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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE CIÊNCIAS BÁSICAS DA SAÚDE
DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA
EXPRESSÃO GÊNICA DE bcl2, RECEPTOR DE ESTRADIOL E RECEPTORES
DE PROGESTERONA A E B EM ENDOMÉTRIO EUTÓPICO E ECTÓPICO DE
PACIENTES INFÉRTEIS SEM E COM ENDOMETRIOSE
Sheila Bünecker Lecke
Orientadora: Profa. Dra. Poli Mara Spritzer
Co-orientadora: Profa. Dra. Débora Martinho Morsch
Dissertação apresentada ao curso de pós-
graduação em Ciências Biológicas: Fisiologia,
UFRGS, como requisito parcial para a obtenção
do título de Mestre em Ciências Biológicas:
Fisiologia.
Porto Alegre, 2006.
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Livros Grátis
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2
Dedico esta dissertação ao Prof. Dr. Geraldo Attilio D’Carli.
Muito obrigada, professor, por ter me contagiado com o
seu entusiasmo pela vida acadêmica e científica.
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3
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, a Deus.
Agradeço a minha família pelo estímulo e apoio constantes, pela confiança, pela
amizade e pelo amor. Pai e mãe, obrigada pelo exemplo de vida.
Agradeço ao meu amor, Cristiano, por estar sempre presente. Obrigada pela
compreensão e paciência, pela amizade e amor sinceros, e pelo abrigo nas horas
difíceis.
Agradeço ao Prof. Dr. Francisco Lhullier pela orientação em busca de meus
interesses acadêmicos e pelo constante assessoramento profissional.
Agradeço à Profa. Dra. Ilma Simoni Brum da Silva pelo estímulo, pela amizade e
pelas certeiras contribuições a este trabalho.
Agradeço às Profa. Dra. Maria Flávia Ribeiro e Profa. Dra. Renata Menezes
Rossat pelo meu “amadurecimento acadêmico”.
Agradeço à Profa. Dra. Maria Beatriz Kohek pelo apoio e pela amizade.
Agradeço ao Dr. César Villodre pelo apoio e pela companhia no laboratório.
Agradeço aos professores Adriane Pozzobon e Rafael Bueno Orcy pelo auxílio,
pela compreensão e pela amizade ao longo destes anos.
Agradeço aos colegas Ana Luiza Ferrari, Antônio Azambuja Miragem, Lolita
Schneider e Vivian Treischel pelo estímulo e pela amizade.
Agradeço ao colega e amigo Vanderlei Biolchi pelos estudos de última hora, pela
parceria, pelo espírito de garoto sempre buscando um sorriso no meu rosto.
Agradeço, particularmente, à colega e amiga Simone Radavelli pela sincera
amizade que criamos a partir desta jornada. Obrigada Simone, além do apoio e do
estímulo, pelo carinho e pela disponibilidade sempre singulares.
Agradeço aos alunos Diego Pianta, Gisele Branchini, Gustavo Kich Brondani,
Juliana Vieira e Polyana Sartori Maier pelo agradável convívio e pela companhia em
muitos experimentos.
4
Agradeço a Miriam Sant’Helena pela disponibilidade e pela atenção durante este
período.
Agradeço a Idelma Oliveira Pithan e Iracema Vera Soares (in memoriam) pela
incansável dedicação no preparo específico dos materiais para os experimentos e na
manutenção do laboratório. Obrigada Idelma, pelo carinho e amizade sinceros.
Agradeço às supervisoras e aos colegas de profissão pela incessante
compreensão e pelo apoio no alcance desta jornada. Obrigada, particularmente, ao
Prof. Dr. Carlos Franco Voegeli pela oportunidade de dividir minha dedicação entre a
atividade profissional e a formação acadêmica de Pós-Graduação, Mestrado.
Agradeço aos responsáveis pela Unidade de Reprodução Humana do Hospital
de Clínicas de Minas Gerais e ao Instituto Biocor do Brasil que possibilitaram a
coleta de material, imprescindível para realização deste trabalho. Outrossim, à
equipe da Unidade de Reprodução Humana do Hospital de Clínicas de Minas Gerais
que realizou a extração e quantificação do RNA total destas amostras.
Agradeço à coordenação e à comissão do curso de Pós-Graduação em Ciências
Biológicas: Fisiologia pela atenção, pelo auxílio e pela disponibilidade demonstrados.
Agradeço pelo privilégio de realizar minha formação de Pós-Graduação,
Mestrado, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Finalmente, agradeço a duas pessoas especiais e fundamentais para
concretização deste sonho.
Primeiramente, agradeço à Profa. Dra. Poli Mara Spritzer pelo exemplo
profissional e humano. Obrigada Dra. Poli Mara, pela intensa dedicação, pela
compreensão, pelo estímulo, pela confiança. Agradeço por ter acreditado e apostado
em mim, desde o início quando chegada de outra universidade. Obrigada por deixar
que sua equipe também se tornasse parte de minha família.
Sou grata também à Profa. Dra. Débora Martinho Morsch, com a qual aprendi
várias das técnicas desenvolvidas em nosso laboratório e utilizadas neste projeto.
Obrigada Débora, pela amizade sincera, pelo apoio e atenção, pela compreensão
nos momentos difíceis e pela alegre convivência. Foi um privilégio ter trabalhado
contigo.
5
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS.................................................................................................03
RESUMO....................................................................................................................07
ABSTRACT................................................................................................................09
LISTA DE ABREVIATURAS.......................................................................................11
LISTA DE FIGURAS...................................................................................................14
LISTA DE TABELAS..................................................................................................16
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................17
1.1 O Endométrio.....................................................................................................17
1.2 O Ciclo Menstrual Feminino..............................................................................18
1.3 A Endometriose.................................................................................................22
1.4 A Endometriose como doença multifatorial.......................................................26
1.4.1 Aspectos Genéticos...................................................................................26
1.4.2 Aspectos Hormonais..................................................................................27
1.4.2.1 Receptores Hormonais......................................................................30
Receptores de Estrogênio (ER).........................................................32
Receptores de Progesterona (PR).....................................................34
1.4.3 Aspectos Imunológicos..............................................................................37
1.4.3.1 B cell lymphoma/leukemia 2 (bcl2)....................................................39
1.5 OBJETIVOS.......................................................................................................41
1.5.1 Objetivo Geral..............................................................................................41
1.5.2 Objetivos Específicos...................................................................................41
2 MATERIAIS E MÉTODOS.......................................................................................42
2.1 Delineamento do estudo....................................................................................42
2.2 Obtenção das amostras de tecido endometrial.................................................42
2.3 Avaliação da expressão gênica por RT-PCR....................................................43
2.3.1 Extração e quantificação do RNA total........................................................43
2.3.2 Síntese do cDNA.........................................................................................43
6
2.3.3 Protocolo geral da PCR...............................................................................44
2.4 Padronização das PCR.....................................................................................47
2.4.1 Padronização da PCR para PR-A................................................................48
2.4.2 Padronização da PCR para PR-B................................................................50
2.4.3 Padronização da PCR para β
2
m (165 pb) ..................................................52
2.5 Análise Estatística.............................................................................................55
2.6 Considerações Éticas........................................................................................55
3 RESULTADOS........................................................................................................56
4 DISCUSSÃO...........................................................................................................64
5 CONCLUSÕES.......................................................................................................70
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................71
7
RESUMO
A endometriose caracteriza-se pela presença de tecido endometriótico –
glândulas e estroma – fora da cavidade uterina. A doença acomete superfícies
peritoniais da pélvis, ovários e septo rectovaginal, sendo mais comum a
endometriose pélvica. Embora os dados sobre a prevalência exata de endometriose
sejam incertos, as evidências indicam uma prevalência em torno de 5 a 10% das
mulheres em idade reprodutiva. Dor, dismenorréia, dispareunia e infertilidade são
sintomas freqüentes da doença. Além de apresentar dependência aos hormônios
sexuais, a endometriose está associada a um conjunto de desordens de diferentes
etiologias, sendo considerada uma doença multifatorial de caráter genético e imune.
