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ANDERSON LUIS VENÂNCIO
A FORÇA DO CENTRO:
A INFLUÊNCIA CONSERVADORA NA PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS
(1844-1853
)
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Anderson Luis Venâncio
A FORÇA DO CENTRO:
A INFLUÊNCIA CONSERVADORA NA PROVÍNCIA DE MINAS GERAIS
(1844-1853
)
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em História da Faculdade de História, Direito e
Serviço Social da Universidade Estadual Paulista “Júlio de
Mesquita Filho”, em cumprimento às exigências para a
obtenção do título de Mestre em História, sob a orientação
da Pro. Dr.ª Marisa Saenz Leme.
.
F
RANCA
2005
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3
AGRADECIMENTOS
À Profª. Dr Marisa Saenz Leme, pela orientação precisa e companherismo, que soube
cultivar minha admiração e respeito. Além disso, pela enorme paciência gasta nas horas
exaustivas de orientação. Também sou grato por tolerar minha teimosia.
À Profª. DrMárcia Regina Capelari Naxara e à Profª. Dr.ª Teresa Maria Malatian, pelas
críticas e sugestões ao trabalho durante o Exame Geral de Qualificação. Na medida do possível, as
mesmas foram incorporadas na redação final do presente estudo.
Aos professores, amigos e funcionários do Instituto de Ciências Humanas da Universidade
Federal de Juiz de Fora, os quais o ouso esquecer, e muito menos deixar de compartilhar com
eles os méritos deste trabalho.Também ao Prof. Dr. Alexandre Barata e a Profª. Dr Claudia
Ribeiro Viscardi, pelo apoio e orientação ainda na graduação.
Aos funciorios do Arquivo Público Mineiro, pela dedicação e profissionalismo
prestados no momento da consulta de seu acervo histórico, bem como aos funcionários da
Hemeroteca Publica de Belo Horizonte.
Aos funcionários da biblioteca da Faculdade de História, Direito e Serviço Social da
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, em especial à Maria de Lourdes Ferro.
Pelas limitações deste espaço, gostaria ainda de agradecer, sob risco de esquecimento, às
seguintes pessoas:
Ao Prof. Dr. Alberto Aggio, Milton Andrezza, Lucas Miranda. Flavio Saldanha, Douglas
Puglia, pela solicitude e demonstração de amizade.
Aos amigos Fabiane Costa Oliveira, Lia Santos, Raimundo Agnelo Soares Pessoa, Gabriel
Gonçalo Rodriguez, Isadora Falleiros Frare, Reginaldo de Oliveira Pereira, Yrapuan Junior, Helio
Martins Junior, Virna Ligia, Nidia Saraiva,Luciene Capellari,Marcelo Seabra, ntia Araújo,
Marcela Marques, Carolina Navarro, pelo apoio e amizade em tempos diceis.
Aos amigos Jorge, Giovane, Eduardo Cruz e David Magalhâes. E de forma especial a
minha querida Emila Grizende.
4
A Deus por ter me guiado e guardado até aqui. Sem Ele nada seria possível.Por último, agradeço a
minha família, maior patrimônio de um homem.
5
“Eu queria contar as historias de Minas, para os
brasileiros do Brasil”.
Noturno de Belo Horizonte (1924)
Mario de Andrade
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO 1 – Viva a Escravidão: O liberalismo e a realidade brasileira 13
1.1 Grandes Temáticas 15
1.2 Novas Abordagens da Historiografia 23
1.3 Um liberalismo brasileiro? 38
CAPÍTULO 2 – A proncia dos “Mares de Morros” 41
2.1 A dinâmica da economia mineira em meados do século XIX 42
2.2 A gênese das disputas políticas em Minas Gerais
2.3 Considerações sobre a Revolução Liberal de 1842
47
53
CAPÍTULO 3 – Titãs em Luta 65
3.1 Católicos, Monarquistas e Partidários da Ordem 66
3.2 Mudanças na Maré 86
CAPÍTULO 4 – Forças Pendulares 98
4.1. O Naufrágio 99
4.2 A retomada conservadora 106
CONSIDERAÇÕES FINAIS 129
BIBLIOGRAFIA E FONTES 135
7
Introdução
A Historiografia brasileira nas últimas décadas tem feito importantes avanços nas
tentativas de explicar o funcionamento da sociedade brasileira no oitocentos. O esforço tem se
revelado procuo, na medida em que os mecanismos que regiam tal sociedade estão sendo postos
em discussão, favorecendo o debate trico sobre temas como nacionalidade, cidadania, política,
etc. Por sua vez, trabalhos que envolvem pesquisas sobre a vida social e cultural no oitocentos têm
sido de grande valia para matizar o período, tratando cada vez mais de temáticas mais especificas.
É nesse sentido que o presente trabalho está inserido. Não pretendemos apresentar soluções que
sirvam de perfeitos modelos explicativos, mas apenas propor um debate mais aprofundado no que
se refere à política partidária nas Minas Gerais, num recorte temporal que vai de 1844 a 1853.
Tal recorte se justifica pelo fato de que nesses anos a política brasileira sofreu importantes
transformações, quando o Partido Liberal e o Partido Conservador buscaram depois de muitos
confrontos um entendimento. Alguns conflitos envolveram lutas armadas, como a Revolução
Liberal de 1842 e a Praieira em 1848.
Em 1853 inaugurou-se a Conciliação, política de congraçamento” entre os Conservadores
e Liberais, incentivada sobretudo por D. Pedro II, com vistas à unidade política do País. O grande
responsável por essa mudança foi Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês do Paraná. Político
mineiro, já experimentado em outros gabinetes e conhecido por seu temperamento enérgico e
suas convicções conservadoras, Honório presidiu o Gabinete da Conciliação até sua morte, em
1856
1
. Todos esses fatos repercutiram em Minas Gerais, alterando a composição política na
Proncia e estabelecendo uma articulação entre o centro político, no caso o Rio de Janeiro, e a
periferia mineira.
1
Uma boa narrativa sobre a Conciliação esem: NABUCO, Joaquim. Um Estadista no Império. Rio de Janeiro,
Editora Nova Aguilar S.A, 1975. P. 153.
8
A presente pesquisa visa à análise das relações políticas que se observam na Assembléia
Provincial de Minas Gerais da 5º até a 9º Legislatura. Ou seja, da anistia aos envolvidos na
Revolução de 1842 em 1844 até 1853, quando entrou em cena a Conciliação e, também, com o
poder central representado na Proncia na pessoa do seu Presidente indicado pelo Gabinete.
Buscamos verificar como os Liberais mineiros encastelados na Assembléia se relacionaram com o
Governo Central, sobretudo após a Revolução Liberal de 1842, na qual a derrota militar significou
também uma perda da capacidade de exercer a hegemonia sobre as diretrizes políticas da Nação e
determinar até onde o Estado poderia interferir na esfera privada. Desta forma, verificar-se-á, à
luz da empiria, se a Assembléia Provincial serviu como um território onde as demandas localistas
puderam ser expostas, negociadas e contrapostas ao projeto centralizador.
Este trabalho vincula-se à História Política. Na análise tentaremos entender melhor o jogo
partidário na Proncia e os caminhos de resistência institucional que porventura a elite mineira
tenha trilhado, dando especial ênfase às relações recíprocas entre Centro e Periferia. Desta
maneira, não queremos fazer uma simples narrativa dos “acontecimentos e das intenções dos
atores nesses acontecimentos”,
2
mas, somando-se a isso, verificar sobre quais estruturas e
instituições o modo de pensar e as ações históricas dos atores foram submetidas. Acreditamos que
os acontecimentos políticos por si não trazem uma explicação para os fatos, longe disso, os
acontecimentos devem ser conjugados com outros fatores e dimensões da realidade histórica.
3
No que se refere à Historiografia sobre Minas Gerais, percebemos que nosso tema ainda
o foi suficientemente explorado. Alguns trabalhos nos oferecem apontamentos importantes
sobre a política mineira no período. José Murilo de Carvalho, em seu livro “A Construção da
Ordem”, defende a tese de que em Minas havia um predomínio de políticos Liberais, tendo em
vista o fato de que a maioria dos mineiros que ocuparam pastas Ministeriais serem filiados ao
2
FERREIRA, Marieta de Moraes. A Nova “Velha História”: O retorno da História Política. In: Estudos Históricos.
RJ, Vol 7, N. 10, 1992. P. 211.
3
FALCON, Francisco. História e Poder. IN CARDOSO, Ciro F. S. e VAINFS, Ronaldo (orgs.) Domínios da
Historia: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997. P 66.
9
Partido Liberal
4
. Em contrapartida Ricardo Arreguy Maia
5
defendeu que em Minas Gerais havia
uma maioria na Assembléia Provincial composta sobretudo por conservadores. Além de
conservadora, essa elite política tinha estreitos laços de parentesco, o que fazia com que toda
política partidária em Minas fosse um Jogo de Compadres”.
6
Patcia F. Genos estudando a proncia, mais precisamente a Zona da Mata Mineira,
chegou a conclusões interessantes sobre as manifestações simbólicas de poder na Proncia. No
seu trabalho chama a atenção a alta concentração de nobiliarquia na região, o que leva a autora a
sugerir que aos olhos do Imperador, Minas Gerais tinha uma importância fundamental, daí a
necessidade em cooptar as elites locais através de títulos nobiliárquicos.
7
Wlamir Silva empreendeu um estudo sobre a Revolta da Fumaça, em que analisa se esse
movimento foi realmente uma revolta de cunho Restaurador ou uma (...) fantasmagoria criada
para consolidar a hegemonia moderada no plano simbólico (...)”.
8
Percebemos que a produção historiográfica na perspectiva da História Política sobre Minas
ainda é suscetível a novas contribuições, tendo em vista que os trabalhos até agora produzidos não
esgotaram as possibilidades que o século XIX em Minas fornece para o historiador. Mas, o
estamos tentando justificar nossa proposta de trabalho baseando-nos na constatação de que não
existem trabalhos suficientes sobre a História Política de Minas Gerais, pois o que justifica um
trabalho historiográfico é a visão que o historiador tem sobre determinado tema; é nisso que
repousa sua originalidade.
Apresentamos então nossa hitese. De antemão sabemos que no icio de 1840 Minas
tinha um quadro considerável de Liberais. Se tal premissa não fosse verdadeira teria sido muito
dicil a articulação de um movimento como o de 1842. Com a derrota de tal movimento é
4
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. A elite política imperial. Rio de Janeiro, Ed da UFRJ,
1980.
5
MAIA, Ricardo Arreguy. Jogo de Compadres: A Política Partidária na Província de Minas Gerais. Belo Horizonte
Dissertação de Mestrado, UFMG, 1992.
6
Idem, p. 148-153.
7
GENOVEZ, Patrícia Falco. As Malhas do Poder: uma análise da elite de juiz de Fora na Segunda metade do século
XIX. Niterói, Dissertação de Mestrado, UFF, 1996.
8
SILVA, Wlamir. Usos da Fumaça: A Revolta do Ano da Fumaça e a afirmação moderada na Província de Minas
Gerais. Lócus, Juiz de Fora, 1998, Vol 4, N 1. P 118.
10
verossímil que as elites batidas tenham adotado pela via institucional (aqui a Assembléia
Legislativa) estratégias de sobrevivência política, de maneira que seus interesses
descentralizadores pudessem de alguma maneira ser preservados diante do avanço centralizador.
Para o entendimento da temática, o primeiro capítulo aborda o tema do liberalismo,
expondo brevemente as condições que permitiram a propagação dessas idéias no Brasil.
Evidentemente, não pretendemos analisar todo o desenvolvimento das idéias liberais ao longo do
século XIX, mas centrar nosso foco do período Regencial até o Segundo Reinado.
Ao longo desse capítulo fizemos um levantamento historiográfico sobre o tema, tentando
situá-lo no transcurso da trajetória política do Brasil Império. Para a construção desse capítulo
fez-se necessário localizarmos o tema no seu contexto histórico, indicando os caminhos pelos
quais o liberalismo encontrou acolhida nas elites brasileiras, centrando o foco no período referente
à nossa pesquisa. Com esse critério selecionamos os autores abordados, apontando o ponto de
vista de cada um sobre as questões e em seguida expressando nosso pensamento sobre os temas.
No segundo capítulo tratamos mais detalhadamente da Proncia de Minas Gerais,
fornecendo informações sobre a economia regional e discutindo o peso político da Proncia e as
lutas partidárias dentro dela. Nesse ponto, fez-se necessário tratar do evento político-militar que
moldaria os contornos dos discursos partidários ao longo da década de 1840, a saber, a Revolução
Liberal de 1842.
No terceiro capítulo buscamos mostrar as conseqüências da Revolução Liberal de 1842
para a situação liberal. Também acompanhar a construção do aparato centralizador na proncia.
Entender como a queda do Gabinete conservador em 1844 influenciou a vida política em Minas
Gerais, e as lutas que se seguiram entre conservadores e liberais.
No quarto capitulo, demos um resumo da política mineira entre 1848 e 1853, o fim
predomínio liberal na Corte e as conseqüências para Minas Gerais. Articulando os acontecimentos
nacionais com os provinciais, buscando amarrar os elos que os prendem. Concluiremos apontando
os resultados que a política de Conciliação empreendida em 1853 trouxe para Minas Gerais.
11
Tentamos focar nossa atenção na identidade forjada entre os conservadores mineiros no
período estudado. Nossa intenção é entender a forma pela qual eles se viam e como os liberais
reagiam a isso.
Assim sendo, para construir um quadro mais próximo dos acontecimentos, temos como
referência o conceito de hegemonia de Gramsci;
9
tal conceito é baseado na construção de grupos
que durante certo tempo permanecem aliados, exercendo uma direção política, intelectual e
ideológica, o tendo como condição sine qua non a dominação econômica. Desta forma não
existe uma correspondência direta entre a infra-estrutura e a superestrutura política. O elo entre as
duas é orgânico, vinculando-se no seio da estrutura jurídico política em que são colocadas na
ordem do dia as contradições econômicas.
10
Noberto Bobbio, ao definir o conceito, expressa-se da
seguinte maneira:
(...) a hegemonia de uma classe ou facção sobre outras classes que
compõem o poder dominante faz com que cada um renuncie aos seus
interesses imediatos, interesses econômico-corporativos, em beneficio do
comum interesse político pela exploração e o domino das classes
subalternas. A hegemonia atua como principio de unificação dos grupos
dominantes, e, ao mesmo tempo, como principio de disfarce de domínio
de classe (...)
11
Portanto, fica evidente que a disputa política entre grupos dominantes ou entre os grupos
que buscam o poder de indicar a direção política de uma nação, nem sempre se da na forma de
imposição pela força, mas como alternativa pode-se buscar a persuasão ou soluções que levem ao
consenso, num processo que pode levar muito tempo para ser concretizado. Assim quando nos
dispomos a usar esse conceito para nossa pesquisa, esta na verdade busca encontrar os
dispositivos de cooptação que levaram uma parcela da elite imperial a ter assegurada sua vitória
o em cima dos grupos espoliados, mas também sobre outras parcelas da elite.
9
GRAMSCI, Antonio. Obras Escolhidas. Lisboa: Estampa, 1974, V. 1.
10
VISCARI, Cláudia Maria Ribeiro. O Teatro das Oligarquias: uma revisão da” política do café com leite” . Belo
Horizonte:C/Arte, 2001. P. 25.
11
BOBBIO, Norberto, . Dicionário de Política. UnB, Brasília , 1986. P. 581.
12
Utilizamos como fontes básicas as Atas e Anais da Assembléia Provincial de Minas Gerais
e os relatórios dos Presidentes de Província.
Das rotinas expostas nos materiais da Assembléia pudemos extrair informações
fundamentais para procurar traçar o quadro do pensamento da deputação em cada Legislatura.
Complementando as Atas usaremos também os Anais da Assembléia Geral, que permitem
analisar de outros ângulos a política mineira e a situação da Proncia, por intermédio das
atuações dos seus parlamentares.
No que se refere ao poder executivo, as “Falas” eram um relatório que o Presidente da
Proncia apresentava na seção de abertura dos trabalhos da Assembléia Provincial, ou quando
tomava posse. Nesses pronunciamentos, os presidentes seguiam a mesma metodologia adotada
pelo Imperador. Davam um quadro da situação da Província e indicavam soluções, alem de
falarem sobre os itens do orçamento. Também apresentavam balanços e avaliações de ações
governamentais feitas anteriormente. Todavia conforme bem assinalou Ungaretti Dias, as “Falas
carregavam claras intenções políticas. Denunciavam as vinculações presidenciais e os interesses
predominantes nos ministérios que os nomeavam”.
12
Tais falas são encontradas no Arquivo
Publico Mineiro, e no banco de dados virtuais da Universidade de Chicago.
Como um todo, procuraremos nessas fontes ouvir as vozes discordantes e concordantes da
política centralizadora e entender como a via da instituição legislativa serviu como uma válvula de
escape para aliviar as tensões desse processo na Província. Tamm tentaremos ver como o
Governo imperial tratou a Proncia, sobretudo após a Revolução Liberal de 1842 e a posterior
anistia ocorrida em 1844.
12
DIAS, Carlos Alberto Ungaretti. Op. Cit. P. 78
13
CAPITULO 1
Viva a Escravidão! O Liberalismo e a realidade brasileira
A historiografia sobre o século XIX no Brasil tem debatido intensamente o liberalismo,
cabendo destacar duas grandes vertentes antagônicas a respeito do tema. A primeira abarca
diversos autores que abordam os posicionamentos então existentes no Ps como uma reação
mimética das elites brasileiras aos modelos europeus. Nesse sentido, a prática liberal no Brasil
estaria muito distante do seu ideário trico. A segunda congrega os estudiosos para quem a
mesma teria derivado de uma adaptação à realidade nacional. Ou seja, a escravidão e o latifúndio
o representariam um empecilho à implementação do paradigma liberal.
A proposta deste capítulo consiste em discorrer sobre a argumentação de alguns
historiadores que trataram do assunto, apontando as principais questões e críticas que podem se
relacionar ao presente estudo. Para tanto, os autores selecionados foram: Roberto Schwarcz, As
idéias fora do lugar,
13
Maria Silvia de Carvalho Franco, As idéias estão no lugar,
14
Emilia Viotti
da Costa,
Da Monarquia à Republica: Momentos Decisivos,
15
Paula Beiguelman, Formação
Política do Brasil,
16
Thomas Flory, El juez de Paz y el jurado en el Brasil imperial: Control
Social y Estabilidad Politica en nuevo Estado,
17
José Murilo de Carvalho, Teatro das Sombras: A
política Imperial,
18
Izabel Marson, O Império do Progresso,
19
Ilmar Rolhoff de Mattos, O Tempo
Saquarema.
20
13
SCHWARCZ, Roberto. “As idéias fora do lugar”. Ao vencedor as batatas. São Paulo, Duas Cidades, 1977
14
FRANCO. Maria Silvia de Carvalho. “As idéias estão no lugar”. Cadernos de Debates. São Paulo, 1, 1976
  
15
COSTA, Emilia Viotti da. Da Monarquia à Republica: Momentos Decisivos. São Paulo, Ed. Unesp, 1999. O
título do capítulo 3 é “Liberalismo: Teoria e Prática”, p.131 a 168.
16
BEIGUELMAN, Paula. Formação Política do Brasil. São Paulo: Pioneira, 1976.
17
FLORY, Thomas. El juez de Paz y el jurado en el Brasil imperial: Control Social y Estabilidad Politica en
nuevo Estado. Mexico: Fundo de Cultura Economica, 1986, p. 35.
18
CARVALHO, José Murilo de. Teatro das Sombras: A política Imperial. São Paulo: Vértice/IUPERJ, 1988
19
MARSON, Isabel Andrade. O Império do Progresso: a revolução praieira em Pernambuco (1842-1855). São
Paulo: Ed. Brasiliense, 1987.
20
MATTOS, Ilmar Rohloff. O Tempo Saquarema. São Paulo: Editora Hucitec, 1987.
14
O debate a respeito do liberalismo no Brasil ganhou força a partir da década de 1970,
contexto muito procio à reflexão sobre os fundamentos da formação política nacional, posto que
o País celebrara em 1972 os 150 anos de sua independência. Além disso, o próprio regime militar
então vigente representava um desafio à intelectualidade brasileira, no sentido de explicação da
nossa História.
Num primeiro momento, não foi a História, como disciplina, que se ocupou de levantar o
debate, mas sim intelectuais oriundos de outros braços das Ciências Humanas. Nesse momento
tentava-se entender o sentido do Estado Nação no Brasil. Grandes temas, como escravidão e
latifúndio projetaram-se em paralelo com a busca da compreensão do desenvolvimento do
liberalismo no pais.
Esse debate foi posto em evidência por Roberto Schwarcz e Maria Silvia de Carvalho
Franco.O primeiro ligado à literatura, a segunda, filósofa. Infelizmente foge ao nosso prosito
tratar desse importante debate teórico em toda a sua profundidade e complexidade; entretanto
julgamos importante fornecer alguns apontamentos que se tornaram referencias para a avaliação
do liberalismo no Brasil, no período que envolve o recorte da presente pesquisa.
Roberto Schwarcz no seu texto “As idéias fora do lugar” (1977)
21
, colocava-se entre os
que acreditavam que o liberalismo no Brasil do século XIX fora s uma tentativa desastrada de
seguir os padrões europeus..Assim essas idéias não estariam adequadas à realidade histórica do
Brasil.Essa incompatibilidade dar-se-ia principalmente em função da escravidão. Nessa
concepção, o sistema escravista não permitiria o desenvolvimento e o exercício das liberdades
individuais e sociais implícitas no projeto liberal. O escravismo teria gerado um tipo de sociedade
que nada tinha em comum com as sociedades onde o liberalismo fora gestado, como a inglesa e
francesa.
21
SCHWARCZ, Roberto. “As idéias fora do lugar”. Ao vencedor as batatas. São Paulo, Duas Cidades, 1977.
15
Defendendo uma posição oposta, Maria Silvia de Carvalho Franco, em “As idéias estão no
lugar” (1976), mostrou que o liberalismo encontrou na sociedade brasileira um terreno fértil. A
autora não via incompatibilidade entre liberalismo e escravidão:dada a dimensão da propriedade
nesta ultima, as elites brasileiras teriam se apropriado adequadamente, de determinados valores e
procedimentos do liberalismo. Teriam, porém, lhes atribuído um novo significado, especifico ao
contexto escravista. Argumentou ela:
No Brasil, contudo, essas idéias esbarravam com a instituição da escravidão.
Longe de tentar eliminar a coerção imposta ao braço africano (pois não tiveram
significação as vozes favoráveis à Abolição no período da Independência), a
particular via liberal brasileira iria adequar as idéias liberais européias à
nossa estrutura econômica, amálgama de braço livre e escravo. Assim
colocados fora de seu lugar”as idéias se fundiram com a autoridade
necessária para a exploração escrava num contexto característico : a ideologia
do favor.
22
No mesmo período, a historiografia retornou criticamente o ao tema, produzindo vários
trabalhos repletos de qualidade. Tais trabalhos começaram centrando-se em temas mais gerais,
para em meados de 1980 tratarem de temas mais específicos.
1.
1 – As grandes temáticas
.
Como já foi dito, a década de 1970 produziu trabalhos historiográficos de muita relevância
para o aprofundamento dos estudos sobre o liberalismo no Brasil do século XIX. Paula
Beiguelman no livro Formação Política do Brasil(1976) tratou do liberalismo, relacionando-o
fortemente com a questão da escravidão no Brasil
23
. Traçando toda a trajetória da escravidão
desde o Primeiro Reinado até a Lei de 13 de Maio de 1888, a autora tentava demonstrar que o
liberalismo aplicado no Brasil não conseguiu dissociar-se da escravidão, procurando defendê-la
até o limite do suportável. Destacando como a questão da Abolição poderia se tornar um
elemento de conflito entre a Coroa e os setores agrícolas representados tanto no partido Liberal
quanto no partido Conservador .
22
FRANCO. Maria Silvia de Carvalho. “As idéias estão no lugar”. Cadernos de Debates. São Paulo, 1, 1976
  
23
BEIGUELMAN, Paula. Formação Política do Brasil. São Paulo: Pioneira, 1976.
16
A autora defendeu que a Coroa detinha um papel de fundamental importância no processo
de formação política brasileira. À época de Independência, a opção pela monarquia representava
antes de mais nada o desejo de manter a unidade do pais, bem como um esforço em manter o
controle do território para a Casa dos Bragança e cultivar o apoio da Inglaterra.
24
Diante do
divórcio entre vários setores da sociedade e D. Pedro I, este decidiu-se pela Abdicação. A
Regência surgiu como saída Constitucional para o problema criado pela saída de D. Pedro I do
poder. Nesse período, o Legislativo tentava se impor sobre o Executivo, atacando tenazmente o
Senado, defensor das prerrogativas do Poder Moderador. Mesmo nesse contexto de crise a
Inglaterra pressionava o Brasil para uma redefinição a respeito do trafico de escravos. O Ato
Adicional de 1834 surge como uma solução de compromisso capaz de aplacar tanto os interesses
dos liberais radicais quanto dos liberais moderados. Segundo a autora, esse epidio proporcionou
que as Assembléias Provinciais fossem criadas, substituindo os Conselhos Gerais das Proncias,
fazendo delas “quase soberanas” em relação ao poder central.
25
Ainda que não concordemos plenamente com a autora nesse aspecto, é fato que a simples
criação das Assembléias Provinciais representaram um duro golpe na estrutura centralizadora
montada por D. Pedro I. Por sua vez, na analise da autora, os pontos arquemedianos do sistema
monárquico brasileiro, continuavam intactos, a saber, o Poder Moderador e o Senado
vitalício.
26
Fato que mostra a preponderância que a centralização apresentava na sua analise.
Mantido o Poder Moderador garantia-se um aprofundamento da engenharia política que
proporcionaria uma conjuntura mais tranqüila ao longo do Segundo Reinado, engenharia essa que
daria à Coroa um raio de ação mais vasto. Daí a afirmação da autora:
Até aqui operamos com o esquema de uma sociedade agrária unida ante o
Moderador para o controle do Executivo com o que, ipso facto, se enfraquece o
Moderador, peça básica da organização monárquica. Porém, se a sociedade
agrária cindir-se politicamente em dois partidos de patronagem, o Moderador
readquirirá toda força com árbitro do revezamento partidário, enquanto, ao
mesmo tempo, o parlamentarismo limitara a Coroa a governar com um ou outro
dos partidos de patronagem.Ou seja: a organização política imperial
24
Idem, p. 233-241.
25
Idem, p. 239.
26
Idem.
17
alcançará seu equilíbrio, conjugando à monarquia o controle do poder pelos
partidos que constituem a representação política da sociedade agrária
escravista
27
Desta forma, a manutenção do Poder Moderador abria maiores possibilidades de diálogo
intra-elites, permitindo que determinados interesses, mesmo aqueles que não estavam na pauta dos
grandes produtores de café, fossem atendidos devido à continua ação de um Poder
suprapartidário, portanto mais independente das bases eleitorais.
Quanto ao sentido do liberalismo brasileiro, Paula Beiguelman nos fornece alguns
apontamentos bastante interessantes. Assim como na Europa, o liberalismo no Brasil constituía-se
em uma luta pela manutenção das liberdades individuais em face do absolutismo morquico e
dos cios do Ancién Regime. A opção monárquica brasileira à época da Independência
representava antes de qualquer coisa a necessidade de oferecer garantias aos grupos
economicamente dominantes de que a base agrícola do país, associada à escravidão, seria
mantida. O caos que se instalou na América Espanhola logo após o estabelecimento de
Republicas, fazia com que setores hegemônicos da sociedade brasileira desconfiassem do sistema
republicano e apelassem para o carisma da Monarquia. Porém, as contradições do Primeiro
Reinado, o centralismo excessivo, fizeram com que setores mais radicais da sociedade passassem
a atacar o sistema monárquico e seu principal instrumento legal de ação:o Poder Moderador.
no contexto das Regências, em que varias agitações partidárias e separatistas se
abateram sobre o Império, os liberais moderados apelaram para um fortalecimento da autoridade
central em detrimento das periferias, traçando uma linha paradoxal: para a defesa das liberdades
individuais (neste caso defender as liberdades individuais implicava necessariamente em proteger
o direito à propriedade escrava, posta em risco diante da fragmentação do Império) era necessário
limita-las, esvaziando os poderes locais - como o do Juiz de Paz muito fortalecido na conjuntura
do Ato Adicional - , de suas excessivas atribuições, e fortalecendo o poder central. O Regresso,
iniciado em 1837, deveria ser visto, segundo a autora, numa ótica em que o liberalismo assumia
27
Idem, p. 236.
18
um caráter mais conservador, passando-se a se suspeitar de determinadas ações que o Ato
Adicional permitia.
A antecipação da maioridade significou antes de qualquer coisa, a possibilidade do
restabelecimento de um ponto de equilíbrio entre as forças políticas do país, via Poder Moderador,
que permitia legalmente ao Executivo ‘construir’ uma maioria, independente da efetiva
composição partidária da Câmara, obtida por intermédio de eleições. Muito sintomática da nova
situação a qual o país estava submetido, foi a primeira eleição realizada pelo Gabinete Liberal em
1840 que deu ampla maioria para o partido na Câmara dos deputados. Para a autora:
na eleição presidida por esse gabinete verifica-se que qualquer dos partidos
que o Moderador efetivamente transformado em chave da organização
política’, como definia a Constituição de 1824 – chama-se ao poder, teria
condições para constituir uma Câmara de sua cor política. Isto é, a
concordância entre o Legislativo e o Executivo, requerida pela formula
parlamentarista vitoriosa desde 1831, se fazia inverter-se a relação clássica:
ao invés de criar o Executivo, a Câmara é que tinha origem nele
28
.
Pode-se afirmar que o liberalismo praticado no Brasil teve inúmeras particularidades e
adquiriu novos significados, fazendo com que se tornasse uma presença constante na vida política
nacional. A conjuntura apresentada pela década de 1840, política e econômica, determinava que o
liberalismo passasse a ser anti-localista e incorpora-se de forma determinante o escravismo.
29
Para a autora, dadas as condições políticas da época, a constituição do partido Conservador e
Liberal não significavam um apelo doutririo às respectivas correntes ideológicas, mas sim
meros sinais distintivos adotados para a competição interpartidária”.
30
Esvaziando-se progressivamente as funções dos Juizes de Paz e da Guarda Nacional
através da Lei nº 261, de 03 de dezembro de 1841, (que reformava o Código de Processo
Criminal), e o decreto 98, de 24 de setembro de 1841,( tratava de reformas na Guarda
Nacional) , o Executivo determinava sua primazia sobre os interesses localistas, centralizando
28
Idem, p. 243.
29
Idem, p. 245.
30
Idem.
19
todo o aparato de coerção, fortalecendo o Ministério da Justiça e naturalmente centralizando a
administração no Rio de Janeiro.Com esse processo, a meta sica do liberalismo era cumprida:
A garantia técnica às liberdades civis aumentava. E a onipotência do Executivo se via atenuada,
sem que se recorresse à formula localista da Regência ( juiz de paz)”.
31
Concluindo seu pensamento, Paula Beiguelman acentuava, e talvez esse seja o ponto mais
importante para a compreensão do liberalismo no período, que este, principalmente após a
Abdicação, passou por metamorfoses em diferentes momentos:
(...) o liberalismo na primeira fase da Regência apresenta-se como simples
integrante de um complexo ideológico circunstancialmente desenvolvido no
curso de um processo que, na verdade, conduziria a esquema diverso. na
segunda configuração ideológica liberal dá expressão e atua sobre um processo
em que o liberalismo esta efetivamente inscrito no vel administrativo,
econômico e do trabalho, traduzindo-se na reforma do sistema judiciário e
paramilitar, na política econômica e na reforma servil (libertação dos
nascituros). Fica, pois dissociada a categoria de Liberalismo considerado
como ideologia característica de duas épocas do Império – de maneira a
permitir apreender em cada caso, para além da referencia formal ao valor
doutrinário intrínseco, a natureza do vinculo com processo organizatório,
econômico e estrutural.
32
Outra autora selecionada, Emilia Viotti da Costa (1977) trouxe novos apartes, ao abordar
outras facetas do processo histórico, para o conhecimento do liberalismo no Brasil. Em seu livro
Da Monarquia a Republica: Momentos Decisivos”
33
a autora faz uma descrição clara da
trajetória do pensamento e prática liberal a partir da Independência.
Apesar do liberalismo brasileiro ter tido uma clara inspiração européia, sua prática e
inclinações podem ser entendidas à luz da própria dinâmica histórica brasileira. Na Europa o
liberalismo nasceu sob a bandeira burguesa, estando muito vinculado com a própria formação do
capitalismo e com a crescente contestação do Ancién Regime. A burguesia tentava frear os abusos
da Coroa e os privilégios dados tanto à nobreza quanto ao clero.
34
31
Idem, p. 249.
32
Idem, p. 253.
33
COSTA, Emilia Viotti da. Da Monarquia a Republica: Momentos Decisivos. São Paulo, Ed. Unesp, 1999. O
titulo do capitulo 3 é “Liberalismo: Teoria e Pratica”, p.131 a 168.
34
Idem, p. 133.
20
Entretanto, no Brasil, para muito além dessas questões, o liberalismo além da defesa da
propriedade privada e do comercio,que lhe é inerente, estava ligado a defesa dos fazendeiros no
seu status quo. Nas palavras da autora“(...)Era necessário encontrar uma maneira de lidar com
essa contradição (entre liberalismo, de um lado, e escravidão e patronagem, do outro)”.
35
De acordo com a autora, no processo de Independência o liberalismo brasileiro assumiu
uma faceta mais revolucionaria, pois visava romper com o sistema colonial. Entretanto, os
mesmos defensores da ruptura com Portugal tornavam-se conservadores no que tange às
transformações sociais de longo alcance. Essas transformações iam desde a questão da posse da
terra, até o problema da extensão dos direitos de cidadania ,em sua plenitude, aos vários setores
que compunham a sociedade brasileira, em especial os futuros ex-escravos..
Passada a fase do que a autora chamava de “liberalismo heróico
36
, em que se procedia o
processo de Independência, surgiu a necessidade de se por em prática o liberalismo, nas
engrenagens políticas da recém nação, já agora objetivando-se criar as bases da divisão de poderes
entre executivo e legislativo e judiciário..
Na sua luta contra os privilégios do Ancién Regime, os liberais europeus afirmaram a
soberania do povo, ao menos utopicamente, a supremacia da lei e insistiram na necessidade da
divisão entre os poderes nas formas representativas de governo. Emilia Viotti da Costa comenta
que eles: (...), converteram em direitos universais a liberdade, a igualdade perante a lei e o
direito de propriedade”.
37
A configuração que o novo Estado brasileiro assumiria a partir da Carta outorgada de 1824
daria ao Brasil um caráter liberal, entretanto a mesma Carta continha elementos de autoritarismo,
muito simbólico nesse sentido é o fato da Carta ter sido outorgada, e não promulgada. A
Constituição fortalecia o Executivo em detrimento do Legislativo, o Imperador tornava-se
responsável pela execução das leis aprovadas pelo Parlamento e o grosso da nomeação para os
mais altos cargos burocráticos também era prerrogativa do Executivo; além do que, naturalmente,
35
Idem, p. 134.
36
Idem, p. 138.
37
Idem, p. 133
21
toda a nobiliarquia seria de responsabilidade do Imperador. A Igreja continuava associada ao
Estado, sendo responsabilidade do Imperador a execução ou não das bulas vindas de Roma.
Entretanto, a grande novidade que a Carta de 1824 trazia era o quarto poder, ou seja, o Poder
Moderador por intermédio do qual o Imperador obtinha a prerrogativa de escolher seus ministros
à revelia do Parlamento, adiar ou suspender eleições, dissolver a Câmara, e, por conseguinte,
convocar novas eleições quando julgasse necessário. O Poder Moderador ainda conferia ao
Imperador a prerrogativa de nomear os membros do Conselho de Estado e mediante uma lista
tplice de candidatos ,os que recebessem as maiores votações durante as eleições, nomear
Senadores.
Todas essas características iriam daí em diante tornar-se alvo de constante contestação por
setores da elite. Em 1844, ano em que começa nossa pesquisa, mantinham-se fortes as discussões
a respeito dos limites e alcance da Constituição de 1824.
No seu primeiro embate com os liberais brasileiros, D. Pedro I saiu vitorioso, porém sua
viria assemelhava-se à de Pirro. Em 24 de Julho de 1824 explodia em Pernambuco uma
revolução comandada por Manuel Carvalho Paes de Andrade. De cunho liberal, republicano e
federalista, a Revolução proclamava Pernambuco juntamente com mais seis províncias do Norte,
autônomo em relação ao Império do Brasil; surgia desta maneira, a Confederação do Equador.
A questão é que a Carta de 1824 promovia uma centralização que aos olhos de muitos
setores liberais era excessiva: as províncias, as municipalidades, o Judiciário, a Igreja, o Exército,
a Armada e todo o grosso do sistema produtivo do país ficavam sob a tutela da burocracia central.
O Governo interferia diretamente na economia fixando alíquotas de importação,
concedendo ou não autorização para empresas nacionais ou estrangeirais operarem no país.
