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GYSELE DA S. COLOMBO-GOMES
A PROMOÇÃO DO ÊXODO DA ZONA DE CONFORTO EM UMA
SALA DE AULA DE LÍNGUA INGLESA:
A IMPORTÂNCIA DO PAPEL DA REFLEXÃO E DA INTERAÇÃO
MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
2006
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GYSELE DA S. COLOMBO-GOMES
A PROMOÇÃO DO ÊXODO DA ZONA DE CONFORTO EM UMA
SALA DE AULA DE LÍNGUA INGLESA:
A IMPORTÂNCIA DO PAPEL DA REFLEXÃO E DA INTERAÇÃO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção de tulo de
MESTRE em Lingüística Aplicada e Estudos da
Linguagem, sob a orientação da Professora
Doutora Maria Antonieta Alba Celani.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
2006
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Ficha Catalográfica
COLOMBO-GOMES, Gysele da S. da. A Promoção do Êxodo da Zona de Conforto em
Uma Sala de Aula de Língua Inglesa: A Importância do Papel da Reflexão e da Interação
Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Área de Concentração: Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem.
Orientadora: Professora Maria Antonieta Alba Celani
Formação de Professores, Ensino-aprendizagem de LE
Palavras-chave: formação de professores, reflexão, interação, êxodo e zona de
conforto.
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BANCA EXAMINADORA:
_________________________
_________________________
_________________________
_________________________
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Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação por processos fotocopiadores ou eletrônicos.
Assinatura: ______________________ Local e Data: ____________
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Ao meu marido e filho, por me amarem e
sempre aceitarem me dividir com os livros e
a pesquisa.
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À minha Josefa e meu pai pelo amor
incondicional, pelo incentivo aos estudos e
por tudo que sempre representaram para
mim.
(in memoriam)
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A G R A D E C I M E N T O S
A Deus, pelas dádivas diárias que me concede.
Ao meu marido e filho, por existirem em minha vida.
À Patrícia Martins, por ser a Patty, mais que irmã e sempre presente em minha
vida, por sua generosidade, amizade, dignidade e carinho.
Ao José Carlos da S. e Souza Júnior, por toda sua ajuda, por seu apoio constante,
por sua tremenda amizade e por dividir com todos o seu brilhantismo.
À Profª Drª. Vera Lúcia Teixeira da Silva, pelo apoio inicial, pelos incentivos, pelo
carinho e pela amizade.
À Profª Gília Barcellos, pela confiança, pelos incentivos e pelo apoio financeiro.
À Profª Drª Anise Ferreira, por ser admirável como professora, por seus conselhos,
sugestões e convívio.
Ao Prof. Dr. Orlando Vian Júnior, por ter ampliado meus horizontes, por sua
generosidade em compartilhar seus conhecimentos, pelas contribuições na
qualificação e pelo apoio de sempre.
À Profª Drª Vera Cabrera, por suas contribuições e sugestões na qualificação.
Aos professores com quem convivi no LAEL, por proporcionarem tantos espaços
para meu desenvolvimento e o de minha pesquisa.
À minha amiga D. Aparecida, por seu carinho e cuidados comigo.
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Ao “Almirzinho” do ICBEU, pela ajuda com as transcrões.
À Ana Maria Gomes Ribeiro (ISAT e PUC RJ), pelas reservas e empréstimos dos
livros e por sua gentileza.
Aos colegas do Seminário de Orientação, pelas discussões e pelo aprendizado que
me proporcionaram.
À Ana Maria Liguevis, por sua ajuda e carinho durante o período que estivemos
juntas.
A todos aqueles que de alguma forma contribuíram para que eu evoluísse como
aluna, professora, pesquisadora e pessoa.
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AGRADECIMENTO ESPECIAL
À Profª Maria Antonieta Alba Celani, por sua seriedade,
simplicidade e sabedoria. Obrigada por ter permitido que eu
aprendesse um pouco do muito que traz em si. Obrigada pela
ajuda e pelo respeito que tem por todos os seus orientandos.
Obrigada por seus incentivos, por sua confiança.
Obrigada por você estar no ensino-aprendizagem, na
pesquisa, na sala de aula, na Lingüística Aplicada...
Obrigada por você existir.
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R E S U M O
A presente pesquisa retrata a proposta de um estudo sobre o papel da
reflexão e da interação como possível alternativa para implementação de ações
promotoras do êxodo da zona de conforto em uma sala de aula de Língua Inglesa.
Procurou-se compreender o papel fundamental do professor-pesquisador de
refletir sobre sua prática em interagir com seus alunos a fim de encorajá-los a
assumir responsabilidade sobre seu processo de aprendizado e a atuar de forma
autônoma e crítica pautada pela visão de Celani (2000). Trata-se de uma
pesquisa-ão conduzida em uma faculdade de formão de professores de
ngua estrangeira localizada numa zona semi-residencial de uma região
metropolitana do Estado do Rio de Janeiro. Na investigação, a pesquisadora
assumiu o papel de participante, também visando à construção de seu próprio
conhecimento sobre as formas como a reflexão e a interação podem contribuir
para a conscientização de ões de construção de conhecimento, e a promoção
do êxodo da zona de conforto. Participaram deste estudo uma professora de
ngua inglesa e seu grupo de alunos. Esta pesquisa foi teoricamente
fundamentada nas obras de Dewey (1909/1997) sobre a reflexão, Brown &
Levinson (1987) sobre a teoria da polidez, Goffman (1967) sobre o estudo da face,
Halliday (1994) sobre o uso da linguagem nas práticas sociais, Vygotsky (1930 -
1998; 1934 - 1987) sobre a interação e a construção do conhecimento. Os
resultados lançam luz sobre possíveis caminhos para o empoderamento de
aprendizes por meio da reflexão e da interação, e o êxodo da zona de conforto.
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A B S T R A C T
The present research portrays the study on the role of reflection and
interaction as a feasible alternative leading to the implementation of actions to the
exodus from the comfort zone in which students of English find themselves in
class. An attempt was made to comprehend the fundamental part played by the
teacher-researcher in reflecting on his/her practice in interacting with his/her
students in order to encourage them to take charge of their learning process and to
act in an independent and critical manner based on the view of Celani (2000). It is
a piece of action research conducted in a college for foreign language teachers
located in a semiresidential area in Greater Rio de Janeiro. In the investigation, the
researcher undertook the role of a participant aiming at the construction of her own
knowledge of the forms through which reflection and interaction can contribute to
raising awareness of the actions for the construction of knowledge and leading to
the exodus from the comfort zone. A teacher of English and her group of students
participated in this study. This research was theoretically based on the works of
Dewey (1909/1997) on reflection, Brown & Levinson (1987) on the theory of
politeness, Goffman (1967) on face work, Halliday (1994) on the use of language
in social practices and Vygotsky (1930 - 1998; 1934 - 1987) on interaction and
knowledge building. The results cast light on possible ways of empowering
learners by means of reflection and interaction, and the exodus from the comfort
zone.
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SUMÁRIO
Introdução 01
Capítulo 1
Caminhos e Conceitos que se Integram para Comunicação e Compreensão
08
1.1 A Reflexão
08
1.2. A Interação
12
1.3. A Zona de Conforto (ZC)
15
1.3.1. Zona de Conforto, Polidez e Relacionamentos Sociais.
19
1.3.1.1. Estratégias para fazer um ato de ameaça a face
(AAF)
27
1.4.
A Gramática Sistêmico-Funcional: Um breve olhar sobre a língua em
uma perspectiva social
31
Capítulo 2
Explicações sobre o Planejamento da Pesquisa
38
2.1. Por que uma pesquisa-ação?
38
2.2. O Contexto
43
2.3. Os Participantes
44
2.4 Coleta de Dados
50
2.4.1.
Os Instrumentos e procedimentos de coleta de dados
51
2.5. Procedimentos de análise e interpretação dos dados
56
2.5.1.
Dados utilizados para responder as perguntas de pesquisa
57
Capítulo 3
Caleidoscópio – Fragmentos de imagens de uma sala de aula ajustados para
formar a imagem de uma prática reflexiva
59
3.1. Primeiro Processo de Análise: A representação das idéias e do universo
dos aprendizes estampados nos diários reflexivos – o sistema de
transitividade, o sistema temático e a avaliação.
61
3.1.1.
O sistema de Transitividade
62
3.1.2.
O Sistema Temático
67
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3.1.3.
Avaliação e Valoração
69
3.2. Segundo Processo de Análise: Uma análise temática – fragmentos de
peças distintas reunidas.
74
3.2.1. Grupo Temático 1:
Fatores que contribuem para permanência na Zona de
Conforto
76
3.2.2. Grupo Temático 2:
Percepção de Mudanças, Reflexão e Interação
80
3.3. Terceiro Processo de Análise:
Ameaças e proteção à face, lucros e vantagens co-construindo o
conhecimento na interação.
93
Considerações Finais 103
Referências Bibliográficas
Anexo
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ÍNDICE DE FIGURAS
Fig 1. Possible strategies for doing FTAs (Brown & Levinson, 1987: 69)
28
Fig.2. Caminhos trilhados que se encontram
37
Fig.3. Escolhas Lexicais de Mário
73
Fig. 4 Movimento para o êxodo da ZC
83
Fig. 5 . Mudança Inicial de Estrela
95
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ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráf. 1 – Classificação e número de processos encontrados no arquivo de texto
62
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ÍNDICE DE QUADROS
Quadro n° 1 – Funções de Fala e Respostas Halliday (1994: 69).
14
Quadro n° 2 – Forma, Significado e Uso da Palavra (Nation 2001: 27)
18
Quadro n° 3 – Formas Diversas de Lucros Obtidos em uma Interação (Brown &
Levinson.)
30
Quadro n° 4 – Exemplos das descrições encontradas nos diários.
64
Quadro n° 5 - Exemplos dos tipos de temas
67
Quadro n° 6 – Ocorrências de itens lexicais
68
Quadro n° 7 – Exemplos de Temas Múltiplos
69
Quadro n° 8 – Avaliação e Valoração - Grupo A
70
Quadro n° 9 - Avaliação e Valoração - Grupo B
72
Quadro n° 10 -Avaliação e Valoração - Grupo C
73
Quadro n° 11 – Exemplos de proteção à face
78
Quadro n° 12 – Exemplos de Atos de Exposição da Face
79
Quadro n° 13: Estado Reflexivo – Percepção Gradual de Clara
85
Quadro n° 14: Percepção de atitudes que denotavam mudanças de Vânia
88
Quadro n° 15: Exemplos de indícios de estar fora da ZC extraídos
dos diários de Estrela
91
Quadro n° 16: Exemplos de mudanças experimentadas por Alessandra
92
Quadro n° 17: Exemplos de atos relacionados à polidez
95
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Introdução
__________________________________________________________________
1
INTRODUÇÃO
Durante o primeiro semestre de 2003, ao conduzir uma pesquisa-ação em
uma turma de alunos avançados numa escola de idiomas, busquei compreender
como os participantes se sentiam em relação à metodologia por meio da qual
aprendiam, como eram influenciados pela atmosfera da sala de aula e sua
interação, e o grau de conscientização das estratégias
1
que utilizavam para
aprender ou adquirir vocabulário.
Os resultados observados nessa primeira pesquisa, que foram
posteriormente utilizados para ampliar o escopo de vocabulário dos aprendizes,
demonstraram que a utilização de estratégias de aquisição ou aprendizado de
vocabulário era em mero bastante reduzido e que o temor de serem
lingüisticamente imprecisos ao usar um novo vocábulo fazia com que utilizassem
apenas um percentual limitado de estruturas ligadas aos primeiros estágios de
aquisição.
Nesse período, considerei a priori que o estado consciente no qual o aluno
se comunicava com estruturas básicas, com as quais não corria o risco de
cometer erros, poderia ser considerado uma Zona de Conforto
2
, na qual buscava
apenas a certeza de ser lingüisticamente preciso.
1
O conceito de estratégias utilizado é o de procedimentos em aprendizado e pensamento que
servem como uma forma de alcançar um objetivo (Richards, 1985:274)
2
“zona de conforto” é um termo por mim cunhado para definir o estado consciente no qual o aluno
se comunica com estruturas básicas, com as quais não corre o risco de cometer erros. Durante a
pesquisa há uma busca de refinamento do termo.
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Introdução
__________________________________________________________________
2
Por compartilhar com Freire (2004:85) a idéia de que “como professor,
devo saber que sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere
na busca, não aprendo nem ensino”, não pude me ater ao estágio inicial resultante
de minhas primeiras considerações tecidas sobre o assunto. Mantive-me ávida por
compreensão, pois o exercício da curiosidade faz a experiência mais criticamente
curiosa, mais metodicamente “perseguidora do seu objeto (cf. Freire, 2004).
Assim, minhas perguntas se expandiram e tornei-me “epistemologicamente
curiosa (idem). Já não bastavam as primeiras considerações e entendimento.
Fazia-se, então, necessário um levantamento da literatura sobre o assunto. Ao
iniciá-lo, logo pude observar a existência de diversos estudos sobre aspectos ou
fatores que podem afetar o desempenho de aprendizes, levando-os à estagnação
na Zona de Conforto (doravante ZC), tais como o estudo de fatores geradores de
ansiedade de Horwitz et al (1991), o estudo sobre alunos reticentes na aquisição
de linguagem de Tsui (1996), o estudo das interações
3
de aprendizes na sala de
aula e os efeitos na aquisição da segunda língua de Seliger (1983), bem como o
estudo de caso de Nascente & Moreira (2003) sobre a influência do afeto na sala
de aula. Todos esses trabalhos discutem a importância da interação para o
desempenho e a aquisição da língua estrangeira; todavia, nenhum desses estudos
aborda o papel da reflexão como alternativa para promoção do êxodo da ZC.
Foi quando me dei conta de que meu objetivo não era apenas investigar os
fatores responsáveis pela permanência na ZC, nem a interação entre aprendizes
para maior aquisição de vocabulário mas, sim, compreender um pouco mais sobre
3
O conceito de interação adotado é o explicitado na Fundamentação Teórica
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Introdução
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3
o papel da reflexão e da interação entre graduandos em Letras, futuros
professores de inglês, objetivando uma crescente evolução no processo de
ensino-aprendizado.
Por meio dessa evolução, vislumbrei promover uma maior comunicão
dos aprendizes entre si, a fim de, como afirma Vygotsky (1930-1998), garantir,
como conseqüência, a preservação, transmissão e assimilão de informações de
experiências acumuladas ao longo da história de aprendizagem.
Interessei-me por essa queso, pois acima de ser pesquisadora, sou
professora de inglês e docente em uma faculdade de Letras. Acredito ainda que
repensar, investigar e refletir sobre a formação do futuro professor é de interesse
amplo no presente contexto brasileiro. Ademais, são esses discentes que em
breve estarão diante do desafio de estar ensinando uma língua estrangeira
professores que podem se deparar com o paradoxo de estar lingüisticamente
estagnados em uma ZC ao vivenciarem na sala de aula atividades de perspectiva
sócio-cultural.
Vejo nessa investigação a possibilidade da prática do exórdio de uma
formação contínua, que como Garcia (apud Magalhães, 2001) assevera, não seria
o que tradicionalmente ocorre entre formação inicial e cursos de aperfeiçoamento,
mas uma formão centrada no desenvolvimento profissional contínuo dos
professores, coerente com o caráter provisório e em constante transformão do
conhecimento. Trata-se, a meu ver, de uma oportunidade de conduzir aprendizes
à conscientizão da importância da busca pela transmissão e assimilão de
informões e experiências, geradora de atitudes que os impelem ao nível de
desenvolvimento potencial, à curiosidade, ao questionamento, à reflexão e à
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Introdução
__________________________________________________________________
4
autonomia. Por este motivo, considerei pertinente investigar o papel da reflexão e
da interão como possível alternativa de promoção do êxodo da zona de
conforto. Tracei, assim, três objetivos, que são:
1- compreender os fatores relacionados à “acomodação” de
determinados aprendizes;
2- identificar as possíveis alternativas que promovam o êxodo
da Zona de Conforto; e
3- verificar como (ou se) a reflexão e a interação de alunos
entre si e com o professor podem levar aprendizes ao êxodo
da zona de conforto.
Para alcançar os objetivos estabelecidos, busquei responder às seguintes
macro-perguntas:
1.Quais são os fatores relacionados à permanência na Zona de
Conforto?
2.Como (ou se) a reflexão e a interação contribuem para
conscientização de ações visando à construção de conhecimento e
significados?
3.De que forma o professor pode levar o aprendiz à
conscientização e implementação de ações que o tornem
autônomo para construir significados e não permanecer na zona de
conforto?
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Introdução
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5
Com intuito de conduzir tal investigação, fez-se necessário o estudo do
conceito e do papel da reflexão; da zona de conforto, da teoria da polidez, dos
relacionamentos sociais e de suas implicações; e da questão da medião do
professor na interação com o aprendiz, para assim gerar uma discussão,
observando, entre outros, estudos como os de Dewey (1909-1979), Goffman
(1967), Brown & Levinson (1987), Halliday (1994), e Colombo-Gomes (2004).
A abordagem metodológica adotada nesta pesquisa foi pesquisa-ação
(Moita Lopes, 2003; Thiollent, 1986; Wallace, 1998), uma vez que foquei minha
atenção em buscar um resultado específico e imediato que pudesse ser
diretamente relacionado à minha prática, em meu próprio contexto de professora.
Essa situação pôde me permitir, como pesquisadora e professora, um
engajamento em um processo de negociação de significados de pesquisa, no
qual, com os aprendizes, meu grupo de orientação e minha orientadora co-
construímos e geramos conhecimento.
Para coletar os dados necessários para a investigação aqui proposta,
utilizei-me de diários reflexivos da professora-pesquisadora, diários reflexivos
dialogados de aprendizes, um questionário Likert
4
, observações e anotões de
campo (ou microetnografia), e gravações em áudio e vídeo das minhas aulas.
Quanto à análise e interpretação dos dados, baseei-me em três processos.
O primeiro deles foi a análise de determinados elementos da língua a partir da sua
função e do contexto de situação de uso em que ele se insere. Pautei-me pela
abordagem sistêmico-funcional de Halliday, pois esta busca descrever como e
4
A definição da técnica Likert é posteriormente feita no capítulo da Metodologia
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Introdução
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6
para que a língua é usada para fazer coisas, e foi por meio dela que analisei as
escolhas lexicais referenciais presentes em meu discurso e no dos alunos
participantes da pesquisa. Foram categorias de análise o levantamento das
escolhas dos processos e das escolhas lingüísticas para a verificação do
posicionamento enunciativo dos participantes em seus diários reflexivos. O
segundo deles foi o de tematização (van Manen, 1990), que tomou como base os
objetivos e as perguntas de pesquisa. O terceiro processo foi pautado pelo estudo
da polidez e os relacionamentos sociais. Foi realizada uma análise da transcrição
de uma das últimas aulas videogravadas, visando à verificão da interação e
preservação de face destes participantes que indicassem ou não sua permanência
na zona de conforto. As a conclusão dos três processos de análise, estes foram
confrontados para que considerações finais fossem tecidas.
A apresentão da presente investigação foi estruturada em três capítulos.
O primeiro deles, Caminhos e Conceitos que se Integram para Comunicão e
Compreensão, foi dedicado à compreensão e construção de conceitos que
fornecessem embasamento teórico à pesquisa, que pudessem auxiliar a análise
dos dados coletados.
No segundo capítulo, Explicões sobre o Planejamento da Pesquisa,
explico o motivo pelo qual a escolha da metodologia foi feita, estabeleço os
objetivos e perguntas de pesquisa, descrevo o contexto, os participantes, os
instrumentos de coleta, bem como os procedimentos de análise e interpretação
dos dados.
No último capítulo, Caleidoscópio – Fragmentos de imagens de uma sala de
aula ajustados para formar a imagem de uma prática reflexiva, dedico-me à
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Introdução
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7
discussão da análise dos dados, concluindo-o com uma síntese dos resultados
obtidos que remete às perguntas de pesquisa motivadoras de minha investigação.
As considerações finais apresentam minhas reflexões acerca de todo o
estudo, de suas especificações e implicações em minha prática, bem como a
proximidade com aprendizes por ele produzida. Traçam, também, os mais
diversos caminhos que podem ser trilhados por mim, por outros professores, por
outros pesquisadores... quiçá por outros professores-pesquisadores ou
pesquisadores-professores que sejam curiosos e se aventurem ao desconhecido
para melhor se conhecerem.
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Fundamentação Teórica 8
Capítulo 1:
Caminhos e Conceitos que se Integram para Comunicação e
Compreensão
Neste capítulo, trilhei caminhos que me conduzissem à compreensão dos
conceitos teóricos que fornecem embasamento à presente pesquisa e nos quais me
apoiei para a análise dos dados coletados. O ponto de saída foi a reflexão que me
conduziu à chamada zona de conforto, que, na verdade, me causou desconforto.
Procurei na polidez e nos relacionamentos sociais infiltrar modelos para mediação
do professor na interação com o aprendiz. Encontrei a gramática sistêmico-funcional
que me norteou ao social e fez com que refletisse novamente na busca de novas
saídas.
1.1. A Reflexão
Pensar é refletir?
Nem sempre pensar significa refletir. De acordo com Dewey (1909), o
pensamento reflexivo é aquele que consiste em examinar mentalmente o assunto e
dar-lhe consideração séria e consecutiva. Este pensamento é uma cadeia e aspira a
chegar a uma conclusão. Esse autor classifica a reflexão como uma conseqüência
uma ordem de tal modo consecutiva que cada idéia engendra a seguinte como seu
efeito natural e, ao mesmo tempo, apóia-se na antecessora ou a esta se refere’.
Desta forma, pode ser percebido que as partes sucessivas de um pensamento
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Fundamentação Teórica 9
reflexivo são derivadas umas das outras, de forma ordenada, não um ir e vir de
idéias. Neste tipo de pensar, há unidades definidas, ligadas entre si de tal arte que o
resultado é um movimento continuado para um fim comum.
Esse autor estabelece dois estados no pensar reflexivo. O primeiro deles é
um estado de vida, hesitação, perplexidade, dificuldade mental, o qual origina o
ato de pensar. O segundo é um ato de pesquisa, procura, inquirição, para encontrar
material que resolva a dúvida, assente e esclareça a perplexidade. Nestes estados,
é importante que haja incerteza para promoção da investigação e que a necessidade
de solucionar a vida seja o fator sico e orientador de todo o mecanismo da
reflexão.
Dewey (1909) o nega que não se pode dizer como alguém deva pensar, da
mesma forma que a ninguém se pode dizer como deve respirar ou fazer o sangue
circular. Todavia, afirma que, embora não seja possível aprender ou ser ensinado a
pensar, todos devem compreender como adquirir o hábito geral de refletir. Para
tanto, é preciso que cada um exercite as fases do pensar mas, acima de tudo, seja
incomodado pela observação, curiosidade e pela necessidade de respostas para
suas incertezas.