Neste sentido, a carência de respostas imunológicas adequadas, aliada a um
provável desequilíbrio entre os processos de proliferação e apoptose celular, pode
ter um papel importante na instalação e manutenção das lesões endometrióticas. O
objetivo deste trabalho foi caracterizar a expressão de genes relacionados aos
processos de proliferação e diferenciação celular em implantes endometrióticos e
endométrio eutópico de mulheres inférteis sem e com endometriose, através da
análise semiquantitativa por RT-PCR. Foram estudadas 34 pacientes consultando
por infertilidade e submetidas à laparoscopia diagnóstica. Quinze pacientes (31,7 ±
1,5 anos) apresentavam endometriose e 19 (32,9 ± 0,9 anos) foram consideradas
controles inférteis sem endometriose. Os dois grupos apresentaram IMC e SHBG
similares. As biópsias de endométrio foram realizadas, em fase folicular, nas
pacientes do grupo controle (C) e nas pacientes com endometriose (endométrio
eutópico (EUT) e ectópico (ECT)). A presença do mRNA para os receptores de
estrogênio e progesterona detectada nos 3 grupos estudados, sustenta a existência
de sensibilidade tecidual local aos hormônios sexuais. Nas condições experimentais
do presente estudo não foi observada diferença estatística na expressão gênica de
bcl2 entre os grupos. A expressão do gene do ER
α
endometrial também foi similar
8
entre os grupos controle, eutópico e ectópico. Contudo, o endométrio ectópico
apresentou níveis de mRNA mais elevados para PR-A (0,84 ± 0,02 UA) em relação
aos grupos controle e eutópico (0,60 ± 0,04 UA e 0,63 ± 0,04 UA; p < 0,05). A
expressão gênica do PR-B não foi estatisticamente diferente entre os grupos do
presente trabalho. Porém, houve forte correlação negativa entre a expressão dos
genes bcl2 e PR-B nas amostras de endométrio sem e com endometriose (r = -
0,795 e p = 0,018), sugerindo que um papel anti-proliferativo do PR-B possa ser
operativo neste modelo de estudo.
9
ABSTRACT
Endometriosis is characterized as the presence of endometrial glands and stroma
outside of the uterine cavity. The disorder attacks the surfaces on the pelvic
peritoneum, ovaries and rectovaginal septum, been commonly the pelvic
endometriosis. Although the exact prevalence remains uncertain, 5 to 10% of women
of reproductive age are estimated to have endometriosis. Pain, dysmenorrhea,
dyspareunia and infertility are frequent symptoms of the disorder. Endometriosis is a
hormonal-dependent disease and has been considered as a multifactorial disorder
with genetic and immune characteristics. Thus, changes on immunologic responses
associated to a potential disequilibrium between proliferative and apoptotic process,
seems to play a main role in the development and maintenance of the endometriotic
lesions. The aim of this study was to characterize the expression of genes related to
cellular proliferation and differentiation in endometriotic lesions and eutopic
endometrium from infertile women with and without endometriosis by RT-PCR
semiquantitative analysis. Thirty four patients consulting for infertility and submitted to
diagnostic laparoscopy were studied. Fifteen patients (31.7 ± 1.5 years old)
presented endometriosis and 19 (32.9 ± 0.9 years old) were considered as control,
free from the disease. Both groups presented similar BMI and SHBG. Endometrial
biopsies were collected during the follicular phase, from patients of the control group
(C) and those from the endometriosis group (eutopic (EUT) and ectopic (ECT)
endometrium). Estrogen and progesterone receptor gene expression was detected in
the 3 groups, supporting the existence of a local sensitivity to sexual hormones. No
statistical differences were observed in bcl2 gene expression between the groups.
The gene expression of ER
α
was also similar among control, eutopic and ectopic
groups. In turn, ectopic endometrium showed higher PR-A gene expression (0.84 ±
0.02 AU) than control and eutopic groups (0.60 ± 0.04 AU e 0.63 ± 0.04 AU; p <
0.05). The PR-B gene expression did not differ among the groups. However, a strong
10
and significant negative correlation between bcl2 and PR-B levels was demonstrated
in the endometrial samples from patients presenting or not endometriosis (r = - 0.795
and p = 0.018), suggesting that an anti-proliferative role of PR-B could be operating
trough this model of study.
11
LISTA DE ABREVIATURAS
β
2
m
β
2
-microglobulina
μg Microgramas
μL Microlitros
17βHSD-1
17β-hidroxiesteróide-desidrogenase tipo 1
17βHSD-2
17β-hidroxiesteróide-desidrogenase tipo 2
°C Graus Celsius
A Androstenediona
AINES Antiinflamatórios não esteroidais
AR Receptor de androgênios
ARO Aromatase
bcl2 B cell lymphoma/leukemia 2
cDNA Ácido desoxirribonuclêico complementar
COX-2 Ciclooxigenase-2
dATP Desoxi adenina trifosfato
dCTP Desoxi citosina trifosfato
DEPC Dietilpirocarbonato
dGTP Desoxi guanina trifosfato
DO Densidade óptica
DNA Ácido desoxirribonuclêico
dNTP Desoxinucleotídeos trifosfatos
DTT Ditiotreitol
dTTP Desoxi timidina trifosfato
E
1
Estrona
E
2
Estradiol
EBAF Fator de sangramento endometrial
E. coli Escherichia coli
12
EP Erro padrão da média
ER Receptor de estrogênios
ERα Receptor de estrogênios subtipo α
ERβ Receptor de estrogênios subtipo β
ERE Elemento responsivo ao estrogênio
FSH Hormônio Folículo-estimulante
GALT Galactose-1-fosfato-uridiltransferase
GnRH Hormônio de Liberação das Gonadotropinas
HCl Ácido clorídrico
HGB Fator de crescimento de hepatócitos
IMC Índice de Massa Corporal
KCl Cloreto de potássio
kDa Kilodaltons
LH Hormônio Luteinizante
M Molar
MgCl
2
Cloreto de magnésio
min. Minutos
mM Milimolar
MMP Metaloproteinase de matriz
mRNA Ácido ribonuclêico mensageiro
ng Nanograma
nm Nanômetros
P Progesterona
pb Pares de base
PCR Reação em cadeia de polimerase
PGE
2
Prostaglandina E
2
PHS
Pos-Hot-Start
PPARγ Receptor γ de proliferação dos peroxissomos
PR Receptor de progesterona
PR-A
Receptor de progesterona subtipo A
PR-B
Receptor de progesterona subtipo B
PRE Elemento responsivo à progesterona
RCQ Relação cintura/quadril
13
RNA Ácido ribonucléico
RPA
RNAse Protection Assay
RT-PCR
Reverse Transcriptase Polymerase Chain Reaction
s Segundos
SHBG Proteína Carreadora de Hormônios Esteróides
TIMP Inibidor tecidual de metaloproteinase
T Testosterona
U Unidades
UA Unidades arbitrárias
V Volts
VEGF Fator de crescimento do endotélio vascular
14
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Estrutura interna do útero......................................................................
Figura 2 – Fases do ciclo menstrual feminino.........................................................
Figura 3 – Fórmula química dos principais hormônios esteróides e suas
interconversões....................................................................................................
Figura 4 – Imagens de laparoscopia.......................................................................
Figura 5 – Teoria da menstruação retrógrada........................................................
Figura 6 – Endometriose: atividade local da aromatase e insensibilidade à
progesterona........................................................................................................
Figura 7 – Endometriose: inativação defeituosa de estradiol.................................
Figura 8 – Estruturas esquemáticas dos receptores hormonais ER e PR..............
Figura 9 – Representação esquemática dos receptores hormonais ER e PR........
Figura 10 – Homologia entre ER
α
e ER
β
...............................................................
Figura 11 – Estruturas esquemáticas dos receptores hormonais PR-A e PR-B.....
Figura 12A – Mecanismo molecular de ação do PR-B e do PR-A..........................
Figura 12B – Mecanismo molecular de ação do PR-A sobre o ER
α
......................
Figura 13 – Resposta imunológica na endometriose..............................................
Figura 14 – Representação esquemática da amostra............................................
