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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
FABIANA MEIRA DOS SANTOS OLIVEIRA
CONFLITOS, GESTÃO E PODER:UM
ESTUDO DE CASO EM UMA
AGÊNCIA BANCÁRIA
VITÓRIA
2005
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1
FABIANA MEIRA DOS SANTOS OLIVEIRA
CONFLITOS, GESTÃO E PODER:UM
ESTUDO DE CASO EM UMA AGÊNCIA
BANCÁRIA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Administração do Centro de Ciências
Jurídicas e Econômicas da Universidade Federal do
Espírito Santo, como requisito para a obtenção do
Grau de Mestre em Administração, na área de
concentração em Gestão de Organizações.
Orientador: Prof. Dr. João Gualberto Moreira
Vasconcellos
VITÓRIA
2005
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2
folha de aprovação
3
AGRADECIMENTOS
A Jesus Cristo, meu Senhor, por ter me dado sabedoria e força para concluir este
trabalho.
Ao meu orientador, João Gualberto, ímpar profissional e amigo, pela ajuda,
estímulos, preciosas sugestões e, sobretudo, por sua dedicação.
A Flávio Mendes da Rocha por sempre acreditar em mim.
Aos meus pais, a quem amo muito, pelo suporte, apoio e incentivo, pois sem eles eu
nada seria.
À amiga Luzia Zorzal pela ajuda nas horas de dificuldade e incentivo na vida
acadêmica.
Aos professores Mônica de Fatima Bianco e Gelson S. Junquilho, pela ajuda no
momento de maior dificuldade que aconteceu na minha vida acadêmica.
Enfim... a todos que, de alguma forma, contribuíram para que este trabalho pudesse
ser concluído, o meu muito obrigada.
4
“A sabedoria protege como
protege o dinheiro; mas o
proveito da sabedoria é que ela
dá vida ao seu possuidor”.
Provérbios de Salomão
5
LISTA DE QUADRO
QUADRO 1 — ANÁLISE DA DINÂMICA DO DISCURSO .............................. 76
6
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 — SENTIMENTOS DE FRAQUEZA E INFERIORIDADE. ANGÚSTIA DE
DESTRUIÇÃO E IMPULSOS AGRESSIVOS ........................................................ 57
FIGURA 2 — IMAGEM DO EGO PEQUENO E FRACO. ANGÚSTIA DE
DESTRUIÇÃO E IMPULSOS AGRESSIVOS CONTRA A ORGANIZAÇÃO ......... 58
FIGURA 3 — INTROJEÇÃO .................................................................................... 59
7
SUMÁRIO
RESUMO ............................................................................................................... 08
ABSTRACT ........................................................................................................... 09
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 10
2 CONCEITOS E CONCEPÇÕES SOBRE PODER ............................................
2.1 OS CLÁSSICOS DO PODER .........................................................................
13
14
2.1.1 Poder segundo Maquiavel ........................................................................
14
2.1.2 Poder segundo Max Weber .......................................................................
17
2.2 O PODER E AS ORGANIZAÇÕES..................................................................
23
2.2.1 Poder segundo Foucault ...........................................................................
23
2.2.2 Poder segundo Morgan .............................................................................
25
2.2.3 Poder segundo Hardy ................................................................................
28
2.2.4 Poder segundo Mintzberg .........................................................................
29
2.3 PODER SEGUNDO PAGÉS ........................................................................
34
2.3.1 Entrevista de avaliação-conselho .............................................................
55
2.3.2 A organização e o inconsciente ................................................................
56
3 METODOLOGIA ................................................................................................ 62
3.1 OBJETIVOS METODOLÓGICOS....................................................................
62
3.2 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ...............................................
63
3.3 ANÁLISE DE DADOS .....................................................................................
65
3.4 O LOCUS DA PESQUISA ...............................................................................
67
3.5 PROTOCOLO DA PESQUISA
68
4 AS PRÁTICAS DE PODER NA GESTÃO DOS RECURSOS HUMANOS: UM
ESTUDO DE CASO EM UMA AGÊNCIA BANCÁRIA EM VITÓRIA (ES) ..........
69
4.1 GESTÃO DE DESEMPENHO PROFISSIONAL .............................................
69
4.2 PESQUISA DE CLIMA ....................................................................................
72
4.3 O LIVRO DE INSTRUÇÕES CODIFICADAS ..................................................
74
4.4 FAZER CARREIRA .........................................................................................
77
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 84
6 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 88
ANEXO .............................................................................................................. 93
8
RESUMO
O objetivo principal deste trabalho é mostrar como as políticas de gestão de pessoas
são utilizadas para melhor gerir a força de trabalho. Ele foi realizado com a intenção
de provocar uma reflexão sobre o modo como as políticas de gestão de pessoas
instrumentalizam práticas de poder. Primeiramente, foi apresentada uma discussão
teórica, abordando vários autores, mostrando como o tema Poder é complexo e
multidimensional. Posteriormente, buscou-se mostrar o lado menos explorado do
trabalho nas organizações, ou seja, não se discutiu aqui a importância do trabalho
para a sociedade nem como ele ajuda o indivíduo a se auto-realizar, enfatizando,
assim, sua importância; mas, procurou-se identificar e compreender, nas políticas da
empresa, o jogo e a interação entre os processos subjetivos e cognitivos do
indivíduo e como os mesmos são influenciados pela organização. Para isso, foi
estudado como os sistemas: econômico, político, ideológico e psicológico são
utilizados sobre os indivíduos pela organização estudada para melhor gerir a força
de trabalho. A metodologia utilizada é uma pesquisa qualitativa, descritiva e
documental. O objeto de observação e análise foi uma agência bancária situada em
Vitória do Espírito Santo, durante o ano de 2004; para tanto, utilizou-se o Estudo de
Caso. Os instrumentos utilizados na coleta de dados foram a entrevista semi-
estruturada e a observação participante, sendo que a forma de se analisar os dados
foi por meio da técnica de triangulação e análise de conteúdo. Concluiu-se que a
empresa utiliza-se de vários dispositivos de mediação (Gestão de Desempenho,
Pesquisa de Clima, Livro de Instruções Codificadas, “fazer carreira”, Participação
nos Lucros e Resultados - PLR, Previdência Privada, Plano de Saúde, Banco de
Talentos e Oportunidades etc.), os quais atuam nos níveis econômico-político-
ideológico-psicológico para garantir o controle e subordinar as forças produtivas dos
trabalhadores aos objetivos da organização.
Palavras-chave: Poder. Políticas de recursos humanos. Sistema sócio-mental.
9
ABSTRACT
The main objective of this work is to show how human resources management
policies are used to improve the management of the workforce. It was carried out
with the intention of provoking a reflexion about the way that human resources
management policies provoke power practices. Firstly, a theoretic discussion was
carried out, including various authors showing how complex and multidimensional.
Afterwards, this study looked into showing the fewer explored side of this work in
organizations, that is, it wasn’t discussed here the importance of work for society nor
how it helps individual self fulfillment, emphasizing this wasy, the importance of work.
However, it attempted to identify and understand, in company policies, the interaction
games between subjective and cognitive processes of individuals and how the same
are influenced by the organization. For this reason, as systems the following was
studied: economic, political, ideological and psychological were used about
individuals by the studied organization in order to better manage the workforce. The
methodology used deals with a qualitative, descriptive and documental research. The
oject of observation and analysis was the branch of a bank sitiuated in Vitória/ES,
during 2004, and for that, a case study was used. The tools used for data collection
were a semi-structured interview and the participative observation, being the means
of data analysis the technique of triangulation and content analysis. It was
concluded that the company use various methods of mediation (Professional
Performance Management, Clime Research, Coded Instructions Book, “ Make
Career”, Profit Share –PLR. Private Pension, Bank Employees Assistance Fund
Health, Talent and Opportunity Bank, etc..),Which act at economic, psychologic,
ideological and psychological level to guarantee the control and subordinate workers
productive force to the objectives of the organization.
Key words: Power. Policies humans resources. Partner-mental system.
10
1 INTRODUÇÃO
O poder se apresenta de várias formas e tipos, levando a uma dificuldade quanto à
sua análise. Como resultado das múltiplas abordagens recebe as mais variadas
interpretações. Para corroborar tal assertiva, expusemos, aqui, algumas fontes de
poder existentes com as suas diferentes perspectivas. Nesse sentido, fez-se um
debate teórico sobre as concepções do poder, observando-se variadas obras, como
Maquiavel (2004); Max Weber (1984, 2004); Foucault (2003); Morgan (1996); Hardy
(1994); Mintzberg (1983, 1992); Crozier (1981); e Pagés et al (1987).
O objetivo principal é mostrar como as políticas de gestão de pessoas são
utilizadas para gerir a força de trabalho. Para isso, são abordados vários
dispositivos que permitem à empresa garantir o controle e subordinar as forças
produtivas dos trabalhadores aos seus objetivos. Cada dispositivo é abrangido por
uma ou por várias instâncias, a saber, a política, a econômica, a ideológica e a
psicológica.
A instância política engloba um conjunto de técnicas de administração a distância,
as quais garantem a obediência às diretrizes da organização. A econômica, uma
política de altos salários, ascensão na carreira, reduzindo as discriminações de
diplomas, sexo, família e meio social de origem que medeiam a aceitação de um
trabalho excessivo. A instância ideológica contempla um sistema de representação o
qual os detentores do poder utilizam para mascarar a realidade; ela busca reforçar a
imagem positiva do papel da empresa, não deixando que o indivíduo se conscientize
das contradições das políticas empresariais e sociais que estejam subentendidas. E
a psicológica favorece a integração dos trabalhadores à empresa, pois atua no nível
inconsciente
, no qual a organização funciona ora dando prazer, ora angústia
(privilégios-restrições) ao indivíduo.
Na realidade, este trabalho foi elaborado com a intenção de provocar uma reflexão
sobre o modo como as políticas de gestão de pessoas instrumentalizam práticas de
poder. Nessa perspectiva, o âmago desta pesquisa gira na seguinte questão: Como
os gerentes da agência bancária estudada interagem com as políticas de RH
da organização, a qual se utiliza de processos subjetivos e cognitivos para
influenciá-los?
11
Nesta pesquisa, os objetivos específicos são:
identificar, descrever e analisar a política da organização, ou seja, quais as
principais práticas de RH que são aplicadas pela organização sobre os gerentes
para gerir a força de trabalho;
Discorrer sobre as principais discussões teóricas sobre a questão do poder; tanto
na sociedade de uma forma geral quanto nas organizações;
estudar as principais práticas de RH que são utilizadas na organização para
melhor gerir a força de trabalho da gerência média, ou seja, como os sistemas:
econômico, político, ideológico e psicológico são utilizados sobre os indivíduos
pela organização bancária analisada
Também, o estudo apoiou-se em dois “pilares”: teórico e prático. O primeiro
relacionado à necessidade de estudar, de forma aprofundada, o tema proposto,
buscando consolidar os conhecimentos obtidos, por meio de várias leituras acerca
do poder, resultando no crescimento e desenvolvimento da compreensão do
assunto.
Ao mesmo tempo, procuramos aplicar a teoria à prática das organizações, isto é,
realizar uma discussão teórica sobre Poder, analisando-o quanto às relações entre a
organização e o trabalhador, contribuindo para ampliar o conhecimento na área de
estudos organizacionais; para tanto, dentre todas as obras abordadas, nesta
pesquisa, o autor que melhor permitiu a análise do objeto empírico foi Pagés
(1987)
1
.
Ainda, pretendemos, inicialmente, entrevistar todos os funcionários da agência
bancária, com exceção dos administradores da cúpula; porém, percebemos que nem
todos os funcionários da agência eram acometidos pelas políticas de RH que este
estudo aborda. Tal fato foi constatado quando dois funcionários da agência foram
entrevistados e, pela análise das respostas obtidas, constatamos que as políticas de
RH utilizadas pela organização não os influenciavam ou, em muitos casos, nem
mesmo existiam. Assim, a análise das entrevistas destes funcionários não permitiu a
análise do âmago principal desta pesquisa. Tal fato pode ser justificado devido a não
existência de metas para os que não são comissionados com cargo de gerente.
12
A relevância do tema para a área acadêmica está apoiada na premissa de que o
poder está presente em qualquer relação e, para melhor compreender suas
manifestações e conseqüências, é preciso considerar o contexto social e as pessoas
envolvidas no processo. Além disso, o poder tem diversos enfoques nos estudos
organizacionais desde o século XIX, sendo esse fato constatado pela existência de
obras de variados autores e múltiplos olhares sobre o tema.
Dessa maneira, nosso trabalho foi organizado de modo que se pudesse perceber
como a temática é multidimensional e subjetiva
.
No capítulo II, abordaram-se as algumas das principais obras sobre o tema poder:
Maquiavel (2004); Max Weber (1984, 2004); Focault (2003); Morgan (1996); Hardy
(1994); Mintzberg (1983, 1992); e Pagés et al (1987), enfocando-se os processos de
mediação, os quais podem ser de quatro instâncias: econômica, política,
ideológica e psicológica. Pagés et al (1987) elabora o conceito de um sistema
sócio-mental, segundo o qual o estado da organização aos níveis econômico,
político, ideológico e psicológico deve ser relacionado com as estruturas
inconscientes dos trabalhadores. Além disso, a organização, por meio do processo
de mediação, traz uma resposta apaziguadora às contradições inconscientes vividas
pelos trabalhadores, impossibilitando a eles assumir suas contradições
inconscientes.
No capítulo III, é apresentado o procedimento metodológico, trata-se de uma
pesquisa qualitativa, descritiva e documental, na qual o locus de observação e
análise foi uma agência bancária durante o ano de 2004. O instrumento utilizado na
coleta de dados foi a entrevista semi-estruturada, sendo que a forma de se analisar
os dados foi por meio da técnica de triangulação e análise de conteúdo.
No capítulo IV, é exposta a análise das entrevistas, confrontando-a principalmente
com a obra de Pagés et al (1987).
No capítulo V, encontram-se as considerações finais trazendo recomendações para
novos estudos que tenham como referência o tema Poder.
1
Pagés é o autor mais próximo teoricamente dos objetivos da dissertação. Por isso, escolhemo-lo como base para nossas
análises.
13
2 CONCEITOS E CONCEPÇÕES SOBRE PODER
Os estudos acerca do poder, suas relações e efeitos no âmbito das organizações e,
mais especificamente, relativos ao comportamento organizacional abrangem
temáticas polêmicas que envolvem, entre outros elementos, a subjetividade, o
conflito, a dominação, as adesões e resistências no processo de gestão de pessoas
(CAPPELLE; MELO; BRITO, 2002).
Clegg, Hardy e Nord (1998, p. 74) afirmam que o
poder continua a ser um conceito que, embora usado
em excesso, é um dos menos compreendidos da
análise organizacional. Ele fornece as bases
ideológicas e epistemológicas para uma teoria de
organizações que contrasta, profundamente, com as
narrativas e modelos interpretativos previamente
discutidos.
Faria (2004) expõe que o estudo do poder e das relações de poder é um tema dos
mais polêmicos e antigos das ciências humanas, podendo ser encontrado expresso
nos primeiros escritos filosóficos de Platão e Aristóteles. O tema poder, no âmbito da
teoria, pertence à esfera da interdisciplinaridade e, no âmbito do significado
cotidiano, pertence à esfera dos amplos e imprecisos significados.
Com o objetivo de esclarecer essa maior abrangência, Motta e Vasconcellos (2002,
p. 362) afirmam que o poder pode ser analisado sob quatro aspectos:
marxista, como um processo de alienação econômica;
psicanalítico, como um fenômeno psicológico de alienação, dependência,
projeção e introjeção, formação de sistemas de defesa, entre outros;
político, como um fenômeno de imposição e de controle sobre as decisões
e sobre a estruturação do trabalho; e
ideológico, como um processo de apropriação do significado e dos
valores.
Dentro deste contexto, neste tópico, abordar-se-ão as várias obras sobre o tema
poder com suas diversas perspectivas. Para tanto, fez-se um debate teórico sobre
as concepções do poder, em Maquiavel (2004); Max Weber (1984, 2004); Focault
14
(2003); Morgan (1996), Hardy (1994); Mintzberg (1983, 1992); Crozier (1981) e
Pagés et al (1987), sendo este último escolhido como autor de base para a análise
do objeto empírico deste trabalho.
Faria (2004) classifica os estudos de Pagés na área da Psicossociologia
os estudos da psicossociologia ou da sociologia
clínica sobre o poder têm procurado integrar uma
concepção relativa aos aspectos ditos objetivos
(econômicos, políticos e ideológicos) aos aspectos
psíquicos do sujeito. Diferenciando-se das análises
sobre comportamento humano, que tomam por base
o behaviorismo ou a psicologia histórico-social de
Vygotsky, a psicossociologia procura integrar uma
determinada sociologia crítica a uma psicologia de
bases freudianas, relacionando o indivíduo/sujeito ao
seu ambiente social, seja institucional, organizacional
ou grupal (FARIA, 2004, p. 126).
Neste estudo, não foram abordadas todas as obras existentes sobre poder por não
ser o nosso foco. Porém muitos outros pesquisadores sobre o tema foram citados,
como Crozier, Etzioni, Merton, Russel etc.
2.1 OS CLÁSSICOS DO PODER
2.1.1 P
ODER SEGUNDO MAQUIAVEL
“O príncipe” foi uma das primeiras e mais importantes obras a abordar o tema Poder,
escrita por Maquiavel em 1532. Ele vê o poder como uma prática inescrupulosa, ou
seja, tudo é válido contanto que o objetivo seja manter-se no poder (a prática acima
da ética). O livro é, na realidade, um manual sobre como obter e manter-se no
poder.
Abordando o Poder em sua obra, Maquiavel (2004a, p.12) declara que quem não
governar na observância das regras prescritas em “O Príncipe” logo perderá o que
ganhou e, enquanto permanecer no poder, conhecerá incontáveis dificuldades e
aborrecimentos.
Produzido com base em fatos históricos, o autor elabora um modelo de praticar o
poder, isto é, o que se deve ou não fazer para consegui-lo e ainda o como se manter
nele.
15
Segundo Maquiavel (2004a, p. 5), há dois tipos de principados: hereditário ou
nascente
Todos os Estados e todos os governos que
exerceram ou exercem certo poder sobre a vida dos
homens foram ou são repúblicas ou principados. Um
principado, ou é hereditário, quando é longeva a
soberana linhagem do Senhor, ou é nascente, como
foi Milão para Francesco Sforza.
Para exemplificar o tipo de principado nascente, o autor fez alusão a um fato
histórico ocorrido sobre Francesco Sforza, filho do condottiere Muzio Attendolo, o
qual foi um dos mais destacados líderes populares e militares entre 1401 e 1466 e
que, em fevereiro de 1450, derrotou a República Ambrosiana, tornando-se o senhor
de Milão.
Em seu livro, ele afirma que os Estados conquistados que viviam antes da ocupação
de acordo com suas leis e em liberdade; há três modos de impor-lhes o jugo:
destruindo-os; ou o novo príncipe fixando a sua morada nele; ou consentindo que
este povo subjugado viva conforme as suas leis, recolhendo um tributo e criando em
seu interior um governo oligárquico que lhes coíba todo amotinamento. No entanto,
seu ponto de vista sobre a decisão correta é que,
na verdade, não há maneira mais segura de possuir
uma província que a talando. E aquele que devém
senhor de uma cidade acostumada a viver em
liberdade e que dela não faz ruínas pode esperar que
ela o arruíne, porquanto esta, em suas rebeliões, terá
sempre a ampará-la a palavra “liberdade” e os seus
antigos costumes, os quais nem a longa duração dos
tempos, nem quaisquer benfeitorias jamais a farão
esquecer (MAQUIAVEL, 2004a, p. 23).
Para Maquiavel (2004) os mais importantes alicerces de qualquer Estado são as
boas leis e, principalmente, os bons exércitos. As forças com as quais um príncipe
defende o Estado dele, ou são próprias ou são forças mercenárias. As mercenárias
são inúteis e perigosas, visto que jamais gozam de estabilidade e de segurança,
pois que estas não são coesas, e sim, ambiciosas, indisciplinadas e infiéis. Esses
mercenários aceitam ser soldados enquanto não há guerra, mas, tão somente esta
se inicie, seguem noutro rumo ou fogem.
Outro aspecto importante abordado pelo autor assevera que um príncipe não deve
ter outras preocupações que não sejam assuntos de guerra ou a organização e a
16
disciplina militar, posto que nisto concerne à única arte atinente ao seu comando.
“Contrariamente, vemos que os príncipes que se ocuparam mais dos seus deleites
que das armas perderam os seus Estados” (MAQUIAVEL, 2004a, p. 69).
Ele instrui que na paz deve-se exercitar mais que na guerra, e isto de duas
maneiras: primeiro, embasando materialmente o exército — mantendo-o bem
disciplinado e exercitado, para tanto, dever-se-á praticar a caça com a qual
acostumará o corpo a rudes condições e aprenderá sobre as condições físicas dos
lugares (montes, vales, planícies, rios e pântanos); segundo, o príncipe deverá
meditar sobre fatos ocorridos, isto é, ler relatos da história e tomando como
exemplos a serem seguidos ou evitados as ações dos grandes homens — como se
comportaram nas guerras e as razões das vitórias e das derrotas.
Quanto ao procedimento com relação aos súditos e aliados, Maquiavel (2004a. p.
73) expõe que
ora, um homem que de profissão queira fazer-se
permanentemente bom não poderá evitar a sua
ruína, cercado de tantos que bons não são. Assim, é
necessário a um príncipe que deseja manter-se
príncipe aprender a não usar [apenas] a bondade,
praticando-a ou não de acordo com as injunções.
É justamente esta a parte do livro tão conhecida no meio popular: os fins são
justificados pelos meios. Maquiavel prega que os meios dos quais se vale um
príncipe são justificados pelos fins, já que eles são impostos, necessários pela
experiência de vida e pelo ambiente no interior do qual o homem deve agir.
Em geral, Maquiavel afirma que, entre a crueldade e a piedade, o príncipe deve
desejar ser piedoso mas com cautela; uma vez que é muito mais seguro fazer-se
temido que amado. Os homens possuem mais receios de conspirar contra quem
pode puni-los cruelmente.
Outro ponto abordado por Maquiavel é quanto a honrar ou não a palavra dita outrora.
Ele revela que os príncipes mais bem sucedidos não honraram suas promessas e que,
além disso, eles souberam, com astúcia, burlar a opinião pública. Ele enfatiza que o
soberano prudente não deve cumprir suas promessas quando tal cumprimento pode
voltar-se contra ele, ou até mesmo, quando se diluem as próprias razões que o levaram
17
a prometer. “Havendo a possibilidade, ele não se aparte do bem, mas que, havendo a
necessidade, saiba valer-se do mal” (MAQUIAVEL, 2004a, p. 86).
