Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS
A INFLUÊNCIA DA INFLEXÃO COSTEIRA NA PRAIA DE MOSTARDAS – RS
SOBRE AS VARIAÇÕES DA LINHA DE PRAIA
LUCIANO ABSALONSEN
Orientador: Prof. Dr. Elírio E. Toldo Jr.
Comissão Examinadora: Prof. Dr. Eduardo Siegle
Prof. Dr. Lauro Calliari
Prof. Dr. Luiz Tabajara
Dissertação de Mestrado apresentada como
requisito parcial para a obtenção do
Título de Mestre em Geociências
Porto Alegre 2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
SUMÁRIO
SUMÁRIO ii
RESUMO iv
ABSTRACT v
LISTA DE FIGURAS E TABELA vi
INTRODUÇÃO vii
ARTIGO SUBMETIDO 1
ABSTRACT 2
ÍNDICE DO ARTIGO 3
INTRODUÇÃO 4
Aspectos Geológicos e Físicos da Área 5
Estudos Anteriores 8
Área de Estudo 10
METODOLOGIA 12
Levantamento dos Perfis Longitudinais 12
Correções Utilizadas 13
Mapas Topográficos da Praia 15
Caracterização dos Eventos 16
RESULTADOS 17
Condições Meteo-Oceanográficas 17
Variações Sazonais 18
Mobilidade da Linha de Praia 18
Variações Tridimensionais 20
Variações Anuais 22
ii
ads:
DISCUSSÕES 25
CONCLUSÕES 27
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 29
SUMÁRIO INTEGRADOR 33
iii
Resumo: A praia de Mostardas com aproximadamente 36 km de extensão está localizada no litoral
médio do Rio Grande do Sul, sendo o balneário de São Simão e o farol de Mostardas os limite norte e sul,
respectivamente. Na metade norte da praia de Mostardas verifica-se um comportamento deposicional
anômalo a maioria das praias do litoral do estado. O comportamento anômalo deste trecho do litoral é
influenciado pela diferença na orientação da linha de costa de aproximadamente 11° presente nesta praia.
Esta inflexão faz com que a energia das ondas atue de maneira diferente nos trechos ao norte e ao sul desta
inflexão, quando analisadas tanto em escala sazonal quanto em escala anual. Dentro de um mesmo ano,
escala sazonal, a morfologia foi moldada de acordo com os eventos à que a praia foi submetida, deixando
superfície da praia plana, baixa e regular com a passagem de tempestades e adquirindo um maior estoque de
sedimentos em sua porção subaérea em condições de mar com ondulações, marcando a sazonalidade desta
praia. As variações anuais, verificadas em um intervalo de 8 anos entre os monitoramentos realizados em
1997 e 2005, notou-se que a metade sul da praia apresenta em quase sua totalidade áreas de erosão. O
comportamento da metade norte é bastante distinto, com um aumento significativo das áreas de estabilidade
e progradação, com 36,1 e 28,1 % dos 17 km deste trecho da praia e uma média de avanço de 1,1 m/ano em
direção ao mar. A metade norte mostra também áreas de progradação superiores às encontradas em estudos
anteriores na costa do Rio Grande do Sul, de 7 e 8 % (Toldo et al., 1999; Esteves et al., 2002). Este
comportamento confirma que a inflexão costeira encontrada neste local influência de maneira significativa as
variações da linha de costa na praia de Mostardas.
iv
Abstract: Mostardas beach, with an approximate extension of 36 km, is located along the intermediate
section of Rio Grande do Sul state’s coastline, its North and South limits being São Simão beach and
Mostardas lighthouse, respectively. At the northern portion of the beach, an anomalous depositional behavior
is found, relative to most beaches along the state coast. The anomalous behavior found at this beach strip is
influenced by a nearly 11º change in beach orientation. Such inflexion makes the wave energy act differently
in beach strips located north and south from the inflexion, as examined in both seasonal and annual scales.
Within a given seasonal scale, the morphology will have been shaped according to events the beach was
subjected to, leaving the beach surface even, low, and regular with the passage of storm events, and
acquiring a greater sediment stock at its subaerial portion in low-sea conditions, thus marking this beach’s
seasonality. Yearly variability, verified at an 8-year interval between monitoring conducted in 1997 and
2005, demonstrated that the southern half of this beach shows erosion in almost its totality. The behavior of
the 17 km of the northern half is quite different, with a significant enhance of stability and accretion areas,
36.1 and 28.1 %, respectively, and a seaward progradation mean of 1.1 m/year. The northern half also shows
progradation areas between 3 and 4 times longer than those found in previous researches made on the Rio
Grande do Sul coast (Toldo et al., 1999; Esteves et al., 2002). Such behavior confirms that the coastal
inflexion found at the place significantly contributes with the shoreline variability in Mostardas beach.
v
LISTA DE FIGURAS E TABELA
Figura 1- Localização da praia de Mostardas no litoral médio do Rio Grande do Sul
Figura 2 - Levantamento longitudinal do perfil de praia utilizando o sistema de posicionamento
global (GPS). As linhas marcam a trajetória do monitoramento; linha tracejada – a
linha d’água associada ao espraiamento da onda; linha contínua – entre a duna frontal e
a linha d’água.
Figura 3 - Deslocamento da linha de praia durante os eventos analisados em 2005, considerando os
pontos de controle de janeiro como referência e marco inicial para estas variações. A
linha pontilhada delimita o local em que ocorre a variação de 11° na linha de costa e
divide os trechos norte e sul dos levantamentos.
Figura 4 - Segmentos de controle com extensão de 300 m e largura média de 30 m, da porção subaérea
referentes aos levantamentos dos meses de janeiro, maio e setembro.
Figura 5 - Segmentos de controle com extensão de 300 m e largura média de 30 m, da porção
subaérea, referentes aos levantamentos dos meses de janeiro, maio e setembro.
Figura 6 - Imagem do satélite Landsat, com a apresentação dos resultados do comportamento da linha
de costa de Mostardas entre os anos de 1997 e 2005 e localização dos pontos de controle
utilizados para criação dos segmentos de controle de 300 m.
Tabela 1 - Condições dos parâmetros oceanográficos e meteorológicos encontrados na realização dos
perfis longitudinais da praia. Onde H
S
é a altura significativa da onda; H
0
a altura em águas
profundas; T o período; L
0
o comprimento de onda em águas profundas; β a declividade da
face da praia e R o runup da onda.
vi
INTRODUÇÃO
Mudanças na morfologia praial causadas por transporte residual de sedimento são aparentes em uma
escala temporal de 10
0
anos ou mais. Flutuações semi-anuais devem-se a ciclos sazonais, ocorrendo erosão
em ciclos de maior energia (perfil de tempestade) e acresção em condições menos energéticas (perfil de
"swell"). Este comportamento cíclico implica em uma classificação dos perfis praiais em de inverno e de
verão, associando as características morfológicas do perfil praial, as condições energéticas recorrentes em
cada uma das estações. Sabe-se, porém que eventos de maior freqüência, na escala de dias a meses, podem
ocasionar mudanças abruptas das condições energéticas e, consequentemente, morfológicas.
As variações morfológicas de curta escala temporal devem-se primordialmente à movimentação
transversal dos sedimentos, enquanto que a movimentação longitudinal apresenta uma escala temporal
maior.
Estudos realizados no litoral do Rio Grande do Sul, com a realização de perfis longitudinais, fizeram
uma análise da variação da linha de costa entre 1975 e 2000 e classificaram a costa em áreas submetidas a
processos de erosão, acresção e estáveis, baseados em levantamentos aerofotográficos e mapeamento da
linha de costa utilizado GPS (Esteves et al., 2001).
Estimativas da capacidade do transporte longitudinal de sedimentos, foram realizadas sendo que os
maiores valores encontrados corroboram com os principais pontos de erosão da costa gaúcha. Estes locais
são a praia do Hermenegildo e o trecho entre o Cassino e o farol da Solidão, com taxas de 2.900.000 m³/ano
e de 2.600.000m³/ano para nordeste, respectivamente (Lima et al., 2001).
O objetivo da presente dissertação, apresentado mediante à publicação do artigo, é avaliar as variações
ocorridas ao longo do litoral de Mostardas dentro de um ano (variações sazonais) e ao longo de 8 anos
(variações anuais) através do uso de ferramentas de previsão e monitoramento oceanográficas e
meteorológicas. Um outro objetivo é verificar se a diferença na orientação da linha de costa é o principal
agente controlador do comportamento anômalo desta praia em relação às praias adjacentes.
vii
A influência da inflexão costeira na praia de Mostardas – RS sobre as variações da linha de praia
Influence of the coastal inflection in Mostardas beach – RS, on shoreline variability
Luciano Absalonsen
1
& Elírio E. Toldo Jr
2
1
Programa de Pós-Graduação em Geociências, IG-UFRGS. e-mail: [email protected]
2
Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica, CECO-IG-UFRGS. e-mail: [email protected]
1
Abstract: Mostardas beach, with an approximate extension of 36 km, is located along the intermediate
section of Rio Grande do Sul state’s coastline, its North and South limits being São Simão beach and
Mostardas lighthouse, respectively. At the northern portion of the beach, an anomalous depositional behavior
is found, relative to most beaches along the state coast. The anomalous behavior found at this beach strip is
influenced by a nearly 11º change in beach orientation. Such inflexion makes the wave energy act differently
in beach strips located north and south from the inflexion, as examined in both seasonal and annual scales.
