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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DAS SOCIEDADES
IBERO-AMERICANAS
MESTRADO
O RECRUTAMENTO MILITAR NA GUERRA DO PARAGUAI:
VOLUNTARIADO E COERÇÃO
FRANCISCA CARLA SANTOS FERRER
Porto Alegre
Julho/2004
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2
FRANCISCA CARLA SANTOS FERRER
O RECRUTAMENTO MILITAR NA GUERRA DO PARAGUAI:
VOLUNTARIADO E COERÇÃO
Dissertação apresentada ao Pro-
grama de Mestrado em História
das Sociedades Ibero-americanas
da Pontifícia Universidade Católi-
ca do Rio Grande do Sul, para ob-
tenção do título de mestre em His-
tória, sob a orientação do Prof. Dr.
Moacyr Flores. Linha de pesquisa:
Sociedade, Urbanização e Imigra-
ção.
Porto Alegre
Julho/2004
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3
Ao meu amado Ferrer;
dedico esta conquista, pelo incentivo, de-
terminação, compreensão, amor e carinho,
sem os quais não conseguiria realizar meus
sonhos.
4
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais por me incentivarem com todo amor e carinho em cada
decisão de minha vida;
Ao Prof. Dr. Moacyr Flores pela orientação,
Ao CNPq, por viabilizar esta pesquisa;
À Prof ª. Drª. Ivone Cordeiro Barbosa, que me incentivou a iniciar a pesquisa
acadêmica, desde a graduação na Universidade Federal do Ceará;
Ao Prof. Dr. Earle.D. Macarthy, por sua prestimosa atenção ao compartilhar
comigo informações e reflexões sobre a Guerra do Paraguai.
Aos professores do curso de s-graduação da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, que me propiciaram a atmosfera de discussão e
conhecimento necessário à realização desta dissertação;
Agradeço o incentivo e apoio dos amigos, que me acompanharam em todas
as etapas, compartilhando sugestões, críticas e indicação de fontes sobre este
5
trabalho acadêmico. Menciono especialmente Julia Matos, Cristine Fortes Lia,
Raquel Padilha e Rodrigo.
Agradeço ainda ao Coronel R/1 Caminha (CMPA), Coronel Barroso Magno
(3ºBPE/CMS) e Jean Michel;
Às amigas Roberta Simara, Rosa Simara e Norma Silveira e às minhas
queridas primas, Magda Márcia e Anamária Araújo, que proporcionaram através de
suas atenções possibilidades de concretizar este estudo cientifico;
À Carla e Alice que sempre foram solícitas em resolver e ajudar os diversos
problemas administrativos, junto à secretaria deste Curso de Pós - graduação;
Agradeço a cooperação da Biblioteca do Exército - RJ, Colégio Militar de
Porto Alegre, Arquivo Histórico do Comando Militar do Sul - POA , Arquivo Histórico
do Rio Grande do Sul, Museu Hipólito José da Costa- RS, Biblioteca Nacional- RJ,
Arquivo Nacional- RJ e a Biblioteca de Rio Grande- RS.
6
Nada envolve tanto os seres humanos, de maneira tão
íntima e completa, quanto a guerra e seus acontecimentos,
com a dívida suprema que ela cobra, ou seja: a morte, a dor as
feridas e os sofrimentos, a mobilização de todos os recursos
(econômico e espiritual, industrial e científico, ideológico e reli-
gioso), a destruição de todas as espécies de bens dos grandes
monumentos às bibliotecas, das fábricas às casas, sem conce-
ber nenhuma distinção entre civis e combatentes, entre jovens
e velhos, entre homens e mulheres, entre crianças e doentes.
Luigi Bonanate.
7
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar a organização e o desenvol-
vimento do recrutamento militar, para o Exército, junto aos segmentos sociais do
Brasil, no período da Guerra do Paraguai. Procuramos compreender o contexto so-
cial e político da região do Prata, pois suas tensões de fronteiras, foram os principais
responsáveis pelo início deste conflito internacional. Para desenvolvermos este tra-
balho, buscamos apoio na História Social, analisando documentos primários, perió-
dicos, imagens e literatura que juntos complementaram a possibilidade de melhor
entendimento da sociedade brasileira no período da referida Guerra.
Palavras - Chave: Recrutamento Militar, Guerra do Paraguai, Exército.
8
ABSTRACT
This work has as objective to analyze the organization and the development of the
military recruitment to the army together to the Brasil´s social segments in the period
of the Paraguay´s War. Thus, we looking for to comprehend the social, political and
economic context of the Prata´s region, so their tensions of frontiers were the princi-
pals responsible by the begin of this international conflict. To develop this dissertation
we sought support in the social History analyzing primary documents, periodics, pic-
tures and literatures, that this together gave the best understanding of the Brazilian
society in the period of the refer war.
Key Words: Recruitment military, Paraguay´s war, Army
9
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura1-Documento paraguaio 22
Figura2-Cautela de jóias entregue ao governo paraguaio, pelas
mulheres paraguais 27
Figura3-Mapa da Campanha do Estado Oriental 44
Figura4-Paissandu após o bombardeio. ruínas do forte 45
Figura5-Inspeção realizada após o ataque a Paissandu pelo chefe
das forças de defesa, Leandro Gomez 46
Figura6-Vista do Forte Coimbra 51
Figura7-Mapa da invasão ao Mato Grosso 52
Fgura8-Retirada da Laguna 54
Figura9-Mapa da invasão ao Rio Grande do Sul 61
Figura10-Expedição ao Mato Grosso 64
Figura11-O nero do século XIX 65
Figura12-Infantaria nas trincheiras em Tuiuti 70
Figura13-Armamento utilizado na Guerra do Paraguai 71
Figura14-Balão de observação 73
Figura15-Fardamento do soldado rio- grandense 77
Figura16-Designação da Guarda Nacional 84
Figura17-Degredados convocados para guerra 86
Figura18-D. Pedro II no campo de batalha em Uruguaiana- RS 91
Figura19-Jovita Alves Feitosa com fardamento de sargento 97
Figura20-Compra e venda de títulos nobiliárquicos e medalhas 101
10
Figura21-Pirâmide social 102
Figura22-Venda de substitutos, como forma de ascensão econômica 108
Figura23-Oficial alemão que participou da Guerra do Paraguai 112
Figura24-Fabricação de braços para guerra 114
Figura25-Sátira do jornal Cabichuí 120
Figura26-O Exército paraguaio através da imprensa brasileira 123
Figura27-Opinião pública sobre a violência e arbitrariedades do recrutamento 129
Figura28-Cólera Morbus no Teatro de guerra 132
Figura29-Hospital de sangue em Passo da Pátria 135
Figura30-Recrutamento forçado 140
Figura31-Recrutamento de um enfermo 141
Figura 32- O Casamento
148
11
INDICE DE TABELAS
Tabela 1-Morte da população do Paraguai 26
Tabela 2-Tabela de Forças da província do Mato Grosso 49
Tabela 3-Designação do número de Guardas Nacionais por província 80
Tabela 4-relação dos donativos feitos ao estado para a guerra 103
Tabela 5-Despesas administrativas na segunda metade do século XIX 105
Tabela 6-Substituição por escravos 116
Tabela 7-Mapa de libertos que assentaram praça até 1868 117
Tabela.8-Ração diária para as operações 130
Tabela 9-Mapa dos oficiais e praças mortos, feridos e extraviados 131
Tabela 10-Mapas de deserções, apreensões e apresentações nos meses de maio e
junho de 1869 138
Tabela 11-Contingente enviado à Guerra do Paraguai da província do Rio Grande do
sul 146
12
SUMÁRIO
INDICE DE FIGURA________________________________________________9
INDICE DE TABELAS ___________________________________________ 11
INTRODUÇÃO ___________________________________________________ 13
1. O ESTOPIM DA GUERRA DO PARAGUAI___________________________ 20
1.1 Tendências historiográficas ___________________________________ 20
1.2- Tensões no Prata ___________________________________________ 30
1.3 Invasão à Província do Mato Grosso____________________________ 47
1.4 Invasão a Província do Rio Grande Do Sul _______________________ 53
2. A CONVOCAÇÃO MILITAR_______________________________________ 61
2.1 O Império na mobilização militar________________________________62
2.2 A ( re ) organização do Exército Brasileiro________________________66
2.3 Mecanismos de apelo patriótico________________________________ 88
2.4 A participação da sociedade na Guerra________________________ 101
2.4.1 Os abastados___________________________________________ 102
2.4.2 Pobres- livres___________________________________________ 105
2.4.3 Os imigrantes alemães____________________________________ 107
3. A COERÇÃO NO RECRUTAMENTO MILITAR. ____________________ __124
3. 1 Evasão da sociedade a Guerra_______________________________ 126
3.2 Alistamento coercitivo______________________________________137
CONSIDERAÇÕES FINAIS ________________________________________151
ARQUIVOS E MUSEUS PESQUISADOS ___________________________ 155
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS__________________________________160
13
INTRODUÇÃO
O trabalho que aqui apresentamos tem como principal objetivo analisar o re-
crutamento militar referente ao Exército brasileiro, no período da Guerra do Paraguai
(1864- 1870), enfatizando a forma de organização e o desenvolvimento deste alis-
tamento na estrutura social do Brasil Império, salientando a Província do Rio Grande
do Sul.
Nesse sentido, esta dissertação diferencia-se dos demais trabalhos acadêmi-
cos, por analisar através da História Social
1
de que forma foi realizado o recrutamen-
to militar na sociedade oitocentista, no período da Guerra do Paraguai, avaliando os
mecanismos utilizados pelo governo imperial para legitimar e obter apoio e coopera-
ção dos diferentes segmentos sociais em participar voluntariamente deste conflito
1
LE GOFF, em seu livro
.
A História Nova. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. Apre-
senta o conceito de História Social com o surgimento da História Nova que procura estudar
a História através da sociedade, interessando-se “pela massa da sociedade, que permeia
distante dos poderes, por aqueles que lhes eram submetidos” e não apenas realizando um
estudo econômico ou político, analisando a sociedade em sua totalidade, nos aspectos eco-
nômicos, políticos e sociais, pois “não história econômica e social. a história pura e
simples em sua unidade. A história que é total social, por definição”.
14
internacional, investigando também, porque ocorreu, com o desenrolar da guerra, o
alistamento forçado e como este foi realizado e recebido pela sociedade brasileira.
Portanto, para analisarmos esses objetivos expostos, foi necessário estudar-
mos e compreendermos o contexto social, político e econômico da região do Prata
responsável pelo desencadeamento do estopim da Guerra da Tríplice Aliança.
Deste modo algumas indagações nortearam este estudo:
Quem eram essas pessoas alistadas à guerra?,
Como elas eram convocadas?
Será que só havia o recrutamento “a laço”, como era recitado pelo lite-
rato?
De que forma a sociedade respondeu a esta conclamação?
Se havia a necessidade do recrutamento forçado, porque os cidadãos
negavam-se a participar da guerra e defender seu país?
O presente tema de estudo surgiu, ao depararmos com a lacuna historiográfica
existente sobre o alistamento militar na Guerra do Paraguai, pois diversos autores
dedicam-se ao estudo desta Guerra, apresentando em seus trabalhos apenas pou-
cas páginas ou capítulos sobre este importante evento
2
histórico, ou apresentam a
visão unilateral da existência apenas do recrutamento coercitivo, relacionando auto-
maticamente a palavra recrutamento na Guerra do Paraguai à coerção.
2
Entendemos evento histórico a partir da perspectiva de Paul Veyne em sua obra
Como se
escreve a história; Foucault revoluciona a história. 4 ed. Brasília: Ed. Universidade de
Brasília, 1998. Na qual considera o evento enquanto fato histórico repleto de inesgotáveis
tramas possíveis.
15
Sendo assim, muitos autores enfatizam principalmente em suas obras, as ba-
talhas militares travadas no teatro de guerra, estudos políticos, econômicos, culturais
e sociais, relegando, em segundo plano a esfera social do alistamento militar.
Desta forma este trabalho possui elevada relevância ao compreendermos a i-
déia de que o recrutamento que existiu na Guerra do Paraguai não foi apenas coer-
citivo, como nos é apresentado na maioria dos trabalhos acadêmicos, mas que hou-
ve um alistamento voluntário no início do conflito, que motivou grande parte da popu-
lação e somente com o passar do tempo, e a longa duração desta guerra é que hou-
ve a necessidade do governo imperial assumir a prática do recrutamento forçado, já
que os “patrióticos” voluntários passaram a fugir da convocação à guerra.
Outrossim, podemos destacar como ponto importante desta pesquisa a des-
construção do pensamento perpassado nas escolas por diferentes livros didáticos e
técnicos da existência apenas do recrutamento forçado na Guerra do Paraguai, po-
dendo por intermédio deste estudo acadêmico ser modificado a compreensão sócio-
histórica deste conflito internacional.
Em função disso realizamos levantamentos e análises bibliográficas sobre o
recrutamento militar na Guerra do Paraguai e investigação documental. Assim sen-
do, essa dissertação está permeado dos seguintes documentos históricos: “Ordens
do Dia do Exército, Decisões do governo, Requerimentos oficiais, documentos do
Exército e da Guarda Nacional, documentos da Justiça, Manuscritos; além das se-
guintes fontes: jornais, literatura da época e imagens”.
16
Portanto é importante compreendermos que ao lidarmos com diferentes fon-
tes históricas,
O historiador abre primeiro com respeito ao passado aquela
que ele conhece melhor. Mas se procura ver tão longe quanto
possível, obrigatoriamente baterá a uma outra porta, depois a
uma outra... à cada vez por-se-ia em discussão uma paisagem
nova ou ligeiramente diferente e, não historiador digno des-
se nome que não saiba justapor um certo número destas pai-
sagens: cultural e social, cultural e política, social e econômica,
econômica e política, etc. Mas a história as reúne todas, ela é o
conjunto dessas vizinhanças, dessas interações infinitas...
3
Seguindo esta perspectiva utilizamos enquanto embasamento historiográfico as
obras dos seguintes autores:, Ricardo Salles, Klaus Becker, Francisco Doratioto,
Vitor Izecksohn, Dionísio Cerqueira, Mauro César Silveira, dentre outros. Estes escri-
tores foram importantes para o desenvolvimento crítico do tema de estudo aqui pro-
posto, mesmo que suas obras apresentem diferentes focos de estudo sobre a Guer-
ra da Tríplice Aliança.
Nesse sentido Ricardo Salles em seu livro "Guerra do Paraguai: escravidão
e cidadania na formação do Exército" analisa a formação do Exército, durante a
Guerra do Paraguai, sua relação com as camadas médias, setores populares livres e
escravos, dando ênfase para o estudo da estrutura social escravocrata, que foi um
dos grupos sociais mais presentes no campo de batalha.
A obra "Alemães e descendentes do Rio Grande do Sul na Guerra do Para-
guai", do autor Klaus Becker, apresenta o estudo da participação na Guerra da Trí-
plice Aliança do segmento social alemão, referente à Província do Rio Grande do
3
BRAUDEL, Fernand. Escritos sobre a História. São Paulo: Perspectiva, 1992, p. 175.
17
Sul. Este trabalho é importante para a historiografia pois, propicia informações de
fontes sobre os alemães no período da Guerra, que o pesquisador priorizou o le-
vantamento de documentos e sua autenticidade, sem realizar análises e diálogos
com os dados coletados.
O livro "Maldita Guerra, Nova história da Guerra do Paraguai" do autor Fran-
cisco Doratioto é um trabalho que propõe ser uma nova versão sobre a Guerra do
Paraguai, indo contra os estudos "revisionistas" de autores como Júlio José Chiave-
nato, "Genocídio Americano: A Guerra do Paraguai". Doratioto, em sua obra,
mencionada, buscou explicar as origens da guerra e seu desenvolvimento, analisan-
do os países envolvidos na supracitada guerra. O autor se prevalece, de uma gran-
de diversidade e volume de fontes, que serão significantes para o desenvolvimento
da presente pesquisa, além das fontes, esta obra é essencial, pois nos traz à tona,
uma nova análise sobre o período da Guerra do Paraguai em sua “totalidade”.
Vitor Izecksohn em seu livro "O Cerne da Discórdia, a Guerra do Paraguai e
o núcleo profissional do Exército", procura analisar a reorganização do Exército Bra-
sileiro, com o desenvolvimento do núcleo profissional da Força terrestre do Brasil;
este livro se tornou importante em nossa pesquisa, pois fornece complementos para
o entendimento da situação do Exército Brasileiro no séc. XIX e a necessidade do
Recrutamento Militar neste período.
O autor Dionísio Cerqueira em sua obra, "Reminiscências da Campanha do
Paraguai", tornou-se relevante, pois este trabalho nos leva a compreender uma épo-
ca e as agruras sofridas pelos participantes na Guerra do Paraguai. Enquanto histo-
18
riadores, devemos apreender as reminiscências como documentos históricos impor-
tantes, pois devemos entender que o “indivíduo”, é um agente histórico, que estabe-
lece relações sociais em seu meio, e não devemos desprezá-los como meros relatos
individuais.
Mauro César Silveira em “Adesão Fatal, a participação portuguesa na Guerra
do Paraguai” apresenta-nos a identificação e participação dos Luso- brasileiros nes-
te conflito internacional, neste sentido, o referente autor nos proporciona o estudo do
recrutamento deste grupo social, até então não identificado e analisado pela histori-
ografia. Em seu outro trabalho intitulado “A Batalha de papel- a Guerra do Paraguai
através da caricatura” o autor nos abriu a perspectiva da análise do recrutamento
militar através da caricatura.
Outras obras sobre a Guerra do Paraguai também foram relevantes para o
desenvolvimento crítico do tema em questão, conforme apresentaremos no decorrer
das “instigantes” páginas deste trabalho.
Ao partir desta premissa o presente trabalho se desenvolveu em três capítu-
los, nos quais:
O primeiro, apresentará uma discussão historiográfica sobre a Guerra do Pa-
raguai e uma análise do contexto social, político e econômico da região platina no
século XIX, em destaque para tensões fronteiriças entre o Rio Grande do Sul e o
Uruguai, que foram responsáveis pelo estopim desse conflito.
O segundo, analisará a reorganização do Exército brasileiro após a deflagra-
ção da Guerra e a convocação da sociedade para participar voluntariamente deste
19
embate internacional, enfatizando os mecanismos utilizados pelo Império para des-
pertar o sentimento patriótico na população, com o intuito de impulsionar todos os
brasileiros à defesa da pátria.
O terceiro, realizará a discussão do fim do entusiasmo patriótico, portanto do
voluntariado e a necessidade da realização do alistamento coercitivo. Demonstrare-
mos também, como era realizado este recrutamento e de que forma a população
fugia desta “caçada humana”.
20
1 O ESTOPIM DA GUERRA DO PARAGUAI
Toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de pro-
dução sócio-econômico, político e cultural. Implica um meio de
elaboração que circunscrito por determinações próprias: uma
profissão liberal, um posto de observação ou de ensino, uma
categoria de letrados, etc. Ela está, pois, submetida a imposi-
ções, ligada a privilégios, enraizada em uma particularidade. É
em função deste lugar que se instauram os métodos, que se
delineia uma topografia de interesses, que os documentos e as
questões, que lhes serão propostas, se organizam.
Michel de Certau
1.1 Tendências historiográficas
A Guerra da Tríplice Aliança foi o maior conflito bélico, estabelecido na A-
mérica Latina, envolvendo quatro países, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai,
dessa forma, existe uma vasta historiografia a respeito do assunto.
As tendências historiográficas apresentam várias “teorias” divergentes a
respeito desta “grande guerra”. Sendo assim, a historiografia tradicional brasileira,
representada em sua maioria por militares, como o General Paulo Queiroz Duarte,
21
Dionísio Cerqueira, Tasso Fragoso, A d´Escragnolle Taunay, apresentam em suas
clássicas obras: Os Voluntários da Pátria na Guerra do Paraguai, Reminiscências
da Campanha do Paraguai, História da Guerra da Tríplice Aliança e o Paraguai e A
Retirada da Laguna, respectivamente, a idéia sistematizada e “simplificada” de que
este conflito internacional foi ocasionado pelas pretensões tirânicas do presidente
paraguaio, Solano López, em conquistar toda região platina e então tornar- se o
“Napoleão do Prata”.
Tal visão simplificada do início da guerra, é assim explicitada por Taunay:
Em 1865, no início da guerra que o presidente do Paraguai,
Lopéz, sem outro motivo que a ambição pessoal, suscitara na
América do Sul, mal amparada no vão pretexto de manter o
equilíbrio internacional, o Brasil, obrigado a defender sua hon-
ra e seus direitos, dispôs-se resolutamente à luta.
4
Compartilhando este pensamento tradicional, os autores Pedro Calmon em
seu livro História da Civilização Brasileira e Hélio Viana em sua obra História do
Brasil, defendem a tese de que a soberania do Império brasileiro foi ameaçada pelo
“devaneio” do ditador paraguaio em pretender alcançar o domínio supremo da regi-
ão do Prata.
Essa visão tradicionalista, em associar as causas da guerra à ambição, tira-
nia e “loucura napoleônica” de López, não deixa de expressar certa coerência,
que Francisco Solano pez, em 1853 foi à Europa e entrou em contato com as
idéias políticas de Napoleão III, retornando fascinado com as idéias do império fran-
22
cês. López o era considerado tirano, apenas pelos autores tradicionalistas, mas
entre o povo paraguaio era visto com temor, pois na coleção de documentos oficiais
de 1868 podemos encontrar a seguinte declaração, segundo a figura nº 1:
Figura 1- Documento paraguaio
Fonte: Papeles de López
Nesta declaração o Tenente Coronel Lucas Carrillo, ao responder como era
empregado a disciplina no Exército Paraguaio, afirmou claramente que “a sua disci-
plina era regida pelo capricho da tirania que dominava aquela infeliz pátria,” o Para-
guai.
Mas não podemos aceitar que esta teoria tradicional explique por si a
causa da invasão ao Brasil e a dinâmica da guerra. Problemas de relações interna-
cionais ligados à geopolítica, economia e sociedade ocasionaram o desencadea-
mento do conflito do Paraguai, conforme analisaremos posteriormente.
4
TAUNAY, A d´Escragnolle. A Retirada da Laguna. São Paulo: Companhia das Letras,
23
No século XX, aproximadamente nos anos de 1960 surgiu uma corrente re-
visionista sobre a História da Guerra do Paraguai, na qual autores como León Po-
mer da Argentina e o jornalista Julio José Chiavenato do Brasil, passaram a defen-
der a tese de que o Paraguai foi massacrado pelo Brasil, Argentina e Uruguai que
se uniram devido à influência do governo britânico, que temia a “independência e-
conômica” do Paraguai.
A República do Paraguai era apresentada por esses autores revisionistas,
como um País desenvolvido e independente economicamente da Inglaterra. Sendo
essa República possuidora de alta tecnologia e de uma sociedade desenvolvida e
civilizada, ao possuir quase 100% de sua população alfabetizada. on Pomer afir-
ma que a Guerra da Tríplice Aliança foi provocada pelo capital inglês, interessado
na livre navegação do rio Paraguai e na destruição dos produtos industrializados da
referida República, por temer o modelo do regime econômico e político do Paraguai
incompatível com as grandes correntes de interesses e idéias britânicas.
Julio José Chiavenato aponta como principal fator de desenvolvimento da
Guerra do Paraguai, a invasão ao Uruguai, que estaria previamente acertado com a
Argentina e o Uruguai devido à assinatura do acordo da Tríplice Aliança realizado
com um ano de antecedência e organizado pela Inglaterra. A tese deste autor trazia
a visão de que com o capital inglês, o Brasil, a Argentina e o Uruguai se organiza-
ram para destruir e exterminar a maior potência econômica, política e social do Pra-
ta.
1997, p.38.
24
Tal pensamento do autor Chiavenato apresentado em seu livro “Genocídio
Americano” foi consumido por gerações de estudantes, principalmente pelo fato de
sua tese ser lançada no período da política militar, na década de 60. Essa idéia re-
visionista foi o enraizada no imaginário da população
5
, que até hoje, podemos en-
contrar em grande quantidade pessoas que acreditam piamente que o Brasil foi o
grande vilão da Guerra da Tríplice Aliança, sendo o maior responsável pela deses-
truturação da sociedade paraguaia.
Essa tese discutida pelo autor Julio José Chiavenato, não é consistente,
pois esse jornalista ao apresentar suas idéias, não dispôs de fontes e documenta-
ções históricas para embasar suas afirmações. Segundo o historiador Jacques Le
Goff é indispensável o uso do documento para fazermos História, seja ele escrito,
ilustração, imagem, transmitido pelo som, ou de qualquer outra maneira.
6
Sendo assim, a ausência da documentação deixa claro que a tese revisio-
nista de Chiavenato não passa do acúmulo de simples idéias literárias. Literárias no
sentido de que, “a literatura tem toda uma liberdade de escrita e criação, sendo an-
tes de mais nada um produto artístico, destinado a agradar e a comover, enquanto a
História se preocupa com a realidade, ou seja em manter conexão entre o real e o
possível.”
