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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E
MATEMÁTICA
IANA FRANCISCATTO AUDINO
COTIDIANO, PESQUISA E LINGUAGEM: UM NOVO CAMINHO PARA
RECONSTRUIR O PROCESSO DE ENSINO - APRENDIZAGEM
Dissertação de Mestrado
Porto Alegre
2006
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2
IANA FRANCISCATTO AUDINO
COTIDIANO, PESQUISA E LINGUAGEM:
UM NOVO CAMINHO PARA RECONSTRUIR O PROCESSO
DE ENSINO- APRENDIZAGEM
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
pelo Programa de Pós-Graduação em
Educação em Ciências e Matemática,
Linha de pesquisa em Matemática, na
Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul.
Orientador:
Prof. Dr. Roque Moraes.
Porto Alegre
2006
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IANA FRANCISCATTO AUDINO
COTIDIANO, PESQUISA E LINGUAGEM: UM NOVO CAMINHO PARA
RECONSTRUIR O PROCESSO DE ENSINO - APRENDIZAGEM
Dissertação apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
pelo Programa de Pós-Graduação em
Educação em Ciências e Matemática, Linha
de pesquisa em Matemática, na Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Orientador: Prof. Dr. Roque Moraes
Aprovada em ______________________, pela Banca Examinadora.
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
Profª. Drª. Marlene Grillo - PUCRS
________________________________________________
Profª. Drª. Valderez Marina do Rosário Lima - PUCRS
_____________________________________
Prof. Dr. Roque Moraes - PUCRS
4
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
A912c Audino, Iana Franciscatto
Cotidiano, pesquisa e linguagem : um novo
caminho para reconstruir o processo de ensino-
aprendizagem / Iana Franciscatto Audino. – Porto
Alegre, 2006.
132 f.
Dissertação (Mestrado) – Fac. de Física, PUCRS, 2006.
Orientador: Prof. Dr. Roque Moraes.
1. Educação. 2. Ensino. 3. Aprendizagem. 4.
Pesquisa Educacional. 5. Autonomia (Educação). 6.
Linguagem. I. Moraes, Roque. II. Título.
CDD 370.7
Bibliotecária Responsável
Iara Breda de Azeredo
CRB 10/1379
5
É preciso acreditar na criatividade do ser humano
para mudar o que é insatisfatório. É preciso mudar
o caminho que a Educação tem tomado, antes que
seja tarde demais.
Tiba
AGRADECIMENTOS
6
Ao professor Drº. Roque Moraes, pela confiança e por todos os ensinamentos
durante esta etapa.
Ao meu amor e minha mãe que me deram apoio nas horas difíceis e estavam
sempre dispostos a me escutar.
Às colegas de escola, Eliana e Andréia, que foram parceiras de trabalho.
A todos os professores e colegas de mestrado que me propuseram construir e
reformular conceitos, em especial à Cris, Déia, Vettori, D’albo, Fê, Gláucia e Kátia,
que sempre demonstraram respeito e muito carinho.
Aos alunos da escola investigada, que possibilitaram não a concretização
da pesquisa, mas um grande aprendizado como ser humano.
RESUMO
A intenção central deste estudo foi a de investigar as percepções dos alunos sobre
uma proposta de ensino-aprendizagem que partiu do cotidiano dos mesmos.
7
Discutiu-se, ainda, as mudanças geradas na concepção dos alunos sobre o papel da
escola e do processo de ensino-aprendizagem após a participação dos mesmos na
proposta realizada em sala de aula. Para a concretização deste propósito, optou-se
pela realização de um estudo descritivo numa abordagem qualitativa, procurando-se
estabelecer interligações entre a prática pedagógica, com valorização do processo
de educar pela pesquisa, e as percepções e comportamentos dos alunos, que
norteavam as relações sociais e intelectuais existentes em sala de aula. A coleta de
dados realizou-se durante o ano letivo de 2004 em uma turma da oitava totalidade
no Ensino Médio da Educação de Jovens e Adultos. Durante a pesquisa procurou-se
desvelar as mudanças geradas em sala de aula a partir da participação em uma
proposta de ensino-aprendizagem com valorização no cotidiano dos mesmos. Os
procedimentos metodológicos selecionados foram os depoimentos dos alunos, orais
ou escritos, e as observações em sala de aula. Ao longo do estudo refletiu-se sobre
o papel da escola e sua organização, a importância da pesquisa em sala de aula,
bem como a estreita ligação entre o conhecimento cotidiano e a linguagem. A
pesquisa possibilitou demonstrar que o partir do cotidiano dos alunos, a motivação, o
uso e o estímulo da linguagem em sala de aula foram fatores que contribuíram e
interferiram de maneira significativa na formação da autonomia e aprendizagem dos
educandos. Como resultado da investigação, verificou-se a importância de aproveitar
o conhecimento cotidiano em sala de aula, bem como os possíveis benefícios de sua
utilização. Procurei demonstrar o quanto nossos alunos podem contribuir com suas
experiências em sala de aula e, desta forma, o quanto estas podem acrescentar na
construção e reconstrução da aprendizagem. Verificou-se, ainda, que uma sala de
aula participativa, democrática, desafiadora, que estimule o engajamento dos
alunos, o intercâmbio e a circulação de diferentes perspectivas sobre os mais
8
variados assuntos contribui para o desenvolvimento da autonomia. Por outro lado,
foi fator necessário para a concretização de aprendizagens mais significativas a
superação, por parte do professor, da centralização do conhecimento. Entendo que
ao descentralizar a aprendizagem podemos formar alunos críticos e autônomos
capazes de mudar a realidade na qual estão inseridos.
Palavras- Chave: Cotidiano, Educação, linguagem, pesquisa, autonomia.
9
ABSTRACT
The central intention of this study was to investigate the perceptions of the pupils on
a classroom proposal based on the pupil’s daily experiences. It was also investigated
the changes generated in the conception of the pupils on the function of the school
and the process of teaching-learning after the participation in the proposal carried
through in classroom. For the fulfillment of this purpose, it was opted to conduct a
descriptive study in a qualitative approach, intending to establish interconnections
between the pedagogical practice with the use of education through research, and
the perceptions and behaviors of the pupils, which guided the existing social and
intellectual relations in classroom. The data collection was fulfilled during the school
year of 2004. During that period there were observed the changes generated in the
classroom from the participation in the proposal with valuation on the pupil’s daily
experiences. The methodological procedures were the pupil’s verbal or written
productions and their comments in classroom. During the study reflections were
produced about the function of the school and its organization, the importance of
doing research in the classroom, as on well as the relationship between the daily
knowledge of the students and the language used in the classroom. The research,
showed that departing from the daily knowledge of the pupils, their motivation, the
investment in the use and the stimulation of the language in classroom were factors
contributed and intervened in a significant way on the formation of the pupils,
autonomy and on the improvement of the learning process. As result of the inquiry it
was verified the importance and the advantages in the use of the daily knowledge in
10
the classroom, as well as the possible benefits of its use. The presented arguments
intend to demonstrate how much our pupils can contribute with their experiences in
the classroom and how much they can add in the construction and reconstruction of
the knowledge. It was also verified that a participative, democratic, challenging
classroom, that stimulates the involvement of the pupils, the interchange and the
circulation of different perspectives on the most varied subjects contributes to the
development of the autonomy. On the other hand it was necessary for the
improvement of students’ learning that the teacher overcome its central role in the
classroom. When learning is decentralized more critical and independet pupils can be
formed, subjects capable to change the reality in which they are inserted.
Words Keys: Daily knowledge, Education, language, research, autonomy.
11
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................10
2 CONTEXTUALIZAÇÃO E JUSTIFICATIVA...........................................................14
3 CONSTRUINDO TEORIAS NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM......24
3.1 O COTIDIANO NA APROPRIAÇÃO DE CONHECIMENTOS.............................25
3.2 O PAPEL DA ESCOLA NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO...................29
3.3 A REORGANIZAÇÃO CURRICULAR..................................................................35
3.4 A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA EM SALA DE AULA.......................................40
3.5 O COTIDIANO COMO FATOR MOTIVADOR......................................................45
3.6 O COTIDIANO E LINGUAGEM............................................................................48
3.7 FINALISANDO O EIXO TEÓRICO.......................................................................53
3.8 SÍNTESE DO CAPÍTULO.....................................................................................58
4 METODOLOGIA DE PESQUISA............................................................................59
4.1 SÍNTESE DO CAPÍTULO.....................................................................................65
5 DESCRIÇÃO DA PROPOSTA REALIZADA EM SALA DE AULA........................66
6 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA.................83
6.1 CONHECENDO O SUJEITO AO LONGO DO PROCESSO................................84
6.2 A CAMINHADA.....................................................................................................89
6.2.1 A construção das relações sociais................................................................93
6.2.2 A autonomia e a construção do conhecimento............................................97
6.2.3 Uma nova visão do processo de ensino-aprendizagem............................103
6.3 SÍNTESE DO CAPÍTULO...................................................................................110
7 CONCLUSÂO.......................................................................................................111
REFERÊNCIAS.......................................................................................................116
APÊNDICE A - Primeiro instrumento de pesquisa inicial (documento em branco).121
APÊNDICE B - Segundo instrumento pós aplicação da proposta realizada em sala
de aula (documento em branco)...............................................................................122
APÊNDICE C - Terceiro instrumento pós aplicação da proposta realizada em sala de
aula (documento em branco)...................................................................................123
ANEXOS..................................................................................................................124
12
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho teve como principal objetivo investigar as repercussões
entre os alunos participantes de uma proposta de ensino que parte do cotidiano dos
mesmos.
Num primeiro momento, procurei identificar suas idéias prévias sobre o papel
da escola, a fim de analisar as possíveis modificações destas idéias após a
participação na proposta de ensino-aprendizagem através da valorização da relação
com o cotidiano. Por fim, pretendi ainda investigar e analisar as percepções dos
alunos sobre o trabalho realizado, buscando identificar em suas produções
mudanças de concepção no processo de ensino-aprendizagem.
O desenvolvimento desta proposta de ensino partiu de uma discussão
realizada em sala de aula. Na escola em que atuava, o Ensino Médio de Jovens e
Adultos estava organizado por totalidades e, de acordo com a supervisão da escola,
cabia a nós, professores, decidir os conteúdos e os eixos temáticos a serem
trabalhados. Resolvi, então, consultar meus alunos para tentar contemplar suas
necessidades diárias e suas curiosidades.
13
Considero fundamental o aluno sentir-se agente de sua própria
aprendizagem. Por isso, iniciei um diálogo aberto e franco no qual os alunos
pudessem mostrar-se por inteiro, manifestando suas opiniões e discutindo suas
dúvidas. Assim, cada nova temática, discutia com meus alunos a relação entre o
tema e suas vidas, bem como de que maneira o conhecimento matemático estaria
envolvido.
Baseada nas discussões em sala de aula e com colegas de aula e de trabalho
minha pesquisa foi tomando forma até que formulei o problema: quais as
contribuições que uma proposta de ensino que parte do conhecimento cotidiano e
valoriza a pesquisa e a linguagem dentro da sala de aula traz para o processo de
ensino - aprendizagem?
Dentro do processo de ensino-aprendizagem, o estudo enfoque quatro
questões que facilitam o encaminhamento e a construção dessa dissertação:
Quais as idéias prévias dos alunos sobre o papel da escola e quais as
modificações geradas nestas idéias a partir da participação dos mesmos na proposta
de ensino com ênfase no cotidiano?
Quais as percepções dos alunos em relação à utilização da pesquisa como
parceira de trabalho?
Como a valorização da linguagem dos alunos e o diálogo contribuem para o
processo de ensino-aprendizagem?
14
Como a descentralização por parte do professor interfere no processo de
ensino - aprendizagem?
Durante o ano de 2004, o trabalho foi desenvolvido com uma turma da oitava
totalidade da educação de Jovens e Adultos, na Escola Estadual de Ensino Médio
Agrônomo Pedro Pereira. O tema gerador da totalidade foi o “Meio Ambiente”. Ao
longo do trabalho os alunos perceberam o quanto era importante falar, socializar
experiências, sendo isso essencial para que houvesse evolução no conhecimento.
Nos capítulos que sucedem este trabalho de pesquisa apresento inicialmente
um relato sobre a minha trajetória profissional, justificando a escolha do tema
pesquisado. Posteriormente, realizo uma discussão sobre os fundamentos teóricos a
fim de dar suporte teórico à pesquisa. A seguir, na metodologia da pesquisa
descrevo a forma de obtenção de informações, bem como a análise utilizada. Então,
apresento um relato do desenvolvimento da proposta, descrevendo os
encaminhamentos das atividades realizadas. Por fim, apresento os resultados das
análises e interpretações, bem como faço algumas considerações finais sobre o
trabalho.
O objetivo aqui o foi o de apresentar uma solução definitiva em forma de
modelo de ensino a ser seguido e nem apresentar respostas prontas para os
problemas de sala de aula. Foi, antes, propor uma discussão e fazer um convite ao
diálogo a respeito do papel da escola, de como ela está organizada atualmente, bem
como da importância da utilização da pesquisa como forma de trabalho e da forte
ligação existente entre linguagem, aprendizagem e o conhecimento cotidiano.
15
A discussão deste tema perpassa por uma profunda reflexão interna, onde
cada membro da escola deve participar de coração aberto. A intenção desta
pesquisa não é encontrar culpados, mas buscar caminhos para que a aprendizagem
seja construída em pilares sólidos, sem rachaduras, já que construídos com a
participação de todos.
16
2 CONTEXTUALIZAÇÃO E JUSTIFICATIVA
Para melhor compreensão da escolha do tema pesquisado, descrevo um
pouco da minha história, bem como as relações da mesma com o meu trabalho.
Minha trajetória como professora iniciou-se no curso de graduação em
Matemática. Como professora contratada, tive a oportunidade de participar de um
grupo de professores que buscava mudanças por meio do Projeto Amigos da
Escola.
O referido Projeto tinha por objetivo promover a participação dos pais nas
atividades da escola, buscando uma maior integração escola-comunidade, pois tal
participação interferia positivamente no desempenho escolar e nas atitudes dos
alunos dentro e fora do ambiente escolar. O segundo passo desse projeto foi realizar
oficinas com os professores da escola para discutir temas tais como a importância
de socializar experiências com alunos e colegas, escutar a todos e, sobretudo,
reavaliar a postura de educador em sala de aula. Nesta época, já percebia a
importância de trocar experiências.
17
Como professora de Matemática, realizei um trabalho com as professoras de
Educação Infantil e Séries Iniciais visando à reestruturação do currículo, pois era
muito clara, para mim, a dificuldade que as crianças apresentavam na quinta série.
Elas sabiam fazer “continhas”, mas não conseguiam interpretar um problema.
Freqüentemente perguntavam: “tem que somar ou multiplicar?”.
Diante disto procurei, por meio de debates, iniciar um processo de reflexão
sobre a importância de trabalhar os conceitos matemáticos por meio de problemas,
pois entendo que cada vez que se traz para dentro da sala de aula exemplos do
cotidiano, possibilita-se ao aluno ter uma visão global do que está sendo proposto
para estudo e aprendizagem. Desta maneira o mesmo sente-se parte do problema e,
assim, tenta resolvê-lo, utilizando os conhecimentos prévios e os adquiridos em aula.
Aqui, comecei a perceber a necessidade de buscar nas experiências dos alunos
suportes para a aprendizagem.
A cada amanhecer, a cada discussão, seja na escola ou na faculdade, aos
poucos, ia tendo certeza da minha verdadeira vocação, pois quando comecei a
cursar a graduação era muito jovem e, como eles, cheia de sonhos, medos e
incertezas.
Apesar das dificuldades, sempre acreditei que uma educação de qualidade é
possível. E o fato de ter iniciado minhas práticas em sala de aula no primeiro ano da
faculdade possibilitou-me não sonhar, mas colocar em prática minhas idéias.
Muitas vezes, ao entardecer do dia tinha vontade de desistir, pois as dificuldades
eram muitas. Mas algo dentro de mim era mais forte e cada amanhecer era um
recomeço.
18
Durante o curso de graduação foi possível confrontar a teoria com a prática,
adquirindo uma grande aprendizagem, pois percebi desde cedo que não
conseguimos fazer nada sozinhos. muito tempo tenho me preocupado em
socializar minhas descobertas e medos com os colegas de trabalho e, sem dúvida,
tenho contado com a sabedoria e a paciência de cada um deles.
Após a minha graduação, trabalhei com a Educação de Jovens e Adultos. Foi
com essa turma que percebi a magia de ser Educadora, pois tinha consciência de
que todos temos a ensinar e a aprender.
Olhar aquelas pessoas de vinte, cinqüenta ou sessenta anos, como se
estivessem conhecendo os números naquele momento, constituía momentos
mágicos e ao mesmo tempo desafiadores. Mágicos, pois aquelas pessoas
mostravam uma disposição em aprender como jamais havia visto. Desafiadores,
porque pensava: Como contemplar os sonhos e desejos de cada um deles?
Minha escola naquele momento, não nos deixava ousar. Estávamos presos a
muitos conteúdos que aos olhos daquelas pessoas não faziam muito sentido. Às
vezes era difícil explicar por que deveriam estudar tudo aquilo. Naqueles momentos,
fui tendo a certeza de que não podíamos trabalhar de modo tradicional, impondo os
conteúdos a serem desenvolvidos, pois assim não estávamos contribuindo para a
aprendizagem significativa dos mesmos.
Ao mesmo tempo, iniciaram-se minhas atividades educacionais numa escola
estadual, onde trabalhei com o curso de Magistério. Com essas turmas de futuras
Educadoras tive, novamente, a oportunidade de discutir como trabalhar os
conteúdos de Matemática, nas séries iniciais. O que muito me preocupava era que
19
muitas daquelas alunas não gostavam de Matemática. Pior, estavam ali para fugir
dela. Muitas vezes me questionei: Como mudar isso? Em alguns momentos obtive
resposta, em outros não; mas sempre que me era permitido, tentava mostrar-lhes a
importância de gostar daquilo que elas também iriam ensinar.
Fato marcante, para mim, foi conhecer e trabalhar no Projeto Amora
desenvolvido por uma escola pública federal de Porto Alegre. Esse projeto não visa
somente ao conteúdo, mas destaca-se por ser um projeto interdisciplinar que utiliza
os meios tecnológicos para ensinar, possuindo, também, assessorias, oficinas e
projetos de aprendizagem nos quais os alunos são agrupados de acordo com o
tema que gostariam de pesquisar. aprendi que tanto alunos como professores
devem ser pesquisadores e o quanto a pesquisa tem a acrescentar em cada sujeito.
Trabalhar nesse Projeto mexeu com uma parte de mim que estava
adormecida, mas que, em pouco tempo acordou. Estava muito claro, para mim, que
a educação não é um monte de gavetas onde a cada momento abrimos uma. Na
verdade, todas estão interligadas e uma depende da outra.
A convivência no Projeto Amora oportunizou-me trabalhar não somente
conteúdos de Matemática, mas de outras áreas também, pois professores e alunos
andavam juntos, lado a lado, ambos investigadores e nenhum dos dois era detentor
de todo saber, pois tudo era construído. O diálogo, o fato de não ter medo de errar e
começar de novo eram fundamentais, tanto para alunos quanto para professores.
Outro fato marcante foi desenvolver, nesta escola, um projeto utilizando os
meios tecnológicos. A idéia surgiu no momento em que percebi que os alunos
gostariam de conhecer a perspectiva histórica daquilo que estava sendo
20
desenvolvido. Entre outras, a pergunta que faziam era: Quem, de fato, descobriu a
Matemática? Além disso, os alunos sentiam falta de pesquisar algum tema sobre o
qual tivessem curiosidade em saber. Muitos reclamavam que usavam pouco o
Laboratório de Informática. Devido a este fato e à curiosidade dos alunos iniciamos a
pesquisa.
