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Sergio H. Pardal B. Freudenthal
A EVOLUÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE
DO TRABALHO
Mestrado em Direito
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
São Paulo
2006
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II
Sergio H. Pardal B. Freudenthal
A EVOLUÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE
DO TRABALHO
Mestrado em Direito
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para a obtenção do título de Mestre
em Direito das Relações Sociais (Direito
Previdenciário), sob a orientação do
Professor Doutor Wagner Balera.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
São Paulo
2006
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III
__________________________________
__________________________________
__________________________________
IV
Dedico este trabalho à minha esposa Cleide
e às nossas filhas Carolina e Catarina;
merecem todas as dedicatórias e todo o meu
amor, até mesmo porque suportam minhas
idiossincrasias humanamente insuportáveis.
V
Agradecimento ao meu orientador Professor
Doutor Wagner Balera. Com grande orgulho
e entusiasmo produzimos esta dissertação
sob a orientação de exigente mestre; orgulho
porque a exigência do mestre é diretamente
proporcional à confiança que tem no
discípulo orientando; e o entusiasmo é
decorrente das suas lições que traçaram um
caminho seguro para o desenvolvimento
científico.
VI
RESUMO
Esta dissertação examina a evolução da indenização por acidente do
trabalho, em especial na legislação brasileira. Discorre sobre a formação
doutrinária deste conjunto de diplomas e pondera suas interpretações. Analisa as
doutrinas infortunísticas e suas aplicações até a atualidade, com particular
atenção à Constituição Federal e suas disposições sobre indenizações por
acidente do trabalho. Acidentes do trabalho e moléstias ocupacionais merecem
muito maior atenção do que pode sugerir o estabelecimento de meras
indenizações pelos males causados. Dignidade e melhores condições de
trabalho, com toda a tecnologia atualmente existente, que deveria ser colocada a
serviço da humanidade, são bandeiras de luta dos movimentos dos trabalhadores
em todo o mundo, o que não retira a importância da reparação devida pelas
seqüelas redutoras da capacidade laboral dos acidentados. Importa muito a
indenização, seja pelo seguro obrigatório, garantindo alguma compensação pela
redução laboral além de anotar o sinistro na devida estatística, seja pela
responsabilidade civil, quando a condenação também possui caráter pedagógico.
Portanto, a indenização por acidente do trabalho é assunto merecedor de tento. O
estudo histórico parte da Revolução Industrial, acompanha a evolução das
doutrinas e da legislação nacional, culminando sua atenção às condições atuais
da lei infortunística: a aplicabilidade da redação atual, com as modificações da
última década, e a formação de uma redação futura para regulamentar o
atendimento do seguro de acidente do trabalho conforme disposto pela Emenda
Constitucional nº 20/98, concorrentemente pelo regime geral público e pelas
seguradoras privadas. A pesquisa desenvolvida se baseou na doutrina nacional e
estrangeira, tradicional e atual, na legislação e na jurisprudência, incluindo
também textos e dados encontrados em revistas periódicas. O tema suscita
amplos debates, pois o presente momento político já vem exigindo considerações
dos tribunais, na busca da consolidação de interpretações mais favoráveis aos
que trabalham, e atenção nas casas legislativas, para compor diplomas de maior
eqüidade, moldando uma sociedade mais rica, com tecnologia avançada e
produtiva, mas também mais justa.
acidentes do trabalho – previdência social – indenização – infortunística –
responsabilidade civil
VII
ABSTRACT
This paper looks over the Labor Accident Indemnity’s Evolution, mainly
inside the Brazilian Legislation. It goes through the doctrinaire view of its law
assemblages, and examines their interpretations. It analyses the Labor Accident
Doctrines and their applications until our present days, giving particular attention to
the Federal Constitution, and its disposition on Labor Accident Indemnity. Labor
Accident and Professional Diseases deserve much more attention than just
suggesting the establishment of an indemnity pay for the damage caused. Dignity and
better work conditions, with all the technology available nowadays, should be put up to
the service of mankind. Those are Fighting Symbol of Workers Unions throughout the
World, which does not take away the importance of the indemnity owned for the
worker, who has suffered Labor Accident, reduced labor capacity’ sequela. Indemnity
is very important, not just because of the Social Security refunds, therefore insuring
some compensation for the worker’s reduced labor capacity, in addition to its
necessary note for Statistics, but also because of its implied Civil Responsibility, when
the condemnation has a pedagogic character as well. Therefore, Labor Accident
Indemnity is a subject that deserves special attention. Its historical study begins with
the Industrial Revolution, goes through the Doctrine’s evolution and our National
Legislation, until the present conditions of the Labor Accident Laws, their present text
application, with all the modifications done on the last decade, and the making of a
future text in order to regulate Labor Accident Social Security Services as is
established on the Constitutional Emend nº 20/98, not only by Government Social
Security Service but by Private Security Companies as well. Its developed research
has based itself on the National and Foreigner Doctrines, both Traditional and
Modern, as well as on Legislation and Jurisprudence , including writings and data
found on periodic magazines. This theme brings up huge debates, since our present
political moment has already been demanding a bigger consideration from our Courts,
on the search of a more favorable Law consolidation and its application in favor of
those who work. It also demands the attention of the Legislation Assembly in the
making of more equal laws, therefore contributing not only to a more rich Society, with
higher and more productive technology, but also to a more just one.
Labor accident – social security institute – indenization – unfortunate – civil
responsability
Sumário
Introdução ........................................................................................ 01
. Capítulo 1:
Evolução histórica de acidentes do trabalho enquanto risco social... 04
1.1 A Revolução Industrial ................................................................ 08
1.2 As doutrinas infortunísticas ......................................................... 16
. Capítulo 2:
A indenização do acidente do trabalho e sua evolução legislativa
no Brasil ............................................................................................ 34
2.1 Evolução legislativa ..................................................................... 36
2.1.1 Decreto Legislativo nº 3.724, de 19/01/19 ..................... 36
2.1.2 Decreto-lei 24.637, de 10/07/34 ................................ 41
2.1.3 Decreto-lei 7.036, de 10/11/44 .................................. 43
2.1.4 Decreto-lei 293, de 28/02/67 ..................................... 47
2.1.5 Lei nº 5.316, de 14/09/67 ............................................... 49
2.1.6 Lei nº 6.367, de 19/11/76 ............................................... 56
2.1.7 Constituição Federal, de 05/10/88 ................................. 60
2.1.8 Lei nº 8.213, de 24/07/91, redação original e
suas alterações ........................................................................ 63
2.1.9 A Emenda Constitucional nº 20, 15/12/98 e
o novo § 10 do art. 201 ............................................................ 71
. Capítulo 3:
Análise da evolução legislativa ........................................................ 73
3.1 Do Decreto Legislativo 3.724/19 até o Decreto-lei 293/67,
com a evolução pelo Decreto-lei 24.637/34 e a importância
do Decreto-lei 7.036/44 .................................................................... 76
3.2 A Lei 5.316/67, a incorporação do
Seguro de Acidentes do Trabalho à Previdência Social
na Constituição Federal em 1969, até a Lei 6.367/76 ..................... 79
3.3 A Lei nº 8.213, de 24/07/91, regulamentar das
normas constitucionais de 1988, em sua redação original .............. 83
3.4 As alterações pela Lei nº 9.032, de 28/04/95 ............................. 90
3.5 A Medida Provisória 1.523-9, de 27/06/97,
a Medida Provisória 1.596-14, de 10/11/97, e
a descaracterização do Auxílio-Acidente ......................................... 94
3.6 A alteração constitucional de 15/12/98
ainda não regulamentada ................................................................ 102
. Capítulo 4:
A diferença entre Seguro de Acidentes do Trabalho
e a responsabilidade civil ................................................................. 107
4.1 Responsabilidade civil ................................................................ 116
4.2 Culpa grave e simples culpa ...................................................... 120
4.3 Os danos e a indenização .......................................................... 130
4.4 A cumulatividade de indenizações por acidentes do trabalho .... 132
. Capítulo 5:
Condição atual e futura do seguro dos acidentes do trabalho ......... 137
5.1 Benefícios atuais ......................................................................... 144
5.1.1 Jurisprudência – aplicabilidade e interpretação das
transformações legais ................................................... 146
5.2 Responsabilidade civil ................................................................. 155
5.2.1 Competência para julgamento e outras considerações . 156
5.3 Projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional ................ 161
. Conclusões .................................................................................... 164
Anexo ao Capítulo 2, tópico 2.1, evolução legislativa ....................... 171
Bibliografia ......................................................................................... 192
1
INTRODUÇÃO
A evolução da indenização por acidentes do trabalho acompanha
o desenvolvimento histórico das relações industriais, obedecendo ao traçado
político-social que se forma, com todas as contradições e conflitos suscitados pela
necessária vinculação entre capital e trabalho. Deste ponto de vista se desenrola
o texto, acompanhando as teorias e os embates doutrinários, as relações
históricas, inclusive as mais recentes, até as incertezas bem atuais.
A formação do Estado no século XX, especialmente na segunda
metade, com a consolidação do Estado do Bem-Estar Social, está presente na
formação do objeto deste estudo. Da mesma forma, as transformações na virada
do século também influenciam os direitos sociais e econômicos em todo o mundo,
incluídos no rol de direitos humanos, com igualdade de importância com os
direitos políticos. As transformações econômicas das últimas duas décadas
reduziram substancialmente as garantias do bem-estar social, sendo necessários
estudos para conter degenerações que possam acontecer nos tecidos sociais.
O acidente do trabalho tem exemplar importância quando se fala
em questão social. Tanto porque é obrigação da sociedade garantir a
sobrevivência de todo e qualquer cidadão que possa ficar privado de sua
capacidade laboral ou tê-la reduzida, quanto pela caução que deve ter o
trabalhador que participa da produção, podendo ser dela vítima.
O Brasil acompanha, de sua forma, a progressão, valendo
analisar a evolução legislativa: a primeira lei infortunística é de 1919; entre 1944 e
1967 desenvolve-se a estatização do seguro contra acidentes do trabalho,
culminando com norma constitucional em 1969; e a regulamentação da
Constituição de 1988, em lei de 1991 – com alterações entre 1995 e 1998 –,
demonstra o destacado e contraditório momento político, em especial nas
mutações relativas aos direitos dos trabalhadores, neste princípio do século XXI.
2
Assim, no primeiro capítulo se apresenta a evolução histórica do
acidente do trabalho, principiando com rápida análise do conceito evolução. A
partir da Revolução Industrial e do desenvolvimento das relações do trabalho,
apresenta-se a evolução das doutrinas infortunísticas, no Brasil e no mundo, a
partir de análises de importantes estudiosos.
No segundo capítulo se expõe a evolução legislativa no Brasil,
desde o Decreto Legislativo 3.724/19, passando pelo Decreto-lei 24.637/34,
Decreto-lei 7.036/44, Decreto-lei 293/67 (de curtíssima duração), Lei 5.316/67, Lei
6.367/76, até a Constituição Federal de 1988, a Lei 8.213/91, na sua redação
original e nas suas alterações, terminando com a Emenda Constitucional 20/98. É
feito o acompanhamento de cada diploma legal, especialmente em relação à
indenização do seguro específico e compulsório. São considerados os
entendimentos formados no desenvolvimento da legislação infortunística
brasileira, consolidando a doutrina pela ótica histórica.
O terceiro capítulo trata de analisar as transformações
legislativas. Complementa as apresentações do segundo capítulo, ponteando os
exames por importantes mudanças: entre a fundamentação pela teoria da
responsabilidade objetiva dando início à idéia de seguro compulsório e a
formação do monopólio do seguro de acidente do trabalho nos institutos
previdenciários; um tópico sobre a incorporação do seguro de acidentes do
trabalho ao sistema previdenciário; e em relação à legislação atual são
necessários exames sobre as alterações que estão em vigor e os temas que
estão em debate, seja pela aplicação da lei em sua redação atual, seja na
formação do que ainda falta regulamentar.
A diferença entre o seguro de acidentes do trabalho e a
responsabilidade patronal é o tema do quarto capítulo. A indenização por acidente
do trabalho com base em culpa ou dolo do empregador é matéria bastante
suficiente para longos trabalhos. Nesta dissertação tal indenização figura como
complemento, em razão de sua consistência adquirida bem mais recentemente.
Apontam-se duas questões de importância doutrinária na responsabilização
3
subjetiva do empregador em danos causados por acidentes do trabalho: a culpa,
e sobre ela o onus probandi, e a cumulabilidade das duas indenizações.
E por fim, preparando as conclusões, o capítulo quinto analisa as
condições atuais das indenizações por acidente do trabalho, tanto no seguro
compulsório quanto na responsabilidade civil do empregador, a aplicabilidade da
legislação na redação em vigor, com observação da jurisprudência, e o futuro do
seguro de acidentes do trabalho, ainda dependendo da regulamentação de
disposição constitucional.
Em suma, com a aplicação das doutrinas formadas, seguindo o
rol histórico da legislação e com análise das alterações nos devidos momentos
políticos, examina-se a evolução da indenização por acidente do trabalho. Dentro
do contexto das transformações que ocorrem em todo o mundo sobre os direitos
dos trabalhadores, deve ser construído um arcabouço jurídico de qualidade
humanitária, preservando princípios do Estado Social.
4
Capítulo 1: Evolução histórica de acidentes do trabalho
enquanto risco social.
Para examinar a indenização por acidente do trabalho é
necessário acompanhar o seu surgimento e a sua evolução nos tempos. O
desenvolvimento, social e técnico, pode se apresentar promissor e ao mesmo
tempo danoso, molestando os trabalhadores e exigindo regulamentações mais
humanas das relações do trabalho, por meio da legislação.
E a evolução histórica da legislação representaria,
obrigatoriamente, uma série de transformações exemplares? Seriam sempre
modificações lapidares, construindo uma arquitetura jurídica defensora dos
direitos sociais dos trabalhadores, ou reduziriam substancialmente tais direitos?
As alterações legislativas demonstrariam continuamente um avanço social, uma
progressão, em especial quando relativas à proteção das vítimas de acidentes do
trabalho? Uma avaliação histórica poderia contribuir bastante para a solução
destas questões.
Talvez não tenha sido possível garantir uma constante
progressividade social da legislação e de sua aplicação, com as idas e vindas no
direito infortunístico de todo o mundo, mas esta continua sendo a preocupação de
juristas, especialmente aqueles que estudam as questões sociais e econômicas.
5
Norberto Bobbio descreve que “os direitos do homem são direitos
históricos, que emergem gradualmente das lutas”, salienta que o seu
desenvolvimento ocorreu em três fases:
(...) num primeiro momento, afirmaram-se os direitos de liberdade
(...); num segundo momento, foram propugnados os direitos políticos (...);
finalmente foram proclamados os direitos sociais, que expressam o
amadurecimento de novas exigências – podemos mesmo dizer, de novos
valores –, como os do bem-estar e da igualdade não apenas formal, e que
poderíamos chamar de liberdade através ou por meio do Estado
1
.
A expressão questão social também representa tal apreensão dos
estudiosos, tendo sido formulada a partir do século XIX, “quando os efeitos do
capitalismo e as condições da infra-estrutura social se fizeram sentir com muita
intensidade”
2
.
A Igreja católica, na Encíclica Rerum Novarum, publicada por
Leão XIII, em 15 de maio de 1891, relaciona a importância da questão social.
Ressalta a sua necessária ação para “pôr termo ao conflito ou ao menos suavizá-
lo”
3
. As preocupações com as relações de trabalho são reforçadas com a
Encíclica Quadragesimo Anno, de Pio XI, em 15 de maio de 1931. Como a
Encíclica Mater et Magistra, publicada em 15 de maio de 1961 por João XXIII,
analisa os “novos aspectos da questão social”, conclamando a restauração das
“normas da justiça e da eqüidade”:
A evolução dos acontecimentos e dos tempos põe sempre mais em
relevo que as normas da justiça e da eqüidade devem ser restauradas, não só no que
diz respeito às relações entre patrões e trabalhadores, como também nas relações entre
os vários setores da economia, entre as regiões de prosperidade desigual dentro do
mesmo país e, no plano mundial, entre os países de diversos níveis de
desenvolvimento
4
.
1
Norberto BOBBIO, A era dos direitos, p. 32.
2
Amauri Mascaro NASCIMENTO, Curso de direito do trabalho, p. 9.
3
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documento sociais, p. 21.
4
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documento sociais, p. 257.
6
Este trabalho se inicia pelo conceito de evolução, inclusive para
sua consolidação. “Desenvolvimento progressivo duma idéia, acontecimento,
ação, etc. (...) Movimento progressivo”
5
; “Passagem progressiva de um estado a
outro. (...) Desenvolvimento ou transformação de idéias, sistemas, costumes,
hábitos, seres orgânicos e inorgânicos”
6
. E ainda importa observar, nas mesmas
fontes: progressivo é o que progride, caminha para a frente, avança. Portanto, a
evolução histórica da legislação infortunística deve significar a sua progressão, o
seu avanço, o desenvolvimento.
Nos tempos atuais, as transformações são mais rápidas e
complexas, suscitando rica diversidade de entendimentos, até mesmo por
contradições de caráter classista. Evolução ou involução, idas e vindas nas
mudanças legislativas, especialmente constitucionais, e em incontáveis países, o
direito social sofre uma alomorfia representativa de um novo perfil social.
Gomes Canotilho, ilustre constitucionalista de Coimbra, ao
analisar as rupturas, como a Constituição portuguesa de 1976, define o “código
binário continuidade/descontinuidade aplicado no direito constitucional”. Ocorre a
“continuidade constitucional quando uma ordem jurídico-constitucional que
sucede a outra se reconduz, jurídica e politicamente, à ordem constitucional
precedente”, sendo a “descontinuidade constitucional quando uma nova ordem
constitucional implica uma ruptura com a ordem constitucional anterior”
7
. Assim,
no Brasil, o texto constitucional de 1988 seria de ruptura, de descontinuidade,
enquanto as alterações através de emendas constitucionais, mesmo que com
fartura, representam continuidade constitucional, com maior obediência aos
princípios e normas vigentes.
Canotilho defende a democracia econômica, social e cultural,
descrevendo, em importante capítulo, o “Princípio da Socialidade”. Sustenta que o
“princípio da democracia econômica, social e cultural tem a mesma dignidade
5
Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa, p. 282.
6
Grande Dicionário Larousse Cultural da Língua Portuguesa, p. 408.
7
J. J. Gomes CANOTILHO, Direito constitucional e teoria da constituição, p. 195.
7
constitucional do princípio do estado de direito e do princípio da democracia
política”, e que tal princípio “apresenta duas dimensões específicas relativamente
a estes dois princípios”, a dimensão teleológica, sendo um objetivo, “um fim do
Estado”, e a dimensão impositivo-constitucional, porque “muitas das suas
concretizações assentam no cumprimento de fins e tarefas por parte de órgãos de
entidades públicas”
8
.
E ainda neste capítulo, o constitucionalista formula o “princípio do
não retrocesso social”, visando a manutenção dos direitos que adquiriram “um
determinado grau de realização”, que constituem uma “garantia institucional e um
direito objetivo”. Segundo Canotilho, o “princípio da democracia econômica e
social aponta para a proibição de retrocesso social”
9
.
Neste princípio de século os direitos sociais, conquistas dos
trabalhadores, concessões das classes dominantes ou frutos do desenvolvimento
econômico, social e político, sofrem mutações colocando em prova a idéia de
democracia econômica e social. A análise da evolução histórica, com a
observação de princípios, como o do não retrocesso social, busca a compreensão
do tema.
8
J. J. Gomes CANOTILHO, Direito constitucional e teoria da constituição, p. 337.
9
“A idéia aqui expressa também tem sido designada como proibição de ‘contra-revolução social’ ou da
‘evolução reacionária’. Com isto quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex.: direito dos
trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido um determinado grau de realização,
passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo. A ‘proibição de
retrocesso social’ nada pode fazer contra as recessões e crises econômicas (reversibilidade fática), mas o
princípio em análise limita a reversibilidade dos direitos adquiridos (ex.: segurança social, subsídio de
desemprego, prestações de saúde), em clara violação do princípio da proteção da confiança e da segurança
dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural, e do núcleo essencial da existência mínima inerente ao
respeito pela dignidade da pessoa humana (...). A liberdade de conformação do legislador nas leis sociais
nunca pode afirmar-se sem reservas, pois está sempre sujeita ao princípio da igualdade, princípio da
proibição de discriminações sociais e de políticas antisociais. As eventuais modificações destas leis devem
observar os princípios do Estado de direito vinculativos da atividade legislativa e o núcleo essencial dos
direitos sociais. O princípio da proibição de retrocesso social pode formular-se assim: o núcleo essencial dos
direitos sociais já realizado e efetivado através de medidas legislativas (‘lei da segurança social’, ‘lei do
subsídio de desemprego’, ‘lei do serviço de saúde’) deve considerar-se constitucionalmente garantido (...).
Não se trata, pois, de proibir um retrocesso social captado em termos ideológicos ou formulado em termos
gerais ou de garantir em abstrato um status quo social, mas de proteger direitos fundamentais sociais
sobretudo no seu núcleo essencial”, p. 338-339.
8
1.1. A Revolução Industrial
“Temos informações críveis de que há uma máquina a vapor
preparando-se agora para correr contra qualquer égua, cavalo ou capão que
possa aparecer no próximo encontro de outubro em Newmarket; no momento, as
apostas estão fixadas em 10 mil libras; a máquina é a favorita”. Assim informava o
Times de Londres no dia 8 de julho de 1808
10
. O favoritismo da máquina indicava
o futuro.
A Revolução Industrial foi a participação inglesa na construção de
uma nova sociedade, capitalista, na virada entre os séculos XVIII e XIX. A Grã-
Bretanha avança tecnologicamente, da indústria do algodão, das tecelagens,
passando por maior aproveitamento das minas de carvão e ferro, alcançando o
domínio ferroviário mundial.
Por mais que a revolução francesa de 1789 possa ter
representado mudanças mais imediatas e marcantes, é a Revolução Industrial
inglesa que consolidará a nova forma econômica da sociedade. O historiador
britânico Eric Hobsbawm sustenta que o processo de desenvolvimento industrial
foi uma revolução, “embora tenha sido moda entre os historiadores conservadores
– talvez devido a uma certa timidez face a conceitos incendiários – negar sua
existência e substituí-la por termos banais como ‘evolução acelerada’. Sustenta
que a Revolução Industrial não poderia ser um “episódio com um princípio e um
fim”, porque continua, com a mudança revolucionária se tornando norma. “Se a
transformação rápida, fundamental e qualitativa que se deu por volta da década
de 1780 não foi uma revolução, então a palavra não tem qualquer significado
prático”
11
.
10
Cf. Time-Life, História em Revista, A força da iniciativa – 1800-1850, A indústria britânica, p. 49.
11
Eric HOBSBAWN, A era das revoluções, p. 44-45.
9
Os primeiros avanços tecnológicos industriais criam uma nova
classe operária, com significativo fluxo migratório do campo. Os trabalhadores
têm participação automática na linha de montagem, com o ritmo de trabalho
invariável e inflexível, e com os proprietários buscando maximizar a produção de
suas novas e caras máquinas. A iluminação a gás, instalada nas fábricas a partir
de 1805, passa a permitir o aumento das horas de trabalho: “as figuras
deformadas daqueles que labutavam na indústria têxtil davam um testemunho
horroroso dos longos dias passados em movimentos repetitivos e incessantes que
envolviam o uso de todos os membros”
12
.
Para a presente monografia, particular importância tem a relação
entre a Revolução Industrial e as condições de trabalho, com suas estruturas e
transformações; e, por conseqüência de tais condições, os acidentes e as
doenças ocupacionais. Também em decorrência das condições de trabalho, tem a
mesma relevância a organização dos trabalhadores, nascida nas linhas de
montagem, pelo espírito coletivo de disciplina e militância e com um senso de
injustiça muito forte.
Hobsbawm comentando a primeira grave crise do capitalismo –
embora com “a expansão da indústria algodoeira e da economia industrial”
zombando “de tudo o que a mais romântica das imaginações poderia ter
anteriormente concebidos sob qualquer circunstância” – com uma acentuada
desaceleração do crescimento “por volta da década de 1830 e princípios de
1840”, aponta a agitação revolucionária que se fazia, com sérias conseqüências
sociais: “a transição da nova economia criou a miséria e o descontentamento, os
ingredientes da revolução social
13
.
A desenvolução tecnológica também teve o seu preço humano
imediato. Os trabalhadores se organizam com exigências e reivindicações. As
condições de trabalho na consolidação da Revolução Industrial fomentam o
12
Cf. Time-Life, História em Revista, A força da iniciativa – 1800-1850, A indústria britânica, p. 59-61.
13
Eric HOBSBAWN, A era das revoluções, p. 55.
10
crescimento do movimento operário, com as propostas de revoluções sociais,
inclusive com a tomada do poder pelo proletariado.
Em 1848, em um dos documentos mais importantes na história do
capitalismo e da luta pela justiça social, o Manifesto do Partido Comunista, Karl
Marx denunciava as linhas de montagem, a formação industrial “despojando o
trabalho do operário de seu caráter autônomo”. Cada vez mais o que se requer do
trabalhador é a operação mais simples, mais monótona e mais fácil de aprender.
Reduz o custo do operário “quase exclusivamente, aos meios de manutenção que
lhe são necessários para viver e perpetuar sua existência”, e desta forma, “à
medida que aumenta o caráter enfadonho do trabalho, decrescem os salários”.
Marx descreve as condições de trabalho, com os operários amontoados na
fábrica. O trabalho dos homens é suplantado pelo das mulheres e crianças, e
cada vez exige menos habilidade e força, e assim se avilta o seu valor
14
.
O desenvolvimento industrial inglês, na primeira arrancada da
Revolução Industrial, transformou as pequenas oficinas dos artesãos e artífices
em grandes linhas de montagem das indústrias capitalistas, firmando a
desqualificação profissional e a degradação das condições de trabalho.
Desqualificação e degradação que são retomadas na atual fase do capitalismo.
Três anos antes da publicação do Manifesto comunista, em 1845,
Friedrich Engels editou um estudo sobre as condições de trabalho criadas pela
Revolução Industrial em sua primeira fase: A situação da classe operária na
Inglaterra. Apresenta análise inicial sobre as condições dos trabalhadores quando
14
MARX e ENGELS, Obras escolhidas, vol. 1, p. 27:
“A indústria moderna transformou a pequena oficina do antigo mestre da corporação patriarcal na
grande fábrica do industrial capitalista. Massas de operários, amontoadas na fábrica, são organizadas
militarmente. Como soldados da indústria, estão sob vigilância de uma hierarquia completa de oficiais e
suboficiais. Não são somente escravos da classe burguesa, do Estado burguês, mas também diariamente, a
cada hora, escravos da máquina, do contramestre e, sobretudo, do dono da fábrica. E esse despotismo é
tanto mais mesquinho, odioso e exasperador quanto maior é a franqueza com que proclama ter no lucro seu
objetivo exclusivo.
Quanto menos o trabalho exige habilidade e força, isto é, quanto mais a indústria moderna progride,
tanto mais o trabalho dos homens é suplantado pelo das mulheres e crianças. As diferenças de idade e de
sexo não têm mais importância social para a classe operária. Não há senão instrumentos de trabalho, cujo
preço varia segundo a idade e o sexo”.
11
se sentem “as repercussões” da Revolução Industrial inglesa, nas fábricas e nas
cinzentas cidades industriais.
Um bom exemplo das evoluções relativas às condições de
trabalho, inclusive na formação dos direitos dos trabalhadores, pode ser
apreendido no período entre 1845 e 1892, entre duas edições do livro citado. No
prefácio para a nova edição, Engels admite a existência de evoluções sociais,
porém proclamando que “a burguesia continuou progredindo na arte de esconder
a miséria da classe operária”
15
.
Boa parte do “estado de coisas descrito” na edição original,
especialmente em relação à Inglaterra, pode pertencer ao passado:
(...) Embora os compêndios usuais não o digam expressamente,
uma das leis da economia política moderna estabelece que, quanto mais a
produção capitalista se desenvolve, tanto menos lhe é possível recorrer aos
estratagemas mesquinhos e ás pequenas vilezas que distinguem o período
inicial de seu desenvolvimento (...)
16
.
Portanto, para Engels, “o estabelecimento de determinado nível
de honorabilidade comercial não obedece a certo fanatismo ético, mas
simplesmente à necessidade de não perder inutilmente tempo e trabalho”
17
. A
perda de tempo indesejável tanto estaria relacionada à organização dos
trabalhadores e seus movimentos paredistas quanto aos sinistros laborais que
também interrompiam a produção.
De qualquer forma, o desenvolvimento industrial aumentava os
conflitos com os trabalhadores, inclusive realçando as contradições nos
interesses de classes, entre a majoração da produção e as mínimas garantias
físicas para os que laboram no maquinário.
15
MARX e ENGELS, Obras escolhidas, vol. 1, p. 215.
16
MARX e ENGELS, Obras escolhidas, vol. 1, p. 211.
17
MARX e ENGELS, Obras escolhidas, vol. 1, p. 212.
12
Engels salienta que “os novos meios de comunicação que haviam
surgido (...) as estradas de ferro e os navios a vapor transoceânicos”, a partir dos
mercados coloniais, estavam definindo o “mercado internacional”, e, “à proporção
que esse progresso se realizava, a grande indústria adquirira uma aparência mais
de acordo com as exigências da moralidade”
18
. Por sua ótica, ocorre a redução
dos conflitos sociais pelo próprio desenvolvimento do pensamento capitalista:
(...) Aprenderam a evitar os conflitos desnecessários e a
reconhecer a existência e a força dos sindicatos; e finalmente chegaram
inclusive a descobrir que as greves constituem – num momento oportuno – um
instrumento excelente para os seus próprios objetivos. Assim, o resultado foi
que os industriais mais poderosos, que antes haviam sido os instigadores da
luta contra a classe operária, passaram a ser os primeiros a pregar a paz e a
harmonia. E tinham para isso razões muito fortes
19
.
A análise de Engels, em documento histórico de 1845, adquire
maior importância para o presente trabalho quando se observa o prefácio na
edição de 1892, com o autor reconhecendo as alterações daquele período sobre
as relações de trabalho. Um exame das condições laborais atuais demonstra o
interesse presente naquele estudo do século XIX, sempre colocando em dúvida a
durabilidade das melhorias nas condições de vida dos trabalhadores.
Outras vertentes de pensamento relacionadas à Revolução
Industrial e às condições de trabalho merecem igual atenção: Robert Owen foi um
filantropo do País de Gales, que “galgou rapidamente os degraus da indústria
para se tornar sócio de um grande cotonifício de Manchester”, e, sensibilizado
com as condições dos trabalhadores, acreditou em uma ordem mais justa de
cooperação entre capital e trabalho. Comprou, em 1800, uma cidade fabril de 2
mil habitantes, New Lanark, perto de Glasgow, e buscou criar uma utopia
18
MARX e ENGELS, Obras escolhidas, vol. 1, p. 212.
19
MARX e ENGELS, Obras escolhidas, vol. 1, p. 213.
13
industrial, com condições dignas de trabalho, “boas moradias, ordem social e
educação”
20
.
A Igreja católica também busca intervir nas novas relações
sociais, publicando, em 15 de maio de 1891, a Carta Encíclica Rerum Novarum,
do Papa Leão XIII. Reconhece os conflitos causados pela “cobiça duma
concorrência desenfreada”, ou seja, pela “usura voraz”
21
. Este importante
documento católico responde aos movimentos operários e à proposta do
socialismo, conclamando a “concórdia das classes”, relacionando as “obrigações
dos operários e dos patrões”, o trabalho conforme o compromisso e o salário que
convém, e defendendo a “dignidade do trabalho”
22
.
