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indivíduos, representando diferentes reações às mesmas situações, ou diferentes técnicas para alcançar os
mesmos fins. (Certa pessoa viaja a cavalo, fazendo o mesmo percurso que outra prefere realizar em carroça;
certa pessoa sente-se tremendamente ofendida se alguém faz "crítica" a um defeito físico seu, enquanto outra
se comporta resignadamente face a tais críticas; etc.)
É esta zona de Alternativas que permite à cultura crescer e acomodar-se aos avanços de
uma civilização. Evidentemente, quanto maior for o entrechoque com culturas diversas, maior será a
possibilidade de adoção de novas Alternativas, por parte dos membros de uma sociedade.
Quando a cultura de determinado povo é invadida por novos hábitos e novas idéias, duas
coisas podem ocorrer: se o patrimônio tradicional dessa cultura é coerente e forte, a sociedade só tem a lucrar
com o referido contato, pois sabe analisar, escolher e integrar em seio aqueles traços culturais novos que,
dentre muitos, realmente sejam benéficos à coletividade; se , porém, a cultura invadida não é predominante e
forte, a confusão social é inevitável: idéias e hábitos incoerentes sufocam o núcleo cultural, desnorteando os
indivíduos, e fazendo-os titubear entre as crença e valores mais antagônicos. Quem mais sofre com essa
confusão social - acentua o sociólogo Donal Pierson - são as crianças e os adolescentes, os responsáveis pela
sociedade do porvir.
Crescendo nessas circunstâncias, a criança não sabe como agir, não é capaz de assumir, em
seu espírito, qualquer expectativa clara de comportamento. E assim se originam, entre outros, os problemas
da delinqüência juvenil, resultados de uma desintegração social.
Pois bem. Devido ao surto surpreendente do maquinismo em nossos dias, bem como da
facilidade de intercâmbio cultural entre os mais diversos povos, observa-se que o núcleo das culturas locais
ou regionais vai se reduzindo gradativamente, a ponto de se ver sufocado pela zona das Alternativas. E a
fluidez naturalmente se acentua, à medida que as sociedades mantêm novos contatos com traços culturais
diferentes ou antagônicos, introduzidos por viajantes ou imigrantes, ou difundidos por livros, imprensa,
cinema, etc. Nossa civilização, antes alicerçada num núcleo sólido e coerente, transformou-se numa
variedades de Alternativas, entre as quais o indivíduo tem que escolher.. Sem ampla comunidade de hábitos e
de idéias, porém, os indivíduos não reagem com unidade a certos estímulos, nem podem cooperar
eficientemente. Daí os conflitos de ordem moral que afligem o indivíduo, fazendo atarantar-se sem saber
quais as opiniões e os valores que merecem acatamento.
Essa insegurança reflete-se imediatamente na sociedade como um todo e,
consequentemente no Estado, pois, conforme ensina Ralph Linton "embora os problemas de organizar e
governar Estados nunca tenham sido perfeitamente resolvidos, uma coisa parece certa: se os cidadãos
tiverem interesses e culturas comuns, com a vontade unificada que daí advém, quase qualquer tipo de
organização formal de governo funcionará eficientemente; mas se isso não se verificar, nenhuma elaboração
e padrões formais de governo, nenhuma multiplicação de lei, produzirá um Estado eficiente ou cidadãos
satisfeitos".
b) O DESAPARECIMENTO DOS "GRUPOS LOCAIS"
As duas unidades mais sociais mais importantes, como transmissoras de cultura, são a
"família" e o "grupo local". Através dessas duas unidades, o indivíduo recebe, com maior intensidade, a sua
"herança social".
São exemplos de "grupo local", em nossa sociedade, o "vizindário" ou "pago" das
populações rurais, bem como as pequenas vilas do interior, ou ainda (um exemplo do passado) os bairros
com vida própria das cidades de há alguns anos atrás.
Por "grupo local" entende-se o agregado de famílias e de indivíduos avulsos que vivem
juntos em certa área, compartilhando hábitos e noções comuns.
Embora não tenha organização formal (como o distrito ou o município), o "grupo local" é a
unidade social autêntica. O "pago", por exemplo, influencia a vida dos seus membros, estabelece limites à
vida social (quais as famílias que podem ser convidadas para as festas) , mantém elevado grau de cooperação
entre os indivíduos, pois todos devem se auxiliar (antigos trabalhos de puxirão) e cada qual tem consciência
desse dever de auxílio mútuo. O Indivíduo conhece perfeitamente os costumes e os princípios morais
instituídos pelo seu "pago"; além disso, há um conhecimento íntimo entre os membros de um mesmo "pago"
(conhecem-se até os animais objetos pertencentes aos vizinhos). Todas essas circunstâncias influem para que
o "grupo local" se constitua numa potente barragem para as transgressões à ordem pública ou à moral (furto,
sedução, adultério, etc.). Ademais, embora não tenha um
meio de reação formal(como a polícia), o "grupo
local encerra grande força punitiva, através de medidas como a perda de prestígio, o ridículo, o ostracismo.
Certamente já depreendemos, então, a grande importância de que se reveste o "grupo local" para assegurar a
normalidade da vida comum, segundo os padrões culturais instituídos pelo grupo.
Acresce notar o seguinte: o integrar-se a um "grupo local" constitui verdadeira
NECESSIDADE PSICOLÓGICA para o indivíduo normal. Este precisa de uma unidade social coesa, maior