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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA E CIDADANIA: UM ESTUDO SOBRE FAMÍLIA E
INSTITUIÇÃO ESPECIALIZADA
MARISA FATIMA VEDOVATTO DE MACEDO
Piracicaba, SP
Agosto/2006
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DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA E CIDADANIA: UM ESTUDO SOBRE FAMÌLIA E
INSTITUIÇÃO ESPECIALIZADA
MARISA FATIMA VEDOVATTO DE MACEDO
Orientador: Prof. Dr. Júlio Romero Ferreira
Dissertação apresentada como exigência
Parcial para obtenção do título de Mestre
em Educação da Universidade Metodista
de Piracicaba – UNIMEP.
Piracicaba, SP
Agosto/2006
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Banca Examinadora
Nome do Orientador: Prof. Dr. Júlio Romero Ferreira
Profª. Drª Maria Cecília Cacareto Ferreira
Profª. Drª Maria Eloísa Famá D’Antino
Profª. Drª. Maria Teresa Dondelli Paulillo Dal Pogeto
Agradecimentos
Agradeço e expresso minha admiração ao meu orientador, Prof. Julio, que com
competência profissional e generosidade enriqueceu este trabalho com sugestões
sempre pertinentes, que me estimulou nos momentos difíceis fazendo com que
encontrasse novas formas de expressar e caminhar.
Às professoras Ciça e Maria Tereza, ambas com experiência e competência
contribuíram desde o meu exame de qualificação apresentando sugestões
fundamentais para reelaboração e conclusão de meu estudo.
À Prof.ª Maria Eloísa Famá D’Antino pelas sugestões, contribuições e por sua
participação na banca examinadora.
Ao gentil e competente corpo docente e administrativo do Programa de Pós
Graduação em Educação.
Aos profissionais da instituição e às mães que participaram deste estudo com boa
vontade, seriedade, disponibilidade e respeito foram imprescindíveis ao meu trabalho.
Em especial à minha família, Rui, Núbia e Eduardo, pelo apoio, carinho e
compreensão em todos os momentos.
À minha mãe pelo exemplo de luta e dedicação à família.
Aos meus irmãos, companheiros de caminhada, presentes em quaisquer
circunstâncias.
À Rosana e Fernanda amigas especiais e de todas as horas.
À Ana Paula pela solidariedade, sucessivos contatos e contribuições para a
realização deste trabalho.
Aos colegas do Mestrado que me proporcionaram uma grande convivência e um
crescimento pessoal e profissional durante os anos de convívio.
RESUMO
Macedo, Marisa F. Vedovatto (2006) Instituição, cidadania e deficiência múltipla.
Dissertação de Mestrado, UNIMEP: Piracicaba – SP.
O presente trabalho teve por objetivo identificar aspectos da instituição
especializada na relação com as condições de vida e cidadania de mães e de suas
crianças com deficiência múltiplas. A trajetória metodológica percorrida pela
pesquisadora se estabeleceu através de: 1) consulta em livros institucionais; 2) sites
eletrônicos oficiais; 3) legislação municipal referente às pessoas com deficiência; 4)
questionários respondidos pelos representantes das Secretarias Municipais; 5) consulta
aos planos de trabalho da instituição de 2005 e 2006; e 6) pesquisa de campo realizada
junto às mães de crianças com deficiência múltipla da instituição. A pesquisadora
constatou no decorrer da análise dos resultados que: a) a instituição se constitui no
único espaço de atendimento a essa população; b) não existe espaço para que as
mães exerçam sua cidadania; c) embora estejam inseridas no Plano de Trabalho da
instituição ações voltadas à inclusão social destas crianças, estas não ocorrem; d) as
práticas de instituição refletem descrédito no potencial de desenvolvimento e
aprendizagem das crianças reforçando isso junto às mães e num movimento contrário à
inclusão escolar; e) há uma precariedade nos serviços municipais básicos (saúde,
educação e ação social) o que reforça e agrava a situação de exclusão social; e f) os
profissionais da instituição também contribuem para a manutenção da exclusão através
de suas práticas assistencialistas. Conclui-se, desta forma que, o poder público não
assume papel regulador e intervencionista voltado à inclusão social das pessoas com
deficiência múltipla e seus familiares. É fato que atualmente essa população não é
beneficiada pelos programas municipais. Por fim, o papel dos profissionais é
fundamental para incentivar as es num processo de exercício de cidadania,
apontando que neste movimento as atitudes não são de passividade e submissão e sim
de consciência e reivindicação de direitos de forma ativa. Dar voz e acolhimento para as
mães sem preconceitos, sem valores pré-estabelecidos, sem julgá-las talvez seja um
bom começo, fazer, enfim, com que elas se sintam pertencentes ao único espaço de
atendimento possível atualmente.
Palavras-chave: Inclusão social, políticas públicas municipais, deficiência múltipla,
famílias.
ABSTRACT
Macedo, Marisa F. Vedovatto (2006) Institution, Citizenship and Multiple Deficiency.
Master Dissertation, Unimep, Piracicaba, S.P.
This research has the objective of identifying some aspects of the specialized
institution relating itself with the living conditions and citizenship of the mothers who
have children with multiple deficiencies. The sources used were: a) institutional books,
b) official electronics sites, c) municipal legislation related to the subject, d) information
provided by the specific municipal department, e) information from 2005 and 2006
institution plans, f) interviews with the mothers with children in the program.
After analyzing all the collected information, the researcher pointed: 1. there is
just this institution to take care of that special population, 2. the mothers do not have
room to take advantage of their citizen rights, 3. the social inclusion of the children does
not occur, although it is an institution policy, 4. the institution attitudes and practices
show they do not believe that the children can improve and develop their learning and
potential, creating a movement against the inclusion in a regular school, 5. the municipal
health care, education system and social programs are defective, providing low quality
services, 6. the institution professionals contribute to maintain the social exclusion
through paternalistic conducts.
In conclusion, the public government does not manage the social inclusion of
these children and their relatives through municipal programs. The professionals need to
incentive the mothers to take advantages of all their citizen rights, and stop with the
submission situation. The mothers need to be heard without prejudices and previous
judgments to make them feel as a part of a group where they can have some kind of
support.
Key words: social inclusion, municipal public policies, multiple deficiency, and families.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................08
CAPÍTULO I - PERCURSO METODOLÓGICO..............................................................13
CAPÍTULO II –CONTEXTUALIZANDO CIDADANIA, DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA E
FAMÍLIA..........................................................................................................................21
2.1. Cidadania: conceito e perspectiva histórica.............................................................21
2.2. Cidadania e as pessoas com deficiência.................................................................31
2.3. As pessoas com deficiência múltipla.......................................................................38
2.4. A família das pessoas com deficiência....................................................................41
CAPÍTULO III - RESULTADOS.......................................................................................53
3.1. O município..............................................................................................................53
3.2. A instituição..............................................................................................................58
3.3. A análise dos prontuários e descrição das mães participantes da pesquisa...........61
Quadro 1: Caracterização dos filhos (matriculados na
instituição)............................................................................................................64
Quadro 2: Caracterização das mães...................................................................65
3.4. O espaço físico, a interação entre os profissionais e mães e a rotina destas na
instituição........................................................................................................................66
3.5. O trabalho da instituição frente às mães, aos alunos com deficiência múltipla e a
concepção de educação inclusiva..................................................................................67
3.6. As impressões das mães ao longo da realização das entrevistas...........................70
3.7. As repostas das mães nas entrevistas.....................................................................72
CAPÍTULO IV – DISCUSSÃO.........................................................................................76
4.1. Direitos assegurados................................................................................................76
4.1.2 Qualidade dos serviços que as mães e as crianças recebem do poder público
municipal.........................................................................................................................78
4.2 A instituição: espaço possível de cidadania..............................................................80
CAPÍTULO V - CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................87
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................90
ANEXOS.........................................................................................................................97
LISTAGEM DOS ANEXOS
Anexo A - LEGISLAÇÃO MUNICIPAL REFERENTE A PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA.................................................................................................................98
Anexo B - QUESTIONÁRIO SECRETARIAS MUNICIPAIS...........................................99
Anexo C - CARTA DE INFORMAÇÃO À
INSTITUIÇÃO...............................................100
Anexo D - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO........................101
Anexo E - QUESTIONÁRIO PARA A INSTITUIÇÃO....................................................102
Anexo F - - LEVANTAMENTO DE DADOS PESSOAIS E FAMILIARES.....................103
Anexo G - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO........................104
Anexo H - ROTEIRO DAS ENTREVISTAS COM AS MÃES........................................105
Anexo I - RELATÓRIO DA DIRETORA DA ESCOLA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
INFANTIL......................................................................................................................107
Anexo J - ÍNDICE DA VULNERABILIDADE SOCIAL DE SUMARÉ.............................109
Anexo K - QUADRO 3: RELAÇÃO DE QUESTÕES REALIZADAS PELA
PESQUISADORA E RESPOSTAS EMITIDAS PELAS MÃES.....................................113
Anexo L – RESULTADOS DO CENSO ESCOLAR 2005 – MEC / INEP......................120
8
INTRODUÇÃO
Os problemas vividos pelas famílias no Brasil podem ser inúmeros, porém um
dos mais penosos é a aceitação e o atendimento da necessidade constante de
cuidados que as pessoas com deficiências múltiplas demandam.
O cotidiano de famílias pobres, migrantes, moradoras na periferia, com ínfimos
serviços municipais impõe condições de vida estressantes e de exclusão social, e para
muitas o desemprego acirra ainda mais essa condição expondo-as a uma sobrevivência
em situação de vulnerabilidade social. Essa situação se complica ainda mais quando a
estas circunstâncias se soma a deficiência múltipla; os problemas parecem adquirir
proporções ainda maiores.
Através desta pesquisa pretendeu-se identificar as condições de vida,
necessidades, expectativas e concepção de inclusão escolar através da fala das mães
de crianças com deficiência múltipla no município de Sumaré. Acredita-se que através
destes relatos, próprios de quem vive esse cotidiano, se pode compreender possíveis
fatores que impedem uma existência cidadã tanto para essas pessoas quanto para
seus familiares.
Estudar a exclusão, pelas emoções dos que a vivem, é refletir sobre o
cuidado que o Estado tem com seus cidadãos. Elas são indicadoras do
(des)compromisso com o sofrimento do homem, tanto por parte do
aparelho estatal quanto da sociedade civil e do próprio indivíduo
(SAWAIA, 2004, p.20)
No Brasil, aponta-se que 14,5% da população possui algum tipo de deficiência,
sendo que 27% destes sem nenhum grau de escolaridade e 29% vivem em condição de
miséria, situação imposta pelo meio social limitando a socialização e o desenvolvimento
dessas pessoas (NERI, 2003).
Esses dados permitem verificar que se torna urgente o combate às
discriminações, condutas de abandono, de exclusão, de desprezo e desvalorização das
pessoas com deficiência, bem como o combate a todas as formas de segregação social
destas pessoas. Esse imperativo já era apontado por Vigotski na década de 20.
9
(...) A humanidade, sempre sonhado com um milagre religioso: que
os cegos vejam e os mudos falem. É provável, que a humanidade
triunfe sobre a cegueira, a surdez e a deficiência mental. Porém a
vencerá no plano social e pedagógico muito antes que no plano
biológico e medicinal. É possível que não esteja longe o tempo em que
a pedagogia se envergonhe do próprio conceito de criança com defeito.
O surdo falante e o trabalhador cego participantes da vida em toda sua
plenitude, não sentirão sua deficiência e não darão motivo para que
outros a sintam. Está “em nossas mãos” o desaparecimento das
condições sociais de existência destes defeitos, ainda que o cego
continue sendo cego e o surdo continue sendo surdo (VIGOTSKI, 1989,
p.61).
A sociedade brasileira encontra em diferentes programas e legislação, a defesa
dos interesses de seus mais diversos representantes sociais. Nossa Constituição é
generosa quanto aos direitos e quanto à proteção dos interesses das pessoas com
deficiência, porém peca quando não interpõe meios para garantir a eficácia de seus
direitos através das políticas públicas, pois estas demandam a atuação direta e efetiva
do Poder blico, concebida como “programas de ação governamental visando a
coordenar os meios à disposição do Estado e as atividades privadas, para a realização
de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados” (BUCCI, 2002, p.41).
Nesse contexto, os poderes – federal estadual e municipal, se colocam perante a
Constituição como instrumento para a realização dessas políticas. Entretanto, somente
através da máxima atuação de cada um - fomentando a participação ativa e efetiva da
sociedade por meio das mais diversas organizações sociais; representados nos
Conselhos Municipais neste caso da Pessoa Portadora de Deficiência e no Orçamento
Participativo – é que ocorrerá o fortalecimento do exercício da cidadania ativa.
A atenção e o atendimento municipal para as pessoas com deficiência múltipla é
extremamente necessário, que o comprometimento orgânico imposto pelo quadro
clínico da deficiência múltipla evidencia a necessidade de tutela familiar ou de
cuidadores em tempo integral, que na maioria dos casos é a própria mãe. Isto torna
essas pessoas, bem como suas famílias, mais vulneráveis, implicando na necessidade
de maior atenção do poder público local para garantir melhores condições de vida bem
como o exercício da cidadania destas pessoas e de suas mães; em geral, figura central
da família diante da deficiência, enquanto cidadã e enquanto representante dos direitos
de outra pessoa.
10
Também, como afirma Demo (1998), a educação ocupa um lugar estratégico em
toda a estruturação social e, se alguma possibilidade de mudança houver para os
problemas da nossa realidade, ela passará pela educação. Porém, também se
considera que para refletir melhor a temática da deficiência múltipla, seja necessário
abordar, não a questão da educação inclusiva, mas principalmente de que forma a
educação pode ser tratada como caminho possível para solucionar progressivamente
inúmeras questões sociais, doloridas e sofridas, que exigem (re)conhecimento e
conscientização por parte dos que as vivenciam.
A pesquisadora que desenvolveu esse estudo atua profissionalmente como
Orientadora Educacional na Rede Municipal de ensino de Sumaré atendendo a uma
clientela submetida a todos os tipos de mazelas presentes no cotidiano das populações
marginalizadas no Brasil. Faz parte da concepção de trabalho da pesquisadora que
este apresenta resultados positivos através da interconexão entre escola e família
dos alunos; sendo este um princípio que a guia em sua atividade cotidiana. Deste
modo, a partir de visitas domiciliares buscou indícios das significações dos modos de
ser e agir dos alunos a quem atende, a partir do contexto em que vivem, podendo
identificar as condições de vida dessa população e de seus familiares. Este trabalho
propiciou, em 2003, o encontro com famílias de pessoas com deficiência múltipla que
neste contexto buscavam melhores condições de vida.
A proximidade entre família e escola que o processo de inclusão exige, ou das
famílias até a Instituição para aguardar as terapias realizadas com os filhos se
apresentou como oportunidade para a realização do trabalho de pesquisa. E, deveria
ser pensado pelos profissionais da instituição como oportunidade de trabalho
sistemático com o objetivo de discutir com estas mães sua realidade sociocultural,
levando-as ao exercício de sua cidadania.
Ao longo dos anos em que trabalha no município pôde constatar o impacto do
processo desordenado de ocupação territorial determinado pela especulação imobiliária
e ausência de ação política voltada para interesses do município. Este processo no
município acompanhou o que ocorreu no país entre 1950 e 1970 período em que a
concentração de modernizações, de recursos econômicos e financeiros e de população
11
impulsionou o processo de metropolização, cuja conseqüência mais evidente é a
periferização impondo condições de vida muito difíceis às famílias.
Em um primeiro momento, este trabalho buscou verificar se as políticas públicas
nas áreas da saúde, educação e ação social, através da prestação de serviços públicos
municipais às pessoas com deficiência e seus familiares, são acessíveis e eqüitativas,
contribuindo para amenizar ou solucionar as dificuldades impostas pela deficiência
frente à situação econômica familiar, com vistas à inclusão social e exercício da
cidadania. Ou seja, o poder público municipal assume suas responsabilidades perante
as pessoas com deficiência múltipla?
Outro aspecto analisado foi o ponto de vista das mães em relação aos seguintes
aspectos: o que almejam e o que conseguem nos serviços públicos municipais; a
percepção de seus direitos; como exercitam sua cidadania; existência de trabalho
sistemático para conscientização das mães quanto aos seus direitos e de seus filhos
com deficiência; o significado da educação inclusiva; e o papel desempenhado pela
instituição filantrópica no contexto de cuidados e inclusão de crianças com deficiência
múltiplas.
Deste modo, propõe-se como objeto de estudo da presente pesquisa a
instituição especializada na relação com as condições de vida e cidadania de mães e
de suas crianças com deficiência múltiplas. A apresentação deste trabalho está
estruturada em cinco capítulos.
O capítulo I contém a exposição do percurso metodológico desenvolvido pela
autora, destacando o tipo de pesquisa, os instrumentos de coleta e análise dos dados.
No capítulo II, foram abordados os temas: cidadania, deficiência/deficiência
múltipla e famílias que convivem com esse fenômeno. Procurou-se ressaltar a situação
destas e o importante papel das políticas públicas nas áreas de educação, saúde e
ação social para a concretização de direitos sociais, voltadas para a população com
deficiência múltipla e principalmente para a que vive em situação de vulnerabilidade
social.
Os resultados foram apresentados no capítulo III e a discussão com base na
fundamentação teórica no capítulo IV. No capítulo V são tecidas algumas
considerações finais tentando contribuir para que as mães possam vir a ser acolhidas e
12
atendidas pelos serviços públicos municipais a partir do conhecimento que a instituição
já possui sobre elas.
13
I. PERCURSO METODOLÓGICO
A proposta metodológica do presente trabalho baseou-se em uma pesquisa
qualitativa por ser,
(...) uma atitude e uma prática teórica de constante busca que define um
processo intrinsecamente inacabado e permanente. É uma atividade de
aproximação sucessiva da realidade que nunca se esgota, fazendo uma
combinação particular entre teoria e dados (MINAYO, 1999, p. 23).
E também por responder questões particulares, pois,
se preocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não
pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de
significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que
responde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e
dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis (MINAYO, 1994, p.21-22).
Nesse contexto, foi realizado um primeiro contato com as Secretarias de Ação
Social, Educação e Saúde do município de Sumaré, para coletar dados sobre a
situação das pessoas com deficiência múltipla e suas famílias, a fim de elaborar a
fundamentação teórica do projeto a ser apresentado como parte do processo seletivo
da Pós-Graduação em Educação, em 2003.
Diante do ingresso no Programa de Mestrado em Educação, o projeto inicial foi
revisado e reestruturado em termos de definição de objetivos, mantendo-se a
população alvo: famílias de crianças com deficiência múltipla em situação de
vulnerabilidade social no município de Sumaré.
A escolha do município para a realização da pesquisa se deu pelo fato da
atuação profissional e residência da pesquisadora no mesmo.
A coleta de dados relacionada ao município foi realizada através de consultas a
bancos de dados eletrônicos oficiais (MEC/INEP, IBGE, PNDU, SEADE), livro
específico que retrata a história da cidade (TOLEDO, 1995), Atlas da RMC (Região
14
Metropolitana de Campinas) produzido pela UNICAMP, e levantamento da legislação
municipal através de consulta à Câmara Municipal de Sumaré (Anexo A).
Também foi utilizado questionário (Anexo B) para coleta de informações junto
aos representantes das Secretarias Municipais de Ação Social, Saúde e Educação,
para uma caracterização do município apresentada no capítulo de resultados.
Diante da constatação da ausência de dados municipais frente à realidade a ser
estudada, decidiu-se partir para uma coleta junto às instituições especializadas que
lidam com esta população no município. Essa coleta de informações versou sobre as
condições sócio-econômicas das famílias de crianças com deficiência múltipla.
Na primeira instituição, constatou-se junto à coordenadora da mesma que as
famílias atendidas pela instituição, de um modo geral, eram de baixa renda, migrantes,
com baixa escolaridade e sem qualificação profissional, em situação de vulnerabilidade
social.
Perfil familiar semelhante foi descrito pela representante da segunda instituição
visitada, com a diferença de que nesta a classificação da situação familiar é de alta
vulnerabilidade social.
Após as visitas, optou-se pela segunda instituição pela disponibilidade percebida
junto à equipe desta quanto à realização da pesquisa.
O contato da pesquisadora com a instituição, objeto de estudo, deu-se
inicialmente através da diretora técnica, por meio da apresentação do objetivo da
pesquisa e da forma de participação da instituição. As informações acerca da pesquisa
foram sistematizadas em uma carta de apresentação (Anexo C). Seguindo as normas
éticas para realização de pesquisas utilizando seres humanos como sujeitos, a diretora
técnica autorizou a realização da mesma assinando o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (Anexo D).
A partir desses trâmites iniciais, a diretora apresentou a pesquisadora para a
Assistente Social que, a partir daquele momento seria o elo de ligação entre ela, os
documentos e as mães das crianças que se buscava pesquisar. Desde o início, essa
profissional mostrou-se solidária à realização da pesquisa, colaborando em tudo que foi
necessário.
15
O primeiro passo para a coleta de dados foi a consulta ao Plano de Trabalho da
Instituição de 2005 e de 2006, utilizado para elaborar uma caracterização da instituição.
Também foi realizada uma breve observação de campo que ofereceu dados
complementares aos depoimentos, registrados em diário de campo.
Foram alvos de observação o ambiente físico e a relação entre os profissionais
da instituição e os familiares, no caso as mães, isto não ocorreu em dias pré-
estipulados, e sim a partir de conversas informais, nos momentos que antecediam as
entrevistas, nos dias em que a pesquisadora comparecia à instituição para consulta aos
documentos, objetivando registrar situações significativas, com o intuito de utilizar estes
dados na discussão do trabalho.
Ressaltando que observar não é olhar naturalmente. Diante de um “[...]
fenômeno social significa, em primeiro lugar, que determinado evento social, simples ou
complexo, tenha sido abstratamente separado de seu contexto para que, em sua
dimensão singular, seja estudado, em seus atos, atividades, significados, relações”
(TRIVINOS, 1987, p.153).
Por fim, foi elaborado um questionário (Anexo E) para a equipe técnica
(assistente social, diretora técnica e psicóloga) para registrar: como ocorre a entrada
das crianças na instituição e as avaliações realizadas; a concepção desta em relação à
educação inclusiva; como o trabalho de inclusão é recebido pelos
especialistas/professores da rede municipal de ensino e sobre o trabalho desenvolvido
com as mães na instituição.
Enquanto a pesquisadora consultava o Plano de Trabalho da instituição, a
Assistente Social elaborou uma relação com 82 nomes de crianças, adolescentes e
adultos com deficiência múltipla, matriculados na Instituição, colocando à disposição os
prontuários para consulta.
Após a leitura da ficha de triagem social de cada prontuário a pesquisadora
selecionou dados de interesse e os transcreveu em ficha denominada: Levantamento
de Dados Pessoais e Familiares (Anexo F), o material analisado serviu como fonte de
dados para a definição dos seguintes critérios para escolha das mães:
- Crianças com faixa etária até 12 anos;
- Diagnóstico de deficiência múltipla;
16
- Atendimento terapêutico através do Projeto Ambulatório (hidroterapia, fisioterapia,
fonoaudiologia e terapia ocupacional) uma ou duas vezes por semana;
Durante o período de leitura dos prontuários procurou-se manter contato informal
com os familiares presentes na instituição. Foram realizadas conversas preliminares
que ofereceram informações sobre os possíveis participantes da pesquisa, bem como a
diminuição da curiosidade sobre a presença da pesquisadora na instituição. Observou-
se ter sido importante para as mães o fato de duas delas, conhecerem a mesma
enquanto Orientadora da escola de ensino fundamental de seus filhos. Foi como se
esse fato autorizasse a pesquisadora a participar daquele espaço.
A opção em realizar entrevistas semi estruturadas com as mães se justifica pela
relação de proteção e compreensão desta para com o filho desde a gestação, no
momento do parto, atendendo-o em tudo que necessita, enquanto “ego auxiliar realiza
tudo que ele precisa para empregar suas energias na construção de sua psique e
posteriormente do psique-soma” (MELLO, 1998, p.5). Segundo Neri (2003), cabe às
mães, em sua grande maioria, o papel preponderante nos cuidados para com os filhos
deficientes, uma vez que estão em maior número no quesito de chefes de famílias que
possuem alguma pessoa com deficiência (22,6%) quando comparadas aquelas das
famílias sem nenhuma pessoa com deficiência (20,6%).
a entrevista semi-estruturada é uma boa opção em pesquisas que tem por
objetivo conhecer as condições de vida dos familiares e das pessoas com deficiência,
pois se constitui em uma situação de interação onde a palavra é por excelência símbolo
de comunicação e os discursos influenciados na relação que se estabelece com o
entrevistador.
Nesse sentido, o que se quer ressaltar é que esse tipo de pesquisa utiliza
basicamente a fala de alguns membros de um determinado grupo, e que essa fala é
significativa e representativa para o todo, porque demonstra que:
Todos os membros do mesmo grupo ou da mesma classe são produtos
de condições objetivas idênticas. Daí a possibilidade de se exercer na
análise da prática social, o efeito de universalização e particularização,
na medida em que eles se homogeneizam, distinguindo-se dos outros
(BOURDIEU apud MINAYO, 1999, p. 111).
17
Segundo Cruz Neto (1994), a entrevista é “[...] uma técnica que se caracteriza
por uma comunicação verbal que reforça a importância da linguagem e do significado
da fala (CRUZ NETO, 1994, p. 57). Por outro lado, também serve como um meio de
coleta de informações sobre um determinado tema científico, pelo fato de “[...] não ser
uma conversa despretensiosa e neutra, uma vez que se insere como meio de coleta
dos fatos relatados pelos atores, enquanto sujeitos-objeto da pesquisa que vivenciam
uma determinada realidade que está sendo focalizada” (CRUZ NETO, 1994, p. 57).
Referindo-se à entrevista semi-estruturada, Minayo (1999) considera que “[...]
suas qualidades consistem em enumerar de forma mais abrangente possível as
questões onde o pesquisador quer abordar no campo, a partir de suas hipóteses ou
pressupostos, advindos, obviamente, da definição do objeto de investigação” (MINAYO,
1999, p. 121).
As entrevistas seguiram um roteiro (Anexo H), com liberdade para que cada
mãe, entrevistada individualmente, falasse sobre o tema proposto uma vez que, as
entrevistas, permitem ao pesquisado re-significar suas experiências de vida, pois “[...]
na entrevista é o sujeito que se expressa, mas sua voz carrega o tom de outras vozes,
refletindo a realidade de seu grupo, gênero, etnia, classe, momento histórico e social”
(FREITAS, 2002, p. 29).
