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Mariana Taboada
COMUNIDADES VIRTUAIS E A METÁFORA DO CIBERESPAÇO:
das esperanças na Internet ao individualismo em rede
Rio de Janeiro
2005
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Mariana Taboada
Dissertação de mestrado apresentada ao Progra-
ma de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura
da Escola de Comunicação da Universidade Fede-
ral do Rio de Janeiro como parte dos requisitos
necessários à obtenção do grau de Mestre.
Orientador:
Prof. Dr. Paulo Roberto Gibaldi Vaz
COMUNIDADES VIRTUAIS E A METÁFORA DO CIBERESPAÇO:
das esperanças na Internet ao individualismo em rede
Rio de Janeiro
2005
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Dissertação submetida ao corpo docente da Escola de Comunicação da Universi-
dade Federal do Rio de Janeiro UFRJ como parte dos requisitos necessários à
obtenção do grau de Mestre.
Aprovada por:
_________________________________________
Professor Doutor Paulo Roberto Gibaldi Vaz (Orientador)
_________________________________________
Professor Doutor Francisco Menezes
_________________________________________
Professora Doutora Fernanda Bruno
_________________________________________
Professor Doutor Henrique Antoun (Suplente)
FOLHA DE APROVAÇÃO
Mariana Taboada
COMUNIDADES VIRTUAIS E A METÁFORA DO CIBERESPAÇO:
das esperanças na Internet ao individualismo em rede
Rio de Janeiro
2005
Taboada, Mariana
Comunidades virtuais e a metáfora do ciberespaço: das espe-
ranças na Internet ao individualismo em rede / Mariana Taboada
— Rio de Janeiro, 2005.
Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura) — Univer-
sidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, Escola de Comunicação
— CFCH, 2005.
Orientador: Paulo Roberto Gibaldi Vaz
1. Determinismo tecnológico e comunicação. 2. Internet e comu-
nidades virtuais. 3. Comunicação - teses. I. Vaz, Paulo Roberto Gibaldi.
II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Escola de Comunicação.
Pós-graduação em Comunicação e Cultura. III. Título.
5
Ao Lu, pelo apoio, carinho, compreensão,
paciência e estímulo do início ao fim dessa
jornada. Pelas muitas horas dedicadas à
discussão sobre a Internet e seu potencial.
6
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a todos aqueles que contribuíram para a realização deste trabalho:
Ao querido professor e amigo PAULO VAZ, que desde a minha graduação me inquietou com
suas questões, que me estimulam ainda hoje;
Aos MEUS PAIS pelo apoio, força e torcida;
À minha IRMÃ, que dividiu os mesmos momentos de angústia;
À FERNANDA COSTA E SILVA pela ajuda em todo e qualquer momento;
Aos meus queridos parceiros BRUNO e JOSÉ que promoveram muitos momentos de des-
contração;
A todos os meus amigos que quiseram participar desse trabalho: FERNADA JARDIM, TIAGO,
BIA, TATU e ALEXANDRE.
Aos meus companheiros da JORGE ZAHAR que souberam compreender como esse mestradro
era importante pra mim. Em especial à MARIANA, que nunca deixou de me incentivar.
À minha fiel amiga ANGELA. Sou muito grata pela preocupação e cuidados de mãe que
tem comigo.
À VALÉRIA, sempre disposta a ajudar.
Ao CNPq, pelo apoio.
7
RESUMO
TABOADA, Mariana. Comunidades virtuais e a metáfora do ciberespaço: das esperanças na
Internet ao individualismo em rede. Orientador: Prof. Paulo Roberto Gibaldi Vaz. Rio de Janeiro:
UFRJ/ECO; CNPq, 2005. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura)
Esta dissertação analisa a questão do determinismo tecnogico articulado ao
surgimento de meios de comunicação, em especial a Internet, e a transformações
na cultura e sociedade. A partir de uma descrição das características técnicas do
meio de comunicão em questão, e de um levantamento das expectativas criadas
em relação às tranformações que ele poderia causar na sociedade, busca-se de-
monstrar como um racícionio determinista é constituído. As a popularização
da Internet, a realidade vivida é diferente, e os impactos previstos por estudiosos
do meio não ocorreram com o escopo estimado, principalmente no que tange
à sociabilidade. A metáfora do ciberespaço entra em crise ao mesmo tempo que
cresce o individualismo em rede.
Palavras-chave: determinismo tecnológico, Internet, comunidades virtuais e
sociabilidade.
8
ABSTRACT
TABOADA, Mariana. Virtual communitues and the methafor of cyberspace: from hopes on the
Internet to the net individualism. Orientador: Prof. Paulo Roberto Gibaldi Vaz. Rio de Janeiro:
UFRJ/ECO; CNPq, 2005. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Cultura)
This work presents an analysis of the tecnologic determinism in relation to the media
emergency, in especial the Internet, and the culture and society transformations. By
describing the techniques characteristics of the media in question, and with a survey
of the expectancy on the transformation that it would be caused on the society, this
work demonstrates how a deterministic line of thought is constituted. After de In-
ternet popularization, the reality is different, and the impacts antecipated by thinkers
didn´t occurr with the goal estimated, principally on the sociability. The methafor
of cyberspace is in crise on the same moment that grows the net individualism.
Key words: tecnologic determinism, Internet, virtual communuties and socia-
bility.
9
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIG. 1: Espaço vazio no Alpha World.
FIG. 2: Espaço sendo preenchido no Alpha World.
FIG. 3: Rua asfaltada e prédio de quatro andares (Alpha World).
FIG. 4: Interface gráfica do Alpha World.
FIG. 5: Página inicial do Orkut.
FIG. 6: Página pessoal (Orkut).
FIGS. 6 e 7: Cadastro para a composição de "perfil" (Orkut).
FIGS. 8 a 13: Fotos pessoais (Orkut).
FIGS. 14 e 15: Janela de "Amigos" (Orkut).
FIGS. 16: Ranking de amigos (Orkut).
FIGS. 17 e 18: Ícones de confiável, "legal" e sexy para os amigos (Orkut).
FIGS. 19 a 22: Janelas de "Testemunhos" (Orkut).
FIG. 23: Janela de “Scraps” (Orkut).
FIG. 24: Divisão das comunidades (Orkut).
FIG. 25 a 44: Comunidades (Orkut).
FIG. 45: Comunidade da Escola de Comunicação da UFRJ — ECO (Orkut).
FIG. 46: "Fórum" da comunidade da Escola de Comunicação da UFRJ (Orkut).
FIG. 47: "Eventos" da comunidade da Escola de Comunicação da UFRJ (Orkut).
FIG. 48: Janela de "Comunidades" (Orkut).
FIGS. 48 e 49: Janela de "Report as a bogus" (Orkut).
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 12
1 O DETERMINISMO TENOLÓGICO E O SURGIMENTO DE MEIOS DE COMUNICAÇÃO 16
1.1 Determinismo tecnológico: constante articulação entre
meios de comunicação e mudança cultural 17
1.2 A causalidade tecnológica na sociedade e o surgimento
de outros meios de comunicação 21
1.2.1 Fixação da informação 21
1.2.2 Capacidade de reprodução 22
1.2.3 Distanciamento espaço-temporal dos atores da comunicação 22
1.2.4 Habilidades e formas de conhecimento necessárias para o uso da cnica 23
1.3 Gutenberg e a revolução da impressão 23
1.4 O surgimento do telégrafo
28
2 INTERNET: ESPERANÇAS E EXPECTATIVAS
33
2.1. Rede, hipertexto e link: a democratização da informação 34
2.1.1 Internet: a comunicação todos-todos 41
2.2. Multimídia e interface gráfica: "ciberespaço" como um lugar
alternativo de sociabilidade e entretenimento 47
3 UM PANORAMA ATUAL DA INTERNET 61
4 COMUNIDADES VIRTUAIS E A SOCIABILIDADE NA REDE 73
4.1 Alpha World: mundo de fantasia como promessa de sociabilidade na rede 76
4.1.1. Interface e interação no Alpha World 79
11
4.2 Orkut: uma comunidade on-line diferente 82
4.2.1 As características técnicas do Orkut 84
4.2.1.1 Nome da pessoa, foto e perfil 85
4.2.1.2 Álbum de amigos, situado no canto superior direito 89
4.2.1.3 As comunidades 94
4.2.2 O tempo e o espaço na interação no Orkut 102
CONCLUSÃO 106
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 111
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR 115
12
INTRODUÇÃO
Esta dissertação trata da queso do determinismo tecnológico articulado ao
surgimento de meios de comunicação, em especial a Internet, e às transformões
na cultura e sociedade. A Internet surgiu com nalidades militares e acadêmicas,
mas em pouco tempo tornou-se uma importante ferramenta de comunicão
para a sociedade de uma forma geral. Rapidamente, teóricos da comunicação e
interessados pelo assunto fizeram uma série de previsões esperançosas acerca das
mudaas que a Internet poderia causar no cotidiano das pessoas, principalmente
em relação à sociabilidade e à formação e organização em comunidades. Essas
apostas foram estimuladas pelas peculiaridades cnicas características do meio,
como organizão em rede e capacidade multidia.
Pom, após 10 anos de popularizão da Internet, as expectativas criadas, em
muitos sentidos, começam a ser desfeitas. Isso não quer dizer que tudo o que
fora antecipado e não aconteceu não possa vir a acontecer. Mas o escopo das
mudaas que de fato ocorreram foi menor do que as perspectivas anteriores
apontavam. A sociedade se apropriou, sim, da Internet, que hoje está totalmente
inserida no contexto social, político, econômico e cultural. Pom, o uso que dela
13
se faz tem características próprias e muitas vezes não previstas quando o meio de
comunicação em questão surgiu.
O desenvolvimento de um pensamento determinista é comum quando um novo
meio de comunicação é inventado e colocado em uso pela sociedade. Esse racio-
nio é articulado da seguinte forma: a partir das caractesticas técnicas de um
meio, prevêm-se as transformões que serão produzidas na sociedade, qual será o
seu uso, como será apropriado pelas pessoas e de que forma agirá sobre a cultura.
Esse é o tema do catulo 1, O Determinismo Tecnológico e o Surgimento de
Meios de Comunicação”, que ainda inclui um apanhado histórico da invenção
de outros dois meios: a prensa e o tegrafo. Esses exemplos servem para ilustrar
que as esperaas e expectativas criadas em torno da Internet ocorreram tamm
com outros meios de comunicão.
O capítulo 2, “Internet: Esperanças e Expectativas”, aborda a questão do surgi-
mento da Internet em si e de que forma o pensamento foi articulado em cima de
seu diferencial técnico. Por meio de uma descrição dessas caractesticas técnicas,
como organização em rede, arquitetura aberta, linguagem hipertextual, capaci-
dade multimídia, interação via interfaces etc., mostra-se como muitos estudiosos
apostaram em profundas transformações sociais provocadas pela Internet. Entre
as apostas feitas, destacam-se o seu potencial democratizador, a possibilidade de
estabelecer relacionamentos em um ambiente terceiro de sociabilidade o mais
atrelado ao espaço físico, o cater libertário do meio, a criação deltiplas per-
sonalidades (máscaras) por um único indivíduo e a formão de comunidades
virtuais por interesse. Para a reunião desses dados, foram pesquisados textos, desde
1993 — ano de surgimento da World Wide Web — a2000, que demonstram a
enxurrada de previsões prematuras e esperançosas em relação à forma pela qual a
Internet seria apropriada pelo homem.
14
O capítulo 3, “Um Panorama Atual da Internet”, apresenta uma rie de dados
de como a sociedade vem usando o meio de comunicão estudado. Baseada
em pesquisas realizadas em países desenvolvidos por possuírem uma massa
representativa de usuários — por entidades respeitadas como a UCLA (Surveying
the Digital Future), Telecom brinica e PEW Institute (Internet and American Life
Project), delineia-se uma visão atualizada da Internet. Fica nítido nesse capítulo
que, ao contrário do que muitos esperavam, o uso da Internet o levou a um
isolamento social e nem à decancia da interação social e familiar. o houve
uma diminuição da interação face-a-face e nem estas foram substitdas por inte-
rações on-line como se havia estimado. Entre outros dados, mostra-se também que
a formação de comunidades voltadas para o jogo e a representação de papéis não
ocorreu da forma esperada. Cabe ressaltar que não se pretende com esse capítulo
traçar meramente uma oposição do que se previu que iria ocorrer e o que es
acontecendo de fato. O objetivo é identificar como um racionio determinista
pode camuflar e obscurecer o que vi a suceder no futuro.
No quarto catulo, “Comunidades Virtuais e a Sociabilidade na Rede”, é feita
uma análise de dois tipos de comunidades virtuais bem diferentes. A primeira é
do Alfa World, mundo virtual com interface gfica que tem como objetivo pro-
mover a sociabilidade entre pessoas desconhecidas na rede. O estudo do Alpha
World é interessante porque se acreditava que esse tipo de comunidade se tornaria
mbolo da sociabilidade em rede que se consolidaria no futuro. A possibilidade
de criar scaras, viver diversas personalidades, conhecer pessoas novas, construir
o ambiente on-line em que se vive e muitos outros apelos zeram com que se
apostasse no seu triunfo. A segunda é do Orkut, comunidade virtual de muito
sucesso atualmente, sobretudo no Brasil, cuja organização e objetivo são bastante
diferentes que as do Alpha Wolrd. O Orkut é baseado em relões sociais que já
existem do espo físico e são reforçadas por meio de interação on-line.
15
Na conclusão deste trabalho, destaca-se que a análise das duas comunidades e o
apontamento das peculiaridades de cada uma são muito úteis para a compreensão
de como pode ser diferente a realidade que hoje se vive com o uso da Internet
principalmente na forma como ela modifica a sociabilidade das previsões
realizadas no passado por meio de um pensamento determinista.
16
A popularização da Internet começou cerca de dez anos. Durante esse tempo,
foram muitas as apostas e expectativas criadas ao seu redor, e boa parte demasiada-
mente precipitada e utópica. As esperanças e as múltiplas possibilidades de uso foram
superestimadas por muitos estudiosos que atuaram como futurólogos e tentaram
antecipar como seria a apropriação desse novo meio de comunicação pela socie-
dade. Da mesma forma, outros, de pensamento mais pessimista, apontaram diversos
caminhos da relação homem/computador/Internet que de fato não se abriram.
Das apostas mais freqüentes, destacam-se: o potencial democratizador, uma vez
que o acesso à informão tornou-se menos restrito e mais barato; a possibilidade
de estabelecer relacionamentos em um ambiente terceiro de sociabilidade, o
mais atrelado ao espaço físico. Um ambiente diferente do trabalho e da casa, onde
o seria necesrio desempenhar os pais vividos no cotidiano e no qual seria
possível encontrar pessoas para além da obrigação. Daí origina-se outra aposta: o
caráter libertário da Internet, pois a tela do computador permite que um único
indivíduo crie múltiplas personalidades (scaras). Além disso, apostou-se alto
1
O DETERMINISMO TECNOLÓGICO E O SURGIMENTO
DE MEIOS DE COMUNICAÇÃO
17
na formão de comunidades virtuais por interesse nas quais seria viável filtrar
quem encontrar e quem não encontrar e onde a limitação espacial não exis-
tiria e no entretenimento em grande escala, espaço onde haveria a possibilidade
de participar de jogos interativos e de fantasia extremamente sedutores.
Após algum tempo de uso e apropriação do meio pela sociedade, as expectativas
criadas começam de certa forma a ser desfeitas. Isso não quer dizer que tudo o
que fora antecipado e não aconteceu não possa vir a acontecer. Porém, o escopo das
mudanças que de fato ocorreram não conflui na direção das perspectivas anteriores
criadas por teóricos de comunicação e por outros interessados no assunto.
É interessante notar que o tipo de pensamento constrdo para antecipar o futuro
da Internet não é novo. Ao contrário, ele é bastante antigo. E nem experiências
passadas que emergiram com o surgimento de outros meios de comunicão
como a prensa e o telégrafo foram capazes de servir de aprendizado. Em
outras palavras, é muito importante ficar extremamente atento para não criar ex-
pectativas prematuras diante do que é novo, desconhecido, e onde a ação humana
é determinante.
1.1 Determinismo tecnogico: constante articulão entre
meios de comunicação e mudança cultural
O racionio em torno da Internet e de outros meios de comunicão é, em geral,
articulado da seguinte maneira: a partir das características cnicas de um determinado
meio, se prevê/anteque tipos de impactos serão causados na sociedade, qual será o
seu uso e como o homem se apropriará dele. Para tal antecipação, o pensamento faz
uma alise das características do meio, contrapondo seu diferencial cnico com outros
meios de comunicação existentes, e, a partir daí, infere-se quais mudanças culturais ele
18
pode provocar. Pensam-se as possíveis mudaas culturais a partir da maneira pela qual
os meios de produção e circulação de formas simbólicas estão sendo produzidos.
No entanto, esse raciocínio, ao contrario, não abrange o fato de que a mídia pre-
cisa ser vista como um sistema mais amplo e em permanente mudança. Cumpre
levar em consideração não apenas o surgimento de um meio técnico, mas todos
os elementos diferentes que participam de um processo comunicacional.
Os problemas levantados por esse tipo de abordagem exigem algum
debate (ver p.259), assim como as declarações de que a Internet e
seu potencial representam uma "agência de democratização". Não é
posvel nessa altura de sua história concluir que, pela facilidade de
acesso e pela transformação "a partir de baixo", ela desempenhará
um papel renovador a longo prazo. Alguns críticos até temem que a
Internet mine todas as formas de ‘autoridade’, afete negativamente o
comportamento e ameace a segurança individual e coletiva. Alguns
especialistas em estudos da mídia têm posto em evidência de modo
correto o que chamam de ‘debates da mídia’. Eles englobam temas
específicos a longo prazo (BURKE, 2004, p.16).
É comum, quando o surgimento de um meio de comunicação, ou quando
o advento de alguma novidade técnica no cotidiano da sociedade, serem feitas
previsões e projeções dos impactos que ele provocará. uma tendência muito
forte de antecipar acontecimentos, o que muitas vezes distorce uma análise mais
crítica do meio.
Com o desenvolvimento da comunicação elétrica, começada com
o telégrafo, surgiu uma percepção de mudança iminente e imediata.
Os debates na mídia na segunda metade do século XX estimularam
a reavalião, tanto da inveão da impressão gráfica, quanto de
todas as outras tecnologias que foram tratadas no princípio como
maravilhas. Geralmente aceita-se que as mudanças na mídia tiveram
importantes conseqüências culturais e sociais. Controversos o a
19
natureza e o escopo dessas conseqüências. o elas primordialmente
políticas ou psicológicas? Pelo lado político, favorecem a democracia
ou a ditadura? A “era do rádio” foi não somente a era de Roosevelt
e Churchill, mas também de Hitler, Mussolini e Stálin. Pelo lado
psicológico, a leitura estimula a empatia com os outros ou o isola-
mento em um mundo particular? A televisão ou “a rede”aniquilam
ou criam novos tipos de comunidades nas quais a proximidade
espacial não é mais importante? (BURKE, 2004, p.23).
Com a Internet não foi diferente. Partindo de um conhecimento adquirido anterior-
mente, tricos da comunicação analisaram como eram a sociedade e o indivíduo
para que pudessem ser transformados por uma tecnologia. Esse conhecimento
histórico baseava-se nos efeitos que ao longo do tempo a cultura sofrera com a
inserção dos meios de comunicão de massa no cotidiano das pessoas. Como o
racionio sobre os efeitos do meio na cultura varia de acordo com o observador,
recorria-se a uma comparação e a uma atribuição de valores proporcionais entre
os meios de comunicação de massa e o diferencial técnico da Internet.
Acreditava-se que em pouco tempo a Internet se tornaria um meio hegemônico.
Ou seja, que o seu uso iria substituir outros meios de comunicação. Por exemplo,
o conhecimento não precisaria ser adquirido em livros, que em geral o o
baratos e ocupam espaço. Com a Internet seria possível encontrar qualquer in-
formação desejada. Para os que procurassem entretenimento, a Internet seria um
prato cheio, uma vez que ela poderia proporcionar a o sonhada interatividade. A
televisão deixaria de ocupar uma posição central no lazer de muitas famílias graças
às maravilhas proporcionadas por esse novo meio, que para muitos era superior
aos outros existentes por promover um entretenimento interativo.
Esse tipo de previo era de alguma maneira compreensível porque a Internet
nasceu como um meio de comunicação que englobava muitos outros meios.