Figura 15 – Padronização da PCR para determinação dos níveis de mRNA do
PR-A em tecido endometrial................................................................................
Figura 16 – Padronização da PCR para determinação dos níveis de mRNA do
PR-B em tecido endometrial................................................................................
Figura 17 – Padronização da PCR para determinação dos níveis de mRNA da
β
2
m (165 pb) em tecido endometrial.....................................................................
Figura 18 – Padronização da PCR para determinação dos níveis de mRNA da
β
2
m (165 pb) em tecido endometrial....................................................................
18
20
21
23
26
28
29
31
31
33
34
36
36
38
43
49
51
53
54
15
Figura 19 – Níveis do mRNA de bcl2 (B cell lymphoma/leukemia 2) avaliados
por RT-PCR em tecido endometrial.....................................................................
Figura 20 – Níveis do mRNA do ER
α
(receptor de estrogênios subtipo α)
avaliados por RT-PCR em tecido endometrial....................................................
Figura 21 – Níveis do mRNA de PR-A (receptor de progesterona isoforma A)
avaliados por RT-PCR em tecido endometrial.....................................................
Figura 22 – Níveis do mRNA de PR-B (receptor de progesterona isoforma B)
avaliados por RT-PCR em tecido endometrial.....................................................
Figura 23 – Correlação entre a expressão gênica de bcl2 e de PR-B....................
57
59
61
62
63
16
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Protocolo geral da PCR............................................................................45
Tabela 2 – Lista dos genes utilizados para realização da RT-PCR, seqüência dos
primers e tamanho dos fragmentos amplificados (pb).............................................46
Tabela 3 – Condições da PCR dos diferentes genes estudados...............................47
17
1 INTRODUÇÃO
Uma das causas mais comuns de infertilidade feminina é a endometriose e o
estudo da doença tem sido objeto de grande interesse e pesquisa nos últimos
quarenta anos. A endometriose caracteriza-se pela presença de tecido
endometriótico fora da cavidade uterina, podendo se manifestar desde a
adolescência até a menopausa.
1.1 O Endométrio
O endométrio é a camada interna do útero, renovada mensalmente pela
menstruação (Figura 1). É formado por epitélio e lâmina própria, contendo glândulas
tubulosas simples que, às vezes, ramificam-se em suas porções mais profundas até
o miométrio. O epitélio, além de revestir e proteger, secreta um muco de constituição
glicoprotéica. O tecido da lâmina própria é rico em células e apresenta grande
quantidade de material intercelular amorfo.
Sob ação dos hormônios ovarianos, produzidos por estímulo da hipófise anterior,
o endométrio sofre modificações estruturais cíclicas que constituem o ciclo
endometrial.
18
Figura 1 – Estrutura interna do útero. Adaptado de
www.eca.usp.br/nucleos/njr/voxscientiae/img/endo5.jpg
1.2 O Ciclo Menstrual Feminino
O sistema hormonal feminino é formado pela interação do eixo hipotálamo-
hipófise-ovários, responsável pela liberação dos seguintes hormônios:
Hormônio de Liberação das Gonadotropinas (GnRH): secretado pelos
neurônios hipotalâmicos;
Hormônio Folículo-estimulante (FSH) e Hormônio Luteinizante (LH):
hormônios da hipófise anterior, ambos secretados em resposta ao GnRH;
Hormônios Ovarianos (Estrogênio e Progesterona): secretados pelos ovários
em resposta aos dois hormônios hipofisários.
Estes hormônios não são secretados em quantidades constantes por todo o ciclo
menstrual feminino. Ocorrem taxas hormonais drasticamente distintas durante as
diferentes fases do mesmo.
Na mulher normal não-grávida, os ovários respondem pelo principal sítio de
biossíntese estrogênica; apesar de quantidades diminutas serem secretadas pelo
córtex das adrenais, tecido adiposo e pele. Destes tecidos extra-ovarianos,
especialmente o tecido adiposo e a pele respondem pelos níveis circulantes de
estradiol durante supressão ovariana e menopausa. A secreção ovariana de
19
estrogênios acontece de maneira cíclica, de acordo com as diferentes fases do ciclo
menstrual feminino (Figura 2).
À medida que o folículo dominante amadurece, sob influência do FSH, as células
de sua camada granulosa se replicam e proliferam, expressando níveis crescentes
da enzima aromatase (ARO). A ARO modula a atividade esteroidogênica local, visto
que promove a conversão de Androstenediona (A) em Estrona (E
1
) e de
Testosterona (T) em Estradiol (E
2
). As células da camada externa – teca – dos
folículos ovarianos em resposta ao LH, sintetizam os androgênios androstenediona e
testosterona a partir do colesterol. Estes androgênios difundem-se para as células
da granulosa, onde são biotransformados pela ARO.
20
Figura 2 – Fases do ciclo menstrual feminino. Adaptado de 164.41.57.42/node104.html.
21
Sendo assim, as células da teca contêm o maquinário necessário para síntese de
androgênios a partir de colesterol e as da granulosa expressam a ARO, convertendo
androgênios em estrogênios (Figura 3). O E
2
é o estrogênio biologicamente ativo. A
E
1
por sua vez, é convertida a E
2
pela enzima 17β-hidroxiesteróide-desidrogenase
tipo 1 (17βHSD-1) presente nas células da granulosa.
Figura 3 – Fórmula química dos principais hormônios esteróides e suas interconversões. StAR –
proteína reguladora da esteroidogênese; P450scc – enzima de clivagem da cadeia lateral; P450c17 –
17α-hidroxilase; 3β-HSD-2 – 3β-hidroxiesteróide-desidrogensase tipo 2; 17β-HSD-1 – 17β-HSD tipo
1; P450arom – aromatase. Adaptado de Attar & Bulun, 2006.
22
A progesterona (P) – de longe a mais importante das progestinas – é secretada
em quantidades significativas apenas durante a segunda metade do ciclo menstrual
feminino, pelo corpo lúteo (Figura 2 – Ciclo Ovariano). O corpo lúteo constitui-se de
um remanescente de células da granulosa e da teca após a expulsão do oócito do
folículo. A transformação das células da granulosa e da teca em células luteínicas é,
sobretudo, dependente do LH, sendo a luteinização das células da granulosa
também subordinada à extrusão do oócito.
Os estrogênios são potentes mitógenos para o endométrio, imprescindíveis para
manutenção da proliferação celular na primeira fase do ciclo – fase proliferativa.
Contrariamente, a progesterona inibe a ação mitogênica do estradiol sobre o
endométrio, favorecendo a diferenciação celular característica da segunda fase do
ciclo – fase secretora (Gurates & Bulun, 2003) (Figura 2 – Ciclo Endometrial). Estes
processos de proliferação e/ou diferenciação celular do endométrio são
acompanhados da indução de inúmeras proteínas e/ou citocinas (fatores de
crescimento, de transformação e de angiogênese, interleucinas, interferons) que
podem atuar de forma sinérgica, ou não, com os esteróides, mediando a ação
hormonal sobre a estrutura e a função endometrial. Enquanto os estrogênios atuam
como agentes pró-inflamatórios, a progesterona exerce uma potente resposta
antiinflamatória (Conneely & Lydon, 2000). De acordo, outros autores indicaram ser
a P, uma potente moduladora das respostas inflamatórias, capaz de induzir a
expressão de citocinas antiinflamatórias (Davies et al., 2004).
1.3 A Endometriose
A endometriose é caracterizada pela presença de tecido endometriótico –
glândulas e estroma – fora da cavidade uterina. A endometriose acomete superfícies
peritoniais da pélvis, ovários e septo rectovaginal, sendo mais comum a primeira
delas – a endometriose pélvica. Giudice & Kao, 2004 relatam casos raros da
patologia em pericárdio, pleura e até mesmo cérebro humano. Apesar de apresentar
natureza de tumor maligno pelo fato de crescer, infiltrar-se e aderir-se aos tecidos
adjacentes (Kitawaki et al., 2002), histopatologicamente é considerada uma doença
benigna.