Definidos os critérios para escolha das mães que participariam da pesquisa e a
técnica para coleta de dados, selecionou-se inicialmente três prontuários de crianças
entre os analisados.
A assistente social foi informada desses critérios e dos nomes das crianças bem
como das mães que participariam da pesquisa. As crianças foram identificadas por
letras A, B e C antecedidas pela letra C (criança): C-A, C-B C-C; e as mães as mesmas
letras antecedidas pela letra M (mãe): M-A, M-B e M-C.
A partir da definição das participantes a assistente social forneceu os dias e
horários de atendimento nos quais as mães acompanhariam as crianças à Instituição
para que a pesquisadora pudesse encontrá-las para um primeiro contato.
Este ocorreu na última semana de outubro de 2005, sendo que a assistente
social apresentou a pesquisadora e o objetivo da pesquisa às mães M-A, M-B e M-C. A
18
apresentação aconteceu em dias diferentes, tendo em vista o agendamento das
terapias.
Após esta apresentação inicial, a pesquisadora reuniu-se, com cada e, em
uma conversa informal, lendo e explicando o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (Anexo G), bem como abrindo espaço para qualquer pergunta.
A mesma explicou que havia planejado três encontros entre elas, com duração
entre 20 a 40 minutos, para a realização da pesquisa, reforçando o anonimato e a
confidencialidade dos dados coletados. Também pontuou-se que as entrevistas
aconteceriam na própria instituição durante o período em que seus filhos estivessem
nas terapias, respeitando os horários necessários para o atendimento a eles, como
troca de roupa para a hidroterapia, almoço, troca de fraldas, medicação ou qualquer
outra eventualidade.
Inicialmente pensou-se em gravar as entrevistas bem como registrar impressões
gerais sobre as mães, observadas durante a realização da mesma em diário de campo,
para posterior transcrição e análise dos dados (TRIVINOS, 1987).
Foi solicitada autorização para que as entrevistas fossem gravadas, contudo, as
mães não concordaram. A não concordância das mães com a gravação implicou em
busca de alternativas para o registro das entrevistas visando não comprometer a
qualidade da pesquisa pretendida. Utilizou-se o registro em diário de campo que
ocorreu imediatamente após o término da mesma, e no encontro seguinte os registros
foram lidos para as mães com o objetivo de esclarecer dúvidas, complementar as
respostas, aprofundar alguns temas ou repensar sobre o que foi dito.
A primeira entrevista com as mães, realizada na primeira semana de novembro
de 2005, foi semi-estruturada com seis questões pré-estabelecidas pela pesquisadora,
mas que permitiam que as mães se expressassem para além destas perguntas. O
encontro durou, em média, 35 minutos.
A segunda entrevista ocorreu uma semana após a primeira, com as três mães
(M-A, M-B e M-C). Esta se iniciou com a leitura das respostas redigidas pela
pesquisadora às seis questões realizadas na primeira entrevista e, após análise e
concordância de cada mãe prosseguiu-se com seis questões adicionais, seguindo o
19
roteiro (somando-se as questões da primeira com as da segunda entrevista, foram
realizadas, ao todo, 12 questões).
Como o ano letivo estava terminando e a instituição organizando o encerramento
das atividades, combinou-se com as mães e a Assistente Social que, após as férias de
janeiro, a pesquisadora entraria novamente em contato para ser informada das
possíveis mudanças de dias e horários das terapias de cada criança/mãe e, retomaria
as entrevistas.
A terceira entrevista ocorreu na primeira semana de março de 2006, com a
leitura dos registros das seis últimas questões, com o intuito de que as mães
recordassem tudo o que havia sido dito. Após a concordância das es frente aos
registros efetuados pela pesquisadora, prosseguiu-se com o roteiro de questões
adicionando mais sete (total de 19, somando-se as três entrevistas), neste encontro
concluiu-se o mesmo com as três mães, finalizando o procedimento de coleta de dados.
Em conversa com a Psicóloga da instituição, a pesquisadora comentou que havia
terminado a coleta de dados e perguntou sobre o caso de uma menina de 8 anos que
chamou sua atenção na etapa de coleta de dados através dos prontuários. Esta
menina, com deficiência múltipla, estava freqüentando uma Escola Municipal de
Educação Infantil três anos, situação rara na rede municipal e, coincidentemente,
neste mesmo dia a mãe se encontrava na instituição, e a psicóloga apresentou a
pesquisadora à mãe que, a partir de uma conversa informal observou que alguns dados
relatados indicavam que sua participação poderia ser um acréscimo ao trabalho.
A mãe foi convidada a participar da pesquisa e aceitando, prontamente, passou
por todos os procedimentos realizados com as outras mães e descritos acima. A
identificação desta mãe é M-D.
Um diferencial na coleta de dados de M-D e C-D foi o contato feito pela
pesquisadora com a direção da Escola Municipal de Educação Infantil na qual C-D está
incluída. Através de um contato telefônico, apresentou-se o objetivo da pesquisa e,
solicitou-se dados que contribuíssem para a mesma. A diretora gentilmente elaborou
um relatório contendo dados sobre a experiência de ter uma criança com deficiência
múltipla, inserida em sua escola.
20
Este relatório (Anexo I), mesmo sucinto, retrata as dificuldades sentidas pelos
funcionários da escola diante do quadro de comprometimentos de C-D, a trajetória de
três anos em que C-D freqüenta esta escola, fornecendo exemplos de práticas
inclusivas, bem como os progressos observados na criança e as atitudes pró-ativas dos
colegas em interagir com C-D, a diminuição do tempo de permanência da mãe na
escola e a importância da participação desta no processo.
A leitura dos prontuários permitiu algumas observações que foram agrupadas
num tópico denominado: A análise dos prontuários e descrição das mães participantes
da pesquisa, juntamente com os dados que caracterizam as crianças e suas mães,
posteriormente, organizados em tabelas,
Os registros das observações sobre o espaço físico da instituição, a interação
entre os profissionais (terapeutas) da instituição e as mães bem como a rotina destas
na instituição no tópico: O espaço físico, a interação entre os profissionais e mães e a
rotina destas na instituição.
Os registros das observações, das conversas informais e do questionário
respondido pela equipe da instituição: diretora técnica, assistente social e psicóloga
foram agrupados no tópico denominado: O trabalho da instituição frente às mães, aos
alunos com deficiência múltipla e à concepção de educação inclusiva.
As impressões subjetivas em relação às mães e síntese das respostas
registradas durante as entrevistas foram agrupadas em forma textual, denominados: a)
As impressões das mães ao longo da realização das entrevistas; e b) As repostas das
mães nas entrevistas [vale a pena ressaltar que inicialmente as falas das mães foram
sistematizadas em quadros (Anexo K) e, posteriormente, transformadas em texto].
21
II. CONTEXTUALIZANDO CIDADANIA, DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA E
FAMÍLIA
No final do século XX, o conceito de cidadania passou a exercer um apelo maior
na sociedade contemporânea tornando-se assunto de debate em diversos movimentos
sociais. Passa-se, então, à reivindicação de direitos através da perspectiva de
construção de uma sociedade melhor e mais justa.
2.1. Cidadania: conceito e perspectiva histórica
Historicamente, a origem da cidadania encontra-se vinculada diretamente à pólis
grega, aquelas unidades políticas autônomas, onde os homens livres tomavam
decisões que objetivavam os interesses relativos à administração da cidade, da pólis.
Para os gregos antigos, o político era, portanto, aquele que participava dos negócios da
pólis. As decisões eram tomadas nas Assembléias, onde os homens precisavam
exercer seu poder de persuasão mediante a palavra, sem violência, numa participação
ativa nos processos decisórios da esfera pública, estando em igualdade uns perante os
outros (DALARI, 2004)
Etimologicamente, a partir do momento em que a cultura grega foi assumida e
difundida pelos romanos a pólis virou a civitas, originando em português, cidade,
cidadão, cidadania (SOARES, 2004).
Na Idade Moderna, quando as Revoluções Burguesas colocam fim ao regime
feudal da Idade Média, com o desenvolvimento do capitalismo, a perspectiva
democrática volta à cena, sendo o regime implantado como melhor meio de
governabilidade, em oposição à monarquia predominante em todo período Medieval. A
noção de democracia compreende agora o acesso de todos os indivíduos à
administração da sociedade, através da denominada democracia representativa, um
sistema no qual os indivíduos elegem seus representantes nos assuntos da
administração política e social.
22
A Revolução Inglesa (século XVII), a Revolução Americana e a Revolução
Francesa (século XVIII) estabeleceram as denominadas Cartas Constitucionais, as
quais se opunham às normas estabelecidas na sociedade feudal, principalmente a
arbitrariedade das monarquias absolutistas, originando-se assim, o chamado Estado de
Direito, o qual tinha como prioridade o estabelecimento de direitos iguais a todos os
homens perante a lei (PINSKY, 2003)
O legado da Revolução Francesa é especialmente importante para
revelar a correspondência entre democracia e cidadania, através do
reconhecimento de três valores fundamentais, essenciais tanto para a
noção de cidadania democrática quanto para a compreensão dos
direitos humanos: a liberdade, a igualdade e a solidariedade
(CARVALHO, 2004, p.44-45).
A defesa de uma Constituição não limitaria o poder dos governantes, como
traria a idéia dos direitos e da cidadania de uma nação, sendo portanto, o único
instrumento não-violento para a segurança dos cidadãos, que não poderiam mais ser
tratados arbitrariamente.
Os homens de uma sociedade mantêm-se como cidadãos à medida
que partilham as mesmas normas e podem lançar mão delas para se
defender. Constituição violada significa cair na tirania e no arbítrio dos
que têm o poder econômico e/ou político (MANZINI-COVRE, 1996.
p.20).
Sob a influência do Iluminismo, as conquistas das revoluções burguesas
mudaram o mundo ocidental, acenando o fim da desigualdade a que os homens
sempre foram relegados. Pela primeira vez na história da humanidade, todos os
homens passaram a ser considerados iguais diante da lei. Os ideais de proteção à vida,
liberdade, igualdade, fraternidade, foram ratificados pela Organização das Nações
Unidas (ONU) com a proclamação da Declaração Universal dos Direitos do Homem
(1948).
Historicamente a concepção de cidadania está diretamente relacionada ao
capitalismo, pois ambos desenvolveram-se concomitantemente. A partir da Idade
Moderna, portanto, a cidadania estava diretamente vinculada à classe burguesa,
23
responsável pela instauração do capitalismo, sendo sua definição uma questão
complexa. O conceito de cidadania não é estanque, definitivo, mas sim fruto de lutas e
reivindicações de cada povo em diferentes épocas, ligada ao exercício da democracia
num contexto de contradições das sociedades capitalistas, que reside na produção
coletiva de riqueza com apropriação privada, determinando o surgimento da política
social “que é uma maneira de expressar as relações sociais cujas raízes se localizam
no mundo da produção” (VIEIRA, 1992, p. 22).
O surgimento de políticas sociais ocorreu o somente para garantir a cidadania
ao proletariado diante da degradação de suas condições de vida e reivindicações, mas
também como alternativas encontradas pelo Capital diante da crise de acumulação
enfrentada no final dos anos 20, configurando o Welfare State ou Estado do Bem Estar
Social, que
[...] constituiu-se no padrão de financiamento público da economia
capitalista. Este pode ser sintetizado na sistematização de uma esfera
pública onde a partir de regras universais e pactadas o fundo público
em suas diversas formas, passou a ser pressuposto do financiamento
da acumulação de capital de um lado, e, de outro, do financiamento da
reprodução da força de trabalho, atingindo globalmente a população por
meio de gastos sociais (OLIVEIRA, 1998, p.19).
Para este autor o gasto com financiamento do capital foi muito maior do que com
a reprodução da força de trabalho, motivo de sua crise, situação não reconhecida nos
discursos dos analistas que passaram a defender a liberdade de mercado e a redução
do papel do estado na economia e no social.
Ao longo dos séculos XIX e XX,
[...] a institucionalização paulatina de direitos sociais, como parte do
desenvolvimento do princípio da cidadania, inspirado na idéia liberal de
igualdade, gerou políticas públicas voltadas seja para compensação
das desigualdades produzidas pela dinâmica de expansão do capital,
seja como moeda de troca (ALMEIDA, 2002, p.29).
Na concepção moderna cidadania é um conceito derivado da Revolução
Francesa (1789) para designar um conjunto de membros da sociedade que têm direitos
e decidem o destino do Estado” (FUNARI, 2003, p.49)
24
Segundo Demo (1992), é
[...] processo histórico de conquista popular, através do qual a
sociedade adquire, progressivamente, condições de tornar-se sujeito
histórico de conquista popular, consciente e organizado, com
capacidade de conceber e efetivar projeto próprio. O contrário significa
a condição de massa de manobra, de periferia, de marginalização
(DEMO, 1992, p.17).
Segundo esse mesmo autor, existem dois tipos de cidadania: a) passiva: com a
idéia moral da tutela e do favor; e b) ativa: que institui o cidadão como portador de
direitos e deveres, participante da esfera blica e que ativamente reflete sobre novos
direitos para as necessidades que surgem abrindo espaço para participação.
Consequentemente ser cidadão significa,
[...] ter direito à vida, à propriedade, à igualdade perante a lei: é, em
resumo, ter direitos civis. É também participar do destino da sociedade,
votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não
asseguram a democracia sem os direitos sociais aqueles que garantem
a participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao
trabalho, salário justo, à saúde, a uma velhice tranqüila. Exercer
cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais (PINSKY, 2003,
p.9).
No Brasil a afirmação de tais direitos ocorreu a partir do século XIX, de modo
diverso. A questão da cidadania foi determinada por fatos históricos e marginalização
de parcelas do povo brasileiro (mulheres, escravos, negros, crianças e adolescentes, e
pessoas com deficiência). Desde o final do Império, antecedido pela abolição da
escravatura, mudanças estruturais que pudessem conduzir a sociedade de maneira
mais justa e inclusiva foram frustradas diante da evolução capitalista.
O avanço republicano supostamente democrático e inclusivo dos cidadãos à
participação política, foi contraposto pela implantação de uma democracia restrita,
vinculada diretamente aos “barões do café” representados diretamente, por mais de três
décadas, pela denominada república oligárquica: 1894 – 1930 (CARVALHO, 2001).
Sendo a ação democrática na forma direta ou representativa, a garantia do
exercício da cidadania por parte de toda sociedade, a instauração de uma democracia
restrita na Primeira República do Brasil, possibilitou o surgimento do fenômeno da
25
marginalização política e econômica. Afinal, “a abolição da escravatura representou
pouco mais do que a simples passagem do cativeiro para a condição de miséria da
maior parte da população pobre e negra” (POCHMANN, 2005, p.23).
Nas primeiras décadas da Primeira República, o surgimento de uma classe
operária deveria significar a possibilidade da inclusão social, formando cidadãos mais
ativos e menos marginalizados política e economicamente. O movimento lutava por
direitos básicos, por uma legislação trabalhista e por direitos sociais. Porém, diante das
divergências ideológicas principalmente entre anarquistas e socialistas, o movimento
operário perdeu força. Sufocados principalmente pela política das oligarquias, os
socialistas, foram obstruídos, impedidos de qualquer conquista e do exercício dos
direitos políticos (CARVALHO, 2001).
A denominada Era Vargas (1930-1945) foi um período de baixa participação
política e de uma precária vigência dos direitos civis. Mesmo com a atenção voltada aos
problemas trabalhistas e sociais que originaram a Consolidação das Leis do Trabalho
(CLT), não se percebeu esta definição como uma conquista democrática ou uma
contribuição para o desenvolvimento de uma cidadania ativa, embora observou-se que
no início desse período ocorreu uma intervenção do Estado de forma mais evidente nas
relações entre capital e trabalho.
O período da decadência da Era Vargas até a derrubada de João Goulart pelo
golpe militar de 1964, convencionalmente denominado de populismo, incorporou as
massas no jogo político por meio de apelos diretos de líderes carismáticos, implicando a
ausência de partidos com programas e ideologias definidas, caracterizando-o portanto,
como um período de assistencialismo, principalmente em relação aos trabalhadores e
às camadas médias (CARVALHO, 2001).
O período de 1964-1985 no Brasil, conhecido como Regime Militar, foi marcado
por uma reação defensiva ao aumento da participação política e, conseqüentemente,
uma imposição do regime ditatorial em que os direitos civis e políticos foram
restringidos. A Nova República começou em clima de esperança e otimismo. A
Constituição de 1988 é considerada a constituição mais liberal e democrática que o país
teve, ampliou os direitos sociais e políticos do cidadão, principalmente em relação às
minorias, recebendo por isso o nome de Constituição Cidadã. Os direitos políticos
26
adquiriram amplitude nunca antes atingida. Passou a contar do texto constitucional o
direito de o cidadão obter informações sobre registros que o Estado mantém sobre ele,
o habeas-data. Os índios tiveram garantido o direito de preservar suas terras,
analfabetos e jovens de 16 a 18 anos adquiriram o direito facultativo de voto; definiu-se
o racismo como crime inafiançável e não-anistiável. Às pessoas com deficiência
destinou-se um salário mínimo (artigo 203), as crianças e adolescentes passaram a
usufruir todos os direitos constitucionalmente consagrados, que se aplicam às pessoas
maiores de 18 anos, considerados então cidadãos de direito, conforme (artigo 227),
resultando em 1990 na aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em 1996,
foi criado o Programa Nacional dos Direitos Humanos, prevendo várias medidas
práticas destinadas à proteção de todos os direitos garantidos constitucionalmente
(CARVALHO, 2001).
O combate ao índice crescente de pobreza e desigualdade exigiu políticas
públicas para o enfrentamento e redução deste fenômeno; a Constituição incorporou a
noção de proteção integral e universal com eqüidade, obrigatória e de responsabilidade
do estado, o Estado do Bem Estar Social, seguindo tendência internacional nas áreas
da Saúde, Educação e Assistência Social. Em tese
[...] Uma proteção social, universal e integral, articulada por sistemas
públicos de assistência social, educação e saúde públicas, faria parte
de um sistema de proteção social mais amplo, que, incluindo certas
garantias de renda mínima, visando o bem estar das famílias,
constituiria um conjunto de direitos formais que o realizariam,
eliminando a pobreza (MENDONÇA, 2002, p.114).
Porém, a garantia constitucional de uma estabilidade democrática e inovações
legais e institucionais na política social criadas a partir de 1988, não resolveram os
problemas sociais e econômicos e a inserção do Brasil a partir da cada de 1990 na
economia internacional, de cunho neoliberal, configurou um Estado Mínimo para o
social e máximo para o capital aprofundando as desigualdades sociais. O
desenvolvimento econômico e as transformações dos hábitos, dos costumes e da
mentalidade da sociedade brasileira, ocorrido nesse período, não medem a qualidade
de vida da população, posto que a renda gerada desse crescimento ainda continua em
27
poder de uma minoria, colocando o Brasil entre os países com maior desigualdade na
distribuição de renda.
Para Vieira (1997, p. 68), a política social no Brasil passa por três períodos: o
primeiro, denominado controle da política”, vai da era Vargas ao início dos anos 60; ao
segundo denomina de “política de controle” e compreende 1964 a1988; o terceiro
período é o que inicia com a promulgação da Constituição de 1988, no qual os avanços
conquistados legalmente no campo dos direitos sociais ainda estão por serem
efetivados, denomina-o de “política social sem direitos sociais.”
Na contramão das conquistas da Constituição as recomendações neoliberais
como alternativas à crise econômica contribuíram para o aprofundamento da miséria e
exclusão social, secundarizando qualquer ação pública destinada ao enfrentamento da
questão social que, aliadas à cultura política brasileira fundada no privilégio dos que
sempre mandaram e na qual predominam as relações de mando, autoritarismo, a
prepotência, agravam as condições de vida da população, gerando no imaginário da
população um sentimento de “incivilidade” que
[...] fixa a pobreza como marca da inferioridade, modo de ser que
descredencia o indivíduo para o exercício de direitos, que percebidos
numa diferença incomensurável, aquém das regras de equivalência que
a formalidade da lei supõe e o exercício de direitos deveria concretizar
(TELLES, 2001, p.21).
Segundo sua análise, a pobreza “é e sempre foi notada, registrada e
documentada” no entanto, esse conhecimento não tem sido suficiente para “construir
uma opinião pública crítica capaz de mobilizar vontades políticas na defesa de padrões
mínimos de vida” (TELLES, 2001, p. 18).
A disparidade nas análises estatísticas sobre pobreza e indigência no Brasil
reflete a inexistência de definição quanto a patamares de qualidade de vida a serem
garantidos a todos, historicamente e sobretudo, no governo de Fernando Henrique
Cardoso tudo se reduziu “a uma combinação de critérios supostamente científicos para
definir a pobreza” (TELLES, 1998, p.9-14).
Aliando-se a isso os critérios focalistas de acesso aos programas, Telles (1998),
aponta que os mesmos acabam excluindo de bens e serviços muitos dos que
28
necessitam, conseguindo “a proeza de fazer os pobres desaparecerem do cenário
oficial” (TELLES, 1998, p. 8) transformando a questão social em “problema a ser
administrado tecnicamente ou problema humanitário que interpela a consciência moral
de cada um” (TELLES, 1998, p. 19).
Os problemas da conjuntura nacional aparentam causar impotência dos
governantes para controlá-los “[...] os problemas sociais se acumulam, justapondo, no
seio das sociedades, categorias sociais com renda elevada ou relativamente elevada ao
lado de categorias sociais excluídas do mercado e por vezes da sociedade”
(WANDERLEY, 2004, p.18).
Martins (1997) alerta que as conseqüências das políticas neoliberais acabam por
criar políticas de inclusão precária e marginal, que favorecem um universo ideológico
unificado, ou seja, apesar da desigualdade material. Cria-se uma ilusão, utilizando o
poder da televisão de transportar todos os cidadãos, ricos e favelados,
simultaneamente a um mundo maravilhoso de consumo, criando um imaginário de
possibilidades para todos. Essa estratégia tem o grande potencial de atenuar os
possíveis conflitos sociais.
Para este autor o excluído é “[...] aquele que não é reconhecido como sujeito,
que é estigmatizado, considerado nefasto ou perigoso à sociedade” (MARTINS, 1997,
p.16) No entanto “[...] uma categoria social ou grupo não pode ser reconhecido como
sujeito, se não se reconhece a si mesmo como sujeito e não atua como sujeito”
(MARTINS, 1997, p.17). Acrescentando que o termo exclusão social foi precedido na
análise brasileira das categorias prévias de pobreza e marginalidade social.
O conceito de exclusão social surge a partir da segunda metade dos anos 80,
para designar as desigualdades e iniqüidades sociais até então tratadas como pobreza
ou marginalidade social, crescentes no país e no mundo.
Um fenômeno estrutural, na concepção de Spozatti (1996)
A desigualdade social, econômica e política na sociedade brasileira
chegou a tal grau que se torna incompatível com a democratização da
sociedade. Por decorrência tem se falado na existência da apartação
social. No Brasil a discriminação é econômica, cultural e política, além
de étnica. Este processo deve ser entendido como exclusão, isto é,
uma privação, da recusa, do abandono e da expulsão inclusive, com
violência, de um conjunto significativo da população, por isso, uma
29
exclusão social e não pessoal. Não se trata de um processo individual,
embora atinja pessoas mas, de uma lógica que está presente nas
várias formas de relações econômicas, sociais, culturais e políticas da
sociedade brasileira. Esta situação de privação coletiva, inclui pobreza,
discriminação, subalternidade, não eqüidade, não acessibilidade, não
representação pública (SPOZATTI, 1996, p. 8).
Para Sawaia (2003),
A exclusão é um processo complexo e multifacetado, uma configuração
de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É processo
sutil e dialético, pois existe em relação à inclusão como parte
constitutiva dela. Não é uma coisa ou um estado, é processo que
envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros. Não tem
uma única forma e não é uma falha do sistema, ao contrário, ele é
produto do funcionamento do sistema (SAWAIA, 2003, p. 9).
Cohn (2004), coloca a promoção do desenvolvimento social como sendo carente
de políticas públicas voltadas à inserção social tanto no campo econômico quanto no
social, e isso equivale a dizer que se
[...] exigem políticas intersetoriais e a capacidade do Estado, sobretudo
nas sociedades latino-americanas e no Brasil em particular, de
remodelar seus sistemas de proteção social e de sua prática histórica
de ação na área social caracterizada por dois traços fundamentais: do
ponto de vista da gestão, ações segmentadas e setorializadas,
transformando as políticas e os programas sociais competitivos entre si,
e quase sempre superpondo públicos-alvo; e do ponto de vista político,
inclusive em realidades onde a descentralização das políticas sociais
avançou, como é o caso brasileiro, seu traço clientelista, favorecendo
através delas reprodução da subordinação dos segmentos pobres da
população à vontade das elites, e com isso freqüentemente construindo
sua dependência com relação ao Estado, tornando-os literalmente
clientes do Estado (COHN, 2004, p. 8).
As políticas públicas no Brasil ainda são pouco discutidas e compreendidas pela
parcela da população à qual se destinam devido à construção cultural desencadeada ao
longo dos anos, onde há falta de credibilidade aos esforços do governo para diminuir as
desigualdades sociais e ampliar a qualidade de vida de sua população. Porém, esse
descrédito não é apenas fruto da falta de compreensão das estratégias políticas para a
organização e superação dos problemas, mas um montante de projetos e trabalhos que
30
não foram viáveis e/ou mostraram-se aquém das expectativas daqueles que esperavam
por soluções e tiveram apenas postergação de seus problemas.
Farah (1991) afirma que a capacidade estatal em resolver os problemas sociais é
bastante desacreditada, onde o descrédito em relação ao Estado e à Administração
pública diz respeito à ação estatal, às diversas políticas públicas, e aos políticos de um
modo geral, cabendo ressaltar que aos dois últimos apontados pesam mais à validade
dos esforços políticos para conter o crescimento acelerado dos problemas sociais.
Segundo Demo (1996, p.10), [...] não será social a política que não tocar nas
desigualdades ou desconcentrar a renda e o poder” no contexto do Brasil a política
social é tão “importante quanto contraditória” observa que,
Seu alcance é limitado, além de não ultrapassar a lógica do sistema.
Entretanto, à medida que souber acionar iniciativas mais estruturais,
como educação, cidadania, ciência e tecnologia, pode aumentar
sensivelmente a oportunidade de algum direcionamento e mesmo
alimentar potencialidades de superação (DEMO, 1996, p. 10).
