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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIA
A MULHER CONTEMPORÂNEA: TECNOLOGIA E PRAZER FEMININO.
RITA DE CÁSSIA TEIXEIRA GUSSO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Tecnologia, da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre em
Tecnologia, Universidade Tecnológica do Paraná.
Orientadora: Profª. Drª. Sonia Ana Charcut
Leszczynski.
Co-orientação: Prof. Jorge Carlos Guerra
CURITIBA
2006
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RITA DE CÁSSIA TEIXEIRA GUSSO
A MULHER CONTEMPORÂNEA: TECNOLOGIA E PRAZER FEMININO.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Tecnologia, da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre em
Tecnologia, Universidade Tecnológica Federal do
Paraná.
Orientadora: Profª. Drª. Sonia Ana Charcut
Leszczynski.
Co-orientação: Prof. Jorge Carlos Guerra
CURITIBA
2006
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TERMO DE APROVAÇÃO
DEDICATÓRIA
A Grande Mãe, que aquece suas filhas e nos
transformou em seres iluminados e poderosos.
A Dona Zilah, que antes de ser amiga, foi mãe e
me amou apesar de. Uma verdadeira mulher,
senhora de si e de suas vontades.
As tias Marina, Zuzu, Dolores, Inha, fortalezas
em vida.
A Thaís, minha irmã, uma guerreira.
Ao Thor que sempre esta ao meu lado.
Aos espíritos antigos, anjos da guarda, Nathalia e
Raphael, que são os meus filhos do coração e
sabem distinguir o ser do ter.
AGRADECIMENTOS
As deusas do panteão dos meus ancestrais, que nos momentos de tristeza me embalaram
nos braços e me fizeram ouvir o som do universo.
Ao meu guerreiro do quadrante Norte, Érik da Silva Pinto, pelo entendimento que tem com
relação as questões da mulher, o respeito pelas diferenças e diversidades.
A minha amiga, companheira dos tempos da Biblioteconomia, Iracema Stacanti Rodrigues,
que me conduziu aos portões do CEFET-Pr., e ao Nelson pela força.
A Sônia Ana, orientadora zelosa, que acreditou no tema me conduzindo ao mundo imaginário
dos grandes estudiosos de sexualidade feminina.
Ao Professor Jorge Guerra, impecável, e que nos momentos de crise foi compreensivo nas
horas de crise e disciplinador nos momentos rebeldia.
Aos membros do Grupo de Gênero, que me deixaram expor a pesquisa.
A Fátima Godinho, Valdice, Sueli do DEE, Vera do DEE, Zélia, que pecaram por terem
nascido mortais.
Ao casal Luciane e Fernando, que espelham legalmente essa nova geração de pares que
respeitam o espaço do outro, representam um dia de sol, meus amores incondicionais.
Ao Eiji San, amigo do coração, que mesmo cansado, me escutou várias e várias vezes.
A Tânia, que me incentivou a ir até o fim, e ao Lucélio Helder, pelas críticas ao meu modo
estranho de tratar a língua portuguesa.
Aos meus meninos grandes, homens feitos, que me proporcionaram grandes discussões
filosóficas, de Paula, Luciano, Petronzelli, e Tedeschi.
Ao André, Bruno, Diego e Jorge, que pela juventude arriscam caminhos, que eu já arrisquei.
vi
SUMÁRIO
RESUMO ..........................................................................................................
ABSTRACT .......................................................................................................
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1
CAPÍTULO 1: CONCEITUAÇÕES ........................................................................... 4
1 CONCEITOS ........................................................................................................ 4
2 FREUD E LACAN ................................................................................................ 6
CAPÍTULO 2: HISTÓRIA DAS MULHERES E DE
SUA SEXUALIDADE .......................................................................................... 8
1 ANTIGÜIDADE ............................................................................................... 9
2 IDADE MÉDIA ............................................................................................... 19
3 IDADE MODERNA ........................................................................................ 28
4 SEXUALIDADE FEMININA NO BRASIL ..................................................... 37
CAPÍTULO 3: MASTURBAÇÃO E ORGASMO FEMININO .................................. 52
CAPÍTULO 4: RECURSOS TECNOLÓGICOS
BRINQUEDOS SEXUAIS ................................................................................. 53
1 AS LOJAS ESPECIALIZADAS ..................................................................... 53
2 BRINQUEDOS SEXUAIS .............................................................................. 56
CAPÍTULO 5: METODOLOGIA, APRESENTAÇÃO E
ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................................................................ 58
1 UNIVERSO PESQUISADO E TÉCNICA DE PESQUISA ............................. 58
2 A PULSÃO, O INCONSCIENTE, A TRANSFERÊNCIA E
A REPETIÇÃO – CATEGORIZAÇÃO ............................................................ 59
3 APRESENTAÇÃO DOS DADOS .................................................................. 62
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS ..................................................................... 79
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 79
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 80
ANEXOS ................................................................................................................. 83
RESUMO
O presente estudo apresenta o retrato de uma mulher diferente daquela que vem
sendo preconizada ao longo da história tanto na literatura quanto na academia. A
pesquisa qualitativa foi desenvolvida em uma cidade metropolitana na região sul do
Brasil com mulheres que atingiram um status pessoal e profissional distinto da média
da população brasileira. Elas ocupam cargos de chefia em empresas de grande
porte. O recorte versou sobre como estas mulheres “entendem” e “assumema sua
sexualidade com a utilização de recursos tecnológicos. Bem como, tratou sobre a
desmistificação da masturbação.
Palavras chave: Sexualidade feminina, tecnologia do prazer, masturbação.
ABSTRACT
The present study presents the picture of a different woman of those that have being
praised throughout the history in literature as well in the academy. It is a qualitative
research that was developed in a metropolitan city in the southern region of Brazil
with women who had reached personal and professional status distinct of the
average of the Brazilian population. They occupy positions of command in big
companies. The extract of these research was about of these women “understand”
and “assume” their sexuality with the use of technological resources. As well as, it
treated on the disclosure of masturbation as a myth.
Key words: Feminine sexuality, technology of pleasure, masturbation.
x
INTRODUÇÃO
Atualmente algumas mulheres que estão no mercado de trabalho brasileiro,
demonstram práticas e/ou conceitos completamente opostos aos estereótipos
femininos existentes na sociedade atual (mãe perfeita, esposa dedicada, mulheres
com jornada dupla de trabalho). Tem-se a idéia que projetam a satisfação sexual,
apenas no momento em que mantêm relações sexuais com seu parceiro, no caso o
homem.
Ao atribuir ao homem, pelo seu pênis a responsabilidade pelo prazer sexual
feminino, observa-se muitas vezes que a mulher, conforme Lins e Braga (2005,
p.218) “detém pouco conhecimento sobre o seu corpo e a sua função,
principalmente do sistema clitoriano, uma fonte mais intensa de prazer”.
Esse modo de pensar é decorrente de uma sociedade patriarcal repressora
no que concerne ao prazer feminino. Essa concepção foi sendo construída e
sedimentada ao longo da história, sendo reforçado pelas instituições sociais. O
máximo que ela poderia almejar, no espaço público, era caminhar ao lado do marido,
auxiliando-o em suas necessidades, contanto que permanecesse na obscuridade.
Ilustra esse fato o dito popular “atrás de um grande homem existe uma grande
mulher” como também a afirmação de Michelle Perrot, em sua obra Mulheres
públicas, ao abordar o comportamento feminino nas cidades “ser homem público é
a honra, enquanto ser uma mulher pública é a vergonha” (PERROT, 1998, p.7).
As profissões que poderiam ser desempenhadas seriam aquelas que não a
expusessem ao domínio público, portanto, dar aulas de piano, cursos de bordado,
patronesse de chás beneficentes, estando implícita a função do marido em ser o
provedor e mantenedor do conforto material da família. Esse pensar remonta a
Pitágoras que dizia, segundo Perrot (1998, p.8), “uma mulher em público está
sempre deslocada”. Essas representações “de que a mulher foi criada para a família
e para as coisas domésticas” (PERROT, 1998, p.9) atravessam a espessura do
tempo, essa vocação é benéfica para a sociedade que ainda é patriarcal.
2
Este estudo trata de uma mulher que apresenta um novo comportamento
social, principalmente perante a sua sexualidade, retratando uma postura inusitada,
podendo-se dizer uma mulher que esta entre ‘aquela Amélia’, que concordava com
tudo e tinha uma postura de subserviência ao homem, pai, irmão e marido e aquela
posterior a ‘revolução sexual dos anos 70’, partícipe do mercado de trabalho, até
então restrito aos homens, que conquistou sua independência financeira e têm a sua
disposição recursos tecnológicos para atingir o prazer sexual e, em termos de
sexualidade, se pode dizer que é resolvida.
Essas mulheres, mesmo com os parceiros, são independentes em relação ao
seu prazer pessoal, se auto-estimulam, massageando a região clitoriana e tem
orgasmo de forma independente. Ao não focar somente no homem a fonte de seu
prazer, não vinculam sexo às demonstrações de carinho como também não projetam
em suas carreiras necessidades sexuais o realizadas. Estes aspectos é que
tornam o estudo relevante, pois apresentam um comportamento inovador, revelando
uma possível concepção diferenciada das mulheres no século XXI.
Exposto este cenário, esta pesquisa tem por objetivo responder às seguintes
questões:
a) qual o perfil sócio-econômico dessa mulher que conseguiu superar
as amarras em termos dos estereótipos que a colocam em uma
posição subalterna ao homem, sendo reprimida pelas instituições
sociais?
b) Qual é a relação entre prazer e utilização de recursos tecnológicos
(brinquedos sexuais) disponíveis na contemporaneidade para auto-
estimulação?
c) Qual é o papel dos vínculos afetivos no conjunto de valores que
permeiam as relações cotidianas dessa mulher.
Para dar resposta teórica a essas questões buscou-se explorar categorias da
Psicanálise e história da sexualidade. O universo dessa pesquisa envolve mulheres
que freqüentam sex shop, compram determinados recursos tecnológicos para a
estimulação sexual.
Para delimitação do estudo foram escolhidas duas lojas especializadas na
temática, denominadas sex shop, localizadas na cidade de Curitiba, Paraná.
3
A metodologia a ser adotada é a pesquisa qualitativa, de campo, tendo como
técnica entrevistas em profundidade, cujo objetivo é nos levar ao entendimento que
essas mulheres têm da sua sexualidade. O discurso das entrevistadas foi
categorizado tendo como base os quatro conceitos centrais da psicanálise:
inconsciente (repressão sexual); pulsão; transferência e repetição, os quais nos
auxiliarão a compreender aspectos sócio-afetivos dessas mulheres, naquilo que as
diferencia daquelas de comportamento padrão.
Esse trabalho mostra o fascinante universo da mulher que descobriu o prazer
sexual proporcionado por si e a si mesma, que descortina os segredos de seu
próprio corpo, rompendo com as atitudes da mulher dita padrão, quebrando as
regras ‘do bom comportamento feminino’. Desnuda o seu corpo e toca-o, utilizando a
tecnologia dos objetos eróticos para facilitar a auto-estimulação. Essa mulher não
deixa de ser mãe, parceira, amiga, companheira, profissional liberal, mas
principalmente mulher. É um penetrar nas histórias pessoais de sua sexualidade.
Com a intenção de mostrar ao leitor a importância da temática, sem o caráter
presunçoso da pesquisadora, utilizamos uma citação de Ginzburg (1987, p.15),
quando no prefácio à edição italiana de sua obra O queijo e os vermes coloca que:
“existe interesse em saber quem construiu Tebas das sete portas?”, perguntava o
leitor operário de Brecht. O interesse existe, que a mulher pesquisada apresenta
um caráter inusitado frente às discussões que estão ocorrendo na sociedade de
hoje, sobre a sexualidade.
O estudo reflete aspectos de uma mulher que desempenha todas as funções
a ela atribuídas, mas que também sabe os segredos do prazer sexual e como
proporcioná-los a si mesma, escapando daquela imagem feminina definida por
Michelet (apud LIPOVETSKY, 2000, 23) “uma mulher, que não pode viver sem o
homem e sem lar, seu ideal supremo não pode ser senão o amor: Qual é seu fim
natural, sua missão? A primeira, amar; a segunda, amar um só; a terceira, amar
sempre”. As mulheres entrevistadas fogem a este padrão de agradar somente ao
homem em todos os aspectos, assumem sua identidade autônoma, vivem para si e
por si mesmas, não vestem a roupa da fragilidade e da docilidade.
As mulheres pesquisadas estão inseridas no contexto sociocultural, todas são
brasileiras e sabem dos problemas sociais, econômicos e políticos que o Brasil
4
enfrenta, dos trabalhadores que tentam sobreviver com um salário mínimo irrisório;
de crianças que se prostituem para garantir o sustento da família; daquelas mulheres
que sofrem violência física e moral de seus maridos; das injustiças sociais, da falta
de emprego, mesmo que o discurso oficial tente minimizar tais situações. No
entanto, esses aspectos não serão tratados, na pesquisa, haja vista, que a proposta
pretende dar enfoque ao prazer sexual independente.
Por uma questão didática, esse trabalho está dividido da seguinte maneira:
histórico da pesquisa, o primeiro passo para a investigação do tema;
descrição do universo, definição do tipo de pesquisa, o tratamento dado às
entrevistas;
análise de conteúdo das entrevistas, organizadas em relatos, com destaque a
fragmentos das narrativas;
análise dos relatos, destacando os quatro conceitos psicanalíticos
empregados para a categorização dos discursos;
detalhamento dos recursos tecnológicos disponíveis no mercado, voltados
para auto-estimulação feminina e conceituação de aspectos relacionados a
esse universo de pesquisa;
capítulo voltado a história da sexualidade feminina, com enfoque especial
para a sexualidade no Brasil. Nesta etapa alguns autores que foram utilizados
para a análise dos resultados da pesquisa de campo são destacados e
o estudo se encerra com as considerações finais e respectivas referencias.
5
CAPÍTULO 1
RELATOS DOS CASOS
Esse capítulo trata do relato dos casos com as entrevistas e de todos os
aspectos pertinentes à metodologia aplicada no estudo, com suas considerações,
sem se perder de vista o processo histórico, a origem da repressão à mulher a partir
da Idade Média.
1 HISTÓRICO DA PESQUISA
Primeiramente, devo esclarecer que tudo começou quando descobri, num dos
locais onde desempenho minhas funções de bibliotecária, que algumas mulheres se
sentem constrangidas ao conversar sobre o tema ‘masturbação’¹. Nos meados de
1999, data da reinauguração de uma das primeiras lojas especializadas na
comercialização de artigos eróticos em Curitiba (PR), conheci quatro mulheres que
tratavam da temática com naturalidade e, segundo elas mesmas, só adquiriam
estimulador clitoriano (brinquedo sexual ou objeto erótico com bateria para estimular
o clitóris) e não ‘consolo (brinquedo sexual ou objeto erótico utilizado para
penetração, pode vir acoplado de estimulador clitoriano).
Agendei com essas mulheres reuniões para discutirmos o assunto e elas se
prontificaram a me atender. Relataram naturalmente suas praticas sexuais, o que
não acontecia com as de meu convívio diário, que, para algumas delas o tema é
ainda um tabu e comprar um estimulador clitoriano ou se masturbar é uma idéia
inconcebível.
¹
Auto-erotismo que visa o orgasmo, utilizando as mãos ou objetos adequados. Também
conhecida por onanismo, devido a uma interdição bíblica aplicada a Onan” (LINS; BRAGA, 2005,
p.130).
6
Existe um desconhecimento ou alienação, nas questões da sexualidade. A
masturbação é considerada, para a maioria, como pecado. A responsabilidade do
prazer sexual feminino está depositada sobre os ombros do homem, que é, nesta
visão, o total responsável pelo orgasmo da mulher; e, estes, conforme apontam
autores como Hite (2001; 2004), Lins e Braga (2005), entre outros desconhecem a
função do clitóris, no prazer feminino. As questões da sexualidade, sempre foram
vistas como naturais para mim. Com esses dois universos observados ‘o da mulher
padronizada pela sociedadee a ‘mulher diferente deste padrão’ fiquei instigada a
iniciar um processo de investigação, num dos sex shop que freqüento.
Como a minha freqüência era regular, duas vezes por semana,
aproximadamente, comecei a ficar conhecida no local. Iniciei diálogos com as
vendedoras, sobre a clientela da loja, mantendo sempre uma atitude que não
interferisse nas vendas, pois, afinal, elas são comissionadas.
Delimitei, como base, as mulheres que eu conhecia e havia contatado. E
forneci para as vendedoras (Anexo 1), o perfil daquelas que eu gostaria de
entrevistar, ou seja, compradoras de estimuladores clitorianos, na faixa etária
compreendida entre 30 e 55 anos, com pós-graduação, salário superior a R$
8.750,00 (oito mil setecentos e cinqüenta reais); funções de gerência em empresas
públicas ou privadas e que fazem ou fizeram terapia psicanalítica.
Repassados os dados para as vendedoras, acabei conhecendo outras
mulheres que também abordavam a auto-estimulação como algo natural e salutar
para a vida pessoal e profissional.
No início, quinze mulheres compunham o universo de pesquisa, mas, por
motivos profissionais, cinco delas, não puderam auxiliar meu estudo.
Para obter o rigor científico exigido para a defesa do tema na academia,
pesquisei autores que tratam da sexualidade feminina, objetivando compreender as
origens e os mecanismos utilizados pela sociedade, a partir da Idade Média, para
conter o desejo feminino.
Solucionados os entraves iniciais, como a aceitação da temática sobre o
prisma do prazer feminino e dos recursos tecnológicos empregados, a definição do
universo, a busca de que pudessem oferecer referenciais teóricos mínimos para
embasar o estudo, dei início a investigação.
7
2 DESCRIÇÃO DO UNIVERSO
O local escolhido para os primeiros contatos foi uma das lojas especializadas
em artigos eróticos, denominadas sex shop, no centro da cidade de Curitiba (PR), e
os subseqüentes encontros em locais determinados pelas mulheres, como seu
trabalho, casas de chá e residência.
Os casos registrados envolvem relatos de 10 mulheres entrevistadas, num
total de 30 sessões, realizadas no período entre 2003 e 2005, com a extensão,
aproximadamente, de três a quatro meses, em Curitiba (PR). Os encontros foram
agendados pelas entrevistadas, dependendo de sua disponibilidade. Observamos
que cada entrevistada teve uma maneira de expor o tema: algumas dissertaram
sobre o assunto e suas praticas e outras simplesmente apresentaram seu ponto de
vista. As entrevistas não foram cronometradas e ou gravadas, apenas foram
realizadas anotações manuscritas, lidas por elas, após a transcrição dos dados em
forma de relatos.
As respostas das entrevistadas foram categorizadas segundo Os quatro
conceitos fundamentais da psicanálise, segundo Lacan (HARARI, 1990). Estas
categorias foram destacadas na transcrição dos relatos, nesta pesquisa, da seguinte
forma: para inconsciente (focado basicamente na repressão) cor amarela;
pulsão (desejo) cor rosa; transferência para cor verde e para repetição cor
azul; o negrito será utilizado para as exposições, que não se encaixavam
claramente nas categorias definidas e as inserções da pesquisadora foram
colocadas entre aspas, sem destaque. Cabe informar que não é objeto desta
pesquisa fazer uma profunda investigação sobre a Psicanálise, mas sim abordar
aspectos essenciais para a categorização e sistematização de elementos
manifestados nos estudos realizados.
São características que envolvem o perfil das entrevistadas a faixa etária
compreendida entre 35 e 55 anos, o ensino superior e s-graduação em MBA,
proficiência em língua inglesa, língua francesa engua espanhola, salários que
variam na faixa de R$ 9.000,00 a R$ 22.000,00, exercendo as funções de gerentes,
8
diretoria e vice-presidência em empresas públicas e privadas, nas áreas de
petroquímica; importação e exportação, consultoria financeira e de recursos
humanos.
Essas mulheres fazem parte de uma faixa da população brasileira,
considerada classe A, oriundas de famílias de alto nível econômico e social que lhes
proporcionaram condições de estudo, não necessitando trabalhar na infância e na
adolescência; fazem parte de um segmento do mercado de trabalho que, até o final
dos anos 80, era prerrogativa masculina, com salários elevados se comparados a
média do trabalhador brasileiro.
Na abordagem da sexualidade feminina, apesar de ser discutida pelos meios
de comunicação de forma mais aberta, observa-se que para a mulher brasileira,
sentir prazer sexual implica na necessidade da presença de um parceiro, de amá-lo
acima de tudo, sendo ele o responsável pelo orgasmo feminino. A masturbação,
quando realizada, é feita na presença do parceiro, que se sabe ser um fetiche
masculino (LINS, BRAGA, 2005, p.61-62) para apimentar as relações do casal.
Ainda, o prazer sexual proporcionado por si, como ato independente, é encarado
pela maior parte das mulheres como pecaminoso, a tal ponto de não ser
referendado nos livros que tratam da sexualidade feminina.
As mulheres observadas nessa pesquisa rompem com esta barreira, mas não
negam a importância de seus parceiros, bem como não fazem um discurso contra o
masculino, inclusive profissionalmente.
Todos os casos relatados foram considerados pela pesquisadora como
fascinantes, que ela mesma tem como pratica a auto-estimulação e a crença de
que prazer sexual pode e deve ser proporcionado por si e a si mesma. Assim, como
essas mulheres fogem ao comportamento das mulheres padrão, definidas dessa
maneira por responderem aos ditames da sociedade a qual indica que, para ser
mulher, deve-se ter um marido, filhos e cuidar da casa, além, é claro, de ajudar nas
despesas domésticas.
Essas mulheres, de uma certa maneira, quebram pré-conceitos masculinos e
femininos, evidenciados por falas como: “é mal humorada, porque não deu uma” ou
“está assim porque o marido não quis transar”, “é mal amada” “falta homem”
“conseguiu tal cargo porque deu para o chefe”, enfim, afirmações que ouvimos no
9
cotidiano sobre a mulher, principalmente se invadimos um espaço restrito aos
homens, ou quando estas mulheres posicionam-se de forma diferente do perfil da
mulher padrão, sendo taxadas de “feministas mal amadas”. Os direitos são
afirmados como iguais, em todos os aspectos. Mas os direitos o são iguais, o
gênero nos transforma em pessoas socialmente diferentes, com desejos e anseios
diversos. Portanto, mulher e homem têm o direito de sentir prazer sexual sós ou
acompanhados, sem as rotulações pejorativas.
Os casos foram numerados seqüencialmente, como também as entrevistadas
não se preocuparam com a linguagem formal. No entanto, se faz necessário
esclarecer que determinadas expressões utilizadas nas entrevistas, não fazem parte
do discurso profissional delas, o comportamento no trabalho é mais formal, definido
pelas regras da etiqueta empresarial. Esta observação pode ser constatada in loco,
pois três entrevistas foram realizadas no local de trabalho das entrevistadas. Cabe
ressaltar que a estratégia de entrevistar duas a duas, partiu delas próprias, que se
conheciam ou eram amigas.
3 RELATOS DOS CASOS
CASO 01
Foi a primeira que concedeu entrevista, ocorrida em janeiro de 2004, julho de
2004 e janeiro de 2005, obedecendo a uma certa seqüência temporal; o pseudônimo
atribuído foi de V.M.
Os pontos que despertaram a atenção da pesquisadora, nessa entrevista e de
um modo geral, foram, primeiramente, a total despreocupação com o aspecto físico
de sua imagem, não querendo dizer com isso, que seja desleixada, apenas que sua
preocupação,após aos quarenta anos, já que tenho 48, deve ser com o interior
e viver a vida em sua plenitude”. Segundo ponto, a descoberta e a função do
clitóris, mesmo sendo, uma pessoa bem informada, prazer sexual, é coisa para
adolescente não para uma mulher de 30 anos”. Terceiro, o rompimento com os
padrões repressores da sexualidade impostos à sociedade.
10
Durante a entrevista foram pinçadas questões da repressão sexual; pulsão;
transferência e repetição, portanto, para se entender parte do universo dessa
mulher, optou-se pela descrição das falas.
O caso número 1 é uma mulher, que fisicamente não corresponde aos
padrões de beleza da sociedade atual, veiculados nas revistas femininas e pelos
meios de comunicação, sua preocupação não esta no corpo físico, “na aparência
física”, ou seja, “quero aproveitar os deleites da vida, mesmo que seja
devorando um leão ou leoa por dia”, “gastar em cirurgias plásticas, mascara a
realidade do corpo”.
Essa mulher, no ápice dos seus 48 anos assumidos, formada em Economia,
pela Universidade Federal do Paraná, com pós-graduação (MBA) na área de
marketing, nos Estados Unidos, ocupa a função de gerente de marketing e entrou na
empresa como assistente. Segundo ela, “a oito anos atrás essa função era
exclusivamente masculina. É filha de pai engenheiro e mãe professora da escola
de línguas Cultura Inglesa aposentada; os pais são os verdadeiros responsáveis por
ela ter se tornado uma economista, sempre enfatizaram a educação formal e a figura
da mulher tendo sua independência financeira. Está no segundo casamento, que
dura 10 anos. Tem um casal de filhos e uma renda mensal de aproximadamente 9
mil reais, sem contar, “com os extras, que variam de 6 a 8 mil a mais por mês”.
