48
Os dois primeiros sacerdotes palotinos que se instalaram em Vale Vêneto foram Jacó
Pfändler e Francisco Schuster,
100
e, logo que chegaram, foi constituída uma comissão que
ficou encarregada da construção da nova igreja: os membros da comissão se chamavam
fabriqueiros.
101
Os imigrantes, além de se encontrarem organizados numa associação
devocional para cultuar a São Francisco de Assis, já haviam erguido uma capela em
homenagem ao santo. Porém, quando da chegada dos padres da Missão palotina, tanto a
devoção quanto a associação foram extintas. Uma nova igreja, consagrada ao Santíssimo
Sacramento, fora construída em substituição à existente.
102
Elevando o status da comunidade
por causa da aliança com os palotinos, os fabriqueiros passaram a tomar decisões a respeito
do progresso religioso do local.
103
Todavia, essa relação começou a apresentar atritos, apesar
de os sacerdotes irem ao encontro dos desejos dos imigrantes.
Passados quatro anos da chegada dos padres, em junho de 1890, as lideranças de Vale
Vêneto relataram ao procurador geral da Pia Sociedade das Missões, Guilherme Whitmee, a
das atividades religiosas dos imigrantes e sua organização nesse sentido. Ao se apresentarem como católicos
fervorosos e exemplares, os colonos buscaram alcançar os seus intentos de terem a independência religiosa,
através da presença de um sacerdote fixo no povoado.
100
O sacerdote Jacó Pfändler era suíço, enquanto que Francisco Schuster nascera na Alemanha. Ambos haviam
estudado no colégio de Másio na Itália, e provavelmente falavam bem a língua italiana. BONFADA, Op. cit., p.
47.
101
Numa reunião entre os padres palotinos e os fabriqueiros de Vale Vêneto, a respeito da construção da nova
igreja, ficaram decididos os seguintes pontos: 1° Deixam todas as decisões para os padres, a escolha do local da
igreja no ponto onde será mais propício para eles escolher (...). 2° A igreja se conhecerá sob o título ‘Corpus
Christi’. 3° O dinheiro transportado pelos padres foi entregue ao Sr. Paulo Bortoluzzi na presença dos abaixo
assinados. Eram 209 [duzentos e nove] e meia moedas em valor de ouro brasileiro de valor de 20, 000 [vinte
mil] réis cada um; mais meia lira esterlina e 2[dois] francos de prata doados por um benfeitor ignorado, não
só mas também 30, 000 [trinta mil] réis em papel brasileiro [sem grifos no original]. 4° A mesma benfeitoria
dará todos os paramentos sacros para rezar missa na mesma igreja, não somente, mas também um conjunto de
três sinos. 5° Antes de levar o dinheiro para o tesoureiro, deverão ser feitos todos os tijolos e transportados à
cidade. 6° O dinheiro consignado deverá ser colocado a juro como acredita mais conveniente o sobrenominado
tesoureiro [Paulo Bortoluzzi]. 7° A arquitetura e estilo da igreja serão ao gosto dos padres. 8° A obra da
construção pertence ao povo. Se vier qualquer dúvida, será decidida pelos padres. Dentre aqueles que se
encontravam presentes na reunião assinaram o documento: o superior geral da Pia Sociedade Guilherme
Whitmee, o padre José Banin, os sacerdotes Jacó Pfändler e Francisco Schuster. Os fabriqueiros: Paulo
Bortoluzzi, José Marcuzzo, Pedro Brondani, Jacó Bevilaqua, José Londero, Antônio Varaschini, Luis Rosso,
Domingos Bortoluzzi, Pedro Vizzoto, Jacó Iopp, Lourenço Bolzan e o escritor Primo Dall’Aglio. A cópia do
documento ficaria nas mãos do tesoureiro, Paulo Bortoluzzi. Vale Vêneto, 29 de julho de 1886. In: RIGUI, Op.
cit., p. 378. (sem grifos no original)
102
Para Jérri Roberto Marin, uma religiosidade autônoma, afastada do controle eclesiástico, não era o que os
postulados do ultramontanismo defendiam. Esses “procuravam destituir os leigos de toda e qualquer autonomia,
submetendo-os à esfera clerical”. MARIN, Jérri Roberto. “Combatendo nos exércitos de Deus: as associações
devocionais e o projeto de romanização da Igreja Católica”. In: MARIN, Jérri Roberto (org.). Quarta Colônia:
novos olhares. Porto Alegre: EST, 1999, p. 78.
103
Vitor Biasoli, ao analisar os estatutos para a construção da nova igreja de Vale Vêneto, alega que os
imigrantes apoiaram os projetos da Pia Sociedade das Missões investindo sua renda e trabalho naquele
empreendimento religioso. A compensação para a população “vinha do fato de ‘possuírem tudo, como dissera o
líder Luis Rosso, e de o povoado ser elevado à condição de curato [em] 1889”. BIASOLI, Op. cit., p. 101. Essa
aliança entre as partes demonstra que, para os imigrantes, a organização dos aspectos religiosos possuía uma
profunda dimensão social, além de que a presença dos palotinos seria a certeza da prosperidade econômica de
Vale Vêneto.