7
5
O imaginário coletivo, faz parte da teoria da História das Mentalidades, pois é por intermé-
dio desse estudo do coletivo social, que o historiador consegue analisar, segundo Michel
Vovelle, em Imagens e imaginário”, uma história das culturas ou do pensamento mani-
festo, ao domínio mais secreto das atitudes coletivas, que se exprimem por atos, gestos ou
simplesmente sonhos, reflexos inconscientes de representações enraizadas.
6
LE GOFF. Jacques. História e Memória. Campinas- SP: Ed UNICAMP,1996, p. 539.
7
SEVCENKO.Nicolau. Literatura como Missão, tensões sociais e criação cultural na
primeira República .São Paulo: Ed. Brasiliense, 4ª ed, 1995, p.20.
25
Esta idéia revisionista é possivelmente contestável, pois como o Brasil po-
deria juntamente com a Argentina e o próprio Uruguai arquitetar o fim do Paraguai
em favor da Inglaterra, que as relações diplomáticas entre o Império e o governo
britânico estavam desarticuladas devido à chamada Questão Christie
8
, que foi
resolvida apenas em 1865, após a invasão do Paraguai ao Mato Grosso e ao Rio
Grande do Sul. Outro ponto relevante que destrói esse empenho dos ingleses em
acabar com o Paraguai, é a presença de muitos britânicos em território paraguaio
ajudando os López na fundição, no estaleiro, no arsenal e em outras atividades..
9
Portanto a idéia do grande complô dos três países, contra o “coitado” Paraguai, é
desconstruido, como o fato de que as Forças do Exército brasileiro foram os gran-
des responsáveis pela mortandade do povo paraguaio.
A mortandade atribuída apenas à guerra, também é outra “criação”, pois o
próprio Solano López era um dos piores assassinos de seu povo, matando em prol
de conseguir fortunas para manter a guerra ou pela suposição da oposição ao seu
governo, como nos é demonstrado na tabela 1:
8
A Questão Christie, segundo Pedro Calmon em História da Civilização Brasileira, consis-
tiu nas reclamações do ministro inglês em virtude da pilhagem, na costa do Rio Grande do
Sul, dos salvados da barca britânica Prince of Wales e da agressão sofrida na Tijuca por
oficiais de marinha da fragata Forth, fatos devidamente explicados pelo governo Imperial. O
governo do Brasil apelou para as nações cultas, nas quais o laudo arbitral do rei dos belgas.
Como a ofensa tinha partido do representante inglês, negou-se o governo brasileiro a man-
ter relações diplomáticas com o seu País , enquanto não recebesse cabais satisfações, que
lhe foram realmente prestadas, em agosto de 1865, pelo ministro britânico, que se apresen-
tou a D. Pedro II, em Uruguaiana, no acampamento defronte da praça assediada a prestes
de render-se às armas nacionais.
9
MENEZES, Alfredo da Mota. Guerra do Paraguai, como construímos o conflito. São
Paulo: Contexto, 1998, p.25.
26
Tabela 1- Morte da população do Paraguai
Fonte: Papeles de López, 1871
A partir das Merias
10
da Madame Lasserre Duprat,
11
e de documentos,
podemos observar que López, prendeu, matou e deixou na pior miséria grande par-
te da população que habitava o Paraguai, entre o próprio povo guarani e os estran-
10
Ao utilizarmos as memórias de Madame Lasserre Duprat nesta dissertação realizamos
seu entrecruzamento com jornais e documentos primários, desta forma entendemos con-
forme Ana Maria Mauad que “memória e História relata a intimidade cotidiana, encontro de
subjetividades e de tempos. De um lado a memória se apresenta cristalizada na narrativa
passada, de outro a História atualiza a narrativa condensada e expande seus significados
produzindo um sentido que, por estar além do limite do relato, o traduz em documento.” As-
sim nos apropriamos desta memória enquanto documento histórico que nos proporciona
uma rica fonte documental.
11
Madame Lasserre Duprat era uma francesa que morava com sua família no Paraguai e
possuía uma casa de negócios. Essa mulher “desterrada” teve seu irmão e pai presos por
López e enviados a um “campo de concentração” localizado na vila de Luque- Paraguai,
sendo retirado de seus negócios, casa e ente queridos.
27
geiros que possuíam negócios e mantinham a economia do Paraguai, não sendo
esse País o gigante da economia do Prata.
Madame Duprat afirmou em suas Memórias, logo após o início da guerra,
que “todas pessoas que foram à cidade, encontraram chaves falsas nas mãos do
juiz: e que este penetrava em todas as habitações” e quando a senhora Gutierrez foi
pegar alguns pertences desta Madame, encontrou “todos os depósitos e armazéns
inteiramente vazios, os móveis de seu quarto arrombados, um armário e uma secre-
tária despedaçados”
12
sendo assim, esta francesa demonstrou a perseguição aos
estrangeiros e a aquisição de suas fortunas em dinheiro ou jóias para a manutenção
do conflito contra a Tríplice Aliança. O seguinte documento da Biblioteca Nacional
pode nos demonstrar esta afirmação de Madame Duprat, conforme a figura 2:
Figura 2
- Cautala de Jóias Entregue ao Governo Paraguaio, por Mulheres
Paraguaias
Fonte:
Papeles de López, 1871
12
MONTENEGRO, J. Arthur. Guerra do Paraguai. Memórias de Mme. Dorothéa Duprat
de Lasserre. Rio Grande- RS: Livraria Americana, p.15.
28
A afirmação do Chiavenato em relação à educação no Paraguai e o fato de
quase 100% dos indivíduos serem alfabetizados e este País ser considerado uma
grande civilização, não se concretiza, a nos depararmos com a obra de Ildefonso
Antônio Bermejo, que nos apresenta cenas, costumes e personagens da vida cotidi-
ana do Paraguai. Este autor apresenta situações em que o próprio presidente Car-
los López critica seu povo considerando-o bárbaro e incapaz, como foi o caso do
Ministro da Fazenda, que foi convocado às pressas a comparecer à casa do gover-
no e recebeu a seguinte “advertência”:
Vocês não me servem mais que de estorvo. Vocês ministros
são uns badulaques, e você é um animal! O ministro inclinou a
cabeça e respondeu submissamente: “Sim, senhor”.[...] O mi-
nistro da Fazenda queria perguntar algo, mas tremiam-lhes os
lábios e não acertava com a palavra. O presidente olhava-o e
exclamou: “ O que é que está olhando, seu bárbaro.”
13
Madame Duprat em suas memórias lembra ainda, de como a população não
era totalmente alfabetizada, pois muitos não sabendo ler pediam a seu irmão, o qual
despachava no comércio e tinha mais aproximação com a população, o favor de ler
suas cartas. Se realmente quase 100% do povo paraguaio sabia ler, porque procu-
rariam uma pessoa para realizar este ato. Assim sendo, Madame Duprat afirma que
“Desta gente pouca sabia ler e escrever, e para fazê-lo, se valiam dele, escrevendo-
lhes as cartas que enviavam para o exército e respondendo as que dali vinham.
14
13
BERMEJO, Ildefonso Antônio.
Episódios da Vida privada, política e social na Repúbli-
ca do Paraguai; tradução, apresentação e notas de Earle D. Macarthy Moreira. Porto Ale-
gre: EDIPUCRS, 2002, p.30-31.
14
MONTENEGRO, op. Cit., p.3.
29
Outra tese mais atual sobre a Guerra do Paraguai se concretiza nas obras
de Francisco Fernando M. Doratioto, Ricardo Salles, Alfredo da Mota Menezes, Vitor
Izeckson, Marco Antônio Cunha, André Toral, Mauro César Silveira, dentre outros,
que buscam analisar o conflito internacional do Prata a partir de uma visão social e
cultural, baseado em pesquisas históricas, diferente dos tradicionalistas que ao ana-
lisarem essa Guerra, se prendem muito às estratégias e táticas militares, além da
idéia do início da guerra centralizar-se na figura tirânica de Francisco Solano López.
Essa nova vertente historiografica também contradiz a visão revisionista de
uma geração de autores, ao apresentar pesquisas documentais, e minimizar a rela-
ção da Inglaterra com os países da Tríplice Aliança, considerado este fator pelos
revisionistas, enquanto causa maior do início do conflito. Doratioto apresenta a “teo-
ria” de que a Guerra do Paraguai teve suas origens no processo histórico da forma-
ção dos Estados Nacionais da região do Prata, enfatizando os problemas de frontei-
ras existentes naquela região.
A este pensamento também se juntam os autores Ricardo Salles, Menezes,
Cunha, que visam trabalhar em suas obras o entendimento político, econômico e
social da região, para compreender os mecanismos responsáveis pela deflagração
da referida guerra.
Autores como Mauro César Silveira, André Toral, Wilma Peres Costa, apre-
sentam ainda novos olhares sobre o conflito, pois Silveira em sua obra “A Batalha
de Papel: a Guerra do Paraguai através da caricatura” analisa todo o desenvolvi-
mento da Guerra da Tríplice Aliança por intermédio desta fonte: a caricatura, mos-
30
trando a possibilidade da utilização de diferentes documentos para analisarmos um
fato histórico.
Na obra de Silveira, como a de André Toral, “Adeus Chamingo brasileiro:
uma história da guerra do Paraguai e Imagens em desordem,“podemos compreen-
der a influência da Nova História, na qual seus teóricos como Jacques Le Goff, Pe-
ter Burke, Michel Vovelle, apresentam- nos a possibilidade de caminhar em outros
campos interdisciplinares, compreendendo o documento no sentido mais amplo, não
nos aprisionando apenas a fontes escritas, ditas oficiais, já que o homem faz parte
da sociedade, de uma cultura que pode estar expressa na pintura, no desenho, na
literatura, nas roupas, ou seja, em seu cotidiano e em tudo que ele se expressa.
Portanto, Le Goff ao atestar que a História Nova pode contemplar novos objetos,
novos problemas e novas abordagens, abriu diferentes espaços de pesquisa para o
historiador, podendo este se basear na multiplicidade de documentos para estudar
um fato histórico.
Partindo da perspectiva dessa nova ótica do estudo sobre a Guerra do Pa-
raguai, encabeçada por Doratioto, Salles, Toral e Silveira, é que pretendemos anali-
sar neste trabalho, o Recrutamento Militar na Guerra do Paraguai e para tanto de-
vemos compreender o contexto econômico, político e social que estava presente no
Prata, os quais foram responsáveis pelo estopim da Guerra da Tríplice Aliança. Nes-
te sentido, este primeiro capítulo buscará analisar as causas e o início do conflito
internacional com o Paraguai, para compreendermos como ocorreu o alistamento
militar no Brasil.
31
1.2- Tensões no Prata
Pode existir entre dois povos e Estados uma tensão tal, e ta-
manha soma de elementos hostis, que um motivo de guerra,
ainda que mínimo em si mesmo, desencadeará um efeito des-
proporcionado, uma verdadeira explosão.
Carl Von Clausewitz
Ao longo do século XIX, as relações entre o Brasil e os Estados do Prata fo-
ram marcadas por profundos momentos de tensão, principalmente com o Estado
Oriental do Uruguai, que se tornou o mais delicado e perigoso problema de nossa
política externa,
15
naquele período. Portanto, a política internacional do Brasil, na-
quela época vigente, primava em manter a “independência” do Uruguai, bem como,
manter sua fronteira sossegada e segura.
Segundo André Lamas, agente diplomático uruguaio, os estadistas brasilei-
ros tinham interesse na pacificação do Estado Oriental.
16
Entretanto, esta suposta
pacificação almejada pelo Império não se concretizou, devido às instabilidades enra-
izadas na “fronteira viva
17
”, entre o Brasil e o Uruguai, cujas relações intrínsecas de
cunho econômico e político envolviam a elite agrária do sul do Brasil e da região
platina.
15
LORETO, Aliatar. Capítulos de História Militar do Brasil, os antecedentes da Guerra
contra o Paraguai. Rio de Janeiro: Companhia Editora Americana, 1953, p.139.
16
Jornal do Comércio
, 22 de setembro de 1852.
17
Segundo a tese de Backheuser, Fronteira Viva, em essência, é uma região, através da
qual, mais dia menos dia, surgem, ou se agravam conflitos internacionais, políticos, ou de
ordem fiscal administrativa, ensejando demonstrações de força militar.
32
Sendo assim, as relações fronteiriças
18
entre o Rio Grande do Sul e a Re-
pública Oriental do Uruguai tinham suas peculiaridades, devido à grande aproxima-
ção destes povos. Tal aproximação facilitava as relações políticas e econômicas dos
grandes estancieiros sul-rio-grandenses, que do outro lado da fronteira, possuíam
grandes propriedades, onde mantinham campos de criação de engorda de gado.
Desde o Chuy ao Cuareím, com cerca de 428 estâncias, que abrangiam a superfície
de 1.728 léguas quadradas, o equivalente a 30% do território do Uruguai”
19
.
Na segunda metade do século XIX, a população brasileira no Estado Orien-
tal, representava segundo Moniz Bandeira, cerca de 40 mil rio-grandenses, ou seja,
o equivalente a 20% do total da população do Estado Oriental. Desta forma, pode-
mos compreender as relações intrínsecas existentes entre os grandes proprietários
de terras brasileiros e os uruguaios, em relação aos aspectos políticos e econômi-
cos, que envolviam o Estado Oriental.
Podemos inferir, assim, que realmente existia uma “fronteira viva”, entre es-
tes dois países, coexistindo uma troca de relações e experiências sociais, políticas,
econômicas, militares e familiares. Por causa desta inter-relação proporcionada pelo
convívio intenso na fronteira sul do País, entre rio-grandenses e uruguaios, grande
parte dos distúrbios políticos no Estado Oriental envolviam diretamente a elite sul-
rio-grandense, possuidora de fortunas neste Estado supramencionado.
18
Conforme o Dicionário de Ciências Sociais, 1986, p. 496,: As relações fronteiriças apre-
sentaram no decorrer do processo em análise, um significativo potencial de integração, de-
terminada por uma situação de fricção interétnica, que pode ser definida como aquelas
características do sistema interétnico que presentes na situação do contato poderão ser
tomadas como os elementos responsáveis pela integração.
19
BANDEIRA. Op. Cit., p. 114.
33
Após analisarmos essa ligação fronteiriça que constitui um subsistema de
outro mais incluso, ou seja, um sistema interétnico no qual existiam vários níveis de
cooperação: o econômico, o social e o político
20
, podemos compreender a participa-
ção dos rio-grandenses nos conflitos armados existentes no Uruguai, entre os Parti-
dos Blanco e Colorado
21
, pois esses brasileiros necessitavam garantir a segurança
de suas propriedades e interesses políticos, econômicos e sociais, localizados na-
quele país.
A posição do governo central brasileiro em relação ao envolvimento dos rio-
grandenses na política uruguaia era negativa, pois o Império o apoiava a partici-
pação militar de seus compatriotas em movimentos armados nos países do Prata,
devido às instabilidades políticas que poderiam ser causadas com a Grã- Bretanha,
por este País sempre se apresentar interessado na independência uruguaia, devido
a importância econômica do Porto de Montevidéu, que era considerado estratégico
para as relações comerciais na América Latina.
Sendo assim, a intervenção brasileira no Estado vizinho poderia ser inter-
pretada como finalidade anexionista e ainda poderia causar suspeitas à Argentina,
levando o Império a uma indesejável posição de isolamento internacional.
22
A partir
desta perspectiva
,
a política imperial pretendia manter a paz na região platina e não
se envolver em problemas diplomáticos e militares contra países daquela região.
20
Segundo o Dicionário de Ciências Sociais, 1986, p.496-497
21
Segundo Alberto Zun Felde, O Partido Blanco era arraigado no meio rural e fiel à tradição
hispânica, o qual encarava a defesa dos interesses americanos e orientais. O Partido Colo-
rado localizava-se, principalmente, na cidade de Montevidéo e oferecia a imagem mais ur-
banizada. Desta forma, este Partido aceitava as correntes liberais européias e se identifica-
va com os imigrantes.
22
DORATIOTO, Francisco. Maldita Guerra: nova história da Guerra do Paraguai. São
Paulo: Companhia das Letras, 2002, p.53
34
Em 1863, ao explodir a revolução chefiada por Venâncio Flores, adepto ao
Partido Colorado uruguaio, o governo brasileiro procurou manter sua política de
neutralidade. Neste sentido, o Império recomendou às autoridades do Rio Grande
do Sul as devidas condutas, que deveriam ser acatadas pelos rio- grandenses, a fim
de evitar comprometimentos da política imperial perante ao Estado Oriental do Uru-
guai.
Conforme o Relatório da Secretária de Estrangeiros de 1863, podemos enten-
der estas supramencionadas condutas imperiais:
Nenhuma proteção e auxílio devia prestar-se à causa da rebe-
lião. As forças rebeldes que se asilassem na Província, deviam
ser colocadas em uma posição inteiramente inofensiva. As au-
toridades que deslizassem de seus deveres, não guardando
ou não fazendo respeitar a mais perfeita e absoluta neutralida-
de por parte do Império, deviam ser severamente punidas.
23
Como podemos observar era obrigação do Presidente da Província do Rio
Grande do Sul procurar persuadir seus concidadãos a ignorar complemente a luta
do outro lado da fronteira, para, segundo o Império, pouparem a si e ao seu país
perigos e dificuldades muito graves”
24
Este mandato imperial ao Presidente de Província do Rio Grande do Sul era
“insensato”, não havendo nenhuma condição de ser cumprido, todavia, o Rio de Ja-
neiro ou “ignorava” a situação da fronteira, onde grandes estancieiros mantinham
23
Relatório da Secretaria de Estrangeiros. 12 de novembro de 1863.
24
DOCCA, Souza. Causas da Guerra com o Paraguay. Porto Alegre: Livraria Americana,
1919.
35
boa parte de sua economia, ou subestimava a ação guerreira que esses brasileiros
do sul do País mantinham em suas raízes.
Este espírito guerreiro do sul- rio- grandense advinha de sua constante a-
ção de lutas em defesa de seu território, sendo a vida militar um aspecto da vida
comum, não sendo preciso inserir nenhuma forma de estrutura militar nessa região
do País, pois no Rio Grande do Sul o problema militar era constante, fazendo parte
da própria substância da existência deste povo guerreiro. Luccock em sua viagem
ao Rio Grande do Sul concluiu que:
Os assuntos militares eram dirigidos energicamente em São
Pedro. Na realidade a cidade é uma guarnição, sendo o go-
vernador seu comandante- em- chefe [...] Todo homem livre da
região se acha alistado numa força considerável em pouco
tempo, numa qualquer emergência.”
25
Enfim, a diplomacia estabelecida do Brasil em relação ao Estado Oriental
não foi correspondida, pois os brasileiros residentes no Uruguai, assim como suas
estâncias foram extremamente desrespeitadas pelo governo Blanco, no Uruguai.
O partido Blanco passou a o cumprir os contratos internacionais, negan-
do-se a renovar com o Brasil o Tratado de Comércio e Navegação, passando assim,
a instituir o imposto sobre as exportações de gado em pé para o Rio Grande do Sul.
Desta forma, a política uruguaia entrou em confronto direto com os interesses dos
estancieiros, os quais utilizavam escravos como peões, em suas propriedades, em
ambos os lados da fronteira. Estes peões eram os responsáveis pelo “transporte”
36
das reses criadas no Uruguai para as charqueadas no Brasil, que consumiam cerca
de 75% destas reses vindas do Estado Oriental.
26
A respeito desta quebra do contrato internacional entre o Uruguai e o Brasil,
o Diário do Rio de Janeiro, trouxe uma notícia, sobre a queima dos tratados, em
plena praça pública, pelo governo uruguaio.
A convite do governo reuniu-se na praça da Independência to-
da a tropa que se achava na capital, o presidente, todo o mi-
nistério, todos os funcionários públicos, e grande número de
cidadãos orientais e à meia-noite, com toda a solenidade pro-
cedeu-se a queima pública dos tratados deliberados com o
Império e que foram declarados insubsistentes, de 13 e 14 do
corrente mês.
27
Ao governo Imperial chegavam também diversas reclamações em relação
às violências e arbitrariedades sofridas por brasileiros, residentes no Uruguai ou em
linhas de fronteira com este Estado. Estas barbáries eram praticadas por particula-
res, autoridades civis e militares uruguaios, resultantes da agitação política e social.
Devido a estas instabilidades ocorreram diversas atrocidades como: assassinatos,
roubos de gado vacum e cavalar nas propriedades particulares dos rio- grandenses
e ainda, o recrutamento forçado de peões brasileiros para o serviço militar uruguaio.
Como nos mostra o Ministro dos Estrangeiros Sinimbu:
Continuam os assassinatos dos súditos brasileiros no Estado
Oriental, assaltos a propriedades brasileiras, violência contra
súditos do Império e passagem de partidas orientais para den-
25
LUCCOCK, John.
Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil
. São
Paulo, 1942, p.114.
26
BANDEIRA, op. cit., p. 166-167.
27
Notícias do Rio do Prata. Diário do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 28 dezembro, 1864
37
tro do nosso território, a fim de neles praticarem abusos inad-
missíveis contra pessoas e contra bens.
28
Tais supramencionados acontecimentos estavam agitando a sociedade bra-
sileira e fomentando as discussões parlamentares. Sendo assim, o Sr. Luís Alves
Leite de Oliveira Bello e Felippe B. de Oliveira Nery
,
indignados com a situação so-
frida pelos brasileiros nesta fronteira, expunham seus pensamentos em relação aos
crimes que ocorriam contra seus compatriotas e suas respectivas impunidades, que
eram corriqueiras. O Sr. Nery num de seus discursos, exigia justiça:
Abusos dessa ordem, meus Srs., a intervenção indébita des-
ses agentes, a perturbação que eles têm levado ao seio de
muitas famílias, a incerteza que fazem pairar sobre grande
número de interesses brasileiros, necessitam de uma repres-
são enérgica.
29
Foram realizados diversos pedidos em prol da realização de condutas enér-
gicas contra o Uruguai, pois a situação se agravava e tornava-se mais tensa naque-
la região. A opinião blica rio-grandense estava excitada e desejosa por uma ação
do governo, que não se manifestava e levava a situação da fronteira com o Estado
uruguaio em “Banho- Maria”.
A presença do farroupilha General Antônio de Souza Neto, na Corte mudou
esta situação aos olhos do Império. O General Neto foi ao Rio de Janeiro, com o
intuito de falar em nome de quarenta mil brasileiros, que estavam sendo persegui-
dos pelos uruguaios e pedir justiça às impunidades que estavam afetando a vida de
seus compatriotas, que viviam no Estado Oriental.
28
FRAGOSO, Tasso.
História da Guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai
, v.1. Rio
de Janeiro: Biblioteca do Exército,1956, p. 127.
38
Contudo, a presença de um ex- General farroupilha, no Rio de Janeiro, cau-
sou grande impacto, pois o governo central passou a temer, que os estancieiros rio-
grandenses afeiçoados aos Colorados, e sentindo-se desamparados pelo Império,
pudessem tomar a iniciativa de resolver a situação supramencionada através da
força, sem o consentimento do governo Central,
30
e deste modo, reavivar os senti-
mentos separatistas, que eram lembranças ainda muito presentes no cotidiano dos
rio- grandenses.
Tendo em vista, a delicada situação na fronteira sul do Brasil, Fernando Luiz
Osório afirmava que a fronteira do Rio Grande não era apenas fronteira da provín-
cia, mas também era fronteira do Império, sendo assim, a manutenção da tranqüili-
dade e da ordem na província, importava a ordem e a tranqüilidade da Nação.”
31
Conforme o pensamento do Fernando Luiz Osório acima exposto, o Gover-
no Imperial resolveu enviar à República do Uruguai, uma missão especial, em 6 de
maio de 1864, comandada pelo Conselheiro José Antônio Saraiva, que tinha por
objetivo resolver diplomaticamente todas as irregularidades pertinentes, que ofendi-
am e prejudicavam os brasileiros, “sem embargo da urgência das circunstâncias e
ainda do estado de excitação do espírito público brasileiro, o governo imperial prefe-
ria tentar um último apelo aos meios amigáveis, na confiança de que surtiria efeito
29
Luís Alves Leite de Oliveira Bello e Felipe B. de Oliveira Nery. Sessão de 09. 11. 1859. IN:
Anais da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul
30
DORATIOTO, op. cit., p. 51.
31
Fernando Luís OSÓRIO. Sessão de 24. 03.1876. IN: Anais da Assembléia Legislativa
da província do Rio Grande do Sul. Décima Sexta Legislatura, Sessão, 1876, p.16. A-
cervo do Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, códice AL4.004
39
em ambos os países
32
expedindo o seguinte conjunto de exigências a serem
cumpridas pelo Governo de Atanásio Aguirre representante do Partido Blanco:
O devido castigo, senão a todos, ao menos daqueles dos
criminosos reconhecidos que passeiam impunes, ocupando
alguns deles postos no Exército oriental, ou excedendo cargos
civis do Estado.
Ao imediato destituídos e responsabilizados os agentes de
polícia, que têm abusado da autoridade, de que se acham re-
vestidos.
A indenização contentemente a propriedade, que sob qual-
quer pretexto tenha sido extorquida aos brasileiros, pelas auto-
ridades militares ou civis da república.
Que fossem postos em plena liberdade todos os brasileiros,
que houveram sido constrangidos ao serviço das armas da
República.
