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É pois o meu intento, senhor, representar a V. Sª. o sadio do Pará, é
pelo seu bom temperamento, de que não se pode fazer pouco caso,
como também de sua fertilidade, porque em seus campos se colhem
açucares e tabacos e se acha cacau, baunilha, axiote, cravo de casca
e também o da Índia, canela, pimenta, noz moscada, muita quantidade
de arroz, curiosas madeiras, anil, alguns gêneros de tintas e entre elas
a tão célebre coxonilha e não de menos estimação a abundância de
algodão que o País produz. Gêneros são estes, Senhor, de que as
nações estrangeiras fazem muito caso, e nós devemos fazer muito
mais, porque com drogas de tanta estimação teremos o Reino
abastecido no que a mercancia tira interesses, e a navegação aumento
de que resulta ao Príncipe poder e ao reino riquezas, e com uma e
outra coisa, seremos temidos e respeitados
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A terra é elogiada no que ela tem de abundante e pronto a ser usufruído
lucrativamente para tornar o reino poderoso e rico e, por conseqüência, temido
e respeitado perante outras nações européias. A este respeito, vale notar o que
diz Sérgio Buarque de Holanda, sobre o pragmatismo dos portugueses em
relação aos motivos edênicos de suas colônias. Em seu Visão do
Paraíso(1959), Sérgio observa que os lusos foram prisioneiros de um “realismo
pedestre”, alcançaram um certo desencanto com as fantasias do paraíso, por já
serem experimentados na prática da conquista de colônias, na África e, nas
conquistas, no próprio Oriente. Quando nos relatos, elogiavam a natureza, a
fertilidade e potencialidade das terras, o faziam a partir de concepção utilitarista
e pragmática, sem fantasias
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. Concebiam um tipo de colonização, acima de
tudo predatória, e o que viam, no Brasil, era uma vasta área pronta à
exploração.
No período imperial, conforme a ata do governo da Província do Ceará,
de 1826, demonstram-se as vantagens de se dispersar os índios que ainda
viviam em aldeamentos:
Quando pois se mande que os índios se dispersem das suas Aldeias, e
vivam aonde muito quiserem, parece-nos que suas datas e sesmarias
devem passar ao domínio direto das Câmaras respectivas para aforá-
las a quem quiser ser útil à Província pela sua cultura; não ficando
deste modo incultas, como tem sucedido no poder dos índios, que nem
264
- Documento da Coleção Studart. Parecer sobre se aumentar o estado do Maranhão,
fazendo-se assento para negros de cabo verde, s/data. In: Revista do Instituto do
Ceará - RIC, 1910, p. 321.
265
- Ver VAINFAS, Ronaldo. Sérgio Buarque de Holanda: historiador das representações
mentais. In: CÂNDIDO, Antonio(Org.). Sérgio Buarque de Holanda e o Brasil. São
Paulo: Editora Fundação Perceu Abramo, 1998, p. 49-57. Vainfas analisa aspectos do
utilitarismo e pragmatismo dos portugueses presentes no livro "Visão do Paraíso", de
Sérgio Buarque.