Esse processo de transformação da protagonista torna-se evidente ao
leitor quando Oribela relata uma das relações sexuais que mantém com seu
esposo, Francisco Albuquerque:
Francisco Albuquerque se veio banhar, me beijando em frente às
naturais, que riam. Até que me quis esconder, veio ele nos arbustos,
relva, me deitou em uma mantilha, cariciou com dedo desenhando os
traços do rosto e dos meus ombros, ele me queria feliz e prenha. Assim
trabalhou sobre mim em fervor para seu sonho (MIRANDA, 1996, p.137).
Mesmo percebendo-se uma relativa liberdade na relação do casal,
beijando-a na frente das naturais, nesse relato da protagonista não se tem a
entrega da mulher ao prazer, já que pela frase “assim trabalhou sobre mim em
fervor para seu sonho” fica evidente que apenas os desejos e sonhos de
Francisco de Albuquerque é que estão sendo satisfeitos.
No entanto, na sua última fuga Oribela encontra o Mouro Ximeno Dias, e
com ele conhece o amor e o desejo. Vale recuperar o fragmento que descreve o
encontro sexual do casal:
Era tal, que atraiu em tudo que há em mim e lhe fui sentir a boca, ele
despertou e me tomou em seus braços num desatino e grandíssimo
ímpeto, correndo com as mãos pelo meu corpo, dizendo suas falas de
amante, a beijar meus beiços e outras obras bem desconcertadas,
famintos afagos, a soltar o meu gibanete de homem, arrancar colchetes,
desatar os cordões da camisa, a me querer deixar feito as naturais, a mim
dava um gosto bom, fino punhal frio arrastando em toda pele, a querer
sentir que ele se fazia em mim, um prazer perseverante, tragando minhas
tentações para vencer minhas malícias, inferno glorioso, tirado de meu
corpo, de minha natureza humana, minha perdição e minha alma indo à
luz, portas se abrindo, minha boca bem aventurada, ele um todo poderoso
a me desfalecer, demandar, huhá, hio hio, digo que sim, re-si, eia, sus,
lago dos cães, hua, hua, ala, ala, saca saca, hão, hão, mas ele disse que
não, e foi dizendo que não e não, que ia causar um grandíssimo mal,
talamavez, ieramá, muitieramá, se vos eu arrebatar, de maneira que
estando ele sobre mim vi entre seus cabelos os chifres, endureci a seus
suspiros e me desfiz do encantamento(MIRANDA, 1996, p.179).
Nos braços de Ximeno Dias, Oribela descobre sua sexualidade, muito diferente
daquela do relacionamento que mantinha com o marido, “um prazer
perseverante, tragando minhas tentações para vencer minhas malícias, inferno
glorioso, tirado de meu corpo, de minha natureza humana, minha perdição e