33
Entretanto, após a apresentação das exigências do Império ao Uruguai e
seu não comprometimento imediato, Conselheiro Saraiva apresentou no dia 6 de
agosto de 1864, o Ultimatum, estipulando o prazo de seis dias, para o cumprimento
de todas exigências brasileiras. O referido Conselheiro esclareceu que o não cum-
primento das exigências preestabelecidas acarretariam na imposição da força militar
em território oriental, para se fazer cumprir todas as determinações exigidas pelo
Imperador.
Nesse mesmo período, Aguirre procurando aliados contra o Império, buscou
concretizar sua aliança com o Paraguai, pois via nesta suposta união uma maneira
de enfrentar tanto Buenos Aires e Rio de Janeiro, como seus adversários internos,
os colorados.
32
Aviso contendo as instruções da Missão Especial Confiada em 1864 ao Conselheiro Sa-
raiva. IN: Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, 1896, v. 59, Tomo I
33
DOCCA, Souza. Causas da Guerra com o Paraguay. Porto Alegre: Livraria Americana,
1919, p.30.
40
O Paraguai apoiou politicamente e militarmente o Uruguai, em prol do equi-
líbrio dos povos do Prata. O apoio do supracitado País ao Uruguai ocorreu rapida-
mente devido à aproximação anterior promovida pelo governo do Estado Oriental,
além da “eterna” desconfiança que o Paraguai nutria contra o Brasil e a Argentina
em relação à estabilidade e integridade de suas fronteiras.
As desconfianças do Paraguai provinham das pretensões de anexação que
a Argentina possuía sobre toda margem ocidental do rio Paraguai, até à fronteira
com a Bolívia, mais ainda, o acesso ao rio Paraná. Em relação ao Brasil existia além
das disputas fronteiriças envolvendo os limites com a Província brasileira do Mato
Grosso, a pressão do Império para que o rio Paraguai fosse aberto à livre navega-
ção, facilitando a comunicação com aquela província.
Portanto fica claro que, para o Paraguai, estabelecer uma aliança naquele
momento com os governos uruguaio e com os federalistas argentinos
34
de Urguiza
seria uma perspectiva promissora, por proporcionar a López força política, econômi-
ca e militar para defender sua Pátria dos supostos interesses do Brasil e da Argenti-
na
Nessas circunstâncias, Solano López mantinha suas forças reunidas para
fazer frente a qualquer movimento suspeito do Brasil e da Argentina que pudesse
afetar a política e principalmente as fronteiras do Paraguai.
35
34
Segundo Francisco Fernando. M. Doratioto
em sua obra intitulada: O Conflito com o Pa-
raguai, a grande guerra do Brasil. São Paulo: Ática,1996. Os federalistas argentinos se
opunham ao projeto político centralizador e expansionista pelo qual a burguesia daquela
cidade buscava se apropriar dos excedentes gerados pelas províncias do interior e criar um
mercado nacional.
35
FRAGOSO, op. cit., v. 1, p.184-185.
41
Sendo assim, podemos perceber que o governo paraguaio sempre esteve
preparado para uma suposta guerra contra o Brasil e a Argentina; desta forma, com
a declaração do apoio ao Estado Oriental, a República do Paraguai realizou um ul-
timatum ao Brasil, em 30 de agosto de 1864, contra a ocupação do território Uru-
guaio, pelas forças militares brasileiras.
O Brasil ao ser comunicado do referido ultimatum, desprezou e subestimou
a ofensiva diplomática e militar do Paraguai, pois no Brasil, os soldados paraguaios
eram vistos com desprezo, “ninguém os supunha capazes de selvagem intrepidez e
da inexcedível disciplina que ostentavam durante a guerra,”
36
por serem considera-
dos um povo bárbaro.
Desta forma, o Império brasileiro prosseguiu sua ofensiva militar ao Uruguai,
contando com o auxílio de tropas terrestres de Venâncio Flores
(do Partido Colora-
do), tendo como principal objetivo: ataques bélicos às cidades de Salto, Paissandu e
Cêrro Largo, onde estavam presentes as forças militares do governo Blanco que era
apoiado por Solano López.
Em 12 de outubro, uma Brigada brasileira, comandada por João Propício
Mena Barreto, penetrou na República Oriental, em direção à vila de Melo, afim de
garantir os interesses brasileiros e fazer represálias. Logo depois, Flores e Taman-
daré começaram o ataque a Salto, cuja posição à beira do rio facilitava a ação con-
junta e propiciava uma base de partida à conquista de Paissandu.
36
DORATIOTO,op. cit., p. 60.
42
No dia 30 de outubro, Flores marchou por terra para o ataque à Paissandu e
Tamandaré seguiu pela via fluvial. No dia 03 de dezembro começaram as opera-
ções conjuntas de Flores e Tamandaré contra Paissandu e somente após um mês a
cidade foi rendida. Sendo assim prosseguiu a mesma manobra conquistando novos
objetivos até a conquista última de Montividéu, capital do Estado Oriental, vide figu-
ra nº 3.
No Brasil, a invasão ao Uruguai foi muito discutida nos jornais, que traziam
notícias do campo de batalha diariamente, contendo as manobras militares. Neste
meio de comunicação, ainda apareciam conclames para que os homens participas-
sem da guerra, a fim de defenderem a Pátria brasileira.
O Hino aos Boêmios de Paysandú, escrito por Augusto Emílio Zaluar é um
exemplo desta convocação da sociedade brasileira:
... Mocidade, eia, avante, partamos,
Hoje a festa é no campo de Marte,
Tremão fracos. “ Morrer pela Pátria”
É divisa de nosso estandarte.
Brasileiros não quebram seus brios
Peito a peito combate os inimigos,
Quando o sangue ferve nas veias,
Não recua diante do perigo. (...)
Gloria aos bravos que as hostes selvagens,
Derão mostras de nosso valor!
O Brasil comovido os abraça,
De seus filhos são eles a flor.
Paysandú as falanges heróicas
Abatido, afinal se curvou,
E na torre eminente da praça
Auri-verde pendão tremulou.
37
43
A luta foi intensa e acabou desenrolando-se nas ruas da vila. Leandro Go-
mez, comandante das forças do Estado Oriental pretendia defender-se até que a
povoação caísse em ruínas, ou morressem todos. Desta forma, a luta continuou até
que por fim os atacantes aprisionaram o General Leandro Gomez, finalizando com a
invasão ao Uruguai.
38
Figura 3-
Mapa da Campanha do Estado Oriental
.
Fonte: Capítulos de História do Brasil, os antecedentes da Guerra do Paraguai.
37
Hino aos Boêmios de Paysandú. Bazar Volante, Rio de Janeiro. 06 de Janeiro de 1865.
38
FRAGOSO, op. cit., v.1, p.169-174.
44
A tomada de Paissandu foi praticamente o fim da intervenção militar ao Uru-
guai. A cidade de Paissandu foi arrasada pelo bombardeio fluvial, realizado por Ta-
mandaré, pela infantaria brasileira e pela força de infantaria de Venâncio Flores.
Figura 4
- Paissandu após o bombardeio. Ruínas do Forte
Fonte:. Soldados de La Memória, imagens y hombres de la Guerra del Paraguay.
45
Figura 5- Inspeção realizada após o ataque à Paisandú, pelo chefe das for-
ças de defesa, Leandro Gomez ( à esquerda)
Fonte: Soldados de La Memória, imagens y hombres de la Guerra del Paraguay
Após o ataque ao Uruguai, López, presidente do Paraguai, viu em suas
mãos a possibilidade em declarar guerra ao Brasil, já que considerava o conflito ine-
vitável, uma vez que acreditava, que depois de seu apoio político ao Uruguai, o Im-
pério voltaria as armas contra sua República.
46
Em 11 de novembro de 1864, o Governo de Assunção capturou o navio
mercante Marquês de Olinda,
39
que levava a bordo o novo Presidente da Província
de Mato Grosso, Coronel Carneiro de Campos, diversos passageiros e recursos
materiais. Sobre este “ato traiçoeiro” cometido pelo Paraguai ao Brasil, o Jornal do
Comércio trouxe a seguinte notícia:
Navegação imperial do Brasil, Assunção, 13 de novembro de
1864: Neste instante, 9 horas da manhã, fui informado de que
paquete brasileiro Marques de Olinda, saído deste porto para
Mato Grosso ante ontem às 2 horas da tarde, levando a seu
bordo o Sr. Presidente para aquela província, se acha desde
esta madrugada ancorado no porto da Assunção e debaixo
das baterias do vapor de guerra paraguaio.
40
Este aprisionamento foi considerado pelos brasileiros como um ato de “pira-
taria”. Isto posto, o Império pediu explicações ao Paraguai pela sua ação inaceitável.
Em resposta, o governo paraguaio enviou uma nota afirmando que estava proibida a
navegação de navios brasileiros no rio Paraguai.
41
A referida nota enviada por Ló-
pez ao Brasil declarava que:
Em conseqüência de uma provocação tão direta, devo declarar
à V. Exa. Que ficam rôtas as relações entre este governo e o
de S. M. o Imperador, impedida a navegação das águas da
República para a bandeira de guerra e mercante do Império do
Brasil, sob qualquer pretexto ou denominação que seja, e
permitida a navegação do rio Paraguai para o comércio de to-
da província de Mato Grosso, às bandeira mercante de todas
as nações amigas, com as reservas autorizadas.
42
39
Segundo Virgílio Corrêa Filho este navio brasileiro pertencia à Companhia de navegação
por Vapor do Alto Paraguai, esta companhia era subsidiada pelo Império para manter linha
regular ligando Montevidéu a Cuiabá.
40
Navegação Imperial do Brasil. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 20 dezembro, 1864.
41
DORATIOTO, op. cit., p. 67.
42
FRAGOSO, op. cit., v.1, p. 251.
47
Após esta declaração acima exposta, Solano López, passou a considerar
que havia iniciado o estado de guerra contra o Império brasileiro, então decidiu
invadir no dia 23 de dezembro de 1864, a Província de Mato Grosso e posteriormen-
te, invadiria a Província do Rio Grande do Sul.
1.3. Invasão da Província do Mato Grosso
Após o rompimento oficial com o Brasil, Solano López iniciou as operações
para o ataque à Província do Mato-Grosso. López pretendia realizar um ataque rá-
pido e vencedor, pois conhecia a impotencialidade do governo imperial, em socorrer
rapidamente a distante Província, e ainda conhecia o despreparo militar do Exército
brasileiro.
Este conhecimento, adquirido pelo ditador paraguaio sobre a Província im-
perial é atribuído a seu informante Isidoro Resquín, que foi enviado para a referida
região, “disfarçado de fazendeiro com o objetivo de examinar a situação da provín-
cia, sua salubridade e sua riqueza.”
43
A Província de Mato Grosso, em meados de 1864 contava aproximadamen-
te 75 mil habitantes os quais encontravam-se desprotegidos, devido à fragilidade
militar presente naquela região. O Exército possuía o efetivo de 875 homens capa-
zes de defender Mato Grosso, quando seu número deveria ser de 3879 soldados.
43
SPALDING, Walter. A invasão Paraguaia no Brasil. Porto Alegre: Editora Nacional,
1940, p.XX.
48
Conforme o mapa de forças da Província do Mato Grosso, segundo a tabela nº
2, feito pelo Barão do Rio Branco, podemos vizualizar a incapacidade militar daque-
la região.
Tabela nº 2-
Tabela de forças da província do Mato Grosso
Fonte: A invasão paraguaia no Brasil
Enquanto a Força Militar brasileira estava desprovida de efetivo, o Exército
paraguaio contava com o adestramento de 30.000 homens de 16 a 50 anos em Cer-
ro Léon, 17.000 recrutas em Encarnación, 10.000 em Humaitá, 4.000 homens em
49
Assunção e 3.000 em Concepción, tendo o total de quase 70.000 soldados prontos
para a guerra.
44
Sendo assim, no dia 24 de dezembro zarpou do porto de Assunção uma ex-
pedição fluvial de cinco embarcações, formadas por quatro batalhões de infantaria,
com 3.200 homens e 12 peças raiadas, comandados pelo Coronel Vicente Barrios.
Esta expedição comandada pelo Coronel Barrios tinha o objetivo de conquis-
tar e manter o Forte Coimbra, vide figura 6, que era a maior defesa, de que, dis-
punha Mato Grosso, em caso de ataque, pois este forte foi construído na época co-
lonial e era estrategicamente localizado às margens do rio Paraguai. Vale salientar
que o Forte Coimbra, maior barreira para o Exército paraguaio, suportou apenas dois
dias as bocas de fogo do Exército inimigo, cedendo logo depois, causando a rápida
despovoação de Corumbá com uma trágica retirada.
A segunda expedição terrestre, partiu de Concepción dias depois, sob o
comando do Coronel Isidoro Resquín, dispondo de 3500 homens, na maioria cava-
leiros. Esta Força Terrestre dividiu-se em duas colunas. A coluna Resquin e a colu-
na Urbieta com o objetivo de atacar Mato Grosso, desta forma a coluna comandada
Resquín foi pelo Forte paraguaio de Bella Vista à margem esquerda do Apa e
penetrou no Distrito de Miranda, enquanto a outra coluna comandada por Urbieta,
adentrou na colônia militar de Dourados , conforme a figura nº 7.
44
FRAGOSO, op. cit., v.1, p. 256.
50
Figura nº6- Vista do Forte Coimbra.
Fonte: Jornal Bazar Volante
A guarnição da colônia de Miranda, compunha-se apenas de 200 praças do
Corpo de Cavalaria da Província e do Batalhão de Caçadores, com pouco mais de
quarenta praças. Rapidamente o pequeno Distrito ficou sob posse dos invasores,
que desta mesma forma avassaladora, passaram a invadir e conquistar outras loca-
lidades, fazendo diferentes vítimas
45
.
A invasão ao Mato Grosso, segundo a figura 7, não era completamente
desconhecida de todas as autoridades, pois o Presidente da Província de Mato
Grosso havia enviado ofícios ao governo Imperial, chamando atenção para esta de-
samparada região. Em 28 de dezembro, no jornal do Comércio, um senador explici-
45
Relatório do Vice- presidente da Província do Mato Grosso. Cuiabá, 17 de outubro de
1865. Typografia De Souza Neves, 1865, p.8.
51
ta sua indignação com o governo imperial, devido a displicência com a fronteira Ma-
to-grossense, cometida pelas as autoridades do Brasil:
O ato de pirataria que acaba de praticar o ditador do Paraguai
serve para demonstrar que não eram infundadas as apreen-
sões dos representantes e administradores desta província,
quando chamaram para ela a atenção do governo. Ainda neste
ano lembrei ao governo a necessidade de olhar mais atenta-
mente para esta fronteira do Império.
46
Figura nº 7- Mapa da invasão ao Mato Grosso
Fonte: Maldita Guerra. Nova História da Guerra do Paraguai
46
Mato Grosso. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 28 dezembro de 1864.
52
Diante dessas vitórias, os invasores partiram de tal maneira que chegaram
a Cuiabá uns por água, outros por terra”
47
com a missão de tomar a cidade, o que
praticamente separaria o Mato Grosso do Império, mas estes planos paraguaios não
se concretizaram, “quer por não se sentirem seguros para avançar, quer por mu-
danças de planos de Solano López.”
48
A invasão do Mato Grosso foi desastrosa para os brasileiros que perderam
em grande quantidade seus compatriotas e boa parte de seu território ao norte, de-
vido às vitórias bélicas cometidas pelo Exército da República Paraguaia.
Esta guerra ao norte do Paraguai perdurou até 1868, contando com inúme-
ros combates e o célebre episódio histórico: A Retirada da Laguna.
49
, que foi retra-
tada por J. Wsath Rodrigues, conforme a figura nº 8.
47
SPALDING, Walter.
A invasão Paraguaia no Brasil
. Porto Alegre: Editora Nacional,
1940, p.XXIII
48
DORATIOTO, op. cit., p. 92.
49
A Retirada da Laguna foi um episódio que ocorreu na Guerra do Paraguai em 1867, em
que foi organizada uma Força militar de 3 mil homens para partirem em defesa da Província
do Mato Grosso. O coronel Carlos de Morais Camisão assumiu o comando desta coluna
brasileira, enviada ao sul de Mato-Grosso para repelir o inimigo, sendo assim, a coluna
chegou a penetrar o Paraguai, mas teve que se retirar devido a falta de víveres, munição e
cavalos, ocasionando a morte de grande parte do efetivo.(TAUNAY, A d´Escragnolle. A Reti-
rada da Laguna: tradução Sérgio Medeiros. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.)
53
Figura nº 8- a Retirada de Laguna.
Fonte: História do Brasil. 5º V
1.4. Invasão da Província do Rio Grande do Sul
Em 1865 a Província do Rio Grande do Sul encontrava-se desguarnecida e
portanto, sua fronteira estava fragilizada. Esta situação fronteiriça facilitou a entrada
do Exército inimigo em território gaúcho.
54
O suposto ataque paraguaio não era um fato desconhecido da população
rio-grandense, pois no final do mês de maio apareceu em São Borja, um desertor do
acampamento paraguaio de São Tomé. Este desertor, na verdade, era do Exército
brasileiro, que fora capturado pelos inimigos após o ataque a Vila de São Tomé, na
Província de Mato Grosso.
O respectivo fugitivo foi encontrado por brasileiros e posteriormente, interro-
gado pelo Cônego Gay. Neste encontro com o nego, o desertor declarou que os
paraguaios estavam esperando suas carretas com canoas e mais de 10.000 ho-
mens de tropa para efetuarem a passagem no Passo de São Borja e depois invadi-
rem Itaqui e Uruguaiana. Este fugitivo ainda relatou sobre a presença de três mora-
dores de São Borja que eram espiões do Exército inimigo.
Essas mesmas informações acima expostas, haviam sido delatadas para
o Tenente Coronel José Ferreira Guimarães, desta forma, encontravam-se todos
moradores da fronteira, supostamente avisados das intenções do Exército de López,
sendo assim, a população de o Borja participou às autoridades superiores, aos
generais, ao Presidente da Província, os preparativos que se faziam no Paraguai
para invadir o território gaúcho.”
50
As providências que o governo Imperial tomou foram de mandar reunir com
rapidez a Guarda Nacional da Comarca de Missões e organizar um corpo de Volun-
tários da Pátria no Rio de Janeiro, que iriam fazer parte da Divisão (duas Brigadas)
comandada por Davi Canabarro na fronteira de São Borja e Quaraí. Esta força de-
50
GAY, João Pedro. Invasão Paraguaia na fronteira brasileira do Uruguai. Porto Alegre,
Instituto Estadual do Livro, Caxias do Sul, Universidade de Caxias do Sul, 1980, p.111.
55
fensora da referida fronteira encontrava-se desarmada, desde a determinação do
Presidente, em 1864 em dividir a fronteira da Província em dois setores, a oeste e
ao sul, confiadas respectivamente a Davi Canabarro e ao Barão de Jacuí.
Devido a esta precariedade das forças comandadas por Davi Canabarro,
este fez o pedido, em 20 de janeiro de 1865, de armamento e munição, que não
chegaram. Em fevereiro o presidente da província enviou o seguinte ofício a Cana-
barro:
Comunico a V. Exª. Que o Arsenal de Guerra de Porto Alegre
apenas dezesseis espadas. No depósito de Rio Grande,
nenhuma. Pistolas de fuzil e clavinas da Guarda Nacional, não
há nenhuma.
51
Nessas condições, as forças de Canabarro receberam a presença indeseja-
da dos paraguaios em 10 de junho de 1865, quando “viu-se do Passo de São Borja
e da Vila descerem de S. Tomé para o rio Uruguai grande número de carretas e
uma fileira de tropas paraguaias”
52
que venceram os Guarda Nacionais na fronteira
do rio Uruguai, dirigindo-se rapidamente para São Borja.
Na referida Vila invadida, o Exército Paraguaio encontrou uma tropa mal
armada de apenas 370 homens, os quais retraíram e foram acolhidos pelo Bata-
lhão de Voluntários da Pátria, que embora assustados e desorganizados em seu
batismo de fogo seguraram a tropa invasora até que os habitantes de São Borja se
retirassem. Conforme Tasso Fragoso a Força Militar brasileira, não tinha condições
de defender São Borja, pois:
51
idem, p.201.
52
idem, p. 61.
56
Eram poucas, mal divididas e mal colocadas. O inimigo vinha
em massa, com cerca de 10.000 homens, e agredia-nos num
ponto em que lhe poderíamos fazer rosto com efetivos re-
duzidos, e ainda assim depois que ele houvesse transposto o
grande rio que nos separava.
53
Desta forma, a população estava apavorada com a presença de paraguaios
em sua redondeza, todos estremeciam de susto. “Só se ouviam gritos e lamenta-
ções pelas ruas que estavam apinhadas de gente. Homens, senhoras, mulheres e
crianças, a maior parte descalços, com lágrimas nos olhos, com cabelos desgre-
nhados, procuravam fugir.”
54
Os paraguaios invadiram e conquistaram a Vila de São Borja, na qual após
o ataque ficaram presentes apenas estrangeiros
55
. Desta forma os invasores após a
realização da pilhagem de propriedades urbanas e rurais seguiram rumo a Itaqui,.
Continuando sua marcha avassaladora, partiu ao ataque à Uruguaiana.
Davi Canabarro, chefe da divisão defensora da fronteira, mandou construir
uma fortificação ao redor de Uruguaiana e afirmou à população desta vila que o E-
xército Paraguaio não penetraria em suas redondezas, portanto, as casas de comér-
cio e a alfândega continuaram abarrotadas de mercadorias e os particulares não se
movimentaram para a retirada de seus pertences.
53
FRAGOSO, Tasso. História da Guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai, v.2. Rio
de Janeiro: BIBLIEX, 1956, p. 114.
54
GAY, op. cit., p.52.
55
Conforme o Cônego Gay existia uma lei que em ataques e conquistas de territórios os
estrangeiros residentes no local conquistado devia ser poupado, devido a acordos de políti-
cas externas.
57
No dia 4 de agosto, o comandante Canabarro ao verificar a fortificação e
perceber que esta não estava adequada mandou inutilizá-la. No dia 25 do mesmo
mês, quando as forças inimigas atravessaram o rio Ibicuí, conforme a figura 9, a
1ª Divisão pertencente a Canabarro deveria ter atacado os paraguaios para os deter,
mas o comandante não o fez, exigindo ordem por escrito do General- em -Chefe pa-
ra o ataque argumentando que este ataque seria uma imprudência. Apesar das for-
ças na região alcançarem sete mil homens e contarem com a vantagem da posição
defensiva.
56
Assim sendo, as forças inimigas não puderam ser vencidas e tiveram êxito
em sua empreitada contra as tropas brasileiras no sul do Brasil, invadindo, conquis-
tando e pilhando seus alvos.
56
DORATIOTO, op.cit., p. 175.
58
Figura nº 9. Mapa da invasão ao Rio Grande do Sul
Fonte
:
Maldita guerra, Nova História da Guerra do Paraguai.
59
De acordo com a contextualização apresentada neste capítulo, podemos com-
preender as causas políticas, econômicas e sociais que influenciaram o início da
Guerra da Tríplice Aliança. Assim sendo, podemos ressaltar as relações fronteiriças
estabelecidas entre a Província do Rio Grande do Sul e a República Oriental do U-
ruguai, na qual havia suprema integração das duas sociedades, ao ponto das deci-
sões políticas do Uruguai interferirem automaticamente na economia do Rio Grande
do Sul, onde muitos estancieiros sulistas possuíam estabelecimentos comerciais,
interesses políticos e sociais.
Devido a essa inter-relação existente na fronteira sul do Brasil, muitos proble-
mas diplomáticos foram estabelecidos ao longo do século XIX, sendo resolvidos por
intermédio da diplomacia ou pela ação militar, como foi o caso da invasão ao Uru-
guai, em que o Império procurou pressionar o governo Blanco do Estado Oriental a
respeitar os interesses brasileiros referente à economia e à população do Rio Gran-
de do Sul.
Contudo, a invasão ao Uruguai pelo governo brasileiro, proporcionou ao
Para-
guai a possibilidade em declarar guerra ao Império, já que este não respeitou o Ul-
timatum proclamado por López em apoio ao País Oriental. Sendo assim, a Guerra
do Paraguai iniciou-se ao ser aprisionado o Vapor brasileiro Marquês de Olinda, em
águas inimigas, prosseguindo com o ataque paraguaio à Província do Mato Grosso
e posteriormente à Província do Rio Grande do Sul.
60
Fonte: Semana Ilustrada
61
2 A CONVOCAÇÃO MILITAR
Não existe uma consciência estatal. Existe uma consciência
patriótica, uma consciência nacional que é feita em parte de
história, em parte de Idea.
Lucien Febvre
Em 1864 ao iniciar a Guerra do Paraguai, o Exército brasileiro não possuía
efetivo pronto para lutar no referido conflito, então o Império passou a ter a necessi-
dade de organizar uma Força profissional para defender sua pátria. Neste sentido o
governo passou a convocar a população para participar da guerra.
Para realizar esta convocação era necessário obter legitimação e apoio do
povo brasileiro em participar deste embate junto às Tropas de Linha do Exército, já
que esta Força era desqualificada pela sociedade. Tal imagem do Exército provinha
da presença de soldados desqualificados, bandidos ou vagabundos, que engrossa-
vam as fileiras dos quartéis.
