e Ramos (1995), começava a circular a Revista
Manchete em 1952. E nas revistas, novos conceitos de produtos, novas opções para
o consumidor. Havia uma grande preocupação com o mercado. Surgiram promoções
e novas técnicas de vendas.
A Televisão foi ganhando espaço e ampliando suas formas de utilização. O
Rádio foi se modificando também, segmentando-se em música e notícias, já que
começava a competir com a TV. A linguagem publicitária sofreu alterações. Dos
tradicionais anúncios que destacavam qualidades objetivas e usos dos produtos,
passamos a uma fase na qual se rompia com esta fórmula pronta e tão comum na
Publicidade brasileira.
De acordo com Marcondes e Ramos (1995), o anúncio do creme dental da
marca Kolynos, “Ah!... gente dinâmica prefere Kolynos”, foi o referencial desta nova
etapa. Já não era mais necessário ser direto e objetivo para agradar o consumidor.
Um novo período de criatividade e de inovação apregoava a Publicidade nacional.
Além do apelo e da linguagem, os layouts mudaram e tornaram-se mais impactantes
e atraentes aos olhos do consumidor.
A linguagem publicitária passava a incorporar a liberdade e a sensação de
progresso daqueles tempos e o tom ufanista e a ênfase à modernidade estavam
presentes nos discursos da Publicidade e da Propaganda.
Para Marcondes (2002, p. 38), a Publicidade começava a ter o papel que
encontramos hoje,
de espelho no qual todos nos olhamos e onde temos uma referência aceita
e comum de quem somos, o que andamos fazendo de bom, o que é
moderno e o que não devemos perder de jeito nenhum, sob o risco de
ficarmos por fora dos avanços da história.
45
A década de 60 é marcada pela criatividade no meio publicitário e pela maior
profissionalização do pessoal, encarregado da divulgação, assim como pela atenção
especial à criação e ao afastamento gradativo da argumentação racional e a
substituição ao apelo emocional, bem como a renovação da linguagem. Neste
período, também, vimos uma maior atenção às agências brasileiras e as fusões de
agências.
Tivemos a Revolução de 1964, chamada, ainda, de contra-revolução, na
qual o povo e as Forças Armadas saíram às ruas e depuseram o governo, uma
revolução pacífica, sem mortes e fuzilamentos, que reivindicava democracia e o fim
do regime ditatorial. O choque político entre as forças políticas e sociais, que
defendiam mudanças estruturais, com os que protegiam a continuidade do regime
imposto pelo então presidente João Goulart resultou na revolução, que proporcionou
o assentamento da democracia nacional.
Neste clima revolucionário, a Publicidade e a Propaganda criavam temas e
conceitos baseados no ufanismo nacionalista, na ideologia progressista e no
sentimento pátrio.
Em 1962, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 4.117, que instituiu o
Código Nacional de Telecomunicações. Em 1963, o Decreto nº 52.026
regulamentava os serviços de radiodifusão e, em 1967, o Decreto-Lei nº 236
estabeleceu que nenhuma entidade ou pessoa poderia ter participação em mais de
dez emissoras de Televisão (cinco, no máximo, devem ser VHF) em todo o país –
fato que parece burlado pelos empresários brasileiros.
Vimos a aprovação, em 1965, da Lei 4.680, que vinha a regularizar as
atividades de Publicidade e de Propaganda no país, e o lançamento, no mesmo ano,
de uma rede nacional de telecomunicações, a Embratel, que viria a promover a
estrutura de telecomunicações no Brasil. Ainda, em 1965, foi fundada a Rede Globo
de Televisão, por Roberto Marinho, e, em 1967, foi inaugurada a Rede Bandeirantes
de TV, pelo empresário João Saad.
46
Tivemos, neste período, a diversificação de Meios de Comunicação, a
seleção de revistas especializadas, como, no ano de 1968, o lançamento, pelo
Grupo Abril, da Revista Veja.
Surgiram, também, pequenas agências com foco na criação, alteraram-se as
formas de remuneração das agências, multiplicaram-se o ensino de comunicações,
ampliou-se o Jornalismo especializado, lançou-se o Anuário Brasileiro de
Propaganda (1969), criou-se o Conselho Nacional da Propaganda e houve um
incremento das pesquisas no setor.
O clima brasileiro era positivo com movimentos artísticos e culturais, como
Tropicalismo e Jovem Guarda.
Surgiu o videoteipe (VT) que viria a revolucionar a TV brasileira,
possibilitando a gravação de programas e sua reapresentação.
Os anos 70 e 80 surgiram com muita expectativa. Os Meios de
Comunicação, em grande expansão, continuaram a oferecer possibilidades
inovadoras de utilização ao setor publicitário. E a Televisão, fenômeno de nosso
tempo, encheu os lares brasileiros de cor. Em 1972, nasceu a TV em cores. A
novela, o produto da Televisão brasileira mais forte e conhecido mundialmente,
fascinava cada vez mais (MARCONDES, 2002).
Tivemos a chamada Terceira Revolução Industrial, com a introdução de
novas tecnologias, da informática, da microeletrônica e dos novos processos de
produção, robotização e automação (GUARESCHI; BIZ, 2005).
A ditadura militar brasileira, a censura, a inexistência de eleições, a
proibição, pairando no ar, fazia com que áreas, como a cultura e a arte, projetassem-
se e se tornassem uma forma de ludibriar a vigilância dos censores. No teatro, no
cinema, na música, nas artes plásticas, todos usavam a arte para expressar sua
indignação pela dureza do regime militar. Jornais e revistas foram censurados,
47
alguns, como Correio da Manhã
14
(1901) e Diário de Notícias (s.d.), ambos do Rio
de Janeiro, deixaram de circular. E, contraditório a este período no qual não se podia
dizer nada, ampliou-se a tiragem de revistas masculinas, como Playboy (1953) e Ele
& Ela (1969) (MARCONDES; RAMOS, 1995).
A mentalidade do consumidor começava a mudar e o preço, em um cenário
em que a inflação era ameaçadora, era o fator preferencial ante a qualidade ou a
variedade dos produtos. Na Publicidade, o planejamento e as pesquisas tomavam
lugar de projeção e o setor se profissionalizava ainda mais com a aprovação, em
1978, do Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária e do Código
Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária – CONAR (oficializados em 1980),
documento classista que visava a normatizar, de maneira ética, a atividade
publicitária, impedindo abusos do setor contra a sociedade e o consumidor
(MARCONDES, 2002).
Nesta época, também, se regularizava a profissão de publicitário e
fortaleciam-se as Associações de Propaganda (AP), entidades regionais, que
defendiam os interesses da atividade e a melhoria do negócio pelo país.
O Marketing Direto experimentou um crescimento considerável no final da
década de 70, com o aumento do uso da mala direta por editoras, indústrias,
imobiliárias e instituições financeiras. Em menos de uma década “as vendas pelo
reembolso postal cresceram quase 2.000% em volume de dinheiro e 300% em
quantidade de objetos” (PINHO, 1998, p. 41).
Os anos 80 foram marcados pelos jovens executivos e empreendedores à
caça de fama e dinheiro, os yuppies. O mercado se intensificava. O Japão e sua
indústria tecnológica desenvolvida, com produtos bons e mais acessíveis que os
ocidentais, invadiram o cenário mundial, espalhando os seus produtos pelos quatro
14
O Jornal Correio da Man surgiu, em 1901, com uma linha participante e combativa e buscava
romper com o governo Campos Sales, que presidia a política de estagnação. Segundo Sodré
(1999, p. 287), o periódico opunha-se à “placidez aparente, alcançada pelo suborno, pela
sistematizada corrupção, institucionalizada a compra da opinião da imprensa”. Entre 1964-65,
representava o “baluarte das liberdades individuais”, no protesto e na denúncia das torturas e
arbitrariedades, típicas deste período histórico. Em represália, as agências estrangeiras contaram a
Publicidade do veículo, que resultou em seu enfraquecimento financeiro, dispensa de redatores e
colaboradores, interferência estrangeira e, conseqüente, fechamento.
48
cantos do mundo, inclusive, nos Estados Unidos, e adquirindo empresas, como o
controle da RCA, da Columbia Pictures, da CBS Records, entre outros ícones do
poder capitalista americano.
Iniciou-se o fenômeno da segmentação no mercado editorial do Brasil,
pressionado pela sofisticação do mercado, pela concorrência e pelos novos recursos
tecnológicos de produção. A maior Revista feminina, Cláudia (1961), passou pelo
processo de adequação, aumentando seu formato, incluindo seções fixas e
ampliando seus interesses editoriais (MARCONDES; RAMOS, 1995).
A Rede Globo de Televisão comemorava o seu décimo quinto aniversário
com total liderança tecnológica, mercadológica e de audiência e em um processo de
sofisticação de vinhetas, chamadas, apresentações e quadros dentro de programas.
Nasceu, em 1981, o SBT, de Silvio Santos (família Abravanel) e, três anos depois, a
Rede Manchete, da família Bloch.
A década de 80 teve na política aspectos importantes, como as primeiras
eleições diretas para o Executivo, em 1982, e o movimento pelas Diretas Já, em
1984.
A década de 90 foi marcada pela valorização da qualidade, baseada no
modelo japonês de qualidade em todos os aspectos que envolvem a produção e a
aquisição de produtos e serviços. Os países ocidentais, como os Estados Unidos,
moldaram-se à nova exigência.
O consumidor desta década, protegido pelos órgãos de defesa e por uma
política global de valorização como cliente preferencial, transformou-se no ponto
principal de atenção e de entendimento para empresas em todos os setores de
atuação. Foi promulgado, enfim, no ano de 1990, o Código Nacional de Defesa do
Consumidor no Brasil.
Os anos 90 foram assinalados, ainda, pela fusão e pela aquisição de
empresas em todo o mundo. Começavam a ser criados os megagrupos, as
megacorporações transnacionais, conglomerados dos mais diversos setores,
49
inclusive da Comunicação, aglutinando poder econômico e rompendo barreiras
geográficas. A economia brasileira se abriu aos produtos importados e novos
anunciantes chegaram ao Brasil. Muitas empresas se uniram para enfrentar um
mercado mais competitivo pela presença de marcas internacionais.
A Internet se popularizou, a partir de 1995, através da web, com suas
qualidades, como criatividade, liberdade, cooperação, reconhecimento e com a
possibilidade de interatividade, que nenhum outro Meio de Comunicação parece
possuir. Como possibilidade de Mídia, no Brasil, iniciou-se com escassez de acesso,
mas muito potencial.
Conforme Castells (2003), a Internet é um Meio de Comunicação que
permite a Comunicação de muitos com muitos numa escala global, como sistema de
Comunicação e organização, tem seu uso aguçado nos últimos anos, formando uma
nova sociedade – a sociedade de rede, composta por todas as pessoas que, de uma
forma ou de outra, estão conectadas a esta nova cultura.
Entramos no chamado mundo globalizado, que, segundo Sodré (apud
MORAES, 1997, p. 134), favoreceu e favorece a desigualdade econômica e política
em escala mundial. A globalização e o mercado são os significantes, que articulam a
construção sócio-lingüística de uma realidade, em consonância com a ideologia
neoliberal, que disfarça o capital financeiro e os mecanismos de desemprego cada
vez maiores. Fora do centralismo financeiro do capital, tende a impor-se como
ideologia e virtualidade.
Ainda nos anos 90, os investimentos, no mercado publicitário, diminuíram e
as verbas encurtaram. A competência mercadológica, os conhecimentos de
Marketing, de pesquisa e de planejamento deram lugar à originalidade e à
genialidade por si só.
A TV por Assinatura segmentava o mercado televisivo e as agências de
Publicidade e Propaganda demoraram a investir nesta alternativa. Em 1990, a
americana Music Television – MTV, por iniciativa do Grupo Abril, entrava no
mercado televisivo brasileiro, quebrando o tabu de que a TV só funcionava se fosse
50
para grandes massas e implantava um modelo inovador, com sua programação
voltada, com exclusividade, para os jovens.
A Televisão segmentada teve e, ainda, tem seu foco em públicos mais
definidos e uma temática mais especifica, dividindo-se em assuntos como esportes,
filmes, notícias, entre outros. A tendência de segmentação tão comum em Revistas
passava, a partir dos anos 90, para a TV, redefinindo as relações dos espectadores
com o meio.
Com a ECO 92 – Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento (CNUMAD) ou Rio-92
15
– evento internacional de Ecologia,
realizado no país naquele ano, com a presença de representantes de mais de 178
países, sendo a grande maioria chefes de governo, tendo como objetivo conciliar o
desenvolvimento com a conservação dos ecossistemas, houve um aquecimento no
mercado publicitário e nas publicações voltadas à ecologia. Emissoras de TV e de
rádio intensificaram programas relacionados ao tema e atraíram grandes
anunciantes dispostos a investir milhões em projetos e em campanhas ecológicos.
A ECO 92 foi o ponto inicial para a preocupação com o meio ambiente e
embasou eventos como a conferência em Kyoto no Japão, em 1997, que deu origem
ao Protocolo de Kyoto, no qual a maioria das nações concordou em reduzir as
emissões de gases poluentes que ameaçam a camada de ozônio e intensificam o
“efeito estufa”; e o Congresso da ONU, em Estocolmo, em 2001, que adotou um
tratado para controlar 12 substâncias químicas organocloradas. Em 2002, foi feita a
reafirmação dos princípios da Agenda 21, durante a Cúpula de Joanesburgo, ou
Rio+10.
15
A ECO-92 foi resultado de um processo conhecido como Agenda 21, construída de forma
consensuada, um plano de ação para ser adotado global, nacional e localmente, por organizações
do sistema das Nações Unidas, governos e pela sociedade civil, em todas as áreas em que a ação
humana impacta o meio ambiente. Foi um processo de planejamento participativo que resulta na
análise da situação atual de um país, estado, município, região, setor e planeja o futuro de forma
sustentável. Constitui-se na mais abrangente tentativa já realizada de orientar para um novo
padrão de desenvolvimento para o século XXI, cuja base é a sinergia da sustentabilidade
ambiental, social e econômica, perpassando em todas as suas ações propostas. Apresentou uma
proposta que rompe com o desenvolvimento dominante, no qual predomina o econômico, dando
lugar à sustentabilidade ampliada, que une a agenda ambiental e a agenda social. Além da Agenda
21, resultaram deste mesmo processo quatro outros acordos: a Declaração do Rio, a Declaração
de Princípios sobre o Uso das Florestas, a Convenção sobre a Diversidade Biológica e a
Convenção sobre Mudanças Climáticas.
51
Vimos, também, movimentos sociais e políticos significativos no cenário
nacional, como o impeachment do Presidente Collor, em 1992, e a eleição de
Fernando Henrique Cardoso, segundo presidente eleito pós-ditadura, em 1993.
Em 1995, a TV Globo completou 30 anos e detinha de 70% a 75% das
verbas, destinadas à Televisão no país, 57% das verbas geradas a partir das
agências e 63% da audiência, em média, do horário nobre nacional, resultando em
10 mil comerciais/dia, produzindo 78% do que ia ao ar (MARCONDES, 2002).
Nos anos finais do século XX, a Publicidade pareceu assumir um papel
fundamental na construção de marcas
16
fortes, de grande personalidade e valor. A
qualidade já era elementar e não mais fator de orgulho para as empresas. Os
produtos e os serviços assemelhavam-se em relação à tecnologia de seus
processos industriais, a seus canais de distribuição, à equivalência dos preços,
oferecidos ao consumidor, e aos investimentos em Comunicação mercadológica,
assim a valorização das marcas assumiu o diferencial entre concorrentes (PINHO,
2001).
O consumidor, mais seletivo, exigente, sensível e atento a seus direitos e a
suas necessidades, podia procurar soluções, que vinham ao encontro de seus
desejos, facilidade, comodidade e conforto.
A segmentação crescente dos veículos, os novos Meios de Comunicação,
como a Internet, as normas de mercado e a globalização criaram um conjunto de
fatores que encurtaram distâncias, inseriram o indivíduo em um mundo sem
aparentes fronteiras, mas que o fizeram perder seu caráter identificatório e
sufocaram-no em um excesso informacional, sem sentido (PAIVA, 2003). Neste
contexto, a Publicidade se encarregava de preencher lacunas e seduzir.
A marca parecia tornar-se o ponto focal de atuação da Publicidade e lhe
cabia fazê-la conhecida e reconhecida pelo consumidor, assim como as associações
16
Marca pode ser entendida como nome, sinal, símbolo ou representação gráfica, combinado ou não,
somado a um conjunto de características funcionais e valores simbólicos, que identifica produtos,
serviços e empresas e atribui valor subjetivo e significado para o consumidor (PINHO, 2001).
52
positivas e a busca constante por sua fidelização. A promessa e a expectativa
associadas à marca levavam ao consumo intenso, em uma cadeia viciosa de
procura incessante.
Hoje, a Publicidade parece atravessar uma nova fase, vive uma nova
tendência, conhecida como Unique Emotion Proposition – UEP, na qual se busca,
através das emoções, sensibilizar, encantar e seduzir o consumidor.
Vemos a segmentação nos Meios de Comunicação, que contribui para o
surgimento de uma imensa quantidade de veículos para atender a diferentes
demandas; altos custos dos investimentos em Publicidade e em Mídia; diversidade
de segmentos de públicos, potenciais e reais, para um mesmo produto ou serviço;
necessidade de criar relações duráveis com os públicos estratégicos das
organizações; a valorização da Comunicação organizacional; a Internet, como
possibilidade efetiva de Mídia; os modismos, como os blogs na web e os acessórios
decorativos para celular; entre outros fatores que delimitam o cenário atual.
Fortalecem-se as alianças, as fusões e as incorporações, criando a
oligopolização das Mídias, a concentração de comandos estratégicos e a
mundialização de conteúdos, mercadorias e serviços, facilitada pelas
desregulamentações, supressão de barreiras fiscais, acumulação de capital nos
países industrializados, deslocação geográfica das bases de produção e por redes
tecnológicas de múltiplos usos (MORAES, 1998).
Segundo Moraes (1998), na flexibilização dos investimentos empresariais, a
realização de lucros implica maior acumulação de capital ao menor custo, através de
amplos mercados consumidores, da concorrência intensa – megagrupos, da
reformulação estratégica das corporações transnacionais, que centralizam funções
de decisão e planos de inovação e coordenam a dispersão das operações
comerciais e industriais.
Estas fusões e alianças necessitam de munição financeira e know-how
tecnológico, reconcentração de capital em investimentos industriais de longo alcance
geográfico, com expectativa de grandiosos retornos em função da economia de
53
escala e de famílias tecnológicas, e necessidade de vultosos recursos para manter
capacitação tecnológica, diversificação produtiva, pesquisa de inovações e
competição em mercados internacionais e marketing global.
Os conglomerados formalizam estratégias de cooperação competitiva,
explicitadas em alianças nacionais e transnacionais, de curta, longa duração ou
duradoura, de acordo com objetivos e desdobramentos. As alianças ocorrem entre
corporações complementares, suplementares e concorrentes. Formam-se, ainda,
alianças setoriais – empresas de diferentes ramos e com base operacional em um
mesmo país, visando ao aproveitamento de interfases nas áreas de conhecimento e
de produção, inclusive entre competidores.
No setor da Comunicação, os aspectos negativos mais visíveis destas
parcerias são: a redução do nível de emprego, os cortes de custos que determinam
enxugamentos dos quadros de pessoal e a concentração e a internacionalização de
conteúdos – informação e entretenimento – nas mãos de poucos megagrupos de
Comunicação.
De acordo com Moraes (1998) e Guareschi (2005), no Brasil, encontramos
poucas famílias que detêm os Meios de Comunicação: Marinho (Globo); Civita
(Abril); Sirotsky (RBS); Saad (Bandeirantes); Abravanel/Silvio Santos (SBT); Bloch
(ex-Manchete); Mesquita (O Estado de São Paulo); Frias (Folha de São Paulo);
Nascimento Brito (Jornal do Brasil e Sistema JB de Rádio); Alves (Aluízio
Alves/Grupo Cabugi de Comunicações – RN); Daou (TV Amazonas); Câmara (TV
Anhanguera); Collor de Mello (Organizações Arnon de Mello – AL); Franco (Albano
Franco – SE); Antônio Carlos Magalhães (Globo – BA); Jader Barbalho (Band – PA);
e Sarney (Globo – MA).
Atualmente, segundo pesquisa DCS/Marplan, divulgada na Revista Amanhã
(2006, p.100), entre os Meios de Comunicação, o percentual da população
brasileira, atingida pelas diferentes Mídias, divide-se em: TV, com 98%, seguida pelo
Rádio FM, com 82%, Mídia Exterior, 73%, Revista, 50%, Jornal, 48%, Outdoor, 43%,
Rádio AM, 39%, Internet, 24% (concentrada entre as classes A e B), TV paga, 18%,
e Cinema, 17%.
54
A Publicidade e a Propaganda parecem se dividir entre as diversas Mídias,
para tentar atingir a grande massa de consumidores e de cidadãos do país. A
Propaganda pode se apresentar, cada vez mais, como possibilidade de divulgação e
de sensibilização, para agregar valor aos produtos, aos serviços, às marcas e/ou
organizações com e sem fins lucrativos.
A Propaganda, sem um instrumento regularizador que defenda o cidadão, ao
contrário da Publicidade que conta com o CONAR para proteger o consumidor, age
livre sobre os Meios de Comunicação, propagando ideologias, princípios e
interesses políticos, sociais e econômicos, sem restrições ou limites. A liberdade de
expressar idéias, crenças e informações parece ser mascarada na lógica da
sedução.
A Propaganda pode entrar em terrenos férteis e propensos a sua atuação.
Governos, regimes e instituições em todo o mundo se utilizam de suas técnicas para
chegar ao cidadão.
A Opinião Pública
17
que precisa da informação como base de entendimento
e ação fica sujeita aos Meios de Comunicação, responsáveis pelo transitar da
informação, e aos interesses de quem os detêm. As pesquisas de sondagem,
realizadas e divulgadas pela Mídia, parecem tomar um impacto decisivo na vida
política de seus protagonistas. Servem como posição estratégica de atitudes
políticas e dos próprios políticos e, também, da imprensa, como forma de ampliar as
vendas de jornais e revistas e aumentar a audiência nos programas de rádio e
televisão, resultando em uma pluralidade de interesses por trás de cada sondagem
(CHAMPAGNE, 1998).
17
Para Lane e Sears (1966), a opinião tem que ser sobre algo, pressupõe um objeto específico. É
uma reação verbal ou resposta implícita de um indivíduo a determinada situação estimulante, na
qual há uma questão de ordem geral suscitada. A Opinião Pública depende da informação sobre o
tema, das implicações e suas conseqüências, e produz uma série de processos sociais. O
processo de formação para a Opinião Pública inicia-se sobre uma opinião inicial, que é emocional;
passa pela busca da informação e gera uma opinião racional, ou seja, sai do nível individual para o
nível coletivo. O tema deve ser suficientemente relevante para gerar discussão pública. Segundo
Herbert Blumer, a opinião pública deve ser a tendência central fixada através da competição entre
opiniões antagônicas e, em conseqüência, ela é configurada pela força relativa e pela ação da
oposição entre as demais opiniões (BLUMER apud COHN, 1987, p. 184).
55
Os veículos de Comunicação, sobretudo a Televisão, colocam os líderes
políticos na lógica da Mídia de dimensão nacional e na busca, exaustiva, de
audiência, apresentando-os a um vasto e heterogêneo público pouco interessado
pela política e assistindo-os com olhos de simples espectador de um programa
televisivo. Os líderes preparam-se e ensaiam os seus papéis para entrar no mundo
fantasioso e deslumbrante da TV. O cenário para a discussão política e a troca de
idéias e de informação torna-se um grande espetáculo. Os publicitários e os
profissionais de Marketing político aproveitam este terreno fértil para criar imagens
públicas que se encaixam no inconsciente da população. O meio político pode ter se
adequado ao novo formato em busca de popularidade. Há uma relação de
interdependência entre os campos: jornalístico, publicitário e político.
Hoje, os Meios de Comunicação, a Publicidade e a Propaganda e os
interesses de grupos dominantes parecem unir-se para determinar o que será ou
não apresentado aos cidadãos-consumidores. Segmentos que estão no poder ou
que pretendem manter o status vigente se esbaldam na Mídia, pertencente a grupos
oligopolistas, que podem manipular a informação e transmitem os ideais de seus
próprios interesses, as suas idéias.
Assim, este é um dos propósitos deste estudo. Compreender aspectos
relevantes da Campanha Institucional dos 40 Anos do Jornal Zero Hora, que utiliza
fatos e depoimentos reais, para realizar o seu discurso de Propaganda e, ao mesmo
tempo, parece querer legitimar o papel e a Ideologia da empresa RBS, maior grupo
de Comunicação da Região Sul do Brasil, na sociedade.
Considerando o Poder da Propaganda e a sua interferência no cotidiano,
bem como o papel do Grupo RBS, buscaremos compreender a campanha, a sua
finalidade e a sua representão no contexto atual. Tais aspectos tornam-se
pertinentes para a área da Comunicação Social, pois o Jornalismo e a Propaganda
se encontram, para formar uma dobradinha, que sensibiliza e encanta o receptor: o
caso do dia, típico do Jornalismo, transforma-se em roteiro para o discurso da
Propaganda, e a RBS, maior produtora e controladora da programação regional local
em Televisão, Jornal e Rádio, parece beneficiar-se por reforçar seu discurso, através
56
do discurso do outro. Assim, é importante falarmos sobre o Grupo RBS e a
Campanha Institucional de Zero Hora, objeto deste trabalho.
2.2 O GRUPO RBS
A Rede Brasil Sul de Comunicação – RBS, da qual o Jornal Zero Hora e a
RBS TV fazem parte, se classifica como uma empresa multimídia regional, que atua
nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Tem como missão “facilitar a
comunicação das pessoas com o seu mundo”,
18
ressaltando o modelo de
Comunicação de alta interatividade, pregado pela organização.
A Rádio Gaúcha – originada da Rádio Sociedade Gaúcha (1927) – foi
fundada em 03 de julho de 1957, por Maurício Sirotsky Sobrinho, Frederico Ballvé,
Arnaldo Ballvé e Nestor Rizzo. Foi o estopim de um projeto para formar uma rede de
emissoras de rádio no interior do Rio Grande do Sul. Este projeto inicial resultou,
alguns anos mais tarde, na Rede Brasil Sul – RBS, que, atualmente, opera Rádio,
Televisão, Jornal, Internet, serviço de informação e “uma fundação social, voltada ao
desenvolvimento auto-sustentado, à construção da cidadania e à execução de
programas de atendimento aos direitos sociais básicos”.
19
A trajetória do poderio comunicacional do Grupo RBS começa, realmente,
nos anos 60, época em que existiam em Porto Alegre os jornais gaúchos: Correio do
Povo (1895), Folha da Tarde (1936) e Folha da Manhã (1969), da Companhia
Jornalística Caldas Júnior; o Diário de Notícias (1925), do grupo Diários Associados;
a Última Hora
20
(1960), de Samuel Wainer e o Jornal do Comércio (1933), da família
Jarros. Em 1964, com o golpe militar, foi fundado, em 04 de maio, por Ary de
Carvalho, um veículo com perfil regional, o Jornal Zero Hora, fruto legítimo da
ditadura militar e sucessor de Última Hora (BERGER, 1998).
18
Informações retiradas do site www.rbs.com.br> Acesso em: 18 out. 2006.
19
Idem, ibidem.
20
O Jornal Última Hora surgiu no Rio de Janeiro, em 1951, sendo um periódico de esquerda, que
apoiava Getúlio Vargas e mantinha uma linha editorial popular. O tablóide era impresso, também,
em Curitiba, São Paulo, Belo Horizonte, Recife, Niterói, Santos e, em 1960, Porto Alegre. Sai de
circulação após o golpe militar de 1964 (BIZ apud GUARESCHI, 2003, p. 33).
57
Em 1962, Maurício Sirotsky Sobrinho recebeu a concessão do canal 12 e
inaugurou a TV Gaúcha, em 29 de dezembro, em Porto Alegre. Em 1964, a TV
Gaúcha passou para o controle do Grupo Simonsen e Maurício Sirotsky Sobrinho
permaneceu, entre 1966 e 1969, dirigindo a TV Excelsior, no Rio de Janeiro
(SCHIRMER, 2002). Em 1967, Sirotsky adquiriu a integridade da Rádio e TV Gaúcha
e afiliou-se à Rede Globo, fundada em 26 de abril de 1965. Em 1969, formou a
primeira Rede Regional de Televisão do país, com a inauguração da TV Caxias.
Finalmente, no ano de 1970, a família Sirotsky expandiu seus domínios pelo
interior do Rio Grande do Sul e Santa Catarina e formou o complexo de
Comunicação: Rede Brasil Sul – RBS, atuando com emissoras de Televisão e Rádio
e Jornais (BERGER, 1998).
A partir de 1970, Maurício e Jaime Sirotsky adquiriram a parte de Zero Hora
do fundador Ary de Carvalho e a família Sirotsky, em 1972, já com a Rádio Gaúcha,
a TV Gaúcha e o Jornal Zero Hora, evidenciaram o poder do Grupo. Entre 1975 e
1980, os jornais Folha da Manhã e Diário de Notícias deixaram de existir, seguido
por Folha da Tarde, permanecendo o Correio do Povo, que, em 1986, depois de dois
anos sem circular, foi adquirido por Renato Ribeiro, que mudou seu tamanho,
passando-o de standard a tablóide, alterando, também, sua linha editorial.
Em 1982, o Grupo RBS criou a Fundação RBS, hoje, conhecida como
Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho – FMS, uma agência de desenvolvimento
social, entidade de direito privado, sem fins lucrativos e de interesse público, que
tem por mantenedora a Rede Brasil Sul – RBS, que apóia técnica e financeiramente
iniciativas de outras instituições e movimentos sociais, visando, de maneira
prioritária, às crianças e aos adolescentes. A FMS possui quatro áreas de atuação:
cooperação técnica e financeira; mobilização social; implementação do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) e cidadania empresarial.
21
Ainda em 82, adquiriu a Rádio Farroupilha AM (1935), na capital gaúcha, e
fez nascer a Rádio Diário da Manhã AM, em Florianópolis. Em 1986, ingressou no
21
De acordo com o apresentado pelo Grupo RBS, no site www.rbs.com.br> Acesso em: 16 maio
2006.
58
mercado de jornais de Santa Catarina, com o Diário Catarinense, na capital
catarinense. Neste mesmo ano, morreu Maurício Sirotsky Sobrinho e assumiu a
Presidência da RBS Jayme Sirotsky.
Na década de 90, Nélson Sirotsky chegou à Presidência do Grupo, em 1991.
No ano seguinte, a RBS adquiriu o seu segundo jornal em Santa Catarina, Jornal de
Santa Catarina (1971), de Blumenau, e lançou a NET Sul – pioneira em TV a cabo
no mercado nacional. Em 1993, o jornal Pioneiro (1948), de Caxias do Sul, foi
incorporado pela RBS e nasceu, em Porto Alegre, a Rádio 102 FM.
Em 1995, tivemos o lançamento da TVCOM em Porto Alegre, a primeira TV
comunitária do Brasil. No ano seguinte, criou-se o Canal Rural, com produção de
conteúdo, dirigido ao setor do agronegócio; houve a associação do Grupo RBS com
a Nutecnet (ZAZ) para o desenvolvimento do primeiro portal brasileiro na Internet; e
nasceu a Rádio CBN 1340 AM, em Porto Alegre.
Em abril de 2000, a RBS lançou o jornal Diário Gaúcho, periódico tablóide
voltado ao segmento popular (classes C, D e E), com circulação inicial na Região
Metropolitana de Porto Alegre. E, em junho de 2002, o Diário de Santa Maria.
Ainda em 2000, inaugurou o projeto RBS Interativa, com a RBS Direct
(Marketing Direto); o portal de Internet clicRBS; e a TVCOM em Florianópolis e em
Joinville. Realizou a associação da Net Sul com a Globocabo e a RBS tornou-se
sócia da plataforma nacional de Televisão por Assinatura. Criou a RBS Publicações,
editora responsável pelo lançamento de livros e de colecionáveis.
Em 2001, a RBS criou a viaLOG, empresa de logística com operação na
Região Sul, e lançou a gravadora Orbeat Music, um selo fonográfico independente,
voltada para a música realizada nos estados do Sul.
Em Televisão, atualmente, o Grupo RBS é composto pela RBS TV, TVCOM
(1995) e Canal Rural (1996). As emissoras que compõem a RBS TV são: RBS TV
Porto Alegre (1962 – canal 12), RBS TV Caxias (1969 – canal 8), RBS TV Santa
Maria (1973 – canal 12), RBS TV Pelotas (1972 – canal 4), RBS TV Uruguaiana
59
(1974 – canal 13), RBS TV Erexim (1972 – canal 2), RBS TV Bagé (1977 – canal 6),
RBS TV Rio Grande (1977 – canal 9), RBS TV Cruz Alta (1977 – canal 5), RBS TV
Passo Fundo (1980 – canal 7), RBS TV Santa Cruz (1988 – canal 6), RBS TV Santa
Rosa (1992 – canal 12), RBS TV Blumenau (1980 – canal 3), RBS TV Joinville (1979
– canal 5), RBS TV Chapecó (1983 – canal 12), RBS TV Florianópolis (1979 – canal
12) e RBS TV Criciúma (1998 – canal 12).
