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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ – UECE
Eluziane Gonzaga Mendes
DE ESPAÇO COMUNITÁRIO A ESPAÇO DO TURISMO –
CONFLITOS E RESISTÊNCIAS EM TATAJUBA, CAMOCIM/CE
Dissertação apresentada ao Mestrado Acadêmico em
Geografia do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade
Estadual do Ceará, como requisito parcial para obtenção do
título de mestre. Área de concentração: Análise Geoambiental
Integrada e Ordenação do Território nas Regiões Semi-áridas e
Litorâneas. Linha de Pesquisa: Sociedade, Espaço e Cultura.
Orientadora: Drª. Luzia Neide M. T. Coriolano
Fortaleza - CE
Abril - 2006
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Universidade Estadual do Ceará - UECE
Mestrado Acadêmico em Geografia - MAG
Título do Trabalho: De Espaço Comunitário a Espaço do Turismo –
Conflitos e Resistências em Tatajuba - Camocim/CE
Autora: Eluziane Gonzaga Mendes
Defesa em: 12 / 04 / 2006 Conceito obtido: Satisfatório com louvor
Nota obtida: 10,0
Banca Examinadora
Profª. Drª. Luzia Menezes Teixeira Coriolano (UECE)
Orientadora
Profª. Drª. Zenilde Baima Amora (UECE)
Prof. Dr. Antônio Jeovah de Andrade Meireles (UFC)
FICHA CATALOGRÁFICA
M538e Mendes, Eluziane Gonzaga
De Espaço Comunitário a Espaço do Turismo -
Conflitos e Resistências em Tatajuba, Camocim – Ceará /
Eluziane Gonzaga Mendes. – Fortaleza, 2006.
192 f.; il.
Orientadora: Profª. Drª. Luzia Neide Menezes
Teixeira Coriolano.
Dissertação (Mestrado Acadêmico em Geografia)
Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências e
Tecnologia.
1. Comunidades. 2. Território. 3. Políticas. 4. Turismo.
I. Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências e
Tecnologia.
CDD: 380.609181131
Às comunidades litorâneas do Ceará,
exemplo de luta pela
terra e pela vida.
Aos meus pais,
Francisco Mendes e Maria Gonzaga
exemplos de força e
amor incondicional.
A todos os que acreditam
ser possível a transformação
da sociedade.
AGRADECIMENTOS
A Deus, agradeço pelo dom da vida. Por meio dela, deu-me a
oportunidade de realizar este trabalho; concedeu-me razão, espírito investigativo,
força de vontade, rompendo os medos trazidos pela inexperiência na arte de
pesquisar.
O rompimento com o medo e a força de vontade conduziram-me à Profª.
Drª. Luzia Neide M. T. Coriolano, que me aceitou como bolsista de Iniciação
Científica, ainda na graduação em Geografia, e, mediante suas orientações, inseriu-
me no mundo da pesquisa. Ao cursar o Mestrado, na metade do caminho, aceitou
acompanhar-me pelas trilhas da ciência que nos levou a Tatajuba. Portanto, minha
imensa gratidão pelas orientações, amizade e confiança doadas em um ato
recíproco e verdadeiro.
Ao Prof. Dr. Luiz Cruz Lima, primeiro orientador da pesquisa, coordenador
do NETTUR-Laboratório de Estudos do Território e Turismo, juntamente com a Profª.
Drª. Luzia Neide Coriolano, meus agradecimentos pela amizade, apoio e confiança
depositados no meu trabalho como componente do NETTUR, onde foram realizados
todos os trabalhos de gabinete, e em meio a tantas atividades desenvolvidas no
período do Mestrado.
Ao Instituto Terramar, de modo especial a Rosa Martins, por me haver
apresentado à comunidade de Tatajuba. Com seu apoio, foi possível escolher este
lugar como foco da pesquisa, representando a realidade da “turistificação” do litoral
cearense. Ainda no Terramar, agradeço as colaborações de Sheila Nogueira e
Jefferson de Sousa.
Ao Núcleo de Educação Ambiental do IBAMA/CE, pela participação no
Diagnóstico Sócioeconômico de Tatajuba. Em especial, sou grata pelo apoio
recebido de Águeda Coelho, com a concessão de informações que foram
imprescindíveis para o desenvolvimento do trabalho.
Ao Prof. Dr. Antônio Jeovah A. Meireles, pelas preciosas críticas e
sugestões, durante o Exame da Qualificação, e, especialmente a Profª. Drª. Zenilde
Baima Amora, por sua colaboração no aprimoramento da metodologia da pesquisa e
à Profª. Ms. Ana Matos Araújo, pelas críticas e leituras dos fragmentos da pesquisa,
incentivando-me com suas palavras de força e estímulo.
Aos professores ministrantes das disciplinas cursadas no Mestrado
Acadêmico em Geografia. Aos Professores Dr. Daniel Pinheiro e Drª. Lidriana de
Souza, agradeço pela confiança e respeito a mim depositados ao realizar o
ENGS2005. Assim como, sou agradecida aos colegas de curso que compartilharam
das discussões, ansiedades e da realização do “I Encontro Nacional de Geografia e
Sustentabilidade-ENGS2005”: Ana Maria, Davis de Paula, Edilce Dias, Jader Sousa,
João Sérgio, Josimeire Barreto, Marcelo Gondim, Marília Colares, Paulo Sucupira,
Sergiano Araújo; e, em especial, a minha amiga Adriana Marques Rocha, pela
sincera amizade, discussões teóricas, leituras críticas e o compartilhar de sonhos e
utopias, além de tantas atividades realizadas no Mestrado e no NETTUR.
A todos os meus colegas, bolsistas e estagiários do NETTUR –
Laboratório de Estudos do Território e Turismo, em particular, Camila, Enyvládia,
Inara, Kleiton e Marcela, pela ajuda, amizade, respeito e apoio doados em todos os
momentos em que precisei de suas colaborações, além do constante incentivo para
continuidade do trabalho de pesquisa. Em especial, agradeço ao querido Aridenio
Quintiliano, pelo afeto, sincera amizade, diversas e constantes colaborações, além
do incessante encorajamento.
Aos moradores da comunidade de Tatajuba, pela amizade gerada ao
longo das viagens de pesquisa e pelos depoimentos e entrevistas concedidas, em
especial Maria do Livramento Carneiro dos Reis (Mariazinha), Maria Iolene Pontes,
Antônio Carneiro dos Reis (Toinho), Maria José de Araújo (Dona Mazé), Sr. Manoel
Ricardo Araújo, Marlene Façanha, Ivan Bezerra, Pedro Ivo da Silva (Ivo), Edvandir
de Souza Monteiro (Didi), Sr. Oswaldo Mateus, Maria Carneiro de Albuquerque (Tia
Bio), Antônio Carneiro da Silva, Vera Carneiro de Souza, João Bastista dos Santos
(Tita), Maria Ivaneide da Silva (nenê) e ao Marcos Aurélio Pozzan.
Às funcionárias Gerda, Júlia, Janaína e ao Elesbão pelo atendimento às
minhas solicitações à Secretaria do Mestrado.
Ao Prof. Dias da Silva e à Dona Luizinha da Silva, agradeço pela amizade
e a correção de alguns textos preliminares da pesquisa.
Ao amigo e professor de francês, Charles R. Teixeira, agradeço
imensamente pela revisão do résumé deste trabalho.
A todas instituições que cederam dados e informações, complementando
a pesquisa.
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico-
CNPq-Brasil, pela concessão de bolsa de estudo, essencial ao desenvolvimento do
trabalho.
Aos meus amados pais, Francisco Mendes e Maria Gonzaga Mendes,
pela dedicação, apoio e amor incondicional. Aos meus irmãos, Evinaldo, Evenilson
e Reginaldo, pelo apoio e admiração. Ainda no âmbito familiar, agradeço em
especial, a minha cunhada Cristiane Mendes, pelas constantes leituras dos textos,
força e admiração.
Enfim, a todos os amigos que incentivaram o desenvolvimento desse
trabalho, que acreditam na Geografia, na pesquisa científica e na existência de uma
sociedade mais justa e solidária. O meu muito obrigada.
RESUMO
A turistificação do litoral, implementada pelas políticas privadas e públicas
preparam o território para receber as empresas, transformando os espaços
comunitários em locus do turismo, sendo os conflitos e resistências imanentes a
esse fenômeno. Esta dissertação teve como objetivo analisar a produção e a
valorização do espaço litorâneo para o desenvolvimento do turismo. A metodologia
etnográfica e a abordagem qualitativa conduziram a investigação e a teoria crítica da
Geografia a análise. A transformação do litoral em mercadoria, para o setor
imobiliário e turístico é um dos vetores da pesquisa que se realizou no Município de
Camocim e na comunidade litorânea de Tatajuba, que ao complementarem o
turismo de Jericoacoara, tornaram-se objetos de interesse da especulação
imobiliária e das empresas do turismo. Nesse lugar é vivenciado conflito fundiário
entre os residentes contra grileiros e especuladores imobiliários, que buscam se
apropriar de terras para seus empreendimentos. O conflito que se apresentou pela
desarticulação entre os moradores, por um lado, ocasionou a divisão interna, e de
outra parte, despertou na comunidade a resistência ao turismo de grandes
empreendimentos e a descoberta de possibilidades, sendo o turismo comunitário
uma das perspectivas.
Palavras-chave: 1. Comunidades 2.Território 3. Políticas 4. Turismo
RÉSUMÉ
La turistification de la zone côtière implantée par les politiques privés et
publiques preparent le territoire pour recevoir les entreprises, en transformant les
espaces communautaires en locus du tourisme. Les conflits et les résistences
appartiennent à ce phénomène. Cette dissertation a eu comme objective analyser la
production et valorization de la zone côtière pour le développement du tourisme. La
methodologie etnographic et l´investigation qualitative sont été la base de la
recherche et la théorie critique de la Géographie a été la base de l´analyse. La
transformation de la zone côtiére en marchandise du secteur immobiliéire et
touristique est un des éléments de la recherche. L´espace de l´investigation est la
commune du Camocim et la communauté des pecheurs de Tatajuba. Ces endroits
ont été transformé en objet d´intérêt de la spéculation sour les terrains et par les
entreprises touristiques. A Tatajuba il y a de conflit de terre entre les résidents, les
“grileiros” et les spéculateurs (agents immobiliers), car les dérnieres désirent
s´aproprier des terres natifes pour ses propres affaires. Il faut mettre en relief que
Tatajuba fait partie de la region touristique de Jericoacoara, plage très connue. Le
conflit, qui inquiete les habitants, a instigué la division interne, en faisant que les
habitants cherchent des nouvelles possibilités dont le tourisme communautaire est
une des perspectives.
Mots-clé: 1. Communautés 2. Territoire 3. Politique 4. Tourisme
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 14
2 A TRILHA METODOLÓGICA....................................................................... 19
2.1 A Pesquisa Etnográfica e a Abordagem Qualitativa................................... 21
2.2 Os Momentos da Pesquisa ........................................................................ 26
3 TATAJUBA – O LUGAR E SUA PAISAGEM............................................... 32
3.1 As Vilas de Pescadores e suas Práticas Cotidianas .................................. 41
3.2 A Atração da Paisagem Litorânea.............................................................. 60
4 TERRITÓRIO DE CONFLITOS E RESISTÊNCIAS...................................... 79
4.1 A Valorização e a Especulação da Terra. .................................................. 85
4.2 O Território Local em Disputa..................................................................... 95
5 DE ESPAÇO COMUNITÁRIO A ESPAÇO DO TURISMO ......................... 117
5.1 As Contradições da Política de Turismo no Espaço Cearense ................ 118
5.2 Tatajuba: entre Passeios e Rotas Turísticas............................................ 134
5.3 O Turismo Comunitário: Nova Proposta................................................... 142
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 161
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 165
ANEXOS ........................................................................................................ 176
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
APP - Áreas de Preservação Permanente
BN - Banco do Nordeste do Brasil S.A
CAEN – Curso de Mestrado em Administração e Economia da
Universidade Federal do Ceará
CDPDH - Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos
CNPT-IBAMA - Conselho Nacional de Populações Tradicionais/IBAMA
DPU – Departamento do Patrimônio da União
ETENE - Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste / BN.
IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDACE – Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará
INSTITUTO TERRAMAR - Instituto Terramar de Assessoria à Pesca
IPECE – Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará
IPLANCE – Fundação Instituto de Pesquisa e Informação do Ceará
MAG – Mestrado Acadêmico em Geografia
NEA-IBAMA - Núcleo de Educação Ambiental/IBAMA
NETTUR – Laboratório de Estudos do Território e Turismo
ONG - Organização Não-Governamental
PDDU - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Camocim
PDITS - Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentável
PNMT - Programa Nacional de Municipalização do Turismo
PRODETUR-CE - Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Ceará
PRODETURIS-CE - Programa de Desenvolvimento do Turismo em Área Prioritária
do Litoral do Ceará
RESEX - Reserva Extrativista
SETUR – Secretaria de Turismo do Ceará
UECE – Universidade Estadual do Ceará
UFC – Universidade Federal do Ceará
ZEE – Zoneamento Ecológico-Econômico
LISTA DE FIGURAS, MAPAS, QUADROS E GRÁFICOS
ÍNDICE DE FIGURAS
1 Rio Coreaú – Camocim-CE......................................................................... 36
2 Rio Coreaú e Vista da Beira – Rio, Camocim-CE ........................................ 36
3 Antigas casas de pescadores de Tatajuba................................................... 37
4 Árvore Tatajuba............................................................................................ 38
5 Ponto de venda (óleo e gasolina)................................................................. 43
6 Igreja católica, Tatajuba – CE ...................................................................... 44
7 Praça de Tatajuba ........................................................................................ 44
8 Casa de farinha – Vila Nova......................................................................... 47
9 Agricultura de subsistência........................................................................... 47
10 Paisagem da Baixa da Tatajuba................................................................. 48
11 Projetos do Pro-Renda .............................................................................. 48
12 Vista da duna Branca ................................................................................. 50
13 Canoas na regata de Tatajuba................................................................... 56
14 Canoa na Lagoa da Torta........................................................................... 56
15 Paisagem panorâmica da gamboa de Tatajuba......................................... 60
16 Falésias vivas - litoral de Camocim-CE...................................................... 64
17 Formação Camocim – CE .......................................................................... 64
18 Duna Barcana ............................................................................................ 69
19 Dunas com eolianitos ................................................................................. 69
20 Migração das dunas sobre a gamboa ........................................................ 71
21 Ecossistema manguezal............................................................................. 73
22 Ponte sobre o mangue ............................................................................... 73
23 Área de tabuleiros em Tatajuba ................................................................. 74
24 Criação de cabras ...................................................................................... 74
25 Área apropriada pela empresa imobiliária.................................................. 99
26 Placa da empresa imobiliária ................................................................... 102
27 Logística projetada pelo PRODETUR-NE II ............................................. 107
28 Associação Comunitária dos Moradores de Tatajuba – ACOMOTA ........ 109
29 Localização de empreendimentos turísticos no litoral .............................. 130
30 Estrutura do Boa Vista Resort & Conference Centre ............................... 132
31 Koala Passeios – Jericoacoara/CE .......................................................... 138
32 Roteiro turístico CE-PI-MA em Jericoacoara............................................ 139
33 Estrutura do Hotel Aventuras ................................................................... 140
34 Pousada Verde Folha............................................................................... 148
35 Casa da Marlene ...................................................................................... 148
36 Pousada Brisa do Mar............................................................................. 149
37 Pousada Santa Maria (em construção) ................................................... 150
38 Pousada Santa Maria (em funcionamento) ............................................. 150
39 Lagoa da Torta......................................................................................... 153
40 Barracas na Lagoa da Torta..................................................................... 153
41 Buggies de passeios vindos de Jericoacoara........................................... 154
42 X Regata Ecológica de Canoas de Tatajuba, Camocim – CE................. 157
43 Canoa vencedora da X Regata de Tatajuba ............................................ 157
ÍNDICE DE MAPAS
1 Município de Camocim – CE........................................................................... 33
2 Acessos a Tatajuba.......................................................................................... 35
3 Localização das vilas de Tatajuba e área do empreendimento
turístico................................................................................................................. 42
4 Área de Proteção Ambiental de Tatajuba, Camocim-CE
Lei Municipal Nº 559/94....................................................................................... 67
ÍNDICE DE QUADROS
1 Situação das posses existentes nas vilas de Tatajuba .............................. 101
2 Proposta de doação de terras para Tatajuba ............................................. 114
3 Equipamentos dos meios de hospedagem e complexos turísticos de
Camocim ........................................................................................................ 127
4 Meios de hospedagem de Tatajuba ........................................................... 147
5 Barracas de Tatajuba ................................................................................. 152
6 Trilhas e atrativos de Tatajuba ................................................................... 155
7 Síntese da história de Tatajuba, Camocim-CE........................................... 188
ÍNDICE DE GRÁFICOS
1 Principais atrativos turísticos de Jericoacoara............................................. 135
2 Comunidades conhecidas pelos residentes e turistas de Jericoacoara ...... 137
1. INTRODUÇÃO
Esta dissertação intitulada De Espaço Comunitário a Espaço do
Turismo – Conflitos e Resistências em Tatajuba, Camocim-CE analisa a produção e
a valorização do espaço litorâneo para o desenvolvimento do turismo, a partir de
conflitos, resistências e contradições na produção socioespacial das comunidades
de pescadores - especialmente em Tatajuba.
O turismo é temática de relevância para a Geografia, pois, nas últimas
décadas, constitui um dos principais elementos na produção e consumo dos
espaços. A modernidade cria inovações tecnológicas que se implantam nos lugares
selecionados pelo capital, como os do turismo, atendendo esta demanda específica,
que exige infra-estruturas como condição para dinamizar o mercado global, nacional
e local.
No litoral nordestino e, em especial, no cearense, foram instalados
resorts, aeroportos, grandes hotéis, parques temáticos, empreendimentos turísticos,
na tentativa de realinhar o espaço local ao locus global. Vários equipamentos
urbanos e técnicos foram implantados para modernizar o litoral, direcionando-o para
o turismo, tendo em vista os que podem usufruir dessa modalidade de consumo – o
lazer de viagem. A produção do espaço para o turismo, no entanto, entra em conflito
com os interesses das famílias que, por gerações, habitam secularmente no litoral,
sendo pressionadas a cederem suas terras. Os espaços comunitários são
expropriados pelos especuladores imobiliários para venda de loteamentos e
implantação de equipamentos turísticos, originando mais conflitos pela terra no
litoral, somados aos existentes, como o da defesa da pesca artesanal.
Os complexos turísticos são preferidos pelos turistas por serem
reconhecidos como lugares seguros, mesmo os alocados em regiões consideradas
“subdesenvolvidas”, como o Nordeste. O território litorâneo, antes espaço dos
chamados “povos do mar”, vivido por comunidades centenárias, é alvo de
15
descaracterização, quando moradores são expulsos de suas terras para dar lugar à
construção de empreendimentos turísticos e equipamentos de luxo. Esse processo
gera nova configuração espacial e evidencia territórios dominados por
empreendedores do turismo. Estas transformações modificam o cotidiano local. Se,
antes, predominavam relações diretas entre pescadores e suas famílias com a
natureza, agora, empresários, empreendedores e comerciantes aparecem como
mediadores dessas relações e desfrutam deste privilégio.
Os grandes empreendimentos turísticos alocam-se em áreas dotadas de
“valor” paisagístico, mas algumas, ocupadas por comunidades pesqueiras, portanto,
desarticulam estas primeiras ocupações. Apresentam a característica peculiar, de
receber turistas em suas dependências e ocupá-los com entretenimento, de tal
ordem que não sobre tempo livre para interação e contatos fora de suas
dependências, o que inviabiliza o conhecimento da comunidade local. O valor
paisagístico serve como ferramenta para atrair turistas que se encantam com os
cenários naturais e com a riqueza dos equipamentos turísticos, a maioria integrante
do circuito hoteleiro mundial. Estas estâncias de férias e do turismo das elites são
objetos de engenharia projetados especificamente para o consumo do lazer, e
constituem ícones do “turismo de sol e praia” no Nordeste brasileiro.
Com a valorização do litoral cearense pelo turismo, ocorreu aumento da
demanda de residentes para esse espaço, desencadeando o processo de ocupação
do litoral pelo veraneio (segundas residências) e, posteriormente pelos serviços
turísticos. Dessa forma, desenvolveu-se o fenômeno da turistificação
1
litorânea em
diversos países. O processo de turistificação do litoral é implementado pelas
políticas privadas e públicas, que preparam o território para receber os
empreendimentos turísticos. Faz-se necessário compreender o fenômeno turismo
litorâneo, assim como a transformação dos espaços pelo e para o turismo. O locus
de investigação desta pesquisa é o Município de Camocim e a comunidade litorânea
de Tatajuba, que ao complementarem o turismo de Jericoacoara, tornaram-se
1
A despeito de este neologismo não possuir, ainda, registro dicionarizado, é largamente utilizado no
jargão das disciplinas vinculadas ao estudo científico do turismo, motivo porque – se aceita – pelo fato
de não haver expressão correspondente na língua culta com a conotação que se lhe confere no
emprego, certamente, muito em breve, os lexicógrafos a oficializarão nas suas obras. O significado
deste conceito, no entanto, será definido nos próximos textos. Emprega-se a palavra, aqui, sempre
em itálico.
16
objetos de interesse da especulação imobiliária, das empresas e Políticas Públicas
de Turismo.
A escolha do objeto da dissertação decorreu da revalorização deste litoral
pelo novo Programa de Regionalização do Turismo, com a indicação desta região
para integrar o roteiro – Ceará-Piauí-Maranhão (CE-PI-MA). O litoral oeste serve de
exemplo de turismo regionalizado. Esta regionalização integra os roteiros turísticos
do litoral oeste cearense – com o delta do Parnaíba - e os lençóis maranhenses, cuja
intenção é viabilizar demandas de consumo para esta moderna mercadoria – o
turismo.
As políticas de regionalização, a nova produção espacial e os novos usos
contribuem para ensejar conflitos pela posse da terra e por espaços para a
implementação do turismo. Tatajuba apresenta-se como uma das comunidades que
enfrenta destemidamente a defesa de suas terras. Essa agressiva reordenação
territorial e a cooptação de lugares para a produção de espaços turísticos situou o
litoral cearense no menu do mercado mundial, ocasionando impactos
socioambientais. Novas áreas configuram-se, apesar de uma série de embates pela
apropriação e uso da terra.
As políticas de turismo ampliam ações em todo o litoral oeste, objeto da
disputa no mercado turístico globalizado, confrontando usos tradicionais com
atividades modernas. Como atividade econômica estimulada pelas políticas públicas,
o turismo passou a ser considerado um dos principais vetores da reprodução
socioespacial do litoral cearense, abrindo um campo de lutas entre os líderes
comunitários, grileiros, especuladores, empresas imobiliárias e os promotores do
turismo.
Camocim é revalorizado pelas empresas turísticas, que instalam seus
empreendimentos, especialmente grandes hotéis, resorts e centros de eventos e
lazer, como é o caso, do “Condado Ecológico de Camocim”. A alocação desses
empreendimentos turísticos exige extensões de terras da ordem de centenas de
hectares, normalmente terras que têm grande “valor” paisagístico e que passam por
litígio entre os que têm a posse e os que dizem ter o domínio, como é o caso das
17
quatro vilas que compõem Tatajuba, área ocupada secularmente por pescadores, e
que é ameaçada por empresário que se declara proprietário de todas as terras da
comunidade.
Nesse lugar, é vivenciado conflito fundiário entre grileiros, especuladores,
empresa imobiliária e residentes. Os primeiros buscam apropriar-se de terras para
seus empreendimentos e a comunidade luta para defender suas posses. O conflito
instigou parte dos residentes a resistir ao turismo de resorts e aos grandes
empreendimentos imobiliários. As reações são esboçadas mediante a crítica ao
turismo de elite, levando ao fortalecimento da organização dos residentes em
associações para luta e a defesa de suas terras.
A comunidade entende que este tipo de turismo é nocivo ao litoral, e, a
exemplo da Comunidade da Prainha do Canto Verde, busca desenvolver um turismo
de forma que beneficie o lugar, que ofereça oportunidades para a sobrevivência
local e participação na sociedade de consumo. Ressalta-se que a luta na
comunidade de Tatajuba não é homogênea, existindo os que acreditam que a
grande hotelaria trará benefícios imediatos. Estes colaboram com os especuladores,
identificando terras vendáveis e ajudando a enfraquecer a resistência comunitária. A
luta divide a comunidade, existindo residentes que são cooptados pelos interesses
exógenos e os que são contra a construção dos equipamentos turísticos. Buscando
entender a realidade de Tatajuba, foram levantados alguns questionamentos que se
apresentam como norteadores desta pesquisa, bem como se formulou os objetivos
que se pretendeu alcançar. Assim, interroga-se:
em que medida os empreendimentos turísticos provocam transformações sociais
e territoriais no litoral, revalorizando Tatajuba e contrariando os interesses da
comunidade?
Quais são as terras em disputa e quem são os especuladores?
Como ocorrem os conflitos de terras no litoral?
18
Quais são as principais estratégias das organizações comunitárias?
Quais são as políticas que reestruturam o litoral cearense para implantação dos
empreendimentos turísticos?
Como as políticas comunitárias podem romper com o modelo formal do turismo,
promovendo melhor distribuição?
Na construção e reconstrução do espaço, os conflitos são imanentes.
Nesse sentido, buscou-se compreender o fenômeno da produção e valorização do
espaço de Tatajuba, mediante o método de investigação etnográfico, com
abordagem qualitativa. Foram utilizados depoimentos, declarações, histórias de
vida, observação participativa e narrações sobre o fenômeno estudado, buscando
interpretá-lo à luz das teorias e conceitos.
Esta dissertação está apresentada em cinco partes. Primeiramente, foi
esboçado breve estudo sobre a metodologia etnográfica e a abordagem qualitativa,
como subsídios aos estudos geográficos das comunidades e do turismo litorâneo,
delineando os momentos e os passos da pesquisa. Em seguida, buscou-se
conhecer a comunidade de pescadores de Tatajuba, caracterizar o lugar, suas
práticas cotidianas, os atrativos locais e as paisagens como objeto da disputa e de
conflito. Na quarta parte, analisa-se a luta pela terra, utilizando-se conceitos
geográficos e econômicos, para compreender a organização, valorização e
especulação de terras e/ou a questão fundiária.
Ato contínuo, investiga-se a realidade de Tatajuba, elabora-se um
panorama das contradições do espaço e da política, refletido na produção de
espaços privatizados e dos espaços do turismo, e a inserção de Tatajuba nos
passeios e rotas turísticas regionais, bem como as tentativas de elaboração do
turismo comunitário como proposta alternativa. Enfim, chega-se a considerações que
foram extraídas do estudo teórico-empírico, apoiadas na síntese cronológica que
revela os conflitos e as resistências na comunidade de Tatajuba, Camocim-CE.
19
2. A TRILHA METODOLÓGICA
Certo, nós não mudaremos o mundo, mas podemos mudar o
modo de vê-lo. Isto é importante porque só assim poderemos
escapar do dogmatismo epistemológico e marcar um encontro
com o futuro (SANTOS, 2004, p. 40).
A pesquisa científica é um ato de elaboração. Com efeito, prepara-se um
caminho que possa contribuir para facilitar a apreensão da realidade empírica que
deverá ser teorizada, analisada e explicada. Nesse movimento, ensina Demo (1999,
v. 14, p.10), “é preciso construir a necessidade de elaborar caminhos e não receitas
que tendem a destruir o desafio da construção”. Assim, cada pesquisador encontra
uma trilha mais adequada aos seus objetivos.
A natureza do objeto de pesquisa sugere caminhos para escolha do
método, de investigação e interpretação, apropriado para análise. “É a natureza dos
problemas que determina o método, isto é, a escolha do método se faz em função
do tipo de problema pesquisado”, anotam Lüdke e André (1986, p.15). Admitiu-se
que a fase exploratória contribuiria para a definição da natureza do fenômeno
analisado. Deslandes (1994, p.32) define as etapas que determinam a exploração do
fenômeno, expressando que
a fase exploratória termina quando o pesquisador define seu objeto de
pesquisa, constrói o marco teórico conceitual a ser empregado, definiu os
instrumentos de coleta de dados, escolhe o espaço e o grupo de pesquisa,
define a amostragem e estabelece estratégias para entrada no campo.
Assim, a fase exploratória facilitou a constituição dos momentos da
pesquisa de campo e da escolha do caminho metodológico. Segundo Minayo (1994,
p.16), a metodologia “é o caminho do pensamento e a prática exercida na
abordagem da realidade. Neste sentido, a metodologia ocupa um lugar central no
interior das teorias e está sempre referida a elas”. No que se refere ao método,
20
Demo (op.cit, p.24), assinala que a “teoria coloca a discussão sobre concepções de
realidade”. O método situa a discussão sobre concepções de ciência, dos conceitos
explicativos da realidade.
Outra explicação sobre método foi retirada das concepções de Moraes e
Costa (1999, p.27), que mostram duas etapas desse processo – a de interpretação e
a da pesquisa / investigação:
O primeiro diz respeito à concepção de mundo do pesquisador, sua visão da
realidade, da ciência, do movimento etc. É a sistematização das formas de
ver o real, a representação lógica e racional do entendimento que se tem do
mundo e da vida. [...] método de interpretação é uma concepção para a
condução da pesquisa científica; é a aplicação da pesquisa científica; é a
aplicação de um sistema filosófico ao trabalho da ciência. Já o método de
pesquisa refere-se ao conjunto de técnicas utilizadas em determinado
estudo. Relaciona-se, assim, mais aos problemas operacionais da pesquisa
que a seus fundamentos filosóficos.
A explicação de Moraes e Costa (1999) mostra que o método de
interpretação é a concepção de mundo do pesquisador, a atitude política e o
posicionamento teórico da realidade analisada, que nesta pesquisa é fundamentado
pela teoria crítica da Geografia. Já o método de pesquisa refere-se aos instrumentos
e técnicas de coleta de dados e informações, que, para Minayo (1994) se denomina
metodologia, prática exercida na abordagem da realidade que influencia diretamente
no método da pesquisa, com esse propósito foi empregada a etnografia e a
abordagem qualitativa.
A compreensão dos fenômenos sociais não é algo fácil de realizar, pois a
realidade não acontece de maneira harmônica e homogênea nos lugares. Cada
agente e elemento que edificam o espaço singularizam os fenômenos sociais, daí
por que as pesquisas colaborarem na tentativa de revelar os fenômenos pela
constituição das análises (sínteses). Ressalta Seabra (2001, p.13) que “conhecer a
realidade não significa necessariamente desvendar a verdade de forma clara e
transparente, mas parte dela”. Os conflitos pela terra e as resistências em Tatajuba
– ajudam a desvendar a produção espacial do território litorâneo cearense pelo
turismo. Os recortes são necessários, pois a ciência “[...] não alcançando dominar o
21
todo, avança por meio da estratégia aproximativa das relevâncias discerníveis”
(DEMO, op. cit., p.33).
Neste segmento da dissertação, trabalha-se a formulação metodológica
para o desenvolvimento da pesquisa, assim como a narração dos momentos que
possibilitaram o caminhar da pesquisa e elaboração da análise. Nesse sentido,
priorizou-se como método de investigação a abordagem qualitativa, por intermédio
da etnografia, voltada para estudos de comunidades inseridas em conflitos pela
terra, acirrados pelo processo de captação de espaços litorâneos para o uso
turístico.
2.1 A Pesquisa Etnográfica e a Abordagem Qualitativa
As realidades sociais, traduzidas por suas expressões, símbolos e
culturas no espaço, são representações complexas. Para analisar processos sociais,
deve-se buscar a compreensão da totalidade para que os fenômenos não fiquem
descontextualizados, mesmo com o estudo de realidades microscópicas. Nessa
perspectiva, “necessita-se, sobretudo, formular conceitos que nos orientem a
harmonizar e integrar estratégias capazes de lidar com as complexidades do
processo social e os elementos da forma espacial”. Essa é uma das contribuições de
Harvey (1980, p.17) para a formulação de métodos de pesquisa da análise do
espaço geográfico.
O real, em sua plenitude, apresenta-se ao pesquisador como algo caótico
e complexo, que a pesquisa e a explicação buscam desvendar. Morin (2003, p.148),
estudioso francês da Teoria da Complexidade, estuda o processo dialético de
compreensão da realidade complexa e salienta que
22
[...] a complexidade é a união da simplicidade e da complexidade; é a união
dos processos de simplificação que são a seleção, a hierarquização, a
separação, a redução, com os outros contraprocessos que são a
comunicação, que são a articulação do que está dissociado e distinguido e
é o escapar à alternativa entre o pensamento redutor que só vê os
elementos e o pensamento globalista que vê o todo.
Na busca da compreensão da complexidade do empírico, subsidiada pelo
entendimento acerca de metodologia e método, e pela aplicação da fase
exploratória, optou-se pelo método de investigação etnográfico, com abordagem
qualitativa, sendo que os dados precisam de interpretação. Para Haguette (1987,
p.55), “os métodos qualitativos enfatizam as especificidades de um fenômeno em
termos de suas origens e de sua razão de ser”. A autora (idem, ibid) ressalta que os
qualitativistas garantem que essa abordagem é capaz de
[...] fornecer uma compreensão profunda de certos fenômenos sociais
apoiados no pressuposto da maior relevância do aspecto subjetivo da ação
social face à configuração das estruturas societárias, seja a incapacidade da
estatística de dar conta dos fenômenos complexos e dos fenômenos únicos.
No mesmo sentido, Lüdke e André (op.cit, p.13), embasados pelas
definições de Bogdan e Biklen (1992), explicam que
A pesquisa qualitativa ou naturalística envolve a obtenção de dados
descritivos, obtidos no contato do pesquisador com a situação estudada,
enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a
perspectiva dos participantes. Entre as várias formas que podem assumir
uma pesquisa destacam-se a do tipo etnográfico e o estudo de caso.
A metodologia etnográfica adequa-se à investigação de comunidades e
suas representações. Essa abordagem na Geografia possibilita enriquecer a análise
da realidade estudada pelos geógrafos, especialmente quando se trata da realidade
de uma cultura particular (NOGUEIRA, 2003). Para esta metodologia, a observação
participante, as entrevistas, a história oral e a história de vida são as principais
técnicas e foram aqui utilizadas, em momentos específicos da pesquisa. Vale
23
salientar que “as técnicas qualitativas contribuem para captação dos fenômenos,
dando sentido à noção de processo” (HAGUETTE, op. cit, p.75).
A metodologia etnográfica apresenta caminhos para a percepção das
características e estratégias das culturas
2
, contribuindo na análise das práticas
cotidianas das comunidades. No litoral cearense, identificações culturais foram
constituídas. As comunidades pesqueiras, mesmo com o pluralismo econômico
3
,
sobrevivem diretamente dos recursos da natureza. Nas cidades, o urbano produz
ligação secundária com a natureza, intermediada pelas atividades industriais que
criam produtos para serem consumidos, acrescido do turismo e do consumo de
serviços. Estas culturas entram em conflito quando uma tenta sucumbir a outra.
A metodologia etnográfica ajuda na percepção destas culturas e de suas
estratégias, contribuindo para compreensão de conflitos e resistências nas
comunidades, bem como o fenômeno da produção do espaço litorâneo. Oliveira
(2001, p.17) revela que “o método assinala, portanto, um percurso escolhido entre
outros possíveis. Não é sempre, porém, que o pesquisador tem consciência de todos
os aspectos que envolvem este seu caminhar; nem por isso deixa de assumir um
método”.
As análises etnográficas não se restringem apenas às comunidades
tradicionais e/ou rurais, mas também, aos grupos urbanos, de imigrantes, das
fábricas, de bairros, entre outros (BATZÁN, 1996). O autor (op.cit, p.18) revela que
nos estudos etnográficos destacam-se dois momentos fundamentais: o processo e o
produto. Ressalta-se o processo:
O processo etnográfico corresponde ao trabalho de campo, realizado
durante um tempo suficiente que permita conhecer a cultura de uma
comunidade pequena. Nesse processo assinalamos um dos momentos
2
Santos, J. L. d. (1983, p. 92) revela que “cada cultura é o resultado de uma história particular, e isso
inclui também suas relações com outras culturas, as quais podem ter características bem diferentes”.
Afirma ainda que a “cultura é um território bem atual”.
3
Maldonado (1993, p.29) explica que “é bastante comum em grupos pesqueiros a prática do
pluralismo econômico que consiste na coexistência ou alternância da pesca com agricultura, não
sendo raros inclusive grupos em que empregam a atividade agrária ou agropecuária”.
24
mais importantes, o acesso à comunidade, o diálogo com os informantes, o
registro de dados e a observação participante.
Baztán (1996, p.3) explica que “a etnografia é o estudo (graphos) da
cultura (ethos) de uma comunidade”. É conduzida pela observação participante,
realizada na escala local, “onde os geógrafos podem realizar estudos das relações
espaciais, no interior das localidades, e particularmente das relações diretas entre os
homens e o espaço onde moram” (SERRA, 1991). As etapas do projeto etnográfico
são: a delimitação do campo; a preparação e documentação, investigação (o
campo), a conclusão (elaboração da ruptura com o campo) e análise dos dados e
informações. A explicação exige uma introspecção no plano da abstração.
A Etnografia é uma metodologia essencialmente das ciências humanas e
sociais, da qual a Geografia faz parte. Busca-se a compreensão dos fenômenos
sociais na produção do espaço, do lugar, da paisagem, do território e do turismo.
Para tanto, a metodologia etnográfica colabora para a obtenção desses propósitos.
Outras características etnográficas são reveladas por Geertz (1989, p. 31), ao
acentuar que este método “interpreta o fluxo do discurso social e a interpretação
consiste em tentar salvar “o dito” num tal discurso da sua possibilidade de extinguir-
se e fixá-lo em formas pesquisáveis”. Geertz (idem, ibid), acrescenta, ainda, que tal
descrição pode ser microscópica.
Nas devidas proporções, a comunidade de Tatajuba, em Camocim-CE,
apresenta-se como uma dessas micro-realidades, diante da turistificação do litoral,
no entanto, para sua compreensão, é fundamental o embasamento teórico. Mostra
Geertz (op.cit, p. 38) que “em etnografia, o dever da teoria é fornecer um vocabulário
no qual possa ser expresso o que o ato simbólico tem a dizer sobre ele mesmo – isto
é, sobre o papel da cultura na vida humana”. A pesquisa da comunidade sugeriu o
método de interpretação crítico, fundamentado pelas categorias e conceitos de
comunidade, lugar, paisagem, território e turismo, acrescidos da compreensão da
complexidade da valorização, especulação e conflitos pela terra litorânea.
A constituição do objeto da pesquisa foi tecida pelas informações e dados
colhidos no campo e nas pesquisas institucionais, respaldadas nos conceitos.
25
Atente-se para o comentário de Gomes (2000, p.368p) sobre a abordagem científica
dos fenômenos, quando explica que
[...] as realidades são completamente explicáveis e a ciência deve ser capaz
de reconstituir os eventos a partir da enunciação de suas causas e de seus
efeitos. Trata-se de traduzir, em uma linguagem clara, objetiva e geral, o
movimento do real. O saber científico é sempre um produto da interface
entre um conjunto de regras determinadas, o método e o objeto.
Na interface do método de interpretação com o objeto analisado
valorizaram-se os aspectos qualitativos da pesquisa, mediante as fontes orais,
complementadas pelos documentos coletados. A pesquisa foi realizada por uma
trilha onde teoria e prática (empiria) caminharam concomitantemente. Nessa
perspectiva, Demo (op.cit., p.27) revela que:
Teoria e prática detêm a mesma relevância científica e constituem no fundo
um todo só. Uma não substitui a outra e cada qual tem sua lógica própria.
Nos extremos, os vícios do teoricismo e do ativismo causam os mesmos
males. Não se pode realizar prática criativa sem retorno constante à teoria,
bem como não se pode fecundar a teoria sem confronto com a prática.
A pesquisa revela a preocupação acadêmica em expressar a importância
da ciência, na reconstituição e interpretação histórico-espacial das realidades e da
metodologia, que, no dizer de Demo (op. cit., p. 24), significa que “todo cientista
criativo e produtivo marca sua presença no mundo científico não só pela teoria e por
vezes pela prática, mas também pela discussão metodológica”. O pensamento de
Carlos (1999, p.62) confirma esta idéia quando expressa que “o trabalho intelectual,
preocupado com a interpretação do mundo não produz sua transformação, mas é
um passo importante na desmistificação e na descoberta do sentido das
representações que permeiam a vida cotidiana no mundo moderno com seus
modelos de felicidade e bem-estar”.
26
2.2 Os Momentos da Pesquisa
As pesquisas de campo na comunidade de Tatajuba foram momentos
essenciais para apreensão dos relatos, das histórias e captação dos anseios do
povo desse lugar, que são, contingencialmente, narradas no desenvolvimento deste
estudo. O caminho metodológico revela detalhes da interação com os moradores, os
diálogos foram momentos fundamentais para complementação dos dados e
informações, além da elaboração da análise. Assim, foi possível estabelecer
relações, selecionar informantes e textos, levantar fatos e histórias, mapear os
campos de estudo, estabelecer os diálogos e fazer anotações de campo da história
oral.
Em agosto de 2004, em parceria com a organização não-governamental –
Instituto Terramar, viveu-se as experiências locais. Foram realizadas coletas de
depoimentos, por meio de entrevistas, com o objetivo de reconstituir a história da
comunidade e conhecer os seus conflitos com os especuladores imobiliários. Foram
diálogos demorados e prazerosos, que ajudaram na maturidade da pesquisadora
para a elaboração das análises.
