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como o ataque de Senaquerib, fizeram com que o profeta modificasse sua crença em dois
aspectos: (i) a fé em Iahweh é agora condição da proteção e (ii) a invasão inimiga contra
Jerusalém faz parte do plano de Deus. Confira estes dois aspectos da pregação diferenciada de
Isaías nos textos a baixo:
“Assim diz o senhor Iahweh:
Tal não se realizará, tal não há de suceder (...)
Se não credes, não vos mantereis firmes (’im lô’ ta’
a
mînû/kî lô’ te’amenû).” (Is 7, 7.9b)
“Ai da Assíria, vara da minha ira;
ela é o bastão do meu furor nas suas mãos.” (Is 10,5)
Pelos textos analisados, parece que Isaías é um citadino, um homem de Jerusalém.
Mas, não só esta conclusão pode ser tomada. Durante o século VIII, o monarca está cercado
por uma elite e é muito provável que Isaías faça parte dessa “aristocracia” jerosolimitana. A
forma como pensa e como lida com a política de seu tempo pode revelar este dado. Além
disso, o profeta sabe escrever (8,1; 30,8), e não de forma rústica
184
. O estilo poético e a
classicidade indiscutível de sua linguagem sugerem que o profeta tenha recebido uma
educação refinada. Basta notar a notável aproximação de sua linguagem com o vocabulário da
Sabedoria
185
.
Neste aspecto, alguns defendem que Isaías pertencia ao grupo dos sábios antes do
chamado para a atividade profética
186
. Outros enfatizam, contudo, as críticas que o profeta faz
a essa categoria
187
. Nessa última tese, o vocabulário sapiencial utilizado por Isaías é explicado
184
Estamos acostumados a pensar o profeta como um simples “orador”. Todavia, as descobertas arqueológicas –
especialmente os óstracos da Samaria – evidenciam que nos dois últimos séculos da monarquia a escrita estava
amplamente difundida. Para uma boa tradução das inscrições israelitas: LEMAIRE, A. Inscriptions hebraïques I.
Les Ostraca. Paris: Ed. du Cerf, 1977. Alguma recolha de material em ANET, p.321-322. Cf. também
AUFRECHT, W.E. Urbanization and Northwest Semitic inscriptions of the Late Bronze and Iron Ages. In:
Urbanism in Antiquity. Sheffield: JSOT Press, 1997, p.116-129 (JSOTS,244).
185
Isaías utiliza metáforas (5,1ss; 28,23ss), jogos de palavras (1,23; 3,24; 5,7) e provérbios (1,3; 2,22; 3,10ss;
5,6ss; 10,15). Além disso, seus oráculos possuem termos da literatura sapiencial que não aparecem muito nos
demais profetas clássicos do século VIII, como hakam e hokma, bîn e bînah, ya‘ats e ‘etsah, yada‘ e de‘a
tûsiyya, entre outros.
186
Assim, FICHTNER, J. Isaiah among the wise. In: CRENSHAW, J.L. (Org.) Studies in Ancient Israelite
Wisdom. New York: Ktav, 1976, p.436 (= “Jesaja unter den Weisen”. Theologische Literaturzeitung, v.74, 1949,
p.75-80).
187
Para ataques explícitos: 5,21; 29,14. O texto de 5,8.11-12 que condena a riqueza e o luxo pode estar se
contrapondo à Sabedoria que as considera um sinal da benção divina (Pr 10,15.22; 12,9; 13,8.11.23; 14,20.23;
18,11 et passim). Veja ainda: Is 3,1-3; 5,19; 14,24; 29,15; 30,1. Nestes últimos, o profeta usa o verbo ya‘ats,