Esses extras são decorrentes de consultorias na área de investimentos
financeiros.
O relacionamento entre seus pais ficou conturbado, piorando no
momento em que o irmão assumiu sua homossexualidade, para o pai “minha
mãe era a única culpada de ter um filho gay”.
Os aspectos da repressão sexual são observados em suas falas quando
admite “ter sido educada para trabalhar, ser boa mãe e questionava-se sobre não ter
direito ao prazer sexual”; “ter fingido orgasmos, para satisfazer o ego do marido”; fui
comparada com um freezer”, “por ter casado grávida e não querer que a família
passasse vergonha”.
Segundo ela seus horizontes se abriram, no momento em que começou
a trabalhar e terminou o MBA”. Para ela, a auto-estimulação com ou sem os
11
brinquedos sexuais no “início era pecado, pois fui educada em uma escola católica,
gerenciada por freiras”.
V. M. buscou a terapia após discutir com o marido e nunca ter sentido um
orgasmo. Reprimida, como grande parte das mulheres, fingia orgasmos, objetivando
garantir “o prazer” do marido, e “na realidade, eu nem sabia bem o que era isso,
para você ver como fui bem informada sobre isso e, além de tudo, o meu ex esposo
era um animal”. O casamento aconteceu, “porque engravidei”. Gravidez, que “foi
acidental. Para ela a questão do prazer sexual “era algo complicado”, que não
tinha problemas de saúde; a “frigidez que o marido lhe imputava”. Era a “responsável
pela falta de tesão. Rita, até que eu acreditei, por um bom tempo nesse discurso
machista e repressor. Eu tinha que sentir prazer sexual, senão a culpada era eu
mesma, não ele. A partir dessa insatisfação comecei a buscar informações, sobre o
que o homem pode nos proporcionar e se realmente tudo está sobre os seus
ombros”. Nesse discurso, mais uma vez, observamos a repressão sexual e a culpa
que a mulher carrega pelo fato de querer sentir prazer e quando isso não ocorre, a
responsabilidade é sua, mesmo que desconheça o próprio corpo.
A transferência é observada quando descobre que o marido tem hábitos
higiênicos terríveis, que eram “tomar banho uma vez por dia; ter bafo de
bebida; ter cheiro de chulé”. Resolve investir na carreira, transferindo para sua
profissão necessidades ou o vazio interior que, até então, não conseguia preencher.
“Rita, um casamento em que o marido ronca e tem hábitos higiênicos
diferentes (dá risada), fica difícil querer dormir na mesma cama, transar e continuar
com ele até a velhice. Então resolvi investir na minha carreira, que sempre tive
facilidade com o inglês e o espanhol, afinal minha mãe é extremamente culta,
facilitando assim minha leitura aos livros técnicos, sem depender da tradução em
português”.
Esse relato demonstra que a entrevistada se sentia enclausurada, com
atribuições que não preenchiam suas lacunas enquanto indivíduo. Adentrar no
mercado de trabalho foi uma das formas de atingir sua independência financeira e
concomitantemente sua liberdade pessoal.
A separação do primeiro marido, decorreu de seu comportamento machista,
onde quem manda em casa sou eu” dizia, “não admito que mulher minha
12
ganhe e saiba mais do que eu”. Sobre a segunda relação ela declara o tenho
mais, tantos problemas com a auto-estima e não me sinto tão reprimida
(lembre-se da terapia), me sinto livre mesmo estando num segundo
casamento, descobri por mim mesma, o que é a auto-estimulação”. Em suas
palavras “descobri o clitóris e até que ele fica em ereção, mais rígido, você veja que
a coisa realmente é extremamente importante. Chego a sentir um frio na espinha,
com ou sem recursos tecnológicos. Rita tenha santa paciência, esses estimuladores
são coisa do capeta e eu achando que era coisa de “puta”, menina dadeira”. Não
estou dizendo que se substitua a relação com um parceiro, ou toque de outra
pessoa, apenas, que dar prazer a si mesma também estimula. Pelo amor de Deus,
que sociedade é essa, quantos recalques, quantas culpas carregamos pela vida.
Para que, se no final iremos morrer mesmo? Tudo nos é negado, mas, enfim,
descobri que eu posso ao menos me proporcionar prazer sexual”.
Nesta fala, podemos observar três dados importantes: primeiro, a pulsão, o
desejo pelo prazer sexual e, segundo, seu rompimento com os ditames da
sociedade referente à quebra do padrão de comportamento, buscando o prazer
porque se sente no direito de ter. O valor dado ao novo parceiro é evidente, pois
este não excede aos limites do bom senso, ou seja, não existe mais a busca
pelo príncipe encantado, o amor idealizado, construído, parece que na Idade
Média”.
O marido do segundo casamento, tendo passado por uma separação,
entendeu que a mulher com independência financeira e entendimento sobre
sua sexualidade, quer mais um companheiro, um vínculo afetivo centrado no
respeito e consideração”.
Em outro momento da entrevista ela fala sobre o seu primeiro contato com
brinquedos sexuais, principalmente o estimulador de clitóris, seu preferido: “ocorreu
na Alemanha, visitando uma loja especializada, fiquei intrigada com os
objetos, perguntei à vendedora para que servem e acabei comprando meu
primeiro estimulador”. “Foi o meu primeiro orgasmo clitoriano digital, ou melhor
dizendo, meu primeiro orgasmo clitoriano com brinquedo sexual em formato de
golfinho”, nessa fala verifica-se a pulsão, o desejo. “Depois dos quarenta, acredito,
sentimos necessidade de gozar, sem termos a preocupação de que estamos
13
pecando contra os deuses”. Nessa observação podemos constatar a libertação dos
padrões comportamentais das mulheres exigidos pela sociedade.
No entanto, ainda nos deparamos, em seu relato, com alguns aspectos
repressivos, como por exemplo, “comprar esse tipo de brinquedo sexual, no Brasil, é
coisa complicada, pois ocupo uma posição em que uma fofoca dessas, acarreta uma
melação no meu cargo, pois homem é tão fofoqueiro quanto a mulher, elas reparam
na roupa e no comportamento, e eles acreditam que sou assexuada e alguns que eu
dormi com o diretor, tudo para justificar onde cheguei. Se eu ainda tenho vestígios
de repressão eles se acham os melhores, mesmo que não sejam, e olhe, eu
gerencio 10 homens, que comandam 50 funcionários (peão) e 15 mulheres em
cargos de chefia, o meu é de gerencia”.
Voltando a falar do marido, não sinto que ele me julgue por me auto-
estimular, para ele sou mais solta e sei o que quero e como quero. Não tenho o
porque de entrar em detalhes”.
As entrevistas terminaram e ela ainda mantém contato comigo, pois “o fato
de falar sobre o assunto, me faz pensar em minhas ações diárias”.
A repetição não foi assinalada na entrevista, porque não apareceu em suas
falas, mas como a mesma tem aproximadamente cinco estimuladores, posso
concluir, portanto que o recurso facilita o prazer gerando repetição do ato.
O ambiente, em que ocorreu o primeiro contato com a entrevistada foi no sex
shop e as outras quatro entrevistas aconteceram, uma no local de trabalho, o que,
deixaram tanto a entrevistada como a pesquisadora constrangida face às
interrupções e atendimentos às ligações telefônicas; as outras três reuniões
ocorreram em sua casa, ambiente tranqüilo e descontraído, que nos oportunizou a
observação de que o local de trabalho a estava cerceando, mesmo quando não era
interrompida. Conclusão: apesar de toda a liberdade que a mulher usufrui, a
sociedade continua exercendo mecanismos de repressão sobre o gênero feminino.
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CASO 02
O segundo e terceiro casos relatados, ocorreram com a participação de duas
entrevistadas, que receberam o codinome G. e R., segundo elas ‘G de grandiosa’ e
‘R de rebelde’, nos meses de março, abril e maio de 2004 e janeiro, fevereiro e
março de 2005.
O primeiro contato ocorreu no sex shop, freqüentado pela pesquisada, e a
apresentação foi feita por uma das vendedoras.
Inicialmente, foi explicado o tema do trabalho e a importância do estudo,
inclusive o sigilo com relação aos nomes verdadeiros.
As entrevistadas são pessoas extremamente bem humoradas e em momento
nenhum ficaram embaraçadas, afirmando aque “não estamos comprometendo
ninguém” ou “Rita temos fogo no rabo e iremos parar no inferno, caso ele exista, ou
estaremos nos braços de Baco, com as roupas de Afrodite”. Nesta colocação,
pude notar o envolvimento de dois conceitos psicanalíticos: o primeiro refere-se à
repressão e o segundo a pulsão o desejo pelo prazer.
G, a grandiosa, tem 46 anos de idade, é economista, especialista em
finanças, e bilíngüe (inglês e espanhol) e ocupa o cargo de gerência na área de
finanças em uma empresa de economia mista; está na função 10 anos e meio,
iniciando sua carreira na empresa como analista de mercado. Seu salário é de 10 mil
reais por mês, sem carga horária semanal específica.
Fisicamente é uma mulher que tem de altura aproximadamente 1m e 75cm,
trajando uma saia abaixo dos joelhos e os cabelos presos, ossos do ofício e das
regras de etiqueta executiva”.
A postura austera faz parte do comportamento profissional, mas que não
atrapalha seu bom humor. A questão dos trajes e comportamento são evidenciadas,
porque em momento nenhum elas aparentam se rebelar quanto às normas
estabelecidas pelas empresas. Pode-se observar, que ambas, separam a
profissional da mulher, não utilizam acessórios como artifícios de sedução, enfatizam
a competência profissional.
Casada duas vezes. Por opção, ela e o segundo parceiro, vivem em casas
separadas, não dividem gastos, porque “Rita dividir grana num sistema
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econômico, onde o capitalismo dita as regras, os relacionamentos tendem a se
confundir, eu me banco ele se banca, Só divido despesas, com a educação dos
meus filhos, frutos do primeiro casamento”.
Começou a freqüentar sex shop desde a conversa que teve com seu
terapeuta, por ouvir diariamente do primeiro marido “que tinha problemas com o
toque”. ”Rita, o praga, (marido) queria que na hora da trepada eu deixasse que ele
me batesse, pois era o que me faltava, além de querer tentar fazer sexo com
outros casais. O terapeuta disse que eu não era obrigada a fazer nada que me
violentasse”. Nesta colocação, pode ser observada a questão da pulsão, o desejo
pelo prazer, contanto que não se sinta em nenhum momento invadida em sua
privacidade.
Continuando sua explicação: ”em uma conversa com o terapeuta ele sugeriu
leituras sobre o assunto e certos recursos, principalmente livros que tratavam de
sexualidade feminina, esses materiais ensinavam técnicas e desmistificavam coisas
como se masturbar é pecado, fazer sexo oral é pecado, enfim tudo é pecado,
inclusive o prazer”.
Verifica-se a questão do inconsciente, a repressão embutida, dificultado o
prazer físico, resquícios da educação católica e de qualquer outra educação
ortodoxa, onde a mulher carrega o pecado original, como é descrito na Idade Média,
em que a Igreja Católica transforma a mulher em ser demoníaco.
”A independência financeira me separou do primeiro casamento ele alegava
que eu era uma frustrada, tão independente, mas frustrada, como mulher, seria
sempre uma funcionária com cargo de gerência ganhando bem, mais infeliz. Você
acredita, disse que eu era frígida, uma doente, Claro, Rita, tudo isso, porque não
aceitava o fato de ganhar mais do que ele. É óbvio, busquei a terapia, mais me livrei
dele”.
Cabe colocar, segundo a observação da pesquisadora, primeiro o aspecto do
inconsciente, o desconhecimento por parte dela de sua sexualidade e, segundo, que
para alguns homens, a independência financeira da mulher faz com que eles se
sintam humilhados, pois deixam de cumprir sua função de provedor do lar, imposta
pela sociedade patriarcal.
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O casamento termina e ela investe em sua carreira, concluindo a
especialização e entrando em contato com um trabalho e função, considerado
geralmente masculino, gerente financeira.
O contato e compra de seu primeiro brinquedo sexual ocorreu logo após a
separação, e no segundo casamento, sente-se mais conhecedora de si mesma e de
sua sexualidade.
“As técnicas de como usá-lo, consegui assistindo filmes alguns pornôs outros
não, eu não me excito com imagens. A sensação da masturbação é de relaxamento,
alívio, é diferente daquela sentida com parceiro, comparo a uma massagem.
Descobri que para ser mãe, mulher, esposa, amante, antes de qualquer coisa
preciso conhecer o meu corpo e saber quais são as partes sensíveis o meu prazer
agora é mais intenso, isso com o marido 2, pois além de ser extremamente
inteligente, tenta entender o universo feminino, não tenho problemas monumentais
com ele. A minha libélula uso antes do sexo com o parceiro e é claro no horário de
expediente, você precisa experimentar, vai superar as suas expectativas. A
masturbação, por eu estar sozinha me sinto mais solta, mais livre. O brinquedo é um
detalhe e por se parecer com a pele humana, tenho a sensação dos meus próprios
dedos me acariciando”.
Nessas falas, se observa a pulsão, o desejo, a busca pelo prazer físico, mas
com a nítida distinção entre o prazer proporcionado a si mesma e aquele com um
companheiro. A borboleta é um modelo de auto-estimulador clitoriano, revestido de
cyber skin (material parecido com pele humana), com valor aproximado de R$
500,00 (quinhentos reais), no mercado.
Por falar em despesas no sex shop, ela comenta: “não gasto fortunas
nessas lojas, apenas compro o necessário, quando necessário, cremes,
pomadas, lingeries, (brinquedinhos); a média mensal é de R$ 300,00 a R$
700,00, acredito que faço essas compras de dois em dois meses. Sei lá. o
parei para computar. Não agüento gastar em salões de beleza”. “Rita não
colocar que faço coleção dos estimuladores de clitóris, eles são mais
higiênicos que a mão, sabe, os cinco dedinhos”.
Esta observação dos gastos, foi destacada, para ilustrar que o conceito de
gastar R$ 300,00 ou R$ 700,00, para ela, não representa muito, mas, em
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contrapartida existem outras pessoas, que recebem mais de R$ 5 mil reais por mês
e gastam em centros de estética. Esta proporcionalidade é definida, pela pessoa,
não cabendo aqui, juízo de valor.
A questão da transferência pode ser observada quando G diz que: “Rita, o
acredito em príncipe, já acreditei, apesar do marido (bundão) 1 ter sido um troglodita,
uma coisa do outro mundo, primata. Acredito hoje, em parceria, respeito mutuo,
cumplicidade e este atual por enquanto funciona assim (não tem pedigree legitimo,
mais serve). Lembre-se não preciso do dinheiro ou da segurança de homem
nenhum”.
“Tento passar para minha filha, minhas experiências e a importância da
mulher ter sua independência, mas antes ela deve ser livre de preconceitos ou
amarras que não levam a felicidade ao prazer, mesmo que tenha uma vida casta.
“Desejo subir mais em minha carreira, não sinto atração nenhuma pelos 08
gerentes que trabalham comigo, nenhum deles me atrai, são novos e
inconseqüentes. Tenho claro que minha libido, meu prazer, dependem de mim
mesma e de mais ninguém”.
Ela faz a transferência quando coloca na carreira uma meta e também a
responsabilidade de sua libido sobre si mesma. Um ponto que não foi foco da
pesquisa, mas observado, refere-se à maneira como elas tratam esses assuntos
com os filhos e filhas. Tanto pecado é descartado como também a busca pelo amor
ideal é desmistificada.
Uma observação interessante feita pela entrevistada, no que se refere ao
termino do primeiro casamento foi Sabe Rita, no final agradeço ao marido 1, o
bundão, porque afinal ele me apontou falhas de comportamento e distorções
de sentimentos que me fizeram procurar ajuda (ele pagava o terapeuta), pena
que ele continua a mesma criatura”.
A repetição é destacada na assertiva da entrevistada quando se refere à
masturbação da seguinte maneira: “Prático a masturbação uma média de 3 vezes
por semana, ou amais, depende da adrenalina. Gosto da sensação, de tocar em
mim mesma, a sensação de intimidade comigo mesma realiza. Faço-me feliz, disso
tenho certeza”.
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G se refere ao ato, como algo saboroso, a ser vivenciado em momentos de
alto estresse ou não, uma pratica diária, em que sentimentos repressores, como
culpa e pecado, não se fazem presentes.
Essa entrevista ocorreu em duas etapas, sempre com a presença de R e, em
alguns momentos, fazendo intervenções, que, por solicitação dela mesma, não
foram anotadas. As intervenções foram de concordância com G, a linha de
pensamento e de comportamento sempre eram de aprovação, apenas com um
toque de humor.
Na segunda parte da entrevista com G, ela observou aspectos do
inconsciente e a repressão, que fazem parte do comportamento de algumas
mulheres que convivem com ela: “desde o nosso último encontro pensei, e achei
importante, destacar que talvez você pudesse colocar que tanto eu como R fomos
criadas nos moldes da educação católica, com direito à Sacre de Marie, portanto, a
sexualidade feminina sempre foi um assunto proibido, o que dirá a masturbação.
Rita no dia em que levanto incorporada, vou para o trabalho e pego para Cristo
minha secretária, formada em Secretariado, que é evangélica (freqüenta aquela
Igreja do griteiro) eu falo da masturbação, do orgasmo, para deixar o dia mais
picante. Você não vai acreditar que, em uma dessas vezes, ela comentou com o
pastor e ele teve a pachorra e a petulância de dizer para ela que eu estou possuída
pelo coisa ruim. Pelo amor aos Deuses, eu wicca, tive que ouvir isso e concordar
com Marx, parece que foi ele, a religião é ópio da sociedade”.
“Rita a sexualidade significa tudo aquilo relacionado ao prazer – corpo e
mente. Desenvolvo minha sexualidade quando me conheço melhor e
reconheço quem sou como mulher. Meus quatro dedos fazem milagre. Busco
numa relação afeto, companhia. Veja bem o tenho expectativa com relação
ao outro, como tinha aos 20 anos, não existe Rapunzel e muito menos
príncipe, apenas seres humanos, que se completam ou não, os acessórios me
auxiliam a atingir o prazer físico, o penso em uma pessoa em específico.
Falo com amigas chegadas sobre os lançamentos mais não sobre o que faço,
isso só diz respeito a mim mesma inclusive aquilo que faço na cama, o
sou de comentar, a vida é minha. Acredito que a independência financeira
facilita meus gastos, inclusive em sex shop, pois coloco esses gastos como
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ligados ao prazer. Leio o que cair na minha mão mais prefiro assuntos ligados
a economia mundial e mercado financeiro, ossos do ofício”.
As considerações finais feitas por G, levam a concluir que sua busca pelo
bem-estar consigo mesma é uma tônica, mas sem a ilusão de um parceiro ideal. Em
momento nenhum demonstrou uma alienação pelo mundo ao seu redor, ela tem um
comprometimento consigo mesma e segue sua vida, conforme sua própria filosofia
de vida.
CASO 03
A entrevistada R, tem 36 anos de idade, graduada em administração, pela
FAE, com especialização na área de Recursos Humanos; com fluência em inglês e
francês, não é casada e não mora com ninguém. Companheira fiel de G: aprendi
muito com G., inclusive sobre aspectos que envolvem consultoria”.
Atualmente, é gerente na área de Recursos Humanos, há cinco anos na
função; foi contratada como estagiária numa empresa envolvida com derivados de
petróleo e tem um salário mensal de 9 mil reais.
O destaque inicial de R é que não tem muita paciência em responder, preferiu
concordar com G em perguntas que exigissem explicações. O vocabulário bem mais
picante e por viver tocando seu corpo foi apelidada pela amiga de “puta fashion”.
“Rita, esse apelido é porque gosto de alisar as minhas pernas e segundo a G,
freira sem convento, (ambas tão risadas), isso não é de bom tom”.
Quando indagada sobre a freqüência em sex shop, respondeu: “freqüento
sex shop, deste que abriu esse aqui, vim por curiosidade, sempre me
masturbei, acho estranho você perguntar e querer pesquisar sobre isso. O
mundo evoluiu, como também a G ter resolvido fazer depois de ter sido usada,
melhor ter se deixado usar, pelo falecido (marido 1)”.
A repetição por ter atingido prazer na auto-estimulação pode ser observada
nas seguintes falas, como também deixa claro, sua impaciência em relacionamentos
amorosos. “Não tenho paciência com namorados, atualmente os homens, ao menos
os que eu conheço, querem se encostar – o máximo que dura uma relação comigo é
20
03 anos, eles são folgados querem se mudar para a casa da gente, usar nosso
banheiro e normalmente são separados e dizem que a mulher era uma praga, nunca
eles. No fundo querem uma boa foda, comida e roupa lavada tudo de graça, como
se fossem verdadeiros garanhões. Não tenho talento para ser a segunda e quem
dirá, cola, para colar os pedaços. Me considero uma profissional competente, invisto
na minha carreira, não tenho muito tempo para namorar. Gosto das facilidades que
os recursos financeiros proporcionam, inclusive para comprar esses mimos, sim são
mimos. Rita recursos tecnológicos é você que fala, para mim, são mimos. Tenho 3
modelos diferentes de estimulador de clitóris e um vibrador, prefiro os primeiros e as
pomadas que excitam”.
“Não acredito em amor romântico, parceiro para a vida inteira, quero ir viajar,
conhecer lugares e outras pessoas, por enquanto, não penso em ser mãe ou ter
marido a empresa facilita viagens para o exterior e com alguém eu não poderia.
Gasto aproximadamente R$ 200,00 por mês, comprei (hoje) dois mimos, gosto das
cores. Sexualidade feminina esta relacionada ao corpo, sentir esse corpo e saciá-lo.
Masturbação é natural como já disse, tenho obrigação de conhecer meu corpo,
meus pontos sensíveis, a leveza do meu próprio toque me encanta, me descubro
todos os dias”. O homem tem que ter um toque feminino, proteção a divina.
Rita se você fizer aquela cara, me aguarde, eu prefiro um sexo selvagem. Vou
de contar um segredo, se uma reunião esta um saco, saio, pego a minha
“bolsinha” no meio das reuniões, vou ao banheiro munida de meu aparelho
portátil (estimulador de clitóris) e me masturbo. Retorno, lépida, feliz que você
nem faz idéia e eles com aquelas cara. Rita, o universo masculino é muito
engraçado”.
O comentário sobre expressão facial surgiu porque a pesquisadora se
espantou com a história de sexo selvagem, o assunto foi deixado para outra
ocasião, já que a pratica do sexo não é tema relevante no momento e neste estudo.
A questão da pulsão, o desejo pelo prazer surge no discurso em que ela
comenta: “Troco confidências, mas não falo do que faço com as amigas, a o ser
Graça, que parece ser minha irmã mais velha. ouvi e a G. também mulheres
falando mal dos mimos e indo comprar escondido. Como é que falam se não
conhecem, acho que mentem, ainda são do tempo que para encontrar alguém você
21
tem que se passar por retardada. Sou fascinada pela tecnologia empregada nos
mimos, além de estimularem o clitóris de maneira perfeita (isso ela pensa) sou
obrigada de uma certa maneira a me depilar inteira, a perseguida fica mais sensível”.
A transferência pode ser observada, no ato de preferir ler jornais e livros de
sua área profissional que ter alguém para não ficar só. No momento em que ela diz,
“a independência financeira acarreta para a mulher ou homem certas facilidades,
mais lembre-se que se paga por isso tanto a que tem dinheiro como aquela que não
tem. Solidão é um preço, mais conheço mulheres que tem maridos e são sozinhas.
Prefiro ler revistas e jornais, que abordem minha área de interesse, do que ter
alguém por ter”.
Essa entrevista, se comparada às duas anteriores, foi sucinta, mas como ela
participou da entrevista com G, se observou pontos comuns com as outras
respostas.
A entrevistada não demonstrou paciência em responder, pois para ela esse
assunto é natural, adoro comer pizza de chocolate e não fico discursando
sobre isso. Masturbo-me, com ou sem mimos, só isso”.
Um aspecto que deve ser ressaltado, todas as três entrevistadas são
católicas, no entanto, não são praticantes, a tal ponto de serem favoráveis ao
divórcio e outras questões que a Igreja Católica condena. Não foram afetadas em
sua sexualidade, ou práticas pelos dogmas da Igreja.
CASO 04
A entrevistada M, caso 04, tem 44 anos de idade, graduada em história, com
especialização em Administração Pública, fluência em língua francesa, casada,
coordena uma empresa de capital misto, com uma carreira de 20 anos, mas 3
anos no cargo diretora executiva. Sua faixa salarial está compreendida entre 7 e 10
mil reais, e fez questão de conversar em companhia da entrevistada de número 5.