20
Como assim? A possibilidade de convergir várias mídias, tendo digitalizado em
sua rede todo o conhecimento, mesclando sons e imagens de qualidade nunca
vista, permitiu que se acreditasse numa predominância da Internet como meio
de comunicação na vida social.
A idéia de uma causalidade tecnológica originou teorias sobre dia e cultura a
partir da década de 50 do século passado. Marshall McLuhan defendia a centralidade
da mídia ao identificar características específicas do meio, independentemente das
organizões provedoras da emissão das mensagens, de quem as usava e com que
objetivo usavam. Da sua famosa frase “o meio é a mensagem”.
Numa cultura como a nossa, há muito acostumada a dividir e
estilhaçar todas as coisas como meio de controlá-las,o deixa, às
vezes, de ser um fato chocante lembrar que, para efeitos pticos
e operacionais, o meio é a mensagem. Isto apenas significa que as
conseências do meio — ou seja, de qualquer uma das extensões
de nós mesmos constituem o resultado do novo estao intro-
duzido em nossas vidas por uma nova tecnologia ou extensão de
s mesmos (MCLUHAN, 4
a
ed, p.21).
Muito comum, porém, diante da construção de um pensamento ou teoria sobre
o surgimento de um meio de comunicação é a atitude de diversos tricos de
se eximir do papel de determinista tecnológico. Muitos afirmam que não eso
construíndo um raciocio dessa natureza. O que se percebe, entretanto, ao se
pensar sobre um novo meio de comunicação que surge é que há a formulação de
um pensamento determinista, no qual o diferencial tecnogico do meio mascara
a forma como a cultura, a cnica e o pensamento serão relacionados.
Um pensamento determinista desse tipo em geral articula dois agentes: a natureza
e os efeitos que um novo meio de comunicação irá provocar. Segundo Paulo
21
Vaz, ao se levar em conta a causalidade intrínseca a esse processo, ca nítido
que um elemento está sendo excluído nesse raciocínio. Consideram-se apenas
quem age, o poder de ação do agente e as conseqüências que trarão, ignorando
o fato de que as tecnologias o capazes de modicar aquilo sobre o qual o
pensamento se aplica.
1.2 A causalidade tecnológica na sociedade e
o surgimento de outros meios de comunicão
Segundo John B. Thompson, os aspectos técnicos o capazes de obscurecer o fato
de que o desenvolvimento de um meio de comunicação reestrutura os modos
pelos quais os indivíduos se relacionam e altera a forma como o conteúdo sim-
lico é produzido e intercambiado. Os indivíduos fazem uso de um meio técnico
para produzir e transmitir formas simbólicas, o que fortalece a tendência de análise
do meio a partir das inovações técnicas que ele possui, principalmente quando se
pensa a potencialidade da cnica a partir dos seguintes atributos:
.
Fixação da informão;
.
Capacidade de reprodução;
.
Distanciamento espaço-temporal dos atores da comunicão;
.
Habilidades e formas de conhecimento necessárias para o uso da técnica.
1.2.1 Fixação da informação
O grau da xão da informação em uma comunicação depende do meio uti-
lizado. Na interação face-a-face, por exemplo, o grau de fixação é baixíssimo
porque o registro das informações depende da meria de seus atores. Em outros
22
casos, como na pintura, a escrita em papel ou pergaminho, impressão e gravação,
o grau de xão é alto. Além disso, é importante considerar a facilidade do meio
em permitir alterações nos registros já feitos. Por exemplo, um papel escrito a
lápis é muito mais suscetível de sofrer alguma modicação do que um desenho
entalhado em uma pedra.
1.2.2 Capacidade de reprodução
Esta é a capacidade de fazer cópias de determinada forma simbólica. A reprodução
de algo entalhando em uma pedra é bastante difícil. A invenção do pergaminho e
do papel facilitou a reprodução de textos religiosos, literários e filoficos. Porém,
a capacidade reprodutiva de qualquer texto realmente foi sentida após a invenção
da quina impressora, que permitiu a multiplicão das formas simbólicas em
velocidade nunca antes vista. A capacidade de reprodução trazida com a imprensa
e depois, com outros meios (litografia, fotografia, radiogravador etc.), serviu à
exploração comercial da informação.
1.2.3 Distanciamento espaço-temporal dos atores da comunicação
Um meio técnico, quando introduzido em um processo comunicacional, permite
que a forma simbólica se desprenda de seu contexto (espacial e temporal). Ela é
levada/transportada para muitos outros contextos em diferentes épocas. Quando
um meio cnico faz parte da comunicão, é possível quebrar barreiras caracte-
sticas da interação face a face. A primeira delas foi romper com a necessidade da
co-presença. Nos tempos pré-modernos os livros eram feitos a mão, impossibilitando
qualquer tipo de reprodução em escala maior. Um mesmo exemplar tinha que
circular de mão em mão, o que limitava muito o público leitor. Da mesma forma,
os meios técnicos também modificam as condões espaciais e temporais em que
23
se exerce o poder, uma vez que interagem à distância e ainda podem intervir no
curso de acontecimentos que estão distantes.
1.2.4 Habilidades e formas de conhecimento necessárias para o uso da técnica
Para fazer uso de determinado meio técnico na comunicão é essencial esta-
belecer alguns todos e procedimentos que devem ser seguidos por todos os
indivíduos. Ou seja, é necessária uma linguagem comum. É preciso desenvolver
certas habilidades para fazer uso do meio e para que ele se torne um facilitador
(e não um entrave) da comunicação. Para codiar e docodicar mensagens, os
indivíduos lançam mão não só das habilidades que os meios técnicos requerem
como de várias formas de conhecimento (repertório) para interpretar tais in-
formações.
Para ilustrar como um pensamento sobre o meio técnico e seu diferencial tec-
nológico é constrdo e compreender que o pensamento determinista sobre a
Internet não é um fato isolado na história dos meios de comunicação, faz-se
necesria uma breve retrospectiva sobre o surgimento de outros meios como a
prensa de Gutenberg e o telégrafo.
1.3 Gutenberg e a revolução da impreso
O nascimento da indústria midiática está intimamente relacionado à invenção
das técnicas de impreso desenvolvidas por Johan Gutenberg a partir da segunda
metade do século XV. Essa invenção permitiu o surgimento de novos centros de
24
poder simbólico que o estavam mais restritos à Igreja e ao Estado que até
então mantinham um controle rígido sobre a produção e a emissão de informação.
Além disso, contribuiu para o crescimento da economia capitalista na Europa no
período em questão.
Pensando a partir do diferencial técnico, as inovações introduzidas e que merecem
destaque nesse então novo meio de comunicação foram o papel e a impressão de
tipos. O papel, matéria-prima leve, maleável e facilmente disponível, facilitou o
“transporte” de informações. A troca de informações se desprendeu da necessidade
de um tempo/espaço concomitantes. Segundo Henry Hallam o papel introduziu:
... a revolution... of high importance, without which the art of writing would
have been much less practised, and the invention of priting less serviceable
to mankind… It permitted the old costly material by which thought was
transmitted to be superseded by a universal substance which was to facilitate
the diffusion of the works of human intelligence.
1
(HALLAM, apud INNIS,
1951, p.19).
E ainda, a impressão de tipos abriu a possibilidade de imprimir textos com rapi-
dez e em maior quantidade. As técnicas de fundão de metal já eram conhecidas
na Europa nessa época, porém Gutenberg as aperfeiçoou de modo que grande
mero de tipos pudessem ser produzidos em uma chapa de metal, permitindo
a composição de textos maiores. Páginas inteiras passaram a ser compostas, o que
facilitou muito a produção de livros, até então manufaturados em cópias manus-
critas. Com o fim da escassez de livros no início da Idade Média houve a neces-
1
... uma revolução... de grande importância, sem a qual a arte de escrever seria muito menos prati-
cada, e a invenção da impressão menos útil para os homens... permitiu que o velho material custoso
por meio do qual o conhecimento era transmitido fosse substituído por uma material universal,
pelo que facilitou a difusão dos trabalhos da inteligência humana.
25
sidade de ampliar bibliotecas e atualizar catálogos para comportar toda a produção
de livros após a invenção de Gutenberg.
A imprensa tornou mais fácil a troca de informações não religiosas, com a produção
de textos de medicina, anatomia, botânica, matemática e geografia. Nesse contexto,
o surgimento de editores ampliou o número de textos selecionados e publicados,
permitindo uma maior variedade de informações e facilidade de acesso a elas.
A Igreja não tinha mais como controlar o que era produzido, como fazia nos
tempos dos manuscritos, quando ainda era posvel patrulhar de perto a atividade
dos copistas e escribas:
The printing press helped solve the problem of noise by multiplying identi-
cal copies of each text and thus reducing the ratio of overhead to new data.
The first result was the rapid recovery and dissemination of a corpus of
relatively error-free texts. The second result was to liberate scholars to turn
their attention toward gathering new data and creating new relevance links.
Because print made it easy to distribute identical copies of the same text,
it also became easier to construct external connections and consequently to
extend and elaborate social schemata
2
(RITCHIE, 1990, p.421).
Outra mudaa introduzida nesse período foi a utilização das línguas verculas
em detrimento do latim, utilizado até então nos textos manuscritos. À medida
que a leitura de livros impressos crescia pela Europa, os editores, autores e im-
2
A imprensa ajudou a resolver o problema de ruído ao multiplicar cópias idênticas de cada texto,
e assim reduzir as despesas com novos dados. O primeiro efeito foi o rápido restabelecimento e
disseminação de uma coleção de textos relativamente livres de erros. O segundo resultado foi liberar
os pesquisadores da necessidade de uma reunião de novas informações e para a criação de novos
laços relevantes. Como a prensa tornou mais fácil distribuir cópias idênticas de um mesmo texto,
também ficou mais fácil a realização de conexões externas e a conseqüente extensão e elaboração
de uma rede social.
26
pressores comaram a orientar suas produções para populações nacionais espe-
ficas. Ao utilizar línguas verculas para tais produções, incentivou-se o desejo
de uniformi-las. O latim continuou sendo empregado como língua oficial
por estudiosos, diplomatas e pela Igreja Católica durante os culos XVI e
XVII. Segundo Benedict Anderson, o uso crescente das línguas vernáculas fez com
que os leitores progressivamente se tornassem conscientes de que pertenciam a
comunidades imaginadas que possam muitos outros leitores desconhecidos (e
que nunca iriam interagir diretamente), embora possuíssem um elo que seria a
imprensa. Segundo Marshal McLuhan:
Dentre as muitas conseqüências imprevistas da tipografia, a emergên-
cia do nacionalismo é, talvez, a mais conhecida. A unificação política
das populações por meio de agrupamentos verculos e linísticos
não foi possível até que a imprensa transformasse cada idioma em
meio de massa extensivo. A tribo, forma prolongada de família de
parentesco consangüíneo, explode com a imprensa, sendo substituída
por uma associação de homens homogeneamente treinados para
serem indivíduos (MCLUHAN, 4
a
ed, p.202).
O desenvolvimento da imprensa foi uma das condições que possibilitou a formação
de uma consciência nacional, mas não uma condão suficiente. Da mesma forma,
a revolução provocada pela impreso de tipos teve, num primeiro momento,
efeito nos lugares em que havia condições sociais e culturais para isso. O simples
fato de a tecnologia existir tamm não era em si suficiente para transformar a
sociedade. Na ssia, por exemplo, a falta de uma elite letrada retardou o pro-
cesso de difusão da imprensa porque inicialmente as possibilidades trazidas com a
invenção de Gutenberg tinham aplicão bem restrita.
o há dúvidas de que a impressão gfica marcou época. O seu surgimento es-
timulou tamm expectativas e ansiedades frente às transformações que poderia
27
provocar. Para Francis Bacon, sofo inglês, o trio imprensa, pólvora e ssola
“mudou todo o estado e a face das coisas em todo o mundo”. A aposta de que
o novo meio de comunicação fortaleceria as práticas democticas e a liberdade
foi forte, pois acreditava-se que o maior acesso à informação poderia minimizar
o controle ou o exercício indevido de poder:
Samuel Hartlib um exilado do Leste europeu na Grã-Bretanha
que apoiou diversas iniciativas de reformas sociais e culturais — es-
creveu que as pessoas comuns, sabedoras de seus direitos e liberdades,
não serão governadas de forma opressora (BURKE, 2004, p.28).
Assim como vemos hoje, uma classe de pessoas aclamava e louvava as novas pos-
sibilidades, enquanto outra se posicionava de forma bastante pessimista diante dessa
invenção. A Igreja via com desconfiaa o fato de que cada leitor poderia, a partir do
impresso, estudar textos religiosos por conta própria, sem a inflncia ou interpreta-
ção das autoridades até então responveis pela transmiso desse conhecimento. Essa
liberdade assustava o clero que durante muito tempo manteve seu poder por meio do
controle de informações e ensinamentos transmitidos aos fiéis:
Na Inglaterra, na cada de 1660, sir Roger LEstrange, o censor-
chefe de livros, ainda questionava-se: "mais males que vantagens
eram ocasionados ao mundo cristão pela inveão da tipografia".
tipografia! Como distorcestes a paz da Humanidade", escreveu
o poeta inglês Adrew Marvell em 1672 (Idem).
De fato a revolução da impreso gráfica teve conseqüências bastante significativas
em todo o mundo. Muitos erros foram cometidos ao se prever o real impacto que
teria sobre a sociedade. Para Elisabeth Eisenstein, historiadora norte-americana,
um estudo criterioso sobre esse novo meio de comunicação deveria partir de uma
análise não isolada da mídia:
28
... para estimar as conseqüências sociais e culturais da nova cnica,
é necessário ver a mídia como um todo, avaliar todos os diferen-
tes meios de comunicação como interdependentes, tratando-os
qual um pacote, um repertório, um sistema, ou o que os franceses
chamam de regime, seja ele autoritário, democrático, burocrático
ou capitalista (EISENSTEIN, apud BURKE, 2004, p.33).
É preciso levar em considerão também que a mídia sofre alterações à medida
que é usada e apropriada pelo homem. Novas necessidades surgem, e a sua utiliza-
ção tende a se adaptar ao ritmo de mudança. Da mesma forma, a interação com
outros meios de comunicação não deve ser esquecida, bem como a íntima relação
entre os meios de comunicação e os meios de transporte. Porém, um pensamento
determinista sobre uma nova cnica que surge faz com que esses fatores sejam
esquecidos num primeiro momento. Assim foi com a impressão gfica, com o
telégrafo, a seguir, e posteriormente com a Internet.
1.4 O Surgimento do Telégrafo
O surgimento do telégrafo também se enquadra na argumentação que está sendo
apresentada, uma vez que foi divulgado de forma articulada a profundas transforma-
ções sociais e culturais. Mais uma vez, nota-se um pensamento causal e determinista
da tecnologia, ou do meio, sobre um todo subjetivo. Muito antes do advento da
Internet, proclamavam a simultaneidade do acontecimento com o seu registro
e difusão, e a possibilidade de reunir toda a humanidade por meio de um veículo
de comunicação. De fato, a compressão do distanciamento espaço-temporal trazida
com as mensagens telegráficas foi significativa, e é por esse fator que vies mais
otimistas foram formuladas com intensidade. Quanto maior o diferencial técnico,
ou quanto mais avançada parecer a tecnologia empregada no meio, mais intensas
29
serão as previsões sobre o seu impacto na sociedade. E o uso da eletricidade era
um fator suficientemente inovador para permitir muitas divagações:
Desde o início os efeitos sociais e econômicos do telégrafo
foram vistos na Grã-Bretanha como tão impressionantes quan-
to o seu próprio desenvolvimento técnico (BURKE, 2004,
p142).
A troca de informações a a utilização da energia elétrica na comunicão,
stava, com rassimas exceções, intimamente atrelada ao seu transporte físico.
A cnica de transmissão de informações usada a partir do telégrafo permitiu
que as noções de espaço e tempo se desvinculassem, uma vez que o distancia-
mento espacial passou a não mais signicar necessariamente um distanciamento
temporal. Até então, as formas simbólicas dependentes de bens sólidos como o
papel precisavam ser transportadas de um lugar para o outro, o que ocasionava
lentidão na troca de informações.
A instalão de cabos submarinos oceânicos para a telegrafia foi uma realização
cnica de grandes proporções. É valido ressaltar que tal feito não teria sido exe-
cutável caso o transporte marítimo a vapor não tivesse se desenvolvido. Charles
Bright, com apenas 26 anos, recebeu o tulo de cavaleiro ao colocar o primeiro
cabo transatlântico em 1858, apesar de seu feito não ter funcionado. Muitas decla-
rações exaltadas marcaram esse acontecimento. O jornal The Times publicou que
o cabo era “a maior descoberta desde Colombo, uma grande conquista... dada à
esfera humana”. Charles Dickens, eufórico, declarou: uma idade de trens expres-
sos, operações indolores, palácios de cristal... e uma centena de curiosidades que
nossos avôs e avós jamais sonharam”, o telégrafo era, “de todas as nossas maravilhas
modernas, a mais espetacular” (Apud BURKE, 2004, p.141).
30
Assim, os meios elétricos introduziram as noções de velocidade e simultaneidade nos
processos comunicacionais. O telégrafo conectou mercados, fossem eles nacionais
ou internacionais. As notícias locais, regionais, nacionais e imperiais começaram
a circular com mais regularidade e volume, uma vez que a imprensa não mais
dependia exclusivamente dos correios. Vale lembrar que o controle político era
exercido com freqüência por meio dessa instituição. Além disso, a imprensa pro-
vinciana marginal ganhou novo fôlego por não estar diretamente submetida à
imprensa metropolitana, abalando o monopólio centro-periferia na transmiso
de informação:
The telegraph weakened the system of political control trough the post office
and the newspaper exchange. The monopoly over news was destroyed and
the regional daily press escaped from the dominance of the political and the
metropolitan press
3
(INNIS, 1951, p.169).
A utilização dos meios etricos e a aceleração na não de tempo tiveram con-
seqüências visíveis na sociedade. Essas conseqüências tinham de certa forma um
caráter ambivalente: se por um lado os meios elétricos permitiam mais liber-
dade diante dos centros de poder como por exemplo em relação ao acesso
de informação —, por outro as ordens e decisões proclamadas por esses mesmos
centros rapidamente eram divulgadas para os que seguiam ordens. Albert Speer,
antigo ministro dos Armamentos da Alemanha, comentou, durante o julgamento
de Nuremberg, os efeitos do uso dessa nova tecnologia na vida alemã: “O telefone,
o teletipo e o telégrafo permitiam que as ordens emanadas dos mais altos escalões
chegassem diretamente aos escalões mais baixos, onde eram executadas sem maiores
ponderações”(Apud BURKE, 2004, p.142).
3
O telégrafo enfraqueceu o sistema de controle político por meio do correio e das trocas nos jornais.
O monopólio sobre as notícias foi destruído, e a impressa diária regional escapou da dominação
da política e da imprensa metropolitana.
31
O telégrafo não intensificou o volume de notícias como imprimiu novo ritmo
na produção/difusão das mesmas. A rapidez com que se tornou possível trocar
informões contrastava intensamente com a realidade até então vigente nas
comunicações. Uma carta enviada da Inglaterra em 1830, por exemplo, poderia
levar de cinco a oito meses para chegar à Índia. Já a resposta poderia levar dois
anos por causa das monções no Oceano Índico. Em 1870 já era posvel enviar
um telegrama da capital inglesa para o mesmo destino em apenas cinco horas.
A resposta chegava no mesmo dia:
Como os canais, ferrovias e ligações oceânicas, também o telégrafo
ligou mercados nacionais e internacionais, incluindo bolsas de valores e
de mercados (algodão, trigo e peixe, por exemplo). Também aumentou
a velocidade de transmissão de informação, pública e privada, local e
regional, nacional e imperial, e foi sendo conquistada à medida que
se transmitiam informações relativas a governos, negócios, assuntos
familiares, condições climáticas e desastres naturais ou provocados pelo
homem, a maior parte delas como notícias (BURKE, 2004, p.142).
para Marshall McLuhan, o telégrafo causou um outro tipo de efeito. Ele abalou o
sentimento nacionalista difundido com intensidade após a invenção e consolidação
das técnicas de impressão. Isso porque o acesso à maior variedade de informações
dificultava, de certa forma, a imposição de um único vs ideológico.
A dinâmica natural do livro e também do jornal é de criar
uma visão acional unificada segundo uma estrutura centralizada; to-
das as pessoas letradas, portanto, sentem o desejo de ver estendidas às
‘regiões mais atrasadas’ e às mentalidades menos letradas os benefícios
das opiniões menos iluminadas e dentro de um padrão horizon-
tal, uniforme e homogêneo. O telégrafo acabou com essa esperança.