Segundo a autora, tal interferência do Estado no mercado, contrariava, os preceitos do liberalismo
clássico. O relacionamento entre a Igreja e o Estado também era por demais estreito, de forma que
os zimos eram recolhidos pelo Estado e os padres recebiam seu salário do Governo, o
Catolicismo era a religião oficial do Estado, estando proibido o culto publico de qualquer outra
22
religião, além disso, a Igreja controlava os registros de nascimento, casamento e morte. Podemos
dizer que a vida de todo o cidadão do Império ficava sob a tutela e registro da Igreja. Coisas como
essas soavam como afronta para os liberais.
38
As a dissolução da Constituinte, ficou evidente que o liberalismo que a maioria deles
defendia o era compatível com o tipo de Estado constrdo pelo Imperador por intermédio da
Carta de 1824. A autora observou que em 1826:
(...) os conflitos voltaram à tona, agravados agora por divergências entre as
próprias elites. A organização do sistema educacional, a legislação agrária, a
abolição do trafico de escravos, a liberdade de culto, a organização dos
conselhos provinciais e municipais, a composição do poder judicial: estes eram
alguns dos pontos que dividiam os representantes em dois grupos opostos, um
liberal e outro conservador.
39
Embora não seja a tônica desta trabalho localizar teoricamente todos os personagens
políticos envolvidos com esse momento da História do Brasil. Observar-se que existiam varias
propostas e várias interpretações sobre o liberalismo e sua aplicação a sociedade brasileira Dessa
maneira, muitos liberais sonhavam com um sistema político mais aberto, em que a força
provincial fosse a tônica. Mas o podemos reduzir a ação liberal somente ao âmbito da
descentralização política. Haviam outras demandas, como, por exemplo, um sistema de educação
livre da influencia eclesiástica, liberdade de culto e o fim do recrutamento militar, tal como era
praticado.
40
Como mostra Emilia Viotti, liberais de variada cepa, como Evaristo da Veiga ou José
Bonifácio empenharam-se em fazer oposição ao monarca e a exigir reformas na Constituição.
Evaristo da Veiga foi um dos principais antagonistas de D. Pedro I e por intermedio do seu jornal
a Aurora Fluminense defendia o Constitucionalismo. Nas suas palavras: Nada de excessos, a
38
Idem, p. 141.
39
Idem, p. 145.
23
linha esta traçada, é a Constituição. Tornar prática a Constituição que existe sobre o papel deve
ser o esforço dos liberais.”.
41
Em 1831 D. Pedro I deixou o poder e uma Regência foi instalada.Uma das primeiras
medidas da Regência recém empossada foi garantir a ordem. A tropa estava em polvorosa e a
ameaça de motins era constante. Assim, já em junho o Ercito permanente foi reduzido e o
governo é autorizado a constituir milícias civis para manter a ordem: originou-se a Guarda
Nacional
42
.
As reformas empreendidas pela Regência foram continuas.Em 1832 a Câmara aprovou o
Código de Processos, que na época veio a ser um dos principais instrumentos de descentralização
política institucional. É marcante o fato de que sob a influencia liberal, uma das primeiras
instituições descentralizadas fosse a jurídica. Para Emilia Viotti, com odigo:
(...) o promotor, o juiz municipal o juiz dos órfãos que até então tinham sido
nomeados pelo governo central passaram a ser escolhidos a partir de uma
lista tríplice proposta pela Câmara Municipal. O Código também conferiu
amplos poderes ao júri. Nesse sentido o código foi uma conquista dos liberais
radicais.
43
Porém, em 1840, parte importante dos liberais assumiram uma postura mais conservadora
frente à estrutura político institucional montada ao longo da década de 1830, voltada para
descentralização. Tal mudança já havia sido sinalizada desde 1838 por Bernardo Pereira
Vasconcelos:
Fui Liberal, então a liberdade era nova no país, estava nas aspirações de todos,
mas não nas leis, não nas idéias e praticas; o poder era tudo; fui liberal. Hoje,
porém, é diverso o aspecto da liberdade: os princípios democráticos tudo
ganharam e muito comprometeram; a sociedade que até então corria o risco
pelo poder, corre agora o risco pela desorganização e pela anarquia. Como
então quis, quero hoje servi-la, quero salva-la e por isso sou regressista. Não
sou trânsfuga, não abandono a causa que defendi no dia do seu perigo, de sua
41
Idem, p. 146.
42
Sobre a Guarda Nacional e o papel desempenhado por essa instituição ver: SALDANHA, Flávio Henrique Dias. Os
Oficiais do Povo: A Guarda Nacional em Minas Gerais oitocentista, 1831-1850. Dissertação de Mestrado, Unesp
Franca, 2004.
43
Idem, p. 153
24
fraqueza, deixo-a no dia que tão seguro é seu triunfo que até o excesso a
compromete.
44
Apesar do movimento pela centralização ter ganhado impulso na década de 1840, os
liberais mais radicais ou extremistas, ainda tentavam garantir seus interesses locais. A disputa
tendeu à radicalização configurando os conflitos armados de 1842 e 1848. Liberais e
Conservadores tinham bandeiras distintas. Segundo Emilia Viotti:
Os liberais eram federalistas, favoreciam a autonomia local, exigiam a
Abolição do Poder Moderador e do Conselho de Estado, opunham-se a
vitaliciedade do Senado e à intromissão do governo na economia, eram
favoráveis ao comércio livre, a liberdade de expressão e de culto. Defendiam o
principio de que o rei reina, mas não governa. Os conservadores defendiam a
posição oposta: centralização, o Poder Moderador, o Conselho de Estado, a
vitaliciedade do Senado, a religião católica como religião do Estado e o
principio do que o rei reina e governa.
45
Contudo, apesar de sinalizar com esses fatores de diferenciação, a autora afirma que os
dois grupos tendiam a se aproximar, já durante a Regência, em razão do medo provocado pelos
setores extremistas de ambos os lados. Entre 1852 e 1862, a Conciliação - política de
congraçamento entre os dois partidos- foi posta em pratica, contribuindo ainda mais para atenuar
eventuais diferenças. A autora, a partir daí não grandes diferenças ideológicas entre os dois
partidos.
A autora considerou que os liberais no Brasil foram incapazes de colocar em pratica o
ideário liberal, pelas próprias limitações impostas pelo sistema escravista. Segundo ela:
Os valores associados ao liberalismo: valorização do trabalho, poupança,
apego à formas representativas de governo, supremacia da lei e respeito às
Cortes de justiça, valorização do individuo e de sua autonomia, crença na
universalidade dos direitos do homem e do cidadão, todos esses dogmas típicos
do credo liberal tinham dificuldade de se afirmar numa sociedade escravista,
que despreza o trabalho manual, cultivava o ócio e a ostentação, favorecendo
laços de família, afirmava a dependência, promovia o individuo em razão dos
seus laços de parentesco e amizade em vez de seus méritos e talentos, (...).As
elites brasileiras não podiam ignorar que o liberalismo nada tinha a ver com a
realidade vivida por milhões de brasileiros.(...), no Brasil o liberalismo
continuava a funcionar como uma utopia, uma promessa a ser cumprida.
Apontava-se para a distância entre o país real e a teoria liberal, criticava-se
sua pratica, mas não suas premissas.
46
44
SOUZA, Otávio Tarquínio de. Evaristo da Veiga. Rio de Janeiro, 1957. P.  
45
Idem, p. 157.
46
Idem, p. 167.
25
Até agora tratamos das abordagens historiográficas referentes ao liberalismo, produzidas
ao longo da década de 1870. Como já foi dito, tais abordagens se ocupavam de grandes temas, os
recortes eram mais amplos, envolvendo rios assuntos. A década de 1980, trouxe novos
trabalhos. Estes se ocupavam de temáticas mais especificas, enriquecendo ainda mais as
discussões e os estudos sobre o liberalismo. Esse será o assunto do próximo tópico.
1.2 – As novas abordagens da historiografia.
Thomas Flory em “El juez de Paz y el jurado en el Brasil imperial: Control Social y
Estabilidad Politica en nuevo Estado” (1986), esta inserido no grupo de autores que buscou
matizar e tratar de forma mais especifica o liberalismo. Para ele, tal questão no Brasil passava não
pelo viés da descentralização político administrativa, mas acima de tudo pelo controle do
aparato judiciário, mais precisamente pela descentralização do aparato judiciário.
Sentindo-se incapazes de resistir, num primeiro momento,a D. Pedro I, os liberais
adotaram como estratégia, fortalecer as magistraturas locais. Em 1827 começava, segundo Flory,
a década liberal. Nesse momento, a vertente liberal defensora da limitação da ingerência do
publico sobre o privado começou a ganhar espaço, ainda que de maneira lenta e gradativa.
Flory defende a idéia de que realizando uma espécie de movimento pendular, a
descentralização judiciária - juntamente com o liberalismo - passou por modificações senveis,
tanto na praxis, como no campo teórico. Por exemplo, vários juizes apoiaram a descentralização e
o fortalecimento dos juizes de paz, bem como todo o aparato repressivo, por quererem aumentar
sua influência e manter um grau alto de autonomia frente ao Ministério da Justiça, bem como
frente ao próprio poder central. Porém (...) cuando, inevitablemente, algunas reformas
26
institucionales amenazaban em la teoria o em la prática atenuar la influencia de la elite de los
juristas profesionales ( los letrados), los magistrados cerraban sus filas em oposicíon al
movimiento de reforma liberal.”
47
A descentralização permitiu que as lideranças locais tivessem um peso maior no jogo
político.Por sua vez, os magistrados perderam parcelas de sua influência com esse movimento
Registrados abusos por parte das autoridades locais, vários setores que antes apoiavam as
reformas (dentre os quais a própria magistratura), começaram a esboçar um movimente de reação,
visando, sobretudo, centralizar novamente a burocracia, em especial, o judiciário.
Explicando melhor esse movimento Flory traçou a seguinte trajetória que se segue. Em
1827 os liberais começaram a gradativamente fortalecer uma figura remanescente da tradição
lusa: o juiz de paz. Para Flory, fortalecer esses juizes fazia parte do plano de fortalecer os
interesses locais.
48
Em 1832, já como reflexo da nova conjuntura política propiciada pela
Abdicação, a Câmara aprovou o Código de Processos, que se tornou um dos principais
instrumentos de descentralização.
49
Mas segundo Flory, o digo de Processos tinha uma outra finalidade além de fortalecer
as elites locais. Ele tinha um caráter profilático na medida em que:
Estas modificaciones dictadas por el código Procesal reflejaron las tensiones
politicas de la época en un grado aún mayor que la ley original del juez de paz.
Como consecuencia de la abdicaíon del emperador, los liberales brasileños
temieron un intento de restauración y una agitacíon interna de los partidarios
del gobierno de Portugal. Se esperaba que al fortalecer aún más el poder de las
autoridades locales podrian evitar-se consecuencias serias.
50
Para o autor, o Ato Adicional de 1834 foi reflexo de um árduo momento de luta entre os
liberais radicais e moderados e conservadores. Representou naquele momento uma espécie de
47
FLORY, Thomas. El juez de Paz y el jurado en el Brasil imperial: Control Social y Estabilidad Politica en
nuevo Estado. Mexico: Fundo de Cultura Economica, 1986, p. 35.
48
Op. cit., p. 57.
49
COSTA, Emilia Viotti da. Op. Cit, P. 153.
50
FLORY, Thomas. Op. cit, p. 107.
27
empate técnico” entre as facções. Carregava em si uma serie de contradições que se, num
primeiro momento, nos conduzem a julga-lo a maior conquista dos liberais, num outro nos fazem
ver essa conquista com mais reserva. Flory assinalou o seguinte:
Es posible interpretar celebre Decreto Adicional de 1834 como la primera
expresión institucional de este deseo liberal de volver a centralizar la
administración. La historiografia tradicional le asignado al Decreto
Adicional precisamente el papel opuesto; lo descrito com el máximo logro
do liberalismo brasileño, debido a sus concesiones a la autonomia provincial a
expensas de la autoridd central. Pero hecho, muchos de los poderes delegados
en las autoridades provinciales bajo el Decreto Adicional no se habián
otorgado nunca anteriormente al gobierno central. Fueron más prerrogativas
del gobierno local, y particularmente de los consejos municipales. Por eso los
defensores del gobierno local en Brasil tienen una perspectiva muy diferente.
Señalan que a pesar de sus pretensiones de descentralización, el Decreto
Adicional sacrificó la autonomía local y le dio el poder a las capitales
provinciales.
51
Assim, se é verdadeiro que as Assembléias Províncias obtiveram mais autonomia, isto se
deu principalmente em detrimento das municipalidades. Mesmo assim, a solução encaminhada
pelo Ato Adicional o foi capaz de aquietar o país. Muito pelo contrario, em varias proncias
houve revoltas contra o poder central, este teve de buscar maneiras de se fortalecer para fazer
frente ao desafio de manter a unidade da nação.
O pêndulo proposto por Thomas Flory oscilou em 1837. Mas desta vez pendeu para o
lado conservador.A partir de 1837, os liberais mais moderados se aglutinaram em definitivo sob
a bandeira conservadora. Os liberais reformistas se viram na necessidade de passarem à
defensiva. .
A década liberal (1827-1837) foi marcada pelo constante esforço dos liberais em
descentralizar a maquina estatal e o aparato judiciário
52
. Tal década terminou com a retomada do
projeto de um Estado centralizado, em que todas as forças políticas confluíam para a Corte. Ao
longo dessa década, os magistrados profissionais, com formação em Coimbra, lentamente
retiraram seu apoio ao projeto descentralizador e passaram a combater os jzes de paz. Isso
51
FLORY, Thomas. Op. cit, p. 244-245.
52
Idem, p. 13.
28
porque os magistrados em vários momentos sentiram-se ameaçados pelo crescimento da justiça
eletiva. Assim a (...) la decadencia de las instituciones liberales iría acompañada de un nuevo
ascenso de la magistratura profesional”.
53
Esse movimento pêndular foi acompanhado do
fortalecimento econômico e político dos cafeicultores cuja principal bandeira era a manutenção da
ordem e a defesa da escravidão.
54
As reformas conservadoras e a derrota da Revolução Liberal de 1842, segundo Flory,
levaram o país a um clima político de equilíbrio.
55
Os conservadores não puderam promover um
sistema político em que houvesse o monopartidarismo. Isso permitiu uma sobrevivência para o
Partido Liberal. Mas com as reformas de 1841 criou-se uma magistratura profissional e
dependente do poder central. Flory ressaltava o fato de a partir disso as posições dos juizes de
direito serem sempre ameaçadas, dependendo da posição partidária que eles tomassem, podendo
ser removidos de seus postos e levados a regiões longínquas.
56
Flory concluiu seu livro assinalando que os magistrados tiveram um importante papel na
vida política do país. Vários deputados eram ligados à magistratura profissionalmente. Desta
forma o exercio da justiça se tornou um meio pelo qual se pode deslumbrar uma faceta das
disputas entre as vertentes do liberalismo no Brasil
Outra autora que procurou lidar de modo mais específico com o liberalismo foi Izabel
Andrade Marson, em sua obra Império do Progresso: a revolução praieira em Pernambuco”
(1987), debruçou-se sobre o tema da revolução praieira, importante fato que, além de marcar a
vida política pernambucana durante a segunda metade do oitocentos, também serviu para dar
novos contornos às relações entre conservadores e liberais no plano nacional. A revolução praieira
foi o ultimo movimento de contestação pelas armas feito pelos liberais.
Não nos cabe aqui traçar pormenores dessa imensa obra nem dissecar os meios
metodológicos empreendidos pela autora. Queremos nos centrar naqueles itens que estão mais
53
Idem, p. 216.
54
Idem, p. 236-237.
55
Idem, p. 281.
56
Idem, p. 289-296.
29
próximos de nossa pesquisa. O próprio recorte temporal feito pela autora parece-nos bastante
significativo. Os anos de 1842 a 1855 foram decisivos para estabelecer a configuração política
predominante ao longo do Segundo Império. Foi nesse período que as instituições conservadoras
ganharam proeminência e hegemonia dentro da política e da própria burocracia imperial.
Isso nos parece muito claro, sobretudo a partir do 1849. Honório Hermeto Carneiro Leão,
grande chefe conservador, havia assumido a Presidência da proncia de Pernambuco, e o conflito
com os liberais da praia designação dada para o setor liberal em Pernambuco - , já havia entrado
na sua etapa final, restando ainda um ultimo foco de resistência, representado na pessoa de Pedro
Ivo. As dificuldades de impor uma derrota militar definitiva a esse líder pareciam intransponíveis
ou na melhor das hiteses muito custosas.
57
Honório recusou-se a negociar com os lideres
rebeldes, sobre isso Izabel Marson faz um comentário que traduz bem o espírito conservador que
lentamente tomava conta a praxis do Estado:
Por questão de ética política, Honório deixou de ouvir os conselhos(...),
querendo assim dar a entender que a nova configuração do Estado Imperial,
assentada sob a insígnia do progresso material e moral, não mais negociava
oficialmente com caudilhos incivilizados.(...).Fora-se o tempo em que um
Vicente Ferreira de Paula chegava a ser recebido no palácio da presidência em
Maceió, para impor suas condições perante as autoridades, como se deu em
1844 na guerra entre lisos e cabeludos. Contra a intransigência de matutos
rebeldes ( fosse um grande proprietário ou um sitiante mestiço como Ferreira
de Paula), o Estado passaria a responder com a autoridade e força necessária,
pois afinal o que a política mais avançada do seu tempo se propunha era
exatamente o domínio da ciência, pelos recursos técnicos, sobre os múltiplos
chefetes locais, fortalecendo o poder do Estado. Se Pedro Ivo possuía seus
trunfos, um dos quais o controle da mata, em contrapartida o Estado dispunha
de armas eficientes; além de remeter todo o material necessário...
(medicamentos, alimentação, instrumentos para luta na mata como foices e
facões), Honório forneceu também obuses e granadas. Agora era a vez de a
técnica, aplicada em armas de grande poder destrutivo, enfrentar o
conhecimento empírico do território.
58
(Grifo nosso)
Dessa maneira, o Estado Imperial assumiu uma nova postura frente aos desafios impostos
pelos poderes locais . Izabel Marson deixou isso bem claro ao afirmar: O Estado imperial que
emergiu da luta entre os partidos de Pernambuco não tolerava mais fazer grandes concessões
aos senhores locais, exatamente por disputar com eles o império político sobre o território e
57
Idem, P. 114-115.
58
Idem, p. 116-117.
30
sobre os cidadãos (...)”
59
. O gabinete conservador que havia sido formado logo após o fim do
qüinqüênio liberal se empenhou em utilizar de todos os meios para impor sua autoridade. Para os
conservadores, perder para os praieiros, significava antes de tudo abrir mão de sua hegemonia
política, além disso, os conservadores haviam passado um bom tempo no ostracismo político e
tiveram bastante tempo para repensar suas estratégias políticas. Se no inicio da década de 1840 o
discurso da ordem era essencial, em 1849 a ordem deveria vir acompanhada do progresso.
Tanto conservadores quanto liberais defendiam o progresso para o Império. Esse progresso
significava o aumento do investimento em obras de infra-estrutura dentro do pais, principalmente
no que se refere a construção de estradas que interligassem os centros produtores com as zonas de
distribuição no litoral ou nas capitais do interior. Existia uma busca por um ideal de civilização
inspirado claramente na Europa. Izabel Marson analisou esse discurso progressista nos
conservadores e liberais através da imprensa pernambucana, bem como ainda através dos
discursos dos deputados na Assembléia Legislativa Provincial de Pernambuco.
60
As tensões entre
os dois grupos se manifestavam na luta pela manutenção de seus redutos eleitorais e na
priorização de áreas de investimento estatal dentro da proncia.
A autora conclui que a “revoluçãoestava na pauta tanto do conservadores quanto dos
liberais, segunda ela:
Convertendo a revolução em instrumento político, os projetos praieiros e
gabirus se tocavam profundamente quanto a forma, fundamento e objetivos. A
revolução se assemelhava a um drama inscrito num processo mecânico do
progresso, a ser visto pelas elites proprietárias e seus representantes, no âmbito
do Senado, da Câmara e do Paço Imperial. O “povo”, indispensável na
composição da cena para fazer numero, é mero espectador, ou, no máximo
figurante.
61
Debelada a oposição liberal representada pelos praieiros, impunha-se a necessidade aos
conservadores de dar prosseguimento aos projetos de modernização” do Estado imperial e
consolidar o predomínio político conseguido, muito em função, das virias militares. A partir de
59
Idem, p. 118.
60
Idem, p. 290- 365.
61
Idem, p. 397.
31
1850 varias leis são aprovadas, tais como a Lei de Terras e a Lei Eusébio de Queiroz. A
conciliação feita em 1853 visava antes de tudo pacificar a cena potica no país, sem todavia,
perder de vista os ideais conservadores.
A imposição da nova ordem não se fazia sem oposição. Senhores locais muitas vezes
rejeitavam os projetos vindos do centro, existiam discordâncias entre as lideranças locais e as
nacionais do partido conservador. Ou seja, a execução daquilo que era tramado nos gabinetes da
Corte era mais difícil do que normalmente se supõe.
Outro autor que contribuiu para o avanço dos estudos mais específicos sobre o liberalismo
foi José Murilo de Carvalho na sua obra A construção da Ordem (1980)
62
. Ele se pros
analisar em profundidade o interior da elite política imperial. Tomando por base a tradição
lusitana, o autor recuperou os traços comuns herdados dessa tradição na formação do Estado
Brasileiro. Tendo em vista que uma parte significativa da elite política nacional teve sua formação
acadêmica em Portugal, mais precisamente em Coimbra, o autor viu nisso um importante aspecto
de união e de homogeneização dos aspectos ideológicos da elite dominante. Essa homogeneização
resultou em um sistema político voltado para a Monarquia, zeloso pela unidade, cioso da
centralização político-administrativa e contando com baixa representatividade e sentimento de
cidadania.
Por sua vez em Teatro das Sombras: a política Imperial (1988)
63
, José Murilo de
Carvalho mostrou as relações que envolviam o Governo Imperial e as elites regionais, tais
relações desdobrando-se em diferentes aspectos socioeconômicos e políticos como a questão das
terras, as eleições e a concessão de títulos nobiliárquicos, exigiram a montagem de um aparato
institucional que pudesse conferir legitimidade ao funcionamento do Estado.
Torna-se fundamental salientar na analise de Jose Murilo de Carvalho que o governo
apesar de ser dotado de poderes excepcionais conferidos pela Constituição, tinha sua força muito
limitada em função do orçamento. Os problemas inerentes às disputas em torno da peça
62
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. A elite política imperial. Rio de Janeiro: 1980
63
CARVALHO, José Murilo de. Teatro das Sombras: A política Imperial. São Paulo: Vértice/IUPERJ, 1988.
32
orçamentária, segundo o autor, demonstravam o “(...) o conflito interno de uma elite política que
hesitava entre as necessidades do governo, que ela dirigia, e os interesses dos proprietários que
ela devia representar”
64
.
Longe de ser uma peça de ficção, o orçamento imperial era o meio pelo qual o Estado
ampliava sua esfera de influência, aumentava a dependência das Proncias e, acima de tudo,
tentava disciplinar os interesses das elites locais. Bastante significativo é o fato do grosso da
arrecadação do governo central vir do imposto sobre exportação, ficando num lugar secundário
os impostos vindos do mercado interno. Isso tornava o governo muito dependente do capital
internacional.
65
Quanto à idéia de que as elites políticas buscavam uma imitação pura e simples dos
modelos externos, sobretudo o inglês, José Murilo se contrapõe com o seguinte argumento:
O debate a respeito dos direitos de importação não foi menos intenso (...). A
partir da metade do século, houve uma tendência a seguir o modelo inglês de
implantar o livre comercio(...). Os debates do Conselho de Estado giravam
principalmente em torno da aplicabilidade da teoria liberal no Brasil (...).
Predominou, no entanto, o realismo político e a lucidez. Percebeu-se que o que
era bom para a Inglaterra não era bom para o Brasil. Poucos conselheiros
acreditavam nos benefícios do livre comercio e as propostas de redução dos
direitos de importação eram sempre adiadas.
66
Desta forma o autor coloca-se entre aqueles que acreditam que longe do mimetismo puro
e simples, havia uma esfera de autonomia das elites locais no que tange a apropriação das idéias
vindas de fora.
A luta pela abolição foi outro ponto em que a Coroa teve de atuar fortemente no sentido de
limitar a influência local sobre os interesses do Estado. As pressões inglesas para o fim do trafico
e a conseqüente queda da Escravidão já se faziam sentir desde 1810, quando foram assinados os
primeiros tratados com Portugal dando um caráter de ilegalidade os trafico e aumentando a
capacidade de intervenção da Marinha Britânica. Por ocasião da Independência a Inglaterra
aproveitou da situação para forçar o Governo brasileiro a considerar a pirataria como
64
Idem, p. 23.
65
Idem p. 33
66
Idem, p. 29-30.
33
crime.
67
Além disso, a constante necessidade de empréstimos junto a banqueiros ingleses, deixava
o Governo Imperial numa situação dicil, já que romper com a Inglaterra significava perder uma
de suas principais fontes de financiamento.
De qualquer forma, independente das pressões inglesas,o governo imperial, mas
precisamente a Coroa, se colocou de forma veemente contra a Escravidão. Essa nova disposição
da Coroa é manifesta a partir de 1866, sendo que no “(...) inicio de 1866, Pimenta Bueno, um dos
mais próximos conselheiros de D. Pedro II, tinha prontos, por encomenda imperial, cinco
projetos abolicionistas que logo foram entregues ao presidente do Conselho (...)”
68
Essa nova
disposição da Coroa icoloca-la em caminho diametralmente oposto ao da maior parte da elite
da nação. Mesmo auxiliares muito próximos ao Imperador não se furtaram a criticar-lhe a
iniciativa.
69
A votação e a aprovação da Lei do Ventre Livre revelou um forte discenso dentro do
núcleo de poder do Pais. Novamente José Murilo relata:
Distinguiam-se assim os atores e os parâmetros decisórios de 1871 dos de 1850.
(...); Em 1871 o jogo foi todo interno: não havia pressão sica externa e não
havia mais traficantes. A iniciativa foi sem duvida da Coroa, secundada pelo
gabinete conservador e apoiada na imprensa abolicionista e parte do Partido
Liberal. (...); A Oposição em 1871 ficou com os proprietários das províncias do
sul, permanecendo os demais em posição de relativa indiferença.(...); Assim é
que 70% dos deputados das três maiores províncias cafeicultoras votaram
contra a lei (...).
70
Se no campo da Abolição a Coroa logrou êxito, no que tange a distribuição de terras no
Império os “Barões” tiveram força suficiente para obstruir qualquer modificação mais
significativa na estrutura fundiária do país.
A Lei das Terras, na realidade, mostrou a incapacidade do governo central em
aprovar ou implementar medidas contrarias aos interesses dos proprietários na
67
Idem, p. 50
68
Idem, p. 61.
69
Idem, p.62.
70
Idem, p. 70-71.
34
ausência de pressões extraordinárias, como sejam a ameaça externa ou a
pressão do Poder Moderador.
71
Ficou muito claro para o autor que a aprovação de determinadas leis, ficavam restritas aos
interesses dos cafeicultores fluminenses, principais produtores de café do país. Se a Coroa
conseguiu varias vitórias em um campo onde eles eram radicalmente contrários, a saber, a questão
da Abolição, foi porque o prestigio do próprio Imperador atuou como o fiel da balança. Esse
empenho da Coroa custou-lhe, a longo prazo, a própria Monarquia. O Poder Moderador
encontrava seus limites dentro dos interesses dos cafeicultores. O preço a se pagar nas vitórias
obtidas sobre a sua base de sustentação custou a Coroa um preço altíssimo. No que tange a Lei de
Terras a Coroa adota uma postura mais conservadora, deixando para o próprio Parlamento
(controlado em sua maioria pelos interesses dos grandes proprietários) a decisão e o
encaminhamento da questão.
Outro autor fundamental, Ilmar Rolhoff de Mattos em seu livro O Tempo Saquarema”
(1987),tratou da trajetória de ascensão do partido Conservador, e, por conseguinte, de sua
hegemonia na política imperial brasileira durante o Segundo Reinado.Com isto apresentou os
matizes que os liberais tinham sobre a sociedade.
Ilmar Mattos começa por demonstrar as grandes mudanças que o Brasil experimentou a
partir de sua independência. A ruptura com a metpole possibilitou toda uma efervescência de
idéias que tomaram conta da sociedade brasileira daquele período, idéias muitas vezes inspiradas
em modelos estrangeiros. Havia um consenso em determinados setores da elite que era
necessário manter a ordem, pois entendia-se ser esta necessária para se manter a dominação e
claro, o sistema escravista.
Ressalta-se de que forma o autor analisou as posturas em face da escravidão: existiam
aqueles homens que se autodenominavam boa sociedade”, e estes sentiam-se feridos em sua
honra pela constante pressão inglesa pelo fim do tráfico negreiro intercontinental; essa pressão se
71
Idem, p. 102.
35
fazia sentir a todo momento pela diplomacia inglesa ou mesmo pela força, representada pelas
constantes invasões da Marinha de Guerra britânica nas águas do Império.
72
É nesse ambiente tumultuado que a cidade do Rio de Janeiro vai se destacar como centro
político e econômico do País. A Corte catalisa as forças políticas da nação e lhe da uma direção
clara. Tudo isso foi possível pela ação da Coroa. Essa no Primeiro Reinado se viu em uma
situação de grande descrédito frente ao restante do país; principalmente em função da perda da
Cisplatina e da própria inabilidade de D. Pedro I em manobrar e negociar com os mais amplos
setores políticos. Essa incapacidade tornou-se um divórcio, que culminou com a Abdicação em
1831. Após o conturbado período das Regências em que a unidade do Império foi posta em risco,
surge a opção pela antecipação da maioridade do Imperador. A partir disso toda cena política do
país ganha novos contornos.
Mas o que vem a ser a denominação “Saquaremas”? Trata-se de um núcleo de políticos
apoiados na cafeicultura da província fluminense que tinham como principais bandeiras a Ordem
e a Civilização.
73
Mas que Ordem é essa? É a ordem necessária para manutenção da Escravidão,
para a regulação e disciplina da violência dentro do país, para a centralização do monopólio da
violência e em ultima instância a completa preponderância do Estado sobre o “Governo da
Casa”.
74
Esse esforço por parte dos Saquaremas pode ser melhor entendido a partir de uma
passagem citada por Ilmar Mattos quando os Conservadores haviam acabado de debelar a
Revolução Liberal de 1842:
No calor dos acontecimentos, parecia como imprescindível punir com
severidade os responsáveis por “uma rebelião aberta e devastadora” nas
palavras do ministro da Justiça, Paulino José Soares de Sousa, e que
pretendera que a Vontade Nacional, legitimamente representada se curvasse
diante do capricho de representantes de interesses meramente provinciais,
exorbitando se suas atribuições”. Contra a pretensão dos luzias, a força
vencedora defendia a necessidade de “armar o poder com os meios
indispensáveis para emancipar-se da tutela das facções”, propugnando, assim,
uma distribuição desigual do aparelho do Estado pelo espaço territorial do
Império.
75
72
MATTOS, Ilmar Rohloff. O Tempo Saquarema. São Paulo: Editora Hucitec, 1987. P. 1
73
Idem, p. 5.
74
Idem, p. 103 a 192.
75
Idem, p. 106
36
A Civilização que os Saquaremas sonhavam era inspirada claramente no modelo europeu.
Na crença inabalável do principio de hierarquia. A idéia era tornar o Brasil o mais parecido
possível com a Europa. Isso tudo claro, tendo como modelo econômico o Agrarismo.Havia uma
clara intenção em ser um Império fundamentado nas idéias liberais. Mas que tipo de vertente do
liberalismo? Tentou-se adaptar alguns princípios básicos do liberalismo com a realidade da
escravidão, estabelecendo um “duplo movimento”: um que visava a construção e fortalecimento
do Estado Imperial e outro a construção da classe senhorial.
76
Além dessas características, as elites
imperiais limitaram a participação política de vários setores da sociedade. Nosso liberalismo não
pressupunha cidadania plena para todos que se sentissem brasileiros ou que de alguma maneira
contribuíssem para o desenvolvimento material e moral da nação.
É dentro desta perspectiva que devemos enxergar o descontentamento dos liberais
moderados (futuros Conservadores) frente ao Ato Adicional.Como as reformas culminadas no Ato
Adicional não satisfizeram plenamente os interesses dos autonomistas mais radicais e nem aos
centralizadores, os conflitos dentro da sociedade passaram por uma fase de extrema
radicalização.Toda impaciência e discordância dos liberais do centro sul acabou por redundar na
Revolução Liberal de 1842. O desenvolvimento dessa revolta será trato no segundo capitulo deste
trabalho. Importa no momento frizarmos que a derrota dos Liberais nesse movimento deu aos
Conservadores a oportunidade perfeita para levarem adiante sua política centralizadora e
impregnarem boa parte da sociedade com seus valores; de forma que para os Liberais essa derrota
o significou apenas um revês temporário, mas sim a total negação para esse grupo de estabelecer
a pauta política para nação. É nesse sentido que devemos entender a hegemonia Conservadora
sobre os Liberais. Desta forma, Ilmar Mattos afirma:
Os saquaremas não se limitaram a impor aos luzias uma derrota no campo de
batalha. Empenharam-se por reduzir as pretensões de uma “revolução” à
condição de rebeliões”, reclamaram maiores poderes para o Governo, e mais
do que tudo, buscaram imprimir uma direção ao predomínio que exerciam no
Mundo do Governo desde então.
77
76
Idem, p.114.
77
Idem, p.129.
37
Empenhados na consolidação morquica”
78
os Conservadoras defendem sua própria
noção de Liberdade e Propriedade. Defendiam a parcial sujeição do “Governo da Casa” frente ao
Estado”. Ilmar Mattos entende como “Casa” os interesses privadosem si, enquanto
Estado”pressupunham o estabelecimento de mediações que se impusessem do mundo privado, na
configuração de uma área publica, apresentada como do interesse do bem-estar coletivo. Dessa
Forma garantia-se a perpetuidade dos interesses da classe senhorial como um todo, que o se
limitavam apenas à esfera Provincial.
79
A ação saquarema se fazia sentir em amplos setores da sociedade. Na questão do tráfico
negreiro sua unidade e força foram decisivas:
Ora, na ação desenvolvida pelos Saquaremas, a busca de uma restauração nos
quadros de uma defensividade ganhou, quase sempre , a formulação da
garantia da Soberania Nacional. Sem embargo, os Saquaremas não apenas
impuseram a questão da soberania nacional e sobrepuseram a questão da
escravidão à questão nativista. No momento de Consolidação do Estado
Imperial, eles articularam a Soberania Nacional à questão da escravidão e, por
meio da Coroa, levaram a cabo políticas especificas, estreitamente articuladas
entre si, caracterizando a direção e a dominação que exerciam.
80
Assim, Ilmar Mattos acredita que os Saquaremas não apenas almejavam o poder pelo
poder, mas antes de tudo sua ação era norteada por princípios que visavam acima de tudo garantir
as bases para a manutenção da boa sociedade”. Ele conclui seu livro da seguinte maneira:
“Para os saquaremas a manutenção da Ordem e a difusão de uma
Civilização apareciam como objetivos fundamentais; eram também os meios
pelos quais empreendiam a construção de um Estado e a construção de uma
classe. Por sua vez, e de modo necessariamente complementar, a construção do
Estado imperial e a constituição de uma classe senhorial, enquanto processos
intimamente relacionados, tornavam-se não apenas resultados de uma intenção
traduzida em ação, mas também os requisitos que asseguravam a Ordem e
difundiam a Civilização.”
81
78
Idem, p.126.
79
Idem, 132.135.
80
Idem, p. 221.
81
Idem, p. 281.
38
1.3 – Um liberalismo brasileiro?
As a apresentação dessa discursão, devemos estabelecer algumas observações. Fazemos
coro a todos os autores que colocam o escravismo como um entrave à completa execução do
liberalismo no Brasil,principalmente no que se refere aos seus aspectos mais democráticos e
participativos. Por outro lado também concordamos com a afirmação de que o liberalismo nas
condições socioeconômicas brasileiras sofreu adaptações que longe de tornarem-no simplesmente
mimetista, ressaltaram a capacidade das elites nacionais de se praticarem varias leituras das mais
diversas ideologias européias, retendo delas aquilo que lhes parecia mais necessário. A próprio
defesa da escravidão, segundo Maria Silvia de Carvalho Franco, não estava em discordância com
o liberalismo, antes pelo contrário, estava plenamente amparada em autores com John Locke.
82
Não podemos concordar com Emilia Viotti no que tange a visão de que os liberais e
conservadores tornaram-se praticamente iguais durante a Conciliação, acreditamos que pelo
contrario, a Conciliação, mesmo sendo bem sucedida no que tange ao enfraquecimento das lutas
interpartidárias, não conseguiu acabar ou eliminar com as diferenciações internas dos partidos
imperiais. Também discordamos de Paula Beiguelman no que se refere ao julgamento de que os
partidos imperiais seriam simples partidos de patronagem, e que a disputa entre eles se limitaria
apenas a obter os favores da Coroa, o existindo maiores diferenciações ideológicas.
Inclinamo-nos a compartilhar o pensamento de Ilmar R. Mattos, quando ele afirma que os
partidos imperiais travaram uma luta pela hegemonia política. Mesmo os dois partidos tendo
matizes liberais semelhantes, a praxis dos dois é completamente diversa. Enquanto os
Conservadores defendem uma expansão cada vez maior do poder do Estado e o monopólio da
violência por esse mesmo Estado, os Liberais estavam mais associados aos interesses localistas,
empenhando-se na defesa da autonomia local, no enfraquecimento da centralização, enfim
construir um Estado em que não se estabelecesse nem o monopólio da violência , nem fiscal, um
estado em que poder Central fosse submisso aos interesses locais.