“A entrevista pode ser definida como um processo de interação social
entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção
de informações, por parte do outro, o entrevistado” (HAGUETTE, op. cit., p.75). As
trocas de informações, a escuta da forma simples do modo de falar dos residentes
da comunidade, conduziram o contato informal para um diálogo, que resultou em
laços de amizade. Além do depoimento oral, o registro da comunidade, realizou-se
pela documentação fotográfica, que possibilitou pormenorizar detalhes da realidade
pesquisada e formar um arquivo imagético de paisagens, das atividades econômicas
(pesca, a coleta de mariscos, agricultura, comércio e o turismo), da infra-estrutura de
serviços na comunidade, das moradias, do lazer e da população.
No segundo momento, em novembro de 2004, teve-se a oportunidade de
aprofundar as observações participantes e conhecer uma das principais
manifestações culturais das comunidades de pescadores - a Regata Ecológica.
Registrou-se o fluxo de visitantes e turistas à comunidade. Observou-se a relação
27
entre visitantes e residentes. Compreendeu-se melhor os laços de afetividade
familiares, entre membros que, mesmo sem morar na comunidade, no período da
regata, retornam para visitar os parentes e prestigiar o movimento cultural.
Neste segundo contato, foram identificadas as lideranças, conquistadas
amizades, facilitando-se, assim, as descobertas. As entrevistas, filmagens e
gravações contribuíram para a reconstituição da história de luta pelas terras.
Trabalhou-se a história oral do lugar. Haguette (op.cit, p.83) explica que “a história
oral é uma técnica de coleta de dados baseada no depoimento oral, gravado, obtido
através da interação entre o especialista e o entrevistado; ator social ou testemunha
de acontecimentos relevantes para a compreensão da sociedade”. Esta
reconstituição histórica foi motivo de prazer para os informantes, que se sentiam
felizes de contribuir com a pesquisa, e se no início, pareciam inseguros,
desconfiados, temerosos, ao final do trabalho contavam com segurança e prazer, o
que lembravam sobre o lugar.
A terceira viagem realizou-se em fevereiro de 2005. Na ocasião colheu-se
informações para subsidiar o diagnóstico socioeconômico e cultural da comunidade.
Atividade desenvolvida pelo Instituto Brasileiro do Meio do Ambiente e Recursos
Naturais Renováveis – IBAMA, juntamente com o Instituto Terramar, que a
pesquisadora teve a oportunidade de participar. Tal diagnóstico tem por objetivo
implantar uma Reserva Extrativista – RESEX. Nesse momento, constatou-se graves
conflitos e desentendimentos internos, alguns moradores até, negaram-se a
responder a pesquisa. Foi possível perceber os conflitos internos em maior
intensidade, o que elucidou a análise das ações dos agentes sociais produtores do
espaço litorâneo, compreendendo seus mecanismos e estratégias na valorização e
especulação do litoral.
Neste terceiro momento, verificou-se que a comunidade não é um todo
harmônico, mas uma realidade de incessantes conflitos entre os que detêm poder e
os que são subordinados. Os primeiros articulam estratégias quase imperceptíveis
aos olhos comuns. Esta realidade é explicada por Silva (2001, p. 50), ao ressaltar o
papel das análises geográficas, explica que
28
[...] deverá preocupar-se com a natureza em todas as suas instâncias. O
espaço geográfico é constituído de totalidades capitalistas e não-capitalistas
tem a sua produção-reprodução realizada por meio do trabalho dos homens
dialeticamente coisificados para o sistema e humanizados para si mesmos,
onde a luta da natureza humana pela sua plenitude de vida se dá dentro e
fora da atividade produtiva, dentro e fora de si mesmos, do seu corpo, da
sua natureza.
Na apreensão da realidade, buscou-se indicadores e informações,
coletados em pesquisas institucionais e bibliográficas, pois, como revela Kourganoff
(1961, p.68), “todo resultado científico mergulha as raízes, ao mesmo tempo nos
trabalhos anteriores e nas descobertas feitas em outros campos”. Diz ainda esse
teórico que “o caráter cumulativo da ciência permite-lhe progredir pela comunhão
dos esforços de inúmeros pesquisadores. É uma obra coletiva” (op. cit., p.71).
Assim, a coleta de dados institucionais ocorreu nas seguintes instituições: Banco do
Nordeste – ETENE / BN, Secretaria de Turismo do Estado do Ceará – SETUR,
Fundação Instituto de Pesquisa e Informação do Ceará - IPLANCE, atual Instituto de
Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará – IPECE, Instituto Terramar, CDPDH -
Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos, Superintendência Estadual do
Meio Ambiente – SEMACE, NEA/IBAMA - Núcleo de Educação Ambiental do
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA,
IDACE – Instituto de Desenvolvimento Agrário do Estado do Ceará, entre outras.
Nessas instituições, foi possível realizar pesquisas, catalogações cartográficas e
documentais, além de coletar depoimentos e informações.
Utilizou-se, ainda, o acervo bibliográfico, fonográfico e hemerográfico do
Laboratório de Estudos do Território e Turismo – NETTUR/UECE e de outras
bibliotecas (UECE, UFC, CAEN). Documentos foram utilizados como o Plano Diretor
de Desenvolvimento Urbano de Camocim – PDDU, Plano de Desenvolvimento
Integrado do Turismo e Sustentável do Pólo Costa do Sol – PDTIS (Avaliação do
PRODETUR I), Diagnóstico Sócio-Ambiental Participativo, realizado pelo Projeto
Gestão Costeira Sustentável e o Dossiê do Conflito Fundiário da Comunidade de
Tatajuba de 2001-2003, documentos elaborados pelo Instituto Terramar, relatórios
de pesquisa – NETTUR, a Ata da audiência pública que ocorreu em 2001, em
Camocim, dissertações, teses, reportagens, sites, entre outros. Revelando a
29
importância dos documentos na pesquisa científica, Lüdke e André (1983, p.39)
explicam que:
Os documentos constituem também uma fonte poderosa de onde podem
ser retiradas evidências que fundamentam afirmações e declarações do
pesquisador, representam ainda uma fonte “natural” de informação. Não são
apenas uma fonte e informação contextualizada, mas surgem num
determinado contexto e fornecem informações sobre esse mesmo contexto.
Esses autores (op.cit, p.38) revelam que a análise documental é realizada
a partir de “quaisquer materiais escritos que possam ser usados como fonte de
informação sobre o comportamento humano”. Os documentos coletados foram
imprescindíveis para confirmação dos fatos e inferências da realidade do fenômeno
observado na pesquisa. Neste sentido, foi possível identificar, com maior evidência,
o conflito em todo o litoral cearense, sobretudo na comunidade de Tatajuba, em
Camocim, entre os anos de 1980 a 2006. Entende-se, como ressalta Silveira (2000,
p.23), a necessidade da “produção de um esquema histórico, não apenas lógico,
capaz de apreender a lógica da história ou, em outras palavras, a carência do real”.
Nesse sentido, elaborou-se um quadro com a síntese cronológica de todos os fatos
históricos, além das estratégias e dos encaminhamentos do conflito vivenciado em
Tatajuba.
A quarta viagem a Tatajuba ocorreu em janeiro de 2006, com a presença
da orientadora da pesquisa. Teve por objetivo complementar e conferir as
informações, coletar pontos no GPS
4
para elaboração de mapas da comunidade;
elaboração de filmagem para composição de vídeo sobre as comunidades
litorâneas; coleta de depoimentos da história de vida dos pescadores, lideranças e
proprietários de negócios turísticos; visita aos novos equipamentos turísticos
(pousada e barraca); elaboração de documentação fotográfica dos atrativos
turísticos; complementação do quadro da cronologia dos acontecimentos históricos e
dos conflitos em Tatajuba, a partir dos depoimentos dos moradores das lideranças
comunitárias. Realizou-se, ainda, pesquisa na comunidade vizinha, com o intuito de
conhecer as relações de Tatajuba com a internacionalmente conhecida Jericoacoara
e com a Sede do Município de Camocim.
4
Sistema de Georreferencialmento por Satélite, utilizado para marcação de pontos vetores na
elaboração de mapas em programas de computadores como o ArcView e CorelDRAW.
30
Nesse momento, em Tatajuba, reconstituiu-se um pouco mais das
histórias de vida dos habitantes. Captaram-se peculiaridades da vida do pescador,
além de se fazer a complementação de informações coletadas nas viagens
anteriores. Lembra Haguette que “a história de vida pode ser enfocada, pelo menos
dentro de duas perspectivas. A primeira, a mais usual, é tratá-la como documento e,
a segunda, como técnica de captação de dados” (op.cit., p. 69). Diz ainda a autora
que, “a história de vida atende mais aos propósitos do pesquisador que do autor e
está preocupada com a fidelidade das experiências e interpretações do autor sobre
seu mundo” (idem, ibid). As histórias eram contadas pelos residentes a pedido da
pesquisadora.
As tabulações dos dados coletados e a triagem dos depoimentos deram
continuidade ao exercício da prática analítica com o confronto entre os dados e
informações, buscando-se compreender a problemática pesquisada. Geertz (op.cit.,
p,29) releva que “o etnógrafo inscreve o discurso social: ele o anota. Ao fazê-lo, ele
o transforma de acontecimento passado, que existe apenas em seu próprio
momento de ocorrência, em um relato, que existe em sua inscrição e que pode ser
consultado novamente”. Seguindo no mesmo sentido, do registro da vida social,
Coulon (1995, p.111) confirma, ao dizer que:
Na medida em que essa corrente (etnográfica) tem como objetivo mostrar
os meios utilizados pelos membros para organizar a vida social em comum,
a primeira tarefa de uma estratégia de pesquisa etnometodológica é
descrever o que fazem seus membros.
O discurso social foi inscrito e exposto a partir da “historicização” do lugar
Tatajuba, caracterização de sua paisagem litorânea como objeto do turismo, o
processo de valorização e conflitos territoriais; as intervenções do Estado mediante
políticas do turismo, além dos conflitos e contradições do desenvolvimento da
turistificação dos espaços litorâneos. Este método ajuda a “tirar grandes conclusões
a partir de fatos pequenos, mas densamente entrelaçados [...]”, anota Geertz (op.cit,
p.38). Entende-se que o desvelar de uma comunidade como Tatajuba pode significar
mais um passo na formulação do conhecimento dos lugares turísticos, dos conflitos
31
de uso e ocupação pela terra litorânea, e, sobretudo, o papel do turismo nesse
contexto.
No corpo desta dissertação, apresentam-se os conteúdos, falas,
depoimentos e imagens da realidade pesquisada. Ressalta-se que os nomes dos
depoentes foram suprimidos para preservar suas identidades e posicionamentos.
Analisa-se com abordagem teórico-crítica, buscando conhecer, interpretar e analisar
a produção do espaço litorâneo para o turismo, tendo como principais atores os
moradores da comunidade de Tatajuba, em Camocim-CE.
3. TATAJUBA: O LUGAR E SUA PAISAGEM
Tatajuba é um lugar
1
onde predomina natureza conservada. Dunas,
lagoas, rio, gamboa, praia e mangues compõem o conjunto de morfologias desse
recanto, considerado paradisíaco para o turismo. Trata-se de uma comunidade
formada por pescadores e agricultores. No sentido leste-oeste, pelo litoral cearense,
a comunidade situa-se após a praia de Jericoacoara, no Distrito de Guriú, Município
de Camocim. Após Tatajuba, existem outras comunidades, a do Maceió, Coité,
Torta, Imburanas e das Moréias, antes de chegar no estuário do rio Coreaú, lugar
chamado de “Ilha do Amor”. No mapa 01, pode-se observar onde se localiza esta
vila de pescadores, no Município de Camocim.
Camocim é o penúltimo município do litoral oeste, quase fronteira com o
Piauí, não fora o desmembramento de Barroquinha. Neste município, localiza-se a
comunidade de Tatajuba, que dista 18 km da sede e está cerca de 340 km de
distância de Fortaleza, capital do Estado, indo pela praia. Camocim tem uma área
absoluta de 1.123,94 km² de extensão (IBGE, IPECE, 2005) e está subdividido
politicamente pelos Distritos de Amarelas, Sede (Camocim) e o Guriú. A Sede
localiza-se à margem esquerda do rio Coreaú, próximo da foz. “O Rio Coreaú divide
o Município quase ao meio, dificultando a ligação da sede com o distrito de Guriú,
localizado a leste, margem direita do Rio” (GOVERNO ...., PDITS, 2003). Camocim
limita-se ao norte com o oceano Atlântico; ao sul com Granja; ao leste com Bela
Cruz e Jijoca de Jericocoara e ao oeste com Barroquinha, conforme o mapa 01.
O caminho mais rápido para Tatajuba é pela praia de Jericoacoara. Leva-
se aproximadamente seis horas de viagem, saindo de Fortaleza. Por essa trilha
tem-se a oportunidade de observar as paisagens das praias cearenses, litoral oeste.
Após passar por Jericoacoara, percorre-se a distância de 12 km até a vila do Guriú,
atravessando-se de balsa (movida a força humana) o lago da Forquilha – conhecido
como lago do Urubu, percorrendo-se mais 18 km pela praia e após esperar a maré
baixar, atravessa-se a gamboa para chegar ao centro da vila de Tatajuba.
1
Para Santos (2002, p.152), “o lugar é, antes de tudo, uma porção da face da terra identificada por
um nome. Aquilo que torna o lugar” específico é um objeto material ou um corpo. Uma análise
simples mostra que um “lugar” é também um grupo de “objetos materiais”.
33
34
Um outro caminho é pela CE-085, denominada como rodovia estruturante,
chega-se ao município de Granja, no distrito de Parazinho, percorrendo 25 km de
estrada vicinal, passando por campos de dunas móveis e semifixas. Todos os
acessos são difíceis, portanto necessária a utilização de carros com tração e bons
condutores.
Os outros acessos são pela sede de Camocim, onde se pega a balsa que
faz a travessia pelo rio Coreaú, chegando à Ilha do Amor. Nessa ilha buggies são
alugados para fazer passeios turísticos para Tatajuba e Jericoacoara. O preço varia
entre setenta e cento e oitenta reais, dependendo do roteiro escolhido, conforme
informações locais (PESQUISA...., 2006). O mapa 02 apresenta o roteiro e as trilhas
mais utilizadas para se chegar a Tatajuba, realizadas durante as viagens de campo.
Nesse roteiro, são apresentados meios de transporte e alguns elementos que
constituem a paisagem desse lugar. O último caminho é geralmente feito pelos
próprios moradores, após pegarem a balsa, em Camocim, atravessam o rio Coreaú,
chegam no Sítio São Mateus onde existem carros particulares de moradores da
comunidade e adjacências, chamados de lotação, que fazem transporte coletivo.
Chegar a Tatajuba é uma grande aventura, não é tarefa simples. No
século XXI, quando todas as facilidades da tecnologia colaboram para que se
chegue a qualquer lugar, estas dificuldades são consideradas atrativos turísticos.
Os caminhos que levam à comunidade são caracterizados pela aventura, que se
deve conquistar. Foi no início do século XX que pescadores desbravaram o
caminho das dunas para encontrar em Tatajuba um lugar perfeito para a produção
da pesca e da lagosta. Os moradores asseveram que a pesca foi uma das principais
motivações da formação da vila. Os relatos coletados informam que as primeiras
famílias a chegarem nesse lugar vieram de núcleos de povoamento dos arredores,
atraídos pela pesca em abundância, o que estimulou a formação da comunidade.
35
36
Na fig. 1 e fig. 2, observam-se o rio Coreaú e ao fundo a paisagem da
beira-rio de Camocim e o barco que faz as travessias com os moradores, visitantes
e turistas que vão para a Ilha do Amor.
FIGURA 1- RIO COREAÚ
FIGURA 2 - Rio Coreaú e vista da Beira-Rio
de Camocim.
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./ 2004
FONTE - Jeovah Meireles, 2002
A história oral da comunidade tem por marco o ano de 1902, quando a
ocupação deu origem a dois núcleos: Cabaceiras de Cima e Cabaceiras de Baixo. A
primeira assim denominada por localizar-se à margem direita de uma gamboa, com
topografia mais elevada; e a segunda, no lado esquerdo, com topografia mais baixa.
A toponímia surgiu da existência de muitas plantas de cabaça (crescentia cujete) nas
proximidades da praia, registrada por uma das primeiras famílias, assentada ao
lugar - a Carneiro. A fig. 3 apresenta três pequenas casas de taipa desocupadas,
37
que simbolizam a origem da formação da comunidade, por suas antigas ocupações,
constatando, assim, a permanência, uso e ocupação das terras de Tatajuba.
FIGURA 3 - Antigas casas de pescadores de Tatajuba
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./ 2004
No ano de 1930, a comunidade decidiu mudar o nome do vilarejo de
Cabaceiras para TATAJUBA, em razão da abundância dessa árvore na praia. Girão
(1971, p.34), pesquisador da História cearense, descreve as características dessa
espécie vegetal assim:
a tatajuba, ou pau de tinta, é madeira de cor amarela, da família das
urticáceas (Chorophora tinctoria Gand), conhecida em Sergipe por moreira
e em Pernambuco por espinheiro bravo. O nome tem outras variantes -
tataíba, tatajuba, tataí, tatarema ... Fornece boa matéria corante amarela,
apropriada para tinturaria, sendo também utilizada em construções.
Em algumas localidades do litoral de Camocim, existe a árvore Tatajuba,
dando origem à denominação desse lugar, conforme se verifica na fig. 4, a árvore
Tatajuba (Chorophora tinctoria Gand).
38
FIGURA 4 - Árvore Tatajuba (Chorophora tinctoria Gand).
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./ 2004
Os depoimentos dos moradores revelaram que, na formação da
comunidade de Tatajuba, também fez parte um morador proveniente do Rio Grande
do Norte. Uma nativa do lugar, a simpática senhora apelidada de Tia Bio, da família
“Carneiro”, fez menção à primeira organização da comunidade e, como se dava a
moradia, pelo respeito entre os membros mais antigos que concediam permissão
para posse
2
de terras dos novos moradores. Na entrevista concedida em novembro
de 2004, a Sra. Maria Albuquerque Carneiro (Tia Bio), assim expressava:
Eu tenho 76 anos. Nasci e me criei aqui. Meu pai, ele se engraçou com
minha mãe e casou-se. Quando a gente veio morar lá no alto. Só que eu
não me lembro a quanto tempo, que tempo, que ano papai casou-se. Mas,
que nós veio pra cá, o filho mais velho é de 1927 e eu sendo de 1928. De
lá nós saímos do Alto e viemos pra cá, na era de 1934. Era, também, do
compade José Chico Gerevais. O morador aqui, era o papai, era o meu
padrim Timóteo. Só tinha esses, quando a gente chegou aqui, eu só
conheci uma casinha que o finado José Ivo tinha morado. Mas, os morador
foi o meu pai e meu padrim, dois irmão (Moradora de Tatajuba, PESQUISA
..., 2004).
A depoente refere-se ao local denominado Alto, retratando o lugar onde
se localizava a antiga Cabaceiras de Cima, e que, entre os primeiros moradores,
2
Diegues (2002, p.85) esclarece que, “para as sociedades tradicionais de pescadores artesanais, o
território é muito mais vasto que para os terrestres e sua “posse” é mais fluída. Apesar disso, ela é
conservada pela lei do respeito que comanda a ética reinante nessas comunidades”.
39
estava sua família. A identidade com o lugar revela-se ao contar a história de vida
dos moradores de Tatajuba. “Deste modo, a relação social realiza-se praticamente, e
esse processo revela uma articulação espaço-tempo iluminando o plano do vivido: a
vida cotidiana e o lugar” (CARLOS, 2004, p.47). Compreende-se que o “plano do
cotidiano do habitante constitui-se no lugar produzido para esta finalidade, e nesta
direção, o lugar da vida constitui uma identidade habitante-lugar” (CARLOS, idem,
ibid).
“Cada lugar é, à sua maneira, o mundo”, como enfatiza Santos (2002,
p.314). Nesse sentido, deve-se buscar a compreensão dos elementos que
singularizam os lugares, e ao mesmo tempo, os elementos que o aproximam do
mundo, encontrando os seus significados. Maldonado (1993), em estudos sobre
comunidades pesqueiras, ressalta que a noção de lugar é fundamental na análise de
comunidades e assinala que “o lugar, a existência local dos fenômenos tanto no
espaço físico como no espaço social é que lhes confere essência, significado e
transcendência. É localmente que nos situamos e é localmente que as coisas
acontecem” (1993, p.34). Acrescente-se que, localmente, se percebem no empírico
as contradições do mundo, e, ao dizer de Santos (2005, p.161), “hoje, certamente
mais importante que a consciência do lugar é a consciência do mundo, obtida
através do lugar”.
Os moradores de Tatajuba se denominam de comunidade tradicional de
pescadores. Para tanto, é importante compreender o sentido do que seja
“comunidade” e de “tradicional”; sendo esta explicada por Diegues (2002, p.89),
como “um dos critérios mais importantes para definição de culturas ou populações
tradicionais, além do modo de vida, é, sem dúvida, o reconhecer-se como
pertencente àquele grupo social particular”. Complementa Coriolano (2004, p.240),
ao refletir sobre o conceito de comunidade, revelando-o desta forma:
A comunidade é um grupo social residente em um pequeno espaço
geográfico cuja integração das pessoas entre si, e dessas com o lugar, cria
uma identidade tão forte que tanto os habitantes como o lugar se identificam
como comunidade. Assim, quando se fala da comunidade de Guajiru, de
40
Icapuí ou de Guaramiranga e de Canto Verde, ou Redonda, por exemplo,
fala-se ao mesmo tempo do povo e do lugar.
Atenta-se para as contradições da sociedade capitalista, reproduzidas nas
comunidades. Existe uma tendência em reportá-las pelos elementos de
solidariedade e cooperação entre seus membros, mas, para Souza, M. L. de. (2004,
p.63) “o realce à solidariedade, coesão e existência de interesses comuns,
desconhecendo esta realidade, tende a conduzir a ação social promovida ou a ser
promovida à reprodução da ordem social”. Ao buscar compreender as comunidades,
é fundamental considerar os seguintes princípios:
A comunidade não é realidade autônoma que possa se traduzir em
elementos distintos da própria sociedade na qual se situa. A sociedade, no
entanto, se expressa em situações sociais diversas, algumas das quais
assumem características específicas. A comunidade é uma dessas
situações. Nesse sentido, a compreensão da sua realidade supõe a
compreensão da realidade global. Por sua vez, também as suas
particularidades próprias atuam sobre essa realidade (SOUZA, M. L. de,
op.cit, p.64)
A comunidade de Tatajuba, mesmo com todas as dificuldades de acesso,
reproduz em proporções diversas as relações capitalistas. Diegues (2002, p.83)
explica o que são as “culturas tradicionais”, nesse contexto:
[...] as culturas tradicionais estão associadas a modos de produção pré-
capitalistas, próprios de sociedades em que o trabalho ainda não se tornou
mercadoria, onde há grande dependência do mercado já existente, mas não
é total. Essas sociedades desenvolveram formas particulares de manejo dos
recursos naturais que não visam diretamente o lucro, mas a reprodução
social e cultural; como também percepções e representações em relação ao
mundo natural marcadas pela idéia de associação com a natureza e
dependência de seus ciclos.
As práticas cotidianas nas vilas de Tatajuba evidenciam associação e
dependência dos ciclos da natureza, além de gradativa ampliação de seus meios de
sobrevivência e a inclusão no trabalho-mercadoria. Sua história, sua paisagem e seu
lugar são analisados, complementando-se com a documentação fotográfica.
41
3.1 As Vilas de Pescadores e suas Práticas Cotidianas
Na década de 1978, os moradores de Tatajuba tiveram que se deslocar
em virtude do movimento das dunas que migravam em direção às casas, do lado
leste para oeste, soterrando-as, até mesmo a Igreja, cujo padroeiro é São Francisco.
A gamboa
3
de Tatajuba teve seu curso deslocado e, resultou na divisão da vila
4
em
quatro núcleos: o de Tatajuba (também chamada de Nova Tatajuba), Vila São
Francisco, Vila Nova e Baixa da Tatajuba, favorecendo a passagem das dunas,
livrando as casas de futuros soterramentos.
A vila central de Tatajuba divide-se em dois núcleos, o que fica de frente
para o mar, nas áreas da praia e pós-praia, e o outro em cima dos terraços
holocênicos com cobertura florestal. Juntos, os núcleos, formam aproximadamente
80 casas. Essa vila é considerada o centro do povoado, onde estão concentrados os
principais serviços e equipamentos urbanos, como: posto de saúde (com dois
agentes de saúde); Escola Gregório Pedro Alexandrino (Ensino Fundamental e
Médio, além de cursos para Educação de Jovens e Adultos, com capacidade de até
150 alunos). A praça foi construída em 1994, com gerador para televisão
comunitária; comércio de óleo e gasolina (ver fig. 5), três barracas na praia; duas
mercearias; um bar; quatro pousadas e duas casas com quartos de aluguel para
turistas, ou seja, um vilarejo. No mapa 03, podem ser observadas a localização das
vilas de Tatajuba e sua distribuição espacial.
3
A gamboa é a influência das águas do mar adentrando o continente. Mistura-se com águas de
origem continental, formando um ambiente fluviomarinho, resultando no aparecimento do
ecossistema manguezal.
4
Pelas características apresentadas pelo aglomerado que constitui as vilas de Tatajuba, caracteriza-
se pelo IBGE (2000, p.17) como um povoado, isto é, “ aglomerado rural isolado que corresponde a
aglomerados sem caráter privado ou empresarial, ou seja, não vinculados a um único proprietário do
solo, cujos moradores exercem atividades econômicas, quer primárias, terciárias ou mesmo,
secundárias, no próprio aglomerado ou fora dele. O aglomerado isolado rural isolado do tipo povoado
é caracterizado pela existência de serviços para atender aos moradores do próprio aglomerado ou de
áreas rurais próximas”.
42
43
FIGURA 5 - Ponto de venda (óleo e gasolina)
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006
A comunicação é realizada por meio do telefone público, instalado em
1998, dez telefones celulares, pelas estações de rádio de Camocim que, ao receber
cartas, avisam aos moradores, para buscarem na rádio ou em casas de parentes.
Entre vizinhos, a comunicação acontece pelas conversas na calçada, ao cair da
tarde, e pelos diálogos entre os pescadores ao contar suas aventuras e perigos
vivenciados no mar.
O posto de saúde fica ao lado do colégio. Um médico, do Programa
Saúde da Família-PSF, realiza consultas na comunidade duas vezes por mês,
acompanhado por uma auxiliar de enfermagem e uma atendente. Os casos mais
sérios são encaminhados para a sede de Camocim ou Sobral. O único reforço
recebido pela comunidade é a existência de dois agentes de saúde, um mora na
Baixa Tatajuba e outro em Vila Nova. Com a dificuldade de atendimento médico, são
as rezadeiras, curandeiras que “curam” pela fé dos moradores, o que contribui para
minimizar problemas, receitando remédios caseiros, utilizando ervas medicinais
como: corama, malva, gergelim, casca de laranja, entre outras. A fé é manifestada
pela presença de duas igrejas, uma católica, cujo padroeiro é São Francisco, e uma
evangélica.
44
Em Tatajuba os moradores sobrevivem, principalmente, da pesca, coleta
de mariscos, comércio e trabalhos públicos na escola e no posto de saúde. A
agricultura nessa área, de praia e pós-praia, não possui expressividade, em razão
das condições de baixa fertilidade do solo. No núcleo central, estão duas das
associações comunitárias, a ACOMOTA – Associação Comunitária dos Moradores
de Tatajuba e o Conselho Comunitário, além do Conselho Litúrgico, da Igreja
Católica. Os compromissos religiosos são tidos como lazer para a maioria da
comunidade.
Na comunidade o lazer é mediado pela cultura dos povos do mar e a
cultura urbana. Como necessidade básica, o lazer é realizado nos banhos de mar,
caminhadas nas praias, regatas, festas do padroeiro São Francisco, nos forrós,
festas juninas, além das conversas nas calçadas. Na figura 6, observa-se a igreja e
na figura 7, a praça, utilizada para o lazer na comunidade.
FIGURA 6 - Igreja católica, Tatajuba- Praça de Tatajuba CE FIGURA 7 -
FONTE - E ziane Mendes, Nov./2004
FONTE- Eluziane Mendes, Nov./2004
lu
A sociedade de consumo transforma o lazer em mercadoria, passando a
ser denominado de turismo. O turismo necessita de serviços e equipamentos, tais
como pousadas, hotéis, parques, resorts. Estes equipamentos vêm chegando a
Tatajuba e muitos outros estão projetados para serem implantados em Camocim.
A TV é um elemento difusor de informações na comunidade. A instalação
da energia elétrica, em 1997, beneficia 70% do povoado. A luz do luar ainda ilumina
45
a comunidade, acompanhando moradores e visitantes nas noites, pois não existe
energia pública entre as casas das vilas. Onde há energia elétrica, 60% possuem
televisores e existem cerca de 15 antenas parabólicas na comunidade, sendo essa
uma das principais diversões nas noites das famílias, e, ainda, um difusor de idéias
urbanas. Ao reportar-se à importância da TV, no cotidiano das famílias, Carlos
(op.cit.,p.59-60) revela que:
O universo da vida cotidiana se transforma abruptamente, novas relações,
mas também novos objetos e valores. A invasão da TV que aos poucos vai
assumindo lugar importante na vida das pessoas ocupando o lugar de
“honra” na sala de visitas, torna-se o centro de todas as atenções e
cuidados, diante dela os olhares se fixam, lábios selam-se e a imagem
preenche ausências – seu todos poder mágico é contagiante.
Ver TV é um dos lazeres dos residentes, mas, apesar de sua presença,
algumas atividades de subsistência são consideradas lazer, no instante em que, as
práticas de pescar, coletar e plantar são realizadas com satisfação e prazer. É o
próprio pescador que comanda seu ritmo, associando-se à cadência da natureza.
Necessidade básica, o lazer é vivido no cotidiano, por intermédio do uso
dos lugares, como apropriação do vivido, da praia, lagoas, entre outros elementos
presentes na comunidade. A prática do lazer é realizada nas praias e lagoas. O fazer
turismo configura-se como “uma forma elitizada de lazer. É uma modalidade de
entretenimento que exige viagem, deslocamento de pessoas, consumo do tempo
livre e o uso de um equipamento por mínimo que seja como transporte e hotéis”,
(CORIOLANO,1998, p.115), e somente os que detêm poder aquisitivo podem se
servir dessa mercadoria, constituindo-se elementos presentes na relação de troca
para o lazer. Os turistas na comunidade são originados de diversos Estados e
países, que chegam em Jericoacoara e realizam passeios a Tatajuba.
A educação formal dos moradores da comunidade é vivenciada na Escola
Gregório Pedro Alexandrino, em Tatajuba, com dez funcionários, sendo que sete são
professores, dentre eles cinco concursados. A escolaridade desses profissionais:
dois com ensino médio científico, um com pedagógico, um com nível superior em
Pedagogia e três fazendo faculdade de pedagogia na UVA – Universidade Vale do
46
Acaraú. A Educação de Jovens e Adultos-EJA (8ª e 7ª séries) e Ensino Médio é um
dos programas realizados na escola. Os diretores afirmaram que houve cerca de
15% de evasão escolar, em 2004. Declararam que os principais motivos são: a
distância da escola e a falta de preocupação dos pais com os filhos adolescentes. O
bolsa-escola contribui para permanência dos alunos na escola. Existe conselho
escolar, formado pelos pais, professores e alunos (15 pessoas), cujo objetivo é
fiscalizar o processo pedagógico local.
As principais dificuldades declaradas pelos entrevistados, quanto à
educação foram: irregular acompanhamento pedagógico; os livros didáticos das
séries subseqüentes não chegam durante o ano letivo; existe pouca participação dos
pais na escola; problemas com drogas fora da escola. A questão ambiental é uma
preocupação de poucos professores, embora haja o planejamento mensal com
coordenadores da sede, nem tudo funciona a contento. Existe a necessidade de
capacitação de professores sobre a temática ambiental, a estrutura da escola é
precária, não tem sala de professores, sala de leitura, nem almoxarifado. Essas
declarações foram feitas ao Núcleo de Educação Ambiental – NEA/ IBAMA, em
2005, que luta pela capacitação dos professores para Educação Ambiental
(COELHO, 2005).
A Vila Nova situa-se na zona mais rural de Tatajuba. Estende-se pelos
tabuleiros pré-litorâneos em uma vasta extensão de terra, onde a fertilidade do solo
é melhor. O delegado do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Camocim informou
que existem 04 sindicalizados em Vila Nova. Nas vilas existe o Projeto Coqueiral,
com área de aproximadamente 12 ha para 10 pessoas, atualmente com 06
beneficiárias.
Os moradores vivem principalmente da agricultura (feijão, macaxeira,
batata doce, mandioca, entre outros), coleta e criação de animais de pequeno porte.
Algumas casas de farinha existem na comunidade. É próximo desse lugar, onde está
47
instalado um dos terrenos da empresa imobiliária
5
. A presença dessa empresa está
modificando o cotidiano dos moradores e muitos dizem até que a Associação de Vila
Nova foi criada pela própria empresa. Nessa vila há energia elétrica e água
encanada. Lá foram construídas cerca de 70 casas, sendo a segunda maior vila de
Tatajuba. A sobrevivência é retirada de atividades tradicionais. As fig. 8 e 9
mostram estas atividades de subsistência.
FIGURA 8 - Casa de farinha – Vila Nova FIGURA 9 - Agricultura de subsistência
FONTE- IBAMA/NEA, Fev./2005 FONTE - IBAMA/NEA, Fev./2005
Um dos agentes de saúde, que trabalha há dezesseis anos em Vila Nova,
informou que os moradores se utilizam de várias plantas medicinais no auxílio da
cura das doenças. Acreditam que essas plantas combatem a gripe, além do chá de
carnaubinha e o soro caseiro para os problemas no intestino. Dependendo do
período do ano, chuvoso ou seco, os principais problemas são as gripes e diarréias,
principalmente nas crianças. As vacinas básicas, programas de prevenção e
medicamentos de gestantes, hipertensos e diabéticos, são fornecidos regularmente.
Além disso, a equipe do PSF – Programa de Saúde da Família visita a comunidade
duas vezes por mês. Quando passa por outras localidades, faz o atendimento rápido
no posto. Os moradores declaram que, quando ocorrem problemas mais graves,
devem se deslocar para Camocim ou Sobral. Apesar das dificuldades de
5
Empresa Vitória Régia Empreendimentos Imobiliários LTDA. que se diz proprietária de 5.275,450
hectares de terra, compreendendo toda área das vilas de Tatajuba, estendendo-se pelo distrito do
Guriú. A história do conflito será retratada em detalhes, no segmento 4, da dissertação.
48
atendimento médico, os moradores apresentam vigor e robustez. Alguns declaram
que é resultado da vida mais sossegada e da proximidade com a natureza.
A Baixa da Tatajuba assemelha-se às características da Vila Nova. Uma
área constituída por aproximadamente 30 casas de moradores, um bar, uma escola
de Educação Infantil e Ensino Fundamental. Nessa área, existem terrenos com
projeto de plantação de coqueiros organizado por institutos brasileiros, em parceria
com instituição alemã, criaram os projetos PRORENDA – RURAL. As fig. 10 e 11
mostram projetos de plantação de coqueiros na Baixa da Tatajuba.
FIGURA 10 - Paisagem da Baixa da Tatajuba FIGURA 11 - Projetos do PRO-RENDA
FONTE- IBAMA/NEA, Fev./2005 FONTE - IBAMA/NEA, Fev./2005
Na Baixa da Tatajuba, atua a Escola José Maria Veras, contando com
seis funcionários, sendo que dois professores são concursados. Na escola, a
evasão em 2003 ocorreu por volta de 5%. Afirmaram que não existem problemas
com drogas. Relataram que quando não há merenda escolar, os alunos faltam com
mais incidência, acrescenta-se que a estrutura física do prédio é precária. A despeito
do meio ambiente, nesta vila ocorrem as mesmas dificuldades da vila de Tatajuba,
pois não existe capacitação, não se discute sobre meio ambiente, turismo e nem
sobre os conflitos fundiários. Buscam gerir a escola, incluindo a participação das
famílias.
49
A Vila São Francisco, pequeno povoado, com 15 construções de taipa e
alvenaria, é o principal resquício da antiga Tatajuba, antes do soterramento pelas
dunas. Localiza-se em cima de um complexo de dunas semifixas e móveis. É a vila
mais rústica, não possuindo energia elétrica, nem água encanada. Uma cacimba
comunitária abastece água do consumo. Os moradores são pescadores, alguns
aposentados, agricultores e comerciantes de coco, que é a principal agricultura
desenvolvida.
Na vila São Francisco, conta a história oral, as terras foram doadas para o
santo São Francisco pelo senhor João Gregório, considerado um dos fundadores de
Tatajuba. Com o deslocamento da comunidade em 1978, em conseqüência da
migração das dunas, apenas algumas paredes da antiga igreja e um tamarindeiro
resistiram à passagem da duna. Essa vila enquadra-se no conceito da teoria de
Santos sobre rugosidades no espaço
6
, portanto essa vila é a rugosidade da antiga
Tatajuba. Faz parte do roteiro do passeio turístico dos bugueiros vindos de
Jericoacoara, que, ao chegarem à comunidade, observam os resquícios dos
alicerces da Igreja soterrada e narram o fato histórico de Tatajuba, surpreendendo
os turistas.
O soterramento da antiga vila e o seu conseqüente descolamento dividiu
as vilas de Tatajuba. Facilmente eles migram e deslocam-se, em virtude das
condições e dinâmica natural, logo vão se adaptando. Na fig. 12, observa-se uma
barcana
7
, denominada pela comunidade duna “branca” e duna “encantada”, cuja
migração foi responsável pelo soterramento da antiga Tatajuba e o conseqüente
deslocamento e subdivisão da comunidade nas quatro vilas.
6
No dizer de Milton Santos (2002, p.43), “chamamos de rugosidade ao que fica do passado como
forma, espaço construído, paisagem, o que resta do processo de supressão, acumulação,
superposição, com que as coisas se substituem e acumulam em todos os lugares”.
7
Para Guerra (1972, p.50; 142), as dunas são “montes de areia móveis, depositadas pela ação do
vento dominante”. Sendo as dunas barcanas “uma forma de duna semelhante a uma foice”. Para
alguns pesquisadores, as dunas barcanas são assim denominadas por se assemelharem a barcas.
50
FIGURA 12 - Vista da duna Branca – Tatajuba - “Duna encantada”
FONTE - Disponível em: <www.tatajuba.com.br/site/cfm/index_interna.cfm>, acesso
em 20/10/2004.
As dunas barcanas são consideradas pela comunidade como encantadas.
Muitas das carnaúbas foram soterradas e até o curso da barra da gamboa foi
modificado, alterando todo o ecossistema local, diminuindo a influência das marés.
O resultado desse processo, relatado pelos moradores, foi a diminuição da produção
de camarões que existia na gamboa. Várias são as lendas contadas a partir do
deslocamento da chamada “duna branca”. No relato do morador da Vila São
Francisco, narra as histórias do imaginário popular:
[...] se o morro não fosse encantado, ele já tinha saído daqui. Ele não existia
aí não. Ele só pode ser encantado. Tem gente que vê um navio cheio de luz
ligada durante a noite. Quando eu era pequeno, cansei de ouvir barulho de
gente tocando violão (Pescador da Vila São Francisco, PESQUISA ...,
2005).
Em 2003, habitavam nas quatro vilas: Tatajuba, Vila Nova, Baixa da
Tatajuba e Vila São Francisco, cerca de 180 famílias, conforme dados fornecidos
pelo agente de saúde da comunidade, compondo uma população de
aproximadamente mil habitantes, entre adultos, jovens e crianças, com maioria de
jovens. No depoimento da ex-agente de saúde, coletado em 2004, soube-se que o
número de nascimentos diminuiu desde a década de 1990. A agente relata os
possíveis motivos:
Antigamente, a média era de uns dez filhos por família. Hoje, são apenas
quatro, veio diminuindo. Talvez dos anos 90 pra cá. O motivo principal
talvez seja porque os anticoncepcionais ficaram mais fáceis. Por exemplo,
aqui no posto de saúde, em 1994, quando foi construído. E com dois ou três
51
anos depois começaram a fazer planejamento familiar. A quantidade de
crianças diminuiu (Moradora de Tatajuba, 26 anos, PESQUISA ..., 2004).
As vilas da comunidade de Tatajuba são compostas, de modo geral, por
pessoas modestas e de poucos recursos técnicos e financeiros. A maioria orienta-se
pelo ritmo das marés, tanto para produção da pesca como para conseguir realizar o
deslocamento de uma vila para outra. Quando necessitam de recursos técnicos,
deslocam-se até a Sede ou a do Município de Sobral, que dispõem de melhor infra-
estrutura de serviços (bancos, hospitais, escolas, correios, rádio, centro de cidadania
para retirar documentos ou fazer cadastramentos do governo). Em certos casos,
quando não conseguem suprir suas demandas, deslocam-se a Fortaleza.
As mulheres de Tatajuba, em sua maioria, trabalham na agricultura. Seus
maridos são pescadores, mas também responsáveis pela colheita, ajudam no
cultivo, quando não estão no mar. A respeito da agricultura realizada pelas famílias
de pescadores, Maldonado (op.cit., p.28) revela que “a questão do campesinato dos
pescadores passa por dois vieses: um deles é o modo como a sua situação
econômica é modelada pela dependência dos recursos marinhos e dos recursos
agrários. O outro é a prevalência praticamente universal da família como unidade de
consumo”. Apesar de que, o excedente da produção da agricultura é vendida
internamente e do pescado para atravessadores, complementado a subsistência.
Os filhos ajudam nos trabalhos de seus pais. Algumas crianças
comportam-se como adultos, pelas atividades que exercem. Configuram-se como
homens em miniaturas. Com a participação no trabalho, as crianças tornam-se
maduras e com grande senso de responsabilidade. As brincadeiras de crianças,
como o jogo de bola, o banho na gamboa, os barquinhos, a boneca e a brincadeira
de roda são presentes em suas vidas. Desde a década de 1990, foram agraciadas
com melhorias no sistema de ensino. Alguns filhos da terra ainda persistem no
sonho da mudança de vida em outros lugares.