A TVCOM é caracterizada por programas locais, produzidos em Porto
Alegre, e denominada comunitária, e o Canal Rural tem uma programação voltada
ao meio rural e ao homem do campo. Em 2005, a RBS adquiriu a 18ª emissora de
TV aberta do Grupo, localizada em Joaçaba.
Em seu complexo de Rádio, estão as emissoras AM: Rádio Gaúcha (1927),
Rádio Farroupilha (1935), CBN 1340 (1996), CBN Diário (1996) e Rádio Rural
(1999), em Porto Alegre, e, em Santa Catarina, Diário da Manhã (1955) de
Florianópolis e Princesa em Lages; e as emissoras FM: Rádio Atlântida (antiga
Rádio Gaúcha Zero Hora FM, 1976), formando a Rede Atlântida que atua nas
cidades de Porto Alegre, Pelotas, Santa Maria, Passo Fundo, Rio Grande,
Tramandaí, Caxias do Sul, Santa Cruz do Sul, Florianópolis, Blumenau, Chapecó,
Joinville, Criciúma, Lages e Brasília; Rede Itapema FM, criada em 1983, com
enfoque na música brasileira, atuando, em 1986, em Porto Alegre, Rio Grande e
Florianópolis, e, em 1990, a Rádio Cidade. Em 2004, adquiriu a Rádio Metrô FM em
Porto Alegre. No segundo semestre de 2006, começou a operar a primeira emissora
de Rádio FM do Grupo RBS, fora do Rio Grande do Sul e Santa Catarina: uma
emissora em São Paulo, adquirida no início deste mesmo ano.
No Jornalismo impresso, a RBS possui os jornais: Pioneiro (adquirido em
1993), em Caxias do Sul; o Diário de Santa Maria (2002), em Santa Maria e, em
Porto Alegre, Diário Gaúcho (2000) e Zero Hora (1964), veículo impresso mais
importante do Grupo. Em Santa Catarina, Diário Catarinense (1986) e Jornal de
Santa Catarina (adquirido em 1992). A RBS é, hoje, a segunda maior editora
60
jornalística do país, com mais de 400 mil exemplares ao dia,
22
perdendo apenas
para a InfoGlobo, que conta com os jornais Extra, O Globo e Diário de São Paulo.
No final do primeiro semestre de 2006, foi lançado o hagah, um portal de
serviços e oportunidades, que divulga anúncios on line de veículos automotivos e
imóveis, além de locais e serviços, como roteiros culturais. Na visão de Nélson
Sirotsky,
23
atual Diretor Presidência da RBS, o site irá complementar o jornal,
ofertando classificados tradicionalmente no papel e de um modo mais amplo, através
da Internet.
O Grupo RBS possui, ainda, um Portal Social – uma plataforma de
relacionamento via web, que busca facilitar a cooperação da sociedade nas
iniciativas de interesse público. Como apresentado no site da organização, “é uma
ferramenta de comunicação com a finalidade de mobilizar pessoas e empresas para
apoiar organizações sociais que atuam em benefício de todos”. O Portal Social
identifica e dá visibilidade a projetos sociais; mobiliza a comunidade para aumentar o
volume de investimentos sociais, de pessoas físicas ou jurídicas; e qualifica e amplia
a credibilidade do processo de doação.
As empresas que, atualmente, compõem o Grupo RBS são: RBS
Publicações, RBS Eventos, RBS Participações S.A., Planejar, viaLOG, Orbeat Music
e FMS.
Quanto ao Jornal Zero Hora, interesse maior deste estudo, é um informativo
diário, tablóide, composto de capas coloridas e miolo preto e branco, que conta com
24 cadernos: Cultura, Casa & Cia, Campo & Lavoura, Ambiente, Sobre Rodas,
Patrola, Vestibular, Empregos & Oportunidades, Gestão, Viagem, Gastronomia,
Vida, ZH Digital, Globaltech, Donna ZH, TV + Show, Esportes, Segundo Caderno,
Meu Filho e Classificados. Além de ter classificados segmentados – ClassiViagem,
ClassiVida, ClassiCasa e ClassiDigital e cadernos de bairros: ZH Bela Vista, ZH
Moinhos, ZH Petrópolis, ZH Bom Fim, ZH Centro, ZH Lindóia, ZH Menino Deus e ZH
Zona Sul. Possui 54 colunistas e um forte departamento de marketing e vendas,
22
Jornal Já. Especial Imprensa. Porto Alegre. Ano 17. Maio de 2006. p. 04.
23
Idem, ibidem.
61
comercializando o veículo em bancas de jornais e revistas e pelo sistema de
assinaturas.
A primeira edição de Zero Hora circulou na capital gaúcha e em municípios
vizinhos, no dia 04 de maio de 1964, um mês depois do fechamento do jornal Última
Hora, tendo sido criada por uma associação de ex-jornalistas e outros investidores,
que adquiriram a editora responsável pela publicação do jornal recém-extinto,
seguindo, mesmo assim, até 1966, seu modelo de Jornalismo. Sua primeira diretoria
foi constituída em junho de 1964, tendo como Diretor-Presidente Dante de Laytano,
Diretor Vice-Presidente Ricardo Eichler e Diretor Responsável Ary Carvalho.
De 1966 em diante, Zero Hora passou por diversas mudanças. De um Jornal
tablóide vespertino, com 24 páginas, composto, paginado e impresso nas oficinas
dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, para 64 páginas e uma nova sede
com modernos equipamentos e instalações, localizada na Avenida Ipiranga, número
1075, em 1968. No ano seguinte, o periódico tornou-se o primeiro Jornal diário do
sul do país a adotar a tecnologia off-set de impressão.
Em 1970, de Empresa Jornalística Sul Riograndense S.A. passou à razão
social de Gaúcha Gráfica e Editora orientada por Maurício Sirotsky Sobrinho. De
1972 a 1976, mudanças continuaram ocorrendo, como a alteração do logotipo, a
ampliação do noticiário político e a criação de uma editoria de economia para o leitor
não-especializado.
Em 1982, Zero Hora superou em venda e em tiragem no estado o Correio do
Povo e, em 1984, instalou o Diário Catarinense, em Florianópolis, expandindo seus
domínios no Jornalismo impresso.
No ano de 1988, Zero Hora iniciou seu processo de informatização e, em
1991, mudou sua apresentação gráfica, reestruturou editorias e reorganizou sua
estrutura de pessoal.
Em 2005, o Jornal Zero Hora inaugurou um novo projeto gráfico que levou
oito meses para ser concluído. Esta foi a terceira grande reforma visual do veículo
62
tendo passado por anteriores em 1964, quando deixou de ser Última Hora e tornou-
se Zero Hora, e em 1989. Em 1994, temos, ainda, a alteração do logotipo do
periódico, que deixou de ser quadrado para ser horizontal e colocado no alto da
primeira página, transmitindo, segundo Knevitz Júnior (2006), autoridade e uma
imagem de Jornal tradicional.
De acordo com Knevitz Júnior (2006), as últimas alterações de Zero Hora
são muito significativas, do ponto de vista estético e simbólico. Há, na nova
concepção, uma valorização das cores, percebível no aumento do número de
páginas coloridas nas edições. Na capa, encontramos fotografias em tamanho
grande, coloridas, que são separadas da manchete por uma moldura azul clara.
Segundo o autor, a cor azul e suas diversas tonalidades podem representar
tranqüilidade, uma cor calmante ajudando a equilibrar o contraste com outras cores
mais vibrantes, distanciando, assim, Zero Hora do visual dos jornais
sensacionalistas, como do Diário Gaúcho.
Ainda sobre as cores de Zero Hora, Knevitz Júnior (2006) fala sobre a faixa
etária dos leitores identificados com o tom azul: pessoas entre 40 e 50 anos de
idade, por esta nuance representar pensamento e inteligência. As cores parecem
muito presentes no periódico, além do aumento do número de páginas coloridas,
aparecem nas páginas iniciais e finais de modo permanente.
Quanto a outras alterações no projeto gráfico de Zero Hora, podemos
destacar a substituição da tipografia, passando de Times New Roman para Minion,
considerada mais clara e legível; a abertura das editorias recebe chamada e frases
de destaque; o crédito das fotografias fica ao lado das imagens; a área de Opinião
abre espaço para colunistas externos; algumas páginas e seções foram
completamente reformuladas, como Palavra do Leitor e a coluna de Paulo Sant’ana;
há uma preocupação com as imagens e em textos mais curtos; as fotografias de
cada colunista estão fixas nas seções, em um processo identificatório entre leitor e
colunista; o novo projeto apresenta-se mais arejado, com textos mais enxutos,
adequando-se ao perfil das massas, no qual há a preferência pelo predomínio de
imagens (KNEVITZ JÚNIOR, 2006).
63
Em seu conteúdo, Zero Hora é dividido em: Economia, Editoriais, Esportes,
Geral, Mundo, Polícia e Política e em seções: Artigos, Obituário, Palavra do Leitor,
Pelo Mundo e Pelo Rio Grande. Fora os 24 cadernos com enfoques específicos e os
cadernos de bairro, com abordagens de assuntos locais.
Para Nélson Sirotsky,
24
Zero Hora é considerado o ponto de partida da rede
de seis jornais diários da RBS e o Jornal referencial da formação de opinião do
estado do Rio Grande do Sul: “um jornal que é plural, no sentido de ter a opinião de
todo mundo”.
O Jornal Zero Hora circula em todo o Rio Grande do Sul e possui 2.053.000
25
leitores, segundo o Ibope. É um informativo de grande representatividade no cenário
regional e nacional, seguindo, como todo o Grupo RBS, as diretrizes da Rede Globo
e representa a força dos grupos dominantes do país.
Atualmente, a Rede Globo possui 227 veículos, divididos em 95 televisões
VHF, 08 UHF, 41 emissoras de rádio AM, 59 emissoras de rádio FM e 24 jornais.
Detém a maior audiência nacional com 54% e controla sozinha mais de metade do
mercado publicitário televisivo brasileiro – US$ 1,59 bi – 53% (GUARESCHI; BIZ,
2005).
De maneira resumida, hoje, os principais mercados da RBS, comandada
pela família Sirotsky, estão no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, onde conta
com 06 jornais; 26 emissoras de rádio AM e FM; a RBS Online, que comporta um
portal de Internet (clicRBS), um portal de serviços (hagah) e um portal de assessoria
ao produtor rural (Agrol); 18 emissoras de TV (RBS TV) afiliadas à Rede Globo, que
juntas constituem a maior rede regional de TV da América Latina, cobrindo 99,7%
dos domicílios com Televisão nos dois estados do Sul; duas emissoras locais de TV
(TVCOM e Canal Rural), produzindo programas regionais; a Rede Gaúcha Sat de
rádio, com 123 emissoras afiliadas, espalhadas em 10 estados do país; uma
gravadora (Orbeat Music); uma operação orientada para o agronegócio (RBS Rural
e Planejar); uma empresa de logística (viaLOG); uma editora (RBS Publicações);
24
Jornal Já. Especial Imprensa. Porto Alegre. Ano 17. Maio de 2006. p. 04.
25
Informações colhidas no site www.rbs.com.br> Acesso em: 16 maio 2006.
64
uma empresa de eventos (RBS Eventos); uma fundação de responsabilidade social
(Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho – FMS); uma emissora de rádio em São
Paulo, a primeira FM do Grupo RBS fora da Região Sul; e a RBS Participações S.A.
(holding do Grupo).
26
Em termos de concessões, instrumento legal para obtenção temporária de
direito de explorar os Meios de Comunicação eletrônicos, de acordo com a
Constituição Federal, de 10 anos para Rádio e de 15 anos para TV, o estado do Rio
Grande do Sul era detentor, em novembro de 2003, de 471 concessões, sendo 91
não comerciais – 06 TVs educativas e 85 rádios comunitárias – e 375 de caráter
comercial e sem fiscalização de entidades civis. Destas concessões, 25 são de TV
(5%), sendo apenas 06 sem cunho comercial; 180 concessões de rádio de Ondas
Médias – OM (39%), as rádios de maior alcance territoriais e conhecidas como
rádios AM; 166 concessões de rádios de Freqüência Modulada – FM (36%); 85 de
rádios comunitárias – CM (18%) e 10 de Ondas Curtas – OC (2%).
Em Porto Alegre, a RBS detém 29% das concessões de Rádio e, destas,
36% são rádios comerciais. Na Mídia televisiva no Rio Grande do Sul, dos
concessionários das 25 emissoras de Televisão, 48% pertencem ao Grupo RBS.
Destas emissoras, 19 concessões são comerciais, sendo que 12 pertencem à RBS,
representando 64% dos veículos do estado (GUARESCHI; BIZ, 2005).
A Constituição de 1988, no artigo 220, parágrafo 5º, ressalta que “os meios
de comunicação não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou
oligopólio”. A não ser que não compreendamos tais expressões, parece ser,
exatamente, o contrário à lei o que ocorre no Brasil. De acordo com Biz (apud
GUARESCHI, 2003, p. 35-6), poucos grupos controlam a TV aberta e paga, criam
programas de distribuição e comercialização, dispõem do setor de comunicações e
reproduzem os oligopólios de propriedade cruzada.
26
Informações colhidas no site www.rbs.com.br> Acesso em: 18 out. 2006, e do livro de
GUARESCHI, Pedrinho; BIZ, Osvaldo. Mídia & democracia. 2005.
65
Em relação à Zero Hora, Nélson Sirotsky
27
acredita fazer um bom jornalismo
e oferecer aos leitores gaúchos e catarinenses uma boa informação. Diz que o leitor
tem o “direito de participar, interferir, de ver seu interesse respeitado dentro do
jornal”. Mas recusa o papel do ombudsman para representar o leitor na elaboração
do periódico. Segundo Sirotsky, os conselhos de leitores representam melhor esta
visão.
Para Koutzii (apud GUARESCHI, 2002, p. 16), o que a RBS e seus
representantes sempre colocam em primeiro lugar é a pauta neoliberal, a lógica do
mercado e das finanças.
2.3 A CAMPANHA INSTITUCIONAL DOS 40 ANOS DE ZERO HORA
No dia 04 de maio de 2004, o Jornal Zero Hora completou 40 anos e, para
comemorar, entre uma série de programas na RBS TV, reportagens e matérias nas
rádios e impressos do Grupo RBS, foi criada uma Campanha Institucional que visava
a apresentar depoimentos de pessoas que tiveram experiências favoráveis
relacionadas, direta ou indiretamente, com o periódico. Fatos do cotidiano dos
protagonistas, que resultaram em transformações positivas e em experiências
gratificantes, proporcionadas pelo Jornal.
A grande quantidade e variedade de matérias e programas que resultou
deste acontecimento, bem como as peças da Campanha Institucional, que
contemplaram TV, Jornal e Rádio, e sua intensa freqüência na Mídia, apresentadas
no decorrer de 2004, em particular nos meses que antecederam a data oficial e nos
meses de maio a julho do ano, parecem ter provocado um excesso informacional
inquestionável.
Além do fato em si ser orgulho para o Grupo RBS e motivo para uma
superexposição desta informação, o indiscutível monopólio dos Meios de
27
Jornal Já. Especial Imprensa. Porto Alegre. Ano 17. Maio de 2006. p. 05.
66
Comunicação da RBS na Região Sul do país fez o assunto ser visto, lido e ouvido,
de maneira insistente, por gaúchos e catarinenses, à mercê desta hegemonia.
Segundo Ramonet (1999, p. 21),
quanto mais os meios de comunicação falam de um assunto, mais se
persuadem, coletivamente, de que este assunto é indispensável, central,
capital, e que é preciso dar-lhe ainda mais cobertura, consagrando-lhe mais
tempo, mais recursos, mais jornalistas. Assim os diferentes meios de
comunicação se auto-estimulam, superexcitam uns aos outros, multiplicam
cada vez mais as ofertas e se deixam arrastar para a superinformação
numa espécie de espiral vertiginosa, inebriante, até a náusea.
Para a campanha na Televisão, que iniciou sua veiculação em março de
2004, foram produzidos 4 (quatro) comerciais de 1 (um) minuto e 4 (quatro)
comerciais de 30 (trinta) segundos, com variações para 10 (dez) e 5 (cinco)
segundos, no período de manutenção da campanha, veiculados nos mais diferentes
horários, durante a programação da RBS TV.
Os comerciais de 1 (um) minuto referem-se à Zero Hora em geral, os
comerciais de 30 (trinta) segundos, por sua vez, fazem referência aos cadernos de
Zero Hora.
A campanha tem como tema básico histórias reais, depoimentos de vida e
intitula-se Esta é uma história real. O trabalho foi desenvolvido pela Agência de
Comunicação Escala e produzido pela Cápsula Cinematográfica.
Os comercias têm, como apelo da Propaganda, depoimentos verídicos que
relatam experiências favoráveis dos protagonistas com o veículo, em linguagem
simples e coloquial. Os testemunhos acontecem em cenários, apresentados em um
teatro, palco, que reproduzem, de maneira sintética, os locais onde cada situação
testemunhal ocorreu ou referendam a história narrada.
Em todos os comerciais, o aspecto heróico do Jornal Zero Hora, como
solução, alternativa ou transformação da vida dos protagonistas, aparece nos
relatos, parecendo reforçar os valores atribuídos à Mídia, que a legitimam e que lhe
dão sinal de distinção, inteligência e credibilidade (GUARESCHI; BIZ, 2005). Zero
67
Hora, com a frase de encerramento: “depois disso, a gente só tem uma coisa a dizer:
muito obrigado”, aparece agradecida, tentando reforçar seu papel social.
Segundo informação apresentada no site do Grupo RBS:
28
Os mais de 1,3 milhão de leitores que têm acesso ao jornal todos os dias,
foram representados através de depoimentos. Criada para televisão, rádio e
jornal, a campanha conta doze histórias reais de leitores que manifestaram,
ao longo dos últimos anos, espontâneos relatos sobre como Zero Hora
influenciou ou mudou suas vidas. O grande objetivo da campanha, foi
homenagear e agradecer a fidelidade, a participação, as críticas e o carinho
que os leitores dispensam ao jornal diariamente.
A hiperemoção, característica da superinformação, parece ter sido tratada
com primazia em cada um dos comerciais. Depoimentos reais, cheios de emoção,
dando credibilidade à informação, capaz de converter-se em espetáculo de massa e
decompor-se em segmentos-emoções (RAMONET, 1999).
O slogan do veículo, A vida por todos os lados, aparece em cada comercial,
assim como nos anúncios de 1 (um) minuto é acrescida a frase “Zero Hora 40 anos
e, nos de 30 (trinta) segundos, há variações nas frases de encerramento, de acordo
com o testemunho apresentado e, como fazem referências aos cadernos do Jornal,
relacionadas a eles, como: “assine Zero Hora e receba em casa o jornal que faz toda
a diferença no seu mundo” (Caderno Viagem) e “assine Zero Hora e receba em casa
o jornal que faz toda a diferença nas suas conquistas” (Caderno Vestibular).
A hegemonia, que se apresenta no Grupo RBS, enquanto detentor dos
Meios de Comunicação da Região Sul do Brasil, parece estender-se por todos os
seus veículos, em especial, pelo Jornal Zero Hora.
Segundo Berger (1998, p. 56),
Zero Hora é um jornal de referência dominante no Rio Grande do Sul, onde
seu efeito é mais representativo que referencial, pois, ao não reconhecer
concorrentes (e eles realmente pouco o são) o jornal atua como ante-sala
do poder, publicizando os que nele escrevem e os elevando a
representantes formais de opinião.
28
Disponível em: www.rbs.com.br> Acesso em: 16 maio 2006.
68
Os valores e as crenças do Grupo RBS e, em particular do Jornal Zero Hora,
parecem reforçados em cada uma de suas ações. A contradição existente entre a
realidade da organização, que sufoca, monopoliza, segmenta e determina o que
deve ou não ser transmitido em informação, de acordo com interesses de grupos
dominantes, e a postura de transparência e compromisso com a verdade, que
enaltece seu discurso, pode ser percebida de maneira gritante.
A Mídia, legitimadora de si mesma, mantém as estratégias dominantes, que
criam e reproduzem idéias que privilegiam grupos sociais, reproduzindo seus
privilégios e discriminando pessoas com menos recursos (GUARESCHI; BIZ, 2005).
Esta condição aparece em cada um dos comerciais da Campanha Institucional dos
40 Anos de Zero Hora.
A Comunicação, que se estabelece no Grupo RBS, parece ser, na realidade,
a Comunicação típica dos interesses das classes e ideologias dominantes,
detentoras do capital e da tecnologia, que mantêm a informação unidirecional e
constituem a Comunicação vertical – dos centros de poder para a periferia,
orientando seu próprio discurso e legitimando a sociedade vigente.
A RBS, em especial o Jornal Zero Hora, é enaltecida e valorizada, como
instituição capaz de promover transformações importantes no cotidiano de todos
nós. O discurso enfatiza a Ideologia da classe dominante e se move pelo senso
comum. A linguagem simples e coloquial dos protagonistas, em um discurso ingênuo
e autêntico desprovido de interesses particulares, legitima o poder da empresa
jornalística.
A RBS é estereotipada na figura da empresa que representa a democracia
exemplar e oferece espaço e participação igualitários, tentando fazer os
intervenientes sentirem-se livres e despidos das amarras e dos preconceitos do
cotidiano.
Assim, para realizar este estudo, utilizaremos como método a Dialética
Histórico Estrutural – DHE, por permitir o diálogo interdisciplinar em seu movimento
conflitivo e dinâmico. Nossa intenção não é obter respostas para todas as questões,
69
mas estudar as Condições Objetivas e Subjetivas, que fazem parte da realidade
histórico-social.
A Semiologia barthesiana trata as relações e inter-relações entre o
lingüístico e o translingüístico. A técnica semiológica trabalha com a Semiologia
Negativa (o signo não é absoluto, é relativo), a Semiologia Ativa (textos do cotidiano)
e a compreensão dos signos, como papel do semiólogo (BARTHES, 1996).
A Pesquisa Semiológica reconstitui o funcionamento dos sistemas de
significação diversos da língua e, sendo em sua essência qualitativa, é a que melhor
permitirá uma compreensão aprofundada do objeto.
Nosso propósito não é realizar um trabalho definitivo, mas possibilitar o
questionamento sobre o objeto apresentado e levantar aspectos relevantes de nossa
realidade, perpassando pelos papéis da Publicidade e da Propaganda em nossos
dias. Compreender, ainda, como o discurso da empresa RBS que, utilizando o
discurso da Propaganda, manifestado na Campanha Institucional de seu veículo
impresso mais significativo e veiculado através da RBS TV, maior empresa de
Televisão da Região Sul do Brasil e afiliada da Rede Globo, reforça e legitima suas
relações com o Poder e a Ideologia dominante, que adota a condição de uma
mercadoria, com valor de troca, legitimadora das estruturas sociais.
Assim, trataremos, agora, as categorias propostas para esta análise, tendo
como teórico Barthes.
2.4 BARTHES E SUAS CATEGORIAS
Para desenvolvimento do trabalho, Comunicação: a Campanha Institucional
dos 40 Anos do Jornal Zero Hora – Uma Leitura Semiológica, as categorias
propostas, a priori, são: Estereótipo, Fait Divers, Poder, Cultura, Ideosfera e
Discurso, tendo como teórico Barthes.
70
De acordo com Barthes, os Estereótipos – imagens fixas – se constituem a
partir de cúmulos de artifício que uma sociedade consome como sentidos inatos, isto
é, cúmulos de natureza. Ele enfatiza (1973, p. 57):
o estereótipo é a palavra repetida, fora de toda magia, de todo entusiasmo,
como se fosse natural, como se por milagre essa palavra que retorna fosse
a cada vez adequada por razões diferentes, como se imitar pudesse deixar
de ser sentido como imitação: palavra sem-cerimônia, que pretende a
consistência e ignora sua própria insistência.
Na criação dos Estereótipos, as imagens prontas, ensejadas no consciente e
inconsciente de um povo, reforçam idéias e comportamentos e mantêm estruturas
estáveis. Corre-se um grande risco quando se repetem estas palavras ou conceitos,
o perigo de uma alienação, da não contestação.
Para Barthes (2004, p. 394),
geralmente, o estereótipo é triste, porque é constituído por uma necrose da
linguagem, uma prótese que vem para tapar um buraco de escritura; mas ao
mesmo tempo não pode deixar de suscitar uma imensa gargalhada: leva-se
a sério; julga-se mais perto da verdade porque indiferente à sua natureza de
linguagem: é ao mesmo tempo desgastado e grave.
Segundo Barthes, afastar-se do Estereótipo é uma tarefa crítica, visa a pôr
em crise a linguagem. Permite isolar este grão de Ideologia que está em todo
Discurso político e atacá-lo; desprender-se da razão mecanicista que faz da
linguagem a simples resposta a estímulos de situação; sacudir o Discurso do Outro e
constituir uma operação de pré-análise e, por fim, falar por Estereótipos é colocar-se
do lado da força da linguagem, o oportunismo presente no Estereótipo deve ser
abandonado.
O Fait Divers – caso do dia – teorizado por Barthes (1971), será fundamental
para compreendermos como se estabelece o roteiro da Campanha Institucional de
Zero Hora. Os Fait Divers são informações excepcionais que caracterizam o
Sensacionalismo, é uma arte das massas, na qual Barthes (1971, p. 275-6) afirma:
o seu papel consiste provavelmente em preservar no seio da sociedade
contemporânea a ambigüidade do racional e do irracional, do intelegível e
do insondável; e esta ambigüidade é historicamente necessária na medida
71
em que o homem ainda precisa de signos (o que o tranqüiliza) mas onde é
também preciso que esses signos sejam conteúdo incerto (o que o
irresponsabiliza).
Barthes (1971, p. 266) salienta que,
o caso do dia só começa onde a informação se desdobra e comporta por
isso mesmo a certeza de uma relação; a concisão do enunciado ou a
importância da notícia, noutras circunstâncias penhores de unidade, nunca
conseguem apagar o caráter articulado do caso do dia.
O Fait Divers se apresenta em uma abordagem da realidade. Barthes (1971)
concebe dois tipos de Fait Divers: Causalidade e Coincidência, ambos formalizam a
noção de conflito, que interpela pela exploração da emoção.
O Fait Divers de Causalidade apresenta duas manifestações: Causa
Perturbada, na qual há o desconhecimento ou a imprecisão causal ou quando uma
pequena causa gera um grande efeito; e Causa Esperada, quando a causa é
normal, a ênfase recai nas personagens dramáticas, vítimas estereotipadas –
criança, velho e mãe.
O Fait Divers de Coincidência possui duas manifestações, também:
Repetição e Antítese. Na Repetição, a informação repetida instaura a onipresença
da mesma factualidade em circunstâncias diferentes, é o igual que se reproduz com
diferença. Na Antítese, duas perspectivas antagônicas são fundidas em uma única
realidade – unificação dos opostos. Uma de suas maneiras de expressão é o
Cúmulo (a má-sorte).
A Fatalidade explica a história. Descarta-se a apropriação racional e a
intervenção da Fatalidade assume o caráter de Deus-ex-Machina, Sujeito Absoluto,
responsável pelo rebanho dos sujeitos relativos, em seus roteiros históricos. Este
parece ser o papel da Mídia: a mediação tranqüilizadora.
O Fait Divers possui um consumo imediato. Notabiliza-se pela sua imanência.
“Não reivindica nada, que possa transcender a sua territorialidade. Está preso ao
presente, cristalizado no aqui e agora. É, por excelência, narcísico” (RAMOS, 2004).
72
No Fait Divers, a Dialética está presente: a Tese é a afirmação do status quo;
a Antítese explica os conflitos históricos; e a Síntese ocorre da mediação
tranqüilizadora com a Fatalidade, incorporando a idéia do Espírito Absoluto
(RAMOS, 2004).
Na categoria Poder, podemos estabelecer um parâmetro entre a Semiologia e
a Psicanálise. No final do século XIX, a Psicanálise surge com Sigmund Freud. Sua
grande contribuição foi mostrar que nada acontece por acaso. O determinismo
psíquico significa que há uma causa para cada pensamento, memória, sentimento e
ação. Fenômenos ocasionados por intenções, conscientes ou inconscientes, e
determinados por fatos precedentes, de maneira espontânea ou provocada por
situações externas. Portanto, o que move ou motiva os comportamentos humanos é
o que está no inconsciente. Nele se originam os processos mentais.
De acordo com Guareschi (2000, p. 37), “os instintos ou pulsões são as forças
propulsoras inatas, que incitam as pessoas à ação. As necessidades seriam a
expressão física, e os desejos, a expressão mental ou psíquica dos instintos”.
O instinto possui quatro componentes: uma fonte (surgimento da necessidade
em todo o corpo ou em partes dele); uma finalidade (reduzir a necessidade); uma
pressão (quantidade de energia ou força utilizada para satisfazer o instinto, de
acordo com a necessidade); um objeto (qualquer coisa, ação ou expressão que
possibilite a satisfação do intento original). E se expressa de duas maneiras:
expressão destrutiva (chamada de instinto da morte, uma carga voltada para
destruição interna do sujeito ou externa manifestada pela agressividade) e
expressão construtiva (chamada de instinto de vida, voltada para busca da
gratificação e do prazer físico e psíquico). Cada expressão tem uma fonte de energia
em particular. A fonte de energia dos instintos de vida é a libido, energia sexual
existente na carga instintiva inata de todo ser humano. Esta energia sexual faz com
que sintamos necessidade por toda a vida e prazeres no contato com o mundo
externo, influenciando para que desejemos certas situações, pessoas ou objetos
(GUARESCHI, 2000).
73
No objeto do instinto estão presentes nossos motivos e fantasias
inconscientes e nossas relações objetais, investidas de energia libidinosa. Em nossa
sociedade capitalista, para satisfazermos o instinto, a pressão e a quantidade de
energia são muito grandes, ocasionando um desgaste maior de energia na busca da
satisfação das necessidades, e a não-satisfação pode criar frustrações e angústias.
O Poder, como dominação, na visão de Weber, que repousa na capacidade
de uma elite impor o seu projeto de desenvolvimento a uma maioria, se encaixa na
relação dialética entre liberdade e submissão. Aí também se encontra a energia
prazerosa da libido que motiva e movimenta o homem. Os dominados e os
dominadores encontram-se associados, por uma aliança comum: o prazer (RAMOS,
2004). O Poder, como libido dominante, é energia prazerosa.
Para Barthes, o Poder é uma categoria multifacetada, interdisciplinar,
acompanhada de diferentes enfoques e transcende ao estado. Poder e prazer são
inerentes ao homem e intimamente relacionados,
adivinhemos então que o poder está presente nos mais finos mecanismos
do intercâmbio social: não somente no Estado, nas classes, nos grupos,
mas ainda nas modas, nas opiniões correntes, nos espetáculos, nos jogos,
nos esportes, nas informações, nas relações familiares e privadas, e até
mesmo nos impulsos liberadores que tentam contestá-lo: chamo discurso de
poder todo discurso que engendra o erro e, por conseguinte, a culpabilidade
daquele que o recebe. (...) plural no espaço social, o poder é,
simetricamente, perpétuo no tempo histórico: expulso, extenuado aqui, ele
reaparece ali; nunca perece; façam uma revolução para destruí-lo, ele vai
imediatamente reviver, re-germinar no novo estado de coisas (BARTHES,
1996, p. 11-2).
Assim, Barthes conclui que a razão desta resistência é o Poder ser o
parasita de um organismo trans-social, ligado a toda a história do homem, e o objeto
em que se inscreve o Poder a linguagem, ou sua expressão obrigatória: a língua. E
a língua implica uma relação fatal de alienação. Os signos da qual é feita só existem
se reconhecidos, isto é, na medida que se repetem, em cada signo encontra-se um
Estereótipo: nunca podemos falar senão recolhendo aquilo que se arrasta na língua,
assim servidão e Poder se confundem.
74
Para Barthes (2003b, p. 51) o paradigma
29
sileo e taceo, tranqüilidade,
ausência de movimento e ruído e silêncio verbal, respectivamente, está relacionado
ao Poder: “(...) a fala, o exercício da fala, está ligada ao problema do poder: é o tema
do direito à palavra”. Assim, a reivindicação da palavra, a supressão do direito de
expressão e o direito ao silêncio, o direito à tranqüilidade da natureza, ao calar-se,
não falar, surge como uma “operação para baldar opressões, intimidações, perigos
do falar, da locutio
30
” (BARTHES, 2003b, p. 52).
A Cultura, para Barthes (s.d., p. 84-94), envolve o cotidiano e pode ser
compreendida como as conversas, músicas e leituras que rodeiam cada um de nós.
A Cultura é o intertexto, materializado no que se exprime quando se une o evento da
linguagem ao evento social. A Cultura se revela através da linguagem, como
instituição social reproduzida em meio aos diferentes grupos formadores da
sociedade.