82
LOCKE, John. Segundo Tratado Sobre o Governo. São Paulo: Ed. Martins Claret, 2004. P. 35-50.
39
José Murilo de Carvalho contribui de forma significativa para a observação de nossa
temática,mostrando como a luta pelo poder é intensa e mesmo a Coroa, apesar de todo o seu
capital simbólico e poder de patronagem, se via tolhida em temas fundamentais. A Coroa travou
rios embates com sua base agrária de apoio,evidenciando-se essa disputa entre os interesses
privados e a construção do Estado.
Flory também fornece importantes contribuições ao sugerir que o liberalismo imperial
segue uma lógica pendular, tendo momentos de aprofundamento, sobretudo quando se delegou
aos juizes de paz uma ampla gama de poderes; e momentos de refluxo, quando a autoridade dos
jzes de paz começou a enfraquecer o próprio ideal de ordem estabelecido por setores da elite
agrária, que temiam que um poder central excessivamente fraco não pudesse fazer valer os
interesses da.
Izabel Marson ao tratar da Revolução Praieira descortinou não a política provincial
pernambucana, mais também mostrou o quão intricada era a rede de interesses que compunha
elite imperial e a sua imposição ao interesses provinciais.
Entendemos então, que quando pensamos em liberalismo brasileiro, não devemos imaginar
uma doutrina social distante e inacesvel à realidade brasileira. A escravidão não foi dentro da
sociedade brasileira um impedimento para que determinadas matizes do Liberalismo se
solidificassem o que nos permite pensar nos elementos de uma cultura política para o oitocentos
brasileiro.
Percebe-se assim, como destacou Lucia Paschoal Guimarães, que as idéias liberais não
tinham um significado único.Suas possibilidades de uso eram bastante amplas como a autora
mostra ao dizer:
A linguagem liberal do ideário liberal, no entanto, é bastante abstrata. Seus
enunciados não esclarecem quem é nação, ou quem são os cidadãos. Tampouco,
explicitam a quem compete elaborar leis. Ou, ainda, quem pode em quem não
40
pode participar do sistema representativo nessa proposta de reordenação da
sociedade.
83
Certamente que a escravidão criou mecanismos perversos de distião social e de status
de raça, que infelizmente até hoje estão presentes no cotidiano brasileiro. Se o liberalismo
aplicado aqui não produziu um sistema de cidadania dentro dos amplos seguimentos que
comem nossa sociedade, a razão não decorre, como alguns haviam sugerido, no mimetismo
dos intelectuais do século XIX em relação à Europa, mas nas contradições de uma sociedade que
primou pelos privilégios aristocráticos de classe, em detrimento da meritocracia.
83
GUIMARÃES, Lucia Paschoal. Liberalismo moderado: Postulados ideológicos e praticas políticas no período
regencial (1831-1837), In: PRADO, Maria Emilia et ali.O Liberalismo Imperial: origens, conceitos e pratica.Rio
de Janeiro, Ed. Revan: UERJ, 2001. P.103-104.
41
Capítulo 2
A Província dos “Mares de Morros”
Neste capítulo será exposta de maneira mais pormenorizada a situação da Proncia de
Minas Gerais durante o período 1844-1853, nos seus aspectos econômicos e políticos.
Tradicionalmente, grande parte da produção historiográfica sobre Minas Gerais no século XIX
esteve voltada para temas pertinentes à História Econômica.
84
Por sua vez, os trabalhos
publicados durante as décadas de 1980 e 1990 também se ocuparam predominantemente em
detalhar as atividades primárias da região.
A maioria dos estudos desse período refutou a tese de que a economia regional fosse
estagnada, carente de mercados interno e externo. Descobriu-se que Minas Gerais, após o ciclo de
extração aurífera, não se tornou uma proncia inerte, mas dinamizou as atividades ligadas ao
mercado interno, sobretudo culturas agrícolas, bovinos, porcos e derivados. Além disso, na
Região da Zona da Mata desenvolveu-se uma forte cultura cafeeira a partir da segunda metade do
século XIX.
85
Portanto, no tocante aos aspectos econômicos, a historiografia mineira sofreu uma
enorme revisão.
86
Um dado importante reside na geografia da região, pois Minas Gerais apresenta topografia
peculiar em sua paisagem: formas de relevo conhecidas como meias-laranjas ou mares de morros.
Essas denominações se devem à erosão das serras que comem o território mineiro (Serra do
Mar, Mantiqueira, Geral e Espinhaço), provocada principalmente pelas chuvas, que
decompuseram os terrenos cristalinos onde predominam principalmente os granitos e gnaisses. Ao
84
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. A elite política imperial. Rio de Janeiro: 1980. P. 200.
85
FRAGOSO, João Luis. Economia Brasileira, no Século XIX: Mais do que uma Plantation Escravista-
Exportadora. IN: LINHARES, Maria Yedda (org.) História Geral do Brasil. Rio de Janeiro, Ed. Campos. 1990.
P. 144-146.
86
A esse respeito ver os Trabalhos de LENHARO, Alcir. As tropas da Moderação, São Paulo, Ed. Símbolo, 1979,
MARTINS, Roberto B. A economia escravista de Minas Gerais no culo XIX, Belo Horizonte. CEDEPLAR,
1980, LIBBY, Douglas Cole. Transformação e trabalho em uma economia escravista, São Paulo, Ed.
Brasiliense, 1988,FRAGOSO, Jo Luis.
Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça
mercantil do Rio de Janeiro. 1790/1830. Rio de Janeiro. Arquivo Nacional, 1992, PIRES, Anderson J. Capital
Agrário, investimento e crise na cafeicultura de Juiz de Fora 1870/1930. Niterói: Dissertação de Mestrado,
Universidade Federal Fluminense, 1993, LIMA, João Heraldo. Café e Industria em Minas Gerais 1870/1920.
Petrópolis: Vozes, 1981.
42
sofrer o desgaste, os acidentes geográficos adquiriram o aspecto de morros com vertentes
arredondadas, ou meias-laranjas. Originariamente, a região era coberta pela Mata Atlântica, hoje
quase extinta. Foi nas encostas dos mares de morros que a cafeicultura mineira se desenvolveu a
alcançou seu apogeu na segunda metade do século XIX.
87
2.1 – A dinâmica da economia mineira em meados do século XIX
Minas Gerais, mesmo em crise econômica por conta do declínio da atividade aurífera, não
adentrou o século XIX estagnada. O ouro já não era abundante como no século XVIII, mas foi na
diversificação de suas atividades que a economia regional conseguiu alento. A atividade de
extração de ouro e diamantes passou a conviver com a produção voltada para o mercado interno
alimentos, bovinos, porcos e derivados. Na Região da Zona da Mata desenvolveu-se uma forte
cultura cafeeira a partir da segunda metade do século XIX.
88
Mesmo viajantes estrangeiros, ao passarem por Minas Gerais, ainda à época de
independência constataram a diversidade econômica da proncia. Dentre eles cabe citar Auguste
de Saint-Hilaire, de quem se seguem algumas notas:
Hoje, 23 de abril comecei a notar, tanto à beira da estrada como a alguma
distância, casas um pouco mais bem tratados de que as vendas, e habitadas por
agricultores abastados. Desde ontem comecei a ver plantações de café, hoje
mais numerosas. Devem aumentar mais ainda à medida que fora me
aproximando do Rio de Janeiro. Esta alternativa de cafezais e atas virgens,
roças de milho, capoeiras, vales e montanhas, esses ranchos, essas vendas,
essas pequenas habitações rodeadas das choças dos negros e as caravanas que
vão e vêm, dão aos aspectos da região grande variedade.
89
Conforme observou Mônica Ribeiro de Oliveira,
90
a paisagem mineira, no século XIX, era
dominada pelas fazendas, que ocupavam 96% do território e absorviam 79% dos escravos da
proncia. Essas propriedades surgiram na medida em que o ouro escasseou e o povoamento
passou abarcar as áreas ainda não ocupadas, mantendo estreita ligação com o seu principal
87
VESENTINI, José Willian. Geografia: Série Brasil. São Paulo, Ed. Atica: 2003. P.269.
88
FRAGOSO, João Luis. Op. Cit. p. 144-146.
89
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Segunda Viagem do Rio de Janeiro a Minas Gerais e a São Paulo. 1822, p. 100.
90
OLIVEIRA, nica Ribeiro de. Juiz de Fora vivendo a História. Juiz de Fora: Núcleo de História Regional da
UFJF, ed. da UFJF, 1994. P. 56.
43
mercado consumidor: o Rio de Janeiro.
91
Elas abasteciam as províncias vizinhas do Rio de Janeiro
e de São Paulo com sua produção excedente de queijos, porcos, toucinho e têxteis. As principais
cidades de Minas Gerais eram Ouro Preto, Barbacena, São João Del Rei, Diamantina e, na
metade do século XIX, Juiz de Fora.
92
Essa economia mais dinâmica permitiu a ampliação da participação política de Minas
Gerais potica no cenário que emergiu com a vinda da Família Real portuguesa ao Brasil.
Segundo observou Alcir Lenharo:
Enquanto se estreitavam os laços mercantis de interdependência entre a
Capital e as regiões produtoras do Centro-Sul, correspondentemente ganhavam
maior destaque os políticos do interior, muitos dos quais envolvidos nas tarefas
de comercialização dos produtos originários de suas próprias propriedades. O
centro das exportações mineiras tinha sede na praça comercial de São João Del
Rey, que juntamente com Barbacena, constituíam os dois pólos de comercio
atacadista, servindo de verdadeiros entrepostos regionais. Situados na entrada
das Gerais, centralizavam o fluxo das mercadorias de diferentes regiões, até
mesmo de Goiás e Mato Grosso. São João Del Rey drenava a maior parte das
exportações de subsistência mineira, ao passo que Barbacena concentrava
principalmente exportações de algodão.
93
A região sul de Minas Gerais, ainda no icio do século XIX, voltava-se
predominantemente para o comércio com a Corte. Essa opção surgiu como mecanismo
espontâneo de sobrevivência à crise da mineração. Pesou ainda o fato de que para a região a
melhor maneira de superar a recessão econômica consistia em redirecionar sua produção
comercial, que sempre foi grande devido à necessidade de abastecimento interno da proncia. Em
ntese, a crise da mineração liberou excedentes para o comércio com o Rio de Janeiro. E por que
o Rio de Janeiro? Porque a Corte, principalmente após a vinda Família Real portuguesa, elevou
cada vez mais sua demanda por abastecimento de todo gênero. Assim, o sul de Minas se
credenciava, pela sua proximidade, a preencher esse espaço. Isso no futuro contribuiu para o
surgimento de uma rica classe de negociantes, fortemente articulados com a política da Corte.
91
LENHARO, Alcir. As tropas da Moderação, São Paulo: Ed. Símbolo, 1979, p 84.
92
OLIVEIRA, Mônica Ribeiro. Op. Cit. p. 57.
93
LENHARO, Alcir.Op. Cit, p. 89-90.
44
Muitos dos Moderados, de vertentes liberais, que participaram da política nacional na época das
Regências, eram oriundos do centro-sul de Minas Gerais.
94
Em busca de um novo grande produto para exportação, Minas Gerais se dedicou em
determinado momento à produção de chá. Esse fenômeno não passou despercebido a Leda Maria
de Oliveira, que em suas pesquisas se deparou com o fato de que
(...) A insistência sobre a produção do chá esteve presente nos documentos em
que as autoridades provinciais registraram a situação de Minas Gerais.
Queixavam-se essas autoridades da indiferença dos fazendeiros que não
percebiam a importância do produto
95
Outro dado relevante destacado pela autora foi a importância atribuída à abertura de
estradas, sempre presente nas preocupações oficiais.
96
Esse empenho se justificava por vários
motivos, mas sobretudo em razão da precariedade das vias de acesso, de questões topográficas e
do imperativo de exportar a produção da Proncia para o Rio de Janeiro. Como será visto no
próximo capitulo, havia enorme preocupação por parte das autoridades provinciais no tocante ao
aprimoramento dos transportes e comunicações.
A introdução da cafeicultura em Minas Gerais ocorreu no icio do século XIX.
Localizou-se, inicialmente, na Zona da Mata, oriunda da região fluminense. Da Zona da Mata se
difundiu rapidamente, transformando-se na principal atividade da proncia e agente indutor do
povoamento e desenvolvimento da infra-estrutura de transportes. A introdução do café em Minas
Gerais foi de fundamental importância para o crescimento econômico regional. Segundo Quiossa:
O desenvolvimento da cafeicultura não será o responsável pelo povoamento
e ocupação da Zona da Mata mineira, como dela dependerá a reorganização da
economia de Minas Gerais através das Exportações e ampliamento de mercado
interno. O café vai sustentar e expandir o aparato estatal mineiro.
97
Nesse contexto, cumpre observar a participação da Zona da Mata na Produção da
Proncia. A tabela abaixo fornece esses dados:
94
Idem, p. 104.
95
OLIVERIA, Leda Maria de.Op. Cit. p. 22.
96
Idem, p.29.
97
QUIOSSA, Paulo Sérgio. Economia Cafeeira e Efeitos Encadeadores: A expansão da Malha Viária na Zona
da Mata (1856-1875). Monografia de Bacharelado, UFJF. Juiz de Fora, 1995. pág. 28.
45
Participação Proporcional da Produção Cafeeira da Zona da Mata Na produção da
Província de Minas Gerais 1847 - 1904
Período Minas Gerais Zona da Mata %
1847/48 745.381 743.707 99,77
1850/51 900.264 898.184 99,76
1886 5.776.866 4.316.067 74,71
1888 5.047.600 4.433.800 87,83
1903/1904 9.404.136 5.993.425 63,73
FONTE: QUIOSSA, Paulo Sérgio. Op. Cit. P. 32
Os dados relativos à produção da Zona da Mata, examinados em períodos diferentes,
demonstram que dos anos 1840 até meados de 1850, essa foi a principal região cafeeira da
proncia. Mesmo nos decênios subseqüentes, essa liderança continuou, ainda que seus números
tenham se tornado modestos.
Além do crescimento econômico, a proncia, em especial a região supracitada, sofreu um
incremento populacional considerável. A cafeicultura também serviu para acentuar-lhe outra
característica: a grande quantidade de escravos.
98
Emilia Viotti da Costa demonstrou isso ao
constatar:
E
m 1853, Ubá contava com 8446 escravos. Pomba com 5 521 e Mar de
Espanha com 9.146 (...) O desenvolvimento das lavouras cafeeiras determinou
uma redistribuição demográfica. Enquanto os municípios de tradicional área de
mineração se despovoam, o inverso sucedia nas zonas cafeeiras.
99
Desse modo, a escravidão era fundamental. Segundo o autor acima, a província detinha
uma quantidade substancial de cativos, enquanto no Nordeste brasileiro a escravidão já dava
claros sinais de esgotamento após a abolição o tráfico em 1850. Como se verá no próximo
98
Idem, p.25.
99
COSTA, Emilia Viotti. Da Senzala à Colônia. ed. São Paulo, ed. Brasiliense, 1997. P. 68
46
capítulo, algumas autoridades locais afirmavam ser Minas Gerais a proncia mais populosa do
Império e que a maior parte de seus habitantes eram livres. Deve-se problematizar, porém, essa
assertiva. Pesquisas recentes demonstraram que o número de escravos na Proncia era muito
grande e possivelmente excedia a população livre.
A razão para tal fenômeno residia na dificuldade em encontrar homens livres dispostos a
trabalhar. Esse desinteresse devia-se ao fato de que em Minas, bem como no restante do Império,
era possível sobreviver sem se tornar um empregado. As famílias podiam se apossar de um
pedaço de terras devolutas e cultivá-lo, extraindo daí o necessário para a subsistência, sem
adquirir trabalho regular.
100
Minas Gerais passou por um surto manufatureiro que diversificou ainda mais a economia
da região e contribuiu significativamente para sua modernização. No século XIX, desenvolveu-se
a indústria têxtil, cujos pioneiros foram os ingleses Pigot e Cumberland, fundadores da fábrica de
tecidos Cana do Reino em 1848, no munipio de Conceição do Serro –, fechada logo depois em
razão de sua existência irregular.
Na região central da proncia, a Mina de Ouro de Morro Velho, pertencente a um grupo
britânico, abrigava a mais importante empresa de mineração, recordista que era em número de
empregados. A Morro Velho (St. John Del Rey Mining Company), fundada no icio de 1850, foi
um dos mais rentáveis empreendimentos ingleses no Brasil, gerando mais da metade da produção
aurífera durante o século XIX.
101
Em ntese, pode-se afirmar que Minas Gerais adentrou o século XIX à procura de uma
nova orientação para sua economia. As frustradas tentativas com outros produtos, como o
100
Sobre o assunto ver: FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. Homens livres na ordem escravocrata. São Paulo:
Ática, 1974.
101
A empresa utilizou-se com grande êxito da mão de obra escrava, sendo que o trabalho livre somente superou o
cativo em 1880. Os ingleses investiram grandes capitais em todo o Brasil, a respeito da influência financeira e política
da Inglaterra no Brasil ver: GRAHAM, Richard. Grã-Bretanha e o início da Modernização do Brasil - 1850 /
1914. Brasiliense, São Paulo: 1973
47
chá, encontrou acolhida na atividade cafeeira e, por breves momentos, na indústria em sentido
mais amplo. A referida cultura se tornou a alavanca da economia mineira, estreitando suas
ligações comerciais com a capital do Império e articulando-a com o restante das grandes zonas
produtoras do Brasil.
2.2 – A gênese das disputas políticas em Minas Gerais
A Província sempre manifestou intensa participação na vida política nacional. No processo
de independência já se observara forte presença mineira nas articulações que levaram o Brasil a
desligar-se de Portugal. Durante a Regência e no Segundo Reinado, além de possuir numerosos
deputados eleitos para a Assembléia Geral, Minas Gerais tamm contava com vários Senadores e
Conselheiros para fazer valer seus interesses junto à Corte. Patrícia F. Genos, estudando a
proncia, mais precisamente a Zona da Mata, chegou a conclusões interessantes sobre as
manifestações simbólicas de poder que lhe eram peculiares. Constata-se em seu trabalho a elevada
concentração da nobiliarquia na região, fruto do grande número de proprietários de terra ligados à
cafeicultura ali residentes. Daí a autora sugerir que aos olhos de D. Pedro II, Minas Gerais tinha
era de importância fundamental, donde a constante necessidade de cooptar as elites locais através
de títulos nobiliárquicos.
102
Para compreender a vida política de Minas Gerais ao longo da década de 1840, faz-se
necessário retomar as discussões presentes na política nacional desde as Regências, pois nestas
está a gênese dos partidos Conservador e Liberal.
Como se sabe, ao final do Primeiro Reinado o Brasil foi sacudido por uma série de
revoltas e insurreições separatistas que ameaçavam a ordem e a integridade do Império. Além
disso, os Regentes viam-se tolhidos diante de um Parlamento que reclamava para si toda a
autoridade. Vários movimentos pediam reformas, principalmente a descentralização. Em outro
102
GENOVEZ, Patcia Falco. As Malhas do Poder: uma análise da elite de Juiz de Fora na segunda metade do
século XIX. Niterói, Dissertação de Mestrado, UFF, 1996.
48
extremo, setores da sociedade argumentaram que a solução federativa e republicana poderia levar
o Império à mesma situação de caos vivida pela América Espanhola. A opção intermediária que se
apresentava consistia em atenuar alguns mecanismos de controle do poder central e reformar a
Constituição de 1824, concedendo às Proncias mais autonomia.
103
Entretanto, se a tese de uma Monarquia Federativa foi recusada, tentou-se postular a idéia
de um pacto federativo entre as proncias e o Estado. Isso fica tido no trabalho de Miriam
Dolhnikoff, O Pacto Imperial, em que a autora trata dos diferentes projetos então propostos para
construir o Estado brasileiro e da sempre presente questão federativa. Segundo ela:
O arranjo institucional consagrado pelas reformas da década de 1830 e pela
revisão dos anos 1840 foi resultado de um processo no interior do qual as elites
provinciais se constituíram como elites políticas comprometidas com o novo
Estado, evitando assim a fragmentação. Como requisito da vitória da unidade
nacional, o modelo implementado na década de 1830 significou a derrota de um
projeto de inclusão social. Este foi o preço pago pela unidade.
104
O anseio por autonomia presente em todo o processo de independência ganhou ainda mais
força na Assembléia Constituinte de 1823. Embora reprimida pela Constituição outorgada em
1824, essa tendência fragmentadora continuou a se manifestar, pois nas Regências algumas
proncias se opuseram tenazmente ao projeto centralizador. Essa resistência, segundo José
Murilo de Carvalho, devia-se em grande parte à fraca ligação de tais áreas ao comércio exterior e
à presença de deres políticos locais desprovidos da formação burocrática que outros brasileiros
favoráveis à centralização tiveram nas universidades portuguesas.
105
Deve-se observar que o
Estado Imperial, durante a fase da Regência e posteriormente no Segundo Reinado, era composto
e legitimado por uma ampla elite política, formada por profissionais liberais, oligarquias do
Nordeste (estas já enfraquecidas devido ao declínio da atividade açucareira), os grandes
cafeicultores do Sudeste e ainda a burocracia governamental.
106
103
CASTRO, Paulo Ferreira.A Experiência Republicana. IN HOLANDA, Sérgio Buarque de .T. II. História Geral
da Civilização Brasileira. São Paulo Difel, 1974.
104
DOLHNIKOFF, Miriam. O Pacto Imperial. Origens do Federalismo no Brasil. São Paulo, Ed. Globo: 2005. P.
19
105
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. A elite política imperial. Rio de Janeiro: 1980. P. 200.
106
CARVALHO, José Murilo. Op. cit. P.197.
49
Determinava a Constituição de 1824 que as Províncias eram franquias administrativas de
um Império indivivel. Como prova de que a autoridade monárquica não seria abalada, manteve-
se o dispositivo segundo o qual o Executivo indicaria livremente o Presidente da Proncia, não
necessariamente nascido na região. A função precípua dos presidentes consistia em executar as
diretrizes do Ministério que os enviava.
107
Conforme frisou Marisa Saenz Leme, essa deliberação
foi anterior à Carta Outorgada e já constava em legislação elaborada pela Assembléia Constituinte
e Legislativa, o que, segundo a autora, reverte o sentido usualmente dado pela historiografia à
escolha do presidente de proncia, qual seja, uma imposição do poder central.
108
O Ato adicional de 1834 acabou por redefinir a autonomia de cada Proncia,
estabelecendo mudanças, ainda que moderadas, aos olhos dos mais radicais que sonhavam com
algo similar a uma república federativa ou confederação.
109
Assim, as unidades do Império
passaram a contar suas respectivas Assembléias Legislativas Provinciais.
110
Estas tinham como
prerrogativa principal zelar pela economia local, cabendo-lhes ainda legislar sobre "pessoas não
livres". Todavia, as Assembléias não poderiam interferir no tráfico de escravos, atribuição esta
exclusiva do Governo Central.
111
Como bem demonstrou Miriam Dolhnikoff:
A partir de 1834 a competência do governo central e dos governos provinciais
foi dividida constitucionalmente (já que o Ato Adicional era uma emenda
constitucional): enquanto o primeiro respondia pelas questões nacionais, os
segundos tornavam-se estratégicos na condução da política provincial. Na
Câmara as elites encontraram o espaço de defesa de seus interesses,
negociando demandas que se confrontavam tanto entre as diversas províncias
como entre estas e o centro.
112
107
GRAHAM, Richard. Clientelismo e Política no Brasil do século XIX. Editora da UFRJ, Rio de Janeiro, 1997. P.
86.
108
LEME, Marisa Saenz. Artigo no prelo: Dinâmicas centrípetas e centrifugas na formação do estado monárquico
brasileiro: São Paulo no 1º Império. IN JANOTTI, Maria de Lourdes denaco, PRADO, Maria Lígia , OLIVEIRA,
Cecília Helena de Salles. A Política na historia e a historia na política.Programa de s-Graduação em História
USP/Ed. Atlanta..
109
MONTEIRO, Hamilton de Mattos. Da Independência a Vitória da Ordem. In: LINHARES, Maria Yedda. (org.).
História Geral do Brasil. Rio de Janeiro. Ed. Campos, 1990. P 118.
110
CASTRO, Paulo Ferreira. Op, cit. P.38.
111
Idem, p. 38. E ver tamm DIAS, Carlos Alberto Ungaretti, DIAS, Carlos Alberto Ungaretti. A Gênese de São
Paulo: A construção dos Poderes Públicos na Província Paulista 1835/1845. Dissertação de Mestrado. São Paulo:
USP, 1993. P.58-59.
112
DOLHNIKOFF, Miriam. Op. Cit, p. 17-18.
50
Dessa forma, embora as elites regionais pudessem gerir seus interesses com relativa
liberdade, os moderados
113
o estavam dispostos a fazer grandes concessões. Emblemática foi a
recusa veemente em se permitir que os Presidentes fossem eleitos no âmbito da Província. O
"Avanço Liberal" encontrou nos moderados - cada vez mais migrando para o lado conservador -
uma feroz resistência.
114
As longas refregas entre Senado e Câmara, o Ato Adicional foi apresentado a esta
última no dia 09 de agosto de 1834. O deputado Limpo de Abreu foi encarregado de discorrer
sobre a peça legal diante dos membros da Regência. Cumpriu a função proferindo o seguinte
discurso:
Senhor. A Câmara dos Srs. Deputados, tendo ultimado as reformas da
Constituição do Império, nos envia em solene deputação para termos a honra
de apresentar a V. M. Imperial o fruto de suas meditações e trabalhos. Este
beneficio, reclamado muito tempo pelo progressivo incremento da
civilização e das luzes e pelas crescentes necessidades das províncias; este
beneficio que o Brasil a despeito dos estímulos de um patriotismo ardente ,
aguardou respeitoso da ação ordinária da lei , é o monumento novo nos fastos
da historia política, que hoje deposita cheio de confiança nas augustas mão de
V. M. Imperial. Investida pelo sufrágio livre dos eleitores da privativa
autoridade de concluir a obra da reforma (...).
115
Pelo trecho acima pode-se perceber a empolgação com que a Assembléia Geral ofereceu à
Regência a reforma constitucional. A intenção do deputado Limpo de Abreu era apresentar o Ato
como resultado de longas meditações, fruto do amadurecimento da vida política nacional. Ele fez
questão de ressaltar que o Ato era necessário pelas crescentes necessidades das províncias”.
Continuou seu discurso da seguinte forma:
(...) A Câmara dos deputados, cônscia de toda a extensão dos seus deveres, de
toda a responsabilidade que contraíra para com a Nação , não podia ser nem
mais fiel à lei de 12 de outubro de 1832, que traçara o circulo de seu poder
constituinte, nem mais solicita em conferir as províncias todos os recursos
necessários à sua nova existência. A capacidade nacional, que deve exaltar
113
Infelizmente não será possível aqui fazer uma discussão sobre a gênese e a composição dos partidos políticos
imperiais, todavia indicaremos uma obra que trata desse assunto de maneira ampla, expondoo só o ponto de vista
do autor mas também a discussão historiográfica sobre o tema: MATTOS, Ilmar Rohloff. Tempo Saquarema: A
Formação do Estado Imperial. São Paulo: Hucitec, 1990. P. 130-131 e SCHWARCZ, Lilia K. Moritz As Barbas
do Imperador:D. Pedro II um monarca nos trópicos. São Paulo, 1998.
114
CASTRO, Paulo Ferreira. Op, cit. P. 38.
115
Instituto Nacional do Livro. Organizações e programas ministeriais, regime parlamentar no Império. 3º Ed.
Brasília, Departamento de documentação e divulgação, 1979.P. 51.
51
mais do que tudo o justo preço do patriotismo prevalece acima de
mesquinhas considerações locais: os objetos provinciais acham-se
cautelosamente descritos e extremados par se evitarem destarte os conflitos e as
lutas intermináveis, que tão fatais podem ser aos interesses dos povos,
comprometendo a sua paz e segurança; a unidade e a energia de ação, sem as
quais o corpo social enlanguece e definha, são conservadas no Governo geral
para poder preencher com vantagem do Estado as variadas e difíceis
obrigações a seu cargo: o principio federal, amplamente desenvolvido recebe
apenas na sua aplicação aquelas modificações que são filhas do estudo e da
experiência das nações mais cultas, respeitando-se enfim religiosamente a
forma de Governo que a Nação adotou e que tem contribuído nas maiores crises
para salva-la do embate das paixões e dos partidos , e as prerrogativas da
coroa imperial adquirem novo esplendor e realce.
116
(grifo nosso)
Tentava-se estabelecer por intermédio da reforma o principio federal, mantendo-se,
entretanto, a integridade do poder central, diante do qual as proncias contariam com mais
independência.
Apesar do discurso proferido pelo deputado Limpo de Abreu, o federalismo implantado
com o Ato Adicional não esclarecia as atribuições de cada Poder nem atendia na totalidade as
reivindicações autonomistas mais radicais. Entretanto, Miriam Dolhnikoff observa que pelo Ato
Adicional “(...) consagrava-se a autonomia provincial. A partir de então o governo provincial
seria composto por duas instâncias: as Assembléias Legislativas e a presidência da
Província”.
117
Como as reformas institdas pelo Ato Adicional não satisfizeram plenamente os
interesses dos autonomistas mais radicais e nem os centralizadores, emergiram vários conflitos.
Assustados com a eclosão de revoltas simultâneas, os moderados passaram a enxergá-las como
debilitantes e até mesmo separatistas, o que colocou os liberais reformistas em postura defensiva.
Diante da ameaça de secessão, o discurso centralizador e conservador adquiriu mais força
e legitimidade. Com a renúncia de Feijó e a eleição de Araújo Lima em 1837, a maioria das
revoltas
118
foram duramente reprimidas (a Sabinada na Bahia, Cabanagem no Pará e a Balaiada no
116
Idem.
117
DOLHNIKOFF, Miriam. Op. cit. P. 97.
118
A respeito das revoltas do período da Regência ver: PESAVENTO, Sandra J. A Revolução Farroupilha. São
Paulo. Brasiliense. 1990, VAINFAS, Ronaldo. Dicionário do Brasil Imperial.Objetiva, 2002 e HOLANDA,
Sergio Buarque. HOLANDA, Sérgio Buarque de O Brasil Morquico. T. II "Declínio e queda do Império" In
História Geral da Civilização Brasileira. São Paulo Difel, 1974.
52
Maranhão). Apenas no front sul (Farroupilha) as forças da Regência sofreram algumas derrotas.
Não obstante, manobras incessantes dos moderados agora chamados de conservadores na
Câmara Geral implementaram um programa de "contra-reformas" que culminou na Lei de
Interpretação do Ato Adicional, aprovada em 1840. Esta retirava das Assembléias uma série de
atribuições e as transferiam para os Ministérios, fortalecendo o poder central.
Diante da ofensiva conservadora consubstanciada no Regresso, os liberais arquitetaram o
Golpe da Maioridade. Vitoriosos, ascenderam mais uma vez ao Gabinete convocaram novas
eleições (as eleições do "cacete"), das quais emergiram com ampla maioria na Câmara Geral e
nas Assembléias Provinciais. Nesta condição nomearam vários Presidentes, permanecendo nove
meses à frente do governo, ao fim dos quais os conservadores voltaram ao poder.
119
Descrevendo tais acontecimentos, Ilmar Rohloff de Mattos comenta:
Os Saquaremas não se decepcionaram completamente: perdiam o governo,
ganhavam a Monarquia (...), retornaram ao governo pelas mãos do próprio
Soberano, promoveram também uma comemoração: a Coroação e a Sagração
do Imperador (...).
120
Desta forma, pode-se inferir que a partir de então a política do Império seria norteada pelas
constantes disputas entre Liberais e Conservadores. O Estado edificado pelos segundos exigia
autoridade sobre aquilo que Ilmar Mattos chamava de a Casa”, ou seja, os interesses
particulares, de indiduos e grupos deveriam subordinar-se aos interesses gerais de longo prazo,
da classe senhorial como um todo.
Essa contenda não estava restrita ao Parlamento ou ao Senado, mas penetrava nas
proncias, onde, longe dos olhos atentos do Poder Moderador, as particularides, bairrismos e
interesses de classe se misturavam ou se sobrepunham aos interesses político-partidários.
119
Sobre os tumultuados acontecimentos que antecederam a Revolução Liberal de 1842 e Minas Gerais ver:
IGLÉSIAS, Francisco. Minas Gerais. In: HOLANDA, Sérgio Buarque de. História Geral da Civilização
Brasileira. O Brasil Monárquico. T. II – “Dispersão e Unidade”. São Paulo Difel, 1974, p. 406-410 e VEIGA, Jo
Pedro Xavier da. Efemérides Mineiras 1664-1897. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1998. P. 543.
120
MATTOS, Ilmar Rohloff. Tempo Saquarema: A Formação do Estado Imperial. São Paulo: Hucitec, 1990. P. 191.
53
2.3 - Considerações sobre a Revolução Liberal de 1842
Em 1842, já depois de reformado o Ato Adicional, revoltaram-se os ricos
proprietários de São Paulo, Minas Gerais e parte do Rio de Janeiro. Foram
derrotados pelo governo conservador que modificara as leis descentralizantes,
ao custo de 180 mortos.
121
Os acontecimentos ocorridos no ano de 1842, conhecidos como Revolução Liberal,
extrapolaram as fronteiras de Minas Gerais. Tratava-se de um levante armado, planejado por
setores das mineira e paulista. Juntamente com a Praieira de 1848, tornou-se emblema da derrota
do Partido Liberal. Derrota que não se restringia ao campo das armas, mas pertinente sobretudo à
hegemonia na condução dos destinos do Império.
Embora os liberais não tenham sido alijados ou marginalizados da política nacional,
importa salientar que um novo pacto foi firmado entre as elites imperiais. Pacto este que excla a
via armada como instrumento legítimo de interesses partidários e foi muito bem expressado por
Justiniano José da Rocha em seu panfleto “Ação, Reação e Transação”. A partir de 1842, com o
triunfo do princípio monárquico”, o Império entraria numa nova fase, em que as paixões e lutas
políticas deveriam serenar. Analisando esse panfleto, Regina Duarte Horta
122
apontou que:
(...) Os períodos de ação e reação se esgotaram e a pátria não pode
estar eternamente condenada aos revezes da oscilação destes extremos.
(...) A conciliação é apresentada como um momento superior no
desenvolvimento histórico (...). Ação, Reação e Transação aparece como
alerta aos mais altos governantes. O povo aqui é um elemento quase
passivo a ser tutelado e guiado, protegido da revolta e do sofrimento
desencadeado pela atuação dos liberais, mas salvo também da ruína da
liberdade causada pela ortodoxia conservadora.
123
A Revolução Liberal de 1842 se inseriu num contexto em que as forças políticas do
Império buscavam equacionar-se e encontrar um ponto de equibrio. Embora fuja à proposta
deste estudo descrever os pormenores desta conflagração, é de suma importância tecer
considerações sobre tal acontecimento, tendo em vista que boa parte da vida política da proncia
121
CARVALHO, José Murilo.
Federalismo e Centralização no império Brasileiro: História e Argumento. In: Pontos
e Bordados – Escritos de História e Política. Belo Horizonte: UFMG, 1999. P.166.
122
Citar. P 118
123
Idem.
54
mineira na década seguinte foi direta ou indiretamente decorrente desse evento. Segundo
Francisco Iglesias:
Desde 1837, desde a queda de Feijó, Minas tem presidentes conservadores, que
se entregam à política do interesse de sua facção; o principal foi Bernardo
Jacinto da Veiga. Manipulando eleições, os conservadores fazem a maioria do
Legislativo Provincial. Para o período de 1840-1841, em face aos liberais
agora unidos, depois de algumas divergências ao inicio da situação
conservadora. O Ministério que segue a Maioridade não envia à Província
presidente que imprima sua marca aos negócios. Repostos no poder os
conservadores, em março de 1841, as autoridades que mandam à presidência
são mais decididas. Cabe-lhes a execução das “leis reacionárias”, e cumprem a
rigor sua tarefa.
124
Sabe-se que os Saquaremas, uma vez reconduzidos ao poder, após a queda do Gabinete
Liberal de 24 de julho, empreenderam novas revies na legislação, imprimindo uma face cada
vez mais centralizadora ao Estado Imperial. Para que esse novo Gabinete Conservador fosse
formado, fez-se necessário dissolver a Assembléia Geral, o que ocorreu logo após a leitura de um
relatório enviado pelo Ministro do Império ao Imperador, no qual o primeiro se queixava de que
A actual Câmara dos Deputados, Senhor, não tem força moral
indispensável para acreditar seus atos e fortalecer entre nós o sistema
representativo. Não pode representar a opinião do Pais porque a
expressão da vontade nacional e das necessidades publicas somente pode
produzir a liberdade dos votos. A existência dessa Câmara não é
compatível com a idéia de um Governo regular, porque predominam
homens que, pondo de parte os meios constitucionais, não recuam diante
de outros que subvertem todas as idéias de organização social, invadem,
usurpam e tendem a constranger, no exercício de suas atribuições, outros
poderes do Estado.