A maioria dos jovens não tem trabalho formal, vivendo da pesca,
agricultura, trabalhos na escola, posto de saúde, serviços gerais e nas barracas que
52
ficam na Lagoa da Torta, ainda pertencente a área de Tatajuba. Lugar onde existe
mais oportunidade de trabalho, além das ocupações nas pousadas, embora de baixo
fluxo. O trabalho como direito à sobrevivência é o principal problema social apontado
pelos moradores de Tatajuba. Nesse aspecto, a natureza é a maior aliada, sendo
dela retirados o alimento, a água, a madeira, o barro, entre outros bens
fundamentais à sobrevivência e à moradia.
A água foi encanada em Tatajuba, por intermediação do projeto do
Conselho Comunitário local, em 2002. Os moradores pagam uma taxa de R$ 7,10,
correspondente ao pagamento da energia utilizada na bomba, pela água e pelo
operador. O sistema de abastecimento é gerido pelo SISAR – Sistema Integrado de
Água e Esgoto. O presidente do Conselho informou que água é proveniente do
lençol freático. Disse com entusiasmo que a “água vem de um poço profundo. Mas a
água é salobra, o nosso espaço é 500m, quase uma ilha, então, ter água doce
ainda, é um milagre!” (Liderança comunitária, 35 anos, PESQUISA ..., 2005).
Dez buggies e duas camionetas fazem o transporte coletivo, cobrando
taxa de seis reais, por trajeto, ida e volta, feito pela praia e mais um real é pago pela
balsa que atravessa o rio Coreaú para se chegar à sede de Camocim. A própria
Prefeitura se utiliza desse transporte para serviços públicos. A maioria dos
moradores reclama dos preços do transporte, pois a renda média é um salário
mínimo mensal. Alguns moradores recebem a ajuda do governo como o bolsa-
escola, quinze reais mensais, que devem ser retirados nas agências bancárias de
Camocim. Desse modo o benefício é reduzido, pois só para o transporte gasta-se
quase 50% do valor que deveria ser ganho.
A simplicidade do povo é retratada em suas práticas. Parte da população
queima o lixo ou enterra. De forma precária, um morador, pago pela Prefeitura de
Camocim, coleta e transporta para um terreno baldio que, inadvertidamente, fica
próximo ao mangue. Apenas no núcleo central da vila (Tatajuba) existe esta coleta
de lixo, duas vezes por semana. Não há conhecimento sobre os ambientes e o
ecossistema manguezal, e de sua importância para manutenção do equilíbrio das
53
espécies marinhas. Outra questão relacionada à saúde pública é a ausência de
esgotos sanitários, poucos são os que possuem fossas e banheiros com sanitário.
A renda dos moradores é proveniente da pesca de peixe e lagosta,
serviços públicos, aposentadorias, comércio de alimentos e, atualmente, pelo
turismo com as barracas e pelas hospedagens. “A pesca, tipicamente artesanal, é
uma atividade propulsora da economia local, sendo realizada com maior intensidade
no mar e de forma alternativa nas lagoas interiores existentes, destacando-se entre
estas o Lago Grande, Laguinho da Torta, Lagoa das Moréias e Lagoa das Baixas”.
(IBAMA, 2001). Os pescadores de Tatajuba fazem parte da Z1 de Camocim (zona
de pesca) e mantém capatazia na comunidade com 143 pescadores associados,
conforme dados fornecidos no Diagnóstico Socioambiental Participativo de Tatajuba
(TERRAMAR, 2003). Depoimento de morador de Tatajuba revela os problemas na
pesca:
Tatajuba tem menos moradores que nos anos 1980, muitos foram embora
para Camocim. A pesca do peixe da década de 1980 para hoje caiu uns
75%. Usavam rede afundiada. Eram 35 canoas decaiu para 12. As barracas
utilizam a produção de Camocim, onde utilizam mais os barcos e botes. As
canoas não pescam no período de julho a dezembro, abandonando apenas
no final de dezembro. O forte do povo de Tatajuba é a pesca, quando
diminuiu muitas famílias foram embora. Antes tinha muitas festas na
comunidade. A pesca só dá pra sobrevivência. O município de Camocim
sobrevivia da pesca. Atualmente, Camocim sobrevive do dinheiro dos
aposentados. Todas as grandes empresas fecharam. A pesca é uma
atividade de risco. Em 1996, parei de pescar (Ex-pescador de Tatajuba, 35
anos, PESQUISA ..., 2005).
Para este morador a pesca artesanal caracteriza-se como uma atividade
de risco. A produção do pescado em Tatajuba diminui ao longo dos anos, muito do
que se produz é para a subsistência. A pesca é a atividade que tem como objetivo
retirar, colher, apanhar, extrair ou capturar quaisquer recursos pesqueiros em
ambientes aquáticos, podendo ser de caráter científico, econômico/comercial,
amadorístico ou de subsistência. A pesca extrativa marítima do Brasil, segundo a
Comissão Nacional Independente sobre os Oceanos (1998, p.103), pode ser
classificada nas categorias de subsistência, artesanal e industrial.
54
- A pesca de subsistência é, exclusivamente, para obtenção de alimento,
não tendo, pois, finalidade comercial de negociação em grande escala. É praticada
com técnicas rudimentares, no mar, nas lagoas, gamboas e rios acessíveis aos
residentes em comunidades tradicionais de pescadores. É prática também de
mulheres como complementação à alimentação diária. Para alguns, esta é mais uma
conquista da mulher, pois, em tempos remotos, esta não se submetia a essa
atividade. Para outros, pode significar novas formas de exploração feminina. Afinal,
trata-se de um serviço árduo e de poucos rendimentos, que, na divisão do trabalho,
se destinava somente aos homens.
- A pesca artesanal abrange o segmento comercial. Em muitos casos, há
vínculos empregatícios com a indústria de processamento ou comercialização do
pescado. Utiliza embarcações de pequeno ou médio porte, com propulsão
motorizada ou não, em áreas próximas à costa. As embarcações são geralmente de
madeira e a captura é capaz de produzir volumes pequenos ou médios de pescado.
Constitui a maior parte da frota pesqueira nacional e tem participação de até 60% do
total das capturas.
No Ceará, a “produção artesanal realiza-se com a participação efetiva dos
pescadores da unidade de produção, mas não pressupõe a posse coletiva das
navegações (um dos instrumentos utilizados na pesca) e nem a divisão eqüitativa
dos resultados do trabalho” (LIMA, 2002, p.113). Isso significa que, mesmo não
sendo produção com relações capitalistas de assalariamento, há exploração do
proprietário da embarcação sobre o trabalho dos demais pescadores, fatos
constatados em Tatajuba.
- A pesca industrial costeira é realizada por embarcações de mais
autonomia, capazes de operar em áreas distantes da costa, com exploração de
recursos pesqueiros, que podem ser relativamente concentrados em áreas
geográficas. Dispõe de apetrechos de captura mecanizados, propulsão de motores a
diesel, de potência mais elevada, e equipamentos eletrônicos de navegação e
55
detecção de cardumes. O material do casco pode ser de aço ou madeira. Esse tipo
de pesca está inserido no circuito mundial de produção.
A pesca de alta tecnologia não existe na comunidade de Tatajuba,
restringindo-se à extração artesanal. No dizer de Santos (2004, p.22), o circuito
superior da produção, “originou-se diretamente da modernização tecnológica e seus
elementos mais representativos hoje são os monopólios. O essencial de suas
relações ocorre fora da cidade e da região que os abrigam e tem por cenário o país
ou o exterior”. No Ceará, a pesca industrial, incluída no circuito superior da economia
pela caracterização de Santos (2004), teve emergência, na década de 1970,
declinando, em termos de captura, sendo esse período o início da tendência de
proletarização dos pescadores, conforme anuncia a Comissão Nacional
Independente sobre os Oceanos (1998).
A maioria das comunidades pesqueiras tem, como base econômica de
maior rendimento, a pesca da lagosta. No período do defeso, os pescadores
cadastrados nas colônias recebem um salário mínimo equivalente a cada mês de
ausência da pesca. Na zona costeira cearense, além da pesca, pratica-se a
aqüicultura, como a maricultura, técnica de criação de frutos-do-mar em fazenda
marinha, assim como a ostricultura e a carcinicultura com a criação de camarões em
viveiros. Esta última é praticada no Ceará desde a década de 1980, como atividade
lucrativa. É fator de atração de vários investidores para o Estado, com a implantação
intensiva de criatórios de camarões. É, no entanto, uma atividade criticada por
ambientalistas e pesquisadores por degradar os estuários, acarretando
desmatamento de mangues e depositação de elementos químicos em águas
marinhas. Camocim, Acaraú, Fortim e Aracati são os municípios de mais atividades
de carcinicultura, sendo esta última, atividade não praticada em Tatajuba.
Em Tatajuba, a pesca artesanal é praticada com 20 canoas, que
pertencem a um projeto realizado pela ACOMOTA – Associação dos Moradores de
Tatajuba, por meio do qual os pescadores compraram as embarcações e pagam
com prestações mensais. Cada canoa leva 4 pescadores para o mar; todos
56
trabalham em cooperação e solidariedade. Características ressaltadas nos estudos
etnográficos sobre as comunidades pesqueiras, como os de Maldonado (op.cit.,
p.80), revelam que:
Por sua natureza cooperativa e pelo distanciamento da terra, a pesca é uma
atividade na qual a confiança e a competência dos participantes constituem
condições da produção. O mar não só sugere risco e conflito, como exige
que haja harmonia entre os pescadores, para que a cooperação possa ter
lugar. Essa cooperação é feita também do senso de igualdade que
caracteriza os pescadores e que termina por se estender até o
desembarque e à fala dos pescadores sobre si mesmos quando em terra.
Os riscos do mar, no extremo oeste do Ceará, sugeriram a utilização das
canoas, em vez das jangadas. Um pescador do lugar revelou (2005) que “a canoa
faz parte da tradição. Antigamente faziam a canoa de facão. Com o tempo
aumentaram o tamanho da canoa, e isso diminuiu a quantidade de acidentes”
. No
litoral leste, utilizam a jangada, que é mais plana e tem menores dimensões,
diferente das características das canoas, como as utilizadas pelos pescadores de
Tatajuba. Nas fig. 13 e 14, pode-se observar seus detalhes.
FIGURA 13 - Canoas na regata de Tatajuba FIGURA 14 - Canoa na lagoa da Torta.
FONTE - Eluziane Mendes, Nov./2004. FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006.
A pesca da lagosta é feita por 15 pescadores. Em período de produção,
cada canoa leva para o mar 20 cangalhas, com 50 filas de caçoeira. Com a rede de
arrasto de praia, pescam o camarão. Alguns donos de canoas, que não mais
57
pescam, alugam suas canoas para a pesca de caçoeira de peixe e lagosta, sendo
que 12,5% da produção ficam para o proprietário. Outros tipos são a pesca de
dormida, realizada no período de janeiro a maio, cada pescaria com duração de
quatro dias, além da pesca de ir e vir realizada diariamente. Na Vila Nova e na Vila
São Francisco realizam a pesca com tarrafa no lago Grande
8
.
As principais espécies capturadas, com seus nomes populares, são:
cavala, ariacó, bonito, garajuba, serra, sardinha, biquara, pilocaia, sapiruna, sambirê,
boca-rocha, judeu (caico
9
) vendido na região. A produção é vendida para três
atravessadores que fornecem gelo e material de pesca, ou então, para a
associação que compra o peixe das canoas, fornecendo gelo e material de pesca,
sendo que a cada quilo de 7,00 ou 6,00 reais vendido, um real é para a Associação
(do quilo de 3,00 reais são retirados cinqüenta centavos). A produção é levada
diretamente para Camocim. Esses valores são recolhidos, pois, em virtude da
dificuldade de acesso à comunidade, os preços do material para pesca, como a
barra de gelo, tornam o produto 150% mais caros. Exemplo é a barra de gelo que
em Camocim é comprada por R$ 1,50 e, em Tatajuba, são cobrados R$ 4,00. O
material da pesca é adquirido em Camocim, mas, quando revendido, fica mais caro,
em razão dos valores com transporte – queixa-se a comunidade.
A pescaria de peixes considerados de grande valor comercial, como o
robalo, só foi possível com a realização de projetos da ACOMOTA, em convênio
com a Embaixada Suíça, que financiou a compra da caçoeira com nylon 90, mais
resistente, para 8 pescadores e 2 canoas trabalharem com a captura dessa espécie.
A pesca com a cangalha é mais acessível, pois é adquirida com menores custos do
que a caçoeira.
As atividades de coleta de mariscos, siri, camarão e caranguejo,
complementam a alimentação familiar, atividade realizada por crianças, jovens e
mulheres. “As lagoas recebem influências das águas do mar quando da ocorrência
8
Informações fornecidas pelos pescadores durante a realização do Diagnóstico Socioambiental de
Tatajuba, IBAMA, 2005.
9
Caico é a denominação popular dos peixes de baixo valor comercial que são vendidos na região.
58
das marés de águas grandes, principalmente durante os meses de novembro,
dezembro e janeiro, ocasião em que diversas espécies de peixes e crustáceos
migram do mar para aqueles ecossistemas e ali se desenvolvem” (IBAMA, 2001).
Os depoimentos dos pescadores e suas histórias de vida revelam
preocupação com a “extinção” do pescador artesanal, pois alegam não receber
investimentos e apoios que contribuam para o desenvolvimento e a continuidade
desse tipo de pesca tradicional, conservadora do ambiente marítimo. Um dos
pescadores, filho de pescador, externou em seu depoimento um apelo a favor da
pesca, pois atualmente, o Estado direciona recursos ao capital globalizado que se
configura com a expansão do turismo. O pescador disse que:
A comunidade ainda vive da pesca. A gente sabe que os investimentos para
o turismo são muitos. O governo não se preocupa com a pesca. Tá todo
mundo: o governo federal, municipal e estadual voltados só para o turismo.
Acho que eles pensam que a pesca tem que acabar, sumir do mapa. A
gente sabe que ela deve continuar. Mas, nossos governos estão
preocupados só com o turismo. Você vê que investimento para pesca não
tem de jeito nenhum. Então, a perspectiva da gente, como pescador
artesanal, é que vai acabar (Pescador de Tatajuba, 29 anos, PESQUISA ...,
2006).
O debate deste problema na comunidade é realizado na Associação
Comunitária, onde os pescadores buscam descobrir novos rumos. Até o ano de
2000, existia uma associação, chamada de ACOMOTA – Associação Comunitária
dos Moradores de Tatajuba, mas, após conflitos internos, alguns integrantes
romperam, formando outras representações denominadas de Conselho de
Desenvolvimento Comunitário de Tatajuba e Adjacências e a Associação dos
Moradores de Vila Nova e Adjacências e Vila São Francisco. No depoimento de um
dos moradores, coletado em 2004, constata-se a insatisfação da ruptura entre as
lideranças:
Antigamente, a comunidade era apenas a ACOMOTA – Associação
Comunitária dos Moradores de Tatajuba, há uns dez anos. Mas hoje, a
organização da comunidade está dividida em três. Eu queria que fosse só
uma. A associação é a unidade da comunidade, a primeira que foi fundada
(Pescador de Tatajuba, 52 anos, PESQUISA ..., 2004).
59
As comunidades tradicionais passam por problemas relacionados à posse
de terras e assegurar a permanência em seus lugares é o grande dilema. O veraneio
e a atividade turística entraram no cenário das comunidades litorâneas do Ceará, a
partir da década de 1980. Esta atividade estimulou a grilagem, especulação e
revalorização das terras do litoral, tanto por elementos exógenos quanto endógenos
às comunidades, como poderá ser constatado no módulo 4, deste trabalho.
Dentre os conflitos pelo uso e apropriação do espaço litorâneo, na
comunidade de Tatajuba, ressaltem-se a calma e a vida pacata dos moradores, a
exuberância da paisagem, formada por natureza conservada, enquadrando-se no rol
dos chamados lugares paradisíacos para o turismo. As paisagens são utilizadas
como dos fatores de atração dos turistas para este litoral.
60
3.2 A Atração da Paisagem Litorânea
Quando eu era pequeno ouvia muitas histórias, hoje já estou
crescido e guardo na memória, estou falando de Tatajuba e
vou falar o resto agora (Poema Tatajuba, 2001).
FIGURA 15 - Paisagem panorâmica da gamboa de Tatajuba
FONTE - Ar
q
uivo Terramar
,
2004.
No sentido do Poema Tatajuba, criado por um dos moradores (2001)
10
, os
residentes revelaram a beleza natural do lugar (ver fig. 15), descrevendo Tatajuba em
versos:
É um lugar tão bonito com paisagem e beleza não construído pelo homem,
mas pela mãe natureza. Obrigado mãe querida lhe ofereço a minha vida por
ter feito essa grandeza.
Quem morar neste lugar bom resultado terá, mas cuide com bem cuidado
tem gente que quer tomar. E quem tiver seu quintal cuidar não é nada mal
só não pode vacilar.
Tudo que estou falando vocês podem acreditar eu sou contra essa empresa
que quer nos atormentar. Agora caros amigos vocês sabem o resultado nem
o pequeno cercado vamos poder aumentar por causa dessa empresa que
se encantou com a beleza que existe neste lugar.
10
Poema TATAJUBA, autor: Morador de Tatajuba, 2001. Disponível em:
<www.geocities.com/novatatajuba
>, acesso em: 6 de abril de 2005.
61
O poema Tatajuba revela o sentimento de pertença e o temor da perda do
espaço de sobrevivência – o espaço vivido. O encanto pelo lugar vai além do visível.
As paisagens de Tatajuba foram inseridas no movimento do capital que
paradoxalmente valoriza e banaliza os lugares, pois as situam no circuito da
economia do turismo. Nesse sentido, os espaços litorâneos são gradativamente
incluídos no processo de transformação para espaços de consumo pelo turismo. As
paisagens de Tatajuba que demonstram uma natureza primária se apresentam como
imagens do paraíso, com praias desérticas, águas cálidas, azuis ou verdes-
esmeralda, areias finas e brancas, lentamente transportadas pelos ventos, utilizadas
para atrair fluxos turísticos. A figura 19 oferece uma visão panorâmica da área,
tendo a gamboa e ao fundo a “duna branca”, confirmando esse imaginário.
O aparente é a sedução da paisagem, mas na essência a sedução maior
é do próprio capitalismo que induz todos ao consumo, transformando tudo em
mercadoria ou produto turístico. Daí questionar-se: será que há atração da paisagem
litorânea? Ou esta atração foi produzida pelo marketing turístico, induzindo nas
pessoas o desejo de ir ver o que se torna banal?
A paisagem é utilizada como atrativo do turismo e no espaço está a sua
base territorial, sendo importante ressaltar a diferença entre esses dois conceitos
geográficos. Santos (2002, p.103) explica que “paisagem e espaço não são
sinônimos. A paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento, exprimem
as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e
natureza. O espaço são essas formas mais a vida que as anima”. O espaço
geográfico inclui a natureza e a produção social. Para Santos (2004, p.54) “a
paisagem é o resultado de uma acumulação de tempos. Para cada lugar, cada
porção do espaço, essa acumulação é diferente: os objetos não mudam no mesmo
lapso de tempo, na mesma velocidade ou na mesma direção”. Dessa forma, pode-se
confirmar a co-existência de espaços diferentes no litoral cearense, as cidades e
espaços como Tatajuba, que conservam suas paisagens e suas práticas cotidianas
com características similares àquelas da formação de seu povoado.
62
O litoral tornou-se um dos principais locus de produção, principalmente
pelo valor criado pelo turismo, além de ser o ambiente preferível da alocação das
cidades brasileiras e mundiais. Com o lazer e o turismo, as paisagens naturais foram
transformadas em mercadoria como elementos de contemplação e de consumo. No
espaço litorâneo cearense, encontra-se diversidade de paisagens, sendo estas
consideradas atrativos da formação de demanda turística. Nesse sentindo, Santos
(op.cit., p. 61) diz que a paisagem “é tudo aquilo que nós vemos, o que a nossa
visão alcança. Domínio do visível, aquilo que a vista abarca. Não é formada apenas
de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons”. As paisagens são
consideradas elementos que constituem parte do potencial turístico de um lugar, não
apenas no âmbito do visível, mas também do sentir e no estabelecimento de
relações afetivas com os elementos que a constituem. Fazem parte da paisagem o
próprio homem e suas marcas culturais.
A fama da praia de Jericoacoara fez aumentar a cobiça dos empresários
pelas áreas do litoral de Camocim, que ainda não estavam inseridas no circuito do
turismo. Este espaço de reserva entra no circuito do consumo. Empresários
compram ou dizem ser proprietários de grandes extensões das terras locais, mesmo
em áreas pertencentes à União, por serem terrenos de marinha, como exemplo, a
praia habitada de Tatajuba. O lugar é possuidor de um conjunto natural constituído
por mar, praia, complexo de dunas fixas, semifixas e móveis, lagoas costeiras,
gamboas, tabuleiros, mangue, entre outros. Preocupando-se com esta região,
Pontes (2003, p.01) revela a importância e fragilidade ambiental de Camocim, ao
dizer que,
por estar localizado no litoral e deter expressiva dinâmica ambiental e
peculiaridades socioeconômicas, o município de Camocim atrai uma série
de investimentos ligados ao turismo, à aqüicultura, ao comércio e a
indústria, passando a ser alvo de uma conjuntura que requer cuidados que
justificam a busca de informações úteis ao gerenciamento.
O Município de Camocim situa-se em áreas de planície litorânea e
tabuleiros pré-litorâneos. Sua costa, ao norte, estende-se por 60km, correspondendo
a quase 10% do litoral cearense (GOVERNO ...., PDTIS, 2003a). Na direção leste –
oeste do Município, encontra-se a praia da Barrinha, que fica a 21 km de distância
63
da Sede. Em seguida, há a Praia Caraúbas, totalmente virgem; praia do Farol do
Trapiá, na Sede, a 2 km de distância da Barrinha; a praia Barreiras, na foz do rio
Coreaú, a 3 km do centro de Camocim, lugar onde se encontra a denominada ilha
da Testa Branca ou Ilha do Amor. Na praia do Xavier, existe apenas uma vila de
pescadores; posteriormente, a Praia de Imburanas, que faz limite com a praia de
Tatajuba; por fim, a Praia do Guriú, limite de Camocim com a praia de Jericoacoara.
O caminho é feito através de trilhas indo por Tatajuba, com carros de tração,
atravessando-se de balsa (movida a força humana) o lago da Forquilha – conhecido
como lago do Urubu, ou ainda vindo de Granja e Parazinho em estrada de piçarra
(GOVERNO ...., PAT, 2000), chega-se a Tatajuba (caminhos descritos nos textos
anteriores).
Outras paisagens de Camocim são formadas: pelos lagos Seco,
Boqueirão, laguinho da Torta e o lago Grande; pelas áreas de mangues; dunas fixas
e móveis; e pelas falésias vivas. A diversidade do conjunto de ambientes da área do
Município, caracteriza-o como de fragilidade ambiental, daí a importância das APAs
– as Áreas de Proteção Ambiental. Nesse sentido, foram criadas duas: a de Tatajuba
(Distrito de Guriú) e a de Maceió (Distrito de Amarelas), no entanto, a implantação
dessas APAS não foi efetivada. No Plano de Ação do Turismo de Camocim – PAT
(2000), outros problemas ambientais são apontados como “ocupação desordenada
dos mangues por salinas, ocupação desordenada do litoral por empreendimentos
turísticos, ausência de legislação e instituições pertinentes às necessidades de
controle ambiental e a ausência de APA’s que funcionem como corredores
ecológicos, partindo dos municípios vizinhos a Camocim”.
As falésias de Camocim são caracterizadas por constituir formas
abrasivas. No Ceará “são representadas por falésias desenvolvidas nos sedimentos
da Formação Barreiras” (SOUZA, M. J. N., 2000, p.22). A Formação Barreiras
caracteriza-se como domínios de acumulação de sedimentos pré-litorâneos, em
algumas áreas da costa, assumindo a denominação de falésias. Em alguns pontos,
como nas praias de Morro Branco, Jericoacoara, Taíba, Paracuru e Camocim, as
exposições de falésias se estendem por alguns quilômetros. Souza, M. J. N. (idem,
ibid) explica que
64
[...] os tabuleiros pré-litorâneos ficam situados à retaguarda do cordão de
dunas, contactando, sem ruptura topográfica, com as depressões
sertanejas. São constituídos por sedimentos da Formação Barreiras e
penetram cerca de 40 Km, em média. Em alguns pontos, atingem o mar e
são esculpidas em falésias funcionais. Têm altitudes que variam,
normalmente, entre 30-50 m, raramente ultrapassando ao nível de 80 m.
A linha de falésias vivas configura porções do continente, com
diversificação Iitológica e estratificada, que estão sendo constantemente trabalhadas
pelas ações eólicas e marinhas. Essas ações, por sua vez, fazem surgir do contato
pela ação marítima escarpas de formas variáveis. Esta feição é representada pela
linha de falésia localizada na zona costeira no Município de Camocim, precisamente
na foz do rio Coreaú (MORAIS, 2000), como se observa nas fig. 16 e 17. O material
que compõe este tipo de falésia, em Camocim, difere do material constituinte das
falésias do litoral leste do Estado, destas são retirados sedimentos para fazer o
artesanato denominado de “garrafinhas coloridas”. As falésias de Camocim possuem
importante estrutura ambiental e são denominadas de Formação Camocim.
FIGURA 16 - Falésias vivas - litoral de Camocim FIGURA 17 - Formação Camocim - CE
FONTE - Vicente de Paula, 2003 FONTE - Vicente de Paula, 2003
A intensa dinâmica do litoral de Camocim, sobretudo de Tatajuba, remete
a pesquisadora para explicação dos elementos constituintes dessa praia. Preocupa
o uso intensivo desse ambiente, em razão da fragilidade dos elementos que
compõem esse ecossistema, e deles dependerem, os moradores das comunidades
litorâneas, além do processo de transformação das paisagens em atrativos para o
turismo.
65
No esboço cartográfico das feições ambientais de Tatajuba, elaborado
pelo IBAMA, em 2001, ao realizar o Laudo Ambiental da Comunidade, foram
utilizados pontos estabelecidos na Lei Municipal nº 559/94, correspondente à
declaração da Área de Preservação Ambiental – APA de Tatajuba, sancionada em
26 de dezembro de 1994 (PREFEITURA ..., 1994), conforme os pontos abaixo:
a) Ponto nº 1- N = 9.685,0 km
(norte) E = 308,0 km
b) Ponto nº 2- N = 9.685,4 km
(norte) E = 316,0 km
c) Ponto nº 3- N = 9.682,0 km
(sul) E = 316,0 km
d) Ponto nº 4- N = 9.682,0 km
E = 308,0 km
Em 2000, a Câmara Municipal de Camocim alterou os limites da área para
4.598 ha, abrangendo a extensão de todas as vilas e do entorno. Conforme as
alterações da Lei nº 559/94, do Art.1º, aprovadas em 2000, pode-se observar a
extensão da APA e sua expressividade ambiental para o município de Camocim e
para a comunidade de Tatajuba, que solicitou ao IDACE – Instituto de
Desenvolvimento Agrário do Ceará que inserisse esta nova delimitação da APA no
cadastro das posses realizado por esse instituto em 2001. A seguir a descrição e
delimitação da APA (PREFEITURA ..., 2000):
Art. 1º - Sob a denominação da APA DE TATAJUBA, fica declarada Área de
Proteção Ambiental, a área compreendida em 4.598 ha (quatro mil
quinhentos e noventa e oito hectares) conforme mapa em anexo único
desta lei, elaborado com o auxílio da carta topográfica da DSG/SUDENE
folha AS, 24-Y-A-VI (CAMOCIM), de acordo com o seguinte memorial
descritivo- Partindo do ponto 1, a oeste, da APA, com coordenadas UTM
(SAD-69) aproximadas 304.500 (E) e 9.684.800 (N). chegando-se aos
pontos 2, 3 e 4, que extremam com o Laguinho ao sul da APA, na divisa dos
campos de dunas com a superfície de tabuleiro continental, segue-se as
respectivas coordenadas 308.400 (E) e 9.681.800 (N); 309.000 (E) e
9.682.100 (N); 309.500 (E) e 9.681.700 (N); partindo para o ponto 5, 6 e 7
que extremam com o Lago Grande, com as respectivas coordenadas
315.300 (E) e 9.682.300 (N); 316.700 (E) e 9.682.500 (N); 317.100 (E) e
9.681.600 (N); chegando-se ao ponto 8, no alto do Tremembé próximo a
Pedra Seca com as coordenadas 319.700 (E) e 9.683.000 (N); parte para o
ponto 9 em direção a localidade de Guriú, delimita-se ao Leste da APA com
o Lago do Córrego da Forquilha (vulgo Riacho do Guriú), com as
coordenadas 323.700 (E) e 9.684.900 (N); finalizando com o ponto 10,
66
considerou-se o limite norte da APA, a linha de preamar do Oceano
Atlântico, com as coordenadas 323.700 (E) e 9.685.900 (N)” (LEI
MUNICIPAL Nº 559/94, CAMOCIM-CE, 2000).
Em 1996, foi expedida a instrução normativa que regularia a Área de
Proteção, porém não foi publicada no Diário Oficial. A área da APA é outro elemento
que acentua os conflitos fundiários na comunidade, processo este que será
detalhado nos próximos textos. Todos os elementos da paisagem que serão
descritos fazem parte da APA, conforme constatado pelos estudos realizados pelo
IBAMA em 2001. No mapa 04, foram vetorizados os pontos estabelecidos,
conforme as descrições acima, da Lei N. º559/94, e de ampliação de área em 2000.
O Laudo Ambiental do IBAMA (2001) constata que as principais feições
geoambientais encontradas na área de Tatajuba são a praia e a pós-praia, os
estuários e manguezais, campos de dunas, as lagoas costeiras e os tabuleiros.
Esses ambientes são resultados dos “processos transgressivos e regressivos de
idades quaternárias e que favoreceram as formações de várias feições costeiras,
incluindo as áreas estuarinas” (TERRAMAR, 2003a).
O mar foi um dos principais elementos de atração a Tatajuba, no início da
formação da comunidade. A pesca era abundante e foi o elemento essencial para
formação do povoado. Uma comunidade tradicional de pescadores ali se alocou, e a
partir da constante observação do mar de Tatajuba, os pescadores foram
aumentando suas pescarias e estabelecendo suas pequenas pesqueiras na praia,
ao lado da gamboa. Sobre o conhecimento tradicional dos pescadores, Diegues
(2004., p.200) revela que:
O conhecimento tradicional dos pescadores artesanais não é pré-lógico ou
pré-científico, (...), ele é baseado em observação continua de fenômenos
naturais recorrentes que permite ao pescador tomar decisões sobre o
momento de ir pescar, sobre o local mais adequado e sobre o uso das
técnicas mais apropriadas. Sem esse conhecimento preciso, seria
impossível a sobrevivência dessas comunidades e a reprodução de um
modo de vida num ambiente marinho sujeito a freqüentes e perigosas
mudanças de tempo.
67
68
As técnicas primitivas e rústicas ainda marcam as ações dessas
comunidades tradicionais relacionadas com o mar. O conhecimento tradicional dos
pescadores é fundamental à reprodução das sociedades comunitárias e sua
permanência na zona costeira. Ressalta-se ainda que as “capturas através de
pescarias com prática de pesca artesanal, caracterizam-se por pequenas
embarcações e sem danos ambientais significativos às regulações ecológicas”
(IBAMA, 2001), contribuindo na conservação do ambiente costeiro. Além da pesca
no mar, a influência das marés é responsável pelo equilíbrio dos ecossistemas no
interior do continente, do manguezal, da depositação de sedimentos na linha da
costa, da troca de matéria orgânica, favorecendo a existência de crustáceos e peixes
que são fontes de alimento na comunidade; sem esquecer que a oscilação das
marés é responsável pelo acesso ou não à vila sede – Tatajuba – nesse sentido,
afirma a comunidade, vive regida pelo ritmo das marés.
A praia e a pós-praia de Tatajuba caracterizam-se por largas faixas, que,
de acordo com os estudos sobre a zona costeira cearense, é resultado dos
processos de regressão marinha. Constata-se esse fenômeno, pela presença de
antigas áreas de mangue, nas faixas de praia, restos de tocos de mangues e
grandes extensões com argila e a formação de rochas nas praias. Essa zona é
caracterizada por terraços holocênicos pretéritos, que, no interior do continente são
recobertos pelos campos de dunas, os quais, no período chuvoso, formam lagoas
interdunares intermitentes (IBAMA, 2001). As dunas são denominadas zonas
vadosas, onde se acumulam águas pluviais, formando lençóis freáticos e lagoas.
As paisagens, compostas pelos campos de dunas, são consideradas
potencial paisagístico da zona litorânea e passaram a ser consideradas como
atrativos turísticos. As dunas resultam da dinâmica, eólica e marinha, que exercem
papel fundamental na modelagem do relevo litorâneo. Em Tatajuba, encontram-se
extensos campos de dunas, que, para os especialistas são resultantes de primeira,
segunda e terceira gerações de formação, alimentadas diariamente pela
depositação de sedimentos na praia e transportados pela dinâmica ação dos ventos.
Na comunidade, as dunas possuem expressiva importância, pois, a partir do seu
69
deslocamento, foi realizada a divisão das quatro vilas (Nova Tatajuba, Vila Nova,
Baixa da Tatajuba e Vila São Francisco). Esse fato faz parte tanto da distribuição
espacial das vilas como do imaginário dos moradores do lugar, por meio da lenda da
duna branca (ver fig. 18). Outro tipo específico de natureza das dunas em Tatajuba
são as com eolianitos, a petrificação dos sedimentos das dunas. Para a população
local, são chamadas de dunas petrificadas e cimentadas, conforme se observa na
fig. 19.
FIGURA 18 - Duna barcana FIGURA 19 - Dunas com eolianitos
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./2004 FONTE - Eluziane Mendes, Ago./2004
Na audiência pública sobre a implantação de Projeto Turístico em
Tatajuba, realizada em Camocim, pela Assembléia Legislativa, em 2001, o
geógrafo
11
, analista da área, relatou em seu depoimento a dinâmica da migração do
campo de dunas e as conseqüências na vida dos moradores de Tatajuba,
assinalando que:
Antigamente era Tatajuba, e hoje, é Nova Tatajuba. Por quê? Porque as
dunas, com a sua migração, com o seu transporte, regidas por um fluxo de
energia fundamental e magnífico, que é o vento, e de grande força, fez com
que a comunidade se deslocasse. Essas áreas de alta vulnerabilidade, de
elevado risco, e outras peculiaridades como o lençol freático, muito
superficial, são áreas destinadas à migração desse material, ao movimento
dessas dunas, isso é que significa sustentabilidade. Significa uma proposta
onde o turismo seja visualizado, essencialmente na movimentação desse
material. Para que essa sustentabilidade seja preservada, essencialmente a
comunidade tem que ter mobilidade. A comunidade daqui a vinte, trinta,
cinqüenta ou cem anos terá que remover suas casas, mudar de um lugar
11
Professor doutor Jeovah Meireles, docente do Depto. de Geografia da UFC e pesquisador sobre
questões ambientais e migração das dunas.
70
para outro, terá que procurar uma outra região ou área onde as dunas
possam seguir seus movimentos de migração (COMISSÃO ..., 2001).
Complementando esta reflexão, o depoimento do deputado
12
que
moderou os trabalhos e que é ambientalista, ratificou a posição do geógrafo para a
comunidade, com as seguintes palavras:
Então, vocês estão numa área que é importante para o litoral, do ponto de
vista ambiental e econômico. Por quê? Ninguém vai para ser turista em
Tatajuba para ver o que ele vê na Beira Mar, em Fortaleza. Não vem. Ele
vem para ver aquela beleza que é aquele campo de dunas, aqueles
lagamares, aquelas lagoas que têm no meio das dunas, que é a coisa mais
linda do mundo. Tatajuba é um local belíssimo! (COMISSÃO ..., 2001).
A migração das dunas, na região do extremo oeste do Ceará, é intensa.
A vegetação sobreposta aos campos de dunas contribui na fixação ou desvio do
deslocamento de sedimentos e sua ausência contribui para a intensa mobilização
das dunas na direção dos ventos. Daí a preocupação que os planejadores devem ter
com os processos migratórios dos campos de dunas, não instalando rodovias,
estradas, equipamentos na direção desses movimentos, minimizando os impactos
ao meio ambiente. No caso de Tatajuba, constata-se a necessidade de mobilização
dos moradores, adaptando-se às condições naturais do lugar e a intensa erosão
exercida pela gamboa. A implantação de um equipamento de grande porte nessa
área, previnem os estudiosos, poderia ser a declaração do extermínio do lugar. A
intensa dinâmica da migração das dunas sobre a gamboa pode ser verificada na fig.
20.
As lagoas costeiras em Tatajuba fazem parte de um complexo lagunar
constituído pelo lago Grande, lagoa das Moréias e a lagoa da Torta (Laguinho), (ver
mapa 01), que possuem extensões que variam até 8 km, adentrando o continente,
pelos tabuleiros litorâneos. Sobre as lagoas costeiras, o IBAMA (2001) explica que
O Lago Grande mantém estreita ligação com o canal principal da planície
flúvio-marinha da denominada Gamboa de tatajuba. Suas águas
apresentam um caráter mais salobro em relação aos demais lagos. Esta
12
Deputado João Alfredo, em 2001, presidia a Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da
Assembléia Legislativa e fez a moderação na audiência pública sobre a implantação de Projeto
Turístico em Tatajuba.
71
afirmação confirma a condição do lago Grande de funcionar como um
sistema lagunar-estuarino, situação fácil de ser constatada pelas espécies
piscícolas e de crustáceos ali existentes, típicas de ambiente de transição
com ambiente marinho, sendo comum mesmo que sazonalmente (IBAMA,
2001).
FIGURA 20 - Migração das dunas sobre a gamboa
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./2004
As lagoas costeiras, juntamente com o campo de dunas, compõem
grande parte da paisagem de Tatajuba. Dos ambientes lacustres, são retirados
alimentos como peixes de pequeno porte, além de outras espécies encontradas
nesse ecossistema, de extrema importância para a sobrevivência dos moradores da
comunidade. Outro fato relevante são as barracas instaladas na lagoa da Torta,
funcionando como ambiente de lazer, fonte de renda para alguns dos moradores e
um dos principais equipamentos turísticos de Tatajuba, visitado por turistas que vêm
nos passeios de Jericoacoara.
Os estuários e manguezais são elementos do ambiente litorâneo que
formam as planícies fluviomarinhas. Decorrentes do processo combinatório entre
agentes fluviais e oceânicos, “apresentam solos indiscriminados de mangues
72
continuamente afetados pela preamar. As plantas de mangues que revestem
mostram muito adensadas, com porte arbóreo e se dispõem longitudinalmente em
relação às calhas fluviais” (SOUZA, M. J. N., op.cit., p.22).
A desembocadura dos rios, juntamente com a influência das águas do
mar, formam o ambiente fluviomarinho, proporcionando a formação dos manguezais.
Os rios que deságuam no litoral cearense, tendo como referência inicial o extremo
leste em direção ao litoral oeste são: Jaguaribe, Pirangi, Choró, Pacoti, Cocó,
Ceará, Cauipe, Curu, Trairi, Mundaú, Aracati-açu, Aracatimirim, Acaraú, Coreau,
Timonha. Nos estudos de Meireles (2002), são identificados nas áreas testemunhos
da variação do nível do mar: os terraços marinhos, eolianitos, antigos corais,
conchas, paleomangue, plataforma de abrasão, lagunas, gerações de dunas, beach
rocks e falésia morta, além dos rios que deságuam nesta região, compondo
constituintes da paisagem litorânea.
As áreas fluviais são dinamizadas pelos fluxos naturais de água, cujos
deslocamentos ocorrem por influência da força de gravidade, indo em direção às
topografias mais baixas, desaguando em lagoas, rios ou no mar. O encontro com
mar na foz ou desembocadura pode ocorrer por um ou vários canais, formando
estuários ou deltas, respectivamente. Os rios cearenses desembocam formando
estuários e constituindo manguezais.
A gamboa de Tatajuba é o canal principal de sua planície fluviomarinha,
mantém ligação com o ecossistema lacustre da região, sobretudo do lago Grande.
No manguezal, encontram-se as espécies Conocarpus erecta (mangue botão),
Langucularia racemosa (mangue de sapateiro), Rhyzophora mangle (mangue
verdadeiro) (IBAMA, 2001). Área mais expressiva do mangue separa a vila principal
da Tatajuba em dois núcleos, como pode ser observado pelas fig. 21 e 22:
73
FIGURA 21 - Ecossistema manguezal FIGURA 22 - Ponte sobre o mangue
FONTE - Eluziane Mendes, Nov./2005 FONTE - Eluziane Mendes, Nov./2005
Os tabuleiros litorâneos em Tatajuba são caracterizados como “área mais
afastada do continente, recobertos por uma vegetação exuberante, com mata
representativa de espécies que não são tão comuns em outras localidades, tais
como jatobá, janaguba e cedro” (IBAMA, 2001). O Laudo Ambiental de Tatajuba
(IBAMA, 2001) revela que, “na área da APA é insignificante a participação desta
feição em termos espaciais, no entanto se reveste de importante aporte de recursos
naturais para as comunidades da Vila de Tatajuba”, assim como as áreas de
planícies fluviais onde fazem plantações de subsistência, denominadas de
“vazantes”, conforme relato de uma moradora da comunidade:
Gosto de viver aqui, por que se eu for pra Camocim só vou viver do meu
aposento. E aqui eu planto um pedaço de cercado, um pedaço de vazante,
um roçado eu não fiz mais, por que tem uns terrenos lá cercado e eu
planto. Dá tudo, dá o milho, a mandioca, o feijão. Batata eu planto. Vivo
muito feliz, graças a Deus (Moradora de Tatajuba, 78 anos, PESQUISA ...,
2004).