Em suma, a doutrina de Maquiavel procura discorrer amiúde sobre a conduta política
dos príncipes e de preceituar-lhes regras para que os mesmos obtenham poder.
2.1.2 P
ODER SEGUNDO MAX WEBER
Em seu estudo da dominação, Weber tentou explicar as características distintivas da
civilização ocidental. A dominação carismática e a tradicional serviram-lhe para
compreender a dominação legal do estado ocidental moderno (BENDIX, 1986).
Weber não estava interessado no poder em geral, mas num tipo especial de poder
— Dominação — que é uma relação de poder na qual o governante crê ter o direito
de exercer o poder, e o governado considera como sendo sua tarefa obedecer-lhe.
Neste tipo de autoridade, há um número de crenças que legitimam o exercício do
poder. Tais crenças determinam relativa estabilidade dos sistemas de dominação
(MEDEIROS, 1977).
As análises baseadas em Weber enfatizam o caráter
relacional do poder como recurso ou capacidade
distribuídos de forma diferenciada e que, se
empregado com o devido grau de habilidade
estratégica e tática pelos atores sociais, produz e
reproduz relações hierarquicamente estruturadas de
autonomia e dependência (CLEGG; HARDY; NORD
1998, p. 75).
O estudo das formas de poder burocrático na sociedade moderna, de acordo com a
análise weberiana, enfatiza a interação complexa que existe entre a racionalização
da sociedade e a da organização, ambas reproduzindo estruturas institucionalizadas
sob o controle de “especialistas” e “peritos” (CLEGG; HARDY; NORD 1998).
Weber (1984, p. 43) expõe que “poder significa a probabilidade de impor a própria
vontade, dentro de uma relação social, ainda que contra toda resistência e qualquer
que seja o fundamento dessa probabilidade”.
Faria (2004, p. 109), abordando Weber, contempla a idéia de que “sociologicamente,
o conceito de poder é amorfo e que todas as qualidades imaginárias de um indivíduo
18
e toda a sorte de constelações possíveis podem colocá-lo em uma posição de impor
sua vontade em uma dada situação”.
Weber, interpretado por Faria (2004), aborda que as conseqüências geradas pela
relação social são a solidariedade e a representação. A primeira é o resultado de
toda a ação de cada um dos participantes ao se impor aos demais participantes; já a
segunda, a ação de um participante (tanto as probabilidades como as
conseqüências) recai sobre os demais participantes. Weber reconhece que o poder
materializa-se em uma relação social de solidariedade ou de representação. A
expressão probabilidade, nesse caso, refere-se à condição de impor ou não a
vontade do mandante — o conceito de poder é reportado a uma realidade específica
que se caracteriza por uma determinação de limites nos espaços de subordinação e
de dominação em condições particulares do conflito.
Consoante Faria (2004), estudar a sociologia do poder em Weber implica estudar os
conceitos de domínio, obediência e disciplina e, também, compreender as noções de
autoridade, coerção e legitimidade.
A dominação, para Weber (1974), vem a ser a
probabilidade de que seja encontrada a obediência
em virtude de um mando de determinado conteúdo e
entre determinadas pessoas. A disciplina refere-se à
probabilidade de encontrar obediência por parte de
um conjunto de pessoas que em virtude de atitudes
arraigadas seja pronta, simples e automática,
encerrando uma obediência habitual, sem críticas e
nem violência. A dominação encerra a probabilidade
de um mando ser obedecido com ou sem disciplina,
ou seja, com a anuência daqueles sobre os quais o
domínio é exercido, em virtude de atitudes
arraigadas, ou contra a resistência destes. Já o uso
da autoridade (racional, tradicional ou carismática)
está relacionado à aceitação da mesma, legitimada
pela referência a uma norma geral, enquanto a
coerção reside na aplicação de sanções com a
finalidade de assegurar o cumprimento de
determinações (FARIA, 2004, p. 110).
Corroborando Dreifus (1993, p. 55), a disciplina é um ingrediente fundamental da
política, já que “ela subsume e supera a obediência tradicional (de cunho
aristocrático) e a subordinação personalizada (carismática ou sultânica), preparando
o terreno para a emergência de um sistema representativo” e possibilitando a
constituição de uma política pessoal.
19
A disciplina, para Weber, tem características condicionadora e formadora do hábito
de obediência de massa acrítica e não resistente; possui traços de ordenamento
regrado, treinado e internalizado, tanto por meios e formas coercitivos quanto
coativos; e se manifesta como autocontrole socialmente desenvolvido. A disciplina
se opõe ao carisma (Dreifus,1993).
Conforme Marsal (2004), o cerne das preocupações de Weber é o poder, isto é, a
política, a religião e o capitalismo.
Weber é um autor deslumbrado fundamentalmente
pelo poder político, ou, se quisermos entendê-lo de
uma maneira mais ampla, por toda a forma de
dominação.
A concepção que Weber tem do poder é de uma
crueza absoluta, separando-se assim de qualquer
aparência jurídica ou ideológica. Está na tradição da
“razão de Estado” ou do “Estado do poder” alemão
(Machstaat). O poder assenta para Weber em última
análise na força, como a lei, o Estado ou a liderança
política. A sua definição não deixa lugar a dúvidas a
este respeito
(Marsal, 2004, p. 16).
Weber (1984) entende por dominação a probabilidade de um grupo obedecer a
mandos específicos. Ele afirma que nem toda dominação tem fundamentação
econômica; entretanto, toda dominação requer um quadro administrativo.
Este quadro administrativo pode estar ligado à
obediência de seu senhor (ou senhores) pelo
costume, de um modo puramente afetivo, por
interesses materiais ou por motivos ideais. A
natureza desses motivos determina em grande
medida o tipo de dominação (WEBER, 1984, p. 170,
tradução nossa).
Para Weber (2004, 1984), existem três tipos puros de dominação legítima na
sociedade, os quais ele chama de tipo ideal: tradicional, carismática e racional.
A dominação tradicional se justifica na autoridade do “passado eterno”; em outros
termos, na santificação dos válidos costumes imemoriáveis, na crença diária na
santidade das tradições antigas e pelo hábito arraigado nos homens de respeitá-los.
Para melhor clarificar, cita-se a autoridade dos patriarcas e anciãos nas sociedades
antigas e o poder do senhor feudal. A tradição religiosa, as crenças e os costumes
sociais fornecem a legitimação desse tipo de autoridade (WEBER, 2004).
20
Na dominação tradicional, o quadro administrativo é composto por servos os quais
são súditos do soberano. As ordenanças são legitimadas pela força das tradições e
pelo livre arbítrio do senhor, cuja tradição é demarcada no âmbito correspondente.
A autoridade tradicional tem mais dificuldades em aceitar inovações sociais, pois o
soberano empossado de acordo com os costumes e as tradições tende a preservar
os elementos culturais herdados do passado, sem questionar as convenções sociais
que é a base até mesmo de seu poder (WEBER, 2004).
Já a dominação carismática é baseada nas qualidades pessoais e extraordinárias de
um indivíduo, ou seja, no carisma que é a devoção e a confiança estritamente
depositadas em uma pessoa que possui qualidades prodigiosas, heróicas ou outras
qualidades excepcionais que a fazem um chefe. A obediência apóia-se na
santidade, heroísmo ou exemplaridade de uma pessoa e também nas ordenações
por ela criadas ou reveladas. Cita-se como exemplo o guerreiro (caudilho) eleito por
razões de confiança pessoal baseada na revelação, no heroísmo ou na
exemplaridade, dentro de um círculo em que a fé e o carisma sejam válidos
(WEBER, 2004).
A dominação carismática supõe um processo de
comunicação de caráter emotivo. O quadro
administrativo dos imperantes carismáticos não é
nenhuma “burocracia”, e ainda menos uma
burocracia profissional. Para a seleção deste quadro,
não existe assembléia ou qualquer outra coisa. Se é
eleito por qualidades carismáticas: o profeta é eleito
pelos seus discípulos, o príncipe de uma guerra por
seus “seguidores”, os chefes, em geral, por “homens
de confiança”. Não há nenhuma “colocação” nem
“destituição”, nenhuma “carreira” nem “ascensão”,
tão somente denomina-se por Senhor segundo sua
própria inspiração fundada na qualificação
carismática do vocacionado [...] Não existe regra
alguma, preceitos jurídicos abstratos, nem aplicação
racional de direito orientada por alguém, também,
não se dão arbítrios e sentenças orientadas por
precedentes tradicionais. (WEBER, 1984, p. 194 e
195).
Weber acreditava que a organização burocrática era o meio racional mais conhecido
de se controlar os seres humanos. Embora ele reconhecesse a influência pessoal
de um líder (carisma), ele concluiu que a liderança burocrática era indispensável
para a administração da massa requerida em uma sociedade moderna (ALBERS,
1974).
21
A profecia legal foi um costume universal. Seu princípio fundamental era de que a lei
só podia ser revelada. As disputas legais eram decididas recorrendo-se a um oráculo
ou a uma ordália (ou a ambos). Os sacerdotes e outros profetas da lei aumentavam
seu poder ao serem chamados a administrar oráculos e supervisionar julgamentos
por ordália. Os profetas carismáticos eram sábios ou sacerdotes escolhidos por suas
qualificações mágicas (BENDIX, 1986).
A dominação racional trata da autoridade fundamentada nas regras, normas,
regulamentos e preceitos reconhecidos e aceitos por todos os membros de uma
dada comunidade. Essa autoridade se impõe pela legalidade na validez de um
estatuto legal estruturado em regras racionalmente estabelecidas. Cita-se o Estado
moderno como exemplo. Além disso, os funcionários formam o quadro típico das
associações racionais. Dentro dessa lógica de raciocínio, o regulamento de uma
empresa é considerado legítimo se ele foi elaborado por uma autoridade detentora
do direito legal de fazê-lo. Esse é um dos princípios no qual a Burocracia se embasa
enquanto forma organizacional (WEBER, 2004).
O típico aparato administrativo que corresponde ao
tipo legal de dominação é chamado de burocracia.
Ele também se caracteriza por esta crença nas leis e
na ordem legal. A posição do burocrata e suas
relações com o governante, os governados e seus
próprios colegas são estritamente definidas por
regras impessoais. Estas regras, de forma racional,
delineiam a hierarquia do aparato, os direitos e
deveres inerentes a cada posição, os métodos de
recrutamento e seleção, e assim por diante
(MEDEIROS, p. 2, 1977).
Weber desejou mostrar que a organização burocrática é a solução racional para os
complexos problemas modernos; isto é, a organização burocrática supera as
tomadas de decisão ou as formas alternativas de organização, por exemplo: por
meio da especialização, divisão de trabalho etc. Weber vai mais além do que
analisar o modelo mecanicista, ele analisa a relação entre o funcionário e o seu
ofício. Em geral, Weber percebe a burocracia como um dispositivo adaptável por
usar habilidades especializadas, não levando em consideração características dos
organismos humanos (MARCH; SIMON, 1993).
O modelo burocrático apresentado por Weber corresponde ao que muitas pessoas
chamam de organização formal. Este modelo incorporou as propriedades funcionais
22
primárias de um sistema burocrático, mas não reconheceu a importância da
organização informal. Weber acertou sobre a necessidade da organização
burocrática para a sociedade moderna; os princípios dele de estrutura burocrática
eram, em muitos aspectos, semelhantes aos desenvolvidos recentemente por
teóricos do campo organizacional (ALBERS, 1974).
Os três conceitos de dominação de Weber referem-se a arquétipos da experiência
humana. “Todos nós já sentimos ou presenciamos a influência penetrante de uma
personalidade forte (carisma) ou de um pai autoritário (tradição), e exemplos de tais
influências podem ser encontrados em todas as situações históricas”. A autoridade
legal também se refere a um protótipo da experiência humana, visto que é fruto dos
costumes e convenções encontradas em todas as sociedades (BENDIX, 1986, p.
302).
As análises da dominação carismática e tradicional feitas por Weber envolviam três
etapas: um estudo comparado de matérias relevantes, a formulação do conceito, um
estudo dos processos pelos quais as grandes mudanças de legitimação e
organização ocorriam.
Até a formulação dos conceitos “dominação legal” e
“burocracia” a análise é mais extensa que no caso do
carisma e da tradição. Mas não há um tratamento
explícito da transformação da dominação legal que
corresponde à discussão de carisma familiar e
institucional ou da luta pelo poder sob a dominação
legal. A razão disso é que Weber não completou sua
Sociologia Política, na qual estava trabalhando à
época de sua morte (BENDIX, 1986, p. 302).
De acordo com Weber apud Motta e Vasconcellos (2002), o tipo de autoridade do
estado moderno e da Burocracia é o racional legal. Esse tipo de autoridade é
impessoal, posto que o subordinado não deve sua lealdade a um indivíduo ou grupo
específico, e sim, às normas e regras da organização.
Para Weber (1984), administração é dominação, e o tipo mais puro de dominação
legal é aquela que se exerce por meio de um quadro administrativo e somente o
dirigente da associação possui a posição de domínio; no entanto, suas ordens são
prescritas.
23
Em síntese, Weber identifica, ao estudar os processos de dominação na sociedade,
como sendo o poder a possibilidade de que uma pessoa ou um número de pessoas
realize a sua própria vontade numa ação comum, mesmo contra a resistência de
outros que participam na ação; dessa forma, ele identificou três maneiras legítimas
em que este processo poderia se dar: Tradicional, Carismática ou Racional Legal
(Burocracia).
Dentro deste contexto, Giddens (1984, p. 71) expõe a raridade de se encontrar
somente um tipo puro de dominação legítima em uma organização
Um tipo ideal é um ‘exagero unilateral’ de
determinados aspectos da realidade, com os quais
podemos então comparar a própria realidade. Por
conseguinte, a formulação weberiana típica-ideal de
burocracia arrola todo um conjunto de traços que
raramente serão encontrados, se o forem, totalmente
desenvolvidos em qualquer organização real.
2.2 O PODER E AS ORGANIZAÇÕES
2.2.1 P
ODER SEGUNDO FOUCAULT
Na obra “Microfísica do Poder”, Foucault (2003) expõe que o poder não é um objeto
natural, uma coisa; é uma prática social construída historicamente. O que ele chamou
de microfísica do poder tem como correlato a investigação dos procedimentos técnicos
de poder que realizam um controle detalhado e minucioso do corpo (gestos, atitudes,
comportamentos, hábitos, discursos). Foucault (2003) estuda o poder como tendo uma
existência própria e formas específicas e não como uma dominação global.
Motta e Alcadipani (2004), comentando as obras de Foucault, afirmam que elas
exercem influência em várias áreas das ciências humanas e que estão sendo
empregadas fundamentalmente para trazer novas luzes para as discussões sobre
poder nas organizações.
Para caracterizar o trabalho desenvolvido pelo
pensador sobre o assunto, o mais correto é falar em
uma analítica do poder, pois o que está em jogo é
“determinar quais são, em seus mecanismos, em seus
efeitos, em suas relações, esses diferentes dispositivos
de poder que se exercem em níveis diferentes da
sociedade, em campos e com extensões tão variadas”.
24
Em sua analítica do poder, Michel Foucault analise três
mecanismos de poder: os suplícios, as disciplinas e a
biopolítica (MOTTA; ALCADIPANI, 2004, p. 120)
Para Foucault (2003), os poderes não estão localizados em nenhum ponto
específico da estrutura social, eles funcionam como uma rede de mecanismos da
qual ninguém escapa. Daí a polêmica idéia de que o poder não é algo que se detém
como uma coisa, como uma propriedade que se possui. Não existem, de um lado, os
que têm o poder; e, do outro, o inverso; existem, sim, práticas ou relações de poder,
o que significa dizer que o poder é algo que se exerce, efetua-se, funciona; e que
funciona como uma máquina social que se dissemina por toda a estrutura social.
Não é um objeto, uma coisa, mas uma relação.
Pelo exposto acima, percebe-se que Foucault rejeita a concepção do poder
inspirada pelo modelo econômico, que o considera como uma mercadoria.
É preciso parar de sempre descrever os efeitos do
poder em termos negativos: ele ‘exclui’, ele ‘reprime’,
ele ‘recalca’, ele ‘censura’, ele ‘abstrai’, ele ‘mascara’,
ele ‘esconde’. De fato, o poder produz; ele produz
real; produz domínios de objetos e rituais de verdade.
O poder possui uma eficácia produtiva, uma riqueza
estratégica, uma positividade. E é justamente esse
aspecto que explica o fato de que tem como alvo o
corpo humano, não para supliciá-lo, multilá-lo, mas
para aprimorá-lo, adestrá-lo (MACHADO, 2003, p.
XVI) (grifo nosso).
O poder não é explicado inteiramente por sua função repressiva, ou seja, não é
expulsar o homem da sua vida social; o que interessa é gerir a vida dos homens,
controlá-los em suas ações para que seja possível e viável utilizá-los ao
máximo, aproveitando as suas potencialidades e utilizando um sistema de
aperfeiçoamento gradual e contínuo de suas capacidades (FOUCAULT, 2003).
Os primeiros métodos de vigilância e controle dos
indivíduos desenvolvidos em instituições, tais como
prisões e casernas, tinham como função tornar
dóceis seu corpo. Assim como os espectadores do
teatro medieval eram conduzidos de uma “mansão” a
outra, os indivíduos nos escritórios têm seu trânsito
regulado e seu olhar educado para detectar a
presença de seus chefes. O olhar direto dos
indivíduos volta-se para a execução de suas tarefas,
enquanto seu olhar periférico se funde aos próprios
sistemas de vigilância: “onde está o capataz? Para
onde foi meu colega? Se ele foi ao banheiro, por que
está demorando tanto?” (VERGARA; CARVALHO;
GOMES, 2004, p. 13).
25
O objetivo deste sistema é, simultaneamente, econômico e político; em outras
palavras, é o aumento do efeito do trabalho, tornando os homens força de trabalho e
dando-lhes uma utilidade econômica máxima; diminuição de sua capacidade de
revolta, de resistência, de luta contra as ordens do poder, neutralização dos efeitos
de contra-poder, produzindo, dessa forma, os homens dóceis politicamente.
(FOUCAULT, 2003).
2.2.2 P
ODER SEGUNDO MORGAN
Para Morgan (1996, p. 163), “poder é o meio através do qual conflitos de interesses
são, afinal, resolvidos. O poder influencia quem consegue o quê, quando e como”.
Ainda, de acordo com Morgan (1996, p. 163 e 164), as fontes de poder são ricas e
variadas. Ele mostra um roteiro analítico, que pode ajudar a entender as relações de
poder e a dinâmica dentro das organizações, auxiliando a identificar, inclusive, as
maneiras pelas quais os atores organizacionais podem tentar exercer influências. As
14 mais importantes fontes de poder são
1 autoridade formal;
2 controle sobre recursos escassos;
3 uso da estrutura organizacional, regras e regulamentos;
4 controle do processo de tomada de decisão;
5 controle do conhecimento e da informação;
6 controle das fronteiras;
7 habilidade de lidar com incerteza;
8 controle da tecnologia;
9 alianças interpessoais, redes e controle da “organização informal”;
10 controle das contra-organizações;
11 simbolismo e administração do significado;
12 sexo e administração das relações entre os sexos;
13 fatores estruturais que definem o estágio da ação; e
14 o poder que já se tem.
Autoridade formal: é a presente em todas as organizações. É um tipo de poder que é
legitimado e reconhecido por aqueles com quem se interage. A autoridade
legitimada, historicamente, tem sido fundamentada por uma ou mais das três
26
características abordadas por Weber (carisma, tradição e lei). Sendo que cada um
desses três tipos de autoridades pode ser encontrado nas empresas modernas.
Controle dos recursos escassos: toda empresa, para sobreviver, depende de um
fluxo de recurso (dinheiro, tecnologia, matéria-prima, pessoal etc.), o controle sobre
qualquer desses recursos pode oferecer poder dentro da organização.
Uso da estrutura organizacional, regras e regulamentos: freqüentemente, são vistos
como instrumentos racionais que auxiliam no desenvolvimento de uma tarefa; uma
visão política desses elementos sugere que, em muitas situações, eles são
evocados para o controle político.
Controle do processo de tomada de decisão: quem pode agir de modo claro no
processo decisório tem o poder de exercer uma grande influência nos negócios da
organização à qual pertence.
Controle do conhecimento e da informação: controlando recursos-chave, uma
pessoa pode influenciar situações organizacionais e também criar padrões de
dependência. Corroborando Morgan, Hardy (1994, p. 220) afirma que se verifica,
com freqüência, na literatura, o relacionamento de poder com relações de
dependência, e que o poder que é acumulado à medida que se controlam recursos
raros e valiosos é que gera a dependência de terceiros por estes recursos.
Controle das fronteiras: supervisionando e controlando as transações de interface
bilaterais, pode-se obter considerável poder, já que tal procedimento possibilita
tomar as medidas necessárias a tempo. Exemplificando, secretárias podem exercer
grandes influências sobre a forma pela qual o seu superior vê uma dada situação,
também podem determinar a quem será dado acesso ao gerente e quando, além de
manipular a informação de maneira a dar maior ou menor importância a atividades
desenvolvidas nos demais setores da empresa.
Habilidade de lidar com incerteza: situações descontínuas e imprevisíveis em algum
lugar da organização podem ter implicações para o funcionamento das outras
subunidades da mesma. A habilidade em lidar com essas incertezas possibilita
considerável poder no todo organizacional.
Controle da tecnologia: a tecnologia tem sido utilizada como instrumento de poder,
ampliando as habilidades humanas de manipular, controlar e impor-se sobre o
27
ambiente. Freqüentemente, há conflitos dentro da empresa quando se deseja mudar
de tecnologia, posto que tal procedimento pode alterar o equilíbrio de poder.
Alianças interpessoais, redes e controle da “organização informal”: amigos bem
colocados, patrocinadores, mentores, coalizões com pessoas para transacionar
apoio e favores, redes informais, sondagens ou simples conversas podem oferecer
fonte de poder aos envolvidos.
Controle das contra-organizações: o sindicato é um exemplo, pois ele ajuda a vigiar
a administração nas empresas. O governo e outras agências reguladoras atuam
também para suprimir ou prevenir o abuso de poder por parte de um monopólio.
Simbolismo e administração do significado: consiste na habilidade que uma pessoa
possui para convencer outros a idealizar realidades que sejam mais interessantes
para alguém acossar. Há três aspectos a analisar: o uso da imagem, do teatro e da
arte de ganhar sem romper verdadeiramente as regras do jogo.