O trabalho foi realizado em duas etapas: na primeira, os alunos construíram
uma home-page e participaram de um grupo de discussões para que todos tivessem
acesso às descobertas de cada um. Era uma possibilidade de eles mesmos
poderem perguntar, dar dicas, ajudar e amesmo criticar o trabalho dos colegas.
Na segunda etapa, os alunos participaram de um Fórum, onde apresentaram seu
trabalho utilizando como instrumento de apresentação sua home-page e outros
materiais que desejassem.
Nessa mesma instituição, desenvolvi, ainda, um trabalho com funções que
consistia em utilizar leituras de tabelas, gráficos, problemas matemáticos, variação
de grandezas, exemplos físicos e programas gráficos, como o graphamatica. O
diálogo teve papel fundamental, pois pedi aos alunos que escrevessem o que
achavam sobre um determinado conceito matemático e, a partir do significado
trazido por eles, definíamos conceitos.
É importante deixar claro que o formalismo no trabalho realizado era o
resultado de um processo no qual cada aluno, ao seu tempo, tinha a oportunidade
de elaborar, e cabia ao professor orientar e dar suporte para que ensino e
aprendizagem ocorressem de maneira tranqüila, tornando a sala de aula um lugar
de troca, construção e reconstrução de conhecimento.
21
Concomitante as atividades relatadas acima tive a oportunidade de conhecer
através de amigos um curso de mestrado que falava o que queria ouvir, aulas mais
atraentes, pesquisa em sala de aula, educar pela pesquisa, reconstrução do
conhecimento a partir das idéias dos alunos. Resolvi então, prestar seleção para
este curso de Mestrado, nele procurava encontrar alternativas para qualificar minhas
aulas, proporcionando um aprendizado com maior significado para os alunos.
Dentre as primeiras leituras que fiz ao estudar para a seleção me remeti para
dentro das idéias de Pedro Demo, como se fosse personagem presente em suas
palavras, aos poucos conforme a leitura avançava percebi que havia em mim traços
fortes de uma professora pesquisadora preocupada em construir em vez de apenas
informar.
Durante o curso de mestrado em Educação em Ciências e Matemáticas,
procurei fortalecer os traços de pesquisadora presente em mim, este fortalecimento
se seu conforme eram realizadas leituras, discussões, desafios, construção de
unidades de aprendizagem, entre outras atividades que me levaram a repensar o
processo de ensino-aprendizagem e o rumo da educação.
Dentre os diversos textos que li um em especial me encantou, este tem como
título: Tomando conta do ambiente em que se vive: Aprendizagem e apropriação de
discursos pela linguagem tendo a autoria de Roque Moraes e Maria do Carmo
Galiazzi. Por sua vez o mesmo revelava elementos que me fazia pensar. A cada
parágrafo que lia sentia cada vez mais vontade de investir no cotidiano, na pesquisa
e na linguagem dos educandos. Neste período tentava imaginar como fazer isso..
Mesmo não tendo ainda clareza de como realizar este propósito optei por uma
22
proposta de aprendizagem que partisse do cotidiano e valorizasse a linguagem e o
diálogo dos educando.
Procurando colocar em prática o desenvolvimento da proposta de
aprendizagem que parte do cotidiano aceitei um convite para integrar o corpo
docente que trabalharia com o Ensino de Jovens e Adultos. Entendia que era
importante trabalhar e promover uma aprendizagem mais significativa a estes alunos
que tiveram a sua escolarização interrompida.
De acordo com a Secretaria Estadual de Educação, deveríamos desenvolver
com os alunos uma educação voltada para as questões do dia a dia, possibilitando
aos mesmos uma integração com a sociedade na qual estão inseridos. Logo, revi o
passado, relembrando dos meus antigos alunos. Percebi que ali estaria minha
oportunidade de recomeçar a trabalhar de uma forma diferenciada com esses
grupos de alunos, que anteriormente haviam demonstrado uma vontade de
adquirir aprendizagens relevantes a sua trajetória de vida.
A proposta da Secretaria Estadual de Educação sugeria um ensino por
temática, no qual, em cada totalidade, os professores abordassem um tema
diferente, ficando a cargo dos mesmos trabalhar os conhecimentos que achassem
necessários para o crescimento pessoal dos educandos.
A busca por alternativas que permitam uma melhor aprendizagem dos alunos
na Educação de Jovens e Adultos é de suma importância, que é cada vez maior o
número de estudantes que param de estudar devido a vários motivos tais como o
fracasso escolar, tão presente nas nossas instituições de ensino. Mas como mudar
isso?
23
Como educadora, entendo que não podemos fechar os olhos para esses
alunos que retornam à escola, cabendo a nós contribuir para o sucesso dos
mesmos, auxiliando esses cidadãos a conquistar uma inserção mais digna junto à
nossa sociedade.
Desta maneira, defendo uma proposta de ensino que parte do cotidiano dos
alunos. Procuro desencadear a aprendizagem a partir da aproximação entre o
currículo e a cultura, explorando o que os mesmos conhecem sobre o assunto.
Somente após essa discussão estabeleço, juntamente com eles os conceitos e os
conteúdos a serem trabalhados. Considero importante dialogar com os alunos,
ouvindo suas reflexões e dúvidas. Entendo que partir do cotidiano dos alunos é partir
de algo que já dominam.
Deste modo, meu objetivo geral consiste em investigar as repercussões em
relação ao processo ensino - aprendizagem após a participação dos alunos numa
proposta de ensino que parte do conhecimento cotidiano e valoriza na sala de aula a
pesquisa e a linguagem dos educandos.
Para tal, inicialmente procuro identificar as idéias prévias dos alunos sobre o
papel da escola. Em seguida, analiso as modificações destas idéias a partir da
participação dos mesmos na proposta de ensino realizada e, por fim, analiso as
percepções dos alunos sobre a proposta realizada em relação ao processo de
ensino-aprendizagem.
Educar é mais do que cumprir cronogramas. É ensinar nossos alunos a
sonhar. É sonhar junto com eles e buscar a realização de nossos sonhos, pois
conforme diz, Rubem Alves,
24
Esta é uma das missões da educação: formar um povo. Ou seja,
ajudar as pessoas a sonhar sonhos comuns para que, juntas,
possam construir. As escolas devem ser o espaço onde alunos e
professores sonham e compartilham seus sonhos, porque sem
sonhos comuns não povo, e não havendo um povo não se pode
construir um país. (2003, p.8).
Ainda nas palavras de Rubem Alves,
Educar é mostrar a vida a quem ainda não viu. O educador diz:
“Veja”- e, ao falar, aponta. O aluno olha na direção apontada e o
que nunca viu. O seu mundo se expande. Ele fica mais rico
anteriormente, ele pode sentir mais alegria e dar mais alegria- que é
a razão pela qual vivemos. Vivemos para ter alegria e dar alegria. O
milagre da educação acontece quando vemos um mundo que nunca
se havia visto (2003, p. 116).
Educar é isso: é sonhar junto com nossos alunos. É lutar para realizar nossos
sonhos. É incentivar o aluno a desbravar caminhos nunca antes trilhados. É mostrar
a ele que não deve ter medo de tentar, pois sempre pode contar com o auxílio do
professor e que cabe somente a ele decidir o caminho a ser seguido.
Julgo importante, nesta jornada chamada educação, que os alunos entendam
o verdadeiro papel da escola. Para que isso aconteça, é necessário que tenhamos
claro nosso papel de educador.
Considero impossível mudar algo em que não acredito. Por isso, é importante
acreditar que uma educação de qualidade é possível e que cabe a cada um sair do
pedestal e sentar ao lado dos alunos, escutando o que eles tem a relatar. Este, sem
dúvida, é o primeiro passo para que ocorram mudanças significativas no processo
educativo.
25
Priorizar em nossa sala de aula a troca, o diálogo, o respeito, a pesquisa, o
conhecimento que cada um traz é imprescindível. Se estes conceitos não regerem o
ambiente escolar, não conseguiremos formar sujeitos autônomos, pois como
conquistaremos a autonomia se não escutamos, debatemos e aproveitamos o
conhecimento trazido por cada um?
Somente quando entendermos o que nossos alunos pensam sobre a escola e
as propostas por ela desenvolvidas é que conseguiremos contribuir para uma
educação qualificada ou de qualidade.
Nesta pesquisa, os alunos estiveram presentes do início ao fim. A atuação
deles fez a diferença e não somente meu estudo Tanto a prática como a teoria foram
se desenrolando, pois considero que a construção e reconstrução são permanentes,
bem como a avaliação de todo o processo.
26
3 CONSTRUINDO TEORIAS NO PROCESSO DE ENSINO - APRENDIZAGEM
Nesta parte do trabalho apresento o panorama teórico no qual meu trabalho
está inserido. Inicialmente, pretendo dissertar sobre o significado do termo cotidiano
utilizado em trabalhos de sala de aula, bem como definir qual seu significado nesta
pesquisa. Após, pretendo rediscutir e reavaliar o papel da escola, bem como a sua
organização curricular. Pretendo, ainda, dissertar sobre a importância da pesquisa
em sala de aula, motivação e linguagem. Entendo que todos esses assuntos estão
interligados ao partir do cotidiano, e a sua utilização em sala de aula pode
ressignificar e reorganizar a escola.
Entendo que todos estes assuntos estão diretamente integrados à construção
do conhecimento, das relações sociais e por conseqüência ligados à aprendizagem.
27
3.1 O cotidiano na apropriação de conhecimentos
O verdadeiro saber é aquele que aparece
automaticamente, no cotidiano,
aumentando a eficiência e o
prazer de viver.
Tiba
Ao utilizar a palavra cotidiano, num primeiro momento, faz-se necessário
defini-la.
De acordo com Guimarães: “Cotidiano, palavra que vem do latim cotidie ou
cotidianus, significa todos os dias, o diário, o comum, o habitual” (2002, p. 11)
Se cotidiano significa “todos os dias”, trabalhar com o cotidiano significa partir
do conhecimento e da cultura trazidos pelos alunos.
O mesmo autor ainda afirma que: “A vida cotidiana é por excelência o lugar
em que se desenvolve a vida humana”. (GUIMARÃES, 2002, p. 32)
É neste cotidiano que crescemos, aprendemos, construímos e reconstruímos
nossos conhecimentos. E se a vida cotidiana é um dos ambientes onde
aprendemos, construímos e reconstruímos nossos saberes, como não aproveita-los
em sala de aula?
28
Ao longo dos anos, observam-se diferentes posicionamentos do trabalho com
o cotidiano. Alguns autores destacam que os temas cotidianos ajudam na
argumentação de um determinado posicionamento; outros relatam que os mesmos
ajudam na construção de um referencial teórico para pesquisas e trabalhos
desenvolvidos, além de destacarem que o cotidiano possibilita a motivação, tal como
nas citações que seguem:
A utilização de temas cotidianos é recomendada por muitos autores
(Gil Perez y Valdés Castro, 1996; Hodson, 1994; Solomon, 1988;
Alonso et al., 1992), por possibilitar a contextualização e motivação
do aprendiz, tornando o processo de aprendizagem mais eficiente e
agradável (ZULIANI; ÂNGELO, 1999, p. 2).
Os autores acima afirmam que o processo de ensino-aprendizagem torna-se
mais eficiente quando se trabalha com o cotidiano, pois ao partir de algo dominado o
aluno pode reconstruir o que conhece, bem como pode adquirir novos
conhecimentos.
O cotidiano é colocado como orientador de práticas e alternativa viável para
as aulas, conforme podemos observar em Lopes, Gomes e Lima:
Por sua vez, o pensamento educacional em ciências sempre
procurou levar em conta as relações entre ciência, vida cotidiana e
contextos sociais mais amplos, seja como forma de superar um
ensino verbalista e academicista, seja como forma de motivar e
provocar interesse nos alunos, seja ainda como forma de garantir o
conhecimento das aplicações de conceitos científicos. (2001, p. 50).
Gurgel aponta como uma das opções de melhorar o ensino a aproximação
entre o cotidiano e a ciência.
29
Sob o ponto de vista didático-pedagógico do processo do ensino, os
dados da investigação evidenciaram que os grupos destacaram a
prática experimental, a inovação curricular, capacitação docente,
produção e aplicação de material didático concreto no ensino e a
relação Ciência e cotidiano como prioridades necessárias para a
melhoria do ensino (1999, p. 8).
Como podemos observar nos depoimentos acima, trabalhar com o cotidiano
ajuda a transformar a educação, torna os alunos mais motivados para a efetiva
participação em aula e a aprendizagem, serve como orientador na prática
pedagógica, auxilia na contextualização e justificação do que se trabalha em sala de
aula bem como do estudo de determinados conceitos; e tem, ainda, a intenção de
compreender os fenômenos e processos que nos rodeiam.
Devemos ter presente que o conhecimento cotidiano está no contexto do dia
a dia de cada indivíduo, pois conforme Morin (2003), devemos mobilizar o que o
conhecedor sabe sobre o mundo.
Ao mobilizarmos os conhecimentos dos alunos, trazemos esta diversidade
cultural para dentro da sala de aula e cada indivíduo tem a oportunidade de
aprender com a experiência e vivência de cada colega, tornando a sala de aula um
ambiente de troca, construção e reconstrução de idéias.
Freire lembra que, “não se deve partir do conceito para entender a realidade,
mas sim partir da realidade para, através do conceito, compreender a realidade”
(1985, p. 63).
Ao longo deste trabalho, é da maneira relatada acima que utilizo a palavra
cotidiano, pois aqui não cabe defini-la como exemplo da vida real quando o
30
professor trabalha seus conteúdos programáticos. Neste estudo, cotidiano define-se
com o partir de algo que se conhece para posteriormente introduzir os conteúdos e
conceitos. Estes, por sua vez, irão surgindo ao longo do processo de ensino-
aprendizagem. Portanto, nesta perspectiva de educação é essencial trazer e
valorizar o que o aluno conhece do mundo.
Lopes; Gomes e Lima destacam que:
A despeito das inúmeras diferenças de enfoque dessas perspectivas
teóricas e dos possíveis questionamentos que possam ser
desenvolvidos nesse campo, podemos afirmar que em todos esses
trabalhos a valorização do cotidiano, das experiências dos alunos,
dos saberes populares e de contextos sociais e tecnológicos mais
amplos tende a assumir um viés crítico e vinculado à defesa de uma
educação democrática (2001, p. 50).
Concordo quando o autor aponta que ao trabalhar com o cotidiano tornamos a
educação mais democrática e crítica. Acredito que quando o aluno percebe que é
conhecedor do mundo, que pode interferir no aprendizado e que os conteúdos não
estão tão distantes da sua vida diária pode motivar-se e, assim, construir
conhecimentos cada vez mais complexos.
Entendo que o cotidiano deve ser visto como uma forma de valorizar a
Ciência, à medida que se justificam e se contextualizam os conteúdos trabalhados,
como no caso abaixo:
as ciências ganham valorização, à medida que se mostram
imprescindíveis às abordagens teórico-práticas que inter-relacionam
dinamicamente o cotidiano com as ciências, na potencialização de
aprendizagens relevantes à formação (KINALSKI; ZANON, 1997, p.
16).
31
Não podemos esquecer da relação e valorização do cotidiano a da ciência.
Devemos mostrar que ela está presente em tudo que nos rodeia, que é aplicável e
que não podemos sobreviver sem ela. À Ciência devemos muitos avanços e o
conforto que desfrutamos. Partir do conhecimento cotidiano é necessário, contudo,
não devemos esquecer do conhecimento científico.
Quando se discute novas metodologias de trabalho para uma educação futura
centrada no aprendizado do aluno, além de discutir o significado e o uso do
cotidiano, faz-se necessário dissertar e discutir sobre o papel da escola.
3.2 O papel da escola na construção do conhecimento
Há tempos em que o professor ensina
o que sabe, Depois vem um tempo
em que ensina o que não sabe.
Rubem Alves
Ao longo dos anos, a sociedade vem sofrendo transformações de cunho
econômico, social, tecnológico e religioso. Essas transformações, bem como os
avanços tecnológicos, refletem diretamente no ambiente escolar. Assim, não se
pode mais priorizar o repasse de informações como se a sociedade continuasse a
mesma. algum tempo sabe-se da insatisfação com a Educação, tanto dos
32
educadores quanto dos educandos. Essa insatisfação revela a necessidade de
reestruturar e resignificar o ensino e o papel da escola.
A escola, por algum tempo, priorizou a “educação bancária” referida por Freire
(1983, p.63). Nesta perspectiva, o professor é que detém o saber e os alunos o
considerados “tabula rasa”, seguindo passivamente as prescrições daqueles que
possuem o saber.
O conhecimento ”aparece como uma doação dos que se julgam sábios aos
que julgam não saber”. Freire (1983, p.63). Ao longo dos anos, observou-se que
esta forma de conduzir o ensino não resolveu os problemas de aprendizagem.
Hoje percebe-se que pouco se perdeu da educação bancária e da escola
tradicional, onde o professor tinha como foco de trabalho o conteúdo a ser
desenvolvido em sala de aula. Seu papel resume-se em ser o transmissor em um
ensino centrado em procedimentos mecânicos, desprovidos de significado para o
aluno, em que se privilegia a quantidade e não a qualidade. Ao aluno cabe somente
aceitar e reproduzir, sem questionar. Será isto educar?
Demo afirma que:
Para que exista educação é preciso que haja construção e
participação. Assim, o contato entre professor e aluno será
pedagógico se for construtivo e participativo. Não pode ter mero
ensino e mera aprendizagem. O aluno não pode reduzir-se a simples
objeto de treinamento. Precisa ser sujeito. Somente educação de
qualidade é capaz de promover o sujeito histórico crítico e criativo.
(2000,p.53)
33
Embora nossa escola ainda tenha traços muito fortes da escola tradicional,
acredito que atualmente passamos por uma metamorfose. Por estarmos em
constantes mudanças, muitas vezes não sabemos ao certo o que fazer e o que
pensar. Muito se discute sobre educação, mas aparentemente este processo de
transformação é lento e a evolução nos parece cada vez mais distante.
Como educadora, às vezes me pergunto o que é mais importante: O
conhecimento científico ou o conhecimento cotidiano? E, ainda, se a educação deve
estar voltada para as necessidades básicas da vida ou para a aprovação no
vestibular?
Morin salienta que
a educação do futuro deverá ser o ensino primeiro e universal,
centrado na condição humana. Estamos na era planetária; uma
aventura comum conduz os seres humanos, onde quer que eles se
encontrem. Estes devem reconhecer-se em sua humanidade comum
e ao mesmo tempo reconhecer a diversidade cultural inerente a tudo
que é humano. Conhecer o humano é, antes de mais nada, situá-lo
no universo, e não separá-lo dele.( 2003,p 47)
Entendo, como Morin, que não podemos separar os indivíduos do universo,
pois se faz necessário conhecer-se em si e em sua diversidade cultural. Este é o
verdadeiro papel da educação. Está muito além do vestibular e do disciplinamento
escolar.
Entendo, também, que desde os seus primeiros dias de escola o aluno deve
ser considerado um ser humano valioso e digno de respeito, possuidor de vivências
anteriores, a quem deve ser permitido o exercício de todas as suas potencialidades.
34
Ele não pode mais ser visto como receptor passivo de informações, mas um sujeito
ativo que aprende e constrói significados através de suas relações com o ambiente
que o cerca.