Para os moradores da comunidade, os tabuleiros são denominados de
“mata”. Nessas matas, plantam para subsistência, alguns possuem plantações de
cocos, retiram madeira, frutas, além de criarem animais de pequeno porte, como se
observa nas fig. 23 e 24:
74
FIGURA 23 - Área de tabuleiros em Tatajuba FIGURA 24 - Criação de cabras
FONTE - IBAMA/NEA, 2005. FONTE - IBAMA/NEA, 2005.
O espaço litorâneo tanto é escolhido para abrigar as cidades do trabalho,
como para lugar do não-trabalho, o ócio. No tempo livre, o homem é levado a buscar
nas paisagens naturais o revigoramento de suas energias, sem tomar conhecimento,
que isso pode originar o desequilíbrio das comunidades costeiras e a destruição dos
ambientes marinhos como vegetação de praia, mangues, falésias, dunas e lagoas
para construção de casas de veraneio, estâncias de lazer – resorts, parques
temáticos, entre outros equipamentos específicos para o lazer elitista. Nas últimas
décadas, esse processo ocorre no litoral cearense, provocando diversos
desequilíbrios, impactos ambientais e conflitos.
Os moradores de Tatajuba vivencia conflitos por não ter a propriedade
legal das terras que habitam. Desde o final da década de 1970, começaram a ser
ameaçados pelo processo de grilagem de terras e, posteriormente, em 2000, ao
descobrir que todas as terras das vilas foram registradas como propriedade de
empresa imobiliária, cujo objetivo é construir um mega-empreendimento turístico e
hoteleiro – o Condado Ecológico de Camocim. A comunidade sabe da importância
do ecossistema que habita, apesar de nem todos terem consciência de que a
verdadeira intenção das empresas é a dominação da terra, para garantir alta renda
da terra e lucros dos negócios. Nesse sentido, na audiência pública ocorrida em
2001, foram feitas várias referências à regulamentação da APA de Tatajuba e não
75
sabem o porquê de não ter sido oficializada. Vários foram os protestos, inclusive
referentes ao desenvolvimento do turismo no lugar:
Sabemos que Tatajuba é uma área muita bela, e por isso queremos
preservá-la com a regulamentação da APA (Área de Proteção Ambiental)
nessa localidade (João Batista dos Santos - Tita, liderança comunitária,
COMISSÃO ..., 2001).
Este depoimento revela a morosidade na oficialização da APA e denuncia o
desenvolvimento do turismo, ao dizer que:
A comunidade quer a área da APA toda. Temos uma APA que, infelizmente,
não é registrada no Diário Oficial. Solicito o apoio do Senhor Prefeito e
Vereadores, se possível, para registrar essa área da APA, a fim de termos
mais segurança. (...) ninguém pode tomar as dores por Tatajuba, somente
a sua comunidade é que pode ter o seu direito digno. Precisamos que a
área da APA seja para a comunidade. Queremos a área da APA registrada.
Com isso administraremos o turismo, que nem a praia do Canto do Verde,
que nem outras cidades que desenvolveram o turismo. Quem tem que
desenvolver somos nós, não ninguém de fora não (Ivan Bezerra – Pescador
e agricultor em Tatajuba, COMISSÃO ..., 2001).
A não-implantação da APA de Tatajuba levou a comunidade representada
pela ACOMOTA, após a realização de Seminário de Sensibilização Ambiental, 2002,
a analisar juntamente com representantes do IBAMA, da UFC, do Terramar, outros
tipos de unidades de conservação que melhor se adequassem àquela comunidade.
Em seguida, resolveram enviar uma carta e com abaixo-assinado, ao Centro
Nacional de Desenvolvimento Sustentado de Populações Tradicionais (CNPT),
solicitando a criação de uma Reserva Extrativista em Tatajuba. Nesse contexto, as
opiniões na comunidade também divergem, pois uns desejam ansiosos a instalação
da RESEX, como estratégia de permanência no lugar e das práticas tradicionais de
subsistência (pesca, agricultura e coleta), enquanto outros temem que possa ser
mais um fator limitante para o desenvolvimento de práticas capitalistas, como venda
de terrenos e casas, entre outros. Vale ressaltar que para implantar essa unidade de
conservação na comunidade é necessário que a empresa seja retirada da área e as
terras sejam legalizadas pelo Estado, pela anulação dos registros de terras da
empresa imobiliária e a reintegração das posses dos moradores. É nítida a
constatação dos anseios nas declarações realizadas em 2004. Disseram que:
76
O que eu mais desejo, é a libertação da Tatajuba pra gente ficar livre dessa
firma. O que eu quero muito é que essa Reserva Extrativista entre aqui pra
gente ficar sossegado. Por que eu tenho certeza se a Reserva Extrativista
entrar nós ficamos livres e eles se afastam! (Pescador de Tatajuba, 65
anos, PESQUISA ..., 2004).
Depoimento contra a reserva extrativista:
Não é uma boa coisa, por que até agora sofremos por não ter documento,
não ter nada pra fazer nenhum tipo de financiamento, mas nós não temos
garantia nem assessoria, agente conquistou o que conquistou e se entrar
essa Reserva Extrativista não é mais nosso. Eu tenho uma vazante e dois
pedaço de chão, se Tatajuba crescer eu vou crescer por que tenho alguma
coisa e vou construir. Mas se vier essa Reserva Extrativista eu vou perder
tudo (Morador de Tatajuba, ex-pescador, 36 anos, PESQUISA ..., 2004).
As opiniões e interesses na comunidade são diversos. Declaram-se
comunidade tradicional, mas estão imersos entre relações capitalistas, mediante
atividades modernas como o turismo. Não se tem uma definição precisa das
populações tradicionais, assim como mostra o Núcleo de Povos e Comunidades
Tradicionais e Específicas, ao salientar que, para “implementar políticas
direcionadas a esse segmento, é preciso ainda definir o conceito de Comunidades
Tradicionais” (2005). As definições perpassam desde os critérios e especificidades
do modo de produção, por forma de apropriação e uso das terras, até as questões
culturais dos grupos que ocupam áreas ribeirinhas, litorâneas, diretamente ligadas a
biomas ou unidades naturais específicas dos geossistemas brasileiros, conforme
explica o Núcleo supracitado.
O Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações
Tradicionais – CNPT
13
, ligado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis, é um dos órgãos criados, pela compreensão de que,
13
O Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações Tradicionais – CNPT foi criado
pela Portaria IBAMA N° 22, de 10/02/92, resultado da constatação que “as questões ambientais e as
questões sociais são indissolúveis”. E ainda pela constatação de que “a força crescente da evidência
de que a maior agressão ao meio ambiente é a miséria” (Disponível http-
//www.ibama.gov.br/resex/pop.htm, acesso em: 11 /11/2005). Ressalta-se que a produção demasiada
das mercadorias vem ocasionando os maiores impactos ambientais do Planeta, além dos impactos
sociais, a própria miséria da humanidade.
77
para conservar os recursos naturais é fundamental contribuir para a sobrevivência
das comunidades. “A análise da destruição e da conservação dos recursos naturais,
permitiu perceber a existência de populações capazes de utilizar e ao mesmo tempo
conservar tais recursos, estes grupos humanos passaram a ser chamados de
"Populações Tradicionais" (CNPT, 2005).
É nesse sentido que o CNPT implanta reservas extrativistas no País, além
de outras atribuições que buscam colaborar para a criação de estratégias de
sobrevivência das comunidades no sistema econômico vigente. O exemplo no
Ceará, é a Reserva Extrativista do Batoque, em Aquiraz, que se encontra em
implantação. Apesar do processo conflituoso e divergente em Tatajuba, foi realizada
em fevereiro de 2005 a pesquisa de levantamento de dados e informações para o
desenvolvimento do Diagnóstico Socioeconômico e Cultural, pelo IBAMA, a primeira
etapa no processo de instalação de uma RESEX. Enquanto, porém, os moradores
não definirem suas opiniões a favor da unidade de conservação, não será instalada
(COELHO, 2005)
14
.
Nos ambientes que constituem as zonas costeiras, as intervenções são
alvo das atenções de estudiosos, tanto por suas características físicas singulares
como pelos impactos das atividades econômicas implantadas nas áreas litorâneas
habitadas pelas comunidades. Diegues (op.cit., p.145) ressalta a importância dos
ecossistemas costeiros:
Os ecossistemas costeiros e marinhos não são somente ambientes de
grande beleza cênica, são o palco onde os homens lutam pela
sobrevivência, retirando bens e serviços em situações de tensões e riscos
de vida. São também espaços por onde se estendem gradativamente as
relações sociais de produção capitalista tanto pesqueira como industrial. A
penetração do capitalismo nessas áreas tem acarretado no Brasil um
crescente esgotamento das fontes de onde jorram as riquezas: meio
ambiente e força-de-trabalho.
Ampliando a compreensão de Diegues, acrescenta-se a produção
capitalista dos espaços comunitários litorâneos de pescadores, pela atividade
turística, que utiliza as paisagens, como parte de sua produção, isto é, a produção
14
Informações fornecidas por Águeda Coelho, representante do NEA/IBAMA, em entrevista realizada
em dezembro de 2005.
78
do desejo e atração pelas paisagens, como forma de geração de lucro, pelo
consumo de serviços e equipamentos instalados nesse ecossistema.
A compreensão do espaço e das paisagens de Tatajuba fez-se
necessária, pois as peculiaridades do uso e apropriação do solo litorâneo
apresentam-se de forma complexa à apreensão das análises. Além disso, o
fenômeno da apropriação de terras e produção do espaço depende do nível de
desenvolvimento econômico, da constituição de sua formação histórica, além das
condições naturais e ambientais encontradas nos lugares. Diante deste quadro, esta
análise sobre a comunidade buscou apreender o processo de uso e apropriação de
terras que se mantiveram conservadas pelas populações tradicionais e que, nas
últimas décadas, vêm sendo gradativamente revalorizadas para o desenvolvimento
do turismo, cujo processo produz permanentes embates. Acirram-se pela instalação
de novas atividades privadas e públicas, que tentam se implantar no espaço
costeiro, respaldadas pelas políticas do Estado, agindo como reestruturadoras do
território.
No próximo segmento, são analisados os conflitos locais, ressaltando
conceitos que contribuíram para o entendimento da produção, valorização e
especulação do espaço litorâneo, no processo de acumulação. O cenário do conflito
de terras em Tatajuba é revelado pelos depoimentos e pela descrição das
estratégias da comunidade, do Estado, dos especuladores e empresários do
turismo.
4. TERRITÓRIO DE CONFLITOS E RESISTÊNCIAS
Graças a Deus, estou morando num lugar, pensando que é
meu. Porque o terreno aqui é meu. Não vendi pra ninguém.
Então, é mesmo que ser meu. Por enquanto sou feliz.
(Pescador, 82 anos, nativo de Tatajuba, PESQUISA ..., 2004).
O lugar é território de domínio, de posse, de política de sobrevivência das
comunidades – é isto que o depoimento do pescador de Tatajuba demonstra. Ao
dizer “é meu, é mesmo que ser meu”, ele sabe, que embora não tendo a posse de
direito, possui a posse de fato, e, ao defender seu lugar, insere-se no conflito,
mediado pelas relações de poder entre os moradores, o Estado e as empresas,
configurando o território de Tatajuba. A reestruturação desse lugar o transforma
paulatinamente em um território turístico, substrato das relações sociais de
produção.
Andrade (2002, p.214) mostra que “a formação de um território dá às
pessoas que nele habitam a consciência de sua participação, provocando o
sentimento da territorialidade que, de forma subjetiva, cria uma consciência de
confraternização entre os mesmos”. Nesse sentido, os territórios têm significado de
lugar, que são para os residentes, das chamadas comunidades, grandes
referências, pois deles dependem sua moradia, trabalho e sua orientação ao
regressarem do mar. Os marcos do espaço, como os morros e falésias, servem de
baliza para seus regressos ao continente. A perda do território, do lugar, significa a
perda da sobrevivência, o desassossego, a desunião, enfim, o conflito. O
depoimento do pescador demonstra com clareza o apego ao lugar e a defesa desse
território, declarando que não o vendeu “pra ninguém” e, enquanto permanecer em
seu lugar, continuará “feliz”.
A expropriação das comunidades tradicionais das terras litorâneas, em
decorrência da especulação, incita conflitos declarados. Os habitantes, os posseiros,
80
atribuem maior importância ao valor de uso
1
e os que adquirem as terras como
mercadoria exploram o valor de troca
2
, especulam buscando renda e lucro fácil. No
espaço litorâneo, a privatização leva à escassez relativa desse fator de produção,
pois, ao elevar o preço da terra, constitui outra modalidade de exclusão social dos
pescadores e agricultores.
A terra, para as inúmeras comunidades tradicionais, é imprescindível às
suas subsistências. Estas comunidades são constituídas de famílias de pequenos
agricultores e pescadores artesanais, rendeiras e seus descendentes, e que
sobrevivem dos recursos do mar e da terra, onde habitam. São comunidades que
vivem do trabalho de pesca artesanal, da coleta e da agricultura, utilizando técnicas
e instrumentos de trabalho simples e seculares, com uso extensivo da terra,
considerada fator de sobrevivência (valor de uso) acima do mercado (valor de troca).
O espaço é produzido e transformado lentamente, sem a pressa da
sociedade moderna, cujo tempo do capital é veloz e acelerado. Estruturas de
componentes modernos, porém, superpõem, às tradicionais, determinando conflitos
na produção do espaço. “O espaço capitalista é produzido pelas relações dialéticas
entre os agentes diretos e indiretos do processo produtivo e a natureza. Na natureza
está o próprio homem, enquanto essência humana, que é negada na produção
capitalista do espaço e só existe como mercadoria força de trabalho” (SILVA, op. cit.,
p.18, grifos do autor).
Diegues (op. cit., p.85) afirma que o território das comunidades
tradicionais possui diferenças do território urbano, apresentando características de
descontinuidade, pois elas necessitam dos espaços aparentemente sem
aproveitamento, como meio de produção e de relações sociais. São espaços de
reserva criados para assegurar a subsistência, enquanto nas sociedades urbanas e
1
Para Marx “a utilidade de uma coisa faz dela um valor de uso. [...] O valor de uso realiza-se somente
no uso ou no consumo. Os valores de uso constituem o conteúdo material da riqueza, qualquer que
seja a forma social desta” (1988, V. I, p.45-46).
2
O autor afirma que “o valor de troca aparece, de início, como a relação quantitativa, a proporção na
qual valores de uso de uma espécie se trocam contra valores de uso de outra espécie, uma relação
que muda constantemente no tempo e no espaço” (idem, ibid).
81
industrializadas os espaços de reservas são fontes de acumulação. Nesse sentido, o
autor expressa que:
O território das sociedades tradicionais, distinto dos das sociedades urbanas
industriais, é descontínuo, marcado por vazios aparentes (terras em pousio,
áreas de estuário que são usadas para a pesca somente em algumas
estações do ano) e tem levado autoridades da conservação a declará-lo
parte das “unidades de conservação” porque “não é usado por ninguém”. Aí
reside, muitas vezes, parte dos conflitos existentes entre as sociedades
tradicionais e as autoridades conservacionistas.
As terras que compreendem a área das vilas de Tatajuba apresentam
descontinuidades e identidades geomorfológicas específicas e os usos dizem
respeito a esses ambientes. Constatou-se que algumas casas de pescadores são
removidas conforme a movimentação das dunas, mostrando que eles respeitam a
dinâmica da natureza, conforme dito anteriormente.
A empresa imobiliária, em cooperação com o Estado, apesar de não
possuir a hegemonia sobre Tatajuba, luta para que isto aconteça, desarticulando o
modo de vida local, e vem conseguindo lentamente este objetivo. Isso identifica o
processo chamado pelos geógrafos de desterritorialização: quando grupos perdem
os territórios, isto é, espaços de vida e de relações entre si e com os demais grupos
da população. Corrêa (2002, p.252) define desterritorialização “como a perda do
território apropriado e vivido em razão de diferentes processos derivados de
contradições capazes de desfazerem o território”. Certamente, os grupos
desfavorecidos vinculam-se a novos espaços cotidianos, pois a sobrevivência
implica o uso do espaço e a criação de novas territorialidades
3
.
Suporte das comunidades, as terras litorâneas possuem uma dimensão
calcada pelas relações sociais, assumindo características que se expandem ao
3
Corrêa (op.cit., p.251) explica que “a territorialidade, por sua vez, refere-se ao conjunto de práticas e
suas expressões materiais e simbólicas capazes de garantirem a apropriação e permanência de um
dado território por um determinado agente social, o Estado, os diferentes grupos sociais e as
empresas”.
82
patamar da identidade cultural, exercida pelo sentimento de pertença dos moradores
a um determinado lugar. Anota Santos (2000, p. 96-97), que
[...] o território não é apenas o resultado da superposição de um conjunto de
sistemas de coisas criadas pelo homem. O território é chão e mais a
população, isto é, uma identidade, o fato e o sentimento de pertencer aquilo
que nos pertence. O território é a base do trabalho, da residência, das
trocas materiais e espirituais e da vida, sobre os quais ele influi. Quando se
fala em território deve-se, pois, de logo, entender que se está falando em
território usado, utilizado por uma dada população.
O território litorâneo, que também é habitado pelas comunidades de
pescadores, tem significado maior do que somente lugar de residência. A existência
de relação afetiva, que produz sentimentos de pertença ao lugar, enseja reações
quando eles se sentem agredidos pela implantação de empreendimentos
desarticulados da realidade local, que se apresentam como ameaças à perda de
seus lugares. As ações comunitárias empreendidas por movimentos sociais
organizados podem ser explicadas por Santos (op. cit., p. 134), quando mostra que
elas passam pelo “cotidiano das pessoas, cuja flexibilidade e adaptabilidade lhe
asseguram um autêntico pragmatismo existencial e constituem a sua riqueza e fonte
principal de veracidade”.
A valorização do espaço litorâneo está associada ao processo de
urbanização, intensificado no Ceará, nas duas últimas décadas do século XX. A
urbanização é o “processo de diferenciação do espaço social gerador de um modo
de vida” (COSTA, 1999, p. 101), difundindo-se, por exemplo, pela reprodução dos
modos urbanos, nos municípios e comunidades litorâneas. Todos têm direito à
cidade e aos benefícios dos serviços urbanos, mas, na prática, poucos são
beneficiários.
A implantação da atividade turística tanto requer como promove nos
espaços, certo grau de urbanização. Para tornar os lugares consumíveis e rentáveis
ao capital, em cada espaço produzido amplia-se o conjunto de expressões e signos
que representam o modo de vida urbano. As instalações de infra-estruturas, que
83
beneficiam notadamente os empreendimentos turísticos e parte da população local,
por sua vez, ampliam os problemas de desigualdades na ocupação e usos dos
espaços.
A expansão do urbano fortalece os lugares corredores turísticos das
cidades de concentração de serviços e de comando do sistema capitalista. São
lugares que se articulam com fragmentos de espaço urbano criados
contingentemente ao longo do litoral. Homogeneização e diferenciação ocorrem
simultaneamente, caracterizando as cidades como locus dos diversos mercados e
fatores de produção. Na reflexão de Lefebvre (2001, p.144), as cidades
[...] contêm a população exigida pelo aparelho produtivo e o ”exército de
reserva” que a burguesia reclama para pesar sobre os salários tanto como
para dispor de uma “rotatividade” de mão-de-obra. Mercado das
mercadorias e do dinheiro (dos capitais), a cidade torna-se também o
mercado do trabalho (da mão-de-obra).
O fenômeno da urbanização acelera-se com a implementação da
atividade turística que procura sempre novas áreas para implantar equipamentos,
produzindo novos territórios turísticos nas comunidades litorâneas, isto é, a
turistificação
4
. A busca incessante para alocar as empresas turísticas acirra conflitos
históricos pela terra no litoral.
Com a urbanização dos espaços litorâneos, ocorre substituição dos
trabalhos tradicionais pelos ligados ao setor terciário, com destaque do comércio,
bancos, escolas, lazeres e o turismo. As comunidades deixam de depender
estritamente dos recursos do mar e da terra, para se tornarem força de trabalho das
empresas e negócios turísticos. A maioria torna-se assalariada. Remete-se ao
processo de proletarização definido por Harvey (2004, p. 122), que envolve “um
conjunto de coerções e apropriações de capacidades, relações sociais,
conhecimentos, hábitos de pensamento e crenças pré-capitalistas da parte dos que
4
Benevides (2004, p.20), ressalta que a “noção de turistificação, é compreendida como processo de
criação de uma ampla ambiência apropriada às práticas turísticas para, com isso, abranger os
contextos objetivos e as representações que estes suscitam para motivar os deslocamentos.”
84
são proletarizados”. Assim, afina-se com os pensamentos de Debord (1997, p.22),
ao explicar a proletarização do mundo, mediante a separação do homem de sua
produção, como o caso dos pescadores artesanais, que destituídos das condições
de trabalho, pela justificativa de decadência dessa modalidade, tendem a se
tornarem proletariados, isto é, assalariados do turismo, da pesca industrial e outras
atividades inseridas no litoral cearense:
Com a separação generalizada entre o trabalhador e o que ele produz,
perdem-se todo ponto de vista unitário sobre a atividade realizada, toda
comunicação pessoal direta entre os produtores. Seguindo o progresso da
acumulação dos produtos separados, e da concentração do processo
produtivo, a unidade e a comunicação tornam-se atributo exclusivo da
direção do sistema. A vitória do sistema econômico da separação é a
proletarização do mundo.
As contradições relativas ao modo capitalista de produzir são enfocadas e
corroboradas por vários autores. Coriolano (2005, p.60) explicita a natureza
contraditória da atividade turística, dizendo que, “por se tratar de capitalismo,
inerente à sua essência, estão as contradições típicas desse modo de produzir que,
enquanto oferece lazer para uns, explora o trabalho de muitos”. Martins (1999, p.29)
exprime que “a reprodução ampliada do capital implica a reprodução ampliada das
contradições que seu movimento incorpora e engendra”. Na medida que os
mercados vão se ampliando, agudizam-se as contradições imanentes à produção do
espaço. Tomando, por exemplo, o turismo no litoral cearense, a cada alocação de
uma nova empresa, emergem novos embates ou acirram-se antigos conflitos nas
comunidades, entre seus membros e com novos atores.
A lógica empresarial entra em confronto com a lógica das comunidades.
Cada qual busca infundir e sustentar suas formas e estruturas. Na expansão
capitalista, na maioria dos casos, impõe-se, no dizer de Damiani (1999, p.60), a
“inclusão perversa”. Todos pertencem à sociedade capitalista, mas se incluem de
forma diferenciada. Assim os trabalhadores, operários, camponeses e nativos
servem de mão-de-obra temporária e barata, incluídos de forma excludente.
85
As comunidades litorâneas tornam-se parte desse processo são
transformadas em produtos turísticos. Quanto mais exótico for o lugar, mais atrativo
para a demanda turística, tal como acontece na praia de Tatajuba. Essa é uma das
motivações, para que se criem mercadorias de todas as espécies e formas.
Coriolano (op. cit., p.154) mostra que o “turismo é uma atividade que implica o
consumo dos espaços com diversidade de formas de utilização estruturantes de
paisagens e de negócios, e dá agilidade a processos dotados de grande capacidade
de organização espacial”. O território é organizado na mesma medida que passa
por processos de valorização, pela dotação de infra-estruturas, serviços e pela
especulação imobiliária.
4.1 A Valorização e Especulação da Terra
O turismo é uma atividade econômica que exige implantação de serviços,
produzindo e reproduzindo o urbano. Assinala Sanchez (1991) que a praia, o mar, a
paisagem, o sol e o clima podem ser gratuitos, mas os serviços agregados ao
turismo fazem parte do circuito mundial da economia urbana. Nesta perspectiva, o
espaço passa a ser produzido e valorizado na busca da acumulação pelo consumo
mercantil.
Desde a década de 1980, o espaço litorâneo cearense é qualificado
(pelas condições de balneabilidade) e mediante ação especulativa e de exploração
exagerada dos preços da terra desencadeada pelas empresas imobiliárias. Sob
ação de grileiros
5
e de especuladores, no litoral, as terras são colocadas em
disponibilidade, na forma de loteamentos para construção de casas e de
5
Grileiros são pessoas que se apropriam indevidamente de terras alheias. Grilar é expropriar terras,
utilizando de atitudes escusas, desde falsificações de documentos de terras em cartórios até brigas
corporais pela posse das terras.
86
condomínios de veraneio, equipamentos de hospedagens, entretenimento, grandes
hotéis e resorts.
Os novos negócios instalados no litoral reduzem as possibilidades de
retirar da terra os produtos agrícolas, transformando a terra em renda e capital pelos
setores secundários e terciários. Com a reestruturação espacial e a transformação
das paisagens, a terra litorânea, como mercadoria, aumentou consideravelmente de
preço, sendo em boa parte usada e paga não mais sob a forma de arrendamento de
propriedades rurais, mas pela venda de lotes. Silva (2001, p.75) mostra que “a terra
não se valoriza em si, a sua valorização é feita nos diversos ramos da produção,
onde há geração de mais-valia e parte dela flui para o mercado de terra”. Harvey
(2002, p. 361) lembra que nesse processo “a apropriação da renda e a existência de
propriedades privadas de terras são condições socialmente necessárias para a
perpetuação do capitalismo”. O litoral tornou-se locus da “reprodução das relações
sociais de produção” (LEFEBVRE, 2001, p.169) ou centro de ações de agentes que
se apropriam da terra associados à acumulação capitalista, por meio da especulação
imobiliária, da exploração das paisagens, expropriando pescadores que há gerações
habitam nas regiões litorâneas. Moraes e Costa (1999, p.132), ao estudarem o valor
do espaço, evidenciam que:
O espaço é também uma matéria finita, o que lhe atribui a qualidade de
raridade relativa. Ele é um bem relativamente escasso. Assim, sua
propriedade propicia um privilégio ímpar, em qualquer período da história.
Na maioria dos lugares, a transformação da terra litorânea em mercadoria
para o turismo foi antecedida pelo fenômeno da segunda residência para o lazer.
Seabra O. (1979, p. 01) define segunda residência como “a habitação cujo uso é
eventual, a qual, portanto, não se constitui um suporte da vida cotidiana”. As
segundas residências para o lazer são frutos do crescimento econômico, que, no
caso cearense, intensificou-se na década de 1980, como resultado e expressão das
ideologias burguesas e consumistas.
87
O capital imobiliário amplia-se no mercado das segundas residências, dos
empreendimentos turísticos e com os loteamentos para condomínios fechados.
Exemplo é a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), valorizando ainda mais a
mercadoria
6
terra. Além da força de trabalho, Silva (2001, p.14) destaca a
mercadoria terra contida no espaço, ressaltando que
[...] o espaço como produto ou produzido advém de relações sociais
complexas; de relações entre mercadorias específicas da sociedade
capitalista – mercadoria terra e mercadoria força de trabalho – e todas as
mediações que permeiam essas relações.
Os mecanismos e estratégias do mercado de terras litorâneas e os
conflitos fundiários resultam, também, da ausência de legislação precisa, bem como
do processo de urbanização litorânea pelo e para o turismo. Nesse contexto, dão-se
as contradições da produção do espaço litorâneo. Na essência do processo de
valorização da terra, encontra-se o mercado de terras, dinamizado pela grilagem e
pela especulação.
Para o desenvolvimento do turismo, o patrimônio natural – como fontes
d´água, praias com elevado potencial paisagístico, grutas, falésias, cachoeiras,
lagoas, serras, entre outras belezas naturais – é redimensionado em seus valores
para a criação do próprio valor no espaço. Daí resultam as apropriações e
privatizações dos espaços para implantação das empresas, que, com o monopólio
das terras, estabelecem uma situação privilegiada no desenvolvimento dos
negócios. O espaço valorizado facilita a especulação dos preços de terras e atração
das empresas.
Na contemporaneidade, o turismo, como atividade econômica e prática da
sociedade urbana, retira das terras litorâneas a renda, pela transformação da terra
litorânea e suas paisagens em produtos turísticos ou pelo preço pago aos
6
“A mercadoria é, antes de tudo, um objeto externo, uma coisa, a qual pelas suas propriedades
satisfaz necessidades humanas de qualquer espécie. A natureza dessas necessidades, se elas se
originam do estômago ou da fantasia, não altera nada na coisa. Aqui também não se trata de como a
coisa satisfaz a necessidade humana, se imediatamente, como meio de subsistência, isto é, objeto de
consumo, ou se indiretamente, como meio de produção” (MARX, V. I, op.cit., p.45).
88
proprietários de imóveis e equipamentos turísticos como hotéis, resorts, parques
temáticos etc., implantados no litoral. Nesse sentido, Campanário (1984, p.12)
revela o processo de pagamento de renda aos proprietários de imóveis dos mais
variados submercados, dentre eles o turístico:
Para cada unidade é designado um tipo predominante de atividade que
deve pagar uma renda aos proprietários dos imóveis ali localizados. Esta
renda é a absoluta na medida em que se refere a um obstáculo único,
indiferente às variações existentes entre os imóveis dentro da unidade; esta
renda refere-se, portanto, a um submercado de uso da terra e surge do
excedente gerado na esfera de produção e/ou circulação de capital e força
de trabalho. Dentro de cada submercado é possível detectarem-se rendas
diferenciais de construtibilidade e de consumo final. Pode-se assumir que os
diferenciais nos custos da construção possam ser superados com o
desenvolvimento da tecnologia.
Com o desenvolvimento das tecnologias, os bens naturais são
privatizados. Por exemplo, as dunas, lagoas, falésias e o mar já não constituem
obstáculos à reprodução ampliada do capital e, a cada dia, são incluídos no circuito
do mercado como objetos de consumo. Resultado desse processo é a ampliação
dos espaços urbanizados nos mais longínquos lugares. Concentram serviços
privados, públicos, e atividades administrativas e privadas, caracterizando-se por
densidades demográficas relativamente altas e sazonais. Um desses exemplos no
Ceará é a praia de Jericoacoara, que, mesmo com a dificuldade de acesso, se
turistificou e vem sendo urbanizada. Além disso, registra-se o rápido e intenso
aumento da especulação imobiliária.
Nas praias urbanas, o mercado imobiliário realiza-se pela venda do solo.
“O solo é uma mercadoria peculiar diferenciando-se, conforme a sua localização e
atributos próprios. Seu preço reflete esta situação singular, visto ser o solo urbano
parcelado e possível de negociação” (ACCIOLY, 1985, p. 44). É assim que praias
são loteadas, parceladas, negociadas e delas retiradas toda renda e lucro possíveis,
especialmente quando destinada ao turismo. Tal fragmentação e venda estruturam
as comunidades e as cidades, a exemplo do que Lefebvre (op. cit., p.163) observa:
89
A terra e mais ainda o espaço inteiro se vendem por parcelas. A
permutabilidade tem uma importância crescente na transformação das
cidades; mesmo a arquitetura depende dela: a forma dos edifícios provém
dos loteamentos e da compra da terra fragmentada em retângulos de
pequenas dimensões.
O Estado é um dos principais agentes de valorização do espaço, senão o
principal. Atua com mecanismos variados – planejamento, legislação, incentivos
fiscais e financeiros, sobretudo pela implantação de equipamentos e de infra-
estrutura que reestrutura o espaço. Alguns lugares são privilegiados com a
instalação de fixos produtivos
7
e são objetos de uma ação mais efetiva dos grandes
agentes imobiliários com finalidades especulativas. Para Accioliy (op. cit., p. 42), a
elevação dos preços “se deve à ação dos especuladores de terra, forçando uma alta
em função das expectativas criadas pelas potencialidades futuras de valorização”.
Nesse sentido, Harvey (op.cit., p.334) assevera que “como o capital se interessa,
pela apropriação da renda, desempenha papéis positivos e negativos em relação
com a acumulação. Suas funções de coordenação realizam-se ao custo de permitir
formas absurdas de especulação imobiliária”.
Na essência dos processos econômicos que se articulam na valorização
do litoral para o turismo, estão o sistema capitalista e a complexidade com que
sucede a especulação imobiliária. O processo se intensificou no Ceará, nas duas
últimas décadas, com muitas empresas envolvidas. Assim, a especulação
caracteriza-se, segundo Sandroni (1985, p.153), pela:
[...] compra e venda sistemática de bens com intenção de obter lucro rápido
e elevado, aproveitando a flutuação dos preços. A atuação do especulador
consiste em comprar mercadorias ou títulos quando seus preços estão em
baixa e revendê-los quando os preços estão em alta. As áreas preferidas
para ação do especulador são as bolsas de valores e de mercadorias ou a
venda de artigos de primeira necessidade.
7
Para Santos (2002, p.167) “a criação de fixos produtivos leva ao surgimento de fluxos que, por sua
vez, exigem fixos para balizar o seu próprio movimento. È a dialética entre a freqüência e a espessura
dos movimentos no período contemporâneo e a construção e modernização dos aeroportos, portos,
estradas, ferrovias e hidrovias”.
90
A ação dos especuladores imobiliários, que parcelam a terra para vender
a veranistas, se junta à das empresas turísticas, que prometem emprego e renda,
produzindo uma falsa realidade no litoral. Este movimento reforça a ideologia do
desenvolvimento econômico a partir dessas atividades, a noção de que estas
possuem efeito multiplicador, produzindo lucro fácil e imediato. Estas idéias ajudam
a produzir e reproduzir o espaço litorâneo, convertendo-o em capital imobiliário
8
. O
processo inicia, geralmente, com a grilagem, compra e venda de terrenos. As
empresas de turismo articulam-se ao Estado e sistemas financeiros para que seus
projetos sejam viabilizados e, na maioria dos casos, beneficiam-se de fatores
externos, como a atratividade das paisagens e/ou vantagens locacionais, sendo os
benefícios convertidos em capital financeiro. Kowarick (V. 44, 1979, p. 33) ajuda a
compreender melhor os mecanismos público-privados da especulação imobiliária,
com finalidade de valorização e parcelamento dos solos urbanos, no tempo e no
espaço:
O novo loteamento nunca é feito em continuidade imediata ao anterior, já
provido de serviços públicos. Ao contrário, entre o novo loteamento e o
último já equipado, deixava-se uma área de terra vazia, sem lotear.
Completado o novo loteamento, a linha de ônibus que o serviria seria,
necessariamente, um prolongamento a partir do último centro equipado.
Quando estendida, a linha de ônibus passa pela área não loteada, trazendo-
lhe imediatamente valorização.
A lógica da valorização e parcelamento da terra, a partir da implantação
de infra-estrutura, pode ser verificada no litoral cearense, especialmente, no litoral
oeste, área do Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste
– PRODETUR/NE. O Programa, ao implementar estrada, água, luz e saneamento,
revaloriza as terras litorâneas. Mesmo os espaços vazios de ocupação, as praias
distantes, como a de Tatajuba, podem ser consideradas tal como Kowarick (1979)
define: “terrenos de engorda”, isto é, lugares onde são alocadas infra-estruturas,
podem ser vistos como nichos de negócios e de especulação, espaços de reservas
8
Deve-se “entender o conceito de capital imobiliário como relação social, articulado com o Estado,
construtoras, financeiras etc., visando à apropriação do lucro sob a forma de renda da terra ao gerar
lucros, isto é, o processo de valorização imobiliária decorrente do movimento de capital investido na
ampliação da renda da terra” (ACCIOLY, op.cit., p.44).
91
ao capital e ao planejamento do turismo. Kowarick (op. cit, p.37), falando sobre a
especulação imobiliária, ajuda a entender o litoral cearense, ao esclarecer que
[...] a especulação imobiliária não se exprime tão – somente pela retenção
de terrenos que se situam entre um centro de suas zonas periféricas. Ela se
apresenta também com imenso vigor dentro das próprias áreas centrais,
quando zonas estagnadas ou decadentes recebem investimentos em
serviços ou infra-estruturas básicas. O surgimento de uma rodovia ou vias
expressas, a canalização de um simples córrego, enfim, uma melhoria
urbana de qualquer tipo, repercute imediatamente no preço dos terrenos.
A inserção de investimentos, no espaço, eleva o preço dos terrenos, além
de valorizar as áreas circunvizinhas. Essa valorização dos espaços desencadeia a
especulação das terras, forçando a expropriação dos pescadores, pois este primeiro
usuário é levado a vender as terras pela pressão das empresas imobiliárias, como é
o caso de várias comunidades espalhadas pelo litoral cearense, exemplo é o da
comunidade da Praia das Fontes, em Beberibe. As intervenções do Estado alocando
infra-estrutura, e das empresas pressionando a população local, produzem a
transformação do litoral, levando à venda e revenda dos terrenos que passaram à
condição de mercadoria. Alguns residentes, contudo, resistem e permanecem em
suas casas, ao passo que outros vendem as próprias residências e os filhos ficam
privados das terras dos ancestrais.
A lógica dos promotores imobiliários, na valorização dos espaços, eleva a
criação de fluxos (de pessoas e de mercadorias) direcionados para as áreas
consideradas turísticas, provocando diferentes impactos:
A criação de espaços turísticos e de lazer a partir de novas estratégias
interfere na produção de novas centralidades, no sentido em que produzem
pólos de atração que redimensionam o fluxo das pessoas num espaço
mais amplo. O fato de que o espaço se transforma em mercadoria produz
uma mobilização frenética desencadeada pelos promotores imobiliários e
pode levar à deterioração ou mesmo destruição de antigos lugares em
função da realização de interesses imediatos, em nome de um presente
programado e lucrativo, que traz, como conseqüência, a destruição de
92
áreas que passam a fazer parte do fluxo de realização do valor de troca
(CARLOS, 1999, p.67).
Diversas são as atividades que se instalam no litoral (turismo e a
carcinicultura), cada uma delas com suas especificidades, embora movidas pela
mesma expectativa, a acumulação, busca incessante de lucro e/ou de mais-valia.
Assim, “as empresas monopolizam primeiro as terras para obter a garantia de super-
lucros” (SEABRA O., 1979). A compreensão das estratégias do mercado de terras e
o processo de turistificação dos lugares remete ao fator político, que é fundamental
na produção do espaço e das articulações no território. Para captar essa dimensão,
deve-se atentar para o que revela Santos (2002, p.184):
[...] o espaço organizado não pode ser jamais considerado como uma
estrutura social dependendo unicamente da economia. Se esse pudesse
ter sido o caso em situações do passado, nos dias de hoje é mais que
evidente o fato de que outras influências interferem nas modificações da
estrutura espacial. O dado político, por exemplo, possui um papel motor.
A dimensão política está presente, sobretudo, nas normatizações que
contribuem para produção e valorização do espaço. No caso do solo urbano
transformado em mercadoria, ocorreram privatizações, por meio da implantação de
cadeias hoteleiras no litoral. Considerando que a maioria dessas terras é de
marinha, pertencente ao Patrimônio da União
9
, a privatização litorânea torna-se um
problema bem maior. Os grandes resorts, cadeias hoteleiras, implantam-se nas
proximidades do mar, e, quanto mais próximo e deslumbrante for a paisagem, mais
caro o produto. Por conseqüência, os terrenos de marinha são privatizados.
9
A lei 9.636, de 15 de maio de 1998, discorre que os terrenos de marinha se estendem da posição da
linha da preamar-média, de 1831, até a distância de 33 metros medidos horizontalmente para a parte
da terra. Eles são considerados bens imóveis da União. Situam-se no continente, na costa marítima,
nas margens dos rios e lagoas, bem como contornando ilhas, aonde se faça sentir a influência das
marés. Os acrescidos de marinha são aqueles formados, de modo natural ou artificialmente, para o
lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha. (TERRAMAR, 2004b,
p.33)
93
O “Projeto Orla”, elaboração do Governo Federal e órgãos responsáveis
pelo gerenciamento costeiro, é visto como um avanço nos processos de uso e
ocupação da zona costeira. O depoimento do gerente do Patrimônio da União
(GERENTE ...., 2005) destaca que a ocupação pelas comunidades encontra-se em
processo de regularização, principalmente as localizadas em Fortaleza. Disse que:
A União lançou um projeto chamado “Orla” e está em andamento, a nível
nacional, todos os Estados litorâneos brasileiros. Aqui, nós estamos
trabalhando muito essa questão da ocupação e do reordenamento da orla
marítima, através do “Projeto Orla”, com parcerias com o governo municipal,
estadual, com a sociedade civil e as comunidades de base, esse processo
está em andamento. Nesse processo está se discutindo, como é que
faríamos o ordenamento e ocupação desses terrenos. Em Fortaleza, quem
tem ocupado hoje, quase tudo está regular, mesmo aquelas comunidades
pobres como o Serviluz, o Pirambu e o Poço da Draga. Todas essas
comunidades têm a inscrição da ocupação de seus terrenos no Patrimônio
da União.
Estudiosos e ambientalistas temem que o Projeto Orla, juntamente com o
Zoneamento Ecológico-Econômico-ZEE, apenas legitimem os usos que tendem a
desembocar na intensificação do processo de apropriação da terra para alocação
dos empreendimentos e negócios no litoral, além de controlar os conflitos fundiários,
pela delimitação de áreas e normatização de usos. Ocorrem assim, uma divisão
territorial do espaço e a valorização dos espaços produtivos destinados às empresas
capitalistas. A lógica capitalista tem no espaço substrato para acumulação do capital
e para reprodução da sociedade de consumo. Portanto, a propriedade da terra é o
primeiro fundamento dessa reprodução. A importância deste processo, segundo
Lefebvre (op. cit., p. 160-161), está na base da acumulação geral, porque,
[...] ainda que essa propriedade imobiliária tenha dado lugar à propriedade
mobiliária, a do dinheiro e do capital, ela persiste. E mesmo ela se
consolida, desde o tempo de Marx, a burguesia enriquece comprando
terras, constituindo para si propriedades fundiárias (e, conseqüentemente,
reconstituindo, sobre a base de um novo monopólio, a propriedade
fundiária e a renda terra). A propriedade da terra, no fundo intacta,
reconstituída pelo capitalismo, pesa sobre o conjunto da sociedade.