Na análise do pensamento reflexivo, Dewey (idem) afirma que existem
funções essenciais da atividade reflexiva dentro dos limites de cada unidade do
pensamento e estipula os limites da reflexão: uma situação embaraçosa, perturbada
ou confusa no início; e uma situação esclarecida, unificada, resolvida, no final. O
autor denomina a primeira de pré-reflexiva’, na qual o problema a ser resolvido é
apresentado. na situação final, quando a vida foi dissipada, a situação é
pós-reflexiva; resulta em uma experiência direta de domínio, satisfação e gozo.
Seguindo esta linha, observa-se que, dentro dos limites da reflexão, situam-se
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Fundamentação Teórica 10
várias fases do pensar de forma reflexiva, que podem seguir ou não uma seqüência
fixa. São elas:
(a) as sugestões, as iias que nos fazem agir exteriormente ( ex.: diante de um
buraco a ação direta é saltar), um salto para a busca de uma possível
solução;
(b) uma intelectualização da dificuldade que foi sentida se transforma um
problema a ser resolvido (ex.: mas e se eu colocasse um objeto para cobrir o
buraco?);
(c) o uso de uma sugestão seguida de outra, a idéia-guia, como uma hipótese
para coleta de informações sobre o problema;
(d) a elaboração mental da iia ou suposição para solução – o raciocínio; e
(e) a verificação da hipótese pela ação.
Muitas vezes nem todas as fases acontecem. A verificação nem sempre se
realiza. casos em que as conseqüências deixam de corroborar essa realização.
Assim, a idéia é refutada em última instância. Porém, uma grande vantagem da
posse da atividade reflexiva é que o insucesso não é simples insucesso. Trata-se de
uma atitude instrutiva porque uma pessoa que realmente pensa aprende tanto com
os insucessos quanto com os êxitos, pois um insucesso “(...) aponta àquele cujo
pensamento foi nele envolvido e que a ele não chegou às cegas e às quais outras
observações a fazer (Dewey, 1909).
O que em geral seria apenas causa de aborrecimento e desânimo para uma
pessoa não acostumada a pensar reflexivamente é, para um investigador de idéias
experiente, um estímulo e um guia. Por isso, é conhecendo o pensamento de Dewey
que o professor se incomoda ao perceber que alguns aprendizes permanecem na
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Fundamentação Teórica 11
zona de conforto buscando proteção à sua face positiva e/ou negativa.
Acrescento, outrossim, a importância de um grande impulso dado ao
desenvolvimento do conceito de reflexão nos últimos anos por Schön (1987; 1992b).
Esse estudioso propõe que a prática reflexiva envolve três componentes básicos,
apresentados por ordem crescente de complexidade: (a) o conhecimento-na-ação;
(b) a reflexão-na-ação; (c) a reflexão-sobre-a-ação. O conhecimento-na-ação pode
ser entendido como o saber fazer. Segundo Schön (1987:25), conhecimento-na-
ação é revelado ao desempenharmos nossa ação de forma espontânea e
habilidosa. Desta maneira, entende-se que conhecemos implicitamente as atividades
que exercemos, embora não sejamos capazes de falar sobre elas: “a ação bem
desempenhada geralmente revela um conhecimento superior àquele que sabemos
verbalizar” (Schön, 1983:51) A reflexão-na-ação, por sua vez, caracteriza-se pelos
pensamentos que levam o indiduo a improvisar, tomar decisões e atitudes no
mesmo momento em que está atuando em sala de aula, permitindo-lhe resolver os
problemas com os quais se depara. Deste modo, a atividade de reflexão-na-ação
implica na construção de novas situações na prática de cada um, segundo aponta
Schön (1987:36). Ademais, Schön (1992a) afirma que este tipo de reflexão pode
envolver a manifestação de um componente particular, que ele denomina
conversation with the situation (diálogo com a situação). O autor identifica quatro
momentos no processo de reflexão-na-ação: a) um momento de surpresa no qual o
professor se surpreende pelo que o aluno faz; b) um momento em que reflete sobre
este fato e procura entender a rao que o levou a surpreender-se; c) um momento
em que reformula o problema gerado pela situação; d) um momento em que testa
esta nova hipótese a partir de uma experiência didática (cf. Schön, 1992b:83). A
reflexão-na-ão permite tamm que o professor encoraje, reconheça e valor à
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Fundamentação Teórica 12
confusão de seus alunos e à sua própria. É uma maneira de lidar com os momentos
de incerteza e conflito que sempre se manifestam nos processos de aprendizagem.
Schön (1987:31) afirma tamm que, além de refletir sobre o conhecimento
na ação, é extremamente importante que se reflita sobre a ação. Neste caso, é
preciso que olhar retrospectivamente e pensar no que aconteceu, no que observou,
no significado que dado e na eventual adoção de outros sentidos. Refletir sobre a
reflexão-na-ão é uma ação, uma observação e uma descrição, que exige o uso de
palavras” (Schön:1992b:83). Finalmente, Schön (1983:333) alerta para a importância
da INTERAÇÃO para que a reflexão-na-ação aconteça.
1.2. A Interação
A definição primária de interação é “uma ação que se exerce mutuamente
entre duas ou mais pessoas; uma ação recíproca”. O conceito de interação adotado
neste trabalho é o refinado por Goffman (1981). Para esse autor, interação é um
encontro de dois ou mais atores que exercem uma influência recíproca”.
As primeiras bases teóricas subjacentes às pesquisas voltadas à interação
foram de perspectiva psicolingüística, cuja concepção de linguagem e de
aprendizagem estava voltada apenas para a forma da língua aprender a língua
consistia em um processo distinto do uso da mesma. Graças à contribuição de
Vygotsky (1930-1998), temos hoje como base uma teoria de natureza sociocultural.
A aprendizagem ocorre em, e como resultado de, ações socioculturais e a linguagem
em uso. A contribuição desse autor destaca como fundamental o papel da interação
no processo ensino-aprendizagem.
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Fundamentação Teórica 13
Quanto ao professor, seu posicionamento em relação à interação com o
aprendiz inicia pelo papel do aprendizado no desenvolvimento do ser humano.
Vygotsky (1930-1998: 117,118) afirma que o aprendizado é um aspecto necessário
e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente
organizadas e especificamente humanas. Assim, o bom aprendizado é visto como
aquele que se adianta ao desenvolvimento. Vygotsky desenvolveu o conceito de
Zona Proximal de Desenvolvimento (ZPD). E este conceito tem sido amplamente
discutido. Dentre vários autores que o examinam estão Lantolf (2000), Schneuwly
(1994), e Vasconcellos & Valsiner (1995). Vygotsky (1930-1998: 112) define a ZPD
como a:
... distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma
determinar através da solução independente de problemas, e o nível
de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de
problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com
companheiros mais capazes.
Essa definição inicial vem, por conseguinte, sendo acrescida de algumas
alterações produzidas por estudiosos que a investigam. Schneuwly (1994), por
exemplo, afirma que a ZPD como uma zona de conflito entre possibilidades
internas e demandas externas. Nesta visão, o desenvolvimento depende de um fator
pessoal, interno, ou seja, do desenvolvimento já alcançado e, ao mesmo tempo, das
condições sociais externas. Ao tentar solucionar um conflito, o indivíduo tem a
oportunidade de se desenvolver, dando origem a novas formas de funcionamento
psicológico. O papel do outro, nessa relação, é primeiramente estabelecer o conflito
e, no caso de uma interação pedagógica, apontar caminhos para a solução.
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Fundamentação Teórica 14
A interação pode ser também compreendida como troca ou papéis de falas,
idéias ou opiniões. Uma importante contribuição de Halliday (1994) para a
compreensão do conceito de interação é a noção de fala e respostas, pois a
distinção básica entre dar e receber remete-nos àquela que está relacionada à coisa
que é trocada na interação como é observado em sua citação:
An act of speaking is something that might more appropriately be
called an ‘interact’: it is an exchange, in which giving implies
receiving and demanding implies giving in response. (p. 68)
Entende-se, assim, que a troca pode ser de informação ou de bens-e-serviços,
sendo que no primeiro tipo a troca é, via de regra, estritamente verbal, enquanto, no
segundo tipo, é estritamente o-verbal. Do cruzamento dos papéis de fala e do
objeto que é trocado em uma interação originam-se as quatro funções de fala
básicas de iniciação de uma interação que são a oferta, o comando, a declaração e
a interrogação. A ocorrência dessas funções de fala pressupõe quatro respostas que
são as esperadas em uma interação. As perguntas e respostas esperadas, como
também as não esperadas, estão resumidas no quadro n°1:
Iniciação
Resposta esperada Resposta não esperada
Dar bens e serviços Oferta Aceitação Rejeição
Pedir bens e serviços Comando Cumprimento Recusa
Dar informação Declaração Confirmação Contradição
Pedir informação Interrogação Resposta Recusa
Quadro n° 1 – Funções de Fala e Respostas Halliday (1994: 69).
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Fundamentação Teórica 15
Como professora e pesquisadora, almejo ser um agente promotor de
condições e de situações que estabeleçam movimentos, mudanças e aprendizado
por meio de atividades em duplas e grupos, nas quais a interação contribua para a
redução da distância entre o conhecimento real e o conhecimento potencial; desta
forma, pretendo criar o conflito necessário para que a colaboração de pares mais
capazes conduza cada um ao conhecimento real. Compartilho, portanto, com
Vygotsky (1930-1998: 117,118) a idéia de que o aprendizado desperta vários
processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar quando
INTERAGIMOS com pessoas em nossos ambientes e quando cooperamos com
nossos companheiros. Encontra-se na asserção deste autor a explicação para as
atividades realizadas em aula durante a pesquisa, para os diários reflexivos
dialogados e, por último, mas igualmente importante, para as discussões com o
grupo de pesquisa e com minha orientadora.
1.3. A Zona de Conforto (ZC)
O incômodo e desconforto do professor – uma proteção à face negativa do aprendiz
“Esqueci a palavra que pretendia dizer, e meu pensamento,
privado de sua substância , volta ao reino das sombras.
(O. Mandelstam)
Minha experiência como docente de Letras (Português-Inglês) contribuiu para
que percebesse a existência de um tipo de aluno que traz em si a crença de que
errar não é permitido. Devido a isso, limita-se a responder o que lhe é perguntado na
expectativa de estar sempre produzindo o “certo”. Conseqüentemente, permanece,
de uma certa forma, estagnado em um patamar no qual, objetivando ser preciso
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Fundamentação Teórica 16
lingüisticamente, o interage de forma ativa - transpõe apenas uma parcela de seu
escopo de vocabulário passivo para ativo e retém a maior parte de significados
construídos em seu acervo passivo.
A situação acima descrita não difere do que foi apresentado na comunicação
de Colombo-Gomes (2004) no 14° Intercâmbio de Pesquisas em Lingüística
Aplicada (InPLA). foram expostos os resultados de uma pesquisa-ação conduzida
com um grupo de aprendizes, na qual foi observado que evitavam a exposição da
imagem blica que cada um tinha de si próprio. Com tal atitude, mantiveram-se
sem evoluir na aprendizagem e na construção de novos significados na língua
inglesa. Este estágio de permanência não evolutiva foi denominado pela
pesquisadora de Zona de Conforto.
Ora, como bem aponta Leffa (2000), a tradição no ensino de línguas
estrangeiras tem destacado a importância do vocabulário através de inúmeras
atividades pedagógicas. Segundo ele, “língua não é xico, mas o léxico é o
elemento que melhor a caracteriza e a distingue das outras”. Ainda citando o autor:
Se alguém, ao estudar uma língua estrangeira,
fosse obrigado a optar entre o léxico e a sintaxe, certamente
escolheria o xico: compreenderia mais um texto
identificando seu vocabulário do que conhecendo sua
sintaxe.
Percebe-se, assim, que no ensino-aprendizagem da língua estrangeira, a
transposição do vocabulário passivo para o ativo é um importante aspecto deste
processo. Ademais, como diz Leffa (2000), “o léxico é o único conhecimento que
pode ser aumentado, geralmente para o resto da vida, que sempre é possível
aprender novas palavras”. Neste caso, é fundamental a validade da distinção entre
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Fundamentação Teórica 17
conhecimento passivo e ativo. Nation (2001) salienta que o conhecimento passivo
traz em si a idéia de que o insumo da língua é recebido de outros por meio da leitura
ou da escuta, enquanto o conhecimento ativo é aquele produzido ao falarmos ou
escrevermos. Esse autor acrescenta que o uso de vocabulário passivo envolve a
percepção da forma de uma palavra enquanto lida ou ouvida e a retenção de seu
significado. o vocabulário ativo envolve o DESEJO de expressar um sentido ou
uma idéia por meio da fala ou escrita com retenção e produção da forma da palavra.
Quando aplicados ao vocabulário, os termos receptivo (passivo) e produtivo
(ativo) cobrem todos os aspectos envolvidos em se conhecer uma palavra. Nation
(2001:26) sugere que conhecer uma palavra envolve, em um nível mais geral, forma,
significado e uso. Por isso, de nada adiantará o significado construído e adquirido
que não seja transposto para o uso. Além disso, de que servirá a construção de
significados se estes não forem mecanismos da linguagem na prática em seu grupo
social?
Nation (2001: 27) propõe o quadro 2 onde pode ser observado o
entrelaçamento do que é ativo (produtivo) e passivo (reprodutivo) em relação ao que
está envolvido quando se conhece uma palavra.
Acredito que um dos papéis do professor do curso de formação de
professores de língua estrangeira seja o de conduzir seus aprendizes à
conscientização sobre o que uma palavra envolve, em um nível mais geral, sua
forma, seu significado e seu uso para a construção de significados. Com isto, em
breve passarão a reproduzir esta prática com seus futuros alunos e compreenderão
a importância dessa tarefa.
O processamento dessa construção é tão mais profundo quanto maior for o
número de experiências vividas pelo sujeito envolvendo o significado em questão.
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Fundamentação Teórica 18
Falada Passivo Como a palavra soa?
Ativo Como a palavra é pronunciada?
Escrita Passivo Como é a palavra?
Ativo Como a palavra é escrita? (ortografia)
Passivo Quais partes são reconhecíveis na palavra?
(prefixo, sufixo, radical...)
F
O
R
M
A
Partes
da
Palavra
Ativo Quais partes da palavra são necessárias
para expressar o sentido desejado?
Passivo Que significado a forma desta palavra
sinaliza?Forma
e significado
Ativo Que palavra pode ser usada para expressar
este significado?
Passivo
O que está incluído no conceito?Conceitos
e
Referentes
Ativo A quais itens o conceito pode se referir?
Passivo Quais outras palavras esta nos faz lembrar?
S
I
G
N
I
F
I
C
A
D
O
Associações
Ativo Que outras palavras podemos usar no lugar
desta?
Passivo Em que padrões esta palavra ocorre?Funções
Gramaticais
Ativo Em que padrões devemos usar esta palavra?
Passivo Quais palavras ou tipos de palavras
acompanham esta palavra?Colocações
Ativo Quais palavras ou tipos de palavras
devemos usar com esta palavra?
Passivo Onde, quando e com que freqüência
esperamos encontrar esta palavra?
U
S
O
Restrições
sobre o uso
(registro,
freqüência,...)
Passivo Onde, quando e com que freqüência
podemos usar esta palavra?
Quadro n° 2 – Forma, Significado e Uso da Palavra (Nation 2001: 27)
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Fundamentação Teórica 19
Uma palavra que é lida ou ouvida apenas uma vez, sem grande envolvimento
por parte do aprendiz, pode ser facilmente esquecida. uma palavra que retorna e
é afetiva e cognitivamente usada terá mais chance de ser inserida no escopo de
vocabulário ativo dos aprendizes. Tal pressuposição fundamenta a importância da
promoção do êxodo da zona de conforto. Para este êxodo, todavia, verifica-se a
necessidade de uma maior compreensão do conceito de Zona de Conforto pelo
professor e pelos aprendizes.
1.3.1. Zona de Conforto, Polidez e Relacionamentos Sociais
Em seus estudos, Brown & Levinson (1987) discutem a polidez e os
relacionamentos sociais nas interações. A teoria da polidez toma por base os
postulados teóricos de Grice (1975), nos quais a comunicação é possível porque os
interlocutores obedecem mutuamente ao Princípio da Cooperação (doravante PC).
Este princípio consiste em quatro máximas gerais: de relevância, quantidade
qualidade e modo. Grice salienta que o PC e as máximas são observados pelo
falante porque os objetivos centrais de uma interação são atingidos se os
participantes tiverem interesse em realizar trocas de conversas proveitosas para os
propósitos buscados. Essas máximas são violadas toda vez que o falante transpuser
o limite do sentido literal do que disser. Ao objetivar mais do que o sentido literal de
suas palavras, o falante estará violando uma ou mais máximas, gerando assim
implicaturas da conversação, isto é, expressando de maneira implícita a sua
mensagem.
Brown & Levinson (1987) partiram desses postulados para formular a teoria
da polidez. Eles consideram a polidez a violação de uma ou mais máximas, advindas
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Fundamentação Teórica 20
da necessidade do falante de seguir o Prinpio da Cooperação, garantindo assim a
qualidade da interação. Não obstante, explicam que o Princípio da Cooperação e o
Princípio da Polidez possuem status distintos.
O primeiro desses princípios apresenta um modelo de comunicação
socialmente neutro, tendo como suposição essencial a observância às máximas, ao
que é racionalmente esperado em uma interação. O segundo, por sua vez, quebra a
neutralidade do modelo de comunicação em busca da manutenção da face.
As questões enfocadas no trabalho desses estudiosos permitem a
compreensão da escolha de permanecer em uma zona de conforto. Eles sugerem
que os padrões de construção de mensagens, ou “formas de colocar as coisas, ou
simplesmente o uso da língua, são parte do que constitui os relacionamentos
sociais. Acrescentam, ainda, que a descoberta dos princípios de uso da língua pode
coincidir com a dos princípios construídos de relações sociais, em seu aspecto
interacional, ou seja, as dimensões pelas quais os indivíduos fazem uso para se
relacionarem entre si de determinadas formas. Na realidade, é possível observar que
a qualidade dos relacionamentos sociais e a natureza social dos relacionamentos
geram uma escolha de atitude.
Entretanto, o basta apenas compreender o que é observável. Brown &
Levinson (1987) indicam que, ao interagir verbalmente, os indivíduos parecem
compartilhar de uma orientação estratégica. Primeiramente, elege-se uma Pessoa
Modelo (doravante PM) um falante de uma língua natural que apresenta duas
propriedades especiais: a racionalidade e a face.
A racionalidade é definida como a disponibilidade de a PM ter uma forma de
raciocínio precisamente definível dos fins ao modo como este fins foram alcançados.
Brown & Levinson (ibid) salientam que Aristóteles considerou a racionalidade um
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Fundamentação Teórica 21
‘raciocínio prático’ que garantisse inferências dos fins ou objetivos aos meios que
satisfizessem esses fins.
A face significa especificamente que a PM é dotada de dois desejos em
particular: o desejo de ser desimpedida e o desejo de ser aprovada sob certos
aspectos. Segundo Goffman (1967), a face é a exposição pública do self, imagem
pública que qualquer indivíduo quer preservar na interação. A face é algo em que se
é investido emocionalmente, preservável, ameaçada ou melhorada, mas que deve
estar presente freqüentemente numa interão. De acordo com Brown & Levinson
(ibid), ela pode ser negativa, para liberdade de ação e de nenhuma imposição; ou
positiva, a incansável busca do ser humano por aprovação.
Em segundo lugar, todos os membros adultos e competentes de uma
sociedade têm e são conscientes de que todos devem ter uma auto-imagem pública,
imagem esta que todo membro quer reivindicar como sua. Essa imagem pública
consistirá em dois aspectos: a face positiva e a face negativa. Ademais, todos os
indivíduos deverão fazer uso de determinadas capacidades racionais.
Tendo em vista esses conceitos, surgem, então, as seguintes perguntas:
Como um ser usa a linguagem? Ela é usada entre a vontade de satisfazer os
desejos da face da PM e a vontade de dizer coisas que infrinjam esses desejos? A
resposta dos autores nos remete à compreensão de que é possível a utilização de
estratégias lingüísticas como meio de satisfazer fins comunicativos e os desejos da
face. A PM deve ser uma referência para a descrição de estilos específicos de
interação cultural e verbal. Desta forma, ela caracteriza a qualidade afetiva dos
relacionamentos sociais e traz em si o compartilhamento de uma orientação
estratégica das faces dos participantes, o elemento-chave da noção popular de
polidez.
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Fundamentação Teórica 22
O trabalho de face (cf. Goffman, 1967) refere-se às comunicações designadas
para criar, apoiar ou desafiar a face. A combinação de duas regras a regra do
respeito próprio e a regra de consideração pelo outro faz com que uma pessoa
tenda a portar-se, em um dado evento, de modo a manter tanto a própria face como
a face dos demais participantes.
A ZC nada mais é do que um estágio em que o individuo convive com a
dualidade característica da PM, isto é, usa a linguagem de forma diádica lidando
com a racionalidade e a face. É algo que envolve a polidez de cada indivíduo.
Todas as PMs possuem uma face positiva e uma face negativa, e todas as PMs são
agentes racionais, ou seja, escolhem os meios para satisfazerem seus fins. Ora,
que a face consiste em um conjunto de desejos a serem satisfeitos apenas pelas
ações dos outros, em geral será de interesse mútuo de duas PMs manter a face do
outro. Assim, o falante tentará preservar a face do ouvinte, a não ser que ele possa
fazer com que o ouvinte preserve a sua (a do falante) sem nenhuma coerção ou
recompensa. Na verdade, o que o aprendiz parece querer é causar uma boa
impressão durante as interações em sala de aula, seja com o colega de turma, e a
turma, seja com o professor: ele não deseja ter sua face invadida e sim preservada.
Muitos são os atos de ameaça à face (AAF). Para Goffman (1974: 9) a
expressão “perder a face” significa causar uma impressão, ter de abaixar a
cabeça para o outro. a expressão “proteger a face” tem relação com o processo
em que o indivíduo é bem sucedido ao dar a impressão de que não “perdeu a face”.
Conseqüentemente, é compreensível que o aprendiz não queira ter sua face
negativa ameaçada, ou que não queira perder a face e posicione-se em uma zona
de conforto. Desta forma, mantém-se em um estágio de comodidade e de proteção
da face, ao participar de ações interacionais utilizando apenas de estruturas básicas
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Fundamentação Teórica 23
e comunicações não-verbais, ou ainda, fazendo uso de sua primeira língua neste
caso, em particular, o português.