Descentralizou o mundo do jornal de maneira tão completa que as
visões nacionais uniformes se tornaram impossíveis antes mesmo da
Guerra Civil. Conseqüência talvez de maior importância, o telegrafo,
na Amércia, atraiu os talentos literários mais para o jornalista do que
32
para o livro. Poe, Twain e Hemingway são exemplos de escritores que
não podiam encontrar nem experiência nem saída, a não ser no jornal.
Em contraposição, na Europa, os numerosos pequenos grupos nacio-
nais estavam organizados num mosaico descontínuo que o telégrafo
não fez senão intensificar. O resultado foi que, na Europa, o telégrafo
reforçou a posição do livro e obrigou mesmo a imprensa a assumir
um caráter literário (MCLUHAN, 4
a
Ed, p.288).
Se o telégrafo permitiu a descentralização da emissão das informações, e conse-
entemente uma quantidade de mensagens mais ecticas e menos controladas,
o que pensar das transformações que a comunicação em rede poderia trazer? Que
impactos e previsões erradas e prematuras não poderiam inferir ao se pensar sobre a
Internet e todo o seu diferencial cnico introduzido no campo das comunicações?
Mais uma vez, a ingenuidade de pensar o meio através da técnica esteve presente.
E o que se pode constatar é uma enxurrada de esperanças e expectativas diante
de um meio de comunicação dinâmico que se modifica a cada dia.
33
Muitas expectativas e até mesmo sonhos sobre o impacto que a Internet viria
a causar na sociedade e na cultura contemporâneas foram divulgadas e propagadas
muito antes até de sua popularização. Alguns teóricos chegaram a declarar que
migraríamos rumo ao "ciberespaço" e passaríamos grande parte de nossas vidas.
Outros, mais cautelosos, olhavam para o novo meio que surgia com certa descon-
fiança e ressalva, principalmente no que tange à questão das desigualdades sociais,
tão evidentes em nosso mundo. Fato é que uma enxurrada de previsões foi feita
em relação ao caráter democrático e libertário da Internet, grande parte calcada em
possibilidades e inovações técnicas apresentadas pelo novo meio. Da organização em
rede, passando pela linguagem hipertextual, sem esquecer da interface gráfica e sua
característica multimídia, a Internet se apresentou como uma caixinha de surpresas
repleta de novidades e de esperança para muitas mazelas da vida.
Partindo de uma análise técnica das especificidades da Internet e de um levantamento
das previsões formuladas desde a criação da World Wide Web (www), em 1993, até
o ano 2000, será possível clarificar como muitos teóricos pensaram o surgimento da
Internet. E ficarão nítidas as semelhanças entre esse racicínio e os formulados anterior-
mente, quando surgiram outros meios de comunicão, como a prensa e o tegrafo.
2
INTERNET: ESPERANÇAS E EXPECTATIVAS
34
2.1. Rede, hipertexto e link: a democratização da informão
A Internet é estruturada por uma rede de computadores interconectados ao redor do
mundo. Em outras palavras, a "matéria-prima" desse meio são os computadores e suas
ligações atras de cabos, linhas telenicas, ondas que comportam fluxos de
informações que circulam livremente pela rede. Esta, por sua vez, por ser rizotica
e hipertextual, contribuiu decisivamente para fortalecer e estimular visões utópicas,
libertárias e democráticas em relação ao novo meio que surgia. Assim como qualquer
rede, o "ciberespo" é estruturado, antes de qualquer coisa, em s que se ligam dois
a dois e que teoricamente irão se ligar a outros nós indefinidamente. E são justamente
por essas ltiplas ligões que se pensava a rede, responvel pela exisncia do espaço
informação, como uma malha de topologia aberta, repleta de entradas e saídas.
Os prinpios segundo os quais a rede se estrutura e que lhe dão esse contorno
de teia são descritos por Gilles DELEUZE (p.15-21) no capítulo ‘Rizoma, de
Mil Platôs, muito antes da popularizão da Internet. Teóricos desse novo meio
de comunicação têm baseado seus estudos sobre o conceito de rede nestes
princípios, a saber:
.
Princípio de coneo: qualquer ponto de um rizoma pode ser conectado
a outro e deve sê-lo”. Isto é, a rede deve ser pensada como uma teia, onde cada
ponto possui diversas ramificações que levam a outros pontos que possuem outras
ramificações. A estrutura da rede é rizomática.
.
Princípio de heterogeneidade: os nós da rede possuem em sua memória um
conjunto de palavras, textos, imagens e sons. Eles são, portanto, heterogêneos.
.
Princípio de multiplicidade: “é somente quando o múltiplo é efetivamente
tratado como substantivo, multiplicidade, que ele não tem mais nenhuma relação como
sujeito ou como objeto, como realidade natural ou espiritual, como imagem e mundo”.
35
Esse princípio se manifesta na multiplicidade de identidades que o indivíduo pode as-
sumir na rede. Cada avatar (representação de um indivíduo no ambiente digital) é um
sujeito, ao passo que um sujeito torna a sua presença no ambiente digital ltipla.
.
Princípio da ruptura a-significante: “um rizoma pode ser rompido, que-
brado em um lugar qualquer, e tamm retomado segundo uma ou outra de suas
linhas e segundo outras linhas”. O rompimento de uma parte da rede o irá
comprometer o seu funcionamento. A estrutura da rede é capaz de se reorganizar.
Cada ponto, se analisado isoladamente, comporta dentro de si uma rede própria.
.
Princípio de topologia: o funcionamento da rede se por vizinhança.
Isto é, o que nela acontece depende dos caminhos percorridos, das conexões es-
tabelecidas e da proximidade dos pontos.
.
Princípio da mobilidade dos centros: a rede é acentrada. Na realidade, ela
possui diversos centros que comportam inúmeras ramificações, raízes e rizomas.
A rede, além desses princípios, possui uma caractestica que estimulou ainda mais
as formulações libertárias em relação ao ciberespaço. É o princípio da partilha. Com
o advento da Internet, e principalmente da World Wide Web, a conexão pode ser
estabelecida o entre um usrio e o seu servidor, mas também entre vários
usuários que passaram a compartilhar dados e informações.
É necesrio ressaltar, porém, que a Internet se expandiu pela sociedade civil,
rompendo as fronteiras dos meios militar (para o qual foi criada) e acadêmico,
após a invenção da www. Tim Berners-Lee, idealizador e pai da www, inspirou-
se no projeto Memex, de Vannevar Bush, para criar uma rede não hierárquica e
com multipossibilidades de conexões. Segundo ele, o século anterior [XIX] fora
dominado pela mentalidade enciclopédica, em que o objetivo primordial do
36
gerenciamento de informações era encontrar o escaninho para cada pacote de
dados (Apud JOHNSON, 2000, p.89). Vannevar Bush quebrou esse paradigma em
seu famoso artigo “As We May Think”. Nele, propôs a crião de um dispositivo
capaz de armazenar informões textuais e gráficas de tal forma que cada parte
dos dados pode ser conectada (linkada) a outras de forma arbitrária.
Em 1945, logo após a Segunda Guerra Mundial, iniciou-se um processo de so-
brecarga de informações, fruto da exploo da pesquisa durante os anos em que
o mundo esteve em conflito. Vannevar Bush, naquela época chefe da organização
que coordenava o esforço de guerra dos cientistas norte-americanos, percebeu
que o crescente número na produção de informões em breve iria provocar uma
dificuldade para organizá-las ou mesmo localizá-las. Descontente com todos os
tipos de armazenamento e indexação de informações tradicionais, Bush difundiu
a idéia de que a forma como se organizavam dados funcionava de maneira linear,
enquanto o pensamento humano se estrutura de forma o-linear. Para ele, a pro-
dução de conhecimento estava se desenvolvendo em uma escala maior do que a
nossa capacidade de processar esse conhecimento, o que ocorria em parte porque
os sistemas de indexação utilizados eram artificiais.
Bush idealizou, eno, o Memex, um dispositivo com o objetivo de tentar solucio-
nar a questão. Sendo uma mistura de máquina de microfilmagem e computador,
o Memex deveria ser capaz, além de estocar informações de livros, gravações e
comunicações, de disponibilizá-las com facilidade, rapidez e flexibilidade. As
informações seriam organizadas de forma intuitiva, assim como ocorre em nosso
pensamento: em vez de se basear em gabinetes de arquivos ou auto-estradas, o
dispositivo deveria seguir pistas, trilhar caminhos e estabelecer conexões. Seus
usuários deveriam acessar informações armazenadas em um grande reservatório
por meio de uma televisão dotada de alto-falantes. E uma vez que a conexão
37
fosse estabelecida, o usuário poderia gozar da possibilidade de criar uma tri-
lha, acessível a qualquer momento, de todas as informações visitadas e todos
os links realizados.
Tim Berners-Lee, ao idealizar a www, buscou concretizar a idéia de Vannevar Bush.
Para isso, inspirou-se também em Ted Nelson e no termo hipertexto, cunhado
por Bush cerca de 20 anos após a publicação do artigo As We May Think”: “[...]
hipertexto significa uma escrita não-seqüencial – texto que se ramifica e oferece
opções aos seus leitores. Uma melhor leitura numa tela interativa” (BUSH, 2001,
www). Nelson, assim como Bush, começava a investir na idéia de criar um imenso
reservatório de dados acessível em tempo real. O Memex de Nelson se chamava
Xanadu. Esse dispositivo deveria também ser um canal de troca incessante de
mensagens; um canal de comunicação ininterrupta, através do qual a humanidade
dialogaria entre si no presente e tamm com seu próprio passado.
A World Wide Web foi criada, então, para ser esse dispositivo, ou algo bem próximo
dele. O próprio nome traduz o que se esperava: um sistema hipertextual com uma
estrutura descentralizada que permite a conexão entre um ponto e qualquer outro
na rede. Uma estrutura semelhante à de uma teia (web), uma teia de amplitude
global (world wide web). Navegar nessa rede seria o mesmo que construir um
hipertexto. E na verdade, por princípio, toda a World Wide Web poderia ser vista
como um único hipertexto, uma vez que qualquer site que nela esteja hospedado
pode ser, na teoria, linkado a qualquer outro.
Assim, na rede criada por Berners-Lee, construir um hipertexto é o mesmo que
realizar conexões. Ao clicar em um link, deve ser possível viajar para todos os lados
e direções. Embarcar em um passeio sem rumo preciso, onde a trajetória se pretende
imprevisível. A possibilidade de coneo e a escolha de determinados links em
38
detrimento de outros na construção de um texto o hipertexto chocou-se,
de certa forma, com um estilo de leitura estabelecido em meios de comunicão
tradicionais como livros e revistas. Por mais que, ao ler uma revista ou jornal, seja
possível subverter a ordem das páginas começando a leitura do jornal pela
última gina, por exemplo , o é posvel ir o mais longe nessa transgres-
o. Isso porque ambos são produtos acabados; as informões o organizadas
e, a partir da impressão no papel, o poderão sofrer mais nenhuma mudaa
estrutural. o hipertexto é, em princípio, o hierárquico e sem qualquer tipo
de ordem preestabelecida, o que permite uma leitura fragmentada, multilinear e,
principalmente, valoriza o papel do leitor (receptor) na construção da narrativa.
A revolução que o hipertexto proporciona, segundo Pierre vy, inverte os pais
da escrita e da leitura:
Aquele que participa da estruturação de um hipertexto, do traçado
pontilhado das possíveis dobras do sentido, é um leitor. Simetrica-
mente, aquele que atualiza um percurso, ou manifesta determinado
aspecto da reserva documental, contribuiu para a redação, finaliza
temporariamente uma escrita interminável. Os cortes e remissões,
os caminhos de sentidos originais que o leitor inventa podem ser
incorporados à própria estrutura dos corpos. Com o hipertexto, toda
leitura é uma escrita potencial (LÉVY, 1999, p.61).
O autor ou o editor de textos em meios não digitais é o responvel por ordenar
os dados contidos no produto impresso de forma que guie os leitores. As infor-
mações o marcadas e distribuídas ao longo da gina com uma hierarquia bas-
tante definida e pensada. Em uma matéria de jornal, por exemplo, tem-se tulo,
subtítulo, blocos de textos com a matéria em si, ilustrações, legendas, boxes, olhos
(caso a matéria seja longa) etc. Todos esses recursos o utilizados para moldar o
caminho que o leitor irá percorrer ao ler a reportagem. Isso o significa que
o se possa ler apenas o tulo, o lead e o último parágrafo da matéria. Porém, é
39
preciso notar que essa leitura "não-linear" é muito diferente da o-linearidade
intrínseca ao hipertexto:
Paper pages are bound into books in a single sequence; paper index cards
must be arranged with no more than one card before and one after them
even though they can easily searched in nonsequencial order. But sreen-based
paged and cards become lexias: they occupy a virtual space in wich they can
be preceded by, followed by, and placed next to an infinitive number of other
lexias. Lexias are often connected to one another with “hiperlinks” (or “hot
words”), that is, words that are displayed in color to alert the reader/viewer
that they lead someplace else
1
(MURRAY, 1999, p.55).
Na verdade, o hipertexto é não-linear em sua essência. Um hipertexto o tem
um determinado início e um determinado m. Mas isso não significa que ele não
comece e o termine. Ele tem inúmeros começos e inúmeros finais. Cada usuário,
ao construir o seu hipertexto, é quem determina a sua linearidade. Portanto, mais
do que o-linear, o hipertexto seria multilinear:
Hypertext may be taken as the paradigm of the digital author. Hipertext
is a digital text that may be read not in the fixed direction suggested in
a printed book but as a series of links that jump across the presented text
in any direction. It may exist on a CD-ROM, a hard disk on a individual
computer, or on a site on the Internet, on any medium compatible with
digital technology. These links may be provided by the author, by the reader,
by previous readers or by any combination of these. Many scholars have
1
Páginas de papel estão dispostas nos livros em uma única seqüência; verbetes em papelm de
ser dispostos com não mais de um verbete anterior e outro posterior a eles, mas mesmo assim
podem facilmente ser procurados em ordem não-seqüencial. Mas páginas e verbetes em uma
tela se tornam léxicos: eles ocupam um espaço virtual no qual podem ser precedidos, seguidos
ou substituídos por um infinito número de outros xicos. Léxicos são em geral conectados a
outros com hiperlinks (ou hot words), ou seja, palavras são escritas com destaque para alertar o
leitor/usuário que elas levam para algum outro lugar.
40
noted the novelty of hypertext in comparison with printed books and its
implication for theoy and literature (Bolter 1990; Landow 1992; Lanham
1898; Murray 1997; Ryan 1999)
2
(POSTER, 2001, p.94).
O que se impõe nessa situão é muito mais amplo do que a questão de quem
assina a autoria de um texto. É preciso dimensionar as possibilidades que o hi-
pertexto traz e o fato de um texto não ser mais uma estrutura fechada. É claro
que há uma autonomia de sentindo em qualquer escrito porque existem diversas
interpretações sobre ele. Mas tais caractesticas intrínsecas do hipertexto foram,
de certa maneira, responsáveis pela aposta de muitos teóricos nas práticas libertá-
rias e democráticas que a Internet poderia promover. Para Mark STEFIK (1996),
a Internet, com sua rede hipertextual, deveria se tornar em um curto espaço de
tempo uma rede interlinkada de iias.
Por mais que uma rede possa ser mais, ou menos, descentralizada que outras, a
conectividade é uma de suas características fundadoras. Ou seja, a condição de
existência em uma rede é que um elemento (nó) esteja conectado a muitos outros.
O que irá determinar as potencialidades desse nó são as suas possibilidades de co-
nexão e, conseentemente, o seu poder de alcance. Donna Haraway esperava um
profundo impacto que esse potencial poderia trazer ao falar do primeiro browser
da web, o Mosaic:
2
Hipertexto deve ser visto como um paradigma do autor digital. Hipertexto é um texto digital
que pode ser lido não em direções fixas, como se fazia nos livros impressos, mas como uma série
de links que saltam sobre o texto apresentado em qualquer direção. Isso pode existir num CD-ROM,
num disco rígido ou num computador individual, num site da Internet ou em qualquer mídia
compatível com as tecnologias digitais. Esses links podem ser oferecidos pelo autor, pelo leitor,
por leitores anteriores ou por uma combinão desses agentes. Muitos pesquisadores verificaram
a inovação do hipertexto em comparação com os livros impressos e suas implicações na teoria e
na literatura (Bolter 1990; Landow 1992; Lanham 1898; Murray 1997; Ryan 1999).
41
Mosaic was about the power to make hypertext and hypergraphic conne-
ctions of the sort that produce the global subject of techonociense as a potent
form of historically contingent, specific human nature at the end of the mil-
lennium
3
(HARAWAY Apud HARMON, 1997, A1).
Nesse contexto, entende-se a constrão de um texto na rede, com links que co-
nectam nós dispersos, como algo mais abrangente; como um meio de expor idéias
e ideais e como uma conseente construção cultural e social. Segundo Manuel
CASTELLS (2003), a abertura da arquitetura da Internet, com o seu desenvolvimen-
to autônomo à medida que os usrios tornaram-se produtores da tecnologia e
artífices de toda a rede, foi a fonte de sua principal força.
2.1.1 Internet: a comunicação todos-todos
O hipertexto e a estrutura em rede permitiram uma interatividade desconhecida
nos meios de comunicação de massa. A troca de informações que seguia o modelo
um-todos — um emissor para vários receptores — passou a poder se orientar pelo
padrão todos-todos. Cada usuário é um emissor potencial por poder lançar dados
na rede que podem ser captados por outros usuários em diversas partes do mundo,
desde que estejam também conectados. E se tornar um emissor não é uma tarefa
muito difícil: o acréscimo de nós é simples e o custo relativamente baixo para quem
está conectado. É fácil, sob essa perspectiva, entender por que se criou tamanha
expectativa de que a Internet traria uma democratização revolucionária para o acesso
3
O Mosaic tinha o poder de fazer conexões hipertextuais e hipergráficas do tipo que produz o
objeto global da tecnociência como uma potente forma de contingência histórica, de natureza
humana específica no final do milênio.
42
a informações. Em tese, a comunicação, não estando mais restrita a poucos emis-
sores, poderia se libertar do monopólio das elites e corporações tradicionais sobre
as fontes e canais de difusão de informação, monopólio que ocorre, por exemplo,
com as emissoras de televisão aberta. Uns poucos canais são responsáveis por pes-
quisar (selecionar) e transmitir informações, tendo elas caráter jornalístico ou de
entretenimento, para uma grande massa que permanece passiva na maior parte do
processo comunicacional.
Para Nicolas NEGROPONTE (1993, p.173) as redes de televisão e de computadores
o tinham praticamente nada em comum. Ele considerava uma rede de televisão
uma hierarquia distributiva, na qual existe uma fonte responsável por emitir si-
nais e muitos escoadouros homogêneosdestino dos sinais. E considerava que
as redes de computadores formavam uma teia de processadores heterogêneos,
todos eles podendo agir tanto como fonte quanto como escoadouro: “São tão
diferentes uma da outra que seus projetistas nem sequer falam a mesma língua:
a racionalidade de um é tão lógica para o outro quanto o fundamentalismo is-
lâmico para um católico italiano”.
Da discussão sobre quem é o emissor e quem é o receptor em dada comunica-
ção, deriva-se, muitas vezes, a questão de que nunca o receptor é integralmente
passivo na troca de informações. Isso porque cada receptor interpreta as men-
sagens recebidas singularmente, de acordo com um reperrio e um acúmulo
pessoal de experncias. Mas é inegável que os receptores possuem possibilidades
mínimas de interação ou ação no padrão de comunicação que rege os meios
de comunicação de massa, pois o principal nessa troca já foi pré-determinado
pelos poucos emissores:
Unlike traditional mass media which represent a one-to-many communi-
cation model, the Web represents both many-to-one and many-to-many
43
models (Hoffman, Novak, & Chatterjee, 1995; Morris & Ogan, 1996).
Many individual consumers can initiate communication to the same web
site at the same time. This many-to-many scenario is unique to the Web,
because many points of origination and destination coexist in cyberspace.
With such features as cyberchat and listserv mailing list that simultaneously
connects people with common interests, the Web becomes a mean for many-
to-many communications. There is no single source of message origination
or single destination on the Web. Negroponte (1996) describes such use of
computer networks as a ‘digital age in which all information is digitalized.