125
O Ministro foi muito hábil: alegando que a marcha da administração era obstada em
virtude da composição liberal da Câmara, justificava a sua dissolução. Mas para tanto era
necessário destruir qualquer sombra de legitimidade que aqueles deputados poderiam ter. Por isso
o Ministro insistiu que “a existência dessa Câmara não é compatível com a idéia de um Governo
regular”, porque os liberais não respeitaram a Constituição ao promover o processo eleitoral. E o
mesmo Ministro avançou:
124
IGLÉSIAS, Francisco. Op.Cit, p. 406.
125
Instituto Nacional do Livro.Op. Cit. p. 84-85.
55
(...) O Brasil inteiro Senhor, se levantará para atestar que em 1840 não houve
eleições regulares.(...) Reconhecem os Ministros de V. M. Imperial que os
princípios de ordem não foram todo repelidos da composição da atual Câmara
dos Deputados; e reconhecem-no com tanto maior prazer quanto isso prova a
força da opinião nacional, que apesar de comprimida, conseguiu colocar nessa
mesma Câmara homens notáveis por suas luzes, talentos e virtudes; mas o que
poderão sues esforços, sua habilidade e seu patriotismo diante dos obstáculos
que têm de encontrar? A salvação do Estado, tal qual se acha constituído pela
constituição de e seu Ato adicional, exige portanto que a actual Câmara dos
Deputados seja substituída por outra, a quem a liberdade do voto dê caráter de
representante da opinião nacional e a força moral indispensável para firmar
entre nós o sistema monárquico-constitucional-representativo. E por isso os
Ministros de V. M. Imperial não hesitaram um momento em pedir a Vossa
Majestade Imperial a providencia compreendida no decreto que têm a honra de
depositar nas augustas mãos de V. M. Imperial, que resolvera como houver por
bem.
126
Aos olhos do Ministro, dissolver a Câmara era essencial para a manutenção da
organização estatal então vigente. Para ele, o equilíbrio político do País só seria restaurado
mediante uma nova eleição em que os homens comprometidos com um determinado projeto
nacional seriam, em sua totalidade, reconduzidos ao poder público. Pelo trecho acima afigura-se
evidente que os novos deputados teriam o perfil adequado se fossem conservadores. Dissolvida
a Câmara e convocadas novas eleições, os conservadores voltaram a ser maioria. Em 1841
retornaram com o Conselho de Estado e no mesmo ano reformularam o digo do Processo
Criminal.
Para os liberais, a situação chegava ao limite do suportável: as conquistas
descentralizadoras obtidas na Regência estavam sendo demolidas uma a uma pelos saquaremas.
Desta maneira, segundo Sérgio Buarque de Holanda, para parte dos liberais a única opção de
curto prazo era uma revolta armada. A resistência destes às reformas conservadoras se estendia
em vários pontos do País, principalmente no Rio de Janeiro, Bahia, Ceará e Parba.
127
No
entanto, os principais focos de ações armadas estavam em São Paulo e Minas Gerais. Os liberais
em todo o Brasil articularam uma sociedade secreta e, tendo como base o Rio de Janeiro,
prepararam um levante conjunto. A idéia era deflagrar o movimento em São Paulo e estabelecer
126
Idem.
127
HOLANDA, Sergio Buarque de. Op. cit. P. 464-467.
56
uma ligação com o movimento Farroupilha no Sul, logo em seguida Minas e Rio de Janeiro
adeririam ao mesmo. Contava-se ainda com a adesão de várias Províncias do Nordeste.
128
É interessante notar que em momento algum se questionava a legitimidade do Imperador;
pelo contrário, uma das justificativas ideológicas do movimento era "libertar o Imperador da
tirania que o cercava".
129
Evidentemente, além de libertar o monarca fazia-se necessário restaurar
a ordem institucional dentro dos limites do Ato Adicional. Isso se comprova pela fala de uma das
lideranças do movimento em Minas Gerais, José Feliciano Pinto Coelho, mais tarde Barão de
Cocais, em resposta à Câmara Municipal de Barbacena cidade situada a cerca de 340 km da
capital, Ouro Preto –, que lhe convidou para assumir o cargo de presidente interino da Proncia
em 10/06/1842:
Ilmos. Srs.: Acabo de receber o oficio de V.Sas., pelo qual me convidam a
tomar posse de presidente interino da Província, para que fui aclamado pela
Guarda Nacional e o povo desta mui nobre e leal cidade. Com o fim de dirigir
os esforços da província na sustentação e defesa da Constituição do Estado e
do trono do nosso adorado monarca, o Sr. Dr. Pedro II; e reconhecendo eu o
quanto em verdade urge que nos reunamos em torno do trono imperial para
libertamos nosso imperador da influência perniciosa de uma oligarquia cega de
ambição e capricho (...), protestando desde já e jurando que meu procedimento
é dirigido somente pelo desejo de ver minha pátria gozar de liberdade e o meu
monarca e amo no pleno, completo e absoluto gozo de todos os seus direitos
majestáticos, tanto quanto a Constituição e o Ato Adicional o querem.
(...).(grifo nosso)
130
Os liberais não almejavam romper com a monarquia, isso o trecho acima deixa claro.
Também não esperavam romper com o sistema constitucional. Antes, intentavam com seu
movimento reverter a desvantagem política que os afligia. Para eles não se tratava de um simples
ato de rebelião contra a ordem institda, mas de libertar o Imperador da tirania conservadora.
Esperavam que seu ato fosse reconhecido como heico e patriótico. Acreditando que a salvação
pública estava em suas mãos, o se furtavam a pegar em armas.
128
DIAS, Ungaretti. Op. Cit. p. 114.
129
VEIGA, José Pedro Xavier da. Op. Cit. P. 545
130
In: VEIGA, José Pedro Xavier da. Op. Cit. P. 546
57
Conforme observou Richard Graham, nesse período alguns políticos viam no liberalismo a
possibilidade de favorecer as elites locais em detrimento do poder central.
131
Nessa perspectiva, a
ação armada foi tramada e executada. A Revolução Liberal de 1842 foi antes de tudo um
movimento de elites.
132
O caráter diferenciado do movimento estava na composição dos
revoltosos. Parcela significativa das lideranças era composta por homens com alguma influência
na Corte, políticos como o Senador Feijó, Teófilo Otoni, Antonio Marinho, etc. Os liberais não
cogitavam a hitese de secessão, mas ambicionavam a todo custo a hegemonia política e a
direção do Estado Nacional. A articulação da rebelião ocorria em vários pontos do País, mas sua
execução revelou-se aquém das expectativas.
133
O discurso de um Senador mineiro, José Bento,
expressa o tom da revolta que atingiu os liberais mineiros com a interpretação do Ato Adiconal:
“Desejávamos uma interpretação, mas que não fosse confusa, que não contivesse idéias falsas em
parte, e noutras não fosse annuladora do Acto Adicional”.
134
Teófilo Otoni também não se furtou
a criticar a situação. Para ele:
Tudo quanto tender a modificar os princípios constitucionais garantidos no acto
addicional é uma reforma, que esta fora da esphera do poder ordinário, e não
pode ser decretada senão por um poder completamente autorizado.
135
Teófilo Otoni tornou-se peça essencial para a execução da Revolta. Conforme aponta
Paula e Silva, o referido, quando ainda deputado no ano de 1842, no dia 12 julho:
Procurou refutar a afirmação de Carneiro Leão, defendendo o direito universal
dos povos à insurreição e resistência. Passando pela Conjuração Mineira e
Pela Revolução Pernambucana, Ottoni chega em 1821 e narra os
acontecimentos que antecederam a Independência. Nesta época o Brasil era
131
GRAHAM,Richard. Op cit. P. 232.
132
MARSON, Isabel Andrade. O Império da Revolução: Matrizes Interpretativas dos Conflitos da Sociedade
Monárquica. IN FREITAS, Marcos Cezar de. Historiografia Brasileira em Perspectiva. São Paulo. Ed. Contexto,
1998, p. 79.
133
A respeito da Revolução Liberal de 1842 ver: Autos dos Inquéritos da Revolução Liberal de 1842 em Minas
Gerais. Brasília: Senado Federal, Editora da Universidade de Brasília, 1979; FILLER, V. Liberalism in Imperial
Brazil: The Regional Rebellions of 1842. Stanford University, 1976; MARINHO, Jo Antônio. História do
Movimento Político de 1842. Belo Horizonte; Itatiaia; São Paulo: Ed. USP, 1977.
134
ANAIS do Senado do Império do Brasil. Segunda Sessão da Primeira Legislatura de 29 de julho e o de setembro
de 1839, tomo III, 1913, p.40.
135
ANAIS do Parlamento Brasileiro. Câmara dos Srs. Deputados, 1838, I, p.43.
58
governado por um monarca legitimo e mesmo assim proclamou sua
independência por um ato de rebeldia.
136
Segundo a autora, o que conferia sustentação moral aos liberais era a alegação de que os
conservadores haviam rompido com a Constituição, a origem de toda legitimidade e legalidade
do governo”.
137
Apesar da previsão ser de que todas as Proncias se levantariam juntas, os
liberais mineiros
138
aderiram ao movimento quando este já havia sido controlado em São
Paulo. Chefiaram a insurreição em Minas Gerais alguns ex-deputados que haviam perdido os
cargos com o advento da nova Assembléia conservadora. Foram eles: Teofilo Benedito Otoni,
José Pedro Dias de Carvalho, nego José Antônio Marinho, Dr. JoJorge da Silva, Dr. Camilo
Ferreira Armonde, Dr. Manuel de Mello Franco.
Em 10 de junho de 1842, José Feliciano Pinto Coelho foi aclamado Presidente interino da
Proncia. Embora não tenha sido surpreendido pelo movimento, o Presidente da Proncia,
Bernardo Jacinto da Veiga, sofreu inicialmente alguns reveses. Em Minas, a direção da Revolta
estava dividida, pois muitos acreditavam que deveriam esperar mais tempo para atacar Ouro
Preto. outros julgavam conveniente assaltar e tomar imediatamente a capital. A falta de um
líder mais forte acabou por dificultar a própria ação do governo para reprimir os revoltosos. Estes
desfechavam pequenos ataques em diversos pontos, recuando rapidamente. Ainda que tenham
logrado uma viria significativa em Queluz, o conseguiram abordar a capital devido às suas
desavenças internas. Segundo o Cônego Marinho, as hesitações em atacar a capital causaram a
derrota da Revolução:
A revolução, porém, se havia perdido no mesmo momento em que a valentia dos
chefes e soldados Insurgentes pleiteava com tanta audácia a vitória de
Queluz.
139
136
SILVA, Fernanda Lourdes Carvalho de Paula e. Em Brancas Lutas: A trajetória de Tfilo Ottoni, suas idéias
políticas e sua prática social na consolidação do Estado no Brasil (1831-1869). Dissertação de Mestrado. Faculdade
de História. Direito e Serviço Social, Unesp – Franca. Franca, 2003.P. 36
137
Idem.
138
:VEIGA, José Pedro Xavier da. Op. cit. P. 545.
139
MARINHO, José Antonio. História do Movimento Político de 1842: apresentação de Francisco Iglesias, Belo
Horizonte, Ed. Itatiaia; São Paulo, Ed. da Universidade de São Paulo, 1977, p. 153.
59
Ao tomarem conhecimento da aproximação de Caxias, os revoltosos trocaram a direção
do movimento, à frente do qual colocaram Teófilo Otoni. Este, logo que soube da derrota paulista,
deixou o Rio de Janeiro e rumou para Minas. No da 20 de agosto ocorreu em Santa Luzia a
batalha decisiva, onde as tropas liberais foram derrotadas por Caxias. Findo o conflito, foi
nomeado para presidir Minas Gerais o ultraconservador Francisco José de Souza Soares de
Andréia. O preço da Revolta foi bem mais alto do que em São Paulo, em virtude principalmente
dos roubos, pilhagens e todo tipo de excesso praticados por beligerantes de ambos os lados.
140
Doravante, a Revolta tornou-se um anátema para os liberais. Apesar de ao longo da década de
1840 haverem surgido tentativas de recuperar a imagem do movimento, este passou a ser
lembrado como um exemplo da falta de patriotismo e respeito à ordem por parte dos liberais.
Mais do que uma derrota militar, os liberais sofreram um revés político, no sentido de que
o poderiam ditar as regras do jogo. Após o fim da Revolução Liberal, os conservadores se
apressaram em nomear presidentes capazes de manter a ordem e Minas Gerais passou por um
processo de pacificação. Os conservadores fizeram questão de assinalar que o movimento não
havia sido uma revolução, mas uma rebelião, justificando maiores poderes ao governo central.
Nas palavras de Ilmar R. Mattos, “buscaram imprimir uma direção ao predomínio que exerciam
no Mundo do Governo, desde então”.
141
Conservadores mineiros, como Bernardo Pereira de
Vasconcelos, passaram a exigir modificações nodigo de Processo Criminal no sentido de
tornar mais abrangente o conceito de crime de rebelião, visando punir não os cabeças do
movimento, mas todos que dele participaram
142
. Inobstante, por ocasião da queda do Gabinete
Conservador em 1844, sucedido por um Ministério em que predominavam seus opositores, os
revoltosos de 1842 foram anistiados pelo Imperador.
140
Idem, p. 418-419.
141
MATTOS, Ilmar Rohloff. Op. cit. P. 129.
142
SILVA, Claudiane da. A Casa Habitada: A construção da representatividade política na província de São Paulo.
Dissertação de Mestrado. Franca: UNESP, 2003. P. 114.
60
A anistia, além de reanimar os liberais, reafirmava o caráter elitista do movimento e a
importância dos seus protagonistas. Em 1844, assinou-se uma paz, “a paz dos vencedores”.
143
Entretanto, vários oposicionistas mineiros mostrar-se-iam futuramente críticos ao projeto
conservador de construção institucional. Mesmo diante da anistia, elementos como Teófilo Otoni
revelavam constantemente seu descontentamento com as concessões feitas por outros liberais ao
Governo. Otoni afastou-se da política por longo período durante a década de 1850, dedicando-se à
sua empreitada de desbravamento da região do Vale do Rio Macuri, nos extremos dos “mares de
morros”.
144
Enfatiza-se que talvez um dos ganhos da Revolução de 1842 tenha sido justamente a
negação da via armada enquanto instrumento político aceitável. Essa estabilidade, ainda que
precária e excludente em vários aspectos, mostrou-se positiva na medida em que o País de
gradativamente melhorar sua concepção de respeito às instituições. A História Nacional revela
que “quebras institucionais” nunca redundaram em melhorias de vida para a população ou
aperfeiçoamento de um sistema político mais justo e minimamente igualitário.
Conforme dito anteriormente, a partir de 1842 os conservadores começaram a aprimorar o
aparato repressivo do Estado, fortalecendo o Ministério da Justiça e esvaziando, estrategicamente,
os jzes de paz. Para presidir a Proncia, o Governo Imperial nomeou Francisco Soares de
Andréa, destacado membro do Partido Conservador e substitdo somente em 1845. Esta
substituição deve ser examinada no novo contexto político que se esboçava, decorrente do retorno
dos liberais ao Poder. No entanto, Minas Gerais voltaria a ser governada por conservadores a
partir de 1848, com o fim do qüinqüênio liberal e o acirramento das lutas interpartidárias. A
143
DIAS, Carlos Alberto Ungaretti. Op. cit. P. 119-121
144
Retornando a política em 1856, Teófilo Otoni candidatou-se ao Senado, sendo o mais votado da lista. Todavia seu
nome foi recusado pelo Imperador. Em 1860 publica sua famosa “Circular dedicada aos srs. Eleitores pela Província
de Minas Gerais e especialmente dirigidos aos srs. Eleitores deputados pelo . Distrito eleitoral da mesma província
para a próxima legislatura”. Neste Panfleto Teófilo Otoni enfatiza suas convicções liberais causando grande agitação
na vida política do Império, sobretudo devido a eloqüência de seus argumentos. Assim sendo a Circular Tornou-se
um marco na volta à cena política do liberalismo de matizes republicanos e americanistas”. O fato é que durante os
anos 60 o ideal liberal ganhou fôlego.
61
Conciliação de 1853 permitiu um arrefecimento da lutas entre os Partidos na Corte, movimento
esse acompanhado em Minas Gerais.
Tratemos mais detalhadamente das mudanças ministeriais desse período. Os liberais
voltaram ao poder 1844, em uma inversão” ministerial promovida pelo Imperador. Tal mudança
foi motivada em parte pelos choques entre Honório Hermeto Carneiro Leão, prestigiado líder
conservador, e o monarca. Assim, em 02 de fevereiro subia ao poder o Ministério do Segundo
Reinado, de orientação Liberal, contando com nomes como Manuel Alves Branco (Fazenda e
Justiça), JoAlves de Almeida Torres e Visconde de Macaé, na pasta de Império. A partir de
então os liberais se mantiveram no poder por cinco anos, totalizando-se nesse período seis trocas
ministeriais. Todavia, o qüinqüênio liberal foi marcado pela timidez na condução da política
nacional, pois seus chefes hesitavam em alçar quaisquer vôos mais altos, talvez porque a derrota
de 1842 ainda permanecesse viva nas suas memórias.
145
Os últimos gabinetes desse período foram marcados pela efemeridade. A Revolução
Praieira,
146
ocorrida em Pernambuco em 1848, além de revelar que ainda haviam liberais
dispostos a pegar em armas contra o governo, também evidenciou o descompasso entre os
correligionários do Sul e do Nordeste.
147
Ao fim do qüinqüênio liberal, a maioria dos projetos
propostos governamentais ainda não havia sido votada, tais como a reforma da Guarda Nacional
ou as incompatibilidades eleitorais.
148
Em 1848, frente à incapacidade dos liberais em levar adiante os projetos do Gabinete, o
Imperador reconvocou os conservadores ao poder. Assim, em 29 de setembro de 1848, assumiu
um Gabinete Conservador, governou até 11 de maio de 1852, quando foi substitdo por outro
similar.
149
Em 1849, Sales Torres Homem, sob o pseudônimo de Timandro, publicou seu famoso
145
Idem, p.10.
146
Sobre a Revolução Praieira ver: MARSON, Isabel Andrade. O Império do Progresso: a revolução praieira.
Brasiliense, 1987.
147
IGLÉSIAS, Francisco. Op. Cit. 10.
148
Idem, P. 11.
149
Organizações e Programas Ministeriais. Regime Parlamentar no Império. MEC, Instituto Nacional do Livro,
Brasília. 1979, pp. 112-113.
62
panfleto O Libelo do Povo”, criticando a monarquia, em especial a Casa dos Bragança, e
atacando violentamente a situação conservadora.
150
O ano de 1850 foi um dos anos mais profícuos dentro dos prositos da direção
saquarema, e não para ela, mas para todo o Brasil no Segundo Reinado
151
. Afinal, justamente
em 1850 aboliu-se o comércio infame”. Também foi promulgada a Lei de Terras, efetivou-se a
reforma na Guarda Nacional e, por fim, promulgou-se o digo Comercial.
152
Além disso, no
plano da política externa, o Brasil logrou uma vitória significativa em seus negócios no Prata,
derrotando oder uruguaio Oribe.
153
Em 1853 inaugurou-se a Conciliação, política de “congraçamentoentre conservadores e
liberais, incentivada sobretudo por D. Pedro II, com vistas à unidade política do País. O grande
responsável por aproximação foi Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês do Paraná. Político
mineiro, já experimentado em outros gabinetes e conhecido por seu temperamento enérgico e
convicções conservadoras, presidiu o Gabinete da Conciliação até sua morte, em 1856.
154
Foi sob a direção de Honório Hermeto Carneiro Leão que o Gabinete encaminhou a Lei
eleitoral. A matéria foi debatida em 1855 e a intenção do projeto consistia claramente em
moralizar o processo eleitoral, renovando-lhe os princípios de gestão.
155
Uma vez aprovada, a Lei
dos rculos tornou-se a principal contribuição do Gabinete da Conciliação para o
aperfeiçoamento das engrenagens políticas do Império. Em Minas, a Lei gerou na eleição
subseqüente situações muito curiosas, tais como as descritas abaixo:
(...) Em Sabará, o conselheiro Luís Antonio Barbosa, que ocupara postos
eminentes, com o apoio do governo, de seu partido e setor do partido
adversário, disputa com um médico desconhecido e consegue eleger-se por
dois votos. Em Ubá, um rábula de pouco escrúpulo tem que lutar com Joaquim
Fernandes Leão, Liberal, e Fremem Rodrigues Silva, conservador, e o não
150
DUARTE, Regina Horta. História, verdade e identidade nacional. Quatro panfletos políticos do Segundo
Reinado. In: Locus, Juiz de Fora, v. 2, n. 2, p. 119, 1996.
151
É justamente a partir de 1850 que o Império Brasileiro começa a passar por reformas modernizadoras de sua
economia e sociedade. A esse respeito ver: GRAHAN, Richard. Grã-Bretanha e o Início da Modernização do
Brasil: 1850-1914. Brasiliense, 1973.
152
SCHWARCZ, Lilia K. Moritz. Op. Cit, p. 101-102.
153
Idem, p. 103.
154
Uma boa narrativa sobre a Conciliação está em: NABUCO, Joaquim. Um Estadista no Império. Rio de Janeiro,
Editora Nova Aguilar S.A, 1975. P. 153.
155
IGLESIAS, Francisco. Op. Cit, p 51.
63
menos conhecido deputado Paulo Cândido. Na spera do pleito, os três se
reúnem para que um se apresente, a fim de evitar a eleição do rábula; todos
trabalham contra ele, mas sem êxito, pois sua vitória é tranqüila (...).
156
O ano de 1857 foi dicil, marcado já pelo esgotamento da política de conciliação e pela
alta dos produtos agrícolas, além de uma crise no setor bancário. Em fins de 1858, o Gabinete de
Caxias caiu, sendo substitdo pelo Visconde de Abaeté. Nesse Gabinete os conservadores
predominavam sem exceção, rompendo dessa forma com a política de conciliação.
157
Assim, entre 1840 e 1860, o aparato centralizador do Estado Imperial foi erigido. Isso se
deveu em grande parte ao interesse dos grandes senhores de terra em assegurar a manutenção da
estrutura socioeconômica. Somente um poder central forte poderia garantir a escravidão e o
tráfico negreiro, além de defender os interesses nacionais junto às potências estrangeiras e garantir
a ordem no interior do Ps.
Entretanto, em Minas Gerais, assim como em todo Império, levantaram-se vozes nas
Assembléias tentando frear ou adaptar essa estrutura aos interesses provinciais. Tentava-se resistir
aos interesses públicos em favor dos interesses privados existentes nas localidades. Em Minas
Gerais tentava-se criar uma infra-estrutura capaz de atender as constantes demandas por melhorias
por parte dos cafeicultores.
A modernidade da Zona da Mata mineira convivia com a tradição das zonas de ocupação
mais antiga, como o centro da Proncia. Esta pulsava em ritmo acelerado, buscando solucionar
seus conflitos internos e se impor na política imperial do Segundo Reinado. Nesse sentido, a
Assembléia Provincial surgia como o elo de ligação com o Rio de Janeiro. As lutas partidárias
adquiriram contornos mais pacíficos, de modo que a violência ainda tão comum à sociedade
daquela época foi limitada pela nova cultura política, pautada pela negociação entre centro e
periferia, moldando a realidade de um país que buscava ter lugar garantido no mundo europeu
civilizado.
156
IGLÉSIAS, Francisco. Op. Cit, p. 59.
157
Idem, p. 64.
64
A história da Assembléia Provincial de Minas Gerais é emblemática, porque nela várias
contradições da política imperial foram expostas visceralmente. Nela o liberalismo brasileiro
deixava de ser um objeto de contemplação teórica e passava a ser elemento prático dentro de uma
sociedade impregnada pela escravidão e pelo latifúndio.
Minas Gerais não estava isolada do Império, pois seus dilemas eram questões que
atravessavam o País. Portanto, quando nos dispomos a aprofundar o estudo da Assembléia
Provincial, nossa motivação não é buscar apenas as especificidades da realidade local, mas a
existência simultânea de elementos estabilizantes e perturbadores”
158
no dia-a-dia dos deputados
provinciais e nos seu discurso partidário.
158
HOBSBAWM, Eric. O que os Historiadores devem a Karl Marx? IN: HOBSBAWN, Eric. Sobre a História. São
Paulo: Cia das Letras, 1998. P.167.
65
CAPÍTULO 3
Tis em Luta
Neste capítulo tratar-se-á da imposição do projeto Saquarema, elaborado com o objetivo
de subordinar os poderes locais, com ganhos de autoridade e ingerência para o governo central.
Assim, será descrita a progressiva instituição desta política em Minas Gerais durante o período
estudado, bem como a resistência Liberal suscitada pela mesma na Assembléia Provincial. Como
referência bibliográfica para os fatos históricos ora expostos foi utilizada a obre de Paulo Ferreira
Castro, Experiência Republicana (1974).
A presente dissertação desposa a tese de que a centralização imposta pelos saquaremas
encontrou resistência em vários pontos do País. A tentativa de obstar esse processo não foi,
portando, uma especificidade mineira. A própria Revolução de 1842 revela que havia um
consenso entre as elites dominantes, em especial no centro-sul, de que a centralização deveria ser
limitada, senão revista. A oposição liberal às reformas conservadoras se manifestava em diversas
regiões: no epidio de 1842, as proncias do Rio de Janeiro, Bahia, Ceará e Paraíba esboçaram
contrariedade, tal como o Rio Grande do Sul.
159
No entanto, os principais focos insurrecionais
ocorreram em São Paulo e Minas Gerais.
A via da força ganhava legitimidade entre os liberais em razão da própria noção de
liberalismo por eles desposada, que consistia em ver na referida concepção política, acima de
tudo, uma forma de favorecer as elites locais em detrimento do poder central.
160
Os liberais,
enquanto partido, não cogitavam a hitese de separação, mas almejavam a todo custo arrematar a
hegemonia política e a direção do Estado Nacional.
159
CASTRO, Paulo Ferreira Experiência Republicana. IN HOLANDA, Sérgio Buarque de .T. II . História Geral da
Civilização Brasileira. São Paulo Difel, 1974.
160
GRAHAM, Richard. Clientelismo e Política no Brasil do século XIX. Editora da UFRJ, Rio de Janeiro, 1997. P.
232.
66
Foi a busca pela hegemonia o grande propulsor das contendas políticas dentro do Estado
Imperial ao longo do Segundo Reinado. Tal disputa passou ora por complexas estratégias de
negociação, ora por movimentos inicialmente armados. Nesse contexto conturbado, os dois
partidos do Império tiveram suas identidades forjadas. A historiografia aponta para a viria das
teses conservadoras, mas em vários momentos a preponderância do partido foi questionada. O
objetivo deste capítulo consiste em mostrar as nuances da luta partidária dentro de Minas Gerais,
umas das mais importantes proncias do Império.
3.1 -
Católicos, Monarquistas e Partidários da Ordem
O cotidiano da Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais, assim como toda a vida
política do País no período compreendido entre 1844 e 1853, foi repleto de lutas partidárias.
Resolveu-se após a malograda experiência liberal de 1842 que o apelo às armas, longe de ser boa
opção, acabava por colocar seus protagonistas em grande desvantagem. O sistema político
elaborado no Segundo Reinado passava por redes de negociação entre centro e periferia e, mais
tarde, sobretudo a partir de finas da década de 1860, por uma maior intervenção do Poder
Moderador, de forma a equilibrar as disputas partidárias, evitando exageros ou radicalizações que
desembocassem no rompimento das engrenagens institucionais.
Seguindo essa lógica, o ano de 1844 foi deveras turbulento para cenário político nacional,
pois o Imperador decidiu permitir a reabilitação dos Liberais. Isso implicava em formar um novo
gabinete no qual estes fossem predominantes. Era natural, portanto, que nas proncias se
fizessem sentir modificações na conjuntura.
Em Minas Gerais não foi diferente. Presidia a proncia o general Soares de Andréia,
elemento ligado ao Partido Conservador, tendo sido uns dos repressores nomeados pelo governo
central para combater a Rebelião de 1842, após o desfecho da qual seu governo começou. Os
prejzos materiais na proncia mineira haviam sido enormes, o que a debilitou sobremaneira. A
maioria da Assembléia era composta por Conservadores, fruto do ambiente criado pela derrotada
67
dos seus antípodas em 1842. Mesmo contando com uma Assembléia em que a cor política de seu
partido era predominante, Soares de Andréia não se furtava a fazer algumas reclamações em seu
relatório enviado a Assembléia nesse ano, insatisfeito que se mostrava com a extinção de um
imposto pelos legisladores. Segundo ele
161
:
A Assembléia Provincial julgou abolir na última lei do orçamento o imposto
sobre a compra, venda e troca dos escravos, e o de 800 rs do gado morto no
talho (...). O primeiro desses impostos é pago em todo o Império, e pode mesmo
tomar-se como um meio de moralidade. Se nenhuma transacção se fizesse de
objectos de valor, sem preceder um registro, não seria tão fácil a apropriação
das cousas alheias; e muito particularmente sobre escravos é indispensável que
cada um possa a todo tempo mostrar a legitimidade com que os possue e
nenhum modo é mais seguro do que pelo pagamento do imposto.
162
O argumento do presidente é bastante original. Para manter o imposto necessário numa
conjuntura em que a cafeicultura ainda não havia feito sentir seus efeitos em Minas Gerais e era
grande a demanda por recursos necessários à reconstrução da proncia e recuperação da infra-
estrutura recorreu-se ao argumento de defesa da propriedade. Segundo o general, o tributo seria
um meio de “moralidade”, pois com o registro do mesmo seria possível dificultar ou mesmo evitar
a apropriação das cousas alheias”, assegurando assim a manutenção da legitimidade” da
propriedade. O ideal de defesa da ordem cruzava-se com o imperativo de que o
Estado dispusesse
de meios de controle, fossem eles tributários, políticos ou sociais.
O argumento parece ter logrado êxito, pois pouco depois a Assembléia voltou atrás e decidiu
restabelecer o imposto. Tal medida chocou-se com a resistência dos deputados liberais, resultando
em protestos públicos de alguns membros da instituição. Impossibilitados de barrar ou derrubar a
volta do tributo, os legisladores da oposição fizeram uma declaração de votos. Nesta,
apresentaram um ato de desagravo à sua causa, fazendo constar suas as razões:
161
Optamos por transcrever as fontes mantendo o português original, evitando qualquer tipo de atualização
gramatical.
162
Falla dirigida á Assembléia Legislativa Provincial de Minas Geraes na abertura da sessão ordinaria do anno de
1844 pelo presidente da provincia, Francisco José de Souza Soares 'Andrea. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J.
Villeneuve e Comp., 1844.Arquivo da Universidade de Chicago. http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/448/000058.html , 21 de
outubro de 2003, às 19:00.
68
“Declaramos que votamos contra o Imposto da Meia Siza (...), por ser nossa
profunda convicção que a restauração dessa imposição, alem de vexatória, pois
que (...). a cobrança não pode ser feita em huma terrível inquisição, he
eminentemente prejudicial aos interesses da Agricultura, e Industria da
Província que tão oneradas estão com as numerozos impostos (...), recebem
um golpe mortal restauração da dita meia Siza.
Ouro Preto, 12 de Abril de 1844
163
Assinaram esse documento quatro deputados, sendo eles Francisco de Paula Santos, o
padre Jacinto Jode Almeida, Manoel Teixeira Galo de S. Martinho e um quarto nome que
o foi possível identificar. O tom trágico usado pelos deputados ao redigir a declaração de votos
revela a intenção de frisar sua discordância; para eles a Agricultura e Indústriada proncia
seriam mortalmente feridas, prejudicando a população e o crescimento econômico regional. O
imposto se lhes afigurava uma imposição inaceitável e vexatória, consistindo em verdadeiro ato
de inquisição. Termos fortes proferidos por uma oposição vencida, mas sabedora de que os atos
praticados na casa legislativa teriam repercussão pública, considerando-se que os Anais da
Assembléia eram transcritos para posterior publicação em um Jornal contratado pela instituição.
164
Isso explica o tom eloqüente da declaração, pois intentava-se angariar a simpatia da população
letrada de Ouro Preto, então capital da Proncia.
O aperto econômico o freou, contudo, os investimentos na infra-estrutura da proncia.
As ligações desta com o Governo eram bastante próximas e, para melhorar a comunicação com a
Corte, iniciou-se a construção da Estrada do Parahybuna. Nesse ano os recursos para a
continuidade da obra saíam dos cofres do Tesouro Nacional e não da Proncia
165
.
Mesmo nessa conjuntura de aperto fiscal, percebe-se que Soares de Andréia empenhou-se
em compensar os combatentes do partido conservador que haviam lutado em 1842. Precisamente,
163
Arquivo Público Mineiro, Ata da Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais, ano de 1844, Al 3/28 caixa
54.
164
Tais jornais eram produzidos por tipografias contratadas pela própria Assembléia para publicar seus trabalhos.No
caso dessa legislatura a tipografia contratada publicava o Jornal Diário da Assembléia Legislativa Provincial de
Minas Gerais.
165
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/448/000038.html em 21 de outubro de 2003 às 19:15 horas.
69
fez aprovar uma lei de “auxílio” aos veteranos e anexou ao seu relatório uma lista com os nomes
dos mortos tombados em defesa da “legalidade” em 1842.
166
A oposição tentava se manifestar das mais diferentes formas, cabendo salientar a
importância dos juízes no âmbito das localidades
167
. Observe-se que a Reforma do Código de
Processos centralizou o aparato judicial, mas os magistrados municipais ainda eram uma peça
importante no jogo de poder das elites imperiais. Ao tomar posse, Soares de Andréia trocou os
jzes em vários munipios. Esse fato não passou despercebido aos deputados da oposição, que
encaminharam o seguinte requerimento:
Requerimento
(...) Que se pergunte ao Governo desta Província.
1 Quantos juizes Municipais substitutos nomiados por (?) em conformidade
do Art. 19 da Lei de 3 de Dezembro de 1841 tem sido demitidos pelo mesmo
Governo.
2 Qual a Lei em Ordem em que se tem firmado o Governo para este
procedimento.
3 Quais os motivos que (?) com a essas demissões.
Paço da Assembléia, 17 de Fevereiro de 1844
Autor: J. Pereira de
Souza
168
Esse pleito deflagrou uma série de intensos debates na Assembléia, culminando com sua
rejeição pela deputação em 22 de fevereiro do mesmo ano. Cumpre notar que tais discussões
giravam sempre em torno da seguinte questão: devia o Presidente da proncia dispor com tanta
facilidade dos cargos que tocavam tão profundamente a vida das localidades? Independentemente
das argumentações da oposição, a resposta dos conservadores foi melhor sintetizada pelo
deputado Resende:
(...) Estava a presidência no seu direito resolvendo a demissão do que se trata, e
que a oppinião contraria, além de insustentável oppoem-se a alguns princípios
sustentados pelo nobre deputado, côo vou demonstrar. É insustentável, por
isso,que ella não pode viver na presença da lei de 3 de dezembro de 1841, e do
regulamento respectivo que mui expressamente dão aos presidentes de
166
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/448/000103.html em 29 em 29 de outubro de 2003, as 21:10 horas.
167
Ver: FLORY, Thomas. El Juez de Paz y El Jurado en el Brasil Imperial: control social y estabilidad política en el
nuevo Estado. México: Fondo de Cultura Economica, 1986.
168
Arquivo Público Mineiro, Ata da Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais, ano de 1844, Al 3/28 caixa
54.
70
província o direito de demitir os delegados, subdelegados de polícia e seus
suplentes, logo que mal servirem, ou que a sua conservação for inconveniente
ao serviço publico. E casos tães tem os presidentes livre arbítrio de demittir
esses empregados , e assim o procedendo estão no seu direito: é isso
incontestável. Entendo, e é verdade, que esse arbítrio deve ter as limitações da
razão e da justiça (apoiados) mas nem por isso deixão os presidentes de tê-
los.
169
Com maioria na Assembléia, tornava-se fácil aos Conservadores derrotar eventuais
requerimentos que pudessem constranger o Governo. Proteger os atos deste não era só uma
questão de fidelidade partidária, mas tamm um ato que visava a sobrevincia política;
principalmente porque os jzes municipais tinham um papel importante no período eleitoral.
Além disso, o próprio presidente Soares de Andréia, em seu relatório, deixava claro seu
desconforto diante da força política preservada por alguns dos antigos revoltosos. Segundo ele:
(...) apenas restão da parte da rebellião a vontade de alguns homens
injustamente absorvidos e que nos contão ter sempre a mesma sorte; e do outro
lado, alguns pequenos conflictos entre poucas autoridades, a quem lhe custa ver a
facilidade com que as funcções publicas passão ás mãos de alguns que forão
rebeldes, que pela impunidade estabelecida entre nós, tem sido absolvidos nos
trinunaes
170
Pode-se notar que o presidente considerava injusta a reocupação dos cargos públicos pelos
mesmos homens que ele combatera em 1842. Assim, não causa estranhamento constatar que a
deputação conservadora apoiou demissões decretadas pelo general no intento de evitar
“inconvenientes ao serviço publico”. Alguns dias depois, o deputado que redigira o primeiro
requerimento encaminhou outro relativo ao mesmo tema. Infelizmente, o documento original ao
qual se teve acesso estava em más condições, o que prejudicou a leitura do mesmo. Por
conseguinte, a transcrição abaixo apresenta algumas lacunas:
(...) informação
Se contra a determinado no (...) de 8 de Julho de 1842 alguns dos substitutos
dos Juizes Municipais forão nomeados Subdelegados, suplentes destes, e se
estão ou não em exercício acumulando ambos os empregos
12 de Março de 1844
169
O Compilador Mineiro, sábado de Março de 1844, n 15, p. 3.
