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LUZIA FERREIRA PEIXOTO
A ASSISTÊNCIA PSICOESPIRITUAL
NA ENFERMAGEM:
ENSINO E PRÁTICA
Doutorado em Ciências da Religião
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Programa de pós-graduação em Ciências da Religião
São Paulo-SP / 2006
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II
LUZIA FERREIRA PEIXOTO
A ASSISTÊNCIA PSICOESPIRITUAL
NA ENFERMAGEM:
E
NSINO E
P
RÁTICA
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência
parcial para a obtenção do Título de Doutora em
Ciências da Religião sob a orientação do Prof. Dr. Ênio
José da Costa Brito.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Programa de pós-graduação em Ciências da Religião
São Paulo-SP / 2006
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III
B
ANCA
E
XAMINADORA
__________________
__________________ __________________
__________________
__________________
__________________ __________________
__________________
__________________
__________________ __________________
__________________
__________________
__________________ __________________
__________________
_________________
_________________ _________________
__________________
__
_
IV
N
osso
T
EMA:
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem:
ensino e prática
O
ração do
E
nfermeiro:
Texto extraído da homilia de
Mons. Juvenal Arduini.
Semana da enfermagem, Uberaba-MG, 1991.
F
iguras de
F
undo:
P
rimeira
P
arte:
Scanner de um folheto do Movimento de Valorização da
Enfermagem: com a frase de Wanda Horta: “Vida Cuidando de Vidas”: da ABEN-GO,
SIEG, FNE, Goiânia-GO, 1999.
S
egunda
P
arte:
lâmpada modelada pela autora da tese.
L
etras
U
tilizadas nos
T
extos:
Belwe Lt BT, e com itálico nas chamadas dos textos da pesquisa.
V
Oração do Enfermeiro
C
RISTO:
Curaste tantos enfermos,
Quando caminhavas pela Palestina:
Coloca teu ser em meu ser,
Para que eu revele tua face.
Coloca teu olhar em meus olhos,
Para que eu compreenda os doentes.
Coloca tuas mãos em minhas mãos,
Para que eu alivie os sofredores.
Coloca teus gestos em meus gestos,
Para que eu fortaleça os abatidos.
Coloca teus passos em meus passos,
Para que eu busque os abandonados.
Coloca tua força em meu cansaço,
Para que eu levante os angustiados.
Coloca teu rosto em minha dor,
Para que eu Te veja nos enfermos,
Coloca tua presença em meu ‘ser’,
Para que eu não me sinta só.
Coloca tua Palavra em minha palavra,
Para que eu mantenha o diálogo.
Coloca teu amor em meu amor,
Para que eu seja fraterna.
Coloca tua alegria em minha alegria,
Para que eu reparta a paz.
Coloca tua oração em minha oração,
Para que eu acenda a lâmpada da Fé,
E promova a saúde de meus irmãos.
A
RDUINI,
J
uvenal (1991)
VI
DEDICATÓRIAS:
A
D
eus
T
rino, fonte
e luz de toda sabedoria;
A Universidade
Católica de Goiás –UCG
por
ter viabilizado
meu projeto
Aos meus queridos
pais: Jovino Peixoto e
Jovelina Ferreira dos Santos
(in memoriam) que
incentivo em minha
formação humana,
religiosa, ética e
profissional;
À minha Família pelo
constante apoio em minha
caminhada;
À Enfermagem pela
qual dedico meus esforços;
DEDICATÓRIA ESPECIAL:
À minha querida Família pelo carinho,
incentivo e apoio.
À Enfermagem, especialmente
enfermeiras e enfermeiros que se
dedicam ao ensino e prática na
enfermagem.
VII
AGRADECIMENTOS
:
A
o Prof.Dr.Ênio José da Costa Brito, cuja orientação, apoio, confiança e
credibilidade foram vitais para a realização do meu Doutorado;
À
Profa. Dra. Maria Alves Barbosa pela ajuda e apoio na área da
enfermagem, viabilizando a transdiciplinariedade em nossa tese;
A
o Prof. Dr. Valmor da Silva pelo grande apoio e incentivo;
À
Profa. Dra. Yara Gustavo de Castro, orientadora de pesquisas da pós-
graduação, pelo apoio e ajuda essenciais nos vários momentos dessa
pesquisa;
À
Profa. Dra.Milca Severino Pereira e ao Prof. Dr. José J. Queiroz pela
atenção e dedicação.
Aos colegas professores dos Departamentos de Teologia / Filosofia-FIT e
Enfermagem-ENF, pelo incentivo, pelo e apoio, essenciais em vários
momentos dessa caminhada;
A
os enfermeiros pela acolhida calorosa, nas Universidades do Centro-
Oeste do Brasil: UCG e UFG, Goiânia,Go; JK; Anápolis,Go; UFMS Campo
Grande-MT; UNIC e UFMT - Cuiabá,MS, viabilizando nossa pesquisa de
campo;
À
todos e a todas
que direta ou indiretamente contribuíram para o meu
sucesso, um grande Deus lhes pague!
A
os Familiares que valorizaram meu trabalho e compartilharam em
minhas conquistas.
O
brigada!
VIII
R
esumo
O
estudo tem como objetivo geral discutir o
ensino e a prática
da
assistência psicoespiritual prestada aos clientes, partindo de percepções de docentes e
discentes dos cursos de graduação em enfermagem e enfatizar a assistência
psicoespiritual aos clientes no ensino e na prática de enfermagem.
Pesquisa do tipo
descritivo-exploratória realizada na região Centro-Oeste do Brasil.
A amostra foi
constituída de 63 enfermeiros e 141 acadêmicos de
cursos de graduação em
enfermagem.
A Coleta de Dados
realizada pela pesquisadora que utilizou como
instrumento o questionário aplicado após aprovação do projeto pelo
Comitê de Ética
em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-PUCSP. Foram
discutidos
os valores espirituais na formação dos novos profissionais de enfermagem.
Considera-se que mais do que oferecer remédios, os profissionais precisam saber ouvir
o paciente e sua família, trabalhar a prevenção, cuidar do indivíduo como agente ativo
no processo de cura. Na formação acadêmica, os novos profissionais precisam de um
espaço que lhes garantam conhecimentos religiosos para a assistência psicoespiritual
A
autonomia do paciente
deve ser o eixo condutor
para
introduzir a espiritualidade na
prática
.
Por fim considera-se entre outros aspectos, que
a fé dos clientes é uma
alavanca positiva na recuperação mais rápida; que o fazer e o cuidar devem estar
voltados para a assistência integral humanizada e que o
enfermeiro
deve cuidar dos
clientes e não da doença, além de prestar assistência integral segundo as necessidades.
Concluiu-se com a certeza de que nossa tese levantou muitas possibilidades
para sensibilizar aqueles e aquelas que trabalham na área de saúde!
P
ALAVRAS
C
HAVES:
Educação em enfermagem, assistência psicoespiritual, o fazer e o
cuidar, assistência integral ao paciente.
IX
ABSTRACT
T
he general goal of this study is to discuss the
teaching and practice
of
psychospiritual assistance to clients, considering the teachers’ and students’ perception
of the graduation courses on nursing, and to emphasize the psychospiritual assistance
to clients in the nursing teaching and pratique. Descriptive-exploratory research carried
out in the Middle West Region of Brazil. The sample was comprised of 63 nurses and 141
students of graduation courses on nursing. Data were collected by the researcher, who
used the applied questionnaire as an instrument, after approval of the project by the
Research Ethics Committee of the
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo -
PUCSP.
The spiritual values of education of the new nursing professionals were
discussed. It is believed that more than offering drugs, the professionals need to know
how to listen to the patient and his/her family, work for prevention and take care of the
individual as an active agent in the healing process. In the academic education, the
new professionals need a space that assures them religious knowledge for the spiritual
assistance. The autonomy of the patient must be the conductor axis to introduce the
spirituality in the practice. Finally, among other aspects, it is believed that the faith of
the clients is a positive power for the faster recovery; that doing and taking care must
be turned to the humanized integral assistance and that the nurse must take care of the
clients rather than the disease, besides providing full assistance according to the needs.
We are sure that our thesis brought many possibilities to touch those who work
in the area of health!
K
EY
W
ORDS: Nursing education, psychospiritual assistance, doing and taking
care in nursing, full assistance to the patient.
X
Sumário
Agradecimentos VII
Resumo VIII
Abstract IX
INTRODUÇÃO 1
i. Fundamentação teórica 3
ii. Objetivos 9
iii. Percurso metodológico 10
PRIMEIRA PARTE
A ENFERMAGEM: Vida Cuidando de Vidas 13
CAPÍTULO I -
A ENFERMAGEM E A DIMENSÃO RELIGIOSA: aproximação à
realidade 15
1.1 Enfermagem: visão geral 16
1.1.1
Fase empírica 17
1.1.2
Fase evolutiva 20
1.1.3
Fase de aprimoramento 22
1.2 Dimensão religiosa cristã na prática da Enfermagem 25
1.3 Assistência psicoespiritual 29
1.4 Educação em Enfermagem 33
1.4.1
Análise dos dados quantitativos 36
1.4.2
Resultados: O que pensa e o que fazem os docentes e discentes de
Enfermagem quanto à assistência espiritual? 37
CAPÍTULO II - A SAÚDE E AS RELIGIÕES 48
2.1 Religiões e cristianismo: visão geral 49
2.1.1 E o que é religião? 50
2.1.1.1 Período pré-cristão 51
2.1.1.2 Período cristão 55
2.2 Saúde e doença 61
2.2.1 O que é inteligência? 63
2.2.2 E a doença? 64
2.3 A crença-fé como força terapêutica 68
2.3.1 O que é a fé? 71
XI
SEGUNDA PARTE
VALORES ESPIRITUAIS NA EDUCAÇÃO EM ENFERMAGEM 75
CAPÍTULO III - CRENÇAS RELIGIOSAS NA RECUPERAÇÃO DA
SAÚDE 77
3.1 As culturas: o sagrado e os símbolos 78
3.1.1 Conceitos de cultura e a teia cultural 79
3.1.2 A culturas e os símbolos religiosos 81
3.2 O fenômeno religioso 84
3.2.1 O Sagrado e o profano no mundo moderno 88
3.3 Saúde-salvação 92
3.3.1 A força de cura pela fé 95
3.3.2 Ciências e religiões, interfaces terapêuticas? 103
CAPÍTULO IV - TENSÃO ENTRE FÉ E RAZÃO 113
4.1 Fé e Razão 114
4.2 A fé como fenômeno psicológico 123
4.3
A fé como fenômeno espiritual 131
CAPÍTULO V – A EDUCAÇÃO EM ENFERMAGEM 138
5.1Perspectivas na assistência psicoespiritual 139
5.1.1 Novos horizontes sem medo de mudar 140
5.1.2 Reinventar para inovar 146
5.2 Resgate de valores básicos 153
5.2.1 Realidades últimas 156
5.3 Encontro com o sagrado 160
5.3.1 Espiritualidade e mística 161
5.3.2 Crer e aprender 163
CONCLUSÃO 172
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 181
ANEXOS:
191
Roteiro da Pesquisa de Campo 192
Aprovação do Comitê de Ética da PUC-SP 196
XII
INTRODUÇÃO
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
1
I
NTRODUÇÃO
A motivação para a realização deste estudo surgiu em decorrência de
reflexões a respeito da realidade social, da formação do profissional de Enfermagem e
da abordagem ao ser humano quando este necessita de cuidados em sua saúde.
O culo XX nos deixou como herança guerras e genocídios, produção de
armas e enorme poder de explosão de bombas atômicas e de destruição em massa.
Somos surpreendidos a cada dia, com avanços técnicos e científicos inimagináveis até
pouco tempo. Entretanto, todo esse progresso não tem permitido a solução de
problemas aflitivos que assolam a humanidade. A quantidade cada vez maior de
assaltos, seqüestros e assassinatos leva a sociedade a procurar segurança em sistemas
sofisticados de autodefesa que, no entanto, não correspondem ao bem-estar geral.
Estudos recentes mostram que, no mundo, a fome e as doenças matam 13,5
milhões de crianças por ano, e 40 mil por dia. No Brasil morrem, por dia, 700 crianças
no primeiro ano de vida, decorrentes das condições socioeconômicas. No país, 51,1%
de crianças vivem em situação de miséria; 7 milhões de menores abandonados
permanecem nas ruas, favelas, corredores, monturos de lixo, sem destino e sem futuro
(IBGE, 2005:2-118).
Em nossa época, o ser humano é levado a não olhar mais para dentro de si
mesmo. Ele olha ao seu redor e o que vê absorve sua atenção, que, exaustivamente,
esporeia o pensamento a examinar e indagar os fatos. A tecnologia, a frieza da ciência,
o capitalismo selvagem e a competição em todos os níveis sociais ignoram
sentimentos e prejudicam a humanização.
As condições de vida das camadas populares resultam na violência cotidiana,
infringem os direitos humanos e agravam a saúde integral das pessoas, conseqüência
de uma crise de abrangência planetária, gerada pela inabilidade com o progresso e a
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
2
tecnologia, com o desprezo dos valores fundamentais humanos, suportes de uma vida
plena (IBGE, 2005:2-118).
Entretanto, a convergência cultural aponta para a necessidade de superar a
fragmentação e o reducionismo, em busca de uma compreensão mais ampla do ser
humano e da natureza.
Com as descobertas nos campos da Física e da Biologia, diversas áreas do
saber têm mudado suas concepções básicas. Surgiram vários conceitos, nos quais
a
saúde é vista como uma prática cotidiana de vida
. Esta nova abordagem se coaduna
com o
holismo
, uma compreensão do estado de inter-relação e interdependência
desses fatores, uma vez que a maneira fragmentada de compreender os fenômenos
não se tem mostrado totalmente adequada (VILELA, 1996:11;57).
Paralelas ao progresso cnico-científico, as exigências também
aumentam cada dia na expectativa de uma eficiente assistência às pessoas. A
capacidade de confiança, fidelidade, fé e humanização fornece condições para o
relacionamento com as outras pessoas e com o universo. Este é um aspecto
fundamental da vida humana.
Saúde é uma atitude para com a vida, um caminho a percorrer. pessoas
aparentemente saudáveis que andam pelas ruas e desempenham seu trabalho
normalmente, mas que estão mental e espiritualmente
enfermas.
Outras estão
fisicamente enfermas, mas aprenderam a conviver com o sofrimento, fazendo dele
uma oferta a Deus; são amigas da vida (CAVALCANTI, 1997:96).
Como enfermeira, tive a oportunidade de trabalhar nas diferentes
especialidades da Enfermagem e, nos campos de estágio, percebi atitudes
diferenciadas dos acadêmicos de
Enfermagem
nos cuidados biofísicos e/ou espirituais.
Os biofísicos usavam técnicas sistematizadas, garantindo o desempenho perfeito
destas. Mas, ao abordarem a problemática vida/morte, temporal/transcendental,
apresentavam grandes dificuldades, agindo como se estivessem em um campo
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
3
desconhecido. Sentiam-se despreparados para
valorizar a experiência de da pessoa
e a pessoa de fé.
Isto nos levou a questionar o “fazer” e o “cuidar” do cotidiano da Enfermagem
quanto ao aspecto psicoespiritual, e isto constitui o problema básico desta pesquisa.
Em pesquisa realizada no mestrado, encontra-se que:
A assistência psicoespiritual tem ficado em segundo plano. Ensina-se
na teoria, mas na prática é diferente. Essa assistência tem muito, a
desejar, cuida-se mais do físico, da doença em si
(Meire,
PEIXOTO:2000).
Surgiu então o questionamento: a Enfermagem tem se preocupado com o
aspecto psicoespiritual das pessoas a quem dispensa cuidados? Os profissionais de
Enfermagem têm recebido formação para esse tipo de assistência psicoespiritual aos
clientes? As normas ensinadas e os princípios de ética no curso de Efermagem
asseguram a abertura da prática da Enfermagem para essa experiência de fé dos
clientes? O que falta na educação em Enfermagem para uma boa assistência integral
ao ser humano,
, ,
, valorizando a fé dos pacientes?
Pretende-se com o trabalho vitalizar os valores psicoespirituais na
formação dos profissionais de Enfermagem que parecem estar ficando em
segundo plano.
Neste sentido, a tese é relevante por três razões: pela importância
socioreligiosa, importância profissional e importância acadêmica, conforme se discute
na fundamentação teórica.
a.
Fundamentação teórica
A terminologia “educação em Enfermagem” constitui-se de um leque na
formação dos novos profissionais de Enfermagem, abrangendo os cursos de nível
médio (técnico), de graduação, de pós-graduação
Lato
e
Estrito Senso
, além da
formação permanente.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
4
Considera-se nesta tese, especificamente, a formação dos profissionais de
Enfermagem do ensino superior.
O que caracteriza a profissão de Enfermagem é o cuidado integral com o ser
humano traduzido na assistência psicobiológica, psicossocial e psicoespiritual.
Quando se omite um desses aspectos, não se faz Enfermagem
(PAIVA, 1999:43). Esta
consideração merece atenção especial: além de um resgate, é também uma projeção
para o futuro. Justifica-se assim
a importância
socioreligiosa, profissional e acadêmica
à valorização da assistência psicoespiritual aos clientes. O referencial teórico é a
assistência integral ao ser humano para sua rápida recuperação.
A Enfermagem tem em suas bases os valores espirituais cristãos na assistência
psicoespiritual às pessoas, entendidos como:
tratar cada pessoa como gostaria que tratassem a si mesmo;
cuidar da pessoa como um todo, psicobiológico, psicossocial e
psicoespiritualmente;
atender as necessidades básicas dos clientes, sem distinção de raça,
posição social ou credo religioso;
ver nos clientes a pessoa humana e não seu fator econômico;
jamais cuidar de seus próprios interesses prejudicando outras pessoas:
colegas, pacientes.
Esses valores devem estar voltados para o cuidado da pessoa humana,
sobretudo nos momentos mais difíceis, quando esta se sente agredida pelas doenças.
Sobre a dimensão técnica, hoje, incide muito uma dimensão religiosa cristã,
na educação em Enfermagem, referente à assistência psicoespiritual às pessoas;
porque cristianismo e educação em Enfermagem têm em comum o ideal de lutar pela
saúde integral do ser humano. É essa dimensão religiosa cristã que pode dar suporte
espiritual à Enfermagem no “fazer” e no “cuidar” das pessoas (BOFF, 1999:143).
A vivência profissional tem mostrado que os clientes que têm no
Transcendente encontram mais força para recuperação mais rápida.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
5
b.
Importância
socioreligiosa
A vivência socioreligiosa se nas diferentes áreas de nossa vida. Ela é
mesclada no nosso dia-a-dia não apenas em momentos estanques para atividades ou
orações. Na doutrina cristã, encontra-se a p
arábola do Bom Samaritano:
Um homem descia de Jerusalém a Jericó, e caiu no meio de assaltantes que,
após havê-lo despojado e espancado, foram-se, deixando-o semimorto.
Casualmente, descia por esse caminho um sacerdote; viu-o e passou adiante.
Igualmente um levita, atravessando esse lugar, viu-o e prosseguiu. Certo
samaritano em viagem, porém, chegou junto dele, viu-o e moveu-se de
compaixão.
. .
. Aproximou-se, cuidou de suas chagas, derramando óleo e
vinho; depois o colocou em seu próprio animal, conduziu-o à hospedaria e
dispensou-lhe cuidados. No dia seguinte, tirou dois denários e deu-os ao
hospedeiro, dizendo: `Cuida dele, e o que gastares a mais, em meu regresso
te pagarei [...]´
(Lc 10,30-35).
O trabalho do enfermeiro
retrata a atitude do bom samaritano, que acolhe,
cura, cuida e, independentemente de credo religioso, raça,
status
social, luta pela
vida
e, no exercício profissional, também delega funções. Tem uma atenção constante aos
“feridos no caminho”. Depois de sanar as feridas, recorre a outros profissionais da área
da saúde para uma “assistência integralizada”, isto é, com a participação de vários
profissionais da área de saúde, tais como médicos, psicólogos, sociólogos e outros.
O ser humano não está pronto. A sua experiência existencial define-se como
um processo de permanente encarnação histórica, isto é, de conquista pessoal e do
mundo. E, nessa experiência existencial, o ser humano passa por
fases de tristeza, de
dor, doenças e limitações diversas
. É justamente nessas fases que se fazem necessários
os cuidados de
Enfermagem
, na tentativa de garantir-lhe um pido restabelecimento
para a volta às suas funções, a preparação para novas realidades de limitações ou para
entrar na vida eterna.
Com a religião, tem-se a possibilidade de ver uma dimensão
diferente no ser humano
(Thaís-pesquisa, PEIXOTO:2000).
Eis, portanto, uma faceta desse suporte religioso para a assistência
psicoespiritual às pessoas.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
6
Lutar pela vida e pela dignidade humana é um dos valores cristãos. É ser
enfermeiro é lutar contra as barreiras que nos impedem de reconhecer a dignidade
humana de cada pessoa.
É deixar transparecer o transcendente no mundo, em todas
as necessidades, preocupações e anseios da pessoa humana
1
.
c.
Importância profissional
Os valores espirituais cristãos se tornam efetivos no amor e no serviço ao
próximo, no respeito à sua cultura, valorizando sua (DEGRANDIS, 2000:34), para um
rápido restabelecimento da saúde. Para gente que cuida de gente, seu trabalho deve
fundamentar-se em um respeito profundo para com as pessoas (PAIVA, 1999:46).
Segundo Neves (1998:241), é aqui que entra a empatia, a fonte de encontro das
diferenças e o sucesso na valorização da dimensão do sagrado na saúde, que se
estabelece por meio da habilidade do profissional da Enfermagem de saber usar a
linguagem da outra pessoa a quem presta cuidados.
A linguagem é o canal ordinário da empatia. Se duas pessoas chegam a certo
grau de identificação pessoal, vão usar espontaneamente um modo comum de falar.
Respeitando a dos clientes, o profissional pode se identificar melhor com
eles. Através de análises e fórmulas não se conhece as pessoas. Ao respeitar a de
outras pessoas, adquire-se uma compreensão muito mais íntima e significativa a
respeito delas do que a mera análise científica nos pode proporcionar. “Compreender,
significa, na verdade, identificar o subjetivo com o objetivo, resultando numa nova
realidade que a ambos transcende” (NEVES 1998:243-253).
A Enfermagem, sem esta assistência integral ao ser humano, perde seu
sentido de ser, pois é, justamente, esta harmonia na assistência aos clientes,
que caracteriza a Enfermagem
(Thaís-pesquisa, PEIXOTO:2000).
1
“[...] procurar sua face” (Sl 27,8) significa ir consultar a Javé em seu santuário (2 Sm 21,1). “Conhecê-
lo”, viver em sua presença (Am 5,4), servi-lo fielmente.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
7
O ser humano é um conjunto de matéria e espírito, não como duas
realidades distintas, mas fazendo parte de um mesmo todo. Por isso, quando ocorrem
distúrbios no físico, no corpo do indivíduo, seu espírito também é atingido, sua mente
abalada.
Se, por outro lado, a pessoa tem problemas psicomorais ou psicoespirituais,
seu corpo também é afetado nas suas funções metabólicas e glandulares. É o indivíduo
todo que adoece e não apenas uma das partes do ser. O espírito e o corpo interagem,
contribuindo para ativarem-se mutuamente. “As taras hereditárias, os traumas
psíquicos, as condições infra-humanas de existência modificam a relação ideal do ser
humano com seus atos e, portanto, interessam [...] à educação em Enfermagem”
(MOROUX, 1961:7).
Daí a importância de zelar-se por corpos sadios, saudáveis e por mentes
alegres, livres, contribuindo para nosso completo bem-estar como pessoa humana.
Trabalhar em saúde é um compromisso de fraternidade. Para se ter saúde e
combater as enfermidades, exige-se um esforço individual tanto do profissional quanto
do indivíduo que recebe o cuidado.
d.
Importância acadêmica
Parte-se do princípio que o trabalho transdisciplinar pode provocar um
diálogo da Teologia com a educação em Enfermagem, tentando a revalorização
psicoespiritual na assistência ao ser humano. “[...] deveria haver uma integração
interdisciplinar. Tratar desses valores fundamentais em todas as disciplinas, inclusive
em Saúde Pública, durante as visitas domiciliárias “ (Meire, PEIXOTO:2000).
O objeto de estudo da Enfermagem é o próprio ser humano, que é, por
essência, religioso, e essa religiosidade precisa ser levada em conta na sua assistência
integral, sem perder de vista esse aspecto psicoespiritual.
Precisa-se entender melhor esse aspecto psicoespiritual, falamos muito, mas
não se aprofunda. Ver o que é básico na espiritualidade. Acho esses valores
muito confusos para as alunas, o ‘como lidar com a espiritualidade do
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
8
outro’. Na realidade não se trabalha isso. É muito mais fácil prescrever e
identificar cuidados físicos
(Thaís-pesquisa, PEIXOTO:2000).
É importante trazer à tona os valores fundamentais espirituais da Enfermagem
que parecem estar sufocados pela frieza esmagadora das ciências especulativas.
Existem avanços científicos e tecnológicos em quase todas as áreas do saber. Na área
da saúde se multiplicam, em ritmo acelerado, as questões capazes de orientar novas
pesquisas. Entretanto, a dimensão religiosa cristã na educação em Enfermagem, na
assistência psicoespiritual, permanece relativamente intocável, apresentando uma
grande escassez de pesquisas e um desafio de interpretação, sobretudo no que diz
respeito à fé dos clientes. Sentimos isto em nosso próprio meio universitário.
É necessário, como diz Paulo Freire (1983:27), “reinventar” e
trazer à tona os
valores adormecidos. No diálogo da teologia com a saúde, pretendemos valorizar a
na formação dos novos profissionais de Enfermagem, na assistência psicoespiritual ao
ser humano, para a recuperação mais rápida dos pacientes, que parece estar sendo
menosprezada.
A Enfermagem tem ficado para trás. Nos dias de hoje, tão conturbados, com
tanta violência, as pessoas buscam força na fé. E eu tenho visto que a
Enfermagem tem ficado alheia ao aspecto espiritual dos clientes
(Talitha-
pesquisa, PEIXOTO:2000).
A Enfermagem é uma arte e uma ciência. Arte porque com habilidades
procura levar o ser humano a usar seus recursos para satisfazer suas próprias
necessidades básicas, ou seja, para que tenha ambiente saudável, ar puro, luz, água
potável, habitação, moradia, alimentação, emprego, recursos próprios indispensáveis
à conservação psicobiológica, psicossocial e psicoespiritual, além da elevação do nível
de vida na sociedade,
incluindo assistência de saúde, educação, lazer, segurança,
participação nas decisões administrativas da comunidade e assistência espiritual.
A Enfermagem é uma ciência porque se serve de fundamentos científicos,
sistematizando o desempenho tecnológico, para uma melhor assistência integral ao
ser humano. Como profissão da área da saúde, trabalha pela defesa da vida e da
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
9
dignidade humana. É liberal, uma vez que ela possui ética e normas específicas,
independentes das outras profissões da área de saúde. Ao mesmo tempo carece de
pesquisas e de um desafio de interpretação referente ao aspecto psicoespiritual na
assistência de Enfermagem aos clientes. São raras as pesquisas que abordam o desafio
de uma dimensão do sagrado na saúde.
A tese está dividida em duas grandes partes A Enfermagem, Vida Cuidando
de Vidas e Os Valores Espirituais na Enfermagem –
distribuídas em cinco capítulos
.
No primeiro capítulo, A dimensão religiosa cristã, discute-se sobre os valores
religiosos cristãos na prática da Enfermagem e sobre a pesquisa de campo. No segundo
capítulo, como pano de fundo, lembra-se o quanto as religiões, e, de um modo
especial, o cristianismo, ao longo de sua história deram prioridade a esse aspecto
psicoespiritual, influenciando, assim, no “fazer” e no “cuidar” profissional da
Enfermagem. Em Saúde e Religiões, discorre-se também sobre Saúde e Doença e
Crença e Cura como Força Terapêutica. No terceiro, aborda-se A Enfermagem e o
Poder de Cura pela Fé” No quarto capítulo, A Tensão entre Fé e Razão na Educação em
Enfermagem. No quinto capítulo, debate-se sobre a educação em enfermagem com
novas perspectivas para o ensino de Enfermagem na assistência psicoespiritual
aos clientes, com propostas para um futuro promissor na Enfermagem, com
novos horizontes, sem medo de mudar.
e.
Objetivos
Gerais:
a)
Discutir o ensino e a prática da assistência psicoespiritual prestada aos
clientes, partindo de percepções de docentes e discentes dos cursos de
graduação em Enfermagem.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
10
Específicos :
a) Ressaltar a dimensão dos valores religiosos cristãos na educação em
Enfermagem e no atendimento psicoespiritual aos clientes.
b) Tornar presente a importância da assistência integral ao ser humano no
processo de formação e na prática do enfermeiro;
c) Discutir na educação em Enfermagem sobre a dos pacientes como
suporte para sua rápida recuperação.
f.
Percurso metodológico
Pesquisa de campo: atividades da Enfermagem e a vivência dos valores espirituais.
Estudo do tipo descritivo-exploratório realizado na região Centro-Oeste do Brasil.
População: constituiu-se de enfermeiros docentes e de discentes dos últimos períodos,
matriculados nos cursos de graduação em Enfermagem das seguintes instituições:
Universidade Católica de Goiás (UCG), Goiânia(GO);
Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia(GO);
Universidade Juscelino Kubtschek (JK), Brasília(DF);
Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS),
Campo Grande(MS);
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Cuiabá(MT);
Universidade de Cuiabá (UNIC), Cuiabá(MT).
A escolha das instituições deve-se ao fato de se localizarem na região Centro-
Oeste, uma vez que esta é a área geográfica onde atua a pesquisadora.
A amostra foi constituída de 63 enfermeiros docentes e 141 acadêmicos de
Enfermagem. Foram estabelecidos como critérios de escolha enfermeiros atuando no
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
11
ensino e na prática de Enfermagem e alunos matriculados nos últimos anos do curso
de graduação. Tempo de atuação dos docentes: de um a trinta anos.
A Coleta de Dados foi realizada pessoalmente pela pesquisadora em visitas às
instituições, em dias, horários e locais pré-estabelecidos pela direção e previamente
agendados com os docentes e discentes dos cursos. A quantidade da amostra, para os
dois grupos docentes e discentes, foi aleatória, segundo as oportunidades oferecidas
pelas instituições pesquisadas.
O instrumento
utilizado para a coleta foi um questionário estruturado
(Anexo II), com trinta questões com os seguintes enfoques:
os valores religiosos como suporte no ensino de Enfermagem;
a dimensão religiosa presente no ensino da Enfermagem;
a assistência psicoespiritual repassada na educação em Enfermagem.
1.3.2
Aspectos éticos
Entre os aspectos éticos observados para a realização do estudo, citam-se a
apreciação e a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUCSP) (Anexo I) conforme o que recomenda a
Resolução 196/1996(BRASIL, 1996).
Para garantir o anonimato dos entrevistados, em pesquisa anterior, foram
adotados nomes fictícios (Thaís, Talitha, Carla, Elke, Miriam, Meire, Suse, Vivi, Cris,
Rose, Léo, pesquisa, PEIXOTO,2000).
A análise bibliográfica e da pesquisa de campo forneceram subsídios para
trabalhar a valorização da assistência psicoespiritual de Enfermagem aos clientes.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
12
P
RIMEIRA
P
ARTE
V
IDA
C
UIDANDO
DE
V
IDAS
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
13
A
E
NFERMAGEM:
V
ida
C
uidando de
V
idas
:
V
ida Cuidando de Vidas expressa o fazer e o cuidar profissional da
enfermagem. Este
slogan
foi proferido por uma das pioneiras da enfermagem no
Brasil, Wanda de Aguiar Horta (1997:27).
A
borda-se, nesta primeira parte, “A Dimensão Religiosa na Enfermagem:
aproximação à realidade” e A Saúde e As Religiões” quanto à assistência
psicoespiritual aos clientes. Enfoca-se “a saúde e a doença”, harmonia e desarmonia
integral do ser humano com o cosmos, em uma visão holística com ênfase ao aspecto
espiritual como componente indispensável na assistência aos clientes.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
14
C
APÍTULO
I
A
E
NFERMAGEM E A
D
IMENSÃO
R
ELIGIOSA:
aproximação à realidade
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
15
C
APÍTULO
I
A E
NFERMAGEM
E A
D
IMENSÃO
R
ELIGIOSA:
aproximação à realidade
A história da Enfermagem desde suas origens em diversos países do mundo,
evidencia as pioneiras da Enfermagem, a Enfermagem no Brasil e em Goiás. As
religiões, e de um modo especial o cristianismo, influenciaram a Enfermagem pelo
fato de a profissão ter suas origens nas primeiras comunidades cristãs e ordens
religiosas.
Evidenciar o desenvolvimento da Enfermagem é adentrar a história do ser
humano através dos séculos, na satisfação de suas necessidades básicas. Foi em
resposta a essas necessidades que se deu a gênese e a expansão da Enfermagem no
mundo (OGUISSO, 2005:2; STEWART & DOCK, 1977:82).
A palavra
enfermagem
origina-se do latim
infirmus
(CANGE, 1954:355),
significando proteção àquele que não está firme, abrangendo, portanto, o doente, a
pessoa idosa e inválida. Atualmente, o termo adquiriu sentido mais amplo, referindo-
se também à conservação e à proteção da saúde das pessoas sãs (PAIVA, 1999:11).
No século XIX, Florence Nightingale, considerada fundadora da Enfermagem
moderna, influenciou decisivamente na estruturação da profissão (LACIO, 1985:128;
SEYMER, 1996:23; KEKKY, 1999:24).
No Brasil a Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), como entidade de
Classe, o Conselho Nacional da ABEn (CONABEn); a Diretoria Central e o Conselho
Fiscal permitem visualizar como está organizada a Enfermagem no país (OGUISSO,
2005:207).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
16
1.1 Enfermagem: visão geral
Nada é tão instigante e motivador quanto descobrir nossa identidade
profissional!
O sentimento de proteção do semelhante é inerente ao ser humano pela
natureza de seus valores interiores e pela socialização. Está implícito no amor vigilante
dos pais e nos companheiros de lutas nos campos de batalhas. Esse sentimento no
cuidado e na proteção do semelhante é uma das características essenciais da profissão
de Enfermagem (HORTA, Wanda, 1979:27).
2
Para compreender o desenvolvimento da Enfermagem, torna-se importante
conhecer a história antiga quanto a contemporânea, uma vez que os momentos
decisivos na história, tais como a queda do Império Romano, ou as cruzadas, além dos
valores espirituais das religiões através dos séculos, foram decisivas para a
Enfermagem (KÜNG, 2004:19-250; VASCONCELLOS e SILVA, 2003:39). As grandes
guerras, por exemplo, foram também um marco decisivo no desenvolvimento da
Enfermagem como trabalho especializado.
Na Enfermagem distinguem-se três fases distintas: a empírica ou primitiva, no
período anterior a Florence Nightingale
3
; a evolutiva, também denominada Idade de
Florence; e a de aprimoramento, como é conhecida a fase atual (STEWART,I & DOCK
L., 1977:82; BEOZZO, 2003:39).
2
Essa característica da Enfermagem no “cuidar”
eclodiu no gesto de Verônica enxugando o rosto
agonizante de Cristo e de Maria Madalena, com o apóstolo João ao da cruz, consolando a Mãe de
Jesus.
Teve um impulso científico com as diaconisas dos primeiros séculos do cristianismo, e
um
marco científico com repercussões no ocidente, com NIGHTINGALE no século XIX.
3
Florence Nightingale (1820-1910
), inglesa de origem italiana, é considerada a primeira enfermeira que
deu um caráter científico à Enfermagem, no mundo ocidental. De cultura incomum para as mulheres
de sua época, dominava com facilidade o inglês, o francês, o alemão, o italiano, além do grego e do
latim. Destacou-se primeiro na guerra da Criméia (da França e Turquia contra a Rússia). Nessa ocasião,
traçou os primeiros princípios de higienização, cuidando, com mais 38 enfermeiras (leigas e religiosas),
de 8 mil soldados feridos, atingidos pela cólera, malária, tifo. As taxas de óbitos entre os feridos eram
elevadas, e ela conseguiu, com suas companheiras, salvar muitas vidas. Em reconhecimento aos seus
grandes feitos, recebeu o título de Miss Nightingale the Royal Red Cross em 1883. Recebeu
homenagens, incluindo Ordem de Mérito (1907). De volta à Inglaterra, escreveu duzentos livros,
reportagens e panfletos sobre contágios das doenças. Foi homenageada e reconhecida no mundo todo
como a
Dama da Lâmpada.
Lutou pelos direitos das mulheres em seguir carreiras científicas. Faleceu
em 1910. Pode ser comparada como a primeira mulher feminista por suas lutas pelos direitos das
mulheres em seguir carreiras científicas (SALLY, 1993:11-12; OGUISSO, 2005:8).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
17
1.1.1
A fase empírica
Ela é mencionada apenas como ponto de partida dos estudos de
Enfermagem, mas é necessário retomar algumas passagens, especialmente da
influência das religiões, referentes aos valores psicoespirituais importantes na
profissão de Enfermagem.
A Medicina e a Enfermagem tiveram origens distintas e existiram assim por
séculos sem muito convívio entre si, pois a prática médica e a cirúrgica eram muito
simples, o requeriam muita habilidade (OGUISSO, 2005:24). O progresso do qual
nos beneficiamos hoje é produto de lento desenvolvimento para o qual contribuíram
muitas pessoas e fatores de várias ordens. Naquela época, não haviam profissionais ou
equipamentos adequados, o que colocava em risco a vida de várias pessoas (BOWKER,
1997:6-334; CHRISTOPHER, 1985:169).
Na Enfermagem está implícita a influência de valores espirituais e da vida
cristã das pioneiras diaconisas, mulheres ricas da sociedade romana convertidas ao
cristianismo, que deram todas as suas fortunas para construir mosteiros, hospitais e
abrigos para os pobres e doentes (OGUISSO, 2005:36).
O movimento de enfermeiras visitadoras foi organizado nas igrejas primitivas.
A primeira organização foi das diaconisas, com o objetivo de prestar cuidado aos
doentes em domicílio e ajudar os necessitados, visitar os prisioneiros e enterrar os
mortos (DOLAN, 1941:37, tradução nossa). Prestavam assistência sica, intelectual
(social) e espiritual. Entendiam que as pessoas têm necessidade o de alimentos e
roupa, mas também de fraternidade. Incluíram em seus cuidados a assistência
hospitalar e o melhoramento do meio ambiente. Vivenciavam as palavras de Jesus: “o
que fizerdes a um destes pequeninos, foi a mim que o fizestes”, “felizes os
misericordiosos, porque alcançarão misericórdia” (Mt 5,7) (GONZÁLEZ, 1999:107).
A primeira enfermeira diaconisa foi Febe, da Grécia, amiga do apóstolo
Paulo. A Bíblia documenta que ela foi instruída por Paulo para dar assistência aos
feridos. Outra enfermeira que merece destaque é Stª Olympia, diaconisa, cujas
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
18
atividades foram testemunhadas por São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla.
Ela era irmã do imperador romano e esposa de Constantino. Doou aos pobres sua
imensa fortuna que recebera de herança de seus parentes. Construiu conventos com a
ajuda de um grande número de adeptos amigos que trabalhavam em serviço de
caridade, louvando a Deus. Fundou a Ordem das Diaconisas, que teve destaque por
muitos anos.
Merece destaque também um grupo de mulheres da sociedade romana que
se distinguiu no trabalho de Enfermagem.
Eram mulheres ricas
da sociedade,
inteligentes, que haviam se convertido ao cristianismo. Fundaram hospitais e
conventos e trabalhavam para o bem do próximo. Entre elas, temos Sta. Helena (250-
330)
4
, com o nome de Flávia Helena, mãe de Constantino o Grande
5
. Ela se converteu
ao cristianismo e dedicou sua vida aos necessitados. Construiu abrigos e Igrejas para
os peregrinos que iam visitar os Santos Lugares em Jerusalém (DOLAN, 1941:75,
tradução nossa).
Flácida, esposa de Teodoro o Grande e filha de Cláudio, o prefeito de Gaul,
construiu hospitais e dava atendimento aos doentes. Ela visitava e ofertava comida aos
doentes.
Sta. Marcela, também da Grécia, é considerada a primeira enfermeira
científica. Ela transformou o luxo de seu palácio em um mosteiro. Encorajou outras
romanas a deixarem suas vidas fáceis e estudarem latim, literatura grega e as
Escrituras. Foi assassinada durante o saque de Roma.
Sta. Fabíola pertenceu ao grupo de Sta. Marcela (390 d.C). Doou sua imensa
riqueza aos pobres. A grande multidão que compareceu ao seu funeral é testemunha
da gratidão de seus pacientes e do povo romano.
4
Sta. Helena
,
mãe de Constantino
, foi a primeira matrona, convertida, e passou a vida a cuidar dos
necessitados e doentes. É conhecida pelas relíquias das três cruzes. Lutou para reconhecer a
verdadeira Cruz de Jesus (DOLAN, 1941:70; OGUISSO, 2005:37)
5
Constantino, o Grande
, imperador romano que construiu a capital do Império Romano do Oriente,
Constantinopla. Concedeu liberdade de culto aos cristãos no ano de 313 (DOLAN, 1941:75, tradução
nossa).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
19
Sta. Paula (347-404), romana, nascida de família nobre, descendente dos
Gracchi e de Scipios, sua riqueza incluía a cidade de Necrópolis, construída por
Augustus. Foi uma das mulheres mais instruídas dos primeiros tempos, do
cristianismo. Ela ajudou São Jerônimo
6
a traduzir as Sagradas Escrituras conhecidas
como Vulgata (OFÍCIO DIVINO IV, 1999:1328), e encorajava as mulheres a estudarem
e se dedicarem aos doentes. Paula, acompanhada de sua filha, foi à Palestina (385), em
Belém, onde construiu abrigo e hospital para os peregrinos. São Jerônimo
testemunho das atividades e contribuições das mulheres romanas: eram de grande
espiritualidade, movidas pelo conhecimento e tinham habilidade para o ensino
(DOLAN, 1941:69; 70;78, tradução nossa).
Na Idade Média, destacam-se: Sta. Hildegarda (1098-1179), que escreveu vários
livros na área da Medicina direcionados às religiosas encarregadas dos numerosos
abrigos para doentes e peregrinos, cujos conhecimentos abrangiam ciências naturais,
a filosofia, a medicina, a Enfermagem e a música acredita-se até que sua instrução
superava à dos médicos da época (OGUISSO, 2005:39); Sta. Isabel da Hungria (1207-
1231); Sta. Catarina de Siena (1347-1380); São João de Deus (1540-?); São Camilo de
Lelis (1550-1614); São Vicente de Paulo (1576-1660); Sta. Luíza de Marillac (1591-1660);
as Begüinas, entre outros. São Francisco de Assis (1182-1226), fundador da Ordem
Franciscana, dedicou-se aos pobres e humildes, servindo aos leprosos, a quem
considerava os mais desamparados pela sociedade. Sta. Clara, a exemplo de São
Francisco, criou junto com outras mulheres a Ordem Franciscana feminina (Clarissas),
cuidando especialmente dos leprosos (Apud OGUISSO, 2005:38).
6
São Jerônimo
, presbítero e doutor da Igreja (340-420), de Estridão (Dalmácia). Possuía vastíssima
cultura literária e bíblica. Considerado o Leão do deserto, patrono dos biblistas. Foi secretário do Papa
Dâmaso. Auxiliado por Santa Paula e mulheres cultas da sociedade, destacou-se e promoveu a vida
monástica. Em Belém, tomou parte muito ativa nos problemas e não necessidades da Igreja. Escreveu
muitas obras, particularmente comentários das Sagradas Escrituras. (OFÍCIO DIVINO IV, 1999:1328).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
20
1.1.2 A fase evolutiva ou idade de Florence
A Enfermagem como visto anteriormente, tem sua origem nas religiões,
especialmente nas cristãs, das quais adquire valores indispensáveis ao desempenho da
profissão no cuidado das necessidades básicas das pessoas, dando assistência
indiscriminadamente de religião,
status
social, raça ou cor (STEWART, 1977:1-97).
No Brasil, os escravos tiveram relevante função ao auxiliar as famílias e os
religiosos nos cuidados aos doentes, quando já haviam sido fundadas no país as Santas
Casas de Misericórdias, no período entre 1543-1880 (OGUISSO, 2005:102).
O trabalho dos feiticeiros e sacerdotes das sociedades tribais também incluía
o auxílio global aos indivíduos necessitados de assistência à saúde (PIRES, 1989:13)
7
.
No século XIX, mulheres voluntárias, motivadas pelo ideal de socorrer o ser
humano doente e salvar vidas nos campos de batalhas (TERRIN, 1998:184), fizeram
surgir a Enfermagem Científica, que tem suas raízes também nas congregações de
irmãs religiosas de caridade, que, séculos, em vários países do mundo, se dedicam
à assistência aos enfermos e à luta pela vida plena do ser humano (TERRIN, 1998:13).
Florence Nightingale (1820-1910), conhecida como a Dama da Lâmpada e o
Rouxinol da França (SALLY, 1993:11-12), é personagem marcante na elevação do
status da atividade de Enfermagem. Realizou sua obra na segunda metade do século
XIX, que se difundiu por todo o mundo ocidental influenciando, decisivamente, na
estruturação da profissão. Não foi, porém, um fenômeno isolado, mas parte de um
movimento geral para a melhoria das condições da vida humana (LACIO, 1985:128).
7
Uma das primeiras vertentes do trabalho da Enfermagem, organizado como serviço reconhecido
socialmente, foi o trabalho do corpo e do espírito. Outra foi o trabalho leigo das diaconisas nas igrejas
primitivas, como vimos.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
21
No desejo de realizar-se como enfermeira, Nightingale passou o inverno de
1844 em Roma, estudando as atividades das Irmandades Católicas. Em 1849, fez uma
viagem ao Egito e decidiu a servir a Deus, trabalhando em Kaiserswert, Alemanha,
entre as diaconisas. Disposta a seguir sua vocação, preparou-se para a sua grande
missão.