23
Dor, dismenorréia, dispareunia e infertilidade são sintomas da doença. O
diagnóstico de suspeita da doença é feito através da história clínica, exame
ginecológico, ultra-som endovaginal e alguns exames laboratoriais. O diagnóstico
confirmatório da patologia, porém, só ocorre pelo exame anatomopatológico da
lesão ou biópsia para constatação da presença das lesões vasculares. Este pode
ser feito através de cirurgia, laparotomia, ou, preferivelmente, laparoscopia (Scarselli
et al., 2005; Ulrich & Keckstein, 2005). A laparoscopia é um procedimento cirúrgico,
geralmente realizado com anestesia geral, de exame e manipulação da cavidade
abdominal através de instrumentos de ótica e/ou vídeo, bem como de instrumentos
cirúrgicos delicados que são introduzidos através de pequenos orifícios no abdômen.
Para finalidades didáticas, a endometriose foi classificada em graus de I a IV.
Porém na prática, verifica-se que estes graus não refletem obrigatoriamente a
gravidade da doença ou suas chances de tratamento. Basicamente existem três
tipos distintos de lesões: as vermelhas, as escuras e as brancas. As primeiras
constituem os implantes endometrióticos mais recentes, onde é nítida a presença de
um endométrio funcionante, cíclico e ativo. As lesões escuras são áreas
inflamatórias em processos de remodelamento e necrose celular, onde há acúmulo
de debris e hemossiderina. As lesões brancas são as mais antigas, já densas e
fibrinosas (Figura 4).
Figura 4- Imagens de laparoscopia. (a) pélvis normal: OV – ovário; UT – útero; (b) múltiplas lesões
endometrióticas no peritônio: (i) lesões vermelhas, (ii) lesões escuras. Adaptado de Matarese et al.,
2003.
24
Embora os dados sobre a prevalência exata de endometriose sejam incertos, há
relatos de que a endometriose pélvica afete 15 a 20% das mulheres em idade
reprodutiva (Matarese et al., 2003). Outros estudos apontam uma prevalência em
torno de 5 a 10% (Kitawaki et al., 2002; Giudice & Kao, 2004) nesta população. Das
mulheres inférteis, 30 a 50% o são devido a esta patologia (Matarese et al., 2003;
Giudice & Kao, 2004).
Além de aliviar ou reduzir a dor, com o tratamento da endometriose pretende-se:
diminuir o tamanho das lesões; reverter ou limitar a progressão da doença; preservar
ou restaurar a fertilidade da paciente; e ainda evitar ou adiar a recorrência da
doença. Os tratamentos, na maioria das vezes caros, envolvem a administração de
androgênios, agonistas GnRH, progestinas e/ou contraceptivos orais. Entretanto, os
medicamentos para diminuir as concentrações circulantes de estrogênios não
podem ser usados continuamente pela paciente devido aos possíveis efeitos
adversos (como osteosporose e risco à doença cardiovascular) ou a pretensão de
gravidez. Neste último caso, o mais importante no tratamento da endometriose é o
planejamento das ações terapêuticas em comum acordo com o planejamento da
gravidez (Medicine, 2004). Novas drogas, algumas ainda em fase de avaliação,
outras em uso clínico, encontram-se desenvolvidas para o tratamento da
endometriose. Estes novos medicamentos incluem antagonistas da progesterona;
moduladores seletivos dos receptores de estrogênios e/ou de progesterona (ER e/ou
PR); agentes imunológicos; antiinflamatórios não esteroidais (AINES); inibidores de
angiogênese; inibidores da metaloproteinase de matriz (MMP) e, até mesmo,
agentes hipocolesterolêmicos (Chabbert-Buffet et al., 2005; Ferrero et al., 2005a;
Harris et al., 2005). Além destes, os inibidores da aromatase prometem ser a
intervenção farmacológica de escolha, quando associados a agonistas GnRH,
progestinas e/ou contraceptivos orais para as pacientes férteis (Bulun et al., 1999;
Zeitoun & Bulun, 1999; Bulun et al., 2000b; Ferrero et al., 2005a; Attar & Bulun,
2006). Muitas vezes como última alternativa para melhora da dor, as pacientes são
submetidas a cirurgias freqüentes; embora cirurgias repetidas são desaconselhadas
por aumentarem a chance de aderências peritoniais tão prejudiciais como a própria
doença. Cerca de 75% das pacientes apresentam recidiva dos sintomas dois anos
após a cirurgia (Giudice & Kao, 2004). A recorrência da detecção clínica da doença
parece ser maior quanto mais avançado o estágio da endometriose ao primeiro
diagnóstico (Parazzini et al., 2005). Também estão associados à doença riscos
25
aumentados ao desenvolvimento de câncer – ovários, mama e pele, entre outros –
enfermidades atópicas e desordens auto-imunes (Giudice & Kao, 2004). Salvo as
condições fisiopatológicas das mulheres afetadas pela endometriose a saúde
psicológica e emocional das mesmas também sustenta enorme relevância clínica. A
questão torna-se ainda mais difícil nas pacientes que apresentam a “síndrome” da
dor, manifestada por dismenorréia, dispareunia, defecação dolorosa e dor pélvica
crônica (Fauconnier & Chapron, 2005; Ferrero et al., 2005b).
Embora descrita pela primeira vez em 1860 por Rokitansky, a etiopatogenia da
endometriose permanece obscura. Existem várias teorias para desvendar a
patogênese da doença: menstruação retrógrada, metaplasia celômica e metástase
de um fragmento ou células de uma lesão a alguma superfície propícia.
A teoria mais aceita para o desencadeamento da doença é a da menstruação
retrógrada, postulada por Sampson em 1927 (Figura 5). Segundo esta, ocorre
refluxo do conteúdo menstrual – incluindo-se células endometriais – pelas tubas
uterinas até superfícies da cavidade peritoneal. O endométrio eutópico então invade
este ambiente, aderindo-se às membranas superficiais de órgãos adjacentes, onde
encontra condições sub-imunes e aporte sangüíneo favoráveis para o
desencadeamento e sobrevivência das lesões típicas da endometriose. Estudos
sugerem que a implantação ectópica do tecido endometrial requer uma resposta
angiogênica adequada, ou seja, o endométrio humano é capaz de emitir sinais
angiogênicos pelo ambiente que invade, causando a desestabilização da
vascularização local e a atração desta rede de vasos para o seu entorno, onde a
mesma é reestruturada (Groothuis et al., 2005). A presença de vários fragmentos de
endométrio eutópico e o aumento no volume do fluxo menstrual detectado em
pacientes com endometriose auxiliam na fundamentação desta teoria. Cerca de 80 a
90% das mulheres em idade reprodutiva apresentam refluxo menstrual; destas, 6 a
10% desenvolvem endometriose (Giudice & Kao, 2004; Groothuis et al., 2005).
26
Já o proposto pela metaplasia celômica explicaria a presença de endometriose
em mulheres amenorrêicas e em homens. Nesta teoria, células peritoniais sob ação
dependente de hormônios sexuais transformar-se-iam em epitélio tipo Mülleriano,
originando as lesões características da doença.
1.4 A endometriose como doença multifatorial
A endometriose está associada a um conjunto de desordens de diferentes
etiologias, sendo considerada uma doença multifatorial de caráter genético,
hormonal e/ou imune.
1.4.1 Aspectos Genéticos
A endometriose parece estar relacionada à herança genética, sendo descritos
genes candidatos ao desenvolvimento e progressão da doença. Além disso, há
tempo suspeita-se de que a endometriose esteja relacionada a uma tendência
familiar, visto que alguns estudos demonstram um aumento na freqüência da doença
entre parentes de primeiro grau especialmente quando considerada a linhagem
materna (Simpson, 2002; Simpson, 2005). Kao e colaboradores descrevem genes
que contribuiriam para a patogênese da endometriose e para os casos relacionados
de infertilidade, incluindo o gene da aromatase, do receptor de progesterona e de
Figura 5 – Teoria da menstruação
retrógrada. Modificado de Giudice &
Kao, 2004.
27
fatores de angiogênese; além de genes envolvidos nos processos de nidação,
toxicidade embrionária, disfunções imunes, respostas apoptóticas relacionados a
alterações da atividade mitótica do tecido e sobrevivência do endométrio ectópico
(Kao et al., 2003).