A Rerum Novarum, sobre a condição dos operários, expõe
soluções de conciliação, conforme os costumes cristãos e, entre os deveres do
Estado, lista também a proteção do trabalho dos operários, das mulheres e das
crianças.
No que diz respeito aos bens naturais e exteriores, primeiro que
tudo é um dever da autoridade pública subtrair o pobre operário à
desumanidade de ávidos especuladores, que abusam, sem nenhuma discrição,
das pessoas como das coisas. Não é justo nem humano exigir do homem tanto
trabalho a ponto de fazer pelo excesso da fadiga embrutecer o espírito e
enfraquecer o corpo. A atividade do homem, restrita como a sua natureza, tem
limites que se não podem ultrapassar. O exercício e o uso aperfeiçoam-na, mas
é preciso que de quando em quando se suspenda para dar lugar ao repouso.
Não deve, portanto, o trabalho prolongar-se por mais tempo do que as forças
permitem. Assim, o número de horas de trabalho diário não deve exceder a
força dos trabalhadores, e a quantidade do repouso deve ser proporcionada à
qualidade do trabalho, às circunstâncias do tempo e do lugar, à compleição e
saúde dos operários
23
.
20
Cf. Time-Life, História em Revista, A força da iniciativa – 1800-1850, A indústria britânica, p. 67.
21
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documentos sociais, p. 14.
22
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documentos sociais, p. 21-26.
23
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documentos sociais, p. 36.
14
A Encíclica citada apresenta ainda exigências de jornada mais
curta para trabalhos mais pesados e mais nocivos à saúde, além de maior
proteção às mulheres e às crianças
24
.
As associações operárias católicas, dentre tantas associações
naquele momento político, deveriam atender às reclamações de direitos lesados
eventualmente, regulando os litígios na qualidade de árbitros
25
.
Vale também ressaltar as encíclicas Quadragesimo Anno, e Mater
et Magistra, enquanto importantes registros da Igreja Católica, em sua
participação na humanização da relação entre capital e trabalho.
A mais importante resposta dada pelo Estado na época aos
movimentos operários acontece na Alemanha governada por Otto von Bismarck,
com a instituição, entre 1883 e 1889, do primeiro regime amplo de seguro social
estatal. “Como se sabe, ocorreu na Alemanha, nos últimos 20 anos do século XIX,
a primeira iniciativa, sistematizada e organizada, de proteção social obrigatória e
garantida pelo Estado”
26
.
Cesarino Jr., ao conceituar o Direito Social, ressalta
historicamente a Revolução Industrial, o movimento operário e a formação da
legislação infortunística, acompanhando o desenvolvimento da automação
27
.
A Revolução Industrial produz a grande transformação econômica
e social, com as máquinas, a linha de montagem, a divisão do trabalho. Surge o
trabalho assalariado, e, com o desenvolvimento, os direitos dos trabalhadores; a
evolução industrial aumenta a exploração, a desvalorização do trabalho, mas se
conquista a jornada máxima e alguma regulamentação do contrato de trabalho; e
o acidente do trabalho, com todos os seus equiparados como doenças
24
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documentos sociais, p. 36-37.
25
In Antonio DE SANCTIS, Encíclicas e documentos sociais, p. 42-44.
26
Ilídio das NEVES, Direito da segurança social, p. 149.
27
Cf. CESARINO JR., Direito social brasileiro, p. 48-55.
15
ocupacionais, também sobreveio à Revolução Industrial, desde a sua existência
passando pelo desenrolar da legislação infortunística.
A melhoria nas condições de trabalho – seja conquista do
movimento operário, represente a evolução da sociedade ou signifique concessão
patronal para a preservação do lucro – também exigiu especial atenção aos
acidentes do trabalho, um dos graves males decorrentes da industrialização.
Pela metade do século XIX a Inglaterra ainda era a vitrine da
industrialização, sem sofrer nada igual à onda revolucionária que varria a Europa
continental em 1848, uma nação tão autoconfiante que sua rainha Vitória
escreveu em seu diário, no dia 29 de abril de 1851: “Somos capazes de qualquer
coisa”
28
. E esta revolução, “lançada nestas ilhas não só pelos comerciantes e
empresários como através deles” transformaria o mundo. “Nada poderia detê-
la”
29
.
A situação da classe operária inglesa no primeiro
desenvolvimento da Revolução Industrial era bastante miserável e sem proteção.
E agora, nos dias atuais, com todas as evoluções dos sistemas protetivos,
preventivos e de seguros, os acidentes do trabalho e as doenças ocupacionais
continuam ocorrendo. Com todo o desenvolvimento tecnológico, prosseguem
políticas e relações de trabalho admitindo a “inevitabilidade de infortúnios
laborais”.
28
Cf. Time-Life, História em Revista, A força da iniciativa – 1800-1850, A indústria britânica, p. 73.
29
Eric HOBSBAWN, A era das revoluções, p. 69.
16
1.2. As doutrinas infortunísticas
O desenvolvimento doutrinário em relação aos acidentes do
trabalho tem como o seu fator principal a imputação de responsabilidade pelo
sinistro. Da teoria da culpa aquiliana até a inclusão no seguro social existe larga
diversidade de interpretações, com radical importância nas transformações que
ocorrem na legislação infortunística. Com diferentes formas ou definições, os
estudiosos apresentam a evolução deste fenômeno: responsabilidade subjetiva,
culpa extracontratual ou aquiliana, culpa contratual, responsabilidade objetiva,
risco profissional, para alguns o risco de autoridade e/ou risco da empresa, e, por
fim, a teoria do risco social.
A primeira teoria, culpa extracontratual ou aquiliana, tem como
base a concepção civilista de culpa, pela qual haveria obrigação indenizatória por
parte do empregador a partir da comprovação de sua culpa no sinistro. Com a
culpa contratual simplesmente inverte-se o ônus da prova, e assim, passou a ser
obrigação do empregador provar não ser culpado. Vale observar com atenção
esta primeira evolução doutrinária, pois no direito brasileiro contemporâneo utiliza-
se de tal fundamento no debate sobre a responsabilidade civil do empregador em
decorrência de acidentes do trabalho, como analisa o capítulo 4 deste trabalho.
A responsabilidade objetiva representa um marco doutrinário da
indenização por acidente do trabalho sem a definição de culpa. É a base para as
teorias do risco profissional e do risco social; responsabilidade objetiva do
empregador ou da sociedade; indenização por acidente do trabalho através de
seguro obrigatório sob responsabilidade patronal ou por cobertura previdenciária
equiparando os acidentes do trabalho e as doenças ocupacionais aos outros
riscos sociais.
As teorias do risco de autoridade e do risco da empresa
mereceram maiores considerações de alguns autores, enquanto aprimoramentos
17
da teoria do risco profissional. O risco de autoridade ampliaria a cobertura, para
além da atividade industrial, também para os trabalhadores no comércio e na
agricultura. E a teoria do risco da empresa representaria a absorção das do risco
profissional e do risco de autoridade.
Um dos grandes e atuais debates no mundo jurídico
previdenciário acontece sobre qual seria teoria contemporânea aplicável para o
seguro de acidentes do trabalho: se o risco profissional ainda fundamenta a
indenização por responsabilidade objetiva em relação aos sinistros laborais ou se
o risco social seria o mais completo, representando a cobertura de todo e
qualquer acidente, sem diferenciação quando relacionado ao trabalho.
Para estudo da evolução da indenização por acidente do trabalho,
concorre análise de vários autores e estudiosos, tanto na doutrina internacional
quanto na nacional, buscando o entendimento histórico, com objetivo de garantir a
saúde do trabalhador; pelo menos o máximo possível. Desta forma, como o
objetivo é estudar o desenrolar doutrinário até o embate da atualidade, e não
cada teoria, compensa observar em separado o caminho de estimáveis autores,
históricos ou atuais.
O modelo bismarckiano de segurança social – com um sistema de
seguros sociais, tendo o seguro de acidentes do trabalho sido aprovado no
Reichstag (Parlamento alemão) em 1884
30
– consolida a responsabilidade
objetiva, com seguro compulsório e específico para os acidentes do trabalho. Do
seguro social à seguridade social os conceitos previdenciários foram se alterando;
e no estudo da infortunística, não obrigatoriamente no mesmo tempo ou pelo
mesmo motivo, também se modificam opiniões.
Risco profissional ou risco social, o acidente do trabalho deve ter
cobertura indenizatória obrigatória. Se for por responsabilidade exclusiva do
empregador, é necessário avaliar a função do Estado, ou seja, será um seguro
30
Cf. Ilídio das NEVES, Direito da segurança social, p. 148.
18
compulsório com monopólio estatal ou de livre concorrência mediante
fiscalização. Se for definido como risco social equiparado a todos os outros,
responsabilidade da sociedade, cabe decidir, minimamente, se a indenização
deve ser com benefícios diferenciados em razão da ocorrência laboral ou não.
Com a vitória das forças democráticas na 2ª Grande Guerra
começando a se demarcar, a Inglaterra definia a doutrina da seguridade social, a
garantia social para os cidadãos, a libertação do homem da necessidade.
Consolidava-se o que se denominou Welfare State, o Estado do Bem-Estar
Social, norteando todo o desenvolvimento econômico do capitalismo na segunda
metade do século XX.
Assim, em fins de 1942, William Beveridge apresentava o seu
Relatório ao Parlamento Britânico, propondo modificações nos sistemas de
previdência social, ressaltando a importância histórica daquele momento em que
“a guerra está abolindo toda espécie de fronteiras”
31
.
No que diz respeito a acidentes do trabalho, Beveridge entendeu
que para a unificação do seguro social, impunha-se:
Supressão do atual plano de indenizações por acidentes de
trabalho e inclusão do seguro por acidentes de doenças industriais no esquema
do seguro social unificado, sujeito a: a) um método especial de custear essa
provisão; b) pensões especiais para a incapacidade prolongada e bonificações
para as pessoas dependentes, nos casos de morte devida a tais causas
32
.
Com esta base, Beveridge expõe o sistema então vigente, que
estaria atribuindo “a cada empregador a responsabilidade legal de indenizar
qualquer empregado pela perda da capacidade produtiva, devida a acidente ou
doença industrial, ocorrido durante o emprego e por causa deste”. Para o
31
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 11.
32
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 56.
19
parlamentar inglês, aquele sistema estaria “rompendo com os princípios gerais do
direito comum”, porque estabelecia “uma indenização independente de qualquer
negligência direta ou indireta do empregador, bem como de qualquer negligência
do empregado (...)”
33
.
Destaca grandes benefícios produzidos por este sistema, com a
habilitação dos empregados para obter a devida indenização e com os seguros
desenvolvidos pelos empregadores, contra os riscos de sua responsabilidade.
Porém, aponta com bastante afinco as desvantagens, que poderiam ser
eliminadas com “um novo e diverso sistema”. Por um lado critica “a ameaça ou a
prática do litígio: um infortúnio que, muitas vezes, não constitui de maneira
nenhuma culpa do empregador e que este não podia prevenir, é tratado por
métodos aplicáveis à culpa”, por outro a falta de assistência do empregado, “que
sofre pressão para reduzir a sua queixa, para aceitar uma indenização
deslealmente inferior à que tem direito”. Censura, com toda razão, a não
compulsoriedade de um seguro pelo empregador, “exceto na indústria mineira”,
além dos conflitos mal resolvidos, diversidades nas definições, custas
administrativas altas, incapacidade na restauração do empregado lesado
34
.
Beveridge já alvitrava “o princípio geral da horizontalidade das
taxas de indenização por interrupção dos salários”. Ressaltava que “se um
operário perde a perna num acidente, suas necessidades são as mesmas, quer
tenha ocorrido o acidente na fábrica, ou na rua”
35
. A idéia de inclusão dos
acidentes do trabalho na seguridade social, teoria do risco social, forma então o
fundamento bastante utilizado em altercações na atualidade.
Suscitando o debate sobre a distinção “entre a incapacidade
resultante de acidente ou doença industrial e as outras formas de incapacidade,
se nos parecer de interesse prático”, William Beveridge arrola três argumentos
favoráveis à diferenciação: o primeiro seria a segurança para os trabalhadores
33
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 56.
34
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 56-58.
35
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 61.
20
pelos riscos industriais; o segundo argumento seria que a incapacidade foi sofrida
quando o empregado trabalhava debaixo de ordens; e, como terceiro argumento,
“só se fizer uma provisão especial para os resultados do acidente ou doença
industrial, independente da negligência”, a limitação da “responsabilidade do
empregador (...) aos resultados das ações pelas quais ele é moral e efetivamente
responsável”. E, no mesmo tópico, se contrapõe a tais argumentos: considera o
primeiro “bastante forte”, mas não tanto “se o risco de acidente, no local do
emprego, não é materialmente maior do que os riscos ordinários da rua ou do lar”,
e quanto ao segundo e ao terceiro, “conquanto mais fracos (...) não podem ser
facilmente descurados”
36
.
Sem qualquer desvio em sua proposta do seguro social unificado,
Beveridge admite que:
(...) a indenização por acidentes e doenças industriais, num plano
unificado de seguro social, pode e deve ser combinada com as vantagens de
uma indenização discriminada, para os resultados dos acidentes e doenças
industriais, quando estes provoquem a morte ou a incapacidade prolongada
(...)
37
.
Assim, Beveridge, ao traçar a “hipótese de um método especial
para custear a incapacidade industrial”, acrescenta que “o verdadeiro critério jaz
numa combinação de métodos”, e, portanto:
(...) em parte, os riscos devem ser englobados e custeados pela
contribuição geral do seguro; em parte, devem ser guardados separadamente e
36
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 62.
37
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 63.
21
colocados sobre os ombros dos empregadores, afim de dar um incentivo
financeiro definido à prevenção dos acidentes e doenças (...)
38
.
Como se depreende, nem mesmo na formação doutrinária básica
em defesa da plena inclusão do acidente do trabalho ao sistema de seguridade,
no meritório Plano Beveridge, a teoria do risco profissional e a teoria do risco
social devem, ou mesmo podem, ser absolutamente contraditórias.
Dentre as doutrinas atuais, vale destacar Manuel Alonso Olea e
José Luis Tortuero Plaza, professores universitários espanhóis, que em sua obra
clássica, Instituciones de Seguridad Social, descrevem as teorias sobre a
imputação de responsabilidade. Apontam a inviabilidade da doutrina da culpa
aquiliana, e mesmo com a primeira correção pela inversão de provas, ou seja, o
empresário, ainda que arcando com o onus probandi, poderia destruir a
presunção de sua culpa. Seguem expondo a evolução da teoria do contrato para
a responsabilidade objetiva, mencionando as culpas in eligendo e in vigilando
39
.
Olea e Plaza registram a legislação específica infortunística de
seu país, com base na teoria do risco profissional: “... accidente de trabajo es la
lesión sufrida con ocasion o por consecuencia del trabajo y de él responde el
empresario por el mero hecho de su ocurrencia...
40
, e descrevem sua superação,
com críticas à excessiva ampliação conceitual, trazendo também para sua
proteção episódios de origem difusa ou extralaboral
41
.
Após concluir o exame da substituição da doutrina da
responsabilidade pela da solidariedade de todos os membros da comunidade
38
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 66.
“(...) Não é necessário, para esse fim, que os empregadores de cada indústria suportem, como
atualmente, o total desse custeio, uma vez que eles concorram para uma parte dele. Tampouco é necessário
dar um incentivo financeiro especial à prevenção do perigo em todos os empregos; em muitos empregos, o
risco de acidentes industriais é menor do que o risco de acidentes fora do local de trabalho, ou é quase
desprezível. A carga especial que recai sobre os empregadores, para estimular a prevenção dos acidentes e
doenças, pode restringir-se, na prática, às indústrias nas quais são necessárias precauções especiais”.
39
Cf. OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 112-113.
40
OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 113.
41
Cf. OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 114-115.
22
frente ao sinistro que qualquer um deles possa padecer, Olea e Plaza trazem a
análise para a atualidade, ressaltando que a “tendencia indudable lleva a la
generalización de la responsabilidad por accidente de trabajo”, com a
conseqüente redução da responsabilidade patronal, não invalida por completo a
teoria do risco profissional.
Observam a responsabilidade empresarial de forma mais ampla,
com o contrato de trabalho criando obrigações empresariais como zelar pela
integridade física de seus empregados:
El contrato de trabajo, ampliado en cuanto al deber de protección
que impone al empresario, tiene posibilidades más amplias de las que tuviera a
principios de siglo. El empresario es deudor de seguridad, lo que se percibe hoy
con consecuencias otras que las meras de fundamentar responsabilidades por
culpa, al basarse la deuda en la solidaridad de cuantos participan en la empresa
y tenderse, por otro lado, al que se ha denominado ‘enriquecimiento del
contenido’ del contrato de trabajo, al ampliar el deber de protección del
empresario
42
.
Com muita importância para análise da atual situação brasileira,
vale anotar que os professores espanhóis admitem a aplicação da teoria
contratual sobre a culpa na responsabilidade empresarial:
La culpa, contractual o extracontractual, civil o penal, cuando
efectivamente exista puede servir para imputar responsabilidades al empresario
o al tercero, además de la tarifada propia de accidente de trabajo; porque
aunque la cumulación de ambas responsabilidades se combata – y con razones
sólidas cuando quiere “objetivarse” la civil, abandonando la culpa – la
acumulación no deja de acomodarse a sentimientos generales de justicia – que
en este terreno piden también “una diferencia de trato jurídico entre el inocente y
el culpable”, sobre todo cuando la culpa es grave, o constitutiva de delito (...)
43
.
42
OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 116.
43
OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 116.
23
Entendendo o acidente do trabalho enquanto risco social, Olea e
Plaza admitem a teoria da culpa patronal, civil ou penal, acolhendo até mesmo,
remotamente, a dupla indenização. E apontam o risco profissional como critério
útil para imputação de responsabilidades em atividades perigosas ou especiais,
ressaltando, porém, que as indenizações não são atos suficientes para a
prevenção de acidentes do trabalho
44
.
Dentre os autores brasileiros, Anníbal Fernandes delineia a
evolução da doutrina infortunística, partindo da culpa extracontratual ou aquiliana,
“uma solução mais utópica do que real”; com a teoria contratual invertendo o ônus
da prova; a responsabilidade objetiva, indenização por acidente do trabalho sem
culpa; a partir dessa, a teoria do risco profissional; a teoria do risco de autoridade,
a teoria do risco da empresa
45
.
Anníbal Fernandes, como se observa, entendia bastante válida a
teoria do risco profissional, com a exclusiva responsabilidade patronal quanto ao
seguro compulsório contra acidentes do trabalho. Assim, apresenta sua
preocupação sobre os aprimoramentos doutrinários, como a Teoria do Risco de
Autoridade, que daria cobertura não apenas aos trabalhadores na área industrial,
mas também para os que atuavam na agricultura e no comércio:
A teoria do risco profissional (...) não resguardava os interesses
de trabalhadores na agricultura e comércio, porque baseada apenas na idéia de
perigo da atividade industrial
46
.
44
OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 117:
“(...) Finalmente, el riesgo profesional puede seguir siendo criterio útil de imputación de
responsabilidades respecto de trabajos especialmente peligrosos y de las actividades en que existan, y factor
que juegue hacia la extención y cumplimiento de las medidas de seguridad; sus efectos en tal sentido, sin
embargo, son aleatorios porque el aseguramiento del riesgo tiende a transformar éste ‘en un simple costo de
la actividad del sujeto y en especial de la actvidade empresarial’, lo que, contra lo que Beveridge creyera, no
es aliciente importante para la mejora de las condiciones físicas de trabajo. A tal efecto la represión penal, y
la cuasipenal representada por el recargo de las prestaciones – que añade un ingrediente punitivo al carácter
compensatorio de éstas – si ha habido infracción en las medidas de seguridad, de que se hablará más
adelante, es com seguridad de efectivo mayor, lo que sigue demonstrando también la utilidad actual de este
modo de imputar responsabilidades; hasta tal punto que se ha llegado a afirmar que no tanto la
indemnización del perjudicado como la prevención de situaciones de perjuicio, es el fin perseguido por este
tipo de normas”.
45
Cf. Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 50-51.
46
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 52.
24
Assim, a teoria do risco de autoridade incluía tais trabalhadores,
“calcada na mera condição de subordinação do empregado ao empregador, pelo
contrato de trabalho”. E tal teoria diminuiu sua influência “em virtude da tendência
de se ampliar a proteção contra acidentes também a trabalhadores sem relação
empregatícia”.
Quanto a Teoria do Risco da Empresa, Anníbal Fernandes cita
Lyon-Caen, que preferia, em vez de risco profissional, o risco da empresa, “trata-
se de responsabilidade sem culpa (...) e de uma garantia devida ao assalariado”.
Desta forma, a teoria da empresa absorveria as do risco profissional e risco de
autoridade
47
.
E, por fim, sobre a Teoria do Risco Social, Anníbal Fernandes
ressalta que:
No Brasil, o seguro de acidentes do trabalho foi inserido na
estrutura da Previdência Social com a Lei n. 5.316, de 14.9.1967, tornando-se
Seguro Social obrigatório; e assim oferecia a maior garantia do pronto e efetivo
pagamento das indenizações. Tal o ponto a ser retido
48
.
Octávio Bueno Magano também descreve a culpa aquiliana,
dizendo que “antes do advento da sociedade industrial, a obrigação de indenizar
danos derivados de acidentes do trabalho sujeitava-se à regra geral de que o
dano indenizável é o resultante de culpa”
49
. Sobre a teoria do contrato, Magano
afirma que “possuía o grande mérito de inverter o ônus da prova”
50
. Define em
separado a responsabilidade pelo fato de coisa, quando “o dano causado por um
objeto deve ser suportado pelo respectivo proprietário, sem se cogitar de sua
culpa”
51
.
47
LYON-CAEN, Manuel de droit du travail e de la sécurité sociale, Paris, LGDJ, 1955, p. 344, apud Anníbal
FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 52.
48
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 53.
49
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 5.
50
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 7.
51
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 7-8.
25
Magano entende que o risco profissional “refletia (...), a realidade
de ser a indústria, em si mesma, causa perene de risco independentemente de
qualquer medida de prudência ou de prevenção, por parte do patrão ou do
empregado”, devendo limitar a indenização inclusive com o regime tarifário, com a
“implantação do seguro obrigatório”
52
. Discorre sobre o risco de autoridade, bem
ajustado ao trabalho industrial, porém teria perdido “a sua voga ante a tendência
da legislação acidentária de se estender também a pessoas sem relação
empregatícia, como é o caso dos trabalhadores avulsos e autônomos”
53
.
Por fim, Magano Bueno compreende que o seguro social seria
mais coerente, observando que “o acidente do trabalho acarreta para o
trabalhador ou seus dependentes, um estado de necessidade do mesmo grau do
que o derivado dos demais riscos sociais”, além dos benefícios de prestação
continuada para o trabalhador acidentado, “enquanto perdura a sua incapacidade
para o trabalho, solução socialmente mais desejável do que o pagamento de
indenização”
54
.
Teresinha Lorena Pohlmann Saad, em específico capítulo sobre
as principais teorias para o fundamento das reparações por acidente do trabalho,
apresenta um quadro sinótico da evolução teórica
55
, com cinco teorias sobre o
“fundamento jurídico da proteção atribuída ao acidentado”.
O primeiro quadro trata da teoria de “Culpa Extracontratual ou
Aquiliana”, exigindo “prova, pelo empregado, de culpa do patrão”. A seguir vem a
“Teoria contratual”, quando “o ônus da prova recai no patrão, o contrato de
trabalho gerava obrigação implícita desse dever de zelar pela segurança física do
empregado”. Depois, Teresinha Saad apresenta a “Teoria da Responsabilidade
Objetiva”, dispondo que “todo dano causado por coisas úteis à empresa configura
a responsabilidade do patrão, sem se cogitar de sua culpa”. O quadro seguinte
52
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 10.
53
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 10-11.
54
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 12.
55
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Acidentes do trabalho, p. 52-53
26
caracteriza a “Teoria do Risco Profissional (adotada no Brasil desde a 1ª Lei
acidentária)”, dispondo “a responsabilidade pelo acidente do trabalho (...)
atribuída ao patrão, independente de culpa, quem aufere lucros deve também
assumir os riscos inerentes à qualquer atividade”. Por fim, Saad expõe a teoria do
risco social:
Considera o acidente do trabalho contingência social, igual às
outras cobertas pela previdência social, como a doença, a velhice, etc”. A
responsabilidade, portanto, deve ser atribuída à Previdência Social
56
.
Em didática exposição sobre as teorias que fundamentam as
reparações por acidentes do trabalho, a autora distingue a responsabilidade civil
remanescente, ressaltando:
(...) o ciclo evolutivo desde o campo da responsabilidade civil até
o seguro social. A responsabilidade civil, contudo, não está afastada, pois se a
vítima do infortúnio laboral prova em juízo dolo ou culpa grave do empregador
ou de seus prepostos na ocorrência do evento acidentário, cabe, perfeitamente,
a ação civil (...), sem prejuízo dos direitos infortunísticos junto à Previdência
Social
57
.
Em publicação de 1968, Estatização do seguro de acidentes do
trabalho, analisando a Lei nº 5.316, de 14/09/67, o professor gaúcho Oswaldo
Opitz expunha a sua crença no “sentimento de fraternidade humana, maior do
que a ambição de lucro”
58
.
56
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Acidentes do trabalho, p. 53
57
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Acidentes do trabalho, p. 52.
58
Oswaldo OPITZ, Estatização do seguro de acidentes do trabalho, p. 21:
“Ressalta, desde logo, a significação do estudo da infortunística do trabalho, ante a grandeza e
progresso do sistema industrial do mundo. Ninguém mais recorda, sequer, aqueles momentos fantásticos que
encheram de entusiasmo os industriais do século passado, quando a máquina a vapor veio revolucionar a
produção. Não se via o perigo que isso pudesse causar ao operário, mas unicamente o bem-estar que à
humanidade proporcionava. Por muito tempo, a miséria deixou de rondar os lares dos operários, porque a
procura de braços era maior que a oferta. Deste momento em diante, foi também que nasceu a maior
preocupação relativa à segurança dos operários das máquinas. Um sentimento de fraternidade humana,
maior do que a ambição de lucro, emergiu dessa massa de engrenagens, em socorro não só dos operadores,
vítimas de acidentes, como de seus familiares, quando aqueles eram fatais”.
27
Além do otimismo e confiança inapelável na humanidade, o autor
ressalta que o acidente do trabalho não poderia ter a sua indenização baseada
em culpa:
Nasce assim, a teoria do risco profissional ou da responsabilidade
profissional. a culpa aquiliana foi, definitivamente, afastada de todas as
legislações dos povos cultos, no que tange à infortunística do trabalho, com
magníficos resultados. O aprimoramento dessa legislação foi rápido, de tal sorte
que hoje temos verdadeiros monumentos legais a respeito, sendo que no Brasil
chegou ao ponto da estatização do seguro de acidentes do trabalho”
59
.
Com base nos trabalhos de Saleilles e de Josserand, Opitz
sustenta que “o fato que deu origem à lesão é que deve ser levado em conta para
a responsabilidade do empresário e não a culpa”, destaca que a regra jurídica não
poderia se basear na culpa para justificar a indenização por acidente do
trabalho
60
.
Fernando Figueiredo de Abranches, em seu livro Do seguro
mercantilista de acidentes do trabalho ao seguro social, entende que a
transformação do seguro de acidente do trabalho não acontece com a Lei nº
5.316/67, quando ainda estaria válida a teoria do risco profissional, mesmo com a
estatização. A partir da Constituição de 1969 haveria a integração do acidente do
trabalho não apenas na autarquia que administra e sim no sistema de previdência
social. Desta forma, para Abranches:
Pelo seguro social, o risco dos acidentes do trabalho deixa de ser
responsabilidade do empregador e passa a ser da sociedade, razão porque o
seu custeio é contribuição da União (representando a parcela da sociedade que
59
Oswaldo OPITZ, Estatização do seguro de acidentes do trabalho, p. 23.
60
Oswaldo OPITZ, Estatização do seguro de acidentes do trabalho, p. 25:
“(...)A preocupação maior deve estar voltada para a vítima do infortúnio do trabalho e não para o
dono da empresa, que usufrui as vantagens. O infortúnio do trabalho é um fato social e como tal deve ser
encarado, independentemente do elemento psicológico que o causou. É um fato que está no mundo fáctico e
não no mundo dos pensamentos. O fundamento da responsabilidade do infortúnio deve ser procurado dentro
do fato sócio-econômico, sem olhar para o lado espiritual. Assim, a regra jurídica que nascer desse fato-
econômico, jamais pode se basear na culpa, para justificar uma indenização por acidente do trabalho”.
28
não contribui), com a fixação da despesa com que há de integrá-lo, do
empregador e do empregado
61
.
Fernando Abranches sustenta, inclusive, que Opitz corretamente
entendeu “não só que a Lei nº 5.316, de 1967, apenas integrou o seguro contra
acidentes do trabalho no sistema da previdência social, como também que houve
a estatização por ter sido entregue ao INPS a execução de tal seguro”
62
.
Bastante importante a análise histórica da legislação acidentária
brasileira elaborada por Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, relacionando
sua evolução às doutrinas infortunísticas, com a divisão da história do acidente do
trabalho no Brasil em três fases. Classifica, historicamente, a reparação
acidentária no Brasil enquanto:
(...) obra da evolução legislativa, que se iniciou com a reparação
qualificada da responsabilidade privatística (do empregador e, por subrogação,
do segurador privado) até alcançar a publicização da responsabilidade, com a
integração do infortúnio laboral na previdência social e sua obrigação de reparar
infortunisticamente (...)
63
.
A primeira fase, segundo Tupinambá, é a que antecede o primeiro
diploma legal infortunístico, sem ultrapassar a teoria contratual, ou seja, ainda no
entendimento da indenização somente mediante culpa. “Entre a data da
Independência – em que o Brasil se torna país soberano – e 1919”. Caracteriza
61
Fernando F. ABRANCHES, Do seguro mercantilista de acidentes do trabalho ao seguro social, p. 22.
62
Fernando F. ABRANCHES, Do seguro mercantilista de acidentes do trabalho ao seguro social, p. 29:
“Com percuciente senso jurídico deve ter constatado que o seguro de que se trata ainda não se
transformara em seguro social, porque a Constituição de 1967 o vedaria.
Não é dos dias atuais a preocupação dos países em adotar o seguro de acidentes do trabalho como
seguro social e, no particular, é unânime o voto dos doutrinadores brasileiros. E a tendência do direito
moderno é, também, nesse sentido”.
63
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p.13.
29
esta etapa pela responsabilidade subjetiva do empregador, “quando a reparação
acidentária está sob o império das normas da legislação civil, do direito comum”
64
.
Segue destacando que “não era fácil, contudo, provar a culpa do
patrão”, e assim “divisou-se uma segunda solução, ainda dentro da mesma fase,
a da responsabilidade contratual”. Definia-se a culpa presumida do empregador,
mas ainda cabendo-lhe provar a “não-culpa”
65
.
Na segunda fase, havia sido vencida a teoria da culpa, com o
início da legislação acidentária utilizando a teoria da responsabilidade objetiva,
com indenização independentemente de culpa do empregador; porém, dolo do
empregado ainda “desnaturaria a obrigação de indenizar”. Esta fase “se localiza,
temporalmente, entre 1919 – quando é editada nossa primeira lei de acidentes do
trabalho, a de nº 3.724, de 15 de janeiro de 1919 – e 1967, e é quando vigora a
regra da responsabilidade objetiva do empregador”. Destaca que “nesta etapa, as
indenizações acidentárias eram na forma de quantias de pagamento único,
solucionando, por isso, a necessidade do acidentado a curto prazo e não para o
futuro, a longo prazo”
66
.