Justificando que trabalham em órgãos similares.
O seu primeiro contato com o sex shop aconteceu quando procurava “fitas
de vídeo com filmes picantes, fico constrangida em locadoras. Sabe no fundo
22
meu marido me presenteou com um brinquedo erótico, portanto, é arrojado
para a dia dos homens que conheço. Rita, vamos esclarecer não gosto do
termo marido, prefiro parceiro, pois temos uma parceria”. “Voltando ao
assunto, essas lojas oferecem artigos voltados ao sexo, sem questionamentos
ou interpelações pelos vendedores. A disposição dos produtos apela para o
sexo mais de maneira discreta – não é apelativo”.
O desejo e busca pelo prazer pode ser observado nas seguintes
manifestações, inclusive nos momentos em que admite a necessidade de estar e
de não ter problemas financeiros ou de emprego. “tudo na vida é prazer com
momentos de algumas atribulações isso eu aprendi em casa minha mãe sempre
teve uma visão aberta, e com a idade, ao menos eu, senti necessidade de buscar
algo que não dependesse de meu parceiro, ele tem 54 anos de idade e por ter uma
vida estressada – para mim não é isso, mas para ele é – sua performance não é das
melhores ele desconhece a anatomia feminina é do tempo que pênis grande é a
solução. (Tudo gira em torno do pênis, o monte, nem pensa ou sabe que existe o
clitóris). Quando terminamos de transar eu fico com a sensação de que não senti
com a mesma intensidade. Agora eu me masturbo antes e a transa com ele, é
diferente. Porque liberei o excesso sozinha. Rita, não para comparar a
masturbação com a relação sexual. Não estou competindo com ninguém”. A mulher
é livre sempre, mesmo que digam ao contrário não me sinto discriminada e nem
objeto sexual. Dar prazer ao meu corpo é uma obrigação. Funciona como uma
descarga de adrenalina em momentos de estresse os acessórios facilitam. Rita,
nem sempre o parceiro que escolhemos corresponde a tudo é um excelente pai,
amigo, mas amante (homem) ele é – só isso – é (falta ênfase). Leio muitos livros que
falam da sexualidade feminina (Marina Colasanti, Muraro, Beauvoir etc), auto ajuda,
tudo que facilite a minha vida, me torne melhor. Não temos problema com
estabilidade profissional, mesmo sem ter medo da perda do emprego, ser mãe, filha,
amiga e parceira, as vezes pesa, precisamos de momentos para nós, momentos
íntimos”.
Um outro dado importante, nessa entrevista é o fato de orientar a filha de
maneira, que ela conheça seu próprio corpo, a descoberta de determinadas
sensações corporais, serão feitas por si só.
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“Rita, sempre vi a masturbação, como natural, não acho que seja
diferente, inclusive oriento minha filha, para sentir mais prazer e para isso ela
deve conhecer seu corpo”. “Educo-a com o seguinte princípio, em qualquer
relação busque o prazer, independente de ser ou não sexual, não fique
colocando chifre em cabeça de cavalo, sinta”.
A clareza com que ela relata a questão da repressão, de ter a noção que o
tema incomoda as pessoas e estranheza em atribuírem ao outro o prazer. “Rita em
off, eu nunca tive problemas em sentir orgasmos, e acredito que a masturbação
facilita esse conhecimento do corpo, mas achava no começo a uns dez anos atrás
que era estranho, ninguém praticar e não tocar no assunto, como se fosse, uma
doença ruim. Sinto necessidade de orgasmos, prefiro estimular meu clitóris sozinha,
a cumplicidade comigo é maior, parece e com o marido, não se pode demonstrar
realmente o que sinto”.
Todo o ato feito que gera prazer é repetido e isso pode ser constatado pela
afirmativa da entrevistada, quanto diz: “Me masturbo toda a vez que tenho vontade,
mais acho que deve ser três vezes por semana, não exijo do meu parceiro que ele
corresponda a todas as minhas necessidades sou sua parceira, esposa é pesado
antes de tudo sou mulher e isso me foi ensinado por M A (a próxima
entrevistada)”.
A transferência ao objeto para facilitar o prazer, mas não com a conotação de
substituir o pênis do parceiro, já que opta pela compra dos estimuladores de clitóris e
não pelos vibradores de penetração (formato de pênis), como também pode se
considerar um fetiche. “Prefiro os acessórios que estimulam meu clitóris, mas não
dependo deles, acho fashion”.
Antes do termino da entrevista ela fez questão de elucidar outros pontos,
como: “não comento com minhas amigas, porque elas não entendem, ou se
fazem de desentendidas, acho que esse assunto não diz respeito a ninguém,
converso com meu parceiro, acredito que ele esteve um tempo achando que
eu o traia, coisa de macho (machucado). M A compartilha das idas as lojas,
mas o trocamos confidências a não ser agora, você perguntando demais.
Ela é casada com o meu irmão, que por sinal é um desastre divino, um bobão.
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Ele sem sua Amélia seria atropelado por ele mesmo nós é que o colocamos
em cima dos trilhos (por bem ou por mal). Deixe isso para lá”.
Ela sugeriu que para um próximo estudo eu perguntasse “para a mulher se o
parceiro dela entende o que faz na cama e se entende caso saiba, o que é a
masturbação feminina e por que ela faz? o prazeres diferentes, lembre-se
marido não quer dizer homem/amante eles às vezes falham neste ponto, no
ser amante – ao menos o meu”.
CASO 05
A entrevistada de número 5, como foi comentado, é amiga de M, é casada,
e foi denominada de M A e, como ela, tem gestos e uma linguagem expressivos.
Tem 43 anos de idade, com graduação em Agronomia, mestrado em Solo, fluência
em inglês e é responsável pela área de Agricultura, com o cargo de direção
aproximadamente 7 anos, percebendo uma renda mensal de R$ 12 mil reais,
incluídas assessorias que faz nas horas vagas.
Ao ser argüida sobre como chegou a conhecer os sex shop, respondeu: “fui
levada a freqüentar pela jovem aqui do meu lado, quando começaram a surgir
problemas com o marido, mas não faço por estímulos externos trabalho
diariamente com aproximadamente 12 homens, que segundo as pessoas que
me visitam no trabalho tirariam qualquer mulher do sério, como acho que eles
trocam de casa, fico com o meu, ao menos conheço seus limites. São
impossíveis falta tudo, não crescem, o cérebro foi retirado junto com a
placenta (dá risadas)”.
O dado importante na afirmativa feita é a visão que ela tem em relação às
questões do casamento e do relacionamento, que perdura 15 anos, os problemas
que ela se referiu segundo a amiga sua imaturidade, ele ainda acha que tem 20
anos, portanto, sua responsabilidade é questionável, principalmente nas
coisas dos filhos (2)”.
M. A. complementa a resposta da amiga (M) “acreditava em amor
romântico, do século passado, hoje acredito na estabilidade, não em termos de
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dinheiro mais de relação, meu marido ganho mais ou menos o que eu ganho,
não disputo mercado com ele. Gosto da vida que levo, ao menos eu acho,
fiquei confusa (ri)”.
A repressão sexual surge no momento em que expõe sua opinião sobre a
educação das mulheres, como também a expectativa que a sociedade tem das
mulheres, o peso que elas carregam nos ombros. “As mulheres são criadas com
muita expectativa no outro, não em si mesmas. O resultado dessa educação faz com
que sua auto estima baixe e que sua felicidade fique na dependência do outro,
senão casar se transformará numa pessoa mal humorada, desagradável. E uma
velhice de solidão, como se casamento e os filhos fossem garantia de companhia e
final feliz. O discurso que ouvimos é ter alguém para garantir sua felicidade na
velhice” e poder freqüentar lugares onde solteiras são discriminadas”.
Na próxima fala podemos detectar o que ela pensa dos homens, sobre
mulheres que são resolvidas, independentes em todos os aspectos e colocam em
risco a posição deles de provedores.
“A pílula proporcionou a liberdade para a mulher, mas não é só isso, a
liberdade esta em poder comprar qualquer coisa e manter a si mesma e os seus
sem contar com as migalhas dada pelo marido ou pai, seja quem for. Os brinquedos
facilitam, mas não representam liberdade normalmente quem faz esse discurso
são os homens imagine alguém conviver com uma mulher assim, que não
depende mais deles e não é homossexual ou qualquer coisa. Ela escolhe os seus
parceiros e sabe o que quer deles”.
Para ela a confirmação de que sua maneira de pensar esta correta está na
afirmação de que entendi que ter marido e filhos pode significar solidão, tive
uma tia que morreu só, em uma casa para idosos, porque ficou doente e
ninguém quis cuidar dela (marido e filhos)”.
A busca pelo prazer retratada pela pulsão, pelo desejo são observados, na
seguinte afirmação: “Rita, a vida depende de nós mesmos e do que fazemos para
torná-la melhor. O prazer sexual também pode ser dado por nós a s mesmas. A
vida é muito curta para ficarmos remoendo fatos que nos recordam melancolia,
lembre-se do câncer. Tudo depende de nós mesmas, afinal se a mulher o decidir
por engravidar não há “cristo” que a faça pensar ou agir ao contrário”.
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“Entendo, que promiscuidade é aquela criatura que o busca a felicidade, o
equilíbrio e coloca seu prazer dentro de uma caixa de sapatos com tamanho
definido e aberto quando se precisa dele. Adoro me masturbar me realizo como
qualquer outra coisa que faço na vida”.
A transferência pode ser verificada, na próxima fala, como também um
fetiche. “Sapatos compro em lojas especializadas, roupas em boutique e vibradores
em lojas que vendem estes artigos. Não compro nada pelo correio, pois senão posso
tocá-los, pegar com as os, literalmente, não compro. Mariana às vezes pede por
catálogo (contei era segredo, dão risadas)”.
A entrevistada não tem um registro claro das vezes que repete a ação que lhe
causa prazer, inclusive despesas com objetos que também excitem o parceiro: “Não
sei quantas vezes faço isso por semana, sei que é mais do que uma,
principalmente se eu estiver tomando um delicioso banho na hidromassagem. Tenho
um consolo (brinquedo sexual com bateria em formato de pênis, utilizado para
penetração) e um golfinho (brinquedo sexual com bateria em formato de golfinho,
estimula od clitóris), venho nas lojas para ver as novidades, mas não compro os
vibradores sempre que venho, compro também calcinhas, fantasias e essas coisas.
Chego a gastar R$ 700,00, presentes para mim mesma e umas roupinhas para
seduzir meu marido que como diz M é -, ele é, não peça para explicar você
estará invadindo minhas entranhas. (Dá risadas)”.
No intervalo do cigarro, comenta suas preferências, como ler poesias de
Fernando Pessoa e livros sobre budismo, que para ela essa pratica acalma e
“auxilia a enxergar as coisas da vida com mais clareza”.
Inicialmente, a entrevistada não autorizou essa fala, no entanto, justifiquei a
importância de sua preferência com relação a utilização do recursos tecnológico,
inclusive o inconsciente agindo, o que acabou por resultar em sua permissão.
As próximas falas demonstram aspectos repressivos, inclusive no fato de não
ter se separado; outro aspecto importante é que o vínculo entre ela e o parceiro se
baseia no respeito e admiração que ela nutre por ele: “Não gostaria de que você
colocasse isso, mas prefiro o orgasmo clitoriano, o consolo uso com o marido, claro
que quando ele bebe além da conta, ele acha que a mulher fazer isso é promíscua,
puta de rua”.
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“Às vezes são complicadas numa relação duas pessoas se distanciarem
tanto, mas devo admitir gosto dele, não amor de poetas e ninfetas, mas tenho um
sentimento de respeito e admiração se não fosse isso teria me separado”.
Os relatos dos casos 5 e 6 se diferenciam muito pouco, dos anteriores, a
diferença está na maneira como as mulheres abordam a temática, umas se sentem
mais à vontade e outras, por timidez temerosa, principalmente, quanto ao sigilo,
quando a pesquisadora explica que o sigilo ético faz parte da pesquisa.
CASO 06
O caso de número 6 foi relatado por A P, graduada em Direito, com
especialização em Direito do Trabalho; aos 46 anos de idade trabalha como
assessoria jurídica numa empresa de veículos automotivos, 9 anos na função,
com fluência em inglês e italiano, conta com um salário mensal de 8 mil reais e
gasta, em média, R$ 400,00 nos sex shop.
No primeiro contato, ela comentou: “passo pouco tempo no Brasil, os pais
moram no Rio de Janeiro, e eu moro sozinha aqui, estive casada, mas o meu
trabalho e salário atrapalharam a relação, porque passo a maior parte do meu
tempo na Europa, venho para cá, por causa da carreira” e alega “não ter
talento, para ser a esposa ideal ou qualquer outra coisa que um homem ache
sobre como deve ser uma mulher. Não acredito no amor romântico ou alma
gêmea. Aprendi a me masturbar no período em que morei numa pensão, no
tempo de Faculdade”.
A pulsão pode ser verificada nos seguintes discursos: “busco nessas lojas
produtos que não o vendidos em outras, mas elas devem ser clean, limpas, sem
passar a sensação de escuridão, como algo feito nas sombras”. Acredito em
inovações, por isso compro vibradores (estimulador de clitóris) de vários tipos; gasto
conforme meu humor, em média 500,00. Os brinquedos erotizam a masturbação e a
liberdade gerada, refere-se ao poder de comprá-los. A independência financeira
facilita, mas o é isso, depende o que é prioritário e esses brinquedos como o
ato são para mim. Sexualidade refere-se à sexo; libido, gênero. Procuro as coisas
28
boas da vida, pois minha área de trabalho, às vezes, nos faz seguir leis que nem
sempre concordamos e pela função não posso me envolver em assuntos contrários
a masturbação feminina refere-se a um momento em que a mulher se despe só para
si, é ela com ela. Rita eu estou namorando, um senhor de 43 anos, ele é diretor
de uma empresa de papel e celulose, não converso com ele sobre temas como
a minha sexualidade, acho que ainda não é hora”.
O inconsciente revela-se quando diz: “não preciso de filmes para me
masturbar, mas, às vezes, presencio uma cena erótica e aproveito o momento, com
discrição. Não recebi orientação sexual em casa, na Faculdade, em conversas e
leituras descobri certas coisas, que não vou revelar. Não me sinto promíscua ou que
cometo algum pecado mortal, isso diz respeito a mim mesma e a mim interessa,
ninguém tem nada com isso. Gosto de ler romances, mas dou preferência para
as biografias, faço pensando na minha carreira e em ter momentos comigo
mesma”.
A entrevista foi encerrada e não ocorreram outras, pois a entrevistada estava
com viagem marcada para o exterior, a trabalho.
CASO 07
A entrevistada de número 7 recebeu o nome de M J, tem 36 anos de idade,
formada em Comércio Exterior, Especialização em Propaganda, fala com fluência
inglês e francês. É solteira, tenho namorados, nunca recebi propostas de
casamento. Adoro namorar, por isso sempre tenho um. Não moro com
ninguém e não admito que freqüentem minha casa, como também, não pago a
conta para ninguém, talvez por pensar assim, esteja sozinha”.
Trabalha como gerente comercial de uma empresa que exporta madeira,
preferencialmente para o mercado comum europeu. Recebe, aproximadamente, R$
7.000,00, não incluso os benefícios e gasta em média nos sex shop R$ 300,00.
A pulsão é revelada no seguinte discurso: “compro o que quero e por favor,
vibrador vou comprar em açougue (pede desculpas, pelo cinismo). Tem 03
vibradores, todos com nome. Os brinquedos facilitam a ação e são charmosos. Me
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masturbo desde a adolescência, gosto de sentir orgasmo induzido (quando ela faz)
ou seduzido (quando sente provocado pelo carinho de alguém). Adoro homens
inteligentes, se for burro deixo falando sozinho, como detesto ser chamada de
gostosa. Você me perguntou qualquer coisa sobre prazer sexual, para mim é sentir
orgasmo, mas não são todos que me levam a essa sensação/realização, as vezes
prefiro não começar, só faço quando estou a fim, o outro é outro”.
No discurso dessa entrevistada, podemos constatar que sua prioridade no
momento é a sua carreira, “espero ocupar cargos mais altos na empresa que
estou, gostaria de morar na França ou Espanha, sou muito respeitada no local
de trabalho e isso me realiza, apesar da competição com homens. o sei
dizer o que é sexualidade talvez envolva sexo, mas não é só isso, eu acho.
Ou é?”.
Pode se identificar o inconsciente no momento em que revela: “Rita eu acho,
que na relação sexual a gente acaba competindo, fingindo emoções que não se
sente, para agradar o outro, isto às vezes, me parece confuso, parece que falta
maturidade nos homens e até nas próprias mulheres. Não recebi orientação
nenhuma, como também não me sinto pecadora, apesar de ter uma tia freira,
entre nós, acho que ela pratica também (brincadeira)”.
CASO 08
A entrevistada de número 8 recebeu o nome de V. L., completou 50 anos de
idade, economista, com especialização na área de Finanças e Marketing, fala por
exigência da profissão e do cargo, é consultora executiva de uma empresa que atua
na área de petróleo e seus derivados e fala francês, inglês e italiano. Recebe
mensalmente, R$ 12.000,00 mil reais por mês e gasta, em média, nas lojas de sex
shop R$ 900,00.
Quando indagada sobre a freqüência em sex shop ela respondeu: “estou
debutando nas lojas brasileiras, na Europa e Estados Unidos tudo é mais
acessível, você encontra essas lojas em shopping, aqui ainda não vi nenhuma.
Freqüento esta por ter um bom atendimento e ficar no Centro de Curitiba”.
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V. M. me concedeu a entrevista, porque uma amiga em comum, explicou as
minhas intenções com o trabalho e sua seriedade, e nesta fala pude observar o
inconsciente “Estou fazendo a entrevista porque uma amiga nossa em comum, falou
do seu tema e da seriedade com que você trata essas questões. tenho lido
artigos que falam de uma mulher sofredora, pobre, lésbica e as mulheres como eu
onde estão”.
Na fala a seguir, ela explica sobre a utilização dos brinquedos e me fornece
alguns dados de sua vida pessoal “esses brinquedos também são comprados
pelas moças de programa, mas os utilizam em sua grande maioria para realizar
a fantasia dos clientes, eu acho. Para mim, são o símbolo da mulher
contemporânea, agora podemos nos dar prazer. Homens e mulheres são
iguais, respeitadas as diferenças, pois o bom esta na diversidade. Sou frágil,
mais o homem também é. Sempre me masturbei sem recursos, agora os utilizo
porque posso comprá-los. Fui casada, 30 anos, terminou porque tudo termina,
o que não acaba é a relação da mãe com os filhos, isso é eterno. Tenho um
filho que me fez o favor de me dar um neto, queria matá-lo na época, mas
agora vejo que ser avó é lúdico. Por enquanto, dou presentes, conselhos
mais tarde, agora brincamos. Tenho um parceiro só para os bons
momentos, dividir espaço não. Passei por problemas sérios na vida e aprendi que
tudo se torna mais fácil, quando mantemos a esperança e o humor, a alegria ajuda a
superar os problemas e isso consegui, a masturbação ajuda a relaxar”. Nesta fala
podemos identificar o desejo realizado que irá ser repetido.
“Perdi uma mama e meu casamento acabou, me senti mutilada, mas
hoje, reconheço foi uma doença que eu provoquei, e prometi para mim mesma,
viver bem para poder partir bem”.
A pulsão dessa entrevistada é revelada, no momento em que diz: “sou
consultora de uma empresa onde os homens comandam, ou seja, comandavam a
eu chegar, não me sinto atraída por eles e talvez por isso achem que sou lésbica.
Engano deles, eu me dou prazer e passo isso para os outros ai fica mais fácil ser
notada e galgar os “píncaros da glória”, horrível essa expressão, parece coisa da
década de 20. Ter 50 anos é entender que o pior nosso é nosso e o melhor
também, para que se preocupar com o amanhã se não temos certeza de que
31
teremos um amanhã. Rita vivo um dia após o outro e se tenho tempo me dou ao luxo
de “gozar” sozinha; é fabulosa a sensação de estar consigo mesma”.
Essa entrevistada pode ser definida como uma otimista, com os pés no chão,
cônscia de suas responsabilidades e, apesar de tudo, afirma “meu universo
imaginário não tem limites, vôo mesmo quando não tenho asas”. Ela explica essa
frase da seguinte maneira, “as amarras Rita, estão na nossa mente, se tenho a
capacidade de me aprisionar, porque não criar asas e voar, isso é muito mais
prazeroso”.
Os relatos das entrevistadas de números 9 e 10, são breves anotações,
porque não autorizaram que eu relatasse, na íntegra, suas opiniões sobre o tema.
Portanto, só fiz o registro de alguns dados em casos relevantes ao tema.
CASO 09
A M C, 50 anos de idade, gerente de negócios de uma empresa de
investimentos é casada com alguém, que segundo ela, “é bom, pois afinal estou
com ele até hoje”. A pulsão surge quando confessa que se “estimula com a
imagem e gosta de assistir cenas picantes, não pornôs, mais que estimulem a
imaginação”. Confessou sentir apenas o orgasmo clitoriano.
A repressão é notada quando “eu achava que prazer e orgasmo era coisa de
puta e quando a mulher se torna mãe, o prazer deve ser em ver os filhos felizes;
após a separação fui em busca de tratamento psicológico para resolver a depressão
e por aconselhamento médico, comecei a usar os estimuladores; sou católica e, sei
muito bem, os males que a Igreja causou para nós, depois de informação vinda de
amigas e de algumas leituras, como, O código da Vinci. A mulherada sempre foi
sacaneada”.
32
CASO 10
B, 46 anos de idade, envolvida com publicidade e propaganda, não revelou a
empresa em que trabalha, mas admitiu ter uma renda mensal de R$ 14 mil reais e
foi aprender a se masturbar, “quando arranjei um amante, que me ensinou os
primeiros passos”. Hoje esta com o marido e tenta mostrar que se ela e ele se
masturbarem a relação ficará melhor, com mais sincronia (aqui pode-se observar a
pulsão).
Os aspectos em comum com estas entrevistadas além do fato de não terem
autorizado as anotações, foram que elas se masturbam com as mãos, ou com a
utilização de um estimulador de clitóris em formato de ovo com uma bateria que é
acoplada à calcinha, com um dispositivo de liga/desliga que pode ser deixado pelo
lado externo da saia, fixo no cinto, facilitando assim o seu funcionamento.
4 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS RELATOS
Um dos pontos assinalados como relevantes pela pesquisadora, no estudo,
foi a constatação de que todas as entrevistadas apresentavam um perfil educativo
repressor, todas são oriundas de famílias católicas e freqüentaram escolas
confessionais. Portanto, implicitamente, apresentavam alguns resquícios da
repressão sexual, imputada às mulheres da Idade Média, no período em que a Igreja
Católica detinha o poder absoluto estudado por alguns autores como: Leal (c2004),
Perrot (1998; 2001), Silva (1995) entre outros. O que faz parte do inconsciente
dessas famílias, e de certa maneira, influenciou alguns comportamentos repressivos,
que possivelmente tenham sido superados pelo processo terapêutico, que sete
delas vivenciaram, auxiliando-as a transpor o discurso negativo sobre a pratica da
masturbação.
A Igreja Católica na Idade Média cultivou a misoginia entre os adeptos,
favorecendo o domínio do homem sobre a mulher e mesmo transformando o
casamento em um sacramento, ditando regras para domesticá-lo e discipliná-lo
conforme a sua ideologia; as relações sexuais não deveriam ser praticadas com
33
luxúria, como por exemplo, após o jantar, e em determinados dias da semana
(segunda, terça, quinta e sábado), conforme Samara (1988) e Silva (1995), isso vem
confirmar o discurso da Igreja, onde o sexo era permitido para procriação,
negando o prazer.
A mulher não tinha o direito de manifestar seu gozo e o orgasmo pleno nem
deveria ser cogitado; comportando-se com dignidade, o homem poderia ejacular,
mas com discrição.
Para o homem o casamento era uma excelente relação, pois continuava com
sua liberdade, mas, para a esposa, restava a monotonia e a negação.
Eva passa a ser o símbolo do pecado e da perdição e a Virgem Maria é
elevada e cultuada, servindo como modelo para as mulheres. As mulheres que não
seguissem esse modelo e expressassem algum tipo de poder, eram punidas. Assim,
nesse período (séculos XIII ao XVIII), ocorre a fase mais obscura e abominável da
história, a caça as bruxas. As mulheres caçadas eram culpadas de exercerem sua
sexualidade e de manterem relações sexuais supostamente com o diabo (SILVA,
1995).
Na Idade Média a frigidez feminina passa a ser norma; a mulher orgástica, ou
era considerada prostituta ou tinha pactuado com o demônio, era uma bruxa.
A libido feminina, desde aquela época passa a ter regras, isto com o objetivo
de controlar, frustrar a mulher, e demonstrar o poder de uma sociedade patriarcal
(SILVA, 1995).