Within a given seasonal scale, the morphology will have been shaped according to events the beach was
subjected to, leaving the beach surface even, low, and regular with the passage of storm events, and
acquiring a greater sediment stock at its subaerial portion in low-sea conditions, thus marking this beach’s
seasonality. Yearly variability, verified at an 8-year interval between monitoring conducted in 1997 and
2005, demonstrated that the southern half of this beach shows erosion in almost its totality. The behavior of
the 17 km of the northern half is quite different, with a significant enhance of stability and accretion areas,
36.1 and 28.1 %, respectively, and a seaward progradation mean of 1.1 m/year. The northern half also shows
progradation areas between 3 and 4 times longer than those found in previous researches made on the Rio
Grande do Sul coast (Toldo et al., 1999; Esteves et al., 2002). Such behavior confirms that the coastal
inflexion found at the place significantly contributes with the shoreline variability in Mostardas beach.
Palavras Chave: erosão costeira; inflexão costeira; jato costeiro
2
ÍNDICE
INTRODUÇÃO
Aspectos Geológicos e Físicos da Área
Estudos Anteriores
Área de Estudo
METODOLOGIA
Levantamento dos Perfis Longitudinais
Correções Utilizadas
Mapas Topográficos da Praia
Caracterização dos Eventos
RESULTADOS
Condições Meteo-Oceanográficas
Variações Sazonais
Mobilidade da Linha de Praia
Variações Tridimensionais
Variações Anuais
DISCUSSÕES
CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
3
Introdução
As praias arenosas oceânicas são ambientes altamente dinâmicos e são influenciados por agentes
hidrodinâmicos, morfológicos e eólicos. A ação dos processos hidrodinâmicos nas zonas litorâneas é
bastante intensa, dando origem a movimentos quase permanentes dos materiais de fundo depositados. A
variabilidade das ondas e das correntes traduz-se em significativas alterações na capacidade de transporte, o
que conseqüentemente, conduz a modificações mais ou menos irregulares dos fundos e da geometria das
costas (Carmo e Marques, 2003).
A erosão e deposição costeira são fenômenos tridimensionais que usualmente são inferidos com dados
de variações em uma dimensão como mudanças na feição de um perfil de praia perpendicular à costa ou a
posição da linha de praia. O monitoramento da praia proporciona uma maneira de entendimento de sua
dinâmica e os fatores que influenciam os ganhos e perdas ao longo da costa e podem revelar tendências de
estabilidade de praia ou taxas de movimentação desta linha. (Morton et al., 1993). A análise do
comportamento das praias com o auxílio de perfis perpendiculares, tradicionalmente utilizados,
proporcionaram a criação de alguns modelos morfodinâmicos evolutivos, que comparam a morfologia da
praia com a ação das ondas incidentes (Wright e Short, 1984; Sunamura, 1988).
As variações no comportamento de uma praia arenosa oceânica podem também, ser calculada através
da análise da variação da linha de praia. A linha de praia ou linha do swash é uma feição bastante dinâmica e
representativa das condições morfodinâmicas atuantes no local. A média da posição da linha d’água em uma
região e o volume de areia total são altamente correlacionados. Assim, a posição da linha de praia
proporciona uma aproximação útil para o volume de areia subaéreo (Dail et al., 2000). Como o swash é o
principal mecanismo para a troca de sedimentos entre a zona subaérea e subaquosa da praia e o
conhecimento deste processo é vital para a modelagem da evolução da linha d’água (Masselink et al., 2005)
e também para o entendimento do comportamento evolutivo e zoneamento de uma praia.
4
Aspectos Geológicos e Físicos da Área
A planície costeira do Rio Grande do Sul corresponde à porção emersa da bacia de Pelotas, a mais
meridional das bacias sedimentares da margem continental brasileira. Sua linha de costa possui uma
orientação NE-SW e se estende por cerca de 620 km, desde Torres, ao norte, até a desembocadura do arroio
Chuí, ao sul, cobrindo cerca de 33.000 km
2
e alcançando, em alguns setores, mais de 100 km de largura, o
que a caracteriza como a planície costeira mais ampla do país.
A morfologia de praia arenosa baixa somente é modificada no extremo norte da costa do Rio Grande
do Sul, junto à cidade de Torres onde afloram arenitos eólicos da formação Botucatu e rochas vulcânicas da
formação Serra Geral, ambas do Mesozóico da bacia do Paraná. Estas rochas constituem imponentes
promontórios nos quais o mar elaborou inúmeras feições geomorfológicas características de erosão de
costões rochosos, como falésias, cavernas de abrasão, arcos naturais e plataformas de abrasão (Tomazelli e
Dillenburg, 1998).
A planície costeira do Rio Grande do Sul foi formada durante o quaternário, através de sucessivos
eventos de subida e descida do nível relativo do mar. A cada evento de máximo transgressivo, um sistema
laguna-barreira foi criado ao longo do litoral, sendo que os sistemas I, II e III são datados do Pleistoceno. O
sistema IV, em que se localiza a atual linha de praia, formou-se no Holoceno, durante a última transgressão
marinha, nos últimos 5 ka, com o mar atingindo alturas de 4 a 5 m acima do nível médio atual.
A diminuição da taxa de subida do nível relativo do mar e a estabilização temporária no final do
evento transgressivo foram responsáveis pela implantação de uma barreira transgressiva que, provavelmente,
possuía dimensões reduzidas tendo em vista o limitado suprimento de areia fornecida pelos poucos rios que
alcançavam a praia. A maior parte da carga arenosa transportada pelos principais rios que chegavam à
planície costeira não alimentavam diretamente as praias, pois ficava retida nos ambientes lagunares
reinstalados nos espaços de retrobarreira associado às barreiras pleistocênicas, como a laguna dos Patos e
lagoa Mirim. A queda do nível relativo do mar que se seguiu ao máximo transgressivo permitiu o
desenvolvimento de uma ampla barreira progradante, que ocorreu através da formação de cristas praiais e
eólicas e apresentou seu maior desenvolvimento no interior de suaves reentrâncias da linha de costa nos
trechos costeiros entre Torres e Tramandaí, e na reentrância de Rio Grande (Tomazelli e Dillenburg, 1998).
5
A plataforma continental adjacente à planície costeira apresenta uma pequena declividade (2 m/km) e
conseqüentemente uma extensa largura, que varia entre 100 e 180 km (Martins et al., 1972) e uma feição
morfológica característica da plataforma interna é a presença de bancos arenosos lineares. A plataforma
interna mais rasa do que 20-30 m é, em sua quase totalidade, coberta por areia terrígena de composição e
textura muito semelhante aos sedimentos das praias adjacentes (Tomazelli, 1978). Esta é provavelmente a
única fonte de sedimentos para as praias e dunas costeiras atuais, junto com a própria remobilização dos
sedimentos das praias adjacentes, pois praticamente todo o sedimento trazido pelos rios é retido nos sistemas
lagunares presentes no estado e acabam não contribuindo de maneira significativa para as praias.
Os sedimentos praiais são compostos em quase toda sua extensão por areias finas quartzosas bem
selecionadas, com uma média de 0,2 mm (Martins, 1967; Nicolodi et al., 2002). O litoral sul do estado
apresenta um trecho de 40 km, conhecido como concheiros do Albardão, que apresenta sedimentos bimodais,
caracterizados por uma mistura de areia fina quartzosa mais cascalho e areia biodetríticos. Estes depósitos
biodetríticos são provenientes do retrabalhamento de paleolinhas de praias afogadas durante a transgressão
holocênica e/ou do retrabalhamento de depósitos concentrados na cava de bancos arenosos pela
hidrodinâmica atual. A praia do Cassino ao sul da laguna dos Patos é influenciada localmente, pelo aporte
significativo de sedimentos finos em suspensão nas proximidades de sua desembocadura (média de 0,14 mm
a 0,18 mm), o que favorece a baixa declividade (1°-2°) da zona de estirâncio (Calliari e Klein, 1993). Outra
exceção é a área de aproximadamente 54 km próxima ao Farol da Conceição que apresenta sedimentos
biodetríticos formados por fragmentos de conchas, restos carbonatados de animais marinhos e areia grossa
ancorados a praia (Buchmann e Tomazelli, 2000).