Repensar as políticas públicas voltadas à inclusão social de pessoas com
deficiência múltipla requer uma modificação não estrutural para minimizar as
dificuldades causadas pelas limitações trazidas por estas pessoas, mas também
extinguir os padrões de normalidade convencionados pela sociedade, tema recorrente
em vários documentos internacionais e nacionais expressando que:
Deve-se dar atenção especial às pessoas portadoras de deficiências,
visando a assegurar-lhes um tratamento não discriminatório e eqüitativo
no campo dos direitos humanos e liberdades fundamentais, garantindo
sua plena participação em todos os aspectos da sociedade (MEC,
2004, p.7).
Segundo esse raciocínio, trabalhar para a efetivação da plena participação em
todos os aspectos da sociedade nos remete à introdução de uma nova ética de
convivência social, a “Ética da Diversidade” que, segundo Genro (2004), seria um
movimento que rompe com o ideal de um modelo pré-estabelecido de humanidade e,
por conseguinte, de seres humanos normalizados dentro de um padrão ideal.
31
Em verdade, não são os excluídos que necessitam aceitar e se adequar aos
padrões exigidos pela sociedade, mas o inverso, esta sociedade teoricamente
democrática é quem deve rever suas formas e conceitos frente à aceitação da
diversidade enquanto prática e não apenas em pressupostos teóricos.
Genro (2004) se reporta à definição desse novo comportamento ético
ressaltando que,
Essa Ética é um legado da mobilização das pessoas com deficiência,
assim como de outros segmentos discriminados. E é um alicerce
necessário em nossa luta comum pela emancipação social, política e
econômica do País. Pois, se a história tornou essas pessoas sujeitas à
dependência, sujeitas à exclusão, foi a sua consciência histórica,
convertida em resistência e em luta, que as tornou sujeitos de direitos,
sujeitos de sua própria emancipação. Como disse Adorno, certa vez,
“uma democracia efetiva pode ser imaginada enquanto uma
sociedade de quem é emancipado” (GENRO, 2004, p.7).
2.2. Cidadania e as pessoas com deficiência
Quando se analisa a questão da cidadania voltada para as pessoas com
deficiência, constata-se os diferentes tratamentos recebidos historicamente, desde o
extermínio nas sociedades antigas, à proteção do cristianismo na Idade dia sob
rigorosa disciplina (Pessotti, 1984), até o atendimento em instituições especializadas,
determinado pelo contexto social contemporâneo (JANNUZZI, 1992). Enfim, um
processo que alijou a cidadania dessas pessoas, afastando-as de qualquer efetivação
de seus direitos e deveres.
Segundo o IBGE (2000), no Brasil 24, 5 milhões de pessoas com deficiência,
o que corresponde a 14,5% da população brasileira, índice superior aos dados
censitários anteriores em decorrência da coleta de dados de acordo com as
recomendações da Organização Mundial de Saúde. Os últimos dados foram coletados
utilizando um critério mais amplo de deficiência incluindo na análise destas informações
sobre pessoas com alguma incapacidade. Utilizando a Classificação Internacional de
32
Deficiências Incapacidades e Desvantagens (CIDID, 1989), o conceito de deficiência
refere-se,
[...] a perda ou anormalidade de estrutura ou função psicológica ou
anatômica, temporária ou permanente, e incapacidade, como restrição,
resultante diretamente de uma deficiência da habilidade para
desempenhar uma atividade considerada normal, ou enquanto resposta
do indivíduo a uma deficiência (CIDID, 1989, p. 295).
Neri (2003), oferece dados sobre a realidade dessa população no Brasil. A
concentração de pessoas com deficiência é maior nos municípios mais pobres
(principalmente no Nordeste) e, quanto mais pobres esses deficientes, menor o acesso
a tratamentos e próteses. Esta realidade reforça a necessidade de ões preventivas
no acompanhamento pré-natal e melhorias das condições de vida, como fatores que
poderiam evitar ou minimizar casos de deficiências. Além da prevenção é necessário
atender aos que já estão com a saúde comprometida ou doença estabelecida,
objetivando limitar as conseqüências físicas e sociais desta. Enfim,
[...] é requerida uma ação integrada, que liga a prevenção e a
reabilitação com as estratégias e as mudanças no esforço
governamental, com objetivo de alterar as atitudes chaves de
desenvolvimento, combate à pobreza e de garantia dos direitos
humanos (NERI, 2003, p.19).
A relação entre deficiência e pobreza é tema em destaque no Programa de Ação
Mundial para as Pessoas Deficientes (1981):
Menos de 80% do total das pessoas deficientes vivem em zonas rurais
isoladas dos países em desenvolvimento. Em alguns deles, a proporção
de pessoas deficientes é calculada em até 20% e, se incluirmos famílias
e parentes, os efeitos negativos da deficiência podem afetar 50% do
total da população. A relação entre deficiência e pobreza ficou
claramente demonstrada. Se o risco de deficiência é muito maior entre
os pobres, a recíproca também é verdadeira. O nascimento de uma
criança deficiente ou o surgimento de uma deficiência numa pessoa da
família pode significar uma carga pesada para os limitados recursos
dessa família e afeta a sua moral, afundando-a ainda mais na pobreza.
O efeito conjunto desses fatores faz com que a proporção de pessoas
deficientes seja mais elevada nas camadas mais carentes da
sociedade. Por esta razão, o número de famílias carentes atingidas pelo
33
problema aumenta continuamente em termos absolutos. Os efeitos
dessas tendências constituem sérios obstáculos para o processo de
desenvolvimento.
Ainda de acordo com Neri (2003), apesar do Brasil ter a melhor legislação
voltada para a população com deficiência, pouco se avança concretamente para
garantia das condições de cidadania, apontando barreiras arquitetônicas, sociais e
culturais, até mesmo no interior das próprias famílias, como fator de exclusão social.
Para Reily (2004), as barreiras sociais surgem quando pessoas da família ou da
comunidade se deparam com a deficiência e, muitas vezes, não sabem como lidar com
as mesmas. É o que a autora denomina de “auto-integração ameaçada”, “[...] essa é a
forma como lidamos com as nossas instabilidades. A diferença ameaça a ordem”
(REILY, 2004, p. 48).
Refletir sobre deficiência requer constatar que o reconhecimento das diferenças
entre os seres humanos está presente nos discursos de senso comum aos de caráter
científico. Sendo que algumas diferenças não causam qualquer reação nas pessoas,
enquanto que outras “[...] especialmente as incomuns, inesperadas, bizarras, sempre
atraíram a atenção das pessoas despertando, por vezes, temor e desconfiança”
(OMOTE, 1994, p.65). E, ainda, aquelas diferenças que chamam a atenção das
pessoas [...] são percebidas como desvantajosas e são atribuídas significações
especialmente negativas, levando o seu portador ao descrédito social” (OMOTE, 1999,
p.5).
A compreensão da deficiência é possível
[...] indo-se além das pessoas excepcionais ou deficientes... O que
de distintivo em todos os indivíduos deficientes e comum a todos eles
não são as suas próprias características, mas a resposta característica
dos outros face a eles (BARTEL, 1980, apud FERREIRA, 1994,
p.14).
Ela é a manifestação de diferenças, cuja marginalização está enraizada histórica
e culturalmente, determinando as atitudes sociais de interação ou não na convivência
com estas pessoas, uma vez que “[...] a interação com o outro é sempre situação de
conflito em potencial” (GLAT, 1998, p.22). Daí o papel das regras sociais de conduta, a
34
fim de administrar os conflitos encaixando este “outro” em categorias que permitem
prever e controlar seus comportamentos.
Essas categorias tendem a estabelecer o status social de deficientes aos que
não atendem às expectativas dominantes da sociedade, enfatizando suas dificuldades
em detrimento de suas possibilidades de desenvolvimento e aprendizagem
(FERREIRA, 1994).
Portanto, as concepções acerca das diferenças/deficiências determinam a
maneira de lidar, encarar e legislar sobre as pessoas que diferem dos padrões
convencionais de desenvolvimento, comportamento, aprendizagem e comunicação, a
estas pessoas se atribui estigmas, que são geradores de preconceitos, estes
constituídos por atitudes de conteúdos emocionais e desconhecimento concreto e
vivencial sobre algo ou alguém, construindo estereótipos sobre as pessoas. Os
estereótipos são simplificadores da realidade e indevidamente generalizantes,
orientando as relações com as pessoas rotuladas (AMARAL, 1994).
Amaral (1998) descreve a deficiência como “fenômeno global, distribuída em dois
subfenômenos: deficiência primária (deficiência e incapacidade) e deficiência
secundária (desvantagem)” (AMARAL, 1998, p. 24). Por deficiência primária
compreendem-se as alterações intrínsecas da pessoa acarretando incapacidades, que
estão diretamente relacionadas ao orgânico, enquanto a secundária trata da leitura
social da deficiência, apontada como o maior entrave para o desenvolvimento desta
pessoa. A autora destaca que o imaginário de cada um de nós está repleto de imagens
confusas sobre a deficiência, personificadas em obras literárias, na mídia, ligadas a
comportamentos morais indesejáveis e, também nas recordações de nossas vivências
com crianças que desviavam do padrão da época, o que evidencia ainda mais a
necessidade de reflexão conceitual sobre a deficiência para além do “maniqueísmo da
plenitude versus falha, sanidade versus insanidade, perfeição versus imperfeição,
eficiência versus ineficiência” (AMARAL, 1998, p. 26).
Segundo Omote (1999), nas relações estabelecidas com pessoas com
deficiência, independentemente do rótulo a ser utilizado, é fundamental que a mesma
seja “tratada de conformidade com as necessidades particulares, respeitando-se a sua
individualidade e a singularidade” (OMOTE, 1999, p. 17). O autor ainda ressalta que o
35
negativo, quando da utilização de rótulos é seu uso impróprio, pois para ele a mudança
terminológica não garante o fim dos preconceitos e marginalização.
Talvez a falta de acessibilidade, dificuldades urbanísticas, ausência de
transportes adaptados impossibilitem os familiares de retirarem seus filhos de casa,
principalmente os que necessitam de cadeiras de rodas ou outros apoios, ou que
possuam um comprometimento maior aprofundem, ainda mais, a falta de convivência
social alimentando os tabus e mitos sobre a deficiência, talvez a grande contribuição da
educação inclusiva esteja na possibilidade de que inserida num contexto amplo de
mudanças visando à inclusão social, permita “[...] a construção de uma sociedade
democrática, na qual todos conquistam sua cidadania e na qual a diversidade é
respeitada e aceitação e reconhecimento político das diferenças” (MENDES, 2002,
p.61).
Em outras palavras,
A idéia de inclusão se fundamenta em uma filosofia que reconhece a
diversidade na vida em sociedade. Isto significa garantia de acesso de
todos a todas as oportunidades, independentemente das peculiaridades
de cada indivíduo ou grupo social (ARANHA, 2002, p.2).
A educação numa perspectiva inclusiva vem sendo divulgada e defendida
através de documentos internacionais gerados a partir de intensas lutas em prol da
defesa dos direitos humanos, entre eles destaca-se a Declaração Mundial de Educação
para Todos (1990) e a Declaração de Salamanca (1994), e na legislação brasileira,
tanto a Constituição Federal, quanto a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
9394/96, bem como os Documentos Oficiais lançados por setores responsáveis pela
educação especial indicam a importância da convivência entre todas as crianças com
deficiência ou não, num cotidiano onde a diversidade humana seja acolhida, valorizada
e trabalhada pelas escolas com flexibilidade curricular, metodológica e respeito à vida,
independente das características dos alunos.
Sobre o passado, o presente e o ambiente sócio-cultural na vida dos deficientes,
o texto “Regras Gerais sobre a Igualdade de Oportunidades Para as Pessoas com
Deficiência” (ONU, 1993), é elucidativo ao abordar que:
36
Em todas as partes do mundo e em todos os níveis de cada sociedade
há pessoas com deficiência. O número total de pessoas com deficiência
no mundo é muito grande e está a aumentar. Resultado das diferentes
circunstâncias sócio-econômicas e das diferentes disposições que os
estados adotam em favor do bem estar dos seus cidadãos. A atual
política em matéria de deficiência é o resultado da evolução registrada
ao longo dos últimos 200 anos. Em muitos aspectos reflete as
condições gerais da vida e as políticas sociais e econômicas surgidas
em épocas diferentes. Não obstante, no que respeita à deficiência,
também muitas circunstâncias concretas que influenciaram as
condições de vida das pessoas que dela padecem: a ignorância, o
abandono, a superstição e o medo são fatores sociais que ao longo de
toda história isolaram as pessoas com deficiência e atrasaram seu
desenvolvimento.
A Constituição de 1988, em meio à retomada da democracia foi pródiga, quando
coibiu
[...] situações injustas promotoras de mais desigualdades e de maiores
discriminações, quanto promover direitos universais em vista de maior
igualdade. Sendo que, o caminho da igualdade pode permitir que a lei
venha em ajuda de pessoas de vulnerabilidade congênita ou adquirida,
tal como no caso dos portadores de necessidades especiais ou de
pessoas em situação de vulnerabilidade social. Em vista de equalização
de condições para atenuar profundas desigualdades, pode-se ter uma
desigualdade jurídica para maior igualdade social (CURY, 2005, p.20 e
21).
O texto Constitucional estabeleceu não a regra geral relativa à questão da
cidadania (artigo 1º) e do princípio da igualdade (artigo 5º), mas também: a
competência da União, Estado, Distrito Federal e Município para cuidar da saúde e
assistência pública da proteção e garantia das pessoas com deficiência (artigo 23, II); a
competência concorrente para legislar objetivando a proteção integral e integração da
pessoa com deficiência (artigo 24, XIV); a proteção ao trabalho, proibindo qualquer
discriminação no tocante ao salário e admissão da pessoa com deficiência (artigo
XXXI), bem como a reserva de vagas para concursos públicos (artigo 36, VIII); a
assistência social, compreendendo a habilitação e reabilitação e benefício
previdenciário (artigo 203, IV e V); a educação prevê atendimento especializado em
casos de necessidade indicando que preferencialmente deve-se matricular a pessoa
com deficiência na rede regular de ensino (artigo 208, III); a eliminação das barreiras
37
arquitetônicas, de logradouros públicos, edifícios, adaptação de transportes coletivos
(artigo 227, II, parágrafo 2º); preocupação com a criança e adolescente com deficiência,
com criação de programas de prevenção e atendimento especializado além de
treinamento para o trabalho (artigo 227, II).
Após sua promulgação seguiu-se a edição de vários outros documentos legais
visando regulamentar ou garantir outras condições em prol desta população,
impulsionadas por movimentos sociais de familiares, instituições não governamentais e
organizações das próprias pessoas com deficiência, que levaram o Brasil à condição de
país com melhor legislação quanto à proteção e garantia dos direitos de cidadãos com
deficiência. Por exemplo: a Lei nº 7853, de 24/10/1989. Dispõe sobre o apoio às
pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria
Nacional para integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE, institui a tutela
jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do
Ministério Público, define crimes, e dá outras providências; a Lei 10.098, de 19/12/2000.
Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das
pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e outras
providências; o Decreto 3298 de 20/12/1999. Regulamenta Lei 7853, de
24/10/1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência, consolida as normas de proteção, e outras providências; Lei 10.436
de 24/04/2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais-Libras e outras
providências e a lei nº 10.845 de 5/03/2004. Institui o Programa de Complementação ao
Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência, e
outras providências.
Kassar (1999) analisa que a descentralização, enquanto redimensionamento das
competências entre as esferas de poder federal, estadual e municipal, é a marca da
Constituição cidadã, trazendo ao mesmo tempo avanços e recuos, seguindo as
contradições da própria sociedade, composta por setores antagônicos,
Ressalta que a continuidade da participação do setor privado no atendimento
educacional às pessoas com deficiência, mantendo o “preferencialmente” na rede
regular de ensino, vai ao encontro do modelo econômico neoliberal evidenciado a partir
do início da década de 90, de redução da ação direta do Estado exaltando a iniciativa
38
privada. Observa que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, foi
elaborada a partir desse contexto ideológico e que, após oito anos seu texto, registra a
marca dessa mudança da história ao citar os Princípios e Fins da Educação no texto
constitucional aprovado em 1988. Naquele momento a educação é estabelecida como
direito de todos e dever do Estado e da família [...]. em 1996, no texto da LDB/96, a
educação é apresentada como’ dever da família e do Estado”, prosseguindo
ressaltando que a responsabilidade para com o atendimento de pessoas com
deficiência vai se tornando cada vez menos de responsabilidade do Estado que o
repassa ao poder local, fortalecido pela sociedade civil impondo uma nova relação “[...]
As ‘parcerias’ entre os serviços públicos e privados entram, mais do que nunca, em
pauta, visto que o discurso a favor do recuo do estado procura legitimar-se na
valorização das ações de caráter privado, sejam filantrópicas, sejam lucrativas”
(KASSAR, 1994, p.36, 37).
Independentemente das críticas, embora o aparato legal para pessoas com
deficiência seja significativo à realidade é cruel para um grande número delas, pode-se
dizer que muitas vidas sendo privadas de atendimento, conhecimento e relações
sociais principalmente quando se trata de deficiências severas ou múltiplas.
2.3. As pessoas com deficiência múltipla
Pessoas com deficiência múltipla ou severa apresentam uma variedade de
comprometimentos físicos, sensoriais, psicológicos e cognitivos, necessitando de
grande número de profissionais para seu atendimento.
O termo deficiência múltipla tem sido utilizado para “caracterizar o conjunto de
duas ou mais deficiências associadas, de ordem física, sensorial, mental, emocional ou
de comportamento social, com comprometimento global e da capacidade adaptativa”
(MEC, SEESP, 2004, p.11).
Os dados sobre essa população são escassos, mas pode-se afirmar que as
barreiras sociais acentuam-se em relação a elas e que sua situação social é ainda mais
frágil, uma vez que impossibilitados de uma vida independente, não se enquadram nos
39
moldes produtivos do sistema capitalista e acabam introjetando neles próprios e na
família a culpa pelas suas carências.
Bourdieu (1999) fundamenta que as relações de poder se dão por questões
econômicas e ideológicas, à medida que a classe dominante impõe seus gostos, estilos
e seus padrões morais como os corretos e estes são incorporados como naturais pelos
dominados.
[...] O efeito da dominação simbólica (seja de etnia, gênero, cultura,
língua, etc) se exerce não na lógica pura das consciências
cognoscentes, mas através dos esquemas de percepção, de avaliação
e de ação que são constitutivos dos habitus e que fundamentam,
aquém das decisões da consciência e dos controles da vontade, uma
relação de conhecimento obscura a ela mesma (BOURDIEU apud
NOGUEIRA & CATANI, 1998, p.49-50).
A ausência de uma ação política efetiva que cumpra os direitos sociais,
constitucionalmente previstos no Capítulo II, desde 1988, o ajuste neoliberal, configura
um estado mínimo para o social e máximo para o capital.
Portanto, quando se trata de atendimento para pessoas com deficiências
múltiplas o que vem à tona é a segregação destas em instituições de caráter
filantrópico, à margem da sociedade, dos textos legais, “a história do atendimento às
pessoas com deficiência severa está registrada em cada decreto ou lei pelo
silenciamento” (KASSAR, 1994, p. 41)
Mesmo assim, estas pessoas se constituem em sociedade, incorporando
aspectos dessa realidade social de maneira singular e ao mesmo tempo coletiva e,
sendo excluídas/marginalizadas porque não triunfam naturalmente.
No entanto, mesmo colocadas na ”marginalidade” do processo de
produção da sociedade, à margem” dos serviços de saúde pública, à
“margem” nas propostas educacionais/pedagógicas do ensino público,
à “margem” dos programas de mercado de trabalho (...) existem. Todos
participam, autorizados ou não, de todas essas (e de muitas outras)
práticas sociais (KASSAR, 1994, p.101).
Santos (2004) considera que as pessoas com comprometimento severo têm sido
negligenciadas pelas políticas de atendimento às pessoas com deficiência. Afinal, seu
40
atendimento, em diferentes instituições, apresenta certo caráter assistencialista que não
leva em conta práticas inovadoras, principalmente com vistas à inclusão. Os poucos
indícios de interação verificados pelos profissionais que lidam com esses deficientes,
apontam que o deficiente severo ainda não é percebido como ser humano em toda sua
potencialidade, evidenciando a carga ideológica que os termos severo e profundo
possuem, até mesmo para os profissionais que atuam nessa área. Essa prática de
considerá-los desprovidos de qualquer possibilidade de interação tem lhes “[...] negado
a possibilidade e a oportunidade de se constituírem enquanto sujeitos históricos,
capazes de construir e conquistar suas próprias histórias-trajetórias” (2004, p.13).
Sobre as instituições filantrópicas que acabam sendo um dos pouquíssimos
espaços de atendimento a essa população, Bueno (1993) informa que após a Segunda
Guerra Mundial houve, no Brasil, um aumento das mesmas, dividindo-se em entidades
filantrópicas assistenciais dirigidas à população com baixo poder aquisitivo e empresas
prestadoras de serviços de educação e reabilitação com tecnologia de ponta para
atender a população com alto poder aquisitivo, garantindo-lhes os direitos à saúde e
educação de fato. Observando, ainda, que o poder público transferiu suas
responsabilidades para o setor privado e que, através da filantropia muitas vezes se
desconsideram os direitos sociais básicos das pessoas com deficiência.
A relação que se estabelece neste contexto “entre os ‘adultos’ e os adolescentes
parece ter o viés da ‘infantilização’, podemos dizer uma desconsideração com a
(qualidade de) pessoa: que pensa, sente e se constrange” (KASSAR, 1994, p. 92).
Embora a representatividade do setor privado seja influente na formulação das
políticas públicas em questões envolvendo a deficiência, a eficiência dos atendimentos
especializados não tem garantido o desenvolvimento de competências que garantam a
inserção social (BUENO, 1993; D’ANTINO, 1998).
Para Jannuzzi (1993, p.3), “[...] à medida em que guardamos o deficiente em
nossas instituições especiais para o resto de suas vidas, estamos impedindo que esta
sociedade seja desafiada pelas diversidades que muitas vezes ...evidenciam.”
Na análise de D’Antino (1998), a ideologia observada cotidianamente nas
instituições é a manutenção do aluno naquele espaço de segregação, onde o
descrédito para com a clientela atendida se transforma no amor incondicional, condição
41
necessária para o trabalho. A filantropia assume um poder oculto, dominador e
alienante que dificulta ao educador exercer seu papel junto ao educando deficiente ou
não, impedindo-o de propiciar a convivência entre os pares, a troca de experiências
num cotidiano onde aprendizagem e desenvolvimento humano estão implícitos.
2.4. A família das pessoas com deficiência
A importância da família para o desenvolvimento da criança e do adolescente é
justificada biologicamente pela fragilidade e dependência do bebê ao nascer perante
outras espécies, necessitando de cuidados, de proteção e alimentação, bem como
psicologicamente pela necessidade de relações afetivas para o equilíbrio emocional
futuro (BECKER, 2004).
Juridicamente a família também é reconhecida como locus principal para o
desenvolvimento humano. A Constituição de 1988 encerra a discriminação legislativa
das constituições anteriores com relação à família, destacando-se o paradigma da
eqüidade jurídico-social da mulher em relação ao homem no núcleo familiar, o que vai
se detalhar ou aperfeiçoar no Código Civil de 2002, eliminando a discriminação de
gênero. Entre as mudanças cito a alteração do termo Pátrio Poder para Poder Familiar,
estabelece que a guarda dos filhos passa a ser do cônjuge com melhores condições de
exercê-la, institui que o pai ou mãe que contrai nova união estável não a perde quanto
aos filhos de relacionamento anterior, o poder familiar substitui o termo “homem”,
quando usado genericamente para referir-se ao ser humano pela palavra “pessoa” e,
ainda permite ao marido adotar o sobrenome da mulher.
Na análise de Manzini-Covre (1995, p. 107), “a família e, nela a mulher, é uma
organização que mudou na história.[...] como uma organização social, é campo do
processo de alteridade, é campo para se pensar também o exercício da cidadania.”
Para Carvalho (1994),
[...] a família é o primeiro sujeito que referencia e totaliza a proteção e a
socialização dos indivíduos. Independente das múltiplas formas e
desenhos que a família contemporânea apresente, ela se constitui num
42
canal de iniciação e aprendizado dos afetos e das relações sociais
(CARVALHO, 1994, p. 93).
Segundo Martinez & Biasoli Alves (1995),
Cabe à família, na grande maioria das sociedades ocidentais, a tarefa
de determinar como vão se dimensionar as práticas de educação
utilizadas com a criança, compondo todo o ambiente em que ela vive,
estabelecendo formas e limites para as relações e interações entre as
gerações mais novas e mais velhas (MARTINEZ & BIASOLI ALVES,
1995, p.113).
As pesquisas sobre famílias no Brasil mostram diversidade quanto à sua
composição. Coexistem famílias nucleares (casal e filhos), matrifocais (uma mulher, um
companheiro fixo ou não, filhos de ambos ou de outras uniões dos dois) e famílias
ampliadas (casal, filhos e outros parentes). Ressalta-se que, a família nuclear é tida
como referencial e ideal de ordenação da vida doméstica de uma grande maioria da
população, assim a dinâmica familiar,
[...] nunca é apenas reposição de formas de conduta ou de modelos
estabelecidos, nem a família é instituição dedicada a assegurar a
continuidade inalterada do processo de reprodução social. Ao contrário,
a ação da família, como grupo de convivência, é marcada por uma
dinâmica intensa, que demanda de seus integrantes um constante
exercício de repensar o presente e o futuro, o que os leva a
reorganizarem continuamente suas estratégias (ROMANELI, 1995,
p.76).
Atribui-se à crescente participação da mulher no mercado de trabalho, em
conseqüência de dificuldades econômicas enfrentadas pelas famílias, o fator motivador
das alterações dessa dinâmica, equilibrando as relações de gênero, mas que, não
elimina as relações hierarquizadas e o domínio masculino na família.
Szimanski (1995) confirma que a família nuclear burguesa é realmente o modelo
hegemonicamente imposto e captado por uma grande parcela da população, que se
frustra ao perceber que a realidade familiar vivida é completamente diferente do modelo
ideal.
Essa mesma autora constata que essa frustração é geradora de sentimentos de
inadequação pelo não enquadramento ao padrão imposto como correto, o que não
43
deveria ser. E, conclui afirmando que, “[...] o mundo familiar mostra-se numa vibrante
variedade de formas de organização, com crenças, valores e práticas desenvolvidas na
busca de soluções para as vicissitudes que a vida vai trazendo” (SZIMANSKI, 1995, p.
27).