Todo esse processo de frustração, de controle da libido feminina, acaba por
gerar na mulher uma doença, que foi considerada feminina - a histeria levando ao
enclausuramento em sanatórios para tratamento de doentes mentais.
Na Modernidade essa doença foi foco de aprofundamento dos estudos do
criador da psicanálise, Freud, que descobriu, durante os atendimentos clínicos em
suas pacientes diagnosticadas como histéricas que estas, ao reprimirem emoções,
poderiam apresentar sinais de histeria, mas, ao falarem, faziam desaparecer
momentaneamente os sintomas ou então os deslocavam para o corpo. Levando-o a
concluir que os sintomas apresentados por suas pacientes estavam intimamente
ligados à sexualidade e surgiam como uma defesa necessária contra uma
representação sexual intolerável (SILVA, 1995, p.21). As descobertas feitas por
34
Freud, irão alterar completamente a visão dos médicos da época sobre a
sexualidade feminina (ênfase que se dada na parte pertinente aos quatro
conceitos psicanalíticos).
Em termos nacionais, observamos, pelos estudos de historiadores, relatos de
famílias, no período anterior, e logo posterior à Proclamação da República, em que
as jovens em idade de contrair matrimônio eram enviadas para conventos com
objetivo de preservarem sua virgindade, como também recebiam orientação das
mães para servirem ao esposo, que havia sido escolhido pelo pai (SAMARA, 1998 e
SILVA, 1998).
No Brasil do século XXI ainda observamos mães educando suas filhas para o
bom casamento, tendo como exigência primeira a virgindade e o desconhecimento
da própria anatomia feminina.
Outro exemplo sobre a repressão feminina e a extirpação do desejo, no
século XXI, se refere a certas tribos da África e no Oriente Médio, que violentam
suas mulheres, mutilando-as mediante a excisão do clitóris e a costura dos grandes
lábios. Essa pratica retira da mulher a experiência do orgasmo, além de gerar
esterilidade, frigidez e distúrbios psicológicos irreversíveis (SILVA, 1995, p.171).
Além do discurso da Igreja com relação ao pecado da mulher para reprimi-la,
a sociedade patriarcal cria um outro mecanismo para controlar o desejo sexual da
mulher e seus direitos, o amor romântico, a lenda do príncipe encantado, que rouba
a amada da torre do castelo, representado pelo jugo do pai. Uma questão que é
observada nos casos de números 2, 3 e 5 das entrevistas.
Esse conceito de amor surge na Europa Renascentista, onde apareceram as
cortes de amor; o amor romântico, que servia de inspiração aos poetas e, no fundo,
era uma forma de impedir a entrada do feminino na nova cultura da Renascença, a
que e, mais tarde, resultaria no Capitalismo. Esse mecanismo de impedimento tinha
um caráter cerceador da liberdade feminina, transformando-a em um ser frágil, dócil,
a espera de seu príncipe encantado e o homem em uma figura dinâmica, que tinha
como principal missão resgatar a mulher aprisionada num castelo (LINS; BRAGA,
2005 e LEAL, c2004).
35
Esse pensamento pode ser observado ainda no imaginário de algumas
mulheres do século XXI, como foi dito, pois ainda nos defrontamos com discursos
em que o orgasmo sexual só atingirá seu clímax com um único parceiro.
Como pode se observar, nos relatos apresentados, a questão da repressão
sexual ainda continua sendo uma pratica da sociedade atual com raízes no
pensamento medieval.
Outro ponto de destaque no discurso das entrevistadas se referiu à pulsão, o
desejo sexual, diferente das mulheres da Idade Média e de algumas do período
atual, elas buscam a satisfação desse desejo, mediante a masturbação e/ou auto-
estimulação do clitóris, com a utilização, ou não, dos brinquedos sexuais.
Devemos lembrar que a mulher da Idade Média, tinha sua sexualidade
reprimida, inclusive a auto-estimulação era regalia permitida somente ao homem.
A questão da transferência, entendida no texto como deslocamento, é
detectada no momento em que elas afirmam que se utilizam, do recurso tecnológico
como fonte estimuladora de prazer e repetem a ação por atingirem o orgasmo
clitoriano, ou seja, transferem para o objeto de desejo mesmo não existindo a
penetração. O surgimento desses recursos é datado do século XVII, conforme
detalhamento ser abordado no item 5, deste capítulo.
A contribuição teórica de Lacan, sobre o fenômeno da desconstrução da
figura do pai, da passagem a um outro modelo familiar no qual ele deixa de ser o
patriarca, diferente da família ocidental do século XIX e XVIII destacado, nos auxilia
a compreensão das mulheres pesquisadas, levando-nos a acreditar no surgimento
de uma nova sociedade e conseqüentemente, de uma estrutura familiar diversa.
5 OS RECURSOS TECNOLÓGICOS PARA O PRAZER FEMININO
Para efeito deste estudo serão abordados os recursos tecnológicos com
baterias acopladas, ditos brinquedos sexuais, para o prazer feminino, via
estimulação clitoriana, comercializados nas lojas especializadas, denominadas
popularmente de sex shop e adquiridos pelas entrevistadas. um vasto número
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desses recursos tecnológicos disponibilizados no mercado desses recursos
tecnológicos, que objetivam facilitar a masturbação ou auto-estimulação feminina.
Os primeiros brinquedos sexuais, segundo a literatura, surgiram no século
XVII, em substituição ao toque terapêutico dado pelo médico responsável pelo
tratamento de mulheres que apresentassem um desejo sexual desenfreado ou o
‘furor uterino’. O toque terapêutico era uma técnica médica, aplicada no órgão
genital feminino, resultando em um orgasmo. Nos dias de hoje, o médico que aplica
esse tipo de tratamento terá sérios problemas em sua carreira. Segundo Maines
(1999, p. 48)
levar mulheres histéricas ao orgasmo usando uma técnica manual, exigia do médico
uma habilidade especial. Ele tinha que ajustar a intensidade da massagem e ter
força para sustentar o tratamento por tempo suficiente para que os resultados
ocorressem.
Para substituir esse toque terapêutico, foram inventados métodos
engenhosos, como, duchas frias, cadeiras de balanço, um mecanismo que
funcionava à corda chamado de percutador, e consistia em acariciar a vulva
acoplada a um manipulador a vapor que com movimentos ritmados massageava a
região pélvica da mulher através de uma abertura especialmente projetada em uma
mesa acolchoada (MAINES, 1999, p.48).
Os primeiros vibradores elétricos surgiram com a Revolução Industrial. Estes
dispositivos eram portáteis, mais eficazes que os dedos e de modo mais confiável
que os seus predecessores, aqueles que eram acionados por uma corda ou a vapor
e que paravam freqüentemente antes da conclusão do tratamento. Para os médicos,
da época, os vibradores elétricos encurtavam o tempo que eles teriam que gastar
para manipular os órgãos genitais das pacientes.
Os brinquedos sexuais (aparelhos destinados a facilitar o orgasmo feminino
e/ou masculino com ou sem companhia de alguém, e outros acessórios),
desenvolvidos após a Revolução Industrial destinam-se, basicamente, à satisfação
individual ou a satisfação do casal, existindo uma gama variada de modelos,
inclusive aqueles que podem ser utilizados com o parceiro ou parceira. Deve-se
esclarecer que, atualmente, a maioria desses recursos são patenteados e passam
por um rigoroso controle de qualidade, que alguns podem ser introduzidos nos
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órgãos genitais. Todos esses aparelhos são reconhecidos pelo Departamento de
Patentes dos Estados Unidos, ou pelo país responsável pela invenção.
Os séculos XX e XXI caracterizam-se pelo grande avanço tecnológico
impulsionado pela sociedade capitalista. Isto tem resultado nas mais variadas formas
de obtenção da lucratividade.
Nesta perspectiva, a proliferação da indústria do sexo resulta também de
outros fatores como, por exemplo, a discussão sobre a sexualidade da mulher,
principalmente nas questões que dizem respeito ao seu prazer com ou sem parceiro.
Estudos recentes, referente à anatomia feminina e sua sexualidade, apontam,
por exemplo, “uma anotação feita pelo ginecologista Robert Latou Dickinson, na
década de 40, do século XX, onde ele relatava ter observado uma variação na
genitália feminina, semelhante a uma minhoca, o clitóris, até então ignorado” (LINS;
BRAGA, 2005, p.106). Outros estudiosos e pesquisadores como “Thomas Laqueur,
Masters e Johnson também identificaram um sistema clitoriano, concluindo que o
verdadeiro órgão sexual feminino também é composto pelo clitóris” (LINS; BRAGA,
2005, p.205).
Assim, graças a esta descoberta com suporte fundamentado na literatura
médica, sabe-se que o clitóris também é o responsável pelo prazer, pois sem sua
fricção o prazer vaginal é atingido com certa dificuldade.
Por intermédio dessas novas informações com relação ao clitóris, a indústria
do sexo inicia um processo de produção de recursos tecnológicos, voltados para o
prazer clitoriano e vaginal da mulher, produzindo diferentes estimuladores e
disponibilizando-os para compra em sex shop, sites na Internet que comercializam
esses produtos.
As primeiras vendas de brinquedos sexuais surgem, no Brasil, a partir de
1980, aproximadamente. No início, (e até hoje), as vendas são feitas por indicação
(uma amiga recomenda outra para a vendedora e essa vai a casa da cliente com os
objetos), à distância pela Internet; os primeiros sex shop, surgem em locais
‘discretos’ e, apenas a partir de 1990, passam a ser encontrados em ruas centrais
das grandes capitais brasileiras. No caso de Curitiba, essas lojas ainda não fazem
parte do complexo logístico dos shopping centers.
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Essas lojas, conhecidas como sex shop, ou sex boutique, são locais
específicos para a comercialização de produtos eróticos como vídeos, livros, DVDs,
roupas íntimas, brinquedos sexuais, cremes, pomadas entre outros. Enfim, todos os
recursos disponíveis no mercado, com preços variados, em que os freqüentadores,
tanto homens como mulheres, podem beneficiar-se.
Nesse comércio, segundo a presidente da Associação Brasileira das
Empresas do Mercado Erótico e Sensual, com sede no Rio de Janeiro, “as mulheres
representam 70% dos consumidores de sex shop espalhados pelo Brasil, setor que
movimenta mais de R$ 700 milhões por ano” (BARTEL, 2006, p. 6), o sexo feminino
busca apimentar suas fantasias sexuais. Deve-se observar que aos menores de 18
anos a entrada é vedada; caso consigam burlar a segurança (vendedores), para
adquirir os produtos devem apresentar carteira de identidade.
A propaganda dessas lojas é veiculada na mídia em alguns canais de
televisão e emissoras de rádio, como também em programas que envolvem o tema e
que são apresentados depois das 22 horas. Apesar dessa abertura, ainda se pode
observar um certo constrangimento sobre o assunto, que os destaques são
direcionados aos temas que abordam a saúde sexual, relacionamento afetivo e o
orgasmo a dois.
Os preços desses brinquedos podem variar de R$ 15,00 (quinze reais) a R$
500,00 (quinhentos reais). Os fatores que influenciam seu valor decorrem do tipo de
material utilizado na sua produção como: silicone, cyber skin (material com
qualidade acima do látex e do silicone, parecido com a pele humana), tex,
acoplados com bateria ou não, enfim, quanto mais incrementados pela sofisticação
tecnológica, mais caros serão. Em anexo (Anexo 3), encontram-se ilustrações de
dois modelos patenteados e outros disponíveis para compra nos sex shop.
39
CAPÍTULO 2
A PSICANÁLISE E OS QUATRO CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE LACAN
Apresento, neste capítulo, o olhar psicanalítico sobre a sexualidade feminina,
procurando esclarecer que muitas ‘doenças malignas’ que acometiam as mulheres,
na Idade dia e na Idade Moderna, eram resultantes do processo repressivo que
elas sofriam, negando-lhes o prazer do gozo e exigindo-lhes um comportamento
dócil, uma subserviência primeiro ao pai depois ao esposo e filhos.
Apresentamos a seguir, notas voltadas à contextualização de Sigmund Freud
e sua percepção sobre a mulher, questões sobre o complexo de Édipo e o
sentimento de castração gerado pela falta do falo, que trarão luz às reflexões
propostas sobre nosso objeto de estudo.
Da teoria psicanalítica de Lacan destacamos os quatro fundamentos, que
foram utilizados para categorizar conteúdos presentes nas entrevistas, efetuadas
nesta pesquisa: repressão, pulsão, transferência e repetição. A escolha desse autor
teve o objetivo de embasar a categorização motivada pela forte presença da
Psicanálise na vida das entrevistadas.
Com relação a este capítulo verifica-se que, as doenças tidas como
exclusivamente femininas e consideradas ‘malditas’ desde a Idade Média (ênfase
para a histeria e a angústia), continuam a receber o mesmo olhar preconceituoso da
sociedade. Inclusive atualmente, como conseqüência da sociedade patriarcal,
apesar de os homens também apresentarem sintomas de depressão e angústia, a
doença é encarada como uma conseqüência atrelada à busca do homem pelo
sucesso material, nunca com questões que envolvem sua sexualidade.
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1 A PSICANÁLISE
A Psicanálise² surge em 1922, num momento em que as mulheres sofriam
imposições feitas pelo patriarcado e que padrões de comportamento eram ditados
pelos homens que, além de detentores do poder financeiro, transformavam-nas ‘em
esposas’ com o objetivo de garantir a sobrevivência da espécie, a perpetuação do
nome e também sua satisfação sexual. Dessa forma, deveriam ter como qualidades
principais a abnegação e submissão, tornando-se mães prestimosas e cuidadosas
além de uma fêmea completa para o prazer masculino. No entanto, o prazer lhes era
negado e se ousassem manifestar seu desejo pelo orgasmo, eram consideradas
prostitutas e/ou doentes, com desvios de comportamento. O prazer e o orgasmo
feminino foram, e ainda são, considerados subversivos. No entanto, o homem, por
sua vez, buscava/busca o seu prazer e a realização de seu gozo, inclusive em
relacionamentos extraconjugais, comportamento este validado pela sociedade e
abordado por autores como Foucault (1986); Rago, (1987); Silva (1995) Grant
(1998); Stringuini (2001).
A repressão sexual, atribuída às mulheres causava, em algumas delas,
sintomas diagnosticados como histeria, uma doença considerada feminina por estar
atrelada aos órgãos sexuais femininos, parte do corpo da mulher geralmente
desconhecido pelos homens.
Qualquer tentativa da mulher em tentar buscar seu prazer ou discuti-lo era
tratado como um comportamento anormal. Silva (1995, p.26), ao se referir à histeria
afirma: “a besta negra, tal como chamavam os médicos, era não uma doença
maldita por tudo que representava de irregularidade, instabilidade; como também
encarnava um sexo culpabilizado pelo desejo que provocava nos homens”.
²1) Um método para a investigação de processos mentais de outro modo inacessíveis; 2) um
conjunto de teorias psicológicas e psicopatológicas em que são sistematizados os dados introduzidos
pelo método psicanalítico de investigação e de tratamento (LAPLANCHE; PONTALIS, 1967, p.495).
41
A histeria marcava, como ainda marca, a mulher que, após cumprir sua
missão, ditada pela sociedade patriarcal (de mãe dedicada e abnegada), deparava-
se com a saída de casa dos filhos em busca de novos rumos, restando-lhe apenas
os afazeres domésticos e uma convivência diária com o esposo em um universo de
faz-de-conta, em muitos casos, consciente dos relacionamentos extraconjugais.
O desejo feminino era reprimido e castrado, gerando, muitas vezes, reações
comportamentais diagnosticadas como insanidade mental, furor uterino, histeria,
pecado e pactuante com o demônio (MARTINS, 2004, p.113-114).
Hoje, ainda, podemos observar que algumas mulheres, conversando entre si
sobre o tema, julgam pejorativamente outras que por vivenciarem sua sexualidade
diferente dos padrões ditados pela sociedade são colocadas num limbo, taxadas de
’mulheres fáceis’, ’oferecidas’ e de ’ninfomaníacas’.
Sigmund Freud (1856-1939), um médico austríaco, neurologista, criador da
Psicanálise, apresenta ao mundo o inconsciente, “enunciado com um prefixo
negativo in que o situa como um espaço, uma zona, um lugar além ou oposto à
consciência, a soma dos efeitos da linguagem num sujeito”³ (CESAROTTO, 2005,
p.38).
Freud tornou-se um dos maiores pensadores do culo XX. Um dos pontos
mais decisivos de sua teoria foi modificar a noção de sexualidade, colocando por
terra as concepções sexuais existentes, no final do século XIX, consensuada entre
os médicos da época (LINS; BRAGA, 2005, p.255). Todo o comportamento sexual
que fugisse a esse quadro era considerado desvio, conduta anormal e sinal de
depravação moral.
³ Sujeito, capacidade da palavra que, ao dizer mais que o esperado, acabou revelando um
desejo do qual não se tinha notícia anteriormente (CESAROTTO, 2005, p.38).
42
Para Freud a sexualidade “não se limita à função dos órgãos genitais e
desperta muito cedo, logo após o nascimento. Uma série de excitações e atividades,
presentes desde a infância, proporcionariam prazer” (apud LINS; BRAGA, 2005,
p.255). O fato de ele ter descoberto a sexualidade infantil levou muitos médicos da
época a rejeitarem sua teoria, pois o argumento estaria “profanando a inocência da
infância” (apud LINS; BRAGA, 2005, p.255), mesmo que tenha explicado que a vida
sexual das crianças é diferente dos adultos.
Freud se aprofundou nas questões relacionadas à natureza e ao tratamento
dos sintomas psíquicos, mais precisamente a histeria, tema que despertou sua
atenção. Descobriu, durante os atendimentos clínicos em suas pacientes
diagnosticadas como histéricas, que ao reprimirem emoções poderiam apresentar
sinais de histeria, mas, ao falarem, faziam desaparecer momentaneamente os
sintomas ou então os deslocavam para o corpo somatizando-o. Isto leva Freud a
concluir que os sintomas apresentados por suas pacientes estavam intimamente
ligados à sexualidade e surgiam como uma defesa necessária contra uma
representação sexual intolerável.
Para Freud (1998) a sexualidade humana não tem por objetivo natural o único
e estanque propósito de reprodução da espécie. Também não ocorre seguindo um
padrão, ou seja, o ser humano não se relaciona sempre com alguém do sexo
oposto. Ele não almeja necessariamente o prazer sexual sem sofrimento. Pode-se
dizer o mesmo da mulher.
A sexualidade não precisa ser expressa por meio dos órgãos genitais,
cabendo-nos aqui observar que, sexual para a psicanálise “é um conjunto de
atividades sem ligações com os órgãos genitais, não se devendo, portanto, confundir
o sexual com o genital” (LINS; BRAGA, 2005, p.255), podendo, ser praticada
utilizando-se de outras partes do corpo, como por exemplo, adornos e/ou adereços;
seu início não ocorre em uma idade ou situação predeterminada, como também, não
precisa acontecer na relação ou na presença de um outro ser humano, podendo se
dar com animais (caso dos praticantes de zoofilia), objetos (pessoas que introduzem
em seus órgãos genitais garrafas entre outros), ou mesmo com o próprio corpo,
denominada de auto-estimulação e/ou masturbação e imaginação.
Segundo Battaglia (2005, p.16):
43
Freud não só constatou, mas teorizou a respeito da inexistência de um caminho
natural para a sexualidade humana, que se manifesta por meio de desvios perversos
e polimorfos. Não há, portanto uma maneira única de satisfazer o desejo (sempre
sexual), o que confere ao humano a sina de estar sempre insatisfeito frente a este.
Esses desvios foram considerados como pulsão sexual, sempre variável,
portanto, exercida de formas parciais, e “não em instinto, que vem a ser padrão de
comportamento próprio de cada espécie animal. A libido é o que penetra, percorre e
marca o corpo, sinalizando-o pela premência de ser satisfeito” (BATTAGLIA, 2005,
p.16). Isso seria conseqüência oriunda, no início da vida de cada bebê, onde existe
um tempo mítico, em que todas as suas necessidades são satisfeitas pela mãe, e
que seria o retorno a essa experiência de satisfação que o indivíduo buscaria pelo
resto de sua vida, jamais encontrando. Esse não encontro gera um trauma, como um
gozo enorme que o invade, tornando-se a expressão da função pervertida da
sexualidade que a criança experimenta como sendo própria, e isso se
precocemente (BATTAGLIA, 2005, p.16).
Para se afastar desse trauma sexual e do encontro com a imagem de si
mesmo, o sujeito para se salvar da submissão ao Outro, precisa sustentar o seu
próprio desejo.
Entenda-se o outro, não como semelhante ou parceiro com quem o sujeito buscará
identificar-se, mas como aquele que está para além de uma dimensão imaginária,
sendo o portador de um tesouro de significantes. Isto é, uma instância que é feita de
palavras e que as portas até o indivíduo, permitindo-lhe aceder às representações e
assim estabelecer diferenças entre aquilo que aparentemente ou imaginariamente
pode parecer semelhante. Incluam-se a diferença entre os sexos e as gerações
que estabelecem as relações de parentesco. Quem primeiro ocupa esse lugar de
Outro para a criança, é aquele que exerce a função materna (BATTAGLIA, 2005,
p.14).
Para Freud (1998) isto tem a ver com a perda da simbiose do bebê com sua
mãe, o resultado disso será a constatação da incompletude humana e a mortalidade
do homem.
Apesar de criar essa nova maneira de analisar o indivíduo e a histeria, Freud
não consegue se livrar da origem: a limitação dada pelo complexo de Édipo (primeiro
encontro da diferenciação sexual). A mulher, mesmo na teoria freudiana, não é
observada como alguém que ultrapassa a figura da mãe: “toda a sua teoria acerca
de feminilidade confirma o mito paterno, na origem, meio e fim do processo sexual
da mulher” (SILVA, 1995, p.30).
44
A mulher, analisada por Freud, tinha o estigma de representar a imagem e ter
semelhança com a Virgem Maria, exigindo dessa mulher um comportamento de
castidade e reclusão, uma vez que o desejo pelo prazer era uma experiência que
deveria ser vivenciada somente pelo marido. Em decorrência disso, a mulher negava
a sua feminilidade e seus desejos, já que eram vistos como uma “necessidade
maligna e doentia” (SILVA, 1995, p.30).
Ao abordar a questão do psiquismo ou do inconsciente feminino, Freud
definiu três destinos e suas prováveis conseqüências:
a) diante do sofrimento imposto pela realidade sexual da Falta da mãe (a menina
descobre que ela não é o falo de sua mãe e também que não tem um pênis, gerando
o complexo de castração), a filha se sentindo rejeitada pelo pai, pode; b) sentir-se
decepcionada pelo pai e regredir para a mãe, com a conseqüente recusa da Falta;
nesse caso, pode tender para a homossexualidade; em ambos os casos o pai não foi
suficiente para representar uma metáfora capaz de arrancá-la do envolvimento
materno; c) e o último aponta para a saída edípica, a menina renuncia à mãe-fálica e
aceita a Falta, deslocando seu desejo para o falo do pai, imaginariamente capaz de
lhe compensar a falta de um pênis por um filho. Assim sendo, a reação da menina à
castração (mãe) define o modo como irá vivê-lo na relação edípica com o pai (SILVA,
1995, p.141).
Freud observou e analisou uma mulher em que sua opinião ainda era
secundária, restrita somente aos aspectos relativos à educação dos filhos e afazeres
domésticos, vivia como uma sombra; onde sua função principal era de gerar filhos
perfeitos e manter impecável a casa e “as coisas do marido”, respondendo
prontamente às necessidades sexuais do marido e somente as dele.
Freud reduziu, conforme destaca Silva (1995, p.141) “a mulher a uma cópia
invertida do homem, a diferença sexual seria nada mais nada menos do que o
reflexo especular daquilo que se processa segundo o psiquismo masculino”.
Todavia, observe-se que na época de Freud o pano de fundo era a negação dos
direitos das mulheres e a articulação feminina. Éramos e ainda somos, em muitos
casos, tratadas como seres secundários. Atribuía-se à mulher, uma emotividade e
intuição exageradas, além de suas peculiaridades orgânicas ligadas à maternidade,
justificativa dada para abalizar sua inferiorização.
No momento histórico pelo qual passava a sociedade, na época de Freud, os
avanços tecnológicos, caminhavam lentamente, da mesma forma, as descobertas da
medicina. Apesar de sua teoria com relação à sexualidade feminina apresentar para
45
alguns, uma conotação machista, não se pode negar sua contribuição e importância
para o esclarecimento da questão da sexualidade e também de ter sido perceptivo
para detectar que não “havia compreendido bem a mulher, deixando várias
interrogações que os posteriores a ele não souberam responder psicanaliticamente,
resvalando para psicologismos e teorias contraditórias” (SILVA, 1995, p.141).
O prazer feminino sob a percepção freudiana continuou sendo
incompreendido, no entanto, não se pode negar que é a partir de Freud que
sexualidade passa a ser estudada de forma diferente.