94
A produção capitalista, evolui aceleradamente, assim como a sua
ideologia, exigindo um mundo de tempos rápidos, quando tudo e todos são
subordinados à produção técnica, alta produtividade, força de trabalho e eficiência.
Daí, por que sua expansão é incessante. Conforme Lefebvre (op.cit., p.176), há
quase uma regra de subordinação do espaço ao capitalismo que se estende por
todos os territórios e lugares, apesar de suas descontinuidades. Mostra este autor
que o processo,
[...] partindo, no tempo de Marx, de países limitados (a Inglaterra, uma parte
do continente europeu, depois a América do Norte), conquistou o globo
depois de ter constituído o mercado mundial, obtendo sucessos colossais
(principalmente a criação de lazer, do turismo etc.), apesar de algumas
derrotas graves, revoluções e revoltas
.
A expansão capitalista em busca de novas mercadorias e mercado
consumidor acontece por meio de confrontos, revoltas e conflitos entre grupos
sociais. As comunidades, a cada dia, são inseridas em um processo de urbanização
e exploração intensificado pelos media, pela televisão, nos mais recônditos espaços.
A redução das possibilidades de sobrevivência dos nativos no litoral clama por
ampla intervenção, exigindo-se que o Poder Público “olhe” para a pesca e a
agricultura de subsistência. Não basta apoiar os empreendimentos das grandes
empresas, mas há que se atentar para as iniciativas comunitárias.
As contradições e conflitos próprios do capitalismo “permanecem
irresolvidos, por isso sem as conquistas e os percalços que esse percurso implica é
impossível chegar às contradições do espaço” (MARTINS, op.cit, p.27). As
contradições do espaço litorâneo cearense, nesta pesquisa, são constatadas pelos
diversos elementos que expressam as progressões e regressões dos conflitos
vivenciados pelas comunidades, inseridas na produção dos territórios turísticos.
Nesta investigação, revelam-se detalhes desta produção capitalista, a partir de
depoimentos e declarações sobre a disputa fundiária vivenciada pelos moradores da
comunidade de pescadores de Tatajuba, em Camocim-CE.
95
4.2 O Território Local em Disputa
Se hoje Tatajuba se encontra numa situação delicada, é
porque alguém está tentando tirar o seu sossego; alguém está
tentando tirar a sua segurança; alguém está tentando tomar os
espaços que são reservados para as próximas gerações
(Liderança comunitária, depoimento na audiência pública da
COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS, 2001).
Entre as décadas de 1970 e 80, conforme depoimento dos moradores, as
terras de Tatajuba começaram a ser griladas e vendidas à empresa Imobiliária de
Fortaleza
10
que as repassou para o proprietário da Fazenda Vitória Régia, ex-
acionista da FININVEST, que tem sua sede no Rio de Janeiro, e, no Ceará, localiza-
se próxima à comunidade, na Baixa Grande, em área de tabuleiros pré-litorâneos,
denominada pela comunidade como “matas”. Nos depoimentos (PESQUISA ...,
2004; 2005), constatam-se as ameaças e o medo sofrido pelos moradores, no início
do processo de grilagem das terras:
Aquela vazante de frente, que fica bem na beira da praia, foi vendida pro
João Sales, um ladrão que tem ai que mediu tudo. Os coqueiros atrás do
meu cercado, ele fez uma medição de tudo e vendeu para empresa como
se fosse dele. Eu acho que tem uma enrolada muito grande, por que o João
Sales nunca saiu de Camocim, eles nunca chamaram o João Sales pra
nada e a justiça nunca citou o nome de João Sales. Ele fez isso no começo
dos anos 80, e a mãe morria de medo por que o João Sales tinha uns
capangas que ia pegar o pai, dizendo que o pai ia amanhecer com a boca
cheia de formiga. Hoje tem muita gente revoltada por que sofreu todo
mundo junto (Ex-pescador, 42 anos, morador de Tatajuba).
Novas aquisições de terras e a presença de representantes da empresa
Vitória Régia Empreendimentos imobiliários tornaram perceptível aos moradores a
ação de grileiros em suas terras. O processo se deu a partir de um grileiro que se
dizia dono dos terrenos locais ocupados pela comunidade, cujo sistema de posse,
não era acompanhado de registro formal; assim como se constata em Diegues (op.
cit., p.85), ao ressaltar que “dado o caráter informal da posse coletiva, esses
10
Os moradores da comunidade denunciam que as terras foram griladas por João Sales e vendidas à
Empresa Imobiliária Antônio Sales (2005).
96
terrenos são alvo fácil da especulação imobiliária e os primeiros a serem vítimas de
grilagem”. Após receberem pressão para deixar de utilizar áreas para agricultura e
não construírem outras casas, a comunidade foi tendo consciência da extensão do
problema. Como estratégia de defesa da terra, em 1991, fundaram a Associação
Comunitária dos Moradores de Tatajuba – ACOMOTA. Uma das primeiras
intervenções, em 1994, foi o pedido para criação da APA de Tatajuba. Sobre a
criação da ACOMOTA e a chegada dos representantes da empresa na comunidade,
os moradores contam ( PESQUISA ..., 2004) que:
No final do ano de 1991, foi fundada a ACOMOTA, onde se discutia, com
algumas pessoas mais inteligentes, que era importante que a gente lutasse,
se organizasse e que a gente se desenvolvesse. Buscasse parceiros e
pudesse nós mesmos desenvolver a comunidade e não um estrangeiro vir e
desenvolver. Era esse o objetivo principal. Só que a partir do ano 2000,
mudou a história com a chegada de um senhor chamado “Júlio Koerner”,
que era representante da empresa Vitória Régia. Chegou no ano de 1997
ou 1998, já com conversas bonitas, promessas e conseguiu conquistar
algumas lideranças fundadoras da ACOMOTA. Por causa disso é que eles
se tornaram mais fortes. Aqueles que defendiam que nas terras da
comunidade, quem deveria desenvolver era os próprios moradores, quem
defendia de princípio, se tornou aliado da empresa e por isso dificultou tudo.
Mas, mesmo assim, eu ainda acho interessante a própria comunidade se
desenvolver (Agricultor, 38 anos, morador de Vila Nova).
Neste decurso de organização local, a equipe do PRO-RENDA que
atuava na comunidade, percebendo a problemática, apresentou os componentes da
ACOMOTA à ONG – Instituto Terramar de Pesquisa e Assessoria a Pesca
Artesanal, em 2001. Desde então, esta ONG auxilia a comunidade na luta judicial
contra o conflito fundiário, por meio de seminários, encontros e reuniões, além da
contratação de apoio jurídico
11
. Solicitaram o cadastro das terras da comunidade ao
IDACE - Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará. O órgão fez a identificação
das posses, em 2001. A ONG
12
Instituto Terramar iniciou suas intervenções nas
comunidades do litoral a partir de assessoria à pesca, posteriormente ampliou suas
11
Representante jurídico da comunidade o advogado Francisco Silvino da Silva.
12
As ONG´s “originárias no movimento social dos anos 1970-80, as denominadas organizações não-
governamentais (ONG´s) são organizações civis sem fins lucrativos, que se estabelecem e se
consolidam em função de suas relações com as bases – os setores populares, e com a cúpula -, as
agências de financiamentos, instituições governamentais e iniciativa privada, formando um campo de
instituições que se dependem mutuamente, constituindo o chamado Terceiro Setor”. (LIMA S., 2003,
p.18).
97
atividades, apoiando a luta pela posse da terra. Dentre as comunidades está
Tatajuba, conforme declara uma das componentes do Instituto
13
:
O Terramar elege como prioridade, claro, no princípio era ajudar aos
pescadores a desenvolver uma pesca com novas tecnologias de uma forma
sustentável, só que o pescador tem uma relação direta com a terra. A terra
é que está em questão. Então, é extremamente importante dialogar com os
vários desafios que estão colocados para essas populações. Por conta
disso, algumas comunidades receberam maior atenção do Terramar, quanto
ao processo de resistência e luta pela terra. A Prainha do Canto Verde e
Tatajuba por exemplo (MARTINS, R., 2006).
Uma das orientações da ONG e da assessoria jurídica foi requerer os
registros de posse da fazenda Vitória Régia, no cartório de Camocim, em 2001.
Assim foi relatado pela comunidade (PESQUISA ...., 2004):
No final dos anos 2000 para 2001, parece que os empresários queriam
mesmo tomar posse. E então, foi quando chegou até a gente, na
comunidade, na nossa associação ACOMOTA, entrar na justiça, porque
essa terra era pra ser dos moradores, por que os próprios moradores não
chegaram a vender. A empresa comprou terrenos de posseiros e grileiros. A
empresa tinha dinheiro e comprou por preço barato (Morador de Tatajuba,
40 anos).
Em 2000, foi confirmada a suspeita dos moradores, ao receberem a cópia
dos registros das terras no nome da Fazenda Vitória Régia, no cartório de Camocim,
onde consta que, desde 1993, foram feitos registros e retificações de área,
totalizando 5.275,450 hectares, incluindo toda a extensão habitada pelos moradores.
Com o fato constatado, em 2001, as lideranças da comunidade impetraram diversas
ações contra a empresa, dentre elas: ação anulatória dos registros das terras,
interdito proibitório da implantação da empresa e solicitação, ao Patrimônio da
União, de cessão de área a favor da comunidade. Com essas ações, a empresa
ficou impedida de se instalar. Tanto que nunca foi elaborado Relatório de Impacto
Ambiental, Estudo de Impacto Ambiental ou pedido de licenciamento (Informação
Verbal)
14
.
13
Rosa Martins, componente do Instituto Terramar, responsável pela assessoria na comunidade de
Tatajuba, em entrevista concedida em fevereiro de 2006.
14
Notícia fornecida na SEMACE, em pesquisa realizada em março de 2006.
98
Na figura 25, elaborada pela empresa imobiliária, a partir do recorte da
área de Tatajuba, do Município de Camocim, pode-se ter uma idéia da área
delimitada, pelos traços em vermelho, estendendo-se por 5.275,450 hectares de
terras, que o empresário admite ser o proprietário e declara seus registros. São
observáveis, ainda, na figura, os polígonos em tons de cinza, correspondentes às
vilas de Tatajuba com as suas siglas
15
e os outros, referentes às áreas da Fazenda
Vitória Régia.
Atenta-se para o fato de que parte das terras, segundo a legislação do
Patrimônio da União, são terrenos de marinha, onde é proibida a propriedade
privada plena. Os registros da Vitória Régia incluem toda a extensão habitada nas
vilas de Tatajuba, mas os moradores relatam que é na Vila Nova onde a empresa
possui maior parte das terras, conforme se revela no depoimento (PESQUISA ....,
2004):
Quem apareceu ai foi o João Sales, morador não sei de quem comprou
muitas terras, que comprou pro Antônio Sales, irmão dele, o nome da
empresa é Vitória Régia, que a gente sabe que comprou algumas terras e
hoje diz que é dona de tudo... As terras da empresa ficam uns 6 km daqui,
de Tatajuba, lá nas matas, agora não sei até onde essa terra é marcada, sei
que até dentro do mar não era. Aonde eles têm mais terra é na Vila Nova,
do outro lado (Moradora de Tatajuba, 62 anos).
15
Significado das siglas figura 24 - Tatajuba (T.), Baixa da Tatajuba (B. T.), Vila Nova (V. N.) e Vila
São Francisco (V. S. F.).
99
V
SF
T
BT
V
N
FIGURA 25 – Área apropriada pela empresa imobiliária
FONTE – disponível em: www.tatajuba.com.br, acesso em 20/10/2004
O fato é que as vilas da comunidade de Tatajuba estão totalmente
inseridas nesse polígono, além de compreender a área da APA. O Diagnóstico
Socioambiental Participativo de Tatajuba, Camocim-CE, do Projeto Gestão Costeira
Sustentável (TERRAMAR, 2003a, p.11), realizado pelo Instituto Terramar, em
parceria com a UFC, confirma que:
Em 1993, pressentindo a ameaça que pairava sobre suas terras, a
comunidade começa a lutar pela implantação de uma APA – Área de
Proteção Ambiental. Na época a Câmara Municipal aprovou, em dezembro
de 1994, a lei criando a APA de Tatajuba. Em 1996 a Prefeitura expediu a
Instrução Normativa da APA, que em muitos artigos impede o uso da área
para fins de grande impacto.
A APA de Tatajuba foi criada, restringindo área de uso para 3.775
hectares. Posteriormente, com o aumento da extensão de área, em 2000, a Câmara
Municipal de Camocim alterou os limites para 4.598 ha, conforme o mapa 04. Não
chegou, porém, a ser publicada em Diário Oficial, e isso contribuiu para a ocorrência
dos conflitos. Sobre o processo referente à implantação da APA, na audiência
pública ocorrida em 2001, em Camocim, o representante do IDACE, explicou que
100
Estamos com uma equipe no campo, fazendo o trabalho de reconhecimento
da área. Só que estamos trabalhando a área maior do que a APA que está
definida hoje, de 3.755 hectares. Por solicitação da comunidade, que nos
pediram que a APA fosse levada até o limite do Guriú, essa área se estende
a 5 mil hectares, aproximadamente. Após o reconhecimento pelo trabalho
de campo, que é identificar, cadastrar e medir todo o perímetro, depois
identificar e cadastrar todas as ocupações. Quem tem uma posse lá, se
identificado, cadastrado e medida (COMISSÃO ..., 2001).
Em pesquisas realizadas em 2006, no IDACE, recebeu-se a informação
de que as terras da comunidade não foram tituladas, pois as ações na Justiça
impetradas pela ACOMOTA inviabilizam a titularização das posses, pois, como
declarou o representante, responsável pelo cadastro
16
na comunidade,
até que provem o contrário, as terras pertencem a empresa Vitória Régia e
ela é que a dona. Os moradores só receberão os títulos, se houver a
doação das terras pela empresa ao Estado, que por sua vez faria a
regularização das posses para os moradores cadastrados pelo IDACE e
pelo Patrimônio da União. Isso porque a grande parte das terras dos
moradores foram caracterizadas como terras de marinha, nesse sentido, no
caso de desapropriação, seria pela intervenção do INCRA (ARAÚJO,
2006).
Outras informações auferidas nesse órgão revelam que, em 2001, período
em que foi feito o cadastro das famílias de Tatajuba (ver quadro 1), foi realizada uma
proposta para os moradores que seria: “a doação do lote da moradia mais um
terreno comunitário de 800 hectares para plantação” (ARAÚJO, 2006). As
resistências comunitárias, porém, representadas pela ACOMOTA, não aceitaram o
acordo e solicitaram as terras correspondentes a toda APA de Tatajuba (2000) que
se limitam com o Guriú. Informaram, ainda, que as outras associações aceitam os
acordos, mas este só poderia se concretizar com aval completo entre as três
entidades comunitárias. No quadro 1, está demonstrada a quantidade de famílias
cadastradas, cerca de 370, porém observa-se que além das vilas de Tatajuba, foram
acrescentadas unidades familiares das adjacências como Baixa Grande, Corguinho
e Lago Grande, compreendendo os lotes das casas área total de 355, 04 m
2
:
16
Advogado Romoaldo Candoia de Araújo, representante do Instituto de Desenvolvimento Agrário do
Estado do Ceará – IDACE, entrevista concedida em março de 2006.
101
QUADRO 1 - SITUAÇÃO DAS POSSES EXISTENTES NAS VILAS DE TATAJUBA
Fonte - Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará – IDACE, 2006.
LOCALIDADE Nº LOTES Nº FAMÍLIAS ÁREA (m
2
)
Baixa Grande 9 5 45,59
Baixa da Tatajuba 60 42 76,06
Corguinho 43 35 64,15
São Francisco 29 20 28,76
Tatajuba Cabaceiras 115 72 39,03
Vila Nova 113 71 98,12
Lago Grande 1 1 4,83
TOTAL 370 246 355,04
Enquanto isso, a empresa conquista alguns e divide os residentes. Utiliza
o discurso ambientalista, propaga-se defensora e protetora da APA. Apresenta a
proposta do empreendimento turístico, tentando envolver a comunidade e afirmando
ser uma empresa que adotará “um novo conceito de desenvolvimento econômico-
social sustentável, em terras de grande beleza natural. Localizado próximo a
Jericoacoara, no município de Camocim, são 13 km de praia, abrangendo a bela vila
de Tatajuba
17
.” O projeto é implantar um complexo hoteleiro denominado de
“Condado Ecológico de Camocim”. Para tanto, criaram o “Instituto de
Desenvolvimento de Tatajuba” para apoiar eventos e projetos realizados em
Camocim e na comunidade:
[...] o empreendimento é uma iniciativa da Vitória Régia Empreendimentos
Imobiliários LTDA, que está sendo instalado em terras de propriedade da
empresa no Distrito de Guriú, norte do Ceará, na zona costeira localizada
entre Jericoacoara e a cidade de Camocim. Essas terras se distribuem por
duas fazendas distintas- Fazenda Vitória Régia e Fazenda Tatajuba
(Disponível em <http-//www.tatajuba.com.br/, acesso em 20/10/2004).
A fig. 26 destaca uma das placas da empresa, distribuídas pela área da
comunidade, afirmando sua presença, assegurando o discurso de protetora do meio
ambiente, com os dizeres: “atenção, área de preservação. Vitória Régia S/A”.
17
Informação disponível em <http-//www.tatajuba.com.br/, acesso em: 20/10/2004.
102
FIGURA 26 - Placa da Empresa Imobiliária em Tatajuba
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006.
Os moradores de Tatajuba revelam que o IBAMA fez o levantamento das
terras, a pedido do Ministério Público, elaborando um laudo técnico (IBAMA, 2001)
sobre a área. Nesse documento, consta que 15% da área de Tatajuba é terra da
União
18
, 60% são terrenos de APP – Área de Preservação Permanente e 25% são
terrenos com solo em desenvolvimento, utilizadas pela comunidade com atividades
agrícolas. Baseadas nesses estudos, as lideranças comunitárias (2004) afirmaram
que: “o que a gente sabe que aqui, em Tatajuba, é da União. Uma área super frágil
com dunas, mangue, rios e lagoas. O nosso local tem pouco espaço para
construção”. No referido documento do IBAMA, consta ainda que uma APA, não
seria a melhor opção para área, apontando indícios para a implantação de outra
unidade conservação, a RESEX – Reserva Extrativista.
18
A parcela das terras da União é a que se “encontra localizada nos terrenos que em regra se limitam
com as praias brasileiras. Tais áreas são conhecidas como terrenos de marinha, e correspondem à
faixa de 33 metros a contar da linha de preamar média do ano de 1831. Portanto, os terrenos da
União são identificados a partir da média das marés altas do ano de 1831, tomando como referência
o estado de situação da costa brasileira naquele ano. Os terrenos que se formaram a partir da linha
de preamar média do referido ano em direção ao mar, tanto os aterros como aqueles resultantes do
recuo do mar no tempo, são denominados acrescidos de marinha, que também são áreas de domínio
da União” (Disponível em: <www.spu.planejamento.gov.br>, acesso em: 11/11/2005).
103
Nas pesquisas realizadas em 2004, confirmou-se que a comunidade não
tem a documentação de posse de suas terras, nem os terrenos estão inscritos como
da União. Pela legislação brasileira, os moradores, depois de cadastrados no
Patrimônio da União, deveriam ser isentos ou pagar taxas de ocupação para receber
a permissão de uso. Outros tipos de imóveis, que pretendem se instalar na área,
primeiramente devem passar pelos procedimentos de licenciamento ambiental, pois
a área corresponde a terrenos sob a responsabilidade da União e de competência
institucional do IBAMA. Posteriormente, após a legalização e adequação às normas
ambientais, os proprietários cadastrados na União devem pagar taxas, que são
delimitadas pelas características do empreendimento, que de acordo com o
Departamento do Patrimônio da União - DPU, podem variar entre o pagamento de
foros, laudêmios, permissões de uso, locações, arrendamentos e/ou alienação de
imóveis.
Em 2000, ACOMOTA realizou seminário sobre especulação imobiliária e
conservação ambiental, com a participação da SEMACE, do IDACE, da ONG
Terramar e NEA/IBAMA, para discussão dos problemas. Como estratégia,
mobilizaram a comunidade e apresentaram um abaixo-assinado ao IBAMA e ao
CNPT, solicitando a criação de uma reserva extrativista. Como não há, entretanto,
consenso dos moradores, o processo produziu conflitos internos ainda maiores. O
grupo local que segue a empresa imobiliária diverge do grupo que prossegue a luta
de defesa da terra.
A empresa imobiliária desenvolve diversas estratégias para intervir na
comunidade, obtendo maiores dados sobre a realidade onde atua. Dentre elas,
realizou uma pesquisa socioeconômica em Tatajuba
19
, em 2001. Os responsáveis
pela pesquisa contrataram mão-de-obra local para aplicação dos formulários. Vários
problemas ocorreram durante os trabalhos, inclusive um trágico acidente com o
falecimento de uma componente dos pesquisadores, resultado do buggy ter
capotado nas dunas no momento em que transportava a equipe. Esse fato dividiu
19
A pesquisa socioeconômica de Tatajuba foi realizada pela Geológica Assessoria, Projetos e
Construções Ltda., em 2001. Informações concedidas pela Associação Comunitária dos Moradores
de Tatajuba, em 2004.
104
ainda mais os moradores e o relacionamento entre a empresa e a comunidade.
Depois deste episódio, foi enviada pelos pesquisadores uma carta à ACOMOTA
dando apoio à luta dos moradores (PESQUISA..., 2004):
A luta não será fácil, mas tem uma vantagem: o inimigo é bom de se
derrotar, porque é vulnerável, fanfarrão, fuxiqueiro, mais que estratégico,
achando que o dinheiro compra tudo e se acha o homem mais poderoso do
mundo e o mais inteligente. Isso é próprio dos medíocres. É só ir em frente,
não desistir e trabalhar, por que assim todo santo ajuda.
Outro trecho da carta denuncia a submissão dos moradores de Tatajuba em se
subjugarem e aceitarem calados o empreendimento turístico:
Este Condado tem tudo a ver com conde, como explicam os dicionaristas, e
a juventude de Tatajuba ia se conformar com isso e a população iria ficar
submissa eternamente como vassalos medievais, portanto, essa reação é
espontânea.
O representante jurídico da empresa
20
(2001), na audiência pública,
explicou a origem da fazenda Vitória Régia, ao dizer que “a empresa FININVEST
não tem nada a ver com a empresa italiana. A empresa FININVEST sempre foi
dirigida pela família Antunes Maciel. Posteriormente, é vendido o capital acionário e
ele sai da empresa e hoje tem apenas a Vitória Régia”. Assim que a empresa se
apresentou na comunidade, tinha ligação com a FININVEST, mas, na audiência
pública, informaram que a empresa imobiliária é pertencente apenas a um
proprietário sediado no Rio de Janeiro. Em outras declarações, tentaram explicar os
registros dos imóveis, além da ação de retificação de área, porém não explicaram
claramente, como foi realizada a compra dessas propriedades:
A primeira transcrição que existe desses imóveis data de 1942, a seguinte,
de 1953. São dois documentos: o documento 1973 e 1974. Esses
documentos, de 1974, e que mais tarde, geraram quatro matrículas: 888,
861, 862 e 859. Essas quatro matrículas são anteriores à Lei chamada Lei
20
O advogado Marcos Colares é o representante jurídico da Empresa Vitória Régia
Empreendimentos Imobiliários Ltda.
105
do Registro Público. Essa Lei entrou em vigor nos anos 70. [...] A partir dos
anos 70, todas essas áreas precisaram passar por uma retificação no País
inteiro, não só em Camocim (COMISSÃO ..., 2001).
A despeito da Ação de Retificação de Área, a Comissão dos Direitos
Humanos da OAB e o Escritório Frei Tito de Alencar
21
, na retrocitada audiência
pública, ressaltou que esse tipo de ação favorece a grilagem de terras no País.
Essas ações são favorecidas, pois a União, ao não se manifestar para uma
investigação dos casos, facilita a elaboração dessas retificações (informação
verbal)
22
. Nesse sentido, declarou (2001) que:
Uma Ação de Retificação de Área, embora seja um instrumento legal,
legítimo para regularizar tamanho de terra, mas, infelizmente, neste País,
Ações de Retificações de áreas – não sei se foi o caso - , mas já serviu para
legitimar a atuação de muitos grileiros por este Brasil afora. Ação de
Retificação de Área não tem contraditório, via de regra. Às vezes, as
pessoas que estão na área não tomam nem conhecimento, não sabem nem
o que está acontecendo. Quando, de repente, já vem a decisão que diz que
alguém que tinha cem hectares tem mil hectares. Isso já aconteceu muito.
Na mesma audiência pública, em 2001, o advogado da empresa
imobiliária declara as intenções divulgadas pelos empresários para implantação do
empreendimento turístico na área de Tatajuba e as primeiras ações que serão
tomadas pela empresa em “prol” da comunidade, com a doação das terras e a
promessa de “inclusão social”. Acentuou que:
A Vitória Régia quer, para demonstrar cabalmente que o seu interesse é no
desenvolvimento sustentável da região, nas áreas das comunidades, titular
essas áreas, em nome das comunidades, ampliando em 100%, ou seja, o
dobro da área, pensando na seguinte perspectiva- daqui a duas gerações
terá aí não um a família em cada casa, mas duas, no mínimo. A Vitória
Régia não faz isso por que é boazinha, mas por que crê que não é possível
uns terem muito e outros não terem nada.
21
O advogado Deodato Ramalho, representante da Comissão dos Direitos Humanos da OAB, e o
Escritório Frei Tito de Alencar (Ata da audiência pública, 2001).
22
Informação fornecida pelo advogado Romoaldo Candoia de Araújo, representante do Instituto de
Desenvolvimento Agrário do Estado do Ceará – IDACE, em março de 2006.
106
Sobre as intenções declaradas pela empresa e o significado de
desenvolvimento sustentável, os componentes da Associação dos Moradores de
Tatajuba falaram que “consideramos desenvolvimento sustentável quando os
moradores debatem, quando os moradores, juntos, decidem aquilo que querem e
não quando o empreendedor vem, não sei de onde, dizendo que fará isso e aquilo
[...]” (Depoimento de liderança, audiência pública, COMISSÃO ..., 2001).
As palavras de uma das lideranças da ACOMOTA deixa claro o que
entendem por desenvolvimento sustentável, isto é, a participação dos moradores
nas decisões e intervenções na comunidade, sendo este o primeiro passo para
constituir um processo democrático que busque o verdadeiro desenvolvimento. A
comunidade ressalta que Camocim e Tatajuba são áreas prioritárias para os
investimentos hoteleiros. No site de Tatajuba, revelam detalhes acerca do
empreendimento Condado Ecológico de Camocim:
Informações colhidas junto a algumas fontes em Fortaleza, mencionam que
o investimento projetado é um grande centro de turismo e eventos capaz de
abrigar cerca de 15 mil pessoas e que a SETUR - Secretaria de Turismo do
Ceará e a SEMACE - Superintendência Estadual do Meio Ambiente tem
total conhecimento do projeto. Também menciona-se que a própria SETUR
declara a iniciativa de primeira prioridade para o governo estadual
(disponível em: <
www.geocities.com/novatatajuba
>, acesso em:6/03/2005).
Na figura 27, são divisadas as estratégias da intervenção público-privado,
na região do Camocim, projetadas no Programa de Ação para o Desenvolvimento do
Turismo no Ceará, em sua segunda fase – PRODETUR/CE II, sendo o aeroporto
internacional em Parazinho-Granja, uma iniciativa do Estado, com parcerias
privadas. Sendo este aeroporto a principal estratégia para captar investimentos para
a região.
107
FIGURA 27 – Logística projetada pelo PRODETUR-NEII
FONTE – disponível em: www.tatajuba.com.br
, acesso em 20/10/2004
O principal argumento dos empresários que se apropriaram das terras da
comunidade é que contribuirão para o desenvolvimento sustentável do lugar,
trazendo infra-estrutura e ofertando empregos, com o empreendimento turístico. A
proposta turística para a região prevê a mobilização de fluxos para o lazer e
trabalho, sugerindo a implantação de um aeroporto na região, haja vista a longa
distância entre Fortaleza e esta área. Este aeroporto daria acesso a novas rotas
turísticas que se projetam ao Delta do Parnaíba e aos Lençóis Maranhenses,
concretizando a regionalização do turismo entre o Ceará, Piauí e Maranhão. Assim,
o espaço geográfico vai se estruturando de forma a colocar os fluxos em constante
movimento, com a instalação de infra-estruturas específicas para o turismo.
As estratégias do Estado, aliado aos empresários, evidenciam o avanço e
apropriação dos lugares litorâneos, declarando o que mostra Sandroni (1985, p.60),
ao dizer que “sem as condições objetivas de produção, o trabalho perde seu valor de
uso e o que resta é o valor de troca de sua força de trabalho”. O processo de
produção da sobrevivência dos moradores de Tatajuba depende do espaço livre no
mar, onde se tem a pesca, e da terra, para agricultura de subsistência.
108
Considerando que a comunidade não possui muitas possibilidades de produzir
sozinha, restam como força de trabalho, garantindo a mais-valia dos donos do
capital.
A presença da empresa na comunidade deflagrou lutas internas pela
defesa da terra. Este processo, iniciado com o fortalecimento dos laços de
solidariedade que os nativos mantêm entre si, levou-os a descobrir formas de
resistência e de luta. O movimento caminhou para a divisão, porque alguns
membros capitularam às promessas de emprego, sobretudo, do favorecimento de
algumas lideranças, além de emprego a distribuição de gleba de terra. Esta divisão
culminou com a formação de três associações comunitárias, em 2002. As posições
são diferentes: cada qual luta como melhor lhe convém. O depoimento da moradora
de Tatajuba revela melhor esse fato:
O problema é que no início do conflito existia uma associação que envolvia
as quatro vilas: Tatajuba, Vila Nova, Baixa da Tatajuba e Vila São
Francisco. E porque a gente sabe que existem conflitos. Nós tivemos no
início apoio do Instituto Terramar, a própria diocese de Tianguá estava
apoiando e outras instituições, demonstravam apoio a gente. Por causa
disso, a gente se tornava forte. Mas, muitas pessoas apoiavam a empresa,
porque ela prometia emprego para todos, prometia trabalho,
desenvolvimento, então por causa disso, muita gente achou melhor ficar do
lado da empresa. Então, parte dos associados resolveram formar outras
duas entidades, que dão sustentação a empresa. O problema maior é essa
divisão. A comunidade se dividiu (Moradora de Tatajuba, 28 anos,
PESQUISA ..., 2005).
Existia apenas uma associação comunitária, denominada Associação
Comunitária dos Moradores de Tatajuba – ACOMOTA (ver fig. 28), onde as decisões
eram tomadas em conjunto. Com a divisão das lideranças e a diminuição da
resistência, a estratégia dos especuladores foi facilitada. Antecedendo a divisão,
ocorreu um conflito interno entre os membros da Associação. Os dissidentes
solicitaram o pedido de improcedência e destituição da diretoria da ACOMOTA, em
2001, acusando a ocorrência de fraude na eleição. Foi, contudo, concedida liminar
favorável à diretoria em exercício na ACOMOTA. Daí resultou, em 2002, a criação
do Conselho de Desenvolvimento Comunitário de Tatajuba e Adjacências e a
Associação dos Moradores de Vila Nova e adjacências e Vila São Francisco.
109
FIGURA 28 - Associação Comunitária dos Moradores de Tatajuba - ACOMOTA
FONTE - Eluziane Mendes, Nov. 2004.
Diversas foram as ações realizadas pela ACOMOTA, com apoio da ONG
Terramar e de outras instituições em 2001, conforme se verifica no quadro 07, onde
estão sintetizadas as principais estratégias e encaminhamentos realizados pelas
associações e pela empresa. Dentre estas estratégias, realizou-se uma visita de
alguns membros da comunidade às praias do Cumbuco, Balbino, Praia das Fontes e
a Prainha do Canto Verde, para verificar a intervenção das empresas e do Estado
nesses lugares, conforme relata o depoimento de um dos associados e pescador de
Tatajuba:
Nós fomos à Batoque e peguemos a experiência das outras comunidades,
lá. Eles estiveram contando pra nós que quando os empresários chegaram
lá, prometeram umas coisas pra eles e não cumpriram. E do meio, por fim,
pra eles pegarem um pedaço da terra, pra eles morarem, eles já estavam
sentindo dificuldades. O empresário já tinha tomado de conta. A família
depois que ia crescendo, não tinha pra onde ficar e tinha que ir para outro
lugar. Por que no lugar deles era tudo dos empresários, com pousadas e
vendendo pra outros italianos. E não teve chance. Nós vimos isso. Achamos
que não que a gente não queria isso aqui. Por que se não, a gente ia se
prejudicar mais na frente. (Pescador de Tatajuba, 47 anos, PESQUISA ...,
2004).
110
Outra ação da ACOMOTA foi o pedido de criação da reserva extrativista,
pelo envio de carta ao CNPT – Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado de
Populações Tradicionais, em 2002. Em 2001, foi realizado o Laudo Técnico da
localidade de Tatajuba e, em 2005, sucedeu o Diagnóstico Socioeconômico e
Cultural de Tatajuba. As duas pesquisas foram realizadas com a participação do
IBAMA. Os dissidentes temem que a implantação da reserva venha subtrair novas
parcelas de terras da comunidade. Este problema não está claro no plano da
consciência de muitos moradores, esquecendo-se de que, ao se decidirem pela
venda de seus terrenos para turistas nacionais e estrangeiros, estão agravando
ainda mais o problema dos residentes. O relatado do morador revela bem esse fato:
Na Vila Nova tem mais de dez terrenos vendidos, gente de fora de São
Paulo, outros empresários. Ali no alto, quase tudo vendido e ninguém ta se
incomodando por que ninguém foi vendo. Só reclama quando tá nas vistas,
mas tem muita gente que vendeu e o dono não construiu ainda, mas esse
pessoal vai construir e o desenvolvimento vai aumentar mais. Isso só ta
acontecendo por que não tem união na comunidade e quem tá levando
vantagem com isso é o pessoal de fora (Morador de Tatajuba, 35 anos,
PESQUISA ...., 2005).
As associações diferem na luta e não conseguem manter interesses
comuns, solidarizando-se para pensar coletivamente o lugar. Depoimentos dos
moradores (2004; 2005) denunciam que os terrenos passaram a ser intensamente
fragmentados, loteados e vendidos, depois do cadastramento das posses, realizado
pelo IDACE em 2001. Afirmaram, ainda, que alguns moradores se direcionam ao
órgão, solicitam uma declaração da terra que foi medida, e então realizam a venda.
Disseram que a venda de terras
[...] aumentou depois da medição do IDACE, em 2001, daí pra frente o
pessoal começou a vender as posses vivas que existe. Continuam fazendo,
pegam um local que não tem nada e fazem outra posse. Posse viva
caracteriza quando tem uma casa um cajueiro, uma cacimba, um coqueiro,
alguma coisa que identifica uma posse. Por que só feito vazante em quatro
canto, eu considero ali “olho grande” e grilagem de terra. Se você anda de
noite por ai sem conhecer, você cai por cima do pau das cercas (Liderança
da comunitária, 26 anos, PESQUISA ..., 2006).
111
Reportando-se ao IDACE sobre as vendas de terras em Tatajuba pelos
nativos, revelaram que não existe nenhum tipo de impedimento de um morador
solicitar uma declaração no órgão, comprovando que seu lote foi medido e
cadastrado. Assinalaram que apenas a empresa, que se diz proprietária, pode tomar
alguma atitude, não permitindo essas vendas. As cercas que servem para demarcar
os terrenos dos moradores e, ainda, para delimitar terrenos para vendas,
contribuíram na especulação e valorização da terra como mercadoria.
Vários conflitos de terra no litoral do Ceará tiveram repercussão
internacional. O de Tatajuba foi resultado da criação de uma página na Internet,
elaborada pelo Instituto Terramar, denunciando a problemática vivenciada pelos
moradores, sendo esta: <www.geocities.com/novatatajuba>. Diversas ONGs
estrangeiras, instituições, ambientalistas e estudantes, que se interessam pelas
comunidades litorâneas, souberam do caso de Tatajuba e solicitaram providências
ao Governo do Estado. O representante do IDACE
23
, na audiência pública, (2001),
declarou que:
Temos uma demanda de caráter internacional, e o Governador tem
respondido positivamente. Temos mais de trinta e-mails recebidos nos
últimos dois meses, de ONGs (Organizações Não Governamentais) de
diversos países, de comunidades nacionais, solicitando que o Governo do
Estado proceda ações fundiárias dentro da comunidade de Tatajuba
(COMISSÃO ..., Ata da audiência pública, 2001)..
A empresa instala lentamente seus equipamentos, embora o complexo
turístico esteja impedido judicialmente de se implantar. Aguarda especialmente a
regularização dos conflitos fundiários para alocar o empreendimento. Enquanto isso,
adota como estratégia a mobilização e enfraquecimento da luta local, o
financiamento de projetos sociais (como banda de música na escola, a construção
da sede do Conselho Comunitário, projetos para artesanato, entre outros) como
forma de cooptar os residentes. Estes fatos solidificam o apoio de alguns moradores
23
Antônio Peixoto, representante do IDACE.
112
à empresa. Isto foi declarado nos depoimentos dos moradores, na audiência pública
(2001), afirmaram que:
Se a empresa está na nossa frente é porque puxamos a empresa. Somos
nós que queremos dias melhores. A empresa tem vida para nos dar e a
Associação de Tatajuba não tem. Queremos a empresa sim. Com luta ou
sem luta a empresa ficará do nosso lado sim (COMISSÃO ..., Ata da
audiência pública, 2001).
A busca por dias melhores incita parte da população apoiar aos
empresários. Disseram na audiência pública, em 2001, que:
Se estamos indo para o lado errado, com certeza, futuramente seremos
castigados. Mas se estamos indo para o lado certo, é esse lado que
queremos. Mas a empresa, de anos atrás, vem desenvolvendo empregos.
Hoje temos artesanato, o grupo do Coral, esses empregos geram renda sim
(COMISSÃO ..., Ata da audiência pública, 2001).
As formas de cooptação do movimento de resistência e, simultaneamente,
de ocultação das relações de dominação sobre as associações, desarticulam a
resistência da comunidade. As ações articuladas beneficiam a comunidade,
escamoteando o conflito no processo de valorização do espaço pelo interesse do
capital, mas, contraditoriamente, apesar de produzirem resultados positivos em curto
prazo, ocasionam graves problemas em longo prazo. A declaração do Instituto
Terramar, na audiência pública, (2001), sobre o conflito na comunidade, foi a
seguinte:
Está extremamente visível uma divisão da comunidade dessas lideranças,
exatamente porque parte dessa comunidade se iludiu com a falsa promessa
de que uma empresa que vem do Rio do Janeiro está interessada em fazer
o desenvolvimento de Tatajuba. É lamentável que pessoas irmãs, parentes,
vizinhas, que se conhecem há anos, hoje estejam nessa Audiência
divididos. É lamentável que pessoas, lideranças, que têm sonhos, como
essas pessoas aqui, estejam se deixando envolver por uma migalha que
hoje cai no bolso dessas pessoas e que sabemos que no futuro próximo
essas migalhas deixarão de cair. Porque o emprego que é gerado pela
indústria do turismo no Ceará, para a população local, é muito resumido sim
(COMISSÃO ..., Ata da audiência pública, 2001).
113
O conflito vivenciado em Tatajuba revela-se, além do fundiário, mas pelo
direito à sobrevivência no litoral. Mesmo os que se declaram a favor dos agentes
externos buscam defender o direito ao trabalho e o direito à vida. Apesar do capital
instaurar-se na sociedade, ensejando consumo e acirrando muitos conflitos, algumas
lideranças permanecem resistentes, sendo intensa a atuação das comunidades
litorâneas do Ceará.
Os anos de 2001 a 2003 são considerados pelos moradores como
período crítico, em que foram travados os principais embates, sobretudo, os conflitos
internos que resultaram na fragmentação da comunidade e ruptura da ACOMOTA e
dos laços de solidariedade que existia na convivência entre os moradores. Nessa
fase, surgiram as outras representações comunitárias. A ACOMOTA buscou apoio
no Instituto Terramar e as outras associações, Conselho Comunitário e Associação
de Vila Nova, na própria empresa.
O quadro 7, em anexo, sintetiza as diversas ações realizadas, que deram
continuidade à luta, como a anulação dos registros de terra, denúncias sobre o
conflito e pedidos de apoio. As declarações recentes dessa história (2006) revelaram
a diminuição gradativa dos projetos desenvolvidos pela empresa na comunidade; e
que os empregos e a distribuição de “mesadas” diminuíram e o único projeto que
ainda persiste, é o do Coral infantil, apoiado pelo Conselho Comunitário. Os
moradores, no entanto, sofrem pressões com a derrubada de cercas de vazantes e
com a constante presença de representantes da empresa na comunidade. Fatos
trágicos ocorreram em fevereiro de 2006, quando representantes da empresa em
Tatajuba impediram um morador de cercar uma nova área, resultando em ofensas,
luta corporal e tentativa de homicídio do morador. Não se sabe como sucedeu o
início do conflito, no entanto, a empresa, ao defender as terras das quais se diz
proprietária, não poderia ter reagido com tamanha violência. Outro informação é o
aumento do mercado de terras pelos nativos para compradores nacionais e
estrangeiros.
A empresa busca propor um novo acordo com a comunidade, mediante
“doação” das terras para o Estado regularizar e titularizar os moradores, conforme se
observa no quadro 2, a área de 280,09 ha compreenderia a APP – Área de
114
Preservação Permanente; para as associações comunitárias de moradores 296,01
ha e para os moradores cadastrados no IDACE seria 230,25 ha, correspondente aos
lotes de suas casas. Essa proposta foi apresentada em reunião realizada, em
fevereiro de 2006, com representantes da empresa, da Secretaria de Turismo, da
Procuradoria Geral do Estado, do IDACE, entre outros órgãos, mas com ausência de
qualquer representação da comunidade. Confirmou-se que é interesse do Estado a
implantação de empreendimentos na região de Camocim, pois alega a criação de
empregos e renda, fato que ratifica o “processo de proletarização”.