A Cultura barthesiana possui uma abordagem inscrita e circunscrita na
subjetividade, que resulta na repetição. Repetir não como cópia absoluta e, sim, o
igual que se reproduz com diferença. A Cultura tem como protagonistas, os sujeitos
lacanianos, é o Estádio do Espelho, que se repete, conjugando textos movidos pela
invariância, própria da intertextualidade (RAMOS, 2004).
Ideosfera, palavra criada por Barthes a partir de ideo somado a sphaíra: é o
linguajar de uma Ideologia; sistemas fortes de linguagem, não ideoletal. Para
Barthes, toda a Ideologia é e só é linguagem: “é um discurso, um tipo de discurso”.
Para tanto, seria necessário definir as “ideologias” por intermédio de sua linguagem,
definida por traços típicos de discursividade e, então, verificar se há
correspondências entre estes tipos de discurso e determinações sociopolíticas
(BARTHES, 2003b, p. 178-9).
29
Paradigma, na concepção barthesiana, “é a oposição de dois termos virtuais dos quais atualizo um,
para falar, para produzir sentido”. O paradigma é o móbil do sentido, onde há sentido há paradigma
e vice-versa, e o sentido assenta no conflito, sendo todo conflito gerador de sentido: “escolher um e
rejeita outro é sempre sacrificar ao sentido, produzir sentido, dá-lo a consumir” (BARTHES, 2003b,
p. 17).
30
Locutio, o ato de falar, a produção de fala.
75
Barthes oferece outras particularidades e subcategorias que constituem a
Ideosfera: a Doxosfera – esfera da doxa, do senso comum, do discurso comum; a
Piteosfera – discurso da fé/crença; o Socioleto – a neutralidade, a linguagem de um
grupo social; e a Logosfera – a abordagem biológica, o discurso mecânico/absoluto.
A Ideosfera – esfera das idéias – e suas subcategorias encontram-se
relacionadas com os Discursos Encrático e Acrático. A Ideologia encontra-se na
convergência entre a produção discursiva, a subjetividade e o social (BARTHES,
1999).
Segundo Barthes, toda Ideosfera compreende alguns traços, são eles:
Consistência, Alavanca e Mania.
Por Consistência da Ideosfera, ou Teoria da Consolidação, entendemos dois
momentos distintos: no primeiro momento, as peças são colocadas e mantidas
juntas pela linguagem do logoteta,
31
o que se assemelha a um sistema, o prazer de
uma produção de sistema sem o dogmatismo do sistema transmitido. No segundo
momento, “o sistema de linguagem pega, dá liga”, coesão: a Ideosfera funciona
sozinha, um produto autônomo de circulação, um energético independente: “a ordem
exterior da criação, da produção, foi substituída pela ordem interior da boa
consciência, da fé” (BARTHES, 2003b, p. 181).
Por Alavanca, Barthes (2003b, p. 181) relaciona “artifícios de raciocínio que
possibilitam contrapor-se a uma objeção ou a uma diferença incorporando-a no
sistema, codificando-a nos termos do sistema” e utiliza como metáfora a goma de
mascar: faz um comparativo entre a força das Ideosferas à força da goma de
mascar, na qual queremos nos livrar da bola, mas ela retorna grudada à mão ou à
sola do sapato.
A ideosfera nos recupera contra a nossa vontade, porque ela se constituiu
em espaço completo de linguagem em cujo interior nos situa. Ou ainda,
cada ideosfera: um sistema de forças (de linguagem) sem alavanca exterior
para se desligar (BARTHES, 2003b, p. 182).
31
Logoteta, para Barthes (2003b), é o fundador de linguagem. Exemplos: Marx, Freud.
76
Por Mania, compreendemos a Ideosfera ser vista, sentida como um estado
da alma, um páthos
32
, comparando o sujeito conduzido por uma Ideosfera ao sujeito
dominado por uma droga ou mania. O que se avalia é o grau de proximidade ou
distância em que o sujeito está em relação à coesão do sistema de linguagem
(Ideosfera). As Ideosferas assumem um caráter fantasmagórico e associam-se a
ídolos ou fantasmas, convicções.
Para Bacon (apud BARTHES, 2003b, p. 183-4), há quatro tipos de
fantasmas: fantasmas da tribo, que correspondem a erros comuns de todos os
homens; fantasmas da caverna, erros privados a cada inteligência, advêm dos
gostos; fantasmas do fórum, erros oriundos do emprego da linguagem; e fantasmas
do teatro, erros provenientes dos falsos sistemas dos filósofos. Estes fantasmas,
nossas Ideosferas.
A Ideologia é a produção de sentido a serviço do Poder. É uma categoria
que relaciona o sujeito com o social. O ideológico se concretiza pela produção
discursiva, o processo ideológico é um tipo de discurso, cria a Ideosfera, como
“sistema linguageiro de uma ideologia”. É a conotação onde o lingüístico empreende
o seu diálogo com o cenário social e histórico e encena a legitimação da sociedade
burguesa.
A Ideosfera tende a se estabelecer em doxa, em Discurso da doxa,
vivenciado pelos usuários como um discurso universal, “natural, que não precisa de
explicação, cuja tipicidade não é percebida, em que tudo o que seja ‘exterior’ é
relegado como margem, desvio: discurso-lei não percebido como lei” (BARTHES,
2003b, p. 184).
Este Discurso da doxa, uma espécie de dispositivo regulador do Poder entre
os melhores limites possíveis, dos quais o Poder não pode afastar-se sem perigo de
suas fronteiras, normas, da Ideosfera pública. A Ideosfera de um Poder é como uma
engrenagem que transmite e mantém o Poder e nenhum Poder é realmente forte se
32
Aquilo que se sente, em oposição ao que se faz; estado; sentimento.
77
não for auxiliado por uma linguagem forte, um sistema de linguagem que lhe sirva de
dispositivo de transmissão (BARTHES, 2003b, p. 186).
A Ideosfera, como um sistema de idéias-frases, de argumentos-fórmulas,
portanto um objeto de linguagem copiável e/ou repetível, está ligada a um Poder e,
também, a uma Fé. Tem um elo poderoso com a Fé, que funciona como boa-fé, com
sinceridade e faz com que os sujeitos envolvidos com uma Ideosfera acreditem de
boa-fé no que ela apregoa.
A Ideosfera, como um sistema de linguagem que funciona, tem o poder de
durar. E esta capacidade de duração não comprova sua verdade, mas sua
resistência, o desempenho da linguagem como utensílio. Na Ideosfera, a linguagem
infatigável, como coloca Barthes (2003b, p. 190), e sua perpetuação infinita “tornam-
se como que a própria dureza do poder: é o inexorável à linguagem que ‘gira’, não
se pode ‘rogar’”. Ampliando-se a noção de Ideosfera, podemos dizer que todo sujeito
tem sua Ideosfera, o sistema de linguagem, que fala, na cabeça de cada um, como
uma veneração perpétua da linguagem.
Para compreendermos o que representa Discurso, é importante distinguir
língua e discurso. Segundo Barthes (2003b, p. 90), Saussure formulou a oposição
langue/parole: Dialética sutil entre o sujeito falante e a massa falante.
Língua significa aquilo por que, querendo ou não, sou falado, regras estritas
de combinação (sintaxe) que são leis que permitem a Comunicação. Em
compensação, “impõem de fora um modo de ser, um sujeito, uma subjetividade: pelo
peso da sintaxe, ele deve ser aquele sujeito, e não outro” (BARTHES, 2003b, p. 91).
Por Discurso, entendemos “aquilo que, em certos limites sociais, ideológicos,
neuróticos, eu falo”, estando livre para fazê-lo (BARTHES, 2003b, p. 92).
A imposição de asserção passa da língua para o Discurso, pois este é feito
de proposições naturalmente assertivas. Assim, para preservar o Discurso da
afirmação, é necessário brigar todo o tempo com a língua, matéria-prima, “lei” do
Discurso, para desfazer sua assertividade natural. Como conseqüência, precisamos
78
assumir a responsabilidade de nossa imago frente ao outro, a questão “não é fazer-
se entender, mas fazer-se reconhecer” (BARTHES, 2003b, p. 94-5). É uma luta, uma
prova de forças. Há na língua (língua e discurso) uma disposição dramática, “quer o
discurso assuma a arrogância da asserção, quer deseje contrariá-la”. A língua
dramatiza toda a relação com o outro, todo o sujeito que se torna dramático, para si,
para os outros, pela língua, pela asserção (BARTHES, 2003b, p. 96-7).
Existem modos de Discurso (de discursividade) que avançam porque, na
situação alocutória, existem acontecimentos, “palavras-acontecimentos”, que
desencadeiam, em dado momento, um novo curso dos discursos, chamados
starters, embreagens, espécies de shifters interlocutórios. O shifter interlocutório
coloca bruscamente, em Comunicação o motor afetivo e os órgãos retóricos do
discurso: o carro discursivo funciona. Os desencadeadores podem exprimir as
sacudidas do discurso (BARTHES, 2003a, p. 307). Os desencadeadores típicos são:
gestos; palavras do Outro; palavras pronunciadas pelo próprio sujeito – “uma palavra
minha me duplica e me orienta para outro discurso”, é o desdobramento do sujeito,
em locutor e ouvinte de si; e os Estereótipos sintáticos, que são pedaços de frases
feitas, que só adquirem um conteúdo depois e servem como inícios de
desenvolvimento prontos de antemão (BARTHES, 2003a, p. 308-10).
Para Barthes (1991), o termo Discurso é baseado na palavra “dis-cursos”,
que é ação de correr para todo o lado, são idas e vindas, conflitos. É o lúdico dos
signos. “É a relação da invariância da Língua, como código, com a variância da Fala,
tecida, ludicamente, tal qual o jogo de dominó” (RAMOS, 2005). O Discurso, na
visão barthesiana, é um jogo dialético dos signos, revelado na oralidade, escrita e
imagem. É verbal e não-verbal, intimamente ligado à Cultura e ao Poder. Está
dividido em duas vertentes: o Discurso Encrático e o Discurso Acrático.
O Discurso Encrático é o discurso único, do Poder. A linguagem
33
se
enuncia e se desenvolve sobre as relações de Poder iniciadas nos aparelhos
estatais, institucionais e ideológicos. Representa a Ideologia da classe dominante e
33
Segundo Barthes, a língua é um produto social por oposição à fala que é o componente individual
da linguagem. A linguagem é uma legislação, a língua é seu código, sendo naturalmente assertiva:
“enunciar um vocábulo é imediatamente afirmar seu referente” (BARTHES, 2003b, p. 92).
79
se move pelo senso comum. É o discurso que legitima o status quo, que regulariza a
sociedade vigente. Cria e fortalece os Estereótipos e mantém um grupo na liderança
da sociedade. É o chamado discurso oficial de quem está dentro do Poder e
pressupõe mantê-lo (BARTHES, 2004).
Já o Discurso Acrático é o discurso plural, do questionamento e da negação.
As linguagens se formam fora do Poder e/ou contra ele. Representa a Ideologia
dominada, é um discurso paradoxal, de protesto e mudança. Busca combater o
Poder estabelecido e é contra hegemônico.
Para Barthes, os Discursos Encrático e Acrático evidenciam sua abordagem
dialética, suas influências e seus intertextos. Discursividade e Poder estão
intimamente relacionados (BARTHES, 2004, p. 135):
nas sociedades atuais, a divisão mais simples da linguagem diz respeito à
sua relação com o Poder. Há linguagens que se anunciam, se desenvolvem,
se marcam na luz (ou a sombra) do Poder, dos seus múltiplos aparelhos
estatais, institucionais, ideológicos; chama-las-ei de linguagens ou discursos
encráticos. E, no outro lado, há linguagens que se elaboram, se buscam, se
armam fora do Poder e/ou contra ele; chama-las-ei linguagens ou discursos
acráticos.
Segundo Barthes, estas duas formas de Discurso não têm o mesmo caráter.
A linguagem Encrática é vaga, difusa, é a linguagem da Cultura de Massa
(Imprensa, Rádio e Televisão) e a linguagem da conversação, da opinião corrente
(doxa): “toda essa linguagem encrática é ao mesmo tempo (contradição que lhe dá
força) clandestina (não se pode facilmente reconhecê-la) e triunfante (não se pode
escapar dela): direi que ela é pegajenta” (BARTHES, 2004, p. 135).
Já a linguagem Acrática é paradoxal, desligada da doxa:
(...) sua força de ruptura provém de ser ela sistemática, é construída sobre
um pensamento, não sobre uma ideologia. Os exemplos mais imediatos
dessa linguagem acrática seriam hoje: o discurso marxista, o discurso
psicanalítico e, permitam-me acrescentar, em menor grau, mas
estatutariamente notável, o discurso estruturalista (BARTHES, 2004, p.
135).
80
Na visão barthesiana, Discurso e Poder estão inseparavelmente
relacionados, visto que o Poder está arraigado em todo o Discurso. O Poder é libido
dominante, é intrínseco ao homem, “o poder (a libido dominandi) aí está, emboscado
em todo e qualquer discurso, mesmo quando este parte de um lugar fora do poder”
(BARTHES, 1996, p. 10).
2.5 ESCOLHAS METODOLÓGICAS
Para realização deste trabalho, utilizaremos o Método Dialético Histórico
Estrutural – DHE, por permitir, como já referimos, o diálogo interdisciplinar em seu
movimento conflitivo e dinâmico.
Dialética vem do grego e significa dialogar, conversar, discursar, é o intervir
de idéias, na qual uma proposição é defendida e contestada. Visa à totalidade e
suas partes na confrontação de visões opostas. Cuida de explicar melhor aquela
realidade que admite incursão subjetiva de atores históricos. A lógica Dialética
explora os conteúdos do acontecer e o significado político da história concreta e,
portanto, volta-se para a estrutura da mudança (DEMO, 1990).
Segundo Demo (1990, p. 123-4),
a dialética histórico estrutural parte de que a história é estrutura, não
acidente. Entretanto, não estrutura da estática, mas da dinâmica. Portanto,
não somente a estática faz parte da realidade, mas igualmente a dinâmica.
É decisiva está compreensão, porque evita tanto o superdimensionamento
idealista do lado subjetivo (como deus ex machina), como seu descarte, a
nível de mero acidente. O ser social, como ator político, na história, não é o
que perturba a estática, mas precisamente parte integrante da estrutura
histórica. A dinâmica histórica é estrutural literalmente.
A DHE conjuga os princípios de movimento e ruptura, próprios da Dialética
marxista, com a perspectiva de Invariância do Estruturalismo. O objetivo não é obter
respostas para todas as questões formuladas, mas estudar as Condições Objetivas
e Subjetivas que fazem parte da realidade histórico-social.
81
A Dialética Histórico Estrutural, nem objetivista, nem idealista, é capaz de
confluir Condições Objetivas e Subjetivas no enredamento concreto do fenômeno
histórico.
As Condições Objetivas são a estrutura, o cenário social e histórico, “a
circunstância dada ou coagulada como dado, que delimita a capacidade de
intervenção subjetiva” (DEMO, 1990, p. 118). As Condições Objetivas conjugam o
sentido estrutural da realidade social com a perspectiva do Materialismo Histórico. A
estrutura social, política e econômica.
As Condições Subjetivas são as intervenções do ator social, que significam o
espaço da criação humana histórica, aquilo que o sujeito pode realizar. O cenário é
a própria sociedade, onde tais Condições se relacionam. Assim, segundo Demo
(1990), a DHE é capaz de confluir Condições Objetivas e Subjetivas, na
complexidade concreta do fenômeno histórico, validando a Totalidade Social. As
Condições Subjetivas possuem, ainda, uma influência cultural básica: a Psicanálise,
com sua concepção de Sujeito, em sua característica de conflituosidade histórica,
interagindo com as práticas da realidade social (RAMOS, 2005).
A DHE parte de que a história é estrutura dinâmica, na qual o ser social,
como ator político, é parte integrante na estrutura histórica. A Dialética pretende
compreender não apenas a teoria, mas a prática, o compromisso ideológico, a
estratégia política e a complexidade da realidade social.
A DHE experimenta o saber do provisório, do passageiro e do momento e
pode nos auxiliar na compreensão das conjunturas – signo do provisório, do
flagrante do sentido do inacabado (RAMOS, 2005). Ela nos ajuda a
compreendermos o cotidiano da sociedade e suas contradições, na busca por
mudanças, e não permite espaço para verdades ahistóricas, absolutas. A DHE
oferece a possibilidade de novas descobertas e de transformação, valorizando a
contradição e o conflito, em um processo dinâmico e re-inventivo da realidade social.
A estrutura dinâmica particular da DHE é a Unidade de Contrários, na qual
estabelece diferença conceitual com outras linhas metodológicas e mesmo no
82
espaço dialético: “unidade de contrários significa um todo intrinsecamente
polarizado” (DEMO, 1990, p. 124). De um lado, a vocação sintética da Dialética para
compreender totalidades conflituosas e, de outro, a visão dinâmica da totalidade, na
qual todo social e histórico não é liso, estático, mas, sim, constituído de polarização
interna, em sua estrutura.
A Unidade de Contrários é a Desigualdade Social que torna a sociedade
fenômeno, estruturalmente, dinâmico e provisório. É necessário vermos, na
Desigualdade Social, algo estrutural dado e, também, dinâmico, em ebulição. É a
exploração das maiorias pelas minorias e a fonte imortal das mudanças históricas. O
desigual refaz todo o tempo à dinâmica da mudança.
A Unidade de Contrários pode, ainda, levar a admitir a DHE como capaz de
compreender o dia-a-dia da sociedade, a cotidianidade. O ser social vive a
contradição entre suas esperanças e a realidade concreta, tudo implica no composto
totalizante de Condições Objetivas e Subjetivas. A Dialética precisa compreender
ambas as Condições.
A Semiologia ganhou notoriedade na França, a partir da década de 50,
impregnada pelos signos do pensamento de Saussure, no ponto de vista de uma
abordagem Estruturalista, de teor Funcionalista. A Semiologia de Barthes, no
entanto, aprofundou esta concepção, e atribuiu ao semiólogo a tarefa de se
preocupar com a formulação de conceitos e se ocupar com o desenvolvimento de
pesquisa, juntando teoria e prática, em uma síntese do saber-fazer, com um sentido
histórico (RAMOS, 2004). Barthes valorizou a linguagem como uma ocorrência
decisiva na produção cultural.
Assim, a Semiologia barthesiana trata as relações e inter-relações entre o
lingüístico e o translingüístico, transcendendo os limites dos signos, fazendo-os
dialogar com a territorialidade da subjetividade e do social (RAMOS, 2005).
A técnica semiológica trabalha com a Semiologia Negativa e Ativa. Na
Semiologia Negativa, o signo não é absoluto e, sim, relativo, e nega os caracteres
positivos, fixos. Reforça sua relatividade, uma produção social.
83
Já a Semiologia Ativa trata e imita o signo, buscando compreendê-lo e seu
objeto são os textos do cotidiano. São os textos do Imaginário (ilusão, fantasia),
como narrativas, imagens, retratos, expressões e idioleto, enfim, o repertório de
manifestações linguageiras que transitam no dia-a-dia.
O semiólogo, para Barthes, é um artista, que joga com os signos de forma
consciente, que desvenda enigmas e busca compreender e que não procura
verdades absolutas. Procura um sentido relativizante da produção semiológica
(BARTHES, 1996).
Barthes trabalha a tríade da Dialética – Tese, Antítese e Síntese. Estabelece
o movimento de negações e afirmações, que resulta em uma dedução sobre a
historicidade do signo.
A negação corresponde à ruptura com o Estruturalismo de Saussure e a
afirmação contextualiza uma nova abordagem, a relativização, com base na
realidade histórico-social. Desta forma, a Semiologia Negativa e a Semiologia Ativa
constituem, em suas relações, uma Antese, e o papel do semiólogo, como
conseqüência, uma Síntese. A Tese é saussureana, a Antítese e a Síntese,
barthesianas (RAMOS, 2004).
A Semiologia barthesiana adquire sua própria fisionomia, baseada na
perspectiva Dialética, que busca abraçar o social e o subjetivo. O signo possui uma
determinação da Língua e, também, da Fala. Sofre uma leitura lingüística e
translingüística, que amplia sua dimensão. “Possui uma singularidade polissêmica,
marcada e demarcada pela historicidade” (RAMOS, 2004).
Como a Pesquisa Semiológica reconstitui o funcionamento dos sistemas de
significação diversos da língua (BARTHES, 1999) e, sendo em sua essência
qualitativa, é a que melhor possibilitará uma compreensão mais profunda do objeto
apresentado, neste trabalho. A avaliação qualitativa deste estudo é essencial para
desvendar a qualidade política dos acontecimentos, compreender a teoria e a
prática, o compromisso ideológico e respeitar a realidade social.
84
Assim, é necessário descrever os fatos reunidos a partir de um ponto de
vista e reter os traços que interessam a este ponto de vista (Princípio da
Pertinência), bem como delimitar um conjunto heteróclito de fatos que cumprirá
“tratar” para conhecer-lhe a estrutura, este conjunto deve ser definido pelo
pesquisador anteriormente à pesquisa: o corpus, a coleção finita de materiais
(BARTHES, 1999).
O corpus deve ser bastante amplo para que se possa esperar que seus
elementos saturem um sistema completo de semelhanças e diferenças, até que
neste dissecar não se descubra mais nenhum elemento novo. O corpus precisa,
também, ser o mais homogêneo possível. Caso heterogêneo, estudar a articulação
sistêmica das substâncias envolvidas. Deve coincidir com um estado do sistema, um
“corte” da história e ser, preferencialmente, variado, mas restrito no tempo. Neste
estudo, tais situações apresentam-se bem definidas: o objeto e suas delimitações, a
Campanha Institucional dos 40 Anos do Jornal Zero Hora, no ano de 2004,
manifestada nos 5 (cinco) comerciais de Televisão selecionados, veiculada na
programação da RBS TV, tendo como categorias, a priori, Estereótipo, Fait Divers,
Poder, Cultura, Ideosfera e Discurso, por Barthes.
Nosso propósito não é realizar um estudo terminante, mas, sim, permitir o
questionamento sobre o objeto proposto. Com este trabalho, pretendemos
responder como o Discurso de Zero Hora, manifestado através da Campanha
Institucional, representa a filosofia da empresa jornalística e das estruturas
ideológicas dominantes; de que modo o Discurso da Propaganda trabalha ou não o
Estereótipo; de que forma se estabelece o Fait Divers como roteiro do Discurso da
Propaganda; de que maneira o Discurso Encrático mobiliza o Fait Divers, como
significante, invariante; como a Cultura é particularizada no Discurso da Propaganda;
e de que forma está ou não presente a Ideosfera no Discurso de Zero Hora, através
do Discurso da Propaganda.
No fenômeno da Comunicação, um misto complexo de Condições Objetivas
e Subjetivas, a modulação interpretativa é fundamental. O objeto escolhido, para
este estudo, apresenta importantes indícios e reflexos de nossa sociedade e pode
caracterizar a realidade desta mesma sociedade. Compreender e relativizar a
85
Campanha Institucional dos 40 Anos de Zero Hora, através da Propaganda, dos
Meios de Comunicação mais representativos da atualidade, em especial, dos
veículos mais significativos na Região Sul do país, Zero Hora e RBS TV, e dos
oligopólios da Mídia parece ser de extremo interesse para a área da Comunicação
Social.
2.5.1 Questões da pesquisa
As nossas questões da pesquisa, como já mencionamos, são: como o
Discurso de Zero Hora, manifestado na Campanha Institucional, representa a
filosofia da empresa jornalística e das estruturas ideológicas dominantes? De que
modo o Discurso da Propaganda trabalha ou não o Estereótipo? De que forma se
estabelece o Fait Divers como roteiro do Discurso da Propaganda? De que maneira
o Discurso Encrático mobiliza o Fait Divers, como significante, invariante? Como a
Cultura é particularizada no Discurso da Propaganda? E de que forma está ou não
presente a Ideosfera no Discurso de Zero Hora, através do Discurso da
Propaganda?
2.5.2 Objetivos
Estudaremos a Ideosfera da Campanha Institucional dos 40 Anos do Jornal
Zero Hora, em anúncios de Televisão, veiculados no ano de 2004, através dos
pressupostos de Barthes e das categorias, a priori, Estereótipo, Fait Divers, Poder,
Cultura, Ideosfera e Discurso, usando, como método, a DHE, tendo, como técnica, a
Semiologia, em uma Pesquisa Semiológica. Buscaremos, ainda, compreender e
explicar o papel ideológico do Fait Divers, como significante, invariante, do Discurso
Encrático do Grupo RBS, intricado na Cultura e nas relações de Poder, que mantém
a Ideosfera vigente.
3 DESNUDANDO A CAMPANHA
Analisaremos, agora, a Campanha Institucional dos 40 Anos do Jornal Zero
Hora, através de 5 (cinco) comerciais para Televisão, sendo 3 (três) comerciais, de 1
(um) minuto, e 2 (dois) comerciais, de 30 (trinta) segundos, veiculados na
programação da RBS TV, no ano de 2004. Os comerciais selecionados, em termos
gerais, são os mais representativos.
Os anúncios, com duração de 1 (um) minuto, fazem referência à Zero Hora
em geral, sem distinção entre cadernos, seções ou espaços específicos do veiculo.
Os de 30 (trinta) segundos fazem menção particular aos cadernos de Zero Hora e as
chamadas de encerramento variam, de acordo com os encartes, relacionadas aos
depoimentos.
Todos os comerciais contam com a mesma idéia central, o que garante a
unidade e a identidade necessárias à campanha: relatos verdadeiros, em linguagem
coloquial, narrados em um palco, no qual se reproduz, de modo estilizado, o local,
onde cada situação testemunhal ocorreu ou se referenda a história descrita. Os
depoimentos referem à relação dos protagonistas com o veículo Zero Hora e os
resultados satisfatórios obtidos deste envolvimento. A campanha intitula-se: Esta é
uma história real.
Pelas características rudimentares de uma campanha de Propaganda, ou
Institucional, veremos, nas análises, que muitos elementos e seus significados se
repetem nos comerciais. Esta repetição faz parte das atividades da Publicidade e da
Propaganda. É um dos fatores, que podem caracterizar uma campanha, que faz com
que seja memorizada, na qual o tema garante, uma vez que se repete, em todas as
peças, o mesmo aspecto central. O princípio da repetição se manifesta pela unidade
e pela continuidade. A repetição do tema ou idéia, esta conjunção, na qual todos
formam um conjunto (campanha), exige uma seleção adequada do mesmo tema e
textos simples e claros, adaptados às características técnicas dos meios
selecionados e à linguagem do público-alvo.
87
Os protagonistas destes comerciais serão tratados como intervenientes, uma
vez que se colocam como sujeitos reais, com depoimentos autênticos e suas
histórias de vida, e não como personagens de uma encenação ficcional.
Cada intertítulo, no qual descreveremos o comercial e faremos sua análise,
terá o nome do interveniente que faz o relato. O poder do nome pertence à
mentalidade primitiva. Segundo Chevalier (1991, p. 640-42), encontramos no nome
todas as peculiaridades do símbolo, ou seja, o nome é carregado de significação.
Escrevendo ou pronunciando o nome de alguém, fazemos com que esta pessoa viva
ou sobreviva, o que satisfaz ao dinamismo do símbolo. O conhecimento do nome
proporciona poder sobre a pessoa, aspecto mágico, conexão misteriosa do símbolo.
Conhecer o nome e pronunciá-lo de uma maneira justa é poder exercer um domínio
sobre o ser ou sobre o objeto. O nome é como a imagem ou a sombra (LURKER,
1999). Portanto, por esta força e poder que o nome representa, cada intertítulo
estará relacionado ao nome do interveniente que expressa seu testemunho.
Os comerciais dividem-se em cenas e intercalam tomadas e planos. Assim,
de maneira simplificada, cena, ou seqüência, representa determinada situação
dramática com unidade de tempo e lugar, unidades de ação contínua. É o conjunto
de planos ordenados de maneira que formem uma unidade. Deste modo, um local
diferente indica uma nova cena. Tomada, ou take, tecnicamente, consiste no tempo
que a câmera está acionada. O tempo exato entre o acionar e o desligar da câmera.
Plano, por sua vez, é a dimensão da imagem. Distância entre a câmera e o objeto a
ser filmado. Tem sentido narrativo, entre o tamanho plástico que terá a imagem na
tela e seu significado dramático. Está relacionado com o enquadramento que vemos
na tela.
Segundo Costa (1987, p. 180-1), há “definições e indicações” dos principais
tipos de planos. Usaremos este autor como referência, de modo simplificado, apenas
para facilitar o entendimento das cenas e tomadas que serão descritas. Assim, plano
geral corresponde ao enquadramento da cena, em sua totalidade, capta os espaços
em seu conjunto, é equivalente ao plano de conjunto; plano de meio-conjunto
corresponde ao enquadramento que dá destaque à figura humana, sem isolá-la do
ambiente; plano médio, o parâmetro da figura inteira que surge no enquadramento é
88
usado para definir outras nomenclaturas, mais ou menos equivalentes, do tipo plano
próximo; plano americano, a figura humana é filmada dos joelhos para cima,
aproximadamente; primeiro plano, a figura humana é enquadrada de meio busto
para cima, pode-se usar um valor mediador entre o plano americano e o primeiro
plano; e primeiríssimo plano, também conhecido como close, no qual o
enquadramento é apenas do rosto.
Para melhor compreensão de cada anúncio, faremos a ambientalização e a
descrição das cenas de cada um, o que facilitará entender como acontece a
narrativa, e a transcrição, na íntegra, de cada depoimento para, logo após,
buscarmos compreender os aspectos que envolvem a produção de sentido nos
níveis não-verbal e verbal, tendo como base as categorias de Barthes, Estereótipo,
Fait Divers, Poder, Cultura, Ideosfera e Discurso.
3.1 MANOEL FERREIRA DA SILVA
O comercial, intitulado “Manoel Ferreira da Silva”, tem 60 (sessenta)
segundos. Nele, um homem de 71 anos de idade, branco, cabelos grisalhos, com
bigode, deficiente visual (usa óculos escuros), de Porto Alegre, e sua esposa, uma
senhora, que aparenta ter idade próxima a do marido, branca, cabelos escuros
curtos, de óculos de grau, expõem sua relação com o Jornal Zero Hora.
Este comercial possui duas cenas. Na primeira cena, denominada cena 1,
há tomadas e planos diferentes e é nesta fase que o depoimento acontece. Na cena
seguinte, nomeada cena 2, o interveniente e sua esposa estão na tela, segurando o
veículo Zero Hora em uma sala repleta de fotografias de diversas pessoas e que
fazem alusão a épocas distintas. Estas fotografias estão penduradas às paredes, de
maneira sobreposta, e cobrem todo o fundo. Um locutor masculino, não-identificado,
fala.
Na cena 1, na primeira tomada, Manoel Ferreira da Silva e sua esposa,
Natália Vasques da Silva, estão na tela em primeiro plano, centralizados no vídeo,
89
tendo ao fundo um palco, como um teatro, com cortinas vermelhas (as cortinas estão
se abrindo) e um cenário, onde há um sofá de couro preto (estilo antigo) com
almofadas, um tapete e, na parede ao fundo, quadros, fotografias e bibelôs,
remetendo a uma casa de pessoas idosas, cheia de lembranças e quinquilharias,
além de um aparador, onde estão um abajur aceso com uma luz suave e pequenos
quadrinhos, e um cabide antigo com chapéu e casaco pendurados. Sobre o cenário,
incide uma luz branca criando áreas claras e escuras no ambiente. Há uma música
instrumental melodiosa e triste que está presente em todo o comercial. Manoel veste
calça e camisa social, em tons de cinza claro, e cinto e sapatos pretos,
transparecendo assiduidade, e Natália usa saia preta e blusa rosada. Manoel usa
óculos pretos (escuros), evidenciando sua deficiência, e Natália, além de usar óculos
de grau, está com uma pequena corrente dourada e relógio, manifestando sua
discreta vaidade.
Na tomada seguinte, o interveniente está parado no cenário de pé, em frente
ao sofá, vira-se e senta-se nele. Relata sua história, de forma pausada, em
linguagem simples e rotineira. Sobre a imagem, na parte inferior à direita do vídeo,
surge, e logo após desaparece, o nome do interveniente e sua cidade de origem. Em
determinada passagem do depoimento, Natália entra no cenário e senta-se ao lado
do marido no sofá. Ela está com o Jornal Zero Hora nas mãos. Enquanto o
interveniente e sua esposa descrevem sua narrativa, as tomadas variam entre os
planos: meio-conjunto, americano, primeiro, primeiríssimo plano ou close. Há
passagens da fala gravadas pelo interveniente e sua esposa, enquanto as imagens
são apresentadas na tela, e outras em que eles falam para a câmera.
