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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
INSTITUTO DE ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES
MESTRADO
ESTUDOS SOBRE EXPOGRAFIA
QUATRO EXPOSIÇÕES PAULISTAS DO SÉCULO XX
Maria Violeta Polo
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Artes do Instituto de
Artes da Universidade Estadual Paulista como exigência parcial para obtenção do
título de Mestre em Artes, sob orientação do Prof. Dr. Percival Tirapeli e com bolsa
FAPESP.
São Paulo 2006
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POLO, Maria Violeta
Estudos sobre expografia:
quatro exposições paulistanas do
século XX / Maria Violeta Polo.
326 f.
Dissertação (Mestrado em Artes) Universidade Es
tadual
Paulista. Instituto de Artes / Fundação de Ámparo a Pesquisa do
Estado de São Paulo.
São Paulo, 2006.
Área de concentração: Artes
Orientador: Percival Tirapeli
1. expografia 2. exposição de arte 3. história da arte
Agradecimentos
Primeiramente, gostaria de agradecer a todos aqueles que tornaram
possível esta pesquisa.
Foram muitas as instituições e fundações que abriram seus arquivos
permitindo-me consultá-los, e foram muitos os colegas que em algum momento,
num simples comentário, ou relatando-me alguma experiência vivida mediante as
exposições pesquisadas, me sinalizaram caminhos para dar continuidade a esta
investigação. O simples enumerar de nomes não pode representar o tamanho de
minha gratidão. Atuando nesta área, como pesquisadora e artista provavelmente
encontraremos-nos novamente em próximas ocasiões, assim desejo que num
sistema de contribuição mutua possamos crescer juntos enriquecendo as bases
artísticas da prosperidade.
Agradeço a todos os funcionários, artistas e intelectuais do Instituto de
Artes da UNESP que estiveram ao meu lado, proporcionando-me amizade, durante
todo este percurso que se iniciou na graduação.
Sou grata também às associações e universidades que promoveram
congressos dos quais participei e tanto contribuíram para o amadurecimento deste
trabalho: ANPAP (UNB e UFG), UNESP, UFRJ, USP, AUGM, UNIMARCO e
EMBAP. Às instituições, fundações, museus e bibliotecas que me proporcionaram
acesso a materiais essenciais para o desenvolvimento desta pesquisa e aos
funcionários de cada uma delas pela atenção: Arquivo do Estado, Arquivo do
MASP, Arquivo da Biblioteca Mário de Andrade, Arquivo do IPHAN, Arquivo do
Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, IEB, Arquivo Histórico Wanda Svevo, Arquivo do
Museu Lasar Segall, Hemeroteca do CCSP, Instituto Itaú Cultural, Arquivo de
Carlos Warchavchik além das bibliotecas da ECA e FAU-USP e da própria UNESP.
Para concluir gostaria de fazer um agradecimento especial à minha família
e amigos por me apoiarem e me acompanharem em momentos de dificuldade. E
em especial ao Leandro que tem estado o tempo todo ao meu lado me auxiliando e
incentivando permanentemente e ao Heitor Coradini pela paciência e brilhante
revisão ortográfica.
Não poderia deixar de agradecer à FAPESP, por ter me contemplado
novamente com uma bolsa de amparo a pesquisa, sem a qual teria dificuldades
para me dedicar a esta dissertação.
Resumo
Esta dissertação de mestrado consiste em um estudo sobre expografia, no
qual enfocaram-se quatro exposições realizadas em São Paulo durante o século
XX, as quais apresentaram propostas expográficas inéditas.
As exposições foram selecionadas a partir dos seguintes critérios: tipos
diferentes de expografia, proposta inédita contribuindo para o rompimento de
padrões da época e grande repercussão, inclusive internacional. Através desses
critérios selecionou-se a Exposição de uma casa modernista (1930), com projeto de
Gregori Warchavchik, a Pinacoteca do Museu de Arte de São Paulo (1967-97), com
autoria de Lina Bo Bardi (1957), a Grande tela da XVIII Bienal Internacional de São
Paulo (1985), com curadoria de Sheila Leirner e Arte barroca, na Mostra do
Redescobrimento (2000), com curadoria de Myrian Ribeiro de Andrade Oliveira e
cenografia de Bia Lessa.
A dissertação partiu de um panorama geral da história da expografia e
conceitos com os quais se relaciona. Ao longo do trabalho, foram apresentados da
maneira mais detalhada possível aspectos históricos, técnicos e conceituais de
cada um dos casos, procurando-se, posteriormente, estabelecer um confronto entre
diferentes opiniões publicadas sobre essas expografias em suas respectivas
épocas.
Com este trabalho, espera-se haver contribuído para uma melhor
compreensão sobre o papel da expografia nas exposições de arte a partir desses
exemplos realizados na cidade de São Paulo.
Palavras-chave: expografia, exposição de arte, história da arte.
Resumen
Esta disertación de maestría consiste en un estudio sobre expografía, en el
cual se enfocaron cuatro exposiciones realizadas en San Pablo durante el siglo XX,
las cuales presentaron propuestas expográficas inéditas.
Las exposiciones fueron seleccionadas a partir de los siguientes criterios:
tipos diferentes de expografía, propuesta inédita, contribuyendo para el rompimiento
de padrones de la época y gran repercusión, inclusive internacional.
A través de esos criterios, se seleccionó: la Exposición de una casa
modernista (1930), con proyecto de Gregori Warchavchik, la Pinacoteca del Museo
de Arte de San Pablo (1967-97), con autoría de Lina Bo Bardi (1957), la Gran Tela
da XVIII Bienal Internacional de San Pablo (1985), con curadoría de Sheila Leirner
y el Arte barroca, en la Muestra del Redescubrimiento (2000), con curadoría de
Myrian Ribeiro de Andrade Oliveira y escenografía de Bia Lessa.
La disertación partió de un panorama general de la historia de la expografía
y conceptos con los cuales se relaciona. A lo largo del trabajo fueron presentados,
de la manera más detallada posible, aspectos históricos, técnicos y conceptuales de
cada uno de los casos procurándose, posteriormente, establecer un confronto entre
diferentes opiniones publicadas sobre esas expografías en sus respectivas épocas.
Con este trabajo se espera haber contribuido para una mejor comprensión
del papel de la expografía en las exposiciones de arte, a partir de esos ejemplos
realizados en la ciudad de San Pablo.
Palabras-llave: expografía, exposición de arte, historia del arte.
Índice
Introdução ............................................................................................................. 06
I. Capítulo Breve histórico sobre expografia e definição de conceitos básicos
15
1 - Surgimento do museu na Antiguidade....................................................... 17
2 - Dos gabinetes de curiosidades aos museus públicos................................ 20
3 - Desenvolvimento da expografia moderna.................................................. 23
4 - Museu-fórum.............................................................................................. 34
5 - Era dos curadores...................................................................................... 37
7 - Tendências atuais...................................................................................... 41
II. Capítulo Exposição de uma casa modernista (1930) 48
1 - Precedentes............................................................................................... 50
2 - Gregori Warchavchik e concepção do projeto da expografia.................... 73
3 - Estudo da expografia................................................................................. 94
4 - A repercussão dessa expografia............................................................... 106
III. Capítulo Pinacoteca do Museu de Arte de São Paulo (1968-97) 118
1) Precedentes................................................................................................ 120
2) Lina Bo Bardi e concepção do projeto da expografia................................. 137
3) Estudo da expografia.................................................................................. 154
4) A repercussão dessa expografia................................................................ 166
IV. Capítulo A Grande tela, XVIII Bienal Internacional de São Paulo (1985) 179
1) Precedentes................................................................................................ 181
2) Sheila Leirner e concepção do projeto da expografia................................. 201
3) Estudo da expografia.................................................................................. 218
4) A repercussão dessa expografia................................................................. 235
Apêndice Arte barroca, Mostra do Redescobrimento (2000) 253
1) Precedentes................................................................................................ 255
2) Bia Lessa e concepção do projeto da expografia .......................................
260
3) Estudo da expografia ..................................................................................
263
4) A repercussão dessa expografia ................................................................ 277
Considerações finais ................................................................................................. 286
Bibliografia ................................................................................................................. 295
INTRODUÇÃO
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
7
Esta dissertação de mestrado consiste em um estudo sobre expografia. A
partir de um panorama geral da história da expografia, realiza-se a análise de
quatro casos pontuando aspectos históricos, técnicos e conceituais, procurando-
se, posteriormente, estabelecer um confronto entre diferentes opiniões publicadas
sobre essas expografias em suas respectivas épocas.
O objetivo da dissertação é compreender o papel da expografia nas
exposições de arte. O plano inicial deste trabalho visava a uma reconstituição
espacial das exposições selecionadas, a partir da reunião de plantas, registros
fotográficos, filmagens e informações de textos de catálogos, livros, revistas e
jornais.
Conforme o material foi sendo coletado, outras relações foram
estabelecidas facilitando a compreensão das expografias selecionadas.
Considerou-se, ao longo da pesquisa, que a maneira com que a obra é
apresentada influi na recepção e conseqüentemente nas possibilidades de
fruição, compreensão e interpretações do observador, sobre a obra em questão.
Entendeu-se, porém, que a expografia não pode ser analisada isoladamente.
Considerou-se, então, que as características espaciais da expografia, que por
sua vez explora diversos recursos de comunicação visual e sensorial , exercem
uma interferência que condiciona as possíveis leituras da obra, mas que, em
momento algum, deve-se excluir da análise o projeto da concepção curatorial a
partir do qual a expografia é conceituada.
Desta maneira, o projeto inicial de pesquisa, que pretendia analisar
algumas expografias a partir de teorias de percepção visual, modificou-se
gradativamente. Passou-se assim a enfatizar mais o projeto curatorial no qual a
expografia estava inserida. Para melhor compreensão dessas propostas,
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
8
consideraram-se as referências biográficas de cada autor e a contextualização
histórica, as quais, reunidas, estabeleceram características fundamentais
presentes na concepção de cada expografia.
Ao elaborar o projeto, fez-se a opção por exposições ocorridas dentro do
circuito paulistano de arte uma vez que a pesquisa está sendo realizada em São
Paulo o que amenizou problemas de acesso às fontes. Fez-se também a opção
por exposições que tivessem sido realizadas no século XX uma vez que no
período anterior a esta data não se encontram registradas muitas inovações no
campo da expografia em São Paulo. Outros critérios considerados na seleção
foram: 1) estilos distintos de expografia; 2) contribuição para o rompimento de
padrões de sua época; 3) grande repercussão do assunto no Brasil e
internacionalmente. Desta forma foi possível selecionar quatro exposições que,
por sua proposta expográfica inédita, tornaram-se símbolos na história das
exposições de arte no Brasil:
a) Exposição de uma casa modernista (1930): projeto da arquitetura e
concepção do evento por Gregori Warchavchik. Há de se considerar que não se
trata apenas da exposição de uma casa de arquitetura moderna, mas na
exposição de todo o pensamento modernista que reforçou o conceito da Semana
de Arte Moderna de 22. Esta foi a primeira oportunidade que os modernistas
brasileiros tiveram de expor suas obras em um espaço com arquitetura
condizente, o cubo branco, uma expografia moderna. Os espaços anteriores eram
improvisados ou atendiam a critérios expográficos usados nos palácios reais
europeus do século XIX, ainda com forte herança dos gabinetes de curiosidades.
b) Pinacoteca do Museu de Arte de São Paulo (1967-97): arquitetura do
edifício e projeto museográfico por Lina Bo Bardi (em 1957). Questionando a
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
9
educação positivista favorecida pela expografia moderna, Bo Bardi propõe uma
nova expografia capaz de favorecer o diálogo entre obras de diferentes técnicas,
materiais, culturas, estilos e períodos da história da arte. Para tanto, a arquiteta,
auxiliada por Pietro Maria Bardi, desenvolveu um novo suporte para trabalhos
bidimensionais, os cavaletes de cristal. Esses foram dispostos de forma
aparentemente aleatória, com as informações das respectivas obras nos painéis
didáticos encontrados no verso de cada uma. A arquitetura do museu, que se
assemelha a uma caixa de vidro suspensa em conjunto com os cavaletes de
cristal, permite, além do diálogo estabelecido entre as obras, a inserção destas no
cotidiano da cidade.
c) Grande tela, XVIII Bienal internacional de São Paulo (1985):
concepção da expografia e curadoria por Sheila Leirner. Observando que a
expografia moderna era aplicada em todas as exposições de arte, questionando a
organização da bienal por módulos de representações nacionais e constatando a
semelhança entre as pinturas realizadas por toda parte do mundo, Sheila Leirner
impôs seu discurso criando a Grande tela. Criou três corredores de cem metros
de comprimento nas quais as pinturas neo-expressionistas foram expostas lado a
lado. O que mais incomodou os artistas foi o fato de que a exposição não atendia
os padrões da expografia tradicional (o cubo branco) na qual haviam idealizado
suas pinturas.
d) Imagem do barroco, Mostra de redescobrimento (2000): curadoria de
Myrian Ribeiro de Andrade Oliveira e cenografia de Bia Lessa. Nessa exposição
a intenção foi de realizar um ambiente lúdico que resgatasse a essência do
barroco, proposta na qual Bia Lessa levou o uso da cenografia ao extremo. O
espaço, que emocionava o público por sua beleza e exuberância, desconsiderou
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
10
questões básicas de conservação, segurança e a circulação. Mas a critica mais
constante veio por parte de galeristas, críticos e curadores de outras instituições.
A critica mais observável foi que a cenografia não apenas competia com as obras,
mas que ela atraia para si toda a atenção do público.
Há de se considerar que o material necessário para o desenvolvimento
desta pesquisa não se encontra de todo publicado. Apesar das exposições
escolhidas representarem eventos de grande porte, como ocorre na maioria das
vezes os respectivos catálogos, quando existentes, costumam ser editados antes
da abertura da exposição. Conseqüentemente, estes catálogos privam-se de
registros fotográficos da exposição, limitando-se a divulgar o projeto curatorial,
oferecendo muitas vezes os textos auxiliares sobre o assunto tratado; as imagens
das obras limitam-se geralmente ao registro fotográfico isolado de cada obra,
antes mesmo que esta seja inserida no espaço da exposição. Em alguns casos, o
catálogo chega a apresentar plantas com o objetivo de situar espacialmente o
visitante no espaço da exposição, porém, estas não apresentam precisão sobre
dados necessários para uma reconstituição da expografia. O material principal
utilizado no presente trabalho é em grande parte resultado de uma extensa
pesquisa realizada nos arquivos de instituições culturais que permitem acesso de
pesquisadores. Nesses arquivos encontrou-se, além de hemerotecas, fotografias,
textos e desenhos originais, entre outros documentos. É importante, porém,
salientar que grande parte deste material ainda não se encontra catalogado, ou
devidamente arquivado, dificultando a localização dessas fontes de consulta. De
modo geral, estas instituições carecem de recursos financeiros, limitando o
número de funcionários, recursos adequados para conservação do material e
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
11
dificuldades referentes à aquisição e manutenção de equipamentos, que, no caso,
dificultam em muito a reprodução do material solicitado.
Ao definir o projeto desta pesquisa, considerou-se o fato de que no Brasil
o estudo acadêmico sobre expografia vem sendo realizado num período muito
curto de tempo dado inclusive que justifica a importância desta dissertação. Em
aspectos gerais, as teses e dissertações encontradas sobre o assunto datam,
aproximadamente, do ano 2000. Antes desta data, o material bibliográfico
brasileiro direcionado ao estudo da expografia resumia-se basicamente a livros de
museologia, que abordam o assunto sob aspectos gerais, além de manuais de
museografia, que, como tais, limitam-se a enumerar regras e dados técnicos.
Em 1946, o recém inaugurado ICOM (International Council of Museums
ou Conselho Internacional dos Museus), órgão não-governamental dependente da
UNESCO, considerou a museografia como um dos assuntos principais a serem
debatidos em seus congressos periódicos. Reconheceu assim o papel do
museógrafo: profissional que é responsável por aspectos arquitetônicos,
circulação do público, instalações técnicas e métodos de apresentação, além de
conceber os critérios de armazenamento, conservação e segurança, funções
antes realizadas pelo conservador, museólogo ou curador da exposição. Em
1993, André Desvallées, no seu Manuel de Muséographie (BOTTALLO, 2001,
p.11), cria um complemento ao termo museografia, segmentando ainda mais a
especialização do profissional responsável pelo espaço do museu, criando o
termo expografia.
“A expografia visa pesquisar uma linguagem e uma expressão
fiéis para traduzir o programa científico de uma exposição. Nisso,
ela se distingue tanto da decoração que utiliza os elementos de
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
12
exposição em função de simples critérios estéticos, e da
cenografia, que, salvo em certas aplicações particulares, se serve
dos elementos de exposição ligados a um programa científico
como instrumentos de um espetáculo, sem que eles sejam o
sujeito central de tal espetáculo” (BOTTALLO, 2001, p.11).
A utilização do termo está presente no decorrer de toda esta pesquisa por
ser o que contempla da melhor forma o enfoque aqui escolhido, sem abordar
questões que não seriam relevantes neste trabalho. Nos últimos anos
registraram-se algumas iniciativas no Brasil que visaram à reflexão sobre o
assunto. Uma das iniciativas ocorreu em 1995, com a realização do Seminário de
Museografia: A linguagem dos museus a serviço da sociedade e seu patrimônio
cultural, que reuniu representantes do Chile, Argentina, Uruguai, Bolívia, Paraguai
e do próprio Brasil, e foi realizado no Rio de Janeiro, organizado pelo Instituto de
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Cícero Dias Fonseca de
Almeida, coordenador do Seminário, afirma que o evento passou a ser planejado
em 1989, devido à crescente importância da museografia no panorama da
museologia, disciplina orientada pelo aperfeiçoamento do processo de
comunicação dos museus, uma das funções mais valorizadas nos últimos anos
(ALMEIDA, 1997, p.V-IV). Outro evento específico sobre o tema foi realizado em
2005. Trata-se do primeiro Seminário internacional de museografia e arquitetura
de museu, organizado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (FAU UFRJ). Outros congressos, tanto
da área de artes quanto de museologia, abriram espaço nos últimos anos para
comunicações sobre expografia, chegando em algumas ocasiões a formar mesas
temáticas sobre o assunto. Isso ocorreu, por exemplo, na V Semana de Museus
da Universidade de São Paulo (2005), um dado que nos induz a constatar uma
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
13
movimentação cada vez mais significativa de pesquisadores interessados nessa
área.
Apesar da expografia representar apenas uma subdivisão da
museografia, esse assunto, por mais específico que pareça, está longe de ser
esgotado. Apesar do número crescente de pesquisas sobre o tema, estas variam
de acordo com os objetivos e enfoque pretendido por cada autor. Esta pesquisa,
por exemplo, mesmo que mantendo o mesmo objetivo compreender o papel da
expografia nas exposições de arte poderia ser realizada de diversas formas.
Uma opção, por exemplo, seria realizar uma espécie de estudo de campo, no qual
uma mesma obra fosse inserida em diversas condições expográficas, e
analisassem as relações estabelecidas. Seria possível também entrevistar o
público e estabelecer dados estatísticos sobre o assunto. Este trabalho, porém,
em nenhum momento apresentou pretensões de se aprofundar em aspectos
sócio-culturais, sócio-econômicos ou educativos apesar de que, no decorrer da
investigação, muitos dados a respeito foram considerados relevantes e são
apresentados, ainda que de forma difusa, no decorrer da dissertação.
Esta dissertação foi estruturada em quatro capítulos mais uma sessão
referente às considerações finais. O primeiro foi intitulado Breve histórico sobre
museus, formas expositivas e definição de conceitos básicos e apresenta de
forma cronológica aspectos gerais da história do museu, enfatizando aspectos
relacionados à expografia em cada período, de modo a facilitar a compreensão de
seu desenvolvimento e esclarecimento de conceitos utilizados. O conteúdo deste
primeiro capítulo pertence, em grande parte, ao trabalho de pesquisa de iniciação
científica Obra e espaço nas exposições de arte: uma documentação sobre o
cubo branco, realizado pela autora em 2002.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
14
As sessões consecutivas (capítulos II, III, IV e um apêndice) são,
respectivamente, referentes a cada uma das quatro expografias estudadas e
especificadas anteriormente: Exposição de uma casa modernista (1930),
Pinacoteca do acervo, Museu de Arte de São Paulo (1968-97), Grande tela, XVIII
Bienal Internacional de São Paulo (1985) e Arte barroca, Mostra do
Redescobrimento (2000). Cada um capítulo, encontra-se subdividido em:
1- Precedentes: breve contextualização histórica e expográfica da instituição
(quando é o caso) e de outras exposições de arte que antecedem o
evento;
2- Breve biografia do autor e conceituação do projeto: dados biográficos
sobre o autor da expografia, considerando-se sua formação, trabalhos
anteriores e outras experiências relevantes para a conceituação do
projeto em vigor que se apresentará teorizado;
3- Estudo da expografia: descrição do projeto executado, dificuldades
encontradas e leitura analítica sobre técnicas e recursos utilizados na
expografia;
4- Repercussão dessa expografia: apresentação de depoimentos e críticas
positivas e negativas, selecionadas e organizadas de forma que
possibilitem compreender como foi a recepção e repercussão da
expografia na época, como também confrontar opiniões.
Apresentar-se-á no final da dissertação o item considerações finais em
que serão realçados aspectos centrais sobre cada capítulo e uma reflexão sobre
os aspectos comuns e possíveis desdobramentos do assunto.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
15
CAPÍTULO I
BREVE INTRODUÇÃO HISTÓRICA SOBRE EXPOGRAFIA
E DEFINIÇÕES DE CONCEITOS BÁSICOS
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
16
Este capítulo apresenta, em linhas gerais, o desenvolvimento da
expografia no decorrer da história do museu de forma cronológica. Os conceitos e
terminologias da área são definidos no decorrer do texto. Assim, o capítulo foi
subdividido em:
1 - Surgimento do museu na Antiguidade
2 - Gabinetes de curiosidades e museus públicos
3 - Desenvolvimento da expografia moderna
4 - Museu-fórum
5 - Era dos curadores
6 - Tendências atuais
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
17
1 - Surgimento do museu na Antiguidade
Sabe-se que museu é um termo derivado da palavra grega mouséion, que
significa casa das musas. As musas eram filhas de duas divindades: Zeus e
Mnemosine (deusa da memória); eram, portanto, portadoras da memória total e
da criação. Estas musas somavam nove irmãs e cada uma delas era inspiradora
e protetora de uma arte em particular. Através das diversas artes (como música,
narrativa, dança etc), faziam os homens se esquecerem da tristeza e ansiedade.
No século V a.C., uma das alas dos Propileus da Acrópole de Atenas era
chamada de pinakothéke,
onde eram reunidas as
pinturas de Polignoto, de
Tasos e outros artistas
(ROJAS, 1979, p.24). Através
de estudos arqueológicos,
tem-se conhecimento das
grandes coleções de objetos
de arte dos faraós e
imperadores da Antiguidade. Segundo Suano (1986, p.12), essas coleções
funcionavam como símbolo de poder e prestígio social e durante os períodos de
guerra funcionavam como reservas econômicas. Comenta ele também a
existência de listas detalhadas, feitas por escritores clássicos, descrevendo as
coleções romanas alojadas nos templos. Segundo Rojas (1970, p. 24), os
principais colecionadores desse período foram Cícero, Pompeu e Júlio Cesar.
Essas coleções cresceram tanto durante as invasões romanas, no século III a I
Ruínas da Acrópole de Atenas grega (In: HOLANDA, 1986)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
18
a.C, que houve a necessidade de se construir anexos nos templos e distribuir os
objetos de arte ao longo dos corredores de todos os seus edifícios públicos. Logo:
“Júlio Cesar doou suas coleções ao templo de Vênus Genetrix e
vários outros imperadores seguiram seu exemplo. As coleções
nos templos eram perfeitamente visíveis pelo público comum e
algumas coleções particulares eram abertas à visitação, como a
do Imperador Agripa, que conclamava outros romanos a imitá-lo.
O sentido de tais coleções era demonstrar ‘fineza, educação e
bom gosto’ sobretudo em relação à cultura grega. Tanto assim
que a partir do séc II a.C,. o colecionismo entre romanos ricos
transforma-se em competição (...). As coleções romanas, no
entanto, para além da simples demonstração de riqueza e gosto,
tinham por fim último ilustrar o poderio e força dos inimigos
conquistados por Roma” (SUANO, 1986, p.13).
Paralelamente, no fim do século III a.C., a estabilidade econômica da
dinastia dos Ptolomeus, no Egito, favoreceu o investimento em um centro do
saber enciclopédico construído por Ptolomeu Filadelfo (ROJA,1979, p.24). Essa
construção foi anexada ao palácio de Alexandria e compreendia um conjunto de
edifícios. Nesses edifícios eram exibidos objetos raros, instrumentos científicos e
obras de arte, além de abrigarem eles biblioteca, anfiteatro, observatório, salas de
trabalho e de estudo, jardim botânico e zoológico. No século I a.C., o historiador
ateniense Estrabão nomeou esse centro de saber de Alexandria com o termo
mouséion”. Ao descrever o ambiente, citou seus pórticos e as salas de reuniões
onde os sábios se reuniam, reforçando a relação estabelecida por ele entre a
casa das musas, centro da ciência e da arte.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
19
Segundo Suano, o termo museu, nesse período, estava ligado apenas ao
conceito de coleção, sem depender necessariamente de um edifício físico ou de
estar à disposição da sociedade:
“Assim, com o correr do tempo, a idéia de compilação exaustiva,
quase completa, sobre um tema ficou ligada à palavra “museu”,
dispensando mesmo as instalações físicas. Ou seja, compilações
sobre diversos temas eram publicados com o nome de “museu”.
Assim foi com o Museum Metallicum, publicado por volta de 1600
pelo naturalista e colecionador Aldovrando de Bologna e do qual
se dizia conter todo conhecimento da época sobre metais. No
século XVIII publicou-se, em Frankfurt, Alemanha, o Museum
Museorum (que era elenco de especiarias) e, em Londres, o
Petical Museum (coletânea de canções e poemas). E o Museum
Britanicum, folhetim publicado em 1791, nada mais que
compilações sobre “assuntos elegantes para conversação” e
“coisas curiosas, pitorescas e raras”, segundo sua própria
apresentação” (Suano, 1986, p.11).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
20
2 Dos gabinetes de curiosidades aos museus públicos
Durante a Idade Média, personalidades como os imperadores Carlos
Magno e Constantino VII, Porfirogêneto, colecionaram objetos de arte com a
intenção de acumular tesouros, objetos raros procedentes de diversas partes do
mundo (ROJAS, 1979, p.26). Essas peças eram amontoadas ocupando paredes
inteiras de gabinetes, jardins e corredores de seus palácios. Atualmente, por
convenção, esses espaços são denominados gabinetes de curiosidades,
buscando estabelecer uma diferenciação do termo museu. Consta que eram
exibidas apenas para convidados; e, estes, por sua vez, não podiam tocar os
objetos expostos e proibidos pela Igreja Cristã, o que criava um encantamento
sobre tais tesouros (SUANO, 1986, p.14).
Logo, a Igreja Cristã, que até então pregava o desprendimento em
relação aos bens materiais supérfluos, passou a receber doações, concentrando
assim um dos maiores tesouros. Existe a hipótese de que foi assim ela adquiriu
grande poder político, o que lhe permitiu fazer alianças, formalizar pactos e
financiar guerras contra inimigos do Estado Papal (Ibidem, p.14).
Huguès decVarine-Bhan
1
afirma que mesmo durante o período feudal não
havia o conceito de museu tal como ele é entendido atualmente. Por extensão, a
palavra cultura também não existia; tal conceito era expresso de forma difusa;
definido como uma coisa viva” e imaterial. Assim, não havia como existir o
interesse por parte da pequena elite de acumulá-la ou conservá-la.
No século XIV, as coleções continuaram simbolizando o grau de status;
as famílias reais continuavam competindo entre si. Datam desse período coleções
do “doge de Veneza, as dos duques de Borgonha, na França, e as do duque de
1
Presidente do ICOM em 1979, entrevista a ROJAS, 1979, p.10-11).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
21
Berry que enchia seus dezessete castelos com manuscritos, pedras preciosas,
relíquias...” (SUANO, 1986, p.14).
Durante os séculos XV e XVI (Renascimento), os europeus passaram a
adquirir manuscritos gregos e romanos que se encontravam sob poder dos
árabes, assim como objetos da Antiguidade, encontrados em escavações no
território italiano. Nesta época, a arquitetura, escultura e pintura tiveram merecido
destaque, recebendo
um grande incentivo
por parte da nobreza
e do clero, que
patrocinavam suas
produções, a fim de
adquirir obras de arte
com menor custo. No
mesmo período,
surgiram também
coleções particulares de estudiosos de ciências naturais ou história, que seguiam
o mesmo critério de acúmulo de objetos diversificados.
Em 1601, o arcebispo de Milão, Frederico Borromeo criou um centro
didático para produções artísticas, a Academia de Belas-Artes. Essa academia
passou a ser chamada de museum por exibir inúmeras obras de arte. Esse recurso
(imagético) foi usado pela Contra-reforma para preservar a sociedade católica. O
acesso era restrito e tinha como objetivo criar um repertório seleto para que os
artistas produzissem arte, respeitando os moldes aprovados pela Igreja.
Museu particular de história de 1655 (
In:
SUANO, 1986)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
22
No decorrer dos séculos XVII e XVIII, outros museus passaram a aceitar
visitação pública. Com o tempo, porém, foram restringindo a entrada de pessoas
da classe baixa que se vestiam com “trajes inapropriados” e falavam alto como se
estivessem em feiras públicas. A corte justificava que as visitas do povo rompiam
o clima de contemplação” (SUANO, 1986, p. 27). Os museus passaram a ser abertos
ao grande público apenas no fim do século XVIII. Na França, por exemplo, isso
ocorreu após a Revolução Francesa (1789), por meio de um decreto de 1793, de
autoria do novo governo,
que nacionalizou todas
as coleções dos reis do
país. Assim, obras foram
instaladas no Palácio do
Louvre, que quando foi
reaberto ao público
passou a se chamar
Museu da República
(república significa, literalmente, coisa pública). Outros paises europeus, até
metade do século XIX, também institucionalizaram seus acervos, através de
processos diferenciados, criando museus abertos ao público.
A partir da segunda metade do século XIX, sugiram os primeiros museus
construídos fora da Europa. Um dos primeiros foi realizado em 1867, quando a
Universidade de Yale recebeu como donativo toda a coleção privada do norte-
americano James J. Jarves. A partir do início do século XX, muitos museus
passaram a ser constituídos através de doações realizadas por donos de
indústrias.
Grande galeria do L'ouvre, França, séc XVIII (Catálogo L’ouvre)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
23
3 - Desenvolvimento da expografia moderna
Durante o século XIX, os museus já apresentavam distinções tipológicas
por ramos do saber: arqueologia, botânica, arte etc., mas, em geral, as obras se
aglomeravam, repetiam-se, estando quase sempre expostas de forma
desordenada. Ou seja, o interior das galerias, além da arquitetura e decoração
extremamente rebuscadas, apresentava os quadros pendurados nas paredes em
número excessivo, dispostos lado a lado, uns sobre os outros, de forma a ocupar
todo o espaço das paredes.
É precisamente nesse século que o espaço e a forma de exposição
sofreram alterações acentuadas e acompanharam o ritmo das diversas mudanças
sócio-culturais. Com relação ao estilo das salas, citamos o caso do Museu Pio
Clementino, no
Vaticano, em 1822;
nele se
acrescentou,
intencionalmente,
uma decoração de
estilo neoclássico
em uma galeria
com esculturas
clássicas antigas;
isso gerou uma ambientação que remetia a princípios tradicionais de simetria e
perspectiva racional. Sob influência dessa idéia, os expositores valeram-se de
fundos escuros para apresentar objetos medievais, fundos brancos e cinzas para
Sala de arte romana no Museu Pio Clementino, 1822 / Vaticano.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
24
obras renascentistas, rosa e dourado para remeter ao rococó e assim
sucessivamente.
Após tais experimentações,
“... decidiu-se que fundos demasiadamente escuros
interferiam na contemplação do objeto em si mesmo, e
pensou-se que o fundo perfeito seria o mais neutro, o que
permite ver isoladamente o objeto. Assim, muitos museus
modernos têm paredes brancas ou da cor neutra dos
materiais utilizados, para não criar contrastes cromáticos
com as peças expostas” (Rojas,1979, p.41).
Durante o século XIX, uma época marcada pelo crescimento da
sociedade burguesa e avanços industriais na Europa,-se inicio às Exposições
universais. Segundo Pesavento (1997, p.43), a dimensão de universalidade era
caracterizada pela “abrangência de itens expostos, englobando tudo o que
concerne à atividade humana”, somada ao caráter internacional do evento, que
permitia que outros paises também pudessem expor. Segundo a mesma autora,
estas exposições podem ser vistas de duas formas distintas. A primeira delas é a
que eles pretendiam expor propriamente: um caráter pedagógico e didático,
preocupando-se em catalogar todos os itens expostos a partir de critérios
científicos, apresentando uma preocupação enciclopédica e, também, preocupada
em transmitir:
valores e ideais, como solidariedade entre as nações e a
harmonia entre as classes, crença no progresso ilimitado,
confiança nas potencialidades do homem no controle da
natureza, a fé nas virtudes da razão e no caráter positivo das
maquinas etc.” (Ibidem, 1997, p. 44).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
25
A segunda visão que propõe Pesavento é a da ideologia da civilização
moderna (no sentido marxista de alienação, de “véu da realidade”), a qual ela
denuncia:
“a exposição busca ocultar a exploração do homem pelo homem,
a concorrência imperialista entre as nações e o processo de
submissão do trabalhador à maquina. [...] E ainda nesse sentido
as exposições universais representam a utopia de uma época
segundo os olhos e os desejos da classe burguesa em ascensão.
[...] funcionava para os visitantes como uma ‘janela para o
mundo’. Ela exibia o novo, o exótico, o desconhecido, o
fantástico, o longínquo” (Ibidem, 1997, p. 44-5).
Em 1851, inaugura-se na Inglaterra a exposição do Palácio de cristal,
promovido pela rainha Vitória e coordenado pelo príncipe Alberto.
“Espaço de lazer, a exposição ofereceu às mercadorias e à
produção técnica que lhes deram nascimento o aspecto lúdico
capaz de arrastar multidões. Não é por nada que o imaginário
social conservou justamente esta faceta de tais eventos: as
exposições como espetáculo, onde operários e burgueses
contemplavam as maravilhas da indústria e da civilização”
(PENSAVENTO, 1997, p. 50).
O que é mais interessante para esta pesquisa são as inovações que a
exposição do Palácio de cristal trouxe para a expografia. O edifício que deu nome
à exposição foi vencedor de um concurso e foi construído especificamente para o
evento. O autor do projeto foi John Paxton, que, segundo Pesavento (1997, p.
74), havia sido horticultor e jardineiro do Duque de Devonshire, para quem
anteriormente havia construído uma estufa de ferro e vidro para abrigar exóticas
plantas tropicais” com o qual seu projeto se assemelhava. Esses materiais
empregados na construção do edifício em questão, não só formavam uma
composição leve e elegante, como representavam o avanço da indústria na
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
26
época. Esses mesmos materiais
combinados com o concreto foram
essenciais aos projetos de
arquitetura moderna da Escola
Bauhaus, da Escola de Chicago, e
aos projetos pós-modernos, como
na arquitetura brutalista. Essas
tendências da arquitetura
empregavam o “concreto armado”,
nome da técnica no qual o concreto
moldado se sustenta pelo emprego
de barras de ferro ficou conhecida.
Nesses novos estilos o emprego de
janelas com vidros cada vez
maiores suspensos por caixilhos de
metal também foi bastante
característico. O ferro empregado no edifício de cristal apresentava formas
ornamentais que na arquitetura moderna foram substituídos por linhas retas e
grandes curvas.
A importância do evento foi tão significativa para a Inglaterra que o
terreno cedido para a construção do Palácio de cristal era antes o Parque Hyde,
que representava o coração de Londres. O edifício, apresentando 124 metros de
largura por 564 metros de altura, chegou a abrigar grandes fontes e árvores que
já pertenciam ao parque, provavelmente centenárias pela suas dimensões.
Inauguração do Palácio de Cristal, Londres, 1851
(aquarela de Eugene Lami; in: PENSAVENTO, 1997,
p.75)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
27
Outra inovação, além do
emprego desses materiais na
construção, foi o uso de etiquetas
para identificar os objetos
apresentados. Nas exposições de arte
anteriores o critério de identificação
das obras era dado através de uma
numeração presente em cada objeto
exposto, que, havendo interesse, podia ser procurado numa lista na qual os dados
técnicos (como o preço) encontravam-se enumerados. Esse novo sistema
utilizado para identificar as obras imediatamente passou a ser adotado também
pelos grandes magazines ou lojas de departamento.
A primeira loja de departamentos foi fundada em Nova York no ano de
1855 e chamava-se Wannamaker (CINTRÃO, 2001, P.22). Nela adotou-se uma
estrutura museológica e educativa, com auditório, sala para cada tipo de arte e
informações tais como procedência e autoria ao lado de cada objeto. Esse
modelo foi copiado da grande exposição do Palácio de cristal, que no mesmo ano
havia sido apresentada em Nova York.
Nesse mesmo período outras ocorrências também convergem em direção
à expografia moderna:
“Ao trabalhar a questão ideológica do espaço museológico
de exposições, Brian O'Doherty afirma que é por meio do
‘Salão’ de pinturas na França dos anos 1830 que se conhece
uma definição implícita do conceito de galeria, que ele
considera apropriada para a época. Segundo o autor, uma
galeria é um lugar com uma parede, a qual é coberta por uma
Obras identificadas por legenda no Palácio de
Cristal, Inglaterra, 1851 (detalhe de foto de John
Mayall)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
28
parede de pinturas. A parede em si não tem estética
intrínseca; ela é simplesmente uma necessidade, um pano de
fundo" (Bottallo, 2001, p.66).
Por volta de 1840, a arquitetura na Europa e nos Estados Unidos,
adaptou-se a fim de atender às diversas exigências da época, como, por exemplo,
preocupações com questões de higiene e sanidade e com o desenvolvimento
tecnológico. As novas construções privilegiavam o conceito de zoneamento e
circulação, separando os ambientes de maneira nítida, onde se analisava a
dependência ou independência das áreas entre si. Questões de iluminação dos
ambientes e de cores aplicadas também passaram a ser assuntos estudados,
buscar evitar ambientes escuros e mal ventilados.
Também no fim do século XIX iniciaram-se os estudos da psicologia da
Gestalt (termo alemão que significa figura, configuração e forma). Trata-se de
uma ciência que analisa princípios da percepção humana. Entre os princípios
difundidos por essa ciência está a relação perceptual definida pelo contraste entre
figura e fundo. A partir desse principio, a expografia moderna buscou estratégias
capazes de “anular” o fundo para destacar o objeto exposto.
Os novos materiais utilizados pela arquitetura moderna contribuíram para
o desenvolvimento desta expografia, que exigia
espaços cada vez menos ornamentados e mais
amplos. A necessidade de ampliar os espaços
expositivos partiu da nova forma de ver, de fruir,
trazida pela arte moderna. Nas figuras
bidimensionais após o advento da fotografia,
desenvolveu-se um novo enquadramento, que
Pintura de Claude Monet,
Lago com
nenúfares, de 1899.
(National Gallery, Londres).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
29
parte da idéia de corte. A partir do momento em que as figuras são literalmente
cortadas, como se pode observar na tela Lago com nenúfares de Claude Monet.
O observador tende a projetar a imagem para fora do quadro, completando
mentalmente a figura que se projeta para o seu exterior. Sob esse aspecto, perde-
se a analogia estabelecida entre a moldura do quadro e o batente da janela. Daí a
decorrência do uso de passe-partout maiores e paredes lisas no fundo da obra.
A necessidade de se ampliar o espaço ficou implícita na escultura,
principalmente a partir do cubismo. Apesar de se tratar de objetos tridimensionais,
era costume, antes da expografia moderna, exibir as esculturas contra as
paredes, quando não amontoando uma sobre as outras no canto de alguma sala,
impedindo sua observação por vários ângulos. A escultura desenvolvida pelos
cubistas, a partir do momento que desconstruía as imagens, obrigava o
observador a rodeá-la
para compreender o que
estava sendo
representado. Assim, o
espaço de circulação
que a escultura exigia
ao seu redor deixou de
ser desrespeitado.
A convenção de
espaços cada vez mais
amplos em galerias e
museus foi viabilizada pela criação de um novo mobiliário. Os pedestais que
apoiavam esculturas receberam proporções maiores permitindo que objetos
Manifesto futurista reivindicando o fim dos museus que na
época não aplicavam critérios muito desenvolvidos para
organizar o acervo:
“Museus; dormitórios públicos onde se repousa sempr
e ao lado
de seres odiados ou desconhecidos (...) ao longo de suas
paredes”
(Umberto Boccioni, ilustração, 1909).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
30
menores pudessem ser
observados na altura dos olhos,
substituindo prateleiras e mesas
largas. Para os objetos
bidimensionais criaram-se painéis,
desenvolvidos inicialmente nas
oficinas da Escola Bauhaus. O uso
deste mobiliário tornou a
montagem das exposições mais versáteis. Os limites foram rompidos e o espaço
dos museus e galerias modernos adquiriram flexibilidade, possibilitando pela
primeira vez organizar o espaço de acordo com as obras disponíveis.
A partir daqui desenvolveram-se duas tendências de expografia moderna.
A primeira denominaremos expografia moderna
tradicional, que teve origem na Alemanha e
recebeu grande contribuição da Escola
Bauhaus. A segunda chamaremos de
expografia moderna italiana, com origem na
Itália durante o Regime Fascista, a qual foi
menos difundida. Ambas foram desenvolvidas
na primeira metade do século XX.
A principal diferença entre as duas tendências de expografia moderna
está em como estes painéis e espaços se desenvolveram. Ambas partiram do
princípio de anular o fundo; seguiram, porém, vertentes diferentes. Na Alemanha,
optou-se, a partir de estudos cromáticos, na aplicação de cores claras, enquanto
Reprodução de obra de Ka
ssimir
Maliêvich,
Quadro preto sobre fundo
branco
(1900
-
10).
Sala do diretor da Bauhaus de Weimar (Alemanha),
1923, primeira sede da escola. (In: CARMEL-ARTHUR,
2001, p. 27).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
31
na Itália optou-se pelo uso da transparência através de estruturas de metal, não
utilizando paredes para expor.
Na medida em que cada vez mais se ampliaram os painéis expositivos
na expografia moderna tradicional, elas adquiriram o aspecto de paredes reais. A
partir deste momento, estes painéis ou paredes móveis não apresentam
obrigatoriamente obras bidimensionais penduradas, sendo utilizados
freqüentemente para vedar o campo de visão do observador, isolando inclusive
obras tridimensionais. Os pedestais
passaram a ser modulares e apresentar
um acabamento semelhante ao dos
painéis. Convencionou-se o branco
como uma cor neutra, por proporcionar
contraste para uma gama maior de
cores e refletir luz, uma vez que
também se convencionou como ideal a
iluminação difusa e homogênea. Esse modelo encontra-se diretamente ligado à
proposta de arquitetura moderna difundida pela Escola Bauhaus. O arquiteto Le
Corbusier, apesar de não fazer parte dessa Escola, desenvolveu uma linha
estética parecida; ele participava de congressos internacionais difundindo tais
propostas. No Brasil, Gregori Warchavchik, que foi o principal difusor das idéias
da Escola Bauhaus, realizou a primeira exposição usando expografia moderna
realizada em São Paulo, a Exposição de uma casa modernista, assunto do
próximo capítulo desta pesquisa. Este modelo expográfico também foi aplicado na
construção de um dos primeiros museus de arte moderna criados no mundo, o
Obra minimalista de Robert Morriz, 1965.
momento em que a arte se funde na expografia
moderna tradicional, podemos dizer que é o auge
desta expografia. (In: BATCHERLOR, 2002)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
32
MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York), que foi referência para os museus
construídos posteriormente, em outros países.
Freqüentemente,
museus e galerias, quando
não eram construídos nessa
base de referência, adaptam
seus espaços para atender
tais qualificações mesmo
quando seu acervo não é de
arte moderna ou
contemporânea. Isto
ocorreu por exemplo
com a Grande galeria
do L’ouvre. Durante
a Segunda Guerra
Mundial, todo seu
acervo permaneceu
guardado num porão
temendo ataques. Quando a guerra terminou, ao remontar a exposição,
preferiram adotar critérios modernos pintando as paredes de branco e expondo
apenas algumas obras que foram enfileiradas numa altura média de visão. O
restante das obras permaneceu guardada no porão, transformado em reserva
técnica, algo que antes o Museu L’ouvre não possuía.
Já na expografia moderna italiana, os painéis, que a principio
apresentavam medidas padrões, permitindo a exibição de uma ou mais obras de
Grande Galeria do
L’ouvre após Segunda Guerra Mundial.
(Catálogo L’ouvre)
Expografia italiana feita por Edoardo Pérsico e Marcello Nizzoli para a
Galeria Vittorio Emanuelle, Milão, 1934. Trata-
se de uma estrutura metálica
com obras penduradas em diferentes planos e altura
s de maneira que elas
não se sobrepõem (in: ANELLI, 2005, p.110)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
33
Obras sobre painel engradado elaborado por
Marcello Nizzoli e Edoardo Pérsico, Milão, 1934
(detalhe,
in:
ANELLI, 2005, p.111)
acordo com suas proporções, foram
reduzidos gradativamente até que
esses possuíssem a mesma medida da
obra exposta. Em alguns casos, o
painel chegou a ser substituído por
hastes de ferro ou finas colunas que se
estendiam do chão ao teto e pelos
quais as obras eram penduradas
individualmente. Os pedestais também
tiveram as superfícies maciças reduzidas. Assim, sua aparência assemelhava-se
muito mais a mesas altas e esguias, transformadas posteriormente em tripés,
reduzido por sua vez a um único e fino pé central. A disposição das obras no
espaço, que em muitos casos parecia flutuar, sofreu grande influência dos
trabalhos gráficos de diagramação de jornais e revistas. Esse trabalho era uma
das poucas atividades à qual os arquitetos, durante períodos da primeira e
segunda guerra, puderam se dedicar dada a estagnação de sua atividade
comum. Assim, na mesma proporção em que a expografia moderna tradicional
visou isolar a obra, esta ampliou cada vez mais sua comunicação com outras. A
arquiteta italiana Lina Bo Bardi, tema do terceiro capítulo desta pesquisa, eliminou
a última haste aparente, proporcionando ainda mais transparência a esses
objetos, utilizando o vidro aplicado inclusive na parede do edifício.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
34
4 - Museu-fórum
Têm-se registrado, principalmente a partir da década de 70, propostas
que visam democratizar o espaço do museu. Essas teorias partem do
pressuposto que o ato de organizar uma exposição, ou seja, selecionar obras e
estabelecer um roteiro, pode direcionar a fruição do público, manipulando-o.
O debate organizado pelo americano Ducan Cameron em 1971, com o
título “Museu: templo ou fórum?”
2
, foi uma reflexão por parte de educadores
preocupados com o caráter pedagógico adotado pelas instituições museológicas,
influenciando fortemente as discussões sobre a democratização dos museus.
Segundo Cury, o intuito do discurso era propor a mudança dos museus como
templos do patrimônio burguês para o espaço crítico de discussão, debate e
integração” (idem, p. 20). Analisando o discurso de Cameron, Suano comenta:
Ele comparou muito bem as vitrines aos ‘altares do templo’ onde
as obras humanas eram admiradas, tanto assim que o Museu
Nacional de Ontário, no Canadá, anuncia em seu frontão: ‘Os
trabalhos de Deus através dos tempos, o trabalho do homem
através dos anos’. O oposto do templo seria o fórum, a praça
pública da Antigüidade Romana onde tudo se discutia e se
analisava” (SUANO, 1986, p. 90).
Suano explica que Cameron partiu do pressuposto que os dois “tipos de
museus poderiam coexistir, bastando que o público fosse avisado sobre o
conteúdo que o esperaria”. A partir daí, ela defende uma mudança geral na forma
com que dirigentes se aproveitam da política cultural” para outros fins, criando
confusões a respeito da “coisa pública”. Cameron defende um espaço museal
2
CAMERON, Ducan F. The museum: a temple or the forum. Curator, New York, v. 14, n. 1, p. 11-14, Mar.
1971 (esta publicação não esteve disponível durante a pesquisa; portanto, não se encontra na bibliografia ).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
35
onde não existam hierarquias ou qualquer tipo de manipulação e distorção sobre
o assunto exibido. Diz que o museu-templo é aquele que valoriza o único”, o
verdadeiro”, fazendo referência ao discurso de W. Benjamin e propondo
abandonar o culto” existente em relação ao belo”, para discutir o equilíbrio e o
conflito” que permeiam os dois lados da moeda. Ele quer que o público tenha
acesso a todas as informações possíveis sobre o objeto, de modo que ele seja
capaz, após seu estudo, de definir sua própria opinião.
Ainda na década de 70, com intenção de converter o museu num fator
crítico da sociedade”, Crespán e Tallero sugerem um planejamento de
desordenação” das obras expostas nos museus de arte, argumentando:
A rígida ordenação dos elementos traduzir-se-á numa
interpretação subjetiva da realidade a que o museu pretende fazer
[...]. As pessoas preferem elaborar suas próprias interpretações e
estabelecer suas próprias conexões, pondo à parte as
interpretações e conexões pré-estabelecidas por outros” (Crespán
e Tallero in SUANO, 1979, p. 118 -121).
Uma proposta que se enquadra a todas estas exigências que consistem
no que foi chamado de Museu-fórum, ocorreu aqui no Brasil num trabalho que se
iniciou em 1957 e se concretizou em 1968, três anos antes ao discurso realizado
por Cameron. Trata-se da exposição da Pinacoteca MASP com o projeto de Lina
Bo Bardi, que será abordada com mais detalhes no terceiro capítulo. Essa
exposição se propunha imprimir um caráter didático, que, segundo a autora,
combatia a educação positivista representada no museu pela expografia moderna
ou Museu-templo, como eles a chamam aqui. A expografia da Pinacoteca MASP
buscou apresentar as obras de forma “desordenada” possibilitando que cada
visitante traçasse seu próprio roteiro.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
36
Cury apresenta outra proposta, que defende um processo de tomada de
decisão cooperativa”. Nessa proposta a autora afirma que sempre haverá a
existência de uma autoria implícita na montagem de uma exposição. Contudo,
propõe que o museu considere a opinião do público e do “outro cultural” (que para
Cury é o artista daquilo que está sendo exposto). Para Cury, a responsabilidade
das escolhas curatoriais são exclusivas do museu. A autora conclui a questão,
afirmando:
“a maneira como as decisões são tomadas:
1) decisões quanto ao rumo do sistema, dominando o nível
estratégico (político), entendido como projeção do estado futuro
desejado;
2) decisões quanto à formalização da estratégia a partir de ações
organizadas em planos, dominando o nível tático, conseqüência
das decisões estratégicas;
3) decisões pertinentes à execução dos planos, que permitem o
alcance de objetivos”
(CURY, 1999, p. 68).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
37
5 - Era dos curadores
Reconhecendo as conseqüências provocadas pela autoria de museus ou
curadores, Bottallo afirma:
“É necessário destacar que tal atuação recria uma nova
fetichização dos objetos artísticos assim contextualizados. Assim,
o curador assume o papel de criador de contextos artísticos
herméticos nos quais a apreciação fica dependente da sua
presença reveladora das questões artísticas envolvidas na
montagem. Dessa forma, o curador pretende o lugar do artista ao
criar 'teses' artísticas que defende com autoridade institucional,
tanto para determinar valores pessoais como se fossem princípios
ou verdades soberanas ou 'formais' e, ao fazê-lo, retira do público
a capacidade de recriar conteúdos simbólicos” (2001, p. 62).
A etimologia da palavra curadoria, segundo o Dicionário Houaiss da
língua portuguesa
3
, é de procedência latina, do elemento composto cur. No latim
esse elemento dá origem a palavras como curator, oris: o que está encarregado
de alguma coisa; inspetor; comissário; curador, tutor; curatrix, icis: quem tem
cuidado de; curiosus, a, um: cuidado, diligente, que busca, procura com cuidado,
desejo de saber, curioso. Ainda, é explicado que “curador de arte” significa: “quem
ou aquele que se encarrega de organizar e promover a manutenção de obras de
arte em museus, galerias etc”.
O Novo dicionário da língua portuguesa
4
, de Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira apresenta a palavra associada apenas ao seu emprego de uso medicinal
curar, cuidar” e de direito cível: aquele que tem, por incumbência legal ou
judicial, a função de zelar pelos bens e interesses dos que por si não o possam
3
HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
4
Ferreira, Aurélio Buarque do Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1986.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
38
fazer”. Da mesma forma, o Dicionário brasileiro da língua portuguesa
5
da
Encyclopaedia britânica do Brasil não relaciona o curador a demais atividades,
mas emprega à palavra curadoria o significado acepção”: sentido em que se
toma uma palavra; interpretação, significado”.
O Glossário de Terminologia Museologica, de Miguel A. Madrid (México,
1989), define: “En un museo las actividades del curador se orientam basicamente
al cuidado, control, estúdio y interpretación de las colecciones depositadas en el”,
e depois explica os desdobramentos dessas atividades, baseando-se no manual
Instructivo sobre descripción de actividades y ofícios del profesional del INAH de
Iker Laurraui (México, 1975). A definição de Madrid, de acordo com o que
pretendemos abordar, especifica as funções apenas do curador que se encontra
vinculado a algum museu, instituição ou coleção particular.
É de se levar em conta que apenas o curador que possui esse tipo de
vínculo lida diretamente com a aquisição de obras e suas pesquisas têm como
principal objetivo estabelecer novas relações entre o que se encontra no acervo,
para que as obras da reserva técnica também circulem. Entendemos que também
existem aqueles curadores que não possuem vínculo direto com algum museu ou
instituição, como por exemplo, o curador independente. É comum que ambos
pertençam ao meio acadêmico como docente, mas sua função principal relaciona-
se ao papel de pesquisador e crítico de arte. O curador independente parte
primeiramente de um discurso, resultado de alguma pesquisa que determina
critérios para a escolha, seleção e organização das obras apresentadas.
5
Mirador Internacional. Dicionário brasileiro da língua portuguesa. São Paulo: Encyclopaedia
britânica do Brasil Publicações Ltda, 1975.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
39
Partindo do princípio de que por trás de toda exposição de arte existe um
projeto curatorial, pode-se considerar, dentro do museu de arte e instituição
cultural, a prática da curadoria realizada pelo próprio artista. Entendemos que
essa curadoria pode ser realizada muitas vezes de forma inconsciente, mas para
que o artista selecione suas obras é necessário o estabelecimento de critérios.
Mesmo no momento em que as obras são dispostas no espaço, algum discurso
está sendo apresentado.
Por fim, considera-se também a banca julgadora dos conhecidos salões
de arte, formada geralmente por artistas, colecionadores, críticos e
pesquisadores. Cabe a esta banca, por sua vez, não apenas distribuir prêmios,
mas também estabelecer critérios para selecionar alguns entre todos os trabalhos
inscritos e organizar a exposição do salão. Assim, reconhecemos quatro tipos de
curadoria: 1) o curador vinculado a uma instituição ou museu, 2) o curador
independente, 3) o curador-artista e 4) a banca julgadora dos salões de arte.
Frisa-se que o discurso do curador apresenta-se na leitura de todos os
signos presentes na exposição. O discurso se apresenta e pode ser verificado em
diversos pontos: a) definição do tema, b) objetivo da mostra, c) seleção das obras;
d) a organização por período, estilo, tema ou técnica; e) relações ou
interpretações possíveis de se estabelecer pela disposição das obras de arte no
espaço e demais elementos da expografia presentes no ambiente que são
capazes de interferir ou direcionar o discurso devem ser coerentes dentro da
proposta apresentada. O curador deve entender o conteúdo das obras e as
possibilidades de interpretações sem ignorar que a exposição possa receber
diversas conotações de acordo com a recepção e relação estabelecida com e
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
40
pelo visitante. O trabalho curatorial em muitos momentos históricos chegou a
definir conceitos e a participar da construção de estruturas na história da arte.