Quando a Inglaterra, a França e a Turquia (1854) declararam guerra à ssia
(Guerra da Criméia), os soldados encontravam-se muito abandono, e a mortalidade
entre os hospitalizados era altíssima. Nightingale e 38 voluntárias (religiosas, leigas) de
diferentes hospitais conseguiram abaixar a taxa de mortalidade de 40 para 2%. Os
soldados intitularam-na “anjo da guarda”, posteriormente imortalizada como a “Dama
da Lâmpada" porque, com lanterna à mão, percorria as enfermarias, atendendo aos
doentes. Nightingale contraiu febre tifóide e, ao retornar da guerra (1856), mesmo
inválida, dedicou-se com ardor a trabalhos intelectuais. Pelo prêmio que recebera do
governo inglês, pela sua atuação na Criméia, fundou a Escola de Enfermagem Saint
Thomas (1859), passando depois a ser chamada de Escola de Enfermagem Nightingale,
onde foram criadas as bases do ensino de Enfermagem, com a preparação das
primeiras enfermeiras diplomadas (OGUISSO, 2005:7; LIRA, 1989:45).
Também no século XIX a Igreja Protestante, na Inglaterra, começou a se
desenvolver trabalhos para cuidar de doentes, destacando-se o de Theodor Fliedner
(1822), um jovem pastor. Fundou uma escola de Enfermagem com o nome de
Diaconisas de Kaiserswerth e comprou uma casa que servia de abrigo e hospital para
os doentes. Elizabeth Fly (1780-1845), esposa de Fliedner, dama da sociedade que
cuidava de prisioneiros, em particular, de mulheres e doentes mentais, fundou a
primeira Ordem Protestante na Inglaterra, as Irmãs de Misericórdia, ou Irmãs de
Enfermagem (1840), que mulheres eram treinadas para cuidar de doentes (OGUISSO,
2005:51).
É curioso constatar (1860-1897) a similaridade histórica da profissionalização
da Enfermagem nos diversos países: Reino Unido, Estados Unidos, França, Portugal,
Espanha, Argentina, Taiwan (OGUISSO, 2005:140).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
22
Nas primeiras escolas de Enfermagem, o médico foi de fato a única pessoa
qualificada para ensinar. A ele cabia, então, decidir quais das suas funções poderia
delegar para as enfermeiras.
Florence morreu em 13 de agosto de 1910, deixando emergente o ensino de
Enfermagem. Assim, a Enfermagem surge não mais como uma atividade empírica,
desvinculada do saber especializado, mas como uma ocupação assalariada que vem
atender à necessidade de mão-de-obra nos hospitais, constituindo-se como uma
prática social institucionalizada e específica (OGUISSO, 2005:51).
As primeiras atividades da Enfermagem, cujos membros eram intitulados
enfermeiras, desempenhavam inúmeros papéis: farmacêuticas, nutricionistas,
fisioterapeutas e assistentes sociais, com uma atenção voltada a medidas de alívio e
manutenção de ambiente higiênico. Como provedoras de cuidados de saúde,
satisfaziam a todas as necessidades do paciente (IYER, 1993:15).
1.1.3 Fase de aprimoramento
, fase atual
Enfermagem moderna (Brasil)
A Enfermagem brasileira (1890) tem seu momento histórico incrustado na
influência do período vitoriano na Inglaterra e na religiosidade predominante nas
culturas. Está ligada à Enfermagem norte-americana e ao movimento sanitarista
surgido no Brasil, nas primeiras décadas do século XX, no contexto da política
governamental de industrialização, urbanização e liberação portuária para
importação e exportação (PAIVA, 1999:11).
No final do século XIX, as doenças infecto-contagiosas, trazidas pelos
europeus e pelos escravos africanos, começaram a propagar-se rápida e
progressivamente e a questão saúde passa a se constituir um problema econômico-
social. Para deter essa escalada que ameaçava a expansão comercial brasileira, o
governo, sob pressões externas, assumiu a assistência à saúde, através da criação de
serviços públicos, da vigilância e do controle mais eficaz sobre os portos. Estabeleceu
uma quarentena e revitalizou, através da reforma Oswaldo Cruz introduzida em 1904
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
23
(OGUISSO, 2005:57), a Diretoria-Geral de Saúde Pública, incorporando novos
elementos à estrutura sanitária, como o Serviço de Profilaxia da Febre Amarela, a
Inspetoria de Isolamento e Desinfecção e o Instituto Soroterápico Federal, que
posteriormente veio se transformar no Instituto Oswaldo Cruz (PAIVA, 1999:11).
Mais tarde, a Reforma Carlos Chagas (1920), numa tentativa de reorganização
dos serviços de saúde, criou o Departamento Nacional de Saúde Pública, órgão que,
durante anos, exerceu ação normativa e executiva das atividades de Saúde Pública no
Brasil.
A formação de pessoal de Enfermagem para atender inicialmente aos
hospitais civis e militares e, posteriormente, às atividades de saúde pública principiou
com a criação, pelo governo, da Escola Profissional de Enfermeiros, no Rio de Janeiro,
junto ao Hospital Nacional de Alienados, do Ministério dos Negócios do Interior. Essa
escola é, de fato, a primeira escola de Enfermagem brasileira. Foi criada pelo Decreto
Federal n.791, de 27 de setembro de 1890, e denomina-se hoje Escola de Enfermagem
Alfredo Pinto, pertencendo à Universidade do Rio de Janeiro (UNI-RIO) (OGUISSO,
2005:60).
A Cruz Vermelha Brasileira foi organizada e instalada no Brasil no final de
1908, tendo como primeiro presidente o médico Oswaldo Cruz. Destacou-se a Cruz
Vermelha Brasileira por sua atuação durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
Durante a epidemia de gripe espanhola (1918), colaborou na organização de postos de
socorro, hospitalizando doentes e enviando socorristas a diversas instituições
hospitalares e em domicílio. Atuou também socorrendo vítimas das inundações, nos
estados de Sergipe e da Bahia, e das secas, no Nordeste. Muitas das socorristas
dedicaram-se ativamente à formação de voluntárias, continuando suas atividades
após o término do conflito.
As primeiras escolas de Enfermagem no Brasil foram: Escola Alfredo Pinto
(Rio,1890); Escola da Cruz Vermelha (Rio, 1908); Escola de Enfermeiras do
Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), São Paulo (1922);
Escola Ana Nery
(Rio,1923) - destacada como elemento-chave no processo de institucionalização da
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
24
Enfermagem, foi a primeira escola brasileira a ministrar o ensino sistemático de
Enfermagem. No período de 1937-1956, foram organizadas 29 novas escolas de
Enfermagem no Brasil. A Escola Carlos Chagas (Belo Horizonte-MG,1933).
Em Goiás, registros da Escola de Enfermeiras Florence Nightingale
(Anápolis-GO, 1937), da Escola de enfermeiras da Casa de Saúde Evangélica (Rio
Verde-GO, 2002) (GUIMARÃES, 2004:24-45). A Escola de Enfermagem São Vicente de
Paulo (Goiânia-GO, 1942), que posteriormente se tornou o Departamento de
Enfermagem da Universidade Católica de Goiás (UCG), tem grande influência na
Enfermagem de Goiás, assim como o curso de Enfermagem da Universidade Federal
de Goiás (UFG, 1975). Atualmente existem outros cursos de Enfermagem em
funcionamento tanto na capital quanto no interior do estado: Anápolis-GO (1999),
Valparaíso (2001), Ipameri (2003), e outros que ainda estão sendo criados no estado de
Goiás (GUIMARÃES, 2004:45-35).
“Vida cuidando de vidas”, expressão utilizada por Horta (1979:27), tem sido
parafraseada por seus discípulos e trabalhada em eventos científicos da categoria, a
exemplo da Semana Brasileira de Enfermagem realizada em Goiânia, em 1999, que
expressou a grandeza da profissão da Enfermagem.
Vários fatores alteraram a dimensão da prática da Enfermagem, entre eles, as
modificações sociais, científicas, tecnológicas, educacionais, econômicas e políticas.
Durante o processo evolutivo, traço comum remanescente é a atenção da
Enfermagem sobre a totalidade das necessidades da pessoa. Isso levou à criação de
uma diversidade de especialidades: fisioterapia, serviço social, nutrição, contribuindo
para sanar as necessidades básicas das pessoas.
Para que o enfermeiro possa dar assistência integral à pessoa humana, além
do preparo sobre comportamento, atitudes e conhecimentos técnicos de Enfermagem,
são exigidos conhecimentos de química, fisiologia, biologia, psicologia, sociologia,
farmacologia, ética, doenças transmissíveis e não-transmissíveis, vacinas, saúde
pública, obstetrícia, pediatria, clínica médica e cirúrgica, bioestatística, teologia da
saúde e administração, esterilizações e assepsia de materiais. O Processo da
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
25
Enfermagem, que é a sistematização da assistência, permite que sejam aplicados, na
prática, esses fundamentos teóricos (HORTA,1979:27).
Nos dias atuais, a Enfermagem brasileira se organiza, civil e socialmente, por
meio da ABEn, da Federação Nacional das Enfermeiras (FNE), das
Sociedades/Associações de Especialistas de Enfermagem e do Conselho Federal de
Enfermagem (COFEn), que atua por delegação do poder público.
A Revista Brasileira de Enfermagem (REBEn) (1929),
Órgão Oficial da ABEn, é
publicada bimestralmente e constitui-se de grande valor para a classe. Trata de
assuntos relacionados à saúde, profissão e ao desenvolvimento da ciência.
1.2
Dimensão religiosa cristã na prática da Enfermagem
Ser ou tornar-se um ser humano significa ser religioso (ELIADE, 1984:7). Nos
documentos paleantropianos das gêneses humanas, não existe comprovação de
religiosidade porque a religião não é elemento “fossilizável”. Entretanto, os
antropólogos consideram que eles eram humanos completos e por isso tiveram
religião, porque o ser humano tem se mostrado ao mesmo tempo
faber
,
sapiens
e
religiosus
(ARDUINI, 1999:50).
A dimensão religiosa pode provocar sentimentos extremamente ambíguos
nas pessoas: produzir o melhor e o pior, ou seja, um sentimento muito sutil ou
violento. Desse modo, pode-se ter grandes inquisidores ou serafins. Levar à capacidade
de adorar, de absolutizar, erigindo em absoluto qualquer coisa limitada: a pátria, a
ciência, o partido, o cônjuge, ou cair na idolatria constantemente denunciada pelos
profetas da Bíblia (Is 1,21). Pode um indivíduo se tornar cego e até fanático.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
26
Ao contrário, quanto mais nos tornamos humanos, fraternos mais nos
aproximamos do verdadeiro Absoluto
8
.
A religião é uma das forças gigantescas que perpassa o coração humano.
Entretanto, a religiosidade pura e simplesmente não basta. Cada época se transforma,
e o curso do tempo traz a cada instante novos problemas. As questões das sociedades
hoje não são as mesmas da Idade Média ou do Terceiro Mundo; outras são as
angústias das sociedades desenvolvidas e hiperorganizadas.
Os antropólogos têm registrado que a busca de relacionamento com o
Absoluto, a dimensão religiosa, é o fator mais constante e universal nas culturas dos
povos.
Todas ´as pessoas’
9
estão presas numa teia inescapável de mutualidade;
entrelaçados num único tecido do destino. O que quer que afete a um
diretamente afeta a todos indiretamente. Não posso nunca ser o que deveria
ser; até que você seja o que deveria ser. E você não pode nunca ser o que
deveria ser até que eu seja o que devo ser
(KING, on line,24-
--
-
maio/2005).
É mister, em cada época, reorganizarmos os valores religiosos, para que
realmente respondam aos problemas humanos atuais; para os cristãos, a Boa Nova
não pode deixar de ser boa-nova, de ser resposta à vida humana
10
.
A profissão de Enfermagem assiste a pessoa mediante o respeito no
atendimento de suas necessidades básicas. Para tanto, é imprescindível identificar seus
problemas, tendo amplos e atualizados conhecimentos sobre o cuidado integral, sem
os quais sua atuação seria desnecessária e, muitas vezes, prejudicial (HORTA, 1979:11).
A Enfermagem é arte e ciência. É arte porque, com habilidades, procura, entre
outros aspectos, levar o ser humano a usar seus recursos para satisfazer suas próprias
8
Para os cristãos, descobrir o verdadeiro Absoluto é descobrir o Deus humilde e vivo, na manjedoura
de
um estábulo
, e dobrar o joelho diante d’Ele (Mt 2,11). Adorar o verdadeiro Deus nos torna cada vez
mais humanos.
9
O grifo é nosso.
10
A essência dos valores cristãos é ser Boa Nova (Lc 2,10-11). É o próprio Filho de Deus, Jesus Cristo. E a
condição para vivenciarmos esta
Mensagem
é, procurarmos esclarecer-nos na
limpidez da doutrina
cristã
. Não podemos, por exemplo, ser pré-marxistas ou pré-freudianos.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
27
necessidades básicas
11
; e é ciência porque se serve de fundamentos científicos,
sistematizando o desempenho tecnológico, para melhorar a assistência integral ao ser
humano. Seu currículo está direcionado para esse preparo de comportamentos e
atitudes.
A doença quase sempre causa medo, pavor, insegurança. E a Enfermagem
pode levar luz e novas esperanças às pessoas angustiadas, proporcionando-lhes
tranqüilidade e paz nessa hora difícil. Entre os cristãos, pode simbolizar o bom
samaritano, o gesto de Verônica, enxugando o rosto de Jesus, a solidariedade de João e
Maria Madalena, com a mãe de Jesus ao da cruz, a lâmpada usada pelas diaconisas
nos primeiros séculos do cristianismo e por Florence Nightingale, no século XIX, nos
campos de batalha. Apesar da explosão de informações e da rápida evolução que
ocorre na biotecnologia, precisamos continuar a promover a conduta agradável,
gentil, com nossos semelhantes, cujas vidas temos o privilégio de tentar melhorar
(SUDDARTH, 1991:5).
Um outro aspecto bastante usual nas definições de Enfermagem reporta-se ao
espírito de “cuidar” a ela inerente, à devoção desinteressada a uma causa
fundamentalmente dedicada a ajudar as pessoas doentes. É uma dimensão religiosa
cristã que vem das origens da Enfermagem, como visto anteriormente. Respeitar,
ajudar a satisfazer os anseios espirituais do paciente faz parte do cuidado básico de
enfermagem.
As citações que exaltam a responsabilidade do enfermeiro no que se refere ao
atendimento das necessidades espirituais e materiais do paciente evidenciam a
enorme influência do cristianismo na Enfermagem ocidental, que atravessa séculos e
marca fortemente nossa cultura brasileira (SUDDARTH, 1991:103). O enfermo clama
por uma espiritualidade que responda ou ao encontro de suas angústias,
inquietações, inseguranças, de suas decepções. Clama por uma força do seu interior
11
Necessidades básicas
: ambiente saudável, habitação, moradia, alimentação, emprego, recursos
próprios indispensáveis à conservação psicobiofísica, psicossocial e psicoespiritual; elevação do nível
de vida na sociedade, incluindo assistência de saúde, educação, lazer, segurança, participação nas
decisões administrativas da sociedade e assistência espiritual.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
28
que humanize suas angústias. Ele busca, ainda que inconscientemente, segundo a
doutrina cristã, recuperar a dimensão mística da cruz
12
.
Os dados qualitativos do estudo
Em estudo anterior (PEIXOTO 2000:1-126), identificamos posicionamentos
dos profissionais de Enfermagem e o modo como agem em relação aos
valores
espirituais e à dimensão religiosa
. Esses dados contribuíram para respaldar a discussão
em torno da formação dos profissionais para a assistência psicoespiritual, trabalhada
no presente estudo.
A. Dimensão dos valores religiosos
Q-1. Em quê a religião influencia a Enfermagem?
As respostas a essa pergunta foram bem semelhantes. Os entrevistados
consideraram que a religião influencia no “doar” às pessoas carinho, amor, afeto,
atenção no cuidar, bem como nos aspectos da consciência, como lealdade, respeito.
São justamente esses valores que qualificam a profissão da Enfermagem,
diferenciando-a de outras profissões. Então, podemos considerar que, na prática da
Enfermagem, está incluída a dimensão de muitos valores religiosos. “A religião é muito
importante para humanizar. Porque tecnologia, para mim, significa algo muito frio,
muito mecânico” (Talitha-pesquisa,PEIXOTO:2000).
É um perigo não trabalhar com esses valores nos dias de hoje, pois estão
presentes na vivência cotidiana das pessoas e vão influenciar sempre:
12
Cruz onde morreu o ungido
, o servo de Javé, o Cristo. Segundo a analogia cristã,
o Cristo atual é o
doente
sobre o qual a dor estendeu sua mão implacável, que revive em sua carne
a morte e
ressurreição
de Jesus, o Primogênito entre os mortos.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
29
[...]positivamente, ajudando numa recuperação mais pida do paciente ou
negativamente com uma carga de preconceitos, de superstições que
deprimem mais as pessoas dificultando sua cura
(Talitha-
pesquisa,PEIXOTO:2000).
Hoje, o sentido epistemológico de humanização está muito diversificado. Para
o Ministério da Saúde (2005), humanizar é socialização fria, visando ao desempenho
profissional-tecnológico, em ambiente limpo, sem nenhuma preocupação com as
outras necessidades básicas dos pacientes. No sentido cristão, ele vai muito além de
uma socialização fria, por caridade, para ficar livre do outro, em certas circunstâncias.
Humanização aqui é no sentido de um profundo respeito pela pessoa do outro. É no
sentido de fraternidade, acolhimento das pessoas. Os valores religiosos cristãos nos
ajudam a ser mais humanos, mais acolhedores das necessidades básicas dos pacientes.
1.3 Assistência psicoespiritual
Q-2. A Enfermagem tem se preocupado com o aspecto
psicoespiritual dos clientes?
As respostas da maioria dos entrevistados foram
negativas.
Os docentes
consideram que estão
“tecnificando”
o ensino e esquecendo essa parte espiritual que é
tão importante no
“cuidar”,
na relação com o ser humano; acham que estão deixando
muito a desejar nesse aspecto. Nos dias de hoje, tão conturbados, as pessoas procuram
forças na fé; e a
Enfermagem
tem ficado alheia à vida espiritual dos clientes e, às
vezes, até proíbe
líderes religiosos
de oferecerem essa assistência espiritual às pessoas
doentes. Uma das entrevistadas afirma que
“se ensina muito na teoria, mas não se
vivencia na prática”.
Eu acho que a religião, neste contexto, é importante para criar novos
sentimentos e não apenas ‘fazer’, desempenhar tarefas. Temos um
despreparo tão grande, todas nós dos cursos de graduação, que nem
ousamos falar nesse assunto. Poucas disciplinas enfocam essa questão, e
bem superficial
(Carla e Suse-pesquisa, PEIXOTO:2000).
Percebemos aqui uma grande contradição no comportamento dos profissionais
da Enfermagem. Os enfermeiros educadores entrevistados estão convictos da
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
30
importância da religião na vida das pessoas e de que o que caracteriza a profissão da
Enfermagem é a assistência integral ao ser humano. Chegam a abordar, na teoria,
quando dão aulas, sobre a importância da atenção ao aspecto psicoespiritual dos
pacientes, mas não colocam em prática esses ensinamentos. E, o que é pior, muitas
docentes sequer falam dessa assistência. Esse tema tem se tornado estranho para os
acadêmicos. Alguns até questionam: “O que é assistência psicoespiritual? É chamar o
psicólogo para o doente, ou o padre para dar a extrema-unção?”
A Enfermagem convive
com doentes, com seres necessitados de cuidados,
frágeis, com necessidades afetivas, e se não tivermos amor, doação, carinho, não se
ensina
.
A epistemologia e a ontologia do cuidado se refletem na forma como o
cuidado é visualizado. O
“cuidar” e o “fazer” da Enfermagem
requerem a visão
holística do ser humano, sem a qual não exercemos a profissão. Como disse Boff
(1999:93):
”quem cuida, cuida do todo
. O ser humano é indivisível. Podemos até curar
uma ferida local em um dos membros do corpo, mas, se não levarmos em conta as
necessidades básicas da pessoa, ela não ficará saudável”. Para Waldow (2004:20),
“cuidar é ajudar o outro a crescer e se realizar.
Cuidar do corpo de alguém é prestar
atenção ao sopro que o anima. E isto é um desafio para a Enfermagem:
vitalizar a
preocupação com os aspectos psicoespirituais aos clientes
.
Q-3 Na educação em Enfermagem, o aspecto psicoespiritual dos
clientes tem a mesma prioridade que os aspectos psicobiofísico e
psicossocial?
As respostas da maioria dos entrevistados foi negativa. Consideram que houve
um esquecimento desse aspecto na prática dos enfermeiros, mas lembram que um
enfoque especial nas aulas, embora reconheçam que, como mesmo a ciência
confirma, não é só o “bisturi” que cura.
Tem-se a visão holística do paciente, mas no aspecto humano, e deixa
muito a desejar. Mesmo o aspecto humano tem sido abordado como
atendimento das necessidades biofísicas: higienização do ambiente, e
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
31
realização das tarefas técnicas referentes ao doente
(Suse e Vivi-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
A Enfermagem reconhece que os valores espirituais são fundamentais no
tratamento dos clientes, mas não são levados a sério. O que está acontecendo com a
Enfermagem? Será que é sobrecarga de trabalho? Horas-extras exaustivas? Salários
desestimulantes? Superlotação das unidades básicas e dos hospitais? A presença de
uma mentalidade tecnocrata? Uma visão secularizada?
Q-4.
A do cliente pode influenciar em sua recuperação de
maneira que ela seja mais rápida?
Todos os entrevistados reconheceram a importância da cura espiritual na
recuperação dos aspectos psicobiofísico e psicossocial do cliente. Estão convictos de
que as pessoas que têm essa força espiritual maior recuperam-se mais rapidamente,
atingem as expectativas. “A harmonia entre mente e corpo é importante na cura”.
“Quando o espiritual está bem, influencia diretamente na cura” (Thais, pesquisa,
PEIXOTO: 2000).
A gente percebe que quem acredita e está mais próximo da presença de Deus
tem uma recuperação mais tranqüila. Supera de uma forma melhor tanto a
vitória, no sair bem; e até mesmo a morte. Quem tem sabe exatamente o
caminho de cada saída. Quem tem enfrenta até a morte com muito mais
facilidade. Os que não têm fé são muito difíceis de serem tratados
(Cris,Vivi e
Léo-pesquisa,PEIXOTO:2000).
São interessantes essas respostas. Se a recuperação é mais rápida para aquelas
pessoas que têm fé, então por que a Enfermagem não tem levado a sério esse aspecto?
Se a Enfermagem se empenha na recuperação, mais rápida possível, dos seus clientes,
então por que não planeja os cuidados psicoespirituais, ao mesmo tempo que os
outros aspectos?
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
32
Q-5. A fé do profissional de Enfermagem em um Ser Superior,
pode ajudar na recuperação dos clientes? Como?
Os entrevistados foram unânimes em dizer que sua própria ajuda a
respeitar a religiosidade dos pacientes. “Quem tem é sensível às necessidades dos
pacientes. Para cuidar, você não pode cuidar de uma forma agressiva, você não pode
estar desmotivada” (Talitha, pesquisa, PEIXOTO:2000).
Quem tem anuncia o verso da medalha: “Hei! Alegra-te, tudo vai dar certo!
Você não está sozinho! Ânimo! Para quem tem fé tudo é possível!”
Q-6. Você, quando presta assistência de Enfermagem, preocupa-se
com o aspecto psicoespiritual das pessoas?
Quando desenvolve pessoalmente cuidados técnicos aos pacientes, a maioria
dos entrevistados preocupa-se com o aspecto psicoespiritual das pessoas. Contudo,
sem planejamento, sente dificuldades em atender às necessidades das pessoas.
Os
professores precisam saber o que está acontecendo, do que as pessoas estão
precisando (Thaís, Talitha e Míriam-pesquisa, PEIXOTO:2000).
Percebe-se, aqui, que
os
enfermeiros docentes têm uma abertura para a
dimensão religiosa e acreditam na força da para a recuperação dos clientes.
Usam
esse recurso como um cuidado à parte, sem planejamentos, como se o integrassem
os cuidados da Enfermagem.
Dão essa assistência quando surgem oportunidades, mas
não anotam nos prontuários dos pacientes. Dão a entender que se trata de um
cuidado independente da assistência de Enfermagem e, também, que não é um
cuidado muito importante para a recuperação das pessoas.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
33
1.4 Educação em Enfermagem
Q-7. Quando você faz orientações de Enfermagem aos clientes,
fala sobre os valores espirituais?
Os entrevistados reconhecem a importância dos valores religiosos para o
respeito à individualidade e à diferença das pessoas. Ao mesmo tempo o se sentem
aptas para abordar o tema. Percebem a necessidade de mecanismos que viabilizem
essa capacitação.
Segundo Arduini (1999:54), a
“religião é a chave hermenêutica para a
compreensão da contextura cultural dos povos
”.
Para respeitar a dos clientes, é imprescindível ter conhecimentos das
diferentes doutrinas
13
das religiões, daquilo que pode motivar a fé das pessoas.
[...] devemos ampliar os conhecimentos psicoespirituais através de leituras,
seminários, grupos de discussões, grupos de assistência mesmo, acompanhar
grupos de assistência espiritual, mostrar para as alunas, como organizar esses
grupos de ajuda, ou auto-ajuda também; e ler muito, pesquisar. Os próprios
professores precisam ter convicção também, mais segurança, de que
também eles precisam desse aspecto espiritual. Eles não podem transmitir
segurança, se não têm convicção do outro aspecto da vida, dessa dimensão
Transcendental
(Talitha, Léo, Cris e Vivi-pesquisa, PEIXOTO:2000).
Q-8. Em que a educação em Enfermagem precisa melhorar para
prestar assistência psicoespiritual aos clientes?
Apesar de as escolas passarem atualmente por uma reforma curricular,
percebe-se ainda a necessidade da interdisciplinaridade e de conhecimentos
específicos que possam respaldar a assistência psicoespiritual.
13
Doutrinas:
regulamentos, normas que norteiam as ações dos fiéis nas religiões.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
34
Detectam-se aqui propostas
para uma possível melhoria do ensino dos novos
profissionais de Enfermagem, no atendimento do aspecto psicoespiritual aos clientes:
Deveria haver uma integração interdisciplinar e tratar dos valores
fundamentais da Enfermagem em todas as disciplinas, inclusive nas visitas
domiciliárias,
na formação dos profissionais. E um posicionamento
profissional voltado para o ensino tem que valorizar a religiosidade da
pessoa, porque, senão, nós não ensinamos. Vai depender dos professores, vai
depender de cada educador, de dar mais esse enfoque espiritual. A grande
dificuldade pela qual a Enfermagem está passando é que ela quis ser muito
‘profissional’, e achar que ser profissional é ser dura, autoritária, para que a
Enfermagem seja aceita como profissão
(Thaís e Talitha-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
As pessoas entrevistadas propõem que todos os enfermeiros docentes
assumam a responsabilidade de ensinar a assistência integral aos pacientes e não
deixem a cargo apenas de algumas disciplinas, como a Ética e a Psicologia. Assim, esse
aspecto teria a oportunidade de ser melhor embasado nas atividades técnicas da
Enfermagem. “Apesar da sobrecarga de tarefas técnicas, a Enfermagem deve insistir em
buscar mais tempo para ouvir as pessoas” (Talitha-pesquisa,PEIXOTO:2000).
É difícil para a Enfermagem oferecer assistência psicoespiritual aos clientes, se
não se dispõe de tempo. Quando o cliente percebe que a enfermeira está com pressa,
ele se inibe e se fecha em si mesmo. E, se é interrogado, não tem espontaneidade para
falar de suas necessidades básicas. Ter mais tempo para ouvir as pessoas é
indispensável à Enfermagem.
“Dar mais presença aos clientes, nos momentos difíceis”.
Os paradigmas de humanização estão mudando; passaram a enfocar os
afazeres técnicos, e a higienização do paciente no meio ambiente. ‘Que pena
que s enfermeiros trabalhamos tão mal o espiritual!’
(Elke-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
Muitas vezes, as pessoas estão angustiadas, com problemas e não têm a quem
recorrer. Pode a Enfermagem, mesmo com a falta de tempo, amenizar os sofrimentos
desses clientes? “Quando se valoriza mais a técnica, esquecendo-se dos valores
espirituais ela se torna muito fria, cética: ‘é preciso fazer isto!’, ‘aquilo não é correto’.“
(Talitha-pesquisa, PEIXOTO:2000).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
35
Percebemos aqui, mais uma vez, a importância da dimensão religiosa para
humanizar e sensibilizar a Enfermagem para as necessidades básicas das pessoas a
quem atende.
..
.
A busca da cientificidade levou a Enfermagem a ganhar dimensões
enormes, negando tanto os aspectos psicossociais e psicoespirituais. A
Enfermagem deve explicitar esses valores fundamentais em forma de
problemas e questões; e buscar as soluções de maneira partilhada com toda
a equipe de Enfermagem, fazendo o próprio grupo ser sujeito do processo de
espiritualidade que o vivificará
(Carla-pesquisa,PEIXOTO:2000).
É interessante essa ressalva, na medida em que é muito válida para os
enfermeiros que se julgam incapazes de promover assistência espiritual. Diante disso
questiona-se: Será que na realidade os profissionais não têm capacidade para atender
às necessidades psicoespiritual? Será que é por falta de treinamento?
Para o desenvolvimento de habilidades técnicas, o treinamento é
indispensável; e isso não é pertinente também para a habilitação na assistência
psicoespiritual? Um treinamento para desenvolver as habilidades! Seque é isso que
está faltando à Enfermagem?
A “equipe de Enfermagem precisa ser sujeito” nesse processo de atendimento
psicoespiritual aos clientes; “[...] deve procurar esclarecer, através de leituras,
pesquisas, seminários, grupos de discussões, discutirem em todos os períodos do
curso” (Meire-pesquisa,PEIXOTO:2000).
A Enfermagem não deve se preocupar apenas com as atualizações
tecnológicas e científicas, mas não deixar esses valores espirituais “adormecidos”, “em
segundo plano”; porque, quando necessitar prestar uma assistência nesse sentido,
corre o risco de assustar-se, sobretudo em sentir-se incapacitada, porque não havia
pensado, nesses valores nem trabalhado com eles, anteriormente. “Os próprios
professores precisam entender melhor este aspecto psicoespiritual. Fala-se muito, mas
não se aprofunda. Acho que esses valores são ensinados de uma maneira muito
confusa para os alunos” (Elke e Míriam-pesquisa, PEIXOTO:2000).
Parece que pessoas que não crescem espiritualmente porque não
trabalham esse aspecto no seu próprio interior, são frágeis como “crianças
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
36
engatinhando”. Será que não é preciso pensar mais sobre esse aspecto psicoespiritual?
Talvez, se fosse planejada e anotada no prontuário, a assistência psicoespiritual aos
pacientes não se tornaria mais explícita para a academia?
1.4.1 Análise dos dados quantitativos
A abordagem quantitativa foi dirigida aos discentes e docentes com atuação
também na prática, enfocando a assistência psicoespiritual na profissão de
Enfermagem. A amostra constituiu-se de 63 enfermeiros e 141 alunos de Enfermagem.
Foram utilizados questionários previamente elaborados, com trinta questões fechadas,
abordando a educação em Enfermagem no que se refere à assistência psicoespiritual
aos clientes (Anexo I).
O instrumento foi aplicado pessoalmente pela autora nas salas de aulas e nas
salas dos professores, em dias e horários previamente marcados pela direção do
departamento onde foi realizada a pesquisa. Foi realizada em seis cursos do Centro-
Oeste do Brasil (Anexo I).
1.4.2 Resultados: o que pensam e o que fazem docentes e discentes de
Enfermagem quanto à assistência espiritual?
Destacam-se, nesta pesquisa, sete tabelas e três figuras com dados que
enfocam uma visão geral sobre a assistência psicoespiritual no ensino e na prática de
Enfermagem.
Tabela 1. Como vêem a religião nos dias de hoje (%).
Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Docente Discente Total
a. Importante 96,8 87,9 90,9
b. Com descrença 3,2 8,1 6,4
c. Indiferente 0,0 4,0 2,7
Nota: dados e freqüência da q-1.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
37
Análise da q-1:
Variante a: “importante”
A maioria dos
docentes e discentes
julga “
importante
a religião, com pequena
variante entre os índices, predominando uma variante maior entre os docentes.
Variante b: “com descrença”
Nessa variante um menor índice entre os docentes (3,2%), e discentes
(8,1%) que “vêem a religião com descrença”. Apesar de ser um índice pequeno, é
preocupante, por ser a religiosidade uma característica do ser humano.
Variante c: “indiferente
O índice dos docentes é zero, mas o índice dos discentes, apesar de
pequeno, mereceu ser questionado. “Por quê?” Atualmente, existem religiões
diversificadas para todas as opções. Será que essas pessoas conseguem viver
independentemente de uma interiorização maior, que vai além da matéria criada?
Tabela 2. Percepções sobre as características da Profissão de Enfermagem (%).
Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Docente
Discente
Total
a. Assistência integral ao ser humano 98,4 99,2 98,9
b. Executar horários 0,0 0,8 0,5
c. Ser bem técnica 0,0 0,0 0,0
Nota: dados e freqüência da q-2
Análise da q-2:
Variante a: “Assistência integral ao ser humano”
Percebe-se que a maioria de docentes (98,4%) e discentes (99,2%) reconhece
a importância da assistência integral ao ser humano como uma característica da
profissão de Enfermagem.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
38
Variante b: “Executar horários”
O índice dos docentes é zero. Docentes não dão prioridade a horários; mas
existe uma parcela, ainda que insignificante de discentes (0,8%) que não entendeu
essa característica da profissão. Horários existem para o bom funcionamento da
técnica, mas não são prioritários às urgências do momento na assistência aos
pacientes.
Variante c: “Executar horários”
Nesta variável, o índice dos dois grupos foi zero. Percebe-se que a
Enfermagem está ciente de que a técnica existe para o bom desempenho no
cuidado.
Tabela 3. Considerações dos docentes e discentes sobre os valores
religiosos na Enfermagem (%).
Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Docente Discente Total
a. Tratar cada pessoa como a si mesmo 69,8 78,7 75,8
b. Cuidar da pessoa como um todo 84,1 77,2 79,5
c. Atender às necessidades básicas dos clientes 65,1 81,9 76,3
d. Ver nos clientes a pessoa humana e não seu
fator econômico
50,8 66,9 61,6
e. Jamais cuidar de seus próprios interesses,
prejudicando outras pessoas
49,2 52,0 51,1
f. Nenhum dos itens mencionados 0,0 0,0 0,0
Nota: dados e freqüência da q-4.
Análise da q-4:
Estes dados são muito pertinentes por apresentarem a dimensão dos valores
religiosos na profissão de Enfermagem, valores indispensáveis na profissão. As
respostas de todas as variantes deveriam ser 100% tanto dos docentes quanto dos
discentes.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
39
Variante a:
Tratar cada pessoa como a si mesmo”
Dos docentes 69,8% responderam entre os discentes, 78,7% . A maioria
dos docentes e discentes cuida das pessoas “como gostaria de ser tratada”. Os
discentes apresentaram maior índice de aprovação do que os docentes.
Questiona-se: por que os discentes estão com um índice maior de
aprovação nessa variante? Será que os discentes vivenciam melhor os valores
espirituais do que os docentes?
Variante b:
Cuidar da pessoa como um todo”
A maioria reconhece essa necessidade – docentes (84,1%) e discentes (77,2%)
com um índice maior dos docentes. Uma minoria de docentes e discentes não
está convicta dessa importância;
Variante c:
Atender às necessidades básicas dos clientes”
Entre os entrevistados, 65,1% dos docentes e 81,9% dos discentes acham
prioritário a assistência aos pacientes. A diferença entre docentes e discentes é
muito grande; quase a metade dos docentes se contenta em exercer o “cuidado”
imediato sem se comprometer com as outras necessidades dos clientes. A
maioria dos discentes (81,9%) está convicta da importância da atenção às
necessidades básicas da pessoa que está sendo cuidada.
Variante d:
Ver nos clientes a pessoa humana e não o seu fator econômico”
Mais da metade dos docentes (50,8%) e uma porcentagem mais significativa
dos discentes (66,9%) – responderam afirmativamente à questão.
Questiona-se: por que menos da metade dos docentes e, por outro lado, um
número significativo de discentes acha que deve ver nos clientes o seu fator
econômico? Seque se trata de diferenciação no tratamento das pessoas? Ou
porque vê nos clientes de um modo geral o suporte dos seus salários?
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
40
Variante e:
Jamais cuidar de seus próprios interesses prejudicando outras
pessoas”
Os índices aqui são assustadores: nem a metade de docentes (49,2%) e
pouco mais da metade de discentes (52%) concordaram com essa afirmação. Será
que, na vida profissional, não é possível cuidar dos próprios interesses sem
prejudicar quem quer que seja?
Tabela 4. Percepções dos docentes e discentes sobre as curas psicobiofísicas e
psicossociais relacionadas com a cura psicoespiritual (%).
Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Percepções Docente Discente Total
Sim 61,7 48,0 52,4
Às vezes 36,7 50,4 45,9
Não 1,7 1,6 1,6
Nota: dados e freqüência da q-28.
Análise da q-28:
A maioria dos docentes (61,7%) e menos da metade dos discentes afirmam
que “sim”.
Questiona-se o porquê dessa diferença. Será que a maioria dos docentes
está convicta dessa realidade, mas não fala dessa importância com os alunos?
Na segunda variável (às vezes), é grande a diferença entre os índices de
docentes (36,7%), com os discentes (50,4%).
Por que optaram pela variável “às vezes”? Será que associam o espiritual
com o psicológico, supondo que existem doenças ligadas somente ao
psicológico? Ou é porque não dão importância a essa assistência às pessoas?
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
41
A última variável (“não”), apesar de os índices serem pequenos, tanto para
docentes (1,7%), como para os discentes (1,6%), é preocupante, por se referir ao
ser humano que é indivisível. É o ser total que adoece e não apenas uma parte.
Tabela 5. Percepções dos docentes e discentes, quanto aos valores religiosos na Enfermagem
(%).Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Docente Discente Total
a. A mesma prioridade: aspectos
psicobiofísicos e psicossociais
27,6 19,7 22,2
b. Tem ficado em segundo plano 69,0 73,2 71,9
c. Não tem importância no bom
desempenho da profissão
3,4 7,1 5,9
Nota: dados e freqüência da q-27.
Análise da q-27:
Variável a:
A mesma prioridade: aspectos psicobiológicos e psicossociais”
Em se tratando dessa questão, tem-se um índice bem significativo de
docentes (27,6%), com índice menor dos discentes (19,7%), que afirmou ter na
prática a mesma prioridade que os outros aspectos assistenciais.
Questiona-se: será que esses profissionais e discentes estão conseguindo dar
assistência integral aos clientes?
Variável b:
Tem ficado em segundo plano
A grande maioria de docentes (69%) e discentes (73,2%) confirma essa
variável com uma diferença significativa dos discentes nessa afirmação. Por que
existe essa diferença nos índices de docentes e discentes?
Variável c: “Não tem importância”
Apesar dos índices serem baixos tanto para docentes (3,4%) quanto para
discentes (7,1%), essa afirmativa é preocupante por constatar que os profissionais,
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
42
e com um índice bem maior dos discentes, preocupam-se com o desempenho
técnico.
Tabela 6. Considerações de docentes e discentes sobre a assistência psicoespiritual (%).
Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Docente Discente Total
a. Fazer parte dos estágios
supervisionados
70,7 46,7 54,4
b. Não precisa de treinamento em
estágios
24,1 37,7 33,3
c. Indiferente 5,2 15,6 12,2
Nota: dados e freqüência da q-26.
Análise da q-26:
Variável a:
Fazer parte dos estágios”
A maioria dos docentes está convicta da necessidade de praticar a
assistência psicoespiritual. É grande a diferença entre os índices dessa variável,
na qual os docentes (70,7%) são a maioria e, entre os discentes (46,7%), menos da
metade.
Questiona-se: será que a grande maioria dos profissionais de Enfermagem
percebe essa necessidade e os discentes talvez a percebam, mas se sintam
inseguros em optarem por ser supervisionados?
Variável b:
“Não precisa de treinamento em estágio”
Os índices entre docentes (24,1%) e discentes (37,1%) têm pouca diferença.
São índices significativos, por se tratar de uma reposta negativa a uma prática de
assistência ao cliente, da qual a maioria afirma não ter segurança.
Questiona-se: como dar assistência integral sem treinamentos?
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
43
Tabela 7. Assistência psicoespiritual: ensino e prática (%).
Enfermagem. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Docente Discente Total
a. Precisa ser anotada no prontuário do paciente
82,0 52,9 62,6
b. Não precisa ser anotada 13,1 38,0 29,7
c. Só dá essa assistência quem quer e tem tempo
a mais
4,9 9,1 7,7
Nota: dados e freqüência da q-30.
Análise da q-30:
Variável a: “Precisa ser anotada no prontuário do paciente”
Uma maioria significativa de docentes (82%) confirma a importância dessa
tarefa na Enfermagem. pouco mais que a metade dos discentes (52,9%) está
sensibilizada para essa tarefa.
Variável b: “Não precisa ser anotada”
Dos docentes, 13,1% confirmam essa variável, com índice significativo de
discentes (38%). Trata-se de um cuidado importante. Então por que não anotar?
Questiona-se, no prontuário é anotada toda assistência técnica de
Enfermagem ao paciente, por que não anotar a assistência psicoespiritual?
Variável c: “Só dá essa assistência quem quer e tem tempo a mais”
Nesta variável os índices são pequenos para docentes (4,9%) e discentes
(9,1%), mas preocupantes. Se essa assistência faz parte do desempenho
profissional, por que deixa-la como opcional? Fazer quem tem tempo a mais?
Será que a prática da Enfermagem oferece tempo de sobra?
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
44
Figura 1: Assistência psicoespiritual: ensino e prática na Enfermagem (%). Centro-Oeste do Brasil,
2005.
Nota: esta figura se refere a q-30 (docentes).
Análise da q-30:
O gráfico mais uma vez evidencia a opinião dos docentes, quanto à q-30,
mostrada na
tabela 7
, referente à
variável a
: A assistência psicoespiritual precisa ser
anotada no prontuário do paciente” (cf.comentário tabela 7).
Figura 2: Percepções sobre o ensino e a prática da Enfermagem na assistência psicoespiritual.
Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Nota: esta figura se refere à q-21 (exclusiva dos docentes).
18,2
10,9
70,9
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
8
0,0
Ser tratado na teoria, em todas
as disciplinas
Só na ética
Estar presente em todas as
Disciplinas, inclusive nos estágio
(em %)
Só dá essa assistência quem
quer e tem tempo a mais
4,8%
Não precisa ser anotada
12,7%
Precisa ser anotada no
prontuário do paciente
79,4%
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
45
Análise da q-21:
Variável a:
“O ensino sobre a assistência psicoespiritual deveria ser incluído em
todas as disciplinas, inclusive nos estágios”
A maioria dos docentes (70,9%) não só está convicta da importância da
assistência psicoespiritual na Enfermagem, mas também acha que esta precisa
fazer parte do conteúdo de todas as disciplinas no ensino e na prática da
Enfermagem.
Variável b:
“Só na ética”
Com um índice pequeno:10,9 %.
Questiona-se: um cuidado indispensável da profissão sendo enfocado na
ética teria condições para fazer parte da rotina da Enfermagem?
Variável c:
“Ser tratada na teoria, em todas as disciplinas”
Variável com um índice bem menor: 18,2%.
Questiona-se: a teoria de cuidados de Enfermagem, sem uma vivência nos
estágios, não correria o risco de ser esquecida, ou ficar em segundo plano,
devido à insegurança dos profissionais para colocá-la em prática?
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
46
Figura 3: A educação em Enfermagem precisa melhorar para dar uma melhor assistência
psicoespiritual. Centro-Oeste do Brasil, 2005.
Nota: esta figura se refere à q-20 (exclusiva dos docentes).
Análise da q-20:
Variável a:
”Está tudo bem”
Apesar de esta variável ter um índice baixo (3,2 %), com a grande maioria
dos docentes pensando ao contrário, é preocupante o fato de esse grupo de
docentes achar que está tudo bem na educação em Enfermagem. Depoimentos
anteriores confirmam que não se consegue dar assistência integral na
Enfermagem. Como pode estar tudo bem? Será que esses docentes só vêem
importância na parte técnica, ou se contentam em dar assistência integral
quando lhes sobra tempo?
Variável b:
”Deve fazer parte do currículo [...], com anotações no prontuário do
paciente”.
Curioso esse índice: 22,2%. Nos gráficos da figura oito, item “Precisa ser
anotado no prontuário do paciente” representa 79,4%. Portanto, a maioria
expressiva dos docentes está convicta que esse tipo de assistência além de fazer
parte de todas as disciplinas, deve ser anotada no prontuário do paciente.
Pequena parcela dos professores acha que deve fazer parte do currículo.
47,6
31,7
22,2
3,2
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Treinar os enfermeiros na
assistência aos clientes
Deve fazer parte do currículo
acadêmico a assistência
psicoespiritual aos clientes,
com anotações no prontuário
Está tudo bem
Docentes
(em %)
Falar desses valo
res em todas
As disciplinas
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
47
No próximo capítulo, abordaremos o tema Saúde e Religião, com uma visão
geral da influência religiosa na saúde através dos séculos; com enfoque em saúde-
doença e crença-fé como força terapêutica.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
48
C
APÍTULO
II
A
S
AÚDE E AS
R
ELIGIÕES
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
49
C
APÍTULO
II
A
S
AÚDE E AS
R
ELIGIÕES
Ao longo da história, as pessoas têm buscado o sentido e a verdade de sua
própria natureza e do universo e, nessa busca, encontram as religiões. Mesmo as
ciências naturais eram originalmente religiosas. Nos últimos trezentos anos,
religião e
ciência
se separaram como caminhos do conhecimento, mas, neste decênio, estão
sendo questionadas pela sua interdependência (SOUSA, Paulo et al. 2005:2).
A crença de um povo no sobrenatural e na imortalidade da pessoa é aceita
como fato real.
A pesquisa e a reflexão antropológicas apontam o fenômeno religioso
como indispensável chave hermenêutica para a compreensão da cultural dos povos.
Para compreender o ser humano, é necessário compreender a presença do relativo
(ARDUINI, 1999:54).
Veremos os movimentos sociais, políticos e religiosos que ocorreram na
Europa nos séculos XIV, XV e XVI, suas conseqüências no cuidado dos doentes e as
origens da prática do cuidar na Enfermagem
(OGUISSO,
2005:
7). Mais especificamente
falaremos do cristianismo, pelo fato de ser nossa cultura brasileira estruturada
profundamente pelo cristianismo e, também, pelo fato de a Enfermagem ocidental ter
sido influenciada por valores cristãos.
