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• As vivências e representações afetivo-sexuais representam tabus na
Instituição, entre os reservistas/atiradores e os seus pares.
Tais questões foram se configurando mediante o contato com o
pensamento de Michael Foucault (1984) e a literatura, sobre poder e sexualidade,
principalmente as que tratavam de minorias sexuais. Posteriormente, tal incursão
nessa literatura se apresentou como um possível empecilho, uma vez que me
conduziria a refletir a construção de uma masculinidade dada num só pólo, o
‘não-gay’, correndo o risco de reduzir e empobrecer a discussão.
Nesse contexto, outro fator de ordem pessoal dificultava a fluência de
minha inserção no campo, movida por uma ‘resistência’ à aproximação com uma
instituição militar, distante do meu universo de vivência pessoal, uma vez que
não havia prestado o Serviço Militar Obrigatório. Porém, tinha na minha
trajetória pessoal a vivência no Escotismo, que compreendeu minha infância e
parte da adolescência
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, objetivando uma vivência significativa da minha
experiência como homem.
Aqui vale destacar a significante aproximação entre o Escotismo e o
militarismo brasileiro. A criação do Movimento Escoteiro (Scouting for Boys),
pelo general inglês Baden Powell, em 1907 na Inglaterra, coincidiu com a
presença significativa de Oficias e Praças da Marinha Brasileira que estavam em
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O Escotismo, embora seja um movimento que não é ligado às Forças Armadas ou aos Órgãos de
Formação de Oficias, e nem tão pouco de Reserva, possui um caráter/pedagogia extremamente militar.
Seu idealizador foi oficial do exército britânico, o Lord Baden Powell. A princípio, esse movimento tinha
como função treinar meninos ‘nativos’ na atuação como estafetas para atravessarem as linhas inimigas,
durante a Guerra dos Böers, na África. Anos mais tarde é que ele assumiu outros contornos, tanto na
Inglaterra quanto pelo mundo. Badinter (1993) argumenta que nos Estados Unidos, em plena expansão
industrial, os homens americanos se inquietavam em relação à virilidades de seus filhos, apavorados,
sobretudo, com os discursos feministas, com a feminização da educação familiar e escolar e com a
ascendência da lei materna. Aspectos que eles julgavam retirar a oportunidade dos jovens de se tornarem
‘homens’ e, por isso, alguma providência deveria ser tomada. Segundo a autora, essas preocupações
fazem parte da implementação do Escotismo nos EUA em 1910, no qual o grande objetivo declarado do
movimento era “fazer dos meninos pequenos grandes homens e lutar contra as forças da feminização”
(BADINTER, 1993:93). Assim, a vivência no escotismo deveria enfatizar/encorajar o espírito de equipe e
a virilidade sobre todas as formas. Aqui, provas, desafios, disciplina e rigor moral vão ser exacerbados,
permanecendo longe de qualquer ‘tendência’ efeminada. Neste contexto, o então presidente Theodore
Roosevelt torna-se o modelo de ‘homem supremamente viril’ (sedutor, individualista, atlético, senhor de
si e, se necessário, agressivo) e também é eleito como seu presidente honorário. Aos poucos, foi sendo
proposto um ideal masculino, exaltando a auto-afirmação moral e física. Enfim, um espaço de doutrina e
‘adestramento’ de jovens na manutenção e reprodução de um ideal hegemônico masculino.