170
Falla dirigida á Assembléia Legislativa Provincial de Minas Geraes na abertura da sessão ordinaria do anno de
1844 pelo presidente da provincia, Francisco José de Souza Soares 'Andrea. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J.
Villeneuve e Comp., 1844. Arquivo da Universidade de Chicago http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/448/000004.html, 21 de
outubro de 2003, às 20:00 horas.
71
J P Souza
171
Mais uma vez a bancada conservadora obstruiu o pedido, impedindo-o de ser levado adiante.
Chama a atenção justamente essa firme barragem que os deputados conservadores impuseram aos
seus congêneres considerados de “oposição”. O ambiente de intolerância fez-se presente em todos
os momentos. O clima assemelha-se a um campo de batalha, onde os dois lados esforçam-se para
o ceder nada ao inimigo. As lutas ocorriam por vários motivos. Evidentemente, determinados
temas eram mais senveis como delimitação de munipios e paróquias, remoção de juízes, etc.
e colocavam os representantes do governo central em choque com as localidades. Isso talvez
explique a iniciativa do presidente em criar alguns cargos de confiança dentro da Assembléia,
reservando para si a prerrogativa de indicar seus ocupantes. Esses postos seriam locados na
Secretaria de Governo, cuja reorganização foi defendida por Soares de Andréia. Afigura-se
relevante a insistência do general em propor o cargo de secretário de “nomeação do governo
imperialcujo salário seria de 1:400$000, com gratificação de 932$666, totalizando 2:332$666
e um official de Gabinete” nomeado pelo presidente da proncia que auferiria vencimentos
idênticos aos do primeiro. Pela tabela demonstrada no relatório, estes seriam os cargos de maior
remuneração
172
e aparentemente superiores aos demais do ponto de vista hierárquico. O propósito
destas medidas era claro: aumentar o controle do Governo sobre a burocracia da Assembléia.
O recrutamento para a Guarda Nacional foi durante o ano de 1844 motivo de longa
discussão entre os deputados. Em verdade, no que se pode observar, o deputado Pereira e Souza,
pelas suas críticas e discursos identificado com a oposição, lançou um ataque
o contra a aludida
conscrição, mas contra determinadas medidas de
recrutamento do Exército que, no seu
entendimento, eram abusivas e feriam a economia da Proncia. Recuperem-se seus argumentos:
171
Arquivo Público Mineiro, Ata da Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais, ano de 1844, Al 3/28 caixa
54.De agora em diante AALPMG.
172
Falla dirigida á Assembléia Legislativa Provincial de Minas Geraes na abertura da sessão ordinaria do anno de
1844 pelo presidente da provincia, Francisco José de Souza Soares 'Andrea. Rio de Janeiro, Typ. Imp. e Const. de J.
Villeneuve e Comp., 1844. Arquivo da Universidade de Chicago http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/448/000012.html
, 21 de
outubro de 2003, às 20:20.
72
Sr presidente, pedi a palavra para mandar a meza huma indicação, afim de se
representar no Governo Geral, para que se faça cessar na Província de Minas
Gerais o atual recrutamento, que em minha opinião tem causado mais males a
província do que a desoladora febre Escarlatina em todo o Império. Sr
Presidente , o estado de nossa província he bem melancólico, e a causa não
outra senão as violências cometidas: nossas povoações achão-se desertas,
nossos concidadãos foragidos!... Não são estes foragidos, aqueles que estão na
circunstancia de serem recrutados: são paes de família, casados, maiores de 40
e 50 anos, abandonado lavouras e industrias. (...) Terror tem se espalhado que
ninguém escapara aos terríveis efeitos do recrutamento, muito mais depois da
circular de S. Ex. compreender no
recrutamento os G.N. violando assim a Lei
de 18 de Agosto de
1831.
Veja nessa Lei que a G.N. são isentos do
recrutamento (lê o artigo da Lei). (...) Sr. Presidente, além de ser
manifestamente contraria a constituição e as Leis , creio que foi mais hum
feixo de discórdia que se lançou na Província de Minas.
173
Várias questões foram levantadas nesse trecho, como, por exemplo, a legalidade de se
recrutar compulsoriamente elementos diretamente da Guarda Nacional. O deputado parecia
revoltado contra essa medida do poder central que manda recrutar com preferência os filhos dos
homens mais abastados: não sei se no que fundou a ex. para assim proceder quando o filho de
hum homem he regularmente e bem qualificado G.N e como s. ex. mandou recrutar esses”. Feitas
essas reclamações, o deputado Pereira e Souza ilustrava seu argumento citando a seguinte
situação:
Sr. Presidente, ainda ontem eu soube que chegaria a essa capital hum cidadão
recrutado, que em seu districto seria Juiz de Paz e Vereador da Câmara, além
de ser casado e negociante abastado. Em que lei, em que ordem se apóia o
Governo cometer estes desatinos e arbitrariedade?
174
Além de reivindicar o status que determinados cidadãos deveriam ter, o legislador
apresentou argumentos econômicos contra a conscrição:
Segundo os meios, que se tem empregado nessa província o Governo não
exceptua a ninguém: paracece-me que s. ex. não terá escrúpulo em mandar
recrutar o próprio Vigário Capitular: não sei quem se julgara izento de huma
tal arbitrariedade. A continuar semelhante sistema, he querem-se
completamente abocanhar tudo, atrasando dessa maneira a agricultura,
mineração, industria e comercio(...). Essa província de Minas, que a pouco
mais de hum anno passou huma rebelliaão, he por desgraça nossa agitada
173
O Compilador Mineiro, 16 de Fevereiro de 1844, p. 2. Hemeroteca Pública de Belo Horizonte.
174
Idem.
73
dessa maneira. Sr. Presidente, consideremos o negocio do recrutamento por
outro lado: dado que cessou o comercio da escravatura, começou logo a
agricultura a sentir a falta de braços:eu quisera que apparecessem no recinto
da casa todos os comerciantes da província, para que nos dissessem o seu
estado. Mas srs. Nenhuma destas considerações tem valido, para que não se
emprgassem os meios mais violentos, recrutando-se homens casados, Paes de
filhos, maiores de quarenta e cincoenta annos (...)
175
Após essas exaustivas explicações, o deputado apresentou seu requerimento para votação
em plenário, nele expondo uma preocupação até então oculta, no caso o uso político do
recrutamento:
Indico que se represente ao Governo Central a urgente necessidade que de
fazer cessar o recrutamento nesta província de Minas Geraes, não porque
tem sido recrutados um numero maior do que aqueles que se pode suportar a
nossa industria nascente, como porque no estado de ressentimentos, e ódio, que
ainda divide a população em alguns lugares, tem o recrutamento servido de
meio de opressão para as autoridades pouco escrupulosas no cumprimento de
seus deveres.
176
(grifo nosso)
Além dessas reclamações, o legislador, em dado momento dos trabalhos, fez uma denúncia
contra o governo da Proncia, a respeito das eleições para oficiais da Guarda. Nas suas
palavras:
Confesso, sr. Presidente, que na eleição para oficiaes da g. n. tem havido
algumas irregularidades, e que por mesmo a lei das eleições deveria ser
alterada. Mas terá isso o governo direito de altera-las a seu arbítrio? As leis
são feitas pela Assembléia Geral, e por ella tem de ser derrogada. Ora não
seria pela muito louvável, que em vez de se expedir esse regulamento, fizesse
uma representação aos poderes respectivos pedindo insistentemente a reforma
da lei? Que a lei consagra o escrutínio secreto e que o regulamento o
proscreve, é coisa, que se depreende muito claramente da leitura da ordem que
citei. Eu avistei (...), a uma dessas eleições , e vi que se violou o segredo
ordenando-se a um guarda, que reformasse as suas listas. Se não falei nisto na
sessão passada foi porque me persuadi, que esse regulamento fora feito para
aquelle caso somente e por termos sofrido do estado de perturbação em que se
achou a província . Estando porém informado que ainda vigora esse
regulamento, julgo de meu dever censura-lo, uma vez que as circunstâncias são
diversas (...)
177
O deputado Pereira e Souza foi certeiro. Suas palavras revelam a preocupação que ele
nutria pela economia regional, com ênfase na necessidade de o-de-obra no interior da
175
Idem.
176
Idem.
177
O Compilador Mineiro, 15 de Abril de 1844, p. 1. Hemeroteca Pública de Belo Horizonte.
74
proncia. O recrutamento era caracterizado como lesivo às liberdades individuais e denunciava-
se o descumprimento da lei correlata, que instaurava um clima de insegurança entre os
proprietários e comerciantes. Não é objetivo desse estudo verificar se os argumentos do deputado
são verdadeiros ou apenas intrigas oposicionistas, mas examinar-lhes o conteúdo. O sistema de
recrutamento forçado imposto pelas autoridades imperiais colocava os liberais em situação
bastante difícil naquele momento. Considerando que a maior parte dos cargos de mando estava
nas os dos conservadores, tornava-se difícil aos liberais proteger seus agregados da conscrição.
Essa incapacidade conjuntural de defesa dos agregados poderia se revelar desastrosa para os
liberais nas eleições. Pereira e Souza, sendo da oposição, preferiu enfatizar os argumentos
econômicos no intento de persuadir os deputados, independentemente da posição partidária, de
que o recrutamento, tal como então praticado, causaria prejzos a todos.
Na contramão do deputado Pereira e Souza, o presidente Soares de Andréia se preocupava
em aumentar os controles do Estado sobre o Guarda, sobretudo porque condenava a escolha dos
oficiais mediante eleição; para ele
Continua a existir nesta província um modo, já reprovado em outras, de terem os
oficiais de companhias eleitos pelos guardas delas, e é tão claro a
inconveniência de comandar por graça dos seus súditos, que direi desta vez que
é preciso acabar com esta anomalia, entregar-se ao governo a nomeação e
demissão de todos os oficiais.
178
Analisando a Guarda Nacional em Minas Gerais, Flavio Dias Saldanha entende que a
corporação teve um caráter descentralizado na sua concepção, o que permitia um fluxo de
lideranças locais dentro da hierarquia. Entretanto, com o “Regresso”, cada vez mais a instituição
se viu subordinada ao Ministério da Justiça, sofrendo um processo de centralização. Essas
reformas começaram:
178
Fala dirigida à Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais na abertura da sessão ordinária do ano de 1844
pelo presidente da Província, Francisco José Soares de Andréa. In: Site: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/448/index.html.
Acessado em 20/11/2003.
75
Em virtude de “dependerem dos guardas alguns oficiais, que, ambicionando a
reeleição, ou elevação à postos superiores, não os querem desagradar”, ou pela
“inconveniência de comandar por graça dos seus súditos”, a legislação
original da milícia cívica, na parte referente à nomeação dos postos, sofreria
interpretações dos governos provinciais no sentido de fazer com que a
hierarquia social presente na sociedade se refletisse nos quadros de comando
da Guarda Nacional.
179
O ano de 1844 também foi emblemático na medida em que se revelava difícil a
convivência dos deputados conservadores e liberais dentro da Assembléia. Não obstante a palavra
conciliação” estivesse sempre presente nas declamações, na prática muitos a consideravam uma
degeneração dos valores partidários, uma subversão da superioridade conquistada pela força e
impressa no funcionamento do Estado desde 1842. Por exemplo, quando o deputado Francisco
Duarte Ribeiro Badaró discursava na Assembléia em favor de um requerimento então em pauta,
o se furtou a combater a idéia de conciliação nos seguintes termos:
Fallou o nobre deputado em conciliação com os Santa Luzias, Sr. Presidente
não sou inimigo da conciliação, e de todo o coração abraçaria meos
adversários políticos, se elles renegando suas idéias anárquicas, quisessem
ligados conosco trabalhar na grande obra de reorganização do paíz: porém em
quanto esses homens jaetão-se do sangue, que espargirão, em quanto sustentão,
que o principio de resistência é dogma do homem social, fallar em conciliação,
é fallar em hum cousa impossível.
180
Era inadmissível para esse membro do “partido da ordem” que o indiduo subvertesse as
instituições e a ordem pública alegando o princípio de resistência privada como ação ordinária.
Nesse aspecto, parcela dos conservadores parecia totalmente contrária a qualquer doutrina ou
dogma” que conferisse ao indiduo ou à comunidade o direito de se insurgir ordinariamente
contra seus governantes. Isso não representava contradição, com o pensamento liberal, pois num
sistema representativo dependente do voto, com o pensamento liberal, pois as contestações
poderiam ser feitas de modo constitucional.
179
SALDANHA, Flavio Henrique Dias. Os Oficiais do Povo: a Guarda Nacional em Minas Gerais oitocentista, 1831-
1850. Dissertação de Mestrado, Unesp-Franca. 2005, p. 70.
180
Compilador Mineiro, Sábado, 23 de Março de 1844, nº 12, p. 4.
76
Outro aspecto ideológico interessante, no extremo das posições conservadoras, era a
opinião de um deles, deputado padre Jacinto José Almeida, sobre o Iluminismo:
Quando o nosso Povo apenas acabava de quebrar os ferros que o junglão à
Metrópole, quando carecia elle de se lhe distribuíssem Catecismos Religiosos,
que se lhe ensinassem a crer, foi quando se lhe entregou Voltaire, Rousseou,
Barão d’Holbach, Volney, Talleyrand, e quantas producções anafelficas, anti-
religiosas, e anti-sociaes o inferno em sua raiva vomitou sobre a infeliz França.
Honra pois ao Povo Brasileiro, que com tantos germes de destruição não esta
ainda affogado no cathaclysma da impiedade, e da anarchia. Por sem duvida
não tem elle semelhante na História do Mundo! He elle eu creio, o melhor dos
Povos do Universo.
181
As palavras acima servem para ilustrar o sentimento de reprovação que alguns
conservadores nutriam por toda uma geração de filósofos que se empenhou em derrubar o Áncien
Regime. O padre Jacinto Jo Almeida fez questão de ressaltar o caráter excepcional do povo
brasileiro, pois este não aderiu em massa aos ensinamentos “anti-religiosos” e anti-socieaes
advindos dessa linha de pensamento. Desqualifica-se tanto a corrente filosófica quanto os seus
adeptos. Dessa forma, os liberais eram apresentados como uma negação dos bons costumes: afinal
seriam eles os defensores das pregações do “inferno” que haviam entregue a “infeliz França” à
desordem. Parte dos conservadores em Minas Gerais agarrava-se a esses preceitos para recusar
qualquer trégua ou conciliação ao seu inimigo.
Pode-se avaliar o ano de 1844 em Minas Gerais como um período durante o qual as
paixões partidárias foram mais importantes do que qualquer coisa. Os Conservadores encastelados
no aparelho estatal se esforçaram em não ceder nada ao seu inimigo”, empenhando-se na
construção da hegemonia a todo custo. A Revolução de 1842 era constantemente lembrada para
estigmatizar o que sobrara de elementos liberais na Assembléia Provincial. Orbitando em torno do
presidente Soares de Andréia, os conservadores levantaram trincheiras e barricadas quase
inexpugnáveis. Entretanto, a anistia imperial aos revoltosos de 1842 e a conseqüente inversão de
gabinetes na Corte ensejaram a modificação do cenário político na Proncia, fenômeno mais
nitidamente palpável a partir de 1845.
181
Idem, terça-feira, 19 de março de 1844, nº 10, p. 4.
77
No plano nacional, Joaquim Nabuco ofereceu uma leitura acurada dos bastidores da
inversão” de 1844, segundo ele:
Em maio de 1844 Nabuco volta ao Rio de Janeiro, mas para assistir nesse
mesmo mês à dissolução da Câmara. No intervalo das sessões tinha-se dado o
grande choque entre o Imperador e Honório, e os liberais haviam feito com
Aureliano o mesmo pacto que este fizera em 1841 com os conservadores.(...) é
assim, exclusivamente em Pernambuco que o partido da Ordem vai combater,
de 1844 até 1848, apoiado apenas, na Corte, pelos chefes do Senado.
Estabelece-se, então, uma aliança estreita entre ele e o partido Conservador do
Rio, chamado Saquarema (...)
182
No tocante a Minas Gerais, em 1845, Soares de Andréia foi removido, assumindo em seu
lugar o vice-presidente Quintiliano José da Silva.
183
Este se mostrava conservador ao tomar posse,
mas produziu um relatório no qual era perceptível a intenção de transmitir uma imagem mais
moderada. Entretanto, em alguns momentos não se furtou de demonstrar seu descontentamento
diante da volta dos liberais ao poder na Corte.
A destituição de Soares de Andréia foi um duro golpe que a deputação conservadora teve
de suportar. Pelas Atas do ano de 1845, dispõe-se de alguns apontamentos sobre os problemas
surgidos naquele ano. Embora os trabalhos estivessem previstos para começar no dia 31 de janeiro
de 1845, isto só foi possível em 07 de fevereiro, na 9º Sessão Preparatória da Assembléia
Legislativa Provincial, quando se obteve o quorum necessário. nas primeiras sessões os
conservadores soltaram suas cargas contra o Quintiliano José da Silva. Exigiram e conseguiram a
aprovação de um requerimento pedindo explicações ao Presidente da Proncia (no caso era um
vice em exercício, pois o ministério não havia ainda designado um substituto) sobre as
providências tomadas para investigar o “horroroso atentado comettido contra o cidadão
Joaquim Bento Francisco”, datado de 13
de fevereiro de 1845. O autor desse requerimento foi o
deputado Gomes Candido.
No dia 19 de fevereiro de 1845, a Assembléia Provincial recebeu vários ocios (do Juiz
de paz de Nasareth, a 11 de agosto 1844, e do sub-delegado e juiz de paz de Conceição da Barra, a
182
NABUCO, Joaquim. Um estadista no Império. Rio de Janeiro: Topbooks, 5 Ed. 1997. P. 93-96.
183
A leitura de seu relatório foi bastante complicada. Explica-se: os originais do documento encontravam-se em
péssimo estado de conservação, o que complicou muito a leitura do documento. Sinceramente é uma enorme pena,
tendo em vista que esse é foi o 1 º relatório do “qüinqüênio liberal”.
78
12 de julho) reclamando da Lei 271, art. 6: “inconvenientes que resultão da execução do art. 6 da
Lei 271. Esta lei, promulgada ainda durante a presidência de Soares de Andréia, desmembrava
rias paróquias e vilas, criava novos munipios e extinguia outros.
A lei acabou revogada logo depois. Isso é muito significativo na medida em que se entende
que as localidades perderam parcelas de poder consideráveis com a criação das Assembléias
Provinciais. O documento não especificava, mas, ao que tudo indica, a Lei 272 feriu, de acordo
com as representações, ou criou muitas dificuldades para as localidades atingidas por elas. Talvez
tenha causado um reordenamento das forças dentro das localidades, posto que desmembrava
algumas freguesias. Os ofícios recebidos pela Assembléia Provincial demonstraram o quanto as
autoridades locais julgaram inconveniente tal medida. Atendendo a numerosos pedidos, a Lei foi
revogada e tudo voltou a ser como outrora. Os conservadores na Assembléia tiveram de ceder e
consentir no fortalecimento das localidades, reafirmando em âmbito provincial o que então era
feito nacionalmente com o ressurgimento dos liberais no cenário político nacional.
Num primeiro momento, isso pode parecer contraditório. Entretanto, cumpre considerar
que as Assembléias Provinciais não eram instituições desligadas das municipalidades, pois dentro
das primeiras os interesses locais possuíam grande peso. O Governo central tinha a necessidade
constante de promover negociações com as localidades. Isso conferia à política imperial um
caráter bastante dinâmico.
Em 1845 os conservadores ainda eram maioria na Assembléia Provincial Mineira,
presidida por Bernardo Pereira Vasconcellos, expoente conservador em Minas Gerais. Pelos anais
percebe-se que os deputados tinham consciência do momento político pelo qual o País passava;
em vários momentos transparecia o desgosto dos conservadores pela reabilitação dos liberais. O
deputado Miranda fez alguns comentários nos quais dava sua opinião sobre as mudanças
ministeriais, afirmando em tom de desabafo:
184
184
O Compilador Mineiro, Sexta-Feira 28 de fevereiro n 6, p. 1.
79
(...) Essa conciliação, que nunca teve por fim a paz (....) e sendo uma das
condições dessa torpe aliança a perseguição do partido da ordem, o extermínio
dos legalistas e a entrega destes aos seus mais hidagaes inimigos políticos,
tudo quanto observamos, não nos deve admirar, é uma conseguencia do
progresso do ministério actual.
Tenha-se presente o contexto no qual as palavras desse deputado eram ditas. Os liberais
voltaram ao poder com a anistia concedida pelo Imperador em 1844. Iniciava-se um período em
que os seus antípodas estariam alijados de uma maior representação na Assembléia Geral, nas
Assembléias Províncias, nas Presidências de Província, nos cargos Ministeriais ou em qualquer
situação de mando. O único local onde os conservadores poderiam ainda ser maioria era o
Senado, isso porque o cargo era vitalício. Essa instituição sofreria uma série de ataques visando
sua reforma ao longo do qüinqüênio liberal. Embora o Ministério composto pelos liberais falasse
em conciliação, tido estava para os conservadores que tempos diceis se avizinhavam, dado o
caráter de disputa beligerante existente entre os dois partidos.
Além disso, uma vez que as eleições provinciais dariam vitória certa aos liberais, os
conservadores mineiros alimentavam a perspectiva de que seriam perseguidos tal qual
perseguiram seus opositores. A remoção de Soares de Andréia da Presidência da Proncia por si
já anunciava uma mudança radical na situação. O vice que o sucedeu afigurava-se moderado
demais para vários conservadores e não lhes dava a sustentação necessária à defesa de seus
interesses eleitorais no interior da proncia. Não tardou para que surgissem na Assembléia
denúncias de assassinatos e corrupção eleitoral. Ouça-se, por exemplo, as reclamações do
deputado Cruz Machado:
Quantos attentados não estão impunes?Quantos não foram objetos de louvores,
e cobertos de uma certa gloria?sim elles estão cheios de triunpho (...)
mas,senhores, o 2 de fevereiro não odiava tanto os princípios quanto os
homens, e lhe era indiferente que fossem eleitos os Santa Luzias, palacianos,
bentevis, ou marombas, com tanto que nem um dos proseriptos tomasse parte do
grande banquete eleitoral: é por isso que a Câmara actual constitui um
amalgama de todas as opiniões violentas, que erão abraçadas pelas minorias
das províncias
185
185
Idem, segunda feira, 3 de março de 1845, nº 7, p. 3.
80
A tensão entre Quintiliano Jo da Silva
186
e a bancada conservadora na Assembléia
Provincial tendeu a aumentar significativamente. Por exemplo, o deputado Nogueira Barboza, em
acalorado discurso acerca das circunstâncias - segundo ele suspeitas, senão ofensivas à lei - em
que ocorreu o recrutamento de um funcionário público para o Exército, por ocasião das eleições
de 1845, declarou-se desgostoso com a nova administração da província, representada pelo
presidente interino Quintiliano José da Silva, em substituição ao general Soares de Andréia.
Segundo ele, “estas circunstâncias (...) revelão a alma ignóbil do obscuro (...), a quem foi
confiada a presidência da Província de Minas”. Não por acaso, foram aprovados vários
requerimentos nos quais se questionava o comportamento do vice-presidente da Província. Como,
por exemplo, o que segue transcrito abaixo:
“Requeiro que se peça ao Exmo Vice Presidente os seguintes esclarecimentos:
- 1 Se na Villa de Baependy houve acontecimentos contrários a ordem
publica por ocasião de 29 de Abril(? – leitura muito duvidosa) do ano passado.
- 2 Se por motivo delles houve homicídios ou ferimentos
- 3 Que provindencias se derão , e qual foi o resultado dellas
- 4 Que se envie uma por copia toda a correspondencia official à respeito .
- 17 de fevereiro de 1845
- Nogueira Barboza
187
Tudo indica que o grande problema do vice-presidente residia na sua identificação com o
Partido Liberal, apesar de sua declarada filiação aos conservadores, estes apeados do poder em
1844, com a anistia dos revoltosos de 1842 e a constituição do Gabinete de 2 de fevereiro, no
qual figuravam nomes do Partido Liberal.
A irritação dos conservadores foi visível na Assembléia Provincial. O discurso do deputado
Miranda é revelador na medida em que permite ter uma idéia dos humores dos deputados
conservadores em Minas Gerais.
186
Quintiliano José da Silva assumiu como vice-presidente da Província de Minas Gerais. Posteriormente foi
nomeado presidente da província por um gabinete liberal.
187
Idem, segunda feira, 3 de março de 1845, nº 7, p.5.
81
“Sr presidente, eu acho que as couzas vão caminhando muito bem: O Systema
de Conciliação foi proclamado. Foi a bandeira que hasteou o gabinete de 2
de Fevereiro, e todas as perseguições que aparecem, os males, os
sofrimentos blicos que pesão sobre a maioria da nação, não são senão
uma conseqüência muito natural dessa concilião, que nunca teve por fim
a paz, e a concórdia entre os membros da família brasileira, mas a
concórdia do governo com os homens, que pegarão em armas, derramando
sangue innocente de seus patrícios, quiserão decidir os destinos do império, e
sendo uma das condições dessa torpe aliança a perseguição do partido da
ordem, o extermínio dos legalistas e a entrega destes nas mãos de seus mais
fidagais inimigos políticos, tudo quanto observamos, não nos deve admirar, é
uma conseqüência do progresso do Ministério actual”.(Grifo nosso)
188
A crítica aqui se voltava contra dois fatos diferentes, porém confluentes: A Anistia e a
Conciliação. Aos conservadores afigurava-se ilógico chamar de volta ao governo um partido que
pegara em armas contra o governo. Considerava-se insano fazer a conciliação com um inimigo
que desejava o seu extermínio. As críticas do deputado Miranda foram completadas pela fala do
deputado Badaró:
O Ministério de 2 de fevereiro concedeo a annistia, mais foi isso o menos, eu
sempre respeitei esse acto, por partir do poder moderador, o preâmbulo do
decreto foi tardio, por que a rebellião foi justificada, e por tanto, repreendidos
aqueles que a esmagarão, e este pensamento (...) estava tanto na mente do
governo, que a imprensa governista declarou que os vencidos devião ser
annistiados e os vencedores punidos, e que forão demitidos todos os
empregados publicos que havião combatido a revellião, sustentados pelos
cabeças do movimento de 10 de julho (...) Mas eu sei que o governo entregou-se
aos vencidos para esmagar os vencedores (...) cujo o único crime consistia em
obedecer ao governo imperial, quando esse mandou combater esse partido que
impunhava as armas contra a lei de interpretação do acto adicional, contra a
lei de reformas e a lei do conselho de estado, é por que o ministério actual sabe
que a opposição repele o principio anarchico de resistência armada, que
nunca ira discentir dos seus princípios no campo de combate, que sobre tudo é
respeitadora da monarchia e das leis. (...) Não foi o voto livre, mais o voto
arrancado pela violência, obtido pela fraude, com a preferência dos princípios
mais santos da justiça e do publico decoro.(grifo nosso)
189
Essa fala é muito interessante por revelar as novas regras do jogo político então emergente.
Tais regras passavam por uma submissão ao Poder Moderador, pelo repúdio à liderança liberal e,
sobretudo, pelo compromisso com a manutenção da ordem política e da estabilidade interna,
negando o princípio também liberal de resistência armada contra a opressão.
188
Idem.
189
Idem, segunda feira, 3 de março de 1845, nº 7, p. 6.
82
A profusão de queixas à Assembléia Provincial sobre os abusos cometidos nas eleições foi
intensa. Além disso,
algumas personalidades saquaremas foram perseguidas e mortas. Após
acalorado debate, a casa legislativa encaminhou à Presidência da Proncia o seguinte
requerimento do deputado Vasconcellos, grande expoente conservador em Minas Gerais:
Requeiro que se solicitem ao exm. Governo da Província, todas as illustrações
acerca do processo instaurado em Pouso Alegre acerca do assassinato
perpetrado na pessoa do senador João Horta Leite Ferreira de Mello: que
andamento tem dado a esse processo (....). Requeiro mais copias das decisões
dadas pela presidência da província sobre a competência dos juizes de paz que
presidirão as elições. Copias das portarias, e quaisquer ordens tendentes a
eleição: o numero de reclamações, que apparecerão e o destino que se lhes
deo.
190
As reclamações não se limitavam à corrupção eleitoral - corrupção esta da qual
possivelmente a maioria já se beneficiara em algum momento de sua trajetória política. Em rias
ocasiões a indignação dos deputados extrapolava os limites da proncia. As denúncias sobre as
fraudes ocorridas nas eleições legislativas revelavam não as mazelas do sistema, mas também
evidenciavam o pânico dos deputados conservadores, que viam seus correligionários serem
batidos em todas as esferas e regiões. Comentando sobre a situação no Rio de Janeiro, o deputado
Cruz Machado fez as seguintes observações:
(...) Na província do Rio não houve eleição: veja-se como foram feitos os
eleitores de Saquarema! E ainda nos chamão de Saquaremas. Mas srs. A
depuração, a fraude e a violência deo o resultado que observamos: uma
amalgama de representantes da minorias turbulentas, numa liga do frio com o
quente, do grave com o leve, da luz com as trevas (...)
191
Na fala acima, o deputado Cruz Machado negava que seu partido fosse protegido daí o
termo “saquarema”. Ele entendia que os Liberais eram uma minoria, minoria turbulenta que pela
fraude” e “violência” lhes tomava o poder na Corte e no restante das proncias do Império.
Como se pode observar, as falas estão repletas de ressentimento.
Para os conservadores era difícil ver os vencidos de 1842 retornarem à cena política
cobertos de glória, impondo-lhes derrotas eleitorais em seus domínios, como que subvertendo o
190
Idem, quarta feira, 12 de março de 1845, n 11, p.2.
191
Idem, sexta-feira, 14 de março n 12, p. 2.
83
mundo criado por eles. Um mundo onde a hierarquia e a ordem deveriam prevalecer.
Horrorizavam-se quando recebiam notícias de que numa determinada localidade mineira,
quando ocorridas as eleições, os legalistas que mais influirão foram imediatamente mandados
para a cadeia”.
192
O que talvez lhes parecesse mais desolador era ver os liberais usarem os
mesmos artifícios dos quais outrora eles haviam se valido. Os mesmos mecanismos que
favoreciam a fraude eleitoral para os saquaremas agora se voltavam contra eles. O deputado
Pereira e Souza exprimiu na Assembléia, com muita alegria, sua opinião sobre o resultado das
eleições, segundo ele “as eleições estão sendo julgadas pelo paiz, forão julgadas pelo poder
competente e legalmente confirmadas”.
193
Como os conservadores defendiam a manutenção das instituições, mas estas não lhes
favoreciam, deparavam-se então com uma encruzilhada. Contestar as eleições passava por
contestar determinados instrumentos que eles próprios haviam forjado. Assim, chegou-se ao
ponto em que a criatura se voltava contra o criador. O único recurso de que dispunham para
extravasar sua indignação era ainda a Assembléia. Todavia, tal expediente encontrava na
medida que as eleições de 1845 deram ampla maioria aos liberais dentro da Proncia. O
deputado Rodrigues Silva encaminhou a seguinte representação ao Imperador em nome da
Assembléia:
(...), A Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais, Senhor prescinde de
narrar os attentados commetidos pela administração da província com o fim de
arrancar das urnas eleitores votos que elles jamais preferindo se a magestade
das leis tivesse sido acatada(...) A Assembléia Legislativa Provincial de Minas
Gerais não ousa dirigir a V. M. I. um voto de reprovação contra a política que
hoje dirige os destinos do Império, apenas se contenta e manifestar suas
appreenções acerca do futuro, se um systema governativo mais justo e
imparcial não for substituído ao que hoje domina essa infeliz província.
Senhor, a Assembléia Legislativa Provincial julga bárbara e cruel (...)
perseguir, daqueles cidadãos que em 1842, com tanta demanda pelejarão e
vencerão e prol das instituições do paiz.
194
192
Idem, p. 4.
193
Idem, segunda feira, 17 de março, n 13, p. 3.
194
Idem..
84
Tentando talvez ressaltar as diferenças entre conservadores e liberais, o deputado
Rodrigues Silva redigiu essa representação de maneira cuidadosa. Vale a pena analisar
brevemente os principais pontos de sua argumentação. Primeiro, ele não atacava diretamente o
Ministério, talvez temendo que um ataque direto aos Ministros do Imperador parecesse um
ataque direto ao trono. Limitava-se a atacar a administração da Proncia que representava essa
nova situação liberal. Segundo, seu alvo era a suposta ilegalidade do processo eleitoral em
Minas Gerais, que teria sido manipulado pela vice-presidência. Embora em momento algum a
Assembléia dissesse explicitamente que pretendia radicalizar suas ações, o fato de expressar
suas “apprenções acerca do futuro” caso a gestão da proncia não fosse modificada era uma
sutil ameaça. A Assembléia fazia questão de terminar lembrando que em 1842, eles, os
conservadores, haviam assegurado a estabilidade do Ps, salientando que não apenas pelejaram,
mas tamm venceram, deixando claro que vencedores não aceitavam ser tratados como
perdedores. Entretanto, o mais significativo nisso tudo é a data da representação: dia 07 de Abril
de 1845! Não havia como tecer ameaças de forma mais sutil.
195
Batidos em âmbito nacional, restou aos conservadores protestar na imprensa e no Senado
para tentar obstruir quaisquer avanços dos liberais. Dentro da Proncia o que se assistiu durante
a sessão da Assembléia de 1845 foi uma série de acusações de corrupção eleitoral feitas pelos
conservadores. O partido procurou apresentar-se como tima, porém uma tima que defendia
sempre a legalidade. Assim, o ano de 1842 continuava a ser lembrado e fincava-se uma
estratégia de desqualificação do inimigo frente à opinião publica. Nuvens escuras pairavam
sobre o Partido Conservador na Proncia.
em 1846, o que se presenciava era uma Assembléia Provincial composta em sua
maioria por liberais. O próprio discurso do novo presidente da proncia em fins 1845 revelava-
se muito distante da lógica centralista conservadora. Segundo Quintiliano José da Silva, agora
promovido:
195
Idem.
85
Ao governo não cabe organizar processos, nem licito lhe é perturbar a
marcha serena e regular da justiça, mas sendo seu rigoroso dever fazer
cumprir religiosamente a Lei, elle se não afastará d´esta tarefa, sejão quais
forem as considerações, que se lhe apresentem. Com quanto seja hum facto
averiguado que os Mineiros são dotados de um excellente índole, e que entre
elles, a civilização se acha repartida com huma quasi igualdade(...)
196
O novo mandatário fez questão de dar ao seu relatório um caráter mais eqüidistante,
embora se observe que os conservadores não tinham a mesma percepção, pois, como visto
anteriormente, eles não pouparam críticas ao novo presidente.
Ao comentar a posse do novo Bispo de Mariana, Quintiliano Joda Silva revelava sua
alegria pelo descomprometimento partidário do mesmo, insinuando que o antecessor era mais
parcial ao observar que um sacerdote não deve: Acobertar tantos crimes (ilegível) dos partidos
políticos para dividirem huma responsabilidade, que lhes era toda pessoal; por isso defendião-se
attribuindo todo ao espírito de partido, como se o ser partidista fosse huma missão do
sacerdócio.
197
Em ntese, pode-se inferir a partir das fontes expostas que, no período de 1844 a 1845, os
conservadores mineiros esforçaram-se para imprimir à Proncia sua lógica de governo.
Combateram e não deram espaço aos poucos deputados liberais que compunham essa legislatura.
Agiram de forma a proteger seu homem de confiança, o General Soares de Andréia, e passaram a
sistematicamente a atacar o novo presidente, Quintiliano José da Silva, assim que este assumiu a
presidência da proncia. Nutriam forte identidade grupal, identificando-se como defensores da
monarquia, da ordem e da própria fé católica, na medida em que consideravam as idéias do
Partido Liberal contrárias a tudo isso. Talvez quem melhor exprimiu o sentimento dos
conservadores e relação àquele momento político tenha sido o deputado Firmino, nas seguintes
palavras:
196
Falla Dirigida Á Assembléa Legislativa Provincial De Minas Geraes Na Sessão Ordinaria Do Anno De 1845 Pelo
Vice-Presidente Da Provincia, Quintiliano José Da Silva. Ouro Preto, Typ. Imparcial De B.X. Pinto De Sousa, 1845,
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/449/index.html em 20/05/2003, 14:50.
197
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/449/000013.html em 20/05/2003, 15:00
86
O Governo deo as posições officias ao partido nacional para este o sustentar na
falta de apoio dos homens que querem a liberdade sem a ordem, cujos esforços
se dirigiam a obter a alliança desses dois únicos grandes elementos da
grandeza e prosperidade das nações. Houve pois um verdadeiro contracto entre
o poder e o partido nacional, e nada de ais ridículo do que explicar pelos
laços de gratidão a alliança do poder com os homens de junho, a gratidão não
é, nem pode ser, o resultado de um contrato oneroso.
198
3.2- Mudanças na Maré
A volta dos liberais ao poder na Corte redundou no revigoramento da oposição liberal em
Minas Gerais. O chamado “qüinqüênio liberalcomeçou em 02 de fevereiro de 1844, terminando
em 29 de setembro de 1848, período durante o qual seis gabinetes passaram pela Corte. Apesar
disso, no conjunto os seis gabinetes considerados não conseguiram domar a oposição da
“Patrulha” no Senado, agindo “trôpegamente por dissensões de todo o tipo”.
