Capítulo 1 – O homem pantaneiro
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há propriamente uma autonomia da cultura popular, sendo esta subordinada à
dominante; para os indutivistas, ao contrário, a cultura popular é autônoma, com
criatividade específica, nascendo das classes subalternas, a qual se transforma em
resistência à pressão dominante. No entendimento de cultura como resistência, a
cultura popular não tem o aspecto de secundária, conseqüentemente, menos
importante que a erudita. Ela troca, interage com a erudita. Sob este enfoque, não é
apenas folclore ou tradição, porque é dinâmica, provoca o surgimento de novas idéias,
sem que se reproduza a si mesma. É um conjunto de sistemas, de diferentes
perspectivas e produtos culturais. Conforme Carvalho (1985), a cultura adquire rótulos:
cultura autônoma, de fronteira, de cinema, dominante, emergente, hegemônica,
instituída, latente, oficial, patente, política, subalterna, central, privação, híbrida,
operária, pós-moderna. Entretanto, este trabalho prioriza como Manoel de Barros lê e
constrói sua realidade, sua imagem do homem pantaneiro em seu contexto cultural que
não tem uma abordagem valorativa, assim como não traz o vício de fazer a diferença
entre cultura popular e erudita que, aqui, perdem os parâmetros de bem/mal e passam
a ser analisadas de forma compreensiva e situacional.
A existência humana (Bandeira, 1995) é constituída de duas partes, numa
visão generalista: sociedade e cultura. A própria sociedade é uma produção cultural e a
cultura é, por sua vez, elaboração social. O social é um modo de organização da vida
humana que se estrutura em coletividade e essa, na totalidade ordenada. O cultural
está em como o individual significa particularmente e como se torna único e, assim,
diferenciando-se de outras culturas. É a cultura que confere significado à vida social.
Por isso não pode haver sociedade sem cultura, embora possa haver cultura sem
sociedade, através da sua produção remanescente.
A cultura, enquanto dimensão da vida social, do processo social, é um
produto coletivo e tem, no Brasil, a pluralidade como palco: como refletores que a focam
à distância, o colonialismo e o escravismo, os quais desenvolvem a produção simbólica
como texto/roteiro. O “escravagismo colonial”, conforme Bandeira (1995, p.12), “... é
que dá sentido a ser branco, negro ou índio e às relações entre si. É ele o alicerce
fundante da cultura brasileira”.