Alguns tipos de atos ameaçam intrinsecamente a face. É importante ressaltar
que, ao me referir a ‘atos’, compartilho do significado que Brown & Levinson
atribuem à palavra algo que pretendemos fazer por meio de comunicação verbal
ou não-verbal. Similarmente, entendo o significado de Atos que Ameaçam
Intrinsecamente a Face como atitudes, que, por sua natureza, correm contrárias aos
desejos da face do ouvinte e/ou do falante.
Brown & Levinson (1987: 65) estabelecem duas distinções entre atos que
ameaçam a face. A primeira delas é em relação aos atos que ameaçam a face
negativa e à face positiva. Os atos contrários ao desejo da face negativa do ouvinte,
aqueles demonstratores que o falante não pretende evitar impedir a liberdade de
ação do ouvinte, indicam que:
(i) um ato é imposto para que o ouvinte execute. O falante pressiona o
ouvinte a agir de uma determinada forma. Ex: ordens e demandas (o falante
sinaliza que quer que o ouvinte faça ou deixe de executar algum ato),
sugestões e conselhos (o falante sinaliza que o ouvinte deveria executar
algum ato), lembretes (o falante sinaliza que o ouvinte deva lembrar de
executar algum ato), ameaças, avisos e desafios (o falante sinaliza que
pressionará o ouvinte a agir de alguma forma e que criará sanções negativas
caso o ouvinte não aja da maneira estipulada pelo falante);
(ii) uma ação que conduza a algum ato positivo que acontecerá
futuramente ao ouvinte. Assim, o falante pressiona o ouvinte a aceitar ou
recusar promessas e ofertas visando à obtenção de uma retribuição;
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Fundamentação Teórica 24
(iii) um ato que demonstre algum interesse do falante em relação a algo
que pertença ao ouvinte, fazendo com que o ouvinte pense que deva proteger
o alvo de desejo do falante ou dá-lo ao ouvinte. Como, por exemplo, elogios,
expressões de inveja ou admiração, ou emoções fortes como raiva, desejo
intenso de obter algo.
os atos que ameaçam o desejo da face positiva, por indicar que o falante
não se importa com os sentimentos e desejos do ouvinte. Esses tipos de atos
sinalizarão que o falante o quer satisfazer os desejos do ouvinte. Incluem-se em
tais atos:
(i) atos que demonstrem que o falante tem uma avaliação negativa de
algum aspecto da face positiva do ouvinte. Ele o quer aquilo que o
ouvinte quer. Por exemplo:
a) queixas, insultos, desaprovações, desprezo, acusações,... (O
falante indica não querer o que ouvinte deseja e não aprovar suas
características pessoais, crenças e valores);
b) contradições e discórdias, desafios ( o falante indica achar que o
ouvinte está errado ou equivocado sobre um determinado assunto e
não aprova a posição do ouvinte.)
(ii) atos que demonstrem que o falante não se importa ou é totalmente
indiferente à face positiva do ouvinte. São exemplos:
(a) expressões de explosão de emoções ou sentimentos (o falante
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Fundamentação Teórica 25
motivos para que o ouvinte o tema ou sinta-se intimidado);
(b) irreverências, abordagem de temas ‘picantes’ ou inadequados ao
contexto (o falante demonstra que não tem os mesmos valores que o
ouvinte nem os mesmos medos ou temores);
(c) o ato de o falante enfatizar as ‘coisas ruins’ do ouvinte e suas
próprias qualidades. Neste caso, o falante estará indicando desejar
causar um mal estar no ouvinte e acentuando a sua falta de interesse
pelos sentimentos do ouvinte;
(d) abordagem de temas que causam polêmica ou discórdia como raça,
religião, política, times e torcidas, a liberdade da mulher, o
homossexualismo, e outros assuntos que possam vir a trazer a
possibilidade ou a probabilidade de atos que criem uma atmosfera
ameaçadora aos ouvintes;
(e) uma resistência óbvia em não participar de ou cooperar em uma
determinada atividade ex: uma interrupção na fala do ouvinte com
afirmações e raciocínio incoerente à fala anterior que fogem à gica e
aos argumentos do falante (non-sequiturs), ou não dar atenção ao que
é dito, indicando assim que o falante não se importa com os desejos
da face positiva e da face negativa do ouvinte;
(f) o uso de termos de tratamento para se dirigir às pessoas e outras
identificações do estado civil das pessoas nos primeiros encontros (o
falante pode identificar incorretamente o ouvinte, acidental ou
intencionalmente, de forma ofensiva ou que o embarace).
É possível observar que as classificações dos atos de ameaça à face em
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Fundamentação Teórica 26
algumas ocasiões sobrepõem-se. Sobrepõem-se porque alguns deles ameaçam
tanto a face positiva quanto a face negativa.
A segunda distinção proposta por Brown & Levinson (1987: 67) está nos atos
que ameaçam a face (AAF) do falante e naqueles que ameaçam a face do ouvinte.
Ainda que ambos estejam cooperando mutuamente na manutenção da face, o
falante pode ameaçar a face do ouvinte. Dentre os AAFs para o falante estão:
(i) os atos que ofendem a face negativa:
(a) expressão de agradecimento ou gratidão (o ouvinte admite uma
dívida, transforma sua face em humilde);
(b) a aceitação da gratidão ou das desculpas do ouvinte (o falante pode
se sentir constrangido para minimizar a transgressão ou a dívida do
ouvinte ; por exemplo, para falar “Eu não quis dizer isto”, ou então,
“Não é nada, não se preocupe.”);
(c) desculpas (o falante pode crer que teve uma boa razão para agir da
forma que fez ou que deixou de fazer, em um ato que o ouvinte criticou
o que pode gerar uma nova crítica do ouvinte, causando assim um
confronto entre as diferentes posições de ambos);
(d) a aceitação de ofertas (o falante fica constrangido por aceitar ter
uma dívida e transgride a face negativa do ouvinte);
(e) respostas às gafes (faux pas) do ouvinte (se o falante nota
visivelmente a gafe, pode causar embaraço ao ouvinte; se fingir o ter
notado, pode sentir-se incomodado e aborrecido);
(f) promessas e ofertas indesejáveis (o falante se compromete em
ações futuras indesejáveis; portanto, sua insatisfação em fazer tais
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Fundamentação Teórica 27
ações pode ofender a face positiva do ouvinte).
(ii) os atos que agridem a face positiva:
(a) pedidos de desculpas;
(b) aceitação de elogios;
(c) esgotamento físico; tropeços, uma queda ou escorregão, ou uma
falha;
(d) confissões de culpa e aceitação de erros ou responsabilidade;
(e) auto-humilhação e auto-contradições;
(f) exposição de sentimentos e falta de controle de risos ou lágrimas.
Brown & Levinson (1987: 68) ressaltam que, em um contexto de
vulnerabilidade mútua de face, qualquer indivíduo racional buscará evitar estes
AAFs, ou emprega certas estratégias visando à minimização da ameaça em si.
Estes autores indicam que o indivíduo levará em consideração o peso relativo de
três desejos:
a) o desejo de transmitir o conteúdo de um determinado AAF;
b) o desejo de ser eficiente, racional e direto;
c) o desejo de manter a face do ouvinte de algum modo.
1.3.1.1. Estratégias para fazer um ato de ameaça à face (AAF)
Observa-se numa interação que um ator será explícito (on Record) ao fazer
um ato A se estiver clara aos participantes a intenção comunicativa que o levou a
fazer A (i.e. uma intenção o amgua com a qual as testemunhas concordam.
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Fundamentação Teórica 28
Não obstante, se o ator é implícito off Record ao fazer A, então mais de uma
intenção possível, de tal modo que o se pode atribuir ao ator uma determinada
intenção).
A ação minimizadora (redressive action) é aquela “que a face ao ouvinte”,
isto é, que tenta se contrapor ao dano potencial de face de um AAF, fazendo-o de tal
forma, ou com tais modificações, que indiquem claramente que F não pretende ou
não deseja tal AAF, e que F reconhece os desejos de face de O, desejando que eles
sejam atingidos.
Nota-se que haverá sempre duas possibilidades para o falante: cometer um
ato de ameaça à face ou não. Os autores sugerem um esquema no qual se pode
perceber as estratégias para execução ou não dos AAFs, cuja estrutura é a
seguinte:
1- Sem ação minimizadora
Explícito
2- com polidez positiva
Com ação minimizadora
(dando a face)
3- com polidez negativa
EXECUTAR O AAF
4 -Implícito
5- NÃO EXECUTAR O AAF
Fig 1. Possible strategies for doing FTAs (Brown & Levinson, 1987: 69)
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Fundamentação Teórica 29
Ao executar uma ação com uma determinada intenção e dando a face,
- expondo-se - o falante vai lidar com a polidez positiva ou a polidez negativa. Em
seus estudos, Brown & Levinson (1987: 70), afirmam que a polidez positiva é
orientada em relação à face positiva do ouvinte, isto é, a auto-imagem que ele
reivindica para si. A importância de um ato de ameaça à face é minimizada neste caso
quando garantia de que o falante quer o mesmo que o ouvinte. Por exemplo, o
falante considera a posição do ouvinte sobre um determinado aspecto similar à sua,
portanto, perceberá a reciprocidade e o que falar não implicará em causar uma
avalião negativa da face do ouvinte.
Em relação à polidez negativa, esses estudiosos a classificam em uma
‘teoria do evitamento’, baseada essencialmente em tentativas de evitar alguns atos.
As realizações de estratégias de polidez negativa consistem em assegurar que o
falante reconheça e respeite os desejos da face negativa do ouvinte e que não interfira
em sua liberdade de ação.
Quanto aos lucros que podem ser obtidos em uma interação, se o falante for
explícito, poderá conseguir quatro grandes vantagens. A primeira delas é a de poder
reunir a pressão pública contra o endereçado ou em apoio próprio. Em segundo lugar,
o falante poderá ganhar crédito em honestidade, indicando que ele confia no
enderado. Em terceiro lugar, o falante pode ganhar crédito por sua sinceridade,
evitando o perigo de ser visto como um manipulador. Por último, ele pode evitar o
perigo de ser mal compreendido.
Em contrapartida, sendo implícito, o falante pode lucrar de diversas formas,
pois:
(a) pode ganhar crédito por ter tato;
(b) pode correr menos riscos de ter seu ato incluído em “fofocas”;
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Fundamentação Teórica 30
(c) pode evitar a responsabilidade de interpretação danosa à face;
(d) pode (não explicitamente) dar ao endereçado a oportunidade de ser
visto como tendo cuidado com o falante ( e assim poder testar o
ouvinte – os sentimentos de O em relação a ele)
Em resumo, os lucros em geral podem ser simplificados como propõe o
quadro n° 3:
Lucros pela explicitude
(on record)
Lucros na explicitude não minimizada
(bald-on-record)
§ clareza e perspicácia;
§ demonstração de não-
manipulação
§ eficiência ( F pode alegar que
outras coisas são menos
importantes que a face, o que não
é um AAF.)
Lucro com minimização: F tem a
oportunidade de dar a face
Lucro pela implicitude
(off record)
§ Polidez positiva (para satisfazer a
face positiva de O;
§ Polidez negativa (para satisfazer
a face negativa de O.
§ F pode satisfazer a face negativa
em maior grau do que a
conseguida pela estratégia da
polidez negativa;
§ F pode evitar a responsabilidade
por sua ação, que as estratégias
explícitas envolvem( mas corre o
risco de criar ambiidade e
obscuridade.
Quadro n° 3 – Formas Diversas de Lucros Obtidos em uma Interação (Brown & Levinson.)
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Fundamentação Teórica 31
Por último, é importante ressaltar que a seriedade de um ato de ameaça, isto
é, os cálculos dos lucros que podem ser obtidos ao usar ou não a polidez positiva ou
negativa, envolve diversos fatores em muitas culturas, quiçá em todas. Entretanto, a
distância social entre os participantes de uma interação é provavelmente o fator que
promoverá a atitude de cada ator.
1.4. A Gramática Sistêmico-Funcional:
Um breve olhar sobre a língua em uma perspectiva social
Falar de linguagem requer falar sobre como as pessoas usam a língua e
como a língua é estruturada. Observar estas questões envolve a análise das
interações lingüísticas e conduz ao reconhecimento da importância dos contextos de
situação (registro) e de cultura (gênero), para entendermos por que um texto tem o
significado que traz em si. O propósito ou a função geral de uma interação é o
gênero ao qual o texto usado nesta interação pertence. Usa-se o conceito de
gênero para explicar e descrever como as pessoas usam a linguagem para alcançar
objetivos culturalmente reconhecidos.
uma vasta variedade de gêneros reconhecidos como tipos de atividades
sociais, por exemplo, gêneros literários, educacionais, ou gêneros que são usados
em nosso cotidiano, como “comprar e vender”, contar piadas”, “trocar opiniões”, e
muitos outros mais. Dentro do contexto de cultura, encontramos o contexto de
situação, o registro. O registro apresenta três variáveis: campo, modo e relações,
que podem rapidamente ser identificadas numa interação.
A primeira delas é o assunto que está sendo tratado. Quando a ele nos
referimos, estamos tratando do campo, que é realizado pela metafunção
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Fundamentação Teórica 32
ideacional. Observa-se, na segunda varvel, o papel que a linguagem tem na
interação, pois a adequamos de acordo com a distância entre os participantes.
Utilizamos uma linguagem ao falar com o juiz em um julgamento e outra com um
amigo íntimo. Ao abordarmos esta variável, focamos o modo do texto, que é
realizado pela metafunção textual. A terceira variável do registro é observada nas
relações interpessoais entre os participantes de uma interação e os papéis
assumidos na interação. Esta variável é denominada relações e é realizada pela
metafunção interpessoal.
Uma vez que a presente pesquisa partiu de um problema com o qual
podemos nos deparar ao usarmos a linguagem na prática social e em um contexto
de ação – neste caso, a sala de aula – procurei subsídios na Gramática Sistêmico-
Funcional a fim de encontrar uma iluminação teórica da questão em jogo, de forma a
contribuir para a elucidação do problema.
Partindo do pressuposto acima, considero relevante enfocar a princípio as formas
de uso da língua, que é um sistema de significados e que, segundo Halliday (1994),
é usada em três categorias distintas, porém simultâneas. Primeiramente, para
falarmos de nossa experiência de mundo e também para expressarmos nossas
percepções. Em segundo lugar, fazemos uso da língua para interagirmos com outras
pessoas. Em terceiro lugar, optamos por organizá-la para dar formato ao nosso
texto, ou para ordenarmos nossas mensagens. Halliday (idem) considera cada uma
dessas categorias acima mencionadas uma metafunção da linguagem. Seguindo
esta visão hallidayana, Thompson (1996) afirma que, ao optar por um determinado
fraseado, o falante está fazendo uma escolha entre outras prováveis e realizando
três tipos de significados simultaneamente, ou seja, ao utilizar a língua o falante está
realizando significados relativos à representação da experiência através da língua.
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Fundamentação Teórica 33
Tais significados referem-se às atitudes em relação ao outro e aos papéis
assumidos, e à organização do conteúdo da mensagem.
Compreende-se, assim, a perspectiva multifuncional adotada pela visão
funcional da língua: uma forma combinada das metafunções. O texto escolhido pelo
usuário ou falante expressa significados sobre a realidade através da metafunção
ideacional; expressa suas atitudes em relação ao outro e os papéis sociais
assumidos através da metafunção interpessoal, e a organização estrutural de seu
texto é expressa pela metafunção textual.
Cada metafunção apresenta um sistema subjacente que viabiliza a realização de
seus significados. A metafunção ideacional ou experiencial está relacionada ao uso
da língua como representações de experiências e do mundo. A realização dessas
representações se através do sistema de transitividade. Eggins (1994:220)
afirma que o uso desse sistema implica a escolha de processos e seus argumentos.
Segundo Halliday (1994:206), o sistema de transitividade é a mais forte expressão
de experiência, haja vista a forma com que o falante constrói um mundo de
representações baseado na escolha de determinados processos.
No sistema de transitividade, cada oração é composta de três elementos. O
primeiro desses elementos é denominado processo, a ação. seis tipos de
processos. Eles podem ser materiais, processos de fazer, relacionados a ações do
mundo físico,como trazer, transferir, buscar, circular etc.; mentais, processos de
sentir ( cf. Halliday, 1994: 112) e são relativos à representação do nosso mundo
interior (Thompson, 1996: 82). Halliday divide os processos mentais em três
subtipos: processos mentais de cognição, relacionados à decisão e compreensão
(saber, entender, decidir); processos mentais de percepção, relacionados à
observação de fenômenos (sentir); e processos mentais de afeição, relacionados
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Fundamentação Teórica 34
aos sentimentos (gostar, amar). Os verbais, processos de dizer, estão na fronteira
entre os processos mentais e relacionais; os processos comportamentais são
ações que englobam comportamentos físicos e psicológicos realizados de forma
simultânea, eles estão entre os materiais e os mentais; os existenciais são
processos que se encontram entre os processos relacionais e materiais. As
proposições existenciais são realizadas tipicamente pelos processos haver, existir e
ter (em português brasileiro); todavia, outros processos como emergir, surgir e
ocorrer podem ser considerados existenciais em alguns contextos. Os processos
relacionais o processos de ser. Eles possuem uma função classificatória,
relacionando duas entidades no discurso. Halliday (1994: 119) afirma que todas as
nguas acomodam formas sistemáticas de realização dos processos relacionais,
sendo que o autor identifica as três abaixo citadas como as principais:
1. intensivo: onde X é (ou está) A
2. circunstancial: onde X é (ou está) em A (onde a preposição em pode também ser
substituída por outra)
3. possessivo: onde X tem (ou possui) A
Cada um desses tipos pode ainda ser classificado de dois modos:
1. atributivo: onde A é um atributo de X
2. identificativo: onde A é a identidade de X
O segundo desses elementos é a circunstância. As circunstâncias são de
caráter opcional; e os participantes, o terceiro elemento, geralmente representados
por grupos nominais. Os padrões de transitividade são a realização oracional das
escolhas contextuais. Segundo Eggins (1994: 270), ao selecionar o tipo de processo
a usar e a configuração de participantes que desejam expressar, os próprios
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Fundamentação Teórica 35
participantes estão ativamente escolhendo representar uma experiência em
particular.
A metafunção interpessoal, conforme Eggins (1994) aponta, expressa os papéis
e as atitudes dos participantes de determinada interação. Ela é realizada através dos
sistemas de MODO e MODALIDADE, que sinalizam a interação. O sistema de
MODO organiza a oração em dois componentes ou constituintes: modo oracional,
composto por sujeito e finito; e o resíduo, composto pelo predicador, complemento e
adjunto. É nesse sistema que se estabelecem as relações entre os participantes. O
de MODALIDADE tem um efeito importante para regular comportamentos. Este
sistema possui dois tipos: modulação (obrigação) e modalização (probabilidade e
usualidade).
O sistema de modalidade tem um efeito importante para regular
comportamentos, uma vez que evidencia os diversos graus de “poder”, pois
mediante o uso de verbos modais de diferentes escalas de obrigação, o falante pode
se colocar numa posição de maior ou menor poder que o ouvinte (ex: “Você deve
ajudar seu amigo” - em contraste a “Você poderia ajudar seu amigo”). Ao se discutir
esse sistema pode ser observada uma mudança de questões estritamente
gramaticais em direção a áreas mais complexas para estabelecermos como certas
em termos estruturais. Com a avaliação (evaluation), fica-se ainda mais na fronteira
da gramática, pois muito da avaliação é expresso por escolhas lexicais e poucas são
as estruturas gramaticais que podem ser vistas como se evoluíssem com uma
função primariamente avaliativa. Contudo, é importante perceber que a avaliação é
a parte central de qualquer texto. Ela pode ser definida como a indicação se o
falante ou emissor de uma certa mensagem considera que algo (uma pessoa, uma
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Fundamentação Teórica 36
coisa, uma ação, uma idéia, um evento ou situação, etc.) seja bom ou ruim (cf.
Thompson, 1996: 65).
A metafunção textual está relacionada ao sistema temático. Este sistema é
o que à oração o seu caráter de mensagem, dividindo a sentença em duas
partes: o tema e o rema. O tema é o ponto de partida da mensagem, enquanto o
rema é o elemento onde o tema é desenvolvido.
O tema envolve três aspectos: tipo, que subdivide-se em simples ou múltiplo;
escolha de marcado ou não-marcado; e escolha de predicado ou não predicado.
Sem estruturas como “tema”, não existiriam textos. Segundo Halliday (1994), o limite
do Tema é o primeiro elemento com função na Transitividade, chamado Tema
ideacional. Se esse elemento é único, é chamado de Tema simples. Porém, quando
antes dele ocorrem outros elementos, passa a ser chamado de Tema múltiplo.
Esses elementos são o Tema textual e o Tema interpessoal.
É notável a importância do sistema temático e de acordo com Eggins
(1994:306):
The essential contribution made by textual meaning is to actualize a
range of different textual structures which operate at all levels of the text, and
whose function is to enable the experiential and interpersonal meanings we
have chosen to make to be realized in a cohesive and coherent way.”
Pautei-me pela metafunção ideacional e pela metafunção textual para a
análise de dados coletados. Na primeira, a fim de verificar o papel da linguagem de
acordo com a distância social entre os participantes, e observar a forma como os
aprendizes construíram em seus diários o mundo de representações baseados em
sua escolha de processos. Na segunda, na busca da compreensão da forma de
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Fundamentação Teórica 37
organização da mensagem de cada participante dos eventos em que aprendizes e
eu, professora e pesquisadora, participamos as aulas. Bem como, baseei-me nos
atos de ameaça à face positiva e negativa, e nas estratégias de proteção da face.
Embora os caminhos de conhecimento e teoria que tenha trilhado
acontecessem de forma simultânea tivessem um aspecto paralelo, em um dado
momento cruzavam-se, quebrando assim a premissa de que as paralelas nunca se
encontram. A figura abaixo traduz essa percepção:
Fig. 2: Caminhos trilhados que se encontram.
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Metodologia
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CAPÍTULO 2:
Explicações sobre o Planejamento da Pesquisa
2.1. Por que uma pesquisa-ação?
Como ponto de partida de minha confissão, voltei-me para uma reflexão sobre
o desenvolvimento daqueles que participam em uma pesquisa. Como bem aponta
Moita Lopes (2003: 31) as pesquisas objetivam que todos “entendam o mundo em
que vivem”, como possibilidade de relacionarem os objetivos pretendidos com os
objetivos alcançados. Sinto que meu papel como professora requer de mim uma
postura de busca de uma revisão de minhas atitudes como uma profissional que
exercita o questionamento sobre o quê, como e por que ensinar. Na realidade, em
minha investigação, tamm precisei de respostas para algumas perguntas que
indicariam os caminhos que deveria trilhar para alcançar os objetivos estabelecidos.