199
A “Patrulha” era
a alcunha dada aos senadores conservadores que fizeram cerrada oposição aos Ministérios entre
1844 a 1848. As grandes teses liberais não foram postas em prática. Segundo Francisco Iglésias:
Realmente, ao fim de um qüinqüênio de exercício do poder, as grandes teses
liberais de reforma da Guarda Nacional, a questão das incompatibilidades, a
reforma da lei de 3 de dezembro de 1841, entre outras, não haviam sido
votadas, em mesmo debatidas como deveriam. Elas convinham ao partido no
poder. Demais, não havia unidade liberal sobre elas, como se sobretudo na
questão do exercício da magistratura, tese defendida pelos praieiros e
combatida pelos luzias do Sul.
200
Se na execução de seus projetos nacionais os liberais o lograram êxito, não se pode dizer
o mesmo quanto à condução dos necios provinciais. Ao longo desse período, os liberais dos
Gabinetes apoiaram ostensivamente seus associados nas Proncias, freando a centralização. O
máximo que a oposição conservadora na Corte podia fazer era estabelecer uma trincheira
defensiva no Senado, espaço em que, dada a vitaliciedade, os conservadores eram maioria. Nas
proncias, estes foram batidos e reduzidos em seu número de representantes legislativos.
198
Idem.
199
IGLÉSIAS, Francisco. Vida política, 1848-1868. In HOLANDA, rgio Buarque de .T. II. História Geral da
Civilização Brasileira. São Paulo: Difel, 1974. P. 09.
200
Idem , p. 11.
87
Em Minas Gerais, como já apontado, Soares de Andréia foi substitdo por Quintiliano
José da Silva. Este permaneceu na presidência por três anos (1845-1847), após o que foi sucedido
outro liberal, Bernadino José de Queiroga. Tanto este como aquele trataram de favorecer seus
aliados políticos e prosseguiram as obras de infraestrutura dentro da província. Suas ações
caminharam numa linha tênue entre a legalidade e a ilegalidade, acusados muitas vezes de
contrariar a lei em proveito de correligionários locais.
no início dos trabalhos, em 1846, os deputados liberais empenharam-se deliberadamente
em barrar o acesso à Assembléia Provincial aos conservadores. Como muitos destes haviam sido
eleitos suplentes, a estratégia situacionista consistiu em não chamá-los, ou postergar-lhes a posse
dentro do possível. O parecer emitido pela comissão de poderes da Assembléia e transcrito abaixo
permite vislumbrar a questão
O sr. Alcântara Machado, como relator da Commissão de Poderes leu e
mandou a mesa o seguinte: A commissão de poderes a quem foi apresentado o
diploma do sr Firmino Rodrigues Silva, entende que estando em discussão o
parecer sobre o diploma do sr. Francisco Diogo Pereira de Vasconcellos, se
deve esperar pela aprovação da Casa
201
Se a deputação anterior, de maioria conservadora, nutria profunda antipatia pelo
presidente da proncia em função do seu apoio cada vez maior aos liberais, a nova, que tomara
posse em 1846, mostrava-se extremamente disposta a cooperar com a Presidência. As Atas da
Assembléia deixam claro esse sentimento de empatia. Por exemplo, foi aprovado um
requerimento do deputado Faria e Castro que pedia a criação de uma comissão para redigir os
votos de graça ao novo presidente de forma no qual se manifeste a mais sólida confiança que a
Assembléia deposita na sua administração, bem como o mais dedicado apoio, que esta decida a
prestar-lhe”.
202
Para tanto, o deputado contou com a anuência irrestrita da casa legislativa.
Das deputações até aqui examinadas, essa parece ter sido uma das mas alinhadas com a
Presidência da Proncia. O orçamento sofreu varias emendas, a região do centro de Minas foi
muito beneficiada, vários pagamentos pendentes foram autorizados pela Assembléia. Além disso,
201
Idem.
202
Ata da Assembléia Legislativa Provincial Mineira. de 1846, Al 3/28 encad. 61, p.245.
88
continuaram os investimentos em estradas. Nesse ano Assembléia votou várias comissões de
deputados para irem congratular-se com o presidente, em diversas ocasiões o aniversário da
Imperatriz, o aniversário da Constituição do Império e também uma comissão para felicitá-lo pela
sua posse, que anteriormente Quintiliano José da Silva era vice-presidente
203
–, revelando uma
relação muito cordial com o Executivo.
Ainda em 1846, o presidente Quintiliano Joda Silva informava em seu relatório que o
Imperador conheceria in loco todas as províncias do Império, devendo ir ao Sul em breve e talvez
passando por Minas Gerais. Fez questão de ressaltar que O Monarcha observa pessoalmente o
Estado do Império, e fica habilitado parar remediar os males de seus fieis súditos”.
204
Quando da
visita do Imperador à capital de Minas Gerais, ainda em 1846, a Assembléia votou uma comissão
de sete deputados para recepcioná-lo fora da cidade, fazendo questão de passar a imagem de uma
Assembléia unida.
205
Falando a respeito do poder do Imperador, o presidente afirmava que Huma
vontade superior aos partidos, terminando todas as discordias, abranda, e faz desapparecer o
terrível frenesi das facções, que tantos males nos tem causado”.
206
Um ambiente de euforia se apossara da Assembléia Provincial. Compartilhando do
otimismo que cercou esta e a Presidência da província, o deputado Cônego Roussim comentava:
“Srs a actual administração tem desenvolvido um programa de sua política que
é estabelecer a conciliação , e por isso não tendo tirado de suas posições a
maior parte dos empregados (...) o governo não tem admitido a política de
exclusivismo: tem conservado todo o pessoal que empregado pelas
administrações passadas (...)
207
Pelo que se nota, nesse primeiro momento os liberais mineiros pareciam compartilhar das
intenções do governo central de pacificar as lutas partidárias. A conciliação, mesmo ainda não
203
Idem.
204
Falla dirigida á Assembléa Legislativa Provincial de Minas Geraes na sessão ordinaria do anno de 1846, pelo
presidente da provincia, Quintiliano José da Silva. Ouro Preto, Typ. Imparcial de B.X. Pinto de Sousa,
1846,http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/450/000004.html, em 18/11/2003, às 20:00.
205
Idem.
206
Falla dirigida á Assembléa Legislativa Provincial de Minas Geraes na sessão ordinaria do anno de 1846, pelo
presidente da provincia, Quintiliano José da Silva. Ouro Preto, Typ. Imparcial de B.X. Pinto de Sousa,
1846http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/450/000005.html em 18/11/2003, às 20:30.
207
Idem.
89
sendo uma realidade plena, já era buscada e fazia parte do dicionário político do “qüinqüênio
liberal”. Ao mesmo os situacionistas afirmassem trabalhar pela concórdia dentro da proncia,
alegando não estarem promovendo perseguições ou expurgos, na prática, como visto, barravam o
acesso à Assembléia aos conservadores utilizando expedientes eleitorais duvidosos nada que os
conservadores quando no poder não houvessem feito e, claro, trabalhando com um corum
menor de deputados, justamente para não ter de chamar os suplentes conservadores.
A média de comparecimento às reuniões da Assembléia situava-se em torno de 19
deputados, mas o regimento da Casa exigia que fossem convocados 36. Na prática, na Legislatura
de 1846 a 1847, tomaram posse 22 deputados. Desta maneira, se não existia exclusivismo no
tocante à distribuição dos cargos públicos provinciais, no que se refere ao centro decisório a
política consistia em manter os conservadores fora da Assembléia. Fica evidente que a reclamada
conciliação estava longe de se efetivar.
Entretanto, se de um lado o otimismo aumentava, outros problemas surgiam e
representavam sérios empecilhos para a administração. O presidente expressou em seu relatório
grandes preocupações quanto à organização das forças policiais dentro da Proncia. A respeito da
necessidade de aumentar-lhes o efetivo, observou que “Tendo-se recolhido à Corte do Império,
por ordem do Governo Imperial, a Força de Linha, que existia nessa Província, não temos hoje
para o serviço senão o Corpo Policial e as duas Companhias de Pedestres do Gequitinhonha e
Rio Doce”.
208
Daí inferia o seguinte:
Tornando-se pois de maior urgência o augmento da Força Policial, devo
declarar-vos que sobre sua organização a experiencia deve ter convencido
da necessidade de alguma reforma. O atual regulamento assim como esta, não
pode contribuir para manter a disciplina do Corpo(...).
209
Fica claro pelo fragmento acima que existiam duas preocupações: aumentar o efetivo
militar e tornar mais fortes os mecanismos disciplinares para evitar eventuais distúrbios na tropa.
Ele concla:
208
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/450/000011.html.
209
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/450/000012.html.
90
(...) e por que este tem necessariamente de ser augmentado, eu vos proponho a
creação de huma Companhia de Cavallaria , e outra de Infantaria denominada
de addidos, a primeira em atenção ás multiplicadas diligencias do serviço
publico, que demandão o emprego de Praças de Cavallaria, e a segunda, que
deve ser tudo sujeita aos Regulamentos do Exercito, afim de terem ella praça
os indivíduos que não apresentarem os documentos de que trata o artigo 10º do
Regulamento N. 6, assim como aquelles que, pertencendo á outras
Companhias se mostrarem incorrigiveis por sua má conducta..
210
Sentindo-se fortes e seguros, os deputados liberais na Assembléia Provincial em 1847
continuavam a agir com tranqüilidade e tocavam adiante seus projetos para Minas Gerais. Ao
mesmo tempo, na Assembléia Geral os liberais da Praia causavam prejuízos e perturbações sérias
dentro da Casa e já emergia no horizonte o confronto que envolveria o Trono, o Senado e a
Câmara dos Deputados por conta da eleição doder da Praia, Chichorro da Gama.
As oscilações políticas não impediam, contudo a atenção para a infra-estrutura material da
proncia.Um dado importante que permite entrever a preocupação dos liberais com o
melhoramento dos meios de transporte, sobretudo estradas que pudessem ligar Minas Gerais aos
centros de poder político e econômico do Ps, foi a Indicação apresentada pelo deputado
Bandeira “para que se dirija a Assembléia Provincial do Rio de Janeiro uma representação
expondo a necessidade de fazerem-se construir a Estrada que segue do Parahybuna até a Cidade
de Petrópolis”.
211
O deputado mineiro França Leite já demonstrara na Assembléia Geral os
malefícios da carência de infra-estrutura para a economia mineira e paulista:
A Província de Minas Gerais e o interior de São Paulo são sem duvidas os que
ais soffrem pelas dificuldades do transporte (....) e por isso mesmo que
offerecendo um transporte fácil, e de horas , por diminuto preço, faz com que
as ricas produções possão chegar aos grandes mercados do Brazil e da Europa,
sem sobrecarregados de grandes despezas. Eu lembro-me de um exemplo que
me foi subministrado pelo nosso colega Sr. Ottoni. Disse-me ele que Minas
Novas produzia uma grande abundancia de algodão da melhor qualidade, de
cujo producto o paiz não tirava vantagem alguma porque a conducção para o
Rio de janeiro era muito difficil, vindo os gastos com transporte, sem imbutir os
gastos da produção a ser superiores ao preço que no mercado encontrava o
mesmo gênero: aqui temos pois uma produção muito vantajosa perdida
inteiramente no interior da Província por causa da falta de transporte.
212
210
Idem.
211
Idem.
212
Annaes do parlamento Brazileiro. De Agora em diante APB. Câmara dos Srs. Deputados. Primeiro Anno
daLegislatura, Sessão de 1847, Tomo Primeiro. Rio de Janeiro, Typografia de H. J. Pinto, 1880, pp. 23-24.
91
Diante desses problemas e dos prejzos que a falta de estradas provocava, a Assembléia
Provincial, juntamente com a Presidência, deveriam agir para diminuir os custos do transporte de
mercadorias aos centros consumidores. Novamente a Assembléia discutiu a continuidade da
Estrada Normal do Parahybuna, considerada de vital importância para a proncia, já que a ligava
à Corte no Rio de Janeiro; além disso, a via tornar-se-ia o meio pelo qual os produtores de café do
Vale do Paraibuna escoariam sua produção para os portos do Rio de Janeiro.
A volta dos liberais ao poder permitiu que algumas lideranças do movimento de 1842
pudessem retornar a vida política. Uma delas era Theofilo Benedicto Ottoni, que reapareceu na
Assembléia Provincial após longo período afastado. Como prova de seu revigorado prestígio, fora
nomeado, juntamente com alguns outros cidadãos, pela Assembléia Provincial para felicitar as SS.
MM. Imperiais pelo nascimento da Princesa Isabel. A designação partiu do Presidente da
Assembléia e contou com a anuência da mesma. Mesmo não sendo deputado, Theofilo Ottoni
contava com grande prestígio frente às demais lideranças liberais da proncia. Outra liderança, o
padre Antonio Marinho, havia conseguido se eleger deputado por Minas para a Assembléia Geral.
As relações entre Assembléia e Presidência continuavam amigáveis, mas embora toda a
deputação fosse composta por elementos ligados ao Partido Liberal, em 1847 surgiram algumas
dissensões. O deputado Joaquim Camillo de Britto, na sessão do dia 18 de março, fez chegar à
mesa uma declaração sua, na qual se manifestava contra as licenças administrativas concedidas
pela Assembléia a alguns “empregados públicos”. Segundo ele tais licenças foram:
Concedidas pela Assembléia por entender que elas se equivaliam a
aposentadorias e “(...)1 por entender não estar nas raias das attribuições dos
Corpos Legislativos Provinciais dar tais aposentadorias ou licenças, em face do
que dispõe a Constituição política do Estado. 2 por não julgar conveniente nem
justas tais dispensas , antes comprometterem granvemente o futuro financeiro
da Província : injustas porque achando-se em idênticas circunstancias muitos
outros Cidadãos pertencentes às classes dos agricultores e negociantes,
nenhuma providencia se tem tomado para diminuir seu desgraçado futuro,
sendo que estas classes concorrem poderosamente para a sustentação da
sociedade.
213
213
Idem
92
Pouco tempo depois, o mesmo deputado tornou a se pronunciar nos seguintes termos:
Eu abaixo assinado declaro que votei contra o Parecer da Comissão de
Fazenda Provincial, que dava licença por tempo ilimitado à alguns Empregados
Públicos: 1 por entender que licenças com tal caráter equivalem à
aposentadorias, o direito de cuja a decretação não é liquido que pertença às
Assembléias Provinciais. 2 por aumentar as despesas da Província. 3 por
entender que os agraciados não estão em circunstancias de as merecer.
214
Evidentemente, a atitude do legislador não significou uma grave crise política dentro da
Proncia, mas serve para ilustrar que a unidade de sua bancada não era tão sólida. Também
demonstra que os liberais em Minas não eram monolíticos, mas possuíam uma certa diversidade
de opiniões sobre gestão do Estado e comportamento político.
Também na Assembléia Geral o comportamento da Assembléia Provincial era
questionado pelo deputado conservador Carvalho, da província do Mato Grosso:
Sr. presidente, em 1843 a província de Minas Geraes decretou o imposto de 4$
por cada animal que entrava naquella província, em 1845 porém, o corpo
legislativo, tomando em consideração a inconstitucionalidade de semelhante
imposto, decretou a revogação (...) Mas sr. Presidente, não obstante esta
decisão do corpo legislativo, continua o mesmo imposto terrível a parar sobre o
commercio de duas províncias do império, Goyaz e mato Grosso, e porque?
Porque a assembléia provincial de Minas Geraes entendeu que lhe era justo
decretar um imposto revogado e reconheccido inconstitucional pelo poder
competente, uma vez que ele aparecesse debaixo de outro titulo e de outra
denominação. O senado, na sessão do anno passado, tomando conhecimento
dessa lei provincial mineira que contem essa disposição já revogada pelo corpo
legislativo, adoptou e offereceu a consideração da câmara um projeto que tem
por fim declarar o imposto de 4$ que ora apparece em uma outra lei provincial
de Minas Geraes, esta comprehendido na revogação feita pela resolução de 4
de maio de 1845.
215
O deputado Carvalho reclamava de um imposto que teoricamente já deveria ter sido
abolido e, no entanto, continuava em vigor na proncia de Minas Gerais, numa decisão unilateral
da Assembléia Provincial.
Também no parlamento nacional, o deputado conservador Manoel Junqueira criticava os
abusos cometidos pelos liberais em Minas Gerais, esforçando-se por mostrar que os
conservadores no poder não se excediam no exercício da autoridade claro que tal afirmação
214
Idem
215
APB, 1847. p. 164-165
93
deve ser problematizada. Para ilustrar o comportamento tolerante” dos seus congêneres, o
congressista descreveu a seguinte situação:
(...) conversando com o ilustre general que o governo havia encarregado da
pacificação da Província de Minas Gerais, como que indicando-lhe a marcha
que ele deveria seguir nessa província, chegou a certo ponto quando o illustre
general lhe disse que a commissão era honrosa, mas que era espinhosa, que elle
havia de cumprir seus deveres; que se fosse recebido de armas na mão, seria
forçado a repellir a agressão, mas que se o recebessem em paz elle os traria
amigavelmente e não praticaria um acto que provasse hostilidade a
província .
216
Ainda que padecendo de fissuras internas e sofrendo oposição dos conservadores na
Assembléia Geral, os liberais em Minas deram prosseguimento a uma estratégia de consolidação
do poder e reabilitação frente ao fracasso de 1842. O ponto alto desta linha de ação se deu pela
voz do deputado Salomé. Em 1846, existia um requerimento na Assembléia Provincial pedindo a
elevação do Arraial de Santa Luzia à condição de Vila. Discutindo tal projeto, o legislador
pronunciou-se desta arte:
Sr Presidente, vou mandar a Mesa huma pequena emenda sobre o primeiro
artigo do Projecto: e a seguinte, aonde se nesse artigo Villa de Santa
Luzia diga-se Villa Eterna de Santa Luzia. (...)Esse nobre deputado de certo
quer dar bom testemunho sobre ao movimento que teve lugar em Santa Luzia
em o memorável dia de 20 de Agosto de 1842 (...). Srs, quando os antios
querião eternizar algum acontecimento memorial, levantavão-lhe um
monumento e nós que devemos eternizar o maior acontecimento ocorrido nessa
Província para encomendar à lembrança dos vindouros, não podendo agora o
fazer de outra maneira, consegui-mo-lo por força de acto desta Assembléia que
attesta nossa gratidão para com os briosos Mineiros, que não duvidarão de
expor sua vida, e fortuna, appoiando-se numa força armada aos inimigos da
Constituição e do Imperador (appoiado) (...) Já se foi o tempo em que a palavra
Santa Luzia era pronunciada com horror, medo e repugnância: se foi o
tempo em que por ella se designava tudo quanto de pior no Mundo, que era
sinônimo de infâmia e perversidade. Hoje porém felizmente já nos achamos bem
longe desse tempo (...) Hoje o nome de Santa Luzia se ao homem
reconhecido partidista da nacionalidade Brasileira (appoiado) (...) Eu abraço
meu aparte, porque Srs eu desejo perpetuar a memória do generoso movimento
de 42.
217
Do trecho acima pode-se extrair vários apontamentos. Parece que a bancada liberal
desfrutava então de um momento tão singular que o via motivos para esconder os
216
APB, 1847.P. p. 441
217
Idem.
94
acontecimentos de 1842. Eles não se orgulhavam de sua participação na Revolução de 1842
como tamm faziam questão de redimi-la aos olhos da Nação; daí elevar-se o Arraial de Santa
Luzia a Villa, desmembrando o munipio de Sabará, e ainda por cima trocar-lhe o nome. Na
concepção do deputado Salomé, os eventos de 1842 serviram para distinguir os “inimigos da
Constituição”, no caso os conservadores, dos partidistas da nacionalidade Brasileira”.
Talvez essa autodenominação visasse associar os conservadores ao elemento português ao
a qualquer outra coisa que não fosse legitimamente nacional. Se em outros momentos estes
haviam tentado se valer publicamente de seus feitos em 1842, agora os liberais, amparados pelos
sucessivos Ministérios na Corte, faziam questão de recordar que naquele ano alguns “briosos
Mineiros” o “duvidarão de expor sua vida e fortuna” em prol do Imperador e da Nação. Até
então apenas os conservadores invocavam seus mártires de 1842 para atestar patriotismo. A
inversão” de 1844 não significou apenas uma mudança de direção ministerial, mas uma
oportunidade de redenção para os liberais mineiros. Tal projeto passava pela necessidade de
alterar aquilo que até aquele momento tinha sido o motivo de sua vergonha: Santa Luzia. Cumpre
recordar que os conservadores alcunhavam seus antípodas de Luzias justamente em alusão à
derrota que lhes impuseram naquele arraial.
Essa estratégia demandava a construção de “monumentos” que pudessem moldar a
memória coletiva à nova realidade do poder. Mais do que nunca, tratava-se de conseguir uma
viria ideológica, de conquistar a hegemonia, de fazer com que 1842 não fosse mais lembrando
como o ano da grande derrota liberal, mais como um momento em que sacrifícios foram feitos em
nome do Ps. Tratava-se “de perpetuar a memória do generoso movimento de 42”. Ao que tudo
indica, esses deputados possuíam boa noção da importância de se construir mbolos e da
necessidade de moldar a memória nacional.
218
218
Tal artifício será empregado muitos anos depois, depois da Proclamação da Republica. Os heróis republicanos
foram heróis moldados segundo a natureza do novo regime político. É inevitável pensarmos o quanto determinados
aparelhos de dominação são repetidamente usados ao longo dos culos, sempre para “perpetuar a memóriados
vencedores. Sobre isso ver: CARVALHO, José Murilo. A Formação das Almas.
95
Entretanto, a Assembléia discutiu longamente o nome mais apropriado para a nova Vila.
O deputado Catão, por exemplo, sugeriu que o nome fosse outro, tendo em vista que foi a pessoa
“(...) Augusta do Imperador que teve de lugar o Acto do Poder Moderador que mandou por fim
nas perseguições de que se fazião na Província”. Assim, em deferência ao Imperador, ele pedia
que a localidade fosse batizada o como Villa Eterna de Santa Luzia, mas como “Villa Nova da
Imperatriz”. outro deputado, o sr. Carvalho, propôs que o nome fosse “Villa Heróica de Santa
Luzia”. Estranhamente e sem mais explicações, a opção final foi pela manutenção da antiga
denominação.
219
Talvez uma das razões do recuo liberal nessa questão tenha sido a forte oposição ainda
existente na esfera nacional. Se na província os deputados tentavam dar novo significado para
1842, no parlamento nacional os conservadores remanescentes travavam uma guerra para manter
o significado de rebelião do movimento. À frente dessa luta estava o deputado Manoel Junqueira,
que, discorrendo sobre 1842, discursava em referência aos liberais:
(...) as proposições que se lanção no meio da representação nacional contra
uma maioria do paiz real que tantas provas tem dado de seu amor á ordem, de
sua adhesão á sagrada pessoa do monarcha e a constituição que nos rege?
Seria facção aquella porção de brasileiros que nos dias nefastos de 1842 se
levantou como um homem para chamar aos seus deveres os que ousarão
levantar o estandarte da rebellião, e derramar o seangue de brazileiro nos
campos de Venda Grande e Santa Luzia? Se isto é facção, declaro em alto bom
som que pertenço a ela, mas um monarchista desta ordem, um monarchista sem
tacha, não podia entregar ao olvido, para não dizer coisa, semelhante
proposição. Querem tornar odiosa um porção de homens que desta casa e fora
della têm constantemente sustentado as idéias ordem? Que tem concedido ao
governo todos os meios de que te carecido para a marcha da aministração?
Querem tornar odiosa a nós que com nossos esforços e a outros que com seu
sangue e com seu dinheiro acudirão ao chamado do Throno quando o Throno
precisava do auxilio de seus filhos? (...)”“(...) Nós, senhores, nos dias de perigo
concorremos ao chamado do Throno; e nos dias de perigo(...) ainda nos
levantamos para combater a esses que ousarão levantar o grito da rebellião
em S. Paulo, em Minas , ou em qualquer outra província do Império.
220
Afigura-se evidente que os conservadores tentavam a todo custo afirmar sua identidade em
torno da vitória no campo de Santa Luzia em 1842. Impunham-se como patriotas e partidários da
ordem e apresentavam-se como defensores do trono, proclamando-se monarquistas. Emblemático
219
APB, 1847.P. p. 441
220
APB, 1847. P. 443-444.
96
foi o fato de o deputado referir-se à atuação dos conservadores em 1842 como ações de “filhos”
que prestavam auxílio ao “Throno”, reproduzindo uma relação filial entre os conservadores e o
monarca. Ainda nesse movimento de contra-ofensiva, outro congênere mineiro na Assembléia
Geral denunciava os abusos cometidos em sua proncia de origem, abusos estes que já estariam
se tornando “costumes” entre os liberais de todo o País:
Quando algum magistrado, por mais recto e inteligente que seja, não vai de
acordo com os interesses dos grupos que em alguns lugares se ostentão
defendores da política do governo, todas as intrigas, todas as calunias são por
ellas empregadas para obter do governo a remoção desses magistrados; e
quando as não obtêm, recorrem a um meio que vai se generalisando na
província de Minas, consiste este meio em armar um processo ao magistrado
por qualquer pretexto, pronuncia-lo, prende-lo e atribuir tudo a política, e
ainda que os processos não tenhão de ir adiante, servem para vingar-se do
magistrado, e apresentar ao governo como necessidade a remoção, porque se
diz que o magistrado contra quem procederão não pode mais administrar
justiça naquelle lugar (...)
221
Nessa conjuntura de guerra entre os partidos, encontrar meios de remover magistrados
comprometidos com um ou outro lado era de fundamental importância. Rebatendo essa acusação,
o deputado pela Assembléia Geral, Antonio Marinho, que participara intensamente do movimento
em Minas em 1842, afirmava:
( ...) mas depois de se ter dissolvido previamente uma câmara, depois de se ter
dado instruções contra todo o direito constitucional para a eleição de uma nova
, depois de terem entregado o voto do cidadão á poeira, esses mesmo que hoje
clamão pela expressão do voto, o que fizerão? Removerão, demittirão e
nomearão para Minas um presidente que sabião ser um tição que se ia lançar á
mina (...) Corremos para Barbacena, onde tínhamos mais forte apoio, e
entendemos que não para sustentar os direitos civis e a liberdade de voto,
mas para garantir as nossas próprias vidas (appoiados), nhamos necessidade
de pegar e armas(...) Eu pertenço a um partido, esse partido comprometeu-se , e
eu me comprometi com elle com tal fidelidade com tal convicção que tínhamos
praticado um acto que por maneira nenhuma nos deshonrava (...)
222
Vê-se que os liberais mineiros tentavam a todo o momento imputar aos seus inimigos a
responsabilidade pela conflagração de 1842. Além disso, alegavam que os conservadores quando
221
APB, 1847.P. 128
222
APB, 1847. P.675-676.
97
no poder valiam-se dos mesmos métodos que ora criticavam. A Rebelião aparece aqui como um
ato destinado a salvaguardar a sobrevivência frente a um inimigo que ansiava em devorar sua
presa, em aniquilar totalmente o oponente. Por isso, Antonio Marinho não se sentia desonrado por
ter se insurgido.
Em ntese, durante o período ora examinado, liberais e conservadores buscaram
estratégias similares para se consolidar no poder em Minas Gerais. O biênio 1844-1845 foi
marcado pela hegemonia conservadora na Assembléia Provincial. a partir de 1846, tanto a
presidência da proncia quanto a deputação identificavam-se em maior ou menor grau com o
Partido Liberal. A oposição era representada por alguns conservadores que conseguiram se eleger
para a Assembléia Geral. Ainda nesse período, os liberais tentaram conferir novo significado à
Revolta de 1842, dando-lhe uma conotação de ato patriótico, buscando, além da sobrevivência
política, sua redenção frente à História.
98
Capítulo 4
Forças Pendulares
Neste capítulo tratar-se-á da situação política em Minas Gerais a partir de 1848.
Observamos até agora uma dinâmica relação entre conservadores e liberais na Proncia, marcada
por constantes oscilações. Tais movimentos resultavam da necessidade constante de ligação entre
o poder central e lideranças provinciais. Estas, mesmo apoiadas pelo Rio de Janeiro, precisavam
estabelecer alianças dentro da Assembléia Provincial para viabilizar seu governo e implementar as
medidas propostas pelos Ministérios. A referência bibliográfica para os eventos históricos listados
é Francisco Iglesias, Vida Política, 1848-1868.
Pelas informações coletadas, a Assembléia Provincial de Minas Gerais não atuava segundo
o que eventualmente constituiria o ideário trico dos partidos que a compunham. Na verdade, ao
mesmo tempo que alguns deputados demonstravam conhecimentos profundos sobre a situação
política da Europa e os principais tricos do liberalismo; outros seguiam uma lógica pragmática,
buscando agradar suas clientelas no interior da província e, simultaneamente, conciliar os
interesses provinciais com os interesses partidários.
Também afigura-se evidente que, após a presidência do general Soares de Andréia, a
proncia de Minas passou a ser governada por administrações comprometidas com o Partido
Liberal, as quais mobilizaram a máquina eleitoral para eleger deputações favoráveis. Nesse
período, percebe-se uma clara tentativa dos liberais mineiros de conferir novo significado ao
movimento de 1842, pois muitos entendiam que a hegemonia política seria possível a partir de
uma releitura desse acontecimento, desqualificando a tese de “rebelião e dando-lhe uma
conotação patriótica.
Neste capítulo será exposta a subseqüente reação conservadora, não só no âmbito da
Proncia, como é natural, mas também a vel nacional. Demonstraremos os elos entre ambas as
99
esferas e suas conseqüências para a construção de um projeto que inseria Minas Gerais,
juntamente com as demais províncias, na construção do Estado-Nação Brasileiro.
4.1 – O Naufrágio
Em 1848, os liberais em todo o País sofreram um duro revês. Houve uma nova inversão
Ministerial e o Gabinete anunciado pelo Imperador foi composto por conservadores. Era o
Gabinete de 29 de setembro, cuja liderança era ocupada por homens como Visconde de Olinda
Presidente do Conselho e Euzébio de Queiroz na pasta da Justiça. Nas Assembléias Provinciais,
os liberais perderam seu esteio ministerial.
O novo presidente da proncia, Bernadino Jo de Queiroga, tomara posse em 04 de
novembro 1848. Ao assumir reconheceu a complexidade da situação, pois se tratava da “mais
populosa e importante província do Império”.
223
Na nova conjuntura, em que cada vez mais a
cafeicultura despontava como fonte de riqueza, o presidente voltou suas atenções para a questão
das estradas. De acordo com o relatório, a principal estrada de Minas Gerais, a Estrada do
Parahibuna, consumia 9:500U rs dos recursos provinciais.
224
Mas na perspectiva do presidente era
necessário fazer mais. Para tanto, ele explicou aos deputados que:
A facilidade de communicação da província entre si com os principais
mercados de suas producções, sendo essencial ao desenvolvimento de sua
riqueza e população, constitue uma necessidade geralmente sentida, e que
sempre mereceo o cuidado e os desvelos dos legisladores Mineiros(...).
225
As relações entre Assembléia Provincial e Assembléia Geral, ao que tudo indica, não eram
as melhores. A mudança de Gabinete proporcionou aos conservadores ampla maioria na segunda.
Isso provocou grande descontentamento para o governo em Minas Gerais. Um projeto de
223
Falla dirigida á Assembléa Legislativa Provincial de Minas Geraes na sessão ordinaria do anno de 1849 pelo
presidente da provincia, José Idelfonso de Sousa Ramos. Ouro Preto, Typ. Imp. de B.X.P. de Souza, 1849.
(http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/453/000003.html). Dia 08/10/04 16:00
224
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/453/000013.html 08/10 16:40
225
Idem, (...) http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/453/000011.html 08/10 16:15
100
Felicitação ao Corpo Legislativo pela sua atual reunião” aparentemente sofria algum tipo de
oposição, sendo sua votação continuamente adiada. O requerimento foi apresentado pelo liberal
deputado B. Machado, no dia 14 de agosto de 1848, e dizia o seguinte: “Requerimento N 3:
Requeiro que se nomeie com urgência uma Commissão Especial afim de redigir uma Felicitação
a Assembléia Geral Legislativa pela sua presente reunião”. Por fim, o projeto foi votado no dia
25 de agosto de 1848, mas foi umas das votações mais tumultuadas da Assembléia até então. Os
deputados conservadores, Negreiros e Gouvêa, em uma manobra interessante, encaminharam à
mesa um pedido para que a votação fosse nominal, no que foram atendidos. Vinte e dois
deputados (incluindo o presidente) votaram a favor e três votaram contra. A fim de registrar seu
descontentamento, o deputado Negreiros apresentou a seguinte declaração:
Declaração de Voto: Declaro que votei contra o Projeto de Felicitação não
simplesmente pelo motivo da Reunião da Assembléia Geral, sempre grata e
esperançosa, mas sim pelo motivo de estar ela Confeccionando certas de
determinadas Leis.
226
Não ficou claro que leis ora em votação pela Assembléia Geral tanto incomodavam o
deputado, mas é certo que os liberais no Parlamento já haviam começado a passar por um período
de instabilidade grave. Em março o Ministério presidido por Manuel Alves Branco foi substitdo
pelo do Visconde de Macaé. Este, porém, mostrou-se efêmero e caiu, pois perdera toda sua
sustentação na Câmara, sendo logo sucedido pelo Ministério de 31 de maio, último suspiro do
governo liberal.
Entretanto, em Minas Gerais os liberais ainda detinham o domínio da quina eleitoral.
Comparando os três deputados mais votados para a Assembléia Geral pelo Partido Liberal com os
dois nomes mais votados para Assembléia Geral pelo Partido Conservador temos
227
:
Deputados Liberais por Minas Gerais mais votados:
José Dias de Carvalho – 837 votos
José Antonio Marinho827 votos
Theofilo Ottoni – 803 Votos
Deputados Conservadores por Minas Gerais mais votados:
226
APB, 1848, P.22..
227
APB, 1848.P 19
101
Francisco Digo Pereira Vasconcellos – 402 votos
Antonio Jose Monteiro de Barros – 370 votos.
Era possível perceber que o prestígio dos chefes liberais dentro da proncia continuava em
alta. Theofilo Ottoni obteve quase o dobro dos votos de um dos maiores expoentes conservadores
em Minas: Francisco Digo Pereira Vasconcellos. Evidentemente, boa parte desse resultado deve
ser vista na ótica de um processo eleitoral viciado, em que a cooptação era prática comum.
Entretanto, percebe-se que o controle da administração ainda pertencia aos liberais.
Os liberais mineiros passaram à ofensiva dentro do parlamento nacional, convocando sua
bancada a permanecer unida e dar sustentação ao Gabinete Liberal que estava no poder. O
deputado Antonio Marinho assim exortava os deputados: “Para que o Systema representativo se
torne realidade, considero da maior urgência, da maior necessidade, publicar uma lei de reforma
judiciária e outra de incompatibilidades. Eis aqui meus senhores uma que cumpre extremar a
maioria e minoria”.
228
Antonio Marinho conclamava os correligionários a cerrarem fileiras para
“realizar o pensamento liberal”,
229
e para tanto ele próprio tentava adotar um discurso menos
beligerante e reformista. Outro mineiro, Christiano Ottoni, continuava em guerra contra a
deputação conservadora. Suas críticas asseveram:
(...) Desde a decretação do acto adiconal alguns cidadãos que se tinhão opposto
a esta reforma, e não a aceitarão francamente , escreverão no programa do seu
partido a necessidade de o modificar, restringindo as franquezas concedidads
ás provincias. O systema de restringir as attribuições das assembléias
provinciaes tem sido constante, e tem o seu castello forte no conselho de estado;
não expressão , clausula, ou phrase do acto adicional que não procure
interpretar no sentido de restringir essas atribuições.
230
O trecho permite observar aquilo que a historiografia já apontou em outros momentos: os
conservadores estavam empenhados em limitar as atribuições das Assembléias Provinciais. O
deputado concluiu:
228
APB, 1848. P. 104.
229
Idem, 159.
230
Idem, p.115-116.
102
É oppinião corrente no partido político representado pelo lado da câmara que
reputo nosso adversário, que conm estabelecer por uma lei quaes os casos em
que o poder executivo geral poderá suspender a execução das leis provinciaes;
estes senhores te sustentado que o poder legislativo geral pode decretar essa lei,
entretanto ella é evidentemente anti-constitucional. O acto adicional arca os
casos únicos em que o poder legislativo poderá revogar os actos das
assembléias provinciaes e concede ao poder executivo a faculdade de mandar
executar as leis provinciaes ainda não sancionadas, mas em hyppotese nenhuma
permite que suspenda a sua execução.
231
Percebe-se pelo discurso que o deputado tentava retomar o significado do Ato Adicional:
sua ênfase recaía sobre o reforço da autoridade das Assembléias Provinciais. Para ele era
inadmissível que o poder legislativo central anulasse costumeiramente as leis locais. Seu ataque
dirigia-se sobretudo contra as idéias centralistas patrocinadas pelos conservadores. Pensando na
realidade de Minas, Gerais Christiano Ottoni suspeitava que o próprio movimento de 1842
houvesse sido incentivado pelos conservadores, dentro e fora da proncia, com o fim de aniquilar
com as premissas do Partido Liberal. Para ele:
(...)o ministério de 28 de Março não não prevenio os movimentos de 1842,
como ate provocou e chamou com seus actos guerra civil. E o que se conclui da
declaração do ex-ministro da guerra desse ministério, porque dizendo que um
anno antes sabia do projecto desses movimentos com todas as suas
particularidades, com tudo nada fez, ao tomou medidas preventivas, não pedio á
assembléia que habilitasse com os meios necessários, cruzou os braços, e depois
disse – desprezei todas as leis porque a salvação publicassem o exigia! (...).