62
Podemos certificar, que estava presente no imaginário dos brasileiros do sé-
culo XIX a visão de um Exército desqualificado, estando este, à margem da socieda-
de. Nesse sentido é que houve um grande empenho do governo em modificar a i-
magem desta Força terrestre e incentivar a participação voluntária dos cidadãos na
guerra.
2.1 O Império na Mobilização Voluntária
Para conseguir o voluntariado da população, o Império procurou despertar o
patriotismo de seu povo, para isto, “deu as mãos” à imprensa, para juntos construí-
rem um sentimento de amor à pátria no imaginário social. Construção esta perpas-
sou através de poemas, caricaturas, fotografias, hinos e pela personificação do sen-
timento patriótico, através da figura de Jovita Alves Feitosa e do próprio imperador
que assumiu o lugar de primeiro Voluntário da Pátria, conforme aprofundaremos no
desenvolvimento deste capítulo.
Portanto, o Império imbuído de tal missão de convocar o povo à guerra,
também fez uso de Decretos - Lei que beneficiavam aqueles que participassem vo-
luntariamente da Guerra da Tríplice Aliança, como a Lei dos Voluntários da Pátria.
Então houve toda uma movimentação do governo em estimular o sentimento patrió-
tico.
Esta conclamação partiu de início dos jornais que apresentavam à popula-
ção as barbaridades cometidas pelo Exército inimigo aos soldados brasileiros, con-
63
forme a caricatura 10, que apresentou os soldados que foram lutar a favor de
seus compatriotas mato- grossenses, retirando-se do campo de batalha em estado
cadavérico”, instigando assim o ódio aos paraguaios, responsáveis pela morte de
muitos brasileiros.
Figura nº 10- Expedição ao Mato Grosso
Fonte: Jornal Cabrião
A figura de Solano López também foi atacada pela imprensa brasileira, ao
apresentá-lo enquanto um Tirano, Ditador, louco, “famulento abutre” e Nero do sécu-
lo XIX, conforme a figura nº 11, em que apresenta a caricatura grotesca de Solano
64
López enquanto o “Nero do século XIX”, responsável por muitas mortes para conse-
guir realizar sua sandice, conquistar o Prata.
Figura 11
- O Nero do século XIX
Fonte: A Vida Fluminense
Utilizando essa faceta da personalidade ditatorial de López, a imprensa con-
clamou muitos brasileiros, conforme o seguinte artigo do jornal Semana Ilustrada:
65
Ao patriotismo e dedicação dos brasileiros.
Cidadãos!
Sanhudo barbarismo açula-se contra nós das plagas ao sul
do Império! [...]
Tresloucado ambicioso, que sonhaste a irrisória dominação do
Prata, cavaste teu próprio abismo; faze a oração dos morim-
bundos que teus dias são breves.
Brasileiros! Ao Paraguai!... Corramos sobre este povo que teve
a audácia de insultrar-nos.
57
A imagem de Solano López foi manipulada de uma maneira extremamente
“consistente” no imaginário social, ao ponto da historiografia brasileira tradicional
considerar o fato da tirania deste dirigente paraguaio ser a causa primordial do acon-
tecimento da Guerra da Tríplice Aliança, como apresentamos no capítulo anterior.
O apoio da imprensa à Corte em construir o sentimento patriótico na popula-
ção do Brasil, conclamando-a a participar das fileiras do Exército, a fim de defender
a Pátria, se modificou com o desenvolvimento da guerra pois, após um ano do confli-
to, os jornais que antes noticiavam as atrocidades cometidas pelo Exército paraguaio
ao Brasil, passaram a criticar o governo.
Então a imprensa mudou seu foco, influenciando a opinião pública que já es-
tava descontente com a longa duração da luta, assim, os meios de comunicação
passaram a apresentar uma forte crítica à incapacidade do Exército em terminar a
guerra, dos erros dos chefes militares e ao recrutamento forçado, influenciando o
povo a não participar mais dessa conflagração, que trazia a morte, falência e a de-
sestruturação da família brasileira.
57
Semana Ilustrada, 25 de dezembro de 1864. p. 3.
66
Portanto, podemos inferir que a utilização destes mecanismos patrióticos uti-
lizados pelo governo, foram importantes para estimular de início, o sentimento patrió-
tico dos cidadãos brasileiros.
2.2 A (re) organização do Exército Brasileiro
Neste capítulo, ainda, analisaremos como foi organizado o Exército Brasilei-
ro para lutar na Guerra do Paraguai, observando as dificuldades da formação de um
contingente profissional, que se encontrava desprovido de efetivo humano, arma-
mento, víveres e fardamento, estando completamente desestruturado e incapacitado
de enfrentar o Exército paraguaio.
Nesta perspectiva, abordaremos criticamente de que forma foi realizada a
convocação militar junto à sociedade brasileira, enfatizando os mecanismos utiliza-
dos pelo Império para legitimar a participação da população neste conflito interna-
cional.
Dessa forma, deflagrada a Guerra do Paraguai em 1864 contra o Brasil, com
o aprisionamento do navio brasileiro Marquês de Olinda e posteriormente a invasão
pelo numeroso Exército paraguaio nas Províncias do Mato Grosso, em 1864 e do
Rio Grande do Sul em 1865, apresentadas no capítulo anterior. O Império percebeu
a necessidade de organizar um Exército forte capaz de defender a pátria brasileira,
que estava sendo ameaçada.
67
Portanto para organizar uma Força Terrestre, surgiu, quando as Forças bra-
sileiras depararam-se com o Exército formado pelo Paraguai, que possuía um efetivo
aproximadamente de 80.000 mil homens distribuídos entre a armas de infantaria,
cavalaria e artilharia, que no teatro de operações
58
assumia suas respectivas fun-
ções, atacando o inimigo através de manobras estratégicas.
59
A Guarda Nacional que após a Independência passou assumir a defesa do
território brasileiro, com o maior número de efetivo e incentivo econômico, em detri-
mento do Exército profissional, o se mostrou capaz de enfrentar as Forças para-
guaias, devido a essas manobras estratégicas, em que os comandantes militares do
Paraguai utilizavam a combinação das Armas, para eliminar as tropas aliadas, esta-
belecendo assim, uma”nova” forma de guerrear, diferente das “guerras de guerri-
lhas” ou guerras irregulares, travadas no Prata.
De acordo com Luigi Bonanate, as guerras regulares são diferentes das
chamadas guerras de guerrilhas nos seguintes aspectos:
As guerras regulares são travadas segundo regras comuns e
compartilhadas, recorrendo predominantemente a aparatos mi-
litares especializados .
58
Segundo a
Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais do Exército Brasileiro
, o Teatro de
Operações é o espaço geográfico- terrestre ou marítimo- necessário à condução de opera-
ções militares de vulto. Normalmente, o teatro de operações predominantemente terrestre
possui, no sentido da profundidade, duas zonas- a de combate e a de administração.
59
Segundo o Major Amerino Raposo Filho no livro, A Manobra na Guerra. A manobra é
considerada estratégica, quando tem em vista determinado objetivo estratégico, quer dizer,
envolve a posse de uma área operacional que interessa às Forças Armadas adversárias,
implicando na conjunção de esforços, no espaço e no tempo, culminando com a convergên-
cia das ações sobre uma área do território em poder do inimigo, utilizando a combinação
das armas no escalão do Exército.
68
As guerras irregulares ou guerras de guerrilhas englobam todos
os casos em que os instrumentos usados se apresentam como
anormais, como é o caso de guerra de corso ou de grupos.
60
Essas incursões militares no Prata, que eram realizadas pela Guarda Nacio-
nal, juntamente com pouco efetivo do Exército e a ajuda financeira dos estancieiros
resolviam os problemas de fronteira do Brasil, mas revelaram-se incapazes de “solu-
cionar” o conflito com o Paraguai. Esta incapacidade da Guarda Nacional ocorreu-
porque a Guerra da Tríplice Aliança envolveu Estados nacionais centralizados e o
forças regionais, necessitando colocar no centro dos acontecimentos um aparato
militar do Império que até então desempenhava funções secundárias: o Exército re-
gular.
61
O combate do Brasil com o Exército regular do Paraguai, trouxe o emprego
de inovações tecnológicas para a Força Militar profissional do Brasil, com a mudança
de estratégias e táticas
62
de combate, que deviam adaptar-se a guerra de trincheiras
que se estabelecia no campo de batalha. Conforme a figura nº12.
O estudo cartográfico obteve avanços, devido às batalhas travadas em um
campo diferente e inóspito, fora do território brasileiro, o qual necessitava do estudo
para possibilitar o reconhecimento do terreno a fim do desenvolvimento “seguro” de
táticas, anteriormente planejadas pelos comandantes militares brasileiros
60
BONANATE, Luigi. A Guerra. São Paulo: Estação Liberdade, 2001, p. 24.
61
SALLES, Ricardo. Guerra do Paraguai: escravidão e cidadania na formação do Exér-
cito. Rio de Janneiro: PAZ E TERRA, 1990, p.59.
62
Conforme André Corvisier no livro A Guerra, p. 116. A estratégia é a parte da guerra rela-
tiva aos movimentos gerais que se executam fora da visão do inimigo, antes da batalha. A
tática consiste em executar da melhor forma possível, a missão que lhe foi confiada, isto é,
exclusivamente com os meios a sua disposição. Daí a fórmula muito utilizada no Exército
francês: Missão, meios, decisão.
69
Figura nº 12
- Infantaria nas trincheiras em Tuiuti
Fonte: Álbum de retratos e vistas. Fundação Biblioteca Nacional
A utilização de canhões, fuzis raiados, armas de carregar pela culatra, armas
de repetição, revólveres, diferentes tipos de munições e torpedos, foram algumas
das novas tecnologias empregadas com êxito pelo Exército Brasileiro, nesta referida
guerra, devido à necessidade ocasionada pela duração do conflito e a guerra regular
que se instalara no Prata. Assim sendo, o General Paulo Queiroz Duarte apresentou
algumas armas utilizadas no conflito do Paraguai contra o Brasil, conforme a figura
nº 13.
70
Figura nº 13- Armamento utilizado na Guerra do Paraguai pelo Brasil
Fonte. Os Voluntários da Pátria na Guerra do Paraguai, Vol 1
Sobre o estudo topográfico, Napoleão Bonaparte em seus discursos sobre a
guerra explicita a necessidade do reconhecimento do terreno, para desenvolver com
êxito, a guerra.
71
É muito importante ter bons mapas de todo o território [...]. É
necessário que todos os reconhecimentos sejam feitos no De-
partamento Topográfico da Guerra, a fim de que possamos, se
for preciso, enviar aos generais todas as instruções adequa-
das. Então, desde o começo da guerra, eles ficariam sabendo
dos trabalhos de campo da campanha defensiva que deverão
ser preparados nas várias posições, no caso de acontecimen-
tos inauspiciosos.
63
O balão tripulado utilizado na observação das posições inimigas, segundo a
figura 14, foi outro “equipamento” empregado na Guerra da Tríplice Aliança. O
balão foi um instrumento muito utilizado devido o estacionamento dos Exércitos, em
frentes distantes, separados muitas vezes por trincheiras e a permanência prolonga-
da dos acampamentos em pontos estratégicos, que chegavam a perdurar meses no
mesmo terreno.
O desenvolvimento tecnológico obtido pelo Brasil com o desenrolar da guer-
ra, não supriu as necessidades básicas de efetivo apresentadas no início da luta.
Portanto o governo brasileiro teve que convocar um grande número de homens ca-
pazes de lutar na referida guerra contra o Paraguai, que o Exército não dispunha
de força humana, capaz de participar de um grande conflito, pois, em 1864, seu con-
tingente era reduzido, contendo apenas 18.000 homens, disseminados em todo Pa-
ís
64
.
63
LUVAAS, Jay. Napoleão na arte da guerra. Rio de Janeiro: Record, 2001, p.28.
64
FRAGOSO, op. cit., v.1, p. 158.
72
Figura nº- 14
- Balão de observação
Fonte: Maldita Guerra. Nova História da Guerra do Paraguai
Dezoito mil homens era um número pequeno de força humana, mas sua
disseminação em todo País piorava a situação, pois “as dificuldades em fazer con-
vergir para um ponto batalhões espalhados pelas províncias, e nestas mesmas
subdivididas em longínquos destacamentos pelo interior”
65
não possibilitou a união
deste efetivo de dezoito mil homens para marcharem em direção ao teatro de guer-
ra.
A incapacidade da Força Terrestre brasileira surgiu por causa do descaso do
Império com o Exército, que iniciou após a Independência do Brasil em 1822, quan-
73
do o Exército passou a ser considerado pelas autoridades imperiais como uma ame-
aça à estabilidade política do novo sistema de governo.
O Exército profissional era considerado perigoso, pelo motivo da presença
de portugueses junto ao oficialato e ainda, a indisciplina dos soldados, que participa-
vam de motins, arruaças e tumultos no período regencial. Tais aspectos presentes
no Exército causavam desconfianças na sociedade política, que temia a restauração
do Antigo Regime.
Portanto, o ambiente de tensão em relação a possíveis atitudes restaurado-
ras do Exército, à oposição aos portugueses e às dificuldades financeiras do gover-
no imperial em manter uma Força profissional, possibilitou a criação da Guarda Na-
cional em 1831, que era “quase totalmente auto financiada e constituía-se num bara-
tíssimo mecanismo de controle da população e no final dava até lucro através da
venda das patentes de oficiais.”
66
Desta forma, podemos inferir que a Força Militar
profissional não possuía importância para o Império, antes de 1864, ocupando lugar
absolutamente destituído de significado na sociedade.
67
Outrossim, o governo não investia no Exército, deixando de arcar com o for-
necimento básico para seu funcionamento, faltava-lhes homens, armamentos, víve-
res, ou seja, todas as condições necessárias formação e manutenção de uma força
militar nacional, capaz de defender a pátria brasileira. Neste sentido, podemos com-
65
BRASIL. Ministério da Guerra. Relatório do ano de 1864. Rio de Janeiro, 1865, p. 2.
66
CARVALHO, José Murilo de. Teatro de Sombras: a política Imperial. São Paulo: Editora
revista dos Tribunais; Rio de Janeiro: Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro,
1988, p. 39.
67
SODRÉ, Nelson Werneck. História Militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasilei-
ra, 1956, p.137.
74
preender a insuficiência das tropas brasileiras através da seguinte depoimento de
Dionísio Cerqueira:
O nosso pequeno e mau aparelhado Exército deixava muito,
senão tudo, a desejar, desde a instrução técnica e o preparo
indispensável para a guerra até o comissariado de víveres e
forragens, o serviço sanitário, o aprovisionamento de armas,
fardamento, equipamento, meios de transporte, etc.
68
Através dos relatórios do presidente de Província dos anos de 1865 e 1866,
também podemos verificar o descaso do governo para com a Força Terrestre Militar,
pois foi negado a esta Força o aumento do orçamento à guerra, mesmo depois da
batalha deflagrada, como nos mostra o seguinte relatório:
Não tendo o poder legislativo votado a lei do orçamento para o
exercício de 1864 e 1865, mandou o decreto 1177 de 9 de
setembro de 1862. As quantias votadas nessa lei para circuns-
tâncias ordinárias eram insuficientes para os serviços deste
exército nas mesmas circunstâncias, quanto mais depois das
sérias complicações no Rio da Prata, o governo apelando para
o patriotismo da população excedeu 24.000 praças [...] isto
trouxe o aumento de despesas nos arsenais.
69
Todavia esta lei orçamentária, o satisfazia as mínimas necessidades do
Exército, que estava se formando para a guerra, pois a referida lei autorizava o uso
de verbas equivalente ao ano de 1862, o qual contava apenas com 14.000 praças,
enquanto que em 1865, este número havia crescido em 10.000 praças. Portanto, os
novos soldados não receberiam seu soldo mensal.
68
CERQUEIRA, Dionísio. Reminiscência da Campanha do Paraguai. Rio de Janeiro:
BIBLIEX, 1980, p. 63.
75
O fardamento também não era suficiente, enquanto o Exército contava
24.000 homens, foram adquiridas pela força em 1865, apenas 4.000 fardas. Sendo
assim, podemos perceber que o “Arsenal de Guerra estava desprovido de arma-
mento, de cavalhada, de fardamento, com exceção de lanças, havia 2.000”
70
A figura 15, demonstra a falta de recursos que o Exército possuía; anali-
sando-a, podemos compreender a situação do cotidiano do soldado na Guerra do
Paraguai, sendo este tipo de fardamento oferecido aos Voluntários da Pátria, no
Rio Grande do Sul, onde o terreno de campanha era de difícil acesso e inóspito.
Para complementar a análise, Dionísio Cerqueira descreve as dificuldades das
marchas:
Fazíamos essas marchas ordinariamente com alpercatas
espanholas, chinelas de couro ou descalços. Os banhados
eram muitos, os atoleiros freqüentes, e as botas enchiam-se
de água e de lama. Com os sapatos e botinas acontecia o
mesmo e os pés se feriam.
Raro era o soldado calçado
71
[
grifo nosso].
69
Relatório de Guerra
do Rio Grande do Sul do ano de 1865. P. 13
70
Relatório de Guerra do Rio Grande do Sul do ano de 1865. Bacharel João Marcellino de
Souza Gonnzalo, p. 1.
71
CERQUEIRA, op. cit., p. 208.
76
Figura nº 15- Fardamento do soldado rio- grandense
Fonte. Os Voluntários da Pátria. V.1
Fatores que incluem as dificuldades de suprimento, aprovisionamento, a-
quartelamento e equipamento sempre limitaram o alcance, a intensidade e a dura-
ção da guerra em muitos períodos da história da humanidade
72
. Portanto, o forne-
cimento destes fatores é imprescindível para a realização da operação de guerra.
Cabe salientar, que esses fatores essenciais, não foram providos ao Exército brasi-
leiro, pois, segundo o Coronel Chicuta, participante da guerra da Tríplice Aliança,
faltava às tropas brasileiras todas as condições básicas que um Exército é obrigado
a possuir para realizar um combate:
77
Agasalho (abrigo) não se encontra, então não se tem onde
comprar sabão para lavar roupa [...] até o presente temos fari-
nha e sal, um resto de sabão e erva para tomar mate [...] os
cavalos já andam muito magros, não para se fazerem mar-
chas muito grandes em cima deles...
73
Em 1831 e principalmente depois de sua reorganização em 1850, a Guarda
Nacional encontrava-se presente em todos os conflitos do Império, pois a lei que a
regia declarava que as Guardas Nacionais eram criadas para “defender a constitui-
ção, a liberdade, independência e a integridade do Império; para manter a obediên-
cia às Leis, conservar ou estabelecer a ordem e a tranqüilidade pública e auxiliar o
Exército de Linha na defesa das fronteiras e costas.”
74
Os Corpos de Guardas Nacionais eram organizados e subordinados a auto-
ridades locais. Seu serviço, pessoal era obrigatório, abrangia os homens maiores de
18 anos, que tivessem uma renda superior a 200 mil réis, com exceção dos militares
de terra e mar, autoridades locais, maiores de 50 anos, reformados da Marinha e do
Exército e inaptos para o serviço. Àqueles que não queriam fazer parte desta força
militar podiam indicar substitutos de boa procedência.
Segundo o Decreto de 10 de setembro de 1860, todos os cidadãos filhos de
estrangeiros, que possuíssem renda superior a 200 mil réis eram obrigados a servir
na Guarda Nacional.
75
Sendo assim, o Sr. Johan Gottlieb Lang, descendente de a-
72
KEEGAN, John. Uma História da Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 79.
73
MATOS, Marília (org
). Coronel Chicuta, um passo- fundense na guerra do Paraguai
.
Passo Fundo: EDIUPF, 1997, p. 50.
74
Lei de 18/8/1831, artigo 1º, Coleção Leis do Império 1830-1831, p. 50.
75
Ministério dos Negócios da Justiça, Rio de Janeiro em 28 de março de 1865.
78
lemão, nascido em setembro de 1844, em São Leopoldo serviu com idade de 18 a-
nos na Guarda Nacional:
Com 18 anos também prestei meu serviço militar. Naqueles
tempos estávamos mais a vontade do que hoje. Quartel não e-
xistia e mesmo durante a semana a maioria de nós não dispu-
nha de tempo. Por isso nos reuníamos aos domingos. Cada
domingo de manhã, das 9 horas, passamos revista em frente
da casa do capitão Joaquim Paula de Fogaça.
76
Devemos salientar, que os interesses gerais do governo coincidiam com os
interesses dos estancieiros do Rio Grande do Sul, em defender as fronteiras, portan-
to, as forças empregadas provinham da organização militar local que eram mantidas
por este poderoso segmento social, que estavam acostumados em constantes
contendas com seus vizinhos, devido às desavenças políticas, econômicas e familia-
res.
Assim, Sodré atesta que:
Todos lutavam, conseqüentemente por um objetivo direto, de-
fendiam o que era seu ou aquilo de que pretendiam apossar-se
[...].Não é preciso, pois, nessa região devastada constantemen-
te pela guerra, inserir nenhuma forma de estrutura militar: o
problema militar, ali é o cotidiano, o constante, é a própria
substância de existência.
77
O governo decretou em 21 de janeiro de 1865 a convocação de 14.796
Guardas Nacionais dos diferentes corpos, divididos em cotas distribuídas entre as
províncias, não para defesa das praças, fronteiras e costas do Império, como pa-
76
BECKER, Klaus. Alemães e descendentes do Rio Grande do Sul na guerra do Para-
guai. Canoas: Hilgert- PAH, 1968, p.12.
79
ra o serviço de guerra na República do Paraguai
78
, assim fortalecendo o Exército no
sul do País.
Conforme a tabela 3 que demonstra, o Decreto-Lei nº. 3383, evidenciou a
relação de cotas por província:
Tabela 3- Designação do número de Guardas Nacionais por Província:
Fonte:
Decreto Lei nº 3.383 de 21 de janeiro de 1865
77
SODRÉ, op. cit., p. 82-83.
78
BRASIL, Decreto- Lei n. 3383 de 21 de janeiro de 1865. In: Leis do Brasil, Rio de Janeiro:
Tipografia Nacional, 1865, p.45.
80
Ao se tentar fazer cumprir o Decreto-Lei acima exposto, houve uma certa re-
sistência por parte dos Guardas Nacionais, gerando um grande mero de substitui-
ções, já que esta prática era regulada pelo Decreto- Lei n. 3513, de 12 de setembro
de 1865, o qual decretava que:
Art. 1º O cidadão Guarda Nacional, que por si apresentar outra
pessoa para o serviço do Exército por tempo de nove anos,
com idoneidade regulada pelas Leis Militares, ficará isento não
do recrutamento senão também do serviço da Guarda Na-
cional.
79
.
Essa resistência dos Guardas Nacionais em participar da Guerra do Para-
guai, pode ser explicada em grande parte, ao “temor das oligarquias, que controla-
vam a instituição, de desguarnecer as províncias, notadamente aquelas em que ha-
via maior concentração de escravos.”
80
Conforme a seguinte manifestação do Presi-
dente de Província do Pará, podemos constatar este temor das oligarquias:
Apesar de trabalhar com presteza e real interesse para reunir e
escolher voluntários em sua província, o presidente Couto de
Magalhães objetiva ao governo imperial que não podia des-
guarnecer a sua dilatada província, não de cuidar a frontei-
ra, como prevenir um movimento escravocrata que ali se ob-
serva.
81
Outros aspectos que causavam desmotivação nos Guardas Nacionais em
combater na Guerra do Paraguai era o receio de que esta força militar fosse incorpo-
79
BRASIL. Decreto- Lei, n. 3513, de 12 de setembro de 1865. In: Leis do Brasil, Rio de Ja-
neiro: Tipografia Nacional, 1865, p. 336.
80
COSTA, Wilma Peres. A Espada de Dâmocles. O Exército, a guerra do Paraguai e a
crise do Império. São Paulo: HUCITEC, 1996, p. 234.
81
Idem, p. 235.
81
rada ao Exército, pois um dos piores castigos para população livre, era servir nesta
Força de Linha e o fato da necessidade dos Guardas Nacionais saírem de seus mu-
nicípios, abandonando seus empregos públicos, propriedades ou negócios, podendo
vir a perder seu patrimônio, devido a sua ausência.
Assim sendo, a caricatura 16, apresenta a figura de um Guarda Nacional,
rodeado por sua família e sua insatisfação ao ser designado à guerra. Esta imagem
apresenta em sua legenda o diálogo do designado com sua esposa, no qual o sol-
dado coloca que se sua mulher tivesse morrido de pneumonia, ele não precisaria ir
para esse conflito, que seria considerado arrimo de família por ser provedor de
tantas crianças. A ilustração e a escrita na caricatura são uníssonas, pois uma com-
pleta a outra, conforme a seguinte afirmação de Onici Flores:
A ilustração mostra os pormenores caracterizadores de perso-
nagens, situações, ambientes, objetos. Os comentários relati-
vos à situação representada aparecem por escrito. Escri-
ta/ilustração integram-se, associando-os a consideração do in-
ter discurso que se faz presente como memória, dando uma o-
rientação ao sentido num contexto dado aquele e o outro
qualquer.
