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A “revolução”, entre aspas, de 1964 aconteceu quando eu estava ter-
minando um trabalho em Roma. A volta para o Brasil, no início de 1965,
foi uma profunda experiência, porque encontrei o nosso país sob a ação
repressiva dos militares, criando um clima de medo e de apreensão, parti-
cularmente no nível da comunicação. Era difícil saber com quem se fala-
va. Atuei na capelinha universitária. Fiquei muito preocupado com a situ-
ação de jovens, rapazes e moças desaparecidos e eliminados pelo poder
repressivo. Acompanhei, também, lideranças do operariado. Eram as duas
áreas mais visadas. Em nível da Igreja, agradeço a experiência de
colegas, companheiros de sacerdócio, que souberam expressar a sua
rejeição a essas atitudes e tomar a defesa dos perseguidos. Eu mesmo
visitei vários na prisão e procurei acompanhar suas famílias. Essa foi a
imagem de 1965 até vários anos depois.
Trecho 4 – Depoimento de Luís Inácio da Silva
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Quando houve o 31 de março, eu tinha exatamente dezoito anos de
idade. Trabalhava na Metalúrgica Independência. E eu achava que o
golpe era uma coisa boa. Eu trabalhava junto com várias pessoas de
idade. E pra essas pessoas, o Exército era uma instituição de muita
credibilidade. Como se fosse uma coisa sagrada. Uma coisa intocável. O
Exército era uma coisa que poderia consertar o Brasil. Quando houve o
golpe, a Metalúrgica Independência tinha 45 pessoas, e a gente tinha uma
meia hora para o almoço. Todo mundo de marmita, a gente sentava pra
comer e eu via os velhinhos comentarem: Agora vai dar certo, agora vão
consertar o Brasil, agora vão acabar com o comunismo. Era essa a idéia.
Essa era a visão que eu tinha na época do golpe militar.
Eu acho que a gente tem que dividir o regime militar entre a intenção
dos militares que deram o golpe em 1964 e aquilo em que se transformou
depois do golpe, a revolução. Pois eu acho que houve uma deformação,
se você tirar fora as questões políticas, as perseguições e tal, do ponto de
vista da classe trabalhadora o regime militar impulsionou a economia de
forma extraordinária. Hoje a gente pode dizer que foi por conta da dívida
externa, “milagre” brasileiro e tal, mas o dado concreto é que, naquela
época, se tivessem eleições diretas, o Médici ganhava.
Quando é que começou a classe trabalhadora a se rebelar contra o
regime militar? A classe trabalhadora despolitizada, a massa. Quando
acabou o “milagre brasileiro”. Exatamente a partir do final da década de
setenta, quando tivemos que pagar o que nós tínhamos tomando
emprestado na década de sessenta.
No governo do Médici, eu tava me formando politicamente. Aí
quando foi em 1975, eu fui ser presidente do Sindicato.
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Em entrevista para o livro “Memória Viva do regime militar” de Ronaldo Costa Couto.
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Em entrevista para o livro “Memória Viva do regime militar” de Ronaldo Costa Couto.