Há uma série de genes, e seus produtos, envolvidos na susceptibilidade e
prognóstico da doença: ARO; galactose-1-fosfato-uridiltransferase (GALT);
receptores de estradiol (ER), progesterona (PR) e androgênios (AR); gene supressor
de tumor p53 (Simpson, 2002; Giudice & Kao, 2004); fator de sangramento
endometrial (EBAF), de crescimento de hepatócitos (HGB), inibitório de leucemia e o
de crescimento do endotélio vascular (VEGF); metaloproteinase de matriz (MMP) e
inibidor tecidual de metaloproteinase (TIMP); receptor γ de proliferação dos
peroxissomos (PPARγ); 17βHSD; complemento C3; glutationa peroxidase; catalase;
trombospondina 1; integrinas e glicodelinas (Simpson, 2002; Giudice & Kao, 2004).
1.4.2 Aspectos Hormonais
A endometriose caracteriza-se por ser uma disfunção dependente de hormônios.
Além das células da granulosa dos folículos ovarianos, a enzima aromatase está
presente em outros tecidos: fibroblastos do tecido adiposo e da pele,
sinciciotrofoblasto placentário, ossos, endotélio vascular, musculatura lisa da aorta,
cérebro e nos implantes endometrióticos (Simpson et al., 1997; Gurates & Bulun,
2003). Está bem estabelecido o fato de o endométrio ectópico, ou seja, de os
implantes endometrióticos serem dependentes de estrogênios para sua manutenção
e crescimento.
Apesar da controvérsia sobre a presença da atividade da enzima aromatase no
tecido endometrial de mulheres sadias, para vários autores, o endométrio de
mulheres sem endometriose não expressa a ARO (Bulun et al., 1993; Bulun et al.,
1994; Noble et al., 1996; Kitawaki et al., 1997; Dheenadayalu et al., 2002; Gurates &
Bulun, 2003). O endométrio responde à ação hormonal pela presença local de
receptores hormonais específicos desigualmente expressos durante o ciclo
menstrual. Estudos comprovam a presença de ER e, inclusive, ARO no endométrio
ectópico, indicando que os implantes endometrióticos apresentam anormalidades
relacionadas à produção e/ou ação dos esteróides. Muitos autores descrevem
28
aberrante expressão de ARO no endométrio ectópico e, por conseguinte,
biossíntese local de E
2
(Bulun et al., 1993; Bulun et al., 1994; Noble et al., 1996;
Zeitoun & Bulun, 1999; Bulun et al., 2000a; Dheenadayalu et al., 2002; Kitawaki et
al., 2002; Gurates & Bulun, 2003; Huang et al., 2005; Morsch et al., 2006) –
incentivando a manutenção, crescimento e piora das lesões endometrióticas (Figura
6).
Figura 6 – Endometriose: atividade local da aromatase e insensibilidade à progesterona. E
1
– Estrona;
E
2
– Estradiol; 17β-HSD1 – 17β-hidroxiesteróide-desidrogenase tipo 1; 17β-HSD2 – 17β-HSD tipo 2;
ER – Receptores de estrogênio. Modificado de Kitawaki et al., 2002.
Além disso, na endometriose, acredita-se que ocorra resistência tecidual à ação
protetora e anti-estrogênica da progesterona (Zeitoun et al., 1998; Zeitoun & Bulun,
1999; Attia et al., 2000; Kitawaki et al., 2002; Gurates & Bulun, 2003). Para a
adequada diferenciação do endométrio durante a fase secretora do ciclo menstrual
feminino, a P promove a indução da enzima 17βHSD-2 e processos de “down-
regulation” dos ER. A 17βHSD-2 inativa o E
2
por catalisar sua conversão à E
1
,
esteróide biologicamente menos ativo (Figura 3). Bulun et al., 2000a, propõem que a
possível resistência tecidual à P observada na endometriose poderia explicar o fato
de muitas pacientes não responderem ao tratamento com progestinas, visto que esta
insensibilidade geraria uma deficiência da 17βHSD-2 e, conseqüentemente,
concentrações locais elevadas de E
2
(Figura 7). Ainda não existe um consenso a
respeito da atividade local da 17βHSD-2 na endometriose, visto que outros autores
29
descrevem aumento da enzima no tecido doente (Kitawaki et al., 2000; Kitawaki et
al., 2002).
Figura 7 – Endometriose: inativação defeituosa de estradiol. P – Progesterona; E
1
– Estrona; E
2
Estradiol; 17β-HSD type 1 – 17β-hidroxiesteróide-desidrogenase tipo 1; 17β-HSD type 2 – 17β-HSD
tipo 2. Adaptado de Bulun et al., 2000a.
A resposta tecidual, frente a diferentes hormônios sexuais, verificada no
endométrio, deve-se à presença de receptores específicos. Portanto, o E
2
e a P
atuam sobre o endométrio basicamente pela ligação a receptores próprios. A
expressão local dos receptores de estrogênio (ER) e de progesterona (PR) é
regulada pelos esteróides durante as diferentes fases do ciclo menstrual feminino.
Por conseguinte, a proporção entre a expressão de ER e PR, bem como entre a
expressão das suas diferentes isoformas, no endométrio, podem determinar a
resposta tecidual frente a estrogênios e progestinas respectivamente (Sereepapong
et al., 2004).
Sabe-se que os hormônios sexuais não são secretados em quantidades
constantes por todo o ciclo menstrual feminino e, conseqüentemente, ocorrem
flutuações na expressão dos receptores hormonais correlacionados a estes eventos.
No endométrio, as concentrações de ER são máximas durante toda a fase
proliferativa do ciclo, declinando na segunda fase do mesmo (Fujishita et al., 1997).
Em células endometriais glandulares, os níveis de ER e PR, verificados por imuno-
histoquímica, decaem significativamente da fase proliferativa para a secretora do
ciclo (Mylonas et al., 2005).
30
1.4.2.1 Receptores Hormonais
Os ER e PR pertencem à superfamília dos receptores de hormônios esteróides,
juntamente com os receptores de androgênios, glicocorticóides, mineralocorticóides,
hormônios tireóideos e vitaminas A e D. A estrutura protéica destes receptores pode
ser dividida em domínios individuais de funções específicas (Kumar et al., 1987;
Kuiper et al., 1997; Oehler et al., 2000), representados na Figura 8 e 9A:
Região A/B: porção N-terminal do receptor que contém domínio(s) de
transativação celular específico(s), designados por AF;
Região C: constitui a zona central de reconhecimento dos elementos
responsivos ao(s) hormônio(s) e de ligação ao DNA. Esta região apresenta dois
sítios com zinco – a zinc finger motif – para mediar o acoplamento específico ao
DNA. Assim sendo, a região C é o domínio de dimerização do receptor;
Região D: parece ser o domínio de junção da região de ligação ao DNA
(região C) com a de ligação ao hormônio esteróide (região E);
Região E: porção C-terminal do receptor que constitui a região de
acoplamento ao ligante, ou seja, de ligação ao hormônio esteróide. Esta região
interage com os co-ativadores e co-repressores transcricionais. Também
apresenta um domínio de transativação específico (AF). Além disso, está
envolvida na dimerização do receptor e em sua localização nuclear;
Os receptores de estrogênio ainda apresentam um sexto domínio – a região F –
responsável por modular sua própria taxa de transcrição.
31
Figura 8 – Estruturas esquemáticas dos receptores hormonais ER e PR. Modificado de Oehler et al.,
2000.
Figura 9 – Representação esquemática dos receptores hormonais ER e PR. (A) Receptor inativo; (B)
Receptor ativo: acoplado ao ligante. Modificado de Alberts et al., 2002 – Molecular Biology of the Cell,
4° edição.