Essas perguntas foram de ordem filosófica e baseadas em algumas que Freire
(1970) propõe, como:
(a) O que faço?
(b) Como faço?
(c) Como me tornei assim?
(d) Quero ser assim?
(e) O que significa ser assim?
(f) Posso agir de forma diferente?
(g) Como o meu agir reflete naqueles que participam comigo do processo
ensino-aprendizagem em que estou inserida?
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Ao compreender o que buscava, descobri que o cerne de meu interesse em
fazer pesquisa era investigar minha própria prática, com a expectativa de
experimentar alternativas para a minha ação pedagógica, com o intuito de construir
meu próprio conhecimento sobre as formas como a reflexão e a interação
contribuem para a conscientização de ações de construção conhecimento.
Assim, partindo do pressuposto de que o papel fundamental do professor-
pesquisador é de refletir sobre sua prática em dialogar com seus alunos a fim de
estimulá-los a assumir responsabilidade sobre seu processo de aprendizado e a
atuar de forma autônoma e crítica, julguei relevante uma pesquisa, pautada pelos
seguintes objetivos:
1- compreender os fatores relacionados à “acomodação de
determinados aprendizes;
2- identificar as possíveis alternativas que promovam o êxodo da
Zona de Conforto; e
3- verificar como (ou se) a reflexão e a interação de alunos entre
si e com o professor podem levar aprendizes ao êxodo da zona
de conforto.
Esta análise procurou responder às seguintes macro-perguntas:
1.Quais o os fatores relacionados à permanência na Zona
de Conforto?
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2.Como (ou se) a reflexão e a interação contribuem para
conscientização de ações visando à construção de
conhecimento e significados?
3.De que forma o professor pode levar o aprendiz à
conscientização e implementação de ações que o tornem
autônomo para construir significados e não permanecer na
zona de conforto?
Por isso, optei por utilizar como metodologia a pesquisa-ação, antes de tudo,
porque queria realizá-la como professora e pesquisadora, queria contar com a
colaboração de meus aprendizes e visava à compreensão para a transformação.
Ademais, assim como ensino e aprendizagem, ensino e pesquisa caminham juntos.
Neste aspecto, deve-se lembrar da asserção de Freire (2001a: 32) de que não
ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Ao tratar do tema, o autor enfatiza
que:
(...) o que de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma
forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da
natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que
se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se perceba e
se assuma, porque professor, como pesquisador (op. cit.).
Para compreender minha escolha, também se faz necessária uma breve
retrospectiva da pesquisa no contexto educacional em nosso país.
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As pesquisas na área de ensino-aprendizagem de ngua no Brasil,
tradicionalmente, foram sempre caracterizadas por se encaixarem no quadro de
investigação teórico-especulativa baseada em informação advinda principalmente da
lingüística, que estabelece implicações para como se proceder em sala de aula, sem
que esta seja o objeto de investigação. Ou ainda, caracterizavam-se por estarem
calcadas na investigação do produto da aprendizagem de línguas. Ora, com estas
características tradicionais, evidencia-se assim que, desta forma, ou o processo de
ensino-aprendizagem fica fora do alcance do pesquisador, uma vez que tal pesquisa
tem como objetivo dar sugestões para a sala de aula, ou temos a investigação
dessas sugestões com foco no resultado da aprendizagem, sem que o processo de
ensinar e aprender seja considerado.
Moita Lopes (1996: 89) apontava a pesquisa-ação como uma das
tendências da pesquisa na área de ensino-aprendizagem de línguas no Brasil, uma
vez que a sala de aula deixou de ser reconhecida como lugar da certeza, ou de
aplicação de um saber pronto e acabado, e passou a ser compreendida como
espaço da procura deste saber, em que o professor passou a ter um papel central
na prática social da construção de conhecimento sobre a sala de aula. Assim, a
pesquisa-ão pode ser utilizada:
(a) como uma maneira privilegiada de gerar conhecimento
sobre a sala de aula, devido à percepção interna do
processo que o professor tem;
(b) como uma forma de avanço educacional, que envolve o
professor na reflexão crítica do seu trabalho.
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Celani (2000b), ao apontar as tendências de pesquisa em Lingüística
Aplicada, indica um crescimento de estudos nas áreas de ensino-aprendizagem de
nguas e formação de professores, alunos, pesquisadores e coordenadores que se
engajam em um processo de negociação de significados de pesquisa, tornando-se
co-construtores no processo de geração de conhecimento. É na asserção desta
autora que encontro o vínculo com as idéias que compartilho com Vygotsky
(1930/1998), que, se pensarmos na construção do conhecimento em colaboração
com o outro, podemos conduzir uma pesquisa que propiciará aos aprendizes
maiores possibilidades para a interação, com o intuito de compartilhar conhecimento
e aprendizagem.
Uma outra importante visão sobre a pesquisa-ação é a de Thiollent (1986:
14), que a considera “uma pesquisa social com base empírica que é concebida e
realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um
problema coletivo e no qual os pesquisadores os participantes representativos da
situação ou problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo”.
Ademais, este tipo de pesquisa, aponta Thiollent (2002: 195):
...possibilita o estudo dinâmico dos “problemas, decisões,
ações, negociações, conflitos e tomadas de consciência que ocorrem
entre os agentes durante o processo de transformação da situação.
Em relação a ser uma metodologia atraente, Wallace (1998) explica que a
pesquisa-ação pode ter um resultado específico e imediato que pode ser
diretamente relacionado à prática, no próprio contexto do professor...”. Em meu
caso, acredito que é atraente principalmente por me permitir como pesquisadora um
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engajamento em um processo de negociação de significados de pesquisa, em que,
com os aprendizes, co-construímos e geramos conhecimento.
2.2. O Contexto
A pesquisa foi conduzida em duas fases. A primeira durante o primeiro semestre de
2005, quando houve a coleta de dados. A segunda fase deu-se no segundo
semestre daquele ano e no primeiro semestre de 2006, quando houve a alise de
dados. A investigação teve como cenário uma sala de aula numa faculdade privada
de formação de professores de língua estrangeira localizada numa zona semi-
residencial de uma região metropolitana do Estado do Rio de Janeiro. A instituição
tem como principal objetivo formar profissionais que se diferenciem não em
termos de competência técnica, bem como de propiciar aos seus alunos uma
conscientização política e uma sensibilidade em relação aos problemas inerentes ao
papel da linguagem no contexto social em que vivem. É importante salientar aqui a
receptividade e colaboração da direção e coordenão da faculdade, e a dedicação
e interesse dos participantes os aprendizes que venceram a inibição inicial
quanto à gravação das aulas. Acredito que a interação estabelecida entre mim,
professora-pesquisadora, e os participantes foi muito importante para a pesquisa,
permitindo uma reflexão compartilhada sobre os fatos observados e estudados,
procurando entendê-los. Erickson (1986) enfatiza a necessidade de um bom
relacionamento entre pesquisador e participantes para que se obtenha confiança
entre ambos e para que o pesquisador consiga ter acesso ao ponto de vista deles.
Foi pautada pela asserção desse autor que procurei conduzir esta investigação.
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2.3.Os participantes
São participantes desta pesquisa:
a) A professora-pesquisadora, mestranda, 43 anos, especialista em Lingüística
Aplicada (Universidade Federal Fluminense) e em Língua Inglesa (Universidade do
Estado do Rio de Janeiro), mestranda do programa de Lingüística Aplicada ao
Ensino de Línguas da Pontifícia Universidade Católica, SP. Semestralmente leciono
três disciplinas do curso de Letras - Discurso Oral na Língua Inglesa, uma disciplina
do terceiro período; Língua Inglesa II Fonética e Fonologia da Língua Inglesa; e
Língua Inglesa III O Sintagma Nominal. Como fruto de uma contínua reflexão,
venho modificando a abordagem de ensino nestas disciplinas buscando amenizar a
centralização do papel do professor e dar mais voz aos aprendizes a fim de que
estes se envolvam também no processo reflexivo de ensino e aprendizagem e
adquiram, através de maior interação com seus pares, responsabilidade sobre seu
processo de aprendizagem para que passem a atuar de forma autônoma. A fim de
aprofundar-me na pesquisa, durante o primeiro semestre de 2005, optei por ter
apenas uma turma, ngua Inglesa I. Procurei participar ativamente do processo de
ensino-aprendizagem, colocando em discussão todos os questionamentos
desencadeados no decorrer da investigação, guiada principalmente pela leitura de
meus diários e os dos aprendizes, com o propósito de propiciar a reflexão sobre a
percepção interna que tínhamos em relação ao que fazíamos em sala de aula.
Durante cada releitura dos diários, meus e dos aprendizes, modificava o tipo de
atividade e dinâmica de minhas aulas. Milhares foram as dúvidas em relação ao
caminho a seguir. Confesso que este trabalho me tornou mais sensível às
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necessidades de meus alunos e a observação das reações em aula me tornou
totalmente dependente da turma em um processo contínuo observava, refletia,
agia, refletia, lia diários, lia anotões, refletia, ouvia, refletia, planejava, agia,
mudava, crescia....
b) Os aprendizes: Cursando a disciplina ngua Inglesa I na faculdade onde
leciono, havia 22 alunos do primeiro período, que eram na grande maioria jovens
que escolheram o curso na instituição em virtude do horário oferecido, por
trabalharem e preferirem a ênfase na formação de professores da língua inglesa e
suas literaturas, curso oferecido neste horário e município apenas por esta
instituição e pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Campus FFP) em
horário parcialmente integral, tarde e noite. Os participantes desta pesquisa têm
previsão de término de curso para no mínimo em dezembro de 2008. Classifico os
aprendizes participantes desta pesquisa em duas categorias participantes centrais
e participantes de apoio (chamo-os de participantes de apoio por ter utilizado seus
diários para contrastar ou corroborar alguma asserção não explícita, bem como
esclarecer qualquer vida que tivesse ao ler os diários dos participantes centrais).
Dentre os vinte e dois alunos da turma, optei por escolher seis alunos para serem os
participantes centrais, observados na pesquisa.
Os participantes de apoio são todos aqueles que fazem parte da turma. Assim
como os participantes centrais, eles escreveram diários reflexivos, participaram da
gravação das aulas, bem como contribuíram com comentários e participações em
nossas discussões. os centrais foram aqueles que selecionei para maior
observação e investigação.
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Considerei importante investigar como a reflexão contribui para promoção do
êxodo da ZC de qualquer um de meus alunos. Por esse motivo, a escolha dos
participantes centrais foi feita baseada na noção de competência. Canale e Swain
(1980:28-31) oferecem um arcabouço teórico para a descrição dos diferentes tipos
de competência. O modelo dessas autoras, com a revisão procedida por Canale
(1983), representou um grande avanço, dominando a área de avaliação de
ensino/aprendizagem de inglês como língua estrangeira e como segunda língua
durante uma década. Em seu modelo final, essas autoras incluem quatro tipos de
competência, que são:
a) competência gramatical: implicando o domínio do código lingüístico, a habilidade
em reconhecer as características lingüísticas da língua e usá-las para formar
palavras e frases;
b) competência sociolingüística: implicando o conhecimento das regras sociais que
norteiam o uso da ngua, compreensão do contexto social no qual a língua é usada.
Tal competência permite o julgamento da adequação;
c) competência discursiva: dizendo respeito à conexão de uma série de orações e
frases com a finalidade de formar um todo significativo. Este conhecimento tem de
ser compartilhado pelo falante/escritor e ouvinte/leitor; e
d) competência estratégica: como a competência comunicativa é relativa, estratégias
de enfrentamento devem ser usadas para compensar qualquer imperfeição no
conhecimento das regras.
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Para Canale e Swain (1980), os aprendizes adquiririam competência
comunicativa se ficassem expostos, de maneira uniforme, a essas quatro formas de
competência.
Desta forma, foram escolhidos seis aprendizes que apresentassem uma das
seguintes características:
(i) as quatro competências, mas participasse das interões em aula se
fosse solicitado.
(ii) as quatro competências e participasse das interações em aula sendo ou
não solicitado.
(iii) apenas a competência gramatical e não participasse das interações em
aula;
(iv) apenas a competência discursiva e a estratégica, e participasse das
interações em aula.
Após observá-los nas interações em aula e os textos produzidos
individualmente durante o mês de fevereiro, escolhi Estrela e Elvis, que se
enquadravam nas características (i); Clara e Alessandra, que se enquadravam nas
características (ii); Mário, que se enquadrava nas características (iii); e Vânia, que
se enquadrava nas características (iv). Vale ressaltar que fiz uso de nomes fictícios
para preservação dos nomes dos aprendizes.
Caracterização dos participantes centrais:
Estrela tinha 17 anos, nasceu em 09 de outubro de 1987, estudou por cerca de seis
anos numa escola de idiomas e freqüentou o curso Normal (Magistério) no Segundo
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Grau de uma instituição pública. Ela comunica-se com facilidade, mas nas primeiras
nove aulas participava se fosse solicitada ou questionada pela professora. Em
sua primeira apresentação em fevereiro de 2005, Estrela fez uso de inglês em tom
baixo de voz. Foi, entretanto, direta ao falar sobre si, citando quem era, quais eram
seus objetivos e suas expectativas sobre a disciplina. Durante os trabalhos em
pares, observei que optava por ouvir mais do que expressar sua opinião e em
trabalhos em grupo demonstrava concordar com o que Alessandra em geral
propunha. Estrela escreveu todos os seus diários em inglês.
Elvis tinha 21 anos incompletos ao começar o semestre letivo, estudava havia quase
seis anos numa escola de idiomas e é advindo do Segundo Grau cnico de uma
renomada instituição federal. Embora tenha se apresentado em inglês,
comunicando-se com clareza, precisão lingüística e fazendo uso de estratégias
discursivas desde o primeiro dia de aula, evitava a interação com a turma. Elvis
atribui sua escolha pelo curso de tradução à sua timidez. Observei que em trabalhos
em pares D não se intimidava com o uso de inglês para expor sua opinião ou para
resolver uma tarefa proposta. Todavia, nas discussões em grupo, permanecia em
silêncio, ainda que não concordasse com o grupo. Ou ainda, se resolvesse expor um
ponto de vista diferente de seus colegas de turma, evitava os olhares dos colegas e
buscava no da professora a confirmação e a aprovação do que falara. Escreveu
todos os diários em português.
Clara cursou Formação Geral no Segundo Grau em um colégio estadual e estudou
inglês por mais de cinco anos em um curso de inglês em outra cidade. Embora fosse
bastante jovem, já lecionava em um pequeno curso de inglês. No primeiro dia de
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aula apresentou-se em português e afirmou que o se sentia nem um pouco à
vontade para falar inglês em grupo, que não via propósito nas atividades serem
feitas em inglês, pois acreditava que quem começa um curso de Letras
Português/Inglês tem de saber o idioma. Portanto não havia necessidade de
prática oral. Clara apresentou grande resistência para participar das tarefas
propostas durante todo o mês de fevereiro e somente na aula do dia 18 de março
(quase um mês após o início do curso) passou a falar em aula. Nessa data, Clara
demonstrou possuir competência comunicativa e grande habilidade para interagir em
grupo ou em duplas. Escreveu a maior parte de seus diários em português.
Alessandra, 19 anos, estudou por cerca de seis anos numa escola de idiomas e
freqüentou o curso Normal (Magistério) no Segundo Grau de uma instituição pública.
Ela trabalhava durante o dia em atividade incompatível com o magistério e estuda à
noite na faculdade. Desde o primeiro dia de aula, Alessandra participou das
atividades propostas, apresentou-se e questionou as datas das atividades propostas
pela professora em inglês, bem como continuou falando em inglês mesmo após o
término da aula. Era freqüente voluntária para iniciar quaisquer que fossem as
discussões. Escreveu seus diários em português e em inglês.
Mário tinha 19 anos incompletos ao começar o semestre letivo e era autodidata.
Oriundo de uma escola estadual e do Pro Uni, aprendeu inglês por meio de um
curso composto de fascículos e CDs de áudio. Na apresentação inicial frisou a sua
deficiência em se comunicar em inglês e insistiu durante grande parte do semestre
em fazer uso apenas de português. Atribuía em seus diários não conseguir
acompanhar as aulas à sua falta de compreensão auditiva. Durante a atividade em
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que tivesse de se expressar em inglês, apresentava muita resistência para expor sua
avalião e opinião, e não conseguia argumentar sem inserir mais palavras em
português do que em inglês em sua fala, ainda que soubesse como traduzi-las.
Entretanto, era cuidadoso em concordâncias sujeito/verbo e apropriação de tempo
verbal para contrastar presente, passado e futuro. Mário o aceitou inicialmente o
fato de ter nossas aulas gravadas. Posteriormente, foi dissuadido pela própria turma
para que as aulas fossem, pelo menos, áudio-gravadas. Todos os seus diários foram
escritos em português.
Vânia , 26 anos, estudou inglês por mais de cinco anos em uma escola de idiomas e
estava sem estudar por quase dez anos. Altamente participativa, fazia-se
compreender usando uma estratégia de substituição das palavras que não conhecia
em inglês por conceitos formados por palavras com radical do latim. Não possuía
precisão lingüística, nem distinguia tempo verbal. Cometia erros elementares, mas
não se intimidava em grupos, nem em trabalhos em duplas. Não obstante,
conseguia transmitir suas idéias e opinião sobre assuntos diversos. Vânia escreveu
seus diários, em grande parte, em português.
2.4. Coleta de Dados
A literatura sobre metodologia para pesquisa-ação aponta diversos
instrumentos para coleta de dados. Os instrumentos em sala de aula permitem
coletar dados que se caracterizam, segundo Cavalcanti e Moita Lopes (1991) e
Moita Lopes (1996), como fotografias daquilo que ocorre no ensino pela explicitação
das tentativas de aprender-ensinar línguas. Os dados de sala de aula, segundo Van
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51
Lier (1990), caracterizam-se por ações que (1) ocorrem em um contexto e são
típicas da maioria dos aprendizes de língua; (2) permitem que se descreva o que foi
feito e aconteceu durante uma determinada prática que influenciou uma ação e que
implicações posteriores puderam ser observadas; (3) provêm de rotinas prováveis de
acontecer e previstas pelos participantes (professor e aprendizes); (4) revelam a
competência comunicativa real dos aprendizes; e (5) mostram o trabalho cognitivo
dos aprendizes, não diretamente mensurável em termos de quantidade de produto,
mas pela qualidade da produção de língua.
A coleta de dados foi conduzida por meio de instrumentos característicos da
pesquisa etnográfica (cf. Erickson, 1986). Uma de suas características
metodológicas é a utilização de diversos instrumentos e métodos de coleta e de
análise de dados - conhecida como triangulação, como aponta Van Lier, (1990:12).
Segundo Erickson (op. cit) a triangulação amplia as possibilidades de observação
reduzindo a inter-subjetividade advinda da coleta e da análise dos dados.
A terceira etapa foi dedicada à análise e discussão de dados para elaboração
das considerações finais.
2.4.1. Os Instrumentos e Procedimentos de Coleta de Dados
Os instrumentos utilizados para coleta de dados da sala de aula constituíram-
se de diários reflexivos da professora-pesquisadora, diários reflexivos dialogados de
aprendizes, um questionário Likert, observações e anotações de campo (ou micro-
etnografia), e gravações em áudio e vídeo das minhas próprias aulas.
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Em relação ao uso de diários reflexivos da professora-pesquisadora, desde 24
de fevereiro de 2005, ao término de minhas aulas, eram registrados em forma de
diário os fatos observados, bem como sentimentos que tive em relação a minhas
ações e as reações de meus alunos. Esse instrumento tem se mostrado eficiente
para o professor refletir criticamente sobre sua prática, apesar de não promover por
si só a reflexão crítica.
A releitura de meus diários demonstrou que, por diversas vezes, havia
ansiedade em ver mudança em minha sala de aula. Além disso, algumas
observações sintéticas geraram a compreensão de que certos detalhes sobre
minhas tomadas de ações advindas de uma reflexão em ação (cf. Schön,
1983,1992) deveriam ter sido descritos por completo. Conseqüentemente, foram
escritos diários mais longos a partir do segundo mês de aula.
Com a finalidade de levar os aprendizes a refletirem, primeiramente sozinhos
e, em seguida, indiretamente comigo, a pesquisadora, sobre (1) sua atuação e
interação em sala de aula, e sobre (2) a compreensão a respeito da forma como
procediam em relação a estes dois aspectos adquiridos, os diários reflexivos se
constituíram, a meu ver, no mais importante instrumento de coleta de dados para a
pesquisa, que as questões levantadas foram sementes que brotariam como
respostas para algumas das perguntas de ordem filosófica propostas por Freire
(2001) inicialmente mencionadas neste capítulo. Acredito que a principal forma de se
conseguir evoluir em qualquer atividade intelectual começa quando se conhece a
resposta para algumas dessas perguntas.
O uso de diários reflexivos tem sido muito freqüente no programa de formação
de professores. Entretanto, a literatura aponta um mero bastante restrito de
materiais produzidos para orientação de professores sobre o uso relevante do diário
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com objetivo de promover desenvolvimento pessoal e profissional. A minha primeira
experiência com diários deu-se em uma das disciplinas do mestrado e fôra bastante
proveitosa para que refletisse sobre meu projeto de pesquisa.
Todos os aprendizes da Turma de Língua Inglesa II daquele semestre se
comprometeram em escrever seus diários e sempre entregá-los na aula seguinte.
Sempre lia e relia o que cada um escrevia e acrescentava perguntas e comentários
que os levariam a novas reflexões para os próximos diários. Utilizei os dez primeiros
para que adquirissem prática em descrever suas opiniões e sentimentos de forma
direta e sincera. Após terem escrito quinze diários, completados no dia 28 de abril de
2005, os aprendizes passaram a escrever apenas um diário a cada duas aulas. Com
isto, consegui cerca de trinta diários de cada aprendiz. Segundo Nunan (1989), os
diários de aprendizes sobre suas experiências de aprendizado provêm informação e
introvisão (insight) sobre o aprendizado da língua, o que é improvável de ser
conseguido por outros meios. De fato, como apontava Van Lier (1988: 66), os
diários puderam fornecer informações sobre o que motiva o professor e aprendizes
na sala de aula, bem como sobre fatores afetivos e pessoais que influenciam a
interação e a aprendizagem. Creio que a idéia dos diários foi muito bem aceita
desde o primeiro dia de aula. Fiz uso apenas de excertos dos diários que tratavam
dos temas investigados. Esses excertos compuseram um arquivo de texto que se
constituiu em um total de 211 parágrafos, cerca de 26.388 (vinte seis mil, trezentos e
oitenta e oito) bytes, equivalente a 4.600 (quatro mil e seiscentas) palavras (tokens).