Information is customized to the demand of the consumer. Glider (1990)
predicts the new computer technology will increase the power of the people
by “blow[ing] apart all the monopolies, hierarchies, pyramids, and power
grids of established society. The medium will change from a mass-produced
and mass-consumed commodity to an endless feast of niches and specialties
4
(HA, JAMES, 1998, p.456).
A aposta de Sheizaf RAFAELLI e Robert LAROSE (1993) era que a Internet se
tornaria um meio de comunicação de massa novo e colaborativo. Seria alimenta-
do por informações de uma ampla audiência segmentada e sofreria um mínimo
controle editorial. As salas de bate-papo (chats), as conferências video-textuais
e os Eletronic Bulletin Boards seriam, segundo eles, três exemplos da emergente
4
Ao contrio da mídia de massa, que apresenta o modelo comunicacional um-todos, a Web
apresenta tanto o modelo todos-um quanto o modelo todos-todos (Hoffman, Novak, & Chatter-
jee, 1995; Morris & Ogan, 1996). Muitos usuários individuais podem iniciar uma comunicão
com o mesmo website ao mesmo tempo. Esse roteiro todos-todos é peculiar da Web porque
muitos pontos de origem e destino coexistem no ciberespaço. Com tantas características como
os ciberchats e listas de e-mails que simultaneamente conectam pessoas com interesses comuns, a
Web se torna um meio para uma comunicação todos-todos. Não há uma única fonte da origem
da mensagem nem um destino único na Web. Negroponte (1996) descreve tal uso da rede de
computador como uma “era digital na qual toda a informação está digitalizada. A informação
é customizada para a demanda dos consumidores. Glider (1990) prevê que a nova tecnologia
do computador irá aumentar o poder das pessoas ao demolir todos os monopólios, hierarquias,
pirâmides e poderosas grades da sociedade. A dia irá mudar, de algo que é produzido e con-
sumido em massa, para um banquete semm de nichos e especialidades.
44
comunicação interativa de massa, na qual a audncia participaria ativamente na
constituição das mensagens. Em acordo com a iia de quebra do monopólio na
produção e emiso de informações, Maria Leoneire C. Oliveira argumentava que
o receptor deixaria de ser um deposirio de informações e passaria a ser mais
que ativo; se tornaria interativo. Para ela, o advento da Internet permitiu que o
sentido não fosse previamente fechado (determinado). Ao contrio, possibilitou
diversas interpretações e interveões dos atores sociais. Assim, abriu-se a possibi-
lidade de instaurar uma nova forma de poder. O domínio da informação poderia
ser exercido por um número maior de pessoas, mais indivíduos seriam ativos no
processo. Esse caráter interativo do meio levou, segundo a pesquisadora, a um
questionamento sobre o conceito de poder, que ela considerava imposvel de ser
analisado somente no contexto das superestruturas:
A interatividade proporcionada pelas redes vem favorecer a democra-
tização da informação, ou seja, não mais aqueles que detêm o
poder e o controle sobre as informações. Este passa a ser exercido nas
microestruturas, na dimensão relacional (OLIVEIRA, 1997, p.5).
Essa liberdade no acesso à informão foi tamm aclamada por estudiosos em
relação à política e a um provável fortalecimento da democracia. Alguns acreditavam
que o efeito positivo nas práticas poticas democticas trazidas pela comunicação
interativa em rede seria maior do que a emergência da televisão:
From a democratic perspective, the unprecedented possibilities for citi-
zens deliberation and public input to decision-making processes, hitherto
conned to representatives and their ofcials, define the new media as
paradigmatically distinct and potentially empowerin
5
(SILVERSTONE,
1999, p.59-60).
5
De uma perspectiva democrática, as possibilidades sem precedentes para que os cidadãos partici-
pem de debates públicos para tomada de decisões, até agora restritas aos politicos e seus assessores,
definem a nova mídia como paradigmaticamente distinta e potencialmente mais poderosa.
45
Basicamente, o que se pensava era que a democracia seria favorecida por esse pro-
cesso porque os indivíduos passariam a conviver com uma maior gama de pontos
de vista sobre diferentes temas, o que lhes permitiria transformar-se, mudar de
opinião, abrir-se à diferença, e não pensar como as elites gostariam que pensassem.
Como o acesso à informação política também se tornaria mais fácil, os cidadãos
poderiam estar mais bem informados e em alguns casos passariam a ter acesso a
registrosblicos.
Lewis A. Friedland analisou um experimento realizado, em janeiro de 1994, na
University of Wiscosin School of Journalism and Mass Communication para de-
monstrar suas esperanças no potencial democrático da Internet. O Online Wiscon-
sin, modo como o projeto era chamado, foi um dos primeiros jornais de nocias
da www na Raleigh News and Observer (Carolina do Norte, EUA), e explorava as
possibilidades que a nova mídia trazia ao acesso da informação. Segundo Friedland,
jornais desse tipo demonstram o potencial democrático de realizar publicações na
rede. Bastava uma equipe enxuta e um capital inicial baixo (se comparado com o
orçamento de outros tipos de publicão):
A team of students was able to design, publish and begin to distribute news
journal world-wide for less than $5000, demonstrating that the capital cost
of internet publishing is minimal
6
(FRIEDLAND, 1996, p.202).
Em acordo com essa idéia, Pierre vy defendia:
Qualquer grupo ou indivíduo pode ter, a partir de agora, meios téc-
nicos para dirigir-se, a baixo custo, a um imenso público internacio-
6
Um grupo de estudantes estava apto a desenvolver, publicar e começar a distribuir notícias em
um jornal na web por menos de cinco mil dólares, demonstrando que o custos financeiros para
uma publicão na Internet são mínimos.
46
nal. Qualquer um (grupo ou indivíduo) pode colocar em circulação
obras ficcionais, produzir reportagens, propor sínteses e sua seleção
de notícias sobre determinado assunto (LÉVY, 1999, p.240).
O diferencial do Online Wisconsin era que sua hipertextualidade, característica do
meio, começava a ser explorada ao narrar hisrias que enfatizavam diferentes
pontos de vista. A publicão oferecia subsídios para que cada leitor construísse
sua própria opinião. O público deveria ser capaz não apenas de ler uma narrativa,
mas também de participar dela, tanto “investigando” sua veracidade como acres-
centando informações à história. Friedland almejava que esse processo tivesse um
grande impacto nas práticas democráticas da sociedade:
By presenting citizens solving problems in a narrative structure that builds
context and historical understanding, a model begins to emerge for journal-
ism that merges the two functions of the collection and dissemination of
information and the provision of a forum for public debate identified by
Garnham earlier. A collection of views can be archived, reread, explored
and connected in new ways that offer new models of problem solving that
expand the narratives boundaries of tradicional journalism. These models
offer an alternative to the plebiscitary model of eletronic democracy that is
both deliberative and pratical
7
(FRIEDLAND, 1996, p.202).
7
Ao apresentar aos cidadãos a solução de problemas em uma estrutura narrativa que constrói um
contexto e um pensamento histórico, começa a emergir para o jornalismo um modelo que mescla
as duas funções de reunir e distribuir informação e a promoção de fórum para o debate público
identificado anteriormente por Garnham. Uma coleção de pontos de vista pode ser arquivada, relida
explorada e conectada de novas maneiras, podendo oferecer novas formas de solucionar problemas,
o que expande as fronteiras das narrativas do jornalismo tradicional. Esses modelos oferecem uma
alternativa aos modelos plebiscitários de democracia eletrônica, o que é deliberativo e prático.
47
Nesse contexto de utopia, desejo e esperaa em relão ao novo meio que
surgia, a Internet, vista como um espo terceiro de sociabilidade, chegou a ser
proclamada como um ambiente semelhante à ágora ateniense da Gcia Antiga
(MITCHELL, 1996). Um espaço blico igualitário, não hierquico, onde todos
poderiam expressar suas opiniões livremente. O ex-vice-presidente dos Estados
Unidos, Al Gore, acreditava que o "ciberespo" seria um remédio para o declínio
da democracia em seu país (Apud WERTHEIM, 1999, p.211). Todos passariam a
participar de discussões públicas e da tomada de decisões. Seria posvel, assim,
uma participação política mais consciente e menos condicionada. A massificação
seria menor porque diversas opiniões e atitudes seriam expostas:
On the other hand, modern communication networks give individuals the
opportunities for a freer choice of information, life-styles, and communica-
tion (the control of making contacts, the possibility of making them fast and
on a long distance). That is why they are sometimes called technologies of
freedom
8
(VAN DIJK, 1993, p.400).
2.2. Multimídia e interface gráfica: "ciberespo" como
um lugar alternativo de sociabilidade e entretenimento
Além de um acesso livre a informações, a Internet abriu a possibilidade de mesclar,
em um único meio, sons, textos e imagens. O seu caráter multimídia, ou, como
preferem alguns teóricos, hipermídia, permitiu a convergência de diferentes meios
8
Por outro lado, redes modernas de comunicação proporcionam aos indivíduos oportunidades
de livre seleção de informação, estilo de vida e comunicação (o controle de fazer contatos, a
possibilidade de realizá-los de forma mais rápida e a longas distâncias). Por isso elas são chamadas,
às vezes, de tecnologias de liberdade.
48
de comunicão. Segundo Manuel Castells, a tecnologia digital possibilitou a
compa-ctação de todos os tipos de mensagens e assim formou uma rede capaz de
comunicar todas as espécies de símbolos sem o uso de centros de controle. A uni-
versalidade da linguagem digital e a lógica pura do sistema de comunicação em
rede criaram as condições tecnogicas para a comunicação horizontal global.
Ao se conectar à rede é possível ler textos, ouvir músicas, assistir a filmes, conver-
sar com outras pessoas ou a fazer tudo ao mesmo tempo. A Internet se mostra,
mais uma vez, um ambiente aberto à diversidade e à democrática convivência de
gostos distintos. Uma das caractesticas mais importantes da multimídia é que ela
permite captar a maioria das expressões culturais em toda a sua multiplicidade.
Acreditava-se que o seu surgimento seria equiparável ao fim da distião entre
dia audiovisual e dia impressa, cultura popular e cultura erudita, entreteni-
mento e informação, educão e persuasão:
Todas as expressões culturais, da pior à melhor, da mais elitista à
mais popular, m juntas nesse universo digital que liga, em um
supertexto histórico gigantesco, as manifestões passadas, presen-
tes e futuras da mente comunicativa. Com isso elas constroem um
novo ambiente simbólico. Fazem da virtualidade nossa realidade”
(CASTELLS, 2001, p.394).
Essa outra realidade construída a partir de um novo ambiente simbólico permite
entender por que a Internet foi vista, durante a década de 1990, prioritariamente
como um espo virtual de sociabilidade e, sobretudo, alternativo ao espaço físico.
Por mais que se considerasse o ambiente digital dependente de suportes sicos
satélites de comunicão, chips de silício, bras ópticas e outros aparatos tec-
nológicos , e que as experiências ali vividas fossem sentidas fisicamente pelo
homem, esse outro” ambiente era visto na maioria das vezes como um domínio
para a mente; um ambiente libertário e mais democrático que a realidade no espa-
49
ço físico. Nesse peodo, foi comum utilizar meforas espaciais para dar conta da
construção do hipertexto e conseqüentemente da formação do traçado do "cibe-
respaço". O espo digital foi considerado um lugar “habitável”, onde os usuários
podiam pela primeira vez “entrar” e passear (to browse) pelas informações.
É curioso, portanto, que esse conceito de "ciberespaço" não tenha surgido no campo
da infortica, mas no da literatura. William Gibson, em seu romance de cção
científica Neuromancer, escrito em 1984, utilizou o termo para designar o universo
das redes digitais que configuravam um centro de tenes mundiais. Um espaço
digital navegável onde companhias e indivíduos relacionavam-se virtualmente em
uma sociedade de informação. Por meio de implantes neurais, os personagens de
Gibson imergiam em um ambiente tridimensional digital e interagiam e viviam
experiências virtuais.
Voltando ao campo da informática, pode-se inferir que uma dimensão física é
atribuída ao ambiente digital em grande parte pelo fato de que o contato entre
o indivíduo e o espaço de dados se realiza através de interfaces, principalmente
as interfaces gficas. Ao idealizar a World Wide Web, Tim Berners-Lee acreditava
que a interface de seu sistema o deveria ser baseada exclusivamente em texto.
Douglas Engelbart havia demonstrado, em meados da cada de 1950, a im-
porncia do uso de tela com múltiplas janelas de trabalho, conexões associativas
entre documentos e programas para a comunicão e o trabalho coletivo. No fim
dacada de 1970 foram feitas diversas demonstrões públicas para a realização
de trabalhos grupais, os groupwares, nos quais a interação ocorria através de várias
camadas de interfaces compatíveis com diferentes tipos de aplicação. Isto é, uma
vez que algum comando era aprendido, ele podia ser, no futuro, reutilizado. A
relação entre homem e máquina cou mais próxima e amigável. O esforço que
50
o usuário devia fazer a cada novo uso do seu sistema tornou-se progressivamente
menor. Suas experiências anteriores passaram a ser reaproveitadas.
Engelbart defendia a idéia de que era fundamental articular o sistema do compu-
tador ao sistema humano via dispositivos eletrônicos inteligentes. E, para tal, era
necesrio haver coerência na concepção das interfaces homem/máquina. Para-
lelamente, propôs a aliança entre a cartografia e o código binário, na qual cada
pixel na tela do computador corresponderia a um nimo pedaço na memória da
quina. Dessa forma, os dados passaram a ter uma localização sica no sistema,
e a idéia do ambiente digital como um espo-informão começou a se formar,
muito antes mesmo de a Internet surgir. Mas para que serviriam essas coordena-
das espaciais dos bits? Para manipular as informações diretamente, para deslocar
ícones de um lado para o outro da tela, abrir arquivos, fechar documentos... O
usuário pôde, assim, sentir-se mais próximo da informão. Para isso foi preciso
desenvolver um dispositivo capaz de realizar essas tarefas, para ser a personificação
das vontades do usuário no information space. Este dispositivo é o mouse, que se
tornou fundamental para a navegão na www:
O software operava uma coordenação entre os movimentos da mão
do usuário e um ponteiro na tela, permitindo a Engelbart clicar em
janelas ou ícones, abrir e fechar coisas, reorganizar o espaço-infor-
mação no monitor. O ponteiro correndo na tela era doppeelganger, o
duplo virtual do usuário. O feedback visual dava à experncia seu
caráter imediato, direto: se o mouse fosse movido um centímetro
ou dois à direita, o ponteiro na tela faria o mesmo. Sem esse vínculo
direto, toda experiência mais pareceria com a de ver televisão, onde
estamos circunscritos à influência de um fluxo constante de imagens
que são mantidas separadas, distintas de nós. O mouse permitia ao
usuário entrar naquele mundo e manipular realmente as coisas dentro
dele, sendo por isso muito mais do que um dispositivo apontador
(JOHNSON, 2000, p.89).
51
O surgimento da interface gráfica possibilitou que os códigos de programação
característicos do sistema MS-DOS fossem encobertos, e que se simulaase um
ambiente mais amivel para os usuários. O homem passou a interagir com
sua quina de forma instantânea, simplesmente por meio de estímulos sensó-
rio-motores. Inicialmente, essa concepção gca foi inspirada num ambiente
de escritório: pastas, arquivos, lixeiras etc. Logo depois, principalmente após
o surgimento da www, as interfaces grácas passaram a ter uma variedade de
representações. Para LÉVY (1999), a evolução das interfaces foi guiada, funda-
mentalmente, no sentido de melhorar a definição e a diversicação dos modos
de comunicação da informação.
Essa característica tecnogica da Internet é importante para a compreensão de
determinadas previsões e projeções feitas em relação ao meio e ao seu uso. O pa-
radigma introduzido pela interface gráfica e as conseentes mudanças na relação
homem/máquina foram considerados pela psicóloga do MIT Sherry Turkle a
passagem de uma “cultura de lculos” para uma “cultura da simulação”.
A simulão ocorreria em ambientes digitais que têm por característica fundamental o
poder de representar espaços navegáveis e habiveis. Para Janet Murray, dias como
livros e filmes retratam espos por meio de descrições verbais ou imagéticas, e apenas
o ambiente digital poderia apresentar espos nos quais seria possível se mover:
You are not just reading about an event that occurred in the past; the event
is happening now, and, unlike the action on the stage of a theater, it is hap-
pening to you. Once that trapdoor slams, the only navigational commands
that work are the ones that lead further and deeper into the troll-filled lower
world
9
(MURRAY, 1999, p.82).
9
Voo está apenas lendo sobre um evento que ocorreu no passado; o evento está acontecendo
agora, e, ao contrio de uma cena no palco de um teatro, ele acontece com você. Uma vez que
52
The ability to move through virtual landscapes can be pleasurable in itself,
independent of the content of the spaces
10
(Idem, p.129).
Vale ressaltar, pom, que essa idéia de que o computador poderia disponibilizar
um “outro espaço começou a se desenvolver na década de 1970, quando pes-
quisadores do MIT desenvolveram o jogo Zork. Por meio de uma linguagem de
programão estabeleceu-se o dlogo entre o homem e a máquina: o usuário
enviava uma informão ao computador, e este respondia seguidamente, como
se fosse uma máquina de calcular realizando operações de soma ou subtração.
Dessa característica interativa do Zork derivou a sensação de o computador abrigar
um outro tipo de espaço físico com o qual estamos acostumados — mefora do
ciberespaço. A narrativa constrda no Zork depende quase exclusivamente das
escolhas do usuário. Além de tomar decies a todo instante, ele experimenta as
conseências de suas opções. É necesrio, portanto, que o participante orquestre
suas ações à medida que aprende com seus erros e acertos. Janet Murray conside-
rava que a imero no "ciberespaço" era tamanha que os fatos não só aconteciam
à medida que eram vivenciados, como aconteciam porque o usuário estava.
Inicialmente, a existência do ambiente digital ligou-se mais à interatividade do
que à representação gráfica. No entanto, com a proliferão de sites na www nos
últimos dez anos, o quadro mudou. Conjugando potencial interativo e multimídia,
o alçapão bate, o único comando de navegação que funciona são aqueles que levam mais longe
e mais fundo nas buscas do submundo.
10
A capacidade de se mover através de ambientes virtuais pode ser prazeroso por si só, indepen-
dentemente do conteúdo desse espaços.
53
a www abriu uma variedade de possibilidades de uso e uma enxurrada de previsões
de como esse potencial técnico seria explorado. Além do cater democtico e
liberrio, a Internet originou tamm novas possibilidades de entretenimento e
sociabilidade. Uma nova mídia que oferece atividades lúdicas onde os usuários
podem interagir em tempo real:
O ciberespaço tornou-se, porém, muito mais que um mero espaço
de dados, pois, como observamos, grande parte do que ali se passa
não esvoltado para a informação. Como muitos comentadores
frisaram, o ciberespaço é usado fundamentalmente o para a coleta
de informação, mas para interação social e comunicação e também,
cada vez mais, para o entretenimento interativo, o que inclui a criação
de uma profusão de mundos de fantasia on-line em que as pessoas
assumem elaborados alteregos (WERTHEIM, 2001, p.50).
Muitos estudiosos esperavam que o espo virtual iria ser explorado como uma
arena de atuação para um “eu” mental em um plano imaterial diferente e alter-
nativo ao plano real:
People were supposed to be immersed in online worlds unto them-
selves, separete from everyday life (RHEINGOLD, 1993). Jacked into
cyberespace (GIBSON, 1984), their "second selves" world take over
(TURKLE, 1984). "Avatars" (cartoon bodies) would more accurately
represent their inner, cyberespace expressed personas (WEBB, 2001)
11
(WELLMAN, HAYTHORNTHWAITE, 2003, p.5).
11
Esperava-se que as pessoas estivessem imersas em mundos on-line, separadas da vida do dia-a-
dia (Rheingold, 1993). Mergulhados no ciberespaço(Gibson,1984), o mundo de seus "segundos-
eus" ganha força (Turkle, 1984). "Avatares" poderiam representar mais precisamente suas íntimas
personalidades (Webb, 2001).
54
A perspectiva era de que o "ciberespaço" iria se tornar, nesse sentindo, muito
mais que um espaço de dados. Grande parte do que se passaria nele o estaria,
teoricamente, voltado apenas para a informação. Segundo Wertheim, o ambiente
virtual seria usado fundamentalmente para a interação social, a comunicação, e cada
vez mais para o entretenimento interativo, o que incluiria a criação de mundos de
fantasia on-line em que pessoas poderiam despreocupadamente assumir alteregos.