A ligação do hormônio esteróide ao seu receptor específico provoca uma
mudança conformacional na região E, levando à dissociação das chaperonas
citoplasmáticas (proteínas inibitórias, como as de choque térmico) e à dimerização
do mesmo. Este complexo receptor-ligante então interage com seqüências
específicas do DNA conhecidas por elementos responsivos ao hormônio, no caso,
ao estrogênio e à progesterona – ERE e PRE, respectivamente (Figura 9B). Estes
ERE e PRE localizam-se nas regiões promotoras dos genes que o ligante regula
32
(Greene et al., 1986), ou seja, próximos a genes responsivos a estrogênios e
progestinas, respectivamente. Portanto os ER e PR atuam como fatores de
transcrição, modulando a síntese de mRNA e de proteínas específicas.
Também são descritos mecanismos de transdução de sinal via receptores
esteróides independentes de transcrição gênica e síntese protéica. Denominados
como efeitos não genômicos dos receptores esteróides, estes modulam proteínas
reguladoras da membrana ou do citoplasma celular. Várias ações biológicas dos
esteróides têm sido associadas a este novo tipo de sinalização celular, como a
regulação de proteínas quinases, por exemplo, a da Tirosina-quinase e a das MAP-
quinases (Simoncini & Genazzani, 2003; Mulac-Jericevic & Conneely, 2004).
Receptores de Estrogênio (ER)
São descritos dois subtipos de receptores de estrogênio. O receptor estrogênico
“clássico”, hoje denominado ER
α
, foi descoberto por Elwood Jensen em 1958.
Clonado pela primeira vez a partir de células uterinas, o ER
α
consiste em uma
proteína de 595 aminoácidos com peso molecular de, aproximadamente, 65 kDa
(Greene et al., 1986). Kuiper e grupo (Kuiper et al., 1996; Kuiper et al., 1997)
identificaram, inicialmente em tecido prostático de ratos e em ovário (células da
granulosa) de ratas, o segundo receptor de estrogênio – o ER
β
. Segundo este
mesmo grupo, o ER
β
contém 485 aminoácidos com peso molecular de,
aproximadamente, 54,2 kDa. O ER
β
humano chega a ter 47% de homologia com o
ER
α
humano e ser cerca de 89% idêntico ao ER
β
de ratos e de camundongos
(Enmark et al., 1997). A estrutura protéica dos subtipos de ER humanos apresenta
homologia de 97% no domínio de ligação ao DNA (região C) e de 59,1% no domínio
de acoplamento ao ligante (região E) (Figura 10). O grau de homologia existente
entre o ER
α
e o ERβ humanos é baixo, especialmente quando considerado o
domínio de ligação ao ligante. Tal característica promove o uso de estrogênios
sintéticos seletivos, designados para um ou outro subtipo de ER (Enmark &
Gustafsson, 1999; Koehler et al., 2005).
33
Figura 10 – Homologia entre ER
α
e ER
β
. Adaptado de Oehler et al., 2000.
A existência de dois subtipos de ER e a habilidade de formarem heterodímeros
sugerem a existência de três mecanismos alternativos de sinalização para os
hormônios estrogênicos: nas células que expressam somente um dos subtipos – α
ou β – formam-se homodímeros do receptor; enquanto nas que expressam ambos
ER, heterodímeros podem surgir de acordo com a proporção existente de cada
subtipo. Estas formas alternativas expandem o potencial fisioregulatório dos
hormônios estrogênicos, permitindo uma interação diferenciada aos ERE (Kuiper &
Gustafsson, 1997; Saunders, 1998). Paech e colaboradores, trabalhando com as
propriedades transativadoras dos ER sobre diferentes elementos responsivos do
gene promotor, sugeriram respostas gênicas distintas ao controle exercido pelos
ER
α
e ERβ (Paech et al., 1997). Este grupo verificou que a ligação de E
2
-ERβ-DNA
(via AP1) inibe a transcrição gênica, enquanto que antagonistas estrogênicos
ativariam o mesmo processo. Apesar do grande interesse sobre a distribuição celular
e resposta dos ER
α
e ER
β
frente à ação dos hormônios sexuais e seus
antagonistas, a importância biológica da existência destes dois subtipos de ER, no
endométrio, permanece obscura.
Utilizando RT-PCR semiquantitativo, Enmark et al., 1997, detectaram a
expressão de ambos ER em tecido da glândula mamária e útero, bem como em
linhagens celulares de tumor de mama. O mesmo grupo, pela sensível técnica de
RPA (RNAse protection assay), verificou a presença de ER
α
em endométrio, ovários
e tumor de mama; e de ER
β
em glândula mamária, pulmões e células isoladas da
granulosa nos ovários.
34
Receptores de Progesterona (PR)
São descritas duas isoformas do receptor de progesterona: PR-A e PR-B. O PR-
A consiste em uma proteína de 769 aminoácidos com peso molecular de,
aproximadamente, 94 kDa; enquanto o PR-B apresenta 933 aminoácidos com peso
molecular de, aproximadamente, 114 kDa (Horwitz & Alexander, 1983; Horwitz et al.,
1986; Kastner et al., 1990a). As isoformas do PR diferem apenas na porção N-
terminal do receptor, visto que o PR-B apresenta 164 aminoácidos adicionais em
relação ao PR-A (Figura 11). Esta diferença estrutural entre as isoformas do PR
confere funções de transativação específicas para o PR-B, capaz, então, de ativar
genes não responsivos ao PR-A.
Figura 11 – Estruturas esquemáticas dos receptores hormonais PR-A e PR-B. NTD – domínio N-
terminal; DBD – domínio de ligação ao DNA; LBD – domínio de ligação ao ligante. Adaptado de Oehler
et al., 2000.
Os estrogênios e a progesterona aumentam e diminuem, respectivamente, a
expressão dos receptores de progesterona nos tecidos-alvo. O PR-A e o PR-B são
ou resultado do processo de transcrição a partir de promotores alternativos no
mesmo gene, gerando, portanto, dois mRNAs distintos (Kastner et al., 1990a;
Kastner et al., 1990b; Gronemeyer et al., 1991); ou resultado da tradução em sítios
diferentes do mesmo mRNA (Conneely et al., 1987). Deve-se lembrar que a
transcrição de um único gene a partir de promotores diferentes adiciona flexibilidade
ao controle da expressão gênica, bem como prováveis diferenças funcionais nas
proteínas finalmente traduzidas.
Há evidências de que as isoformas do PR sejam funcionalmente diferentes e de
que regulem a transcrição gênica de maneira específica ao tipo celular e ao
35
promotor nuclear correlacionado. Semelhante ao que ocorre com os receptores de
estrogênios, o PR-A e PR-B também podem formar homo e/ou heterodímeros
intracelulares de acordo com a proporção existente de cada isoforma. As formas
alternativas do PR, como homo e/ou heterodímeros, expandem o repertório
fisiológico de resposta à progesterona (Conneely & Lydon, 2000; Conneely et al.,
2003).
Sabe-se que o PR-B promove a transcrição de genes responsivos à P. Portanto,
o PR-B está relacionado à resposta anti-estrogênica propriamente dita: processos de
apoptose e diferenciação celular; inativação de estrogênios e “down-regulation” de
ERs (Figura 12A – Esq.). Por sua vez, a isoforma A demonstra ser a repressora
dominante do PR-B (Figura 12A – Dir.) (Vegeto et al., 1993; Wen et al., 1994;
Graham & Clarke, 1997; Mangal et al., 1997). O PR-A ainda parece estar envolvido
com a repressão da atividade transcricional de outros receptores esteróides,
incluindo-se estrogênios, glicocorticóides, androgênios e mineralocorticóides (Figura
12B) (Vegeto et al., 1993; McDonnell & Goldman, 1994; McDonnell et al., 1994; Wen
et al., 1994; Giangrande et al., 2000). Sob essas considerações, Mulac-Jericevic e
colaboradores observaram que agonistas do PR-A podem inibir tanto a atividade
transcricional do PR-B como do ER-α (Mulac-Jericevic et al., 2000).
36
Figura 12 (A-Esq.) – Mecanismo molecular de ação do PR-B, promovendo a transcrição gênica. Coas
= proteínas co-ativadoras; B = PR-B; PRE = elementos responsivos à progesterona. (A-Dir.) –
Mecanismo molecular de ação do PR-A, inibindo a transcrição gênica. A = PR-A; Cor = proteínas co-
repressoras; HD = histonas. (B) Mecanismo molecular de ação do PR-A sobre Erα, reprimindo sua
atividade transcricional. ER = ER
α
; ERCoa COMPLEX = complexo co-ativador do ER
α
; ERE =
elementos responsivos a estrogênios. Adaptado de Giangrande et al., 2000.