82
A caricatura no período da Guerra do Paraguai funcionou enquanto maior dis-
seminadora de notícias sobre este conflito internacional, que no século XIX, uma
parcela considerável da população era analfabeta, podendo assim, as ilustrações
tornarem-se “verdadeiros” textos jornalísticos. Podemos então, considerar que “a
caricatura é uma forma de comunicação social, com sua linguagem própria e com
82
FLORES, Onici Claro. A leitura da Charge: 500 anos. Canoas- RS: Ed da ULBRA, 2002,
P.50.
82
um sistema de elementos que compõem esta linguagem,”
83
tornando-se na impren-
sa, um importante documento histórico, repleto de informações sociais e políticas
que permeiam o imaginário social de um período.
Essas caricaturas foram responsáveis tanto para confirmar e impulsionar, por
parte do Império, a população a comparecer voluntariamente às fileiras do Exército,
em prol da defesa do País, que foi “apunhalado” pelo Paraguai, como funcionou con-
tra o governo, com o desenrolar da guerra, enquanto arma de denúncia às insatisfa-
ções da sociedade brasileira, como o recrutamento forçado.
Ao compreendermos a caricatura enquanto um documento histórico, podemos
considerá-la uma importante fonte, para analisarmos o tema proposto deste trabalho
acadêmico: o recrutamento militar na Guerra do Paraguai. Conforme a seguinte cita-
ção de Michel Vovelle:
As fontes iconográficas não somente são abundantes, mesmo
em seu inventário atual, como também oferecem perspectivas
renovadas de reflexão. Não obstante afigurar-se paradoxal, eu
diria que, em certos aspectos, elas podem parecer mais ino-
centes” ou, afinal de contas, mais reveladoras que o discurso
escrito ou oral, graças às significações que delas podemos ex-
trair, em termos de confissões involuntárias.
84
Podemos atribuir essa resistência dos Guardas Nacionais em participar do E-
xército, devido também ao estigma de degradação social atribuído àqueles que ser-
viam nas fileiras dessa Força. A sociedade do período Imperial, não concedia ao
militar “nenhum lugar de destaque, sua importância individual ou de classe era redu-
83
FONSECA, Joaquim da. Caricatura. A imagem gráfica do humor. Porto Alegre: Artes e
Ofícios,1999, p. 25.
84
VOVELLE, Michel. Ideologias e Mentalidades. .2 ed, São Paulo: Brasiliense, 1991, p. 70.
83
zida,”
85
Dessa forma, as tropas permaneciam longos períodos sem receber o soldo,
fardamentos, víveres, ou quaisquer recursos, sendo considerado um castigo servir
na Tropa de Linha.
Figura nº 16
- Designação do Guarda Nacional
Fonte: Jornal A Semana Ilustrada
85
SODRÉ, op. cit., p.137.
84
Essa Força era percebida pela sociedade brasileira como depositária de
desqualificados, desocupados, delinqüentes e vagabundos, que eram recrutados na
sociedade para receberem disciplina em total isolamento, com castigos corporais,
até que pudessem conviver em comunidade, sendo bastante comum que o “preso
fosse conduzido ao quartel e nele conservado em segurança até que a disciplina o
constituísse em estado de se lhe facultar maior liberdade”.
86
Portanto, de acordo com Klaus Becker:
No Rio Grande do sul, as autoridades policiais igualmente re-
crutavam todos os indivíduos considerados perigosos, pois,
como soldados podiam ser controlados melhor. Assim a maio-
ria dos que estavam em condições de servir, considerava o
serviço militar um castigo.
87
A imagem 17 apresentada no jornal Bazar Volante explicita uma crítica so-
bre a convocação dos presos condenados à guerra, quando um oficial chega ao
quartel levando um “degredado” para servir ao Exército e seu amigo diz que já havia
muitos presos nas salas do quartel que eram condecorados, ou seja, esta caricatura
reafirma a presença de delinqüentes nas fileiras das Tropas de Linha.
Devido a esta ojeriza da sociedade em servir no Exército, podemos compre-
ender o baixo efetivo presente na Força, além do descaso do governo, que não os
provia de víveres, fardamentos, armamentos e um soldo digno. Portanto, “a desor-
ganização era espantosa. Faltava tudo. As tropas estavam descalças, com o farda-
86
HOLANDA, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira. São Paulo: DIFEL,
1974, p. 189
.
87
BECKER, op. cit., p. 45.
85
mento e soldos inteiramente atrasados.”
88
Nesse sentido, as acomodações nos
quartéis eram péssimas e o armamento antiquado.
A Lei n. 1220 de 20 de julho de 1864, fixava a Força de Linha para circuns-
tâncias ordinárias em 18.000 praças e 24.000 praças em casos extraordinários, po-
dendo este efetivo ser preenchido com 4.000 Guardas Nacionais, cujos números
não eram suficientes para o Brasil combater o Paraguai.
Figura nº 17- Degredados convocados para guerra
Fonte: Jornal Bazar Volante
88
SODRÉ, op. cit., p. 103.
As salas do quartel estão apinhadas. Já não há mais lugar para presos condecorados
86
Com a necessidade de organizar um grande efetivo para defender o País, o
governo lançou mão de algumas armas para realizar a convocação do maior número
de força humana. Sendo assim, em 7 de janeiro de 1865, o Imperador decretou a Lei
nº 3.371, que criava o Corpo de Voluntários da Pátria, o qual oferecia vantagens aos
homens de 18 a 50 anos que se apresentassem voluntariamente para combater na
Guerra.
Atendendo as graves e extraordinárias circunstâncias em que
se acha o País, e a urgente e indeclinável necessidade de to-
mar, na ausência do Corpo Legislativo, todas as providências
para a sustentação, no exterior, da honra e integridade do Im-
pério, hei por bem Decretar:
Art. São criados, extraordinariamente, Corpos para o serviço
de guerra, compostos de todos os cidadãos maiores de 18 a-
nos e menores de 50 anos, que voluntariamente se quiserem
alistar, sob as condições e vantagens declaradas.
Art. 2º Os voluntários que não forem Guardas Nacionais, terão,
além do soldo que recebem os voluntários do exército, mais
300 réis diários e a gratificação de 300$000, quando derem
baixa e prazo de terra de 22 500 braças quadradas nas colô-
nias militares ou agrícolas, além de outras honrarias militares e
pensão por invalidez ou morte.
Art. Os voluntários terão direito aos empregos públicos, de
preferência, em igualdade de habilitações, a quaisquer outros
indivíduos.
89
Treze outros artigos, regulavam a lei de Voluntários da Pátria, oferecendo
vantagens e regalias, como a questão da “baixa do serviço após o término da guerra
e a concessão de uma pensão ou meio soldo às famílias cujos chefes viessem a
falecer em conseqüência de ferimentos recebidos em combate.”
90
89
BRASIL.
Decreto n. 3371
de 7 de janeiro de 1865. . In: Leis do Brasil, Rio de Janeiro:
Tipografia Nacional, 1865, p. 3.
90
DUARTE, Paulo de Queiroz. Os Voluntários da Pátria na Guerra do Paraguai. v 1.Rio
de Janeiro: BIBLIEX, 1981, p. 202.
87
Atendendo a necessidade do País, o Império também decretou no dia 4 de
agosto de 1865 a Lei que equiparava os Corpos de Voluntários da Pátria aos Corpos
de Voluntários da Guarda Nacional. Este Decreto- Lei nº 3505 afirmava que:
Artigo Único. Os corpos da Guarda Nacional, que com a
sua organização atual, com os seus oficiais e praças vo-
luntariamente se prestarem para o serviço de guerra, se-
rão equiparados aos Corpos de Voluntários da Pátria e
gozarão de todas as vantagens que a estes são concedi-
das.
91
Portanto, os supracitados decretos eram um incentivo à participação do povo
na guerra, e neste sentido, é que muitos indivíduos atenderam a conclamação do
governo com entusiasmo. Deste feito, surgiram soldados de todos os cantos do Pa-
ís, muitos dispostos a defenderem seu País e obterem por intermédio da Lei dos Vo-
luntários da Pátria, uma melhor condição econômica.
Podemos verificar, de acordo com o relatório do Ministro da Guerra do ano
de 1865 que:
De todos os pontos do Império concorreram os cidadãos
oferecendo-se para marchar em corpos de Voluntários, ou
de Guardas Nacionais; um ainda não se recusou ao sa-
crifício que a Nação exige; o brado da guerra contra os in-
vasores do nosso território é uníssono em todo Império (...)
Pelo número de voluntários, de que se organizaram vá-
rios corpos, podemos calcular o entusiasmo, com que os ci-
dadãos se oferecem a marchar para a guerra, não tendo si-
do preciso ao governo empregar meio algum de violência
para alcançar tão lisonjeiro resultado.
92
91
BRASIL. Decreto n. 3505, de 4 de agosto de 1865. In: Leis do Brasil, Rio de Janeiro:
Tipografia Nacional, 1865, p. 329.
92
Relatório de Presidente de província - Ministério da Guerra, Relatório 1865, p 10.
88
2.3 Mecanismos de Apelo Patriótico
Para assegurar o voluntariado de toda sociedade, era preciso que o governo
buscasse legitimação, apoio e cooperação da população. Para este feito, o governo
passou a utilizar o apelo patriótico, no qual pretendia despertar e nutrir o sentimento
nacional contra o inimigo comum, o qual representava a “barbárie.”
Os elementos utilizados na aclamação patriótica foram hinos, bandeiras,
poemas, canções, enfim, toda uma rede de mecanismos ajustados em prol da con-
vocação de recursos humanos à Guerra. Dessa forma, “o hino nacional e a bandeira
foram incorporados ao cotidiano dos grandes centros urbanos, por meio de festejos
cívicos, nas comemorações de vitórias ou nas cerimônias de partida das tropas.”
93
Sendo assim, os hinos incentivavam o patriotismo, cristalizando o sentimen-
to de Honra e nacionalismo. Além destes hinos estarem presentes em jornais para
“aquecerem” a população, os mesmos estavam presentes também nos campos de
batalha, para impulsionar os soldados que estavam no front. Todos os recursos
possíveis foram utilizados pelo Império na tentativa de construir rapidamente uma
crença na Nação. Pois naquele momento:
... era necessário que todos os cidadãos, em aditamento a
qualquer compulsão externa, também fossem compelidos por
sua própria consciência e seus próprios ideais ou, por outras
palavras, por uma compulsão que exerciam individualmente
sobre si mesmos, a subordinar suas necessidades pessoais às
da coletividade, do País ou da Nação, e a doar-lhes a própria
vida, se necessário.
94
93
DORATIOTO, op, cit.,. p. 461
94
ELIAS, Norbert. Uma digressão sobre o nacionalismo. In: Os Alemães: a luta pelo poder
e a evolução do hábitos nos séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,1997, p.
140.
89
Destarte, o Barão Homem de Melo pronunciou que “nos momentos solenes
da Pátria nenhum pode escapar à imensa responsabilidade futura.”
95
Os hinos eram
compostos de palavras fortes que conclamavam a sociedade brasileira a participar
da guerra:
Mocidade, eia, avante partamos.
Glória aos bravos que às hostes
selvagens deram mostras de nosso valor
O Brasil comovido abraça
De seus filhos são eles a flor.
96
Esses hinos foram compostos para atingir os segmentos sociais, com o in-
tuito de convocar a população que hesitava em entrar no serviço militar ou para
manter os soldados, que haviam aderido aos combates na guerra. Deste modo o
hino “Aos Voluntários da Pátria”, incentivava os fortes guerreiros a irem avante em
todas as batalhas:
Aos Voluntários da Pátria
Do Paraguai o cacique
Há de pagar a ousadia
Com que a traição insultou
A nossa soberania.
[...]
Avante nobres guerreiros!
Do Paisandú pior sorte
Na Assunção demos aqueles
De tão nefanda corte.[...]
Os guaranis e agaces
De uma vez aniquilemos,
Dessa raça bandidos
Que ainda tão perto temos.
97
95
HOMEM DE MELO, Francisco Inácio M.
Palácio do governo do Ceará
, 25 de julho de
1865.
96
Jornal Bazar Volante, Rio de Janeiro, 12 / 02/ 1865.
97
idem, 28/ 01/ 1865.
90
O Imperador com o intuito de entusiasmar o povo para guerra, assumiu o
posto de Primeiro Voluntário da Pátria e partiu em direção a Uruguaiana, conforme a
figura 18. As tropas ficaram impressionadas e alegres com a presença da Majes-
tade em campo de batalha.
98
Esta atitude do Imperador produziu ótimo efeito sobre
o povo brasileiro, como nos mostra João Pedro Gay:
todos foram tocados de uma comoção singular, pela notícia
que nos trouxeram da partida do Imperador para o teatro de
guerra. (..) cada cidadão deve esforçar-se para concorrer com
seu imposto de sangue para desagravar a nacionalidade ultra-
jada, em que até a última camada social ergue-se vertiginosa,
com esse rancoroso entusiasmo...
99
A imagem 18 apresenta a importância e imponência da figura do Impera-
dor na Guerra, ao demonstrar seu olhar fixo ao infinito do campo de batalha, pronto
para emanar ordens “decisivas” sobre o conflito a seus oficiais.
98
GAY, op. cit.
99
Idem, p. 127.
91
Figura nº 18- D. Pedro II, no campo de batalha em Uruguaiana- RS
Fonte: Guerra do Paraguai. Memórias & Imagens
Para intensificar profundamente o entusiasmo patriótico, o governo fez uso
da figura simbólica de Jovita Alves Feitosa, uma mulher cearense de 18 anos, nas-
cida na cidade de Inhamuns- CE, que ao sentir- se afrontada devido “o desespero
público, a narração triste e sanguinolenta das devastações, pilhagens e atrocidades
cometidas pelas forças invasoras”
100
decidiu partir da casa de seu tio em Jaicós- PI
à capital, Teresina, para fazer parte do Corpo de Voluntários da Pátria, com o intuito
de defender suas irmãs brasileiras no Mato Grosso.
Jovita ao chegar em Teresina, “tomou trajes grosseiros de homem, cortou
os cabelos com uma faca, tomou um chapéu e dirigiu-se ao Palácio da Presidência,
92
pedindo para se alistar como voluntário da pátria.”
101
A jovem corajosa passou a ser
um voluntário na graduação de sargento, devido à utilização de sua figura patriótica
pelo governo, que almejava convocar os homens à guerra.
Assim, a patriótica mulher seguiu junto com 460 praças para o Maranhão,
Paraíba, Pernambuco e Rio de janeiro e em todas as províncias por que Jovita pas-
sou foi recebida com grande entusiasmo e gratidão nacional. Além disso, a mesma
era tida como uma heroína comparada a Joana D´Arc, assim, os presidentes de
Província e até o próprio Imperador passaram a “utilizar” a figura da “Joana D´Arc
nacional”, com o intuito de motivar a população a lutar pela Pátria. Sendo assim, a
imagem de Jovita foi explorada com o intuito de despertar apego pelo qual:
... é mediado, através de símbolos especiais, alguns dos quais
podem ser pessoas. Esses símbolos e a coletividade que eles
representam atraem para si fortes emoções positivas do tipo
usualmente chamado “amor”. A coletividade é vivenciada e os
símbolos são representados como algo separado dos indiví-
duos em questão, algo superior e mais sagrado do que eles.
As coletividades que geram um Ethos nacionalista são estrutu-
radas de tal modo, que os indivíduos que as formam podem
vivenciá-las mais especificamente, vivenciar seus símbolos
carregados de emoção como representantes deles pró-
prio.
102
No Maranhão, foi encenada uma peça teatral, que falava sobre a vida de
Jovita que a colocava como heroína. Portanto, a construção da imagem da defenso-
ra da pátria exaltou o sentimento nacional, fazendo com que muitos brasileiros se
disponibilizassem a ir ao front.
100
FLUMINENSE. Traços biográficos da heroína brasileira, Jovita Alves Feitosa. Rio
de Janeiro. Typografias Imperial, 1865, p. 12.
101
Idem, p. 13.
102
ELIAS, op.cit., p. 143.
93
O espetáculo realizado nesta província lotou, devido ao tamanho entusias-
mo da sociedade. A mulher guerreira assistiu ao espetáculo de um camarote ador-
nado com a bandeira nacional. No final da peça teatral, a atriz chamou Jovita Alves
Feitosa ao palco, deu-lhe um escudo, tirou-lhe o boné, colocou uma coroa de louros
em sua cabeça, em seu pescoço um cordão e um crucifixo de ouro.
103
Esta indumentária fornecida a Jovita, possui toda uma representação simbó-
lica em busca da personificação da imagem desta mulher enquanto “mártire” nacio-
nal que se apresentou voluntariamente, doando sua própria vida em defesa de sua
pátria (mátria), assim sendo podemos interpretar a coroa de louros posta em sua
cabeça, como a coroa de espinhos fincada na cabeça de Jesus Cristo ( que fora
capaz de dar sua vida pelo homem), esta analogia é confirmada pela doação de um
cordão e um crucifixo de ouro, que representam respectivamente, a simplicidade e a
coragem cristã desta jovem mulher.
Em Pernambuco foi recitada em sua homenagem a seguinte poesia:
“À Heroína Brasileira Jovita Alves Feitosa”
Na onda do movimento
Do País em convulsão
Fero, pujante, sedento,
Terrível como o vulcão,
Destaca-se à luz do dia
Um tipo de valentia,
Enchendo-se de simpatia
O mais revel coração.
(...)
Não me admira a coragem
Dos filhos que unidos dão
A pobre mãe na voragem
103
FLUMINENSE. Op. cit., p 16.
94
Nobre, solicita, mão!
Um lhe diz: Eu vou, eu corro!
Outro! Esperai meu socorro!
E ela diz: Meus filhos morro
Se não me der proteção (...)”
104
Esta poesia é uma exaltação da mulher que se dispõe a lutar pelo País, que
estava em convulsão e necessitava da valentia de seu povo. Bem assim, a coragem
daquela mulher procurava incentivar a presença dos filhos da nação a proteger a
Pátria, que ora encontrava - se fragilizada. Jovita Alves assumiu esta figura simbóli-
ca até sua chegada ao Rio de Janeiro, onde permaneceu, não sendo aprovada, pelo
Império, sua partida junto aos Voluntários da Pátria no sul do País.
No Rio Grande do Sul, a figura de Jovita Alves não foi aclamada e muito
menos considerada uma heroína, pois para os rio- grandenses, acostumados com
as lidas da guerra e portanto a terem mulheres nos campos de batalha em condição
de vivandeiras ou “china de soldado”, a situação de mulher guerreira de Jovita não
causou convocação patriótica junto aos gaúchos.
Na concepção sul- rio- grandenses essas mulheres que acompanhavam as
tropas “eram prostitutas buscando obter lucros da situação, eram esposas e aman-
tes que seguiam seus companheiros, eram mães que buscavam dar apoio e cuida-
dos a seus filhos.”
105
104
Idem, p. 38.
105
SALLES, op. cit., p. 125.
95
Portanto, dentro destas condições, os sul-rio-grandenses consideravam es-
sa atitude de Jovita Alves, como um devaneio de mais uma mulher pronta para a-
companhar seu amor. Sendo assim, Apolinário Porto Alegre em sua peça teatral,
trata essa mulher nordestina como uma vivandeira, que abandona seu lar, sua terra
e acaba a vida como uma prostituta no Rio de Janeiro em condições de miséria.
Cena 3ª
ERNESTO. ... conheci Jovita quando ela aqui chegou com o
Corpo de Voluntários do Piauí. Sua mocidade e devotamento à
pátria interessaram-me desde logo por ela. Senti muito, quan-
do vi que não a deixaram partir com o exército... quer me pa-
recer que aquela menina havia de conseguir um nome brilhan-
te [...]. Eu conhecia Margarida. E ela entre as mulheres mun-
danas, uma das mais moderadas e honestas; contei-lhe a vida
de Jovita, ela comoveu-se muito e foi buscá-la para sua com-
panhia. Em casa de Margarida começaram o as relações de
Jovita com Guilherme. O mais o Sr, sabe...
106
A maior importância da figura de Jovita para o Império, era o fato de ela ser
uma mulher que se apresentava como voluntária, enquanto os homens fugiam do
serviço da guerra.. A figura da mulher cearense, vide a imagem 19, disposta a
enfrentar o inimigo procurou convencer muitos cidadãos a fazerem parte dos volun-
tários, dispostos então a “morrerem pelo Brasil”.
Outros exemplos de coragem e bravura realizados por soldados na guerra
foram demonstrados em jornais, para que a população se entusiasmasse e corres-
se para engrossar as fileiras do Exército. Benedito, natural do Taquari, foi um dos
heróis que defendeu a sua pátria com força e determinação:
96
... Benedito só, e sem arma alguma, diante de centenas de i-
nimigos implacáveis, respondeu com sangue frio. Não me en-
trego. Os paraguaios por vezes repetiram aquela ordem, a-
companhado de horríveis ameaças e o jovem Benedito, sem-
pre com sangue frio, lhes deu a mesma resposta. Desespera-
dos os paraguaios com um tal heroísmo em uma alma tão ten-
ra, lançarão mão da espada, e a erguerão sobre a cabeça do
jovem, dizendo- lhe; entrega-te se não te matamos. Benedito,
tendo a espada inclinada sobre sua cabeça, e a imagem da
pátria gravada no seu coração, cruzou as mãos sobre a fronte
e respondeu: não me entrego! Não me entrego! E não entre-
gou-se senão a Deus tão somente! Morrendo pela Pátria.
107
Figura nº 19
- Jovita Alves Feitosa com fardamento de sargento
Fonte: Traços biográficos da heroína brasileira, Jovita Alves Feitosa
106
PORTO ALEGRE. Apolinário; PAREDES, Menezes. Jovita.,1868.
107
Os heróis brasileiros. Brasil Histórico, Rio de Janeiro, 21/ 05/ 1865.
97
Nessa corrida para conclamar e impulsionar a sociedade a um comprome-
timento com a Pátria, o governo lançou mão da imprensa que realizou o papel fun-
damental da construção de uma “consciência patriótica.”
Sendo assim, Juvenal Galeno, um grande literato
108
do período, publicou no
jornal O Cearense uma poesia sobre a Guerra, no intuito de desenvolver no povo
cearense o amor pela Pátria.
À Guerra
À guerra! Eis o brado que solta hoje a Pátria
Que soltem no Prata seus filhos gentis
Sofrendo os ultrajes de imbeles Estados,
Ingratos selvagens, traidores e vis; (...)
às armas! À guerra- Brasil, ó gigante,
És forte, qual vasto que imenso poder!
Tens ferro no seio pra armar os teus bravos,
E matas pra os mares de esquadra encher;
Assim quem te vence, quem pode curvar-te?
Só Deus, minha Pátria, te pode vencer:
À guerra, ò gigante! Aos campos da glória!
És forte, qual vasto que imenso poder! (...)
Mil vezes a morte que torpe existência...
É o brado de todos cumprindo o dever:
Avante! Eia, à luta, que certa a vitória
Espera os guerreiros, que sabem vencer
109
(...)
108
Juvenal Galeno da Costa e Silva nasceu em Fortaleza no dia 27 de setembro de 1836,
filho de próspero agricultor, José Antônio da Costa e Silva. Foi estudar no Rio de Janeiro e
ao retornar ao Ceará em 1856, trouxe seu primeiro livro impresso "Prelúdios Poéticos" que é
considerado como marco inicial da literatura cearense, livro típico do Romantismo a obra de
Juvenal Galeno teria o seu auge, já na maturidade do poeta, com o lançamento de Lendas e
Canções Populares, de 1865, e com uma nova edição em 1892, acrescida de Novas Lendas
e Canções. Esta principal obra é marcada pela Poesia simples, coloquial, dos poemas popu-
lares. Juvenal Galeno foi Um dos fundadores do instituto do Ceará, Patrono da Cadeira
23 da Academia Cearense de Letras, e ainda em vida, as duas filhas, Henriqueta e Julia-
na, criarem a Casa Juvenal Galeno, dedicada a assuntos literários e culturais. O poeta, que
ficara cego em 1906, por causa de um glaucoma, morre de uremia em Fortaleza no dia 7 de
março de 1931, aos 95 anos de idade.
109
Juvenal Galeno. “A Guerra”, Jornal O Cearense, 28/01/1865.
98
Nesta poesia supracitada, Galeno conclama os brasileiros a pegar Às ar-
mas!” e ir “À luta! Aos campos da glória, ”como uma forma de atender “o brando que
solta hoje a Pátria.” Na última estrofe transcrita, o literato procura intensificar, que a
morte não pode ser uma preocupação para o cidadão patriota.
No Rio Grande do Sul a morte em combate não era encarada como um
grande mal, um sofrimento ou desgraça, devido suas histórias de lutas em território
de conquista. Para o rio-grandense a morte era vista com naturalidade, muitas ve-
zes como um “regalo” para o soldado ferido mortalmente.
Nesse sentido a imprensa sul rio- grandense, também desempenhou seu
papel de criação do espírito nacional. Mesmo sendo os “gaúchos” um povo que
sempre esteve pronto para lutar e defender seu território, foram também necessá-
rias aclamações patrióticas, afim de garantir a presença desta população de guerrei-
ros nos combates.
Seguindo esta perspectiva, podemos perceber que o jornal A Sentinela do
Sul publicou uma notícia, na qual exaltava a figura épica do rio- grandense, em que
este estava acostumado a “pelear” e nunca fugir de seu “ tributo de sangue”. Portan-
to, esta informação nos apresenta como se procurou garantir mais voluntários gaú-
chos na luta contra o Paraguai.
