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crítica, como verificado em publicação do jornal “Folha da Noite”, na coluna sobre
rádio, escrita por Blota Junior (1944, s/i):
[...] O amigo liga o rádio e pode ficar até uma hora ouvindo uma porção
de gente, e ouvindo só ele. Primeiro pernóstico, sestroso, Zé Conversa,
campeão da vida e da mordida, a gíria em forma de preto. E quando o
cordão continua, feito seleção de futebol que entra em fila indiana na
cancha, vem Pernafina, o chofer da pizza napolitana, dos conceitos
magistrais, da voz com lixa de aço nº 4. “Evem” Ervilha Riso, a mulher
labareda, Sinésio Trombone, o popularíssimo gostosão da Vila Matilde, o
impressionante Professor Percival Redegondolo Sabinchas de
Alcoforado, Don Segundo Sombra, a sombra viva de Carlito Gardel, e
toda uma coleção de vozes, de trejeitos, de micagens, de imitações
doces, melífluas, rascantes, terminando nessa criação do Moleque
Barbosinha, ídolo de uma multidão de guris, que diariamente se
acotovela talvez apenas para vê-lo em suas trapalhadas.
Ele é um exemplo de tenacidade, que venho acompanhando desde que
entrei no rádio, quando seus conselhos eram os melhores dentro da
espontaneidade de que se vestiam. Enquanto todo mundo teimava em
me ensinar a falar, a respirar no microfone, a irradiar o futebol, a ler
textos, ele apenas me ensinava a compreender os homens do rádio, os
invejosos, os ferinos, os inconscientes. Ele tinha uma larga escola, e
quando às vezes olho para os degraus que já subi, ainda o vejo lá
embaixo, com o chapéu Humphrey Bogart de lado, a larga mão
espalmada, sacudindo níqueis, me ensinando a viver num ambiente em
que a erudita e decantada “struggle for life” é mais pronunciada que em
qualquer outro. Depois, ele subiu todos os degraus com facilidade,
porque tinha esperado anos. Hoje, ele é Adoniran Barbosa. Cartaz. E os
evangelhos diriam: bem-aventurados os que confiam nos homens,
porque um dia encontrarão um homem que os descobrirá...
O grande sucesso restringiu o tempo que Adoniran poderia dedicar às
composições. Nessa época, Adoniran conheceu diversos compositores que
integravam as equipes das rádios. Assim, em meados de 1945, Adoniran retomou
parcerias musicais e após o casamento com Matilde, também voltava a gravar
seus sambas. Adoniran foi cartaz até 1950, quando Moles pediu demissão da
Rádio Record e migrou para a Rádio Bandeirantes, deixando seu ator principal
sem novos quadros. Como compositor Adoniran não fazia tanto sucesso, pois o
samba que se tocava nas rádios ainda era quase que exclusivamente de
compositores cariocas.
Após a partida de Osvaldo Moles, Adoniran investiu em temas
carnavalescos e até obteve algum resultado positivo com o público mineiro. No
entanto, foi em 1951 que Adoniran despontou como compositor, ao abordar em
seu repertório a história de Mato Grosso e Joca, personagens semelhantes aos
que interpretava na Rádio Record. Talvez porque a letra conte os lamentos de
três conhecidos de Adoniran, que foram despejados de um casarão abandonado,