Nele foram encontrados 818 (oitocentos e dezoito processos), aproximadamente
18% (dezoito por cento) ou 1/5 (um quinto) do texto.
Encontrei uma certa resistência dos aprendizes em relação a serem vídeo-
gravados. Embora tivesse conversado com todos sobre a gravação da aula, senti
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que não lhes parecia agradável serem filmados. Discuti com meu grupo do seminário
de pesquisa a possibilidade de apenas gravá-los em áudio, o que de um certo modo
foi bastante positivo. Foi quando descobri que este “medo” da câmera não é uma
reação incomum. Outros pesquisadores também enfrentaram problemas desta
natureza. Portanto, precisei em princípio gravar algumas aulas em áudio. Na
primeira delas, percebi que precisaria conversar com os alunos novamente, uma vez
que mal podia ouvir suas vozes na gravação, tamanha era sua inibição. Após nossa
conversa esclarecedora, tivemos mais duas aulas áudio-gravadas, uma em março e
outra em abril. No fim do mês de abril tornei a conversar com os aprendizes sobre a
possibilidade de termos algumas aulas deo-gravadas. Consegui convencê-los e a
primeira vídeo-gravação foi no dia 02 de junho de 2005. A seguinte foi no dia 23 de
junho de 2005. A observação e a gravação das aulas auxiliaram na análise da
prática dos aprendizes e da professora, detectando as coerências e incoerências
entre o discurso e a minha prática efetiva como professora.
Ainda na segunda etapa comecei a transcrever as aulas áudio-gravadas e
vídeo-gravadas, sempre procurando relacionar algo que observara ou ouvira nas
fitas com o que lia nos diários. Saliento que não fiz uso de nenhum método de
transcrição específico. As falas foram transcritas ortograficamente, respeitando o
que foi dito, sem qualquer correção gramatical, apenas substituindo alguns traços de
oralidade nas falas dos participantes (como perguntas sem o uso de auxiliares, ou
uso inadequado de expressões sob influência do português.), uma vez que esse
aspecto não foi foco de minha investigação e tamm por levar em conta que lidei
com duas línguas o português (nos diários) e o inglês (nas aulas e em alguns
diários). Ressalto que para a preservação da identidade de todos os aprendizes, eu
os denomino A1, A2, A3, ...A22. Após a observação das gravações das aulas,
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também tentei relacionar o que ouvia com as notas de campo microetnografia,
segundo Erickson (1986) - feitas quando considerei necessário registrar algum
aspecto importante que captara durante alguma atividade por exemplo, a
sensação de que alguns aprendizes estavam reagindo às perguntas que fizera em
seus diários reflexivos e dialogados, ou de ter me sentido menos ansiosa em
determinadas aulas. A triangulação das gravações com as notas de campo e com
meus diários reflexivos foi importante para descrever as minhas impressões de
professora e pesquisadora, uma vez que nossa memória não é capaz de armazenar
tantas lembranças de fatos ocorridos em aula.
Na aula de 30 de junho de 2005 utilizei uma atividade pedagógica (Atividade
Pedagógica Potencialmente Exploratória, doravante APPES em português e PEPA
em inglês) com fins investigativos. Allwright (2003) sugere que APPES são
instrumentos que promovem uma discussão para reflexão sobre a possível solução
de problemas que acontecem em sala de aula. Como base da atividade utilizei um
questionário Likert que foi, primeiramente, respondido individualmente, em seguida
em pares e por fim com a turma toda. Nesta data, apenas dezesseis dos 22
aprendizes estavam presentes, entre os quais todos os participantes centrais.
A técnica Likert é um conjunto de afirmações de atitudes. É geralmente usada
no formato de questionário, no qual o respondente deve expressar seu grau de
concordância ou discordância numa escala de 1 a 5. As afirmativas foram
formuladas a partir da leitura dos primeiros diários. Meu propósito era fazer deste
instrumento o ponto principal para uma sessão reflexiva conduzida próximo ao fim
do semestre para investigar se houvera alguma mudança produzida pela reflexão
decorrente da análise dos diários. Saliento ainda que a escolha da atividade para
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abordagem do assunto em pauta foi também realizada com base nas notas de
campo colhidas em cada aula.
Os resultados do questionário, bem como o modelo Likert, podem ser
observados no Anexo I, sob o título “PEPA Potencially Exploratory Pedagogic
Activity.
2.5. Procedimentos de análise e interpretação dos dados
Quanto à análise e interpretação dos dados, confesso que fui bastante
influenciada pelas leituras feitas durante um Curso de Gramática Sistêmico
Funcional (GSF). Pude verificar que a vio hallidayana traz em si uma teoria atual e
complexa, bem como uma ferramenta investigativa capaz de fornecer subsídios
suficientes para diferentes veis de análises da linguagem com perspectiva social.
Não obstante, ainda senti a necessidade de inserir outras referências teóricas para
conferir um grau maior de confiabilidade e credibilidade à pesquisa. Por isso, decidi
basear-me em três processos.
O primeiro deles foi a análise de determinados elementos da língua a partir da
sua função e do contexto de situação de uso em que ele se insere. Pautei-me pela
abordagem sistêmico-funcional, pois esta busca descrever como e para que a língua
é usada para fazer coisas, e é por meio dela que analisei as escolhas lexicais
referenciais presentes no discurso dos alunos participantes da pesquisa. Foram
categorias de análise o levantamento dos processos, do conteúdo temático e as
escolhas lingüísticas para a verificação do posicionamento enunciativo dos
participantes em seus diários reflexivos.
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O segundo deles foi o de tematização (van Manen, 1990), que tomou como base
os objetivos e as perguntas de pesquisa. A análise temática ou a tematização (cf.
van Manen, 1990:79) refere-se ao processo de recuperação do tema ou temas que
estão incorporados e dramatizados nos significados e imagens emergentes”. Esse
estudioso (op. cit: 87) acrescenta que tema é a forma de capturar o fenômeno que
alguém tenta entender”. Portanto, a tematização dos dados foi feita a partir do
momento inicial da análise, partindo dos objetivos e das perguntas de pesquisa.
O terceiro processo foi pautado pelo estudo da polidez e os relacionamentos
sociais. Foi realizada uma análise da transcrição de uma das últimas aulas
videogravadas, visando à verificação da interação e preservação de face destes
participantes que indicassem ou não sua permanência na zona de conforto. Após a
conclusão dos três processos de análise, estes foram confrontados nas
considerações finais.
2.5.1. Dados utilizados para responder as perguntas de pesquisa
Para responder a primeira pergunta de pesquisa (Quais são os fatores
relacionados à permanência na Zona de Conforto?), busquei a compreensão
da questão nos diários reflexivos dialogados, na micro-etnografia, em minha
percepção do não-uso de palavras pelos aprendizes e no questionário Likert por
eles respondidos.
Foi por meio da análise dos processos, do sistema de transitividade, do
levantamento do conteúdo temático e das escolhas lingüísticas realizados nos
diários que encontrei a resposta para a segunda pergunta (Como (ou se) a
reflexão e a interação contribuem para a conscientização de ões para
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construção de conhecimento e significados?). Foi possível observar co-
ocorrências lexicais com altos índices de correlação que revelaram fortes
predições.
A transcrição e a audiência das aulas gravadas apontaram alterações
significativas nas atitudes em sala de aula. Os diários escritos após as aulas
também contribuíram para possíveis respostas para a segunda pergunta de
pesquisa.
Por último, embora não menos importante, foi com a triangulação de todos
os dados que tentei encontrar indícios de efeitos ou causas para as mudanças
ocorridas durante a pesquisa. Desta forma, acredito ter investigado as questões
referentes à última pergunta de pesquisa (De que forma o professor pode levar
o aprendiz à conscientização e implementação de ações que o tornem
autônomo para construir significados e não permanecer na zona de
conforto?)
Neste capítulo, foram apresentados a metodologia adotada para esta
pesquisa, o contexto e os participantes da pesquisa, os instrumentos e os
procedimentos de coleta, de análise e de interpretação dos dados, e os
comentários sobre a confiabilidade da investigação em questão. Utilizo o capítulo
seguinte para dar início à terceira etapa da pesquisa, para refletir e tecer
considerações sobre os dados coletados, e refletir sobre as limitações do estudo.
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Análise e Discussão de Dados
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Capítulo 3:
Caleidoscópio – Fragmentos de imagens de uma sala de aula ajustados para formar
a imagem de uma prática reflexiva
Neste capítulo, dedico-me à discussão da análise de dados. Tratou-se de um
estágio que requereu uma volta à fundamentação teórica, muito cuidado e
observação. Nele intencionei perquirir os matizes de minha sala de aula a fim de
alcançar a compreensão das questões levantadas neste trabalho. Colecionei
fragmentos em cada categoria de análise. Ao agrupá-los, vi imagens antes
desconhecidas, que pouco a pouco se tornavam mais nítidas. Foi quando o meu
papel de educadora e os aprendizes destacaram-se no panorama pedagógico ao
qual pertenço.
Parti da questão da centralidade da linguagem na construção do
conhecimento pautada por Halliday (1985-1994) e por Brown & Levinson (1987), no
conceito da interação e da ZPD, pautada por Vygotsky (1930-1998). Foi por contar
com meus pares competentes, meus colegas do seminário de orientação e minha
orientadora que fui levada a um estágio de maior compreensão e de reflexão. Na
realidade, um estágio de pensar reflexivo, como o sugerido por Dewey (1909): com
sugestões, idéias propulsoras de ações externas; uma intelectualização da
dificuldade sentida; o uso de uma sugestão seguida à outra; uma elaborão ou
suposição da compreensão da situação; uma nova atitude. Encontra-se nesse fato a
importância de pertencer a um grupo de pesquisa coeso como o nosso do seminário
de orientação (2004/2005).
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Análise e Discussão de Dados
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Quanto à centralidade da linguagem na construção do conhecimento, a base
teórica para análise dos dados foi calcada, primeiramente, em Halliday (1985, 1994),
pois segundo esse autor, cada elemento da língua pode ser analisado a partir da
sua função e do contexto de situação de uso em que ele se insere. A abordagem
hallidiana busca descrever como e para que a língua é usada para fazer coisas, e foi
por meio dela que investiguei as escolhas lexicais referenciais presentes nos
participantes da pesquisa. Foram categorias de análise:
(a) a transitividade, o levantamento das escolhas dos
processos;
(b) o ponto de partida de cada tópico dos diários, os temas;
(c) as escolhas lingüísticas para verificar o posicionamento
enunciativo dos participantes ao refletirem sobre a ação da
sala de aula quanto à interação e preservação de face; e
(d) a avaliação e valoração dada a cada tópico.
Em segundo lugar, os dados foram organizados em grupos temáticos (cf. van
Manen, 1990), nos quais foram tomados como base os objetivos e as perguntas de
pesquisa. Por último, com a finalidade de investigar as possíveis mudanças na
interação e preservação de face dos participantes, foi feita a análise de uma das
últimas aulas videogravadas. Essa análise foi pautada pelo estudo da polidez e dos
relacionamentos sociais (Brown & Levinson, 1987). Após a conclusão dos três
processos de análise, estes foram confrontados para a elaboração das
considerações finais.
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Análise e Discussão de Dados
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3.1. Primeiro Processo de Análise: A representação das idéias e do universo
dos aprendizes estampada nos diários reflexivos o sistema de transitividade,
o sistema temático e a avaliação.
Para a alise da representação das idéias e das experiências fiz uso de
um programa de computador muito útil na operacionalização da descrição dos dados
coletados nos drios, o WordSmith Tools, versão 3 (Scott, 1998),
Trabalhei com a lista de palavras (Wordlist), com a freqüência e ocorrência
de palavras. Embora tenha feito o download do manual do WordSmithTool 3, sugiro
a leitura do livro Lingüística de Corpus ( Berber-Sardinha, 2004), em que o autor
dedica o terceiro capitulo de seu livro à explanação sobre o funcionamento de listas
de palavras, concordâncias e palavras chaves.
Levando em consideração que a presente análise enfoca a linguagem, faz-
se necessário explicitar o contexto de situação e o contexto de cultura analisados
para a compreensão do que os textos trazem em si. O gênero analisado é o diário
reflexivo de cada aprendiz. O contexto de situação apresenta as seguintes variáveis:
o campo as reflexões dos aprendizes sobre as aulas e suas atitudes em relação ao
processo de ensino-aprendizagem de que participam; o modo escrito pelos
aprendizes para ser lido pela professora; e as relações os aprendizes e a
professora.
Ao escreverem seus diários, os aprendizes traduziram representações de
suas experiências e do mundo. A realização dessas representações se dá através do
sistema de transitividade, que é um sistema subjacente à metafunção ideacional. A
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Análise e Discussão de Dados
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transitividade é a mais forte expressão de experiência. Ao observar a escolha de
processos feita nos diários reflexivos foi possível compreender a forma como os
aprendizes construíam suas representações do que acontecia na sala de aula.
O arquivo de texto, composto por parágrafos selecionados dos diários dos
seis aprendizes centrais, consiste em um total de 211 (duzentos e onze) parágrafos,
cerca de 26.388 (vinte seis mil, trezentos e oitenta e oito) bytes, equivalente a 4.600
(quatro mil e seiscentas) palavras (tokens). Nele foram encontrados 818 (oitocentos
e dezoito) processos, aproximadamente 18 % (dezoito por cento) ou 1/5 (um quinto)
do texto. Nesse total encontram-se predominantemente processos relacionais e
mentais, respectivamente 247 (duzentos e quarenta e sete) e 237 (duzentos e trinta e
sete), 195 (cento e noventa e cinco) processos materiais, 103 (cento e três)
processos verbais, 30 (trinta) processos comportamentais e 6 (seis) processos
existenciais, como pode ser observado no gráfico abaixo:
0
50
100
150
200
250
Relacional
Mental
Material
Verbal
Comportamental
Existencial
Gráfico 1 – Classificação e número de processos encontrados no arquivo de texto.
3.1.1. O Sistema de Transitividade
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Análise e Discussão de Dados
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63
Haja vista meu interesse em investigar os fatores envolvidos na permanência
na Zona de Conforto e o papel da reflexão e da interação para o êxodo desse
patamar de estagnação, enfoquei apenas os processos relacionais e os mentais,
pois, além de serem os que ocorrem em maior freqüência, realizam significados
inerentes à questão, uma vez que os mentais revelam sentimentos e são relativos à
representação do nosso mundo interior, ao passo que os relacionais, por possuírem
uma função classificatória, relacionam duas entidades no discurso. Além disso,
podem atribuir um valor a um determinado elemento como membro de uma classe,
bem como identificar uma entidade em termos de outra.
Os processos relacionais ser, estar e ter foram utilizados para sinalizar a
auto-identificação dos aprendizes. Foi possível encontrar descrições experienciais
em grande proporção nos parágrafos analisados, como é descrito no quadro n° 4.
Clara (competência comunicativa + interação voluntária) usa seus diários
para estabelecer o seu perfil como aprendiz por meio de processos relacionais
intensivos (002) a (006), (008) e (009), possessivo (001). Desde as primeiras aulas
Clara afirma possuir confiança para interagir em aula, pois o tinha dificuldades
para usar a língua. Os processos que utiliza estabelecem quem ela é e lhe atribui um
valor.
É curioso, entretanto, que a confiança para usar a língua inglesa durante toda
a aula veio gradativamente. Suas primeiras impressões surgem somente no
segundo mês de aula. Clara reflete sobre suas atitudes e indaga se estar mais à
vontade em sala significa mudança, como pode ser observado nos exemplos (003)
ao (007). É possível perceber novos valores atribuídos por ela.
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Análise e Discussão de Dados
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64
N° do
Exemplo Exemplo Aprendiz Data
(001) (...) e até agora não tive muitas dificuldades. Clara 25/02
(002) (...) acho que estou mais à vontade para falar em inglês. Clara 04/03
(003) (...) Bom, eu só estou me sentindo mais à vontade para conversar
em inglês. Isso é mudança?
Clara 11/03
(004) (...) Como já venho falando nos últimos diários estou me sentindo
mais à vontade para falar em inglês.
Clara 18/03
(005) (...) Estou mais à vontade para falar em inglês. Clara 31/03
(006) (...) Eu me sinto mais à vontade quando estou perto de vc... E dele
tb!!!
Clara 07/04
(007) (...) Não tenho sentido dificuldades e acho que as aulas estão se
tornando mais fáceis de serem entendidas.
Clara 13/04
(008) (...) Quando os trabalhos são em dupla eu me sinto mais a vontade
para falar em inglês. Porém alguns colegas não falam em inglês
quando estão em dupla.
Clara 18/04
(009) (...) Sempre fui um garoto muito tímido e o fato de ter que me
expor, ser o alvo de vários olhares “Really gets to me”!!! É bastante
difícil se manter compenetrado quando o nervosismo se apodera
de você.
Elvis 24/06
(010) (...) Mesmo sabendo que meu inglês não é ruim eu queria ver como
era o inglês das outras pessoas.
Clara 19 e
20/05
(011) Eu acho que minhas atitudes não estão mudando em nada, ou
melhor, acho que estou mais à vontade para falar em inglês.
Clara 04/03
(012) (...) Será que há algo errado comigo? Não sinto mudanças no meu
comportamento. Bom, eu estou me sentindo mais à vontade
para conversar em inglês.
Clara 11/03
(013) (...) Estou achando as aulas mais fáceis de serem entendidas e...
+ a vontade para falar em inglês.
Clara 08/04
(014) (...) me vi cometendo erros bobos que não deveria mais estar
tendo, preciso me concentrar mais para relembrar o que quero
dizer.
Vânia 04/03
(015) (...) A mudança de tomar iniciativa de tentar de buscar a resposta
correta isso eu considero uma mudança em meu comportamento.
Vânia 10/03
(016) Acredito que o meu nível do idioma não é adequado para o curso,
já que não compreendi 100 % do que foi dito em inglês (...)/Fiquei
com vergonha na hora em que a professora me fez uma pergunta,
(...)
Mário 24/02
(017) Não gosto muito de trabalhar em dupla. Mário 01/04
(018) (...) Nesta aula, aprendemos sobre como nos comunicamos
utilizando certas estratégias.
Alessandra 02/05
(019) (...) eu fico assustado em ter que falar inglês porque nem professor
eu tive para aprender inglês.
Mário rias
datas
(020) Na 5ª feira adorei o debate em sala. Eu até falei um pouquinho.
Fiquei encabulado com uma coisa: aqueles temas foram extraídos
dos meus diários? Tudo o que eu venho falando estava ! (...)Não
tive problemas essa semana... Só em ter conseguido me expressar
em inglês, foi um troféu para mim! Estou satisfeito comigo mesmo.
Mário
30/06 e
01/07
(021) (...) Gostei de trabalhar em grupos na aula, pois só assim consegui
falar mais ou menos e inglês.
Mário 01/05
(022) (...) Eu achei interessante, pois vi que muitas delas eu executo no
meu dia-a-dia, mesmo sem notá-las.
Alessandra 02/05
(023)
( ... ) Percebo que em todas as aulas a profª faz com que nós
juntemos a uma ou + pessoas e creio que ela deva ter boas razões
p/ isso, arriscando um palpite, diria que é p/ promover a integração
entre todos e nesse ponto eu também concordo.
Elvis Sem
data
Quadro n° 4 – Exemplos das descrições encontradas nos diários.
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Análise e Discussão de Dados
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65
Pode ser observado que os processos relacionais escolhidos por Clara e Elvis
(competência comunicativa + interação não voluntária) enfocam, primeiramente,
quem são e como agem nas interações em aula, estabelecendo para seu próprio
conhecimento a forma como atuavam em aula em contraste com os outros
participantes.
Além disso, no exemplo (010), Clara admite sua preocupação com a
competência de seus colegas de turma, ainda que seja consciente da sua
capacidade e habilidade de uso da segunda língua.
Quanto aos processos mentais, Clara (competência comunicativa + interação
voluntária), Estrela (competência comunicativa + interação não voluntária), MO
(competência gramatical/ sem interação), Vânia (competência estratégica/ pouca
precisão gramatical + muita interação voluntária) e Alessandra (competência
comunicativa + interação voluntária) os utilizaram para descrever suas percepções,
sua afeição como se sentiam, e como entendiam e aprendiam, conforme pode ser
visto nos exemplos (011) ao (018).
Assim como Clara e Elvis, Alessandra e Mário usaram os processos
relacionais para sinalizar sua identificação e a descrição de sua experiência. No
diário de 01/07, MO afirma estar satisfeito. Sua satisfação, como pode ser
observada no excerto (020), é atribuída à forma como sua experiência anterior
em sala de aula e ao fato de ter atuado inusitadamente.
No presente contexto, esses dados evidenciam três aspectos. O primeiro
deles é a autoconscientização de determinados aprendizes de que pensar de forma
reflexiva crítica pode alterar ou influenciar sua atitude. Uma intelectualização da
dificuldade que foi sentida se transforma em um problema a ser resolvido, conforme
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Dewey (1909) sugere. Mário inicialmente declara não gostar de falar, porém
descreve em seu diário em 01/05, exemplo (021), uma mudança de atitude
influenciada por sua interação e reflexão sobre sua ação. O mesmo aplica-se a
Alessandra em 02/05, no exemplo (022): a reflexão fez com que ela percebesse
suas ações como uma maneira de lidar de forma mais adequada ao enfrentar
diferentes dificuldades.
O segundo aspecto está relacionado com a preservação da face positiva do
aprendiz. Ao tentar evitar ser julgada ou avaliada por seus colegas (010), Clara
espera que os demais participantes se manifestem para que ela possa comparar sua
competência antes de expor sua face. Assim como M, Elvis (009) também acha que
ter de se expor o afeta bastante. O mesmo acontece com Vânia (014), que não
admite ainda estar cometendo erros bobos. Ainda que sejam aprendizes com
competências distintas, parece-me que os três compartilham da necessidade de
terem a face preservada e, conseqüentemente, permanecerem na zona de conforto.
O terceiro aspecto está relacionado à forma como a interação pode promover
o êxodo da zona de conforto. Os processos mentais e relacionais realizaram, nos
diários de D e MO, uma seqüência de pensamentos reflexivos sobre a integração ao
grupo, a interação em aula e a expressão de idéias e opiniões em inglês que
conduzem a um vel de participação voluntária mais freqüente, como pode ser
observado no exemplo (023) e em uma de minhas notas de campo, datada 02/07:
(024) A prática semanal de discutirem seus textos em inglês com parceiros diferentes tem feito
diferença! Na aula passada, ao monitorar a atividade em pares, percebi que havia um
comprometimento maior em tentar usar o vocabulário do texto que havia trazido. Hoje NÃO estão
usando a estratégia de formar conceitos para mencionarem o assunto discutido. Mário não falou
português... e está atento ao grupo. As duplas que costumam “se esconder” estavam separadas por
opção própria. Fred perguntou a Mário quais partes eram reconhecíveis na palavra (prefixo, sufixo,
radical...). também em inglês... Eles lembraram do texto do Nation.