A costa do Rio Grande do Sul apresenta uma conjunção de fatores que favorece a formação e evolução
de um dos mais extensos sistemas contínuos de dunas costeiras do mundo, possuindo topografia com baixa
rugosidade (planície costeira), regime de ventos apropriado e um grande estoque de areia quartzosa fina,
oriunda da plataforma e disponível em uma longa praia continuamente exposta à ação das ondas (Tomazelli
e Villwock, 1992). As dunas costeiras estão presentes ao longo de quase toda a extensão do litoral,
excetuando apenas alguns setores onde a urbanização ocorreu sobre este ambiente (Esteves, 2004).
As praias do Rio Grande do Sul são influenciadas pelo regime de ventos e massas de ar vinculados às
altas pressões tropicais e polares, representadas pelo Anticiclone Tropical semifixo do Atlântico Sul (ATAS)
6
e o Anticiclone Polar Migratório (APM). A alternância desses dois sistemas favorece a predominância de
ventos do quadrante NE nos meses de setembro a março e, de abril a agosto, a influência dos ventos de SW.
O ATAS apresenta um movimento zonal, ora se afastando para o oceano, ora invadindo o continente, o
que determina não só a circulação de ventos e massas de ar, mas o papel sazonal do deslocamento de
sistemas frontais, linhas de estabilidade e na influência da convecção tropical (Fonzar, 1994). Os ventos
associados à passagem dos sistemas frontais são importantes para o litoral. Durante abril de 1997 a julho de
1999, foram analisados 20 ciclones que geraram ressacas na praia do Cassino (RS), sendo que 85% do
aumento do nível do mar foi influenciado por ventos do quadrante sul. Em especial, os ventos do quadrante
SW, que apresentam condições ideais para o empilhamento de água na costa, visto que a orientação da costa
do Rio Grande do Sul é NE-SW. Quanto a sazonalidade destes eventos também se observa que 60%
ocorreram durante o outono, 15% durante o verão, 15% na primavera e apenas 5% no inverno (Saraiva et al.,
2003).
As ondas no litoral do Rio Grande do Sul apresentam sua forçante associada ao sistema meteorológico.
A análise das estatísticas de ondas para um arquivo histórico de 30 anos, obtidos visualmente, entre 1939 e
1979, para o litoral do Rio Grande do Sul apresentou valores de altura significativa média de onda entre 1,0 e
1,6 metros, períodos médios entre 5 e 7 segundos e as seguintes porcentagens de direção de ondas: 22%
vindas de leste, 20% nordeste, 19% sul, 12% sudeste, sudoeste com 10% e norte, noroeste e oeste com
freqüência menor que 5%. Em relação a sazonalidade destas ondas, foi detectado que em todas estações a
direção predominante era das ondas provindas de leste, embora no verão a direção nordeste e leste tenham
valores de ocorrência próximos (25%) e no inverno as freqüências de nordeste, leste e sul, são semelhantes,
aproximadamente 17% (Coli, 2000).
Devido à pequena importância da maré astronômica, média de 0,47 m e predominantemente
semidiurna (Garcia, 1997), acentua-se a importância das marés meteorológicas, definidas como a diferença
entre a maré observada e a maré astronômica prevista. As marés meteorológicas intensificam sua
importância com a passagem de frentes frias, condições acima descritas, que geram ventos de SW e
empilham água na costa. Situações com o vento soprando no sentido oposto, provenientes de NE, acarretam
efeito contrário, um rebaixamento do nível do mar.
7
Nos resultados apresentados por Nicolodi et al. (2000), as correntes longitudinais são bidirecionais.
Em 1996 e 1997 ocorreu um pequeno domínio da corrente para SW com valores médios de 62,8 e 54,8 %,
respectivamente. Já entre os anos 1998 e 1999 observou-se uma inversão, com a corrente para NE
apresentando ocorrências de 54 e 51,2 %. Ocorreram também variações sazonais, concordante com o padrão
de ondas incidentes, sendo que entre outubro e março houve predomínio de correntes para SW e entre maio e
agosto o domínio das correntes de NE.
Estudos Anteriores
Os problemas que envolvem as variações da linha de praia, principalmente relacionados à erosão
costeira, são objetivo de estudos em praias do mundo inteiro, pois aproximadamente 70% das costas arenosas
no mundo estão submetidas a este fenômeno (Morton, 1979). As razões para a atual erosão costeira
amplamente espalhada podem ser classificadas em duas categorias: (i) causas naturais relacionadas ao
aumento do nível do mar, mudanças no regime de ondas pelo aumento das tempestades, redução no
suprimento de sedimentos, dinâmica costeira, suscetibilidade de erosão de elementos costeiros, tais como
praias, dunas e costões, morfodinâmica da praia e zona de arrebentação, subsidência e compactação costeiras
e tectônica; (ii) causas antropogênicas, que podem afetar diretamente, como obras de proteção, extração de
areia, urbanização da linha de costa e represamento de rios, ou indiretamente através de mudanças climáticas
(Souza, 2001).
Ao analisar este problema na linha de praia do Rio Grande do Sul, aparecem alguns indícios de estar
submetida à erosão em grande parte dos 620 km de costa. Este comportamento pode ser observado em
diferentes trabalhos que analisaram escalas temporais de curto e longo período (Tomazelli et al., 1998; Toldo
et al., 1999; Esteves et al., 2002). Em uma análise de longo período, a erosão da linha de costa evidenciada
pelo afloramento na praia de sedimentos de retrobarreira de idade holocênica e a existência de uma escarpa
praticamente contínua ao longo das dunas frontais, sugere que este processo não é um fenômeno temporário
e nem local. Embora a erosão seja basicamente desenvolvida durante eventos episódicos (tempestades), é
bastante provável que seja superimposto por um mecanismo mais lento e longo, como a subida no nível
relativo do mar (Tomazelli et al., 1998).
8
Os sinais de erosão podem ser vistos não só em escala de longo período, como também na análise de
curto período. Na escala de curto período, a verificação de uma série temporal de 22 anos (1975-1997),
mostrarou que a linha de praia é caracterizada principalmente por estados erosivos. A linha de praia
apresentou estados erosivos e deposicionais, com 528 km das praias em retração, 50 km sob condições de
progradação e 50 km sem variações significativas (Toldo et al., 1999). Outro trabalho similar, realizado em
curto período de tempo, entre 1975 e 2000, indicou que aproximadamente 81% das praias estão em erosão,
12% são estáveis e 7% estão sofrendo progradação (Esteves et al., 2002).
Devido à tendência generalizada de erosão, apresentada em diferentes escalas temporais, ressalta-se a
importância de se avaliar as principais características e as razões envolvidas nos pequenos segmentos do
litoral que apresentam um comportamento diferenciado, sendo caracterizados pelo avanço de sua linha de
costa.
O comportamento progradante das praias, inverso ao erosivo, também é causado por agentes naturais e
antropogênicos. A praia do Cassino, localizada no extremo norte do litoral sul, é uma das praias que
apresentam um comportamento progradante, porém nesta praia, de padrão diferenciado está associado a
intervenções antropogênicas. A alta taxa de deposição de 4,1 m/ano, é influenciada pela existência de um
longo molhe em sua extremidade norte (Lélis e Calliari, 2003), que retêm os sedimentos trazidos pela deriva
litorânea. Outros dois locais que apresentaram taxas de progradação foram às praias de Dunas Altas e
Mostardas, no litoral central, com 31 e 35 km de extensão, respectivamente, porém este comportamento não
está associado a interferências antrópicas, visto que o litoral central é fracamente urbanizado (Toldo et al.,
2004).
Independente da escala analisada, na praia de Mostardas, verificou-se um comportamento anômalo as
praias vizinhas. A análise de longo período mostra que neste setor do litoral a praia passa de um
comportamento erosivo para estável. Já na análise de curto período as praias ao norte e ao sul de Mostardas
são caracterizadas pelo comportamento erosivo.
Como o presente trabalho apenas avalia variações de curto período, as condições deposicionais, nesta
escala temporal, são favorecidas pela existência de uma diferença na orientação da linha de costa de 11° na
praia de Mostardas. A diferença no alinhamento desta praia faz com que parte dela se apresente mais
protegida da ação das ondas de maior energia provenientes do quadrante sul, com maior capacidade de
9
remobilizar e transportar os sedimentos praias. Outro fenômeno importante, denominado de jato costeiro, foi
analisado na praia de Mostardas, através de imagens de satélite, em que se verificou a presença de uma
corrente costeira de pequena escala temporal que se forma em condições especiais de passagem de frentes
frias e transporta sedimentos em suspensão de um depósito temporário para um mais permanente localizado
fora da zona de arrebentação. O acúmulo de sedimentos condicionados pela diferença do alinhamento da
linha de costa é uma importante fonte para o desenvolvimento de um amplo campo de dunas costeiras, face
praial e também da linha de contorno batimétrica de 10 m que se alarga no local (Toldo et al., 2004).