A experimentão com identidades e o jogo interativo surgiram como formas
sedutoras e, mais ainda, inovadoras de sociabilidade. A comunicação em rede per-
mitiu que os indivíduos se relacionassem a distância com pessoas desconhecidas.
Facilitou a troca e reduziu a dificuldade que envolve o início de um relaciona-
mento. Ao mesmo tempo, trouxe segurança a seus atores por preservar o anoni-
mato. Rapidamente, a Internet foi considerada uma ferramenta social importante
(WERTHEIM, 2001). O domínio digital — esfera publicamente acessível de jogo
psicogicoapareceu como promessa de um lugar em que pessoas de todos os
continentes poderiam criar coletivamente “outros” mundos e experiências nas quais
seria permitido o expressar alteregos como participar de fantasias grupais
dotadas de muita imaginação. Um lugar para o convívio social e para o jogo.
As possibilidades quase infinitas de interação social traduziam-se nas salas de chats,
grupos de discuso, canais IRC, runs e nos MUDs. Os MUDs o ambientes
on-line de multiusuários onde é possível conviver com outras pessoas. Em tese,
eles conjugam toda a potencialidade do "ciberespaço" como um domínio psíqui-
co coletivo. Significando "multiuser domain" ou "donio de multiusrios", os
MUDs são uma vero eletrônica dos jogos de RPG (Role Playing Games). Nesses
jogos, mais importante do que a competição entre participantes é a constrão da
narrativa, o desenrolar da história e a densidade dos personagens criados. Muitas
características do convívio social, como confiança, responsabilidade, sentimento de
55
ganho e perda, são recriadas nesses ambientes. NEGROPONTE (1995) considerava
que os MUDs não seriam nem a casa e nem o trabalho, mas um “terceiro lugar
onde as pessoas dedicariam cada vez mais tempo de seus dias. Assim como ele,
muitos apostaram que progressivamente as pessoas iriam adotá-lo como forma de
divero e alternativa para encontrar e mesmo conhecer pessoas:
The emergence of MUDs has created a new kind of social sphere, both like
and radically unlike the environments that have existed before. As they
become more and more popular and more widely accessible, it appears likely
that an increasingly significant proportion of the population will at least
become familiar with mudding and perhaps become frequent participants in
text-based virtual realities
12
(CURTIS, apud STEFIK, 1996, p.289).
Computer connectivity seems to fill similar needs to television: entertainment
and escape (Rubin, 1981). Although we found that computer connectivity
was not significantly linked to time spent with any of the traditional mass
media, future research should explore displacement effects on television use
as entertainment-oriented
13
(PERSE, DUNN, 1998, p.490).
Esses ambientes deveriam ser valorizados, segundo alguns pesquisadores, porque
permitiriam que orescessem determinadas características pessoais não manifesta-
12
A emergência dos MUDs tem criado um novo tipo de esfera social, tanto parecida como dife-
rente das que existiam anteriormente. À medida que se tornam mais e mais populares e mais
acessíveis, parece que cada vez mais uma proporção significativa da população irá de alguma forma
se familiarizar com a interação nos MUDs e talvez se tornar participante freqüente de realidade
virtuais baseadas em textos.
13
A conectividade via computador parece preencher necessidades similares à da televisão: entre-
tenimento e fuga (Rubin, 1981). Embora nós achemos que a conectividade do computador não
fosse significativamente atrelada ao tempo gasto com qualquer das tradicionais mídias de massa,
pesquisas futuras poderão explorar os efeitos desse deslocamento do uso da televisão como entre-
tenimento orientado.
56
das por timidez ou insegurança — no convívio social diário do espaço físico.
Em um MUD, a primeira atitude que um usuário deve tomar é criar a sua p-
pria identidade. Ou seja, um personagem que, ao se relacionar com personagens
criados por outros usuários, contribui ativamente para a constrão do imagi-
nário constituinte do MUD. Ambientes de fantasia permitiriam assim, segun-
do Sherry TURKLE (1997), a expressão de ltiplos e muitas vezes inexplorados
aspectos do eu. Wertheim concordava:
Uma amiga minha adepta do MUD me disse que, para ela, o jogo é
uma maneira de expressar aspectos de si mesma que sente o serem
aprovados pelo implacável otimismo do ‘sorria e você será feliz’ da
empreendedora sociedade americana de nossos dias. A participação
num MUD lhe parece dar lugar a um aspecto mais sombrio, en-
tretanto, mais "real" dela mesma (WERTHEIM, 2001, p.172).
O uso de scaras na comunicão on-line é possível porque ela se realiza através
de interfaces. Os indivíduos o representados na rede, principalmente quando a
comunicação se em mundos virtuais, por meio de avatares. Os avatares podem
ser textuais o próprio usuário descreve textualmente suas características físicas e
psicológicas ou imagéticos frente a um número de opções, o usuário escolhe
o avatar que deseja e ainda pode se descrever textualmente. Essas máscaras garantem
o anonimato e oferecem grande liberdade para que cada um seja o que quer. Um
homem pode fingir ser mulher, um latino-americano pode-se dizer europeu, um
idoso pode voltar à juventude... Ou mais, é possível encarnar as três personalidades
ao mesmo tempo. A comunicação em rede e a possibilidade de se comunicar em
várias janelas ao mesmo tempo só fortalecem o jogo com múltiplas identidades.
Dessa forma, determinadas “marcas”, como idade, raça, estatura, cor e tipo de
cabelo, sexo e classe social são facilmente dribladas em uma comunicão on-line
realizada em ambientes de multiusrios. A liberdade disponível é tentadora e
57
pode seduzir qualquer um que se sinta tolhido por convenções éticas e estéticas
impostas na vida do espaço sico. Wertheim considerava que o "ciberespaço"
significava, principalmente para os jovens, a possibilidade de construir uma vida
melhor, uma vez que as perspectivas no espaço físico eso cada vez piores. Todas
as esperanças e sonhos juvenis encontrariam abrigo em ambientes de multiusuá-
rios. Moças e rapazes, segundo ela, encarariam esse espaço alternativo como uma
possibilidade para conhecer novas pessoas, namorar em segurança; um lugar onde
se poderia alcaar um poder e uma importância cada vez mais diceis de serem
atingidas no espaço físico. Para fundamentar sua teoria, Wertheim utiliza algumas
entrevistas feitas com usrios por Sherry Turkle:
Moro numa parte da cidade horvel. Vejo um apartamento que
é um buraco de rato, vejo um emprego que o leva a nada, vejo
AIDS. Em seu mundo no MUD, por outro lado, disse Josh: "Vejo
amigos, tenho algo a oferecer, vejo sexo seguro" (WERTHEIM,
2001, p.211).
Howard Rheingold, um dos pioneiros nos estudos sobre comunidades virtuais,
almejava que os MUDs, embora fossem mais atrativos para adolescentes e jovens
— pelo fato de possuírem mais tempo para se dedicar a esse tipo de atividade —,
seduzissem também aqueles que já m uma maior experiência de vida: For many,
a MUD is a place where they feel more confortable in some ways than they do in real
world
14
(RHEINGOLD, 1993, p.155).
A possibilidade de ser o que se deseja ser e poder conviver só com aqueles que
nos interessam criou uma certa euforia na análise das mudanças que a Internet e
14
Para muitos, um MUD é um lugar onde podem, em alguns sentidos, se sentir mais confortáveis
do que se sentem no mundo real.
58
suas possibilidades de interação e sociabilidade trariam à sociedade. Estar livre do
controle do chefe e da falia, por exemplo, e de pressões internas que cada um
se impõe no convívio social cotidiano pareciam ser uma ótima opção para uma
vida mais feliz, mais prazerosa e com o nimo de regras impositivas do tipo o
que é necessário ter” e “como se deve ser”:
Knowledge of MUDlore and skill at communicating with people to help
you achieve your ends, and the ability to create places and puzzles for
others to explore, are a form of mastery, a way for people who might lack
social status in their real-world community to gain status through their
MUD skills in their alternate community. For people whose lives are
controlled by parents or professors or bosses, there is a certain attraction
to a world in which mastery and the admiration of peers is available to
anyone with imagination and intellectual curiosity
15
(RHEINGOLD,
1993, p157-8).
De acordo com a idéia exposta acima, Wertheim acreditava que os MUDs, em um
primeiro momento, poderiam parecer não passar de fantasias juvenis, pois em geral
o ambientes fantasiosos e fantásticos. Mas sob um olhar um pouco mais atento
revelariam-se domínios surpreendentemente complexos de explorão psico-
social. Isso porque os MUDs não se baseiam unicamente em jogos. Existem também
MUDs sociais que permitem a interação de multiusuários em um mesmo ambiente
para discutir determinados assuntos ou vivenciar determinadas histórias. Nesse
15
O conhecimento dos MUDs, a habilidade de se comunicar com pessoas para ajudá-las a alcan-
çar seus objetivos e a capacidade de criar espaços e jogos para os outros explorarem o uma
forma de superioridade, uma maneira para que as pessoas que m um baixo status social em suas
comunidades do mundo real ganhem status em suas comunidades alternativas. Para pessoas cujas
vidas são controladas pelos pais, professores ou chefes, uma certa atração por um mundo no
qual a perícia e a admiração dos colegas estão disponíveis para qualquer um com imaginação e
curiosidade intelectual
59
sentido, ela defendia que a Internet seria uma ferramenta social importante, por
constituir uma esfera publicamente acessível de jogo psicológico. Para algumas
pessoas (MURRAY, 1997), o prazer de dividir um espo virtual no qual é pos-
vel “conversar com qualquer um conectado à Internet seria muitas vezes mais
prazeroso do que participar de um jogo no espo físico. Acreditando no poder
desse novo meio de entreter as pessoas, Negroponte afirmou:
No ano 2000, haverá mais gente se divertindo na Internet do que
assistindo àquilo que hoje chamamos de redes de televisão. A In-
ternet vai desenvolver-se para além dos MUDs e MOOs (que soam
demasiado como um Woodstock da cada de 1990) e começar a
oferecer uma gama mais ampla de entretenimento (NEGROPONTE,
1993, p.174).
Além de promover experiências lúdicas, a Internet, vista como um lugar terceiro
e alternativo de sociabilidade, aumentou muito as chances para a formação de co-
munidades de interesse. A aposta era que mais e mais pessoas iriam se sociabilizar
por meio da Internet, que na rede é posvel selecionar e juntar aqueles que
possuem interesses comuns independentemente das distancias geogficas. Ou seja,
a comunicação em rede favorece encontros motivados e não-casuais porque nela
é possível ltrar e classificar informões. Podem-se encontrar pessoas interessadas
nos mais variados assuntos, como religo, esporte, política, arte etc., e com elas
estabelecer novas formas de sociabilidade:
Talvez estejamos vivendo uma revero do processo de isolamento
individualista moderno, buscando, pelas tecnologias (o que é estra-
nho), uma nova forma de agregação social (eletrônica, efêmera e
planetária), o que chamo de agregão eletrônica. A cibercultura,
esse estilo” da cultura técnica contemporânea, é o produto socio-
cultural da sinergia entre a sociabilidade estética contemporânea
60
de que nos fala Maffesoli e as novas tecnologias microeletnicas
(LEMOS, 1998, p.12).
O ciberpioneiro J.C. Licklider esperava que a vida poderia ser melhor e mais feliz
para os indivíduos on-line porque as pessoas com quem estes se relacionariam
com mais intensidade seriam escolhidas por afinidades, interesses e objetivos, e o
por acidentes de proximidade. Horward Rheingold, um dos fundadores da WELL
— comunidade on-line pioneira —, chegou a acreditar que ele e seus colegas da
WELL viviam esse momento nirvânico:
Meus amigos e eu acreditamos por vezes que somos parte do futuro
com que Licklider sonhou, e freqüentemente podemos comprovar
a verdade de sua previsão (WERTHEIM, 2001, p.172).
Assim como ele, muitos outros também apostaram em uma migração efetiva rumo
ao "ciberespaço":
À medida que formos nos interconectando, muitos dos valores na-
cionais cederão lugar àqueles de comunidades eletrônicas maiores
ou menores. Nós nos sociabilizaremos em bairros digitais, nos quais
o espaço sico se irrelevante e o tempo desempenhaum papel
diferente (NEGROPONTE, 1993, p.12).
A ciberutopia sonhou com um espo virtual onde comunidades idealizadas ou
de fantasia seriam estabelecidas, livres dos entraves geográficos, dos preconceitos
de ra, sexo e idade. Essas comunidades aparentaram ser ainda mais atraentes
porque surgiram em um momento de colapso de instituões como a família e de
crescimento do isolamento e da alienação. A Internet, com sua vasta teia global,
surgiu para todos nós como umalvula de escape, em que havia a esperança de
incluo num todo social mais amplo e abrangente (WERTHEIM, 2001).
61
D
epois de tantas previsões exaltadas e esperançosas sobre as mudaas que a
Internet poderia trazer para a sociabilidade na sociedade contemponea, cumpre
traçar um paralelo entre as perspectivas criadas e a realidade que hoje se vivencia.
o se trata de meramente contrastar o que se previu que iria ocorrer e o que está
acontecendo de fato, mas de buscar construir um tipo de raciocínio pelo qual seja
possível identificar os motivos para se ter pensado de determinada forma, e, acima
de tudo, refletir sobre os motivos que levaram a sociedade a utilizar a Internet de
uma determinada maneira, eo de outra.
Acreditava-se piamente que o advento da Internet iria produzir novos tipos de
interão social. E de fato produziu. Mas esses novos modelos de interação não
alcançaram, até o momento, a magnitude que muitos esperavam. A possibilidade de
constituir comunidades virtuais on-line chegou a ser entendida como a culminação
de um processo no qual localidade e sociabilidade estariam sendo desvinculadas do
processo de formação da comunidade. Novos atrativos passariam a ser responsáveis
pela interação humana antes territorialmente limitada. Também se previu que a
Internet implicaria isolamento social e decancia da interação social e familiar,
3
UM PANORAMA ATUAL DA INTERNET
62
uma vez que os relacionamentos face-a-face perderiam progressivamente sua
imporncia e seriam substitdos por novos tipos de interão on-line. E ainda
havia a crença bastante forte de que a Internet levaria os indivíduos a viverem
cada vez mais em ambientes de fantasia on-line, onde teriam múltiplas e diversas
identidades diferentes, das vividas no espaço sico.
No entanto, o que se vivencia hoje, dez anos após a popularização do meio, é uma
realidade um tanto diferente. Segundo Manuel CASTELLS (2003), o debate sobre
como seria a introdução da Internet na sociedade, e como esta dialogaria com outros
meios de comunicação já existentes, foi prejudicado por três limitações, a saber:
.
Realizou-se em um momento muito anterior à difusão generalizada da Internet.
As observações foram feitas em cima de um número restrito de usuários do meio
de comunicação em questão;
.
Havia um mero reduzido de pesquisas emricas confiáveis sobre os verda-
deiros usos da Internet;
.
As questões levantadas para a formulão de teorias eram de caráter bastante
simplista e, em alguns casos, enganosas.
Hoje, esses entraves tendem a desaparecer. A difusão da Internet é algo que já
aconteceu, sobretudo em sociedades economicamente mais desenvolvidas, o
que já torna possível realizar algumas análises sobre os seus verdadeiros impactos
sociais.
Para comar, é valido ressaltar que a Internet é majoritariamente usada de forma
instrumental. O seu uso está intimamente vinculado a trabalho, família e relações
cotidianas. Mais de 80% das pessoas utilizam a Internet para se corresponder por
e-mail. Algumas estimativas realizadas nos Estados Unidos chegaram a mostrar que
quatro trilhões de mensagens foram trocadas em 1998 no país, e que cerca de 42%
63
1
UCLA Center for Communication Policy.
2
O e-mail reduz os custos pessoais e os riscos da comunicação escrita: menos fechado que
uma carta e menos pessoal que uma conversa telefônica. Trocar saudações e informões por
e-mail, em vez de usar o telefone, é tamm mais fácil quando muitas zonas separam os cor-
respondentes e é dicil estabelecer uma comunicação sincronizada. Há igualmente uma ótima
motivação em mandar um e-mail, pois sabe-se que ele será recebido em poucos minutos, em
vez de demorar dias.
dos americanos verificam diariamente suas caixas de e-mail (UCLA CCP
1
, 2000).
Os pprios usuários consideram a necessidade de conferir os e-mails pessoais o
motivo número um de acessar a Internet.
Um dos fatores que contribui para essa estatística é que o e-mail não requer muitas
habilidades e nem um aparato tecnológico muito apurado. Am disso, serve bas-
tante bem como veículo de comunicão, com alguns efeitos o encontrados em
comunicação via telefone ou mesmo na interação face-a-face. Com o e-mail, por
exemplo, é possível enviar uma mesma mensagem para várias pessoas ao mesmo
tempo ou atéltrar com quem se deseja manter comunicação.
E-mail reduces the personal costs and risks of written communications: less
committal than a letter and less personal than a telephone conversations.
Exchanging greetings and information by e-mail rather than by phone is
also much easier when many time zones separate the correspondents and
make synchronous communication difficult. There also appears to be a greater
motivation to send e-mail, knowing that it will be received in matther of
minutes, rather than days
2
(NIE, HILLYGUS, ERBRING, apud WELL-
MAN, HAYTHORNTHWAITE, 2002, p.233).
Outro uso bastante corrente na Internet é a busca de informações de qualquer
tipo: esportes, viagens, notícias, trabalho, informões sobre produtos etc. Tanto os
usuários mais antigos como os mais recentes classificam a busca por informões
como a primeira ou segunda razão de estar on-line. Segundo o UCLA report (UCLA,
64
CCP, 2000), dois terços dos usuários consideram a Internet um importante meio
para se pesquisar e obter informações.
Em relão à especulão a respeito do papel da Internet como um terceiro lu-
gar de sociabilidade, diferente e desconectado do espaço sico, encontra-se hoje
uma posição mais crítica e criteriosa sobre o assunto. É lógico que a Internet foi
apropriada pelas práticas sociais, mas com determinadas características que muitos
teóricos não haviam considerado anteriormente:
The Internet is no longer just a third place where people go to escape and
play with games and identities. Today, many of the common forms of daily
social interaction can be conducted online, from checking the news and sports
scores to researching and booking travel reservations. However, there is little
consensus about wheter the ability of useres to conduct personal and profes-
sional life trough Internet technologies is ultimately good or bad for society
at large, local communities, or individual well-being (Wellman and Giulia,
1999)
3
(HOWARD, RAINIE, JONES, apud WELLMAN, HAYTHORN-
THWAITE, 2002, p48).
O uso da Internet como um meio no qual seria possível a construção de diversas
identidades e onde a representação de papéis fantasiosos teria um grande valor
ficou restrito a uma poão bem pequena da sociabilidade desenvolvida na rede.
Na verdade ela é mais restrita aos adolescentes, que, segundo Manuel Castells,
estão na fase de fazer experimentações com suas identidades:
3
A Internet não é mais apenas um terceiro lugar onde as pessoas fogem ou participam de jogos
e brincam com identidades. Hoje, muitas das formas mais comuns da interação social diária
podem ser realizadas on-line, desde checar as notícias e resultados esportivos apesquisar ou
fazer reservas de viagem. De qualquer modo, o consenso é pequeno a respeito de se a habilidade
do usuário em conduzir sua vida pessoal e profissional por meio da tecnologia da Internet é
realmente boa ou ruim para a sociedade como um todo, para as comunidades locais ou para o
bem-estar individual.
65
De fato, são os adolescentes que estão no processo de descobrir
quem realmente são ou gostariam de ser, oferecendo assim um
fascinante campo de pesquisa para a compreensão da construção
e da experimentação da identidade. No entanto, a proliferação de
estudos sobre esse assunto distorceu a percepção pública da prática
social da Internet, mostrando-a como o terreno privilegiado para
fantasias pessoais (CASTELLS, 2003, p.99).
A constatação de que a experimentação com identidades em ambientes on-line
ficou restrita a um determinado público é reforçada ao se analisar a percentagem
de tempo total gasto em salas de bate-papo (chats). Em 2001, segundo o relario
da UCLA (Surveying the Digital Future Year Two, p.18), os usuários com mais de seis
anos de contato com a Internet ocupavam 1,8% do tempo conectados em chats,
enquanto os iniciantes despendiam 6,5%. no ano seguinte, essa percentagem
caiu para 0,7% e 1,8%, respectivamente.