A terceira e última fase classificada por Tupinambá Miguel Castro
do Nascimento se inicia com a Lei 5.316, de 14 de setembro de 1967. Então
começava “a fase de integração do acidente do trabalho na previdência social”
67
.
64
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p. 13:
“(...) Inicialmente, pelas disposições das Ordenações Filipinas e, posteriormente, pelo artigo 159 do
Código Civil, que entrou em vigor em 1º de janeiro de 1917. Assim, é responsável e repara quem tem culpa.
Atribuía-se ao infortunado, para valer seus direitos, o ônus de comprovar e caracterizar a culpa do
empregador. Era a solução pela denominada teoria da culpa aquiliana. (...)”
65
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p. 14:
“(...) Ainda é a culpa do empregador que embasa a obrigação de reparar as conseqüências
incapacitantes do acidente mas com uma acentuada diferença, a inversão probatória. O patrão, para se
exonerar da responsabilidade, é que deveria comprovar que não agira culposamente. Em outras palavras,
havia uma presunção juris tantum de que o empregador era culpado ante a ocorrência acidentária, visto que
era sua obrigação zelar pela integridade de seus trabalhadores e mantê-los, durante toda a atividade laboral
e até o fim do contrato, em idênticas condições de validez àquelas de quando do início do contrato. Mas se a
culpa era presumida, admitia-se a prova da não-culpa. Prova esta que, na prática, não era difícil, o que mais
minimizava as situações de reparação.
(...) Em outros países, cujo exemplo nossa legislação seguiu, houvera a simples derrogação, em
infortunística, do princípio geral da culpabilidade”.
66
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p. 14/15.
67
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p.16.
30
Defende Tupinambá a integração do acidente do trabalho na
previdência social, pela necessidade de prestações mensais continuadas, além
da reabilitação profissional:
Em vez de reparações de pagamento único, deviam ser
pagamentos mensais reajustáveis substitutivos do salário que, pela
incapacidade ou morte, desaparecia. A necessidade (...) obrigou a transferência
da responsabilidade do empregador para a previdência social.
68
Tupinambá divide o risco social em risco profissional e risco
genérico, diferenciando assim o sistema protetivo. A previdência social deve dar
cobertura às incapacidades, reduções de capacidade ou morte provenientes da
atividade laboral, risco profissional, e às outras incapacidades ou mortes que não
se originam da atividade do trabalho, risco genérico. Entende que para a
prestação previdenciária o que importa é a conseqüência incapacitante ou morte
que geram a necessidade humana, restando para a legislação acidentária a
preocupação com a origem.
Pode-se, então, admitir um sistema indenizatória diferenciado, por
certo com maior conveniência para o infortunístico
69
.
Sustenta Tupinambá Nascimento dois motivos para a manutenção
do estudo especifico do risco profissional em separado ao do risco genérico:
apenas a lei acidentária previa a indenização por redução na capacidade
laborativa e os benefícios acidentários eram de maior valor. A diferença também
68
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p. 16.
69
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p. 17:
“(...) Assim, a perda de uma perna pode advir pelo fato da prestação de trabalho e, por isso, risco
profissional, ou advir de uma ocorrência estranha à atividade laboral e, por isso, risco genérico. Risco
profissional e risco genérico são divisões do risco social, todo ele abrangido pela previdência social.
O que interessa, em princípio, ao seguro social, é a conseqüência incapacitante ou morte geradoras
da necessidade humana. A causalidade, nesta fase, não importa, para excluir alguém da prestação
previdenciária. Numa segunda fase, para se saber qual o sistema protetivo, é que se vai examinar se a causa
da conseqüência reparável, foi o risco profissional ou o risco genérico. A constatação não é excluidora do
sistema; sim, classifica a contingência coberta no sistema indenizatório específico: ou benefícios previstos
pela previdência social comum ou benefícios previstos na lei acidentária. O que se quer dizer é que a
legislação de acidente do trabalho só se envolve com as contingências que tenham base no risco
profissional”.
31
se reflete no custeio, com o pagamento do seguro obrigatório por obrigação pelo
empregador. Assim, seria possível incluir o acidente do trabalho no seguro social,
mantendo caráter diferenciado
70
.
Contudo, seguem os entendimentos contraditórios. Se o seguro
de acidentes do trabalho integra o seguro social, devem todos os benefícios ser
iguais? Ou ainda valem sistemas diversos, inclusive com custeio próprio? São
temas que norteiam debates técnicos até os tempos atuais.
Com as vigentes normas constitucionais no Brasil, em relação aos
acidentes do trabalho, torna-se preciso examinar a aplicabilidade das teorias, até
em defesa do princípio do não retrocesso social, conforme lecionado por
Canotilho.
A Carta Magna dispõe, no art. 7º, inciso XXVIII, o “seguro contra
acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que
este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”.
E, com a redação alterada pela Emenda Constitucional nº 20, em
15/12/98, passou a trazer o art. 201, o novo § 10, prevendo que “lei disciplinará a
cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo
regime geral de previdência social e pelo setor privado”.
A legislação acidentária, com as alterações a partir de 1995,
dispõe os benefícios previdenciários e acidentários – auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez e pensão por morte – com valores iguais, e com o
auxílio-acidente enquanto indenização ao segurado, quando, após consolidação
das lesões decorrentes de acidentes de qualquer natureza, resultarem seqüelas
que impliquem redução da capacidade para o trabalho que ele habitualmente
exercia. Portanto, o benefício indenizatório de prestação continuada, próprio para
70
Cf. Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Curso de direito infortunístico, p. 17-18:
32
o seguro de acidentes do trabalho sob responsabilidade da autarquia federal,
deixou de ser exclusivo para acidentes do trabalho.
Por um lado, pela legislação ordinária, o acidente do trabalho é
equiparado às contingências comuns, coberto igualmente pelo seguro social; por
outro, a norma constitucional aponta enquanto princípio o seguro obrigatório para
acidentes do trabalho, com responsabilidade exclusiva do empregador, e sem
excluir mais uma indenização, na ocorrência de dolo ou culpa. A partir desta
dicotomia, desde 1998 a Carta Magna admite a privatização do seguro, conforme
seja disposto em lei futura.
O ciclo evolutivo tão exposto e analisado por estudiosos de todo o
mundo poderia classificar o seguro compulsório de acidente do trabalho, ao final
da evolução doutrinária e legislativa, enquanto seguro social sob responsabilidade
estatal. Porém, ainda se pode defender indenizações de caráter diferenciado em
relação aos acidentes do trabalho, com base na teoria do risco profissional, com
seu custeio apenas a cargo do empregador. A equiparação dos benefícios
substitutos da remuneração, auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão
por morte, não representa um impeditivo para um seguro indenizatório com a
imputação de responsabilidade ao empregador.
E da mesma forma, em relação a responsabilidade civil,
observando a necessária culpa grave sumulada pelo tribunal brasileiro ou a
simples culpa conforme dispõe a atual norma constitucional, caberia a aplicação
da teoria contratual, bastante aproximada da responsabilidade objetiva.
As doutrinas do infortúnio laboral têm direta relação com a história
industrial e operária, alcançando o seguro social com larga diversidade
33
interpretativa. Importante o estudo de técnicos da Organização Internacional do
Trabalho, em 1984, trazendo como recomendação:
(...) a maioria dos membros do grupo recomenda que os países
avancem, na medida em que os recursos permitam e a opinião pública
reconheça a justiça deste critério, no rumo de um sistema unificado de
aposentadoria por invalidez com base antes no grau deste que na sua causa. A
minoria, embora não se oponha a essa unificação, prefere que se continue
pagando mais às vítimas de lesões profissionais
71
.
A evolução ao risco social, a inclusão do acidente do trabalho no
sistema previdenciário enquanto fato incapacitante de igual qualidade a qualquer
outro, pode ser de plena aplicabilidade nas sociedades em que os acidentes do
trabalho e as doenças ocupacionais encontrem repúdio institucional, de toda a
sociedade. Nos países em que a legislação e sua aplicação – com prevenção,
indenização e punição – façam os sinistros ocupacionais tornarem-se exceções, e
sempre com conhecimento público, com certeza deixará de existir a necessidade
de seguros compulsórios. O Brasil atual ainda se mostra bastante insensível
acerca de condições de trabalho.
71
OIT, A seguridade social na perspectiva do ano 2000, tradução de Celso Barroso Leite, São Paulo: LTr,
1985, apud Anníbal Fernandes, Os acidentes do trabalho, p.53-54.
34
Capítulo 2: A indenização do acidente do trabalho e sua evolução
legislativa no Brasil.
Para o entendimento da evolução legislativa da indenização por
acidente do trabalho é necessário um exame descritivo sobre cada diploma, a
partir da primeira lei de acidentes do trabalho no Brasil. No Capítulo 3 se procede
à análise da evolução doutrinária, com tópicos históricos balizados na
incorporação do seguro de acidentes do trabalho ao sistema previdenciário e na
legislação contemporânea com todas as suas alterações.
Aproveitando a divisão que faz Tupinambá Castro, conforme
exposto no Capítulo 1, tópico 1.2, o Decreto Legislativo 3.724/19 estaria
inaugurando um segundo período (o primeiro período seria anterior ao diploma
que encetou o Direito Infortunístico, ainda pela exigência de culpa para
indenização), já vigorando a regra da responsabilidade objetiva do empregador e
ainda nesta fase se incluem o Decreto-lei 24.637/34, o Decreto-lei 7.036/44 e o
Decreto-lei 293/67. A terceira e última fase naquela exposição de Tupinambá, se
inicia com a Lei 5.316/67, marco histórico com a estatização do seguro de
acidentes do trabalho, com a Constituição de 1969, conforme Fernando
Abranches, então verdadeiramente integrando o seguro de acidentes do trabalho
ao seguro social, e não unicamente ao Instituto Nacional de Previdência Social.
A Constituição Federal de 1988, em sua redação original,
manteve a cobertura do seguro social aos “eventos de doença, invalidez, morte,
incluídos os resultantes de acidentes do trabalho”, art. 201, inciso I, além de
conter a garantia (mantida na redação atual) do seguro a cargo do empregador,
em seu art. 7º, inciso XXVIII.
35
A Lei nº 8.213/91 conservou os conceitos relativos à matéria,
mesmo com as alterações que ocorreram pela Lei nº 9.032, de 28 de abril de
1995, e posteriores medidas provisórias culminando com a Lei nº 9.528, de 10 de
dezembro de 1997. Equipararam-se os valores dos benefícios previdenciários e
acidentários, representando a exata inserção do acidente do trabalho ao sistema
previdenciário, a plena adoção da teoria do risco social. E de uma forma bastante
radical, praticamente extinguindo o seguro compulsório de acidentes do trabalho
em relação à indenização, visto que os sinistros laborais estariam devidamente
cobertos pelo sistema previdenciário.
Por fim, talvez como uma forma de acatamento do ditame
constitucional disposto no art. 7º, inciso XXVIII – direito dos trabalhadores ao
seguro obrigatório contra acidentes do trabalho, sob responsabilidade do
empregador, teoria do risco profissional –, a Emenda Constitucional 20/98 alterou
o art. 201, em seu inciso I, acrescentando o § 10, que dispõe o seguro de
acidente do trabalho atendido concorrentemente pelo regime geral público e pelo
setor privado.
Dando continuidade à análise evolutiva da legislação em relação
às indenizações por acidentes do trabalho, é bastante útil o acompanhamento das
leis infortunísticas brasileiras.
36
2.1. Evolução legislativa
2.1.1. Decreto Legislativo nº 3.724, de 15/01/1919
A primeira lei acidentária no Brasil ocupa um lugar de muito
destaque na história legislativa. Precede inclusive a Lei Elói Chaves, de 24 de
janeiro de 1923, criadora da primeira Caixa de Previdência, que é tida como a que
inaugura a previdência social brasileira. Celso Barroso Leite assim entende e
argüi:
Alguns especialistas apontam outros marcos iniciais, porém a
questão ficou decidida em definitivo quanto em 1960 foi instituído o “Dia da
Previdência Social”, que se comemora a 24 de janeiro. Também se comemora
nessa data o “Dia do Aposentado”, instituído em 1988
72
.
A legislação infortunística em 1919 e a legislação previdenciária
em 1923 representam o momento político daquele princípio de século, marcado
pela Primeira Guerra Mundial e por todas as suas conseqüências. O
desenvolvimento da Revolução Industrial havia atingido um ponto de ruptura, por
ocasião da primeira revolução socialista na Rússia. Até então o capitalismo, fruto
das revoluções, inclusive a industrial, mantinha o poder institucional isolado.
Agora, com o socialismo soviético, outro sistema social, político e econômico no
controle do Estado, passava a ser necessária a convivência entre os
pensamentos contraditórios. As conquistas ou concessões que se faziam entre o
Estado, os patrões e os trabalhadores passaram a ser disputados em outro
campo político, cada vez mais institucional e internacional.
72
Celso Barroso LEITE, Dicionário enciclopédico de previdência social, p. 89.
37
No princípio do século XX o Brasil começa a sua formação
industrial e edita sua primeira lei de proteção ao acidente do trabalho.
Em seus Comentários à Consolidação das Leis da Previdência
Social, Anníbal Fernandes narra um breve histórico dos acidentes do trabalho no
Brasil, começando pelo Decreto Legislativo 3.724/19.
O ano de 1919 reflete uma ação social muito intensa, mostrando
a presença do assalariado na sociedade brasileira, e resulta indesligável dos
acontecimentos de 1917, com a grande movimentação de assalariados e as
grandes greves, particularmente em São Paulo
73
.
Fernandes salienta que a primeira lei se refere “aos que
trabalham com máquinas”, e que se trata de um “sistema de auto-seguro”, quando
o “empregador deve pagar as indenizações”
74
.
Da mesma forma, Octávio Bueno Magano relata o histórico da
elaboração da lei, com seu “demorado processo de gestação no Congresso
Nacional”. Descreve todo o trâmite congressual que resultou “na lei nº 3.724, de
15 de janeiro de 1919”
75
.
73
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 177.
74
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 178.
75
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 19-20:
“A lei 3.724, de 15 de janeiro de 1919, foi resultado de um demorado processo de gestação no
Congresso Nacional. O processo iniciou-se com o projeto nº 169, de 1904, de autoria do deputado Medeiros
e Albuquerque. Quatro anos depois, isto é, em 1908, o referido projeto foi substituído pelo de nº 273 dos
deputados Gracho Cardoso, Sá Freire, Altino Arantes e Simeão Leal e este, no mesmo ano, pelo de nº 337,
do deputado Wenceslau Escobar. Seguiu-se, em 1915, o projeto nº 273, do senador Adolfo Gordo, elaborado
com a colaboração do Departamento do Trabalho do Estado de São Paulo. O projeto em causa, depois de
aprovado no Senado, ficou paralisado na Câmara dos Deputados, ao que tudo indica pelas objeções contra
ele levantadas pelo Centro Industrial do Brasil, cujo teor tornou-se público em virtude de entrevista concedida
ao Jornal do Comércio, pelo presidente da entidade, o industrial Jorge Street. A principal objeção tinha em
mira a prestação obrigacional imposta aos empregadores, em caso de acidentes, a saber, a concessão de
uma pensão. Sustentava Jorge Street, que o critério do pagamento de uma indenização seria melhor, tendo
em vista as peculiaridades do país e, à guisa de concluo, dizia: “É, pois, baseado em muito boas razões
que eu peço seja facultada aos industriais a escolha de uma das duas formas: pensão ou capital”. A
reivindicação apontada repercutiu em novo projeto da Câmara, o de nº 284, de autoria de Maximiano de
Figueiredo, que adotou o critério de indenização para o caso de morte, mantendo o critério de pensão vitalícia
para as hipóteses de incapacidade permanente. Seguiu-se-lhe o substitutivo do deputado Prudente de
Moraes consubstanciado no projeto nº 239, que eliminou o critério de pensão vitalícia também para os casos
de incapacidade permanente. Este último projeto foi objeto de revisão por uma comissão composta de José
Lobo, Andrade Bezerra, Nicanor do Nascimento, José Augusto, Josino de Araújo, Raul Fernandes, Durval
Porto e Carlos Penafiel, convertendo-se, afinal, na lei nº 3.724, de 15 de janeiro de 1919”.
38
Naquele processo legislativo já se debateu sobre dois modelos de
indenização tarifada (com valores calculados conforme disposição legal e não por
cláusulas de contratos) – como aponta Marco Fridolin Sommer Santos –, “o da
reparação-capital e o da reparação-pensão”. O primeiro consiste em um valor
calculado sobre “o salário da vítima e as conseqüências danosas da lesão sofrida
(...) pago à vítima ou a seus familiares de uma só vez”, enquanto o outro
“calculado nos mesmos critérios (...) seria pago mensalmente, por tempo
determinado ou vitaliciamente”
76
.
O Decreto Legislativo 3.724/19 tinha seu fundamento na teoria do
risco profissional; considerando, em seu art. 2º, que o acidente do trabalho “obriga
o patrão a pagar indenização ao operário ou à sua família”, ainda com exceção
para “os casos de força maior ou dolo da própria vítima ou de estranhos”.
Quanto ao conceito de acidente do trabalho, ainda bastante
restrito, dispõe o art. 1º, sobre o acidente-tipo, “produzido por uma causa súbita,
violenta, externa e involuntária no exercício do trabalho”, com “lesões corporais ou
perturbações funcionais, que constituam a causa única da morte ou perda total ou
parcial, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho”, tendo
equiparada a “moléstia contraída exclusivamente pelo exercício do trabalho”, de
forma bastante restritiva.
Assim, no citado art. 2º, a primeira lei acidentária confirma a
responsabilidade do empregador na indenização, sem a análise de culpa, apesar
das restrições ainda existentes naquele diploma; e o
art. 3º conceitua os
“operários, para efeito da indenização”.
O art. 4º estende a obrigação à União, Estados e Municípios, para
com seus operários nas mesmas condições.
76
Marco Fridolin Sommer SANTOS, Acidente do trabalho entre a seguridade social e a responsabilidade civil,
p. 51.
39
Em seu Título II, a lei determina as indenizações, calculadas
segundo a gravidade das conseqüências do acidente. Assim, conforme define o
art. 5º, as conseqüências podem ser: a morte; a incapacidade total e permanente
para o trabalho; a incapacidade total e temporária; a incapacidade parcial e
permanente; e a incapacidade parcial e temporária. E, em seu parágrafo único, se
estipula o limite da temporariedade em um ano, entendendo-se como permanente
a partir de então.
A lei apresentava o conceito de invalidez relacionado ao trabalho,
quando determinava enquanto razões para a indenização, além da morte, a
incapacidade para o trabalho, total ou parcial, permanente ou temporária.
Estipulava prazo para a incapacidade temporária e exigia regulamentação para
definição e especificação da incapacidade.
Por morte ou incapacidade permanente, seja total ou parcial, a
indenização seria em pagamento único; para a incapacidade temporária, no prazo
máximo de um ano, pagamento mensal continuado.
Por morte e incapacidade total e permanente (arts. 7º e 8º) a
indenização equivalente a soma de salário de três anos (com mais um valor “para
as despesas do enterramento” no caso de morte), obedecido o limite disposto na
lei (art. 6º); e por incapacidade parcial permanente (art. 10), seria de 5 a 60% da
soma que receberia se a incapacidade fosse total e permanente, de acordo com a
classificação constante no regulamento.
Para a incapacidade total temporária (art. 9º) deve o trabalhador
receber indenização de metade de seu salário pelo prazo máximo de um ano; e
para a incapacidade parcial temporária (art. 11) a indenização seria a metade da
diferença salarial causada por tal incapacidade. A continuidade da incapacidade
após o prazo de um ano importa na suspensão da indenização continuada e no
pagamento da indenização por incapacidade permanente, seja parcial ou total
(art. 12, caput e parágrafo único), deduzidos os valores que foram pagos (art. 14).
40
Além das indenizações, a lei também previa a obrigação do
patrão na “prestação de socorros médicos e farmacêuticos” (art. 13).
A imediata comunicação do acidente, “à autoridade policial do
local”, já era uma obrigação do empregador (art. 19) e a lei dispunha um
procedimento judicial próprio (artigos 21 e seguintes).
Com a indenização a cargo do patrão, fundamentada na teoria da
responsabilidade objetiva, sem um seguro predeterminado obrigatório, o Decreto
Legislativo 3.724, de 15 de janeiro de 1919, inaugura a legislação acidentária
brasileira, já sem a exigência de culpa para a responsabilização da empresa
empregadora.
Para o desígnio que se pretende, é preciso demarcar o alcance e
a evolução da indenização acidentária, observando a previsão de um pagamento
continuado de “metade do salário diário” ou de “metade da diferença entre o
salário que vencia e o que vencer em conseqüência da diminuição da (...)
capacidade de trabalho” (seria uma diferença salarial causada pela incapacidade
parcial e temporária), sempre “até o máximo de 1 ano”, inclusive com o devido
desconto dos valores pagos, na indenização em pagamento único que possa o
trabalhador ter direito por incapacidade permanente.
Responsabilidade objetiva, ainda sem o seguro compulsório, mas
com a obrigação indenizatória patronal sem culpa. É a implantação da teoria do
risco profissional, inicialmente pela formação industrial, basicamente com
indenização em pagamento único, com prestação mensal continuada por no
máximo um ano.
41
2.1.2. Decreto-lei nº 24.637, de 10/07/1934
Em 1934, com Getúlio Vargas instalado no poder, mas ainda
antes da implantação do Estado Novo, a segunda lei acidentária brasileira traz
alguns avanços, sem grandes transformações doutrinárias, ainda fundamentada
na teoria do risco profissional.
Anníbal Fernandes faz breve comentário sobre o Decreto nº
24.637, de 10-7-1934 (com força de lei):
Foi editado no melhor momento de conquista social, advindo da
Revolução de 30. Já ali, a figura protegida do empregado vem muito melhor
delineada, em termos de definição jurídica e por igual as classes de
dependentes. Aumenta, de certa forma, a proteção, na medida em que a lei de
1934 prepara um sistema em que o empregador repassa a sua
responsabilidade para uma seguradora ou deposita o valor em estabelecimento
bancário
77
.
Octávio Bueno Magano também narra o trabalho legislativo na
confecção desta lei, destacando que “pouco tempo depois de promulgada a lei nº
3.724/19, já se começou a pensar em sua alteração”, culminando com o Decreto
24.637, de 10 de julho de 1934
78
.
Em seu art. 1º o Decreto 24.637/34 mantém o conceito de
acidente do trabalho relacionado, além de com a morte, com a incapacidade para
77
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 178.
78
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 22:
“Pouco tempo depois de promulgada a lei nº 3.724/19, já se começou a pensar em sua alteração. A
iniciativa coube à Comissão de Legislação Social da Câmara dos Deputados, cujo projeto logrou aprovação
da Câmara dos Deputados, sendo remetido ao Senado em 24 de outubro de 1923. Esta casa resolveu,
porém, adotar novo texto, calcado em trabalho de Araújo Castro. Mas esse novo texto foi rejeitado pela
Câmara Federal. Seguiu-se um projeto de autoria de Afrânio Peixoto, apresentado à Câmara dos Deputados
em 1927. A Câmara não chegou, todavia, a votá-lo. Finalmente, em 1932 organizou-se, no Ministério do
Trabalho, recém-criado, uma comissão presidida por Evaristo de Moraes, cujo anteprojeto converteu-se no
decreto nº 24.637, de 10 de julho de 1934”.
42
o trabalho; ampliou, em seus parágrafos, o entendimento sobre as doenças
profissionais, ainda incluindo as atípicas.
Ampliava a cobertura indenizatória com a definição do empregado
em seu art. 3º, “com as exceções constantes do art. 64”. O empregador, conforme
o art. 4º, “é a pessoa, natural ou jurídica, sob a responsabilidade de quem
trabalha o empregado”.
Este decreto trata, em seu capítulo III, do salário e da
indenização, artigos 6º a 30. Após o detalhamento do salário, impede a dupla
indenização, admitida nos dias atuais, mas garante a possibilidade de “ação
contra terceiro civilmente responsável pelo acidente”.
o Decreto 24.637/34 repete a mesma classificação das
conseqüências do acidentes ditada no Decreto nº 3.724/19: morte, incapacidade
permanente e total, incapacidade permanente e parcial, incapacidade temporária
e total ou incapacidade temporária e parcial. Firma, ainda acompanhando a
primeira lei, a indenização em pagamento único, para morte ou incapacidade
permanente, seja total ou parcial, e a indenização em prestação continuada por
até 1 ano. Estando a vítima inscrita em “instituição de seguro social oficialmente
reconhecida” cabe uma reversão de parcela da indenização para a instituição.
A garantia da indenização, capítulo V do citado decreto, deve se
dar através de contratos de seguro de acidentes do trabalho ou de depósitos
bancários em garantia. Amplia o que Anníbal Fernandes denominou “sistema de
auto-seguro”, indenização sob responsabilidade direta do empregador, com
responsabilidade através de seguro contratado ou de depósito bancário.
43
2.1.3. Decreto-lei nº 7.036, de 10/11/1944
Em fins de 1944, também final do Estado Novo getulista, este
novo decreto busca o aperfeiçoamento do anterior, fundamentado na teoria do
risco profissional, ampliada, conforme Anníbal Fernandes, pela teoria do risco de
autoridade. Assim, ficam incluídos os trabalhadores na agricultura e comércio,
com base na condição de subordinação do empregado, e não somente na idéia
de perigo da atividade industrial
79
.
Nos Comentários à CLPS, Anníbal Fernandes ressalta que o
seguro obrigatório é um aperfeiçoamento do sistema, com responsabilidade do
empregador, mas com o fim do auto-seguro
80
, ou seja, a indenização deixa de ser
responsabilidade direta do empregador. Enquanto o Decreto 24.637/34
determinava a cobertura através de contrato de seguro ou depósito bancário, o
Decreto-lei nº 7.036/44 atinge o seguro compulsório e específico.
Conforme se analisa no Capítulo 3, sobre a evolução legislativa, o
Decreto-lei nº 7.036/44 apontava para o futuro, alvitrava a monopolização estatal
do seguro de acidentes do trabalho que ocorreria em 1967, não pelas disposições
deste decreto que não se cumpriram, mas sim pelo choque entre os diplomas que
se sucederão.
Octávio Bueno Magano discorre sobre o Decreto-lei 7.036, de 10
de novembro de 1944, ressaltando que o diploma anterior, Decreto-lei 24.637/34,
ressentia-se de “falhas que se foram realçando com a sua aplicação”
81
.
79
Cf. Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 52.
80
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 178:
“Em 1944, com o Decreto-lei 7.036, aperfeiçoa-se um sistema que dá segurança a um acidentado
no sentido de se ter de quem cobrar a indenização. Por quê? Porque a lei determina ao patrão que faça
seguro numa companhia seguradora. Não com qualquer companhia seguradora, mas com uma das
companhias seguradoras autorizadas a operar no ramo de seguros contra acidentes do trabalho. Essas
seguradoras já vinham há muitos anos trabalhando nisso, pois desde 1934 se preparava o sistema. É claro
que, se o empregador não tivesse o seguro, responderia diretamente, mas a fiscalização do trabalho era
acionada para verificar a existência do contrato de seguros preventivamente. Já não se tratava de auto-
seguro”.
81
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de inortunística, p. 24.
44
Na resolução de tais falhas, Magano aponta as inovações do
Decreto-lei nº 7.036/44 em doze pontos: a mudança do conceito de acidente do
trabalho, “que, ao invés de definir-se pelo efeito, como no decreto de 1934
(acidente é toda lesão...), passou a caracterizar-se pela causa (acidente é aquele
que provoca lesão corporal...) (art. 1º)”; a ampliação do campo de aplicação,
retirando as exclusões do diploma anterior, “como a dos empregados com
vencimentos superiores a cem conto de réis e várias outras já anteriormente
referidas (art. 76)”; a “melhor explicitação das concausas (art. 3º)”; a “extensão do
conceito de acidente”, passando a abranger os que tenham ocorrido “no período
destinado às refeições, ao descanso ou satisfação de necessidades fisiológicas,
no local ou durante o trabalho (art. 6º, § único)”; a “maior latitude do acidente ‘in
itinere’”, admitindo não apenas o “ocorrido na hipótese da condução especial
dada pelo empregador”, mas inclusive o que ocorra “na locomoção do empregado
por vias e meios perigosos (art. 7º)”; passam a ser os “beneficiários do acidentado
morto não mais os herdeiros e sim os dependentes (v. art. 11)”; o aumento do
“valor das indenizações (art. 17)”; a permissão de “cumulação de indenização
acidentária com as prestações da previdência social (art. 30); também a
“cumulação da indenização acidentária com a de direito comum, uma vez provado
o dolo do empregador (art. 31); ficou destinado “um capítulo à prevenção de
acidentes (artigos 77/81)”; a previsão da readaptação profissional (artigos 90/93);
e, finalmente, a disposição do seguro obrigatório (art. 94)
82
.
Em obra com 2ª edição mais recente, Anníbal Fernandes comenta
que “no regime do Decreto-lei n. 7.036/44, as seguradoras privadas, as
cooperativas dos sindicatos e as Carteiras dos Institutos de Aposentadoria e
Pensões atuavam em regime de concorrência”
83
. Porém, “o esquema referido
82
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 24-25.
83
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 113.
45
permitia fácil identificação de uma empresa como bom ou mau risco...”
84
; e a
relação entre a ocorrência de sinistros e novos encargos para empresa, se por um
lado auxiliava a prevenção, por outro possibilitava que as seguradoras privadas
só aceitassem os melhores contratos.
Entre as inovações listadas por Magano – o mais plausível
conceito para acidentes do trabalho, pela causa e não pelo efeito; a
concausalidade; a ampliação na aplicação tanto em relação aos segurados
quanto nas formas de acidentes, inclusive o in itinere; até o destaque final para a
disposição do seguro obrigatório – é importante a concentração do estudo nas
indenizações, com o aumento do valor e a permissão de cumulação de
indenização acidentária com as prestações da previdência social e mesmo com a
indenização de direito comum, quando do dolo por parte do empregador.
Segue o Decreto-lei nº 7.036/44 as mesmas caracterizações das
incapacidades, com maiores valores para as indenizações em pagamento único,
em caso de morte ou incapacidade permanente, seja total ou parcial, ou em
prestação continuada até o prazo de um ano.
Em seu art. 30, o citado decreto-lei mantém o seguro de acidentes
do trabalho desvinculado, independente, dos benefícios “seguro-invalidez” e
“seguro-morte” mantidos pelas “instituições de previdência social”, mesmo
apontando o rumo da monopolização estatal apenas confirmada em 1967. Com
cumulatividade das indenizações acidentárias com os benefícios previdenciários,
estaria presente a admissibilidade conjunta das teorias do risco profissional e do
risco social. Os benefícios previdenciários, substitutivos da remuneração, seriam
84
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 114:
“(...) Havendo elevado índice de sinistros no período, reajustava-se o prêmio; não havendo, de
costume, nada mais se cobrava. Com isso certa prevenção eficaz era contemplada, pois a ocorrência de
sinistros determinava os novos encargos para a empresa. Enfim, podia a seguradora com facilidade buscar
novos contratos superavitários e evitar os deficitários.
As Carteiras dos Institutos de Aposentadoria, à vista do monopólio anunciado pelo Decreto-lei n.
7.036 (e sempre adiado), deveriam aceitar as propostas de seguro, mesmo que a experiência de sinistros
fosse no sentido de déficit. Assim, numa seleção negativa, o mau risco acabou por ficar com as instituições
de previdência. Por isso mesmo, pedreiras utilizando dinamite, trabalho subaquático etc. foram clientela
cativa da Carteira de Seguros do antigo IAPI”.
46
responsabilidade da sociedade, enquanto as indenizações dispostas na lei
infortunística representariam a obrigação patronal.