Aproveitar o que nosso aluno compreende do mundo é o primeiro passo para
que aconteça uma educação futura voltada para o ser humano.
Acredito que para auxiliar na educação de nossos alunos, primeiramente
devemos refletir sobre o verdadeiro papel da escola, sempre nos questionando:
Educar para quê? Educar para que nosso aluno seja crítico, autônomo, enfim, que
saiba se posicionar no mundo que o cerca.
Conforme lembra Morin, “a educação deve favorecer a aptidão natural da
mente em formular e resolver problemas essenciais e, de forma correlata, estimular
o uso total da inteligência geral” (2003, p. 39).
Assim, não se pode permitir que a educação de nossas escolas seja exercida
de forma autoritária, onde os chefes é que tomam as decisões, neste caso, os
professores. Deve-se pensar numa educação libertadora, onde o indivíduo, aluno,
toma suas próprias decisões. Para chegarmos a esta educação libertadora não
podemos priorizar uma educação centrada na reprodução de incansáveis listas de
exercícios. Devemos incentivar nosso aluno a pensar e não a reproduzir
A escola deve ser um ambiente de troca, onde professores e alunos andam
juntos tentando resolver e compreender problemas. Desta maneira, devemos
privilegiar o diálogo, a participação, a busca por solução de problemas. Assim se
elaboram novos conhecimentos. Como afirma Fleuri: “Na busca de compreender e
35
resolver os problemas que surgem da própria prática, as pessoas discutem, trocam
opiniões e experiências, buscam informações e elaboram novos conhecimentos”.
(FLEURI, apud. VALQUEZ, 1997, p.59).
Uma proposta de educação de qualidade deve ser estruturada a partir do
cotidiano dos alunos, do seu contexto, do seu discurso cultural e de sua linguagem,
pois “é a partir deles que o trabalho da escola precisa organizar-se, enriquecendo os
discursos dominados, complexificando os conhecimentos que os alunos
trazem“, (MORAES, 2004, p. 4)
Considero que devemos partir do que o aluno traz para, aos poucos, atingir
conhecimentos mais complexos e formalizar conceitos, e isso não significa que o
conhecimento deva ser trabalhado de forma superficial.
Deste modo, cabe a nós, agentes da educação, reorganizar e ressignificar o
papel da escola, assumindo-nos aprendizes e, junto com nossos alunos, construir e
reconstruir o verdadeiro papel da escola, buscando um ensino de qualidade.
Como diz Morin (2000), a missão de um ensino educativo é transmitir não um
mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa condição, nos ajude a
viver e que favoreça, ao mesmo tempo, um modo de pensar aberto e livre.
Ainda de acordo com Morin (2000), o significado de “uma cabeça bem cheia”
é aquela onde o saber é acumulado, empilhado, e não dispõe de um princípio de
seleção e organização que lhe sentido. “uma cabeça bem-feita” é aquela que
em vez de acumular o saber dispõe de uma aptidão geral para colocar e tratar os
36
problemas, além de organizar princípios que permitem fazer ligações entre os
saberes e dando-lhes sentido.
Acredito ser este o papel da escola: formar alunos que possuam “uma cabeça
bem-feita” com pensamento aberto e livre, atribuindo sentido ao que aprendem e
descobrem, podendo assim modificar sua maneira de ser e de viver.
Considero que numa sociedade como a nossa, que se caracteriza pelas
desigualdades econômicas e sociais, a educação deve ser considerada como a
possibilidade de garantir ao homem instrumentação que o auxilie a tornar-se
autônomo, livre, questionador e crítico.
O principal objetivo institucional da educação deve ser o desenvolvimento do
pensar, agir, sentir humano, permitindo mudanças de toda uma sociedade, num
processo participativo e dinâmico, onde a cultura de cada um é respeitada e
compartilhada entre todos, visando minimizar as desigualdades tão presentes em
nossa sociedade. Para tal, seria importante que o processo educativo viabilizasse a
criação e a descoberta. Enfim que o aluno participasse ativamente do processo
educativo e não fosse apenas coadjuvante. A escola deve preparar o aluno para
contribuir e criar, assim como para negociar e compartilhar idéias e conhecimentos.
Pois de acordo com Demo (2000, p. 26), ,
o aluno aprende reconstruindo o conhecimento com mão própria, ora
de maneira individual, ora de maneira coletiva. Precisa ter a chance
de errar, de discutir, de testar, de achar soluções próprias, de divergir
e de argumentar. A aula tradicional reprodutiva é feita para evitar
tudo isso, em vez de inspirar isso.
37
Ao dissertar sobre o papel da escola perpassamos pela discussão de como a
mesma está organizada. Portanto, neste momento centro minhas idéias na forma
como o currículo está organizado, bem como na sua reorganização.
3.3 A reorganização curricular
Ensinar não é transferir conhecimento,
mas criar as possibilidades para a
produção ou a sua construção.
Freire
O currículo deve ser elaborado pelo professor, juntamente com os alunos, não
se pode aceitar que o mesmo seja somente um instrumento de execução de um
plano previamente estabelecido. Por isso deve se integrar novos pontos de vista,
alternativas e experiências que visem proporcionar ao educando a construção do
conhecimento, não há fragmentação do saber.
Com o passar dos anos, vem se comprovando a ineficiência do modelo
tradicional. Conforme Moraes (2000), a escola deve buscar superar a excessiva
preocupação com o disciplinamento. A partir da divisão do currículo por disciplinas, a
escola fragmentou o saber. Os alunos, por sua vez, possuem dificuldades em
perceber que estão utilizando os mesmos conhecimentos em diversas disciplinas.
38
Além de gerar um afastamento do todo, muitas vezes isso inviabiliza que os alunos
percebam os conhecimentos trabalhados em aula no seu cotidiano. Assim, trazer o
cotidiano destes alunos para a sala de aula e trabalhar com suas necessidades é
aproximar as disciplinas. Em nosso cotidiano elas se encontram juntas, não
aparecem separadamente como na escola. Considero importante partir do cotidiano,
buscando no conjunto das disciplinas construir uma aprendizagem mais significativa
para os alunos.
Conforme Morin,
os desenvolvimentos disciplinares da ciência não trouxeram as
vantagens da divisão do trabalho, mas também os inconvenientes da
superespecialização, do confinamento e do despedaçamento do
saber. Não produziram o conhecimento e a elucidação, mas
também a ignorância e a cegueira. (2000, p.15)
O que observamos em nossas escolas é que a partir do desenvolvimento das
disciplinas, nossa preocupação desde as primeiras séries escolares é separar e
isolar dissociando os problemas em vez de reuni-los. “Em tais condições, as mentes
jovens perdem suas aptidões naturais para contextualizar os saberes e integrá-los
em seus conjuntos”. (MORIN, 2000, p. 15)
Atualmente, percebe-se em nossas escolas um currículo extensivo, que
prioriza um aprendizado voltado para a reprodução e cópia, onde pouco se viabiliza
o diálogo, a troca de saberes e a busca e construção do conhecimento. Currículo
este no qual, segundo Demo, “a aprendizagem é definida pelo repasse do professor,
de tal sorte que o aluno somente sabe o que lhe é transmitido” (2000, p.58).
39
Na nova visão de educação, devemos adotar em nossas instituições de
ensino um currículo intensivo que visa o aprender a aprender, movido pela
construção de conhecimento. Neste novo modo de pensar, o papel do professor
aparece como orientador, fazendo com que o aluno trabalhe com autonomia
crescente. Nesta nova proposta, prioriza-se “em vez de aprender, fazer ciência; de
copiar, construir conhecimento; de memorizar, criar alternativas.”(DEMO, 2000. p.
59).
Entendo que dentro desse currículo intensivo, em vez de conhecimentos
isolados aparecerá o todo. Nas palavras de Morin, “o todo tem qualidades ou
propriedades que não são encontras nas partes, se estas estiverem isoladas uma
das outras, e certas qualidades ou propriedades das partes podem ser inibidas pelas
restrições provenientes do todo”. (2003, p. 37)
Cada disciplina é importante à medida que se faz necessária sua utilização
para solucionar problemas. O conhecimento não se isoladamente. Assim,
fundamentado em Ubiratan D’Ambrósio, assumo que “o conhecimento fragmentado
dificilmente poderá dar a seus detentores a capacidade de reconhecer e enfrentar
tanto problemas quanto situações novas que emergem em um mundo complexo”
(1993, p.80).
Os saberes do educando, sua cultura e bagagem de experiências devem ser
reconhecidas, aproveitadas e valorizadas pela escola. Segundo Freire (1987), é
preciso saber ler a “leitura do mundo” que ele realiza, a fim de que possa ser
concretizado um projeto educativo que lhe permita não apenas conhecer mais, mas,
sobretudo ser mais.
40
O espaço escolar pode contribuir para a autonomia dos alunos na medida em
que o professor estimula e possibilita o intercâmbio de pontos de vista entre os
educandos, para tal é importante estabelecer um clima cordial, de afeto e respeito
mútuo. Segundo Piaget, no processo educativo deve se considerar dois aspectos
essenciais: o moral e o intelectual.
Não se pode formar personalidades autônomas no domínio moral se
por outro lado o individuo é submetido a um constrangimento
intelectual de tal ordem que tenha de se limitar a aprender por
imposição sem descobrir por si mesmo a verdade; se é passivo
intelectualmente, não conseguiria ser livre moralmente.
Reciprocamente, porém, se a sua moral consiste exclusivamente em
uma submissão à autoridade adulta, e se os únicos relacionamentos
sociais que constituem a vida da classe são os que ligam cada aluno
no individualmente a um mestre que detém todos os poderes, ele
também não conseguiria ser ativo intelectualmente. (1973, p. 69)
Desse modo, a escola deve priorizar uma reorganização curricular que
priorize projetos de pesquisa, onde poderão ser trabalhadas as diversas áreas de
conhecimento de forma interdisciplinar. Nestes projetos é essencial que se utilize a
pesquisa, o debate, o trabalho em grupo, as produções próprias sejam elas
individuais ou coletivas. Enfim, que o aluno tenha liberdade de buscar a sua
verdade, que possa utilizar o que domina e que cada disciplina seja utilizada
conforme sua necessidade.
Segundo Moraes (2004), a interdisciplinariedade tem seus pés presos à
realidade e o discurso cotidiano. Devemos interligar os saberes a outros saberes,
aproveitando o conhecimento trazido pelos nossos alunos. E ser interdisciplinar é
contextualizar o ensino, é tomar como ponto de partida o conhecimento popular e o
discurso do cotidiano, é trabalhar com o todo, para depois chegar nas partes.
41
Logo, o currículo nas escolas deve ser organizado a partir do cotidiano dos
alunos, pois desta maneira eles partem de algo que dominam para, futuramente,
atingirem conhecimentos mais complexos. Assim, faz-se necessário romper com o
modelo tradicional, pois os conteúdos disciplinares não podem constituir pontos de
partida, mas devem integrar o currículo conforme as necessidades dos alunos. “O
retalhamento das disciplinas torna impossível aprender o que é tecido junto, isto é, o
complexo” (MORIN, 2000, p. 14).
Ainda, conforme Morin,
O conhecimento das informações ou dos dados isolados é
insuficiente. É preciso situar as informações e os dados em seu
contexto para que adquiram sentido. Para ter sentido, a palavra
necessita do texto, que é o próprio contexto, e o texto necessita do
contexto no qual se enuncia. (2003, p. 36)
Portanto, para uma nova educação não podemos nos prender ao
disciplinamento, pois, para construir o conhecimento precisamos do contexto. De
acordo com Demo, “não se pode separar indivíduos, parceiros e cultura, pois são
faces do mesmo processo global”. (2000, p.39). Devemos aproximar as disciplinas e
trazer a cultura e o contexto de nossos alunos para sala de aula e trazer o próprio
aluno, desta vez não como ouvinte, mas sim como agente de sua aprendizagem.
“O desafio é superar currículos que tomam como ponto de partida programas
de conteúdos disciplinares para atingir currículos que partem dos contextos dos
alunos” (MORAES, 2004, p. 2).
42
Ao construir um currículo escolar, o professor deve preocupar-se com a
interdisciplinariedade e a transdisciplinaridade, procurando organizar as mesmas, “a
partir dos saberes populares e do conhecimento do senso comum já dominado pelos
alunos e comunidades” (MORAES, 2004, p. 3).
Entendo que, se partirmos do todo para as partes, estaremos evoluindo para
uma educação futura, voltada para humanização, onde a pesquisa tem papel
fundamental como discutiremos a seguir.
3.4 A importância de pesquisar em sala de aula
Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço
e comunicar ou anunciar a novidade
FREIRE
Quando se deseja que a sala de aula seja um ambiente democrático, onde se
privilegia a construção e reconstrução e não a mera informação, a postura tanto por
parte do aluno, quanto por parte do professor precisa ser reavaliada. Os
conhecimentos não mais serão repassados para os alunos e tanto estes como os
professores devem assumir um papel de pesquisadores, visando descobrir e
redescobrir o conhecimento.
43
Ao trabalhar com o cotidiano dos alunos, nos deparamos com diversos
conhecimentos. Nesta perspectiva, a pesquisa torna-se necessária para lidar com as
diversas informações que os alunos trazem para o ambiente escolar. Entendo que a
pesquisa auxilia na investigação de toda esta diversidade trazida para dentro da sala
de aula, bem como para a construção da autonomia de cada sujeito.
De acordo com Demo,
o aluno não chega a construir sua autonomia sem tornar-se sujeito
de suas próprias propostas. O professor por sua vez não está ali
para facilitar as coisas, ou repassar o conhecimento a ser apenas
copiado e reproduzido, mas para desafiar os alunos. (2000, p.32)
Quando defendo o trabalhar com pesquisa, refiro-me à busca pela verdade,
não a cópia para reprodução. Refiro-me a produções próprias e argumentadas, para
as quais se faz necessário ler não somente no sentido de informar-se, mas no
sentido de buscar algo que auxilie na argumentação e no debater para contrapor e
fortalecer idéias e teorias.
Kamii afirma que “a essência da autonomia é que as crianças se tornam
capazes de tomar decisões por elas mesmas” (1986, p.72). Desta forma, a pesquisa
torna-se aliada na medida em que o aluno percebe que é capaz e que, se confiar em
si, pode aprender a buscar soluções para suas dificuldades e necessidades.
Trabalhar com pesquisa é trabalhar com autonomia, é dar ao aluno a
possibilidade de mudar o rumo de sua trajetória. Assim, o professor deve propiciar
um ambiente desafiador onde cada aluno seja estimulado a agir, pensar, sentir,
relacionar-se com as outras pessoas, participando efetivamente da construção de
44
sua aprendizagem. Para isso, parece importante que os professores, ao longo dos
diálogos, usem expressões como: “Eu creio que...”, “Em minha opinião...”, “Vocês, o
que pensam?”, “Estão de acordo com isso que se disse?”, “Porque você acredita
nisso?”, “Não aceito esse seu argumento por isso ou por aquilo. Dê-me outro
argumento mais consistente”. Piaget diz que “o que se deseja é que o professor
deixe de ser apenas um conferencista e que estimule a pesquisa e o esforço, ao
invés de se contentar com a transmissão de coisas já prontas” (1973, p.15)
Deste modo, é importante que o professor assuma essa postura diferenciada.
Quanto ao aluno, é relevante que entenda que não receberá as coisas prontas.
Neste processo, o professor possui o papel de orientador e mediador e não de
transmissor.
Através do diálogo e da troca de experiências entre todos serão resolvidos os
problemas levantados ao longo dos questionamentos realizados em aula, visando
contribuir para a autonomia dos sujeitos envolvidos. Conforme podemos detectar no
texto de Moraes (2002), a educação pela pesquisa visa desenvolver sujeitos
autônomos e criativos.
Assumir-se pesquisador é assumir-se aprendiz, pois todos têm a acrescentar
independentemente de nos considerarmos melhores do que outros. É o que
podemos perceber em Morin, quando afirma que “as culturas devem aprender umas
com as outras, e a orgulhosa cultura ocidental, que se colocou como cultura-mestra,
deve se tornar também uma cultura aprendiz. Compreender é também aprender e
reaprender incessantemente.” (2003, p. 102).
45
Entendo que a educação pela pesquisa seja uma alternativa para terminar
com o repasse de informações tão presentes em nosso ambiente escolar, pois,
segundo Moraes, Galiazzi e Ramos (2002), educar pela pesquisa é acreditar que a
realidade se constitui a partir de uma construção humana que tem presentes as
relações que os indivíduos estabeleceram com as diferentes experiências culturais
e, em especial, com os conhecimentos que podem ter relevância num mundo como
o de hoje.
Devemos, portanto, organizar nossas aulas partindo do cotidiano dos alunos e
que através da discussão em aula, pouco a pouco, o aluno conquiste certa
independência do professor, assumindo-se aprendiz e tomando para si a
responsabilidade de sua aprendizagem.
Quando os professores assumem uma postura diferenciada em sala de aula,
fazendo com que o aluno seja agente de sua aprendizagem, possibilita ao mesmo
“caminhar com as próprias pernas”, procurando com autonomia e criatividade
solucionar problemas que possam surgir ao longo do processo de ensino-
aprendizagem.
De acordo com Demo,
a ciência é uma pretensão de conhecimento, dentro de um processo
infindável de busca e pesquisa. Não existe produto propriamente
final. A verdade não é propriedade de ninguém e pode sempre ser
rediscutida naquilo que depende de consenso para ser válida. A
validade não prescinde da comunicação (1997, p. 22).
É importante que educandos e professores entendam que a busca pelo
conhecimento é eterna, que a verdade é mutável e é essencial que se esteja em
46
constante movimento. A pesquisa e a busca pela verdade devem ser algo presente
na vida diária de todos.
Em uma sala de aula com pesquisa é importante destacar o valor da
linguagem e da participação do grupo de suas idéias e opiniões, pois podemos
interligar nossos conhecimentos com o dos outros. Dessa forma possibilita-se a
inclusão da ação, reflexão e argumentação. Outro fator relevante é a motivação.
Alunos motivados pesquisam e participam mais efetivamente das aulas. Se
partirmos do que o aluno conhece, bem como de sua curiosidade, estaremos
motivando os mesmos. Sem motivação o sujeito torna-se apático e sem vontade de
aprender.
Tiba afirma que “uma boa aula é como uma refeição: quanto mais atraente
estiverem os pratos que você, cozinheiro professor, dispuser sobre a mesa, mais os
alunos desejarão saboreá-los” (1988, p. 31).
Assim, julgo necessário dissertar sobre a ligação entre motivação e cotidiano.
Pratos atraentes fixam nossos olhares e, desta forma, nos motivam.
47
3.5 O cotidiano como motivador
O poder e o prazer são os grandes
benefícios de ensinar aprendendo.
Tiba
Toda e qualquer atividade necessita de motivação. Estudos comprovam que
quando se está motivado se produz mais e se vive melhor. Quando se fala em
educação, deve-se falar também em motivação. Percebe-se, nas escolas, alunos
ativos, inteligentes, com habilidades em informática, enfim, alunos com grande
concentração de informações e conhecimento, mas que na sua maioria estão
desmotivados em sala de aula.
Entendo que a escola precisa moldar-se a esta nova realidade. O aluno de
hoje muitas vezes possui conhecimentos que o próprio professor desconhece. A
Internet traz o mundo para dentro de sua casa. Se nossos alunos possuem
conhecimento, por que não aproveitá-los em sala de aula. Se buscarmos, a partir
das vivências, mostrar o quanto eles conhecem e podem socializar com colegas e
professores, estaremos estimulando seu posicionamento frente aos desafios
propostos pela escola e pela vida. “Toda a atividade humana resulta de motivação
proposta pela realidade na qual está inserido” (D’AMBRÓSIO, 1993, p 6). Isto
significa que quando trabalhamos explorando os conhecimentos de nossos alunos,
isso os motiva, despertando seu interesse pelo que é proposto.