Sexo e administração das relações entre os sexos: muitas empresas são
influenciadas por valores relativos a um dos sexos, conseqüentemente, a vida
organizacional é influenciada pelo sexo predominante.
Fatores estruturais que definem o estágio da ação: visão “pluralista” do poder, ou
seja, o poder está difuso entre as pessoas. Embora alguém consiga acumular
considerável poder pessoal, este é atenuado pelo poder dos outros. “Este ponto de
vista relativo à estrutura profunda de poder leva a reconhecer a importância de
fatores tais como relações de classe na determinação do papel que se ocupa dentro
das organizações e, conseqüentemente, do tipo de oportunidade estrutural e de
poder a que se tem acesso” (Morgan, 1996, p. 190).
O poder que já se tem: o poder atrai mais poder. Freqüentemente, ele é usado para
adquirir mais poder, por exemplo, políticos comumente usam o poder que possuem
relacionando-o a acordos de débitos informais em que a ajuda ou os pedidos de
favor retornam em data posterior.
Constata-se, assim, que o autor aborda o poder ora como um recurso, ora como
alguma coisa que alguém possui ou como uma relação social caracterizada por
28
algum tipo de dependência, como um tipo de influência sobre alguma coisa ou
alguém; mostrando, dessa forma, como as fontes de poder são ricas e variadas.
2.2.3 Poder Segundo Hardy
Conforme Hardy (1994), poder é um conceito complexo e sempre que é invocado
apresenta considerável controvérsia ao redor da definição e uso do termo;
abrangendo palavras tais como coerção, manipulação, autoridade, persuasão e
influência; na realidade, estas são várias formas de poder.
De acordo com Lukes (apud HARDY, 1994), há quatro dimensões de poder, a saber:
poder de tomada de decisão, não tomar decisão, poder simbólico e poder do
sistema.
Poder de tomada de decisão: focaliza exclusivamente o poder no processo de
tomada de decisão. Vários pesquisadores analisaram decisões fundamentais que
ilustram relações de poder existentes em uma dada comunidade. O objeto de estudo
era determinar quem tomaria as decisões. Concluiu-se que diferentes grupos
prevalecem na hora de tomar decisões. Este estudo ficou conhecido como o modelo
pluralista. Uma das críticas a esta pesquisa é que o uso de poder é limitado a
somente esta arena.
Não tomar decisão: conforme Bachrach e Barartz (apud HARDY, 1994), é
tipicamente usada pelos grupos dominantes para proteger o status quo porque tende
a apoiar e reforçar preceitos existentes de processos de tomada de decisão. Os
mesmos tendem a usar uma variedade de barreiras (tais como procedimentos e
rotinas políticas) para impedir os subordinados de participarem completamente no
processo de tomada de decisões; esses mecanismos foram chamados de não
tomada de decisão, já que permitem aos atores mais poderosos determinar
resultados por detrás das cenas. Os críticos a este modelo afirmam que o trabalho
de Bachrach e Barartz é uma melhoria no modelo pluralista, posto que continuou
assumindo, de alguma forma, que o conflito era necessário para estimular o uso de
poder da não tomada de decisão.
Poder simbólico: consoante Pettigrew (apud HARDY, 1994), é associado a tentativas
de grupos de interesses para legitimar as suas demandas e de legitimar as
29
demandas de outros através do gerenciamento de significados. Os mecanismos que
ajudam os atores a criar legitimidade são o uso de símbolos, dentre os quais
destaca-se o idioma, os rituais e os mitos. Edelman (apud HARDY, 1994) ressalta
que o significado está na sociedade e não no símbolo. O idioma é um aspecto
importante de atividade política simbólica, pois pode ser usado como um catalisador
para mobilizar apoio, ou como um dispositivo para tornar assuntos obscuros e
oposição quieta. Os rituais, assim como as cerimônias, recorrem a procedimentos
que carregam certas mensagens e significados. O mito pode ser usado para
legitimar posições de poder existentes, enfatizando a importância do passado e da
tradição.
Poder do sistema: reconhece o fato de que alguns grupos são politicamente
desvantajosos como resultado de sistemas que os penalizam, sem atribuir a causa
ao uso consciente de poder por grupos específicos de indivíduos. Esta quarta
dimensão de poder mostra que grupos podem estar sujeitos ao poder, embora ele
possa não ser usado ativamente contra eles, em contraste com as outras
dimensões, em que o poder é mobilizado conscientemente por atores na forma de
estratégias políticas para alcançar fins desejados.
2.2.4 P
ODER SEGUNDO MINTZBERG
Segundo Mintzberg (1983, p. 4), “é definido poder simplesmente neste livro como a
capacidade para afetar resultados organizacionais” (tradução nossa).
O comportamento das organizações é um jogo de poder em que vários jogadores —
agentes com influência — buscam o controle das decisões e ações da empresa.
Os jogadores são classificados em agentes internos e externos. Os agentes internos
são os empregados da instituição, os encarregados de tomar decisões e ações de
forma regular; são os que determinam o resultado final e os que expressam os
objetivos que a empresa perseguirá. Já os agentes externos são aqueles que não
pertencem ao quadro de pessoal da organização, porém utilizam suas influências
para afetar o comportamento dos empregados. Ademais, as fontes primordiais de
poder se encontram:
na habilidade técnica;
30
na posse dos recursos escassos;
no corpo de conhecimento;
nas prerrogativas legais; e
ao acesso a pessoas que possuem o poder.
A partir das combinações naturais entre tipos de coalizões interna e externa,
Mintzberg (1992) identificou os ‘tipos puros’ dos quais vieram a surgir seis
configurações de poder mais freqüentes nas organizações, a saber: instrumental,
sistema fechado, autocracia, missionária, meritocracia e arena política.
a) A organização instrumental
Na realidade, é um instrumento à disposição de um agente ou grupo de agentes
externos; ela é concebida para atender aos objetivos expressamente anunciados
deste agente. As estruturas deste tipo de organização são ferramentas
estabelecidas para a consecução eficiente dos propósitos deste grupo ou agente.
É burocrática; uma vez que pode-se, por meio das normas, provar que os agentes
internos estão fazendo o que o agente externo quer. “Estas normas en realidad
sirven para proteger a los agentes internos, permitiéndoles ‘probar’ que han actuado
de acuerdo con los intereses del agente externo dominante”. O agente externo
prefere os controles burocráticos, pois um centro de poder pessoal supõe uma
ameaça ao poderio dele.
Corroborando tais idéias, Etzioni (1974, p. 72) evidencia ainda que
as organizações normativas são entidades nas quais
o poder normativo é a principal fonte de controle
sobre a maioria dos participantes dos níveis
inferiores, cuja orientação para com a organização é
caracterizada pelo alto engajamento. O
consentimento nas organizações normativas apóia-
se principalmente na internalização das diretrizes
aceitas como legítimas. A liderança, rituais,
manipulação de símbolos de prestígio e símbolos
sociais e a ressocialização estão entre as técnicas
mais importantes de controle que são empregadas.
Portanto, consoante Mintzberg (1992), a primeira condição para que surja uma
organização instrumental é que o poder de um agente externo deva estar
concentrado nas mãos de um agente ou grupo de agentes externos os quais
controlam uma dependência ou setor importante da organização ou uma
31
prerrogativa legal. As restrições formais são o meio externo de primordial influência
para as instituições instrumentais. Um agente externo converte uma empresa em um
instrumento a serviço dele, centralizando o poder em um só indivíduo — o diretor
executivo.
Os agentes internos da organização instrumental geralmente não desenvolvem uma
identificação com os objetivos da empresa, conseqüentemente, neste tipo de
empresa, não é desenvolvida uma forte ideologia. Esta organização é desenhada
para perseguir os objetivos dos agentes externos, sem ter uma vida própria. Dessa
maneira, o que faz com que os agentes internos se esforcem pela organização são
os incentivos materiais.
Etzioni (1974, p. 62 e 63) ratifica essas noções, ao expor que
as organizações utilitárias são aquelas em que a
recompensa é o principal meio de controle sobre os
membros dos níveis inferiores, e a participação
calculista caracteriza a orientação da grande maioria
desses participantes [...]. Poder remunerativo —
como seja, a manipulação de salários, comissões,
gratificações, condições de trabalho e recompensas
semelhantes — constituem a fonte de controle
predominante...
Pode-se citar como exemplo básico de organizações utilitaristas as empresas que
não necessitam de um trabalho especializado — bancos e companhias de seguros
— as quais atribuem ênfase à remuneração, aos objetivos econômicos e às suas
estruturas burocráticas; a remuneração é atribuída de acordo com os rendimentos,
algo que é necessário a estas estruturas altamente racionalizadas.
b) O sistema fechado
É formado por uma coalizão interna burocrática, utilitarista — os membros internos
contribuem com a organização de acordo com os incentivos materiais. O controle
interno é baseado em normas burocráticas de trabalho. A diferença entre este
sistema e o anterior é que o poder pertence a um grupo disperso e desorganizado
de agentes externos, conseqüentemente, a coalizão externa é passiva.
c) A organização autocrática
Possui uma coalizão externa passiva, entretanto com uma coalizão interna
personalizada formada por um diretor executivo que exerce o controle mediante
32
meios pessoais, o que gera agentes internos leais ou sob pena de demissão. Desse
modo, neste tipo de organização, não há jogos políticos. O diretor executivo governa
de forma absoluta todo o sistema de poder de maneira autocrática.
As autocracias tendem a ser empresas pequenas — normalmente pouco visíveis e
por isso precárias — que operam em ambientes simples (porém podem sofrer
mudanças), controladas de forma pessoal por somente um indivíduo, tais como,
empresas controladas por seus proprietários. As autocracias dão-se, também, em
empresas que estão atravessando crises difíceis ou as que estão sendo dirigidas por
uma pessoa que possua idéias bem claras, atuando como um líder forte, tal como
nos regimes ditatoriais.
d) A organização missionária
Utiliza a ideologia para controlar, impondo a sua missão, exercendo controle sobre
seus sistemas de autoridade, especialização (habilidade) e política. A coalizão
externa é passiva; já a coalizão interna, por meio da forte ideologia implantada,
serve para mantê-la unida em torno dos objetivos ideológicos.
Além disso, os membros da organização são confiáveis, visto que todos possuem as
mesmas tradições e crenças sobre a empresa, além de se identificarem com ela —
pois eles foram socializados e doutrinados outrora. Todos os agentes se identificam
com o objetivo de preservar, ampliar e aperfeiçoar a missão da mesma, atuando de
acordo com os seus interesses; possui alto grau de participação. A estrutura da
organização é muito simples, apesar de burocrática, posto que está baseada nas
normas. A coalizão interna tenta neutralizar as influências externas, impondo-lhes
uma missão.
Normalmente, este tipo de configuração surge quando a organização teve no
passado um líder carismático ou uma história desenvolvida por fortes tradições ao
redor de uma missão claramente estabelecida que gera atratividade para os seus
membros. O líder carismático formula, primeiramente, de forma clara e eloqüente, a
ideologia, para assim atrair os primeiros membros; em seguida, proporciona à
organização um rico conjunto de tradições e crenças, uma história distinta.
Diante do exposto, Etzioni (1974, pp. 249-50) conceitua carisma como
33
... a capacidade de uma pessoa de exercer influência
difusa e intensa sobre as orientações normativas de
outros indivíduos [...] Os líderes políticos e religiosos,
por outro lado, têm carisma porque exercem
tipicamente influência difusa sobre a orientação
normativa de seus seguidores. De acordo com a
definição acima, o carisma, como a autoridade, é
uma propriedade relacional. Mas enquanto a
autoridade, como geralmente entendida, implica
apenas que o sujeito mantém obediência a seus
próprios critérios para decisão e ação, e aceita como
legítimas as diretrizes de seus superiores, o carisma
implica que o sujeito foi influenciado no sentido de
modificar alguns dos seus próprios critérios.
De forma natural e voluntária, os membros da organização missionária depositam
toda sua fé nos líderes, que exercem sua influência sobre os mesmos, apoiando-se
na ideologia existente. O que esses líderes não podem fazer é mudar as tradições
básicas, impondo-lhes sua autoridade; caso isso ocorra, a organização se
transformará em uma autocracia.
e) A organização meritocrática
O poder está concentrado na habilidade e no talento do pessoal do núcleo de apoio,
conseqüentemente, a coalizão interna é profissionalizante. Porém, devido à existência
de vários tipos de peritos e especialistas, implica a presença de uma considerável
atividade política. Estes disputam uns com os outros pelos recursos, âmbitos de
atuação e projetos estratégicos; além disso, os programas de formação dão aos
especialistas grande mobilidade. Portanto, a lealdade à organização não é um fator
muito importante. A coalizão externa é passiva. Normalmente, esse tipo de
organização é formado quando a empresa realiza um trabalho complexo que requeira
um alto grau de habilidade de seus agentes internos.
A condição principal para que surja a meritocracia é possuir um ambiente e um
sistema técnico complexo, a organização deve confiar para cumprir sua missão em
empregados qualificados (especialistas) que normalmente se encontram no núcleo
operativo ou talvez no pessoal de apoio, concedendo-lhes um poder considerável;
por exemplo, os hospitais com seus médicos; as universidades com seus
professores; as agências espaciais com seus cientistas; as empresas de eletrônica
ou de processos de automatização com seus engenheiros.
34
f) Arena política
É caracterizada por um conflito intenso, estendido e breve. Surge quando o conflito
se estende sem controle algum, normalmente envolve ambas as coalizões,
relacionando-as entre si; pode também surgir quando, nas organizações politizadas,
os conflitos se intensificam, escapando a qualquer controle — todavia, este tipo de
arena política não pode durar muito tempo, pois representa, normalmente, um
sintoma de que a organização está prestes a morrer.
Os sistemas de autoridade e a ideologia, os mais importantes para integrar os
esforços dos agentes, são fracos. Nas arenas políticas, o que importa é a habilidade
política — a capacidade de persuasão, de negociação e de coerção. Os
conhecimentos técnicos e a habilidade não são importantes.
2.3 PODER SEGUNDO PAGÉS
O trabalho não está separado da vida privada e nem da coletiva; ele produz
significados e valores concretos que têm entre si correspondências múltiplas. A
lógica capitalista separa o trabalho dos valores individuais e coletivos; substitui os
valores concretos do trabalho por um valor abstrato, o dinheiro; e este tenta
subordinar os valores do indivíduo e da coletividade (BRAVERMAN, 1977).
O trabalho humano representa o recurso exclusivo da humanidade para enfrentar a
natureza. Assim, a força de trabalho é para o homem uma categoria especial,
distinta e não intercambiável, simplesmente porque é humana. O senhor do trabalho
de outros normalmente confunde força de trabalho com qualquer outro meio de
executar uma tarefa; uma vez que, para ele, vapor, cavalo, água ou músculo
humano que movam seu moinho são vistos como fatores de produção
(BRAVERMAN, 1977).
Analisando o trabalho do ponto de vista capitalista de produção, percebe-se que os
trabalhadores são separados do meio da produção e só têm acesso a ele vendendo
a força de trabalho a outro; os trabalhadores estão livres de constrições legais
(servidão, escravidão...) que os impeçam de dispor da própria força de trabalho; o
propósito do emprego do trabalhador torna-se a expansão de uma unidade de
capital pertencente ao empregador (capitalista); o processo de trabalho começa com
35
um contrato ou acordo que estabelece as condições da venda da força de trabalho
pelo trabalhador e da sua compra pelo empregador (BRAVERMAN, 1977).
A divisão do trabalho foi uma inovação no modo capitalista de produção, esta divisão
deu-se de maneira diferente quanto à divisão de tarefas, ofícios ou especialidades
da produção por meio da sociedade, pois nenhuma sociedade antes do capitalismo
subdividiu sistematicamente o trabalho de cada especialidade produtiva em
operações limitadas; esta forma de divisão do trabalho tornou-se generalizada
apenas no capitalismo.
Assim, em grupos onde a divisão primitiva do
trabalho se dá de acordo com o sexo, todo homem
ou mulher não apenas saberá fazer todas aquelas
coisas que homens e mulheres usualmente fazem
entre si como também devem ser capazes de fazê-
las eficientemente[...] por exemplo, uma mulher
dedicará seu tempo à produção de potes para uso
diário e outra faz poteria exclusivamente para ritos
religiosos [...] não encontramos o tipo de organização
em que uma mulher caracteristicamente se
especialize em juntar argila, outra em modelá-la e
uma terceira em cozer os potes (BRAVERMAN,
1977, p. 71).
A divisão do trabalho na sociedade é característica de todas as sociedades; no
entanto, a divisão pormenorizada do trabalho é produto peculiar da sociedade
capitalista; esta divisão pormenorizada destrói ocupações consideradas e torna o
trabalhador inapto a acompanhar qualquer processo completo de produção
(BRAVERMAN, 1977).
Subdividir pormenorizadamente o trabalho barateia suas partes individuais, isto
numa sociedade baseada na compra e venda da força de trabalho torna o
trabalhador vulnerável ao sistema como um todo, ou seja, isso significa que a força
de trabalho capaz de executar um processo completo pode ser comprada mais
barata como elementos dissociados do que como capacidade integrada num só
trabalhador (BRAVERMAN, 1977).
A divisão do trabalho exige a constituição de
mecanismos de controle... Em nome da eficiência, a
racionalidade começa a ser privilegiada e as
manifestações do caos passam a ser combatidas.
Surgem os patrões e os empregados, os chefes e os
comandados; criam-se horários de trabalho;
estabelecem-se cronogramas de produção;
esboçam-se organogramas. As forças da ordem
passam a ditar também a construção do ambiente
36
físico: enquanto o olhar dos patrões se centraliza na
perseguição do excedente (VERGARA; CARVALHO;
GOMES, 2004, p. 13).
Este trabalho procura mostrar como as políticas de gestão de pessoas são utilizadas
para melhor gerir a força de trabalho; em outras palavras, não se discorrerá aqui a
importância do trabalho para a sociedade nem como o mesmo auxilia o ser humano
a se auto-realizar, enfatizando, desta forma, a importância do mesmo.
Porém, procurar-se-á identificar e compreender, nas políticas da empresa, o jogo e a
interação entre os processos subjetivos e cognitivos do indivíduo e como os mesmos
são influenciados pela organização; provocando, dessa forma, uma reflexão sobre o
modo como as políticas de gestão de pessoas instrumentalizam práticas de poder.
Crozier (1981) afirma que o comportamento humano no seio das organizações não
tem a simplicidade nem a previsibilidade dos esquemas de comportamento do tipo
estímulo-resposta como se pensavam outrora.
Quando se aceita pensar que o comportamento
humano não pode ser determinado simplesmente
através de estimulantes pecuniários, e que os
“sentimentos” têm uma influência direta sobre as
“atividades”, já não se está muito longe de
reconhecer efetivamente que a distribuição do poder
e o sistema das relações de poder, no seio de uma
organização, têm uma influência decisiva sobre as
possibilidades e as formas de adaptação de cada um
dos seus membros, e sobre a eficácia do conjunto da
organização (CROZIER, 1981, p. 215).
As contradições sociais não são mais visíveis, porém ocultas em profundidade, isto é,
a empresa hipermoderna e a sociedade
neocapitalista, em seu estágio mais avançado, têm
como característica construir um sistema quase
perfeito para ocultar as contradições. Isso nos levou
a estudar o poder capitalista como nova totalidade
em substituição à antiga, na qual talvez a
característica mais profunda é que ela vem modificar
as ‘relações do econômico, do político, do ideológico
e do psicológico (PAGÉS et al, 1987, p. 16)
Cappelle e Brito (2002) afirmam que os sistemas sócio-econômicos mundiais têm
passado por rápidas e contínuas reconfigurações, permeadas pelo desenvolvimento
tecnológico. Em meio a esse movimento, surgem métodos de gestão de pessoas
que defendem a busca de formas de mediação das relações de trabalho mais
ajustáveis ao ambiente contemporâneo. Esses métodos são caracterizados como
37
uma concepção mais humana da gestão, que trabalha a motivação e promove a
adesão aos objetivos organizacionais.
Dentro deste contexto, Pagés et al (1987) elabora o conceito de um sistema sócio-
mental, segundo o qual o estado da organização, aos níveis: econômico, político,
ideológico e psicológico deve ser relacionado com as estruturas inconscientes dos
trabalhadores. Além disso, a organização, por meio do processo de mediação, traz
uma resposta apaziguadora às contradições inconscientes vividas pelos
trabalhadores, impossibilitando-lhes assumir as suas contradições inconscientes.
A organização segue políticas contraditórias cujo
princípio é aliar fortes restrições a grandes vantagens
oferecidas ao indivíduo. As vantagens integram o
indivíduo à organização, faz com que ele aceite as
restrições e até mesmo os objetivos de exploração e
dominação da empresa (PAGÉS et al, 1987, p. 26).
As vantagens oferecidas pela empresa funcionam como um termo mediador que se
interpõe entre os objetivos dominantes da organização e a percepção das coerções
sofridas pelo trabalhador, harmonizando-os.
O processo de mediação atua como uma aliança das restrições (coerções) da
empresa e os privilégios oferecidos aos indivíduos. Os privilégios atuam de modo a
ocultar dos trabalhadores os objetivos organizacionais; os termos mediadores para a
empresa procuram desenvolver as forças produtivas dando aos empregados toda
espécie de satisfação de ordem econômica, política, ideológica, psicológica, isto é,
um trabalho interessante, alto salário, responsabilidade, satisfações morais,
momentos de prazer, status e, concomitantemente, garantir o controle e subordinar
as forças produtivas dos mesmos aos objetivos da empresa e do sistema capitalista.
A mediação assegura o controle pelo fato de que a
contradição é “resolvida” pela empresa. Os privilégios
são oferecidos por ela, ao seu modo, segundo sua
própria lógica, a empresa reforça assim a
dependência dos trabalhadores, destituindo-os do
poder de organizar eles próprios a produção em
relação a ela, ao mesmo tempo pela forma de
intervenção e pelo seu conteúdo.
As contradições do sistema capitalista nem sempre
são diretamente observáveis, pois são ocultadas e
transformadas pelos processos de mediação
(PAGÉS et al, 1987, p. 28).
38
Crozier (1981) percebeu o mesmo que Pagés et al (1987): os sentimentos e as
expressões de sentimentos pelos membros de uma organização podem ser
utilizados como uma arma no jogo das relações de poder — “se é possível
demonstrar efetivamente que o comportamento afetivo dos subordinados está
condicionado por uma série de fatores controláveis, é difícil não fazer uso desse
conhecimento” (CROZIER, 1981, p. 217).