A partir da década de 80, a autoria realizada sobre a exposição passou a
ser assumida explicitamente por grande parte dos museus de arte. Um caso que
marcou a trajetórias das exposições de arte no Brasil foi o da Grande tela (tema
do quarto capítulo deste trabalho) que ocorreu na XVIII Bienal internacional de
São Paulo e teve autoria de Sheila Leirner. Esse caso ficou conhecido como o
primeiro em que um curador submeteu as obras de artistas contemporâneos à
sua interpretação, expondo não as obras em si, mas sua leitura crítica;
obviamente, isso ocorreu contra a vontade de muitos dos autores que faziam
parte da exposição.
Atualmente tornou-se habitual nas exposições de arte apresentar logo no
inicio um texto como introdução, sob autoria do próprio curador.
Simultaneamente, seu nome é divulgado em todos os informes publicitários
referentes à exposição.
“Deixamos, assim, de trabalhar no ambiente da obra de arte
contextualizada para especular sobre o museu como linguagem e
esse tipo de exposição passa a constituir-se quase como uma
metalinguagem” (Bottallo, 2001, p. 64).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
41
6 Tendências atuais
Atualmente há pesquisadores que, buscando refletir sobre conceito
originário de expor objetos e de museu, estabeleceram outras relações possíveis.
Rebollo (2001, p.3) esclarece que o termo exposição, usado freqüentemente para
se referir a mostras de arte, tem procedência do latim exponere, que significa “pôr
para fora”, “entregar à sorte”. Entende-se, porém, que estas são relações
estabelecidas em um contexto contemporâneo. Bottallo, por exemplo, remete o
museu ao teatro
6
, justificando que, entre outros aspectos, ambos estabelecem o
relacionamento do público com o objeto, privilegiando a visualidade do ato de expor.
Segundo Rebollo, há um conceito de influência européia que também
compara a exposição de arte a um espetáculo teatral. Nele, justifica-se que o
público, no decorrer da exposição, realiza um trajeto e interage com as obras como
se fosse um ator que cumpre o roteiro imposto. Desta mesma maneira, qualquer
que seja a forma com que a exposição é montada, todos os elementos expostos,
contextualizando a obra de arte, fazem parte de um cenário.
Dentro desse conceito, a expografia moderna é apresentada como um tipo
de cenografia em que qualquer texto explicativo, etiqueta, pedestal, luz, forma ou
cor da parede constituem elementos cenográficos (REBOLLO, 2001, p.12-13).
Assim, uma alteração qualquer na expografia moderna pode descaracterizá-la,
dramatizando-a, por exemplo, através do uso de iluminação direcionada ou da
aplicação de outras cores que não sejam o branco na parede de fundo. A isso
Rebollo denomina cenografia dramatizada. Outro conceito, usual no Brasil e o que é
6
Theatrum, theos, theoría (teatro, deus, teoria) derivam do mesmo radical (theoréin), que significa
ver, observar, estendendo-se a lugar de observação (teatro), aquele que observa (deus), observação
(teoria).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
42
utilizado neste trabalho, reconhece a cenografia nas exposições de arte apenas
quando ela remete à teatralidade. No decorrer do trabalho, esse estilo de expografia
será denominado expografia cênica, fazendo menção à skênê utilizada no teatro
grego para ambientar as histórias, originando a cenografia atual (PAVIS, 1996,
p.42-47). A utilização deste recurso muitas vezes se funde às obras de tal maneira
que, devido à possibilidade de confusão, alguns críticos a denominam ironicamente
“instalação”.
Em geral, apela-se para a cenografia quando existe a preocupação de se
reforçar alguma idéia inserida no discurso do curador. É comum justificar o uso
desse recurso, alegando-se a velocidade com que o público contemporâneo, em
especial os jovens, recebem informações. Em uma tentativa de apreender a
atenção desses visitantes, procura-se transmitir simultaneamente grande
quantidade de informações para ganhar dinâmica, a partir da aplicação de cores,
sons e recursos cinéticos. Apesar da comprovação de bons resultados, ainda
existem muitas críticas como a apresentada abaixo:
“Laurence Alloway afirma que ‘grandes exposições são ambientes
artificiais, algo entre carnavais e museus. Eles são dependentes,
claro, da mobilidade das obras de arte, já que são retiradas de seus
locais originais e dos depósitos permanentes com uma liberdade
semelhante àquela com a qual um crítico seleciona fotografias para
reprodução. Nesse sentido, uma exposição renovada, como a
Bienal, é mais parecida com um cinema drive-in do que com um
museu, do qual algumas de suas exposições podem ser
emprestadas´." (Bottallo, 2001, p. 101).
Alcindo Moreira Filho, em depoimento à autora desta pesquisa, observou
que a cenografia dramatizada exerce um grande papel em exposições de caráter
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
43
histórico-narrativo. Explica que ela pode facilitar leituras e situar objetos expostos,
mas sua aplicação em exposições de artes é questionável.
Textos e depoimentos realizados por profissionais de instituições culturais
apresentam de forma predominante a idéia de que cumprir um papel educativo é
prioritário em qualquer museu, apelando assim para o aspecto comercial apenas
como meio de sobrevivência. Visando à liberdade de expressão, a fim de conquistar
um público crítico cada vez maior, rendem-se muitas vezes de forma consciente aos
patrocinadores que têm grande influência na mídia e que por sua vez fazem
divulgação de grandes artistas, conseqüentemente, criando chavões. Críticos como
Antônio Luiz Andrade (arquiteto e artista plástico Casa das Rosas), José
Bittencourt (historiador e editor dos Anais do Museu Nacional), José Nascimento
Junior (coordenador do Sistema Estadual de Museus/ RS), Maurício Segall
(museólogo Museu Lasar Segall), todos eles confirmam que esta estratégia
publicitária promove a indústria cultural, vendendo arte como animação. Este fato se
confronta com o regimento do ICOM que zela pelo museu sem fins lucrativos, tendo
a cultura como um bem não vendável. Os museus têm investido cada vez mais nas
visitas monitoradas, procurando educar e despertar o interesse do público,
amenizando assim a massificação. Mesmo assim, existe ainda uma grande
polêmica sobre o assunto; especialistas discutem se esse público monitorado foi
sensibilizado o suficiente para compreender a arte e retornar ao museu por sua
espontânea vontade ou se ainda é movido pela mídia.
Dentro deste aspecto, este trabalho dedica um apêndice ao módulo
Imaginário religioso brasileiro apresentado na Mostra do redescobrimento em São
Paulo, no ano 2000. Entre as exposições que utilizaram recursos cênicos em sua
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
44
expografia, essa foi a que mais se destacou no circuito das artes e na mídia,
durante os últimos anos.
São várias as questões que tornam dificultoso o trabalho do curador.
Comentaremos a seguir duas grandes classes delas: novos formatos/suportes e
questões de conservação das obras.
Uma tendência atual é o cibermuseu. A partir da década de 90, observa-se
que museus da cidade de São Paulo dispõem, freqüentemente, de computadores
com acesso a galerias virtuais e jogos didáticos associados ao tema da exposição.
Apenas acompanhando esse processo é possível determinar como tais meios se
relacionam e analisar suas distintas qualidades.
Existe a hipótese que, com o avanço da tecnologia digital, em breve será
possível apreciar pinturas, inclusive esculturas e instalações, pela Internet,
descartando-se assim a necessidade de visitar museus. Entende-se, porém, que o
contato físico real entre sujeito e objeto não pode ser substituído integralmente;
ficaria reduzido o cibermuseu a uma fonte de consulta, como são os livros e
catálogos.
Essa consideração, claro está, não se refere à apreciação de trabalhos que
foram pensados e desenvolvidos para o suporte digital. Trata-se de exceção à
regra. As obras digitais, assim como as obras de vídeo-arte, são freqüentemente
restritas à exibição no espaço do museu enquanto poderiam ser disponibilizadas ao
público via Internet ou empréstimos de reproduções. Contudo, isso exclui as obras
como de vídeo-instalação ou web-instalação que dependem de condições físicas
adequadas, que são encontradas no espaço do museu.
Por outro lado, o freqüente sucateamento de suportes antigos tem sido
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
45
causa do abandono de várias obras artísticas, devido aos avanços da tecnologia.
Isso exigiria um compromisso do museu ou do próprio artista de atualizar
constantemente o suporte das obras para que estas não fossem privadas da
exibição. Muitas instituições estão, nos últimos anos, digitalizando seus acervos. Na
discoteca do Centro Cultural São Paulo, por exemplo, todos os discos de vinil, fitas
de rolo e fitas cassete foram não só digitalizadas mas passaram por um tratamento
de masterização com a intenção de remover ao máximo ruídos provocados pelo
desgaste ou condições impostas pelos antigos suportes. Contudo, no caso das
artes visuais o procedimento praticado no CCSP não pode ser o mesmo. No ensaio
“El museo del futuro: ¿una contradición en los términos?”, foi levantada essa
questão, na perspectiva de artistas que estão optando por novas mídias:
Si la resolución de la pantalla llegara a alcanzar um tamaño de
10.000.000 por 10.000.000 de pixels, ?cómo se veremos uma
imagen de un artista que había sido renderizada a 800 por 600
pixels?: degenerará en una minúscula imagen en medio de una
desmesurada pantalla negra, o en una gran imagen con una
resolución espantosamente baja” (Ippolito, 1998)
Fica a critério do artista, portanto, decidir se deve fazer manutenções
constantes em suas obras para que elas não sejam ultrapassadas por novas
tecnologias adotadas ou preferir conscientemente incorporar esses aspectos como
parte de seu trabalho. Uma possibilidade para preservar a obra seria reproduzi-la,
enquanto ainda compatível, sob a responsabilidade do museu virtual, para que
possa continuar sendo exibida posteriormente.
O assunto remete novamente à discussão do reconhecimento da obra pelo
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
46
fato de ela ter pertencido ao acervo de alguma instituição ou fundação. Interrogado
sobre o assunto, Lorenzo Mammi faz a seguinte reflexão:
“em geral a obra é colocada em um espaço artístico para ser
reconhecida como arte. As galerias, geralmente, seja qual for sua
forma, têm a função de dar a uma intervenção de qualquer tipo de
meio o status de obra de arte. Colocar a obra na Internet não dá
nenhum status; tem-se que construir a Internet e depois ela é
exibida na Bienal. Esse é um elemento importante do espaço
expositivo que é refletido de maneira séria e sistemática. O
problema não é o cubo branco ser ou ter outra característica, o
problema é que se precisa de um espaço, um espaço sagrado, que
numa certa medida santifique o que se está mostrando” (MAMMI;
in: POLO 2002).
Em 2003, uma matéria divulgada na Folha de São Paulo comentava que
havia pessoas que dormiram durante as exibições de vídeo-arte no Paço das Artes
de São Paulo, porque se entediavam, aguardando o re-início da sessão. É uma
prática corrente reservar salas inteiras do espaço da exposição para exibição de
vídeo-arte, que são repetidas consecutivamente. Isso não é justificável quando tais
obras apresentam um contexto narrativo ou linear, forçando o visitante a aguardar
seu recomeço após o fim de cada sessão. Há de se considerar que existem muitas
obras que duram mais de trinta minutos. Outro aspecto que não justifica a exibição
de vídeo-arte nestas exposições é simplesmente o fato de estes não interagirem
com o espaço, ou exigirem recursos espaciais específicos para sua exibição, como
ocorre com as vídeo-instalações. Uma proposta corrente é a de se exibir esse
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
47
tipo de obra em salas de cinema, mais apropriadas e confortáveis, respeitando
inclusive um cronograma que estabeleça os horários das sessões.
CAPÍTULO II
EXPOSIÇÃO DE UMA CASA MODERNISTA (1930)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 49
Neste capítulo será desenvolvido um estudo sobre o projeto de
expografia apresentado na Exposição de uma casa modernista que ocorreu no
ano de 1930, em São Paulo, capital. Trata-se de uma casa construída por Gregori
Warchavchik, arquiteto russo formado pela Universidade de Roma, que veio ao
Brasil em 1923 e pretendia divulgar a arquitetura moderna, estilo com o qual
trabalhava. Integrando-se com os artistas que haviam realizado a Semana de arte
Moderna de 1922 (realizado no Teatro Municipal de São Paulo), o arquiteto
buscou integrar várias linguagens do mesmo estilo para realizar essa exposição.
É importante salientar que foi ela a primeira oportunidade que os artistas
modernistas tiveram para expor suas obras num espaço e condições expográficas
também modernas.
Para tornar possível a compreensão, o primeiro tópico descreve em
linhas gerais como as exposições de arte eram realizadas no Brasil até 1930,
fazendo alguns apontamentos sobre a arquitetura da época. No segundo tópico
há dados sobre a formação de Gregori Warchavchik, descrevendo alguns
trabalhos anteriores e influências que interferiram na sua formação, bem como a
vinda ao Brasil desse arquiteto e sua trajetória que desencadeou a realização do
projeto da exposição em questão. A seguir, no terceiro tópico, desenvolve-se uma
análise descritiva sobre a expografia da Exposição de uma casa modernista. O
capítulo se encerra (quarto tópico) mostrando como o assunto repercutiu na
época com os desdobramentos e adaptações da expografia que foi usada
posteriormente, e de forma predominante, em museus de arte moderna e
contemporânea.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 50
1) Precedentes
Sabe-se que no início do século XX existiam no Brasil apenas duas
academias de arte: a tradicional Escola Nacional de Belas Artes do Rio de
Janeiro, institucionalizada em 1889 e o Liceu de Artes e Ofícios, fundado em
1905, em São Paulo.
Nesta capital, os principais locais onde se realizavam exposições eram o
Museu Paulista (conhecido também como Museu do Ipiranga), a Pinacoteca do
Estado de São Paulo. Nesse período, os artistas brasileiros recebiam bolsas do
governo e de mecenas para aprenderem a arte acadêmica na Europa, importando
tanto estilos como maneiras de expor obras de arte.
Através das pesquisas de Pesavento (1997) e Cintrão (2001), pode-se
perceber o modo como as exposições artísticas se desenvolveram
simultaneamente às exposições comerciais entre os séculos XIX e XX, fundindo
valores e estratégias de caráter didático que resultaram na expografia moderna.
Como mencionado no capítulo anterior, na Europa do século XIX, a burguesia
começou a ter acesso às antigas coleções da aristocracia, as quais já se
encontravam em museus públicos ou à venda, devido à grande decadência que a
elite passava na ocasião. Conseqüentemente, os artistas, procurando outras
formas de vender seu trabalho, organizavam exposições em galerias alternativas,
independentemente dos grandes salões de arte; isso foi praticado por Coubert em
1855, quando inovou no modo como dispôs seus quadros, criando espaços entre
eles, motivo pelo qual é considerado precursor do cubo branco (expografia
moderna).
A burguesia, em ascensão, com a intenção de ganhar status, seguiu o
antigo modelo aristocrático e começou a reunir obras de arte e pequenos bibelôs,
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 51
que eram dispostos de forma a ocupar paredes inteiras de suas residências.
Nesse período, as lojas começaram a expor objetos em vitrines. Os objetos
artísticos e muitas réplicas, que antes só podiam ser admirados nos museus,
tornaram-se acessíveis em lojas.
“[...] as lojas de departamento se consideram agências culturais
responsáveis pela educação do gosto, atenuando
consideravelmente a linha que divide o objeto de museu do objeto
de consumo. [...] De qualquer forma, as lojas de departamento
surgiram quando já havia museus como alternativa de espaço de
lazer, com uma vantagem sobre as coleções institucionais: o
público burguês podia consumir o que lá estava exposto. O
‘contemplável’ tornava-se ‘consumível’. [...] Assim, um mesmo
objeto podia ser visto em três contextos diferentes, dependendo
da forma como era apresentado: como objeto para consumo
(numa loja), como objeto decorativo, utilitário ou parte do
colecionismo privado (numa residência) e, finalmente, como um
objeto de valor histórico e/ou artístico, para a educação e
apreciação pública (em um museu)” (CINTRÃO, 2001, p. 22 e 27-
8).
No Brasil ocorre algo semelhante. Muitos costumes eram importados por
estrangeiros que migravam ao país como também por brasileiros que viajavam
freqüentemente à Europa. Em 1913 inaugurava-se a primeira loja de
departamentos, a Mappin Stores, filial de uma rede comercial inglesa. A primeira
sede localizava-se em frente ao Teatro Municipal no centro de São Paulo. Como
se trata de uma loja de departamentos, subentende-se que ela já apresentava em
sua estruturação espacial, uma divisão temática dos produtos muitas vezes
importados e, que apresentavam etiquetas com dados técnicos de identificação
seguindo modelo adotado no Palácio de Cristal (1851). A loja oferecia também um
salão de chá, biblioteca e organizava exposições e eventos culturais.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 52
Antes da existência do
Mapping em São Paulo, os
artistas que vieram a formar a
geração de modernistas
brasileiros, viam-se obrigados a
improvisar espaços para
realizar suas exposições, uma
vez que não podiam participar
das exposições financiadas
pelo Estado. Em geral, estes
espaços conquistados se
encontravam dentro de estabelecimentos comerciais. A fim de não desperdiçar
espaço, a parede cedida era totalmente tomada por pinturas e gravuras postas a
venda, imitando a antiga expografia usada nas galerias dos palácios reais
europeus do século XIX (que, por sua vez, remetiam aos gabinetes de
curiosidades). Esta era uma prática bastante comum mesmo entre artistas
“acadêmicos”, ou, em outras palavras, que não tendiam ao moderno e eram
apoiados pelo governo. Cintrão (2001, p.161) enumerou 630 exposições
realizadas em 222 espaços diferentes, anunciados no jornal O Estado de São
Paulo, entre o período de 1905 a 1930. A maioria dos locais se concentrava na
região central de São Paulo. Os endereços eram: rua São Bento nº 51, rua Direita
nº 11, rua XV de Novembro n° 27 e rua Libero Badaró nº 29. Entre os endereços
encontram-se estabelecimentos comerciais, clubes, cinemas e edifícios públicos.
Mappin Stores, em 1924 localiza
do na Praça Patriarca,
centro de São Paulo. (Detalhe de Cartão-
postal. Ed.
Preising).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 53
É provável que a primeira exposição de um artista moderno realizada em
São Paulo tenha sido a de Lasar Segall
7
, em 1913, promovida pelo senador José
Freitas Valle. O artista, no entanto, ainda não residia no país; seu
estabelecimento só se deu em 1923, passando a integrar o grupo modernista. Os
trabalhos apresentados na mostra, apesar de avançados para os padrões
brasileiros da época, pertenciam a um período anterior à sua produção
expressionista, iniciada em 1909. O conjunto
selecionado contemplava em grande parte obras de
linguagem impressionista e outros que se
encontravam num período de transição para o
expressionismo. Segall, antes de viajar, foi advertido
sobre o gosto estético dos paulistanos, por sua irmã
Luba Segall Klabin, que já vivia em São Paulo. As
noticias nos jornais fizeram comentários amenos,
mas de certa forma positivos. Isso não surpreendeu
Segall, que aguardava uma rejeição. Em geral, era
divulgado que a exposição seria de um jovem
“simpático” artista russo de futuro promissor; assinalavam-se também alguns
“erros” que o amadurecimento do artista poderia vir a corrigir no futuro. Em um
gesto apelativo anunciavam que 20% do valor arrecadado da venda das obras e
7
Lasar Segall nasceu num gueto judeu na cidade de Vilna (Polônia, que na época pertencia ao
território russo). Imigrou em 1906, aos 15 anos de idade para a Alemanha, onde viveu até 1923.
Estudou até 1909 na Escola de artes Aplicadas de Berlim, como bolsista do governo. Depois se
transferiu para a Academia de Belas Artes de Berlim, onde estudou até 1912 e desenvolveu seus
primeiros trabalhos expressionistas. Nesse período, um irmão e uma irmã de Segall já haviam se
estabelecido na cidade de São Paulo, assistidos pela família Klabin (também de procedência
judaica). Segall fez sua primeira viagem ao Brasil em 1912-3, permanecendo por breve período
hospedado na casa da mesma família Klabin; depois retornou à Alemanha. Seu trabalho era
destacado entre artistas do expressionismo alemão e nesse meio relacionava-se bem com artistas
e intelectuais da Escola Bauhaus. Seu retorno definitivo ao Brasil em 1923 foi decorrente de
problemas financeiros em conseqüência da inflação do período pós-guerra na Alemanha
(BECCARI, 1984).
Lasar Segall (sentado do lado
esquerdo da foto) com seus
colegas na Imperial Academia
Superior de Belas Artes de
Berlin, 1909. (In:
BECCATO,
1984)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 54
com a rifa de um quadro, seria revertido para o Hospital da Criança, da Cruz
Vermelha, de forma que ao adquirir obras, estar-se-ia praticando
simultaneamente uma caridade. Apenas em CampinasSP, onde a exposição
também foi realizada, uma das criticas publicadas nos jornais julgou que tais
“erros” eram qualidades do trabalho (BECCATO, 1984, p. 48-64 passim).
Em 1914, a artista Anita Malfatti montou sua primeira exposição no Brasil,
realizada no Mapping Stores, no centro de São Paulo. Havia acabado de retornar
de seus primeiros estudos realizados na Europa e pretendia pleitear uma bolsa.
Os quadros apresentados nessa exposição, porém, ainda não apresentavam os
traços modernos que vieram a caracterizar sua obra no retorno de sua segunda
viagem de estudos ao exterior, desta vez aos Estados Unidos da América. Uma
exposição sua realizada em 1917 tornou-se conhecida pela crítica negativa que
Monteiro Lobato lhe dedicou, questionando se sua obra significava paranóia ou
mistificação.
Em depoimento autobiográfico realizado por Malfatti em 1917, a artista
relatou as experiências que vivenciou em sua primeira viagem à Europa.
Descreveu como ocorreram seus primeiros estudos de arte e as exposições que
visitou:
“Não me lembro das comidas, dos cansaços das viagens desse
tempo, só da alegria de descobrir cores. Fiz uma viagem para o
sul da Alemanha para ver a 1º exposição dos pós-
impressionistas, Pissarro, Monet, Sisley, Picasso, o Douanier
Rousseau, Gauguin e Van Gogh. Vi também Cézanne e Renoir. /
Foi o fim de minhas reservas. Estava feliz. Segui para Paris e fui
ver o Louvre, a todos os pequenos museus e vi romantismo de
Rodin, mas só lembrava da exposição de Colônia” (MALFATTI,
1939. In: BATISTA, 1972, p.41-42).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 55
De acordo com a observação de Cintrão (2001), essa exposição dos pós-
impressionistas, à qual Malfatti se
referiu, é a IV Sonderbung, na qual
apresentaram obras de acordo com
todos os critérios da expografia
moderna. A exposição realizada pela
artista, em seu retorno, apresentou
as obras de acordo com a
expografia usada nos palácios reais
no século XIX, a qual Cintrão denominou modelo parisiense”. Supôs-se assim
que a artista, ainda pouco experiente, preferiu seguir os conselhos “do artista
Alfredo Norfini, que expunha regularmente na cidade, buscando obter um
ambiente mais acolhedor e apropriado para os trabalhos, de acordo com o gosto
da época” (CINTRÃO, 2001, p.182); e destacou o seguinte trecho encontrado no
diário da artista:
“Sr. Norfini foi muito gentil pois nos ajudou a pendurar os quadros
para sua melhor vantagem. A sala foi toda forrada de aniagem de
cor natural e compramos três grandes palmeiras e mais três
grandes plantas que dão um ar alegre e festivo à sala. No centro
dela colocamos um grande tapete vermelho e grupos de cadeiras
dispersas” (MALFATTI apud ibidem, 2001, p. 182).
É possível, porém, detectar pensamentos relacionados a aspectos da
expografia moderna mesmo que com interesse meramente comercial, como
destaca Cintrão, com base em artigo que encontrou sobre a exposição de Dário e
Mário Barbosa:
"A exposição está instalada à rua São Bento e ocupa um
espaçoso armazém cujas paredes estão totalmente cobertas de
Sala com obras de Vicent V
an Gogh, na exposição
Somberburd, Colônia 1912. (In:
CINTRÃO, 2001,
p.135).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 56
quadros. Talvez lucrassem os artistas e o público se, em vez de
tão numerosas telas, houvesse-as em menos número e mais
escolhidas. Dispostas assim como se acham, umas prejudicam
as outras, o público se desorienta e é difícil formar uma
impressão nítida e completa da exposição (...). Sua exposição
oferece exemplares de todos os gêneros. Desde os simples
estudos de paisagem, impressões de marinha, naturezas mortas,
figuras, cópias de quadros célebres (...)" (ESTADO DE SÃO
PAULO, 5/3/1916 apud CINTRÃO, 2001, p 153).
Outros locais onde se podia expor obras modernistas durante a década
de 1910 e 1920 eram os salões particulares da elite paulistana, que se dedicava
ao cultivo de café para exportação e iniciava o processo de industrialização.
Entre estes aristocratas, os que abriam espaço aos artistas modernos estavam
Freitas Valle, Paulo Prado; contudo, estes
artistas também organizavam suas próprias
reuniões.
De acordo com registros de Mário de
Andrade, a princípio entre doze e quinze artistas
(os mesmos que posteriormente organizaram a
Semana de Arte Moderna de 1922), se reuniam
regularmente às terças-feiras, num “estúdio
acanhado”, um cômodo do sobrado no qual
morava Mário de Andrade, na rua Lopes Chaves:
“Do ponto de vista intelectual foi o mais útil dos salões, se é que
de podia chamar aquilo de salão. [...] A arte moderna era assunto
obrigatório e o intelectualismo tão intransigente e desumano que
chegou mesmo a ser proibido falar mal da vida alheia. As
discussões alcançavam transes agudos, o calor era tamanho que
um ou outro sentava nas janelas (não havia assento para todos)
Grupo de modernistas em frente à
casa de Mário de Andrade, 1922
(Arq. Mário de Andrade, IEB-USP).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 57
e assim mais elevado dominava pela altura, já que não pela voz
nem o argumento. E aquele raro retardatário da alvorada parava
defronte, na esperança de alguma briga por gozar” (ANDRADE,
1945, p. 239).
Às quartas à
noite, estes artistas se
reuniam com um grupo
maior na Vila Kyrial,
propriedade do senador
Freitas Valle, o
responsável pelas
primeiras bolsas de
estudos na Europa para
os artistas brasileiros.
Tratava-se de um evento social, no qual não existia a mesma espontaneidade das
reuniões que ocorriam na casa de Mário de Andrade. Na Vila Kyrial “eram
recebidos os artistas modernos e intelectuais da nova corrente, no local se falava
mais em francês que português e bebia-se excelentes vinhos” (BECCARI, 1985,
p.14). Havia uma programação para cada encontro em que se realizavam
conferências e recitais. De acordo as fotografias de sua casa e o conteúdo do
texto, publicado em 1917 em uma revista chamada Panóplia, pode-se conhecer o
estilo adotado por parte da aristocracia na época. É possível notar também onde
e como eram acomodadas as obras modernas que, à medida que se inseriam na
coleção, eram mescladas às demais.
espalhados pelas paredes em pinturas, assinada por artistas
notáveis, cai ao ambiente um evocativo de legenda desde a
biblioteca de preciosos volumes e fumoir até a sala de jantar,
Fot
o da galeria da residência de José Freitas Valle, publicada na
revista Panóplia em 1917, São Paulo (In: AMARAL, 1976, p. 45-6).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 58
tudo está disposto numa ordem, numa harmonia de conforto
sóbrio e elegante, que fazem da casa de dr. Freitas Valle uma
verdadeira obra d’arte, em seu conjunto. / Iríamos além da
pequena tarefa a que nos propusemos nesta sessão, se
fossemos dizer de tudo que há na Villa Kyrial digno de ser
conhecido e admirado, só a vasta galeria de quadros, a mais
notável do Brasil, e onde existem algumas obras primas da
pintura francesa, espanhola e nacional, daria assunto para uma
crônica ou para um livro. E isto se não tivéssemos que falar e
comentar, enumerando-os, todos os outros objetos d´arte:
mármores, bronzes, [...] sevres finíssimos, variedades de
cerâmica, móveis antigos, medalhas raras e muitas outras coisas
belas” (Revista Panóplia, São Paulo, 1917 in: AMARAL, A. 1976, p. 44-
5).
Aos domingos, em ambiente não muito diferente, almoçava-se na casa
de Paulo Prado, o salão da Av. Higienópolis. Os almoços eram oferecidos para
um grupo de cerca de cinqüenta pessoas (BECCARI, 1985, p.14), onde se
degustava a comida luso-brasileira. Paulo Prado também atuava como mecenas,
possuía obras, catálogos e revistas de arte moderna que trazia da Europa e
serviam como referência para os artistas e intelectuais modernos brasileiros:
“Ainda aí a conversa era estritamente intelectual, mas variava
mais e se alargava. Paulo Prado,(...)convertia sempre o assunto
das livres elucubrações artísticas aos problemas da realidade
brasileira (ANDRADE, M. 1945, p. 239).
Em 1922, o grupo organiza a Semana de Arte Moderna, que foi realizada
no Teatro Municipal de São Paulo. Foi uma semana inteira com uma
programação que contemplava uma exposição de artes plásticas e arquitetura,
concertos musicais e recitais de literatura, todas as obras eram de autoria de
integrantes do grupo de artistas modernistas residentes em São Paulo e no Rio
de Janeiro. Apesar dos artistas participarem em menor número o evento poderia
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 59
ter sido realizado na capital do país, Rio de Janeiro, mas quanto a isso Mário de
Andrade fez a seguinte reflexão:
“Ora no Rio [de Janeiro] maliciosos, uma exposição como a de
Anita Malfatti podia dar reações publicitárias, mas ninguém se
deixava levar. Na São Paulo sem malícia, criou uma religião. (...)
O artigo ‘contra’ do pintor (sic) Monteiro Lobato, embora fosse um
chorrilho de tolices, sacudiu uma população, modificou uma vida”
(Ibidem, 1945, p. 236).
Mário de Andrade, no mesmo texto, justifica o fato de os artistas cariocas
serem representados em menor número dizendo que estes se encontravam
isolados e sem o apoio do mecenato privado como ocorria em São Paulo.
“O fautor verdadeiro da Semana de Arte Moderna foi Paulo
Prado. E só mesmo uma figura como ele e uma cidade grande,
mas provinciana como São Paulo, poderiam fazer o movimento
modernista e objetivá-lo na semana. / Houve tempo em que se
cuidou de transplantar para o Rio [de Janeiro] as raízes do
movimento, devido às manifestações impressionistas e
principalmente pós-simbolistas que existiam então na capital da
República. Existiam é inegável, principalmente nos que mais
tarde, sempre mais cuidadosos de equilíbrio e espírito
construtivo, formaram o grupo da revista ‘Festa’. [...] Então seria
mais lógico evocar Manuel Bandeira, com seu ‘Carnaval’. Mas se
soubéramos deste por um acaso de livraria e o admirávamos, do
outros, nós, na província, ignorávamos até os nomes, porque os
interesses imperialistas da Corte não eram nos mandar
‘humilhados ou luminosos’, mas a grande camelote acadêmica,
sorriso da sociedade, útil de provinciano gostar” (Ibidem, 1945,
p.235).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 60
O evento, que simboliza um momento de ruptura na história da arte
brasileira, preserva além das próprias obras ali apresentadas, materiais gráficos
do evento como programa (catálogo) e cartaz de divulgação, anúncios e críticas
em jornais e depoimentos. Todos, atualmente, foram vastamente publicados
buscando rememorar o polêmico acontecimento:
“Mas como tive coragem para dizer versos diante duma tão
barulhenta que eu não escutava no palco o que Paulo Prado me
gritava da primeira fila das poltronas?... Como pude fazer uma
conferência sobre artes plásticas, na escadaria do Teatro
[Municipal], cercado de anônimos que me caçoavam e ofendiam
a valer?... / O meu mérito de participante é mérito alheio: fui
encorajado, fui enceguecido pelo entusiasmo dos outros” (Ibidem,
1945, p. 232).
O que se desconhece é a existência de registros fotográficos que
documentem o evento e de textos descritivos sobre a organização espacial da
exposição realizada no hall do Teatro Municipal. Não é possível saber, assim,
como esses artistas que
pretendiam apresentar inovações
modernas lidaram com a
arquitetura do edifício projetado
por Ramos de Azevedo no
momento de expor suas obras. O
dado de maior precisão que existe
é um esboço feito por Yan de
Almeida Prado à Aracy Amaral em
1969, onde apresenta a
distribuição das obras pelo saguão
Desenho de Yan Almeida Prado à Aracy Amaral em 1969 (in
AMARAL, A. 1976, p.193)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 61
do Teatro Municipal de São Paulo na “Semana de Arte Moderna” de 1922. Nele é
possível observar que as obras foram dispostas no hall de entrada do teatro, onde
se estabeleceu um módulo individual para cada artista. Também a partir do
desenho, é possível supor que as obras bidimensionais tenham sido penduradas
em painéis, antecedendo (no Brasil) uma característica do museu moderno,
inaugurada pela Escola Bauhaus, como já foi tratado no capítulo anterior.
No mesmo ano, integram-se ao grupo Antônio Gomide e Tarsila do
Amaral; esta, recém
chega da Europa, abre
um salão em sua
residência, do qual
logicamente os artistas
modernistas participam.
Apesar das influências
modernas, o fato de
haver estudado apenas em Paris fez com que continuasse a expor as obras
mesmo modernas do modo antigo. Sua residência se localizava na alameda
Barão de Piracicaba; “não tinha um dia fixo, mas as festas eram quase semanais”
(Ibidem, 1945, p. 240). Apesar do clima de festa, os integrantes do grupo não se
encontravam na melhor situação. Após a realização da Semana de arte Moderna,
os resultados positivos surgiram apenas em longo prazo e alguns deles viveram
momentos de incompreensão e exclusão social:
“pouco depois da Semana, quando fixada na compreensão da
burguesia, a existência de uma onda revolucionária, ela principiou
nos castigando com a perda de alguns empregos. Alguns
estávamos quase literalmente sem trabalho. Então íamos para o
Tarsila no salão de sua casa em 1929 na alameda Barão de
Piracicaba, São Paulo (AMARAL, A. 2003, p. 329).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 62
ateliê da pintora [Tarsila do Amaral, na alameda Barão de
Piracicaba, São Paulo] , brincar de arte, dias inteiros. Mas dos
três salões aristocráticos, Tarsila conseguiu dar ao dela uma
significação de maior independência, de comodidade” (Ibidem,
1945, p. 240).
Em 1923, Tarsila do Amaral retorna a Paris para continuar seus estudos.
Na segunda metade do mesmo ano, encontram-se também em Paris: Oswald de
Andrade (com quem inicia um namoro), Sérgio Milliet, Anita Malfatti, Ronald de
Carvalho, Vicente do Rêgo Monteiro, Di Cavalcanti. Ainda em 1923 Paulo Prado
apresenta ao grupo Olívia Guedes
Penteado. Tratava-se de uma jovem
viúva que também residia em São
Paulo e ao mesmo tempo mantinha
uma residência em Paris para a qual
retornava freqüentemente. Sua casa
em Paris era decorada com o
costume local no estilo Luís XVI, e a
casa em São Paulo tinha arquitetura
e decoração eclética, com projeto de
Ramos de Azevedo. Nessa casa em
São Paulo, Olívia Penteado também
realizava reuniões semanais, um
dos tantos salões particulares da cidade entre os quais o grupo de modernistas
freqüentava apenas dois.
Até então, segundo Tarsila do Amaral, Olívia Penteado não apresentava
interesse sobre arte moderna; simpatizou-se primeiro com os artistas e através
deles entrou em contato com a arte moderna:
Salão Dourado da re
sidência de Olívia Guedes
Penteado (In: MATTAR, 2002, p.338).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 63
“Foi então que percorremos juntas, em companhia de Oswald de
Andrade, as galerias de arte vanguardistas de Paris e na mesma
ocasião adquirimos, na galeria de Léonce Rosemberg, telas de
Fernand Léger e outros mestres. D. Olívia soube compreender
que o movimento modernista já estava vitorioso apesar da guerra
que ainda se lhe fazia, mesmo em Paris. Voltando ao Brasil, deu
braço forte aos nossos artistas novos” (Tarsila do Amaral in
AMARAL, 2003, p.128)
Após esse entrosamento, os modernistas passam a freqüentar os salões
de Olívia Penteado, que eram realizados às terças-feiras à tarde. Todos
participaram ativamente; “foi o maior e mais verdadeiramente salão. [...] A
sociedade era mais numerosa e variada” (ANDRADE, M. 1943, p. 239).
Conseqüentemente, as reuniões do grupo de modernistas que ocorriam também
nas noites de terça-feira, na casa de Mário de Andrade, se inviabilizaram.
Nesse mesmo período, Lasar Segall mudou-se para São Paulo com sua
esposa que, no momento, era Margarete Suhr. Em carta para o amigo Will
Grohmann, escrita no dia 10 de fevereiro de 1924, Segall comenta suas primeiras
experiências no Brasil, sua estadia e novas amizades.
“Há quatro semanas moramos na nossa casinha. É um
sobradinho novo com uma vista maravilhosa. Pendurei todos os
meus quadros e está parecendo um pequeno museu: um
cantinho europeu em solo estrangeiro. Muitas vezes recebo
vistas. O mais belo foi ter sido um dia surpreendido por um grupo
de jovens (14 pessoas), todos músicos, escritores, pintores e
grandes adeptos da arte moderna. O meu nome lhes era familiar
através de jornais, revistas e livros e sou apontado como um dos
maiores expoentes da Alemanha e da Rússia. Eles vivem grande
parte do tempo em Paris e na Itália e estão bem orientados sobre
tudo o que aconteceu na vida artística dos últimos dez anos na
Europa, mas bem orientados mesmo, e possuem tudo o que
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 64
apareceu nesse período em livros e revistas” (SEGALL, L. 1924
in: BECCARI, 1984, p.77).
Em fevereiro, Segall abre seu novo ateliê para visita pública, no qual
procura vender, além de seus trabalhos, aquarelas e gravuras que trouxera da
Europa. Recebe em sua casa, além dos modernistas e outros intelectuais,
algumas personalidades da cidade como o senador Freitas Valle, Carolina e
Gofredo da Silva Telles, Olívia Guedes Penteado e Azevedo Marques. No mês
seguinte, expôs no centro de São Paulo um conjunto maior de obras, acrescidas
de suas últimas produções, além de obras pertencentes à coleção de sua esposa.
Logo, Segall é convidado a apresentar uma conferência na Villa Kyrial, realizada
no dia 8 de Junho de 1924, e passa a freqüentar regularmente as reuniões.
Em junho de 1924, ocorreu a revolução do general Isidoro Dias Lopes,
que partiu do Rio de Janeiro em direção a São Paulo, ameaçando bombardear a
cidade. Aracy do Amaral aponta que este acontecimento desencadeou o inicio de
uma conscientização política entre os modernistas. Na noite do dia 5 de julho,
oficiais e soldados foram executados e as tropas militares invadiram a cidade.
Muitas famílias se refugiaram no interior do estado de São Paulo, como, por
exemplo, a de Oswald de Andrade, que
precisou de um salvo-conduto assinado
por um delegado para poder se retirar da
cidade passando por onde for possível”,
como constava no documento (AMARAL,
2003, p, 157-9). Durante um período de
três meses a cidade não foi abastecida e
os pontos de comércio permaneceram
Soldados fazendo trincheira na rua Constantino
Crispiniano, centro de São Paulo durante
revolução do general Isidoro Dias Lopes, em
1924 (AMARAL, A. 2003, p.158)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 65
fechados. Nem todos tiveram oportunidade de se retirar da cidade. Segall e suas
esposa
8
, por exemplo, se refugiaram na casa de Berta Klabin:
“Ficamos lá acho que três meses, enquanto durou a revolução,
comendo couve-flor, porque era o que havia para comer e ainda
assim porque tivemos sorte de ter como vizinho um chacareiro
que nos vendia verduras” (SUHR, 1979 apud BECCARI, 1984,
p.198).
Passado esse período, Olívia Penteado, que havia conhecido Segall em
suas exposições, convidou-o para decorar um salão que pretendia construir para
expor as recentes aquisições que formariam uma coleção de obras modernas.
Apesar de não existirem registros sobre como essas primeiras exposições de
Segall foram realizadas, é muito provável que sua montagem apresentasse
critérios da expografia moderna. Isto teria sido aplicado na medida do possível,
uma vez que não poderia
reformar os locais que lhe eram
emprestados e tampouco
apresentava condições
financeiras para construir seu
próprio espaço. A flexibilidade na
ocasião se restringiria à maneira
como as obras estariam
dispostas no espaço, provavelmente alinhadas na altura dos olhos e
8
Margarete Suhr teve dificuldades em aprender o novo idioma. Não conseguiu se adaptar à rotina
da cidade que na época era muito provinciana. Sentia falta da vida movimentada de Berlin com
seus teatros, cabarés e concertos. Retorna à Alemanha; Segall, porém, não pôde acompanhá-la,
pois havia viajado com passaporte de “Nansen”, que era dado aos judeus russos emigrados, que
lhe anulava a nacionalidade e o impedia de retornar à Alemanha. (BECCARI, 1984, p.75, 80 e
188).
Segall no seu ateliê
em Dresde,
Alemanha, 1919.
Nesta foto pode-se
observar que as
paredes não
apresentam acúmulo
de obras nas
paredes e que elas
estão praticamente
alinhadas numa
altura de
aproximadamente
1,70m.
(In:
BECCARI, 1984,
caderno de fotos
s/p).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 66
estabelecendo uma distância padrão entre elas. Há de se considerar que na
Alemanha, local de onde viera, a expografia moderna já se encontrava bastante
desenvolvida e caracterizava a Escola Bauhaus com cujos professores Segall
havia convivido.
Para construção do salão, Olívia Penteado reformou uma cocheira que,
localizada no jardim de sua residência, não era mais usada. Ali Segall teve
liberdade para decorá-la, caracterizando o espaço moderno; realizou uma pintura
de cerca de 10m
2
que
compreendia o forro e parte
das paredes no interior do
salão e na fachada do
mesmo. A partir do
esclarecimento feito à Assis
Chateaubriand, por ocasião
da inauguração do espaço
(no dia 6 de agosto de
1925), é possível entender
os conceitos aplicados:
“A pintura decorativa é ao contrário do quadro. Este é
organicamente completado por si mesmo e separado do meio
que o cerca pela moldura onde foi embutido. A pintura decorativa
não. Ela está intimamente identificada com a arquitetura. Faz
contraste com a pintura que, não grado tudo, tira ainda a sua
fonte de inspiração da vida e não se pode libertar das formas
sensíveis da natureza. A pintura decorativa deve ser
completamente abstrata e as figuras nela representadas
precisam ser distribuídas arquitetonicamente e construídas de
todo o ponto abstratamente, como a mesma arquitetura. Cada
época criou a sua arquitetura própria e daí vem que a pintura
Vista parcial do Salão Modernista, apesar da decoração de
Segall, nem tudo que compunha o salão era moderno. Os tapetes
e quase todo o mobiliário pertenciam a outros estilos,
porém a
disposição que receberam era moderna. (In:
MATTAR, 2002,
p.136)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 67
decorativa própria como a arquitetura cria a expressão do
momento. É lamentável que ainda existam gerações de pintores,
que para ornar um interior, se sirvam de modelos de épocas há
muito tempo desaparecidas” (SEGALL apud CHATEAUBRIAND,
1925. In: MATTAR, 2002, p.124-5).
A primeira idéia apresentada por Segall, na qual citou que a pintura é
isolada pela moldura que limita sua área, impedindo
seu diálogo com o espaço, não pode ser aplicada de
forma genérica às pinturas produzidas a partir do
impressionismo, como foi tratado no capítulo anterior.
É possível que Segall tenha simplificado seu diálogo,
generalizando a questão, a fim de obter maior
didatismo e se fazer compreender. No momento em
que Segall comparou as pinturas decorativas de teor
figurativo ao abstrato, seu discurso tornou-se mais
coerente com os conceitos da arquitetura e da
expografia modernas apresentadas neste trabalho.
Segall demonstrou uma preocupação principalmente
com os princípios da pintura moderna e executou no
local, como ele mesmo denominou, um painel. Ou
seja, apesar de fundir-se arquitetonicamente”, a
pintura decorativa desse estilo é presente e não se
anula no espaço, transformando-o.
Na época, esse trabalho suscitou opiniões contrastantes. Mário de
Andrade julgou que a pintura colorida realizada por Segall, conseguia, apesar das
cores, favorecer as obras expostas:
Estudo da pint
ura
realizada no forro do
Salão Modernista, por
Segall (In:
MATTAR,
2002, p.131)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 68
“Ficou uma maravilha, você não imagina. Decoração inteiramente
linear e... volumal do Segall. [...] Só uma parede de fundo é que
tem uma figura duma nobreza de linhas, encanto! O resto é uma
pura combinação das mais belas cores deste mundo, só que
tanta cor havia de matar os quadros, pois é o contrário, o Léger, a
Tarsila ficam sublimes lá dentro. O resto moderno que dona
Olívia tem não vale grande coisa. Enfim, uma delícia das delícias
e a festa estupendíssima” (ANDRADE, M., 1925 apud AMARAL,
A. In: MATTAR, 2002, p. 112).
A posição de Chateaubriand foi oposta, julgando que a pintura de Segall não
cumpriu o papel secundário que deveria, anulando as obras expostas:
“Se tivesse uma crítica a fazer a Segall seria isto: em alguns dos
seus “panneaux” dir-se-ia que ele esquece que numa superfície
que vai ser pintada, as propriedades geométricas condicionam a
obra d’arte. As suas figuras têm forte relevo: Segall pinta a
‘nuance’ com rara virtuosidade, mas às vezes o objeto principal
se perde na vastidão do quadro. A isto responderá ele: ‘Eu não
me escravizo ao ambiente que nos cerca. Nele me engolfo
apenas para aumentar a minha capacidade de abstração. Na arte
que pratico há muito espaço cedido à objetividade’.”
(CHATEAUBRIAND, 1925 In: MATTAR, 2002, p.125).
Apesar de a pintura no forro emoldurar a parte superior das paredes, as
obras aí não só foram expostas na mesma altura como também ficaram bastante
isoladas umas das outras e de qualquer outra informação visual; inaugurava-se,
assim, naquele salão, uma das principais características da expografia moderna.
A pintura de Segall ocupava uma área incapaz de interferir nas obras mais do que
interferia a expografia até então praticada.
A citação a seguir faz parte de uma entrevista realizada por Beccari ao
cineasta Paulo Mendes de Almeida, que era conhecido de Lasar Segall e que
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 69
teve a oportunidade de conhecer o salão modernista de Olívia Penteado, cinco
anos após sua inauguração:
“Cheguei a ver o pavilhão, mas me lembro apenas de alguns
móveis coloridos, esmaltados de preto, de roxo, grandes
almofadas coloridas, uma escultura modernista (era uma cabeça
de Lipchitz), alguns quadros muito bons (um Picasso, um Picabia
e quadros de Segall também). Que ele [Lasar Segall] tenha feito
painel na parede não me lembro. Estive lá em 1930, quando o
príncipe de Gales esteve aqui (duque de Windsor) e dona Olívia
foi uma das pessoas que o receberam” (ALMEIDA apud
BECCARI, 1984, p. 219).
É interessante notar que a pintura de Segall não tenha ficado registrada
na memória de Paulo, porém, durante a entrevista, recordou-se claramente dos
objetos expostos na sala. Uma hipótese é que, ao ingressar no local, Almeida não
tivesse sido previamente comunicado sobre o tema. Assim, teve mais liberdade
de reter seu olhar no que mais lhe chamou a atenção, ficando despercebido o que
se encontrava espontaneamente em seu campo de visão. Já Mário de Andrade e
Assis Chateaubriand haviam sido avisados sobre a existência da pintura antes de
ingressar no local e, conseqüentemente, era também muito provável que tenham
criado expectativas para vê-la terminada. Além disso, o clima de comemoração
pode ter interferido na maneira de fruir e perceber tudo o que se apresentava no
local.
Nesse mesmo salão modernista, Olívia Penteado realizava reuniões
praticamente semanais, inclusive algumas sem data definida nas quais reunia
apenas o grupo dos modernistas. Tarsila do Amaral observou “Ai [nesse salão
modernista] é que os artistas se reuniam. Já o chá das terças-feiras, congregando
as altas figuras da sociedade paulista, servia-se na sala de jantar do palacete,
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 70
cujas paredes se cobriam de Gobelins” (AMARAL,T. apud AMARAL, A. In:
MATTAR, 2002, p. 110). Aparentemente, os modernistas tinham grande estima
por Olívia Penteado, chamada freqüentemente de Nossa Senhora do Brasil, como
num ato de gratidão. Ela acompanhou a trajetória do grupo até 1934, data de seu
falecimento.
Pouco antes da inauguração do salão modernista de Olívia Penteado,
precisamente no dia 14 de junho de 1925, o arquiteto Gregori Warchavchik
publicou seu primeiro artigo sobre arquitetura moderna em São Paulo, num jornal
de língua italiana. Em novembro do mesmo ano, tornou a publicar o mesmo texto,
agora traduzido para o português e, assim, iniciou-se um debate sobre arquitetura
moderna no Brasil. A partir desse segundo pronunciamento, o grupo de
modernistas passou a conhecê-lo, integrando-o ao grupo e inteirando-se do
assunto ainda inédito no país.
Tarsila do Amaral realizou duas exposições individuais na Galerie Percie
em Paris, a primeira em 1926 e a segunda em 1928. De acordo com os estudos
de Aracy Amaral, a artista demonstrava-se bastante insegura diante da
expectativa que ela mesma criava quando imaginava a reação do público europeu
ao conhecer suas obras da fase Pau-brasil. Este aspecto a teria instigado a
investir em artifícios que lhe pudessem servir de
apoio. Tarsila encomendou uma apresentação
poética a Blaise Cendrans, amigo do grupo
modernista. Ao lado disso, decidiu investir em
molduras. Orientada pelo galerista Level,
contatou Pierre Legrain e encarregou-o desse
trabalho. Legrain era artista e fazia serviços de
Obra A cuca de Tarsila do Amaral
emoldurada por Legrain (In:
AMARAL,
2003, p.320)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 71
encadernação no estilo art-déco, procurando sempre inovar na aplicação de
materiais, formas e texturas diferentes.
“Assim foi que às telas caracterizadas por um certo pós-cubismo
revestido de encantadora magia se sobrepõem os trabalhos de
Legrand (que sem dúvida em alguns casos interfere nas obras da
pintora, pelo que vemos em rara fotografia da exposição do Rio
de Jjaneiro de 1929, no caso de Manacá). [...] Assim vemos que
realizou molduras de pergaminho, espelhos recortados, papelão
ondulado, couro. A crítica se referia aos tableaux-objets de
Tarsila em decorrência das molduras de Legrain, mas essas
molduras fornecem também uma indicação da importância que a
pintora sempre atribuiu ao elemento decorativo e neste em
particular, fala alto sua feminilidade no ‘arranjo’ harmonioso de
uma composição como na relação moldura-tela” (AMARAL, A.
2003, p.231-2).
De acordo com as fotografias de suas duas exposições, tanto na França
(1926-8) quanto no Brasil (1929), não se observam sinais de expografia moderna.
É provável que a artista tenha demorado para assimilar os conceitos da
expografia moderna, que, a princípio, parece ser mais condizente com seu
trabalho. Em ambos os casos, suas telas ornamentadas pelas molduras art- déco
foram inseridas em espaços que, por si, apresentam características arquitetônicas
Exposição de Tarsila do Amaral em 1929, no Parque Hotel do Rio de Janeiro (In: AMARAL, 2003, p. 320).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 72
de estilos passados, ostentando outros adornos nas paredes. A disposição das
telas, apesar de estabelecer um espaçamento um pouco maior que na expografia
comum do século XIX, apresenta critérios cuja pretensão é mais a de preencher
espaços vazios, expondo o maior número de obras possível.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 73
2) Gregori Warchavchik e a concepção do projeto da expografia
Gregori Warchavchik nasceu em 1896, em Odessa, Rússia. Começou a
interessar-se por arquitetura em 1913, vivendo na mesma cidade na qual o estilo
neo-clássico implantado pelos arquitetos de Catharina II, A grande, era
predominante. Ingressou no curso de arquitetura na Universidade de Odessa,
mas viu-se obrigado a abandonar o país em 1917, no período da Primeira Guerra
(1914-18).
“Na ocasião, meu pai estava muito doente, no fim da vida. Foi
preso por uma das
facções (os russos
vermelhos), vivia num
cubículo com outros
presos graduados. Pedi
então que me deixassem
substituir meu pai,
ficando preso no lugar
dele. Aceitaram.
Colocaram-me num
porão e me trataram
bem. Uma noite, acordei
com uma forte fuzilaria e
reparamos que alguns de nossos companheiros já não estavam
entre nós. Depois, entendi. Eles tinham sido fuzilados em
represália, pois os russos brancos haviam matado prisioneiros
vermelhos e, agora, era a vez da vingança. Chegaram até à letra
V e suspenderam o fuzilamento” (WARCHAVCHIK in
BEUTENMULLER, 1978, s/p).
Ao sair da prisão, retirou-se para Itália, que se encontrava em meio às
invasões francesas e inglesas. Uma vez em território italiano, começou a
conhecer a arquitetura renascentista e outros estilos antigos.
Cartão postal da Rua Richelieu de Odessa (com Teatro ao fundo)
,
século XIX. (In: < http://commons.wikimedia.org >).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 74
“A arquitetura esteve nas mãos de gente forte, forte como
Brunelleschi, arquiteto admirável em toda história da arte. Visitei
templos e fiquei admirado com os vãos de 70 e 80 metros das
igrejas, construidas sem cálculos. O cálculo só foi feito no século
passado, verificando-se que estava tudo exatamente certo, quer
dizer, como resultado de pura sensibilidade” (Ibidem, 1978, s/p).
Chegando em Roma, matriculou-se no Instituto Superiore di Belle Arti,
onde teve aulas com Guazzaroni e Manfredo Manfredi, para o qual chegou a
trabalhar como assistente por um ano (BARDI in FERRAZ, 1965, p.7). Formou-se
em 1920 e passou a trabalhar para Marcello Piacentini, um de seus ex-
professores de arquitetura, realizando, entre outros trabalhos, a construção do
Teatro Savoya em Florença.
“Apesar das Bienais e Trienais e de alguns contatos com os
centros atuais do norte da Europa, especialmente Holanda e
Alemanha pré-nazista, a arquitetura italiana era dominada pelo
ecletismo, utilizando-se dos estilos de qualquer época e de
qualquer região [...]. Até Piacentini, vindo do ensino
rigorosamente oitocentista [...], após ter-se equilibrado nas
elegâncias do Rococó, tentando estilizá-lo [...], mudou suas
preferências (adequando-se aos tempos politicos), para a
majestade da arquitetura da Roma dos tempos do Império,
filtrando-a, todavia, através das experiências de Hoffmann e da
Escola vienense. Warchavchik, antes de tudo, teve que defender-
se desses ensinos negativos. Não tinha tido a possibilidade de
estabelecer contatos proveitosos com iniciadores das polêmicas
sobre a arquitetura, que então era chamada também de
funcional. Se alguma coisa se verificou na Itália, isto foi somente
em Milão, com o Grupo dos Sete, com a construção da Bienal
das Artes Decorativas de Monza, em 1927. [...] podemos
imaginar qual seria a posição de um estudante que saíra da
Escola de Roma, Meca dos professores do ‘Ornato
architettonico’. O drama destes institutos, que durante muito
tempo eram chamados de ‘Escolas de desenho arquitetônico’, foi
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 75
justamente a separação havida entre a organização estrutural,
reservada aos engenheiros e o setor da ornamentação das
fachadas, tarefa esta do artista decorador, chamado arquiteto”
(Ibidem, 1965, p.7-8).
Warchavchik destacou-se logo nos primeiros trabalhos ao lado de
Marcello Piacentini
9
, tornando-se conhecido inclusive no Consulado do Brasil em
Roma, que o convidou a trabalhar
pelo período de um ano na
Construtora de Santos, dirigida por
Roberto Simonsen, cujo escritório
localizava-se em São Paulo.
Warchavchik aceitou a proposta e
veio para o Brasil em 1923,
transportando em sua bagagem todos os livros já publicados pela Escola
Bauhaus. O depoimento abaixo retrata a impressão que o arquiteto teve ao
desembarcar no país, apresentando aspectos positivos e negativos. Quando
Warchavchik afirma “que o homem faz tudo para estragar mas não consegue” ele
se refere à arquitetura do Rio de Janeiro. A paisagem urbana brasileira era
predominantemente eclética. As construções do período misturavam adornos da
arquitetura neo-clássica, colonial, barroca, árabe etc:
“Cheguei ao Rio [de Janeiro] e fiquei extremamente
impressionado com a beleza da cidade. Aliás, mais tarde, Le
Corbusier disse uma frase muito interessante: que o Rio de
Janeiro é tão lindo que o homem faz tudo para estragar mas não
consegue. O que me deixava entusiasmado eram as praias e as
9
Marcello Piacentini trabalhou com a arquitetura oficial fascista na Itália e projetou para o Brasil o
edifício Matarazzo ao lado do Viaduto do Chá, São Paulo, em 1938 (TOLEDO, 2004, p. 143).