2.1 Religiões e cristianismo: visão geral
As religiões são consideradas como comunidades de pessoas que
compartilham práticas e crenças (geralmente em um Deus ou deuses), que se reúnem
em construções especiais para o culto ou a meditação e que vivenciam o mundo de
maneira particular. Mais de três quartos da população mundial consideram-se
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
50
pertencentes a uma religião, independentemente do pouco ou muito que a praticam
(BOWKER,1997:7).
2.1.1 E o que é religião?
No sentido concreto a religião significa um todo de pessoas fiéis à mesma
crença (SCHLESINGER,1981:229). Segundo
Arduini
(1999:54), o testemunho
antropológico-cultural demonstra que o “ser humano”
(o grifo é nosso) procura
transcender em direção ao Absoluto. É perene e ecumênica a prática que leva a
humanidade a superar a vinculação com os seres limitados, para colocar-se em
dimensão com o transcendente.
Esse transcendente pode ser chamado
Ser Supremo, Deus, Espírito,
Sobrenatural, Criador, Causa Primeira
. Os antropólogos, afirma Arduini (1999:55), têm
registrado que a busca de relacionamento com o Absoluto, a dimensão religiosa, é o
fator mais constante e universal nas culturas dos povos. Independentemente de haver
acervo ou não das concepções, a comunicação religiosa com a entidade
transcendental sobressai-se como um
traço característico do ser humano
através de
sua evolução histórica. Tudo isso reafirma a importância da assistência integral às
pessoas.
Houve um esquecimento dessa parte, pela Enfermagem. Mas até a ciência
reconhece que não é o ‘bisturi’ que cura: você pode melhorar o biológico,
dar alimentação parenteral (endovenosa), mas, se você omitir o aspecto
espiritual dos pacientes, eles não vão
melhorar (Talitha-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
Muitos pacientes retornam ao hospital várias vezes com os mesmos sintomas
anteriores, depois de se submeterem a sofisticados tratamentos. Será que não faltou o
tratamento integral a essas pessoas?
Ver-se-á, aqui, a
evolução da assistência à saúde nos períodos históricos:
pré-
cristão e cristão.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
51
2.1.1.1 Período-Pré-Cristão
cultos e crenças de povos que se perpetuam desde a pré-história até os
tempos modernos, como na gruta de Skoteino, em Creta, onde se encontram
elementos religiosos que se encadeiam desde 2000 a.C. até o fim do período romano.
Também a continuidade religiosa na Ásia Menor perdurou desde o sétimo milênio
antes de Cristo até o advento do cristianismo (ARDUINI, 1999:46).
Outro testemunho da atualidade e do significado da dimensão religiosa dos
povos é a presença, mais do que milenar, das grandes religiões tradicionais que
envolvem vários bilhões de habitantes espalhados pela terra e que, ainda hoje,
continuam em plena vitalidade. O ser humano tem um dom para experienciar o
sagrado. Se o sagrado não existisse, não haveriam religiões. A essência é igual para
todas as religiões, o que é diferente são as maneiras de visualizar o sagrado”
(USARSKI, on line, 2005).
A religião nasce como uma experiência do sagrado. O sagrado tem uma
dinâmica própria que se manifesta no profano em uma ordem independente, mas que
deixa traços.
Guimarães Rosa, em Grande sertão, veredas (1956
,
apud QUEIROZ,
1996:17),põe em destaque esse aspecto marcante no universo religioso do ser humano:
“Eu cá não perco ocasião de religião [...] aproveito todas [...] uma só pra mim é
pouca[...].Vale, se vale[...]”.
No mundo atual, há: *
**
*515 milhões de hindus; *
**
*300 milhões de budistas; *
**
*400
milhões de confucionistas; *900 milhões de muçulmanos; *
**
*75 milhões de
xintoístas; *
**
*50 milhões de taoístas; *
**
*20 milhões praticam o judaísmo; 350
milhões de
adeptos das religiões africanas tradicionais; *
**
*um bilhão e 644
milhões de cristãos. Somente estas religiões somam *4 bilhões e 254 milhões
de pessoas no mundo
(ARDUINI, 1999:53).
Além dessas, muitas outras expressões de religiosidade nas sociedades
ágrafas e modernas que não podem ser esquecidas. As cidades, em muitas partes do
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
52
mundo, vão se edificando ao redor do núcleo religioso, como lugares sagrados e
santuários.
As religiões, com suas leis e seus preceitos, direcionam as culturas dos povos
através dos séculos.
Nesse período pré-cristão
, as doenças eram tidas como um castigo
de Deus ou resultavam do poder do demônio. Por isso, os sacerdotes ou feiticeiros
acumulavam funções de
médicos e enfermeiros
. O tratamento consistia em aplacar as
divindades, afastando os maus espíritos por meio de sacrifícios. Usavam-se massagens,
banhos de água fria ou quente, purgativos, substâncias provocadoras de náuseas.
Mais tarde, os sacerdotes adquiriam conhecimentos sobre práticas medicinais
e passaram a ensinar pessoas, delegando-lhes funções de
enfermeiros
e farmacêuticos.
Alguns papiros, inscrições, monumentos, livros de orientações políticas e religiosas,
ruínas de aquedutos e outras descobertas nos permitem formar uma idéia do
tratamento dos doentes no Egito (CHRISTOPHER, 1985:169).
Os egípcios deixaram alguns documentos sobre a medicina conhecida em sua
época. As
receitas médicas deviam
ser tomadas acompanhadas da
recitação de
fórmulas religiosas
. Praticavam o hipnotismo, a interpretação de sonhos; acreditava-se
na influência de algumas pessoas sobre a saúde de outras. Havia ambulatórios
gratuitos, onde eram recomendados a hospitalidade e o auxílio aos desamparados
(OGUISSO, 2005:3).
Na Índia, documentos do século VI a.C. demonstram que os hindus
conheciam ligamentos, músculos, nervos, plexos, vasos linfáticos, antídotos para
alguns tipos de envenenamento e o processo digestivo. Realizavam alguns tipos de
procedimentos tais como suturas, amputações, trepanações e corrigiam fraturas.
Nesse aspecto, o budismo contribui para o desenvolvimento da Enfermagem
e da
medicina. Os hindus tornaram-se conhecidos pela construção de hospitais. Foram os
únicos, na época, que
citaram enfermeiros
e exigiam deles qualidades morais e
conhecimentos científicos. Nos hospitais
músicos e narradores de histórias distraíam
os pacientes.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
53
O
bramanismo fez decair a medicina e a Enfermagem
pelo exagerado
respeito ao corpo humano. Proibia a dissecação de cadáveres e o derramamento de
sangue, impedindo, com isso, a evolução da cirurgia. As doenças eram consideradas
castigos (GONZÁLEZ, Vol.I, 117,1999).
Entre os assírios e babilônios, existiam penalidades para médicos
incompetentes, tais como amputação das mãos, indenização, entre outras. A medicina
era baseada na magia; acreditava-se que sete demônios eram os causadores das
doenças. Os sacerdotes médicos vendiam
talismãs com orações contra ataques dos
demônios
. Nos documentos assírios e babilônicos, não há menção de hospitais nem de
enfermeiros (OGUISSO,2005:3). Conheciam a
lepra
e
sua cura dependia de milagres
de Deus
, como no episódio bíblico do banho no rio Jordão: “Vai, lava-te sete vezes no
Rio Jordão e tua carne ficará limpa (II Reis:5,10-11)”
14
.
Os doentes chineses eram cuidados por sacerdotes. As doenças eram
classificadas da seguinte maneira: benignas, médias e graves. Os sacerdotes eram
divididos em três categorias, que correspondiam ao grau da doença da qual se
ocupavam. Os templos eram rodeados de plantas medicinais. Os chineses conheciam
algumas doenças como varíola e sífilis. Faziam operações de lábio-leporino. Nos
tratamentos para anemia, indicavam ferro e fígado; em doenças da pele, aplicavam o
14
Lembramos aqui, que a lepra, hoje denominada hanseníase, continua através dos séculos como um
estigma indelével. A desestigmatização da lepra não está na troca do nome, mas numa
transformação completa de nossos paradigmas que norteiam nosso comportamento social. Segundo
BOFF, o ser humano está mergulhado na experiência ética ou moral, vive-a no meio da ambigüidade e
de conflitos. Assim a ética que se vem do grego
ethos
, consiste na teia das relações sociais em que o ser
humano nasce e desenvolve. A ética é a reflexão questionadora da realidade que circunda o ser
humano, englobando suas experiências, vivências, dilemas, problemas e as relações sociais no mundo
da vida e do trabalho (Apud OGUISSO, 2005:162). Para Castel (2004:15-21)., a exclusão vem se impondo
pouco a pouco como um
mot-valise
para definir todas as modalidades de miséria no mundo. Eis dois
exemplos de excluídos, e poder-se-ia multiplicá-los. O que eles têm em comum? Um foi aceito
trabalhou e foi socializado pelo trabalho. O outro nunca conheceu um trabalho fixo, e se perdeu ao
longo de mudanças sucessivas no trabalho. É espreitado pela depressão, às vezes suicídio,
delinqüência, toxicomania e talvez a hanseníase ou Aids. São excluídos. Quem são eles? A exclusão se
a todos aqueles que se encontram fora das normas sociais implantadas pelas políticas dominantes.
Na América Latina, encontram-se alguns dos mais tradicionais mecanismos políticos de exclusão
social. Os privilégios de poucos, além de fragilizar ainda mais a situação de muitos trabalhadores,
sacramentalizam a exclusão de uma maioria que sempre esteve fora da proteção social. Em 1990,
estima-se que 52% da população ativa estava desprovida de qualquer garantia e proteção social
.
Graças
às ONGs, esses índices vêem caindo (CASTEL,2004:137-143). As ONGs são entidades sem fins lucrativos,
a maioria do tipo associação (95% no Brasil) ou fundação. Um leque amplo de ONGs é formado por
entidades assistenciais, caritativas/filantrópicas (CASTEL, 2004:143).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
54
arsênico. Usavam o ópio para a anestesia. Construíram alguns hospitais de isolamento
e casas de repouso (GONZÁLEZ, 1999:15; CHRISTOPHER, 1985:174).
Os japoneses aprovaram e estimularam a eutanásia. A medicina era fetichista
e a única terapêutica era o uso de águas termais (OGUISSO, 2005:15).
Na Grécia, as primeiras teorias gregas se prendiam à mitologia. Apolo, o deus
sol, era o deus da saúde e da medicina. Usavam sedativos, fortificantes e hemostáticos,
faziam ataduras e retiravam corpos estranhos; também tinham casas para tratamento
dos doentes. A medicina era exercida pelos sacerdotes-médicos, que interpretavam os
sonhos das pessoas. O tratamento das doenças consistia em banhos, massagens,
sangrias, dietas, sol, ar puro, água pura mineral. Dava-se valor à beleza física, à cultura
e à hospitalidade. O excesso de respeito pelo corpo atrasou os estudos anatômicos. O
nascimento e a morte eram considerados impuros, causando desprezo pela obstetrícia
e o abandono dos doentes graves. A medicina tornou-se científica graças a Hipócrates,
que deixou de lado a crença de que as doenças eram causadas por maus espíritos.
Hipócrates é considerado o Pai da Medicina. Observava o doente, fazia
diagnóstico, prognóstico e terapêutica. Reconheceu doenças como tuberculose,
malária, histeria, neurose, luxações e fraturas. Seu princípio fundamental na
terapêutica consistia em "não contrariar a natureza, porém, auxiliá-la a reagir". Para
tratar doenças usava massagens, banhos, ginásticas, dietas, sangrias, ventosas,
vomitórios, purgativos, calmantes, ervas medicinais e medicamentos minerais
(GONZÁLEZ, 1999:117).
A medicina não teve prestígio em Roma, onde durante muito tempo era
exercida por escravos ou estrangeiros. Os romanos eram considerados essencialmente
guerreiros. O indivíduo recebia cuidados do Estado como cidadão para tornar-se bom
guerreiro, audaz e vigoroso. Roma distinguiu-se pelo cuidado com a limpeza das ruas,
ventilação das casas, água pura e abundante e redes de esgoto. Os mortos eram
sepultados fora da cidade, na via Ápia. O desenvolvimento da medicina dos romanos
sofreu influência do povo grego (GONZÁLEZ, 1999:117).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
55
2.1.1.2 Período Cristão
O cristianismo teve início com a vida, o ministério, a morte, a ressurreição e a
ascensão de Jesus, um judeu nazareno que os cristãos acreditam ser o Filho de Deus.
Suas raízes são mais antigas e penetram fundo na tradição judaica, considerando-se a
Nova Aliança ou o Novo Testamento em relação ao Antigo. A história e a interpretação
primitiva de Jesus, que foi considerado o Cristo ou o Messias
15
, estão registradas no
Novo Testamento, que inclui os Evangelhos, as Epístolas (cartas) e outros escritos do
século I.
Jesus, anunciado pelos profetas (Is 42,1), trouxe-nos uma filosofia de vida:
“amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos” (Lc 10,27). Sua
mensagem se resume no Sermão da Montanha (Mt 5,1-12).
Jesus era da dinastia de rei (Mt 1,6), mas viveu pobre (Lc 2,12), foi torturado e
morreu abandonado (Jo 19,30). Em seus ensinamentos, Ele afirmou: “quem der um
simples copo de água a quem tem sede não ficará sem recompensa”(Mt 10,42); e mais,
“não há maior amor do que dar a vida para a pessoa amada”.
Através dos séculos, entre as religiões, o cristianismo foi a maior revolução
social de todos os tempos. Influiu positivamente através da reforma dos indivíduos e
da família. Os não-crentes escreveram a respeito dos cristãos: "Vede como eles se
amam". Desde o início do cristianismo, os pobres e enfermos foram objetos de
cuidados especiais por parte dos cristãos (DOLAN,1941:4, tradução nossa).
O cristianismo é uma das chamadas grandes religiões. Tem aproximadamente
1,9 bilhão de seguidores em todo o mundo, incluindo católicos, ortodoxos e
protestantes (CAMPOS, 1995:150). Cristianismo vem da palavra Cristo, cuja doutrina
baseia-se na crença de que todo ser humano é eterno, a exemplo de Cristo, que
ressuscitou após sua morte. O Antigo Testamento trata da lei judaica ou Torá.
Começa com relatos da criação e é todo permeado pela promessa de que Deus,
15
Cristo significa Messias, pessoa consagrada, ungida, a Palavra de Deus encarnada, o enviado (Jo 1,1).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
56
revelado a Abraão, a Moisés e aos profetas, enviaria à terra seu próprio filho como
Messias, o Salvador (QUESNEL, 2004:5).
O Novo Testamento contém os ensinamentos de Cristo, escritos pelos
apóstolos Mateus, Marcos, Lucas e João, e as cartas dos apóstolos às primeiras
comunidades, os Atos dos Apóstolos e o Apocalipse (MORESCHINI,1996:31).
O cristianismo firmou-se como uma religião de origem divina. Seu fundador
era o próprio Filho de Deus, enviado como Salvador e construtor da história junto
com o homem. Ser cristão, portanto, é engajar-se na obra redentora de Cristo, tendo
como base a em seus ensinamentos. Os cristãos de Jerusalém repartiam todos os
seus bens materiais (At 2.44-45). Muitos vendiam suas propriedades e davam à igreja o
produto da venda, a qual distribuía esses recursos entre o grupo (At 4.34-35).
Cristo havia instruído seus seguidores a fazerem "discípulos de todas as
nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo" (Mt 28.19). O
assassinato de Estevão, um judeu convertido deu início a uma rápida expansão do
cristianismo (At 6,5). Rapidamente, a doutrina cristã se espalhou pela região do
Mediterrâneo e chegou ao coração do Império Romano.
A difusão do cristianismo pela Grécia e Ásia Menor foi obra especialmente do
apóstolo Paulo, que não era um dos doze discípulos, e teria sido chamado para a
missão pelo próprio Jesus. Através dos tempos, muitos fatos têm confirmado a
vivência cristã dos discípulos e das discípulas de Jesus.
Os cristãos reconhecem que Jesus foi e é a intervenção pessoal de Deus para
restaurar seu poder e força no mundo (BOWKER, 1997:136). Foi na Antioquia que os
discípulos, pela primeira vez, foram chamados de “cristãos” (At 11, 26b).
O poder divino foi restaurado por Jesus, por meio do ensinamento, do perdão
dos pecados e da cura (Mc 2,5-12).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
57
Deus fala e age através de Jesus, nas palavras de Jesus: “Quem me vê, o
Pai” (Jo 14,9). Mas Jesus também chamava Deus de Abba, “Pai”, distinto de si mesmo,
dando origem à crença de que Ele era, ao mesmo tempo, Deus e homem. Essa crença
de que “é Deus quem em Cristo reconcilia o mundo consigo” levou às seguitntes
doutrinas cristãs básicas: Encarnação, Cristologia, Trindade, e Remissão (II Cor 5,19).
O ensinamento de Jesus era simples; Ele o sintetizou no amor a Deus e ao
próximo. Mas era também exigente: uma vida de ágape, ou amor cristão, de um tipo
novo e generoso. Antes de morrer, Jesus, diante dos discípulos, mostrou sua convicção
de que, mesmo após a morte, Ele seria para eles e para os que viessem depois deles, o
intermediário de tudo que conheceram sobre Deus por meio dele. Pegou o pão e
disse: “Este é o meu corpo”; pegou o vinho e disse: “Este é o meu sangue”. Desse modo
prometeu, mais do que simples palavras, estar com eles todos os dias até o fim dos
tempos (Mc 14,22-25; Lc 22,19-20; Mt 26, 2-5).
Entre os séculos IV e V, o cristianismo teve vários baluartes da ciência, entre
os quais, Santo Agostinho, Santo Ambrósio, Santo Hilário e São Jerônimo, intitulado o
Leão do Deserto pelo sua sabedoria, por sua vida austera e pelo valor de suas obras.
Estudou filosofia, gramática, retórica, letras, hebraico e dedicou-se ao estudo das
Sagradas Escrituras na língua em que haviam sido escritas. É o autor da Vulgata
16
(ARMS, Dom Paulo Evaristo,1993:144) .
Durante o século XIX, conhecido como “século missionário”, o cristianismo
espalhou-se pelo mundo (BOWKER, 1997:137), tendo como compromisso básico a
prece e o culto projetados na ação de atendimento aos pobres e aos doentes.
A recompensa na partilha dos bens alavanca os fiéis no amor ao próximo: “O
que fizerdes a um desses meus irmãos pequeninos a mim o fizestes ”(Mt 25,40), Faz,
assim, que os cristãos se tornem vitais para a educação e a saúde no mundo.
16
Vulgata é o livro que apresenta a tradução da Bíblia direta do hebraico para o latim, por São
Jerônimo.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
58
Veremos, em síntese, a expansão do cristianismo em termos numérios. É
difícil, segundo Antoniazzi e Matos (1996:17), calcular o número exato dos cristãos no
passado. Só podemos estabelecer estimativas:
no início do culo IV, os cristãos estão espalhados pelo Império Romano e são 5
milhões (ou pouco mais), numa população de 50 milhões;
no século XIII, a população da Europa (exceto a ssia) era quase toda católica e
alcança 50 milhões; os cristãos orientais (separados de Roma) eram bem menos
numerosos;
na metade do século XVI (1550), o número de cristãos era de 60 milhões, na Europa
Ocidental. De 15 a 20 milhões de protestantes, e mais de 40 milhões, de católicos;
no início do século XX (1900),os cristãos eram 558 milhões (1/3 da população mundial,
que era de 1.620 bilhão); os católicos eram 272 milhões (a metade dos cristãos);
em 1990, a população mundial estava próxima de 5,3 bilhões; os cristãos, 1,758 milhões;
e os católicos, 962 milhões.
População residente no Brasil em 2000: 169.799.170 (83576015-homens e 86223155-
mulheres) (IBGE, 2000:69).
O cristianismo continua a ser a religião de mais de 1/3 da humanidade (IBGE, 2000:17).
No entanto, por que falar sobre as origens das religiões e do cristianismo?
Justamente porque, ao falarmos da dimensão religiosa na educação em Enfermagem,
tentamos revalorizar a importância da assistência psicoespiritual, trazendo à tona essas
raízes culturais e religiosas.
Vê-se as religiões sob dois aspectos: de um lado, a alienação por algumas
seitas e algumas religiões; e num outro sentido, a busca dessa espiritualidade,
de desenvolvimento melhor do ser humano. Vê-se como uma coisa
contraditória nos tempos modernos. Entende-se que, por um lado, todo
um movimento de resgate dessa humanidade do ponto de vista espiritual, de
pessoas que individualmente, ou em coletividade, buscam desenvolver sua
espiritualidade. Essa é uma vertente; e uma outra vertente é a forma como
os meios de comunicação de massa têm trabalhado a religiosidade das
grandes multidões, de uma forma, não de busca dessa espiritualidade que
leva ao desenvolvimento humano, mas de uma espiritualidade que faz dos
seres humanos meios de alienação mesmo, de manipulação de aspectos
econômicos, que são valorizados e encobertos com essa perspectiva da
religiosidade. Isso é preocupante nos tempos modernos
(Carla-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
Com doutrinas expressas em leis e preceitos, as religiões desempenham
um papel educativo e formador de seus membros. Esse caráter pedagógico leva seus
fiéis a se exercitarem nas virtudes para o desempenho de boas ações, adquirindo
condutas e comportamentos de ajuda mútua, respeito comunitário e fraternidade.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
59
De um modo geral, a religião, não importa qual, é muito importante! Da
forma como a humanidade vem caminhando em busca de novas
tecnologias, a religião é muito importante para humanizar. Porque
tecnologia significa algo muito frio, muito mecânico. A religião, neste
contexto, é importante para criar novos sentimentos e não apenas “fazer”,
desempenhar tarefas
(Talitha-pesquisa,PEIXOTO:2000).
A Enfermagem surgiu, como vimos anteriormente, desse contexto social
religioso, cujos valores são centrados nos cuidados integrais ao ser humano:
psicobiofísico, psicossocial e psicoespiritual, que caracterizam o fazer e o cuidar dos
clientes.
E um posicionamento profissional voltado para o ensino tem que ter uma
religiosidade, porque, senão, nós não ensinamos. Tornamo-nos muito
idealistas! Nós convivemos com doentes, com seres necessitados de
cuidados, frágeis, com necessidades afetivas; e se não tivermos amor,
doação, carinho, nós não ensinamos. Acho que isso deixa um pouco a
desejar. Vai depender das professoras, vai depender de cada educadora, de
dar mais esse enfoque espiritual
(Thaís-pesquisa,PEIXOTO:2000).
Tudo isso consolida o significado antropológico da religião que acompanha a
humanidade por toda parte, em todos os tempos. E confirma a importância de nossa
tese de revalorizar, na educação em Enfermagem, o aspecto psicoespiritual na
assistência às pessoas.
Nos dias de hoje, as pessoas estão tendo formas de religião voltadas mais
para a espiritualidade. As religiões passam por um período de
transformação, atualmente. -se a criação de seitas, pessoas procurando
religiões, sem nenhuma base, sem nenhuma fundamentação teológica, sem
nenhuma espiritualidade maior; outro trabalhando em nível da fragilidade
emocional das pessoas. Muitas vezes, a gente pode até crescer
intelectualmente em muitos conhecimentos científicos, mas algumas
pessoas não crescem espiritualmente, porque nunca trabalharam este lado, o
lado espiritual. Então, são frágeis como crianças engatinhando
(Míriam-
pesquisa,PEIXOTO:2000).
Constata-se que toda assistência à pessoa humana precisa levar em
consideração esses valores fundamentais, indispensáveis à valorização das pessoas.
Ter religião significa estar em contato com uma dimensão maior; um cultivo
de aspectos que esse cotidiano difícil não tem permitido que seja
desenvolvido. É impressionante como as pessoas doentes reportam à ajuda
religiosa. Isso tanto nas nossas vidas pessoais quanto profissionais. Agora,
que pena que nós, enfermeiras, trabalhamos mal com
isso (Carla-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
60
Howard Ggardner (apud SILVA, 2000:31), psicólogo e neurologista, nos anos
1970 e 1980 criou a “Teoria das Múltiplas Inteligências”. Esta teoria parte da premissa
de que nós, seres humanos, possuímos múltiplas inteligências e nascemos com
potencial para desenvolver inúmeras outras que não podem ser quantificadas. Depois
disso, a dimensão espiritual humana individual e coletiva foi admitida pelas ciências.
Foi divulgada, questionada e completada em processo gradual, aparecendo em textos
nos anos 1990 (SILVA, 2000:25).
Gardner (1943, apud, SILVA, 2000:25) mapeou oito inteligências humanas
17
,
entre elas, a inteligência espiritual/existencial; e afirmou que não e jamais haverá
uma lista única de inteligências. A inteligência espiritual pode ser definida como a
inteligência que transcende o imanente do ser humano e que vai além da inteligência
inter e extrapessoal. Tem estreita correlação com a inteligência emocional,
necessitando das demais inteligências para se construir e se expressar de maneira
holística na realidade humana (SILVA, 2000:68). Foge de nossa área de interesse
descrever sobre as demais inteligências citadas.
Para Eliade (1996:91), “o ser humano religioso assume um modo específico de
existência no mundo”. Seja qual for o contexto histórico ou cultural, o
homo religiosus
acredita na existência de uma realidade transcendente que se manifesta em diferentes
tempos, lugares, de forma real e santificadora.
Para ele, a existência humana se
plenifica na religiosidade, ou seja, na participação da realidade última, interior e
exterior, expressa no mais íntimo do seu ser, uma realidade que o transcende e o põe
em contato com o Absoluto, dentro da dialética do sagrado e do profano.
Na perspectiva histórico-religiosa, os deuses criaram o ser humano e o
mundo; e os heróis civilizadores os confirmam. A história das obras divinas e semi-
divinas estão nos mitos. Ao resgatar o sagrado, o ser humano instala-se e mantém-se
junto dos deuses, no mundo real e no simbólico. Por isso, o ser humano é, em sua
essência, religioso.
17
Lingüística, lógica-matemática, espacial, corporal, cinestésica, musical, intrapessoal, interpessoal.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
61
A religiosidade, por sua universalidade antropológica, caracteriza uma
inteligência, essencial no ser humano, e espresente de mil maneiras, em todas as
épocas, civilizações e culturas. Pode-se dizer que ela é parte integrante da inteligência
que o ser humano tem de si mesmo no espaço e no tempo, em busca do
conhecimento. O conhecimento ultrapassa fronteiras, atento ao novo e às questões
holísticas. A inteligência espiritual é capaz de desenvolver no coração humano o
sentido de solidariedade. É assim que a Enfermagem supõe o processo de empatia
entre enfermeiro e paciente.
2.2 Saúde e doença
A Organização Mundial de Saúde (OMS), definiu a saúde não só como
ausência de doenças, mas como um estado completo de bem-estar físico, espiritual e
social
18
. Esse conceito deu margem a muitas interpretações no referencial de completo
bem-estar de cada pessoa, levando em consideração suas limitações. Entretanto,
queremos lembrar aqui a importância dada ao aspecto espiritual, que tem sido pouco
compreendido pelas ciências especulativas modernas.
A OMS e a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS), analisando a
situação de saúde nas Américas, observaram que essa área apresenta um duplo
problema: as enfermidades tradicionais do subdesenvolvimento e um aumento
constante das moléstias transmissíveis, e as crônicas não transmissíveis. Chama-nos a
atenção a epidemia da Aids que, segundo a Rede Internacional de Saúde, apresenta
um índice de incidência para cada 100 mil habitantes; 9,6 para homens e 3,8 para as
mulheres (OPAS/OMS,2002:133). Acrescentem-se a miséria, o desemprego e os
danos à saúde causados pela violência urbana. Agravando essa situação, existem as
políticas de ajuste econômico, exigindo reduções dos gastos no setor público e
18
A Declaração feita na Conferência Internacional da Saúde, realizada em setembro de 1968, na
cidade de Alma-Ata, capital da República Socialista Soviética do Azaquistão. Preparada pela
Organização Mundial de Saúde e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância, a conferência foi
precedida de dois anos de estudos e reuniões, em vários países, com o objetivo de levantar a
experiência mundial sobre os cuidados primários da saúde, definir o papel dos governos em relação
ao assunto e formular recomendações para o desenvolvimento de programas nacionais e
internacionais nesse campo (PESSINI, 1990:304).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
62
provocando cortes nos recursos para a educação, a saúde e os serviços sociais
(VILELA,1996:113).
A VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS), em Brasília, em 1986, definiu
saúde como a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda,
meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso a terra e sua
posse e acesso a serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de
organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos
níveis de vida (VILELA, 1996:299).
Apesar de a VIII CNS empregar um conceito minucioso, considerando
diversos valores de saúde, esqueceu-se, entretanto, da valorização do aspecto
psicoespiritual, força vital do equilíbrio integral do ser humano.
Uma atitude convergente foi a decisão da OMS de acrescentar a dimensão do
bem-estar espiritual ao seu conhecido conceito multidiciplinar de saúde, que era
entendida como uma condição de saúde, se existisse a presença física, psíquica e
social. Segundo Sousa (et al, 2005:1): “A valorização acrescentada, considerando o
lado espiritual/religioso, é, sem dúvida, o selo decisivo e universalizado do
entrelaçamento de ciência e religião”.
Saúde, no sentido ideal, qualifica as quatro dimensões da pessoa, formando
um conjunto inseparável:
Saúde psíquica: implica a orientação no tempo e espaço, ausência de alienação,
capacidade de equilibrar-se nas diversas situações da vida, auto-realização, abertura para o
outro, e para si mesmo, liberdade de pensamento, de expressão e de criação.
Saúde biofísica: é a ausência de mutilações, de lesões, de dor, de cansaço, de fome, de sede.
É o desenvolvimento normal do indivíduo, é o equilíbrio entre os componentes orgânicos.
Saúde social: é o ajustamento do indivíduo no grupo social (entendendo-se por
ajustamento a capacidade que a pessoa tem de se situar, de se relacionar com as outras). A
saúde social implica habitação adequada, equilíbrio dos fatores econômicos (trabalho e
salários condizentes), lazer, educação (que permita, pela observação e análise, o
questionamento da realidade), amizade, simpatia, relacionamento.
Saúde espiritual: relaciona-se com as outras dimensões, na medida em que encara a vida
toda. O ser humano tem uma finalidade na vida, sede de um Absoluto (ou transcendente).
Para os cristãos, é Deus; para os muçulmanos, é Alá; para os ateus, o ser humano. Esse
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
63
Absoluto é fundamental para a superação das dificuldades, de um sofrimento ou de uma
doença. Essas quatro dimensões formam um conjunto sustentado pelo relacionamento
humano (PESSINI, 1990:304).
A saúde é fundamental para o desenvolvimento e a formação da
personalidade. “Gerar-me no espírito foi um trabalho maior do que gerar-me na
carne” (apud CRENOME, 1990:21). Uma pessoa espiritualmente desenvolvida controla
e condiciona positivamente o corpo, a mente e a emotividade. A sua maneira de viver
é a expressão de seu ser. A doença espiritual é um estado no qual o ser humano es
fragmentado do no seu eu. E a saúde espiritual, ao contrário, é um estado de
equilíbrio. É a inteligência espiritual que faz o elo entre os dois estados de saúde e
doença espirituais, portanto, é o meio com o qual nós podemos nos curar (SILVA,
2000:182).
O ser humano somente pode ser entendido em sua tolalidade. Quando se lhe
possibilita o desenvolvimento de todas as dimensões, uma superação do
materialismo e uma inclinação ao que é invisível (SILVA, 2000:184).
A busca do bem-estar biofísico, psicológico e espiritual do ser humano passa
pelo desenvolvimento de sua inteligência intrapessoal e sua auto-estima, evitando sua
autodestruição. O cérebro em si es constantemente refazendo-se em razão das
oscilações neurais, integrando a novas experiências e transcendendo os problemas da
vida humana (SILVA, 2000:208). Entre todas as buscas humanas, a busca da sabedoria é
a mais perfeita, sublime, útil e saudável. Nessa busca, o ser humano usa e dispõe da
inteligência
19
.
2.2.1. E o que é a inteligência?
Segundo Édouard Claparède
(1897, apud SILVA, 2000:23), psicólogo e
pedagogo suíço, a inteligência é a capacidade que o ser humano tem de se adaptar a
situações novas. Vemos, assim, que a saúde é uma atitude para com a vida, um
caminho a percorrer, com todas as exigências do nosso ser, nas três dimensões já
19
A busca da sabedoria é a mais perfeita porque vai além do temporal, tem a capacidade de
transcender ao infinito.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
64
mencionadas. pessoas aparentemente saudáveis que andam pelas ruas e
desempenham seu trabalho normal, mas que estão mental e espiritualmente enfermas.
Outras estão fisicamente enfermas, mas aprenderam a conviver com o sofrimento: são
amigos da vida (CAVALCANTI, 1997:96).
Saúde o é, portanto, um objetivo, mas uma fonte de riqueza da vida
cotidiana. Saúde é uma prática cotidiana de vida, um modo de bem viver conosco,
em família, em ambientes de trabalho, nas comunidades e no planeta em que
habitamos. Os profundos problemas do ser humano atingem seu foro íntimo e
estranhamente são mais intensos quanto mais se movem, em um contexto de
religiosidade supersticiosa: sobre o amor, o sexo, os fenômenos de transe e de êxtase, o
medo do mal, a necessidade visceral de vencer as doenças, de ter boa qualidade de
vida, a busca incondicional pela felicidade verdadeira ou aparente. Esses são temas e
problemas mal conduzidos no âmbito religioso que provocam um desequilíbrio na
vertente antropológica (TERRIN, 1998:11).
Essa realidade nos leva, como profissionais
de saúde, a não ficarmos alheios à problemática religiosa humana e a nos
aprofundarmos em conhecimentos específicos dessa área.
A dimensão espiritual é importante para o exercício da Enfermagem, uma
espiritualidade que faça com que o ser humano tanto aquela que assiste (a
enfermeira) como o que é assistido (o paciente) sejam sujeitos desse
processo de espiritualidade
(Carla-pesquisa,PEIXOTO:2000).
As pessoas que têm essa força maior espiritual conseguem uma recuperação
mais rápida. Têm uma resposta mais positiva em relação ao corpo, à mente”
(Miriam,pesquisa,PEIXOTO:2000).
2.2.2
E a doença?
A doença causa dano em nosso aspecto psicoespiritual, procurando
evidenciar a importância desse tema, que faz parte da assistência no “fazer” da
Enfermagem, mas que, parece, não está sendo aplicado na prática.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
65
A doença foi definida como o lado escuro da vida. Basta ter lido o livro de
(Jó 3-42), ou vivido pessoalmente uma doença muito grave, ou mesmo ter visto nos
olhos de um parente, ou de um amigo, o desgaste do sofrimento e da doença que
agride física e espiritualmente, para compreender o abismo de negatividade que ela
esconde.
É certo que a doença como mal, ou melhor, como a concretização física e
determinativa de um mal, entre no contexto das religiões e defronte-se com o
problema da vida e do seu significado, mas, se mal orientada, provoca mais
desequilíbrios. A doença é antivida, pode levar-nos às margens da vida, a uma erosão
da existência, à mortificação e à crise do viver, provocando, para, todos os efeitos, a
perda da integridade e da própria identidade pessoal (TERRIN, 1998:195).
A história comparada das religiões apresenta, inicialmente, o lado obscuro da
doença, como uma nebulosa de negatividade que não podemos precisar e determinar
adequadamente. Nestas, a saúde e a salvação são correlatas, e a contrapartida do mal,
dos demônios (tudo que é negativo) e da doença tem uma forma compacta orgânica.
A doença confunde-se com os monstros originários e com os espíritos maus, com a
possessão demoníaca e com o pecado (CAMURÇA, 2005:75).
A doença é, assim, a primeira experiência pessoal do anticosmo, do caos e da
desordem. Os monstros são a manifestação mais evidente disso, com sua confirmação
que se coloca a meio caminho entre a pessoa e o cósmico. Para a experiência pessoal,
parece que a desordem cósmica é o paradigma original, sobre o qual se conjugam as
correspondências próprias de qualquer outra desordem que intervém de modo
variado, para perturbar o organismo e provocar as doenças (CAMURÇA, 2005:157).
A doença quase sempre provoca uma crise na pessoa, que se traduz em
dependência, isolamento, quebra de comunicação (com sua vida, no dia-a-dia, com
os familiares). Essa situação deprime o doente, que, às vezes, passa pela fase de revolta,
necessitando de ajuda para ver o lado positivo da vida (PESSINI, 1988:20). Toda
doença é uma ameaça à integridade da pessoa, “uma degeneração da qualidade de
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
66
vida”. Surge de um conflito com o mundo, e a cura é obra de um reequilíbrio de
forças que produzirão seu efeito em nível energético e somático
(
PESSINI, 1988:216).
A doença violenta o doente em seu interior, na medida em que é uma lesão
para sua integridade psicobiofísica. Para se concretizar a cura biofísica, é
imprescindível realizar, antes, a psicoespiritual. Portanto, a doença, considerada
desarmonia do espírito, nasce de uma discordância entre as próprias energias
espirituais e as energias cósmico-universais
(
PESSINI, 1988:160). Talitha, nossa
entrevistada, insiste sobre a importância da assistência integral da enfermeira às
pessoas, no impacto da doença:
Vemos tanta gente desencantada lá no hospital. Pessoas que estão muito
agredidas, infelizes, abandonadas pela família, que ainda acham que a
doença é castigo de Deus: ´Olha eu não fui bom`, ´eu mereci`. E outras
idéias que deprimem as pessoas. Isto não está bem claro para muita gente.
Um tabagista, por exemplo, fuma a vida inteira. Ele sabe que faz mal, que
está caminhando para uma neoplasia pulmonar, mas na hora que aparece
um câncer ´de verdade`, ele vai dizer: ´Ah! é castigo!`, ou então, ´Isto é
porque trabalhei demais`.Se não se tentar motivar essas pessoas, elas
desistem de viver. A vida “inteira” se agrediram; e se nesse momento da
doença, continuarem a se agredir, não vão viver. É o momento de resgatá-las
para uma vida melhor
(Talitha-pesquisa,PEIXOTO:2000).
As manifestações de conflitos do indivíduo consigo mesmo, e com o mundo,
podem assumir uma linguagem corporal, fazendo-o sofrer. A doença seria, assim, uma
espécie de linguagem cifrada, um último e trágico protesto do indivíduo contra uma
situação adversa. É a realidade psicossomática que atinge todo o organismo. A
primeira constatação que o doente faz é a da ruptura de sua unidade subjetiva.
Quando estava são, não sentia o peso de sua corporeidade, todo o seu ser obedecia ao
impulso de sua vontade. Agora, sente alguma coisa que o paralisa, os membros não
lhe obedecem, sente o corpo como alguma coisa distinta do seu eu, sente-se dividido.
Essa ruptura subjetiva é agravada pela crise de comunicação com os outros.
Imobilizado, longe de seu ambiente, em posição de inferioridade, o doente
sente que o mundo se afasta e o deixa só. Mesmo os que o visitam o o
compreendem, não conseguem entrar no seu mundo de pequenos interesses, que
para ele são importantes e únicos. Se a doença avança, pode levá-lo ao fechamento e
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
67
à hostilidade, impedindo a comunicação com os outros e até com o Transcendente
(PESSINI, 1987:76).
Nenhum ser humano escolhe o sofrimento, a doença. Sofre na medida em
que não tem meios de recusa-la. Sua atitude tanto pode ser de aceitação e resignação
como de revolta e protesto. Segundo Boff (1976:9), aceitar ou recusar o sofrimento são
atitudes que podem ter como única raiz a covardia. Quem o aceita admite os estigmas
do pecado e das alienações. Quem o recusa pode estar fugindo da solidariedade dos
oprimidos, a fim de refugiar-se numa vida acomodada.
Muitas vezes, preocupamo-nos com aspectos mais profundos da teologia,
esquecendo-nos de verdades bíblicas simples e essenciais do cristianismo. A mais
importante resume-se em: ”Deus é Amor”
(
CAVALCANTI, 1997:59). Em nossa vida
cotidiana de Enfermagem, é necessário amar sempre os pacientes, nossos
semelhantes, cultivar um profundo respeito para com as opiniões religiosas
divergentes e ter habilidade para tratar com elas.
Precisa-se aprender a amar as pessoas, mesmo não concordando com
algumas de suas idéias, discordando de seus pontos de vista. Assim, estaremos sempre
abertos para aprender e crescer. assim poder-se-ão contornar as opiniões
divergentes com respeito, ganhando o direito de sermos ouvidos, podendo mostrar
com amor a verdade do cristianismo
(
CAVALCANTI, 1997:37).
O mundo do Extremo Oriente considera a doença estritamente ligada a um
equilíbrio total de energias, de forças e de contra-ofertas. Do mesmo modo, nesse
ponto, entram em cena os dragões, mas aparecem sobre um pano de fundo de
desordem. As sombras de nosso inconsciente, paralelamente ao conceito mitológico,
lento e progressivamente, constroem um conceito de doença e da miséria humana.
Para os cristãos, no calvário, Deus marcou um encontro com todos aqueles
que sofrem na carne e no espírito toda sorte de negatividade, engendrada pelo
egoísmo humano, os condenados da terra, com os quais seu Filho se identificou. A
superação do estado de infelicidade parte da constatação de que, se a desordem é a
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
68
causa de todos os males, a harmonia espiritual, enérgica e cósmica será o princípio
que permitirá atingir o bem-estar, a saúde, com salvação e felicidade (TERRIN,
1998:261)
20
.
O mal não sai do pó, e o sofrimento não brota da terra. É o ser humano que
causa o sofrimento ( 5, 6-7). chegou às margens do desespero; não tinha nada
mais a perder. Criou coragem e começou a abrir-se a um novo caminho na vida
humana, o caminho da esperança. Sente-se livre e dialoga com Deus. “Sei que podes
tudo [...]” (Jó 42,2-6). Ganhou a batalha. A fé transporta montanhas! “Quem não tem fé,
não vai subsistir” (Is 7,9).
A doença surge em formas diversificadas como dor, fome, sofrimento e pelas
mais diversas causas. Desgasta nossos dias, consome nossas energias em medo,
insegurança e preocupação, podendo provocar o desejo de morrer ou mesmo a
estagnação, o desespero, o desistir de lutar. Sobrevêm a aflição e a exaustão (TERRIN,
1998:31).
A absoluta obediência à vontade de viver se expressa hoje de formas e
colocações diferentes quanto às concepções clássicas. Os problemas não dizem mais
respeito ao verdadeiro e ao falso, ao bom e ao mau, ao útil e ao inútil, mas às novas
categorias emergentes, referindo-se ao ser sadio e ao estar em forma, em dar espaço e
forma às próprias exigências relacionadas com a pessoa. E isso ocorre com o
completo bem-estar psicobiofísico, psicossocial e psicoespiritual (TERRIN, 1998:261).
2.3 A crença-fé como força terapêutica
A crença e a verdade são condições necessárias para todo conhecimento.
João Evangelista (Jo 8,34) nos fala da verdade como luz e vida. O conhecimento que
temos das realidades que nos envolvem é limitado por nossa mente cognitiva. Esses
valores apreendidos pelo nosso cérebro são sentimentos que estimulam muitas
20
Na Antigüidade, Asclépio era considerado o deus dominante da cura. Hipócrates (400 a.C.) foi o
primeiro a atribuir causas naturais às doenças (BOFF, 1976:21; VILELA,1996:57).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
69
pessoas a reconhecer uma Inteligência Superior, o Transcendente, Deus. E no mais
fundo do coração humano, foram semeados o desejo e a nostalgia deste Deus. “Tarde
Te amei, é beleza tão antiga e sempre nova” (Santo Agostinho).
Vale a pena voltar a alguns relatos das origens para trazer à tona a natureza
da dívida que as pessoas imaginavam ter em relação às potências, às forças que
fizeram o universo e o ser humano. Pois o ser humano contemporâneo está sofrendo
a crise da falta de significado existencial em conseqüência do desequilíbrio entre os
avanços científicos e tecnológicos, cada dia mais panteísticos. O mundo interior ficou
subdesenvolvido por causa do excesso de estímulos para as relações horizontais,
esquecendo-se do Transcendente.
Essa relação humana com as origens, origens dela mesma, assim como de
tudo que a cerca, proporciona uma relação tal que as pessoas reais nela estão, ao
mesmo tempo, presentes e ausentes
(
GODELIER, 2001:270). Apesar de todo avanço
tecnológico, as pessoas vêm experimentando uma série de decepções, especialmente
porque nenhum remédio de última geração ou equipamento moderno e sofisticado
pode aplacar a angústia vital, a falta de significado e de sentido existencial. Na
tentativa de fugir de seus anseios interiores, das relações verticais com o
transcendente, as pessoas direcionam suas energias nas áreas exteriores
(
MAGANDI,
2004:49).
O ser humano foi se decepcionando por causa do crescimento unilateral dos
aspectos exteriores e das relações horizontais, e a razão instrumental da ciência
contribuiu para a aparente dessacralização do mundo. Aparente porque entendemos
que o sagrado está na imanência e na transcendência de tudo e de todos, e sempre
encontrará uma forma de se manifestar
(
MAGANDI, 2004:3). É na caminhada cotidiana
que a
Enfermagem
se volta para todas essas realidades, pois, por acreditarem nos
valores do ser humano, Florence Nightingale e Ana Nery,
pioneiras da Enfermagem
científica, enfrentaram os campos de batalhas na Europa e no Brasil (CASTRO,
1989:15).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
70
É, acreditando nesses mesmos valores que, nos hospitais e em outras
instituições de saúde, em diferentes lugares do mundo, os enfermeiros lutam pela
recuperação da saúde do ser humano (CASTRO, 1989:15).
Abordamos, em nossa pesquisa, a crença no sentido de fé, voltada para o
Transcendente
21
. Apresentamos crença e como dons de Deus, em um respeito
profundo pela de cada cliente. Falamos da evangélica, da força desse fenômeno
que é capaz de transportar montanhas, desse estímulo que revigora a vida dos que
crêem. Tentamos extrair um pouco do aroma transcendente que a fé nos proporciona.
A partir da fé, o que cada um de nós pode realizar? A opera maravilhas!
Crer não é imaginar, mas é um autêntico milagre! Revigora-nos interiormente e nos dá
coragem para que o nos sentirmos abatidos diante dos obstáculos. Somos
impulsionados a nos superar e ir além dos nossos limites e a conquistar novos espaços.