48
Cabe aos professores estimular e respeitar a cultura de cada aluno para que
o mesmo sinta-se seguro para expor suas idéias e crenças. Alunos seguros e
motivados participam mais efetivamente das aulas contribuindo para construção de
sua aprendizagem. Conforme Ubiratan D’Ambrósio:
cada grupo cultural tem suas formas de matematizar. Não como
ignorar isso e não respeitar essas particularidades quando do
ingresso da criança na escola. Nesse momento, todo o passado
cultural da criança deve ser respeitado. Isso não lhe dará
confiança em seu próprio conhecimento, como também lhe dará uma
certa dignidade cultural ao ver suas origens culturais sendo aceitas
pelo seu mestre. (1997, p 17),
Para aprender, o aluno necessita estar motivado, seguro, num ambiente
próprio, onde sinta-se fortalecido. “A melhor maneira de ensinar Matemática é
mergulhar as crianças num ambiente onde o desafio matemático esteja naturalmente
presente”. (D’AMBRÓSIO, 1993, p 30)
Mas o cotidiano como fator motivador não deve ser visto apenas como
exemplo dos conteúdos a serem trabalhados em nossas aulas. Considero
importante conhecer os nossos alunos e, para isso, é essencial que nos situemos
em seu universo, explorando suas reais vivências e trazendo as mesmas para
dentro do ambiente escolar para que, aos poucos, sejam estabelecidas relações
entre essas vivências e os conceitos a serem trabalhados, pois “conhecer o ser
humano não é separá-lo do Universo, mas situá-lo nele.” (MORIN, 2000, p.37)
Uma maneira de motivar os alunos é partir do que eles conhecem. Tornar as
aulas mais atrativas e escutar o que eles têm a falar são formas de valorizar o
conhecimento de cada um e ao mesmo tempo é uma forma de motivação. Um aluno
motivado tem mais vontade de aprender. Tiba afirma que:
49
a motivação pode ser interna, quando estamos interessados em
aprender alguma coisa, ou externa, quando alguém nos desperta o
interesse, a vontade de aprender. Ao receber uma comida saborosa,
sentimos vontade de comer mais. Informações atraentes produzem
resultados semelhantes: quanto mais sabemos, mais queremos
aprender. O que torna uma informação atraente é o humor, a clareza,
além de seu objetivo final: ser útil (1988, p.35).
Em síntese destaca-se que a motivação do aluno é importante para que
ocorra a aprendizagem. Digamos que partir do que o aluno conhece é motivá-lo e
assim promover a aprendizagem.
Como falar em cotidiano, motivação, pesquisa e aulas diferenciadas, sem
falar em linguagem. A linguagem, seja ela escrita, verbal ou gestual, está presente a
cada etapa de nossas vidas.
Acredito que não se pode separar o sujeito de suas formas de comunicar-se
com o mundo. Nessa perspectiva, linguagem e cotidiano se entrelaçam como laços
de uma corda que jamais poderão ser tecidos separados. Assim, neste momento
passo a dissertar sobre a relação entre cotidiano e linguagem.
50
3.6 Cotidiano e linguagem
A palavra é uma espécie de ponte
lançada entre mim e os outros.
Bakhtin
Existe uma forte ligação entre linguagem e cotidiano, pois, conforme Moraes,
“não se pode separar o sujeito e a sua linguagem do discurso da sua cultura, sobre
o qual ele também influi ou pode influir”. (2004, p. 3). Considero que, se partir de
uma linguagem cotidiana e de senso comum, pela interação com outras vozes e
outros discursos sociais os sujeitos podem, gradativamente, apropriar-se de outras
linguagens e discursos. De acordo com Smolka, é essencial estimular a linguagem
dentro de sala de aula, pois é “no momento das interlocuções sociais e nos
movimentos de interlocuções” que “a linguagem se cria se transforma, se constrói
como conhecimento humano” ( 1989, p. 45).
Assim, devemos sempre estar atentos às expressões de nossos alunos sejam
orais ou escritas. As manifestações devem ser instigadas e valorizadas, pois “o
conhecimento, sobre forma de palavra, de idéias, de teoria, é o fruto de uma
tradução/reconstrução por meio de linguagem e do pensamento” (Morin2003, p.20).
51
Ao propormos o trabalho valorizando a linguagem trazida e produzida pelos
alunos, devemos estar atentos aos erros. Muitas vezes o aluno não compreende o
que o professor fala, e por conseqüência está sujeito ao erro.
O erro deve ser encarado tanto pelos alunos como pelos professores como
um meio de desafiá-los a pensar e a refinar suas idéias, encontrando novas
possibilidades. Não é um trabalho fácil para os professores, aos quais Fernández
recomenda “que não se obriguem à urgência de dar respostas certas; ao contrário,
que consigam construir novas perguntas a partir das perguntas de seus alunos”
(2001, p.36).
Morin afirma que “a educação deve se dedicar, por conseguinte, à
identificação da origem de erros, ilusões e cegueiras” (2003, p. 21). É essencial que
o professor trabalhe com os erros, estimulando os alunos a falar e expressar
argumentativamente sua forma de raciocínio é importante para que a educação seja
construída em pilares sólidos e rígidos.
Morin ainda salienta que o professor, além de manter-se atento aos erros,
deve estar sempre preparado para o novo. Embora não possamos prever como ele
se apresentará, devemos esperá-lo para que possamos aproveitar tudo que ele
pode nos trazer. Quando se encoraja os alunos a falar e escrever, estamos sujeitos
a nos depararmos com o novo. É essencial que se trabalhe com ele, pois caso
contrário, podemos desencorajar os alunos em suas descobertas e desestimular seu
senso crítico, curioso e criativo.
A fala é a maneira com a qual muitas vezes expressamos nossos novos
conhecimentos e é através das palavras que conseguimos nos comunicar e trocar
52
idéias. Estas idéias estão intimamente presas à linguagem que dominamos, pois é a
partir desta linguagem que fazemos a leitura e compreendemos a realidade
cotidiana.
De acordo com Moraes e Galiazzi:
Falar é exercitar uma participação numa polifonia de vozes, é
envolver-se com outros sujeitos num processo dialógico e
participativo na construção de uma realidade discursiva coletiva. O
falar é modo de manifestação de identidades que se constituem e, ao
mesmo tempo, participam da constituição de outras identidades.
Falar é expressar a individualidade da própria voz, num ambiente
discursivo de múltiplas vozes, todas se influenciando mutuamente.
Isso nos leva a enfatizar a importância da fala na sala de aula. Falar,
tanto alunos como professores, é modo de ampliação de horizontes
de compreensão, de reconstrução gradual dos discursos. (2004, p.7)
Escutar o que nosso aluno traz para sala de aula e estimular esta fala é
estimular novas aprendizagens. Acredito que a fala deve ser argumentada e o aluno,
desde cedo, deve ser encorajado a sustentar suas idéias. Perguntas que estimulem
o raciocínio devem estar presentes a cada diálogo dentro de sala de aula, pois
incitar a fala dos alunos é estimular o aprendizado em grupo. Quando refiro o termo
fala argumentada, refiro-me a falar com propriedade, com fundamentação, o que
está muita alem do certo ou errado.
Juntamente com a fala, é extremamente útil trabalhar com a escrita, mas não
meramente como reprodução e sim de maneira construtiva, possibilitando ao aluno
expor e argumentar suas ideais. É necessário deixar claro que este processo é feito
de retomadas, pois não se pode considerar acabada uma primeira versão. Os alunos
devem ser estimulados a repensar suas produções tentando sempre reconstruir
suas idéias iniciais. Demo afirma que se deve “trabalhar a escrita como processo,
53
tendo em vista que o pensamento crítico vive de retomadas, de superação, de erros
e de produção novas, da aprendizagem permanente” (2000, p.32).
Nesta perspectiva de educação, Moraes (2004) afirma que é importante
romper o silêncio da sala de aula, fazendo com que os alunos assumam suas vozes.
Romper com este silêncio é assumir a importância da participação. É valorizar os
movimentos e momentos de interlocuções. Não diálogo sem participação, todos
têm a aprender e ensinar. Conforme lembra Freire (1985), ninguém é totalmente
ignorante em relação a nenhum assunto. Nenhuma aprendizagem parte do nada,
existindo sempre um conhecimento prévio, e a partir desta linguagem conhecida
podemos construir ou reconstruir uma nova aprendizagem. Desta maneira, aprender
é reconstruir conhecimentos existentes. Aprender é tornar mais complexos
conhecimentos e discursos já anteriormente dominados.
Portanto,
De algum modo as ações educativas precisam iniciar-se a partir do
discurso cotidiano, estabelecendo pontes entre o que a escola
propõe e outras culturas. É isso que possibilita maior significatividade
para as iniciativas de aprendizagem escolares. A partir disso outros
referentes, outros discursos podem ser gradativamente chamados
para o diálogo. Tendo o discurso cotidiano como ponto de partida,
diferentes linguagens podem trazer diferentes tipos de contribuições
ao trabalho de sala de aula. (MORAES e GALIAZZI, 2004, p. 3)
Nesse sentido, as ações educativas devem partir do contexto dos alunos para
construir saberes mais complexos. Entendo que dentro do complexo está o simples.
Desta forma, utilizar o conhecimento cotidiano serve de trampolim para trabalhar o
conhecimento científico.
54
Quando refiro em partir do contexto, isto o significa trabalhar com o
conhecimento superficial. Vejo que ao trabalhar com o cotidiano estreitamos os laços
com nossos alunos, estimulando tanto a linguagem falada quanto escrita. Assim,
encorajamos os mesmos para partirem para algo mais complicado, visando à
construção de novos argumentos. Conforme Ramos, “para passar de um
pensamento simples a um pensamento complexo é preciso haver ação mediada
para que possa haver a reestruturação desses conhecimentos”. (2004, p. 3)
Não podemos esquecer que a aprendizagem não se apenas no ambiente
escolar. Ela acontece ao longo da existência, logo, “é preciso partir do conhecimento
dos alunos, percebido por suas manifestações e pelo seu discurso, constituído no
meio social em que se inserem”. (RAMOS, 2004, p. 3). Em muitos momentos,
mesmo sem perceber, os alunos têm em sua vida diária um contato imediato com as
disciplinas oferecidas pela escola. Cabe a nós discutirmos com nossos alunos essas
aproximações mediando o conhecimento formal ao utilizado no cotidiano de suas
vidas.
Desse modo, reafirmo que a sala de aula deve ser um espaço democrático,
onde os conhecimentos sejam trabalhados a partir do que os alunos conhecem e
defendo que suas idéias sejam valorizadas e estimuladas. Que esta sala de aula
esteja aberta a desvendar e aprender com o novo e com os erros trazidos nas
manifestações lingüísticas dos alunos.
55
3.7 Finalizando o eixo teórico
A aprendizagem da leitura e da escrita inicia-se antes do ingresso do aluno na
escola, no contato informal e cotidiano que estabelece com materiais gráficos
existentes no ambiente em que vive, compartilhando diferentes ações sociais que
envolvam as mais diferentes formas de linguagem. Valorizar e utilizar esta
linguagem própria na sala de aula faz com que os alunos mostrem-se mais
motivados e abertos para o novo.
Vygotsky (1989a) enfatiza apropriadamente que as conclusões da criança em
sua trajetória para compreender e intervir na realidade, o modo como articula o
conhecimento que possui, ou os ”conceitos cotidianos”, com aqueles que recebe
na escola, as aproximações que realiza para apropriar-se do novo “conhecimento
científico” devem ser considerados e valorizados pelo professor.
Não como negar a ligação entre cotidiano e linguagem. Investir nas
manifestações dos nossos alunos, sejam escritas, orais ou gestuais, é acreditar na
capacidade humana. É contribuir para a formação de sujeitos críticos e autônomos,
educando para cidadania.
É preciso rediscutir e ter clareza do papel da escola, caso contrário não
conseguiremos promover mudanças. Nossas escolas passam hoje por uma
metamorfose. Encontramos dificuldades tanto financeiras, quanto de espaço físico e
de recursos humanos. Apesar das dificuldades, acredito no ser humano e no
professor, que com esforços pode mudar o futuro de nossos educandos. Para tal, é
56
necessário reorganizar-se o currículo afim de que os conceitos sejam trabalhados a
partir do que o aluno conhece, pois o mesmo precisa de estímulo, necessita sentir-
se valorizado em suas manifestações, sejam orais, escritas ou gestuais.
A escola deve ser um espaço democrático, onde cada sujeito pode e deve ter
opinião e onde a mesma seja respeitada. É importante, ainda, trabalhar com o todo
para, depois, trabalhar com as partes. Na vida cotidiana é desta forma que os
conhecimentos são exigidos.
Além disso, é relevante ressaltar a importância da pesquisa dentro da sala de
aula. A nós, educadores, cabe introduzi-la. Cabe a nós, também, nos assumirmos
como pesquisadores, pois as descobertas através da pesquisa, ao invés da simples
cópia, é que irão fazer a diferença no mundo de hoje. Conforme Ludke e André:
o conhecimento não é algo acabado, mas uma construção que se faz
e refaz constantemente. Assim sendo, a pesquisa está sempre
buscando novas respostas e novas indagações no desenvolvimento
de seu trabalho. (1986, p.18)
O conhecimento é algo que está em constante transformação e a escola não
pode fechar os olhos para a mudança. Por sua vez, a pesquisa, a leitura e a
discussão fazem com que estejamos abertos a buscar respostas para essas
transformações.
A sociedade tão desigual na escola a possibilidade de mudar o seu futuro.
Então, cabe a nós, educadores, promover uma educação mais igualitária, estimular
a pesquisa em vez da cópia, a descoberta em vez da “decoreba”, a participação em
57
vez da aceitação, enfim promover uma sala de aula democrática onde se privilegie o
ser, o criar, o fazer.
Quanto à relação entre cotidiano e linguagem, é preciso buscar em cada
sujeito sua história. Esta deve estar presente em nossa sala de aula, servindo como
motivadora para que os alunos estabeleçam pontes entre os saberes populares e os
científicos. Entendo que estamos fortemente ligados a nossas falas, bem como ao
conhecimento produzido no cotidiano. Então, é preciso reconhecer e utilizar o que
nossos alunos trazem e produzem. assim estaremos abertos a novas
descobertas.
A discussão deste modelo de educação futura deve estar centrada na
condição humana. Como diz Morin (2003), devemos efetivamente recompor o todo
para conhecer as partes. Estas partes estão tecidas junto com o todo. É assim que
vejo esta nova escola, capaz de formar sujeitos não somente para o vestibular mas
para a vida, utilizando o conhecimento cotidiano e também científico, porque o todo
contempla tudo isso e muito mais.
Como afirma Demo, “a meta é sempre construir a independência das
crianças” (2000 p. 30). Ser independente é ser cidadão autônomo e atuante na
sociedade em que se vive. Construir a independência das crianças é trabalhar com o
conhecimento cotidiano e o científico.
Entendo que todos os aspectos levantados ao longo desse eixo teórico
contribuem para a construção tanto das relações sociais quanto do conhecimento,
bem como para a conquista da autonomia.
58
A construção desta triangulação perpassa por todos os temas levantados
acima, pois não há como construir as relações sociais se não motivar o aluno
visando que o mesmo sinta-se mais seguro e apto para socializar informações.
Construir relações sociais é promover a participação efetiva dos alunos visando que
se assumam sujeitos capazes de mudar o ambiente em que estão inseridos, não
intelectualmente, mas também moralmente, pois com o outro não adquirimos
conhecimento como também reformulamos valores e crenças.
A partir de Guareschi (1998, p.151),
falar de relações é falar de incompletudes, e pensar em algo aberto,
em algo que pode ser ampliado ou transformado. Nesse sentido,
uma análise dos grupos, ou da sociedade, a partir do conceito de
relação, é sempre uma análise que implica relatividade, que apenas
feita, já pode estar se transformando. As relações são como as
ondas do mar, em contínuo movimento, em contínua mutação.
Assim construir relações é estar em constante mutação, é encontrar no outro
um pouco de nós num incansável aprender, entrelaçado as relações encontra-se a
construção do conhecimento e da autonomia.
Tanto o processo de construção do conhecimento como da autonomia, é
realizado pelo próprio aluno e mediado pela atitude do professor. O professor, ao
propiciar uma sala de aula democrática, onde as ações educacionais visam a
criatividade ao invés de reprodução, bem como o uso da pesquisa como parceiro de
trabalho, favorece esse processo, porque esta metodologia prevê a busca de
informações, a seleção de dados e fontes de referência, a formulação de idéias
prévias, a validação de resultados e o compartilhamento da pesquisa com outros
sujeitos, seja por escrito ou oralmente. Dessa forma, é sempre o aluno que
59
desencadeia a construção do conhecimento, bem como da autonomia na medida em
que o mesmo encontra soluções para resolver seus problemas.
Quem sabe, após esta metamorfose, nós efetivamente buscaremos sair de
nossos casulos para, como as borboletas, voarmos livres, a fim de descobrir novos e
belos horizontes.
60
3.8 Síntese do capítulo
PARTIR DO COTIDIANO
Resignificar o
papel da escola
Reorganizar o
currículo
implica
Numa nova metodologia de trabalho
que
utiliza
linguagem
motivação
pesquisa
diálogo
DESCENTRALIZA O PROCESSO DE ENSINO – APRENDIZAGEM
POR PARTE DO PROFESSOR
GERA MAIOR SIGNIFICADO AO PROCESSO
DE ENSINO - APRENDIZAGEM
61
4 METODOLOGIA DA PESQUISA
A pesquisa se orientou por uma abordagem qualitativa. Como tanto a
pesquisadora quanto os educandos fizeram parte da construção da proposta
desenvolvida em sala, fizeram-se presentes alguns pressupostos da pesquisa-ação.
Conforme Thiollent (2002), um dos aspectos importantes é a oportunidade de
participar. Porém, como os alunos não participaram do processo de análise dos
depoimentos, esta pesquisa não pode ser entendida totalmente como uma pesquisa-
ação.
A presente pesquisa pode ser caracterizada por uma abordagem qualitativa/
construtiva - naturalista, podendo ser entendida como um processo integrado de
aprender, comunicar e interferir.
Essa abordagem de pesquisa assume realidades construídas pelos sujeitos
envolvidos, entendendo-se que constitui um conjunto de crenças e teorias,
conscientes ou implícitas, nossas e dos que conosco convivem, que se revelam
através do discurso construído na linguagem. Outro fator relevante é que a pesquisa
qualitativa trabalha também com a compreensão dos atos envolvidos. É através de
cada depoimento que o pesquisador observa os avanços ou retrocessos, tanto em
62
si, como nos alunos envolvidos na pesquisa. Assim, foram necessários registros
diários do desenvolvimento da proposta.
As teorias, de algum modo, foram reconstruídas a partir de suas
manifestações lingüísticas e das informações coletadas foram produzidas categorias
emergentes. Focalizei de modo especial os modos de percepção dos sujeitos
envolvidos, bem como os meus conhecimentos, crenças e valores como
pesquisadora.
O método utilizado envolveu uma impregnação aprofundada nos fenômenos
para a obtenção de descrições e interpretações dos mesmos. Das informações
reunidas por meio de manifestações orais e produções escritas foram construídas
categorias que foram aperfeiçoadas e complementadas até atingir-se uma clareza
nas construções teóricas produzidas. As observações de sala de aula serviram para
identificar de que forma os alunos participaram do processo.