Projeto de residências econômicas geminadas de
Warchavchik, Roma, 1921 (In: FERRAZ, 1965, p.48).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 76
palmeiras. Antes de embarcar na Itália, eu não conhecia essas
praias, mas já sonhava com elas sem conhecê-las, sem nunca tê-
las visto” (WARCHAVCHIK; in: BEUTENMULLER, 1978, s/p).
Warchavchik cumpriu o período de contrato da Construtora Santos que
não lhe deu liberdade para desenvolver seus projetos de arquitetura moderna. No
dia 14 de junho de 1925
10
, Warchavchik publicou um artigo intitulado Futurismo,
no jornal Il Picollo (que publicava os textos em italiano). No mesmo ano publicou
uma versão traduzida no Correio da Manhã do Rio de Janeiro, com o título Acerca
da Arquitetura Moderna, no dia 1º de novembro do mesmo ano. Esse texto foi
considerado o primeiro manifesto de arquitetura moderna no Brasil. Em seu
conteúdo comparava a arquitetura moderna a uma “máquina para habitação”,
teoria parecida com a de Le Corbusier: “casa máquina”:
“Essas máquinas são construídas por engenheiros, os quais ao
concebê-las, são guiados pelo princípio de economia e
comodidade, nunca sonhando em imitar algum protótipo. Esta é a
razão porque as nossas máquinas modernas trazem o verdadeiro
cunho do nosso tempo” (WARCHAVICHIK, 1925. In: BATISTA et
al, 1972, p.9-11 passim).
Warchavchik buscava esclarecer qual devia ser a função do arquiteto,
uma vez que, no Brasil, os arquitetos continuavam sendo considerados como
decoradores de fachada. Warchavchik pretendia que o arquiteto se ocupasse de
questões estéticas e estruturais, dispensando o uso de quaisquer ornamentos:
10
Também, em 1925, realizou-se a primeira exposição de arquitetura moderna L’Esprit Nouveau,
esta, com autoria de Le Corbusier. Ela ocupou um pavilhão na Exposição Internacional de Paris,
apresentando uma construção moderna decorada com pinturas e esculturas também modernas.
Segundo Geraldo Ferraz, a exposição fazia referência revista` (de mesmo nome, criada em
1920), na qual Le Corbusier e seu primo Amédée Ozenfant procuraram ordenar o pensamento
moderno [pois] eram idéias muito esparsas, não havia um movimento. O movimento começou a
crescer, isto que é engraçado, com a revista de Le Corbusier ” (Ferraz (entrevista), p. 23, 1978).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 77
“A construção desses edifícios [máquinas para habitação] é
concebida por engenheiros, tomando-se em consideração o
material da nossa época, o cimento armado. Já o esqueleto de tal
edifício poderia ser um monumento característico da arquitetura
moderna” (Ibidem, 1925).
O argumento mais utilizado por Warchavchik para propor uma nova
arquitetura foi a apropriação de novas técnicas e materiais, referindo-se, no caso,
principalmente à utilização do concreto armado. De acordo com Segawa, a
tecnologia do concreto armado foi desenvolvida desde o inicio do século XX na
Itália (SEGAWA, 2002, p.60). Esse material apresentava maior resistência, além
de proporcionar mais possibilidades plásticas ao construtor, minimizando o
número de vigas e colunas de sustentação:
“Esses edifícios, uma vez acabados, seriam realmente
monumentos de arte da nossa época, se o trabalho do engenheiro
construtor não se substituísse em seguida pelo do arquiteto
decorador. É aí que, em nome da ARTE, começa a ser sacrificada
a arte. O arquiteto, educado no espírito das tradições clássicas,
não compreendendo que o edifício é um organismo construtivo,
cuja fachada é sua cara, prega uma fachada postiça, imitação de
algum velho estilo, e chega muitas vezes a sacrificar a nossa
comodidade por uma beleza ilusória. Uma bela concepção do
engenheiro, uma arrojada sacada de cimento armado, sem colunas
ou consolos que a suportem, logo é disfarçada por meio de
consolas postiças asseguradas por fios de arame, as quais
aumentam inútil e estupidamente tanto o peso como o custo da
construção” (Ibidem, 1925).
Warchavchik argumentava que o projeto arquitetônico deveria preocupar-
se apenas em atender as necessidades de seu tempo; para tanto, deveria ser um
conhecedor não só da história da arquitetura como também dos costumes:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 78
“Estudando a arquitetura clássica, poderá ele [o arquiteto
moderno] observar o quanto os arquitetos de épocas antigas,
porém fortes, sabiam corresponder às exigências daqueles
tempos. Nunca nenhum deles pensou em criar um estilo, eram
apenas escravos do espírito do seu tempo. Foi assim que criaram
espontaneamente, os estilos de arquitetura conhecidos não
somente por monumentos conservados, edifícios, como também
por objetos de uso familiar colecionados pelos museus. E é de se
observar que esses objetos de uso familiar são do mesmo estilo
que as casas onde se encontram, havendo entre si perfeita
harmonia” (Ibidem, 1925).
E enfatizou, por várias vezes e de diversas formas em seu texto, a
coerência que deveria existir entre a utilização dos materiais empregados no
projeto, as necessidades conteporâneas a serem contempladas como também o
emprego de uma estética condizente:
“A beleza da fachada tem que resultar da racionalidade do plano
da disposição interior, como a forma da máquina é determinada
pelo mecanismo que é a sua alma [...]. O arquiteto moderno deve
amar sua época [...]. Tomando por base o material de construção
de que dispomos, estudando-o, conhecendo-o como os velhos
mestres conheciam suas pedras, não receando exibi-lo no seu
melhor aspecto do ponto de vista de estética, fazendo refletir em
sua obra as idéias de nosso tempo, a lógica, o arquiteto moderno
saberá comunicar à arquitetura um cunho original, cunho nosso, o
qual será talvez tão diferente do clássico como este é do gótico.
Abaixo as decorações absurdas e viva a construção lógica, eis a
divisa que deve ser adotada pelo arquiteto moderno” (Ibidem,
1925).
No período entre as duas publicações do artigo-manifesto, em italiano e
em português, mais precisamente no dia 15 de outubro de 1925, o jornal O
Estado de São Paulo publicou outro artigo sobre arquitetura moderna. Trata-se de
uma carta enviada de Roma, com autoria de Rino Levi, que era brasileiro e, no
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 79
momento, estudava no Instituto
Superiore di Belle Arti di Roma,
mesma universidade em que
Warchavchik estudara. Os
conceitos contidos em sua
carta assemelhavam-se aos do
manifesto de arquitetura
moderna; foram, porém, apresentados com maior sutileza. Em vez de condenar o
uso total de ornamentos, propôs apenas que estes fossem aplicados sem
excessos. Os projetos que Levi desenvolveu posteriormente, apesar de
empregarem o cimento armado, apresentavam ornamentos no estilo art- déco, em
voga nas décadas de 1930-40.
“A arquitetura, como arte mãe, é a que mais se ressente dos
influxos modernos, devido aos novos materiais, à disposição do
artista, aos grandes progressos conseguidos nestes últimos anos
na técnica da construção e, sobretudo, ao novo espírito que
reinava em contraposição ao neoclassicismo frio e insípido.
Portanto, praticidade e economia, arquitetura de volumes, linhas
simples, poucos elementos decorativos, mas sinceros e em
destaque. Nada de mascarar a estrutura do edifício para
conseguir efeitos que no mais das vezes são desproporcionados
ao fim e que constituem sempre uma coisa falsa e artificial” (LEVI,
1925 in BATISTA et al, 1972, p.7-8).
Também propôs que o artista, no caso, sem usar a palavra arquiteto,
fosse ao mesmo tempo um técnico para que “consiga maior fusão entre o que é
estrutura e o que é decoração” (Ibidem, p. 7). Propôs, ainda, um planejamento
urbano buscando solucionar problemas de harmonia estética. Preocupava-se não
só com o edifício (obra de arte ou monumento) em si, mas também com a estética
Cine Ufa-Palácio, (Recife) projetado por Rino Levi em 1938 (In:
SEG
AWA, 2002, p. 61)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 80
do local onde seria inserido e como estaria posicionado. Podemos observar que
Levi aborda a arte de um outro modo, entendendo que ela é suscetível a
interferências e diálogos com o contexto no qual ela se insere:
“Toda obra de arte deve ser ambientada, isto é, deve ser vista
sobre uma determinada (sic) visual e deve estar em harmonia com
os objetos que a contornam. Um monumento concebido para uma
pequena praça e com uma orientação prefixada perde muito do
efeito se não colocado no ponto no qual o via o artista com seu
pensamento quando o projetava. Fixada esta idéia, é evidente que
as construções que, com mau sistema, hoje se projetam sem
preocupação alguma de sua adaptação ao lugar; constituem uma
ofensa à estética das cidades. A estética das cidades é um novo
estudo necessário ao arquiteto da viação e de todos os demais
problemas urbanos.” (Ibidem, 1925).
Levi não só menciona a importância de se conhecer a história da
arquitetura, como também de estar atualizado em relação à arquitetura
contemporânea de outras nações, investigando novas tecnologias que,
adaptadas, poderiam solucionar problemas particulares da arquitetura no Brasil:
“É preciso estudar o que se fez e o que se está fazendo no
exterior e resolver os nossos casos sobre estética da cidade com
alma brasileira. Pelo nosso clima, pela nossa natureza e nossos
costumes, as nossas cidades devem ter natureza e nossos
costumes, as nossas cidades devem ter um caráter diferente das
da Europa. / Creio que a nossa florescente vegetação e todas as
nossas inigualáveis belezas naturais podem e devem sugerir aos
nossos artistas alguma coisa de original, dando às nossas cidades
uma graça de vivacidade e de cores únicas no mundo” (Ibidem,
1925).
Deu-se, assim, o inicio de um debate que fazia especulações sobre qual
era a melhor arquitetura para o Brasil. No dia 21 de abril de 1926, O Estado de
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 81
São Pulo publicou um novo artigo sobre o assunto. Tratava-se um texto que, em
resposta à proposta de arquitetura moderna de Warchavchik, defendia a
arquitetura colonial como mais adequada às necessidades do país. O texto, que
ocupava uma página inteira do jornal, tinha autoria de um médico, o doutor José
Mariano Filho (1881-1946), que integrava o Instituto Central de Arquitetos do Rio
de Janeiro e presidia a Sociedade Brasileira de Belas Artes, à época. Não
rejeitava radicalmente a proposta de Warchavchik; concordava que a arquitetura
no Brasil deveria ser aprimorada, mas menosprezava suas idéias pela
procedência estrangeira, exaltando o nacionalismo.
“A expressão ‘colonial’, empregada freqüentemente pelo saudoso
professor Araújo Vianna para designar os elementos decorativos
do estilo tradicional brasileiro, tem sido mais uma vez invocada
com significação pejorativa pelos partidários dos estilos exóticos.
/ Esses engraçadinhos senhores não admitem que a arquitetura
tradicional seja passível de nenhum processo de
aperfeiçoamento [...]. Dizemos que este estilo, aqui implantado
pelos nossos maiores e trabalhado ininterruptamente durante três
séculos, é o estilo da raça [...]. É quanto nos basta. Também não
pretendemos demover os estrangeiros do culto das normas
arquitetônicas ativas em seus países. [...] Tenho para mim que o
público brasileiro ainda não fez ao seu estilo arquitetônico a
justiça de compreender tudo que lhe oferece para seu próprio
conforto.” (MARIANO FILHO, 1926, p.4).
Assim como Warchavchik, o dr. Mariano Filho também rejeitava a
aplicação excessiva de adornos nas fachadas e defendia um estudo histórico da
arquitetura. Contudo, propunha um resgate também histórico, defendendo a
arquitetura colonial, como única genuinamente brasileira e adequada às
características climáticas, reforçando assim a idéia de que as outras propostas
importadas não atendiam as necessidades do país:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 82
“Precisamos estudar seriamente, a fundo, o estilo [colonial] que
nos coube por herança histórica. De seus ensinamentos
saberemos tirar os corolários de que carecemos para enfrentar as
múltiplas exigências que nos são impostas pelo século atual. O
nosso propósito maior é a individualização do estilo (...). Quando
os antigos construíam grossas paredes de pedra, cuja espessura
variava entre cinqüenta centímetros e um metro, eles procuravam
defender-se da ação dos raios solares. A experiência da
dominação sarracena fê-los adotar essa praxe sábia, e hoje nós
todos sabemos que as velhas casas de grossas paredes são
infinitamente mais agradáveis do que as lindas ‘bombonières’
Luiz XVI, através de cujas paredes lindamente decoradas com os
‘macorrões’ do estilo, os desgraçados habitantes são
irremediavelmente ‘grelhados’ durante a noite pelo calor
acumulado nas paredes durante o dia” (Ibidem, 1926, p.4).
Porém, a proposta de se utilizar concreto armado na estrutura das
construções, apresentada no manifesto e justificada como opção prática e
econômica, foi aceita, com relativa facilidade:
“Temos hoje o direito de procurar soluções rápidas e econômicas,
bem diferentes daquelas em cujo ambiente se criou e
desenvolveu a arquitetura brasileira. / O surto vertiginoso do
cimento armado, do concreto, de todos os meios breves e
simples de construir: a variedade de soluções mecânicas para as
artes menores, tudo isso não merece, em justiça, ser cortejado
com os meios rudimentares de que dispunham gerações
anteriores. / Cada época em arte trabalhou os elementos com os
meios e as noções do século. Mas precisamos de boa fé
distinguir a diferença de intenção entre certos tratamentos
tradicionais e os sucedâneos atuais” (Ibidem, 1926, p.4).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 83
A arquitetura neo-colonial como proposta de modernização da arquitetura
brasileira foi inaugurada em 1914 por Ricardo Severo
11
(1869-1940), engenheiro
civil português que passou a viver no Brasil em 1909. “A publicação de sua
conferência de 1914 e de outra palestra, proferida na Escola Politécnica da São
Paulo em 1917, constituem as primeiras tentativas de sistematização do
conhecimento sobre a arquitetura tradicional brasileira” (SEGAWA, 2002, p.35).
Os arquitetos que participaram da
Semana de Arte Moderna em
1922, Antonio Garcia Moya (1891-
1949) e Georg Przyrembel (1885-
1956) apresentaram influências da
arquitetura neo-colonial em seus
trabalhos. Przyrembel era polonês
e ingressou no país em 1912,
sendo encarregado de vistoriar a reforma da igreja de São Bento, em São Paulo.
Desde então se dedicou ao estudo das arquiteturas colonial e barroca, cujas
características já estudava e foram adicionadas à arquitetura eclética. Um de seus
principais projetos foi realizado em 1928, quando construiu o convento e a igreja
Nossa Senhora do Carmo em estilo barroco, também em São Paulo. Segundo
Aracy Amaral (1976), aparentemente, o principal critério de seleção dos artistas
para participar da Semana foi o fato de eles apresentarem propostas que
diferissem dos padrões brasileiros da época. Não havia uma necessidade de
serem modernos, mesmo porque a linguagem moderna na arquitetura
encontrava-se menos definida do que em outras artes.
11
SEGAWA, 2002; AMARAL. A, 1976.
Projeto: Taperinha na Praia Grande
, fevereiro de 1922,
do arquiteto georg Przyembel. (In:
AMARAL, 1976,
p.157).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 84
Os projetos de Moya (que tinha descendência espanhola) para a Semana
apresentavam, como contra-proposta à arquitetura neo-colonial luso-portuguesa,
traços característicos das arquiteturas mediterrânea, espanhola, moura, pré-
colombiana, asteca e maia (Ibidem). Devido a essas influências, o trabalho com
volumes e linhas retas foi maior, aproximando-se um pouco mais da arquitetura
moderna e art-deco. As padronagens indígenas, como maia, asteca e marajoara,
devido sua simetria e geometricidade, foram bastante usadas para adornar
construções art-deco, e estão presentes também em projetos de Lucio Costa e
Rino Levi, por exemplo.
Diante do pequeno grau de informação sobre arquitetura moderna que os
brasileiros possuíam na época, não tardou que Warchavchik ingressasse ao
grupo modernista, participando das reuniões geralmente organizadas na casa de
Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade. Em 1926, Warchavchik passou a
publicar suas idéias em jornais, através de entrevistas realizadas pelos próprios
modernistas.
Através do grupo, conheceu também Lasar Segall, de quem se tornou
amigo íntimo e posteriormente cunhado, casando-se com Mina Klabin, irmã da
esposa de Segall, Jenny Klabin. Mina Klabin foi uma grande aliada de
Warchavchik, visto que sabia alemão, podendo traduzir-lhe todos os livros da
Projetos de Antonio Moya: túmulo (1921) e residências (1926). (In: AMARAL, 1976, p.153-5).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 85
Escola Bauhaus como também trabalhar
como paisagista em seus projetos
modernistas. Em jardins, Mina empregava
apenas plantas tropicais de maneira
inusitada para uma época que copiava a
simetria dos jardins europeus, o que
desvalorizava as plantas nativas.
Warchavchik, em 1927, casado e com cidadania brasileira, estabeleceu
um escritório de edificações e projetou sua própria residência, a primeira casa de
arquitetura moderna no Brasil. Essa casa localizava-se na rua Santa Cruz na
cidade de São Paulo e sua construção, a princípio, não foi autorizada pela
prefeitura. Para tanto, Warchavchik mascarou o projeto da fachada com
ornamentos e construiu sua residência da forma que pretendia inicialmente, tendo
concluído a obra em 1928. Apesar das cobranças dos fiscais, Warchavichik nunca
adicionou os ornamentos sob o falso argumento de que não possuía dinheiro para
concluir a obra.
Projeto da fachada da casa da Rua Santa Cruz, mascarado com adornos; e foto da casa após conclusão
das obras.
(
In:
FERRAZ,G. 1965, p.
23).
Casa construída em Berlin, 1926
por Walter
Grupius que dirigiu a Escola Bauhaus de
1919 (data de inauguração) a 1923. (
In:
CARMEL-ARTHUR, 2001, p. 36-7)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 86
Enquanto a casa modernista se encontrava em fase de finalização, outro
arquiteto moderno passou a ser mencionado na imprensa por Mário de Andrade,
alimentando mais o assunto. Tratava-se de Flávio de Carvalho que, em 1927,
inscreveu um projeto com
arquitetura moderna, num
concurso público para construção
de um novo edifício para o Palácio
do Governo do Estado de São
Paulo; teve sua proposta vetada. O
edifício, bastante arrojado, ausentando-se de ornamentações, estruturava-se em
cimento armado, compondo-se de volumes com linhas retas e algumas formas
circulares. Sua planta estava subdividida em blocos de diversas alturas e servidas
por elevadores. Cada bloco apresentava um terraço individual com jardins,
viveiros de aves e holofotes para
iluminação externa. Estariam
também providos com várias
formas de defesa, abrigando
canhões e aeroplanos
(ANDRADE, M. 1928. In:
BATISTA et al, 1972, 20-21).
Nos primeiros meses de
1928, a residência de
Warchavchik foi concluida e
ganhou cobertura da imprensa.
Mário de Andrade públicou uma
Projeto para Palácio do Governo, por Flávio de
Carvalho, 1927 (
In:
AMARAL, A. 2003, p.275).
Foto do Diário Nacional do dia 18 de junho de 1928
com matéria de Mario de Andrade, sobre a casa,
(arquivo MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 87
matéria que ocupava meia página no Diário Nacional no dia 7 de junho de 1928,
incluindo fotos da construção; o Correio Paulistano publicou no dia 8 de julho de
1928 um texto de autoria do próprio arquiteto. Em resposta, o arquiteto paulistano
tradicionalista Dácio de Morais manifesta-se contra a arquietura de Warchavchik,
publicando suas críticas também no Correio Paulistano e reunindo-as
posteriormente em um panfleto. (FERRAZ, G. 1965, p.28). Warchavchik ganhou
direito à resposta, o que lhe rendeu a públicação de mais dez artigos, no mesmo
jornal, que se estenderam até meados de 1929 (Ibidem, 1965, p.52). Oswald de
Andrade, no dia 10 de fevereiro de 1929, públicou também no Correio Paulistano
uma manifestação em defesa da arquitetura moderna, esclarecendo conceitos de
Le Corbusier e criticando a postura profissional de Dácio de Moraes, que
posteriormente se rende e se transforma em mais um adepto ao modernismo.
De acordo com o depoimento de Tarsila do Amaral, em pouco tempo a
casa virou atração na cidade e pela primeira vez, podia-se ver concretizado um
exemplo da construção moderna sobre a qual se debatia a três anos nos jornais:
“Aos domingos, famílias de São Paulo, no clássico automóvel
recheado de gente, iam para a rua Santa Cruz, paravam,
desciam, postavam-se diante do portão central, comentavam o
absurdo de uma casa sem telhado, o absurdo de umas janelas
inteiramente de vidro, colocadas como uma faixa em sentido
horizontal, fazendo ângulo reto com a faixa da parede lateral.
Tudo liso, sem um ornamento escultórico. Que loucura!
Risadas ostensivas... / Um automóvel, dois, três, vinte, e a
romaria do domingo Inteiro continua em inspeção curiosa.
Rotineiros intransigentes tocavam a campainha e perguntavam
se aquilo era realmente uma casa. Outros, de temperamento
maleável para as idéias e coisas novas, pediam, num gesto de
entusiasmo, para visitar o interior e Warchavchik. Em troca,
acedia num gesto de bondade. Foi contribuindo assim ao
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 88
desenvolvimento de muita sensibilidade artística” (AMARAL, T.,
1936).
Diante dessa grande projeção de 1929, Warchavchik resolve promover a
nova arquitetura, através de uma casa que permanecesse aberta à visitação
pública. Desta forma, comprou um terreno novo
no bairro do Pacaembu, um dos muitos que se
encontravam em formação. Com os primeiros
sinais da crise cafeeira, ainda na década de 1920,
fazendas inteiras próximas à cidade passaram a
lotear seus terrenos. Parte desses terrenos foi
comprada por imigrantes que instalavam novas
fábricas. À medida que a cidade se
industrializava, multiplicavam-se também as casas
e surgiam as vilas de operários. Apesar do
período de crise, o bairro do Pacaembu
apresentava seus primeiros lotes ocupados por
mansões. E foi ali, na rua Itápolis, 119 que Warchavchik iniciou a construção da
casa a ser exibida.
Seria uma oportunidade que os paulistanos teriam para conhecer melhor
a casa moderna ou “racional” e “econômica”, como ele divulgava. Um discurso
bastante conveniente para o momento, visto que na década de 1930 a queda da
bolsa de Nova York atingia diretamente São Paulo. Pela cidade, ocorriam atos de
vandalismo e violência nas ruas, entre os quais gráficas de jornais tiveram suas
oficinas invadidas e arquivos queimados. Nesse período, a crise que se alastrava
atingia inclusive os artistas modernistas; eles perdiam o apoio financeiro vindo por
Referencia de como as obras
eram expostas
em 1923 pela
Escola Bauhaus cujos livros
haviam sido estudados por
Warchavchik. (In: CARMEL
-
ARTHUR, 2001, p.28).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 89
parte dos mecenas que os encaminhavam ao exterior para que pudessem
desenvolver seus estudos.
Dentro desse contexto, Warchavchik amplia seu projeto para exibir, além
da arquitetura, objetos de design e arte modernos. Com isso, os artistas tiveram
a oportunidade que lhes faltava. Foi a primeira vez, no Brasil, que foi possível
expor de forma pública obras de arte moderna em um local que apresentasse
características de uma expografia moderna.
Apesar de toda dificuldade encontrada pelo arquiteto devido à falta de
materiais necessários
para a construção da
casa e seu
acabamento e também
para a confecção do
mobiliário, os artistas
modernistas não o deixaram desanimar. Warchavchik improvisou uma oficina nos
fundos de sua própria casa; seus pensamentos justificavam o esforço:
“O homem moderno num meio de estilos antiquados deve sentir-
se como num baile a fantasia. Um ‘jazz-band’ com as danças
modernas num salão estilo Luiz XV, um aparelho de telefonia
sem fio num salão estilo Renascença. É o mesmo absurdo como
se os fabricantes de automóveis, em busca de novas formas para
as maquinas, resolvessem adotar a forma do carro dos papas do
século XIV” (WARCHAVCHIK, 28 jun1972, p.33).
Durante o período em que a casa era construída, no dia 22 de novembro
de 1929 deu-se a visita de Le Corbusier que, regressando da Argentina, passeava
no Brasil pela primeira vez e se hospedou na casa de Paulo Prado. Logo no
Estante para expor obras de arte e, escrivaninha projetados por
Warchavchik para a
Exposição de uma casa modernista
, 1930.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 90
primeiro dia foi entrevistado por Geraldo Ferraz e Flávio de Carvalho, que
publicaram o evento nos jornais. No segundo dia, Le Corbusier dirigiu-se à casa
de Warchavchik na Rua Santa Cruz, acompanhado de um grupo que reunia
artistas, jornalistas e arquitetos (entre os quais se encontrava Dácio de Moraes)
para conhecer seu trabalho. Além de conhecer a primeira casa modernista da
cidade, que era onde residia o próprio Warchavchik, o grupo que acompanhava
Le Corbusier pôde visitar também outras duas, que se encontravam em
construção no bairro do Pacaembu, como comentaremos mais adiante.
Le Corbusier pôde ver como, além das formas e materiais característicos
da arquitetura moderna presentes na obra de ambos os arquitetos, Warchavchik
investia também nas cores, conseguindo efeitos que agradaram muito o visitante:
“Le Cobusier percorreu todas as dependências, interessando-se
muito pelos detalhes, desde o revestimento de massa brilhante
nas paredes, onde a luz produz os mais surpreendentes efeitos,
até às particularidades do jardim, onde o cactus brasileiro e
outras plantas que o europeu considera exóticas, identificam o
ambiente ao que mais temos de nosso” (FERRAZ, 1929b).
O revestimento das paredes ao qual se refere era resultante de uma
composição de cimento branco, caulim e mica, aplicada nas paredes externas
com intenção de adquirir um acabamento rústico”, com uma textura semelhante
\á que Luis Barragán fazia no México (WARCHAVCHIK, 1930 apud: SEGAWA,
2002, p. 47). Segundo Mário de Andrade “a mica brilhante torna as paredes muito
decorativas e assim o artista pôde prescindir de molduras, colunatas e demais
enfeites superficiais e superpostos” (ANDRADE, M., 1928)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 91
“Os interiores da casa de residência do sr. Gregorio Warchavchik
foram muito apreciados pelo ilustre renovador da arquitetura, que
disse serem eles os mais imprevistos que ele até agora
encontrou em toda América do Sul” (FERRAZ, 1929b).
De acordo com o relatório que Warchavchik encaminhou ao CIAM
(Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna), no congresso realizado em
Bruxelas no ano de 1930, o interior de sua casa apresentava as seguintes
características:
“As paredes do estúdio estão revestidas com o mesmo material
[da área externa]. O forro é de esmalte prateado a duco. As
cortinas cor tabaco, os móveis de imbuia lustrados preto
brilhante, as cadeiras estofadas com pele de bezerro. O quadro
de Lasar Segall. A entrada é pintada em cor de limão claro,
vermelho vivo e branco. A imbuia é lustrada ao natural. A sala de
jantar é realizada em vários tons de cinza e prata, preto e branco.
A sala de música é de um azul claro acinzentado, as cortinas
azuis e os estofamentos de veludo roxo-violeta e cinza, os
móveis prateados e alguns lustrados de preto. Almofadas em
cores de laranja e abóbora. Todo o primeiro andar é branco e
todo madeiramento, inclusive portas e móveis, em laca vermelho
vivo. Todos os móveis do jardim são também dessa cor, inclusive
as tinas e os vazos de plantas” (WARCHAVCHIK, 1930 apud:
FERRAZ, 1965, p.51).
Na seqüência, após a visita à residência de Warchavchik, dirigiram-se à
casa da rua itápolis, construída para sediar a Exposição de uma casa modernista
a qual ainda se encontrava em fase de construção.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 92
[Le Corbusier]examinou detidamente a construção da nova
casa de Warchavchik. [...] não esconde a impressão primeira que
tem, desce aos detalhes, escolhendo o que lhe agrada e comenta
o valor da cor, melhor realçada pelo fundo branco. Considera,
também, a combinação dos elementos como a madeira das
guarnições das portas e as paredes de cimento. Acompanhamo-
lo ao fundo do jardim lateral fechado por um muro branco
redondo, que ele elogia pelo seu ‘caráter plástico’” (FERRAZ,
1983, p.57).
Saindo dali, dirigiram-se à casa da rua Bahia que tinha suas obras recém
concluidas. Ao conhecê-la, Le Corbusier manifestou que em termos de linhas
estruturais era a que mais lhe havia agradado. A casa branca inserida na
vegetação ganhava muito contraste do verde, adquirindo destaque. Também lhe
agradou o contraste das janelas com venezianas vermelhas sobre o branco das
mesmas paredes, fazendo-o comentar: “o proprietário da casa deve possuir
cultura suficiente para aceitar tantas inovações arquitetônicas como as que
constato”; depois compara as obras de Warchavchik às do arquiteto moderno
francês Rob Mallet-Stevens (FERRAZ, 1929a).
“Na noite desse mesmo dia, no Instituto
de Engenharia [...], Le Corbusier realizou
a sua primeira conferência no Brasil,
sobre ‘a revolução arquitetural
contemporânea’. [...] mencionou, antes
de tudo, a visita que fizera às residências
construídas por Warchavchik e às obras
do escultor Celso Antônio [...] as citou
como índices os mais ponderáveis do
progresso cultural já em desenvolvimento
Vista dos fundos
da casa da rua Itápolis com o
muro que divide o quintal de (arquivo MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 93
na capital paulista” (FERRAZ, 1983, p.57).
No dia 27 de novembro de 1929, Le Corbusier encaminhou a Giedeon,
teórico e secretário da CIAM (Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna),
uma carta indicando Gregori Warchavchik como representante sul-americano no
CIAM:
“Meu caro Giedeon, do interior da casa absolutamente simpática
do sr. Warchavchik, arquiteto em São Paulo, lhe comunico que um
grupo de arquitetos modernos deseja ser incorporado aos
Congressos Internacionais. Apóio inteiramente este pedido,
porque os trabalhos executados são muito interessantes e o grupo
de São Paulo tem uma vitalidade da melhor qualidade” (O Estado
de São Paulo, 28 out 1969, s/p).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 94
3) Estudo da expografia
Este estudo foi realizado a partir de imagens registradas por filmagem e
fotografias, todos em preto e branco, plantas da casa e textos da época que
chegam a descrever alguns ambientes com mais precisão, inclusive pelo catálogo
que enumera as obras apresentadas.
É importante esclarecer que parte das obras enumeradas no catálogo
não foi localizada através dos documentos disponíveis. Felizmente, os cômodos
principais foram fotografados, mas esses registros muitas vezes não contemplam
todos os ângulos. Em alguns casos, a foto original, que poderia oferecer maior
precisão, não foi localizada nos arquivos consultados, restando-nos reproduções
de pouca nitidez encontradas em antigas publicações.
Fachada da casa modernista da rua Itápolis, com anúncio da exposição
(arq. Lazar Segall)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 95
Entre as obras de arte não localizadas, podemos listar a aquarela de Di
Cavalcanti, as sete aquarelas de Esther Bessel e duas de Cícero Dias; estes dois
últimos estavam apresentando, pela primeira vez, suas obras à sociedade
paulistana. Também não foram localizados: duas pinturas em afresco de Antônio
Gomide, três pinturas de Jenny Klabin Segall, o álbum de xilogravuras de Oswald
Goeldi, três das cinco obras expostas de Lasar Segall, três entre quatro obras de
Anita Malfatti, um entre os quatro quadros de Tarsila distribuídos pela casa.
Essas obras poderiam estar distribuídas na escada, no hall de entrada ou nos
quartos de solteiro, ou, ainda, na cozinha, nos banheiros e na edícula.
O número de obras com que cada artista participou nesse evento
contrasta com a quantidade de obras que cada um expôs na Semana de arte
moderna. Registramos, desta maneira, que não houve uma preocupação
quantitativa, mas representativa. A exposição se caracterizou por uma seleção
mais criteriosa, que objetivou não apenas representar, através de poucas obras, o
movimento modernista, mas também integrar cada uma das peças da forma mais
adequada ao espaço disponível. Mesmo com um embasamento imagético
limitado, é possível afirmar que houve uma
nítida preocupação em expor as obras
considerando-se temas, cores e dimensões,
na tentativa de preservar uma área livre ao
redor da peça, propiciando a observação
individual de cada uma.
Todas as obras expostas foram
identificadas com números marcados em
etiquetas, através dos quais se podia consultar a lista de obras no catálogo, que
Detalhe mostrando etiqueta de
identificação sobre a moldura do quadro
Colina vermelha de
Lasar Segall (arq.
Lasar Segall)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 96
continha a
numeração
correspondente.
Essas etiquetas
estavam fixadas
sobre molduras ou
pedestais de cada
objeto, uma forma
de identificação bastante usual na época.
A linguagem gráfica utilizada tanto no catálogo quanto no
cartaz de divulgação colocado em frente à casa tem forte identificação com o
trabalho gráfico produzido pela Escola Bauhaus. As semelhanças consistem na
diagramação do texto, no
uso das cores (vermelho,
bege e preto) e no próprio
desenho gráfico
geometrizado, como se
pode verificar nas
imagens abaixo.
Diferente da outra
casa construída na
mesma época no
Pacaembu, essa
apresentou uma divisão
Capa do catálogo criada por
Warchavchik, impressa
possivelmente no ateliê de Lasar
Segall (arq. Carlos Warchavchik).
Folha de rosto de uma publicação
da Bauhaus criada por László
Moholy-Nagy, 1923. (
In:
CARMEL-ARTHUR, 2001, p.29)
Planta
baixa da
casa (
In:
FERRAZ,
G. 1965,
p. 36)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 97
padrão entre os ambientes, pela qual a sala de estar com escritório fica separada
estruturalmente da sala de jantar, que, por sua vez, é integrada por uma
passagem larga. A casa da rua Mello Alves apresenta a planta baixa da área
térrea da casa, sem nenhuma divisão entre esses ambientes, que acham
espacialmente integrados. Essa característica tornou-se recorrente nas
construções dos museus modernos, o que torna o espaço flexível, permitindo que
as áreas sejam redimensionadas de acordo com as necessidades do momento.
Warchavchik procurou reunir ao máximo todos os resultados positivos
obtidos das experimentações nas construções anteriores. Considerou, além dos
materiais estruturais da casa, materiais de acabamento, combinações das cores e
paisagismo. Repetiu, assim, a textura rústica nas paredes externas da casa,
mantendo-as brancas, de modo a contrastar com as venezianas de madeira
pintadas de vermelho. As linhas retas e parede lisa da fachada da casa
estabeleciam diálogo harmonioso com o jardim projetado por Mina Klabin, no qual
os cactos e palmeiras ali plantados ganhavam dimensões escultóricas. Esse
jardim contornava a casa pelo lado esquerdo, estendendo-se entre a parede da
casa e o muro de
delimitação do
terreno, criava um
corredor que
direcionava até o
quintal social. Ali
havia um banco de
praça e um caminho
paralelo às paredes,
Jardim íntimo com escultura de Brecheret (
In:
FERRAZ, G. 1965, p. 91)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 98
feito com pedras quadradas de tamanhos irregulares e coloração clara,
contrastando, assim, com a grama. Na foto observa-se que ao fundo se encontra
uma das esculturas de mármore de Victor Brecheret, emoldurada pelas plantas. O
contraste está com a parede do fundo. Essa, apesar de também ser branca, é
escurecida naturalmente pela projeção de sombra da textura e corresponde à
parede lateral do lado externo da edícula. A angulação da fotografia favorece a
centralização do
olhar na escultura
não só pelo encontro
das linhas da
perspectiva como
também pelo
caminho de pedras
que reforça este
direcionamento do
olhar.
A porta de entrada ficava do lado direito da construção e consta no
catálogo como “porta de ferro forjado” feita pelo próprio arquiteto. A fotografia
abaixo ilustra uma visão parcial do hall ocultando, do lado direito, as portas de
entrada para o lavabo e para a cozinha. De acordo com a descrição de Oswald de
Andrade, neste local encontrar-se-ia um “vaso de feira” solicitado em último
momento à Patrícia Galvão (Pagu), o qual não foi citado no catálogo. Nesta
imagem, observa-se, do lado direito, parte da escada que dá acesso aos
dormitórios. Na parte superior, em primeiro plano, vêem-se as luminárias
modulares desenhadas por Warchavchik, presentes na área interna e externa de
Vista parcial do
hall
e sala de estar durante exposição (arq MASP).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 99
todas suas construções. Do lado esquerdo, tem-se uma visão parcial da sala de
estar. O ângulo permite a visualização de parte dos móveis construídos por
Warchavchik em sua oficina, um tapete da Escola Bauhaus, Dessau, o quadro
Homem amarelo de Anita Malfatti e, sobre a estante, ao lado da porta de ingresso
ao terraço frontal da casa, uma escultura feita por Menotti del Picchia.
O quadro de Malfatti encontra-se posicionado a uma altura média,
favorecendo o ângulo de visão de quem estivesse sentado no sofá dianteiro, de
forma que o “homem amarelo” pareceria se apoiar sobre o encosto do sofá ao seu
lado. A base da obras encontra-se pouco abaixo da altura do encosto do sofá, a
área central da tela aproxima-se a 1,20m de altura, medida abaixo da altura
média do campo de visão de alguém em pé, que por convenção é estabelecida
em 1,60m.
Um aspecto interessante era o uso das cores nos ambientes. Não há
registros sobre qual foi a
cor usada nas paredes
do hall de entrada. Na
fotografia, apesar da
diferença de iluminação
entre o hall e a sala,
pode-se deduzir, através
da tonalidade do cinza,
que a parede do hall
estivesse pintada de
Foto da sala (arq. Lasar
Segall) e a mesma pintada p
/
referencia das cores do
ambiente.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 100
azul
12
, que é uma das cores que já haviam sido usadas nas casa da rua Santa
Cruz.
A sala de estar, segundo descrição de Geraldo Ferraz (1965), era verde-
claro com o forro pintado de branco-marfim. Pode-se observar que as paredes
são completamente lisas e não possuem molduras. Os móveis de formas
inéditas”, ainda segundo Ferraz, eram prateados com estofado roxo. As cortinas
eram alaranjadas. A tapeçaria confeccionada pela Escola Bauhaus apresentava
geralmente composições geométricas com diversos matizes das cores primárias,
azul, vermelho e amarelo e, algumas vezes, elementos em preto.
Na parede oposta, diante do quadro Homem amarelo, estava posicionado
o quadro de Lasar Segall, Colina vermelha, mas a uma altura padrão de 1,60m.
Ambos os quadros se aproximam pela gama cromática, criando um equilíbrio de
força de tensão cromática no sentido transversal do espaço, pois se destacavam,
pelo alto contraste das cores complementares estabelecido entre o fundo verde-
claro das paredes e as obras em que predominava o vermelho-bordô. Essa
12
Se a parede repetisse a mesma cor usada no hall de entrada da casa da Santa Cruz, o
vermelho, na fotografia em preto e branco enxergaríamos a parede praticamente preta; e se fosse
amarela ou de outra cor muito clara, seria quase branca.
Esses quadros (respectivamente) O homem amarelo, Morro da favela e Colina vermelha
sobre fundo de cor
aproximada à que foi utilizada na parede da sala de estar sobre a qual se encontravam.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 101
mesma pintura de
Segall não estava
centralizada na parede,
ao contrário,
encontrava-se
posicionada no
extremo oposto à
luminária,
estabelecendo assim
outra relação de
equilíbrio de força de
tensão, de acordo com a área ocupada da parede.
No fundo da sala, na parede angular às outras duas recém-mencionadas,
encontrava-se a obra Morro da favela de Tarsila do Amaral, temática semelhante
à obra Colina vermelha, de Segall. O quadro foi exposto preservando a moldura
art-deco feita por Pierre Legrain em Paris. Encontrava-se alinhada com o centro
do sofá que estava deslocado para a direta do centro da parede. Na lateral do
lado esquerdo próximo à porta do terraço havia um cacto plantado em um vaso
modular. No outro extremo do lado direito, havia um móvel de cantoneira fazendo
ângulo com a entrada para a sala de jantar. Sobre este móvel havia um estudo de
busto em gesso, com autoria de Celso Antônio. A disposição de todos estes
objetos em frente à parede, considerando que o cactos e a escultura se
encontravam em áreas de dimensões proporcionais aos seus respectivos
tamanhos, resultava numa relação de equilíbrio entre os elementos e o fundo.
Quadro de Tarsila do Amaral, busto de Celso Antônio e
almofada da coleção de Olívia Penteado
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 102
No outro
extremo da sala localiza-
se um escritório
favorecido pela luz de
uma grande vidraça.
Sobre a escrivaninha há
uma pequena escultura
em bronze de
Jaques Lipschitz e,
no outro extremo da mesa, uma luminária trazida de Paris, ambos os
objetos pertencentes a Olívia Guedes Penteado. Sobre a parede do lado
esquerdo da vidraça, vê-se a gravura Os emigrantes de Lasar Segall. Na parte
frontal, na passagem que há para o hall de entrada, posicionou-se a escultura de
mármore preto de Brecheret, Mulher com guitarra deitada. Na mesma parede se
encontra a obra Homem amarelo de Malfatti. Seu posicionamento nesse local é
valorizado pelo comprimento da sala, no mesmo sentido.
Durante a exposição, a sala de jantar funcionou como sala de leitura,
escritores
13
modernos encheram as estantes de livros: revistas de arte,
espalhadas na displicência de uma casa habitada”, como relata Tarsila do Amaral
em seu artigo publicado no Diários Associados. Entre os livros sobre a estante,
encontrava-se um busto em gesso de Graça Aranha esculpido por Celso Antônio,
que contrastava com o acabamento escuro das paredes revestidas com placas de
13
Entre os escritores modernos que participaram estavam: Alcântara Machado, Álvaro Moreira,
Affonso Schmidt, Arthur Carneiro, Ascenso Ferreira, Augusto Meyer, Brasil Gerson, Cassiano
Ricardo, Felipe d’Oliveira, Graça Aranha, Guilherme de Almeida, Jorge de Lima Jose Américo de
Almeida, Manoel Bandeira, Mário de Andrade, Menotti Del Picchia, Motta filho, Osório César,
Oswald de Andrade, Plínio Cavalcanti, Plínio Salgado, Paulo Prado, Ronald de Carvalho, Rubens
de Moraes, Tristão de Athayde.
Outro ângulo da sala de estar (arquivo MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 103
madeira
compensada de
imbuia natural. A
cortina em primeiro
plano é a mesma
da sala de estar,
com tonalidade
alaranjada. No
fundo desse
cômodo há outra
cortina igual, que,
nesta fotografia, se encontra fechada, cobrindo a visão do quintal com o muro
circular. O forro branco desse ambiente se integra com uma faixa superior da
parede que termina na mesma altura do lustre central, também branco. Este lustre
foi adquirido por Olívia Penteado em Paris e consta no catálogo com o nome de
l’anneau de saturne.
O dormitório do casal tinha todos os seus móveis construídos com imbuia
polida e as paredes pintadas de lilás claro. Nesse ambiente ganhavam grande
Quarto de casal sob dois ângulos de visão (arq. MASP e arq. Lasar Segall,
Sala de jantar adaptada para sala de
leituras durante a exposição (In:
FERRAZ, 1965, p 97). Como detalhe
fotografia colorida, de acordo com
descrições de Ferraz, na tentativa de
ilustrar a aplicação de cores feita pelo arquiteto Warchavchik. Não há dados
que definam as cores do piso e tapete deste ambiente.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 104
destaque um quadro de Tarsila do Amaral e a
colcha de veludo bordada e pintada por
Regina Gomide Graz
14
. Na segunda fotografia,
a colcha aparece em contra-luz, permitindo
melhor identificação das regiões pintadas e
com relevo. O outro extremo do dormitório
apresenta uma poltrona, uma cômoda e uma
penteadeira as quais se alinham à janela com
extensão horizontal; e de canto, uma das inovações apresentadas por
Warchavchik no Brasil. Até então, construíam-se apenas janelas centralizadas na
parede; quando pretendiam aumentar as aberturas, investia-se na construção de
mais de uma janela, todas iguais e distribuídas de forma simétrica pela parede.
Um dos dormitórios de solteiro, o único registrado, também apresentava
móveis de imbuia. Na fotografia ainda é possível observar duas telas entre as
14
O casal John Graz e Regina Gomide Graz já trabalhavam há quase dez anos confeccionando
objetos modernos para decoração de ambientes.
Ao lado, fotografia de um dos quartos de
solteiro (In:
FERRAZ, 1965, p. 93) e, acima,
imagem da pintura Religião brasileira
de
Tarsila do Amaral, identificada no ambiente.
Quadro Cartão Postal
de Tarsila do
Amaral sobre fundo lilás que interfere
suavizando as cores da pintura.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 105
quais Religião brasileira, de Tarsila do Amaral, aparece ao lado da janela; a outra
não foi identificada. Não se sabe se as almofadas são da autoria de Regina
Gomide Graz ou de Dominique (Paris), emprestadas por Tarsila do Amaral e
Olívia Penteado.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 106
4) Repercussão dessa expografia e alguns desdobramentos
A inauguração da Exposição de uma Casa Modernista realizou-se no dia 14
de março de 1930. Estiveram presentes diversas personalidades da cidade,
inclusive aqueles que, a princípio, não simpatizavam com o movimento.
“E entre os visitantes, o sr. Carlos Pinto Alves, que nos vaiava
sincronizadamente em 22, e agora chora de emoção no ambiente
‘futurista’, e o já citado e ilustre senador Freitas Valle, que brecava
a ida de Brecheret para a Europa, promovida por Julio Prestes (em
21) e a de Anita, conseguida pela sra. Washington Luis (em 22) o
qual agora se expande vigorosamente a favor de tudo. Ambos
muito distintos amigos mas de quem divirjo diametralmente em
crítica e lógica” (ANDRADE, O. 19 abr 1930, O Jornal).
Freitas Valle, citado por Oswald de Andrade, era um dos poucos mecenas
que recebia os artistas modernistas em seu salão; foi, inclusive, quem promoveu as
exposições de Lasar Segall em 1913. Contudo, seu apoio não era tão intenso
quanto o de Paulo Prado e, posteriormente, o de Olívia Guedes Penteado. A
personalidade mencionada por Oswald de Andrade no trecho acima, Carlos Pinto
Casa com público no dia da inauguração. (Fonte: FERRAZ, 1965)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 107
Alves, chegou, inclusive, a publicar no Diário da Noite um artigo fazendo analogia
entre os eventos da Semana de arte moderna e a Exposição de uma casa
modernista, elogiando-os:
“Aquele livre jogo de linhas puras e equilibradas em movimento
constante e em constante harmonia com a natureza tropical não é
simples tentativa; é uma sólida realização. Ali no costado do
Pacaembu, o espírito moço do Brasil fincou sua bandeira; e a casa
de Warchavchik ficará sendo avançada deste estupendo século
vinte. / Brecheret, Tarsila, Gomide, Celso Antônio, Anita Malfatti,
John Graz e tantos outros, atenderam ao toque de reunir. /
Ninguém se iluda; o São Paulo meteco e colonial está bem morto e
enterrado; as idéias novas estão em marcha; nada as deterá”
(ALVES, 27 mar. 1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.98).
Carlos P. Alves se rendeu a tal ponto ao movimento modernista que esse
trecho de seu depoimento assemelha-se ao pensamento de Oswald de Andrade
publicado poucos dias depois:
A casa de Warchavchik encerra o ciclo de combate à velharia,
iniciado por um grupo audacioso, no Teatro Municipal, em fevereiro
de 1922. É a despedida de uma época de fúria demonstrativa [...]
Da Semana de arte moderna à casa vitoriosa de Warchavchik vão
oito anos de gritaria para convencer que Brecheret não era
nenhuma blague, que Annita Malfatti era a coisa mais séria deste
mundo, que a literatura da Academia Brasileira de letras era uma
vergonha nacional, etc. etc! (ANDRADE, O. 19 abr 1930, O Jornal).
A abertura do evento foi filmada e exibida nas salas de cinema da época.
Era a primeira oportunidade, no Brasil, que havia para se entrar em um ambiente
semelhante aos que eram exibidos nos filmes de Greta Garbo, por exemplo. O
evento oferecia paralelamente outras atividades realizadas no próprio local como
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 108
palestras sobre arquitetura com Warchavchik,
as quais eram freqüentadas regularmente por
estudantes, oficinas com Tarsila do Amaral e
saraus literários.
A exposição, que a princípio
funcionaria de 26 de março a 14 de abril de
1930, chegou a ter sua data de encerramento
prorrogada até o dia 20 de abril, a pedido de
vários estabelecimentos de ensino que
desejavam que seus alunos visitassem a Exposição. Antes mesmo do
encerramento, os jornais já anunciavam que a casa havia sido visitada por mais de
20 mil pessoas, até então, número significativo levando-se em consideração a
população de São Paulo na época.
São muitas as citações nas quais se compara a casa na rua Itápolis às
construídas anteriormente por Warchavchik, a primeira na rua Santa Cruz e a
segunda na rua Bahia. Segundo o arquiteto Marcos J.
Carrilho, entre as três é possível observar
características diferentes. Assim, a falta de inovações
arquitetônicas na casa da rua Itápolis em relação às
anteriores construídas por Warchavchik, transfere a
importância sobre o ineditismo arquitetônico para o
”fato de ter sediado a Exposição de Arte Modernista e
da decorrente demonstração do princípio da integração
das artes: arquitetura, artes plásticas e artes aplicadas”.
Carta do diretor de Cahiers d’Art, Paris,
Chisthian Zervos, informando a
Warchavchik que imagens da casa
modernista haviam sido incluídas em
um filme (FERRAZ, 1965).
Anuncio de prorrogação da data
de encerramento da exposição
(FERRAZ, 1965)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 109
Segundo análise desse autor, a casa da rua Itápolis não apresentava
muitas inovações para a arquitetura, além do que já havia sido experimentado nas
anteriores. Na planta baixa, os cômodos estavam distribuídos de forma
convencional, como se aplicava aos sobrados de classe média em São Paulo,
aspecto denunciado, inclusive, pela presença da edícula, algo que não ocorreu na
segunda.
“Diante daquelas linhas puras e simples, diante daquela admirável
plasticidade com que Gregori joga com os planos e os volumes,
desprezando todo o acessório para não transgredir os limites do
essencial, o que obtém com rara felicidade: diante daqueles
interiores confortáveis e repousantes, tão agradáveis de ficar-se
neles” (RAPOSO, 15 abr. 1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.90).
Quanto aos materiais empregados, houve uma evolução entre as três
casas, principalmente entre a primeira e a segunda. Entre as mudanças, está a
construção da laje em concreto armado, permitindo a implantação de terraços com
jardim, enquanto na primeira casa foram utilizadas telhas, que foram dissimuladas.
Outra mudança foi em relação às venezianas, na primeira de tecido e as outras de
madeira pintada de vermelho, contrastando sobre as paredes brancas. Tratava-se
de uma ousadia para a época, que foi elogiada, inclusive por Le Corbusier durante
sua visita (FERRAZ, 1965, p.91). Contudo, a substituição dos materiais e confecção
dos mesmos não significava necessariamente a redução dos custos. O que se
economizava eram elementos de informação visual, ou, em outras palavras,
adornos investindo em volumes com contornos retos e circulares. Apesar do slogan
de casa econômica, a arquitetura moderna tornou-se uma opção estética que
atendia as necessidades de um novo estilo de vida:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 110
“Ela está, na realidade, criando o estilo da nossa época, valendo-se
dos materiais novos, ferro, cimento e vidro, como o permite o
imenso progresso da técnica industrial, e satisfazendo as
necessidades de simplificação, lógica, higiene e economia em que
se funda o espírito esportivo do mundo moderno” (FORMA, revista,
set. 1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.90).
As dificuldades encontradas por Warchavchik de conseguir materiais
adequados e mão de obra especializada no Brasil para confecção dos móveis e
acabamentos acarretaram trabalho artesanal e importação de peças que elevaram
os custos de algo que não era industrializado no país. Segundo Aracy Amaral, as
circunstâncias políticas e econômicas que o país atravessava também não
contribuíram para sua popularização:
“A nosso ver, contudo, a possibilidade de projeto e construção de
uma casa por Warchavchik, por seu caráter antieconômico, tinham
sentido de uma relação de vanguarda sem maiores repercussões
coletivas como passaria a ocorrer a partir dos anos 30. Era, no
entanto um privilégio de uma elite endinheirada, a ‘boa forma’
acessível a uns poucos como ainda o é, hoje, entre nós a boa
forma de desenho industrial inspirado no industrial designer
escandinavo ou italiano: um luxo” (AMARAL, A. 2003, p. 340).
Apesar dos altos custos, a economia de elementos de informação visual
agradou muitos visitantes; grande parte dos depoimentos registrados na época
associavam a casa ao bem estar, sensação de conforto, praticidade e higiene:
“Cingindo-se rigorosamente aos esforços da economia, ele fez obra
de arte. Utilidade e beleza. Trata-se duma impressão de bem estar
que é um prazer deliciosíssimo. Nos seus interiores há muito que
aprender. São uma verdadeira lição de bom gosto. Chegam a
realizar o que Ozenfant preconizou: a decoração sem ‘décor’.
Chegam a realizar o que não tenha a sua razão de ser e não
obedeça a um sentido estrito de necessidade imediata; que não
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 111
seja, enfim, indispensável e útil” (RAPOSO, 15 abr. 1930. Apud:
FERRAZ, 1965, p.90).
Outro aspecto elogiado era a plasticidade de volumes e linhas retas que
compunham a arquitetura da casa:
“a casa de Warchavchik é a casa moderna, a utilização técnica do
espaço e a ciência da construção posta a serviço do conforto.
Inteligência do século XX utilizada no sentido de tornar a vida
cômoda. Domina-se o sentimento arquitetônico, vivendo este da
harmonia simplíssima de um jogo geométrico. Seus grandes
planos, sua sábias linhas tornam-na uma jóia. O espírito nosso
repousa na visão serena e forte de sua estruturação” (DELL
PICCHIA, 20 mar. 1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.90).
Havia inclusive quem já mencionasse o acontecimento como um marco na
história da arquitetura brasileira:
“É pois de excepcional importância a sua contribuição. Pode-se
falar, no Brasil, em arquitetura de antes e de depois de Gregori
Warchavchik” (ALMEIDA, P. M., 9 ago. 1930. Apud: FERRAZ, 1965,
p.90).
A combinação desta arquitetura com o jardim tropical também não deixou
de ser admirada:
“Ele teve o dom de casar suas construções com a natureza, do
modo mais imprevisto e agradável possível” (ANDRADE, M., 1945.
Apud: FERRAZ, 1965, p. 87).
Ao que consta, a repercussão dessa nova linha estética de jardinagem que
valoriza plantas tropicais foi tão grande que o preço dos cactos passaram a ser
inflacionados nas floriculturas, segundo Mário de Andrade (24 dez. 1929).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 112
O livre acesso à casa facilitava muito a divulgação de suas propostas; outro
fator favorável era o período de mudanças pelo qual os cidadãos de São Paulo
passavam no momento, como argumenta Salvador Candia:
“São Paulo industrializava-se, a nação tinha vontade de renovar
suas estruturas políticas e sociais, os artistas também
proclamavam, muda Brasil./ Para ver quadros é preciso ir até eles;
para ler livros, ter vontade de fazê-lo. As figuras e paisagens da
pintura modernista, a linguagem das “Memórias de João Miramar”,
exigiam erudição, sensibilidade para apreciá-las, mas a arquitetura
da rua Itápolis estava lá, passava-se em frente e foi demais para a
mentalidade paulista. Bons tempos, eram tão dourados que ainda
havia escândalos” (CANDIA, 18 jun. 1986).