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A troca de informação, estritamente verbal, realizada com o cruzamento dos
papéis de fala entre Mário e Fred, durante a interação, contribuiu para que Mário
expusesse sua face sobrepondo seu desejo de obter uma informação à necessidade
de proteção de sua face negativa. Ao responder ao pedido de informação feito por
Fred, Mário está em movimento contínuo para fora da ZC.
3.1.2. O Sistema Temático
Cabe ao tema de cada oração dar efeito à mensagem que se quer
transmitir. Por conseguinte, sua escolha será sempre fundamental para enfatizar o
que o falante e/ou o escritor deseja realmente. Como meu objetivo era conhecer o
ponto de partida de cada diário, a análise foi feita baseada no primeiro tema de cada
parágrafo.
O tema vai até o primeiro elemento da Transitividade, que pode ser o
Participante, a Circunstância ou o Processo (cf. Halliday, 1985-1984). Nos duzentos
e onze (211) parágrafos retirados dos diários reflexivos dialogados, quarenta e
quatro deles possuem temas do tipo simples, ideacional ou tópico como tema inicial,
como nos exemplos do quadro n° 5:
A minha principal mudança
é que estou buscando muito mais o meu melhor
Tema Ideacional (participante)
Não marcado
Rema
Continuo
com a minha opinião de que a aula da professora é bastante ...
Tema Ideacional
(Processo)
Marcado
Rema
Quadro n° 5 - Exemplos dos tipos de temas
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Os temas simples, cerca de trinta e nove (39), têm como característica
predominante serem relacionados aos próprios aprendizes, as aulas e as mudanças.
Esta relação se explica pela escolha de processos usados na primeira pessoa do
singular nos diários (nos escritos em português/ 469 ocorrências em 4600 tokens;
nos escritos em inglês/ 103 ocorrências em 4600 tokens). Adiciona-se à explicação a
ocorrência descrita no quadro n° 6:
Número de
ocorrências
Proporção
individual
Proporção
do grupo
Pronomes Pessoais do Caso Reto
EU 69 69/4600
I 103 103/4600
NÓS 03 03/4600
WE 27 27/4600
202/4600
4.39%
Pronomes Possessivos
MEU 20 20/4600
MY 20 20/4600
MEUS 07 20/4600
MINHAS 05 20/4600
NOSSA 04 20/4600
NOSSAS 01 20/4600
NOSSO 01 20/4600
NOSSOS 01 20/4600
59/4600
1.28%
Pronomes oblíquos
ME 61 20/4600
MIM 04 20/4600
65/4600
1.41%
Quadro n° 6 – Ocorrências de itens lexicais
Verifica-se, então, que 7% de todo material analisado corresponde à
descrição experiencial dos aprendizes, da forma como vêem seu mundo, pois os
assuntos abordados por eles descrevem fatos relacionados aos próprios.
Quanto aos temas múltiplos, não obstante o primeiro ser tema textual,
interpessoal ou o primeiro elemento do tema uma circunstância, o tema ideacional
sempre aponta para fatos relacionados aos aprendizes, vide os exemplos no quadro
n° 7:
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Exemplos de Temas Múltiplos
Particularmente estou me sentindo feliz...
Tema interpessoal Tema Ideacional Rema
Sinceramente senti me péssimo...
Tema Ideacional Tema Ideacional Rema
To top it off, I would like to say
Tema Textual Tema Ideacional Rema
Quadro n° 7 – Exemplos de Temas Múltiplos
3.1.3. Avaliação e Valoração
As discussões realizadas no curso de GSF que mencionei anteriormente
levaram-me à compreensão de que a avaliação pode ser definida simplesmente
como a indicação da opinião de um falante sobre algo, ou seja, o que o falante
pensa sobre um determinado assunto – se é bom ou ruim.
A incidência de algumas palavras ou grupos de palavras que apontavam
para determinados sentidos também norteou esta análise. A avaliação e a valoração
dessas palavras denotam como a língua foi usada para adotar ou expressar algum
tipo de atitude em relação a determinados pontos.
Após a verificação dos assuntos reincidentes nos diários, três deles foram
selecionados para o levantamento da valorização a eles atribuída, e,
conseqüentemente, a atitude expressa pelos aprendizes.
Como pode ser apreciado nos quadros demonstrativos de avaliação e
valoração (quadros 8, 9 e 10), dois grupos de palavras foram recorrentes em
todos os diários: o grupo A ‘Aulas/ Aula/ Classes’ (quadro 8), e o grupo B
‘Mudança/ Mudanças/ Mudança’ nas aulas (quadro 9) . Também foram
encontradas algumas referências ao grupo C ‘Inglês/ Uso de inglês; todavia, o
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maior número de ocorrências deu-se nos diários de Mário, conforme pode ser
observado no quadro n° 10.
No grupo A (quadro 8) , o verbo adorar, os adjetivos e modificadores
apontam para uma valorização positiva da aula por parte dos aprendizes.
Similarmente, demonstram três tipos de atitudes: afetiva, apreciativa e avaliativa.
Avaliação do
Aprendiz
Grupo A
‘Aulas/ Aula/ Classes
Data
Mário
Adorei essa...
Fiquei descontraído (...) calmo.
(...) foi muito legal.
Adorei (...)
(...) foi baseada na discussão em grupo.
Nessa (...) o objetivo principal foi alcançado (escrever e
falar)
(03/03)
(03/03)
(10/03)
(11/03)
(01/04)
(19 e 20/05)
Estrela
(...) foi proveitosa.
com dificuldades que me fizeram aprender mais
are very important
I don’t say anything in
I’m losing that little sensation of nervousness that
remained from (… ) in Clélia Nanci
I realized that the more I do in (…) presentations and
expose myself to the public, the more I get confidence in
myself.
(25/02)
(04/03)
(20/05)
(27/05)
(03/06)
Alessandra
muita informação para uma (...) só
muito produtiva
Nesta (...) aprendemos
When I knew I could do it in (...), I felt so well
(01/04)
(15/04)
(05/05)
(24/06)
Elvis
particularmente, estou me sentindo muito feliz e até
mesmo excitado por fazer parte dessa (...)
em todas as (...) a profa faz com que nos juntemos a
uma pessoa.
(03/03)
(05/05)
Quadro n° 8 - AVALIAÇÃO E VALORAÇÃO - Grupo A
A atitude afetiva revela o estado ou visão emocional que os aprendizes
trazem em si sobre a aula. Eles a vêem como proveitosa, produtiva, legal,
important. Além disso, atribuem à aula características promovedoras de bem estar
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(ex: I get confidence in myself, estou me sentindo muito feliz, I felt so well, I’m
losing that little sensation of nervousness). Entretanto, a atitude apreciativa
expressa é menos positiva. Ela é crítica e produziu um efeito de mudança no ritmo
das aulas que costumava preparar (‘muita informação para uma aula só’). Pude
perceber que, ao traçar meus objetivos para cada aula, pensava no meu ritmo de
ensino, esquecendo-me de que ensino e aprendizagem caminham juntos. Por essa
razão, distribuí conteúdo de forma menos densa ao longo do semestre. A atitude
avaliativa, por sua vez, expressa uma avaliação social do grupo (‘a profa faz com
que nos juntemos a uma pessoa’, ‘aprendemos’, estou (...) até mesmo excitado
por fazer parte dessa aula
5
).
No grupo B, as atitudes afetiva e avaliativa dos aprendizes sobre si
próprios e sobre o processo no qual estão inseridos predominam. Essa
predominância é produzida pelo uso dos processos mentais sinto e learn, que
revelam uma atitude gradual de mudança e da forma como essa mudança atua
sobre o comportamento de cada um.
Vânia, Alessandra e Mário demonstraram gradativamente a melhora em
seu desempenho. O desenvolvimento desses aprendizes, que me parece um
movimento de saída da zona de conforto, é acentuado pela troca gradual do uso de
português por inglês até mesmo em seus diários (vide quadro n° 9).
5
O sentido de aula na frase de Elvis refere-se à turma de inglês.
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Avaliação do
Aprendiz
Grupo B
‘‘Mudança/ Mudanças/ Mudança’ nas aulas
Data
Vânia
me tornando mais segura para falar
principal (...) buscar muito mais o meu melhor
tentar buscar a resposta certa
Now I’m trying to think all the time in English
I think we’re learning more vocabulary day by day
Now I see the language not only to communicate
I needed to interact with my classmates
(03/03)
(04/03)
(10/03)
(31/03)
(14/04)
(03/06)
(10/06)
Alessandra
estou aprendendo a me expressar melhor por meio da
fala…
estão relacionadas a capacidade de compreender
melhor o vocabulário
(18/03)
(18/03)
Mário
Não sinto (...)
Minhas atitudes não estão mudando...
Não sinto (...)
Estou sentindo (...)
Estou me sentindo mais à vontade para falar inglês
Estou mais à vontade para falar inglês
Estou até começando a gostar
Estou, como sempre, sentindo (...) ao falar...
Minhas atitudes vêm mudando em relação aos trabalhos
em dupla
(...) Mudanças... Ah! Estou me sentindo com mais
vontade de participar das aulas! (…)Não senti
dificuldades nessa aula.
( ... ) I can’t feel any changes on my attitudes.
(25/02)
(04/03)
(11/03)
(17/03)
(18/03)
(31/03)
(01/04)
(07/04)
(13/04)
(15/04)
(06/05)
Quadro n° 9 - AVALIAÇÃO E VALORAÇÃO - Grupo B
No grupo C (quadro 10), temos uma valorização diádica divergente
positiva e negativa. A escolha de palavras de Mário denota uma atitude afetiva
negativa em relação a falar inglês fato bastante contraditório, haja vista a posição
de Mário como futuro professor de inglês.
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Avaliação do
Aprendiz
Grupo C
‘Inglês/ Uso de inglês
Data
Mário
não é adequado
não consigo soltar
não compreendo 100%
fiquei com vergonha
não precisei falar nada
não entendi
fico assustado quando tenho que falar
nunca conversei em inglês, medo começar
fico inseguro
medo de se expressar em ...
detesto falar...
ter conseguido me expressar em (...) , foi um troféu.
(...) Estou satisfeito comigo mesmo.
(24/02)
(24/02)
(24/02)
(10/03)
(11/03)
(10/03)
(06/05)
(06/05)
(06/05)
(06/05)
(12 e 13/5)
(30/06)
Clara
Estou me sentindo mais à vontade para falar inglês
Estou mais à vontade para falar inglês.
Estou até começando a gostar...
Estou, como sempre, sentindo mudança ao falar...
(18/03)
(31/03)
(01/04)
(07/04)
Quadro n° 10 - AVALIAÇÃO E VALORAÇÃO - Grupo C
Os substantivos, adjetivos e processos usados por Mário evidenciam essa
atitude. Como mostra a figura n° 3:
Fig.3 Escolhas Lexicais de Mário
Inglês
detesto
não é adequado vergonha
não compreendo
não entendi
assustado
inseguro
medo
troféu
conseguido expressar
satisfeito
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Em todos os seus diários, Mário avalia o uso de inglês como algo negativo.
Sua atitude, como futuro professor de inglês, é, de uma certa forma, uma evidência
de estar estagnado na zona de conforto, bem como salienta sua preocupão com a
preservação de sua face.
Em relação à Clara, observa-se uma atitude mais positiva e uma crescente
aceitação do uso de inglês e maior interação em aula. Essa atitude pode ser
percebida em asserções como:
Estou me sentindo mais à vontade para falar inglês (18/03)
Estou mais à vontade para falar inglês (31/03)
Estou até começando a gostar (01/04)
Estou, como sempre, sentindo bem ao falar... (07/04)
Atribuo muito desses fatos observados, que acredito serem indícios de um
movimento para o êxodo da zona de conforto, à reflexão promovida pela feitura dos
diários e a interação freqüente em aula. Isso porque pouco adiantariam as atividades
organizadas para a turma, ainda que desenvolvessem por si a oralidade, se os
aprendizes não estivessem conscientes de seu grau de estagnação para se
comunicar.
3.2. Segundo Processo de Análise: Uma análise temática – fragmentos de peças
distintas reunidas.
Van Manen (1990: 64) salienta em seus estudos que a escrita direciona a
pessoa à uma prática reflexiva – em contraste à conversação face a face, nas quais
os indivíduos estão muito mais envolvidos. Os diários reflexivos dos aprendizes
foram, novamente, de grande valia nesta etapa. Entretanto, a atitude reflexiva
salientada por esse estudioso, juntamente com as demandas lingüísticas do processo
de escrever, cria determinadas restrições em algumas descrições de experiências
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vividas nos diários. Nem tudo que é relatado nos diários recebe foco o aprendiz
acentua as idéias mais relevantes à sua experiência. Por esta razão, observei,
também, o resultado do grupo das respostas do questionário Likert (organizado, como
mencionara anteriormente, em afirmações colhidas nos diários e na microetnografia
onde cito algumas observações feitas em aula pelos aprendizes). Partindo desses
dados, foi possível estabelecer temas, agrupá-los e, de acordo com a maior
incidência, buscar compreender os principais fatores envolvidos nas questões
investigadas na pesquisa.
A noção de tema” é usada em diversos contextos e traz em si inúmeros
significados. Na literatura, por exemplo, o tema de um determinado texto é
estabelecido em relação ao elemento que ocorre em maior freqüência. Na GFS, o
tema pode ser definido como o ponto de partida da mensagem. na pesquisa
científica humana, a noção de tema pode ser mais bem compreendida ao se
examinar o seu caráter metodológico e filosófico. Segundo van Manen (1990:87), um
tema é (1) uma experiência de foco, de significado de um ponto; (2) é a forma de
capturar um fenômeno que alguém tenta entender. Esse autor (1990:78) acrescenta
que a análise de um tema muito freqüente é vista como...
(...) an unambiguous and fairly mechanical
application of some frequency count or coding of selected
terms in transcript or texts (…).
Nos diários reflexivos foram encontrados diversos temas, como mudanças,
diferença, participação e não-participação, reflexão, incapacidade e inaptidão. Esses
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temas contribuíram para que conseguisse capturar de forma interpretativista a
essência das questões relacionada à primeira e segunda pergunta de pesquisa.
Para responder a primeira delas (Quais são os fatores relacionados à
permanência na zona de conforto?) foi observada a incidência do tema “fatores que
contribuem para permanência na zona de conforto”. para responder a segunda,
(Como(e se) a reflexão e a interação contribuem para conscientização de ações
para construção de conhecimento e significados?) foi observada a incidência do
tema “percepção de mudanças”.
3.2.1. Grupo Temático 1: Fatores que contribuem para permanência na
Zona de Conforto
A não-participação, o sentimento de incapacidade ou inaptidão para L2, o
uso de escopo reduzido de vocabulário e a falta de interação foram os indicadores
da permanência dos aprendizes na ZC. Em muitas ocasiões encontrei nos diários e
constatei por cuidadosa observação durante as aulas afirmações exemplificadoras
desses indicadores.
Em nossos primeiros encontros, Vânia, em dois momentos distintos,
demonstrou estar consciente de seu uso de escopo reduzido por ter dificuldades
para memorizar palavras. Ela desconhece, todavia, que a capacidade de
memorização não é inerente à construção de significados.
(...) Tenho uma certa dificuldade em memorizar vocabulário em inglês, mais já memorizei pelo
menos uma palavra dita nesta aula, o que diz que em breve estarei melhorando tendo sempre esse
contato com a língua. (24/02/05)
(...) Meu grande problema com vocabulário é memorizá-lo, tenho que encontrar um meio estar
sempre relembrando as palavras. (03/03/05)
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O sentimento de inadequação ou inaptidão para o idioma exerce uma grande
força detentora do indivíduo na ZC, assim como o conforto de não se arriscar a
expor sua face retém Mário em um estado de conforto e comodidade, mas de
permanência na ZC.
( ... ) Adorei o método de ensino da professora, pois não há nada como se aprofundar numa nova
ngua falando português. Infelizmente, percebi que não consigo soltar o meu inglês em meu
grupo. Acredito que o meu nível do idioma não é adequado para o curso, já que não compreendi
100 % do que foi dito em inglês. (Márcio, 24/02)
(...) Sinceramente, eu adorei essa aula porque não precisei falar nada em inglês, o que me deixou
muito confortável. (Márcio, 11/03)
Por um período, Clara permaneceu no estágio de conhecimento real (cf.
Vygotsky, 1930-1998). O que ela aprendeu ao longo de sua experiência como
aprendiz de uma L2 permanece intacto, sem nenhuma evolução, o que entendi, no
presente contexto, como uma indicação de permanência na ZC. Esse fato parece-
me estar conectado à não-interação em aula, como nos indica o excerto abaixo:
Hoje eu não aprendi nada porque não participei da aula. (Clara, 03/03)
Percebe-se, no entanto, que a reflexão e a autoconscientização apontam um
caminho para que Vânia abandone a ZC. Compreendi esse fato como uma
indicação de que a aluna parecia ter descoberto “o que fazer” para melhorar.
(...) Tamm estou encontrando várias dificuldades com a palavra, me vi cometendo erros bobos que
não deveria mais estar tendo, preciso me concentrar mais para relembrar o que quero dizer.
(Vânia, 04/03)
(...) A dificuldade quanto a memorização do vocabulário continua a mesma, preciso me
concentrar mais para relembrar o que quero dizer. (Vânia, 10/03)
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É possível notar que a intelectualização da dificuldade que foi sentida se
transformou em um problema a ser resolvido. Vânia consegue conscientizar-se do
que ela considera falhas em sua aprendizagem; todavia, ela está ciente do que deva
fazer para melhorar sua atuação – concentrar-se.
Os indicadores de permanência na ZC, anteriormente exemplificados, foram,
por conseguinte, tamm considerados fatores que contribuem para permanência
dos aprendizes na ZC. Sintetizando-os, é possível caracterizá-los pela falta de
participação, e como conseqüência, menores chances de construir novos sentidos, e
a necessidade de proteção da face.
Encontram-se no quadro 11 exemplos de proteção à face retirados dos
excertos dos diários reflexivos:
Aprendiz Atos de Proteção à Face Data
Clara
(...) Acho que para conseguir minorar essas dificuldades
eu tenho que tentar falar mais inglês em sala, apesar de
não sentir muito à vontade ainda.
(17/03)
Mário
Não tenho muita coisa para falar. Gostei de trabalhar em
grupos na aula, pois só assim consegui falar mais ou
menos e inglês. Até porque só tinha amigos no grupo!
Não gosto muito de trabalhar em dupla.
(01/04)
Clara
Até agora não senti dificuldade em trabalhar com pessoas
diferentes, até pq ainda ñ tive que trabalhar com
ninguém que eu não gostaria...
(...) No começo das aulas eu não gostava de falar inglês
em sala, pois ficava com vergonha. Mesmo sabendo que
meu inglês não é ruim eu queria ver como era o inglês
das outras pessoas.
(08/04)
(19 e 20/05)
Elvis
(...) Sempre fui um garoto muito tímido e o fato de ter
que me expor, ser o alvo de vários olhares “Really gets to
me”!!!
(24/06)
Quadro n° 11 – Exemplos de proteção à face
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Em contrapartida, o início de uma ação indicadora de movimento para
fora da ZC quando a reflexão e a autoconscientização contribuem para que a
necessidade de comunicação e interação em aula sobreponha-se ao desejo de
preservação da face. Essas ações apontam atitudes afetivas valorizadas
positivamente, como as descritas no quadro n° 12:
Aprendiz Atos de Exposição da Face Data
Clara
(...)Estou achando as aulas mais fáceis de serem
entendidas e... + à vontade para falar em inglês.
(...) Acho que minhas atitudes vêm mudando com relação
aos trabalhos em trio e em dupla... Não o em dupla eu
tinha que falado gosto ! Acho que tenho gostado
desse tipo de trabalho because eu só tive que fazer com
pessoas que...
(08/04)
(13/04)
Alessandra
Todavia, quando se trata de eu me avaliar eu observo que
há momentos em que eu não aproveito os recursos
lingüísticos disponíveis, como o meu uso do vocabulário.
Às vezes, eu apenas me restrinjo ao uso de poucas
palavras porque, dependendo do assunto, não tem
como “falar” dele, usando palavras as quais são
consideradas “novas” para mim. O que posso fazer
apenas é buscar um vocabulário variado. O resultado
será o meu crescimento intelectual perante tal
conteúdo.
(09/06)
Estrela
( ... ) I have observed that I am losing that little
sensation of nervouness that remained from the times of
school presentations in Clélia Nanci. I realized that the
more I do in class presentations and expose myself to the
public the more I get confidence in myself and, as a
consequence, I even like the thing and want to do it again.
(23/06)
Mário
Na feira adorei o debate em sala. Eu até falei um
pouquinho. Fiquei encabulado com uma coisa:
aqueles temas foram extraídos dos meus diários?
Tudo o que eu venho falando estava lá!
Não tive problemas essa semana... em ter
conseguido me expressar em inglês, foi um troféu
para mim! Estou satisfeito comigo mesmo.
(30/06)
(01/07)
Elvis
(...) Eu, como pessoa, não como aluno, admito que
tenho por natureza uma atitude bastante reservado
com relação a pensamentos e opiniões de que me
ponho a pensar e refletir bastante sobre observar
essas coisas e assuntos, sofrendo a quando devo
falar e o que vou falar. (...) Essa atitude é típica do meu
ser e creio que assim me mostrava na sala de aula.
(01/07)
Quadro n° 12 – Exemplos de Atos de Exposição da Face
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80
Atribui-se à interação um papel catalisador, bem como de força centrífuga
para o êxodo da ZC. É tamm evidenciado o resultado de melhor desempenho em
aula. No excerto abaixo, torna-se evidente a ligação entre interação e
empoderamento, pois Clara contribui para a melhora do desempenho do colega e,
simultaneamente, toma para si o poder de se autocorrigir.
A interação com meus colegas contribui para que eu tenha um melhor desempenho em aula.
Mas não sempre depende muita do colega. Quando os trabalhos são em dupla eu me sinto mais a
vontade para falar em inglês. (Clara, 18/04)
Agora me sinto muito a vontade para falar em sala e mesmo errando coisas bobas como trocar “he”
por “she” e “his” por “her” eu não me importo, pois sempre que eu troco essas palavras ou qualquer
outra eu mesma me corrijo. (Clara, 18/04)
(...) Estou, como sempre, sentindo mudança ao falar... Apesar de você pensar que eu falo mais por
causa de Dênnys isso ñ é verdade. Eu me sinto mais à vontade quando estou perto de vc... E
dele tb!!! (Clara, 07/04)
Os fatores que contribuem para permanência na zona de conforto podem,
a meu ver, ser subjugados se forem postos à tona, se aprendizes estiverem
conscientes do poder que tais fatores exercem sobre si e a forma como os mantém
retidos à ZC. Para tanto, cabe ao professor promover situações para conduzi-los a
reflexão e a autoconscientização do processo em que participam e empoderá-los
para, assim, evoluírem.