O comercial finaliza com a cena 2, na qual o interveniente e sua esposa se
apresentam em plano de meio-conjunto, com o Jornal Zero Hora nas mãos e, ao
redor, várias fotografias, colocadas às paredes. Nesta cena, Manoel aparece com
terno, gravata e lenço (no bolso do paletó) e Natália com outra blusa. Ela ajeita a
gravata do marido, mostrando dedicação e cuidado. Os dois estão sorrindo,
animados. Há um locutor masculino não-identificado que narra o registro final, o
agradecimento de Zero Hora e a assinatura do veículo. O comercial finaliza com a
identidade visual e o sloganZero Hora 40 anos. A vida por todos os lados – nas
cores branca, preta e amarela, tons do veículo Zero Hora.
90
Quanto ao texto, Manoel e Natália dizem:
- Esta é uma história real. (Cena 1 – O interveniente e sua esposa estão
em primeiro plano, tendo, ao fundo, o palco e o cenário. Manoel é quem
fala)
- Meu nome é Manoel Ferreira da Silva. (Cena 1 – Manoel está em pé no
cenário, em frente ao sofá)
- Idade 71 anos. (Manoel senta-se no sofá)
- Primeiro lugar eu gosto de ler os pequenos anúncios que a Zero Hora
tem.
- Depois as notícias sociais e todas as outras notícias. (Manoel se ajeita
no sofá)
- Eu sou deficiente visual há mais de 30 anos.
- A minha esposa que lê todos os dias pra mim. (Natália entra no cenário e
senta-se ao lado de Manoel. Carrega uma edição de Zero Hora)
- A Natália Vasques da Silva.
- Levanto de manhã e já pego a Zero Hora e começo a ler, né?! (Voz de
Natália)
- Eu sou presidente de uma obra assistencial. (Depoimento de Manoel)
- Dinheiro para ajudar as crianças. (Natália lê uma passagem de uma
matéria ou reportagem do Jornal. Manoel ouve, atento)
- Faço campanha pra criança carente e a pessoa necessitada. (Manoel
fala)
- Eu sou um homem deficiente visual, mas sou um homem feliz na vida.
- Deus abre as janelas do céu pra mim! (Manoel fala com otimismo)
Um locutor, masculino, não identificado, diz:
- Depois disso, a gente só tem uma coisa a dizer: muito obrigado.
(Cena 2 – Manoel e Natália, sorrindo, estão segurando Zero Hora em
uma sala coberta de fotografias pelas paredes)
- Zero Hora 40 anos. A vida por todos os lados. (Exibe, na tela, a identidade
visual de Zero Hora com o slogan).
Neste comercial, vemos a qualidade de produção da campanha e as
tomadas e os planos são agradáveis aos olhos do telespectador. A ênfase é dada à
91
figura de Manoel, idoso e deficiente visual, e a sua esposa, Natália, companheira,
carinhosa e atenciosa. O tom de voz de Manoel, ao narrar sua história, deixa
transparecer sua emoção. O discurso agrada pela pessoa de Manoel, pelo otimismo
de sua fala e pela relação harmoniosa com sua esposa.
3.1.1 Análise
Quanto à produção de sentido não-verbal, podemos ressaltar: o teatro, a luz
branca incidente sobre o palco e o cenário, a música instrumental, a quantidade
excessiva de objetivos no ambiente, a figura de Manoel, a deficiência do
interveniente reforçada pelo uso dos óculos escuros e as fotografias.
O teatro, em seus subsídios elementares, engloba atores e espectadores.
Goethe caracteriza o palco como “tábuas que significam o mundo” (LURKER, 1997,
p. 709).
Segundo Chevalier (1991, p. 871), “o teatro representa o mundo, manifesta-
o aos olhos do espectador. Mexe com o manifestado (...). E porque o representa, faz
perceber o seu caráter ilusório e transitório”.
Cada história relatada faz com que o espectador (neste caso, telespectador)
se projete no ator (interveniente) e se identifique com o personagem interpretado,
compartilhando os sentimentos expressos, interpretando o papel do ator e se
colocando em uma situação dramática imaginária. A escolha do teatro, como espaço
para realização da campanha, parece visar a esta transitoriedade. Cada história ali
apresentada simboliza uma passagem de vida de cada interveniente e que poderia
representar cada um de nós, em nossas histórias de vida. Cada um de nós,
telespectadores do comercial, pode se colocar na figura do interveniente,
sensibilizando-se com sua história e atribuindo ao discurso a legitimidade que
almeja. Esta relação sensibiliza e legitima o fato.
92
A luz branca, que incide sobre o cenário, pode representar a vida e o bem. É
um dos símbolos religiosos originais da história do homem, em sua referência ao
divino, ao imaterial. A luz, em suas diversas interpretações, corresponde à natureza
da divindade (LURKER, 1997). É o símbolo favorito da imaterialidade, do espírito, de
Deus, da vida e da felicidade (BECKER, 1999, p. 174). A cor branca é a matiz da
revelação, da graça, da transfiguração, que deslumbra e desperta a compreensão, o
tom da revelação de Deus. Está relacionada à ordem, à simplicidade, ao otimismo, à
dignidade, à afirmação, à modéstia, ao despertar, à harmonia, à estabilidade e à
divindade (FARINA, 1990, p. 112). Características intrínsecas no discurso do
interveniente.
A luz, projetada sobre o centro do palco, deixa áreas escuras ao redor do
cenário, remete claridade e leveza ao ponto principal da cena, onde o relato
acontece. Ilumina o ambiente, atribuindo-lhe leveza e, por conseqüência, à Zero
Hora e a sua mensagem, dando uma impressão de tranqüilidade e segurança. A luz
simboliza, na tradição cristã, vida, salvação e felicidade, em oposição às trevas, ao
mal, à infelicidade, ao castigo, à perdição e à morte (CHEVALIER, 1991, p. 570). A
luz surge em oposição à sombra absoluta, que sugere o não conhecer, a ignorância,
âmbitos e estados moralmente inferiores, do conhecimento aprisionado à pura
opinião e não norteado pelo mundo das idéias (BECKER, 1999). A luz corresponde
à natureza da divindade. O caráter luzente é de propriedade dos seres, que
pertencem ou estão voltados aos céus. O aspecto espiritual da luz revela-se no fato
de ser o fundamento do ver, do reconhecer (LURKER, 1997, p. 403-4).
A sombra, oposta à luz do consciente, pode ser entendida como as trevas do
inconsciente subjetivo, do lado avesso da personalidade, vivenciado de maneira não
consciente. Na crença católica, a sombra de Deus é personificada em Lúcifer, irmão
e inimigo. O Anticristo é o irmão inimigo de Cristo que se embate no fim dos tempos.
Cristo afastou-se da sombra para lutar contra o tentação de Satã (LURKER, 1997, p.
689). Luz e sombra concebem dualidade universal.
O centro do palco, iluminado pela luz, pode significar o princípio, o real
absoluto, o centro dos centros que representa Deus, cuja presença é universal e
ilimitada, independente do tempo e do espaço. O centro é a imagem dos opostos,
93
concebido como foco de intensidade dinâmica, lugar de condensação e de
coexistência de forças opostas, local da mais concentrada das energias
(CHEVALIER, 1991, p. 219).
O centro é idealizado como o ponto inicial do movimento da unidade em
direção à multiplicidade, do interior ao exterior, do não-manifesto ao manifesto, do
eterno para o temporal, os processos de emanação e divergência, e onde se
coligam os processos de retorno e de convergência na procura da unidade. Cada
povo e cada indivíduo têm um centro do mundo próprio, seu ponto de vista, seu
ponto magnético, imaginado como união entre um desejo do homem de saber, amar
ou agir, coletivo ou particular, e o poder sobre-humano adequado para satisfazer o
desejo. O ponto, onde se ligam desejo e poder, é o centro do mundo. O centro,
como irradiação vertical, pode ser compreendido como um lugar de passagem, o
cenáculo das aliciações, o caminho entre os planos celeste, terrestre e infernal do
mundo, o umbral de transposição e da ruptura (CHEVALIER, 1991, p. 219-21).
Assim, parece ser este o significado atribuído à luz que incide sobre o centro
do cenário (palco). O ponto de início e transposição, o lugar da decisão e da
fronteira divisória da vida e da história de cada interveniente, a partir de sua relação
com Zero Hora, a luz da felicidade, da revelação e do caminho, em oposição às
sombras e à ignorância. Zero Hora parece ser o agente principal do qual tudo
depende.
A música instrumental melodiosa e triste que acompanha todo e todos os
comerciais, além de servir como elemento integrador da campanha, sensibiliza. A
música faz parte da tradição cultural de cada povo e tem uma relação afetiva e
identificatória entre as diferentes culturas. Seria difícil imaginarmos o mundo sem
música. Ela parece estar incorporada ao dia-a-dia, em diferentes estilos e gêneros
musicais. Parece difícil imaginarmos a televisão em silêncio. Em raras ocasiões, nas
quais a ausência de som predomina (alguns comerciais optam pelo silêncio para
despertar interesse), em geral, a TV tem no som um dos seus elementos mais fortes
associado à imagem. A música dos comerciais da campanha parece servir como
pano de fundo, de modo a não interferir nas narrativas, e, ao mesmo tempo, pelo
94
tom melodioso, instrumental e triste, parece reforçar as imagens e as falas e
sensibilizar os relatos.
O cenário faz referência a uma casa, à morada dos intervenientes que, para
Chevalier (1991, p. 196-7), representa o núcleo do mundo, a imagem do universo. O
local onde vive e interage o interveniente e sua esposa. Como um símbolo feminino,
a casa possui um sentido de refúgio, de proteção, de segurança. Segundo Lurker
(1997, p. 119) e Becker (1999, p. 58-9), como espaço ordenado e fechado, que traz
um centro à vida humana, a casa é símbolo do cosmos ou da ordem cósmica, é o
centro sagrado, onde o homem está perto de Deus. Representa a sua privacidade. A
escolha pela casa parece reforçar a presença de Zero Hora no local mais íntimo e
reservado dos intervenientes. Parece caracterizar o comparecimento do veículo na
rotina e na vida de cada um.
A exagerada exposição de objetos no fundo do cenário (quadros, fotografias,
enfeites, móveis, roupas, entre outros) remete à idéia de acervo, peculiaridade das
pessoas com idade avançada que acumulam, em sua história e vida, objetos e
recordações materiais, além da experiência e da vivência típicas da maturidade.
Caracteriza o cenário, o lar de um casal idoso, e parece atribuir ao testemunho a
noção de experiência, de sabedoria, de conhecimento pela vivência, a maturidade,
portanto, por estas atribuições, parece buscar a legitimação do relato.
Para Chevalier (1991), a velhice é um sinal de sabedoria e virtude. A
longevidade dá ao homem acúmulo de experiência e reflexão. Segundo Lurker
(1997), sabedoria, luz e vida estão associadas. O arquétipo do velho sábio se
confunde com Deus Pai. A opção por um casal idoso, para falar em nome de Zero
Hora, parece buscar, pelo conhecimento e sabedoria que representam, credibilidade
ao episódio e, em conseqüência, ao veículo. Esta opção parece querer validar Zero
Hora, pela maturidade e pela confiabilidade que os intervenientes transparecem e
pela maturidade que o periódico alcança ao completar 40 anos.
O cuidado na apresentação (vestimenta) de Manoel e a atenção de Natália
em relação a ele (no final do comercial, na cena 2, Natália está ajustando a gravata
do marido, além de ser a pessoa, que lê o Jornal para ele todos os dias) passam a
95
noção de harmonia e de entrosamento entre o casal. De acordo com Lurker (1997,
p. 303-4), a palavra grega harmonia significa conformidade, união. Assim, é possível
derivar um princípio de conformidade, a coesão de partes independentes entre si
que, em movimento, se relacionam ou a união de elementos opostos em um todo
ordenado. O casal, homem-mulher, parece representar esta união. Esta união
harmoniosa vai de encontro à presença harmoniosa de Zero Hora na rotina do casal.
A harmonia entre eles (Manoel e Natália e, também, o casal e Zero Hora) faz
parecer que existe um pacto, uma parceria, na qual um respalda e confirma o outro.
Isso transmite a idéia de cumplicidade ao discurso, tornando-o mais forte.
A roupa é um símbolo exterior da atividade espiritual, a forma visível do
homem interior (CHEVALIER, 1991, p. 947). No Antigo Testamento, a roupa podia
significar o caráter daquele que a usa. Deste modo, a vestimenta não é um atributo
exterior alheio à natureza daquele que a veste, ao contrário, expressa a sua
realidade essencial. Em seu simbolismo, a roupa é símbolo do próprio ser do
homem. É um dos primeiros indícios do homem da consciência de si mesmo, da
moral, reveladora da personalidade e de seu caráter influenciável, assim como de
sua vontade de influenciar outros.
Uma peça específica da vestimenta (lenço, gravata, cinto) indica associação
a um grupo, mérito ou missão. O cinto é a primeira peça do vestuário. Segundo a
Bíblia, o cinto preso ao redor da cintura, por ocasião do nascimento, religa a unidade
ao todo, ao mesmo tempo, que liga o indivíduo. Ao religar tranqüiliza, conforta, dá
força e poder. Ao ligar leva em troca à submissão, à dependência, à restrição da
liberdade (CHEVALIER, 1991, p. 245).
As vestes dos intervenientes parecem reforçar estas particularidades, uma
vez que Natália troca de blusa na cena final, aparentando preocupação ao se vestir,
e Manoel usa cinto, que pode ser entendido como sua ligação (submissão) e
re-ligação à Zero Hora e a participação do veículo na sua vida e rotina
(pertencimento). Ao finalizar o comercial, Manoel está com o terno completo, como
se reverenciasse o Jornal, e Natália ajeita sua gravata, para que se apresente de
maneira impecável. Os dois perfilam-se frente à câmera, como se estivessem
posando para ela.
96
Quanto à deficiência do interveniente, esta contagia e cativa por si só.
Segundo Lurker (1997), o olho representa: “janela para o mundo e ao mesmo tempo
espelho da alma”. Para Chevalier (1991), o órgão da percepção visual é, de forma
natural, o símbolo da agudeza intelectual. A visão dualística é uma percepção
mental: a alma tem dois olhos, um voltado para o tempo e outro para a eternidade.
Ser cego carrega dupla conotação: significa, para uns, desconhecer a realidade das
coisas, negar a evidência e, desta forma, ser lunático e irresponsável; para outros, é
aquele que ignora as aparências enganadoras do mundo e tem o privilégio de
conhecer uma realidade secreta e profunda, proibida aos comuns mortais
(CHEVALIER, 1991, p. 217). No comercial, pelo depoimento, vemos esta segunda
noção prevalecer. Chevalier (1991) ressalta, ainda, que o cego participa do divino, é
o inspirado, o poeta, o dramaturgo, o vidente. A cegueira nos velhos simboliza a
sabedoria do ancião, a luz interior, a contemplação visionária (BECKER, 1999, p.
61). Estas qualidades parecem bem exploradas na seleção deste interveniente, para
falar sobre Zero Hora, e sensibilizam e dão crédito ao episódio.
Na cena de encerramento do comercial, o interveniente e sua esposa estão
com o Jornal Zero Hora nas mãos, sorrindo, em um local repleto de fotografias de
diferentes pessoas, afixadas às paredes. Estas fotografias representam o Poder de
interferência e de influência de Zero Hora na vida e na história de cada um. Isto é
percebido, ainda, no slogan do próprio veículo: Zero Hora: A vida por todos os lados.
A vida de todos e todas as suas histórias de vida.
Para Barthes (1980), ao sermos fotografados, preparamos-nos para a pose
e, assim, fabricamos um outro corpo, criando uma imagem. A Foto, como um jogo
social, faz com que posemos, mas esta mensagem suplementar não deve alterar a
essência de nossa individualidade. A Foto é o aparecimento de eu próprio como
outro, uma dissociação artificiosa da consciência de identidade.
A Foto-retrato, segundo Barthes (1980, p. 29-31), é um campo, no qual se
cruzam, confrontam e deformam quatro imaginários: frente à objetiva, somos aquele
que julgamos ser, aquele que gostaríamos que os outros julgassem que fôssemos,
aquele que o fotógrafo julga que somos e aquele de quem o fotógrafo se utiliza para
97
expor a sua arte. Desta maneira, não paramos de imitar a nós mesmos e somos
assaltados por uma sensação de inautenticidade.
No imaginário, a Fotografia representa o momento em que um sujeito sente
que se transforma em objeto. Como objeto, nossa Foto não é mais de nosso domínio
e nos vemos catalogados à disposição da sociedade: “os outros – o Outro –
desapropriam-me de mim próprio, fazem ferozmente de mim um objecto, têm-se à
sua mercê, à sua disposição, arrumado num ficheiro, preparado para todos os
truques subtis” (BARTHES, 1980, p. 31).
A apropriação de Zero Hora, mesmo que consensual, das fotografias das
diferentes pessoas e sua utilização como elemento integrador da campanha
parecem representar esta desapropriação a que se refere o autor. As fotos tornam-
se objetos para serem usufruídos pela empresa RBS e pela sociedade, para
confirmar princípios e valores de quem as utilizam.
Segundo Barthes (1980), a Fotografia é constituída em objeto e as
personagens são constituídas em personagens, pela sua semelhança com seres
humanos, sem uma intencionalidade particular, e pairam entre a margem da
percepção, a do signo e a da imagem, sem, no entanto, abordar qualquer uma. A
Foto é contingência pura, é sempre alguma coisa que é representada, contrária ao
texto que, pela ação de uma palavra, pode fazer passar uma frase da descrição à
reflexão.
As fotos dos comerciais, como elemento ilustrativo da campanha, não
exigem ou reivindicam nada. Não podem levar à reflexão. Estão ali, imóveis, apenas,
reforçando os valores transmitidos nas falas dos intervenientes e no slogan de Zero
Hora.
A Fotografia desperta certo feiticismo de querer ver, de querer saber.
Participa da arte pelo teatro. Para Barthes (1980), a câmera obscura produziu o
quadro perspectivado, a Fotografia e o diorama, que são artes do palco. Aproxima-
se do teatro, também, pelo aspecto da morte. O teatro é conhecido por sua relação
com o culto dos mortos e os primeiros atores se distinguiam dos espectadores por
98
desempenharem papéis de mortos. A Foto tem este caráter do todo-imagem, porque
não somos nós na Fotografia, tornamo-nos objeto, assim, a morte em pessoa.
Corresponderia, talvez, a uma morte assimbólica, fora da religião e do ritual,
“mergulho brusco na Morte literal”. Conserva, em si, o signo imperioso da morte
futura.
(...) é esta mesma relação que eu encontro na Foto; tão viva que se
esforçam por a conceber (e esta fúria de “tornar vivo” só pode ser a
denegação mítica de um receio da morte), a Foto é como um teatro
primitivo, como um Quadro vivo, a figuração do rosto imóvel e pintado sob o
qual vemos os mortos (BARTHES, 1980, p. 53).
De acordo com Barthes (1980, p. 57), toda a Foto é contingente, sem
sentido, e só pode significar, buscar uma generalidade, adotando uma máscara, o
que faz de um rosto o produto de uma sociedade e da sua história. Estas
características, que aproximam a Fotografia do teatro, parecem encaixar-se na
escolha do teatro, como espaço, o local central, no qual transcorre toda a
campanha, e nas fotografias que encenam o grande final. Assim, como as fotos da
campanha tornam-se objeto, este se torna produto para ser consumido pela
sociedade e produto da trajetória de Zero Hora.
Barthes (1980), ainda, fala-nos sobre a Fotografia unária, ausente de
punctum.
34
Foto unária é aquela que transforma a realidade sem a desdobrar e tem
tudo para ser banal, sendo a unidade da composição, a apresentação de uma única
coisa, a regra inicial da retórica vulgar. Como a fotografia pornográfica que, segundo
o autor, é uma foto ingênua, “sem intenção nem calculismo. Como uma vitrina que,
iluminada, só mostrasse uma única jóia, ela é inteiramente constituída pela
apresentação de uma única coisa, o sexo: nunca há um segundo objectivo,
intempestivo, que venha semi-esconder, adiar ou distrair” (BARTHES, 1980, p. 64-
6).
Este parece ser o propósito a que dispõe as fotografias da campanha: serem
usadas de forma banal, ilustrativas, apresentadas como uma única coisa (fotos de
34
Para Barthes (1980), punctum é um pormenor, que faz detonar nosso interesse por uma Fotografia
em relação a outras, sem acepção de moral ou bom gosto, a passagem de um vazio. É um
suplemento que acrescenta algo a Fotografia e que, no entanto, já está nela, uma espécie de fora-
de-campo sutil, como se a imagem lançasse o desejo para além daquilo que dá a ver.
99
pessoas, famílias). As fotos da campanha, pela sua função de ilustrar e compor o
tema principal dos comerciais, poderiam ser vistas como fotografias unárias,
ausentes de um detonador, que acrescentaria algo a mais do que servirem como
papel de parede e reforço, silencioso e sem contestação, aos interesses da RBS.
A Fotografia, por ser uma imagem imóvel, significa que as personagens que
a representam não se mexem e, também, não saem de lá, estando “anestesiadas e
fixadas, como se fossem borboletas” (BARTHES, 1980, p. 83). E, portanto, a Foto
pode ser usada ao bel prazer, como objeto de nossa sociedade.
Segundo o autor, na Foto, não se pode negar que aquilo que vemos esteve
lá. Há uma dupla posição conjunta: de realidade e de passado. Assim, devemos
tomá-la por redução, pela própria essência, o noema da Fotografia. A intenção em
uma Foto não é a arte nem a Comunicação, é a referência, ordem fundadora da
Fotografia, é confirmar que aquilo que vemos existiu. Tem relação com a
ressurreição, como a imagem de Cristo impregnada no Sudário da Túria. É uma
emanação do real no estado passado e estabelece uma presença imediata no
mundo, uma co-presença. Sua essência é ratificar aquilo que representa, não
inventa, é a própria autentificação e este poder sobrepõe-se ao de representação.
Pode mentir sobre o sentido da coisa, sendo tendenciosa, mas não sobre sua
existência. Não deixa lugares vagos, não se permite acrescentar nada.
Desta forma, as fotos da campanha estão lá, apresentando pessoas que
existiram, certificando sua existência. Utilizadas como objetos da campanha, não
criticam ou reivindicam nada, não podemos atribuir-lhes nada, também, servem,
apenas, como autenticação e reforçam os depoimentos, os valores que Zero Hora
pretende transmitir e as estruturas da sociedade atual.
A Fotografia parece delinear a verdade. É o que acontece, quando julgamos
certa Foto “parecida”. A semelhança é uma conformidade com a identidade,
imprecisa, imaginária, ao passo que nos permite falar em semelhança sem ter visto
o modelo. Uma Foto pode parecer qualquer coisa, menos com quem ela representa,
pois a semelhança remete à identidade do sujeito, coisa irrisória, ela apresenta-o
enquanto ele próprio e, não, enquanto nele próprio (BARTHES, 1980, p. 143).
100
(...) diz-se “revelar uma foto”, mas aquilo que a acção química revela é o
“irrevelável”, uma essência (de ferida), aquilo que não pode transformar-se
mas apenas repetir-se sob a forma de insistência (do olhar insistente)
(BARTHES, 1980, p. 75).
Ao escolher as fotografias para caracterizar a cena 2 dos comerciais e uni-
las ao slogan de Zero HoraA vida por todos os lados, criamos uma ligação entre o
observador e as fotos, uma sensação de semelhança com nossas próprias fotos e
imagem e um sentimento de cumplicidade. A escolha das fotografias se legitima:
“uma espécie de ligação umbilical liga o corpo da coisa fotografada ao meu olhar: a
luz, embora impalpável, é aqui um meio carnal, uma pele que eu partilho com aquele
ou aquela que foi fotografado” (BARTHES, 1980, p. 115).
Ritualizar as fotografias, afixando-as às paredes, pela sua plenitude
insuportável, tornam-nas indialéticas, pois, de acordo com Barthes (1980, p. 127):
a Fotografia é indialéctica: ela é um teatro desnaturado em que a morte não
pode “contemplar-se”, reflectir-se e interiorizar-se; ou ainda: o teatro morto
da Morte, a exclusão do Trágico; ela exclui toda a purificação, toda a
catarse.
A escolha das fotos de diferentes pessoas em diversas épocas cria uma
sensação de curiosidade no observador (telespectador), uma certeza de que
aquelas pessoas existiram: “a Fotografia é uma evidência forçada, carregada, como
se caricaturasse, não a figura daquilo que representa (é bem o contrário), mas a sua
própria existência” (BARTHES, 1980, p. 158).
Barthes (1980, p. 157) ressalta, ainda, que a Fotografia realiza a confusão
da realidade:
este seria o “destino” da Fotografia: fazendo-me crer (...) que encontrei a
“verdadeira fotografia total”, ela realiza a confusão inaudita da realidade
(“Isto foi”) e da verdade (“É isto!”). Passa a ser simultaneamente verificativa
e exclamativa; leva a efígie a esse ponto louco em que o afecto (o amor, a
compaixão, o luto, o entusiasmo, o desejo) é garante do ser. Aproxima-se,
então, efectivamente, da loucura, junta-se à “verdade louca”.
Na Fotografia, estabelecemos que o objeto existiu e esteve lá, onde o
vemos. É aqui que reside à loucura, porque, antes, nenhuma representação podia
101
garantir o passado da coisa, mas, com a Foto, a certeza é imediata. A Foto torna-se
uma nova forma de alucinação, moderada, partilhada: falsa ao nível da percepção e
verdadeira, ao tempo. “Imagem louca, tocada pelo real” (BARTHES, 1980, p. 159). A
Fotografia pode ser louca e séria: séria, se o seu realismo permanecer relativo,
suavizado por hábitos estéticos ou empíricos, ilusões perfeitas; e louca, se este
realismo for absoluto, a busca inacessível da realidade. A seleção das fotos para
finalizar os comerciais parece ter as duas conotações, ilusões perfeitas das imagens
que cria e a busca inalcançável da realidade para respaldar os princípios de Zero
Hora.
Quanto aos Estereótipos, estes são visíveis na figura do homem idoso,
deficiente e lutador, e em Zero Hora, como instituição arraigada ao cotidiano de
todos nós e sua inserção na vida social. O interveniente reforça a idéia do idoso-
cego-batalhador, quando relata que, mesmo possuindo uma limitação, é um homem
feliz e abençoado por Deus: “eu sou um homem deficiente visual, mas sou um
homem feliz na vida. Deus abre as janelas do céu pra mim!”. Em seu relato, Manoel
diz, ainda, ser presidente de uma obra assistencial e fazer campanhas para crianças
carentes e pessoas necessitadas, mostrando-se como uma pessoa atuante na vida
social. Zero Hora, estereotipada na figura da instituição, que é elementar na rotina
das pessoas, que está incorporada ao cotidiano, tem lugar de destaque no contexto
diário de todos (“Levanto de manhã e já pego a Zero Hora e começo a ler, né?!”) e
está inserida, de forma participativa e atuante, na vida social, quando Natália lê a
passagem “dinheiro para ajudar as crianças”, logo após o marido mencionar seu
trabalho em obras assistenciais, fica evidente esta colocação.
O Fait Divers assume papel decisivo, formaliza a noção de conflito, que
interpela pela exploração da emoção. Escolhe-se um caso específico – caso do dia
– e transforma-o em roteiro da campanha de Propaganda, afinal, segundo o próprio
interveniente, “Esta é uma história real”.
Quanto à tipologia de Fait Divers do comercial, encontramos dois momentos
específicos para análise: o primeiro relacionado ao interveniente e seu depoimento,
e o segundo, ao tipo de informação e estrutura da campanha.
102
Sobre o interveniente e seu relato, temos o Fait Divers de Causalidade de
Causa Esperada estruturado na figura do homem idoso e deficiente visual. O peso
da narrativa recai sobre esta Personagem Dramática, que simboliza fragilidade e
candura humana. Gera emoções e suscita identificação projetiva fazendo com que
sejamos inseridos no seu lugar, pela sua condição de sacralização, advinda da
moral e da igreja, e da catarse, pelo intermédio da solidariedade e da compaixão
(RAMOS, 2002).
O Fait Divers de Causalidade interpela pelo conflito como drama e o sujeito
relativo pode recorrer, em sua fraqueza, a um Sujeito Absoluto para deliberar sobre
os obstáculos de sua vida, prevalecendo a dialética da Fatalidade, vista como
Sujeito Absoluto, que possui a explicação para o inexplicável. O sujeito relativo –
idoso, deficiente – vê na Fatalidade – Zero Hora, Mídia, Deus – seu Poder e se torna
submisso, diante de sua força e saber: “eu sou um homem deficiente visual, mas sou
um homem feliz na vida. Deus abre as janelas do céu pra mim!”. Assim, no relato,
Deus e Zero Hora assumem o papel de intercessores dos conflitos humanos. O final
feliz, a contemplação, é a garantia da Fatalidade.
Vemos presente, ainda, de forma secundária, o Fait Divers de Coincidência
de Antítese, através da midiatização, na qual um sujeito deficiente visual “lê” Zero
Hora. Duas perspectivas diferentes e antagônicas, o cego e um veículo impresso,
são fundidas em uma única realidade. A Antítese se estabelece no conflito dramático
e na Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual todos compartilham possibilidades e
valores comuns.
O tipo de Fait Divers que prevalece no comercial, quanto ao depoimento e
interveniente, visto que tanto a Causalidade quanto a Coincidência interpelam pelo
conflito e pela Fatalidade, é o Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada, na
presença da Personagem Dramática, o idoso, cego, e a Fatalidade, representada em
Zero Hora, como Sujeito Absoluto, capaz de “contornar os impasses incontornáveis
historicamente” (RAMOS, 2002, p. 112).
O segundo momento da análise, quanto ao tipo de informação e estrutura da
campanha, encontramos o Fait Divers de Coincidência de Repetição, presente no
103
objeto padronizado: na idéia central – os depoimentos reais, bem como nos
elementos que compõem física e visualmente a campanha: o teatro, o palco, os
cenários, as cenas, as tomadas e os planos, a luz, a música instrumental, as
fotografias, a frase de encerramento do locutor não-identificado, a assinatura e a
exibição do logotipo e do slogan do Jornal.
Na Repetição, a informação repetida instaura a onipresença da factualidade
em circunstâncias diferentes. Repetir não o original como cópia e, sim, sua
reprodução com diferenças, no desigual. Insinua a onipresença da factualidade, que
se mantém em qualquer circunstância. E tem como desfecho, solução, a Fatalidade,
o Deus-ex-Machina, Sujeito Absoluto, que desata os nós coincidentes (RAMOS,
2002). Nos comerciais, a Repetição ocorre na idéia central, nos elementos
estruturais e na onipresença da mesma factualidade, mas se distingue no perfil e no
depoimento (relato) de cada interveniente, é o desigual. A Repetição parece operar
como uma forma de persuasão, buscando memorizar, seduzir e convencer.
As relações de Poder são percebidas na figura de Zero Hora, que participa
da vida cotidiana e social dos intervenientes. E, pelo próprio relato de Natália, ser a
primeira ação de sua rotina: “levanto de manhã e já pego a Zero Hora e começo a
ler, né?!”. O Poder, como dominação, se encaixa na relação dialética entre
submissão e liberdade. No valor atribuído à Zero Hora no dia-a-dia, o cego que “lê”
Zero Hora todos os dias, logo que levanta. O Poder, como energia prazerosa,
garante a submissão do pacto estabelecido entre dominados e dominadores.
A Cultura se mostra, através da linguagem, como instituição social
reproduzida em meio aos diversos grupos que compõem a sociedade, neste
comercial, no idoso, deficiente visual e lutador, no seu jeito de falar otimista. Possui
uma abordagem inscrita e circunscrita na subjetividade, que deriva na repetição, não
como cópia integral e, sim, o igual que se reproduz com diferença. Assim, o discurso
libertador e oportuno que enaltece Zero Hora está manifesto neste depoimento.
A Cultura é expressa, também, no modo de falar (rotineiro, coloquial) e vestir
dos intervenientes. Na preocupação, através do discurso e da vestimenta, de
104
influenciar os outros e transparecer distinção, isto é percebido ao falar do trabalho
social e ao usar terno para referendar Zero Hora.
A Ideosfera é a produção de sentido a serviço do Poder. Os sujeitos, Manoel
e Natália, relacionam-se com o social e a produção discursiva, e consolidam o
ideológico. Toda palavra de enaltecimento conferida à Zero Hora cria a Ideosfera. A
conotação, onde o lingüístico cultiva o seu diálogo com o cenário social e histórico e
encena a legitimação da sociedade. A Ideosfera tende a se estabelecer em discurso
da doxa, vivenciado pelos usuários como um discurso unânime, que não carece de
explicação, cuja tipicidade não é percebida, em que o que seja exterior é
desprezado como margem.
Temos, nas subcategorias da Ideosfera, a Doxosfera, que constitui o senso
comum, autenticando o papel de Zero Hora, como capaz de estar incorporada ao
cotidiano e participar, ativamente, da vida social; a Piteosfera, com o discurso da
crença que Zero Hora, e a Mídia, tem o Poder de transformar a sociedade; o
Socioleto, que concebe a neutralidade da linguagem de um grupo social, no caso, a
linguagem simples e cotidiana do cidadão brasileiro; e a Logosfera, o discurso
espontâneo e incondicional, que independe da vontade do sujeito.