Novamente surgiu um escândalo. Apesar de novos adeptos, nem todos
estavam felizes com a nova linguagem estética da arquitetura; e havia quem sequer
queria reconhecê-la como tal:
“É lamentável que a Prefeitura tenha permitido a construção dessas
casas grotescas, quando o seu Código de Obras Arthur Saboya, no
art. 146 determina: O estilo arquitetônico de decorativo é
completamente livre, enquanto não se oponha ao decoro e à regra
da arte de construir. A Diretoria de obras poderá recusar projetos
de fachadas que acusam um flagrante desacordo com os preceitos
básicos da arquitetura. Ora, isto quer dizer que é permitida a
construção em qualquer dos estilos arquitetônicos, mas,
logicamente quando não se obedece a nenhum estilo deve ser
proibida. Logo, a casa do Pacaembu não poderia ser construída,
porque, não tendo arte, não pode ter estilo. Tal casa está portanto
em desacordo com os preceitos básicos da arquitetura porque não
tem beleza” (NEVES, 16 abr. 1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.90).
Christiano das Neves era professor de arquitetura na Universidade
Mackenzie e publicou dois artigos, um no dia 14 e outro no dia 16 de abril de 1930
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 113
intitulados respectivamente: Arquitetura e Futurismo” e A máquina de habitar do
Pacaembu”, criticando Warchavchik e sua proposta de arquitetura. No texto do dia
16 prossegue sua crítica, buscando defender a estética da cidade:
“Como arquiteto e professor da mal compreendia arte arquitetônica
no Brasil, protestamos veementemente que se qualifique como obra
de arquitetura as tais máquinas de habitar sensaboronas e feias,
atarracadas e banais, que permanentemente afligirão os nossos
olhos [...]. Imagine-se o que será essa cidade jardim [bairro do
Pacaembu] se continuarem a aparecer as casas tumulares de
cimento armado. Será inevitável a desvalorização desses terrenos,
que mais parecerão um prolongamento do cemitério do Araçá”
(NEVES, 16 abr. 1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.90).
No artigo de resposta publicado por Warchavchik, também no Diário de São
Paulo, ele argumentou que em dois momentos Neves afirmou que os paulistanos
eram ignorantes, pois muitos haviam aceitado a arquitetura moderna. Em primeiro
momento, Neves criticou-o por ser “de outros nortes, de outra origem e de outra
religião” buscando
desqualificar sua
arquitetura argumentando:
“Estamos fartos que venha
gente estranha ao nosso
meio, pretender divertir-se
a nossa custa,
aproveitando-se da
ingenuidade de certas
pessoas”; num segundo momento, apresentou alguns agravantes dessa situação:
“protestamos ainda que abuse da ingenuidade do nosso povo em matéria que
Charge de Belmonte publicada na Folha da Manhã, dia 10 de abril de 1930
(arq. MASP)
“Eu nunca fui amante da arquitetura futurista...
mas, depois que vi essas coisas amontoadas sou o maior fã do mundo”
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 114
desconhece, impondo-lhe essa insensatez artística e expondo-o ao ridículo perante
as pessoas cultas que visitam nossa cidade” (NEVES, 14 abr. 1930 apud:
WARCHAVCHIK, 20 abr. 1930). Warchavchik rebate:
“Com estas palavras insinua que todos os arquitetos modernos
(inclusive eu) são uns ignorantes tão completos, que somente se
arvoram em modernistas, ‘por lhes ser difícil, (como ele escreve
textualmente) compor com a infinidade de linhas curvas; e por
desconhecerem mesmo as regras da composição arquitetural,
traçam a esmo a reta, o elemento mais simples dos elementos
geométricos’” (WARCHAVCHIK, 20 abr. 1930).
Depois de destacar estes trechos e protestar que apesar de a casa estar
em exposição pública e o professor Neves não lhe haver dado a “honra de sua
visita”, Warchavchik limitou-se a salientar que já era legalmente um cidadão
brasileiro, a resumir seu currículo e a argumentar:
“Estas insinuações emitidas com o fim evidente de prejudicar moral
e materialmente a um colega de profissão, só por si já vem
demonstrar que o sr. Christiano das Neves não tem sequer noção
dos seus deveres de profissional, o que vem completar o quadro da
já proverbial ignorância deste ilustre senhor, ignorância fácil de ser
provada pela leitura dos seus numerosos e diversos artigos, onde
ele se vê obrigado a citar tenentes e coronéis como autoridades em
assuntos arquitetônicos, quando não encontra material para citar no
seu inseparável conselheiro o livro de Charles Blanc”.
(WARCHAVCHIK, 20 abr. 1930).
De acordo com os artigos publicados, as sensações dos visitantes ao
ingressarem na casa eram realmente positivas, como se expressa nesta citação:
[...] as pessoas que as visitam [referindo-se não só a casa do
Pacaembu, mas às outras duas anteriormente construídas] por
dentro ficam encantadas: sentem que ali se viverá com inteiro
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 115
conforto a vida dos nossos dias. E os que aceitam as formas
modernas, com o gosto da vida moderna, esses acham deliciosas
as surpresas de Warchavchik, obtidas por meio dos elementos
geométricos mais simples e mais puros” (FORMA, Revista, set.
1930. Apud: FERRAZ, 1965, p.90).
Menotti dell Picchia, que participou da exposição, observou como nesse
ambiente todos os elementos encontravam-se integrados. Assim como em outros
comentários aqui mencionados, associou a linguagem estética do local à higiene,
da mesma forma que atualmente remete-se freqüentemente a expografia moderna
à assepsia:
“Suas acomodações interiores são esplêndidas. A impressão que
se dá é de higiene, conforto e bom gosto. Nada ali é demais. Só há
o necessário e o que há, harmoniza-se por tal forma com o
ambiente que este cria uma alma singular de esplendor e de
beleza” (DELL PICCHIA, 20 mar. 1930. Apud: FERRAZ, 1965,
p.90).
Foi visitando seu interior durante a exposição que Mário de Andrade
observou como o ambiente modernista, completamente livre de ornamentos,
favorecia a interpretação dos objetos apresentados como obras de arte. Em seu
artigo publicado no Diário da Noite propôs a inserção de outros objetos, mesmo que
pertencentes ao cotidiano, para que ganhassem conotação artística. Esta é uma
discussão presente ainda hoje e que vem acompanhando o desenvolvimento da
expografia no decorrer da história da arte.
“Se eu possuísse uma casa modernista (...), entre os móveis
modernos da sala-de-visita eu colocava uma cadeira Luiz XV.
Imaginemos isso em nossa cabeça: qual a sensação que dá? A
única legítima atualmente a respeito duma cadeira Luiz XV: a
sensação dum objeto de arte” (ANDRADE, M., 27 mar 1930).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 116
Oswald interpretou erroneamente a observação de Mário de Andrade e o
criticou dizendo que em uma casa modernista não se deveriam inserir objetos do
passado. Tarsila utiliza as palavras sóbrio, silencioso e confortável para descrever
sensações que a casa lhe proporcionou:
“ Pintores de vanguarda ali estavam representados, com seus
quadros alegrando as paredes; esculturas completavam o interior
na linha sóbria de um móvel ou um canto silencioso do jardim;
escritores modernos enceram as estantes de livros; revistas de
arte espalhadas na displicência de uma casa habitada; móveis em
conjunto admirável, tapetes, louças, no conforto previsto e estudado
da casa moderna. Foi acontecimento exposto a visitas de trinta mil
pessoas que por lá passaram” (AMARAL, T., 1936)
Segundo Cintrão, no Brasil não se estava preparado para as mudanças
propostas nos eventos da Casa Modernista, pois:
“fazendo que se perdessem no tempo e fossem recuperados muitos
anos depois, por meio de escassas publicações. Sequer
influenciaram na maneira de apresentar as obras de arte, que
permaneceu praticamente a mesma até o surgimento do Museu de
Arte Moderna de São Paulo, em 1947 (sic), e do Museu de Arte de
São Paulo, em 1948, e entrando numa nova era que adaptou
painéis como o principal suporte para obras bidimensionais. Não
por acaso, os projetos arquitetônicos que surgiram após os anos 50
praticamente eliminaram as paredes das salas de exposição
(CINTRÃO, 2001, p.224).
Apesar da opinião de Cintrão, os registros de exposições realizadas
posteriormente pelos modernistas comprovam o contrário. Ocorre que até então
não se construiam museus de arte e as exposições havidas até então eram
realizadas em espaços improvisados, tal como já se fazia anteriormente. Contudo, a
distribuição das obras na Exposição condiz com a expografia moderna.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 117
Ainda em 1930, Warchavchik apresentou sua tese no IV Congresso Pan-
Americano de Arquitetura, no Rio de Janeiro, e comentou sobre a exposição em seu
relatório apresentado ao CIAM. Também em 1930, houve outra exposição de arte
moderna como recordou Ferraz:
“O mês de junho começara com uma grande notícia: a vinda a São
Paulo, via Recife e Rio de Janeiro, do pintor Vicente do Rego
Monteiro, que se fazia acompanhar do editor de uma revista
parisiense, Montparnasse, o crítico e estudioso de arte Geo-
Charles. Chegavam com um acervo de quase noventa quadros,
entre os quais vinham Gleizes, Picasso, Lhote, Léger, Vlaminck,
Severini, Foujita, Marcoussis, o próprio Rego Monteiro, cuja pintura
era então desconhecida aqui. Na informação, mencionávamos que
se tratava, nesse ano de 1930, tão tormentoso, politicamente, da
terceira grande exposição, depois da de Brecheret e da Exposição
de uma Casa Modernista, empreendida pelo arquiteto Warchavchik”
(FERRAZ, 1983, p.79).
CAPÍTULO III
PINACOTECA
MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO (1968-97)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 119
Neste capítulo desenvolveremos um estudo sobre o projeto de expografia
da Pinacoteca do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP), que
permaneceu em uso no museu no período de 1968 a 1997. O primeiro tópico
narra a história dos primeiros anos do MASP, buscando frisar as idéias que o
conceberam, detalhando iniciativas e desenvolvimento do projeto; tal é o contexto
no qual as premissas que determinam o projeto da expografia em questão são
traçadas. No segundo tópico, abordaremos a formação da autora do projeto, que
foi Lina Bo Bardi, bem como algumas experiências vivenciadas por ela, que
influenciaram diretamente seu trabalho e, conseqüentemente, o desenvolvimento
do projeto. No terceiro tópico analisaremos descritivamente a expografia da
Pinacoteca MASP (1968-97) cuja proposta expográfica foi inédita, tanto no país
quanto no exterior, por conta principalmente da criação dos “cavaletes-painéis”.
Na seqüência, no quarto tópico, será feito o relato sobre a repercussão das
opiniões tanto dos críticos como do público, documentadas na época.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 120
1) Precedentes
O Museu de Arte de
São Paulo foi fundado em
1947. Seu mentor foi Assis
Chateaubriand (dono dos
Diários Associados). Entre
outras personalidades que
fizeram parte desta história
destacaremos:
Pietro Maria Bardi,
que foi intitulado
diretor do museu,
assessorava a compra e catalogação de todas as novas aquisições de
obras e introduziu o sistema de painéis didáticos no museu.
Lina Bo Bardi, que foi autora do projeto do edifício/museografia do museu e
da criação dos “cavaletes-paineis”. Trata-se de um projeto que reúne
“cavaletes de vidro” (suporte para obras bidimensionais até então inédito),
associados aos “painéis didáticos” usados pelo museu desde sua
inauguração.
No período que precede o surgimento do MASP e sucede a Semana de
arte moderna de 1922, ocorreram várias iniciativas em direção à criação de um
museu de arte moderna propriamente dito. Durante a década de 1930, além da
Exposição de uma casa modernista, do qual discorremos no capítulo anterior,
realizaram-se algumas exposições organizadas pelo SPAM (Sociedade Pró Arte
Detalhe mostrando edifício dos Diários Associados em reforma
durante 1938 na região central de São Paulo (TOLEDO, 1980,
p.145).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 121
Moderna, 1932-34) e CAM (Clube de Arte Moderna, 1931-32); outras exposições
ocorreram, por exemplo,
o Salão de maio, de
1939, e o Salão do
SPAM, de1934.
Nenhuma dessas
iniciativas, porém,
buscava formar um
acervo visando um
possível museu de arte
moderna. Havia poucos museus na época e os acervos existentes não
contemplavam representações significativas que fossem capazes de ilustrar a
história das artes. Contudo, a Pinacoteca do Estado de São Paulo, além de
algumas obras de artistas brasileiros, possuía muitas reproduções, cópias de
obras existentes em museus da Europa realizadas pelos bolsistas financiados
pelo governo brasileiro durante o período de estudos no exterior.
“São Paulo era paupérrima em obras de arte; algumas coleções
de contemporâneos como a de Paulo Prado, de Oswald de
Andrade, Olívia Penteado acabaram se dispersando. Obras
antigas praticamente nunca existiam tanto em qualidade quanto
em quantidade” (BARDI, 1967, p.17).
Foi sensibilizado por essas condições na qual o Brasil se encontrava
privando sua população de fruir objetos de arte originais e mais representativas
que Assis Chateaubriand desejou criar um museu de arte. Isso está de acordo
com seu próprio depoimento escrito por ocasião da inauguração do MASP em
1947:
Salão do SPAM, 1934 (arq. Lasar Segall)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 122
“Há quinze anos entrando no Museu do Ipiranga, um domingo, vi
um grupo de adolescentes de uma das nossas escolas públicas,
os olhos embevecidos para alguns quadros daquela modesta
galeria. Via-se que não entendiam de pintura. Mas nos olhos
fervia-lhes um êxtase indisível, diante das páginas de arte que
contemplavam. Eram os estudantes, em sua maioria, filhos de
italianos. Eu lhes disse: ‘Um dia faremos uma sociedade com
homens de sensibilidade e de inteligência. E com eles daremos
uma galeria de arte para vocês” ( CHATEAUBRIAND, 1947 apud:
Departamento de Documentação, 1968, s/p).
A década de 1940 propiciou um ambiente favorável para quem quisesse
investir na criação de museu de arte no Brasil: em primeiro lugar, a Segunda
Guerra, que se desenrolava em um território no qual obras de arte de grande
valor se concentravam, e, em segundo lugar, o avanço econômico do Brasil em
conseqüência do crescimento do setor industrial. Na tentativa de proteger obras
de arte dos bombardeios, Germain Bazin organizou uma exposição de pintura
francesa apresentada no Brasil. Segundo Flávio Motta, que posteriormente
chegou a compor o conselho consultivo do MASP, nesse momento: O Brasil
recebe o primeiro grande impacto de qualidade, vindo da Europa depois da
Missão francesa de 1816” (Ibidem, 1968, s/p). Logo em 1941, Quirino da Silva,
que também integrou o conselho consultivo do MASP, conseguiu introduzir um
salão de arte na Feira Nacional de Indústrias, que ocorria anualmente em São
Paulo e representava um fato inédito:
“o poeta Guilherme de Almeida viu bem esse significado,
dizendo, por ocasião da inauguração do certame: ‘... nesse
instante decisivo da vida tumultuária de São Paulo, eis que num
recanto propicio este em que estamos entre os stands
gritantes de progresso desta nossa Segunda Feira Nacional de
Industrias, um Salão de arte se inaugura. Um salão de arte numa
feira de indústrias... Isto é um sintoma, um símbolo, um sinal dos
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 123
tempos. É preciso compreendê-lo bem no seu importantíssimo
sentido” (Ibidem, s/p).
Em 1946, Chateaubriand contratou Quirino da Silva para escrever sobre
arte no jornal e conseqüentemente trabalhar como “técnico de museu”, uma
espécie de consultor. Foi uma tentativa de iniciar o desenvolvimento de seu novo
projeto, a criação do Museu de Arte Antiga e Moderna (que era o primeiro nome
do que veio a ser o MASP). Por algum período, Quirino havia-se dedicado à
pintura e criado uma revista de arte chamada Forma, na qual Frederico Barata
15
,
jornalista responsável pela editoração de arte na cadeia de jornais Diários
Associados, já havia escrito. Quirino da Silva chegou a esclarecer para Geraldo
Ferraz que também trabalhava como jornalista para Chateaubriand, na época:
“Assis tencionava fazer um museu de arte e o consultava quanto
à composição de um acervo, uma coleção de arte ambiciosa,
sem dúvida, para a época, mas imaginada e iniciada num
momento em que o mercado europeu cedia à gente de -bas
(sic) quanta tela disponível em mão de pessoas que se achavam,
então, em dificuldades”. (FERRAZ, 1983, p.30).
Ainda segundo Ferraz, Chateaubriand chegou a convidar Quirino da Silva
para que o acompanhasse à Europa para comprar obras de arte para o acervo,
mas Silva recusou a proposta em razão de seu medo de viajar em avião. Mesmo
assim, Chateaubriand não desanimou e usando como referência a história que
conhecia sobre o Museum of de Modern Art, de Nova Iorque, dizendo que Nelson
Rockefeller não estava sozinho durante sua criação, revelou que daria
continuidade ao projeto porque os milionários paulistas tinham dinheiro para
15
Frederico Barata foi um dos primeiros doadores do MASP, oferecendo a obra Cinco moças de
Guaratinguetá de Emiliano Di Cavalcanti (BARDI, 1992, p.10), que por curiosidade também
chegou a trabalhar nos Diários Associados, fazendo caricaturas para jornal assinando sempre
como Urbano (FERRAZ, 1983, p.19).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 124
doações. E que cada participante ficaria com o nome gravado numa placa,
acompanhando uma tela ou escultura” (Ibidem). Assim, passou-se a publicar
anúncios nos jornais dos Associados, solicitando doações para a formação do
Museu. Segundo informações publicadas pelo departamento de documentação,
as primeiras doações de obras que integrariam o acervo da instituição foram
reunidas no ateliê do próprio Quirino da Silva (DEPARTAMENTO DE
DOCUMENTAÇÃO, 1968, s/p).
Foi durante esta fase, em 1946, pouco antes de escolher a cidade que
sediaria o museu, Chateaubriand conheceu Pietro Maria Bardi com quem viria a
formar uma equipe. Pietro Maria Bardi era de Roma e dedicava-se ao comércio e
divulgação das artes plásticas e arquitetura. Sua formação, porém, não foi muito
convincente: foi expulso do colégio após ser reprovado pela quarta vez no
segundo ano da escola primária. Bardi foi trabalhar como operário, depois, de
ofice-boy, para um advogado, estudando por conta própria, chegando a publicar
seu primeiro livro já aos 16 anos de idade. Foi um ensaio sobre as possessões
coloniais de Jeremias Bentham, publicado pela editora L’Avanti! de Milão”
(BARDI, 1992, p. 13). Enquanto jovem, foi seguidor de Mussolini e chegou a servir
na Primeira Guerra. “É sabido que tenho um passado fascista, o que não me
impediu de combater mais tarde a arquitetura oficial de Mussolini, numa polêmica
que se tornou notória” (Ibidem, p.13). Na década de 1930, Bardi viajou com
destino a Buenos Aires, Argentina, onde participou do IV CIAM e realizou uma
exposição de arquitetura italiana no Museo Nacional de Bellas Artes. Na volta fez
escala no Brasil, visitando Minas Gerais, viagem que lhe despertou interesse por
conhecer a América Latina. Em Roma, administrava o Studio d’Arte Palma para o
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 125
qual chegou a contratar Francesco Monotti como diretor e Mario Modestini como
restaurador.
“O Studio foi um empreendimento que tentei depois do final da
Guerra, pois durante o conflito adquiri muitas obras: baseado no
comércio, abrangia também a cultura, com a organização de
mostras de pintura e escultura, cursos de história da arte,
conferências e outras atividades ligadas às artes plásticas. A
sede, bem montada e acolhedora, dotada de biblioteca, depósito
e oficina de restauro, localizava-se num prédio na praça Augusto
Imperatore [em Roma]. Clientes e curiosos não faltaram.
Comecei com mostras de artistas de renome, lancei algumas
exposições curiosas, insisti na minha polêmica pela arquitetura
racional que teve bastante repercussão na Itália” (Ibidem, p.9).
Bardi conta ainda que algum tempo depois, a jovem arquiteta Lina Bo
veio trabalhar conosco. Começamos a namorar e casamos” (Ibidem, p.9). Lina Bo
de quem discorreremos mais adiante relatou em uma entrevista realizada
pouco antes de seu falecimento em 1992, que Bardi era uma pessoa que tinha
muitos amigos estrangeiros, principalmente americanos e franceses e que se
ajudavam mutuamente:
“Pietro ajudava todos os jovens, especialmente os judeus
exilados em 1937 para que os fascistas não os matassem.
Ajudou também a Bruno Zevi
16
, que tinha se formado com Walter
Gropius e foi para os Estados Unidos (...) Pietro ajudou muito aos
jovens que recorriam a ele, pois era muito amigo de Giuseppe
Terragni e tinha ajudado na fundação de arquitetura orgânica”
(BO BARDI, 2002, p.238).
Lina Bo havia integrado o movimento de resistência na Itália e era
também filiada ao partido informal Comunista durante a guerra; antes de vir para
o Brasil, havia se desiludido com seu país:
16
Bruno Zevi havia trabalhado na revista Domus junto com Lina Bo Bardi na década de 1940.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 126
“Em 1946, nós percebemos que nosso sonho de um país
moderno, livre, havia terminado. Convocaram eleições livres e
ganhou a Democracia Cristã. Foi terrível; e disse: ‘Vou embora’.
Minha mãe estava desesperada” (Ibidem, p. 238).
Nesse mesmo ano (1946) casou-se com Bardi, que queria levá-la para
viajar e desejava continuar conhecendo a América Latina. Enquanto juntos
planejavam uma viagem para conhecer Quito e México, receberam um convite
para vir ao Brasil. O convite partia de amigos de Bardi, que estavam vivendo no
Rio de Janeiro. Foram estes o embaixador Pedro de Moraes Barros e o jornalista
italiano Mário da Silva que, antes da Segunda Guerra, fora redator do Lavoro
Fascista, jornal romano.
Assim, o casal Bardi ingressou no Brasil em 1946, trazendo consigo
obras da coleção Studio d’Arte Palma para realizar algumas exposições de arte.
Realizaram duas exposições seguidas no salão nobre do edifício do Ministério da
Saúde do Rio de Janeiro, local conseguido por intermédio de Mário Silva, que
lhes traduziu os catálogos para o português. Uma exposição foi de pinturas
italianas do século XIII ao XVIII e a outra, de artistas italianos contemporâneos.
Depois dessas duas exposições, como observa Olívia de Oliveira, o casal chegou
a realizar uma terceira exposição na sala de exposições do Palace Hotel
Copacabana, com objetos de arte para decoração de interiores (Ibidem, p. 242).
Bardi recorda na introdução do livro História do MASP, escrito em 1992,
que durante a realização das exposições mencionadas no Rio de Janeiro,
Chateaubriand, foi um dos primeiros visitantes a comparecer. Na ocasião
demonstrou-se interessado pelos quadros antigos, adquirindo quatro deles.
Chateaubriand conversou com Bardi sobre seu interesse de montar um museu de
arte no Brasil. No mesmo texto, Bardi recorda que seu amigo Mário Silva lhe disse
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 127
que Chateaubriand era conhecido como o “rei da comunicação” e o advertiu
diversas vezes dizendo para tomar cuidado, pois ele tinha fama de aventureiro;
mas Bardi diz que não teve a mesma impressão e logo confiou nele “Poderia até
ser aventureiro, mas no bom sentido” (BARDI, 1992, p.10). Bardi e Chateaubriand
passaram a se reunir em almoços e jantares nos quais conversavam sobre as
possibilidades de estabelecer tal museu. No decorres de tais encontros Bardi
chegou a convencer Chateaubriand a mudar o nome do museu:
“Diversas vezes ele me disse que eu deveria projetar o novo
estabelecimento e pretendia denominá-lo ‘Museu de Arte Antiga e
Moderna’. O Criador admitia a discussão: com o pouco de ‘savoir
faire’ lhe mostrei a inutilidade de diferenciar as artes, sendo
preferível não fazer distinções e abranger todas as artes
plásticas. Percebi que conquistava sua confiança. Aos poucos ele
se convenceu e aceitou o título de ‘Museu de Arte’, como o
MASP era conhecido no início” (BARDI, 1992, p.11).
Uma vez convencido, Chateaubriand convocou Quirino da Silva e
Geraldo Ferraz à sua sala para comunicar que o título de Museu de Arte Antiga e
Moderna não deveria mais ser publicado, pois seria alterado para Museu de Arte
de São Paulo, um título mais conveniente” (FERRAZ, 1983, p.131). Esse novo
título se mostrou uma ótima estratégia, uma vez que o museu dependia de
doações e que poderia haver repulsa pela arte “antiga” por parte de uns e pelo
adjetivo “moderno” por parte de outros.
Os encontros continuaram e, enfim, Chateaubriand convidou Bardi para
assumir a direção do novo museu. Bardi aceitou a proposta, mas a cidade que
sediaria o novo museu ainda não estava definida. Pensava-se em duas cidades:
Rio de Janeiro ou São Paulo, mesmo apesar de os anúncios pedindo doações
para o museu já se encontrarem em publicação.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 128
Lina Bo aprovou a nova idéia do nome do museu. Havia-se apaixonado
pelo Rio de Janeiro, estava encantada com os avanços da arquitetura moderna
no Brasil e logo teve vontade de construir o tal museu. Lina Bo chegou a
confessar em vários momentos (como no documentário
em vídeo “Lina Bo Bardi”), que desejava construir o
museu no Rio de Janeiro, mas Chateaubriand escolheu
São Paulo. Rio de Janeiro podia ser a capital do país,
mas São Paulo apresentava um grande
desenvolvimento financeiro iniciado com o cultivo de
café e com o crescimento da industrialização. Bardi
recorda que recebeu a noticia enquanto estava no Rio
de Janeiro através de um telegrama escrito em italiano
por Chateaubriand, com a seguinte mensagem:
“Domani andiamo a São Paulo. Ho deciso di aprire là il
Museo, nell’edificio che stò finendo diconstruire, sede dei Diários Associados”
(BARDI, 1992, p. 13).
O novo edifício dos Diários Associados, que naquele momento passava a
abrigar também o MASP, situava-se na rua Sete de Abril, em pleno centro de São
Paulo:
ainda se encontrava na fase do concreto. Inspecionamos o
primeiro andar, uma área com cerca de mil metros quadrados.[...]
Lina projetou os espaços no segundo andar do edifício
denominado ‘Guilherme Guinle’, cujo projeto era de autoria do
arquiteto francês Jacques Pilon, autor também do vizinho prédio
da Biblioteca Municipal. Era simples, parecia um apartamento: o
ingresso levava a um corredor e deste à sala principal destinada
à coleção. Havia uma sala para exposições periódicas e outra
Desembarque de Lina Bo
e Pietro Bardi em São
Paulo
em 1947 (BO
BARDI, 1993, p. 26)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 129
para a exposição didática de história da arte. Finalmente havia
auditório, para 100 lugares, destinado a cursos, conferências,
concertos e para a qual Lina desenhou uma cadeira dobrável que
foi produzida por Roberto Consolaro, um artesão italiano que aqui
morava, pois no comércio nada encontrávamos semelhante”
(BARDI, 1993, p.13).
Inicialmente ocuparam apenas uma sala, ainda em alvenaria, na qual se
encontravam duas escrivaninhas, um quadro negro e uma estante onde eram
dispostas as aquisições que chegavam (BARDI, HOSSAKA, s/d, p.24). No
período de 1947 a 1958, Bardi realizou freqüentes viagens ao exterior em busca
de obras para compor o acervo. Durante sua ausência, a arquiteta Lina Bo
assumia a direção do museu, enquanto coordenava a adaptação do espaço e
montagem da exposição.
Realizou-se uma cerimônia de inauguração do MASP no dia 2 de outubro
de 1947, mesmo nas condições nos quais o local se encontrava, para permitir que
alguns cursos fossem iniciados. A proposta inicial do MASP não se resumia
simplesmente a exibir uma coleção de arte. Sua concepção assemelhava-se
muito mais à proposta de um centro cultural: pretendia-se educar, formar um
blico com sensibilidade e repertório necessários para a melhor fruição da arte.
Parte dos cursos possuía um acento prático, possibilitando não só a vivência de
uma experimentação artística, como também capacitando pessoas que
quisessem exercer alguma função no museu. Isso possibilitou que muitos ex-
alunos fossem posteriormente contratados. Assim, além do curso de história da
arte, ofereceram-se aulas de estética, pintura, música, design, paisagismo,
museografia e outros.
Para se ter uma idéia do estado das obras de construção, durante a
inauguração (que atraiu artistas, intelectuais, representações políticas e do
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 130
exterior), o edifício se encontrava ainda coberto por andaimes. Usou-se como
elevador uma armação que se suspendia com a ajuda de guinchos usados na
construção; em todo o recinto do museu encontravam-se caixas cal dispostas em
diversos pontos com o objetivo de amenizar a umidade do ar, que poderia
danificar as obras existentes.
“A arquitetura interna do Museu restringiu-se às soluções de
‘flexibilidade’, à possibilidade de transformação do ambiente,
unida à estrita economia que é própria do nosso tempo” (BO
BARDI, 1993, p.46).
Apesar das condições climáticas inadequadas, o Museu apresentou as
obras que já existiam na coleção como de Picasso, Cézanne e Rembrandt, sobre
painéis que, segundo Lina Bo, eram de fundo neutro(Ibidem, p. 46).
Esses painéis eram aparentemente de madeira pintada, suspensos à altura de
aproximadamente um metro, por uma fina estrutura metálica. Cada um deles
comportava, de cada lado, aproximadamente, dois ou três quadros dependendo
de suas dimensões, alinhados pela altura da parte superior das telas. A
disposição destas obras também não apresentava nenhum critério de
Foto do interior do MASP no edifício Diários Associados após reforma em 1950 (In:
BO
BARDI, 1993, p.47)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 131
organização, sendo que estas eram identificadas por uma pequena legenda
descritiva, disposta sempre do lado direito de cada uma, e, em algumas
circunstâncias, na parte inferior, e outras, na lateral, seguindo um critério que
aparentemente visava preencher espaços vazios encontrados no painel de fundo,
de acordo com o formato da tela. Todas as obras que possuíam molduras sem
autenticidade da época foram eliminadas e substituídas por um filete [também]
neutro(Ibidem, p.46). Através de fotografias ainda é possível observar que no
fundo da sala sobre uma longa mesa aparentemente estreita, cujo comprimento
atravessava o recinto, apresentavam-se pequenas esculturas e outros objetos
tridimensionais. Em outra parte do museu, realizou-se uma exposição de painéis-
didáticos que forneciam informações sobre toda a história da arte, portando
grande número de ilustração fotográfica, textos, gráficos e legendas. Painéis
semelhantes a estes haviam
sido usados anteriormente pelo
Studio d’Arte Palma em
mostras didáticas na Europa e
aqui se encontravam
traduzidos para o português.
“Este sistema, então inédito, de se
apresentarem num museu painéis
de fácil compreensão,
despertando o interesse do
público, teve várias críticas,
inclusive internas. Havia quem
dissesse que podiam ser
interpretados como relevo à falta
de cultura na cidade. Insisti e
acabei mostrando que, através
Painel didático utilizado
no MASP no ed. Diários
Associados e detalhe de
fixação dos canos
estruturais (arq. MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 132
daquelas manifestações, o MASP oferecia seu espírito inovador:
não ser apenas um mostruário de obras, mas um local que
incentivava a iniciativa, o interesse pela história. Esta decisão
realmente derivava de uma indagação sobre o nível de
informação local sobre o assunto. Não queríamos ensinar arte a
pessoas notoriamente informadas, no entanto, pretendíamos
ampliar aquela difusão. A situação na cidade indicava a
necessidade de difundir conhecimentos específicos que
justificavam a abertura de um museu diferenciado da já existente
Pinacoteca do Estado, continuadora de uma museologia
oitocentesca” (BARDI, 1992, p.13).
Apesar de haver surgido críticas negativas, o uso desses painéis-
didáticos rendeu a primeira projeção internacional do recém-inaugurado Museu de
Arte:
“todavia, no congresso da UNESCO em México City, naquele
mesmo ano, a idéia e o método foram discutidos, unanimemente
aprovados, e a relação publica na revista do órgão ‘Museum’. Era
a primeira vez que se enfrentava o problema da divulgação da
arte a um público freqüentador de um museu; pareceu lógico a
proposta vir de um país novo” (BARDI, 1967, p.16-17).
Além da sala da Pinacoteca e da exposição didática, o Museu
comportava mais duas salas para exposições temporárias que exibiam no
momento obras de Ernesto de Fiori e na outra a Série bíblica de Cândido Portinari
que pertencia à coleção particular de Chateaubriand e, posteriormente, foi
adicionada ao acervo do Museu. A sede do museu no edifício dos Diários
Associados teve sua construção concluída apenas em 1950, após a finalização
dos demais estabelecimentos como o auditório e as oficinas. Durante esse
período duplicaram a parede da sala de exposição do acervo com a finalidade de
reduzir a temperatura do ambiente que foi controlada desde o principio entre 23 e
26°C e 60° de umidade no ar para manter a conservação das peças. Todos os
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 133
espaços eram iluminados com luz branca e homogênea, resultante de uma
combinação de lâmpadas de tubo fluorescente rosa e branco, intercaladas e
escondidas atrás de caixilhos móveis.
Apesar de, na época, o Museu ter atraído um público de cerca de mil
alunos (BARDI, HOSSAKA, s/d, p.24) somados a quinhentos visitantes por dia
(BO BARDI, 1993, p.44), o museu não atingia a visibilidade pretendida, o que
dificultava a aquisição de patrocínio. Segundo Bardi, a identificação dos Diários
Associados com o Museu de Arte era tanta que as pessoas chegavam a chamar o
MASP durante os primeiros anos de sua existência de Museu dos Diários
Associados” (Ibidem, p.13) e provavelmente era por esse motivo que o restante
da imprensa paulistana (concorrente dos Associados) não divulgava nada sobre o
assunto. Outro fator que também causou muita confusão foi o fato de o Museu de
Arte Moderna de São Paulo, criado em 1949 por Francisco Matarazzo Sobrinho,
ter ocupado, durante seus primeiros anos de formação, um espaço alugado no
mesmo edifício dos Diários Associados. Assim, apesar de ambos apresentarem
propostas de trabalho bastante diversificadas, o Museu de Arte de São Paulo, ao
longo de sua trajetória, foi freqüentemente confundido com o Museu de Arte
Moderna de São Paulo. E continuou sendo, mesmo na década de 1970, quando
o MASP já ocupava sua nova sede na avenida Paulista, que lhe projetou maior
visibilidade. Isso também se observa na simples leitura dos artigos de jornais da
época, que faziam, igualmente, confusão.
O principal trabalho de aquisições de obras para a formação do acervo foi
realizado até 1958, ano em que a equipe responsável por essa ação perdeu o seu
principal integrante, Assis Chateaubriand. Tratava-se de um trabalho de equipe
formado por Assis Chateaubriand, Edmundo Monteiro e Pietro Maria Bardi. A
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 134
função de Bardi era a de realizar as aquisições e catalogações das obras, o que
se tornava possível pela experiência que havia adquirido em trabalhos anteriores;
seu conhecimento sobre história da arte e os contatos que mantinha com
colecionadores, donos de museus e antiquários dos Estados Unidos da América e
diversos países da Europa. Quem realizava as negociações e concretizava as
compras era Edmundo Monteiro, que cuidava de toda parte burocrática, enquanto
Assis Chateaubriand se dedicava a encontrar novos doadores. Ele era assim
descrito por Bardi:
“Detestado por muitos, pois pregava a participação financeira em
favor de suas campanhas beneficentes. Aplicava o ‘seu’ IPTU em
prol de todos os que não podiam ser taxados por este ou aquele
programa benemérito. / Autêntico manipulador de opinião publica,
conhecia a prole dos abastados com tamanha familiaridade que
surpreendia, ficando difícil adivinhar a fonte de informação. Sabia
tudo de todos. Ninguém escapava de seu retrato de candidato a
doador do MASP. Era difícil, diria impossível, recusar seu pedido”
(Ibidem, p. 20).
Na imprensa, Chateaubriand teve de publicar um artigo para se defender
das acusações, que afirmavam que ele quase sempre chegava a ameaçar os
candidatos a doadores com campanhas difamatórias, caso ele se negasse a fazer
a contribuição desejada” (FARIA, 1997, p.10). Por outro lado, de acordo com o
depoimento de Bardi, a recepção das novas obras e o ato da doação pareciam
ser tão bem armados, que o evento acabava por promover a imagem do doador
de tal maneira que transformava a doação em algo muito atrativo:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 135
“Chateaubriand costumava organizar tudo para que a chegada
das obras da coleção fosse bem divulgada na imprensa,
envaidecendo os doadores. Às vezes, os convocava ao porto do
Rio ou Santos ou nos aeroportos
onde desembarcassem as obras,
fazendo abrir a caixa, com fotógrafos
registrando o acontecimento,
discursos de felicitações aos
doadores e seus jornais completavam
a acolhida divulgando o fato. Outras
vezes organizava, ou pedia aos
doadores que organizassem,
recepções de gala à noite, em suas
bonitas residências quando a obra
era mostrada ao público presente. O sistema funcionava bem e
as festas eram um sucesso” (BARDI, 1993, p.30).
Em 1953, o descrédito que o acervo recebia no Brasil onde corriam
boatos que as obras eram falsas levaram Bardi a pensar numa estratégia para
acabar com as difamações. Assim, buscou o reconhecimento internacional,
levando o acervo do MASP em tournée por diversos países da Europa e para os
Estados Unidos. A mostra percorreu, entre outros, o museu do Louvre de Paris,
Palais dês Beaux Arts de Bruxelas, Central Museum de Utrecht, Tate Galery de
Londres, Kunsthalle de Düsseldorf, Kunstmuseum de Berna, Palazzo Reale de
Milão e Metropolitan Museum de Nova York. Em todos, houve grande
repercussão e alguns países chegaram a reivindicar a devolução das peças.
Mesmo sem a mesma repercussão no Brasil, após o período de tournées, o então
presidente Juscelino Kubitschek doou “alguns milhões de dólares para fortalecer a
coleção” (BARDI, s/d, p.25):
“a importância das peças reunidas embora em limitada
quantidade era tão inusitada que em São Paulo (cuja modesta
Doador exibindo a nova aquisição do MASP
Madame
Cézanne de vermelho
que é aplaudida a bordo do navio
Uruguai em 1949 (
In:
NATALI, 1997, p.34)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 136
Pinacoteca do Estado, fundada em 1911, pouco teria a
proporcionar aos interessados em artes plásticas, a não ser
através de reproduções) que muita gente duvidava de que as
obras exibidas no prédio fossem originais, supondo-as meras
cópias.” (Departamento de Documentação, 1968, s/p).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 137
2) Lina Bo Bardi e a concepção do projeto de expografia
Lina Bo Bardi, como ficou conhecida, nasceu em 1914, em Roma (Itália)
e seu nome original era Achilina Bo. O sobrenome Bardi foi acrescentado em
1946 quando se casou com Pietro Maria Bardi antes de vir para o Brasil.
Em 1914, a Itália ingressara na Primeira Guerra Mundial, lutando ao lado
de França e Inglaterra contra a Alemanha. Em 1920, inicia-se um período de
reconstrução européia que exigia grande demanda de matéria-prima de países
como o Brasil, a Argentina, a Austrália e de produtos industrializados vindos
principalmente Estados Unidos da América. Em 1929, os capitais desses países
em reconstrução se esgotaram e os países fornecedores encontraram-se com
excesso de mercadoria estocada nos portos, o que gerou a conhecida crise de
1929 com a Queda da Bolsa de Nova York. E foi nesse ambiente que Lina Bo
viveu sua infância e adolescência; no meio de uma longa crise:
“A Itália foi o país onde as agitações sociais tiveram a maior
duração e também aquele onde a reação se manifestou com
maior veemência. Apesar de estar entre os vencedores, a Itália
[...] não conseguiu, na Conferência de Versailles, ver atendidas
suas exigências sobre o Mar Adriático. Internamente, os reflexos
da política externa italiana fizeram-se sentir [...]. O aumento do
desemprego, a instabilidade monetária e os conflitos sociais
propiciaram a penetração dos ideais marxistas. Já em 1920,
operários e camponeses começaram a empregar a política de
ocupação de fábricas e terras, respectivamente” (Hollanda, s/d, p.
261).
Simultaneamente às invasões, surge o movimento dos Fáscios Italianos
de Combate. Inicia-se, assim, o movimento dos fascistas que organizavam
expedições punitivas cuja finalidade era destruir os núcleos socialistas” (Ibidem, p.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 138
261). Seu líder Benito Mussolini é convocado pelo próprio rei da Itália, Vítor
Emanuel III, para assumir a presidência do ministério, dentro de um regime
parlamentar, que contava com representantes de todos os partidos, com exceção
da Partido Socialista. E em 1924, após o assassinato de um líder socialista que
havia se manifestado contra o regime, Mussolini perdeu apoio dos demais
partidos e declarou um golpe de estado. Iniciou-se o Regime Fascista seguido da
censura à imprensa e, logo, da abolição das liberdades constitucionais, adquirindo
um caráter ditatorial.
“Os regimes ditatoriais instalados na Alemanha, na Itália e
posteriormente, no Japão (a partir de 1932) ocasionaram uma
política de agressão por parte das potências. (...) Essa política,
marcada pela invasão de territórios independentes e ataques à
soberania de outros países, provocou o inicio da Segunda Guerra
Mundial” [1939 a 1945] (Ibidem, p. 264 - 265).
No mesmo ano que se iniciou a
Segunda Guerra Mundial, Lina Bo recebeu o
título de arquiteta pelo Instituto Superiore di
Belle Arti di Roma, mesma instituição na qual
os arquitetos Rino Levi e Gregori
Warchavchik se formaram. Em busca de trabalho, mudou-se para Milão, em 1940,
cidade na qual a expografia apresentava-se bastante desenvolvida, como se pode
observar na ilustração ao lado. Milão ficava, não só em sentido geográfico, mais
longe do coração do regime e era um banco de prova, de conhecimento e de
experimentação muito mais amplo do que a capital” (BO, G, 2006). Nesta
ocasião, Lina Bo associou-se ao arquiteto Carlo Pagani, montando um estúdio de
desenho que chegou a ser bombardeado em 1943:
Logotipo (In: BO BARDI, 1993, p.25)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 139
“Com os grandes bombardeios cada
vez mais perto, todos nós
abandonamos Milão para a região
vizinha a Parma, à exceção de Lina,
que quis ficar, a qualquer custo, no
apartamento do último andar de Piazza
Crispi (hoje Piazza Meda), que, em
breve, transformou-se em um reduto de
intelectuais vários e espalhados, porém
de grande valor, de De Chirico à Frai. a
Raffaele Carrieri, entre outros. Com o
escritório e a Itália destruídos pelas
bombas inglesas, não era possível,
obviamente, projetar ou construir nada,
sequer o próprio amanhã” (Ibidem).
Parte dos trabalhos que
faziam nesse escritório era para Gio
Ponti, um arquiteto bem conceituado
no país, diretor da Trienalle de Millano e da revista Domus, o qual Lina Bo ilustrou
a partir de 1941. Em 1944, junto com Pagani, passou a trabalhar diretamente na
edição da revista Domus. Nesse mesmo ano, Lina Bo se dedicou tanto à atividade
gráfica com ao jornalismo que assumiu, inclusive, a vice-diretoria da revista. Em
1945, com apoio de Bruno Zevi e Raffaele Carrieri, criou o semanário de
arquitetura intitulado A”, um suplemento da revista Domus. Ingressou, também,
na equipe da revista Corriere della Sera, aumentando seu orçamento, o que lhe
permitiu dispensar o apoio financeiro que recebia de seus pais. Sua irmã Gabriela
Bo esclareceu que Lina nessa situação “Procurava outros trabalhos, pois durante
a guerra nada se construía tudo se destruía. Trabalhou com ilustração de revistas,
aprendia a fazer objetos de sucata...” (BO, G. in MICHILIES, 1993).
Exposição realizada em Milão em 1935, período no
qual Lina Bo ainda e
ra uma estudante de arquitetura
(In: BENEVOLO, 1976, p.575)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 140
Os objetos de sucata aos quais Gabriela Bo se refere, fizeram parte de
mais outro trabalho. A Itália passava por um momento difícil. Segundo declaração
de Lina Bo (1993, p. 235), durante a guerra o jornalismo passou a ser sua
profissão, e que quando houve a queda do fascismo todos entraram no
movimento de Resistência. Além disso, ela também era filiada ao informal Partido
Comunista. Como jornalista escrevia sobre desenho industrial e arquitetura e
assinava textos de vários periódicos, entre eles o Tempo e a revista Mondadori.
Através dessa revista foi que conheceu Pietro Bardi, numa ocasião que lhe
encomendaram uma entrevista com ele. Mas é na revista feminina Grazia que
Lina Bo desenvolveu um trabalho de caráter social, e que se relaciona com sua
produção futura:
“todo mundo estava alterado comigo e me recriminava: ‘Escreves
em um periódico femenino!’. Grazia foi importante. Uma vez
recebi uma carta que dizia: ‘Que posso fazer? Tenho um bebê,
mas não tenho dinheiro para um berço, nem nada para poder
fazê-lo’. Respondi que recolhesse um caixote pequeno de fruta.
Assim elaborei o projeto, evidentemente caseiro, com um
acolchoado por dentro, uma colcha de retalhos; algo humilde pois
não tinha nada. Depois lhe disse que pusesse um babadinho ao
redor e que a pintasse. Aquilo entusiasmou! Recebi montanhas
de cartas, quero dizer, aquilo era algo social. [Logo seu trabalho
passou a ser reconhecido pelos outros arquitetos, inclusive ex-
professores da faculdade.] Nós pensávamos salvar a
humanidade com a arquitetura moderna e o desenho industrial.
Não há sido possível.” (BO, 1993, p.241).
Na mesma semana que a guerra terminou, Lina Bo e seus colegas da
revista Domus dirigiram-se para Roma para documentar a arquitetura destruída.
Para tanto, ela chegou a pedir autorização ao exército americano que ocupava a
região. No caminho passaram entre soldados e tanques de guerra dos quais
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 141
tentavam desviar. Mas foi ao chegar em Roma, que correram o maior perigo, pois
as granadas e bombas enterradas no chão ainda não haviam sido removidas
(Ibidem, p. 236-238), experiência essa que marcou sua vida.
Em 1946, Lina Bo, que já expressava vontade de mudar de país, casa-se
com Pietro Bardi e viaja ao Brasil. No mesmo ano o Partido Liberal Cristão vence
as eleições na Itália, fazendo com que Lina Bo perdesse suas últimas esperanças
no país e adotasse o Brasil como sua nova nação. Ao expressar o carinho pelo
país que escolheu, descreveu-o como: Um país pobre, de gente pobre, mas
riquíssimo, maravilhoso, onde se podia fazer coisas. Politicamente, a situação do
Brasil é muito perigosa, especialmente hoje em dia [década de 1990] (Ibidem,
p.242).
Em 1948, ano que o MASP foi
inaugurado, Lina Bo instalou ao lado do Museu
um escritório de desenho de mobiliário e
ambientes, chamado Estúdio Palma de arte e
arquitetura. Este escritório foi montado em
sociedade com
Giancarlo
Palanti,
arquiteto
italiano, que
havia
concluído o curso de arquitetura dez anos antes
que ela e também havia sido seu professor.
Vista do interior do Estúdio Palma (BO
BARDI, 1993, p.56)
Galeria ambiente do Estúdio
Palma, 1956. (BO BARDI, 1993,
p.60).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 142
Em 1950 funda junto com Pietro Bardi a revista Habitat, que vira
referência em artes e arquitetura” (Folha de São Paulo, 2006, p.E7). Nesse
mesmo ano inicia a construção da Casa de vidro, sua primeira obra de arquitetura
e sua residência. Durante os primeiros anos dessa década, Pietro Bardi
encontrava-se freqüentemente ausente no MASP, ocupado com o ciclo de
exposição de obras do MASP, que estava sendo realizado em países europeus e
nos Estados Unidos, buscando legitimar as obras. Desta maneira, Lina Bo, que já
havia participado da montagem do MASP, passou a substituí-lo durante as
viagens. Nesse mesmo período, o acervo desse museu havia aumentado
consideravelmente e eram oferecidos muitos cursos, passando a carecer de
espaço e novas instalações. Assim, Pietro Bardi aceitou uma proposta que visava
associar o MASP a uma nova Fundação, a atual FAAP (Fundação Armando
Alvarez Penteado). Essa fundação possuía um grande edifício, capaz de
contemplar as necessidades pelas quais o MASP estava passando.
Lina Bo, aparentemente, ignorava a negociação enquanto substituía
Pietro Bardi e
paralelamente
procurou outras
soluções:
“Foi então que pensei: ‘O
Museu não pode ficar
aqui no edifício dos
Diários Associados, no
meio dessa desordem’.
Foi então quando vi que
Ciccillo Matarazzo havia
montado a I Bienal
Proposta de edifício para o MASP, projetado por Lina Bo para MASP em
1
951, antes de conhecer a clausula do testamento. (Arq. Lina Bo e P. M.
Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 143
[1951] no Trianon, queria criar um museu ali, mas não conseguia
porque Affonso Reidy havia feito um projeto muito bonito, mas
com muitas colunas. Isto é o belvedere do Trianon se acabava
[para Matarazzo], pois era doação de uma família muito rica que
vivia lá perto, na avenida Paulista, e os herdeiros cediam o solar
sempre e quando alguém apresentasse um projeto para ocupar o
solar do Trianon deixando livre o belvedere. Então o projeto foi
rejeitado pela existência dessa clausula no testamento. Jorge
Wilheim projetou uma torre que também ocupava todo solar,
assim que também teve o projeto rejeitado.” (BO BARDI, 1993,
243).
Em 1955, Lina Bo começou a dar
aulas na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade São Paulo,
FAU-USP. Ela comenta que no mesmo
ano foi à prefeitura resolver algumas
coisas”. Por acaso viu a maquete de um
projeto para o Trianon e solicitou informações sobre o assunto. Ela conta que
ficou inconformada ao descobrir que o Trianon na avenida Paulista estava sendo
demolido para a construção de grandes banheiros públicos subterrâneos
17
:
”... uma porcaria do começo do século, que ao ser aberto ao
público, fica imundo e, com aquele jardim encima (...) um jardim
do estilo daquela da estação Central do Brasil, [da cidade Rio de
Janeiro] com roseiras e parterres” (BO BARDI, 1993, 243).
17
Sempre muito próxima a assuntos políticos, Lina Bo Bardi publicou, após ganhar apoio do
governo, na revista Mirante das artes em 1967: “A Prefeitura de São Paulo tinha aprontado o
projeto de um ’logradouro’ público decente, mas que carecia de requisitos sentimentais dignos da
herança do velho Trianon” (BO BARDI, 1967, p.20). Foi uma tentativa de justificar a interrupção do
projeto que segundo ela mesma “São Paulo não os tinha e precisava” (BO BARDI, 1993, p. 243).
Restaurante Trianon (In: FREIRE, 1997)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 144
Imediatamente contatou o secretário de obras J. C. Figueiredo Ferraz,
que também era professor na FAU USP e Edmundo Monteiro, que no período
substituía Chateaubriand, no momento em viagem com Bardi:
“Se Pietro estivesse presente com Chateaubriand não teria feito o
museu. E disse a Edmundo: ‘Vi que demoliram o Trianon. Quero
construir lá o edifício do museu e quero anunciá-lo no Diários
Associados de todo país, que eram trinta e três jornais e
emissoras de rádio (ainda não havia televisão, houve pouco
depois, mas não muito grande, belíssima, muito bonita e
importantíssima)..., e quero apresentar meu projeto, que não
ocupará o belvedere, falar imediatamente com o [ex-] governador
(sic) Adhemar de Barros e apoiar sua candidatura a presidência
da República em troca do edifício do museu’” (Ibidem, p. 244).
Ainda segundo Lina Bo Bardi, Monteiro (que substituía Chateaubriand,
em viagem com Bardi na tourné) aprovou imediatamente a idéia e através de um
telefonema marcou uma reunião com
o prefeito de São Paulo (de 1957 a
1961), Adhemar de Barros, para as
dez horas da manhã do dia seguinte.
A reunião foi realizada com sucesso;
segundo Lina Bo Bardi, ele não se
demonstrou muito interessado no
projeto, mas interessou-se muito pela idéia de ter sua campanha contemplada
pelo apoio da cadeia de rádio e jornal dos Diários Associados.
Lina Bo Bardi conta que após a reunião, ela e Monteiro dirigiram-se ao
edifício dos Diários Associados e, logo na entrada, foram informados que o Bardi
e Chateaubriand haviam acabado de chegar de viagem. Lina Bo Bardi conta que,
Esboço do projeto desenvolvida para o MASP no
Trianon em 1955. (Arq. Lina Bo e P. M. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 145
por iniciativa de Monteiro, entraram na sala e relataram os novos planos aos dois.
Pietro Bardi imediatamente rejeitou a idéia, pois já havia fechado acordo com a
FAAP, mas Chateaubriand se iluminou” e começou a tentar convencer Bardi do
contrário. Depois Bardi se arrependeu:
cometi um erro, devo confessar. [...] Contatos foram feitos e
ficou acertado que o MASP teria ali um espaço, no qual seria
exposto seu acervo, ao qual se juntaria com as obras da coleção
do fundador da FAAP. Nossas obras chegaram a ser colocadas
para uma experiência, nas salas da Fundação, porém a
qualidade de algumas peças a serem incorporadas á coleção era
questionável. Perturbado pelas dúvidas, observei que assim não
se poderia fazer o convênio e tomei uma decisão imediata:
‘rocambolescamente’ voltei com tudo para a rua Sete de Abril
com aprovação de Edmundo. Este episódio teve como única
conseqüência a permanência dos cursos criados pelo Museu na
FAAP. Como esta foi criada com objetivo precípuo de ser um
centro educacional, a incorporação dos cursos já estruturados do
MASP, com corpo docente, corpo discente e equipamentos,
atendeu plenamente essa proposta” (BARDI, 1992, p. 30).
As fotografias do Museu de Arte de São Paulo, em 1957, apresentam
uma nova concepção de expografia que evidencia claramente influências da
expografia moderna italiana no trabalho de Lina Bo Bardi. Os painéis foram
eliminados e as obras passaram a ser penduradas sobre hastes metálicas
verticais com a etiqueta de identificação suspensa do lado direito de cada obra.
De acordo com a pesquisa de Renato Luiz Sobral Anelli (2005, p.104), o arquiteto
italiano Edoardo Persico foi o precursor deste estilo e, após sua morte, Franco
Albini deu continuidade ao seu trabalho, tornando-se um dos maiores produtores
de museografia no pós-guerra.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 146
Essa expografia também se enraíza na arquitetura moderna juntamente
com seu conceito político internacional no qual a arquitetura racional ou
funcional atende o que estes arquitetos entendem por “necessidades da
modernidade”, apresentando soluções que teoricamente prevaleceriam sobre o
discurso estético. Pérsico era um dos arquitetos que se encontravam inseridos em
tal discussão, porém, com uma certa ressalva:
Se se desejar considerar a arquitetura nova fora das fórmulas
estéticas, mais do que falar de internacionalismo é preciso
restaurar o conceito de um mundo totalmente racional e
inteligente” (PERSICO, 1947 apud: BENEVOLO,
1976, p. 472).
O principal fator que diferencia a
expografia moderna tradicional (cubo branco) da
expografia moderna italiana é sua aproximação
à linguagem do desenho gráfico em
contraposição à idéia de síntese influenciada
pela Teoria da Gestalt. Assim como todos os
outros arquitetos modernos, os italianos
também buscavam difundir suas idéias
“internacionais” na tentativa de alterar o gosto
da sociedade:
Os italianos transformam todas as oportunidades
que se lhes apresentam em momentos de educação
do público visitante a uma sensibilidade moderna,
tornando muitas vezes o tema especifico da
exposição um objeto secundário. [...] Pode ser identificado o
Expografias
de Franco
Albini, a
primeira
realizada
em Milão,
1941; e as
outras em
Genova,
1950-1. (In:
ANELLI,
2005,
p.111).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 147
desenvolvimento de uma forma específica de expor objetos e
imagens que atravessa a participação nas Bienais de Monza e
Trienais de Milão, a montagem de inúmeras mostras de
propaganda do regime fascista, o projeto de lojas e vitrines
comerciais, experiências que acabam sendo transpostas para a
exposição de objetos de arte e daí para a museografia” (ANELLI,
2005, p. 104)
A atuação principal de Edoardo Pérsico e Franco Albini concentrou-se
coincidentemente em Milão, cidade na qual Lina Bo morou nos últimos anos de
sua vida na Itália. Não foram encontradas, porém, referências diretas de Lina Bo
acerca de tais arquitetos; seus depoimentos antes de tudo apresentavam uma
preocupação social. Ela reconhece suas raízes na arquitetura racionalista. Na
citação, a seguir, denomina arquitetura “irracionalista” as construções
arquitetônicas nazi-fascistas que denomina “elefantíaca e não-monumental”:
“O conjunto do Trianon vai repropor, na sua simplicidade
monumental, os temas hoje tão impopulares do racionalismo. [...]