No mundo contemporâneo, as mudanças ocorridas na família
relacionam-se com a perda do sentido da tradição.[ ] Assim o amor, o
casamento, a família, a sexualidade e o trabalho, antes vividos como
pré-estabelecidos, passam a ser concebidos como parte de um projeto
em que a individualidade conta decisivamente e adquire cada vez maior
importância social (SARTI, 1995, p. 43).
Analisando que esse processo foi motivado pelas mudanças legais e de trabalho
envolvendo a posição das mulheres na sociedade, acarretando mudanças na
concepção das relações familiares se colocando em questão não a autoridade em si,
mas o princípio da hierarquia no qual se funda a autoridade tradicional, dos pais sobre
os filhos e do homem sobre a mulher. Destaca que nesta época é urgente desfazer toda
confusão caracterizada pelo excesso de autoridade tradicional ou permissividade nas
relações no interior das famílias, objetivando uma experiência de democratização no
cotidiano familiar, a partir da construção da individualidade de cada uma das pessoas
com base, no respeito mútuo, reciprocidade e cooperação entre pais e filhos, homem e
mulher, com vistas a potencializar a emancipação da sociedade.
A autora, ainda avalia que essa experiência, “reflete-se no plano da cidadania, ao
prover os indivíduos de recursos para participar democraticamente na esfera pública, a
partir da internalização do princípio da autonomia que potencializa sua capacidade de
discernir, julgar e escolher” (SARTI, 1995, p. 48).
Com relação a esse tema, é importante ressaltar que,
[...] nenhuma família existe em um vácuo histórico-social. Sua
organização interna, bem como o rumo que toma o desenvolvimento da
vida de cada um de seus membros, é determinada pela estrutura social
mais ampla que a circunda. A instituição familiar exerce, além da função
reprodutora básica, uma função ideológica. A conduta de seus
membros é marcada pela influência de diversos agentes sociais
externos (escola, governo, igreja, meios de comunicação, etc) que
atuam de forma persuasiva na imposição de normas e padrões,
veiculados como normais (GLAT & DUQUE, 2003, p. 13).
44
As famílias além das influências desses agentes sociais externos, elas vêm
sendo alvo, ao longo do século XX, de políticas sociais marcadamente elitistas,
assistencialistas, tutelares e fragmentadas, que não conseguiram alterar o quadro de
pobreza e exclusão social no país, conforme a opinião de Carvalho (2004).
A pobreza impõe circunstâncias estressantes e dolorosas às famílias, parte da
população não tem conseguido acessar condições mínimas de dignidade e cidadania,
vem aumentando o número de mulheres na chefia dos domicílios quer pela migração
imposta a alguns membros, por motivos de sobrevivência, quer pelos elevados índices
de violência urbana (homicídios), tornando-se motivo de desestruturação do espaço
familiar. As moradias em precárias condições favorecem acidentes causados pela
degradação do meio ambiente, o desemprego crescente, o difícil acesso a serviços
públicos de saúde e educação, cultura, entre outros tantos problemas. Condições de
vida que caracterizam uma situação de vulnerabilidade social, que pode ser definida
como,
[...] o resultado negativo da relação entre a disponibilidade dos recursos
materiais ou simbólicos dos atores, sejam eles indivíduos ou grupos, e
o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais,
que provêm do Estado, do mercado e da sociedade. Este resultado se
traduz em debilidade ou desvantagem para o desempenho e mobilidade
social dos atores (ABRAMOVAY et al, 2002, p. 29)
Nestas condições, a garantia da sobrevivência familiar material e afetiva requer
estratégias próprias de quem vivencia um cotidiano de privações.
Carvalho (1995) pesquisou essa situação junto a famílias pobres, moradoras em
favelas nas grandes regiões metropolitanas, utiliza a expressão apartheid social” para
expressar a situação de exclusão urbana destas famílias. Analisando que, a
sobrevivência é garantida pela convivência através da família ampla, formada também
por conterrâneos, que denomina de solidariedade conterrânea e parental”, através de
ajuda financeira para pagar contas atrasadas ou comprar gás, por exemplo. Identifica,
em segundo lugar, uma solidariedade apadrinhada, caracterizada pelo nculo que
alguns membros possuem com as classes média e alta, facilitando a aquisição, através
da doação, de bens de consumo, ou até mesmo ajuda financeira para a compra de um
45
terreno ou materiais de construção. Em terceiro lugar, reconhece a “solidariedade
missionária, representada pelas diferentes religiões. Destacando o caráter ambíguo
dessa ajuda, que pode servir para atenuar revoltas e indignações perante as injustiças,
criando cumplicidade com a pobreza, reproduzindo o apartheid social” ou podendo
estabelecer pressupostos facilitadores de valorização do trabalho coletivo como
condição de mudança.
A autora observa ainda que, as moradias em bairros periféricos, em cortiços e
barracos amontoados, não garantem o direito de privacidade, afetando os nculos
familiares. Tais locais não oferecem bens e serviços nimos para sobrevivência
material (transporte, trabalho, coleta de lixo, saneamento básico) e, nem oportunidades
para trocas culturais, acesso à educação e lazer, determinando que estas famílias não
rompam com sua identidade de excluídos. Observa, também que os serviços oferecidos
em saúde e educação têm apenas objetivos compensatórios e não de promoção. E,
conclui ressaltando que,
[...] o Estado exerce apenas um papel residual na proteção social das
famílias empobrecidas [...] Forjada na cultura da subalternidade, a
submissão dos indivíduos se transforma em sina. Com ela convivem
numa alienação consentida. O uso da bebida alcoólica pelos adultos ou
a cola de sapateiro por crianças/adolescentes parece ser um vício
compulsório à vida desta população, seja porque já enganou ou engana
a fome, seja porque, na exclusão e na discriminação a que estão
submetidos, só lhes resta alienar-se cada vez mais (CARVALHO,
2004, p. 100).
Não dúvidas de que a pobreza exerce pressão muito grande no interior das
famílias alterando sua composição, dinâmica, as relações entre os membros,
contribuindo para possíveis situações de conflitos e violência, na luta diária para suprir
as necessidades básicas. A pobreza “é questão de violação dos direitos humanos”
(WERTHEIN & NOLETO, 2004, p.19).
Uma vez que, pelo Artigo 25, da Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948, “toda pessoa tem direito a um nível de vida adequado que lhe assegure, assim
como à sua família, saúde e bem-estar, especialmente alimentação, vestuário,
habitação, assistência médica e os serviços sociais necessários”.
Para Demo (1998) a pobreza é questão social histórica, onde
46
[...] não é “dada”, “natural”, ” fortuita” ou “desígnio divino”, mas dinâmica
histórica concreta, fabricada por um grupo privilegiado como estratégia
de manutenção e produção de vantagens. Assim a parte fundamental
da pobreza é sua inconsciência no pobre, e que, por isso, é fortemente
cultivada pelo grupo dominante (DEMO, 1998, p. 18).
Neste sentido afirma que a forma mais degradante de pobreza não é a carência
material e sim a política, quando as pessoas não se dão conta de sua condição,
“politicamente pobre é quem sequer consegue perceber que é pobre” (DEMO, 1998,
p.9).
Na atualidade, a política social brasileira preconiza a família como foco prioritário
de atenção tendo em vista que as condições de vida dos indivíduos dependem., em
grande parte, da inserção social dos membros da família, sendo nela que se articulam
as diversas formas alternativas de tentativa de superação das situações de
precariedade social, face ao desemprego ou inserção precária no mundo do trabalho,
sendo necessário compreender a família como um dos espaços privilegiados de
proteção de seus membros sem desresponsabilizar o Estado da obrigação de garantir e
assegurar as atenções básicas de proteção, desenvolvimento e inclusão social de todos
os cidadãos e, em especial dos mais vulneráveis na sociedade contemporânea.
(CARVALHO, 1998)
Williams e Aiello (2004), estudando eventos estressores, resiliência e
empoderamento de famílias de crianças com deficiência, indicaram a necessidade de
se estabelecer relação de parceria no trabalho de intervenção precoce com as famílias
destas crianças, transformando-as em “um agente de transformação social capaz de
mudar e enfrentar com dignidade as múltiplas adversidades da vida” (WILLIAMS &
AIELLO, 2004, p. 201). Acrescentaram a uma lista de eventos estressantes como
divórcio, desemprego, doenças físicas, abuso de álcool e drogas, problemas conjugais,
com filhos, dois outros - o primeiro, que consideram o maior evento estressor a atingir
as famílias, a pobreza, referem-se à luta ou desafio para sobreviver em uma sociedade
desigual, situação que faz com que grande parte das famílias não tenha como suprir
47
suas necessidades básicas” (WILLIAMS & AIELLO, 2004, p. 197), e o segundo o
surgimento na família de uma criança com deficiência.
Diversos autores têm estudado o que ocorre na família a partir do nascimento de
um filho deficiente (AMARAL, 1995; BUSCÁGLIA 1993). A gravidez e até mesmo o
período que a antecede é marcada por planos e sonhos envolvendo o bebê perfeito,
filho maravilhoso que superará os pais em tudo. Quando o bebê, ao nascer contraria os
sonhos dos pais por apresentar alguma deficiência, torna-se um fato que precisa ser
comunicado aos pais com muito cuidado. Estudos indicam que essa comunicação nem
sempre é cuidadosa, aumentando o desespero familiar e, muitas vezes, determinando o
tipo de expectativas em torno do desenvolvimento do filho (SOUZA, 1998).
A família terá que se adaptar à nova realidade, num processo marcado por
sentimentos de culpa, revolta, incredulidade, peregrinação, esperançosa por um
milagre. Esse processo é cíclico, variando de família para família, caracterizado por
reações previsíveis, sendo a primeira de choque, seguida pela negação, que uma vez
superada, impõe o fato à família (BRITO & DESSEN, 1999).
Encarar a situação é viver um período de depressão, do ponto de vista psíquico
é necessário os pais viverem o luto pela morte simbólica do filho sonhado, isto
possibilita que eles reconheçam o outro filho, real que pode ser amado apesar de suas
imperfeições (AMARAL, 1995).
Após esse período de luto, o filho passa a ser aceito e os familiares aprendem a
conviver com essa realidade. Nesse processo a família precisa ser orientada por
profissionais, receber apoio e informações precisas e atualizadas sobre a condição do
filho, bem como, as alternativas de atendimento e soluções para os problemas diários
(GLAT & DUQUE, 2003).
Orientações são necessárias para evitar que o filho deficiente passe a
representar o problema da família, uma vez que essa tende,
[...] a se organizar em função dessa condição patológica encarnada
pelo indivíduo com necessidades especiais. [...] se estrutura de tal
forma em torno desse membro considerado especial, que tudo o que
ocorre com os demais é minimizado e/ou descuidado em função de se
atender às suas necessidades, as quais são muitas vezes,
hiperdimensionadas (GLAT & DUQUE, 2003, p.20).
48
Isso pode tornar-se patológico, prejudicando toda a família, principalmente os
irmãos pelas atitudes de superproteção em relação ao filho deficiente e é prejudicial a
este porque,
[...] ameaça a dignidade humana, e faz com que essas pessoas sejam
impedidas de experimentar as situações de risco da vida cotidiana que
são necessárias para o desenvolvimento humano normal. Negar a
qualquer pessoa sua cota justa de experiências que envolvem risco é
mutilá-las ainda mais para uma vida saudável (PERSKE, 1972, p.195-
196, apud GLAT & DUQUE, 2003, p.21).
Para essas autoras, tais atitudes podem ser explicadas como uma compensação
inconsciente dos pais, que se sentem limitados perante a deficiência, daí abrirem mão
de todos os planos e outros deveres para dedicação exclusiva ao filho deficiente, como
também na incompreensão destes diante dos sentimentos ambíguos com relação ao
filho, de amor e ódio, alegria e sofrimento, aceitação e rejeição.
A presença da deficiência perturba a estrutura familiar para sempre e quanto
maior for a dependência do deficiente maior será o número de problemas concretos
para a família, quer enquanto grupo quer enquanto indivíduos, em termos objetivos e
subjetivos. A família terá que enfrentar diariamente o estigma de ser a família do
deficiente, medos, frustrações e limitações, intolerância, preconceitos, falta de estrutura
para atendimento, enfim, falta de oportunidades.
Essas dificuldades podem fazer com que muitos casais se distanciem,
culminando em separação (SILVA, 1988 apud BRITO & DESSEN, 1999), ou servir de
motivação para que a união familiar seja maior segundo Buscáglia (1993), ou ainda
contribuir para que muitas famílias se fechem em si mesmas, evitando contato, num
movimento de auto defesa contra a rejeição social.
Essa atitude de isolamento acaba “supervalorizando a condição especial do
indivíduo e restringindo mais ainda seu papel social no seio da família, assim como
suas possibilidades de inclusão no meio social mais amplo” (GLAT & DUQUE, 2003,
p.24).
Martinez e Biasoli Alves (1995), considerando a importância do ambiente familiar
e dos pais durante a infância dos filhos, apoiadas na concepção de Omote (1980) e de
49
Telford e Sawrey (1978), de que a deficiência de um filho pode acarretar alterações no
grupo familiar todo, desorganizando tanto as relações intra-familiares como as extra-
familiares, atentas também a indicadores de que a maneira como a comunicação e o
diagnóstico da deficiência chega aos pais influencia a dinâmica familiar, realizaram uma
pesquisa junto a doze famílias (nível sócio-econômico médio-baixo) com os seguintes
objetivos: “verificar as formas de os pais tomarem conhecimento do problema da
criança hoje em dia; a influência das informações que lhes são passadas na formação
de uma percepção sobre a criança; a rotina de vida da família que se estabelece desde
então” (MARTINEZ & BIASOLI ALVES, 1995, p. 114)
Para a coleta de dados utilizaram a entrevista semi-estruturada, e constataram
que, quando o diagnóstico não é dado de imediato, os próprios familiares começam a
suspeitar de que algum problema com a criança devido a atrasos no
desenvolvimento evolutivo, as gerações mais velhas (avós, tias) alertam sobre essa
situação. A procura pela avaliação médica só ocorre quando a família pode suportar a
confirmação de suas suspeitas. O parecer do profissional pode colaborar no sentido de
delimitar precisamente o problema, tranqüilizando os pais ou pode servir para mascarar
o problema, através de informações incompletas, principalmente quando a patologia
não tem uma identificação imediata.
A maioria dos pais entrevistados apresentou dúvidas quanto ao problema das
crianças, inseguros para abordar a deficiência, tecendo afirmações contraditórias,
ficando evidente a falta de conhecimento sobre o assunto. Com relação às alterações
familiares, observou-se que, alguns pais procuraram emprego mais próximo da casa,
para atender possíveis emergências, relataram maior aproximação com os filhos
(terapias, médicos) e quanto a passeios alguns diminuíram as saídas para não
incomodar os outros com o filho (proteger contra a deficiência) e outros ao contrário
utilizaram a saída para estimular as crianças.
Finalizam confirmando que “[...] a excepcionalidade não fica restrita apenas ao
indivíduo mas atinge a família na sua totalidade e neste sentido, vem fundamentar a
necessidade de atenção e cuidado para elas e suas crianças” (MARTINEZ & BIASOLI
ALVES, 1995, p.119).
50
Uma referência importante, relacionando família e deficiência é o resultado da
análise descritiva de 19 dissertações de Mestrado, abordando o tema Relações
Familiares do Portador de Necessidade Especial e Outras Condições de Risco”, do
Projeto Integrado de Pesquisa denominado A Pós-Graduação em Educação Especial:
Caracterização e Perspectivas dos Programas e Análise Crítica da Produção Discente”,
iniciado em 1995, conduzido por Nunes, Ferreira, Glat e Mendes (1998), com objetivo
geral de examinar o conhecimento em Educação Especial produzido nos programas de
Pós-Graduação em Educação e áreas afins.
Tais dissertações foram elaboradas focando a relação das crianças em situação
de risco ou pessoas portadoras de necessidade especial com pares significativos”
(pais, educadores, agentes de cuidados), sua descrição e o desenvolvimento de
programas de intervenção precoce, com diferentes objetivos. A análise foi direcionada
por um roteiro, que permitiu as seguintes considerações,
[...] as Dissertações destacam a importância de um ambiente familiar
interativo, o que implica em considerar que os adultos devem propiciar
níveis adequados de estimulação, interações apropriadas e
sintonizadas às capacidades de desenvolvimento de crianças pequenas
e às respostas contingentes de seus sinais comunicativos. [...] Quanto
ao aspecto metodológico, alguns programas de intervenção se
mostraram eficazes ao melhorar a interação adulto-criança e,
conseqüentemente, promover a aquisição e estimulação de importantes
habilidades no desenvolvimento infantil. [...] delineando algumas
tendências, ... a adoção de uma abordagem social da deficiência que
reflete a preocupação com os processos que engendram o binômio
exclusão/inclusão social (PAULA, CUNHA, NUNES et al, 2003, p.
95, 96)
Para Glat (1996), independente das mudanças que ocorrem, a família pode
facilitar ou impedir a inclusão social do deficiente. Para ela é neste primeiro grupo social
que a criança percebe pela convivência o quanto é aceita, se ajustando às regras
aprendendo a desempenhar papéis e ter atitudes necessárias à sua socialização ao
longo da vida.
Chacon (1995), objetivando refletir sobre a integração social do deficiente, optou
fazê-lo a partir da família, através da fala das mães, por conceber que a criança
constitui-se enquanto ser social na família (instituição com normas próprias) e que a
51
mãe dentre todos os membros familiares, não menos importantes, é quem assume
além de todas as tarefas peculiares às mulheres e donas de casa, a responsabilidade
pelo tratamento e educação do filho deficiente mental, e também é quem abre mão de
seus projetos pelos filhos, bem como está mais ligada a eles desde o nascimento,
supondo que por isso exerça maior influência no processo de integração social destes.
Entre as conclusões apresentadas destaca-se a que se refere quanto à importância da
família,
[...] a criança desde o nascimento participa das relações sociais,
internalizando formas caracteristicamente humanas de comportamento,
e constituindo um modo de ser mais afeto ou menos afeto ao
relacionamento social [....] Também resultado das condições sócio-
econômicas e culturais presentes no grupo ao qual está inserido. [...] O
papel das relações familiares parece ganhar maior significação quando
se pensa na criança deficiente, dado que a ela são oferecidas poucas
oportunidades de relacionamento social fora do ambiente familiar. A
maneira como a deficiência é vivida na/pela família e a forma como é
internalizada, pelo deficiente, por meio de ações mediadas, determina
seu maior ou menor grau de integração, na complexa rede de relações
sociais, nos diferentes segmentos, inclusive na própria família
(CHACON, 1995, p. 119).
Meiado (1998), a partir dos dados coletados através de um estudo de caso sobre
deficiência mental severa apontou que: interação familiar com o deficiente acontecia
apenas nos momentos de higiene e alimentação ignorando suas tentativas de
comunicação, mantido em espaços restritos na casa, sempre nos mesmos lugares,
sendo excluído no próprio espaço familiar. Para a autora, a comunicação sobre a
deficiência do filho pode ter determinado esse tratamento que associado às carências
de atendimento e de informações, gerou um quadro de exclusão, indicando a falta de
ações estratégias nas áreas de saúde e educação da sociedade para amenizar o
desamparo destas famílias.
Podemos concluir que, a família é o espaço indispensável de garantia para a
sobrevivência integral de todos os seus membros independente de sua composição,
com uma dinâmica própria de cada unidade, determinada e subordinada por questões
de ordem psíquica, emocional, ideológica, social, econômica, cultural, histórica,
potencialmente sujeita a intercorrências ao longo de sua existência, dentre essas
52
destacamos o surgimento da deficiência, impondo mudanças subjetivas e objetivas
(como foi afirmado anteriormente) na dinâmica familiar a partir de sua constatação,
exigindo que a reorganização familiar ocorra o mais breve possível uma vez que, disso
depende o desenvolvimento e a inclusão social da criança deficiente para uma
existência enquanto cidadão.
A inadequação familiar em lidar com a deficiência pode determinar a exclusão no
próprio ambiente familiar, contrariando o papel de proteção atribuído a este espaço.
Ter um filho deficiente para qualquer família requer, além de todo um
investimento psíquico para superação do choque inicial, recursos financeiros para os
cuidados necessários com higiene, alimentação, medicamentos, tempo disponível para
acompanhar terapias e tratamentos médicos e, na deficiência múltipla um cuidador em
tempo integral, o que em famílias pobres será um dos membros (a mãe na maioria dos
casos), com isso determinando que este fique impossibilitado de trabalhar,
comprometendo ainda mais a qualidade de vida do deficiente e do grupo familiar.
A falta de informações sobre as condições de vida em situação de
vulnerabilidade social, e a presença da deficiência pode levar a interpretações errôneas
e preconceituosas sobre comportamentos e atitudes das pessoas nestas
circunstâncias.
Sendo assim “o potencial protetivo e relacional aportado pela família, em
particular daquelas em situação de pobreza e exclusão, é passível de otimização se
ela própria recebe atenções básicas diversificadas que se complementam”
(CARVALHO, 1998, p.36).
Compreende-se que a família é instituição que deve ser cuidada e protegida
pelo Estado, por ser instância delegada de serviço público (DEMO, 1996, p.10) através
da implementação de políticas públicas articuladas e intersetoriais.
53
III. RESULTADOS
Neste capítulo encontram-se informações obtidas a partir: 1) de consulta em
livros institucionais; 2) sites eletrônicos oficiais; 3) legislação municipal referente às
pessoas com deficiência; 4) questionários respondidos pelos representantes das
Secretarias Municipais; 5) consulta aos planos de trabalho da instituição de 2005 e
2006; e 6) pesquisa de campo realizada junto às mães de crianças com deficiência
múltipla atendidas pela instituição.
Todas essas informações foram sistematizadas e transformadas em dados
apresentados nos subitens: O Município; A Instituição; A análise dos prontuários e
descrição das mães e das crianças; O espaço físico, a interação entre profissionais e
mães e a rotina na instituição; O trabalho da instituição frente às mães, aos alunos com
deficiência múltipla e a concepção de educação inclusiva; As impressões das mães ao
longo da realização das entrevistas e suas respostas a estas.
3.1. O município
A origem histórica de Sumaré está relacionada às doações de Sesmarias durante
o Império, vinculada à história da região de Campinas, à qual pertencia. Sua
emancipação política ocorreu em 30 de dezembro de 1953, passando a ser município
composto pelos distritos de Nova Veneza e Hortolândia, este último emancipado em
1991.
A imigração intensa até final de 1910 foi substituída a partir dos anos 50 pela
vinda de milhares de migrantes de todo o país. Este fato associado à política de isenção
fiscal para indústrias que se instalassem no município provocou mudanças significativas
na organização social e econômica local. Em 1970, o município tinha 18.439 habitantes,
passou para 68.790 em 1980 e chegou a 148.214 em 1991 (TOLEDO, 1995, p. 156).
54
A intensidade do fluxo migratório diminuiu desde então, mas continua ocorrendo.
Deste modo, o município apresenta características de cidade dormitório
1
por concentrar
domicílios para pessoas que trabalham nas cidades vizinhas.
Sumaré compõe a Região Metropolitana de Campinas (RMC), criada pela Lei
Complementar Estadual nº 870, em 19/06/2000, juntamente com Americana, Artur
Nogueira, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia,
Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa
Bárbara D’Oeste, Santo Antonio de Posse, Valinhos e Vinhedo.
Segundo o Censo de 2000 (IBGE, 2000), havia no município 196.717 habitantes,
esse dado em comparação com o dado censitário anterior demonstra que a intensidade
de indigência no município em 1991 era de 39,98%, em 2000 de 51,79%, e a de
pobreza 58,03% em 1991 e 72,30% em 2000 (PNUD/Muninet, 2000). Esses dados
indicam que a população vem precisando cada vez mais da intervenção do poder
público nas mais diversas áreas, garantindo assim, melhores condições de vida.
Outros dados relevantes da situação de pobreza e indigência são observados
através do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (I.P.V.S) que analisa as situações
de maior ou menor vulnerabilidade social dos municípios do estado, às quais a
população se encontra exposta.
O objetivo do indicador descrito é fornecer aos gestores municipais informações
mais detalhadas das condições de vida da população em seu território, fazendo-os
compreender que as múltiplas faces da pobreza não se expressam somente através de
indicadores de renda, mas que a estes devem ser agregados informações sobre grau
de escolaridade e ciclo de vida familiar, analisado em função da ocupação territorial das
famílias, dados apresentados cartograficamente (Anexo I). A visualização espacial dos
territórios mais vulneráveis facilita o planejamento de ações locais (SEADE/2000).
As situações de vulnerabilidade do município de Sumaré são resumidas em seis
grupos, cujos índices percentuais são, com representação gráfica (Anexo J):
- Grupo 1 (nenhuma vulnerabilidade) - 1, 8% (3.535 pessoas)
- Grupo 2 (vulnerabilidade muito baixa) – 8, 9% (17.479 pessoas)
1
O termo cidade dormitório é utilizado para caracterizar cidades em que os indivíduos vêm para dormir, ou seja,
todas as relações sociais, profissionais, comerciais e de lazer estão concentradas fora do território municipal.
55
- Grupo 3 (vulnerabilidade baixa) - 31, 2% (61.306 pessoas)
- Grupo 4 (vulnerabilidade média) - 35, 5% (69.786pessoas)
- Grupo 5 (vulnerabilidade alta) - 9, 2% (18.181 pessoas)
- Grupo 6 (vulnerabilidade muito alta) - 13, 4% (26.430 pessoas)
Dados mais atuais indicam uma população estimada em 215.730 habitantes
(SEADE, 2004), geograficamente distribuída em seis regiões, relativamente isolada
pelos eixos rodoviários, com condições de vida diferenciadas, confirmadas acima.
A ocupação territorial desordenada através de loteamentos de baixo custo sem
infra-estrutura, atraiu uma população de baixa renda em busca de terrenos mais
baratos. Esta situação de loteamentos aprovados sem qualquer critério do poder
público, associado às crises econômicas e aumento do desemprego, determinou
invasões em áreas impróprias para moradias, ocasionando aumento significativo de
favelas no município.
A proximidade com Campinas e o Paulo transformou Sumaré no destino de
contingentes populacionais excluídos destes centros urbanos, uma vez que a
[...] concentração nas grandes cidades foi acompanhada pelo processo
de conurbação entre os municípios vizinhos, com a extroversão de
atividades econômicas e população. [...] A produção de espaços
específicos para o exercício das atividades hegemônicas, somada às
inúmeras intervenções do setor público, que busca através de suas
ações privilegiar sobretudo os agentes hegemônicos e as parcelas com
maior poder aquisitivo da sociedade, conduziu à periferização,
entendida como o processo de exclusão social e geográfica das
modernizações do país. As periferias urbanas são o exemplo mais
cabal da valorização desigual dos homens e dos lugares (ALMEIDA,
2003, p. 214, 230).