Os processos de mediação, conforme Pagés et al (1987), podem ser de quatro
instâncias: econômica, política, ideológica e psicológica.
A instância econômica engloba uma política de altos salários, ascensão na
carreira, reduzindo as discriminações de diplomas, sexo, família, meio social de
origem; que medeia a aceitação de um trabalho excessivo. A expressão financeira
dos objetivos estende-se aos indivíduos que são avaliados em função do potencial
financeiro que representam e são motivados da mesma maneira. Dão-se honras e
prêmios aos que atingirem ou ultrapassarem as metas individuais. Assim, a
organização, cujo funcionamento é estruturado por seus objetivos financeiros, se
esforça para organizar de maneira homóloga as relações entre os membros de seu
pessoal, de modo que faça do dinheiro o código universal, e reduzir as relações
sociais a relações mercantis. Toda uma série de dispositivos faz com que a
promoção dos indivíduos dependa do desenvolvimento e do sucesso comercial da
empresa.
Na instância política, há um conjunto de técnicas de administração a distância, as
quais garantem a obediência às diretrizes da organização e, ao mesmo tempo, o
desenvolvimento da iniciativa individual por meio de regras e princípios que o
indivíduo interioriza, aplica e reproduz. Para tanto, existe a substituição das ordens
pessoais por regras e princípios interiorizados; desaparece o papel autoritário do
chefe (não são mais os mandantes) e surgem os simples intérpretes das regras da
empresa.
As políticas são definidas por regras precisas, estabelecidas em manuais, as quais
fixam para cada cargo as atribuições, modalidades de ação, as normas de
procedimento e vendas de cada produto, as formalidades administrativas
39
concernentes a cada operação etc. Este sistema torna possível o governo a
distância, já que os princípios impostos são de fato aplicados.
As atividades de cada indivíduo são codificadas pelo sistema de regras, bem como
seu campo de relação (clientes, fornecedores, administradores). Este sistema, na
realidade, é uma pequena parte de uma gigantesca administração na qual tudo é
planificado, formalizado, codificado. “Esta passagem da gestão através de ordens
para a gestão através de regulamentos é uma característica fundamental das novas
formas de poder. Passamos, assim, da obediência a um chefe para a adesão a uma
lógica” (PAGÉS et al, 1987, p. 49).
“O indivíduo se liberta da tutela estrita e mesquinha do chefe (característica da
organização clássica) para cair sob a tutela muito mais obscura, ameaçadora e
insidiosa de uma entidade impessoal” (FARIA, 2004, p. 127).
A autoridade, isto é, o poder de controle que tem sua origem em um status
codificado, é inerente ao cargo e não à pessoa que o desempenha; da mesma
forma, a conduta administrativa é executada em conformidade com as normas
organizacionais preestabelecidas. Tal formalidade serve para atenuar o atrito dos
contatos oficiais, substituindo-os por fórmulas estabelecidas pelas regras
organizacionais; desse modo, é possível calcular a conduta dos funcionários e
estabelecer um sistema de expectativas mútuas. Além disso, a formalidade facilita
os contatos entre os funcionários nos casos em que haja desentendimentos
pessoais, já que ambos estão limitados por normas. “Fórmulas específicas de
procedimentos favorecem a objetividade e impedem que os sentimentos agressivos
se transformem em atos de violência” (MERTON, 1978, p. 108).
Merton (1978, p. 109) expõe que
a burocracia proporciona o máximo de segurança
profissional. A função da inamovibilidade, das
pensões, dos salários reajustáveis e das promoções
regulamentadas é assegurar o desempenho leal dos
deveres do cargo sem consideração de pressões
estranhas. O principal mérito da burocracia está na
sua eficiência técnica devido à ênfase que dá à
precisão, rapidez, controle técnico, continuidade,
discrição e por suas ótimas quotas de produção. A
estrutura está concebida para eliminar por completo
as relações do tipo pessoal e as considerações
emocionais (hostilidade, ansiedade, vínculos efetivos
etc).
40
A estrutura burocrática exerce sobre o trabalhador uma pressão contínua para torná-
lo metódico, prudente e disciplinado. A disciplina só pode ser efetivada se os
padrões ideais são sustentados por fortes sentimentos que assegurem dedicação
aos próprios deveres. A eficácia de tal estrutura depende de que se possa difundir
nos funcionários atitudes e sentimentos apropriados.
A disciplina (interpretada como acatamento aos regulamentos) aparece na vida do
burocrata como um valor imediato. A sua vida está projetada para si em termos de
carreira graduada, promoções, pensões, salários reajustáveis etc. tudo isso
objetivando estimular o trabalho disciplinado e o acatamento das normas.
“Tacitamente se espera do funcionário que ele adapte seus pensamentos e
sentimentos e atuações à perspectiva dessa carreira”. O significado simbólico das
normas contribui para que os sentimentos se transfiram dos fins para os meios
(MERTON, 1978, p. 116).
Visando à legitimidade da regra, são necessários que os seus formuladores não
sejam diretamente os encarregados da execução por parte do proletariado. É
necessário um sistema mediador — staffs —, o qual é encarregado de assumir a
difusão e a perenidade da regra; assim, o criador da regra desaparece, criando a
ilusão de que o sistema funciona independentemente.
Corroborando tais idéias, Giddens (1984) afirma que os detentores do capital estão
separados dos que detêm realmente o poder nas corporações: os executivos, e
estes são leais principalmente para com as corporações sob sua direção.
É por meio das regras que a centralidade da organização é mantida e, dessa forma,
o poder da direção central. Esta define, portanto, as modalidades de funcionamento
do conjunto e, em referência a seus princípios, é que são tomadas as decisões.
O exercício do poder não consiste em ordenar, tomar
decisões, mas em delimitar o campo, estruturar o
espaço no qual são tomadas as decisões [...] o poder
é de fato detido por aquele que cria a regra do jogo,
pois ele propõe de uma só vez o conjunto de
condições às quais são sujeitos os participantes
assim como suas relações mútuas (PAGÉS et al,
1987, p. 51).
Além disso, o sistema de regras é visto como uma proteção contra a arbitrariedade
dos chefes, atenuando o caráter subjetivo dos julgamentos e dos abusos de poder.
41
Assim, a defesa contra a arbitrariedade mascara o reforço do poder da organização,
por meio de uma inversão de sentido, o sistema de controle é apresentado como
uma ajuda. O resultado desta operação de consolidação ideológica do sistema de
regras é constituir uma imagem boa da empresa e de culpabilizar o indivíduo: o
culpado não é aquele que age contra sua consciência, porém contra a regra.
O sistema de regras enquanto sistema de controle
não é vivenciado como coercitivo mas protetor. Ele
instaura um quadro que permite canalizar a angústia,
assimilável a um sistema de defesas. Sua eficácia
reside na identificação que ele estabelece entre a
sobrevivência do indivíduo e a da empresa [...] o
sistema de restrições é também sistema de proteção,
o reforço das restrições produz a segurança em um
movimento dialético. Este sentimento de segurança
nutre da coerência do sistema de regras, o qual dá
uma impressão de poder àquele que se submete a
ele (PAGÉS et al, 1987, p. 70).
Constata-se que a eficácia do sistema não é constituída por uma racionalidade
técnica, mas pelas representações que são produzidas a partir desta racionalidade,
pela sua transformação em sistema ideológico, em valor, em sistema de defesa
psicológica.
Gérard (2003) expõe que um dos jogos de poder utilizados pelos atores
organizacionais desprovidos de recursos para progredirem na estrutura hierárquica
da empresa seria por meio da estratégia de proteção de posição, ou melhor, o jogo
da conformidade às regras ou do respeito à lei que, segundo ele, trata-se do
escudo protetor — e sobretudo legitimo — das regras
[que] permite aumentar a proteção e evoluir mais
facilmente em uma cultura organizacional
mecanicista ou com pessoas de personalidade
analítica. [...] Pode-se constatar que o jogo da
“conformidade às regras” se apresenta como o meio
de defesa mais eficaz nas burocracias mecanicista e
profissional. O respeito indefectível das regras
prescritas pelos membros em posição de autoridade
permite proteger-se e legitimar suas ações
defensivas (GÉRARD, 2003, p. 57).
Além disso, o sistema de regras passa a despersonalizar as relações de poder;
neste novo sistema, não há mais quem decide e quem executa, pois todos são
sujeitos da própria submissão às normas. Os staffs não passam de meros
intérpretes das regras os quais devem assegurar o seu bom funcionamento.
42
Crozier (1981) percebeu que, graças às regras, cada membro da organização se
encontra protegido contra a influência coercitiva de seus superiores e contra a dos
seus subordinados, porém essa proteção constitui também uma forma de isolamento
de dupla conseqüência: por uma parte, ele está privado de toda iniciativa e
submetido totalmente às regras que lhe são impostas de fora; e, pela outra, está
completamente livre de qualquer laço de dependência pessoal; ele não teme
ninguém. Esse tipo de relação humana faz perder sua importância afetiva quanto às
relações entre superiores e subordinados, tanto para uns quanto para os outros.
Outro ponto destacado é que a proliferação das normas burocráticas impessoais
diminui os atritos e aumenta a necessidade de vigilância; todavia, simultaneamente,
a hostilidade suscitada pelo clima burocrático e os resultados insatisfatórios que
deles resultam, na prática, reforçam essa necessidade. Esse processo é designado
por Crozier (1981) como “círculo vicioso”.
Exemplificando, as frustrações dos diferentes grupos que não podem discutir as
decisões que irão afetá-los e que vêem suas atividades submetidas a uma rígida
vigilância suscitam pressões tão fortes que seus superiores não se sentem
confiantes para enfrentá-las, e as decisões passam a ser tomadas em um nível
hierárquico suficientemente afastado para escapar ao contato. Se os funcionários
que devem tomar essas decisões não estão mais em contato com os que serão por
elas afetados, as tensões forçosamente diminuirão, as frustrações continuarão e, por
meio delas, continuará a pressão no sentido de centralizar.
A instância ideológica engloba um sistema de representação do qual os detentores
do poder se utilizam para mascarar a realidade. A função da ideologia é reforçar a
imagem positiva do papel da empresa, não deixando que o indivíduo se conscientize
das contradições das políticas empresariais e das contradições sociais que
subentendam.
Farias (2004, p. 128) expõe que
a organização exerce seu poder pela estruturação de
um sistema de crenças e valores, de uma ideologia,
que cuida de oferecer uma versão coerente entre as
aspirações dos agentes e as relações sociais, pois a
contribuição destes agentes para o processo de
produção depende, em larga medida, da integração
ideológica, obtida através de dispositivos técnicos
43
cada vez mais sofisticados. A organização pretende,
portanto, constituir-se em uma nova igreja que
professa uma nova religião, através de um sistema
de dogmas (chamado, na teoria das organizações,
de cultura organizacional), de crenças e valores, de
uma moral de ação, configurados como escrituras
sagradas e rituais, visando à adesão dos agentes.
Nessa perspectiva, Schein (1997, p. 12) define cultura organizacional como um
padrão de suposições básicas compartilhadas que um grupo aprendeu para resolver
seus problemas de adaptação externa e integração interna. Esse padrão foi
trabalhado o suficiente para ser considerado válido e, então, ser ensinado aos novos
membros como o modo correto para perceber, pensar e sentir em relação a esses
problemas.
Pode-se observar a cultura por meio de comportamentos padrões quando as
pessoas estão interagindo — a linguagem usada, o ritual usado para trabalhar em
cada situação etc; normas grupais — valores padrões que envolvem o grupo na
execução de uma tarefa; exposição de valores — os principais anúncios publicados
e os valores que o grupo reivindica tentando alcançar; filosofia — as principais
políticas e ideologias que guiam as ações do grupo; regras do jogo — as regras
implícitas para alcançar sucesso na organização (o que se espera de um novato
para ser bem aceito pelo grupo é um exemplo); Clima — o sentimento que é
transmitido a um grupo pelo plano físico e os modos pelos quais os membros da
organização interagem, e sua interação com clientes etc.; habilidades — as
competências especiais que os grupos exibem realizando certas tarefas, a
habilidade para fazer certas coisas que são passadas de geração para geração sem
necessariamente ser articulado por escrito; hábitos de pensamento, modelos
mentais ou paradigmas lingüísticos — as atitudes cognitivas compartilhadas que
guiam as percepções, pensamento e idioma usados pelos membros de um grupo e é
ensinado aos novatos no processo de socialização; e significados compartilhados
— a compreensão emergente que é criada por membros de um grupo quando eles
interagem (SCHEIN, 1997).
Muitas organizações utilizam os valores essenciais da ideologia humanista cristã
(respeito ao indivíduo, valorização do esforço e do sacrifício, perseverança,
44
integridade etc) para ocultar as condições reais de exploração. A estes valores
tradicionais são incorporados os valores modernos (mudança, progresso técnico,
eficácia, sucesso individual etc) formando, assim, uma nova cultura por meio da
integração de valores antigos em um novo sistema cujos fundamentos são
contraditórios com a moral tradicional.
Para ilustrar os valores que compõem este novo sistema, Pagés et al (1987) citam:
progresso técnico e mudança;
auto-superação, esforço e sacrifício;
respeito e consideração para com o indivíduo;
espírito de competição, sucesso individual, individualismo;
integridade e honestidade exigidas de todos e, em particular, dos
responsáveis;
responsabilidade para com o mundo, contribuição para a melhoria da
sociedade;
busca de perfeição;
qualidade dos serviços fornecidos e dos produtos realizados;
igualdade de oportunidade de promoção, ausência de favoritismo;
liberdade de expressão, possibilidade de exprimir a todo o momento suas
dificuldades, seus problemas e suas aspirações;
contribuição para a felicidade dos indivíduos;
sentimento de plenitude pelo trabalho;
recompensa dos esforços dedicados à empresa.
Valores tradicionais, como sacrifício, respeito ao próximo, integridade, são
misturados com elementos contraditórios, como espírito de competição, eficácia e
individualismo. Todos os valores supracitados constituem uma moral de ação e
certos pontos chegam, inclusive, a ser regras práticas de funcionamento. A
credibilidade deste sistema é fundamentada no fato de os indivíduos colaborarem
para a formação deste sistema de valores.
Faria (2004, p. 128 a 129) constatou que as empresas possuem
um sistema de transmissão, destinado a inculcar nos
agentes as crenças que permitem que suas
existências tenham algum sentido. O sistema de
transmissão ideológica nas unidades produtivas
45
possui mecanismos que criam e disseminam valores.
Estes mecanismos ou são explícitos, valendo-se de
jornais internos, quadros murais, homepage,
comunicações através de meios eletrônicos e
programas de treinamentos, ou são mecanismos
implícitos, agindo através de confraternizações,
promoções esportivas, associações cooperativas de
consumo para os empregados etc. A hierarquia, a
disciplina e o controle são assim legitimados pela
função ideológica, a qual transmite um conjunto de
crenças a serem partilhadas pelos agentes. [...] a
crença, em síntese, é a de que quanto mais a
organização se desenvolve, mais se desenvolvem
seus membros.
Além disso, o mais surpreendente é o papel dos processos sutis de autopersuasão,
pelos quais o sujeito colabora para sua própria doutrinação e resolve seus conflitos
ideológicos, reforçando também a ideologia dominante sempre com a impressão de
pensar livremente. Para exemplificar, uma contradição entre os princípios e sua
aplicação: a pressão do trabalho e uma política de pessoal vantajosa para os
empregados; esta contradição não é formulada de maneira explícita, ela é resolvida
antes de ser formulada por uma produção ideológica própria do sujeito, por exemplo,
ao justificar que não se atingiu as metas organizacionais a culpa é própria do
homem, esta atitude atribui o fenômeno universal e vago à natureza humana e não
em questionar se as metas eram tangíveis ou não. Não são questionadas as regras,
e sim, aceitam-nas.
Esta contradição é logo camuflada antes mesmo de
se tornar consciente através da produção ideológica
do sujeito. Ele mesmo produz um novo “princípio,
extraído de um velho fundamento ideológico (são
homens, a natureza humana é falível), o que lhe
permite resolver sua contradição ideológica e
preservar a coerência de suas idéias [...]. O sujeito
pode continuar a crer nos princípios “que ele
aprendeu” e que o faz viver, mediante uma ligeira
modificação ou atenuação da doutrina. Ele elabora
ideologicamente, aderindo à doutrina oficial, mais
que isso, porém, produzindo ele mesmo uma
doutrina de compromisso (PAGÉS et al, 1987, p. 89).
Uma pessoa sente-se culpada quando sabe que fez algo “mau” (muitas vezes a
intenção é considerada equivalente ao ato pelo indivíduo). No entanto, o que é mau
pode ser desejável e prazeroso para o ego. Esse estado mental — culpa — pode ser
mais bem designado como medo da perda de amor. Se o indivíduo perde o amor de
quem é dependente, deixa também de ser protegido de uma série de perigos, ou
pior, fica exposto ao perigo da punição (FREUD, 1997).
46
O sentimento de culpa é claramente apenas um medo da perda de amor, uma
ansiedade social. Na relação entre o indivíduo e a organização, esse medo pode vir
desde um não reconhecimento de seus esforços ou dedicação até a demissão. Além
disso, a agressão surge do conflito entre a necessidade do amor da autoridade e o
impulso no sentido da satisfação instintiva (FREUD, 1997).
De acordo com Russel (1979), o impulso à submissão tem raízes no medo;
observando o relato de vários trabalhadores, em sua obra, ele percebeu,
nitidamente, como eles são “forçados” a colaborar com a empresa — o medo de
perder o emprego, caso eles não venham a se sujeitar, é nítido.
Lebrun (1984) enfatiza que força não significa necessariamente a posse de meios
violentos de coerção, mas de meios que permitam influir no comportamento de outra
pessoa.
Ademais, as políticas das empresas podem ir mais além do que um simples “tratar
bem o pessoal” (regra da empresa clássica); elas podem se apoiar em uma filosofia,
na qual não somente se contentam em dar, como, para se desculpar da exploração,
exigem, também, em nome dos valores mais profundos e secretos dos
trabalhadores, o desejo de dar um sentido à existência, o desejo de ser útil a uma
coletividade, o desejo de criar e se apropriar do futuro. Tais políticas podem ser
percebidas pelas satisfações materiais, o plano de aposentadoria, as vantagens
extraprofissionais, as satisfações morais, o sentimento de ser considerado,
respeitado, de não ser peão, de ter o direito de falar que a empresa não se interessa
somente pelo lucro mas também pelas pessoas (PAGÉS et al, 1987).
A organização, na sua realidade econômica e política, propõe aos indivíduos uma
imagem de força e poder (o porte da organização, o caráter mundial, a eficácia, os
objetivos de conquista — lucro e expansão) que compõem uma imagem agressiva
de onipotência, favorecendo a projeção de sonhos individuais de onipotência, ao
mesmo tempo em que mantém a angústia que os alimenta. Esta imagem de poder
absoluto é consolidada ideologicamente pela empresa, isto é, ela propõe,
conscientemente, a imagem de seu poder que é consolidada como um valor e um
modelo para os indivíduos (PAGÉS et al, 1987
).
47
Na instância psicológica, a organização funciona ora dando prazer, ora angústia
(privilégios-restrições) ao indivíduo. Esta instância
favorece a integração dos trabalhadores à empresa,
pois atua ao nível inconsciente. Faz com que o
indivíduo introjete as restrições (coerções) e os tipos
de satisfação que ela oferece, os quais, então,
funcionam como princípios autônomos da psique.
E mais, o prazer que se tem pelo trabalho, do qual se
aprende a não abdicar. Inversamente, o salário, as
alegrias do poder que cada um à sua maneira
desfruta, de uma forma ou de outra, a seu nível,
amenizam as dúvidas, os escrúpulos morais que
possam nascer; fazem com que se suportem os
conflitos inerentes ao sistema psicológico, a angústia
permanente, o vazio interior, a pobreza da vida
particular e das relações pessoais. Trata-se de uma
organização sistêmica, em que os diversos tipos de
mediação se relacionam mutuamente, vêm tampar os
buracos sufocando as contradições nascentes.
Porque sua lógica é comum, trata-se de um sistema
coerente, orientado para a subordinação, para o
enquadramento do indivíduo no seio de uma ordem
global econômica-política-ideológica-psicológica
definida centralizadamente (PAGÉS et al, 1987, p.
29).
Dessa forma, a organização antecipa-se aos conflitos, absorve e transforma as
contradições antes que estas resultem em conflitos coletivos, ou seja, mediação é a
antecipação de conflitos.
Por conseguinte, todas esta instâncias se reforçam mutuamente, posto que se
organizam em uma lógica coerente objetivando assegurar o controle da organização
sobre seus membros; todos os níveis da organização produzem o indivíduo e
incitam-nos a reproduzi-la a seu modo.
Cada um dos meios de dominação é
simultaneamente um elemento dos outros. Por
exemplo, o poder econômico da organização reforça
seu poder psicológico, pois sua imagem de poder
cultiva a angústia ao mesmo tempo em que serve de
suporte para a identificação. A ideologia da empresa
é mais bem aceita quanto mais se inscreve nas
práticas econômicas, principalmente suas políticas
referentes a pessoal. Simetricamente, a adesão
ideológica e a psicológica reforçam o poder
econômico da empresa, fortalecem a credibilidade de
suas políticas. O domínio do sistema provém de sua
globalidade e de sua coerência, ainda mais que
nenhum elemento é considerado em particular
(PAGÉS et al, 1987, p. 38).
48
Também, a organização logra poder do fato de trazer uma “resposta” às
contradições psicológicas individuais e interindividuais, possibilitando, assim, ao
indivíduo defender-se da angústia dele; propõe-lhe um sistema de defesa sólido,
socialmente organizado e legitimado pela sociedade, à custa de reforços múltiplos.
Medem, dessa maneira, as contradições sociais e psicológicas e interpsicológicas.
Oferecem uma solução global aos problemas da existência (PAGÉS et al, 1987. p.
39 e 40).
Outro ponto a se destacar nas políticas de recursos humanos é que elas não são
apenas procedimentos descritivos do funcionamento da organização, mas também o
fundamento de uma produção ideológica — não se pode dissociar os
procedimentos, as técnicas, os dispositivos e o discurso destes dispositivos da
maneira como funcionam, como são vividos pelos indivíduos. Os dispositivos
operacionais e a ideologia estão indissoluvelmente ligados: eles têm como função
fazer interiorizar certas condutas e, ao mesmo tempo, os princípios que os
legitimam.