A frase final do comercial – “Depois disso, a gente só tem uma coisa a dizer:
muito obrigado. Zero Hora 40 anos. A vida por todos os lados” – ampara a falsa
modéstia do Grupo RBS, que admite o depoimento que engrandece o periódico e
sua importância no cenário social. E parece apropriar-se da fragilidade e da
inocência humanas para caracterizar seu discurso.
O depoimento de Manoel reforça o Discurso Encrático de Zero Hora e, por
conseguinte, da empresa RBS. A RBS e seus valores, através de seu veículo, são
sublimados, como instituição enraizada em nosso cotidiano e com efetiva
participação no contexto social. O discurso ressalva a ideologia da classe
predominante e se move pelo senso comum. O Discurso Encrático está expresso em
toda a relação dos intervenientes com o veículo Zero Hora e, em particular, é
percebida na declaração final de Manoel, quando diz: “Deus abre as janelas do céu
pra mim!”. Há uma associação, quase instintiva, entre Zero Hora e os valores
105
divinos. O céu é a manifestação da transcendência, do poder, da perenidade e da
sacralidade. Símbolo pelo qual se exprime a crença em um ser divino celeste,
criador do universo e responsável pela fecundidade da terra, dotado de presciência
e sabedoria infinitas. É o símbolo da ordem sagrada do universo e dos poderes
superiores ao homem. É a morada dos deuses e dos bem-aventurados. Aspiração
dos homens, lugar da perfeição e da plenitude (CHEVALIER, 1991, p. 227-30). Ao
associar sua história de vida, o que faz e quem é à Zero Hora, o interveniente atribuí
ao periódico valores sublimes, como sacralidade, sabedoria e revelação.
Assim, de maneira sintética, vemos, neste comercial, os Estereótipos na
figura do homem idoso e deficiente visual que sensibiliza por sua aparência, ao
mesmo tempo, que transmite a idéia de ser guerreiro em meio a sua fragilidade, e na
função da Mídia, que participa da vida particular e coletiva de todos nós.
Percebemos a incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada,
já que o peso da narrativa incide sob a Personagem Dramática, o idoso, que
representa a fragilidade e a singeleza humana. Mobiliza emoções e pode fazer com
que nos transportemos para seu lugar em uma identificação projetiva, pela sua
sacralização, solidariedade e compaixão.
O Fait Divers de Causalidade interpela pelo conflito e o sujeito relativo
busca, em sua debilidade, um Sujeito Absoluto, para resolver os conflitos de sua
história, imperando a lógica da Fatalidade, o Sujeito Absoluto, que tem resposta para
todos os assuntos e dúvidas. O sujeito relativo – idoso, cego – reconhece na
Fatalidade – Mídia, Deus – seu Poder e se torna subordinado, pelo seu alento e
sabedoria, que lhe certifica o final feliz.
Vemos, de modo secundário, o Fait Divers de Coincidência de Antítese,
através da midiatização, na qual o sujeito é igualado aos demais por uma
inteligência não materializada. A Antítese se estabelece no conflito dramático e na
Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual todos vivenciam realidades iguais.
A tipologia dominante, quanto ao interveniente e ao relato, é do Fait Divers
de Causalidade de Causa Esperada, na figura do idoso, Personagem Dramática, e
106
na Fatalidade, na Mídia, como mediadora dos conflitos e assuntos sociais e resposta
às questões insolúveis.
Como tipologia de Fait Divers predominante da informação e da estrutura da
campanha, temos o Fait Divers de Coincidência de Repetição, pela padronização do
objeto, no qual se repete a idéia central, os elementos estruturais e a onipresença da
mesma factualidade, mas se distingue no perfil e no depoimento (relato) dos
intervenientes, é o desigual. A Repetição parece atuar como um modo de
persuasão, visando a memorizar, seduzir e convencer.
A fala do interveniente ressalta, ainda, o Poder, como dominação e energia
prazerosa, que permite que dominados e dominadores se deparem associados pelo
prazer. O sujeito relativo – idoso, deficiente – vê no Sujeito Absoluto – Mídia, Deus –
a possibilidade de inserção a uma prática social comum, a leitura de um periódico, e
divide com ele interesses comuns à sociedade (a relação entre as obras
assistenciais desenvolvidas pelo interveniente e as matérias de Zero Hora). O
sentimento resultante é o prazer: o Poder, a libido dominante.
A Cultura está especificada nas relações do dia-a-dia, no valor atribuído à
Mídia e no perfil do interveniente: idoso, cego e lutador. A Ideosfera, como um
discurso unânime, que define o senso comum, confirma o papel de Zero Hora, como
ativa e participante na conduta social; o discurso da fé de que a Mídia tem o Poder
de atuar (e transformar) na vida dos sujeitos e na sociedade; o discurso que
representa a neutralidade da linguagem de um grupo social – o incansável cidadão;
e o discurso espontâneo e reflexo, que independe da vontade do sujeito.
Percebemos o Discurso Encrático, o articular da dominação, que valoriza as
instituições vigentes, que atribui valores à Mídia e uma capacidade de atuação e
transformação além da sua real possibilidade, cultivando as estruturais de Poder da
sociedade.
E, finalmente, temos, como categoria, a posteriori, a Fotografia que, para
Barthes (1980), é um jogo social, no qual criamos uma imagem, um objeto, que pode
ser utilizado pela sociedade e foi usada pela campanha para caracterizar o slogan e
107
o Poder de interferência e de influência que Zero Hora acredita ter na sociedade. As
Fotos-retrato, utilizadas como elementos ilustrativos da campanha, não exigem ou
reivindicam nada. Não podem levar à reflexão. Estão, apenas, reforçando os valores
transmitidos nas falas dos intervenientes e no slogan do periódico, servindo de
reforço silencioso aos interesses da empresa RBS.
3.2 IARA SOARES
O comercial “Iara Soares” tem 1 (um) minuto de duração. Nele, uma mulher
negra, cabelos curtos, de 36 anos de idade, nascida em Caçapava do Sul, casada,
dona-de-casa e mãe relata sua experiência com o veículo Zero Hora.
O comercial possui duas cenas. Na cena 1, várias tomadas e planos são
feitos e é nesta parte que o relato ocorre. Na cena 2, a interveniente aparece na tela,
em plano de meio-conjunto, segurando uma edição de Zero Hora em uma sala
coberta de fotografias de diferentes pessoas e que fazem menção a diferentes
décadas. As fotografias estão presas às paredes, sobrepostas, e não deixam
mostrar o fundo. O locutor masculino, não-identificado, fala.
Na cena 1, primeira tomada, Iara Soares está em primeiro plano, ao lado
esquerdo do vídeo, tendo ao fundo um palco, como um teatro, com cortinas
vermelhas (as cortinas estão se abrindo) e um cenário, no qual estão uma pequena
casa de madeira, com enxadas, pás, roda de carreta e machado apoiados na
parede, e um banco de madeira, lembrando uma casa simples de pessoas que
vivem no campo. Sobre o cenário, incide uma luz branca. Há uma música
instrumental melodiosa e triste que acompanha todo o comercial. Iara veste calça
jeans, uma blusa laranja, com bolinhas brancas, e sandálias baixas de couro
marrom. Usa brincos dourados, em formato de pequenas argolas, e aliança de
casamento.
Na tomada seguinte, a interveniente “entra” timidamente no cenário e senta-
se na ponta direita do banco de madeira. Com as mãos apoiadas sobre as pernas
108
aparenta acanhamento. Começa a contar, pausadamente, em linguagem simples e
coloquial, sua história. Sobre a imagem do lado superior direito do vídeo, surge, e
logo depois desaparece, o nome e a cidade de origem da interveniente. Este
“contar” de sua história intercala gravações feitas pela interveniente e passagens em
que fala na própria cena. Enquanto a interveniente narra sua história, as tomadas
intercalam os planos: primeiro, meio-conjunto, americano e close.
O comercial tem seu desfecho, com a cena 2, na qual a interveniente se
apresenta em plano de meio-conjunto, segurando o Jornal Zero Hora e, ao redor,
várias fotografias de diferentes tamanhos, pessoas e contextos, que remetem a
diferentes épocas, estão afixadas às paredes, sobrepostas, de modo a não mostrar
o fundo. Há um locutor masculino não-identificado que reproduz o texto final, o
agradecimento de Zero Hora e a assinatura do periódico. O comercial encerra, com
a identidade visual e o slogan, Zero Hora 40 anos. A vida por todos os lados, nas
cores preta, branca e amarela, tonalidades do veículo.
Quanto ao texto, Iara Soares diz:
- Esta é uma história real. (Cena 1 – Iara está, em primeiro plano, em
frente ao palco e ao cenário)
- Meu nome é Iara Margarete Saraiva Soares. (Cena 1 – A interveniente
entra no cenário e senta-se no banco de madeira)
- Tenho 36 anos.
- Nasci em Caçapava do Sul.
- Tenho meu marido e meus filhos, né?!
- Não tenho serviço fixo, né?!
- Só faço limpeza.
- Esta aqui é lá no horto da Prefeitura Municipal. (Iara segura o Jornal Zero
Hora, com a matéria em que aparece, e mostra-a para a câmera)
- Tava lá no Centro de Convivência.
- Aí uma amiga minha me disse:
- Sabia Iara que tu tá na Zero Hora.
- Aí... Aí eu olhei e não acreditei que fosse eu.
- Mas era eu mesma.
- Tô aqui ó. (Iara aponta para sua fotografia no Jornal. Detalhe na matéria)
109
- Depois que eu vi a minha foto na Zero Hora.
- O pessoal tá me tratando melhor, né?!
- Porque tem gente assim ... Assim, são meio racista, né?!
- Foi o dia mais feliz da minha vida!
- “As coisas ficam mais fáceis quando a gente acredita no que faz” Rosane
de Oliveira. (Iara lê uma matéria de uma edição do Jornal)
O locutor masculino, não identificado, fala:
- Depois disso, a gente só tem uma coisa a dizer: muito obrigado. (Cena 2
– Iara está com Zero Hora nas mãos, na sala coberta de fotografias. Está
com um sorriso acanhado)
- Zero Hora 40 anos. A vida por todos os lados. (Aparece, no vídeo, a
identidade visual de Zero Hora e o slogan).
Este comercial, também, possui uma qualidade de produção excelente, com
tomadas e planos agradáveis. O rosto humilde e triste da interveniente, Iara Soares,
e seu sorriso meigo e tímido aparecem sempre com destaque, deixando
transparecer sua emoção ao relatar o importante fato de sua vida. A linguagem
coloquial salienta e enfatiza o relato, tornando-o mais real e sensível.
3.2.1 Análise
Temos importantes aspectos a serem considerados: a casa de madeira, os
utensílios de lavoura (pás, enxadas, roda de carreta) e a expressão do rosto de Iara,
além dos elementos comuns à campanha: o teatro, o palco, a luz branca sobre o
cenário e as fotografias.
Como já mencionamos, o teatro simula o mundo e faz idear seu caráter
ilusório e efêmero. Cada história relatada faz com que o telespectador e o
interveniente compartilhem sentimentos e o observador se coloque em uma situação
dramática imaginária, sensibilizando e legitimando o relato apresentado.
110
A luz branca sobre o cenário pode representar a vida e o bem, a revelação,
a transfiguração que desperta a compreensão. Está associada à ordem, à
simplicidade, ao otimismo, à dignidade, à afirmação, à modéstia, ao despertar, à
harmonia, à estabilidade e à divindade (FARINA, 1990, p. 112). Aspectos implícitos
ao discurso. Sobre o centro do palco, remete claridade ao ponto onde ocorre o
testemunho. As áreas escuras e as sombras podem representar o não conhecer, a
ignorância, o conhecimento aprisionado à opinião e não guiado pelo mundo das
idéias (BECKER, 1999). Assim, luz e sombra idealizam dualidade universal.
Vale lembrarmos que o centro do palco pode representar o princípio, o
centro dos centros que simboliza Deus, cuja presença é universal e ilimitada, livre do
tempo e do espaço. O núcleo, como irradiação vertical, pode ser entendido como um
lugar de passagem, o cenáculo das aliciações, o caminho entre os planos celeste,
terrestre e infernal do mundo, a porta de transposição e de rompimento
(CHEVALIER, 1991, p. 219-21). Este pode ser o significado dado à luz que incide
sobre o centro do cenário (palco). O ponto de início e transposição, o lugar da
decisão e do perímetro divisório da vida e da história de cada interveniente, a partir
de sua relação com Zero Hora, a luz da felicidade, da revelação e do caminho, em
oposição às sombras e à ignorância. Zero Hora é o pivô principal do qual tudo
depende.
O cenário representa o local, onde vive a interveniente e seu estilo de vida
simples. A casa, de acordo com Chevalier (1991, p. 196-7), está no centro do
mundo, é a imagem do universo. É, também, um símbolo feminino, com o sentido de
refúgio, de proteção, de seio materno, de mãe. Na Psicanálise, o exterior da casa é
a máscara ou aparência do homem. Por ser de madeira, um dos materiais mais
antigos e importantes para o homem, reforça o sentido maternal, contém uma
sabedoria e uma ciência sobre-humanas, além de estar relacionada à força vital,
portar e ocultar (BECKER, 1999). Representa a privacidade e a intimidade da
interveniente. A participação de Zero Hora na vida íntima e particular de Iara.
Já os utensílios de trabalho, usados na lavoura, como pás e enxadas,
representam a relação íntima do homem com a terra, as raízes. A lavoura,
universalmente considerada como um ato sagrado, representa a tomada de posse, o
111
pertencimento, a manutenção da vida. A enxada, assim como o arado, está ligada a
um simbolismo fálico, da fertilidade, o sulco corresponde à mulher. O machado,
símbolo de poder e adereço de dignidade, exprime a capacidade dos anjos
distinguirem os contrários e a sagacidade e o poder deste discernimento. A roda de
carreta remete a outra característica do campo: o deslocamento feito por carroças.
Ela simboliza ciclos, reinícios e renovações, movimento (CHEVALIER, 1991). Estes
elementos caracterizam o cenário e o relato e parecem atribuir ao discurso a pureza
e a inocência da vida simples, o pertencer e a renovação, ligadas à terra.
O rosto, o olhar triste e o sorriso acanhado de Iara sensibilizam. Ela parece
não estar à vontade. Na maior parte do comercial, sua voz é gravada e, em poucas
passagens, ela fala na cena. Ao falar, demonstra timidez. Segundo Chevalier (1991,
p. 790-1), o rosto não é para si mesmo, pois ninguém vê seu próprio rosto, a não ser
através de espelhos ou miragens, é para os outros e para Deus. É a parte mais viva
e sensível do corpo, onde habitam os sentidos e, que, querendo ou não,
apresentamos aos outros. Representa o eu íntimo parcialmente desnudado, mais
revelador do que o resto do corpo inteiro. A face é o símbolo do que há de divino no
homem, feito a imagem e a semelhança de Deus. A expressão delicada e tímida de
Iara e o seu relato criam uma atmosfera sensível que nos faz compartilhar um
sentimento afetuoso e nos identifica com a interveniente. Vemos, através de seu
rosto e olhar, as janelas para o mundo e o espelho da alma, salientadas por Lurker
(1997). Observamos o peso da discriminação, do racismo e da desigualdade, que
acompanha o seu testemunho.
A cor da pele de Iara torna-se fator desencadeante do testemunho. A
negritude, assunto tratado de forma não expressa, que se presencia e se nega em
nossa sociedade, concebe uma realidade mascarada. Para Chevalier (1991, p. 633),
o negro se refere a um estado primitivo do homem, no qual predominam a selvageria
e a dedicação, a impulsividade e a bondade, a coexistência dos contrários,
manifestados em uma sucessão instantânea. Jung (e a concepção dos alquimistas)
considera a cor preta como o lado sombrio da personalidade, portanto que se deve
superar, indicaria como a fase inicial de uma evolução progressiva ou grau
derradeiro de uma evolução regressiva. O branco, por sua vez, seria a conclusão de
um desenvolvimento no sentido da perfeição.
112
Nesta visão, que acompanha a sociedade neoliberal, na qual o negro é um
estado inicial em busca da evolução, do branco, as questões raciais parecem que
nunca chegarão a um acordo e o negro parece que não terá espaço de destaque e
oportunidade em nossa sociedade. No entanto, Zero Hora, um ícone do
neoliberalismo, se insinua como possibilidade de igualdade e de equilíbrio nos
conflitos sociais.
Na cena final, a interveniente está em um local coberto de fotografias de
diferentes pessoas, presas às paredes, e segura uma edição de Zero Hora. As
fotografias representam o Poder de interferência e de influência de Zero Hora na
vida e na história de cada um, evidenciado no slogan: Zero Hora: A vida por todos os
lados. A vida de todos e todas as suas histórias.
Vale recordarmos que, para Barthes (1980), as Fotografias são um jogo
social, a criação de uma imagem, o aparecimento de eu como outro, uma
dissociação artificiosa da consciência de identidade. É todo-imagem e, portanto,
objeto para ser usado pela sociedade. Há uma desapropriação do sujeito e a Foto
objeto é usada como elemento integrador e ilustrativo da campanha, está ali, imóvel,
apenas, reforçando os valores transmitidos na fala da interveniente e no slogan de
Zero Hora. Caracteriza o cenário e, assim como o teatro, elemento unificante em que
todas as histórias se passam, encerra um ciclo de encenação. A temática das
fotografias da campanha – diferentes pessoas em diversas épocas, usadas como
pano de fundo na cena final, estão ausentes de um detonador, que acrescentaria
algo a mais a elas, mais do que servirem como papel de parede e reforço, calado e
sem contestação, aos interesses da RBS. Servem, apenas, como autenticação e
avigoram os depoimentos, criam uma ligação com o observador, uma semelhança
com nossas próprias fotos, e parecem respaldar os valores que Zero Hora pretende
transmitir e as estruturas da sociedade vigente.
Quanto aos Estereótipos, imagens prontas, ensejadas no consciente e
inconsciente de uma nação, que alentam idéias e comportamentos e mantêm
estruturas estáveis, este encontra lugar na figura da mulher e reforça a relação da
mulher negra, como frágil e insignificante no contexto social. A RBS, em especial o
veículo Zero Hora, também é estereotipada na figura da empresa que representa a
113
democracia exemplar e oferece espaço e participação igualitários, tentando fazer a
interveniente sentir-se livre e despida dos preconceitos do cotidiano.
O Fait Divers, que se apresenta pela exploração da emoção, se transforma
em plano da campanha de Propaganda, já que: Esta é uma história real. Vemos dois
momentos específicos: um relacionado ao perfil e ao depoimento da interveniente,
outro associado aos elementos estruturais e ao tipo de informação da campanha.
Sobre o perfil da interveniente e seu relato, vemos o Fait Divers de
Causalidade de Causa Esperada presente na figura da mulher-mãe. O peso da
narrativa recai sobre a Personagem Dramática, vítima estereotipada: mulher, mãe e
negra. A Personagem Dramática parece simbolizar delicadeza, humildade,
concessão e doçura. Provoca emoções e suscita identificações projetivas, fazendo
com que sejamos colocados em seu lugar, pela sua condição de sacralização,
proveniente da moral e da igreja, e da catarse, pela mediação da solidariedade e da
compaixão (RAMOS, 2002).
O Fait Divers de Causalidade interpela pelo conflito e o sujeito relativo
recorre, em sua impotência e fragilidade, a um Sujeito Absoluto para definir sobre os
obstáculos de sua vida, prevalecendo a dialética da Fatalidade – Sujeito Absoluto,
que tem solução para todas as questões. O sujeito relativo – mulher, mãe, negra –
vê na Fatalidade – Zero Hora, Mídia – seu Poder e se torna submisso diante de sua
força e sabedoria, afinal, “depois que eu vi a minha foto na Zero Hora. O pessoal tá
me tratando melhor, né?! Porque tem gente assim (...) Assim, são meio racista,
né?!”. Desta forma, Zero Hora assume o papel de intermediário dos conflitos
humanos. O final feliz, a contemplação (“Foi o dia mais feliz da minha vida!”) é a
garantia da Fatalidade.
Vemos, secundariamente, o Fait Divers de Coincidência de Antítese, através
da midiatização, na qual o sujeito só se torna gente porque aparece na Mídia. O
aparecimento na Mídia faz com que o indivíduo seja respeitado, tenha um melhor
tratamento, torne-se sujeito. A Antítese se estabelece no conflito dramático, presente
no racismo, e na relação antagônica entre a classe dominada, representada na
pessoa de Iara Soares, o sujeito relativo, e a classe dominante, designada na figura
114
da empresa jornalística e detentora dos Meios de Comunicação, o Sujeito Absoluto,
a Fatalidade, capaz de amenizar questões pontuais da vida social.
A tipologia de Fait Divers predominante no perfil e no testemunho, neste
comercial, considerando que ambos interpelam pelo conflito e pela Fatalidade, é o
de Causalidade de Causa Esperada, através da mulher-mãe-negra e de Zero Hora,
a Fatalidade, como Sujeito Absoluto, que entra em cena, para contornar os nós
incontornáveis historicamente (RAMOS, 2002, p. 112), os conflitos raciais.
Quanto ao tipo de informação e estrutura da campanha, encontramos o Fait
Divers de Coincidência de Repetição, presente no objeto padronizado (tema central,
teatro, palco, luz branca, fotografias, entre outros). Elementos comuns a toda a
campanha. Na Repetição, a informação repetida instaura a onipresença da
factualidade em circunstâncias diversas. Repetir não o original como cópia e, sim,
sua reprodução com diferenças, no desigual. Insinua a onipresença da factualidade,
que se cultiva em qualquer circunstância. E tem como desfecho, solução, a
Fatalidade, Sujeito Absoluto, que desata os nós coincidentes (RAMOS, 2002).
Nos comerciais, a Repetição ocorre na idéia central, nos elementos
estruturais e na onipresença da mesma factualidade e se distingue no perfil e no
relato dos intervenientes, é o desigual. A Repetição parece atuar como uma forma
de persuasão, buscando memorizar, seduzir e convencer.
As relações de Poder tornam-se evidentes e vemos o discurso opressor e
redentor. A pobre vítima da sociedade, a mulher negra, encontra, na figura do
opressor, a empresa capitalista RBS, a salvação – a valorização como pessoa. Pelo
testemunho, Zero Hora consegue provocar mudanças importantes na história
(“Depois que eu vi a minha foto na Zero Hora. O pessoal tá me tratando melhor, né?!
Porque tem gente assim (...) Assim, são meio racista, né?!”) e na rotina de cada um
(“Foi o dia mais feliz da minha vida!”). A linguagem simples e coloquial da
interveniente mascara um discurso ingênuo e autêntico desprovido de interesses,
mas que legitima o Poder da empresa jornalística.
115
O Poder, como dominação, que repousa na capacidade de uma elite em
impor o seu projeto de desenvolvimento a uma maioria, se encaixa na relação
dialética entre liberdade e submissão. Aí se encontra a energia prazerosa da libido
que motiva e movimenta o homem. Os dominados e os dominadores encontram-se
associados por uma aliança comum: o prazer (RAMOS, 2004). O Poder, como libido
dominante, é energia prazerosa. Zero Hora, ao escolher o texto de Rosane de
Oliveira, “as coisas ficam mais fáceis quando a gente acredita no que faz”, lido pela
interveniente, no encerramento de seu testemunho, dá a entender que o veículo
acredita poder oferecer a igualdade e o respeito que Iara crê ter conseguido, depois
de ver sua fotografia no Jornal.
A Cultura se apresenta, através da linguagem, como instituição social
reproduzida nos diferentes grupos formadores da sociedade, neste comercial, na
figura da mulher, mãe, negra, casada, dona-de-casa, do interior, sem trabalho fixo,
apenas ocasionais, que participa de sua comunidade (“Esta aqui é lá no horto da
Prefeitura Municipal. Tava lá no Centro de Convivência”). Em seu jeito de falar
simples, no qual corta e abrevia as palavras e apresenta pequenos vícios de
linguagem. Na sua aparência tímida de se expressar e visível, também, em seu jeito
acanhado de sentar, olhar e vestir. Parece representar uma classe social popular
formada por homens do campo, relacionada ao cultivo da terra. Possui uma
abordagem inscrita e circunscrita na subjetividade, que resulta na repetição, não
como cópia absoluta, e, sim, o igual que se reproduz com diferença. Assim, o
discurso libertador e oportuno que engrandece Zero Hora está presente neste
depoimento, também. A Mídia, em especial o Jornal e a Televisão, aparece como
elemento fundamental na Cultura e desenvolvimento regional, capaz de promover a
“democracia racial”.
A Ideosfera é a produção de sentido a serviço do Poder. No comercial, todos
os elementos, os gestos, as expressões, os planos e o discurso reforçam esta
relação de Poder. O sujeito, Iara Soares, relaciona-se com o social e a produção
discursiva e concretiza o ideológico. Cada palavra de aceitação e de enaltecimento
atribuída à Zero Hora no discurso da interveniente cria a Ideosfera. A conotação,
onde o lingüístico empreende o seu diálogo com o cenário social e histórico e
encena a legitimação da sociedade burguesa.
116
A Ideosfera tende a se estabelecer em discurso da doxa, vivenciado pelos
usuários como um discurso universal, “natural, que não precisa de explicação, cuja
tipicidade não é percebida, em que tudo o que seja exterior é relegado como
margem, desvio: discurso-lei não percebido como lei” (BARTHES, 2003b, p. 184).
Nas subcategorias, que constituem a Ideosfera, temos a Doxosfera, que
estabelece o senso comum, legitimando o papel de Zero Hora, como agente social,
transformador da realidade; a Piteosfera, com o discurso da crença que Zero Hora e
a Mídia em geral têm o Poder de transformar o sujeito e a sociedade e mediar os
conflitos sociais; o Socioleto que representa a neutralidade da linguagem de um
grupo social, no caso, a linguagem simples e coloquial da população que vive e
trabalha no campo; e a Logosfera, o discurso mecânico e absoluto que independe
da vontade do sujeito.
A frase de encerramento do comercial, narrada por um locutor não-
identificado (“Depois disso, a gente só tem uma coisa a dizer: muito obrigado. Zero
Hora 40 anos. A vida por todos os lados”), concretiza a falsa modéstia da empresa
jornalística que permite o depoimento que engrandece o veículo, que consente na
exposição pessoal das dores e dos conflitos humanos e, ao mesmo tempo,
posiciona-se como humilde. A humildade é a mentalidade e a postura do servir, a
origem de todas as virtudes. Parece que quem foi humilde foi Iara Soares, que serviu
para enaltecer os falsos valores de igualdade e liberdade de preconceitos,
apregoados por Zero Hora.
O depoimento da interveniente reforça o Discurso Encrático da empresa de
Comunicação RBS. A empresa, por intermédio de Zero Hora, é enaltecida e
valorizada, como instituição capaz de promover transformações importantes no
cotidiano e na sociedade, de oferecer igualdade e equidade social. O discurso
enfatiza a ideologia da classe dominante e se move pelo senso comum. Quando a
interveniente diz: “depois que eu vi a minha foto na Zero Hora. O pessoal tá me
tratando melhor, né?!. Porque tem gente assim (...) Assim, são meio racista, né?!.
Foi o dia mais feliz da minha vida!”, está manifestando o Discurso Encrático, que
legitima a sociedade vigente, que valida o status quo, cria e fortalece os Estereótipos
117
e mantém um grupo na liderança da sociedade. É o discurso oficial de quem está
dentro do Poder e pressupõe mantê-lo (BARTHES, 1999).
Assim, neste comercial, encontramos, de forma resumida, os Estereótipos
na figura da mulher negra e frágil, vítima da sociedade, e no papel da Mídia, que
representa a democracia exemplar e oferece espaço e participação para todos.
A incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada está
presente na Personagem Dramática da mulher-mãe e, de forma secundária, o Fait
Divers de Coincidência de Antítese, no conflito dramático, presente no racismo e na
relação antagônica entre a classe dominada e a classe dominante. Assim, o Fait
Divers dominante, considerando que ambos interpelam pelo conflito e pela
Fatalidade, é o de Causalidade de Causa Esperada, através da mulher-mãe-negra e
de Zero Hora, a Fatalidade, como Sujeito Absoluto, que entra em cena para
“contornar os impasses incontornáveis historicamente” (RAMOS, 2002, p. 112).
Como tipo de Fait Divers da informação e da estrutura da campanha, temos
o Fait Divers de Coincidência de Repetição, pela padronização do objeto, no qual se
repete a idéia central, os elementos estruturais e a onipresença da mesma
factualidade, mas se distingue no perfil e no relato de cada interveniente, é o
desigual. A Repetição parece atuar como um modo de persuasão, buscando
memorizar, seduzir e convencer.
O Poder, como dominação, que assenta na habilidade de uma elite impor o
seu projeto de desenvolvimento a uma maioria, e na energia prazerosa da libido,
que permite que dominados e dominadores se encontrem associados, por um pacto
comum, o prazer, pode ser percebido em todo o discurso, em particular, no relato
final: “depois que eu vi a minha foto na Zero Hora (...) Foi o dia mais feliz da minha
vida!”. O sujeito relativo – mulher, negra – vê no Sujeito Absoluto – Zero Hora, Mídia
– a possibilidade de igualdade e de respeito no contexto social (“Depois que eu vi a
minha foto na Zero Hora. O pessoal tá me tratando melhor, né?!. Porque tem gente
assim (...) Assim, são meio racista, né?!”). O sentimento resultante é o prazer: o
Poder, a libido dominante.
118
A Cultura está particularizada nas relações cotidianas, no valor atribuído à
Mídia e no perfil da interveniente: mulher, mãe, negra, dona-de-casa, diarista, vítima
da sociedade (vítima de discriminação racial). No jeito de falar com vícios de
linguagem e no modo de vestir, simples e despretensioso, de Iara.
A Ideosfera, como um discurso universal, discurso-lei não percebido como
lei, que estabelece o senso comum, legitima o papel de Zero Hora, como agente
social, capaz de transformar ou, pelo menos, amenizar os conflitos sociais; o
discurso da crença de que a Mídia tem o Poder de transformar o sujeito e a
sociedade; o discurso que representa a neutralidade da linguagem de um grupo
social, no comercial, da mulher negra, vítima de discriminação racial; e o discurso
instintivo e automático que independe da vontade do sujeito. O Discurso Encrático, o
falar da dominação, que valoriza a Mídia, mantém os Estereótipos e reforça as
estruturas de Poder da sociedade.
E, como categoria, a posteriori, vemos a Fotografia que, segundo Barthes
(1980), é um jogo social, no qual criamos uma imagem, um objeto, que pode ser
utilizado pela sociedade. Usada na campanha para caracterizar o slogan e o Poder
de interferência e de influência que Zero Hora acredita ter na sociedade. As Fotos-
retrato nada reivindicam e não podem levar à reflexão, somente, avigoram os
valores transmitidos nas falas dos intervenientes e no slogan do veículo, servindo de
reforço silencioso aos interesses do Grupo RBS.
3.3 ADÃO DE CASTRO JÚNIOR
O comercial “Adão de Castro Júnior” tem duração de 1 (um) minuto. Nele,
um homem branco alto, calvo, olhos azuis de, aproximadamente, 40 anos de idade,
da cidade de Cachoeirinha, ex-comerciante, atual instrutor de Centro de Formação
de Condutores fala de sua história com Zero Hora.
Assim como os demais comerciais, este tem duas cenas. Na cena 1, há
várias tomadas e planos e é nesta fase que a narrativa acontece. Na cena posterior,
119
cena 2, o interveniente Adão de Castro Júnior está segurando o veículo Zero Hora
em uma sala coberta de fotografias de diferentes pessoas, de idades variadas e
tempos distintos. As fotografias estão afixadas às paredes, sobrepostas, e não
deixando aparecer o fundo. O locutor masculino, não-identificado, fala.
Na primeira tomada, da cena 1, Adão está na tela em primeiro plano, à
esquerda do vídeo, tendo ao fundo um palco, como um teatro, com cortinas
vermelhas (as cortinas estão se abrindo) e um cenário, onde estão enfileiradas
classes escolares, uma mesa com cadeira e painéis ao fundo, cobertos por placas
de trânsito, referendando uma sala de aula de um curso para condutores de veículos
automotivos. Sobre o cenário, incide uma luz branca. Há uma música instrumental
melodiosa e triste que acompanha todo o comercial. Adão parece bem vestido, de
modo clássico, com calça bege clara, tipo social, camisa azul clara e sapatos de
couro na cor marrom. Usa relógio.
Na tomada seguinte, o interveniente já está no cenário, sentado em uma das
classes escolares, tendo sobre esta um exemplar do Jornal Zero Hora. Começa a
contar, de maneira pausada, em linguagem simples e rotineira, sua história. Na
maior parte do comercial, Adão fala na cena e parece possuir facilidade para se
comunicar, apenas em pequenas passagens há a gravação de seu depoimento.
Sobre sua imagem na parte inferior direita da tela, surge e desaparece o nome e a
cidade de origem do interveniente. Enquanto o interveniente descreve sua história,
as tomadas intercalam os planos: médio, primeiro, meio-conjunto e, principalmente,
close.
