casar os saberes culturais locais com os saberes curriculares para tornar a prática pedagógica
mais “próxima” do aluno. E, a segunda razão está marcada pela experiência vivida e o
conhecimento adquirido através de leituras. Com a segunda razão o pressuposto é de que o
trabalho terá uma orientação etnográfica constituindo-se na apreensão e interpretação dos
saberes locais. Este pressuposto fundamenta-se em Clifford Geertz (1997) no seu livro O
saber Local onde constata que todos os fenômenos sociais, políticos, jurídicos, culturais são
fenômenos locais. Nesse livro, Geertz analisa de forma comparativa os factos antropológicos e
as leis jurídicas e afirma que “a navegação, a jardinagem, e a poesia, o direito e a etnografia
também são artesanatos locais: funcionam à luz do saber local” (Geertz, 1997: 249). Ainda
alargando mais esta justificativa incorpora-se a crítica social e epistemológica que Lyotard
(1989) desenvolve sobre a Modernidade. A crítica à Modernidade caracteriza-se pela
descrença às grandes narrativas. Essa descrença pôs em crise o modelo da racionalidade
científica universal e criou um espírito voltado para as racionalidades locais. Na mesma esteira
de argumentação, Boaventura de Sousa Santos no seu livro Um Discurso sobre as Ciências,
(1997), defende a crise do paradigma dominante. Crise esta que se carateriza pela interacção
de pluralidade de condições sociais e teóricas
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. Estas críticas pretendem trazer, à luz da razão,
a simbiose entre o conhecimento escolar e o saber tradicional local enraizado na cultura e no
sujeito. Embora estas críticas iluminassem para uma abordagem sobre as questões relevantes,
ainda não havia espaço adequado em Moçambique para se expor dentro da educação. Porém, a
inquietação sobre a importância das culturas locais sempre esteve na origem de todas leituras
desenvolvidas no quadrante educativo. Com a introdução do currículo local no Ensino Básico
criara-se a oportunidade institucional para um “resgate” das culturas diversas de Moçambique,
no sentido de chamá-las a “contribuir para a melhoria” da aprendizagem.
A introdução do currículo local abre espaço para discutir a relevância das culturas locais na
escola. Na verdade, a inclusão dos elementos das culturas locais facilita uma aprendizagem
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Boaventura de Sousa Santos apresenta como condições sociais e teóricas que conduziram à crise do paradigma
dominante a relatividade da simultaneidade, a emergência da química quântica, o rigor da medição posto em
causa pela química quântica, os avanços do conhecimento nos domínios da microfísica e biologia, a análise das
condições sociais, dos contextos culturais, dos modelos organizacionais da investigação científica, antes
acantonada no campo separado e estanque da sociologia da ciência, que ganhou espaço na reflexão
epistemológica e a preocupação sobre o conteúdo conhecimento científico do que a sua forma. Esta última
questão impulsiona Santos a afirmar que o conhecimento científico moderno é conhecimento desiludido e infeliz
por transformar o sujeito em ser autômato. (Santos, 1997: 23-36).