Todas as observações foram registradas sistematicamente em relatos
descritivos. O acompanhamento do dia-a-dia da sala de aula possibilitou cotejar-se
os dados coletados com os pressupostos teóricos. Deste modo, foi possível
“aprofundar o conhecimento subjetivo de forma sistemática, válida e exata na
direção de uma compreensão do significado do fenômeno estudado” (Engers, 1987,
p.87).
A pesquisa envolveu os alunos da oitava totalidade da Educação de Jovens e
Adultos do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Médio Agrônomo Pedro
Pereira, situada no município de Porto Alegre/RS.
63
A oitava totalidade corresponde ao primeiro ano do ensino médio. Porem
cada totalidade equivale a um semestre.
Esta pesquisa teve a participação de uma turma de aproximadamente 30
alunos, sendo sua faixa etária dos 22 a 60 anos de idade, com uma grande
variedade de vivências.
As informações foram obtidas por meio de observações diárias e da resposta
dos alunos a diferentes instrumentos, sejam falados ou escritos.
Num primeiro momento, iniciei com os alunos uma discussão oral sobre
formas de trabalho que iríamos utilizar nas aulas de Matemática, perguntando aos
mesmos qual a relação da Matemática com suas vidas e como a mesma se
apresentava. Destaquei que teríamos uma hora semanal e que cada modalidade
seria trabalhada por temáticas, de acordo com o planejamento da escola. Nestes
encontros perguntei-lhes sobre o que achavam importante: trabalhar com
conhecimentos de interesse comum aos mesmos ou trabalhar conteúdos isolados de
Ensino Médio. Das respostas produzidas neste processo dialógico traçamos um
planejamento para as aulas. É importante deixar claro que o planejamento tinha por
intenção levantar possíveis conhecimentos a serem trabalhados, e não representar
um roteiro de conteúdos e atividades a serem seguidos.
Dando continuidade ao primeiro momento, através de discussões orais,
perguntei aos alunos: Qual a relação da Matemática com suas vidas e de que forma
se apresentava no seu dia-a-dia. Esta discussão contribuiu para que eu entendesse
as reais necessidades dos alunos e traçasse os possíveis conhecimentos que
posteriormente fizeram parte do planejamento citado anteriormente. É relevante
64
esclarecer que foi estabelecido um prévio planejamento das aulas, mas que somente
a partir das discussões realizadas em aula e das contribuições trazidas pelos alunos
que o mesmo foi tomando forma.
Num segundo momento, iniciei com os alunos uma discussão oral sobre o
motivo pelo qual eles retornavam à escola. Minha intenção inicial era conhecer e
entender suas necessidades, bem como continuar incentivando-os a falar em aula.
Então pedi-lhes que respondessem por escrito esta questão, juntamente
com a segunda questão que era: qual o papel da escola em relação a
aprendizagem? Minha intenção nessa questão era entender de que forma os alunos
julgavam ser o papel da escola, do professor, bem como o seu próprio papel quanto
à construção da aprendizagem.
Num terceiro momento, foi aplicada uma proposta de ensino-aprendizagem
que partiu do cotidiano dos mesmos e que foi criada através de um processo
dialógico em sala de aula. Sobre essa proposta falarei detalhadamente no próximo
capítulo.
Após a participação dos alunos na proposta desenvolvida, foi pedido aos
mesmos que respondessem questões referentes à realização e participação da
proposta desenvolvida e novamente foi-lhes perguntado qual o papel da escola. As
respostas ofereceram subsídios para que eu pudesse analisar as modificações na
concepção do papel da escola, bem como entender de que maneira repercutiu na
aprendizagem dos alunos o trabalho que partiu do conhecimento cotidiano.
65
Como metodologia de análise optei pela Análise de Conteúdos. Para a
realização da mesma a partir dos instrumentos de pesquisa aplicados segui
recomendações de Moraes (1999): no primeiro momento fez-se a leitura do todo, em
seguida dividiu-se o todo em partes. Esta etapa chama-se unitarização. Depois,
passamos para uma segunda etapa que consistiu em agrupar as idéias
semelhantes, que anteriormente foram unitarizadas. A esta etapa damos o nome de
categorização.
Conforme Moraes (1999) é com base no processo de categorização que se
pode compreender e explicar o que estamos investigando. Assim, todas as questões
levantadas, orais ou escritas, bem como as observações realizadas em aula no
decorrer do desenvolvimento da proposta foram submetidas a este processo.
É nessa perspectiva de unitarização e categorização de todo material
coletado, seja das minhas observações ou das produções escritas e orais dos
alunos, que foi realizado um metatexto descritivo e interpretativo. Descritivo, pois
descrevi os resultados, constatações, observações e análise da proposta aplicada.
Interpretativo na medida em que pretendi ampliar a minha compreensão como
pesquisadora, fundamentada através de teorização. Acredito que através da
descrição e da interpretação que ocorre ao mesmo tempo, acontece uma
impregnação do todo, dando origem a novas teorizações.
É importante esclarecer que todo este processo é feito de retomadas, pois “o
conhecimento não é algo acabado, mas uma construção que se faz e refaz
constantemente. Assim sendo, o pesquisador estará sempre buscando novas
66
respostas e novas indagações no desenvolvimento de seu trabalho” (LUDKE;
ANDRÉ, 1996, p. 18)
67
4.1 Síntese do capítulo
Discussão oral sobre a
forma de trabalhar na
disciplina
Realização do primeiro
instrumento de coleta de
dados (APÊNDICE A)
Levantamento de conteúdos aula
dialogada (ANEXO D)
Aplicação da proposta
descrita no capítulo 5
Aplicação do 2º e 3º
instrumento de coleta de
dados (APÊNDICE B e C)
Leitura dos materiais coletados no
1º, 2º e 3º. Instrumento escrito e
das observações orais das falas
dos alunos
Unitarização do
material lido
Categorização
do material
unitarizado
Reorganização
das categorias
Meta texto descritivo e argumentativo (capítulo 6)
68
5 DESCRIÇÃO DA PROPOSTA REALIZADA
Nesta parte do trabalho descrevo como ocorreu a proposta realizada em aula,
bem como trago algumas observações como pesquisadora e manifestações dos
alunos.
É importante deixar claro que este processo iniciou anteriormente a proposta
aqui relatada. O mesmo iníciou em março de 2004. Durante os meses que
antecederam a proposta foram realizadas debates para que os alunos ao poucos
entendessem que nesse processo é importante participar. Através de uma aula
dialogada discutiu-se com os alunos a forma que iríamos trabalhar nas aulas. Após
esta discussão pedi aos mesmos que respondessem algumas questões. Estas
tinham como propósito realizar um levantamento dos conteúdos que os alunos
consideravam relevantes, bem como teve o intuito de conhecê-los, estas questões
bem como o levantamento dos conceitos a serem trabalhados serão apresentados
no próximo capítulo, é relevante também esclarecer que durante estes meses não foi
trabalhado conteúdos meramente expositivos. A partir de material trazido pela
professora e alunos trabalhamos questões que os alunos julgaram importante de ser
trabalhados.
Portanto centro minhas idéias a proposta realizada a qual inicialmente em
agosto do mesmo ano, através de um questionamento reconstrutivo foi desenvolvido
um debate oral em sala de aula a fim de identificar as idéias prévias dos alunos
sobre o “Meio Ambiente”. Para tal, foram propostas as seguintes questões:
69
Qual a relação entre a Matemática e o Meio Ambiente?
Que conceitos poderiam ser trabalhados dentro da disciplina, a partir desta
temática?
De que formas poderiam trabalhar estes conceitos?
Quais as utilidades destes conceitos no seu dia-a-dia?
Esse encontro deu origem a uma série de questionamentos. Ao longo do
debate ficou constatada a preocupação com o Meio Ambiente. Tentando contemplar
o maior número de assuntos, resolveu-se realizar uma pesquisa de opinião sobre
assuntos ligados ao Meio Ambiente. Como propusemos partir do cotidiano do aluno,
de sua curiosidade e de seus conhecimentos prévios, os conhecimentos
matemáticos a serem trabalhados foram definidos ao longo do processo
desenvolvido em aula. É importante salientar que cada passo era debatido e em
nenhum momento o professor procedeu de modo autoritário.
A intenção do trabalho foi estabelecer na sala de aula um ambiente de troca,
parceria, construção e reconstrução de saberes, respeitando o ritmo de cada um dos
evolvidos no trabalho. A intenção era, ainda, que cada um assumisse sua voz,
sendo agente de sua aprendizagem e dono de sua própria história. Para tal as aulas
foram organizadas a partir de uma proposta de trabalho trazida pelos alunos e
discutida em sala de aula, conforme citado anteriormente.
Em seguida, relato alguns pontos que considero relevantes ao entendimento
da presente pesquisa. É importante salientar que a proposta não deve ser
70
considerada como um roteiro de atividades, pois como defendo o partir do cotidiano
dos alunos, a mesma se molda de acordo com a realidade de cada grupo de
trabalho. Aqui foram trabalhados alguns conhecimentos matemáticos, mais
precisamente os ligados à Estatística, conforme as necessidades apresentadas pelo
grupo. A partir desta proposta poderiam ser trabalhados outros conhecimentos
matemáticos como, por exemplo, funções e probabilidade.
Para melhor entendimento da proposta de trabalho, descrevo-a em dez
momentos, aos quais chamei “Passo a passo a caminho da autonomia”.
Primeiro passo:
Durante a aula de Matemática, os alunos organizaram-se em grupos e
escolheram o tema da pesquisa de opinião. Ficou decidido que os grupos não
poderiam ter mais de seis componentes. Quando indaguei os mesmos sobre a
opção de determinar somente um número máximo de componentes, argumentaram
dizendo: “assim todos tem oportunidade de decidir com quantas pessoas acham
conveniente trabalhar.” Tratamos, a princípio, que o trabalho deveria ser em grupo
para priorizar discussão e troca. Para tal finalidade eles concordaram que não
poderiam ser feitos trabalhos individuais, pois era importante a troca e debate de
informações. Após os grupos formados, constatei que não havia grupos menores
que quatro integrantes.
71
Após os grupos formados e o tema escolhido, os mesmos deveriam organizar
no mínimo seis questões para a sua pesquisa. Essas questões deveriam partir dos
seus conhecimentos prévios. Porém, um aluno perguntou: “posso trazer material
para ajudar na elaboração das questões?”. Nesse momento consultei o grupo, que
decidiu que seria importante o uso de materiais que ajudassem na formulação das
questões. Ficou decidido que neste encontro os mesmos formulariam as questões a
partir dos seus conhecimentos e que no próximo encontro trariam material que os
ajudasse a reformular suas questões de pesquisa.
A pesquisa em revistas e livros ajudou na formulação das questões que
compuseram o roteiro das entrevistas.
Segundo passo.
Os alunos reescreveram as questões a partir de subsídios teóricos. Neste
encontro, alguns alunos perceberam a ligação entre disciplinas como Biologia e
Português. Por isso, propuseram um convite às professoras destas áreas para
integrarem-se nas pesquisas. No mesmo momento convidei-as para engajarem-se
nesta proposta. Na mesma semana, a professora de Biologia disponibilizou sua aula
para revisar as questões propostas pelos grupos, de modo que os alunos
compreendessem o que tinham perguntado para poder revisar as alternativas de
respostas.
72
Devido ao conselho de classe, os alunos não tiveram aula na semana
seguinte. Assim, tiveram quinze dias para realizar suas entrevistas. Combinamos
que seria realizado o mínimo de cinqüenta entrevistas por grupo, ficando acertado
para o terceiro encontro trazer o material coletado.
Os encontros seguintes foram registrados separadamente, por disciplinas,
pois não foi possível contemplar um horário que pudéssemos trabalhar concomitante
com as três áreas. Desta forma, o trabalho foi realizado em cada disciplina, mas
sempre priorizando o diálogo para troca de informações e a discussão para melhor
entendimento sobre o assunto a ser trabalhado. Nós, professores, nos
encontrávamos semanalmente. Quando não era possível realizar encontros fora do
horário de aula, utilizávamos os recreios.
Terceiro passo
Nas aulas de Matemática
Nesta aula os alunos iniciaram o processo de categorização do material
coletado. Cada grupo organizou-se de forma diferenciada que à medida que iam
surgindo questionamentos, procurava orientá-los, sempre fazendo com que eles
opinassem. Esta minha postura inicialmente garantiu algumas manifestações como:
“quem sabe tu mostra o que tu queres.” Neste momento, percebi que eles estavam
73
sentindo-se incomodados, pois não receberiam mais modelos, teriam que criá-los.
Porém, aos poucos, cada aluno a seu tempo percebeu que a intenção era a de que
eles tomassem suas próprias decisões, isto é, que começassem a criar o hábito de
fazer escolhas e de argumentar sobre as mesmas.
Para o encontro seguinte pedi que os alunos trouxessem livros de Matemática
do Ensino Médio para realizarem uma pesquisa.
Nas aulas de Biologia
Foram trabalhados os passos para a montagem de um trabalho científico,
pelas normas da ABNT. Conforme salientou a professora de Biologia, os alunos
mostraram-se curiosos, fazendo-lhe muitas perguntas como, por exemplo, se “o
trabalho devia ser digitado”. Já quanto à forma e quantidade de regras para a
apresentação de trabalho, ficaram assustados. Diziam, “tem que ter citações!”. Neste
momento, a mesma afirmou que todos estavam ali para aprender e ela para ajudar.
Aos poucos, conforme as perguntas iam sendo respondidas os alunos foram se
acalmando e o trabalho aos poucos começou a tomar forma.
Nos encontros de Língua Portuguesa
74
Trabalhou-se em momentos isolados, porém no primeiro contato com o
grande grupo a professora achou que seria interessante discutir com os alunos
sobre como estruturar um texto, resumir com as próprias palavras e como incluir
citações de autores.
A professora mostrou-se surpresa com o silêncio que se expandia pela sala e
com as perguntas colocadas pelos alunos. Ao final da aula, perguntou-lhes: O que
aconteceu que hoje estavam tão quietos? Rapidamente um aluno responde: “isso
que tu mostraste hoje era muito mais interessante do que tínhamos para conversar”.
Ficou claro para mim, enquanto pesquisadora, que as vozes se calam quando
trabalhamos com algo que realmente parece interessá-los.
Num outro canto da sala, ao final do período, observei duas alunas que
conversavam sobre a importância de resumir e não apenas copiar. Uma dizia a
outra: “se s resumirmos com nossas palavras garantimos a autoria das nossas
idéias”.
Quarto passo
Em Matemática
75
Observando os alunos, constatei que muitos pensavam em trabalhar com
gráficos e alguns falavam em fazer média das idades dos entrevistados. Assim,
considerei importante realizar uma pesquisa em livros de Ensino Médio, para que os
alunos compreendessem alguns conhecimentos matemáticos que seriam
importantes para auxiliá-los nas análises dos questionários.
Organizei a pesquisa em perguntas:
1. O que é amostra?
2. O que é freqüência absoluta e relativa?
3. O que é moda?
4. O que é mediana?
5. Como se calcula uma média aritmética?
Cada grupo recebeu um livro. Neste momento, pedi que tentassem associar o
que achavam com a pesquisa ou com fatos diários, para facilitar a compreensão dos
conceitos. Os alunos discutiram entre si o significado de cada uma daquelas
questões, tentando fazer associações com suas vidas e com o trabalho
desenvolvido. Algo que considerei relevante foi o trabalho em grupo. Todos os
componentes liam e tentavam expressar para o colega seu entendimento. Ora
olhavam os exemplos que o livro trazia, ora retornavam para o seu dia-a-dia.
76
Algo que me chamou a atenção foi o fato de que para eles era muito mais
fácil explicar os conceitos através de exemplos. Talvez por que os conceitos
veiculados pelos livros na maioria das vezes são algo muito teórico.
Na aula de Biologia
Foi solicitado que os alunos iniciassem uma pesquisa científica por escrito,
embasando o assunto escolhido pelo grupo. Cabe salientar que todo o material para
a pesquisa (livros, revistas e jornais) foi trazido pela professora e pelos alunos. A
professora e alguns alunos que tinham acesso à Internet trouxeram materiais que
abordavam o assunto não só de seu grupo, mas também do grupo dos outros
colegas.
Durante esta pesquisa observei que os alunos discutiam o que consideravam
relevante para o seu trabalho. Liam, debatiam e argumentavam perante aos colegas
o porquê de incluir esta ou aquela informação. Ao longo desse encontro percebi que
a fala de muitos não era mais baseada somente no que achavam mas era uma fala
fundamentada em diversas fontes de pesquisa.
Em Língua Portuguesa
77
Trabalhou-se a construção de textos de acordo com as dúvidas e solicitações
dos alunos.
Dentre as minhas observações o que chamou a atenção foi o fato de que
muitos alunos não mais copiavam diretamente das fontes de pesquisa utilizadas.
Muitos já reescreviam o que liam conforme sua interpretação.
Quinto passo
Na aula de Matemática
Neste dia conversamos em grande grupo, socializando informações
adquiridas na pesquisa da aula anterior. Cada grupo manifestava-se relatando de
que forma tinha entendido o significado daqueles conceitos matemáticos. Pude
verificar novamente a dificuldade de verbalizar o conceito formal expressado pelos
livros, porém exemplificavam de maneira correta utilizando seus conhecimentos
diários.
Em Biologia
78
As pesquisas foram realizadas em sala de aula trabalhando cada grupo com
seu devido enfoque. Algo que gostaria de destacar foi a troca de materiais e de
informações entre os grupos. Era constante a fala: “olha que interessante, acho que
servirá para tua pesquisa”.
Em Língua Portuguesa
Foi trabalhado o texto poético com a temática Meio Ambiente, procurando
fazer com que os alunos se motivassem pela vida.
Sexto passo
Em Matemática
Os alunos retomaram as análises, pois, como professora, entendia que eles
agora possuíam mais conhecimento e poderiam analisar de forma mais completa
suas pesquisas. Ainda neste encontro os alunos confeccionaram gráficos
relacionados a cada questão feita. Conforme as dúvidas dos alunos, procurava
orientá-los. Percebi que alguns grupos tiveram dificuldades em trabalhar com média
79
aritmética. Neste momento parei a aula e propus que fizéssemos um exemplo para
sanar as dúvidas que os grupos tinham. Considerei mais prudente colocar um
exemplo no quadro e discutir com todos, do que sentar apenas com o grupo que
estava com dificuldades e apontar falhas. Talvez essa atitude os levasse à
desmotivação e a primeira hipótese estimulasse a discussão.
Na aula de Língua Portuguesa
A partir dos textos elaborados pelos grupos, foi solicitado aos alunos que
sublinhassem as palavras acentuadas e que procurassem agrupá-las de acordo com
um critério escolhido por eles. A partir disso, trabalhou-se a acentuação gráfica das
palavras e nesse encontro foram resolvidas algumas dúvidas que os alunos tinham
em relação à colocação de palavras nos textos que estavam escrevendo. Observei
que alguns grupos não estavam interessados em rever seus textos. Quando
perguntei se não tinham dúvida disseram: “meu trabalho está pronto”. Porém,
outros relatavam: “é importante rever o que está pronto”.
Ficou clara, para mim, a dificuldade de alguns grupos entenderem que as
coisas podem ser mudadas e reescritas. Talvez porque na maior parte de suas vidas
escolares estes alunos estivessem sujeitos à apreciação constante do professor, na
qual este apontava os erros na correção e somente atribuía uma nota, sem estimular
a reescrita e assim a evolução do trabalho.