2 LACAN E O FEMININO
Com Jacques-Marie-Émile Lacan (1901-1981), a sexualidade feminina passa
a ser observada de forma diferente de Freud, seu analista. Psicanalista e filósofo
francês, suas idéias de fundo estruturalistas abalaram o cenário psicanalítico, a partir
da década de 1960. Lacan foi uma das figuras dominantes na vida cultural francesa
e do estruturalismo, repensou todo o sistema criado pelo Pai da Psicanálise, Freud.
Acreditava que todo o questionamento freudiano deveria passar por uma
interrogação de cunho filosófico e isto resultou em sua expulsão da Associação
Internacional de Psicanálise - IPA, órgão mais influente à época.
Para ele a psicanálise havia perdido o sentido original, e, como conhecedor
profundo da obra de Freud, valendo-se do estruturalismo e da lingüística,
reorganizou conceitos psicanalíticos, marcando, com isso a influência recebida de
Saussure (1857-1913) e da antropologia de Claude Levi-Strauss (1980- ).
Essa reorganização dos conceitos visou resgatar os fundamentos
psicanalíticos que, para Lacan se encontravam no próprio conceito de inconsciente.
Em suas discussões sobre o imaginário, deduziu que a linguagem é a condição de
existência do inconsciente e que existe no sujeito falante. Para Lacan “as
palavras tinham seu sentido, não eram meras maneiras de dizer” (HARARI, 1990,
p.26).
Lacan abre vias fecundas para o estudo da sexualidade feminina:
46
em seus últimos seminários, quando, ele apontou para algo que poderia se
acrescentar à teoria psicanalítica e contribuir para maior compreensão do sexo
feminino: ou seja, sua divisão, por um lado, entre um desejo masculino por essência,
isto é, fálico; e por outro, tudo que se pode dizer é que não há uma essência, não há
algo que o defina, não sequer uma garantia simbólica de que ele exista. Descrito
em seu matema da diferença sexual, Lacan o apresentou como um gozo lógico e
passível de ser inscrito num discurso lógico (SILVA, 1995, p.142).
A partir disso, sua conceituação permitiu que se abrissem outras perspectivas
para se pensar a sexualidade feminina, o Édipo e a castração, poderiam ser vistos
por outro ângulo, “aquele que escapa à estrutura fálica e permite à mulher situar-se
num campo de absoluta heterogeneidade em relação ao masculino” (SILVA, 1995,
p.142).
Lacan vivenciou um momento de efervescência da sociedade. Estava
engajado nos movimentos sociais e culturais da França, onde a concepção herdada
da sociedade patriarcal ortodoxa era menos acirrada, aproximou-se de mulheres que
participavam ativamente do mercado de trabalho, decorrente do seu acesso à
educação formal. A liberdade sexual feminina que caminhava a passos largos,
inclusive pela descoberta e uso massivo da pílula anticoncepcional que trouxe para
as mulheres condições de optarem por uma vida sexual com prazer, sem os riscos
sociais e orgânicos de uma gravidez.
A invenção da pílula anticoncepcional proporcionou à mulher a liberdade de
escolher entre ficar ou não grávida. Optar pela manutenção de um casamento de
aparências ou dissolvê-lo, enfim, a descoberta de que o desejo e a busca pelo
prazer não eram pecados mortais e que a imagem e semelhança com a Virgem
Maria faziam e fazem parte de um discurso machista geralmente religioso, e,
também, uma desculpa para justificar sua exclusão do mercado de trabalho.
Outra contribuição de Lacan foi a de ter teorizado o fenômeno de
desconstrução da figura do pai, da passagem a um outro modelo familiar onde o
homem (pai) deixa de ser o patriarca (atualmente a mulher também desempenha a
função de provedora da casa), diferente da família ocidental do século XIX
(NOGUEIRA, 1999).
A análise lacaniana, dentro do contexto, nos parece ser a mais coerente com
as conseqüências da globalização e com o sujeito pós-moderno. Vivemos, segundo
47
Forbes (2005, p.13), “um momento de transição histórica do sujeito da era industrial
para o da era da globalização”. Tanto a globalização quanto a psicanálise atual
revelam que entramos num momento mais propício à essência feminina.
3 OS QUATRO CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA PSICANÁLISE NA VISÃO
LACANIANA.
Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise: repressão, pulsão,
transferência e repetição, foram desenvolvidas por Lacan em seu Seminário 11,
originalmente com o título Os fundamentos da psicanálise.
A repressão é uma manifestação geralmente associada ao inconsciente que
vem à tona nas falas das pessoas, assim como o preconceito e outras
manifestações enraizadas e que as pessoas pensam não estar praticando em seu
dia-a-dia, ou “não ser assim”.
Para Lacan, existe no inconsciente uma linguagem em que está presente o
Real, o Simbólico e o Imaginário. Para Cesarotto (2005, p.25)
O imaginário inclui duas acepções. Por um lado, quer dizer falso e, por viés, aponta à
ilusão de autonomia da consciência. Por outro lado, tem a ver diretamente com as
representações e as imagens, as matérias primas das identificações... Fora deste
âmbito, os humanos existem porque falam. O registro do Simbólico tem, na
linguagem, sua expressão mais concreta, regendo o sujeito do inconsciente. Ela é
causa e efeito da cultura, onde a lei da palavra interdita o incesto e nos torna
completamente diferentes dos animais... O Real, como terceira dimensão, é sempre
aludido pela negativa: seria aquilo que, carecendo de sentido, não pode ser
simbolizado, nem integrado imaginariamente. Aquém ou além de qualquer limite,
seria incontrolável e fora de cogitação. A reflexão a seu respeito traz de novo o velho
problema de incompatibilidade cognitiva entre o sujeito e o objeto. Relação
impossível, por ser o segundo sobredeterminado, e o primeiro subvertido pelo
desejo.
Em termos concretos, o inconsciente permeia o tempo inteiro as nossas
ações e julgamentos, e a repressão se manifesta nem sempre de maneira
consciente, mas traduzida em linguagem, respostas a determinadas situações em
que, sem termos noção, somos impelidos a determinados comportamentos. Como
exemplo: a mulher que nega a sua sexualidade por ter sido incutido nela a idéia de
que buscar ou sentir prazer é algo maligno e pecaminoso, obrigando-a a reprimir
48
desejos que envolvam sua sexualidade. Frente a essa negação ela irá desenvolver
comportamentos repressores. A mulher carrega a culpa de gerar desejo e desejar;
alimenta, então, um conflito entre o que foi protagonizado para ela e o que a
natureza dela lhe impõe.
Foi incutido à mulher, durante séculos, que o seu prazer só poderia ser
atingido mediante a penetração do falo masculino e com o seu marido. Uma
“verdade” que nos, dias de hoje, sabemos que não corresponde à realidade, ou seja,
o orgasmo feminino é sentido, também mediante a estimulação do clitóris, e isso
pode ser proporcionado pela própria mulher, independente de ter ou não parceiro
(HITE, 2004, p.12-14). Observam-se, hoje em dia inclusive, casos em que a auto-
estimulação ainda é negada, e julgada como uma perversão, uma imoralidade, ‘nada
salutar aos olhos de Deus’. Sabe-se, mas não se fala que masturbação e/ou auto-
estimulação, ainda é vista como uma prática pecaminosa, “um insulto ao homem”.
Ainda observamos mulheres que buscam no casamento, uma legalização
para o ato sexual e de certa maneira a estabilidade financeira da mulher, o que nos
dias atuais é um grande engodo, como também mulheres que colocam sobre o
ombro dos homens a responsabilidade de lhe proporcionarem orgasmo.
Casamentos que vivem somente de aparências, nos quais o respeito entre os
parceiros foi embora muito tempo. O sustento da família muitas vezes recai nos
ombros da mulher, em consonância com a responsabilidade de educar os filhos e
cuidar do marido. A jornada dupla de trabalho é uma tônica da sociedade
contemporânea, mesmo com todos os recursos tecnológicos existentes e os
avanços da medicina, o pensar da sociedade continua sendo aquele embasado no
século XIX.
A pulsão (desejo) apresenta um papel fundamental, junto com o inconsciente
na articulação dos conceitos psicanalíticos. O inconsciente, na visão psicanalítica, é
aquilo que não se percebe ou se nega a perceber, mas que está presente nos atos,
falas e desejos humanos.
Assim, na interpretação psicanalítica, a pulsão ou desejo é a busca pela
obtenção do prazer. No entanto, ele é limitado por nossa consciência que tenta ser
regida pelo real (códigos de conduta, leis entre outros) e principalmente pelo
49
inconsciente integrado e construído no indivíduo, ao longo de sua história de vida,
que envolve os aspectos culturais, morais, religiosos entre outros.
A pulsão prazerosa não alcançada tende a ser transferida para outro objeto
de poder que pode ser: tangível, como a ‘paixão’ por sapatos, ou compras no
shopping quando as ‘coisas não andam bem’; intangível como aquelas pessoas
viciadas em trabalho; ou o comando tirano sobre os funcionários em uma empresa.
A transferência consiste no deslocamento do passado para o presente
(analisando e analista), porque na repetição veicula-se o desejo inconsciente, cuja
elucidação constitui a mola mestra do tratamento. No caso do estudo, transferir para
um recurso tecnológico um elemento que facilite o seu orgasmo, esse brinquedo
pode ter ou não o formato fálico. Nessa pesquisa as mulheres, apenas se utilizam do
recurso como instrumento para facilitar seu orgasmo que poderia ser conseguido
com as mãos.
Em termos concretos, transfere-se para um objeto o desejo que, resultando
em satisfação e prazer, será repetido várias e várias vezes.
A repetição ocorre no momento em que o ato gerou prazer, isto pode ser
consciente ou inconsciente. No caso deste estudo, se o gozo feminino ocasionou
satisfação, a tendência é repeti-lo várias vezes.
50
CAPÍTULO 3
A SEXUALIDADE FEMININA NA IDADE MÉDIA, IDADE MODERNA E NO
BRASIL.
A sexualidade feminina a partir da Idade Média até os nossos dias, será
tratada nesse capítulo, com destaque para história da sexualidade no Brasil com um
breve relato visando esclarecer o período em que a dicotomia entre o masculino e o
feminino aparece na sociedade. Destaca-se o momento aproximado em que a
sexualidade feminina inicia seu processo de repressão e o surgimento da
competitividade entre os gêneros, dando-se ênfase às estruturas sociais.
Todas as fases do desenvolvimento das sociedades foram marcadas pelos
avanços tecnológicos e a cada descoberta ocorreram modificações entre o
relacionamento dos indivíduos com o meio ambiente.
Dentre inúmeras descobertas, a invenção da escrita, trouxe a possibilidade de
se registrar e armazenar as informações, gerando uma mudança no comportamento
da humanidade como também em seu controle. Ela colabora para a formação dos
estados, o comércio, as burocracias. O nascimento da imprensa, com Gutenberg,
alavanca a disseminação da informação, até então restrita aos mosteiros. Com o
processo de industrialização surge a civilização industrial, marcada pelo
aparecimento da energia elétrica e com ela os meios de comunicação de massa, até
chegarmos à era tecnológica, onde as fronteiras territoriais deixam de existir e o
mundo torna-se globalizado, conectado.
Pode-se observar que em todas as fases de desenvolvimento, a sociedade
vai moldando gradativamente os papéis que mulher e homem deverão
desempenhar, ou seja, a mulher a dócil, subserviente às necessidades do marido,
‘boa parideira’, reprimida em seu desejo sexual em oposição ao homem, provedor,
senhor e onipotente.
O embasamento teórico deste capítulo, foi buscado em autores como Rose
Marie Muraro (2000), que enfatiza a questão da sexualidade feminina sob um
enfoque político-econômico; Michel Foucault (1986) , referência para quem estuda a
história da sexualidade sob uma visão sociológica; Michelle Perrot (1998; 2001),
51
historiadora francesa, que aborda a questão da sexualidade sob o ponto de vista dos
excluídos da história; Maria Escolástica A da Silva (1995), na linha psicanalítica
entre outros.
Embora adotadas perspectivas diferentes, observa-se que, independente da
corrente ou da abordagem, a sexualidade feminina sempre está atrelada à
dominação do masculino sob o feminino e, em muitos momentos históricos, é
negada a presença da mulher como agente atuante da história.
1 IDADE MÉDIA
A Idade Média tem seu início com a queda do Império Romano, a tomada de
Constantinopla em 476 d.C. a 1453 d.C. e a migração de vários povos que
introduzem seus costumes, nos quais suas mulheres gozavam de mais liberdade e
menos isolamento, se comparadas com as gregas e romanas. Elas continuavam sob
a tutela e guarda dos pais e se mantinham virgens até o casamento, conduta
extremamente apreciada. Segundo Silva (1995, p.100) “o adultério e a perda da
virgindade eram fatos punidos com a morte uma vez que a propriedade se transmitia
através da linhagem e esta não podia ser impura”.
Nesse período, o infanticídio de meninas era uma pratica difundida, tornando-
as, assim, uma mercadoria escassa, com alto valor no mercado e incentivando a luta
dos homens por avançar e conquistar novos territórios. Isso não torna as mulheres
mais poderosas, apenas mais valorizadas enquanto mercadoria, mesmo que
sofressem todo o tipo de atrocidades de seus maridos.
As mulheres, nos primeiros tempos da Idade Média, eram consideradas
importantes reservas de trabalho, sendo manipuladas de acordo com a vontade,
desejos e necessidades dos homens (MURARO, 2000, p.110). No entanto, como os
homens viviam em guerras, as mulheres recebiam a educação e eram responsáveis
pela transmissão e preservação da cultura, tanto que conseguiram se destacar nesta
área até o retorno dos homens do campo de batalha.
Para Bourdieu (1999, p.31)
52
a relação sexual se mostra como uma relação social de dominação, é porque ela
está construída através do princípio de divisão fundamental entre o masculino, ativo
e o feminino, passivo, e porque este princípio cria, organiza, expressa e dirige o
desejo - o desejo masculino como desejo de posse, como dominação erotizada, e o
desejo feminino como desejo da dominação masculina, como subordinação
erotizada, ou mesmo, em última instância, como reconhecimento erotizado da
dominação.
Para o homem o casamento era uma excelente relação, pois continuava
com sua liberdade, mas para a esposa restava a monotonia e a negação.
Havia as mulheres celibatárias, uma categoria que surge nesse período, e
assim sendo estavam livres da domesticidade; da reprodução e do domínio
masculino. Com isso as abadessas foram se tornando mulheres poderosas e
ricas, mas com a formação do Santo Império por Carlos Magno, as monjas são
excluídas da educação dos meninos, já que para o pensamento religioso do
período "o sexo feminino era frágil e suas mentes instáveis" (MURARO, 2000,
104). Esses jovens eram encaminhados para as escolas palacianas, mas com a
queda do Império Carolíngio, os meninos deixam de receber educação e as
meninas continuaram a serem educadas.
Com a morte de Carlos Magno, as mulheres voltam a ter influência e poder,
a tal ponto que no século X, quando da instauração do celibato para os padres,
isto não foi obedecido, pois os sacerdotes não poderiam viver sem suas
mulheres. Apesar disso tudo, o infanticídio das meninas continua sendo praticado
de maneira intensa, diminuindo apenas com a ascensão do regime feudal e os
progressos agrícolas (MURARO, 2000, p.104).
O poder doméstico (dos pequenos feudos), começa a ser exercido pelo
domínio público dos palácios; e as filhas e filhos menores eram deserdados para
que com isso as propriedades e reinos não diminuíssem de tamanho, o direito a
progenitura toma lugar à herança de todos os filhos, independente de sexo.
A tradição oral paulatinamente é substituída pelas leis escritas, nas quais
os homens recebem todos os direitos e as mulheres as restrições; a educação
das crianças a então efetuada nos mosteiros, passa a ser atribuição das
universidades e escolas nas catedrais, onde as mulheres são excluídas. Como os
homens passam a ter tempo livre, que as guerras tinham terminado, elas são
excluídas da cultura e da política (MURARO, 2000, p.105).
53
A Igreja centraliza novamente seu poder, na dominação masculina e as
grandes abadessas vão sendo substituídas pelos burocratas. Esse fato ocorre
com a reforma gregoriana e no interior da Igreja surge uma literatura misógina.
As mulheres, a partir disso começam a se interessar pelos movimentos
heréticos, como os cátaros; e se formam comunidades autônomas, como, por
exemplo "o Movimento das Beguínas, que era formado por leigas celibatárias que
fugiam da dominação patriarcal e ao mesmo tempo ameaçavam a autoridade
masculina exercida pelos padres da Igreja" (MURARO, 2000, p.106).
No entanto, com o decorrer do tempo as mulheres são desqualificadas e
penalizadas pelos doutores da Igreja e da Universidade, ficando proibidas de
exercerem suas profissões, como foi o caso da França que proibiu que o ato
cirúrgico fosse realizado pelas mulheres.
Nesse período os cuidados com à saúde era praticado pelas mulheres,
visto que elas detinham o saber das ervas, passado de geração a geração por
suas ancestrais, com condições de manipulá-las e ministrar aos pacientes,
ficando para os homens a medicina, que naquela época tinha como suporte as
cartas astrológicas e os encantamentos, resultando muitas vezes na morte dos
pacientes, ao contrário, do tratamento ministrado pelas mulheres.
Os papas possuíam poder absoluto e tudo aquilo que o estivesse sob o
seu controle era passível de extermínio; culminando na destruição de mulheres
que ousassem desafiar a corporação masculina, como os médicos e o poder do
homem. O saber feminino foi sufocado pelo saber científico (masculino).
Deve-se ter em conta que, nesta época, o pensamento medieval tinha
como base a crença que nos primeiros tempos (Idade Antiga) os ritos eram feitos
em homenagem a Grande-Deusa, a Deusa Mãe, Gaia, a que tinha o poder de
gerar e habitar a terra, de uma certa maneira distante da imagem da Virgem Maria
(LEAL, c2004).
A identificação das mulheres com as deusas as transformaram em
depositárias naturais do legado (poder de gerar ou exterminar a vida) sob a forma
de crença na magia e nos sortilégios. Essa aura de poder pode estar ligada ao
início de criação dos seres humanos, onde a mulher pode ter sido fecundada por
um espírito da natureza (SILVA, 1995, p.160).
54
A Igreja Católica, para garantir sua supremacia sobre o feminino e o saber
das mulheres, instaura a Inquisição que tinha como uma das principais funções
exterminar as ‘bruxas’, aquelas que se rebelaram contra a ordem estabelecida, tal
situação ocorrendo pelo menos três séculos de atrocidades contra as mulheres
(SILVA, 1995, p.165).
São Thomas de Aquino foi o responsável por insuflar a crença antiga e
reviver os antigos temores de castração pela mãe lica. Para ele as feiticeiras
tinham o poder de tornar os homens impotentes, conseqüência de fazerem pacto
com o diabo (SILVA, 1995, p.169). Os ritos em reverência ao deus cornífero
(divindade dos celtas) que tinha corpo de cavalo e cabeça de homem com chifres,
foi reduzido às cerimônias escondidas, tal qual o rito da lua cheia, onde a mulher
nua, circulava uma fogueira, pedindo a grande mãe, fertilidade e abundância
(SILVA, 1995, p.165).
Com a influência de São Thomas de Aquino, junto ao Papa João XXII
(1316-1334), que autorizou em 1326 a instaurar processos inquisitoriais contra as
bruxas e contra os heréticos.
Essas mulheres eram nada mais, nada menos, que mulheres anciãs, que
detinham o conhecimento da cura com ervas e com esta ajudavam a população, à
época sem acesso a recursos financeiros para gastar com os médicos. Esses
conhecimentos eram transmitidos pela linguagem oral e ocorria de geração para
geração, mas não passavam pelo saber oficial da Igreja nem dos médicos.
Portanto, isso constituía um poder extra-oficial zelosamente guardado, sobretudo
pelas mãos das mulheres. Para alguns, inclusive os clérigos, a vagina possuía
dentes que morderiam seus parceiros em caso de relações sexuais não oficiais. O
poder das curandeiras poderia ser usado tanto para matar como para dar a vida,
propiciar fecundidade ou esterilizar; essa ambivalência provoca, de uma certa
maneira, fantasmas inconscientes de ameaça de castração, fazendo emergir a
lembrança da onipotência das deusas da Antigüidade (LEAL, c2004, p.101).
Na obra escrita por Heinrich Kramer e Jakob Sprenger, dois padres
dominicanos, intitulada Malleus malleficarum: o martelo das feiticeiras, em 1486,
retrata o ódio dos autores pelas mulheres, se constitui em um manual pedagógico
para aqueles que desejam obter informações sobre os demônios, as feiticeiras e
55
as suas obras maléficas, descrevendo as características do crime considerado
como bruxaria, facilitando, assim, a identificação das bruxas ou praticantes de
bruxaria no cotidiano e na perseguição. No texto observa-se um ódio invejoso à
feminilidade e, sobretudo, seu medo à intensa luxúria suposta nas relações que
as mulheres mantinham com o diabo nas noites do Sabat, obviamente, essa
luxúria era deles próprios, podendo ser observada tal visão na seguinte citação:
houve uma falha na formação da primeira mulher, por ter sido ela criada a partir de
uma costela recurva, ou seja, uma costela do peito cuja curvatura é, por assim dizer,
contrária à retidão do homem. E como, em virtude dessa falha, a mulher é animal
imperfeito, sempre decepciona a mente (KRAMER; SPRENGER, 2000, p.46).
Foram feitos exames detalhados nas partes íntimas das mulheres
acusadas, revelando seus desejos mais secretos e também mais proibidos. Como
exemplo, uma mulher “dizendo que sentia prazer (orgasmo) sozinha, sem o
homem e muito menos que sua função não é procriar, fazer sexo por puro
prazer” (ARAÚJO, 2001, p.45). Plutarco citado por Foucault “afirmava que o papel
de Afrodite e de Eros devem existir no casamento, no entanto deverá ser diferente
daquela dada as amantes” (1999, p.178).
A mulher estava condenada, nesse período, por definição, a pagar
eternamente pelo suposto erro de Eva, a primeira fêmea, que levou Adão ao
pecado e tirou da humanidade futura a possibilidade de gozar da inocência
paradisíaca. Portanto, por compartilhar da essência de Eva deveria ser
permanentemente controlada. No entanto, deve-se lembrar que “Jesus Cristo,
ocupou uma posição de vanguarda em relação ao judaísmo tradicional, pois
conversa com a samaritana; defende a adúltera que estava sendo apedrejada e
permite que uma mulher de má reputação derrame aos seus pés, nardo” (LEAL,
c2004, p.102). Mas, pode-se verificar, pelos fatos históricos, que tudo foi
esquecido e os vigários da Igreja enfatizaram os poderes demoníacos e perigosos
da mulher.
O extermínio das mulheres, inclusive de seus ritos, foi alarmante, no
entanto, determinados ritos eram feitos, mesmo que na obscuridade e a Tradição
(nome dado ao culto da Deusa) continua sendo praticada até nossos dias. Mas
esse período negro da história, resultou em uma mulher mutilada, privada de
56
exercer seus direitos e seu prazer com ou sem parceiro. A toda poderosa Igreja
exerceu forte pressão sobre o adestramento da sexualidade feminina. O
fundamento escolhido para justificar toda a repressão direcionada à mulher era
simples: o homem era superior e, portanto, cabia a ele exercer toda sua
autoridade sobre ela.
No entanto, sabe-se que a bruxa representa o lado perigoso e obscuro da
mulher, que o homem sempre desejou aprender e, por fracassar, ele se
atemoriza, tomando a forma de pavor e se transformando em mais uma violência
contra a mulher. Esse temor, medo que o homem sente pela mulher tem sido, até
hoje, a raiz da repressão feminina.
Resultado da crença da grande-mãe fálica existente em toda a mulher, e
para se livrar dessa ameaça, os homens se defendem, mutilando o sexo feminino
e instituindo a poligamia. Para Silva (1995, p.173) “eles se eximem da Lei e
regridem ao estágio do Pai absoluto da Horda Primitiva, que expulsava os filhos e
possuía todas as mulheres”. Dessa maneira é estabelecido um círculo vicioso,
pois os homens se colocam acima da Lei e burlam a ordem simbólica do Nome-
do-Pai, eles saem fora do triângulo edípico, deixando os filhos às mães.
Após a caça às bruxas, uma nova imagem da mulher é construída;
surgindo uma nova categoria: as operárias, que deveriam educar as filhas e filhos
para serem operários a vida inteira, ou seja, submissão e corpos dóceis; as
classes mais abastadas cultuavam a domesticidade das mulheres, promoviam o
endeusamento do amor materno; colocando-as em um pedestal aguardando um
amor romântico.