Segundo PAGÉS et al (1987), as políticas de recursos humanos são processos de
mediação multidimensionais:
no nível econômico, elas gerenciam as vantagens concedidas ao pessoal, em
contraposição ao seu trabalho;
no nível político, elas asseguram o controle da conformidade às regras e aos
princípios, a divisão dos indivíduos e dos grupos, o comando de suas relações;
no nível ideológico, elas encarnam concretamente os valores de consideração
pela pessoa, do serviço e da eficácia, que legitimam todas estas práticas e
ocultam os objetivos de lucro e dominação;
no nível psicológico, elas praticam uma política de gestão dos afetos que
favorece o investimento inconsciente massivo da organização e a dominação
desta sobre o aparelho psíquico dos seus empregados.
Outrossim, as políticas de recursos humanos desenvolvem outros processos, como
a mediação. A definição de mediação permite estudar a subordinação do sujeito à
empresa sob o ângulo das “vantagens” de toda espécie que esta lhe concede:
abstração, que reduz o conjunto das relações sociais à lógica abstrata do dinheiro;
49
objetivação, que confronta cada funcionário na medida de sua utilidade a partir de
critérios que lhes escapam;
desterritorialização, que separa o indivíduo de suas raízes sociais e culturais, a fim
de torná-lo mais receptivo ao código da organização.
canalização, que transforma o máximo de energia individual em força de trabalho,
por meio da carreira.
a) O processo de Abstração
A abstração é o resultado da introdução de uma
lógica dominada pelas relações mercantis no
conjunto das relações sociais. Ela tende a distanciar
o homem da realidade concreta e vivida, separando-
o e isolando-o de seu contexto global (fazer
abstração de), cercando-o de representações falsas
ou truncadas da realidade (em “fórmulas abstratas”),
fazendo com que suas atividades pessoais e sociais
se tornem desconhecidas para ele (PAGÉS et al,
1987. p. 106).
O dinheiro atua como código dominante; por meio dele, a empresa reduz o conjunto
das relações existentes na sua esfera de influência a um código central, o dinheiro,
ao qual é subordinado o controle sobre os fins, os valores e os motivos. Este código
modela os indivíduos, as produções, as linguagens, as idéias... Dessa maneira, a
maior parte dos objetivos são expressos em termos financeiros: ganhos, salários,
custos, benefícios, investimentos etc; é a partir do objetivo de lucro que as outras
políticas são determinadas.
Além disso, o fato de possuir objetivos quantificados, que podem ser expressos
principalmente por uma carga de trabalho elevada, satisfaz a necessidade de
reconhecimento e segurança — caso o trabalhador atinja as metas, será
considerado recompensado, e esta certeza o protege contra a arbitrariedade.
“A lógica da abstração que ocasiona a perda de comunicação e de solidariedade é
suprimida pela reinjeção sistemática de relações humanas sob a forma de símbolos
e serviços” (PAGES et al, 1987, p. 110). Embora em muitas empresas não se façam
grandes “amigos”, cada um encontra nela um bom ambiente por meio de reuniões,
jantares de família, seminários, jornais internos, relações cordiais. Embora a carga
de trabalho seja excessiva, causando conseqüências psicofisiológicas (ataques
50
cardíacos, depressões nervosas, úlceras), as vantagens extraprofissionais, as
pensões em caso de doenças ou acidentes, os seguros em prol da família (em caso
de morte), todas estas formas de ajuda complementares são distribuídas de forma
generosa, ocasionando a gratidão daqueles que se beneficiam.
Com isso, a empresa consegue pôr em prática a filosofia de consideração pela
pessoa, em um universo dominado pela lógica do dinheiro. Sendo assim, a
denominação das relações mercantis desaparece atrás de todos os símbolos que
permitem a cada um sentir-se respeitado, reconhecido como sujeito. O mesmo
código exprime a submissão aos objetivos da empresa e a consideração que ela
concede ao proletariado dela.
b) O processo de Objetivação
A entrevista é codificada em uma tabela de medidas de desempenho, aptidões,
virtudes e aspirações dos empregados, juntamente com a nota dada. O mesmo é
promovido em função de sua utilidade para a empresa, a qual é aferida por meio da
avaliação quantificada de seu rendimento e de sua adaptação às regras e
mecanismos que as exigências do sistema veiculam. A subjetividade é assim
contabilizada.
A objetivação prolonga a abstração no modo como
apreender o indivíduo, submetendo-o ao reino da
medida. É tudo o que contribui para traduzir em
termos quantitativos as performances, aptidões,
virtualidades e aspirações dos indivíduos. Uma das
características da administração moderna consiste
em considerar a realidade apenas através de
métodos quantitativos, em acreditar que só se pode
dominar um problema quando o formulamos em
termos quantitativos, como se o que fosse
enumerado fosse indiscutível, porque é científico.
Esta concepção, que se pretende racional, tende a
reconhecer o indivíduo apenas em função de sua
utilidade para a organização, utilidade esta medida
através da avaliação quantificada de seu rendimento
e de sua adaptação às regras e mecanismos que
veiculam as exigências do sistema. Ela é sustentada
por uma linguagem cujo modelo é matemático [...] e
serve de verniz às técnicas de poder que encobre
(PAGÉS et al, 1987. p. 112).
Legitimação — Tal procedimento é legitimado por meio de princípios e práticas
ideológicas, tais como a luta contra a arbitrariedade dos chefes e a subjetividade; a
igualdade de todos diante da avaliação; a consideração pela pessoa; a liberdade de
51
expressão; a perfeição do sistema em face da imperfeição humana e o fato de cada
um aplicar as regras a si próprio.
Individuação — a legitimação só ocorre se cada pessoa se encontra isolada em
relação ao sistema, pois o encontro favorece a expressão individual das
reivindicações, amarguras, projetos, valorizando a solidariedade em detrimento ao
sucesso individual. Ao considerar as reivindicações expressas individualmente, a
empresa evita e desintegra as reivindicações coletivas.
Canalização das energias — dentro deste contexto de favorecer o individual, o
funcionário interioriza a necessidade de vencer, atingir os objetivos, despender o
máximo de energia em proveito da empresa. Ele é apoiado tanto pelo gerente
imediato como pelo sistema que o valoriza, por meio de boas notas. O indivíduo que
está suprindo o desejo de vencer esquece o rendimento, a carga de trabalho, tudo.
A partir do momento em que as aspirações dele se exprimem em termos de sucesso
e ambição, a empresa pode satisfazê-lo.
Dominação psicológica — ao instituir um lugar de escuta na Avaliação-Conselho,
oferecendo ao indivíduo a possibilidade de extravasar, falar de medos e aspirações
pessoais, este dispositivo opera a gestão dos afetos, favorecendo o domínio da
organização sobre o aparelho psíquico dos mesmos. “Assim, a situação reforça a
culpabilidade ligada ao fracasso, ao sentimento de não ter feito tudo que era
necessário para vencer, para realizar os objetivos fixados nos planos”.
De forma análoga, quando o indivíduo é convidado a avaliar, ele é estimulado a
identificar-se com a organização, interiorizando as restrições dela e projetando nela
a angústia ligada ao medo do fracasso.
O conflito entre a euforia do sucesso e a angústia do
fracasso provoca uma tensão que é alimentada ao
mesmo tempo em que encontra uma saída na
avaliação-conselho. Por um lado, o indivíduo atenua
esta tensão despendendo toda sua energia conforme
os objetivos e as regras; e, por outro, cultivando
valorizações narcisistas, caso tenha sucesso
(PAGÉS et al, 1987. p. 106).
Percebe-se, pelo exposto anteriormente, como um único dispositivo provoca efeitos
de poder em níveis diversos. Cada dispositivo especializado em um destes níveis
tem ligação com outros dispositivos. Por exemplo, a gestão dos salários, prática
52
econômica, tem ligações ideológicas e políticas; ela remete à ideologia oficial, ao
sistema de regras. A análise do poder confronta esta necessidade de tornar visíveis
os laços que são ocultos nos organogramas e nos discursos “funcionalistas” sobre a
organização.
c) O processo de Desterritorialização
É um conjunto de mecanismos que objetiva separar o indivíduo das origens sociais e
culturais dele, em destituí-lo de sua própria história pessoal para reescrevê-la no
código da empresa, em substituir as referências originais individuais por outras
conforme o interesse da instituição.
Por exemplo, a desterritorialização produz os seguintes efeitos no ritmo da carreira:
a admissão, as promoções, os estágios, os aumentos são acontecimentos que
marcam data. O nome da família não é mais a referência principal, mas sim o nome
da empresa.
Além disso, a política de “mobilidade perpétua” é também um fator importante para
este movimento de desterritorialização-reterritorialização, já que os dispositivos de
mudança deixam os indivíduos muito dependentes da empresa, podendo esta
amoldar de maneira “arbitrária” a trajetória profissional e, portanto, social dos
indivíduos. As relações com a profissão, o status, o salário, a formação serão
moldados pela organização, sem possibilidades de distanciamento deste modelo
caso o empregado queira ascender na carreira. As mudanças contribuem para a
socialização e a aculturação do sujeito.
Ademais, esse processo evita a apropriação do poder por um indivíduo ou grupo. As
mudanças freqüentes evitam que o indivíduo se identifique com uma função ou um
status determinado. Essas mudanças evitam toda cristalização de interesses
individuais ou coletivos sob o controle de um nível determinado da organização.
Assim que um empregado é promovido, ele já aspira a uma nova promoção;
conseqüentemente, ninguém se apropria do poder a um nível qualquer. Percebe-se,
pelo exposto, como este processo coloca os indivíduos numa trajetória e os priva de
um enraizamento.
Outra característica desta mobilidade é a possibilidade que as pessoas possuem de
conhecer várias outras e, ao mesmo tempo, aprender diversos serviços; dessa
53
forma, como todos são intercambiáveis à vontade, ninguém pode se sentir
indispensável.
O procedimento da mudança de cargo freqüente é um bom exemplo de prática
ideológica no sentido de que seus efeitos de poder são reforçados, ao mesmo tempo
em que são ocultados por um discurso ideológico e atual: a ideologia da mudança.
d) O processo de canalização
Este processo procura transformar o máximo de energia individual em força de
trabalho, por meio da carreira. A carreira é um elemento central na relação entre
empregado e empresa; ela intermedeia esta relação no tempo e não mais apenas no
espaço.
Para o indivíduo, ela permite “conter” suas angústias
de não reconhecimento, seu medo de fracasso e
canaliza seus desejos para sonhos de onipotência e
perfeição. Para a empresa, trata-se primeiro de
assegurar a transformação de energia individual em
força de trabalho, e não em revolta contra a
exploração (PAGÉS et al, 1987. p. 133).
A carreira ajuda o funcionário a solucionar a contradição entre a carga de trabalho
excessiva, a tensão e pressão permanente; e, do outro, os desejos de liberdade e
autonomia. Isso é possível por meio da busca pelo “fazer carreira”, uma vez que o
desejo de vencer leva-o a trabalhar sempre mais e melhor. O que não é percebido
pelo trabalhador é que esse proceder produz efeitos de poder, ou seja; fazendo
carreira para “tomar o poder”, o indivíduo encontra-se condenado a vencer. Assim, a
empresa procura transformar este desejo em necessidade (PAGÉS et al, 1987).
O discurso reforça, pois, a idéia do trabalho como sendo o caminho para atingir o
estado de iluminação por meio do conceito de auto-realização. Enquanto se procura
satisfazer as necessidades existenciais do indivíduo, as necessidades da empresa,
de lucratividade e crescimento podem ser igualmente satisfeitas (BELL; TAYLOR,
2004, p. 69).
A partir deste momento, a sucessão dos dias girará em torno da carreira: admissão,
progresso, aumento, promoção se tornarão os elementos essenciais de existência
do indivíduo — o tempo se modela de acordo com os moldes organizacionais e é ele
54
quem dá ritmo à sua existência. Esse dispositivo — carreira — contribui para a
introjeção da organização pelo Ego, posto que o indivíduo reproduz nele o modelo
da empresa visto que ele se estrutura em função deste modelo e a necessidade de
reconhecimento será satisfeita quando reconhecer a empresa nele, isto é, quando
ele não for mais ele mesmo.
O sucesso, a ambição, fazer carreira vão se tornar
para o indivíduo os valores essenciais, pois são eles
e só eles que podem preencher esta angústia do
vazio: para ser reconhecido, é preciso vencer.
A partir do momento em que a carreira se torna o
investimento principal do indivíduo, o móvel principal
da existência, o valor pessoal é reduzido à
competência profissional que lhe serve de código
único (PAGÉS et al, 1987. p. 135).
O deslocamento dos objetivos econômicos para o plano psicológico é perceptível: a
empresa não pede ao trabalhador para trabalhar por dinheiro, ela o chama a vencer,
em ser o melhor. A partir desta mudança de foco, a exploração pela organização
torna-se um objetivo para o funcionário: transforma-se a obrigação em valor pela via
de sucesso.
O sucesso é colocado em primeiro lugar: o trabalho
provém disso. A exigência passa do nível econômico
para o nível psicológico, da mesma forma que a
instância encarregada do controle passa da
organização (sistema de restrição) ao indivíduo (ideal
do Ego, ferimento narcisita do fracasso...)
(PAGÉS et
al, 1987. p. 137).
A empresa transmite a idéia ao funcionário de que é ele quem está superando-se
por meio da carreira; mas, na realidade, são os objetivos dela que estão sendo
atingidos. O aspecto restritivo da empresa neste ponto desaparece, deixando nítidos
apenas os aspectos psicológicos e ideológicos. A eficácia deste dispositivo não é
somente atrelada ao sucesso, mas principalmente ao prazer que este proporciona
aos indivíduos.
O desejo de fazer carreira impulsiona o indivíduo à “obrigação de vencer”. Uma vez
acionado o dispositivo, não é necessário impor grande carga de trabalho nem
mesmo fiscalizar o tempo dele, já que a ideologia do sucesso permite poupar a
imposição e, portanto, as atitudes repressivas, transformando o máximo de energia
55
individual em força de trabalho. Os sacrifícios que a promoção exige são eliminados
pelo valor e a imagem que ela possui.
A organização promove crenças complementares ao “componente psíquico do
trabalho-disciplina, descrevendo o empregado ideal como aquele que interioriza os
valores e objetivos da companhia, ao ponto em que o trabalho produtivo é visto na
combinação do interesse da empresa em produtividade com o do empregado por
crescimento e maturidade. Essas crenças incentivam os indivíduos a desenvolver
uma ligação emocional com a empresa que resulta em “compromisso” e “lealdade”
(BELL; TAYLOR, 2004).
Além dos processos de abstração, objetivação, desterritorialização e canalização,
Pagés et al (1987) abordam também sobre o dispositivo Entrevista de Avaliação-
Conselho e a Organização e o inconsciente.
2.3.1 Entrevista de Avaliação-Conselho
A entrevista de avaliação-conselho, na realidade, é um dispositivo no qual a
empresa, por meio de um gerente, avalia o trabalho, registra as aspirações e
queixas do subordinado imediato e, também, fixa os objetivos do ano seguinte,
sintetizando toda a avaliação em uma nota da qual dependerá o salário do
trabalhador em questão. Este deve assinar a ficha em que a nota é inscrita
independente de ter concordado com o resultado da avaliação; mas, como sinal de
que está ciente. Esta entrevista é exposta ao funcionário como se fosse uma
discussão franca e aberta, aplicando o princípio da consideração pela pessoa.
De acordo com Pagés et al (1987), “a entrevista é um bom exemplo da falsa
neutralidade deste tipo de prática. Concebida para que cada um possa exprimir-se
livre e objetivamente, para solucionar problemas que possam aparecer”.
Esta contradição é reencontrada na própria estrutura
da entrevista que apresenta como se naturalmente
houvesse a conciliação entre satisfação do indivíduo
(CONSELHO) e a submissão aos objetivos da
organização (AVALIAÇÃO). A entrevista de
avaliação-controle é um dispositivo que codifica a
demanda de satisfação do indivíduo no quadro fixado
pela empresa (Pagés et al 1987, pp. 100-1).
56
Em síntese, a entrevista é utilizada como uma prática ideológica, pois é apresentada
como prova de que a empresa leva em consideração os valores humanos, que
protege o funcionário da arbitrariedade dos chefes, que é uma instituição em que se
pode falar abertamente e que permite a cada um encontrar o lugar no qual se sinta
melhor, minimizando o aspecto controle e valorizando o aspecto conselho.
Mesmo que a pessoa perceba que a entrevista de avaliação pode ser usada como
um logro, ela tenderá a recusar este aspecto e a defender este procedimento em
nome dos grandes princípios, evidenciando a existência de um sistema de valores
na instituição; este proceder revela um mecanismo de autopersuasão.
Com isso, o aspecto controle é minimizado e, em contrapartida, o aspecto conselho
é valorizado. Este é o papel da ideologia, que acentuará o fato de levar em conta as
aspirações do empregado, a defesa dos valores básicos da organização para
atenuar outros aspectos: sacrifício, rendimento, desconhecimento do sistema. Por
meio da autopersuasão, o próprio indivíduo produz uma justificativa para impedir a
emergência ao nível consciente das contradições nas políticas da empresa e,
portanto, para desarmar a crítica destas políticas, reforçando sua credibilidade. Isso
o leva a ocultar as contradições internas ao dispositivo que só podem exprimir-se em
termos psicológicos e individuais: sacrifício/felicidade.
2.3.2 A organização e o inconsciente
O indivíduo está ligado à empresa não apenas por laços materiais, morais,
vantagens econômicas e satisfações ideológicas que ela lhe proporciona; porém
também por laços psicológicos. Ele reproduz a organização de forma até mesmo
inconsciente. A organização tende a se tornar fonte de angústia e de prazer para
ele.
Projeção, introjeção, identificação, ambivalência, prazer agressivo, ideal do Ego,
angústia etc constituem elementos dos processos psicológicos inconscientes.
Descrever-se-á sua gênese e seu funcionamento em três etapas: os processos
57
intrapsicológicos, os processos sociais e, por último, a organização-inconsciente
individual.
a) Primeira etapa: Fraqueza do indivíduo, angústia de destruição e impulsos
agressivos
Organização
Poderosa
(Gratificações e
sanções)
Indivíduo
FIGURA 1 — SENTIMENTOS DE FRAQUEZA E INFERIORIDADE. ANGÚSTIA DE DESTRUIÇÃO E
IMPULSOS AGRESSIVOS.
Fonte: PAGÉS et al (1987, p. 151).
Na figura 1, percebe-se a imagem de um indivíduo isolado diante de uma grande e
poderosa organização (fonte de contentamentos — dinheiro, status — e sanções
múltiplas — lazer, família, angústia reprimida, vida pessoal). O indivíduo se encontra
isolado, devido à política da empresa, que é baseada na individualização dos
problemas.
Nesta situação, o indivíduo hipotético tem muita probabilidade de sentir a
organização ameaçadora: as satisfações que ela pode lhe oferecer e retirar, e as
quais ele não pode refutar, constituem uma ameaça à sua integridade. Dentro deste
contexto, o indivíduo possui o sentimento de fraqueza (imagem do seu Ego pequeno
e fraco); experimenta fortes angústias de destruição e impulsos agressivos contra o
objeto ameaçador; vive uma situação de dependência infantil que lembra a
dependência em relação aos pais.
Por meio das múltiplas satisfações (salário, trabalho, carreira, viagens, contatos etc)
que a organização oferece aos indivíduos, ela se apresenta como uma imensa
máquina de dar prazer e, portanto, adquire um imenso poder sobre o indivíduo, ou
seja, o poder de exercitá-lo (dar prazer) com a condição de que ele satisfaça as suas
58
exigências, e o poder de retirá-lo, caso isso não ocorra. A organização é
concomitantemente sedutora e ameaçadora.
Os prazeres propostos pela organização são vinculados ao prazer do indivíduo de
se identificar com o poder dela, de dominar os outros e de vencer continuamente a si
próprio. São prazeres que excluem a paz e a calma. Além disso, as condições como
a organização oferece prazer ao indivíduo, na realidade, servem para reforçar o seu
poder, visto que o prazer é dirigido ao indivíduo isolado; é reforçado por um modelo
de personalidade, um ideal de sucesso e de conquista; é acompanhado por um
sistema muito forte de sanções que proíbe ter o prazer de outra forma.
A figura 1 é uma reconstituição teórica sobre a situação psicológica descrita; tal
situação é instável por ser intolerável.
b) Segunda etapa: Projeção e identificação com o agressor
Defesa
Repressão
Organização Imaginária
(Poder, eficácia)
FIGURA 2 — IMAGEM DO EGO PEQUENO E FRACO. ANGÚSTIA DE DESTRUIÇÃO E
IMPULSOS AGRESSIVOS CONTRA A ORGANIZAÇÃO.
Fonte: PAGÉS et al (1987. p. 152)
O indivíduo se defende contra a angústia e a agressividade de si mesmo,
desenvolvendo um desejo agressivo de onipotência e projetando esse desejo
pessoal na empresa com a qual ele se identifica. O sujeito cria uma imagem do Ego
grandioso, o qual encobre a imagem do Ego pequeno e fraco, e que se identifica
com a instituição. Constrói-se, dessa forma, uma empresa imaginária que engloba
as características da organização real com as quais o indivíduo se identificou.
59
A agressividade que outrora foi dirigida para a empresa é canalizada para o exterior
(clientes, concorrentes, Estado, família...) e para o próprio sujeito — ele deve
eliminar a imagem do Ego fraco, deve vencer-se, se pôr à prova continuamente,
deve merecer a imagem que ele faz de si mesmo; assim, ele é constantemente
culpado (a agressividade constantemente mantida é apenas parcialmente deslocada
para o exterior e reforça a culpa).
c) Terceira etapa: Introjeção
Organização
Imaginária
Indivíduo
Carreira
Sucesso
Poder
Ideal de vida
pessoal e privada
Angústia
Agressividade
FIGURA 3 — INTROJEÇÃO
Fonte: PAGÉS et al (1987. p. 153)
A organização imaginária invade o indivíduo e torna-se uma parte dele. Neste
processo, a organização imaginária adquire vida própria e é por meio dela que o
sujeito se relaciona com a organização real. Dentro deste, a organização imaginária
invade a psique; os limites com a vida pessoal e privada são frágeis; e esta última
torna-se o lugar privilegiado para viver a angústia e a agressividade reprimidas.
O sistema psicológico descrito é conflitante, pois está baseado numa oposição
permanente entre a procura de um prazer agressivo e uma angústia de morte
reprimida. É um sistema fechado em que o prazer leva à angústia e vice-versa. O
objeto de prazer é um ideal inacessível, a procura do prazer é carregada de
angústia: quanto mais se acredita alcançá-lo, por exemplo, subindo na carreira, mais
a angústia é reforçada, pois se percebe que não se está satisfeito nem mesmo se
‘atingir’ seu objetivo, em virtude de que a pessoa é condenada a vencer sempre, isto
é, a sempre querer ascender na organização.