Dizimados pelo tributo de sangue, os rio-grandenses não es-
quecem um momento os seus deveres de brasileiros e ci-
dadãos resignados que sofrem pela Pátria, exultam quando vi-
toriosos e avante sobre os bombardeios paraguaios tomados à
baioneta.”
110
110
Jornal A Sentinela do Sul, Porto Alegre, 07/07/1867.
99
A doação de medalhas e títulos nobiliárquicos, também foram instrumentos
utilizados para garantir a presença de força humana e donativos para o Exército,
pelos segmentos sociais mais abastados do Brasil, sendo assim, muitos títulos e
medalhas foram concedidos a grandes proprietários de terras, senhores de escra-
vos; enfim a população rica do Império.
Diferentes jornais, comentavam e criticavam estas doações, como o jornal
Cabrião que apresentou uma charge
111
sobre esse movimento “inadequado” de
compra e venda de “status” social. Conforme a figura nº20, que apresenta o Ministé-
rio do Império vendendo em um balcão, títulos de nobreza e medalhas, àqueles que
apresentassem um saco de dinheiro. Ao lado do balcão aparece um índio, que é a
representação do Brasil nas caricaturas, envergonhado e cabisbaixo com essa situ-
ação. Ou seja, o jornal apresentou a situação de “corrupção que alimentava a vai-
dade, para dar lugar ao patriotismo” no Brasil.
Entretanto, a aclamação patriótica também foi um mecanismo utilizado
para preencher os claros que se faziam nas reduzidas fileiras de soldados. Em
um primeiro momento, este patriotismo levou realmente à diminuição desses cla-
ros.
111
Segundo Joaquim da Fonseca a Charge significa uma representação pictórica de caráter
burlesco e caricatural. É um cartum que satiriza um fato específico, tal como uma idéia, um
100
Figura nº 20- Compra e venda de títulos nobiliárquicos e medalhas
Fonte: Jornal Cabrião
acontecimento, situação ou pessoa, em geral de caráter político que seja de conhecimento
público.
101
2.4 A participação da sociedade na Guerra
O Brasil, ao participar da guerra, contou com a presença de homens: a-
bastados, livres e pobres, escravos libertos e estrangeiros.
Figura nº 21
- Pirâmide Social.
Fonte: o autor
Conforme a pirâmide social acima apresentada, podemos compreender a
complexidade da estrutural social do Brasil oitocentista, fazendo parte do topo
desta pirâmide os abastados, compreendendo os homens possuidores de rique-
zas econômicas e políticas. Seguindo esta perspectiva no centro da figura acima
encontravam-se homens pobres pertencentes das camadas sociais desfavoreci-
das economicamente, socialmente e politicamente, estando presente dentre eles
na província do Rio Grande do Sul os imigrantes alemães. A base desta pirâmide
estava o sustentáculo da economia brasileira, os escravos.
ABASTADOS
POBRES- LIVRES e
IMIGRANTES
ESCRAVOS
102
2.4.1 Os Abastados
Esta população abastada era constituída por, grandes estancieiros (fazen-
deiros)- donos de escravos, Oficiais superiores e comerciantes exportadores e
importadores.
Ao ser deflagrada a guerra, este grupo social não atendeu ao chamado do
governo para servir ao Exército e lutar contra o Paraguai, mas ajudaram o País for-
necendo donativos e força humana à guerra. Conforme a tabela 4, que apresenta
o número de doações e efetivo humano enviado à guerra.
Tabela nº 4- Relação dos donativos realizados pelo Estado para guerra
Fonte:. Guerra do Paraguai: escravidão e cidadania na formação do Exército
.
103
O oferecimento de donativos foi muito importante para manter a Força de
Linha do Brasil na guerra, pois ao iniciá-la o governo brasileiro não possuía um
orçamento considerável para investir nas tropas de Linha e considerava que o
conflito estabelecido com o Paraguai seria rápido e portanto sem muitos custos,
mas contrariando esta idéia a Guerra da Tríplice Aliança perdurou durante longos
cinco anos. Devido aos cinco anos de guerra o Império aumentou a tropa e ne-
cessitou armá-la, alimentá-la, vesti-la e fornecer assistência médica, crescendo
consideravelmente as despesas públicas.
Em conseqüência deste estado das coisas as contas públicas se desor-
ganizaram, pois “a despesa total do Império não atingia antes da guerra, a 57 mil
contos. Entretanto, logo em 1864 e 1865, despenderam-se 83 mil contos por mo-
tivo da questão oriental, quantia esta que duplicou e quase triplicou em cada um
dos anos subseqüentes."
112
A necessidade de obter recursos financeiros fez com que o império as-
sumisse grande dívida externa ao realizar empréstimos para manter os custos
com a guerra. Segundo Ouro Preto:
A despesa total da guerra, conforme a liquidação feita no
Tesouro Nacional, ascendeu a 613.183:262$695, quantia
que com os respectivos juros deverá pagar a República do
Paraguai, e não compreende a indenização a que tem direi-
to os súditos brasileiros, prejudicados pelos atos de depre-
dação e violência de que foram vítimas.
113
112
FIGUEIRA, Divalte Garcia. Soldados e negociantes na Guerra do Paraguai. São Pau-
lo: Humanitas FFLCH- USP: FAPESP, 2000, p. 42.
113
Idem, p. 49.
104
Isto posto, podemos considerar o quão era importante as doações envia-
das ao governo, pelos “ricos”, em troca da isenção do recrutamento, que, a
força humana estava sendo “arrebanhada” através da conscrição, no seio dos
grupos sociais pobres e dos escravos, conforme iremos aprofundar no próximo
capítulo.
Podemos avaliar através da tabela 5, o seguinte mapa das despesas
administrativas do Brasil na segunda metade do século XIX, os gastos realizados
com o Exército e a Marinha no período da guerra.
Tabela 5-
Despesas administrativas na segunda metade do século XIX
Fonte:
Teatro de Sombras: a política imperial
.
105
2.4.2 Pobres- Livres
No centro da pirâmide estavam presentes capitães, Guardas- Nacionais e
pequenos comerciantes, dentre outros, que desempenhavam tarefas de coorde-
nação e administração (capatazes de estâncias), prestação de serviços (peão,
artista, negros forros), professores, oficiais, suboficiais, funcionários públicos, cai-
xeiros .
Esses homens livres, em meio a esse fervor da guerra foram muito requi-
sitados para fazer parte das fileiras do Exército que havia um grande contin-
gente de homens livres, que não eram utilizados no setor principal de produção,
pois estes livres “eram por suas origens, por sua raça e pelas características das
relações de produção escravistas, incapazes de se situar nos dois grandes cam-
pos da sociedade: o dos senhores e dos escravos.”
114
Sendo assim, podemos
constatar este fato segundo a seguinte afirmação:
eles não votavam nem eram votados, não tinham acesso à
cultura européia predominante, (...). Principalmente nas á-
reas rurais, estavam subordinados social, política e ideolo-
gicamente aos grandes proprietários através de laços de
mandonismo e dependência pessoal.
115
Para conseguir levar o maior número deste grupo social à guerra, o Esta-
do necessitou buscar o apoio e a legitimação entre estes homens livres, que pro-
piciavam o maior número de efetivo necessário às forças militares. A possibilida-
114
SALLES, op. cit., p. 60.
115
Idem, p. 79.
106
de de emprego deste segmento social
116
pobre nas fileiras do Exército era possí-
vel, pois grande parte dessa população não se encaixava na economia escravista
do séc XIX, ficando muitas vezes à margem da sociedade, por o se situar ao
lado dos grandes estancieiros (fazendeiros) e muito menos ao lado dos escravos.
A população pobre, ao ser decretada a Lei dos Voluntários da Pátria, vi-
sualizou uma forma de ascender economicamente e socialmente, pois a Lei for-
necia vantagens e colocação social, para os que se candidatassem a lutar na
guerra espontaneamente. Assim, esses livres passaram a se candidatar volunta-
riamente para o Exército.
Essa população utilizava, além da Lei dos Voluntários da Pátria, outros
meios para ascender economicamente, como o contrato de substituição, que era
estabelecido entre o homem pobre e os mais abastados, que refutavam os servi-
ços da guerra. Portanto, com esse contrato o segmento social pobre garantia
quantias em dinheiro à sua alavancagem econômica.
Nesta acepção, o jornal Cabrião apresentou a seguinte imagem satirizada
sobre essa relação comercial dos substitutos à guerra, como apresentamos na
figura 22, em que aparece um homem, o pipelet, com suas armadilhas para
apresar homens a fim de vendê-los como substitutos, sendo esse negócio garan-
tido, já que a maioria da população não queria ir ao campo de batalha.
116
Ao utilizarmos a palavra “ segmentos sociais” neste trabalho acadêmico, estamos nos
referindo ao conjunto de indivíduos pertencentes ao mesmo grupo social, em que os dividi-
mos em: abastados, pobres- livres e escravos.
107
Figura -22 Venda de substitutos, como forma de ascendência econô-
mica.
Fonte:
Jornal Cabrião
2.4.3 Os Imigrantes alemães
Os imigrantes também se encaixavam entre o segmento social pobre e li-
vre.. Estes estrangeiros que viviam no Rio Grande do Sul eram os antigos mer-
cenários alemães Brummers contratados pelo Império, em 1851-1852, para luta-
rem na Campanha contra o ditador Juan Manoel de Rosas, e seu preposto no
Uruguai, o Presidente Oribe.
108
A atitude do Imperador ao contratar esses soldados irregulares, não era
uma novidade na Europa, pois “todos os Exércitos regulares, até mesmo os da
Revolução Francesa, recrutavam soldados irregulares para patrulhar, reconhecer
e travar escaramuças para eles”
117
e ainda os contratavam para fazer parte do
Corpo da Guarda Imperial como foi o caso do Czar Nicolau I, em 1837.Portanto
podemos inferir que a atitude do Imperador brasileiro era condizente com as práti-
cas de guerra no período.
Após esta guerra, muitos ficaram no Rio Grande do Sul e ganharam terras
ou dinheiro. Grande parcela destes mercenários dedicaram-se ao cultivo da terra,
mas aqueles que não se adaptaram a vida no campo fixaram-se "na sede do mu-
nicípio ou nos povoados, dando início à indústria familiar, onde exerciam ativida-
des como moleiros, sapateiros, alfaiates, tecelões, carpinteiros e marceneiros".
118
Esses imigrantes ainda desempenharam os papeis de professor, e pequenos co-
merciantes.
No período em que estourou a guerra do Paraguai, alemães que tinham
em suas vidas a marca da luta em outras guerras, e que não se adaptavam ao
cultivo da terra, logo se prontificaram para formação de um contingente de volun-
tários de nacionalidade alemã. Conforme a seguinte citação:
além de comissões organizadas em São Leopoldo e em
Santa Cruz, solidários com os destinos de sua segunda pá-
tria, decidiram oferecer seus préstimos e se compromete-
ram perante o governo da Província formar "Corpos de De-
117
KEEGAN, op. cit.,.p 22.
118
FLORES, Moacyr. História do Rio Grande do Sul. ed, Porto Alegre: Nova Dimensão,
1996, p.87.
109
fesa", compostos exclusivamente de voluntários de naciona-
lidades alemãs.
119
Em Relatórios, no Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, do ano de
1865, existia uma elevada quantidade de requerimentos de alemães pedindo pa-
ra participar da guerra. Muitos destes realizavam o pedido colocando-se como
ofendidos, devido ao ataque Paraguaio a sua segunda pátria:
Os alemães residentes nesta cidade e imediações conside-
rando o estado crítico em que se acha o Brasil a quem eles
são dedicados como a uma nova pátria e querendo provar
como são afeiçoados à nação e a sua Majestade o Impera-
dor, cujo procedimento tem enchido de admiração, respeito
e entusiasmo todos os corações, comissionarão os abaixo -
assinados para em nome deles fazerem ciente a V. Exa. de
que estão prontos para organizar um corpo para guarda e
segurança desta cidade e imediação.
120
Estes requerimentos enviados para o governo por imigrantes alemães,
aumentaram consideravelmente, à medida que o Imperador fornecia mais vanta-
gens àqueles que procurassem participar da guerra voluntariamente. Desta for-
ma, podemos considerar que participar da guerra que acabara de ser deflagrada
contra o Brasil, era uma maneira vista pelos alemães de melhorar sua condição
social, realizando a atividade da guerra que fazia parte de suas vidas.
Sendo assim, em muitos requerimentos constava a vontade dos alemães
em participar do conflito, e a necessidade de participar da arma de Artilharia, pro-
fissão que os Brummers,- conheciam profundamente. Segundo o Requerimento
119
BECKER, op. cit., p 34.
120
BRASIL Requerimentos do Exército. Arquivo histórico do Rio Grande do Sul, Porto A-
legre, março de 1865, maço 121.
110
abaixo, podemos constatar a necessidade dos alemães em servir na arma de
Artilharia.
Dizem os abaixo-assinados que tendo se alistado como vo-
luntários da pátria para mostrar a sua gratidão por esta terra
querida, a essa nação e estando prontos para derramar a
última gota de sangue para defender a sagrada causa do
Brasil e julgando que podem prestar melhor serviço sendo
alistados no Corpo de Artilheiros voluntários da pátria que
possuíam seus patrícios como superiores...
121
Devido a esse “entusiasmo” que os alemães demonstravam em participar
da guerra, foi criado em 1865, o Batalhão de Voluntários Auxiliares, que seria
composto por estrangeiros:
Em virtude da autorização que, em ofício de 15 de abril úl-
timo, me foi dada pelo Ex sr. conselheiro Francisco Octavi-
ano de Almeida Rosas [...] mandando aquartelar os estran-
geiros de diversas nacionalidade que se oferecerão volunta-
riamente para concorrer com o Exército Brasileiro na Guerra
contra o Paraguai [...] esta força que tem sido fornecida co-
mo as praças do Exército se denominará "Batalhão de Vo-
luntários Auxiliar" que será formado por quatro companhi-
as...
122
Os imigrantes alemães, além de participar da guerra como voluntários,
também assinavam contratos, em troca de dinheiro, para participarem como
substitutos, daqueles que não queriam participar do conflito.
Conforme o seguinte contrato abaixo podemos visualizar essas substitui-
ções:
121
BRASIL Requerimentos do Exército. Arquivo histórico do Rio Grande do Sul, Porto A-
legre, 08/ 08/ 1865.
111
Entre nós, abaixo assinados, João Schmidt e João Hermes
se fez e acordou a seguinte convenção:
Eu, João Hermes, natural da Alemanha, declaro que me o-
brigo a alistar-me e entrar no serviço ativo do Corpo da
Guarda Nacional , em Santa Ana, [ Rio Grande do Sul] em
lugar de João Jacob Schmidt, pela quantia de seiscentos e
oitenta réis, para que lhe serve este de quitação, e o restan-
te na importância de trezentos mil réis devendo pagar-me o
dito João Jacob Schmidt no fim da guerra, e no caso que
não volte mais no fim da guerra, deve entào pagar o mesmo
João Jacob Schmidt a mencionada quantia de trezentos mil
réis ao meu cunhado Carlos Juchem. E eu João Jacob S-
chmidt prometo e me obrigo a cumprir as condições supra
mencionadas. E para clareza mandamos fazer dois originais
do mesmo teor, por ambos assinado. .
123
Figura nº 23-
Oficial alemão que participou da Guerra do Paraguai.
Fonte:. Alemães e descendentes do Rio Grande do Sul, na Guerra do
Paraguai
122
Ordens do Dia do Exército , nº 26 10 de maio de 1865, AHRGS - FR84.
123
DORATIOTO, op. cit., p. 113- 114.
112
2.4.4 – Escravos
Os escravos faziam parte da base da pirâmide social. Estes eram o sus-
tentáculo da economia brasileira na segunda metade do século XIX. A economia
da época era escravista, baseada na cafeicultura, enquanto no Rio Grande do
Sul os escravos exerciam "profissões manuais, trabalhando nas lavouras, estân-
cias e charqueadas".
124
O recrutamento Militar foi muito realizado junto a esse segmento social,
pois, para aumentar as fileiras do contingente brasileiro o império procurava com-
prar os negros cativos para servir ao Exército.
A elite brasileira estava desgostosa com o Império devido ao tributo de
doar ou vender escravos. Segundo Moacyr Flores "depois da proibição do tráfico
negreiro, em 1850, um escravo custava 2:000$000 de réis" ou seja, o preço do
escravo era alto e quando o Império comprava este escravo de fazendeiros,
sempre os obtinha por um valor mínimo.
Tal situação causava um certo desconforto entre os fazendeiros e o go-
verno, que percebiam a utilização de escravos libertos para a defesa do País,
como uma ameaça à segurança e à propriedade. Conforme o Relatório do ano de
1868, da Província de São Paulo que explicita a preocupação do uso da o- de-
obra escrava na Guerra da Tríplice Aliança.
124
FLORES, Moacyr. República Rio- Grandense: Realidade e Utopia. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2002, p.91.
113
No relatório de 1868, apresentado à Assembléia Provincial, o
presidente de São Paulo afirmou que a continuação da guerra
traria conseqüências desastrosas à economia, e se sentia a
falta de mão de obra na agricultura e na indústria, além de a
moeda nacional desvalorizar-se e tender a, progressivamente,
diminuir ainda mais de valor.
125
Dentro dessa mesma perspectiva, em São Paulo, o Jornal Cabrião apre-
sentou a imagem 24, na qual satirizava este fornecimento de força humana
para guerra, o qual era responsável pelo desguarnecimento da economia do Pa-
ís, apresentando “a fabricação de braços para a guerra” que deveria ser qualquer
pessoa, seja ela importante ou não para a economia do País.
Figura nº 24- Fabricação de braços para guerra
-
- Pois não está vendo, snr. Cabrião? Estamos fabricando braços para a guerra.
-Santo Deus!... Antes fossem destinados para a agricultura. Já não necessitamos de braços
-para a guerra, exm. Snr.: o que falta-nos é uma boa cabeça
Fonte:
Jornal Cabrião.
125
DORATIOTO, op. cit., p113- 114.
114
A participação do liberto nas fileiras do Exército aumentava com o
desenrolar do conflito internacional, pois a necessidade de homens para a luta
fez com que o Imperador decretasse a Lei 3.725, que libertava os escravos da
Nação,
126
com a finalidade de servir ao Exército:
N º 3.725- Decreto de 6 de novembro de 1866.
Hei por bem ordenar que aos escravos da Nação que esti-
verem nas condições de servirem no Exército, se
gratuitamente a liberdade para se empregarem naquele
serviço e sendo casado, estenda-se o mesmo benefício a
suas mulheres.
127
Podemos considerar que houve um grande estímulo governamental para
levar o maior número de escravos ao Paraguai, concedendo liberdade a esses e
doando prêmios honoríficos aos que os libertassem para combater na Guerra da
Tríplice Aliança. Assim, muitos escravos foram doados em troca de títulos honorí-
ficos, conforme a citação abaixo:
Houve oferecimentos individuais: Manoel Antônio Ayrosa-
ofereceu para assentar praça como voluntário a Pedro, par-
do claro, a quem concedeu carta de liberdade.
128
Os escravos também eram doados em substituição por aqueles que queri-
am evadir-se do serviço militar, que a partir de 1866 passou a ser realizado pela
conscrição de todos os homens maiores de 18 anos e menos de 50 anos, que
126
Conforme Ricardo Salles os Escravos da Nação eram africanos que entrados ilegalmente
no País, após a proibição do tráfico em 1850, haviam sido apreendidos e encontravam-se
sob os cuidados do governo imperial. Representavam 7,36% do conjunto.
127
BRASIL. Decreto Lei 3.725 de 6/ 11/ 1866. In: Leis do Brasil, Rio de Janeiro: Tipogra-
fia Nacional
128
SALLES, op. cit., p. 101.
115
estivesse em condições físicas de lutar no front. Em vista disto, podemos verificar
esse sistema de substituição, conforme a declaração de um senhor da cidade de
Campinas, que teve seu filho convocado à guerra:
Tendo um filho que não é Guarda Nacional e devido às cir-
cunstâncias em que nos achamos com a Guerra do Para-
guai e querendo concorrer com o meu contingente para o
triunfo do País, resolvi oferecer, para sentar praça no Exér-
cito, em substituição ao meu filho, o meu escravo Marcolino
de Camargo, ao qual concedi liberdade para tal fim.
129
O sistema de substituição também pode ser compreendido, conforme o
seguinte relatório da comissão de alistamento, realizado na província do Rio
Grande do Sul:
Tabela- 6
- Substituição por escravos
130
Contribuintes Nº de
escravos
Observações
Antônio Joaquim da Silva 2 Por seus filhos menores
José Luís Cardoso Sales 2 Por seus filhos
José Manoel Felizardo 2 Por seus filhos
Fco. Antônio Borges 2 Por seus filhos
João Rodrigues Facundes 2 Por seus filhos
Constantino Antônio Dorne-
les
1 Por seu filho
Antônio Bernadino Ferreira 1 Por seu filho
Fonte:
Comissão de Alistamento,1867
Podemos concluir que os escravos foram incorporados ao Exército, atra-
vés de diferentes mecanismos criados pelo Império, portanto é válido conhecer-
129
MELLO, Silvio Luzardo de Almeida. O Exército e a Abolição da Escravatura- O Exérci-
to e a Proclamação da República. Florianópolis: Insular, 2003, p.48.
130
Comissão de Alistamento, In: Diversos, maço 214, 1867. Porto Alegre: AHRGS.
116
mos a quantidade destes escravos incorporados às Tropas de Linha e suas res-
pectivas categorias:
Tabela 7-
Mapa de libertos que assentaram praça até 1868:
Da Nação 287
Casa Imperial 97
Gratuitos 753
Conventos 95
Casa do Governo 1.806
Substitutos 889
Fonte: Guerra do Paraguai: escravidão e cidadania na formação do Exército
A tabela acima, apresenta diferentes grupos de escravos que foram doa-
dos e conseqüentemente receberam a liberdade, assim os escravos da Nação
eram africanos que entravam ilegalmente no País, após a proibição efetiva do
tráfico em 1850 haviam sido apreendidos e encontravam-se sob os cuidados do
governo imperial. Os escravos da Casa Imperial e dos Conventos eram doações
particulares destas entidades e no caso dos primeiros, da família do imperador ao
Estado para colaboração no esforço da guerra. Os escravos da Casa do Gover-
no, eram os escravos que custaram alguma quantia ao governo, seja sob forma
de compra e indenização e os escravos Gratuitos eram concedidos ao governo
em prol de prêmios honoríficos.
131
Além de todas essas legalidades”, em que o governo oferecia para liber-
tar os escravos, que participavam da guerra contra Lopez, houve ainda muitos
casos de fuga de cativos para o Exército. A maioria destes escravos viam a pos-
sibilidade de conquistar sua alforria, ao combater na guerra. Deste feito, surgiam
diversos casos, em que os senhores de escravos requeriam ao governo a posse
117
de seus escravos fugitivos. De acordo com o seguinte requerimento apresentado
abaixo, podemos verificar um pedido de devolução de um escravo fugitivo:
Que seja excluído do estado efetivo do Batalhão de Arti-
lharia a pé, o soldado Raymundo Manoel, que foi escuso
do serviço militar por se ter verificado ser escravo e haver
sido reclamado, pelo chefe de polícia da Província do Pa-
rá.
132
A participação dos negros na guerra não se dava apenas em sua condi-
ção de escravo, muitos libertos faziam questão de participar da guerra, pois era
uma forma “honesta” deles conseguirem uma certa ascensão econômica e social,
através dos direitos fornecidos pela Lei dos Voluntários da Pátria.
Desta feita, encontramos requerimentos de libertos pedindo para partici-
par da guerra em defesa da sua pátria, mas pediam também suas incorporações
na arma de artilharia e o de infantaria, onde os “escravos” se encontravam em
sua maioria, deixando claro que esses libertos queriam se distanciar da condição
de escravos.
Os abaixo relacionados compenetrados dos males que afli-
gem o paternal coração de Vossa Majestade Imperial pela
invasão desta província pelas ondas paraguaias, vem nesta
ocasião oferecer a V.M. I, formarem um parque de artilharia,
afim de marchar para o lugar que o governo de V. M.I. julgar
necessário serviço do mesmos. Porque os abaixo relacio-
nados são todos homens de côr...
133
131
SALLES, op., cit. p 184.
132
Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul. Ordens do Dia do Exército, 18, dia 18 de
abril e 1865 .
133
REQUERIMENTO. Porto Alegre, 28 de junho de 1865. In: AHRGS.
118
Devido à participação corrente dos libertos na guerra, este aspecto pas-
sou a ser assunto em jornais paraguaios, como o Cabichuí, que se referia às for-
ças imperiais como macacos ao associar o soldado negro a covardia dos prima-
tas, utilizando essa afirmação ideológica, para tentar diminuir a força do Exército
brasileiro e conseqüentemente incentivar a ação dos soldados paraguaios, mes-
mo que os inimigos orientais também utilizassem como força humana negros em
seus contingentes. Conforme Ana Maria Arguello em sua obra “El rol de los Es-
clavos, negros en el Paraguay” havia negros no contingente do Exército para-
guaio, lutando lado a lado com El Mariscal:
En 1866 esclavos y libertos fueron reclutados para el ehjér-
cito, mostrándose el Mariscal siempre reticente a ésta
integración, lo que significaba también una tácita liberación
del status del esclavo..