Segundo dados do Atlas da Região Metropolitana de Campinas (2004),
produzido pela UNICAMP, a região destaca-se pela localização estratégica e facilidade
na rede de transportes, sendo considerada um dos pólos mais importantes de ciência e
tecnologia do país, com estrutura industrial variada, agricultura modernizada articulada
com as indústrias e um setor terciário ativo.
No entanto, mesmo diante desta realidade que parece ser sinônimo de
progresso, persistem graves questões sociais e ambientais, mais acentuadas em
alguns municípios e gerando contrastes entre eles. Esta situação é caracterizada como
56
duas cordilheiras: a da riqueza, composta por parte da região de Campinas, Valinhos e
Vinhedo; e a da pobreza, composta pelos demais municípios, entre eles Sumaré, que
acaba dificultando o planejamento de políticas públicas para a região.
Sumaré está entre os municípios com menor renda familiar, maior população
jovem entre 0 a 14 anos, maior aumento no número de chefes de famílias sem renda,
menor grau de escolaridade, número significativo de analfabetos, carência em serviços
de infra-estrutura, saneamento básico, educação e saúde. Somam-se a esses
problemas prostituição infantil, expansão de favelas e aumento do desemprego. Em
2004 obteve o maior índice de violência do estado de São Paulo (FOLHA DE O
PAULO, 12/02/2005.), embora não esteja mais nessa liderança a violência é uma
constante, principalmente na periferia e entre adolescentes e jovens adultos.
Segundo informações da Secretaria de Educação déficit de vagas desde o
atendimento em creches até o ensino médio; e ainda no ano vigente será iniciado um
trabalho de implantação de serviços com vistas à educação inclusiva, já que não existe
atendimento voltado para crianças com deficiência na rede municipal. A inclusão de
algumas crianças vem ocorrendo por conta das próprias unidades escolares quando
procuradas por familiares ou instituições que tratam diretamente desta população. O
início deste trabalho será a realização de um Censo no município em fase de estudos
para levantamento de dados. O Censo Escolar do Município realizado em 2005 trazem
dados que correspondem a esta realidade (Anexo L)
2
.
Vinculado a esta Secretaria existe um Centro de Recursos de Aprendizagem e
Saúde do Escolar criado em 1993, que se destina a atender crianças com problemas de
aprendizagem do município nas áreas de Psicologia, Fonoaudiologia e Pedagogia. A
Secretaria pretende reestruturar este serviço, de forma que ele atenda a demanda da
inclusão. Atualmente, o atendimento à população com deficiência é realizado por duas
instituições filantrópicas, vinculadas à Secretaria de Ação Social.
As informações sobre a população com deficiência disponíveis nesta Secretaria
são as fornecidas pelas instituições para fins de convênios e subvenção. O total de
Benefício de Prestação Continuada, pago pelo governo federal, através do Ministério do
2
Este Anexo, embora seja o primeiro a ser citado no corpo do texto, foi o último a ser coletado e anexado ao trabalho
– por isso foi denominado Anexo L.
57
Desenvolvimento Social (MDS), em março de 2006, atingiu 1.260 pessoas, entretanto,
destas famílias beneficiadas não consta cadastros municipais de quem são e onde
moram as mesmas. A representante da Secretaria de ão Social informou ainda que
está aguardando o início da realização de um Censo com essa população no município,
e que isso, já foi solicitado às duas instituições, pois considera-se que estas têm
estrutura para o procedimento de coleta destes dados.
A Secretaria de Ação Social oferece atendimento à população em geral através
de 13 postos de Ação Social, desenvolve Programas Federais como: Bolsa família,
PETI - Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, API - Atendimento ao Paciente
Idoso (acamados), PAC - Programa de Atenção à Criança (0 a 6 anos), Agente Jovem
(adolescentes de 16 a 21 anos), Projeto Sentinela (combate à prostituição infantil) e o
PAIF - Programa de Atenção Integral à Família. Projetos Estaduais: Renda Cidadã, Viva
Leite (famílias com crianças entre 6 meses a 7anos), Migrante (reconduzir às famílias),
Girassol (idosos acamados), Ação Jovem (adolescentes entre 17 e 21 anos). E Projetos
municipais: Grupo de Vivência da idade, Projeto Trampolim (crianças e adolescentes
de 7 a 15 anos), PAI - Programas de Auxílio Integrado (famílias), Frente de Trabalho
(destina 5% de vagas para deficientes físicos, Lei Municipal nº 3319).
Na Secretaria de Saúde a situação também é de ausência de dados sobre a
população deficiente, existe cadastro nos casos em que a pessoa necessita de
atendimento domiciliar, chamado de Atendimento Domiciliar Humanizado (ADH).
Segundo as informações fornecidas por um representante desta secretaria o
modelo de atendimento de assistência na rede vem sendo alterado, transformando as
Unidades Básicas de Saúde (UBS) em Programa de Saúde da Família (PSF), o que
permitirá que as necessidades das pessoas de cada território sejam conhecidas e
atendidas.
Atualmente as pessoas com deficiência múltipla e seus familiares, segundo
representante da secretaria, são recebidos/acolhidos sem distinção nas Unidades
Básicas de Saúde. O município tem a responsabilidade de Gestão Plena, nas áreas de
Saúde e ão Social, devendo atender as demandas da população em seu território,
desde as mais simples até as mais complexas. Quando o município não tem estrutura
para ações de média ou alta complexidade deve pactuar com os municípios de seu
58
entorno, chamado de Plano de Regionalização. Conforme normas técnicas
operacionais. A Legislação Municipal pertinente à população com deficiência é escassa
e sem maiores considerações sobre a situação destas pessoas no município.
Constata-se, através dos dados gerados que as pessoas com deficiência não
são, neste momento, prioridade do poder público municipal. Afinal, a maioria dos
projetos implantados pelo poder blico municipal giram em torno de adolescentes e
terceira idade, ficando as pessoas com deficiência excluídas de quaisquer benefícios.
3.2. A instituição
Esta instituição especializada é de natureza não governamental, filantrópica,
voltada para atendimento às crianças com deficiência severa. Atualmente atende 187
pessoas com deficiência física, e/ou mental, leve a severa, a partir do nascimento sem
limite de idade.
Mantem convênios com a Secretaria Municipal de Ação Social, PPD/SAC
Federal, com a Secretaria Estadual de Educação MEC – Educação Especial e recebe
subvenção da Prefeitura Municipal de Sumaré.
No plano de trabalho para o ano de 2005 constava apenas atendimento
terapêutico e ambulatorial na área de Saúde, com poucas referências à inclusão social,
porém, mediante novas determinações do Ministério do Desenvolvimento Social para
repasse de verbas através do Sistema Único de Ação Social (SUAS) em 2005 houve
necessidade de adequação da prestação de serviços à população com deficiência de
acordo com as diretrizes da Lei Orgânica da Ação Social (LOAS, Lei nº. 8742, de 07 de
dezembro de 1993), que são: atendimento prioritário ao segmento das Pessoas
Portadoras de Deficiência visando inclusão social e equiparação de oportunidades;
melhoria da qualidade de vida mediante ações de habilitação/reabilitação sob a ótica da
intersetorialidade; co-responsabilidade de funcionamento entre as três esferas de
governo; parceria governo-sociedade.
Diante disto foi necessário que a instituição redefinisse seu plano de trabalho
para 2006, incorporando em seus objetivos a inclusão social através de projetos
59
desenvolvidos nas áreas de Educação, Saúde e Assistência Social, estabelecendo a
seguinte missão institucional:
a-) Contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população portadora de
necessidades especiais assegurando o seu acesso a projetos que propiciem o
atendimento especializado em habilitação e reabilitação.
b-) Estimular a participação e inclusão da pessoa portadora de deficiência na
sociedade, oportunizando o exercício da cidadania, bem como a luta em defesa de seus
direitos.
c-) desenvolver programas de apoio às famílias.
Os projetos desenvolvidos na Área de Educação são:
- Oficina Pedagógica Terapêutica
- Oficina Pedagógica Ocupacional I
- Oficina Pedagógica Ocupacional II
- Oficina Pedagógica Ocupacional III
- Inclusão e Integração Escolar
- Comunicação Suplementar e/ou Alternativa
- Atendimento Pedagógico ao Projeto de Autismo em conjunto com a área da Saúde.
Os projetos desenvolvidos pela Área da Saúde são:
- Estimulação Essencial
- Atendimento Ambulatorial
- Atendimento aos Portadores de Autismo
Os projetos desenvolvidos pela Assistência Social e Psicologia são:
- Plantão Social
- Projeto de Apoio à Família
- Projeto de Desenvolvimento de Recursos
- Projeto de Atendimento Psicológico
- Projeto de Serviço de Atendimento à Família – S.A.F.
Vale a pena ressaltar que das 60 crianças com deficiência múltipla
matriculadas na instituição, três estão matriculadas na Classe Especial e uma é ouvinte
na mesma. Esta Classe Especial funciona na própria instituição, mas é vinculada a uma
60
Escola Estadual. O convênio foi realizado a pedido da instituição devido ao fechamento
das Classes Especiais na rede estadual; este foi firmado em 2003.
Os demais alunos (56 restantes) diagnosticados com deficiência múltipla
freqüentam o Projeto de Atendimento Ambulatorial, sendo que entre esses alunos
uma menina de 8 anos com deficiência múltipla freqüentando uma Escola Municipal de
Educação Infantil no bairro onde mora.
O Projeto de Inclusão/Integração Escolar, que recebe crianças com deficiência
múltipla desde que o comprometimento mental seja leve, justifica-se tendo em vista a
necessidade de facilitação e viabilização da entrada e permanência de crianças e
adolescentes com necessidades especiais na escola, envolvendo vários profissionais.
Visa incluir e integrar o indivíduo com necessidade especial no processo escolar,
em escola e nível mais adequado às suas necessidades, oferecendo oportunidades de
desenvolvimento biopsicossocial. Atende atualmente 75 alunos. uma lista de espera
de 40 crianças já avaliadas (avaliação neurológica e psicológica) aguardando vaga.
O Projeto de Atendimento Ambulatorial surgiu da necessidade de criar
assistência e monitoramento, através da intervenção terapêutica em Fisioterapia,
Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional para pacientes com necessidades especiais de
um grau mais severo.
A equipe transmite aos familiares didaticamente os procedimentos que eles
poderão realizar em casa auxiliando na reabilitação.
Visa oferecer atendimento multidisciplinar, melhorar a qualidade de vida para o
indivíduo com deficiência severa, o desenvolvimento de suas potencialidades e/ou
preservar o que foi adquirido, em relação aos aspectos motores, cognitivos,
perceptivos e de comunicação.
Cada setor terapêutico oferece atendimento aos familiares de acordo com suas
especificidades, orientando e colhendo informações importantes ao trabalho com a
pessoa com deficiência.
Contudo, cabe ao serviço de assistência social e psicologia o trabalho com os
familiares
3
no sentido de fortalecer o grupo familiar incluindo-o numa rede de proteção a
3
A Psicóloga da instituição, na elaboração do Plano de Trabalho utiliza os autores: Pichón Riviere (1968), Zimerman
e Osório (1997) para fundamentar a proposta.
61
fim de que este possa se organizar e agir para transformação de sua realidade, neste
trabalho a família é considerada a mais segura rede de proteção existente podendo
reverter problemas sociais devendo participar de espaços para reflexão conjunta que
possibilite contato com novos referenciais e outras formas de ver o mundo e resolver
problemas, encarando a problemática da deficiência tornando o grupo familiar co-
participante do processo educativo. Promovem-se reuniões de grupos com os
familiares, trabalho que favorece discussões em torno dos direitos das pessoas com
deficiência, apoio recíproco entre os membros cumprindo função, entre outras, de
neutralizar o isolamento vivenciado pelas famílias empobrecidas em suas redes sociais
habituais, além de oficinas de trabalhos manuais e artesanato.
3.3. A análise dos prontuários e descrição das mães participantes da pesquisa
A leitura dos prontuários dos alunos permitiu perceber que a instituição não
atende somente pessoas com deficiência múltipla, de famílias pobres ou com alta
vulnerabilidade, embora este perfil familiar predomine. O trabalho da instituição é a
opção de atendimento no município para essa população. algumas famílias com
renda mensal entre cinco a oito salários mínimos, pais com formação em nível superior,
moradores em bairros com boa infra-estrutura, que possuem convênio médico familiar.
Chama a atenção o fato de que os encaminhamentos dos alunos para a
instituição em apenas três casos foram realizados por médicos da rede municipal de
saúde, sendo que um grande número destes encaminhamentos ocorreu através de
pessoas conhecidas ou mães de alunos que já freqüentavam a instituição.
A partir da análise elaborou-se a seguinte descrição das crianças e das mães
selecionadas.
- A C-A mora com os pais e três irmãos, seu diagnóstico é de Paralisia
Cerebral e Epilepsia, sua mãe estudou até a terceira série (Ensino
Fundamental) e é quem assume os cuidados com a criança. Moram num
bairro carente de serviços públicos. A renda mensal familiar é de dois salários
62
mínimos, um salário mínimo é o Benefício de Prestação Continuada
BPC/LOAS e outro do trabalho do marido;
- A C-B mora com os pais e dois irmãos, sendo um deles seu irmão gêmeo,
primeiros filhos do casal, seu diagnóstico é de Retardo Neuro Psicomotor,
sua mãe estudou até a quarta série (Ensino Fundamental) e é quem assume
os cuidados com a criança. A família reside num bairro gerado de um
movimento de invasão de propriedade particular, sem infra-estrutura e
serviços públicos, numa casa cedida por conterrâneos, a renda familiar fixa é
o Benefício de Prestação Continuada BPC/LOAS, de um salário mínimo;
- A C-C, mora com os pais e uma irmã mais velha, seu diagnóstico é Paralisia
Cerebral, sua mãe completou o Ensino Fundamental, os pais assumem os
cuidados com a criança, a família reside num bairro próximo ao centro urbano
do município. A renda familiar mensal gira em torno de três a quatro salários,
um deles é o Benefício da Prestação Continuada BPC/LOAS;
- A C-D mora com os pais, uma tia e uma prima, é filha única, seu diagnóstico
é de Retardo Neuro Psicomotor, sua mãe completou o Ensino Fundamental,
os pais assumem os cuidados com a criança, escolheram uma casa para
morar próximo a escola e ao posto de saúde para o atendimento da mesma.
A renda mensal familiar é de três salários mínimos e meio, incluindo o
Benefício da Prestação Continuada BPC/LOAS.
Percebe-se que embora haja variação de renda entre as quatro famílias que
participaram da pesquisa, todas comprovaram junto aos órgãos competentes que, o
total de sua renda mensal e dos membros de sua família, dividido pelos integrantes, é
menor que um quarto do salário mínimo vigente. Este é o critério de renda para
recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Este benefício está previsto
pela Lei Orgânica de Assistência Social LOAS (Lei nº. 8742, de 07 de dezembro de
1993), regulamentado pelo Decreto nº. 1744, de 08 de dezembro de 1995 e pela lei nº.
9720, de 20 de novembro de 1998. Está em vigor desde 01 de janeiro de 1996 e é
operacionalizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS)
e Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
63
Na seqüência o quadro 1 demonstra a caracterização das crianças selecionadas
para a pesquisa, segundo a data de nascimento, idade, sexo, data da matrícula na
instituição (idade), projetos que as atendem, diagnóstico, tratamento neurológico, e
cuidador.
O quadro 2 descreve tanto caracterização das mães, quanto um breve
panorama da dinâmica familiar. Os tópicos destacados em relação às mães foram: a
escolaridade, a profissão, o número de filhos, a ordem do filho com deficiência e a
naturalidade, destacando aspectos familiares como moradia, motivo da mudança para
Sumaré, responsável pelo sustento familiar e composição familiar.
64
Quadro 1: Caracterização dos filhos com deficiência múltipla
Filhos
Data de
nascimento
e idade
Sexo Matrícula na
instituição e
idade da
criança
Atendimentos
Anteriores
Diagnóstico e
comprometimentos
Tratamento
neurológico
Cuidador Freqüenta
escola
regular
A 05/06/97
9 a 2m
M 04/07/03
5a 11m
- Paralisia Cerebral -
Epilepsia:
Ausência de controle
esfincteriano;
Atraso Mental;
Não possui
verbalização.
Hospital da
P.U.C.
Campinas
Mãe
______
B 23/10/01
4a 10m
F 14/07/03
1a 9m
- Retardo Neuro Psico
Motor:
Ausência de controle
esfincteriano;
Atraso Mental;
Não possui
verbalização;
Hipotonia muscular.
Hospital
Estadual de
Sumaré
Mãe Promessa de
vaga na EMEI
assim que
andar.
C 04/04/95
11a 4m
F 28/04/04
9 anos
Fazia terapias
em São Paulo
(reabilitação)
Paralisia Cerebral:
Ausência de controle
esfincteriano;
Atraso Mental;
Não possui
verbalização;
Hipotonia muscular.
Convênio
particular
Os pais
_______
D 07/01/98
8a 7m
F 26/10/01
3a 9m
- Retardo Neuro Psico
Motor:
Ausência de controle
esfincteriano;
Atraso Mental;
Não possui
verbalização;
Hipotonia muscular.
UNICAMP Os pais EMEI desde
20/02/03
65
Quadro 2: Caracterização das mães
Mães Idade Escolaridade Profissão
Nº de
filho
s
Ordem do
filho com
deficiênci
a
Moradia Naturalid
ade -
Estado
Motivo da
mudança
para
Sumaré
Responsável
pelo sustento
familiar
Composição
familiar
M-A 32 3ª série
Ensino
Fundamental
Do lar 4 Própria Paraná Emprego O pai Casal e 4
filhos
M-B 32 4ª série
Ensino
Fundamental
Do lar 3 1ª (gêmea)
Cedida Minas
Gerais
Tratamento
médico para
a filha
O pai Casal e três
filhos
M-C 33 Ensino
Fundamental
completo
Revende
dora de
cosméti-
cos
2 Própria São Paulo
Capital
Fugir da
violência da
capital
Os pais Casal e duas
filhas
M-D 28 Ensino
Fundamental
completo
Balconista
1 1 Alugada Interior do
Estado de
São Paulo
Tratamento
médico para
a filha
Os pais e a tia Casal, a filha,
uma irmã da
mãe com a
filha (5anos).
66
3.4. O espaço físico, a interação entre os profissionais e mães e a rotina destas na
instituição.
A instituição está instalada em sede própria, com 12 salas para terapias, uma
piscina aquecida, uma cozinha, um refeitório, uma sala para oficina de artesanato para
as mães, 3 salas administrativas e uma recepção e banheiros para funcionários, alunos,
mães e visitantes, conta com uma equipe de 24 profissionais. As salas ficam com as
portas fechadas, a circulação de pessoas pelo prédio é mínima. Cada profissional tem
seu próprio espaço.
A área destinada à entrada dos alunos e seus familiares fica na lateral do prédio,
bem como a sala da oficina, ao entrarem no prédio as mães e as crianças estão no
refeitório, uma porta que separa este ambiente das salas de terapias e
administração.
O refeitório é um espaço sem nenhum cartaz ou material de leitura, apenas
mesas, cadeiras e alguns sofás onde as es ficam horas. O quadro de avisos durante
o período em que a pesquisadora freqüentou a instituição esteve sem nenhum material
gráfico. Os avisos existentes estavam colados na porta entre o refeitório e as salas de
terapias e referiam-se ao preço da touca para hidroterapia e à suspensão de terapias
em alguns dias.
As terapeutas buscam as crianças no refeitório para as sessões de terapia
mantendo as portas fechadas durante a realização destas, retornam com as mesmas
no refeitório. Não foi observado diálogo entre elas e as mães, às vezes uma ou outra
terapeuta chegava falando o nome ou apelido da criança, fazendo
perguntas/comentários como: -
Você está com sono? Veio bonita hoje! Tá tudo bem?
Além das mães, a pesquisadora notou um pai que acompanha o filho nas
terapias, pois tem flexibilidade no horário de trabalho, que ao ser convidado a participar
de uma conversa, na presença da assistente social da instituição concordou. No dia em
que a pesquisadora foi conversar com ele, o mesmo demonstrou irritação, alegando
que teria que ir embora mais cedo e que estava de saída, deixando claro que não
gostaria de ser incomodado. Em outros dias, a pesquisadora pode observar que esse
67
pai fica alheio aos grupos de es que se formam, fica deslocado por ser o único
homem.
Também uma irmã que acompanha outro aluno e um menino
acompanhado pela babá, pois, os pais são professores e trabalham em diferentes
horários, todo o contato com a família é realizado através da babá.
Observou-se que a rotina das mães na instituição é restrita ao refeitório, até os
banheiros que devem utilizar estão neste espaço, entram na área das salas de
terapias para trocar os filhos para as sessões de hidroterapia ou retirar/entregar
documentos, o que pode justificar a não concordância em gravar as entrevistas.
Compreende-se que a participação em uma pesquisa realizada por pessoa
alheia a esse meio, que se propõe a gravar as falas das mães pode gerar sentimentos
de desconfiança, apreensão, até mesmo deslocar a atenção destas para o gravador,
criando um clima desfavorável a uma conversa tranqüila e produtiva, comprometendo
mais a qualidade das respostas do que pelo fato destas serem redigidas de imediato
em diário de campo. Os dados coletados neste diário, mesmo sem a riqueza do
discurso que se tem quando se grava, são relevantes e suficientes para a pesquisa.
No refeitório durante o horário de almoço em que as mães alimentam os filhos,
as terapeutas não estão presentes, e ao ver da pesquisadora este é um momento
importante, um indicador de como as mães estão ministrando os cuidados com a
alimentação do filho, um campo de observação e de intervenção terapêutica.
A manutenção do funcionamento da instituição é difícil segundo a Diretora
técnica, requer recursos financeiros maiores do que os disponíveis e isso parece gerar
um clima e um ritmo agitado e constantemente tenso entre as pessoas que respondem
pela administração - Diretora técnica, Assistente Social e Psicóloga, a sensação é que,
estão consumidas pela burocracia dos convênios, repasses de verbas e problemas
financeiros, e acabam se envolvendo mais com papéis do que com as pessoas que
atendem.
3.5. O trabalho da instituição frente às mães, aos alunos com deficiência múltipla e a
concepção de educação inclusiva
68
Segundo as conversas informais e o questionário respondido pela Diretora
técnica, pela Assistente Social e pela Psicóloga, a matrícula da criança ou adolescente
ocorre após avaliação neurológica na própria instituição, o médico fornece o diagnóstico
indicando as terapias.
Com essa indicação é realizada uma avaliação pela equipe terapêutica que
define em qual setor ou projeto aquele aluno será matriculado.
A maior dificuldade percebida e relatada pela psicóloga junto às mães é quanto à
aceitação da pessoa com deficiência, no caso, os filhos. Este fator pode servir como
facilitador ou dificultador do trabalho desenvolvido pela instituição, pois quando há
rejeição, a mãe não comparece com a criança, sempre um parente ou babá que a
acompanha, e em casa a família não segue as orientações dadas pelas terapeutas,
dificultando o trabalho da equipe e o progresso da criança.
Segundo a Psicóloga, os assuntos mais discutidos nos grupos de mães são:
rejeição/aceitação, preconceito, dificuldade de transporte e de tratamento dentário, falta
de apoio dos maridos e a importância dos atendimentos para as pessoas com
deficiência, raramente as mães fazem sugestão quanto ao trabalho desenvolvido pela
instituição, quando muito comentam sobre o serviço de outra instituição.
As mães também participam de atividades para angariar fundos para
manutenção da instituição, ajudando nas barracas das festas, vendendo convites para
Chás, Bingos ou Pizzas e também em cursos de artesanato, oferecidos em parceria
com a Prefeitura.
A oficina de artesanato da instituição recebe o nome de “Clube das Mães”. Ao
que tudo indica não há continuidade nos trabalhos desenvolvidos junto às mães, nem
na oficina e nem através das reuniões indicadas no plano de trabalho, um dos motivos
possíveis pode ser o número insuficiente de profissionais, que a própria instituição é
responsável pela contratação dos mesmos, e isto é limitado tendo em vista os recursos
orçamentários da mesma. Segundo relatos, as mães não são convidadas a participar
de reuniões com representantes municipais, como por exemplo para a criação do
Conselho da Pessoa Portadora de Deficiência em 2005, porque elas não têm como ir.
O trabalho com as famílias inclui também a doação de cestas básicas, fraldas
descartáveis e roupas para as mais carentes. O atendimento psicológico às mães
69
ocorre quando surge algum problema, não uma programação. Ainda o
encaminhadas para requerer o Benefício da Prestação Continuada BPC/LOAS, para
procurarem serviços prestados pelo município como: passe livre oferecido pelo
transporte coletivo do município, passe livre inter-municipal, passe livre inter-estadual e
encaminhamentos para a PUCC, UNICAMP e UNIP.
Sobre a inclusão das crianças em escolas regulares ou classe especial quem
decide é sempre a equipe, cada área faz reunião quinzenal para avaliar o
desenvolvimento das crianças e a mudança ou não de projetos.
As quatro crianças cujas mães participam desta pesquisa não são candidatas a
inclusão nem na classe especial, segundo a equipe da instituição, por apresentarem
comprometimento mental severo e hipotonia muscular
.
A área da psicologia não atende
as crianças com deficiência múltipla, segundo relatos não o que fazer, eles não
interagem, a aparência determina as terapias.
Sobre a experiência da C-D na EMEI, as terapeutas não comentaram nada, até
mesmo porque não acompanham o caso, muito menos comentam com outras mães.
Para elas a M-D é uma mãe difícil. As pessoas que freqüentam a instituição estão
privadas de interação, de maior contato e familiaridade até mesmo no interior destas,
embora ocupem o mesmo espaço suas diferenças e experiências não são questionadas
ou trabalhadas em termos de reconhecimento da dignidade humana e luta por direitos,
são silenciadas, ocultadas com o intuito de manutenção de uma ordem social, onde
somente os mais “aptos” podem aspirar algo além dos atendimentos terapêuticos, não
se discutem experiências de inclusão, seguindo um padrão de atendimento
historicamente determinado pela sociedade.