Para os que crêem nada é impossível a Deus (Lc 1,38). É essa dinamizadora que
impulsiona a Enfermagem a lutar pela vida do ser humano.
Pela fé, os povos conquistaram reinos, praticaram a justiça, foram
contemplados com promessas divinas, amordaçaram a boca dos leões,
extinguiram o poder do fogo, escaparam do fio da espada, recobraram saúde
na doença, mostraram-se valentes na guerra, repeliram os exércitos
estrangeiros [...], sofreram prisões [...], foram acoitados, apedrejados,
serrados [...], queimados em fogueiras nas praças públicas
(OFÍCIO DIVINO
IV, 1999:1328).
A fé mudou a história da humanidade. A fé fez a humanidade caminhar até os
dias de hoje. Na caminhada evolutiva do ser humano, foram sendo extintas as
populações que não desenvolveram a arte de acreditar (FRANCA, 1999:243
).
Foi pela que Abraão obedeceu à ordem de partir. Foi pela fé que Sara deu à
luz um filho na velhice e Abraão foi posto à prova. Assim nasceu a multidão
comparada às estrelas do céu e inumerável como os grãos de areia na praia do mar
21
O sentido de é amplo, abre-se em um leque de significados que vai desde a da criança em sua
professora no maternal, quando esta lhe ensina a decifrar nossa linguagem, passando pelos ideais em
nossa vida profissional, até a transcendência, além das idéias filosóficas e de todo conhecimento
cognitivo, a fé na Causa Primeira, o Transcendente.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
71
(Hb 11,1-19). É essa fé dinamizadora que impulsiona a Enfermagem a lutar pela vida do
ser humano.
2.3.1 E o que é fé?
A para a doutrina cristã é um dom sobrenatural de Deus, uma virtude
teologal, um dom do Espírito Santo à inteligência para compreender as verdades
reveladas por Deus, que nos comunica harmonia, paz e a certeza no amanhã. Quem
não tem fé certamente cairá nas malhas da angústia, da incerteza da vida futura. Ter fé
é sentir o poder da força espiritual de onde ela emana, impulsionando a certeza da
resposta do ato de crença (HEIDEGGER, 1981:32).
A verdadeira não é pensar num Ser Infinito, mas, sim, aquela que leva a
pessoa a sentir Deus vivo, no próprio coração. A pessoa que tem fé tem a experiência
da presença divina. O Rei Davi, na Bíblia, afirmava que via sempre o Senhor diante
dele, à sua direita, para ele não vacilar (At 2,25).
é um modo de possuir o que ainda se espera, a convicção acerca das
realidades que não se vêem. é a força mais potente do universo que nos leva à
energia transformadora – o Amor.
Desde a era glacial, temos registros sobre a faculdade humana de acreditar em
um Ser Superior, entre 80 mil e 455 mil anos atrás (HEIDEGGER, 1889:32).
Fowler (1992:11) afirma que somos dotados da capacidade inata da fé. Essa
capacidade será ativada dependendo das circunstâncias ambientais em que vivemos.
Ela é inesgotável, misteriosa. Qualquer um de nós pode ser iluminado em nosso
esforço de termos fé no Transcendente ou a encontramos nas atitudes de de outras
pessoas, que sejam religiosas (JOSAPH,1998:50). As Escrituras dizem: “Todo aquele que
crer não ficará confundido” (Rm 10,11). “Mas como crer, sem antes ter ouvido falar?”;
e “como ouvir sem alguém que pregue?” (Rm 11,14-15).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
72
Aqui vemos a importância de resgatarmos os valores espirituais na
Enfermagem, habilitando-nos para uma linguagem acessível às novas gerações na
formação acadêmica para a assistência psicoespiritual. É necessário conhecer para
crer. “Mas como crer, sem antes ter ouvido falar? E como ouvir sem alguém que
pregue?” (Rm 11,14-15).
Algo transcendente move o indivíduo, hoje, em sua busca da cura, e nós
docentes precisamos trabalhar as condições técnicas e as condições
patológicas voltadas para a espiritualidade. Precisa-se decifrar a linguagem
que motiva nosso povo. Para isso exige-se preparo
(Léo-pesquisa,
PEIXOTO:2000).
Josaph (1998:85) menciona a tríplice dimensão do crer na existência humana:
Primeiro, crer é acreditar que é verdade sem a verificação imediata da verdade. A
inteligência não vê, não tem argumentos, mas crê, com mais ou menos certeza, que é
verdade; -crença permanece uma obscuridade, no objeto que se crê verdadeiro, mas é
digna de fé a virtude do testemunho de alguém. A fé-crença apóia-se na confiança.
Segundo, crer é confiar em alguém, fiar-se em suas palavras, em sua pessoa. A se firma
como um jogo de fidelidade. É fiel quem fala e dá testemunho.
Terceiro,crer é reconhecer como bem ou valor, é ser capaz de motivar a ão e a
orientação da vida. Crer experimentarão esse sentido, julgamento de valor. É a causa que
constitui nossa razão de agir, de viver e até de dar a própria vida.
Às vezes, a gente está cuidando de pacientes que estão numa forma que
nada serve para eles, não querem mais nada. Então, parecem que não têm fé
em mais nada. Eles se perdem. São muito difíceis de ser tratados, porque
todos os valores que tinham desapareceram (Léo-pesquisa,PEIXOTO:2000).
Quem não tem fé, não acredita em nenhuma dimensão maior. Se os recursos
médicos falham, entra em pânico, se desespera. A mulher citada nos evangelhos, que
sofria de sangramentos, foi curada porque tinha fé no poder de Cristo:
“se eu ao
menos tocar a orla do manto de Jesus, ficarei curada” (Mc 5,25)
.
São insensatos por natureza todos os ‘seres humanos’
22
que ignoram a Deus,
os que, partindo dos bens visíveis, não foram capazes de conhecer Aquele
que é [...) Tomaram por deuses, [...] o fogo e o vento, o ar fugidio, o giro das
estrelas, a água impetuosa, os luzeiros do dia [...] concluam daí quanto mais
poderoso é Aquele que as formou: de fato, partindo da grandeza e da beleza
das criaturas, pode-se chegar a ver, por analogia, Aquele que as criou
(Livro
da Sabedoria
13,1,-9).
22
O grifo é nosso.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
73
Inseridos numa sociedade e cultura, nascemos e crescemos com várias
tradições. Hoje, as pessoas se sentem no direito de examinar diversas vertentes da fé e
escolher em cada uma o componente que lhes parece mais apropriado. É o que, os
antropólogos definem como o supermercado da (INSTITUTO CIÊNCIA E FÉ,
maio/05: on line).
No contexto de uma civilização que se consuma e se consome no nível
exclusivo do
fazer
, o compreender
torna-se mais difícil, obsoleto e sem sentido. Mas a
insatisfação e acomodação do
statu quo
devem ser a alavanca de uma ação
transformadora que conduza o ser ao pensar reflexivo, e construtivo, capaz de elevar a
pessoa ao estado de liberdade para ser conforme seu próprio pensamento. Pois o ser
com os outros no cotidiano, mantém-se entre os dois extremos de solicitude:
aquele
que salta sobre o outro e o domina, e aquele que salta diante do outro e o liberta
(HEIDEGGER, 1889:21)
.
Oh! “Quão belos são os pés dos que anunciam o bem!” (Rm
11,15).
É no “cuidar” da pessoa humana que o enfermeiro se confronta com o
transcendente, pois as pessoas se lembram muito de Deus quando estão em crise, mas,
se tudo vai bem, até esquecem o lado espiritual.
Aquelas pessoas que não têm uma proximidade com Deus, que levam uma
vida desleixada, meio ausente, realmente, elas se lembram do lado
espiritual quando estão em apuros, quando estão passando por dor,
dificuldades, processo de doença. Nesses momentos, a maioria tende a
procurar a presença e a ajuda do Ser Supremo. As pessoas que têm uma vida
íntima com Deus, e que seja normal na vida delas a oração, isso não faz
diferença. Mas uma boa parte o procura na hora que está em apuros,
mesmo, na hora dos apertos
(Cris-pesquisa,PEIXOTO:2000).
As pessoas em crise resgatam a fé, transformando-a em alavanca para superar
os obstáculos da vida. Daí a importância não de respeitar, mas vivenciar a dos
clientes.
Saltar diante do outro e o libertar!
Percebe-se aqui a explosão vocacional da
Enfermagem, chamada a saltar diante do outro e libertá-lo dos grilhões que o oprime
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
74
em sua totalidade humana. Libertá-lo não apenas na área biofisíca, mas em sua
totalidade, incluindo, assim, o psicoespiritual.
A nossa formação cristã brasileira, ocidental, é uma formação que traz a
dimensão espiritual. Vemos o nascimento, a morte e a doença, nessa
dimensão espiritual. É impressionante como as pessoas doentes reportam à
ajuda religiosa. Isso, tanto nas nossas vidas pessoais quanto profissionais
(Carla-pesquisa, PEIXOTO:2000).
Todas as religiões sempre se apóiam na fé, como abertura ao sobrenatural, para
afirmar sua identidade doutrinal. A fé, na perspectiva cristã, leva-nos a superar a
própria morte e a ressuscitarmos para a vida eterna: “Eu o ressuscitarei no último dia”
(Jo 6,44b).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
75
S
EGUNDA
P
ARTE
V
VV
Valores espirituais
alores espirituais alores espirituais
alores espirituais
na Educação em Enfermagem
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
76
C
APÍTULO
III
C
RENÇAS
R
ELIGIOSAS NA
R
ECUPERAÇÃO DA
S
AÚDE
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
77
C
APÍTULO
III
-
C
RENÇAS
R
ELIGIOSAS NA
R
ECUPERAÇÃO DA
S
AÚDE
No capítulo anterior foi abordado o tema da saúde e as religiões, com um
enfoque do cristianismo, pelo fato de sua dimensão religiosa estar na cultura brasileira
e na profissão da Enfermagem. Neste capítulo, tem-se uma visão geral das crenças
religiosas na recuperação da saúde, visando o sagrado com os símbolos, o fenômeno
religioso e a cura em saúde/salvação numa visão cristã. Fala- se também das culturas e
crenças religiosas, por estar “o ‘ser humano’ amarrado às teias de significados que ele
mesmo teceu” (GEERTZ, 1989:15, grifo nosso).
Num contexto geral a saúde está ligada às condições sociais das pessoas. A
grande maioria do povo brasileiro sofre de muitas enfermidades:
Não tem acesso aos meios mais elementares de prevenção e tratamento.
A desnutrição ainda é, no Brasil, a maior causa de morte prematura, especialmente de
crianças.
Muitos se desesperam nas filas do INSS.
O povo busca, onde pode, alívio para a dor.
As chamadas sessões ou cultos de “cura divina” e de “libertação”, apesar das
restrições que lhes possam ser feitas, tornam-se um espaço de alívio e de expressão
para o povo sofrido e preenche, de alguma forma, o grande vazio do descaso pela
saúde da população.
Segundo Cruz (2004:23), o perfil religioso brasileiro reflete o “caleidoscópio”
cultural de nossa terra; e, ao estudar os traços culturais brasileiros, o que mais se
destaca são a pluralidade e a vitalidade religiosas.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
78
A cura em saúde-salvação alavanca o cliente na reabilitação para o bem-estar
apesar das limitações depois dos traumas causados pela enfermidade. Os símbolos
religiosos (bíblia, terço, medalhas, amuletos) comunicam alento e esperança ao cliente
(ROSA, 1997:16).
3.1
As culturas: o sagrado e os símbolos
As ciências da natureza e do espírito surgem da cultura. Estão localizadas na
mente e no coração humano. Cultura é um sistema semiótico, integrado com o
conceito de religião, cuja abordagem global é auxiliar-nos a ganhar acesso ao mundo
proporcionando-nos o diálogo com as áreas do saber humano (informação verbal)
23
.
Geertz (1989:15), antropólogo, defende o conceito de cultura semiótica,
utilizando a definição de Weber (1918) de que “o ‘ser humano’ é um animal amarrado
a teias de significados que ele mesmo teceu” (grifo nosso). Essas teias e suas análises
são a cultura; não como uma ciência experimental em busca de idéias, mas como um
ciência interpretativa, à procura de significado. A pesquisa de Geertz é mais de estudos
empíricos do que indagações teóricas. Enfrenta duas decisões dilacerantes: o que
incluir e como tratar respeitosamente aquilo que é incluído. Não se entra em
contradição ao introduzir novas estimativas em estudos posteriores a certos
documentos, por exemplo, em revisões retrospectivas, nos casos em que a substância
do argumento não é seriamente afetada, pois “não qualquer sentido em continuar
a dizer ao mundo que os Australopitecíneos remontam a um milhão de anos, quando,
agora, os arqueólogos estão encontrando fósseis de quatro a cinco milhões de anos
(LANGER, 1953:443).
Geertz (1989:2) deixa transparecer suas idéias originais pela ordem mais lógica
do que cronológica. Em sua obra Interpretação das culturas, ele se coloca na linha dos
grandes antropólogos deste século e o mais destacado movimento intelectual para
revigorar o estudo da cultura como sistema simbólico. Faz uma tentativa de
esclarecimento sistemático do próprio conceito de cultura, em relações com o
23
Cultura semiótica é aquela pela qual se organiza o animal no mundo (Peixoto. PONDÉ, sem.1/04).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
79
comportamento real de indivíduos e grupos. Tratam-se de estudos empíricos para não
se afastar das imediações da vida social, sem se afastar de outras áreas afins, como
Organização Social, História Comparada e outras. A cultura é pública, porque o
significado é público. O livro da Torá, para os sociólogos, é cultura.
É consenso geral
na psicologia que a cultura se produz no córtex; e isso faz que o indivíduo se
modifique.
3.1.1
Conceitos de cultura e a teia cultural
O conceito de cultura surgiu no estudo da Antropologia. Geertz (1989:2),
sintetizando o conceito de Tylor (1968), assim se expressa: o ser humano é um animal
amarrado a teias de significados, a cultura. Religião é cultura, e estudá-la é uma
característica do ser humano moderno. O pantanal conceptual para o qual pode
conduzir a espécie de teorização é o
Mirror for man,
de Clyde Kluckhohn. Assim se
expressa:
Cultura é o modo de vida global de um povo; o legado social que o
indivíduo adquire de seu grupo; uma forma de pensar, sentir e acreditar;
uma abstração do comportamento; uma teoria elaborada pelo antropólogo,
sobre a forma pela qual um grupo de pessoas se comporta realmente; um
celeiro de aprendizagem em comum; um conjunto de orientações
padronizadas para os problemas recorrentes; comportamento aprendido;
um mecanismo para a regulamentação normativa do comportamento; um
conjunto de técnicas para se ajustar tanto ao ambiente externo como em
relação aos outros seres humanos; um precipitado da história
(KLUCKHOHN,
1972:670).
Ao se falar em culturas lembra-se aqui o que poderia esperar que um
“selvagem” criado por uma alcatéia de lobos na floresta interpretasse o mundo com
perspectivas substancialmente diferentes das nossas. E mesmo em comparações
menos radicais, como as que podem ser feitas entre pessoas que vivem em condições
culturais muito diferentes, percebem que o grau de experiências de vida determinam a
atitude mental com que interpretamos a realidade. Mas certas coisas que todos nós
experimentamos. E muitas vezes as crenças e expectativas que decorrem dessas
experiências comuns a muitos grupos são as coisas mais difíceis de serem identificadas
e confrontadas (VILELA, 1996:209).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
80
Acredita-se que todo ser humano goste de amor, carinho, compreensão. Nas
instituições de saúde vai gente de todo jeito:
status
social, raça, cor, religião diferente.
E, o que é pior, vai quem não gostaria de ir. Em razão disso, os profissionais de saúde
precisam estar preparados para todo esse desafio. A única forma de conhecer o
mundo é conhecê-lo em pedaços, pois o ser humano vive em “pedaços”. Trabalhar
com a cultura é fazer um “trabalho meio clínico”, tem que ajuntar pedaços. Ter
delicadeza no discernimento, sem perder a noção do todo. O ser humano diante da
insegurança das teorias se agarra às hipóteses.
Por que é tão importante a previsão? Agarrar a determinadas posturas,
garantir teoria e espaços, submetendo o corte de determinadas idéias?
A modernidade vem com a capacidade de definir; e a pós-modernidade,
com a materialização do que o social não pode definir. Quando o relativismo reina
em toda parte, vem o que ele chama de pós-modernidade.
“Cultura e religião têm entendimentos tipicamente atuais”. O trabalho do
antropólogo é ampliar o discurso, aprender com outras ontologias. A Antropologia
tem como objetivo o alargamento do universo, do discurso humano: a instrução, a
diversão, o conselho prático, o avanço moral. Os textos antropológicos são
interpretações de segunda e terceira mão. A rigor, somente um nativo interpreta sua
cultura em primeira mão. Na busca demasiadamente profunda pelos sentidos dos
fatos, está presente o perigo de que a análise cultural perca contato com as
“superfícies duras da vida”. Necessário se faz recorrer à Etnografia (Durkheim,
1970:11)
24
.
Segundo Geertz (2002:12), “se você quer compreender o que é ciência, deve
em primeiro lugar, ver o que os praticantes da ciência fazem”. Em Antropologia Social
fazer Etnografia é representar a análise antropológica como forma de conhecimento.
É uma “descrição densa que define o esforço intelectual.” A discussão de Ryle (1697,
24
Fazer etnografia é nos situarmos numa teia cultural: estabelecer relações, selecionar informações,
transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário e outros.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
81
apud GEERTZ, 1989:15) sobre “descrição densa” aparece em seus dois ensaios Le
Penser: Pensando e Refletindo e O Pensar dos Pensamentos:
O caso é que, entre o que Ryle chama de: descrição superficial, do que o
ensaiador (imitador, piscador, aquele que tem o tique nervoso...) está
fazendo (contraindo rapidamente sua pálpebra direita) e a descrição densa
‘do que ele está fazendo (praticando a farsa de um amigo imitando uma
piscadela para levar um inocente a pensar que existe uma conspiração em
andamento’).
Ai está o objeto da Etnografia: uma hierarquia estratificada de estruturas
significantes categorias culturais, tiques nervosos, piscadelas, falsas piscadas,
imitações, ensaios produzidos, percebidos e interpretados. A Etnografia é o tipo de
esforço intelectual que Ryle representa como a descrição densa. Quando se quer
conhecer uma ciência, é necessário participar da comunidade para entender seu
objetivo: multiplicidades de culturas sobrepostas. Segundo Eliade (1986:120), fazer
apologia cultural é aprender com as outras culturas. A Sociologia da Religião funciona
melhor quando se associa à Antropologia Cultural, que é uma ciência hermenêutica. A
cultura é uma espécie de palco-texto, onde estão vários autores trabalhando, onde a
Ciência da Religião é convívio de colegiado.
3.1.2
As culturas e os símbolos religiosos
Todo fenômeno religioso se situa no tempo e no espaço, tem um contexto
histórico que é básico para se manifestar de maneira histórica. As mudanças históricas
mudam o comportamento religioso através do surgimento de novos símbolos, ritos e
mitos, fazendo da história um elemento constitutivo e não causa do fenômeno
religioso. As estruturas religiosas fundamentais são atemporais, a-históricas: não se
pode precisar onde e quando nasceu uma estrutura religiosa. É por isso que:
O condicionamento histórico não modifica nunca em profundidade a
estrutura de um símbolo arquetípico, ao contrário, confere novas
significações. Aparecem outras valorações, em função do contexto histórico,
mas seguem submetidos pela dependência de uma mesma estrutura básica
(ALLEN, 1985:176).
O fundamental para se interpretar o fenômeno religioso é reduzi-lo às
estruturas simbólicas básicas, instrumentos de generalização. A pessoa religiosa não
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
82
cria ela própria a estrutura básica da religião. Segundo Allen (1985:97) a religião
implica uma ruptura radical com o secular ou profano, na medida em que transcende
o natural da experiência cotidiana. Diante da revelação do sagrado o
homo religiosus
atua de maneira dinâmica e criativa, criando com essa experiência seu universo
religioso, uma revelação mítica do sagrado, uma hierofania, e fica bem aberto a outras
valorações e outras tentativas de criatividade espiritual, assim, vê o mundo como
inacabado e que cabe a ele criá-lo repetindo a cosmogonia do sagrado (ALLEN,
1985:198).
Segundo Eliade (1954:12), o pensamento é consubstancial à existência
humana, anterior à imagem e à razão discursiva. O símbolo revela os aspectos mais
profundos dos meios de comunicação. Imagens, símbolos e mitos trazem à luz as mais
escondidas possibilidades do ser. A religião, numa visão de seu estudioso, é abordada
como expressão de cultura, e deve ser vista do interior, isto é, naquilo que lhe é
específico, e não apenas como objeto genérico olhado elo psicólogo, sociólogo,
ecônomo ou político.
Para falar do sagrado como os símbolos, Eliade (1986:125) apresenta uma
metodologia cuja base se concentra em dois princípios:
A dalética das hierofanias esta busca, através do processo dedutivo, distinguir o sagrado do
profano. O sagrado pode ser definido como experiência com o totalmente outro, com o
poder, a realidade última em termos transcendentes. A dialética do sagrado e do profano
busca aos olhos do
homo religiosus
a transcendência para sair da cotidianidade do tempo e
do espaço.
Os sistemas estruturais dos símbolos religiosos nestes a simbologia é algo dado, não
inventado ou descoberto. Pela simples contemplação de um fenômeno natural como o céu, a
lua é suficiente para o
homo religiosus
entender o transcendente do símbolo religioso.
Ninguém os inventou, mas são símbolos religiosos inquestionáveis. A afirmação eliadiana é
que “o mundo fala ou se manifesta através dos símbolos”.
Para Eliade (1996:91), o ser humano é
homo simbolicus
, e todas as suas
atividades implicam simbolismo. Conclui que todos os acontecimentos religiosos têm
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
83
um caráter simbólico. E as diferenças encontradas nos símbolos nos dão a conhecer a
cultura que interfere nas interpretações dos símbolos.
Os símbolos religiosos revelam as estruturas fundamentais do mundo: o
mundo fala ao ser humano e, para entender esta linguagem, basta conhecer os mitos e
decifrar os símbolos do sagrado. Desempenham um papel considerável na vida
religiosa da humanidade. É graças a eles que o mundo se torna “transparente”,
susceptível de mostrar a transcendência. Para o ser humano religioso, a Natureza
nunca é exclusivamente natural. Está sempre carregada de valor religioso. O Céu se
revela um infinito transcendente. As águas são o reservatório das possibilidades de
existência de vida sobre a terra, simbolizam a soma universal das virtualidades.
Podemos encontrar uma clara exposição de imagens e símbolos nas teorias de Freud y
Jung (1930 e 1912, apud IACOBI, 1957:86 y sigs) sobre os símbolos. Diversos fatores
contribuem para privilegiar, hoje, o estudo do simbolismo:
Descobrimento da psicologia profunda, com possibilidade de conhecer a atividade do
inconsciente com interpretação de imagens, figuras às quais não devem ser consideradas
sem seu valor aparente, senão como sifras de situações que a consciência não deseja e
não pode optar.
Vemos em Mircea (1952:229) que os arquétipos e símbolos derivados do inconsciente das
pessoas constituem "aberturas" a um mundo de imagens e símbolos.
Para Segal (1940, apud TERRIN 1998:74), o reducionismo é pobre porque ele não
valorizou o campo simbólico religioso.
As culturas orientais das quais tiveram origem várias religiões, entre elas, a da
Grécia, da China, da Indonésia, dispõem de uma vasta literatura sacra escrita,
riquíssima em simbolismos religiosos
25
.
25
Para as culturas orientais o cosmos vive e fala. O ser humano se concebe como um microcosmos, faz
parte da criação dos deuses; reencontra em si mesmo as santidades que reconhece no Cosmos. O
casamento é valorizado como uma hierogamia Terra/Mulher. A Mulher é assimilada à gleba, as
sementes ao sêmen virile e o trabalho agrícola à união conjugal. A união sexual (
maithuna
) é, antes de
tudo, uma integração entre esses dois princípios, a Natureza-Energia smica, e o Espírito. O corpo
humano, homologado ritualmente ao Cosmos ou ao altar védico (que é o imago mundi), é igualmente
assimilado a uma casa. A última passagem da condição humana é expressa por uma imagem dupla, a
rotura do telhado e o vôo nos ares. Na maioria das religiões arcaicas, o “vôo” significa um modo de ser
sobre-humano à vontade de se mover à vontade, portanto, uma propriedade do “espírito”. Essas
homologações antropocósmicas interessam-nos à medida que elas são as “cifras” das diversas situações
existenciais. Isto é o mesmo que eu dizer que o ser humano é acessível a uma série infinita de
experiências que poderiam chamar-se “cosmos” (ELIADE, 1954:179).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
84
3.2
O fenômeno religioso
Seres humanos buscam sempre ser felizes, livres, viver em paz. O nosso eu se
constrói a todo o momento. Vou-me conhecendo, confrontando e assimilando novas
experiências de crenças e valores com as outras pessoas. Respeito-me e me amo à
medida que sou amado e respeitado. O meio ambiente influencia em nossa formação
pessoal com crenças religiosas e mitos (SCHIAVO, 2005:84).
A fenomenologia das religiões
26
começou com Rudolf Otto (1917:11). Seu
trabalho teve uma repercursão mundial. Seu sucesso foi em função da originalidade
da sua obra. Otto ao invés de estudar as idéias de Deus e de religião, analisou o lado
irracional do sagrado. No livro
Das Heilige
, ele expressa o sentimento de pavor diante
do sagrado,
mysterium tremendum
,
mysterium fascinans
(OTTO, 1957:117).
Quarenta anos depois, Eliade (1986:117) focalizou a sua forma específica de
redução, apresentou o seu trabalho numa outra perspectiva, o fenômeno do sagrado
com toda a sua complexidade e não apenas o irracional. Não se trata de uma relação
entre o não racional e o racional, mas o sagrado na sua totalidade. E isso provocou
uma nova visão nos conceitos de sagrado.
Não faz muito tempo o público tomou conhecimento, através de um livro de
Aldo N. Terrin (1998), de um intenso debate que se trava no mundo anglo-
saxônico, desde meados dos anos 80, em torno do estatuto epistemológico
das ciências da religião. Apesar de que este debate se arrasta algumas
décadas, alguns elementos novos entraram em cena. Destacam-se dois:
primeiro, o falecimento de Mircea Eliade (1986), e a publicação de seu
legado para a posteridade, a monumental `Encycoopedia of Religion´.
Ambos os acontecimentos possibilitaram e despertaram revisões e críticas ao
paradigma estabelecido da História Comparada das Religiões.
(CRUZ
Eduardo R, 2004:1).
A primeira definição do sagrado para Eliade (1996:118) é que “o sagrado se
opõe ao profano”. A diferença entre sagrado e profano traduz-se como uma oposição
entre o real e irreal. Eliade não se preocupou em criar um paralelo entre o racional e
o irracional. O que lhe interessou foi o Sagrado na sua totalidade. Assim, aborda dois
26
A fenomenologia
forma um dos campos mais vastos do conhecimento humano, pois se relaciona
com todas as outras ciências formando um amplo leque.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
85
grandes temas no seu livro O Sagrado e o profano: o espaço sagrado e a sacralização e
a Existência humana e a vida santificada.
Para Eliade (1954:182), o ser humano toma consciência do sagrado porque
este se manifesta. Isto é a hierofania
27
. Pode-se dizer que a história das religiões, desde
as mais primitivas às mais elaboradas, é constituída por um número considerável de
manifestações sagradas. Até a hierofania suprema que é para o cristão, a encarnação
de Deus, Jesus Cristo. Não se trata de adorar a pedra, ou a árvore, mas veneram-nas
porque são manifestações do sagrado. Uma pedra sagrada, nem por isso é menos
pedra. Aparentemente nada a distingue de todas as demais pedras. Para os que têm
uma experiência religiosa, toda a natureza é susceptível de revelar-se como
sacralidade cósmica. O cosmos na sua totalidade pode tornar-se hierofania. Os povos
das sociedades arcaicas tinham a tendência de viver o mais tempo possível no
sagrado, ou perto dos objetos sagrados. dois modos de ser no mundo: sagrado e
profano.
Para Eliade (1986:118), o campo das Ciências da Religião coincide com todas as
outras ciências. O método do historiador das religiões difere daquele que são próprios
do psicólogo, da lingüística e do sociólogo porque ele preocupa somente com
símbolos religiosos, vinculados à experiência religiosa do mundo. Difere também do
empregado pelo teólogo, pois toda teologia implica uma reflexão sistemática sobre o
conteúdo da experiência religiosa e busca uma mais profunda e clara compreensão
das relações existentes entre Deus Criador e o ser humano, criatura. Usa o método
empírico de enfoque. Interessa-lhe o significado do fenômeno religioso e sua história.
Deve também sistematizar o resultado de suas pesquisas e reflexões sobre a estrutura
do fenômeno estudado. Por outro lado, completa seu trabalho histórico como
fenomenólogo ou filósofo da religião que surge do desejo irresistível do ser humano
de transcender o tempo e a história. Preocupa-se somente com os símbolos religiosos
para ter por esses meios uma visão religiosa do mundo.
27
Hierofanias são manifestações das realidades sagradas a partir da forma mais elementar: a
manifestação em um objeto qualquer, uma pedra, uma árvore.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
86
Eliade (1986:121) jamais teve medo de declarar que a religião deve ser
estudada com critérios religiosos; e afirma que o sagrado não se submete a nenhum
reducionismo das ciências sociais, psicológicas, históricas. Faz parte de uma categoria
sui-generis
, que não pode ser submetida à análise científica.
Para alguns autores, como Eliade, a religião pode ser descrita
morfologicamente. Ela é inerente ao ser humano e se manifesta por meio de uma série
de coisas: céu, sol, lua, água, fecundidade, vegetação, guerra, morte, que são comuns
a todas as culturas. A diferença entre a Escola de Roma
28
e Eliade é que aquela é muito
mais historicista, e mais peso as circunstâncias históricas, culturais e sociais. Eliade
descreve uma morfologia do sagrado. Apesar de o ter tido propriamente uma
formação teológica, foi acusado de “crípto-teólogo, em sua insistência de atribuir um
caráter
sui-generis
do fenômeno religioso. Essas críticas nos parecem injustas, uma vez
que toda disciplina nova nasce de uma outra e, por um tempo, mais curto ou mais
longo, será desenvolvida por profissionais adaptados e manterá um certo caráter
híbrido e indefinido (CRUZ, Eduardo. R, 2004:1).
Eliade defende que o estudo do fenômeno religioso seja realizado a partir de
categorias próprias deste universo religioso. Isto não quer dizer que a religião possa ser
entendida isoladamente de seu contexto histórico, mas que não se reduzam suas
particularidades constitutivas a meros fatos históricos ou culturais. Segundo ele, ao se
buscar a essência da religião através de categorias próprias, deve ser estudada a partir
do princípio metodológico da irredutibilidade do sagrado. A experiência do sagrado
vivenciada no universo religioso não pode ser reduzida a uma causa de fatores
socioeconômicos ou psicológicos. Portanto para Eliade, o estudo das religiões deve ser
fenomenológico para que elas não sejam descaracterizadas. Ele se entende como
historiador da religião, ou seja, um estudioso do fenômeno religioso. Afirma que, para
28
Nos período helenístico e Imperial Romano, destacaram-se várias escolas filosóficas, entre elas, a do
neoplatonismo, um aperfeiçoamento do pensamento filosófico grego que parece extremamente atual
em razão da grande similaridade entre a visão e a concepção de mundo que emergem de seus
pressupostos filosóficos básicos e a atual visão de mundo que surge da Física Moderna, da Teoria Geral
dos Sistemas e da Psicologia Transpessoal. A figura mais importante do movimento neoplatônico foi
Plotino (205-253 d. C.) de Alexandria, fundador da Escola Romana em 244 d.C., discípulo de Amônio
(que soube conciliar Platão e Aristóteles e a transmitir a seus discípulos, sobretudo a tinPloo). Outros
discípulos famosos de Amônio foram Orígenes, o Pagão, Longino, Eugênio e Orígines, o Cristão.
http://www.perfeitauniao.org/oficina/1998/plotino e o neoplatonismo.htm (acessado em 17/05/06).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
87
captar o significado de uma manifestação religiosa, o fenomenólogo das religiões deve
ser capaz de descobrir o que nela possa haver de único e específico. O transcendente,
que aos olhos de Eliade (2002:15) é a experiência do sagrado, precisa ser reduzido às
categorias compreensíveis, senão não há como interpretar o fenômeno religioso.
As ciências sociais, ao interpretar a religião, deixam escapar a principal
característica da religião, o sagrado, e, segundo Allen (1898, apud ALVES, 2003:2), a
fenomenologia
29
é a mais recente e a mais importante desde o ponto de vista
metodológico, um dos métodos de estudo dos fenômenos religiosos em Ciências das
Religiões
30
. Para Terrin (1998:14), o estudo das religiões é marcado por dois grandes
períodos: o primeiro, o distanciamento do fato religioso; o segundo, aquele no qual
cresce a consciência da natureza social da religião.
Velasco (2002:13) descreveu os métodos cruzados, método comparativo e
crítico, para compreender mutuamente cada religião. Faz reflexões sobre a
neutralidade, para uma perspectiva própria do estudo das religiões, e autonomia,
como construção de um ponto de vista comum, para o estudo do fenômeno religioso.
Segal (1940, apud ELIADE, 1996:2) apresenta dois campos opostos de
pesquisadores da religião: os religionistas e os reducionistas. Colocando Eliade no
primeiro grupo, ele critica sua obra dizendo que um fenômeno religioso pode ser
reconhecido como tal se apreendido em seu próprio nível, se for estudado como algo
religioso. Tentar apreender a essência de um tal fenômeno por meio da fisiologia,
psicologia, sociologia, economia, lingüística, arte ou qualquer outra disciplina é falso.
Para Durkheim (1970, apud CRUZ, 2004:3), a ambição suprema era chegar a
conclusões práticas, fornecer diretrizes à ação social. Mas para chegar não havia, a
seus olhos, outro caminho senão o da ciência positiva. A constante preocupação é
evitar o misticismo, abismo onde se arriscaria a soçobrar a razão humana, a
29
Fenomenologia, método de estudo das religiões através dos fenômenos religiosos (Temas da filosofia
de todas as épocas, com links para outras páginas de Cobra Pages em cultura, educação e
comportamento).
30
Ciência das Religiões se entende as várias possibilidades de enfoques para o estudo do fenômeno
religiosok nas diferentes áreas: psicologia, antropologia, sociologia,m entre outras áreas(ALVES,
2003:1).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
88
abordagem exclusivamente culturalista do religioso. À semelhança de René Girard, ele
destaca a violência e a centralidade do sacrifício nas religiões primitivas. Contudo, ao
contrário de Girad, Burkert evita divagações de cunho edipiano e concentra-se nos
dados que as modernas ciências biológicas, construídas com o apoio da teoria da
evolução, podem nos oferecer. Em diálogo com estes dados, ele propõe características
para a religião:
O que é almejado e lidado na religião não pode ser visto, ou tocado, ou trabalhado da
mesma forma como ocorre no cotidiano. Esta característica fala mais do que da
transcendentalidade do objeto da religião e inclui também o seu caráter não-prático,
ambíguo e paradoxal.
Contrariamente à inefabilidade,”a religião manifesta-se através da interação e da
comunicação”. Aqui as definições culturalistas são úteis.
A religião se distingue de outras formas de comunicação simbólica, como o
jogo e a arte.
Otto (1869-1937) se opõe aos naturalistas. Refere-se à religião como ética.
Para ele todas as religiões têm o sentimento de mistério. Otto retoma Kant (1804) pela
forma pura da razão – os objetos que despertam os sentidos.
O que é sagrado para Otto? É o
tremendum
,
o facinans
,
o intocável
,
o
numinoso
o sagrado que brota no fundo da alma, sensibilizado pelo mundo exterior,
através dos sentidos. É a razão do ser humano que traz essa disposição, o impulso
religioso não são percepções sensíveis. o sentimentos que diferem de tudo que a
razão pode dar. Otto tem a obsessão do
tremendum
que é indispensável em toda
religiosidade. O instinto religioso. A experiência religiosa é incomunicável. Dizer que
uma pessoa é santa se refere ao campo moral, questões morais. O numinoso é algo
incompreensível, fora do eu, do nós. Esse objeto provoca uma reação nos sentidos e
faz despertar o sagrado no fundo da alma do religioso.
3.2.1
O sagrado e o profano no mundo moderno
O impacto da mudança radical da medicina ocidental ocorreu com a
revolução cartesiana. Antes de Descartes
(1596-1650), a maioria dos terapeutas
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
89
associava corpo e alma, e tratavam seus pacientes no contexto do meio ambiente
social e espiritual. Suas concepções de doença e seus métodos de tratamento
evoluíram com o tempo, mas sempre consideraram o paciente como um todo.
Porém, o próprio Descartes que introduziu a separação entre corpo e mente,
reconheceu que a interação entre ambos é um aspecto essencial da natureza humana,
com suas implicações na medicina, mostrando-se muito menos cartesiano do que seus
discípulos. No século XVII muitas tentativas de modelos mecanicistas fracassaram. No
século seguinte surgiram numerosos contramovimentos, sendo a homeopatia o mais
difundido e bem-sucedido.
Capra (1982:25) considera que as raízes dos problemas que atingem a área da
assistência à saúde encontram sua base conceitual no Modelo Biomédico. Para
suplantá-las é necessário adotar um conceito holístico e ecológico de saúde, com
mudanças radicais na base conceitual da ciência médica
31
.
Se levarmos em conta a luta sem tréguas que hoje ainda existe entre ciências
naturais e ciências do espírito, desde o nível epistemológico até o da metodologia
própria das diversas ciências que militam nos dois âmbitos, podemos perceber como a
situação se complica mais ainda e como os problemas correlacionados se estendem a
todos os campos do saber e abarcam, hoje, o mundo inteiro das disciplinas, convidado
a escolher entre uma ou outra concepção.
Isso aconteceu a partir do Iluminismo e, particularmente, depois das
primeiras grandes descobertas de caráter microbiológico feitas na era positivista, no
final do século passado, quando se começou a relacionar uma causa específica, como
uma bactéria ou um vírus, com o aparecimento de uma doença infecciosa particular
(TERRIN,1998:153).
Médicos e filósofos da Idade Média delinearam a importância de uma
medicina holística, a exemplo de Cristo, que falava e ensinava com fatos. Isso inclui
em compreender as doenças considerando um grande quadro no qual a filosofia e
31
A educação médica sofreu a influência da divisão cartesiana, encontra-se divorciada das
preocupações sociais e espirituais (VILELA, Eliane 1996:64)
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
90
ciências naturais se encontram, teologia e alquimia se aproximam, e a saúde fazendo
parte de um plano natural e sobrenatural que abrange qualquer ser vivo ligado
dinamicamente a todas as outras realidades.
Para o ser humano religioso, o Sagrado transcende esse mundo, mas se
manifesta a ele; e esse fato o santifica. Crê que a vida tem uma origem sagrada. Os
deuses criaram o ser humano e o mundo, os heróis civilizadores acabaram a criação e
a história de todas essas obras divinas e semidivinas, e estas estão conservadas nos
mitos. Compreende-se o profano como a consciência dilacerada do a-religioso.
Para a consciência moderna, um ato fisiológico (alimentação, sexualidade)
não passa de um fenômeno orgânico. Mas para o “primitivo” tal ato nunca é
simplesmente fisiológico; é e pode tornar-se sacramento, isto é, uma comunhão com
o sagrado. O Sagrado com sua história apresenta-nos a experiência do
religiosus
e
suas diferenças com a experiência profana
32
.
Eliade (1996:115) descreve as modalidades do sagrado e a situação do ser
humano num mundo carregado de valores religiosos. É cil ver tudo o que separa o
modo de ser no mundo, da existência de um ser humano a-religioso. Este recusa a
transcendência, aceita a relatividade da “realidade” e acontece até duvidar do sentido
da existência. Mesmo as grandes culturas do passado conheceram também seres
humanos a-religiosos. Mas o ser humano a-religioso moderno assume uma nova
situação existencial: reconhece-se unicamente sujeito, agente da história e recusa todo
o apelo à transcendência, dessacraliza-se e dessacraliza o mundo. no sagrado um
obstáculo diante de sua liberdade. se sente plenamente ele próprio, no momento
em que estiver radicalmente desmistificado. será verdadeiramente livre no
momento em que tiver matado o último deus.
É interessante constatar quantas encenações iniciáticas persistem ainda em
numerosas ações e gestos do ser humano a-religioso dos nossos dias: a guerra, as
iniciações militares, e a psicanálise afrontam seu próprio inconsciente. A iniciação está
32
Há diferenças na experiência religiosa que se explicam pelas diferenças econômicas, de cultura, de
organização social e pela história.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
91
tão estritamente ligada ao modo de ser da existência humana que inúmeros gestos e
ações do ser humano moderno ainda repetem quadros iniciáticos.
A luta pela vida, as provas e as dificuldades que entravam uma vocação e
uma carreira repetem as práticas iniciáticas. É em conseqüência dos golpes que
recebe, dos sofrimentos e das torturas morais e físicas que sofre que o jovem se
“experimenta” a si próprio, conhece as suas possibilidades, toma consciência de suas
forças e acaba por tornar-se ele próprio espiritualmente adulto e criador
33
. Toda
existência humana se constitui por uma série de provas, pela experiência tirada da
morte e da ressurreição.
O ser humano profano é descendente do
homo religiosus
e não pode anular
sua própria história, os comportamentos dos seus antepassados religiosos. É
constituído de sua atividade consciente e pelas suas experiências irracionais. As
estruturas do inconsciente apresentam similitudes com as imagens e as figuras
mitológicas. O inconsciente apresenta uma aura-religiosa.
Toda crise existencial põe de novo em questão a realidade do mundo e a
presença do ser humano no mundo: isto quer dizer que a crise existencial é religiosa,
pois, nos níveis arcaicos de culturas, o ser se confunde com o Sagrado. Como vimos, é
a experiência do sagrado que funda o mundo, e até a religião mais elementar. É antes
de tudo uma ontologia. Esta solidariedade nos mostra em que sentido até o ser
humano mais francamente a-religioso partilha ainda, no mais profundo do seu ser, de
um comportamento religiosamente orientado. Mas as “mitologias” privadas do ser
humano moderno, os seus sonhos, os seus devaneios, os seus fantasmas, não
conseguem alçar-se ao regime ontológico dos mitos justamente porque não são
vividos pelo ser humano total. A atividade inconsciente do ser humano moderno não
cessa de lhe apresentar inúmeros símbolos e cada um tem uma certa mensagem a
transmitir, uma certa missão a desempenhar, tendo em vista assegurar o equilíbrio da
psique ou restabelecê-lo (ELIADE ,1996:216).
33
Trata-se bem entendido da espiritualidade tal qual é concebida no mundo moderno.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
92
O ser humano profano a-religioso das sociedades modernas é ajudado pela
atividade de seu inconsciente sem que ele consiga uma experiência e uma visão do
mundo propriamente religioso. O inconsciente lhe oferece soluções para as
dificuldades da sua própria existência e, assim, desempenha o papel da religião,
porque antes de criar uma experiência criadora de valores, a religião lhe assegura a
integridade. De certo ponto de vista, quase poderia dizer-se que, entre aqueles
modernos que se proclamem a-religiosos, a religião e a mitologia estão “ocultas” nas
travas do inconsciente. Eles possuem em si próprios a possibilidade de uma
experiência religiosa. Por outro lado, poderíamos dizer, numa perspectiva cristã, que a
não religião equivale a uma nova queda da humanidade: o ser humano a-religioso
teria perdido a capacidade de viver conscientemente a religião. Depois da primeira
queda, a religiosidade caiu no nível da consciência dilacerada; depois da segunda caiu
ainda mais profundamente no fundo do inconsciente: foi esquecida (ELIADE ,1996:24).
Param aqui as considerações do historiador das religiões. É aqui também que
principia a problemática própria ao filósofo, ao psicólogo e até mesmo ao teólogo.
3.3
A saúde-salvação
As religiões, desde sempre, associaram, de maneira bem estreita, o conceito
de salvação ao de saúde e bem-estar e, muitas vezes, usaram esses dois termos
indiscriminadamente com um único significado e para indicar uma única realidade
geral, da qual o ser humano tem necessidade num mundo em que ele está
constantemente ameaçado.
Constatamos historicamente através dos séculos que todos os povos e as
culturas se enchem de veneração perante a realidade do Divino que impregna todo o
universo; vivenciam o significado sagrado de todas as coisas e cultivam a
espiritualidade como aquela visão interior que une tudo à sua Fonte divina
(BOFF,
1999:25).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
93
O conceito bíblico-teológico de salvação inclui diversos significados. Os
estudiosos do Antigo Testamento demonstram que o campo da palavra shalom, que
corresponde ao termo Salvação do Novo Testamento, indica que “ser salvo” significa
tornar-se inteiro, sem dicotomias no seu ser, encontrar a saúde, a paz, a alegria plena,
que correspondem ao bem-estar psicobiofísico, psicossocial e psicoespiritual (Jo
15,11).
“Salvar”, no grego clássico, deriva de “são” e significa: devolver a saúde ao
doente, a segurança ao ameaçado, arrancar da morte o moribundo. Salvação é como
o novo tempo. Buscar a salvação significa também, buscar a cura; o significado de
cura aqui não é, primeiramente, a cura de sintomas, de doenças episódicas ou mesmo
crônicas, trata-se da cura “salvação do ser”, do indivíduo, da personalidade. É a cura
ontológica. É a cura que, num primeiro momento, desvela o indivíduo diante de si
mesmo, ao tornar-se consciente das grandes lacunas e fragilidades de seu ser. Num
segundo momento, o indivíduo é abençoado com a graça salvadora que lhe confere o
sentido de viver e as grandes referências para sua jornada de vida. Encontra, portanto,
o centro estruturante de sua existência. A graça lhe oferece o fundamento para as
terapias recorrentes, na busca constante da saúde total.
Esta saúde integral a
Enfermagem, em suas atividades técnicas, deve estar sempre empenhada em devolver
aos pacientes e/ou clientes. Inclui-se portanto, aqui, a cura psicoespiritual, a qual
estamos tentando revalorizar (ROSA, 1997:18). As pessoas que têm essa força maior
espiritual, conseguem uma recuperação mais rápida, uma resposta mais positiva em
relação ao corpo, à mente” (Carla, pesquisa, PEIXOTO:2000).