Outro aspecto do conflito é que essa proposta só poderá ser efetivada
com o consentimento das três associações comunitárias, sendo que a ACOMOTA
deveria retirar as ações na justiça contra a empresa imobiliária, dando abertura para
a proposta de doação das terras para que o Estado pudesse regularizar e titularizar
os moradores de Tatajuba, encerrando o conflito e dando encaminhamento aos
planos dos empreendedores. Além disso, existe outro empecilho, apresentado pelos
órgãos: é que o número de posseiros na área das vilas aumentou, desde o ano do
cadastro em 2001, e a empresa, em sua proposta, garante que só iria doar terras
para os cadastrados nesse período.
QUADRO 2 - PROPOSTA DE DOAÇÃO DE TERRAS PARA TATAJUBA
VILAS DE TATAJUBA TERRAS
PROPOSTAS PARA
AS ASSOCIAÇÕES
TERRAS PARA
POSSEIROS
CADASTRADOS NO
IDACE EM 2001
TERRAS PARA O
ESTADO
APPs
Nova Tatajuba 87,54 ha 63,41ha
Baixa Tatajuba 64,87 ha 50,38 ha
Vila Nova 116,69 ha 96,96 ha
Vila São Francisco 26,91 ha 19,50 ha
280,09 ha
TOTAL 296,01 ha 230,25 ha 280,09 ha
Fonte - Empresa Vitória Régia Empreendimentos Imobiliários, 2006.
24
No mesmo mês, aconteceram outras reuniões entre os representantes da
empresa, do Estado (IDACE) e os da comunidade, quando foi apresentada a nova
proposta que se mostrou mais condizente com a realidade dos moradores, apesar
24
Material distribuído pelos representantes da empresa, em reunião realizada em fevereiro de 2006.
115
de não ser o ideal (SILVINO DA SILVA, 2006)
25
. Mesmo assim, solicitaram dos
representantes das associações uma resposta, dando um período de um mês para
que fosse pensada pela comunidade uma decisão e, em seguida, retirada a ação
contra a empresa. O conflito fundiário representa grande resistência para o
desenvolvimento do negócio turístico, pois os empresários necessitam legalizar as
terras para atrair novos investidores
26
(FRANÇA, 2006).
O poema abaixo
27
demonstra as características das terras que compõem
Tatajuba e o avanço do capital sobre esse lugar. Ao tomar conhecimento do conflito
e das conseqüências desse processo na vida dos moradores, o Deputado criou o
apelo, em forma de poesia. Mediante símiles e outras figuras poéticas, roga que o
grande capital permita que a comunidade permaneça em seu lugar de
sobrevivência. Além disso, incita os pescadores à resistência e à luta, para levar
“além mar, a ganância dos especuladores”, solidificando com o apoio de suas
mulheres, que, nas praias e nas terras, possam tecer nova história, cujo enredo se
refira à justiça social.
TATAJUBA
Que sabe o grande capital
Do delicado curso de tuas dunas,
Ampulhetas semoventes a marcar
O espaço e o tempo de teus nativos?
Que conhecem as régias empresas
De fluxo diário de tuas marés
A encher e vazar tuas camboas,
Alegrias perenes de teus curumins?
Que pensam os novos Midas
Desse teu luar prateado,
A banhar de luz teu lago grande,
Pai-provedor desses teus pescadores?
Que teus ventos, Tatajuba,
Que levam e trazem teus homens do mar,
Carreguem, para além mar,
A ganância de tais especuladores.
25
Informações fornecidas pelo Advogado da comunidade Francisco Silvino da Silva, em entrevista
concedida em março de 2006.
26
Informações fornecidas em entrevista com representante da Secretaria de Turismo, em março de
2006.
27
Poema Tatajuba, de autoria do deputado João Alfredo Telles Melo, disponível em:
<www.geocities.com/novatatajuba>, acesso em: 6 de abril de 2005.
116
E que as mulheres do litoral,
Que tecem a vida com bilros e amores,
Possam gestar uma nova história
Nas praias/terras sem males nem dores.
A história de Tatajuba manifesta-se como exemplo das lutas pela posse
da terra e do processo de turistificação do litoral cearense. Não é a primeira e
provavelmente, não será a última, mas espera-se que as análises desses conflitos
contribuam para o entendimento da valorização da terra litorânea, e que ponham em
relevo a justiça social, dando direitos e condições de permanência das comunidades
no litoral.
No próximo texto, será retratado, especificamente, o turismo, por sua
dimensão política reestruturadora dos espaços, e ainda como formas de preencher
brechas deixadas pelos grandes empreendimentos, dando oportunidade para o
desenvolvimento das resistências locais, para permanecerem em suas terras; além
de estratégia de sobrevivência, buscando inserir as comunidades litorâneas na
cadeia produtiva do turismo, mediante a organização comunitária, prática estimulada
em Tatajuba, desde 2002, com o desenvolvimento de projetos de turismo
comunitário.
5. DE ESPAÇO COMUNITÁRIO A ESPAÇO DO TURISMO
Os lugares são inseridos na produção das mercadorias. A década de
1990 foi considerada como o período em que o turismo cearense teve maior
desenvolvimento. Esse processo, porém, não acontece de forma tranqüila. O
turismo, por intermédio das estratégias de marketing, transforma os espaços das
comunidades em atrativos e incita os conflitos fundiários
1
no litoral. A luta pela terra
torna-se um épico confronto.
Desde o final da década de 1970, a comunidade de Tatajuba passou a
ser ameaçada pela grilagem de suas terras, e, posteriormente, a partir da década de
1990, foram surpreendidos com a apropriação das terras pela empresa imobiliária,
fato narrado no texto anterior, processo que se realiza de forma conflituosa.
Tatajuba, que era uma comunidade isolada pelas dunas, a partir de sua inserção em
passeios e roteiros turísticos, gradativamente é inserida na valorização do litoral-
mercadoria. O conhecimento da comunidade sobre a pretensa implantação de
empreendimento turístico em sua área incitou, primeiramente nos moradores,
reações de oposição à empresa, e, posteriormente com a cooptação das antigas
lideranças, resultou na fragmentação da solidariedade, deixando os dissidentes
submissos à proletarização pelo turismo.
O litoral, antes espaço de comunidades de pescadores, passa por intensa
reestruturação, na perspectiva de realinhar esse espaço no circuito da economia do
turismo. Para tanto, a implantação do turismo induz a criação de políticas que
ensejam grandes intervenções, pela tentativa de reestruturar o espaço, cujo objetivo
é a implantação de novos investimentos que integram o litoral na economia-mundo.
Nesse sentido, tenta-se analisar o turismo, compreendendo o que leva a essa
indução e inserção. Busca-se compreender o papel do Estado na produção do
1
Para Gomes, H. (2002, p.87) “ao longo dos anos 70, 80 e 90 muitos conflitos entre populações
nativas e grileiros se desenrolaram ao longo do litoral cearense. São exemplos os casos de Redonda
– Icapuí, Esteves e Fontainha em Aracati, Prainha do Canto Verde, Praia das Fontes e Uruaú em
Beberibe, Barra Vella e Balbino em Cascavel, Batoque – Aquiraz, Sabiaguaba – Fortaleza, Cumbuco
– Caucaia, Paracuru, Capim Açu – Paraipaba, Maceió – Itapipoca, Caetanos – Amontada e Tatajuba
– Camocim”.
118
espaço, mediante políticas de reordenamento e regionalização do turismo litorâneo
cearense com os litorais do Piauí e Maranhão.
A turistificação dos litorais é implementada pelas políticas privadas e
públicas, que estruturam os territórios para receberem as empresas. Destacam-se
alguns elementos do Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no
Nordeste – PRODETUR/NE. Esse Programa, sobretudo na sua segunda fase,
colabora para a valorização do litoral oeste, com destaque do Município de Camocim
e da comunidade de Tatajuba, conforme constatado nos textos a seguir.
5.1 As Contradições da Política de Turismo no Espaço Cearense
O turismo, atividade em constante expansão e consumo do espaço, induz
o desenvolvimento de políticas de reordenamento do território para torná-lo palco e
substrato de seu desenvolvimento. Portanto, pretende-se analisar esse processo e
como as dimensões privadas, públicas e comunitárias, complementam-se e
contrapõem-se no modelo hegemônico.
A atividade turística é utilizada, tanto para justificar o desenvolvimento
econômico dos territórios, incentivando o desenvolvimento de políticas públicas,
quanto para justificar a intensificação das mazelas sociais dos lugares. Esta visão
transforma o turismo em “mito”, passando a ser uma das responsáveis pelas
transformações que acontecem no espaço e na sociedade. Knafou (1996, p. 63), ao
dizer que “a palavra turismo é polissêmica, pois evoca, ao mesmo tempo, uma
atividade humana e social, e todo aparelho econômico – igualmente muito
importante – que a rejunta”, confirma a intensidade da expansão do turismo pelos
territórios e da dimensão socioeconômica atingida pela atividade.
Não existe visão única do turismo como atividade econômica ou como
prática social. Fundamental, no entanto, é compreender que o turismo se insere na
produção capitalista e que, portanto, seu desenvolvimento reproduz a mesma lógica.
119
É uma prática social, por ter em sua essência o lazer, porém cooptado para a
acumulação, objetivando lucro.
Knafou (op.cit., p.72) entende ser o turismo “uma complexa atividade
humana, que coloca em questão os desejos e as representações do mundo, é então
reduzido a uma atividade econômica lucrativa, criadora de empregos”. Não se
pretende reduzir a dimensão do turismo, mas depreender o seu real significado na
produção/consumo do espaço litorâneo para o desenvolvimento do lazer
mercadoria. Essa modalidade de lazer é prioridade para o Estado, sugere a criação
de estratégias econômicas, desenvolvimento de políticas de reordenamento do
território, “consideradas investimentos públicos e empreendimentos privados”
(RODRIGUES,1997), isso para que a natureza, as cidades e as comunidades sejam
inseridas no circuito da economia global. Desse modo, os lugares são
transformados em centros de excelência para o consumo. Do contrário, ao pensar o
social, o gasto público na qualificação dos lugares para a população é considerado
despesa e não investimento.
O turismo é um fenômeno espacial, configura-se, portanto, como atividade
que exige políticas públicas, pois utiliza os serviços e infra-estrutura instalada nos
lugares. Knafou (idem, ibid) confirma ao dizer que
[...] o turismo utiliza equipamentos cujo monopólio não lhe pertence
(transportes, hospedagens, alimentação etc.); porque o mais freqüente é
que varie conforme as estações, o que subentende muita mão-de-obra
itinerante, difícil de ser analisada; muito trabalho escondido; muita
opacidade fiscal; muitas dissimulações; porque os próprios turistas, como
qualquer população em movimento, são de difícil contabilização.
Esses são alguns elementos da complexidade de compreensão do
turismo. Rodrigues (op.cit., p.44) assinala, ainda, que, na bibliografia do turismo, há
“dois enfoques: um que trata da produção e outro que analisa o consumo da
paisagem, do território, do espaço”. Considera, contudo, que o problema maior é a
complexidade da produção e do consumo relacionados à atividade turística. Isso
porque não existe “o turismo”, mas um conjunto de serviços de entretenimento,
hospedagem, alimentação, transporte, entre outros, além de infra-estruturas,
utilizadas pela atividade, tornando a alise complexa. O próprio espaço é
120
transformado em cenário espetacular, onde a vida é artificializada para a produção
de territórios turísticos. Sanchez (1991, p.219) revela que “a incorporação do espaço
do lazer ao processo econômico implica na configuração de uma atividade produtiva
que o transforma em mercadoria. Nessa perspectiva, o turismo se delineia como um
novo setor produtivo”; isto é, lazer e turismo promovem políticas territoriais.
O turismo é entendido ainda como “um fenômeno histórico sem
precedentes, na sua extensão e no seu sentido, é uma das invenções mais
espetaculares do lazer da sociedade moderna” (DUMAZEDIER, 1994, p. 38). Desde
então, o lazer “emerge como uma expressão da sociedade de consumo, que
necessita dele para se reproduzir ideológica e materialmente” (CORIOLANO, op. cit.,
p. 29). Portanto, o lazer foi materializado pelas viagens, transformado em turismo,
num produto de consumo e numa atividade lucrativa em constante expansão. Esse
processo é inerente à Modernidade, mundialização da economia e globalização dos
espaços. A despeito do turismo globalizado, Gallero (1996, p.34) revela que:
A globalização uniformizou os instrumentos, os veículos, os produtos de
consumo, a linguagem tecnológica, as modas, os materiais e
subseqüentemente os hábitos, as respostas, as aspirações de setores
importantes da sociedade. E também generalizou as formas de realizar o
turismo e, o que é mais grave, unificou – a televisão mediante – a utilização
dominante do tempo livre.
As políticas contribuem na permanência e criação das mercadorias, que
invadem todas as dimensões da existência, sobretudo o espaço. Nessa perspectiva,
Santos (2004, p.30) lembra que “o espaço, portanto, tornou-se a mercadoria
universal por excelência. Como todas as frações do território são marcadas,
doravante, por uma potencialidade cuja definição não se pode encontrar senão a
posteriori, o espaço se converte numa gama de especulações de ordem econômica,
ideológica, política, isoladamente ou em conjunto”. Igualmente, para Carlos (1996,
p.28), a produção do espaço em mercadoria resulta na criação de espaços do vazio:
O espaço produzido pela indústria do turismo perde o sentido, é o presente
sem espessura, quer dizer, sem história, sem identidade; neste sentido é o
espaço do vazio. Ausência. Não-lugares. Isso porque o lugar é, em sua
essência, produção humana, visto que se reproduz na relação entre espaço
e sociedade, o que significa a criação, estabelecimento de uma identidade
entre comunidade e lugar, identidade essa que se dá por meio de formas de
apropriação da vida.
121
Quando as políticas são direcionadas para a criação/estruturação de
equipamentos exclusivos do lazer mercadoria, criam espaços do vazio. As próprias
comunidades costeiras são lugares que fazem parte do substrato da produção do
turismo no espaço geográfico, ou mesmo caminham para a produção de espaços do
vazio.
Para o turismo, os lugares são, mais facilmente, valorizados, à medida
que o marketing consegue promovê-los nos mass media. Quando apresentam
características singulares de beleza paisagística e/ou culturais, como Tatajuba,
facilitam a valorização e restam transformados em elementos banais, isto é,
imagens-mercadorias, reestruturadas para o turismo.
A freqüência dos lugares explica-se pela constante expansão do capital
em busca da promoção do turismo. Além da inserção dos lugares comunitários, o
turismo produz “lugares” específicos para o consumo do lazer. Exemplos são os
parques temáticos internacionais, como: Disney World, Sea World, Cabo Kennedy,
lugares e estâncias turísticas, estudadas por Trigo (1993). Schlüter (2001, p.233)
demarca que “os centros turísticos de Cancún (México) e de Puerto Plata (República
Dominicana) são exemplos mais claros dessas estâncias turísticas na América
Latina”. A autora (op. cit., p.231-232), ao analisar a dimensão e desenvolvimento do
turismo, revela que,
[...] na década de 1950, quando a América Latina tentou desenvolver-se
por meio do turismo, empregou as mesmas políticas adotadas por todas as
nações em desenvolvimento. Sem avaliar, de forma crítica se esta seria
realmente a melhor alternativa, os países da região elaboraram uma
política para o turismo segundo os moldes implementados em outros
países, em desenvolvimento.
O mesmo modelo para implementação do turismo foi seguido pelos
países da América Latina, pelo Brasil, onde os empreendimentos internacionais são
considerados fontes de divisa, daí o processo de qualificação dos territórios e a
agressiva atração de investimentos. As políticas territoriais são elaboradas na
perspectiva desses objetivos e o Estado emerge como um dos principais agentes de
turistificação.
122
A turistificação dos lugares resulta de ações de comando, que, na maioria
dos casos, são de agentes exógenos aos lugares, configurando-se como processos,
em grande parte, alheios às vontades dos habitantes das comunidades. Santos (op.
cit., p.80) revela que as políticas
[...] são cada vez mais estranhas aos fins próprios do homem e do lugar.
Daí a necessidade de operar uma distinção entre a escala de realização
das ações e a escala do seu comando. Essa distinção se torna
fundamental no mundo de hoje- muitas das ações que se exercem num
lugar são o produto de necessidades alheias, de funções cuja geração é
distante e das quais apenas a resposta é localizada naquele ponto preciso
da superfície da Terra.
Knafou (op. cit., p.70-71) considera que as três fontes de turistificação,
dos lugares e dos espaços são: os turistas, que estão na origem do turismo; o
mercado, a segunda fonte de criação dos lugares turísticos; e a terceira fonte são os
planejadores e promotores “territoriais”. Assim “o processo de turistificação não vem
do próprio lugar”, desconsidera os residentes como centro do processo. Este fato só
ocorreria se os projetos de turismo fossem ligados a iniciativas locais. Para
Coriolano (2005, p.26), um território turístico “ocorre quando o lugar torna-se capaz
de gerar relações turísticas, ocorre o uso do espaço, formando territorialidades”.
Compreende-se que os agentes sociais atuam na produção do espaço e
são fundamentais à atividade turística, são considerados, então: as comunidades,
que produzem espaços com características primordiais de uso, definidas pelo
cotidiano; as empresas, que (re)estruturam os espaços para venderem seus
produtos; o Estado – promotor de parcerias e de alianças com o setor empresarial –
normatizando os usos turísticos e desejando a arrecadação de tributos e divisas
para as contas nacionais; e os turistas e visitantes, que contribuem na formação de
demandas para o consumo de serviços especializados, às vezes identificando novos
territórios turísticos ou de lazer. As ações, aqui realçadas, desembocam na
produção, valorização e privatização do espaço litorâneo cearense.
As ações dos agentes considerados revelam-se na realidade vivida em
Tatajuba. A comunidade age pelas ações de resistência ao empreendimento
hoteleiro. Por outro lado, alguns contribuem na especulação e valorização do lugar
123
como mercadoria, além de desejarem gerir seus negócios turísticos. A empresa
Vitória Régia Empreendimentos Imobiliários tem seu raio de ação em Tatajuba, ao
dizer-se proprietária das terras, buscando implantar seu negócio hoteleiro e, para
tanto, intervém diretamente no lugar, mediante estratégias de cooptação, reveladas
anterioriormente. Os turistas e visitantes chegam ao lugar, em passeios comprados
em Jericoacoara e, Camocim, e alguns compram lotes de terra e instalam pousadas.
É o caso de um gaúcho, um espanhol, entre outros, que chegaram como visitantes e
tornaram-se proprietários de pousadas; e, enfim, o Estado, agente normatizador e
reestruturador dos espaços.
O Estado, como agente de turistificação, insere-se nas relações de poder
exercidas no território litorâneo, favorecendo o desenvolvimento de políticas com o
objetivo de implantar redes para o fluxo do turismo global. Redes são entendidas
como “toda infra-estrutura, permitindo o transporte de matéria, de energia ou de
informação, e que se inscreve sobre um território onde se caracteriza pela topologia
dos seus pontos de acesso ou pontos terminais, seus arcos de transmissão, seus
nós de bifurcação ou de comunicação” (CURIEN, 1998, apud SANTOS, 2002,
p.262).
No contexto elaborado, os nós são representados pelos lugares onde
foram instaladas infra-estruturas, como: rodovias, comércio, aeroportos, portos etc.
São pontos de conexão, portanto, lugares de poder que constituem foco das redes
empresariais que compõem o turismo de elite, atuando no litoral. Procuram criar
condições, juntamente com os investimentos do Estado, principalmente, em
educação, infra-estruturas e serviços, que possam ser consideradas vantagens
locacionais. Isso porque a modalidade de turismo denominada “praia e sol” é
também utilizada como negócio no restante do litoral brasileiro e mundial. Portanto,
Santos (op. cit., p.214) adverte para a idéia de que:
Numa situação em que as virtualidades de cada localização estão sempre
mudando, instala-se o que bem se pode denominar de guerra dos lugares.
Estes não apenas devem utilizar suas presentes vantagens comparativas,
como criar novas, para atrair atividades promissoras de emprego e de
riqueza. Na batalha para permanecer atrativos, os lugares se utilizam de
recursos materiais (como as estruturas e equipamentos), imateriais (como
os serviços). E cada lugar busca realçar suas virtudes por meio dos seus
símbolos herdados, os recentemente elaborados, de modo a utilizar a
imagem do lugar como imã.
124
A transformação dos lugares em territórios turísticos demanda, sobretudo
do Estado, como agente de turistificação, o desenvolvimento de políticas públicas
para implantar redes competitivas no espaço. Ressalta-se que se deve “perceber o
espaço geográfico não como receptáculo de eventos, mera soma de fragmentos
particularizados” (ALMEIDA, 2004, p.12), mas em constante transformação,
sobretudo com a implantação de políticas. Para Fonseca (2005, p.81), “a noção de
políticas públicas – publicy policy – foi difundida inicialmente nos países anglo–
saxões, na segunda metade do século vinte. Políticas públicas referem-se ao
conjunto das ações e omissões do Estado para resolver problemas que afligem a
sociedade”. A autora (op. cit., p.82), anota, ainda, que:
É importante salientar que existem políticas públicas de várias naturezas
(econômica, social, cultural, segurança etc.) e que alguns delas apresentam
forte incidência espacial, ocasionando significativas mudanças na
organização do espaço. As políticas públicas de turismo implementadas no
Brasil nos últimos anos, por exemplo, têm provocado a reestruturação do
espaço em grandes extensões do litoral nordestino, ao procurar adequá-lo
ao exercício dessa nova função econômica.
As políticas públicas implementadas buscam inserir o espaço litorâneo no
circuito mundial da economia, por meio do estabelecimento de arranjos produtivos,
onde os territórios são requalificados e recebem nova funcionalização – a turística.
Implantam-se fixos e cria-se mão-de-obra especializada, para contribuir na formação
de fluxos. As políticas territoriais são elaboradas para reestruturar os lugares, em
função do crescimento econômico.
Outras políticas foram criadas, com menor incidência na organização
espacial, que repercutiram em âmbito municipal, como o Plano de Ação Turístico –
PAT e, posteriormente, a Política Nacional de Municipalização do Turismo – PNMT.
Esta última, para Fonseca (op.cit., p.98), “foi idealizada dentro da ótica do Estado
Neoliberal e delega aos municípios responsabilidades na condução e
implementação da atividade turística local, através do planejamento com enfoque
participativo”.
125
O território é o substrato onde acontece a materialização das políticas
públicas. No Ceará, as políticas de turismo foram implementadas e “têm particular
importância para o Estado o PRODETURIS
2
e o PRODETUR/CE, pois
compreendem projetos de grande porte em parceria com agências multilaterais de
crédito (BID), sendo o primeiro um instrumento técnico-operacional do segundo”
(ALMEIDA, op. cit.,p.84). Corrobora-se esta informação com a análise de Fonseca
(op.cit., p. 101), ao afirmar que “o Ceará foi o estado nordestino que mais investiu
recursos no PRODETUR/NE, totalizando 23 % do total dos investimentos da região,
demonstrando a importância que o governo cearense tem dado à atividade turística
no Estado. Os investimentos nos demais estados variaram entre 7% e 12%”.
A implementação da atividade turística priorizou as grandes empresas, o
capital, desrespeitando as comunidades e valorizando os habitantes apenas como
mão-de-obra. “Um consumo coletivo que tem como principal agente a iniciativa
privada e como principal ‘regulamentador’ o Estado” (RODRIGUES, op. cit., p.62),
sendo as políticas implementadas, direcionadas para o desenvolvimento do turismo
de alto nível, visando o crescimento econômico. Nesse sentido, “a produção global
do turismo é baseada, sobretudo, em novas formas de organização da atividade que
impõem ritmos à sociedade”, conforme ressalta Silveira (2002, p.39).
Para viabilizar o ritmo do capital, programas e projetos são realizados com
o objetivo de reordenar o território para implantação das empresas. Esse é o caso do
PRODETURIS – Programa de Desenvolvimento do Turismo em Área Prioritária do
Litoral do Ceará, do PRODETUR/NE – Programa de Ação para o Desenvolvimento
do Turismo no Nordeste e, recentemente, do Programa de Regionalização do
Turismo, do Ministério do Turismo e da Secretaria de Políticas Públicas de Turismo
(2004).
A rodovia estruturante, no entanto, uma das obras do PRODETUR I,
construída para dinamizar o fluxo de pessoas para o turismo no litoral oeste,
influenciou na demanda de turistas em direção a Camocim. Com efeito, na fase do
PRODETUR/CE II, o Município foi inserido como área prioritária para receber infra-
2
PRODETURIS – Programa de Desenvolvimento do Turismo em Área Prioritária do Litoral do Ceará.
126
estrutura e investimentos. Está prevista a instalação de aeroporto no distrito de
Parazinho, que dista cerca de 6km da Sede, além de outras infra-estruturas que
dinamizarão os fluxos, atraindo os investimentos privados no extremo oeste do
Ceará, conforme a figura 03, apresentada no texto anterior, que mostra a logística
projetada pelo PRODETUR-NE II, para a área de Camocim.
Informações auferidas da avaliação do PRODETUR, inseridas no Plano
de Desenvolvimento Integrado do Turismo e Sustentável do Pólo Costa do Sol -
PDITS (2003), confirmam as afirmativas, revelando que:
Os estudos realizados mostram que a segunda etapa do programa não
pode deixar de contemplar três Municípios bastante impactados pelos
investimentos realizados na primeira fase: Aquiraz, Camocim e Jijoca de
Jericoacoara. Sem intervenções pontuais essas três localidades não
conseguirão garantir a sustentabilidade da atividade turística uma vez que já
se percebe claramente o aumento do fluxo e o crescente interesse da
iniciativa privada em investir na região.
A hotelaria é um dos setores que cresce com intensidade em Camocim.
Abrange desde pousadas familiares a complexos de lazer, como Hotel Camocim
Boa Vista Resort & Conference Centre, além de outros empreendimentos com seus
projetos em elaboração, como Residencial Village Farol, Village Maceió, Residencial
Marilha, Village Park Resort “Caraúbas”, Hotel Caranguejo Resort. Ressalta-se que
o empreendimento Condado Ecológico de Camocim, complexo turístico com dois
hotéis, que se estende por área de 1.500ha, projeto em elaboração, por fazer parte
do contexto de conflitos fundiários na comunidade de Tatajuba. Pode-se observar
no quadro 03, a quantidade de empresas e negócios da hotelaria, instalados e os
que serão implantados nos próximos anos em Camocim, justificando a revalorização
deste lugar pela atividade turística.
127
QUADRO 03
EQUIPAMENTOS DOS MEIOS DE HOSPEDAGEM E COMPLEXOS TURÍSTICOS DE CAMOCIM
NOME FANTASIA
SUBTIPO
DISTRITO
INICIO DA
ATIVIDADE
N.º DE
EMPREGADOS
UHS
LEITOS
Camocim Praia Hotel Hotel Sede 1977 04 14 31
Camocim Park Hotel Hotel Sede 1977 09 22 76
Camocim Boa Vista Resort &
Conference Centre. Marilha
Mirante Empreendimentos
Turísticos Ltda.
Resort Sede 2001 40 120 -----
Condado Ecológico de
Camocim *
(Obs: marster plan em
elaboração)
Resort e complexo de lazer Praia da
Tatajuba
----- ----- ---- -----
Área Marilha Clube* Resort e complexo de lazer Camocim
Beira-rio
---- ---- ---- ----
Residencial Village Farol* Resort e complexo de lazer Praia do
Farol
----- ---- ---- -----
Village Maceió* Resort e complexo de lazer Praia de
Macéio
----- ---- ---- ----
Residencial Marilha* Resort e complexo de lazer ---- ----- ---- ---- ----
Village Park Resort
“Caraúbas”*
Resort e complexo de lazer Praia das
Caraúbas
---- ---- ---- ----
Hotel Caranguejo Resort* Resort e complexo de lazer ------ ---- ----- ---- ----
Hotel Lusitânia Hotel Sede 1988 03 18 36
Pousada Maceió Pousada Praia de
Maceió
1996 03 03 12
Pousada Verde Folha Pousada Nova
Tatajuba
1994 05 02 04
Pousada Brisa do Mar Pousada Nova
Tatajuba
1992 05 06 12
Pousada Santa Maria Pousada Nova
Tatajuba
2005 03 03 -----
Hotel Municipal de Camocim Hotel Sede 1997 09 34 70
128
FONTE: ADAPTADO DO PAT (2000) E PDITS (2003).
Pousada Le Baron Pousada Sede 1995 03 04 12
Pousada Beira Mar Pousada Sede 1984 03 06 18
Pousada e restaurante Brisa
do Lago
Pousada Sede 1996 05 10 36
Pousada Paraíso Pousada Sede 1992 05 09 33
Pousada Ponta Porã Pousada Sede 1986 03 22 56
Pousada Esplanada do Porto Pousada Sede 1997 04 07 19
Pousada o Rancho Pousada Sede 1995 03 11 22
Total Pousadas (11) Hotéis (05) Resorts e complexos de lazer (07)
* Projetos em elaboração.
O crescimento intensivo dos empreendimentos hoteleiros e os complexos
de lazer em Camocim, além das áreas de Jijoca de Jericoacoara, de Aquiraz
, de
Fortaleza, é uma das justificativas para inserção no mapa das prioridades da
Secretaria de Turismo. A SETUR (2004), revela que “a oferta hoteleira nas regiões
prioritárias, em 2003, era composta por 988 meios de hospedagens com 21.661Uhs
e 52.979 leitos. O pólo Fortaleza apresenta magnitudes superiores às observadas
para as demais regiões”. No Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo e
Sustentável do Pólo Costa do Sol – PDTIS (2003), são apontadas instalações de
infra-estruturas que possibilitem a integração e formação de roteiros regionalizados.
Além dos projetos hoteleiros está prevista a construção de um aeroporto
regional, que sirva as cidades de Camocim e Jijoca de Jericoacoara. O
objetivo é atender melhor à demanda que já busca o interior facilitando,
também, o trânsito dos turistas que desejam conhecer o Delta do Parnaíba,
ou os Lençóis Maranhenses, localizados nos Estados vizinhos. Os
investimentos públicos e privados somados, atingirão cerca de U$$ 20
milhões. A análise detalhada dos fatores acima mostra que a não inclusão
dos Municípios de Aquiraz, Jijoca de Jericoacoara e Camocim na segunda
etapa do PRODETUR/ CE pode significar a degradação da região, que já
sofre os impactos do turismo. Ações de infra-estrutura, preservação,
conservação do Meio Ambiente e Capacitação da População são
fundamentais para que a região possa se beneficiar adequadamente da
atividade turística (GOVERNO ..., PDTIS, 2003a)
No PDTIS (2003) ressalta que “a proximidade que Camocim tem com as
localidades de Parnaíba, no Piauí, e Jericoacoara e a serra da Ibiapaba, no Ceará,
facilitará para que o Município venha a se constituir, num futuro próximo, inclusive
129
pelas ligações rodoviárias a serem estabelecidas, num corredor de atrativos naturais
da maior relevância para as atividades turísticas da região”. Esses fatores são
cooptados como justificativa da formação de roteiros regionalizados.
O Ministério do Turismo, criado em 2003, teve como prioridades o
lançamento do Plano Nacional do Turismo e, posteriormente a criação do Programa
de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil, seguindo as metas elaboradas
no Plano Nacional. Para o Ministério (BRASIL, 2004, p.11), a “regionalização do
turismo é um modelo de gestão de política pública descentralizada, coordenada e
integrada, baseada nos princípios da flexibilidade, articulação, mobilização,
cooperação intersetorial e interinstitucional e na sinergia de decisões”.
Revela-se que o contexto das políticas públicas brasileiras continua
descentralizando ao ponto de delegar aos municípios responsabilidades, justificando
o enfoque participativo. No Programa, entretanto, explica que “regionalizar é
transformar a ação centrada na unidade municipal em uma política pública
mobilizadora, capaz de provocar mudanças, sistematizar o planejamento e
coordenar o processo de desenvolvimento local e regional, estadual e nacional de
forma articulada e compartilhada” (BRASIL, idem, ibid).
Na fig. 29, pode-se observar a localização de alguns empreendimentos, e
ainda, os municípios, em vermelho, que receberão novos projetos, constatando a
produção e expansão dos espaços turísticos no litoral cearense. É claramente visível
que no litoral leste estão concentrados os equipamentos, no entanto, o Município de
Camocim, no extremo oeste, configura-se como o foco de novos empreendimentos
turísticos que se encontram em elaboração.
130
131
A política de regionalização do turismo oferece a perspectiva da formação
de produtos turísticos regionais, com a criação de roteiros integrados. No Nordeste,
os Estados do Ceará, Maranhão e Piauí iniciaram a criação de um convênio para
formação de um pólo turístico regional integrado.
Os Estados do Ceará, Maranhão e Piauí firmaram no dia 4 de março um
convênio de cooperação com o Ministério do Turismo e o Banco do
Nordeste para a formação do primeiro pólo turístico regional integrado, no
âmbito do Prodetur. A partir do acordo, técnicos nomeados pelos parceiros
estabelecerão os mecanismos operacionais necessários para a elaboração
do Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentável do Pólo
Regional da Costa Norte, que abrange os município de Jijoca de
Jericoacara, Camocim e Barroquinha, no Ceará; Cajueiro da Praia, Luiz
Correa, Parnaíba e Ilha Grande, no Piauí; e Araioses, Água Doce do
Maranhão, Tutóia, Paulino Neves e Barreirinhas, no Maranhão. (JORNAL
BRASIL TURISMO, 08/05/2005).
O Pólo Regional da Costa Norte é a nova proposta lançada pelos estados
que compõem o CE-PI-MA. Considerada iniciativa pioneira e, após sua consolidação
no PRODETUR Nordeste II, esses Estados poderão receber recursos e
financiamentos pelo BID e de contrapartida federal. O citado periódico expressa que
“o objetivo principal do convênio é promover a melhoria da qualidade de vida da
população e a consolidação da atividade turística local” (JORNAL BRASIL
TURISMO, 08/05/2005). As ações para elaboração do pólo turístico da Costa Norte
foram subdivididas, segundo informações do Jornal Brasil Turismo (idem, ibd), da
seguinte maneira:
A parceria estabelece que o Ministério do Turismo ficará responsável por
coordenar a elaboração do PDITS do Pólo Costa Norte, com recursos da
contrapartida federal ao Programa. De sua parte, os Estados deverão
trabalhar no desenvolvimento integrado e sustentável do turismo na região,
formatando, por exemplo, circuitos que possam compartilhar a presença dos
mesmos turistas, entre outras ações que desencadeiem benefícios à região,
como um destino único, em que se incluem campanhas de promoção e
divulgação do novo pólo.
No objetivo apresentado para formação da parceria CE-PI-MA, põem-se
em destaque a promoção da melhoria da qualidade de vida da população e a
consolidação da atividade turística local. Como compreender o local, na perspectiva
132
da captação de investimentos globais? Esse é o caso do Ceará, que se apresenta
na “vanguarda” do roteiro regionalizado, por ter, em Camocim, inaugurado o Boa
Vista Resort & Conference Centre, de propriedade de empresário italiano, “[...] o
resort revelou o potencial turístico do município para o mercado internacional,
marcadamente italianos e portugueses, que chegam cada vez em maior número ao
Nordeste brasileiro, tendo como principal portão de entrada Fortaleza” (JORNAL
BRASIL TURISMO, 08/05/2005).
Na fig. 30, é possível observar elementos que compõem a infra-estrutura
do Boa Vista Resort & Conference Centre.
FIGURA 30 - Estrutura do Boa Vista Resort & Conference Centre
FONTE - NETTUR/UECE, 2006.
133
O turismo constitui-se como atividade contraditória, porque desagrega as
comunidades, artificializa os lugares e impacta o meio ambiente, mas é reclamado
como uma prática social, indutora de políticas públicas. A cultura e a natureza,
condições de produção, restam destruídas pelos mesmos meios: o crescimento
econômico. É apontado como uma possibilidade de reanimação da economia,
promovendo um desenvolvimento local integrado a todos os setores sociais e
econômicos das comunidades. Souza, M. J. L. de. (1997, p.21), refletindo se o
turismo pode contribuir para a política de desenvolvimento local”, anota que:
Na medida em que o turismo, em vez de simplesmente se ajustar a uma
realidade marcada por heteronomia, disparidades e preconceitos
(eventualmente até agravando esses problemas), contribuir, de algum
modo, para minorar esse quadro, ele estará, sem ressalvas, sendo um fator
de desenvolvimento socioespacial.
Partindo desse pressuposto, entende-se que o desenvolvimento do
turismo no Ceará não atingiu o patamar de uma política promotora do
desenvolvimento socioespacial. Ocorreu nos moldes do crescimento econômico, em
contraposição às culturas locais, pois esse modelo tem "preferência pelo turismo de
massa, que resulta na acumulação e reprodução do capital, através dos grandes
empreendimentos como resorts, hóteis de luxo, parques, balneários” (CORIOLANO,
1998, p. 144).
Nesse sentido, como os lugares são inseridos na produção e
implementação do turismo? E como as políticas comunitárias podem mediar as
relações entre turismo globalizado e o local? Esses são alguns questionamentos que
se pretende analisar, diante da realidade que se apresenta na comunidade de
Tatajuba, um dos lugares onde o turismo busca introduzir sua reprodução,
garantindo sua equivalência, como será constatado nos próximos escritos.
134
5.2 Tatajuba: entre Passeios e Rotas Turísticas
Passa muito turista por aqui. Tatajuba faz parte de uma rota de
Camocim-Jeri e de Jeri até Camocim, passa muito. E também
durante o dia os turistas vão para a Lagoa da Torta que é
atrativo turístico. Quando eles compram os pacotes em Jeri, já
inclui o passeio para Tatajuba. Eles passam! (Depoimento de
um Pescador, nativo de Tatajuba, PESQUISA ..., 2006).
“Eles passam” – essa é a expressão do morador de Tatajuba, reportando-
se aos turistas vindos de Jericoacoara, comunidade turística que se localiza no
Município de Jijoca de Jericoacoara, limitando-se com o Município de Camocim,
especificamente com o Distrito de Guriú, onde se localiza Tatajuba, portanto,
comunidades vizinhas.
Jericoacoara era uma vila de pescadores que se assemelhava à de
Tatajuba, conforme os depoimentos dos residentes do lugar, em pesquisa realizada
em janeiro de 2006. Dentre as declarações que fizeram menção a Tatajuba e ao
início da construção de pousadas no local, destacam-se algumas (NETTUR, 2006):
Jeri era Tatajuba antigamente.
Antigamente, Jericoacoara era bom também. Existia fartura da pescaria e
plantação. Hoje com o turismo ninguém planta mais. Tudo tem que ser
comprado.
Tatajuba, a comunidade é mais unida, diferente de Jericoacoara onde a
comunidade não trabalha em grupo.
Tatajuba é bom, mas já se tem iniciado a construção de pousada no local,
mas ainda não se tem a mesma movimentação que em Jericoacoara.
A praia de Jericoacoara é considerada pelo trade turístico uma das mais
belas do Ceará e um dos atrativos mais cobiçados e valorizados no litoral. Suas
terras são vendidas com preços que variam na ordem de milhões – não é um fato
burlesco. É verídico, pois até à equipe de pesquisadores, ao chegar à comunidade,
nas camionetas que fazem o trajeto da Sede do Município à praia, foram oferecidas
as tais terras.
135
Na coleta de depoimentos dos residentes, na praia de Jericoacoara,
comprovou-se que Tatajuba é vendida como um dos seus passeios turísticos.
Conforme se observa no gráfico 01, a “pedra furada”, estrutura rochosa na praia, foi
o mais cotado, sendo que o passeio para Tatajuba, fica entre os atrativos de Jeri, de
maior destaque.
GRÁFICO 01 - PRINCIPAIS ATRATIVOS
TURISTICOS DE JERICOACOARA
10%
8%
4%
12%
14%
26%
6%
10%
6%
4%
COM. DE TATAJUBA
DUNAS
FESTAS
LAGOAS
MANGUE SECO
PASSEIO DE BUGGY
PEDRA FURADA
PÔR DO SOL
PRAIA
OUTROS
FONTE - NETTUR/UECE, 2006.
Em “Jeri”, nome reduzido do lugar, acatado pelos turistas, ofertam-se
passeios à lagoa Azul, ao mangue Seco e também à lagoa da Torta em Tatajuba. A
partir dessa rota, alguns turistas e visitantes passaram a conhecer Tatajuba,
dizendo-se encantados e, alguns, compraram lotes e instalaram suas próprias
pousadas, como se constatará no próximo texto. Dentre os atrativos, os passeios de
buggies, as lagoas, o forró na praia, Tatajuba e a lagoa da Torta são os mais
freqüentados.
Os depoimentos citados são apenas um demonstrativo que confirmam a
preocupação dos moradores de Tatajuba. Na realidade, parte dos moradores, pois
os vendedores das barracas na lagoa da Torta, estão satisfeitos com o modelo de
turismo empregado. Revelam-se no depoimento do morador a satisfação dos
barraqueiros, a adaptação pelo modelo de turismo e a defesa pela entrada de
136
empresas na comunidade. Os moradores que mais “conscientes” apelam para que
seja realizado um turismo diferente:
Os turistas muitas vezes compram uma água de coco, comem um peixe
na lagoa. Lá tem barraca é um lugar muito bonito. Quem vende lá são
daqui. As pessoas que estão lá vendendo na lagoa estão felizes e
defendem a empresa, porque acham que é dessa forma é que o
desenvolvimento é do jeito que está aí. Eles estão vivendo do turista. Se a
senhora for comer um peixe lá, a senhora volta é tudo muito caro. Porque a
maioria dos turistas é tudo gringo. Eles acham que todo mundo que vai pra
lá é estrangeiro. Eles exploram o turista. Para eles é um grande
investimento. Para quem pensa num turismo diferente aquilo é uma
exploração (Pescador, 29 anos, PESQUISA ..., 2006).