80
Em Biologia
Continuação da pesquisa e construção da introdução e da conclusão do
trabalho. Neste encontro observei que os alunos mostravam-se irritados com alguns
colegas, pois diziam: “como é difícil trabalhar em grupo”.
Fica evidenciada a dificuldade que o ser humano tem de aceitar e trabalhar
com as idéias dos outros.
Sétimo passo
Na aula de Matemática
Encontro para revisar as análises da pesquisa e confeccionar os gráficos em
cartazes para apresentação oral do trabalho. Houve um pouco de conflito neste
encontro, pois alguns alunos não estavam contentes com os cartazes que foram
confeccionados para a apresentação.
81
Na aula de Biologia
Os grupos se prepararam para as apresentações. Concomitante à
apresentação dos dados matemáticos obtidos os alunos deveriam apresentar as
respostas corretas, justificando-as conforme seus aprendizados por meio da
pesquisa. Neste encontro os alunos pareciam estar tensos devido à apresentação
que se aproximava, mostravam-se ansiosos e confessavam não compreender como
iriam ser avaliados nas três disciplinas.
Já em Língua Portuguesa
Os alunos trabalharam a oralidade, interpretando textos poéticos. Novamente
demostraram ansiedade, pois a todo o momento perguntavam: “o que devemos
falar”.
Oitavo e nono passo
82
Apresentação oral da pesquisa realizada. Neste momento, as professoras das
três áreas de conhecimento estavam reunidas para avaliar a apresentação. Neste
dia os alunos entregaram também o trabalho escrito.
Apresentação dos trabalhos em grupo e entrega dos trabalhos escritos,
conforme as regras da ABNT. Todos os trabalhos foram filmados.
Durante as apresentações, os alunos foram indagados com as seguintes
perguntas:
1. Por que escolheram este tema para pesquisar?
2. Qual o critério de escolha dos entrevistados?
3. Como foi a aceitação das pessoas entrevistadas?
4. Como vocês se sentiram ao longo do desenvolvimento do trabalho?
5. O que vocês levam para a vida de vocês após o desenvolvimento deste
trabalho?
6. De que forma este estudo pode mudar a situação da população?
Além destas, foram feitas perguntas referentes aos dados coletados e
analisados.
Ao longo das apresentações pude perceber o quanto os alunos aprenderam e
o quanto foi significativo, para eles, participarem efetivamente da construção de sua
aprendizagem.
83
Décimo momento
Neste encontro, novamente com as professoras das três áreas reunidas,
conversamos com os alunos para que colocassem tudo que sentiram ao longo do
trabalho realizado.
Durante o trabalho observou-se que o cotidiano esteve presente do início ao
fim desta proposta. Inicialmente foi a partir de uma escolha sua o trabalho se
desencadeou, as perguntas por sua vez traziam resíduas e particularidades das
experiências e vivencias dos participantes.
Ao longo deste processo cada um a seu tempo demonstrou um crescimento
no processo de ensino-aprendizagem. A cada discussão percebia nos educandos
uma vontade de expor os conhecimentos que adquiriam no decorrer do tempo não
meramente num sentido informativo, mas no sentido de expor e rediscutir de forma
argumentada os conhecimentos reconstruídos.
Percebi que os educandos não mais abriam um livro para buscar a verdade
absoluta, mas sim buscava neste o auxílio para tentar contemplar seus
pensamentos, cada um a seu modo passou a resignificar seu aprendizado buscando
em suas vivencias pontos de partida para entender o que os livros estavam
expressando e assim aos poucos cada um foi passando de simples pensamento
cotidiano para um conhecimento mais elaborado.
84
No capítulo que segue, descrevo os sentimentos e as percepções dos alunos
quanto à participação dos mesmos na proposta realizada. Para tal, utilizo tanto as
suas manifestações orais como os seus depoimentos escritos.
85
6 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS DA PESQUISA
Neste capítulo pretendo analisar e interpretar os dados da pesquisa. Faço-o
em forma narrativa visando recompor o processo ocorrido. Ao longo do texto estão
presentes categorias que surgiram a partir da análise das observações de sala de
aula e dos depoimentos escritos, bem como das manifestações orais dos
educandos.
Relato como iniciou o trabalho e, nesse ensejo, foco nos sujeitos da pesquisa,
pois julgo necessário entender os motivos pelos quais meus alunos voltaram a
estudar, situando-me em suas dúvidas, anseios e perguntas. Entendo que antes de
educar é necessário conhecer.
Numa segunda etapa, dentro da categoria a caminhada, realizo algumas
análises as quais chamei de subcategorias. Em cada uma delas procuro analisar os
aspectos positivos e negativos levantados pelos participantes da proposta de
ensino- aprendizagem. Para tal, destaco observações quanto ao trabalho em grupo,
aos benefícios de trabalhar com o conhecimento cotidiano, à pesquisa na sala de
aula como aliada na construção do conhecimento, bem como pretendo descrever as
mudanças geradas na linguagem dos alunos quanto à concepção de escola e
construção da aprendizagem.
Desta forma, descrevo abaixo minhas análises e interpretações como
pesquisadora e integrante da pesquisa.
86
6.1 Conhecendo o sujeito ao longo do processo
Compreender os outros faz com que cada
um se conheça melhor a si mesmo.
Deleuze
Como nesta pesquisa o diálogo esteve presente a todo o momento e foi a
partir dele que a mesma se encadeou, retorno, num breve relato, aos primeiros dias
dessa pesquisa.
Em março de 2004 comecei um trabalho junto aos alunos de EJA, conforme
citei anteriormente. Meu primeiro desafio consistia em como trabalhar os
conteúdos de Matemática em uma hora semanal de aula.
Confesso que nos primeiros dias fiquei chocada e não sabia o que fazer.
Pensando numa solução, resolvi dialogar com meus alunos. Levei para sala de aula
três volumes de livros do Ensino Médio e iniciei a conversa dizendo ser impossível
trabalhar todos aqueles conhecimentos no tempo que nos foi pré-estabelecido.
Naquele momento lancei uma discussão oral, perguntando o que seria mais
importante para eles: trabalhar conhecimentos isolados ou trabalhar com questões
voltadas para a vida diária?
87
Ao longo desse diálogo percebi que os alunos gostaram da segunda hipótese,
pois muitos deles tinham receio à disciplina e gostariam de aprender algo mais útil a
suas vidas cotidianas. Diziam estar cansados de fórmulas e conteúdos sem sentido.
Porém, alguns me indagaram “como fica o vestibular?” Ao refletir sobre esta
pergunta fui muito clara com meus alunos dizendo-lhes que considerava impossível
trabalhar tantos conteúdos em tão pouco tempo. Minha prioridade como educadora
não seria simplesmente passar informações, pois minha preocupação era a de
ajudá-los a resolver problemas de suas vidas diárias, bem como as dúvidas que
surgiriam a partir dos conteúdos trabalhados, procurando desencadear discussões
que estimulassem o pensamento, tentando assim, formar sujeitos críticos,
pesquisadores, capazes de utilizar o conhecimento adquirido em aula para mudar
suas realidades, bem como para adquirir novos conhecimentos.
Como os diálogos com os alunos eram sempre proveitosos, decidi iniciar
minha pesquisa perguntando-lhes sobre duas questões: Por que eles voltaram a
estudar? E qual o papel da escola?
Num primeiro momento em aula obtive olhos apreensivos e até assustados.
Em conversas posteriores os alunos me revelaram que se perguntavam: O que ela
quer? Ou ainda: onde ela quer chegar? Aos poucos, essas perguntas foram sendo
respondidas e os olhares apreensivos deram lugar aos olhares curiosos. A cada aula
os alunos se envolviam num processo dialógico cada vez mais constante e
interessante. Constante, pois tornou-se hábito em todos os nossos encontros.
Interessante devido ao fato de que a cada encontro surgiam novas possibilidades de
conhecimento trazidas pelos alunos.
88
Minha primeira pergunta teve como intenção conhecer melhor os alunos e
entender os motivos pelos quais retornavam à escola. Entendo, como educadora e
ser humano, que se não nos propusermos a escutá-los, eles não irão fazer o mesmo
conosco. Considero importante conhecê-los e fazê-los se conhecer. Como diz
Rubem Alves (2003), a primeira tarefa da Educação é ensinar as crianças a serem
elas mesmas. Isso é extremamente difícil, pois o programa da escola consta de uma
série de saberes que os professores tentam ensinar, mas representam desejos de
outros que não são os das crianças.
Tentando compreender esses desejos, li e reli muitas justificativas,
questionamentos e curiosidades que me foram repassados ao longo das aulas. Em
grande parte deles, a necessidade de voltar à escola apareceu por motivos de
trabalho, por realizações pessoais e amesmo pela simples vontade de retornar e
crescer intelectualmente. É o que podemos observar nas falas abaixo.
A necessidade de buscar um futuro melhor para minha família fez
com que eu retornasse. A falta de oportunidade de trabalho me fez
voltar. Voltei a estudar para não perder o emprego, estava ficando
para trás. Para melhorar de vida! Hoje entendo a necessidade de
estudar. Para saber mais e aprender o que não sei. Estou
aposentado! A necessidade me tirou da escola, mas agora que tenho
tempo, resolvi voltar. Para ter um diploma. Para provar para mim
mesmo que, apesar da idade, eu ainda posso aprender. Para auxiliar
meus netos! Eles têm dúvidas e eu queria poder ajudá-los.
Nos depoimentos acima fica identificada a importância de estar ali e o quanto
cada um veio buscar. Mesmo cansados de uma jornada de trabalho, estavam ali,
alegres e atentos a cada movimento, pergunta e questionamento que eu propunha.
Confesso que senti uma responsabilidade muito grande e em muitos momentos
89
medo de falhar e de decepcioná-los. Aos poucos, fui vencendo meus medos e
continuei a pesquisa.
Com o passar dos dias, lancei o seguinte desafio para que os alunos
refletissem: Como a Matemática acontece no dia-a-dia? Quais suas utilidades e
relações com seu trabalho ou afazeres domésticos? No mesmo momento um aluno
me respondeu: “tudo”. Indaguei-o pedindo que explicasse melhore tive como
resposta que: “a Matemática está presente na hora de preparar a comida, no tempo
que levamos até chegar o trabalho e até quando precisamos medicar nossos filhos”.
Como verifiquei que os alunos ficaram empolgados, resolvi investir e
aproveitar suas experiências cotidianas nas aulas de Matemática, pois é no dia-a-dia
que nos entregamos por inteiro. Conforme diz Agnes Heller:
o homem participa da vida cotidiana com todos os aspectos de sua
individualidade, de sua personalidade. Nela colocam-se em
funcionamento todos seus sentidos, todas as suas capacidades
intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus sentimentos,
paixões idéias, ideologias ( 1970, p.17).
Se é no cotidiano que nos mostramos por inteiro, considero importante utilizar
esses conhecimentos. Dessa maneira, juntamente com os alunos fui programando
os conteúdos que seriam trabalhados tentando contemplar suas dúvidas. A partir de
suas falas, estudamos regra de três, unidades de medidas, porcentagem, juros,
analisamos saldos bancários e interpretamos gráficos. Embora alguns destes
conteúdos fossem de ensino fundamental achei relevante trabalha-los, pois os
alunos tinham dúvidas que necessitavam ser esclarecidas. É importante também
90
salientar que a escolha por esses conteúdos ocorreu a partir dos questionamentos
de aula. Como podemos detectar nas seguintes falas.
Não entendo meus extratos bancários, acho que está sempre
faltando dinheiro. Queria entender melhor os juros, nunca sei quando
é melhor pagar a vista ou comprar a prazo. Fico louca quando o
médico me manda dar remédio as meus filhos, não compreendo as
quantidades que a bula traz, fico com medo de machuca-los. Não
entendo nada daqueles gráficos que tem no jornal. Para que serve
aquilo?
Cada vez mais os alunos traziam dúvidas sentindo-se mais à vontade nas
aulas. É importante deixar claro que as perguntas sempre foram valorizadas e as
mesmas não eram respondidas somente por mim. Através de diálogos,
questionamentos e pesquisas as mesmas eram respondidas e mais perguntas
surgiam.
Entendo que o professor deve orientar seus alunos e instigando-os a fazer
perguntas e não oferecendo respostas prontas. Como diz Rubem Alves: “O caminho
da inteligência passa através das mãos. Pensamos para ajudar as mãos. Das mãos
nascem as perguntas. Das cabeças nascem as respostas. Se a mão não pergunta a
cabeça não pensa.”(2003, p. 53)
Respeitando cada indivíduo e suas particularidades, procedemos ao longo da
pesquisa como se estivéssemos desbravando uma selva. A cada dia fomos
perdendo o medo do desconhecido e a selva aos poucos foi tornando-se bela e
mágica. Desta forma, fomos aprendendo com a natureza que em cada um de
nós.
91
6.2 A caminhada
Com a intenção de fazer com que meus alunos se assumissem de vez,
sujeitos da sua aprendizagem, decidi soltá-los, para que dessem seus primeiros
passos sozinhos.
Inicialmente, faço uma analogia e comparo o trabalho até o momento ao
desenvolvimento de uma criança.
Na etapa anterior, como mãe, observei-os, ajudei-os a formular suas
primeiras palavras chegando a ensaiar alguns passinhos. Agora, como crianças
maiores, fortes, falantes e com olhares atenciosos ao mundo novo que os rodeia,
resolvi soltar suas mãos para que, aos poucos, dessem seus primeiros passos
sozinhos.
Sei que algumas conseguiram caminhar mais rápido e em pouco tempo
estavam correndo. Porém, outras caíram e tinham vontade de desistir, mas como
uma mãe atenciosa, estava ali, pronta para estender a mão e dar o apoio
necessário, para que todos conseguissem, a seu tempo, caminhar e até correr.
Em agosto começamos a trabalhar dentro da temática Meio Ambiente.
Novamente através de uma aula dialogada, iniciei perguntando: O que gostariam de
estudar dentro desta temática?
Desta conversa surgiram muitos assuntos tais como: a reciclagem do lixo; o
destino do lixo hospitalar; racionamento de água; chuva ácida; o desmatamento,
92
entre outros. Verifiquei que cada grupo de pessoas tinha interesse em estudar algo
diferente.
Assim, parti para outras perguntas: Como podemos trabalhar? O que
trabalhar? Novamente tive olhares assustados e confesso que também estava
assustada, pois quando damos voz aos nossos alunos devemos estar preparados
para que as coisas em alguns momentos fujam do que imaginávamos. Por isso, é
importante nos assumirmos também pesquisadores, para que as barreiras sejam
vencidas por todos ao longo de todo o processo.
Em meio a esta conversa, um grupo de alunos levantou a seguinte idéia:
“Professora, quem sabe não podemos fazer pesquisa de opinião?” Outro indagou:
“Assim, cada um de nós poderia trabalhar o assunto que tem vontade?” Neste
momento iniciei meu papel de orientadora, tentando organizar melhor as idéias que
iam surgindo.
Primeiramente ficou decidido que íamos fazer pesquisas de opinião, onde
cada grupo de alunos escolheria o assunto que desejasse. Somente uma condição
foi imposta a eles: que o tema a ser contemplado deveria estar dentro da grande
temática Meio Ambiente. Indaguei à turma: Será que é possível contemplar a
Matemática na pesquisa de cada grupo? “Claro”, disse um aluno. Perguntei: Como
tu achas que isso pode ser feito? “Bom, os dados coletados nas entrevistas podem
ser analisados”. Então, ficou decidido que seria feita uma análise matemática das
respostas obtidas dos entrevistados Não ficou decidido, naquele momento, de que
forma os dados seriam analisados, pois acreditei que ao longo do trabalho isso
ficaria mais claro. Em seguida, criou-se em conjunto um cronograma para que
93
tivéssemos um norteador e, assim, não nos perdêssemos ao longo do trabalho. Este
cronograma foi relatado no capitulo anterior, bem como as demais informações dos
passos da proposta realizada.
Então, começamos a ensaiar nossos primeiros passos. Nas primeiras etapas
da proposta os alunos mostraram-se apreensivos. Muitas vezes me perguntavam se
estava certo ou errado e eu, como orientadora, retornava a pergunta com outra
pergunta.
Tentava mostrar-lhes que deveriam discutir em grupo, justificando suas idéias
com argumentos e contrapondo as idéias dos colegas sempre que achassem
necessário.
Ao longo deste processo, ao qual chamei de a caminhada, surgiram as duas
primeiras subcategorias, as quais identifiquei como: A construção das relações
sociais e a autonomia e construção do conhecimento. Dentro delas apresentam-se
fragmentos da importância de investir no cotidiano, do trabalho em grupo e da
pesquisa em sala de aula. Pontos estes levantados pelos participantes. Todos ao
seu modo contribuíram para a construção das relações sociais, do conhecimento,
bem como da autonomia.
Estas subcategorias surgiram no momento em que percebi que os alunos
estavam preocupados em fundamentar suas idéias, percebendo que utilizando
somente seus conhecimentos prévios não seria suficiente para argumentar e
contrapor as idéias dos colegas. Quanto às relações sociais, eram importantes para
a construção do conhecimento.
94
A terceira subcategoria, intitulada Uma nova visão do processo ensino-
aprendizagem, traz fragmentos das mudanças geradas na linguagem dos alunos
quanto ao papel da escola e às maneiras de adquirir conhecimento.
Esta subcategoria, por sua vez, teve origem no momento em que os alunos
perceberam que somente copiar, esperar pelo professor e escutar o que o mesmo
tem a “transmitir” não eram mais suficiente para aprender.
Portanto, remeto minha análise a cada uma das subcategorias citadas acima
tentando descrever cada uma delas.
Durante esta caminhada, perpassamos por dias ensolarados, mas também
por temporais. A cada dia ensolarado íamos em busca do novo aproveitando o bom
tempo. em tempos de chuva nos abrigávamos, repensando todas as descobertas
e obstáculos enfrentados a cada nova trilha que desbravávamos.
6.2.1 A construção das relações sociais
Só a cooperação leva à autonomia
Piaget
95
Uma das funções da educação é a socialização do conhecimento. Porém não
pode limitar-se a este aspecto, pois educar é “auxiliar o encontro da inteligência do
educando com a vida, o encontro de sua sensibilidade com a pluralidade rica do
viver”. ( MORAIS, 1986, p. 6)
A educação, além de propiciar aos alunos aquisição de conhecimentos,
necessita possibilitar-lhes um crescimento interno, onde desde suas primeiras
etapas escolares seja exercitada a busca pela verdade, o direito à dúvida, bem
como seja-lhes possível construir relações sociais.
Uma forma de propiciar as realções sociais é o trabalho em grupo.
Estabelecer na sala de aula um cenário no qual os alunos vivenciem situações que
levam a compartilhar ideais, ou idéias mas que, ao mesmo tempo, possibilita o
crescimento pessoal de cada indivíduo.
No depoimento “o trabalho em grupo nos proporciona sermos mais do que
colegas, mas sim parceiros”, fica claramente evidenciada a importância das relações
interpessoais no ambiente escolar, pois não trabalhamos somente com
conhecimentos específicos em nossa sala de aula. Muitos sentimentos estão
envolvidos e seria ingênuo da nossa parte não admitir que estas relações interferem
no aprendizado de cada um. Portanto, fazer de nossa sala de aula um ambiente em
que os alunos possam conhecer-se melhor num sentido cooperativo faz com que
esta cooperação e parceria contribuam para o seu desenvolvimento educacional.