O comercial termina com a cena 2, na qual o interveniente se apresenta em
plano de meio-conjunto com o Jornal Zero Hora nas mãos, sorrindo e, ao redor,
várias fotografias, presas às paredes, de diferentes pessoas, de diversas idades,
que reportam há várias décadas. Há um locutor masculino não-identificado que
reproduz o texto final, o agradecimento de Zero Hora e a assinatura do periódico. O
comercial encerra com o slogan e a identidade visual – Zero Hora 40 anos. A vida
por todos os lados – nas cores branca, preta e amarela, matizes de Zero Hora.
120
Quanto ao texto, Adão diz:
- Esta é uma história real. (Cena 1 — O interveniente está em primeiro
plano, tendo, ao fundo, o palco e o cenário)
- Meu nome é Adão de Castro Júnior. (Cena 1 — Adão já está no cenário,
sentado em uma das classes escolares)
- Eu comecei tendo um pequeno comércio.
- Começou a trabalhar eu e minha mãe sozinhos nesse ponto.
- Ai, realmente não deu certo.
- Chegamos à conclusão que não tinha mais como toca. (Close. Adão
coloca as pontas dos dedos sobre a testa e os lábios, tentado evitar o
choro)
- Realmente, ela ... ela se abraçou em mim, né?! E chorou.
- A gente chorou, né?! (A voz de Adão soa triste e melancólica)
- E como todo o desempregado o quê que faz? (O tom de voz de Adão se
anima)
- Vai procurar um emprego.
- Aonde?
- Nos classificados.
- Abri a Zero Hora lá e verifiquei que haviam vários cursos.
- Hoje eu sou instrutor, né?! Do CFC. (Adão fala em tom confiante)
- Centro de Formação de Condutores.
- A leitura de Zero Hora, né?! Ela foi o primeiro passo que eu dei pra me
tornar uma pessoa diferente.
- Ela te abre todo um mundo para ti.
- Diariamente.
O locutor, masculino, não identificado, fala:
- Depois disso, a gente só tem uma coisa a dizer: muito obrigado.
(Cena 2 — Adão está segurando Zero Hora em uma sala coberta de
fotografias pelas paredes)
- Zero Hora 40 anos. A vida por todos os lados. (Surge, na tela, a
identidade visual do veículo e o slogan).
121
Como toda a campanha, este comercial possui uma qualidade de produção
excelente, com tomadas e planos aprazíveis. O rosto com a fisionomia tranqüila de
Adão, a facilidade de expressão ao falar, as variações em seu tom de voz (do triste e
melancólico ao animado e confiante) deixam transparecer sua emoção ao relatar o
determinante acontecimento em sua vida. O discurso prende pelo otimismo e por um
senso de vitória, de resultado alcançado com sucesso.
3.3.1 Análise
Em relação à produção de sentido não-verbal, podemos salientar a figura de
Adão. Além dos elementos comuns à campanha: o teatro e o palco, a luz branca que
incide sobre o cenário e as fotografias.
Como já relatamos, o teatro representa o mundo e faz intuir seu caráter irreal
e passageiro. As histórias apresentadas fazem com que o telespectador se projete
no interveniente e compartilhe os sentimentos expressos, inserindo-se em uma
situação dramática imaginária, uma relação que sensibiliza e autentica o evento.
A luz branca pode simbolizar a vida e o bem. O branco é o tom da revelação,
da transfiguração, que desperta a compreensão. A luz sobre o centro do palco, que
cria luminosidade ao centro e sombras ao redor, remete a idéia de claridade e de
leveza ao ponto principal da cena, ao relato. A luz brota em oposição à sombra
absoluta, que indica o não conhecer, o conhecimento escravizado à mera opinião.
Luz e sombra indicam dualidade universal.
O centro do palco pode significar o princípio, o real absoluto, lugar de
condensação e de coexistência de forças contrárias. O centro, como irradiação
vertical, pode ser compreendido como um lugar de passagem, a alameda entre os
planos celeste, terrestre e infernal do mundo, o portal de transposição e da ruptura.
Pode ser este o significado atribuído à luz que incide sobre o centro do
cenário (palco). O ponto de início e transposição, o lugar da decisão e da fronteira
122
divisória da vida e da história de cada interveniente, a partir de sua relação com Zero
Hora, a luz da felicidade, da revelação e do caminho, em oposição às sombras e à
ignorância. Zero Hora é o atuante essencial do qual tudo depende.
Na cena final, o interveniente está com o Jornal Zero Hora nas mãos,
sorrindo, satisfeito, em um local rodeado de fotografias de pessoas diversas. Estas
fotografias podem simbolizar o Poder de interferência e de influência sobre a vida e
a história dos sujeitos, que o veículo sugere, afinal, o próprio slogan do periódico diz:
A vida por todos os lados”, a vida das pessoas, suas histórias.
Como já registramos, para Barthes (1980), a Fotografia é um jogo social, a
criação de uma imagem, o aparecimento de eu como outro, tornando-se objeto para
ser usado pela sociedade. Há uma desapropriação do sujeito e a Foto objeto é
utilizada como elemento integrador da campanha, reforçando os valores transmitidos
nas falas dos intervenientes e no slogan de Zero Hora.
Quanto aos Estereótipos, estes encontram vez na figura do homem
caucasiano, bem vestido e bem sucedido. Zero Hora também é estereotipada na
figura daquela que representa a possibilidade de transformação pessoal e
oportunidade para todos, afinal, como o próprio Adão diz: “a leitura de Zero Hora,
né?! Ela foi o primeiro passo que eu dei pra me tornar uma pessoa diferente. Ela te
abre todo um mundo para ti. Diariamente”.
O Fait Divers parece formalizar a noção de conflito, que interpela pela
exploração da emoção. Define-se o caso do dia e transforma-o em roteiro da
campanha de Propaganda, já que: Esta é uma história real.
Quanto ao interveniente e seu testemunho, o Fait Divers de Causalidade de
Causa Perturbada está presente, visto que uma pequena causa gera um grande
efeito, assim, a leitura de Zero Hora “abriu o mundo” para o interveniente. O conflito
vem à tona pelo efeito, cuja causa é ilógica para explicar as suas repercussões: o
interveniente lê Zero Hora e se torna uma pessoa diferente. Atribui à Zero Hora o
valor de suas conquistas. Tira de si o peso (ou a glória) da responsabilidade por
suas ações e suas aquisições.
123
Também, de maneira secundária, vemos presente o Fait Divers de
Coincidência de Antítese, através da midiatização, na qual um sujeito encontra
solução para sua carreira, trabalho e sustento nas páginas de Zero Hora. Duas
perspectivas diferentes e opostas, o desempregado e o veículo impresso, são
fundidas em uma única realidade, fazem parte de uma mesma realidade (“E como
todo o desempregado o quê que faz? Vai procurar um emprego. Aonde? Nos
classificados. Abri a Zero Hora lá e verifiquei que haviam vários cursos”). A Antítese
se estabelece no conflito dramático e na Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual
todos compartilham possibilidades e oportunidades. O sujeito relativo – Adão –
encontra no Sujeito Absoluto – Zero Hora – a solução transformadora para sua vida
(além de uma nova ocupação profissional, Zero Hora “abriu o mundo” para ele, com
novas possibilidades e horizontes).
A tipologia de Fait Divers predominante, já que ambos interpelam pelo
conflito e pela Fatalidade, é do Fait Divers de Causalidade de Causa Perturbada, já
que uma pequena causa (“A leitura de Zero Hora, né?!”) gera um grande efeito (“Ela
foi o primeiro passo que eu dei pra me tornar uma pessoa diferente. Ela te abre todo
um mundo para ti”). A leitura de um jornal gera transformações decisivas, causa
ilógica para explicar tamanha repercussão.
Na campanha, quanto ao tipo de informação e estrutura, vemos, ainda, o
Fait Divers de Coincidência de Repetição, na simbolização. No objeto padronizado.
Repetição do original não como cópia, e, sim, sua reprodução com diferenças, no
desigual. Insinua a onipresença da factualidade, que se mantém em qualquer
circunstância. E tem como desenlace, solução, a Fatalidade, Sujeito Absoluto, que
desata os nós coincidentes (RAMOS, 2002). A Repetição ocorre na idéia central, nos
elementos estruturais e na onipresença da mesma factualidade e se distingue no
perfil e no relato dos intervenientes, é o desigual. A Repetição aparece como uma
forma de persuasão, pois parece querer memorizar, seduzir e convencer.
As relações de Poder são percebidas na figura de Zero Hora capaz de
provocar mudanças significativas na vida pessoal e profissional do interveniente,
afinal, ler Zero Hora foi o primeiro passo para Adão se tornar um sujeito diferente e
Zero Hora abre a mundo, representado como as possibilidades, as oportunidades,
124
as novas perspectivas. A imagem que o interveniente passa de que Zero Hora pode
mudar, transformar uma pessoa, a ponto de torná-la diferente do que era antes
deste contato, reforça este Poder, esta dominação e submissão. O pacto,
estabelecido entre dominados e dominadores, se revigora e mantém a estrutura
vigente. O Poder, como dominação, se encaixa na relação dialética entre submissão
e liberdade, e, como energia prazerosa, mobiliza o homem à ação.
A Cultura se revela através da linguagem, como instituição social
reproduzida em meio aos diferentes grupos que formam a sociedade, neste caso, na
figura de um homem, branco, ex-comerciante e atual instrutor. Em seu jeito de falar
bem articulado, espontâneo, à vontade. No modo de vestir que aparenta sobriedade.
Parece representar a classe média, pela iniciativa empreendedora do antigo
comércio e pela atual profissão de instrutor, área voltada à formação e ao
conhecimento. A Cultura possui uma abordagem inscrita e circunscrita na
subjetividade, que resulta na repetição, não como cópia absoluta, e, sim, o igual que
se reproduz com diferença. Desta forma, o mesmo discurso libertador e oportuno
que enaltece o Jornal Zero Hora, está traduzido neste testemunho.
A Ideosfera é a produção de sentido a serviço do Poder. O sujeito, Adão,
relaciona-se com o social e a produção discursiva, e concretiza o ideológico. Toda
palavra de enaltecimento, atribuída à Zero Hora, cria a Ideosfera. A conotação, onde
o lingüístico empreende o seu diálogo com o cenário social e histórico e encena a
legitimação da sociedade e dos valores burgueses. A Ideosfera tende a se instituir
em discurso da doxa, vivenciado pelos usuários como um discurso universal, que
não necessita de explicação, em que tudo o que seja exterior é relegado como
margem (BARTHES, 2003b).
Nas subcategorias, que compõem a Ideosfera, temos a Doxosfera, que
estabelece o senso comum, validando o papel de Zero Hora, como agente
transformador do sujeito; a Piteosfera, com o discurso da fé que Zero Hora e a Mídia
em geral têm o Poder de transformar o sujeito e a sociedade e oferecer alternativas
viáveis de mudança; o Socioleto, que representa a neutralidade da linguagem de um
grupo social, a linguagem cotidiana e otimista de um trabalhador brasileiro de classe
125
média; e a Logosfera, o discurso maquinal e incondicional que independe da
vontade do sujeito.
A frase de encerramento do comercial – “Depois disso, a gente só tem uma
coisa a dizer: muito obrigado. Zero Hora 40 anos. A vida por todos os lados” –
sustenta o falso comedimento da empresa jornalística, que permite o depoimento
que engrandece o Jornal e lhe atribui valores, além dos esperados por um veículo
de Comunicação.
O depoimento do interveniente reforça o Discurso Encrático do Grupo RBS.
A empresa, através de Zero Hora, é enaltecida e valorizada, como instituição capaz
de promover transformações importantes em cada um de nós: “o primeiro passo que
eu dei pra me tornar uma pessoa diferente”; e em nosso cotidiano: “ela te abre todo
um mundo para ti”. O discurso ressalta a Ideosfera da classe dominante e se
movimenta pelo senso comum. Quando Adão diz: “a leitura de Zero Hora, né?! Ela
foi o primeiro passo que eu dei pra me tornar uma pessoa diferente. Ela te abre todo
um mundo para ti. Diariamente”, está manifestando o Discurso Encrático, que
legitima a sociedade atual, autentica o status quo, fortalece os Estereótipos e
perpetua um grupo no comando da sociedade.
Assim, de modo resumido, neste comercial, encontramos os Estereótipos na
figura do homem branco, biotipo ideal na sociedade vigente, potencialmente capaz
de se inserir no mercado de trabalho e obter sucesso pessoal e profissional, e no
papel da Mídia, que oferece oportunidades ilimitadas.
Vemos a incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Perturbada, na
medida em que uma pequena causa, a leitura de Zero Hora, produz um grande
efeito, a mudança completa na vida do interveniente, do fracasso de um comércio
falido a uma nova e próspera ocupação, e o Fait Divers de Coincidência de Antítese,
visto que a Mídia assume função de mediadora tranqüilizadora, a solução mágica
dos conflitos humanos.
Encontramos, no tipo de informação e na estrutura da campanha, o Fait
Divers de Coincidência de Repetição, na padronização do objeto. Repetição não
126
como cópia absoluta, mas o igual que se reproduz com diferença. Assim, a mesma
factualidade se apresenta em depoimentos distintos, desiguais.
Vemos na fala do interveniente, ainda, o Poder, como dominação e energia
prazerosa, que permite que dominados e dominadores se encontrem associados,
por um pacto comum, o prazer. O sujeito relativo se isenta da responsabilidade por
sua própria vida e desempenho e, assim, está isento de cobrança, já que a Mídia é a
responsável por suas mudanças e ascensão. O alívio resultante é o prazer: o Poder,
a libido dominante.
A Cultura está particularizada nas relações cotidianas, no valor atribuído à
Mídia e no perfil do próprio interveniente: homem, branco, meia idade, ex-
comerciante e atual instrutor (uma atividade que lhe dá poder e destaque sobre
outros, visto que tem o papel de ensinar), além de seu jeito de falar, espontâneo e
claro, vestir e postar-se.
A Ideosfera, como um discurso universal, que estabelece o senso comum,
corrobora o papel de Zero Hora, como agente transformador; o discurso da crença
de que a Mídia tem o Poder de transformar o sujeito; o discurso que representa a
neutralidade da linguagem de um grupo social; e o discurso automático e mecânico
que independe da vontade do sujeito, o dito por ser natural, é o que é e não se sabe
ou questiona o porquê.
Percebemos o Discurso Encrático, o dizer da dominação, que valoriza as
instituições vigentes, em particular a Mídia, e que mantém as estruturais de Poder,
as diferenças, os modelos-padrão e as amarras da sociedade neoliberal.
Temos como categoria, a posteriori, a Fotografia que, de acordo com
Barthes (1980), é um jogo social, no qual criamos uma imagem, um objeto, que pode
ser utilizado pela sociedade, caracterizando o slogan e o Poder de interferência e de
influência que Zero Hora acredita possuir na sociedade, servindo de apoio silencioso
aos interesses da RBS.
127
3.4 O APELO COMERCIAL: ASSINE ZERO HORA
Passaremos, agora, a analisar os comerciais de 30 (trinta) segundos da
Campanha Institucional dos 40 anos de Zero Hora, anúncios que fazem parte da
mesma idéia central, os depoimentos reais, e se intitulam: Esta é uma história real,
mas estão relacionados com os cadernos de Zero Hora e, portanto, apresentam
elementos próprios, independentes dos comerciais de 1 (um) minuto.
Os comerciais mantêm os elementos unificadores e identificadores da
campanha: o teatro, o palco, o cenário (que varia para caracterizar cada
testemunho), a luz branca incidente sobre os cenários, a música instrumental, as
cenas, tomadas e planos, as fotografias, o locutor não-identificado e a identidade
visual dos 40 anos de Zero Hora com o slogan.
Como estão relacionados aos cadernos de Zero Hora, estes anúncios fazem
alusão a cada um apresentado e sugerem a assinatura do periódico, o cunho,
mesmo institucional, já apela para o aspecto comercial do veículo. Entre os 24
cadernos de Zero Hora, foram escolhidos três: Gastronomia, Casa & Cia e
Vestibular, dos quais analisaremos os dois primeiros.
Estes comerciais têm, ainda, como fator unificante, o texto final, que não
remete mais ao agradecimento de Zero Hora às mensagens e aos depoimentos dos
intervenientes, e, sim, ao quanto o veículo pode interferir na rotina e na história de
cada um, se os indivíduos (consumidores) assinarem o periódico, sugerindo um
processo de identificação e, até mesmo de dependência, em relação ao Jornal. Há
um tom imperativo – Assine Zero Hora. Outro elemento novo é o telefone da Central
de Assinaturas de Zero Hora, em destaque, através de um teaser, cantado, e de sua
visualização na tela.
Há, ainda, na campanha, variações destes comerciais para 10 (dez) e 5
(cinco) segundos, breves chamadas para serem usadas, em geral, durante a
programação da RBS TV. As chamadas de 10 (dez) segundos são variações dos
comerciais de 30 (trinta) segundos dos cadernos Gastronomia e Casa & Cia.
128
Utilizam partes dos comerciais de origem (imagens e textos). Encerram com a
identidade visual dos 40 anos de Zero Hora, o slogan e o telefone da Central de
Assinaturas. Apenas 1 (um) dos comerciais de 10 (dez) segundos, intitulado pela
produtora Clip Todos, mostra as cenas 2 de todos os comerciais da campanha (nas
quais, os intervenientes estão segurando Zero Hora na sala repleta de fotografias).
São utilizadas as imagens finais dos 8 (oito) comerciais da campanha. O texto é:
Zero Hora 24 cadernos e 54 colunistas para fazer a diferença na sua vida. 0800-
642-8222”. Encerra, também, com a imagem da identidade visual dos 40 anos, o
slogan e o telefone.
As variações de 5 (cinco) segundos, também, são dos comerciais que fazem
referência aos cadernos de Zero Hora. As imagens usadas são as das cenas 2 dos
comerciais. Quanto ao texto, há, apenas, a frase cantada: “assine Zero Hora 0800-
642-8222”. Estes finalizam com a identidade visual dos 40 anos, o slogan e o
telefone da Central de Assinaturas.
Nestes anúncios, o aspecto comercial de Zero Hora parece tornar-se mais
evidente, uma vez que remetem aos cadernos do veículo e usam, de maneira
imperativa, a frase “assine Zero Hora”. Isto sugere ação. As frases de encerramento
variam no final, conforme os cadernos, mas iniciam do mesmo modo: “assine Zero
Hora e receba em casa o jornal que faz toda a diferença (...)”. Os comerciais
apresentam qualidades e vantagens que Zero Hora pode oferecer para fazer toda a
diferença na nossa vida, dia-a-dia, mundo, conquistas. A solução mágica para todos
os nossos problemas, dúvidas e impasses. O “receba em casa” traduz a comodidade
que parecemos esperar da Mídia, as soluções gratificantes acessíveis de modo
prático e sem esforço.
3.4.1 Jamille Dalla-Nora
A duração do comercial “Jamille Dalla-Nora” é de 30 (trinta) segundos. Nele,
uma mulher, com mais de 60 anos de idade, branca, cabelos curtos e grisalhos,
obesa, de Júlio de Castilhos fala sobre o Caderno Gastronomia do Jornal Zero Hora.
129
O Caderno Gastronomia é publicado, semanalmente, às sextas-feiras e
encartado no periódico. É colorido, ilustrado, apresenta receitas de comidas e
bebidas diversas e matérias relacionadas ao tema, fazendo, ainda, matérias
particulares às estações do ano e datas comemorativas.
Este comercial, como os demais da campanha, possui duas cenas. Na cena
1 é na qual a interveniente fala, prevalecendo, durante sua narrativa, o plano médio.
Na cena 2, a interveniente está na tela, em plano de meio-conjunto, segurando o
veículo Zero Hora, em uma sala coberta de fotografias de diferentes pessoas e que
remetem a épocas específicas. Estas fotografias estão penduradas às paredes,
sobrepostas, e de modo a não mostrar o fundo, e um locutor masculino, não-
identificado, fala. Sobre a imagem, surge na tela, na parte inferior mais à direita do
vídeo, as palavras 24 cadernos + 54 colunistas.
Há, ainda, no final do comercial, um teaser cantado, com o número do
telefone da Central de Assinaturas de Zero Hora – 0800-642-8222. Enquanto o
teaser é cantado, vai surgindo na tela uma seqüência de exemplares dos diferentes
cadernos de Zero Hora, como um leque, e se forma, número por número, na parte
inferior central do vídeo, o telefone apresentado. A seqüência de exemplares se
forma e desaparece. A última imagem é da identidade visual – Zero Hora 40 anos: A
vida por todos os lados, centralizada na tela, e do telefone abaixo dela.
Na primeira tomada, da cena 1, Jamille Dalla-Nora está na tela, em primeiro
plano, à esquerda do vídeo, tendo ao fundo um palco, como um teatro, com cortinas
vermelhas (as cortinas estão se abrindo) e um cenário, onde há um sofá, coberto por
uma manta de tricô, uma geladeira, um fogão, uma pia, uma mesa com cadeiras
(copa), um balcão, panelas penduras em um suporte, vasos de flores, quadros,
fazendo referência à copa e à cozinha de uma casa simples, sem luxo ou decoração.
Sobre o cenário, incide uma luz branca. Há uma música instrumental melodiosa e
triste que acompanha todo o comercial.
Na tomada seguinte, a interveniente está no cenário, sentada no sofá.
Relata a sua história, de modo pausado, em linguagem simples e rotineira. Sobre as
imagens, aparece e, logo após desaparece, no lado direito, em baixo do vídeo, o
130
nome da interveniente e sua cidade de origem. Enquanto Jamille faz sua narrativa,
as tomadas transitam entre os planos primeiro e close. Há passagens da fala,
gravadas pela interveniente, enquanto sua imagem aparece na tela, e outras em que
fala na cena. Jamille veste uma blusa na cor salmão com gola bordada. Usa brincos
e pulseira dourada, relógio e aliança e tem as unhas pintadas, demonstrando
vaidade.
A cena 2 é na qual o comercial finaliza. A interveniente se apresenta,
sorrindo, em plano de meio-conjunto, com o Jornal Zero Hora nas mãos em uma
sala, tendo, ao fundo, várias fotografias, afixadas às paredes. Há um locutor
masculino não-identificado que reproduz a inscrição final, a frase relacionada ao
Caderno apresentado. O comercial encerra com a entrada do teaser, com o telefone
da Central de Assinaturas de Zero Hora, a seqüência de edições dos cadernos, que
se forma e desaparece no vídeo, o telefone e, por fim, a identidade visual de Zero
Hora e o slogan.
Quanto ao texto, Jamille diz:
- Esta é uma história real. (Cena 1 — Jamille está sorrindo, tendo ao fundo
o palco e o cenário)
- Eu tenho receitas assim de muitos anos. (Cena 1 — A interveniente está
sentada no sofá, tendo, às mãos, um caderno grande, um livro de
receitas, no qual estão afixadas as receitas, colecionadas do Jornal Zero
HoraGastronomia. Ela folheia o livro de receitas e vai apontando para
as matérias)
- Desde que a Zero Hora começou assim.
- Tem aqui um bolo de fubá maravilhoso! (Jamille faz referência a uma das
receitas de seu livro)
- Primeira coisa que eu faço é esperar sexta-feira. (Jamille está com uma
edição do Caderno Gastronomia nas mãos, no qual apresenta, como
assunto principal, a chamada “Muito bem casados” e a fotografia dos
doces que levam este nome)
- Pra mim lê a Gastronomia.
- Eu leio todos os dias mais a Zero Hora.
131
- Mas eu gosto mais é esse aqui. (Jamille está com a edição do Caderno e
faz referência a ele)
- A gente não cozinhando direito, às vezes, pode até perde o marido, né?
(A fisionomia de Jamille demonstra preocupação ao dizer esta frase.
Finaliza o relato sorrindo)
Um locutor, masculino, não identificado, fala:
- Assine Zero Hora e receba em casa o jornal que faz toda a diferença no
seu dia-a-dia. (Cena 2 – Jamille, sorrindo, segura um exemplar de Zero
Hora em uma sala coberta de fotografias pelas paredes. Sobre sua
imagem, na parte inferior mais à direita do vídeo, aparecem as
indicações: 24 cadernos + 54 colunistas)
O comercial encerra com a entrada de um teaser cantado, com o telefone da
Central de Assinaturas de Zero Hora.
- 0800-642-8222. (Surge, na tela, a seqüência de exemplares dos diferentes
cadernos de Zero Hora, como um leque, e se forma, número por número, na parte
inferior central do vídeo, o telefone apresentado. A seqüência de exemplares se
forma e desaparece. A última imagem é da identidade visual e do sloganZero
Hora 40 anos: A vida por todos os lados, centralizada na tela, e do telefone abaixo).
Neste comercial, percebemos, também, a qualidade de produção de toda a
campanha e tomadas e planos agradáveis. A ênfase é dada à figura de Jamille, uma
senhora, provavelmente, dona-de-casa. O relato marca pelo interesse particular da
interveniente no Caderno Gatronomia e sua preocupação em cozinhar, visto sua
aparência física (obesa) e seu testemunho (“A gente não cozinhando direito, às
vezes, pode até perde o marido, né?”), evidenciando uma geração.
O tom de voz de Jamille, ao narrar o seu depoimento, em geral, é animado.
O discurso marca pela aparência de Jamille, que representa uma geração de
mulheres, casadas, donas-de-casa, que cuidam do lar e da família, tendo, no
alimento, sua demonstração maior de cuidado e de amor.
132
3.4.1.1 Análise
Podemos salientar a casa (copa e cozinha, áreas íntimas da habitação) e a
aparência física da interveniente (obesa). Além do teatro, do palco, da luz branca
incidente sobre o cenário e das fotografias.
Vale lembrarmos que o teatro representa o mundo e faz conceber seu
caráter ilusório e transitório. As histórias apresentadas fazem com que o
telespectador e a interveniente compartilhem os sentimentos anunciados, em uma
situação dramática imaginária, uma relação que sensibiliza e autentica o relato.
A luz branca que pode simbolizar a revelação e desperta a compreensão,
incide sobre o palco, dando luminosidade ao centro, remetendo claridade e leveza
ao ponto principal da cena, ao depoimento. A luz surge em oposição à sombra, que
sugere o não conhecer. O centro do palco pode significar o princípio, como
irradiação vertical, pode ser entendido como um lugar de passagem, o caminho
entre os planos celeste, terrestre e infernal do mundo, o portal de transposição e da
ruptura.
Parece ser este o sentido dado à luz que incide sobre o centro do cenário
(palco). O ponto de início e transposição, o lugar da decisão e da fronteira divisória
da vida e da história de cada interveniente, a partir de sua relação com Zero Hora, a
luz da felicidade, da revelação e do caminho, em oposição às sombras e à
ignorância. Zero Hora é o elemento essencial do qual tudo depende.
O cenário faz referência a uma casa, à cozinha e à copa, a áreas íntimas do
domicílio. Reproduz a casa de Jamille. Segundo Chevalier (1991, p. 196-7), a
habitação concebe o núcleo do mundo, a imagem do universo. O local onde vive a
interveniente. Como um símbolo do maternal, a casa possui um sentido de abrigo e
de segurança. Para Lurker (1997, p. 119) e Becker (1999, p. 58-9), como espaço
metódico e fechado, que traz um centro à vida humana, a casa é símbolo do cosmos
ou de sua ordem, é o centro sagrado, onde o homem está próximo de Deus.
Representa sua privacidade.
133
As áreas reservadas da casa, a cozinha e a copa podem significar
intimidade e calor. A cozinha está associada, segundo a Psicanálise, ao local das
transmutações alquímicas ou das transformações psíquicas, ou seja, um momento
da evolução interior (CHEVALIER, 1991, p. 196). O fogão, centro da morada,
ampara aos que buscam proteção, é símbolo da comunidade humana e da
segurança. Segundo Lurker (1997, p. 274), para muitos povos, o lume sagrado do
fogão valia como força vital da família. A copa com sua mesa de refeições é o centro
ao redor do qual as pessoas podem reunir-se, é o símbolo da refeição comunitária
(BECKER, 1999). Representa o convívio partilhado. Esta representação está ligada
à exposição da intimidade da vida da interveniente, de seu local sagrado de relação
social e com a família.
Quanto à aparência física da interveniente, a obesidade, esta reforça o
testemunho e se encaixa, perfeitamente, ao Caderno apresentado: Gastronomia.
Jamille passa a idéia de uma dona-de-casa, que adora cozinhar e vê, no alimento,
valores determinantes para a família e o casamento. Irônico, mas real, associa a
culinária e a gastronomia ao glutão. O fato é amenizado pela simpatia da
interveniente. Zero Hora reforça a imagem associada da pessoa que se dedica a
cozinhar a gordura e ao excesso. Na sociedade, que prima pela exterioridade física,
pela magreza, pelo culto ao corpo malhado e perfeito e está recheada de jovens
anoréxicas e com bulimias, integra o Caderno Gastronomia a um público com mais
idade, que já está além dos padrões rígidos de beleza atuais. O jovem parece
marginalizado da possibilidade de comer bem, com saúde e manter a estética.
Na cena final, a interveniente está com o Jornal Zero Hora nas mãos,
sorrindo, em um espaço cheio de fotografias de diferentes pessoas. Estas fotografias
representam o Poder de influência e de interferência de Zero Hora na vida e na
história de cada um, uma vez que diz: “Zero Hora: A vida por todos os lados”. A vida
de todos e todas as suas histórias de vida.
Vale relembrarmos que, para Barthes (1980), a Fotografia é um jogo social,
a criação de uma imagem e, portanto, objeto para ser usado pela sociedade, uma
desapropriação do sujeito, utilizada como artifício ilustrativo da campanha,
reforçando os valores transmitidos nas falas dos intervenientes e no slogan de Zero
134
Hora. Pode servir como autenticação dos depoimentos e parece respaldar os valores
que Zero Hora pretende transmitir e as estruturas da sociedade atual.
Quanto aos Estereótipos, estes são percebíveis na figura da mulher, dona-
de-casa, dedicada à família e submissa, e em Zero Hora, como instituição
pertencente ao cotidiano de todos nós e sua inclusão na vida familiar e social. É
importante salientarmos que Jamille não aparenta ser uma mulher frágil e delicada,
com uma fisionomia submissa e meiga. Ao contrário, tem uma voz forte, é afirmativa
e enérgica ao falar, parece ser autoritária, mas os seus valores a tornam submissa.
Esta característica está associada não a sua aparência física ou ao jeito de falar e se
postar, mas aos valores atribuídos ao seu discurso.
A interveniente reforça a idéia da mulher casada e subordinada que precisa
de habilidades domésticas, em particular dotes culinários, para não perder o marido
(“A gente não cozinhando direito, às vezes, pode até perde o marido, né?”). A
posição da mulher tem sido variável, em função de concepções éticas, religiosas e
sociais, e do papel que assume na sociedade. Todavia, percebemos que a
submissão em relação ao casamento, sobretudo, em mulheres com mais de 60 anos
de idade, ainda, é uma realidade e que atributos como costurar, limpar, cuidar dos
filhos e cozinhar são valorizados por elas e por seus cônjuges. Ao aceitar o relato,
Zero Hora corrobora com estes princípios (a matéria da edição que Jamille mostra
para a câmera, diversas vezes, durante seu depoimento, tem como título “Muito bem
casados” e faz referência aos doces que levam este nome, mas que, pelo contexto,
reforçam o discurso e os valores imbuídos nele).
Segundo Lurker (1997, p. 425-6), a relação masculino-feminino
particularizada na dualidade homem-mulher e na imagem do casamento suscita
papéis específicos. Ao masculino cabe uma posição de precedente, visto que é
reconhecido como autor de todo devir, como princípio criador, é o primeiro que,
através da criação ou emanação, faz surgir o mundo, como segundo. Assim como
Adão, primeiro ser humano, de quem Eva foi criada, como segundo. Como símbolos,
aos homens cabem ferramentas e armas, que indicam o móvel, o penetrante, à
mulher, em seu papel secundário, mas não menos importante, cabe a tarefa de
acolher, cuidar e proteger.
135
O Jornal Zero Hora, por sua vez, é estereotipado na figura da instituição que
está inserida na rotina das pessoas, incorporada ao cotidiano e tem lugar de
destaque nas atividades ditas rotineiras (“Primeira coisa que eu faço é esperar
sexta-feira. Pra mim lê a Gastronomia. Eu leio todos os dias mais a Zero Hora”) e
que contribui para manter o equilíbrio e a harmonia social, valorizando instituições
conhecidas da sociedade em vigor, como o casamento e a família, neste caso,
através do Caderno Gastronomia e das receitas, que podem manter o casamento.
O Fait Divers, que se instaura pela exploração da emoção, se transforma em
roteiro da campanha, que salienta: Esta é uma história real. Quanto ao depoimento e
ao perfil da interveniente, o Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada está
estruturado na figura da mulher idosa. O peso da narrativa recai sobre esta
Personagem Dramática, que simboliza acolhimento, doação e candura. Provoca
emoções e suscita identificações projetivas, fazendo com que sejamos lançados em
seu lugar, pela sua condição de sacralização, oriunda da moral e da igreja, e da
catarse, pela mediação da solidariedade e da piedade (RAMOS, 2002).