A promessa de sociabilidade irrestrita na Internet o se concretizou da forma que
foi idealizada. A esperança de que comunidades virtuais on-line seriam capazes de
reunir pessoas com interesses comuns, e que esses estimulariam o surgimento de
laços sociais mais fortes, como de amizade, por exemplo, podendo culminar até
em interação face-a-face, não se realizou com o escopo previsto. A experiência
vivida pela WELL permitiu, de certa forma, obscurecer a realidade e estimulou a
crença de que aquele tipo de comunidade on-line iria se reproduzir com grande
facilidade na Internet. Cabe ressaltar que a própria WELL, ao longo dos seus anos
de existência, teve que sofrer transformações para se adaptar às necessidades de
comercialização e à troca de proprierio. Na verdade, à medida que a Internet foi
sendo incorporada ao cotidiano das pessoas, seus efeitos se mostraram bem menos
espetaculares do que se imaginava.
66
Pesquisas realizadas em países do Primeiro Mundo demonstram que o uso da
Internet não levou a um isolamento social e nem uma diminuição da in-
teração face-a-face. Ao contrário, a interação on-line passou a fazer parte das
relações sociais que eram mantidas no espaço sico, ou por meio de intera-
ção face-a-face ou via outros meios de comunicação como o telefone. Em um
estudo promovido pela Telecom Britânica (BT), centrado no uso doméstico da
Internet no Reino Unido, constatou-se não haver muita diferea entre o co-
tidiano e o comportamento social de usrios eo usuários da Internet. Além
disso, demonstrou-se que a interação on-line e por telefone reforçam o contato
com os amigos.
Após analisar o comportamento de cerca de 2.600 pessoas, em aproximadamente de
200 domicílios, os pesquisadores Ben Anderson e Karina Tracey constataram que:
o há incios, a partir destes dados, de que indivíduos que têm
agora acesso à Internet em casa e a utilizam estejam gastando
menos tempo assistindo televio, lendo livros, ouvindo dio ou
envolvidos em atividade social em casa se comparados a indivíduos
que não têm (ou o m mais) acesso à Internet em casa. As únicas
mudanças que podem ser associadas ao ganho de acesso à Internet
o um aumento do tempo dedicado ao e-mail e ao surfe na web
um resultado espantosamente óbvio. As únicas mudanças que
podem ser associadas à perda do acesso à Internet são o menor
tempo gasto no preparo da comida, mudanças em circunsncias
educacionais e no emprego remunerado baseado em casa (CAS-
TELLS, 2003, p.101).
O que se percebe é justamente o contrário. A Internet permite um refoo dos
laços sociais com os amigos e com a família. Em um levantamento realizado em
2000 pelo Internet and American Life Project (2000), do Pew Institute, considerado
67
uma amostra nacional significativa, o e-mail é capaz de ampliar os contatos sociais
gerais e ainda ampliar o contato com a família e os amigos. Para Castells, se algo
pode ser inferido sobre a Internet nesse sentido é que ela tem um efeito positivo
sobre a interação social e estimula o contato com outras fontes de informão. No
entanto, o pprio autor ressalta que há alguns relatos conflitantes sobre o uso da
Internet pela sociedade. Dois estudos são citados quando se prentende provar que
a Internet leva, sim, a um isolamento social: um levantamento on-line promovido
pela Universidade de Stanford e um estudo de Pittsburgh. Mas embora as duas
pesquisas tenham sido realizadas por instituições de nome e respeito, Castells faz
ressalvas ao modo como foram conduzidas, pois permitem uma visão um pouco
distorcida da realidade:
No caso do estudo de Pittsburgh, um fator importante parece ter
sido o fato de que aquelas famílias estavam usando a Internet pela
primeira vez: na verdade, foram os pesquisadores que lhe forneceram
computadores com o objetivo de observar o seu comportamento
(CASTELLS, 2004, p.104).
No caso do levantamento de Nie e Erdring (2000) [Universidade
de Stanford], a perda de sociabilidade relatada dizia respeito apenas
aos usuários mais assíduos da Internet, o que poderia indicar a exis-
tência de um limiar de uso da Internet acima do qual a interação
on-line sacrifica a sociabilidade off-line (Idem).
Portanto, de um modo geral, o corpo de dados não sustenta a tese de
que o uso da Internet leva a menor interação social ou ao isolamento
social (Idem).
Em 1998-99, Keith Hampton e Barry Wellman desenvolveram um estudo sobre o
subúrbio de Netville, localizado em Toronto, no Canadá. No total, cerca de 65%
das 120 casas do local passaram a ter acesso à Internet com banda larga em tempo
integral gratuitamente por dois anos, com a condição de que seus proprierios
68
4
Nossa pesquisa tem sido guiada pelo desejo de estudar comunidades off-line assim como as on-line.
Estamos interessados na totalidade das relações nos nós das comunidades, e não apenas no comporta-
mento em um meio de comunicação ou localidade. Nesse ponto, nos diferenciamos dos estudos de
comunidades virtuais que olham apenas para as relações on-line (veja alguns em Smith & Kollock,
1999) e dos tradicionais estudos sociológicos de in-person, comunidades baseadas no bairro. O padrão
superenfatiza a prevalência apenas dos laços no computador, enquanto o último ignora a importân-
cia do transporte e comunicação ao conectar membros de uma comunidade que estão distantes.
Ao contrário de muitos estudos de CMC [computer-mediated communication] que observam estudantes
num laboratório experimental (reveja em Sproull & Kiesler, 1991;Walther, Anderson,& Park, 1994),
estudamos pessoas em seus ambientes reais. Nós focalizamos aqui os efeitos da novas tecnologias de
comunicação sobre os habitantes da conectada vizinhaa de Netville.
fornecessem as informões necesrias para a pesquisa. Para Hampton e Wellman,
o estudo desenvolvido em Netville é pioneiro e diferente de muitos outros sobre
comunidades on-line:
Our research has been guided by a desire to study community offline as well
as online. We are interested in the totality of relationships in community
ties and not just in behavior in one communication medium or local. This
we differ from studies of virtual community that only look at relationships
online (see some of the chapters in Smith & Kollock, 1999) and from tra-
ditional sociological studies of in-person, neighborhood-based communities.
The former overemphasizes the prevalence of computer-only ties, whereas
the latter ignores the importance of transportation and communication in
connecting community members over a distance. Unlike many studies of
CMC that observe undergraduates in laboratory experiments (reviewed in
Sproull & Kiesler, 1991; Walther, Anderson,&Park, 1994), we study people
in real settings. We focus here on the effect of new communication technolo-
gies on the residents of the wired neighborhood of Netville
4
(HAMPTON,
WELLMAN, 2001, p.478).
Os pesquisadores perceberam que o uso da Internet ampliava os relacionamentos
sociais, tanto os que eram mantidos nas comunidades locais quanto os mantidos à
distância. Isto é, os usuários da Internet estabeleciam mais laços sociais — fossem
69
eles fortes ou fracos —, maior conhecimento do próprio bairro e também de as-
suntos externos do que as pessoas que não estavam conectadas. Isso não ocorreu
pelo fato de a Internet possuir ou ser algo especial:
It is not that the Internet is special. Rather, the Internet is another means
of communication used along with existing media, especially in-person
contact and the telephone. When distance makes in-person and telephone
communication difficult, CMC has the potential to fill the gap. CMC seems
especially useful for increasing contact and support for those who previously
had been just out of reach. The Internet fosters globalization: it increases
local as well as global contact. The blossoming of the Internet has affected the
ways in which people connect with each other, eliminating the financial cost
of long-distance communication, reducing the time cost of contacting far-away
people, and emphatizing communication by written text—e-mail—rather
than by audio (phone) or audiovisual (in person)
5
(HAMPTON , WELL-
MAN , 2001, p.492).
Os pesquisadores chegaram à conclusão de que, embora algumas comunidades
funcionem apenas on-line, como a WELL, na ptica a maioria das pessoas utiliza a
Internet como um meio de comunicação para estar em contato com outras pessoas
ou membros das suas pprias comunidades. O principal é que, ao contrio das
previsões alarmistas, as novas tecnologias de comunicação, neste caso a Internet,
o afastam as pessoas de suas comunidades. Ao contrário: ela reforça relaciona-
5
o é que a Internet seja especial. Mais propriamente, a Internet é um outro meio de comunicação
usado junto com a mídia já existente, especialmente o contato face-a face e ao telefone. Quando a dis-
ncia torna esse contato pessoa-a-pessoa ou pelo telefone dicil, o CMC tem o potencial de acabar com
essa brecha. O CMC aparece especialmente útil para aumentar o contato e dar suporte para aqueles que
anteriormente deixaram de estar ao alcance. A Internet promove a globalizão: aumenta o contato local
ao mesmo tempo que o global. O desenvolvimento da Internet tem afetado as formas como as pessoas se
conectam umas com as outras, eliminando os custos nanceiros de uma comunicação a longa distância,
reduzindo o tempo gasto em contatar pessoas distantes e enfatizando a comunicação por textos escritos
e-mail em lugar do contato por áudio (telefone) ou audiovisual (face-a-face).
70
mentos já existentes e mantém laços que poderiam ser perdidos pelas dificultades
na manuteão de uma comunicação.
Para Castells, a Internet tem um papel bastante relevante na estruturação de
relações sociais e contribui muito para o que ele chamou de um novo padrão
de sociabilidade baseado no individualismo. O que isso quer dizer? Que sem-
pre os indivíduos viveram em redes sociais, só que agora essas redes passaram
a ser mediadas pelo computador. Ou seja, a interação social on-line permite
organizar as relações sociais de uma forma geral. O individualismo em rede não
significa uma série de indivíduos isolados, mas sim um padrão social. Baseados
em interesses ou valores comuns, os indivíduos montam suas redes, sejam elas
off-line ou on-line:
Communities and societies have been changing towards “individuali-
zed networks. In networked societies, boundaries are more permeable,
interactions are with diverse others, linkages switch between multiple
networks, and hierarchies are flatter and more recursive (Wellman, 1997,
1999a, 1999b; Castells, 2000). Hence, many people and organizations
communicate with others in ways that ramify across group boundaries.
Rather than relating to one group, they cycle through interactions with
a variety of others, at work or in the community. Their work and com-
munity networks are diffuse, sparsely knit, with vague, overlapping, social
and spatial boundaries
6
(WELLMAN, QUAN-HAASE, BOASE, CHEN,
2002, p.12).
6
Comunidades e sociedade têm mudado rumo a cadeias individualizadas”. Nas sociedades em
rede, as fronteiras são mais permeáveis, as interações ocorrem de formas diversas, conexões lançam-
se entre múltiplas redes, e as hierarquias são horizontais. Por isso, muitas pessoas e organizações se
comunicam de maneiras que ramificam as fronteiras do grupo. Mais que se relacionar com um
grupo, eles circulam por meio de interação com uma variedade de pessoas, no trabalho ou na
comunidade. Seus trabalhos e redes de comunidade são difusas, com barreiras sociais e espaciais
vagas e superpostas.
71
A formação dessas redes individuais on-line pode originar comunidades no
espaço sico e comunidades virtuais, o que permite o desenvolvimento de um
tipo de comunicação cada vez mais presente em nosso cotidiano: a comunicação
híbrida, na qual relações sociais são estabelecidas e mantidas tanto em espaços
físicos quanto em ambientes virtuais. E a Internet seria, dessa forma, o suporte
tecnológico que permite a integração desses dois tipos de comunicação: a on-
line e a off-line:
Ela [Internet] é, na maior parte dos casos, um modo de realizar a
distância atividades que outrora dependiam da proximidade física ou
de outros meios de comunicação. De fato, ela parece se constituir
num modo de ser dos indivíduos, num modo de construir e manter
laços familiares, de amizade e de trabalho; de agir a distância; e, por
fim, de obter e processar informações. Mais do que o tema de um
lugar especial onde novas formas de sociabilidade podem ocorrer, o
que parece predominar é o tema do híbrido, isto é, o problema da
integração e depenncia dos indivíduos em relação a um objeto
técnico (VAZ, 2004, p.4).
Nesse sentido, cabe retomar a refleo a respeito das previsões feitas inicialmente
sobre os impactos que a Internet causaria na sociedade. Muito do que se disse não
se concretizou e muitas esperaas foram desfeitas. Como já visto anteriormente,
esse tipo de raciocínio equivocado ocorreu porque se pensou a Internet a partir
de suas especificidades técnicas, crendo que elas seriam suficientes para promover
determinadas transformações.
O racionio mais coerente no momento seria tentar entender os efeitos da so-
ciedade na Internet. Isto é, compreender sua importância na sociedade contem-
porânea, que nada mais é que uma sociedade organizada em rede. Mais que isolar
indivíduos, permitir a manifestação de ltiplas identidades ou ainda ser uma
72
ágora eletnica, a Internet deve ser estudada e vista como uma dia essencial na
contemporaneidade. Um meio de comunicação que foi apropriado pelo cotidiano
das pessoas, tanto no ambiente de trabalho como na execução de tarefas do dia-
a-dia, como pagar contas, fazer compras de supermercado ou marcar encontros
com amigos.
73
As expectativas exageradas e as esperanças criadas em torno do surgimento
da Internet permitiram que o conceito de "ciberespo" fosse entendido como
uma dimeno complementar do espaço físico e que iria conferir à sociedade
contemporânea possibilidades inéditas e mudanças drásticas no trabalho, comuni-
cação, diversão, sociabilidade e até no pensamento. Desde a invenção da interface
gráfica, da Internet e, principalmente, da World Wide Web, essas esperaas foram
demasiadamente infladas, e chegou-se a acreditar que acompanhaamos um pro-
cesso de migrão para o information space. Isto é, que progressivamente atividades
restritas ao mundo físico passariam a ser realizadas preferencialmente no mundo
digital. O ambiente digital foi rapidamente encarado como um meio alternativo e
terceiro. Nele, as pessoas poderiam conviver socialmente, seja freqüentando chats,
runs, canais IRC ou integrando mundos de fantasia conhecidos como MUDs,
esvaziando-se as relações sociais estabelecidas no espo físico.
Um dos ambientes que logo foi proclamado como emblemático de um futuro
em que a sociabilidade e o convívio em comunidade se deslocaria para a rede
4
COMUNIDADES VIRTUAIS E
A SOCIABILIDADE NA REDE
74
foram os MUDs. Isso porque nesses ambientes há a possibilidade de interagir com
outras pessoas conectadas à rede e ainda com o ambiente no qual se está imerso.
Ou seja, além de uma conversação on-line, os usuários são também influenciados
pelo lugar onde esta acontece.
Os MUDs nada mais são que mundos virtuais. Isto é, ambientes em que se pode
explorar, modificar e compartilhar o conteúdo de um banco de dados com ou-
tros usrios em tempo real. Esses mundos virtuais podem ser baseados tanto em
interfaces textuais, como o LambdMOO, quanto em interfaces gráficas, como é o
caso do Alpha World.
Nos MUDs baseados em interfaces exclusivamente textuais, os usuários devem, além
do conteúdo da conversa, descrever sua própria imagem. Como não uma repre-
sentação gráfica do ambiente nem dos sujeitos em que nele estão, a identidade de
cada um é construída por meio de descrições textuais. Essas descrições permitem
total liberdade para cada um ser o que quiser. O avatar identidade assumida pelo
indivíduo na rede é, na maioria das vezes, único e personalizado, pois dificilmente
duas pessoas se descreverão com as mesmas características e detalhes.
Porém, o aperfeiçoamento das interfaces gráficas e a freqüente conceituação do
espaço informacional como um novo lugar estimularam a necessidade de repre-
sentar as conversas on-line e seus participantes não textualmente como também
graficamente. Assim surgiram MUDs com interfaces gráficas bidimensionais e,
posteriormente, tridimensionais, onde tanto os avatares como os lugares onde se
conversa possuem representões gficas. Cada participante, ao entrar no mundo,
escolhe um avatar constituído e assume, então, sua nova identidade.
Nesses ambientes de multiusuários, mais importante do que a competição entre os
participantes é a construção da narrativa, o desenrolar da história e a densidade dos
75
personagens criados. E isso vale também para os MUDs. Um jogo sem tabuleiro e
sem peões. Cada indivíduo é o seu próprio peão, e o tabuleiro é o ambiente onde
se realiza a interação.
Logo os MUDs deixaram de se basear unicamente em jogos. MUDs sociais foram
criados para permitir a interação de multiusuários num mesmo ambiente para
estabelecer vínculos. Em geral, esses mundos possuem modelos interativos seme-
lhantes. A grande diferença é que cada um possui uma temática própria, expressa
em características visuais peculiares. A diferença desses ambientes é, em grande parte,
marcada por sua interface. Alguns MUDs são versões virtuais de pontos turísticos,
outros simulam enredos de hisrias cinematográficas, como Godzila e Arquivo X.
O TrekMUSE, por exemplo, é um MUD Jornada nas Estrelas onde os participantes
podem a adquirir suas naves interestelares.
Assim como nos jogos de RPG, cada participante escolhe um personagem dentro
da história, ou dentro do ambiente. E com ele vivencia uma série de histórias,
narrativas construídas por ele e pelos demais participantes. Da mesma forma que
quando lemos incríveis romances somos transportados para uma realidade adjacente
repleta de outros personagens, tentou-se criar uma sensação de estar em outro
lugar ao caminhar por ambientes virtuais.
O que se proclamava como o mais interessante nos MUDs eletrônicos, e que seria
o seu grande diferencial para todos os tipos de entretenimento e convio social
existentes, é que o participante de um MUD seria uma espécie de "autor", uma
vez que poderia criar e alterar o espo em que estivesse inserido. O ambiente
em que se estabelece a comunicação o es plenamente formado, e a tarefa de
complementar esse mundo seria dos seus próprios habitantes: “Denominar é criar,
e nos mundos MUD o simples ato de denominar e descrever é tudo que é preciso
para gerar um novo alterego ou ‘cibereu’ (WERTHEIM, 2001, p.171).
76
Muitos tricos acreditaram que progressivamente as pessoas passariam a fazer
parte de comunidades on-line e que estas chegariam a substituir comunidades
geograficamente localizadas, alterando espantosamente a forma de se relacionar
em sociedade.
4.1 Alpha World: mundo de fantasia como
promessa de sociabilidade na rede
Um exemplo do tipo de comunidade que faria parte dessa mudança é o Alpha
World, um dos maiores e mais conhecidos mundos virtuais 3D dos mais de mil
acessíveis via complexo do Active World
1
. Desde que foi colocado na Internet, em
1995, já havia sido visitado por mais de 800 mil usuários. Assim como os demais
MUDs de sua categoria, o Alpha World possui uma interface gráfica que permite
visualizar os usuários e o ambiente na tela. É posvel conferir a estrutura geográ-
fica, a topologia e a espacialidade desse ambiente.
Inicialmente, o espaço do Alpha World era totalmente vazio. Uma superfície mal-
traçada, sem caractesticas naturais, com uma coloração esverdeada simulando,
como no mundo sico, a idéia de uma terra virgem clamando por ser habitada.
Esse espaço é desde o início metrificado por sistema de coordenadas cartesianas
próprias, sendo estabelecido um ponto de origem (0,0), chamado de Ground Zero
(GZ). Esse é um ponto focal onde a maioria dos visitantes entra no Alpha World.
O sistema divide o plano em células de 10x10 metros e permite que os avatares
se transportem para qualquer ponto do mundo. Por exemplo, as coordenadas
57N 64W significam que se deseja ir 570 metros ao norte e 460 a oeste da escala
GZ.
1
Dados de dezembro de 2001.
77
Além de coordenadas geográficas, existe tamm uma medão ppria do tempo,
o Alpha World Standart Time (AWST). Como esse mundo abriga cidadãos e turistas
de todas as partes do mundo, foi necesrio convencionar uma hora padrão para
evitar desencontros provocados pelas diferenças de fusos horários no mundo físico.
Como esse padrão o é adotado por nenhum país na realidade, ele foi atualmente
alçado à categoria de Virtual Reality Time (VRT).
À medida que os usuários entram e tornam-se cidadãos do Alpha World, os espaços
vazios começam a ser preenchidos. Os próprios usuários é que m a responsabilidade
de construir esses espaços. Ao se tornarem membros do mundo, recebem um kit com
objetos definidos, uma espécie de Lego virtual.o quase mil peças diferentes que
podem ser combinadas entre si das mais variadas formas. É posvel construir portas,
janelas, estradas, paredes, flores, qualquer coisa. E embora sejam criadas estruturas bi-
zarras e inéditas, alguma homogeneidade elas terão, porque a matéria-prima delas é
sempre a mesma. A interface é, de certa forma, construída pelos próprios usuários a
partir de pas fornecidas pelos designers iniciais desse mundo.