232
O deputado praticamente sugeriu que a Revolução de 1842 foi, antes de mais nada, fruto
de uma provocação dos conservadores. Provocação que objetivava conduzir os liberais a uma
situação de guerra.
O ministério parece que desejava que apparecessem esses movimentos para ter
ocasião de esmagar seus contrários, e de proprosito não quis tomar medidas
preventivas. Quando no senado se disse a esse ex-ministro, segundo elle affirma,
que tomasse cuidado, que visse se precisava de mais força, se precisava de outros
meios; ele respondeu que não precisava, que as leis lhe davão meios sufficientes
para poder vencer a rebellião; mas, depois, accusado de ter calcado aos pés todas
as leis, satisfez-se com dizer que não lhe bastarão os meios legaes! Não é bem
claro o intento de provocar a guerra civil? Guardou-se o segredo de que o
ministério estava ao facto da conspiração, para que não a desanimassem os
conspiradores, para que sahisse a campo e fossem esmagados.
233
231
Idem,
232
Idem,
233
Idem, p. 27.
103
No campo oposto, o deputado mineiro Francisco Diogo Pereira Vasconcellos defendia os
conservadores mineiros e a ação do governo na repressão ao movimento de 1842. Sua defesa
baseava-se no fato de que nem toda a proncia aderira à revolta e muitos tomaram o partido do
governo. Segundo ele:
(...) admira-se que se diga que foi a província inteira que se sublevou, quando
em muito lugares os briosos guardas nacionaes leaes ao seu juramento,
repellirão as forças do partido que então se insurgio. Em muitos lugares da
província de Minas correu sangue mineiro, não porque a legalidade provocasse
combates, mas porque era provocada para os aceitar. Não houverào em 1842
muitos sacrifícios generosos da parte dos mineiros? Quantos cidadãos não
fizerão consideráreis donativos em dinheiro? Quantos não abandonarão suas
propriedades para marcharem para o capo de batalha?
234
O deputado Francisco Diogo Pereira Vasconcellos prosseguiu na exposição daquilo que
julgava uma série de crimes cometidos pelos liberais ao assumirem o controle de Minas Gerais em
1844:
Passando a examinar as violações da lei que partirão da presidência, diz que
pode-se fazer juízo do estado da sua província, sabendo que em 1844 todas as
autoridades policiaes forão demittidas, desde a mais graduada até a ultima,
quase todos os officiaes da guarda nacional, os collectores das rendas publicas,
etc., etc.... removidos quase todos os juizes de direito e juizes municiapes, e que
estes empregos forão coinfiados aos mais violentos agentes do movimento de 10
de Junho. Não se satisfizerão porém com isto; o presidente da província não
querendo achar tropeços em lei alguma, começou por demittir o oficial-maior
da secretaria da presidência, demissão que pouco depois foi seguida de outra
de um official da secretaria. Talvez se diga que não nada mais ordinário do
que demittir-se um offficial de secretaria em que o governo não confia, mas nota
que na província de Minas uma lei que prohibe a demissão destes officiaes
(...).
235
Percebe-se pelo trecho acima uma séria divergência entre o testemunho do deputado em
relação às declarações da bancada liberal ao longo do período 1844-1848. Esta insistia que não
havia promovido nenhum tipo de perseguição ou demissão arbitrária. Entretanto, o relato afirma
que até funcionários cujos cargos deveriam ser garantidos por lei, como o caso do oficial da
secretaria lembremos que esse cargo foi criado pelo ex-presidente de Minas, o conservador
Soares de Andréia, objetivando garantir uma maior centralização da burocracia provincial –,
foram sumariamente demitidos. Não se pretende entrar no mérito partidário, mas demonstrar que
234
Idem, p.28.
235
Idem, p. 44.
104
tanto liberais como conservadores não se prendiam a determinados aspectos legais. O importante
para a boa parte dos componentes desses grupos era a manutenção do poder e da governabilidade.
As reclamações públicas contra eventuais desvios de conduta de seus adversários visavam acima
de tudo encenar uma peça, onde o sistema representativo era viciado pela corrupção da burocracia
e do processo eleitoral.
Além dos debates que envolviam corrupção e uso indevido do direito de nomear ou
demitir funcionários, os deputados dessa legislatura provincial, assim como os de outras, também
se preocupavam com problemas de infra-estrutura e gastos com estradas. Como já foi referido,
estas eram de extrema importância o presidente da proncia de Minas. Ele comentava estarem
todos convencidos “(...) de que o objeto do mais vital interesse para um Paíz, é a facilidade das
communicações entre suas diversas povoações”.
236
O presidente também se preocupava com a
atividade agrícola e questões que envolviam a regulamentação do sistema financeiro e da posse de
terras. Segundo ele: “Creio também que uma Lei sobre Sesmarias, e a abolição de alguns
privilégios, que tem servido para animar a fraude, unida a instituição de Bancos deverião
concorrer para muito augmentar nossa lavoura, melhorar nossos productos, e por conseguinte
os nossos interesses”.
237
É interessante notar que esse comentário foi feito em 1848. Em 1850 a
Assembléia Geral regulamentou o acesso à terra com a Lei 601, de 4 de setembro do mesmo
ano conhecida como a Lei de Terras –, que representou a primeira tentativa no Brasil
independente criar parâmetros claros para a posse da terra. Essa lei acabou sofrendo forte
embargo de parcelas significativas dos fazendeiros que sentiam-se prejudicados de alguma forma.
Outro dispositivo criado que também atendia as reclamações do presidente foi a Lei 556. de 25
de Junho de 1850. Esta criava o Código Comercial, no intento de regulamentar a ação dos
comerciantes e banqueiros, tornando o mercado interno mais estável, ao menos sob o ponto de
vista jurídico.
236
Fala dirigida à Assembléia Provincial de Minas Gerais no ano de 1848.
Presidente: Bernadino José de Queiroga. http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/452/000017.html, dia 08/04/2004, às 21:50.
237
Idem. http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/452/000015.html dia 11/05/2004, às 17:12.
105
A deputação liberal na província de Minas Gerais continuava a enfrentar problemas, o
apenas com relação à volta dos conservadores, mas também sérias dissenes em suas fileiras. O
deputado Negreiros teve um sério atrito com o restante da bancada liberal. O motivo era o projeto
número 31 da Comissão de Poderes, para que fosse dirigida uma representação aos Supremos
Poderes do Estado” pedindo a reforma do Artigo 40 da Constituição, que tratava dos limites das
Assembléias Proncias, pois dizia que somente a Assembléia Geral e o Senado poderiam fazer
modificações em projetos de lei. Um segundo ponto de discórdia foi o parecer 87, o qual
solicitava a verdadeira” interpretação do art. 61 da Constituição, que fixava o número de 116
deputados para a Assembléia Geral. Negreiros acreditava que não se devia enviar representação
alguma”. A discussão foi encaminhada da seguinte forma: o deputado Negreiros pediu que a
votação fosse nominal. Primeiro foi votado o parecer 31, com vinte votos a favor, incluindo o
do próprio, e sete contra. Quanto ao parecer 87, a votação foi de vinte e um a favor e oito
contra, incluindo Negreiros. Os perdedores deste segundo pleito encaminharam e entregaram uma
declaração em que demonstravam todo o seu descontentamento.
A Assembléia Provincial de Minas Gerais demonstrou ter um entendimento próprio sobre
liberdade, confeccionando uma lei que prejudicava os interesses das nações contrárias à
escravidão. No dia 25 de setembro de 1848, a referida instituição aprovou um artigo aditivo do
deputado Leão que dizia o seguinte: Fica creada (...) uma imposição de 2 /-/ 000 sobre Escravos
comprados ou alugados por Estrangeiros não naturalizados residentes na Província pertencente
aquelas Nações que se ocupão da abolição da Escravatura.”
238
Embora não fosse atribuição da
Assembléia regular a questão do tráfico negreiro, os deputados liberais mostraram-se irritados
com a crescente pressão inglesa pela extinção do mesmo. Isso explica esse novo imposto que
penalizaria justamente aqueles que de alguma forma estavam ligados à Inglaterra ou a qualquer
outra nação que pressionasse o Império pelo fim do tráfico. Fazia-se sentir no âmbito provincial
todo o descontentamento que a abolição e as crescentes pressões externas podiam causar, o que
238
AALPMG de 1848, p. 231.
106
revela a sintonia então existente entre os assuntos regionais e os nacionais. O presidente
Bernadino José de Queiroga reconhecia que sem a escravidão a proncia passaria por inúmeras
crises. Referindo-se a uma pequena rebelião de escravos ocorrida no Distrito de Baependy e São
Tomé das Letras do Termo de Baependy, o presidente informava que a situação estava sobre
controle, porém fazia a seguinte advertência:
Não obstante porém o que fica dito cumpre que não estejamos desprevinidos: a
nossa lavoura é toda mantida por braços escravos; e se o numero d´estes em
augmento, se os abolicionistas continuarem em seus projetos, ao passo que não
for promovida com afinco a colonização Européia, nós estaremos sobre um
formidável volcão.
239
Nestes anos observa-se uma tentativa de reação dos liberais em Minas Gerais, frente ao
avanço dos conservadores na Corte. Os primeiros tornaram-se praticantes dos mesmos
expedientes de manipulação da máquina pública dos quais os segundos eram acusados durante
suas gestões. Temas como escravidão, reforma agrária, atividades bancárias e agricultura estavam
nas pautas de debates e ocasionalmente transcendiam o alcance da Assembléia Provincial, o que
o impedia que o presidente e os deputados emitissem opiniões e até mesmo legislassem sobre
essas questões. Encerrando-se o ano de 1848, os liberais mineiros sofriam uma dupla desilusão:
perdiam o necessário apoio dos ministérios e viam outra revolta liberal, a Praieira, fracassar.
4.2 A Retomada Conservadora
em 1849 a retomada conservadora na Corte parecia irreversível. Um novo presidente foi
enviado a Minas Gerais. A deputação empossada nesse ano ainda contava com alguns
remanescentes liberais. Logo que assumiu, a bancada destes passou a fazer uma série de
questionamentos ao presidente. Assim que os trabalhos foram iniciados, os deputados revelaram
firme disposição para investigar determinas demissões de delegados de polícia e eleições de
Juízes de Paz, conforme demonstram os dois requerimentos expostos abaixo:
239
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/452/000005.html , dia 11/05 de 2004, hora 16:25
107
Requerimento N 1: Requeiro que se peça a Exma Presidência da Província um
quadro das demissões e nomeações havidas entre 1844 a 1848 dos Cargos de
Delegados e Subdelegados de Policia com declaração das épocas em que forão
efectuadas. Outro sim das alterações havidas durante o mesmo período na lista
dos substitutos dos Juízes Municipais e dos Órfãos.(20 de agosto de 1849,
deputado Teixeira)
240
Requerimento N 2: Requeiro que se peça ao Governo uma relação nominal de
todos os Juízes de Paz ultimamente eleitos com declaração dos Distritos e
Municípios a que pertencem(20 de agosto de 1849, deputado Jose Augusto)
241
Surgiram mais requerimentos questionando o governo sobre a demissão de “colletores”,
pedindo uma lista dos demitidos e nomeados”, bem como a relação de distritos e munipios
onde os liberais sofreram maiores derrotas. Questionou-se muito as eleições de vários Juízes de
Paz, principalmente no intervalo entre 1848/1849.
No Parlamento presenciou-se a bancada conservadora de Minas Gerais apoiar
ostensivamente o novo presidente, JoIdelfonso de Sousa Ramos. Este, ainda como deputado na
Assembléia Geral, tecera então severas críticas às administrações liberais na província. Segundo
ele, o comportamento da deputação liberal na Assembléia Provincial mineira e dos sucessivos
presidentes nomeados pelos gabinetes liberais foi desastroso porque:
A administração da província de Minas Gerias é accusada ali de haver exercido
uma ditadura infreme, e por meio da violência, do terror, da ameaça ter
conquistado o voto da província. Da analyse dos factos se verá, Sr. Presidente ,
que nenhum se apresenta que prove semelhante asserção. (...) Achava-se
reunida a Assembléia Província nos dias que se succederão a 29 de Setembro ;
de todos os meios se lançou mão afim de por tropeços, embaração insuperáveis
à marcha da administração. (Muitos apoiados) Aquella Assembléia que na
mesma sessão havia reconhecido a sua incompetência para legislar sobre a
guarda nacional, logo depois se julgou autorisada para fazer vitalícios todos os
postos. (Apoiados) Os empregados públicos que ate a classe de administrador
de barreira forão julgados vitalícios, e, que mais doe, os recursos da província
que devião ser applicados para sua prosperidade, forão estragados
acintamente. (Muitos apoiados) Quase todas as verbas do orçamento forão
esgotadas e 4 meses do anno financeiro; contractos prejudiciaes se
improvisarão, carregando um déficit (...) os que assim procederão voltarão
para suas casas fazendo alarde de haverem posto o governo e circunstancias de
não ter 10$ para despender.
242
240
AALPMG de 1849, p. 255.
241
Idem.
242
APB, 1849. P.26
108
A grande crítica de Sousa Ramos repousava na tentativa da Assembléia Provincial de
legislar sobre a Guarda Nacional. Em relação a esta, os conservadores reconduzidos ao poder não
tolerariam esse tipo de atitude das Assembléias Provinciais. Esse incidente (conforme mais tarde
se verá) será sempre lembrado como uma tentativa de usurpação das atribuições do poder central.
Os liberais, diante da iminência de deixar o poder, praticaram a política de terra
arrasada”, consumindo as rendas provinciais, para que a próxima administração o tivesse
recursos e entrasse em colapso. Segue-se outra acusação grave do deputado Sousa Ramos:
“Logo depois (...) tiverão os desastrosos acontecimentos da província de
Pernambuco. Ninguém ignora que o partido da opposição na Província de
Minas Geraes applaudio a revolta (muitos apoiados), procurou por todos os
meios agitar a população (apoiados). Eu não poderei deixar de trazer a
lembrança da câmara que o administrador da província de Minas Geraes se viu
a braços constantemente com uma opposicão que lhe declarava guerra, e
guerra de morte, qualquer que fosse seu procedimento, mesmo antes de
aparecerem seus actos (...)
243
Novamente os liberais mineiros foram retoricamente envolvidos em mais uma revolta.
Embora a Praieira tivesse ligações diretas com Minas Gerais, Souza Ramos sugeria que os
mesmos estavam dispostos a apoiar mais esse movimento de oposição à Corte e, e além disso,
teriam tentado obstruir ao máximo a ação do novo presidente indicado em fins de 1848 e de seu
sucessor Dias de Carvalho, ambos do Partido Conservador.
No parlamento, muitos deputados liberais acusavam seus adversários de fraudar o processo
eleitoral: as críticas às eleições de Minas Gerais foram muito severas, emitindo-se várias
representações contra o processo eleitoral, o que provocou a seguinte reação do deputado
Francisco Diogo Pereira Vasconcellos:
Eu sinto muito que nesta casa não esteja alguns dos representantes, porque eu
queria convencel-o aqui , eu o queria fazer retractar, assim como consegui que
se retratasse a assembléia provincial de Minas Geraes, retirando uma
representação que era em tudo semelhante a essa (...) A paixão cega aos
representantes a um ponto tal , sr. Presidente, que elles ate esquecem das
243
Idem.
109
regras as mais ordinárias das convenciencias e do decoro , elles ofendem a
cada passo o bom senso nesta representação.
244
Ao que tudo indica, na própria Assembléia Provincial de Minas Gerais teriam surgido
críticas à lisura do processo eleitoral. A mesma casa legislativa emitiu algumas representações
questionando as eleições, movimento seguido por parte da bancada liberal na Assembléia Geral.
Tais representações, segundo Vasconcellos seriam, além de absurdas, ofensivas ao decoro
parlamentar.
Apresentando as razões que levaram os conservadores a obterem maioria, tanto na
Assembléia Provincial de Minas quanto na sua representação na Câmara, o mesmo deputado
afirmou:
Eu creio, sr. Presidente, que se os illustres representantes consultassem seus
antecedentes, seu procedimento, teriam em si mesmos satisfactoria explicação
da tremenda derrota que a opinião publica lhes deu em Minas. Os artigos
incendiários que ali apparecerão, os Timandros que ali se espalharão e a que se
deu uma divulgação extraordinária, as epigraphes de abaixo a centralização,
viva a confederação das províncias; - as sympathias que confessão ter pelos
desgraçados de Pernambuco, são sem duvida as causas que contribuirão para
que a província de Minas os excluísse deste recinto, esses homens que tinhão
faltado a todos os seus compromissos, a todas as suas promessas mais sagradas
(...).
245
Para Francisco Diogo Pereira Vasconcellos, o que trouxe a derrota aos liberais foram suas
posições contra a centralização proposta pelos saquaremas, sua adesão ainda que simbólica – ao
movimento Pernambucano e sua apaixonada defesa do federalismo, avaliado como confederação.
Não é proposta deste trabalho lidar com a questão do federalismo no oitocentos brasileiro, mas
pode-se supor que toda a rejeição sofrida pelos liberais nas urnas não tenha como única causa
questões referentes à centralização e descentralização. As possibilidades que surgem são
inúmeras, desde a simples corrupção eleitoral até questões de cunho ideológico e de organização
política.
244
APB, 1849. P. 32
245
Idem, p. 32-33.
110
O ano de 1850 foi importantíssimo na trajetória conservadora. Foi o ano em que os
conservadores voltaram efetivamente a comandar a Proncia de Minas Gerais e, na Assembléia
Geral, consolidaram sua hegemonia. As eleições provinciais de 1849 deram-lhes na proncia uma
esmagadora vitória. Seu retorno ao poder significava a oportunidade de desmontar as
modificações introduzidas pelos liberais na burocracia da proncia ao longo do qüinqüênio,
demitindo funcionários ligados à antiga gestão, removendo jzes, enfim dando à situação
conservadora condições de governabilidade.
O novo presidente, Alexandre Joaquim Siqueira, em seu relatório apresentado na sessão
extraordinária da Assembléia, ressaltava para a bancada conservadora que:
Sendo urgente a necessidade de habilitar-se o governo com os convenientes
meios para bem reger a província, e havendo a Assembléia Provincial em sua
ultima reunião confeccionado Leis calculadamente meditadas para embaraçar a
marcha regular da Administração, pelo que tiverão de (...) força foi que meu
Antecessor vos convocasse extraordinariamente para reverdes essas
preposições, ‘as quaes um ligeiro exame basta, para as convencer que à ellas
não presidira o espírito consciencioso do Legislador.
246
Ao que tudo indica, os liberais, sabendo que seriam batidos nas eleições de 1849, adotaram
uma estratégia de terra arrasada. Pelo regimento anterior da Assembléia, os deputados
deveriam se reunir em julho. Entretanto, a urgência pedida pelo novo presidente fez com que
em março fosse convocada uma sessão extraordinária. Observa-se que o mandatário fez questão
de nomear novos funcionários para cargos de confiança dentro da proncia, demitindo aqueles
que não detinham a cor política do partido que agora retornava ao poder. Isso é verdadeiro na
medida em que o próprio presidente admitia que:
Achão-se nomeados os 276 substitutos dos 46 Juízes Municipaes e de Orphãos
da Província os quaes tem de funccionar no quatriênio p. f. D`eles não conheço
pessoalmente a quase totalidade. Declaro-vos porém solemnemente, que
esforcei-me por colher informações que me habilitassem a nomear indivíduos,
que, sobre terem dado provas de) sua adhesão a actual forma do Governo
compenetrassem bem da santidade das attribuições que a lei lhes confere,
administrando justiça imparcial e inteira.
247
246
Relatorio do presidente da provincia de Minas Geraes, o ill.mo e ex.mo dr. Alexandre Joaquim de Siqueira, na
abertura da sessão extraordinaria da Assembléa Legislativa Provincial no dia 25 de março de 1850. Ouro Preto, Typ.
Social, 1850. (http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/454/000004.html)( http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/454/000005.html
247
Idem, (http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/454/000009.html, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/454/000010.html
111
Também em seu relatório o presidente não se constrangeu em demonstrar alegria frente à
nova situação. Mais do que nunca os conservadores consolidavam uma posição confortável no
cenário político nacional. Citando uma mensagem que a Assembléia havia recebido do Ministro
do Império, ele disse: “O Ministério de 29 de Setembro, asteou a bandeira da Justiça e da
Tolerância para com todos os brasileiros, tem sido defendido e susntentado por todos sos amigos
da verdadeira liberdade, da pax e da ordem publica.
248
Não obstante, a vantagem dos saquaremas em todos os setores da política nacional não
significava que eles poderiam baixar a guarda. A oposição na Assembléia Geral continuava
questionando as eleições em Minas Gerais. Eram necessários constantes esforços para legitimar a
maioria obtida na proncia no pleito anterior. O deputado Inácio Joaquim Barbosa lembrava aos
seus colegas que:
Aproveitarei esta occasião para protestar contra uma proposição do
Sr.deputado pela Província do Pará, quando disse que não era crível que na
província de Minas Geraes, cuja máxima parte pertence ao grande partido
liberal, houvesse uma eleição livre sem que esse grande partido tivesse dado um
representante...!(...) Mas se o nobre deputado quizesse dar-se ao trabalho de
esmerilhar um pouco os factos convercer-se-hia facilmente de que o partido que
sustenta o governo, se não é o o que ais grita e Minas, e se não é o que se
apresenta mais violento, é seguramente aquelle que é mais forte pelas
sympathias da população.
249
É interessante notar que, para esse deputado, não foi a violência que deu aos
conservadores a maioria dos votos, mas a simpatia da qual o Partido Conservador dispunha junto
aos eleitores. E continuou dizendo:
A prova disso poderia o nobre deputado encontrar facilmente, lembrando-se
que o tal partido chamado liberal (apoiados.) (titulo usurpado, mas com elle
esta habituado a assim appellidar-se e eu não quero dar grande importância a
questões de palavras, chamai-o hei liberal), partido que elle supõe dominar a
maxima parte dos habitantes de Minas, e ter alli maioria, nunca pode dar um
representante quando esteve fora do poder. Este facto fala muito mais alto
(apoiados.) (...) Se o nobre deputado quizesse recordar também das eleições de
1847, quando estávamos inteiramente fora do poder, sem termos um empregado
de policia a nosso favor, um meirinho, um porteiro de câmara sequer, se
estarmos arregimentados, veria que pela votação espontânea da província de
Minas tivemos ainda um terço dos votos dos eleitores que concorrerão á eleição
(...)
250
248
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u248/000012.html
249
APB, 1850. P. 140.
250
Idem,
112
A questão dos conservadores serem maioria tanto na Assembléia Provincial mineira
quanto no parlamento nacional foi alvo constante de críticas da bancada liberal em ambas as
casas. No parlamento, tomando a defesa da causa saquarema, o deputado mineiro Pereira da Silva
tratou de explicar em pormenores porque os liberais não estavam em maioria:
Mas disse o nobre membro, porque é que não vierão opposicionistas para a
actual câmara? O honrado membro sabe melhor do que ninguém que o motivo
porque o paiz não mandou representantes da sua opinião.O partido do nobre
deputado entrou no poder em 1844, para sustentar certas idéias políticas pegou
me armas em 1842 em Minas e em S. Paulo, e declarou no seu manifesto que
isto praticava para obter a revogação de certas leis inconstitucionaes como a
lei do conselho de estado, a da interpretação do acto addicional, e a lei de 3 de
Dezembro de 1841; entretanto subio em 1844 para o poder, e durante todo o
tempo em que esteve nelle não tratou de revogar estas leis por amor das quaes
fizerão uma rebelião.
Podemos observar pelo trecho acima que para o deputado Pereira e Silva os liberais não
tiveram capacidade de articulação para desfazer as reformas conservadoras, o que conferia ainda
mais legitimidade ao aprofundamento das mesmas. Ele completou dizendo:
(...) esquecerão-se nas doçuras do poder dquellas ideas que na opposição
havião abraçado, que aconteceu foi cahirem em 1848 desmoralisados, todos os
homens moderados que tinhão acopnhado esse governo como elemento de
ordem, o abandonarão, elles se acharão sós no paiz e para ainda mais se
desacreditarem pegarão em armas em Pernambuco em favor da Idea de uma
assembléia constituinte, isto é, de ua idéia contraria as instituiçòes do paiz. E
Minas estabelecerão por lei a vitaliciedade dos postos da guarda nacional,
distribuirão em contractos todo o dinheiro dos cofres públicos para o fim de
tirarem aos seus sucessores os elementos de força governativa (...)
251
Joaquim Nabuco ofereceu uma outra versão para explicar a queda dos liberais em 1848 e a
ascensão dos conservadores. Segundo ele:
Com o gabinete Paula Souza caía a situação liberal, queda atribuída por
Teófilo Ottoni, não como era notório, ao esfacelamento do partido, à sua falta
de coesão, às incompatibilidades pessoas dos seus chefes, mas ao arrefecimento
das boas graças do palácio (...).
252
251
APB, 1850. P. 732.
252
NABUCO, Joaquim. Op. Cit. P. 106.
113
Os poucos congressistas liberais eleitos tentavam a todo custo sustentar sua causa. No
parlamento, os liberais mineiros pressionavam a Casa para que os suplentes fossem chamados.
Chamar os suplentes tornou-se vital, na medida que muitos suplentes por Minas eram do Partido
Liberal. Numa discussão entre a deputação mineira, o deputado liberal Souza Franco disse para
seu colega conservador Paula Fonseca:
Eu desejava que o nobre deputado concorresse commigo para a vinda de alguns
supplentes por Minas Geraes, para que pudessem vir discutir os negócios de
sua província, hoje fora da lei; eu desejaria que o nobre deputado quisesse
sentir commigo que a província de Minas Geraes esta muito mal representada...
(Vivas reclamações. O orador continua com força) em numero, em numero, Srs
deputados. Eu nunca costumei rebaixar assim meus colegas, para que no meio
de uma proposição e venhão interromper e antes que eu houvesse concluído.
Contem-se quantos deputados por Minas estão presentes na casa; estão
presentes quatro ou cinco, quando deverão estar vinte, e a importante província
de Minas Geraes vai agora arrastada a cauda das outras, não tem mais na
câmara aquella influencia que antes tinha, ella que sempre marchou a testa de
outras deputações! Concorra o nobre deputado commigo para que sua
província tenha nesta câmara a devida influencia. (...)
253
O apelo girava em torno da recuperação da influência que a deputação mineira tivera
historicamente até aquele momento no parlamento e que as dissensões partidárias estavam
prejudicando. Surgiu um debate interessante entre os deputados Mello Franco (liberal) e Souza
Ramos (conservador e ex-presidente da proncia de Minas Gerais). O caso é que o segundo havia
afastado um juiz da cidade de Paracatu e nomeado outro. Segundo o deputado Mello Franco, esse
juiz operava favoravelmente nas eleições para dar vitória aos conservadores. Nas suas palavras, o
presidente da província havia corrompido o novo juiz, pois o“(...) encarregou da conquista
eleitoral daquella cidade com a promessa de ser nomeado juiz de direito (...).
254
Prosseguiu em
suas acusações, argumentando que o homem nomeado para ser juiz em Paracatu “(...) é o mesmo
que figurou em uma espécie de sediçãozinha que teve lugar no Araxá, é um homem que não
devera merecer a confiança de nenhum governo, é um juiz venal e corrupto (...)”
255
Mello Franco
então desferiu a sua principal acusação:
253
Idem, p. 402.
254
Idem, p. 570.
255
Idem.
114
(...) Esse homem chegado em Paracatu, tão austero para co seus adversários
políticos, tão perseguidor, enxergando crimes em quantos não partilhavam as
opiniões dominantes, procedeu desta maneira: despronunciou a um individuo
que negociou notas falsas, apezar das provas e dos documentos que tinhão
partido do governo anterior ao Sr. ex-presidente daquella província (...)
256
O complicador nesse debate é que o acusado de possuir notas falsas era irmão de uma
liderança conservadora em Minas Gerais, o ex-presidente da província Quintiliano José da Silva.
Para Mello Franco o erro do ex-presidente Souza Ramos foi “Na nomeação de tal juiz V. Ex.
curvou-se às exigências de partido para vencer as eleições, e elle já foi premiado com a
nomeação de juiz de direito, em remuneração desses serviços(...)”
257
e completou:
“(...) eu não digo, senhores, que o ex-presidente da minha província tivesse
aconselhado ou directamente influído para que esses factos ocorressem alli mas
parece que ninguém poderá desconhecer que se não fosse a política adoptada
de proteger o bem-estar do partido dominante, e de proscrever o adversário,
elles não se darião, ou se reproduzirião em tão grande escala (...)”
258
Na verdade, ao que indicam as falas do deputado Mello Franco, o grande ressentimento dos
liberais era concernente ao resultado inglório das eleições. Isso fica evidente na seguinte fala do
mesmo legislador:
(...) Entendo Sr. presidente, que os factos que se derão em minha província são
de muita gravidade (...), não quero discutir as eleições da província de Minas,
que foi o único alvo a que se propôs o ex-presidente daquela província (...).
259
Mas o trecho em sua totalidade permite entrever como os partidos atuavam para manter a
qualquer custo suas bases políticas. O império das circunstâncias acabava impondo em alguns
momentos aos presidentes de proncia a consecução dessa tarefa. Os presidentes, antes de
servirem às proncias, deviam lealdade ao gabinete que os sustentava. Daí algumas atitudes que
beiravam o destempero. O deputado Antão, liberal mineiro, denunciava as práticas eleitorais
conservadoras na proncia:
(...) A província de Minas tem victima desta violência. (Não apoiados). A
necessidade em que o governo tinha collocado o partido que o apoiavaa
empenhar-se na luta com todo o esforço, a necessidade e que o governo tinha
collocado os presidentes de empenhar-se no triumpho eleitoral, fez com que o
presidente de Minas descesse da altura em que se devera collocar. Eu lamento a
256
Idem.
257
Idem.
258
Idem.
259
Idem, p. 571.
115
sorte do paiz, lamento o estado de immoralidade a que tem chegado o povo;
houve um tempo em que uma carta de um presidente escripta a um particular
em occasião de eleiçòes era um grande crime; a opinião publica se revoltava
contra o presidente que se animava a escrever uma carta a respeito de
eleições.
260
Os argumentos do deputado corroboram a idéia de que o sistema eleitoral do
Império não conseguia exprimir com lealdade a verdade das urnas. Nas engrenagens da cooptação
eleitoral, o presidente da proncia tinha um papel fundamental. Para que a centralização
ocorresse satisfatoriamente, era necessário que o governo tivesse total controle das sucessões
presidenciais. Controlando o presidente era possível interferir mais nas eleições. O deputado
prosseguiu afirmando:
Muitos dos nobres membros que pertencem a maioria fizerão censuras a u
presidente de Minas porque uma outra vez escrevesse uma carta a um amigo a
este respeito; mas o que temos visto na quadra actual? Como se fazem as
eleições? Os presidentes assignão seu nome nas circulares em que convidão a
todo mundo a tomar parte das eleições, elles impõem a obrigação de votar em
uma chapa; isto praticou o presidente de Minas, este facto creio que nenhum de
nos contestará. (Reclamações.) O presidente de Minas dirigio-se por muitas
vezes a differentes lugares por circulares confidenciaes recommendando o
plano eleitoral. Eu estranho mais ainda esse facto, quando observo que na
Província de Minas o presidente formava como um directorio geral com outros
indivíduos para triumphar o seu partido nas eleiçòes; o presidente de Minas, o
chefe de policia, o juiz de direito da capital, que é juiz dos feitos, o secretario do
governo, todos assignavão as circulares a respeito da eleição; impunhão se
chapas a todos os lugares; ouvi dizer mesmo que tinhão commissões locaes com
que se correspondião; tenho provas de que algumas dessas commissõeslocaes
estavão autorisadas a fazer nomeações e demissões, que depois devião ser
approvadas.
261
Novamente devemos ressaltar que os presidentes de proncia tinham um papel
importantíssimo na burocracia imperial. Não por representarem o poder central, mas por serem
elos fundamentais para a continuidade política do partido que compunha o gabinete. O mesmo
deputado continuou seu discurso alegando que:
Mas senhores, para que este aparato de força na província de Minas? O que fez
a opposição? Portou-se de maneira a mais submissa, portou-se como uma
opposição que te consciência de sua força, parecia que o partido da opposição
era o partido do governo, e que o partido do governo era o partido da
opposição, a opposição portou-se com toda a moderação, entretanto que o
260
Idem, p. 66.
261
Idem.
116
partido do governo agiu como desordeiro, assolando a população, instigando
cidadãos uns contra os outros (...)
262
Talvez tentando resgatar a imagem de moderados, comprometida que fora pela Praieira, o
deputado Antão fez questão de ressaltar que mesmo diante de tantos abusos o seu partido soube
manter a disciplina. A resposta às denúncias feitas por ele foram dadas pelo deputado conservador
Barbosa:
Conclue o nobre deputado grande reacção na província de Minas. Eu não sei se
o nobre deputado queria que o governo actual governasse com agentes do
nobre deputado nos commandos de força e empregos de polícia. Ë verdade que
comandantes da guarda nacional e autoridades policiaes forão demittidos, era
uma necessidade política, a que toda administração que quizesse marchar com
força havia de sujeitar-se. O Sr, Souza Ramos, que mui dignamente, occupou a
presidência da província de Minas, não tinha vistas de demitti-los, tentou
governar sem demittir; depresssa porém conheceu que não era possível. O
primeiro acto de demissão dado pelo Sr. Souza Ramos, que foi a um
subdelegado do município da capital, foi acolhido como signal da mais violenta
reacção; todas as fúrias da imprensa do nobre deputado se desenvolverão
contra elle (...)
263
Sintomática foi essa resposta. O próprio deputado Barbosa admitia que sem o uso da força
e do monopólio sobre a distribuição dos cargos públicos seria impossível imprimir ao governo o
sentido da administração defendida pelo partido dominante. Para ele tais expedientes eram
justificados pela necessidade política”. Assim, o presidente Souza Ramos não deveria ser
responsabilizado pelos seus atos, necessários que eram à manutenção da governabilidade da
proncia. Não satisfeito, o deputado Barbosa continuou com sua defesa, agora num tom bastante
inico, procurando comparar os acontecimentos de Pernambuco aos de Minas Gerais em 1842:
(...) se houvesse em Minas a repercussão dos acontecientos de Pernambuco, aos
deputdos acontecerãao o mesmo que aconteceu em 1842; um dos nobres
deputados seria o primeiro a ir-se entregar ás autoridades, e o outro seria o
primeiro a se offerecer como parlamentario entre aquelles que tivessem a
desgraça de rebellar-se, e o governo legal; portanto nada tinhamos a receiar
dos senhores, e realmente nunca nada receamos. (...) se queixou o nobre
deputado da grande irascibilidade em que se achão os partidos, que tem
chegado a este ponto depois que subio ao poder o actual ministerio: o nobre
deputado não achou outra explicaçào para isto que não seja a violência do
procedimento havido na província de Minas. A explicação é muito ais simples, é
que quando os nobres deputados estavão no poder a opposição que se lhes fazia
era uma opposição toda de moderação (...) quando os nobres deputados
262
Idem, p. 66.
263
Idem, p. 107.
117
passarão para a opposição não houve recurso de que não lançassem mão
(...)
264
Além de promover demissões, afastar desafetos e mudar a compatibilizar a legislação
com a nova situação política, os conservadores também se empenharam em alterar os
monumentos” erigidos pelos rivais quando no poder. Desta maneira, as energias da Assembléia
foram canalizadas para modificar o status do principal mbolo liberal: Santa Luzia. Conforme
demonstrado anteriormente, os liberais haviam elevado o arraial à categoria de Vila,
desmembrando-o do distrito de Sabará. Argumentando que Santa Luzia não reunia condições
econômicas e sociais para se manter como Vila, a Assembléia Provincial decretou a supressão das
Vilas de Santa Luzia e São Francisco das Chagas do Capo Grande e ainda determinou que os
terririos pertencentes ao munipio de Santa Luzia fossem incorporados ao munipio de
Sabará.
265
Se os liberais tentaram reconstruir a memória coletiva elevando o arraial de Santa Luzia a
Vila, fazendo com que a derrota de 1842 fosse vista como uma vitória moral, como um ato de
patriotismo, os conservadores agora adotavam a estratégia de desconstrução e impunham-lhes
nova derrota no campo simbólico. Neste, pequenas coisas assumiam grandes significados. Por
exemplo, o deputado Pinto de Vasconcellos, aproveitando que a Assembléia discutia uma
profunda reforma no Seminário de Mariana, pros que alguns professores fossem chamados a
dar explicações por que, segundo ele, Em lugar do retrato de S. M. I foi colocado
o retrato do
Revolucionário Nunes Machado (...)”.
266
A volta ao poder significava destruir todos os símbolos e
figuras do partido oponente.
Outra tarefa da deputação mineira na Assembléia Geral consistiu em justificar a situação
da proncia no tocante ao recrutamento. Vários deputados de outras proncias mostravam-se
indignados com o fato de Minas Gerais não oferecer recrutas em número compatível com seu
tamanho. O deputado mineiro Paula Santos defendeu sua terra natal nesses termos:
264
Idem, p. 108.
265
APB, 1850. P. 339
266
Idem.