No art. 31 se inicia outra diferenciação importante, com a
admissão de dupla indenização, ou seja, mais uma indenização, de direito
comum, pelo empregador, na ocorrência de acidente que “resulte de dolo seu ou
de seus prepostos”.
O Decreto-lei 7.036/44 determina, em seu art. 94, a
obrigatoriedade do seguro de acidentes do trabalho por parte do empregador,
seguro que deve ser “realizado na instituição de previdência social a que estiver
filiado o empregado” (art. 95). E, em suas disposições transitórias, impede
autorizações a novas entidades seguradoras, mantendo temporariamente as
então existentes (art. 111).
Assim, em período que não foi respeitado, determinava a
passagem paulatina dos seguros de acidentes do trabalho para as carteiras dos
institutos de previdência social, com a cessação definitiva das “operações de
seguros contra o risco de acidentes do trabalho, pelas sociedades de seguro e
pelas cooperativas de seguro de sindicatos” (art. 112).
Um exame do seguro compulsório criado pelo Decreto-lei
nº 7.036/44, do monopólio para os institutos previdenciários e ainda sobre o
embate legislativo na primeira fase da ditadura militar instaurada em 1964 faz
parte do Capítulo 3 deste estudo.
47
2.1.4. Decreto-lei nº 293, de 28/02/1967
O Decreto-lei nº 293/67 foi criado para impedir a finalização tantas
vezes adiada do período para a monopolização estatal do seguro de acidentes do
trabalho. O Decreto-lei 7.036/44 criara o seguro obrigatório, com o monopólio de
sua exploração para os institutos de previdência, valendo destacar que o período
de transição vinha sendo alongado, com as vinte e duas seguradoras privadas
que existiam continuando a operar no seguro de acidentes do trabalho. No
governo Castello Branco, este diploma de curta vida devolvia o seguro aberto
para todas as seguradoras, inclusive as que ainda não eram autorizadas,
mantendo a concorrência com o INPS
85
.
Teresinha Saad afirma que o Decreto-lei nº 293/67 “foi um dos
diplomas legais mais impróprios, retrocedendo a tudo quanto de bom havia sido
conquistado na legislação sobre infortunística”
86
.
Em seu Comentários à CLPS, Anníbal Fernandes discorre sobre o
Decreto-lei nº 293/67, editado “ao final do governo Castello Branco, abrindo a
todas as companhias de seguros, a exploração do ramo de seguro de acidentes
do trabalho”
87
.
Octávio Bueno Magano, admite, ao comentar a lei seguinte, que o
“decreto-lei nº 293, de 28 de fevereiro de 1967, teve duração efêmera”. Lembra
que o decreto-lei 7.036, de 1944, quando estipulou o seguro obrigatório apontava
85
Cf. Anníbal FERNANDES, Acidentes do trabalho, p. 116.
86
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa, p. 101.
87
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 178.
48
o monopólio para os institutos de previdência, que era adiado com alguma
insistência, até culminar com o decreto de curta duração
88
.
Desta forma, o Decreto-lei 293/67 consolidava e confirmava o
atendimento privado do seguro de acidentes do trabalho, com a concorrência
entre as seguradoras privadas e o então recém-criado Instituto Nacional da
Previdência Social.
O Decreto-lei nº 293/67 inovou no tocante às indenizações de
prestações continuadas: no caso de morte ou incapacidade total e permanente
seria “uma renda mensal reajustável”, em complemento à pensão ou a
aposentadoria concedida pelo Instituto Nacional de Previdência Social; no caso
de incapacidade parcial e permanente, “superior a 25% (vinte e cinco por cento)”,
a indenização poderia ser, “mediante escolha do acidentado”, através de uma
renda mensal reajustável ou de um pagamento de uma só vez; e com a
incapacidade parcial e permanente de um menor grau, a indenização seria paga
de uma só vez (art. 9º).
Mesmo durando pouco tempo, o Decreto nº 293/67 serviu para
colocar termo às previsões do Decreto nº 7.036/44 que nunca se realizavam. Sem
suporte político suficiente, ao invés de redistribuir o seguro de acidentes do
trabalho para as seguradoras privadas, suscitou a Lei nº 5.316/67, firmando o
monopólio estatal.
88
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 25:
“O decreto-lei nº 7.036/44 ao estatuir o seguro obrigatório havia concedido aos institutos de
previdência o monopólio da respectiva exploração (art. 95).
Contudo, como não estivessem estes aparelhados para o apontado efeito, o mesmo diploma legal, no
capítulo das disposições transitórias, previu que o aludido monopólio se consumaria só em 31 de dezembro
de 1953, termo final que veio a ser sucessivamente prorrogado.
As companhias privadas ainda operavam paralelamente ao INPS, na realização do seguro de
acidentes, quando sobreveio o decreto-lei nº 293, de 28 de fevereiro de 1967, estabelecendo a primazia do
seguro privado, mas admitindo que o INPS continuasse a operar na área respectiva, em regime de
concorrência (art. 3º), tal aliás como já vinha acontecendo.
Este decreto-lei inovou também no que toca à reparação do acidente. Instituiu para o caso de morte
e incapacidade total e permanente, uma renda mensal em benefício do acidentado ou seus dependentes; no
caso de incapacidade permanente, superior a 25%, tornou a renda mensal optativa, dispondo que, sendo a
incapacidade inferior ao referido limite a indenização seria a forma exclusiva de reparação (artigo 9º)”.
49
2.1.5. Lei nº 5.316, de 14/09/1967
Se o Decreto Legislativo nº 3.724, em 19 de janeiro de 1919,
inaugura a legislação infortunística, a Lei nº 5.316, em 14 de setembro de 1967,
conduz o acidente do trabalho para a incorporação à previdência social, com sua
consolidação na Constituição Federal de 1969.
Fernando Figueiredo de Abranches evidenciava que a lei ordinária
havia integrado o seguro contra acidentes do trabalho no INPS, retirando-o das
seguradoras particulares:
“(...) Se o tivesse integrado na previdência social, para usar a
expressão constante na Lei de Infortunística e adotada por vários doutrinadores,
seria flagrantemente inconstitucional. O INPS, por essa lei, passou apenas a ser
o seu agente executor”
89
.
Teresinha Saad, em quadro sinótico aponta enquanto fundamento
jurídico da Lei nº 5.316/67 a “Teoria do Risco Profissional, ampliada pela
chamada Teoria do Risco de Autoridade e do Risco Social”
90
.
As transformações doutrinárias sobre o acidente do trabalho
meneiam entre a responsabilidade social e a obrigação securitária patronal, desde
a Lei nº 5.316/67 – que em sua ementa expõe: “integra o seguro de acidentes do
trabalho na previdência social e dá outras providências” – até as reformas da
legislação ordinária e da Carta Magna, entre 1995 e 1998 – igualando os
benefícios sob responsabilidade da previdência social e apontando o retorno do
seguro a cargo do empregador “atendido concorrentemente pelo regime geral de
previdência social e pelo setor privado”. Tais transformações são objeto de
89
Fernando Figueiredo de ABRANCHES, Do seguro mercantilista de acidentes do trabalho ao seguros
social, p.18.
90
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, p. 110.
50
análise no Capítulo 3, com maior concentração nas mudanças com vigência na
atualidade.
Anníbal Fernandes descreve a evolução entre “a lei que não
houve”, Decreto 293/67, e a Lei 5.316/67, integrando “o seguro de acidentes do
trabalho na previdência social”. Entende que o Decreto-lei nº 293/67 abria campo
à privatização, tratando o seguro de acidente do trabalho como mais uma
modalidade de seguro privado, e que a Lei 5.316/67 foi “uma reversão completa
das expectativas”, trazendo à Previdência Social o monopólio que o Decreto-lei nº
7.036/44 indigitava:
(...) Não se recorria ao princípio do risco social, mas ao ponto de
vista da mecânica de custeio. O INPS arrecadava contribuições – cuja natureza
parece tranqüila, como tributo ou contribuição parafiscal. O segurado sabia de
quem cobrar a indenização. Não havia, portanto, o problema da insolvência do
empregador, por não existir a apólice de seguro ou em razão de uma eventual
liquidação da companhia seguradora. Para reparar o dano havia o INPS, criado
pelo Decreto-lei nº 72/66
91
.
Octávio Bueno Magano, expõe seu entendimento em que
caracteriza o Decreto-lei nº 293/67 por sua “duração efêmera”, substituído pela
Lei nº 5.316/67, regulamentada pelo Decreto nº 61.784/67”:
A nova lei levou a efeito a integração do acidente do trabalho na
Previdência Social, com as seguintes espécies de prestações: auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez, pensão por morte, auxílio-acidente, pecúlio,
assistência médica e reabilitação profissional
92
.
A Lei 5.316, de 14 de setembro de 1967, distingue toda a sua
importância no artigo 1º, que declara: “o seguro obrigatório de acidentes do
trabalho, de que trata o art. 158, XVII, da Constituição Federal, será realizada na
91
Anníbal FERNANDES, Comentários a CLPS, p. 179.
92
Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 26.
51
previdência social”, com o avanço paulatino de sua aplicabilidade, em 1º de
janeiro de 1968, 1º de julho de 1968 e 1º de julho de 1969, como apresenta
Magano
93
.
Acidente do trabalho é o que “ocorrer pelo exercício do trabalho, a
serviço da empresa, provocando lesão corporal, perturbação funcional ou doença
que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da
capacidade para o trabalho”, com a equiparação das doenças do trabalho e de
outros acidentes, inclusive o in itinere, “no percurso da residência para o trabalho
ou deste para aquela” (art. 2º).
Os benefícios indenizatórios passaram a ser de prestação mensal
continuada no lugar das indenizações por pagamento único; benefícios
substitutivos das remunerações mais favoráveis aos então dispostos pela Lei
Orgânica da Previdência Social (Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960), ou
enquanto complemento salarial quando a capacidade laboral do segurado foi
reduzida.
O art. 6º da Lei 5.316/67 discorre sobre o auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez, tendo como base de cálculo o salário do dia do
acidente, “não podendo ser inferior ao seu salário-de-benefício”, sendo que para o
primeira seria “deduzida a contribuição previdenciária” (restando 92%); e a
pensão por morte em valor igual ao que seria a aposentadoria por invalidez
acidentária, “qualquer que seja o número inicial de dependentes”.
Ainda no art. 6º, é interessante ressaltar o conceito de grande
invalidez, além da incapacidade meramente laboral, presente no § 4º, com a
majoração do benefício em 25% se o inválido “necessitar da permanente
assistência de outra pessoa”. Com a integração do seguro de acidentes do
trabalho no sistema público, não poderia o segurado receber mais de uma
substituição de sua remuneração pelo mesmo sistema, e assim o § 8º do mesmo
93
Cf. Octávio Bueno MAGANO, Lineamentos de infortunística, p. 26.
52
art. 6º explicita que o percebimento dos benefícios auxílio-doença, aposentadoria
por invalidez ou pensão por morte acidentários “exclui o direito aos mesmos
benefícios nas condições” da Lei Orgânica da Previdência Social.
A Lei 5.316/67 cria, em seu art. 7º, o “auxílio-acidente”, garantido
aos acidentados quando ocorrer a “redução permanente da capacidade para o
trabalho em percentagem superior a 25% (vinte e cinco por cento)”, calculado, no
percentual da incapacidade, sobre o valor que representaria a aposentadoria por
invalidez.
Para a “redução permanente da capacidade para o trabalho em
percentagem igual ou inferior a 25% (vinte e cinco por cento)”, o art. 8º assevera
um “pecúlio resultante da aplicação da percentagem da redução à quantia
correspondente a 72 (setenta e duas) vezes o maior salário mínimo mensal
vigente no País na data do pagamento”. Completa-se a indenização acidentária
com o pecúlio em caso de morte ou invalidez.
Além da integração do seguro de acidentes do trabalho ao
sistema previdenciário – se através da lei ou de disposição constitucional
posterior valerá ainda maior análise no Capítulo 3 – a Lei 5.316/67 evoluía
radicalmente sobre a indenização do seguro obrigatório para acidentes do
trabalho.
Importante salientar que o diploma anterior, o Decreto-lei nº
7.036/44, mesmo indicando a monopolização futura estatal sobre os acidentes do
trabalho, conservava com absoluta separação o regime previdenciário do seguro
infortunístico, especialmente nas disposições sobre as indenizações, sendo
admitida a cumulabilidade de indenização acidentária com benefícios sob
responsabilidade dos institutos previdenciários.
A Lei nº 5.316/67 dispõe sobre o auxílio-doença, a aposentadoria
por invalidez e a pensão por morte, enquanto benefícios acidentários, com valores
53
mais favoráveis dos que os dispostos na Lei Orgânica da Previdência Social, de
1960, LOPS, mas substituindo os benefícios previdenciários. E, para os casos de
maior gravidade, invalidez ou morte, restou o denominado pecúlio, em pequenos
valores para a “redução permanente da capacidade para o trabalho em
percentagem igual ou inferior a 25% (vinte e cinco por cento)”, ou em seu “valor
máximo” em caso de morte, ou invalidez quando a aposentadoria previdenciária
do acidentado seria igual ou superior a 90% (noventa por cento) do benefício
determinado pela LOPS.
O principal na alteração pela Lei nº 5.316/67 era o benefício de
prestação mensal continuada: auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e
pensão por morte com o título de acidentários, com valores mais favoráveis do
que os que estariam dispostos na Lei Orgânica da Previdência Social de 1960; e
auxílio-acidente para a incapacidade parcial mas permanente, quando
representasse mais de 25% na redução laboral.
José Paulo Leal Ferreira Pires, em análise da época da Lei
5.316/67, expunha suas divergências, compreendendo que a “nova legislação
está longe de se erigir em o ideal acerca da espécie”. Diverge radicalmente do
sistema indenizatório adotado, classificando-o enquanto “acima de tudo de
confuso, e inadequado à realidade brasileira”. Seria favorável a uma solução mais
simplista: o governo deveria revigorar o Decreto-lei nº 7.036, de 1944, e revogar o
Decreto-lei nº 293, de 1967. Afirma que o sistema indenizatório aplicado seria
menos favorável aos trabalhadores
94
.
Em comentário à lei acidentária (na 5ª edição, em 1984, já a Lei
nº 6.367/76), Tupinambá Miguel Castro do Nascimento entende exatamente o
94
José Paulo Ferreira PIRES Acidentes do trabalho, p. 10.
54
contrário. Defende que a indenização através de prestação continuada compõe
melhor a necessidade dos trabalhadores:
(...) A um determinado momento, se viu que a solução de
pagamento de indenização numa só quantia, de uma única vez, não tinha o
sentido reparatório que se pretendia dar. O sistema adotado não atendia, no
fundo, às necessidades do acidentado. O que ele precisava era de um
substitutivo de seu salário que ficara reduzido ou desaparecera. O fato de se lhe
pagar uma quantia relativamente vultosa, tornava-o um suficiente econômico
durante algum tempo. Porém, como regra, o homem brasileiro não tem o hábito
da poupança e do investimento. Isto equivale a dizer que a quantia
representativa da indenização em pouco tempo era gasta e, pouco tempo
depois, a miséria voltava como grande problema individual e social. Impunha-se,
portanto, uma solução mais justa que enfrentasse o problema da indenização no
presente sem olvidar o futuro
95
.
A estatização do seguro de acidentes do trabalho marca um
momento político importante, com o Decreto nº 293/67 proporcionando às
companhias particulares de seguro o retorno da primazia, e a Lei nº 5.316/67
cumprindo rapidamente aquilo que o antigo Decreto-lei nº 7.036/44 determinava
para acontecer em um período que nunca se esgotava: o monopólio do seguro
nos institutos previdenciários, em 1967 já o Instituto Nacional de Previdência
Social. Tão acirrada disputa demonstra, exatamente o que afirma Ferreira Pires:
A acirrada luta de anos entre as duas facções já mencionadas,
serve para evidenciar à saciedade um fato: em termos comerciais, esta
modalidade de seguro é altamente lucrativa, pois, se assim não fosse, seria
totalmente injustificável esta situação”
96
.
Com a Lei nº 5.316/67, a indenização infortunística passa para a
responsabilidade estatal, para o então recém criado Instituto Nacional de
95
Tupinambá Miguel Castro do NASCIMENTO, Comentários à lei de acidentes do trabalho, p. 12.
96
José Paulo Ferreira PIRES, Acidentes do trabalho, p. 14.
55
Previdência Social, INPS, com benefícios de prestação continuada, além dos
pecúlios por invalidez ou morte.
Os benefícios acidentários por incapacidade temporária ou
permanente ou por morte, auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão,
são clara representação da inclusão do seguro de acidentes do trabalho ao
sistema previdenciário. Tendo valores superiores aos seus congêneres dispostos
na Lei Orgânica da Previdência Social são inacumuláveis com tais (afinal, não se
poderia receber pelo mesmo sistema previdenciário dois substitutos da
remuneração mensal). Desta forma a lei reforçava o caráter de seguro específico
contra acidente do trabalho pelos benefícios diferenciados, além do auxílio-
acidente por redução laboral e dos pecúlios, indenizações por pagamento único
em razão de invalidez ou morte.
A indenização por acidente do trabalho deveria ser por
pagamento único ou por benefício de prestação mensal continuada? Estas eram
teses com bons defensores, como exemplos infra citados, respectivamente José
Paulo Leal Ferreira Pires e Tupinambá Miguel Castro do Nascimento; porém, com
qualquer forma de pagamento, o monopólio estatal no controle do seguro estaria
consolidado. E com o passar do tempo e das leis futuras, também estavam
consolidados os benefícios de prestação mensal continuada, indicando que
representavam uma evolução no rumo da teoria do risco social. Esta evolução
culmina nas últimas alterações legislativas e constitucionais que estarão descritas
nos últimos tópicos neste Capítulo 2 e merecerão maiores análises no Capítulo 3.
Por fim, a Constituição Federal de 1969 integra o acidente do
trabalho à Previdência Social, dispondo no art. 164, item XVI: “Previdência social
nos casos de doença, velhice, invalidez, morte, seguro de desemprego, seguro
contra acidente de trabalho e proteção à maternidade, mediante contribuição da
União, do empregador e do empregado”.
56
2.1.6. Lei nº 6.367, de 19/10/1976
Em 1976 está consolidada a inclusão do seguro de acidentes do
trabalho no sistema previdenciário. Enquanto para os trabalhadores rurais valia a
Lei nº 6.195/74, a Lei nº 6.367/76, iniciando sua vigência em 1º de janeiro de
1977, dispunha, conforme o seu art. 1º, sobre o “seguro obrigatório contra
acidentes do trabalho dos empregados segurados do regime de previdência social
da Lei n. 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), e
legislação posterior, (...) realizado pelo Instituto Nacional de Previdência Social
(INPS)”, considerando também empregados o trabalhador temporário, o avulso e
mesmo o presidiário exercendo trabalho remunerado.
O fundamento da Lei nº 6.367/76 continua sendo a Teoria do
Risco Profissional, ainda que com maior tendência à Teoria do Risco Social
97
;
mantém sob responsabilidade exclusiva do empregador uma contribuição
adicional representando o seguro de acidentes do trabalho; por outro lado,
restringe a cobertura das doenças profissionais e do trabalho, equiparando
apenas as “constantes da listagem organizada pelo Ministério da Previdência e
Assistência Social” (art. 2º, § 1º, I), admitindo somente algumas exceções.
Anníbal Fernandes analisa a Lei 6.367/76 com bastante
pessimismo, entendendo-a enquanto grave retrocesso em relação à Lei 5.316/67,
na forma bem própria de quem vivia a época:
Do ano de 1964 até a Lei n. 6.367, de 1976, caracteriza-se o
período por alterações profundas da legislação acidentária. Fato marcante é o
estabelecimento do monopólio estatal do seguro de acidentes do trabalho, mais
de 30 anos após a sua proposição no Decreto-lei n. 7.036/44.
97
CF. Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa, quadro sinótico, p. 120.
57
Dado também relevante do período é que a ampliação e
abrangência dos benefícios concedidos aos acidentados ou portadores de
doenças profissionais, que atinge seu ponto máximo com a Lei n. 5.316, de
14.9.1967, a partir daí passa a sofrer recuos constantes que culminam com a
Lei 6.367, de 19.10.1976; bem como a ampliação da legislação de segurança,
higiene e medicina do trabalho
98
.
Quanto ao conceito de acidente do trabalho, contido no art. 2º,
Anníbal Fernandes tem razão quando afirma que houve recuos. O conceito ficou
realmente mais restrito, com a equiparação das doenças de forma bem mais
limitada, pois, em seu § 1º, inciso I, estipula que são entendidas enquanto doença
profissional ou do trabalho “a inerente ou peculiar a determinado ramo de
atividade e constante de relação organizada pelo Ministério da Previdência e
Assistência Social (MPAS)”.
Mantendo o monopólio estatal, respeitando a regra constitucional,
a Lei 6.367/76 dispõe os benefícios substitutivos da remuneração (auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez e pensão por morte) em condições mais favoráveis do
que os previdenciários também mantidos pelo INPS, tanto nos percentuais
aplicados quanto nas bases de cálculo (art. 5º). Assim, seriam computados sobre
a base mais favorável – o salário-de-contribuição do empregado vigente no dia do
acidente ou sobre o salário-de-benefício –, o auxílio-doença em 92% e a
aposentadoria por invalidez e a pensão em 100%, com qualquer tempo de serviço
ou número de dependentes, respectivamente. Permanece, no § 3º, a majoração
em 25% para o benefício do segurado que “necessitar de assistência permanente
de outra pessoa”, para os casos de grande invalidez; e segue também, no § 5º, a
exclusão do direito de recebimento do mesmo benefício, “nas condições do
regime geral de previdência social do INPS”.
O auxílio-acidente – benefício indenizatório previsto na anterior
Lei 5.316/67 para redução laboral parcial e permanente, “em percentagem
superior a 25% (vinte e cinco por cento)” – passa a ser calculado, conforme o art.
98
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 124.
58
6º da Lei 6.367/76, em 40% da base mais favorável (salário do dia do acidente ou
salário-de-benefício), porém, devido somente para o acidentado que, “após a
consolidação das lesões resultantes do acidente, permanecer incapacitado para o
exercício da atividade que exercia habitualmente (...) mas não para o exercício de
outra”.
Quando as lesões resultassem em “seqüelas definitivas, perdas
anatômicas ou redução da capacidade laboral, constantes da relação previamente
elaborada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), as quais,
embora não impedindo o desempenho da mesma atividade, demandem,
permanentemente maior esforço na realização do trabalho”, o benefício
indenizatório devido, art. 9º, seria “um auxílio mensal” correspondendo a 20%
(vinte por cento) da base mais favorável.
Ressalte-se que este auxílio suplementar era inacumulável com
aposentadoria, diferentemente do auxílio-acidente, calculado em 40%, que era
vitalício. Entendia o legislador que as perdas decorrentes do acidente do trabalho
que obrigassem o trabalhador a mudar de função causariam perdas financeiras
inclusive na aposentadoria, pois a mudança funcional motivaria redução na
remuneração com reflexos no benefício, enquanto a redução na capacidade
laboral, mantendo a mesma função, não representaria diminuição na
aposentadoria.
Nos artigos 7º e 8º ficaram dispostos os pecúlios, indenizações
em pagamento único, em caso de morte ou invalidez decorrentes de acidente do
trabalho.
As indenizações em pagamento único não impediam o
percebimento de benefícios sob a responsabilidade dos institutos de
aposentadoria e pensões, enquanto os benefícios acidentários substitutivos da
remuneração, auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte,
eram inacumuláveis com outros iguais e mantidos pelo mesmo instituto.
59
Posteriormente incluídas na Consolidação das Leis da
Previdência Social, através do Decreto 89.312, de 23/01/1984, estas foram as
regras válidas até a Lei 8.213, de 24/07/1991.
60
2.1.7. Constituição Federal, de 05/10/1988
Em 5 de outubro de 1988 era promulgada a Constituição Federal,
em um momento de ruptura com o regime arbitrário que fora instalado em 1964 e
derrotado em 1985 pela eleição indireta de Tancredo Neves. Em razão da morte
do eleito, tomou posse o vice José Sarney.
Manteve-se o seguro de acidentes do trabalho fundamentado na
teoria do risco profissional, constando, no Título II, Capítulo II, Dos Direitos
Sociais, em seu art. 7º, inciso XXVIII, o direitos dos trabalhadores ao seguro
contra acidentes do trabalho, sob responsabilidade exclusiva do empregador, e
ainda possibilitando a cumulação de indenizações, quando este incorrer em dolo
ou culpa. E também se conservou, na redação original, o monopólio estatal de
atendimento a este seguro, com o art. 201, inciso I, dispondo que os planos de
previdência social deveriam atender inclusive os acidentes do trabalho.
Se por um lado, a manutenção do monopólio estatal, a cobertura
dos eventos de acidentes do trabalho pela previdência social, poderia representar
a inclusão na teoria do risco social, por outro, o Diploma Máximo, exatamente no
título Dos Direitos e Garantias Fundamentais, teria base na teoria do risco
profissional, determinando o seguro compulsório sob responsabilidade exclusiva
do empregador.
Em obra editada logo após a promulgação da Constituição
Federal em 1988, Anníbal Fernandes elabora uma primeira avaliação, apontando
61
no art. 7º, inciso XXVIII, o estabelecimento de dois direitos: “seguro e reparação
civil”. Ressalta que o seguro de acidentes do trabalho é encargo do patrão:
(...) O seguro é encargo do patrão, que deve custeá-lo sozinho, e
não somando os seus aos recursos advindos dos segurados e das empresas
em geral”
99
.
Em análise de 1993, Wagner Balera denotava que o acidente do
trabalho havia sido “objeto de tratamento distinto pelo constituinte”, e, portanto,
para estabelecer “um regime próprio, especial e específico”, inclusive admitindo a
reprivatização deste seguro, porém, considerado como “de relevância pública
100
.
Defendendo a absoluta inclusão do acidente do trabalho ao
seguro social, sem qualquer diferenciação, Celso Barroso Leite entende que “o
seguro de acidentes do trabalho ainda existe na maioria dos países”, mas
principalmente pelo “apego à tradição e (por) motivos econômicos”. Sustenta que
a manutenção do seguro contra acidentes do trabalho seria “uma teimosia
desnecessária, complicadora, onerosa e ilógica”. O ilustre previdenciarista infere
que a previdência social cobre conseqüências e não causas, e a prevenção
relativa aos acidentes e doenças profissionais ou do trabalho são matéria de
“segurança e higiene do trabalho e de proteção à saúde, de responsabilidade de
outras áreas”
101
.
Em resumo do exame das Cartas Constitucionais brasileiras,
Anníbal Fernandes ressalta que “como contingência social ou não, sempre o
infortúnio teve cobertura por seguro especial”. Sua integração na previdência teria
ocorrido para “fins de aprimoramento e pronta aplicação e nunca para diluição
entre outros riscos não-ocupacionais”
102
.
99
Anníbal FERNANDES, A constituição da transição democrática e os trabalhadores, p. 40.
100
Wagner BALERA, A reprivatização do Seguro de Acidente do Trabalho, RPS 146, p. 26.
101
Celso Barroso LEITE, Seguro de Acidentes do Trabalho, RPS 212, p. 543:
“A prevalecer a idéia de uma cobertura separada para os acidentes do trabalho, teríamos também
de tê-la para os acidentes de trânsito (muitos milhares de mortes por ano no Brasil), para os acidentes
comuns (os mais numerosos de todos), para as doenças cardiovasculares e assim por diante”.
102
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 160.
62
O legislador constituinte em 1988 admitia o acidente do trabalho
enquanto risco social, coberto pela previdência social, por sua vez fazendo parte
da seguridade social. Porém, ao mesmo tempo garantia um seguro específico sob
responsabilidade exclusiva do patrão, teoria do risco profissional,
responsabilidade subjetiva, sem elidir a possibilidade de mais uma indenização no
caso de dolo ou culpa, agora com base na teoria contratual da responsabilidade
subjetiva.
Portanto, confirma-se a aplicabilidade das teorias doutrinárias
sem a obrigação de óticas excludentes. Maiores exames se fazem no Capítulo 3,
observando a inter-relação entre os diplomas e as alterações, e no Capítulo 4,
sobre a responsabilidade civil do empregador.
Sobre a prevenção aos acidentes do trabalho, cabe apenas
destacar o art. 7º, inciso XXII, da CF 88, que garante a redução dos riscos através
“de normas de saúde, higiene e segurança”.
63
2.1.8. Lei nº 8.213, de 24/07/91, redação original e suas alterações
Em sua redação original, a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991,
espelha com fidelidade a nova constituição promulgada em 1988. As alterações
subseqüentes, pelas Leis 9.032/95 e 9.528/97, esta última originada em medidas
provisórias, possivelmente apontam para a fundamentação plena na teoria do
risco social, equiparando o acidente do trabalho e seus equiparados aos demais
riscos sociais. Importante destacar que a Carta Magna mantém a coabitação das
duas teorias infortunísticas, sendo o acidente do trabalho um risco previsto na
cobertura do seguro social e ao mesmo tempo objeto de seguro específico sob a
responsabilidade do empregador.
O custeio disposto em lei diversa, a Lei 8.212/91, no art. 22, inciso
II, sob responsabilidade exclusiva do empregador, estipulada em 1% (um por
cento), 2% (dois por cento) ou 3% (três por cento) sobre o total das
remunerações, deveria acompanhar a teoria do risco profissional, sendo o seguro
específico sustentado apenas pelo empregador, ficando a responsabilidade da
autarquia social na administração.
Anníbal Fernandes entende que ficou mantida “a mesma fórmula
das anteriores, pela qual o custeio se faz mediante algo como uma sobretaxa em
relação aos demais percentuais exigidos das empresas”
103
. Aponta dúvidas sobre
a constitucionalidade:
É de duvidosa constitucionalidade um sistema de custeio que
assim interpreta a expressão “seguro a cargo do empregador” (...). A tradição da
cobertura do infortúnio, a finalidade do seguro e a letra da Lei Maior indicam a
intenção do legislador de onerar a empresa, e somente ela, com o custeio do
seguro acidentário
104
.
103
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 182.
104
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 181-182.
64
Pela redação atual, desde a Lei 9.732, de 11 de dezembro de
1998, a aposentadoria especial também estaria sendo financiada pelo seguro de
acidentes do trabalho, mas ocorre que nas disposições alteradas da Lei de
Benefícios, 8.213/91, art. 57, §§ 6º e 7º, estão previstas as alíquotas a serem
acrescidas (6%, 9% ou 12% sobre o salário do trabalhador com direito ao
benefício especial) para garantir o benefício especial.
As alíquotas acrescidas deveriam, portanto, financiar a
aposentadoria especial ou completar o seu financiamento. E isoladamente os
percentuais previstos na Lei 8.213/91, art. 22, II, devem continuar financiando (ou
enquanto sobretaxa de financiamento) exclusivamente os benefícios decorrentes
de acidentes do trabalho e doenças profissionais ou do trabalho, o que não é o
caso da aposentadoria especial.
Ainda sobre custeio é preciso destacar a Lei 10.666, de 8 de maio
de 2003, em seu art. 10 determinando a redução em até cinqüenta por cento ou o
aumento até cem por cento, de acordo com o desempenho da empresa em
relação aos acidentes do trabalho e seus equiparados. A metodologia de cálculo
do denominado Fator Acidentário Previdenciário consta na Resolução nº 1236, de
28 de abril de 2004, do Conselho Nacional de Previdência Social.
Acidente do trabalho é conceito presente no art. 19: “ocorre pelo
exercício do trabalho a serviço da empresa (...) provocando lesão corporal ou
perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou
temporária, da capacidade para o trabalho”. Seus equiparados estão descritos
nos artigos 20 – as “entidades mórbidas”, doenças profissionais ou do trabalho –
e 21 – concausalidade, acidente sofrido no local e horário do trabalho, doença
proveniente de contaminação e acidente sofrido ainda que fora do local e horário
de trabalho se executando ordem, na prestação espontânea de serviço à
empresa, em viajem a serviço e no percurso da residência ao local de trabalho e
vice-versa, in itinere.