O objetivo deste trabalho é avaliar as variações ocorridas ao longo do litoral de Mostardas dentro de
um ano (variações sazonais) e ao longo de 8 anos (variações anuais) através do uso de ferramentas de
previsão e monitoramento oceanográficas e meteorológicas, verificando se a diferença na orientação da linha
de costa é o principal agente controlador do comportamento anômalo desta praia em relação às praias
adjacentes.
Área de Estudo
O litoral do Rio Grande do Sul apresenta uma extensa planície costeira com apenas duas interrupções,
as desembocaduras do rio Tramandaí e da laguna dos Patos e também as desembocaduras do rio Mampituba
e do arroio Chuí nos limites norte e sul do estado, respectivamente. Devido a seu grande comprimento é
tradicionalmente divido em três áreas. O litoral sul com aproximadamente 210 km de extensão e
apresentando o arroio Chuí e a desembocadura da laguna dos Patos como limites sul e norte,
respectivamente, o litoral médio que se estende da desembocadura da laguna dos Patos ao farol da Solidão,
com 215 km e o litoral norte iniciando no farol da Solidão até a desembocadura do rio Mampituba, na divisa
com o estado de Santa Catarina, com 195 km.
O comportamento diferenciado de Mostardas em relação às praias adjacentes e a pequena urbanização
foram os principais fatores que motivaram a escolha deste local para a realização do estudo.
A cidade de Mostardas, localizada no litoral médio, possui uma população de pouco mais de 13 mil
habitantes (Censo IBGE 2005), porém o recente asfaltamento da rodovia BR-101, que dá acesso a
Mostardas, pode ocasionar em um aumento rápido de sua população. Esta área foi caracterizada como
10
prioritária para obras de gerenciamento costeiro, devido à baixa urbanização, a preservação de suas dunas, a
presença do Parque Nacional da Lagoa do Peixe, que e abriga importantes ecossistemas e um dos maiores
santuários de aves migratórias do hemisfério sul e pelo forte potencial de crescimento demográfico com a
recente melhoria de seu acesso (Esteves, 2004). O acesso para o balneário Mostardense é realizado por uma
estrada de 11 km em condições precárias, pois atravessa um extenso campo de dunas com quase 5 km neste
local sendo provavelmente este o motivo de apenas uma pequena parcela da população residir no balneário.
A área de estudos, localizado na praia de Mostardas, apresenta aproximadamente 40 km de extensão e
largura de 75 m. O limite norte é o balneário de São Simão, 30°58’ S e 50°40’ W, e o farol de Mostardas,
31°15’ S e 50°54’ W, o limite sul (Fig. 1). As dunas frontais na praia de Mostardas são bastante
desenvolvidas e apresentam-se erodidas apenas com a passagem tempestades de grande intensidade. Os
sedimentos são compostos por areia de granulometria fina (0,22 mm) e quartzosos de alta maturidade, o que
favorece a baixa declividade (1/25) e um comportamento morfodinâmico com tendências dissipativas
(Barletta, 2000).
Figura 1: Localização da praia de Mostardas no litoral médio do Rio Grande do Sul
Farol de Mostardas
Balneário de
São Simão
Balneário
Mostardense
30°45
31°20
:
05102.5 km
51° 00’
50° 35’
Rio Grande
do Sul
Laguna dos
Patos
11
Metodologia
A avaliação da variabilidade da linha de costa é uma ferramenta muito importante para questões
associadas ao gerenciamento costeiro e vem se difundindo no diagnóstico de áreas de uma praia que
apresentem diferentes comportamentos. Os métodos tradicionalmente usados para a realização desta análise
são a comparação de mapas históricos e fotografias aéreas ou através de diferenças verificadas em perfis
perpendiculares à praia. Mais recentemente vem se adotando técnicas modernas e precisas derivadas do
emprego do sistema de posicionamento global (GPS). Entretanto, este método também requer que se escolha
um indicador para ser monitorado. Os principais e mais utilizados indicadores descritos pela literatura são a
linha de vegetação, crista da duna frontal, pé da duna frontal, crista do berma, limite entre a praia úmida e a
praia seca, linha da maré alta e a linha d’água.
A feição escolhida como referencial para os levantamentos foi à linha de espraiamento da onda ou
linha de swash, pois esta, é um indicador prático que pode ser monitorado ao longo de toda a área e permite a
repetição de suas medições (Toldo e Almeida, 2003) e segundo McCurdy (1947, In: Pajak e Leatherman,
2002), ao analisar fotografias aéreas a linha d’água constitui-se no melhor indicador do limite físico entre o
oceano e o continente. Durante a realização dos perfis em campo a linha d’água mostrou-se um ótimo
indicador (Fig. 2), pois foi facilmente diferenciada ao longo da praia. A escolha da utilização desta
metodologia deve-se aos fatos de que os métodos convencionais de monitoramento de praia apresentam
algumas desvantagens quando comparados aos perfis longitudinais com GPS: (i) o grande tempo necessário
para a realização de longos perfis, (ii) a perda comum de monumentos permanentes que a praia ou
rapidamente erode ou ficam sujeitos a atuação substancial de ondas durante tempestades e (iii) os erros
associados com estimativas de mudanças volumétricas usando dados inadequados (Morton et al., 1993).
Levantamento dos Perfis Longitudinais
A análise da variabilidade da praia de Mostardas foi obtida através da realização de quatro perfis
longitudinais utilizando GPS. Um realizado em 1997 e outros três em 2005, desta forma permitindo avaliar o
12
padrão sazonal, no mesmo ano, e o padrão de variação de escala anual, para oito anos, neste trecho do litoral
do Rio Grande do Sul.
A aquisição dos dados dos três levantamentos de 2005 foi realizado utilizando um receptor Pathfinder
Pro-XS GPS, marca Trimble, com precisão submétrica entre 10 e 30 cm no modo de navegação, tanto para o
datum vertical, quanto para o horizontal. No campo a antena receptora do GPS é instalada em um veículo
que se desloca sobre a linha d’água a uma velocidade média de 50 km/h (Toldo et al., 1999). A antena
estática do GPS encontra-se instalada no campo, próximo ao local de monitoramento, distante no máximo de
20 km do GPS no modo de navegação, aumentando assim a precisão dos dados obtidos. Os dados gerados
por esta antena são utilizados para a correção daqueles adquiridos no campo. A taxa de amostragem de
ambos equipamentos é de 3 s, o que permitiu a geração de arquivos para pós-processamento com precisão,
também, submétrica (Toldo e Almeida, 2003).
O perfil de 1997 foi obtido de forma similar ao de 2005. Naquele ano foram utilizados dois aparelhos
Garmim GPS 100 Personal Surveyor, um no modo cinemático, também acoplado em um carro e outro
operando no modo estático, porém com precisão inferior ao levantamento feito em 2005.
Correções Utilizadas
A grande dinâmica da zona de swash acarreta em uma alta mobilidade da linha de praia. Logo, a
utilização da linha d’água como feição monitorada deve ser adequada a cada condição meteorológica e
oceanográfica atuante nos levantamentos, possibilitando assim uma correta comparação entre os diferentes
perfis. Para as praias oceânicas do Rio Grande do Sul a linha está situada a aproximadamente 16 m do nível
médio do mar, tendo em consideração as características de altura e o comprimento da onda em águas
profundas, bem como a declividade média da face praial.
As correções necessárias são relacionadas aos diferentes padrões de ondas incidentes no local, a maré
astronômica e meteorológica e a declividade da face da praia.
A amplitude da maré astronômica com valor médio de 0,47 m pode gerar um deslocamento de 14 m no
plano horizontal, pois o levantamento é realizado sobre uma face de praia com declividade média de 1/30. O
erro está associado à diferença dos valores de maré encontrados durante as diferentes datas de realização do
13
levantamento em campo e pode ser monitorado através de instrumentação no campo ou, como no caso do
presente trabalho, por consulta de tábuas de maré astronômicas disponibilizadas pela Marinha do Brasil.
A amplitude da maré meteorológica ou ressaca é um fenômeno que poderia causar um grande erro no
levantamento, devido a sobrelevação ou rebaixamento do nível de água na costa, podendo alcançar 1,20 m
(Almeida et al., 1997) e gerar um erro maior que 35 m no plano horizontal, para uma declividade média da
face praial de 1/30. Entretanto, o erro associado a maré meteorológica pode ser monitorado através do uso de
informações sobre a entrada de frentes frias ou tempestades no litoral sul do país, em consulta ao modelo de
previsão do Instituto de Astronomia e Geofísica da Universidade Federal de São Paulo (IAG-USP),
previamente ao início da coleta de dados no campo.
