torná-lo o mais próximo possível do considerado belo socialmente. Mas, o que
querem os negros?
Eles querem ser reconhecidos como humanos; querem também o poder
que sempre lhes foi negado, em relação às decisões sociais. Querem ser vistos como
alguém que pertence ao mundo da cultura valorizada, da educação. Assim, a questão
por trás desse desejo é muito mais complexa. Talvez para as meninas que
participaram desta pesquisa, todos esses elementos inseridos na rejeição de seus
cabelos não estejam assim tão claros, aparecendo-lhes apenas como uma questão
estética a respeito do bonito e do feio.
[...] por tudo que sabemos sobre a inserção dos negros em nossa sociedade,
desde a escravidão até os dias atuais, reconhecemos que estamos inseridos em
relações assimétricas e de poder em que os brancos dominam os meios de
produção, a mídia, os lugares de poder, a informação, a escolarização. Sendo
assim, por mais que a comunidade negra desenvolva historicamente, estratégias
de resistência e de combate ao racismo e á discriminação racial, tenho que
admitir que a formulação de um olhar “desencontrado” do negro em relação a si
mesmo, à sua raça, à sua cultura invade os espaços sociais freqüentados por
esses sujeitos, o que implica, muitas vezes, para o negro e para a negra, uma
aceitação parcial do conteúdo da proposição racista e a rejeição à história inscrita
em seus corpos. E mais, esse processo pode tomar proposições maiores e resultar
na rejeição de elementos do corpo que no decorrer da história e da cultura,
passaram a ser considerados com o que mais atestam o pertencimento à raça
negra. Destes ,o principais são a cor da pele e o cabelo. (GOMES, 2002, p.182).
Quando uma menina ou uma mulher negra rejeita sua cor ou seu cabelo,
ela não está rejeitando apenas seu corpo, mas, principalmente, toda uma história que
se construiu por meio da forma como os negros foram “inseridos”/“excluídos”, em
nosso país. Ou seja, subjaz à rejeição de si uma pesada carga que se inscreve num
passado escravista de negação de sua pessoa humana. Essa negação se relaciona com
lembranças dolorosas da infância. E esse é, a meu ver, o foco principal que temos que
considerar, quando se analisa a rejeição dos negros/as aos seus corpos, às suas
características físicas. Desse modo, é importante
[...] ponderar que, para o negro, o estético é indissociável do político. A efecácia
política desse debate está não naquilo que ele apresenta ser, mas, ao ele no
remete. A beleza negra nos remete ao enraizamento dos negros no seu grupo
social e racial. Ela coloca o negro e a negra no mesmo território do branco e da
branca, a saber, o da existência humana. A produção de um sentimento diante de
objetos que tocam a nossa sensibilidade faz parte da história de todos os grupos
étnico/raciais e, por isso, a busca da beleza e o sentimento do belo podem ser
considerados como dados universais do humano. (GOMES, 2002, p.184).
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