65
Os benefícios acidentários constam no art. 18, segundo Anníbal
Fernandes mesclados “às demais contingências”, sem contribuir para maior
clareza na legislação, misturando “‘alhos com bugalhos’, no afã de adotar
‘plenamente’ a teoria do risco social”
105
. Porém, mesmo estando definidos em lista
comum, na redação original havia as diferenças nos cálculos, seja pelo percentual
seja pela base mais favorável.
Assim, o seguro de acidente do trabalho garantia: para a
incapacidade permanente e total, a aposentadoria por invalidez acidentária; para
a incapacidade provisória e total, o auxílio-doença acidentário; para a
incapacidade permanente e parcial, o auxílio-doença; e para a morte, a pensão. E
mantinha os resquícios da indenização acidentária em pagamento único, pecúlio,
para invalidez e morte, conforme os artigos 81 e 83, garantindo ao acidentado,
além dos benefícios com cálculos mais favoráveis, ainda uma indenização com
maiores características de securitária.
Na redação original, enquanto os benefícios do auxílio-doença, da
aposentadoria por invalidez e da pensão por morte poderiam ser previdenciários
ou acidentários (tendo os acidentários valores maiores), o auxílio-acidente era um
benefício indenizatório restrito para seqüelas decorrentes de acidentes do
trabalho ou seus equiparados.
O auxílio-acidente, disposto na Lei 8.213/91, em seu art. 86,
substituía os dois benefícios indenizatórios da Lei 6.367/76. O novo auxílio-
acidente estava disposto em três versões percentuais: com a “redução da
capacidade laborativa que exija maior esforço ou necessidade de adaptação para
exercer a mesma atividade”, deve ser calculado em 30% da base mais favorável –
o salário-de-contribuição do dia do acidente ou o salário-de-benefício –; se houver
a “redução da capacidade laborativa que impeça, por si só, o desempenho da
atividade que exercia à época do acidente porém não o de outra, do mesmo nível
de complexidade”, o auxílio-acidente será em 40%; e, na ocorrência da “redução
105
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 193.
66
da capacidade laborativa que impeça, por si só, o desempenho da atividade que
exercia à época do acidente, porém não o de outra, de nível inferior de
complexidade”, o benefício acidentário deverá ser em 60%.
Desta forma, cabe insistir, a Lei de Benefícios, em seu art. 18,
mesclava benefícios previdenciários, comuns, aos acidentários, porém, nas
formas de cálculo conservava a diferenciação.
Em 28 de abril de 1995, a Lei 9.032 parece dar um basta à teoria
do risco profissional, implantando definitivamente a teoria do risco social. E tal
direção ainda recebe ajuda por medidas provisórias que culminam com a Lei
9.528, de 10 de dezembro de 1997.
São equiparados os benefícios substitutivos da remuneração,
auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, e é o auxílio-
acidente transformado em benefício comum, uma indenização em percentual
único, 50%, para seqüelas decorrentes de “acidentes de qualquer natureza”, e
não mais apenas em relação aos acidentes do trabalho. Apenas o que restaria do
seguro de acidentes do trabalho, sob responsabilidade patronal conforme garante
o art. 7º, inciso XXVIII, do Diploma Máximo, seria a contribuição de 1%, 2% ou
3%, de acordo com o risco de acidentes na atividade preponderante, com as
alterações dispostas na Lei nº 10.666/03.
Para os benefícios acidentários, acaba a base de cálculo mais
favorável, passando todos a ser calculados pelo salário-de-benefício, média
contributiva, conforme determina o art. 29, inciso II; e os pecúlios (artigos 81 e 83
da Lei 8.213/91) extinguem-se definitivamente pela Lei 9.032/95, com o devido
auxílio da Lei 9.129/95.
O auxílio-doença previdenciário, não decorrente de acidente do
trabalho, na redação original, seria calculado em “80% (oitenta por cento) do
salário-de-benefício, mais 1% (um por cento)” para cada ano de contribuição, “não
67
podendo ultrapassar 92% (noventa e dois por cento)”, enquanto se “decorrente de
acidente do trabalho” seria “92% (noventa e dois por cento)” da base mais
favorável, sem importar o tempo de contribuição. Pela atual redação, será uma
“renda mensal correspondente a 91% (noventa e um por cento) do salário-de-
benefício” em qualquer hipótese, inclusive se “decorrente de acidente do trabalho”
(art. 61).
A aposentadoria por invalidez era definida também “em 80%
(oitenta por cento) do salário-de-benefício, mais 1% (um por cento)” por ano de
contribuição, “não podendo ultrapassar 100% (cem por cento)”, mas se fosse
decorrente de acidente do trabalho, seria sempre 100% (cem por cento) da base
mais favorável, com qualquer tempo de contribuição. Agora a aposentadoria por
invalidez se calcula em “100% (cem por cento) do salário-de-benefício” inclusive
se for acidentária (art. 44).
A pensão por morte, em 1991, tinha seu valor “constituído de uma
parcela, relativa à família, de 80% (oitenta por cento) do valor da aposentadoria
que o segurado recebia ou a que teria direito, se estivesse aposentado na data do
seu falecimento, mais tantas parcelas de 10% (dez por cento) (...) quantos forem
os dependentes, até o máximo de 2 (duas)”; mas, no caso do falecimento em
conseqüência de acidente do trabalho, o benefício seria calculado em 100% (cem
por cento) da base mais favorável. A partir da Lei 9.032/95, com atual redação
pela Lei 9.528/97, a pensão por morte representará 100% (cem por cento) da
aposentadoria, ou virtual aposentadoria, do segurado falecido, sem importar o
número de dependentes ou a razão da ocorrência (art. 75).
O auxílio-acidente (art. 86), vitalício e calculado em três
percentuais diferentes de acordo com a redução na capacidade laboral do
segurado, vai sendo descaracterizado, a partir da Lei 9.032/95, passando a ter um
percentual único, 50%, não mais sendo exclusivo para lesões decorrentes de
acidentes do trabalho e passando a constar no art. 124, inciso V, da Lei 8.213/91,
com o impedimento do recebimento de “mais de um auxílio-acidente”. Vale
68
ressaltar que a Lei 9.129, de 20 de novembro de 1995, simplesmente efetuou a
correção da redação.
Seguem as alterações na norma relativa ao auxílio-acidente, pela
Medida Provisória 1.523, em sua 9ª edição, em 27 de junho de 1997, e depois na
Medida Provisória 1.596, 14ª edição, em 10 de novembro de 1997, convertida na
Lei 9.528, de 10 de dezembro de 1997. Estas alterações são as atualmente
vigentes, recebendo tópicos específicos no Capítulo 3.
Assim – saliente-se, para boa interpretação jurídica, que a partir
da Medida Provisória nº 1.596-14/97, em 10/11/97 – “o auxílio-acidente mensal”
passou a corresponder a 50% do salário-de-benefício, “até a véspera do início de
qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado”. Pela mesma Medida
Provisória, o art. 86, § 2º, passou a conter a inacumulabilidade do auxílio-doença
com qualquer aposentadoria, ou seja, confirmando o fim da vitaliciedade do
benefício acidentário; vitaliciedade que havia sido consolidada na redação original
da Lei nº 8.213/91.
Ficaram revogados os § 4º e 5º da redação original, que,
respectivamente, incorporavam a metade do auxílio-acidente, ou o seu valor
integral, na pensão dos dependentes no caso de falecimento do segurado resultar
ou não de outro acidente do trabalho.
E ainda foi incluído o atual § 4º, dispondo que a “perda da
audição, em qualquer grau, somente proporcionará a concessão do auxílio-
acidente, quando, (além do nexo causal) resultar, comprovadamente, na redução
ou perda da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia”. Tal norma
vem em defesa de um caráter meramente indenizatório e nunca preventivo para a
lei infortunística, tentando reduzir a concessão de benefícios com origem na
disacusia neurosensorial bilateral, a surdez profissional, sempre tão comum nas
frentes de trabalho. Ampla jurisprudência, como se expõe no Capítulo 5, dispõe
que se a contínua exposição aos ruídos excessivos pode agravar a disacusia que
69
se abate sobre o trabalhador, deve ocorrer a concessão do auxílio-acidente, com
a devida restrição médica, que dificilmente é cumprida.
No lugar da vitaliciedade do benefício acidentário que existia na
redação original da Lei 8.213/91, restou a inclusão do valor mensal do auxílio-
acidente nos salário-de-contribuição que serão utilizados no cálculo do salário-de-
benefício, base para a aposentadoria (art. 31), e assim o valor do auxílio-acidente
estaria somado ao valor da aposentadoria. Porém, importante ressaltar dois
estreitamentos no direito do trabalhador: em primeiro lugar, a soma do valor do
benefício acidentário ao salário-de-contribuição do segurado não poderá
ultrapassar o limite de contribuição vigente no mês; porém, muito mais grave será
a perda decorrente do atual salário-de-benefício, disposto no art. 29, inciso II, da
Lei nº 8.213/91, bastante alterado pela Lei 9.876/99.
O salário-de-benefício, base para o cálculo de todos os
benefícios, inclusive os acidentários, é, pela atual redação da lei, a “média
aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta
por cento de todo o período contributivo”. Vale lembrar que a Lei nº 9.876/99
dispõe, em seu art. 3º, a regra de transição com o período contributivo
considerado de julho de 1994 em diante. Assim, serão utilizados no cálculo da
aposentadoria os maiores salários do trabalhador que representem 80% (oitenta
por cento) de todos desde julho de 1994. Pela redação anterior, o salário-de-
benefício era calculado pela média dos 36 (trinta e seis) últimos salários-de-
contribuição.
Assim, para que haja a inclusão integral do benefício indenizatório
à aposentadoria seria necessário o percebimento daquele por pelo menos oitenta
por cento do período contributivo utilizado para a concessão da aposentadoria,
talvez desde julho de 1994, além da soma dos valores não poder exceder o limite.
Por fim, vale também salientar que com a equiparação dos
benefícios acidentários e previdenciários em seus valores, pode ocorrer a
70
diminuição de ações judiciais relativas aos acidentes do trabalho contra a
autarquia federal por falta de interesse de agir, já que os valores dos benefícios
acidentários não mais serão superiores. As ações acidentárias apresentam dois
temas para debate: a lesão do trabalhador e o nexo de causalidade do acidente
ou doença. Sem qualquer referencial de vantagem financeira no benefício
acidentário, basta comprovar a lesão sofrida, pouco importando o nexo causal
com a atividade, para perceber benefício previdenciário no mesmo valor.
Com a possível diminuição no ajuizamento de ações acidentários
contra o instituto previdenciário, também pode acontecer o aumento de ações de
responsabilidade patronal, agora tramitando na esfera trabalhista. No Capítulo 5
serão observadas as questões mais atuais, como as mantidas pela jurisprudência
relativa ao auxílio-acidente e as alterações jurisprudenciais acerca da
competência para processar e julgar as ações indenizatórias com base na
responsabilidade civil da empresa empregadora.
71
2.1.9. Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998, e o novo § 10 do art.
201
Na prática, estava estabelecida a inclusão dos acidentes do
trabalho no conjunto de riscos sociais, restando como diferencial entre benefícios
previdenciários e acidentários meramente o título. Vale destacar que o auxílio-
doença acidentário ainda contém garantias trabalhistas importantes: a
manutenção do emprego pelo prazo mínimo de doze meses após a cessação do
benefício conforme o art. 118 da Lei 8.213/91; e o depósito na conta do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço, em razão do disposto na CLT, art. 4º, parágrafo
único.
Ocorre que ainda restava a disposição constitucional no art. 7º,
inciso XXVIII, que não estaria presente apenas estampado no custeio, Lei
8.212/91, art. 22, inciso II, sem qualquer benefício diferenciado.
Celso Barroso Leite, sempre favorável ao fim do seguro
diferenciado para acidentes do trabalho, em publicação de julho de 1998,
analisando uma proposta do Ministério da Previdência e Assistência Social
denunciava que a meta final parecia “ser o seguro privado de acidentes do
trabalho”, e salientava os “inconvenientes teóricos dessa solução, além dos
práticos”. Desta forma, defende que o seguro de acidentes do trabalho deve ficar
“embutido na previdência social”, que, por sua vez, deve ser sempre pública
106
.
Enfim, através da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de
dezembro de 1998, foi acrescentado o § 10 no art. 201 da Carta Magna, dispondo
que a “Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida
concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado”.
106
Celso Barroso LEITE, Seguro de acidentes do trabalho, RPS 212, p. 544.
72
Desta forma, entre a integração dos acidentes do trabalho nas
responsabilidades da previdência social, acompanhando a teoria do risco social, e
a responsabilidade patronal por um seguro específico, conforme a teoria do risco
profissional, surge a privatização do seguro de acidentes do trabalho, ainda
aguardando a regulamentação, existindo mais de uma dezena de projetos de lei
em tramitação no Congresso Nacional, com alguns merecendo observações.
As alterações da legislação ordinária indicavam a inclusão plena
do acidente do trabalho na teoria do risco social, com sua equiparação integral às
ocorrências não laborais, igualando os valores dos benefícios e
descaracterizando o auxílio-acidente. Porém, a determinação do art. 7º, XXVIII, da
Carta Magna, exige um diferencial, e, com o complemento presente na Emenda
Constitucional nº 20/98, é grande a possibilidade da privatização do seguro contra
acidentes do trabalho, talvez representando um retrocesso na matéria
infortunística. No Capítulo 3 se procederá a análise das mudanças, e no Capítulo
5 será apresentada rápida exposição dos projetos de lei em tramitação no
Congresso Nacional.
73
Capítulo 3: Análise da evolução legislativa
A legislação infortunística, com seu histórico exposto no Capítulo
2, relaciona-se diretamente com o seguro obrigatório contra acidentes do
trabalho, com referências ainda superficiais sobre a responsabilidade do
empregador, em caso de dolo ou culpa, além da garantia securitária obrigatória.
Assim, analisa-se neste Capítulo 3 o desenvolvimento desta legislação brasileira
específica, com a responsabilidade civil, recentemente definida enquanto
competência da justiça do trabalho, merecendo o Capítulo 4 e, no Capítulo 5, o
tópico 5.2.
Alinhavando desde o Decreto Legislativo nº 3.724, em 1919, o
despertar de tão importante garantia para os trabalhadores; passando pelo
Decreto-lei nº 24.637/34; com o desenvolvimento presente em especial no
Decreto-lei nº 7.036, de 1944, instituindo o seguro obrigatório e apontando para o
monopólio dos institutos previdenciários; e até o Decreto-lei nº 293, de efêmera
duração em 1967, estaria representada uma etapa (tópico 3.1).
A importante resposta do Congresso Nacional pela Lei nº
5.316/67 integrando o seguro de acidentes do trabalho, com a incorporação
definida pela Constituição Federal de 1969, também merece um exame próprio
até a Lei nº 6.367/76 (tópico 3.2).
A Lei nº 8.213/91, em sua redação original, regulamentando as
disposições da Constituição Federal de 1988, reflete os momentos da transição
democrática (tópico 3.3). As graves alterações pela Lei nº 9.032/95 (tópico 3.4) e
74
pela Medida Provisória 1.523-9/97 (tópico 3.5), apontam para a absoluta
integração do acidente do trabalho conforme a teoria do risco social.
E, finalmente, pela alteração constitucional em 1998, EC nº 20, o
seguro de acidentes do trabalho passará a ter a possibilidade do atendimento
concorrente entre o regime geral, público, e o setor privado, as seguradoras,
conforme a lei regulamentará. Prosseguirá um seguro diferenciado e sob
responsabilidade contributiva absoluta do empregador, acompanhando a teoria do
risco profissional, conforme a previsão constitucional de 1988, mas não mais com
o monopólio estatal estabelecido historicamente (tópico 3.6).
Seja considerado risco social ou risco profissional, o acidente do
trabalho continua presente no dia-a-dia dos trabalhadores. Conforme exposto no
Capítulo 1, tópico 1.1., sobre a Revolução Industrial, Friedrich Engels, prefaciando
em 1892 a importante obra em que analisa a situação da classe operária inglesa,
datada de 1845, admitia melhorias nas condições laborais durante um período
pouco menor do que cinco décadas.
Acontecia o que se poderia denominar conquistas das classes
trabalhadoras ou meras concessões das classes dominantes, e inclusive sendo
apenas para setores privilegiados, criando uma aristocracia na classe operária.
Porém, ocorrem avanços e recuos em quaisquer enfrentamentos, com o
capitalismo concedendo tão somente para evitar perdas de tempo, ou por uma
evolução humanitária com maiores exigências de dignidade no trabalho.
No presente momento político, retrocessos nos direitos sociais
ocorrem em diversas regiões do mundo. Com as transformações da legislação,
tanto na de caráter indenizatório quanto na relativa às prevenções de acidentes
ou doenças ocupacionais, marchas e contramarchas ficam demonstradas no
histórico da infortunística brasileira.
75
Tendo o Capítulo 2 descrito cada diploma legal infortunístico,
neste Capítulo 3 se analisa a evolução do ponto de vista da doutrina: se a
responsabilidade objetiva é da empresa empregadora ou da sociedade; se o
seguro obrigatório deve ser administrado pela autarquia pública ou pelas
seguradoras privadas; e se o benefício indenizatório a ser pago pela seguradora,
pública ou privada, deve ser por pagamento único ou por prestação mensal
continuada.
Sobre a forma de pagamento da indenização acidentária, vale
observar os reflexos que ocorrem no campo pessoal do acidentado e na
sociedade. No campo pessoal do acidentado, o debate é aguerrido, de 1919 até
os tempos atuais – um exemplo citado no Capítulo 2, item 2.1.5, é o entendimento
diferenciado de José Paulo Leal Ferreira Pires e de Tupinambá Miguel Castro do
Nascimento: enquanto o primeiro entende que a indenização por prestação
continuada “seria menos favorável ao trabalhador”, o segundo afirma ser “uma
solução mais justa (enfrentando) o problema da indenização no presente sem
olvidar o futuro”.
O pagamento único poderia parecer mais favorável apenas no
imediato, com valores vultosos, enquanto o pagamento mensal continuado deve
representar um substitutivo salarial em razão da redução na capacidade
laborativa do segurado.
Os reflexos da concessão dos benefícios acidentários na
sociedade estão na busca das mais corretas estatísticas da ocorrência de
acidentes do trabalho e moléstias ocupacionais, para conhecimento e elaboração
de políticas prevencionistas.
76
3.1 Do Decreto Legislativo nº 3.724/19 até o Decreto-lei nº
293/67, com a evolução pelo Decreto-lei nº 24.637/34 e a
importância do Decreto-lei nº 7.036/44
Fomentando a teoria do risco profissional, com base na
responsabilidade objetiva como fruto de uma época, conforme exposto no
Capítulo 2, o primeiro diploma infortunístico brasileiro, Decreto Legislativo nº
3.724/19, apresenta o auto-seguro, a indenização sob responsabilidade direta do
empregador, através de pagamento único. O período analisado neste tópico,
entre 1919 e 1967, representa a evolução razoavelmente linear até o Decreto-lei
nº 293/67, este com efêmera duração.
O Decreto-lei nº 24.637/34, solidifica a teoria do risco profissional
e amplia o campo de aplicação e o conceito de doença profissional. Foi
promulgado na primeira parte do período em que o Brasil foi governado por
Getúlio Vargas, antes do Estado Novo, com conquistas sociais para os
trabalhadores. Em especial exige garantias para a execução da indenização
acidentária, com os empregadores mantendo contrato de seguro ou ficando
obrigados a fazer um depósito, proporcional ao número de funcionários, e
podendo ser elevado até ao triplo, caso se trate de risco excepcional ou
coletivamente perigoso. Estava estabelecida uma garantia para o auto-seguro.
Com o Decreto-lei nº 7.036/44, o aperfeiçoamento do sistema
iniciado com as obrigatoriedades do Decreto-lei nº 24.637/34 termina com o auto-
seguro, tornando compulsório o contrato com uma seguradora. “Não com
qualquer companhia seguradora, mas com uma das companhias seguradoras
autorizadas a operar no ramo de seguros contra acidentes do trabalho”
107
.
107
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 178.
77
Sempre importa ressaltar que o Decreto-lei nº 7.036/44, mesmo
com adiamentos de suas disposições, apontava para a monopolização das
carteiras de acidentes do trabalho pelos institutos de previdência social, com o fim
da participação das seguradoras privadas.
Inclusive porque a forma de concorrência que se estabelecia entre
o setor privado e os institutos públicos era bastante desleal – conforme se
depreende dos ensinamentos de Anníbal Fernandes, valendo recordar a sua
militância no Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários enquanto
fiscal –, com as companhias privadas operando apenas com o bom risco,
restando as pedreiras que utilizavam dinamite enquanto clientela cativa do antigo
IAPI
108
. Nada mais justo do que o fim de tal concorrência.
Sobre as indenizações, os diplomas desta época dispunham a
“reparação-capital”
109
, mediante pagamento único, com raras disposições sobre
pagamentos mensais continuados, porém sempre temporários, com período
máximo de recebimento por um ano. Por outro lado, impedindo qualquer confusão
com os benefícios previdenciários, como aposentadoria por invalidez e pensão
por morte, plenamente cumuláveis com as indenizações decorrentes de acidentes
do trabalho ou seus equiparados. E o Decreto-lei nº 7.036/44 já previa a
cumulação também com uma indenização de direito comum, quando o acidente
ocorresse por dolo do empregador e de seus prepostos.
O Decreto-lei nº 293, de 28 de fevereiro de 1967 representou o
retrocesso em toda a história legislativa do acidente do trabalho no Brasil.
Saliente-se que, em clara contradição com o retorno da concorrência entre os
institutos públicos e as seguradoras privadas, inovava com o estabelecimento de
prestações mensais continuadas, como renda mensal por morte ou complemento
à aposentadoria por invalidez, conforme descrito no Capítulo 2, item 2.1.4. Em
108
Cf. Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 114.
109
Os termos “reparação-capital” e “reparação-pensão”, utilizadas diversas vezes neste Capítulo 3,
representam respectivamente a indenização em pagamento único e a indenização através de prestação
mensal continuada e constam no trabalho de Marco Fridolin Sommer SANTOS, Acidente do trabalho entre a
seguridade social e a responsabilidade civil, p. 51, citado no Capítulo 2, item 2.1.1.
78
resposta à retrogradação disposta em tal decreto, o Congresso Nacional aprovou
a Lei nº 5.316, em 14 de setembro de 1967, que “integra o seguro de acidentes do
trabalho na previdência social, e dá outras providências”.
79
3.2 A Lei nº 5.316/67, a incorporação do Seguro de Acidentes
do Trabalho à Previdência Social na Constituição Federal em
1969, até a Lei nº 6.367/76
Naquele momento político, em meados de 1967, a refutação pelo
Congresso Nacional do retrocesso exposto no Decreto-lei nº 293 daquele mesmo
ano, também acabava com a dubiedade representada pela diretriz do Decreto-lei
nº 7.036/44, o monopólio do seguro contra acidentes do trabalho nos institutos de
previdência social, com aplicação em prazos sempre adiados. A Lei 5.316, de 14
de setembro de 1967 “integra o seguro de acidentes do trabalho na previdência
social”, ou seja, monopoliza sua administração no recém-criado Instituto Nacional
da Previdência Social.
A lei acidentária, nº 5.316/67, com igual importância a da Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS, mereceu estudos históricos. Fernando
Figueiredo de Abranches publica em 1974 importante obra, Do seguro
mercantilista de acidentes do trabalho ao seguro social. O autor afirma que “esta
Lei não transformou o seguro de acidentes do trabalho em seguro social. Acenou
apenas com o princípio, adotando um sistema semelhante ao do seguro social
que, finalmente foi consagrado pela Constituição de 1969”
110
. Saliente-se que,
mesmo com esta pequena divergência de data com outros autores, adiando suas
considerações com base em norma constitucional, Abranches concorda que a Lei
nº 5.316/67 é o marco do seguro social.
A questão doutrinária fica resolvida com a Constituição de 1969,
mas segue em debate a teoria sobre a responsabilização relativa aos sinistros
laborais, se continua o risco profissional consagrado até ali ou se o acidente do
trabalho estaria integralmente absorvido como qualquer outro risco social,
passando ser responsabilidade de toda a comunidade. Prevalecendo a teoria do
110
Fernando Figueiredo de ABRANCHES, Do seguro mercantilista de acidentes do trabalho ao seguros
social, p. 22.
80
risco profissional, sob responsabilidade patronal (conforme consta explicitamente
no art. 7º, inciso XXVIII, da atual Carta Magna), aglutinam-se contraditas entre a
estatização do seguro, com o pagamento de indenizações por prestações
mensais continuadas (quiçá vitalícias), e a sua privatização, com o retorno de
indenizações mediante pagamentos únicos, valendo pensamentos que mesclem
as idéias.
Abranches destaca que a existência de contribuição diferenciada
para o seguro de acidentes do trabalho não impede sua inclusão no seguro social,
e, quando reclama sobre a falta de regulamentação dos ditames da Lei nº
5.316/67, aproveita para defender, fundamentado na teoria do risco social, que “o
custeio do seguro social contra acidentes do trabalho será o da contribuição
tripartida da União, do empregador e do empregado”
111
.
A integração entre o seguro de acidentes do trabalho e a
previdência social torna então inacumuláveis benefícios previstos na Lei Orgânica
da Previdência Social com os de mesmo nome dispostos na lei acidentária
(pensão por morte, aposentadoria por invalidez e auxílio-doença), porquanto
estariam substituídos pelos de melhor valor. Conservam-se ainda indenizações
por pagamento único, denominadas pecúlios, em pequenos valores na ocorrência
de reduções mínimas na capacidade laboral e em valor máximo em casos de
morte ou invalidez quando os benefícios previdenciários, pensão ou
aposentadoria, forem iguais ou superiores a 90% do valor do benefício do mesmo
nome previsto na lei acidentária.
111
Fernando Figueiredo de ABRANCHES, Do seguro mercantilista de acidentes do trabalho ao seguros
social, p. 39-40:
“O prejuízo, na ausência de regulamentação, no sentido de fixação do custeio, é dos empregados,
dos empregadores e do INPS.
Para os primeiros seria uma injustiça aguardar-se a providência, porque o novo sistema é muito
mais benéfico para eles e seus dependentes. E, se foi instituído em seu favor, seria um contra-senso que a
demora lhes fosse prejudicial.
Para os empregadores, seria injusto, por igual, porque, antes, a responsabilidade pelos riscos era
exclusivamente sua, e, pelo seguro social, na concepção da Constituição atual, passou a ser da
comunidade”.
81
A Lei 6.367, de 19 de outubro de 1976, entrando em vigor no dia
1º de janeiro de 1977, confirma o seguro de acidentes do trabalho integrado no
sistema previdenciário, sob responsabilidade do Instituto Nacional de Previdência
Social, INPS, mas ainda enquanto seguro diferenciado. Um seguro diferenciado
tanto em relação aos benefícios como para o custeio, embora a contribuição,
diferenciada e sob responsabilidade exclusiva do empregador, represente apenas
uma sobretaxa, observando um caixa único para o custeio e benefício de todo o
sistema previdenciário.
Quanto ao custeio, a Lei nº 6.367/76 atende bastante ao previsto
por Abranches. Assim, leciona Anníbal Fernandes:
Quanto ao custeio a Lei nº 6.367 declara que será atendido (o
seguro de acidentes do trabalho) pelas atuais contribuições previdenciárias; é o
encargo dos trabalhadores, da empresa e da União, com mais um acréscimo,
incidente sobre a folha de contribuição
112
.
No tocante aos benefícios, consolida-se a indenização através de
prestação mensal continuada, que se poderia distinguir como “reparação-pensão”,
seja substituindo o benefício previdenciário com bases mais favoráveis, seja
enquanto auxílio-suplementar e auxílio-acidente; e ainda restam os pecúlios,
memorando as indenizações da legislação anterior, em pagamento único, a
“reparação-capital”, nos casos de invalidez ou morte, respectivamente ao
segurado acidentado ou aos seus dependentes
113
.
Assim, ao final do período militar ditatorial, o seguro de acidentes
do trabalho estava incluído no sistema previdenciário estatal, sob a
responsabilidade do Instituto Nacional de Previdência Social, mas diferencial, com
benefícios mais favoráveis aos trabalhadores e com contribuições específicas
para as empresas empregadoras.
112
Anníbal FERNANDES, Comentários à CLPS, p. 180.
113
Vide nota 108, cf. Marco Fridolin Sommer SANTOS, Acidente do trabalho entre a seguridade social e a
responsabilidade civil, p. 51.
82
A lei então vigente era a Consolidação das Leis da Previdência
Social, Decreto nº 89.312, de 23 de janeiro de 1984, trazendo a Lei 6.367/76, e
assim, mantendo como fundamento jurídico a “Teoria do Risco Profissional, com
acentuada tendência à Teoria do Risco Social”
114
.
Firmava-se o monopólio estatal do seguro contra os acidentes do
trabalho, integrando-o aos riscos sociais cobertos pela previdência social, mas
com alguns diferenciais que conservaram – sem qualquer mensuração – a
responsabilidade objetiva do empregador, a teoria do risco profissional.
Consolidava-se também o sistema de indenizações por benefícios
de prestação continuada: ou em substituição aos previdenciários, porque mais
favoráveis; ou tipicamente indenizatórios pela redução na capacidade laboral. As
indenizações em pagamento único restaram apenas enquanto pecúlios por
invalidez ou morte.
114
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, p. 120.
83
3.3 A Lei nº 8.213, de 24/07/91, regulamentar das normas
constitucionais de 1988, em sua redação original
A Constituição Federal promulgada em 05 de outubro de 1988,
com a reinstalação do estado de direito, confirmou a Teoria do Risco Profissional,
com acentuada tendência à Teoria do Risco Social. Ampliou o caráter protetor do
seguro de acidentes do trabalho, confirmando o monopólio estatal, dispondo que
os planos de previdência social devem atender inclusive aos acidentes do
trabalho, mas também determinando a obrigação exclusiva do empregador em
relação ao seguro obrigatório, e ainda sem impedir que o empregador tenha que
indenizar quanto incorrer em dolo ou culpa. A responsabilidade civil, matéria
também bastante atual, é objeto do Capítulo 4.
Sobre acidentes do trabalho, a redação original das Leis 8.212 e
8.213, de 24 de julho de 1991, respectivamente relativas ao custeio e aos
benefícios, dava continuidade à evolução, conforme bem demonstrado na Carta
Magna de 1988. Para a contribuição de exclusiva responsabilidade do
empregador, mantinha a idéia de risco leve, risco médio e risco grave; e para os
benefícios, ficavam mantidos os substitutivos da remuneração (auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez e pensão por morte) com valores mais favoráveis do
que os mesmo tipos previdenciários, além da indenização pela redução na
capacidade laboral através do auxílio-acidente e dos pecúlios por invalidez ou
morte.
A Constituição Federal de 1988, pela ótica de Wagner Balera, em
artigo citado no Capítulo 2, item 2.1.7, admitiria no art. 7º, XXVIII, “a criação de
carteira autônoma que teria por exclusiva função a de operar o seguro obrigatório
contra acidentes do trabalho”, mesmo com o art. 201 incluindo prestações
84
relativas aos acidentes do trabalho
115
. De qualquer forma, até a Emenda
Constitucional nº 20/98 a privatização do SAT ainda não parecia inevitável.