A diferença na altura das ondas incidentes afeta também de forma significativa a linha de praia, devido
a variações do runup da onda. O runup é definido como a máxima elevação do uprush da onda acima da
média do nível. O uprush consiste em duas componentes: a sobrelevação da média do nível d’água durante a
ação da onda (setup) e a flutuação desta média (swash). Sendo o runup um importante parâmetro para
determinar a porção ativa de um perfil de praia. (CEM, 2001). O runup para as praias do litoral do Rio
Grande do Sul apresenta valor aproximado de 0,55 m, que associado à declividade da face da praia resulta
em um espraiamento da onda com valor médio de 16 m e pode ser monitorado através de dados de onda
medidos visualmente ou por instrumentos ou através de modelos de previsão de ondas (Toldo e Almeida,
2003). A correção deste parâmetro foi realizado utilizando a equação (1) do runup da onda (Ruggiero et al.,
1996), que realizou suas investigações de campo na costa central do Oregon, em praias dissipativas de alta
energia comuns na costa do noroeste do Pacífico.
2
1
00
)(27.0 HLR
β
= (1)
onde
β
é a declividade da face de praia; o comprimento de onda em águas profundas e a altura
de onda em águas profundas.
0
L
0
H
A altura das ondas foi medida visualmente em campo verificando a altura significativa (H
S
) da
primeira linha de arrebentação, na zona de quebra de ondas, com o auxílio de uma régua topográfica.
14
Estando o observador posicionado na zona de nível médio do mar e alinhando os olhos, a crista da onda e o
horizonte para a medição. Posteriormente a altura de onda na linha de arrebentação (H
S
) foi transformada
para a altura de onda em águas profundas (H
0
) através de um programa disponibilizado pelo Coastal
Engineering Research Center.
As variações médias da declividade da face da praia entre 1/20 e 1/40, induzidas por fatores sazonais
ou pelas modificações locais do fluxo de energia das ondas incidentes, constituem-se em fator de erro de
difícil monitoramento para levantamentos de áreas com dezenas de quilômetros de extensão, como no caso
da praia monitorada. Para praia de Mostardas optou-se por usar a média das declividades da face da praia do
litoral do Rio Grande do Sul (1/30), pois este valor corrobora com as variações encontradas por Barletta
(2000), que verificou uma média de 1/25 para o farol de Mostardas, limite sul da área de estudo.
Mapas Topográficos da Praia
As variações encontradas em uma praia são tridimensionais e a realização dos perfis longitudinais
utilizando GPS são favoráveis para a visualização das mudanças na morfologia subaérea ao longo da praia e
na identificação de estágios morfodinâmicos (Wright e Short, 1984). Para analisar o impacto da ação de
diferentes condições de energia de onda no comportamento do litoral de Mostardas, foram escolhidos quatro
pontos representativos ao longo dos 40 km da praia estudada, sendo utilizados como ferramenta para
compreensão das variações sazonais observadas. Nestes quatro locais criaram-se segmentos de controle com
aproximadamente 300 m de comprimento e 30 m largura para cada uma das datas dos levantamentos
realizados no ano de 2005.
Para construção dos segmentos de controle foram utilizados os dados dos levantamentos para demarcar
a linha d’água e um segundo perfil longitudinal localizado no meio do pós-praia (Fig. 2). Esta análise não foi
realizada para o ano de 1997, pois durante este levantamento apenas se monitorou a linha d’água.
15
Figura 2: Levantamento longitudinal do perfil de praia utilizando o sistema de posicionamento global (GPS).
As linhas marcam a trajetória do monitoramento; linha tracejada – a linha d’água associada ao espraiamento
da onda; linha contínua – entre a duna frontal e a linha d’água.
Caracterização dos Eventos
A compreensão precisa das condições reinantes em cada um dos levantamentos foi analisada não só
através das condições que a praia apresentava no dia do monitoramento, mas também durante os dias que
antecederam o mesmo, pois as condições hidrodinâmicas em que a praia estava submetida nestes dias foram
responsáveis pela modelagem de seu perfil subaéreo. Para isso, foram analisadas imagens do satélite
geoestacionário GOES no canal infravermelho, disponibilizadas pelo Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE), permitindo assim a análise espacial e temporal da cobertura de nuvens. Também foram
utilizados os dados de vento e ondas disponibilizados pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos (CPTEC).
16
Resultados
A praia de Mostardas apresenta comportamentos distintos quando analisada durante um curto período
de tempo, variações sazonais, e quando analisada em um intervalo de oito anos, variações anuais. Desse
modo, os resultados são apresentados separadamente, segundo estas duas escalas temporais.
Os três levantamentos realizados durante o ano de 2005, janeiro, maio e setembro, foram utilizados na
obtenção dos dados para a verificação das variações sazonais da linha de costa. A realização do
monitoramento da segunda linha, no meio do pós-praia (Fig. 2), nestas três datas, permitiu ainda verificar o
comportamento tridimensional do perfil subaéreo da praia.
O comportamento da praia ao longo dos oito anos resultou da comparação dos perfis longitudinais
realizados em 27/11/1997 e 19/01/2005. Os padrões hidrodinâmicos analisados nestas duas datas mostraram-
se similares e apresentaram as melhores condições físicas para comparações.
As condições oceanográficas e meteorológicas encontradas nos quatro dias de monitoramento são
apresentadas na tabela 1.
Tabela 1: Condições dos parâmetros oceanográficos e meteorológicos encontrados na realização dos perfis
longitudinais da praia. Onde H
S
é a altura significativa da onda; H
0
a altura em águas profundas; T o período; L
0
o
comprimento de onda em águas profundas; β a declividade da face da praia e R o runup da onda.
Data do
Monitoramento
H
S
(Visual)
H
0
(Calculado)
T L
0
β R
Maré
Astronômica
Maré
Meteorológica
27/11/1997 1,46* 1,07 7 76,47 0,0333 0,45 0,4 -0,1
19/01/2005 1,85 1,13 10,7 178,75 0,0333 0,70 -0,1 0,15
9/05/2005 1,71 1,19 9 126,47 0,0333 0,60 0,6 0,15
9/09/2005 1,49 1,09 8 99,92 0,0333 0,51 0,3 0
* parâmetro obtido através de reanálise feita pela NOAA (www.nomads.ncdc.noaa.gov/data.access).
Condições Meteo-Oceanográficas
A análise dos eventos responsáveis pela modificação da morfologia registrada na praia durante os 3
perfis longitudinais realizados com a utilização do GPS pode ser retratada através da verificação das
condições meteorológicas e oceanográficas da área de estudo nos dias antecedentes a realização do perfil.
17
Em relação às condições observadas no levantamento de janeiro - 19/01/2005, verifica-se através das
imagens de satélite do INPE a presença de um grande centro de alta pressão atuando sobre toda a região sul
do país, que apresenta giro anti-horário no hemisfério sul. Esta alta pressão favorece os ventos provenientes
de N e NE junto à costa, com apenas uma inversão em sua direção, em 16 de janeiro, voltando a soprar de
NE nos dias seguintes. Além de ocorrer à inversão do vento, a média de sua intensidade que até esta data, 16
de janeiro, era de 8 m/s, diminuiu para uma média de 4 m/s. A análise da altura e direção das ondas mostrou
que até o dia 16 as ondas deslocavam-se de SE e com altura média de 1,5 m e após esta data ocorreu uma
mudança do vento para sul e um pequeno aumento em sua altura média.
No levantamento realizado em maio - 09/05/2005 verifica-se a passagem de uma frente fria, que
atingiu o litoral do Rio Grande do Sul entre os dias 4 e 8 de maio. Esta frente fez com que tanto o vento, com
uma variabilidade maior, quanto às ondas, apresentassem um giro gradual em sua direção, variando do
quadrante norte para sul. Apesar da passagem da frente fria, não houve um aumento significativo na
intensidade do vento e altura de onda, apenas durante o dia 8 ocorreu pico de 12 m/s e 2 m, respectivamente,
e no dia seguinte foi registrada uma redução destes valores.
A passagem da frente fria, que antecedeu o levantamento de setembro - 9/09/2005, foi mais intensa do
que aquela analisada em maio. O padrão da mudança da direção dos ventos foi semelhante ao de maio,
apenas com intensidade média mais elevada, aproximadamente 9 m/s, para a componente sul do vento. A
direção predominante das ondas foi de sul, atingindo a praia de Mostardas durante os dias 4 a 6 de setembro,
com alturas superiores a 2 m. Após esta data, a frente deslocou-se para leste em direção ao oceano.
Variações Sazonais
Mobilidade da Linha de Praia
As variações sazonais da linha de costa foram medidas com a criação de pontos de controle afastados
entre si em aproximadamente 2 km de distância. Os pontos de 1 a 10, e de 11 a 20 estão localizados nos
trechos norte e sul, respectivamente, da área de estudo. O trecho norte apresenta uma diferença de 11° no seu
alinhamento, quando comparado com o alinhamento do trecho sul (Figs. 3 e 6).