3.2.2. Grupo Temático 2: Percepção de Mudanças, Reflexão e Interação
Como foi estabelecido na fundamentação trica (item 1.2), o pensamento
reflexivo é aquele que consiste em examinar mentalmente o assunto e dar-lhe
consideração séria e consecutiva. Esse pensamento é uma cadeia e aspira a chegar
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a uma conclusão. Partir de um determinado estágio para alcançar uma compreensão
requer paciência e persistência. Um dos assuntos recorrentes nos diários foi a idéia
de mudança. Todavia, embora soubessem que a feitura dos diários visava a
contribuir para a pesquisa de sua professora, os aprendizes não sabiam qual
benefício obteriam desse ato colaborativo.
A proposta de escreverem sobre suas experncias como aprendizes
durante aquele semestre foi compreendida de distintas formas. Alguns deles,
principalmente os aprendizes de apoio, compreenderam que os diários poderiam
representar o resumo do que aprenderam na aula e assim se preparariam para
avaliões. A visão de Elvis sobre o diário limita-se a vê-lo apenas como um
instrumento de comunicação com a professora, como no exemplo abaixo:
(...) Começo a pensar nesse diário como uma forma não de contribuição às pesquisas da
profª, como também uma ajuda a nós mesmos. Por meio destas páginas podemos
testemunhar nossas dúvidas, descontentamentos e podemos até mesmo também relatar
avanços nos nossos estudos. (Elvis, 10/03)
Mário, em contrapartida, em alguns diários, demonstra acreditar que eles eram
usados para que a professora extraísse os temas das atividades:
Fiquei encabulado com uma coisa: aqueles temas foram extraídos dos meus diários? Tudo o que
eu venho falando estava lá!
Não tive problemas essa semana... (Mário, 30/06)
Vânia, por exemplo, costumava listar as dificuldades sentidas em aula;
entretanto, após refletir enquanto escrevia seu diário, percebeu a importância de
interagir com seus colegas de turma para alcançar uma meta considerada por ela
importante: saber o vocabulário uma preocupação explicada por Leffa (2000) para
a tomada de decisão com a finalidade de optar entre o léxico e a sintaxe (vide
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fundamentação teórica, item 1.3). O texto de Vânia retrata sua inquietação como
uma situação conturbada ou confusa no início – ‘I had some difficulties to do it’:
In this class we replaced sentences, and I had some difficulties to do it. To know the vocabulary,
to substitute the phrases I needed to interact with my classmates. So to work in group was
important to do this activity. (Vânia, 10/06)
Com o processo de reflexão, Vânia descreve essa situação inicial
transformada em uma situação esclarecida, unificada, resolvida no final. Foi por
meio dessa reflexão que a aprendiz conseguiu compreender a necessidade de
interagir para construir o conhecimento necessário para resolução da tarefa proposta
em sala, iniciando, assim, o movimento de mudança e, por conseguinte, o êxodo da
ZC.
Obviamente, o processo reflexivo não é promovedor imediato de mudanças.
Pode, inclusive, conduzir o aprendiz à conscientização do insucesso antes da
promoção de mudanças. Contudo, o que em geral seria apenas causa de
aborrecimento e desânimo para uma pessoa não acostumada a pensar
reflexivamente é, para um investigador de idéias experiente, um estímulo e um guia.
Encontra-se nessa situação uma das razões pela quais o exercício de refletir deve
ser parte da rotina do aprendiz para a construção de novos sentidos e significados
em uma situação de ensino-aprendizagem de uma segunda língua. Assim sendo,
creio que o processo de êxodo da ZC é árduo, requer inquietação, curiosidade e
desejo de mudar. Vânia foi uma dos aprendizes que mobilizaram suas forças para
vencer uma resistência ou dificuldade para atingir o fim desejado no contexto,
construir novos sentidos e significados. A figura 4 representa toda a ação de
Vânia.
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Análise e Discussão de Dados
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Fig. 4 Movimento para o êxodo da ZC
Ao receber diário de 10/06 de Vânia, percebi que o modo como ela refletiu
sobre sua ação alterou sua atitude em aula. Em uma das vídeo-gravações, percebi
sua participação na discussão em pares, sem fazer uso da L1, sobre a cena de um
vídeo da atividade. Ela demonstrou perceber variações nas escolhas lexicais, como:
A17: I noticed many other words we learned recently. A word that [trecho inaudível] (...) referring to
the word fight? ‘You know any one that can …
A5: Strive
Dificuldades
para
compreensão e
comunicação
ZC
Reflexão e
Interação
Reflexão
Mudança
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Considero, outrossim, relevante reiterar que o pensar reflexivo para a
feitura do diário não é por si só responsável pela mudança imediata de atitude e pelo
desejo de interagir para construção de novos significados. São as diversas fases do
pensar reflexivo, alternadas com a ação, que colaboram para mudança. Na
realidade, a mudança vem como resultado da experiência direta de domínio
acrescida da necessidade da verificação de hipóteses (Se eu interagir vou me
comunicar melhor? Vou construir novos significados?) pela ação (interação).
É importante frisar que não houve um tempo em comum entre os
aprendizes para percepção de mudanças. No caso de Clara, nenhuma mudança em
termos de maior prodão oral é percebida inicialmente, como pode ser observado
em fragmentos de dois diários escritos na primeira quinzena após o início das aulas:
(...) o sinto mudanças, continuo achando a aula meio confusa e tediosa. (Clara, 25/02)
Eu acho que minhas atitudes não estão mudando em nada, ou melhor, acho que estou mais à
vontade para falar em inglês. (Clara, 04/03)
Dewey (1909) estabelece dois estados no pensar reflexivo. É a partir da
segunda semana do mês de março que surge um sinal do primeiro estado reflexivo –
um estado de vida, hesitação, perplexidade, dificuldade mental, o qual origina o
ato de pensar. É quando, pela primeira vez, Clara se questiona sobre seu
comportamento:
(...) Será que algo errado comigo? Não sinto mudanças no meu comportamento. Bom, eu
estou me sentindo mais à vontade para conversar em inglês. Isso é mudança? (Clara, 11/03)
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A partir da segunda quinzena de março, a percepção torna-se mais clara e
é evidente nos próximos diários, como indicam os excertos agrupados no quadro
13:
Estado Reflexivo – Percepção Gradual de Clara Data
(...) Estou sentindo mudanças nessa questão de trabalho em grupo, estou
me sentindo mais..., não sei explicar.
(17/03)
(...) Como já venho falando nos últimos diários estou me sentindo mais à
vontade para falar em inglês.
(18/03)
(...) Nossa, em todo diário e tenho escrito à mesma coisa! Estou mais à
vontade para falar em inglês.
(31/03)
(...) Estou, como sempre, sentindo mudança ao falar...
(07/04)
Quadro n° 13: Estado Reflexivo Percepção Gradual de Clara
Esse estado reflexivo somado à percepção gradual de Clara parecem ter
provocado em Clara mudanças que resultaram em atitudes de menor preservação
da face e, como conseqüência, maior participação e interação nas aulas. Nos
excertos de 01 de abril e 13 de abril o retrato das mudanças já ocorridas em suas
atitudes:
Não estou encontrando dificuldades e na verdade estou até começando a gostar das aulas. (Clara,
01/04)
(...) Acho que minhas atitudes vêm mudando com relação aos trabalhos em trio e em dupla (...)
Não tenho sentido dificuldades e acho que as aulas estão se tornando mais fáceis de serem
entendidas. (Clara, 13/04)
Há, tamm, em dois fragmentos dos dias 08 e 15 de abril, a descrição do
movimento de Clara para o êxodo da ZC, em dois estágios: primeiramente achando
as aulas mais fáceis e, em seguida, sentindo-se mais à vontade para participar das
aulas.
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(...) Estou achando as aulas mais fáceis de serem entendidas e... + à vontade para falar em
inglês. (Clara, 08/04)
(...) Mudanças... Ah! Estou me sentindo com mais vontade de participar das aulas! Não senti
dificuldades nessa aula. (Clara, 15/04)
Embora compartilhe com Dewey a idéia de que não seja possível aprender
ou ser ensinado a pensar, considerei muito positivo, como professora, o fato de
Clara atribuir a mim a responsabilidade por sua atitude reflexiva em duas ocasiões
distintas (19/05 e 08/07). Assim sendo, saliento aqui a importância de o professor
contribuir de alguma maneira para que todos aprendizes compreendam a forma de
como adquirir o hábito geral de refletir.
(...) você me fez refletir e perceber que desde o início das aulas houve muita mudança. (Clara,
19/05)
(...) Eu gostei muito da atividade que fizemos e apesar de tudo me senti a vontade e participaria de
outros se fosse necessário, apesar de relutar um pouco para fazer essa atividade eu gosto deste
tipo de trabalho. Posso até dizer que no próximo semestre vou sentir falta das suas aulas. Obrigada
por me fazer aprender que é realmente importante falar e participar das aulas. (Clara, 08/07)
O processo de êxodo de Clara da ZC avançou com a percepção de poder
e a despreocupação com a face, que se destaca no fragmento do diário de 20 de
maio:
(...) Agora me sinto muito a vontade para falar em sala e mesmo errando coisas bobas como
trocar “he” por “she” e “his” por “her EU O ME IMPORTO, pois sempre que eu troco essas
palavras ou qualquer outra EU MESMA me corrijo. (Clara, 20/05)
Em contraste com Clara, o tempo empreendido para tomada de
consciência de Mário para sinalizar qualquer mudança é maior. É observável
também o sentimento de incapacidade e necessidade de proteção à face, que são
explícitos em diversos fragmentos em um único diário.
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(...) Infelizmente, percebi que não consigo soltar o meu inglês em meu grupo. Acredito que o meu
nível do idioma não é adequado para o curso, que o compreendi 100 % do que foi dito em
inglês. Praticamente, metade da aula eu perdi por falta de compreensão auditiva. (Mário, 24/02)
Entretanto, embora o movimento de êxodo de Mário seja mais tênue, ele
começa a demonstrar a percepção que pode se comunicar na L2, bem como
compreender o que é falado em aula no segundo mês de aula. É perceptível que
a preocupação com sua face o é tão intensa como no início do semestre. Além
disso, a demonstração de satisfação é nitidamente traduzida como autoconquista.
(...) Consegui me concentrar mais na aula, pois como foi bem descontraído, fiquei bastante calmo.
Com isso, compreendi a aula inteira (que alívio!!!) e consegui falar em inglês! Ufa! (03/03)
Mário continuou seu movimento para fora da ZC e avaliou positivamente
seu progresso com palavras e/ou expressões como quase 100% em inglês’,
adorei’, ‘o objetivo principal foi alcançado...
(...) No trabalho em grupo expressei minhas opiniões quase 100 % em inglês. Adorei o método do
trabalho já que o objetivo principal foi alcançado (escrever e falar). (Mário, 19 e 20/05)
Comparado à sua localização inicial na ZC, nos últimos diários e, por
conseguinte, nas últimas aulas, Mário demonstrou uma evolução promovedora de
auto-estima e autoconfiança. Acredito que por sua atitude reflexiva e mais interativa,
Mário deu seus primeiros passos para fora da ZC. Foram passos que requerem
continuidade para o êxodo total, mas que representam uma vitória para um aprendiz
de L2.
Na feira adorei o debate em sala. Eu até falei um pouquinho.Só em ter conseguido me
expressar em inglês, foi um troféu para mim! Estou satisfeito comigo mesmo. (Mário, 30/06 e
01/07)
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Quanto à percepção de mudança de Vânia, parece-me ser essa um pouco
mais acentuada. Acredito que essa percepção deve-se ao desejo de comunicar-se
que a aprendiz traz em si. Freqüentemente, eu notava que era nas atividades em
dupla que Vânia tinha mais iniciativa para interagir na L2. Vale lembrar sua atitude
participativa em aula, pois ainda que fosse na L1, Vânia sempre ressaltava em seus
diários a percepção das atitudes que denotavam mudanças, conforme pode ser
observado no quadro n° 14:
Percepção de atitudes que denotavam mudanças de Vânia Data
(...)Estou me tornando mais segura para falar.
(24/05)
(...) A minha principal mudança é que estou buscando muito mais o meu
melhor, estou me dedicando ao máximo para conseguir desenvolver um
bom texto.
(04/03)
(...) A mudança de tomar iniciativa de tentar, de buscar a resposta
correta isso eu considero uma mudança em meu comportamento.
(10/03)
Quadro n° 14: Percepção de atitudes que denotavam mudanças de Vânia
A meu ver, a percepção da forma que deveria agir para melhorar seu
desempenho na L2 provocou mudança não somente na prática da oralidade, mas
também em sua produção textual. Seus próximos diários são, voluntariosamente,
escritos em inglês, com fragmentos que traduzem a reflexão sobre a solução para
evoluir na L2, como pode ser observado nos exemplos de 17 de março e 14 de abril.
( ... ) Now I’m trying to think all the time in English I’ve watched films on DVD’s in English to improve
my listening skills. (Vânia, 17/03)
( ... ) I think we are learning more vocabulary day by day. (Vânia, 14/04)
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Em diversos fragmentos é possível encontrar a expressão de satisfação de
V. em se comunicar em inglês. Tratam-se de indícios de uma atitude de quem não
está detido em uma ZC. Todavia, é no excerto do diário de 20 de maio que a
satisfação de ser bem-sucedida na aprendizagem é descrita.
( ... ) I see the language not only to communicate, I’m learning many things about English and I’m
enjoying it a lot. (Vânia, 20/05)
Estrela nunca apresentara dificuldades para se comunicar em inglês. Ela
própria salienta não ter problemas quanto a isso. Entretanto, foi somente a partir do
segundo mês de aula que seus diários foram escritos em inglês. Essa foi sua
primeira mudança em relação à sua atitude como aprendiz. A figura 5 representa
o primeiro movimento de mudança de Estrela.
Estrela em 24/02/05 Estrela em 10/03/05
( ... ) However, for
me, the most
important thing
that occurred in
this class was to
learn that we need
to be helpful and
friendly with our
peers.
Reflexão Interação
Compreensão
Mudança
Nova atitude
Figura n° 5 – Mudança Inicial de Estrela
(...) No que se refere à
minha participação na
sala de aula posso
dizer que hoje, friso
hoje, neste dia não
encontrei problemas
para expressar-me no
idioma estrangeiro,
(...)
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Ainda que escrevesse seus diários em inglês ou, sempre que solicitada,
participasse das aulas, usando a língua alvo, Estrela, a princípio, não apresentou
diferença do perfil que apresentava no início do semestre. Todavia, próximo ao
término do período, ela demonstrou estar envolvida nos dois estados do pensar
reflexivo descrito por Dewey (1909). O primeiro deles, um estado de dúvida,
hesitação e perplexidade, o qual origina o ato de pensar. O segundo estado em que
se encontra envolvida é aquele que expressa seu ato de pesquisa, procura,
inquirição, para encontrar material que resolva sua vida, assente e esclara sua
perplexidade. Esses dois estados são descritos no diário de 10 de junho.
Primeiro estado do pensar:
This week, I’ve been more concerned with my participation in class because I feel that you expect
me to express my thoughts with more frequency and I know that you are always wanting us to talk
because it is good for us, it is essential to our learning. (…) that is why I’ve been reflecting about my
interaction and asking myself question, such as: “Was my participation in class today
satisfactory?”(…) (Estrela, 10/06)
Segundo estado do pensar:
.(…) that is why I’ve been reflecting about my interaction and asking myself question, such as:
“Was my participation in class today satisfactory?”(…)
For me, this kind of reflection was part of my routine, but this last week it obtained a major
importance. (…)Talking about the subject of your class, I want you to know that I have been
monitoring myself more often (…) (Estrela, 10/06)
Nesses estados, Estrela apresentou incerteza para promoção da
investigação, e a necessidade de solucionar a vida fator básico e orientador de
todo o mecanismo da reflexão crítica.
Há, entretanto, uma mudança de atitude expressa em um de seus últimos
diários. Os fragmentos abaixo traduzem as novas características de Estrela, que
parecem-me inerentes a estar fora da ZC: não apresentar inquietações durante suas
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falas, não ser controlada por fatores como humor e reações de seus colegas, não se
incomodar com resultados diferentes do expectável, nem se incomodar em expor sua
face. São exemplos de indícios de estar fora da ZC os excertos dos diários de
Estrela agrupados no quadro n° 15.
Indícios de estar fora da ZC Data
( ... ) I have observed that I am losing that little sensation of
nervousness that remained from the times of school presentations in
Clélia Nanci.
I realized that the more I do in class presentations and expose myself to
the public the more I get confidence in myself and, as a consequence, I
even like the thing and want to do it again.
(…)I also realized, in my every class reflections, that there are some
things creativity, inspiration and organization of the ideas that
depend on external factors, such as mood and weariness,
(…) and we must be prepared if we feel that we are not having the
results that we expect.
(23/06)
Quadro n° 15: Exemplos de indícios de estar fora da ZC extraídos dos diários de Estrela
Em relação à Alessandra, percebe-se uma busca por mudanças para
conseguir melhor expressividade oral, bem como compreensão auditiva a partir do
diário datado 18 de março (quadro 16). Contudo, os dados concernentes à
importância da reflexão, da interação e do modo como esses itens contribuíram para
a evolução de Alessandra são encontrados, apenas, em seus diários no quinto mês
de aula.
O ato de refletir e interagir com o meio é muito importante para o meu desenvolvimento, tanto
social, quanto intelectual. (...) Concluindo, acredito que o ato de refletir me leva a entender que
através do meu vocabulário e das avaliações que eu faço de mim mesma, eu participo das
aulas o tempo todo, mostrando meus ideais, pontos de vista e respostas às perguntas
apresentadas. (Alessandra, 09/06)
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Exemplos de mudanças experimentadas por Alessandra Data
(...) Sobre as mudanças que estou experimentando, estou aprendendo a
me expressar melhor por meio da fala e também aprendendo certos valores
(que infelizmente não quero citar) que tem me ensinado a saber vivenciar
fatos na vida de forma sábia e construtiva.
(...) Sobre as mudanças que estou experimentando (...) Sei que tenho
conseguido vencer e entender tudo com maior clareza
(18/03)
Quadro n° 16: Exemplos de mudanças experimentadas por Alessandra
Durante a pesquisa, não percebi em Elvis nenhum movimento para fora da
ZC. Seu desempenho, quando solicitado, sempre foi muito bom. Porém, se um
gráfico indicando sua prática de oralidade e interação no grupo fosse traçado,
perceberíamos que não haveria alterações expressivas. Embora considerasse
importante praticar a L2, como afirma em seu diário datado 03 de março, em muitas
ocasiões, tecia comentários sobre o assunto na L1 ou respondia em tom muito baixo
procurando ser ouvido apenas pela professora. Ademais, todos os seus diários
foram escritos em português.
(...) Continuo com minha opinião de que a aula da profª é bastante interessante pois mistura calma,
tranqüilidade e eficiência, não prejudicando o rendimento da aula sem contar o fato de falar inglês
na sala, que p/ mim é bastante importante. (Elvis, 03/03)
Em relação à pesquisa, essa atitude revela que é possível permanecer na ZC
ainda que o aprendiz tenha competência comunicativa. Similarmente, apesar de
possuir esse tipo de competência, a necessidade de proteção à face, para
determinados aprendizes, sobrepõe-se ao desejo de comunicar-se.
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Em seus diários Elvis sempre refletia sobre as aulas e a forma como eram
conduzidas, bem como demonstrava perceber a importância da interação:
(...) Percebo que em todas as aulas a profª faz com que nós juntemos a uma ou + pessoas e
creio que ela deva ter boas razões p/ isso, arriscando um palpite, diria que é p/ promover a
integração entre todos e nesse ponto eu também concordo. (Elvis, 17/03)
Somente próximo ao término do semestre Elvis demonstrou sentir a
necessidade de deixar a ZC. O fragmento abaixo retrata o exato momento em que
propulsionado por uma força maior, a interação do grupo durante uma atividade,
Elvis é quase que ‘expelido’ para fora da ZC.
(...) Sempre fui um garoto muito tímido e o fato de ter que me expor, ser o alvo de vários olhares
“Really gets to me”!!! É bastante difícil se manter compenetrado quando o nervosismo se apodera de
você. Mas depois de um certo tempo, quando vo sai está dentro do turbilhão e sabe que
“there’s no way back” tudo o que você tem a fazer é ir até o fim e tentar se sair bem. E foi essa a
experiência pela qual passei nessa aula. (Elvis, 24/06)
3.3. Terceiro Processo de Análise: Ameaças e proteção à face, lucros e
vantagens – co-construindo o conhecimento na interação.
Para esta análise baseei-me no conceito de face e atos de ameaça à face
(Goffman, 1974), a teoria da polidez (Brown & Levinson, 1987), que juntos permeiam
o conceito de Zona de Conforto (Colombo-Gomes, 2004-2006). Os dados
analisados foram colhidos de uma das aulas videogravadas. A videogravação teve
oitenta e oito minutos de duração. Nela foram encontrados quatrocentos e oitenta e
nove (489) turnos
6
, com cerca de 56 sobreposições de vozes. Cento e dezoito (118)
tomadas de turnos forma realizadas por mim, enquanto as demais foram realizadas
pelos aprendizes, com exceção dos aprendizes A19 e A21 que participaram das
6
O conceito de turno que utilizo é o de Jacoby (2000): ...turns are emergent units dynamically designed in real
time to be recognizable as now just beginning, now still in progress, and now ending.
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discussões em subgrupos, cujo som não foi captado. Esses números revelam que,
embora traga em mim a preocupação de proporcionar aulas onde haja maior
simetria nas vozes de professora e aprendizes, ainda controlo quase um quarto das
falas o que se trata de uma grande porção comparada ao mero de alunos
presente em sala.
Após diversas audiogravações e videogravações, os aprendizes
demonstravam estar mais confortáveis durante as aulas. Além de ter observado este
fato, pude corroborar esta impressão com a leitura dos diários reflexivos e com o
resultado da PEPA (Anexo I). No item 14, por exemplo, a turma inteira afirma não ter
medo de ter algum colega rindo de uma atuação inadequada em aula. Ainda assim,
foi possível perceber na transcrição da aula, em uma situação estável, com um elo
social mais fortalecido, a ocorrência de diversos lucros de interação, busca de
vantagens, atos de ameaça à face e atos de minimização de ameaça à face,
transgressão à face positiva do falante, e atos contrários aos desejos da face do
ouvinte.