Não sendo o custeio objeto deste trabalho, desnecessário tecer
considerações sobre os percentuais e riscos diferenciados e mesmo as novidades
a partir da Lei 10.666/03; considerações que exigiriam diversos estudos, inclusive
comparativos da contribuição exclusiva do empregador e os gastos em benefícios
decorrentes de acidentes do trabalho e seus equiparados, como os que se
realizam atualmente para a regulamentação do FAP, Fator Acidentário
Previdenciário.
O Fator Acidentário Previdenciário, conforme a Lei nº 10.666, de 8
de maior de 2003, em seu art. 10, possibilitará reduzir “em até cinqüenta por
cento” ou aumentar “em até cem por cento” a “alíquota de um, dois ou três por
cento” previsto na Lei nº 8.212/91, art. 22, inciso II. Portanto, a contribuição
exclusiva do empregador relativa ao Seguro de Acidentes do Trabalho, sob
responsabilidade do Instituto Nacional de Seguro Social, poderá ser dobrada ou
diminuída para a metade, “conforme dispuser o regulamento, em razão do
desempenho da empresa em relação à respectiva atividade econômica, apurado
em conformidade com os resultados obtidos a partir dos índices de freqüência,
gravidade e custo, calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho
Nacional de Previdência Social”.
Em relação aos benefícios, a Lei 8.213/91, na redação original,
determinava cálculos bem mais favoráveis aos acidentários em relação aos
benefícios previdenciários e ampliava o auxílio-acidente, devido exclusivamente
em razão das seqüelas após a consolidação das lesões decorrentes de acidente
do trabalho ou doença ocupacional.
Na primeira redação estava mantida a base de cálculo mais
favorável para os benefícios acidentários: o salário-de-benefício ou o salário-de-
115
Wagner BALERA, A reprivatização do Seguro de Acidente do Trabalho, RPS 146, p. 26.
85
contribuição do dia do acidente. O salário-de-benefício, base comum de cálculo
para os benefícios previdenciários, é sempre uma média contributiva, cuja fórmula
de cálculo sofreu alterações substanciais. A idéia de valor mais favorável se
relaciona bastante com a forma de cálculo do salário-de-benefício.
Conforme o Decreto nº 89.312/84, a Consolidação das Leis da
Previdência Social, em seu art. 21, inciso I, o salário-de-benefício para o auxílio-
doença, a aposentadoria por invalidez, a pensão por morte e o auxílio-reclusão,
era “1/12 (um doze avos) da soma dos salários-de-contribuição dos meses
imediatamente anteriores ao do afastamento da atividade até o máximo de 12
(doze), apurados em período não superior a 18 (dezoito) meses”. Ou seja, o
benefício era calculado sobre a média dos doze últimos salários sem qualquer
atualização monetária. Bastante evidente que naqueles tempos, com o salário-de-
benefício calculado nesta falsa média do último ano, sem correção monetária das
parcelas utilizadas, o valor mais favorável dificilmente não seria o do último
salário-de-contribuição, especialmente com índices inflacionários bem maiores
que os da atualidade.
Com a promulgação da Constituição Federal em 05/10/1988 a
média falsa, sofrendo todas as perdas inflacionária, tornou-se inconstitucional. A
Carta Magna, em seu art. 201, § 3º (mesmo com redação diferenciada a partir da
Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998), exige que todos os salários-de-
contribuição considerados no cálculo de benefício sejam devidamente
atualizados. E a Lei 8.213/91, em sua redação original, obedecendo à norma
constitucional sobre a correção monetária, dispôs, no art. 29, a média dos últimos
salários-de-contribuição, “até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período
não superior a 48 (quarenta e oito) meses”. Desta forma, a média dos últimos três
anos, com todas as parcelas devidamente atualizadas, ficou bem próxima do
último salário, algumas vezes inclusive ultrapassando-o.
O salário-de-benefício constituindo uma média mais justa, a base
de cálculo mais favorável para os benefícios acidentários, prevista no art. 28, § 1º,
86
da Lei 8.213/91, perdia bastante de sua importância. Assim, a Lei nº 9.032/95
revogou esta determinação, sem causar muitas comoções.
Portanto, quando o salário-de-benefício adquiriu a atual forma de
cálculo – pela Lei 9.876, publicada em 29 de novembro de 1999, é a média dos
maiores salários que representem 80% de todos desde julho de 1994 – a base de
cálculo mais favorável para os benefícios acidentários já havia sido retirada.
Quando decorrentes de acidentes do trabalho, além da base mais
favorável, o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez tinham o percentual
máximo, 92% e 100%, respectivamente, qualquer que fosse o tempo de
contribuição do acidentado, e a pensão por morte eqüivaleria a 100%, com
qualquer número de dependentes. Estavam assim diferenciados os benefícios
acidentários dos comuns, dos previdenciários, estes sempre calculados com base
na média, no salário-de-benefício, e com percentuais que levavam em
consideração o tempo de contribuição ou o número de dependentes, conforme
exposto no Capítulo 2, item 2.1.8.
O auxílio-acidente disposto no art. 86 substituía dois benefícios da
legislação anterior: o auxílio-acidente e o auxílio-suplementar. Pela Lei 8.213/91 o
benefício era mensal e vitalício, em três percentuais diferentes, 30%, 40% ou
60%, para os diferentes graus de redução na capacidade laboral.
Valores mais favoráveis para os benefícios acidentários, com
cobertura contributiva exclusiva por parte do empregador, relacionam-se à teoria
do risco profissional, mesmo que o monopólio estatal represente a inclusão do
seguro especial ao sistema previdenciário. Mas, além disso, também representam
motivos para a maior exigibilidade das devidas comunicações de acidentes e, em
especial, da admissão dos nexos de causalidade nas moléstias ocupacionais.
A reparação e principalmente a prevenção de acidentes do
trabalho e seus equiparados, dependem diretamente do conhecimento. E assim,
87
maior discernimento sobre os graus das seqüelas não apenas define melhor a
indenização mensal mais justa como também possibilita melhor conhecimento e
conseqüente prevenção.
Em obra recente, Sebastião Geraldo de Oliveira apresenta um
quadro com dados oficiais sobre acidentes do trabalho, de 1975 a 2003
116
, e é
bastante interessante observar as reduções e suas relações com as alterações na
legislação infortunística:
É importante mencionar que a estatística oficial é feita com base
nas informações prestadas pelo empregador sobre o acidente. Todavia, é
grande a quantidade de ocorrências que não são notificadas , por ignorância
dos envolvidos, por receio das conseqüências ou por falta de registro formal do
trabalhador. Avalia-se que os registros só atingem 50% dos acidentes
efetivamente ocorridos, principalmente a partir de 1991, quando o art. 118 da
Lei n. 8.213 instituiu a garantia de emprego por doze meses, após a cessação
do auxílio-doença acidentário.
Um forte sinal da subnotificação pode ser observado no
descompasso estatístico entre os acidentes registrados e a quantidade de
mortes. Enquanto o número de acidentes nos últimos trinta anos teve redução
significativa, o volume de mortes manteve-se elevado; por ocorrer a ocultação
do acidente do trabalho, mas é muito difícil omitir um óbito...
117
116
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Indenizações por acidentes do trabalho ou doença ocupacional, p. 27-
28.
117
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Indenizações por acidentes do trabalho ou doença ocupacional, p. 28-
29:
“As entidades sindicais não acreditam nas reduções estatísticas dos últimos anos e demonstram
desconfiança dos índices oficiais. Alegam que estão encontrando dificuldades para o reconhecimento das
doenças ocupacionais pelos empregadores e junto à perícia médica do INSS, tanto que é visível o aumento
das demandas judiciais buscando o enquadramento da patologia como doença ocupacional.
Apesar dessas ponderações, é mesmo provável que se esteja consolidando uma tendência de
cuidado maior dos empresários com a questão da saúde do trabalhador. A pressão sindical, as repercussões
negativas na mídia, as atuações do Ministério Público do Trabalho e da Inspetoria do Ministério do Trabalho
e, especialmente, as indenizações judiciais estão promovendo mudanças no gerenciamento desse tema.
Auditorias especializadas já mensuram o chamado ‘passivo patológico’ das organizações, comprovando que
o investimento na prevenção de acidentes e doenças reflete-se positivamente no balanço, com reflexo na
avaliação mercantil da empresa”.
88
O art. 118 da Lei 8.213/91 (continua vigente), com a garantia de
um ano de emprego para o acidentado, como observa Sebastião Geraldo de
Oliveira, acaba contribuindo para a subnotificação dos acidentes e doenças
laborais.
Benefícios mais favoráveis e o auxílio-acidente exclusivamente
para seqüelas resultantes de acidentes do trabalho e seus equiparados ainda
auxiliavam na alimentação de estatísticas mais próximas da realidade.
Além dos benefícios de prestação continuada, substitutivos da
remuneração ou indenizatórios da diminuição na capacidade laboral, a redação
original da Lei nº 8.213/91 mantinha os pecúlios, sobreviventes da “reparação-
capital”, das indenizações em pagamento único, para o segurado inválido ou para
os dependentes do segurado falecido, somente quando em decorrência de
acidente do trabalho.
Em suma, a redação original da Lei 8.213/91, em relação aos
acidentes do trabalho, notadamente quanto às indenizações, coroava o caráter de
seguro especial dando continuidade à Lei nº 5.316, editada em 1967. Mantinha a
contribuição suplementar exclusiva do empregador (que ainda persiste), com as
indenizações principais em prestações mensais continuadas com razoável grau
de diversidade em razão da lesão – auxílio-doença, aposentadoria por invalidez,
pensão por morte e auxílio-acidente em três percentuais, 30%, 40% ou 60%, pela
ordem da perda funcional, além dos pecúlios por invalidez ou morte em
pagamento único.
Desta forma, seguia válida a teoria do risco profissional, mesmo
que com acentuada tendência à teoria do risco social, acompanhando a análise
que Teresinha Saad apresentava para a Lei nº 6.367/76
118
. A inclusão do acidente
do trabalho enquanto risco social tem sido o desenvolvimento doutrinário, como
se observa no Capítulo 1, item 1.2; porém, a Constituição Federal brasileira
118
Cf. Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, p. 120.
89
dispõe em seu art. 7º, inciso XXVIII, um seguro contra acidentes do trabalho, sob
responsabilidade do empregador. Como expõe Wagner Balera, “o risco do
acidente, posto em cotejo com os demais riscos sociais, foi objeto de tratamento
distinto pelo constituinte”
119
. Portanto, com todas as pretensões de implantação
integral da teoria do risco social, a garantia constitucional exige um seguro próprio
com base na responsabilidade patronal, acompanhando a teoria do risco
profissional.
Com as transformações que são analisadas nos próximos tópicos,
vale observar a aplicabilidade das duas teorias para os acidentes do trabalho, do
risco profissional e do risco social, de forma híbrida, com o cruzamento de duas
espécies diferentes.
Os benefícios acidentários mais favoráveis ou exclusivos,
conforme dispostos na Lei nº 8.213/91, em sua redação original, eram um bom
motivo para que trabalhadores exigissem a necessária comunicação do acidente.
As condições de trabalho, em especial as práticas industriais, demonstram que os
acidentes do trabalho que não são comunicados são os que vão acontecer de
novo; e na maior parte das vezes com resultados mais graves.
A prevenção dos acidentes do trabalho de forma alguma poderia
ficar restrita aos índices que se constróem com a concessão de benefícios
acidentários. O direito da segurança e saúde dos trabalhadores já conquista
autonomia acadêmica e a indenização segurada nem mesmo corresponderia a
punição do empregador. Porém, enquanto para boa parcela de empregadores a
ocultação de acidentes do trabalho pode representar substancial lucro no
mercado (além das possibilidades de redução da própria contribuição obrigatória
do seguro de acidentes do trabalho, através do FAP, Fator Acidentário
Previdenciário, conforme exposto acima), o fim dos benefícios acidentários mais
favoráveis ou exclusivos contribuem de forma inequívoca para o crescimento das
subnotificações de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais.
119
Wagner BALERA, A reprivatização do Seguro de Acidente do Trabalho, RPS 146, p. 26.
90
3.4 As alterações pela Lei nº 9.032, de 28/04/95
Em 28 de abril de 1995 estava aprovada pelo Congresso
Nacional, com bastante rapidez, a lei que elevava o salário mínimo de setenta
para cem reais, alterando substancialmente a Lei de Benefícios da Previdência
Social, 8.213/91, especificamente em relação aos acidentes do trabalho.
A mais importante alteração nas normas infortunísticas foi a
equiparação dos cálculos para os benefícios acidentários e comuns.
Extingue-se a base mais favorável, salário-de-benefício ou
salário-de-contribuição do dia do acidente, quando a diferença entre eles deixara
de ter grande importância, como demonstrado no item 3.3.
Antes da Constituição Federal de 1988 o salário-de-benefício para
auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte era sempre sobre
a média reduzida, dos últimos doze salários-de-contribuição sem a correção
monetária. Portanto, na quase totalidade das vezes, o salário-de-contribuição do
dia do acidente teria valor superior à média denominada salário-de-benefício.
Com a exigência constitucional de atualização monetária para todas as parcelas
utilizadas na média, a diferença diminuiu consideravelmente, muitas vezes até
ocorrendo ao contrário, com a média sendo superior ao último salário.
Atualmente, com a alteração do art. 29 da Lei 8.213/91 através da
Lei 9.876/99, o salário-de-benefício é a média dos maiores salários-de-
contribuição que representem 80% de todo o período contributivo, iniciando tal
contagem na competência de julho de 1994 (regra de transição, art. 3º da Lei
9.876/99), conforme exposto no Capítulo 2, item 2.1.8. E esta é a forma de
cálculo, média de 80% de todo o período contributivo, para todos os benefícios de
prestação continuada, inclusive os decorrentes de acidentes do trabalho.
91
Eleita uma base única para todos os benefícios, o auxílio-doença
e a aposentadoria por invalidez passam a valer respectivamente 91% e 100% do
salário-de-benefício, sejam acidentários ou previdenciários e pouco importando o
tempo de contribuição (além dos períodos de carência), e a pensão por morte
passa a representar 100% da base, sem importar se era acidentária ou não, bem
como qual o número de dependentes.
Atualmente a integralidade do valor da pensão por morte, 100%
da aposentadoria do segurado falecido independentemente do número de
dependentes que receberão o benefício, suscita ações judiciais em que se tenta a
equiparação deste percentual máximo para as pensões concedidas nos tempos
em que a lei determinava percentuais inferiores.
Para as aposentadorias por invalidez e pensões por morte, a
equiparação dos valores torna os títulos acidentários de menor importância, talvez
alguma para fundamentar recebimento de seguro privado ou para ajuizamento de
ação indenizatória contra a empresa empregadora. Quanto ao auxílio-doença
acidentário resta o depósito do FGTS durante o tempo de afastamento (CLT, art.
4º, parágrafo único) e principalmente a garantia de emprego por um ano (Lei
8.213/91, art. 118); porém, como bem aponta Sebastião Geraldo de Oliveira, esta
garantia é uma das grandes razões de subnotificações de acidentes do trabalho,
para a fuga das responsabilidades.
Os pecúlios, resquícios das indenizações em pagamentos únicos
que estavam previstos nos artigos 81 e 83 da Lei 8.213/91, são revogados,
eliminando uma característica securitária da legislação primeva.
No auxílio-acidente, disposto no art. 86 da Lei 8.213/91, as
alterações foram doutrinárias. A primeira mudança no caput transforma o
benefício em indenizatório para seqüelas que impliquem em redução da
capacidade funcional, porém decorrentes de acidentes de qualquer natureza, não
mais exclusivo para acidentes do trabalho e seus equiparados. Estariam
92
desnecessários os conceitos estampados nos artigos 19, 20 e 21 da Lei de
Benefícios. No § 1º do art. 86, a Lei 9.032, no lugar dos três percentuais, 30%,
40% e 60%, passou a constar “50% (cinqüenta por cento) do salário-de-benefício”
para qualquer hipótese.
O art. 124 da Lei 8.213/91, apresenta a lista dos benefícios cujo
recebimento conjunto não é permitido, salientando-se que consta no caput a
garantia ao direito adquirido. Nesta lista das inacumulabilidades, a Lei 9.032/95
incluiu, em seu inciso V, a proibição do recebimento de “mais de um auxílio-
acidente”.
Como se observa, nas primeiras alterações, através da Lei
9.032/95, o auxílio-acidente foi transformado em indenização por acidente de
qualquer natureza, calculado sempre em 50% do salário-de-benefício, e passando
a ser impedido o percebimento de mais de um benefício desta espécie. Não mais
se pensava em diferentes reduções da capacidade laborativa ou qualquer
indicativo sobre os sofrimentos do trabalhador brasileiro, bem ao contrário, o que
se programa é o esquecimento. Além de firmar um percentual só e classificar a
origem da lesão a ser indenizada como acidente de qualquer natureza, a
legislação também passa a impedir o recebimento de benefícios diversos para
ocorrências diferentes. Grave contradição com a história e a tradição legislativa
de nosso país.
É preciso destacar que receber mais do que um benefício de
prestação continuada em decorrência do mesmo acidente do trabalho nunca foi
possível. O trabalhador acidentado recebe o auxílio-doença enquanto estiver
impossibilitado de trabalhar; se confirmada a sua invalidez terá a conversão do
auxílio-doença em aposentadoria por invalidez, enquanto se receber alta,
havendo seqüelas redutoras de sua capacidade laboral, teria direito ao auxílio-
acidente.
93
Para o acidentado que retorna ao trabalho recebendo auxílio-
acidente o agravamento da seqüela do acidente ou da moléstia ocupacional,
colocando-o absolutamente incapacitado, obriga à conversão do auxílio-acidente
já concedido em aposentadoria por invalidez, mas sem cumular os dois
benefícios. Para o mesmo acidente cabe apenas um benefício, seja auxílio-
doença acidentário, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez acidentária ou
pensão por morte acidentária.
Porém, seqüelas causadas por acidentes diversos podiam gerar
mais de um benefício acidentário, indenizando o trabalhador essencialmente
pelas perdas laborais causadas pelos diferentes sinistros relacionados ao
trabalho. Pois a Lei nº 9.032/95 incluiu o auxílio-acidente no impeditivo artigo 124
da 8.213/91, deixando de ser permitido o recebimento de mais de um. Importante
salientar o início do caput do referido artigo: “Salvo no caso de direito adquirido,
não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios ...”.
Consolidava-se, com estas primeiras transformações, a inclusão
do acidente do trabalho enquanto risco social, sem qualquer diferenciação para os
acidentes do trabalho e seus equiparados, entre eles as doenças ocupacionais.
94
3.5 A Medida Provisória nº 1.523-9, de 27/06/97, a Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/97, e a descaracterização do
Auxílio-Acidente
Antes de avaliar o benefício indenizatório acidentário e sua
descaracterização, cabe registrar uma contradição que durou muito pouco sobre a
inacumulabilidade de pensão e aposentadoria. A MP nº 1.523-9/97, incluiu o
inciso VII no art. 124 da Lei 8.213/91, dispondo o impedimento de percebimento
dos dois benefícios, sob a alegação de que a pensão estaria alçada a substituta
integral da remuneração do segurado. Ressalva-se o direito à opção pelo
benefício mais vantajoso.
Tal inacumulabilidade durou poucos dias: nascida em 27 de junho
de 1997, foi revogada pela Medida Provisória nº 1.473-33, em 11 de julho de
1997, sem completar nem um mês, triunfando o entendimento sobre a
característica contributiva da previdência brasileira, com contribuições diversas
gerando benefícios diferentes. A pensão por morte é decorrente das contribuições
do segurado falecido, enquanto a aposentadoria, qualquer que seja a espécie,
decorre da contribuição do próprio segurado. Mesmo sendo benefícios do mesmo
sistema, o caráter contributivo do regime previdenciário brasileiro não admitiu a
inacumulabilidade intentada naquela medida provisória. Durou pouco tempo este
ensaio, mas o suficiente para a imprensa da época apelidá-lo de “MP Mata-
Viúva”
120
.
Ainda pela MP nº 1.523-9/97 foi embutido um § 4º no art. 86
(descrito no Capítulo 2, item 2.1.8), tentando conter as concessões de auxílio-
acidente em decorrência da surdez profissional, enquanto na redação original o
que estava previsto era a incorporação de metade do benefício na pensão na
120
Cf. Folha de S. Paulo, 14/07/1997, Painel, p. A4.
95
ocorrência do falecimento do segurado ou de sua integralidade no caso de ocorrer
o falecimento por outro acidente do trabalho.
Deste modo, pela redação atual do § 4º do art. 86, nos casos de
perda da audição, disacusia neurosensorial bilateral, a concessão do auxílio-
acidente só poderia ocorrer quando, além do reconhecimento do nexo causal
entre o trabalho e a doença, “resultar, comprovadamente, na redução ou perda da
capacidade para o trabalho que habitualmente exercia”.
Ora, os tribunais já haviam consolidado a concessão do benefício
acidentário, com a determinação da restrição médica para que o trabalhador não
atinja a denominada surdez social, mesmo que o segurado se apresente com
grau mínimo. O que importa são as possibilidades de agravamento da moléstia e
não o grau em que se encontra. A legislação meramente indenizatória e sem
qualquer ânimo preventivo, como pretende a autarquia previdenciária nas ações
acidentárias em que litiga, não encontra aceitação nos julgados. Portanto, mesmo
que a disacusia neurosensorial bilateral que acomete o trabalhador não reduza
sua capacidade laborativa, se for necessário a sua retirada do ambiente ruidoso
para que o agravamento da surdez não aconteça, ele terá direito ao auxílio-
acidente. Além de alguns julgados expostos no Capítulo 5, tópico 5.1.1, vale
destacar a Súmula nº 44, do Superior Tribunal de Justiça, com plena
aplicabilidade:
Súmula nº 44, STJ
A definição, em ato regulamentar, de grau mínimo de disacusia,
não exclui, por si só, a concessão do benefício previdenciário.
Na continuidade das versões desta medida provisória, até com
mudança de número, a data da Medida Provisória nº 1.596-14, 10 de novembro
de 1997, tornou-se importante, mesmo com a conversão na Lei 9.528, em data
96
bem próxima, 10 de dezembro de 1997. Importante porque pode ser o marco do
fim da vitaliciedade do auxílio-acidente.
O auxílio-acidente, que a redação original da Lei nº 8.213/91
destacava em três percentuais e sempre vitalício, perdeu todas as premissas
próprias de um seguro especial. Passa a ser devido enquanto indenização
quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer
natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o
trabalho que o segurado habitualmente exercia, e será pago de forma mensal,
correspondendo a cinqüenta por cento do salário-de-benefício, sendo devido até a
véspera do início de qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado.
E reforçando estes ditames da nova redação do § 1º do art. 86, em seu § 2º
destaca-se a proibição de cumulação do auxílio-acidente com qualquer
aposentadoria.
Anníbal Fernandes, lecionando sobre o tema, entendia que “a
igualização de regras e benefícios transforma em res nullius as normas da
Constituição que prevêem programas distintos para benefícios de origem
ocupacional (acidentário) ou não-ocupacionais (de previdência)”
121
.
Assim, estava absolutamente transmutado o benefício auxílio-
acidente, perdendo por fim a sua vitaliciedade.
Conforme exposto no Capítulo 2, item 2.1.8, a redação atual do
art. 31 da Lei 8.213/91, dispõe a integração do “valor mensal do auxílio-acidente”
no salário-de-contribuição, “para fins de cálculo do salário-de-benefício de
qualquer aposentadoria”. No lugar do caráter vitalício que a redação anterior
determinava, resta somar o valor mensal recebido como auxílio-acidente ao
121
Anníbal FERNANDES, Acidentes do trabalho: evolução e perspectivas, in Curso de direito previdenciário,
p. 133-134:
“Na nova redação da legislação transfigurada, o auxílio-acidente teria seu fim na ‘véspera do início
de qualquer aposentadoria’. Em que pesem as exemplificadas decisões do tribunal paulista contrárias à
inacumulabilidade do benefício acidentário com aposentadoria, as linhas legais lembram o poeta Augusto dos
Anjos, que em seus ‘Versos Íntimos’ bem avisava: ‘O beijo, amigo, é a véspera do escarro, A mão que afaga
é a mesma que apedreja...’”.
97
salário-de-contribuição utilizado para o cálculo da aposentadoria. Significa que se
o trabalhador estiver recebendo o auxílio-acidente durante todo o período
considerado para o cálculo da aposentadoria, então sim, terá o benefício
acidentário somado integralmente à sua aposentadoria.
Ocorre que o período contributivo a ser considerado para o
cálculo da aposentadoria, a partir da Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999,
passou a ser 80% de todo o tempo de contribuição, desde a competência de julho
de 1994, como consta no Capítulo 2, item 2.1.8.
Além do limite de contribuição, que não pode ser ultrapassado
pela soma dos valores do auxílio-acidente e do salário-de-contribuição, o período
básico de cálculo vai se tornando bastante longo, tornando difícil a integração do
auxílio-acidente na aposentadoria. Basta imaginar que apenas o trabalhador que
recebe seu auxílio-acidente desde data anterior a julho de 1994, em razão da
regra de transição contida no art. 3º da Lei 9.876/99, poderá ter o valor
integralmente incluído em sua aposentadoria; enquanto o auxílio-acidente com
início desta data de transição em diante terá participação cada vez menor no
cálculo das aposentadorias dos trabalhadores.
A inacumulabilidade entre dois auxílios-acidente mantém-se
impassível, no art. 124. Mas, a partir da MP 1.596-14/97, estaria também
determinado o fim do auxílio-acidente na véspera de qualquer aposentadoria e a
inacumulabilidade de aposentadoria e auxílio-acidente, suscitando muitos
entendimentos contraditórios.
As contradições podem ser divididas na data marco da
vitaliciedade do auxílio-acidente: 10/11/1997.
Até este dia os benefícios com a denominação auxílio-acidente,
mesmo concedidos pelo percentual único (50%) imposto através da Lei 9.032/95,
eram mensais e vitalícios, para durar a vida inteira. Portanto, os trabalhadores
98
que tiveram a Data de Início de seus Benefícios, DIB, anteriores a 10/11/1997,
receberam os benefícios enquanto vitalícios. Não seria a mudança posterior da lei
que poderia modificar tal característica. Afinal, a Constituição Federal garante, em
seu art. 5º, XXXVI, que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada”.
E a partir de 11/11/1997 fica estabelecida a mesma contradita que
impediu a continuidade da medida provisória chamada pela imprensa da época de
“MP Mata-Viúva”
122
. Por pouco tempo tal artifício proibiu o recebimento de pensão
e aposentadoria pelo mesmo segurado, sendo vencida pela alegação de que a
contributividade da previdência brasileira não admitiria proibição de cumulação de
benefícios com origens contributivas diversas. Pois, da mesma forma, o benefício
acidentário teria sua origem contributiva no seguro de acidentes do trabalho, sob
responsabilidade exclusiva do empregador, enquanto a aposentadoria por razão
diversa estaria coberta pela contribuição do sistema previdenciário, com
participação tripartite, empregador, empregado e União.
Sobre as divergências relativas ao tempo anterior à citada medida
provisória, não restam quaisquer razões aos que podem achar cancelada a
vitaliciedade presente na concessão. Infelizmente o Instituto Nacional do Seguro
Social prossegue efetuando cancelamentos de auxílios-acidente por ocasião da
concessão de aposentadoria, mesmo quando as datas de início dos benefícios
acidentários são anteriores a 10/11/1997, alegando que direito adquirido ao
recebimento dos dois benefícios seria apenas se os dois fossem com início
anterior à mudança legislativa...
Os tribunais não têm deixado dúvidas sobre a manutenção da
qualidade de vitalício para os auxílios concedidos quando a lei assim os
determinava; e, mais ainda, alguns julgados também entenderam que os
concedidos na vigência da lei modificada conservariam a qualidade de vitalícios;
ou porque compreendem que a proibição de cumulação seria apenas para auxílio-
122
Cf. Folha de S. Paulo, 14/07/1997, Painel, p. A4.
99
acidente com aposentadoria que tenha por fundamento o mesmo fato gerador, ou
porque apontam como inconstitucional a proibição de cumulação de benefícios
com origens contributivas diversas. Estes julgados são estudo do Capítulo 5, item
5.1.1.
Com a igualação dos benefícios previdenciários e acidentários e a
descaracterização do auxílio-acidente, além da extinção dos pecúlios
acidentários, poderão se reduzir substancialmente as ações acidentárias contra o
Instituto Nacional do Seguro Social, com a absoluta integração do acidente do
trabalho à teoria do risco social. Porém, estaria deixando de se cumprir o disposto
no art. 7º, XXVIII, da Carta Magna.
Para Celso Barroso Leite, em 1998, antes da promulgação da
Emenda Constitucional 20, o seguro de acidentes do trabalho, “com suas
conhecidas complicações” já teria desaparecido “do quadro de nossa proteção
social”
123
. As mudanças, a partir da Lei 9.032/95, desaparecendo com o seguro
de acidentes do trabalho, deixam sem resposta a disposição constitucional
determinante do seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, e
podendo aumentar consideravelmente a busca de uma reparação indenizatória
pelo direito comum em ações contra o empregador.
A Constituição Federal de 1988, quando, no art. 7º, inciso XXVIII,
determinava um seguro especial sob responsabilidade do empregador e, no art.
201, inciso I, dispunha a cobertura previdenciária dos eventos de doença,
invalidez e morte, inclusive os resultantes de acidentes do trabalho, bem
acompanhava, respectivamente, a teoria do risco profissional e a teoria do risco
social. Importante destacar, no Capítulo 1, item 1.2, Olea e Plaza, entendendo o
acidente do trabalho enquanto risco social, mas apontando o risco profissional
enquanto critério útil para imputação de responsabilidade em atividades perigosas
ou especiais
124
. E até mesmo William Beveridge, também citado no Capítulo 1,
123
Celso Barroso LEITE, Seguro de acidentes do trabalho, RPS, 212, p. 542.
124
OLEA e PLAZA, Instituciones de seguridad social, p. 117.
100
item 1.2, sem qualquer desvio na proposta de seguro social unificado, aceitava
uma indenização discriminada para morte ou incapacidade prolongada causada
por acidente do trabalho
125
.
A Constituição brasileira aplica as duas teorias, do risco
profissional e do risco social. A evolução entre elas não exige a suplantação
integral de uma teoria pela outra; mais salutar é admitir a convivência: com a
responsabilidade social, do sistema previdenciário, para com qualquer risco social
que possa impedir o segurado de manter sua atividade, e com o seguro especial
indenizatório contra acidentes do trabalho, de responsabilidade contributiva
apenas da empresa empregadora.
Enquanto a previdência social garante a substituição da
remuneração de forma a manter o incapacitado em condições dignas e próximas
das que tinha em atividade, o seguro de acidentes do trabalho pode dispor um
suplemento, como representavam os diferenciais favoráveis nos benefícios
auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, e o auxílio-
acidente para os que retornavam à atividade. Administração concorrencial ou
apenas pública, indenizações em pagamento único ou benefícios em prestações
continuadas são questões que ainda não estavam em voga naquele momento.
Era pacífico que o seguro contra acidente do trabalho, obrigação patronal
ordenada pela Constituição Federal, deveria ser administrado pelo Instituto
Nacional do Seguro Social, pagando indenizações em prestações mensais
continuadas e vitalícias.
Anníbal Fernandes destaca que o trabalho é o maior valor social
“e especialmente contemplado na Constituição de 1988”, e sendo assim:
(...) somente fará sentido a reparação da infortunística ou a
indenização civil que restitua a vítima à situação anterior o mais amplamente
possível; certamente em posição melhor do que as vítimas de danos de origem
125
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 63.
101
não ocupacional. A razão, sic et simpliciter, é que o sinistro decorreu do
trabalho
126
.
