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pra comprar madeira, porque da encomenda sai o dinheiro pra comprar madeira,
pra fazer a encomenda da pessoa. Ele disse:“pois faça dois pilões pra mim”. Digo
faço, o senhor tem dinheiro pra comprar a madeira, o material? “Tem onde
vender?”.Tem. “Pois eu vou deixar dinheiro pra você comprar duas toras de pau,
pra fazer dois pilões de metro”. Eu comprei. Quando é que o senhor vem olhar?
“Quando é que eu venho? Digo: venha daqui a três dias que dá pro senhor olhar,
se não tiver feito, eles estarão ao menos enformado.
Aí com 3 dias ele veio, já tava enformado, feito boca, feito cintura, ele olhou e
disse: “e aqui o que é que vai ter mais?” Eu disse: só é limpeza, que ele está só
enformado, só é fazer a limpeza, lixar, dá polimento, limpar o cavaco pra não ficar
ninguém pegando em cavaco. “Venho amanhã?” Digo: venha.
Aí ele veio e disse: “agora eu quero meia dúzia, é muito bonito”, ele disse. Eu digo:
não, é bem feito. Ele disse: “eu tô gostando, que é pr`eu levar pro Riiio (ênfase
nessa palavra), de Janeiro, que eu moro lá”. O nome dele é Antonio Machado, ele
era vereador. Aí eu fiz os pilões, eu lixei, quando ele chegou tava tudo polidinho,
ele disse: “quero seis pilões agora”. Aí quando veio tava mais bonito que os outros.
Ele disse: “tá mais melhor que aqueles ali, agora eu vou querer é...”
Quantos foi Ciça, que ele mandou fazer, de tonelada? “120 mão, 120 pilão, pra
interar com aqueles que já tava feito” (palavras de Cícera, sua esposa).“Você vai
fazer uma carrada agora de pilão”, ele disse. Tem dinheiro, se o senhor tem
dinheiro, eu vou fazer o tanto que o senhor quiser.
Nesse tempo eu trabalhava sozinho, esse menino aí (Cícero) não tava trabalhando
mais eu ainda não. Aí eu fiz os 120 pilão dele, porque eu tava já vendo a chegada
do trato dele levar e não dar certo, porque não ia dar. Me disseram que aquilo era
serviço de doido, “você só trabalha porque você é doido, você não tem juízo não”.
Eu digo eu não sou doido não, eu tenho é precisão de dinheiro, precisão de
ganhar. Depois passei a fazer gamela mais dois filhos meus, Assis e Francisco.
No campo da encomenda reside, também, inúmeras possibilidades de
atitudes. Como disse Michel de Certeau, “a arte de dar um golpe é o senso da
ocasião”.
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A malícia e a astúcia deslizam nessa narrativa recheada de discretos
risos do artista e escancaradas gargalhadas de Cícera, que não se conteve ao
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DE CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano – as artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 2000. p 101.