A declaração do morador de Tatajuba revela que, na lagoa da Torta, o
turismo segue o mesmo ritmo de Jericoacoara, sendo o aumento dos preços e do
custo de vida a maior reclamação dos residentes. Vários depoimentos constataram
as modificações ocorridas na antiga vila e as mudanças negativas. Um deles falou
assim: “a comunidade piorou porque o sossego diminuiu”, “sem o turismo era paz”.
Expressam os processos de segregação socioespacial na vila, ao dizer que “o nativo
não pode construir, mas o turista pode”, confirmam, dizendo que “estamos perdendo
o lugar para os estrangeiros” (Depoimentos dos moradores de Jericoacoara,
NETTUR, 2006).
Dentre as modificações ocorridas nessa praia, estão também os impactos
ambientais que se intensificam no período de alta estação ou de festividades, com o
exorbitante aumento do fluxo de pessoas, usufruindo e utilizando o mesmo espaço.
As fossas negras, lençol freático contaminado, lixo, fluxo intenso de automóveis e a
construção irregular são apontados como os piores problemas causados na natureza
de Jericoacoara. Ressalta-se que as construções irregulares estão contribuindo para
a mudança de direção da migração das dunas, que se direcionam para soterrar a
vila.
137
Apesar dos depoimentos revelarem grandes mudanças sociais e
ambientais na vila, outros rebatem, ao afirmarem que, com o turismo tudo melhorou;
que a atividade turística trouxe benefícios para a comunidade, sobretudo de infra-
estruturas e trabalho. Constatam esse fator, quando comparam Tatajuba com
Jericoacoara, pois, conforme a pesquisa realizada, cerca de 47% dos entrevistados,
entre turistas e residentes, afirmaram conhecer o lugar, principalmente pelos
passeios, como mostra o gráfico 02.
GFICO 02 - COMUNIDADES CONHECIDAS
PELOS RESIDENTES E TURISTAS DE
JERICOACOARA
3%
6%
3%
9%
3%
16%
13%
47%
CAIÇARA
CAMOCIM
CORREGO DO BRAÇO
GUR
JIJOCA
MANGUE SECO
PREA
TATAJUBA
FONTE - NETTUR/UECE, 2006.
Os moradores de Tatajuba possuem modos próprios de ver e pensar o
turismo desenvolvido nesse lugar. O depoimento da moradora de Tatajuba revela o
medo que sentem de a comunidade se transformar num lugar turístico, nos moldes
de Jeri:
Jericoacoara eu conheço assim, que tem muitas drogas, tem vários turistas
diferentes uns praticam coisas boas, umas coisas ruins. Tem muita droga e
isso a gente não quer pra cá. A gente quer que aqui fique sempre assim
tranqüilo. Lá os nativos venderam e os que têm terra não têm direito a mais
nada, que ali tudo é de novos donos. Aqui a gente não quer isso, a gente
quer que os turistas que cheguem aqui seja bom, que beneficie os que
moram aqui. Vamos trabalhar juntos. Não que venha o povo de fora, ficam
suas pousadas boas, ganhe bom dinheiro e os nativos nada. Isso é que a
gente não quer (Moradora de Tatajuba, 30 anos, PESQUISA ..., 2004).
138
Mesmo com a tensão sofrida por parte dos moradores, Tatajuba é um dos
atrativos de roteiros turísticos realizados antes da iniciativa do Programa de
Regionalização do Ministério do Turismo (BRASIL, 2004). Alguns residentes de
Jericoacoara e outras empresas, como a Jeri Moom, a Koala Turismo (ver fig. 31),
Off Road, entre outras, realizam essas viagens, tendo Jericoacoara e Fortaleza
como os principais pontos de saída. Os preços e os dias da viagem variam pelos
detalhes do roteiro, sendo realizadas em carros tracionados, na maioria, do tipo
troller, entre cinco e dez dias.
FIGURA 31 - Koala Passeios – Jericoacoara/CE
FONTE - NETTUR/UECE, 2006.
Na fig. 32, verifica-se um turista, em Jericoacoara, observando o roteiro
realizado na viagem, sendo a própria Jericoacoara e Tatajuba pontos visitados, além
do delta do Parnaíba e os Lençóis Maranhenses, pontos altos, isto é, os principais
atrativos nos Estados vizinhos.
139
FIGURA 32 - Roteiro Turístico CE-PI-MA em Jericoacoara
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006
Parte da comunidade de Tatajuba teme que seu espaço se torne um lugar
do turismo de grandes empreendimentos. A empresa imobiliária
3
tenta implantar o
“Condado Ecológico de Camocim”, um complexo para turismo e eventos, em área
que compreende 5.275,450 hectares, denominada de Costa da Tatajuba (ver mapa
03). Os empresários alegam que a área corresponde a duas fazendas – a Vitória
Régia e a fazenda Tatajuba. Em informações coletadas na SETUR
4
, disseram que
esse empresário realiza um trabalho de atração de investidores para as terras das
quais se diz proprietário, sobretudo daqueles que desejam se agregar ao projeto do
Condado Ecológico de Camocim (FRANÇA, 2006). No site
5
da empresa, são
apresentados os elementos de marketing do negócio, incluindo as paisagens e
festividades do lugar como parte de seus atrativos. Assinalam, ali, que o
empreendimento será “um novo conceito de desenvolvimento econômico-social
sustentável, em terras de grande beleza natural”
. O Hotel Aventuras (fig. 33) é o
3
Empresa Vitória Régia Empreendimentos Imobiliários Ltda., responsável pela implantação do
empreendimento turístico.
4
Informações fornecidas pela Secretaria de Turismo do Estado do Ceará, Coord. de Atração de
Investimentos e Fomento, em entrevista concedida em março de 2006.
5
www.tatajuba.com.br acessado em 20/10/2004.
140
primeiro equipamento instalado na área, que, de acordo com o depoimento da
moradora de Tatajuba (PESQUISA ..., 2006), se localiza “na Baixa Grande, no
Guriú, onde a empresa tem uma sede e um hotel. No início o representante era o
chamado Júlio Koerner e ele saiu. Hoje é o Rogério Sabóia que representa a
empresa e mora em Camocim”.
FIGURA 33 - Estrutura do Hotel Aventuras
FONTE - Disponível em:< www.tatajuba.com.br
>, acesso em: 20/10/2004.
Os empresários garantem que vão surpreender o turista, e, para alcançar
essa meta, asseguram que protegerão a biodiversidade, iriam criar programas de
inclusão social para os moradores locais e, para finalizar, pretendem tornar a área
atrativa a Investimentos. Isto é, associados ao Estado, por meio das políticas de
investimentos, reestruturarão o território para o comércio, conforme as estratégias
demonstradas na figura 27. Além destas, os moradores de Tatajuba revelam que os
empresários chegaram na comunidade oferecendo diversos benefícios:
Quando a empresa chegou, eles começaram a formar estratégias de
trabalho para poder conquistar o pessoal, o morador. No início eles
trouxeram curso de artesanato e quiseram formar uma cooperativa.
Formaram um coral, que até hoje, é o que existe e mantêm eles ainda,
segurando as pessoas e outras coisas. Tem um prof. de Camocim que vem
141
todos os sábados dar aulas de canto e de instrumentos. É o que eles estão
segurando (Liderança da ACOMOTA, 30 anos, PESQUISA ..., 2006).
Muitas são as promessas feitas aos moradores da comunidade, sobretudo
a criação de empregos e a “inclusão social”. O representante
6
da Comissão dos
Direitos Humanos da OAB e do Escritório Frei Tito de Alencar, na audiência pública
de 2001, porém, ratifica, a essência das empresas:
Empresa visa lucro. É fantasia achar que uma empresa vem pra cá para
distribuir riqueza com a comunidade. Todo empreendimento traz também
“benefícios sociais”, dá empregos etc. Mas fundamentalmente, empresa
quer lucro (COMISSÃO ..., 2001).
Os moradores de Tatajuba são pessoas que vivem das atividades de
pesca, agricultura, coleta, serviços e do pouco comércio. Nesse sentido, alguns
moradores acreditam que um empreendimento de grande porte não teria condições
de oferecer desenvolvimento para o lugar, como é proposto. Constata-se tal idéia,
nas palavras do morador:
O empreendimento pra nós aqui não é bom não. Porque, como é que nós ía
trabalhar com um empreendimento do turismo, se nós não sabemos
trabalhar com o turismo. Eles é que vão tomar de conta de tudo. Nós não
vamos ser nem empregados dele, com certeza (Pescador de Tatajuba, 65
anos, PESQUISA ..., 2004).
O turismo transforma os lugares em objetos mercadológicos, valorizando
o espaço em função do valor de troca e do consumo. O espaço vira mercadoria para
o turismo, mas, para continuar no mercado, as políticas criadas apóiam as
empresas, desconsiderando a dimensão social, assim como ratifica Beni (2005), ao
dizer que “são elas as que mais se beneficiam das políticas públicas de promoção,
as que têm acesso ao financiamento e encontram condições favoráveis para
incorporar novas tecnologias”.
6
Advogado Deodato Ramalho, representante da Comissão dos Direitos Humanos da OAB e o do
Escritório Frei Tito de Alencar.
142
O conflito pela terra com os grileiros, especuladores e empresas
imobiliárias incita ações de resistência ao turismo globalizado e seus grandes
empreendimentos. O mapeamento dos investimentos turísticos na área de
Camocim explica a revalorização da terra litorânea, para o mercado turístico
internacional. Evidencia a constante tensão em defesa da posse da terra, fazendo
surgir uma nova proposta de turismo – o comunitário. Esta forma leva as
comunidades a buscar sua inserção na cadeia produtiva do turismo.
A versão comunitária do Turismo em Tatajuba é um projeto em
construção que “caminha” lentamente. O turismo denominado “convencional”, no
entanto, acelera sua implantação, através dos equipamentos hoteleiros, como
poderá ser constado no desenvolvimento do próximo texto.
5.3 O Turismo Comunitário: Nova Proposta
A ordem global busca impor, a todos os lugares, uma única
racionalidade. E os lugares respondem ao Mundo segundo os
diversos modos de sua própria racionalidade (SANTOS, 2002,
p.338).
O espaço litorâneo cearense, gradativamente, é reestruturado para o
turismo, mediante a viabilização das políticas públicas e privadas. As contradições
do capitalismo são evidenciadas, ao assinalar que oferece emprego, ao mesmo
tempo em que produz a substituição de atividades tradicionais, enseja concentração
de renda e dá possibilidade para a existência de atividades comunitárias, entre
outras. Da lógica capitalista, surgem as próprias contradições, que derivam
“possibilidades” de sobrevivência das comunidades. Os moradores buscam “uma
nova racionalidade”, apoiados pelas organizações não-governamentais.
Do seio da exploração, surgem propostas de desenvolvimento do turismo
pelas comunidades, promovido por políticas comunitárias em oposição ao modelo
dos resorts e complexos turísticos. Desenvolvem pequenos negócios, como
143
pousadas domiciliares, restaurantes, barracas, venda de artesanato e exposição das
tradições locais, buscando a geração de emprego e renda; sendo que a lógica do
capital é reproduzida nas comunidades. No turismo de base local, o caráter
impactante e degradador é menor. Confirma esta idéia Vasconcelos (2003, p. 326),
ao dizer que
[...] o turismo litorâneo vem explorando intensamente as praias, falésias,
lidos, corais, deltas, todas as paisagens costeiras deslumbrantes e atrativos.
Quanto maior a ocupação do litoral, maior a implementação de
equipamentos turísticos. A tendência tem sido de aumento de conflitos
nessa ocupação à medida que se multiplicam os projetos turísticos,
sobretudo os mega projetos.
Uma das opções para minimizar os efeitos dos impactos da implantação
dos grandes empreendimentos no litoral, atraídos pelos incentivos
7
do Estado, é
utilizar a atividade turística como política comunitária para geração de renda e uma
forma de inclusão no turismo global, conforme aponta a comunidade. Emerge,
assim, o “Turismo Comunitário”, gerido pelos moradores.
O Turismo Comunitário é desenvolvido utilizando-se dos recursos naturais
e culturais existentes nos lugares. Diferencia-se do turismo de massa, convencional,
pois este se realiza pela implantação de grande infra-estrutura, além do marketing
intenso para tornar o lugar conhecido (MENDES; CORIOLANO, 2003b). Já essa
nova política de turismo, também chamada de Turismo Socialmente Responsável,
tenta priorizar a conservação do meio ambiente e das culturas tradicionais. É a
alternativa encontrada pelas comunidades que buscam desenvolver o turismo,
criando oportunidades de trabalho, complementando a renda dos moradores. As
ações são tentativas de constituir uma política comunitária e social, cujo objetivo é a
permanência e sobrevivência no espaço litorâneo.
As políticas de turismo comunitário são apoiadas pelas iniciativas das
organizações não-governamentais que contribuem na implantação dos pequenos
7
Almeida (op. cit., p.102) relata que “um expediente de uso corrente da Política de Desenvolvimento
do Estado do Ceará tem sido a utilização de benefícios fiscais para atrair a instalação de novos
empreendimentos produtivos”.
144
negócios, além de realizar o marketing turístico dos lugares, atraindo os turistas às
comunidades, com a oferta de produtos simples, culinária, artes e cultura. Nesse
sentido, acreditam que se torna mais fácil, criar laços de comunicação e respeito
mútuo entre turista e morador, sendo as relações mais solidárias e pessoais, em
oposição do turismo “convencional”, em que as relações são impessoais e distantes.
O Instituto Terramar é a instituição que contribui na implantação e
desenvolvimento do turismo comunitário em Tatajuba e na Prainha do Canto Verde.
O depoimento de uma representante
8
do Instituto revela o significado do turismo
comunitário para a ONG:
Significa estar pensando numa outra lógica de desenvolvimento que não é
pautado no capital e no lucro. Mas, em princípios de vida, de interação com
o meio ambiente e também de desenvolvimento e movimento de circulação
de renda no local, ajudando a comunidade a se desenvolver numa
perspectiva da socioeconômica solidária. Quer dizer, a interação das várias
expressões do processo produtivo - agricultura, pesca, artesanato, turismo e
culinária. Fazer com que a interação e o planejamento desses vários
processos acabam, fortalecendo ainda mais as atividades principais da
comunidade que é a pesca e a agricultura, e as atividades complementares
- o artesanato, a pintura, a arte, a musicalidade e o próprio turismo, que se
apresenta como uma atividade complementar à atividade principal daquela
população (MARTINS, 2006).
Na dimensão comunitária, a atividade turística é pensada, ainda, como
forma de reação, mas, ao mesmo tempo, é uma inserção na economia. É a
reprodução em dimensões microescalares, pois não foge do modelo capitalista de
geração de renda, mas se apresenta como uma nova proposta, por ser uma política
“de baixo para cima”, gestada pela comunidade; uma política comunitária que busca
beneficiar a base e não às grandes empresas pertencentes ao circuito mundial da
economia. Nesse sentido, caracteriza-se como uma reação ao turismo dito
convencional, que se realiza sem a participação dos residentes. Não aceitam
“calados” a implantação das grandes empresas turísticas, ao contrário, buscam criar
possibilidades de trabalho para os moradores, por intermédio de projetos endógenos
que contribuam para a sobrevivência.
8
Rosa Martins componente do Instituto Terramar, desenvolve o monitoramento do projeto de turismo
comunitário em Tatajuba, Camocim-CE, em entrevista concedida em fevereiro de 2006.
145
A vila de pescadores da Prainha do Canto Verde, no litoral leste, em
Beberibe, é um dos exemplos de política comunitária no Ceará, onde os agentes são
os moradores da comunidade (MENDES; CORIOLANO, 2003a). A vila tornou-se
referência para outros lugares, como a comunidade de Tatajuba, que busca
desenvolver o local pautado na conservação da natureza e respeito às culturas
tradicionais. Ao se tratar de respeitar a cultura local, Santos (op. cit., p. 144-145) faz
referência ao conflito entre cultura popular e de massa,
[...] os “de baixo” não dispõem de meios (materiais e outros) para participar
plenamente da cultura moderna de massas. Mas sua cultura, por ser
baseada no território, no trabalho e no cotidiano, ganha a força necessária
para deformar, ali mesmo, o impacto da cultura de massas. Gente junta cria
cultura e, paralelamente, cria uma economia territorializada, uma política
territorializada. Essa cultura de vizinhança valoriza, ao mesmo tempo, a
experiência da escassez e a experiência da convivência e da solidariedade.
É desse modo que, gerada de dentro, essa cultura endógena impõe-se
como um alimento da política dos pobres, que se dá independentemente e
acima dos partidos e das organizações.
A política dos desprovidos de capital apresenta-se por suas dimensões
comunitárias. Se existe o turismo criado pelos ricos, por que os pobres não poderiam
também fazê-lo? Na sociedade da mercadoria, os produtos são constantemente
criados e recriados, no mercado formal e informal. Em relação ao turismo,
certamente, não acompanham os mesmos padrões e selos de luxuosidade.
Apontado, porém, nos documentos elaborados sobre Tatajuba, isto é, no laudo
técnico do IBAMA (2001), Diagnóstico Socioparticipativo (TERRAMAR; UFC, 2002) e
outros documentos do governo (PDTIS 2003), o turismo apresenta-se como
alternativa de geração de renda e complemento das atividades extrativistas
tradicionais (pesca, agricultura e a coleta).
Tatajuba é conhecida, pela maioria dos visitantes, como uma extensão
de Jericoacoara, conforme constatado nas pesquisas realizadas nessa praia, em
2006. Alguns condutores de trilhas da comunidade chegam a externar esse fator
com indignação, pois garantem que em Tatajuba existe maior diversidade de
atrativos e que, portanto, deveria se tornar conhecida e o turismo ser mais uma fonte
146
de renda para seus moradores. Apesar do difícil acesso à comunidade, muitos
turistas passam por Tatajuba, vindos de Jericoacoara ou Camocim, quando fazem
passeios de buggies pela região.
Os moradores ainda não conseguiram organizar e estruturar a
comunidade para o desenvolvimento do turismo e não recebem apoio
governamental para isto. Os apoios recebidos são de instituições não-
governamentais, como o TERRAMAR, por meio da ACOMOTA, pretendem implantar
um projeto de turismo comunitário, com financiamento de ONG´s estrangeiras, para
capacitação e desenvolvimento de infra-estrutura comunitária, nova sede da
associação – ACOMOTA, pousadas e quartos, restaurante e equipamentos,
capacitação para guias, merendeiras e outros.
Outro apoio oferecido à comunidade verifica-se por intermédio das
representações comunitárias: Conselho Comunitário de Tatajuba e Associação
Comunitária de Vila Nova. De acordo com o depoimento dos moradores (PESQUISA
..., 2005), essas associações recebem recursos “doados” pela empresa imobiliária
para o desenvolvimento de projetos de banda de música, nova sede do Conselho,
projeto de Internet, entre outros. Em ambos os casos, o Estado é ausente no que
concerne ao desenvolvimento de equipamentos comunitários. Em 2003, foi
elaborado pelas associações, com suporte da empresa imobiliária, um projeto com a
temática “Definição Macro-estratégia de Desenvolvimento Sustentável das
Comunidades: Tatajuba, Baixa da Tatajuba, Vila Nova e Vila São Francisco”.
Justificava a “decadência” da pesca e o surgimento do turismo como “redenção”
para o desenvolvimento da região e, ainda, era uma tentativa de negociação com a
empresa, conforme é revelado no trecho do documento:
(...) acreditamos que um processo de construção de uma Agenda
Comunitária, com ampla participação e envolvimento das diversas
“correntes” presentes na comunidade, minimizará estas arestas e facilitará
as negociações entre estas e a empresa Vitória Régia (CONSELHO ...,
2003, p.15).
A proposta da “Agenda Comunitária” foi enviada em 2003, para o Fundo
Nacional do Meio Ambiente (FNMA), com o objetivo de angariar recursos para o
147
desenvolvimento de um plano local de desenvolvimento “sustentável”. Foi, porém,
denunciado pelo Fórum em Defesa da Zona Costeira do Ceará – FDZCC, em 2003,
pois alegaram que não fez referência à ACOMOTA, associação mais antiga da
comunidade. Referenciam apenas as associações criadas em 2002, além de estar
claramente expresso que esse projeto foi criado para cooptar a comunidade para os
interesses dos grandes empreendimentos.
As associações, excetuando a ACOMOTA, não apóiam a criação da
RESEX na comunidade, mas, contraditoriamente, elaboraram um projeto, solicitando
recursos das mesmas instituições governamentais que trabalham com a instalação
da reserva extrativista. Percebe-se a manipulação das ações comunitárias pelas
empresas, mas os próprios moradores, iludidos pela idéia do crescimento econômico
e do consumo, deixam-se conduzir.
A infra-estrutura é simples, no entanto, no período da realização deste
estudo, que compreendeu os anos de 2004 a 2006, contatou-se um crescimento dos
meios de hospedagem, assim como da construção de casas dos moradores. A
hospedagem é feita nas pousadas e quartos de aluguel, distribuídos na vila de
Tatajuba. Os quartos domiciliares são estruturas modestas, mas acolhedoras.
Oferecem lanches, almoços e jantares, sendo o peixe frito, a moqueca de arraia e os
crustáceos, os pratos regionais. No quadro 4, tem-se o inventário dos meios de
hospedagem:
QUADRO 4 – MEIOS DE HOSPEDAGEM DE TATAJUBA
ESTABELECIMENTO
Pousadas
PROPRIETÁRIO /
origem
QUANTIDADE DE
LEITOS
FINANCIAMENTO
Verde Folha Holandês 07 com banheiros Próprio
Brisa do Mar Manoel Pedro 10 com banheiros Próprio
Pousada Santa Maria Miguel (espanhol) 03 com banheiros Próprio
Casa da Matusa Desativada
QUARTOS DE
ALUGUEL
PROPRIETÁRIO QUANTIDADE DE
LEITOS
FINANCIAMENTO
Casa da Dona Mazé Mazé 02 Próprio
Casa da Marlene Marlene 03 Próprio
Casa do Sr. Oswaldo Oswaldo / Dona
Antônia
05 Próprio
Casa do Zezinho Zezinho 03 Próprio
Total de leitos 33
FONTE: PESQUISA DIRETA, 2005-2006.
148
Nas figuras a seguir, pode-se observar alguns desses meios de
hospedagem existentes na comunidade. A pousada Verde Folha (fig. 34), o
proprietário é natural do Rio Grande do Sul
9
. Foi pescador profissional e mora na
comunidade há quase 12 anos. Fazia parte da ACOMOTA e da Colônia de
Pescadores. Declarou que “sempre quis viver em um lugar tranqüilo” (PESQUISA ..,
2005). Conheceu primeiro Jericoacoara e depois veio para Tatajuba onde foi bem
recebido. No começo, tinha apenas um restaurante e depois começou a fazer o
receptivo das pessoas que vinham da lagoa da Torta. Instalou os quartos e criou a
pousada. Passou um ano em Camocim e dois em Fortaleza. Assinalou que o
movimento na pousada caiu muito. Há sete anos, só havia duas pousadas,
recentemente foram instaladas outras. Em 2006, a pousada Verde Folha foi vendida
para um grupo de holandeses, que efetuou também a compra das terras adjacentes.
Por conta desse fato, criou conflitos com o seu vizinho, outro estrangeiro, um
espanhol, proprietário da pousada Santa Maria.
FIGURA 34 - Pousada Verde Folha
FIGURA 35 - Pousada Casa da Marlene
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./2004 FONTE - Eluziane Mendes, Ago./2004
Na pousada Casa da Marlene
10
(figura 35), são alugados quartos para
hospedagem, além de serem servidas refeições e vendido artesanato feito pela
própria moradora. Informou que as pessoas na comunidade têm medo de que o
turismo traga problemas como drogas, mas confirma que em Tatajuba há o turismo
9
Marcos Aurélio Pozzan em entrevista concedida em fevereiro de 2005.
10
Marlene, moradora de Tatajuba, em entrevista concedida em agosto de 2004 e janeiro de 2006.
149
ecológico, dos que gostam da natureza. Acreditam que alguns turistas trazem
informações, ensinam novidades, passam experiências, pois se entrosam com os
nativos. Declara ainda, que a comunidade necessita de apoio do Governo e de
instituições, pois sem ajuda eles não têm como divulgar o lugar.
FIGURA 36 - Pousada Brisa do Mar
FONTE - Eluziane Mendes, Ago./2004
Na fig. 36, observa-se a pousada Brisa do Mar, a primeira construída em
Tatajuba, de frente para a praia. O proprietário é nativo de Tatajuba o senhor Manoel
Pedro. Pertence a família do senhor Oswaldo Mateus
11
, uma figura conhecida e
importante na comunidade, padrinho de vários moradores. È, também um
empresário local, proprietário de um bar, quartos de aluguel e de um buggy. Assume
a posição de grande articulador, já foi político, é uma das principais lideranças
comunitárias. Fundou a ACOMOTA, mas, nas discussões pelo conflito fundiário,
rompeu seu vínculo com a associação. Trabalha como coletor de dados de pesca
para o IBAMA de Camocim. Além de ser um líder religioso, que, não se sentindo
bem na Igreja Católica, lidera a igreja evangélica em Tatajuba.
11
O senhor Oswaldo Mateus. Informações fornecidas pelos moradores de Tatajuba, em fevereiro de
2005.
150
FIGURA 37- Pousada Santa Maria, em construção.
FONTE - Eluziane Mendes, Nov./2004
FIGURA 38 - Pousada Santa Maria, em funcionamento.
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006
Na figura 37, observa-se a construção da pousada Santa Maria,
propriedade de espanhol, um decorador. Na figura 38, de 2006, verifica-se a
pousada construída e em funcionamento. É uma estrutura de pequeno porte, com
decoração que varia entre o requinte e o rústico artístico. Informações auferidas na
comunidade, em 2004, dão conta de que o proprietário comprou o terreno de nativo
de Tatajuba. A presença do espanhol e as diferenças culturais foram motivos para a
151
ocorrência de problemas com a comunidade, no período da construção da pousada.
As declarações dos moradores expressam alguns desses conflitos:
[...] ninguém pode chegar perto da pousada dele, que ele já fica irritado e
manda todo mundo sair. As pessoas passam por lá pra olhar e ele manda
passar, sair fora que é dele. Ele não quer que ninguém entre, que ninguém
veja. Lá só entra os trabalhadores. Tudo é propriedade dele. Ele não quer
amizade com os nativos, nem bater papo. O negócio é dele. Ele é muito
irritante (Moradora de Tatajuba, 35 anos, PESQUISA ..., 2004).
Outro depoimento revelou as diferenças culturais:
Gostaria de um turismo respeitoso e que a gente entendesse com ele e ele
com a gente. Fosse amigo da comunidade. Nem andasse fazendo o que
não deve, desrespeitando a gente, porque a gente tem criança. Não pode
haver certas coisas com que tem turista que praticamente anda nu, aí em
frente da minha casa, muita gente viu. Muitos pescadores que vinham do
mar viu. Ele não comprou a praia pra ele andar nu e nem nós, os nativos
pra aceitar isso dele (Moradora de Tatajuba, 32 anos, PESQUISA ..., 2004).
As diferenças entre os padrões culturais são presentes e ressalta-se com
os depoimentos dos moradores. Muitos têm medo de que o proprietário estrangeiro
possa trazer novos investidores europeus. Aparenta não ter bom convívio com os
nativos, fato que se expressa com inserção de novos hábitos culturais como placa
no portão, com os dizeres: “não entre, bata no chocalho e espere no portão.
Obrigada”. Afirma-se com o seguinte depoimento de um morador da comunidade:
Ele veio pra cá, passou três meses, foi embora, voltou pra passar mais três
meses e vai voltar de novo. Aí, é isso que a gente fica preocupado, ele vai
trazer os amigos dele. Se nós não conseguimos empatar só ele, imagine
quando ele trouxer mais gente (Pescador de Tatajuba, 40 anos,
PESQUISA ..., 2004).
O medo de perder o lugar de sobrevivência é um elemento presente nos
moradores de Tatajuba. Independentemente, entretanto, da presença do espanhol,
outros estrangeiros já estão comprando propriedades, como é o caso da pousada
Verde Folha vendida para holandeses. Muitos terrenos estão sendo comprados
como reservas, esperando a hora de colocá-los no mercado, funcionando como
152
“terrenos de engorda”, no dizer de Kowarick, aguardando a valorização imobiliária do
lugar, assim como ocorreu em Jericoacoara.
Enquanto a problemática da posse da terra não é resolvida, alguns
moradores buscam opções para sobreviver no lugar, com negócios turísticos. As
barracas na praia e na lagoa da Torta (ver fig. 39) são elementos da infra-estrutura
turística local, a maioria propriedade dos moradores de Tatajuba, além das
pousadas e casas com quartos de aluguel para turistas, como se pode constatar nos
quadros 4 e 5.
QUADRO 5 – BARRACAS DE TATAJUBA
PROPRIETÁRIO QUANTIDADE/LOCAL FINANCIAMENTO
Vera 01 Praia Próprio
João Galdino 01 Praia Próprio
01 Praia Didi
02 Lagoa da Torta
Próprio
Raimundinha 01 Praia Próprio
FONTE: PESQUISA DIRETA, 2004-2006.
Os donos das barracas contaram que trabalhar na lagoa não é fácil. No
período das chuvas, sobe o volume da água e, conseqüentemente, devem deslocar
as barracas em direção das dunas, afastando-se das águas. Na fig. 40, pode-se
observar ao fundo a Barraca do Didi, construída em um patamar mais alto, cujo
objetivo é evitar o deslocamento da infra-estrutura desse equipamento no período
chuvoso. Apesar das dificuldades apresentadas pelas condições naturais do lugar,
revelam-se satisfeitos com o trabalho que realizam.
Nas margens da lagoa da Torta, pertencente à área de Tatajuba, ficam
localizadas cinco barracas, quatro de propriedades de nativos. Os turistas e
visitantes têm acesso, pelos buggies alugados em Camocim ou Jericoacoara,
conforme se observa na fig. 41. Descem as dunas para chegar na lagoa. Vários
moradores da comunidade trabalham nas barracas como cozinheiras, garçons,
auxiliares, além da venda do artesanato local. Uma das cozinheiras informou que os
bugueiros, realizando brincadeiras nas dunas, sofreu um acidentou e foi levado para
o hospital de Camocim. Disse, ainda, que alguns bugueiros são imprudentes. “
153
aconteceram vários acidentes, inclusive com turistas que vêm de Jeri e Camocim”,
relatou a moradora (PESQUISA ..., 2005).
FIGURA 39 - Lagoa da Torta - Tatajuba
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006
FIGURA 40 - Barracas na Lagoa da Torta
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006
154
FIGURA 41 - Buggies de passeios vindos de Jericoacoara
FONTE - Luzia Neide Coriolano, Jan./2006
A ACOMOTA iniciou o planejamento do turismo comunitário de Tatajuba,
a partir de julho de 2002, com a realização de um Seminário de Planejamento, por
meio do Instituto Terramar. A esse evento fizeram-se presentes convidados de
outras comunidades como: Batoque – Aquiraz, Balbino – Cascavel, Caetanos –
Sabiaguaba e Prainha do Canto Verde – Beberibe, além de participantes do
Terramar e CPP – Comissão Pastoral da Pesca e representante do Departamento
de Geografia da UFC. Foram discutidas estratégias e ações para o desenvolvimento
do turismo, a criação de parcerias com outras instituições governamentais e não-
governamentais, a troca de experiências entre as comunidades, a inserção de
Tatajuba na Rede do Turismo Comunitário, além de um breve inventário sobre os
atrativos de Tatajuba (TERRAMAR, 2002).
Os atrativos identificados pelos moradores da comunidade foram:
as dunas – Funil, Encantada (branca), Alfoles, Morro Branco, Zé Tereza, Alto do
Petróleo, Barreira Vermelha e São Francisco;
os lagos e lagoas – lago Grande, lagoa da Torta, lago das Moréias e lago Verde;
155
o mangue – onde existe ponte para acesso de carros e pode-se observar a
natureza;
a gamboa – lugar para nadar, pescar peixes de pequeno porte, pescar camarão
e esportes aquáticos;
a praia – lugar para banho, pescaria, pesca do siri e passeio de jangada;
a gastronomia – pratos feitos à base de peixes, caranguejo, camarão, ostras,
sururu, lagosta, siri, entre outros;
a paisagem do pôr-do-sol em cima da duna encantada (branca);
os principais eventos – regata ecológica, festa do padroeiro São Francisco,
festas juninas e forrós.
O Instituto Terramar desenvolve projetos de assessoria às comunidades
do litoral cearense, mediante apoio para o desenvolvimento da pesca, sendo o
turismo uma atividade recente na pauta dos projetos da ONG. Buscam assessorar o
desenvolvimento do turismo comunitário, por meio de propostas financiadas por
instituições estrangeiras e órgãos nacionais. Os encaminhamentos e atividades
realizadas para o desenvolvimento da atividade turística em Tatajuba são
observados no quadro 7, em anexo, a síntese das ações.
Nas reuniões de monitoramento do turismo comunitário em Tatajuba, foi
realizado levantamento das principais trilhas, com atrativos naturais e culturais, que
podem ser realizados no lugar. Conforme o relatório apresentado pelo Terramar
(2003), elaborado em oficina na ACOMOTA, as principais trilhas e os significados, a
partir do imaginário dos moradores do lugar, são apresentados no quadro 6.
QUADRO 6
TRILHAS E ATRATIVOS DE TATAJUBA
TRILHA SIGNIFICADO DA TRILHA
Trilha Velha Tatajuba
“Há mais ou menos 15 anos a Velha Tatajuba foi soterrada pelas
dunas. Os moradores dividiram-se nas quatro vilas atuais: Vila Nova,
Baixa da Tatajuba, Tatajuba (atual) e Vila São Francisco.
Atualmente, dá para ver somente os resquícios da velha igreja,
cacimbas, tocos de árvores, pois tudo foi soterrado pela areia. O
nome do lugar deve-se a árvore Tatajuba, que além de sombra, tira-
156
se o leite para curar fraturas e a madeira serve para fazer canoas.
Existem poucas árvores”.
Trilha Morro Branco
“Antigamente o braço de mar, atual gamboa, seguia até a Pedra
Branca, um povoado, onde tinha um porto, depois do lago grande.
Um navio encalhou e lá se formou o morro branco. O morro é
encantado, aparecem luzes, vozes e música”.
Trilha do Lago da
Torta
“O lago também tinha comunicação com o mar. Um dia um navio
naufragou e entrou no lago, na altura do “coqueiro do Abenço” e
chegou em Parazinho onde foi construída uma igreja”.
Trilha Zé Tereza
“Zé Tereza tinha vazantes, com avanço da areia soterrou as
vazantes e foram criados morros. Todo ano desloca-se”.
Outros atrativos
apresentados sem o
significado
“Praia do coqueiro, dunas do funil e pedra seca”.
FONTE: (TERRAMAR, 2004a).
As fig. 42 e 43 apresentam alguns dos momentos da X Regata Ecológica
de Canoas de Tatajuba em novembro de 2004, o principal evento cultural, que faz
parte do calendário oficial de eventos do Município de Camocim. É organizado pelos
moradores, intermediado pela associação. Mais do que um evento cultural e
manifestação genuína, a regata é um momento de articulação política e
manifestação social. Todos os anos as temáticas manifestam as preocupações,
anseios e necessidades dos “povos do mar”. Em 2004, a regata teve como tema:
”Água é fonte de vida, confraterniza 10 anos”. Para a realização deste movimento,
os moradores recebem apoio e patrocínio das instituições e pessoas, que colaboram
para a confecção do chamado pano da canoa. Dessa forma, cada canoa representa
o seu patrocinador. Em 2004, a canoa vencedora foi patrocinada pelos alemães que
faziam parte do projeto Pro-Renda em Tatajuba, sendo eles os responsáveis pela
construção do site da comunidade
12
.
12
Site de Tatajuba: www.geocities.com/novatatajuba.
157
FIGURA 42 - X Regata Ecológica de Canoas de Tatajuba, Camocim-CE
FONTE - Eluziane Mendes, Nov./2004
FIGURA 43 - Canoa vencedora da X Regata Ecológica de Tatajuba.
FONTE - Eluziane Mendes, Nov./2004
158
O turismo comunitário é desenvolvido pela ACOMOTA, por iniciativa do
TERRAMAR, pois as outras duas representações comunitárias seguem caminhos
divergentes. Para tanto, foi criado o Regimento Interno do Grupo de Turismo
Comunitário Sustentável de Tatajuba, em 2004.
No documento, foi descrita uma normatização, contendo valores das
taxas de cada grupo, correspondendo (bugueiros, quartos domiciliares, barracas,
hospedaria, restaurante, merendeira, guias, artesãos, além do cadastramento
pessoal) sendo que cada grupo específico deverá ter um regimento interno; como
deve ser conduzida a participação e presença nas reuniões, cursos, prestação de
serviços, projetos ou atividades outras; com vagas limitadas; as punições no caso de
descumprimento dos acordos estabelecidos em conjunto; os benefícios de ser
associado e quais critérios devem ser seguidos para participar do fundo rotativo, que
se presta à realização de empréstimos em dinheiro para o desenvolvimento dos
negócios turísticos; e como deve ser realizada a contratação de prestação de
serviços pelo grupo. Enfim, a observação, a partir desse documento de que a
comunidade conduz seu processo permeado pelos padrões do capital, mas
diferencia-se no ritmo, na infra-estrutura e nos beneficiados, buscando uma
distribuição eqüitativa entre os membros.
Nas coletas de depoimentos (PESQUISA ..., 2004, 2005, 2006)
realizadas, nas conversas e diálogos com os moradores de Tatajuba, foi possível
captar algumas frases que, para eles, expressam o significado do turismo e de
turista, e que, no meio das conversas, confundiam as duas expressões.
Disseram que “o turismo é esse que chega. Porque tem turismo de várias
coisas. Tem aquele que vem pra gastar e aquele que só vem pra sujar”. Outro
morador, associado da ACOMOTA, disse que “o turista é aquele que vem para
conhecer as comunidades. Os turistas ficam encantados com a comunidade.
Conversam com a população, muitos conhecem o povo da ACOMOTA”. Um
pescador complementou, dizendo que os turistas “são as pessoas que vêm de fora
159
pra visitar e conhecer a localidade e seis pontos turísticos”. Uma moradora
compreende que, para receber turistas, é necessária infra-estrutura, dizendo que os
turistas são “pessoas passando férias, fins de semana, conhecendo os lugares e
procurando conforto”.
Ao questionar os moradores sobre o trabalho na atividade turística,
declararam parte de suas dificuldades e ansiedades, fato que se confirma no
depoimento de uma moradora (2004), ao dizer que “a gente tem vontade de
trabalhar com o turismo, mas aí vem a parte financeira. As pessoas ainda não têm
uma infra-estrutura necessária, mesmo o mínimo para o turista”. A partir dessas
dificuldades, é que se baseia o apoio da ONG, ao tentar implementar projetos para
infra-estrutura e capacitação.
Muitos revelaram não saber trabalhar com o turismo e apresentam
receios. Exemplo desse fato é constatado na declaração do pescador de Tatajuba
(40 anos, PESQUISA ..., 2004): “nunca trabalhei com turismo. Não sei nem como é o
trabalho com turismo. Por isso não sei nem dizer se gostaria ou não. Não sei nem
lutar com o turismo, ainda”. Certamente, existe grande diferença entre o trabalho na
pesca e atividades de serviços, como é o turismo, a começar pela mudança na
temporalidade do trabalho. Apesar das dúvidas, existem aqueles que desejam se
inserir na atividade e revelam “desejo que tenha emprego em pousadas dos nativos.
Tenho vontade de ter meu próprio negócio – um restaurante” (Moradora de Tatajuba,
35 anos, PESQUISA ..., 2005).
Sobre o turismo comunitário, o definem como: “é aquele que a gente
procura desenvolver junto com as outras atividades, porque às vezes as
comunidades deixam de trabalhar com as outras atividades e querem trabalhar só
com o turismo” (Liderança de Tatajuba, 28 anos, PESQUISA ..., 2006). Na
declaração da moradora revela-se o desejo de trabalhar com o turismo, ao tempo
que demonstra o medo da gradativa decadência da pesca, como nas comunidades
vizinhas, a exemplo de Jericoacoara, onde o turismo cresceu sem limite, em
oposição às atividades tradicionais dos nativos, conforme constatado nos textos
anteriores. Noutro depoimento, é revelada pelo morador a idéia de que, nas
comunidades, o turismo deveria ser realizado em pequenas proporções e gestado
160
pelos residentes. Disse que “a forma como tem sido feito é um caminho. Se construir
grandes hotéis, Tatajuba vai perder o que as pessoas (turistas) gostam da
tranqüilidade” (Pescado, 35 anos, PESQUISA ..., 2006).
Projetar o desenvolvimento do turismo em Tatajuba pela gestão
comunitária é uma ação política, na medida em que buscasse atingir objetivos em
grupo. Quando conseguir organizar e alcançar a coesão da comunidade, poderá
garantir a permanência no lugar, o respeito pela cultura local e pelos meios de
sobrevivência. Nesse sentido, configurar-se-á uma ação política desenvolvida no
mundo do capital. É importante compreender, que o desenvolvimento do turismo
pelas comunidades é resultante, ainda, da pressão do mercado sobre os moradores,
que os induzem à criação de propostas de trabalho que se inserem na economia,
isto é, a pesca e a agricultura que mantinham a sobrevivência das comunidades são
ditas como atividades em “decadência”, fato que é tomado como justificativa para
ampliação de atividades que claramente fazem parte do universo do trabalho-
mercadoria.