A garantia constitucional do art. 7º, XXVIII, não estará
regulamentada se as igualações dos benefícios previdenciários e acidentários na
prática extinguem o seguro de acidentes do trabalho. Da mesma forma, também
na prática, pode ocorrer a substituição da indenização mais ampla possível,
através de um seguro obrigatório e especial, por uma indenização por culpa
simples, culpa contratual com o ônus de prova do empregador, através da ação
indenizatória por parte do empregado, agora sob a competência da Justiça do
Trabalho.
E a solução mais imediata apresentada em reforma constitucional
foi um novo seguro contra acidentes do trabalho, com atendimento, em
concorrência, pelo regime geral de previdência social, representado pelo INSS, e
pelo setor privado.
Novamente em debate: o acidente do trabalho foi incluído na
teoria do risco social, igualado a todos os outros sinistros que merecem
atendimento do regime geral de previdência social (art. 202, CF), a partir da
equiparação de todos os benefícios (Lei 9.032/95 e seguintes); e, ao mesmo
tempo, em obediência ao disposto no art. 7º, XXVIII, da mesma CF, fica mantido o
seguro contra acidentes do trabalho conforme a teoria do risco profissional.
Porém, agora, conforme o art. 201, § 10, da Carta Magna, redação pela Emenda
Constitucional nº 20, de 15/12/1998, será um seguro em que concorrerão para a
sua administração o instituto púbico e as seguradoras privadas; e possivelmente
com o retorno às indenizações em pagamento único, com regras iguais para
qualquer companhia seguradora, dispostas em legislação e decretos
regulamentadores.
126
Anníbal FERNANDES, Os acidentes do trabalho, p. 262.
102
3.6 A alteração constitucional de 15/12/98, ainda não
regulamentada
Em princípio de 1993, Wagner Balera, em artigo citado no
Capítulo 2, apontava que o constituinte determinara “de modo expresso, (...) a
institucionalização de plano especial e específico de custeio e de prestações
acidentárias”. E admitia que a definição de “nova carteira de acidente, desatrelada
do plano básico da seguridade, e custeada exclusivamente pela empresa não
afrontaria (...) a dicção constitucional que rege tal matéria”. Defendeu através da
relevância pública do seguro de acidentes do trabalho e de sua administração, a
possibilidade da participação de seguradoras privadas neste seguro obrigatório.
Assim, a reprivatização da carteira de seguro contra acidentes do trabalho seria
tutelado pelo Estado, como todo o sistema de seguridade social, e com ele
definindo “linhas genéricas do vinculum iuris que irá relacionar a empresa com a
entidade seguradora”
127
.
Contra o seguro especial, diversificado, Celso Barroso Leite
criticou, em 1998, uma proposta do Ministério da Previdência e Assistência Social,
MPAS, com a meta final parecendo “ser o seguro privado de acidentes do
trabalho”, ressaltando inconvenientes teóricos e práticos para tal solução.
Defendeu seu entendimento notório de que o simples restabelecimento do seguro
127
Wagner BALERA, A reprivatização do Seguro de Acidente do Trabalho, RPS 146, p. 25-27:
“Ao ser investido, pela coletividade, do poder-dever de controlar o vínculo entre companhia
seguradora e empresa, o Poder Público poderá desfazer (de ofício, ou por provocação dos segurados) a
avença, sempre que não haja correspondência plena entre o negócio e o bem comum posto sob tutela
estatal.
Para tanto a seguradora deveria firmar, com o organismo dirigente da seguridade social, contrato de
gestão mediante o qual se comprometeria a adotar sistema de tarifação risco a risco, com graduação
progressiva sempre que o índice de acidentes ocorridos na empresa tomadora superasse o índice médio do
setor; a manter controle de sinistralidade e a exigir progressivos e comprovados investimentos na prevenção
de acidentes e em programas destinados à recuperação do trabalhador vitimado.
O contrato de seguro a ser comercializado junto aos empregadores, por seu turno, estaria regulado
por cláusulas obrigatórias de estímulo a investimentos em segurança do trabalho e na boa conservação do
meio ambiente do trabalho.
As condições de rescisão do contrato, nos casos de descumprimento das estipulações obrigatórias,
deveriam ser comunicadas ao gestro da seguridade social, para fins de controle e providências punitivas.
Superpõe-se, assim, o componente social ao mero esquema privado de operação de um negócio
lucrativo.
O contrato de seguro de acidentes cumpre missão social que não pode ser descurada, nem pelo
Estado, nem pelo segurador, nem pelo empregador”.
103
de acidentes do trabalho na área pública já seria uma insensatez, e que a sua
privatização provavelmente levaria ao descalabro
128
.
Considerando o seguro de acidentes do trabalho praticamente
inexistente a partir das alterações na legislação infortunística entre 1995 e 1998,
sem uma resposta nos diplomas ordinários para a ordem constitucional expressa
no art. 7º, XXVIII, e ainda com o provável crescimento nas ações indenizatórios
no direito comum ajuizadas contra as empresas empregadoras, a Emenda
Constitucional nº 20, em 15 de dezembro de 1998, completa o retorno a tempos
anteriores a 1944, com a nova redação do art. 201, estampando em seu § 10:
Art. 201...
§ 10. Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho,
a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo
setor privado.
A Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003,
altera os regimes próprios de previdência social dos servidores públicos, e em sua
primeira votação na Câmara Federal continha a revogação do § 10 do art. 201,
mas tal ato não foi mantido para a redação final. Assim, tramitam no Congresso
Nacional alguns projetos de lei, com muitas possibilidades de surgirem alguns
outros, todos buscando a regulamentação da nova regra constitucional, tema do
Capítulo 5, tópico 5.3.
128
Celso Barroso LEITE, Seguro de acidentes do trabalho, RPS, 212, p. 544:
“..., é preciso reconhecer que a área privada atravessa uma fase das mais difíceis, principalmente
por motivo das novas realidades econômicas. Por conseguinte, não é este o momento de pretender transferir
para ali uma atividade que até mesmo o Estado tem dificuldade para executar a contento e na qual a atuação
das nossas seguradoras particulares se revelou precária, para não dizer nefasta.
Não se trata, é claro, de entender que o setor público é intrinsecamente superior ao setor privado.
Sabe-se, ao contrário, que em ambos algumas coisas funcionam bem outras funcionam mal. O importante,
no caso, é que se para certas atividades o setor privado é mais próprio, outras são inerentes ao setor público.
Um último ponto de caráter teórico a assinalar, embora seja também prático sob mais de um
aspecto, é a existência de motivos para admitir que a proposta do MPAS seja em boa parte fruto de pressões
de grupos interessados no que pode voltar a ser um rendoso filão”.
104
O que se pode depreender de uma análise sobre a legislação
brasileira e sua relação com as teorias infortunísticas, é a aplicação específica de
teorias diversas. O acidente do trabalho é um risco social coberto pela
previdência, com benefícios substitutivos da remuneração, auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez e pensão por morte, de igual valor seja qual for o
sinistro ocorrido, laboral ou comum, acompanhando, portanto, a teoria do risco
social. A Constituição Federal também prevê um seguro específico contra os
acidentes do trabalho, a cargo do empregador, fazendo prevalecer a teoria do
risco profissional. E, com a possibilidade ainda de mais uma indenização por
parte do empregador, quando incorrer em dolo ou culpa, aplicando-se, neste
caso, a teoria da culpa contratual.
Admitindo-se o acompanhamento teórico híbrido, ainda deverá
render muitos embates teóricos para definir como será a aplicação da teoria do
risco profissional em relação ao seguro privatizado que deverá ser regulamentado
pelo Congresso Nacional.
Por um lado, vale lembrar que a acirrada disputa entre
privatização e estatização do seguro de acidentes do trabalho em 1967 mereceu
a certeza de muitos doutrinadores, como Ferreira Pires (Capítulo 2, item 2.1.5),
sobre a alta lucratividade desta modalidade de seguro, e no atual momento as
coisas não são muito diferentes.
Por outro, o saudoso Anníbal Fernandes afiançava:
Trata-se de buscar a superação dos riscos do trabalho, obter a
máxima prevenção e, não sendo possível, reparar também ao máximo o obreiro
e seus dependentes. Admitiu-se, no curso deste estudo (...) a possibilidade de
pelo conflito, pressões e interesses de trabalhadores e agentes econômicos e
estatais, obter-se avanço na matéria acidentária. É a dialética da vida, ou seja, a
praxis social
129
.
129
Anníbal FERNANDES, Acidentes do trabalho, p. 262.
105
Os desenvolvimentos práticos a partir da Lei nº 9.032/95, com a
diminuição na concessão de benefícios acidentários pela autarquia federal e com
a probabilidade do aumento das demandas judiciais sobre a responsabilidade civil
patronal, merecem algum estudo.
A responsabilidade civil, a indenização e a fundamentação pela
teoria da culpa contratual, são objetos do Capítulo 4. Neste Capítulo 3 resta
compreender a inclusão do acidente do trabalho à teoria do risco social, com os
benefícios de prestação mensal continuada, decorrentes da incapacidade para o
trabalho, total ou parcial, permanente ou temporária, equiparados para qualquer
que seja a sua origem, para qualquer risco social ocorrido; e, ao mesmo tempo,
cabendo a aplicabilidade da teoria do risco profissional, conforme disposto na
Carta Magna, art. 7º, inciso XXVIII.
E, se o seguro compulsório contra acidentes do trabalho,
responsabilidade patronal conforme a Constituição Federal, será administrado por
seguradoras privadas ou pela autarquia pública, dependerá de aprovação de lei
específica e, com muita importância, da forma para sua aplicação. Interessante
notar que o § 10 do art. 201 da Carta Magna, possibilitando a privatização, é fruto
da Emenda Constitucional nº 20, aprovada em 15 de dezembro de 1998, e até o
presente início de 2006 não houve aprovação de qualquer regulamentação.
Ainda necessita também de amplos debates a forma indenizatória
mais coerente e favorável aos trabalhadores brasileiros: através de pagamento
único, mais vultoso no momento do recebimento, ou por benefícios de prestação
mensal continuada que vitaliciamente garantam a perda remuneratória sofrida
pelo trabalhador acidentado. Com a consolidação de privatização de tal seguro,
certamente será mais difícil a manutenção do benefício mensal continuado
vitalício, pois, para indenização relativa a sinistros, seria bastante imprevisível a
duração dos pagamentos, apenas suportável pela autarquia federal, com
gigantesca estrutura. Enquanto não for aprovada a nova legislação infortunística,
em atendimento ao ditame constitucional, procede apenas ficar no aguardo,
106
sendo grandes as possibilidades de aprovação de um seguro compulsório com
indenizações mediante pagamento único.
Também não poderia ser descartada a manutenção do monopólio
estatal do seguro de acidentes do trabalho, valendo observar a diversidade de
estudos que vêm sendo publicados sobre o custeio de um bom seguro, e ainda
garantindo indenizações mensais continuadas, suplementando o benefício
previdenciário, nos casos de invalidez ou morte, ou a remuneração do trabalhador
em atividade, quando ocorrer a redução na capacidade laborativa.
Enquanto tramitam as leis, todo o debate deve ser bem-vindo.
107
Capítulo 4: A diferença entre Seguro de Acidentes do Trabalho e a
responsabilidade civil
A diferença entre o seguro compulsório contra acidentes do
trabalho e a responsabilidade civil do empregador se delineia na evolução da
legislação infortunística no Brasil, descrita no Capítulo 2, item 2.1.
A publicação do Decreto Legislativo nº 3.724, em 15/01/1919, ao
mesmo tempo em que inaugura a responsabilidade objetiva, a teoria do risco
profissional, sem qualquer manifestação sobre indenização com culpa, poderia
estar substituindo a indenização então disposta no direito comum. A princípio,
quando a evolução doutrinária firmou a responsabilidade sobre o acidente do
trabalho independentemente de culpa, seria possível a interpretação restritiva a
qualquer cumulação de indenizações.
O Decreto–lei nº 24.637, de 10/07/1934, impede expressamente o
que poderia significar dupla indenização, exonerando o empregador de pagar à
vítima, pelo mesmo acidente, qualquer outra indenização de direito comum;
apesar de não excluir o direito de acionar terceiro civilmente responsável pelo
acidente.
Foi na vigência do Decreto-lei nº 7.036, de 10/11/1944, que
passou a ser admitida a dupla indenização, ainda exonerando o empregador da
indenização de direito comum, a menos que o acidente tivesse resultado de dolo
seu e de seus prepostos. A partir destas disposições do art. 31 do Decreto-lei
7.036/44, a jurisprudência foi ampliando a responsabilidade subjetiva do
empregador, passando a ser devedor de indenização não somente em caso de
108
dolo, mas também por culpa grave, inclusive por negligência e omissão de
precauções.
Claro exemplo dos entendimentos que se iam consolidando é o
acórdão de 1962, da lavra do ministro do Supremo Tribunal Federal Antônio
Gonçalves de Oliveira, como Relator no RE nº 49.462
130
, com a seguinte ementa
e excertos do voto:
EMENTA: - Acidente do trabalho e responsabilidade civil. Ação de
direito comum. Em caso de falta inescusável do empregador; se há prova de
que este não se preocupa com a segurança do operário ou do público e dá
causa ao acidente, pode a vítima recorrer à ação de direito comum (...).
Não somente em caso de dolo, mas, em caso de falta grave, em
que o empregador demonstre pela negligência e omissão de precauções
elementares, despreocupação e menosprezo pela segurança do empregado,
dando causa ao acidente, neste caso, não tenho dúvidas em admitir a ação de
direito comum. (...).
Além do caso de dolo, a ele se equiparam, pois, a negligência
grave, a omissão consciente do empregador, que não se incomoda com a
segurança do empregado, expondo-o a perigo, ao acidente. Neste caso é que a
ação de direito comum tem cabimento: tal falta de equipara ao dolo, a que se
refere o art. 31 da Lei de Acidentes.
O pensamento do Ministro Gonçalves de Oliveira, muito bem
expresso no acórdão supra citado, no período de 1961 a 1963 foi sendo adotado
pelos demais componentes do STF, conforme pode se verificar nos seguintes
julgamentos: RE 23.192 Embargos, RE 48.894, RE 49.462, RE 43.984, RE
46.643 Embargos, RE 49.462 Embargos e RE 50.297
131
.
130
Antônio Gonçalves de OLIVEIRA, voto RE, http:/www.stf.gov.br, acesso em 30/01/2006.
131
Cf. Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Cumulação da indenização por acidente do trabalho com os
benefícios acidentários, Revista LTr, 69, 11, p. 1305.
109
A consolidação destes entendimentos culmina com a aprovação
da Súmula nº 229, na Sessão Plenária do Supremo Tribunal Federal, em 13 de
dezembro de 1963:
Súmula nº 229, STF
A indenização acidentária não exclui a do direito comum, em caso
de dolo ou culpa grave do empregador.
As leis seguintes, de nº 5.316, de 14/09/67 e a de nº 6.367, de
19/11/76 – sem nem contar o Decreto-lei nº 293, de 28/02/67 – eram
absolutamente omissas sobre a matéria. O Supremo Tribunal Federal confirmou a
aplicabilidade da Súmula 229, mesmo na vigência de legislação que nada
dispunha sobre a cumulação de indenizações. Importante observar que o
Decreto-lei nº 7.036/44 determinava a exoneração do empregador ao pagamento
de indenização pelo direito comum, porquanto tal indenização estaria coberta pelo
seguro, com exceção para acidentes que resultem de dolo seu ou de seus
prepostos. Isto significa que a norma era o impedimento da cumulação, enquanto
apenas em caso de dolo poderia acontecer a exceção.
A interpretação que o Supremo Tribunal Federal consolida pode
ser classificada “segundo seus efeitos”, enquanto extensiva, como definiu Vicente
Ráo:
Quando na norma se declara menos do que, na realidade, se quis
declarar, e, em conseqüência, sua letra exclui casos que o seu espírito abrange,
então, o intérprete amplia o sentido direto e imediato do texto, para fazer incidir
no preceito os casos aparentemente e indevidamente não contemplados
132
.
A extensão de aplicação da exceção disposta no Decreto
7.036/44 demonstrava a evolução normativa das relações de trabalho. E assim,
132
Vicente RÁO, O direito e a vida dos direitos, v. I, t. 3, p. 479.
110
equiparava-se ao dolo – que era o motivo previsto no diploma legal para a
admissão da cumulação de indenizações – a negligência grave, a omissão
consciente do empregador, que não se incomoda com a segurança do
empregado, expondo-o a perigo, ao acidente.
Norberto Bobbio expõe a função interpretativa da jurisprudência,
distinguindo o contraste entre juspositivismo e antipositivismo:
(...) O positivismo jurídico é, realmente, acusado de sustentar
uma concepção estática da interpretação, que deveria consistir somente na
reconstrução pontual da vontade subjetiva do legislador que pôs as normas,
sem se preocupar em adaptar estas últimas às condições e exigências histórico-
sociais variadas, como faz, ao contrário, a interpretação evolutiva sustentada
pela corrente antipositivista
133
.
No caso analisado, mesmo que sem corresponder exatamente à
corrente antipositivista, a interpretação extensiva sumulada pelo Supremo
Tribunal Federal respondeu, como deveria, às condições e exigências histórico-
sociais.
Perseverando no objetivo de estender os direitos e garantias
destinados aos trabalhadores, o Supremo Tribunal Federal sumula a
cumulatividade de indenizações por acidente do trabalho. A indenização por
responsabilidade objetiva, coberta pelo seguro obrigatório, não elide a obrigação
de nova indenização do patrão, no caso, não mais apenas de dolo, mas também
de culpa grave. E prosseguiu com o mesmo entendimento, mantendo a aplicação
da Súmula 229, mesmo quando a Lei nº 5.316/67 e a Lei nº 6.367/76 se calaram
sobre o assunto.
133
Norberto BOBBIO, O positivismo jurídico, p. 213-214.
111
Portanto, até a Constituição Federal de 1988, a Súmula nº 229, do
Supremo Tribunal Federal estava integralmente vigente, com plena defesa e
aceitação na doutrina e na jurisprudência.
Na Assembléia Nacional Constituinte que culminou com a Carta
Magna de 1988, foi bastante debatido o tema referente a acidentes do trabalho,
com o substitutivo apresentado com texto limitado ao “seguro contra acidentes do
trabalho a cargo do empregador”, e aprovado com destaque com emenda aditiva
do Deputado Nélson de Carvalho Seixas acrescentando “... sem excluir a
indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”
134
.
Vale memorar a brilhante defesa do deputado Antônio Carlos
Mendes Thame:
(...) A realidade é que o Brasil registra um dos mais altos índices
de acidentes do trabalho. Não vou aqui repetir estatísticas, mostrar o número de
casos fatais, ou descrever os riscos a que se submetem os trabalhadores
brasileiros, gerando milhares de leucopênicos por benzeno, ou vítimas da
contaminação por chumbo, asbesto, xilol ou sílica. Venho apenas para defender
a emenda que repõe no texto, além do seguro contra acidentes do trabalho, a
cargo do empregador, a “indenização no caso de dolo ou culpa do empregador”.
(...) Defendemos uma Constituição em que haja uma escala de prioridades: em
primeiro lugar o homem, em segundo a produção e em terceiro a propriedade. E
quando colocamos na Carta Magna um dispositivo como este que vamos agora
votar, estamos dizendo que acima da produção está o homem, criado à imagem
e semelhança de Deus. Quando contratamos um homem, estamos admitindo
um eletricista, um maquinista, um torneiro, um pedreiro, um carpinteiro, e não
um provador de benzeno. O que a emenda propõe é pouquíssimo, é quase
nada (...)
135
.
134
Cf. Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Cumulação da indenização por acidente do trabalho com os
benefícios acidentários, Revista LTr, 69, 11, p. 1305.
135
Cf. Congresso Nacional, Diário da Assembléia Nacional Constituinte de 26/02/1988, p. 7673 apud
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Cumulação da indenização por acidente do trabalho com os benefícios
acidentários, Revista LTr, 69, 11, p. 1304.
112
E assim a Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de
1988, determina em seu art. 7º, inciso XXVIII:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social: (...)
XXVIII seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do
empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando
incorrer em dolo ou culpa.
Desta forma, a responsabilidade civil do empregador, plenamente
cumulativa com benefícios acidentários do seguro obrigatório, administrado pela
autarquia federal ou não, passa por mais uma evolução: a exigência subjetiva
para a obrigação indenizatória por parte do patrão trespassou de dolo para dolo
ou culpa grave, e agora, pelo texto constitucional, para dolo ou simplesmente
culpa, sem necessária qualificação de gravidade.
O seguro compulsório contra acidentes do trabalho, garantia
constitucional enquanto responsabilidade objetiva (art. 7º, XXVIII, 1ª parte), tem
sua base na teoria do risco profissional, ubi emolumentum, ibi onus. Já no art.
201, a Carta Magna acolhe a teoria do risco social em relação ao acidente do
trabalho, dispondo o atendimento pela previdência social, a (inciso I) “cobertura
dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada”, inclusive quando a
doença, invalidez ou morte decorrem de acidente do trabalho ou de seus
equiparados, doenças laborais, acidentes in itinere etc..
A inclusão dos sinistros resultantes de acidentes do trabalho, que
constava no texto original do citado inciso I do art. 201, agora não se apresenta
na redação dada pela Emenda Constitucional 20/98, pois soaria como
desnecessário: se não existe exclusão para qualquer ocorrência, o que importa é
o resultado, doença, invalidez ou morte. Para William Beveridge (capítulo 1, item
113
1.2) é o “princípio geral da horizontalidade das taxas de indenização por
interrupção dos salários”
136
.
Na primeira regulamentação do sistema previdenciário disposto
na Constituição Federal de 1988, a Lei 8.213/91 mantinha algum diferencial para
os benefícios acidentários, conforme narrado no capítulo 2, item 2.1.8, e no
capítulo 3, item 3.3; eram valores mais favoráveis ou benefícios exclusivos para
seqüelas decorrentes de acidentes do trabalho. Portanto, aplicava-se à Carta
Magna de 1988, de forma híbrida, as duas teorias de responsabilidade objetiva,
dos empregadores, risco profissional, e da sociedade, risco social.
As equiparações de benefícios previdenciários e acidentários, a
partir da Lei 9.032/95, consolidavam a integração do acidente do trabalho à teoria
do risco social. Considerando-se a contribuição exclusiva disposta pela Lei
8.212/91, em seu art. 22, inciso II, apenas uma sobretaxa
137
, um mero reforço
para o sistema previdenciário, o seguro de acidente do trabalho teria deixado de
existir.
Porém, a simples extinção do seguro de acidente do trabalho
suscitaria uma lacuna, um descumprimento ao disposto no art. 7º, XXVIII, 1ª
parte, e a privatização admitida no § 10 do art. 201, aguardando regulamentação,
poderá recolocar na ordem do dia a aplicação da teoria do risco profissional,
provocando a produção de um novo seguro de acidentes do trabalho,
indenizatório e compulsório.
A indenização por responsabilidade civil decorrente de acidente
do trabalho também é afiançada pela norma constitucional (art. 7º, XXVIII, 2ª
parte), porém na forma de responsabilidade subjetiva, com a exigibilidade de
culpa para a indenização.
136
William BEVERIDGE, O plano Beveridge, p. 61.
137
Cf. Anníbal FERNANDES, Acidentes do trabalho, p. 182.
114
Da exigência do dolo, conforme o Decreto 7.036/44, com o
acréscimo da falta grave, presente na Súmula 229 da STF, e até a simples culpa,
como consta no artigo constitucional, este caminho pode significar a evolução da
culpa aquiliana para a culpa contratual, alterando o onus probandi, mas sempre
responsabilidade subjetiva.
Restringe-se a aplicabilidade da teoria do risco em relação à
responsabilidade civil do empregador nos casos de acidente do trabalho, porque
tal entendimento pode conduzir a novas defesas de inacumulabilidade das
indenizações pelo seguro próprio e pelo empregador nos casos de dolo ou culpa
de qualquer qualidade ou grau, como se vê no item 4.3.
O acidente do trabalho enquanto risco social estaria coberto pela
previdência; já o seguro de acidentes do trabalho, obrigatório, sob
responsabilidade patronal e, talvez em futuro próximo, administrado
concorrentemente pelo instituto previdenciário e pelas seguradoras privadas,
fundamentar-se-ia na teoria do risco profissional. Se a responsabilidade civil
estiver baseada também na teoria do risco profissional – responsabilidade
objetiva, sem a exigibilidade de culpa –, abrirá algum espaço para a defesa da
cobertura pelo seguro obrigatório do empregador, impedindo qualquer outra
indenização, mesmo com culpa, leve ou grave, ou até dolo.
A exigência para o direito do trabalhador a ser indenizado,
primitivamente era o dolo, ato intencional, causador do acidente do trabalho, por
parte do empregador ou de seus prepostos. A jurisprudência ampliou o conceito
de tal exigência, acompanhando a própria evolução dos conceitos humanitários,
com a Súmula 229 do STF definindo a indenização também por culpa grave e
com a Constituição Federal de 1988 transformando a exigência mínima em
apenas culpa.
Para estudo da indenização por acidente do trabalho, em especial
pelo seguro compulsório e em complemento pela responsabilidade civil, importa
115
definir algum conceito desta última, especificamente em relação ao acidente do
trabalho. Além disso, cabe analisar o desenvolvimento da idéia de culpa, os
danos e a cumulabilidade das indenizações.
116
4.1 Responsabilidade civil
São pressupostos da responsabilidade civil, segundo Maria
Helena Diniz, a “existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada
juridicamente, isto é, que se apresenta como um ato ilícito ou lícito, pois ao lado
da culpa, como fundamento da responsabilidade, temos o risco”; e também a
“ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vitima” pela ação; e,
ainda, o “nexo de causalidade entre o dano e a ação (fato gerador da
responsabilidade), pois a responsabilidade civil não poderá existir sem o vínculo
entre a ação e o dano”
138
.
Silvio Rodrigues prefere apresentar quatro pressupostos: ação ou
omissão do agente, culpa do agente, relação de causalidade e dano
experimentado pela vítima
139
.
Tendo a culpa enquanto pressuposto, a responsabilidade civil
teria caráter absolutamente subjetivo, enquanto muitos autores, como Maria
Helena Diniz e Sílvio de Salvo Venosa, admitem a responsabilidade objetiva
“nesta fase de responsabilidade civil de pós-modernidade”
140
.
Para Teresinha Saad a culpa não é mais fundamento único, o
risco está no mesmo patamar:
A culpa no evoluir da responsabilidade civil permanece, mas não
mais como único e exclusivo fundamento; ao seu lado convive o risco, no qual a
responsabilidade deixa de ser a sanção a uma regra de comportamento, para
ter parâmetro no fato material causador do dano.
138
Cf. Maria Helena DINIZ, Curso de direito civil brasileiro, p. 36-37.
139
Cf. Silvio RODRIGUES, Direito civil: responsabilidade civil, p. 14-18.
140
Cf. Sílvio de Salvo VENOSA, Direito civil, p. 20-27.
117
A responsabilidade civil, portanto, margeia o campo da
responsabilidade subjetiva, assentada no milenário princípio da culpa, e o da
responsabilidade objetiva, fundada no risco, perfilhando ambos um fim comum:
o ressarcimento dos danos
141
.
O atual Código Civil, Lei nº 10.406, de 10/01/2002, em seu “Título
IX, Da responsabilidade civil, Capítulo 1, Da obrigação de indenizar”, dispõe, no
art. 927, a reparação pelo dano causado por ato ilícito, trazendo, em seu
parágrafo único a adoção da responsabilidade objetiva:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187
142
), causar
dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a
atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua
natureza, risco para os direitos de outrem.
A responsabilidade objetiva presente no parágrafo único dirige-se
com bastante exclusividade para os casos especificados em lei em atividades de
risco, por sua natureza.
Para Silvio Rodrigues, “são poucos, no direito brasileiro, os casos
de responsabilidade civil inspirados na teoria do risco”:
São conhecidos os argumentos expostos a favor e contra a teoria
do risco, que teve neste país e alhures entusiastas adeptos e adversários
fervorosos. A verdade, entretanto, é que, embora admitida em alguns casos
específicos pelo legislador, jamais teve acolhimento absoluto e generalizado. De
141
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, p. 32.
142
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
118
regra, com os temperamentos impostos pelo progresso, a teoria da culpa ainda
é prevalecente
143
.
Vale ressaltar que Silvio Rodrigues, ao analisar o parágrafo único
do art. 927 do Código Civil de 2002, aponta que a responsabilidade objetiva se
aplica em dois pontos: nos casos previstos em lei e quando o autor do dano
através da sua atividade cria riscos para os outros:
A segunda hipótese é de considerável interesse, pois se inspira
diretamente na teoria do risco em sua maior pureza. Segundo esta, como vimos,
se alguém (o empresário, por exemplo), na busca de seu interesse, cria um
risco de causar dano a terceiro, deve repará-lo, mesmo se agir sem culpa, se tal
dano adveio. Ubi emolumentum, ibi onus
144
.
Teorias modernas terão cada vez maior aplicabilidade na
responsabilidade civil, porém, quando se estuda acidente do trabalho é obrigatória
a diferenciação entre o seguro compulsório, conforme disposto na 1ª parte do art.
7º, XXVIII, da Carta Magna, e a indenização patronal em razão de dolo ou culpa,
conforme consta na 2ª parte do mesmo artigo constitucional.
Maria Helena Diniz, mesmo admitindo o risco como fundamento
da responsabilidade, ao lado da culpa, define em quadro sinótico a “natureza da
responsabilidade por acidente do trabalho” enquanto “contratual-legal e (...)
subjetiva, fundando-se na culpa ou dolo do patrão”
145
.
Portanto, a responsabilidade civil, no que tange ao acidente do
trabalho, conforme disposto na Constituição Federal, art. 7º, XXVIII, 2ª parte,
mantém o caráter subjetivo, ou seja, relaciona-se com a culpa do empregador.
Daí a importância do conceito de culpa e o seu desenvolvimento.
143
Silvio RODRIGUES, Direito civil, p. 157.
144
Silvio RODRIGUES, Direito civil, p. 162.
145
Maria Helena DINIZ, Curso de direito civil brasileiro, p. 427.
119
A responsabilidade objetiva quanto ao acidente do trabalho,
também está prevista na Carta Magna, sem culpa, pelo risco profissional, no art.
7º, XXVIII, 1ª parte, e pelo risco social, no art. 201, I.
120
4.2 Culpa grave e simples culpa
Para este trabalho é desnecessário tecer maiores considerações
ao conceito de dolo, “vontade conscientemente dirigida ao fim de obter um
resultado criminoso ou de assumir o risco de o produzir”
146
, ato voluntário e
criminoso. Tal característica sempre foi suficiente para a obrigação de
indenização civil e para punição criminal, valendo apenas como início da
possibilidade de cumulação de indenizações, pelo seguro obrigatório e pelo
empregador, mesmo que o Decreto-lei nº 7.036/44 iniciasse a cumulabilidade
exatamente na defesa do contrário.
Quando dispôs a inacumulabilidade das indenizações,
entendendo que a do direito comum estaria absolutamente coberta pelo seguro
compulsório, o legislador abriu a exceção para quando o acidente fosse
decorrente de dolo do empregador ou de seus prepostos; e, desta exceção, foi
ampliada a responsabilidade subjetiva, atingindo exigência apenas da culpa,
grave, leve ou mesmo levíssima, alcançando este conceito também a negligência
e a omissão, e, em boa parte das vezes, com o onus probandi do empregador.
Culpa já não depende de ato intencional, com amplo leque de
qualificações, de levíssima a dolosa, por ação ou omissão, “pode ou não ser
maliciosa, voluntária ou involuntária”, segundo De Plácido e Silva:
Revela, pois, a violação de um dever preexistente, não praticado
por má-fé ou com a intenção de causar prejuízos aos direitos ou ao patrimônio
de outrem, o que seria dolo.
Na culpa, não há a positiva intenção de causar o dano; há
simplesmente a falta ou inobservância do dever que é imposto ao agente
147
.