134
A figura 25- demostra a utilização da imagem pelo jornal paraguaio
Cabichuí, presente no campo de batalha, com a finalidade de depreciar a Força
Militar brasileira aos soldados paraguaios. Essa caricatura apresenta o Marquês
de Caxias recepcionando Bartolomé Mitre, com uma banda de música composta
por soldados brasileiros, representados grotescamente enquanto macacos.
134
ARGUELLO, Ana Maria. El rol de los Esclavos: Negros en el Paraguay. Asunción,
Edição do autor, 1988.
119
Figura 25- Sátira do jornal Cabichuí, onde mostra o Marquês de Caxi-
as resecionado Bartolomé Mitre, com uma banda de música composta por solda-
dos brasileiros ou macacos.
Fonte: . Maldita Guerra: Nova história da Guerra do Paraguai
Esses jornais do Paraguai eram publicados e controlados pelo governo,
repercutindo suas opiniões, que os redatores eram funcionários públicos ou
oficiais e soldados do Exército, sendo assim “num Exército e num País desalen-
tados pela guerra, pela fome, pela miséria e que não vislumbrava nenhum sinal
de paz no horizonte, a criação dos jornais, inclusive os ilustrados, era uma medi-
da tomada explicitamente para fortalecer a moral do Exército.”
135
Em contra partida a imprensa brasileira, juntamente com o governo traba-
lhou a construção da figura de Solano López como um Tirano, louco, ambicioso,
que foi capaz de deflagrar a guerra com o intuito de se transformar no “Napoleão
do Prata”. O Exército paraguaio foi atacado, sendo descrito através das caricatu-
120
ras como uma Força inferior, composta por animais bárbaros, comandados pelo
El Mariscal, o ditador. Como nos é apresentado na caricatura, 26, do jornal
Vida Fluminense, no qual aparece um Exército formado por bípedes, sendo co-
mandado por Solano Lopez.
Portanto, a luta não foi travada apenas no campo de batalha, por Exérci-
tos, mas “a guerra do Paraguai foi travada em várias frentes, sendo uma delas a
imprensa” a qual foi responsável pela criação das imagens desordenadas” de
ambas as Forças militares.
136
Figura 26-
O Exército paraguaio através da imprensa brasileira.
Fonte: A batalha de papel.A Guerra do Paraguai através da caricatura.
135
TORAL, André. Imagens em Desordem. A iconografia da Guerra do Paraguai ( 1864-
1870). São Paulo: Humanitas/ FFLCH/ USP, 2001, p.69.
136
Para aprofundar essa discussão vide: SILVEIRA, Mauro César. A Batalha de Papel. A
Guerra do Paraguai através da Caricatura. Porto Alegre: L&PM, 1996. E TORAL, André.
Imagens em Desordem. A iconografia da Guerra do Paraguai ( 1864- 1870). São Paulo:
Humanitas/ FFLCH/ USP, 2001.
121
Podemos concluir ao fim deste capítulo, que ao iniciar a guerra do Brasil
com o Paraguai, nosso País não possuía um Exército organizado capaz de en-
frentar as Forças Militares do País invasor. Assim, o governo imperial teve a ne-
cessidade de organizar e estruturar a Força Militar brasileira, aumentando o efeti-
vo, melhorando as condições do armamento e da tecnologia empregada na guer-
ra, para fazer frente aos ataques do Exército inimigo.
O Império utilizou em um primeiro momento do conflito armado, meca-
nismos que procuravam incentivar a participação voluntária da população na
guerra, seja pela criação de leis de incentivo, as quais favoreciam econômica e
socialmente os segmentos sociais do Brasil, ou pela utilização da aclamação pa-
triótica realizada junto à imprensa, utilizando poemas patrióticos, e a manipulação
da figura simbólica de Jovita Alves Feitosa e de outros voluntários que procura-
vam defender o País, a fim de desenvolver um sentimento de amor à Pátria, ca-
paz de levar fortes combatentes a lutar em defesa de seu País afrontado.
Portanto, nesse primeiro desenrolar da guerra houve uma resposta entusiás-
tica da população, que desejava defender o País do ato traiçoeiro da República do
Paraguai, mas a existência do recrutamento voluntário não inibiu o alistamento for-
çado no decorrer do conflito. Desta forma com o desenvolvimento da guerra o senti-
mento patriótico foi se esfacelando, e este recrutamento militar realizado de forma
coercitiva passou a ocorrer principalmente após um ano da guerra, em 1866, devido
as péssimas condições do Exército, a dificuldade do Império em suprir as Forças de
Linha de víveres, fardamentos, armamentos, além da duração da referida contenda
e as notícias vindas do campo de batalha sobre as mortes por doenças e por comba-
122
tes. Estes foram alguns dos fatores que desestimularam os voluntários a se apresen-
tarem à guerra.
Diante de tais circunstâncias, o governo passou a utilizar o recrutamento
coercitivo, em busca de força humana para suprir o front das batalha. Sendo as-
sim analisaremos no próximo capítulo esse Recrutamento Militar Coercitivo que
se estabeleceu no Brasil com o desenrolar da Guerra da Tríplice Aliança.
123
Fonte: Jornal Cabrião
124
3 A COERÇÃO NO RECRUTAMENTO MILITAR
Algumas vezes, as autoridades locais organizavam festas e ou-
tras reuniões populares para então, com o povo reunido, efetu-
ar o alistamento forçado, através do emprego direto da força.
Ricardo Salles
Ao ser deflagrada a Guerra do Paraguai, conforme apresentamos no capítu-
lo anterior, houve entusiasmo da população em participar deste conflito, pois ”o ata-
que paraguaio a Mato Grosso causou uma indignação no Brasil, visto como ato trai-
çoeiro e injustificável.”
137
O ataque paraguaio, sem declaração de guerra ao Brasil fez com que em to-
do o País houvesse, de início, um despertar patriótico com a apresentação de volun-
tários para combater no campo de batalha, deste modo, a Corte expediu uma ordem
dispensando os recrutadores, já que o número de voluntários era maior do que a
137
DORATIOTO, op. cit., p. 111.
125
expectativa do governo, como nos apresentou o Ministro José Egydio Gordilho em
seu relatório do ano de 1865:
Pode-se calcular em dez mil o número de cidadãos, que tem
concorrido para formar batalhões, que engrossem o nosso E-
xército em operações a vista de semelhante entusiasmo, sus-
pendeu-se o recrutamento, na Corte, e em muitos lugares, e ul-
timamente expediu-se ordem dispensando os recrutadores em
todas as províncias, porque o governo julga desnecessário co-
agir pessoas alguma para tomar parte na defesa do Império,
quando milhares de cidadãos correm espontaneamente a ofe-
recer-lhe os seus serviços.
138
Portanto, podemos compreender que não existiu apenas o recrutamento for-
çado na Guerra da Tríplice Aliança como nos apresentam diversos autores. Entre-
tanto Júlio José Chiavenato, ao se preocupar em denunciar a coerção na sociedade
brasileira no período da guerra, acaba não se remetendo ao voluntariado que existiu
de forma entusiástica e surpreendente no início do conflito do Paraguai contra o
Brasil.
Esse entusiasmo promovido pelo sentimento de amor à Pátria insuflado pelo
mecanismo de aclamações patrióticas, ou pelas Leis de incentivo à guerra que pro-
porcionavam vantagens econômicas e sociais para os voluntários, existiu de forma
intensa. Portanto, ao excluir este caráter voluntário dos soldados, Chiavenato apre-
sentou para toda uma geração de estudantes a existência apenas do recrutamento
forçado, como forma de garantir material humano para lutar no referido conflito inter-
nacional, tornando assim, a compreensão do recrutamento apenas enquanto forma
coercitiva não existindo o voluntariado.
126
Por causa desta construção similar de recrutamento igual à coerção é que,
procuramos neste capítulo, desestruturar essa ligação única do recrutamento en-
quanto ato forçado, apresentando discussões e análises sobre a existência da con-
vocação voluntária, presente na sociedade brasileira, no período da Guerra da Trí-
plice Aliança.
3.1 Evasão da sociedade a Guerra
.
A dificuldade em suprir a Força de Linha de homens com o prolongamento
da Guerra era notável em todas as Províncias, até mesmo no Rio Grande do Sul,
que sempre foi a maior mantenedora de homens à guerra em diversos conflitos no
Prata. Dessa forma, o General Manoel Luís Osório comunicou ao presidente do ga-
binete Liberal João Lustosa Paranaguá, em 1866, que havia dificuldades em se ob-
ter novos soldados no sul do País:
A demora nas reuniões de tropas nasce das circunstâncias difí-
ceis de serem vencidas de momento; muita gente estava oculta
nas matas, muitos outros tinham passado ao Estado Oriental e
é difícil reunir com presteza esses elementos dispersos; e
que falo no Estado Oriental, cabe aqui dizes a V. Exa. Que pedi
ao General Flores permissão para mandar reunir naquele País
os elementos próprios para o serviço da guerra.
139
Em 1865 foi o ano em que os rio- grandenses mais participaram com seu
efetivo na luta internacional do Paraguai, isso deveu-se pela guerra ter iniciado em
fins de 1864 e em 1865 ocorrer a ameaça da invasão paraguaia no território sul. En-
138
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra.1865, p. 11.
127
tão, a fim de defender suas fronteiras e suas cidades, que foram invadidas pelo ini-
migo em 1865, muitos cidadãos da província procuraram participar voluntariamente,
fazendo com que o Rio Grande do Sul, neste ano fosse um dos maiores mantenedo-
res de soldados à guerra.
Em 1866 após o fim das batalhas no território meridional, tornou-se nítida a
dificuldade de reunir no sul do País, homens à guerra. Sendo assim, o recrutamento
forçado passou a atuar com toda sua violência e arbitrariedade entre os sul- rio-
grandenses, assim como em todo o País.
Figura 27- Opinião pública sobre a violência e a arbitrariedades do recruta-
mento.
Fonte:
Jornal Cabrião
139
IZECKSOHN. Vitor. O Cerne da Discórdia. A Guerra do Paraguai e o Núcleo Profis-
sional do Exército Brasileiro. Rio de Janeiro: BIBLIEX, 1997, p. 108.
128
Essa dificuldade de arregimentar soldados para a guerra ocorreu devido aos
intensos combates, deserções, perda do “entusiasmo patrióticoe de elevadas bai-
xas, causadas por doenças como a disenteria que assolava principalmente os recém
recrutados vindos do norte do País, “que não se adaptavam ao clima, aos rigores do
inverno e a mudança de alimentação, quase exclusiva de carne gorda, com à qual
não estavam habituados”
140
.
Ao verificarmos a Ordem do Dia do Exército 26 de 1867, constatamos,
conforme a tabela 8, a alimentação ingerida pelos combatentes no campo de ba-
talha, podendo observar inclusive as diferenças entre a ração oferecida para a cava-
laria e para a infantaria, sendo aquela agraciada com erva e esta com café e açúcar.
Tabela.8
- Ração diária para as operações
INFANTARIA CAVALARIA
Carne Carne
Farinha Farinha
Café Sal
Açúcar Erva
Sal Fumo
Fumo
Fonte: BRASIL. Ordem do Dia do Exército, nº 26. 10/ 01/1867
Os rio- grandenses que possuíam em sua cultura o costume de tomar o chi-
marrão, que é uma bebida feita com “água fervida” e erva, nos campos de batalha
ferviam a água dos rios e ingeriam essa bebida costumeiramente, trocando-a pela
água, tornando mais difícil a contaminação desses soldados sulistas, em sua maioria
representantes da cavalaria, pelo Coléra Morbus, diferentemente dos nordestinos
140
CERQUEIRA, op. cit., p.65.
129
que ingeriam o café e a água dos rios, sendo notável a morte por Coléra, entre os
combatentes da Infantaria, onde a maior representatividade era de pessoas do norte
do país.
141
A disenteria era portanto o flagelo dos Exércitos de Campanha, que grassa-
va intensamente e fazia inúmeras timas. O Cólera Morbus também foi responsável
pela morte de inúmeros homens na guerra, tornando-se um dos piores inimigos das
Forças Militares, pois a epidemia matou até fins de 1867, cerca de quatro mil solda-
dos brasileiros, dos quais 130 eram oficiais
142
.
Conforme a tabela 9 apresentada por Tasso Fragoso, a soma das mortes
de praças e oficiais desde o início do conflito até 1870 é equivalente a 4.332 mil ho-
mens, ou seja, estatisticamente podemos concluir que a epidemia do Cólera Morbus,
foi o maior responsável por mortes nessa guerra, pois em dois anos de conflito ex-
terminou cerca de quatro mil soldados, conforme descrevemos anteriormente.
Tabela 9-
Mapa dos oficiais e praças mortos, feridos e extraviados
Oficiais Praças Soma
Mortos 366 3. 966 4. 332
Feridos 1. 280 17. 317 18. 597
Extraviados 31 957 988
Total 23.917
Fonte:. História da Guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai V. 5
141
Ordem do Dia do Exército, 1867
.
142
DORATIOTO, op. cit., p. 284.
130
Sendo assim, os jornais apresentavam ilustrações do Cólera como um gran-
de inimigo, tanto para o Exército aliado como para o Exército paraguaio. Conforme a
figura 28, em que apresenta a caricatura do Cólera Morbus representado pela
morte, e esta se disponibilizando para acabar com o conflito entre o Paraguai e o
Brasil.
Essas situações de mortandade nos campos de batalha chegavam ao Brasil
como “Notícias da Guerra” nos jornais do país, que apresentavam à população os
horrores do conflito. Dessa forma, a maioria dos supostos soldados voluntários ao
tomarem conhecimento das agruras da guerra passaram a fugir do serviço militar,
principalmente, devido à duração do conflito que se estendeu por longos e duradou-
ros anos, chegando a cinco anos de guerra.
O jornal A Sentinela do Sul demonstrou a presença dos rio- grandenses no
campo de batalha e a morte de muitos soldados proveniente das epidemias e dos
confrontos com o Exército inimigo:
No meio do leito que envolve a província do Rio Grande do Sul,
que tem 30.000 dos seus filhos em armas, por entre as laceran-
tes dores, milhares de famílias que nos longínquos campos do
Paraguai sucumbem a metralhada do inimigo ou às voragens
das epidemias existentes...
143
143
Jornal Rio Grandense de 06 de maio de 1867.
131
Figura 28- Cólera Morbus no Teatro de Guerra
Meus amigos como vocês não querem pegar-se às deveras, e estão tanto tempo amolando meio
mundo, venho disposto a ensinar- vos como se acaba com semelhante história em um instante, pon-
do mãos a obra!...É sim ou não vejam em que ficam.
Fonte:Jornal Cabrião
Muitos militares morriam de epidemias ou de ferimentos oriundos das bata-
lhas, devido às precárias condições do sistema de saúde na Guerra, pois a quanti-
dade dos médicos não era suficiente para salvar tantas vidas. Podemos constatar tal
afirmação baseado no relatório do Ministro da Guerra que explicitava a falta de mé-
dicos e enfermeiros para suprir a necessidade do confronto internacional:
O corpo de saúde não possui o número de oficiais necessá-
rio para as circunstâncias extraordinárias, em que nos achamos.
Chamados à Corte os cirurgiões militares existentes nas Províncias,
vão seguindo para o teatro da guerra, onde são indispensáveis os
seus cuidados, não porque a mudança de clima faz avultar o nú-
mero dos doentes, mas também porque em ações, que devemos es-
perar as nossas forças, e as do inimigo, deverão os feridos ser pron-
tamente socorridos.
144
144
BRASIL. Relatório do Ministério da Guerra. 1865. P. 12.
132
As condições de saúde eram portanto, extremamente precárias no teatro de
guerra, faltavam-lhes praticamente tudo, desde remédios à alimentação, pois o nú-
mero de doentes e mortos aumentava a cada momento. A respeito desta precarie-
dade nos recursos dicos do Exército brasileiro, Andrade Neves em uma carta en-
dereçada a Osório em 1866, demonstrou sua preocupação com o extermínio de mui-
tos soldados, devido a falta de recursos à guerra:
Estamos mal; estão adoecendo muitos soldados e tem morrido
alguns, e os médicos sempre gritando que não remédios.
Nossas cavalhadas estão morrendo aos montes. Tem havido
deserções. Os soldados estão muito nus e sem soldo. V. Exa.
Nos dê remédios para esses males.
145
Portanto, as doenças eram grandes vilãs do conflito. Dessa forma, Marquês
de Caxias passou a reclamar da grande quantidade de soldados portadores de do-
enças e sem condições físicas de lutar, enviados pelas províncias para o Teatro de
Guerra. Sendo assim, Marquês de Caxias em 1868, enviou uma carta ao ministro da
Guerra pedindo providências a respeito das condições dos praças enviados da Corte
para o Campo de Batalha, pois era inaceitável o envio de enfermos para o combate:
Acontecendo manifestar-se a bexiga em muitas das praças,
que aqui tem chegado fazendo do contingente por V. EX. reme-
tido, verificando-se não haverem elas sido vacinadas nas pro-
víncias de que são filhos, ou nessa Corte.
146
Dentre todas essas dificuldades enfrentadas pelos brasileiros, de acordo
com a figura nº 29, os hospitais de guerra eram ainda locais inóspitos para o cuidado
145
SODRÉ, Nelson Werneck. A História Militar do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1979.p. 126.
133
de enfermos, devido a falta de higiene que proporcionava a proliferação de bactérias
causando a morte de muitos “moribundos”. Dionísio Cerqueira, em suas reminiscên-
cias nos apresenta as precárias condições de um hospital de campanha em uma de
suas visitas neste estabelecimento:
O primeiro serviço que fiz foi : Dia ao hospital. Arranjei um ca-
valo e fui ao outro lado do Cerro ver os soldados que baixaram.
Impressionou-se o mau cheiro nauseabundo que exalava aque-
le estabelecimento sanitário improvisado. Haviam-no colocado
num saladero, onde se abatia grande número de reses e pre-
parava-se charque. Não sei porque, sempre tivemos pronunci-
ada predileção pelos lugares insalubres para quartéis e Hospi-
tais. Haja vista o Hospital Central ambos edificados em terre-
nos alagadiços”
147
Devido essas condições precárias do Exército brasileiro que não provia os
seus homens de fardamento, armamento, víveres, saúde e ao prolongamento da
guerra, tornava-se mais difícil nutrir o Front de força humana, havendo uma grande
evasão dos patrióticos Voluntários da Pátria.
146
BRASIL. Ministério da Guerra. Correspondência do Comando em Chefe. Documento
nº 40
.
147
CERQUEIRA, op.cit., p.58.
134
Figura 29- Hospital de sangue em Passo da Pátria
Fonte: Candido López
Ao analisarmos os Relatórios de Presidente de província, Ordens do Dia do
Exército e outros documentos, podemos verificar que a partir de 1866, os
requerimentos que antes eram pedidos de engajamento à guerra, passaram a ser
requerimentos de familiares ou militares solicitando a liberação dos Voluntários que
assentaram praça em 1864 e 1865. Podemos verificar essa afirmação, conforme o
seguinte requerimento de Bento Bithencourt Borges em 1866:
Diz Bento Bithencourt Borges Da Campanha do batalhão de
Infantaria, para onde foi como adido juntar-se ao serviço dos
Voluntários (em 1865) tendo abandonado sua família e
algumas plantações de que tirava sustento vem pedir algum em
seu lugar, por ser pobre, achar-se em completo abandono e
sua mulher enferma, necessitando da presença do
Suplicante.
148
148
BRASIL. Requerimentos. Ano 1866, maço 130, 28 de janeiro de 1866. AHRGS.
135
Os pedidos oficiais ao Imperador eram expedidos em grandes volumes,
principalmente por familiares que viam a possibilidade de morte aos seus “entes
queridos”, devido às notícias que chegavam dos campos de guerra. Nessas condi-
ções, a viúva Gregória Torres Nunes, enviou um requerimento pedindo a exclusão
de seu filho da guerra:
A viúva Gregória Torres Nunes, mãe de Eugênio Victoriano
Nunes, fazendeira residente no Chuí [...] tem seu filho na guer-
ra e pede que seu capataz fique em lugar de seu filho, pois
sendo viúva, fazendeira com criação de gado, plantação e es-
cravos.[...] Agora a Suplicante se na urgente necessidade
de vir à presença de V. Exa. Impetrar a justiça de isentar do
serviço seu filho.
149
Os requerimentos demonstram a evasão que em 1866 começava a ocorrer
na Campanha do Paraguai, seja por meios legais ou por deserções. De acordo com
o General Osório a fuga começou a tornar-se prática constante nos acampamentos,
pois em maio de 1867, este oficial explicitou sua preocupação sobre a deserção,
“que se tornara comum, aceita como algo lícito, enquanto aqueles que têm vertido
seu sangue pela Pátria em-se abandonados aos seus esforços reduzidos e luta-
rem sem recursos”
150
Devido às deserções foi criada em 1867 a polícia volante, que era responsá-
vel pela captura dos “fugitivos”, que aumentava com o passar dos anos. O Relatório
do Ministro da Guerra do ano de 1867 apresentou o seguinte documento sobre as
Polícias Volantes:
Representando o Sr. General barão do Herval, em ofício de 10
de fevereiro deste ano manda-se se criar em cada comando
149
BRASIL. Requerimentos. Ano 1866, maço 131, 25 de setembro de 1867. AHRGS.
150
DORATIOTO, op. Cit., p. 288.
136
superior para este ano às polícias tido volantes que, percorren-
do os respectivos distritos, apreendessem os desertores que
em grande número vagão; [...] como também para reunir os in-
divíduos não qualificados guardas nacionais, que estejam no
caso de servir no Exército e capturar criminosos; recomendan-
do-lhes que providenciassem de forma a não se darem abusos
e vexame nesse serviço.
151
Sobre as deserções que ocorreram nos campos de batalha, conforme a ta-
bela 10, Visconde de Taunay, em seu Diário do Exército do ano de 1869, nos for-
nece dados sobre esses acontecimentos de fugas nos acampamentos, revelando a
grande quantidade de desertores e a ação de captura da polícia, que conseguia re-
cuperar quase cinqüenta por cento do total desses fugitivos:
Tabela nº- 10
- Mapas de deserções, apreensões e apresentações nos me-
ses de maio e junho de 1869
151
BRASIL. Ministério da Guerra. Relatório do ano de 1867. P. 85.
137
Fonte
: Diário do Exército, 1869.
As deserções eram ocasionadas devido às péssimas condições do Exército,
que não provia os soldados de fardamento, veres e armamento, sem oferecer con-
dições respeitáveis para lutar, além da duração do conflito que se estendia por
duradouros anos. Segundo Von Kosertiz, algumas das razões do grande número de
deserções eram ocasionadas pelas péssimas acomodações nos quartéis, pelo fato
do armamento ser antiquado e o fardamento de má qualidade, não existindo ne-
nhum atrativo para alguém se alistar ou prestasse seu serviço militar ao Exército.
152
3.2 Alistamento Coercitivo
Por causa das dificuldades enfrentadas pelo Império em enviar e manter
soldados na guerra, é que o governo optou pelo recrutamento coercitivo, portanto
em janeiro de 1868, foi ordenado às autoridades locais a seguinte posição: “atuem
152
BECKER, op. cit., p. 46.
138
com todo rigor no recrutamento, na prisão de designados e na aquisição de voluntá-
rios
153
.”
Em face desta nova realidade de alistamento militar, os métodos pelos quais
os recrutadores utilizavam eram brutais e diretos, de acordo com a figura 30,
“sendo os recrutas literalmente capturados para o serviço militar, sendo a coerção e
os castigos físicos assumidamente os meios de manutenção da disciplina e da or-
dem na corporação militar”
154
Podemos afirmar então, que o recrutamento militar de
forma coercitiva passou a fazer parte do cotidiano da sociedade brasileira pois se-
gundo Paulo Queiroz Duarte, este tipo de alistamento forçado era realizado “nos
quatro cantos do País”:
Em algumas províncias as autoridades recrutadoras, delegados
de polícia e seus prepostos iam caçar o caboclo no Amazonas
e Pará, o tabaréu nordestino na caatinga, o matuto na sua ta-
pera, o caiçara no litoral, enfim, brancos, mulatos e os negros,
que depois de reunidos e contados, eram despachados em
magotes sem uma simples inspeção de saúde e sem indagar
de sua condição de chefe de família, para as capitais provinci-
ais ou mesmo para a Corte.
155
153
DORATIOTO, op. cit., p. 267.
154
SALLES, op. cit., p. 80.
155
DUARTE, op. cit., v. 1, p. 206.
139
Figura nº 30- Recrutamento forçado
Fonte: Jornal Cabrião
Ao iniciar essa “caçada humana”, os jornais que antes procuravam incentivar
patrioticamente a população a participar da guerra, passaram a denunciar ferozmen-
te as atrocidades cometidas pelos recrutadores, ao recrutar a todos os homens,
mesmo aqueles que tinham seus direitos de isenção do serviço militar, por serem
arrimos de família, ou por possuírem mais de 60 anos, ou até mesmo por serem por-
tadores de alguma deficiência física. Dessa forma, de acordo com a figura 31, o
140
jornal Cabrião de São Paulo, apresentou a imagem que delatava esse recrutamento
ilícito, ao ser alistado um homem” surdo e idiota” que não tinha mínima condição físi-
ca de participar da guerra.