Saúde e salvação, segundo Terrin (1998:154), são termos co-originários,
surgiram de um mesmo conceito e partilharam, por muito tempo, do mesmo sentido
e de um mesmo significado geral que acabou se cindindo bem mais tarde. Ambos
derivam do sânscrito
svastha
(bem-estar, plenitude). A mesma coisa aconteceu com o
termo
sotería
na língua grega e em outras línguas, segundo a qual justamente Asclépio
é considerado
sotér
: aquele que cura o físico e que é, ao mesmo tempo, o “salvador”,
cura também o espiritual. A partir daí salvação passou a designar cura, saneamento.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
94
Na língua latina é emblemático o significado de
salus
, termo capaz de
incorporar, mesmo em época recente, tanto o significado de saúde como de salvação.
É preciso lembrar que em outras línguas acontece a mesma combinação
.
O anúncio da paz se refere à conquista do bem integral, sem aflições, sem
sofrimentos morais, sociais ou biofísicos. O mensageiro que o profeta se refere, é Jesus,
encarnado que vem ao encontro da criatura humana, que a cura, perdoa e salva. As
curas são atribuídas a uma
dúnamis,
a um poder divino que habita em Jesus e que dele
emanava uma força: “Toda a multidão procurava tocá-lo porque dele saía uma força
que curava a todos” (Lc 6,19). Foi em virtude dessa força que a hemorroíssa ficou
instantaneamente curada, ao simples toque nas vestes de Jesus. Esta é a força do
Senhor de curar doenças (
dúnamis Kyríou
) em ação (ROSA, 1997:18).
Esta
dúnamis
divina exige a para tornar-se operativa. Acontece como os
dois pólos positivos e negativos, da força elétrica: é no encontro de ambos que
surge a luz. Assim também acontece na cura: ”[...] tua fé te curou” (Mc 6,36; Mt 13,58).
Para Jesus, é pela que a pessoa pode entrar na área da força onipotente de
Deus, que é amor, fonte de vida e saúde. Tudo é possível a Deus e se torna possível,
também, às pessoas que entram na esfera de Deus (Mc 9,23). A é, portanto, uma
força todo-poderosa, um poder de realizar as coisas mais difíceis. Para que se realize a
cura é necessário entrar nessa força. Para tanto, a fé deve produzir uma convicção
profunda que não se abala diante das maiores dificuldades, nem hesita, como hesitou
Pedro, ao caminhar sobre as águas (Mt 14,30-31). “Quem crer será salvo, quem não
crer já está condenado” (Jo 3,16-18).
Segundo os cristãos, Jesus veio para que “todos tenham vida e a tenham em
abundância” (Jo 10,10). Ele mostra sua preocupação com a “vida em abundância”,
saúde integral da pessoa humana. Isso é o mesmo que se afirma na educação em
Enfermagem quanto ao cuidado da pessoa humana. Para garantir um compromisso
constante com a saúde, Jesus exorta seus discípulos a cuidarem sempre dos enfermos:
“Em qualquer cidade que entrarem [...] curem os doentes que nela houver”. Todo
sofrimento, tristeza, supõe uma ascese. É o prenúncio de uma Páscoa: morrer e
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
95
renascer. É a passagem da morte para a vida em múltiplas circunstâncias. Muitas
pessoas passam a ter depois de uma dor, de um sofrimento, ou de perdas de entes
queridos (PESSINI, 1987:55).
Na profissão de Enfermagem, os enfermeiros são desafiados a conviver com
pessoas as mais variáveis possíveis: diferentes estilos de vida, fé, cultura, raça, cor,
sexo, nível social.
Nas instituições de saúde vai quem o gostaria de ir. E é nesse
ambiente de busca pela vida, na qual se consta uma ascese “dos mensageiros”, que os
enfermeiros estão proclamando a saúde-salvação aos clientes.
A nossa saúde integral depende da harmonia holística do nosso ser com o
universo. Harmonia das dimensões, como vimos, psicobiofísicas, psicossociais e
psicoespirituais. Quando uma dessas dimensões falha, acontece o desequilíbrio geral
de todo o nosso ser, provocando as doenças. Eis aqui a grande tarefa pedagógica da
Enfermagem: lembrar sempre que não basta só ciência, técnica, hospitais, profissionais
competentes, mas é necessário também o equilíbrio holístico para sanar todos os
males (VILELA, 1999:28).
3.3.1
A força de cura pela fé
Como vimos no capítulo dois deste trabalho, em A fé como força terapêutica:
Fowler (1992:11) afirma que somos dotados da capacidade inata da fé. Essa capacidade
será ativada de acordo com as circunstâncias ambientais em que se vive. Ela é
inesgotável, misteriosa. Também Josaph (1998:5) nos lembra que qualquer um de nós
pode ser iluminado em nosso esforço de termos no Transcendente ou de encontrar
nas atitudes de fé de outras pessoas, que sejam religiosas.
Numa situação como a nossa, hoje, os doentes se multiplicam dia-a-dia,
muitas vezes, e não mais se conseguem curar doenças com antibióticos porque as
doenças são cada vez mais ardilosas e sutis. Então, é preciso recorrer cada vez mais, a
psicofármacos, antidepressivos, neuroléticos, tranqüilizantes, entre outros, muitas
vezes, com efeitos devastadores à pessoa. Na falta de outra coisa, não devem ser
demonizados aqueles que recorrem às técnicas psicossomáticas de inspiração oriental,
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
96
aqueles que fazem ioga, que praticam o
shiatzu
japonês ou a planoterapia, entre
outras técnicas (SANFORD,1981:81).
Verifica-se, no campo da saúde e da doença, um amplo espectro de
possibilidades que vão além das expectativas médicas em relação às doenças, cuja
força e orientação dependem da mente, da visão da realidade, da capacidade de
controlar as próprias idéias e emoções, em que a fé religiosa adquire uma nova
confiança e otimismo que a pessoa expressa em relação a si mesma e ao mundo e, é
capaz de fazer milagres:
a prática da medicina popular, que tem sido uma prerrogativa
das mulheres por ser a arte de curar associada às tarefas e ao espírito de maternidade.
Os curandeiros são mulheres ou, às vezes, homens cujos poderes de cura, segundo
suas culturas, não dependem de diplomas, mas de suas ligações ao mundo dos
espíritos
(
TERRIN,1998:194).
No Brasil, a figura do curandeiro mais conhecida talvez seja a da tradicional
benzedeira, aquela simpática senhora conhecida no bairro que resolve desde uma
diarréia infantil até afastar mau-olhado ou quebrante. Donas de uma tradição secular,
geralmente passada de mãe para filha, hoje, continuam tão procuradas quanto no
passado.
O ritual da benzedeira é simples e rápido, mas quem se submete a ele garante
eficácia comprovada. “Quando estou com um problema peço a ela para me benzer, e
sempre melhoro”. Ao observarmos o trabalho de uma benzedeira, a primeira
indagação que fazemos é: “Como o simples cruzar de ramos e a recitação de algumas
orações podem surtir o efeito esperado?“.
Na interpretação popular e também segundo a explicação desses curandeiros,
a razão da eficácia está pura e simplesmente na fé, de quem recebe a bênção e de
quem a ministra. (FRANCA, 1999:244).
À luz de uma análise mais crítica, porém, a causa pode ser outra. Na verdade,
o processo seria muito semelhante ao da psicanálise. A benzedeira, a exemplo do
psicanalista, oferece ao seu paciente uma explicação que vem ao encontro das
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
97
crenças dele. Ao atribuir a causa de um resfriado constante ou da perda do emprego a
um mau-olhado, o que faz é dar ao cliente a possibilidade de lutar contra um inimigo
definido, no qual ele acredita, tornando sua situação compreensível, fácil de ser
superada.
Quando a medicina não mostra uma saída que agrada o cliente, ele busca
outro caminho. Depara-se com cenários de crentes como esse:
Entre choros e rezas a imagem de Nossa Senhora, vestida em cores azul e
branca, seguia em procissão na tarde de uma certa sexta-feira, até o alto do
morro nos arredores de São Sebastião do Alto, a 250 quilômetros do Rio de
Janeiro. Cortejo com mil pessoas e o vidente Eurípides Batista Pinto que dizia
ter visto a Virgem Maria
(Católica Net, on line, maio/05).
No país das crenças,
, ,
, Eurípides não é exceção. É apenas parte do curioso
fenômeno da sobrevivência dos curandeiros na era da ressonância magnética, de
exames de DNA, clonagens de animais e explosões científicas de células-tronco. E
nesse terreno a lógica nada vale, tampouco as prescrições médicas. O que vale é
recorrer a saídas que estão muito além da porta dos laboratórios anti-sépticos e de
seus equipamentos de última geração. Por se tratar de um terreno de discussões tão
abstratas, há uma porta aberta para o charlatanismo.
Para os crentes não importa as vidas dos céticos. Eles enfrentam horas de
viagem em precários ônibus para mais um ritual de esperança de curas que não vem
da ciência, mas da fé.
Cada um tem sua própria história para contar.
Todas as manifestações religiosas são igualmente infundadas em se tratando
de comprovação científica, pois a fé se baseia na incerteza. Toda religião é uma
hipótese não verificável. A importância do Sagrado reside em um experiência social,
cultural. Para o crente a vivência de um sentido maior ultrapassa a vida e a realidade
social. O fiel que reza e suplica ao Criador se submete a força do Sagrado. Os céus
podem ou não atender-lhe a ajuda solicitada (GOMES, 1992:215).
Para os cristãos, o poder divino no mundo foi restaurado por Jesus anunciado
pelos profetas (Is 42,1). Trouxe-nos uma filosofia de vida: “amar a Deus sobre todas as
coisas e ao próximo como a nós mesmos” (Lc 10,27) e por meio do ensinamento do
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
98
perdão dos pecados, comunica-nos a cura. Ele dava importância à cura interior no
aspecto psicoespiritual. Antes de curar o corpo, curava o espírito: “seus pecados estão
perdoados”, disse ao paralítico; depois ordenou: “Toma seu leito e vai para casa”
(Mc 2,5-12). Os cristãos acreditam que Deus falava e agia através de Jesus, nas palavras
de Jesus: “Quem me vê, o Pai” (Jo 14,9). Jesus também chamava Deus de
Abba
,
“Pai”, distinto de si mesmo, dando origem à crença de que Ele era, ao mesmo tempo,
Deus e homem. Essa crença de que “[...] é Deus quem em Cristo reconcilia o mundo
consigo [...]” levou às doutrinas cristãs básicas: Encarnação, Cristologia, Trindade (II Co
5,19).
O ensinamento de Jesus era simples. Ele o sintetizou da Bíblia judaica (Antigo
Testamento) no amor a Deus e ao próximo. Mas era, também, exigente: uma vida de
ágape, ou amor cristão, de um tipo novo e generoso. Antes de morrer, Jesus, diante
dos discípulos, mostrou sua convicção de que, mesmo após a morte, Ele seria para
eles e para os que viessem depois deles o intermediário de tudo que conheceram
sobre Deus por meio dele. Pegou o pão e disse: “Este é o meu corpo”; pegou o vinho e
disse: “Este é o meu sangue”. Desse modo, prometeu, mais do que com simples
palavras, estar entre eles, todos os dias, até o fim dos tempos.
Para os cristãos, a doutrina da remissão dos pecados,
da cura interior
, na
valorização do aspecto psicoespiritual, é a crença de que as coisas que Jesus fez
durante sua vida,
curando as pessoas
e restituindo-as a Deus, independentemente de
quão pecadoras tivessem sido, podem repetir-se hoje, para os que m fé. Sua morte
na “Cruz” triunfa sobre a separação de Deus provocada pelo pecado e pela morte. Essa
valorização que a religião crisao aspecto psicoespiritual é justamente o que se
tenta revalorizar na
educação em Enfermagem
(BOWKER, 1997:136).
Essa assistência psicoespiritual aos clientes faz parte do ‘fazer’ da
Enfermagem. Mas isso é meio complicado, fala-se muito, principalmente
quando trabalha-se com as necessidade humanas básicas, mas têm-se muitas
dificuldades quando se trabalha com o espiritual: ‘Como eu faço? Como
abordo isso com o paciente? Como percebo essas necessidades?’. Temos essa
fragilidade
(Miriam, pesquisa, PEIXOTO:2004).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
99
Através dos séculos, as curas e os milagres de Cristo fizeram parte da fé
coletiva do
povo cristão
. Na intemporalidade de Deus, experiências de e cura e de
atos de amor ainda permanecem em nossas Igrejas, como o incenso perfumado que
contribui para a percepção da presença de Deus.
Trouxeram-lhe todos os que
padeciam de toda espécie de doenças e tormentos: endemoninhados, lunáticos,
paralíticos. Ele os curou (Mt 4, 24; 21, 14), [...] e Jesus curava aqueles que precisavam
de cura (Lc 9,11). Tomé acreditou porque viu o Senhor. “Bem-aventurados os que não
viram e crêem sem ter visto” (Jo 20,28).
São bem-aventurados, são felizes, os que
crêem
. A presença do Senhor traz felicidade, a certeza do sucesso, da cura, porque
Ele é a fonte de alegria indivisível e gloriosa (1Pd 1, 8b). Quem não crê não é feliz [...] e
o pessimismo o derrota
(DEGRANDIS, 2000:18).
A é o ponto principal para que se realize a cura. Quem não crer não entra
na energia divina, não faz contacto, na visão cristã, com Cristo que interliga o
imanente com o transcendente.
Quando eu estou com um doente grave, eu seguro a mão dele, seguro o
ombro dele e converso, mentalmente com ele, sobre Deus, sobre o poder
interior que ele tem, porque Deus está dentro dele. Eu procuro mostrar que
Deus está nele. E converso mentalmente com ele, “por isso, ele é capaz de
tudo, porque Deus está nele”. Então eu passo isso para o doente; ele pode
estar mal, dormindo, mas eu converso mentalmente com ele, inserindo Deus
nele, visualizando a luz de Deus, com muita
energia para ele. Isso recupera
qualquer pessoa
(Meire, pesquisa, PEIXOTO:2004).
A é exigida da parte dos beneficiários das curas, mas também, da parte dos
curadores. Quando os discípulos perguntaram a Jesus porque não foram capazes de
curar o epiléptico, Ele lhes respondeu: “Por causa da fraqueza da vossa fé, pois em
verdade vos digo: se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte:
‘Transporta-te daqui para lá’, e ele se transportará e nada vos será impossível”
(Mt
17,20)
.
Notamos que a cura interior leva ao bem-estar total da pessoa. Esse purificar
o coração é, muitas vezes, livrar-se de mágoas, rancores ou mesmo ódio a outras
pessoas. Ressentimentos que fazem mal à própria pessoa que não consegue se livrar
deles.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
100
Jesus, referindo-se a de um oficial que lhe pedira ajuda, ficou admirado,
virou-se para a multidão que o seguia e disse: “Eu vos declaro que nem mesmo em
Israel encontrei tamanha fé”. Os mensageiros voltaram para a casa do oficial e
encontraram o empregado em perfeita saúde (Lc 7,1-10).
O poder do amor curativo do Senhor Jesus manifesta-se do início ao fim da
missa, ponto culminante de celebração litúrgica dos católicos. Nessa Celebração
Eucarística são utilizados vários símbolos e sinais , expressões do amor e da cura do
Senhor: a água benta, o crucifixo, o sinal da cruz. A própria Missa ou o Culto têm sido
usados como cerimônia de cura. As orações expressam a dos fiéis: ”Senhor, eu não
sou digno [...] mas dizeis uma palavra e serei salvo”. É uma oração de confiança no
poder de Jesus Cristo de transformar em bem-estar as necessidades biofísicas,
psicossociais e psicoespirituais (DEGRANDIS, 2000:18).
As pessoas dão repetidamente testemunho de cura poderosa que
experimentam: corpo, mente e espírito, segundo elas, por intermédio da “Sagrada
Eucaristia”. Manifestam o desejo profundo de receber esse “pedacinho de pão”,
anseiam pela graça, pelo alimento e pela cura que fluem do Divino.
A busca da cura por meio da reflete a legítima aspiração do ser humano de
encontrar a “vida em abundância (Jo 10,10)”. O direito humano à vida, em sua
plenitude, nos limites das condições da existência, é premissa básica de toda pessoa. A
dimensão do sagrado não é somente o estudo sobre o transcendente, ela investiga,
também, o psicoespiritual: o falar sobre Deus e a procura humana pelo sentido da
existência e do sofrimento. A busca da cura, por intermédio de símbolos religiosos,
sinaliza a interpelação da criatura ao Criador a respeito de sua presente condição. Esse
diálogo pode incluir o protesto e o lamento. Jó, em sua enfermidade, orava: “Por isso
não posso ficar calado. Estou aflito, tenho de falar, preciso queixar-me, pois o meu
coração está cheio de amargura (Jó 7,11)”.
A cura é um processo, desenvolve-se ao longo da evolução da personalidade.
Ao curar-se de um sintoma ou um aspecto doentio, o indivíduo, em determinada
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
101
época de seu desenvolvimento psicológico, físico e relacional, é claro, não elimina a
possibilidade de surgirem outros focos de enfermidades, com sintomas diferentes,
numa mesma época ou em tempos diferentes. Também pode ocorrer que a causa dos
sintomas não tenha sido eliminada ou que não tenha ocorrido a “cura espiritual”, pois
a palavra cura não tem o sentido simples de tratamento sintomático que o uso atual
comumente lhe confere, mas é empregada no significado mais lato de tratamento da
personalidade (DEGRANDIS, 2000:36).
A cura é expressão de aperfeiçoamento constante do ser, visando à plenitude
da vida do indivíduo e de seus relacionamentos com o Criador, com o próximo, com
a natureza e consigo mesmo. O ser humano está sempre sujeito às transformações que
ocorrem no seu organismo nas múltiplas interações com o meio ambiente em que
vive. O cuidado consigo mesmo é tarefa para toda a vida. Saber amar-se, respeitar-se
conhecer e aceitar os limites do próprio ser pessoal. O descuido pode provocar a volta
da doença ou o surgimento de nova enfermidade
34
.
Daí o valor das Comunidades de solidariedade, como espaço preventivo de
ação ministerial pelo bem-estar, na contínua busca da vida completa.
Estar curado
não significa necessariamente a eliminação da doença; cura pode ser o ganho de uma
atitude nova ou de outra perspectiva sobre determinada condição. Os Evangelhos dão
testemunho de uma variedade de curas: físicas, espirituais e emocionais ou
psicológicas. As curas físicas são as mais palpáveis, mesmo para o leitor ocasional do
Novo Testamento. Envolviam freqüentemente uma cura posterior, do espírito da
pessoa vista nas palavras de perdão de Jesus. Do mesmo modo, em algumas das curas
espirituais, Jesus perdoava os pecados e convocava os pecadores a uma conversão
que exigia uma transformação total do coração (Jo 8,11).
[...] dois cegos seguiram Jesus, gritando:”Tem piedade de s, filho de
Davi!”Então Jesus perguntou-lhes: “Vós acreditais que eu posso fazer isso?”
Eles responderam: “Sim, Senhor”. Então Jesus tocou nos olhos deles dizendo:
“Faça-se conforme a vossa fé.” E os olhos deles se abriram
(Mt 9,27-31).
34
Doença referindo-se ao ataque orgânico, por germes patológicos e enfermidade ao desajuste
orgânico da pessoa, como um todo.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
102
muitas outras curas nos evangelhos que parecem ser de natureza
psicológica. Isso inclui alguns dos supostos exorcismos realizados por Jesus, em que o
Espírito
de Deus
parecia estar em confronto direto com os espíritos maus. Na época
em que os evangelhos foram escritos, não havia categoria para a doença mental.
Neuroses e psicoses, bem como algumas doenças físicas, eram identificadas com
poderes do mal que se originavam de espíritos impuros. Conseqüentemente, algumas
dessas curas, originalmente percebidas como exorcismos, eram muito provavelmente
curas psicológicas, nas quais Cristo trazia paz e estabilidade a uma pessoa perturbada
(CASERA, 1985: 65).
Ainda não se sabe exatamente quais os hormônios que são produzidos em
maior quantidade a partir de um estímulo de ou pensamento positivo, mas, pela
boa resposta do corpo, supõe-se, obviamente, que sejam aqueles ligados ao reforço do
sistema imunológico ou aqueles ligados à sensação de prazer, bem-estar, como a
endorfina” e a “serotonina”
. Essa descarga hormonal fortalece o organismo para lutar
contra as doenças. Vêem-se expressões como esta:
Minha bandeira é a fé, a vontade de me superar talvez por isso os médicos
não saibam como cheguei onde estou agora. No hospital muitos rezavam e
liam a Bíblia para mim. Isso me fazia dormir quando estava com muita dor.
Saber que milhões estão rezando por mim me fortalece muito
(ROSA,
1997:143).
Para Fowler (1992:3), a para muitas pessoas aparece como subsídio para o
fortalecimento pessoal, em momento de escassez de recursos de saúde e de recusos
emocionais. Fé como preocupação última.
A relação entre religião e saúde é consubstancial, imemorável e intocável, e
certamente não poderá ser dissolvida por um impacto técnico-científico. Entretanto,
quanto mais fortes são a relação e a ligação do ponto de vista histórico-religioso na
cura das doenças, tanto mais se mostra sem fundamentos, para o ser humano
ocidental de nossos dias, o sentido dessa relação.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
103
3.3.2 Ciências e religiões, interfaces terapêuticas?
A medicina ocidental surgiu das curas tradicionais e populares. Além da
medicina cosmopolita, da popular ou do curandeirismo, muitas culturas
desenvolveram suas próprias medicinas. A relação entre medicina e saúde é difícil de
ser avaliada, porque a maioria das estatísticas usa o conceito biomédico de saúde,
definindo-a como ausência de doença (CAPRA, 1982:127).
Alguns sistemas, como o indiano, chinês, persa e outros, baseiam a cura
numa tradição escrita, de conhecimentos empíricos, com abordagem holística. Além
desses sistemas, todas as sociedades desenvolveram a medicina popular: crenças e
práticas transmitidas oralmente às gerações. Ao longo dos tempos, a cura foi praticada
por curandeiros populares que concebiam a doença como um distúrbio da pessoa
como um todo. Em termos científicos modernos, o processo de cura representa a
resposta coordenada do organismo integrado às influências ambientais causadoras de
tensão. Essa concepção de cura compromete um grande número de conceitos que
transcende a divisão cartesiana e que não pode ser formulado de acordo com a
estrutura da ciência médica vigente. Por isso, os pesquisadores biomédicos tendem a
desprezar as práticas dos curandeiros populares, relutando em admitir sua eficácia. Tal
cientificismo médico, com as especializações científicas, progressivamente foi
abandonando o estudo do fenômeno cura, a razão de ser da medicina (CAPRA,
1982:133).
No começo deste século, a infecção era a mais importante causa de
enfermidades graves, debilitantes e crônicas. Decorridos oitenta anos, a tensão
emocional tomou-lhe o lugar. Com efeito, muitas vezes o
stress
reduz a capacidade do
indivíduo de combater com êxito as infecções
(CAVALCANTI,1997:38).
Pesquisas têm demonstrado que a raiva tende destruir o corpo e o espírito.
Aquele que chamar de “louco” ao seu irmão será condenado ao fogo do inferno. Essas
palavras são duras, mas verdadeiras. Quem tem raiva corre perigo. A mente e o
espírito estão sincronizados e ordenados pelo corpo, pelo mesmo centro de controle
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
104
interno, e o que afeta um afeta os outros. Se nossos pensamentos estiverem em
harmonia, a mente subconscientemente dirige o corpo ao bem-estar geral. Ao
contrário, quando sintonizamos nossa mente no ódio, na amargura, nas mágoas, nos
ressentimentos e nas irritações, descontrolamo-la inconscientemente, provocando
uma pane geral do organismo, causando uma queda na proteção orgânica, tornando-
o vulnerável às doenças, às dores, às fraquezas, ao nervosismo, ao mal humor e à
apatia espiritual. O estresse é reconhecido como uma fonte de muitas enfermidades. E
o câncer está ligado ao estado emocional (CAVALCANTI,1997:45).
A filosofia de Descartes (
1650, apud
CAPRA,1982:118) alterou profundamente o
comportamento médico, levando a medicina a se concentrar na máquina corporal e a
negligenciar os aspectos psicológicos, sociais, espirituais e ambientais da doença.
Então, os profissionais da saúde passaram a achar cada vez mais difícil lidar com a
interdependência de corpo e mente. A divisão cartesiana permitiu aos cientistas tratar
a natureza como algo morto, e inteiramente apartada de si mesma, vendo o mundo
material como uma vasta quantidade de objetos reunidos numa máquina de grandes
proporções.
A excessiva ênfase nas bactérias criou a idéia de que a doença é a
conseqüência de um ataque vindo do exterior, em vez de um distúrbio do próprio
organismo.
Ao concentrar-se em partes cada vez menores do corpo, a medicina perde
freqüentemente de vista o paciente como ser humano. Ao reduzir a saúde a um
fenômeno mecânico, a medicina não pode mais ocupar-se com o fenômeno da cura.
Essa é talvez a mais séria deficiência da abordagem biomédica. Embora todos os
membros da área da saúde saibam que a cura é um aspecto essencial de toda a
medicina, o fenômeno é considerado fora do âmbito científico. Não se discute os
termos
saúde e cura
na academia. Essa exclusão é evidente, é um fenômeno que não
pode ser entendido em termos reducionistas. A cura envolve uma complexa interação
de todos os aspectos psicobiofísicos, psicossociais, psicoespirituais.
Há, entretanto em nossos dias, um retorno à
visão religiosa-terapêutica,
na
qual religião e medicina se encontram e se confundem. Por outro lado, esse retorno
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
105
provoca muito incômodo e incompreensões nos médicos e na ciência médica que
vive ligada ao modelo médico de compreensão do ser humano e de suas doenças.
Ciências e religiões, depois de séculos de separação, voltam a associar-se em
interfaces transdisciplinares. Os resultados terapêuticos e preventivos têm mostrado
uma correlação entre a presença da religiosidade e as mudanças visíveis em situações
clínicas como: menor propensão à delinqüência, ao abuso de substâncias, às
separações matrimoniais e às condutas suicidas. Estudos que correlacionam a
religiosidade e os achados neurocientíficos têm demonstrado a associação entre
modificações neuroelétricas e neuroquímicas. Também a influência da religiosidade
sobre os processos educacionais tem sido demonstrada por diferentes estudos, por
exemplo, João Paulo II (1999, apud SOUSA et al. 2005:1) marcou essa virada nos
conceitos quando afirmou que: “Numerosos cientistas têm manifestado o desejo de
corresponder ao apelo aproximativo; e já realizam amplas investigações científicas
sobre as influências religiosas na vida humana”.
Para Sousa et al. (2005:1), as manifestações científicas de Einstein (1925) foram
os primeiros passos facilitadores dessa aproximação pois, quando se referiu que um
cientista pode ser um homem religioso em uma perspectiva cósmica, não
antropomorfa de Deus, apresentou o antropomorfismo como uma necessidade da
pessoa comum de compreender a divindade
35
. O cientista iria por outro caminho,
mais abstrato e menos sincrético. Mas ambos (sujeito da multidão e sujeito da ciência)
podiam ver-se irmanados ante a circunstância divina. Essa abertura posicionada por
Einstein foi uma ruptura do estereótipo que incompatibilizava ciência e religiosidade
no mundo moderno, levando em consideração que a ciência para nascer precisou se
afastar do pensamento religioso dogmático, para se constituir como domínio
disciplinar em outro paradigma.
35
Antropomorfismo (
anthropomorphismus
) é a tendência para interpretar todo tipo ou toda espécie de
realidade em termos de comportamento humano, ou por semelhança, ou analogia com esse
comportamento. “Crenças “antropomórficas”, ou “antropomorfismos”, são chamadas em geral de
interpretações de Deus em termos de conduta humana. Toda a ciência moderna se veio formando
mediante uma progressiva libertação do A. e o esforço de considerar as operações da natureza
segundo a sua semelhança com as pessoas, mas “juxta propria principia” (ABBAGNANO, 1960:64).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
106
A partir de Einstein começaram os diálogos entre ciência e religião. João
Paulo II (1999:34) afirmou que religião sem ciência não é boa religião e ciência sem
religião não é boa ciência.
A área da Psicologia é uma das pioneiras a investigar o tema medicina
versus
religiosidade. As pesquisas confirmam:
Estados de meditação profunda, de experiências místicas intensas ou de imersão religiosa
associam-se às alterações eletroencefalográficas.
Técnicas de imagens cerebrais, tipo Spect (single photon emission computed tomography)
ou Pet (positron emission tomography), ou ressonância magnética
mostram aumento de
atividade em algumas áreas cerebrais
e diminuição em outras
áreas durante os estados
mentais-corporais antes referidos.
Experiências místicas e mediativas
são processos, provavelmente, mensuráveis e
quantificáveis.
O bem-estar espiritual
é uma das dimensões de avaliação do estado de saúde, junto às
dimensões corporais, psíquicas e sociais.
Médicos defendem que a
reza intercessória
(por outrem) pode ser um fator coadjuvante no
tratamento de pacientes cardíacos
(SOUSA et al 2005:5).
Estudos (com Pet)
36
sobre os efeitos da religiosidade mostram que nas pessoas
com capacidade de meditação profunda praticando yoga, um aumento do
metabolismo da glicose cerebral e um aumento significativo da atividade cerebral, na
região do córtex pré-frontal, durante a meditação (SOUSA et al. 2005:2 e 3). Sabe-se
que o efeito das “crenças religiosas e posturas positivas” influenciam na recuperação
mais rápida das pessoas. Constata-se:
A e os pensamentos são avaliados no primeiro momento no sistema límbico, conjunto
de núcleos cerebrais associados às emoções.
Em seguida, a informação é transmitida para o córtex, onde ela será elaborada pela razão e
pela consciência. É aqui que o cérebro analisa intelectualmente do que se trata a
informação e como será a reação.
A informação é devolvida para o sistema límbico e enviada para o tálamo, uma espécie de
coordenador de toda a estimulação que entra e a resposta disparada do tálamo;
A informação segue para o hipotálamo, onde serão produzidas substâncias que ativarão a
glândula hipófise.
36
PET é um acrónimo, sigla empregada para:
PET (exame dico) um exame médico da
medicina nuclear
:
::
:
Positron Emission Tomography
ou
Tomografia de emissão de positrões.
PET (plástico) – um plástico reciclável.
PET (Programa Estadual de Transportes)
um programa do Governo do estado do Rio de Janeiro
visando à recuperação dos meios de transportes públicos, especialmente na região metropolitana do
Rio de Janeiro.
. .
. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/PET (Acesso
em 19 maio 2006).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
107
A glândula fabricará hormônios que agem sobre o sistema nervoso central e sobre o
sistema imunológico, responsável pelas defesas do organismo a respeito de doenças
(ROSA, 1997:141).
Maass (2005, apud SOUSA et al. 2005:2), investiga a tese de que orações
podem ajudar na cura de doentes. Preces dirigidas a pacientes que se submeteram a
cirurgias trazem resultados positivos. Ainda são prematuras confirmações decisivas,
mas as pesquisas realizadas evidenciam esse elo entre espiritualidade e saúde.
Como já descrito as
doenças provocam uma desarmonia global
no
organismo, que envolve toda a pessoa humana. Constatamos, assim, que não é
possível dissociar a saúde psicobiofísica e psicossocial da psicoespiritual, assim como
também não é possível trabalhar para a saúde espiritual sem, ao mesmo tempo,
empenhar-se pela saúde total da pessoa humana.
A religião cristã, mais ligada ao progresso tecnológico do ocidente e
dependente da dicotomia corpo/espírito, deixou-se levar, muito cedo, por outros
princípios e, talvez, tenha negligenciado muito depressa a função terapêutica que lhe
fora confiada paralelamente à sua missão de evangelizar. Limitando-se a pensar na
“salvação da alma”, a religião deixou para a medicina a cura do corpo e de todas as
doenças consideradas, e apressadamente, como um problema do organismo
humano, do corpo confirmado, por sua vez, como simples máquina capaz de
desgastar-se
(TERRIN, 1998:187).
O contexto psicossocial de nossa vida pode ser entendido especialmente por
meio do
ens spirituale
37
. A
força da mente
pode causar doenças, mas pode também
servir para eliminar doenças. Médicos sempre reconheceram os efeitos do placebo
38
. A
mente pode ser usada como sugestão terapêutica: a influência da vontade é um
capítulo importante da medicina. De fato, pode acontecer que o ser humano que não
se permita nada de bom e que se odeie acabe ficando doente após o ódio que sente
por si mesmo. O ódio por si mesmo provém de um obscurecimento do espírito. E
37
Influências espirituais na classificação de Paracelso (1493-1541, apud TERRIN, 1998:187).
38
Arsenal de artifícios a fim de inspirar confiança nos pacientes, com efeito de ligação entre o corpo e
a mente.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
108
pode acontecer que as imagens sejam amaldiçoadas na doença, trazendo consigo
febres, epilepsia, apoplexia e outras coisas mais. A força da vontade tem parte na
doença, pois a vontade é uma geradora de espíritos, dos quais o ser humano nem
mesmo suspeita.
Terrin (1998:1) apresenta as afinidades entre as duas dimensões: histórico-
religiosa e psicossomática. Presume que, no panorama das religiões antigas e novas,
haja alguma relação entre estar-bem biofísico, no psicológica e espiritual e mais, que
seja possível, quando existe um equilíbrio, com liberdade e transparência de nosso
espírito, induzir e até mesmo provocar um estado de bem-estar biofísico. O ser
humano busca a Paz, a resolução de seus problemas, o fim do “stress” emocional, mas
a paz não vem em comprimidos.
A ciência médica reconhece que emoções como medo, tristeza, inveja,
ressentimento e ódio são responsáveis pela maioria de nossas doenças. As estimativas
variam de 60 a 100%.
A tensão emocional invisível na mente é capaz de produzir no
corpo mudanças assombrosamente visíveis que podem chegar a ser graves e mortais.
Pode causar pressão alta, papeira tóxica, enxaqueca, artrite, apoplexia, doenças
cardíacas, úlcera gastrointestinal e outras doenças sérias, por demais numerosas para
serem mencionadas. Os médicos receitam remédios de acordo com os sintomas
dessas doenças, mas não podem fazer muito pela causa fundamental agitação
emocional.
Uma situação interior de conflitos é comum ao ser humano de hoje.
Vivemos em época de angústia; é aguda a consciência de uma fragmentação
do eu. Conflitos de vários gêneros são o reflexo de discordância profunda, de
disformidade no coração do ser humano, de ambivalência na fonte do paradoxo do
eu contra si mesmo. A experiência religiosa ocupa notável importância no cerne
desses conflitos e sempre lhes oferece a solução. A experiência religiosa cria um
processo psicológico que conduz à unificação do eu. O resultado da experiência
religiosa é algo que unifica o que é discordante, assume e harmoniza os elementos
disformes e contraditórios
(TERRIN, 1998:187).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
109
Para Capra (1992:2), a definição da OMS é irrealista, pois descreve a saúde
como um estado estático de perfeito bem-estar em vez de um processo em constante
mudança e evolução, mas reconhece que ela revela a natureza holística da saúde que
terá de ser apreendida se quisermos entender o fenômeno da cura. O avanço da
medicina científica se deu no século XIX com as descobertas da biologia. O
conhecimento detalhado das funções biológicas em níveis celulares e moleculares
permitiu o desenvolvimento em larga escala de farmacoterapias e avanços cirúrgicos
em níveis jamais previstos.
Quando as religiões não são capazes de sanar as doenças e os incômodos
psicobiofísicos, psicossociais e psicoespirituais cotidianos do ser humano, perdem seu
sentido de ser, pois trata-se de uma omissão bastante grave, porque o ser humano
contemporâneo é, antes de tudo, um ser doente de corpo e espírito; um paciente é um
sofredor que sabe que es doente e que pede, com absoluta prioridade, para ser
curado. ”Senhor, não sou digno de que entres em minha casa [...] mas diga uma
palavra e meu servo será curado” (Lc 7, 1-10).
As igrejas cristãs, entretanto, têm procurado encontrar formas novas de cura,
técnicas e orações espirituais aptas a curar os muitos enfermos de espírito de nossa
civilização. Têm tentado estar mais atentas à saúde “total”, à relação saúde /salvação,
como é de sua própria tradição e de toda a história da maioria das religiões, que dão
atenção de bem-estar físico, social e espiritual, das quais parecem afastar-se as pessoas
de hoje, por descuido ou ignorância, mesmo no momento em que é invocada sua
realização com maior ansiedade e urgência (TERRIN, 1998:4).
A nos milagres sempre realizou prodígios, e, do mesmo modo, as igrejas
cristãs sempre nos convidaram a crer, porque a fé pode “realizar milagres”. Hoje,
porém, essa não é apenas uma consideração piedosa ou somente uma expressão de
das pessoas. Recebe confirmações do mundo das ciências, da física e da teoria do
conhecimento em geral. Em relação aos enfermeiros, esta se traduz na confiança,
na certeza de que os pacientes “vão ser” bem atendidos nos impactos das doenças.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
110
É importante também salientar que as funções da fé e da oração não excluem
o cuidado pessoal e o uso de recursos naturais providos pelo Criador para o bem de
todas as criaturas. As Escrituras fazem referências ao uso de outros meios preventivos
ou terapêuticos (Is 1,6; Lc 10,34).
Não se trata de desprezar os tratamentos medicinais: é o próprio textio
sagrado que através do anjo ensina a Tobias a usar a bílis do peixe como medicina
para a doença dos olhos (Tb 6,9). No Livro do Eclesiástico, explica-se como não se
deve considerar falta de confiança em Deus o recurso ao médico; ao contrário, deve-
se honrar o médico, porque o próprio Deus o criou, como criou as ervas medicinais e
deu, ao ser humano, a capacidade de descobrir suas propriedades curativas e colocá-
las a seu serviço (Eclo 38,1-15). No fundo, tudo é dom de Deus e glorifica ao Criador,
Senhor da vida e da saúde.
O Eclesiástico (Eclo 38,1-15) explica a devida ordem a ser seguida em caso de
doença: em primeiro lugar, o doente deve purificar seu coração de todo o pecado,
dirigir-se a Deus, oferecer-lhe sacrifícios segundo suas possibilidades. Notamos que a
cura interior leva ao bem – estar total da pessoa.
Recorrer a esses aspectos não quer dizer que a medicina,a Enfermagem
tenham de ser menos científicas; ao contrário podem tornar-se mais coerentes com as
recentes conquistas da ciência moderna.
A saúde e o fenômeno da cura têm tido significados diferentes. Os conceitos
de saúde e vida não podem ser definidos com precisão. Dependem do conceito que se
tem do organismo vivo e de sua relação com o meio ambiente. Estão intimamente
relacionados.
A cura, o pensamento faz com que os pacientes consigam conviver em
paz com a doença ou aumentando a chance de coragem de enfrentar a
passagem da morte. Acredito que a ajuda no desprendimento, ajuda a
pessoa a compreender e aceitar a morte, s não lutar com isso com raiva e
ódio
(Rose, pesquisa, PEIXOTO, 2002).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
111
Livre, também, de si mesma, a pessoa “se realiza”, põe-se a serviço da vida e
da saúde de todos, criando um ambiente saudável de paz, harmonia e solidariedade,
que previne e cura a maioria das doenças.
No entanto, além dessa terapia normal, da força transformadora da Palavra,
Jesus realizou curas instantâneas que chamaram, poderosamente, a atenção do povo
para a presença viva e os sinais do Reino. As curas eram, em si mesmas, expressões
vivas desta realidade. Elas fazem parte do próprio Reino de Deus que se instaura com
força (dúnamis); são a irradiação do amor misericordioso do nosso Deus que nos vem
visitar; manifestam o mistério da Pessoa do Cristo que, por sua vez, é a revelação do
Pai que é Amor (PESSINI,1993:68).
A sanidade emocional, construída com base em relacionamentos justos,
carregados de respeito, amor e compreensão, é aspecto crucial da saúde humana. Em
geral, as reuniões de cura privilegiam os sintomas físicos ou as doenças orgânicas.
desequilíbrios do ser humano que indicam patologias graves. As pessoas almejam ser
curadas também de anomalias provenientes de relacionamentos doentios, desde a
infância até a maturidade.
É igualmente evidente que os indivíduos não são curados, ainda que
temporariamente o tenham sido, se voltarem a conviver numa sociedade doentia, ou
seja, num país com enormes distâncias sociais, educacionais e econômicas entre os
cidadãos. A sociedade que não estabelece sistemas de políticas públicas que criem
oportunidades de bem-estar para todos os seus agregados é geradora de doenças que
podem se manifestar física, psicológica, espiritual ou estruturalmente.
É possível superar o mal e a doença por meio das energias espirituais, da
força interior, da confiança, do otimismo, se devemos a nós mesmos muitos de nossos
males. Vislumbramos a afinidade entre as duas virtudes, saúde e salvação.
A cristã é o paradoxo de uma aceitação alegre da existência e o “sim” à
morte que nos conduzirá à plenitude do amor de Deus. “Ninguém pode vir a mim, se
isso não lhe for dado por meu Pai” (Jo 6,65). Sem o Espírito Santo, o dom pascal de
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
112
Cristo ninguém pode crer (1 Cor 12,3; At 11,21ss). Para os cristãos, essas “boas novas”,
ou Evangelhos (do grego
euaggélion
), de salvação do pecado e da morte (cura
interior), devem ser compartilhadas não só no grupo religioso cristão, mas, também,
com todas as pessoas que dependem de ajuda, portanto que recebem assistência de
Enfermagem. Nesse contexto, em que a religião é chamada a mostrar sua força
terapêutica, interessa-nos mais o
talitha kumi
: “menina levante-se” (Mc 5,41: Mt 9,26;
Lc 8,40-56). Reconhecer como a salvação tem ou pode ter uma antecipação
significativa no momento em que se torna saúde e cura e não quando, com a fácil
promessa de um outro céu, em um futuro mais ou menos distante, nos deixa,
entretanto, viver na angústia e na doença (TERRIN,1982:41).
Jesus convocou os doze apóstolos e lhes deu poder e autoridade sobre todos
os demônios e para curar as doenças, e os enviou a pregar o Reino de Deus e a curar.
Os discípulos partiram; percorriam os povoados, anunciando a Boa Nova e fazendo
curas em todos os lugares (Lc 9, 1-6). Lembra-se aqui que discípulos de Jesus são todos
os que repetem seus gestos, seguindo sua doutrina. São todas as “vidas cuidando de
vidas”, todos que lutam pela “vida em abundância” do ser humano.
Neste capítulo, foi abordado o tema das crenças religiosas na recuperação da
saúde, com enfoque das culturas com o sagrado e os símbolos. Viram-se também os
fenômenos religioso e saúde/salvação. O próximo capítulo abordará o tema “tensão
entre fé e razão”, com uma visão geral sobre a fé como fenômeno psicológico e
espiritual.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
113
C
APÍTULO
IV
T
ENSÃO ENTRE
F
É E
R
AZÃO NA
E
DUCAÇÃO EM
E
NFERMAGEM
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
114
C
APÍTULO
IV
-
T
ENSÃO ENTRE
F
É E
R
AZÃO NA
E
DUCAÇÃO EM
E
NFERMAGEM
As ciências modernas avançam influenciadas por novas descobertas. O
Big-
Bang
e a cosmologia inflacionária, a relatividade, a física quântica, a termodinâmica
irreversível, a genética humana, as ciências cognitivas, as neurociências, a informática
e muitos outros campos científicos foram atraídos
pela força propulsora do sagrado
e
introduzidos nas discussões a respeito de
Deus, como criador e ator
de toda a história.
Por outro lado, teólogos do cristianismo, judaísmo, islamismo, budismo e
confucionismo travam conversações com a ciência (TED, 2003:12).
É perene e ecumênica a práxis da humanidade transcender-se ao absoluto,
, ,
, a
superar a vinculação com os seres limitados, para colocar-se em comunicação com o
transcendente. Esse transcendente pode ser chamado Ser Supremo, Deus, Espírito,
Sobrenatural, Criador, Causa Primeira. É a Energia que tudo atrai e conduz como sua
base e segurança, impulsionando o ser humano na história, no cosmo (ARDUINI,
1999:49).
Quando o ser humano fragmenta sua unidade, numa visão distorcida da
com tabus e crenças contra os princípios da vida humana, entra num caos. Esses casos
são mais difíceis de serem tratados e requerem muita tática da Enfermagem ao ajudar
esses pacientes, sem ferir suas crenças religiosas.
Segundo Ribeiro (2005:19), a redução da análise do saber leva a dados
imediatos, perceptíveis pelos sentidos somente da ordem material e física, levando o
ser humano a uma visão limitada na descoberta de si mesmo. A modernidade e a pós-
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
115
modernidade no campo das ciências dão primazia ao princípio de secularização,
supervalorizando o “ter” sobre o “ser”, fruto de uma sociedade tecnológica e
consumista, refletindo diretamente no saber. Dá-se mais atenção à tecnologia de
ponta do que aos valores humanos e direitos da pessoa. Quando se faz o diálogo entre
e ciência, estas passam a fazer parte do campo do conhecimento humano, ficam a
serviço do ser humano como objeto de sua realização. D a importância deste
capítulo sobre fé e razão no contexto de assistência psicoespiritual.
Este capítulo dispõe sobre “A Tensão entre Fé e Razão na Educação em
Enfermagem” com os subtítulos: “Fé e Razão”; a “Fé como Fenômeno Psicológico”; e
“Fé como Fenômeno Espiritual”.
4.1 Fé e Razão
As tensões entre e razão fazem parte do estado de crença no contexto
religioso, pois a religiosidade que cria o ambiente de e é mantida pelo sistema de
crenças é atributo do ser racional. O ser humano o faz movido pelo senso da razão,
pois é a racionalidade que determina o ser religioso. O senso religioso transcende a
todo e qualquer limite estabelecido pela razão. Os limites do ser humano racional são
extrapolados pela espiritualidade transcendente, presente no ser essencial (JOÃO
PAULO II,
1999:34).
Afirma Espinosa (1632-1677, apud JOÃO PAULO II, 1999:4) que o ser humano
é uma unidade de alma e corpo, não uma composição ou mistura da alma com o
corpo, porque o ser humano é idéia do corpo e idéia da afecção do corpo, como tal
conhecedor de um ser singular existente em ato, que é o próprio corpo e os corpos
existentes. A primeira coisa que constitui o ser atual da alma humana não é senão a
idéia de uma coisa singular existente em ato. A união do corpo e da alma é a própria
essência humana, e a causa da união da idéia e de seu objeto (corpo) é Deus-
Natureza-Naturante e substância única. Corpo e alma são modos, desdobramentos da
substância divina, desdobramentos de acontecimentos corporais e de idéias que
formam duas séries distintas que se unem numa única série: Deus.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
116
Como modo finito da substância,
o ser humano
é quem constrói sua alegria e
sua felicidade, ascendendo, assim, ao transcendental e à eternidade (SIEMEK,
2001:228).