Como afirma Capra, a vida não tomou conta do planeta pela violência, mas pela
96
cooperação, pela formação de parcerias e pela organização em redes” (2002,
p.239).
Outro aspecto que me chamou atenção ao longo do trabalho foi a questão de
ouvir e falar. Como disse um aluno: “neste processo aprendemos que é importante
falar, mas também ouvir”. Pude perceber neste depoimento que é importante ouvir
para entender as idéias dos colegas e depois falar para expressar suas próprias
idéias. Neste exercício dialógico os alunos foram compreendendo que na fala dos
outros também há aprendizagem, reconhecendo a necessidade de ouvir para depois
falar. Conforme Lima: “O trabalho a muitas mãos requer e propicia aprendizagens. É
preciso saber escutar, é importante ser capaz de colocar-se no lugar do outro,
buscando compreender seu ponto de vista.” ( 2002, p. 287).
Neste outro depoimento, ficam evidenciadas as dificuldades de compreender
e trabalhar com outros sujeitos.
Não gostei muito de trabalhar em grupo. É difícil conviver com as
idéias de outras pessoas. Achei muito complicado cada um pensa de
um jeito diferente. Trabalhar em grupo é difícil, pois nem todo mundo
trabalha no mesmo ritmo. Portanto preferia trabalhar sozinha.
Sei que trabalhar com as opiniões dos outros, aceitar estas idéias, respeitar o
ritmo de cada um são tarefas difíceis, mas também necessárias ao desenvolvimento
do indivíduo. Como afirma Perrenoud (2000), ouvir, opinar e chegar a um consenso
é difícil, mas faz com que o educando, junto com seus educadores, se desenvolva
tornando–se um ser crítico. Para enfrentar os desafios do mundo é preciso ser
crítico, opinando e ouvindo, criticando, mas também sendo criticado.
97
É importante que o educando perceba as diferenças presentes em nosso
cotidiano, bem como o modo que as relações com os outros são possibilidades
também de crescimento. Nem todos são iguais e na diferença também
aprendizado. Como diz Rubem Alves:
A segunda tarefa da educação é ensinar a conviver. A vida é
convivência com uma fantástica variedade de seres, seres humanos,
velhos, adultos, crianças, das mais variadas raças, das mais variadas
culturas, das mais variadas línguas, animais, plantas, estrelas...
Conviver é viver bem em meio a essa diversidade (2003, p.14).
A importância de estreitar os laços com as pessoas com as quais convivemos
e como estas fortes ligações podem ajudar em nossas aprendizagens foram outros
aspectos observados ao longo das aulas. É o que podemos detectar na seguinte
afirmação “quando trabalhamos em grupo sentimo-nos mais fortes e amparados, isto
nos confiança para perguntar e defender nossos pontos de vista. Está confiança
nos auxilia em nosso aprendizado.”
Quando temos a oportunidade de conhecer melhor as pessoas que convivem
conosco, seja no ambiente profissional ou escolar, isso nos proporciona segurança
para que nos posicionemos frente às situações que acontecem em nosso dia-a-dia.
A partir desta confiança sentimo-nos mais seguros para defender nossas opiniões e
buscar respostas para nossos questionamentos, possibilitando transformação de
nossos conhecimentos em outros mais complexos.
Nesta outra citação, o aluno salienta: “o debate é importante! O trabalho em
grupo nos faz crescer como ser humano, pois temos a oportunidade de aprendermos
com o outro.”
98
Quando se oportuniza a construção das relações sociais, o aluno percebe
que “o grupo também representa oportunidade de exercitar o aprender a viver com
outros sujeitos. É o espaço para o exercício da cooperação e o desenvolvimento da
solidariedade.” (MORAES, 2002, p. 137)
Neste outro depoimento, evidencia-se o aumento da autoconfiança:
A aula torna-se mais prazerosa quando podemos relatar nossas
experiências. Aos poucos estou perdendo o medo de falar, pois os
colegas escutam minhas experiências de vida sem questionar se
está certo ou errado. Isso faz com que não tenha medo.
Proporcionar a construção das relações sociais é fortalecer os vínculos de
todos os presentes É mostrar-lhes que os mesmos devem sentir-se seguros,
amparados para que possam avançar sem medo em seu aprendizado.
Desta forma, as ações educacionais devem resgatar a autoconfiança e auto-
estima dos educandos que, assim, realizam esforços no sentido de progredir social e
cognitivamente.
Nesta parte da nossa caminhada, descobrimos o quanto é importante ter
alguém para nos estender a mão. Nas decidas muito íngrimes era necessário
conviver, escutar e falar para que todos continuassemos inteiros. A cooperação fez
com que seguissemos a caminhada buscando novos horizontes em dias
ensolarados.
99
6.2.2 A autonomia e a construção do conhecimento
O conhecimento humano é essencialmente coletivo,
e a vida social constitui um dos fatores essenciais da
formação e do crescimento dos conhecimentos
Piaget
A aprendizagem deve favorecer o aprimoramento dos horizontes sociais,
culturais e cognitivos dos educandos. Para tal, o professor precisa considerar o que
o aluno conhece e a partir disso, organizar experiências educativas que possibilitem
a ampliação destes conhecimentos.
Pude perceber que ao investir no cotidiano dos alunos em sala de aula, os
mesmos tornaram-se mais participativos nas aulas e ficavam ansiosos para contar
suas experiências de vida, tentando relaciona-las com o trabalho proposto. Destas
experiências surgiam questionamentos que levavam o grande grupo a repensar
suas crenças e valores e, assim, realizávamos um processo de reconstrução dos
nossos saberes. Nos depoimentos abaixo tento mostrar o quanto é importante
investir no que nossos alunos já dominam.
Quando realmente podemos utilizar o que conhecemos em sala de
aula, aprendemos melhor. Afinal, estamos aqui para aprender!
Quando temos a possibilidade de comparar o que conhecemos da
vida com o que está escrito nos livros, aprendemos melhor.
100
Nas respostas dos alunos fica evidenciado o quanto as aulas podem se tornar
mais significativas e prazerosas para os mesmos se trabalharmos a partir de suas
experiências cotidianas. Como Netto e Carvalho afirmam: “o jogo dos sonhos e
desejos e atividades rotineiras produz insatisfações, angústias, opressões, mas
também segurança”. ( 1994, p.23)
Essa segurança que temos presente no dia-a-dia é que nos permite sustentar
nossas idéias iniciais. Contudo, é a partir das inseguranças, também presentes na
vida diária que podemos questionar o que conhecemos como certo, tornando-o
incerto e, assim, promover mudanças em nossas crenças e valores. Demo relata
que “partindo do conhecido, podemos reconstruir o novo, em processo permanente
de aprendizagem.” (2000, p. 39). Este movimento entre certeza e incerteza e novo
gera questionamentos e, desta forma, gera conhecimento.
Investir no que nossos alunos conhecem é necessário para a construção do
conhecimento e da autonomia. Fazê-lo entender, como diz Demo(2000), que o
processo de formação jamais termina faz com que o mesmos busquem investir em
conhecimento, tornando cada vez mais complexa a sua natureza. Sempre temos a
aprender, construir e reconstruir. Assim, devemos considerar que estamos em
constante aprendizado, dentro ou fora do ambiente escolar.
Como diz Ubiratan D’Ambrósio (1993), sempre que trabalhamos com as
situações ou problemas que a realidade impõe, os alunos tornam-se mais
motivados. A partir desta motivação, os alunos mostram-se por inteiro, buscando
desbravar outros saberes ainda não conhecidos e alcançando a abstração de
conhecimentos mais complexos como, por exemplo, o conhecimento científico.
101
Portanto, motivá-los como diz Freire (1985) é, sem dúvida, perceber em sua
fala ingênua um oceano de saberes. É compreender que num pequeno gesto ou
numa pequena frase pode estar um grande conhecimento. Assim se constrói
conhecimento, investindo em nossos alunos, buscando em sua realidade e cultura
as fontes de seu saber.
Outro aspecto importante levantado pelos alunos foi o quanto o trabalho em
grupo pôde contribuir para a construção do conhecimento. Dentre os depoimentos
dos alunos destaco: “o trabalho em grupo fez com que percebêssemos que quando
existe troca construção de conhecimento”. Analisando a frase do aluno, pode-se
perceber que o trabalho em grupo proporciona a socialização de conhecimentos, a
construção ou reconstrução do que se conhece, buscando na argumentação a
sustentação para as discussões, além do crescimento pessoal que os debates em
grupo proporcionam a cada indivíduo. É ainda um espaço onde os sujeitos
apreendem com as trocas e estas os fazem crescer intelectualmente.
É o que podemos reafirmar com as idéias de Moraes: “o grupo por excelência
é um local para o desenvolvimento de capacidades argumentativas orais. Nele a
linguagem é exercida. Competências argumentativas se desenvolvem”. (2002, p.
137)
Assim, considero que ao promover o trabalho em grupo, estamos
proporcionando aos alunos a convivência com a diversidade de opiniões, idéias e
até ritmos. Trabalhar com esta diversidade e promover a construção e a
reconstrução de idéias é mostrar ao aluno a importância de falar para argumentar,
mas ouvir para entender os diferentes posicionamentos num sentido cooperativo.
102
Dentre as etapas desta caminhada fez-se presente a busca por argumentos
para sustentação da linguagem utilizada em sala de aula. Neste caso, como os
alunos não obtinham da minha parte as respostas para todos os seus
questionamentos, pois eu procurava a todo o momento indagá-los com outras
perguntas para que eles mesmos refletissem sobre o que estavam falando ou
escrevendo, surgiu como forte aliado de trabalho o ato de pesquisar.
Deste modo, os alunos encontraram nos livros aliados que estavam ali para
auxiliá-los nos momentos de dúvidas. É o que podemos observar no próximo
depoimento, que vem complementar a relação de parceria entre aluno e o livro: “ao
pesquisar nos livros, encontramos um parceiro que nos ajuda a buscar o
conhecimento e a desenvolver a capacidade de encontrar ajuda para formular
nossas próprias respostas.”
Como lembra Moraes (2002), inicialmente construímos argumentos e
hipóteses para nossas idéias, mas é necessário pesquisar, lendo livros e revistas, e
explorando teorias, sempre com o intuito de encontrar elementos que ajudem na
fundamentação de nossos argumentos em construção. É importante lembrar aos
alunos que os livros tem a função de fundamentar nossas idéias. Muitas vezes o
encontramos neles as respostas prontas, pois estas respostas vêm de nós mesmos.
Nesse sentido, os livros nos ajudam a complementar nossas idéias.
A busca pela autonomia de trabalho foi outro aspecto observado. Os alunos
eram levados a assumirem-se sujeitos de sua aprendizagem e a cada aula
mostravam a necessidade de buscar subsídios para aprender. É o que podemos
observar neste desabafo:
103
no início era difícil, ficava irritada com a professora que parecia que
não queria ajudar. Em vez de dar as respostas fazia outras
perguntas, ficava louca! Com o passar do tempo percebi que
dependia de mim. Então corri atrás, pesquisava até descobrir o
que queria. Hoje não fico esperando por ninguém, sei que se não
lutar por uma vida melhor, ninguém o fará por mim. Assim é na
escola, depende de nós.
Conforme afirma Demo:
Autonomia é conquista árdua que não termina. Dói principalmente no
começo, pois sua primeira fase é sentir-se perdido. Tirada a muleta,
a pessoa se sente abandonada. Mas assim descobre que pode
andar sem muleta. (2000, p. 19)
É importante que o aluno busque sua autonomia e que perceba que sua
aprendizagem não depende somente do professor. Ele é um facilitador, está ali para
motivá-lo, não para oferecer respostas prontas. Conquistar a autonomia é buscar por
si caminhos para resolver suas dúvidas e problemas. Esta é também uma das
tarefas da escola: formar sujeitos autônomos.
Neste outro depoimento, o aluno mostra que a pesquisa faz com que não
aceitemos passivamente o que os outros nos dizem. Ele relata que a pesquisa o fez
duvidar para depois confirmar oferecendo maior segurança à argumentação de suas
falas e produções escritas, como podemos observar: “ao pesquisar assumi um olhar
mais crítico ao que os outros me diziam”.
Outro aspecto presente nos depoimentos dos alunos foi a integração que o
ato de pesquisar proporciona a todos, conforme podemos acompanhar: “ao
pesquisar, conseguimos fazer ligações, isto facilita o aprendizado.” Neste
104
depoimento fica evidenciada a percepção do aluno no sentido de que o
conhecimento não se isoladamente e que existem ligações entre as áreas de
conhecimento. Com a pesquisa, tendo a leitura como forte aliada para a busca pelo
conhecimento, os alunos fazem ligações entre o cotidiano, entre os assuntos
tratados em aula e entre as diversas áreas de conhecimento. Isso possibilita-lhes
trazer simbolicamente o mundo para dentro da sala de aula e esta para o mundo,
num movimento de reconstrução de saberes. Entendo que ao se assumirem
pesquisadores em sala de aula, isso permite-lhes compreender, interpretar e
influenciar no contexto em que vivem. Desta maneira, devemos partir da linguagem
dos alunos para, com outras, construír aprendizagens mais complexas.
Souza diz que:
Formar massas críticas significa ultrapassar os limites físicos das
instituições educacionais por meio de um ensino coerente e
articulado; propiciar experiências significativas para uma presença no
mundo que envolva reciprocidade no compartilhar e partilhar; implica
acréscimos de qualidade. (1996, p. 14)
Entendo que acréscimo de qualidade é partir do cotidiano dos alunos,
buscando nele a segurança para construir ou reconstruir saberes e é propiciar o
trabalho em grupo para que ocorram discussões a fim de encontrar conhecimento e
identificação com o grupo, além de utilizar a pesquisa para que os sujeitos possam
fortalecer suas idéias iniciais ou reconstruí-las. Considero ser este o caminho para
construir o conhecimento e formar alunos críticos, autônomos e criativos, capazes de
mudar o mundo que os cerca.
105
Durante o caminho, certo dia pegamos uma trilha aparentemente bela, mas
com muitos percalços. Conforme andávamos, verificávamos o quão era difícil decidir
em qual pedra íamos pisar para evitar que caíssemos. A cada arranhão fomos
percebendo o quanto podemos aprender com as experiências dos outros e o quanto
é preciso acreditar em nós mesmos. Isso fará a diferença na hora de optar por qual
caminho iremos continuar a caminhada.
6.2.3 Uma nova visão do processo ensino-aprendizagem
Autonomia significa ser capaz de considerar
os fatores relevantes para decidir qual deve
ser o melhor caminho da ação.
Kamii
Ao longo da caminhada, muitas foram as mudanças observadas. Dentre as
quais chamaram-me a atenção a mudança de concepção de escola, onde os alunos
assumiram que não bastava mais copiar para aprender, gerando mudanças em suas
linguagens e possibilitando um novo modo de ver a vida e uma nova visão de como
construir conhecimentos, assumindo-se para isso sujeitos de sua aprendizagem.
Retornando ao passado, volto a uma das primeiras perguntas que fiz aos
alunos: qual o papel da escola? Para identificar as mudanças geradas faço uma
106
análise simultaneamente buscando o passado e o presente, pois ao final da
pesquisa realizada em aula refiz esta pergunta aos alunos.
Observando os comentários dos alunos: “A função da escola é ensinar, dar
informação” e “Hoje o professor incentiva a gente a buscar e pior se nos
interessarmos aprendemos mais”, pude perceber na interpretação deste depoimento
que antigamente os alunos tinham a visão de que o papel da escola era apenas
informar. Hoje a mesma passou a ser vista como incentivadora da busca de
informações, além de possibilitar ao aluno entender que esta busca depende dele,
substituindo o receber informações por buscar.
De acordo com Piaget é preciso
conquistar por si um certo saber, com realização de pesquisas
livres, e por meio de um esforço espontâneo, levará a retê-lo muito
mais; isso possibilitará ao aluno a aquisição de um método que lhe
será útil para toda a vida e aumentará permanentemente a sua
curiosidade, sem o risco de estancá-la; quanto mais não seja, ao
invés de deixar que a memória prevaleça sobre o raciocínio, ou
submeter a inteligência a exercícios impostos de fora, aprendeele
a fazer por si mesmo funcionar a sua razão e construirá livremente
suas próprias noções (1973, p. 54)
Entendo que é preciso incentivar os alunos a buscar soluções para suas
dúvidas, é preciso que ele por si encontre caminhos para resolver os problemas que
vão surgindo. Estes caminhos criados pelos próprios alunos farão a diferença ao
longo de suas vidas. Quanto àqueles incansáveis exercícios repetitivos, muitas
vezes cairão no esquecimento.
Nestes outros depoimentos faz-se presente a tradição de que a função da
escola é transmitir conhecimento ou ainda que é apenas através da “decoreba” que
107
se aprende, como podemos observar na seguinte afirmação: a função da escola é
passar para o aluno o que ele não sabe”, ou ainda: “é fazer com que agente decore,
para aprender.”
Em contrapartida, neste outro depoimento coletado após a pesquisa está
implícito que a aprendizagem acontece quando trocamos experiências, “agora
percebo que a aprendizagem é uma troca de conhecimento. É importante buscar,
decorar não adianta”.
Piaget (1973, p.17), diz que “compreender é inventar, ou reconstruir através
do inventado, e será preciso curvar-se ante tais necessidades se o que se pretende,
para o futuro, é moldar indivíduos capazes de produzir ou de criar, e não apenas
repetir.”
Deste modo, para que os alunos possam criar e produzir as ações
educacionais devem modificar-se, pois o é possível ter criatividade se as
atividades de aulas visam somente reproduções. Para que a criatividade ocorra é
preciso estimular os alunos a desbravar caminhos ainda não trilhados. Trilhar novos
caminhos é buscar na incerteza de uma nova trilha a possibilidade de novas
descobertas e assim possibilidades de aprender.
Um aluno relata que a aprendizagem acontece à medida que o professor
expõe a matéria. Ele possui o conhecimento e ao aluno cabe escutar para assimilar:
“o professor deve colocar o assunto a ser trabalhado, e nós devemos escutar por
que assim estamos aprendendo”. Porém, hoje, os alunos percebem que a escola é
lugar para debates, questionamentos, certezas e incertezas, é um espaço para
construção, como podemos observar: agora participamos, argumentamos,
108
mostramos nossas dúvidas sem ter medo, porque a escola é lugar para crescer, não
adianta somente escutar, é preciso aprender a falar.”
Habermas (1990) diz que deve-se propiciar a todos os participantes iguais
oportunidades de falar, de questionar e expor argumentos, de expressar
sentimentos, atitudes e intenções para coordenar, fazer oposições. Permitir a
“situação de fala” deve garantir que o discurso dos participantes esteja livre de
limitações e dominações (liberdade e justiça).
Ouvir os alunos é permitir aos mesmos a oportunidade de expressar
oralmente seus conhecimentos e dúvidas. Tão necessário quanto ouvir é falar, pois
é a partir da fala que os indivíduos se mostram por inteiro. Portanto, é preciso
incentivá-los a assumir suas vozes.
No depoimento seguinte mostra-se a superação da aula copiada onde os
alunos apenas escutavam e copiavam: “antes achava que para aprender na escola
era copiar do quadro e escutar o professor. Hoje percebo que devemos falar e
usar tudo que está a nossa volta, por isso copiar só não adianta.” A partir da
proposta, os alunos passaram a olhar o professor não mais como a única fonte para
aprendizagem, assumindo outras formas de gerar conhecimento. Como lembra Tiba,
“a grande diferença entre o decorado e o sabido é que neste último o aluno sabe
usar o conhecimento de qualquer maneira e tem a possibilidade de criar, superando
o que o professor ensinou.” (1998, p. 111).