O que quero chamar de monumental não é questão de tamanho
ou ‘espalhafatoso’ é apenas um fato de coletividade, de
consciência coletiva. [...] O racionalismo tem que ser retomado
como marco importante na posição de reação política que tudo
tem a ganhar numa posição ‘irracionalista’ apresentada como
vanguarda e superação. Mas é necessário eliminar do
racionalismo todos os elementos ‘perfeicionistas’, herança
metafísica e idealista, e enfrentar, dentro da realidade, o
‘incidente’ arquitetônico” ( BO BARDI, 1967, p.20).
Quando menciona os “elementos perfeicionistas” da arquitetura
racionalista, refere-se aos revestimentos utilizados no acabamento da construção
que na sua visão deveriam ser eliminados, o que ocorreu na nova vertente
arquitetônica denominada brutalista.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 148
Em 1956, Lina Bo Bardi tentou se inscrever no concurso de docente na
disciplina de Teoria da arquitetura na FAU-USP, na qual já ministrava aulas, mas
foi impedida pelos outros professores da área de Engenharia, talvez devido à sua
vertente política (BO BARDI, 1993, 250). No momento, ela se encontrou sem
trabalho e sem perspectivas de construir o Museu na avenida Paulista; então
aceitou o convite de um amigo seu, o médico Felloni Mattos, e foi para Salvador
(Bahia) construir uma casa. Logo, ela se encantou com a simplicidade do local e
começou a colecionar obras de artesãos locais. Cerca de vinte dias depois,
recebeu um telegrama de Pietro Bardi solicitando seu retorno. Avisava que o
MASP seria construído na avenida Paulista e que haveria uma cerimônia pública
na qual Adhemar de Barros colocaria a primeira pedra, dando inicio à construção.
Lina Bo Bardi voltou uma semana depois e a obra não foi iniciada.
Em 1958, Lina Bo se desdobrou entre São Paulo e Salvador onde
começou a lecionar Teoria da arquitetura na Escola de Belas Artes da Faculdade
Federal da Bahia e escrever na sessão cultural do jornal Diário de Notícias da
Bahia. Em 1959, restaurou o Solar do Unhão,
em Salvador, para fazer um Museu de Arte
Popular e realizou a exposição Bahia na V
Bienal Internacional de São Paulo, no Parque
do Ibirapuera, com colaboração de M.
Gonçalves. Essa exposição na V Bienal foi
visitada pelo governador da Bahia Juarez
Magalhães, que logo a convidou para
construir o Museu de Arte Moderna da Bahia,
o que foi efetivado entre 1959-63.
MAM-
Bahia exibindo bailarinas de Degas da
coleção do MASP (In:
BO BARDI, 1993,
p.256).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 149
“Lina acreditava que o nordeste fazia parte do ‘arco de
conhecimentos’ desconhecido para os brasileiros, a influência
moura, árabe: os muxarabis, o recato obrigatório das mulheres, a
relação patriarcal, a vingança pela honra, as roupas negras
usadas pelas mulheres e tantas outras manifestações que
encantaram Lina, daquele Brasil arcaico, feudal e intocado. Era
preciso preservá-lo, segundo ela, como documentação, antes que
tudo aquilo fosse descaracterizado pela urbanização e a
industrialização que avançava” (MICHILES, 2006, p.2).
Em 1960, recebeu na Bahia outro telegrama avisando que as obras do
MASP seriam iniciadas, porém o prefeito exigiu que o projeto contemplasse um
salão de bailes:
“O prefeito queria construir de qualquer maneira um ‘grande salão
de baile’ com em [na parte de] cima o Museu de Arte de São
Paulo. Mas o belvedere devia ser ‘livre de colunas’ o pé direito da
construção acima dele devia ser de oito metros e a construção
mesma não podia passar dos dois andares. Em baixo o ‘SALÂO
DE BAILE’. Minhas tentativas para manter o teatro foram inúteis:
tinha que ser salão de baile e nada mais. A firma construtora já
havia sido escolhida” (BO BARDI,1967, p.20).
Lina Bo Bardi não concordou com a proposta, mas acrescentou ao
projeto um salão com intenção de modificá-lo posteriormente:
“O ‘salão de baile’ pedido pela Prefeitura de 1957 foi substituído
por um grande Hall Cívico, sede de reuniões públicas e políticas.
Um grande teatro-auditório e um pequeno auditório-sala de
projeções completam este embasamento” (BO BARDI, 1997,
s/p.).
Antes de iniciar a obra deste edifício suspenso por duas colunas,
procurou um engenheiro para cuidar dos cálculos:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 150
“Lembrei do ex-secretário de obras, professor na Politécnica e na
FAU, que tinha elogiado o projeto. Fui procurá-lo: ‘O senhor não
quer trabalhar de graça numa obra pública que vai ser construída
em São Paulo?’ ‘Eu trabalharei de graça, somente os desenhistas
serão pagos. .José Carlos de Figueiredo Ferraz aceitou. Assim
começou a obra em 1960. Tive que enfrentar objeções dos
técnicos da Prefeitura e da firma construtora que tinha
dificuldades em aceitar o protendido [que é uma variação do
concreto armado]( BO BARDI, 1967, p.20).
Logo que termina o mandato do prefeito Adhemar de Barros, as obras
são interrompidas:
“Aguardamos muito Feraz e eu, porque conosco não se brincava;
construíram a parte baixa e depois pararam a obra; só
terminaram o belvedere, mas com a parte de baixo não muito
bem construída, mas enfim, correta” (BO BARDI, 1993, 245).
Nesse mesmo ano, Lina Bo Bardi passou a se dedicar paralelamente ao
teatro. Traduziu a obra de Bertold Brecht, Ópera dos três vinténs, que foi montada
no Teatro Castro Alves em Salvador, com sua cenografia. A peça foi dirigida por
Martin Gonçalves (1919-1973), que, segundo Michiles, era pernambucano,
psiquiatra e pintor de formação clássica; ele havia estudado na Inglaterra, França
e no Actor´s Studio, em Nova York”, diretor da Escola de Teatro da Bahia desde a
década de 1950 e, como Bo Bardi, apreciava as manifestações tradicionais da
cultura popular do nordeste (MICHILES, 2006, p.3).
[Era a]primeira montagem brasileira de uma peça de Bertold
Brecht. [...] A montagem sob sua direção [referindo-se a Martin
Gonçalves], seguiu o método do dramaturgo alemão que sugeria
uma nova metodologia em contraposição ao naturalismo, em
outras palavras, um teatro que não mantivesse o público envolto
a alienação da fantasia, mas que pudesse exercer um olhar
crítico “distanciado” e assim quebrasse “a quarta parede do
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 151
teatro”: o ator e o espectador integrados numa mesma
cumplicidade” (Ibidem, 2006, p.3).
Em 1961, continua trabalhando com Gonçalves e faz a cenografia para a
peça Calígula de A. Camus, exibida no mesmo teatro. Mas 1961 foi também o
ano em que Prestes Maia assumiu a prefeitura de São Paulo (1961-65) e teve
como secretário da Educação e da Cultura o professor Fernando Azevedo.
Azevedo conhecia a trajetória do MASP e o incentivou a dar continuidade à
construção do Museu:
Lembro muito bem. Ali por volta de 1937 ou 38, já ouvia o
Chateaubriand falar do Museu. [...] Freqüentemente o [assunto]
do Museu de Arte entrava em nossas palestras. [...] Visitei-o
muitas vezes. Conhecia o acervo. Mas fiquei conhecendo melhor
quando o professor Bardi me levou de sala em sala, explicando o
valor de cada peça do Museu. Eu era então secretário da
Educação e da Cultura do Prefeito Prestes Maia [...] Depois da
visita, fui recebido pelo Conselho do Museu. Havia uma reunião.
[...] Falamos então da necessidade do Museu expandir-se, de ter
um local condigno para abrigar suas obras e melhor poder servir
a comunidade. Eu lhes disse que tomaria a incumbência de honra
de levar ao prefeito Prestes Maia as duas grandes proposições
do Museu de Arte” (Fernando Azevedo in DIÁRIO DE SÃO
PAULO, 1968, s/p.).
Assim, o prefeito Prestes Maia demonstrou interesse em reiniciar a
construção do MASP e a obra enfim foi retomada. Durante os primeiros anos
dessa nova etapa da construção do MASP no Trianon, Bo Bardi continuou
residindo em Salvador. Permanecia viajando constantemente, até que em 1964,
com o golpe militar, as coisas começaram a se complicar e o trabalho
desenvolvido em Salvador caracterizava-se como de esquerda:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 152
“estava aqui em São Paulo e recebi um telegrama do meu
secretário [...] dizendo: ‘Madalena (uma cachorra vira-latas que
eu havia encontrado na rua e tinha criado ali no teatro e no
museu) está doente, melhor que você não volte até ela melhorar’.
E pensei: ‘Algo feio ocorreu por lá e não posso voltar’. [...] Na
Bahia, a Marinha era terrível e me abriram um processo ali. Me
ocultei, desapareci. Voltei em junho com a abolição do Ato
Institucional [AI-5], mas percebi que já não sobrava nada, haviam
acabado com tudo e não se reergueu nunca mais, tudo se
acabou” (BO BARDI, 1993, p. 251).
Durante a construção do MASP no Trianon da avenida Paulista, Bo Bardi
e Ferraz enfrentaram muitos problemas com a construtora contratada pela
prefeitura. Buscando controlar a obra mais de perto e, uma vez que havia voltado
a residir em São Paulo, ela transferiu seu escritório para o local da obra. Esse
método Lina Bo Bardi passou a adotar a cada nova grande obra que assumia.
“A arquitetura verdadeira é uma luta. Se o arquiteto realiza um
croqui, desenha o edifício, o entrega e não se ocupa mais... não é
o mesmo. Ao ver os edifícios que tenho construído me lembro de
tudo, até das coisas mais pequenas. Agora, na próxima
construção, o endereço dos trabalhos de controle da construção
estará na obra, a escritório estará ali. Já não tenho escritório, o
monto dentro das obras. Os engenheiros costumam gostar muito
e todos querem vir também para o escritório e montam conosco a
sessão de engenharia” (BO BARDI, 1993, p.246).
Paralelamente, enquanto dirigia a obra do MASP, Lina Bo Bardi deu
continuidade à sua carreira dedicando-se ao design, cenografia de cinema e
teatro, montagens de exposições e arquitetura de edifícios públicos. Entre os
edifícios que realizou em São Paulo, destacam-se o Museu do Instituto Butantã,
em 1965, o Museu de Arte Moderna de São Paulo no Parque do Ibirapuera, em
1982 e o SESC- Pompéia, também em 1982.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 153
Organizou as seguintes exposições
18
: A mão do povo brasileiro, em 1996
no MASP; Reencontro ou redescoberta, em 1975 no MASP, com E. de Almeida;
Designer no Brasil: história e realidade, em 1982 no SESC-Pompéia com Ferraz e
A. Vainer, Intervalo para crianças em 1985 no SESC-Pompéia e outras.
Em 1968 voltou a colaborar em outras peças de teatro e filmes realizados
tanto em São Paulo, quanto em Salvador ao lado de profissionais
19
como G.
Jonas (1968), A. Faria (1968), João Celso Martines Correia (1969-71) e E. Elito
(1980-91) no Teatro Oficina de São Paulo e Cacá Rosset (1985).
“Caso o Glauber não tivesse conhecido a Lina, com certeza não
teria realizado O Deus e o Diabo na Terra do Sol como o
conhecemos; sobretudo a concepção da interpretação antológica
de Othon Bastos, do personagem Corisco marcada nitidamente
pelo método do ‘distanciamento’ de Bertold Brecht (...). A
presença da Lina nas filmagens do Deus e o Diabo, em Monte
Santo (Canudos-BA) está registrada no seu diário pessoal onde
têm anotações e desenhos da equipe. Curiosamente nos créditos
não consta o seu nome” (MICHILES, janeiro de 2006).
18
GALLO, 2004, p.170-173
19
Ibidem.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 154
3) Estudo da expografia
A expografia do MASP (1968-97) foi concebida de maneira integrante à
concepção de todo edifício, de modo que ao ser estudada teve-se que considerar
o projeto museográfico em sua totalidade. A partir de textos que descrevem o
espaço do Museu, principalmente dos textos com autoria da própria arquiteta Lina
Bo Bardi, estruturaram-se aqui as principais características da museografia
objetivando sempre relações com a expografia. Visou-se desta maneira abordar a
expografia num primeiro momento de maneira abrangente e seqüencial. Serviram
como suporte imagético fotografias que registram o local na época de sua
inauguração e desenhos do projeto, realizados pela arquiteta.
O projeto do edifício para o MASP na Avenida Paulista foi concebido não
apenas contemplando carências estruturais e metas do próprio Museu, como
também submetendo-o às condições impostas mencionadas anteriormente,
somadas ao conhecimento e criatividade de Lina Bo Bardi. Uma dessas
condições liminares, capaz inclusive de vetar a ocupação do terreno, era a de
preservar o belvedere do Trianon, que deveria permanecer livre. Apesar de sua
considerável extensão de 2.500 m
2
, Bo Bardi arquitetou um edifício de dois
blocos, um subterrâneo e outro suspenso sobre dois pilares
20
criando um vão livre
que preservaria o belvedere com a passagem desobstruída, desafiando a
tecnologia da época. Ou como ela mesma descreveu tecnicamente a estrutura do
edifício MASP-Trianon:
20
número alterado posteriormente, para quatro sob orientação do engenheiro Figueiredo Ferraz
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 155
“A estrutura se divide em quatro conjuntos principais:
1. A caixa superior é um pórtico com laje nervurada em concreto
protendido na cobertura e vigas-parede nas laterais;
2. Um tabuleiro (laje nervurada de concreto armado faz
transição das cargas para interior, onde se encontram as
vigas, parede de apoio, além de sustentar o quinhão de carga
proveniente do pavimento da administração;
3. No pavimento da administração, dois consoles engastados
nas vigas-parede da escada suportam a assimetria dos
balanços nesse trecho;
4. As vigas parede constituem a massa de apoio do conjunto até
o rés-do-chão” (BO BARDI, anotações, Arquivo Lina Bo Bardi
do Instituto Lina Bo e Pietro Maria Bardi, s/d).
O terreno do belvedere sediou, até a década de 1950, o Restaurante
Trianon, projetado por Ramos de Azevedo, no qual se realizavam reuniões e
bailes da alta sociedade (FREIRE, 1997). Neste novo projeto, contrariando o
antigo uso do espaço, que privilegiava algumas castas da sociedade, Lina Bo
Bardi pretendeu contemplar todas as classes sociais:
“Tentei recriar um ‘ambiente’ no Trianon. E gostaria que lá fosse
o povo, ver exposições ao ar livre e discutir, escutar música, ver
Projeto da fachada do edifício MASP no Trianon, (Arq. Lina Bo e P. M. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 156
fitas. Até crianças, ir brincar no sol da manhã e da tarde. E
retreta. Um meio mau-gosto de música popular, que enfrentado
‘friamente’, pode ser também conteúdo’” (BO BARDI, 1997, s/p).
Todo o projeto do MASP, apesar de grandioso, foi caracterizado pela
simplicidade de formas e materiais apoiado
em conceitos das artes contemporâneas
como também no argumento que seu
aspecto não poderia inibir o povo. Todos
os materiais estruturais do edifício, vigas
de ferro e o concreto que preserva a marca
das formas são aparentes. Também não
foram camufladas as tubulações coloridas
propositalmente para identificar as
passagens de ar condicionado, hidráulica e
elétrica, facilitando a manutenção. A
arquiteta classifica este estilo arquitetônico
como “Arquitetura Pobre”, maneira como
ela o entendia e denominava este
movimento conhecido também como
brutalista. Trata-se de uma maneira de
lidar com conceitos da arquitetura
moderna, despindo ainda mais a estrutura do edifício:
“Procurei uma arquitetura simples, uma arquitetura que pudesse
comunicar de imediato aquilo que, no passado, se chamou de
‘monumental’, isto é, o sentido de ‘coletivo’, da ‘Dignidade Cívica’.
Aproveitei ao máximo a experiência de cinco anos passados no
MASP
em fase de construção na av. Paulista
(
In:
Revista Manchete, 1968)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 157
nordeste, a lição da experiência popular, não como romantismo
folclórico mas como experiência de simplificação. Através de uma
experiência popular, cheguei àquilo que se poderia chamar de
Arquitetura Pobre. Insisto não do ponto de vista ético. Acho que
no Museu de Arte de São Paulo eliminei o esnobismo cultural tão
querido pelos intelectuais (e os arquitetos de hoje), optando pelas
soluções diretas, despidas. O concreto como sai das formas, o
não acabamento, podem chocar toda uma categoria de pessoas.
O auditório propõe um teatro despido, quase a ‘granja’
preconizada por Antonin Artaud” (BO BARDI, 1997, s/p).
O teatro ao qual se refere tem capacidade para acomodar um público de
500 pessoas e é bastante flexível, podendo ser utilizado de duas formas ao
menos. A primeira como um grande auditório ou
sala de cinema, comportando poltronas para a
platéia na área central, voltadas para o lado
inferior da sala. A segunda com as poltronas
acomodadas da mesma forma e com aplicação
de cortinas, bambolinas e rotunda,
transformando o espaço num teatro italiano. O
fato de esses acessórios não se encontrarem
instalados permanentemente caracteriza uma
tentativa de incentivar a realização de peças de
teatro em espaços não italianos. Este teatro pode ser adaptado à arena, muito
usual em montagens de teatro brechtiano ou ainda invertendo a situação
transformando os corredores laterais em proscênio, que, como ela mesmo
menciona, foi uma forma preconizada por Antonin Artaud.
“Nós eliminamos a sala e o palco que serão substituídos por uma
espécie de lugar único, sem isolamentos ou barreiras, que virá a
O mesmo auditório transformado em
arena (primeira imagem) e com laterais
transformadas em proscênio. (Arq. Lina
Bo e P. M. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 158
ser o próprio teatro da ação. Uma comunicação direta será
estabelecida entre o ator e o espectador, pois este estará situado
no centro da ação e envolvido por ela. Esse envolvimento será
conseqüência da própria configuração da sala. [...] O público
estará sentado no centro da sala em cadeiras móveis permitindo
que siga o espetáculo pelo qual será envolvido” (ARTAUD,
Antonin. Lê thêâtre et son doublé.
Paris: Éditions Gallimard. p.138
apud: RATTO, 1999, p.41).
Dentro da mesma linha
estética da arquitetura desse
teatro-auditório, o restante do
edifício, inclusive as salas de exposição, são “despidas”. Lina Bo Bardi não
somente buscou integrar ao cotidiano do museu um público que antes se
ausentava, como integrar inclusive as obras expostas à paisagem cotidiana da
cidade. Desta maneira, o novo edifício esbanjava transparência em toda extensão
de sua fachada.
“Os museus novos devem abrir suas portas, deixar entrar o ar
puro, a luz
nova. Entre
passado e
presente não
há solução de
continuidade.
É necessário
entrosar a
vida moderna,
infelizmente
melancólica e
distraída por toda espécie de pesadelos, na grande e nobre
corrente da arte” (BO BARDI, 1997, s/p).
Projeto com vista lateral do edifício (arq. Bardi)
Proj
eto o vão livre, com as escritas “líber” e “liberdade”
escritas ao contrário (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 159
A parte superior do edifício elevada pelas pilastras representava uma
extensão de setenta metros de luz, cinco de balanço de cada lado, oito de pé
direito livre de qualquer coluna” (Ibidem). Trata-se de dois andares com galerias
de 2.220 m
2
de área mais 370 m
2
destinados às atividades administrativas em
cada um. Este bloco é totalmente revestido por vidros encaixados em caixilhos
de metal. Estes vidros mediam 6 metros de altura e foram os maiores vidros
construídos na América Latina, até então. A incidência de luz solar, de acordo
com Bo Bardi, seria controlada através de persianas reguláveis. De toda forma, a
principal fonte de iluminação prevista para o museu seria fornecida por lâmpadas
tubulares de iodo, posicionadas nas laterais da sala de forma que a luz fosse
rebatida pelo forro pintado com cal branco, o que resultaria numa iluminação
homogênea em todo o ambiente.
A paisagem da cidade
obtida no belvedere pode ser
observada também em todo o
edifício pelo fato de suas
paredes serem de vidro. Os dois
andares subterrâneos não foram
excluídos desta característica e
sua arquitetura possibilitou a
vista da paisagem central da
cidade, desde o restaurante, loja, biblioteca e das duas galerias disponíveis para
exposições temporárias (com exceção dos dois auditórios). Essa visão era obtida
através da vidraça emoldurada por jardineiras ao longo de toda parte externa do
edifício sobre o Viaduto Nove de Julho. A transparência estava inserida na
Estudo para fechamento da biblioteca e restaurante com
vitrines expositivas (
In:
BO BARDI, 1993, p.109)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 160
delimitação desses ambientes, divididos por vitrines expositivas transparentes,
nas quais se expunham objetos como estatuetas, amuletos, urnas e cerâmicas de
valor arqueológico, pertencentes a diversas civilizações.
Este recurso arquitetônico já havia sido empregado pela arquiteta na
construção de sua própria residência em São Paulo, a Casa de vidro (construída
em 1950-51). Uma casa elevada em relação ao terreno irregular e cuja fachada é
totalmente de vidro e se encontra cercada pela vegetação tropical com grandes
árvores.
Nessa nova sede do Museu, a transparência não se restringiu apenas às
paredes do edifício, abrangendo os suportes criados para expor as obras.
Desenhos de estudo feitos pela arquiteta em 1963 revelam alguns dados técnicos
da elaboração dos cavaletes de cristal. A idéia de expor as obras em cavaletes
representava uma tentativa de romper com o que se entendia por distanciamento
imposto pela maneira
que as obras eram
exibidas até então. A
idéia era expor as
obras de maneira
próxima à do
momento em que
foram produzidas,
numa tentativa de
desmistificar a arte. Esses “cavaletes de cristal”, como a autora os denominava,
proporcionam ainda mais transparência ao Museu, numa tentativa de inserir as
obras do museu na paisagem cotidiana da cidade, estabelecendo um diálogo
Lina Bo ao lado do cavalete de cristal no pavimento destinado à
Pinacoteca ainda em fase de construção (arq. MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 161
permanente. Pretendia-se, assim, não apenas transferir obras do passado para a
atualidade como atrair aqueles que estivessem no lado externo, criando uma
espécie de vitrine.
No projeto de suportes
para obras, elaborado em
1963, os cavaletes consistiriam
em uma lâmina de vidro
transparente que seria
temperado ou de cristal,
suspenso por um bloco, que
poderia ser de concreto ou
granito. Entre estes materiais
sugeridos, efetivou-se o cristal
e o concreto. O projeto previa
que o suporte (cavalete de
cristal) exibiria trabalhos
bidimensionais de diversas
técnicas e materiais. Os quadros seriam parafusados por trás através de orifícios
feitos na área central do vidro e os trabalhos sob papel seriam prensados entre
dois vidros. O fato de os blocos precisarem se adaptar para sustentar números
diferentes de vidros acarretou a necessidade de uma flexibilidade no método de
encaixe, que deveria permitir ajustes para diversas espessuras de vidro. A
solução consiste em um vinco na parte superior do bloco no sentido
perpendicular, com um lado em ângulo reto e outro com cerca de 30°, o qual
estaria forrado de feltro para não arranhar o vidro, que era travado por uma
Projeto do cavalete de cristal com etiqueta frontal (arq. Bardi).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 162
madeira de mesmo formato, encaixada e
parafusada no bloco. O tamanho padrão
do cavalete foi calculado em 80
centímetros de largura e 2 metros de
altura, porém foram projetados também
cavaletes mais largos e com tamanhos
variados para exibição de obras de
maiores dimensões ou conjuntos de obras,
os quais, se necessário, poderiam ser
apoiados em mais de um bloco de
cimento.
No mesmo projeto existem
anotações da arquiteta indicando a localização das etiquetas de identificação das
obras com dados técnicos na parte inferior da obra, sobre a placa transparente.
Outra observação informava que as molduras, quando substituídas, se limitariam
a um friso de madeira de lei rente ao quadro sem passepartout. Também indicava
que os quadros deveriam ser forrados por trás e que todos os cavaletes estariam
posicionados no mesmo
sentido e com a frente da
obra para a mesma direção.
O projeto de 1963
visava inclusive a confecção
de suportes transparentes
para obras tridimensionais.
Funcionário montando painel didático (arq. MASP)
Projeto de pedestais transparentes (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 163
Esses também seriam de vidro, mas teriam vigas de metal (representadas pela
linha azul) em seu interior para suportar o peso das obras. A parte interna de
metal remete ao pedestal projetado por Franco Albini na década de 1950 na Itália,
ou seja, já havia sido testado e utilizado. Provavelmente não foi produzido por
questões financeiras. No lugar desse, optou-se pelo pedestal modular utilizado
largamente na expografia moderna tradicional, confeccionado de madeira com
acabamento liso pintado de forma homogênea com cores consideradas neutras,
ou seja, branco ou cinza ou preto.
Na versão final dos cavaletes de vidro, o fundo da obra foi forrada por
uma nova versão dos painéis didáticos, originários da Galeria d’Art Palma de
Pietro Maria Bardi e utilizados pelo MASP no edifício dos Diários Associados.
Outra alteração foi a abolição das etiquetas de identificação das obras previstas
nos painéis. Assim, a identificação de cada obra encontra-se no painel encontrado
respectivamente no verso do cavalete de vidro. De acordo com Luís Hossaka
(1969), essa atitude se justificou pelo comportamento dos visitantes, observado
na sede anterior do Museu, durante seus 21 anos de funcionamento:
[expondo a obra] com o nome do autor e respectivo título, o
visitante limitava-se a lê-los e passar adiante. As informações
complementares sobre a escola que
pertenciam os artistas, colocadas nas
respectivas pranchas eram raramente
lidas. Não todos, evidentemente, mas a
grande maioria dos visitantes
simplesmente as ignorava. A montagem
que agora apresentamos obriga o visitante
a procurar o título da obra e seu autor no
verso do quadro. Lá ele irá encontrar
também outras informações. A curiosidade
natural o levará a informar-se, lendo os
Cavalete com painel aguardando suas respectivas
obras (arq. MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 164
demais tópicos. Desejamos assim prender um pouquinho mais a
atenção do visitante e informá-lo, obrigando-o a um pequeno
esforço físico e a uma salutar ginástica mental” (HOSSAKA, 20
abr. 1969)
Segundo Bo Bardi, a atitude de ocultar as legendas vinha reforçar ainda
mais a tentativa de democratizar a exibição das obras:
“as obras [modernas e antigas], em uma estandardização, foram
situadas de tal maneira que não colocam
em relevo a elas, antes que o observador
lhes ponha a vista. Não dizem, portanto,
‘deves admirar, é Rembrandt’ mas deixam
ao espectador a observação pura e
desprevenida, guiada apenas pela
legenda, descritiva de um ponto de vista
que elimina a exaltação” (BO BARDI,
1993, p.46).
A estratégia inicial da
exposição do antigo local do MASP
(na Rua 7 de Abril) não foi suficiente
para atingir tais objetivos e a nova
tática implantada em 1968 visou
amenizar possíveis preconceitos e
esnobismo por parte do público, numa
tentativa de educá-lo:
“É nesse sentido social que se constituiu o Museu de Arte de
São Paulo, que se dirige especialmente à massa não informada,
nem intelectual, nem preparada” (BO BARDI, 1997, s/p).
Em uma outra estratégia em direção ao didatismo, Pietro Maria Bardi
mudou periodicamente as obras de lugar durante todos os anos. Segundo
Vista da Pinacoteca MASP de dois extremos
opostos da sala. (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 165
Eugênia Gorini Esmeraldo
21
, que foi sua secretária a partir de 1979, o propósito
era fazer com que o visitante não se acostumasse com a localização das obras,
na esperança de que ele, a cada nova visita, descobrisse outras obras capazes
de deter sua atenção, criando uma espécie de rodízio. Numa periodicidade de
três meses, aproximadamente, Bardi instruía funcionários sobre a nova
organização das obras. Não eram ao todo embaralhadas, preservando
agrupamentos por escolas. Ou seja, reorganizava espacialmente a localização de
grupos, por exemplo; alguma vez transportava para a parte frontal todas as obras
nacionais. As outras obras que estivessem no local (que poderiam ser obras do
Impressionismo) passavam para o fundo ou meio da sala e assim
sucessivamente. O que se preservava era o distanciamento padronizado entre as
obras independente da classificação ou grupo ao qual pertenciam, expondo todas
as obras de forma homogênea.
“O fim do Museu é de formar uma atmosfera, uma conduta apta a
criar no visitante a forma mental adaptada à compreensão da
obra de arte e, nesse sentido, não se faz distinção entre uma
obra de arte antiga e uma obra de arte moderna. No mesmo
objetivo, a obra de arte não é localizada segundo um critério
cronológico mas apresentada quase propositadamente no sentido
de produzir um choque que desperte reações de curiosidade e de
investigação” (BO BARDI, 1997, s/p).
21
em depoimento à pesquisadora em janeiro de 2006.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 166
4) A repercussão dessa expografia
Essa seção baseia-se em de dados obtidos em jornais da época da
inauguração do edifício do MASP-Trianon. Trata-se de um recorte feito entre 1968
e 1971; após esse período, as publicações sobre a expografia do Museu
escasseiam-se. Os demais textos estudados foram publicados num período
posterior ao falecimento da arquiteta Lina Bo Bardi, em 1992.
O edifício foi terminado em 1968, na gestão do prefeito Faria Lima (1965-
69). Poucos meses antes, Assis Chateaubriand faleceu sem ver a obra do Museu
concluída. Na inauguração, dia 07 de novembro de 1968, a Rainha da Inglaterra,
Elisabeth II, fez um discurso em sua homenagem e depois entrou no museu, onde
viu algumas das obras que ali já estavam expostas. Apesar da vasta cobertura da
imprensa e do acontecimento ter sido televisionado, não houve muita repercussão
sobre a expografia pelo fato de que nem todas as obras se encontravam em
exposição.
Ocorre que no período em que o
edifício do MASP no Trianon foi concluído, as
condições climáticas não favoreceram a
transferência das obras de uma sede para a
outra, sob o risco de sofrerem choque térmico.
A imprensa jornalística documentou todo o
processo a partir de outubro de 1968 e
relatava que Bardi inspecionava tudo
rigorosamente. A imprensa mostrava como as
obras eram embaladas para o transporte como também a nova sala da
Termostato controlando temperatura e
umidade do ar na Pinacoteca do
MASP-
Trianon ainda vazia em 1968.
(arq. MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 167
pinacoteca vazia, apenas com um
aparelho que media a temperatura
e a umidade do ar. Publicavam,
além da história do MASP, a
história de cada uma das obras
mais representativas da história da
arte pertencentes ao acervo e,
também, as explicações técnicas de Bardi sobre conservação e segurança. Ele
esclarecia que a mudança seria realizada apenas quando as condições climáticas
entre as salas coincidissem, que todas as precauções possíveis deviam ser
tomadas para não danificar as obras ou correr risco de roubo. Justificava
freqüentemente os motivos pelos quais o acervo não tinha seguro: por um lado,
porque o seguro de tais obras era muito elevado e o Museu não contava com
tamanha soma; por outro lado,
afirmava que se alguma obra fosse
extraviada, dinheiro algum poderia
recuperá-la e, conseqüentemente,
essa obra, mesmo restaurada, se
desvalorizaria; portanto, o melhor
era seguir medidas de precaução.
Quanto ao risco de roubo, afirmava
que dificilmente alguém conseguiria passar pela alfândega portando esses
objetos. Além do mais, poucas pessoas teriam poder aquisitivo para comprar uma
das obras, tornando sua comercialização inviável.
Obras sendo embaladas para mudanç
a da sede da
rua Sete de Abril para a nova sede no Trianon (
In:
Diário da tarde, 1968).
Funcionários limpando e restaurando as obras antes de
embalá
-
las para mudança (
In:
Revista Manchete, 1968)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 168
A mudança do Museu
foi concluída apenas no ano
seguinte, ocasião em que se
realizou uma segunda cerimônia
de inauguração datada de 07 de
abril de 1969, com a presença
do prefeito de São Paulo no
momento, Faria Lima. Uma
matéria da mesma data, que
ocupava uma página inteira no
Jornal da Tarde, anunciava a
abertura do Museu com o
slogan: “Museu de Arte, um
palácio de vidro para guardar obras raras”, o que remete ao Palácio de Cristal de
1851. O texto explicava detalhes sobre o funcionamento do Museu, sua
arquitetura, acervo e anunciava em destaque:
“Não é um museu escuro, com cheiro de mofo. Não é todo
fechado, mas de vidro temperado. Não é preciso pagar para
conhecer as suas obras. O Museu de Arte de São Paulo é do
público” (JORNAL DA TARDE, 1969, p.22).
E uma citação de Bardi, logo abaixo, complementava: “É um museu vivo,
didático, destinado ao público, principalmente estudantes e operários”. Foi a partir
dessa data que os jornais passaram a publicar artigos com comentários prós e
contra a arquitetura e critérios expográficos da pinacoteca no edifício MASP-
Trianon.
Informe-publicitário sobre o MASP, anunciando “Museu de
Arte, um Palácio de vidro para guardar obras raras (arq.
MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 169
Antes de mostrar as
opiniões de críticos ou
especialistas da área,
mostraremos as opiniões do
público em geral (não
especializado, portanto), uma
vez que esse representava o
público alvo que o Museu
pretendia atrair. Uma
reportagem realizada pelo O Estado de S. Paulo, com o mesmo objetivo,
apresentou dados que revelam um público bastante heterogêneo freqüentando o
museu pouco depois de ser aberto à visitação:
“Maria Inês Colado e Eloah de Freitas são amigas e juntas
arrumavam os cabelos nos espelhos de uma obra de Concerto
Pozzati.. [...] Nós íamos para Sabaúna, mas desistimos. Viemos
ao museu. Vamos recomendá-lo a todos os nossos amigos; ver
quadros é uma forma de aprender e aumentar a cultura, não é
mesmo?’ ’E, depois, este tem a vantagem de mostrar obras
desde o Renascimento até hoje. E isso é ótimo, dá oportunidade
para um confronto, está tudo muito equilibrado, bem distribuído’.”
(O ESTADO DE S. PAULO, 1969, p.27).
A mesma reportagem registrou a opinião de uma estudante de arquitetura
da FAU USP, chamada Ana Maria, mesma faculdade da qual Lina Bo Bardi
havia sido impedida de lecionar. De todos os depoimentos publicados este foi o
mais negativo:
“Esse prédio é pobre e feio. Lá na FAU não há quem goste dele,
aluno ou professor. É um monstro deslocado aqui em cima,
Pinacoteca-MASP, com elevador aparente no centro da
fotografia, 1969 (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 170
apertado entre uma casa velha e um velho edifício. Não combina
com nada, principalmente com a paisagem. O homem não se
integra nele. É o que chamamos de brutalismo
22
total em
arquitetura. [E define:] Brutalismo é isso mesmo: inadequação; o
homem fora da arquitetura” (MARIA, A. apud ibidem, 1969, p.27).
A reportagem apresentou também estudantes de outros cursos
universitários ou mesmo de colégios que foram ao MASP munidos de caderno e
caneta para copiar
as informações dos
painéis-didáticos,
que estavam atrás
dos quadros. Nem
todos apresentavam
a mesma disposição;
parte do público
alegou interesse nas
informações, mas protestava, provavelmente pelo incômodo de ficar em pé por
muito tempo, ignorando a existência da biblioteca dentro do próprio museu. Uma
dessas pessoas insatisfeitas foi a estudante Claudete Dittlicho, que deveria
esboçar algum quadro e copiar dados biográficos para um trabalho escolar;
protestava sobre o preço do catálogo e do fato de não poder fotografar as obras
22
Segundo Villanova Artigas, arquiteto que projetou o edifício da FAU-USP em 1961, existe a
tendência de se classificar qualquer construção com concreto aparente de brutalismo. Ele entende
que o brutalismo é uma tendência européia que “abandona os valores artísticos da arquitetura,
privilegiando a técnica”; outra coisa é a tendência em particular da arquitetura paulistana, que
“utiliza materiais despidos e os emprega de forma simples, assinalando a perspectiva de um
avanço técnico e buscando interpretar nossa herança cultural” (FERNADES, F., Bienal 50 anos;
Exposição Internacional de Arquitetura. In: FARIAS, A. (org), 2001, p.282).
Alunos fazendo anotações a partir dos painéis didáticos 1969 (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 171
(Ibidem, 1969, p.27). Havia quem
criticava a existência dos painéis-
didáticos naquele local: “absurdo: isso
obriga o visitante a muitas voltas; e
mais: o espaço da parte de trás poderia
ser usado para outro quadro” (THEIL
FILHO, J apud ibidem, 1969, 27).
Outros visitantes abordados
chegaram a se declarar encantados com as obras e com o Museu. Muitos
entravam em um museu pela primeira vez em suas vidas e iam acompanhados de
família e amigos. No conteúdo desta reportagem, assim como nas demais lidas
do período, em nenhum momento o edifício do MASP é relacionado à idéia de
ostentação, ou como um inibidor.
Pelo contrário, todos os
documentos analisados, registros
fotográficos e textos, demonstram
um público bastante descontraído,
ocupando o edifício como um local
de lazer e descanso, observando
as obras ou conversando diante
da paisagem. A mesma reportagem descrevia que em alguns momentos, durante
o final de semana, o número de crianças chegava a ser maior que o de adultos e,
que elas se divertiam correndo entre os cavaletes de cristal. No entanto, segundo
um segurança, o maior perigo se encontrava no comportamento dos adultos que
freqüentemente se mostravam tentados pela idéia de tocar nas obras.
Uma família observando as obras na Pinacoteca
-
MASP 1969 (arq. Bardi).
Pinacoteca
-
MASP com visitantes 1969 (
arq. MASP)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 172
Entre os críticos de arte, houve quem questionasse a qualidade estética
dos painéis-didáticos, não necessariamente as iniciativas presentes nesta
expografia:
“O novo Museu é também ideal para jogos de ‘adivinha quem é’
bem como para desmoralizar quem olha para um Frans Hals e
apressa-se em exclamar “Que belo Rembrandt”. O nome do
artista só aparece no verso da placa de vidro as tais que
provocam vibrações táteis. Olha-se o quadro e gira-se cento e
oitenta graus (...) O giro é satisfatório. Além do nome do artista, o
verso das glamurosas armações fornece toda uma variedade de
pequenas reproduções coloridas, tiradas dos Gênios da Pintura
[Coleção da editora Abril] ou da [Revista] Manchete, com títulos
e informes recortados a tesoura das mesmas respeitáveis
publicações e coladas em baixo ou ao lado das figurinhas. (...)
Entretanto, que sentido faz associar-se de maneira tão próxima
originais do maior valor com reproduções populares recortadas e
compostas em estilo ‘álbum dia das mães’ feito em escola
primária?” (MAURICIO, 1969, s/p)
Alguns captaram sem maiores dificuldades o que Lina Bo Bardi pretendia
atingir com o projeto do MASP realizado na avenida Paulista. É importante
reforçar que a fundação do Museu de Arte se justificou desde o inicio como um
projeto social liderado por Assis Chateaubriand. Uma vantagem para a população
era de que, em função disso, o Museu também não cobrava ingressos. Na citação
a seguir, a jornalista, após dissertar sobre os benefícios que a arquitetura do
museu oferecia aos paulistanos (destacando o uso do belvedere como área de
lazer), mostra-se sensibilizada com a coleção que se apresentava acessível a
todos, além de notar a possível integração do Museu com o cotidiano da cidade:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 173
“Diante de painéis de
cristal, num salão de
paredes também de
cristal, umas mil e
quinhentas pessoas a
cada domingo e
feriado para,
recebendo o apelo,
que os séculos não
emudecem, contido em
obras supremas da
arte (...). É a arte
desmistificada,
subtraída ao seu santuário excepcional entre muros de palácios e
castelos, onde tinham ingresso apenas as castas privilegiadas,
para transformar-se no bem próximo (...) do povo, no meio do
cotidiano da vida” (IZAR, 1969, p.5)
Os apontamentos de Jayme Mauricio, um funcionário do MAM_RJ na
época, fez menção sobre como, ali no MASP, a arquitetura e a coleção se
encontravam integradas. Elogiou ambas, mas questionou a funcionalidade da
expografia a qual intitulou “display”. Na sua interpretação, essa expografia se
caracteriza mais como uma instalação, uma obra de arte capaz de despertar
sensações e influenciar o comportamento do visitante:
“Assim como a humanidade transforma-se um todo global, assim
também o Museu transforma-se num todo já-vi-tudo... / Ao entrar
na nova sala do Museu, após os primeiros momentos de espanto,
lembramo-nos de uma espécie de montagem documentária, onde
figuras lado a lado, [encontram-se] todas visíveis ao mesmo
tempo, uniformes. [...] A nova sede do Museu de Arte realiza um
show tão tridimensional que parece aspirar à própria quarta
dimensão. As estrelas arranjam-se em diversos planos, com todo
cuidado para que nenhuma obstrua a vista da outra criando-se
quase um efeito de sucção sobre quem contempla o espetáculo.
Ao fundo visitantes sentados em um dos bancos disponíveis observam
paisagem da cidade (arq. Bardi).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 174
[...] Quem por ele passeia, sente seu corpo a cada momento
vibrar contra as arestas polidas e vibrantes da floresta de placas
de vidro que sustentam os Renoir, os Cenann (SIC) e seus pares.
Na verdade, o display funciona ainda, ele mesmo, como uma
obra de arte ultravanguardista ao mesmo tempo Op e
participante” (MAURICIO, 1969, s/p).
Já Julio Tavares afirma que a interferência de uma obra sobre a outra, ou
mesmo da paisagem sobre a obra, é algo negativo. Para ele, a existência da
moldura que delimita a área do quadro e da parede “como referência” são
essenciais, e sua abolição, injustificáveis, prejudicando a compreensão da obra:
“Meter aqueles quadros todos
pendurados como roupas num varal, é
um exercício de armar quebra-cabeças
apreçiável, mas não é um modo de
apresentar quadros para informar, educar
e satisfazer a emoção estética das
pessoas. [...] Misturam-se todos os
quadros em diferentes perspectivas
justapostas, paralelas, simultâneas, de tal
modo que o azulado do quadro do
referido Renoir fica amarelo por causa do Van Gogh que surge
logo detrás de esguelha [...] Tenho visto muito museu. [...] Por
algum motivo ninguém usou essa idéia de misturar a paisagem
com quadros nem mesmo no moderno e lindíssimo museu da
Fundação Maeght no povoado de Vence. Integrar é uma coisa,
misturar é outra. No Museu de Arte houve mistura sem
combinação. Afinal, se a paisagem é bela perturba os quadros,
se é feia perturba ainda mais; e por cima da paisagem, aquelas
persianas que dão ao salão imenso um ar de apartamento
atacado de manias de grandeza. Um dia, espero, será modificada
a apresentação absurda e esteticamente injustificável do acervo
do Museu de Arte, de modo a tirar dele aquele ar de vitrina de
loja em liquidação. [...] Se a moldura existe é para traçar os
limites do quadro, de sua composição, de suas cores. Pois bem:
Vista parcial da Pinacoteca
-
MASP (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 175
conservou-se a moldura, mas acabou-se com toda outra medida
de relação. Se já não conhecesse aqueles quadros, e ainda os
conhecendo fiquei com esta sensação, sairia convencido de que
a disposição que se lhes deu não é a de um museu e sim a de
um depósito onde eles estão muito bem guardados”.(TAVARES,
J. 1970, s/p).
A visão de Eyck se contrapõe à de Tavares. Para ele, a melhor forma de
entender uma pintura seria visitando o ateliê do próprio artista ou local onde ela
foi realizada. Diante dessa impossibilidade, porém, julgou que a melhor opção
seria observá-la de maneira livre no espaço como na expografia em questão
ao invés da forma tradicional de expor pinturas, fixando-as ou “trancando-as” em
paredes:
“Num certo sentido sentido errado pinturas em paredes
tendem a ser vistas como janelas para um outro mundo, mas isto
nega a realidade tátil de sua superfície pintada, i.e., a existência
física de algo realmente feito com tinta, pincel, pincelada após
pincelada NO ESPAÇO” / Uma pintura cada pintura constitui
sua própria realidade ‘pintada’ seja lá o que for que retrate. Essa
realidade será melhor descoberta se a pintura for devolvida para
onde foi pintada, que é também onde o pintor estava quando a
pintou. A verdade sendo que sua essencial bidimensionalidade
não pode respirar integralmente quando fixada trancada
numa parede. (EYCK,1997,s/p)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 176
No arquivo da arquiteta
(Instituto Lina Bo e Pietro Maria
Bardi) estão guardados, em
pedaços de papel, depoimentos de
duas personalidades que para ela
foram muito significativos. O
primeiro encontra-se em um
bilhete escrito pelo arquiteto Oscar
Niemeyer, datado de 16 de outubro de 1986, onde diz: “Lina Bardi, só hoje visitei
seu museu. É muito bonito. O melhor e mais belo museu que conheci. Oscar
Niemeyer”. O segundo depoimento encontra-se em uma anotação feita pela
própria arquiteta, em 1985, para registrar um acontecimento que lhe relataram.
Trata-se do momento no qual o compositor de vanguarda John Cage, em visita ao
Museu gritou: “Essa é a arquitetura da
liberdade”. Em outro manuscrito, onde
ensaiava uma comunicação que
realizaria na FAU-USP em 1989, a
arquiteta mencionou o acontecimento e
Imagem do bilhete escrito por Oscar Niemeyer para Lina
Bo Bard
i datado em 16 out. 1987 (arq. Bardi)
John Cage visitando MASP acompanhado por
Pietro Bardi e sua assistente Maria Eugênia (arq.
Anotação feita por Lina Bo Bardi para
recordar-se do comentário de Jonh Cage a
respeito de sua arquitetura (arq. Bardi)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
177
comentou a esse respeito:
“achei que ele estivesse conseguindo comunicar aquilo que eu
queria dizer quando projetei o MASP: o museu era um “nada”,
uma procura da liberdade, eliminação de obstáculos, a
capacidade de ser livre frente às coisas” (BO BARDI, anotações,
Arquivo Lina Bo Bardi do Instituto Lina Bo e Pietro Maria Bardi,
s/d).
O cineasta Aurélio Michiles fez uma nova interpretação na qual remete à
fachada do edifício características de um telão de cinema, onde a cidade com
seus acontecimentos se projetavam no Museu e se mesclavam com a biografia
dos artistas, os temas das obras e a disposição delas no espaço sobre os
cavaletes de cristal:
“No Brasil dos anos 60, quando a liberdade era exercida em sua
radical expressão, mesmo que a ditadura radicalizasse e
inventasse arranjos ilegais para institucionalizar o cerceamento
dos direitos democráticos, LINA projeta o MASP, segundo suas
palavras, o conceito desta edificação queria dizer: ‘... uma
procura da Liberdade, a eliminação de obstáculos, a capacidade
de ser livre frente às coisas.’ / Este bloco retangular suspenso,
com vidro de alto a abaixo, neles, refletindo dia e noite o cotidiano
da avenida Paulista. Como se fosse uma tela de projeção de
filmes. Aqui mais uma vez é a arquitetura como cinema. /
Vejamos: o espaço vazado, aberto aos olhos de curiosos. Onde
tudo se vê. Ali está um outro que espia e olha uma outra. Alguém
silenciosamente espera um outro alguém no meio da algazarra
da cidade - automóveis, ônibus, táxis sob o tremor do metrô que
passa por debaixo dos pés. De repente o barulho do bater da
porta de um táxi é ensurdecida pela sirene de polícia. Finalmente
eles, aquele alguém com o outro alguém se encontram e
debruçam-se na paisagem do vale. O plano vazado do prédio
permite que o vento frio sopre sobre os cabelos. Naquele lugar
escolhido, eles se aninham e beijam-se indiferentes aos milhares
de olhares que ali se avistam. Antes que se perceba a cena final,
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 178
ela é cortada para um outro plano. Um outro alarido se aproxima,
as sirenes de polícia surgem em primeiro plano misturando-se ao
vozerio da multidão que se aglomera gritando palavras de
ordens. Imediatamente o quadro está cheio e os personagens
daquele dia, mais uma vez, utilizam o espaço livre do vão livre
para reivindicar alguma coisa: salário, igualdade, justiça. / E
sobre suas cabeças a caixa retangular guarda obras de arte
assinadas por personagens singulares da nossa história. Muitos
deles para expressar seus sentimentos artísticos pagaram com a
própria vida. Foram presos, condenados a morrer loucos,
solitários e que somente a história lhes devolveu o horizonte da
vida. Quem poderia imaginar um quadro de Van Gogh exposto
em plena praça pública? Pois um dia isso aconteceu. Os Bardi
expuseram-no na cidade de Salvador, Bahia. / A arquiteta ou o
arquiteto LINA BO BARDI, como gostava de ser denominada,
desejou que no seu projeto de Museu as obras estivessem
suspensas, como o próprio prédio e assim as obras pudessem
expor-se aos olhos do outro, como numa visão tridimensional. O
outro interagindo, rodeando, feito a caça e o caçador. Como a
câmera na mão do cinema, o movimento livre desenhando o
olhar na história. A arquitetura de LINA tem essa dimensão
cinematográfica metafórica” (MICHILES, janeiro 2006).
CAPÍTULO IV
A GRANDE TELA,
XVIII BIENAL INTERNACIONAL DE SÃO PAULO (1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 180
Nesse capítulo é desenvolvido um estudo sobre a expografia intitulada
Grande tela, usada na XVIII Bienal Internacional de São Paulo (1985). A mostra
teve a curadoria de Sheila Leirner e contribuição dos arquitetos Felipe Crecenti e
Haron Cohen.
O trabalho de Sheila Leirner foi resultante da observação de que a
expografia moderna era utilizada de forma predominante nas exposições de arte,
como também do questionamento sobre a organização da Bienal por módulos de
representações nacionais. Durante os anos que antecederam o evento após um
longo período de mais de duas décadas, no qual as performances e instalações
predominaram no circuito das exposições de arte , Sheila Leirner constatou que
muitos artistas de toda parte do mundo estavam retomando a pintura. Segundo
suas observações, o discurso artístico vindo com essa retomada era demasiado
semelhante em suas manifestações. Assim, impôs seu discurso criando a Grande
tela, na qual as pinturas foram consideradas como coadjuvantes.
A concretização da Grande tela resume-se em três corredores de 100
metros de comprimento nas quais as telas de grande formato foram expostas lado
a lado. O que mais incomodou os artistas foi o fato que a exposição não atendia
os padrões da expografia moderna na qual haviam idealizado suas pinturas.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 181
1) Precedentes
Um ano após a fundação do Museu de Arte de São Paulo por Assis
Chateaubriand, em 1947, Francisco Matarazzo Sobrinho anunciou a fundação do
Museu de Arte Moderna. Matarazzo era conhecido como Ciccillo Matarazzo,
engenheiro e fundador do que na época era o maior grupo industrial da América
Latina, a Metalúrgica Matarazzo.
Segundo Carvalho, até os anos 1930 “seu gosto não ia além dos
acadêmicos” (CARVALHO, 2001, p.2). Porém na década de 1940, integra um
grupo de intelectuais do qual faziam parte o crítico Sergio Milliet, o arquiteto
Eduardo Kneese Mello e outros que discutiam a possibilidade de fundar um
museu de arte moderna em São Paulo. Matarazzo tinha contato com Nelson
Rockefeller
23
, fundador do Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) e o
principal acionista da Standard Oil (conhecida como Esso), que apoiou a
iniciativa. Houve inclusive um ato documentado no qual Rockefeller e Matarazzo
assinaram um acordo de cooperação entre os museus em 1949. Esse foi um ato
que partidarizou aqueles que investiam em arte e que se encontravam nas vistas
de Chateaubriand. Em termos gerais, os mecenas, colecionadores e possíveis
candidatos a doadores de obras se dividiram; os que tinham afinidade com arte
moderna passaram a apoiar o MAM, obrigando o MASP a se consolar apenas
com aqueles que rejeitavam a arte moderna (FERRAZ; BARDI).
23
Carvalho (Ibidem, 2001, p. 2) conta também que o interesse de Rockefeller em patrocinar a arte
moderna estava estritamente vinculada à Guerra Fria. Era uma maneira de divulgar uma imagem
sofisticada” do país e promover negócios. As exposições de arte abstrata (para se contrapor às
pinturas figurativas do realismo socialista), que integraram muitas vezes a Bienal Internacional de
São Paulo, eram patrocinadas pela CIA (a central de espionagem norte americana), porém, esses
dados não eram divulgados.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 182
Apesar do clima de competição, a primeira sede do MAM localizou-se nas
instalações do edifício dos Diários Associados; como comentou Geraldo Ferraz,
que no período era jornalista dos Diários Associados na rua Sete de Abril:
“Não entendemos por que Chateaubriand, tão cioso de sua
iniciativa, cedeu por um aluguel mínimo as instalações que
[Vilanova] Artigas, um dos arquitetos jovens que mais
apreciávamos, se encarregou de ‘modernizar’ a arquitetura interior,
em que começou a funcionar o MAM” (FERRAZ, 1983, p.147).
Também segundo depoimento de Ferraz, enquanto o MASP ocupava a
ala direita do edifício e oferecia cursos atraindo jovens paulistanos, o MAM abriu
um bar, que se tornou um dos pontos da cidade onde as pessoas se reuniam no
fim do dia. Foi nesse mesmo bar que se ouviu pela primeira vez falar em bienal,
algo que, segundo Ferraz, empolgava Ciccillo Matarazzo. O empreendimento fez
com que o MAM se destacasse mais que o MASP no período e deu a
oportunidade a São Paulo de exibir a primeira grande demonstração de arte
internacional (ibidem, p.148). Com a criação de prêmios, o MAM passou
automaticamente a enriquecer seu acervo, formado inicialmente pelas coleções
de Ciccillo e de sua esposa Yolanda Penteado Matarazzo, que havia vivido em
Paris na década de 1920 e conhecido, entre outros artistas, Brancusi e Léger.
A primeira realização da Bienal Internacional de Arte de São Paulo foi
realizada em 1951 e teve como modelo a Bienal de Veneza, na qual, em 1948,
Ciccilio Matarazzo havia sido o comissário da representação brasileira. Os
contatos internacionais foram estabelecidos por Yolanda Penteado, que viajou
com apoio das embaixadas brasileiras instaladas no exterior, sob indicação do
presidente Getulio Vargas (CYPRIANO, 2001, p.4). Além do próprio Brasil, outros
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 183
vinte e um paises tiveram seus artistas representados na primeira edição do
evento.
Para realização desse evento, construiu-se um pavilhão sobre a estrutura
do antigo Restaurante Trianon, construído pelo escritório Ramos Azevedo, na
Avenida Paulista (onde atualmente se encontra o MASP). O projeto de adaptação
teve autoria dos arquitetos Luís Saia e Eduardo Kneese de Mello, o plano e a
supervisão dos interiores ficou sob
responsabilidade do arquiteto Jacob Ruchti.
A montagem ficou a cargo de Gilmar
Morelo, Aldemir Martins, Frans Krajcberg,
Carmélio Cruz e Marcelo Grassmam que
trabalhavam no MAM. Wolfgang Adolf
Arthur Pfeiffer, que também compôs a
equipe de montagem, ficou encarregado da exposição dos alemães e trabalhava
para o MASP na época (PFEIFFER in: TIRAPELI, 1995, p.117).
Como se pode observar, nas ilustrações o pavilhão apresentava poucas
aberturas, fator que favoreceu a aplicação da expografia moderna. Ainda de
acordo com as fotos, o pé-direito do espaço expositivo era de aproximadamente
3,50m de altura, as paredes estruturais tinham acabamento liso e o piso era de
madeira. Fez-se também uso de paredes de conglomerado de madeira para
dividir os ambientes e expor obras. Estes não chegavam a tocar o forro, porém
eram altos o suficiente para vedar o campo de visão do observador que deveria
se restringir a um espaço de cada vez.