161
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao concluir este estudo depois de dois anos de reflexões e análises,
pode-se afirmar que pesquisar é produzir conhecimento, pois o objeto de
análise que inicialmente parecia caótico, paulatinamente foi sendo
compreendido, dando margem a esta produção. Na investigação o objeto é
elaborado, visto ser apreendido, analisado e explicado sob o prisma de uma
interpretação. Certamente há lacunas que não se conseguiu preencher,
podendo ser complementado posteriormente, por esta pesquisadora ou por
outros.
O texto, aparentemente estático, contém um movimento, sendo
possível captar “progressões” e “regressões” dos fatos, da história, da dinâmica
natural e social, da produção do espaço e do turismo, revelando o movimento
do real ocorrente de forma complexa, exigindo do pesquisador e do leitor
atenção e sensibilidade para compreender que a recuperação dos fatos
espaciais e históricos não é facilmente discernível. Buscou-se, contudo, retirar
da complexidade do real da comunidade de Tatajuba um saber, uma produção
de conhecimento sobre esta realidade empírica. Assim, empiria e teorias
possibilitaram a produção dos registros e de um novo conhecimento.
Foi uma oportunidade para maior compreensão de como se
desenvolve o modo de produção capitalista nas comunidades litorâneas,
especificamente em Tatajuba, pois se passou a compreender que não é
possível analisar os fenômenos fora deste contexto. Ao explicar como fazem os
positivistas, que recortam o objeto e o descontextualizam, cada vez mais, o
pesquisador se distancia da totalidade, reduz sua compreensão, muitas vezes
sem perceber. Ao compreender o objeto, no entanto, localizando-o no contexto
da sociedade de consumo, abre-se a possibilidade de uma melhor
aproximação da realidade estudada. Admite-se que não se tenha conseguido
apreender toda a complexidade ou contradições da produção do espaço, no
entanto, esta pesquisadora sente-se gratificada pela abertura à metodologia
162
crítica assumida e pela compreensão de que os objetos pesquisados diante
dessa metodologia se tornam menores, pois é mais importante a analisar as
contradições da sociedade capitalista.
Pode-se asseverar que, apesar das dificuldades de acesso, a
comunidade de Tatajuba vem sendo apropriada pelo capital. A expropriação
das terras dos pescadores se intensifica, a urbanização e modernização se
aceleram, motivadas pelo turismo. Reproduzem-se as relações capitalistas,
atropelando ou desfazendo as comunitárias. Ainda existem, entretanto, indícios
de solidariedade entre os nativos, reveladas em suas práticas cotidianas,
caracterizando a cultura dos “povos do mar”, repleta de sentidos e
representações sociais, diferenciadas das citadinas, pois se relacionam com
uso direto da natureza, especialmente por sua intimidade com o mar.
As dificuldades provocadas pela diminuição dos meios de
subsistência, a ausência de incentivos à pesca artesanal, à coleta e à
agricultura familiar, causaram desordem nas práticas cotidianas da
comunidade, que se encontra em um dilema perante essa transformação de
usos, costumes e trabalhos. Com a decadência da pesca artesanal e da
agricultura de subsistência, o “nativo” se torna submisso à produção de outrem,
pelo trabalho-mercadoria, isto é, pelo assalariamento por atividades
econômicas implantadas no litoral, como o turismo. E, assim, no litoral, as
atividades modernas sobrepõem às tradicionais, mas estas não se extinguiram.
A produção do espaço volta-se para empreendimentos externos, e,
embora ainda não tenha descaracterizado a paisagem local, incitou a divisão
interna da comunidade, o que é mais grave. Os investidores que se alocam na
região do Camocim esperam a implantação da infra-estrutura, especialmente
do aeroporto, para maior atuação. Camocim está sendo considerada uma área
prioritária para os investimentos turísticos, sendo o Estado o principal mediador
na atração de investidores e empreendimentos. Este litoral pouco visitado
passou a integrar roteiros regionalizados (política de regionalização), para
atender esta nova diretriz da reprodução capitalista. Se for difícil vender um
produto turístico, criam-se roteiros integrados, facilitando sua comercialização.
163
As paisagens e as terras de Tatajuba são utilizadas como elemento
da disputa entre os moradores que possuem as posses e a empresa
imobiliária, que diz ter a propriedade, e este conflito fundiário fundamenta-se
em um “jogo de interesses”, que envolve o poder público, as empresas e as
resistências comunitárias. A mega-empresa, em acordo com o IDACE,
compromete-se a doar à comunidade as terras que os moradores ocupam
secularmente, o que se torna um paradoxo. E, ainda, divulga o lugar dentro e
fora do país na intenção de negociar “suas terras” e atrair investidores que se
agreguem ao seu projeto: Costa de Tatajuba – Condado Ecológico de
Camocim. Pode-se assegurar que esses investimentos divergem dos
interesses locais.
Com as pressões exercidas sobre os moradores, a luta pela terra
passou a ser apoiada pelos associados da ACOMOTA, pois acreditam que a
garantia de suas terras ainda é o melhor caminho. Certamente, as resistências
comunitárias configuram-se como entraves ao “progresso e expansão” da
empresa que atua naquela área. E, mais dia, menos dia, se as resistências
forem arrefecidas, os mais fracos serão levados a ceder seus objetivos, e
assim se afirmará o poder do capital sobre o da comunidade. Se as
resistências, todavia, conseguirem se fortalecer, como ocorre em algumas
praias do Ceará, poderão garantir sua permanência no lugar e o turismo
comunitário ganhará mais um núcleo no litoral cearense, fortalecendo o turismo
dos desprovidos de capital e daqueles que não buscam, tão-somente,
acumulação, mas a valorização humana.
Tatajuba é um território em conflito, pois a comunidade que tem o
sentido de lugar, de referência, de coesão está ameaçada pelas atividades que
ali se implantam. A perda dessa representação causa uma profunda
desordem, a desestruturação de modos de vida e a insegurança nos
residentes. O conflito que se apresenta pela desarticulação entre os
moradores, por um lado, ocasionou a divisão interna, por outro, despertou na
comunidade o sentido da luta, da descoberta de possibilidades, sendo o
turismo comunitário tecido nessa perspectiva.
164
Constatou-se que nem todos da comunidade têm consciência da
dimensão dos planos e políticas que o Estado e os empresários têm para seu
lugar. Muitos desconhecem estes planos e suas reais intenções. E, ainda mais,
alguns acreditam que esta política é necessária, em conseqüência da
promessa de oferta de ocupação e renda.
O lazer mercadoria tornou-se um negócio lucrativo para as
empresas que buscam sempre novos lugares para esta prática, especialmente
no litoral cearense. O espaço turístico Jericoacoara já aponta sinais de
saturação, sendo Tatajuba um produto que deverá ser “desenvolvido” e
“explorado”, para complementar e inovar Jeri. Assim, Tatajuba, de espaço de
reserva, torna-se um espaço do turismo. A lógica capitalista dos grandes pólos
receptores turísticos é ali reproduzida.
Enfim, a análise da comunidade Tatajuba define a transformação “de
espaços comunitários em espaços do turismo”. Exemplifica as lutas e conflitos
vivenciados em diversas comunidades no litoral cearense, imersas na
turistificação. O caminho a ser seguido pela comunidade não deve ser único.
As lutas e as contradições estão sempre presentes na sociedade de consumo
pelos diversos interesses. As análises apontam, contudo, que há indícios de
que os pescadores, as rendeiras, os nativos cada vez mais se engajam na luta
pela defesa de suas terras e de oportunidades de ganhos pelo turismo. Assim,
pequenas pousadas, passeios ecológicos, apresentações da cultura dos povos
do litoral, produção artesanal, são incluídos na chamada cadeia produtiva do
turismo, fortalecendo as estratégias locais.
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HOTEL OÁSIS PRAIA DAS FONTES - Material promocional: Disponível em:
<
www.hotelpraiadasfontes.com.br
>, acesso em: 20/05/05.
IPECE - Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará. SECRETARIA DO
PLANEJAMENTO E COORDENAÇÃO (SEPLAN). Perfil Básico dos Municípios.
174
Fortaleza: IPECE, 2000; 2005. 10p. Acesso em: 25/10/2005, disponível em-
<
www.ipece.ce.gov.br
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IPLANCE. Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará. SECRETARIA
DO PLANEJAMENTO E COORDENAÇÃO (SEPLAN). Mapa dos Municípios.
Fortaleza: IPECE, 1998. Disponível em-<
www.iplance.ce.gov.br
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JORNAL BRASIL TURISMO. Disponível em: www.brasilturisjornal.com.br, acesso
em 08/05/05.
MARINA PARK HOTEL - Material promocional. Disponível em:
< www.marinapark.com.br>.acesso em: 20/05/05.
MEIRELES, A. J. A. Abordagem Geomorfológica para a Realização de Estudos
Integrados para o Planejamento e Gestão em Ambientes Fluvio-marinhos. In:
Geocrítica, revista de Geografia da Universidade de Barcelona, Espanha. 2002.
_____. Rio Coreaú, Camocim-CE. 2002. 1 fotografia aérea, p&b.
_____. Falésias do Litoral Leste do Estado do Ceará: Análise dos Processos
Morfogenéticos e Impactos Ambientais. In: Revista Geonotas. Departamento de
Geografia - Universidade Estadual de Maringá Volume 3 Número 2. Abr/Mai/Jun
1999. Acesso em: Agosto de 2005. Disponível em <
http-
//www.dge.uem.br/geonotas/vol3-2/Meireles.html
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POEMA TATAJUBA (2001). Disponível em: <www.geocities.com/novatatajuba
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acesso em: 6 de abril de 2005.
PROJETO ORLA. SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO – SPU. Disponível
em: <www.spu.planejamento.gov.br>, acesso em: 11/11/2005.
EMPRESÁRIOS DO CEARÁ VÃO A LISBOA EM BUSCA DE PARCEIROS.
Reportagem disponível em: <www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro>, acesso em
20/10/2004.
TATAJUBA. Disponível em: <www.geocities.com/novatatajuba
>, acesso em: 6 de
abril de 2005.
ENTREVISTAS
ARAÚJO, R. C. de. Conflitos Fundiários em Tatajuba, Camocim-CE. 2006.
Entrevista concedida a E. G. M. em março de 2006.
COELHO, A. A implantação de reserva extrativista em Tatajuba, Camocim-CE.
2005. Entrevista concedida a E. G. M. em dezembro de 2005.
175
FRANÇA, L. R. P. O Desenvolvimento do Turismo em Camocim e Tatajuba.
2006. Entrevista concedida a E. G. M. em março de 2006.
GERENTE do Patrimônio da União – SPU/CE. Ocupação em terras de marinha.
2005. Entrevista concedida a E. G. M. em outubro de 2005.
MARTINS, R. Turismo comunitário em Tatajuba, Camocim-CE. 2006. Entrevista
concedida a E. G. M. em março de 2006.
PESQUISA DE CAMPO. Entrevistas e coletas de depoimentos concedidas
pelos moradores, pescadores e lideranças da Comunidade de Tatajuba,
Camocim-CE a E. G. M., realizadas em ago. e nov. (2004), fev. (2005) e jan. (2006).
SILVINO DA SILVA, F. O conflito fundiário e os processos judiciais em
Tatajuba, Camocim-CE. 2006. Entrevista concedida a E. G. M. em março de 2006.
176
ANEXOS
177
ANEXO I
Roteiros das entrevistas e coletas de depoimentos concedidos pelos moradores da
comunidade de Tatajuba, Camocim-CE, realizadas em ago; nov. (2004) e fev.
(2005).
Pesquisa
De Espaço Comunitário a Espaço do Turismo - Conflitos e Resistências em Tatajuba, Camocim/CE
Período: Ago; Nov. (2004); Fev. (2005), Jan. (2005)
Pesquisadora Responsável: Eluziane Gonzaga Mendes
Orientadora: Profª. Drª. Luzia Neide M. T. Coriolano
Pesquisador colaborador: Aridenio B. Quintiliano
1. TEMÁTICA – O LUGAR
Origens (por que a comunidade está vinculada à Camocim? ) Quando chegou o primeiro morador?
Vindo de onde? Qual a primeira família?
Quais os acessos para chegar em Tatajuba? Qual distrito pertence?
Quais são as comunidades vizinhas? Como é o relacionamento?
II - O POVO (trabalho)
Quantos moradores? Quantas famílias?
Quantidade (média) de filhos por família?
Quantidade de jovens?
Quantos moradores não são de Tatajuba? Vindos de onde? Como é o relacionamento?
Quais são os tipos de trabalho? Qual a média de renda?
Quais as profissões dos moradores de Tatajuba?
Você trabalha onde?
- na própria casa ( )
- fora de casa ( )
Você passa quantas horas trabalhando?
4h ( ) 6h ( ) 8h ( ) 12 h ( )
Qual a média de renda da família?
100 reais ( ) 200 reais ( ) 260 reais ( ) 300 reais ( ) mais de 400 reais ( )
III - CULTURA E LAZER
Principais costumes locais? Lendas conhecidas? Mitos?
Quais os principais eventos e/ou manifestações tradicionais (folclóricas) da comunidade?
Qual tipo de artesanato e de matéria-prima? Para quem são feitas as vendas?
Quais são as comidas típicas?
Quais são as diversões na comunidade?
IV - CARACTERIZAÇÃO DA TERRA (ATRATIVOS DE TATAJUBA)
De quem são as propriedades? (Terreno de marinha, privado ou de empresas, terrenos em litígio)
Quais são os atrativos naturais do lugar?
178
V – EQUIPAMENTOS E INFRA-ESTRUTURA DA COMUNIDADE?
Quando chegou energia elétrica e água? Como era a vida antes? E agora?
Telefone – quantidade:
Carros – quantidade:
Televisão – quantidade:
Transporte – quantidade:
Tipos de casa – quantidade:
Antenas parabólicas– quantidade:
Escola (qual a faixa etária)?
Quantos alunos?
Posto de saúde – Quantos médicos? Qual a periodicidade de atendimentos?
Creche:
Praça:
Igrejas:
Associações Comunitárias:
Quantidade de casas das vilas e moradores:
Qual a vila de melhor condição de infra-estrutura? Por quê?
Você gostaria que a comunidade mudasse? O que deveria mudar?
2. TEMÁTICA – PESCA
Quantidade de pescadores? Faixa etária?
Tipo de embarcação (por que canoa e não jangada)? Quando surgiu? Quem inventou?
Qual a zona de pesca que a comunidade pertence?
Você gosta de ser pescador? Qual outra atividade você gostaria de exercer? O seu pai era pescador?
Como é feita a venda do peixe e de outros produtos?
Existe alguma história específica dos pescadores de Tatajuba?
Qual é o vínculo dos pescadores de tatajuba com outros lugares? Como é feito?
Você gostaria que a comunidade mudasse? O que deveria mudar?
Você passa quantas horas trabalhando?
4h ( ) 6h ( ) 12h ( ) mais de 24h ( )
Qual a média mensal de renda da família?
100 Reais ( ) 200 Reais ( ) 260 Reais ( ) 300 Reais ( ) mais de 400 ( )
3. TEMÁTICA – TURISMO E CONFLITOS DE TERRA
Você sabe o que é o turismo? O que significa o turismo para você?
Sua comunidade tem discutido sobre o turismo? O que acham do turismo?
Que tipo de turismo você considera melhor para sua comunidade?
Quais são os turistas que vêm para Comunidade? Quantidade?
Que tipo de turista você gostaria que viesse para Comunidade?
Quem está se beneficiando com o turismo?
O turismo pode ajudar você e seus amigos? Como?
Você acha que a comunidade tem que ser divulgada? Por quê? Como?
Existem pessoas nas comunidades que trabalham ou trabalharam com Turismo?
O que o turismo pode trazer para você?
Como o turismo pode contribuir para o desenvolvimento dessa comunidade?
A comunidade sofreu algum impacto por investimentos turísticos?
Você tem informação sobre empreendimentos turísticos que estão querendo implantar na
comunidade? O que poderia informar?
Existe algum conflito em relação ao turismo? Quais?
Existem conflitos pela terra em Tatajuba? Conte a história?
Qual a relação da Comunidade com Jericoacoara?
O que você deseja para sua Comunidade?
OBSERVAÇÕES:
179
Pesquisa
De Espaço Comunitário a Espaço do Turismo - Conflitos e Resistências em Tatajuba, Camocim/CE
Período: 2004-2006
Pesquisadora Responsável: Eluziane Gonzaga Mendes
Orientadora: Profª. Drª. Luzia Neide M. T. Coriolano
INVENTÁRIO DOS SERVIÇOS OFERECIDOS NA COMUNIDADE
CASAS DE ALUGUEL
NOME DO
ESTABELECIMENTO
QUANTIDADE TAMANHO PROPRIETÁRIO
POUSADAS
NOME DO
ESTABELECIMENTO
LEITOS TAMANHO PROPRIETÁRIO
QUARTOS DE ALUGUEL
NOME DO
ESTABELECIMENTO
LEITOS TAMANHO PROPRIETÁRIO
BARRACAS
NOME DO
ESTABELECIMENTO
MESAS TAMANHO PROPRIETÁRIO
RESTAURANTES
NOME DO
ESTABELECIMENTO
MESAS TAMANHO PROPRIETÁRIO
Fonte: Pesquisa Direta, 2004-2006.
180
ANEXO II
Roteiros das entrevistas e coletas de depoimentos concedidos pelos moradores da
comunidade de Tatajuba, Camocim-CE, realizada em jan./2006.
Pesquisa
De Espaço Comunitário a Espaço do Turismo - Conflitos e Resistências em Tatajuba, Camocim/CE
Período: 2004-2006
Pesquisadora Responsável: Eluziane Gonzaga Mendes
Orientadora: Profª. Drª. Luzia Neide M. T. Coriolano
Pesquisadores colaboradores: Aridenio B. Quintiliano e Marcela S. Costa.
O LUGAR
Histórias do lugar, as lendas, duna branca, o barco que naufragou, a igreja soterrada e a velha
Tatajuba soterrada, os visitantes, as festas.
Qual a área total de Tatajuba? Quais os limites? Quantos quilômetros têm a praia?
Os atrativos de Tatajuba? O Movimento na lagoa da Torta?
O PESCADOR
História do pescador.
Quais os instrumentos utilizados para pesca?
Quais os tipos de pesca?
Por que utilizam canoas?
Quantidade de pescadores?
Quantos associados na colônia?
CONFLITOS DE TERRA
Quando começou a grilagem e a especulação?
Propriedade das terras?
A venda das terras?
Como está o processo de regularização fundiária?
Quando começou a presença da empresa na comunidade? Como?
Qual foi o ano da pesquisa socioeconômica realizada pela Empresa Vitória Régia na comunidade?
Os moradores sofrem ameaças?
REGULARIZAÇÃO DA APA
Como anda o processo da APA?
Qual a participação da Prefeitura na regularização da APA de Tatajuba?
Como vem ocorrendo o Conselho Consultivo do Parque Nacional de Jericoacoara?
ORGANIZAÇÃO COMUNITÁRIA
Quando começou os conflitos internos?
Como e Por que a ACOMOTA sofreu intervenção Oficial e da empresa? Quando?
A presença da ONG Terramar?
Quando ocorreu o contato com o Terramar? E do grupo de Turismo? Está funcionando?
TURISMO
Como é o empreendimento da empresa imobiliária?
Quem são os proprietários?
Como está o caso, atualmente?
TURISMO COMUNITÁRIO
Quais as expectativas da comunidade? O que esperam para o futuro?
Quais os medos e anseios?
OBS.: Coletas de depoimentos realizadas com as lideranças e amostragem dos pescadores e
residentes em Tatajuba.
181
ANEXO III
Formulários aplicados com os turistas, residentes e ao IBAMA, em pesquisa
realizada em Jericoacoara-CE e na Prefeitura de Camocim-CE, em Jan./2006.
FORMULÁRIO 01
(RESIDENTES )
1. População
Qual a naturalidade? _______________________________
1.1.Dados gerais sobre os residentes
1.1.1. Gênero do entrevistado: a) masculino ( ) b) feminino ( )
1.1.2. Estado Civil: S ( ) C ( ) D ( ) V ( ) Outros ( )
1.1.3. Chefe da família
1.1.4. Faixa etária do entrevistado
a) menos de 18 anos
b) 18 a 25 anos
c) 25 a 35 anos
d) 35 a 45 anos
e) 45 a 55 anos
f) 55 a 60 anos
g) mais de 60 anos
1.1.5. Quantas pessoas residem na casa?
1.1.6. Escolaridade do entrevistado:
a) Não alfabetizado
c) Entre a 1ª e a 4ª série
e) Médio completo
g) Superior completo
b) Alfabetizado
d) Entre a 5ª e a 8ª série
f) Médio incompleto
h) Superior incompleto
1.1.7. Renda familiar
a) Nenhuma
c) De 1 a 2 salários mínimos
e) Acima de 4 salários mínimos
OBS: salário mínimo = R$ 300,00
b) Menos de 1 salário mínimo
d) Entre 2 e 4 salários mínimos
f) mais de 4 salários mínimos
1.1.8. Qual a profissão do entrevistado?
1.1.9 Proprietário de algum estabelecimento? Restaurante, Loja, barracas, mercantil?
2. Perguntas específicas
2.1. Quanto tempo o senhor (a) reside no local?
2.2. Qual a sua opinião sobre o turismo em Jericoacoara?
Trouxe algum benefício para a Comunidade? Quais?
2.3 O relacionamento dos residentes com os turistas é cordial?
2.4. Com a existência do turismo ocorre aumento dos preços das mercadorias
(gêneros alimentícios etc.)? Em qual período é maior o aumento?
2.5. . O Senhor (a) acha que ocorreu melhorias das infra-estruturas básicas
no Município e em Jeri pelo o fato de ser local turístico?
a) sim ( ) b) não ( )
Quais?___________________________
2.6 Quais os principais atrativos de Jericoacoara procurados pelos turistas?
Esses atrativos são conservados?
2.7 A associação de moradores de Jericoacoara está integrada ao turismo?
182
Em que atividades voltadas aos visitantes, organização de práticas de artesanato
ou até mesmo, na tomada de decisões junto aos órgãos responsáveis?
a) sim ( ) b) não ( )
2.8. 11Há problemas e práticas a favor da preservação ambiental?
a) sim ( ) b) não ( )
2.9 Como era Jeri, antes da chegada do Turismo?
2.10. Você tem conhecimento sobre as Comunidades vizinhas?
Conhece Tatajuba? Já teve oportunidade de ir a essa comunidade?
2. 11 O que você sabe sobre Tatajuba?
2.12. Algumas observações:
FORMULÁRIO 02
(TURISTAS)
1.Turista
Qual o seu país e cidade de origem?
1.1.Dados gerais sobre os residentes
1.1.9. Gênero do entrevistado: a) masculino ( ) b) feminino ( )
1.1.10. Faixa etária do entrevistado
b) menos de 30 anos ( ) jovem
b) 30 a 60 anos ( ) adulto
c) mais de 60 ( ) velho
1.1.11. Quantas pessoas residem na casa?
1.1.12. Escolaridade do entrevistado:
a) Não alfabetizado
c) Entre a 1ª e a 4ª série
e) Médio completo
g) Superior completo
b) Alfabetizado
d) Entre a 5ª e a 8ª série
f) Médio incompleto
h) Superior incompleto
1.1.13. Qual a profissão do entrevistado?
2. Perguntas específicas
2.1. Como ficou sabendo da existência deste destino turístico?
2.2. Quais os motivos que o levaram a conhecer Jericoacoara?
2.3. Como os residentes e os profissionais de turismo receberam o senhor (a)?
2.4. Qual o meio de transporte utilizado para se chegar em Jericoacoara? Foi difícil o acesso?
2.5. Como você classificaria a qualidade das vias de transporte para se chegar em Jericoacoara?
a) ótima ( ) b) boa ( )
c) regular ( ) d) ruim ( )
2.6.Qual a sua opinião sobre o turismo de Jeri?
2.7. Na sua opinião a infra-estrutura (básica e turística) do município atende às necessidades do
turista? Como você a classificaria?
a)ótima ( ) b)boa ( )
c)regular ( ) d)ruim ( )
2.8. Quem o acompanhou nessa viagem?
a) esposa ( ) b)filhos ( )
c) parentes ( ) d) amigos ( )
183
e) outros: __________________________
2.9. Como você classificaria a estrutura do local onde está hospedado? E a qualidade do
atendimento?
2.10. Você utilizou o serviço de alguma agência turística? Qual?
2.11. Como você avaliaria Jericoacoara? Pretende retornar?
a)ótima ( ) b)boa ( )
c)regular ( ) d)ruim ( )
2.12 Você tem interesse de residir em Jericoacoara?
2.13 Você conhece outras localidades do entorno de Jericoacoara? Quais? Conhece Tatajuba?
Ouviu falar? Tem vontade de conhecê-la?
Algumas observações:
FORMULÁRIO 03
(IBAMA DE JERICOACOARA)
1. Existe algum órgão oficial da localidade ou do Estado que fiscaliza a qualidade do serviço turístico
oferecido?
a) sim b) não
Qual?
2. Com relação à preservação ambiental, os turistas respeitam o meio ambiente?
a) sim b) não
3. E os próprios residentes, eles se preocupam com a conservação do meio ambiente?
a) sim b) não
4. Existe alguma interação entre a Secretaria de turismo do município e o IBAMA no planejamento do
território para o turismo?
a) sim b) não
Como se dá essa interação?
5. A prefeitura do município preocupa-se em conservar o meio ambiente?
a) sim b) não
6. O IBAMA é o órgão que fiscaliza e controla a APA de Jericoacoara. Desde a sua criação, em 1984,
alguma empresa, em especial do ramo turístico, já tentou ser implantada sem que o IBAMA tivesse
conhecimento? Comente algum caso.
7. Existem conflitos de terra na comunidade, como especulação e grilagem de terras? Quais os
principais problemas enfrentados pelo IBAMA?
8. Como é a relação de Jericoacoara com as comunidades vizinhas?
9. Como é feita a coleta e a depositação do lixo produzido em Jericoacoara? Qual a participação do
IBAMA?
10.De que forma o IBAMA atua no entorno da APA de Jeri, com na Comunidade de Tatajuba?
11. Existem conflitos de terra em Tatajuba, como o IBAMA atua?
184
FORMULÁRIO 04
Prefeitura de Camocim
Universidade Estadual do Ceará
Laboratório de Estudos do Território e Turismo
Pesquisador:
Município: Data:
Entrevistado:
2. Perguntas específicas
2.1. Qual a importância do turismo para o
desenvolvimento do município?
_______________________________________
2.2 Quais os distritos e comunidades que fazem parte
do litoral de Camocim?
_______________________________________
2.3. Quais os principais atrativos que Camocim
oferece aos turistas?
_______________________________________
2.4. Qual o nível de receptividade do turismo pela
comunidade?
_______________________________________
2.5. Quais os meios de transporte mais utilizados
pelos turistas para chegar em Tatajuba? São de fácil
acesso? E as vias de acesso estão em boas
condições? Notifique as diferentes origens das vias?
______________________________________
2.5. O que a prefeitura tem feito para o
desenvolvimento do turismo em Camocim e Tatajuba?
_______________________________________
2.6. Em que o turismo em Camocim contribui para
melhoria das condições e qualidade de vida dos
nativos? Como?
_______________________________________
2.7. Quais os tipos de serviços turísticos existentes no
Município?
__________________________________
2.8. Existe algum órgão oficial da localidade ou do
Estado que fiscaliza a qualidade do serviço turístico
oferecido?
a) sim ( ) b) não ( )
Qual? _____________________________
2.16 Existe algum empreendimento na área de
Tatajuba? Como é a entre empresários e os nativos?
2.17 Existe conflitos de terra em Camocim?
2.9. Quanto ao preço dos gêneros alimentícios,
houve grande aumento por se tratar de um local
turístico?
a) sim ( ) b) não ( )
_________________________________________
2.10. Existe alguma interação entre a Secretaria de
turismo do município e a associação de moradores
no planejamento do território para o turismo?
Como se dá essa interação?
2.11. Existe alguma parceria de Camocim com as
outras comunidades do entorno? Existe algum
projeto nesse sentido?
_________________________________________
2.11.1 Existe alguma relação / parceria entre Jeri e
Tatajuba, no roteiro dos passeios turísticos?
_________________________________________
2.12. A infra-estrutura básica de Camocim atende
às necessidades dos turistas e dos residentes? A
prefeitura tem algum projeto nesse sentido?
a) sim ( ) b) não ( )
2.13. A mão de obra que trabalha nas atividades
voltadas para o turismo recebe alguma
capacitação?Fazem cursos? Onde?
a) sim ( ) b) não ( )
_________________________________________
2.14. Qual tipo de hospedagem mais procurada
pelos turistas?
_________________________________________
2.15. Como se distribui a rede de hospedagem em
Camocim? São próximas umas das outras?
Existem diferenças de preços entre eles?
185
2.18 Como a prefeitura organiza as questões
referentes à terra? E as do Patrimônio da União?
Existe cadastro?
____________________________________________
2.19. Sobre a APA de Tatajuba, como está a situação?
2.20. Sobre o Programa de Regionalização do
Turismo, como Camocim é feita a participação
no programa?
____________________________________________
2.21 Como será a parceria CE-PI-MA?
____________________________________________
2.22 Há projetos ou programas de atração de
Investimentos para Camocim?
____________________________________________
186
ANEXO IV
Roteiros das entrevistas e coletas de depoimentos concedidas por representantes
de instituições sediadas em Fortaleza, realizadas no período de 2004 -2006.
1 ONG INSTITUTO TERRAMAR
ENTREVISTADO: Rosa Martins
TEMÁTICA: O Turismo comunitário em Tatajuba, Camocim-CE.
PERIÓDO: 2004 a 2006.
ROTEIRO da entrevista concedida em Fev./2006:
- Como é feita a atuação do Terramar nas comunidades cearenses?
- Quais as comunidades assessoradas pelo Terramar?
- Como as comunidades têm contato com o Terramar?
- Quais os principais problemas sofridos pelas comunidades litorâneas?
- Como ocorre o conflito fundiário no litoral cearense?
- Quais as características do processo de luta pela terra?
- O que significa o turismo comunitário para esta instituição?
- Como se realizam os projetos de turismo comunitário?
- Quais as comunidades que desenvolvem esses projetos?
2 IBAMA - INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS
RENOVÁVEIS
ENTREVISTADO: Àgueda Coelho (NEA/IBAMA)
TEMÁTICA: A implantação de reserva extrativista em Tatajuba, Camocim-CE.
PERIÓDO: 2004 a 2005
ROTEIRO da entrevista concedida em dez /2005:
- Como é realizada a intervenção do IBAMA nas comunidades litorâneas do Ceará?
- Como é feita a implantação de uma Reserva Extrativista - RESEX?
- Qual comunidade já tem RESEX?
- Como o IBAMA atua na mediação de conflitos fundiários?
- Como se realiza esse processo em Tatajuba?
- Como anda o processo atual em Tatajuba?
- Quais os resultados do Diagnóstico Socioeconômico e Cultural realizado em Tatajuba em fevereiro
de 2005?
3 IDACE – INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO DO CEARÁ.
ENTREVISTADO: Advogado Romoaldo Candoia de Araújo
TEMÁTICA: Conflitos Fundiários em Tatajuba, Camocim-CE.
PERIÓDO: Mar./2006
- O que caracteriza um conflito fundiário? Existe em Tatajuba – Camocim/CE?
- Como foi realizado o cadastro das posses em Tatajuba – Camocim/CE?
- Como anda o processo de regularização e titularização das posses?
- O processo de instalação da RESEX – Reserva Extrativista?
- Qual a área da empresa que atua em Tatajuba? O que alegam?
- Existe denúncia de vendas de terras em Tatajuba, o que se pode afirmar sobre esse fato?
- Como anda o processo atual? Quais as instituições envolvidas no caso?
187
4. SETUR - SECRETARIA DE TURISMO DO ESTADO DO CEARÁ
ENTREVISTADO: Leonardo R. P. França (Setor de Atração de Investimentos e Fomento da SETUR)
TEMÁRICA: O Desenvolvimento do Turismo em Camocim e Tatajuba.
PERIÓDO: Mar./2006
- Como vem sendo desenvolvido o Programa de Regionalização do Turismo no Ceará?
- Como se realiza o trabalho da SETUR na atração de investidores para o Ceará?
- Quais são os investimentos e investidores no litoral oeste e em Camocim?
- O que a SETUR pode informar sobre o empreendimento “Condado Ecológico de Camocim – Costa
de Tatajuba”?
- Como é realizada a atuação deste empresário na área de Tatajuba?
- Existe conflito fundiário entre a comunidade e a empresa? Como está ocorrendo esse processo?
- Quais as infra-estruturas que o Governo do Estado e a SETUR pretendem implantar no extremo
litoral Oeste?
- Qual informação pode ser fornecida sobre a implantação do Aeroporto em Parazinho, Município de
Granja?
5. CDPDH - CENTRO DE DEFESA E PROMOÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS
ENTREVISTADO: Advogado Francisco Silvino da Silva (CDPDH)
TEMÁTICA: O conflito fundiário e os processos judiciais em Tatajuba, Camocim-CE.
PERIÓDO: Mar./2006
- Que tipo de ação judicial a ACOMOTA requereu contra a empresa Vitória Régia Empreendimentos
Imobiliários?
- Como se encontra o processo judicial?
- Quais propostas foram realizadas pela empresa para a comunidade?
- Como o IDACE atua na mediação do conflito fundiário?
- A comunidade sofre algum tipo de ameaça? Como e quando?
- Em relação a venda de terras pelos moradores, o que se pode afirmar?
- Como se encontra o conflito atual?
6. SPU - SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO/CE
ENTREVISTADO: Gerente do Patrimônio da União - Cea
TEMÁTICA: Ocupação em terras de marinha.
PERIÓDO: Out./2005
- O que são terras de marinha?
- Como é feita a regularização das terras de marinhas?
- Que tipo de taxas são pagas para ocupação dessas terras?
- Existem conflitos fundiários no litoral?
- Como é desenvolvido o Projeto Orla no Ceará?
188
ANEXO V
QUADRO 7
SÍNTESE DA HISTÓRIA DE TATAJUBA, CAMOCIM-CE
ANO PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS
1902
Formação da comunidade das Cabaceiras de Cima e
Cabaceiras de Baixo.
1930
A mudança do nome da comunidade de Cabaceiras para
Tatajuba.
1978
Soterramento da vila de Tatajuba pelas dunas e a construção
da Nova Tatajuba.
1970 - 1980
Processo de Grilagem de terras (final da década de 1970).
1989
Descoberta da comunidade do início do processo de grilagem
de terras e ameaça de especulação.
1991
Criação da ACOMOTA – Associação Comunitária dos
Moradores de Tatajuba.
1993
Processo de criação da
Á
rea de Proteção Ambiental de
Tatajuba.
Chegada do Projeto Pró-Renda Rural, convênio com
Alemanha.
Registros de Terras no nome da Fazenda Vitória Régia, no
cartório de Camocim-CE.
1994
Declaração da Lei Municipal de Preservação Ambiental nº
559/94, da área do litoral de Camocim, denominada de
Tatajuba – APA de Tatajuba, com extensão de 3.755 ha..
1996
Expedição da Instrução Normativa nº 001 de janeiro de 1996,
que estabeleceu as normas reguladoras da Implantação da
área de Proteção Ambiental da Tatajuba, instituída pela Lei
municipal nº 559/94.
1997
Energia elétrica na comunidade.
1998
Chegada do telefone público.
2000
Conhecimento da Comunidade sobre o empreendimento
turístico “Condado Ecológico de Camocim”.
Alteração da área da APA de Tatajuba, Lei Municipal Nº
559/94, para 4.598 ha.
Seminário da ACOMOTA sobre especulação imobiliária.
189
2001
Contato da Comunidade com o Instituto Terramar.
Retificação dos registros de terras para 5.275, 450 hectares
como propriedade da Fazenda Vitória Régia.
Identificação das posses de terras da comunidade pelo
IDACE - Instituto de Desenvolvimento Agrário do Ceará.
Pesquisa Socioeconômica Condado Ecológico de Camocim-
CE, na comunidade de Tatajuba, realizada pela Geológica
Assessoria, Projetos e Construções Ltda., financiada pela
Vitória Régia Empreendimentos Imobiliários Ltda. – 02.01.
ACOMOTA requer os registros de terra da Imobiliária Vitória
Régia datados de 1993, no Cartório de Camocim, pela
comunidade de Tatajuba.
Ruptura e subdivisão das lideranças da ACOMOTA.
Elaboração do Laudo Ambiental de Tatajuba pelo IBAMA.
Audiência Pública com a Assembléia Legislativa do Ceará,
em Camocim.
Ação de Interdito Proibitório - 10.04.01.
Solicitação ao Gerente do Patrimônio da União da cessão de
área de Patrimônio da União a favor da Comunidade de
Tatajuba - 24.04.01.
Visita de membros da comunidade de Tatajuba às praias do
Cumbuco, Balbino, Praia das Fontes e Prainha do Canto
Verde – 06.01.
Carta enviada ao Presidente da Comissão de Direitos
Humanos da Assembléia Legislativa do Ceará- 05.06.01.
Ação Anulatória dos registros de terra da empresa imobiliária
- 14.06.01.
Denúncia do conflito fundiário encaminhada aos deputados
estaduais - 21.06.01.
Reunião na Secretaria da Ouvidoria Geral e do Meio
Ambiente - 24.07.01.
Laudo Técnico da localidade de Tatajuba/ Camocim - IBAMA
- 08/2001.
Pedido de improcedência da destituição da Diretoria da
ACOMOTA em exercício - 28.08. 01.
Audiência Pública - Implantação do Projeto Turístico em
190
2001
Tatajuba/Camocim 12.09.01.
Representação contra o Promotor de Justiça de Camocim
encaminhada à Procuradora de Justiça do Estado do Ceará -
09.01.
Ação cautelar dos dissidentes da ACOMOTA, solicitando
liminar de suspensão das eleições da ACOMOTA - 01.10.01.
Liminar em favor da Diretoria em exercício na ACOMOTA -
04.10.01.
2002
Criação de mais duas associações- Conselho Comunitário de
Tatajuba e da Associação de Moradores de Tatajuba, na Vila
Nova.
Nota-denúncia elaborada pelo TERRAMAR- BID financia
infra-estrutura para projeto de Turismo - 08.03.02 16.
Seminário de Sensibilização Ambiental, realizado pela
ACOMOTA – 02/02.
Carta encaminhada ao Procurador de Justiça, Dr. Alexsander
Sales - 08.04.02.
Carta ao Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado de
Populações Tradicionais (CNPT) para debater sobre
processo de criação da Reserva Extrativista em Tatajuba.
Implantação de sistema de abastecimento de água na
comunidade.
Abaixo-assinado solicitando ao Centro Nacional de
Desenvolvimento Sustentado de Populações Tradicionais
(CNPT) a criação de reserva extrativista em Tatajuba -
04.2002.
Seminário de Planejamento do Turismo Comunitário de
Tatajuba (representantes das comunidades de Batoque,
Caetanos, Balbino, Canto Verde, Ponta Grossa, Tatajuba e
das instituições: CPP de Fortaleza, UFC-Geografia e o
Terramar). 12-14.07.02.
Solicitação de certidão do andamento do processo de
Interdito Proibitório contra a Fazenda Vitória Régia e
Fininvest S/A. - 13.02.03
Diagnóstico SocioambientaI Participativo Tatajuba Camocim,
elaborado pela UFC - 06.03.03
191
2003
Proposta de Criação da Agenda Comunitária Local de
Tatajuba e Adjacências e a Definição Macroestratégia de
Desenvolvimento Sustentável das Comunidades: Tatajuba,
Baixa da Tatajuba, Vila Nova e Vila São Francisco, elaborada
pelo Conselho de Desenvolvimento Comunitário de Tatajuba
e adjacências, encaminhado ao Fundo Nacional do Meio
Ambiente (FNMA) – 30.05.03
Carta de solicitação de apoio à Comunidade de Tatajuba
encaminhada ao Fórum em Defesa da Zona Costeira /
FDZCC - 30.06.03
2004
Realização de atividades de monitoramento do projeto de
Turismo Comunitário de Tatajuba, assessorado pelo
Terramar – 04.04.
Elaboração do regimento interno do grupo de turismo da
ACOMOTA.
Seminário de Educação Ambiental, realizado pelo
NEA/IBAMA – 05/04.
Visita da ONG - Nichos e Terramar para elaboração do
projeto de construção da nova sede da ACOMOTA – 08/04.
Constituição de Fórum para discutir sobre os conflitos de
terra e o turismo na comunidade com várias representações
(empresa Vitória Régia, Terramar, IBAMA, IDACE etc.).
2005
Reuniões do Fórum na comunidade.
Elaboração de pesquisa do Diagnóstico Socioeconômico e
Cultural de Tatajuba, pelo IBAMA, primeira etapa da
instalação da RESEX.
Conflitos e derrubada das cercas das vazantes dos
moradores pelos representantes da empresa imobiliária.
Conflitos internos, vendas de terrenos e pousadas para
estrangeiros (holandês e espanhol).
Carta elaborada pela ACOMOTA e encaminhada ao
IBAMA/CNPT, solicitando a retomada do processo de
implantação da RESEX.
Construção da Pousada Santa Maria, propriedade de um
espanhol.
APA ainda não publicada em diário oficial e não realizado o
192
2006
zoneamento previsto na Instrução Normativa de nº 001 de
janeiro de 1996.
Não-titularização das posses da terra.
Reserva extrativista não foi implantada.
Construção e inauguração de barraca suspensa na lagoa da
Torta, pertencente a morador de Tatajuba – 22.01.06.
Reuniões entre empresa, os órgãos do Estado e
representantes da comunidade para definirem proposta de
doação de terras para Tatajuba - fevereiro e março de 2006.
FONTE - Pesquisa direta e Dossiê do Conflito Fundiário na Comunidade de Tatajuba – 2001-2003.
ORGANIZAÇÃO - Eluziane Mendes, 2006.
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