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A maior parte da historiografia sobre a história dos negros no país discute sobre o caráter
brando ou cruel da escravidão no Brasil. A partir dos estudos de Gilberto Freyre
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o eixo
fundamental do debate foi determinar se a escravidão teria sido boa ou má, em virtude dos
aspectos da violência, coisificação, patriarcalismo e paternalismo nas relações entre senhores e
escravos. Procuramos analisar os discursos das obras de historiadores da conhecida Escola de São
Paulo, como Fernando Henrique Cardoso, Octávio Ianni, entre outros, que procuraram
desmistificar a abordagem de senhores benevolentes, cativos submissos, fiéis, sem manifestações
de rebeldia, tratados severamente para evitar o vício e a indolência que lhes seriam “naturais”.
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Em seguida estudamos outro grupo de historiadores, como por exemplo, Silvia Lara,
Sidnei Chalhoub, Célia Marinho de Azevedo, Keila Grinberg, que passaram a analisar estes
críticos da “benevolência e da suavidade” da escravidão questionando a sua imagem real como
bárbara e cruel, onde a própria violência constituiu
-se na força central de manutenção da ordem
e
do controle social que acabava também contribuindo para silenciar as ações autônomas dos
africanos e afrodescendentes.
18
Maria Helena Machado e muitos dos historiadores sociais dos anos 1980 e 1990
19
não
negam o conteúdo violento daquelas relações sociais. Para ela se constituíra uma sociedade
desigual na qual uma camada detinha o poder de expropriar não só os frutos do trabalho, mas
também, a pessoa do próprio produtor. A autora cita também que não se pode negar a presença de
uma “pedagogia da violência” nessas relações entre senhores e cativos; igualmente, não podem
ser subestimados os laços que davam coesão aos membros daquela “comunidade”.
20
Assim, a
16
FREYRE, Gilberto.
Casa
-grande &
Senzala
. 45º Edição. Rio de Janeiro: Editora Record, 2001. FREYRE,
Gilberto.
Sobrados e mucambos : decadência do patriarcado e desenvolvimento do urbano. 14. ed. rev. São
Paulo: Global, 2003.
17
CARDOSO, Fernando Henrique e IANNI, Octavio. Cor e Mobilidade Social em Florianópolis (aspectos das
relações entre negros e brancos numa comunidade do Brasil Meridional). São Paulo: Companhia Editora
Nacional. v. 307, 1960. (Coleção Brasiliana). CARDOSO, Fernando Henrique. Negros em Florianópolis: relações
sociais e
econômicas
. Florianópolis: Insular, 2000. CARDOSO, Fernando Henrique. Capitalismo e Escravidão no
Brasil Meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.
18
AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Onda Negra Medo Branco: o negro no imaginário das elites – século
XIX
. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1987. GRINBERG, Keila.Liberata: a Lei da ambigüidade: as ações de
liberdade da corte de apelação do Rio de Janeiro, no século XIX. Rio de Janeiro: Relume-Dumara, 1994
.
CHALOUB, Sidney. Visões de Liberdade: Uma História das últimas décadas da Escravidão na Corte. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990. LARA, Silvia Hunold. Campos de Violência: escravos e senhores na
Capitania do Rio de Janeiro, 1750/1808
. Rio de Janeiro
: Paz e Terra, 1988.
19
Ver também: FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano: A Criminalidade em São Paulo (1880-
1924)
. 2 ed. São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001.
20
MACHADO, Maria Helena Pereira Toledo. Crime e Escravidão: Trabalho, luta e resistência nas lavouras
paulistas (1830-
1888)
. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987.p. 17. Vale lembrar que como anotou Lilia Schwarcz