60
Em síntese, os elementos da organização que influenciam a formação da
personalidade individual são:
Uma imagem social de onipotência;
O culto da força da organização;
O isolamento do indivíduo;
Um modelo de personalidade baseado na dominação dos outros e de si próprio;
Uma máquina de prazer, isto é, a oferta, sob múltiplas formas, do prazer de
dominar e de dominar-se; e
Uma máquina de angústia, que funciona na base de exigências muito fortes, de
um controle onipresente, da generalização da ameaça e da retirada do prazer.
A influência social da empresa gera no psicológico a formação de uma estrutura
psicológica conflitante e fechada em que o prazer agressivo, a perseguição de um
ideal de perfeição e angústia de morte reforçam-se reciprocamente. Ela desenvolve
os processos massivos de projeção, identificação e introjeção da organização e do
trabalho pelo indivíduo; gerando as seguintes conseqüências:
o indivíduo persegue objetivos e regras da empresa que se tornam vitais para
seu próprio funcionamento psicológico, assim como ele terá uma dedicação
externa ao seu trabalho;
uma extrema tensão psicológica, o reforço da angústia e dos impulsos
agressivos.
Faria (2004, p. 127) afirma que
o poder da organização decorre, em parte, de sua
condição de responder às contradições psicológicas,
o indivíduo, ao mesmo tempo, colabora ativamente
com o poder da organização, quer pelo fato de ser
influenciado por esta quer por não conseguir afrontar
suas contradições íntimas: a gênese das relações de
poder é ao mesmo tempo social e psicológica,
simultaneamente exógena e endógena.
A partir de tais concepções, instala-se o ceticismo: será que as organizações agem
conscientemente? Crozier (1981, p. 252), por meio de seus estudos, chegou à
seguinte conclusão: “Quanto mais dinâmico e complexo é o sistema de relações de
poder e negociação, tanto mais o controle social tende a ser exercido
conscientemente pela direção.”
61
3 METODOLOGIA
A pesquisa qualitativa tem ocupado um lugar reconhecido dentre as muitas formas
de se estudar os fenômenos que envolvem os seres humanos e as suas relações
sociais estabelecidas em ambientes diversos. Segundo esta perspectiva, “um
fenômeno pode ser mais bem compreendido no contexto em que ocorre e do qual é
parte, devendo ser analisado numa perspectiva integrada” (GODOY, 1995a).
Para tanto, a abordagem qualitativa não se apresenta como uma proposta
rigidamente estruturada; ela permite ao pesquisador usar a imaginação e a
criatividade, propondo, assim, trabalhos que explorem novos enfoques (GODOY,
1995a).
Nesse sentido, e para melhor clareza e exposição das idéias, foram abordados dois
critérios, os quais são utilizados para identificar a natureza metodológica dos
trabalhos de pesquisa, que são, segundo Santos (1999), objetivos e procedimentos
de coleta de dados.
3.1 OBJETIVOS METODOLÓGICOS
Segundo os objetivos metodológicos, esta pesquisa é caracterizada como descritiva.
A “pesquisa descritiva é um levantamento das características conhecidas,
componentes do fato/fenômeno/problema” (SANTOS, 1999, p. 26). Para Andrade
(1997, p. 15), “neste tipo de pesquisa, os fatos são observados, registrados,
analisados, classificados e interpretados, sem que o pesquisador interfira sobre eles.
Portanto, os fenômenos do mundo físico e humano são estudados, mas não
manipulados pelo pesquisador”.
Além disso, Godoy (1995b) ressalta que “a análise de documentos constitui-se numa
valiosa técnica de abordagem de dados qualitativos, podendo ser também utilizada
para complementar informações obtidas em outras fontes”. A palavra documento,
neste caso, deve ser entendida de forma ampla, ou seja, materiais escritos, jornais,
revistas, diários, obras literárias, científicas e técnicas, cartas, memorandos,
relatórios etc (GODOY, 1995a).
62
3.2 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS
O procedimento de coleta de dados é o método prático utilizado para juntar as
informações necessárias à construção dos raciocínios em torno de um problema
estudado. Dentre as formas mais comuns de se coletarem informações, Santos
(1999) aborda o experimento, o levantamento, o estudo de caso, a pesquisa
bibliográfica e a pesquisa documental.
Neste trabalho, o procedimento de coleta de dados realizou-se por meio do estudo
de caso.
O estudo de caso é a estratégia escolhida ao se
examinar acontecimentos contemporâneos, mas
quando não se podem manipular comportamentos
relevantes. O estudo de caso conta com muitas das
técnicas utilizadas pelas pesquisas históricas, mas
acrescenta duas fontes de evidências que
usualmente não são incluídas no repertório de um
historiador: observação direta e série sistemática de
entrevistas. Novamente, embora os estudos de casos
e as pesquisas históricas possam se sobrepor, o
poder diferenciador do estudo é a sua capacidade de
lidar com uma ampla variedade de evidências —
documentos, artefatos, entrevistas e observações —
além do que pode estar disponível no estudo
histórico convencional (YIN, 2001).
Para Godoy (1995a), o estudo de caso é caracterizado como um tipo de pesquisa
cujo objeto é uma unidade — que pode ser um simples sujeito, um ambiente ou uma
situação particular — que se analisa profundamente. Também, tem-se como objetivo
proporcionar vivência da realidade por meio da discussão, análise e tentativa de
solução de um problema extraído de um contexto social.
Corroborando tais idéias, Triviños (1987) afirma que o “estudo de caso é uma
categoria de pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa aprofundadamente.
Esta definição determina suas características que são dadas por duas
circunstâncias: a natureza e a abrangência da unidade”.
No estudo de caso, geralmente, o pesquisador utiliza vários dados extraídos de
diversas fontes de informação em diferentes momentos. A técnica fundamental de
pesquisa é a observação e a entrevista. Produz relatórios, normalmente, informais,
narrativos, ilustrados com citações, exemplos e descrições fornecidos pelos sujeitos,
63
podendo, também utilizar: fotos, desenhos etc. — contanto que auxilie na
transmissão do caso (GODOY, 1995a).
Neste trabalho, o estudo de caso serviu para identificar “como” os trabalhadores da
agência bancária estudada interagem com as políticas de RH da organização, a qual
se utiliza de processos subjetivos e cognitivos para influenciá-los.
Em geral, os estudos de caso representam a
estratégia preferida quando se colocam questões do
tipo “como” e “por que”, quando o pesquisador tem
pouco controle sobre os eventos e quando o foco se
encontra em fenômenos contemporâneos inseridos
em algum contexto da vida real (YIN, 2001).
Além do estudo de caso, a pesquisa bibliográfica e a observação participante
também foram utilizadas para coletar dados. Para tal, o instrumento de coleta de
informações foi entrevistas, utilizando-se questões semi-estruturadas. As vantagens,
de acordo com Gil (1999), são
a) a entrevista possibilita a obtenção de dados
referentes aos mais diversos aspectos da vida social;
b) a entrevista é uma técnica muito eficiente
para a obtenção de dados em profundidade acerca
do comportamento humano;
c) os dados obtidos são suscetíveis de
classificação e de quantificação.
A observação participante consiste na participação real do pesquisador na
“comunidade” pesquisada. O pesquisador assume, até certo ponto, o papel de um
membro do grupo. A observação participante pode se dar de duas formas: a) natural,
quando o observador pertence à mesma comunidade ou grupo que investiga; e b)
artificial, quando o observador se integra ao grupo com o objetivo de realizar uma
investigação (GIL, 1999).
Esta pesquisa se enquadra na primeira categoria. As vantagens desta técnica de
coleta de dados são:
a) facilitar o rápido acesso a dados sobre situações habituais em que os
membros das comunidades se encontrem envolvidos;
b) possibilitar o acesso a dados que a comunidade ou grupo considera de
domínio privado; e
c) possibilitar captar as palavras de esclarecimento que acompanham o
comportamento dos observados (GIL, 1999).
64
3.3 ANÁLISE DE DADOS
A análise dos dados configurou-se por meio da técnica de triangulação e análises de
conteúdo. As análises de conteúdo são rubricas sob as quais virão se organizar os
elementos de conteúdo agrupados por parentesco de sentido. É basicamente a
transformação de um texto em grupos ou unidades de forma análoga. Dentre as
possibilidades de categorização, a mais utilizada e eficaz é a análise por temas ou
análise temática, que se traduz por isolar temas de um texto e extrair as partes
utilizáveis, de acordo com o problema pesquisado, para permitir sua comparação
com outros textos escolhidos da mesma maneira (LAVILLE; DIONE, 1999).
Conforme Godoy (1995a), a análise de conteúdo prevê três fases: pré-análise,
exploração do material e tratamento dos resultados. A primeira fase é caracterizada
como uma fase de organização, normalmente envolve a seleção dos documentos
que serão trabalhados na pesquisa. A segunda fase é a exploração em profundidade
do material selecionado na fase anterior, procedendo a codificação, classificação e
categorização dos mesmos. Já, na terceira fase, ocorre o tratamento dos resultados
e a interpretação; “apoiado nos resultados brutos, o pesquisador procurará torná-los
significativos e válidos. Utilizando técnicas quantitativas e/ou qualitativas,
condensará tais resultados em busca de padrões, tendências ou relações implícitas”.
As unidades de análise podem variar: alguns
pesquisadores escolherão a palavra, outros optarão
pelas sentenças, parágrafos, e até mesmo, o texto. A
forma de tratar tais unidades também se diferencia.
Enquanto alguns contam as palavras ou expressões,
outros procuram desenvolver a análise da estrutura
lógica do texto ou de suas partes, e outros, ainda,
centram sua atenção em temáticas determinadas
(GODOY, 1995a)
.
Triviños (1987) caracteriza a análise de conteúdo com algumas peculiaridades
essenciais: uma delas é o de ser um meio para estudar as “comunicações” entre os
homens, colocando ênfase no conteúdo “das mensagens. Outra, é a “inferência” que
pode partir das informações que fornece o conteúdo da mensagem, o que
normalmente ocorre, ou de premissas que se levantam como resultado do estudo
dos casos que apresenta a comunicação.
Denzin e Lincoln (2000) argumentam que, na triangulação, um investigador
desdobra métodos diferentes — como uma entrevista, dados de censo e
65
documentos — para validar achados. Esta técnica geralmente é considerada como
um processo de usar percepções múltiplas para clarificar significados, verificando a
repetição de uma observação ou interpretação. Porém, reconhecendo que nenhuma
observação ou interpretação é perfeitamente igual, a triangulação também serve
para clarificar significados por meio da identificação de diferentes modos sobre o
qual o fenômeno é visto.
Em 1978, Denzin usou o termo triangulação, o qual veio emprestado da navegação
e de estratégias militares, para discutir a combinação de metodologias no estudo do
mesmo fenômeno. O conceito de triangulação estava baseado na suposição de que
qualquer influência inerente à fonte de dados, investigadores e métodos poderia ser
neutralizada quando usado em conjunto com outras fontes de dados, investigadores,
e métodos (CRESWELL, 1994).
De acordo com Denzin (1978) apud Denzin e Lincoln (2000), há quatro tipos básicos
de triangulação, a saber:
— triangulação de dados: usa uma variedade de fontes de dados em um estudo;
— triangulação de investigador: usa vários investigadores diferentes;
— triangulação de teoria: usa perspectivas múltiplas para interpretar um único jogo
de dados; e
— triangulação metodológica: usa métodos múltiplos para estudar um único
problema.
Nesta pesquisa, foi utilizada a triangulação de dados e a metodológica. A
metodologia empregada nesta pesquisa para a coleta e tratamento de dados está
privilegiando a abordagem qualitativa, conforme ratifica Campomar (1991)
O uso de métodos qualitativos tem crescido em
importância nas pesquisas acadêmicas em
Administração e, entre eles, o Estudo de Casos
merece destaque por sua utilidade e pela falta
generalizada de conhecimento sobre essa
metodologia.
Em suma, o presente trabalho é um estudo de caso caracterizado como uma
pesquisa qualitativa, descritiva, documental e bibliográfica, na qual o locus de
observação e análise foi uma agência bancária, durante o ano de 2004. Os
instrumentos utilizados na coleta de dados foram a observação participativa e a
66
entrevista semi-estruturada, sendo que a forma de se analisar os dados foi por meio
da técnica de triangulação e análise de conteúdo; tais procedimentos se justificam
visto serem a forma mais adequada de se tratar o objeto de estudo em questão.
3.4 O LOCUS DA PESQUISA
O locus desta dissertação é uma agência bancária localizada em Vitória (ES). Ela
possui atualmente 29 funcionários, distribuídos da seguinte forma:
3 administradores, sendo um gerente geral, um gerente de administração e um
gerente de negócios;
8 gerentes de contas (Gecon);
1 gerente de expediente;
8 assistentes de negócios;
1 caixa-executivo;
4 escriturários do setor de atendimento;
4 escriturários do setor administrativo.
A pesquisa foi feita com a participação da gerência média, isto é, foram entrevistados
todos os oito gerentes de contas da agência durante o ano de 2004; tal escolha justifica-
se, em função de que os Gecons são os funcionários que possuem a maior
responsabilidade: a de trazer o resultado para agência e, por possuírem tão grande
obrigação, são os mais afetados pelas políticas de RH aplicadas na organização.
Os gerentes de contas são funcionários comissionados, cada gerente possui uma
carteira de clientes a qual utiliza vários produtos bancários e, segundo o consumo de
produtos por cliente, gera-se uma pontuação na carteira. Esta pontuação é que
determina se o gerente está cumprindo as metas da organização ou não.
A gerência média é praticamente quem gera o resultado da agência toda; são eles os
responsáveis por captarem os clientes e venderem os produtos. O resultado da
agência, na realidade, é o cumprimento de um conjunto de metas que vem da diretoria
do banco, a qual a transmite para a superintendência, a superintendência divide as
metas pelo total de agências, e as agências as subdividem para cada gerente de
contas.
67
De acordo com a soma do maior número possível de metas cumpridas por gerente,
a agência consegue uma pontuação total, e essa pontuação é comparada, por meio
de um ranking de notas com outras agências no Estado; essa pontuação final
preceitua se a agência está indo bem ou não. Com isso, fica patente a grande
responsabilidade que é atribuída aos gerentes de contas.
Além disso, este estudo pretendeu inicialmente entrevistar todos os funcionários da
agência, com exceção dos 03 administradores; porém, percebeu-se que nem todos
os funcionários da agência eram acometidos pelas políticas de RH que este estudo
aborda. Dessa maneira, a análise das entrevistas destes funcionários não permitiu a
análise do âmago principal desta pesquisa. Tal fato foi constatado quando dois
funcionários da agência foram entrevistados e, pela análise das respostas obtidas,
constatou-se que as políticas de RH implementadas pela organização, a qual se
utiliza de vários dispositivos que atuam nos níveis: econômico, político, ideológico e
psicológico, não os influenciavam ou, em muitos casos, nem mesmo existiam, fato
este pode ser justificado devido a não existência de metas para os que não são
comissionados com cargo de gerente.
Outro ponto a se destacar com relação às entrevistas é que as respostas, além de
serem apresentadas de forma globalizada, foram também padronizadas todas no
gênero masculino para assim não permitir a identificação do entrevistado.
3.5 PROTOCOLO DA PESQUISA
Para atingir os objetivos desta pesquisa, foi feito um roteiro de entrevista semi-
estruturada a qual foi utilizada para entrevistar os gerentes. Utilizando-se da técnica
de triangulação e análises de conteúdo este roteiro foi composto por 29 questões
envolvendo várias rubricas sobre as quais se organizaram os elementos de
conteúdo agrupados por parentesco de sentido, ou seja, fez-se uma análise
temática, isolando temas de um texto e extraindo as partes utilizáveis permitindo
assim a comparação com outros textos escolhidos da mesma maneira.
Todas as entrevistas foram tabuladas em uma planilha que permitissem a análise de
seu conteúdo e posteriores comparações entre si; cada questão possuía uma ou
várias rubrica que abordavam as questões econômicas, políticas, ideológica e /ou
psicológicas, de acordo com o autor de base: Pagés.
68
A questão de 1 a 6 (ver anexo) procurou descobrir os processos de mediação
(restrição x vantagens). A questão 7 a 11 procurou perceber a Instância Econômica
(a qual engloba uma política de altos salários, ascensão na carreira, reduzindo as
discriminações de diplomas, sexo, família, meio social de origem; que medeia a
aceitação de um trabalho excessivo). A questão 12 a 16 aborda a Instância política
(a qual engloba um conjunto de técnicas de administração a distância, as quais
garantem a obediência às diretrizes da organização e ao mesmo tempo o
desenvolvimento da iniciativa individual por meio de regras e princípios que o
indivíduo interioriza, aplica e reproduz). Já a questão 17 a 20 aborda sobre a
questão ideológica e a questão 21 a 29 sobre a psicológica.
Essa estrutura não é estática e a análise de cada rubrica não se deu de modo
isolado, pois todas estas instâncias se reforçam mutuamente pois se organizam em
uma lógica coerente objetivando assegurar o controle da organização sobre seus
membros, sendo assim, a resposta de uma questão reforçava uma outra ou
mostrava a dicotomia existente no discurso.
69
4 AS PRÁTICAS DE PODER NA GESTÃO DOS RECURSOS HUMANOS: UM
ESTUDO DE CASO EM UMA AGÊNCIA BANCÁRIA EM VITÓRIA (ES)
4.1 GESTÃO DE DESEMPENHO PROFISSIONAL
Um dos primeiros dispositivos utilizados pela Instituição para melhor gerir a força de
trabalho que irá ser abordado é a Gestão de Desempenho Profissional.
A Gestão de Desempenho Profissional é um mecanismo que permite à Instituição
avaliar cada funcionário semestralmente. Cada trabalhador é avaliado pelo seu
superior hierárquico. Essa avaliação semestral possui pesos pré-estabelecidos
definidos a partir da visão estratégica do banco. As informações relativas ao
desempenho do funcionário irão compor um placar de desempenho profissional, cuja
pontuação final será um número entre 100 e 600.
Este dispositivo é composto por três etapas: planejamento, acompanhamento e
encerramento; e possui como base:
a) foco no resultado;
b) flexibilidade para ajustar-se às mudanças estratégicas demandadas pelo
mercado;
c) diminuição da subjetividade no processo de avaliação.
O planejamento é a etapa de negociação dos objetivos da unidade, da equipe e os
individuais; seleção de avaliados e avaliadores; realização do acordo de trabalho e
entendimento entre avaliadores e avaliados sobre as pretensões de indicação para
comissionamento.
O acompanhamento ocorre durante todo semestre, e possui como condutor as
seguintes etapas:
observar a evolução do cumprimento das metas e fatores de desempenho;
propiciar condições de crescimento para os envolvidos;
promover a participação de todos;
dialogar, tendo como pressuposto, transparência, receptividade, liberdade e
respeito;
70
coletar dados e informações que possibilitem aperfeiçoar o desempenho e o
processo;
conversar sobre o desempenho observado; e
registrar no sistema Gestão de Desempenho Profissional as anotações sobre o
desempenho do avaliado.
O encerramento é a última etapa e, caso não seja acordada solução entre avaliador
e avaliado ou entre ambos e o comitê de administração da agência, a avaliação será
encerrada com discordância.
A Gestão de Desempenho Profissional é muito parecida com a entrevista de
avaliação-conselho abordada por Pagés et al (1987) em sua obra; pois, na
realidade, ela é um dispositivo no qual o banco, por meio de um gerente, avalia o
trabalho e fixa os objetivos de seu subordinado no ano seguinte, sintetizando toda a
avaliação em uma nota da qual dependerá a confirmação da comissão atual ou o
registro das indicações de comissionamento.
Essa avaliação é exposta ao funcionário como se fosse uma discussão transparente
e aberta, tendo toda consideração pelo funcionário; para tanto, o avaliador e o
avaliado sentam juntos para discutirem as notas outrora postas pelo avaliador no
sistema, possibilitando a discordância ou a justificativa do avaliado.
Tal procedimento dá a impressão de que a empresa leva em consideração os
valores humanos e que, ao mesmo tempo, protege os indivíduos da arbitrariedade
dos chefes, posto que é uma avaliação objetiva e mensurável.
No entanto, por meio da análise das entrevistas, descobriu-se como a maioria dos
funcionários percebe essa avaliação:
Entrevistado A: “É um instrumento teoricamente fantástico, moderno e bem elaborado.
Só que como os administradores não têm na maioria dos casos uma formação adequada
em administração de empresas, em gestão de pessoas, eles não sabem trabalhar com a
Gestão de Desempenho Profissional eles a usam como ferramenta de punição, só
sabem usar para punir, uma ferramenta maravilhosa que o banco tem, mais mal
utilizada”.
Entrevistado B: “É uma ferramenta administrativa de coerção. Só serve para coibir e
forçar as pessoas a fazer o que a administração deseja. Ela é ineficaz na sua essência e
muito eficiente na forma de repreender”.
Entrevistado F: “É um mecanismo de avaliação do funcionário que ainda pode melhorar
muito mais (já foi pior). Ela dá indicativos que corresponde o que a outra pessoa está
falando de você se você não se espelhar da forma que o seu chefe quer você não
consegue ficar bem na Gestão de Desempenho Profissional; então o mecanismo tinha
71
que ser neutro (eu tinha que ser avaliado sem a influência de quem está me avaliando).
A avaliação é importante pois temos que ter norte, só que a nossa não é funcional. É um
mecanismo de avaliação do funcionário que ainda pode melhorar muito mais (já foi pior).
Ela dá indicativos que corresponde o que a outra pessoa está falando de você se você
não se espelhar da forma que o seu chefe quer você não consegue ficar bem nesta
avaliação; então o mecanismo tinha que ser neutro (eu tinha que ser avaliado sem a
influência de quem está me avaliando). A avaliação é importante pois temos que ter
norte, só que a nossa não é funcional. Eu já fui mal avaliado em uma agência que eu
trabalhei só para me descomissionarem. Era uma perseguição pessoal, tanto é que eu
nunca tive uma avaliação daquela. E mesmo com o meu bom histórico de avaliações o
banco não se deu o trabalho de olhar para comparar e questionar o porquê desta má
avaliação (se havia algum atrito entre eu e o meu superior). Perdi a minha comissão (a
corda quebra do lado mais fraco). Por isso eu vejo que não tem resultado essa avaliação,
ela é estanque, não olha o histórico de vida do funcionário, o qual deveria ser analisado”.