Em 1951, Ciccillo Matarazzo passou a presidir a comissão organizadora
para comemoração do IV Centenário da fundação da cidade de São Paulo a
Funcionário sentado sobre escultura
retrata o despreparo
da equipe (arq.
Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 184
convite do governador e do prefeito de São Paulo. Uma das propostas era
presentear a cidade com o Parque do Ibirapuera. Os projetos arquitetônico e
paisagístico ficaram a cargo de Oscar Niemeyer e Roberto Burle Marx,
respectivamente. Apesar de obra inconclusa, a II Bienal ocupou dois pavilhões do
Parque do Ibirapuera. E foi no Palácio das Nações (atual Pavilhão Manoel
Nóbrega) e Palácio dos Estados (atual PRODAM) que o evento se instalou,
realizando sua cerimônia de abertura em 16 de dezembro de 1953. A
inauguração do parque estava prevista para 23 de janeiro de 1954, data do IV
Centenário de São Paulo; e apesar do número de visitantes que freqüentavam a
Bienal, foi aberto ao público somente no dia 21 de agosto daquele ano, quando as
obras foram concluídas.
De acordo com depoimentos de Pfeiffer (2002 e TIRAPELI, 1995), que
participou da organização e montagem das primeiras exposições do MAM, MASP,
MAC e da I à IV Bienais, todas as paredes na Bienal (estruturais e provisórias)
eram brancas. De procedência e formação alemã, Pfeiffer defendia rigorosamente
o uso de paredes brancas e todas as demais características que compõem
expografia moderna. Declarou que contava com uma equipe improvisada, com
mão de obra desqualificada, inclusive desconhecedora dos cuidados necessários
para lidar com objetos de arte; e que, além disso, contava apenas com boa
vontade e disposição por de artistas.
Nessa segunda edição da Bienal, utilizaram-se vitrines e painéis
semelhantes aos usados pelo MASP, com influência da expografia italiana. Os
painéis eram de madeira conglomerada apoiada sobre bastidores de madeira de
forma vazada, que tocavam o piso dando sustentação. As tábuas de madeira
variavam conforme a dimensão das obras: em geral não tocavam o piso,
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 185
ocupando uma área de 1m a 2,5m de altura e 3m de largura, aproximadamente.
Eram dispostas de forma que além de expor obras, delimitavam espaços,
formando pequenas salas e um
percurso pré-determinado. De
acordo com Pfeiffer (Ibidem), as
condições de trabalho eram tão
precárias que para essa edição
da Biena faltou verba para
compra da tinta branca,
obrigando-os a assumir a cor
do conglomerado de madeira “o que não era o ideal”. Os países que faziam
questão de ter as paredes de sua sessão pintadas de branco tiveram que arcar
com os custos, seguindo ordens do secretário da Bienal. Contou ainda que muitas
obras foram danificadas com exceção das da sala especial de Picasso, a única
que tinha guarda cuidando.
“Numa madrugada (de 1953) fomos convocados às duas horas
da manhã para correr à Bienal porque haviam chegado umas
caixas ‘de certa importância’ e profissionais da área; com muita
energia e discrição deveriam plantar suas tendas e acampar para
um piquete noturno de proteção e de manipulação do que havia
sido desembarcado. Não se contava assim, de repente, com
museólogos e com especialistas, mas sim com essas pessoas
que de boa vontade arregaçavam as mangas e esqueciam o
próprio nome. ‘Guernica’ havia chegado. Como contorno, Marcel
Duchamp, George Braque e Paul Klee” (BONOMI, 2002, p.33).
Foi a única oportunidade que a cidade teve de recepcionar o quadro
Guernica de Picasso, exibida entre tantas outras obras de artistas de renome.
De acordo com testemunho de Percival Tirapeli, Pfeiffer mencionava que nesta
Vista parcial da sala especial do Picasso, II Bienal
(Arquivo Histórico Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 186
edição da Bienal recebeu um dos primeiros ensinamentos sobre expografia para
obras tridimensionais de arte moderna. Na ocasião, o artista Henry Moore
montou sua exposição com auxilio do crítico e teórico de arte Herbert Read,
aplicando estratégias para máxima valorização das obras. Moore, ao executar
suas esculturas, preocupava-se com o entorno no qual sua obra viria a ser
localizada. Suas características influenciavam na escolha do material e
conseqüentemente forma, cor e textura, visando à obtenção de alto contraste e
angulações favoráveis de visão. Read, ao analisar o processo de trabalho de
Moore em 1959, mencionou: “o escultor, [ao elaborar seu trabalho], tende a andar
em roda da massa de pedra, esforçando-se por fazê-la satisfatória de qualquer
ponto de vista” (READ, 1976, p.157). E foi com essa visão que dispuseram as
obras de maneira que o público pudesse circular entre elas e observá-las por
diversos ângulos de visão, uma das principais características da expografia
moderna. Havia, porém, aqueles que continuavam aproximando as esculturas
para perto da parede, como ocorreu com a obra de Walter Bertori na sala da
Áustria. Outra prática desfavorável para observação de objetos tridimensionais,
usada inclusive em exposições atuais, é a disposição de várias obras sobre uma
espécie de mesa larga o suficiente para acomodar o conjunto, ao invés de
apresentar as mesmas sobre pedestais individuais. Isso ocorreu na sala dos
Estados Unidos da América, com as obras de menor porte de Alexander Calder;
ali, o esforço de um observador na tentativa de visualizar outro ângulo do objeto é
desfavorecido na medida que o distanciamento físico entre o observador e o
objeto se amplia.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 187
Esses mesmos
pavilhões posteriormente
abrigaram a terceira edição da
Bienal, que em 1955 estreou
uma nova expografia. Os
batentes de sustentação dos
painéis apresentavam um novo
desenho: eram formados por
uma armação de tubos brancos
que formava quadros vazados, encaixados de forma perpendicular à tábua de
madeira, emoldurada pelo mesmo material, delimitando-a assim. Na fotografia ao
lado há painéis dispostos de duas formas distintas. Os que se encontram no piso
térreo têm aproximadamente 3m de largura e formam um circuito aberto em
sincronia com as esculturas ali dispostas. No mezanino, os painéis são mais
longos e em alguns casos angulares,
com extensão próxima de 5m. Assim,
formam pequenos circuitos ou salas
abertas, dividindo as obras de
diferentes representações.
A partir da quarta edição da
Bienal, o evento foi realizado no
Pavilhão das Indústrias (atual Pavilhão
Ciccillo Matarazzo e conhecido informalmente como Pavilhão Bienal) localizado
no outro extremo da Marquise do Ibirapuera e que ocupa uma extensão maior de
terreno, além de oferecer três pavimentos. Esse e os demais edifícios que
Vista parcial da II Bienal com obras de Alexander Calder
(Arquivo Histórico Wanda Svevo)
Vista parcial da III Bienal com esculturas de Ma
ria
Martins (Arq. Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 188
sediaram a Bienal no
Parque do Ibirapuera
apresentam alguns fatores
físicos favoráveis para a
exibição de obras de arte,
como o pé direito alto,
ausência de paredes fixas em todo seu interior e uma área extensa. Os edifícios
sobre pilotis têm suas partes laterais formadas por painéis de vidros em caixilhos,
cuja incidência de luz podia ser controlada por persianas externas. Ao contrário
do que ocorre na Bienal de Veneza, por exemplo, no qual cada país é exibido em
um pavilhão diferente, o Pavilhão Ciccillo Matarazzo por sua extensão é capaz de
alojar no mesmo local e tempo obras representativas de todas as nações
participantes. Independentemente dessa possibilidade, tradicionalmente desde o
inicio o espaço do edifício foi subdividido, criando um módulo para cada país.
A IV Bienal inaugurou no edifício um novo mobiliário expositivo. Houve
um número maior de países participantes, que aumentou de 31 na III Bienal para
49 países participantes na edição seguinte. A capacidade do novo edifício
permitiu também que o número de obras fosse ampliado, o qual praticamente
dobrou. De 2074 obras expostas na III Bienal à mostra passou a apresentar 3800
obras na IV Bienal. Com a conclusão dos demais edifícios no Parque do
Ibirapuera, o MAM foi removido do Edifício dos Diários Associados na Rua Sete
de Abril e instalado por um breve período no edifício do Museu da Aeronáutica e
transferido posteriormente para o terceiro andar do Pavilhão Ciccillo Matarazzo.
IV Bienal com novo mobiliário expositivo (arq. Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 189
A montagem da exposição da IV Bienal manteve os métodos anteriores,
que utilizavam painéis, pedestais e vitrines, novamente com o desenho alterado.
Os painéis foram ampliados, continuaram brancos, mas desta vez estavam
suspensos por hastes de ferro pintadas de preto, que se estendiam do forro ao
piso do pavimento sob influência da expografia moderna italiana. A altura desses
painéis variava de acordo
com as dimensões das obras.
O objetivo era preservar uma
área de fundo livre que
emoldurasse a obra, como
ocorre na expografia moderna
tradicional, de influência
alemã. Em alguns casos,
como ocorreu na sala com 63 obras de Jackson Pollock, os painéis chegaram a
tocar o chão. As vitrines também mudaram e seu suporte, que antes se
assemelhava a uma mesa,
passou a apresentar a mesma
aparência dos pedestais
modulares protegendo as
obras com vidros que seguiam
o mesmo desenho da parte
inferior.
A V Bienal, realizada em 1959, também apresentou um novo estilo de
painéis, cuja sustentação era realizada sobre cavaletes de aproximadamente
40cm de altura. A maior alteração que essa Bienal sofreu foi administrativa. Duas
Sala do Jackson Pollock, as dimensões dos painéis variavam
de acordo com as obras (arq. Wanda Svevo).
V Bienal com novo mobiliário expositivo (arq. Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 190
direções foram abolidas, centralizando as decisões na figura de um único diretor,
o diretor geral que nesta edição foi Arturo Profili. As diretorias abolidas foram a
técnica e a artística, cujos encarregados eram Wolfgang Pfeiffer e Sérgio Milliet,
respectivamente, mas mudanças ainda mais estruturais viriam a ocorrer nos anos
seguintes.
A direção geral da VI e da VII ficou a cargo de Mario Pedrosa e o estilo
do mobiliário expositivo novamente foi modificado. Os painéis tiveram suas
dimensões ainda mais ampliadas e estes se apoiavam sobre calços pretos que
erguiam os painéis aproximadamente a 10 cm de altura em relação ao piso. Os
filetes brancos que emolduravam os painéis também brancos continuaram
presentes. Apesar das mudanças, como ocorreu nas edições anteriores, alguns
dos painéis remanescentes continuaram sendo usados, pois os novos raramente
eram produzidos em número suficiente.
De acordo com Álvaro Machado (2001, p. 10), durante a direção de Mário
Pedrosa, Matarazzo demonstrou-se descontente com a situação em que a
entidade se encontrava. Os gastos do MAM e da Bienal eram arcados pela verba
de sua empresa e as obras premiadas que formavam o acervo do Museu
encontravam-se sob segurança precária. Em decorrência desta situação,
deliberou em abril de 1962 a
desvinculação das entidades
tornando o MAM e a Bienal
autônomos; porém, continuaram
presididos por ele. Meses depois,
Matarazzo e Yolanda Penteado
VI Bienal, a expografia moderna italiana é substituída
pela tradicional (arq. Histórico Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 191
doaram três coleções particulares de obras de arte, acrescida do acervo inteiro do
MAM aos cuidados da Universidade de São Paulo.
Ciccillo Matarazzo também parou de investir recursos de seu capital na
Bienal, que desta maneira passou gradativamente ao poder público. Apesar disso,
a administração permaneceu privada por se tratar de uma fundação; assim, seus
funcionários não são concursados.
“Rosa Artigas revela que, nas três primeiras exposições, Ciccillo
dividiu os custos com o governo em partes iguais. Já na 5° Bienal,
o empresário entrava com 1/3, e o governo bancava o resto. A
partir da sexta edição, em 1961, o governo arcaria com 4/5 das
despesas” (CYPRIANO, 2001, p.3).
Os demais membros que pertenciam ao corpo administrativo do MAM e
da Bienal (diretor e conselheiros) reivindicaram judicialmente a possibilidade de
manter o nome MAM e sua coleção correspondente. Não foram totalmente
atendidos, porém, foi-lhes permitido, a partir de 1969, utilizar apenas o nome da
entidade. Após essa resolução, a nova entidade da USP (Universidade de São
Paulo), que concentrava todas as coleções, recebeu o nome de Museu de Arte
Contemporânea. A exposição do MAC foi organizada por Walter Zanini com
recursos da USP e continuou ocupando a mesma sede que ocupa até hoje, uma
parte do terceiro andar do Pavilhão Ciccillo Matarazzo.
Para sediar o novo MAM, construiu-se um edifício debaixo da Marquise
do Parque Ibirapuera, que foi projetado por Lina Bo Bardi. Sua proposta
expográfica substituía o branco, que foi usado de forma rigorosa em todas as
exposições realizadas até então pela Bienal e antigo MAM , pelo azul celeste e
pela transparência de toda fachada do Museu. Isso favorecia a vista do Parque
Ibirapuera e vice-versa, como comentado no capitulo anterior.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 192
Durante o desenrolar do processo jurídico que envolvia as entidades,
aboliu-se o cargo de diretor geral, criando-se quatro comissões assessoras de
artes plásticas, arquitetura, artes cênicas e artes gráficas. E assim a Bienal
ingressou numa nova realidade, financiada por um governo ditatorial. De acordo
com Agnaldo Farias (2001), o nome “autoridades” passou a constar na abertura
dos catálogos como integrantes de uma “Comissão de Honra”. E diz ainda:
“O aval do poder corria por conta do reconhecimento da
importância estratégica da Bienal dentro da política de
aproximação com as outras nações, explícita no convite à
participação feito a todos os países” (FARIAS, 2001, p.130),
Durante a cerimônia de abertura do evento, os artistas premiados
entregaram uma carta ao presidente da República, Castelo Branco, solicitando
que ele intercedesse na prisão de quatro intelectuais, libertando-os. De acordo
com a mesma fonte, enquanto alguns artistas apresentavam um amadurecimento
em suas obras inseridas em diversas correntes do abstracionismo, outros
retomavam o figurativismo. Quanto à expografia, aparentemente conservou-se o
mesmo mobiliário, porém o branco passou em alguns casos a ser substituído,
como ocorreu na sala de Sérgio Camargo,
onde os pedestais modulares e os painéis
expositivos estabeleciam contraste com as
obras brancas.
Na IX Bienal, realizada em 1967, as
intervenções do governo foram ainda mais
drásticas. E os militares, antes mesmo de
promover a lei de censura AI-5 (1968-79),
impediram a exibição de obras nas quais interpretaram algum ato “ofensivo às
Sala de Sérgio Camargo, VIII Bienal, in
catálogo 50 anos da Bienal p. 132)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 193
autoridades” ou feria a Constituição brasileira de então que proibia o uso de
símbolos [escudo ou bandeira
brasileira] para fins que não fossem
cerimônias e rituais patrióticos”
(FARIAS, 2001, p.138). Durante o
período de regime militar, o evento
sofreu, assim como outras Bienais,
descrédito de vários países que
deixavam de comparecer às aberturas do evento, quando não, de enviar obras
dos artistas mais reconhecidos. Dos 67 países participantes na IX Bienal, 58
participaram na X Bienal e caiu gradativamente estabilizando-se entre 48 a 52
países participantes. Segundo Álvaro Machado (2001, p.11), isso ocorreu devido
às denuncias de forte repressão e tortura praticada pelos militares aos seus
opositores. Conta que estes atos eram denunciados por parte dos artistas
brasileiros que viviam no exterior, como Hélio Oiticica. Julio Le Parc, artista
argentino que também vivia na Europa, chegou a declarar que tinham, inclusive,
conhecimentos sobre exposições de arte que não foram realizadas por força de
intervenções militares, entre elas, a mostra Civilização do Nordeste, organizada
por Lina Bo Bardi, que seria apresentada em Roma e foi vetada pela embaixada
brasileira na Itália.
Apesar desses fatos, muitas das obras apresentadas na Bienal eram de
arte conceitual, motivo que segundo o jornalista Cypriano (2001), deixava
Matarazzo aparentemente desconcertado diante do governo que financiava o
evento. Com o número crescente de instalações, a partir da X Bienal, parte dos
painéis reproduz o aspecto de parede de forma realista, criando ambientes
X Bienal com paredes móveis, sala Mira Shendel
(arq. Histórico Wanda Svevo).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 194
isolados, quando necessário. Pela primeira vez na história da Bienal, criou-se
uma coordenadoria voltada exclusivamente para a expografia, que no momento
foi denominada Instalação e Montagem, formada por Ubirajara Martins e Walter
Maffei. Essa comissão de montagem foi extinta nas próximas edições do evento,
XI e XII Bienal, para as quais conservou-se apenas a Comissão Técnica de Arte,
que foi acrescida na XII do Comissão de Planejamento e Execução, formada por
dez integrantes. Apesar disso, segundo a Folha de São Paulo (2001, p.10), a
partir dessa edição muitas delegações estrangeiras passaram a encontrar seus
estandes sem nenhuma montagem à véspera da inauguração do evento.
De acordo com Aracy Amaral (1983), em um artigo escrito por ocasião de
sua primeira visita à XI edição da Bienal (1971), o maior problema evidenciado
nessa e na anterior edição do evento foi a falta de organização, que pode ser
entendida como deficiência de projeto curatorial. Conta que, nesse período, as
artes plásticas no Brasil, assim como no restante da América Latina, passava pelo
que ela descreveu como um período de “crise”. Entre os artistas que se
encontravam no país uma boa parte estava passando por uma fase de
transformação, experimentando novos materiais, enquanto outra parte dos
artistas eram classificados como tradicionais, pois não pertenciam às vanguardas,
e que raramente participavam do evento. Ainda segundo Amaral, os artistas de
vanguarda em geral, que tinham uma carreira mais consolidada ou um trabalho
mais amadurecido, estavam residindo em sua maioria no exterior: Helio Oiticica,
Antonio Dias, Mira Shendel, Amélia Toledo, Cildo Meireles, Tomoshigue Kusuno e
Lígia Clark. Na ocasião, o crítico de arte argentino Jorge Glusberg denunciou
essa ocorrência. De acordo com ele, a organização da Bienal comportava-se
extra oficialmente como “autocensurante” e, ao rejeitar a participação massiva
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 195
destes artistas tradicionais (uma vez que alguns poucos participavam) ou ao
ignorar sua atuação artística em suas respectivas nações, a entidade como que
se reportava a um “país sem habitantes”. Em matéria de retrospectiva da história
de 50 anos da Bienal, a Folha de São Paulo (2001) também menciona esse
acontecimento na XI edição: “A falta de uma orientação curatorial para o evento
torna a participação brasileira caótica”.
A XII Bienal foi realizada em 1973 e caracterizou-se pela introdução de
obras interativas como os objetos de Lygia Clark, instalações penetráveis e outras
propostas de vanguarda. De acordo com Farias (2001, p.164), a proposta destas
obras permitia estrategicamente que o público se expressasse num período de
repressão ditatorial que vivenciava.
Em 1975, Matarazzo, que já não contribuía mais financeiramente com o
evento, afastou-se oficialmente da organização da Bienal e conseqüentemente a
estrutura administrativa foi novamente alterada. Aboliu-se a Comissão Técnica de
Arte e a Comissão de Planejamento e Execução, sendo substituídas,
respectivamente, pelo Conselho de
Arte e Cultura e pelo Planejamento
de Montagem. Outra alteração do
evento, que precede a XIII Bienal, foi
a exclusão das outras artes que
integravam a exposição, atribuindo
ao evento o caráter exclusivo de
artes plásticas. Apesar dessas
medidas, as outras artes continuaram presentes, inserindo-se em performances,
instalações e outros meios. Nesta edição não houve uma considerável redução de
XII Bienal ,penetrável de Vera Figueiredo (arq.
Histórico Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 196
paises participantes, totalizando 42 contra 53 paises participantes na XII Bienal e
59 na anterior. Apesar da nova comissão chamada Planejamento e Montagem
que se repetiu na XIV Bienal sob comando de Flávio Mindlin Guimarães e Marklen
Slag Landa, continuou-se desenvolvendo a mesma proposta expográfica.
A XV Bienal teve sua equipe administrativa reduzida e o processo de
premiações extinguido. Pela primeira vez criou-se o cargo de Assessor Curatorial
assumido por Carlos von Schmidt, que trabalhou ao lado do Conselho de Arte e
Cultura. Essa Bienal propõe uma retrospectiva do evento, apresentando as obras
premiadas até então. O espaço do Pavilhão é subdividido de forma proporcional
por paredes modulares de madeira pintada de branco com aproximadamente
3,5m de altura. Os painéis sobre calços ou cavaletes não são mais usados. O
novo modelo também não apresenta o filete branco que o emoldurava e seu
aspecto liso cobre qualquer emenda realizada. A disposição dessas paredes
modulares foi configurada a partir da estrutura arquitetônica do próprio edifício.
Elas ligam de forma perpendicular as vigas de sustentação às paredes
semelhantes usadas para cobrir a fachada do edifício, preservando a área interna
do pavilhão vazia.
Uma prática freqüente durante as Bienais foi vedar os vidros da fachada
com tapumes pitados de branco, criando salas na qual as obras poderiam ser
isoladas de agentes externos. Assim, se isolavam tais obras num ambiente
“neutro”, do qual pudessem contrastar. Essas mesmas salas também passaram a
alojar instalações na medida em que iam surgindo.
Outro aspecto que possivelmente contribuiu para o aumento dimensional
dos painéis foi a retirada das persianas na parte externa do edifício, que, como
conseqüência, aumentou consideravelmente a incidência de luz no espaço, o que
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 197
é um fator indesejado. Pfeiffer chegou a manifestar que essa iluminação
excessiva era um problema. Em 1978, quando assumiu a direção do Museu de
Arte Contemporânea instalado no terceiro andar do mesmo edifício, procurou
vedar a passagem de luz com os próprios painéis expositores, principalmente do
lado em que batia sol à tarde, mas lamentou: “Com isso o prédio perde um pouco
da beleza, pois fecha-se a paisagem que é um espetáculo, por si própria”
(PFEIFFER in: TIRAPELI, 1995, p.171).
A XVI Bienal, realizada em 1981, apresentou sua estrutura reformulada
como ocorreu nas edições anteriores. Desta vez nomeou-se um curador geral,
Walter Zanini, que organizou a exposição por módulos temáticos, eliminando a
divisão antes estruturada pela divisão geopolítica. Outra alteração ocorreu no
método usado para selecionar os artistas brasileiros. Segundo Zanini, os júris
faziam uma seleção demasiado concessiva”, permitindo a participação
exagerada de artistas brasileiros: ‘Entrava tudo, sem rigor, como num salão’.”
(FOLHA DE SÃO PAULO, 2001, p. 11). E o mesmo artigo complementou:
“Zanini assumiu a direção das Bienais de 81 e 83 e inaugurou um
estilo autoral de curadoria, restaurando o prestigio do evento.
Para tanto, acabou com a seleção de brasileiros via inscrição e
passou a convidar diretamente os artistas, inclusive os
estrangeiros, antes selecionados pelos respectivos corpos
diplomáticos” (Ibidem, 2001, p.11).
A exposição se estruturou em três núcleos organizados por analogia de
linguagem e um módulo especial, que teve curadoria de Annateresa Fabris. O
Núcleo I apresentava obras de técnicas tradicionais como pintura, desenho e
escultura; o Núcleo II apresentava obras estritamente ligadas à arte conceitual,
abrangendo instalações, performances, arte postal e livros de artistas; e o Núcleo
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 198
III, vídeo-arte. O módulo especial organizado por Fabris foi intitulado Arte
Incomum e se fundamentou especialmente no acervo do Museu do Inconsciente.
O projeto de montagem e comunicação visual ficou a cargo de Jorge
Aristides de Souza Carvajal (FARIAS, 2001, p. 196). O aspecto dos painéis da
edição anterior foi mantido, porém reformulou-se a distribuição espacial,
atendendo à nova estruturação da exposição. Quando essas paredes não se
apoiavam em vigas ou paredes maiores que tocavam o forro, eram acrescidas em
pontos estratégicos através de hastes de sustentação firmadas no forro e
pintadas de branco. A área reservada para apresentação da exposição Arte
Incomum foi pintada de preto e por cima dos painéis atravessavam faixas de
tecido escuro que se cruzavam no ar. Apesar da ambientação escurecida, as
obras bidimensionais ali expostas apresentaram passepartout branco,
provavelmente na tentativa de inibir ou amenizar alguma interferência direta da
cor escura na leitura da obra.
A XVII Bienal, realizada em 1983, repetiu a mesma estrutura da Bienal
anterior. O curador geral foi novamente Walter Zanini, que presidiu um Conselho
de Arte e Cultura (denominado também como Comitê Internacional) formado por
seis membros, entre os quais encontrava-se Sheila Leirner. Paralelamente, outros
sete curadores trabalharam sobre comando do curador geral, cuidando cada um
de uma área especifica, que abrangia desde cinema, performance, linguagens
tradicionais até pintura, desenho, fotografia etc.; pela primeira vez, houve a
inclusão do grafite. De acordo com Leirner o projeto do curador foi bem planejado:
“núcleos, vetores, exposições satélites são termos essenciais
que, na prática, permitem uma articulação entre as linguagens,
um relacionamento menos restritivo como quer Zanini entre a
arte e as técnicas. E isso separa definitivamente a Bienal das
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 199
grandes exposições internacionais como as de Kassel, Veneza
etc” (LEIRNER, 1991, p.213).
Ainda segundo Leirner, todo processo de divisão de obras, organização e
montagem afirmava o projeto curatorial inicial. Assim, todo percurso favorecia
nitidamente estabelecer conexões entre as obras.
“E isso se deve não apenas a uma compreensão extraordinária
do espaço, como sobretudo àquela noção decididamente mais
generosa, democrática e socializante com relação ao processo
coletivo de realização da arte” (Ibidem).
Essa análise desencadeia nos conceitos “balão e Grande Obra” que
Sheila Leirner apresente em alguns de seus textos escritos a partir de 1981. Tais
conceitos se evidenciaram na Bienal seguinte, quando ela assumiu a curadoria e
realizou a Grande tela, da qual trataremos mais adiante.
Os segmentos criados na XVII Bienal abordam as mais diversas
linguagens artísticas contemporâneas, criando sempre associações com
segmentos históricos. De acordo com Farias:
“O panorama mostrava-se extremamente variado, uma
configuração da suspeita de que os blocos vanguardistas com
suas cartas pragmáticas bem definidas estavam se
desmembrando. As fronteiras se cruzavam e mais do que nunca
se podia pensar em termos de uma arte regionalista” (FARIAS,
2001, p. 201-2).
Entre os segmentos, retomou-se a exposição especial realizada na XVI
Bienal, Arte Incomum, dando-lhe uma continuidade. Essa nova exposição foi
chamada Arte Obsessiva e ocupou grande parte do primeiro andar.
No piso térreo, simulou-se uma “rua” na qual era exibido o Concerto
Fluxus, que apresentava obras e documentos e aconteciam performances
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 200
(Ibidem). Nessa seção, assim como no restante da Bienal, havia salas especiais
com referências históricas, além de uma sala que homenageava Flávio de
Carvalho. Outros segmentos organizados por diversos curadores apresentaram
escultura, grafite, instalações e outros meios como vídeo e informática.
Houve também uma área, chamada pelo comitê organizador tanto de
piazza como de pulmão” da Bienal, onde se concentravam obras representantes
de “período de transição” (Leirner, 1991, p.213): elas retomavam não só a pintura
como resgatavam características de movimentos passados, sendo intituladas de
neo-expressinismo e transvanguarda, estilo que compôs a Grande Tela na XVIII
Bienal.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 201
2) Sheila Leirner e a concepção do projeto da expografia
A Grande tela, expografia tratada neste capítulo, é, acima de tudo, um
conceito sobre arte teorizado pela crítica de arte Sheila Leirner, que foi
materializado como uma expografia. Representa não apenas a obra mais
importante de sua carreira como também a síntese das idéias que desenvolveu
até então.
Sheila Adans
Leirner nasceu no ano
de 1948, em São Paulo.
Juntamente com seu
irmão Terence Leirner
(três anos mais jovem),
foi praticamente criada
pelos avós maternos
Felícia e Isaí Leirner.
Filha de Gica Leirner e
de Louis Adams viveu
até os treze anos, como ela mesma descreveu entre duas famílias judias
refugiadas do Holocausto, até que seus pais se divorciaram e,
conseqüentemente, perderam aos poucos o contato com a família paterna
(LEIRNER, 2005-6).
A família materna, com a qual Sheila Leirner permaneceu, fazia parte do
circuito artístico de São Paulo. Apoiavam fundações e sociedades como de
cinema, teatro e literatura. O avô, Isaí Leirner que faleceu pouco tempo após o
Festa na casa dos pais de Sheila Leirner na rua Guadelupe, São Paulo,
1953: da esquerda para a direita, entre outros: Yolanda Mohalyi
, sua tia
Clara, Abe (seu pai Louis Adans), Gica Leirner (sua mãe), Mané Katz
,
Lasar e Jenny Klabin Segall
, Isai e Felícia Leirner (seus avós), a escritora
Maria de Lourdes Teixeira. No fundo, a escultora Moussia Pinto Alves
e o
crítico - Sérgio Milliet. Nas paredes, ao fundo à esquerda vê-
se uma tela
de Samson Flexor e à direita, uma pintura de Lasar Segall. (In:
LEIRNER,
2005-6)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 202
divorcio dos pais já havia contribuído com a fundação do Museu de Arte
Moderna de São Paulo, da qual posteriormente foi diretor-tesoureiro. Sua avó
Felícia era escultora, aprendiz de Victor Brecheret e chegou a ser premiada na VII
Bienal. Ambos colecionavam obras de arte que eram distribuídas pela casa e com
as quais Sheila Leirner conviveu durante sua infância e adolescência, iniciando
seu repertório imagético e em alguns casos estabelecendo relações afetivas:
“Hoje, se acaso passo diante do Monumento às Bandeiras no
Parque Ibirapuera, imediatamente me vem à memória a maquete
de pedra que Victor Brecheret ofereceu à minha avó e que ela,
com todo cuidado, pousou na mesa da biblioteca entre os
pesados livros de arte. Atrás, circundado pelas estantes e
encimado por um grande óleo de Chagall que tinha sido adquirido
do próprio artista. [...] Da grande poltrona na qual geralmente me
sentava - sob a tela Cartão Postal de Tarsila que pertencia à
coleção dos meus avós e que eu adorava por causa dos
macaquinhos e do Pão de Açúcar - o barco, as figuras dramáticas
e os cavalos de Brecheret sempre interpunham-se ao meu olhar
obrigando-me a entortar o pescoço se, além de ouvi-la, eu
também quisesse ver a sua expressão. [...] Na parte social
ficavam as telas de "seniores" como Portinari, Pancetti, Segall,
Guignard, Tarsila, Di Cavalcanti, Maria Leontina, Milton Dacosta,
Bonadei, Léger, Braque, Picasso, Miró, Campigli, Pascin, entre
outros. Da mesma forma que alguns colecionadores daquela
época, os meus avós preferiam a marginalidade da Escola de
Paris ao academicismo europeu. Porém, na sala de almoço e
jardim de inverno, quando ainda não existia a noção de art brut,
eles também abriam espaço para primitivos brasileiros como
Raimundo de Oliveira ou Cassio M’Boi [...] nos corredores que
levavam aos dormitórios, ficavam os desenhos e as gravuras de
Flávio de Carvalho, Grassmann e dezenas de outros artistas”
(Ibidem, 2005-6).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 203
Apesar da pouca idade de Sheila
Leirner na época, ela manifestou
recordar-se dos momentos que passou
ao lado de seu avô, de seus pais e
principalmente de sua avó,
acompanhando-a à “casa amarela” de
Assis Chateabriand e às aulas de
escultura na casa de Victor Brecheret.
Conseqüentemente, registrou em seu
diário (2005-6), entre suas memórias, acontecimentos artísticos como a
inauguração do edifício do MASP na Paulista, e a comemoração do Quarto
centenário da cidade de São Paulo, que contribuíram para sua formação
intelectual.
“Eu tinha três anos quando meus pais me carregaram pela
primeira vez ao Museu de Arte Moderna, cinco [anos] quando me
apresentaram a tela de Picasso já no Pavilhão de Niemeyer, sete
[anos] quando os prêmios a Léger e a Kubin foram contestados
respectivamente pelos críticos Mário Pedrosa e Lourival Gomes
Machado, e já me afligia diante da batalha do ‘bem’ da arte
moderna contra o ‘mal’ ao qual eles davam o terrível nome de
‘obsoleto’” (Ibidem, 2005-6).
Em diversos momentos, Sheila Leirner mencionou palavras que lhe
marcaram a memória em conseqüência dos debates que ocorriam entre os
adultos no ambiente em que estava inserida (nas visitas que fazia com sua avó à
casa de artistas e intelectuais e durante as refeições ou festas na residência em
que vivia). Discussões essas que, como ela própria alegou, na época não
compreendia:
Victor Brecheret em seu ateliê, onde Sheila
Leirner ia quando acompanhava sua avó
Felicia Leirner (
In:
LEIRNER, 2005
-
6)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 204
Hoje as crianças vêem "Star Wars". Eu vivia "Art Wars", onde o
que estava fora da arte não raro se misturava com o que estava
dentro. Logo, na mesa redonda da casa de meus avós,
construtivismo, lirismo, expressionismo, semi-abstracionismo,
semi-figurativismo, unidade tripartida de Max Bill, limões de Di
Preti, também essas palavras se confundiam com IV Centenário,
hors-concours, prêmios, juris de seleção, juris de premiação,
comissários estrangeiros, críticos, artistas, política, justiça e
injustiça” (Ibidem, 2005-6).
No decorrer de seus relatos, mesmo nos relacionados à infância, é
possível estabelecer associações e encontrar aspectos capazes de contribuir
numa possível interpretação da Grande tela. No trecho a seguir, Sheila Leirner
reflete sobre como se sentia inserida num sentimento cívico de ‘progresso
cultural’ no qual entendia que a Bienal era um importante agente, e destacou
algumas palavras-chave entre as quais encontra-se: “imenso” espaço, acúmulo
“infinito” de obras e, escala “gigantesca” da obra:
“Ainda pequena, tinha realmente a sensação de que vivia um
momento essencial para essa totalidade cultura-mundo-país-São
Paulo que, além do mais, fazia 400 anos. Comprovados pela
minha adorada placa comemorativa de metal colocada na frente
da casa. A isto juntava-se a nova palavra ‘Bienal’ que, no meu
entendimento, mais do que nos museus e galerias, era o único
lugar onde as pessoas podiam realmente descobrir os mistérios
da arte e dos seus artífices. / Mas, por que as primeiras bienais
de São Paulo eram tão grandes e importantes? Em relação a
mim, o Trianon que mudava para o ‘imenso’ espaço do
Ibirapuera, o acúmulo ‘infinito’ desses objetos que os adultos
chamavam de pinturas e esculturas, a descoberta dos valores da
‘arte moderna’ que, me parecia, eles consideravam ‘supremos’, e
sobretudo a escala ‘gigantesca’ dessa Guernica (de Picasso) tão
anunciada em 1953, tudo isso possuía um poder oculto e
amedrontador. Eu me sentia minúscula como um gato numa
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 205
usina, porém plena de um grande e inexplicável sentimento cívico
de ‘progresso cultural’, cujo significado não só não conhecia,
como mais tarde iría questionar” (Ibidem, 2005-6).
Durante a infância, Sheila Leirner não só estava inserida num ambiente
no qual prevaleciam como principal assunto as artes, como também de acordo
com seu próprio depoimento germinou um senso crítico imposto pela própria
situação em que se encontrava. Testemunhando o clima de euforia provocado
pela Guernica, sem receber qualquer resposta ou esclarecimento para suas
perguntas
24
, encontrou-se forçada a refletir sobre o assunto. Apesar da
imaturidade, do pequeno repertório adquirido para chegar a qualquer resposta
esclarecedora, através dessa tática que lhe foi imposta, “inteligente didática da
anti-didática” (Ibidem, 2005-6), como classificou, exercitou não só seu raciocínio,
como também, inconscientemente, uma leitura fenomenológica da obra,
classificando-a como “sombria”. Isto, porém, não esclarecia, dentro de seu
universo infantil, “uma vez que crianças gostam de cores” (Ibidem, 2005-6),
porque os adultos estavam tão ansiosos diante dessa obra. Uma possibilidade de
tanto êxito poderia atribuir-se à dimensão da obra como mencionou na citação
anterior, mas a incerteza e questionamentos prevaleciam:
“Assim, desde criança eu via a Bienal de São Paulo como uma
enorme e eficiente fábrica de turbulências e contradições, onde
nem mesmo a feira das vaidades conseguia subjugar os seus
valores nascentes. Apesar de fazerem parte de grupos e
movimentos ideológicos coletivos, nos anos 50 e 60 as
singularidades e as personalidades individuais falavam mais alto
e o mundo das artes fabricava estrelas tanto quanto Hollywood
(Ibidem, 2005-6)
24
“Como eu estava na idade dos porquês, presumo o que essa torrente de novidades devia
exaurir meus pais e avós em suas respostas, pois eles acabaram por adotar a fórmula do "porque
sim" (Leirner, 2005-6).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 206
Todos esses acontecimentos artísticos, partidarismos e polêmicas foram-
lhe tão marcantes e, somados, provavelmente tornaram-se tão complexos, que,
segundo seu próprio depoimento, conseguiu compreender parte deles apenas
quando adulta:
“Lembro perfeitamente das discussões em torno da polêmica
suscitada pelo corte da maioria dos brasileiros de tendência
figurativa, inscritos na 4ª Bienal de São Paulo. Os senhores e
senhoras presentes gritavam bastante quando diziam que "o júri
tinha privilegiado os concretistas". Deve ser por isso que, na
idade adulta, levei um bom tempo para compreender que os
artistas e poetas daquela tendência não eram os vilões que eu
imaginava” (Ibidem, 2005-6).
Mesmo sem compreender o que ocorria em seu entorno no universo
artístico, atribuiu a ele a ocasião que lhe despertou interesse o oficio que
pretendia seguir, com nove anos de idade. Isto ocorreu numa ocasião em que
seu avô Isaí Leirner, discordando dos critérios de seleção de obras para a IV
Bienal, demitiu-se do MAM e organizou uma mostra-protesto com os principais
artistas recusados de arte “abstrata informal”:
[...] foi graças a ela que descobri a minha vocação jornalística.
Quando acompanhei o meu avô a esta mostra-protesto dos
principais artistas "recusados" pela Bienal, no saguão do edifício
do jornal Folha de S. Paulo na Alameda Barão de Limeira, vi pela
primeira vez, atrás de vidros, as imensas rotativas do jornal. Elas
faziam muito ruído e a menina que eu era imaginou, extasiada,
todo aquele papel impresso sendo lido por milhares de pessoas.
Claro que, depois daquela emoção, a exposição do meu avô não
me impressionou. O que era uma prosaica exposição de pinturas
diante de tal instalação em performance cinética?" (Ibidem, 2005-
6).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 207
E assim ocorreu. Desde menina
exercitou sua escrita periodicamente e
esta se tornou sua atividade predileta. Já
sua experiência com a prática artística
não lhe resultou tão estimulante. No
depoimento a seguir, é possível constatar
que suas preferências estilísticas na
época não eram muito compatíveis com
as de sua família:
“Se eu fosse artista, pensava, poderia
esquecer-me completamente de mim. Ficaria
horas perdida no deleite de compor naturezas mortas. Nunca
repetiria as incompreensíveis e às vezes até mesmo agressivas
ou angustiantes imagens e formas "modernas" que eu via nos
museus, galerias e bienais. E sobretudo nos ateliês de Felícia e
de Yolanda Mohalyi, artistas que minha avó e minha mãe me
faziam freqüentar. Lá, naquela sombria casa do Sumaré que
cheirava a tinta, onde eu recebi algumas aulas de pintura olhando
de esguelha um estranho boneco de pano do tamanho de um
homem que ficava num canto, nem a bondade e a doçura de
Yolanda aliviavam a minha sensação de estranheza. Ao invés do
cavalete e das telas, eu teria preferido um milhão de vezes
encher as páginas de um caderno grosso, sem deixar qualquer
espaço em branco, filigranando flores ou robustecendo e
aveludando frutas. Não raro, tentaria a transparência de um copo
ou o brilho de uma louça com o que conseguiria de mais natural
da aquarela ou do pastel. Eu seria uma artista acadêmica!!!
(Ibidem, 2005-6)
Esta preferência foi explicitada também em outras passagens, como
quando descreveu sua primeira visita ao MoMA de Nova York, aos dezesseis
anos em 1964.
Alguns dos diários que Sheila Leirner escreveu
(LEIRNER, 2005-6)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 208
“Assim, com a minha pouca idade, testemunhei, ou captei sem
saber precisamente, certas revelações do contexto artístico da
época, como a emergência daquele ismo numa conjuntura
marcada pela herança do expressionismo abstrato, a
emancipação de uma imagética associada à cultura do consumo,
o questionar do lirismo da pintura monocromática, a reabilitação
do Dadá e do modelo duchampiano e, do ponto de vista
específico de Warhol, o recurso às técnicas de reprodução
mecânica, reciclagem de imagens fotográficas, a predileção pelas
iconografias funestas e... o glamour! / Verdade que não senti
qualquer emoção quando vi Rauschenberg, Oldenburg, Jim Dine,
Rosenquist, Wesselmann, Lichtenstein, Indiana, Jasper Johns e
outros ainda naquela exposição do MoMA. Mas a achei
interessantíssima! Apenas chorei
quando, na visita à coleção do
museu, deparei com ‘O Cigano
Adormecido’ de Henri Rousseau o
Douanier, artista primitivo que me
emociona até hoje e cuja tela eu
conhecia apenas em reprodução de
livros. Penso que foi como
encontrar pessoalmente um velho e
virtual amigo”
(Ibidem, 2005-6).
Sheila Leirner concluiu o
segundo grau em São Paulo, participando de grêmios estudantis onde iniciou sua
atividade como agitadora cultural. Porém, devido a problemas pessoais que a
abalaram emocionalmente não conseguiu dar continuidade aos seus estudos,
abandonando as três universidades nas quais havia ingressado:
Os artistas Basquiat e Warhol com She
ila Leirner no
Studio 54, Nova York, 1983,
vinte anos após sua
primeira visita ao MoMA depois. (
Copyright © Patrick
McMullan Photography).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 209
“A vida, eu só via a dos outros. Ficava num canto como um
animal selvagem e espreitava. Da mesma
maneira como fazia nas classes de
primeiro ano das três faculdades às quais
me havia inscrito depois de ter sido
admitida entre os primeiros colocados:
Comunicações, Ciências Sociais e
Advocacia. Comparando a vida social e os
estudos, para mim, não havia grande
diferença. Ambos eram penosos e, pela
igual falta de compensação intelectual,
provocavam a mesma pergunta: ‘O que
estou fazendo aqui?’ Eu teria preferido
escolher amigos e eventualmente
professores que me fossem condizentes
mas, sobretudo, adquirir sozinha aqueles
conhecimentos. Deve ter sido por esta
razão que, mais tarde, dei outro sentido à
vida mundana, enveredei o autodidatismo,
escolhi meus próprios mestres e deixei algumas sábias pessoas
orientarem o meu trabalho” (Ibidem, 2005-6).
Em 1968, partiu para Paris (França), onde permaneceu com sua mãe
durante os três primeiros meses. Depois, reiniciou seus estudos cursando
Sociologia do Urbanismo na Université de Vincennes (França), Direção de
Cinema na École Pratique des Hautes Etudes e Sociologia da Arte com Pierre
Francastel na Sorbonne.
Em 1970, retornou ao Brasil e trabalhou como assistente de produção
para o cineasta Luis Sergio Person. Em 1973, iniciou seu trabalho como crítica de
arte no jornal Última Hora de São Paulo sob direção de Samuel Wainer. Em 1975
transferiu-se para O Estado de S. Paulo passando a escrever para o suplemento
Cultura. Em 1976, tornou-se membro da Associação Brasileira de Críticos de Arte
(ABCA) e recebeu o prêmio de “Melhor critico do ano”.
Retrato de Sheila Leirner por Flávio de Carvalho
(
In:
LEIRNER, 2005
-
6)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 210
Em 1982 publicou seu primeiro livro Arte como medida, pela editora
Perspectiva. Trata-se de uma coletânea de artigos sobre arte, selecionados entre
os que escrevera até então. Entre suas resenhas críticas desenvolveu os
conceitos que denominou balão e Grande obra, os quais foram retomados
constantemente no decorrer de sua carreira. De acordo com sua própria definição
o balão tem uma significação próxima à conceituação da obra:
“Um balão, por exemplo, pode representar hoje tudo aquilo que
os artistas procuravam há muito: o espetáculo efêmero, que
contenha por isso um sentido mágico, mítico, simbólico,
ritualístico. Aquilo que contraria, com efeito, toda idéia de
formalismo que faz as pessoas apreciarem a arte olhando para
ela. Pois sugere a estrutura mítica ou de totem que como Levi-
Strauss apontou ‘não existe apenas para ser olhada, mas para
ser pensada’. De certa forma conserva a única inovação possível
para a arte que é a remoção do significante ou a fundição pura
e total entre ele e o significado. O balão conserva-se assim antes
e após a sua experiência material” (Ibidem, O balão e a Grande
obra, 1981. In: Ibidem, 1982, p.115).
O conceito de Grande obra no decorrer de sua carreira como crítica
recebe diferentes graus ou atribuições de onde surgem as variações Grande
coleção e Grande tela.
“A Grande Obra é aquela soma sincrônica, não hierárquica e não
qualificável, de ações artísticas contemporâneas que une as
polaridades e incorpora as diversidades, enviando o fenômeno da
simultaneidade dessas ações” (Ibidem, Grandes formatos: euforia
e paixão,1983. In: ibidem, 1991, p.94).
No seu entendimento, a Grande obra atua da seguinte maneira:
“A Grande Obra [...] dissolve e purifica igualmente a falsa química
da ambição artística habitual, unindo as polaridades [atividades
paralelas do artista e do fruídor em relação á obra], incorporando
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 211
as diversidades [estratégia para não criar exclusões no meio
artístico], representando verdadeiramente o barômetro da saúde
espiritual da nossa cultura” (Ibidem, O balão e a Grande obra,
1981. In: Ibidem, 1982, p.116).
Sua atividade voltada à curadoria iniciou-se no circuito latino americano.
Em meados de 1982, assumiu o cargo de diretora executiva da Associação Latino
Americana de Artes Visuais em Buenos Aires (Argentina) e foi correspondente da
Presse pour les Revues d'Art da França, Arte da Colômbia e D'Ars de Milão
(Itália) a São Paulo. Integrou o Comitê Científico da exposição Fantástica arte
latino-americana realizada no Museu de Indianópolis, Estados Unidos da América.
E foi assistente de Aracy Amaral na organização da representação brasileira para
a exposição da Bienal Latino Americana de Arte sobre Papel, realizada em
Buenos Aires.
Entre 1982-83 realizou o vídeo-performance chamado Trilogia amorosa
pertencente à coleção do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São
Paulo, instituição para a qual contribuiu com texto em catálogo. Essa sua obra
consiste em um jogo de palavras realizando na primeira parte uma “Metáfora (de
arte) da crítica” e, na segunda, uma “Metáfora (poética) da crítica”. Na primeira,
realizou uma analogia entre arte e crítica a partir das palavras didática,
linguagem, metáfora e reflexão entre outras; na segunda, criou uma poesia
concreta mesclando as palavras crítica, arte e criar, assim como também
transformar, transferir, capaz, paz e tear.
“A trilogia que qualifiquei ‘amorosa’ é, de fato, uma ação de amor
à crítica e a arte, mas sobretudo um manifesto por meio do qual
tento dissolver como sempre desejei, inclusive em meus
trabalhos futuros como curadora os limites que afastam uma e
outra. [...] Trilogia Amorosa é, portanto, uma peça crítica e é
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 212
também uma peça de arte a qual não tentarei desvendar por
meio de palavras como faço com as demais. [...] Para não trair
minha peça amalgamada, meu manifesto amoroso embora
sinta bastante tentada uma vez que amo a palavra também como
objeto xamanístico de meditação entre a arte e o público , relevo
este trabalho da mesma forma como acredito que se deva fazer
com as obras de uma exposição: em silêncio e espacialmente.
Ou seja, (ceno)graficamente” (Ibidem, Introdução à Trilogia
amorosa, 1990. In: Ibidem, 1991, p.28-9).
Assim, a partir de sua declaração pode-se afirmar que em seu raciocínio
não só a critica se iguala à arte, ou mesmo é uma arte, como também que a
crítica é essencial na intermediação entre o objeto artístico e o público. Esclarece
também que esta crítica pode ser expressa através de outros recursos além da
palavra, como, por exemplo, pela cenografia.
Em 1982 identificou casos nos quais entendeu que a curadoria
apresentava um discurso crítico individual ou “pessoal”, manifestando que era
dessa maneira que as exposições de arte deveriam passar a ser montadas.
“A Documenta [quatrienal de Kassel, 7° edição, 1982] rompeu
inteligentemente com a tradição das exposições temáticas,
abandonando aparentemente a crítica apriorística, sem contudo
renunciar à mostra teórica. Substituiu a pesquisa pelos
procedimentos empíricos, cujo único critério foi a vivacidade da
obra hoje. [...] Em suma, a Documenta é, como não poderia
deixar de ser depois da batalhada conquista da liberdade crítica,
um ponto de vista. E como foi organizada por pequeno grupo
conscientemente sectário e que sustenta idéias comuns [...], é um
ponto de vista pessoal. Uma obra extremamente criativa
[entenda-se aqui a “obra” do curador] que, ao mesmo tempo, vê e
se funda em outras obras. Por essa razão, talvez, é que as bases
teóricas da Documenta são as vezes tão ambíguas quanto a arte
que ela trata, e é apenas por meio de uma linguagem cifrada e
subjetiva que captamos as suas finalidades. Afinal, essa
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 213
‘construção de um sonho’, essa ‘regata vagarosa’, segundo
afirma Rudi Fuchs, é na verdade uma aula de como uma
exposição deve ser feita em nossos dias. Ou seja, de forma a
tornar-se o análogo mais perfeito possível do processo da arte na
qual ela acredita” (Ibidem, Crise? No mundo, sim. Na arte,
anuncia-se o futuro, 1982. In: Ibidem, 1991, p.86-7).
Em 1983, apresentou idéias ainda mais próximas à Grande tela. Além de
refletir sobre o discurso crítico do curador, abordou a questão de o curador propor
uma moldura e um recorte além do recorte já presente na própria obra de arte
(bidimensional), reflexão apoiada nos conceitos do balão e da Grande obra:
“Aqui deve ser feito um breve parêntese para destacar a
mudança extraordinária que a crítica vem sofrendo nos últimos
anos. Ao se liberar das amarras da objetividade, racionalismo,
estruturalismo etc.; ao transformar corajosamente o discurso
numa espécie de obra análoga ao objeto de enfoque, muitas
vezes a crítica alcança agora não só a criatividade literária como
sobretudo uma grande profundidade filosófica. A metáfora poética
de Celant contra essa continuidade quebrada e interrompida
cortada de maneira a formar inumeráveis fragmentos e porções
de telas (pinturas), criando intervalos e separações é
extremamente interessante. Pois o seu entendimento pode
influenciar grandemente a nossa maneira de ver e pensar a arte. /
A visão criativa do critico italiano pode nos fazer enxergar a arte
como uma questão de continuidade histórica ou até mesmo
colocá-la sob o prisma da ‘Grande Obra’ a que me refiro, quando
pretendo verificar o fato artístico à luz da totalidade. [...] Esses
cortes a que comumente chamamos de moldura ou de ‘limites da
pintura’, portanto, passariam então a ter por um lado uma única e
funcional finalidade ajudar a descobrir a história, ou por outro lado
reforçar os atos estruturados que se dão entre o artista e o fruidor
atos que, como um todo, agem como ‘cola’ psíquica, existencial
e intelectual que mantém toda cultura interligada” (Ibidem,
Grandes formatos: euforia e paixão, 1983. In: Ibidem, 1991, p.94-
5).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 214
Através dessa citação, acompanhamos também o raciocínio de Sheila
Leirner sobre a condição em que o crítico se encontra, que “Ao se liberar das
amarras da objetividade, racionalismo e estruturalismo” depara-se com a
subjetividade da obra e sua livre interpretação. A citação a seguir representa uma
reflexão sobre esse assunto, feito pela própria Sheila Leirner quinze anos depois,
na tentativa de analisar o que pensava ainda no início de sua carreira.
“Penso que, assim como os psicanalistas criam-se a partir da
própria neurose (precisam sofrer mentalmente o suficiente para
procurar ajuda e tornarem-se eles mesmos terapeutas), alguns
críticos de arte provavelmente devem se formar tomando por
base o desafio de conformações não raro estranhas à sua
sensibilidade. Analisar o incógnito é uma forma de enfrentar o
medo que ele causa. No futuro, talvez eu sentisse que era muito
perigoso entrar na subjetividade das obras - colocar em confronto
as minhas particularidades e a dos artistas - sem instrumentos
contemporizadores da mediação crítica como, entre outros, a
língua, história, filosofia, semiologia e mesmo a psicanálise...”
(Ibidem, 2005-6).
Concomitantemente, há de se considerar como Sheila Leirner
interpretava na época a pintura neo-expressionista (que logo em seguida iria
ilustrar sua teoria de Grande tela): como uma arte extremamente subjetivista.
Essa afirmação aparece em seu artigo Grandes formatos: euforia e paixão, escrito
em 1983, dois anos antes de assumir a curadoria da Bienal. Grande parte dos
assuntos que escrevia no período eram resultantes do que estava sendo
mostrado nos diferentes segmentos da XVII Bienal, além de outras exposições
realizadas no período. O que foi decorrente do fato de estar integrando a
Comissão de Arte e Cultura da Fundação Bienal de São Paulo e acompanhando o
exercício curatorial de Walter Zanini. Posteriormente, ela viria a questionar o
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 215
nome “neo-expressionismo” atribuído pela maioria dos críticos à “nova pintura”
confrontando essa arte com a arte expressionista.
“Uma ‘nova’ pintura que vai além dos estilos e correntes, além do
‘expressionismo’ ou do ‘pós-modernismo’, trazendo a arte para
mais perto do corpo. Criando e utilizando uma linguagem corporal
que enfatiza tipos mais rudes de depoimento. Uma reação contra
o intelectual, a fixação tecnológica que dominou a arte nos
últimos vinte anos. [...] A mudança fundamental da pintura, porém
reside no fato de ela ser atualmente a expressão (não
representação) do pensamento. [...] Hoje a pintura (pós-
minimalista) não representa mais. Ela é. [...] Ela é, como uma
correspondente direta, não mediada, do pensamento, ação ou
percepção. / A despeito de nossos vícios formalistas e
‘simbolizantes’, esta pintura nos oferece raras oportunidades de
repetir a avaliação empírica em termos convencionais de forma,
conteúdo, sugestão, associação, estrutura, narração, gestalt,
fenomenologia etc. Pois é uma pintura que sempre se manifesta
contra uma ‘psicografia’, o espectro materializado e simultâneo
de uma captação transcendental do eu, do mundo, da vida e das
complexas e inexplicáveis relações entre eles” (Ibidem, Grandes
formatos: euforia e paixão, 1983. In: Ibidem, 1991, p. 96 a 98).
No decorrer do texto, tende a nivelar o trabalho de diferentes pintores
inseridos nessa tendência estilística.
“os novos artistas (e também os não artistas) têm finalmente a
permissão. Experimentam o sabor de uma ‘liberdade’ feita de leis:
expansão, imagem, mau gosto, subjetividade, primitivismo,
arcaísmo, exteriorização etc. [...] Muitos sem consciência de que
estão diante de novas normas que são contra as normas, de
novos valores antivalores, entregam-se à euforia ilusória da
subversão. Outros constroem, de fato, um ‘novo mundo’ dentro
do caos. [...] É difícil, contudo, separar a ‘nova pintura’ da nova
‘visão’ de pintura a que também se conseguiu chegar atualmente.