Avatar: representação
gráfica do sujeito
FIG. 1: Simulação da realidade física. Um espaço vazio que deve ser preenchido
pelos participantes do Alpha World.
78
É curioso, porém, que com toda a liberdade dada aos cidadãos para criar qualquer
estrutura nesse mundo, inclusive formas abstratas e irrealizáveis fisicamente, a maioria
deles prefere construir objetos que existem e são comuns no mundo físico. Prédios,
casinhas, ruas, tudo que possa remeter à vida real no mundo físico é recriado, talvez
para ser mais fácil se sentir familiarizado no novo ambiente. O apego por interfaces
que simulam o mundo físico é, ainda, reforçado pelo fato de que as estruturas não-
convencionais dificultam a navegação e afastam novos visitantes.
É paradoxal, entretanto, que, apesar de simular o mundo sico, possuindo até coor-
denadas geográficas para a medição do espaço e escala para monitorar o tempo,
o Alpha World, assim como o "ciberespaço" como um todo, não está sujeito às
limitões impostas ao mundo sico. Em vez de átomos, moléculas e matérias,
esses ambientes possuem como matéria-prima as informações em rede, um dos
principais fatores que permitiu que se apostasse alto nas suas possibilidades de
sucesso e transformação do convívio social.
Moinho
FIG. 2: Espaços do Alpha World sendo preenchidos. Aqui já se pode ver que algum
participante inseriu um moinho no ambiente..
79
4.1.1. Interface e interação no Alpha World
A interface gráfica do Alpha World é divida em três janelas principais: a primeira e
a segunda servem diretamente para a interação entre os usuários, e o as janelas
de visualização do mundo e para a conversa textual. A terceira abriga o painel
de controle.
Na janela principal o usuário vê o mundo através dos olhos do seu avatar. Ele
tanto pode se ver, isto é, ver o seu avatar, como ver o mundo pela visão do seu
avatar. À medida que a sua representão caminha pelo ambiente, se aproximando
de um determinado local, a visão que temos na tela muda, nos aproximando e
afastando de determinados lugares. É comum também encontrar outros avatares
vagando pelo ambiente, são os outros cidadãos ou turistas do Alpha World.
Prédio virtual
FIG. 3: Nessa imagem o espaço foi preenchido por uma rua asfaltada e
por um prédio de quatro andares.
80
Além de conversar com outros cidadãos do mundo, você pode explorar o ambiente.
Ao contrio do mundo físico, não há meios de transportes no Alpha World. Sem
carros, aviões ou trens, a solão é caminhar. Andar pelas ruas e estradas desse
mundo é uma aventura inédita. Mas se andar é uma tarefa banal e entediante,
o há problema; é possível também voar. Entretanto, o meio de locomoção mais
interessante e mais contrastante com a meticulosa simulação desse mundo é o te-
letransporte. Por meio dele é posvel instantaneamente alcançar qualquer ponto
do Alpha World; basta informar as coordenadas de onde se deseja chegar.
O Alpha World foi pensado numa tentativa de mesclar fisicalidade e virtualidade.
Sua dimensão física se ligaria ao fato de ele possuir referências geográcas bas-
tante precisas, possuir objetos similares aos reais-físicos, ser construído por uma
Janela
gráfica
Janela textual
Janela de
controles
FIG. 4: Interface gráfica do Alpha World. A interação é realizada
por meio de três janelas.
81
linguagem (de programação) e, principalmente, por se estruturar sobre relões
sociais entre os seus cidadãos. Contudo, seria também um lugar não-físico,o-
material. Um espaço em constante mutação e construção. Um ambiente livre de
problemas reais como terremotos, tempestades e incêndios. Enfim, um espaço
virtual.
Porém, a popularização da Internet na última década não veio acompanhada de
umamigração rumo ao espaço virtual como muitos estudiosos e interessa-
dos no assunto estimaram. O convívio em mundos de fantasia ou em mundos
virtuais com as características do Alpha World cou mais restrita a adolescentes
e jovens. Não houve, e nem parece que irá haver, também, como previsto, um
esvaziamento do convio social em ambientes sicos como bares e praias. Como
se mostrou no capítulo anterior, o que se vive cada vez mais é integração entre
o convívio na rede e o convívio no espaço físico, no qual as atividades realiza-
das em ambientes virtuais são em grande parte um meio de reforçar as relações
sociais existentes.
Um exemplo de comunidade que têm justamente a inteão de reforçar o con-
vio com os amigos e familiares e que no Brasil está fazendo grande sucesso é a
comunidade Orkut. Essa comunidade possui o objetivo de promover a sociabilidade
e permitir a interação na rede, assim como a comunidade do Alpha World. Pom,
ao analisar com minúcia o sistema de navegação da comunidade e compreender
como e por que a interão se dá, é fácil distinguir suas peculiaridades em relação
aos MUDs e aos ambientes de fantasia que tanto se declarou como promessas de
sociabilidade na sociedade contemponea.
82
4.2 Orkut: uma comunidade on-line diferente
O Orkut foi criado pelo turco Orkut Buyukkokten, de 29 anos, funcionário
do famoso site de busca Google. Ele se inspirou em um trabalho anterior, de-
senvolvido no Club Nexus, um sistema desenvolvido em 2001 por estudantes
da Universidade de Stanford com o objetivo de ajudá-los em suas necessidades
de informação.
A iia que Buyukkokten pensou em colocar em prática no Orkut foi a criação
de uma comunidade que posssse a seguinte caractestica: ser um clube privativo.
Impôs, portanto, a premissa básica de que para fazer parte dessa comunidade virtual
o basta querer. É necesrio ser convidado. Ou seja, algum conhecido ou amigo
deve mandar um e-mail com o convite para integrar a comunidade. assim é
possível penetrar nesse mundo. Essa restrição existe para que, necessariamente,
o novo integrante do Orkut conheça pelo menos um participante no meio e,
dessa forma, já tenha com quem se relacionar. Há assim um ponto de partida para
o estabelecimento de novos laços sociais. Segundo Buyukkokten, o diferencial de
sua comunidade com relação a tantas outras que existem na Internet é que ela é
uma rede de amigos confiáveis, como se pode ler na gina inicial:
Orkut is an online community that connects people through a network of
trusted friends. We are committed to providing an online meeting place where
people can socialize, make new acquaintances and find others who share
their interests
2
(https://www.orkut.com).
2
Orkut é uma comunidade on-line que conecta pessoas por meio de uma rede de amigos con-
fiáveis. Nós nos comprometemos em promover um lugar de encontros on-line onde pessoas
podem se sociabilizar, fazer novos conhecidos e achar outras pessoas com quem possam partilhar
seus interesses.
83
O fato de as relações sociais estabelecidas no Orkut terem algum tipo de ligação
com o mundo real é um motivo bastante relevante para o seu sucesso. Muitas
pessoas que não se interessavam por relacionamentos on-line enxergaram no
Orkut uma possibilidade de manter contato com amigos mais distantes ou que
se perderam no tempo. E quem deseja conhecer novas pessoas não se sente
entrando em um ambiente totalmente desconhecido, como ocorria em outros
ambientes de sociabilidade on-line, como as salas de bate-papo, por mais que os
chats fossem organizados pelos mais variados temas, como por exemplo: amor,
amizade, música, idade etc. Em geral conversa-se com pessoas nunca vistas e
totalmente animas. O objetivo do Orkut é o de sociabilidade na Internet, mas
de uma forma diferente. É necessário estabelecer comunicação com pessoas já
conhecidas para, aí sim, partir para uma busca pelo desconhecido, se este for
o desejo. Segundo a teoria dos Seis Graus de Separação com seis contatos
chega-se a qualquer pessoa do planeta —, na qual se baseia a comunidade, é fácil
descobrir amigos em comum de seus amigos:
Eu não costumo freqüentar salas de bate-papo, diz Gabriel Souza.
"Mas achei o Orkut interessante porque você pode buscar pessoas
e ainda reencontrar amigos"
(Apud Revista Época, 16 de agosto de
2004).
No Brasil o sucesso do Orkut foi algo surpreendente. Segundo dados colhidos
pelo IBGE, em 12 de agosto de 2004, o cerca de 1.211.000 usuários em todo
o mundo, sendo que os 599.343 desses são brasileiros, ou seja, 49,41% do total
da comunidade. Esse mero ainda pode ser maior uma vez que muitas pessoas
mentem ao preencher o seu perfil dizendo que o de outros países, na tentativa
de driblar um possível boicote que estaria sendo armado para os brasileiros. Alguns
boatos circularam na Internet dizendo que o acesso ao Orkut ficava bem mais
lento e com muitas possibilidades de erro para quem se declarava natural do Brasil.
Nada foi comprovado, porém, apesar de ser fato que houve muita reclamação de
84
que os brasileiros estariam se apropriando do Orkut, estabelecendo, inclusive, o
português como língua padrão para a comunicão.
4.2.1 As características técnicas do Orkut
Após receber o convite, o futuro usuário tem acesso ao sistema do Orkut e come-
ça a preencher um extenso e detalhado cadastro sobre si. Assim, vai construindo
a sua página pessoal na comunidade, que possui um layout pado para todos os
seus participantes, o que facilita bastante a navegação, principalmente para os
iniciantes. Os dados incldos nela podem ser alterados apenas pelo seu dono, e
a maioria das informações ali inseridas são acessadas — visualizadas — pelos que
o considerados amigos na comunidade.
FIG. 5: Página inicial do Orkut (home page).
Senha de acesso
Nome do
membro
85
A página principal de cada integrante é divida em ts áreas principais, a saber:
.
Nome da pessoa, foto e perfil, localizados do lado esquerdo da gina;
.
Álbum de amigos, situado no canto superior direito;
.
As comunidades de que se faz parte, no canto inferior direito da página.
Nome,
foto e
perfil
Comunidades Amigos
FIG. 6: Exemplo de página pessoal
4.2.1.1 Nome da pessoa, foto, e perfil
Essa é a primeira parte da página pessoal montada pelo novo participante, que pre-
enche um cadastro sobre a sua vida. O cadastro é divido em ts partes. A primeira
chama-se general. Nela o feitas perguntas mais gerais como data de nascimento,
estado civil, sexo, nacionalidade, religião, orientação política, além de uma breve
descrição pessoal. A segunda, chamada de interested”, é centrada nos gostos de cada
86
um. Esportes preferidos, filmes mais interessantes, sicas que marcaram, livros de
cabeceira e cozinha mais apetitosa o informões que o usuário preenche para
que os outros possam conhecer ainda mais sobre a sua vida. A terceira e última
janela é “contacts”. Nela é posvel deixar anotados e-mail, telefone e mesmo o
endereço pessoal no mundo físico.
Vale ressaltar que não é necessário preencher o cadastro completo. É possível escolher
que tipo de informações se quer disponibilizar e quais se prefere manter em sigilo.
Além disso, pode-se determinar quem pode acessar essas informações. Por exemplo,
FIGS. 6 e 7: Exemplo do cadastro que o novo usuário deve preencher para compor o seu perfil.
General Contacts
As chaves indicam que possi-
blidade de selecionar quem terá
acesso aos dados registrados ali. É
uma forma de preservar minima-
mente algumas informações mais
íntimas, se este for o desejo.
87
no caso da janela contacts”, informações como telefone e endereço podem ficar vi-
síveis apenas para o próprio usuário, para os amigos dele, para os amigos dos amigos
ou, para qualquer um da comunidade. Esse sistema permite que cada um estabeleça
o grau de privacidade que deseja ter sobre sua vida e seus dados.
Na última janela desse perl há a possibilidade de escolher uma foto que será o
seu cartão de visitas. Em geral é uma foto de rosto para facilitar a identificação.
Algumas pessoas preferem selecionar uma imagem que seja característica de sua
personalidade ou que represente algo do seu modo de vida. Mas a maioria pre-
fere fotos pessoais, variando das mais descontraídas às posadas. Essa característica
do Orkut é curiosa porque se opõe diretamente ao anonimato o exaltado logo
as o surgimento da Internet.
A Internet possibilitou a comunicação em várias janelas e conseqüentemente a
possibilidade de se adotarem múltiplas personalidades em ambientes virtuais de
sociabilidade. Uma das grandes vantagens que muitos teóricos proclamavam sobre
a comunicação em comunidades virtuais estava no fato de que cada um poderia ser
o que desejasse. Como a interação se realiza por meio de interfaces, e a tela preserva
e protege quem está por trás dela, cada usuário pode se descrever da maneira que
deseja ser naquele momento. que em comunidades ao estilo do Orkut não
muito sentido em pensar sob esse ponto de vista. O grande apelo e diferencial do
Orkut é estimular que seus participantes se mostrem; deixar que os outros saibam
quem realmente é aquele que está ali. Até é possível criar uma personalidade que
não a sua, escolher a foto de uma atriz famosa, mentir nos gostos e no modo de ser,
mas não faz sentido para quem verdadeiramente quer se comunicar via Orkut:
Com a foto, o grau de anonimato diminui. Pode haver casos em que
a imagem não se refere ao usuário (ou porque é uma imagem di-
versa, ou uma imagem de outra pessoa). Entretanto, como cada novo
88
FIGS. 8 e 13: Alguns integrantes do Orkut escolhem, em vez de fotos pessoais, imagens que gostam
ou fotos de personalidades famosas para ilustrar a si próprio. Na figura 8, a integrante escolheu
uma imagem da Hello Kit (personagem infantil) para ser o seu cartão de visita. Já na figura 9, a
escolha foi por algúem relevante no contexto mundial. Na figura 11, a pessoa escolheu uma foto
pessoal, mas de quando ainda era criança. Apesar da total liberdade na escolha dessas imagens,
a grande maioria prefere selecionar fotos atuais para facilitar a identificação de amigos mais
distantes ou que se perderam com o tempo (figuras 12 e 13).
FIG. 8 FIG. 9
FIG. 10 FIG. 11
FIG. 12 FIG. 13
89
usuário só ingressa no sistema a partir do convite de alguma pessoa
(algum amigo, segundo o Orkut), há um certo constrangimento em
se falsificar essa informação (da imagem). Ou seja, no Orkut existe
menos anonimato e mais constrangimento em forjar informações.
Algo que se dizia muito comum nos chats de Internet. Nesses ca-
sos o grau de anonimato era total e junto com ele a desconfiança
(DORNELLES, 2004, www).
4.2.1.2 Álbum de amigos, situado no canto superior direito
Após preencher o cadastro que iformar o seu perfil, é hora de procurar por ami-
gos. Para isso existe um sistema de busca chamado friend finder”. Nele, digita-se o
nome e o sobrenome da pessoa que se está procurando e, uma vez obtido sucesso
na busca, é posvel adicioná-la à lista de amigos. Para tanto, uma mensagem é
então enviada para a pessoa perguntando se de fato ela é sua amiga ou não. E só
após essa aceitação é que a foto com o link para a página do amigo é adicionada
no canto superior direito da tela.
Além do friend nder, encontram-se amigos nas ginas de pessoas conhecidas,
ou os amigos lhe acham e convidam a fazer parte de seu álbum. O mero com
a quantidade de amigos que se tem aparece na mesma janela, o que provoca uma
certa euforia em fazer amigos. A impreso que muitas vezes ca é que existe
competição para ver quem conhece mais gente. Alguns participantes do Orkut
m um mero exagerado de amigos, gerando desconfiança sobre quem ali é
verdadeiramente amigo. quem argumente que o é preciso manter contato
com todos os amigos que aparecem listados. O importante para os idealizadores da
comunidade é que aquela rede seja construída; cada indivíduo deve ser responsável
por montar sua própria rede de amigos.
90
FIGS. 14 e 15: A quantidade de amigos que alguém tem nessa comunidade pode ser um motivo de
competição entre os participantes. Nas duas imagens acima, verifica-se que os usuários possuem
um número bem alto de amigos 577 na primeira e 873 no segundo caso. Provavelmente os dois
participantes não mantêm um contato regular com metade desses amigos cadastrados.
Ao construir essa rede, que com um simples clique no link view networkpode ser
visualidada, é posvel estabelecer um ranking desses amigos. Ou seja, ao aceitar
determinada pessoa como amiga é necesrio classificar como é essa amizade. São
quatro as oões dispoveis:best friend,good friend,friend,acquaintance e
havent met”. A gina com essas classificações não fica acesvel para qualquer
pessoa. Tais informões cam restritas aos seus donos. No link “karma é pos-
vel estabelecer outros cririos de avaliação para os amigos. Pode-se avaliá-los
com estrelas para indicar que se é deles —, com um rosto sorrindo que
representa se o amigo é de confiança ou o — e com corões que indicam
se a pessoa é sexy ou não.
Essa classificação acaba por gerar um certo critério de conduta social. Muitas pessoas
se sentem na obrigação de retribuir estrelas para o serem tidos como mal -agra-
decidos. Esse procedimento acaba reproduzindo alguns padrões encontrados na
91
vida social do espaço sico, onde muitas vezes é necesrio agir com etiqueta
no convívio diário com os demais. Existem comunidades no pprio Orkut que
foram criadas para ajudar os participantes em suas dúvidas sobre como agir com
elegância em determinadas situões. A comunidade Orkutiqueta é uma delas. A
descrição da comunidade é a seguinte:
FIGS. 16: Ranking dos amigos. Essas
informações só ficam acessíveis aos
donos das paginas.
FIGS. 17 e 18: Esses
ícones permitem
considerar se o
amigo é confiável,
"legal" e sexy.
Além disso, com
uma estrela é
possível ser fã dos
amigos admirados.
92
Dúvidas sobre comportamento no Orkut? Dúvidas ainda não res-
pondidas sobre Orkut? Não relute, poste aqui e esclareça suas dúvidas
de como interagir no Orkut, nas comunidades, com as pessoas e ser
educado(a) (www.orkut.com/Community.aspx?cmm=40567).
Nela discute-se como ter um comportamento ético e criterioso no relaciona-
mento com outras pessoas. Questões como: “Como retirar amigos com etiqueta?”,
“Como declinar alguém? e “Devo retribuir estrelinhas? são debatidas em runs
onde cada integrante a sua opino. As opiniões o diversas, claro. quem
ache que só se deve dar uma estrela de quem realmente se é . outros acham
que pode ser válido retribuir um agrado desse tipo: “Não é preciso ser fã de todos
os seus fãs, mas em geral costuma-se retribuir a estrelinha”, afirma Bianca Bueno,
membro da comunidade.
Além das estrelinhas, carinhas (rostos sorrindo) e corações, pode-se redigir teste-
munhos (“Testimonial”) nos quais se escreve o que se pensa sobre aquela pessoa.
Em geral são declarões de amizade e amor, elogios e manifestações intensas de
carinho ou de saudade. Seguem abaixo alguns exemplos de testemunhos:
FIGS. 19, 20, 21 e 22: Nos testemunhos os recados o menos emeros
que nos scraps (ver a seguir).
93
Quando o assunto é outro que não necessariamente manifestar o que se pensa
sobre a pessoa — elogios, de uma forma geral —, a comunicação é feita na seção
scraps”. Os scraps nada mais são que recados que são deixados para o dono da pá-
gina. Funciona como um mural. Os temas são variados: marcar encontro, agradecer
algo, dar parabéns, dizer que está com saudade, perguntar algo irrelevante sobre
o dia-a-dia, brincar com a pessoa etc. O scrapbook é um espaço importante para
a sociabilidade no Orkut por permitir que haja uma comunicação dissociada de
uma concomitância temporal. Isto é, uma pessoa escreve um recado na página de
um amigo ou conhecido e este irá ler apenas quando acessar a sua página pessoal
ou quando receber um e-mail avisando que alguém deixou um recado .
FIG. 23: Em geral os “scraps” são recados curtinhos e ficam armazenados no “scrapbook”.
94
4.2.1.3 As comunidades
As comunidades são criadas pelos próprios participantes do Orkut e podem ter os
mais variados temas. grande liberdade na escolha dos assuntos, mas alguns, como
pornograa, são proibidos. Pode-se criar e participar de quantas comunidades quiser.
Existem comunidades de artistas, esportistas e pessoas famosas. Outras são do tipo: “Eu
odeio segunda-feira, “Eu amo o meu boxer, “Eu amo música. E ainda há imeras
comunidades de faculdades, cogios, bares, praias etc., nas quais é possível encontrar
pessoas que freqüentam ou freqüentaram um mesmo ambiente no mundo sico.