O PR-A encontra-se constantemente expresso no endométrio durante o ciclo
menstrual feminino, enquanto que a isoforma B oscila (Feil et al., 1988). Mangal et
al., 1997, também descreveram mudanças na expressão relativa de PR-A/PR-B de
acordo com as fases do ciclo menstrual.
As concentrações do PR refletem as mudanças ocorridas nas células
glandulares do endométrio, visto que as alterações de PR-A e PR-B não chegam a
ser significativas nas células estromais. As concentrações do PR no epitélio
glandular crescem durante a fase proliferativa do ciclo, sob influência do E
2
, e
regridem após a ovulação pela crescente presença de P (Garcia et al., 1988;
Snijders et al., 1992; Fujishita et al., 1997; Mangal et al., 1997). Snijders et al., 1992,
inclusive assumem que as concentrações de PR são máximas nas células
endometriais glandulares nos primeiros dias da fase secretora quando, então,
sofrem uma drástica redução. Apesar da ausência de PR nas células glandulares em
fase secretora, as células estromais continuam a expressá-los (Garcia et al., 1988;
Snijders et al., 1992). Ainda referente às flutuações hormonais, o PR-B parece ser a
isoforma mais sensível a esta exposição (Mangal et al., 1997).
37
Mangal et al., 1997, utilizando extratos de endométrio e a técnica de Western
blott, observaram que os níveis de PR-A são sempre superiores aos de PR-B, não
importando a fase do ciclo menstrual considerada. Concluíram ainda que em meios
hipoestrogênicos, a expressão de PR-B encontra-se reduzida.
1.4.3 Aspectos Imunológicos
O sistema imune parece estar envolvido na patogênese da endometriose visto
que a enfermidade apresenta características de doença inflamatória crônica.
Inúmeros componentes do sistema imune encontram-se alterados nas mulheres com
endometriose, ocorrendo secreção aumentada de citocinas pró-inflamatórias, fatores
de crescimento, prostaglandinas e proteinases (Jones et al., 1998; Gurates & Bulun,
2003; Giudice & Kao, 2004). A carência de respostas imunológicas adequadas,
criando condições sub-imunes, pode ser agregada aos demais aspectos associados
à instalação e sobrevivência das lesões endometrióticas.
Bulun e colaboradores propuseram um modelo molecular de interação entre as
propriedades celulares proliferativas e inflamatórias na endometriose (Bulun et al.,
2001). Segundo este modelo, o E
2
promove a produção local de prostaglandina-E
2
(PGE
2
) via indução, direta ou indireta, da PGE-sintase-2 (COX-2). Por sua vez, a
PGE
2
é conhecida como potente indutora da atividade da ARO na endometriose.
Portanto, este mecanismo de feedback positivo resulta em intensa produção de E
2
e
PGE
2
no tecido endometriótico.
Está bem estabelecida a associação de metaloproteinases de matriz (MMP) às
condições normais de desenvolvimento e crescimento do endométrio, como sua
participação no processo fisiológico da menstruação. Entretanto, a expressão
aberrante de MMP é relacionada à invasão e ao remodelamento tecidual provocados
pelo implante endometriótico (Zhou & Nothnick, 2005).
A presença de tecido endometriótico fora da cavidade uterina – o que caracteriza
a endometriose – sugere anomalias intrínsecas ao endométrio ectópico associadas a
neoangiogênese, deficiência na resposta mediada por células e presença de auto-
anticorpos (Matarese et al., 2003; Ulukus & Arici, 2005) (Figura 13).
Alterações da imunidade celular relacionadas à diminuição da citotoxicidade de
células T e T natural killers (NK), bem como ao aumento do número e da ativação de
38
macrófagos, resultam na inadequada remoção de células do endométrio ectópico da
cavidade peritoneal. Além disso, o aumento da produção local de inúmeras citocinas
e fatores de crescimento pelo sistema imune e pelo próprio endométrio ectópico,
promovem a implantação dos fragmentos endometriais e induzem processos de
proliferação e angiogênese (Figura 13). Suspeita-se que a endometriose seja uma
doença auto-imune pela presença de auto-anticorpos locais e circulantes, além de
outras manifestações auto-imunes associadas.
Figura 13 – Resposta imunológica na endometriose. Auto-Ag – auto-antígenos; Auto-Ac – auto-
anticorpos; DCs – células dendríticas; EGF – fator de crescimento da epiderme; FGF – fator de
crescimento de fibroblastos; IFN – interferon; IL – interleucina; iNOS – sintase de ácido nítrico; MMP –
metaloproteinase de matriz; PG – prostaglandina; TGF – fator de transformação; TNF – fator de
necrose tumoral; VEGF – fator de crescimento do endotélio vascular. Adaptado de Matarese et al.,
2003.
Acredita-se que deva existir algum desequilíbrio entre os processos de
proliferação e apoptose celular na endometriose. O aumento na expressão de
moléculas anti-apoptóticas verificadas no endométrio ectópico podem contribuir para
39
o desenvolvimento da endometriose, conferindo-lhe resistência frente às respostas
imunológicas e elevando suas chances de sobrevivência fora do útero (Nishida et al.,
2005). Goumenou et al., 2004, apontaram que a apoptose é um processo de
regulação do endométrio ectópico, que colabora para sobrevivência do mesmo. De
acordo com outros autores, foi observada uma diferença significativa no índice de
apoptose entre endometriose e endométrio controle, sendo muito menor na
presença da doença (Meresman et al., 2002). Tanto a apoptose, como as proteínas
correlacionadas com mesma, desempenham importante papel nas mudanças
ocorridas no endométrio durante as fases do ciclo menstrual. Isto porque a apoptose
é descrita como um processo fisiológico de morte celular programada, onde a célula
utiliza um especializado maquinário para matar a si mesma.
1.4.3.1 B cell lymphoma/leukemia 2 (bcl2)
Uma das proteínas mais estudadas na regulação do processo de apoptose
celular é a bcl2 – B cell lymphoma/leukemia 2. A bcl2 constitui uma proteína de
membrana mitocondrial, com peso molecular de, aproximadamente, 25 kDa. Consta
que foi inicialmente descrita de uma translocação cromossômica – t(14; 18) – em
linfoma de células B foliculares humanas; sendo atualmente caracterizada em vários
tipos celulares além do tecido linfóide: epitélio glandular, pele, intestinos e neurônios
(Hockenbery et al., 1991). O gene da bcl2 pertence a um novo grupo de
protooncogenes que prolongam a sobrevivência celular, neutralizando e bloqueando
seus mecanismos de apoptose (Hockenbery et al., 1990; Gompel et al., 1994;
Hockenbery, 1995). Em resposta a fatores promotores do crescimento, como
hormônios esteróides e fatores de crescimento, a expressão nuclear de outros
protooncogenes (c-myc, c-fos, c-jun, c-myb) também se altera rapidamente
(Schuchard et al., 1993). Morsch et al., 2006 (in press) demonstram níveis de mRNA
para c-fos significativamente elevados em endométrio ectópico; enquanto não
existem diferenças na expressão gênica do mesmo em endométrio eutópico de
endometriose e de pacientes inférteis.
A habilidade da bcl2 em antagonisar a morte celular é modulada pela sua
interação a proteínas apoptóticas, inclusive à família das Bax (proteínas ativadoras
da apoptose). O controle da apoptose acontece pela interação das proteínas
40
ativadoras e repressoras que atuam por vias de sinalização entre a superfície e o
meio intracelular, respectivamente, ativando ou inibindo proteases internas, como as
caspases (Li & Yuan, 1999).
São descritos “down-regulation” de genes pró-apoptóticos e “up-regulation” dos
anti-apoptóticos em endométrio eutópico e ectópico de endometriose.
Apesar do constante interesse sobre os protooncogenes, o mecanismo de ação
da bcl2 permanece em debate (Pinton et al., 2001).