Figura nº 31
- Recrutamento de um enfermo
.
Fonte: Jornal Cabrião
As notícias advindas dos jornais sobre a forma do recrutamento eram publi-
cadas diariamente em jornais de todo Brasil, que tinham como finalidade denunciar e
criticar, através de caricaturas e textos a coerção realizada junto à sociedade do Pa-
ís. Assim, podemos verificar por intermédio dos jornais Cabrião de São Paulo; Pedro
II do Ceará e O Rio Grandense, do Rio Grande do Sul diversas críticas e denúncias
em relação à forma de conscrição realizada nas referentes províncias:
141
Na era do recrutamento- 1866, acaba de apresentar-se em pa-
lácio um pobre homem, completamente idiota e honrado pela
natureza com um famoso papo, que lhe será fatal em qualquer
ataque, por que o inimigo não desprezará tão bom alvo. Na
verdade! Designar um coitado que traz o Jaraguá no pescoço,
e mal suportará o peso da arma, é mais do que injustiça, cheira
a loucura. Designem homens sãos e valentes, que possam ba-
ter-se no campo de batalha, mas não percam o tempo envian-
do idiotas, rengos e papudos. No teatro da guerra não ex-
posição de raridades, para que se faça tais remessas.
156
Jornal Cabrião- São Paulo.
Percorrem em forma de passeata atualmente as ruas desta ci-
dade, implorando a caridade pública, um grande número de ve-
lhos, cegos, aleijados, mulheres e crianças, que de diferentes
pontos da província tem vindo até aqui acompanhando os pais,
maridos e filhos únicos, que a sanha dos recrutadores tem ar-
rancado as suas famílias...
157
Jornal Pedro II- Ceará.
[...] Ao delegado da capital de Porto Alegre, sobre o menor de
nome Manoel, recrutado na freguesia. de Torres, pelo capitão
Demétrio Alves de Araújo, e ainda sobre outro menor Valério,
filho de Solidônio dos Santos Pinheiro recrutado em Caçapa-
va
158
Jornal Rio Grandense- Rio Grande do Sul
Conforme as denúncias dos jornais em diversas províncias do País podemos
constatar que a legislação não era cumprida, as Leis
159
anteriormente estabelecidas
156
Jornal Cabrião. São Paulo, 09 de dezembro de 1866, p. 3.
157
Jornal
Pedro II,
“Scenas do Recrutamento”. Ceará 07 de fevereiro de 1869.
158
Jornal Rio Grandense. Porto Alegre. 01 de janeiro de 1867 p.2.
159
O regulamento do serviço militar era composto de 18 artigos os quais atribuíam: 1º- O
serviço de alistamento de voluntários engajados, recrutas, substitutos e libertos será imcubi-
do a um oficial superior de Exército adido ao quartel general. Servirá como adjunto um
médico, que será especialmente encarregado da inspeção de saúde dos indivíduos que se
houverem alistar.[...]. proceder-se- a inspeção de saúde, finda a qual se for o indivíduo
apto para o serviço do Exército, será remetido ao ajudante general, acompanhado de uma
nota contendo os necessários esclarecimentos a seu respeito.[...]. No caso de ser o indi-
víduo julgado incapaz do serviço do exército, será logo despedidos (Ministério dos Negó-
142
para regular o Recrutamento Militar eram desrespeitadas, sendo os aleijados, doen-
tes, inaptos, menores de 18 anos e arrimos de família recrutados com todo rigor e
enviados para o campo de batalha.
Nesse contexto, a população menos abastarda era alvo incansável dos re-
crutadores, pois entre esse segmento é que se aglomerava a maior quantidade de
soldados para guerra, justamente porque não constituíam propriedade dos setores
mais influentes da sociedade imperial, recaindo sob essa parcela da sociedade a
coerção com maior rigor.
Em princípios do mês de setembro, tratou-se de formar um no-
vo Corpo no centro dos Municípios de São Borja e de Itaqui.
Muita pouca gente se achava nesta campanha apta para o ser-
viço militar; porém, pretendendo-se, a toda força, formar um
novo Corpo, os encarregados recrutaram quase todos os va-
rões que encontraram, de 10 anos para cima, aptos ou não pa-
ra o serviço, deixando ao desamparo e na desolação multidão
de famílias, que ficaram sem um só homem.
160
A partir das palavras do Cônego Gay, acima expostas, podemos constatar a
maneira vil como era realizado o recrutamento militar, no Rio Grande do Sul, não
sendo respeitados as Leis do serviço militar. Ao serem recrutados os homens das
famílias, sendo poupados apenas as mulheres, deixando-as com os encargos de
provir e manter a família, enquanto seus maridos e filhos eram carregados à força
para o campo de batalha, desorganizando a estrutura social e econômica das cida-
des.
cios da Guerra, Rio de Janeiro, 09/ 10/1867. Gabinete o Ministro João Lustosa da Cunha
Paranaguá.)
160
GAY. Op.cit., p.103.
143
Entre os alemães, a situação do recrutamento não era diferente, sendo leva-
dos do seio da família os seus chefes e suas crianças, para aumentar o Exército de
Linha, não sendo respeitada, nenhuma lei de isenção. Podemos verificar esse fato-
conforme o seguinte episódio retratado por Klaus Becker:
Três jovens, filhos únicos de viúvas, cujos requerimentos para
a dispensa do serviço militar, que lhes assegurava a lei, não fo-
ram deferidos a tempo. Três viúvas pois, ficaram durante cinco
anos na miséria porque seus únicos arrimos foram alistados,
contrariando a lei.
161
De acordo com as discussões anteriores, podemos verificar que o alistamen-
to forçado era constante no cotidiano da sociedade brasileira, permanecendo até o
fim da guerra, para suprir as Forças do Exército de contingente humano. Por inter-
médio da coerção dos Guardas Nacionais e do envio de substitutos.
No Rio Grande do Sul, eram contratados por valores estabelecidos, “voluntá-
rios” pobres, alemães ou lusitanos que vendiam seus serviços para a guerra. Con-
forme Mauro César Silveira muitos lusitanos no País, passaram a se engajar nas
tropas com o objetivo de ganhar dinheiro, que em 1866 era precário o voluntari-
ado dos brasileiros:
Em ofício ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, José Maria
do Casal Ribeiro, o cônsul interino de Portugal no Rio de Janei-
ro, Daniel da Silva Ribeiro, comunicava sua decisão de cobrar
uma taxa de 200 mil réis fortes- moeda lusitana- ou 4 contos e
40 mil réis fortes ( câmbio de 20%) para a expedição de cada
desembaraço aos cidadãos interessados em assentar praça no
Exército Imperial. O diplomata alegava que a medida devia-se
161
BECKER, op.cit., p. 26.
144
a intensa procura dos súditos portugueses dispostos a substitu-
ir membros da Guarda Nacional designados para a Campanha
do Prata, seduzidos pelas crescentes cotações do mercado-
que já superava a mil e duzentos réis.
162
Os lusitanos que viviam no Brasil, candidatavam-se a vender seus serviços
àqueles que fugiam da guerra e que podiam pagar certas quantias em dinheiro para
enviar substitutos em seus lugares. Esses portugueses
163
, mesmo prestando servi-
ços à guerra, não foram poupados do recrutamento forçado, sendo coagidos a parti-
ciparem ao lado dos brasileiros na Guerra do Paraguai. Esta coerção foi conferida
através da acusação realizada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros da Nação
Portuguesa ao Imperador que:
Cobraria o resultado da reclamação dirigido ao governo imperi-
al acerca dos súditos portugueses que foram coagidos a a-
companhar armados as forças do General Neto; e bem assim a
respeito dos súditos de Sua Majestade que fazendo parte do
Corpo Policial dessa Corte foram contra sua vontade incorpo-
rados no Exército do Sul.
164
Igualmente, o Rio Grande do Sul, enviou ao campo de batalha, conforme a
tabela nº- 11, do ano de 1867 cerca de 32.000 homens, contando com os Guardas
Nacionais, os recrutados e a tropa de linha, a qual correspondia 8% da população
da província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
162
SILVEIRA, Mauro César. Adesão Fatal. A participação portuguesa na Guerra do Pa-
raguai. Porto Alegre: EDIPUCRS. 2003. p. 209.
163
Sobre a presença dos portugueses na Guerra do Paraguai, vide: SILVEIRA, Mauro César.
Adesão Fatal. A participação portuguesa na Guerra do Paraguai.
Porto Alegre:
EDIPUCRS. 2003. E a Tese de doutorado do mesmo autor, defendida na Pontifícia Univer-
sidade Católica do Rio Grande do Sul em março de 2001.
164
Idem, p,212.
145
Tabela- 11- Contingente enviado à Guerra do Paraguai da Província do Rio
Grande do Sul
1864 2.418 Guardas Nacionais
1865 19.287 Guardas Nacionais
1686 1.000 Recrutados
1867 4.000 Recrutados
Total 26.705
Fonte: Jornal Rio- Grandense
Os fortunados, mesmo tendo a seu favor a Lei da substituição ou a possibili-
dade de doação, também sofreram dificuldades provindas do recrutamento, pagando
seu tributo à guerra ao enviar sua mão- de- obra escrava ou livre para engrossarem
as fileiras do Exército, acarretando complicações econômicas para esse segmento
social, conforme abordamos no capítulo anterior.
Os agentes recrutadores lucravam 4$000 por indivíduo que recrutassem,
mas depois, deu-se-lhes uma gratificação fixa de 40$000 mensais, mas estes agen-
tes precisavam garantir as cotas mínimas das províncias
165
, pois quem não preen-
chesse suas cotas poderia ser exonerado do cargo ou da patente adquirida, perden-
do assim, o prestígio social que o título honorífico representava na sociedade oito-
centista. Todavia, o recrutamento coercitivo era lançado desordenadamente sob a
população, como bem aponta o general Paulo Queiroz Duarte em sua publicação:
Os Voluntários da Pátria na Guerra do Paraguai:
O recrutamento em alguns municípios e mesmo na capital ex-
cedeu em muito o limite do razoável, em termos de humanida-
de, gerando justas reclamações da imprensa local, pois alguns
contingentes, apanhados no interior, chegaram acorrentados à
capital da província. O povo, que assistia ao deprimente espe-
táculo, chamava a esses grupamentos humanos de bandos”,
165
SODRÉ, op.cit., p. 135.
146
e a confraria do Carmo, apiedada, se prestou a abrigar em seu
convento os pobres escolhidos, mitigando-lhes o sofrimento.”
166
Os agentes recrutadores alistavam arbitrariamente qualquer indivíduo que
estivesse ao seu alcance, mesmo os escravos do meio urbano que trabalhavam na
rua para seus patrões. Podemos nos reportar a esta afirmação conforme o seguinte
documento:
Tendo o pardo Herculano, escravo do desembargador Francis-
co Joaquim Gomes Ribeiro, feito as declarações constantes do
termo junto, das quais se depreende Ter sido na tarde de 23 do
mês corrente recrutado por duas praças do Corpo Policial, que
o conduziram na direção do Quartel dos Borbonos, sendo solto
na esquina da dita rua por Ter aparecido um cabo que disse
conhecê-lo como escravo, deliberei mandar apresentar o dito
pardo à V. EX. para dar quaisquer esclarecimentos que julgue
ainda necessários para esclarecer a verdade, fazendo-o retirar
logo depois para casa de seu senhor.
167
Portanto, sendo o recrutamento realizado indevidamente muito cidadãos
procuravam artimanhas para fugir dessa “caçada humana”, enquanto os abastados
tinham ao seu lado a Lei da substituição e a possibilidade de doação de donativos à
guerra, a população pobre do norte e nordeste fugia para o sertão, embrenhando-se
nas matas até escapar dos recrutadores, e os pobres do sul do País fugiam para o
Uruguai, a fim de conseguirem a isenção do serviço militar.
Além da fuga para as matas e para o Uruguai muitos alistavam seus sobri-
nhos e filhos, ou casavam-se com mulheres mais velhas para alegar isenção do ser-
viço militar por serem arrimos de família, pois “no Brasil, os homens solteiros e que
166
DUARTE, op.cit., v 1, p. 245.
147
não fossem arrimos de família eram os primeiros a serem convocados para guer-
ra.”
168
Podemos visualizar a seguinte imagem 32, que retrata essa forma de fuga
dos cidadãos.
Figura 32
- O casamento
Inspetor de quarteirão
: Se não quer ir para S. Paulo assentar praça, hade casar com
minha tia.
Recruta:
Só se Vmc. Me der um mez para pensar.
Fonte:. Maldita Guerra: Nova história da Guerra do Paraguai
O recrutamento era utilizado também como arma política contra os inimigos,
pois se recrutava por vingança política e pessoal. Esse recrutamento tomou feitos de
caçada humana pois, “as autoridades subalternas se aproveitavam, muitas vezes, da
167
Ofício do Secretário de Polícia ao Comandante do Corpo Militar de Polícia, apud:
CUNHA, Marco Antônio Cunha. A Chama da Nacionalidade. Ecos da Guerra do Para-
guai. Rio de Janeiro: BIBLIEX, 200. p.37.
168
DORATIOTO, op.cit.,p. 266.
148
oportunidade para satisfazerem os seus ódios particulares, e desejo de vingança e
cobiça, lesando a lei.”
169
Os responsáveis pelo alistamento militar caçavam seus adversários políticos
no período de eleições, contrariando o Art. 108 da Lei de 19 de agosto de 1846, que
proibia o recrutamento 60 dias antes da eleição primária e 30 dias depois. Este alis-
tamento realizado no período eleitoral buscava diminuir a força do opositor político e
ainda destituir dos postos de comando no teatro da Guerra àqueles ligado ao partido
político contrário.
Podemos verificar essa perseguição política devido à notícia do jornal cario-
ca Diário do Povo, que apresentou o uso do poder do recrutador para enfraquecer
seu adversário político:
Em Capivari, o líder conservador, Francisco Fernando de Bar-
ros, foi nomeado chefe de polícia e tomou posse em 31 de a-
gosto. Para anular o prestígio eleitoral do padre Fabiano José
Pereira de Camargo, líder liberal, Barros saía de madrugada,
acompanhado do destacamento policial e corria atropelada-
mente a cidade, varejando domicílios e prendendo os liberais
que encontrava para remetê-los como “ Voluntários da Pátria” à
capital da província.”
170
Sendo o alistamento realizado de forma arbitrária e coercitiva, em 1866 o
Ministro da Guerra apresentou a proposta de modernização do sistema de recruta-
mento, que ele considerava violento e defeituoso, sendo necessário confeccionar
169
SODRÉ, op.cit.,p. 130.
170
Jornal Diário do Povo apud, DORATIOTO, Francisco Fernando Monteoliva. Maldita
Guerra: Nova história da Guerra do Paraguai. São Paulo: Companhia das Letras, 2002 p.
267.
149
uma nova Lei de Recrutamento conforme as circunstâncias do período coibindo os
abusos prestados sob a população do País:
A nossa lei de recrutamento defeituosa, como todos reconhe-
cem subsiste, e a sua revogação depende de estudo e conhe-
cimentos práticos para ser ela devidamente substituída.
Vós tendes a peito dotar o Pais com boa lei de recrutamento, e
por isso que o tributo de sangue é o mais precioso, marchais
com prudência colhendo as informações, que vos habilitem a
confeccionar uma lei conforme as nossas circunstâncias. Se a
lei, que temos não corresponde aos nossos desejos, não deixa
o governo de sua parte coibir os abusos, que aparecem na sua
execução.
171
Por intermédio deste capítulo buscamos analisar como o recrutamento for-
çado foi realizado junto à sociedade brasileira, enfatizando o Rio Grande do Sul, por
ser esta província a maior mantenedora de homens ao conflito internacional e por
ser seu território o palco desta guerra. Sendo assim, podemos observar que diferen-
te das outras províncias, o Rio Grande do Sul possuía diferentes segmentos sociais
como os alemães e os lusitanos que fizeram parte das fileiras recrutadas para o E-
xército.
Contudo, podemos observar as diferentes maneiras que o alistamento coer-
citivo foi empregado, seja para nutrir a Força de Linha, seja para descontar desa-
venças políticas e particulares, ou para manter as regalias dos recrutadores e dos
presidentes de províncias, que ganhavam dinheiro e títulos nobiliárquicos, conforme
o maior número de soldados enviados aos campos de batalha.
171
BRASIL. Ministério da Guerra. Relatório do ano de 1866.
150
Buscamos ainda, ressaltar as irregularidades cometidas pelos agentes recru-
tadores, ao realizarem sua função, desrespeitando a Lei de alistamento que segura-
va isenção aos arrimos de família, menores de 18 anos, maiores de 60 anos, defici-
entes e doentes, sendo realizada uma verdadeira “caçada humana”, junto à popula-
ção do País.
151
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Guerra do Paraguai foi o maior conflito bélico da América Latina, que envol-
veu o Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. Esta Guerra possui uma vasta biblio-
grafia que apresenta diversificadas análises, porém a especificidade do tema alis-
tamento militar foi pouco explorada pela historiografia brasileira, em que as princi-
pais relevâncias destinam-se ao estudo da complexidade bélica, econômica e políti-
ca do referido conflito internacional.
Dessa forma a presente dissertação procurou analisar a convocação militar no
período da Guerra da Tríplice Aliança, enfatizando os mecanismos que incentivaram
a participação voluntária da população à guerra supracitada e os instrumentos coer-
citivos que passaram a ocorrer com o prolongamento deste conflito.
Para analisarmos o recrutamento militar foi necessário realizarmos uma pes-
quisa sobre o contexto político, econômico e social da região platina, onde ocorreu a
ebulição das causas da Guerra do Paraguai. Conforme este estudo podemos com-
preender que as relações fronteiriças estabelecidas entre a Província do Rio Grande
do Sul e a República Oriental do Uruguai foram o estopim deste conflito internacio-
152
nal, que os problemas diplomáticos entre estes dois países foram resolvidos pela
ação militar, com a invasão ao Uruguai pelo Império brasileiro, sendo esta a última
alternativa do governo do Brasil. Devido a essa invasão bélica à República Oriental,
o Paraguai que era aliado desse País, percebeu neste confronto sua grande possibi-
lidade em declarar guerra ao Brasil, desse modo, aprisionou o navio brasileiro Mar-
quês de Olinda e partiu em ofensiva militar às Províncias do Mato Grosso e do Rio
Grande do Sul, onde no princípio obteve êxito, devido à desorganização militar do
Brasil.
O Brasil, ao ser deflagrada a Guerra com o Paraguai, não possuía um Exér-
cito organizado, capaz de lutar contra a Força regular do inimigo, faltava-lhes arma-
mento, víveres, fardamento e efetivo humano para condensar a verdadeira forma
que um Exército regular deveria obter para ser capaz de combater em frentes de
batalhas.
Nesse sentido é que o governo passou a ter necessidade em formar e forta-
lecer o Exército brasileiro, que antes era relegado a segundo plano na sociedade
oitocentista, já que em grande parte da força terrestre, responsável em manter a paz
e defender as fronteiras era organizada pela Guarda Nacional, poucos oficiais e sol-
dados do Exército, que não foram capazes de conter as forças inimigas do Paraguai.
Seguindo essa perspectiva o Império ansiava pela organização de contin-
gente para enviar ao campo de batalha, a fim de defender as fronteiras do Brasil.
Sendo assim, o governo utilizou em um primeiro momento, mecanismos de incentivo
a participação do povo na guerra, como a criação da Lei dos Voluntários da Pátria
153
que favoreciam econômico e socialmente os segmentos pobres, livres, abastados e
escravos presentes no Brasil.
Podemos ainda ressaltar outra estratégia utilizada pelo governo imperial
que foi a aclamação patriótica, a qual primou pela utilização de poemas, hinos, ban-
deiras, construção e manipulação de figuras simbólicas como a cearense Jovita Al-
ves Feitosa e o Imperador voluntário 1, que demonstravam sentimento de amor à
Pátria, estando assim prontos a defenderem seu País contra a invasão dos “bárba-
ros” paraguaios.
Esses instrumentos patrióticos causaram uma resposta entusiástica da
população, que se apresentou, no início da Guerra, para defender seu País do ato
traiçoeiro de pirataria” cometido pelo Paraguai, portanto podemos atestar que o vo-
luntariado fez parte do cotidiano do povo brasileiro no desencadear da Guerra da
Tríplice Aliança, desmontando assim teorias sobre a existência quase exclusiva da
coerção no alistamento militar para o Exército brasileiro no período compreendido
entre 1864 a 1870.
Ao afirmarmos o voluntariado na Guerra do Paraguai, não podemos excluir a
presença da coerção praticada junto à sociedade brasileira, pois com o desenrolar
desse conflito e seu prosseguimento duradouro, o entusiasmo patriótico reduziu-se e
o governo passou a utilizar o recrutamento forçado, para suprir a força humana nos
campos de batalha, os quais recebiam inúmeras baixas devido aos conflitos bélicos,
as epidemias e doenças que permeavam diariamente a vida dos soldados no front .
154
Ao analisarmos o evento da Guerra do Paraguai, não podemos deixar de
explicitar a importância deste fato histórico enquanto construtor da identidade nacio-
nal do Brasil, que este conflito propiciou o encontro de diferentes pessoas, com
suas culturas específicas e diferentes, no campo de batalha, lutando em prol de um
bem comum, a “nação” brasileira.
Ao finalizarmos esta dissertação, compreendemos que a mesma funciona
como um “tronco” no qual surgem inúmeras ramificações de questionamentos histó-
ricos sobre o tema proposto: O recrutamento militar na Guerra do Paraguai, que pre-
tendemos elucidar nas próximas pesquisas.
155
ARQUIVOS E MUSEUS PESQUISADOS
Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul- RS
Autoridades Militares 1864- 1867
Assuntos Militares. Arsenal de Guerra, 1864- 1870
Diversos, 1864- 1866
Ordens do Dia do Exército, 1864- 1870
Pasta Justiça, 1864-1865
Requerimentos, 1864- 1870
Relatório de Presidente do Província do Rio Grande do Sul, 1864- 1870
Colégio Militar de Porto Alegre- RS
Coleção de Leis Imperiais, 1864- 1870;
Decisões do Governo Imperial, 1864- 1870.
Arquivo Nacional- RJ
Coleção Polidoro da Fonseca Quintilha Jordão
Fundo Ministro da Guerra.
156
Arquivo Histórico do Exército- RJ
Manuscritos, 1865- 1868.
Instituto de Estudos Brasileiros- SP
Manuscritos de 1869, ou resumo histórico das operações militares comandadas por
Caxias ( Tib a 37)
Papeles de Lopez el Tirano pintado por si mesmo y sus publicacions, 1871, (Tib a
40)
Prejuízos aos particulares pelas invasões paraguaias em Mato Grosso e Rio Grande
do Sul, ( Tib 2- a 41)
AMERLAN, Albert. Bosquejos de la Guerra del Paraguay, ( Tib d 23)
BEVERINA, Juan. La Guerra del Paraguay, ( Tib e 1-7)
Manuscrito. Diário relativo a Guerra do Paraguai de 15 de março a 23 de junho de
1866, ( 4- a 48)
Biblioteca de Rio Grande- RS
Coleção José Arthur Montenegro
Documentos,
Obras biblioagráficas,
Retratos.
157
REVISTAS E PERIÓDICOS
Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa- RS
1. A Reforma. Porto Alegre, 1869- 1870
2. O Comercial. Rio Grande, 1862 e 1865
3. O Correio do Sul. Porto Alegre, 1868
4. Actualidade . Porto Alegre, 1866- 1867
5. Diário de Rio Grande, 1869- 1870
6. A Estrela do Sul, 1866 –1869
7. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, agosto 1867
8. Rio Grandense - Rio Grande- 1866-1867
9. Semana Ilustrada. 1865- 1866
10. A Sentinela do Sul - Porto Alegre, 1867-1868
11. O Cruzeiro do Sul- 1865
Biblioteca Nacional
1- Bazar Volante, Rio de Janeiro, 1864-1867
2- Diário do Povo, Rio de Janeiro, 1864- 1870
158
3- Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 1864- 1866;
4- Revista Americana, Rio de Janeiro, 1909- 1901;
5- Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro:
1870, v 32;
1872, v 45, n 35;
1896, v 59;
1914, v 5, tomo especial;
1960, v48;
1961, v 251;
1962, v 255,
Arquivo Nacional
1- Cabrião, São Paulo, 1866- 1867
2- La Nacion, Argentina, 1869
3- El Pueblo, 1866
4- Diário Oficial do Império do Brasil, 1867- 1868
5- Correio Oficial, Rio de Janeiro, 1865
159
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ARIÈS, Philippe.
A História das Mentalidades
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Martins Fontes, 2001.
BANDEIRA, L. Moniz.
O Expansionismo brasileiro e a formação dos Estados na
Bacia do Prata- Argentina, Uruguai e Paraguai: da colonização a Guerra da
Tríplice Aliança. São Paulo: Brasília, DF: Editora da Universidade de Brasília,
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