Uma das características da sociedade feudal foi a exclusividade do espaço
masculino, decorrente de uma profunda relação entre dois homens, o vassalo e o
senhor. A ajuda que o vassalo deveria prestar ao seu senhor estava implícita
neste relacionamento, quer com sua espada, quer com seus conselhos e, na
necessidade, com a sua bolsa. A honra de uma pessoa poderia ser maculada por
outra e a desonra equivalia à morte, reforçando com isso, o comportamento
machista, justificando as violências contra a mulher, inclusive sua eliminação, em
caso de legítima defesa da honra masculina.
57
Na ética do macho, a honra da mulher é passiva, devendo ser defendida
pelo marido, pai, irmão ou por um cavaleiro que assistiu e a defende. A honra da
mulher era uma extensão da masculina (LEAL, c2004, p.118).
A nobreza entorpecida pelo poder acreditava que todas as mulheres
camponesas podiam ser possuídas sexualmente, por eles. O senhor tinha o
direito de deflorar a noiva de seu vassalo.
Como os casamentos eram arranjados e serviam para preservar a linha de
consangüinidade ou interesse do latifundiário, a pratica foi denominada de tutela,
gerando muitas vezes, a venda de mulheres.
O casamento era despido de amor, e os senhores mantinham relações
com prostitutas, concubinas e até mesmo com as camponesas, aumentando
notadamente o número de bastardos. Os cavaleiros descritos como modelos de
virtude, na realidade, eram machistas.
Os autores desse período retratam a mulher como abjeta e suja. A
sexualidade feminina é voraz, como ao fogo que não pode ser extinto, só é ouvida
pelo homem e se ele for enfeitiçado por ela, terá como resultado sua desgraça.
A mulher que buscasse mediante as relações sexuais o gozo, cometia
pecado venial, pois o sexo deveria ser praticado somente com o objetivo de
procriar.
O conceito de pecado é introduzido pela Igreja Católica no período em que
tentou terminar com os lupanares, convertendo as prostitutas ao Cristianismo,
uma tentativa mal sucedida, fazendo, no entanto, que essas mulheres
acrescentassem em suas vidas, segundo Leal (c2004, p.114) “a sensação de
pecado e um enorme sentimento de culpa”.
Nas palavras de Leal (c2004, p.130) mesmo “o amor cortês, estando
centrado na figura da mulher, continuou a ter um caráter masculino e
antifeminino”. O amor cortês dos cavaleiros era mais literário do que real; a
amada, a dama, pertencia a aristocracia; a pobre ficava de fora, sendo violentada
e sem direito algum. A esposa, continuava desamparada, humilhada e sendo
ofendida pelo marido. A mulher medieval continua sendo discriminada e relegada
ao segundo plano, excluída ao longo do processo histórico, mesmo que tenha
sido uma guerreira e lutasse pelos seus direitos.
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O final da Idade Média é marcado pela substituição do feudalismo para um
novo modo de produção e se inicia o processo de transição da sociedade feudal -
para a sociedade capitalista mercantil. O sistema de propriedade privada das
mercadorias não se limita mais aos bens gerados pela terra. O sistema de
governo passa a ser mais centralizado e burocratizado, como também o
conhecimento vai se tornando mais sistematizado.
2 IDADE MODERNA
O início da Idade Moderna é marcado pela crise do feudalismo e a
transição da sociedade feudal para a capitalista mercantil. Teve como fatos
históricos relevantes o antropocentrismo, naturalismo e racionalismo. Foi o
apogeu do mercantilismo com a implantação do sistema colonial, formação dos
estados nacionais absolutistas, e as reformas: protestante e burguesas liberais;
Revolução Industrial na Inglaterra, a Independência dos Estados Unidos; a
Revolução Francesa; ascensão de Napoleão Bonaparte; consolidação do
capitalismo industrial e liberal; formação do proletariado; movimentos sociais;
socialismo e anarquismo. Entretanto, deve-se ter em mente que uma evolução
não se faz em linha reta. Os sistemas se sobrepõem e coexistem, assim sendo,
em determinadas regiões ainda existem resquícios do sistema anterior, e o
pensar não se moderniza tão rápido como as inovações tecnológicas, ou seja, o
pensar moderno ainda é medieval e assim sucessivamente.
As bases do século XVI em diante, vão se formando, vindo a culminar com
a invenção da imprensa por Gutenberg, que democratiza, de uma certa maneira,
as idéias, haja visto, surgirem os primeiros livros impressos, até então
exclusividade dos monges copistas.
O pensamento mágico é substituído pela racionalidade científica, marcada
pela obra de Descartes intitulada O discurso sobre o método, surgindo uma
nova era epistemológica.
No século XVIII ocorre a invenção da máquina a vapor e de outras
destinadas às fabricas, substituindo a mão-de-obra artesanal assim como as
59
produções das famílias, portanto, um período onde podem ser observados os
primeiros indícios da Revolução Industrial.
As monarquias começam a ser substituídas pelas repúblicas, tendo como
tônica a democracia.
O Catolicismo sofre o abalo com a Reforma de Martin Lutero, o
Protestantismo, apregoava que, para conseguir a salvação o indivíduo deveria ter
fé. Essa visão simplista gerou uma distorção, que todos os atos cometidos pelo
outro são válidos, inclusive a exploração alheia, “o protestantismo avaliza e torna
possível o novo sistema" (capitalista/industrial) (MURARO, 2000, p.119).
Com o protestantismo, a educação dos meninos e das meninas passa a se
realizar em instituições separadas, como também, deixa de existir o culto a
Virgem Maria.
A produção econômica sai do contexto familiar e passa a acontecer nas
fábricas, ficando para as mulheres a função de cuidarem dos filhos e filhas, que
os homens trabalhavam agora longe de suas casas, resultando novamente, na
exclusão do feminino no domínio público.
As mulheres abastadas geravam muitos filhos e para não estragarem seus
corpos, durante a amamentação, logo que nasciam os encaminhavam para as
áreas rurais; onde seriam amamentados pelas amas-de-leite, que receberiam por
este serviço. Sobre isso Foucault (1982, p.31), relata um acontecimento onde
"uma dessas amas que, por ser muito pobre, aceitou vinte crianças para
amamentar e depois de um ano devolveu apenas uma viva, todas as outras
dezenove morreram por falta de alimentação". A mãe biológica, sofria pela perda
dos filhos, eximindo-se de culpa, os filhos excedentes eram de uma certa maneira
'eliminados', não ocorrendo nenhum tipo de punição para as amas-de-leite.
Todas essas transformações exigiam uma nova concepção para a
feminilidade, ou seja, a pureza; piedade religiosa e a submissão, tornando assim,
a mulher em um ser frágil e despreparado para as atividades públicas. O trabalho
feminino executado fora de casa, para as classes abastadas era considerado um
escândalo.
A ênfase é dada à mulher com comportamento puro e submisso, limitada
ao espaço privado, reprimindo-a de tal maneira, que começam a surgir as
60
primeiras doenças femininas. A primeira ligada ao aparelho reprodutor feminino,
face ao ilimitado número de filhos gerados. A mulher se torna escrava de seu
útero e ovários.
A segunda refere-se ao aspecto psicológico, sendo ela reprimida nas
questões do desejo e do prazer. A medicina desconhecendo o corpo feminino;
passa a nominar algumas doenças como histeria, frigidez e furor uterino que, no
fundo, encontravam-se atreladas à sexualidade feminina.
Para sanar as tais doenças, tanto na Europa como nos Estados Unidos, os
médicos, utilizam o procedimento da cliterodoctomia (ablação do clitóris), que
segundo eles, auxiliavam as mulheres na pratica da virtude, pois ela se tornaria
fria, inorgástica e submissa.
Outro aspecto notado decorria do fato de que por não conseguirem viver
sua sexualidade e não participarem dos aspectos financeiros, se tornavam alheias
a estes assuntos, incapacitando-as a gerenciarem os recursos deixados pelos
maridos após a morte, acarretando mais problemas físicos e mentais.
Os homens, como não praticavam seus impulsos sexuais com a esposa,
buscavam nas escravas, empregadas, e com as prostitutas, seus prazeres,
gerando relações ambíguas, ou seja, uma servia para ser a mãe dos seus filhos e
a outra para lhes oferecer prazer, comportamento que ocorria também na Idade
Média e até os dias atuais.
No entanto, deve-se ter em conta que durante toda a Idade Média, as
mulheres pobres sempre trabalharam mais do que os homens, como o fazem até
hoje: atividades fora e dentro do lar, ganhando menos e obtendo menos
privilégios, sendo severamente punidas, por questionarem a condição da mulher,
mediante a sua sexualidade e do seu saber, enquanto que as mais ricas se
dedicam ao amor cortês, à submissão e às normas que se originavam dele, pois
tinham que garantir o casamento e conseqüentemente sua própria sobrevivência.
As mulheres pobres trabalhavam fora de casa e tinham que gerenciar o
mínimo de recursos financeiros, questionavam as sociedades e os regimes,
mediante o envolvimento em revoltas da Europa, como na Revolução Francesa,
onde elas auxiliaram na tomada da Bastilha e para por fim à monarquia.
61
Após a queda da monarquia, as mulheres que colaboraram com a
Revolução Francesa foram reivindicar seus direitos, junto à Assembléia do Povo,
onde foram redigidas a Declaração dos Direitos do Homem e a Declaração dos
Direitos da Mulher (anexo 4). Quando a autora Olympia de Gouges, foi apresentar
o documento aos deputados do povo, eles responderam:
a Revolução Francesa é uma revolução de homens. Não podemos conceder os
Direitos da Mulher porque hoje foi o dia em que nasceram os direitos do homem..." E
Olympia de Gouges, antes de ser decapitada declara: a mulher tem o direito de subir
ao cadafalso, ela também deve ter o direito de subir à tribuna (PERROT, 1998, p.59).
Essas declarações denotam a concepção de que a mulher se destinava ao
silêncio e à obscuridade.
A mortalidade feminina aumentou, principalmente entre as operárias,
porque eram as últimas a receberem alimentos; como também trabalhavam nas
minas de carvão junto com os homens, as grávidas tinham seus bebês na própria
mina. O carvão extraído era utilizado como combustível para as fábricas, sendo
uma atividade menos remunerada, principalmente para as mulheres.
Além de trabalharem nas minas, as mulheres começaram a trabalhar nos
teares mais pesados, que eram sublocados dos operários pela metade do preço.
Com a saída do homem do campo para os grandes centros urbanos, que já
começam a surgir, o sistema capitalista sedimenta a dicotomia entre a mulher
privada e a pública; a virtuosa e a prostituta.
A sociedade vai se masculinizando cada vez mais e com o objetivo de
aumentar a produção, os operários passam a ser controlados em seus mínimos
gestos, iniciando-se portanto a mensuração da produção.
O trabalho se torna fragmentado e o operário deixa de ver o produto final.
Tudo passa a ser separado, o pai dos filhos e da mulher; a infância da fase
adulta; a vontade se separa das emoções; a sexualidade do afeto; e as áreas do
conhecimento vão se tornando cada vez mais específicas. O individualismo é
enfatizado, todo mundo controlando todo mundo; o indivíduo se torna escravo do
lucro e dos bens; o consumismo inicia sua ascensão, ocorrendo uma super
valorização do corpo - a mulher tornando-se objeto de prazer.
62
O mercado de trabalho para as mulheres fica ainda mais recessivo;
levando-as em determinadas situações a se prostituírem, para garantirem o
sustento da família.
Nesse período começam a surgir os primeiros movimentos sociais
modernos, no que se refere às questões trabalhistas, inclusive as mulheres se
movimentam visando melhoria na qualidade de vida de suas famílias.
A primeira versão do feminismo vai surgindo, tendo como luta a cidadania,
conseguida mediante o direito ao voto, à educação e outras questões femininas.
Não com a mesma ênfase dos movimentos dos operários; porém com mais
profundidade e com mais obstáculos do que os enfrentados pela classe
trabalhadora. As mulheres combatem o patriarcado, uma questão bem mais
antiga do que a sociedade de classes combatida por Marx. Essas organizações
são características da civilização industrial pois em qualquer período anterior
jamais poderiam ocorrer (MURARO, 2000, p.135).
Independente de classe social as mulheres o tinham garantias de seus
direitos legais ou culturais, a tal ponto de serem impedidas de viajarem sozinhas,
falarem em público, caso o fizessem eram taxadas de ‘bruxas’, ‘mal-amadas’ ou
‘lésbicas’, no entanto, existiram homens que tentaram à medida do possível,
auxiliá-las.
As primeiras feministas do século XIX lutaram pelo direito ao voto e
também pela abolição da escravatura, lutas que se integraram as lutas sindicais
do movimento operário. Muitas vezes, ocorreram conflitos ideológicos entre as
mulheres da classe média e das operárias, devemos lembrar que as perspectivas
eram diferentes: umas lutando pela sobrevivência da família outras não, mas
lutavam também pela sobrevivência do gênero.
Aquelas que lutavam pelo direito ao voto se envolveram em greves
violentas; a tal ponto de no dia 08 de março de 1908, cento e cinqüenta mulheres
foram queimadas vivas em seu local de trabalho pelos patrões, por estarem
reivindicando melhores salários e redução na jornada de trabalho.
Na segunda metade do século XIX, surge uma nova classe de mulheres
trabalhadoras, aquelas que iriam compor o setor de serviços: as datilógrafas,
telefonistas, professoras primárias, secretárias, balconistas e as representantes
63
da indústria de roupas femininas que irão florescer e dar impulso, mais tarde, à
indústria da moda e dos cosméticos.
O movimento sindical feminino assistido pelas sufragistas da classe média
em muitos momentos conflitaram com a classe das trabalhadoras, sendo que as
segundas normalmente eram as penalizadas.
Nessa época ocorreram várias greves, visto que, apesar das mulheres
trabalharem o dobro de horas dos homens ganhavam bem menos. O movimento
de mulheres só vai ter sucesso na segunda década do século XX.
O movimento que surgiu no século XIX não questionava a domesticidade e
a figura assexuada da mulher vitoriana (austera), no entanto, as que ousavam
questionar a sexualidade feminina foram severamente criticadas e rejeitadas por
outras feministas. No início dos anos 20 surge uma revolução sexual, as mulheres
cortam os seus cabelos longos; maquiam seus rostos, encurtam suas saias e
buscam o prazer na vida sexual. O ideal de mulher agora é sentir orgasmo vaginal
com seu marido (LINS; BRAGA, 2005).
A figura da mulher vitoriana assexuada e com ela o culto da domesticidade,
não foi questionado pelo movimento feminino das sufragistas, no entanto, agora elas
queriam adentrar no domínio público, mas conservando as características do
privado, ocorrendo um retorno ao conservadorismo, que, após a Primeira Guerra
Mundial, as reformas feministas não eram bem vistas. Surge o modelo proposto por
Sigmund Freud, que cultuava a domesticidade, a mulher verdadeira é dona-de-casa
e boa mãe. Poderia exercer seus instintos maternos no âmbito doméstico e não
competir com o homem (CESAROTTO, 2005).
Mesmo com essas aberturas, a divisão sexual do trabalho e a estratificação
continuaram, haja vista que a dicotomia entre privado/público não foi abalado.
Com a Grande Depressão ocorrida na Europa e nos Estados Unidos, os
homens perdem seus empregos e a sociedade se levanta contra o trabalho
feminino, gerando uma luta de mulheres contra mulheres, porque algumas
ficaram com medo de que seus maridos fossem demitidos, que a mão-de-obra
feminina era mais barata.
As profissões consideradas femininas vão surgindo, primeiramente aquelas
ligadas à educação, como a professora primária, bibliotecária, exercidas pelas
64
moças das classes populares, como a italiana Maria Montessori, Pauline
Kergomard, a primeira a fundar uma escola maternal. A entrada nas
universidades, irá ocorrer após a Segunda Guerra Mundial. Os cursos ligados à
saúde e ao direito irão ser confiados às mulheres posteriormente. Surgem as
religiosas, na Europa e as suas obras de caridade ou filantropia, que elas
tinham o espírito materno e a docilidade para trabalhar com os menos favorecidos
e doentes (PERROT, 1998, p.110).
Permeando esse período e com a derrota da Alemanha na Primeira Guerra
Mundial, os alemães, sobre a influência de Adolph Hitler, iniciam seu processo de
reconstrução do país e do espírito alemão, visto que o líder apregoava a pureza e
superioridade da raça ariana sob as demais. Hitler incentivou a reprodução,
dizendo-se defensor dos valores da família e da propriedade, mediante uma
campanha anticomunista junto aos camponeses alemães.
A mulher alemã deveria parir o maior número possível de filhos, e mesmo
durante a derrota ele apregoava que os soldados deveriam ter mais de uma
mulher para poderem gerar mais filhos. O planejamento familiar é abolido e o
regime interfere inclusive no domínio privado. As mulheres eram incentivadas a
entrarem para o exército, como enfermeiras, espiãs, sabotadoras, mas não
poderiam usar armas ou uniformes, comprovando o descaso com o sexo feminino
mesmo que se precisasse de sua atuação (MURARO, 2000, p.140).
A invenção da bomba nuclear, em 1945, modifica a relação da humanidade
com o meio ambiente e como conseqüência com as relações de poder, pois
aqueles que detêm tecnologia
7
tem supremacia sobre aqueles que não a
possuem, surgindo os países do terceiro mundo.
4
É o estudo sistemático dos instrumentos, procedimentos e métodos que se empregam
nas diversas técnicas. (...) a tecnologia é a aplicação dos métodos das ciências naturais e ciências
físicas ao exercício de uma atividade a fim de conhecer todas as leis intervenientes, de criticar e
aperfeiçoar os processos e de comunicar seu conhecimento pelo ensino técnico (GAMA, 1986,
p.163).
65
O mercado de trabalho feminino inicia seus passos no sentido da mulher
adentrar no mercado masculino. O saber no mundo vai se desdobrando, o
retardamento do envelhecimento e da morte já são possíveis e as transformações
nas relações de gênero se iniciam fortemente. A dominação do mais forte sobre o
mais fraco ocorre de maneira voraz e as grandes riquezas vão se concentrando
em determinados países, assim como o poder. A competitividade surge tanto no
aspecto econômico como no social.
Os papéis sexuais nos países subdesenvolvidos diferem segundo as
classes sociais, de acordo com o interesse do sistema. A mulher pertencente ao
meio rural continua sendo oprimida; as trabalhadoras urbanas, são obrigadas a
trabalhar para garantir o sustento da família, pois em muitos casos não contam
com a presença do companheiro. A exploração feminina nessa classe ocorre nas
questões do salário, porque, recebem menos do que os homens; aquelas
pertencentes à classe dominante apesar de deterem maiores privilégios, eram
submissas aos maridos pois não podiam perder posição, riqueza e poder.
As mulheres pertencentes à classe média urbana dividem-se em: a)
aquelas que apresentam um comportamento conservador, no sentido de
manterem-se no papel de donas de casa e defenderem os valores tradicionais da
sexualidade, educação, economia e política; b) as intelectuais, profissionais
liberais, que não produzem valor, mas são imprescindíveis para que o sistema
atinja estágios mais avançados. As participantes desse grupo são mais liberais
inclusive com as questões de costumes e política (BASSANEZI, 2001; GREGORI,
2003).
As mulheres passam a usufruir dos benefícios da pílula anticoncepcional,
apesar da Igreja Católica e de alguns segmentos da sociedade serem contrários;
pois dissociava sexo da maternidade; no entanto, deve-se ter em conta que
haviam interesses por detrás disso; como o controle da natalidade em países
menos desenvolvidos.
A sociedade produtiva e austera do século XIX, agora é substituída pela
sociedade de consumo, e a mulher desse período, apesar de parecer bem por ter
tudo, sofre um tipo de neurose, conseqüência da não utilização de todas as suas
66
capacidades humanas, segundo o resultado das pesquisas desenvolvidas por
Bety Friedan.
Simone de Beauvoir, treze anos antes, lançava em 1950, Paris, O
segundo sexo obra que abordava a questão da mulher no patriarcado, mas irá
atingir o público após o lançamento da publicação de Friedan Mística feminina.
Essas iniciativas fizeram nascer o primeiro movimento feminista moderno
(MURARO, 2000, p.174).
Por coincidência ou não, os Estados Unidos da América torna-se uma
grande potência. Os jovens americanos se recusam a participar da guerra contra
o Vietnã, por acharem que não deveriam perder suas vidas em uma batalha que
não lhes dizia respeito. Como resultado disso, surge uma sociedade alternativa;
são questionados os padrões da sociedade competitiva, patriarcal e racista - os
hippies, assim denominados, passam a se dedicar ao cultivo da terra; utilizam
uma alimentação, à base de verduras e geralmente tem uma postura religiosa
voltada ao budismo e hinduísmo. O corpo, mente e espírito são encarados como
um todo. Esta concepção esta mais integrada com a vida que começa a surgir.
As mulheres iniciam uma revolta generalizada, questionando e se
posicionando contrárias a qualidade de suas relações com os homens,
inclusive em determinados casos chegam a assumir um comportamento
homossexual. Não querem mais ser objetos sexuais e nem inorgásticas. Os
movimentos feministas se posicionam contrários as relações de dominação e
poder; as questões do privado e público são discutidas.
A partir desses movimentos, as mulheres começam a ter acesso ao poder;
o trabalho executado em casa passa a ser dividido com os homens, e a imagem
masculina de provedor começa a cair por terra; inclusive no que concerne à
educação dos filhos.
A liberdade sexual ocorre de maneira mais intensa, mais ainda atrelada à
dominação econômica. Paralelo, a todo esse contexto, as feministas de direita
manifestam-se quanto à insatisfação das mulheres depois de quinze anos de
conquista no mercado de trabalho e frustração na vida familiar, decorrentes do
investimento que elas fizeram em suas carreiras. Como conseqüência, surge um
movimento cultural, no final dos anos 80, que apregoava a necessidade de se
67
retornar aos valores dos anos 50, esmagando portanto, o feminismo nos Estados
Unidos e na Europa (MURARO, 2000, p.174/179).
Na atualidade, houve uma explosão do consumo; a mulher se faz presente
no mercado de trabalho masculino, passando a disputar com ele as vagas até
então restritas ao homem. Ela tem buscado o seu prazer e desejo, algumas
colocando um ponto final em relações conjugais violentas, que traziam dor e
sofrimento. Esses sintomas prevêem o declínio do patriarcado, visto que a
superação da dicotomia entre público e privado esta deixando de existir, no
entanto, observa-se ainda comportamentos machistas e concepções de que a
mulher serve somente para gerar filhos, cuidar do marido e auxiliar na
subsistência da família, mesmo que não seja reconhecida como provedora em
muitos casos.
3 SEXUALIDADE FEMININA NO BRASIL
Os primeiros relatos que tratam da sexualidade da mulher brasileira tem seu
início com descrições de viagens dos europeus, que desembarcaram no Brasil e se
depararam com um povo que vivia seminu, os índios e as índias que, sob a visão do
estrangeiro tinham um comportamento pouco civilizado, se comparado com os deles
na época. Segundo os historiadores, estudos e documentos sobre esse período são
raros, como também o julgamento feito sobre este povo e tinha como base a
tradição cristã.
A perspectiva que é descrita por esses viajantes foi feita sob o “paradigma
teológico e do princípio de que os brancos eram os eleitos de Deus e por isso
superiores aos povos do novo continente. O desconhecimento da palavra revelada,
da organização estatal e da escrita foram vistas como marcas de barbárie e de
primitivismo” (RAMINELLI, 2001, p.11). Tudo o que fosse diferente ao padrão
europeu era observado como um desvio da fé e transgressões “capazes de conduzir
os americanos ao inferno” (RAMINELLI, 2001, p.12).
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Toda a descrição da mulher indígena sofreu a influência de uma visão
européia, portanto, qualquer costume diferente era visto como degeneração e
transgressão do mundo que buscava estar próximo a Deus.
Segundo as descrições, o nascimento de um tupinambá era considerado
como um acontecimento importante para toda a tribo e para o homem, que
participava do parto, pressionando o ventre da mulher caso o nascimento do bebê
apresentasse problemas. Era ele, também, o responsável pelo corte do cordão
umbilical do menino, nas meninas os cuidados eram recebidos da própria mãe,
denotando-se neste gesto, a importância do sexo masculino para essa tribo. No
período de restabelecimento da mãe o esposo ficava ao seu lado, alimentando-se
apenas de farinha d’água. Esse período terminava quando a cordão umbilical caia.
Outro costume extremamente criticado era o fato do pai achatar o nariz do filho
quando este nascia, para os estrangeiros isto significava inferioridade e
domesticação, ato contrário das crianças européias, que “as es apertavam o
nariz dos filhos com a intenção de torná-lo mais afilado” (RAMINELLI, 2001, p.13).
Após o termino do resguardo (queda do umbigo) as mulheres retornavam as
suas atividades diárias, quando nos primeiros meses após o parto comprimiam o
ventre contra os troncos, evitando assim a flacidez. O resguardo sexual era
recomendado pelo chefe religioso da tribo e caso não fosse cumprido traria para o
homem problemas de saúde mais tarde.