As mães que procuram conversar sobre a inclusão de seus filhos são orientadas
a aguardar o momento certo. A equipe não nega a necessidade e o direito da educação
para todas as pessoas, segundo a diretora técnica -
Mas só quando elas estão
preparadas para isso”
, reconhecendo que, se a mãe quiser tem todo o direito de ir em
busca de escola para seu filho e nem por isso a instituição a desampara, utiliza essa
busca como indicador de que necessidade da equipe trabalhar mais com ela a fim
de conscientizá-la das dificuldades de seu filho, considera perverso algumas instituições
desligarem a criança das terapias quando esta ingressa na escola comum, por isso não
70
desligam do atendimento alunos incluídos, trabalham com a possibilidade de que a
criança precise retornar por mais um tempo, sempre tem vaga para uma criança ou
adolescente que já tenha freqüentado a instituição.
Com relação à aceitação da inclusão na rede municipal de ensino as dificuldades
apontadas pela diretora técnica são muitas. Segundo seus relatos diretoras que
brigam por não concordarem com a matrícula de alunos com deficiência, outras
ameaçam até mesmo responsabilizar a instituição se a criança machucar ou criar
qualquer problema na escola. Como também diretoras que colaboram apesar de
todas as dificuldades de adaptação e relacionamento.
A instituição, segundo a mesma, tem condições de contribuir com a Secretaria de
Educação ministrando cursos e orientações para os professores e especialistas da rede
municipal de ensino e, adverte que é urgente um trabalho integrado entre as
Secretarias de Ação Social, Saúde e Educação porque a pessoa com deficiência é
responsabilidade e necessita do trabalho das três áreas, destacando que a inclusão
sem apoio técnico na escola regular não atinge bons resultados.
Segundo observação da Assistente Social, vem aumentando o número de bebês
na Instituição, devido a problemas no parto os médicos do Hospital Estadual (próximo à
instituição) fazem a carta de encaminhamento junto com a alta hospitalar a fim de
iniciar a estimulação precoce e acompanhamento do desenvolvimento da criança.
3.6. As impressões das mães ao longo da realização das entrevistas.
O olhar inicial das mães, quando questionadas se desejavam participar da
pesquisa, indicou desconfiança, voltavam-se para a Assistente Social da Instituição,
como que buscando a resposta ou talvez a permissão.
Essa desconfiança foi desaparecendo com o tempo, em cada encontro as
respostas foram se alongando mais, e com mais significado. As impressões registradas
no diário de campo foram agrupadas e incluem algumas informações específicas de
cada uma delas.
71
A M-A demonstrou preocupação em dar respostas certas, pedindo desculpas ao
final da primeira entrevista por alguma resposta errada, mesmo lhe tendo sido falado
que não haveria certo ou errado. Pessoa simples, se considera nervosa, mas participou
tranqüilamente a partir da segunda entrevista, não teve dificuldade em compreender as
questões.
A M-B cresceu no interior de Minas Gerais, trabalhando na roça desde criança,
estudou até a série do fundamental, comentou que sofre por não poder dar o que os
filhos pedem, como um doce ou brinquedo. Tem grande dificuldade em manter as
fraldas e remédios para a filha, necessita da ajuda de conterrâneos e da própria
instituição.
A M-C inicialmente reagiu com desconfiança, foi se soltando após o início da
segunda entrevista, completou o Ensino Fundamental, disse ter se mudado da cidade
de São Paulo para Sumaré, e que está estranhando a falta de atendimento para a filha.
Assume que não consegue se desligar da filha nem à noite, esta dorme ao lado de sua
cama. Relatou que quer saber a causa da deficiência de sua filha, não aceita, sente-se
culpada e por isso tem medo que “judiem”dela, acha que todas as mães se sentem
culpadas pela deficiência de seus filhos. Não conversa sobre esses sentimentos com a
equipe da instituição porque os considera dela, não gosta de compartilhá-los nem
com o marido, perguntou se realmente existe criança com deficiência múltipla em
escolas comuns, disse que até então não tinha conhecimento disso, achava que estava
só previsto em lei e que ainda não acontecia.
A M-D concordou com a entrevista sem demonstrar preocupações, deixando
claro o desejo de correr contra o tempo para que sua filha se desenvolva, está
procurando uma escola de natação para matriculá-la, tem certeza que só as terapias
quinzenais na instituição não teriam proporcionado o desenvolvimento que ela teve
nesses três anos freqüentando a EMEI, não fica à vontade na instituição diz que prefere
estar na escola. Respondeu as questões objetivamente, ressaltando que não aceita a
deficiência, para ela o que existe é uma convivência com a deficiência e não aceitação.
Segundo a Assistente Social da instituição, as três primeiras mães são legais,
participativas, já a quarta mãe é difícil.
72
3.7. As repostas das mães nas entrevistas
Para a sistematização dos registros das entrevistas foi realizada uma tabela com
os mesmos que pode ser visualizada no Anexo K. E, através desta, elaborou-se o texto
abaixo destacando as informações mais relevantes.
Embora as mães desconfiassem de que havia problema com seus filhos o
diagnóstico foi realizado por médicos. Esse diagnóstico marcou as mães e é insuficiente
para elas, estas continuam tentando compreender o porquê do fenômeno da deficiência
em sua família.
Uma mistura de sentimentos: de culpa, inconformismo e traumas acompanham
suas vidas numa rotina de cuidados que assumem com os filhos, algumas auxiliadas
por filhas mais velhas e pelos maridos. A essa rotina de cuidados com o filho deficiente
somam-se os cuidados com a casa e os demais membros da família, além do
acompanhamento até a instituição para as terapias e no caso de M-D até a EMEI.
As quatro mães recebem em seu nome o Benefício da Prestação Continuada, no
valor de um salário mínimo, garantido pela Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS).
Tal benefício tem como critério que a mãe não trabalhe, pois esta é quem provê as
necessidades dos filhos devendo estar em casa para isso. Isto ocorre com M-A e M-B,
para esta última é atualmente o único rendimento da família uma vez que seu marido
está desempregado.
M-C e M-D trabalham informalmente pois consideram fundamental terem esse
compromisso para se distraírem e não ficarem pensando nos problemas com as filhas,
preocupadas com o futuro delas.
As dificuldades relatadas pelas mães variam de acordo com a faixa salarial, indo
da falta de recursos financeiros para alimentação e cuidados para com os membros da
família; falta de artigos para higiene da criança com deficiência; falta de transportes
adaptados até problemas de saúde (nas mães o mais relatado foi de coluna devido ao
peso das crianças e a necessidade de carregá-las para todos os cuidados e ambientes
necessários).
73
Frente a tantas dificuldades as mães mesmo procurando insistentemente, no
caso de M-B, ajuda de instituições como igrejas e o poder público municipal não foram
atendidas; a única ajuda relatada foi da instituição.
O poder público nas áreas de saúde, educação e ação social não tem
correspondido às necessidades e muito menos às expectativas das mães, pode-se falar
da omissão deste para tratar as pessoas com deficiência e seus familiares.
Os relatos indicam que não eqüidade nos atendimentos prestados, além de
desconsideração e descaso em lidar com os problemas e o sofrimento dos outros.
Cestas básicas e fraldas, próteses e órteses, carrinhos e cadeiras de rodas
garantidas por lei foram solicitações que as mães M-B, M-D fizeram e não foram
obtidas. M-A e M-C não procuraram por estes serviços.
Ainda segundo os relatos, atendimento médico especializado é conseguido após
espera de dois a três meses de agendamento, tratamento odontológico é inexistente.
Os funcionários dos postos de atendimento em saúde ignoram as dificuldades destas
famílias quanto a locomoção, nos transportes e falta de tempo e condições adequadas
para esperarem de quatro a oito horas por atendimento para elas próprias ou para seus
filhos.
Sobre a possibilidade de seus filhos estarem em escolas comuns as quatro mães
demosntraram que gostariam que isso acontecesse, através de comentários sobre a
importância da convivência com outras pessoas referiram-se até à possibilidade de
aprendizagem de leitura e escrita.
No entanto o despreparo, o preconceito, a falta de conhecimento e a falta de
uma política de educação inclusiva aliada ao desconhecimento por parte das mães
sobre seus direitos favorecem situações onde elas ouvem a recusa da possibilidade de
atendimento, no caso de M-A ou a promessa feita a M-B de que assim que sua filha
andar/melhorar ela terá sua vaga garantida.
M-C temendo que sua filha seja mal tratada nem procurou por isso. Comenta
que ouviu muitas histórias de maus tratos contra crianças deficientes e que tem
certeza de que sua filha está melhor sendo cuidada somente por ela e pela instituição,
embora tenha demonstrado interesse em conversar sobre inclusão de crianças com
deficiência múltipla.
74
Para M-D que, orientada pela médica que trata de sua filha procurou e matriculou
sua filha numa escola municipal de educação infantil três anos, a importância desta
vivência para o desenvolvimento de sua filha é imensa. Diz perceber sua filha mais
independente, disposta a andar, a se comunicar reagindo aos diferentes estímulos do
ambiente escolar de maneira ativa.
Mesmo tendo expectativas com relação a escola comum para seus filhos as
mães, exceto M-D, não tratam deste assunto com as terapeutas, consideram não ser a
hora ou por temerem problemas com a equipe. Segundo M-C, quando matriculou sua
filha na instituição questionou sobre a possibilidade de sua filha freqüentar outros
atendimentos como a classe especial que fica na instituição, a resposta que ouviu é que
pelo comprometimento de sua filha o lugar dela seria somente o projeto Ambulatório e
assim ocorre desde então sem questionamentos. É importante ressaltar que M-D
procurou a escola por conta própria e que a instituição não foi consultada sobre a
inclusão ou não desta criança bem como não acompanha o processo de inclusão.
Com esses sentimentos ambíguos sobre a escola comum, resta às mães apostar
nas terapias semanais e que estas sejam ampliadas ou ensinadas a elas para que
possam realizá-las em casa visando acelerar a melhora de seus filhos. M-A, M-B e M-C
relataram perceber que seus filhos ficam mais tranqüilos nos dias em que freqüentam a
instituição, já M-D acha que a filha fica irritada e que ela gosta mesmo é da escola,
assim como ela própria, porém é o único lugar existente para a realização das terapias
necessárias à filha.
Sobre o atendimento na instituição as mães discordam sobre o trabalho e
atenção das terapeutas. Para M-A somente a fisioterapeuta explica e conversa sobre o
que fazer com seu filho, M-B e M-C consideram que todas são atenciosas e explicam os
exercícios que devem ser feitos em casa, M-D acha que as terapeutas desanimam
muito mais do que incentivam as mães, particularmente não recebeu orientação de
nenhuma das terapeutas sobre como ajudar sua filha em casa, ressalta que as mães
deveriam receber mais atenção da equipe da instituição e serem orientadas a
estimularem os filhos em casa para melhorar o nível de desenvolvimento destes.
Sobre a atenção dada às mães o relato das mesmas indica que as reuniões são
mínimas, com pouca liberdade para se expressarem. Somente M-C considera o
75
trabalho na oficina estimulante. Sobre a participação em reuniões fora da instituição
para tratarem de temas relevantes sobre deficiência, necessidades,ou a eleição do
Conselho Municipal da Pessoa Deficiente ocorrida em 2005 elas relataram que não
foram convidadas, somente M-A foi convidada uma vez, ela foi e não foi informada de
outras reuniões, as demais não foram informadas e disseram considerar isso importante
e que iriam se fossem convidadas.
Enfim em meio a uma rotina cansativa, omissão do poder público municipal, falta
de atendimento e desrespeito de seus direitos M-A e M-B relataram que não
questionam os acontecimentos, aceitam os fatos como acontecem, M-C e M-D
comentam que procuram algumas explicações, não aceitam as respostas quando não
estão satisfeitas, mas preferem não se envolver em situações de reivindicações,
procuram resolver seus problemas, mas se precisam de sua ajuda colaboram.
As expectativas das mães para com o poder público municipal são variadas de
acordo com a realidade enfrentada pelas famílias, podendo ser assim agrupadas:
Na área da saúde: manutenção de médicos e remédios nos postos;
Na área da ação social: distribuição de fraldas e cestas básicas;
Na área de educação: legislação que garanta os direitos à inclusão e
especialistas para o atendimento nas escolas;
Garantia de acessibilidade: adaptação nos transportes coletivos, melhoria
nas calçadas.
76
IV. DISCUSSÃO
Este capítulo resgata a temática exposta no capítulo anterior, bem como a
revisão bibliográfica que retrata os temas desta pesquisa. Busca sintetizar, assim, os
dados e referenciais obtidos nas diferentes fontes consultadas.
Subdivide-se em itens que destacam: os direitos assegurados, qualidade dos
serviços que as mães e as crianças recebem do poder blico municipal e a instituição
como espaço possível de cidadania.
4.1. Direitos assegurados
Os direitos descritos na Constituição de 1988 podem ser divididos em três tipos,
denominados de 1ª, e geração como veremos a seguir. Esta Constituição
assegura os direitos individuais: liberdade, igualdade, privacidade, considerados de
primeira geração, que podem ser garantidos em função do cumprimento dos direitos
sociais próprios do século XX. Tratados como de segunda geração são os que
englobam: direitos à moradia, saúde, educação, trabalho. Os de terceira geração,
denominados direitos transgeracionais por considerarem os cidadãos que ainda não
nasceram, são conhecidos como o direito à biodiversidade, ao desenvolvimento,
equilíbrio do meio ambiente, visando à garantia mais abrangente dos direitos
individuais. Esses direitos são resultados de diferentes momentos de lutas e conquistas
da humanidade e seu exercício efetivo é a cidadania.
A cidadania vai sendo respaldada juridicamente através da ampliação e
regulamentação de leis, visando garantias legais a todos os segmentos da população.
Estas leis são fundamentadas no princípio da eqüidade para contemplar grupos
minoritários e estigmatizados; que sobrevivem em precárias condições de vida
caracterizadas pelo fenômeno da exclusão social, vulneráveis em sua existência e no
exercício ou reconhecimento de sua cidadania. Entre esta população encontram-se
pessoas com deficiência múltipla e seus familiares, principalmente quando vivem em
condição de pobreza, com vistas a extinguir ou amenizar situações onde a
77
desigualdade se coloca de maneira acirrada, tornando-os mais vulneráveis, gerando o
fenômeno da exclusão social, conceito mais abrangente que a pobreza, por englobar
elementos éticos e culturais, como a discriminação e a estigmatização de minorias, e
relativo, porque varia de acordo com a sociedade em questão (Sposati, 2000).
O foco desse aparato legal é a promoção do desenvolvimento da pessoa
humana independente de sua condição aparente, enquanto cidadã, também com direito
a participar da formulação e implementação das ações do poder público, principalmente
no âmbito municipal, as políticas públicas. Estas são responsáveis pela concretização
dos direitos, principalmente os sociais, desenvolvidas através do planejamento e
investimento de recursos financeiros para execução de programas de ação
governamental das três esferas de poder: federal, estadual e municipal, obedecendo ao
princípio constitucional de descentralização.
A Constituição Federal de 1988 reflete os interesses dos mais diversos
movimentos sociais no Brasil, entre eles os das pessoas com deficiência em
consonância com os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos. A
depender da administração pública e da implementação de políticas públicas voltadas a
este segmento da população é que ocorre a concretização dos direitos previstos no
texto legal. Contudo, percebe-se que as políticas públicas existentes e em vigor
atualmente não contribuem para a concretização destes direitos previstos na
Constituição.
Na concepção atual das políticas públicas de proteção social que englobam as
áreas de educação, ação social e saúde, cabe ao município, enquanto menor escala
administrativa governamental, conhecer as situações de pobreza, privação e exclusão a
que estão submetidas parcelas da população de seu território, identificando
necessidades, diferenças, particularidades e potencialidades de cada segmento
populacional. Tendo como foco o núcleo de apoio e proteção comum a todos eles,
oferecendo às famílias serviços e programas de atendimento nas três áreas citadas,
promovendo a autonomia e o desenvolvimento humano e social.
Como foi possível constatar nos resultados, o atendimento às pessoas com
deficiência múltipla neste município é realizado por instituições filantrópicas que
oferecem atendimento gratuito à população carente ou não de recursos financeiros,
78
assumindo um papel que deveria ser desempenhado ou gerenciado pelo Estado. A
atuação da administração pública municipal se limita a cumprir as formalidades legais
para firmar convênios e receber verbas, em um “faz de conta” de que essa população
esteja sendo atendida de forma plena e satisfatória.
Verifica-se que a mesma Constituição que estabelece mecanismos de proteção
e participação popular visando à cidadania ativa legitima ações da sociedade civil no
âmbito da filantropia, sem ser questionada quanto à qualidade e o modo de atuação
junto à população atendida; incentivando que cada vez mais as instituições privadas
tomem o lugar de políticas públicas. Isto ocorre principalmente com as destinadas a
populações menos favorecidas, aprofundando o problema da segregação e exclusão
social das pessoas com deficiência e de seus familiares ao invés de caminhar para sua
inversão: a inclusão social destas.
4.1.2 Qualidade dos serviços que as mães e as crianças recebem do poder público
municipal.
Os relatos das mães referentes aos serviços, equipamentos e atenção que
recebem do poder público municipal indicam omissão do mesmo, descumprimento do
princípio de eqüidade e desconsideração às necessidades destes cidadãos em seu
território.
Os direitos constitucionalmente assegurados não são do conhecimento das
mães ou, em alguns casos, apenas vagamente conhecidos: sabem que a inclusão
escolar existe, mas não como funciona; desconhecem a prioridade de atendimento na
área de saúde; etc.
Estas famílias não estão minimamente contempladas pelos serviços municipais
nas áreas de educação, saúde e ação social. A área de ação social mesmo quando
procurada insistentemente pelas mães para obtenção de cestas básicas, fraldas,
cadeira de rodas ou próteses auditivas não correspondeu às expectativas/necessidades
das mães privando a família como um todo e em especial seus filhos com deficiência de
equipamentos e condições necessárias para uma existência com qualidade de vida.
79
Sobre o atendimento na área de saúde os serviços nos postos são
conseguidos após um longo período de espera, tanto para o atendimento de
emergência como para as consultas com especialistas. Os acompanhamentos dicos
de neurologia são realizados pela Unicamp ou PUC, no município de Campinas. Os
relatos das mães demonstraram desconfiança no tratamento em Sumaré pela carência
de médicos, remédios e pela alta rotatividade de médicos observada nos serviços
prestados. Não cadastro das crianças com deficiência, sistema que poderia facilitar
ou encurtar o tempo de espera para elas e suas mães.
Com relação à educação é fato que não qualquer serviço educacional para
estas crianças. Através dos relatos pode-se observar que as mães deixam clara a
insegurança quanto à atenção que o filho receberia na escola comum, apesar de alta
expectativa sobre os efeitos da mesma.
A instituição desta forma é reconhecida na lacuna criada por outras instituições
e também por contemplar outras necessidades, daí as es apostarem no aumento do
número de terapias e na orientação para reproduzirem em casa os exercícios para a
melhora do quadro clínico de seus filhos. Talvez esperem pela cura, com a qual
algumas diretoras também contam para a matrícula da criança na escola comum.
Além das terapias, em alguns casos que se apresentam em períodos
conturbados para as famílias como: desemprego, falta de recursos financeiros; a
instituição também garante ajuda concreta e rápida para o alívio da privação a que as
famílias estão submetidas, na forma de cestas básicas, fraldas, cadeiras de rodas, além
de outros encaminhamentos legais como: requerimentos de benefícios ou passes.
Estas atitudes acabam preenchendo a lacuna deixada pelo poder público municipal.
As áreas de saúde e ação social, esta última responsável pela realização dos
convênios com a instituição, têm responsabilidades legais historicamente determinadas
para o atendimento a esta população. a secretaria de educação reconhece que
necessita se estruturar para atender aos princípios da educação inclusiva uma vez que
ausência de uma política educacional voltada à inclusão e de serviços de
acompanhamento e orientação. Este fato libera os educadores
(professores/especialistas) para reagirem frente a esta realidade ou possibilidade de
inclusão de alunos com deficiência das mais diversas maneiras, tendo em vista que a
80
inclusão escolar demanda competência profissional, conhecimento, relações
democráticas no interior das escolas e um imperativo ético de respeito à diversidade
humana por parte dos profissionais que lidam com essa situação.
A ausência de parâmetros legais e impositivos cria situações desfavoráveis e
perversas para os familiares que procuram pelo atendimento educacional nas escolas
municipais para seus filhos, gerando traumas e sofrimentos, possivelmente
exterminando o embrião da luta por efetivação dos direitos das pessoas com
deficiência, mutilando qualquer tentativa de exercício de cidadania.
4.2 A instituição: espaço possível de cidadania
As instituições são regidas historicamente por uma disciplina rígida quanto a
horários e silenciamento dos seus usuários, com atividades e espaços bem definidos
que são cumpridos pelos alunos e seus familiares. “Todos” se adequam às regras e à
disponibilidade dos funcionários e terapeutas de acordo com a estrutura concebida e
organizada por uma diretoria. O trabalho dos profissionais é consumido pelas
exigências burocráticas dos convênios e organização de eventos para arrecadação de
recursos financeiros necessários para o funcionamento da mesma. Neste contexto a
atuação profissional passa a ser focada nas terapias semanais tendo em vista o número
reduzido de profissionais. Assim sendo, a deficiência passa a ser a única condicionante
das pessoas atendidas nesse espaço. O restante de suas vidas tende a ser
desconsiderado, não se estabelecendo como prática predominante a crença de que
aquelas pessoas têm potencial de desenvolvimento para além de sua aparência e
funcionamento.
Nessa rotina de serviços prestados, a inclusão escolar pode ser aspirada
pelos familiares de deficientes múltiplos em casos onde não há comprometimento
mental. Entretanto, mesmo quando não ocorre esse comprometimento mental, quando,
por exemplo, a criança tem hipotonia muscular que a impede de se sustentar sentada
ou equilibrar a cabeça, não há a menor indicação da instituição para que ocorra a
inclusão, e se pressupõe que as mães também não desejam isso por perceberem as
81
dificuldades de seus filhos. Percebe-se que os próprios profissionais da instituição
atuam no sentido de reforçar nas mães a baixa expectativa frente às possibilidades de
escolarização de seus filhos, enfim, do seu desenvolvimento global.
Também, na visão destes profissionais, a suposição de que as mães não
compareceriam às reuniões para discussões sobre direitos ou mesmo a eleição do
Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência (constituído em 2005), porque
para elas seria muito difícil sair de casa, pelos cuidados que os filhos exigem. Então,
eles mesmos definem um profissional da instituição que representasse as mães nestas
reuniões. Diante deste fato, a cidadania dessas mães é mutilada, não são informadas e
nem convidadas a participarem e as informações não chegam até elas. Conclui-se que
os objetivos elencados no plano de trabalho institucional se prestam a meras
formalidades para o cumprimento de exigências legais. O atendimento a que estão
submetidas acaba por silenciar as mães dentro da instituição e as mães que vão contra
isso são tidas e tratadas como “pessoas difíceis”, revoltadas pela condição de
deficiência de seus filhos. Como é o caso da M-D que por orientação da médica de sua
filha foi por conta própria até a escola de educação infantil e matriculou sua filha, sem
qualquer acompanhamento da instituição.
Assim, a inclusão escolar não é meta para a instituição, sendo que ocorre a
recomendação para que ela aconteça quando as crianças estão preparadas para serem
incluídas. Cabe aqui uma questão: em que consiste uma criança com deficiência
múltipla estar preparada para a inclusão escolar?
A hipótese que se levanta é que nem mesmo a instituição e seus funcionários
conseguiriam responder a esta pergunta. Sabe-se que o preconceito e a marginalização
a que pessoas com deficiência múltipla estão expostas é em grande parte devido a sua
aparência e funcionamento, o quadro clínico da maioria delas determina
comprometimentos associados nas áreas da linguagem, física (locomoção, do tônus
muscular, descontrole esfincteriano) e deficiências sensoriais, aspectos que as tornam
dependentes de cuidados de outras pessoas, o que de acordo com os resultados da
presente pesquisa se centraliza na figura das mães.
Esse comprometimento gera preconceitos e atitudes equivocadas em que se
subestima ou se desconsidera as potencialidades e capacidades delas. As limitações
82
aparentes acabam ocultando possibilidades e capacidades não evidentes, respaldando
práticas limitadas a cuidados com higiene e alimentação por não se acreditar na
existência da capacidade de desenvolvimento e progressos nessas pessoas.
Entretanto, quando estes indivíduos são estimulados e apoiados
adequadamente, de acordo com a singularidade de sua existência, interagem de
maneira promissora demonstrando progressos em seu desenvolvimento, conquistas
que os estimulam a cada vez mais estar num ambiente de convívio social ampliado e
significativo de experiências e desafios a serem enfrentados, como ocorreu com C-D.
Essa condição de amplo convívio social é o estar junto das crianças que não
têm deficiência, nas escolas comuns. É um direito constitucional que pode gerar para
elas expectativas e exigências que contribuem para a melhora na qualidade de sua vida
e de seu estágio de desenvolvimento transformando a condição de desvantagem,
inferioridade ou desigualdade em motivação, força, energia para seu próprio
desenvolvimento enfim, estimulando-as e dando sentido à sua existência enquanto
seres humanos.
Embora sendo categorizadas enquanto crianças com deficiência múltipla
observa-se que uma diversidade quanto à situação de cada criança, ou seja, os
comprometimentos e capacidades são diferenciados, relacionados também aos
diferentes contextos familiares que podem ser favoráveis ou desfavoráveis ao
desenvolvimento e aprendizagem, evidenciando a singularidade no processo de
desenvolvimento e aprendizagem de cada uma delas. O que deve ser considerado é
que mesmo que muitas não consigam progredir quanto ao domínio dos conteúdos
curriculares formais elas têm o direito de receber todas as oportunidades educacionais
que favoreçam seu desenvolvimento global. Em outras palavras significa atingir o
máximo de suas potencialidades e capacidades de desenvolvimento, numa atmosfera
ética de respeito à dignidade e diversidade humana sem dispensar os atendimentos
terapêuticos que também necessitam e que ganham novo significado quando estas
crianças estão inseridas num grupo. Negar experiências a estas crianças é privá-las
dos riscos necessários ao desenvolvimento humano. (Glat e Duque, 2003).
As famílias recorrem à instituição porque é o único espaço de atendimento para
seus filhos, e para algumas a possibilidade de atenuar, as carências e situações
83
desfavoráveis que suas condições de vida lhes impõem, obrigando-as a conviver com a
omissão do poder público encarando a deficiência como a cruz que deve ser carregada
pela família aceitando e agradecendo a boa vontade da instituição. Isto se caracteriza
numa “alienação consentida” (Carvalho, 2004) determinada pela atuação dos diversos
profissionais que atendem seus filhos, impondo normas e padrões tidos como normais.
Disso decorre uma pressão que desencoraja qualquer intenção de luta pela
reivindicação dos direitos previstos constitucionalmente.