Quando a Gestão de Desempenho Profissional é usada como uma ferramenta para
coagir e punir, fica perceptível seu funcionamento como uma prática de poder.
Outros, porém, embora percebam a dicotomia existente neste dispositivo, tendem a
recusar este aspecto e a defender este procedimento em nome de outros princípios,
evidenciando a existência de um sistema de valores na organização. Encontra-se
aqui um mecanismo de autopersuasão.
Entrevistado G: “Eu acho que a Gestão de Desempenho Profissional é um instrumento
para registrar a situação do funcionário. É um registro da atuação/desempenho dele. E
serve para premiar quem tem o desempenho desejado. É um histórico do funcionário. Se
não tivesse essa avaliação como avaliariam o funcionário?. É um critério justo. A minha
ascensão depende dela e eu sou livre para registrar o que eu quiser”.
Entrevistado H: “A Gestão de Desempenho Profissional serve para você gerir o
funcionário, verificar se ele está cumprido o que lhe foi pedido, se ele está se
desenvolvendo, acompanhar o dia a dia. Desde o ano de 80 esse instrumento tem sido
aprimorado, só que no dia a dia você tem pouco tempo para se dedicar a ele. É um
instrumento eficaz que acaba sendo mal administrado e mal gerido. Ela serve para as
pessoas acompanharem seu desenvolvimento em cada semestre, o que você evoluiu no
seu trabalho. Ela não é mais eficaz por que não se dá mais valor a ela. Se você dedicar
um tempo por semana a ela, ela funcionaria melhor. Minha ascensão depende dela e
expor os meus medos é depor contra mim mesmo”.
Na Gestão de Desempenho Profissional, verifica-se uma prática ideológica, isto é,
ela transmite ao indivíduo avaliado matematicamente (se cumpriu a meta, a nota é
boa; se não, é ruim) que seu critério é justo, já que contra objetivos quantificáveis
não há como se justificar. Além disso, por possuir objetivos mensuráveis, ela gera
segurança e satisfaz a necessidade de reconhecimento; caso o funcionário atinja as
metas, será considerado recompensado e esta certeza o protege da arbitrariedade
dos chefes.
72
Outro ponto a se destacar neste dispositivo é que essa nota influencia na
Participação dos Lucros e Resultados (PLR) e também na continuação ou não do
exercício da comissão, ou seja, se o funcionário for mal avaliado, ele pode ser
destituído do posto de gerente, voltando, dessa forma, a receber um salário no
mínimo inferior a 50% do que recebe.
Analisando este aspecto, constata-se a existência de um processo de abstração e
objetivação conforme já explanado por Pagés et al (1987), isto é, submete o
trabalhador ao reino da medida, ou seja, possibilita traduzir em termos quantitativos
aspectos subjetivos como performances, aptidões, virtualidades e aspirações do
indivíduo. Esta compreensão racionalizada tende a enxergar o indivíduo apenas em
função de sua utilidade para a empresa, utilidade medida por meio da avaliação
quantificada de seu rendimento e de sua adaptação às normas e mecanismos que
veiculam as exigências do sistema. “Ela é sustentada por uma linguagem cujo
modelo é matemático e serve de verniz às técnicas de poder que encobre”.
Assim, o funcionário é avaliado em função de sua utilidade para a instituição a qual é
verificada pelo seu rendimento mensurável (verifica-se a mensuração da
subjetividade), esta nota influencia também no sistema econômico (salário, PLR,
ascensão na carreira etc.) fazendo com que a promoção do funcionário dependa da
manutenção e, principalmente, do desenvolvimento e sucesso comercial da
organização. Tal dispositivo estimula o indivíduo a querer vencer; em outros termos,
a trabalhar sempre mais e melhor, levando-o a “fazer carreira”, a fim de que a
empresa possa satisfazê-lo.
4.2 PESQUISA DE CLIMA
Paralelamente, a instituição, ao convidar o funcionário para avaliar o clima
organizacional, estimula-o a identificar-se com ela própria e a interiorizar as
restrições dela. Esse dispositivo, clima organizacional, institui um lugar de escuta
oferecendo ao indivíduo a possibilidade de extravasar falando dos seus sentimentos;
este dispositivo opera a gestão dos afetos, favorecendo o domínio da organização
sobre o aparelho psíquico do sujeito. Dessa maneira, a organização antecipa-se aos
73
conflitos, absorve e transforma as contradições antes que elas resultem em conflitos
coletivos.
A pesquisa de clima, assim como a Gestão de Desempenho Profissional, é realizada
semestralmente via sistema informatizado. Essa pesquisa é realizada de forma
confidencial e individual, possibilitando ao funcionário avaliar o ambiente de trabalho
relativo ao semestre e o superior imediato dele o qual o avaliou na Gestão de
Desempenho Profissional, sendo a participação na pesquisa voluntária. O resultado
é apresentado de forma globalizada, evidenciando a percepção de grupo.
A pesquisa de clima é composta por várias questões às quais devem ser
respondidas dentro de uma escala que varia de 1 a 6; o resultado é obtido pela
média aritmética simples das questões; caso a agência seja mal avaliada, ela pode
sofrer intervenção por outras unidades do banco para corrigir os problemas
detectados.
Com relação à pesquisa de clima, a maioria dos empregados se exprimiram assim:
Entrevistado A: “Na pesquisa de clima a gente tem que ser sincero e saber que por
muitos ela é mal utilizada também, ela é utilizada da mesma forma que os
administradores usam mal a Gestão de Desempenho Profissional - como instrumento de
punição. Muitos colegas utilizam a pesquisa de clima como uma forma de dar o troco,
como uma forma de punir o administrador/avaliador. Eu nunca vi uma ação específica
em relação à pesquisa de clima, nunca nem ouvir falar”.
Entrevistado F: “É outra furada. É a mesma coisa da Gestão de Desempenho
Profissional. Se eu fizer uma má avaliação eu estarei atingindo o meu superior
hierárquico e ele conseqüentemente vai saber que “eu faço parte daquela avaliação”,
pois a minha agência tem pouca gente e não é legal ele saber que tem gente insatisfeita.
Isso não é bom nem para a pessoa que está fazendo, nem para a agência como um
todo. Ela não é eficaz, ou você mente que está tudo bem ou leva as retaliações.
Também acho que ela não é funcional, por dois motivos, primeiro por que quando você
responde, embora “você não seja identificado naquilo que você respondeu”, as pessoas
só conseguirão ver o total da resposta da agência, de todo mundo, ela tem impacto na
PLR, se a agência for mal classificada ninguém recebe, isso não faz sentido; se eu tenho
abertura para criticar, eu não devo criticar pois isso vai mexer no meu bolso, na realidade
o canal não é aberto para reclamar pois se eu reclamar vai mexer no meu bolso.
Segundo, eu nunca vi a administração da agência responder de maneira pro-ativa a essa
avaliação, então, é uma avaliação que não interfere nesse sentido. Eu não sinto uma
contrapartida. Não vou falar que ela não está nem aí, para mim a única importância para
a agência é o resultado, ou seja, de como ela vai ser vista lá em cima; mais eu não vejo
uma atitude de volta para mudar. Ela quer tirar nota boa para ser bem vista lá em cima
porém não vejo uma atitude de mudança nos pontos em que ela foi criticada”.
Entrevistado B: “Uma babaquice; por que não mede nada. Por outro lado essa
avaliação me faz refletir alguns questionamentos, por exemplo, sinto orgulho de trabalhar
no BANCO? Para mim vale mais como uma oportunidade de me questionar se eu estou
74
no caminho certo, mais como um alto desenvolvimento que propriamente do que dizer
que alguém esta avaliando aquele clima ali”.
Nesta perspectiva, constata-se que a política da instituição procura influir no
psicológico do indivíduo. Primeiro, por meio da Gestão de Desempenho Profissional,
estimulando o funcionário a buscar sempre melhorar e ser submisso; segundo, por
meio da pesquisa de clima, porém os administradores locais são os responsáveis
pela má utilização desses mecanismos, gerando os sentimentos descritos acima, e
fazendo com que os objetivos organizacionais, principalmente no nível ideológico,
não funcionem.
4.3 O LIVRO DE INSTRUÇÕES CODIFICADAS
O Banco estudado é uma instituição gigantesca na qual tudo é codificado pelo
sistema de regras. As políticas são definidas por normas precisas estabelecidas no
Livro de Instruções Codificada — as quais prescrevem para cada cargo as
atribuições e os procedimentos de execução de cada serviço, tornando, dessa
forma, possível o gerenciamento desta grande empresa a distância. A centralização
da instituição e o poder da direção central são assegurados por meio das regras que
definem os procedimentos de operacionalização do conjunto e são referências no
processo decisório.
Esse modo de administrar é enquadrado nos estudos de Pagés et al (1987) na
instância política a qual reúne um conjunto de técnicas de administração a distância,
que garantem a obediência às instruções da instituição; desaparecendo, pois, o
papel autoritário do chefe e fazendo surgir os simplórios intérpretes das normas.
Em síntese, os entrevistados expressaram com os seguintes dizeres sobre o sistema
de normas da instituição:
Entrevistado H: “Tudo é licado. Se você cumpre tudo que está escrito, você se protege;
se você deixa de cumprir, está se expondo. Agora a quantidade de mudanças diárias
nas instruções é muito grande, você chega a ter mais de 4000 no ano, isso ai no dia a
dia, você acaba engolido pelas tarefas e acaba não acompanhando toda a mudança. É
como a lei, está lá escrita e a ignorância da lei é culpa da gente. Não é sempre possível
agir de acordo com as normas, procura-se ter bom senso para buscar a melhor solução
para o cliente e para o banco; se as normas estão sendo sempre mudadas é justamente
para se adaptar ao dia a dia. E caso não se cumpra o que está nas normas a gente
pode sofrer um processo administrativo, pode sofrer uma interpelação por escrito. Às
vezes se submeter a uma instância superior que vai avaliar a responsabilidade ou
irresponsabilidade do funcionário”.
75
Entrevistado F: “Ajudam pois elas sistematizam procedimentos. Se não tivesse as
normas ficaria muito vulnerável tudo o que você fizesse, embora tenha coisas que eu não
concorde mais eu vejo pelo lado da segurança que ajudam. Não é possível seguir 100%
das normas, e é por isso que você tem um cargo de gerencia, pois às vezes você tem
que decidir independente de normas (se for só para você seguir normas, você não
precisa ser gerente). Quando há burlas pode ocorrer dois casos: se durante o período
que você teve um cliente fora das normas e ele saiu do banco sem deixar prejuízos, não
há problema nenhum. porém se acontecer algum problema durante a permanência deste
cliente na agência você está sujeito a um processo administrativo e dependendo do caso
pode perder a comissão ou até mesmo ser demitido”.
Entrevistado A: “Acho que elas protegem, porém acho que protegeria melhor se a
nossa carga de trabalho fosse compatível com a jornada de trabalho. Com uma carga de
trabalho tão pesada a gente fica vulnerável, as normas são como as leis na vida privada,
você não pode alegar desconhecimento delas, dentro do banco é a mesma coisa, você
não pode alegar desconhecimento das normas. Você tem um ritmo de trabalho que não
lhe permite conhecer bem as normas. Você não tem condição de a cada coisa nova que
irá fazer ler a instrução todo dia (pois aparece novidade todo dia e a instrução muda
constantemente). Elas protegem se você conseguir fazer dentro delas, o fato delas
existirem é uma proteção que existe, agora o acesso a essa proteção é que está
complicado”.
Entrevistado G: “Às vezes a gente pensa que elas dificultam; toda empresa tem que ter
as suas normas. Às vezes você pensa diferente mas não pode pois a norma lhe impede.
Em suma, ela não prejudica, ela ensina, mostra o caminho”.
Observa-se, pelas respostas, como o processo de mediação traz uma resposta
apaziguadora às contradições inconscientes vividas pelo funcionário,
impossibilitando-o assumir as suas contradições inconscientes, ou seja; ao mesmo
tempo em que afirmam que as normas são freqüentemente usadas para punir, eles
ressaltam a função de proteção (punição X proteção).
Neste processo, percebe-se também a função da ideologia reforçando a imagem
positiva da instituição, não permitindo ao funcionário se conscientizar plenamente
das contradições das políticas da empresa.
Seguindo a dinâmica do discurso sobre as normas, percebe-se a retomada da
contradição, a cada afirmação positiva (+) chama uma contrapartida negativa (-) e
vice-versa; trata-se de um discurso com altos e baixos.
76
CONCEPÇÃO POSITIVA (+) CONCEPÇÃO NEGATIVA (-)
Se você cumpre tudo que está escrito,
você se protege
a quantidade de mudanças é muito grande...
isso ai no dia-a-dia, você acaba sendo engolido
pelas tarefas e não acompanhando toda a
mudança
Ajudam porém se acontecer algum problema... você está
sujeito a um processo administrativo,
dependendo do caso pode perder a comissão ou
até mesmo ser demitido.
Acho que elas protegem... porém acho que protegeria melhor se a nossa
carga de trabalho fosse compatível com a
jornada de trabalho... você tem um ritmo de
trabalho que não lhe permite conhecer bem as
normas.
O fato de elas existirem é uma proteção
que existe
agora o acesso a essa proteção é que está
complicado.
Ela ensina, mostra o caminho às vezes a gente pensa que elas dificultam
QUADRO 1 — ANÁLISE DA DINÂMICA DO DISCURSO
Todos eles responderam que sempre há um pequeno desvio no cumprimento das
normas e que quem procede fora delas está sujeito a responder a um processo
administrativo interno ou até mesmo à demissão. Ao serem questionados se já foram
punidos ou responderam a um processo interno ou pedido de informações, eles
argüiram com os seguintes dizeres:
Entrevistado B: “Se eu fosse seguir as normas ao pé da letra, não precisava nem fazer
greve, o cliente não ia ser atendido ia causar um caos de todo tamanho, tamanha é a
burocracia nas nossas regras e ninguém poderia falar nada pois eu estaria seguindo as
normas. As regras são feitas apenas para punir. Então elas existem para: não fazer e
punir. Eu já respondi a um processo. Isso vai de administrador para administrador. Eu já
fiz coisas em que foi muito mais grave, em que o prejuízo foi muito maior e a pessoa me
chamou a atenção de uma forma que eu aprendi, agradeci, reconheci o erro e fiquei
satisfeito. Já tive administradores que me chamaram a atenção por coisas tão idiota que
eu fico pensando: como uma pessoa tem tanta capacidade reconhecida em currículo,
tanto estudo na área, inspira tantos ídolos dentro da empresa e se preocupa com
bobagens tão pequenas dentro de um universo com tantas prioridades. Isso me chateia
muito... e para mim que tenho a personalidade perfeccionista fere muito. Não é como
você fez, mas como chegaram para lhe falar que machuca ou não. Às vezes não foi nem
o processo em si que me abalou mais”.
Entrevistado C: “Sim. E muitas vezes por pequenas coisas, só para dizer quem é que
manda; outras vezes só para compor mais processos (juntar provas contra mim) e
resguardar o interesse da administração. Senti-me mal, pois eu defendo o BANCO e
nunca agi com dolo. Você se sente fragilizado e impotente diante das normas, as normas
que deveriam estar me protegendo estão me culpando. É ruim pois você percebe o
quanto você é frágil e o tanto que você está exposto no exercício do seu trabalho. Esses
processos são sempre a nível pessoal, com o objetivo de resguardar o interesse da
administração, ou seja, rebenta a corda pelo lado mais fraco. Não existe cumplicidade,
77
ou seja, deixar por menos; e sim a estrita observância das normas no sentido de estar
repreendendo mesmo. Ali encerra o companheirismo, ali encerra a amizade”.
Entrevistado D: “Eu respondi um pedido de informação que na minha opinião nada
mais foi do que uma fabricação de elementos para um proceder futuro, pois o
procedimento foi deferido por meu superior imediato e também é prática comum no
banco. Como eu não nasci ontem, ficou caracterizado para mim que isso foi
simplesmente para fabricar um elemento para ter contra mim futuramente; a arquitetura
do planejamento é que magoa muito para mim. Eu me senti tranqüilo, pois quando você
age com má fé no banco você está ferrado mesmo; se você erra sem fazer nada por má
fé, você pode ficar mais tranqüilo, há tanta coisa no banco e você está sujeito a um
erro, agora, nesse caso, uma atitude normal do dia a dia de todos os gerentes de contas,
ficou claro que queriam um pedido de informação, um papelzinho, que eu respondi, e
para mim não significa nada”.
Com isso, fica evidenciado ainda mais que o objetivo da instituição não é proteger o
indivíduo, mas garantir a sua obediência à lógica empresarial capitalista.
4.4 FAZER CARREIRA
Pagés et al (1987), em sua obra, abordam que a empresa, por meio do “Fazer
Carreira”, transforma o máximo da energia individual em força de trabalho. A carreira
auxilia o indivíduo a resolver a incompatibilidade entre o excesso de trabalho e a
pressão constante, e o desejo de liberdade e autonomia. A aspiração de vencer leva
o indivíduo a trabalhar mais e melhor, produzindo efeitos de poder, isto é, o
funcionário é condenado a vencer. A instituição transforma esse desejo em
necessidade. A eficiência deste dispositivo está atrelada ao sucesso e ao prazer
gerado ao trabalhador.
Nas entrevistas, todos responderam que já participaram de algum processo de
seleção para concorrer a um cargo melhor dentro da instituição. Atualmente, o
processo seletivo concorrencial é por meio do Banco de Talentos e Oportunidades, o
qual é um sistema de recrutamento interno informatizado em que o funcionário
candidato se inscreve na função oferecida e concorre à vaga. Esse Sistema
disponibiliza aos funcionários as oportunidades criadas na empresa, tais como
concorrência a cargos comissionados, processos seletivos internos (para gestores,
gerente de agência, auditores etc.). O processo seletivo avalia as seguintes
informações: dados pessoais e funcionais, resultado das três últimas Gestão de
Desempenhos Profissionais e o histórico funcional no Banco (cargo atual, cargos
exercidos em substituições, formação acadêmica e certificações internas).
78
Ao serem questionados se aspiram a outra promoção ou função, as respostas
podem ser resumidas nos seguintes dizeres:
Entrevistado D: “Sim, claro. A gente está sempre trabalhando para crescer”.
Entrevistado E: “Eu sempre procurei crescer no banco, sempre procurei trabalhar na
maior variedade de áreas possíveis”.
Ao serem questionados se eles se sentiam como se fossem uma extensão do
banco, como se o banco fizesse parte deles, as respostas foram:
Entrevistado C: “Sim. O banco me extrapola, ele exige o máximo de você. Às vezes no
horário de lazer você tem que estar prospectando negócios para o banco, por que as
metas são cada vez maiores e mais crescente, e você precisa de mais tempo que o
normal para atingi-las. Então no seu convívio social você representa o banco, não tem
jeito”.
Entrevistado D: “O tempo todo”.
Entrevistado B: “Sim, agora eu sou “fulano” do BANCO, e não somente “fulano” mais.
Agora é nome e sobrenome. Isso é muito forte. Por que a onde você estiver e falar que é
funcionária do BANCO as pessoas enxergam o BANCO com você. Quando você faz
alguma coisa certa, o BANCO agiu certo; mais quando você erra, “fulano” errou. Isso
para cliente, para colega, para a administração. Você leva o ser funcionário do BANCO
para a sua vida pessoal”.
Entrevistado G: “Eu acho que mais eu faço parte do BANCO do que o BANCO de mim.
Eu acho que a gente divulga pouco o nome do BANCO fora do nosso expediente, eu
acho isso um erro. Mas é por que a gente tem o dia a dia tão carregado que chega o final
de semana a gente está tão cansado”.
Todas as respostas selecionadas deixam transparecer que o dispositivo carreira tem
contribuído para a introjeção da organização pelo EGO (o indivíduo reproduz nele o
modelo da organização, visto que ele se estrutura em função deste modelo e a
necessidade de reconhecimento será satisfeita quando reconhecer a empresa nele).
Ao serem questionados sobre a carga de trabalho, as respostas continham sempre o
mesmo conteúdo como se constata abaixo:
Entrevistado A: O volume de atribuições é incompatível com o tempo e com sua
capacidade física. Todo mundo deixa coisas sem fazer, registra como se tivesse feito,
uma simples conferência de assinatura você às vezes não tem condição de verificar,
você acaba se responsabilizando por coisas muito subjetivamente ou executando coisas
muito no feeling pois as atribuições são incompatíveis com as 8 horas de trabalho. A
carga é excessiva. Você trabalha mas você não consegue fazer tudo, aí você assume
responsabilidades por aquilo que você não conseguiu fazer (ainda é chamado a atenção
pelo que não conseguiu executar dentro das 8 horas)”.
Entrevistado E: “A carga de trabalho é excessiva. Tenho muitas responsabilidade,
dividida com a administração, porém vem mais para o seu lado. Você percebe mais
79
quando eles lhe cobram. Em termos de responsabilidade eles utilizam assim: você está
em um cargo de gerência, você tem responsabilidade, você tem vantagens; mas eles
não aproveitam isso para fazer sempre muito mais que o normal. Igual agora, no final do
ano, passaram umas responsabilidades além do que estava contratada; por exemplo,
você tem que cumprir com um nível de pontuação na carteira, que você não tem nem
mais tempo para planejar dentro daquelas responsabilidades que foram delegadas. Eles
vão colocando tanta coisa que você perde total poder de gerência dentro das atribuições
que lhe foram delegadas. Eles cobram além das responsabilidades que foram
delegadas”.
Entrevistado F: “O dia para mim tinha que ter no mínimo 16 horas de trabalho. Minha
carga de trabalho é exaustiva”.
Ao serem abordados por problemas de saúde que foram provocados ou agravados
pelo estresse do trabalho, relataram:
Entrevistado B: “Eu tenho problema de saúde bancária sim. Há muitos funcionários do
BANCO que tem depressão, herpes e gastrite, é só reparar; são sintomas de
funcionários do BANCO. A herpes normalmente se tem uma a duas vezes no ano. Tem
época em mim que ocorre duas vezes por mês. Depressão, à medida que você tem uma
carga de trabalho maior mais deprimido você se sente, mais irritado”.
Entrevistado A: “Diverticulite, esofagite e depressão. Mesmo diagnosticada por escrito
(por um atestado médico de um psiquiatra) mesmo assim eles sabendo que eu estava
tirando férias para cuidar da minha saúde, ainda recebo um telefonema no meio das
minhas férias para procurar outra agência; então isso tende a agravar”.
