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Para que vejamos um dos problemas que a análise de Nozick está sujeita, considere o seguinte
exemplo.
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Para que a crença de que p seja objeto de conhecimento para S, a crença de S de que p
precisa cumprir, segundo Nozick, a condição expressa por (SU). Suponha que eu observo um
cachorro o qual, por sua vez, obstrui o meu contato visual com uma réplica perfeita de um
pato. Eu creio que (p) há um cachorro diante de mim. A crença de que p cumpre a condição
(SU): nos mundos mais próximos onde não há um cachorro diante de mim, eu veria a réplica
do pato e não formaria a crença de que há um cachorro diante de mim. Suponha que eu sei
que p implica logicamente que (q) há um animal diante de mim e que eu creio que q com base
em p e nessa implicação. A minha crença de que q não cumpre a condição (SU): nos mundos
mais próximos onde não há um animal diante de mim, o cachorro estaria ausente, eu veria a
réplica de pato e formaria a crença de que há um animal diante de mim. Esse é um resultado
intuitivamente insuportável.
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Parece implausível pensar que eu posso saber que há um cão
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O exemplo é de Hawthorne (2004, p. 42).
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Em um comentário não publicado sobre a teoria de Rober Nozick, Saul Kripke é descrito como tendo
apresentado o seguinte caso contra a tese de que (SU) é uma condição necessária sobre conhecimento empírico
(Adams (2005, p. 24) e Dretske (2005, p. 24 nota 4) relatam a objeção de Kripke): S está em uma região onde
todos os celeiros vermelhos são genuínos e onde celeiros de outras cores possuem exemplres genuínos e
exemplares de papier-mache. Nessa situação, toda vez que S crê que há um celeiro vermelho diante dele, de
acordo com Nozick, S sabe que há um celeiro vermelho diante dele, pois se fosse falso que há um celeiro
vermelho diante de S (por exemplo, por que há um celeiro amarelo diante de S), S não creria que há um celeiro
vermelho diante dele. Entretanto, alega Kripke, a teoria de Nozick implica que S pode saber que há um celeiro
vermelho diante dele mesmo que S não possa saber que há um celeiro diante dele: S não pode saber que há um
celeiro diante dele se, ex hypothesi, existem cópias de papier-mache de celeiros de outras cores que não a
vermelha misturados com celeiros genuínos e se S creria que há um celeiro diante dele (olhando, por exemplo,
para um celeiro amarelo) mesmo que nesse caso houvesse diante dele apenas um cópia de papier-mache de
celeiro. Assim, segundo Kripke, (SU) não pode ser uma condição do conhecimento empírico já que essa
condição nos coloca na situação constrangedora de termos que admitir que S sabe que está diante de um celeiro
vermelho mas que S não sabe que está diante de um celeiro. Embora o exemplo de Kripke não seja exatamente
análogo ao exemplo de Hawthorne (pois o segundo trata claramente de conhecimento inferencial, enquanto o
primeiro é naturalmente entendido como tratando de conhecimento perceptual, i.e., não-inferencial), ele pode ser
facilmente modificado para tratar de conhecimento inferencial da seguinte maneira. Suponha que S está na
situação descrita por Kripke. Suponha ainda que S está diante de um celeiro vermelho e que ele crê que (p) S está
diante de um celeiro vermelho. Como nós vimos, S cumpre (SU) e, se as outras condições são satisfeitas, S sabe
que está diante de um celeiro vermelho. Suponha que S perceba claramente que p implica (q) S está diante de um
celeiro e que S deduz validademnte q de p e baseie a crença de que q sobre a crença de que p e sobre a crença de
p implica q. Segundo Nozick, já que a crença de que q de S não cumpre (SU), S não sabe que q, mesmo que ele
venha a crer nisso com base em raciocínio dedutivo válido desde uma premissa que ele conhece. Assim como o
exemplo de Hawthorne, esse resultado parece insuportável. (Agradeço a Cláudio de Almeida por ter me
chamado atenção para a semelhança entre os exemplos de Hawthorne e Kripke)