Isso gera nas mães um misto de sentimentos que acabam paralisando-as e
impedindo-as que procurem ou pensem em inclusão escolar para seus filhos, o
silenciamento é total, até mesmo para quem experimenta uma situação de inclusão
escolar da filha. Não autorização para conversas sobre esse assunto nos espaços
da instituição ou mesmo fora dela.
Isso é reforçado a todo instante na sociedade pois a atenção que se volta às
pessoas com deficiência enfatiza as dificuldades em detrimento de suas possibilidades
de desenvolvimento e aprendizagem (Ferreira, 1994). Essa atitude serve como
manutenção da exclusão, a instituição não age nem pensa diferente, toda a equipe
técnica reafirma isso junto às mães, tendo em vista que a deficiência é a manifestação
de diferenças cuja marginalização está enraizada histórica e culturalmente,
determinando as atitudes sociais de interação ou não na convivência com estas
pessoas.
Esta realidade requer uma modificação não estrutural, para minimizar as
dificuldades causadas pelas limitações trazidas por estas pessoas, mas também
extinguir padrões de normalidade convencionados pela sociedade, ressaltando que, a
combinação de fatores que aumentam a desigualdade (indicadores de renda,
escolaridade, ocupação, localização da moradia, deficiência múltipla) produz as piores
formas de exclusão, refletindo na realidade uma (ir)responsabilidade das políticas
públicas e o reflexo de problemas estruturais de ordem político, econômico e social que
permanecem intocados.
Nesse sentido deve-se atentar para as conseqüências de políticas neoliberais
que acabam por criar políticas de inclusão precárias e marginais, favorecendo um
universo ideológico unificado (Martins, 1997), gerando nas mães sentimentos de
84
pertença na instituição ao participarem das reuniões para festas e das oficinas quando
na realidade estão sendo atendidas com assistencialismo sem instrumentalizarem-se
para o exercício da cidadania ativa.
Há muito o que se fazer para resgatar nessas mães a segurança e a certeza de
seu espaço enquanto cidadãs de direitos, para que possam exigir dos representantes
quer da instituição especializada ou da administração pública ações efetivas que
contribuam para a qualidade de vida suas e de seus filhos.
Estes representantes atuantes junto a famílias que convivem com o fenômeno
deficiência devem ter claro que:
a) A exclusão social espalhada por todo o território nacional é fruto de
um modelo econômico, político e social perverso, imposto por
países e organismos internacionais que sustentam a atual ordem
econômica mundial;
b) Nem todas as famílias têm a mesma capacidade de organização e
controle sobre o seu destino, levando-se em conta a desigualdade
na distribuição de renda do país;
c) uma diversidade de organização, crenças, valores e práticas
desenvolvidas na busca de soluções para as vicissitudes cotidianas
por parte de cada família, o que não permite propostas rígidas de
modelos de atendimento pré-estabelecidos;
d) Todas as pessoas por mais dificuldades que enfrentem no seu dia a
dia têm sentimentos e preocupações como todos os seres
humanos, portanto, não estão preocupados com sua
sobrevivência diária, em matar sua fome (Sawaia, 2004); e
e) Que a deficiência marca a mãe para sempre, ela revive o luto pela
perda do filho ideal em cada fase da vida deste, em idade escolar,
na adolescência, na época de namorar, trabalhar, concomitante à
preocupação de quem vai cuidar de seu filho quando ela vier a
falecer.
85
Mediante a situação de inclusão as famílias vivem à margem dos serviços
públicos, contudo, mesmo diante dessa situação de ausência de políticas públicas
voltadas à educação inclusiva, deparamos com uma experiência particular de inclusão.
Para isso, resgataram-se os resultados obtidos com a M-D onde os relatos da diretora e
da mãe se cruzam e se complementam apontando para a importância da vivência de
todos os envolvidos em meio a um sistema de ensino que ignora a experiências
inclusivas bem sucedidas. Fica claro o imperativo ético e a competência da diretora e
professoras na condução da experiência, demonstrando a sensibilidade em acolher a
mãe e sua filha na contramão de um processo que exclui. Estes relatos indicam que é
possível a inclusão de crianças com deficiência múltipla e que todos ganham com isso.
Como inúmeras fontes tratando deste assunto, prova que profissionais
comprometidos com a história atual, com uma prática aberta, sujeita a críticas e que
não abrem mão de seu papel e responsabilidade perante as necessidades dos outros.
Se por um lado a omissão (do poder público, e alguns profissionais) há, por outro, o
compromisso - de alguns profissionais - indicando que a rede municipal de educação
tem muito a aprender/apreender desta experiência, servindo como paradigma de
prestação de serviço possível.
Vale a pena ressaltar, entretanto, que esta é uma experiência que também
depende muito da e, e demonstra que relações no interior de uma escola podem e
devem ser democráticas e que a mesma não tem o que esconder dos pais. A mãe tem
tido participação ética nesse processo de inclusão de sua filha não extrapolando limites
e permitindo que sua filha corra riscos, vai percebendo e atribuindo significados
juntamente com os profissionais da escola aos pequenos gestos, balbucios a atitudes
de sua filha, reconhecendo-a enquanto sujeito capaz de desenvolvimento, sabe que o
processo também depende dela e que exigir só dos profissionais da escola é deixar de
lado sua responsabilidade.
Enfim, essa maneira de encarar a inclusão escolar não é dada, natural, ela tem
que ser discutida com as mães por profissionais através de uma política municipal de
proteção social que tenha como referência o reconhecimento da diversidade humana e
da importância da educação para todos os seres humanos articulada com as áreas de
saúde e ação social principalmente para crianças com deficiência múltipla, ressaltando
86
que o estar na escola não dispensa os atendimentos terapêuticos podendo sim (re)
significá-los.
Ressalta-se que indicações da necessidade de discussão e trabalho
conjunto entre instituições especializadas, famílias, representantes de secretarias
municipais e outros segmentos sociais sobre: o papel, os objetivos e a concepção de
inclusão social de cada segmento tendo em vista o aparato legal existente, uma vez
que não inclusão social sem a inclusão escolar e nem os governos conseguirão
cumprir as Metas de Desenvolvimento do Milênio (ONU, 2000), referentes à
universalização do acesso à educação primária enquanto persistir a segregação e o
atendimento às pessoas com deficiência múltipla delegado às instituições filantrópicas.
87
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No limite dos dados obtidos durante a realização deste trabalho constatou-se
que os investimentos do poder municipal têm relação direta com a qualidade dos
serviços básicos (saúde, educação, transporte coletivo, água, saneamento básico) e
que as autoridades municipais gastam pouco e/ou mal, produzindo uma rede de
serviços precários e insuficientes para a população, afetando diretamente as famílias
que vivem em maior vulnerabilidade social. Neste caso, se inserem as pessoas com
deficiências, suas mães e a questão da cidadania dessa população. É direito destas
receber serviços e atenção do poder público municipal obedecendo ao princípio de
eqüidade e a realização destes atendimentos depende tanto do compromisso ético
quanto financeiro dos investimentos públicos destinados aos serviços básicos citados
acima e também da capacidade das famílias em exigir a alocação de recursos numa
perspectiva que as beneficie.
Percebeu-se a inexistência de garantias de que o setor público seja capaz de
pensar a dimensão do fenômeno da deficiência nas determinações das condições de
vida das famílias que o vivenciam. Para isso seria necessário que este setor assumisse
papel regulador e intervencionista e sua contrapartida na garantia de direitos sociais
através de políticas públicas voltadas para a inclusão social, principalmente das
pessoas com deficiência múltipla e seus familiares. É fato que atualmente essa
população não é beneficiada pelos programas municipais.
É fato também que não solução a nível local para o processo de exclusão
social da população municipal atingida por esse fenômeno que se acentua com relação
às famílias que convivem com a deficiência, mas afirmamos que é possível para esta
instância de poder contribuir para a melhoria das condições de vida das mesmas. Para
que isso ocorra, torna-se necessário que o governo local comprometa-se com os
problemas sociais de sua população, o que não ocorreu historicamente neste município.
Sua história retrata uma ocupação territorial desordenada motivada pela especulação
imobiliária e crescimento acelerado das regiões metropolitanas, gerando a periferização
em seu território, agravando as condições de vida dos cidadãos e dificultando a criação
88
e manutenção de serviços públicos que atendam suas demandas. Acredita-se que a
simples melhoria nos serviços sicos reduziria as dificuldades e precariedade nas
condições de vida da população estudada.
O papel assumido pela instituição enquanto entidade filantrópica resume-se à
prestação de serviços assistenciais. Embora a equipe que dirige a instituição, destaque
mudanças com relação aos atendimentos e a legislação voltada à inclusão escolar,
observou-se por parte desta disposição em discutir a questão da inclusão escolar junto
à rede municipal de ensino e ao mesmo tempo certa insegurança em discutir o assunto
abertamente, talvez porque diante da omissão e repasse de responsabilidades do poder
público, frente as pessoas com deficiência e suas famílias para a instituição esta se
sobrecarregue e se coloque numa posição de que é a única responsável por essa
população e que deve trabalhar com a mesma não permitindo que ela extrapole o
espaço institucional.
Os relatos das mães refletem a exclusão social que vivenciam trajetórias de
vulnerabilidade, precariedade no acesso e exercício dos direitos e incapacidade de agir
e de se fazer representar politicamente. Isolam-se e não questionam os serviços que
recebem e os que faltam. Não indicadores de que esta situação seja revertida num
curto espaço de tempo.
Tal constatação é grave, pois a importância da população organizada e
consciente de seus direitos não pode ser subestimada, principalmente num país como o
Brasil de extrema desigualdade e num regime democrático.
Este regime supõe organização e participação popular de todos os segmentos
sociais para reivindicar, fiscalizar e avaliar as administrações públicas. Porém isso não
ocorre naturalmente, principalmente para os segmentos mais estigmatizados e
discriminados da população.
Esta é uma tarefa que tem que ser conjunta, entende-se que a organização de
pais de crianças com deficiência múltipla com os profissionais que trabalham para
atendê-los pode gerar forças motivadoras preocupadas com o bom funcionamento dos
serviços públicos principalmente nas áreas de saúde, educação e ação social,
questionando a atenção e os atendimentos oferecidos a esta população, reivindicando
melhoria e implementação de outros serviços municipais cruciais, destaca-se aqui a
89
oferta de educação inclusiva e de transportes adaptados, tema que surgiu a partir das
necessidades percebidas pelas mães em seu dia a dia.
Constatou-se que sendo a instituição o espaço possível de atendimento para
esta população a união dos pais e dos profissionais desta surge como condição
fundamental para o exercício da cidadania das mães, tendo em vista a fragilidade
destas em buscar isoladamente melhorias de suas condições de vida. O respaldo dos
profissionais é importante para esse movimento em busca dos direitos.
As famílias vivem, em diferentes graus, situações de emergência permanente o
que as tornam dependentes de serviços públicos nas três áreas já citadas, estes devem
transformar-se para a promoção de qualidade de vida. A parceria entre poder público e
instituição poderia facilitar o acesso aos serviços municipais através de um cadastro
comum e de informações necessárias para um melhor dimensionamento dos
problemas, necessidades e expectativas das mães acompanhando-as continuamente
para verificar se estão sendo atendidas e acima de tudo se estão sendo respeitadas
enquanto cidadãs que buscam ativamente soluções para as vicissitudes do seu dia a
dia.
O que se propõe é que a partir da identificação e do conhecimento existente
sobre essa população através da instituição se organize uma rede de serviços
municipais, articulando as diferentes secretarias municipais que funcione como um
sistema de defesa e promoção da cidadania, que busque dar conta dos problemas
destas famílias em toda sua dimensão. Montando um sistema de informações tanto a
partir dos registros de atendimento quanto da discussão com as mães planejando as
ações com a participação destas.
90
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97
ANEXOS
98
Anexo A
LEGISLAÇÃO MUNICIPAL EFERENTE A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
Lei 1511, de 21 de agosto de 1981.”Autoriza aquisição e doação de aparelhos
auditivos, cadeiras de rodas e aparelhos ortopédicos à deficientes físicos.”
Lei Orgânica Municipal, de 5 de abril de 1990: Capítulo da Saúde, da Educação,
da Promoção e Assistência Social e dos Esportes, Lazer e Turismo.
Lei nº. 2469, de 23 de setembro de 1992. “Capítulo XI Das rampas que permitem
o acesso de deficientes físicos.”
Lei nº. 2604, de 03 de novembro de 1993. ”Dispõe sobre o atendimento
preferencial a gestantes, mulheres com crianças no colo, deficientes, aposentados e
idosos de ambos os sexos em estabelecimentos comerciais de serviços e similares e
dá outras providências.”
Lei nº. 2725, de de dezembro de 1994. ”Estabelece a obrigatoriedade às
empresas de transportes coletivos urbanos permissionárias de serviço público em
Sumaré, a manter 04(quatro) assentos, em cada veículo, para uso de: deficientes
físicos, gestantes, mulheres com crianças de colo, idosos e cegos.”
Lei nº. 3051, de 26 de agosto de 1997. ”Regulamenta vagas especiais em
estacionamentos públicos e em estabelecimentos comerciais e bancários, no
Município de Sumaré.”
Lei nº. 3299, de 12 de maio de 1999. ”Autoriza o Executivo a criar o Conselho
Municopal de Integração da Pessoa Portadora de Deficiência de Sumaré.”
Lei nº. 3319, de 22 de julho de 1999. “Institui o Programa de Incentivo ao Trabalho
e Requalificação Profissional do Município de Sumaré destinando, 5% do total das
vagas do Programa para preenchimento com deficientes físicos,.”
Lei nº. 3389, de 21 de dezembro de 1999. Autoriza o Poder Executivo a isentar os
desempregados e deficientes em geral da taxa de inscrição em concursos públicos
para cargos no serviço municipal.”
Lei nº. 3891, de 04 de novembro de 2003. “Dispõe sobre a reserva de áreas nas
vias públicas para estacionamento de veículos de uso de deficientes físicos.”
99
Anexo B
QUESTIONÁRIO SECRETARIAS MUNICIPAIS
SECRETARIA MUNICIPAL DE__________________________
Realizado em________________________________________
Respondido por_______________________________________
Cargo ou função que desempenha________________________
1- Esta Secretaria dispõe de dados estatísticos ou outras informações sobre a
população com deficiência no município?
2- Dentre os projetos realizados por esta Secretaria algum que se dirija
prioritariamente às pessoas com deficiência e seus familiares? Existe alguma
proposta neste sentido?
3- O que está sendo realizado com vistas à Educação Inclusiva?
100
Anexo C
CARTA DE INFORMAÇÃO À INSTITUIÇÃO
Esta pesquisa, a ser desenvolvida pela Mestranda Marisa Fatima Vedovatto
de Macedo, aluna do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade
Metodista de Piracicaba (UNIMEP), tem como objetivo,
compreender as condições de
vida e necessidades dos sujeitos portadores de deficiência múltipla e de seus familiares,
bem como, o atendimento que recebem e o que almejam do poder público municipal com
ênfase na educação inclusiva enquanto direito constitucional de todos os cidadãos, através
do relato dos familiares.
Estaremos analisando num primeiro momento os prontuários de todos os portadores
de deficiência múltipla atendidos por esta Instituição a fim de, selecionar as famílias que
através de um responsável legal serão convidadas a participar da realização das entrevistas
na própria instituição para obtermos dados que contemplem o objetivo proposto. Para tal
solicitamos a autorização desta Instituição para a triagem dos sujeitos e, para aplicação de
nossos instrumentos de coleta de dados. Afirmamos que esse trabalho de pesquisa não
oferecerá riscos de qualquer ordem aos sujeitos ou à Instituição. Os sujeitos não serão
obrigados a participar da pesquisa, podendo desistir a qualquer momento, conforme consta
no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que assinarão. Tudo o que for falado será
confidencial. Quaisquer dúvidas que existirem agora ou depois poderão ser livremente
esclarecidas, bastando entrar em contato conosco no telefone abaixo mencionado. De
acordo com estes termos, contamos com a colaboração desta instituição através de seu
representante legal no sentido de autorizar a realização deste trabalho assinando abaixo.
Uma cópia ficará com a Instituição e outra com a pesquisadora.
Obrigado.
Piracicaba, 01 de junho de 2005.
_____________________________ ________________________
Marisa Fatima Vedovatto de Macedo Profº Drº Julio Romero Ferreira
PPGE – UNIMEP
101
Anexo D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, a Assistente
Social, ________________________________________________________
representante da Instituição, após a leitura da Carta de Informação à Instituição,
ciente dos procedimentos propostos, não restando quaisquer dúvidas a respeito do
lido e do explicado firma seu Consentimento Livre e Esclarecido de concordância
quanto à realização da pesquisa. Fica claro que a Instituição, através de seu
representante legal, pode, a qualquer momento, retirar seu Consentimento Livre e
Esclarecido e deixar de participar do estudo alvo da pesquisa e fica ciente que todo
trabalho realizado torna-se informação confidencial, guardada por força do sigilo
profissional.
Sumaré, ___de ___________________de 2005.
____________________________
Representante da Instituição
102
Anexo E
QUESTIONÁRIO PARA A INSTITUIÇÃO
1.Como ocorre a entrada da criança/adolescente na Instituição? Quais as avaliações
realizadas?
2.A instituição trabalha para a inclusão dos seus alunos?
Quais os critérios para isso?
Quem decide sobre esse momento?
3.Se as mães procuram a escola por conta própria a instituição acompanha o
processo?
4.Os alunos com deficiência múltipla também são atendidos com vistas à inclusão
escolar?
5.A experiência da C-E é divulgada junto às mães para encorajá-las na busca de
escola para seus filhos?
6.Quais as dificuldades percebidas junto às mães?
Como sistematizam o trabalho junto a elas (reuniões, cursos, palestras)?
7.Quais as reações das diretoras da rede municipal de ensino frente a inclusão de
alunos da instituição?
8.Outros encaminhamentos em que a instituição colabora com as famílias.
103
Anexo F
LEVANTAMENTO DE DADOS PESSOAIS E FAMILIARES
Nome:_____________________________________________________DN:___/___/____
Naturalidade:______________________________________________________________
Bairro: _____________________________Tempo moradia município:________________
Naturalidade: ________________________Grau de instrução: ______________________
Pai:______________________________________________________________________
Mãe:_____________________________________________________________________
Composição Familiar: Total:___________
n.° de adultos:___________ n° de crianças:_____________
Benefícios:
( ) LOAS ( ) Pensão ( ) PETI ( ) Bolsa Escola
Outros:___________________________________________________________________
Valor:____________________________________________________________________
Habitação:
( ) própria ( ) alugada ( ) financiada ( ) cedida ( ) Outros__________________________
Número de cômodos:________________________________________________________
Infra-estrutura do bairro:
( ) coleta de lixo ( ) pavimentação asfáltica ( ) equipamentos sociais ( ) esgoto
( ) transporte coletivo ( ) iluminação pública
Renda mensal:_____________________ Gastos:_________________________________
Gastos com higiene pessoal do deficiente:_______________________________________
Aluno encaminhado por:_____________________________________________________
Problemas apresentados:_____________________________________________________
_________________________________________________CID:___________________
Projetos:
( ) Ambulatório ( ) Atendimento Global Terapêutico ( ) Autismo ( ) Comunicação
Suplementar Alternativa ( ) Estimulação Essencial ( ) Inclusão Integração Escolar
( )Lesado Medular ( ) Oficina Pedagógica Terapêutica ( ) Oficina Pedagógica Ocupacional
Perua: ( ) sim ( ) não
Terapias:
( ) Classe Especial ( ) Educação Artística ( ) Educação Física ( ) Fisioterapia ( )
Fonoaudiologia ( ) Pedagogia ( ) Psicologia ( ) Neurologia ( ) T. O.
Matrícula na Instituição_____________________________________________________
Frequenta escola regular?____________________________________________________
Dados obtidos a partir da Ficha Social utilizada pela instituição.
104
Anexo G
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, ____________________________________________________, abaixo
assinado, declaro ter pleno conhecimento do que se segue:
- Fui informado, de forma clara e objetiva que, a pesquisa irá analisar as condições
de vida e necessidades dos sujeitos com deficiência múltipla e de seus
familiares, bem como o atendimento que recebem e o que almejam do poder
público municipal com ênfase na educação inclusiva enquanto direito
constitucional de todos os cidadãos;
- Sei que nesta pesquisa serão realizadas entrevistas com familiares de crianças
com deficiência múltipla na própria instituição de atendimento;
- Estou ciente que não é obrigatória a minha participação enquanto sujeito, nesta
pesquisa, caso me sinta constrangido (a) antes ou durante a realização da
mesma poderei retirar meu Consentimento Livre e Esclarecido e deixar de
participar do estudo alvo sem qualquer prejuízo:
- Sei que os dados levantados serão analisados posteriormente e mantidos em
caráter confidencial, sendo resguardados o nome dos participantes bem como a
identificação do local da coleta dos mesmos;
- Poderei obter informações durante a realização do estudo ainda que isto possa
afetar a minha vontade em continuar participando dele através do Professor
Doutor Julio Romero Ferreira, professor orientador deste estudo, pelo telefone
(19) 3124-1515 Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade
Metodista de Piracicaba (UNIMEP);
- Foi-me esclarecido que o resultado da pesquisa somente será divulgado com
finalidade acadêmica, esperando contribuir para maior conhecimento do tema
estudado;
- Estou ciente de que os dados serão utilizados na dissertação de Mestrado da
Pedagoga Marisa Fatima Vedovatto de Macedo aluna da Universidade acima
citada.
- Declaro, ainda, que recebi cópia do presente Termo de Consentimento que
segue assinado por mim, pela pesquisadora e pela Assistente Social da
Instituição na qualidade de testemunha
Sumaré, ____de______________________de 2005.
Sujeito da Pesquisa:___________________________________
Pesquisadora:_______________________________________
Marisa Fatima Vedovatto de Macedo
CPF 091.399.688-20
Assistente Social:_____________________________________
105
Anexo H
ROTEIRO DAS ENTREVISTAS COM AS MÃES
1.Quando e através de quem tomou conhecimento sobre a deficiência?
2. Desde então o que passa pela sua cabeça que não quer calar. Um pensamento
que vai e volta?
3. Sobre trabalhar fora. Já experimentou, gostaria?
4. A família recebe ajuda de alguma igreja, ou instituição filantrópica? Nos momentos
mais difíceis quem socorre?
5. Quais as maiores dificuldades em sua rotina de cuidados com seu (a) filho (a)?
6. procurou serviços municipais da Ação Social em momentos de crise financeira
na família? Como foi?
7. E serviços de saúde, como médicos e dentistas?
8. E escolas ou creches municipais você procurou? Como foi isso? Por que não
procurou?
9. Você passou por experiências que desrespeitaram seus direitos. Você reclamou,
ou costuma reclamar quando isso acontece em sua vida?
10. Participa de alguma Sociedade Amigos de Bairro ou outra associação que
reivindica melhorias para a comunidade?
11. Percebe diferenças em seu (a) filho (a) nos dias em que faz as terapias? Ele
sinais que gosta?
Percebe que ele está progredindo?
12. Se além dos atendimentos na Instituição ele freqüentasse uma escola, o que
você acha que representaria para ele?
13. A lei diz que todas as crianças devem freqüentar escolas, isso inclui seu filho
(a). Já conversou sobre isso com os terapeutas? Perguntou se poderiam encaminhar
seu filho?
14. Você pensa em ir atrás desse direito para teu filho (a)?
Por quê?
15. Você considera que os terapeutas orientam vocês mães, sobre como lidar,
encarar ou resolver problemas frente à deficiência? Como?
16. Existem atividades em grupo de mães para discussão de problemas,
sentimentos, leis e direitos, organizados pela Assistente Social ou Psicóloga?
106
17. alguma situação ou regra aqui na instituição que você acha que poderia
mudar? Já fez alguma reclamação ou crítica?
18. Diante das suas dificuldades, se você pudesse pedir algo para a prefeitura
agora, o que seria?
19 Você já foi convidada para participar de reuniões com autoridades para discutir
problemas referentes às condições dos deficientes no município?
107
Anexo I
RELATÓRIO DA DIRETORA DA ESCOLA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL
C-E foi matriculada em 20/02/2003.
Obs.Terapeutas da Instituição não compareceram para acompanhar o
processo de inclusão da aluna.
Ela foi matriculada a pedido da mãe, conforme orientação médica para se
socializar com outras crianças, pois é filha única. Tinha e ainda tem um grau de
dificuldades acentuado e nós da escola nem imaginávamos como trabalhar,
organizar o espaço da sala de aula, refeitório, atividades e nem como recebê-la.
Aceitamos o desafio, sabendo de toda dificuldade que enfrentaríamos.
Foi conversado com a mãe que a escola precisaria muito da ajuda dela neste
processo, no sentido dela acompanhar C-D nas atividades escolares durante o
período de aula, até os profissionais terem mais segurança em lidar com ela e suas
necessidades.
Tendo em vista que era uma criança que ficava deitada no carrinho de bebê,
babando muito, sem nenhum tônus muscular, não ficava sentada, não demonstrava
ouvir e enxergar, não acompanhava nada com olhar, tinha sempre a mesma
expressão facial, parecia uma boneca de pano com vida.
Em 2003 freqüentou uma classe de jardim I. A professora primeiramente
conversou com a classe a respeito da nova coleguinha e suas dificuldades. Os
alunos começaram a ajudar mais a professora a partir da entrada da C-D, brincavam
e cooperavam com a colega, muitas vezes brigavam para empurrar o carrinho,
segurar a bolsa, brinquedos, etc. O grupo tornou-se mais solidário, as crianças não
têm o preconceito dos adultos, eles não viam o problema da colega e sim seus
momentos de alegria e tranqüilidade, isto sem dúvida foi o mais importante, ela se
sentia amada por todos.
No parque a mãe e a professora seguravam C-D nos brinquedos, no tanque
de areia era feito ao redor dela montes de areia, evitando que caísse, gostava e
gosta até hoje, de brincar na areia.
Quando a atividade era assistir a um filme permanecia no carrinho como se
nada estivesse acontecendo.
108
Nas atividades de papel a mãe fazia por ela segurando na sua mão, a mãe
se realizava com essa atividade.
Quando ficava agitada ou gritava muito, a mãe a levava para casa antes do
término da aula.
Em 2004 freqüentou o jardim II, com dificuldade ficava sentada na cadeira
de rodas, começou a dar sinais de alegria quando ouvia o canto dos colegas,
passou a prestar atenção e a acompanhar a professora e os colegas como olhar, na
areia e nas atividades que eram realizadas no chão tentava engatinhar, começou a
segurar os brinquedos e livrinhos, conseguia com dificuldade controlar a saliva.