O Fait Divers de Causalidade interpela pelo conflito e o sujeito relativo
recorre, em sua impotência, a um Sujeito Absoluto, para deliberar sobre as
dificuldades de sua vida, prevalecendo a dialética da Fatalidade, vista como este
Sujeito Absoluto, que possui respostas para todas as dúvidas. O sujeito relativo –
mulher, idosa, submissa – vê na Fatalidade – Zero Hora, Caderno Gastronomia,
Mídia – seu Poder e se torna obediente, diante de sua força e sabedoria, afinal, “a
gente não cozinhando direito, às vezes, pode até perde o marido, né?”. Assim, Zero
Hora e o Caderno Gastronomia assumem os papéis de intermediários das questões
humanas. O final feliz, a contemplação, é a garantia da Fatalidade.
Vemos, também, o Fait Divers de Coincidência de Repetição, através da
midiatização, na qual a informação repetida instaura a onipresença da mesma
factualidade em conjunturas diferentes, é o igual que se reproduz, com diferença. Os
mesmos valores são reproduzidos em discursos e contextos, em histórias e
depoimentos, a priori, díspares. Os intervenientes de cada comercial apresentado
nesta segunda parte da campanha (os comerciais relacionados aos cadernos de
Zero Hora), suas histórias pessoais, sua relação com Zero Hora, enfim, remetem a
136
mesma ocorrência, reproduzida em modos de expressão, em situações, em perfis
distintos. A Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual todos encontram respostas
para suas necessidades e seus interesses, por mais frívolos e superficiais que
sejam, está presente na figura da Mídia e em sua ação na sociedade. Os valores de
Zero Hora e da sociedade burguesa, a hegemonia da classe dominante, que
promete garantir a justeza de oportunidades e a igualdade para todos, são
reproduzidos, não no original, na íntegra, mas em vários discursos, em situações
desiguais.
A tipologia de Fait Divers predominante, visto que ambos interpelam pelo
conflito e pela Fatalidade, é a de Causalidade de Causa Esperada, na presença da
Personagem Dramática, a mulher, idosa, dona-de-casa, submissa, e a Fatalidade
representada em Zero Hora, no Caderno Gastronomia, como Sujeito Absoluto,
capaz de oferecer o que se deseja. Oferecer o que se quer, desde que atrativo para
todos os gostos, estilos e gêneros. Uma fórmula que tem funcionado em Zero Hora,
visto que o periódico tem 24 cadernos distintos. O lema deveria ser: atacar (agradar)
a todos, por todos os lados.
Temos, ainda, na campanha, quanto ao tipo de informação e estrutura, o
Fait Divers de Coincidência de Repetição na simbolização. No objeto padronizado:
teatro, palco, luz, cenas, fotografias. Repetição do original não como cópia, e, sim,
sua reprodução com diferenças, no desigual. Insinua a onipresença da factualidade,
que se mantém em qualquer circunstância. E tem como final, saída, a Fatalidade,
Sujeito Absoluto, que desata os nós coincidentes (RAMOS, 2002). A Repetição
ocorre na idéia central, nos elementos estruturais e na onipresença da mesma
factualidade e se distingue no perfil e no relato dos intervenientes, é o desigual. A
Repetição aparece como uma forma de persuasão, que busca memorizar, seduzir e
convencer.
A Repetição, também, ocorre na assinatura final: “assine Zero Hora e receba
em casa o jornal que faz toda a diferença (...)” e no telefone da Central de
Assinaturas. Esta Repetição, imperativa, faz parecer que Zero Hora pode fazer
diferença positiva na vida de cada um de nós. A Repetição serve como ênfase
persuasiva, que funciona para memorizar, seduzir e convencer o observador.
137
As relações de Poder são percebidas na figura de Zero Hora, que participa
da vida cotidiana e social da interveniente. Pelo próprio relato de Jamille: “primeira
coisa que eu faço é esperar sexta-feira. Pra mim lê a Gastronomia. Eu leio todos os
dias mais a Zero Hora. Mas eu gosto mais é esse aqui”. O Poder, como dominação,
se encaixa na relação dialética entre submissão e liberdade. No valor atribuído à
Zero Hora no dia-a-dia, a mulher que coleciona receitas por medo de perder o
marido (“A gente não cozinhando direito, às vezes, pode até perde o marido, né?”).
O Poder, como energia prazerosa, garante a submissão do pacto estabelecido entre
dominados e dominadores.
A Cultura se mostra, através da linguagem, como instituição social
reproduzida em meio aos diversos grupos que compõem a sociedade, neste
comercial, na mulher, idosa, dona-de-casa, prendada, dedicada ao lar e submissa às
regras sociais. É visível, também, no jeito de falar descontraído e imperativo de
Jamille. E, em sua aparência, sem muita vaidade. Jamille parece pertencer à classe
popular, isto é notado nos valores apresentados e na caracterização do cenário, que
reproduz, de modo estilizado, sua residência modesta. A Cultura possui uma
abordagem inscrita e circunscrita na subjetividade, que deriva na repetição, não
como cópia integral, e, sim, o igual que se reproduz com diferença. Assim, o
discurso que prega pela oportunidade, participação e resposta e enaltece Zero Hora
está evidente neste depoimento.
A Ideosfera é a produção de sentido a serviço do Poder. O sujeito, Jamille,
se relaciona com o social e a produção discursiva, consolidando o ideológico. Toda
palavra de enaltecimento conferida ao Caderno Gastronomia e à Zero Hora cria a
Ideosfera. A conotação, onde o lingüístico cultiva o seu diálogo com o cenário social
e histórico e encena a legitimação da sociedade. A Ideosfera tende a se constituir
em discurso da doxa, vivenciado pelos usuários como um discurso comum, que não
precisa de explicação, cuja tipicidade não é percebida, em que o que seja exterior é
abandonado como margem.
Nas subcategorias da Ideosfera, temos a Doxosfera, que constitui o senso
comum, autenticando o papel de Zero Hora, como capaz de estar incorporada ao
cotidiano e participar, ativamente, da vida social e dos padrões estabelecidos; a
138
Piteosfera, com o discurso da crença que Zero Hora e a Mídia têm o Poder de atuar
na vida dos sujeitos e na sociedade, compartilhando os valores sociais; o Socioleto,
que concebe a neutralidade da linguagem de um grupo social, a linguagem simples
e cotidiana de uma dona-de-casa; e a Logosfera, o discurso natural e irrestrito, que
independe da pretensão do sujeito.
A frase de encerramento: “assine Zero Hora e receba em casa o jornal que
faz toda a diferença no seu dia-a-dia” ampara toda a visão que caracteriza Zero
Hora: sem modéstia e com muita pretensão, sobre sua influência em nossas vidas,
em nosso cotidiano. O Jornal que faz a diferença e, portanto, melhora, o nosso dia-
a-dia, se coloca como determinante no contexto da vida social.
O depoimento de Jamille reforça o Discurso Encrático de Zero Hora e, por
conseguinte, da empresa RBS, e mantém valores e regras sociais arraigados na
vida social. A RBS e seus valores, através de seu veículo e encarte, são sublimados,
como instituição enraizada em nosso cotidiano e com efetiva participação e
interferência no contexto social. O discurso reforça a ideologia da classe e dos
padrões predominantes e se move pelo senso comum. O Discurso Encrático está
expresso em toda a relação da interveniente com o veículo Zero Hora e o Caderno
Gastronomia e, em particular, é percebida na declaração final: “a gente não
cozinhando direito, às vezes, pode até perde o marido, né?”. Assim, o alerta deveria
ser: mulheres devem cozinhar direito se não perderão seus maridos, aquelas que
não sabem cozinhar estarão fadadas à solteirice. Servir é a palavra de ordem.
Qualidades como companheirismo, honestidade, caráter, entre outros, são deixados
de lado, em prol da boa comida e dos prazeres medíocres.
De maneira abreviada, temos, neste comercial, os Estereótipos na figura da
mulher, idosa, dona-de-casa, dedicada e submissa, que simboliza a doação, a
delicadeza e o cuidado feminino, e na função da Mídia, que participa da vida
particular de todos nós e preserva os valores sociais (casamento, família).
Percebemos a incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada,
já que o peso da narrativa incide sob a Personagem Dramática, a mulher, idosa, que
representa a doçura e a doação humana. Mobiliza emoções e faz com que sejamos
139
levados a seu lugar em uma identificação projetiva, pela sua sacralização,
solidariedade e indulgência.
O Fait Divers de Causalidade interpela pelo conflito e o sujeito relativo
busca, em sua impotência, um Sujeito Absoluto para resolver os conflitos de seu
destino, reinando a lógica da Fatalidade – Sujeito Absoluto, que tem resposta para
todos os assuntos e dúvidas. O sujeito relativo – mulher, idosa, submissa –
reconhece na Fatalidade – Mídia – seu Poder e se torna dependente, pelo seu
alento e sabedoria, que lhe afirma o final feliz.
Vemos, ainda, o Fait Divers de Coincidência de Repetição, através da
midiatização, na qual a informação repetida instaura a onipresença da mesma
factualidade em circunstâncias diferentes – o igual que se reproduz com diferença.
Os mesmos valores são reproduzidos em discursos e contextos, nos diferentes
comerciais da campanha. A Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual todos
encontram respostas para suas necessidades e interesses, por mais frívolos e
superficiais, está presente na figura da Mídia. Os valores de Zero Hora e da
sociedade burguesa são reproduzidos (e reforçados), não no original, na íntegra,
mas em vários discursos, em situações desiguais.
Na campanha, quanto ao tipo de informação e estrutura, vemos, ainda, o
Fait Divers de Coincidência de Repetição, na simbolização, no objeto padronizado. A
Repetição ocorre na idéia central, nos elementos estruturais e na onipresença da
mesma factualidade e se distingue no perfil e no relato dos intervenientes, é o
desigual. A Repetição aparece como uma forma de persuasão: memorizar, seduzir e
convencer.
A fala da interveniente ressalva, ainda, o Poder, como dominação e energia
prazerosa, que permite que dominados e dominadores se deparem unidos pelo
prazer. O sujeito relativo – mulher, idosa, submissa – vê no Sujeito Absoluto – Mídia
– a possibilidade de compartilhar interesses e valores comuns à sociedade (o
Caderno Gastronomia ajuda você a manter seu casamento, visto ser condicional
para isto saber cozinhar direito). O sentimento resultante é o prazer: o Poder, a libido
dominante.
140
A Cultura está especificada nas relações do dia-a-dia, no valor conferido à
Mídia e no perfil da própria interveniente: mulher, idosa, dona-de-casa, submissa e
com um jeito de falar descontraído.
A Ideosfera, como um discurso universal, que perpassa o senso comum,
confirma o papel de Zero Hora, como ativa e participante na conduta e nos valores
(regras) sociais; o discurso da crença de que a Mídia tem o Poder de atuar na vida
dos sujeitos; o discurso que representa a neutralidade da linguagem de um grupo
social; e o discurso instintivo e mecânico que independe da vontade do sujeito sem
questionamento.
Vemos o Discurso Encrático, o proferir da dominação, que valoriza as
instituições vigentes – Mídia, casamento, família, mantém valores e regras sociais
estabelecidas e desgastadas em nossa sociedade e cultua os pactos sociais.
E, por fim, como categoria, a posteriori, a Fotografia que, de acordo com
Barthes (1980), é um jogo social, no qual criamos uma imagem, um objeto, que pode
ser utilizado pela sociedade. Foi usada para caracterizar o slogan e o Poder de
interferência e de influência que Zero Hora confia ter na sociedade e reforçar os
valores passados nas falas dos intervenientes e no slogan do periódico, servindo de
ajuda silenciosa aos interesses da RBS.
3.4.2 Lissandra e Giuliano Gomes
O comercial “Lissandra e Giuliano Gomes” tem 30 (trinta) segundos. Nele,
um casal fala sobre sua experiência com o Caderno Casa & Cia de Zero Hora.
Lissandra é uma mulher branca, com cabelos longos e loiros, magra e jovem.
Giuliano é um homem branco, com cabelos castanhos escuros, magro e jovem. O
casal, de Porto Alegre, aparenta ter menos de 30 anos de idade.
141
O Caderno Casa & Cia é publicado e circula no Jornal Zero Hora, todas as
semanas, às terças-feiras. É um encarte colorido e ilustrado que apresenta dicas,
tendências, alternativas e propostas para decoração.
Este comercial tem duas cenas. Na cena 1 é quando os intervenientes
falam. Nesta etapa, há variedade de tomadas e de planos. Na cena 2, os
intervenientes estão na tela, em plano de meio-conjunto, segurando Zero Hora, em
uma sala coberta de fotografias de diferentes pessoas e que remetem a períodos
específicos. As fotografias estão penduradas às paredes, sobrepostas e de modo a
não mostrar o fundo, e um locutor masculino, não-identificado, fala. Sobre a imagem,
surge na tela, na parte inferior mais à direita do vídeo, as palavras 24 cadernos + 54
colunistas.
Há, ainda, no final do comercial um teaser cantado, com o número do
telefone da Central de Assinaturas de Zero Hora – 0800-642-8222. Enquanto o
teaser é cantado, vai surgindo na tela uma seqüência de exemplares dos diferentes
cadernos de Zero Hora, como um leque, e se forma, número por número, na parte
inferior central do vídeo, o telefone. A seqüência de exemplares se forma e
desaparece. A última imagem é da identidade visual com o sloganZero Hora 40
anos: A vida por todos os lados, centralizada na tela, e do telefone sob ela.
Na cena 1, na primeira tomada, Giuliano e Lissandra estão na tela, em
primeiro plano, à esquerda do vídeo, abraçados, tendo ao fundo um palco, como um
teatro, com cortinas vermelhas (as cortinas estão se abrindo) e um cenário, onde há
estantes vermelhas ao fundo, com objetos decorativos em seus nichos, um tapete,
um quadro, com ilustração abstrata, puff branco, sofá branco de linhas retas,
referendando a uma casa moderna, com aparência limpa com poucos móveis,
objetos e enfeites. Incide uma luz branca sobre o cenário. Há uma música
instrumental melodiosa e triste durante todo o comercial.
Na tomada seguinte, o casal já está no cenário, sentado no sofá branco, de
linhas retas e modernas, com almofadas às costas. Narram o fato, de maneira
pausada, em linguagem simples e rotineira. Sobre as imagens aparecem e, logo
após desaparece, no lado direito, em baixo do vídeo, os nomes dos intervenientes e
142
a cidade de origem. Enquanto os intervenientes descrevem sua história, as tomadas
transitam entre os planos: primeiro, americano e meio-conjunto.
Lissandra veste blusa sem mangas, justa, na cor marrom, calça bege e
sapatos de salto alto bege escuro. Giuliano usa calça jeans, camisa azul clara,
calçados pretos e meias pretas. Ambos usam relógio. Demonstram cuidar de sua
aparência, em especial Lissandra, pelos braços torneados, a postura ereta, a
maquilagem suave e o cabelo escovado. Há passagens da fala gravadas pelos
intervenientes, enquanto sua imagem é apresentada, e outras em que falam,
diretamente, na cena.
Na cena 2, os intervenientes se apresentam, sorrindo, em plano de meio-
conjunto, em uma sala repleta de fotografias afixadas às paredes. Giuliano está com
o Jornal Zero Hora nas mãos e Lissandra puxa de dentro do veículo o encarte Casa
& Cia. Os dois se olham e sorriem. Há um locutor masculino não-identificado que
reproduz a inscrição final, a frase relacionada ao Caderno apresentado no relato. O
comercial termina com a entrada do teaser, com o telefone da Central de
Assinaturas de Zero Hora, a seqüência de exemplares com os diferentes cadernos,
que se forma e desaparece, e o telefone. Por fim, a última imagem é da identidade
visual de Zero Hora centralizada no vídeo e do telefone.
Quanto ao texto, Lissandra e Giuliano dizem:
- Esta é uma história real. (Cena 1 — Lissandra e Giuliano estão, abraçados,
tendo ao fundo o palco e o cenário. Lissandra fala)
- Fomos na loja. Esse sofá é lindo, maravilhoso! Vamo compra? (Cena 1 —
O casal está sentado em um sofá. Giuliano fala, gesticula e tem, às mãos,
uma edição de Zero Hora enrolada, em forma de canudo. Seu tom de voz
é animado)
- Mas aquele sofá não dava na sala. (O tom de voz de Giuliano demonstra
decepção)
- Quer dizer, daí a gente foi para os encartes da Casa & Cia.
- Pegava aquele monte de encarte, botava tudo no chão, circulava e
marcava. Isso! (Lissandra fala. Sua voz soa empolgada. O casal folheia
143
uma edição do Caderno Casa & Cia. Ao lado, empilhada sobre o sofá, há
uma série de edições do periódico)
- E tem idéias bem interessantes que tu pode resgatar e consegue utilizar no
teu apartamento.
- Isso é o mais maravilhoso!
O locutor, masculino, não identificado, fala:
- Assine Zero Hora e receba em casa o jornal que faz toda a diferença na
sua vida. (Cena 2 – Giuliano está com o Jornal Zero Hora nas mãos,
aberto. Lissandra puxa o encarte de Casa & Cia, sorrindo para o marido. O
casal está em um ambiente coberto de fotografias pelas paredes. Sobre a
imagem, na parte inferior mais à direita do vídeo, aparecem as indicações:
24 cadernos + 54 colunistas)
O comercial encerra com a entrada do teaser cantado, com o telefone da
Central de Assinaturas de Zero Hora:
- 0800-642-8222. (Vai surgindo na tela a seqüência de exemplares dos
diferentes cadernos de Zero Hora, como um leque, e se forma, número por
número, na parte inferior central do vídeo, o telefone. A seqüência de
exemplares desaparece. A última imagem é da identidade visual e do
sloganZero Hora 40 anos: A vida por todos os lados, centralizada na
tela, e do telefone).
A qualidade de produção de toda a campanha, as tomadas e os planos
agradáveis são visíveis neste comercial. A ênfase é dada ao casal jovem, bonito,
simpático, em harmonia. O relato marca pelo entrosamento do casal, ambos falam
com empolgação na cena. A parceria que se apresenta em relação ao casal na
decoração da casa, um assunto, normalmente, de interesse feminino, torna o relato
agradável. O tom de voz de Lissandra e de Giuliano é animado. A possibilidade de
resolver os problemas de espaço e ter alternativas de decoração plausíveis, dando a
entender que o Caderno Casa & Cia pode oferecer isto, de modo efetivo, é o que
prende o discurso: a praticidade (“daí a gente foi para os encartes da Casa & Cia”), a
variedade (“aquele monte de encarte”) e a concretização (“tem idéias bem
interessantes que tu pode resgatar e consegue utilizar no teu apartamento”) de
144
idéias criativas e interessantes para a casa que todos podem ter. A casa ideal,
desejada, bonita e atual parece fácil de ser alcançada.
3.4.2.1 Análise
Sobre a produção de sentido não-verbal, temos a casa moderna e a imagem
do casal jovem e bonito em harmonia. Além dos elementos comuns à campanha: o
teatro, o palco, a luz branca projetada sobre o cenário e as fotografias.
Vale recordarmos que o teatro representa o mundo e faz idealizar seu
caráter irreal e efêmero, fazendo com que o telespectador e os intervenientes
compartilhem os sentimentos anunciados, numa situação dramática imaginária, uma
relação que sensibiliza e autentica o caso.
A luz branca pode representar a matiz da revelação, que desperta a
compreensão. Incidindo sobre o palco, cria luminosidade e sombras, atribuindo a
idéia de claridade e de leveza à cena e ao testemunho. A luz nasce em oposição à
sombra, que sugere o conhecimento escravizado à pura opinião. O centro do palco
pode significar o princípio e, como irradiação vertical, pode ser compreendido como
um lugar de passagem, o portal de transposição e da ruptura.
Pode ser este o significado dado à luz que se projeta sobre o centro do
cenário (palco). O ponto de início e transposição, o local da decisão e da fronteira
limite da vida e da história de cada interveniente, a partir de sua relação com Zero
Hora, a luz da felicidade, da manifestação e do caminho, em oposição às sombras e
à ignorância. Zero Hora é o desencadeador do qual tudo depende.
O cenário refere-se a uma casa moderna, com objetos e móveis de linhas
retas, quadro com ilustração abstrata. Representa a habitação e o estilo de vida dos
intervenientes. A casa concebe o núcleo do mundo, a efígie do universo
(CHEVALIER, 1991, p. 196-7), é o local onde vivem e atuam os intervenientes.
Como uma alegoria do materno, a morada possui um significado de amparo e de
145
segurança. Segundo Lurker (1997, p. 119) e Becker (1999, p. 58-9), como ambiente
ordenado e fechado, a casa é o centro sagrado, onde o homem está perto de Deus.
Evidencia seus gostos, estilos e preferências. Representa sua privacidade. Salienta
a presença e a interferência de Zero Hora no espaço mais íntimo e reservado dos
sujeitos.
Quanto à imagem do casal, pessoas jovens e bonitas, vivendo em harmonia
e curtindo prazeres simples, ressaltamos a escolha deste par como representativo
de Zero Hora. O Caderno Casa & Cia faz referência a estilos de vida dinâmicos,
jovens, como se pessoas antigas (ou antiquadas) não pudessem ter vez no encarte.
A visão do casal jovem, associada ao Caderno e às soluções para problemas
cotidianos simples, fúteis e estéticos, faz a vida parecer mais fácil.
Segundo Lurker (1997, p. 303-4), a palavra grega harmonia significa
conformidade, união. É possível decorrer um princípio de conformidade, a coesão de
partes independentes entre si que se relacionam ou a união de elementos opostos
em um todo ordenado. O casal, homem-mulher, parece representar esta união. Esta
união harmoniosa vai de encontro à solução harmoniosa proposta pelo veículo e seu
Caderno.
Na cena final, os intervenientes estão em uma sala coberta de fotografias de
diferentes pessoas, presas às paredes. Giuliano tem às mãos uma edição de Zero
Hora aberta e Lissandra tira do meio do Jornal o encarte Casa & Cia. O casal se
olha e sorri. As fotografias representam o Poder de influência e de interferência de
Zero Hora na vida e na história de cada um, visto que o slogan do veículo diz: “Zero
Hora: A vida por todos os lados”. A vida de todos e suas histórias de vida.
Como mencionamos, a Fotografia é um jogo social, a criação de uma
imagem, portanto, um objeto para ser usado pela sociedade, uma desapropriação do
sujeito. Serve, apenas, como autenticação e fortifica os depoimentos, criando uma
ligação com o observador, uma semelhança com nossas próprias Fotos, e pode
respaldar os valores que Zero Hora tenta transmitir e as estruturas da sociedade.
146
A frase de encerramento do comercial, também, evidencia o Poder de
influência e de interferência na vida e na rotina de todos nós que o veículo parece
querer reforçar. Isto fica claro ao dizer: “assine Zero Hora e receba em casa o jornal
que faz toda a diferença na sua vida”.
Quanto aos Estereótipos, estes são visíveis na figura do casal jovem, bonito,
branco e harmonioso, e em Zero Hora, como instituição capaz de atuar no dia-a-dia
e na vida de todos nós e solucionar questões particulares de nossas rotinas e
interesses. Os intervenientes reforçam a noção do casal unido por gostos (“Fomos
na loja. Esse sofá é lindo, maravilhoso!”), interesses (“Vamo compra?”) e
pensamentos comuns (“daí a gente foi para os encartes da Casa & Cia”), que
encontra soluções harmoniosas para sua história (“tem idéias bem interessantes que
tu pode resgatar e consegue utilizar no teu apartamento. Isso é o mais
maravilhoso!”). A idéia de casal bem sucedido, também, está implícita, uma vez que:
aquele sofá não dava na sala”, e não: aquele sofá não dava no orçamento. Zero
Hora, por sua vez, é estereotipada na figura da instituição que está inserida no
cotidiano e tem soluções para as questões rotineiras e simples da vida (“tem idéias
bem interessantes que tu pode resgatar e consegue utilizar (...)”).
O Fait Divers, que interpela pela exploração da emoção, se torna roteiro da
campanha: Esta é uma história real. Vemos presente o Fait Divers de Coincidência
de Repetição, através da midiatização, na qual a informação repetida instaura a
onipresença da mesma factualidade em circunstâncias diferentes – o igual que se
reproduz com diferença. A mesma idéia ou informação, os mesmos valores, são
reproduzidos em discursos e contextos, em histórias e depoimentos, a princípio,
diferentes. Os intervenientes, suas histórias pessoais, sua relação com Zero Hora,
enfim, remetem ao mesmo fato, reproduzido em modos de expressão, em situações,
em perfis distintos. A Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual todos encontram
respostas para suas necessidades e interesses, por mais fúteis e aparentes que
pareçam, é visível na figura da Mídia e em seu papel no social. Os valores de Zero
Hora e da sociedade burguesa, neoliberal, a supremacia da classe dominante que
promete assegurar a democratização de oportunidades e a igualdade são repetidos,
não no original, na íntegra, mas em diversos discursos, em contextos desiguais.
147
Quanto ao tipo de informação e estrutura da campanha, temos, ainda, o Fait
Divers de Coincidência de Repetição, na simbolização, no objeto padronizado. A
Repetição ocorre na idéia central, nos elementos estruturais e na onipresença da
mesma factualidade e se distingue no perfil e no relato dos intervenientes, é o
desigual. A Repetição surge como uma maneira de persuasão, que visa memorizar,
seduzir e convencer.
As relações de Poder são visíveis na figura de Zero Hora, que participa da
vida dos intervenientes. O Poder, como dominação, se encaixa na relação dialética
entre submissão e liberdade. No valor, atribuído à Zero Hora na vida do casal, que
encontra soluções domésticas em um encarte de jornal. O Poder, como energia
prazerosa, abona a submissão do pacto, estabelecido entre dominados e
dominadores.
A Cultura se apresenta através da linguagem, como instituição social
repetida em meio aos diversos grupos que constituem a sociedade, no comercial, no
casal jovem, branco, bonito, harmonioso e entrosado. Os dois falam animados, em
linguagem coloquial, parecem possuir um bom nível de instrução. Vestem-se de
maneira discreta e usam tendências da moda (maquilagem suave, cabelos
escovados e lisos de Lissandra). Parecem pertencer à classe média, terem poder
aquisitivo e estarem ligados às tendências e aos modismos. Isto é visível na
caracterização do cenário e na preocupação estética com a casa, além da aparência
física, das roupas e da postura do casal. A Cultura possui uma abordagem inscrita e
circunscrita no subjetivo, que deriva na repetição, não como cópia total e, sim, o
idêntico que se reproduz com diferença. Assim, o discurso que prega pela solução,
resposta, alternativa e enaltece Zero Hora está manifesto neste relato.
A Ideosfera é a produção de sentido em prol do Poder. Os sujeitos,
Lissandra e Giuliano, se relacionam com o social e a produção discursiva, e
solidificam o ideológico. Toda expressão de enaltecimento conferida ao Caderno
Casa & Cia e à Zero Hora cria a Ideosfera. A conotação, onde o lingüístico alimenta
o seu diálogo com o contexto social e histórico e encena a legitimação da sociedade.
A Ideosfera tende a se estabelecer em discurso da doxa, vivenciado pelos usuários
148
como um discurso trivial, que não precisa de explicação, cuja tipicidade não é
percebida, em que o que seja exterior é deixado como margem.
Temos, nas subcategorias da Ideosfera, a Doxosfera, que estabelece o
senso comum, autenticando o papel de Zero Hora, como capaz de estar incorporada
ao cotidiano e participar da vida pessoal e íntima de todos; a Piteosfera, com o
discurso da crença que Zero Hora e a Mídia têm o Poder de atuar na vida dos
sujeitos e na sociedade, oferecendo alternativas e solucionando dúvidas; o
Socioleto, que concebe a neutralidade da linguagem de um grupo social, no caso, a
linguagem cotidiana de um casal jovem, ativo e moderno; e a Logosfera, o discurso
automático e incondicional, que independe da vontade do sujeito.
A frase de finalização do comercial: “assine Zero Hora e receba em casa o
jornal que faz toda a diferença na sua vida” ampara toda a visão que caracteriza
Zero Hora: sem moderação e com muita pretensão, sobre sua influência em nossas
vidas. O Jornal que faz toda a diferença e, portanto, melhora nossa vida, se coloca
como determinante no cenário da vida particular e social.
O depoimento, compartilhado pelo casal que, pelo entrosamento, corrobora
a fala um do outro, reforça o Discurso Encrático de Zero Hora e, em conseqüência,
da empresa RBS e da sociedade neoliberal. A RBS e seus valores, através de seu
veículo e encarte, são sublimados, como instituição pertencente ao nosso cotidiano.
O discurso reforça os valores de consumo (“Vamo compra?”), a ideologia da classe
e dos padrões dominantes (beleza, realização material, interesses superficiais,
aparência) e se move pelo senso comum (“Isso é o mais maravilhoso!”).
De maneira simplificada, vemos, neste comercial, os Estereótipos na figura
do casal jovem, bonito, moderno, que vive em harmonia e participa das tendências,
e no desempenho da Mídia, que participa da vida privada de todos nós.
Percebemos, na fala dos intervenientes, a incidência do Fait Divers de
Coincidência de Repetição, pela midiatização, na qual a informação repetida
instaura a onipresença da mesma factualidade em circunstâncias diferentes, é o
igual que se reproduz com diferença. Os valores de Zero Hora e da sociedade
149
burguesa, a superioridade da classe dominante, que promete garantir oportunidades
e eqüidade para todos, são reproduzidos, não no original, na íntegra, mas em muitos
discursos, em situações díspares, como no depoimento. E, no tipo de informação e
estrutura da campanha, temos o Fait Divers de Coincidência de Repetição, através
da padronização do objeto.
A fala dos intervenientes ressalva o Poder, como dominação e energia
prazerosa, que permite que dominados e dominadores se deparem atrelados pelo
prazer. O sujeito relativo – o casal – vê no Sujeito Absoluto – Mídia – a possibilidade
de compartilhar interesses comuns, soluções práticas e rotineiras. O sentimento
resultante é o prazer: o Poder, a libido dominante.
A Cultura está especificada nas relações do dia-a-dia, no valor conferido à
Mídia e no perfil dos intervenientes: mulher, jovem e bonita; homem, jovem e
charmoso; um casal, jovem, bonito e moderno que se expressa bem ao falar. A
Ideosfera, como um discurso universal, que determina o senso comum, confirma o
papel de Zero Hora, como ativa e participante na vida de todos nós; o discurso da fé
de que a Mídia tem o Poder de atuar na vida dos sujeitos; o discurso que simula a
neutralidade da linguagem de um grupo social; e o discurso espontâneo e reflexo
que independe do desejo do sujeito, sem questionamento.
Vemos o Discurso Encrático, o pronunciar da dominação, que se reproduz
incessantemente, que valoriza as instituições vigentes – Mídia, que mantém valores
e Estereótipos sociais.
Finalmente, percebemos, como categoria, a posteriori, a Fotografia que,
para Barthes (1980), é um jogo social, no qual criamos uma imagem, um objeto à
disposição da sociedade e, nesta campanha, caracterizou o slogan e o Poder de
interferência e de influência que Zero Hora crê ter na sociedade. As fotos da
campanha reforçam os valores explicitados nas falas dos intervenientes e no slogan
do veículo, servindo de alicerces silenciosos aos propósitos da empresa RBS.
150
3.5 UMA PERSPECTIVA DE SÍNTESE
Retomaremos, de maneira sucinta, os principais aspectos de cada comercial
analisado, tendo como categorias, a priori, Estereótipo, Fait Divers, Poder, Cultura,
Ideosfera e Discurso, e nossas principais conclusões.
Todos os comerciais apresentaram elementos padronizados, o que
configurou a Campanha Institucional, quanto ao tipo de informação e estrutura: o
tema central – os depoimentos reais, as cenas, as tomadas e os planos, as
assinaturas de encerramento, a identidade visual dos 40 anos de Zero Hora e o
slogan, assim como o teatro e o palco, os cenários, a luz branca incidente sobre os
cenários, criando áreas claras e escuras, a música instrumental e as fotografias.
Sabemos que a Propaganda necessita de tema e elementos marcantes que,
reproduzidos em diversas peças e repetidos, garantem memorização e identificação.
Esta padronização simbólica é típica das atividades da Propaganda e parece visar a
persuadir, a seduzir e a convencer.
A escolha do teatro como local para realizar os relatos pareceu buscar uma
transitoriedade característica. Cada história apresentada pode criar entre
interveniente e telespectador uma relação projetiva, uma identificação, na qual o
observador se colocou na posição do interveniente, em uma situação dramática
imaginária, e sensibilizou-se com seu testemunho. Esta relação pode dar aos relatos
e, por conseqüência, à Zero Hora credibilidade, força e aceitação.
Os cenários caracterizaram os testemunhos, pareceram funcionar como
reforço visual aos depoimentos, caracterizando, ainda, os próprios intervenientes e
seus estilos de vida. A música instrumental serviu como elemento unificante da
campanha e buscou sensibilizar.