Como pode se observar, na Europa as mulheres entregavam seus filhos para
as amas de leite, as índias eram incapazes de fazer isso, as crianças eram
amamentadas pelas mães e seguiam com elas o tempo todo, inclusive nos trabalhos
de roça. No entanto, alguns relatos de viajantes apresentam algumas atrocidades e
barbarismos cometidos pelos indígenas, inclusive que o amor maternal e a
preservação da família, eram pouco significativas para os silvícolas brasileiros
(RAMINELLI, 2001, p.16).
A poligamia era uma pratica que denotava prestígio entre os índios, e as
mulheres eram tratadas com respeito exceto nos momentos em que o marido se
embebedava. As mulheres eram sempre protegidas e defendidas pelo esposo,
inclusive aquelas que tinham “um gênio ruim” (RAMINELLI, 2001, p.19).
69
A sexualidade feminina, tinha seu início na puberdade e segundo as
descrições “as moças perdiam a cabeça, eram tentadas pelo Diabo, enquanto os
rapazes auxiliavam a família, caçando e pescando. A sexualidade pertencia ao
mundo feminino, e o trabalho era a tônica entre as classes de idades masculina”
(RAMINELLI, 2001, p.24). Pode-se observar que a misoginia se fazia presente, pois
devemos nos lembrar que nesse período a Igreja detinha um enorme poder sobre as
ações dos europeus principalmente em Portugal. Essa visão denota a culpa de Eva
sobre as desgraças da raça humana, pela imputação da responsabilidade de ter
seduzido Adão a comer o fruto proibido. Esse ato trouxe consigo a fragilidade moral
do sexo feminino, segundo a Igreja Católica.
Para o frei Yves d’Evreux (apud (RAMINELLI, 2001, p.25) “entre as mulheres,
o tempo não provocava o aprimoramento do espírito, mas a sua degradação, pois as
transgressões perpetradas durante a vida traduziam-se em rugas, seios caídos e
costumes abomináveis”.
Outro fato que merecia ser destacado pelos viajantes, era o fato das mulheres
andarem nuas, incitando à lascívia e à luxúria, mas não eram todos que
compartilhavam dessa visão, pois para alguns os enfeites usados pelas francesas
eram mais sedutores do que a nudez das índias. A nudez era vista por elas com
naturalidade, eram mais discretas. Normalmente, os jovens eram iniciados sem sua
sexualidade pelas mulheres mais velhas da tribo, como também existiam práticas
homossexuais, quando masculinas com a montagem de tendas públicas que
serviam para trabalhos de prostituição, quando femininas exemplificada no costume
das mulheres de cortarem os cabelos, partir para a guerra e ter uma mulher para
servi-las, a qual era tratada como esposa.
As índias velhas eram descritas como pervertedoras e com necessidades de
ingerir a carne humana do inimigo, esse gesto segundo Raminelli (2001, p.27)
“reunia em si os piores atributos de Eva”. Segundo os relatos as mulheres índias e
principalmente as idosas, sentiam prazer em devorar o inimigo.
Pode-se observar, que a concepção de mulher que a Igreja fazia nesse
período na Europa, rompeu fronteiras além mar. Assim, os homens eram,
preservados e inclusive essas mulheres não poderiam ser catequizadas e
convertidas ao cristianismo. No entanto, para Raminelli (2001), a postura das
70
mulheres índias em não se renderem ao europeu personificava a resistência do povo
contra os empreendimentos coloniais europeus, que para eles era inviável
prosseguir com os trabalhos de catequese e colonização.
No Brasil, desde o seu descobrimento, a Igreja tem uma forte influência sobre
o comportamento daqueles que aqui viviam, haja vista que a colonização foi
portuguesa e, na Europa, Portugal era um dos países que sofria uma forte influência
da Igreja Católica.
Com a chegada das mulheres de cor branca ao Brasil, a cultura do branco e
do índio vão paulatinamente se mesclando, com primeira sobrepujando a segunda.
A catequização dos índios brasileiros e de suas mulheres, pelos jesuítas,
mesmo com toda a resistência, influencia os comportamentos, resultando mais tarde
numa perda de identidade indígena.
A sexualidade da mulher branca, que aqui chegou, vem com as mesmas
características da européia. A Igreja ditava as regras, inclusive nas questões
pertinentes ao vestuário, comportamento e até no momento do casamento.
O estereótipo da mulher, no caso do regime patriarcal era: a moça donzela
deveria ser branca, pálida, frágil, virgem, pura, sensível, discreta, tímida; a mulher
adulta deveria ser gorda, maternal, coxas grossas, nádegas proeminentes, seios
fartos, quadris largos; em uma palavra, segundo Leal (c2004, p.170) “uma mulher
forte e parideira que servisse aos interesses básicos do homem que eram a
procriação e os cuidados com o lar”.
As mulheres eram sempre lembradas do terrível mito de Eva, ou seja, de que
elas haviam feito com que o homem pecasse contra Deus, fazendo-o (Adão) comer
do fruto proibido (ARAÚJO, 2001, p.46).
Esse discurso era sempre enfatizado, porque uma das características da
sociedade patriarcal é limitar ao ximo o espaço da mulher, reconhecer o poder
que o homem tem na família. Portanto, a mulher deveria ocupar seu lugar e função
na sociedade na qual esta inserida, ou seja, a esposa, mãe e filha perfeita.
A restrição masculina imposta as mulheres, foi efetivada de maneira
autoritária, tanto as esposas como as filhas eram consideradas propriedades suas.
Não podiam fazer compras nas lojas; a clausura era rompida, nos dias de missa,
pois os outros serviços religiosos, conforme Leal (c2004, p.167) “podiam ser
71
exercidos em capelas e oratórios no interior da casa”. O espaço das ruas era
exclusivo do homem, e o único tipo de mulher que podia circular sem restrições era
a prostituta.
Desde cedo, as mulheres de família (assim consideradas), deveriam ter “os
seus sentimentos devidamente domesticados e abafados”, ou seja, caso a menina
de 12 ou 13 anos, apresentasse um comportamento inquieto, a Igreja permitia o
casamento precoce, pois, no confessionário, o padre, vigiava de perto os seus
gestos, atos, sentimentos e até sonhos, conforme as instruções dos manuais
confessionais da época (ARAÚJO, 2001, p.51). Tanto as solteiras como as casadas,
as mulheres só eram vistas em público aos domingos, na missa, comportamento que
fazia parte de suas obrigações, mesmo depois de casadas, sua presença em público
só era permitida se acompanhadas dos pais ou do esposo.
O casamento era uma forma de domesticar o desejo e as sensações,
podendo portanto, o homem ter uma idade de 30, 60 ou 70 anos de idade, e a
esposa tendo agora o marido como seu senhor e devendo a ele respeito e
obediência e mesmo casada a Igreja continuava exercendo seu poder sobre o
relacionamento. Nada de excessos era permitido, muito menos de erotismo, a
relação sexual servia somente para a procriação. As relações sexuais do casal eram
codificadas conforme os padrões machistas e os imperativos religiosos. O convite
sexual deveria partir sempre do marido, e a mulher não podia recusar, ao ser que
estivesse doente ou com uma indisposição, que muitas vezes não era respeitada.
Deveria existir controle sobre as necessidades da carne, pois o ato sexual
não se destinava ao prazer, isso no caso da mulher, porque o homem poderia
buscar o prazer nos braços da prostituta ou de sua amante.
Em suma, com ou sem prazer, com paixão ou sem ela, nessas condições, a
menina tornava-se mãe e uma mãe honrada, pois havia saído da casa dos pais,
direto para a casa do marido. “Na visão da sociedade misógina, a maternidade teria
de ser o ápice da vida da mulher. Doravante, ela se afastava de Eva e aproximava-
se de Maria, a mulher que pariu virgem o salvador do mundo (ARAÚJO, 2001,
p.52). Mas mesmo neste momento, o brilho da mulher era ofuscado pela presença
dos médicos homens que diziam “que ela continuaria dependente do saber, e do
poder masculino(ARAÚJO, 2001, p.52). Tentavam mapear o corpo feminino e, um
72
tanto “desnorteados e desastrados inventavam interpretações para o funcionamento
e os males da vulva, da menstruação, do aleitamento, do útero, e as prescrições,
eram mais uma dominação a ser suportada” (ARAÚJO, 2001, p.52).
O adestramento de comportamento além de ser feito pela família, igreja,
contava também, com o auxílio dos mecanismos informais de coerção, ou seja,
comentários maldosos dos vizinhos, participação em certos círculos sociais.
Contudo, os desvios da norma, não eram incomuns, e algumas mulheres
tentavam não aceitar passivamente a subordinação, utilizando-se de recursos da
sedução, como por exemplo, quando as mulheres passeavam, as roupas eram
pesadas e cheias de detalhes, em casa vestiam-se com camisolas de tecido
transparente onde os seios ficavam expostos, como das escravas que se vestiam
assim por causa do trabalho exaustivo durante todo o dia. Os trajes tão sumários,
descompostos ou excessivos, eram artifícios culturalmente aceitos que incitavam o
desejo masculino, de uma certa maneira rompendo algumas das regras impostas
pela sociedade misógina.
As meninas desse período, tinham conhecimento básico da leitura; da escrita;
da costura; das contas; e dos bordados, que se realizavam em casa ou em
recolhimentos, ambientes de clausura. Aprendiam também, a tocar e cantar, visando
estarem sempre alegres e divertidas. O objetivo era encaminhá-las ao casamento
tornado-as hábeis na “arte de prender seus maridos e filhos como por encanto, sem
que eles percebam a mão que os dirige nem a cadeia que os prende” (ARAÚJO,
2001, p.51). Aquelas que não freqüentavam aulas no recolhimento recebiam
orientações das mães, amigas, escravas, primas. As mães deste cedo se prestavam
a estas orientações, haja vista que os sentimentos da menina deveriam ser
domesticados e abafados.
As meninas que não seguiam as regras impostas, eram encaminhadas para
os conventos, onde viviam em regime de clausura, negando a sua sexualidade “em
benefício do espírito” (RAMINELLI, 2001 p.73). No entanto, estando em clausura
elas tentavam com discrição romper as barreiras impostas, e como afirma Raminelli
(2001, p.73) “todos sabiam e todos fingiam não saber. Deus também sabia, mas
decerto perdoava”. Observa-se, que os conventos além de resolverem os problemas
73
daquelas que apresentavam desvios de comportamento, também controlavam os
matrimônios.
Deve-se observar, que era vedado a mulher discutir questões pertinentes ao
seu sexo ou de seu país. A inteligente, questionadora, gerava perigo ao poder
masculino; portanto seu conhecimento deveria tratar somente de aspectos frívolos e
depender economicamente do marido.
Na região sul do Brasil, destacada por ter sido a região escolhida para a
pesquisa, compreendida pelas capitais, Desterro (atual Florianópolis), Curitiba e
Porto Alegre, o processo de povoamento, ocorreu de forma singular do restante do
país, que existia um projeto de planejamento, voltado a preencher os espaços
vazios, que fazia parte de uma estratégia militar, que consistia em defender o
espaço e ultrapassar os meridianos das Tordesilhas (PEDRO, 2001, p.278). Isso
favoreceu o tom da população, ou seja, um branqueamento da pele da população e
uma economia diferenciada. Para a defesa e expansão territorial, os homens eram
convocados para as guerras, obrigando as mulheres a assumirem funções de
controle dos negócios da família, conseqüentemente ela adentrava no domínio
público, visando garantir e preservar os bens da família. Essa atividade a obrigava a
mulher a sair sozinha de casa, principalmente nos centros urbanos, o que raramente
acontecia no restante do país e no interior dessas capitais. Segundo os relatos de
viagem do botânico francês, Auguste Saint-Hillaire, que aqui esteve, entre 1816 e
1822, coletando e estudando a fauna e flora brasileira “as mulheres eram mais
sociáveis e suas feições mais delicadas, com a pele branca, o que não acontece no
restante do país, sendo natural encontrá-las caminhando sozinhas pelas ruas”
(PEDRO, 2001, p.280). Outro fator que colaborava para isso, era a não existência de
mão-de-obra escrava. As funções desempenhadas pelos escravos deveriam ser
executadas por eles mesmos, inclusive pelas mulheres.
Com a Proclamação da República, começam a surgir as elites urbanas que
eram formadas em Curitiba e Porto Alegre, por comerciantes e pequenos industriais
e em Desterro (atual Florianópolis), comerciantes, armadores, agenciadores e
construtores de navios. Esses grupos estavam ligados às populações de imigração
recente e ditaram as características das novas elites urbanas (PEDRO, 2001, p.281).
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Esses novos grupos começam a incentivar e promover na imprensa local, em
seus editoriais, novas regras de comportamento para as mulheres.
O conteúdo, desse discurso, era civilizador, “existiam as mulheres pobres,
mas essas não se encaixavam nos modelos ideais propostos, a imagem feminina
veiculada pelos jornais, da época” (PEDRO, 2001, p. 281).
Segundo Pedro (2001, p.281),
a boa mãe, virtuosa, esposa e filha dedicada, esse modelo fazia do ideário da
sociedade ocidental, nos sermões dados pelos padres nas missas; que além
disso acrescentaram que essa mulher era responsável pelo progresso e civilização,
dessa região, já que eram consideradas criadoras e educadoras das novas
gerações.
Como existia uma redução nos papéis familiares das mulheres, face a
inexistência de escravos, esse fato se torna referência importante, nas definições de
distinções, ou seja, “a cor da pele o interessava, mas implicitamente estava dito
para fazer parte da elite ele deveria ser branco, livre, ter propriedade e ser distinto”
(PEDRO, 2001, p.281).
Com a Proclamação da República, surgem e são reforçados os novos
modelos femininos, havendo intensas transformações e remanejamento nas elites
que vinham se delineando no século XX.
Após as crises políticas superadas na Região Sul, principalmente nas
Capitais, surgem às reformas que significariam uma nova configuração do espaço
físico, ocorrendo um controle e segregação das camadas populares, numa tentativa
de afastá-las dos centros urbanos. Essas políticas tiveram em relação a mulher
algumas particularidades, que eram possíveis para as elites urbanas, mas tornavam-
se inviáveis para as mulheres das camadas populares (PEDRO, 2001, p.291/292).
No entanto, esses modelos eram utilizados como justificativa para os baixos salários
pagos pelos empresários, às mulheres e crianças; e pelos líderes operários para
excluir esses trabalhadores do mercado de trabalho.
Com o crescimento das áreas coloniais, surgem populações de diferentes
origens étnicas e estas começam a disputar espaços políticos, que foram “sendo
contestados e desprezados por uma elite urbana de origem portuguesa, que
buscava prestígio econômico e social, entre outras, pela diferenciação de suas
mulheres” (PEDRO, 2001, p.292).
75
No entanto, como as condições econômicas não favoreciam a identificação
das mulheres com o novo modelo e a diversidade cultural era heterogênea, os
comportamentos ditados que compreendiam os papéis de esposa, mãe e dona-de-
casa, não foram adotados.
No caso de Curitiba, destacaram-se ainda menos, pois os defensores da
República e do pensamento positivista eram somente 31, dificultando ainda mais a
identificação dos novos modelos femininos. Mas a imagem da figura materna era
valorizada; e estava atrelada “a missão civilizadora das mulheres, a qual de acordo
com o ideário positivista, deveria ser instruída para aperfeiçoar o esposo e educar os
filhos para a Humanidade” (PEDRO, 2001, p.293).
Essa imagem materna era reforçada também pelos médicos onde se
“procurava persuadir as mulheres de que o amor materno é um sentimento inato,
puro e sagrado e que a maternidade e a educação da criança realizam sua vocação
natural” (RAGO, 1987, p.79).
Em Curitiba, após a Proclamação, travou-se uma verdadeira batalha entre os
positivistas que eram aliados aos maçons e os católicos conservadores que
buscavam predominar no pensar da cidade. Mas essas duas correntes concordavam
que a mulher deveria ser esposa, mãe e dona-de-casa, se integrando portanto com
o restante do país, nessa idealização.
O pensamento da Igreja Católica encontrava apoio principalmente nos
imigrantes italianos, isto devido ao fato de que, para a Igreja as mulheres tiveram
vital importância para o processo de colonização, lembrando que para os italianos, a
religião é um elemento de união e de identidade étnico (PEDRO, 2001, p.293). A
tradição era mantida pelas mães, que juntamente com a escola, religião e à língua
eram elas, que no lar promoviam a conservação da identidade nacional baseada na
origem étnica.
No caso de Desterro, a tradição era a residência matrilocal, visto que, os
homens se ausentavam por longos períodos no mar, obrigando as mulheres a
comandarem as famílias. Normalmente, a filha e o genro moravam na casa dos pais
da mulher, no entanto, com a presença da nova família civilizada, qualquer parente,
além de pais-filhos, atrapalharia, gerando desse fato a imagem negativa da sogra
(PEDRO, 2001, p.295/297).
76
No início do século XX, em Florianópolis, ocorreram tentativas de reajustar as
mulheres das camadas populares, ao ideário proposto, recato, passividade,
delicadeza e outros atributos considerados femininos e próprios da mulher. Caso
essas mulheres não se ajustassem ao comportamento idealizado sofreriam
repressão e arbitrariedade por parte das autoridades policiais, que fugiriam às
normas próprias de sua natureza (SOIHET, 2001, p.366).
As italianas e alemãs eram valorizadas, tanto que nos jornais, se encontrava
com facilidade anúncio de homens procurando mulheres de uma dessas origens
étnicas para contrair matrimônio. No entanto, não se pode dizer o mesmo das
imigrantes polonesas, que chegaram depois e ocuparam áreas menos rteis,
obrigando-as a executarem na área urbana, serviços considerados subalternos, que
em outras regiões do país eram executadas por populações de origem africana
(PEDRO, 2001, p.296).
Essas mulheres, como aquelas pobres de outras regiões do país,
apresentavam valores morais e comportamento social e sexual bastante diferentes
daqueles exigidos das consideradas distintas.
A fragilidade da mulher abordada nos discursos caia por terra, haja vista, a
existência de mulheres solteiras ou viúvas que gerenciam seus bens, cobravam
dívidas e instauravam processos. Em nada, aparentavam fragilidade nem se
comportavam dessa maneira. A presença delas podia ser vista em repartições
públicas; nas ruas, vendendo, lavando roupas, praticando prostituição; garantindo
assim, sua sobrevivência e da família. Aquelas que ficavam em casa, costuravam
para as classes abastadas; também se faziam presentes, nas escolas lecionando,
portanto, a mulher se fez presente em todo o processo de construção do país e na
urbanização das cidades, desempenhando papéis importantes, mesmo que o
recebessem a valorização no mercado de trabalho.
A imagem idealizada da mulher alemã desconsiderava a classe social de
origem, mas em contrapartida, com o enriquecimento, as teuto-brasileiras que viviam
nas áreas urbanas são convidadas a exercer exclusivamente os papéis de esposa,
mãe e dona de casa, acontecendo o mesmo com as residentes em Curitiba e as
moradoras de Porto Alegre. Nesse sentido, Porto Alegre sofreu uma forte influência
do pensamento positivista
77
que tinha por ideário feminino a questão de que "ser mãe era o papel mais mulher
que uma mulher poderia desejar. A autoridade masculina, ficava explícita nos
discursos e na submissão feminina eram compreendidos o binômio obediência e
amor (PEDRO, 2001, p.298).
As mulheres deveriam seguir estes princípios, porque eram delicadas e
meigas e sua função principal seria aperfeiçoar a natureza humana.
Como no restante da Região Sul, essas campanhas tiveram um caráter
limitado, já que esbarravam em culturas diferenciadas como também papéis sexuais,
difíceis de modificar.
No entanto, todo esse discurso era validado pela Igreja Católica, em todas as
regiões do país, mas também pelos dicos, mesmo que as mulheres se
destacassem na área da medicina e da literatura entre outras. Deve-se lembrar, que
um dos fatores da caça as bruxas na Idade Média, “tratava-se da repressão de um
saber, ainda que empírico, praticado pelas mulheres” (TOSI, 1998, p.394). O próprio
Freud dizia que “mulher é ser mãe” (GRANT, 2004, p. 22), resolvendo assim a
questão da castração e quando interrogado do que quer uma mulher?. Ele
responde:ela deseja o Falo” (apud SILVA, 1995, p.43), que a mulher era um
homem castrado, no entanto, após ter passado por um período confuso e com sua
saúde comprometida, ele reconhece que a “influência da falta de um pênis na
conformação da feminilidade pode não ser uma realidade, mas mais uma de suas
idéias fixas” (STRINGUINI, 2001, p.53) e para concluir ele sugere “se quiserem
saber mais sobre a feminilidade, consultem sua própria experiência de vida, ou
perguntem aos poetas” (STRINGUINI, 2001, p.53).
Deve-se ter claro, que toda essa concepção do que a mulher deveria ser e de
como se comportar faziam parte da ideologia burguesa, que as pertencentes as
camadas populares, normalmente "não eram casadas formalmente; trabalhavam e
muito, brigavam na rua, pronunciavam palavrões, fugindo, em grande escala, aos
estereótipos atribuídos ao sexo frágil" (SOIHET, 2001, p.367).
O casamento era uma aspiração da elite branca e burguesa, visando garantir
o patrimônio, o que não era conseguido pelas mulheres pobres, incentivando assim
o regime de concubinato. Caso reclamassem seus direitos eram espancadas e
sofriam violências, com assessoramento da justiça.
78
No entanto, as mulheres violentadas física ou moralmente, desenvolveram
estratégias
com vistas a mobilizar para seus próprios fins representações que lhes eram
impostas, buscando desviá-las contra a ordem que as produziu; ou seja, definiram
muitos de seus poderes por meio de um movimento de reapropriação e desvio dos
instrumentos simbólicos que instituem a dominação masculina contra o seu próprio
dominador (SOIHET, 2001, p.398).
Tem-se como exemplo, os casos de crimes contra a honra, justificavam tal
ação, com os argumentos utilizados pelos homens, usando a defesa a reputação.
Pode-se verificar, portanto, que no final do século XIX e início do século XX,
as mulheres, em sua grande maioria pertencentes às camadas populares e algumas
da classe burguesa, tentaram subverter os padrões preestabelecidos no que
concerne aos estereótipos idealizados para elas. No entanto, o que a sociedade da
época não aceitava era o adultério praticado pelas mulheres. Em se tratando dos
homens, essa pratica, como a do abandono, eram admissíveis, tendo como
justificativa apresentarem sensações diversas daquelas do sexo feminino.
Mesmo com os avanços dos os recursos científicos, a mulher ainda era vista
como um ser moral e socialmente perigoso, que, portanto, nas palavras de Engel
(2001, p.332) “deveria ser submetida a um conjunto de medidas normatizadoras
extremamente rígidas que assegurassem o cumprimento de seu papel social de
esposa e mãe; o que garantiria a vitória do bem sobre o mal, de Maria sobre Eva”.
Como a mulher tinha como missão principal assegurar o bem estar da família,
ela deveria ter conhecimento da leitura e da escrita, facilitando assim seu trabalho de
orientação em casa.
Sob essa perspectiva, surge a profissão mais indicada para ela exercer, nos
anos de 1930 e 1940; o magistério primário que se torna trabalho de mulher, pois
seria como educadora - professora normalista, que ela se responsabilizaria pela
instrução de seus alunos, mas também de educá-los para o caminho do bem,
conforme os ditames da sociedade da época. Afinal de contas ela é a mais indicada
por ser mais dócil, frágil. Mesmo que a rigidez disciplinar desse período, de uma
certa maneira apresentasse certa ambigüidade, para aquela que era meiga e dócil.
No entanto, com a introdução de novas teorias educacionais, exige-se que o
79
controle sobre a classe seja mantido, mas de maneira mais indireta, sem tanta
rigidez.
As distinções entre os papéis femininos e masculinos, no entanto,
continuaram nítidos; a moral sexual diferenciada se fazia presente, inclusive nos
chamados anos dourados (anos 50), fase de ascensão da burguesia no Brasil, a
vocação prioritária da mulher, continuava sendo “a maternidade e a vida doméstica e
qualquer coisa fora disso iria contrariar a sua natureza” (BASSANEZI, 2001, p.616).
O mercado de trabalho para ela continuava sendo restrito e sua sexualidade
negada, mesmo que começassem a surgir os movimentos no Brasil, em prol dos
direitos da mulher.
A mulher brasileira até o início do século XX segundo Silva (1998, p.29)
“correspondia ao ideal vitoriano de esposa, mãe e donas de casa”. As alterações
vão ser sentidas com o desenvolvimento urbano-industrial, onde as mulheres da elite
urbana passaram a articular seus pontos de vista e a se comunicar com outras.
A urbanização trouxe consigo, mudanças em alguns padrões culturais, que
começa ocorrer uma distância entre a moradia e os locais de trabalho, estudo e
lazer; os trajetos agora percorridos por transportes coletivos, o aumento de carros
populares nas ruas, facilitam atividades que até então não eram procuradas.