[...] prefiro acreditar que o que ocorre é algo assim como uma
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 216
reeducação dos sentidos, a elaboração de um novo
discernimento (ou de uma generosa nova falta de discernimento)
que permite não só colocar lado a lado artistas jovens e maduros,
como principalmente unificar por linguagem utopicamente comum
as mais diversificadas procuras, as mais diferentes intenções”
(Ibidem, Grandes formatos: euforia e paixão, 1983. In: Ibidem,
1991, p.97 a 99).
E encontra, diante deste quadro, a possibilidade de adaptar a teoria de
Grande obra à Grande tela, criando uma analogia entre a “arte, o homem e a
vida”; após haver esclarecido que “a arte não é vida, é uma atividade cercada
pela vida e da qual depende” (Ibidem, 1991, p.96):
“É muito interessante verificar o quanto muda, com todas essas
questões, a própria forma de encarar a arte, o homem e a vida.
Isto pode ser percebido não apenas por meio da nova concepção
de escala, da crítica poética e idealista de Celant que ‘unifica’ a
pintura na Grande Tela, ou na idéia mais ampla ainda da Grande
Obra. Isto pode ser detectado sobretudo na própria e nova visão
da pintura” (Ibidem, Grandes formatos: euforia e paixão, 1983. In:
Ibidem, 1991, p.100).
Sheila Leirner assumiu o cargo de curadora da Bienal atendendo convite
feito pelo novo presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Roberto Muylaert,
em 1984. No mesmo ano iniciou seu trabalho planejando a XVIII Bienal, atuando
como comissária, viajando para visitar diversas bienais, exposições e ateliês de
artistas no circuito internacional. No mesmo ano abriu concurso no Brasil para que
os artistas pudessem inscrever suas obras para seleção, propondo pela primeira
vez na história da Bienal um tema com intenção de criar uma unidade na
exposição. Apesar do tema proposto O homem e a vida ser bastante criticado
pela imprensa da época, muitos artistas inscreveram seus trabalhos. À medida
que as obras foram submetidas, Sheila Leirner pôde constatar que a grande
maioria das obras enviadas eram, coincidentemente ou não, relacionadas com a
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 217
pinturas neo-expressionistas. Isso ela já havia constatado no circuito artístico
tanto nacional quanto internacional, após um longo período (décadas de 1960 e
70) com o predomínio de arte conceitual e performances. Se a curadora não
aprovou todos, aprovou a participação de quase todos os trabalhos inscritos.
Paralelamente, como uma medida de precaução, supondo que nem todos
os países enviariam obras de artistas de sua preferência, solicitou à Fundação
Bienal a possibilidade de encaminhar convites individuais para garantir a
presença daqueles artistas internacionais que ela planejava para a exposição.
Assim, organizou a exposição sobre expressionismo (como referência histórica) e
neo-expressionismo, estilos que pretendia confrontar.
Após essa exposição, apesar da grande quantidade de críticas negativas
à Grande tela, Sheila Leirner foi premiada na categoria Personalidade artística do
Ano na América Latina, pela Associação Argentina de Críticos de Arte que
reconheceu seu trabalho critico na organização da XVIII Bienal Internacional de
São Paulo. Continuou integrando a Fundação Bienal e sendo curadora da XIX
Bienal Internacional de São Paulo. Depois foi membro honorário do Centro
Cultural Brasil-Israel, Membro do ICOM, Membro fundador do Instituto da
Fundação Arthur Rubinstein em São Paulo.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 218
3) Estudo da expografia
A Grande tela, estudada aqui, representou o núcleo central da XVIII
Bienal Internacional de São Paulo que teve a curadoria de Sheila Leirner em
1985. Essa exposição porém, foi estudada considerando-se os demais segmentos
de obras da exposição da Bienal, que a contextualizam. Utilizou-se como suporte
imagético fotografias e filmagens que registram o evento, rascunhos com
cálculos, plantas e perspectivas do projeto. Também foram considerados os
depoimentos dos próprios arquitetos envolvidos e da curadora realizados na
época, além dos textos escritos por Sheila Leirner sobre o assunto. Os arquitetos
que contribuíram para esta realização foram Haron Cohen e Felippe Crescenti
(que também era cenógrafo) no planejamento do espaço e Luiz Loureiro na
execução da montagem.
O projeto geral de curadoria, no entanto, não foi totalmente planejado por
Sheila Leirner. Roberto Muylaert ao convidá-la já possuía um plano piloto para a
exposição, no qual listava as exposições especiais e definia a chamada
publicitária para divulgação da mostra.
“’A Bienal é uma festa’ foi a frase
que encontramos, logo no inicio da
organização, para definir o que seria
a sua 18° Bienal versão 1985. Ela
reflete o espírito da mostra”
(MUYLAERT, s/p. In: Fundação
Bienal de São Paulo (c), 1985).
O discurso de Sheila Leirner apresentado no
documentário Arte e vida (dirigido por Adrian Cooper),
Cartaz da XVIII Bienal
(arq. Histórico Wanda
Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 219
no entanto não contradiz a afirmação de Muylaert. Leirner explicava que a Bienal
era reflexo da época em que viviam, cujo espírito se caracterizava na idéia de
espetáculo e diversão; aspectos, segundo ela, presentes na exposição.
Porém, o plano piloto da exposição, coordenado por Muylaert definia uma
temática nacionalista brasileira:
“Outra definição importante, estabelecida desde o projeto original,
foi de que a 18° Bienal seria antes de tudo brasileira, mas não só
na concepção, projeto e montagem, como no sentido de reservar
a maior área possível aos artistas nacionais e às nossas
manifestações culturais vinculadas ao espírito da mostra. / Foi
assim que surgiram as exposições ‘Expressionismo no Brasil:
heranças e afinidades’, ‘O turista aprendiz’, ‘A criança e o jovem
na Bienal’, ‘Xilogravuras de cordel anos 60/70’, além de uma
importante programação musical, integrada ao espírito da
exposição” (MUYLAERT, s/p. In: Fundação Bienal de São Paulo
(c), 1985).
Esse enfoque não coincidia com o de Leirner que visava questões
voltadas à globalização. Preocupava-se em apresentar suas reflexões sobre a
arte contemporânea; assim as exposições especiais receberam um destaque
secundário juntamente com o tema nacionalista que lhe havia sido proposto.
Estas exposições foram concentradas no terceiro pavimento do edifício onde
foram apresentadas de forma paralela, sem integrar o discurso do restante da
mostra.
Ali a área foi dividida em quatro partes que não necessariamente se
complementavam, sendo duas de organização nacional e duas internacionais. A
primeira nacional foi Expressionismo; heranças e afinidades, a única cuja temática
estava relacionada com o restante da mostra, poderia ser considerada como uma
continuação da sessão histórica apresentada nos primeiros andares, a qual se
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 220
destinava a apresentar artistas brasileiros expressionistas, integrantes do
movimento modernista. A outra nacional foi chamada de O turista aprendiz. Teve
como fonte o livro de Mário de Andrade de mesmo nome, no qual descreve as
viagens que realizou durante vinte anos percorrendo o Amazonas e outros
estados brasileiros. Esta parte da exposição compôs uma cenografia utilizando
recursos cênicos nos quais eram apresentados vídeos, filmes, fotografias e peças
de indumentária de povos brasileiros. Na seqüência apresentou-se pela primeira
vez no Brasil uma coleção de 150 máscaras bolivianas. A quarta exposição,
também inédita no país foi inteiramente organizada pelos Estados Unidos da
América. Chamava-se Entre a ciência e a ficção e apresentava 81 trabalhos de
arte e tecnologia de 67 artistas. As exposições de gravura e xilogravura foram
apresentadas também neste andar, sem integrar-se, porém, com nenhum outro
seguimento da Bienal.
No restante da exposição, a ênfase ao que já havia sido escrito por
Sheila Leirner foi evidenciada. Paralelamente à chamada publicitária pré-
estabelecida, o tema escolhido para a mostra foi O homem e a vida. Como se
mencionou anteriormente, fazia parte de uma reflexão da curadora sobre a arte
neo-expressionista, através da qual ela pôde idealizar a Grande tela, uma
variação da teoria da Grande obra sobre a qual escrevia desde 1981.
O tema O homem e a vida divulgado na imprensa como requisito para
seleção das obras possibilitou que a Grande tela, teorizada em 1983, fosse
materializada, uma vez que muitos artistas atenderam as expectativas de Sheila
Leirner, enviando para a exposição pinturas que poderiam ser classificadas como
neo-expressionitas. Como tradicionalmente o evento abrangia diversas técnicas
das artes plásticas, a mostra da pintura neo-expressionista foi inserida
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 221
espacialmente entre outras obras contemporâneas, das quais todas (inclusive o
neo-expressionismo) haviam sido classificadas como “transvanguada”. Este termo
foi criado por um critico de arte italiano, Achille Bonito Oliva em 1979, para tratar
da produção de um pequeno grupo de artistas italianos, mas posteriormente
houve uma apropriação internacional e consecutiva generalização do termo
(DEMPSEY, 2003, p. 282-3). Outro seguimento tradicional da mostra era o de
referencia histórica, que inserida no discurso da curadoria, visava apresentar, a
principio, apenas arte expressionista. No entanto, o que poderia ser entendido
como um recurso de contextualização histórica foi utilizado para confrontar as
pinturas realizadas nesses diferentes períodos, se considerarmos a opinião da
própria curadora sobre originalidade:
“Depois de um período otimista que prezava a verdade, a
autenticidade da linguagem, do corpo e da natureza (arte
conceitual, do corpo, da terra), assim como a espontaneidade dos
materiais e atitudes (arte povera, performance), o nosso
momento experimenta uma preocupação renovada com o
relativismo, simulação, permissividade, e isto está evidente
principalmente entre os alunos das nossas faculdades de artes.
Trata-se de um retorno ao grotesco de todas as repressões
sociais, morais e estéticas. Em qualquer parte do mundo usa-se,
para isso, um excesso de referenciais do passado. O que faz
lembrar perfeitamente as palavras de Marx acerca da repetição
histórica: ‘Todos os grandes acontecimentos e figuras repetem-se
duas vezes... a primeira como trajetória e a segunda como farsa’.
[...] ‘Apropriação’, ‘escavação de imagens’, ‘era do simulacro’. Por
alguns anos, essas palavras encheram o ar enquanto tentávamos
explicar a nós mesmos o que estava acontecendo na arte atual
que chega ao fim. O termo que não ouvimos muito, contudo, foi
‘original’, tanto que já começávamos a perguntar o que ele
significa. É hora de perguntarmos novamente o significado desta
palavra e pensarmos seriamente nos valores individuais que
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 222
permanecerão, a despeito das modas e estilos, apenas pelo
alcance e originalidade do seu trabalho” (Ibidem, Expressionismo
e neo-expressionismo, 1986. In: Ibidem, 1991, p.157-8).
Com a proposta da Grande tela de criar uma unidade entre todas as
obras e sob o pretexto de democratizar o espaço da exposição, Leirner apelou
para diferentes estratégias. A primeira foi apresentar as obras em toda mostra,
não apenas na Grande tela sem divisões geo-politicas, estabelecendo analogias
entre as obras, algo que já havia sido realizado na Bienal anterior sob a curadoria
de Walter Zanini. Outra proposta praticada, e até então inédita, foi a de
exteriorizar essa medida interferindo inclusive na ordem com que as bandeiras de
cada representação eram hasteadas ao longo do edifício da Bienal, passando a
respeitar \ ordem alfabética. Este evento que até então foi realizado de maneira
desapercebida, chegou a receber notas publicadas em diversos jornais. Essas,
em geral, preocupavam-se em
anunciar o fato de a bandeira dos
Estados Unidos da América,
ocasionalmente, encontrar-se entre as
de Cuba e Nicarágua uma vez que
ainda se vivia no período da Guerra-
Fria
25
.
25
Outro ato político que atraiu a atenção da imprensa ocorreu durante a cerimônia de
abertura da XVIII Bienal. Após um longo período de ditadura militar no qual o presidente da
República havia deixado de participar da abertura do evento, a Bienal contava novamente com a
presença de um presidente e, desta vez, um civil, José Sarney. Outro aspecto que alimentava esta
questão era o fato de se tratar de um período que antecedia as eleições para prefeito em todo o
país, transformando esse momento da Bienal num palanque político em São Paulo.
Bandeiras vistas desde o interior do Pavilhão
Ciccillo Matarazzo durante a XVIII Bienal (1985),
(
In:
COPPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 223
No decorrer da montagem, à medida que as obras chegavam, o projeto
da expografia foi gradativamente modificado. Mesmo com todos os cuidados
tomados na solicitação de obras a outros países, muitas das que foram recebidas
não correspondiam às solicitadas. O texto da curadora menciona que haviam sido
tomadas precauções diante da possibilidade de que nem todos os artistas
estrangeiros contemporâneos, cujas obras eram esperadas, seriam contemplados
para participar da exposição. Por esse motivo Sheila Leirner solicitou
antecipadamente autorização para convidar alguns artistas individualmente,
garantindo a participação de suas obras. Porém, ocorreu que alguns países
enviaram obras para o seguimento histórico que não correspondiam à arte
expressionista. Este fato, a principio, representou para a equipe de montagem um
rompimento na unidade do discurso expositivo. Na tentativa de aproveitar as
obras enviadas, os arquitetos sugeriram o estabelecimento de “contrapontos” no
discurso. Este preocupação, no entanto, poderia representar algo irrelevante para
o público, uma vez que nas edições anteriores da Bienal não se propôs uma
unidade de discurso em toda exposição. Mas os arquitetos não se rendiam diante
deste fato e procuravam ao máximo respeitar o projeto da curadoria:
“Queremos que a Bienal seja, ela própria, uma instalação. Não
um mero suporte para mostrar a arte do momento. Mas um
projeto todo amarrado, que conte um caminho, coerente, desde a
porta até o terceiro andar” (CRESCENTI, 1985 apud: GIOBBI, 9
set 1985, p.22).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 224
Concomitantemente, na medida em que as obras contemporâneas
chegavam ao pavilhão, foram, freqüentemente, remanejadas. Isto é possível de
se observar em diversas listas de cálculos (encontradas no arquivo da Bienal)
entre as quais existem dois tipos. Uma geral, com o título “Espaço da 18°Bienal”,
re-datilografada na mediada em que se obtinha uma previsão sobre o espaço total
que as obras ocupariam, com a intenção de distribuir o espaço do pavilhão entre
os diferentes seguimentos que compunham a Bienal. Outra lista intitulada “Núcleo
I GT Nave central”
também era
freqüentemente atualizada,
com diversas anotações
manuscritas. Ela
apresentava nitidamente a
intenção de calcular a
extensão em metros
lineares de pinturas neo-
expressionistas que
estariam compondo a
Grande tela. Pode-se
observar que à medida que
as obras chegavam,
confirmava-se ou não a
participação delas na
Grande tela. Assim, comparando-se as listas, observa-se que os nomes de alguns
artistas eram acrescidos, outros apagados ou, ainda, remanejados para outros
Detalhe de uma das listas de cálculo da Grande tela
(arq.
Histórico Wanda Svevo).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 225
segmentos, quando eles especificavam como suas obras deviam ser expostas ou
não atendiam os quesitos da pintura neo-expressionista. Foi este o processo no
qual se selecionou-se somou a largura de todas as pinturas contemporâneas que
poderiam ser classificadas como neo-expressionistas, independente da
nacionalidade do artista e seu currículo.
Após toda seção de cálculos, os arquitetos distribuíam o espaço do
pavilhão, demonstrando entender e respeitar as idéias da curadora (Ibidem, 1991,
p. 224). Assim, traçou-se um percurso imposto ao visitante. Zelando para que
este fosse respeitado, foram distribuídos ao público textos explicativos sobre o
evento e a concepção da curadoria, acrescido de mapa com texto sobre o trajeto
que seria percorrido. Outra precaução foi programar as escadas rolantes apenas
para descer, forçando uma visitação iniciada no térreo e concluída no último
pavimento. No texto Como visitar a Bienal (presente no panfleto distribuído na
entrada ao visitante), Leirner explicava que a medida visava também respeitar a
arquitetura do edifício cujos pavimentos são integrados por rampas, as quais
neste caso passariam a ser obrigatoriamente usadas. E acrescentava que essa
iniciativa havia sido, inclusive, elogiada pelo arquiteto do edifício, Oscar Niemeyer,
dias antes da abertura oficial da exposição. Quanto à concepção do percurso
proposto, o objetivo era fazer com que o visitante estabelecesse relações entre as
obras apresentadas, confrontando a produção expressionista (original) e a neo-
expressionista.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 226
Planta da XVIII Bienal com divisões temáticas da curadoria (feito pela autora)
Buscando situar as obras contemporâneas historicamente, organizou-se
no térreo uma exposição de referência histórica, na qual se apresentavam, de um
lado, obras de artistas convidados que contribuíram para o desenvolvimento da
arte produzida no momento e, do outro lado, à esquerda do edifício, o Grupo
COBRA, representando os expressionistas. Trabalhando com a idéia de
metalinguagem, as obras do Grupo COBRA foram dispostas sobre uma parede
com formas sinuosas. As obras dos demais artistas convidados para compor o
segmento de referência histórica foram dispostas sobre painéis de alvenaria que
formavam “leques” quando observados por cima, no mezanino do primeiro
pavimento, espaço que foi chamado de belvedere da Bienal. A disposição desses
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 227
painéis permitia também que
as obras fossem observadas
do lado externo do edifício,
cujos vidros, para esta
exposição, não foram vedados.
No primeiro pavimento
da Bienal, com o espaço
dividido pela rampa, foram
expostas, de um lado, obras
com tendência ao abstracionismo geométrico, como o construtivismo, e, do outro
lado, obras com tendência figurativa como o surrealismo e o realismo que
ocupavam uma área mais extensa por incluir o mezanino. Antes de ingressar na
rampa, o visitante passava por duas obras de Borofsky, Homem voador e Homem
falante que para os organizadores representava a entrada na “zona de turbulência
da Bienal” ou como os arquitetos
classificavam a Grande tela, “espaço
do debate e da reflexão” (COHEN; in:
COOPER, 1985).
O guia entregue na entrada
Como visitar a Bienal recomendava ao
visitante que, durante a subida da
rampa para o segundo pavimento,
observa-se que “nesse trajeto você ainda encontra artistas que dão continuidade
ao que foi visto no primeiro andar. Isso significa um período de transição para a
Grande tela que está bem a sua frente” (LEIRNER, 1985, p.4). Essas primeiras
Vista obtida desde o belvedere da Bienal, com visão parcial do
panorama histórico e vidros da fachada descobertos (In:
COPPER, 1985)
Obras de Borofsky vistas desde o segundo
pavimen
to (
In:
COOPER, 1985).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 228
obras avistadas encontravam-se dispostas ao redor da rampa e correspondiam às
pinturas neo-expressionistas de três artistas contemporâneos de nacionalidades
diferentes. Foram excluídas da Grande tela por exigirem condições expográficas
especificas. Trata-se da produção de Hella Santarossa (Alemanha Ocidental) que
apresentou 3 obras de 4 a 8 metros de largura, totalizando 16 metros de
extensão; Martin Disler (Suíça), que apresentou uma pintura-instalação de 22
metros de extensão, e Jorge Pizzani (Venezuela) que apresentou pintura-
instalação-performance de 10 metros de extensão.
Após a passagem por essas obras, o texto indicava que ao visitante que
seguisse em frente, sem desviar sua atenção para as naves laterais”, e
experienciasse o penetrável listrado de Daniel Buren, antes de ingressar na
Grande tela. Sobre
esta obra comentava:
“é uma interferência do
artista que provoca
deliberadamente uma
perturbação visual no
espaço da Bienal”
(Ibidem, p..4).
As naves
laterais” citadas
acima, sobre as quais recomendava-se que fossem visitadas apenas após a
Grande tela, eram espaços de tamanhos e formas irregulares interligados entre si
e com a paisagem do Parque do Ibirapuera; com a intenção de respeitar a
arquitetura do edifício, preservaram-se livres os vidros. Nesses espaços estavam
Projeto desenhado por Haron Cohen mostrando naves laterais com
instalações entre a Grande tela e o
s vidros descobertos da fachada
(arq. Histórico Wanda Svevo).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 229
expostas as demais obras contemporâneas como instalações, obras de arte neo-
pop, grafites e performances. Entre estas obras receberam destaque na época as
pinturas transvanguardistas de Jacques Charlier (Bélgica) e David Clarkson
(Canadá), Como Stefano Di Stasio (Itália) que integrou a Grande tela, eles faziam
releituras de pinturas clássicas sobre as quais alteravam também os pedestais ou
molduras beirando a comicidade. Destacou-se a proposta plástica até então
inusitada de Leda Catunda e a instalação realizada com 17 toneladas de borracha
onde Per Inge Bjorlo (Noruega) apresentou cinco linoleogravuras de sua autoria,
integradas ao espaço que construiu.
No texto distribuído, a curadora comentava sobre essa organização
espacial:
“Há também os espaços que circundam a Grande tela e que
foram chamados de Naves laterais, como se simbolicamente o
grande conjunto de pinturas
representasse também a nave
central de um templo, construído
para o culto litúrgico de
celebração da arte, Homem e
vida. Nessas naves irregulares
estão as instalações que
mantêm estreita relação com a
‘nova pintura’ ou com o caráter
de Grande tela. São espaços
intrincados que permitem
configurar finalmente o caráter
polêmico dessa zona de
turbulência, que é onde a Bienal se apóia, onde surgem as
questões mais importantes. Uma zona que é a principal razão da
existência da grande exposição” (Ibidem, Expressionismo e neo-
expressionismo, 1986. In: Ibidem, 1991, p.225).
Desenho de um dos corredores laterais da Grande tela
(arq.
Histórico Wanda Svevo).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 230
A Grande tela concebida por Sheila Leirner e aqui materializada com a
contribuição de Haron Cohen e Felippe Crescenti era apresentada da seguinte
forma ao público:
“É um conjunto de grande impacto que pretende espelhar a
situação atual da Nova pintura. Veja como artistas de
diferentes partes do mundo têm as mesmas preocupações. /
Na Grande tela, os trabalhos são articulados entre si, num
desenrolar ininterrupto, narrativo e ruidoso. Não se espere,
porém, um discurso coletivo fluente e linear. A Grande tela
não nega o individual; ela revela o individual por meio da
modulação provocada pelo espaço padrão de 20 centímetros
entre cada tela. Nas duas extremidades do corredor central
da Grande tela estão as esculturas de John Davies que
simbolizam o título da 18° BISP, O homem e a vida
(LEIRNER, 1985, p.4).
Na Grande tela, foram apresentadas mais de
duzentas pinturas neo-expressionistas de quarenta e cinco artistas, realizadas
sobre diferentes suportes, madeira, chapas de metal, telas tradicionais, lonas sem
batente e papel kraft (em muitos casos), sem passepartout ou qualquer tipo de
proteção. Elas foram alinhadas em paredes de três corredores com 6 metros de
largura entre as paredes, com
100 metros de extensão e 5
metros de altura. Ao todo,
somaram-se 600 metros
lineares de obras, entre as
quais a distância estabelecida
variava entre 10 e 20
centímetros, de acordo com as
Uma
artista na Grande tela pintando sua obra sobre papel
Kraft durante montagem da XVIII Bienal (
In:
COPPER, 1985)
Uma das obras de John
Davies, escolhidas para
simbolizar o Homem e a
Vida (arq. Histórico wanda
Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 231
dimensões das obras que
havia em cada parede.
Grande parte das pinturas
tinha, em média, de 2 a 3
metros quadrados. A menor
provavelmente foi a II Tetto
do italiano Enzo Cucchi,
com dimensão de 46
centímetros de altura por 18
centímetros de largura; e a maior foi uma pintura sem título da artista japonesa
Mika Yoshizawa que media 3,30 metros de altura por 8,90 metros de largura.
O único critério respeitado na organização das pinturas foi o de não
desmembrar o conjunto de obras de cada artista, apresentando-as de modo
consecutivo. A organização seqüencial entre estes conjuntos, no entanto, era
aleatória. Desrespeitaram-se as classificações geopolíticas e os diferentes graus
de reconhecimento no circuito artístico que cada artista possuía, tivesse ele uma
carreira consolidada ou emergente; isso, na tentativa de criar uma “unidade”,
como Sheila Leirner já havia mencionado em 1983. A justificativa apresentada era
de que a representação geopolítica tradicional favorecida pelo uso de salas
individuais conduz a leitura dos visitantes à interpretação, criando hierarquias. E
reforçava: “ela não deve de forma alguma ser a vitrina do que se faz no exterior,
como modelo para a produção dos países subdesenvolvidos” (ibid. id. pg. 222).
Corredor lateral da Grande tela durante montagem do (arq.
Histórico Wanda Svevo).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 232
Havia, no entanto, além das pinturas neo-expressionistas presentes na
entrada da zona de turbulência, obras de outros quatro artistas que não foram
incluídos diretamente na Grande tela. Suas obras, devido à quantidade elevada
que representavam, foram exibidas em salas anexas à Grande tela, cujos
acessos só eram possíveis através do ingresso em seus corredores. Estes quatro
artistas foram: Peter Bömmels (Alemanha Ocidental) com treze pinturas que
somavam 21 metros de extensão; Olé Sporring (Dinamarca) com cinqüenta obras,
entre elas, pinturas de óleo sobre lona, linoleogravuras e pinturas sobre papel
que, juntas, somavam 65,01 metros de extensão; Gunter Damisch (Áustria) com
vinte e três pinturas que somavam 21 metros de extensão; e Hirokazu Kosaka
(Japão) com três pinturas de 2 metros de altura e 4 metros de largura cada uma,
e um vídeo de 90 minutos. Assim, se estas outras obras presentes nas salas
anexas e na entrada da zona de turbulência tivessem sido somadas, a medida em
extensão de obras neo-expressionistas aproximar-se-ia a 800 metros lineares, o
que dependeria da
construção de um quarto
corredor.
Uma quinta
passagem aberta nos
corredores da Grande tela
dava acesso à região das
naves laterais onde se
localizava o grafite de Carlos Matuk (brasileiro). Esta obra encontrava-se entre as
naves com obras de outros dois grafiteiros brasileiros, Waldemar Zaidler e Alex
Corredor central da Grande tela durante montagem do (arq. Histórico
Wanda Svevo).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 233
Vallauri com sua instalação Rainha do frango assado, uma das obras da XVIII
Bienal mais destacadas pela mídia.
As condições expográficas definidas na Grande tela remetem à
expografia aplicada nas galerias dos palácios reais europeus até o século XIX,
que por sua vez apresentavam ainda forte influência dos gabinetes de
curiosidades. Há de se considerar que a partir da década de 60, a expografia
moderna já havia sido assimilada de tal maneira no circuito artístico que, em
geral, os artistas, ao produzirem suas obras, previam mesmo inconscientemente
que tais condições expográficas usadas para obter uma maior valorização da obra
de arte. Nas reflexões de Sheila Leirner, a expografia da Grande tela estava de
acordo com a linguagem artística das obras expostas. Para justificar a mudança
de expografia, explicava que as manifestações artísticas da década de 70,
caracterizadas pela idéia de espetáculo, “exigiam o rigor e a neutralidade da
‘caixa branca’ como espaço de galeria, museu ou bienal, para poder se
desenvolver” (LEIRNER, 1991, pág. 222). Esta auto-afirmação da obra de arte,
diante de seus objetivos, tornava-se secundaria. A pretensão da curadora no
momento não era apresentar obras de vários artistas individualmente e, sim, uma
única obra, uma exposição capaz de apresentar, além de uma unidade temática,
um único discurso.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA 234
“A Grande tela é um antimuseu, uma antigaleria; e ela não nega
os trabalhos individuais que palpitam, têm vida própria, com
diferenças gritantes, e também semelhanças, entre si. O confronto
é algo interessante, não é uma vala comum. [...] O homem é um
só e está vivendo um mesmo momento, de fim de século, de
holocausto nuclear. [...]
Está procurando se as
raízes têm o sentido de
um novo humanismo
que, de certa maneira, é
utópico, porque não
existe a possibilidade de
voltar. No fundo é uma
situação que está
evidente nas instalações
e na Grande Tela.”
(LEIRNER, 1985, in
Visão).
Equipe que trabalhou na XVIII Bienal Internacional de São Paulo (In:
LEIRNER, 2005
-
6)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
235
4) A repercussão dessa expografia
A construção deste tópico fundamentou-se em artigos e entrevistas
publicadas em jornais, revistas e vídeo que documentaram o evento na época. Há
que se considerar que, pouco antes da abertura da Bienal, um material impresso
escrito pela própria curadora foi distribuído para toda a imprensa e posteriormente
para o público que ingressava na exposição. Este material já citado anteriormente
continha informações sobre a programação, uma introdução assinada por Roberto
Muylaert e um texto sugerindo um roteiro de visitação com explicações sobre
questões conceituais da curadoria. Ou seja, quem visitava a exposição tinha
acesso a informações capazes de lhe proporcionar uma perspectiva geral sobre o
evento. Inclusive, o texto avisava com antecedência que a Grande tela era
considerada uma “zona de turbulência” que apresentava “caráter polêmico”, na
qual a Bienal se apoiava e de onde surgiam as “questões mais importantes”
(LEIRNER, 18° Bienal de São Paulo, 1985; in: LEIRNER, 1991, p. 225). Esses
textos escritos por Sheila Leirner, com exceção do roteiro, chegaram,
posteriormente, a ser republicados no livro Arte e seu tempo (1991).
A polêmica em torno da Grande tela começou antes mesmo da abertura
da mostra, envolvendo comissários, artistas participantes e jornalistas. Durante a
montagem, o crítico alemão Jurgen Harten, diretor do museu Kunsthalie de
Dusseldorf, que havia sido convidado para orientar a comissão de montagem da
Bienal, não concordou com a idéia da Grande tela. Passou dias discutindo com a
curadora Sheila Leirner sobre a disposição das telas e tipos de diálogos que
poderiam estabelecer (O Estado de São Paulo, 22 set 1985). Não conseguindo
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
236
convencer Leirner a
expor as obras de acordo com a expografia moderna tradicional, retirou-se da
comissão no dia 21 de setembro, duas semanas antes da abertura da Bienal,
ameaçando levar consigo todos os artistas descontes com a montagem
(GUIMARÃES, C., 28 dez 1985). Segundo Amarante (4 out. 1985), ao abandonar
a equipe, Harten alertou os artistas, funcionários do consulado e o comissário da
Alemanha sobre o tratamento que as obras estavam recebendo. Isto se justificava
a partir do momento que na Bienal de Kassel cada artista alemão havia recebido
um amplo e individual espaço para expor suas obras, ao contrário do que ocorria
na Grande tela.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
237
Outros
países também se desentenderam com o projeto da curadoria. O comissário
argentino Jorge Glusberg, por exemplo, havia planejado previamente uma
exposição individual chamada Da nova figuração à nova imagem, na qual os
artistas de seu país reuniam-se em uma única sala. Amarante (1989, p.237) conta
que ele também não consegui impor seu projeto sobre o de Sheila Leirner que
organizava as obras por analogia de linguagem. Assim a exposição foi
desmembrada e oito dos artistas argentinos passaram a integrar a Grande tela.
Fragmentos da Grande tela
mostrando
obras de diferentes artistas que haviam
sido enfileiradas:
1.Gunter Damisch, Áustria
2. Hubert Scheibl, Austria
3.Helmut Middendorf, Alemanha Oriental
4.Rodrigo de Andrade, Brasil
5. Daniel Senise, Brasil
(In: COOPER, 1985)
1
2
3
4
5
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
238
No caso
dos Estados Unidos da América, a reação foi diferenciada. Previamente, sob o
argumento de que não concordava com a organização por analogia de linguagens
e exigindo a representação por nacionalidade, da mesma forma que havia exigido
na edição anterior, não enviou obras de 42 artistas sugeridos pela curadoria
brasileira; ofereceu a exposição Entre a ciência e a ficção que acabou integrando
o evento. Entre os cinco artistas norte-americanos, três aqui desembarcaram sem
obras prontas (tiveram que improvisar instalações com materiais conseguidos no
Brasil), enquanto outros dois configuravam entre os convidados especiais
(RIDING, 14 nov 1985). Porém nenhum deles integrou a Grande tela.
Tanto a Folha de S. Paulo quanto o Estado de São Paulo registraram,
pouco antes da abertura, a ação de alguns artistas (principalmente alemães) que
tardiamente protestaram sobre a colocação de suas obras na Grande tela,
ameaçando retirá-las da mostra caso, não lhes fosse concedido um espaço
individual. Contam que houve briga,
gritaria e Sheila Leirner estipulou
Vocês pintam e nós organizamos a
Bienal” (Folha da Tarde, 5 out 85).
Depois esclareceu para a imprensa
Eles não querem confronto [...] Eles
não querem um espaço não
acadêmico como o da Grande tela, preferem uma disposição tradicional” (Folha
da Tarde, 5 out 85). Nesta situação, os artistas preferiram deixar seus trabalhos a
retirar-se do evento, pois participar desse evento era um fator de extrema
importância. Alguns passaram a fazer avaliações positivas:
Grande tela (arq. Histórico Wanda Svevo)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
239
No geral acho que a exposição está boa,
claro que há sempre falhas. Para mim foi
extremamente positivo estar aqui, uma
vez que na Alemanha praticamente não
se tem notícia do que é feito nos termos
da arte no Brasil”. (SALOMÉ; apud:
AMARANTE, 13 out 85).
Apenas um dos artistas
alemães, Bernd Koberling, chegou a
retirar duas entre suas nove obras,
uma de cada extremo, na tentativa de
distanciar seu trabalho dos de outros
artistas (RIDING, 14 nov 1985). No
lugar da tela, os organizadores da
Bienal colocaram uma plaqueta com
os seguintes dizeres: “obra retirada
pelo artista”. No documentário Arte e vida dirigido por Adrian Cooper, Haron
Cohen declarou que a insatisfação desse artista provavelmente não estivesse
atribuída especificamente ao espaço, mas ao fato de que suas obras se
encontravam entre as obras de um novato e de um de seus concorrentes do
mercado artístico. Ainda segundo Cohen, o caso deste artista foi a necessidade
de afastar sua obra para evitar comparações diretas capazes de desvalorizar seu
trabalho. Os outros que não retiraram suas obras chegaram a fazer várias
declarações à imprensa sobre o assunto:
“As pessoas que foram encarregadas de pendurar os quadros têm
uma idéia engraçada sobre pintura. Elas acham que quadros de
7,5 metros de altura (sic), como é o caso de algumas das minhas
telas, podem ser vistos a três metros de distância. Isso, para mim,
A imagem no alto mostra espaço vazio na Grande
tela resultante da retirada de uma d
as pinturas de
Koberling. Abaixo, um aviso afixado no local vago
informando “Obra retirada pelo próprio artista” (
In:
COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
240
é
o mesmo que colocá-los no escuro. Tenho muita vontade de
participar da Bienal, mas acho que mostrar estas telas dessa
maneira é o mesmo que não mostrá-las” (DOKOUPIL in JORNAL
DA TARDE, 04 out. 1985, pág. 19).
Esta declaração é razoável se considerarmos um ângulo de visão de 60°,
medida padrão utilizada para calcular uma distância entre a obra e o observador,
propiciando a observação desta por inteiro. De acordo com o catálogo da
exposição, a maior obra de Dokoupil não possuía 7,5 metros de altura, mas de
largura, caso contrario ela não deveria ser exposta numa parede de 5 metros de
altura. Com base nas listas de cálculo da organização da Grande tela, esse artista
estaria participando com nove telas que somariam 33 metros de extensão.
Calculando que a média de largura de suas telas fossem de 3,66 metros, seriam
necessários no mínimo 7,83 metros para observar cada trabalho, sua obra de 7,5
metros exigiria o dobro da distancia. Obviamente isto na Grande tela era inviável,
uma vez que a distância entre as paredes era de 6 metros e o observador estava
impedido de se apoiar na outra parede pois ela também continha pinturas. Nos
corredores laterais, a situação era ainda mais grave, apesar de grande parte das
obras apresentarem menor porte; no meio dos corredores encontravam-se
colunas de sustentação do edifício. Pelas imagens registradas também é possível
observar que quando as pinturas feitas sobre lona e outras sobre papel
apresentavam altura maior que a das paredes construídas, estendiam-se pelo
chão. Isto ocorreu também com as pinturas de Hella Santarossa expostas na
“entrada da zona de turbulência”.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
241
Com a
repercussão do assunto, outros artistas participantes passaram a se manifestar
contra a idéia da Grande tela. No dia 16 de outubro de 1985, o colunista Ruy
Castro chegou a publicar na
Folha de São Paulo a
seguinte nota:
“A marchande Sheila Leirner,
organizadora da Bienal, está
sendo chamada por alguns
artistas nacionais de ‘coveira do
expressionismo’. Apesar disso,
a Bienal é um sucesso, com um
recorde de visitantes”
(CASTRO, 16 out 1985).
Entre os artistas atingidos pela polêmica encontravam-se o grupo Casa 7
formado por cinco artistas brasileiros com idade entre 23 e 25 anos.. Apesar de
configurarem como iniciantes, destacavam-se em exposições realizadas a partir
de 1983, no circuito artístico Rio de Janeiro/ São Paulo; alguns já ostentavam
prêmios na área. Nas filmagens do documentário Arte e vida é possível ver
imagens destes artistas felizes, participando da montagem da Grande tela. Mas
as polêmicas geradas em torno dessa exposição refletiram diretamente em sua
produção. Após a XVIII Bienal, todos mudaram o estilo de seu trabalho, quando
não abandonaram a pintura. Um dos integrantes desse grupo, o artista Nuno
Ramos, que na época era estudante de filosofia, apesar de ter recebido prêmio
pelas obras, antes mesmo da realização da XVIII Bienal, atualmente não
reconhece essa etapa do seu trabalho excluída de seus catálogos. Segundo Nuno
Integrantes do grupo Casa 7 participando da montagem da
Grande tela
(
In:
COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
242
Ramos essa foi a
primeira vez em que um curador impôs claramente sua autoria e escreveu no
catálogo: Bienal 50 anos:
“O curador, hoje, é o grande autor; a autoria migrou do artista para
o curador. O primeiro rebaixamento estilístico ocorreu na Bienal
da Grande tela, em 1985. Foi uma instância muito impositiva e
hoje penso que não briguei contra ela como devia” (RAMOS,
2001; in: FARIAS, 2001, p.344).
Durante a realização do evento,
houve registro de opiniões também por
parte do público sobre a Grande tela.
Nesta edição da Bienal que atingiu um
recorde de público, chegando a 220 mil
pessoas, constatou-se que 100 mil
nunca haviam ido à Bienal (O Estado de
São Paulo, 17 dez 1985). Apesar do trabalho educativo que assessorou esses
visitantes, tanto com a visita monitorada quanto através do guia impresso, muitos
deles sequer reconheciam as pinturas contemporâneas como arte. Outros
protestavam por não poder observar bem as obras presentes na Grande tela. De
acordo com a cobertura do evento feita pela imprensa em geral, o público era
levado à exaustão durante o percurso devido à grande monotonia que as obras
apresentavam dentro da Grande tela.
“Os visitantes saiam com um sentimento de incompreensão
absoluta, não por não entenderem, mas porque o que viram não
tinha sentido. (...) Tudo girou em torno dela [Grande Tela] apesar
de os artistas reunidos nos três corredores serem muito ruins”
(KINTOWITZ, 22 out. 1985).
Visitante observando obras na Grande tela (In:
COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
243
Houve
quem expressasse uma visão romântica da arte, ignorando a influência
mercadológica sobre ela no decorrer de sua história. Praticamente todas as
rupturas de estilos, possíveis de se observar, acompanharam transformações
sociais, intercâmbios culturais, como também descoberta de novos materiais,
desenvolvimento de técnicas, instrumentos e conceitos. Todo artista carrega
consigo um vasto repertório que em maior ou menor grau interfere na sua
produção artística. O sentido de aura também está relacionado à forma com que
as obras são apresentadas. A expografia moderna, no momento em que procura
“neutralizar” o ambiente, numa tentativa de isolar a obra do mundo exterior ao do
seu espaço expositivo, favorece esta interpretação. A Grande tela rompe com a
expografia moderna, inserindo as obras dentro de um novo contexto. Um discurso
que aborda questões sobre a globalização e o espetáculo e não um discurso que
procura mitificar a obra exposta. A citação escolhida para ilustrar tal abordagem
que mitifica a arte passada faz parte de um artigo escrito pela artista plástica
Anésia Pacheco e Chaves:
“Existe a posição crítica que visa limpar de uma vez o terreno de
todo o entulho de modismos e preconceitos que atrapalham a
criação de novos sentidos. [...] A 18º Bienal marca a ruptura. É a
despedida das bienais e salões tradicionais e também da “Arte
Oh!” com seu charme antigo, e dos artistas da ‘aura’, queridos
fantasmas dos quais, cada vez menos, conseguimos acreditar
nesse tempo do comércio de arte. Quem vale mais? E o que
significa valer se não o entendermos comercialmente? Os outros
critérios estão cada vez mais longe. É cada vez mais difícil
separar a mão que cria daquela que paga. O preço paga um valor
que é estabelecido socialmente e que plasma numa coisa só o
criar e o custar. A produção cultural que não consegue espaço
para aparecer é uma produção cultural inexistente, já que não
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
244
existe no mercado que é o que, hoje, faz
as coisas de fato existirem” (CHAVES, 15
dez 85).
Pietro Maria Bardi que foi
diretor e co-fundador do MASP,
apresentou um posicionamento mais
radical que o da artista citada acima.
Afirmou, em entrevistas e artigos
escritos por ele, que o que viu de arte contemporânea na XVIII Bienal não poderia
ser considerado arte. Questionou, por exemplo, a presença de “pichações”
apresentadas como arte dentro da Bienal. De acordo com seu raciocínio se na rua
todos protestavam, considerando-a algo marginal, como ali poderiam valorizá-la?
Em uma das entrevistas cedidas, Bardi criticou a Grande tela:
“Não se deve fazer uma exposição de quilómetros e quilómetros
de percurso, ainda mais mostrando uma enorme e confusa
massa de coisas. [...] É preciso dar ao espectador tempo e
condições para que veja e julgue a obra” (BARDI; apud: LUCCÁ,
12 jan 1986).
Em decorrência do que viu na exposição, Bardi atribuiu valor artístico
apenas às obras apresentadas no núcleo histórico:
“passando os olhos por esse aglomerado de mercadorias
bienalescas, naturalmente tiramos o chapéu, por deferência, a
certos talentos das vanguardas históricas, provocadores de
inovações, generosos proponentes de acertos e modos de
expressão(BARDI, 1985, Status nº 136).
Em sua opinião, a falta de obras de boa qualidade na exposição é
conseqüência da breve periodicidade do evento. Bardi comentou ter advertido
Ciccilio Matarazzo, antes mesmo da fundação da Bienal que a idéia de se
Grande tela (In: COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
245
realizar uma bienal
já estava ultrapassada, que as artes não mudam de dois em dois anos e os
próprios italianos já estavam organizando trienais e quadrienais. Outros críticos
também dividiam a mesma opinião como o norte-americano Donald Kuspit ao ser
entrevistado sobre a função da arte e o papel da crítica:
“Acho que mais importante do que se organizar exibições de arte
a cada dois anos seria a criação de um comitê internacional de
arte (...) atento ao que se passa no cenário da arte mundial. E
quando este comitê achasse que era o momento de se fazer uma
exposição, porque certos movimentos no mundo da arte estavam
maduros ou representavam algo novo, então elas deveriam ser
feitas”. (KUSPIT; apud: SICHEL, 7 dez 1985).
Quanto à discussão sobre a valorização da arte, foi ela alimentada pelo
fato de nem todos reconhecerem as qualidades artísticas do neo-expressionismo
em alta no mercado da época:
“A Grande tela conseguiu desmistificar a
tendência neo-expressionista e demonstrar
cruamente que ela é produto de marketing
cultural e mercadológico, que posiciona em
segundo plano as qualidades artísticas das
obras” (ARAUJO, 12 jan 1986).
Entre os que dividiam esta
opinião, havia os que propunham o
rompimento de um suposto preconceito existente por parte dos pintores neo-
expressionistas, em relação às novas tecnologias:
“Como muitas galerias de arte hoje, ela [a Grande tela] até inspira
um certo horror, tantos são os estímulos e as sensações que se
sente durante o passeio. [...] Enquanto isso, os neo-
Visitante tateando pintura na Grande tela. Ao
fundo, parte da instalação de Daniel Buren (In:
COOPER, 1985).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
246
e
xpressionistas, nas paredes da Bienal, aos gritos tentam
demonstrar a falta de sentido do mundo moderno e a certeza de
que a tecnologia jamais trará a
felicidade ao homem. [...] O
corredor não é o enterro do
mundo, mas é certamente do
neo-expressionismo. Resta
somente os pintores agora
perderem o medo da tecnologia
ou voltarem mais tranqüilamente
aos pincéis. As paisagens
serenas e bucólicas do século
passado andam dando
excelente preços nos leilões”
(LAMARE, 11 dez 85).
Luiz Ventura em seu artigo Neo-expressionismo, a única arte possível? e
apoiado em depoimento do artista Franz Krajcberg, questionou uma persistente
carência de uma identidade artística latino-americana não contemplada no
evento. De acordo com sua constatação, a Grande tela, assim como ocorreu em
toda trajetória da Bienal, apesar de constantes protestos, transmite a idéia de que
todos os artistas regionais são diretamente influenciados pelo mercado artístico
europeu e norte- americano:
“Não há dúvida de que ele [Fraz Krajcberg] tem razão quando diz
que o nosso continente ‘está cada vez mais se entregando aos
ditames do mercado artístico ocidental’, e que esta Bienal dá a
impressão de que a arte no ‘Brasil é de meros copiadores de arte
neo-expressionista alemã e americana’. [...] desde a 1º Bienal, o
que se testemunha é a ênfase no esforço de prestigiar - e impor -
a arte da moda no momento. [...] pouco ou quase nada se tem
feito para congregar, divulgar e promover as diferentes
expressões artísticas do Brasil e da América Latina como um
Grande tela (In: COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
247
c
onjunto diferenciado - mas igualmente valioso - da arte que se
produz no mundo de hoje” (VENTURA; Luiz, Jornal da Tarde, 22
out 85).
Sem frisar que o neo-expressionismo fosse cópia ou retorno à pintura,
Ricardo Nascimento Fabrini apresenta uma opinião positiva sobre a Grande tela.
Em seu entendimento, ela evidenciou a persistência da pintura considerada pelas
edições anteriores da Bienal, como superada:
“A Grande tela atestava que, depois que a tela como suporte
bidimensional foi empacotada (Christo), empastada (Karel
Appel), oxidada, queimada (Yves Klein), rasgada à faca
(Lucio Fontana), perfurada à bala (Niki de Saint-phale),
continuava ostentando sua materialidade, ou seja,
relativamente ao observador. A tela, tantas vezes dita
superada pelas vanguardas artísticas como se verificara
em Bienais anteriores, em particular na XIV edição, de 1977,
que expusera quase que tão somente instalações ,
apresenta-se, agora, na Grande tela, cicatrizada, ‘re-
esticada: à sua estripação, pôde-se, então, constatar, não se
seguiu a esterilidade, mas a parição de múltiplos modos de
figuração” (FABRINI, 2002, p.51).
Roberto Pontual, crítico de arte julgou que estratégias de marketing
equivocadas influenciaram a curadoria, resultando numa exposição onde o critério
do quantitativo predominou. De acordo com seu raciocínio, este aspecto presente
inclusive na Grande tela, prejudicou a possibilidade de reflexão, por parte do
público, sobre as obras apresentadas. Sua opinião em certo aspecto reforça a
idéia de Sheila Leirner de que o que estava sendo apresentado não eram
necessariamente as obras, mas sua opinião. Porém a reflexão da curadora foi
automaticamente descartada ou ignorada pelo crítico, que pretendia que esta
fosse exercitada e não simplesmente assimilada pelo público:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
248
O defeito é o provincianismo de acreditar na quantidade, como se
isto trouxesse público. Também a recuperação do
expressionismo como foi feito [através da Grande tela] não
mostrou outras individualidades que poderiam dar a esta Bienal
um excelente confronto. A de Paris também foi dirigida, este ano,
para a prevalência da figura, mas tinha trabalhos abstratos e não
era esta monotonia que se encontra na Bienal de São Paulo. O
que faltou a essa Bienal foi uma atitude reflexiva em relação ao
expressionismo” (PONTUAL, apud: Folha de São Paulo, 14 dez
85).
O artista Julio Plaza protesta pelo excesso de “pinturas-quadro” expostas
(excluindo claramente o grafite ou a pintura instalação) e vê o que foi exposto
como uma banalização da arte contemporânea, o resultado de uma visão
simplificada que reduz a complexidade da arte contemporânea, revelando as
muitas “frestas” no mercado de quadros e a suposta “festa” apresentada pela
Bienal.
“A pretexto de nos fornecer uma leitura crítica, nos dá uma leitura
indiferenciada que endossa a “arte” regida pelo sistema de
pintura-quadro. É que aquilo que é chamado de “arte”, não é mais
do que a redução da pluralidade das práticas artísticas
contemporâneas a um só sistema, o da pintura-quadro
(artesanal). É assim que o sistema da arte pode ser ritualizado,
domesticado e assimilado na apropriação do desejo pela ordem
social e institucional e o ego do curador traduzido em cenógrafo
(PLAZA, 14 de dez 85).
A partir da reflexão de Baravelli, artista plástico que possuía uma coluna
na Folha de S. Paulo, este retorno à pintura que negava as artes
contemporâneas como instalações e performances predominantes nas Bienais
não se distanciava muito delas, se considerada a efemeridade de seus suportes:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
249
os artistas andam fazendo obras inviáveis (muito grandes, com
materiais super frágeis, salas que depois são desmontadas e
somem) porque, inconscientemente não acreditam mais naquilo e
se ‘suicidam’ enquanto artistas” (BARAVELLI, 18 out 1985).
Ainda, segundo seu raciocínio, esta arte seria resultante do caráter de
espetáculo implícito na Bienal. Em sua opinião, a Grande tela, assim como a
criação de um tema para a mostra A Bienal é uma festa” e todo projeto
expositivo praticado também na XVI e XVII edições da Bienal resultavam de um
“exercício de publicidade moderninha” banalizando a arte, deixando-a em
segundo plano. Há que tentar inverter uma situação em que a Bienal deixaria de
chamar atenção para si e passaria a servir como suporte para que outros se
destacassem. Na disputa por publicidade, teria perdido espaço para as nações
que, num clima competitivo, procuram destacar-se trazendo cada vez mais
artistas para preencher salas especiais, investindo em recursos como expografia
e catálogos coloridos. As nações, por sua vez, estariam também perdendo
espaço para os artistas que teriam descoberto que para expor em local grande,
com tantos leigos e clima de Playcenter, não serviam gravuras intimistas.
Começaram a preparar obras especialmente arranjadas para esse tipo de show e
a fazer salas inteiras - quanto mais bombásticas melhor”. E conclui questionando,
independentemente da qualidade dos trabalhos em questão por analogia, o
espetáculo da missa católica, ao qual, em nome de um “deus” ou de um ideal, os
artistas de multimeios cedem suas obras, como coadjuvantes:
”Por que um artista deveria concordar em ter seu trabalho
exposto na Grande tela, modificando completamente sua
intenção original? Em nome de que ‘deus’ deveria fazer tal
suicídio? Em nome do “Grande curador’? Será o ‘Grande
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
250
c
urador’ uma barreira de curadpores de vários países,
separados por dez centímetros uns dos outros? ” (Ibidem).
Cacilda Teixeira da Costa, após observar o descumprimento de normas
museológicas que visam proporcionar o maior destaque possível às obras
expostas em diferentes setores, fez uma ressalva que considerou positiva, a
imposição do discurso da curadora expressa de uma forma original:
“Quanto à Grande Tela, também um artifício da montagem para
expressar um pensamento da curadoria me parece arriscado mas
correto, no sentido de que a curadoria tem autoridade para propor
uma referencia ao tempo presente, ainda que esta nos remeta ao
sufocamento da violência e dissolução, materializados naquele
corredor de angustia. / Em suma, se Sheila apenas continuasse
em um caminho iniciado por ela e que vinha dando certo, seria
decepcionante. Ir adiante, com ousadia, é que é raro” (COSTA;
15 out 1985).
Corredor central da
Grande tela
(
In
: COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
251
Luccá,
questionou a falta de “silêncio” entre as obras presentes na Grande tela,
defendendo o uso da expografia moderna tradicional para proporcionar a
possibilidade de compreensão das obras ao público:
“A Bienal, neste particular, é um exemplo claro e gritante dessa
nossa mentalidade ‘comunicacional’ moderna que está
produzindo resultados do avesso. No afã de comunicar
atrapalhamos cada vez mais a comunicação. / E um dos
elementos que está sendo mais atropelado pela nova mania de
comunicação desvairada é o silêncio. Em termos gráficos, o
silêncio encontra sua expressão no branco, no espaço, no
espacejamento. Deste ponto de vista, gráfico - do ‘branco’
necessário entre dois elementos visuais a exposição do 2º
andar, a Grande tela, falhou tremendamente. Tem razão [Pietro
Maria] Bardi, pois sem um suficiente espaço isolante,
sem arejamento entre cada tela, não há condição
psicológica alguma para o espectador ‘ver e julgar a
obra’. Quem esteve lá, constatou: as paredes dos 3
corredores da mostra - que se quis a principal da
Bienal - estavam, em bom português, atulhadas de
quadros. Uma verdadeira gritaria silenciosa” (LUCCÁ,
12 jan 1986).
A partir do discurso do crítico Henrique
Rolim, pode-se estabelecer como a expografia da
Grande tela, pensada para contrapor a expografia
moderna, teve sua função invertida. Dois
conjuntos de esculturas de John Daves foram
expostos em cada extremidade da Grande tela e
eleitos, pela equipe de montagem, como símbolo
representante do tema da Bienal O homem e a
E
sculturas de John Daves nos
extremos da Grande tela (
In:
COOPER, 1985)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
252
vida. O fato é que,
apesar de todas as telas serem bastante chamativas pelos fortes traços e cores, a
proximidade de umas com as outras numa área tão extensa, criou uma
homogeneização. A partir do momento em que estas esculturas por si carregam
outra linguagem, ao serem dispostas neste local, criam um grande contraste.
Desta forma, o que a princípio deveria negar, a expografia passou a funcionar
como tal.
“A Grande Tela é no fundo a própria negação da pintura. (...) não
conseguindo espelhar a atual fase da Nova Pintura pelo simples
motivo de não envolver o espectador, descaracterizando a
linguagem pictórica,. a Grande Tela podia ser polêmica, mas isso
não consegue ser, por não haver confronto, somente um
desestimulante discurso plástico confuso e ineficaz para difundir a
arte. Nega o individual, elimina até o coletivo realçando as
esculturas de John Davies, nas duas extremidades do corredor
central. As atenções foram todas dadas a este espaço, nem
revolucionário nem inovador, criando somente barreiras para que
a pintura seja lida sem a interferência apelativa de um grande
show” (ROLIM, J. Henrique. Tribuna 15 out 85).
APÊNDICE
IMAGEM DO BARROCO,
MOSTRA DO REDESCOBRIMENTO (2000)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
254
Essa parte da pesquisa que trata do módulo Arte barroca da Mostra do
redescobrimento foi reduzida a um apêndice devido à inacessibilidade ao projeto,
plantas detalhadas ou outro material primário de maior precisão (decorrente de
fatores como a desestruturação da Brasil Connects). Assim, este estudo, numa
tentativa de reconstituir o espaço e estruturar as idéias que deram base à sua
concepção, fundamentou-se em fontes secundárias, compostas, além dos textos
dos catálogos, por artigos e entrevistas, dos quais podem-se coletar algumas
informações. Estes dados foram constantemente confrontados com uma planta
baixa da cenografia encontrada na Internet e fotografias da Mostra. Optou-se,
assim, reduzi-la à condição de apêndice. Não obstante, discutiremos suas
propostas, na medida do possível, ao lado das propostas expográficas contidas
nos capítulos 1 a 4.
O objeto de abordagem desta parte da pesquisa será a cenografia cênica
como recurso expográfico. A cenografia cênica foi usada no decorrer do século
XX para criar ambientações, principalmente em museus de história e exposições
de temática infantil. Nessas exposições, a ambientação criada exerce uma função
didática e contribui na maioria das vezes para atrair o público, especialmente o
público leigo no assunto exposto.