18
-5 10 25 40
Deslocamento horizontal da linha de praia (m)
Localização dos pontos de controle
1
20
15
10
5
Balneário de
São Simão
Balneário de
São Simão
Balneário
Mostardense
Balneário
Mostardense
Farol de
Mostardas
Farol de
Mostardas
Posição da linha de praia
de controle em janeiro
1
2
3
4
10
11
12
14
15
16
17
18
19
20
5
6
7
8
9
13
Posição da linha de praia
média em maio ( )
Posição da linha de praia
média em maio ( )
Posição da linha de praia
média em setembro ( )
Posição da linha de praia
média em setembro ( )
Figura 3: Deslocamento da linha de praia durante os eventos analisados em 2005, considerando os pontos de
controle de janeiro como referência e marco inicial para estas variações. A linha pontilhada delimita o local em
que ocorre a variação de 11° na linha de costa e divide os trechos norte e sul dos levantamentos.
A quantificação da mobilidade da linha de praia foi realizada através da medição nos pontos de
controle, adotando a posição da linha de costa em janeiro como um marco inicial, portanto, as variações da
linha de costa de maio e setembro estão relacionadas à posição da linha em janeiro. O perfil de janeiro foi
escolhido como a posição de controle para a análise do comportamento sazonal, pois foi o primeiro a ser
realizado no ano de 2005.
A comparação dos perfis realizados em janeiro e maio revela um avanço da linha de costa para toda a
área de estudo. Porém, devido à dominância de ondulações provenientes de NE, ondas com menor energia,
que favorecem a deposição e que transportam sedimentos paralelamente à costa para SW, a metade norte da
área apresentou taxas médias menores de progradação, da ordem de 27 m, quando comparadas com as do
trecho sul, que apresentaram progradação média 2 m maior (Fig. 3).
O levantamento de setembro foi realizado após a passagem de uma frente fria, que atingiu a praia de
Mostardas quatro dias antes deste levantamento e apresentou grande intensidade, elevando a altura das
ondas, provenientes do quadrante sul, para 2,5 m. Este evento, associado à passagem de outras frentes frias
que atingiram a costa durante o outono e inverno, período de maior freqüência destes eventos, com
ondulações também provenientes de sul, causaram grande remobilização de sedimentos e uma erosão
19
bastante acentuada em toda a praia. Os trechos norte e sul apresentaram médias de recuo de 20 e 18 m,
respectivamente (Fig. 3).
Variações Tridimensionais
Foram demarcados segmentos de controle de aproximadamente 300 m de comprimento e 30 m de
largura, para uma visão do comportamento tridimensional de detalhe das áreas com deposição, erosão e
estáveis. Nas figuras 4 e 5 são apresentados estes segmentos de controle da metade norte e sul da área
estudada, respectivamente. A localização e numeração dos 4 segmentos analisados correspondem aos pontos
de controle criados para a verificação da mobilidade da linha de praia (Fig. 3).
Comparativamente, as variações tridimensionais nos 4 segmentos analisados refletem as condições
oceanográficas de modo bastante similar. Em janeiro, registra-se um grande estoque de areia armazenada na
porção subaérea, quando comparado as demais datas, e também variações bruscas e rítmicas na altura da
praia, sendo este fato atribuído à presença de cúspides praiais (Figs. 4 e 5). Aliado a este fator, a ausência de
berma formada pode representar o estágio morfodinâmico entre “banco e cava longitudinal e banco
transversal e corrente de retorno” (Wright e Short, 1984).
No período de janeiro a maio a praia apresentou progradação, devido à predominância de ondas de
menor energia provindas de NE durante esta época do ano (Fig. 3). Apesar da progradação da linha de costa
durante este período, verificou-se que o perfil subaéreo da praia, no mês de maio, foi aplainado e rebaixado
em todos os segmentos, deixando a praia com características intermediárias. O aplainamento da praia é
explicado pela passagem de uma frente fria que atingiu o litoral entre os dias 4 e 8 de maio, antes do
monitoramento. Esta frente ocasionou um aumento na altura das ondas apenas durante o dia 8, mesmo assim,
o perfil subaéreo respondeu a esta mudança na energia das ondas através da mudança em sua morfologia
(Figs. 4 e 5).
No perfil de setembro toda a praia estava bastante plana e o estoque de areia subaéreo da praia foi
remobilizado formando provavelmente um banco arenoso na parte subaquosa (Figs. 4 e 5). Este
comportamento é natural após a passagem de frentes frias em que ocorre um aumento da ondulação e
conseqüentemente da energia das ondas, tornando a praia com tendências mais dissipativas.
20
Figura 4: Segmentos de controle com extensão de 300 m e largura média de 30 m, da porção subaérea referentes aos
levantamentos dos meses de janeiro, maio e setembro.
21
Figura 5: Segmentos de controle com extensão de 300 m e largura média de 30 m, da porção subaérea, referentes
aos levantamentos dos meses de janeiro, maio e setembro.
Variações Anuais
A variação da linha de praia de Mostardas para o trecho entre o farol de Mostardas e o balneário de
São Simão está representado na figura 6. A praia de pouco mais de 36 km, apresentou 23,2 km em erosão
(63,5 %), 7,0 km estáveis (19,3 %) e 6,3 km em progradação (17,2 %), entre os anos de 1997 e 2005.
O comportamento da praia de Mostardas por apresentar grande variabilidade entre a metade sul e
norte, quando observado na escala temporal das variações anuais, foi dividido para facilitar a análise (Fig. 6).
22
Esta grande distinção está associada à diferença de aproximadamente 11° na orientação da linha de praia
entre estes dois segmentos do litoral.
A metade sul do levantamento, com 19 km, apresenta em quase sua totalidade áreas em erosão, com
16,9 km, apenas interrompida por dois pequenos trechos, sendo um em progradação e outro estável (Fig. 6).
A linha de praia localizada ao norte desta inflexão costeira, com 17 km de extensão, mostrou uma
maior variabilidade no posicionamento da linha de costa. Quase todas as zonas de deposição e estabilidade
encontram-se no trecho norte, excetuando um trecho estável e um progradante localizados na metade sul. As
áreas de deposição representaram 28,1 % deste trecho, já as áreas de estabilidade e erosão apresentaram uma
proporção similar, com porcentagens de 36,1 e 35,8 %, respectivamente.
As áreas em progradação e estabilidade na metade norte apresentaram um aumento de porcentagem
significativo quando comparada ao sul. A deposição registrou-se um aumento foi de 7,4 para 28,1 % e de 4,2
para 36,1 % para as áreas estáveis. Além de estender a área em deposição, notou-se um avanço da linha de
praia em média 2 m maior no trecho norte e também o ponto de maior progradação localizado 4 km ao norte
da inflexão costeira. A localização deste trecho logo ao norte da inflexão costeira faz com que as médias de
deposição de 28,1 % mostrem-se de 3 a 4 vezes maiores que as médias para a costa do Rio Grande do Sul,
que foram identificadas como sendo de 7 a 8 % em estudos anteriores (Toldo et al., 1999; Esteves et al.,
2002).
A diferença no comportamento dos dois trechos da praia de Mostardas também é evidente quando se
avaliam as taxas de erosão. Novamente, nota-se a importância da inflexão costeira, que deixa o trecho sul
mais exposto às ondas de tempestade. A taxa média de erosão deste trecho mostra-se mais elevada, 24,5 m
de recuo, quando comparada a menor taxa, de 10 m, da metade norte.
23
Figura 6: Imagem do satélite Landsat, com a apresentação dos resultados do comportamento da linha de costa de
Mostardas entre os anos de 1997 e 2005 e localização dos pontos de controle utilizados para criação dos segmentos
de controle de 300 m.
24
Discussões
Nas praias arenosas a variabilidade da linha de costa é controlada pelo equilíbrio dinâmico envolvendo
três principais componentes, a quantidade e tipo do estoque de sedimentos, a energia física ao longo da costa
e a taxa da variação do nível do mar (Davis, 1997), podendo considerar também, a influência antropogênica
como um fator importante para a manutenção deste equilíbrio.
A praia de Mostardas não demonstra nenhuma modificação ocasionada por ações antropogênicas, pois
atualmente possui uma pequena população e suas residências foram construídas atrás das dunas, respeitando
assim, a proteção natural que esta proporciona e não modificando a manutenção do balanço de sedimentos
entre a praia e as dunas.
A variação no comportamento da praia de Mostardas é causada por condicionantes naturais, que
alteram o transporte de sedimentos paralelo e perpendicular à costa em escala temporal bastante variável, e
são processos costeiros importantes no controle da morfologia da praia e determinam em grande parte onde a
costa está em erosão, progradação ou estável.