Tamm existem diversas comunidades que agregam pessoas que tenham um mesmo
hobby, interesse ou paixão, como literatura, viagens, cinema e fotograa. É possível tam-
bém criar comunidades falsas, de pessoas que o existem ou de assuntos esdrúxulos.
Mas em geral elas acabam tendo um número restrito de participantes e informação.
As comunidades o catalogadas por temas, o que permite um sistema de busca
mais simples e eficiente. São 28 categorias, entre as quais estão: Negócios; Música;
Arte e Entretenimento; Comida, Bebida e Vinho; Jogos; Governo e Potica; Via-
gens; Ciência e História etc. Ao lado de cada tópico o número de comunidades
criadas naquela categoria.
FIG. 24: Divisão das comunidades por temas. São 28 no total.
95
FIGS. 25 a 30: Exemplos de comunidades de artistas ou personalidades.
FIGS. 31 a 34: Exemplos de comunidades do tipo “eu amo” ou “eu odeio” alguma coisa.
96
FIGS. 35 a 38: Exemplos de comunidades de lugares, como faculdades, praia, bares etc.
FIGS. 39 a 44: Exemplos de comunidades de hobbies ou de assuntos que possuem interessados em comum.
97
As comunidades são representadas, assim como as páginas pessoais, por ícones,
em geral uma foto ou desenho do assunto que é debatido ou constitui seu tema.
O layout dessas páginas é bem parecido com o das páginas pessoais. No profile
uma descrição do objetivo da comunidade, bem como a data de sua criação,
o nome de seu criador, a quantidade de membros, categoria e a língua utilizada
majoritariamente para a comunicação. No canto superior direito ficam os ícones
com links para as páginas pessoais de seus membros. E no canto inferior direito
ficam as comunidades com temáticas semelhantes.
A troca de mensagens entre os participantes se por meio de fóruns onde são
feitas perguntas ou levantados temas para discussões. Esses temas são listados em
Nome, imagem
e descrição
Comunidades
com temáticas
semelhantes
Membros da
comunidade
Fórum
Eventos
FIG. 45: Janela principal da comunidade da Escola de Comu-
nicação da UFRJ — ECO. A organização é semelhante à das
páginas pessoais.
98
FIG. 46: Exemplo de um tópico do fórum dessa comunidade. A questão debatida aqui entre
os membros é: "Qual foi a pior matéria estudada na ECO?"
FIG. 47: Exemplo de um dos eventos listados na comunidade. Um aviso sobre a festa de calouros.
99
picos, facilitando a navegão por organizar sistematicamente as informões
que ali são inseridas. Há tamm um link para eventos, onde é possível agendar
eventos e encontros com os membros da comunidade.
Para o antropólogo Jonatas Dornelles, é possível também se sociabilizar por meio
das comunidades presentes no Orkut:
Participar de uma comunidade significa poder participar das con-
versas e discussões (tópicos) que envolvem seus membros. Cada
tópico é criado por membros da comunidade. O tópico é um tema
de discussão, o qual gera manifestações dos membros da comuni-
dade. Cada usuário pode participar de várias comunidades. Elas são
dispostas em sua página pessoal e também funcionam como ícones
(DORNELLES, 2004, www).
As comunidades tamm servem como marcas das pessoas que participam delas.
Como assim? Ao entrar na página pessoal de alguém, é possível conhecer um
pouco mais sobre aquele integrante, seus gostos musicais, suas prefencias à mesa,
alguns dados de seu passado, sua aptidão profissional, seus hobbies e até as coisas
que para ele são detestáveis.
Por exemplo, na figura abaixo, pela breve selão de 9 comunidades entre as 16
de qual faz parte, é posvel inferir que a pessoa:
.
Gosta do gênero musical hiphop, pois faz parte de duas comunidades de
artistas do meio: Dr. Dre e Snoop Dogg;
.
Estudou no Colégio Sion;
.
Estuda ou se interessa por desenho industrial;
.
Gosta de cachorros da ra english bull terrier;
.
Pratica ou se interessa por jui-jitsu;
.
Torce pelo Flamengo.
100
Muitas pessoas se inserem nas comunidades apenas para deixá-las no canto direito
da tela como se fossem botons. o participam de discussões e nem alimentam a
comunidade, ou inicialmente participam e depois se desinteressam por ela. No
entanto, como as comunidades são criadas pelos próprios participantes do Orkut,
é necessário que haja uma connua adão de informações, que os debates sejam
permanentes e os runs atualizados, pois é por meio desse processo que elas se
mantêm vivas.
As comunidades criadas, assim como os próprios integrantes do Orkut, podem
sofrer uma avalião dos responsáveis pela manutenção do site. Esse tipo de avalia-
ção é feito quando há uma suspeita de que as regras da comunidade estão sendo
desrespeitadas. Como são muitas ginas para serem controladas, a fiscalização é
FIG. 48: Por meio das comunidades é possível descobir algumas características do participante.
101
feita pelos próprios participantes. Por exemplo: ao clicar no link report as a bogus”,
abre-se uma janela onde se pergunta se existe realmente o desejo de enviar aquela
comunidade para a avaliação. Se a resposta for positiva é necessário preencher um
pequeno formurio onde se questiona o motivo dessa avalião. ainda um
espaço para que, havendo o desejo, se possa detalhar como a comunidade está
desrespeitando as regras do Orkut.
FIGS. 48 e 49: Exemplos do formulário que se deve preencher para justificar
o envio de uma comunidade ou integrante para a avaliação dos responsá-
veis pela manutenção do Orkut.
102
No caso das comunidades, não é permitido o uso de imagens pornográficas ou que
desrespeitem de alguma forma a lei de direitos autorais. No caso dos participantes,
pode-se questionar se a pessoa está usando uma identidade falsa, uma imagem
inapropriada ou usando o Orkut para algum tipo de atividade "profana".
4.2.2 O tempo e o espaço na interação no Orkut
Uma das características peculiares do Orkut, e de certa maneira oposta a muitos
ambientes virtuais de sociabilidade, como as salas de bate papo on-line, é que não
necessidade de haver concomitância temporal e espacial na interação. Sabe-
se que a Internet, mais do que qualquer outro meio, possibilitou a comunicação
desvinculada do tempo e do espo, algo que deve sempre ser considerado ao
analisá-la como um meio de comunicação. No entanto, o diferencial que comuni-
dades com o estilo do Orkut possuem é que elas permitem, além da comunicação,
uma relação de interação e, conseentemente, de sociabilidade em ambientes e
espaços temporais distintos.
Ou seja, é possível estabelecer diálogo, ou trocas simbólicas, entre atores queo
compartilham um mesmo ambiente no mesmo momento. É claro que através do
e-mail é possível se comunicar na rede sem que os dois atores estejam on-line no
mesmo instante. Mas o que se impõe aqui é algo que vai além da comunicação. É
algo que adquiriu um status de comunidade na qual um dos principais objetivos
é o da sociabilidade entre seus participantes. A comunicão em “tempo real”,
o aclamada como principal diferencial trazido pela Internet, faz pouco sentindo
quando se pensa em comunidades virtuais com as características do Orkut.
A liberdade em relação ao tempo e ao espo parece ter se tornado maior quando
se pensa na comunicação no Orkut:
103
A interão cibernética, no entanto, ainda exigia um alinhamento
das pessoas no tempo. Mesmo em espos geogficos distintos, a
conexão simultânea era um aspecto fundamental para a formação de
grupos sociais específicos (DORNELLES, Apud LEVY, 1
o
de outubro
de 2004).
Esse diferencial faz com que, mais uma vez, se tente prever como a sociedade fará uso
da tecnologia e como esta pode ser tornar um marco de uma determinada época:
Algo diferente ocorre no Orkut. E não é uma diferença qualquer que
possa simplesmente ser descrita como um aperfeiçoamento técnico.
A interão social que é feita no Orkut é de um tipo novo e com
conseqüências inéditas. Ela provavelmente caracteriza a sociabili-
dade do início do século XXI. As outras duas formas (logo veremos
quais o) [contato face-a-face e sociabilidade realizada por meio
de aparatos tecnológicos] não deixarão de existir. Compartilharão
todas as três o mesmo contexto social. Em alguns casos uma terá
mais foa que a outra. Mas, de qualquer maneira, as três formas de
sociabilidade estarão presentes e serão acionadas pelos indivíduos,
dependendo das suas necessidades. Provavelmente novas plataformas
de interão surgio. O Orkut pode acabar. No entanto, ele é ex-
tremamente significativo porque inaugura um tipo de sociabilidade
em que o encontro de indivíduos independe, completamente, das
variáveis de tempo e de espaço (DORNELLES, 2004, www).
Para outros estudiosos, no entanto, o femeno Orkut não deve ser superestimado,
numa atitude que se repete incontáveis vezes ao longo da história dos meios de
comunicação. O diferencial técnico, ponto de partida para muitas análises sobre o
assunto, infelizmente obscurece os fatos e, principalmente, estimula pensamentos
que não levam em consideração outros fatores relevantes nesse processo.
104
O sociólogo Gilson Caroni Filho encara a comunidade do Orkut como um reflexo
do contexto em que se es vivendo. Um contexto de vazio político-filosófico em
que se busca desesperadamente um simulacro que supra as necessidades da vida
real e no qual os dispositivos cnico-digitais agenciam uma sociabilidade que ele
considera precária e frenética:
Definido como site de relacionamentos, abriga uma contradão
em termos: a expreso “comunidades virtuais”. O que seriam tais
entidades? o-lugares que primam pela ausência de interão?
Espos que independem da subjetividade dos seus membros? Fal-
sas constelações sem imaginário e história? Agrupamentos que se
definem pela identidade no consumo? Pergunta ao usuário: o que
é pertencer a uma ‘’comunidade do Orkut’? Seria acessar o hábitat
do fetiche da mercadoria? E se houver algum imprevisto do tipo
bad, bad server. No donut for you? A reprodução social passa pela
infantilização eterna. Criança o quer política. Contenta-se com
docinho (CARONI FILHO, 2004).
Para ele, o Orkut acaba reproduzindo o oposto do que pretende. Ao exaltar
tendências do comportamento social na contemporaneidade, estimula uma
compulsividade acumulativa, em vez de resgatar e ampliar o círculo de amizades
que se tem:
“O que era um processo envolvendo concordância de sentimentos,
apreço pelo outro, relação reinventada diariamente, torna-se, no
universo do Google, uma mera operão de adição. Ostentão cur-
ricular de prestígio social. Competitividade deslavada. Com certi-
ficado de qualidade que vem sob a forma de testimonial. Nunca a
solidão agregou tanta euforia. E uma fantástica coleção de retratos.
A impossibilidade constitutiva de se ter mais de 100 amigos é um
detalhe a ser ignorado. Deveriam ter aprendido com o Show de Tru-
man que o horizonte termina na parede (Idem).
105
Se o Orkut é uma comunidade onde é posvel resgatar amizades, conhecer gente,
arrumar trabalho, ou se é apenas um álbum onde se colecionam amigos e reca-
dinhos sem relevância, o importa para a análise feita no presente trabalho. A
questão que se coloca aqui é que, antes de mais nada, o Orkut é um fenômeno,
sim, principalmente no Brasil. Seu sucesso o esta ligado apenas ao seu diferencial
cnico em relação a outros meio de comunicação, mas um somario de fatores
nos quais a necessidade de comunicação e o contexto sociocultural da sociedade
contemporânea o determinantes.
Isto é, muitas apostas feitas por teóricos ou estudiosos da Internet baseadas no
seu diferencialcnico e nas possibilidades que se poderia extrair do foram
suficientes para que elas se concretizassem. Comunidades virtuais de sonho e
fantasia, onde se poderia ser um monstro, uma fada ou um herói, onde os ava-
tares permitem ao indivíduo ser algo que ele não é, caram restritas a alguns
tipos de pessoas, principalmente aos mais jovens. Da mesma forma que outros
mundos virtuais que permitem que cada participante construa de fato o seu
ambiente de interação por meio de interfaces em três dimensões também não
seduziram tanto as pessoas.
É claro que pode haver barreiras técnicas ou de conexão. Para acessar ou participar
de ambientes interativos mais sofisticados é necessária uma configuração mínima no
equipamento e know-how. O Orkut, ao contrário, possui um sistema de navegação
bem simples e requer o mínimo de conhecimento sobre a Internet. É claro que
existem muitos problemas (bugs) nessa comunidade, principalmente o servidor,
que, de tão acessado, ca sobrecarregado, gerando erros em muitos dos acessos.
Mas é algo que os administradores da comunidade eso tentando resolver com
uma certa pressa para que o problema o enfraqueça a sociabilidade no Orkut.
106
A análise da comunidade do Orkut, em contraste com os tipos de comunidades
virtuais que muitos acreditavam que teriam sucesso e impacto na vida social das
pessoas, é bastante ilustrativa. A aposta em MUDs sociais, como o Alpha World, base-
ava-se na idéia de que pessoas anônimas iriam se relacionar com pessoas anônimas.
Esse fator era relevante, pois a possibilidade de se livrar dos pais sociais vividos
no espaço físico e o conseqüente uso de scaras pareciam ser o que todos gos-
tariam de fazer. Relacionar-se com pessoas novas, diferentes e desconhecidas em
um ambiente onde tamm se poderia ser o que/quem quisesse. No entanto, ao
estudar o Orkut e a popularidade que ele atingiu, é fácil perceber algumas caracte-
sticas que se opõem a muitas idéias que antes foram divulgadas como principais
atrativos da comunicação on-line.
Como já visto no capítulo anterior, o marco do Orkut é o fato de ele ser uma
comunidade baseada em los de amizade que existem no espaço físico e que
o reforçados ou reativados por meio da comunidade on-line. Ou seja, não há
um abandono dos papéis representados do espaço físico. Ao contrário, eles são as
CONCLUSÃO
107
condições básicas para o início de uma sociabilidade on-line. É claro que existem
dentro do Orkut muitas outras comunidades em que pessoas que não se conhecem
se relacionam. Mas como já foi discutido, o grande atrativo do Orkut é a possibili-
dade de estar mais ligado a pessoas que já se conhece. Ele permite se manter ainda
mais próximo dos amigos e parentes e é uma forma de penetrar na intimidade
daqueles que já se conhece bem.
O nível de intimidade que cada um tem com os outros participantes da comuni-
dade é controlado. Em uma primeira instância, esse controle é feito pelas pprias
pessoas, que podem selecionar que tipo de informações pessoais, e para quem,
desejam disponibilizar. É uma forma de estabelecer graus de privacidade para os
colegas de comunidade. Numa insncia superior, o controle é geral para a co-
munidade como um todo. Isto é, existe uma administração do Orkut, profissionais
que cuidam do convívio estabelecido e que patrulham se algo “errado” está se
passando ali. Comoo muitas páginas, os pprios participanteso estimulados
a denunciar aqueles que não eso cumprindo as regras estabelecidas. E os admi-
nistradores da comunidadem o total direito de travar sua página e inviabilizar
o seu acesso.
O que se percebe, portanto, é que a comunidade do Orkut o é sedutora por
permitir uma convivência social mais livre, como se proclamava em relação a co-
munidades do estilo do Alpha World. Um caso famoso dessa liberdade irrestrita que
poderia haver na convivência em um MUD é o “estupro” ocorrido no LambdaMOO
(MUD textual). Mr. Bungle, um dos participantes da comunidade, por meio de um
programa de computador, fez com que os outros participantes tivessem suas ações
bloqueadas, e ele próprio passou a determinar textualmente as ações desses avatares,
atos e falas de cunho violento e sexual que zeram com que esses participantes se
sentissem vítimas e psicologicamente abalados. Rapidamente, as vítimas e aqueles
108
que as apoiavam organizaram fóruns e outros tipos de manifestão para expulsar
Mr. Bungle do LambdaMOO.
No entanto, não bastava denunciar o “infrator” aos administradores da comunidade
para que eles tomassem uma providência, como acontece no Orkut. Isso porque,
quatro meses antes do incidente, Pavel Curtis, um dos designers do LambdaMOO,
havia formalizado em um documento chamado LambdaMOO Takes a New Direc-
tion que os “administradores” (wizards) da comunidade seriam a partir daquela
data apenas técnicos. Ou seja, eles o poderiam tomar mais qualquer decio que
pudesse afetar a vida social naquele ambiente, mas apenas colocar em prática aquilo
que seus participantes decidissem: From then on, it was decreed, LambdaMOO would
just have to grow up and solve its problems on its own
1
(DIBBEL, 1998, p.19).
É interessante notar que o que se pretendia com esse documento era conferir à
comunidade total autonomia, pela qual seus membros tinham o dever de admi-
nistrar, resolver os problemas e estabelecer eles próprios regras de convivência.
Muitos teóricos da comunicação esperavam que esse tipo de vida em comunidades
on-line com liberdade irrestrita viesse a fazer cada vez mais parte da sociabilidade
na sociedade contemponea.
Essa utopia da liberdade era em grande parte estimulada, como foi visto no capítulo
2, pelas especificidades técnicas da Internet. A organização em rede e a crença de
que era possível se mover de um ponto ao outro dela permitiu a esperaa de um
mundo mais livre e mais democtico. No entanto, Albert-Láslzló Barabasi possui
1
Dali pra frente, foi decretado que LambdaMOO deveria crescer e resolver os seus problemas
por conta própria.
109
uma vio mais crítica e talvez mais atualizada do que seria essa rede na qual a
World Wide Web está inserida:
The World Wide Web is a scale-free network, dominated by hubs and nodes
with a very large number of links. But as we will see next, this large-scale
topology coexists with numerous small-scale structures that severely limit
how much we can explore simply by clicking our way along the links
2
(BARABASI, 2002, p.105).
Portanto, mais que um sonho de liberdade e sociabilidade irrestrita, o que se vi-
vencia hoje é que a Internet foi incorporada ao cotidiano das pessoas como uma
ferramenta extremamente eficaz para a comunicação. O padrão do individualismo
em rede, defendido por Manuel Castells, parece se desenvolver num contexto no
qual cada indivíduo monta a sua própria rede de relacionamentos e informões
a partir das possibilidades que lhe são conferidas. Vale ressaltar que essas possibili-
dades nãoo irrestritas e infinitas como se previu inicialmente.
A sociabilidade e a interação entre as pessoas mudaram, sim.o porque surgiu
um novo meio capaz de, sozinho, promover tais transformações. A sociabilidade
está sendo transformada, é claro, mas por uma combinação de fatores em que
atuam, juntos, mudanças culturais, transformações no mercado de trabalho e
na família e o desenvolvimento tecnológico. A crise do patriarcalismo, o en-
fraquecimento do Estado e a fragmentação do processo de trabalho estimulam
um comportamento individualista. Induzem os indivíduos a construírem, pro-
2
A World Wide Web é uma rede de extensão livre, dominada por centros e nós com um grande
número de links. Mas, como veremos a seguir, essa topologia coexiste com numerosas estruturas
de escalas menores que limitam a quantidade do que se pode explorar simplesmente clicando
nos nossos caminhos ao longo dos links.
110
2
... a Internet é a ferramenta apropriada para se relacionar em rede e para a comunicação hori-
zontal direcionada para o eu. Essa é uma das razões por que, depois de três décadas de existência,
ela emergiu de comunidades especializadas do mundo dos pesquisadores, técnicos, hackers e
comunidades contra-culturais, para incendiar os negócios e a sociedade como um todo.
gressivamente, suas redes sociais em torno de projetos e desejos pessoais, o que
faz com que a Internet seja um meio altamente propício para esse padrão de
comportamento:
... the Internet is the appropriate tool for networking, and for self-directed,
horizontal communucation. This is one of the reasons why, after three decades of
existence, it emerged from specialized communites in the world of researches, te-
chies, hackers, and countercultural communities, to catch fire in business and in so-
ciety at large
2
(CASTELLS, apud WELLMAN, HAYTHORNTHWAITE, 2002,
p.xxxi)
o se pode deixar de chamar a atenção para o fato de que a Internet ainda pode,
e será, muito explorada. Seu uso sofrerá muitas mudanças, e seu desenvolvimento
tecnogico não sugere uma tendência a ficar estagnado. A cada dia que passa,
multinacionais que investem pesado no setor apresentam alguma novidade aos seus
usuários e, indiretamente, tamm aos o usuários. No entanto, a postura que se
deve tentar ter diante de novas possibilidades que venham a surgir é adotar um
olhar criterioso sobre o assunto, procurando compreender o os efeitos que a
Internet terá na sociedade a partir da utilização de determinado recurso, mas sim
os efeitos que a própria sociedade pode causar sobre a Internet.
111
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