Hoje os alunos percebem certa liberdade de expressão e relatam que
antigamente tinham medo do professor. Percebem uma escola aberta onde todos
são livres para perguntar, como mostra este depoimento: “nos dias de hoje a gente
109
tem liberdade podendo até pedir para estudar algo de acordo com as nossas
necessidades, antes a gente tinha medo de perguntar”.
Outra afirmação expressa a igualdade entre os sujeitos: “agora somos um
multiplicador de informações, às vezes aluno, às vezes professor”. Com estas
palavras, os alunos mostram-se tanto professores como aprendizes, demonstrando
que ambos estão andando lado a lado em busca do conhecimento.
Todos os depoimentos acima evidenciam uma ruptura quanto aos papéis da
escola, do professor e do aluno. Antes os alunos estavam presos às idéias da escola
tradicional como sendo um espaço de exclusão, onde os bons seriam
reconhecidos. O professor possuía todo o conhecimento. Ele era o centro de tudo e
os alunos eram apenas expectadores. Hoje percebem a escola como um ambiente
propício para realizar sonhos, melhorar de vida. Nela todos são incluídos, pois todos
temos a aprender e ensinar, tornando-se um lugar para crescer, onde professores e
alunos andam juntos lado a lado em busca do conhecimento.
“Este trabalho me propiciou perceber que quando temos vontade de aprender
chegamos onde queremos, pois somos cidadãos pensantes e donos do nosso
futuro”. Ao analisar o depoimento, percebi os benefícios de criar na sala de aula um
espaço de troca onde cada um podia revelar suas descobertas e fazer
questionamentos sem medo da crítica. Isso propiciou aos mesmos aumento em sua
auto-estima, gerando um novo cidadão que através de suas idéias pode interferir e
dar um novo rumo para sua vida.
“Nunca pensei que debatendo com os colegas poderia aprender tanto, achava
que na escola com o professor poderíamos aprender.” Fica evidenciada nesta
110
afirmação a importância de descentralizar a aprendizagem do papel do professor e
incentivar os alunos a assumirem-se agentes de sua aprendizagem, buscando
através da troca com os colegas subsídios para construção e reconstrução do
conhecimento. Conforme Tiba, “quem está sempre aberto ao novo saber presta
atenção às pessoas. Dispõe-se a ouvi-las e transformar qualquer oportunidade numa
possibilidade real de aprender.” (1998, p.50).
“Hoje percebo que estamos em constante aprendizado, sempre tem algo novo
para saber, esta lição vai além das dimensões desta sala, levo-as para a vida”,
evidencia-se que o conhecimento não termina e que todos de algum modo temos a
aprender, construir e reconstruir. Como diz Tiba, “quanto mais uma pessoa sabe,
mais descobre existir algo que ela gostaria de saber. Portanto, a sabedoria é um
contínuo aprender.” (1998, p.42).
A partir deste relato: “Quando podemos usar o que já conhecemos, nos
empenhamos mais. Quando interagimos com o meio que vivemos, fica mais fácil de
entender as coisas”, evidencia-se que quando conversamos com nossos alunos,
trabalhamos com seus anseios e ao partir do seu cotidiano possibilitamos uma aula
mais agradável, dinâmica e criativa, fazendo com que os mesmos se engajem no
processo ensino-aprendizagem. Pois, como diz Tiba: “o aluno o consegue
aprender aquilo que não entende, assim como não pode engolir pedaços maiores do
que a sua garganta permite passa” (1998, p.3).
Para que ocorra essa nova visão no processo de ensino-aprendizagem, é
fundamental que os educadores reavaliem o papel da escola. É importante que as
ações educacionais viabilizem a descoberta e a troca, visando não somente a
111
construção do conhecimento, como também a construção das relações humanas. É
necessário também que se supere o autoritarismo e a aula copiada. Para tal, é
fundamental valorizar e partir do que o aluno conhece do mundo, assim como é
importante que se utilize o trabalho em grupo como modo de socializar e construir
novos saberes, através da pesquisa como forma se buscar conhecimento para os
desafios.
Se educadores e educandos estiverem dispostos a desbravar caminhos ainda
não trilhados possivelmente encontrarão barreiras a serem ultrapassados, mas em
contrapartida uma caminhada que perpassa por muitas subidas e decidas, e onde,
ao final, geralmente encontra-se uma linda paisagem que certamente estará viva em
nossa memória até o final de nossa existência.
112
6.3 Síntese do capítulo
Novo caminho para reconstruir o
processo de ensino aprendizagem
Valorizar o diálogo e a
linguagem gerou:
Investir na pesquisa
possibilitou
Descentralizar
aprendizagem
implicou:
Alunos motivados a
novas descobertas
A possibilidade de
construir as
relações sociais
Possibilitou a
socialização do
conhecimento
Aprender com as
diferenças
Criar em vez de
apenas copiar
Fazer ligações entre o
cotidiano e o
conhecimento
científico
Olhar crítico ao que lê
e ao que ouve
Segurança na
argumentação
Passagem de objeto a
sujeito
Capacidade de
buscar soluções para
seus problemas
Espaço igualitário
para falar e ser ouvido
Construção da
autonomia
Mudanças na concepção doa alunos quanto
ao papel da escola, do processo de ensino e
aprendizagem
113
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A sabedoria é um contínuo aprender.
Tiba
Percebo que a repercussão de uma proposta de ensino-aprendizagem que
parte do cotidiano dos alunos tornou-se uma discussão e uma reflexão sobre a
escola enfocando três aspectos: a necessidade de conhecer os sujeitos e fazê-los
se conhecer, os benefícios gerados na construção do conhecimento e das relações
sociais e a necessidade de reformular a escola atual para contribuir de forma efetiva
no processo de ensino-aprendizagem.
Como diz Tiba, “ensinar é um gesto de generosidades, humanidade e
humildade”. (TIBA, 1998, p.61). Humildade de reconhecer que não somos detentores
de todo o conhecimento, generosidade de reconhecer que com o outro também
aprendemos e humanidade por perceber o aluno como parceiro, não como
propriedade. Considero que se optarmos em formar cidadãos, e não robôs
desprovidos de sentimentos e conhecimento, devemos ter presente esta
triangulação no dia-a-dia da sala de aula.
Posso afirmar que não há como educar sem conhecê-los, sem buscar através
de suas necessidades significado para suas aprendizagens.
114
Trabalhar com o cotidiano é escutar o aluno e procurar entender suas
necessidades. É construir a partir da sua leitura do mundo novos caminhos num
processo permanente de aprendizagens.
O diálogo constitui papel fundamental na construção das relações sociais. A
cordialidade do relacionamento do educador com os alunos e destes entre si
posibilita a criação de um clima tranqüilo e ao mesmo tempo desafiador que
favorece o engajamento de todos nas atividades propostas.
Grillo diz que “dialogando o ser humano toma consciência de sua situação, de
seus limites e fragilidades e sabe que se fortifica ao se ligar a um grupo,
constituindo-se em comunidade; é a dupla perspectiva, do individual e coletivo”
(1996, p.120)
Além disso, os educandos percebem que a construção do conhecimento
depende deles, reconhecendo que a apropriação de novos conhecimentos permitirá
a superação dos limites impostos pelas suas condições reais de vida.
Esta investigação mostrou que devemos incentivar os alunos a participar
efetivamente do processo de ensino e aprendizagem. Portanto, priorizar aulas que
utilizem a pesquisa como forma de trabalho, atividades em grupo para estimular a
discussão e socialização em grupo são maneiras de auxiliar na formação de sujeitos
autônomos. É mostrar a eles que pode mais quem sabe mais e isso faz a diferença
na vida.
Quanto à construção do conhecimento numa proposta que parte do cotidiano,
ela possibilita que os alunos tenham a oportunidade de (re)aprender através da
115
prática e não submeter-se a um “modelo” onde meramente reproduzem o que seus
comandantes solicitam.
Constato que a proposta de ensino-aprendizagem aqui descrita e investigada
propicia a formação de sujeitos autônomos. Formar cidadãos autônomos e mostrar
aos educandos que eles podem e devem interferir na aquisição de seu
conhecimento é promover mudanças em suas concepções de escola, de vida e de
prioridades. É posicionar-se frente aos desafios sem medo de expressar-se, seja
através da fala ou da escrita. É reivindicar um mundo melhor e lutar por esse mundo.
Este é, sem dúvida, uma das tarefas da Educação: formar sujeitos capazes de lutar
por seus sonhos e ideais.
Logo, concluo que para que ocorra a construção da autonomia é necessário:
Superar o autoritarismo por parte dos professores, a fim de que alunos e
educadores caminhem juntos na construção da aprendizagem.
Reorganizar o currículo afim de que as ações pedagógicas possibilitem o
criar, sentir, conviver, conhecer, construir e reconstruir.
Alicerçar o conhecimento a partir do cotidiano dos alunos para que através da
sua linguagem se construa ou reconstrua outros saberes.
Utilizar a pesquisa para que os educandos possam encontrar caminhos para
solucionar problemas.
Descentralizar a aprendizagem do papel do professor, afim que os alunos
tenham reais condições de participar do processo de ensino e aprendizagem.
116
Investir na linguagem dos alunos buscando que os mesmos assumam suas
vozes no processo e aprendizagem.
Possibilitar a construção das relações sociais criando na sala de aula um
espaço democrático e respeito mútuo
Partir do cotidiano para motivá-los afim de que se envolvam efetivamente nas
situações de aprendizagem.
Nesta nova escola as aulas não podem ser somente as que os professores
julgam importantes. Nela o aluno é prioridade, seus conhecimentos prévios são
respeitados e aproveitados para gerar novos conhecimentos. Quando falo em partir
do que os alunos conhecem, não significa gerar apenas um conhecimento
superficial, é partir do simples para atingir o complexo.
É também relevante não esquecer que “aprende-se participando,
enfrentando-se situações complexas, singulares e divergentes” (GRILLO, 1996, p.
120). Portanto, esta é a escola que defendo: uma escola onde todos se respeitam e
constroem suas aprendizagem de uma maneira lida e duradoura, mas não
definitiva, pois sempre temos a aprender e ensinar.
Ao chegar ao final desta caminhada, encontramos uma bela paisagem. Por
alguns segundos ficamos quietos olhando o horizonte. O dia estava límpido,
escutávamos os pássaros, mas aos poucos, observando ao redor percebemos que
existiam novos caminhos e que estes levavam a outros, num incansável caminhar.
117
Assim é a educação, cheia de caminhos. Nela nenhuma trilha é definitiva,
pois sempre temos algo novo para conhecer.
116
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CD-ROM. Apresentação Oral. p.2.
122
APÊNDICES
123
APÊNDICE A – Primeiro instrumento de pesquisa inicial (documento em branco)
Escola Estadual de Ensino Médio Agrônomo Pedro Pereira
Educação de Jovens e Adultos – EJA.
Nome:_______________________________ Turma:________
Responda as questões abaixo:
O que levou você a voltar a estudar?
_________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
Qual o papel da escola para você?
_________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
______________________________________________________________
Obrigada, sua opinião é importante.
Prof: Iana Audino
124
APÊNDICE B - Segundo instrumento pós-pesquisa realizada (documento em
branco)
Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Agrônomo Pedro Pereira
Responda as questões abaixo:
1. Esta atividade de aula foi elaborada de acordo com os conhecimentos
de vocês. Como vocês se sentiram ao longo deste processo?
2. Qual a importância para você de participar desta proposta de trabalho?
3. Você considera ter participado mais das aulas trabalhando desta
maneira? Explique:
4.
Você preferiu trabalhar deste modo ou preferia que o professor
explicasse e somente desse exercício? Explique:
5. Você conseguiu estabelecer relações com outras disciplinas
trabalhando deste modo? Explique:
6. Descreva os pontos positivos e negativos da proposta realizada.
Justifique:
Obrigada, sua opinião e participação são muito importantes.
Prof Iana Audino.
125
APÊNDICE C - Terceiro instrumento de pesquisa pós-aplicação da proposta
realizada em sala de aula
Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Agrônomo Pedro Pereira
Educação de Jovens e Adultos- EJA
Leia atentamente e responda:
Ao iniciar o ano fiz a vocês duas perguntas. Uma delas se referia ao que
vocês consideravam que era o papel da escola.
Após este
tempo de vivência de sala de aula e a proposta que vocês
participaram, pergunto novamente:
Para vocês qual o papel da escola?
______________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
Obrigada, sua opinião é muito importante.
Prof. Iana Audino
126
ANEXOS
127
ANEXO ALevantamento de idéias do primeiro instrumento de pesquisa
O retorno à escola
1.0 A necessidade de buscar um futuro melhor para minha família fez com
que eu retornasse.
2.2 A falta de oportunidade de trabalho me fez voltar.
3.1 Voltei a estudar para não perder o emprego, estava ficando para trás.
4.0 Para melhorar de vida! Hoje entendo a necessidade de estudar.
5.1 Para saber mais e aprender o que não sei.
11.1 Estou aposentado! A necessidade me tirou da escola, mas agora que
tenho tempo, resolvi voltar.
11.3 Para ter um diploma.
14.1 Para provar para mim mesmo que, apesar da idade, eu ainda posso
aprender.
10.3 Para auxiliar meus netos! Eles têm dúvidas e eu queria poder ajudá-los.
A concepção inicial de escola
1.1 A função da escola é ensinar, dar informação.
2.0 A função da escola é passar para o aluno o que ele não sabe.
3.0 É fazer com que agente decore para aprender.
128
4.1 Na escola, o professor deve colocar o assunto a ser trabalhado, e nós
devemos escutar por que estamos aprendendo.
5.0 O papel da escola é ensinar. Nós copiamos do quadro para aprender
7.7 O professor deve colocar o assunto a ser trabalhado, e nós devemos
escutar por que assim estamos aprendendo.
16.4 Antes achava que para aprender na escola era copiar do quadro e
escutar o professor
129
ANEXO B Levantamento de idéias do primeiro instrumento de pesquisa s-
aplicação da proposta em sala de aula
A importância de investir no cotidiano
1.3 Quando realmente podemos utilizar o que conhecemos em sala de aula,
aprendemos melhor. Afinal estamos aqui para aprender!
2.1 A aula torna-se mais prazerosa quando podemos relatar nossas
experiências.
4.2 Aos poucos estou perdendo o medo de falar, pois os colegas escutam
minhas experiências de vida sem questionar se está certo ou errado. Isso faz com
que não tenha medo. Afinal estamos aqui para aprender. Isso faz com que nõa
tenha medo.
3.4 Quando temos a possibilidade de comparar o que conhecemos da vida
com o que está escrito nos livros, aprendemos melhor.
17.1 Quando podemos usar o que conhecemos, nos empenhamos mais.
Quando interagimos com o meio que vivemos, fica mais fácil de entender as coisas
O trabalho em grupo
4.2 O debate é importante! Aprendemos que o trabalho em grupo nos faz
crescer como ser humano, pois temos a oportunidade de aprendermos com o outro.
130
5.2 Quando trabalhamos em grupo sentimo-nos mais fortes e amparamos.
Isto nos dá confiança para perguntar e defender nossos pontos de vista. Esta
confiança nos auxilia em nosso aprendizado.
1.7 O trabalho em grupo nos proporciona sermos mais do que colegas, mas
sim parceiros.
10.2 Com o trabalho em grupo aprendemos que é importância falar, mas
também ouvir.
12.3 Não gostei muito de trabalhar em grupo, é difícil conviver com as idéias
de outras pessoas.
10.7 Achei muito complicado, cada um pensa de um jeito diferente.
5.8 Trabalhar em grupo é difícil, pois nem todo mundo trabalha no mesmo
ritmo.
3.9 No início era difícil, ficava irritada com a professora que parecia que não
queria ajudar. Em vez de dar as respostas fazia outras perguntas, ficava louca! Com
o passar do tempo percebi que dependia de mim. Então corri atrás, pesquisava
até descobrir o que queria. Hoje não fico esperando por ninguém, sei que se não
lutar por uma vida melhor, ninguém o fapor mim. Assim é na escola, depende de
nós.
9.9 O trabalho em grupo fez com que percebêssemos que quando existe
troca há construção de conhecimento
131
Pesquisa
18.2 Ao pesquisar nos livros, encontramos um parceiro que nos ajuda a
buscar o conhecimento e a desenvolver a capacidade de encontrar ajuda para
formular nossas próprias respostas.
19.4 Ao pesquisar assumi um olhar mais crítico ao que os outros me diziam
20.1 Ao pesquisar, conseguimos fazer ligações, isto facilita o aprendizado.
Percepções da proposta
18.1 Este trabalho me propiciou perceber que quando temos vontade de
aprender chegamos onde queremos, pois somos cidadãos pensantes e donos do
nosso futuro.
17.4 Nunca pensei que debatendo com os colegas poderia aprender tanto,
achava que na escola só com o professor poderíamos aprender.
15.2 Hoje percebo que estamos em constante aprendizado, sempre tem algo
novo para saber, esta lição vai além das dimensões desta sala, levo-as para a vida.
132
ANEXO C – Levantamento de idéias do segundo instrumento pós-aplicação da
proposta realizada em sala de aula
Uma nova concepção de escola
1.3 Antes achava que para aprender na escola era copiar do quadro e
escutar o professor. Hoje percebo que devemos falar e usar tudo que está a nossa
volta, por isso copiar só não adianta.
2.1 Agora percebo que a aprendizagem é uma troca conhecimento. É
importante buscar, decorar não adianta
3.3 Agora participamos, mostramos nossas dúvidas sem ter medo, por que a
escola é lugar para crescer.
5.3 Percebo que nos dias de hoje a gente tem liberdade podendo até pedir
para estudar algo de acordo com as nossas necessidades.
7.1 O professor incentiva a gente a buscar e pior se nos interessarmos
aprendemos mais.
8.0 Agora somos um multiplicador de informações, às vezes aluno e às vezes
professor.
9.3 Quando podemos usar o que já conhecemos, nos empenhamos mais.
16.1 Quando interagimos com o meio em que vivemos, fica mais fácil de
entender as
coisas
20.2 Hoje o professor incentiva a gente a buscar e pior se nos interessarmos
aprendemos mais
133
21.8 Agora participamos, argumentamos, mostramos nossas dúvidas sem ter
medo, porque a escola é lugar para crescer, não adianta somente escutar, é preciso
aprender a falar.
21.3 Hoje percebo que devemos falar e usar tudo que está a nossa volta, por
isso copiar só não adianta.
18.7 Nos dias de hoje a gente tem liberdade podendo até pedir para estudar
algo de acordo com as nossas necessidades, antes a gente tinha medo de perguntar
134
ANEXO D - Justificativas referente ao questionamento dos conteúdos a ser
trabalhados anteriormente a realização da pesquisa
11.0 Não entendo meus extratos bancários, acho que está sempre faltando
dinheiro.
14.9 Queria entender melhor os juros, nunca sei quando é melhor pagar a
vista ou comprar a prazo.
13.10 Fico louca quando o médico me manda dar remédio aos meus filhos,
não compreendo as quantidades que a bula traz, fico com medo de machuca-los.
12.9 Não entendo nada daqueles gráficos que tem no jornal. Para que serve
aquilo?
Observações sobre a construção das categorias presentes no capítulo 6.
A partir das idéias aqui levantadas e descritas surgiu a categoria conhecendo
o sujeito ao longo do processo, para está foram utilizadas as idéias sobre: o retorno
à escola presente no anexo a e as justificativas dos alunos presente no anexo d.
Para a segunda categoria a caminhada e suas subcategorias foram utilizadas
as demais idéias presentes nos anexos a, b e c.
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