No decorrer da década de 1990, alguns recursos cenográficos passaram
a ser utilizados também em exposições de arte, na tentativa de romper com a
monotonia criada pelo uso intenso de paredes brancas e iluminação homogênea,
típicas da expografia moderna tradicional. Em 2000, os organizadores da Mostra
do Redescobrimento, uma mega-exposição que visava apresentar um resumo de
toda história da arte brasileira, optaram pelo uso da expografia cênica.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
255
A expografia cênica realizada para tal módulo repercutiu dentro e fora do
circuito artístico e museológico, tornando-se símbolo de uma era em que a
exposição se afirmava como espetáculo. A ambientação, que emocionava o
público por sua beleza e exuberância, despertou polêmica principalmente entre
galeristas e críticos de arte que protestavam contra o estilo da expografia cênica,
pois trata-se de uma proposta não convencional em exposições de arte. Eles
argumentaram que a vasta quantidade de informações visuais não destacava as
imagens, além de reclamar do caráter impositivo do discurso curatorial gerado
pela própria opção pela cenografia. A montagem, porém, apresentou outras falhas
mais, desconsiderando questões básicas de conservação, segurança e
circulação. Passemos a discutir esses aspectos.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
256
1) Precedentes
Com o predomínio do uso da expografia moderna nas exposições de arte
na década de 1990, diversos museus, fundações e instituições culturais de São
Paulo procuraram aos poucos romper com a monotonia do branco de seus
espaços. Assim, com o passar do tempo, a expografia moderna adquiriu o caráter
de tradicional. As exposições da Grande tela e a Pinacoteca do MASP, com seus
cavaletes-de-vidro (referentes ao capítulo 4 e 3, respectivamente) estão entre
poucas exceções à expografia moderna e por isso foram tão polêmicas.
Há registros sobre a utilização de novas cores sobre as paredes de
museus a partir da década de 1990, em São Paulo. Quando Lina Bo Bardi, ao
construir em 1969 o Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), pintou a
parede que servia de fundo para a exposição de azul turquesa, causou
insatisfação entre os artistas que apresentavam suas obras.
Segundo Felinto, a Pinacoteca do Estado de São Paulo foi o primeiro
museu de arte de São Paulo a pintar os painéis e paredes da exposição com
“cores mais fortes”. “A Pinacoteca [do Estado de São Paulo] faz uma museografia
bastante arrojada nesse sentido, mesmo sendo em um edifício muito clássico”
(FELINTO in Almeida e Arnaut, 1997, p.254).
Durante o período que Lisbeth Rebollo Gonçalves dirigiu o Museu de Arte
Contemporânea da Universidade São Paulo, iniciaram-se suas primeiras
experimentações, passando a substituir o branco e cores de tom pastel por cores
escuras ou saturadas. A primeira experimentação ocorreu na exposição
Modernismo: Paris anos 20, em 1995, realizada na sede da Cidade Universitária
(GONÇALVES, 2001, p.140).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
257
No Congresso Latino Americano de Museografia realizado em 1995, Vera
Felinto (MAC-USP) argumentou que os museus de arte de São Paulo carecem de
verbas, dificultando investimentos na área da museografia. No caso do MAC-
USP, esse aspecto dificultava a confecção de painéis expositivos. Felinto também
chama a atenção para a outra sede do museu (na Cidade Universitária)
inaugurada em 1992, e que não foi construído para esse fim tendo sido, portanto,
submetido a diversas adaptações. Em sua comunicação, aponta que um dos
problemas desse edifício é a variação da altura do pé direito em suas diferentes
áreas. Outro problema exposto refere-se à falta de controle dos resultados
provocados pela aplicação de cores e demais recursos utilizados para
ambientação pela falta de experiência que a equipe do MAC possuía na ocasião:
“Até um certo tempo, nós trabalhávamos com painéis em tom
pastel, branco, as obras na parede ou em painel uma
museografia muito controlada, muito definida, agora não.
Ultimamente [1995] houve até uma ambientação art deco,(...) as
paredes são pintadas de preto ou outras cores para dar os efeitos
pretendidos. Está se experimentando uma diversificação maior
nesses recursos” (FELINTO in Almeida e Arnaut, 1997, p.254-5)..
Entre os resultados obtidos pela experimentação dos novos recursos
expográficos aplicados na exposição Visualidade Contemporânea, Felinto avaliou:
“Temos um Modigliani no painel preto e ao lado um hidrante
vermelho competindo com ele. E nós não conseguimos
solucionar a questão do edifício dessa forma” (Ibidem, 1997,
p.255).
Contudo, em outras circunstâncias, o mesmo recurso (painel pintado de
preto) apresentou um resultado favorável destacando outra obra:
“Até mesmo afastada, a figura de Antonio Gonçalves Gomide, um
pintor paulista aparece bem ampliada” (Ibidem, 1997, p.255).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
258
O MAC-USP, em 1997, ainda sob direção de Lisbeth Rebollo Gonçalves,
desenvolveu uma pesquisa chamada Recepção estética no Museu de Arte
Contemporânea, cujos resultados foram adicionados à tese de livre docência da
diretora, em 2001. Tratava-se de uma pesquisa de campo, na qual,
periodicamente, o público era interrogado após a visita de duas exposições que
apresentavam propostas de expografia contrapostas. Ambas foram realizadas na
sede do MAC do terceiro andar do Pavilhão Ciccillo Matarazzo no Parque do
Ibirapuera, São Paulo; um local cujo pé direito é de 5 metros e livre de paredes,
como descrito no capítulo anterior.
Uma das exposições era Arte e paisagem: a estética de Roberto Burle
Marx, que apresentava um jardim, faixas de tecido verde penduradas do teto com
a função de delimitar a área expositiva num desenho semicircular. Os painéis
eram pintados com o mesmo tom de verde, havia música ambiente e sala de
vídeo. Essa exposição ocupou uma área total de 1.200 metros quadrados.
A outra exposição usada como contraproposta era Emiliano Di
Cavalcanti: o traço modernista, que apresentava desenhos e caricaturas de
autoria do artista, homenageando seu centenário de nascimento. A exposição
ocupava uma área de 400 metros quadrados e as obras foram apresentadas
sobre painéis brancos e demais características tradicionais da expografia
moderna.
No decorrer da pesquisa registraram-se críticas gerais, especialmente por
parte de estudantes ou profissionais da área de arquitetura e artes plásticas,
quanto à disposição de painéis, etiquetas, ordenação das obras e iluminação.
Destes, apenas uma parte mencionou algo a respeito dos novos recursos
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
259
expográficos e que, em geral, foi considerado como um aspecto positivo. Também
foram poucos os comentários a respeito da cor verde aplicada, mas o suficiente
para notar diversas interpretações a respeito.
Estudantes da escola secundária observaram que a exposição de Burle
Marx apresentava mais informações sobre o artista. Alguns manifestaram que
preferiram a outra (Di Cavalcanti), pela afinidade que possuem com a linguagem
das obras. Em outras palavras, esses adolescentes, aparentemente, não se
influenciaram pelos efeitos provocados pela aplicação de novos recursos
expográficos; a linguagem presente nas obras de cada artista foi priorizada.
Gonçalves, porém, reforça que “Num espaço aberto, como é o MAC/Ibirapuera,
onde se juntam mais de uma exposição, a cor pode atrair o visitante para o local
‘geográfico’ da mostra” (Gonçalves, 2001, p. 157). Como conclusão da pesquisa
fez os seguintes apontamentos:
“A relação do indivíduo visitante da mostra com a exposição é
sempre ativa, ‘criativa’. O visitante interpreta e dá sentido às
exposições que lhe são apresentadas. / A relação do visitante
com a mostra não se dá como mero mecanismo de estímulo e
resposta. A experiência museal oculta um diálogo silencioso entre
o sujeito e as obras de arte numa dimensão que, além de
estética, é sempre social” (Ibidem, 2001, p. 161).
Além da aplicação de cores escuras ou saturadas nas paredes
expositivas, outros recursos cenográficos também passaram a ser
experimentados. Entre eles, algumas experiências foram projetar focos de luz
apenas sobre as obras, acrescentando máscaras para delimitar a área iluminada;
projeção das sombras das esculturas sobre as paredes; projeção de imagens
para contextualizar as obras a partir da imagem de outras que não são expostas;
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
260
na ambientação de algumas exposições foram explorados também os sentidos
auditivo e olfativo, aplicados com menos freqüência.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
261
2) Bia Lessa e a concepção do projeto da expografia
Em 1997, Bia Lessa, então conhecida por seus trabalhos no teatro
Orlando e pela direção do filme Credi-Mi, participa pela primeira vez montando
uma exposição. Essa ocorreu no MAB da FAAP, sobre as criações do estilista
Christian Lacroix. Em 1999 Bia Lessa fez a curadoria da exposição Brasileiros
que nem eu? Que nem quem?, no Salão
Cultural da FAAP. A exposição foi uma
homenagem aos 500 anos do Brasil e o
título foi inspirado no poema de Mário de
Andrade chamado Descobrimento. Em
entrevista à Folha de São Paulo
declarou:
“Não dá para você ver o Brasil só do ponto
de vista histórico. Tem o ponto de vista artístico, o ponto de
vista cultural, o ponto de vista do cotidiano, dos costumes...
É um emaranhado de coisas. Eu acho que é empobrecedor
definir por um ângulo só” (LESSA, 1999 in ANGIOLILLO,
p. 1,).
A expografia apresentada consistiu numa seqüência de treze ambientes
temáticos, como instalações interligadas entre si. A solução arquitetônica e a
dimensão desses espaços remetiam ao de uma residência na qual apenas se
acessa um ambiente através de outro. Nessa construção não existiam corredores
ou mais de uma opção de percurso a ser seguido. Parte dos ambientes temáticos
permitia a interação do público e muitos apresentavam obras de outros artistas e
objetos históricos integrados ao espaço.
Bia Lessa interagindo com painel fotográfico na
exposição
Brasileiro que nem eu? Que nem
quem?
da qual foi curadora (Lílian Martins/ Folha
Imagem).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
262
Em 2000, os organizadores da Bienal realizaram a mega-exposição que
ficou conhecida como Mostra do Redescobrimento, na qual se apresentou um
módulo para cada tipo de arte, abrangendo toda a história da arte Brasil desde o
período neolítico até à contemporaneidade. Cada módulo foi organizado por um
curador e uma equipe diferente, as quais contaram com a participação de
cenógrafos em cada um. Grande parte da mostra apresentava o uso de alguma
cenografia dramatizada. O Módulo da Arte Barroca foi um dos ambientes que
mais despertaram interesse no público, que não raro emocionava-se. Seguindo
uma proposta parecida com o da exposição anterior, as obras estavam inseridas
na cenografia e em diversos momentos o público interagia com elas.
Após abertura da exposição do Redescobrimento, Bia Lessa foi
convidada para fazer a curadoria do pavilhão brasileiro
na edição 2000 da Exposição Universal de Hannover,
Alemanha. O evento é realizado a cada oito anos e tem
duração de cinco meses. O tema da edição de 2000 foi
Homem; meio ambiente e tecnologia. Segundo Clóvis
Rossi (31 maio 2000), o Brasil abordou muito mais o lado
do ser humano. O pavilhão brasileiro ocupou 3.200
metros quadrados comportando dezessete segmentos
criados por Bia Lessa, nos quais o público podia interagir
demandando constante manutenção das obras. De
acordo com os apontamentos de Rossi, a parede de uma das salas era toda
enfeitada com bonecas de pano. Outra sala tinha o chão repleto de almofadas
que serviam de acento para o público, e em cada almofada liam-se versos de
Bia Lessa com sua obra no
pavilhão brasileiro de
Hannover. (Lalo de
Almeida
/ Folha Imagem)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
263
autores brasileiros bordados em sua superfície. Os apontamentos de Rossi
continuam:
“A ‘praça principal’, por exemplo, é uma arquibancada com 42
vídeos que misturam painéis de fotos de cidades brasileiras, de
autoria de Cristiano Mascaro, com entrevistas com intelectuais
brasileiros, do filósofo José Arthur Giannotti ao médico Drauzio
Varella. / As paredes externas foram construídas com 1,5 milhão
de tarugos de madeira, que deslizam por perfurações e permitem
que o visitante imprima seu corpo, por exemplo, na parede”
(Ibidem).
Em 2002, montou a exposição Claro Explícito no Itaú Cultural em São
Paulo, cuja proposta de montagem remete à exposição Brasileiros que nem eu?
Que nem quem?, realizada no MAB em 1999. Com a temática voltada para
exclusão social, Bia Lessa organizou
novamente um percurso entre vários
ambientes temáticos dos quais muitos
eram interativos. Esses ambientes
consistem em diversas instalações e
labirintos repletos de informações sobre
o assunto. Nesse percurso
encontravam-se obras de outros artistas que eram tão integradas ao espaço, que
muitas não apresentavam qualquer identificação de forma evidente (desconheço
o motivo pelo qual isto ocorreu). O que se apresentava no local não era uma
exposição, mas instalações que transmitiam uma única mensagem da forma clara
e explícita de acordo com o próprio título.
Bia Lessa sentada no labirinto de jornais de um
dos ambientes que compõem a exposição
Claro
explicito
realizada no Itaú Cultural, 2002
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
264
3- Estudo da expografia
A expografia da Arte barroca (2000) integrou um projeto expositivo maior,
a Mostra do Redescobrimento, no qual a cenógrafa convidada Bia Lessa foi
previamente orientada por diretores, curadores e arquitetos que organizavam o
evento. Devido à inacessibilidade ao projeto, plantas detalhadas ou outro material
primário de maior precisão, essa pesquisa teve de se fundamentar em fontes
secundárias, composta por artigos, entrevistas e textos dos catálogos. Esses
dados foram constantemente confrontados com uma planta baixa da cenografia
encontrada na Internet e fotografias da Mostra.
A Mostra do Redescobrimento teve curadoria geral de Nelson Aguilar e
foi concebida para comemorar o aniversário de 500 anos do Brasil completos em
2000. O evento passou a ser planejado a partir de 1997, após Aguilar realizar a
curadoria da XXIII Bienal Internacional de São Paulo. O projeto foi originado a
partir da proposta de Mário Pedrosa em 1978, de se criar um “Museu das
Origens” que pretendia apresentar um panorama da arte brasileira (AGUILAR
apud: FIORAVANTE, 2000). A Mostra do Redescobrimento foi estruturada em
catorze módulos que abrangiam desde a arqueologia à arte contemporânea
restritas ao território brasileiro. Cada módulo era coordenado por um curador ou
um grupo de curadores que contava com uma equipe de assistentes e
pesquisadores, além de uma equipe de profissionais encarregados de resolver
questões técnicas e estéticas da montagem, cujo projeto central de cada módulo
era desenvolvido por um cenógrafo específico.
O módulo Arte barroca, como ficou conhecida, era denominado
inicialmente como Imagem Religiosa no Brasil. A curadoria ficou a cargo de
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
265
Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira, historiadora que trabalhava para o Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e como docente na
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Visando a exposição, ela desenvolveu
uma pesquisa de dois anos, fazendo o levantamento das 350 imagens religiosas
que integraram a exposição. Seu texto de 40 páginas presente no catálogo da
exposição fornece dados históricos que abrangem um período que parte do
momento em que a Igreja Católica passou a cultuar imagens, passando pelo
ingresso destas no Brasil e sua produção no país. Dentro deste período aborda o
imaginário religioso brasileiro de cada região em diferentes períodos, comentando
costumes, artistas, técnicas, estilos e iconografia. Apesar de não mencionar a
realização da exposição, todo conjunto exposto ilustra o conteúdo tratado em seu
texto. No último parágrafo, Myriam afirma que o conjunto desse imaginário
religioso está diretamente vinculado à identidade cultural brasileira, aspecto
presente na expografia cênica concebida.
“O interesse das esculturas sacras ultrapassa, entretanto, o
campo da história da arte, constituindo um testemunho eloqüente
dos variados matizes da cultura brasileira, de raízes
profundamente religiosas, e um de seus mais importantes
referenciais imagéticos. Eruditas ou populares, em barro cozido
ou madeira policromada e dourada, executada por religiosos
conventuais ou artistas leigos portugueses e autóctones, em
todas as gamas da mescla racial refletida em suas variadas
tipologias, elas foram onipresentes na cultura brasileira até
princípios do século XX, e ainda sobrevivem com as mesmas
funções nas áreas rurais e nas camadas populares dos grandes
centros urbanos. O resgate de seu conhecimento implica portanto
a restituição de uma parte significativa da memória do país. Ou
da formação da própria IMAGEM” (OLIVEIRA; in: FUNDAÇÂO
BIENAL DE SÃO PAULO, 2000, p.76).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
266
O texto de Nelson Aguilar, curador geral da Mostra do Redescobrimento,
que introduz o catálogo de cenografias realizadas no evento, apresentou algumas
questões preliminares que influenciaram na escolha pelo uso de recursos
cenográficos. O que para ele foi “sem dúvida, a decisão mais delicada”
(AGUILAR; in: FUNDAÇÂO BIENAL DE SÃO PAULO, 2000, p.26), definida
durante planejamento do evento. Aguilar relata que a definição do estilo da
expografia foi resultante da visita realizada a uma exposição que ocorreu na
França, na qual as imagens barrocas brasileiras se encontravam “num dispositivo
museológico convencional” (Ibidem, p.27). Essa exposição, chamada Brésil
baroque entre ciel et terre foi visitada também pelos diretores, curadores e
cenógrafa comprometidos com a exposição Arte barroca. Insatisfeitos com o
efeito obtido, estabeleceram uma contraproposta: recriar a maneira de fluir o
barroco”, o que foi realizado a partir de recursos cenográficos:
“Tínhamos que reencontrar a sensação de Oswald de Andrade:
’No anfiteatro das montanhas / Os profetas de Aleijadinho /
Monumentalizam a paisagem / As cúpulas brancas dos Passos /
E os cocares revirados das palmeiras / São degraus de meu país
/ Onde ninguém mais subiu / Bíblia de pedra sabão / Banhada no
ouro das minas’ ” (Ibidem, p.27).
Em seu texto, Aguilar analisou rapidamente o resultado obtido com a
cenografia de Bia Lessa, de maneira que pôde-se entender que a meta inicial foi
atingida:
“O ambiente que rodeia o público lembra o espaço devocional
conformado por ladeiras que ladeiam campos floridos de onde
emergem as imagens, com a mesma força da natureza. No
mesmo centro do conjunto, está uma nave que esposa o lápis
sinuosa de Oscar Niemeyer, livre da linearidade retangular do
edifício” (Ibidem, p.27).
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
267
Bia Lessa contou com o apoio de uma equipe para desenvolver seu
trabalho. Esta equipe era formada por designer de espaço, designer de luz,
cenotécnicos, técnico de acústica,
entre outros trinta profissionais de
diferentes especialidades. Pouco
antes da abertura da exposição, a
Folha de S. Paulo (13 abr 2000)
divulgou que cerca de cento e
cinqüenta pessoas estavam
trabalhando na montagem do módulo Arte barroca. O local da exposição foi
definido pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha, responsável pelo plano diretor da
Mostra do Redescobrimento, entre outras funções que assumiu durante a
realização do evento. Definindo a museografia geral do evento, Paulo da Rocha
participou das primeiras decisões espaciais do módulo Arte Barroca, para o qual
concebeu parte do térreo, do primeiro andar e o mezanino do Pavilhão Ciccillo
Matarazzo do Parque do Ibirapuera. A área total reservada para o módulo foi de
4700 metros quadrados de um espaço arquitetônico que apresentava rampas e
planos de alturas diferenciadas (ARCOWEB, 2000).
De acordo com a Arcoweb (2000), a cenografia do módulo Arte Barroca
teria sido delineada a partir das primeiras conversas de Bia Lessa com a curadora
Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira. Nestas conversas, Bia Lessa teria sido
informada sobre a história do barroco no Brasil e se interessado pela
peculiaridade comportamental do brasileiro religioso “que subverte a tradicional
concepção do Deus que pune e do homem que tem culpa” e se aproxima do
Construção da cenografia (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
268
sagrado com intimidade chegando a punir o santo quando necessário (LESSA; in:
ARCOWEB, 2000). E assim definiu o teor de sua cenografia:
“Contando a história dessas imagens de características tão
originais, recuperamos também a história do povo brasileiro, que
soube transformar um catolicismo assustador numa mistura
extraordinária de costumes, na qual Deus e os santos estão a
serviço dos homens, e não o contrário” (LESSA; in: FOLHA DE S.
PAULO, 13 abr 2000).
Para contar essa história, o espaço foi dividido em quatro ambientes com
o objetivo de contextualizar as imagens, respeitando as classificações
estabelecidas pela pesquisa da curadora. Para delinear uma organização também
cronológica, a cenógrafa definiu um único percurso, cujo trajeto estabelecia
curvas e retas em diferentes níveis topográficos. A construção de uma “catedral”
nesse espaço contribuiu para a “anulação” da arquitetura do edifício projetado por
Oscar Niemeyer (MONACHESI, 23 mar 2000), fator que afirmava o sentido desta
cenografia como uma ambientação e não uma decoração.
Planta do módulo Arte barroca: 1. Entrada; 2. Porão; 3. Percurso das flores; 4. Catedral (ARCOWEB)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
269
Parte dos
ambientes reproduzia,
através de variados
recursos, situações de
distintas manifestações
religiosas do catolicismo.
Isso exigia a participação
do visitante em alguns
momentos. O
acompanhamento do
trabalho pela curadora (Myriam) garantiu que toda montagem se baseasse em
pesquisas sobre a cultura religiosa realizada em regiões do interior do Brasil,
onde esses costumes praticamente extintos nos grandes centros urbanos
encontram-se mais preservados. (MACHADO, 13 abr 2000).
A entrada do módulo Arte barroca ficava no térreo do Pavilhão Ciccillo
Matarazzo. Seguindo uma ordem cronológica, o primeiro ambiente apresentava o
imaginário português do século XVI que ingressou no Brasil durante o período de
colonização.
A entrada simulava os porões de navios que transportavam essas
imagens. Para conseguir tal efeito, Bia Lessa aproveitou a área inferior ao
mezanino, que possuía um pé-direito mais baixo e forrou as paredes com tábuas
de madeira visíveis que foram iluminadas com luz branca e amena, mantendo
todo ambiente escurecido. Pisando em um caminho feito com fatias de toras
incrustadas no cimento, o público ingressava numa “floresta” criada com troncos
de até 7,20m de altura, que perfumavam o local e estavam encravados num
O primeiro ambiente durante a montagem. Os troncos se misturam
com as colunas do edifício e grande parte das imagens permanece
em sua respectiva embalagem de transporte. O mezanino que está
aparecendo no fun
do da imagem posteriormente foi vedado pela
cenografia. (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
270
terreno cujo piso era
coberto por
cascalhos de ferro.
No decorrer desse
percurso, o público
podia observar as
imagens portuguesas
dispostas entre os
troncos ao longo do
caminho sobre
pedestais modulares
de diferentes alturas forradas por tábuas de madeira. A iluminação amena
predominava até o final do trajeto. Contudo, havia focos de luz mais forte
direcionados sobre as imagens, textos e legendas escritos em branco sobre
placas pretas. Para complementar a atmosfera, reproduzia-se música barroca no
ambiente (ARCOWEB) e, através de fones de ouvido, ouviam-se textos de
Gregório de Matos,
padre Vieira ou
Carlos Drummond
de Andrade nas
vozes de Maria
Bethânia e outros.
(MACHADO, 13
abr. 2000).
Entrada da exposição com início da floresta nas quais estavam as
imagens portuguesas do século XVI (Denise Andrade)
Nesta imagem da floresta observa-se como os textos explicativos eram
apresentados durante o percurso. (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
271
Ao sair da “floresta”, ingressa-se no segundo ambiente, que por sua vez
foi montado no mezanino e onde foram apresentadas imagens produzidas no
Brasil no séc XVII por quatro congregações da igreja católica. Sobre as paredes
se manteve o forro de tábuas largas de madeira e a iluminação permanece
amena. Sobre uma plataforma elevada ao longo da parede, com a lateral forrada
pelas mesmas tábuas e a superfície coberta por cascalhos de ferro, foram
enfileiradas as primeiras imagens de franciscanos e carmelitas sobre pedestais de
madeira semelhantes aos utilizados no ambiente anterior. Essas imagens, em
geral de pequeno e médio porte, eram confeccionadas principalmente em
terracota, “que foi o material preferido por carmelitas e franciscanos” (OLIVEIRA,
2000, p.53), que trabalhavam em oficinas instaladas no litoral brasileiro durante o
século XVII.
Na seqüência sobre um mobiliário expositivo que a cenógrafa denominou
“palco-jangada”, apresentavam-se vinte imagens entalhadas por índios guaranis,
correspondentes às missões jesuíticas do Rio Grande do Sul, no século XVII e
Imagens franciscanas no primeiro plano e carmelitas no segundo. Esta cena provavelmente se
encontrava na rampa lateral que comunica o térreo com o primeiro pavimento. (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
272
primeira metade do século XVIII. Esse ambiente representava um período de
transição estilística das imagens hispânicas, que, ao serem reproduzidas por
guaranis, passaram a apresentar traços da população regional nas feições dos
santos e anjos.
No mesmo ambiente, as imagens beneditinas foram expostas sobre
pedestais com vitrines fechadas na parte superior, onde apenas as imagens
permaneciam iluminadas. Segundo Machado (13 abr 2000), Bia Lessa pretendia
“transmitir a impressão de
arte isolada na clausura,
direcionada à sublimação”.
De acordo com a curadora
(OLIVEIRA, 2000, p.49), as
principais imagens desse
conjunto foram produzidas
por um ceramista: frei
Agostinho da Piedade, de
Salvador; um segundo ceramista chamado frei Agostinho de Jesus, do Rio de
Janeiro e que chegou a assinar quatro esculturas entre 1636 e 1642, motivo,
provavelmente, pelo qual foi afastado da função; e um escultor de madeira, frei
Domingos da Conceição da Silva, de São Paulo.
Ambiente escuro com imagens beneditinas iluminadas dentro
de suas respectivas vitrines sobre pedestais (GNT, 2000)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
273
O terceiro ambiente corresponde às escolas
brasileiras do século XVIII. Na tentativa de reproduzir
uma ambientação festiva de procissão religiosa que
ainda ocorre em pequenas cidades do interior
brasileiro, onde todo trajeto a ser seguido é decorado
com flores pela população , forraram-se todas as
paredes e o chão com flores de papel crepom roxas e
amarelas. A cenógrafa Bia Lessa, com a intenção de
misturar o sagrado e profano, encomendou as
duzentas mil flores de papel crepom, que foram
confeccionadas manualmente pelos detentos
religiosos do Pavilhão 7 do Presídio do Carandiru, de São Paulo (MACHADO, 13
abr. 2000). Essas flores foram coladas sobre as paredes e sobre hastes que,
posicionadas verticalmente, haviam sido soldadas no chão, criando volumes de
forma contínua com diferentes alturas. Essa disposição das flores chegou a ser
interpretada como “mar de flores” pelos cenógrafos Cyro Dell Nero e J. C. Serrone
(2002) e como “campo e montanhas floridas” por Nélson Aguilar (2000, p.27).
Entrementes,
traçou-se um caminho
estreito formado por um
desenho de curvas
sinuosas, no qual o público
em alguns momentos
atravessava pontes. Ao
longo desse trajeto
Funcionário soldando as hastes
de metal no chão (Denise
Andrade)
Flores de papel crepom que serão coladas na ponta de cada
haste de metal soldada e sobre
as colunas do edifício (Denise
Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
274
encontravam-se as imagens sobre pedestais construídos com as mesmas hastes
de ferro, muitas vezes cobertos pelas flores às quais elas pareciam sobressair. A
proximidade dessas imagens
com a área de circulação do
público era tanta que, durante a
exposição, um São João
Evangelista emprestado pelo
Museu Mineiro teve seu
resplendor furtado; eram poucas
as imagens que estavam
protegidas por vitrines
(FIORAVANTE, 1 jun 2000).
Através das cores, as flores dividiam visualmente as escolas em dois
grupos. O primeiro grupo representou a escola mineira, cuja maior referência são
as obras de Aleijadinho Antonio Francisco Lisboa, que se inspirou no trabalho
do português Joaquim Xavier Brito, que veio para o Brasil em 1735. As imagens
de origem mineira foram apresentadas entre flores de papel crepom roxas
fazendo
menção
ao
Corpus
Christi da
Semana
Santa. O
segundo grupo reunia as escolas do Maranhão, Pernambuco e Bahia da quais
Detalhe do percurso entre flores roxas, onde se encontravam imagens do barroco
mineiro. (Denise Andrade)
O percurso de flores amarelas começa na área onde elas
se encontram elevadas (lado esquerdo da foto), onde
te
rminam as flores roxas. A parede de madeira atrás das
imagens (lado direito) corresponde à parte externa da
capela. (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
275
se destaca o trabalho de Manoel Inácio da Costa. Essas imagens foram
apresentadas entre flores de papel crepom amarelo, na tentativa de simbolizar o
ouro, usado de maneira abundante sobre imagens e ornamentos das igrejas
barrocas da região.
No final do percurso, traçado
pelo terceiro ambiente, as flores
amarelas contornavam uma “capela”
construída na parte inferior da rampa
central do Pavilhão. As paredes
construídas com madeira eram curvas
e a altura chegava a 14 metros,
remetendo à edificação da Capela do
Rosário de Ouro Preto (MG). O lado
externo dessa capela foi forrado por
tábuas de madeira, que possuíam
frestas, atraindo a atenção do público
Do lado direito da foto aparece uma das saídas laterais da capela que era rodeada pelo percurso com
flores amarelas. Na área central da foto, ao lado do extintor há dois banquinhos que serviam de apoio
para espiar objetos pelas fendas que havia na madeira. (Denise Andrade)
Interior da capela (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
276
que podia espiar detalhes de igrejas
barrocas através de fragmentos de várias
delas posicionados estrategicamente no
interior das paredes. Dentro da capela, as
paredes eram lisas e claras, servindo de
fundo para retábulos e colunas. O forro
dessa capela simulava um céu estrelado produzido por um trabalho de
iluminação. Na área central, sobre pedestais e sob a proteção de vitrines,
estavam alinhadas em duas fileiras imagens de estilo rococó de igrejas de
Pernambuco, Rio de Janeiro e Maranhão (OLIVEIRA, 2000, p.70).
Pelo fundo da capela, contornando a rampa do Pavilhão pelo lado direito,
encontrava-se uma área que corresponderia à sacristia; encontravam-se também
algumas imagens de Cristo, todas em grande escala. A parede deste ambiente
era de madeira, sobre
as quais o público
podia escrever
mensagens que
teoricamente deveriam
ser pedidos para
padroeiros
(MACHADO, 13 abr
2000) com giz
branco disponibilizado
no local. Sobre essas paredes havia também uma série de pequenas prateleiras
que sustentavam garrafas de um refrigerante chamado Jesus comercializado no
Construção da capela com rampa p
rincipal do
Pavilhão ainda descoberta (Folha/imagem)
Atrás da capela (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
277
Maranhão. A partir do teto, suspendiam-se lâmpadas incandescentes intercaladas
com bandeiras de tecido translúcido sobre as quais estavam reproduzidas
fotografias do carnavalesco Joãozinho Trinta. Na mesma sala em direção à saída
da exposição, estavam expostos grupos de imagens de tamanho natural,
utilizadas em presépios e procissões sobre pedestais feitos com hastes de ferro e
madeira. Ao redor dessas imagens havia tapetes de serragem colorida, formando
desenhos no chão. Na
parede do lado esquerdo ao
fundo estavam dispostos
vários televisores que
exibiam imagens de desfiles
de escola de samba e
vídeos inéditos do cineasta
Eduardo Coutinho. A
música ambiente era um
samba enredo da Mocidade
independente que canta em
forma de oração “Padre
Miguel olhai por nós / Se
liga que essa gente tão
sofrida / ...” (Ibidem). A cenógrafa Bia Lessa comentou a analogia, dizendo que o
barroco já é, por si, uma apoteose” (LESSA apud: MACHADO, 13 abr. 2000).
Imagens de presépio e procissão sobre tapetes de
serragem. No fundo, paredes rabiscadas (Denise
Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
278
4 - A repercussão dessa expografia
Após realização da Mostra do redescobrimento, a expografia cênica
passou a ser utilizada regularmente em mega-exposições nas quais geralmente
assume uma função didática. Seu uso em museus de arte e galerias é bastante
raro, pois suas qualidades geralmente não correspondem às necessidades destas
instituições e fundações. Quando utilizado em exposições de arte, a expografia
cênica limita-se ao desenho arquitetônico do espaço e aos efeitos especiais de
iluminação.
As criticas a respeito da expografia cênica do módulo Arte barroca aqui
apresentadas seguem a seguinte ordenação: em um primeiro momento
apresenta-se a opinião de quem estava envolvido no projeto. Num segundo
momento, opiniões negativas, organizadas em dois grupos: aqueles que
rejeitaram a exposição por completo e os que até elogiaram a cenografia mas não
a reconhecem como expografia ou a entendem como uma estratégia curatorial
impositiva. Num terceiro momento, apresenta-se a opinião daqueles que
ressalvaram como aspecto positivo o acolhimento de um novo público. Num
quarto momento, a opinião para os quais a exposição conseguiu transmitir a
essência do barroco.
Antes, um breve parecer do curador geral quanto à polêmica provocada
pelo cenário do módulo Arte barroca:
“O módulo das imagens religiosas despertou uma saraivada de
flechas dos mais conservadores e uma intensa comunicação com
os visitantes” (AGUILAR; in: FUNDAÇÂO BIENAL DE SÃO
PAULO, 2000, p.27).
E em outra ocasião:
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
279
Tudo muda neste mundo; por que exposição de arte não pode
mudar, tem que ser salão tradicional? Quanto mais a antiarte é
incorporada à arte, mais ela torna-se arte, porque hoje abarca a
consciência do entorno. [...] A gente quer conquistar um público
novo, e essa é uma ocasião única para cativar público para a
causa artística. [...] O ambiente é só um meio, um veículo.
(AGUILAR in Folha de São Paulo, 23 março 2000)
Interrogada, Bia Lessa afirmou que não crê que o uso da expografia
cênica garanta que o público seja atraído, e que isso depende da qualidade da
exposição (LESSA; in: ALZUGARAY, 2000). Emilio Kalil resumiu a expografia
com as seguintes palavras no catálogo das cenografias:
“Bia Lessa, com suas catedrais de madeira, som e luz, e seus
tapetes floridos de procissões, tocou em todos os nossos
sentidos, fazendo-nos experimentar um paraíso ao mesmo tempo
divino e profano; por mãos, o Barroco mostrou-se verdadeira
celebração” (KALIL; in: FUNDAÇÂO BIENAL DE SÃO PAULO,
2000, p.32).
Agnaldo Farias, interrogado sobre a expografia cênica
em entrevista à Folha de S. Paulo, evitou falar diretamente
sobre o assunto. Deixou implícito, porém, um certo temor
quanto à capacidade de compressão da arte por parte de um
público supostamente fascinado por essa
espetacularização:
“[Interrogado, Farias] afirma logo ser contra pré-
julgamentos. Feita a ressalva, diz que sua
preocupação é que o espetáculo termine encobrindo
as obras. ‘Sem tirar a dimensão protagonista da obra
de arte, o responsável pela ambientação pode
propiciar atmosfera mais rica para fruição. [...] Acho
imperdível a oportunidade de visitar tudo dessa
Público atravessando ponte que ficava
no trajeto a ser percorrido (GNT,
2000)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
280
tentativa estupenda de resumir nossa arte,
mas pelo fato de nunca termos visto uma
mostra dessa envergadura, temo que a
política espetacular distancie o público de
exposições pequenas, de leitura em
profundidade”. (FARIAS in FOLHA DE
SÃO PAULO, 23 mar 2000).
A galerista Socorro de Andrade
Lima (Galeria Nara Roesler), foi mais
incisiva e afirmou que os recursos
cenográficos usados como expografia desviavam o foco de atenção do público.
Justificou afirmando que Essa é uma visão de quem entende de arte. As
pessoas, em geral, gostam, e muito” (LIMA; in: FIORAVANTE, 07 set 2000).
Ricardo Trevisan, da Galeria Triângulo, reconhece o estranhamento que
sentiu ao ver as obras inseridas na ambientação construída e reconheceu que se
sentia mais à vontade em exposições que usam a expografia moderna tradicional,
como se faz na Mostra para apresentar a arte moderna e contemporânea.
Generalizou sua sensação afirmando que a cenografia atraía mais a atenção que
as obras e questionou seu uso:
fiquei realmente assustado com o módulo Arte Barroca. Ali tudo
é mal proporcionado. As obras de arte ali servem apenas de
ornamento para a cenografia. Sair dali e ir para outros módulos e
ver arte moderna e contemporânea é realmente um alívio. [...]
talvez esse tipo de cenografia agrade ao público leigo, mas não
sei se esse é o caminho para a popularização da arte.”
(TREVISAN; in: FIORAVANTE, Folha de São Paulo, 25 abril
2000)
Stella Teixeira de Barros considerou, assim como Farias, que a
expografia cênica é reflexo do tratamento espetacularizador das mega-
Equipe de montag
em carregando imagem no
módulo Arte barroca (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
281
exposições. Mas não
afirmou como ocorreu nas
citações anteriores que a
cenografia pudesse desviar
a atenção da obra para si
nem duvidou de sua
capacidade de direcionar a
fruição. O que ela afirmou
foi que o uso desse recurso
desvirtua o significado da
obra de arte exposta e
desmerece os quesitos
pedagógicos que lhe são atribuídos. Para Barros, sua opinião decorre não só por
considerar que o recurso cenográfico possa ser usado com irresponsabilidade:
“Quando os quesitos pedagógicos são preteridos e o apelo visual
excessivo tende a deformar as obras [...]. A exposição do
‘Barroco’ na Mostra do Descobrimento (sic), que vinha envolta
numa esfuziante teatralização das procissões religiosas,
prescindia de grande informação básica: nenhuma explicação
nas paredes, uma exigência cenográfica. Além do mais, a
exuberância não escondia uma generalizada confusão
cronológica e funcional das imagens sacras: onde a maioria das
peças era de altar, o tratamento foi procissional com casos
inversos também. [...] É importante pensar em modos
diversificados para suas exposições, sem descuidar de seu papel
formador e sem transformá-las em pura recreação. A qualidade
não se contrapõe obrigatoriamente às mega-exposições, porém o
efeito da prevalência da lógica do espetáculo sobre a criação
artística pode ser tragicamente pasteurizador: ao mesmo tempo
que se nega a própria condição da arte e de capacidade de
Imagem rodeada por um tapete de serragem no espaço que
corresponderia à sacristia. No fundo, sobre a parede rabiscada
há garrafinhas com água, simulando água benta sobre
prateleirinhas. (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
282
esclarecer, favorece a opressão controladora e uniformizante da
sociedade e desfalca-a de ótimas oportunidades de percepção,
reflexão e perspectiva” (BARROS, 2002, p.70-1).
A educadora Ana Mae Barbosa também reconheceu os atributos
didáticos na expografia cênica e, ao contrário de Barros, considerou que a
contextualização das obras foi bem sucedida. Ressalva que o discurso curatorial
por ela representado foi muito incisivo:
“No caso do módulo Barroco, cenografado por Bia Lessa, a
contextualização foi bem sucedida. Ao entrar no espaço de
representação do Sagrado Católico o roxo que remete aos rituais
da Semana Santa era impactante e rememorante. Entretanto, a
estatuária Barroca brigava e perdia a luta para se tornar mais
visível do que a cenografia. Embora sedutora, a associação entre
procissão e carnavalização induzida pela cenógrafa empobrece a
exposição porque reduz o seu significado a uma única
interpretação. Exposições que conduzem a uma única
interpretação são autoritárias e limitadoras da capacidade crítica
do espectador” (BARBOSA, 2000).
Luisa Strina, galerista, dividiu a opinião dos demais galeristas afirmando
que as obras não se
destacavam entre a cenografia
e ainda duvidou de suas
virtudes pedagógicas. Depois,
entrou em méritos financeiros,
questionando o valor gasto
com um produto efêmero:
As obras com raras exceções,
o só coadjuvantes de uma
cenografia sedutora, mas totalmente antididática. [...] Com esse
Imagem de virgem sobre flores amarelas (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
283
dinheiro gasto com decoração daria para fazer um novo museu
(STRINA; in: FIORAVANTE, Folha de São Paulo, 07 set 2000).
Rafael Rosa mencionou o “maravilhamento” que o conjunto de obras
apresentado lhe proporcionou e como ele foi prejudicado percurso “estressante”
imposto pela expografia cênica, a qual considerou desnecessária (ROSA, 2000):
“Ao final do percurso, do módulo [de Arte barroca], mais do que
qualquer outro na mostra Brasil+500, redescobre-se como a
prova de que a arte brasileira não carece de cenógrafos nem
mesmo de curadores que façam releituras do que já é patrimônio
nacional. O que falta são museus permanentes e bem instalados
para que, no lugar de o público percorrer os meandros da mente
de quem quer que tenha “pensado” uma exposição, uma fantasia
gigantesca e passageira, possa ter seu contato de frente com a
arte produzida neste país” (Ibidem, 2000).
Apesar de incisivas críticas negativas, alguns críticos partiram para a
defesa dessa expografia cênica, elogiando os resultados obtidos pelo evento.
Teixeira Coelho, que já foi diretor do MAC-USP, foi um deles, e considerou que a
expografia moderna tradicional (cubo branco) estava ultrapassada.
Os demais (como os discutidos
problemas de conservação das
obras expostas) dizem quase
todos respeito à dimensão
estática de uma exposição e são
relevantes, porém secundários.
Fundamental é pôr a arte viva
diante do público. E por vezes,
há um preço a pagar por isso.
[...] O outro aspecto vivo foi o do
modo de exibição. Ponto alto
entre todos: a concepção
Detalhe da cenografia: garrafinhas simulando água benta
(Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
284
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
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E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
294
A seguir apresentaremos opiniões positivas à ambientação realizada por
Bia Lessa para o módulo Arte barroca. Todas consideraram que ela conseguiu
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
295
captar e transmitir a essência do barroco, assim explicada por Percival Tirapeli,
pesquisador do assunto:
O barroco é um estado de espírito, emoção. Há muitos críticos
que dizem que ele efervesceu no século XVI e parte do século
XVII, mas ele se passa em toda a história da humanidade
(TIRAPELI; in: GNT, 2000).
A galerista Valú Oria, diferentemente da opinião dos outros galeristas
aqui citados, aprovou o resultado obtido pela encenação:
achei tudo maravilhoso. Cheguei anteontem de Ouro Preto e
acho que a cenografia criada para o barroco não desmerece as
obras expostas.” (ORIA; in: FIORAVANTE, Folha de São Paulo,
25 abril 2000)
Haroldo de Campos, além de elogiar o trabalho de Bia Lessa, numa
tentativa de conter críticas negativas, afirmou que o público especialista em arte
em momento algum teria sua fruição prejudicada pela cenografia realizada em
prol do público leigo.
Entendo que Bia Lessa captou o essencial do barroco: a festa, o
espetáculo, o coreográfico,
o maravilhamento. O
barroco é o âmbito do
lúdico, como tantas vezes
tem afirmado esse nosso
grande especialista nas
manifestações do período,
o poeta Affonso Ávila, o
estudioso da festa
procissional mineira, do
‘Áureo Trono’. Não creio
que uma exposição
destinada
democraticamente a visitantes de todos os estrados sociais (que,
Imagem de Cristo sobre flores amarelas (Denise Andrade)
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
296
aliás, ocorreram em multidão) deva se ater a rígidos critérios
museológicos de preceito para o especialista” (CAMPOS, Folha
de São Paulo, 07 set 2000).
E o historiador Otávio Araújo reforçou a consideração de Haroldo de
Campos, refletindo:
Quem pode resistir ao fato do incenso, da música, do ouro que
criam esse grande cenário? Grande cenografia que a igreja faz
com que seja o grande momento de glória de Deus” (ARAÚJO,
GNT, 2000).
297
Considerações finais
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
287
Nesta dissertação de mestrado enfocaram-se quatro exposições
realizadas em São Paulo durante o século XX, as quais apresentaram propostas
expográficas inéditas. As exposições foram selecionadas a partir dos seguintes
critérios: tipos diferentes de expografia, proposta inédita contribuindo para o
rompimento de padrões da época e grande repercussão, inclusive internacional.
Através desses critérios selecionou-se a
Exposição de uma casa modernista
(1930), com projeto de Gregori Warchavchik, a
Pinacoteca
do
Museu de Arte de
São Paulo (1967-97), com autoria de Lina Bo Bardi (1957), a
Grande tela da
XVIII
Bienal Internacional de São Paulo (1985), com curadoria de Sheila Leirner e
Arte
barroca, na
Mostra do Redescobrimento (2000), com curadoria de Myrian Ribeiro
de Andrade Oliveira e cenografia de Bia Lessa.
A dissertação partiu de um panorama geral da história da expografia e
conceitos com os quais se relaciona. Ao longo do trabalho, foram apresentados
aspectos históricos, técnicos e conceituais de cada um dos casos, procurando-se,
posteriormente, estabelecer um confronto entre diferentes opiniões publicadas
sobre essas expografias em suas respectivas épocas.
No capítulo 1 resumiu-se a história da expografia buscando definir suas
origens e seu desenvolvimento. Essa história se confunde com o próprio
surgimento do museu. Vimos que esse surgimento e desenvolvimento convergiu
para uma proposta de exposição em direção ao isolamento da obra, ou seja,
convergiu para a expografia moderna.
No capítulo 2 abordamos a
Exposição de uma casa modernista,
realizada
por Warchavchik em 1930,
que pode ser considerada o primeiro exemplo de
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
2
88
expografia moderna no Brasil. Essa forma de apresentar obras atendeu critérios
que buscavam valorizar e destacar a obra de arte do ambiente pela eliminação de
elementos visuais do espaço que poderiam competir com o objeto exposto. O uso
desse tipo de expografia foi largamente difundida em museus e galerias de arte de
diversos países, especialmente as de arte moderna ou contemporânea, sendo
considerada uma expografia “neutra”.
No capítulo 3 abordamos a
Pinacoteca
do
Museu de Arte de São Paulo
(1967-97), com autoria de Lina Bo Bardi (1957). Trata-se de uma proposta
expográfica que questiona a expografia moderna tradicional, já estabelecida e
difundida como o modelo por excelência no Brasil. Ao que tudo indica, essa forma
de expor obras parte dos mesmos princípios da expografia moderna, buscou
anular o espaço, usando a transparência como metáfora da liberdade.
No capítulo 4 abordamos a
Grande tela da
XVIII Bienal Internacional de
São Paulo (1985), com curadoria de Sheila Leirner. Nessa exposição, Leirner
procurou impor um discurso curatorial ao invés de valorizar a obra de arte. Ou
seja, trata-se de uma proposta que inverteu a fórmula das propostas expográficas
que vimos nos capítulos 2 e 3. Esse discurso consistiu na criação de um espaço
expositivo que desrespeitava critérios da expografia moderna, como o isolamento
das obras entre si. Trata-se de uma das primeiras propostas de expografia que
divergiu e questionou profundamente a expografia moderna e reconhecida como
marco de inicio da era dos curadores.
No apêndice vimos o módulo
Arte barroca, na
Mostra do Redescobrimento
(2000), com curadoria de Myrian Ribeiro de Andrade Oliveira e cenografia de Bia
Lessa. Trata-se de um exemplo notável de uso de recursos cenográficos no
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
289
discurso curatorial. Nessa exposição, a cenógrafa também divergiu da expografia
moderna tradicional, e suas propostas foram tão radicais que anulavam o espaço
arquitetônico do edifício no qual foi realizado. Suas influencias do teatro e cinema
transpareceram na expografia limitando também o tempo, que foi determinado a
partir de um roteiro único de fruição que não permitia sua interrupção. O módulo
Arte barroca
é um exemplo no qual a curadoria dominou num ato de dramatização
recorreu a diversos recursos de efeitos sensoriais visando prioritariamente a
emoção compreendida num momento de catarse.
É possível afirmar, com base nas perquirições realizadas nesta pesquisa,
que o discurso curatorial vem se modificando. Todas as expografias até aqui
analisadas não foram casos isolados, mas, ao contrário, são representantes
centrais de diferentes discursos estéticos curatoriais.
Primeiramente, observa-se que há uma grande distinção entre dois tipos
de expografia. O primeiro tipo tende à neutralidade, e compreende o estudado nos
capítulos 2 e 3. O segundo tipo de expografia tende a uma postura interferente por
parte do curador, que impõe um determinado discurso na exposição. E
compreende o capítulo 4 e o apêndice. Contudo, vermos mais a frente que essa
divisão esconde uma unidade entre elas.
Muito se especulou em torno da expografia moderna, e ela ainda parece
gozar de título de “espaço ideal” para exposição de obras de arte. Observa-se que
as razões da expografia moderna, em principal no molde alemão, aqui
representada na
Exposição de uma casa modernista
, convergem para o sensório.
Assim, as preferências da expografia moderna se resumem numa relação de
contraste visual, como apontamos diversas vezes. Em outras palavras, trata-se de
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
290
uma relação mais propriamente visual, na esperança que haja possibilidade de
anular o próprio espaço expositivo e possibilitar ao fruidor uma relação imediata
para com a obra de arte. O depoimento de Mário de Andrade evidencia quanto o
contraste visual do espaço em relação a obra automaticamente a destaca, ou
como em suas próprias palavras, proporciona
“a sensação de um objeto de arte”
.
Já a proposta de Lina Bo Bardi parece ser um caso intermediário entre a
pretensa neutralidade e a crítica à expografia moderna (alemã). Vimos que seu
intuito era a crítica à neutralidade, contudo, sua resposta a ela foi uma
reformulação da própria neutralidade. Enquanto os modernistas criticaram a
expografia anterior a ela por não oferecer uma visualidade que valorizasse a obra
de arte, a expografia de Lina Bo Bardi afirmou que a neutralidade da expografia
moderna acabava por direcionar o fruidor. Contudo, esse direcionamento não se
deu, para ela, de forma visual, mas em um outro nível: uma influência positivista
por sobre a expografia moderna, que favorecia uma classificação hierárquica entre
as obras.
Para Lina Bo Bardi esse direcionamento era inaceitável, e isso está
intimamente ligado a sua filiação política. O intuito dessa expografia em particular
introduziu uma nova discussão dentro do ambiente da expografia: a função
didática do curador, em oposição a um dirigismo por parte da já tradicional
expografia moderna. E esse didatismo estava inspirado tanto na dialética marxista
como no distanciamento brechtiano (um recurso, que por sua vez, também é
inspirado na dialética marxista): trata-se de uma estratégia de anular todo e
qualquer discurso por parte do curador, para que o público possa fruir de forma
livre.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
291
Assim, o trabalho desenvolvido Lina Bo Bardi não pode ser visto como
uma relação puramente visual entre obra e espaço expositivo, mas como uma
relação metafórica. Sua opção pelo transparente, pelo translúcido, parece fazer
parte dessa metáfora da liberdade. Assim, é possível afirmar que a
Pinacoteca
do
MASP
radicaliza a
neutralidade visual
, mas com vistas a estabelecer uma
neutralidade conceitual.
Já inversamente é que se encontra a proposta de Sheila Leirner e sua
Grande tela.
Essa expografia já não é apenas uma outra, um alternativo; antes, é
um diálogo entre expografias. A
Grande tela
pressupõe a existência da expografia
moderna; Leirner estabeleceu uma relação entre expografias. Assim, a relação
espaço e obra de arte aí não é tratada em termos puramente visuais, e, tal como
acontece com Lina Bo Bardi, é tratada em termos conceituais. Contudo, a opção
de Leirner não é pelo neutro, mas pela interferência, por evidenciar a
o do
curador
por sobre a obra de arte.
Aqui a fruição é tratada de uma forma inédita: abandona-se a pretensão
de neutralidade e de liberdade, e se envereda por um discurso curatorial ativo. O
movimento em torno da negação da pretensa neutralidade na expografia moderna
faz com que o curador assuma um papel central no ato fruitivo. No caso de
Leirner, vimos que esse papel se deu através de um comentário curatorial sobre a
qualidade de um determinado tipo de obra de arte, algo que não aconteceria com
a expografia moderna e que jamais seria endossada por Lina Bo Bardi.
Num viés parecido é que o módulo do barroco, de Bia Lessa, se insere. A
opção por interferir profundamente na fruição é uma continuação da tendência
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
292
observada em Leirner. O recurso cenográfico, contudo, elevou a discussão a
outros patamares: o do espetáculo.
Tanto a
Grande tela
como o módulo
Arte barroca
foram muito criticados, e,
ao que parece, o motivo foi a desvalorização da arte que essa expografia
produziu. No primeiro caso, houve um uma crítica propriamente dita, por parte de
Leirner, o que contribuiu em muito para a repercussão negativa; no segundo caso,
a criatividade na criação do espaço cenográfico não criticou a obra de arte, mas
apenas sugeriu um espaço totalmente novo e inesperado. Daí que a repercussão
foi bem dividida entre críticas negativas e positivas.
Contudo, os recursos cenográficos vêm ganhando espaço, mesmo que de
forma mais comedida do que foi no módulo do barroco. Isso aponta para uma
modificação na estratégia curatorial. Em muitos museus, a cor branca vêm sendo
substituída por cores diversas, o que já pode ser considerado um recurso que
rompe com a convenção da expografia moderna.
Um dos fatores que as expografias alternativas e cenografias trouxe foi a
espetacularização dos eventos de exposição de artes. Essa espetacularização
está intimamente ligada a diversos fatores como a necessidade de atrair cada vez
mais público, estratégias didáticas, criação de espaços de laser e até mesmo um
rompimento com a assepsia da expografia moderna tradicional. É nesse contexto
que é possível traçar uma profunda mudança de mentalidade em relação a duas
expografias estudadas: a
Pinacoteca
do MASP e o módulo do barroco.
É possível afirmar que, do ponto de vista conceitual as expografias de Bia
Lessa e de Lina Bo Bardi são radicalmente opostas. Enquanto a primeira tende ao
espetáculo, ao catártico, a segunda tende ao distanciamento épico
a la
Brecht.
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
293
Como vimos, a estratégia de Lina Bo Bardi pretendia liberar o público de
interferências no discurso; já a catarse recurso veementemente condenado pela
teoria crítica marxista e tendo no distanciamento brechtiano seu antídoto é o
elemento principal da cenografia dramatizada.
Contudo, quando nos deparamos com um comentário (exclamado em alto
tom de voz) de John Cage
Isto que é liberdade!”
quando se deparou com a
Pinacoteca
do MASP, não é possível interpretar essa frase como um momento de
fruição racional, de distanciamento, e de reflexão crítica. Muito ao contrário, essa
frase só pode ser interpretada como um momento de esfuziante emoção
catártico, em outras palavras.
Assim posto, pode-se afirmar que o critério comunicativo das expografias
moderna alemã e italiana são utópicos. Isso porque um espaço expositivo jamais
se anulará, mas tão somente poderá interferir mais, ou menos. É possível também
afirmar, como regra básica, que o momento fruitivo está ligado a mecanismos
emocionais. E uma regra mais geral ainda é que o público trará seu repertório, sua
experiência, e imprimirá não só sobre a arte, mas também à própria expografia
conceitos culturais que são forçosamente talhados com o passar do tempo. Só
assim, é possível entender que a expografia moderna, na década de 1930 era
algo completamente novo, mas que hoje é algo tradicional, o que implica numa
mudança comportamental do público frente a esse espaço.
Com base nas expografias estudadas no capítulo 4 e no apêndice, é
possível afirmar que as recentes tendências de expografia introduzem uma nova
interpretação sobre a relação entre a obra de arte e a expografia moderna
tradicional, na qual a neutralidade visual é vista como uma utopia. O motivo disso
E STUDOS SOBRE E XPOGRAFIA
294
parece estar em torno de uma concepção que a expografia, seja qual for ser estilo,
forçosamente gerará alguma interferência seja puramente visual, seja no nível
conceitual. Assim, a opção curatorial de interferir conscientemente no que é
apresentado parece ser uma tendência que se encontra em seus primórdios.
É possível afirmar que de um determinado ponto de vista mais geral, pelo
menos, há algo em comum entre todas essas expografias que investigamos, que é
a interferência do espaço expositivo na obra de arte. Os momentos-chave desta
pesquisa indicam que a neutralidade de uma expografia não é possível, e
observa-se um entendimento progressivo da expografia moderna como mais uma
tendência cenográfica. E é nesse contexto que vemos uma tendência ao
surgimento de um novo tipo de artista cujas curadorias de autorias exclusivas
tendem a uma irrepetítibilidade e que por tanto podem ser descritas nos mesmos
termos que a arte propriamente dita.
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