Muitos turnos na aula acentuam a polidez positiva em contraste à
necessidade real de expor uma opinião ou idéia. Os aprendizes demonstram que é
necessário que alguém exponha a face antes de cada um, a fim de salvarem a
própria. Pude notar que se expusesse minha face alegando o ter certeza ou
demonstrasse que simplesmente precisasse da opino de um deles ou da turma
eles tentariam trocar opinião e idéias sobre o assunto abordado. Ademais, quando
me posicionava em relação a um dado assunto, tendiam a concordar com minha
opinião ou com a daquele que primeiro fizesse uma colocação qualquer (vide quadro
n° 17)
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Exemplos de atos relacionados à polidez Tipo
1. P: Very long in comparison to....? (silêncio)…
Well, I’m not sure... And what about if I have
something like this? Is it ok? Is this format ok?
What do ya think?
2. A4: I don’t think so
3. P: You think it is?
4. A5: Not this way.
5. P: So, maybe … what would we have here in this
paragraph?
6. A3: Pros and cons?
7. A4: About the subject.
8. P: So, it is...Ok, it’s the pros and cons of a
subject. Can we have them together?
9. A3: No.
10. A8: No.
11. A14: I, I...I agree with them
12. A18: Me too.
1. vida da professora
exposição da face negativa.
Polidez positiva (para
satisfazer à face positiva dos
aprendizes.
2. Lucro pela explicitude
demonstração de não-
manipulação.
3. Lucro pela explicitude a
professora quer saber a
opinião do aprendiz.
4. Concordar com o falante
buscando preservação da
face.
5. Ameaça à face dúvida sobre
a posição dos aprendizes
6. Pergunta para preservação da
face não se expõe, não
impõe sua opinião.
7. Resposta em tom natural
despreocupação com a
preservação da face.
8. Pergunta da professora
provocação à face dos
aprendizes.
9. 10. 11. 12.
Reivindicação de auto-
imagem do grupo os
aprendizes sinalizam
compartilhar a mesma opinião.
Quadro n° 17: Exemplos de atos relacionados à polidez
Uma outra forma de usar a polidez positiva feita pelos aprendizes é o uso de
tom baixo ao responder qualquer pergunta formulada. Ao transcrever a fita, não foi
possível compreender diversas falas como as de A2 e A3. A meu ver, estes
aprendizes sabiam as respostas para minhas perguntas; todavia, a necessidade de
protegerem sua face era maior que o desejo de interagir: não deixavam de
responder as perguntas da professora, nem arriscavam ameaçar sua face. Dessa
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Análise e Discussão de Dados
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forma, lucravam com a interação: demonstravam interesse na aula e minimizavam a
ameaça à face.
P: What for?
A3: For our partners to.....
A4: make suggestions
P: Ok, good. And then I asked you to pay attention to some details. Do you remember the details I
asked you to focus on?
A3: The format.
P: The format.
A2: [trecho inaudível]
P: Sorry?.
|A2: [trecho inaudível]
|A3: [trecho inaudível]
P: Excuse me?
A2: the plural?
Contudo, algumas dessas ocorrências previamente citadas apontam para
o êxodo da zona de conforto, haja vista a forma como os aprendizes respondem ou
fazem colocações dedicando maior importância à racionalidade quando querem
realmente participar de uma interação sem medo de terem sua face invadida. É
quando o interesse em construir algum sentido, usando estratégias de
dissecação de palavras para compreender ou se fazer compreendido, mesmo que
soe inadequado aos demais participantes da interação. É na forma que A16 interage
que é possível observar o desejo de se fazer compreendida e sobrepor-se à
proteção da face:
P: (…) remember what we have been talking about fearing making mistakes? So, what can you say
about this?
A2: You think... uh... you are afraid to make a mistake before to think you... everybody makes
mistakes.
P: Just hold on, guys. Ok, well, now go ahead. So, what were you saying?
A16: She said about people who [trecho inaudível] and also about... how can I say? When we talk
about vergonha, né, you say people shame on you but when we have to say people... they... estão
com vergonha, como se diz isso?
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97
Dentre essas ocorrências, pode ser observada uma busca de lucro do falante
em momentos distintos. Uma delas é a tentativa de ganhar crédito por ter tato
manter-se neutro, isto é, ao responder uma das perguntas da professora com
finalidade de checar compreensão, A6
7
muda a entoação descendente para
ascendente e, por conseguinte, replica com uma outra pergunta. Logo em seguida,
A3 faz uso da mesma estratégia.
P: Oh, the format. But is it ok if I have blocks? Remember that I asked you to write in blocks? If I have
a block like this for introduction... Is it ok? This format?
A2: No.
P: Why not?
A6: Because it’s very… big…?
[…]
P: So, maybe what would we have here in this paragraph?
A3: Pros and cons?
A6 demonstra coerência diante de sua tentativa de proteger sua face e ser
racional. Todavia, A6 quer participar e checar sua compreensão, mas não quer se
sentir embaraçada caso sua resposta seja inapropriada. O mesmo acontece em um
outro momento quando checagem de vocabulário. A1 responde com a entoação
de resposta, mas com um tom muito baixo, pois não se sente confiante para
responder. A17, que, por sua vez, já usara em aula a expressão to be
embarrassed”, ainda assim, não responde faz uma pergunta esperando a
confirmação da professora.
A1: They are ashamed?
P: Well, you are ashamed when [trecho inaudível] but it’s not a matter of [trecho inaudível]. What is
this? You feel...
A3: Shy...
P: Uh... Oh... Not exactly shy, but you feel...
A17: Embarrassed?
P: Yeah, uhum!
7
Devido à preservação da identidade dos aprendizes centrais e de apoio, os denomino A1, A2, A3..... A22 em
todas as transcrições das aulas.
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Análise e Discussão de Dados
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Após receber a confirmação da professora, A17 demonstra estar mais à
vontade e acrescenta mais uma informação sobre o vocabulário discutido.
A17: I noticed many other words we learned recently. A word that [trecho inaudível] (...) referring to
the word fight? You know any one that can...
A1: Strive.
P: Uhum! Good, Estela! Any other? So, you know that instead of using fight you can also use...
A5: Strive.
P: And what else?
A6: Struggle.
P: Uhum. So, you can use fight, struggle and strive.
A atitude de A17 promoveu a interação entre A1, A5 e A6. Essa interação
gerou uma participação mais intensa do grupo na atividade e, até mesmo, uma
reflexão no momento da ação que causou distintas tomadas de turnos. Por
conseguinte, trouxe o uso da língua como meio, não como fim em si, para
comunicação, interação e desestagnação da inércia comum da ZC.
A11: Sometimes... uh... some people think in Portuguese and then translate to English. When they do
it, they confuse ideas, so on. So, they are not so confident talking in the foreign language. So they...
they.... don’t say what they think.
A4: [trecho inaudível].
A9: And do you think that not showing your ideas... uh... disturbs you [trecho inaudível] ? Not being
able to express your ideas [trecho inaudível]. Does it cause you any problems?
A5: Yes.
P: What kind of problems?
São em ocasiões como a descrita acima que se torna possível observar o
êxodo da ZC, pois a necessidade de comunicação transpõe todas as barreiras
impostas pelo escudo de proteção à face erguido por cada um.
Percebe-se, também, que no grupo atos de ameaças à face sem a
preocupação de minimização pela professora ou pelos aprendizes, como em:
A13: [trecho inaudível] not interact in the class, because you have a... a... you afraid to make a
mistake.
A2: (…) you think... uh... you are afraid to make a mistake before to think you... everybody makes
mistakes.
A5: YOU “asked “, us to do it….
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Análise e Discussão de Dados
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Alguns aprendizes evidenciam uma mudança em seu agir. Nessa aula,
pareciam ter esquecido da gravação, do medo de errar e do desejo de não se expor.
Eles seguiram duas das máximas gerais de Grice (1975): a de relevância (para eles
era importante expressar suas idéias) e a de qualidade (eles acreditavam que suas
asserções eram verdadeiras). No presente estágio, duas generalizações que
ameaçaram a face negativa dos ouvintes (aprendizes e professora): você
(denotando as pessoas) tem medo de cometer erros” e “todo mundo comete erros”.
De modo adverso ao período inicial de nossas aulas, esses atos não trouxeram
nenhuma ameaça à face, nem causaram nenhum movimento para detenção dos
aprendizes na ZC.
Finalmente, acredito ter encontrado possíveis respostas para minhas
indagações. Respondendo a primeira questão de pesquisa (Quais são os fatores
relacionados à permanência na zona de conforto?), observei que os fatores
relacionados à permanência na zona de conforto são diversos, principalmente a
necessidade de proteção à face, a distância social entre os participantes de uma
interação, os cálculos de lucros que podem ser obtidos ao usar ou não a polidez
negativa ou positiva o que envolve fatores relacionados à comunidade em que
estão inseridos, assim como a dúvida concomitante entre o desejo de transmitir uma
idéia e de ser racional em oposição ao desejo de proteger sua auto-imagem.
A figura do professor pode ser considerada um instrumento de detenção à
ZC se a sua figura tiver sido eleita pelos aprendizes como a imagem pública que
desejam para si. Observei que eles sentiam sua face positiva agredida, até mesmo
ao receberem um elogio por reproduzirem a entoação (ascendente ou descente) que
eu utilizava. Em meu caso, não queria impor um modelo; buscava sua
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Análise e Discussão de Dados
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autoconscientização para que compreendessem a importância da transposição do
vocabulário passivo para o ativo. Outrossim, buscava a compreensão do quão
fundamental é a validade da distinção entre o conhecimento desses dois tipos de
vocabulário. Não desejava que os aprendizes retivessem a idéia de que a
construção de conhecimento é recebida de outros, conforme salienta Nation
(2001:24) ao distinguir o conhecimento passivo do ativo, mas que a construção de
conhecimentos e sentidos se constitui em uma ação conjunta em que o desejo de
expressar um sentido por meio da fala ou escrita seja mais forte do que a vontade de
proteger sua face ou permanecer na ZC.
É perceptível que a reflexão e a interação contribuíram para
conscientização de ões visando à construção de conhecimento, vocaburio e
significados quando os aprendizes respondiam ou faziam colocações dedicando
maior importância à racionalidade quando queriam realmente participar de uma
interação sem medo de terem sua face invadida, ainda que lhes soasse inadequado.
Para responder a segunda questão de pesquisa (Como (ou se) a reflexão
e a interação contribuem para conscientização de ações visando à construção
de conhecimento e significados?), saliento que a reflexão realmente contribuiu
para que os aprendizes interagissem, pois a sensação de conquista, destacada nos
diários, causava um sentimento de empoderamento e capacidade inusitado. Por
conseguinte, sentiam-se mais confiantes para discordar e aceitar ou o a opinião
de um de seus parceiros de interação.
Em uma das aulas, vídeo-gravada em junho de 2005, notei que os
aprendizes buscavam utilizar o vocabulário do texto que discutíramos anteriormente
porque era de seu entendimento que uma palavra que é lida ou ouvida apenas
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Análise e Discussão de Dados
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uma vez, sem grande envolvimento por sua parte, pode ser facilmente esquecida, ao
passo que aquela que é retomada e é afetiva e cognitivamente usada terá mais
chance de ser inserida em seu escopo de vocabulário ativo. Dessa forma,
processaram a construção de conhecimento muito mais profundamente, haja vista o
número de experiências vividas por cada um, trocadas a cada vez que evocavam o
significado de determinado vocábulo em questão. Essa conscientização obtida pela
reflexão e compartilhada na interação foi o grande agente promovedor de
mudanças. Graças a essa combinação, os aprendizes implementaram suas ações e
foram, assim, capazes de apresentar solução para sua evolução na aprendizagem.
Após ter compreendido as questões envolvidas nas duas primeiras perguntas
de pesquisa pude encontrar algumas respostas para a última (De que forma o
professor pode levar o aprendiz à conscientização e implementação de ações
que o tornem autônomo para construir significados e não permanecer na zona
de conforto?). O professor pode levar o aprendiz a conscientizar-se de possíveis
ações e a implementá-las a fim de que o tornem autônomo para construir
significados e o permanecer na zona de conforto quando este se propuser a,
antes de tudo, estar aberto a mudanças e aceitar ser educável. O professor
conseguirá esse feito quando trouxer em si a combinação das regras do respeito
próprio e a regra de consideração pelo outro; e, principalmente, quando for capaz de
diminuir a distância social entre aprendizes e professor.
Quando o professor estiver aberto a mudanças e aceitar sua condição de
‘educável’, ele exercerá o seu papel de forma menos autoritária, levando em
consideração as diferenças individuais de cada um. Conseqüentemente, não
ameaçará a face do aprendiz, ou se o fizer, buscará cometer atos que demonstrem
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Análise e Discussão de Dados
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não ser indiferente à face positiva dos aprendizes e que, também, se importa com a
imagem que querem reivindicar para si. Essa postura lhes tra maior auto-estima e
menor necessidade de escudos como proteção de face. Não precisarão mais
permanecer em silêncio, nem falar tão baixo, a ponto de quase o serem ouvidos,
pois saberão que a imagem reivindicada para si é respeitada por seu professor.
Portanto, ainda que exponham sua face negativa ao participarem de interações em
aula, não serão julgados pelo professor e adquirirão o desejo de se comunicarem e
deixarão a ZC.
Quando o professor trouxer em si a combinação das regras do respeito
próprio e a regra de consideração pelo outro, ele também será educável e
consciente de que as metas por ele traçadas podem não ser as mais adequadas.
Ele buscará novos caminhos e enfocará as atividades em que os aprendizes
assumam papéis mais importantes, mais críticos. O professor buscará atividades
que acentuem o interesse de falantes e ouvintes para as atuações em duplas ou
com a turma, que tragam em pauta experiências vivenciadas pelos aprendizes,
dando-lhes oportunidade de retomar determinados vocábulos de forma afetiva e
cognitiva, causando, assim, a inserção desse vocábulo no escopo de vocabulário
ativo dos aprendizes.
Finalizo aqui a análise dos dados obtidos nesta pesquisa. A seguir, retomo as
principais questões que nortearam este estudo com algumas considerações finais.
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Considerações Finais
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa retratou a proposta de um estudo sobre o papel da
reflexão e da interação como posvel alternativa para promoção do êxodo da
zona de conforto em uma sala de aula de Língua Inglesa. Procurou-se
compreender o papel fundamental do professor-pesquisador de refletir sobre sua
prática de interagir com seus alunos a fim de encorajá-los a assumir
responsabilidade sobre seu processo de aprendizado e a atuar de forma
autônoma e crítica. Durante esse período, experimentei alternativas para a minha
ação pedagógica, com o intuito de construir meu próprio conhecimento sobre as
formas como a reflexão e a interação contribuem para a conscientização de ações
de construção do conhecimento. Parti do pressuposto de que o papel fundamental
do professor-pesquisador é de refletir sobre sua prática de dialogar com seus
alunos a fim de encorajá-los a assumir responsabilidade sobre seu processo de
aprendizado e a atuar de forma autônoma e crítica.
Objetivei verificar como a reflexão e a interação de alunos entre si e com
o professor podiam levar aprendizes ao êxodo da zona de conforto, compreender
os fatores relacionados à “acomodação” de determinados aprendizes e a
identificar as possíveis alternativas que promovam o êxodo da Zona de Conforto,
em uma turma da disciplina ngua Inglesa I, em uma faculdade de formação de
professores de língua estrangeira localizada numa zona semi-residencial de uma
região metropolitana do Estado do Rio de Janeiro.
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Considerações Finais
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Enquanto investigava as questões pertinentes aos objetivos
estabelecidos, procurei me conhecer mais profundamente como profissional
reflexiva. Para tanto, busquei respostas para algumas questões propostas por
Freire. Essas perguntas, de ordem filosófica, ao terem suas respostas emersas,
como um fenômeno da saída de um astro eclipsado de detrás do disco aparente
do astro eclipsante, contribuíram para que fosse norteada para as verdadeiras
questões de pesquisa.
Identificar o que faço parecia ser fácil; contudo, deparei-me com fatos
inusitados, como, por exemplo, a descoberta de que ao preparar minhas aulas
desconsiderava as diferenças individuais dos aprendizes. O diálogo reflexivo entre
mim e os aprendizes, criado pelos diários, promoveu mudanças não somente em
suas atitudes, bem como em minha prática durante a pesquisa.
Descobrir o que fazia tornou-me capaz de perceber que o queria ser
daquela forma. Essa percepção remeteu-me a Freire (1996:26; 38; 60) que afirma
que sou educável à medida que me reconheço inacabada’, pois assim pude ser
educável e procurar também mudar. Conscientizei-me de que meu agir era
baseado no que eu era como aprendiz e em minhas atribuições às metas que
alcançava ao longo de minha história de aprendizagem, sem levar em conta as
diferenças individuais dos aprendizes. Isso significou que posso agir de forma
diferente: compreendendo que o tempo empreendido no processo de ensino-
aprendizagem e para a conscientizão para construção de novos sentidos e
significados é variável. Para mudanças, é ainda maior.
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Considerações Finais
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105
De uma certa forma, meu agir refletia em meus aprendizes como
instrumento que contribuía para sua detenção na ZC, uma vez que minhas ões
eram, na sua maioria, contrárias aos desejos da face negativa de alguns deles.
Como professora, ao impor atividades para promover a prática oral, não pretendia
evitar a liberdade de ão dos aprendizes queria-os interagindo, desafiava-os a
responder aos seus pares. Com isso, interferia na polidez positiva dos aprendizes,
ou seja, na auto-imagem que cada um reivindicava para si. Por isso, permaneciam
em silêncio, ou usavam a “teoria do evitamento”, a polidez negativa.
Acredito ter crescido ao reconhecer que eu mesma precisava mudar, ao ter
vivenciado e avaliado as mudanças dos aprendizes, ao ter aprendido vivenciando
o ensinar baseado no diálogo, na reflexão e na interação, ao ter ouvido o que li
nos diários ao invés de ter apenas decodificado os signos escritos pelos
aprendizes.
Durante a pesquisa, como conseqüência da postura que assumi, percebi
uma diminuição gradativa da distância entre mim e os aprendizes. Essa distância
minimizada permitiu-lhes participar do processo de ensino-aprendizagem de forma
ativa: sentiam-se capazes de se enxergarem como aprendizes de uma L2 e de se
avaliarem para buscar mudanças com fins de evolão na prática oral
ingredientes principais para o êxodo da ZC.
A construção de uma saída para a efetivação da aprendizagem
representou uma aprendizagem significativa para meus alunos e uma não-
conformidade para mim como professora. Como fruto das reflexões de aprendizes
e professora obtive uma potencialidade para o ensino-aprendizagem. Edifiquei
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Considerações Finais
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106
minha capacidade de ser educável, compreendi que quanto maior for a resistência
à aprendizagem, menor será a criatividade e autonomia do aprendiz.
Sinto-me gratificada por tanto trabalho e estudo dedicado a esta pesquisa.
Sinto-me recompensada por ter percebido que as partes sucessivas de um
pensamento reflexivo são derivadas umas das outras, de forma ordenada, não um
ir e vir de idéias. Sinto-me feliz em concluir que na pesquisa, nós, aprendizes e
professora, buscamos pensar reflexivamente e que encontramos unidades
definidas, ligadas entre si de tal arte que o resultado foi um movimento continuado
para um fim comum: o êxodo da zona de conforto.
o obstante, não posso deixar de mencionar que ainda existem lacunas
que precisam ser preenchidas para que esta questão seja concluída. o posso
afirmar que os resultados obtidos servem como solução para todos os casos de
permanência na ZC. Creio, todavia, que o que fiz pode ser aplicado ou
experimentado para atingir pelo menos alguns casos, independentemente da L2
ensinada.
Minhas percepções sobre a ZC apontam caminhos que exigem ões
transformadoras do professor, demonstram que o que causa conforto aos
aprendizes é, simultaneamente, um agente causador de desconforto no professor.
É algo paradoxal, mas o êxodo da Zona de Conforto propicia ao professor uma
sensação de conforto por saber que o desejo de aprender pode sobrepor-se ao
desejo de manutenção da face.
Ao escrever estas considerações finais, sinto-me um pouco mais
experiente, mais educável e aberta a mudanças. Compreendo que existe uma
abertura à experiência em minha prática. Consigo enxergar algumas falhas que
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Considerações Finais
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107
cometi, como o ter estabelecido que a entrega dos diários deveria ser via e-
mail. Esse procedimento possibilitaria uma economia de tempo e maior interação
entre os participantes da pesquisa.
Percebi que na pesquisa não existe fim; só existe o começo e uma
inquietação tremenda que nos conduzem a novas pesquisas. Em meu caso,
perguntas como:
ü A permanência na Zona de Conforto é algo comum em qualquer
situação de ensino e aprendizagem?
ü Qual é a identidade do aprendiz que permanece na zona de
conforto? Que práticas discursivas constituem socialmente a
identidade institucional do aluno que permanece na Zona de
Conforto?
ü Qual a identidade do professor que busca a promoção do êxodo da
Zona de Conforto?
ü Como se comportam os aprendizes estagnados na Zona de
Conforto em contextos institucionais diferentes?
Hoje ainda não tenho respostas para essas perguntas, mas acredito ser
possível encontrá-las ou, pelo menos, trilhar caminhos que me incitem a outras
ações transformadoras.
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training ESL teachers. Cambridge University Press
PDF Creator - PDF4Free v2.0 http://www.pdf4free.com
Anexo I
PEPA (Potentially Exploratory Pedagogical Activity)
Discuss with your peer the statements below, then mark with an X the slot which
best suits your opinion.
DA = definitely agree A= agree D= disagree TD= totally disagree BM= beats me!
DA A D TD BM
1 - I never feel self assured when I’m speaking in an English
class.
1 8 5 2 -
2 - I don’t care about making mistakes in class. - 8 8 - -
3 – I shake when I know that I’ll have to answer a question
specially addressed to me.
2 3 5 6 -
4 – I panic when I can’t understand what the teacher is saying
in class.
5 1 8 2 -
5 – I always think my peers know more than I do. 3 1 10 2 -
6 – I freak out if I have to improvise in class. 2 5 2 7 -
7 – I often feel like not coming to my English class. - 3 9 3 -
8 – I feel confident to speak in my English class. 2 3 9 1 1
9 – I fear my teacher being willing to correct all the mistakes I
make.
1 4 6 5 -
10 – Sometimes my teacher is so fast that I fear not catching
up with her.
5 8 - 3 -
11 – I get tenser during English class than during any other
class.
3 6 3 4 -
12 – I prefer to work in pairs or with small groups than
individually or with large groups.
3 11 1 - 1
13 - My previous learning experiences had no meaning to me.
They were neither important nor unimportant to me.
- 1 4 10 1
14 – My worst fear is knowing that my peers may laugh at me. - - 6 10 -
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