O ato de crer é um ato de inteligência, que sabe por que crê:
“fides quaerens
intellectum”
, a que procura compreender. A no seu sentido próprio e pleno com
credenciais racionais supõe o trabalho da razão. A razão está presente ativamente em
qualquer sistema de crença; ao contrário, seria uma cega e insustentável
(FRANCA,1999:4).
e Razão se integram como que, “as duas asas pelas quais o ser humano se
transcende, para contemplação da verdade” (JOÃO PAULO II, 1999:4).
O que é a razão? É a possibilidade de um despertar de si mesmo para curar-
se da embriaguez inerente à própria vida cognitiva. A razão é a cura do sono do
psiquismo, no desejo como ruptura da imanência, como inquietude, pondo em
questão a prioridade do saber e a tematização do ser. É por meio dessa ruptura da
imanência para a transcendência do ser que a razão se torna possível, que a ética pode
revelar o sentido da própria atividade teórica e das construções ontológicas, como
pensamento lógico e racional (FABRI, 2001:265).
A razão por si só, graças à capacidade
do pensamento humano, pode chegar a uma verdade superior que é universal, capaz
de explicar o sentido da vida que projeta no absoluto (FABRI, 2001:151).
P
ercebe-se que, quem acredita e está mais próximo da presença de Deus,
tem uma recuperação mais tranqüila. Supera de uma forma melhor tanto a
vitória, no sair bem; e até mesmo a morte. Quem tem sabe exatamente o
caminho de cada saída
(Criss-pesquisa,PEIXOTO:2000).
Perini (1999:150;151)
afirma que a razão por si só, ao exprimir o mistério,
convida a si mesma a intuir razões que sabe não poder exaurir, mas apenas acolher.
Graças à capacidade do pensamento humano, pode chegar a uma verdade superior
que é universal, capaz de explicar o sentido da vida que projeta no absoluto.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
117
Não são aptas para explicar a as filosofias: ecletismo, historicismo,
cientificismo, pragmatismo, niilismo
39
. Essas filosofias são sistemas e formas de
pensamentos fechados nas exigências fundamentais da verdade; não podem ser
assumidas como aptas para explicar a fé. A inteligência humana põe-se à procura
daquilo que ama. Quanto mais ama, mais deseja conhecer. O desejo da
verdade
impele a razão
a ir mais além. Sua capacidade é sempre maior do que aquilo que
alcança (JOÃO PAULO II, 1999:34).
Para Tomás de Aquino (1225-1274, apud, JOÃO PAULO II, 1999:34), a luz da
razão e a luz da fé provêm ambas de Deus, e, por isso, não se podem contradizer entre
si. A natureza objeto da filosofia pode contribuir para a compreensão da revelação
divina. Desse modo, a não teme a razão, pressupõe o conhecimento natural, da
mesma forma como a natureza pressupõe a graça.
Pela razão, o ser humano alcança a verdade e, iluminado pela fé, descobre o
sentido de tudo.
Segundo o Livro dos Provérbios (4,5 apud JOÃO PAULO II, 1999:35), o esforço
da investigação não está isento da fadiga provocada pelo embate nas limitações da
razão e da contínua chantagem da dúvida. As hipóteses podem seduzir, mas não
saciam. Chega o momento em que necessidade de ancorar a existência a uma
verdade reconhecida como definitiva, que forneça uma certeza livre de qualquer
dúvida.
39
Ecletismo
: grego ekleticos, “quem escolhe”. Significado comum: abordagem filosófica (melhores
teses ou elementos dos diversos sistemas conciliáveis). Significado particular: ”discernir entre o
verdadeiro e o falso nas diversas doutrinas” (CLEMENTE, 1997:109).
Cientificismo:
ETIM, formado a partir de ciência. Significado comum: atitude intelectual século IX;
que concede um valor absoluto ao progresso científico. Confere à ciência o monopólio conhecimento
verdadeiro. Termos próximos: positivismo. Termos correlativos: fé, progresso, ciência (CLEMENTE,
1997:59).
Historicismo:
ETIM, do grego históricos, que respeita a história. Sentido comum: doutrina, tese
filosófica (a verdade não é dessociável). Termos próximos: relativismo. Termos correlativos,
objetividade, verdade (CLEMENTE, 1997:179).
Pragmatismo:
ETIM: grego
pragma
, “ação”. Sentido comum: princípio de eficácia sem preocupação
teórica. Êxito da ação.
Termos próximos
: utilitarismo.
Termos opostos
: intelectualismo.
Termos
correlativos:
ação; conhecimento; verdade (CLEMENTE, 1997:310).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
118
À razão humana é atribuída uma capacidade tal que parece quase superar
seus limites naturais e chegar à causa que está na origem de toda a realidade sensível.
Contrapondo a uma filosofia própria, às rias correntes do pensamento moderno,
como, de um lado, o fideísmo e o tradicionalismo radical pela sua falta de confiança
nas capacidades naturais da razão e, do outro, o racionalismo e o ontologismo, por
atribuir à razão natural aquilo que apenas se pode conhecer à luz da fé, a razão é um
fenômeno antropológico que possibilita ao ser humano um passo novo e decisivo na
evolução da vida. Nesse sentido não se opõe à fé. Com o fenômeno razão, tem-se uma
nova estrutura qualitativamente diferente daquela do mundo animal, acionada ao
estímulo-resposta ou ao binômio sensação-imaginação.
Portanto, não é possível sem a pressuposição da existência do ser superior
do qual se espera a resposta. E essa convicção procede da razão. Crê-se porque,
racionalmente, se sabe da existência da divindade que responde.
Segundo Santo Agostinho (1987:11), nenhum ser humano crê em Deus a não
ser que compreenda alguma coisa, contudo, pela própria fé com que ele crê, é
favorecido na compreensão das coisas maiores. Há, na verdade, algumas coisas em
que de fato não cremos a não ser que as entendamos; e outras que não
entendemos a não ser que creiamos.
Os primeiros padres filósofos do Oriente e Ocidente tiveram como função
mostrar como a razão poderia escapar dos mitos para melhor se abrir à
transcendência. Na teologia escolástica, a prioridade da não faz concorrência à
investigação própria da razão. Sua tarefa é encontrar um sentido e razões que, a todos
permitam entender os conteúdos da fé. Para Tomás de Aquino (1225-1274), entretanto,
constata-se uma progressiva separação entre
e razão filosófica
. Com isso tanto a
razão quanto a ficaram reciprocamente mais pobres. A razão correndo o risco de
perder sua reta final. A fé privada da razão pôs em evidência o sentimento e a
experiência com risco de deixar de ser uma resposta universal. A
privada da razão
cai no perigo de ser reduzida a um mito ou à superstição. A
razão sem a
adulta não
é estimulada a voltar-se para a radicalidade do ser. Ao desassombro da fé, deve
corresponder a audácia da razão. É a reflexão filosófica que contribui para o
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
119
conhecimento do mistério. Embora haja sempre tensões entre e razão, é possível,
no contexto religioso, encontrar um estado de harmonia entre esses opostos, pois
ambos são necessários para o crescimento religioso. Embora a fé esteja acima da
razão, nunca poderão existir divergências entre as duas (JOÃO PAULO II, 1999: 40 e
243).
Trata-se de não se perder a paixão pela verdade última nem o anseio da
pesquisa e a audácia de desvendar-se novos horizontes. A que desestabiliza a razão
do isolamento, impulsionando-a a correr qualquer risco por tudo o que é belo, bom e
verdadeiro.
Encontrar com Deus consiste em procurá-Lo sem cessar através da
e da
razão
. Procurá-lo é ver Deus sem nunca estar saciado de desejá-lo (João Paulo II,
1999:40).
Aqueles pacientes que têm algum valor dentro de si, e estão pedindo ajuda a
um Ser Superior, m uma recuperação bem mais pida, porque querem
viver. Então, isso é muito importante! Parece que é uma coisa que alavanca
os indivíduos. Deve ser a que eles têm dentro deles que faz isso
(Léo-
pesquisa, PEIXOTO, 2000).
A razão está presente ativamente em qualquer sistema de crença; ao contrário
seria uma fé cega e insustentável. E ao exprimir o mistério, a razão convida a si mesma
a intuir razões que sabe não poder exaurir, mas apenas acolher (PERINE, 1999:150).
Desde a antiguidade até nossos dias, razão e fé têm sido trabalhadas por
filósofos, teólogos e estudiosos dos fenômenos religiosos. Cotidianamente, o ser
humano se defronta com situações de vida que requerem atitudes de e decisões
racionais (PERINE, 1999:29).
e razão é que proporcionam às pessoas a capacidade de compreender o
sentido de sua vida, do mundo e de Deus. Deus é o sentido de tudo que existe, e n’Ele
se encerra a plenitude do mistério. O ser humano investiga a verdade com a razão.
O drama da separação entre e razão se deu pela destruição de tudo o que
o pensamento patrístico e medieval tinha concebido e atuado como uma unidade
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
120
profunda, capaz de chegar às formas mais altas da especulação. De um modo geral, o
povo, preocupado ao sentir-se impotente para resolver as situações difíceis, recorre ao
misticismo, muitas vezes em busca de soluções mágicas, miraculosas (PERINE,
1999:29).
Kant
(1724-1804, apud FRANCA 1999:243) afirma que é impossível sem a
pressuposição da existência do ser superior do qual se espera a resposta. E essa
convicção procede da razão. Crê-se porque, racionalmente, se sabe da existência da
divindade que responde. É na compreensão e aceitação dessas tensões que o ser finito
convive harmonicamente com sua finitude e vislumbra o infinito e, pela mesma fé,
gera o conflito. Aceitando sua limitabilidade, salta para o desconhecido, encontrando
nesse ato corajoso do imprevisível, a resposta do eterno, transmitindo-lhe paz. É a paz
interior que supera toda compreensão racional, elevando o crédulo à dimensão
espiritual. A sustenta-se de uma razão fortalecida pela posse da verdade para
confrontá-la com a Revelação (PERINE 1999:149)
40
.
Husserl (1883, apud SIEMEK, 2001:195), para definir a própria subjetividade do
Transcendente, na sua estrutura e nas formas primordiais de ação, trata da diferença
radical de posicionamentos, e até de diversos níveis de pensar e de ser, que separa o
horizonte transcendental da consciência moderna da prática científica.
A razão ocupada em investigar de maneira unilateral o ser humano como
objeto parece ter se esquecido de que este é sempre chamado a voltar-se para uma
realidade que o transcende. Diferentes são os rumos para progredir no conhecimento
da verdade. Entre eles sobressai a filosofia. O próprio sentido grego do termo filosofia,
amor à sabedoria, expressa seu objetivo de colocar o sentido da vida e esboçar a sua
resposta.
Por trás desse único termo filosofia, escondem significados diferentes.
Impelidos a conhecer a
verdade
última da existência, procuramos os conhecimentos
universais para nos compreender e progredirmos na sua realização (SIEMEK, 2001:9).
40
Revelação
é a qualidade de conhecimento oferecido ao “ser humano” pelo próprio Deus.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
121
Scannone (1992:49-60) afirma que faz parte da história da e da razão
filosófica uma relação de mútua influência e de tensão entre ambas. A cristã é
profundamente humana, encontra em Cristo a revelação de Deus e a revelação da
plenitude humana. Na prática, unificam-se numa mesma atitude e ação, os amores a
Deus e ao próximo. Por outro lado, a filosofia, de acordo com seu próprio dinamismo,
tal como suas origens no ocidente, tem como centro o ser humano
.
A sabedoria, segundo a doutrina cristã, é dom do Espírito Santo, que introduz
o ser humano no conhecimento das realidades divinas, formulando seu juízo com
base na verdade da própria fé. É distinta da fé, que aceita a verdade divina tal qual
como é, e é próprio do dom da Sabedoria julgar segundo a verdade divina.
Percebemos como os enfermeiros são vocacionados por um dom divino,
para atuarem numa profissão que luta pela vida humana. Jesus afirma: ”Não fostes vós
que me escolhestes, mas eu que vos escolhi” (Jo 15,16). Somos assim, vocacionados a
capacitar-nos perscrutando a área do saber, sem excluir o ser humano. É necessário
um esforço para que a filosofia volte a encontrar a sua dimensão sapiencial do sentido
último e global da vida (FR, 81, apud PERINE et al.151).
O paradigma de “razão” expressa duas vertentes culturais: a grega, que se
mostra em face de todos os campos da realidade, aberta ao sujeito racional, à
natureza, à sociedade, às crenças, aos costumes, às técnicas, dotada de um poder de
assimilação da realidade que constitui o dinamismo mais poderoso da civilização do
Ocidente; e a razão bíblica, razão da Palavra original na sua manifestação
transcendente (
oriens et alto
), que resistiu fortemente a uma assimilação ou absorção
pela razão grega, vindo a formar a polarização dialética e Razão até hoje presente
em nosso universo simbólico. Nessa diferenciação da razão, nota-se dois paradigmas:
a razão profética no mundo bíblico, com as diversas formas de linguagem que a Bíblia
nos oferece; e a razão epistêmica (ou científica) da Grécia influenciando a formação
da enciclopédia das ciências, em constante crescimento (PERINE et al., 1999:298).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
122
Na tradição helênica, prevalece a transcendência real do inteligível sobre o
sensível, que encontra sua expressão conceptual e lingüística na Alegoria da Caverna
de Platão (PLATÃO apud ABBAGNANO, 1991:131)
41
.
uma analogia dos dois movimentos: o Transcendente que se inclina até
nós e que pode ser acolhido pela nossa razão como uma graça, atitude da fé,
domínio da gratuidade; e o da nossa razão que tenta elevar-se ao transcendente na sua
inalcançável distância ontológica, iniciativa da razão, domínio da necessidade
racional, ou da metafísica. Tanto a estrutura da fé quanto a estrutura da razão são
estruturas teocêntricas, com uma diferença essencial: na estrutura da fé, o movimento
parte do centro transcendente e irradia para o círculo da razão finita como Palavra de
Salvação, cujo acolhimento na razão é a teologia; na estrutura da razão, o movimento
parte da razão finita e converge para o centro transcendente, constituindo-se em
suprema sabedoria humana no esforço de alcançar o “Centro Divino”, o que constitui
a filosofia em metafísica.
Na tradição grega, a Palavra assume a forma palavra da
sabedoria que supõe a transcendência do ser humano para contemplar sua fonte
original da transcendência (PERINE, 1999:301).
A filosofia moderna questionadora abarcou todo o universo do saber.
Concentrou-se no conhecimento humano, esquecendo-se do ser. Em vez de se
concentrar na capacidade do ser humano de conhecer a verdade, limitou-se em
sublinhar suas limitações, dando origem às formas de agnosticismos e relativismo,
perdendo-se no ceticismo geral gerando atitudes de desconfiança dos grandes
recursos cognoscitivos do ser humano, deixando de questionar o sentido e o
fundamento último da vida humana (JOÃO PAULO II, 1999:8).
41
A caverna corresponde ao mundo do visível, e o Sol é o fogo cuja luz se projeta dentro dela. A
ascensão para o alto e a contemplação do mundo superior são símbolos do caminho da alma em
direção ao mundo inteligível. É com a sua "esperança" pessoal que Sócrates [...] apresenta isto. [...]. O
conceito de esperança é aqui empregado com especial referência à expectativa que o iniciado nos
mistérios experimenta em relação ao além. A idéia da passagem do terrestre à outra vida é aqui
transladada à passagem da alma do reino
visível ao reino invisível
. O conhecimento do verdadeiro Ser
representa ainda a passagem do temporal ao eterno. A última coisa que na região do conhecimento
puro a alma aprende a ver, "com esforço", é a idéia do Bem. Mas,
uma vez que aprende a vê-la,
necessariamente tem de chegar à conclusão de que esta idéia é a causa de tudo quanto no mundo
existe de belo e de justo e de que, forçosamente, a deve ter contemplado quem quiser agir
racionalmente tanto na vida privada como na pública".
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
123
4.2 A fé como fenômeno psicológico
O desejo de conhecer é uma característica humana da inteligência para se
saciar nas águas profundas do conhecimento. Em cada conhecimento singular, no
fundo de sua consciência, o ser humano experimenta o incondicional. Aceitar a
implica harmonizar os valores espirituais, anímicos e racionais, pois depende da
aquiescência do ser total. E isto é um fato psicológico (JOÃO PAULO II,1999:17).
O ser humano é a realidade mais complexa no universo natural, com uma
dimensão psicoespiritual. Somos como luz que irradia consciência em vez de fótons.
O corpo é como um campo de energia comandado pela mente. A mente tem em si
uma energia que a faz transcender do mundo material para o espiritual. Até o
envelhecimento é controlado por nossa consciência.
As forças e energias psíquicas se acham presentes em cada coração humano e
depende de cada pessoa a habilidade para submergir nas profundezas de nosso ser. Ai,
bem no íntimo de nossa personalidade, encontram-se depositadas as experiências de
nossos ancestrais; entre elas, está a experiência do
numinoso”
, do
divino
”,
experiência que a humanidade fez ao longo de sua história através dos séculos até
hoje. Descendo até as profundezas de seu coração, a pessoa acreditará não apenas
intelectualmente, mas com toda a sua personalidade: coração, alma, mente e todas as
suas forças. Se todas as energias psíquicas estão envolvidas na fé, a pessoa satisfaz as
mais íntimas aspirações do seu coração, proporcionando a si calma, serenidade,
alegria, satisfação, consolação (BOFF, 1999:52).
A alcança uma certeza superior, a certeza superior ao racional, na medida
em que é baseada num testemunho divino. Mostra-se como um processo de
interiorização, que é saber o verdadeiro conteúdo da credibilidade, aspecto contido
na chegada do apóstolo João ao mulo vazio [...]”viu e acreditou” (Jo 20,8). Este é o
momento intelectual da fé. E a Enfermagem que tem como objetivo principal a
assistência total ao ser humano perde todo o seu sentido de ser quando deixa de lado
essa dimensão. “Damos injeções, fazemos curativos. Isso é doloroso! Nós manipulamos
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
124
o paciente. Então, se agente não colocar e Deus em nossas mãos, jamais a gente
ajuda o paciente“ (Rose-pesquisa,PEIXOTO:2000).
A humana pode ajudar e criar uma base na qual deposita sua força
saneadora e salvífica. Nas ciências contemporâneas, no mundo da fé, acontece que se
mais espaço ao virtual como real. Porém, necessário se faz evitar o reducionismo
antropológico que concentra a visão sobre determinada dimensão humana como se
fosse a realidade total. Nesse caso, o ser humano estaria reduzido apenas ao
fisicobiológico, ao psíquico ou ao espiritual. E é o que usualmente acontece em muitas
interpretações antropológicas. E isto deforma o ser humano, hipertrofiando-lhe uma
dimensão e atrofiando-lhe as demais (TERRIN, 1998:192).
“Na área de saúde,
enfermeiros que perdem a nos valores autênticos da pessoa humana transformam-
se em pessoas céticas, direcionadas aos seus interesses pessoais, provocando desastres
no desempenho profissional” (Talitha-pesquisa,PEIXOTO:2000).
Entender a como uma realidade psicológica, que tem suas fontes nas
profundezas do inconsciente, requer um diálogo respeitoso e ativo entre a Psicologia e
a religião. É um ato de coragem (PEREIRA, 2003:14).
A não é uma verdade abstrata da razão discursiva, mas corresponde-lhe
uma profunda vivência interior que pode atingir as raízes últimas da psique humana
(KAMINSK, 2005:52).
Sendo a um fenômeno psicológico e pertencendo à categoria de valores
sentimentais, para sua efetivação, carece de reflexões racionais. Sem fé, o ser humano
se torna irracional; e sem razão, ele não pode ter fé, pois a sem razão não passa de
crendice. As tensões entre e razão vistas por um vértice psicológico podem ser
entendidas como algo bom e necessário. A harmonia no ser se estabelece pelo
sentimento de segurança, cujo ego seja maduro para administrar as tensões. As
tensões são destrutivas quando são aceitos os frutos da sem qualquer avaliação ou
questionamento, com riscos de interpretações esdrúxulas e distorcidas, levando os
adeptos à ignorância e alienação. O senso comum e lógico aponta realidades
incontestáveis, e isso gera conflitos internos. Com a necessidade de purificar formas
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
125
mitológicas da concepção que as pessoas tinham de Deus, começou o diálogo da
com a filosofia. Um diálogo equilibrado para não cair nas falsas e vãs filosofias
fundadas nos elementos do mundo, e não no transcendente (HEIDEGGER, 1981:30).
A compreensão da como fenômeno psicológico surge do confronto entre
manifestações religiosas e os conflitos internos; e as manifestações da fé. Visamos à
como fenômeno que possa interferir na psique, produzindo alterações nas funções
psicológicas da pessoa que crê.
Quando a ciência coloca em lugar da certeza da a incerteza do
conhecimento, a mente consciente se isolada num mundo de variações psíquicas,
sem raízes ou afinidades de ligação. A energia e a convicção religiosa, assim como a
universalidade da religião, indicam que ela pertence à natureza do arquétipo. É uma
função natural e original que exerce influência sobre o ser humano, tão persistente
quanto os instintos sexuais e de agressão. Os símbolos da religião coincidem, em todas
as épocas e culturas, com as imagens primordiais sempre repetidas. Os arquétipos são
os numinosos, elementos de estrutura da psique que dão origem à fé apoiada na
experiência.
O reducionismo, método de estudo das religiões, defende que é necessário
dar o espaço adequado à explicação científica inevitável, derivada de um mundo fora
da fé. Em geral, a explicação científica desafia a possibilidade da irredutibilidade
a
priori
dos fenômenos religiosos. Ao contrário, não exerceria seu aspecto crítico,
perderia sua identidade. Pelo reducionismo, o nível manifesto da religião esconde um
nível mais importante. O modo comum de crer está vinculado a motivos
insuspeitáveis, a ponto de comportar um deslocamento das motivações profundas e
últimas em relação às motivações manifestas: existe diferença entre o modo
consciente de crer e o modo inconsciente que é conduzido por outros motivos e
outros significados escondidos. É esse mundo subterrâneo e escondido que precisa
emergir; somente então se entenderá como são fracas ou insuficientes as causas que
levam a crer (ARDUINI,1999:29).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
126
A como fenômeno psicológico começou a ser estudada com o advento da
Psicologia moderna, com o estudo do comportamento humano. Nessa perspectiva, a
é um comportamento humano sujeito ao estudo pelas Ciências Sociais, a
Psicologia. Trata-se de um fenômeno pessoal e exclusivo do sujeito que crê. Assim, a fé
vem de áreas profundas de seu inconsciente e é impulsionada pelo numinoso,
independente da vontade (ARDUINI, 1999:5).
É a certeza de coisas que se esperam, a
convicção de fatos que não se vêem (Hb 11,1). São muitas as pesquisas sobre o
desenvolvimento psicorreligioso.
James W. Fowler (1992:100)
descreveu os estágios do desenvolvimento
psicorreligioso da criança. Para ele, a fé é um atributo genético do ser humano;
Caracteriza-se como processo centralizador que sustenta a formação de crenças,
valores, significados; dá coerência e direção à vida das pessoas, ligando-as à confiança
mútua e lealdade.
Para ele a não é uma dimensão separada da vida, uma
especialidade compartimentada, mas uma orientação de uma pessoa total, dando
propósito e alvo para as lutas e esperanças, para os pensamentos e as ações da pessoa.
“É uma forma ativa de ser e comprometer-se, um meio para se adentrar e se modelar
novas experiências de vida”. É sempre ralacional, sempre um outro na fé. Fowler
discerne seis estágios na capacitação para a cristã que se relacionam entre si de
modo hierárquico e seqüencial, numa ordem ascendente. Cada um, ao se adicionar
ao anterior, incorpora-o, podendo ou não, transcender para a fase seguinte. A
transição de uma fase a outra pode ser demorada e difícil, exigindo reconstruções e
conversões. Um novo estágio emerge quando a pessoa se conta das limitações da
fase anterior.
A seguir, um breve relato dos estágios da no desenvolvimento
psicorreligioso da criança até a vida adulta:
Pré-estágio da lactância. A criança, ao iniciar seus primeiros contatos com o ambiente, é
indefesa e necessita de cuidados especiais. Pelo processo inato de adaptar-se ao ambiente
começa o processo de aprendizagem. Apreende as primeiras imagens daqueles que lhe dão
carinho. Para a criança, essas imagens poderosas que a cercam-se, podem dar-lhe a
primeira noção do absoluto. Nessa fase a fantasia preenche os vazios de sua compreensão, e
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
127
o narcisismo excessivo
42
. pode destorcer a socialização com as outras pessoas e com o meio
ambiente.
Estágio da intuitiva-projetiva (entre 4 e 7 anos de idade). Época marcada pela fantasia e
imaginação. se formam as imagens e os sentimentos duradouros: tanto positivos quanto
negativos. Os símbolos e as imagens da religião são entendidos e imaginados de forma
antropomorfa e mágica. Fowler adverte o perigo nessa fase de criar imagens de terror e
destruição, ao se reforçarem tabus e expectativas morais.
Estágio da fé mítico-literal (entre 7 e 8 anos até 11 e 12 anos). A criança começa a diferenciar
o natural do sobrenatural. Deus continua sendo entendido em termos concretos com
imagens antropomorfas e mágicas. É um estágio de corporativa, depende muito do meio
social em que vive. A reflexão sobre os significados das imagens é que leva a criança para o
estágio seguinte.
Estágio de sintético-convencional (entre 11 e 12 anos). A começa a ser marcada pelas
experiências para além da família. Este estágio vai até a fase adulta; e para muitas pessoas,
torna-se a fase permanente. Nesse estágio, a ainda não é uma auto-escolha. A pessoa
experimenta uma divisão da vida em vários cenários de ação; sua fé continua sendo
fundamentada numa autoridade localizada fora de si mesma.
Estágio da fé individualizante-reflexiva (dificilmente surge antes dos 17 ou 18 anos). Para um
grande número de pessoas, ele aparece por volta dos quarenta anos. Muitas jamais o
atingem. Esse estágio é a expressão de uma nova capacidade na escolha e no seguimento de
um caminho próprio. Os resultados das reflexões e opções são pessoais; e não são mais
recebidos de fora como nos estágios anteriores.
O estágio cinco é o da fé conjuntiva. É um estágio raro, antes da metade da vida.
Caracteriza-se por um horizonte mais amplo de compreensão e posicionamento. Em vez de
reduzir os paradoxos e conflitos a um esquema pronto, a pessoa incorpora-os ao seu jeito
de viver a fé.
Estágio da universalizante. Esse é um estágio real, atingido por poucas pessoas. Difícil de
ser descrito em seus conteúdos e processos. Como exemplos temos: Gandi, a Madre Teresa
de Calcutá e o Papa João Paulo II. Nessas pessoas, o eu deixa de ser o foco central de
referência cedendo lugar ao Tu último. A pessoa tem uma experiência contínua da
participação imediata na vida desse Tu, dessa essência divina. Experiência que o é fuga,
mas transformadora do mundo. Ama-se a vida, percebe seu fluir natural e colabora-se com
esse fluir livre. Nessas vidas, o Reino de Deus se faz presente. Vive-se um estado de união
crescente com Deus.
Numa
visão existencialista, a
é entendida como fenômeno existencial, teia
de conceitos que entrelaçam a Psicologia, a Filosofia e a Teologia (PEREIRA 1999,
2003:23).
Na pesquisa acurada que se faz dos anais de Psicologia atual, vê-se que, na
realidade, os fenômenos relativos à religião, à crença e à são essencialmente
oriundos das profundezas do inconsciente. Embora muitas vezes possam se manifestar
como ação volitiva, ou decisão racional, nada mais são do que racionalizações, para
alívio das tensões produzidas por sentimentos incompreendidos. A é inseparável do
ser humano, pois se constitui em atributo essencial da existência. Pela própria
natureza, está intimamente ligada à realidade psicológica do ser que crê, pois envolve
sentimentos, emoções, vontades, desejos, atitudes e demais aspectos da personalidade.
42
Narcisismo, fase em que a criança se sente o centro de todas as atenções.
Cf.Dicionário Aurélio.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
128
Heidegger (1981:33,35) define fé como a manifestação psicológica do
sentimento, emanada das profundezas do inconsciente. Podemos entender que o
sentimento como elemento originado no potencial afetivo é o componente
fundamental do ato de crer. Crer é confiar em algo que é capaz de atender aos anseios
espirituais. É sentir que o ser superior, objeto da fé, responde com amor à petição.
A é uma manifestação natural de todo o ser natural e transcende à razão.
Está além do volitivo, mas se faz presente no contexto da vontade e da razão. Não
pode ser ignorada a realidade psicológica que a envolve, incluindo os pressupostos
teológicos, filosóficos e psicológicos de conclusões fáceis, mas certamente obscuras e
imprecisas, sem evidências científicas (PEREIRA, 2003:13-14).
Acho que se isso não for trabalhado urgentemente, resgatado com
brevidade,, vai ficando cada vez pior, porque hoje, vivemos num mundo
essencialmente capitalista. Primeiro o mercantilismo, as questões
financeiras. Cresce o número de profissionais de saúde presentes no
“cuidado” dos clientes, o pensando em outros interesses, alheios ao paciente
(Rose-pesquisa,PEIXOTO:2000).
A eficácia da ainda não foi aprofundada, nem do ponto de vista
psicológico, nem do religioso. De fato, parece que aquelas pessoas que crêem fazem
milagres. O problema é que nossa não é suficientemente grande, forte,
inquebrantável.
Josias (2003:10), teólogo e psicólogo, afirma: “de um modo geral, para as
pessoas que crêem, não interesse em compreender o significado do fenômeno fé.
Basta apenas crer, pois pela crença elas solucionam seus problemas, minimizam seus
anseios”. Para o cientista, o filósofo, o psicólogo e o teólogo, a compreensão do
fenômeno requer pesquisa e reflexão, pois esta se constitui em fatos dinamizadores do
crescimento da pessoa que crê e da comunidade de fé. Vêem a como uma maneira
de ser, que expressa os conteúdos do inconsciente, e não exclusivamente ações e
formulações morais e éticas (PEREIRA, 2003:10).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
129
Heidegger (1981:26) tem uma postura voltada para a fenomenologia.
Apresenta subsídios significativos para a análise da como fenômeno psicológico. Na
busca cotidiana do ser humano, para reconhecer sua própria personalidade, tem
íntima relação com a fé, com a conscientização do ser que crê. E a partir do estudo de
textos que norteiam os conceitos da Filosofia, Teologia e Psicologia é que se atém à
realidade existencial que pretendemos direcionar a investigação, levando em
consideração os aspectos fenomenológicos envolvidos.
Ao considerar a fé como fenômeno psicológico, adentra-se em uma seara que
nos remete à reflexão sobre uma realidade constituída pela tensão gerada entre e
razão. Ao passo que a razão preconiza o entendimento no sentido da faculdade
cognitiva intelectual, a
transcende o cognitivo e vai em direção de outros elementos
essenciais. Dai a compreensão de que a razão, sem os meandros filosóficos, significa
algo objetivo, e a fé como manifestação do sentimento é puramente subjetiva.
Entretanto, mesmo sendo sentimento, a emerge da essência do ser,
situando-se no âmbito do espírito. O ser humano, pela sua racionalidade, tem
dificuldade de aceitar o inexplicável que está no medo do desconhecido; e o
desconhecido assusta. Diante do desconhecido, o ser humano sente-se débil. A
debilidade tanto o incomoda que precisa explicações para o alívio das tensões. Como
não são convincentes, pois são criadas de fantasias fóbicas, resultam como
conseqüência em ansiedade que, reprimida pelo ego, por meio de mecanismos de
defesa, cria tensões psicológicas que, muitas vezes, desembocam no conformismo, no
espiritualismo vazio ou no ceticismo (HEIDEGGER, 1981:21).
A fé como fenômeno psicológico é o processo humano universal de
construir significados, que é uma parte integrante do desenvolvimento do ego ou da
personalidade. É a disposição total, da pessoa ao ambiente, no qual são investidas a
confiança e a lealdade em centros de valor que dão poder e apoio e dirigem nossas
vidas diárias. É entendida sob dois pontos de vista: cognitivo e psicossocial. O
problema é que nem uma dessas perspectivas reconhece a complexidade da em
termos de sua composição de elementos psicológicos, a consciência, a inconsciência e
os fatores sociais; nem seus elementos espirituais, no numinoso. Ou a é reduzida a
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
130
um comportamento humano em que não espaço para o mistério, ou a um dom de
Deus, em que a pessoa é passiva e reativa e sua personalidade nem entra na dignidade
da fé (PEREIRA, 2003:16).
Não se objetiva aqui esmiuçar as análises e questões profundas das teorias da
fé abordadas pelos filósofos e teólogos em questão, pois os parâmetros de nossa
pesquisa não nos permitem ir além do enfoque de referenciais básicos da fé.
Entretanto, não se pode deixar de mencionar Cal Jung (1875-1961), o grande expositor
da Psicologia contemporânea. Não é possível qualquer referência à Psicologia da
Religião sem que ele seja lembrado.
Ele aborda um amplo trabalho sobre a relação da
Psicologia com a religião, com questões relacionadas com a fé.
Carl Jung (1875-1961, apud HOSTIE, 1968:78) descreveu a como tendo sua
fonte no inconsciente, nos arquétipos, não no sentido reducionista em que o
inconsciente controla a fé. Os arquétipos
43
. para ele, são as formas herdadas de como
a psique funciona, percebe e organiza idéias e imagens. Essas formas controlam o
consciente para formar padrões do conteúdo de toda a psique. Os arquétipos regulam
ou direcionam a percepção consciente. A pessoa é possuída pelos arquétipos e não os
controla. Esses instalam-se na consciência através de símbolos. Esses símbolos são
imagens carregadas emocionalmente que têm caracteres mitológico, universal e trans-
humano. Esses símbolos são as estruturas ou as formas psíquicas que organizam o
inconsciente coletivo, herdeiro de toda experiência humana em todos os tempos.
Os arquétipos, ou as experiências humanas e universais, são poderes
independentes e superiores ao ego residente no inconsciente. Possuem, ou expressam
o numinoso, agente fora independente da consciência que possui ou expressa o
divino, o espiritual ou o stico. Neste sentido, Deus reside dentro da pessoa, nas
estruturas fundamentais de seu ser, e é um sentimento profundo. O ato de crer que se
constitui na não se processa por uma decisão consciente e espontânea do sujeito.
Antes, é movida por impulsos profundos, vindos de substratos inconscientes
(HEIDEGGER, 1981:21).
43
Arquétipos, função natural e original
, força instintiva do ser humano, tão persistente quanto os
instintos sexuais e de agressão.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
131
Jung (apud PEREIRA, 2003:17)
a possibilidade da existência de Deus fora
das estruturas do inconsciente, mas limita suas observações à presença e operação de
Deus dentro da psique.
Para Pereira (2003:17), Deus, ou o numinoso, é uma realidade psíquica, que é
o fundamento da e que vai além da psique. Deus é uma realidade, o fundamento da
psíquica e transcendental. Ter fé é estar possuído por aquilo que nos toca
incondicionalmente. É estar possuído pelas profundezas do inconsciente e pelo Deus
transcendental. Qualquer separação dessas duas realidades não reconhece a
complexidade e a profundidade da fé como uma realidade psicológica e
transcendental.
A alma (psique) que estabelece a ligação entre o somático e o essencial tende,
de um lado, à corporeidade e, de outro, à essencialidade que se denomina
“psicológica”, institui um estado egóico de dimensões conscientes e inconscientes.
Num estado conflitual entre duas dimensões, o sujeito se vê envolvido na tensão
psicológica que, embora conflitante, deve ser administrada pelo ego, de tal modo que
gere um equilíbrio psicodinâmico.
É na compreensão e aceitação dessas tensões que o ser finito convive
harmonicamente com sua finitude e vislumbra, com a esperança, o infinito e, pela
mesma fé, gera o conflito. Aceitando sua limitabilidade, salta para o desconhecido,
encontrando nesse ato corajoso do imprevisível a resposta do eterno, transmitindo-lhe
paz. É a paz interior que supera toda compreensão racional, elevando o crédulo à
dimensão espiritual.
4.3
A fé como fenômeno espiritual
A razão busca explicações que justifiquem sua existência diante de
experiências de qualquer natureza. A fé por si só se basta, não exige explicações,
apenas depende da aceitação. O ser superior ouve a petição do crente e responde de
forma miraculosa. A resposta tem como conteúdo básico o mistério; é algo que foge à
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
132
compreensão racional, não carece de explicação, basta ser sentida e aceita (PEREIRA,
2003:26).
O crente judaico-cristão no mundo criado uma dádiva divina. Acolhe a
vida como um presente do céu, confiante que “todas as coisas concorrem para o bem
daqueles que amam a Deus” (Rm 8,28).
A pessoa que crê na criação divina, sabe respeitá-la, reconhece seus valores.
Aprende a respeitar as outras criaturas, e seus semelhantes, independentemente de
culturas, raças, religiões e
status
social. A experiência da transcendência real que vai
além dos limites do horizonte material e histórico, no qual o ser humano se encerrava,
decantada e pura com relação aos primeiros ensaios que vinham dos tempos pré-
históricos, assume uma característica original na tradição bíblica. Essa característica
original da experiência da transcendência real no paradigma da Palavra criadora (que
é uma Palavra de Revelação, é Jesus Cristo, o centro da (PEREIRA, 2003:298). “A
do enfermeiro [...] vai influenciar na conduta do paciente, seja para recuperá-lo, seja
para aliviar a dor, seja para prepará-lo para a morte“ (Rose-pesquisa,PEIXOTO:2000
).
Se em cada criatura existe um toque divino, passa-se a ver em cada pessoa
um irmão, uma irmã. É o que nos ensina São Francisco de Assis que chamava o sol, a
lua, o vento, a água e toda a natureza de irmão, irmã. Reconhecendo a dignidade de
nossa natureza humana, Alves (1982:93) assim se expressa: “Sei apenas fazer milagres
pequenos: comer quanto tenho fome, beber quando tenho sede e quando ofendido
por alguém, perdoar“.
Para aqueles chamados à reflexão, não basta conhecer como se estrutura o
átomo, como se desenvolvem as doenças cancerígenas ou em que consiste a morte de
uma pessoa do ponto de vista filosófico. Tais conhecimentos são-nos insuficientes.
Empenham-se para alcançar uma concepção sobre a totalidade do real e sobre a
própria existência humana: o fato completo, a coesão global do mundo e da
existência. Sabemos ser impossível esse conhecimento pelos métodos das ciências
exatas. E ao filosofarmos somos levados em direção à totalidade. O sentido último
daquilo que deparamos na experiência. O fato de que vivenciamos o absoluto no
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
133
decorrer de nossas vidas é muito indefinido num universo constituído apenas de acaso
ou acidente. a é capaz de nos possibilitar o conhecimento das realidades divinas
(ALVES, 1982:93).
A é algo que se sente. É sentimento, é ato de sentir. Por ser sentimento, é
subjetiva e transcendente,
, ,
, não abstrata; existe concretamente no ser que crê. É
direcionada a um ser subjetivo e transcendente, mas a transcendentalidade e
subjetividade do objeto da crença não anulam a realidade existencial e a concretude
no espírito de quem crê, pois, embora estando além da compreensão racional, é uma
presença real e concreta, no âmago da existência do ser que crê. O conhecimento que
é peculiar à fé se fundamenta no transcendente. Além das verdades que a razão
natural pode compreender, podemos, pela fé, ver os mistérios escondidos em Deus
(JOÃO PAULO II, 1999:1).
O fundamento filosófico vem dos sentidos sobre a experiência movida com a
luz do intelecto humano. Situa-se na razão natural, ao passo que a é iluminada e
guiada pelo
Espírito de Deus no reconhecimento das verdades reveladas no Filho de
Deus que se fez Homem (Jo 1, 14). Entretanto, a revelação está envolvida de mistério.
Somente a nos permite entrar no mistério trinitário, proporcionando sua
compreensão para vislumbrar o rosto do Pai na vida de Jesus Cristo (JOÃO PAULO II,
1999:13).
É pela que reconhecemos plena e integralmente a verdade de tudo o que
foi revelado. E a permite a cada pessoa exprimir sua própria liberdade. Os sinais
presentes na revelação, em auxílio à razão, servem para conduzir à busca da verdade e
permitir que a mente possa investigar o mistério. O conhecimento comum não anula
o mistério, torna-o mais evidente. Conhecereis a Verdade; e a verdade libertar-vos-á
(Jo, 8,32). A verdade habita no interior do ser humano; e ele necessita perscrutar esse
mistério transcendente, para assimilar a verdade Revelada como expressão do amor
(JOÃO PAULO II, 1999:16).
[...] a experiência existencial da toca a emoção, as profundezas do eu, os
derradeiros destinos da vida, as razões mais profundas pelas quais vivemos
ou morremos
(AMADO, 2004:1)
[...] a experiência existencial da toca a
emoção, as profundezas do eu, os derradeiros destinos da vida, as razões
mais profundas pelas quais vivemos ou morremos
(AMADO, 2004:14).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
134
O conhecimento do mundo e de seus fenômenos não se pela abstração
nem nos parâmetros da época moderna propensa à subdivisão do saber. Na convicção
de que existe uma unidade profunda e indivisível, o mundo bíblico convergiu o
conhecimento da razão e o conhecimento da fé. A razão se serve da para
perscrutar, analisar e julgar o mundo e sua história. A abre a mente para entender a
presença operante divina. Daí se conclui que, se a como crença é algo que emana
do interior do sujeito, ela está além da razão e do intelecto, mas vem das profundezas
do sentimento.
Groome (2005, apud HEIDEGGER, 1981:32), em sua obra “Educação religiosa
Cristã, 1980, a
Dimensão afetiva da fé cristã”, assume a forma de uma relação de
crédito e confiança num Deus pessoal. Está relacionada, com a área afetiva, esna
dimensão do sentimento, sem desprezar o intelectual, o cognitivo.
Santo Agostinho (1987:58), ao desenvolver seu pensamento sobre a fé, não
deixa dúvidas quanto à idéia de que a fé é algo que ocorre independentemente da
vontade ou do desejo daquele que crê. A que se tem no divino origina-se na própria
divindade.
Vê-se em Deus e n’Ele se move quando se faz da existência um constante
voltar para o outro, o ser humano. E é justamente esse o desempenho profissional da
Enfermagem. Na doutrina cristã, dá-se o nome de caridade; e é considerada a maior
de todas as virtudes recebidas de Deus, porque quem ama tem e esperança na
pessoa amada. Considera-se a pessoa humana como o sagrado, no cotidiano da
Enfermagem: “Tira as sandálias dos pés, porque o lugar onde estás é uma terra santa”
(Ex 3,46).
É próprio da existência humana o crer que tráz a esperança e o amor levando
as pessoas à prática do bem e da justiça. É uma dimensão de conversão, de sede de
Deus, de ruptura com o mal, um convite a acolher o bem, como fruto do amor
(JOSAPHAT, 1998:7).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
135
A tem uma dimensão histórica bíblica e se aprofunda na experiência do
povo. Deus aparece dominando a história e indicando o sentido para a vida do povo
(JOSAPHAT, 1998:27).
De todas as buscas humanas, a busca da sabedoria é a mais perfeita, a mais
sublime, a mais útil e a mais agradável. A mais perfeita porque à medida em que o ser
humano se entrega à busca da sabedoria, nesta extensão, ele desfruta de alguma
parcela da verdadeira felicidade (KAMINSK, 2005:52).
Gardener (1994:46)
acredita que em nosso cérebro existe um lugar
determinado para as múltiplas inteligências e que as oito inteligências se
interrelacionam com a inteligência espiritual. Inteligências: lingüística, espacial,
cinestésico-corporal, naturalista, lógico-matemática, interpessoal, intrapessoal,
espiritual.
A inteligência espiritual é aquela que transcende o que é imanente ao ser
humano, vai além da inteligência interpessoal e intrapessoal e guarda estreita relação
com o que Salovey (1990, apud, GARDENER, 1994:46) chama de inteligência
emocional. Necessita das demais inteligências para se constituir e se expressar como
modo de compreensão holística da realidade.
O que significa experimentar Deus, hoje, em nosso mundo panteísta? Nesse
mundo da experiência científica, é possível definir uma experiência de Deus?
A fé como realidade espiritual começa com o entendimento da fé como
fundada na revelação. A pessoa pode estar preparada para buscar e receber a fé, mas
só Deus pode dá-la.
As crises de nossa cultura e das imagens do ser humano afetaram todas as
nossas representações de Deus. Faz-se mister resgatar a experiência do Deus vivo e
verdadeiro que não corresponde à imagem cognitiva de nossa cultura. Experiência,
segundo Boff (1999:8), é uma das palavras mais ricas e difíceis de expressar. É sentir,
vivenciar e experimentar Deus, sua graça, o Espírito Santo
,
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
136
A Bíblia é por excelência o testemunho de radicais experiências de Deus, e só
tem sentido se emergir nas situações nossas do dia-a-dia. Para experienciá-lo é
necessário ouvi-lo e experimentá-lo. Portanto, cada qual deverá percorrer o seu
caminho, na sua área, no seu setor, e na sua interioridade deixar transparecer Aquilo a
que chamamos Deus. Isso não se fará sem empenho e, no máximo, rigor da vida. A
experiência de Deus não é provocada, mas podemos nos preparar para o seu advento.
Quem busca sempre encontra Deus, porque percebe que estava sempre com Ele antes
mesmo de buscá-lo. No entanto, a busca de Deus exige um despojamento de si
mesmo, para ceder lugar a Deus. Vejamos o testemunho de Léo: “[...] quando bate a
dor, os pacientes passam a acreditar que tem alguma coisa maior, um transcendental
a tudo isso”.
É necessário o êxodo para entrar na Terra Prometida, passando pelo deserto,
a noite escura, as longas vigílias para se beneficiar da luz autêntica do dia. É necessário
ter fome e sede de Deus, buscá-Lo como procuramos o ar para respirar ou a água
fresca para saciar nossa sede. Deus é como as ondas de rádio, televisão, ou internet,
que transitam nossa atmosfera; importa ter o monitor e o aparelho ligados para captá-
Lo, então Ele poderá ser ouvido apesar dos ruídos da vida (BOFF, 1999:9).