Entrevistado G: “Irritabilidade, estresse e gastrite. Estar dormindo e acordar pensando
no BANCO até no final de semana. Fiquei hospitalizado por causa da gastrite. Muita
ansiedade: é giro rápido, é cartão, recebíveis e outros”.
Entrevistado H: “Ataques cardíacos, aceleração do coração, palpitação, depressão,
irritabilidade, estresse. Eu tive uma passagem muito estressante a qual ocorreu uma
taquicardia, umas tonturas mais depois estabilizaram”.
Entretanto, mesmo com tanta responsabilidade e uma carga de trabalho muito alta,
causando em muitos funcionários conseqüências psicofisiológicas (ataques
cardíacos, depressão, estresse etc.); observou-se que as vantagens extras
profissionais e todas as outras formas de ajuda complementar funcionam de maneira
compensatória, gerando satisfação daqueles que se beneficiam.
Entrevistado E: “Um dos benefícios oferecidos pelo BANCO que eu sou apaixonado é a
assistência médica, não tem preço o atendimento que a gente tem. Eu acho o plano
excelente, tem muitos médicos associados e cobre todos os exames. Meu cônjuge, que
é dependente, fez uma cirurgia de miopia e não tive despesa nenhuma; minha filha faz
um tratamento em Belo Horizonte com um oftalmologista desde quando nasceu (tem dez
anos) e nunca tive despesa alguma”.
Entrevistado D: “O BANCO oferece vários benefícios como, assistência médica para a
família, tíquete, previdência privada... Eu acho que é uma empresa que concede vários
benefícios. Quando eu trabalhava em outros bancos também sempre tive esses
benefícios, até por que muito deles são previstos em acordos sindicais, e é próprio da
categoria, como o auxílio creche (para crianças de até 7 anos de idade). Eu optei pelo
por este BANCO, apesar de ter todos os benéficos na outra instituição bancária e até
mesmo um salário bem maior, pela estabilidade. Eu quando vim para o BANCO perdi um
80
monte de coisas: salário, cargo... vim com um desafio de reconquistar o que eu já tinha
conquistado antes lá fora; e isso tudo pela estabilidade”.
Entrevistado C: “Primeiro é uma escola, o BANCO te dá todo suporte para você
estudar e evoluir tanto interna como externamente. A questão de relacionamento - Você
conhece muita gente. Plano de saúde, plano de previdência, tíquete, o clube dos
funcionários do Banco, compensações financeiras (Participação nos Lucros e nos
Resultados - PLR e abonos em dinheiro). Qualquer outra empresa não dá o suporte que
o BANCO lhe dá”.
Além disso, alguns têm consciência de que o salário pago na instituição está aquém
do mercado.
Entrevistado A: “Com relação ao mercado eu acho que ele está compatível. Em
relação a nossa formação, na nossa agência por exemplo, qualquer um ali que for sair
dali e procurar um emprego no mercado não vai conseguir um salário global com a
formação e a experiência profissional que tem. Em relação ao que o BANCO exige em
termos de formação para você chegar nesse salário é muito pouco; eu parei no segundo
ano de administração, fiz análise de sistema há 20 anos atrás e o curso não foi
reconhecido pelo MEC, estou sem curso superior com um salário que não acharia fora
do BANCO”.
Entrevistado H: “Apesar do desgaste de trabalhar no BANCO eu acho que sou bem
pago pelo o que eu faço e pelo o que eu sou. Não é um baita de um salário porém eu
acho que não estou ganhando o mínimo do que eu poderia ganhar. Eu acho que com
relação ao mercado está compatível. Se eu saísse daqui não sei se eu encontraria o
salário que o BANCO me paga”.
Entrevistado E: “Com relação ao mercado ele está na média dos bancos. Não conheço
ninguém que trabalhe no setor privado, porém conheço da Caixa Econômica Federal e o
salário é um pouco menor que o meu porém a pessoa tem menos tempo de casa do que
eu”.
Os que estão cientes dessa desvantagem pecuniária com relação ao mercado
ressaltam a importância do benefício estabilidade.
Entrevistado B: “Eu acho meu salário bom, porém comparando com o nível de estresse
é pouco. Em relação ao mercado esta aquém, porém temos a estabilidade que os outros
bancários não têm. No setor privado eles conseguem ganhar bem mais pois ganham
também pela produtividade e nós do BANCO se quisermos fazer hora extra não
podemos”.
Entrevistado D: “Com relação ao mercado, está defasado; ele me atende nas minhas
necessidades básicas porém está defasado. Eu vim do setor privado, e percebo que está
defasado mais ou menos uns 30% (porém isso depende muito). Eu optei pelo BANCO,
apesar de ter todos os benéficos nas outras instituições bancárias e até mesmo um
salário bem maior, pela estabilidade”.
Entrevistado C: “Atende as minhas necessidades básicas mais está aquém do
mercado. Namorei uma pessoa que exercia a função de gerente em uma instituição
bancária particular e também conheço vários amigos que ganham mais que o dobro que
é pago pelo BANCO; porém temos uma vantagem que eles não têm: a estabilidade, e
isso conta muito”.
81
Outra vantagem que, de certa forma, gera uma satisfação para os funcionários é o
status gerado fora do banco, ou seja, na sociedade.
Entrevistado B: “Já consegui tanto respeito como também vantagem financeira por ser
funcionária do BANCO. O contrário também existe. Eu sinto que isto está caindo muito,
já foi status muito maior você ser funcionário do BANCO. Nas cidades do interior há um
status maior que na capital. Já deixei de ser multado por ser funcionário do BANCO,
quando falei para o guarda que era funcionário da agência local a qual ele tinha conta
lá, e no caso dele precisar de algo ele poderia me procurar, senti que ele começou a
relevar e não me multou. Por ser funcionária do BANCO, eu estou morando em um
apartamento alugado por um colega também do BANCO que me fez um preço bem
inferior ao mercado. O plano de saúde, por ser um bom plano, quando eu falo que sou
funcionário o atendimento é bem diferente, bem melhor. Quando eu estou viajando e
falo que sou funcionário do BANCO, abrem-se as portas pois sempre tem alguém que
fala que há um membro da família, um tio que trabalha no BANCO; você percebe que
está numa comunidade brasileira em que quem é funcionário do BANCO é bem visto”.
Entrevistado C: “O Status é algo que tenho e uso, por exemplo, para participar de um
processo seletivo em uma instituição de pós-graduação stricto sensu eu apresentei meu
cartão de gerente; Já passei por diversas situações: uma vez passei com meu carro por
um local proibido e a polícia me parou, eles aliviaram a barra quando eu disse que era
gerente do BANCO, às vezes também uso de forma intuitiva”.
Entrevistado D: “Eu percebo que fora do banco o funcionário do BANCO tem um certo
respeito e uma admiração da sociedade; dentro do BANCO eu não percebo isso. Eu
percebo que quando você trabalha no BANCO você tem um certo respeito da sociedade,
por que o BANCO é uma empresa séria; aí todo mundo pensa que quem trabalha
naquela empresa também são pessoas sérias”.
Esse conjunto de benefícios (salário razoável considerado pela maioria, participação
nos lucros semestralmente, plano de saúde completo, plano de previdência no qual
o funcionário só paga 1/3 do valor sendo o restante custeado pelo banco, status,
tíquete alimentação e refeição, estabilidade, política de ascensão profissional, etc.)
tem gerado o seguinte sentimento nos gerentes com relação a trabalhar na
instituição.
Entrevistado D: “Eu gosto disto. Eu vejo de uma forma positiva ser funcionário do
BANCO. Eu acho uma instituição importante, e eu fazer parte desta instituição faz de
mim e do meu trabalho serem importantes, e ter importância. Pela forma como eu
enxergo a instituição para o país, o que representa essa empresa para o país e para a
comunidade em que eu morro, representa muita coisa, então eu trabalhar para ela
representa muita coisa. Como o BANCO é valorizado eu sou valorizado, o meu trabalho
é valorizado”.
Entrevistado E: “Eu me sinto feliz, por que tudo o que eu sonhei para mim um dia eu
tenho hoje e eu consigo manter isso com o BANCO, só que eu não posso parar, tem que
sempre estar pensando em melhorar”.
Entrevistado B: “Eu acho que foi a escolha certa. Sinto orgulho de trabalhar numa
instituição respeitada. Agradeço por ter uma carreira estável. Eu vejo estabilidade,
conforto, tenho a oportunidade que muitas pessoas gostariam de ter”.
82
Outro ponto a se destacar foi que, durante as entrevistas, percebeu-se que muitos
funcionários estavam ressentidos com a maneira como a máquina burocrática era e
é administrada, inclusive localmente.
Entrevistado C: “Sinto-me bem na minha função atual, mas nos últimos anos essa
função tem sido alvejada: cada ano que se passa somos muito desprestigiados e
sofremos muitas perseguições. O BANCO nos coisifica e nos leva a cada vez mais a
uma baixa estima, e ano a ano e de uma forma até ultrajante. Temos sido muito
desmerecidos e analisados de uma forma assim: estamos ali para gerar lucro,
simplesmente, se gerarmos muito é obrigação, se geramos pouco é incapacidade”.
Entrevistado A: “Eu gosto muito do BANCO, demais mesmo. Eu nunca tinha pensado
em sair do BANCO, mesmo tendo outro negócio que me dá uma renda bem melhor que
o meu salário no BANCO. Depois que entrei nessa agência aqui, vivi e vi que no BANCO
há pessoas diferentes, e bem diferente das pessoas que tinha conhecido, eu até aqui só
tinha conhecido o lado bom do BANCO, não tinha conhecido nenhum colega que não
fosse verdadeiro, de armar de ser maquiavélico com o outro, então isso me decepcionou
muito mesmo, a ponto de eu tomar a decisão de vender meu apartamento e montar uma
empresa de depósito de plástico lá no sul da Bahia, fiz isso mesmo não para sair do
BANCO mais para ficar menos dependente dele, agora o meu sentimento é depender o
mínimo do BANCO”.
Entrevistado F: “Tem dias que eu tenho vontade de largar a empresa que eu trabalho,
por que eu vejo que ela não me valoriza o suficiente para que eu permaneça nela,
principalmente que eu conheço o meu trabalho, sei que eu tenho valor, sei o quanto eu
contribuo para o lucro da empresa, sei o meu papel, sei que o que eu faço paga o meu
salário e mais de uns quatro; e infelizmente, as instituições querem hoje mais sugar que
valorizar, inclusive financeiramente. Isso ficou muito claro nesta última greve que
fizemos: eles não deram a mínima atenção para quase 30 dias de greve. Se eu pudesse
escolher hoje eu jamais seria bancária”.
Nessa perspectiva, é importante ressaltar como cada dispositivo procura influenciar
o trabalhador fazendo com que ele procure “crescer” na instituição, contribuindo para
o sucesso da organização. A Gestão de Desempenho Profissional que opera
principalmente no nível econômico (salário, PLR, ascensão na carreira etc.) gera o
sentimento de querer vencer e “fazer carreira”. A aspiração de vencer leva o
indivíduo a trabalhar mais e melhor, produzindo efeitos de poder. A busca de querer
vencer foi constatada nas entrevistas pelas respostas unânimes de todos já terem
participado do Banco de Talentos e Oportunidades.
A pesquisa de clima institui um lugar de escuta oferecendo ao indivíduo a
possibilidade de extravasar falando dos seus sentimentos, este dispositivo opera a
gestão dos afetos, favorecendo o domínio da organização sobre o aparelho psíquico
do indivíduo. O Livro de Instruções Codificadas, que opera marcadamente no nível
ideológico, evidencia a contradição vivida pelo trabalhador: proteção X punição.
Outro fato descoberto neste trabalho, que influencia no nível psicológico, é o
83
sentimento nos funcionários de que eles são uma extensão do banco e que o banco
faz parte deles.
Outro aspecto importante é quanto ao salário, pois os que não estão cientes da
remuneração paga nas instituições privadas acham que estão ganhando
justamente; e os que sabem desta defasagem salarial ressaltam a importância dada
à estabilidade que eles possuem. Outra vantagem que, de certa forma, gera uma
satisfação para os funcionários é o status gerado fora do banco, isto é, na
sociedade.
Quanto à carga de trabalho, todos deixaram transparecer que ela é bem alta
gerando até mesmo problemas de saúde; porém, para compensar, a instituição
oferece vantagens extra-profissionais e várias outras formas de ajuda complementar,
gerando satisfação daqueles que se beneficiam. Esse conjunto de benefícios
(salário razoável considerado pela maioria, participação nos lucros semestralmente,
plano de saúde completo, plano de previdência no qual o funcionário só paga 1/3 do
valor sendo o restante custeado pelo banco, status, tíquete alimentação e refeição,
estabilidade, política de ascensão profissional, etc.) tem gerado o seguinte
sentimento nos gerentes com relação a trabalhar na instituição: “Eu gosto disto”.
Portanto, é possível constatar a existência de um sistema sócio-mental que atua nos
níveis econômico, político, ideológico e psicológico dos trabalhadores por meio das
políticas de RH da organização.
84
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa pesquisa procurou mostrar como as políticas de gestão de pessoas são
utilizadas para gerir a força de trabalho nas organizações. Nesse contexto, buscou-
se estudar como os sistemas econômico, político, ideológico e psicológico são
utilizados pela organização por meio das políticas de recursos humanos
influenciando os gerentes, para que eles dêem sempre o melhor deles mesmos
(esquecendo a carga de trabalho exaustiva, as metas cada vez maiores e difíceis
etc.), a fim de que os objetivos da organização pudessem ser sempre atingidos.
A metodologia empregada não diz respeito a uma seleção aleatória de indivíduos.
Os gerentes foram escolhidos unicamente no contexto de estudo de casos,
conseqüentemente, é impossível generalizar os resultados a um conjunto mais
amplo de gerentes de outras agências.
Todos os sistemas de mediação se relacionam mutuamente, pois os mesmos são
orientados para o enquadramento do indivíduo no seio de uma ordem global
econômico-político-ideológico-psicológica definida centralizadamente.
A instância econômica utiliza, como dispositivo de mediação, políticas de salários
altos, possibilidades abertas de carreira e vantagens diversas. Os objetivos da
organização são mensurados matematicamente, possibilitando que os funcionários
sejam avaliados em função do potencial financeiro que representam e, além disso,
sejam motivados da mesma maneira.
Dentre os dispositivos criados e utilizados pela empresa, destacam-se a Gestão de
Desempenho Profissional, o Banco de Talentos e Oportunidades, o plano de saúde
e a Previdência Privada.
A Gestão de Desempenho Profissional, que é um processo de avaliação, permite
atribuir uma nota semestral ao funcionário avaliado, que influencia na PLR (se ele irá
ou não receber e o percentual) e na manutenção do funcionário no cargo atual ou na
sua ascensão na empresa, isso tudo tem impacto diretamente no “bolso” do
funcionário.
O Banco de talentos e oportunidades é um sistema de recrutamento interno
informatizado que possibilita ao funcionário se inscrever para concorrer a um cargo
85
superior ao atualmente exercido por ele; tal dispositivo influencia o funcionário a
querer “fazer carreira” no banco, criando o desejo de querer sempre vencer e subir,
levando o trabalhador a produzir cada vez mais e melhor.
Além disso, o processo seletivo interno (Banco de Talentos e Oportunidades) está
diretamente ligado à Gestão de Desempenho Profissional, pois ele utiliza as notas
das três últimas avaliações do funcionário candidato para avaliá-lo no processo
concorrencial, ou seja, se o funcionário não está bem pontuado nestas avaliações
semestrais, suas chances de “subir no banco” diminuem.
Dentre as vantagens diversas que influenciam na instância política, destacam-se o
Plano de Saúde e a Previdência Privada. Com relação ao plano de saúde dos
funcionários, o Banco paga 2/3 do valor correspondente à mensalidade, sendo
facultado ao funcionário uma quantia irrisória por um excelente plano de saúde.
Já o plano de previdência privada, que também utiliza a mesma metodologia de
pagamento do plano de saúde, isto é, o banco também paga 2/3 da mensalidade
sendo a pequena diferença facultada ao funcionário .
A instância política engloba o desenvolvimento de um sistema decisorial de
autonomia controlada assegurando a administração a distância de conjuntos vastos
e complexos. Para tanto, há a substituição das ordens e interdições por regras e
princípios interiorizados de acordo com a lógica da empresa. Há o desaparecimento
do papel autoritário dos chefes e surgem os simplistas intérpretes das regras da
organização.
Nesse contexto, o dispositivo utilizado pela instituição bancária é conhecido como
Livro de Instruções Codificadas e este dispositivo tenta passar ao funcionário que a
sua existência é para resguardá-lo do arbítrio dos chefes; todavia, por meio da
análise das entrevistas, ficou evidenciado que o objetivo é garantir a obediência dos
indivíduos à lógica empresarial capitalista.
A instância psicológica atua ora dando prazer, ora angústia (privilégios-restrições) ao
funcionário. Ela atua no inconsciente fazendo com que o indivíduo introjete as
restrições e ao mesmo tempo as satisfações que ela oferece. A dominação se
exerce ao nível inconsciente e modela a fundo as estruturas da personalidade. A
86
organização funciona como máquina de prazer e angústia, estimulando um processo
psicológico, um ciclo auto-reprodutor em que a angústia alimenta a procura de um
prazer agressivo, motor gerador de angústia.
O funcionário tenta assumir a instituição, a ideologia e as suas regras, o trabalho que
ela lhe propicia e a reproduz, assim, da maneira mais segura e ao mesmo tempo
mais suave e mais adaptada do que se fosse o objeto de uma restrição direta. Ele
vive a empresa como algo essencial do qual não pode se separar. Os conflitos que
ele experimenta permanecem puramente psicológicos e não podem levar a uma
mudança de estruturas.
Como os processos de mediação se relacionam mutuamente, percebe-se esse
processo também na Gestão de Desempenho Profissional quando ela é
apresentada como uma discussão franca e aberta, tendo toda a consideração pelo
funcionário (para tanto, o avaliador e o avaliado sentam juntos para discutirem sobre
as notas outrora impostas no sistema pelo avaliador). Porém, é evidenciado como o
mesmo dispositivo que ora gera prazer pode gerar também angústia, quando o
mesmo é utilizado para coagir ou punir o funcionário.
Outro dispositivo importante a se destacar é o “fazer carreira”, além de ele atuar nas
outras instâncias gerando sentimentos e ações que só venham a reforçar o domínio
da organização sobre o indivíduo; nesta instância, ele gera o sentimento de angústia
quando o funcionário procura resolver a incompatibilidade entre o excesso de
trabalho e a pressão constante com os seus desejos pessoais. Ele é “obrigado” a
transformar o máximo de sua energia individual em força de trabalho, gerando nele a
aspiração de querer vencer. Dessa forma, a empresa transforma o desejo em
necessidade, atuando agora no prazer, que está atrelado ao sentimento de sucesso
no trabalhador.
A instância ideológica procura reforçar a imagem positiva da função da organização,
não deixando as pessoas se conscientizarem das contradições das políticas
empresariais e sociais que subentendam. A empresa procura tornar-se um lugar de
produção de conceitos e valores.
Neste processo de produção da ideologia, destaca-se também o Livro de Instruções
Codificadas; pois, ao mesmo tempo em que os funcionários nas entrevistas
87
apontavam que as normas protegiam, havia sempre um “porém” explícito ou
subentendido nas respostas, evidenciando o aspecto punitivo caso houvesse o seu
descumprimento.
Também, ficou clara a função da ideologia reforçando a imagem positiva da
instituição, não permitindo ao funcionário se conscientizar plenamente das
contradições das políticas da organização.
Fica evidenciado, neste trabalho, como a Gestão de Desempenho Profissional, o
Livro de Instruções Codificadas, o “fazer carreira”, as vantagens diversas (PLR,
Pevidência Privada, Plano de Saúde, clube dos funcionários do Banco...), o status, o
Banco de Talentos e Oportunidades, a pesquisa de clima etc são vários dispositivos
utilizados pela empresa sobre os gerentes para garantir o controle e subordinar as
forças produtivas dos trabalhadores aos objetivos da organização.
88
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92
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2001.
93
ANEXO
ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
1) Seu trabalho é interessante? Você gosta do que faz?
2) Você está satisfeito com o seu salário? Em relação ao mercado, como está?
Você pretende sair do banco?
3) Além do salário, o banco lhe oferece outros benefícios/vantagens? Quais?
4) Você tem muitas responsabilidades? Como é a sua carga de trabalho?
5) Seu cargo lhe oferece algum benefício ou status dentro e/ou fora do banco?
6) A instituição lhe oferece momentos de prazer e descontração? Quando?
7) Qual a sua formação? Em que faculdade/escola?
8) Como é a política de metas da organização? Como ela é estruturada?
9) Quem ultrapassa as metas, ganha alguma coisa? E se não atingi-las o que
acontece?
10) Como você entrou no banco? Como foi seu processo de ascensão?
11) Seu processo de ascensão foi influenciado pela sua formação ou não?
12) O que você acha das normas? Ela o protege, ajuda e/ou dificulta seu
trabalho?
13) É possível sempre agir de acordo com as regras? O que pode acontecer se o
funcionário burlar as normas?
14) Você acha que as normas diminuem os atritos e a necessidade de vigilância?
15) Suas atividades estão definidas nas normas?
94
16) Você se sente isolado na organização, correndo atrás das metas sozinho sem
a ajuda de mais ninguém ou há companheirismo entre os colegas de
trabalho?
17) O Banco lhe proporciona Status? Já passou alguma situação que precisou
usar o nome da instituição para conseguir algo (respeito, crédito...)?
18) Como você se sente em trabalhar nesta empresa?
19) Você já fez algo errado em que foi punido ou respondeu a um processo (ou
pedido de informação)? Como foi? Como você se sentiu?
20) Você sente, algumas vezes, como se fosse uma extensão do banco, como se
o banco fizesse parte de você?
21) você já teve alguns desses sintomas: ataques cardíacos, aceleração do
coração, palpitação, depressão, irritabilidade, úlcera, gastrite, estresse...?
Outros?
22) Você tem ou teve algum problema de saúde que foi provocado ou agravado
pelo estresse do trabalho?
23) Você já participou do banco de talentos e oportunidades?
24) Você aspira a outra promoção/função no Banco?
25) Do que você abdicou pelo banco para poder crescer na sua carreira?
26) O que é, a seu ver, a Gestão de Desempenho profissional? Para o quê ela
serve? Sua ascensão na empresa depende dela?
27) Nessa avaliação, você pode falar dos seus medos e aspirações?
28) O que é, a seu ver, a pesquisa de clima? Qual a sua importância? Como você
se sente fazendo-a?
29) Quem você sugere que eu entreviste?
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