118
Sr. Presidente, tenho observado que alguns nobres deputados se persuadem que
a província de Minas não carrega co ônus do recrutamento para o exercito. Se
assim é, os nobres deputados não estão bem informados do eu ocorre na minha
província . A província de Minas manda par ao exercito um grande numero de
recrutas. (...) Mas,sr. Presidente, quando seja mesmo exacto que a província de
Minas não concorra para o exercito com um numero de recrutas
correspondente ao das outras províncias, isto é devido às circunstancias em
que se acha, como disse, a maior parte da população que em razão da sua
industria esta protegida pela letra das instrucções de 1822. A minha província
abunda de homens industriosos, que não podem ser recrutados sem manifesta
infracção da instrucções (...)
267
Para Paula Santos, se os mineiros o se alistavam no Exército, era porque a prosperidade
econômica da província não o permitia, pois a maior parte da população estava ocupada em
atividades econômicas. Recrutar pessoas com esse perfil, para Paula Santos, infringiria da lei. O
mesmo congressista defendeu a atuação do gabinete conservador quando este mandou anular a lei
que dava vitaliciedade nos cargos aos guardas nacionais. Para ele:
(...) a questão que versava sobre a lei da assembléia provincial de Minas que
decretou a vitaliciedade dos officiaes da guarda nacional daquela província (...)
Pelo acto adicional estavão as assembléias provinciaes autorisadas para
legislar sobre a organisação da guarda nacional (...), mas desde que se
publicou a lei interpretativa de 12 Maio de 1840, lei que o nobre deputado
reconhecerão e sustentarão, e cuja revogação não propuzerão nesta casa,
ficarão as assembléias provinciaes inteiramente inhibidas de legislar sobre a
guarda nacional; e tanto isto é verdade, que a propria assembléia provincial de
Minas, poucos dias antes de decretar essa lei e levantar essa barricada a acção
legal do governo que tomou a administração em 29 de Setembro de 1848
(apoiados) dirigio a assembléia geral uma representação pedindo a reforma da
lei da guarda nacional no sentido em que depois legislou.
268
Como se observou, o deputado começou sua argumentação demonstrando que a
Assembléia Provincial reconhecera tacitamente que não tinha autoridade para legislar sobre a
Guarda Nacional quando enviou à Assembléia Geral um pedido de reforma da lei que a regulava.
Para o deputado, a Assembléia Provincial havia usurpado uma atribuição que não era sua. Outra
incoerência apontada foi a omissão dos liberais em alterar a legislação no sentido de conferir às
Assembléias Provinciais controle maior sobre a Guarda Nacional. O deputado concluiu seu
pensamento afirmando
(...) pelo que se vê, a assembléia provincial de Minas reconheceu que não
estava em suas atribuições legislar sobre a guarda nacional. Ora, tendo depois
267
APB, 1850. P. 524.
268
Idem, p. 580.
119
legislado, tendo dado vitaliciedade aos officiaes da guarda nacional, é
incontestável que commeteu um abuso. (...) Supponhamos que a assembléia
provincial de Minas decreta e o presidente da provncia sancionava uma lei que
declarasse a província separada da comunhão brazileira, ou que considerava o
presidente da província vitalício. Deveria nesses casos o governo cruzar os
braços, aguardar a reunião do corpo legislativo para lhe apresentar a lei? (...)
A lei da assembléia provincial de Minas estava nestas casos figurados, o
governo a suspendeu, e suspendendo-a , comprehendeu bem sua missão.
269
Outro deputado mineiro, Dias Carvalho (conservador), revelou-se muito preocupado com a
possibilidade de os controles do governo central se afrouxarem em Minas Gerais, recordando o
seguinte incidente:
(...) o facto alli acontecido de se haver retirado o presidente da província sem
que ficasse na capital o vice-presidente que lhe sucedeu. (...) Essa retirada do
presidente da província, sem que na capital ficasse seu sucessor, deu motivo
para que a assembléia provincial, que então se achava reunida, tomasse e
consideração a matéria e propuzesse a nomeação de um vice-presidente
interino. Esta nomeação não teve lugar, porque o Sr. Romualdo Antonio
Monteiro de Barros se prestou a ir exercer as funcções de presidentes de
província, mas se assim não tivesse acontecido V. Ex. e a casa claramente
quaes poderião ser as conseqüências de uma semelhante proposição ou medida
tomada pela assembléia provincial.
270
No tocante à situação econômica da proncia, em 1851 o café ainda não se consolidara
como o principal produto de exportação mineiro, embora no País o produto tivesse papel
fundamental. Por isso o presidente José Ricardo de Sá Rego reconheceu que:
A cultura do chá, cujo o desenvolvimento nessa Província chegou ao ponto de
excluir em grande parte a concorrência do chá estrangeiro, não encontrando a
mesma facilidade de consumo no mercado da corte, apesar do baixo preço a
que tem chegado tende naturalmente a afrouxar, o que será para lastimar-se a
vista da perfeição em que se apresenta este produto entre nós. Segundo do
relatório ultimamente apresentado às Câmaras pelo Ministério do Império a
preferência que igualmente vai tendo o chá preto sobre todas as qualidades
poucas esperaas nos deve deixar acerca da exportação deste gênero para
outros paizes, e em tal caso muito converia que nossos lavradores que
quizessem continuar nesse ramo de producção algumas experiências fizessem
sobre aquela qualidade.
271
269
Idem.
270
Idem, p. 231.
271
Relatorio que á Assembléa Provincial da provincia de Minas Geraes, apresentou na sessão ordinaria de 1851 o
doutor José Ricardo de Rego, presidente da mesma provincia. Ouro-Preto, Typ. Social, 1851.
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/455/index.html. Acesso em 03/08/2004.
120
A bancada conservadora não se preocupava apenas em destruir os liberais ou com assuntos
econômicos. O ensino na proncia também era alvo de suas atenções. Diante disso, o presidente
José Ricardo de Sá Rego encaminhou um relatório abordando as deficiências educativas em
Minas Gerais. Listando suas as causas, o mandatário observava:
Um dos maiores erros que tem commettido nossos estadistas, com um notável
detrimento do paiz e certamente o terem transplantado para o nosso Império,
instituições que com quanto sejam profícuas á sociedade geral, e se
compadeção os povos provectos na marcha da civilização, não são contudo
adaptadas á um paiz como o nosso, jovem ainda na civilização, e existência
política, e por ainda fraco em recursos para competir com a robustez da
Europa culta. De que vem, que não fructificando á medida da esperança publica
tão fácil de iludir-se, o aspiro publico desanima no seu cultivo, pragueja o
Governo, e seus agentes aquém com a maior injustiça atribue a todos os males
que affectão a instrucção, sem examinar as verdadeiras causas, que os tem
produzido. Queremos por exemplo, que o ensino simultâneo se generalise por
toda a Província , queremos que os mestres produzam fructos sazonados,
abundantes.
272
A conclusão que se extrai do texto acima é clara: a culpa pelo atraso não era da
administração ou das autoridades imperiais, mas da forma pela qual o ensino era ministrado.
Portanto, a solução seria sistematizar um método educativo próprio para povos de “pouca
civilização” como o brasileiro.
273
Interessante notar que o problema do recrutamento era sempre recorrente nos debates da
Assembléia Geral. O deputado Mello Franco teceu diversas críticas ao sistema de recrutamento
adotado pelo presidente de Minas, Sá Rego. Segundo ele:
pensando que o Sr. Rego deixaria os hábitos de um magistrado político,
servo humilde de um partido, para administrar uma província tão importante
como é a de Minas Geraes. Infelizmente, senhores, a província de Minas parece
hoje votada ao desprezo do governo central: parece que não ninguém que
não sirva para governa-la: falla-se de incompatibilidades, dize que os
272
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/455/000049.html. Acesso em 09/06/2004.
273
Outra observação interessante é quanto ao peso político da província no parlamento nacional ao que parece
inspirava ressentimentos de outras províncias. O deputado Dias Pereira reclamava que. “(...) A província da Bahia
tem dous mil e tantos eleitores, e quatorze são os seus deputados, entretanto que a província de Minas, que não tem
mais de mil e quinhentos eleitores, dá vinte deputados para a câmara; e note-se que isto não é somente na actualidade,
é antigo (...)” Nossa pesquisa não se aprofundou a ponto de verificar o porque desse fato, mas aventamos que essa
diferença seja em função da participação mais ativa de Minas Gerais no processo de Independência, enquanto que as
províncias do norte mantiveram-se mais afastadas e pouco dispostas a apoiar um governo no Rio de Janeiro.
121
magistrados devem occupar-se de seu ministério; entretanto quando se pretende
dar um governador á província de Minas, o primeiro bacharel encontrado serve
para opprimil-a, e provocal-a á desesperação. (...) Devo dizer a V. ex. que nos
primeiros dias da administração do Sr. Sá Rego, um ou outro recruta
violentamente arrastado aa capital, encontrou justiça na presincia; quero ser
justo, e por isso é que refiro a esta circunstância. E verdade foo dispensados
dous recrutas da villa de Curvelo; mas sr. Presidente, o magistrado político
recebendo intimões das localidades, ameaçado com a perda da eleão se
por ventura continuasse a fazer justiça aquelles que indevidamente erão
recrutados, arrepiou carreira (...).
274
(grifo nosso).
Ainda nesse trecho nota-se uma associação entre o problema do recrutamento com a
questão das magistraturas. O deputado reclama uma reforma na legislação criando as
incompatibilidades, projeto que já transitava pelo parlamento nessa época. Argumentava
brandindo a incompatibilidade entre a função de magistrado e a carreira política. Esse trecho
também é importante ao revelar que o recrutamento era usado como instrumento de cooptação
política em determinadas situações.
Mesmo em minoria, os liberais na Assembléia Provincial tentavam barrar o avanço do poder
central. Segundo o deputado Dias de Carvalho:
(...) não vejo no poder legislativo geral o direito de cassar as divisões que
fizerem as assembléias provinciais (apoiados.) Ora. se eu não vejo esse direito
no poder legislativo geral de revogar nesta parte os actos das assembléias
proviciaes, muito menos direito tem o nobre ministro da justiça. Senhores se
formos admittindo estas invasões nas attribuiçòes das assembléias provinciaes
ate onde chegaremos? (...).
275
Na tentativa de desmoralizar as acusações dos liberais referentes à centralização excessiva,
recrutamentos indevidos e corrupção eleitoral, novamente os conservadores mineiros retomaram
os acontecimentos de 1842. Além disso, tentavam se justificar alegando que seus rivais não
adotaram posturas diferentes quando no governo. O deputado Firmino assim resumiu esses
momentos:
(...) Em 1842 li o programma da opposição publicado em Barbacena ao
estampido da fuzilaria. Exigia, como único meio de salvação publica a abolição
immediata e instantânea da lei das reformas do código de processo, da lei do
conselho de estado, do regulamento da câmara temporária. Em 1844 eu o vejo
no poder aceitar todas essas leis, exagerar todos os meios de governo
empregados pelos seus antecessores. Em 1849 segue o mesmo rumo
inteiramente diverso, renega suas idéias de 1842 e 1849, e hastea o estandarte
da constituinte, publicando no Ouro-Preto um período com a epigraphe
274
Idem, p. 99.
275
Idem, p. 642.
122
Abaixo a centralização, viva a confederação das províncias – E 1851 vejo
surgir do seu seio uma nova bandeira.
276
O trecho acima carrega a idéia de que os liberais teriam apresentado um comportamento
amguo, pois quando reconduzidos ao poder não reformaram as leis conservadoras, Levantava-se
a suspeita de que na verdade sua grande demanda fosse um sistema confederado.
Mas estes debates não prejudicavam o ritmo de normalidade dos trabalhos da Assembléia
Provincial de Minas Gerais ao longo do ano de 1851. Entretanto, em 1852 pequenas oposições
surgiram, não necessariamente dentro da casa legislativa, mas na execução de algumas leis. O
presidente Luiz Antonio Barboza relatou à Assembléia que:
Por occasião de executarem-se os Regulamentos 797 e 798 de 18 de Junho
de 1851, que marcarão a forma de proceder-se ao recenseamento geral da
população do Império, determinado pelo art. 107 da Lei de 19 de Agosto de
1846, a perversidade de alguns homens, abusando da ignorância dos habitantes
de algumas Comarcas (...), persuadiu-lhes de que o alistamento dos cidadãos, e
o Registro de nascimento tinhão por fim escravisar os Paes e os filhos, o que
deo lugar a um abalo de caráter grave, mas que felizmente foi de prompto
reprimido pelo Governo da Província, sendo a tranqüilidade publica
restabelecida desde que cessou a ilusão dos amotinados. Nessa Província,
Senhores, os incovenientes práticos daqueles Decretos forão sentidos, alguns
talvez exaggerados por espírito de partido, porém se houve alguém que tentasse
iludir o nosso povo com intrigas tão grosseiras, devemos felicitar-nos pela
resisitencia que lhes opunhão o bom senso dos nossos comprovincianos, e a
confiança que elles depositão no Governo de Sua Magestade, e nos meios
constitucionais (...)
277
Deve ter sido cil a esses homens perversos” enganar a população, principalmente
levando em conta que já na época do presidente Soares de Andréia havia reclamações contra
recrutamentos indevidos. Ao que tudo indica, foi o “espírito de partido” que motivou boa parte da
resistência entre a população. Em outras palavras, certamente os liberais, incapacitados de se
valerem da Assembléia para marcarem suas posições, procuraram desestabilizar a atuação da
burocracia provincial.
276
Idem p. 108.
277
Relatorio que á Assembléa Provincial da provincia de Minas Geraes apresentou na sessão ordinaria de 1852, o
doutor Luiz Antonio Barboza, presidente da mesma provincia. Ouro Preto, Typ. do Bom Senso, 1852.
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/456/000004.html Acesso em 16/08/2004.
123
Outro assunto importante para o presidente da Proncia foi lei que reformou a Guarda
Nacional. No relatório apresentado a Assembléia consta que:
A lei de 19 de Setembro de 1850 deo a Guarda Nacional uma organisação mais
forte, e accommodada aos nossos hábitos e circunstancias, e é licito esperar que
aquella força satisfaça os fins de sua instituição, quando aquella Lei estiver
plenamente executada. Nesta Província esta atrasada a reorganisação da
Guarda Nacional; é isto devido ao desmantelamento em que se achava, ao
complicado processo das qualificações e mais trabalhos preparatórios, junto as
difficuldades que as distancias e faltas de meios promptos de communicação
oppõem á acção do Governo.
278
Reformar a Guarda Nacional era deveras importante para os conservadores, na medida em
que essa instituição, criada na seqüência da Abdicação, no contexto da defesa da Monarquia
Constitucional, se tornara autônoma em demasia. O fato de seus oficiais serem escolhidos
mediante eleição retirava do poder central boa parte do controle sobre a milícia. A lei de 1850
centralizou-a, extinguindo as referidas eleições e subordinando-a ao Ministério da Justiça. Dessa
maneira, os conservadores conseguiram acomodar a Guarda Nacional às circunstâncias de seu
retorno ao poder.
Cumprir as ordens de recenseamento e reorganizar a Guarda Nacional nos moldes exigidos
pela nova lei não eram as únicas preocupações da Assembléia. Fazia-se tamm necessário
disciplinar o clero e trazê-lo à ordem conservadora, afastando seus elementos mais
revolucionários:
Também é preciso confessar que se a invasão estragadora dos princípios
revolucionários não poupou o Sanctuario, desde que começou para nós a
epocha da reorganisação, temos procurado o quanto possível reparar aqueles
esttragos.
279
Não se pode afirmar quem eram esses revolucionários, mas a própria intenção do
presidente em promover expurgos na hierarquia católica, já revelava a disposição de o tolerar-se
nenhuma contestação às diretivas do poder central.
278
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/456/000010.html. Acesso em 12/08/2004.
279
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/456/000011.html. Acesso em 12/08/2004, às 19:15.
124
Outra questão interessante apontada no relatório do presidente, era a necessidade de dar
continuidade às obras da Estrada do Paraibuna, já que:
Sendo a maior obra da província, quer pelo lado de sua utilidade, quer pelos
sacrifícios que nos tem custado, e que tem ainda de custar, é também aquella
sobre a qual se tem fixado mais as vistas dos legisladores mineiros.
280
Cumpre frisar que a importância dessa obra residia no fato de ser a principal ligação entre
a proncia e a Corte, mostrando-se posteriormente essencial para a continuidade da expansão
econômica da proncia, pois escoaria a produção de café da Zona da Mata para os portos
cariocas. Os projetos de modernização e ampliação da estrutura viária da proncia continuavam a
pleno vapor. No parlamento era proposta ao ministro do Império a construção de uma estrada que
ligasse Minas Gerais a Goiás.
Nessa conjuntura, os liberais, acuados pela onda conservadora, procuravam expor
publicamente sua indignação. Theofilo Ottoni, protestando contra os conservadores, recusou o
convite para assumir uma vaga de deputado geral, que se qualificava por ser suplente. Ao
recusar ser empossado, ele justificou-se através de uma carta, da qual alguns trechos seguem
abaixo:
Ilm. e Ex. Sr.- A câmara municipal da cidade de Ouro Preto, capital da proncia
de Minas Geraes, me fez portador de um diploma o qual me habilita a preencher
a vaga que há na augusta câmara dos Srs. Deputados (...) Há porém uma
questão de consciência que me inhibe de acudir aquelle honroso chamado. Em
1849, quando tratava de constituir-se a câmara dos Srs deputados, V. Ex.
recordar-se-há que eu e alguns dos meus nobres collegas, cuja eleição havia sido
pleiteada na província de Minas Geraes por parte da opposição liberal, tivemos a
honra de submetter á consideração dos Srs. Deputados eleitos pelas outras
províncias uma representação de 115 documentos, em a qual julgávamos estar
sobejamente provada que na província de Minas em o anno de 1849 não tinha
havido eleição, e sim uma saturnal indecente, onde a illegalidade e a violência
primao a par do escarneo e do cynismo.. Abundando nesta conviccção, os
signatários da representação appelavão para os Srs. Deputados eleitos pelas
outras províncias, requerendo-lhes em nome do decoro e da honestidade publica
mandassem abrir novamente as urnas na província de Minas, e lhe garantisse a
liberdade do voto(...).Por mais porem que eu aprecie a honra de ser eleito
deputado, recuo diante da responsabilidade de expor meus amigos políticos a
perseguições e vindictas como as de que elles tem sido victimas em
conseguencia da eleição de 1849, tanto mais porque, organizado como esta o
paiz taes sacrifícios serião e pura perda, como V. Ex. não ignora, e as urnas, em
vez de manifestarem o pensamento nacional, continuarão a symbolisar somente
a influencia do poder. Bem ponderado quanto exposto fica, resolvi portanto
280
Idem.
125
supplicar a V. Ex. queria ter a bondade de fazer chegar ao conhecimento da
augusta câmara dos Srs. deputados que eu com muito pezar renuncio este anno a
honra de ser representante da nação (...)
281
Em resposta à carta de Teófilo Otoni, a comissão de constituição e poderes da Câmara, sob
a liderança de dois conservadores, Francisco Diogo Pereira Vasconcellos e João Antonio de
Miranda, emitiu o seguinte parecer “(...) A commmissão deixa de parte a linguagem desabrida e
apaixonada em que esta concebido o dito officio, o porque aconselhão as conveniências
parlamentares, como também tende elle a excitar discussão ociosa e inopportuna sobre um facto
que pela augusta câmara dos Srs. deputados foi julgado regular e legitimo (...)
282
Novamente
os saquaremas procuravam desqualificar seus adversários, daí o emprego de expressões como
linguagem desabrida e apaixonada”. O parecer da comissão, mesmo com os protestos da
deputação liberal, foi aprovado.
283
Mesmo nesse ambiente de extrema militância e intolerância política, os ventos da
Conciliação já se faziam sentir, tanto na Assembléia Geral quanto no Assembléia Provincial. A
partir de 1853, a beligerância entre conservadores e liberais mineiros, acompanhando os
movimentos ministeriais, tendeu a se reduzir. Sabemos que normalmente as eleições no Brasil
Imperial tendiam a ser termômetros das disputas partidárias. Por isso as palavras do presidente
Luiz Antonio Barboza nos fornecem detalhes interessantes sobre os novos tempos que se
avizinhavam:
Nesta Província para nos motivo de orgulho, e satisfação) tanto as Eleições
Municiapaes, como a de Eleitores tiverão lugar nas 207 Parachias, e Curatos,
sem que a ordem publica em parte alguma fosse perturbada. Os partidos
empenharão-se na luta em todos os pontos, em que se julgarão com alguma
probabilidades de triumpho, porém não contarão força entre os elementos da
victória. Á esse facto, e a moderação com que em geral se portarão os diversos
agentes da Administração se deve aquelle resultado. Não quero com isto dizer
de uma maneira absoluta que, nem um abuso ou irregularidade se praticasse:
seria preciso que pertencermos a uma raça privilegiada e estranho ao influxo
das paixões, e interesses, que se envolvem em uma eleição; é certo porém que
em relação ao empenho dos partidos, a extensão da luta, forão elles em
diminuta escala.
284
281
APB, 1852. P. 05
282
Idem, p. 06.
283
Idem, p. 07.
284
Idem, http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/457/000003.html Acesso em 12/08/2004, às 22:30.
126
Observe-se que em momento algum o presidente indicou que a disputa eleitoral tenha sido
plenamente pacífica, mas frisou que ela foi marcada pela “moderação” dos agentes da burocracia
e que a ordem publicanão foi afetada. Chega a ser mico o reconhecimento de que o processo
eleitoral fora de alguma maneira viciado, pois, segundo ele, para que isso não acontecesse seria
necessário pertencermos a uma raça privilegiada”. Entretanto, o foco está no trecho em que o
mandatário, referindo-se às lutas partidárias, afirmava que em ocorreram diminuta escala”.
Os resultados das novas eleições foram muito favoráveis para os conservadores. Como
exemplo exporemos os votos arrematados por algumas lideranças conservadoras e liberais dentro
de Minas Gerais:
285
Deputados conservadores ais votados em Minas Gerais
Luiz Antonio Barbosa – 1406 votos
Francisco Diogo Pereira Vasconcellos – 1382
Manoel Teixeira de Souza – 1359 votos
Deputados liberais
Manoel de Mello Franco – 431 votos
Teófilo Otoni414 votos
José Antonio Marinho398 votos
O prestígio da Assembléia Provincial mineira era grande. Uma representação desta ao
Parlamento, pedindo revisão de uma legislação sobre as municipalidades, foi recebida com bons
olhos pela casa maior:
A assembléia legislativa provincial de Minas em sua representação datada de
21 de Maio de 1852, e que foi commettida ao exame da commissão de câmaras
municiapaes, pede a esta augusta câmara a reforma da lei de de outubro de
1828, que creou e serve de regimento ás câmaras municipaes. Aponta a
sobredita assembléia dous notáveis inconvenientes que nascem das disposições
da citada lei, e que obstão á satisfação dos deveres que as municipalidades
estão commettidos: é o a difficuldade de poderem essas corporações,
compostas de diversos membros, fazerem aos seus municípios todo o bem que
lhes cumpre, dependendo todas as suas deliberações e a execução dellas do
concurso de mais de uma vontade, cujo desacordo muitas vezes embaraça a
adopção e até a execução de qualquer medida; o segundo inconveniente é o
reunirem-se as câmaras em certas épocas, e com longos intervallos, durante
os quaes ficão paralysados todos os trabalhos a seu cargo aggravando-se ainda
285
APB, 1853. P. 96.
127
este mal com as continuadas substituições de seus membros, do que resulta
ainda a falta de uniformidade no pensamento de taes corporações, cujas
decisões são muitas vezes alteradas successivamente sem que alguma chegue a
ter execução, ficando assim tudo estacionário (...).
286
A câmara se comprometeu a deliberar maneiras de reformar a lei de de outubro de 1828,
reconhecendo que o Ps “se recente dos males e defeitos” dessa lei, que comprometia o
funcionamento dos poderes locais, tornando-os ineficientes. Reformar-la significava atender as
reivindicações localistas canalizadas pela Assembléia Provincial de Minas Gerais. Permitia-se
que os elos entre poder central e localidades fossem fortalecidos. A ligação entre eles era A
Assembléia Provincial.
A volta dos conservadores ao poder em 29 de setembro de 1848; significou uma nova
retomada de seu projeto de construção da ordem. De 1848 a 1853, Minas Gerais ficou
comprometida com a política dos sucessivos Gabinetes conservadores que se sucederam na
Corte. A política mineira oscilou como um pendulo ao longo do período estudado. Tal lógica era
determinada pelos movimentos do poder central. Num primeiro momento as tensões entre
liberais e conservadores não desapareceram, mas tenderam a serem tratadas no ambiente
institucional da Assembléia Provincial.
Ao longo desse período percebe-se que cada vez mais a moderação e o comedimento
foram sendo características do dia a dia da política mineira. Prova disso pode ser verificada pelo
discurso de homens como Tfilo Otoni. Este ao se referir a tentativa de ruptura de 1842, assim
se expressou:
Creio sinceramente que mais teria ganho o sistema constitucional, se (...) a
oposição mineira, em vez do recurso às armas , de preferência empregasse
contra o Governo os meios pacíficos que lhe restavam.
287
A oposição à ordem conservadora não cessou, porém livrou-se de eventuais excessos e
revestiu-se cada vez mais de uma convicção que a melhor saída para os impasses entre poder
central e elites locais era a via institucional. Além disso, a partir dos anos de 1850 a cafeicultura
286
APB, 1853. P. 05
287
IGLESIAS, Francisco. Minas Gerais IN HOLANDA, Sérgio Buarque de .T. II . História Geral da Civilização
Brasileira. São Paulo: Difel, 1974. P. 411.
128
mineira começou a se tornar vigorosa, fortalecendo economicamente a Proncia, dando-lhe
uma nova dinâmica. As elites locais não estavam mais dispostas a colocar sua prosperidade em
risco em função de radicalizações.
129
Considerações Finais
Ao longo do trabalho, buscou-se recuperar as disputas entre liberais e conservadores em
Minas Gerais. Como marco dessa disputa temos a Revolução Liberal de 1842. A Revolução não
colocou em risco a integridade territorial do Império, tendo em vista que não teve um tom
separatista, mas serviu para mostrar as fissuras existentes entre setores das elites daquela época.
Acima de tudo, a Revolução mostrou descontentamento de alguns grupos vinculados ao partido
liberal em Minas Gerais e em São Paulo. Entretanto devemos ressaltar que o foram todos os
liberais mineiros que participaram deste movimento, antes, algumas Câmaras, mesmo compostas
por maioria liberal, decidiram se manter afastadas dessa luta.
O resultado da Revolução não foi a sonhadora vitória para os grupos liberais litigiantes,
mas forçou o Governo Imperial a adotar varias estratégias de cooptação para que com o fracasso
da Revolução Liberal em Minas, as elites pudessem ser aproximadas daquilo que Ilmar R. Mattos
chamou de Centro”.
288
Tal “Centro” significava, antes de qualquer coisa, centralizar a sede do poder nacional no
Rio de Janeiro. Implicava em costurar alianças com os mais diversos setores da sociedade,
impondo gradativamente a autoridade do Governo sobre os interesses da “Casa” ou seja, os
interesses privados. Em alguns momentos nota-se que o Governo negociava, em outros, como em
1848 na Revolução Praieira, foi obrigado a utilizar da coação militar.
Pela dimica da Assembléia Provincial de Minas Gerais conclui-se que após a derrota
dos liberais no campo militar em 1842, abateu-se um quadro repressivo sobre a Proncia e as
elites políticas mineiras passaram por um processo de rearticulação frente à nova situação política,
em que os liberais tiveram que refluir para a Proncia e desta tentaram novas estratégias frente ao
projeto conservador. Diante do avanço do projeto centralizador, articulado pelo poder central,
288
MATTOS, Ilmar Rohloff. Op. Cit.P. 126.
130
supõe-se que as Assembléias Legislativas Provinciais tiveram este papel, que constatamos para
Minas Gerais. Nesta província a Assembléia passou a representar para os grupos defensores de
interesses locais, um meio de expor suas demandas, defender seus interesses e garantir sua
influência, pelo menos em vel local.
A hegemonia conservadora apontada por Ilmar Mattos não significou um completo
aniquilamento dos liberais, nem tão pouco os anulou completamente. Segundo este autor, os
conservadores após a derrota dos liberais em 1842 “buscaram imprimir uma direção ao
predomínio que exerciam no Mundo do Governo, desde então”.
289
Mas essa busca constita-se
de um movimento continuo. A hegemonia desse grupo não era um fato dado, mais construído a
partir de amplas negociações, recuos e estratégias de cooptação.
Em Minas Gerais, principalmente na gestão do general Soares de Andréia, nota-se um
grande avanço da centralização na Proncia. Soares de Andréia procurou fortalecer os grupos
conservadores, em especial retribuindo com pensões e menções honrosas à aqueles que tinham
lutado pela legalidade durante a Revolução. Além disso, prestigiou os partidários da centralização
ao coloca-los nos diversos cargos relevantes na burocracia provincial. De forma geral, percebe-se
que todos os presidentes, independentes de sua filiação partidária, procuraram fortalecer
eleitoralmente seus aliados, não para operarem com mais folga na administração provincial,
mas tamm para seguir as diretrizes dos gabinetes instalados na Corte.Tendência que de acordo
com a historiografia sobre o período, se observa para o Brasil como um todo.
Quanto às discussões historiográficas realizada neste trabalho, a respeito dos limites e
significados do liberalismo no Brasil, destacou-se que tal liberalismo sofreu um processo de
adequação à realidade brasileira, tendo em visa as especificidades do Brasil, como a escravidão e
a manutenção do latifúndio. No que se refere à construção da cidadania, o liberalismo do Brasil no
oitocentos encontrou muitos limites, e tal liberalismo mesmo entre as elites mais ilustradas nem
sempre foi uma realidade. A leitura das fontes nos autoriza a dizer que pequenas parcelas do
289
MATTOS, Ilmar Rohloff. Op. cit. P. 129.
131
partido conservador em Minas Gerais, por exemplo, adotavam posições mais extremistas,
criticando qualquer proximidade com as idéias liberais, tidas para esse grupo como subversivas e
prejudiciais a sociedade. Isso ficou muito nítido através da leitura de algumas falas de deputados
provinciais.
Mas na sua maioria, os conservadores foram partidários do liberalismo. De forma geral
viam nessa ideologia a possibilidade de maior atuação do Estado na sociedade, mantendo o
monopólio tributário e coercitivo.Para tanto, procuraram gerir a Província debelando as oposições
locais, removendo oficiais da Guarda Nacional, jzes e outras autoridades que não fossem
concordantes com sua visão para a sociedade. para parcelas do partido liberal, o ideal era que
as localidades dispusessem de mais autonomia frente ao governo, que o monopólio da violência
fosse fragmentado, podendo-se conceder às lideranças locais poderes para administrar a justiça e
punir segundo os interesses dos grandes proprietários locais. Também reivindicavam maior, ou
quase completa, autonomia financeira para a Proncia.
Procurou-se também entender melhor a dinâmica econômica e política da proncia de
Minas Gerais, no período estudado. Com o café, Minas Gerais encontrou um caminho de
prosperidade material. Entretanto para que isso se efetivasse eram necessários constantes
investimentos do governo,provincial e central, para incremento da infra-estrutura da proncia,
sobretudo na construção de estradas que ligassem os centros produtores aos consumidores. Essa
preocupação com o progresso era comum tanto aos conservadores, quanto aos liberais, o que
remete às situações encontradas por Isabel Andrade Marson na Proncia de Pernambuco. Ao que
tudo indica, em Minas Gerais, independente da vinculação partidária, o progresso era uma meta
das elites políticas, podendo apenas variar a maneira de se consegui-lo. Para tanto recorreu-se ao
cultivo de chá, mas tarde ao café, para se alavancar a economia provincial.
A diferença entre os que se alinharam como “liberais” ou conservadores” era política.
Como já referido, a Revolução Liberal de 1842 tornou-se um divisor de águas na província,
passando a ser constantemente lembrada tanto por liberais quanto por conservadores. O seu uso
132
político ficou evidente ao longo do trabalho. Para os conservadores a Revolução atestou a
incapacidade dos liberais em conviverem num sistema parlamentar, representou um desafio a
autoridade do trono, um pecado frente a Igreja e acima de tudo um ato que atestava a falta de
responsabilidade e patriotismo por parte dos liberais. Para esses conservadores, a vitória em 1842
representou a imposição da ordem sobre o caos e atestou o compromisso do partido conservador
com o Imperador e com a ordem.
A Revolução foi alvo de disputa entre os dois partidos na medida em que ambos tentavam
fazer um uso simbólico da mesma. Os conservadores tentaram criar pela Revolução um
monumento ao fracasso dos liberais. Procuraram torna-la um marco da traição e indisciplina
política dos liberais. Conseguiram algum sucesso nessa estratégia pois os liberais passaram a ser
denominados jocosamente de “luzias” pelos conservares, tornando sempre presente a lembrança
da derrota sofrida nos campos de Santa Luzia, arraial pouco distante da capital mineira.
290
Mas como se evidenciou pela pesquisa, os liberais tamm tentaram construir seus
mbolos, ou melhor, aplicaram-se em dar um novo significado àqueles erigidos pelos
conservadores.
Os liberais, ao longo do período de 1844 a 1848, estiveram no controle da proncia. Nesse
período, tentaram mudar o nome do arraial de Santa Luzia, além de promo-lo à cidade.
Buscaram dar um tom de heroísmo aos acontecimentos de 1842, reforçando sua lealdade a
monarquia e ao sistema constitucional.
Os conservadores ao voltarem ao poder em 1848, novamente se dispuseram a desconstruir
todos os mecanismos criados pelos liberais para alcançar sua redenção publica. Tomando o
mesmo exemplo citado no parágrafo anterior, os conservadores reduziram novamente Santa Luzia
à condição de arraial, e diminram ainda mais seus limites.
Apesar das diferenças políticas, os debates na Assembléia entre os dois grupos deixam
transparecer a preocupação em se reafirmar o apego ao sistema político nacional. Observam-se
290
MATTOS, Ilmar Roholoff. Op. Cit. P. 145.
133
também os mesmos métodos de atuação pratica, consubstanciado num forte esquema de
manipulação das eleições. Tal esquema era comum aos dois partidos. Entretanto no âmbito da
retórica, os grupos derrotados nas eleições procuram postar-se como paladinos da justiça e
equidade. Criticando o abuso das autoridades eleitorais, a violência e a cooptação.
Outra crítica sempre comum aos dois grupos se refere ao recrutamento dentro da
proncia. Criticavam-se os todos e critérios para o exercício do recrutamento, principalmente
quando tal pratica colocava em risco suas bases eleitorais e sua rede de clientela. A indicação de
jzes de paz e delegados de policia era tema recorrente nas criticas do grupo que se achava na
oposição. Tais críticas sempre giravam em torno do autoritarismo dos ocupantes dos cargos e
mesmo do próprio presidente da proncia, que ao substituir uma dessas personalidades, tinha
como principal preocupação as eleições vindouras, fato que contrariava às vezes os interesses das
localidades, exigindo uma maior capacidade de negociação.
A Guarda Nacional também esteve presente nos debates entre conservadores e liberais em
Minas Gerais. Registra-se um esforço constante por parte dos conservadores em disciplinar os
oficiais da Guarda na proncia, submetendo-os ao controle do presidente da província e em
ultima instancia ao Ministério da Justiça.
Podemos afirmar que a Conciliação de 1853 serenou as disputas na proncia. Joaquim
Nabuco nos oferece uma boa visão do ambiente criado por esse movimento:
A conciliação era uma idéia que estava sendo advogada com muito aplauso
pela imprensa e no parlamento, principalmente pelos liberais. O desastre da
Revolução em Pernambuco, aniquilando esse partido na sua forma
revolucionaria e tendo fechado o período das revoluções, havia criado um
desejo geral de paz e tranqüilidade. Os partidos estavam preparados para fazer
e receber propostas de concórdia e a opinião impunha moderação aos
vencedores, senhores absolutos do campo.
291
Até mesmo liberais mais radicais como Toefilo Ottoni procuravam encontrar maneiras
mais pacificas de demonstrar seu descontentamento com a política corrente. Conforme apontamos
no trabalho, o próprio Teófilo Ottoni lamentava o uso da força em 1842. Dizia que talvez tivesse
sido melhor usar meios pacíficos para resolver os impasses com o Gabinete conservador.
291
NABUCO, Joaquim. Op. Cit. P. 172.
134
Dessa forma, no transcorrer do período estudado, a influência conservadora na província
tornou-se uma marca incontestável nas administração. A hegemonia conquistada pelos
conservadores não significou necessariamente o aniquilamento das causas liberais, mas sim um
reordenamento das forças políticas em Minas Gerais. O “jeitomineiro de fazer política passou a
ter como tônica a busca pelo consenso, a recusa ao uso da força como primeira opção, enfim, a
busca incessante pela negociação. A busca pelo exercício do poder tornou-se mais silenciosa,
evitando grandes radicalizações, porém constante e efetiva. A força do centro subordinou mas não
enterrou os interesses localistas. Entretanto selou-se um pacto mudo em que as partes
concordavam que a oposição aceitável deveria ser praticada nas salas das Assembléias
Legislativas, as lutas políticas despiram-se de seus aspectos mais violentos e adquiriram feições
mais civilizadas, imitando os modelos europeus.
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1852 – Relatório apresentado pelo Presidente José Ricardo de Sá Rego.
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