Em relação a estes parâmetros naturais, em Mostardas, as características dos sedimentos e o clima de
ondas em águas profundas são bastante homogêneos ao longo dos 36 km monitorados. Apenas ocorre a
modificação das características das ondas quando se aproximam da zona de águas rasas, devido à interação
destas com o fundo.
Os perfis topográficos da porção subaérea da praia, que demonstram as variações sazonais na
morfologia praial (Figs. 4 e 5), identificaram o comportamento bisazonal descrito em outras praias do litoral
gaúcho (Alvarez et al., 1981; Calliari e Klein, 1993) e também para o farol de Mostardas, limite sul da área
de estudo (Barletta, 2000). Os quatro segmentos analisados, 4, 10, 16 e 18, apresentaram um padrão similar
de desenvolvimento ao longo dos diferentes monitoramentos. O perfil de janeiro mostra a praia com um
estoque maior de sedimentos em sua porção subaérea, com cotas altimétricas mais elevadas quando
comparado aos demais perfis. Este fato reflete a condição de deposição observada durante o período anterior
ao levantamento, com o predomínio de ondas de menor energia provenientes de NE.
Outra feição diagnosticada nestes perfis foram às cúspides praiais, uma feição rítmica ao longo da
praia que se estende para a face praial e berma, podendo apresentar variações em suas dimensões entre 10 cm
25
a 40 m (Masselink e Pattiaratchi, 1998). As cúspides foram encontradas nos quatro pontos de análise do
levantamento de janeiro, estando associado aos padrões de fluxo circulatório da zona de swash do tipo
sweeping, em que a movimentação ocorre com a chegada oblíqua das ondas e o uprush e backwash varrem
lateralmente sobre a face praial induzindo uma deriva litorânea significativa (Masselink e Pattiaratchi, 1998).
O perfil topográfico de maio (Figs. 4 e 5) mostra que apesar da praia apresentar uma média elevada de
progradação, quando submetida à passagem de uma frente fria, mesmo que de pequena escala, tem seus
sedimentos remobilizados e procura uma condição de equilíbrio com as condições energéticas atuantes
naquele momento. Em setembro (Figs. 4 e 5), com a realização do levantamento logo após a passagem de
uma frente fria, de maior intensidade que a de maio, o perfil de praia apresentou-se erodido, retratando
novamente o comportamento bisazonal da praia de Mostardas.
A diferença no padrão em que a praia está submetida (erosão, deposição ou estável) e a diferença da
orientação da linha de costa, afetam de maneira pouco significativa à morfologia subaérea da praia de
Mostardas, quando analisada em uma pequena escala de tempo (Figs. 3, 4 e 5). A morfologia reflete
diretamente as condições sazonais e locais da energia das ondas.
Entretanto, as variações ocorridas ao longo de 8 anos, entre 1997 e 2005, apresentaram resultados
distintos da escala sazonal. Esta análise mostra que a diferença de orientação da linha de costa de 11°,
existente entre os trechos norte e sul de Mostardas, produz variações significativas no efeito da ação das
ondas, principalmente no transporte longitudinal de sedimentos. Segundo Lima et al. (2001) as ondas
provenientes de leste apresentam grande importância na parcela total de transporte para SW, às alturas de 1,5
e 1,8 m foram as mais representativas nesta categoria e foram observadas em 6% de todos os registros, sendo
responsáveis por aproximadamente 10% de todo o transporte bruto de sedimentos. As ondas vindas de norte-
nordeste ocorreram em aproximadamente 13% dos registros, e representaram a categoria de ondas mais
freqüentes entre todas que incidem sobre a costa, mas que ocasionam um transporte bruto de menos de 2%
do total. As ondas oriundas da direção sul, registradas em 9% das medições foram responsáveis por mais de
30% do transporte bruto.
O transporte de sedimentos paralelos à costa foi quantificado e a diferença apresentada entre os trechos
de diferente orientação da linha de costa em Mostardas foi de aproximadamente 600 mil m
3
/ano (Lima et al.,
2001). A diferença no potencial de deriva entre os dois segmentos é causada, pois a metade norte da área de
26
estudo permanece mais abrigada das ondas de sul que são responsáveis pela maior parcela do transporte de
sedimentos. Estes sedimentos ao encontrarem o local de diferente alinhamento, são transportados por inércia
para fora da zona de arrebentação, mais profunda onde se depositam. Imagens de satélite nesta área
revelaram a presença deste tipo de correntes de circulação costeira de pequena escala temporal e sugerem
que durante a passagem de frentes frias, podem conduzir a processos difusos de sedimentos em suspensão
para fora da zona de arrebentação. Esta corrente costeira com ampla pluma de sedimentos com giro de
rotação horário, foi denominada de jato costeiro (Toldo et al., 2004).
A análise da variação de oito anos da linha de costa de Mostardas corrobora com os dados discutidos
acima. O fluxo de energia incidente no trecho sul da praia foi maior, mostrando neste trecho da praia
estudada zonas de erosão, com média de -3,1 m/ano sendo estes sedimentos transportados em suspensão para
nordeste, depositando-se ao encontrar uma área com menor energia. A deposição do sedimento faz com que
a parte norte da praia apresente um comportamento distinto ao da metade sul, com predomínio de áreas
estáveis e um aumento das zonas de progradação da linha de praia. O campo de dunas costeiros e a linha
batimétrica de 10 m, também monitoradas por Toldo et al. (2004) são feições que apresentaram amplo
alargamento neste local e são um fator a mais para confirmar o padrão circulatório e a influência da inflexão
costeira em Mostardas.
Conclusões
A utilização de perfis praiais longitudinais mostraram-se bastante eficientes para o monitoramento de
áreas de longa extensão, permitindo a identificação de feições morfológicas como as cúspides praiais e
também o comportamento morfodinâmico da praia de Mostardas.
A morfologia subaérea da praia apresentou-se diretamente associada às condições energéticas atuantes
nos dias anteriores e no momento do monitoramento, sendo que a diferença da orientação da linha de praia
desempenha função pouco significativa na modelagem do perfil subaéreo. Entretanto, a inflexão costeira foi
responsável pelas variações da linha de praia nas duas escalas temporais.
As variações sazonais verificadas com a progradação em toda praia ocorrida entre janeiro e maio
foram maiores no trecho sul, caracterizando a influência apresentada pela inflexão costeira na atuação das
27
ondas ao se aproximarem de águas rasas e no transporte de sedimentos. No período de maio a setembro
ocorreu o inverso mostrado através da erosão em toda a linha de costa.
As variações anuais ocorridas entre 1997 e 2005 mostraram uma distinção entre os trechos norte e sul
da praia de Mostardas. Enquanto na metade sul da praia ocorre o predomínio de áreas em erosão, o
comportamento da metade norte é mais variado, com um aumento significativo das áreas de estabilidade e
deposição. A praia de Mostardas apresenta uma média de progradação no mínimo três vezes maior quando
comparada com a área de deposição da costa do Rio Grande do Sul. Este fato ocorre devido à inflexão
costeira que propicia uma menor exposição do trecho norte a ação das ondas mais energéticas provenientes
de sul.
28
Referências Bibliográficas
Almeida, L.E.S.B.; Rosauro, N.M.L. & Toldo Jr., E.E. 1997. Análise preliminar das marés na barra do rio
Tramandaí, RS. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, 12., 1997, Vitória, ES.
Anais, ABRH, v. 1, p. 560-566.
Alvarez, J.A.; Gré, J.C.R. & Toldo Jr., E.E. 1981. Estudos da praia a nordeste do molhe de Rio Grande,
Pesquisas, (14):131-147.
Barletta, R.C. 2000. Efeito da interação oceano-atmosfera sobre a morfodinâmica das praias do litoral
central do Rio Grande do Sul, Brasil. Rio Grande. 134p, Dissertação de Mestrado em Oceanografia
Física, Química e Geológica, Fundação Universidade Federal do Rio Grande.
Buchmann, F.S.C. & Tomazelli, L. J. 2000. Altos topográficos submersos (Parcéis) na antepraia do Rio
Grande do Sul, Brasil, e sua influência na morfologia e dinâmica praial. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO
DE PRAIAS ARENOSAS, 2000, Itajaí, Anais Itajaí, p. 173-174.
Calliari, L.J. & Klein, A.H.F. 1993. Características morfodinâmicas e sedimentológicas das praias oceânicas
entre Cassino e Chuí, RS. Pesquisas, (20):48-56.
Carmo, J.A. & Marques, J.C. 2003. Proposta de princípios orientadores para o desenvolvimento sustentável
da zona costeira portuguesa. In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTUDOS DO
QUATERNÁRIO, 9., 2003. Recife, PE. Anais Recife, ABEQUA. CD-ROM.
Coli, A.B. 2000. Estudo sobre o clima de ondas em Rio Grande – RS. Rio Grande. 80p, Dissertação de
Mestrado em Engenharia Oceânica, Fundação Universidade Federal do Rio Grande.