O profissionalismo, que surgia fortemente, instala-se com a ditadura militar, e
no final dos “anos 60 e na década de 70, torna-se mais intensificado, ocorrendo uma
repressão nos movimentos sociais e explícito controle sobre as atividades culturais,
educacionais, políticas e religiosas” (LOURO, 2001, p.473).
Esses movimentos também estavam relacionados ao direito por melhores
salários das professoras, das datilografas, entre outras profissões desempenhadas
pelas mulheres, iguais aos homens e também por condições de trabalho adequadas,
que segundo as justificativas dadas, eram inferiores. No caso, do magistério, por
exemplo, apenas uma extensão das atividades exercidas no lar. Ocorreram assim
diversos movimentos, inclusive com a introdução do termo trabalhadoras da
educação e, de uma certa maneira, a igualdade salarial foi possibilitada.
Essa questão do magistério foi colocada para demonstrar, que as mulheres
ao longo da história não se mantiveram caladas ou passivas, como o discurso oficial
desejava transmitir. Houveram movimentos encabeçados por mulheres e que
80
alcançaram o sucesso, observando-se que em muitas ocasiões, as lutas eram com
outras mulheres, que a os dias de hoje, sentem-se acomodadas com o
comportamento imposto no descobrimento do Brasil.
No Brasil, os anticoncepcionais, começam a ser utilizados na década de
1960, apesar das críticas, as mulheres passam a ter mais liberdade no que se refere
as relações com seu parceiro, já que uma gravidez poderia ser evitada por ela, e não
ficar na dependência da decisão ou responsabilidade do homem sobre tal assunto; a
independência econômica, atrelada a áreas do conhecimento, das quais ela passa a
fazer parte, aentão reservado aos homens; os avanços na medicina com relação
ao período de engravidar que pode ser estendido para a faixa etária dos 35 anos
aos 40 anos de idade, os recursos tecnológicos que facilitam suas tarefas em casa,
são facilitadores de sua liberdade sexual, de sua autonomia enquanto mulher.
As décadas posteriores introduzem inovações tecnológicas e a modernidade
ou pós-modernidade obrigam a mulher de uma certa maneira a adentrar ao mercado
de trabalho e suas funções de mãe, esposa e dona de casa, passam a ser divididas
com o parceiro, inclusive nas questões de manutenção econômica da família.
No entanto, a sexualidade nos dias de hoje a “é denunciada como promíscua
e permissiva” (BOZON, 2003, p.152), este discurso representa a ala conservadora,
pois apregoa a perda dos valores morais. Uma outra corrente, ao abordar da
revolução sexual, refere-se a qualquer “novidade como o viagra, as trocas de
parceiros ou o sexo virtual”. Tanto uma como outra ainda encontram-se atreladas
aos controles sociais antigos, haja vista, se exigir prazer com o outro; ter o outro
para buscar prazer e desejo; reciprocidade que se opõe a do prazer individual.
Essas oposições são justificadas em termos de diferenças de natureza psicológica
entre os homens e mulheres (BOZON, 2003, p.153).
Os homens são vistos como “sujeitos desejantes independentes, as mulheres
continuam a ser vistas como objetos a serem possuídos” (BOZON, 2003, p.153).
Nestes discursos aparece a reafirmação da ideologia antiga, apenas com uma
nova roupagem de que tudo é permitido ao masculino, mas no caso da mulher, ela
ainda é reprimida em seus desejos e em seu prazer.
81
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com esse estudo, pode-se considerar que, a literatura sobre sexualidade
feminina, utilizada e consultada para a construção do suporte teórico, nos reportou,
primeiramente a Idade Média, período em que o poder da Igreja agia de maneira
implacável contra as mulheres, a ponto de instalarem os tribunais inquisitórios,
utilizados como meios repressivos contra qualquer manifestação contrária aos
dogmas da Igreja, principalmente a vertente que colocasse Eva acima de Maria.
A sociedade de cunho patriarcal vislumbrava a mulher dessa época como
inferior ao homem, devendo, portanto, prestar-lhe obediência. O desejo e a busca
pelo prazer sexual eram temas descartados, se enfatizava a reprodução, a
perpetuação da espécie. O espaço público poderia ser utilizado pelo homem,
restando a mulher o espaço privado, da casa e dos afazeres domésticos.
A participação das mulheres no processo histórico vai se fazer presente
com os historiadores da corrente da nova História, que irão relatar a história dos
vencidos.
Toda a repressão direcionada a mulher irá acarretar doenças, que eram
consideradas como sendo femininas, o caso da histeria, furor uterino, dentre outras
denominações.
A masturbação, nesse período da história é abordada nos manuais médicos,
não como uma forma de conhecimento do corpo, apenas como uma exteriorização
de mulheres que mantinham pacto com o demônio ou reverenciam as religiões
consideradas pagãs. A Igreja proibia este tipo de ação, colocando-a como
pecaminosa e proibitiva.
A sociedade patriarcal no período da Idade Moderna, também tinha um
estereótipo de mulher, que segundo o próprio Foucault era um mecanismo de
controle social. Falava-se de sexo, da prática sexual, visando controlar o indivíduo e
a população. Esse discurso ocorria nas instituições como Igreja, escola, família e o
consultório médico.
82
A questão da masturbação ou da auto-estimulação é tratada nos consultórios
médicos, para o tratamento de mulheres diagnosticadas como histéricas surgindo
com a Revolução Industrial o primeiro estimulador clitoriano portátil, mas, para ser
utilizado pelo médico.
A mulher ainda não tinha uma participação efetiva no mercado de trabalho
masculino. Era o homem que exercia o papel de provedor nas famílias, portanto,
devendo a mulher prestar-lhe satisfações, situação presente nas famílias nos dias
atuais.
Em contrapartida, surge Freud, o Pai da Psicanálise, que observando
pacientes diagnosticadas como histéricas, resolveu estudá-las, revolucionando com
sua teoria o pensamento médico da época. Ele abordou a sexualidade de maneira
totalmente diferente da vista até então. A sexualidade da criança, os sentimentos de
castração e o Complexo de Édipo, enfim toda uma teoria que tentou solucionar os
problemas repressivos principalmente das mulheres. No entanto, para Freud,
quando “perguntado, o que é ser mulher? Ele responde mulher é ser mãe”. A figura
da mulher continua atrelada à reprodução.
O prazer feminino continua sendo relegado a um plano secundário. As
mulheres modernas continuam sonhando com o príncipe encantado, o amor cortês
ou amor romântico, que lhe proverá prazer.
Lacan, com os quatro conceitos psicanalíticos: repressão, pulsão,
transferência e repetição, utilizados no estudo: para categorizar as falas das
entrevistadas, auxiliou a detectar que algumas delas apresentavam características
repressivas, mas que foram superadas. O prazer sexual o é negado, os
sentimentos de culpa são eliminados. Essas mulheres praticam a auto-estimulaçao,
utilizando-se de recursos tecnológicos disponíveis no mercado, os brinquedos
sexuais.
Lacan abre outras perspectivas para se pensar a sexualidade feminina, a
mulher tem uma natureza diferente da masculina.
A mulher, no período de Lacan, pertencia aos movimentos sociais e culturais
da França, participava ativamente do mercado de trabalho restrito a então aos
homens. Os movimentos de libertação sexual da mulher estão no ápice, a pílula
anticoncepcional libera a mulher, deixando ao seu encargo gerar filhos ou não, sentir
83
prazer. Essa mulher descobre que sente prazer e tem direito a ele. A revolução
sexual estava acontecendo, a França estava em efervescência, enfim a realidade da
época era outra. No entanto, a masturbação a hoje, o é veiculada, inclusive
pelos meios de comunicação, quando falam, se reportam ao casal, não ao prazer
feminino independente, ainda o casamento é a legalização para o prazer sexual
feminino.
As mulheres pesquisadas, desmistificaram a masturbação ou auto-
estimulação, buscam e atingem o prazer independente, romperam com um
mecanismo de repressão imposto pela sociedade, se submeteram ao processo
terapêutico, tem independência financeira, fatores que podem ter influenciado esse
comportamento inovador, os vínculos afetivos são menos intensos, a expectativa
com relação ao outro, não é centrada na imagem do príncipe encantado e sim no
respeito e consideração.
Elas conhecem o próprio corpo, mas, além disso, os vínculos afetivos são
visualizados por elas de outra maneira, a expectativa do príncipe não existe mais. As
relações com o parceiro são centradas no respeito e na consideração.
Essas mulheres geraram filhos e os educaram conforme suas concepções,
portanto, teremos nas próximas décadas uma geração em que a masturbação será
vista com naturalidade por todos, ou não, cabendo estudos sobre o tema.
Dentro deste contexto, sugere-se para próximas pesquisas, questões como:
quais as conseqüências do rompimento com a desmistificação sobre a auto-
estimulação?
Se essas mulheres se caracterizarem por apresentarem um comportamento
inusitado e inovador, qual o significado em termos sociais dessa mudança?
Que mulheres são essas?
Quais as conseqüências desse tipo de comportamento, para a sociedade
atual?
Quais são as implicações decorrentes dessa independência?
Ou até que ponto o prazer independente, gera liberdade para a mulher?
Que poder sobre o corpo e sobre si esta mulher possui?
Enfim, que mulher é essa e as conseqüências para o mercado de trabalho?
Quais as relações de poder entre os gêneros na sociedade?
84
Os brinquedos sexuais também podem ser foco de pesquisas, já que o
modelo do ‘patinho’, representa um brinquedo infantil, nos fazendo lembrar que
Freud dizia que a masturbação era um ato da infância, a indústria do sexo viu nisso
um simbolismo? Questionamento que pode ser pesquisado, haja vista, que para
sermos o que somos hoje, fomos beber da fonte do passado.
85
REFERÊNCIAS
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PRIORE, Mary (org.). História das mulheres no Brasil. 5.ed. São Paulo:
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História das mulheres no Brasil. 5.ed. São Paulo: Contexto, 2001. p.607-639.
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VALENSIN, Georges. Dicionário sexual. São Paulo: IBRASA, 1976.
89
ANEXO 1
ROTEIRO DA ENTREVISTA FEITO COM AS VENDEDORAS DOS
SEX SHOP
PERFIL DAS CLIENTES
1 Tipo de clientela
2 Como são selecionados os clientes
3 Existem clientes vips
4 Política para clientes
5 Cadastro de clientes
90
ANEXO 2
ROTEIRO PARA AS ENTREVISTADAS
CLIENTES
1 Faixa etária da cliente
2 Estado civil
3 Qual a sua religião
3 Escolaridade
1 Profissão
2 Empresa que trabalha
4 Cargo que ocupa
4 Quanto tempo freqüenta a Loja
5 Quantas vezes aparece para comprar na Loja
6 Gasto mensal aproximado na Loja
7 Tipo de recurso tecnológico que adquire
8 Facilidades do recurso tecnológico
9 Por que utilizar os recursos
5 Por que você freqüenta o sexy shop
6 O que você busca nesse tipo de loja.
7 Quais os artefatos que você procura? Por que?
8 Como é a sua pratica sexual
9 Por que da masturbação
10 Você tem parceiro
11 Você sente orgasmo se masturbando
91
12 Em que momento você se masturba
13 O seu parceiro lhe proporciona prazer
14 Em sua opinião o seu parceiro é responsável pelos seus orgasmos
15 Na sua opinião o que são as mulheres modernas
16 Você se realiza com a auto estimulação
92
ANEXO 3
MODELOS DO ESTIMULADORES CLITORIANOS
Para facilitar o entendimento do que sejam esses recursos tecnológicos
apresentam-se, neste trabalho, dois modelos americanos patenteados e licenciados
para a comercialização, com uma explicação da parte interna dos mesmos.
Esclarecemos que, apresentamos esses dois modelos, porque após pesquisa
exaustiva em sites e literatura sobre o tema, encontramos os modelos
referendados.
MODELO 1
ESTIMULADOR CLIOTRIANO COM VIBRATOR.
Identificação: Patente n. US 6.923.755B2, patenteado no Departamento
de Patentes dos Estados Unidos.
Resumo do dispositivo
Estimulador clitoriano com um dispositivo vibrador, dotado de um clipe
adaptável, que permite ser montado junto aos lábios vaginais da usuária. O
dispositivo, com o conjunto do clipe, permite que ele seja instalado de modo a
estabelecer contato com a área do clitóris. Em uma montagem alternativa o
dispositivo pode ser afixado em um suporte, dispensando um outro aparelho
vibrador. O suporte entra em contato com a área do clitóris. Em outra opção, ainda,
o conjunto do clipe adaptável é montado diretamente no dispositivo vibrador dfo
próprio aparelho.
Em todas as opções de montagem, uma ação aderente confortável e eficiente
é exercida junto aos lábios vaginais para assegurar que o estimulador fique na
posição devida.
Bases da Invenção
Área da invenção se relaciona à estimulação clitoriana e mais particularmente
à capacidade de utilização do dispositivo eletrônico, dispensando qualquer
manipulação adicional por parte da usuária.
Objetivos da invenção
Constitui como principais objetivos da invenção:
- facilitar a estimulação da área clitoriana, dispensando que a usuária o
segure na posição;
- permitir que a usuária mantenha uma relação sexual enquanto utiliza o
estimulador;
- fornecer um dispositivo simples e não invasivo que estimule de modo efetivo
o clitóris;
- ser de baixo custo de fabricação e manutenção não comprometendo sua
eficiência.
93
Descrição dos Desenhos
O invento consiste nos detalhes da montagem e combinação de partes
mediante descrição, nas figuras 1 e 2.
A Figura 1 representa uma vista isométrica da montagem ideal do estimulador
clitoriano e a figura 2, a visão superior da montagem do dispositivo descrito na figura
1.
94
FIGURA 3: Mostra uma visão isométrica da montagem do dispositivo descrito na figura 1.
FIGURA 4: Visão isométrica da montagem do dispositivo descrito na figura 1, em outro
ângulo.
95
FIGURA 5: Mostra uma vista de uma montagem alternativa da invenção, onde o conjunto do
clipe é montado no dispositivo vibrador diretamente.
FIGURA 6: Mostra uma vista isométrica de uma montagem alternativa da presente invenção,
onde o dispositivo vibrador é montado de forma removível em um
membro como
suporte.
96
MODELO 2
ESTIMULADOR CLITORIANO COM SUCÇÃO TUBULAT
Identificação: Patente n. US6099463, no Departamento de Patentes dos
Estados Unidos.
Resumo do dispositivo
O estimulador feminino é composto por uma câmara de sucção tubular
dimensionada para se acomodar em torno do clitóris. A câmara de sucção é
conectada à fonte de vácuo parcial variável através de um tubo. A fonte de vácuo
parcial pode ser a boca da usuária ou um dispositivo mecânico tal como uma bomba
ou bulbo de vácuo. O clitóris ao ser sugado pela diferença de pressão, acaba por se
encher de sangue, produzindo uma satisfação de prazer sexual. A força de sucção
pode ser controlada por uma válvula de pressão. A parte frontal do tubo é
anatomicamente adequada para produzir uma vedação, evitando a entrada de ar.
Bases da Invenção
Área da invenção, se relaciona genericamente a dispositivos de estimulação
sexual, especificamente de estimulação feminina.
Objetivos da Invenção
O objetivo primário desta invenção é proporcionar uma sensação de prazer
sexual ao clitóris, como também:
proporcionar uma sensação mais elevada de prazer;
ser de utilização fácil e confortável;
propiciar uma estimulação segura e sem riscos para o clitóris;
proporcionar prazer para si mesma ou a uma parceira;
ser utilizada sob as roupas de maneira desapercebida;
Ser de simples fabricação e de baixo custo.
Descrição dos Desenhos
Figura 1. É um diagrama esquemático do dispositivo de estimulação do clitóris
de acordo com a invenção.
Figura 2. Vista da seção do primeiro tipo de montagem da câmara de sucção
do dispositivo.
Figura 3. Vista da seção do segundo tipo de montagem da câmara de sucção
do dispositivo.
Figura 4. Vista da seção do terceiro tipo de montagem da câmara de sucção
do dispositivo.
Figura 5. Vista da seção do quarto tipo de montagem da câmara de sucção do
dispositivo.
Figura 6. Vista da seção do quinto tipo de montagem da câmara de sucção do
dispositivo.
97
Figura 7. Vista da seção do sexto tipo de montagem da câmara de sucção do
dispositivo.
Figura 8. Vista da seção do sétimo tipo de montagem da câmara de sucção
do dispositivo.
Figura 9. Vista da seção do oitavo tipo de montagem da câmara de sucção do
dispositivo.
Figura 10. Vista da seção do nono tipo de montagem da câmara de sucção do
dispositivo.
Figura 11. Vista da seção do décimo tipo de montagem da câmara de sucção
do dispositivo.
Figura 12. Vista da seção do dispositivo em uso.
98
99
Pode-se observar, pela descrição dos estimuladores, recursos tecnológicos
específicos, sendo que os dois modelos têm como objetivo principal auxiliar as
mulheres a atingirem o orgasmo clitoriano. O material que reveste é lavável (silicone)
e de fácil higienização e tanto um como outro, com a garantia dos fabricantes de não
ferir a região clitoriana.
100
MODELO 3
ESTIMULADORES CLITORIANOS DISPONÍVEIS NOS SEX SHOP
101
102
ANEXO 4
DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA MULHER E DA CIDADÃ
Este documento foi proposto à Assembléia Nacional da França, durante a
Revolução Francesa (1789-1799). Marie Gouze (1748-1793), a autora, era filha de
um açougueiro do Sul da França, e adotou o nome de Olympe de Gouges para
assinar seus panfletos e petições em uma grande variedade de frentes de luta,
incluindo a escravidão, em que lutou para sua extirpação. Batalhadora, em 1791 ela
propõe uma Declaração de Direitos da Mulher e da Cidadã para igualar-se à outra
do homem, aprovada pela Assembléia Nacional. Girondina, ela se opõe abertamente
a Robespierre e acaba por ser guilhotinada em 1793, condenada como contra-
revolucionária e denunciada como uma mulher "desnaturada".
PREÂMBULO
Mães, filhas, irmãs, mulheres representantes da nação reivindicam constituir-
se em uma assembléia nacional. Considerando que a ignorância, o menosprezo e a
ofensa aos direitos da mulher são as únicas causas das desgraças públicas e da
corrupção no governo, resolvem expor em uma declaração solene, os direitos
naturais, inalienáveis e sagrados da mulher. Assim, que esta declaração possa
lembrar sempre, a todos os membros do corpo social seus direitos e seus deveres;
que, para gozar de confiança, ao ser comparado com o fim de toda e qualquer
instituição política, os atos de poder de homens e de mulheres devem ser
inteiramente respeitados; e, que, para serem fundamentadas, doravante, em
princípios simples e incontestáveis, as reivindicações das cidadãs devem sempre
respeitar a constituição, os bons costumes e o bem estar geral.
Em conseqüência, o sexo que é superior em beleza, como em coragem, em
meio aos sofrimentos maternais, reconhece e declara, em presença, e sob os
auspícios do Ser Supremo, os seguintes direitos da mulher e da cidadã:
Art. I - A mulher nasce livre e tem os mesmos direitos do homem. As
distinções sociais só podem ser baseadas no interesse comum.
Art. II - O objeto de toda associação política é a conservação dos direitos
imprescritíveis da mulher e do homem: Esses direitos são a liberdade, a
propriedade, a segurança e, sobretudo, a resistência à opressão.
Art. III - O princípio de toda soberania reside essencialmente na nação, que é
a união da mulher e do homem: nenhum organismo, nenhum indivíduo, pode
exercer autoridade que não provenha expressamente deles.
103
Art. IV - A liberdade e a justiça consistem em restituir tudo aquilo que pertence
a outros, assim, o único limite ao exercício dos direitos naturais da mulher, isto é, a
perpétua tirania do homem, deve ser reformado pelas leis da natureza e da razão.
Art. V - As leis da natureza e da razão proíbem todas as ações nocivas à
sociedade: tudo aquilo que não é proibido pelas leis sábias e divinas não podem ser
impedidos e ninguém pode ser constrangido a fazer aquilo que elas não ordenam.
Art. VI - A lei deve ser a expressão da vontade geral: todas as cidadãs e
cidadãos devem concorrer pessoalmente ou com seus representantes para sua
formação; ela deve ser igual para todos.
Todas as cidadãs e cidadãos, sendo iguais aos olhos da lei. devem ser
igualmente admitidos a todas as dignidades, postos e empregos públicos, segundo
as suas capacidades e sem outra distinção a não ser suas virtudes e seus talentos.
Art. VII - Dela não se exclui nenhuma mulher: esta é acusada, presa e detida
nos casos estabelecidos pela lei. As mulheres obedecem, como os homens, a esta
lei rigorosa.
Art. VIII - A lei só deve estabelecer penas estritamente e evidentemente
necessárias e ninguém pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e
promulgada anteriormente ao delito e legalmente aplicada às mulheres.
Art. IX - Sobre qualquer mulher declarada culpada a lei exerce todo o seu
rigor.
Art. X - Ninguém deve ser molestado por suas opiniões, mesmo de princípio;
a mulher tem o direito de subir ao patíbulo, deve ter também o de subir ao pódio
desde que as suas manifestações não perturbem a ordem pública estabelecida pela
lei.
Art. XI - A livre comunicação de pensamentos e de opiniões é um dos direitos
mais preciosos da mulher, que essa liberdade assegura a legitimidade dos pais
em relação aos filhos. Toda cidadã pode então dizer livremente: sou a mãe de um
filho seu", sem que um preconceito rbaro a force a esconder a verdade; sob pena
de responder pelo abuso dessa liberdade nos casos estabelecidos pela lei.
Art. XII - É necessário garantir principalmente os direitos da mulher e da
cidadã; essa garantia deve ser instituída em favor de todos e não daqueles às
quais é assegurada.
Art. XIII - Para a manutenção da força pública e para as despesas de
administração, as contribuições da mulher e do homem serão iguais; ela participa de
todos os trabalhos ingratos, de todas as fadigas, deve então participar também da
distribuição dos postos, dos empregos, dos cargos, das dignidades e da indústria.
Art. XIV - As cidadãs e os cidadãos têm o direito de constatar por si próprios
ou por seus representantes a necessidade da contribuição pública. As cidadãs
104
podem aderir a ela com a aceitação de uma divisão igual, não nos bens, mas
também na administração pública, e determinar a quantia, o tributável, a cobrança e
a duração do imposto.
Art. XV - O conjunto de mulheres igualadas aos homens para a taxação tem o
mesmo direito de pedir contas da sua administração a todo agente público.
Art. XVI - Toda sociedade em que a garantia dos direitos não é assegurada,
nem a separação dos poderes determinada, não tem Constituição; a Constituição é
nula se a maioria dos indivíduos que compõem a nação não cooperou na sua
redação.
Art. XVII – O direito a propriedade pertence a ambos os sexos quer unidos ou
em separado, para cada é um direito sagrado e inalienável, ninguém pode ser dele
despojado, uma vez que seja um patrimônio da natureza, a menos que legalmente
declarado como de utilidade pública e mesmo assim, com uma justa e antecipada
indenização.
CONCLUSÃO
Mulher desperta. A força da razão se faz escutar em todo o Universo. Reconhece
teus direitos. O poderoso império da natureza o está mais envolto de
preconceitos, de fanatismos, de superstições e de mentiras. A bandeira da verdade
dissipou todas as nuvens da ignorância e da usurpação. O homem escravo
multiplicou suas forças e teve necessidade de recorrer às tuas, para romper os seus
ferros. Tornando-se livre, tornou-se injusto em relação à sua companheira.
Formulário para um contrato social entre homem e mulher
Nós, __________ e ________ movidos por nosso próprio desejo, unimo-nos
por toda nossa vida e pela duração de nossas inclinações mútuas sob as seguintes
condições: Pretendemos e queremos fazer nossa uma propriedade comum
saudável, reservando o direito de dividi-la em favor de nossos filhos e daqueles por
quem tenhamos um amor especial, mutuamente reconhecendo que nossos bens
pertencem diretamente a nossos filhos, de não importa que leito eles provenham
(legítimos ou não)e que todos, sem distinção, têm o direito de ter o nome dos pais e
das mães que os reconhecerem, e nós impomos a nós mesmos a obrigação de
subscrever a lei que pune qualquer rejeição de filhos do seu próprio sangue
(recusando o reconhecimento do filho ilegítimo). Da mesma forma nós nos
obrigamos, em caso de separação, a dividir nossa fortuna, igualmente, e de separar
a porção que a lei designa para nossos filhos. Em caso de união perfeita, aquele que
morrer primeiro deixa metade de sua propriedade em favor dos filhos; e se não tiver
filhos, o sobrevivente herdará, por direito, a menos que o que morreu tenha disposto
sobre sua metade da propriedade comum em favor de alguém que julgar apropriado.
(Ela, então, deve defender seu contrato contra as inevitáveis objeções dos
"hipócritas, pretensos modestos, do clero e todo e qualquer infernal grupo").
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