A luz branca que incidiu sobre o palco, deixando áreas claras e sombras nos
cenários, estava centralizada, focando o ponto principal onde os relatos
aconteceram. Pelo que apresentamos, segundo a simbologia, a luz branca pode
151
representar a revelação, que desperta a compreensão. Já as sombras podem
significar a ignorância, o conhecimento vago da pura opinião. Esta divisão, entre luz
e sombra, pareceu-nos caracterizar Zero Hora como a luz, que pode promover a
revelação, e o resto, visto como margem não produtiva. O centro, onde as histórias
se desenvolveram, pode ser compreendido como o princípio, o movimento, o ponto
de união entre desejo e poder, um local de passagem, de transposição e de ruptura.
Este lugar pareceu representar o desejo do homem e o Poder de Zero Hora, como
agente transformador da vida e da história de todos nós.
A frase de encerramento dos comerciais de 1 (um) minuto – “Depois disso, a
gente só tem uma coisa a dizer: muito obrigado” pareceu reforçar o falso
desprendimento de Zero Hora, que permitiu a exposição da vida e da privacidade do
outro para se enaltecer e promover. A frase de finalização dos comerciais de 30
(trinta) segundos – “Assine Zero Hora e receba em casa o jornal que faz toda a
diferença (...)” – e suas variações, segundo cada Caderno do veículo, bem como o
telefone da Central de Assinaturas (0800-642-8222), pareceram criar uma relação de
identificação e de dependência com Zero Hora, uma vez que ela fará, se for feita a
assinatura, “toda a diferença” em nossas vidas.
“Assine Zero Hora” foi imperativo. E, mesmo tratando-se de uma Campanha
Institucional, pudemos perceber a intenção e o apelo comercial do veículo. Pareceu-
nos não bastar comemorar 40 anos, usando o Discurso do outro para se auto
promover, foi necessário, ainda, incitar a ação do sujeito a favor do mercado e das
finanças, mentalidade típica do neoliberalismo.
Por fim, entre os aspectos comuns da Campanha de Propaganda, tivemos a
identidade visual dos 40 anos de Zero Hora, com o slogan Zero Hora 40 anos. A vida
por todos os lados, e a Fotografia que, por sua representatividade e por perpassar
as análises, tornou-se uma categoria a posteriori.
Através desta simbolização padronizada, tivemos como tipologia
predominante na campanha – quanto ao tipo de informação e estrutura, o Fait Divers
de Coincidência de Repetição. Na Repetição, a idéia repetida instaura a onipresença
da mesma factualidade em circunstâncias diferentes, é o igual que se reproduz com
152
diferença. Assim, se repetiu a idéia central, os elementos estruturais e a onipresença
da mesma factualidade, mas se distinguiu nos perfis e nos depoimentos dos
intervenientes – o desigual. A Repetição pode atuar como um modo de persuasão,
visando a memorizar, seduzir e convencer.
Quanto aos aspectos específicos de cada comercial e às categorias
propostas, tivemos, na primeira análise, o comercial de 1 (um) minuto, intitulado
Manoel Ferreira da Silva, os Estereótipos na figura do homem idoso, deficiente
visual e lutador, que não desanima frente às dificuldades da vida, e em Zero Hora
como instituição capaz de participar ativamente de nossas rotinas e da sociedade.
Vimos a incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada na
figura do idoso, Personagem Dramática, na qual recaiu o peso da narrativa,
mobilizando emoções pela sua sacralização, solidariedade e compaixão, e em Zero
Hora – Mídia – como Sujeito Absoluto, a Fatalidade, capaz de solucionar as
questões insolúveis. De modo secundário, vimos o Fait Divers de Coincidência de
Antítese, através da midiatização, na qual o sujeito foi igualado aos demais por uma
inteligência não materializada. A Antítese se estabeleceu no conflito dramático e na
Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual todos pareceram vivenciar realidades
iguais.
A fala do interveniente ressaltou o Poder, como dominação e energia
prazerosa. O sujeito relativo – idoso, cego – viu no Sujeito Absoluto – Zero Hora,
Mídia – a possibilidade de inserção a uma prática social comum, a leitura de um
periódico, e que dividiu com ele interesses comuns à sociedade, as ações
assistenciais. O sentimento resultante foi o prazer: o Poder, a libido dominante.
A Cultura foi particularizada nas relações do dia-a-dia, no valor atribuído à
Mídia e no perfil do próprio interveniente: idoso, cego e lutador e em seu modo de
falar e vestir.
A Ideosfera, como um discurso unânime, do senso comum, confirmou o
papel de Zero Hora, como ativa e participante na conduta social; o discurso da
crença de que a Mídia tem o Poder de atuar na vida dos sujeitos e na sociedade; o
153
discurso que representou a neutralidade da linguagem de um grupo social – do
incansável brasileiro; e o discurso espontâneo e reflexo, que independe da vontade
do sujeito, sem questionamento.
Percebemos, na fala de Manoel, o Discurso Encrático, manifestado no
articular da dominação – que aprecia as instituições vigentes, que atribui valores à
Mídia e uma capacidade de atuação e transformação além da sua real
probabilidade, cultivando as estruturais de Poder da sociedade.
Na segunda análise, o comercial de 1 (um) minuto, Iara Soares, vimos os
Estereótipos na figura da mulher negra e frágil, vítima da sociedade, e no papel da
Mídia, que tentou representar a democracia exemplar e oferecer espaço e
participação iguais.
A incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada esteve
presente na Personagem Dramática da mulher-mãe e na Fatalidade, Zero Hora,
como Sujeito Absoluto, que entrou em cena para “contornar os impasses
incontornáveis historicamente” (RAMOS, 2002, p. 112). De modo secundário,
tivemos o Fait Divers de Coincidência de Antítese, no conflito dramático, presente no
racismo e na relação antagônica entre a classe dominada e a classe dominante.
O Poder, como dominação, que assenta na habilidade de uma elite impor o
seu projeto de desenvolvimento a uma maioria, e na energia prazerosa da libido,
que permite que dominados e dominadores se encontrem associados, por um pacto
comum, o prazer, pode ser percebido no discurso. Assim, o sujeito relativo – mulher,
negra – viu no Sujeito Absoluto – Zero Hora, Mídia – a possibilidade de igualdade e
respeito no contexto social. O sentimento resultante foi o prazer: o Poder, a libido
dominante.
A Cultura esteve particularizada nas relações cotidianas, no jeito de falar
simples e com vícios de linguagem de Iara e em sua maneira de vestir
despretensiosa, bem como no seu próprio perfil: mulher, mãe, negra, dona-de-casa,
diarista, vítima de discriminação racial.
154
A Ideosfera, como um discurso universal, que estabelece o senso comum,
legitimou o papel de Zero Hora, como agente social capaz de amenizar os conflitos
sociais; o discurso da fé de que a Mídia tem o Poder de transformar o sujeito e a
sociedade; o discurso que concebeu a neutralidade da linguagem de um grupo
social – da mulher negra, vítima de discriminação racial; e o discurso instintivo e
automático que independe da vontade do sujeito. Percebemos, ainda, o Discurso
Encrático, na fala da interveniente, que manifestou o falar da dominação – que
valoriza a Mídia, mantém os Estereótipos e reforça as estruturas de Poder.
Na terceira análise, ainda de um comercial de 1 (um) minuto, denominado
Adão de Castro Júnior, encontramos os Estereótipos na figura do homem
caucasiano, biotipo ideal na sociedade neoliberal, potencialmente capaz de se
inserir no mercado de trabalho e obter sucesso pessoal e profissional, e no papel da
Mídia, que pareceu oferecer oportunidades ilimitadas.
Tivemos a incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Perturbada,
na medida em que uma pequena causa, a leitura de Zero Hora, produziu um grande
efeito, a mudança completa na vida do interveniente, do fracasso de um comércio
falido a uma nova ocupação profissional, e, secundariamente, o Fait Divers de
Coincidência de Antítese, visto que a Mídia assumiu a função de mediadora
tranqüilizadora, a solução mágica dos conflitos humanos.
Percebemos, na fala de Adão, o Poder, como dominação e energia
prazerosa. O sujeito relativo se isentou da responsabilidade por sua própria vida e
desempenho e, assim, esteve isento de cobrança, já que o Sujeito Absoluto – Mídia
– foi o responsável por suas mudanças e ascensão. O alívio resultante foi o prazer: o
Poder, a libido dominante.
A Cultura foi particularizada no perfil do interveniente: homem, branco, meia
idade, ex-comerciante e atual instrutor. Em seu jeito de falar articulado e na
sobriedade ao se vestir.
A Ideosfera, como um discurso geral, que constitui o senso comum,
corroborou o papel de Zero Hora, como agente transformador; o discurso da fé de
155
que a Mídia tem o Poder de transformar o sujeito; o discurso que representou a
neutralidade da linguagem de um grupo social – o homem bem sucedido de classe
média; e o discurso automático e mecânico que independe do anseio do sujeito, o
dito por ser natural, sem se questionar o porquê.
E, por fim, percebemos o Discurso Encrático, o dizer da dominação – que
valoriza as instituições vigentes, como a Mídia, e que mantém as estruturas de
Poder, as diferenças, os modelos-padrão e as amarras da sociedade neoliberal.
Na quarta análise, o comercial de 30 (trinta) segundos, nomeado Jamille
Dalla-Nora, encontramos os Estereótipos na figura da mulher, idosa, dona-de-casa
tradicional e submissa – que simboliza a doação, a delicadeza e o cuidado feminino
– e na função da Mídia – que participa da vida privada de todos nós e preserva os
valores sociais como o casamento.
Percebemos a incidência do Fait Divers de Causalidade de Causa Esperada,
já que o peso da narrativa incidiu sob a Personagem Dramática, a mulher, idosa.
Mobilizou emoções e fez com que fossemos levados ao seu lugar, em uma
identificação projetiva, pela sua sacralização, solidariedade e indulgência. Interpelou
pelo conflito. O sujeito relativo – mulher, idosa – buscou, em sua impotência, um
Sujeito Absoluto – Caderno Gastronomia, Zero Hora – para resolver os conflitos de
seu destino, resposta para todos os assuntos e dúvidas, e reconheceu, na
Fatalidade pela sua sabedoria, seu Poder, tornando-se dependente, o que lhe
assegurou o final feliz.
Vimos, de maneira secundária, o Fait Divers de Coincidência de Repetição,
através da midiatização, na qual a informação repetida instaurou a onipresença da
mesma factualidade em ocorrências diferentes, é o igual que se reproduziu com
diferença. Os mesmos valores foram reproduzidos em discursos e contextos nos
diferentes comerciais da campanha. A Fatalidade, como Sujeito Absoluto, na qual
todos encontram respostas para suas necessidades e interesses, esteve presente
na figura da Mídia. Os valores de Zero Hora e da sociedade burguesa foram
reproduzidos (e reforçados), não no original, na íntegra, mas em vários discursos,
em situações desiguais.
156
A fala de Jamille ressalvou o Poder, como dominação e energia prazerosa,
permitindo que dominados e dominadores se deparassem unidos pelo prazer. O
sujeito relativo – mulher, idosa, submissa – encontrou no Sujeito Absoluto – Mídia –
a possibilidade de compartilhar interesses e valores comuns à sociedade. O
sentimento resultante foi o prazer: o Poder, a libido dominante.
A Cultura esteve especificada nas relações cotidianas, no perfil da
interveniente: mulher, idosa, dona-de-casa tradicional e submissa e em seu jeito de
falar descontraído e nos valores transmitidos em seu Discurso.
A Ideosfera, como um discurso universal, que define o senso comum,
confirmou a função de Zero Hora, como ativa e participante na conduta e nos valores
(regras) sociais; o discurso da crença de que a Mídia tem o Poder de atuar na vida
dos sujeitos; o discurso que reproduziu a neutralidade da linguagem de um grupo
social – da dona de casa tradicional; e o discurso instintivo e mecânico que não
depende da vontade do sujeito.
E, finalmente, vimos o Discurso Encrático, o proferir da dominação – que
valoriza as instituições vigentes – Mídia, casamento, família, que mantém valores e
regras sociais estabelecidas em nossa sociedade e cultua os pactos sociais.
Na quinta e última análise, o comercial de 30 (trinta) segundos, chamado
Lissandra e Giuliano Gomes, encontramos os Estereótipos na figura do casal jovem,
bonito e moderno que vive em harmonia, e no desempenho da Mídia, que participa
da vida particular de todos.
Percebemos a incidência do Fait Divers de Coincidência de Repetição, pela
midiatização, na qual a informação repetida instaurou a onipresença da mesma
factualidade em circunstâncias distintas – o igual que se reproduziu com diferença.
Os princípios de Zero Hora e da sociedade burguesa, a supremacia da classe
dominante, que promete garantir democratização de oportunidades e eqüidade para
todos, foram reproduzidos, não no original, na íntegra, mas em muitos discursos, em
situações diferentes, como neste e nos demais depoimentos.
157
A fala dos intervenientes ressalvou o Poder, como dominação e energia
prazerosa: dominados e dominadores se depararam atrelados pelo prazer. O sujeito
relativo – o casal – encontrou no Sujeito Absoluto – Caderno Casa & Cia, Zero Hora,
Mídia – a possibilidade de compartilhar interesses comuns, soluções práticas e
rotineiras. O sentimento resultante foi o prazer: o Poder, a libido dominante.
A Cultura foi especificada nas relações do dia-a-dia e no perfil dos
intervenientes: mulher, jovem e bonita; homem, jovem e charmoso; um casal, jovem,
bonito e moderno que se expressa bem ao falar. Pareceram ter bom nível
econômico e estarem inseridos nas tendências da moda.
A Ideosfera, como um discurso unânime, que determina o senso comum,
confirmou o papel de Zero Hora, como ativa e participante na vida de todos; o
discurso da crença de que a Mídia tem o Poder de atuar na vida dos sujeitos; o
discurso que simulou a neutralidade da linguagem de um grupo social – do casal,
jovem, ativo e moderno; e o discurso espontâneo e reflexo que independe do desejo
do sujeito, sem questionamento.
Encontramos o Discurso Encrático, o pronunciar da dominação, que pareceu
se reproduzir de modo incessante, valorizando as instituições vigentes – Mídia – e
mantendo princípios e Estereótipos sociais.
Em termos gerais, vimos que as escolhas dos intervenientes para falar em
nome de Zero Hora, e sendo eles representativos da sociedade, puderam
caracterizar Estereótipos já conhecidos. Esta campanha pareceu reforçar estes
Estereótipos, o que, para Barthes (2004, p. 394), corresponde a um grande risco, o
perigo da alienação. Os Estereótipos reforçam idéias e comportamentos e mantêm
estruturas estáveis: “o estereótipo é triste, porque é constituído por uma necrose da
linguagem, uma prótese que vem para tapar um buraco de escritura”.
O Fait Divers, como apelo da Campanha Institucional, pareceu encaixar-se
no que Zero Hora acredita ser seu Poder de influência e de interferência na vida de
cada um. Pareceu que todos nós temos um caso do dia para contar, no qual Zero
Hora pode agir, transformando nossa realidade.
158
O Poder pode ser percebido nas relações de submissão e de dependência
dos intervenientes à Zero Hora e a energia prazerosa, que resulta da relação
dialética entre dominados e dominadores, manteve o pacto social estabelecido que
mantém as estruturas vigentes.
A Cultura foi particularizada nos perfis dos intervenientes, nos seus modos
de vida, jeitos de falar e vestir, e em todas as questões que envolvem o cotidiano.
A Ideosfera encontra-se relacionada ao Discurso, que se relaciona
intimamente com o Poder. Para Barthes (1999), a Ideologia está na convergência
entre a produção discursiva, a subjetividade e o social. Cada palavra de
enaltecimento à Zero Hora criou a Ideosfera. Nas suas subcategorias, tivemos a
esfera do discurso comum, da doxa, presente em todos os comerciais; o discurso da
crença, daquilo que se acredita como verdade; a linguagem comum de diferentes
grupos; e o discurso mecânico e incondicional, que de tanto se repetir é aceito
unanimemente.
Destas categorias de análise, vimos surgir categorias, a posteriori, a
Fotografia e a Ética.
Para Barthes (1980), a Foto é um jogo social, a criação de uma imagem, o
momento em que o sujeito se transforma em objeto à disposição da sociedade. É
contingência pura, é referência de que aquilo que vemos esteve lá, existiu.
Emanação do real em estado passado. É autentificação.
Assim, a Fotografia, como um jogo social, no qual criamos uma imagem, um
objeto, que pode ser utilizado pela sociedade, foi usada pela campanha para
caracterizar o sloganA vida por todos os lados – e o Poder de interferência e de
influência que Zero Hora acredita ter na sociedade.
As Fotos-retrato, utilizadas como elemento ilustrativo e unificador, não
exigiram ou reivindicaram nada e não puderam levar à reflexão. Estavam
revigorando os valores transmitidos nas falas dos intervenientes e no slogan do
periódico, servindo de reforço silencioso aos interesses do Grupo RBS.
159
No desenrolar da campanha, as Fotos serviram como desfecho para as
histórias narradas no teatro, pois teatro e Fotografia despertam certo feiticismo e
estão associados, de acordo com Barthes (1980), à morte. Poderiam representar o
fim de um ciclo ou processo. Pareceram transmitir os valores de Zero Hora:
princípios fechados em si mesmos, sem a necessidade de discussão, aceitos por
todos, como naturais.
Ética, segundo Morin (2005), é o processo dialógico que revela, ao sujeito, a
sua autonomia e a sua dependência, sendo singular, como individualidade, e plural,
por pertencer à espécie humana e habitar um planeta – a Terra.
Assim, a Ética dialoga com o auto conhecimento e contextualiza o sujeito em
seu papel de ser e pertencer. Concede-nos respostas a duas questões essenciais:
Quem somos? Onde estamos?
Isto levanta questões fundamentais aos papéis da Comunicação, da
Propaganda e da Mídia: até onde estamos ajudando a promover este processo
dialógico, no qual respeitamos a autonomia e a individualidade e, ao mesmo tempo,
a coletividade? O que fazemos? Como fontes, para fazer chegar ao cidadão
informação, opinião e entretenimento, estamos dando-lhe autonomia para refletir
sobre os temas que envolvem as bases da sociedade e sua função nela?
Talvez estejamos criando compartimentos fechados, rotulados, através dos
Estereótipos, e cadastrando as pessoas segundo eles e, portanto, fazendo-as perder
sua autonomia, sua capacidade de refletir e julgar. E, assim, não criando espaço
para a troca, o diálogo, que permite o conhecimento e o auto conhecimento, na
medida em que temos a oportunidade de pertencer e nos inserir ao processo.
Talvez, em um mundo tão competitivo e comercial, estejamos servindo
apenas aos interesses econômicos, que mantêm as estruturas estáveis, reforçando
valores e princípios de minorias, que detêm os Meios de Comunicação e, portanto, a
Comunicação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente, a Comunicação, que temos no Brasil, encontra-se atrelada aos
pequenos grupos elitistas, que concentram os Meios de Comunicação. Hoje, poucas
famílias controlam a Mídia no país, atuando em Televisão, Rádio, Jornal, Revista,
Internet. Isto pode se dar pela omissão do poder público, em sua função reguladora
e fiscalizadora, ou, quem sabe, pela sua cumplicidade com estes mesmos grupos.
Esta deficiência tem início na própria Constituição Brasileira que, em seu
parágrafo 5º, artigo 220, determina que os Meios de Comunicação Social não podem
ser objeto de monopólio ou oligopólio, direta ou indiretamente. Como, então, temos
apenas poucos grupos familiares que controlam 90% da circulação, da audiência e
da produção de informação?
Outras discrepâncias são encontradas na lei brasileira, como a proibição de
Igrejas de ser proprietárias de empresas de Comunicação, o que acontece hoje,
também. Um exemplo é a vinculação da Rede Record de TV à Igreja Universal do
Reino de Deus. Nos últimos anos, parece haver uma proliferação de canais de
Televisão, voltados a Igrejas e a grupos religiosos. Sem fazermos analogismos
sobre o certo ou o errado, não é nosso objetivo ou intenção, apenas constatamos a
fragilidade que nossas leis e nossos poderes parecem possuir. A lógica
tecnoburocrática enfraquece a sociedade civil e as razões econômicas sobrepõem-
se aos interesses da nação.
Sabemos que os Meios de Comunicação, hoje, no Brasil, estão presentes na
quase totalidade das residências brasileiras, em particular, a Televisão, em 98% dos
lares no país, e são os instrumentos pelos quais o cidadão busca informação,
opinião e entretenimento, uma vez que outras instâncias de nossa sociedade
parecem carentes para lhe oferecer isto. Aqui encontramos o perigo: na lógica de
mercado, competitiva, econômica, quais os valores são passados e perpetuados
pelos Meios de Comunicação? Estando nas mãos de pequenos grupos elitistas,
podem confirmar e reproduzir os juízos de um modelo de sociedade, que interfere na
construção da real democracia e da cidadania.
161
A ineficiência de políticas públicas e democráticas de Comunicação no país
pode subordinar os direitos sociais dos cidadãos à razão competitiva, entregando
aos mercados financeiros o controle da sociedade.
A Publicidade e a Propaganda tornam-se meios através dos quais se ditam
modas, comportamentos e valores. Ajudam a reforçar os Estereótipos, uma das
manifestações da Ideologia dominante, os preconceitos sobre grupos étnicos, papéis
sociais, atividades profissionais, perfis de cidadãos e a ameaça de exclusão àqueles
que não seguem a visão estereotipada, alentada pelos Meios de Comunicação. A
Propaganda, em especial, sem órgãos reguladores que protejam o cidadão, pode
atuar livremente em nossa sociedade.
A Propaganda e a Mídia produzem seus efeitos a partir de parâmetros
emocionais muito mais fortes que os racionais e parecem buscar um conformismo,
uma massificação alienante dos sujeitos, em prol de uma Ideologia. Na Propaganda
e nos Meios de Comunicação, impera a lógica maniqueísta, dividindo o mundo entre
os bons e os maus, o dominador e o dominado, a recompensa e o castigo.
Este aspecto maniqueísta está presente na Campanha Institucional dos 40
Anos de Zero Hora. A recompensa para as ações e as condutas de cada
interveniente vem através de Zero Hora, instituição capaz de interferir e atuar, de
forma positiva, na vida dos sujeitos.
O Grupo RBS, comandado pela família Sirotsky, compreende 64% dos
Meios de Comunicação do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, sendo a maior
empresa de Comunicação da Região Sul do país. Desta forma, age livre sobre a
Mídia, propagando suas idéias e seus valores e mantendo os interesses e as
estruturais de Poder.
Neste trabalho, nosso objetivo era estudar a Ideosfera da Campanha
Institucional dos 40 Anos do Jornal Zero Hora, em anúncios de Televisão, veiculados
no ano de 2004, através dos pressupostos de Barthes e das categorias, a priori,
Estereótipo, Fait Divers, Poder, Cultura, Ideosfera e Discurso, usando, como
método, a Dialética Histórico Estrutural – DHE, tendo, como técnica, a Semiologia,
162
em uma Pesquisa Semiológica, e, ainda, compreender o papel ideológico do Fait
Divers, como significante, invariante, do Discurso Encrático do Grupo RBS, intricado
na Cultura e nas relações de Poder, que mantém a Ideosfera vigente.
Nossos objetivos parecem alcançados, uma vez que, através das categorias
propostas, que unidas se complementam e criam um todo de relações
interdependentes, percebemos a Ideosfera do Grupo RBS – a produção de sentido a
serviço do Poder. Vale lembrarmos que, para Barthes (2003b), a Ideosfera é e só é
linguagem. Em cada palavra de enaltecimento à Zero Hora nos relatos dos
intervenientes, vimos nascer a Ideosfera, que estabeleceu o discurso da opinião –
doxa, do senso comum; o discurso da crença que não necessita de discussão; que
concebe a neutralidade da linguagem de grupos sociais; e o discurso espontâneo e
incondicional, que independe da vontade do sujeito.
O Fait Divers, que interpela pela exploração da emoção e por seu caráter
sensacionalista, se apresentou como significante, invariante, como roteiro da
Campanha de Propaganda, visto que: Esta é uma história real. Os depoimentos de
vida de cada interveniente – os sujeitos relativos – e sua relação com Zero Hora – o
Sujeito Absoluto – pareceram servir para reforçar o Discurso Encrático da RBS, o
dizer da dominação, latente na Cultura e nas relações de Poder – submissão e
liberdade – que mantém a Ideosfera em vigor.
As categorias, propostas para este estudo, se integraram em um processo
de construção da realidade da Mídia, que vemos no país. Os Estereótipos foram
visíveis nas escolhas dos intervenientes: o cego lutador; a mulher negra, vítima de
preconceito racial; o caucasiano bem sucedido; a dona-de-casa tradicional; o casal,
jovem, bonito e moderno. O Fait Divers, como já mencionamos, interpelou pela
emoção e tornou-se roteiro da campanha. Já o Poder, como dominação e energia
prazerosa, se encaixa na relação dialética entre submissão e liberdade, esta relação
esteve presente em cada testemunho. A Cultura se revelou através da linguagem,
como instituição social reproduzida em meio aos diferentes grupos, formadores da
sociedade. A Ideosfera é a produção de sentido, revelado na oralidade, escrita e
imagem, em prol do Poder, e representou a fala da dominação do Grupo RBS, dono
dos Meios de Comunicação e senhor da mensagem. E o Discurso Encrático, que
163
reproduziu os valores neoliberais e legitimou o status quo, que regulariza a
sociedade, criando e fortalecendo os Estereótipos e mantendo um grupo na
liderança da sociedade.
Como categorias a posteriori, tivemos a Fotografia e a Ética. A Foto, como
um jogo social, no qual criamos uma imagem, um objeto, que pode ser utilizado pela
sociedade, foi usada pela campanha para caracterizar o slogan – Zero Hora 40
anos: A vida por todos os lados – e o Poder de interferência e de influência que Zero
Hora acredita possuir na sociedade. As Fotos-retrato não exigiram ou reivindicaram
nada e não puderam levar à reflexão. Estavam reforçando os valores transmitidos
nas falas dos intervenientes e no slogan do veículo, servindo de reforço silencioso
aos interesses da empresa RBS.
As Fotografias serviram, ainda, como desfecho para as histórias narradas no
teatro, local escolhido para os testemunhos. Teatro e Fotografia despertam um
feiticismo e estão associados, de acordo com Barthes (1980), à morte. Poderiam
representar o fim de um processo. Pareceram transmitir os valores de Zero Hora e,
por conseqüência, do Grupo RBS: princípios fechados, sem a necessidade de
questionamentos, aceitos como unânimes e naturais em nossa sociedade.
A Ética que, em nossa concepção, assenta no processo dialogal, em
elementos, posturas e valores contraditórios, que buscam o auto conhecimento e a
contextualização do sujeito no seu papel no social, se apresentou como uma
abordagem para reflexão dos valores e dos princípios de nossa sociedade e dos
espaços de construção de cidadania e de democracia, igualitária e justa, e em nossa
função e responsabilidade como comunicadores sociais, atuantes nos Meios de
Comunicação.
O diálogo, para ser verdadeiro, tem que acontecer em igualdade de
posições, com respeito ao mundo e à experiência uns dos outros, deve permitir o
reconhecimento da posição de cada um e estar centrado na reciprocidade, para se
chegar ao conhecimento mútuo e à vivência social, isentos das relações de Poder
ou dominação.
164
As questões de pesquisa, colocadas neste estudo, pareceram encontrar
algumas respostas, também. A filosofia da empresa RBS e das estruturas
ideológicas dominantes esteve presente em todo e em cada Discurso. Cada um dos
relatos pareceu transmitir um pouco dos valores e dos princípios do Grupo RBS: a
postura de submissão dos intervenientes frente à Mídia, as palavras de
engrandecimento ao veículo Zero Hora e os desfechos de cada testemunho, que
confirmaram a presença determinante da Mídia em cada uma das histórias
apresentadas, foram indícios desta filosofia. O Discurso da Propaganda trabalhou o
Estereótipo, na medida em que o manteve e o reproduziu, de maneira incessante,
em cada um dos relatos e na própria escolha dos intervenientes. O Fait Divers,
emotivo e sensacionalista, foi usado como roteiro e apelo da campanha. Os casos
do dia emocionam, sensibilizam e validam os testemunhos e, por conseqüência, os
valores apresentados. O Discurso Encrático, da dominação, mobilizou o Fait Divers,
na medida em que interpelou no conflito dramático dos intervenientes e que fez com
que a Mídia – Zero Hora – se apresentasse como Sujeito Absoluto, capaz de
resolver todas as questões insolúveis. A Cultura foi particularizada em cada
testemunho, no perfil dos intervenientes, em seus jeitos de falar e vestir,
representando diferentes grupos que formam nossa sociedade. E, por fim, a
Ideosfera, presente na linguagem, nas palavras de exaltação à Zero Hora e na
opinião corrente, no senso comum, nos diferentes grupos sociais, no discurso
maquinal e incondicional de cada um dos relatos.
Como comunicadores sociais, responsáveis e atuantes, temos que pensar
nos papéis que assumimos nesta sociedade. Apenas seremos tarefeiros, alienados
aos interesses econômicos, reproduzindo, em nossas ações e atividades, os velhos
modelos capitalistas de desigualdade e de submissão ou poderemos produzir uma
Comunicação que respeite as diferenças, os interesses e os valores dos diversos
grupos que compõem a sociedade? Devemos continuar a executar nossas
atividades apenas reproduzindo o modelo econômico, social e político em vigor?
Nós, publicitários, comunicadores sociais, engajados nas premissas atuais,
nas quais tudo pode ser mercadoria, consumido e quantificável, temos ou não
responsabilidade na realidade que vemos hoje? Podemos manter os Estereótipos,
sensibilizar com os casos do dia, reforçar as relações de Poder, nos apropriar do
165
Discurso do outro para falar em nome de nossas empresas, marcas ou instituições,
podemos nos adornar da Cultura, das relações cotidianas e perpetuar as estruturas
e os modelos atuais, ou não. Temos a persuasão e a sedução como motores de
nossas ações e sabemos usá-las a serviço das estruturas de Poder. Podemos
aprender a utilizá-las a favor da sociedade, buscando proporcionar eqüidade e
equilíbrio social.
Visto que não pretendemos encontrar respostas para todas as questões ou
esgotar o assunto, o método, utilizado para este estudo, pareceu ser o mais
adequado. A Dialética Histórico Estrutural – DHE, por permitir estudar as Condições
Objetivas – a estrutura, o cenário social e histórico – e as Condições Subjetivas – a
intervenção do ator social, a criação humana histórica –, sendo o cenário a própria
sociedade, onde estas Condições se relacionam, que fazem parte da realidade
histórico-social, foi a que melhor pode nos orientar neste estudo. A Pesquisa
Semiológica, por sua essência qualitativa, mostrou-se a mais indicada, também.
O objeto escolhido parece apresentar importantes indicações e
representações de nossa sociedade e pode caracterizar esta sociedade, na qual os
Meios de Comunicação assumem importante e decisivo papel, como fonte de
informação, opinião e diversão; os grupos que concentram a Mídia representam uma
pequena parcela da população brasileira, que determina o que deve ou não ser
apresentado, de acordo com seus próprios interesses; a Propaganda parece
adequar-se e moldar-se às necessidades e às expectativas destes grupos
oligopolistas, que detêm capital e tecnologia; o aspecto emocional de todo e
qualquer discurso, por mais pejorativo que seja, ainda é uma fórmula pronta, meio
clichê, como o próprio Estereótipo, e que se encaixa no inconsciente e na psique
humana e legitima valores e estruturas vigentes.
Procuramos relativizar nossas percepções sobre o objeto apresentado,
talvez o que pareça novo neste estudo seja a análise de uma Campanha
Institucional e a crítica ao papel da Publicidade e da Propaganda, áreas da
Comunicação menos reflexivas sobre sua ação na construção dos valores sociais
coletivos e da cidadania. Fica a questão: estamos sendo éticos em nossa conduta
ou apenas reproduzindo interesses, servindo como tarefeiros criativos, divertidos e
166
emotivos a interesses particulares? Que este estudo sirva de inspiração para se
manter o debate sobre nossa função na sociedade e se possa aprofundar o assunto,
propondo-se alternativas viáveis de mudança.
Logo, percebemos que este tipo de análise é importante para levar à
reflexão crítica da Comunicação e da Mídia em nossa sociedade e propomos seu
aprofundamento, no Doutorado, através do estudo de uma nova Campanha
Institucional, de um dos veículos impressos de Comunicação mais representativos
do país, a Folha de São Paulo.
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ANEXOS
ANEXO 1
COMERCIAL MANOEL FERREIRA DA SILVA
ANEXO 2
COMERCIAL IARA SOARES
ANEXO 3
COMERCIAL ADÃO DE CASTRO JÚNIOR
ANEXO 4
COMERCIAL JAMILLE DALLA-NORA
ANEXO 5
COMERCIAL LISSANDRA E GIULIANO GOMES
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