“Ninguém jamais viu a Deus(1 Jo 4,12). Deus se a conhecer por muitos
caminhos; Ele é sempre o outro. É aquele que está no verso da medalha do que vemos
e vivemos. É encontrado onde menos o esperamos. Visto onde cegueira,
contemplado onde cruz, amado onde lágrimas, e se faz luz onde trevas. A
revelação definitiva de Deus é no ser humano histórico. Sem a verdadeira experiência
de Deus, nossa vida andará errando entre muitos deuses falsos, ídolos enganosos da
verdade que perdemos.
Numa perspectiva do espaço epistemológico, a estruturação das experiências se
faz segundo regras cada vez mais rigorosas de racionalidade; e a experiência
tradicional de Deus parece recuar e ser expulsa do campo da racionalidade, com
dificuldade de traduzir-se em uma teologia no sentido estrito. A experiência de Deus é
substituída por vivências pré-racionais e, mesmo irracionais, que se pretendem
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
137
religiosas, folclorização do
rationabile obsequium
da liturgia questionada, com
ceticismo, pelos pesquisadores.
A experiência de Deus é única, que não se desvela por experiências científicas.
Estamos diante de uma Presença analógica, por isso transcendente a toda presença
particular, “
Per via negationis
”. Dizemos que a experiência de Deus é a impossibilidade
do absoluto radical do ser. É a em Jesus Cristo que se manifesta na encarnação e se
plenifica na ressurreição. É uma experiência de diante do sagrado. fascínio e
temor.
Falar de Jesus Cristo como objeto de
, “Credo in dominum nostrum Iesum
Christum”,
é rigorosamente teo-logizante. É traduzir em nossa linguagem a presença
de Deus em Cristo.
Um dos últimos parágrafos da Encíclica
Fides et Ratio
, o Papa João
Paulo II (1999, apud, PERINE, 1999:154) assim se expressa: “A todos peço para se
debruçarem profundamente sobre o ´ser humano`
44
que Cristo salvou no mistério de
seu amor, e sobre a sua busca constante de verdade e de sentido”.
A opção do “ser humano” de viver na verdade é de construir sua própria casa à
sombra da Sabedoria, e nela habitar. E nesse horizonte da verdade, pode compreender
sua liberdade no amor e conhecimento de Deus para a realização de si mesmo
(PERINE, 1999:154).
Na encíclica
Aeterni Patris,
Leão XIII (1880, apud PERINE, Marcelo et al.
1987:154) afirmou a necessidade de se adotar uma filosofia que, sem perder sua
característica de saber humano autônomo, pudesse contribuir à fé e à revelação cristã,
mostrando não as verdades naturais, mas também auxiliando a teologia no
esclarecimento e na organização racional: tornando possível harmonizar os mistérios
divinos com a verdade natural e refutar os argumentos contrários.
Neste capítulo, falamos sobre as diferentes modalidades da fé e da razão.
Veremos no quinto capítulo “A Educação em Enfermagem e os Valores
Psicoespirituais.
44
O
grifo é nosso.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
138
C
APÍTULO
V
A
E
DUCAÇÃO EM
E
NFERMAGEM
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
139
C
APÍTULO
V
A
E
DUCAÇÃO EM
ENFERMAGEM
Nossa reflexão, aqui, sobre a Educação em Enfermagem é no sentido de uma
busca de caminhos firmes e decididos da área do conhecimento, para uma possível
transformação da realidade presente, quanto à assistência psicoespiritual aos
pacientes, que parece segundo pesquisas feitas pos nós, estar deixando a desejar
(PEIXOTO:2004/2005).
Uma das características primordiais do momento atual consiste no fato de as
ciências cruzarem seus conhecimentos numa espécie de rede. Fala-se em
transdisciplinariedade para caracterizar o progresso, o romper as fronteiras entre:
Física, Química, Biologia, Bioengenharia. Surgiram novas ciências como a Quântica,
Eletrônica, Biologia Molecular, Bioinformática entrelaçando virtualidade e digitalidade
(MOSER, 2006:48). Nossa proposta é de resgatar os valores espirituais cristãos na
educação em Enfermagem para a formação dos novos profissionais, por julgar serem
estas indispensáveis à empatia enfermeiro-paciente.
Os enfermeiros docentes, no exercício do magistério, podem se valer da força
interior ao ministrarem as disciplinas curriculares no desempenho didático. A partir
desta articulação, sim, conseguem deixar transparecer, na educação em
Enfermagem, a dimensão religiosa cristã na assistência psicoespiritual às pessoas.
5.1
Perspectivas na assistência psicoespiritual
Neste item, abordam-se os novos horizontes sem medo de mudar, enfocando
a importância da flexibilidade nos programas didáticos e de recriar para inovar
apresentando sugestões aos docentes e discentes em nossa pesquisa de campo.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
140
5.1.1
Novos horizontes sem medo de mudar
A visão do mundo e o sistema de valores que estão na base de nossa cultura e
que têm de ser cuidadosamente examinados foram formulados em linhas essenciais
nos séculos XVI e XVII. A perspectiva medieval mudou radicalmente nos séculos XVI e
XVII. A noção do universo orgânico, vivo e espiritual foi substituída pela noção do
mundo como se fosse uma máquina, que se tornou metáfora. Entre os anos de 1500 e
1700, houve uma mudança radical na maneira da as pessoas entenderem o mundo e a
sua própria maneira de pensar. A nova mentalidade e a nova percepção do cosmo
marcaram profundamente nossa civilização ocidental com aspectos que ainda são
característicos da era moderna. A visão era orgânica, as pessoas vivenciavam mais a
natureza. A ciência medieval era bem diferente da ciência contemporânea que se
apóia na razão e fé; àquela só bastava o significado sagrado das coisas (CAPRA,
1982:49)
45
.
No mundo contemporâneo, indispensável se faz resgatar os valores
inalienáveis das gerações posteriores que nos impulsionam para novos horizontes,
mais humanos, voltados para uma visão holística de todos os povos. Esse resgate
depende de uma reforma profunda dos currículos de ensino educacional em todos os
níveis. Quando se fala da formação do profissional de Enfermagem, deve-se ter uma
preocupação global com a educação em todos os níveis que antecedem a academia
universitária; pois essa é a base na qual se trabalharão os valores espirituais
indispensáveis ao profissional de Enfermagem.
A educação no Brasil es estruturada em: ensino infantil (creche); ensino
fundamental (da a 9ª séries); ensino médio ( a séries) e ensino superior
(graduação e pós-graduação
lato sensu
especialização;
stricto sensu
mestrado e
doutorado).
45
Antes do século XVI, a visão do mundo, na maioria das civilizações, era orgânica, com interdependência
dos fenômenos espirituais e materiais, pela subordinação das necessidades individuais às da comunidade.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
141
Os Estados empenham-se com o ensino fundamental que é de sua
responsabilidade. Apesar disso, a situação da educação permanece crítica. Expressa-se
alto nível de analfabetismo, dificuldade de acesso ao nível secundário e universitário.
Esta situação se ressente, ainda mais, de programas alheios à vida dos estudantes,
infra-estrutura insuficiente ou inadequada, professores mal qualificados em todos os
níveis (KELLOGG, 1991:15).
Esses problemas do sistema educacional têm refletido
diretamente na preparação dos novos profissionais de enfermagem. Eles abrangem
todos os processos educacionais que os qualificam para exercer suas atividades no
setor da saúde. Neste sentido, temos que nos preocupar com a educação em geral,
para a capacitação dos profissionais de Enfermagem.
A educação profissional da Enfermagem
se caracteriza por alto grau de
heterogeneidade e complexidade que varia não de país para país, mas nos próprios
países em si.
No Brasil, a Enfermagem está, como prática social na área de prestação
de serviços e na formação dos novos profissionais, atrelada ao modelo médico-
assistencial hegemônico do país, nas contradições dos sistemas de saúde e educação .
A partir de dezembro de 1996, a educação brasileira passou a ser regida pela nova Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). A promulgação dessa Lei
regulamenta o ensino médio e o ensino profissionalizante.
A LDB introduziu importantes modificações para a graduação: procedimentos
para avaliação externa periódica dos cursos e das instituições de ensino superior; a
formulação, pelo MEC, das diretrizes curriculares para os cursos de graduação, que
deverão substituir os atuais currículos mínimos com a finalidade de permitir às
instituições de ensino superior maior flexibilidade na construção de seus currículos
plenos (PAIVA, 1999:27). Sugere-se, portanto, uma revisão do currículo do Curso de
Enfermagem, pois
A educação em Enfermagem, hoje, tem uma deturpação no sentido de
assistência psicoespiritual. Estamos convictas de que o que nos caracteriza
como enfermeiras é essa abordagem holística, essa assistência integral ao
ser humano. É necessário revermos isto. Na parte do discurso uma
preocupação, mas a Enfermagem faz isso sem planejamentos, não aparece
nas anotações, como identificação de necessidades psicoespirituais. A
atenção da Enfermagem é, basicamente, em cima dos aspectos de
recuperação da saúde biológica; como não é registro, acaba sendo
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
142
entendida como um trabalho não significativo para o exercício profissional
(Carla, pesquisa, PEIXOTO:2000).
Esta atenção psicoespiritual ao ser humano é uma das finalidades da
educação em enfermagem e não pode ser omitida nem acontecer por acaso: é
necessário capacitar os novos profissionais para revigorar, dar ânimo aos enfermos,
pois a doença e o sofrimento, como vimos, são manifestações ameaçadoras que
geram medo e ansiedade aos enfermos, pelo perigo real ou imaginário da vida.
Os desafios diante dos obstáculos das crises atuais não são motivos para
desânimos ou imobilismo, e, sim, motivos de luta permanente. Precisa-se ter sempre
em mente a frase de Morais (1986 apud BOERY, 1994:136): “Propor-se ao ensino é
propor-se a um risco”.
Não devemos ter medo de ser enfermeiras do século XXI;
devemos, sim, ter medo de nos disfarçarmos em profissionais do século XX, frias no
desempenho da técnica, sem levar em conta a dignidade das pessoas, o respeito a elas
e aos valores integrais do ser humano. Precisamos valorizar o aspecto antropo-
teológico para sacralizar o encontro do “cuidar humano” com Deus. A visão do
mundo e a dos sistemas de valores que estão na base de nossa cultura e que têm de ser
cuidadosamente examinados foram formuladas em linhas essenciais nos séculos XVI e
XVII.
Segundo Capra (1982:95), enquanto a nova física no século XX avançava em
novas descobertas, a visão de mundo cartesiana e os princípios da física newtoniana
mantinham sua forte influência sobre o pensamento científico ocidental, e, ainda hoje,
muitos cientistas aderem ao passado mecanicista, embora já esteja superada esta
concepção mecanicista da vida refletindo em nossa cultura.
Aprofundam-se os conhecimentos específicos em cada ciência: Medicina,
Biologia, Psicologia, Teologia, mas quando estamos diante do paciente, procuramos
entendê-lo dentro do esquema geral. Reduzimos os conhecimentos em atendimento
às necessidades imediatas. Ao concentrar-se em partes cada vez menores do corpo, a
medicina perde freqüentemente de vista o paciente como ser humano. Ao reduzir a
saúde a um fenômeno mecânico, a medicina não pode mais ocupar-se com o
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
143
fenômeno da cura. Essa é talvez a mais séria deficiência da abordagem biomédica.
Embora todos os membros da área da saúde saibam que a cura é um aspecto essencial
de toda a medicina, o fenômeno é considerado fora do âmbito científico. Não se
discute os termos saúde e cura na academia. Essa exclusão é evidente, é um fenômeno
que não pode ser entendido em termos reducionistas. A cura envolve uma complexa
interação em todos os aspectos psicobiofísicos, psicossociais, psicoespirituais.
Na história da ciência ocidental, a Biologia e a Medicina sempre caminharam
juntas. Com o estabelecimento em biologia da concepção mecanicista da vida, ela
dominou as atitudes dos médicos em relação à saúde e doença, refletindo em toda a
área da saúde, por conseguinte na Enfermagem, resultando no modelo biomédico.
Neste, o corpo humano é considerado uma máquina que pode ser analisada em
termos de suas peças. A excessiva ênfase no método cartesiano levou a fragmentação
característica de nosso pensamento em geral e das nossas disciplinas acadêmicas.
Com os avanços técnicos e científicos, a prática da Medicina transferiu-se do
consultório geral para o hospital, onde se tornou progressivamente despersonalizada,
desumanizada.
O excessivo uso da alta tecnologia na assistência médica, além de
antieconômico, causa dor e sofrimento desnecessários. São doenças geradas pelo
próprio processo de assistência médica. Os remédios tornaram-se a chave da terapia
médica e podem afetar uma vasta gama de funções reguladoras de todo o organismo
humano, permitindo aos médicos salvar vidas e aliviar sofrimentos. Mas, por outro
lado, deve-se evitar o uso inadequado e abusivo de medicamentos, tanto por parte de
médicos, através das receitas, quanto por parte das pessoas em geral, pela
automedicação, provocando efeitos colaterais, tornando-se um problema de saúde
pública, pelo sofrimento e desconforto para milhões de pessoas (VILELA, 1996:140).
A indústria química nos apavora pelas contaminações dos germes no meio
ambiente. Entretanto, dificilmente encontramos uma justificativa biológica. Sabemos
que muitos tipos de bactérias e vírus associados a certas doenças estão comumente
presentes nos tecidos de indivíduos saudáveis sem causar-lhes qualquer dano e se
tornam patogênicos em circunstâncias especiais, em que diminui a resistência geral do
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
144
hospedeiro, produzindo sintomas patológicos.
O desenvolvimento de doenças
contagiosas depende tanto da resposta do hospedeiro quanto das características
específicas da bactéria. Conhecem-se poucas doenças infecciosas em que as bactérias
causam um dano real e direto às células do organismo do hospedeiro. Na maioria dos
casos, o dano é causado por uma reação excessiva do organismo, uma espécie de
pânico em que mecanismos de defesa são acionados simultaneamente. As doenças
infecciosas, na maioria das vezes, surgem de uma falta de coordenação do organismo,
e não de danos causados por bactérias invasoras.
Newton (1727, apud CAPRA, 1982:59) apresentou a teoria dos princípios
matemáticos de filosofia natural. Antes dele, duas tendências opostas orientavam a
ciência: o método empírico indutivo, representado por Dsbacon, e o método racional,
dedutivo analítico, representado por Descartes. Newton unificou as duas tendências e
desenvolveu a metodologia na qual se baseia a ciência natural. Ao transcender a
divisão cartesiana, a física moderna não só invalidou o ideal clássico de uma visão
estática da natureza, mas também desafiou o mito da ciência isenta de valores.
A teoria quântica uma visão do universo como rede cósmica, dinâmica,
interligada de relações mútuas. Portanto, a física moderna representa a matéria não
como inerte e passiva, mas num estado de contínuo movimento dançante e
vibratório. Existe estabilidade na natureza e não estruturas estáticas. Todas as
propriedades, de qualquer parte dessa teia, decorrem das outras partes do todo, e a
coerência total de suas interações determina a estrutura da teia. A concepção
mecanicista do organismo humano e a resultante abordagem técnica da saúde
levaram a uma excessiva ênfase na tecnologia da enfermagem, que é considerada o
único caminho para melhorar a saúde.
A adoção de um conceito holístico e ecológico de saúde, na teoria e na
prática, exigirá não uma mudança radical conceitual na ciência médica, mas
também uma reeducação maciça do público.
Diante de tudo isso, gostaria de abordar as complexas interações da mente,
do corpo, espírito e do meio ambiente que formam a resistência às bactérias.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
145
Entretanto, são raras as pesquisas desse tema. Na maioria, as pesquisas realizadas,
visam à identificação de microorganismos específicos e ao desenvolvimento de
medicamentos para eliminá-los, esforço bem-sucedido na área médica, no tratamento
de infecções bacterianas agudas.
Segundo Capra (1982:50), os problemas psicológicos são tratados por
psiquiatras e considerados menos importantes na classe médica. E o renascimento
espiritual nas décadas de 1960 e 1970, as novas atitudes, o foi incorporado ao nosso
sistema de assistência à saúde. Observamos na visão cartesiana a imagem do corpo
como máquina, e seu impacto na teoria e na prática médicas é uma profunda
mudança conceitual na visão de saúde e doença. Os próprios enfermeiros são
preparados para enfrentarem uma carga estressante de trabalho. Como são treinados
para usar um modelo de saúde e doença no qual as forças emocionais não
desempenham papel algum, são propensos a ignorá-las em suas próprias vidas.
Por outro lado, Capra (1982:153) acredita que muitas pessoas aderem ao
modelo biomédico porque receiam ter seu estilo de vida examinado e ver-se
contratadas com seu comportamento doentio. Capra foi muito radical em sua fala;
mas reconhecemos que muitos profissionais cristalizam certas idéias na maneira de
ver diferentes situações no desempenho profissional, sem lembrar que nossa sabedoria
é limitada. Conhecemos somente partes da verdade. Somos, portanto, eternos
aprendizes.
O excessivo uso de alta tecnologia na assistência médica, além de
antieconômico, causa dor e sofrimento desnecessários. Foi estimado que um em cada
cinco pacientes admitidos em um típico hospital de pesquisa adquire uma doença
iatrogênicia
46
.
Capra (1982:95) lembra que, enquanto a nova física no século XX avançava
em novas descobertas, a visão de mundo cartesiana e os princípios da física
newtoniana mantinham sua forte influência sobre o pensamento científico ocidental
46
Iatrogênica, do grego “
iatros
”, “médico”, e “gênesis”, “origem”. São doenças geradas pelo próprio
processo de assistência médica.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
146
e, ainda hoje, muitos cientistas aderem ao passado mecanicista, embora já esteja
superada a concepção mecanicista da vida.
As perspectivas de desenvolvimento na educação de Enfermagem na América
Latina para o século XXI, segundo a Kellogg (1991:17), devem unir esforços das
associações de Enfermagem e das instituições nacionais e internacionais para
estabelecerem políticas e estratégias que ajudem a construir um novo modelo de
Enfermagem na América.
Entre as várias propostas da Kellogg (1991:20) para o desenvolvimento de
programas de ensino para uma Enfermagem mais consciente, participativa, está a que
se refere à criação de programas assistenciais que retroalimentem o exercício das
docentes de Enfermagem e estimulem a criatividade dos estudantes, mediante a
participação consciente e permanente nas equipes interdisciplinares. Compartilhar as
problemáticas do contexto social e estimular a criatividade da comunidade para a
criação de ações coerentes com a realidade são dons indispensáveis aos docentes de
Enfermagem.
5.1.2
Reinventar para inovar
Em nossa realidade brasileira, como vimos, constata-se que a assistência
integral ao ser humano precisa ser questionada quanto à assitência psicoespiritual às
pessoas. Entre os problemas apontados, destaca-se a necessidade de programação das
tarefas a desempenhar com os pacientes, relacionadas à assistência psicoespiritual.
Deveria haver uma integração interdisciplinar. Tratar desses valores
fundamentais da Enfermagem, em todas as disciplinas, inclusive nas visitas
domiciliárias. Temos que inovar, criar mecanismos para dar essa assistência
psicoespiritual. Se o paciente não tiver um equilíbrio espiritual, nós vamos
ter dificuldades para ajudá-lo na cura
(Taís, pesquisa, PEIXOTO, 2004).
Embora estejamos convictas de que seja vital uma tomada de providências
em função de um melhor preparo pedagógico do enfermeiro, referente à assistência
psicoespiritual, deve-se considerar que o processo de educar é amplo, gradativo,
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
147
dinâmico e permanente, levando em consideração o contexto social. Jamais se deve
ditar medidas pré-fabricadas, pois toda problemática social deve ser resolvida com
soluções apontadas pela própria comunidade.
Explicitar todos os problemas de que se fala a respeito da assistência
psicoespiritual em forma de questões e buscar soluções de maneira
partilhada com toda a equipe de Enfermagem. As questões sobre os aspectos
psicoespirituais precisam ser trabalhadas como qualquer outra questão da
profissão, como uma atividade a desenvolver. É preciso pensar sobre isso,
falar sobre isso: ‘Como é possível eu me expressar numa assistência espiritual
às pessoas [...] com religiosidades diferentes, sem impor minha religião às
pessoas às quais estou assistindo?
(Carla, pesquisa, PEIXOTO, 2000).
A riqueza de nossas programações didáticas brota dessa participação da
equipe, tornando nosso ensino coerente com o contexto social em que vivemos. As
necessidades acadêmicas são vivenciadas por aquelas que delas participam e estão
mais aptas a discerni-las:
as acadêmicas precisam ser preparadas com esses valores psicoespirituais.
Primeiro a aluna: ‘De que forma ela lida com esses valores, com ela mesma’,
a seguir, aluna-paciente; vivenciar esses valores na profissão. Muitas vezes, o
paciente precisa mais de um bom dia do que de um comprimido de
novalgina
(Talitha, pesquisa, PEIXOTO, 2000).
A Enfermagem, como toda a área da saúde, precisa se posicionar ante os
avanços tecnológicos e científicos. Vejamos a insistência das palavras do educador
Paulo FREIRE: “O conhecimento exige uma presença curiosa do sujeito em face do
mundo. Requer sua ação transformadora sobre a realidade. Demanda uma busca
constante. Implica invenção e reinvenção.”
A grande dificuldade que a Enfermagem está passando, é que ela quis ser
tão ‘profissional’, e achar que ser profissional é ser dura, autoritária. Eu acho
que o ponto chave não é por aí, não! O ponto chave que a Enfermagem
deve buscar dentro do ‘cuidado’, é a questão da humanização, da
sensibilização que sempre existiu na história da Enfermagem, a vida inteira.
Só, que eu acho que esses itens foram esquecidos, ao longo dos anos, em
busca de um profissionalismo na Enfermagem. Para que a Enfermagem seja
aceita como profissão, eu acho que as pessoas começaram a se confundir. Eu
acho! Começaram a ficar muito duras, dizendo: eu tenho que fazer pacotes
de material em dez minutos’, ‘tenho que fazer certos desempenhos
administrativos em determinado tempo’; então essa coisa da humanização
foi ficando de lado. E é justamente a ‘humanização’, que qualifica o
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
148
profissional de Enfermagem. Mas a Enfermagem perdeu um pouco esse
valor. Então o ponto chave, para mim, na Enfermagem, é a questão da
‘humanização’: entender o ser humano, no ‘cuidar’. Quem lida com
máquinas, não precisa disso; mas para quem lida com gente, é fundamental.
A enfermeira tem que ser profissionalizante e humana ao mesmo tempo
(Talitha, pesquisa, PEIXOTO, 2000).
Apesar de não fazer parte de nosso tema, mas para entender melhor o
exposto pela nossa entrevistada
, é bom comentar aqui um pouco dos esteriótipos da
profissão de Enfermagem.
A imagem que a sociedade construiu da Enfermagem, através dos séculos, é
permeada de estereótipos que incluem figuras como: santas, prostitutas, feiticeiras,
heroínas e que se relacionam à função de auxiliar do médico e à falta de vida social.
Além disso, a imagem que a Enfermagem tem de seu trabalho é negativa
47
,
ocasionando frustração pela falta de autonomia encontrada na realidade
profissional
48
.
Conclui-se que os estereótipos da imagem influenciam negativamente sua
prática e que, na história da Enfermagem, se encontram muitas das razões para as
distorções existentes.
A profissão da Enfermagem evoluiu, assim como seu ensino; porém, a falta de
identificação dos veis profissionais de Enfermagem ocasiona frustração pela não
valorização do cargo. A Enfermagem é identificada com uma formação matrilinear e a
formação médica patrilinear. E, para distanciarem-se de suas origens religiosas, as
enfermeiras procuraram especializar-se na tecnicidade, reforçando, dessa maneira,
sua associação ao médico ou tentando desvencilhar-se de um estereótipo, acabando
por aproximarem-se de outro, o que contribuiu para a confusão de seu papel e de sua
imagem (NAUDERER, 2005:76).
47
Imagem negativa,
contribuindo para uma baixa auto-estima (NAUDERER, 2005:76).
48
Considera-se pequena a produção científica sobre o tema no país.”
Uma vez que é de grande
relevância
(NAUDERER, 2005:80.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
149
Essas reflexões sugerem algumas questões: somos pessoas que repetem, em
vez de pensar? Que recebem passivamente em vez de avaliar?
Acostuma-se com uma educação “bancária” em que, segundo Freire
(1981:136), “o saber é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada
saber.” Em outras palavras, é necessário evitar o aprendizado “xérox”, que é aquele que
reproduz apenas o que ouviu.
Deixar de ser mais técnica. Temos dado muita ênfase à técnica, esquecendo a
parte espiritual. Não acolher os líderes religiosos que queiram dar
assistência espiritual, mas procurar também, dar nós mesmas, essa
assistência. Enfermagem é profissão mas é amor também
(Elke, pesquisa,
PEIXOTO:2000).
Precisam ser preparados os novos profissionais para darem, eles mesmos, esta
assistência psicoespiritual aos clientes, sem precisar delegá-la a outros. Parece que,
através dos tempos, para excluir uma formação que priorizava mais aspectos morais,
enfermeiras pesquisadoras acabaram excluindo, também, certos valores religiosos de
humanização que dão suporte à assistência psicoespiritual na Enfermagem.
Segundo Galiléu (1597,
apud COELHO, 1995:149),
a filosofia da natureza está
sempre aberta diante de nossos olhos e, para compreendê-la, é necessário aprender a
linguagem e os caracteres em que ela foi escrita. Com a visão dos cientistas para as
propriedades quantificáveis da matéria, perderam-se os sentimentos e os valores
espirituais humanos. Tornaram-se ciência e tecnologia antiecológicas. Recorrer a esses
aspectos não quer dizer que a medicina e a Enfermagem tenham de ser menos
científicas; ao contrário, podem tornar-se mais coerentes com as recentes conquistas
da ciência moderna.
Professores para quê? Para auxiliar alguém devo estar mais bem informado
que ele e, em primeiro lugar, ter a inteligência daquilo que ele compreende, sem que
minha qualidade de mestre não lhe é de proveito. Todo auxiliar começa com
humilhação; para prestar um serviço, devemos em primeiro lugar humilharmos diante
daquele que queremos auxiliar. Isto é: ajudar é mostrar paciência, é aceitar
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
150
provisoriamente que não tem razão, é ser ignorante com inversão da hierarquia do
ensino-chave de toda a pedagogia. Ser mestre é ser discípulo. É necessário, como
afirma Freire (1983:136), “reinventar” e trazer à tona os valores adormecidos.
Pretende-se reavivar estes valores fundamentais na educação em
Enfermagem, na assistência psicoespiritual ao ser humano, que parecem estar sendo
menosprezados.
Temos o direito de mudar a consciência dos alunos?
O professor libertador nem manipula, nem lava as mãos da responsabilidade
que tem com os alunos. Ensina sem imposições, mas com reflexões. A aula libertadora
ilumina a realidade, desvenda a razão de ser, de qualquer objeto. “Não deixe que o
medo do difícil paralise você”. Não permita que o medo facilmente o paralise e o
persuada-o a desistir de enfrentar a situação desafiante, sem luta e sem esforço.
Na perspectiva libertadora, o professor tem o direito e o dever de contestar o
status quo
em questões de dominação de sexo, raça ou classe. Dialogar! Este pertence
à natureza do ser humano, ser de comunicação (FREIRE, 1987:14). Entretanto
necessita-se de equilíbrio pois às vezes, também se peca por excesso.
As propostas para solucionar
os problemas atuais da Enfermagem
estão nos
próprios grupos comunitários. Como sugeriu a pesquisa de campo estas devem surgir
do contexto social onde são vivenciados esses problemas. Mencionam-se aqui,
algumas propostas dos docentes e discentes em nossa pesquisa de campo:
Tratar esse tema com urgência em todas as disciplinas, inclusive na prática;
reciclar a Enfermagem com mesas redondas, seminários, palestras; aula
magna; visar uma educação permanente; anotar no prontuário dos clientes
a assistência dada; não só chamar os líderes religiosos, mas dar essa
assistência, também
(Elke,pesquisa, PEIXOTO:2004.)
Entretanto, é oportuno lembrar-se da importância de se aproveitar
experiências de grupos que trabalham esses aspectos, interagindo, portanto, com
certas organizações religiosas que possuem experiências de assistência espiritual aos
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
151
enfermos. Destacamos, entre outras, a Pastoral da Saúde
49
, que é uma organização de
grupos de pessoas voluntárias que, nas igrejas cristãs, se dedicam à assistência
psicoespiritual às pessoas, visando à saúde integral das comunidades de fiéis,
interagindo, assim, com a profissão de Enfermagem, contribuindo com suas
experiências para essa assistência. Um dos grandes desafios da Pastoral da Saúde é
abdicar de um Deus puro, que mora no coração, e descobrir o Deus desfigurado em
cada cliente e/ou doente. Essa promoção da vida e da saúde é missão da Igreja e é o
que caracteriza a profissão de Enfermagem. As instituições de saúde são procuradas
pelas pessoas em busca de saúde física e também, necessitadas de presenças humanas
que se solidarizem com elas em suas angústias. A doença é uma situação anormal na
vida. Normalmente, o que o doente mais quer é ficar bom. O normal, portanto, é ter
saúde. A doença deve ser combatida e a saúde procurada.
Para as pessoas de que conseguiram caminhar numa abertura para o
transcendental, a vida, em todos os tempos e lugares, só tem sentido em Deus, o
Criador e Redentor do ser humano. Para os cristãos, Deus não criou o ser humano,
mas o vivifica, anima em todas as suas atividades. A na providência divina às
pessoas a certeza de que o mundo é compreensível.
A visão da pessoa de no cotidiano da vida mostra seus valores, visualizados
pela luz da Palavra revelada por Cristo; chama a atenção, tanto das pessoas quanto da
sociedade, sobre o dever de preservar e promover esses valores
50
. O ser humano é
animado por um espírito que possui e vivifica, intrinsecamente, seu próprio ser,
exprimindo-se através dele. o são duas realidades distintas, mas corpo e espírito
numa única realidade: a pessoa.
49
Pastoral vem de pastoreio: “cuidar”, “zelar”. No cristianismo o “Bom Pastor, o Cristo a vida por suas
ovelhas [...] e as chama, a cada uma, pelo nome”. Como se viu, o que caracteriza a profissão da
Enfermagem é o “cuidar”. O enfermeiro faz parte daqueles e daquelas que lutam pela saúde integral das
pessoas, por isso
deve
anunciar os valores da vida humana, visualizados pela luz das
palavras
de Cristo:
“Eu vim para que todos tenham vida”
e chamar a atenção, tanto dos clientes, quanto da sociedade, sobre o
dever de preservar e promover esses valores.
(PESSINI, 1987:71)
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
152
Deus criou o ser humano destinado à felicidade para ser bonito, saudável,
alegre, feliz predestinado à vida eterna, sem passar pelo sofrimento e pela morte. Por
desviar-se dos planos divinos, o ser humano entrou em caos, com toda a natureza que
o cerca. Experimenta a dor, o sofrimento e a morte; e tem que lutar contra as forças
do mal que desequilibram o cosmo. Necessário se faz ter sempre como meta de
trabalho, a frase do Divino Mestre: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em
abundância” (Jo 10,10). O amor de Deus em nós é um fluir natural, um transbordar
contínuo na vida da pessoa que tem fé. É o primeiro aspecto do fruto do Espírito (Gl
5,22).
Precisa-se entender melhor esse aspecto psicoespiritual, fala-se muito, mas
não se aprofunda. Ver o que é básico na espiritualidade. Acho esses valores
muito confusos para as alunas, o ‘como lidar com a espiritualidade do
outro’. Na realidade não trabalhamos isso. É muito mais fácil prescrever e
identificar cuidados físicos
(Miriam,pesquisa, PEIXOTO:2000).
O enfermeiro, em suas atividades técnicas, se faz profeta e sacerdote Profeta
porque mostra, anuncia e leva ao cliente e/ou doente a Boa Nova da Salvação.
Sacerdote porque ajuda o enfermo a elevar-se e a dar sentido aos problemas
cotidianos, estabelecendo, assim, uma profunda relação enfermeiro/doente. Isto
propicia uma descontração das pessoas e um ambiente familiar com restabelecimento
do equilíbrio psicológico e espiritual.
Com arte e habilidade, o enfermeiro consegue abordar os aspectos espirituais,
levando o cliente e/ou doente a abrir-se não só para Deus, mas, também, para o
próximo, não separando religião da vida. Os valores humanos de solidariedade com o
povo levam a assumir todas as implicações sociais e políticas da fé. Faz-se necessário
segundo os cristãos que: tenha o Espírito de Deus, que renova e sentido a todas as
coisas. Ter significa acreditar que, com a força de Deus-Pai, de Jesus Cristo e do
Espírito Santo, pode-se mudar e transformar a humanidade para melhor. Promover a
vida e a saúde é dever de todo cristão e de toda cristã, de todo enfermeiro que, além
da assistência terapêutica aos doentes, deveria preocupar-se com as suas famílias.
Lembrar sempre que o doente está ligado por laços afetivos aos familiares e às suas
preocupações. Cabe ao enfermeiro humanizar o serviço, sabendo tirar proveito disto
para a reabilitação e recuperação da saúde. O enfermeiro humano é aquele que ouve
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
153
e presta assistência segundo as necessidades imediatas que a pessoa requer. Precisa-se
ser amigo e conselheiro, fazendo o tratamento ser mais de doentes do que de doenças.
O enfermeiro deve cuidar dos clientes e/ou doentes, combater a doença,
restabelecer a saúde, lutar pela erradicação das causas naturais e sociais das
enfermidades, ser um agente de transformação social. E ter, ao mesmo tempo, uma
visão mais ampla, com dimensões no transcendental, revelando-o em suas atividades
profissionais. Reconhecer e mostrar-lhe a beleza das coisas que nos cercam, sob todos
os aspectos, em toda a sua profundidade reveladora da vida que começa aqui e está
destinada à eternidade. Lembramos que a enfermeira é uma grande pedagoga que
ensina através de sua voz e de todos os seus gestos no fazer e no cuidar. Ela presta
assistência ao ser humano que é, ao mesmo tempo, seu cliente.
5.2 Resgate de valores básicos
O mundo vive um momento de grandes transformações científicas,
tecnológicas, éticas, sociais, ecológicas, e sem vida, o principal combustível desses
avanços é a vida humana. E é praticamente impossível entendê-la sem conhecer os
seus caminhos e descaminhos: ameaça de bombas de destruição em massa, catástrofes
ecológicas, clonagem, bio-alimento e outros. Esses são temas cruciais que exigem um
olhar crítico e reflexivo, com implicações tecnológicas, culturais e espirituais em nossa
sociedade,
portanto, na educação em Enfermagem dos novos profissionais. Um dos
descaminhos é, segundo pesquisas por nós realizadas (PEIXOTO:2000/2005), que a
Enfermagem tem deixado em segundo plano a assistência psicoespiritual aos clientes.
Segundo Goldfarb (2004: Sem.I.), necessário se faz determinar mudanças de
importâncias vitais, que darão sentido à vida .
A filosofia de Descartes (1650, apud Goldfarb, 2004: Sem.I) alterou
profundamente o comportamento médico, levando a medicina e “a Enfermagem”
(grifo nosso), com as especializações técnicas e científicas, a se concentrarem na
máquina corporal; progressivamente abandonando o estudo do fenômeno cura,
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
154
menosprezando os aspectos psicológicos, sociais, espirituais e ambientais da doença,
negligenciando, portanto, a essência humana que vivifica o corpo.
Para resgatar o valor integral da pessoa humana, a doutrina cristã se espelha
nas palavras do apóstolo Paulo que compara o corpo a uma residência, a casa, e que
não se pode esquecer que o mais importante na casa é quem reside, o morador: [...]
enquanto moramos no corpo somos peregrinos [...] prefere-se deixar a morada do
corpo, para ir morar junto do Senhor [...] empenha-se em servi-lo, quer esteja no
corpo, quer já tenha deixado essa morada (2 Cor 5,6-10).
Ao longo dos tempos a cura foi praticada por curandeiros populares
51
que
concebiam a doença como um distúrbio da pessoa como um todo. O século XXI é
assinalado pelos avanços técnico-científicos que ajudam o ser humano a equacionar e
propiciar soluções, mas provocam profundos anseios pela liberdade e transcendência.
Sai em busca de uma religiosidade desvinculada do dogmatismo das religiões
tradicionais, como movimento alternativo e que não se deixa prender pelo
dogmatismo científico. A espiritualidade tornou-se uma espécie de monopólio das
terapias alternativas daí o medo de os profissionais de saúde serem taxados como tal
(STANZIANI, 2002:2o).
Desde o século XX, com o “modelo médico” na visão cartesiana, que o
placebo foi deixado em segundo plano. Segundo Stanziani (2002:26),. já existe entre os
profissionais de saúde um anseio de busca por dimensões de experiências religiosas
que os desvinculem dos sistemas religiosos tradicionais e os coloquem na perspectiva
de uma espiritualidade libertadora, adaptada à nova sociedade, vinculada ao
conhecimento tecnológico, por instituições religiosas voltadas para uma visão que
compreenda todas as atividades e crenças de que as pessoas se utilizam para
relacionar suas vidas a Deus, um ente superior divino, ou a uma realidade
transcendente. Entretanto, os esforços dos estudiosos se voltam para definições da
espiritualidade e religiosidade com paradigmas desvinculados da realidade popular.
Acredita-se que a emergência de um novo paradigma se faz necessário concretizar,
51
Cf.capítulo III, crenças religiosas.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
155
não de forma abrupta, mas paulatinamente, em toda a área da saúde, conquistando
espaços e consciências.
Especificamente em relação à prática da Enfermagem, percebe-se o
predomínio do racional em detrimento do emocional, existencial, cultural e religioso.
O novo modo de ser na Enfermagem precisa trazer implicações no cotidiano de seu
ensino. Esse é um desfio para toda a Enfermagem!
Segundo pesquisas realizadas sobre espiritualidade e religiosidade, existem
dois eixos: as crenças dos pacientes e seus efeitos de melhoria ou cura, e as crenças
dos profissionais de saúde, questionando se estão preparados para a temática
espiritual e religiosa em seus contatos com os pacientes. (STANZIANI, 2002:28).
A autonomia do paciente deve ser o eixo condutor para introduzir a
espiritualidade na prática. Compreende-se não ser necessário que a Enfermagem
entenda profundamente da temática, mas que se disponha a acolhê-la na sua prática,
volver essa espiritualidade junto aos pacientes. Um fato narrado por Stanziani
(2002:15) mostra a importância dessa dialética ciência-religião.
Diante do impacto de uma cirurgia de alto risco o médico entrega à paciente
um santinho do Menino Jesus de Praga sugerindo que orasse e alegando que
daí para frente o assunto era com Ele. A paciente demonstrava singular
consideração pelo médico e no efeito significativo de sua recuperação
atribuía particular importância de ter ouvido isso do seu médico. Esperava a
ajuda de Deus através da ciência e convidava o médico a participar disso
(STANZIANI, 2002:33)
.
Em termos científicos modernos, o processo de cura representa a resposta
coordenada do organismo integrado às influências ambientais causadoras de tensão.
Essa concepção de cura compromete um grande mero de conceitos que
transcendem a divisão cartesiana e que não podem ser formulados de acordo com a
estrutura da ciência médica vigente. Por isso, os pesquisadores biomédicos tendem a
desprezar as práticas dos curandeiros populares, relutando em admitir sua eficácia.
Tal cientificismo médico faz com que se esqueça a arte de curar, a razão de ser da
medicina.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
156
Nesse cenário da dialética entre ciência e religião, segundo Stanziani
(2002:13), uma nítida separação entre as idéias da cura científica e cura religiosa, o
que ocasionou historicamente a noção de temas opostos. Entretanto, é preciso
lembrar que antes do cientista e do religioso existe o ser humano, um todo
infragmentável.
São a habilidade e a arte no cuidado e respeito às crendices do paciente que
conduzirão a conduta do profissional de saúde.
A assistência de Enfermagem, além da competência técnica e científica,
segundo Ferreira (2005:45), deve imbuir-se de valores interiores, a fim de garantir a
satisfação das necessidades psicoespirituais, direito dos pacientes em assistência
religiosa, na satisfação de suas necessidades básicas.
5.2.1
Realidades últimas
Neste item, será abordada uma visão geral da essência religiosa do
cristianismo face às realidades últimas: “Porque Ele vive eu posso crer no amanhã”
52
Para os cristãos, a essência do cristianismo é o próprio Jesus Cristo, Palavra viva,
Verbo de Deus encarnado, o Sacramento por excelência, do qual emana toda a
sacralidade cristã. “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava em Deus, e Verbo era
Deus [...] Tudo foi feito por meio dele, e sem ele nada foi feito [...]” (Jo 1,1-18).
O motivo que se leva a falar das realidades últimas, é a esperança que elas
comunicam; motivo de alegria e a certeza promissora do amanhã.
Por que realidades últimas? Mediante quais ciências ou religiões seria possível
“estudar” Deus, se Deus é “aquilo” acima do qual nada mais se pode pensar? Últimas
realidades? Para baixo ou para cima?
Para Rahner (1992:362), a espiritualidade última será a realização do “Sermão
da Montanha!
52
Sentido de toda a vida cristã.
Se Cristo não ressuscitasse vã seria nossa fé
” (1 Cor 15,14-16).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
157
Últimas realidades, aquilo que é “absoluto” em si, “per se”, “é”. O mais
elevado, o mais profundo. O ser humano está sempre na oscilação do limitado e
ilimitado, tendo como pólo a “procura”. Deus está além, transcendente, mais
profundo, o mais fundamental. O limite inatingível, a perfeição, encontra-se no
sobrenatural. Deus é o primeiro, o maior, o mais forte, o absoluto (BURKERT, 2001:41).
O ser humano possui necessidades instintivas, naturais para a prática
religiosa. Pelo fato de possuir esta instância psíquica inata, “o Self”, até a pessoa que se
diz atéia buscará instintivamente uma forma de canalizar e expressar essas
necessidades internas. Se isso não ocorrer de maneira saudável e natural, aparecerá
de maneira distorcida, neurótica ou patológica (BURKERT, 2001:41).
Al Simmns
53
, representando o ser humano moderno e secularizado, elegeu o
Estado, a Ciência e a Tecnologia como seus deuses supremos. No sentido que
queremos atribuir, o esforço significa direcionar a libido voluntária e conscientemente
para reverenciar e ir ao encontro do sagrado, de seu Eu superior ou Self. Para isso, é
necessário vontade e coragem. Coragem é agir com amor (CAMPBELL, 2003:15).
Necessário se faz uma grande dose de humildade. Sem essa não se pode transpor os
limites entre o profano e o sagrado:
hybris
54
O mundo que vemos não é o real.
Emprega-se aqui a Alegoria da Caverna de Platão
55
e o reducionismo: por trás do véu
que esconde a essência da natureza, existem apenas simetria e leis que regem o
comportamento da matéria e suas interações (ELIADE, 1996:40).
Às energias latentes daquela outra caverna, o coração humano insondado, e
o que emanava eram a criação de um templo na história do mundo. Nesse contexto,
um herói cria o aspecto terrível da Grande Mãe, o óvulo fertilizado (CAMPBELL,
2003:11).
53
Uma figura mitológica.
54
Hybris”
é não reconhecer a distinção entre o que é humano e o que é divino. Entre o que é permitido
no plano humano, consciência, e o que permanece como território exclusivo dos deuses. A palavra
esforço
também cabe aqui, pois nesse caminho, nessa divina peregrinação, muitos sacrifícios (
sacros-
ofícios
), precisam ser realizados, começando pela dolorosa descida ao inferno.
Alegoria da Caverna de
Platão:
cf.Capítulo IV,
fé e razão
, rodapé número 245.
55
Alegoria da Caverna de Platão,
cf.Capítulo IV,
fé e razão
, rodapé número 245.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
158
O ser humano é finito, tem acesso a uma parcela mínima do real. A alegoria
da Caverna de Platão retrata bem isso. Estamos submersos num mundo de aparências.
Fazer escolhas subentende um julgamento de implicações seletivas de tudo que nos
rodeia. Pelo simples fato de estarmos no mundo excluímos muita coisa. A essência
do mundo é composta por formas geométricas perfeitas que não podemos vislumbrar
pelos sentidos, apenas por meio da razão (GLEISER, 2001:15).
Questiona-se! Que espécie de encontro entre a natureza e a mente essas
cavernas revelam? E que forças têm para evocar tais imagens?
Parece que a caverna evocava a maneira de um estímulo que poderá gerar, a
cada nova submersão nas camadas mais profundas e obscuras desse grande útero (ou
inconsciente), uma nova condição da consciência, a cíclica e inconsciente penetração
no “Útero Inconsciente [...]”. E os fins dos tempos de nossa existência, a morte? O valor
das religiões nas suas formas de transmissão cultural e nas confissões dos seus
membros consiste, em ligar-se com a preocupação última, adaptando-se à passagem
biológica desta vida para a outra, com a morte (GLEISER, 2001:15).
A morte como fenômeno natural, embora agressiva, é a comprovação
inquestionável da finitude do ser humano. Morrer é algo exclusivamente pessoal, por
isso solitário. “Morre-se só,” diz Pascal (1662, apud ARDUINI, 1999:43). Ninguém pode
delegar o seu morrer. Faz parte da vida o morrer. Todos nós estamos destinados a essa
transmutação. Entretanto, muito mais do que prantear a morte é atalhar ou reduzir o
avanço do morrer indevido.
O grande impasse é o morrer antecipado que esem questão no mundo. O
morrer que está incluído na vida e que devora os viventes. Todos os fatores que vão
consumindo a vida abastecem o morrer. O morrer pode vir desde a fase embrionária
pela mãe que transmite deficiências ao ser humano: carências orgânicas, psicológicas
e socioeconômicas. O trabalhador está morrendo quando lhe impõe esforço excessivo
ou espoliação social. A criança começa a morrer quando lhe falta o leite para seu
sustento, quando debilitada por parasitas, quando lhe é negada a educação. O ser
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
159
humano está morrendo quando é obrigado a viver em condições infra-humanas.
A
morte que se explica pela idade é natural; ao contrário, é antinatural, indevida,
antecipada. É direito fundamental, é dever resistir à devastação do morrer, denunciar
o morrer compulsório e consolidar o existir pessoal e coletivo (ARDUINI; 1999:40).
Segundo Boery (1994:136), nestes momentos, a presença constante da
Enfermagem deveria ajudar a reverter os quadros patológicos ou devolver a paz e
tranqüilidade às pessoas.