Gritava muito mas não mais por estar irritada e sim para se comunicar.
Em 2005 freqüentou o jardim II, nitidamente gostava de ouvir música, bater
palmas, brincar na areia, pegar brinquedos coloridos e passear pela escola. Quando
algo a incomodava jogava objetos, brinquedos, puxava o cabelo dos colegas.
As maiores dificuldades estão nas atividades realizadas no papel.
conseguia ficar em e andar com a mãe ou professora segurando-a pelo corpo.
Parou de babar.
Em 2006 está no jardim II no período da manhã, afetiva e socialmente vem se
desenvolvendo constantemente.
Gosta de ouvir música e cantar (gritos e balbucios), materiais e jogos
coloridos, bexigas, parque e areia.
senta em cadeirinha, tem ainda dificuldade para se locomover, precisa de
alguém segurando-a para ir de um local a outro, vem para a escola andando com
ajuda da mãe, continua usando fraldas e ainda o come sozinha, quando está
ansiosa grita.
A mãe não permanece mais as quatro horas na escola, apenas auxilia na
troca de fraldas e no lanche. Durante a festa da Páscoa a professora muito ocupada
não deve ter dado atenção para C-D, que estava agitada com os enfeites e o
movimento daquela comemoração, em certo momento C-D com muita dificuldade
chamou a professora de pro”, demonstrando alegria com isso, desde então vem
pronunciando essa palavra cada vez com melhor desempenho.
A mãe desde o início vem participando de todas as atividades da escola,
colaborando em tudo que lhe pedido, é atenciosa com filha e com as outras
crianças. Relaciona-se eticamente com os profissionais da escola, uma experiência
valiosa para todos.
109
Anexo J
ÍNDICE DA VULNERABILIDADE SOCIAL DE SUMARÉ
O Município de Sumaré, que integra a Região Administrativa de Campinas,
possuía, em 2000, 196.717 habitantes. Uma análise das condições de vida de seus
habitantes mostra que os responsáveis pelos domicílios auferiam, em média, R$668,
sendo que 48,6% ganhavam no máximo três salários mínimos. Esses responsáveis
tinham, em média, 5,8 anos de estudo, 35,5% deles completaram o ensino
fundamental, e 9,2% eram analfabetos. Em relação aos indicadores demográficos, a
idade média dos chefes de domicílios era de 42 anos e aqueles com menos de 30
anos representavam 19,1% do total.
As mulheres responsáveis pelo domicílio correspondiam a 19,7% e a parcela
de crianças com menos de cinco anos equivalia a 9,4% do total da população.
Os Grupos de Vulnerabilidade Social
As situações de maior ou menor vulnerabilidade às quais a população se
encontra exposta estão resumidas nos seis grupos do IPVS (Gráfico), a partir de um
gradiente das condições socioeconômicas e do perfil demográfico (Tabela).
Distribuição da População, segundo Grupos do Índice Paulista de Vulnerabilidade
Social – IPVS Estado de São Paulo e Município de Sumaré
110
O Grupo que apresenta vulnerabilidade muito baixa - 17.479 pessoas
representa 8,9% do total. No espaço ocupado por esses setores censitários, o
rendimento nominal médio dos responsáveis pelo domicílio era de R$1.140 e 28,1%
deles auferiam renda de até três salários mínimos. Em termos de escolaridade, os
chefes de domicílios apresentavam, em média, 7,4 anos de estudo, 95,7% deles
eram alfabetizados e 49,9% completaram o ensino fundamental. Com relação aos
indicadores demográficos, a idade média dos responsáveis pelos domicílios era de
49 anos e aqueles com menos de 30 anos representavam 10,1%.
As mulheres chefes de domicílios correspondiam a 24,7% e a parcela de
crianças de 0 a 4 anos equivalia a 5,4% do total da população desse grupo.
O grupo de vulnerabilidade baixa - 61.306 pessoas (31,2% do total). No
espaço ocupado por esses setores censitários, o rendimento nominal médio dos
responsáveis pelo domicílio era de R$745 e 41,5% deles auferiam renda de até três
salários mínimos. Em termos de escolaridade, os chefes de domicílios
apresentavam, em média, 6,1 anos de estudo, 92,6% deles eram alfabetizados e
39,0% completaram o ensino fundamental. Com relação aos indicadores
demográficos, a idade média dos responsáveis pelos domicílios era de 43 anos e
aqueles com menos de 30 anos representavam 16,4%.
As mulheres chefes de domicílios correspondiam a 17,8% e a parcela de
crianças de 0 a 4 anos equivalia a 8,1% do total da população desse grupo.
O grupo de vulnerabilidade média compreende 69.786 pessoas (35,5% do
total). No espaço ocupado por esses setores censitários, o rendimento nominal
médio dos responsáveis pelo domicílio era de R$576 e 50,5% deles auferiam renda
de até três salários mínimos. Em termos de escolaridade, os chefes de domicílios
apresentavam, em média, 5,7 anos de estudo, 91,6% deles eram alfabetizados e
4,7% completaram o ensino fundamental. Com relação aos indicadores
demográficos, a idade média dos responsáveis pelos domicílios era de 40 anos e
aqueles com menos de 30 anos representavam 22,4%.
As mulheres chefes de domicílios correspondiam a 18,5% e a parcela de
crianças de 0 a 4 anos equivalia a 10,8% do total da população desse grupo.
O grupo de vulnerabilidade alta, 18.181 pessoas (9,2% do total). No espaço
ocupado por esses setores censitários, o rendimento nominal médio dos
responsáveis pelo domicílio era de R$472 e 62,2% deles auferiam renda de até três
salários mínimos.
Em termos de escolaridade, os chefes de domicílios apresentavam, em
média, 4,7 anos de estudo, 86,2% deles eram alfabetizados e 24,1% completaram o
ensino fundamental. Com relação aos indicadores demográficos, a idade média dos
responsáveis pelos domicílios era de 44 anos e aqueles com menos de 30 anos
representavam 16,3%. As mulheres chefes de domicílios correspondiam a 20,4% e a
parcela de crianças de 0 a 4 anos equivalia a 9,0% do total da população desse
grupo.
O grupo de vulnerabilidade muito alta, um total de 26.430 pessoas (13,4% do
total). No espaço ocupado por esses setores censitários, o rendimento nominal
médio dos responsáveis pelo domicílio era de R$346 e 72,9% deles auferiam renda
de até três salários mínimos. Em termos de escolaridade, os chefes de domicílios
apresentavam, em média, 4,3 anos de estudo, 82,5% deles eram alfabetizados e
19,3% completaram o ensino fundamental. Com relação aos indicadores
demográficos, a idade média dos responsáveis pelos domicílios era de 40 anos e
aqueles com menos de 30 anos representavam 25,2%. As mulheres chefes de
111
domicílios correspondiam a 23,9% e a parcela de crianças de 0 a 4 anos
equivalia a 11,7% do total da população desse grupo.
112
113
Anexo K
Quadro 3: Relação de questões realizadas pela pesquisadora e respostas emitidas pelas mães.
Mães
Questões
M - A M - B M - C M - D
1. Quando e através
de quem tomou
conhecimento sobre a
deficiência?
Ela mesma começou a perceber que o
filho tinha problemas, comparando com
os mais velhos, aos dois meses teve
uma convulsão que só retornou a
acontecer com quatro anos, depois
dessa constatou - se através de um
eletro um problema, depois disso o
médico da PUC iniciou o tratamento, e
ela não tem feito perguntas desde
então, pois não é de muita conversa.
Até um ano foi tudo normal,
nessa idade segundo a mãe
C-B teve uma diarréia, ficou
internada um mês na UTI e
mais 45 dias no quarto, os
médicos alertaram que não
seria normal, nem cresceria.
No hospital assim que ela
nasceu o médico disse que
foi um “vírus”, acha que foi
falta de oxigênio na hora do
parto, outros médicos
confirmaram isso.
Desde o nascimento
desconfiou que houvesse
algum problema embora o
médico dissesse que estava
tudo normal, embora não
sentasse, nem afirmasse o
corpo. Com um ano C-D teve
uma convulsão levou na
Unicamp e ficou sabendo o
diagnóstico.
2. Desde então o que
passa pela sua cabeça
que não quer calar.
Um pensamento que
vai e volta?
Só pensa que foi a demora em fazerem
a cesárea. Ela não teve dilatação, “ele
nasceu roxinho e demorou para
chorar”.
Teve depressão durante a quarta
gravidez, com medo que acontecesse
a mesma coisa.
Arrepende-se de ter pedido
para Deus levá-la, hoje
percebe como ela está
melhorando.
Qual a causa? Foi minha
culpa?
Por que comigo?
Com a minha primeira filha?
3. Sobre trabalhar
fora. Já experimentou,
gostaria?
O marido não deixa, mas pensa que se
trabalhasse melhoraria as condições
da família porque o marido ganha
pouco e também distrairia sua cabeça,
poderia comprar coisas para ela, por
outro lado também não tem com quem
deixar os filhos principalmente C-A.
Trabalhou na roça quando
pequena até se casar, depois
ficou cuidando da avó do
marido, teve filhos e com o
problema da B nem pensa
em sair de casa, mas se
trabalhasse teria pelo menos
dinheiro para comida, que
tem faltado.
Tinha planos de trabalhar
depois que tivesse filhos, o
nascimento de C. cancelou
os planos de tentativa de
um menino e de trabalhar,
como era muito importante
para ela ter seu espaço,
seus compromissos,
passou a ser revendedora
da Natura.
Entre dezembro de 2004 a
julho de 2005, o marido ficou
desempregado. Uma vizinha
conseguiu trabalho temporário
como balconista em uma loja,
continua até hoje, mas sem
registro pra não perder o
BPC/LOAS. Sem trabalhar só
pensava no futuro da filha. No
horário de trabalho (16 às 23
h) D fica com uma moça, o
marido chega em casa 1 hora
depois que ela sai e também
tem uma vizinha que observa
os cuidados com D.
114
Mães
Questões
M – A M - B M - C M - D
4. A família recebe ajuda de
alguma igreja, ou instituição
filantrópica? Nos momentos mais
difíceis quem socorre?
Não, nunca
recebeu ajuda.
Recebe o
BPC/LOAS,
importante para
comprar as fraldas
e remédios.
Não recebeu, embora
tenha procurado a igreja e
pedido ajuda em
mantimentos.
Não. Nunca
precisou.
Não. Os parentes do casal é que ajudaram na
época do desemprego.
5. Quais as maiores dificuldades
em sua rotina de cuidados com
seu (a) filho (a)?
È muito
cansativo, cuidar
de tudo da casa e
dos filhos. Cuida
da casa enquanto
o filho dorme, mas
fica nervosa,
irritada quase
todos os dias.
Conta com a ajuda
da filha de 13
anos.
Nem reclama de cuidar de
B porque ela é boazinha,
fica quietinha, é só colocá-
la na frente da TV,
passear um pouco que ela
gosta.
Segundo a mãe ela gosta
quando esta briga com os
irmãos, ela sorri com essa
situação.
Estaria melhor se tivesse
dinheiro para comprar o
que tem faltado como
comida, porque não deixa
faltar as fraldas e os
remédios para C- B
A renda familiar fixa é o
BPC/LOAS.
Recebe ajuda
da filha de 13
anos e do
marido, os três
cuidam da C-C,
a rotina foi
incorporada por
todos, está
sentindo dores
nas costas
devido ao
esforço físico de
carregar C-C
que, segundo
ela, está cada
dia mais
pesada.
A falta de transporte adequado, o esforço físico de
carregar a filha. Os cuidados são divididos, não
fica pesado, acha que o pai tem mais paciência
que ela, faz passeios.
6. Já procurou serviços municipais
da Ação Social em momentos de
crise financeira na família? Como
foi?
Não. Procurou e, de vez em
quando passa por lá,
pediu cesta básica e um
carrinho maior ou cadeira
de rodas, isso faz uns dois
anos, até hoje não
recebeu nem visita, só
falam que tem que
aguardar.
Não, nunca
precisou.
No período do desemprego do marido procurou
para pedir fraldas, recebeu fraldas para recém
nascido, quando disse que o tamanho estava
errado ouviu que só tinha aquele tamanho, que
tentasse trocar com alguém ou em algum
comércio. Em outra ocasião procurou para
conseguir um aparelho auditivo, mas se passaram
dois anos nem foi mais recomendado o uso pela
médica.
115
Mães
Questões
M - A M - B M - C M - D
7. E serviços de
saúde, como
médicos e dentistas?
Só pediatra de vez em quando, é
muito demorado. Os filhos nunca
fizeram tratamento odontológico.
Demora horas para ser atendida
no pronto Socorro, não levou a
filha para tratamento
odontológico, está aguardando
uma consulta há três meses
com um ortopedista por estar
sentindo dores nas costas.
Deixou a filha com a vizinha que
não trocou a fralda durante o
período que cuidou dela, ela
ficou assada, sem poder
freqüentar a instituição.
A família nunca fez tratamento
odontológico.
Mudou-se de São Paulo
para cá em março de 2005,
lá tinha convênio médico da
firma em que ele trabalhava.
Na primeira semana em que
tinham se mudado para cá
C-C teve febre alta, não
conseguiram médico,
resolveram pagar um
convênio para ela, pois
perceberam que não daria
para contar com os serviços
de saúde municipal.
Como faz acompanhamento na
Unicamp, só utiliza o Posto de
Saúde do bairro em extrema
urgência, o pediatra é o mesmo
que dizia que C-D não tinha
problemas. Não confia nele.
Hoje ele dá atenção, passando-
a na frente, (desconhecia esse
direito)
8. E escolas ou
creches municipais
você procurou ?
Como foi isso? Por
que não procurou?
.
. Chegou a levá-lo na EMEI
quando ele tinha cinco anos,
porque achava ele esperto, e que
tinha condição de aprender um
pouquinho, porém, a diretora
recusou-se a matriculá-lo, disse
que mesmo ele andando, não
daria para ela assumir a
responsabilidade de matriculá-lo
porque trocar fraldas, dar
remédios, não fazia parte da rotina
daquela escola, que ela dava
preferência para crianças normais,
pediu para que a mãe não ficasse
com raiva dela e indicou a
instituição especializada.Na
opinião da mãe a diretora é chefe
sabe o que faz e, é ela quem
manda.
Ficou desanimada.
Nunca procurou. O médico que
cuidou de C-B alertou para seu
problema, que não falaria, nem
andaria e nem mesmo teria
crescimento normal.
A diretora da EMEI onde um
irmão estuda comentou na festa
da Páscoa que a B es
melhorando muito e que, assim
que ela andar terá sua vaga,
pois, já está garantida.
Inclusive disse para a família
não retornar para o Estado de
Minas Gerais, devido ao
desemprego do marido, que
aqui o que ela pudesse fazer
para ajudar ela faria, deu um
ovinho de Páscoa para C-B, a
mãe a considera muito legal.
Pensou em procurar uma
escola, mas ficou com medo
da filha ser mal tratada,
relatou ter ouvido muitas
histórias sobre maus tratos
a crianças com deficiência.
Ouviu de uma médica que
em certa escola deixavam
as crianças em quartos
escuros, depois disso ficou
insegura e prefere que a
filha fique só com ela para
ter certeza que ninguém a
tratará mal.
A médica que acompanha C-D
Deu uma carta encaminhando-a
para ser matriculada em uma
EMEI, a mãe mora próxima a
escola, o primeiro contato foi
com a secretaria que, por conta
própria, disse que naquele caso
só a APAE receberia a criança,
a mãe insistiu em falar com a
diretora que prontamente a
atendeu e francamente disse
que precisaria da colaboração
dela ajudando no processo de
inclusão, desde então só
percebe progressos. Hoje C-D
vai para a escola com a mãe
segurando-a pelas mãos.
116
Mães
Questões
M - A M - B M - C M - D
9. Você passou por
experiências que
desrespeitaram seus
direitos. Você
reclamou, ou costuma
reclamar quando isso
acontece em sua
vida?
Não, porque pensa que a cruz é
dela e tem que carregar sozinha
e também não adianta pedir
porque não recebe nada
mesmo.
Tem insistido no Posto de Ação
Social, pedindo cesta básica e
cadeira de rodas, toda às vezes
ouve a mesma resposta, que deve
aguardar, uma amiga comentou que
era melhor desistir disso, mas ela
não vai, vai continuar a ir atrás do
que necessita.
Quando se sente prejudicada vai
atrás de seus direitos,
principalmente no que se refere à
C-C., sente dificuldades em
lanchonetes e transporte coletivo,
pela não adaptação à cadeira de
rodas, embora dependa pouco
porque tem carro, se outras mães
precisassem de sua ajuda para
uma reivindicação ajudaria.
Reclama na hora, faz
perguntas para se
informar, e vai atrás do
que acha melhor para a
vida da sua família e da
filha.
10. Participa de
alguma Sociedade
Amigos de Bairro ou
outra associação que
reivindica melhorias
para a comunidade?
Não se envolve se considera
desanimada, no bairro não
isso.
Nunca ouviu falar disso.
Nunca foi atrás de reivindicar o
que não usa, não sentiu
necessidade.
Não e acha que seu bairro
nem tem.
11. Percebe
diferenças em seu (a)
filho (a) nos dias em
que faz as terapias?
Ele dá sinais que
gosta?
Percebe que ele está
progredindo?
Fica alegre quando a perua,
quando vai para a fisioterapia,
fica mais tranqüilo após as
terapias, mais feliz.
Tem andado melhor, faz tchau,
brinca do jeito dele com os
irmãos.
Percebe e conversou com as
terapeutas sobre o fato de a filha
repetir movimentos terapêuticos em
casa, fica mais tranqüila, sorri,
demonstra satisfação, o que quer e
o que não quer.
Acredita que ela tem recuperado
bem os movimentos, se fosse todos
os dias poderia ser mais rápida a
recuperação, conhecendo mais
pessoas, ouvindo mais conversas.
Um médico disse que sons
diferentes estimulariam o
desenvolvimento de C-B.
Percebe que fica mais relaxada,
dorme melhor, aparenta maior
bem estar.
Não gosta da instituição ,
relata que quando a perua
pára na porta do refeitório,
C-D começa a demonstrar
irritação, fica agitada, isso
não ocorre na entende
que C-D gosta da escola ,
fica tranqüila.
Acha que o trabalho da
instituição é bom, mas que
só ele não teria promovido
o desenvolvimento da
filha, do jeito que vem
ocorrendo.
117
Mães
Questões
M - A M - B M - C M - D
12. Se além dos
atendimentos na
Instituição ele
freqüentasse uma
escola, o que você
acha que representaria
para ele?
Seria melhor, antes de
freqüentar a instituição era
parado, triste, agora manifesta
alegria, emite sons, acha que
se desenvolveria mais.
Para ela na escola seria bom,
às vezes poderia aprender
alguma lição, ler algo além de
ser mais fácil para fazer
amigos.
Acredita que ela tem recuperado
bem os movimentos, todos os
dias com outras pessoas poderia
ser mais rápida a recuperação,
conhecendo mais pessoas,
ouvindo mais conversas. Um
médico disse que sons
diferentes estimulariam o
desenvolvimento de C-B.
: Teria mais contato com
outras crianças, o que
considera fazer falta, mais
estímulos, desenvolveria mais
rápido, veria outras
amiguinhas, pois se
relaciona com os amigos e na
instituição.
Já acontece com C-D, o que
tem sido uma alegria observar
os progressos, não tem como
falar o tanto que sua filha se
desenvolveu. Percebe o
quanto as crianças ajudam,
baba muito pouco, às vezes
tenta por a mão na boca “para
limpar a baba”.
Ficou mais independente,
considera importante a
interação com outras crianças
e adultos. Percebe que a filha
está mais disposta para andar
(com apoio de alguém).
13. A lei diz que todas
as crianças devem
freqüentar escolas,
isso inclui seu filho (a).
Já conversou sobre
isso com os
terapeutas? Perguntou
se poderiam
encaminhar seu filho?
Não abre a boca para falar
disso”. Acha que o filho é
parado perto das crianças que
vão para a classe especial da
Instituição, relata que as outras
crianças são mais espertas,
acha que não vale a pena falar ,
tem medo de ouvir alguma
coisa que a chateie.
Não toca nesse assunto, acha
que não é importante agora, nem
pensa em falar com as
terapeutas.
Sim, quando matriculou C-C,
perguntou se ela passaria por
outros atendimentos e
freqüentaria a escola ouviu
que não seria possível, que “o
lugar dela é o projeto
Ambulatório”, não questionou
mais.
Procurou por conta própria,
pela orientação da médica,
não consultou a instituição.
A instituição nunca falou sobre
essa possibilidade.
118
Mães
Questões
M - A M - B M - C M - D
14. Você pensa em ir
atrás desse direito para
teu filho (a)?
Por quê?
Não, está bom na instituição,
seria melhor ter atendimento
mais vezes durante a semana.
Isso ela pediu mas falaram
que não dá e que por isso elas
têm que participar das
reuniões, embora não fiquem
sabendo.
E também porque ficou
arrasada com a diretora, hoje
não pensa mais em voltar a
procurar.
Nunca pensou, já tem a
instituição.
Acha que existe muita rejeição, é
lei, mas na prática não se aceita,
tem uma colega que o filho é
autista e a escola não aceitou,
muitas amigas entraram na justiça
para conseguir esse direito e isso
não garante bom atendimento, por
isso prefere a filha em casa sob
seus cuidados e na instituição.
Já foi e está muito feliz
com os resultados, o
progresso está sendo
enorme. A instituição
não acompanha o
trabalho junto à unidade
escolar.
15. Você considera que
os terapeutas orientam
vocês mães, sobre
como lidar, encarar ou
resolver problemas
frente à deficiência?
Como?
Só a fisioterapeuta conversa,
para ela as outras (fono, TO,
Profª de natação) são
caladonas.
Sim, explicam. Ela comenta o que
ela faz em casa, e as terapeutas
explicam o que ela faz nas
terapias.
Ajudam quando precisa, doam
cesta básica.
È informada de como fazer em
casa os exercícios, às vezes
chamam para mostrar o modo
correto, comunicam qualquer
problema.
Considera atenciosos.
Não percebeu
orientação
nem atenção dos
profissionais da
instituição, acha que
são frios. Pensa que
tem mães que não
trabalham e poderiam
fazer mais movimentos
em casa para a criança
desenvolver mais
rápido.
16. Existem atividades
em grupo de mães para
discussão de
problemas, sentimentos,
leis e direitos,
organizados pela
Assistente Social ou
Psicóloga?
De vez em quando tem uma
reunião, dão iberdade para
falar mas é pouca.
As mães ficam no refeitório,
seria bom ver o que elas
fazem com C-A para ela fazer
em casa, mas não pode. Não
gosta de fazer a Oficina, acha
a professora “folgada”, ela
não sabe explicar, não tem
paciência. Ela (professora)
está doente, desde o ano
passado.
Não gosta de artesanato, se
tivesse preferiria participar das
reuniões, acha mais importante,
nunca foi convidada.
Participa da Oficina de Artesanato,
não participa de grupos pelo
menos nunca participou, também
não fala de seus sentimentos de
culpa acha que toda mãe tem
isso, no começo falaram que ela
tinha que soltar mais a C-B, mas
ela não conseguiu, sabe que ela
gosta de ficar sempre com ela, a
dorme no mesmo quarto, do seu
lado.
Não percebe nenhum
trabalho nesse sentido.
Nunca foi informada
pessoalmente, nem por
cartaz, acha importante
reuniões desse tipo.
119
Mães
Questões
M - A M - B M - C M - D
17. Há alguma situação ou regra
aqui na instituição que você acha
que poderia mudar? Já fez
alguma reclamação ou crítica?
Acha meio esquisito, mas
fica quieta, pensa que está
bom assim.
Acha que está tudo bem,
que é muito bom estar na
instituição e que, desde o
primeiro dia foi bem tratada,
fez matrícula numa sexta-
feira e na segunda C-B já
começou a freqüentar.
Acha que funciona muito
bem.
Pensa que deveriam
incentivar mais as mães a
correr com as crianças e não
desanimarem, sabe que o
atendimento é pouco devido
ao número de pessoas que
precisam e que no município
não tem outro lugar, mas
que as mães estão
presentes deveriam
aproveitar melhor esse
tempo que elas ficam
paradas.
18. Diante das suas dificuldades,
se você pudesse pedir algo para
a prefeitura agora, o que seria?
Manter médicos e remédios
nos Postos de Saúde.
Fraldas e cesta básica.
Fazer valer as leis nas
escolas, colocando
especialistas para lidar bem
com os deficientes, rampas e
adaptação nos transportes
coletivos.
Transporte adaptado acha
que o mais difícil é carregar
a filha, que eles vão ficando
pesado e é desanimador sair
com eles, acha que isso faz
com que muitos pais não
saiam com seus filhos nem
para tratamento.”
19 – Você já foi convidada para
participar de reuniões com
autoridades para discutir
problemas referentes às
condições dos deficientes no
município?
uma vez e participou
porque acha importante,
gostou de ter participado, se
tivesse mais ela iria. Levou
o filho, ele não atrapalhou.
Não foi convidada. Não se lembra que isso tenha
acontecido.”
Não, acha que falta esse
estímulo para as mães.
120
Anexo L
FONTE: MEC / INEP 2005
RESULTADOS FINAIS DO CENSO ESCOLAR DE 2005 - MUNICÍPIO DE SUMARÉ
Os resultados referem-se à matrícula inicial na Creche, na Pré-Escola, no Ensino Fundamental (Ensino Regular), no Ensino Médio (Ensino Regular), na Educação Especial e na
Educação de Jovens e Adultos das redes estadual, federal, municipal e privada e o total de matrícula nestas redes de ensino.
Matrícula Inicial
Ensino Fundamental (Regular) Educação Especial
Educação de Jovens e
Adultos (Supletivo
presencial)
Educação de Jovens e Adultos
(Supletivo semi-presencial)
Dependência
Administrativa
Creche Pré-Escola
Educação
Especial
(Incluídos)
Total
1ª a 4ª
série
5ª a 8ª
série
Ensino
Médio
(Regular)
Educação
Profissional
- Nível
técnico
Total
Funda-
mental
Total
Funda-
mental
Médio Total
Funda-
mental
Médio
Total 836
7.582
374
32.809
17.272
15.537
9.570
247
434
95
2.888
1.080
1.808
788
447
341
Estadual 0
0
144
21.674
8.577
13.097
8.426
0
15
15
2.497
785
1.712
788
447
341
Municipal 516
7.211
219
9.840
8.031
1.809
900
107
0
0
176
176
0
0
0
0
Privada 320
371
11
1.295
664
631
244
140
419
80
215
119
96
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