Os resultados de Gompel et al., 1994, apontavam que a expressão da bcl2, por
imuno-histoquímica, em endométrio seria diretamente dependente de hormônios
sexuais. Goumenou et al., 2004 verificaram que a diminuição da relação bcl2/Bax,
no endométrio eutópico, precede a fragmentação do DNA, favorecendo a ocorrência
de apoptose na fase secretora do ciclo menstrual. Pela mesma técnica, imuno-
histoquímica, a apoptose e a presença das proteínas reguladoras bcl2 e Bax não
apresentaram variações cíclicas à fase menstrual em endométrio ectópico,
sugerindo que os mecanismos de controle da apoptose neste tecido possam ser
regulados de forma independente à verificada no endométrio eutópico (Goumenou et
al., 2004).
Considerando a apresentação multifatorial da endometriose, torna-se relevante
estudar a expressão de diferentes genes a fim de elucidar os envolvidos com o
controle da proliferação, da diferenciação e do ciclo celular em endométrio de
pacientes com endometriose e de mulheres inférteis sem a doença.
41
1.5 OBJETIVOS
1.5.1 Objetivo Geral
Caracterizar a expressão de genes relacionados aos processos de proliferação e
diferenciação celular em implantes endometrióticos e endométrio eutópico de
mulheres inférteis sem e com endometriose.
1.5.2 Objetivos específicos
(1) Caracterizar a expressão gênica do ER
α
em endométrio eutópico e ectópico
de pacientes com endometriose e mulheres inférteis sem endometriose.
(2) Caracterizar a expressão gênica do PR-A e PR-B em endométrio eutópico e
ectópico de pacientes com endometriose e mulheres inférteis sem endometriose.
(3) Caracterizar a expressão gênica da bcl2 em endométrio eutópico e ectópico
de pacientes com endometriose e mulheres inférteis sem endometriose.
42
2. MATERIAIS E MÉTODOS
2.1 Delineamento do estudo
Caso-controle, prospectivo.
2.2 Obtenção das amostras de tecido endometrial
Foram selecionadas 34 pacientes, consultando por infertilidade na Unidade de
Reprodução Humana do Hospital de Clínicas de Minas Gerais e do Instituto Biocor
do Brasil. Quinze apresentavam endometriose e 19 tinham infertilidade na ausência
de endometriose. As pacientes não estavam usando nenhuma medicação hormonal
que pudesse interferir com a avaliação molecular e a infertilidade foi caracterizada
como ausência de gravidez após um ano de relações sexuais sem proteção. As
amostras de tecido endometrial foram obtidas a partir de biópsias de endométrio,
realizadas na fase folicular, pela equipe de Belo Horizonte. As amostras foram
transportadas em nitrogênio líquido e armazenadas à temperatura de -80ºC para
processamento posterior.
A partir dos achados histológicos e de laparoscopia do endométrio, foram
constituídos 3 grupos: controle, endométrio das pacientes inférteis sem
endometriose; eutópico, endométrio tópico das pacientes com endometriose e
ectópico, fragmento do implante endometriótico. A organização dos grupos está
detalhada na Figura 14.
43
Figura 14 – Representação esquemática da amostra.
A avaliação clínica das pacientes incluiu medidas antropométricas como peso,
altura, índice de massa corporal (IMC), relação cintura/quadril (RCQ) e dosagem da
proteína carreadora de hormônios esteróides (SHBG).
2.3 Avaliação da expressão gênica por RT-PCR
2.3.1 Extração e quantificação do RNA total
Esta etapa do trabalho foi realizada pela equipe de Belo Horizonte, e as
seguintes pela autora. O RNA total foi extraído utilizando-se o reagente Trizol®
(Invitrogen
TM
Life Technologies) de acordo com as recomendações do fabricante. Os
fragmentos de tecido endometrial foram pulverizados e lisados com a adição de
Trizol®, mantidos no gelo. O RNA total foi extraído com clorofórmio e precipitado
com isopropanol por centrifugação (12000xg a 4°C). O RNA total foi lavado com
etanol 75% e ressuspendido em água tratada com dietilpirocarbonato (DEPC). O
RNA foi quantificado por absorbância de luz a 260 nm em espectrofotômetro
GeneQuant.
2.3.2 Síntese do cDNA
A síntese da primeira fita de DNA complementar (cDNA) foi originada a partir de
5 μg de RNA total, utilizando-se o sistema de pré-amplificação Super-Script First-
strand Synthesis System for RT-PCR (Invitrogen
TM
Life Technologies), conforme
44
instruções do fabricante. O RNA molde foi desnaturado inicialmente a 65°C por 5
min. juntamente com uma mistura dos dNTPs (10 mM de cada dATP, dCTP, dGTP,
dTTP). O anelamento dos oligo(dT)
12-18
(0,5 μg/μL) foi realizado a 42°C por 2 min.
juntamente com a adição de uma mistura de tampão RT 10X (200 mM Tris-HCl, pH
8,4; 500 mM KCl), MgCl
2
(25 mM), DTT (0,1 M) e inibidor de RNAse recombinante
(RNaseOUT
TM
, 40 U/μL). Adicionou-se, então, 1μL de Superscript
TM
II RT (50 U/μL)
a cada tubo de reação e a síntese do cDNA foi realizada durante 50 min. a 42°C . A
reação foi finalizada por incubação a 70°C por mais 15 min. O volume da reação foi
coletado por breve centrifugação e incubado por 20 min. a 37°C com RNAse H de E.
coli (2 U/μL) antes de se proceder a amplificação dos fragmentos de DNA de
interesse.
2.3.3 Protocolo geral da PCR
A amplificação dos genes de interesse foi realizada utilizando-se a RT-PCR
(Reverse Transcriptase Polymerase Chain Reaction). A RT-PCR foi efetuada para
um volume final de 50 μL de reação. As amostras de cDNA foram desnaturadas a
94°C por 2 min. em presença de tampão PCR 10X (200 mM Tris-HCl, pH 8,4; 500
mM KCl) e MgCl
2
(50 mM). Após o pré-aquecimento, 1,25 U de Taq DNA Polimerase
foram adicionadas juntamente com tampão PCR 10X, MgCl
2
, primers sense e
antisense e 0,2 mM da mistura equivalente de dNTPs (Tabela 1). Na tabela 2
encontram-se listados o tamanho e a seqüência dos fragmentos dos genes
amplificados. A tabela 3 apresenta as condições da PCR para os diferentes genes
estudados.
O gene ubíquo
β
2
-microglobulina (
β
2
m) foi amplificado para ajustar a
quantidade de cDNA em cada amostra. O produto de reação da primeira fita de DNA
(cDNA) realizado sem transcriptase reversa foi amplificado para servir como controle
negativo a cada gene estudado. Utilizou-se como controle positivo das reações, o
cDNA sintetizado a partir do RNA total de tecido prostático ou placentário intactos.
Os genes amplificados foram separados em gel de agarose 1,5 % para os
fragmentos com mais de 200 pares de base (pb) e em gel de agarose low melting a
2% para os fragmentos menores de 200 pb; corados com brometo de etídio,
45
submetidos à eletroforese a 120 V e visualizados sob luz ultravioleta. As bandas
esperadas foram quantificadas por análise densitométrica pelo sistema processador
de imagens ImageMaster VDS (Pharmacia Biotech, Uppsala, Sweden).
Tabela 1 – Protocolo geral da PCR
Reagentes
Mistura inicial (μL) Mistura P
os-Hot-Start (μL)
Água com DEPC 34,3 6,5
Tampão PCR 10X 4,0 1,0
MgCl
2
(50 mM) 1,2 0,3
dNTPs (10 mM) 1,0
Primer sense
*
Primer antisense
*
cDNA *
Taq DNA Polimerase
0,2
Os volumes se referem a cada reação de 50 μL. Com exceção do cDNA, todos os reagentes eram
reunidos numa mistura inicial que era agitada suavemente e pipetada nos tubos. Cada tubo recebeu
10 μL da mistura PHS que continha a Taq DNA Polimerase.
* Volume correspondente à padronização do gene de interesse.
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