Segundo Arduini (1999:43), para proteger a vida mental do desespero e da
depressão que são realmente letais, devem existir forças contrárias: otimismo, ou
ópio. Essa medida poderá ser a necessidade última da partilha, de mundos fictícios
que empregam a seriedade e o terror para contrair os medos mundanos, de hierarquia
que se eleva até o absoluto.
Diante da morte, o maior medo do ser humano é o medo
de “Deus”. Essa preocupação negativa da religiosidade é uma pista que pode nos fazer
voltar para a verdadeira causa, a vida. A aquisição da vida é a auto-reprodução, a
auto-regulação e a homeostasia. Daí que os deuses sejam as mais persistentes garantias
da ordem, e os mais enérgicos reguladores da vida.
O limiar que separa os dois
espaços indica ao mesmo tempo, distância entre os dois modos de ser profano e
religioso .
Questiona-se: a morte seria o término definitivo e total? Nada além desse
momento? Não seria possível transcender a morte e perpetuar o ser além do túmulo?
A transcendência evita que o ser humano seja totalmente prisioneiro de sua
fragilidade. De certo modo, compensa as restrições da finitude, é superação
ontológica. É o ir-além ascensional. É passagem de um nível para outro. O salto que
alcança o outro degrau. É o inextinguível que sobrevive às cinzas. É ultrapassar fases,
transpor barreiras, remover limitações, abolir servidões. Cada novo passo é a
ultrapassagem do passo anterior. Pela transcendência, o ser humano se desloca de
uma situação para outra, atravessa etapas culturais, soluciona dificuldades, reergue
mastros tombados, reacende esperanças apagadas, desata nós e abre espaços, repara
fracasso e vence crises.
Quando o ser humano cristaliza seu ciclo cultural numa
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
160
situação social ou fase histórica, anula sua capacidade de caminhar, transcender. A
transcendência tanatológica procura superar a finitude existencial histórica.
Transcender após a morte é cultura arraigada dos povos. O anseio do ser humano de
transcender após a morte lhe a certeza da vida trans-histórica. Quanto mais a vida
se aperfeiçoa, tanto mais interioridade consistente adquire. Sem excluir a alteridade, a
vida intensifica-se no movimento ascendente de interiorização. Assim, o ser humano
vai edificando seu “Eu”, irredutível e inconseptível. A aproximação da morte angustia
o ser humano que busca seu apoio no transcendente (ARDUINI, 1999:42).
Segundo Eliade (1996:127), enfrenta-se o medo do caos, munido de orações,
rituais, promessas e objetos sacros, com a convicção de que a vida ultrapassa a
matéria, na doença e mesmo na morte.
É esse “Eu” que tende a ser inextinguível no desfecho do morrer. Cessam as
dimensões humanas com a ruptura do morrer, mas não se aniquila a totalidade do ser
humano. Este passa por transformação substancial, transmutação, perdendo parte das
conotações existenciais, e assume novo modo de ser. A corporeidade cessa de existir;
o ser humano perdura no existir, com referência material transfigurada. A reflexão
filosófica mostra que não é impossível ao ser humano transcender a própria morte,
através do existir transformado. As expressões culturais dos que terminam essa vida,
sempre atestam que os mortos não desapareceram inteiramente, mas que ainda
vivem, agem e se comunicam. Acredita-se que o morto pode exercer alguma função
sobre os que permanecem na vida. O cuidado, a reverência e o ritual com que se
sepultam os mortos revelam a crença na continuidade da existência após a morte
(ARDUINI, 1999:43).
5.3
Encontro com o Sagrado
Neste item tem-se um enfoque de algumas experiências cristãs sobre a
“espiritualidade e a mística,” e “o crer e aprender”.
Segundo Capra (1982:26), o sagrado es presente em todas as épocas e
atividades da existência humana, invocado ou não, consciente ou inconsciente,
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
161
escondido ou negado. Quanto mais livre é o ser humano mais ele tem consciência da
presença de Deus. E é esta Causa Primeira que sacraliza o cotidiano do ser humano,
em qualquer lugar ou tempo onde ela se manifesta; aflorando no mais íntimo das
pessoas humanas, a fé no sagrado. Portanto, o sagrado é uma relação humana com as
origens, assim como com tudo que o cerca.
Leonardo Boff (1976:158) afirma que “quem experimentou o mistério de
Deus, vive a transparência de todas as coisas e celebra o advento de Deus em cada
situação da vida”.
5.3.1
Espiritualidade e mística
Espiritualidade cristã é a vida no Espírito Santo ou a própria vida cristã
orientada para Deus, através de Cristo, no Espírito Santo. São as diferentes maneiras
pelas quais se experimenta o Transcendente. Parte-se do princípio de que o encontro
com Deus dá-se no encontro com o outro e, de forma especial, com os mais carentes e
necessitados. A realidade é tão evidente e tão positiva, presente e na vida do crente,
que não necessita de demonstrações e provas. Se o ser humano pensa Deus ou tem
uma intuição de algo que supera totalmente a sua imaginação, é porque ele se
encontra no interior do pensamento divino (COMBLIN, 1996:11).
Considerando a passagem evangélica em que Jesus, olhando para os que
estavam sentados ao seu redor, disse: “quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão,
minha irmã e minha mãe”, pergunta-se: e o que é fazer a vontade de Deus?
O século XXI está empenhando em erradicar a dor na vida do ser humano. O
hedonismo nos tem levado a buscar a saúde perfeita, a eterna juventude, a prolongar
a plenitude das forças o maior tempo possível. Contrapondo-se a esse projeto,
aparecem às enfermidades, a dor, a desolação se converte em algo amargo,
inaceitável. Donde vem essa pretensão de perfeição, se o ser humano é limitado, e se
surpreende com a Aids, e outras enfermidades semelhantes? A ciência e a técnica não
conseguem pílulas para o mal imediato? Onde se situa a ciência ante a ineludível
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
162
realidade da morte? Por que o gênero humano não consegue fugir da realidade da
Cruz (HYOS, 2001:14)?
A dor e a enfermidade fazem parte do mistério do ser humano. Certamente, é
justo lutar contra as enfermidades porque a saúde é dom de Deus, mas, segundo a
doutrina cristã, é importante, também entender quando os desígnios de Deus, o
sofrimento batem em nossa porta. Jesus não era masoquista, mas se submeteu à dor. A
base do entendimento do sofrimento cristão está expresso na frase de Jesus: “Quem
quiser vir após mim, negue a si mesmo, tome a cruz de cada dia, e siga-me” (Mt 16,24).
O sofrimento, segundo João Paulo II (1984:31), é verdadeiramente
sobrenatural, porque se enraíza no mistério divino da redenção, e é profundamente
humano porque o ser humano encontra, a si mesmo, sua própria humanidade, sua
própria dignidade e missão.
O sofrimento humano é, muitas vezes, uma expressão de amor pelo ente
querido. Amor e dor são um binômio estreitamente unido na fé cristã. A dor sem amor
gera amargura e desespero, revolta. O amor sem dor é frágil, superficial, incompleto.
A dor é também um caminho de esperança graças à Ressurreição de Jesus
Cristo. A dor não é o fim da existência humana, mas sim um passo, uma Páscoa de
salvação. A dor é salvífica e, quando tem o sentido de eternidade, é sinal de esperança
para o mundo de hoje (HYOS, 2001:15).
Segundo Cerqueira, (2006: comunicação oral), somente o amor pode ajudar-
nos a encontrar um sentido para a experiência humana do sofrimento.
A espiritualidade da vida cristã se resume no Amor. É o amor que deve
direcionar as ações do crente. Na Primeira Carta de Paulo aos Coríntios (12,31-13,13),
tem-se um resumo da importância do Amor na vida das pessoas. Acrescenta-se, aqui,
de um modo especial, do profissional de saúde
56
.
56
Se eu falasse as línguas, as dos homens e as dos anjos, mas não tivesse caridade, eu seria como um
bronze que soa ou um sino que ressoa.
Se eu tivesse o dom da profecia; se conhecesse todos os mistérios e
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
163
5.3.2
Crer e aprender
Como Deus aparece no mundo técnico-científico?
Se Ele aparecesse como um fenômeno no cosmos seria objeto de análise de
ciência, e não o Deus absoluto. Ele “está e é” totalmente ausente. Todo saber e todo
poder es sustentado por um não-saber e um não-poder. A ciência emerge de um
Mistério. O Deus mistério está no mundo técnico-científico, mas retraído, silenciado,
como as raízes de uma árvore, no silêncio da terra, oculto. Deus emerge na vida, vem
misturado com as coisas; emerge na experiência com o outro (BOFF, 1999:140).
Cada pessoa é única. Nela sou convocado para um Transcendente e posso
descobrir uma transcendência viva.
Para Leonardo Boff, (1999:158) o ser humano é um mistério que, em sua
profundidade, um além constitui a permanente “diafania de Deus” no mundo. Por isso
é o maior sacramento de Deus. Daí provem toda a sacralidade da pessoa humana e a
identidade afirmada por Cristo entre o amor ao próximo e o amor a Deus. A pessoa é
um mistério! Nela, descobrimos uma transcendência viva, um mistério que antecede a
todo conhecimento e se mostra maior que a pesquisa antropológica. O ser humano é
analisável pelas ciências humanas, mas permanece algo não dito, não decifrado. Ele
fica sempre além, e se conseguirmos superar a ótica científica, surpreenderemos o
mistério da pessoa que presencializa o Mistério maior-Deus.
“Tira as sandálias dos pés, pois o lugar onde pisas é sagrado” (Ex 3, 6).
toda a ciência; se tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, mas se não tivesse caridade, eu não
seria nada.
Se eu gastasse todos os meus bens para sustento dos pobres, se entregasse o meu corpo às
chamas, mas não tivesse caridade, isso de nada me serviria.
A caridade é paciente, é benigna, não é invejosa, não é vaidosa, não se ensoberbece; não faz nada de
inconveniente, não é interesseira, não se encoleriza, não guarda rancor; não se alegra com a iniqüidade,
mas se regozija com a verdade. Suporta tudo, crê tudo, espera tudo, desculpa tudo.
A caridade não acabará nunca. As profecias desaparecerão, as línguas cessarão, a ciência desaparecerá.
Com efeito, o nosso conhecimento é limitado e a nossa profecia é imperfeita. Mas, quando vier o que é
perfeito, desaparece o que é imperfeito [...] Atualmente permanecem estas três coisas: fé, esperança,
caridade. Mas a maior delas é a caridade.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
164
Aqui, segundo a doutrina cristã, aplicam-se as palavras do próprio Jesus: “Isto
é meu Corpo [...] isto é meu Sangue”, Jesus, o Filho de Deus encarnado, antes de
morrer prometeu aos discípulos estar com eles todos os dias ao final dos tempos e
deixou seu próprio “Corpo e Sangue” como alimento (Mt 26,26). Mistério de Amor de
um Deus que se fez homem.
A esse “Corpo” e a esse “Sangue” fazem parte “todos os corpos” e “todos os
sangues” daqueles que através dos tempos estão unidos a Cristo. São todos, às vezes,
até sem saber, que fazem o bem, praticam a justiça, lutam pela vida, pela paz. Esses
são os chamados Filhos e Filhas de Deus. O próprio Cristo perguntou a Saulo no
caminho de Damasco, cidade da Grécia (At 9,4): “Por que me persegues?”, referindo-se
aos cristãos, incluindo-os em seu “Corpo” e em seu “Sangue” todos os fiéis.
Importante se faz lembrar aqui nessa visão holística cristã que Cristo morreu
“por todos”, por toda a humanidade, e não só pelos cristãos (Rm 8,14-17). Logo,
cristamente se pode afirmar que “Corpo” e “Sangue” de Cristo somos todos nós unidos
a Ele, são todos os que estão bebendo o cálice do sofrimento do dia-a-dia dos
marginalizados, dos que passam fome, dos que são esmagados pela selvageria do
capitalismo, dos que estão crucificados pela dor e pelo sofrimento de doenças.
Dever-se-ia ter o mesmo respeito pelo “Sangue” das pessoas atropeladas nos
asfaltos, e o “Sangue” de Cristo transubstanciado que cai na toalha branca do altar no
momento Eucarístico (comunicação verbal)
57
. Os ministérios são diferentes para:
o sacerdócio do Altar que cuida do “Corpo” e do “Sangue” de Cristo transubstanciados
no altar;
e o sacerdócio dos profissionais de saúde, nos hospitais, no cuidado do “Corpo” e
“Sangue” de Cristo, na pessoa do enfermo.
No fundo ontológico, existe a misteriosidade da vida humana. É Deus em
contínua comunicação e autodoação na história humana, através de cada pessoa. É o
mistério de um Deus Amor! (BOFF, 1999:159).
57
Homilia de Dom Pedro Casaldáliga, no Congresso Eucarístico em Vitória, E.S, 2001.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
165
Segundo Boff (1999:158), fazer experiência do amor é aquilo que acontece em
nós, mas é maior do que nós. Se amarmos em outra pessoa a beleza, a inteligência, a
meiguice, a bondade, a sintonia com nós mesmos, não amamos a pessoa, mas alguma
coisa da pessoa. O amor é gratuito. Amamos o mistério da pessoa que se manifesta
em suas dimensões. Boff questiona: “Será que o facíneo do amor, não é porque es
em jogo o mistério do amor, o facínio da Transcendência viva, isto é, Deus mesmo?”
O amor humano esa serviço desse amor maior: a pessoa é a manifestação
encarnada do Deus Amor, na história humana. É possível aproximar-se de Deus a
partir da experiência humana do amor (1ª Jo 4,4,8).
Cada ser humano, por mais miserável que seja, não pode apagar a
transcendência que se lhe revela no semblante. É sempre maior que todos os seus
crimes; ou impulsos de amor e mística. Deus surge na experiência do outro. Diante do
outro, não estou diante de um objeto catologável. Cada pessoa é uma, única e
irrepetível no cosmos. Antes que se formasse as areias das praias [...] Deus está
presente na trama de toda a existência. Emerge-se, torna-se ad-vento e e-vento.
Podem acontecer momentos de gratuidade nos quais o ser humano reconhece Deus
em sua vida. Apesar dos conflitos insuperáveis, irrompe uma harmonia, uma quietude
interior. Deus pode emergir na vida das pessoas apesar dos descaminhos e das crises
humanas. Ele se irrompe na pessoa como o Absoluto, revela-se! E essa oportunidade é
a experiência mais gratificante da vida. A pessoa sentirá a necessidade de agradecer e
de voltar-se para Deus. Na fé cristã o Transcendente se fez finito e imanente como uma
parte de nosso mundo. A aceitação e o perdão de Jesus de Nazaré são igualmente os
de Deus, afirmações que podem ser escândalo para as filosofias e teologias apofáticas.
[...] a cristã tem uma relação intrínseca com a educação [...] relação entre
crer e aprender. Crer significa aprender, uma vez que a relação com Deus
necessariamente deixa suas marcas no ‘ser humano’. Através desta relação
ele questiona a sua situação no mundo, pergunta pelo significado e sua vida,
enfim, é desencadeado um processo de aprendizagem. Da mesma forma, na
base da aprendizagem está a predisposição de se abrir ao novo, uma atitude
de confiança, que é também o fundamento da . [...] a fé cristã pode
articular-se com a pedagogia na busca de seu alvo maior, ou seja, ‘a vida
plena ou abundante’. A partir desta articulação, constituem-se perspectivas
pedagógicas com características próprias, resultantes de uma reflexão na
qual a teologia entra como uma das fontes
(STREK, 1994:13)
.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
166
Os enfermeiros professores do curso de Enfermagem, no exercício do
magistério, ao ministrarem as disciplinas curriculares, podem valer-se de sua cristã
na busca de seu alvo maior; dessa “vida plena”. Baseados nesta articulação, podem
deixar transparecer, na educação em Enfermagem, esta dimensão religiosa cristã da
assistência psicoespiritual às pessoas.
Martin Palmer (1945, apud STRECK, 1999:13) distingue três fatores que
contribuíram para este envolvimento da
teologia com a educação
:
A fé cristã, desde cedo, colocou dois livros como seu fundamento: o livro da natureza e o
livro de Deus
, evitando oposição entre conhecer a vontade de Deus e explorar os
mistérios da natureza.
Através da razão, observando a natureza e estudando-a, pode-se chegar a Deus. Esta
visão teológica, de grande influência na história do cristianismo, reforça a idéia de que o
mundo pode ser encarado como esfera legítima de atuação cristã, havendo assim,
condições
para as ciências emergirem naturalmente, sob ou ao lado da teologia.
Basta
lembrar que as primeiras universidades surgiram junto aos mosteiros.
No Antigo Testamento
Deus
é, freqüentemente, apresentado como o
educador primeiro
,
do qual deriva toda autoridade dos demais educadores. O Novo Testamento apresenta
Jesus como o mestre
, do qual todos os demais podem ser discípulos
58
O mundo é
apresentado como uma contínua criação de um
Deus que se compraz com a renovação
e com a melhora da qualidade de vida.
Neste contexto o ser humano é desafiado a usar
os seus dons na participação deste processo criativo.
Entende-se que
saúde
, em primeiro lugar, depende do contexto social onde o
ser humano vive; então, saberíamos valorizar mais essa assistência integral às pessoas.
Na escola fala-se muito, mas depois que formam não põem em prática. Tem
exceções, mas a maioria age diferente do que aprendeu, não muita
importância à parte espiritual. Tem ficado em segundo plano. Está meio
pobrezinha, tem que melhorar. Eu pessoalmente acho que preocupo mais
com o físico, principalmente quando o paciente está grave. A gente peca’
por isso. Preocupo mais com o organismo, embora saiba da importância do
espiritual
(Elke, pesquisa, PEIXOTO:2000).
Será que a Enfermagem perdeu seus valores principais, assumindo coisas
demais? O “cuidar” não convive nem com excesso, nem com carência; ele é o ponto
ideal de equilíbrio entre um e outro. A tarefa da Enfermagem é construir esse
equilíbrio com autocontrole e moderação, mas, sobretudo, com a ajuda do Espírito de
vida que nunca falta, porque Ele é o equilíbrio dinâmico.
58
Lembrando que o
Antigo e o Novo Testamento
não representam o mundo como um sistema
fechado, criado em algum momento do passado remoto por um ser todo-poderoso e desde então
entregue à própria sorte (STRECK, 1999:13).
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
167
Segundo Paulo Freire (1983:27), é impossível fazermos uma reflexão sobre
educação sem refletir sobre o próprio ser humano. Fazendo um estudo filosófico-
antropológico, começando em nós mesmos. Encontrar em nossa natureza o núcleo
fundamental onde se sustenta o processo de educação.
O ponto chave para mim na Enfermagem,é a questão da ‘humanização’:
entender o ser humano, no ‘cuidar’. Quem lida com máquinas, não precisa
disso; mas para quem lida com gente, é fundamental
(Talitha, pesquisa,
PEIXOTO:2000).
A “humanização” consiste em tratar cada ser humano como gente, como
pessoa, em suas quatro dimensões, como vimos, e o que caracteriza a Enfermagem é
justamente o cuidado integral. Sem este, a Enfermagem perde o sentido de ser. Ao
“cuidar” do corpo, a enfermeira precisa estar atenta ao “sopro” que o anima. Sem o
cuidado integral, o encaixe do amor não ocorre, não se conserva, não se expande
nem permite a consorciação entre os seres. Sem o cuidado, não atmosfera que
propicie o florescimento daquilo que, verdadeiramente, humaniza: o sentimento
profundo, a vontade de partilha e a busca do amor, da cura.
A pessoa não é formada de partes dissociáveis do todo; quem cuida de
alguém, cuida do todo, da integralidade. O “cuidar” deve ser entendido na linha da
essência humana. O cuidar de estar presente em tudo, pois o ser humano é,
essencialmente, um ser de necessidades físicas, sociais e espirituais, portanto um ser
de cuidados, sua essência se encontra no cuidado.
Sob essa ótica, tem-se a pretensão de resgatar o significado radical da
Enfermagem, convidando os enfermeiros deste século, tentados pela desesperança,
mas fascinados pela utopia, a fazer um salto antropológico originante que redirecione
o destino da evolução técnico-científica da Enfermagem.
A Enfermagem precisa buscar um tempo a mais para ouvir as pessoas, saber
escutá-las; dar presença nos momentos difíceis, ser sensível às situações
críticas dos pacientes. E quando não se faz essa correlação com a religião, a
ética se torna fria demais: “É preciso fazer isto”, Aquilo não é correto”. No
entanto esses “ensinamentos religiosos” precisam ser ensinados na
Enfermagem, não de determinada religião, mas sim de todas que trabalhem
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
168
para o bem das pessoas. As pessoas estão precisando de gente mais humana.
As máquinas laboratoriais dão respostas precisas no diagnóstico: se está com
AIDS ou não. Mas quem vai dar essa notícia, quem vai dar o conforto, quem
vai ser amiga nessa hora? A Enfermagem tem que resgatar isso, no
entendimento de ser sensível às situações crítica do paciente
(Talitha,
pesquisa, PEIXOTO:2000).
Muitos doentes nas filas dos hospitais públicos, do Instituto Nacional de
Serviços de Saúde (INSS), em busca de dignidade de vida, lutando pelo fim de
preconceitos contra os pobres e, mesmo, de doentes, e de um atendimento digno, com
a ajuda humanitária de enfermeiros, não desanimam e acabam descobrindo o Deus da
Vida revelado em Jesus Cristo, em sua pessoa e mensagem, através de profissionais que
transmitem essa força interior. É nesta experiência de acolhida e valorização humano-
divina que se pretende revigorar, na educação em Enfermagem, os valores
psicoespirituais da assistência aos clientes.
O “cuidar” da Enfermagem, mais do que ciência e técnica, exige uma filosofia
do ser e uma reflexão espiritual que nos falem do sentido da vida do ser humano. O que
é o “cuidar”? Segundo Leonardo Boff (1999:33), é um ato, é uma atitude, portanto
abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma
atitude de ocupação, preocupação, de responsabilidade e de envolvimento afetivo com
o outro. É uma dimensão frontal, originária, ontológica, impossível de ser totalmente
desvirtuada. Por sua própria natureza, o “cuidado” inclui duas significações básicas
intimamente ligadas entre si: a atitude de desvelo, de solicitude, de atenção para com o
outro, e a de preocupação e de inquietação, porque a pessoa que “cuida” deve se sentir
envolvida e afetivamente ligada ao outro; portanto não tem sentido dar assistência
psicofísica, omitindo a psicoespiritual.
O enfermeiro precisa de arte e habilidades para abordar os aspectos
espirituais, levando o cliente e/ou doente a abrir-se, não só para Deus, mas também para
o próximo, não separando religião da vida; os valores humanos de solidariedade com o
povo, que levam a assumir todas as implicações sociais e políticas da fé.
Nós, como pessoas, não somos formadas de partes dissociáveis do todo, quem
cuida de alguém, cuida do todo, da integralidade. O “cuidar” deve ser entendido na
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
169
linha da essência humana. O cuidar de estar presente em tudo, pois o ser humano é,
essencialmente, um ser de necessidades físicas, sociais e espirituais, portanto um ser
de cuidados, sua essência se encontra no cuidado.
A consciência antropológica do ser humano lembra algo de íntimo e secreto.
O que a define é a interioridade de todo o ser. A interioridade é processo original que
aguça a percepção e amplia a transcendência do ser humano. É a habitação noética
dos seres. O ser humano comparece a si mesmo, e faz com que o mundo que o
envolve, adquira estado de comparecimento hermenêutico. As realidades, tornam-se
transparentes e significativas. A consciência é consciência de si e do mundo.
A
consciência permite ao ser humano dilatar-se e superar seus próprios limites.
Consegue ser aquilo que não consegue por condição nativa. Carrega conteúdo
misterioso, ameaçador e explosivo. Para um povo, o maior desastre é o funeral da
consciência. Porque a consciência garante a identidade pessoal. Perder a consciência
é perder-se. É desidentificar-se. A consciência é o olhar obstinado que rasga clareiras
na espessura do ser antropológico, em busca de sentido. Poder falar é poder elevar-se
acima dos próprios limites. Ao dizer-se, o ser humano apropria-se de um mundo que
lhe parecia estranho e hostil. Através da expressividade, consegue recuperar o ser que
lhe fugia quando a palavra estava bloqueada (ARDUINI, 1999:14).
A beleza é a harmonia que construímos no cotidiano de nossas vidas e que
permanece nos dias que passam. Ela é o fruto da recompensa de nosso esforços. Isso
vale para as Ciências da Religião, pois a recompensa última, a
parusia,
é o desfecho de
todos os sonhos do dia-a-dia.
As ações de Enfermagem têm enfoque biológico e acentuado cunho técnico
no cuidado do ser humano, porém, quando se estabelece a proximidade tanto como
psicossocial como psicoespiritual, transforma nossa vida dentro e fora dos serviços de
saúde nos quais prestamos a assistência de Enfermagem.
Diagnósticos iguais, mas histórias distintas, dores diferentes, feridas
aparentemente parecidas. Todo dia, emoções novas a serem vividas com muito
trabalho, pouca gente, às vezes com escassez de material e a incerteza de quantas
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
170
pessoas ali entrariam e como chegariam. Tudo isso em meio a muita rapidez e atenção
extremas, a fim de evitar erros de toda a equipe, pois a vida dos pacientes está em
mãos dos enfermeiros literalmente. Eis o que se registra, de um modo geral, na rotina
hospitalar!
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
171
C
ONCLUSÃO
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
172
C
ONCLUSÃO
A civilização se impelida a legitimar a sua relação com a natureza e a
relação entre todos os seres humanos em termos de razão. Ou se adere aos critérios
holísticos que devem presidir a relação dos seres humanos com a natureza e entre si, e
se chega à sociedade sensorial, ou ao imenso potencial destrutivo acumulado nos
mísseis atômicos que poderão destruir, irremediavelmente, a efetivação de uma
civilização do logos (VIEIRA, 1986:31).
Na área de saúde, o avanço tecnológico ao mesmo tempo em que
contribui, também coloca em risco toda espécie de vida do planeta. Em vez de uma
emancipação humana, teríamos aniquilação.
O Brasil apresenta profundas desigualdades sociais, desequilíbrios
construídos ao longo de sua história econômica e social, com raízes no colonialismo e
escravatura. O processo de industrialização e o crescimento do Produto Interno Bruto
(PIB)
per capita
, contribuem para agravar a concentração de renda e as desigualdades
sociorregionais (PAIVA, 1999:A23).
Hoje, mais do que nunca, a humanidade dá-se conta de que, grande parte
dos problemas de doenças decorre de desequilíbrios psicossociais, religiosos e
ambientais, gerados pela fome, pela miséria, pelo desemprego, pela violência e pelas
injustiças estruturais. Se, se negligencia um desses aspectos humanos, perde-se de vista
a perspectiva integral.
Pensar saúde exige o entendimento do contexto em que se insere o ser
humano.
Consta no livro do eclesiástico (30,14-17) que “a saúde e uma boa
constituição física valem mais do que todo o ouro”. E Pessini (1988:23) afirma que: a
civilização de um povo é medida pelo seu comportamento em relação à saúde. Pode-
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
173
se afirmar que a política de saúde é o método mais adequado para medir tal
comportamento. Lembra que: a mortalidade infantil, a atenção aos deficientes e
velhos e a média de vida são todos indicadores do nível socioeconômico e cultural de
uma sociedade.
O setor saúde brasileiro passa por uma mudança de paradigmas. O Sistema
Único de Saúde criado a partir da Constituição Federal de 1988 se expande no país.
Possui os princípios de universalidade, garantindo a todos o direito ao atendimento, à
equidade considerando, que apesar da existência de grupos que vivem de forma
diferente, todo cidadão é igual perante o sistema de saúde e o princípio da
integralidade no qual as ações devem ser combinadas e voltadas ao mesmo tempo
para prevenção e a cura. Conforme este princípio, os serviços de saúde devem
atender o indivíduo como um ser humano integral, não devendo este ser visto como
um amontoado de órgãos, como coração, fígado, pulmões, e solto no mundo. Isto
significa que o ser humano é um todo, inclusive com suas relações com os outros e
com o mundo. Seu atendimento, portanto, deve ser dirigido para a sua saúde e não
somente para as suas patologias.
Os profissionais de saúde precisam estar preparados para todo esse desafio.
Isto colocado, considera-se que a Enfermagem não pode perder seu sentido de ser,
cuidando somente do aspecto psicobiofísico dos pacientes.
Capra (198226) aborda o pensamento cartesiano na Biologia, na Medicina,
na Psicologia e na Economia, expondo a abordagem limitada aos problemas
orgânicos, mas antevê grandes perspectivas para o futuro e aponta uma nova visão da
realidade que envolve mudanças radicais em nossos pensamentos, percepções e
nossos valores.
A saúde no sentido ideal qualifica as quatro dimensões da pessoa,
formando um conjunto inseparável: a saúde psicobiofísica, a saúde psicossocial e a
saúde psicoespiritual. Este estudo levanta-se uma suspeita de que os profissionais se
preocupam mais com o físico, sobretudo quando a doença paciente está grave,
embora saibam da importância do espiritual.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
174
Exige-se da Enfermagem um preparo para confrontar no seu dia-a-dia,
pessoas de raças, cor, credos,
status
social e culturas as mais diversificadas. E o que é
pior! Vai quem não gostaria de ir. A revalorização das bases espirituais na formação
dos profissionais de Enfermagem pode contribuir para uma melhor assistência neste
aspecto.
O ser humano busca sempre ser feliz, livre, viver em paz. Construimos a
todo o momento o nosso próprio “eu”, conhecendo, confrontando-nos e assimilando
novas experiências de crenças e valores com as outras pessoas.
Acredita-se que todo ser humano gosta de amor, carinho, compreensão
(VILELA, 1996:209).
A pessoa enferma nas diferentes instituições de saúde precisa de ajuda
humanitária, de enfermeiros que a entendam, pois está em busca de dignidade de
vida. É nesta experiência de acolhida e valorização humano-divina que se deve
revigorar, na educação em Enfermagem,
os valores psicoespirituais para a assistência
aos clientes.
A Enfermagem é uma profissão, é ciência, á uma arte que tem como
objetivo dar assistência integral ao ser humano. Desenvolveu-se em resposta às
necessidades das pessoas se prestava cuidados, tendo como base da profissão a crença
no valor da pessoa, através do respeito no atendimento de suas necessidades básicas.
Como profissão da área da saúde, é liberal, cujo objetivo principal é a defesa da vida,
da dignidade humana; tem como ideal cuidar da integridade do ser humano. O que a
caracteriza, é justamente esse “cuidado” integral das pessoas que assiste, sem o qual
essa profissão perde a razão de ser. Traz em si, uma dimensão religiosa cristã que vem
de suas origens: de mulheres da sociedade, convertidas ao cristianismo, pioneiras da
Enfermagem nas comunidades primitivas e das congregações religiosas de irmãs de
caridade.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
175
Por outro lado, é difícil para a Enfermagem, oferecer assistência
psicoespiritual aos clientes se não dispuser de tempo. Quando o cliente percebe que a
enfermeira está com pressa, ele se inibe e se fecha em si mesmo. E se é interrogado,
não tem espontaneidade de falar de suas necessidades. Ter mais tempo para ouvir as
pessoas é indispensável à Enfermagem.
Docentes e discentes reconhecem a importância dos valores religiosos
cristãos na formação dos profissionais de Enfermagem; vêem a importância de “dar
mais presença aos clientes, nos momentos difíceis”; reconhecem que, o que
caracteriza a profissão é a assistência integral ao ser humano; consideram que a
assistência psicoespiritual tem ficado em segundo plano; que a Enfermagem es
despreparada para prestar este tipo de assistência aos clientes e que precisa se reciclar.
Entre as propostas dos docentes neste estudo inclui o tratamento desta
temática com urgência em todas as disciplinas, inclusive na prática.
Sendo a atenção psicoespiritual ao ser humano uma das finalidades da
profissão da enfermagem, não pode ser omitida nem acontecer por acaso: necessário
se faz capacitar os profissionais para revigorar, dar ânimo aos enfermos, pois a doença
e o sofrimento, como se sabe, são manifestações ameaçadoras que geram medo e
ansiedade aos enfermos, pelo perigo real ou imaginário da vida (PESSINI, 1988:13).
Gauderer (1994:15), afirma que, para o profissional de saúde, o importante
não é a doença ou o doente, mas a pessoa, o indivíduo que se tornou um paciente por
ser portador de uma doença, contra sua vontade
,
O “cuidar” da Enfermagem exige mais do que ciência e técnica, exige uma
filosofia do ser e uma reflexão espiritual que nos fale do sentido da vida das pessoas. A
conscientização é Páscoa, segundo o pedagogo Paulo Freire (2003, apud
STRECK,
1994:29), porque exige morrer para renascer.
Sem “o cuidado” não atmosfera que
propicie o florescimento daquilo que, verdadeiramente, humaniza: o sentimento
profundo, a vontade de partilha e a busca do amor, da cura. Como pessoas não somos
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
176
formados de partes dissociáveis do todo: quem cuida de alguém, cuida do todo, da
integralidade.
PEIXOTO (2000) encontrou que as pessoas que possuem força espiritual
conseguem uma recuperação mais rápida. A grande quantidade de informações,
mudanças científicas e tecnológicas requer da Enfermagem novas perspectivas e
compreensão do ser humano. Entretanto, na busca constante de um profissionalismo
melhor, parece que está ocorrendo um descuido e descaso com a assistência íntegra
ao ser humano.
O processo de formação necessita recriar para inovar técnicas pedagógicas
para a prestação de assistência integral às pessoas, coerente com os avanços
científicos. Questiono: de que adianta sermos bem técnicas, empregarmos todas as
nossas energias no desempenho técnico, se na fisionomia do paciente está expressa a
sua carga de tristeza interior pelas necessidades mal conduzidas?
As questões levantadas em nossa pesquisa de campo abrem espaço para
possíveis pesquisas:
Como cuidar das pessoas que não m fé, para que se beneficiem de uma recuperação
mais rápida?
Ao cuidar do paciente que tem , como deve ser a atitude do profissional de Enfermagem
que não acredita no transcendente
?
Na profissão da Enfermagem, os valores religiosos servem de
suportes
para
dimensões de vida das pessoas: no dia-a-dia, na doença, no nascer e no morrer.
Atualmente, mais do que de remédios, precisa-se de pessoas que saibam
ouvir, de profissionais voltados à prevenção, à saúde da família e ao indivíduo como
agente ativo no processo de cura.
Ser profissional do setor saúde é muito mais do que tratar de doenças e
fazer curativos; é a notável capacidade de entender o indivíduo de forma ampla e
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
177
complexa, e, além disso, de atender às necessidades básicas desse indivíduo e
promover sua saúde.
Cada pessoa é um ser único, original, fala à sua maneira, a sua linguagem,
palavras simples ou eruditas, mas são
palavras e gestos
que se não forem expressadas
vão ficar em carência, porque são insubstituíveis.
São inúmeros os fatos que poderiam nos tornar mais humanos.
Por que não quebrar uma rotina para deixar os parentes angustiados verem
o paciente, por um instante? Por que não deixar um paciente que está no seus últimos
instantes de vida, ver seus entes queridos ao seu lado, segurando-lhe a mão? Por que
não levar a mãe aflita, numa enfermaria de hospital, ao telefone para ouvir a voz de
seu filho?
Quando o profissional está comprometido com a humanização, toda a sua
postura de ações e suas atitudes são diferentes: ao dar uma injeção no paciente, pode
com um sorriso animador dizer: “mais uma injeção, mas não vai doer!” Mesmo que
seja um tratamento doloroso, será suavisado pela atenção e sensibilidade no “cuidar e
fazer”.
As nossas programações didáticas podem tornar o ensino coerente com o
contexto social em que vivemos.
As acadêmicas precisam ser preparadas com esses valores psicoespirituais.
Primeiro a aluna: ‘De que forma ela lida com esses valores, com ela mesma’,
a seguir, aluna-paciente; vivenciar esses valores na profissão. Muitas vezes, o
paciente precisa mais de um bom-dia do que de um comprimido de
novalgina
(Elke, pesquisa, PEIXOTO:2000).
Terrin (1998:14) questiona: “se todas as tentativas de afugentar a doença e a
morte têm hoje a necessidade de referir-se ao mundo espiritual e a técnicas que
harmonizem o corpo com a psique, e esta com a própria realidade espiritual, isso não
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
178
significa que indireta e inconscientemente, se procura e se projeta um novo advento
do espírito e do mundo religioso?”
A nossa saúde integral depende da harmonia holística do nosso ser com o
universo. Harmonia das dimensões como vimos, psicobiofísicas, psicossociais e
psicoespirituais. Quando uma dessas dimensões falha, acontece o desequilíbrio geral
de todo o nosso ser, provocando as doenças. Eis aqui, a grande tarefa pedagógica da
Enfermagem: lembrar sempre de que não bastam ciência, técnica, hospitais,
profissionais competentes, mas também, é necessário o equilíbrio holístico para sanar
todos os males
(VILELA,1996:
28)
.
Os desafios diante dos obstáculos e das crises atuais não são motivos para
desânimos ou imobilismo, e sim, motivos para luta permanente. Precisa-se ter sempre
em mente a frase de MORAES (1986:15): “Propor-se ao ensino, é propor-se a um risco.”
Atulhada de aparatos tecnológicos, a Enfermagem não pode vivenciar
descuido e descaso negligenciando o aspecto espiritual, ao se programar a assistência
aos clientes. Esse aspecto precisa ser planejado como qualquer outra atividade da
Enfermagem.
O educar permeia todas as atividades da enfermeira, resgatando a essência de
seus valores espirituais no “fazer e cuidar” dos clientes.
A busca de sentido leva a Enfermagem a surpreender-se pela capacidade de
responder e também pela audácia em interrogar. Transforma dúvidas em certezas e
questiona certeza cartesianas para espalhar dúvidas inéditas, sementes de um novo
porvir.
Necessário se faz reinventar, começando com uma análise da dimensão
educadora da enfermeira e sua formação para o exercício de educar. Questiona-se a
ênfase dada à função de educar, concluindo-se que predominância da abordagem
tradicional, gerando falta do pensamento reflexivo.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
179
A Enfermagem deve combater a doença, cuidar dos doentes, restabelecer a
saúde e ajudar as pessoas a tomar consciência de suas vidas. Precisa de
arte e
habilidades
para abordar os aspectos espirituais, levando o cliente e/ou doente a abrir-
se para o próximo, para Deus. Não separar religião da vida, dos valores humanos com
solidariedade para com o povo, que leva-o a assumir todas as implicações sociais e
políticas da fé.
Faz parte do ideal da Enfermagem lutar pela erradicação das causas naturais
e sociais das doenças, sermos agente de transformação social. Na formação
acadêmica, os novos profissionais precisam de um espaço que lhes garanta
conhecimentos religiosos para a assistência psicoespiritual aos clientes e/ou doentes
(HORTA, 1997:16).
Promover a vida e a saúde é obrigação de todo enfermeiro que, além da
assistência terapêutica aos doentes, dever-se-ia humanizar o serviço, sabendo tirar
proveito disto para a reabilitação e recuperação da saúde.
Pode parecer utopia, imaginar a Enfermagem ideal, mas na realidade essa
possibilidade está sendo percebida. Este estudo, de acordo com a amostra
selecionada, confirma essa grande aspiração da maioria na Enfermagem com um
desejo de mudança, e já se descortina um caminho, como mostra este trabalho.
Concluindo, o enfermeiro é um agente de transformação social que ouve e
presta assistência integral, segundo as necessidades imediatas que a pessoa requer. É
amigo e conselheiro, fazendo o tratamento ser mais de doentes do que de doenças.
Enfim, o enfermeiro é um grande pedagogo que ensina através de sua voz e de todos
os seus gestos no “fazer” e no “cuidar”.
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A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
191
A
NEXOS
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P
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A
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C
omitê de
É
tica da
PUC-SP
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
192
A
NEXO
1-
ROTEIRO DA PESQUISA DE CAMPO
I.Os valores religiosos como suporte no ensino de
enfermagem
Identificação:
Onde você se formou:________
Universidade onde leciona:____________
Tempo de docência______________
1. Como você vê a religião nos dias de hoje?
(...) Importante; ( ) Com descrença; ( ) Indiferente.
2. O que caracteriza a profissão de enfermagem é:
(...) dar assistência integral aos clientes no seu todo visando o
psicobiológico, o psicossocial e o psicoespiritual;
...) executar fielmente os horários estabelecidos para os cuidados
de enfermagem visando somente a assistência biológica;
(...) ser bem técnica.
3. É impossível falarmos de saúde e doença no ensino, sem falarmos
dos valores religiosos que dão suporte a profissão da
enfermagem:
(...) sim concordo;(...) concordo em parte; (...) não concordo.
4. Assinale os valores religiosos que devem ser levados em conta
pelo profissional de enfermagem:
(...) tratar cada pessoa como gostaria que tratassem a si
mesmo;
(...) cuidar da pessoa como um todo, psicobiológico,
psicossocial e psicoespiritual.
(...) atender as necessidades básicas dos clientes, sem
distinção de raça, posição social, credo religioso;
(...) ver nos clientes a pessoa humana e não seu fator
econômico;
(...) jamais cuidar de seus próprios interesses prejudicando
outras pessoas: colegas, pacientes.
(...) nenhum dos itens mencionados.
5. Em sua opinião os valores religiosos influenciam no exercício
profissional da enfermagem?
(...) sim, pois nos torna mais sensíveis as necessidades básicas
humanas;
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
193
(...) só em certas ocasiões são importantes esses princípios
religiosos;
(...) os valores religiosos não interferem na formação acadêmica.
6. Você acha que o aspecto psicoespiritual tem sido esmagado pela
frieza das ciências especulativas modernas?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não.
7. Você acha que a ética profissional de enfermagem está impregnada
dos valores religiosos?
(...) sim; (...) em parte; (...) não.
8. O desempenho técnico de enfermagem inclui a assistência
psicoespiritual aos clientes?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não;
9. A dimensão religiosa da enfermagem precisa ser resgatada:
(...) incluindo no currículo acadêmico a disciplina sobre os
valores religiosos cristãos;
(...) ser referenciada em todas as disciplinas;
(...) é indiferente;
(...) só na ética.
10. A enfermagem é uma profissão caracteristicamente feminina”.
Como docente, você acha que é necessário uma maneira
diferenciada na formação das (os) novas (os) profissionais
quanto a relação homem-mulher?
(...) sim, pois os diferentes desempenhos técnico da enfermagem
exigem esta diversificação homem–mulher, para o atendimento aos
pacientes;
(...) é indiferente;
(...) não.
II. Dimensão religiosa no ensino da enfermagem
11. Quando você fez o curso de enfermagem lhe deram ênfase sobre
os valores religiosos?
(...) sim, em todas as matérias;
(...) obtive em disciplina específica;
(...) não, em nenhuma disciplina.
12. Os valores religiosos têm influência na educação em
enfermagem:
(...) melhorando o relacionamento enfermeira-paciente no cuidar
do paciente como um todo;
(...) às vezes;
(...) não possui influência nenhuma;
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
194
13. Na formação acadêmica deve haver uma diferenciação entre
enfermeiras e Enfermeiros na assistência psicoespiritual?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não.
14. Você como professor (a) estimula o desempenho de cuidados
voltados para a espiritualidade do paciente?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não.
15. Você acha que a ética da enfermagem está impregnada de valores
religiosos?
(...) sim; (...) em partes; (...) não.
16. Quando você dá orientação de enfermagem às acadêmicas e aos
acadêmicos, você fala nos valores religiosos cristãos?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não.
17. Quando você dá aulas seu objetivo é:
(...) a formação técnica de novas(os) profissionais
valorizando os valores religiosos na prática da enfermagem;
(...) colocar novos profissionais no mercado de trabalho;
(...) apenas desenvolver o conteúdo proposto.
18. Nos estágios programados você procura revalorizar os
princípios religiosos na educação em enfermagem?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não
19. Quais as diretrizes na educação em enfermagem que mais deixam
transparecer a dimensão religiosa?
(...) no ensino teórico e na prática;
(...) só no teórico;
(...) só na prática;
(...) nenhuma das alternativas.
20. Em que a educação em enfermagem precisa melhorar para dar uma
melhor assistência psicoespiritual aos seus clientes?
(...) falar desses valores em todas as disciplinas;
(...) reciclar as(os) enfermeiras(os) na assistência de
enfermagem aos clientes;
(...) fazer parte do currículo acadêmico a assistência
psicoespiritual aos clientes,com anotações no prontuário;
(...) está tudo bem.
21. O ensino sobre a assistência psicoespiritual deveria:
(...) ser tratados na teoria em todas as disciplinas;
(...) só na ética;
(...) em todas as disciplinas inclusive nos estágios.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
195
III. Assistência psicoespiritual na educação em
enfermagem
22. Você acha que os valores religiosos cristãos na educação em
enfermagem
contribuem para uma boa assistência aos clientes?
(...) sim; (...) em parte; (...) não.
23. Você tem dificuldades para atender as necessidades
psicoespiritual dos pacientes?
(...) sim; (...) não; (...) às vezes.
24. A enfermagem tem se preocupado com o aspecto psicoespiritual
dos clientes?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não.
25. O treinamento das(os) acadêmicas(os), para dar assistência
psicoespiritual deve ser a mesma?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não.
26. A assistência psicoespiritual de enfermagem aos clientes:
(...) precisa fazer parte dos estágios supervisionados
das(os) acadêmicas(os);
(...) não precisa de treinamento em estágios;
(...) é indiferente
27. Na prática da enfermagem o aspecto psicoespiritual tem:
(...) a mesma prioridade que os aspectos psicobiológico e
psicossocial;
(...) tem ficado em segundo plano;
(...) não tem importância no bom desempenho da profissão.
28. A cura psicobiológica e psicossocial estão relacionadas com a
cura psicoespiritual?
(...) sim; (...) às vezes; (...) não
29. Quando um cliente pede ajuda espiritual:
(...) você procura atendê-lo conversando sobre suas
necessidades religiosas;
(...) chama um líder religioso;
(...) não dá atenção.
30. A assistência psicoespiritual dada pela enfermagem :
(...) precisa ser anotada no prontuário do paciente, como os
outros cuidados dispensados;
(...) não precisa ser anotada;
(...) só dá essa assistência quem quer e tem tempo a mais do
horário previsto para os cuidados de enfermagem.
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
196
A
NEXO
2a-
A Assistência Psicoespiritual na Enfermagem: ensino e prática
197
A
NEXO
2b-
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