Dail, H.J.; Merrifiled, M.A. & Bevis, M. 2000. Steep beach morphology changes due to energetic wave
forcing. Marine Geology, (162):443-458.
Davis Jr., R.A. 1997. Regional coastal morphodynamics along the United States Gulf of Mexico. Journal of
Coastal Research, 13(3):595-604.
Esteves, L.S.; Toldo Jr., E.E.; Dillenburg, S.R. & Tomazelli, L.J. 2002. Long- and short-term coastal erosion
in southern Brazil. Journal of Coastal Research, (36):273-282.
29
Esteves, L.S. 2004. Shoreline changes an coastal evolution as parameters to identify priority areas for
management in Rio Grande do Sul, Brazil. Revista Pesquisas em Geociencias, 31(2):15-30.
Fonzar, B.C. 1994. A circulação atmosférica na América do Sul – Os grandes sistemas planetários e
subsistemas regionais que atingem o continente: localização e trajetórias. Caderno de Geociências,
IBGE, Rio de Janeiro, (11) jul./set. 1994, p. 11-33.
Garcia, C.A.E. 1997. O ambiente e a biota do estuário da Lagoa dos Patos. Marés e Correntes. In: Seeliger,
U.; Odebrecht, C. & Castello, J. P. (Eds.). Os ecossistemas costeiro e marinho do extremo sul do
Brasil. Editora Ecoscientia. p.18.
Lélis, R.J.F. & Calliari, L.J. 2003. Identificação de Áreas Prioritárias para o Gerenciamento Costeiro no Rio
Grande do Sul. In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTUDOS DO
QUATERNÁRIO, 9., 2003. Recife, PE. Anais Recife, ABEQUA, CD-ROM.
Lima, S.F.; Almeida, L.E.S.B. & Toldo Jr., E.E. 2001. Estimativa da capacidade de transporte longitudinal
de sedimentos a partir de dados de ondas para a costa do Rio Grande do Sul. Pesquisas, 28(2):99-107.
Martins, L.R.S. 1967. Aspectos deposicionais e texturais dos sedimentos praiais e eólicos da planície costeira
do Rio Grande do Sul. Publicação Especial IG, UFRGS, 13, 100 p.
Martins, L.R.S.; Melo, U.; França, A.M.C.; Santana, C.I. & Martins, I.L.R. 1972. Distribuição faciológica da
margem continental sul-riograndense. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 26., 1972,
Belém. Anais, SBG, São Paulo. p. 115-132.
Masselink, G. & Pattiaratchi, C.B. 1998. Morphological evolution of beach cusps and associated swash
circulation patterns. Marine Geology, (146):93-113.
Masselink, G.; Evans, D.; Hughes, M.G. & Russel, P. 2005. Suspended sediment transport in the swash zone
of a dissipative beasch. Marine Geology, 216(3):169-189.
Morton, R.A. 1979. Temporal and spatial variations in shoreline change and their implications, examples
from Texas Gulf-coast. Journal of Sedimentary Petrology, (49):1102-1112.
Morton, R.A.; Leach, M.P.; Paine, J.G. & Cardoza, M.A. 1993. Monitoring beach changes using GPS
surveying techniques. Journal of Coastal Research, 9(3):702-720.
30
Nicolodi, J.L.; Toldo Jr., E.E. & Gruber, N.L.S. 2000. Análise da direcionalidade das correntes litorâneas no
litoral norte do Rio Grande do Sul. In: SEMANA NACIONAL DE OCEANOGRAFIA, 13., 2000, Itajaí,
SC. Anais Itajaí, AOCEANO, v. 1, p. 461-463.
Nicolodi, J.L.; Siegle, E.; Rechden, R. & Corrêa, I.C.S. 2002. Análise sedimentológica do pós-praia do Rio
Grande do Sul. In: Martins, L.R.S.; Toldo Jr.; E.E.; Dillenburg, S.R. Erosão Costeira: Causas, análise
de risco e sua relação com a gênese de depósitos minerais. Porto Alegre. RS, Brasil. Editora CECO-
IG-UFRGS.
Pajak & Leatherman, S. 2002. The high water line as shoreline indicator. Journal of Coastal Research,
18(2):329-337.
Ruggiero, P.; Komar, P.D. & McDougal, W.G. 1996. Extreme water levels, wave runup and coastal erosion.
In:
COASTAL ENGEENIRING CONFERENCE, 25., 1996. Proceedings ,Amer. Soc. Civil Engrs, p.
2793-2805.
Saraiva, J. M. B.; Bedran, C. & Carneiro, C. 2003. Monitoring of storm surges on Cassino beach, RS, Brazil.
Journal of Coastal Research, (35):323-331.
Souza, C.R.G. 2001. Coastal erosion risk assessment, shoreline retreat rates and causes of coastal erosion
along the state of São Paulo coast, Brazil. Revista Pesquisas em Geociencias, 28(2):459-474.
Sunamura, T. 1988. Beach morphologies and their change. In: Horikawa, K. (ed.). Nearshore Dynamics
and Coastal Processes. [S.1.]: University of Tokyo Press, p. 133-166.
Toldo Jr., E.E.; Almeida, L.E.S.B.; Barros, C.; Baitelli, R.; Martins, L.R. & Nicolodi, J.L. 1999. Retreat of
the Rio Grande do Sul coastal zone. In: Martins, L.R. e Santana, C.I. (ed.). Non Living Resources of the
Southern Brazilian Coastal Zone and Continental Margin. Porto Alegre, RS, Brazil: Editora CECO-IG-
UFRGS: pp. 62-68.
Toldo Jr., E.E. & Almeida, L.E.S.B. 2003. A Linha D’Água como Indicadora da Posição da Linha de Praia.
In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ESTUDOS DO QUATERNÁRIO, 9., 2003.
Recife, PE. Anais, ABEQUA, CD.
31
Toldo Jr., E.E.; Nicolodi, J.L.; Almeida, L.E.S.B.; Corrêa, I.C.S. & Esteves, L.S. 2004. Coastal Dunes and
Shoreface Width as a Function of Longshore Transport. Journal of Coastal Research, (39) Proceedings
of the 8th International Coastal Symposium, in press.
Tomazelli, L.J. 1978. Minerais pesados da plataforma continental do Rio Grande do Sul, Brasil. Acta
Geológica Leopoldensia (2):103-159.
Tomazelli, L.J. & Villwock, J.A. 1992. Considerações Sobre o Ambiente Praial e a Deriva Litorânea de
Sedimentos ao Longo do Litoral Norte do Rio Grande do Sul, Brasil. Pesquisas, 20(1):18-26.
Tomazelli, L.J.; Villwock, J.A.; Dillenburg, S.R.; Bachi, F.A. & Dehnhardt, B.A. 1998. Significance of
present-day coastal erosion and marine transgression, Rio Grande do Sul, southern Brazil. Anais da
Academia Brasileira de Ciências, 70(2):221-229.
Tomazelli, L.J. & Dillenburg, S.R. 1998. O uso do registro geológico e geomorfológico na avaliação da
erosão de longo prazo na costa do Rio Grande do Sul. Geosul, 14(27):47-53.
U.S. Army Coastal Engineering Research Center/ CEM. 2001. Coastal Engineering Manual. Vol (2). Surf
Zone Hydrodynamics.
Wright, L. D. & Short, A. D. 1984. Morphodynamics variability of surf zones and beaches: a synthesis.
Marine Geology, (56):93-118.
32
Sumário Integrador
Os principais resultados obtidos através da realização da dissertação são apresentados a seguir, como
nas conclusões apresentados no artigo.
A utilização de perfis praiais longitudinais mostraram-se bastante eficientes para o monitoramento de
áreas de longa extensão, permitindo a identificação de feições morfológicas como as cúspides praiais e
também o comportamento morfodinâmico da praia de Mostardas.
A morfologia subaérea da praia apresentou-se diretamente associada às condições energéticas atuantes
nos dias anteriores e no momento do monitoramento, sendo que a diferença da orientação da linha de praia
desempenha função pouco significativa na modelagem do perfil subaéreo. Entretanto, a inflexão costeira foi
responsável pelas variações da linha de praia nas duas escalas temporais.
As variações sazonais verificadas com a progradação em toda praia ocorrida entre janeiro e maio
foram maiores no trecho sul, caracterizando a influência apresentada pela inflexão costeira na atuação das
ondas ao se aproximarem de águas rasas e no transporte de sedimentos.
As variações anuais ocorridas entre 1997 e 2005 mostraram uma distinção entre os trechos norte e sul
da praia de Mostardas. Enquanto na metade sul da praia ocorre o predomínio de áreas em erosão, o
comportamento da metade norte é mais variado, com um aumento significativo das áreas de estabilidade e
deposição. Este fato ocorre devido a inflexão costeira que propicia uma menor exposição do trecho norte a
ação das ondas mais energéticas provenientes de sul.
33