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Uma outra forma de repressão dos sentimentos dentro desse grupo, é a seleção por
parte de algumas pessoas, detentoras de um poder sobre os demais, do que são manifestações
adequadas ou não no grupo. Sejam de opiniões, assuntos e mesmo de expressões emocionais.
Um exemplo disso aparece claramente em uma determinada situação, onde há uma maior
abertura para as pessoas falarem e elas começam a falar sobre seus problemas emitindo
opiniões. O grupo se configura ao mesmo tempo um “lugar para se calar”, pois quando
essas pessoas emitem suas opiniões são repreendidas e se calam novamente, e um “lugar para
se falar”, demonstrando claramente a relação entre poder e emoção no grupo, essa
ambigüidade aparece em vários momentos, como no trecho abaixo:
Sr. E = Diz “O que precisa, é nós moradores do bairro tirar essa imagem horrível que se tem do bairro. ...
Então, nós precisamos lutar, nossa ONG, se Deus quiser, vamos conseguir, agora só vamos conseguir
alguma coisa com o apoio da administração, senão, não vamos conseguir nada, se não vamos ficar batendo,
falando, falando e nós não conseguimos nada, fica aquele papo furado e nós precisamos de alguém que faça
lá em cima, que nos apóie e nós esperamos isso do prefeito eleito, esperamos isso dos nossos vereadores,
precisamos de alguma coisa que nos faça ter pelo menos uma satisfação em dizer: “Eu moro na Praia Azul”
era uma maravilha, era lindo isso aqui, porque está desse jeito, está abandonado. É por isso que estamos
reunidos, não é verdade? Pra ver se conseguirmos solucionar esse problema, agora não adianta ficarmos
falando, falando, falando, se não tiver apoio da parte administrativa
Dra.: “Nossa ONG não é para brigar, é para construir. A ONG não é para brigar com ninguém, é para
construí, independente de política, entende? Eu digo porque a idéia foi minha, através do PSF...
Nós temos adolescentes na rua, nós vamos dar curso de capacitação, nós vamos ocupá-los de outro forma.
Vamos ocupar o espaço público, para que as profissionais do sexo irem para outro lugar. Não estou
discriminando, mas não estou defendendo, sei que é errado. Também não podemos jogá-las fora, quero dizer
que a ONG... não é de briga, é de mostrar que estamos construindo alguma coisa com esforço de uma
comunidade, de uma área de abrangência limitada em prol de uma comunidade também...
Dra.: “A nossa ONG tem um intuito, reclamar do odor, do asfalto é lá na prefeitura não é coisa da ONG.
Reclamações nós não vamos resolver nada porque nós aqui somos apenas integrantes da ONG”.
(15/12/04- Reunião Geral da ONG)
No fato citado acima, a médica representante do poder dentro do grupo, repreende as
pessoas que falaram dos problemas do bairro como o odor da água, a falta de asfaltamento
segurança inadequada, fazendo com que outras pessoas do grupo, pelo menos nesse momento,
concordem com ela, seja por concordarem com sua opinião ou por medo (no caso abaixo a
pessoa é funcionária da prefeitura e subordinada dela no PSF):
V.: O essencial para nossa ONG que está nascendo agora é saber qual é o nosso objetivo. Porque nós
estamos aqui, então, foi falado, críticas... Ficar brigando por asfalto, esgoto, isso é bla, bla, bla..(em um
tom irônico)”
V: “Estou sentindo de que não seja essencial no momento...”
V.: “nosso objetivo como ONG é outro. Nós precisamos de empenho. O primeiro passo é conhecer os
problemas. Isso é o mais fácil. Passos pequenos, aos poucos”. (ela estava exaltada)