146
Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa, p. 229.
147
DE PLÁCIDO E SILVA, Vocabulário jurídico, p. 460.
121
Sílvio de Salvo Venosa aponta a culpa civil em seu sentido mais
amplo, sem relacionar a intensidade do dolo ou da culpa com o montante da
indenização:
A culpa civil em sentido amplo abrange não somente o ato ou
conduta intencional, o dolo (delito, na origem semântica e histórica romana),
mas também os atos ou condutas eivados de negligência, imprudência ou
imperícia, qual seja, a culpa em sentido estrito (quase-delito). Essa distinção
entre dolo e culpa ficou conhecida no Direito Romano, e assim foi mantida no
Código francês e em muitos outros diplomas, como delitos e quase-delitos. Essa
distinção, modernamente, já não possui maior importância no campo da
responsabilidade civil, em sentido lato, pois, como regra, a intensidade do dolo
ou da culpa não deve graduar o montante da indenização, embora o presente
Código apresente dispositivo nesse sentido (art. 944, parágrafo único). A
indenização deve ser balizada pelo efetivo prejuízo
148
.
Silvio Rodrigues, após conceituar culpa grave, leve e levíssima
149
,
afirma que a “distinção entre dolo e culpa, bem como entre os graus de culpa”
haveria perdido a sua oportunidade; porque “quer haja dolo, quer haja culpa
grave, leve ou levíssima, o dever de reparar se manifesta com igual veemência”:
Ora, como a indenização deve ser o mais possível completa, uma
vez que indenizar significa tornar indene a vítima, o agente causador do dano,
em tese, tem a obrigação de repará-lo integralmente, quer tenha agido com
dolo, quer com culpa levíssima
150
.
148
Sílvio de Salvo VENOSA, Direito civil, p. 33.
149
Silvio RODRIGUES, Direito civil, p. 148:
A culpa grave é a decorrente da imprudência ou negligência grosseira, como a do motorista que
dirige sem estar habilitado, ou daquele que, em excesso de velocidade, atravessa um sinal de trânsito
fechado. Costuma-se dizer que a culpa grave ao dolo se equipara.
A culpa leve é aquela na qual um homem de prudência normal pode incorrer. E a culpa levíssima é
aquela da qual mesmo um homem de extrema cautela não poderia deixar de escapar.
150
Silvio RODRIGUES, Direito civil, p. 149.
122
Dispõe o Código Civil de 2002, em seu art. 944, caput e parágrafo
único:
Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a
gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a
indenização.
Silvio Rodrigues também elogia mais esta inovação do novo
Código Civil, em busca de maior eqüidade, “quanto houver inescondível
desproporção entre o montante (da indenização) e o grau de culpa do
responsável”
151
.
Portanto, o Código Civil é bastante claro, a indenização se mede
pela extensão do dano e não pelo grau da culpa. Para a responsabilidade civil
relativa ao acidente do trabalho basta a culpa no sentido mais amplo que se
possa encontrar.
O escorço apresentado no Capítulo 2 demonstra o percurso
histórico da indenização por responsabilidade civil. Do art. 31 do Decreto-lei nº
7.036/44 até a Súmula 229 do STF, estava representado o movimento político do
final da primeira metade do século XX. A segurança do trabalhador e a melhoria
nas condições de trabalho, em especial as industriais, tornavam-se obrigações
cada vez maiores para o empregador; de forma que negligência ou omissão,
despreocupação e menosprezo pela segurança no trabalho, passaram a
caracterizar falta grave, equiparada ao dolo. E assim a Súmula 229 acrescenta a
falta grave do empregador enquanto fator para a cumulação da indenização pelo
seguro obrigatório com outra a cargo do patrão.
151
Silvio RODRIGUES, Direito civil, p. 150.
123
No mesmo avanço linear conceitual, a Carta Magna de 88
desqualifica a culpa enquanto exigência para a cumulação de indenizações, no
momento em que retira a necessidade de comprovação de sua gravidade. Para a
indenização, enquanto na Súmula 229 do STF exigia-se dolo ou culpa grave do
empregador, pelo art. 7º,inciso XXVIII, da Carta Magna, exige-se somente dolo ou
culpa, esta em qualquer grau.
Se o grau de culpa não tem influência no cálculo da indenização
nem na qualificação da responsabilidade patronal, é necessário apenas
comprovar a sua existência. Nas relações de trabalho ocorre bastante a culpa in
vigilando, “que se traduz na ausência de fiscalização do patrão ou comitente com
relação a empregados ou terceiros sob seu comando”
152
.
Calderon, Rivas, Bustos e Campoy, em importante obra sobre
acidentes do trabalho e doenças profissionais, destacam a responsabilidade da
empresa empregadora quanto ao cumprimento de suas obrigações. E distinguem
dois tipos de responsabilidade: pelo descumprimento de suas obrigações relativas
ao seguro obrigatório e pela falta de medidas de segurança e higiene no trabalho:
(...) puede producirse la responsabilidad de la empresa en caso
de incumplimiento de sus obligaciones establecidas en la Ley.
Podemos distinguir dos tipos de responsabilidad:
a) Por incumplimiento de las obligaciones en materia de
inscripción, afiliación, altas y bajas, cotización y
aseguramiento del accidente de trabajo y la enfermedad
profesional (...).
b) Por haberse producido el accidente o la enfermedad
profesional como consecuencia de falta de medidas de
seguridad e higiene en el trabajo (...). De ello se pueden
derivar las siguientes responsabilidades:
152
Sílvio de Salvo VENOSA, Direito civil, p. 37.
124
- Administrativa Laboral.
- Seguridad Social (recargo de prestaciones).
- Penal.
- Civil.
153
Para acidentes-tipo ocorridos dentro da área de trabalho, em
ações judiciais produzem-se laudos periciais que comprovam, com poucas
chances de dúvidas, a existência ou não de culpa do empregador, inclusive in
vigilando. Porém, doenças laborais e mesmo lesões decorrentes de acidentes não
comunicados se demonstram por análise de um período e não de um momento,
e, portanto, existem maiores dificuldades para produção de provas necessárias.
Aceitando-se a exigibilidade da culpa do empregador para que
deva indenizar o empregado, é preciso também acatar o conceito de culpa em
seu sentido mais amplo, observando o onus probandi. Provar a culpa do patrão
não era fácil no começo do século XX, como se analisa no Capítulo 1, item 1.2, e
continua bastante difícil nos tempos atuais. O cumprimento do disposto no art. 7º,
inciso XXVIII, da Carta Magna, exige o seguro obrigatório de acidente do trabalho,
sem elidir a obrigação de indenizar o trabalhador quando o acidente decorrer de
dolo ou culpa do empregador. E a culpa do empregador pode ficar caracterizada
pela mais simples omissão em relação à segurança do trabalho.
As obrigações patronais sobre segurança e higiene no trabalho
constam na legislação trabalhista pátria e incumbe às empresas cumpri-las e
provar o seu cumprimento.
153
Enrique Hevia-Campomanes CALDERON et al., Los accidentes de trabajo y las enfermedades
profesionales, p.237.
125
Em obra sobre o meio ambiente do trabalho, João José Sady
discorre sobre as normas de prevenção e o dever genérico de prevenir riscos:
Essas teorias que se fixam na busca de uma violação concreta da
norma para caracterizar a culpa da empresa no acidente do trabalho perdem de
vista que a infração a uma proibição específica não é a única violação da norma
protetiva em higiene e segurança do trabalho.
Com efeito, o direito positivo estabelece um dever genérico do
empregador de antecipar-se aos riscos ambientais do trabalho, indo além das
exigências literais das normas regulamentares
154
.
A antecipação, afirma Sady, é dever definido no Programa de
Prevenção de Riscos Ambientais, o PPRA, obrigação patronal. Acidente ou
doença ocupacional que possa representar descumprimento ou falha do PPRA é
culpa do empregador, sendo seu o ônus de provar o contrário. E vale salientar
que Sady aponta culpas além “das normas regulamentares”.
Por mais que se aleguem vencidas e ultrapassadas as idéias de
prevenção mediante punição, todos os processos que investigam acidentes do
trabalho são importantes para prevenção e impedimento de novas ocorrências.
De um lado os benefícios acidentários diferenciados no seguro
compulsório, cuja base é a responsabilidade objetiva, podem auxiliar a prevenção
pela presença nas estatísticas. Por outro a indenização em razão da culpa do
empregador também busca maior responsabilidade e prevenção, mesmo que seja
somente para prevenir despesas desnecessárias com indenizações.
154
João José SADY, Direito do meio ambiente do trabalho, p. 165.
126
Moacyr Duarte apresenta etapas para investigação e prevenção
de acidentes, com eficaz convencimento ao responder se os acidentes são
inevitáveis:
Considerar o fato de que todo acidente tem inegáveis aspectos
aleatórios parece suficiente para dar resposta afirmativa à questão. No entanto,
o estudo sistemático de um grande número dessas ocorrências revela que a
maior parte delas é causada por falhas humanas e de equipamentos, falhas
essas que deveriam ser controladas por diretrizes gerenciais, procedimentais e
programas de manutenção. Vistos sob este aspecto, os acidentes afiguram-se
evitáveis
155
.
A culpa da empresa empregadora, destacando as possíveis
exclusões por evidência (como por exemplo o acidente causado por dolo do
empregado), deve ser presumida, caracterizando, com afirma Sílvio de Salvo
Venosa, a inversão do ônus da prova, sem se confundir com responsabilidade
objetiva:
Nas hipóteses de culpa presumida, carreadas pela jurisprudência,
há inversão do ônus da prova: cabe ao réu provar que não agiu com culpa. A
culpa presumida, contudo, não se confunde com a responsabilidade objetiva,
que independe de culpa
156
.
O Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e Região, entidade de
trabalhadores industriais de uma importante região do estado de São Paulo,
publicou em março de 2000, um trabalho sobre vítimas dos ambientes do
trabalho, com declarações, fotografias e uma importante análise sobre as
155
Moacyr DUARTE, Riscos industriais: etapas para investigação e prevenção de acidentes, p. 2.
156
Sílvio de Salvo VENOSA, Direito civil, p. 39.
127
condições de trabalho no Brasil. Com o subtítulo “Ocultando provas do crime”
apresenta triste exemplo de culpa patronal e dano:
Hermínio Gualberto tinha 44 anos de idade quando teve a mão
direita esmagada numa das prensas desprotegidas da Tecnoestamp. O
acidente aconteceu no dia 23 de março de 1988. O relatório do Dr. Antônio
Fernando Barros de Azevedo, médico fiscal da Secretaria de Relações do
Trabalho de São Paulo, assim sintetizou a situação:
“Há vários dias a máquina apresentava defeito sem que a
empresa procurasse corrigi-lo”, e continua: “o que é mais grave, permitiu
criminosamente que uma máquina com defeito permanecesse em serviço,
máquina de alta periculosidade como a prensa. Além disso, o fato de
desrespeitar a interdição do agente da Delegacia Regional do Trabalho para
que a máquina fosse revisada, só pode significar que vieram consertar o defeito,
no sentido de ocultar uma prova do crime, pois é este o nome correto da
ocorrência”
157
.
O exemplo apresentado deve ser dos mais graves, e não existem
estatísticas que possam representar a fundo o que ainda acontece de acidentes
do trabalho e doenças profissionais.
Herval Pina Ribeiro, especialista em Medicina do Trabalho,
elaborou sua tese de doutorado com base na ocorrência de Lesões por Esforços
Repetitivos na categoria bancária da cidade de São Paulo. Descreve o
desenvolvimento desta doença profissional, atualmente bastante ocorrente,
baseado em pesquisas científicas. Comprova as subnotificações da doença a
partir de comparações em duas tabelas do BANESPA, uma em onze estados e
157
Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco e Região, Vítimas dos ambientes do trabalho: rompendo o silêncio,
p. 16.
128
outra na “Capital, Região Metropolitana (RM) e Interior do estado de São Paulo,
em abril de 1994”:
Nota-se que a taxa de ocorrência é maior na Capital que na
Região Metropolitana e quatro vezes superior à do Interior. São disparidades
muito grandes entre os três primeiros estados e os demais, e entre a Capital, a
Região Metropolitana e o Interior do estado de São Paulo para que se atribuam
causas externas ao circuito médico / empresa / INSS. Se atentarmos para a
progressão dos registros ou notificações no período, poucas dúvidas restarão
de que as causas dessas disparidades são endógenas ao circuito
158
.
Especificamente sobre a doença profissional estudada, Herval
Ribeiro afirma que a “ida ou não ao médico pode não ser uma livre manifestação
de vontade”, e que a “negação e ocultação das LER é um fenômeno bilateral”:
O não querer ir ao médico por parte de trabalhadores
sintomáticos ou a ida tardia dos trabalhadores da amostra – em média, 11
meses entre os primeiros sintomas e o diagnóstico médico, fazem parte do
mesmo fenômeno de negação e ocultação que diante das pressões e
contrapressões se flexibiliza, levando à subnotificação maior ou menor, mas
sempre presente. São cúmplices: o médico do adoecido que não estabelece o
nexo entre trabalho e as LER, o administrador local que se nega ou retarda a
emissão do CAT, o perito do INSS que recusa o diagnóstico do médico que
assiste o doente e o técnico do serviço especializado da empresa que sonega a
informação
159
.
Conforme define o Código Civil de 2002 a indenização deve ser
medida pela extensão do dano, trazendo mínima exceção em seu parágrafo único
para, eqüitativamente, evitar excessivas desproporções entre culpa e
indenização. Logo, observando a culpa patronal mínima enquanto sempre
suficiente para constituir a responsabilidade civil e, portanto, a indenização, não
158
Herval Pina RIBEIRO, A violência oculta do trabalho, p. 133.
159
Herval Pina RIBEIRO, A violência oculta do trabalho, p. 134-135.
129
há porque avaliar maior ou menor culpa nas ocorrência dos sinistros laborais;
basta existir.
Não importa o tamanho da culpa para definir o valor da
indenização, porque este se relaciona com o dano causado.
130
4.3 Os danos e a indenização
Conforme dispõe o Código Civil de 2002 em seu art. 944, mesmo
com a leve exceção disposta no parágrafo único, a indenização deve equivaler
aos danos. Tanto aos patrimoniais quanto aos morais, inclusive os de ordem
social, como, por exemplo, os causados pelos preconceitos por não poder
trabalhar em uma sociedade que glorifica o trabalho.
O dano patrimonial, segundo Sílvio de Salvo Venosa, “é aquele
suscetível de avaliação pecuniária, podendo ser reparado por reposição em
dinheiro, denominador comum da indenização”
160
.
Danos patrimoniais causados pelos sinistros laborais são de
razoável dimensionamento; existem perdas imediatas, como as hospitalares,
médicas e farmacêuticas, e de mais longo prazo para tratamentos, mas as de
maior rigor são as causadas pela diminuição da capacidade laboral, ou mesmo
pela total incapacidade do trabalhador. “Dano negativo ou lucro cessante ou
frustrado”, como Maria Helena Diniz denomina, é o lucro que o lesado “deixou de
auferir, em razão do prejuízo que lhe foi causado”
161
.
A relação entre o dano e a indenização pode não ser exata, mas
ainda é a única forma possível de se buscar reparações. Assim Silvio Rodrigues
explicita:
A idéia de tornar indene a vítima se confunde com o anseio de
devolvê-lo ao estado em que se encontrava antes do ato ilícito. Todavia, em
numerosíssimos casos é impossível obter-se tal resultado, porque do acidente
resultou conseqüência irremovível. Nessa hipótese há que se recorrer a uma
situação postiça, representada pelo pagamento de uma indenização em
160
Sílvio de Salvo VENOSA, Direito civil, p. 43.
161
Maria Helena DINIZ, Curso de direito civil brasileiro, p. 63.
131
dinheiro. É um remédio nem sempre ideal, mas o único de que se pode lançar
mão
162
.
Na responsabilidade civil relacionada ao acidente do trabalho, a
reparação pelos lucros cessantes deve representar a parcela salarial, descontado
o valor do benefício percebido pelo sistema oficial, durante os meses em que o
acidentado continuar vivo e incapacitado para o trabalho, mesmo que
parcialmente. Três formas de pagamento se apresentam: em prestações mensais
continuadas de forma vitalícia, em prestações mensais com data certa de término
pela expectativa de sobrevida do trabalhador, ou em um pagamento único,
calculado sobre a expectativa de sobrevida.
No acidente do trabalho e na doença ocupacional existem
também perdas morais, sem cunho econômico mas de graves conseqüências,
inclusive nas relações sociais. Yussef Said Cahali esclarece que “no dano
patrimonial, busca-se a reposição em espécie ou em dinheiro pelo valor
equivalente” buscando a indenização plena, recompondo o patrimônio, “opera-se
o ressarcimento do dano patrimonial”, diferentemente da reparação por dano
moral:
Diversamente, a sanção do dano moral não se resolve numa
indenização propriamente, já que indenização significa eliminação do prejuízo e
das suas conseqüências, o que não é possível quando se trata de dano
extrapatrimonial; a sua reparação se faz através de uma compensação, e não
de um ressarcimento; impondo ao ofensor a obrigação de pagamento em
quantia certa de dinheiro em favor do ofendido, ao mesmo tempo que agrava o
patrimônio daquele, proporciona a este uma reparação satisfativa
163
.
Definida a culpa da empresa empregadora na ocorrência do
sinistro laboral, acidente ou doença, a indenização deverá ser paga sobre o dano
causado, englobando então perdas patrimoniais e perdas morais.
162
Silvio RODRIGUES, Direito civil, p. 186.
163
Yussef Said CAHALI, Dano moral, p. 42.
132
4.4 A cumulatividade de indenizações por acidentes do
trabalho
A partir de 1919, com o Decreto Legislativo nº 3.724 abraçando a
teoria da responsabilidade objetiva, só se pode começar a pensar novamente em
indenização por responsabilidade subjetiva a partir do Decreto-lei nº 7.036/44,
exatamente pela cumulabilidade que o diploma proibia com exceção. E na
atualidade, com o seguro obrigatório determinado na Constituição Federal sem
excluir a indenização por responsabilidade civil, fica invariavelmente determinada
a cumulabilidade das indenizações.
Desta forma afiança Teresinha Saad, admitindo ainda o debate
sobre a compensação entre as indenizações:
O assunto, no que tange à compatibilidade das duas ações, não
padece mais de dúvida. O pressuposto que pode ser passível de
questionamento é a compensabilidade, ou não, entre as reparações
164
.
Saad aponta também as correntes divergentes, uma defendendo
a indenização apenas como complemento ao benefício acidentário, enquanto a
outra, majoritária na atualidade, entende correta a cumulação sem compensação:
A reparação infortunística decorre da teoria do risco, amparada
pelo seguro social a cargo da Previdência Social, enquanto a responsabilidade
civil comum tem como supedâneo a culpa do patrão ou seu preposto. As causas
e os sujeitos passivos da obrigação de reparar são distintos
165
.
Da mesma forma leciona Sebastião Geraldo de Oliveira, com a
interpretação que tem amplíssima aceitação, sobre a norma constitucional
164
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, p. 241.
165
Teresinha Lorena Pohlmann SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, p. 241.
133
garantindo a cumulação das indenizações e não relações complementares entre
elas:
A responsabilidade civil do empregador, decorrente do acidente
do trabalho, não gera mais resistência, especialmente diante do peso e
dimensão do preceito constitucional do art. 7º, XXVIII. Todavia, percebem-se,
ainda, hesitações ou incompreensões, especialmente na jurisprudência, no que
tange à cumulação das reparações civis com os benefícios acidentários. Até
hoje encontramos acórdãos determinando a dedução dos valores recebidos do
INSS na apuração de danos materiais fixados, com o argumento básico de que
a vítima não deveria ter uma acréscimo de rendimento por causa do acidente,
bastando a reposição do nível de renda anterior. Aduzem outros que a
reparação não pode ser superior ao limite do dano causado, razão pela qual, no
cálculo da indenização, dever-se-ia deduzir o valor dos benefícios
acidentários
166
.
Sebastião de Oliveira defende a cumulabilidade das indenizações;
são indenizações com fundamentos em teorias diversas, e sem ser excludentes
ou complementares:
O empregado acidentado recebe os benefícios da Previdência
Social, cujo pagamento independe da caracterização de culpa, já que a
cobertura securitária está fundamentada na teoria da responsabilidade objetiva.
E pode receber, também, as reparações decorrentes da responsabilidade civil,
quando o empregador tiver dolo ou culpa de qualquer grau na ocorrência, com
apoio na responsabilidade de natureza subjetiva. Como registra o texto da
Constituição, a cobertura do seguro acidentário não exclui o cabimento da
indenização
167
.
Ressalte-se que o parágrafo único do art. 927 do Código Civil de
2002 tem aplicação bastante exclusiva, para os casos de responsabilidade
objetiva, independentemente de culpa. Desta forma, não transfere, como poderia
166
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Indenizações por acidentes do trabalho ou doença ocupacional, p. 73.
167
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Indenizações por acidentes do trabalho ou doença ocupacional, p. 73.
134
parecer, a responsabilidade civil por acidentes do trabalho para a
responsabilidade objetiva, teoria do risco profissional. Porque, se assim fosse,
poder-se-ia admitir o esgotamento da cumulabilidade das indenizações.
Maria Helena Diniz conclui que a responsabilidade civil por
acidente do trabalho não pode ter caráter objetivo, pois este estaria coberto pela
previdência social; apontando, porém, o necessário cumprimento das
responsabilidades patronais de prevenção:
Com o advento da CF/88, não mais teria razão a aceitação da
teoria da responsabilidade civil objetiva por acidente de trabalho, apesar de a
empresa ser responsável pela adoção e uso de medidas coletivas e individuais
de proteção à segurança e saúde do trabalhador, devendo prestar informações
pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a
manipular (...). Como prevenção do risco de sua atividade empresarial, o
empregador contribui para a Previdência Social, para que esta atenda aos
empregados acidentados, cobrindo despesas com tratamento e reabilitação,
com o auxílio-doença (...) ou auxílio-acidente (...), pagando aposentadoria por
invalidez ou pensão por morte (...)
168
.
Sebastião Geraldo de Oliveira também entende diferenciadas as
duas indenizações, uma de responsabilidade objetiva e outra em razão de culpa:
(...) O seguro acidentário destina-se a proteger a vítima e não
diminuir ou substituir a obrigação do empregador de reparar o dano causado
pelo acidente ocorrido por sua culpa ou dolo. O fato gerador da indenização não
foi, a rigor, o exercício do trabalho, mas o ato ilícito do patrão
169
.
Defende-se o diferencial entre o seguro obrigatório de acidentes
do trabalho e a responsabilidade civil do empregador, se por nada de mais
importante, pelo menos em defesa da cumulatividade das indenizações.
168
Maria Helena DINIZ, Curso de direito civil brasileiro, p. 425-426.
169
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Cumulação da indenização por acidente do trabalho com os benefícios
acidentários, Revista LTr, 69, 11, p. 1306.
135
Com análise diversa das normas legais, Marco Fridolin Sommer
Santos defende o fim das cumulabilidades. Pretende uma “reinterpretação do art.
7º, inciso XXVIII da Constituição Federal” que não deverá merecer acolhida nos
tribunais e academias, mas vale alguma atenção e estudo, inclusive para não
concordar.
Sommer Santos argüi que a não exclusão da indenização em
caso de dolo ou culpa, presente na norma constitucional, significaria a inclusão de
tal indenização na cobertura do seguro
170
. Ou seja, o seguro de acidentes do
trabalho daria cobertura ao empregador nos casos de dolo ou culpa,
responsabilizando-se pela indenização devida. Em caso de dolo, caberia a ação
regressiva pelo Instituto Nacional do Seguro Social, ainda administrador do
seguro
171
.
Com as últimas alterações na Constituição Federal e na
legislação ordinária, os acidentes do trabalho suscitam muitas dúvidas. Enquanto
objeto do seguro especial administrado pela autarquia federal, com a equiparação
dos benefícios a partir de 1995, os sinistros laborais estariam incluídos nos riscos
sociais cobertos pelo sistema previdenciário. E, em relação à contribuição de
obrigação exclusiva do empregador, não é difícil afirmar que não passa de uma
mera sobretaxa. Porém, a disposição constitucional, art. 7º, XXVIII, ainda exige
um seguro diferencial, que, agora, após a Emenda Constitucional nº 20/98 ter
acrescentado o § 10 ao art. 201, ainda dependendo de regulamentação através
de lei ordinária, poderá ser administrado concorrentemente pelo sistema público e
pelas seguradoras privadas.
E o mesmo artigo constitucional ressalta, até enquanto princípio,
que cabe mais uma indenização do empregador, além da decorrente do seguro
obrigatório, quando este incorrer em dolo ou culpa.
170
Cf. Marco Fridolin Sommer SANTOS, Acidente do trabalho entre a seguridade social e a responsabilidade
civil, p. 79.
171
Cf. Marco Fridolin Sommer SANTOS, Acidente do trabalho entre a seguridade social e a responsabilidade
civil, p. 83.
136
Portanto, com base na teoria do risco social, o sistema
previdenciário estaria garantindo a sobrevivência do acidentado, equiparando o
sinistro laboral a todos os riscos sociais.
Porém, para o cumprimento do ditame constitucional (1ª parte do
inciso XXVIII do art. 7º), fundamentado na teoria do risco profissional –
responsabilidade objetiva, com a contribuição exclusivamente patronal –, é
necessário um seguro especial e compulsório. Vale ressaltar que tal seguro
especial não precisaria obrigatoriamente ser privatizado e com indenização
mediante pagamento único, nem vice-versa.
Mediante a norma constitucional (2ª parte do inciso XXVIII do art.
7º), cabe ainda, cumulativamente, a indenização patronal quando este incorrer em
dolo ou culpa, ressaltando a cada vez maior amplitude do conceito de culpa.
No Capítulo 5 trata-se das teses atuais relativas às indenizações
por acidentes do trabalho, inclusive sobre a responsabilidade civil e a
competência para o seu julgamento.
137
Capítulo 5: Condição atual e futura do seguro dos acidentes do
trabalho
Neste início de 2006, o seguro contra acidentes do trabalho, a
cargo do empregador, ainda está sob responsabilidade do Instituto Nacional do
Seguro Social, INSS. Como se observa no tópico 5.3, a privatização do seguro,
prevista no art. 201, § 10 da Carta Magna, com redação pela Emenda
Constitucional nº 20/98, ainda não se encontra regulamentada por lei ordinária.
Logo, este seguro compulsório garantido constitucionalmente
encontra-se em fase de transição. As alterações na legislação ordinária desde
1995 terminaram com os benefícios exclusivos e diferenciados em relação aos
acidentes do trabalho. Restava assim a contribuição que pode representar apenas
uma sobretaxa, sem por isso afiançar a existência do seguro determinado na
Carta Magna. As transformações seguem, aguardando regulamentação da nova
disposição constitucional, e com aplicação da legislação infortunística com os
benefícios comuns e acidentários equiparados.
Importante relevar que a Constituição Federal tem supremacia
hierárquica, é a Lei Maior; e nela continua constando o seguro contra acidentes
do trabalho, sob responsabilidade contributiva exclusiva do empregador,
diferenciado do sistema previdenciário mesmo que administrado pela mesma
autarquia.
138
Em artigo citado nos capítulos 3 e 4, publicado em 1993, Wagner
Balera confirmava a intenção do legislador constituinte dispondo um regime
próprio para o seguro de acidente do trabalho:
(...) o risco do acidente, posto em cotejo com os demais riscos
sociais, foi objeto de tratamento distinto pelo constituinte. Os autores da
Constituição entenderam, a meu juízo, de estabelecer um regime próprio,
especial e específico, para a matéria
172
.
A unificação dos benefícios a partir da Lei 9.032/95 parecia
indicar, como comemorou Celso Barroso Leite, que “o seguro de acidentes do
trabalho, com suas conhecidas complicações, já desapareceu do quadro da
nossa proteção social”
173
. Mas não foi o que aconteceu; a norma inscrita no art.
7º, XXVIII, não foi revogada, e nem parece que poderia ser por se tratar de direito
social, de princípio constitucional.
Na situação atual, sem a regulamentação da nova regra
constitucional (art. 201, §10), a autarquia federal administra um seguro de
acidentes do trabalho praticamente inexistente. Sem diferencial nos valores dos
benefícios, com a contribuição que se chamou de sobretaxa, o seguro de acidente
do trabalho que consta na Lei 8.213/91 desobedece aos termos constitucionais.
Porém, a extinção do seguro especifico suscitaria uma grave lacuna, por
descumprimento do princípio constitucional.
Assim, historicamente a natureza jurídica do seguro de acidente
do trabalho, desde que disposta em lei brasileira, está ligada à responsabilidade
objetiva, sem culpa. Começa pela obrigação indenizatória, passando pelo auto-
seguro e chegando ao seguro compulsório. É monopólio estatal desde 1967, com
norma constitucional nascida em 1998 admitindo sua privatização. Mesmo
incluindo o acidente do trabalho aos riscos sociais cobertos pela previdência
social conforme disposição do art. 201, inciso I, a Constituição manteve a
172
Wagner BALERA, A reprivatização do Seguro de Acidente do Trabalho, RPS 146, p. 26.
173
Celso Barroso LEITE, Seguro de acidentes do trabalho, RPS, 212, p. 542.
139
obrigação de seguro específico enquanto obrigação patronal, indenização por
acidente do trabalho com base na responsabilidade objetiva.
Sebastião Geraldo de Oliveira, discorrendo sobre a atual situação
do seguro de acidentes do trabalho, desacredita em sua natureza jurídica
enquanto seguro:
(...), o seguro de acidente do trabalho no Brasil, apesar da
denominação, não tem natureza jurídica nem conteúdo de seguro propriamente
dito. Apesar da denominação “seguro”, só garante ao acidentado um benefício
estrito de cunho alimentar. O seguro de acidente do trabalho não contempla
indenização alguma, nem determina reparação de prejuízos sofridos; apenas
são concedidos benefícios para garantir a sobrevivência da vítima e/ou seus
dependentes, como ocorre com todos os demais segurados da Previdência
Social.
Com efeito, o chamado seguro acidentário não oferece qualquer
cobertura além da que já é concedida pela Previdência Social. O valor que o
empregador recolhe, atualmente, a título de seguro de acidente do trabalho
apenas financia os benefícios previdenciários em geral, aos quais qualquer
trabalhador segurado tem direito, dentro da amplitude da seguridade social,
para a qual também o empregado contribui com sua parte. Assim, não se
recolhe, a rigor, seguro de acidente do trabalho, mas uma parcela adicional para
financiar os benefícios previdenciários concedidos pelo INSS, dentre eles,
aqueles decorrentes dos infortúnios do trabalho
174
.
A redação atual da Carta Magna admite a administração do
seguro de acidente do trabalho pelas seguradoras privadas, contrariamente à
174
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Cumulação da indenização por acidente do trabalho com os benefícios
acidentários, Revista LTr, 69, 11, p. 1307.
140
opinião de Celso Barroso Leite, que saudava o desaparecimento do seguro
diferenciado para acidente do trabalho:
A atual onda de privatização costuma levar a excessos, como
quase toda onda. No caso do seguro de acidentes do trabalho, se o seu simples
restabelecimento na área pública já seria uma insensatez, e sua privatização
provavelmente levaria de volta ao descalabro de quem conhece o assunto
decerto tem bem presente na lembrança.
Após lembrar a precariedade da atuação das nossas seguradoras
privadas, “para não dizer nefasta”, Celso Barroso Leite critica a proposta de
privatização que o Ministério da Previdência estava apresentando:
Não se trata, é claro, de entender que o setor púbico é
intrinsecamente superior ao setor privado. Sabe-se, ao contrário, que em ambos
algumas coisas funcionam bem outras funcionam mal. O importante, no caso, é
que se para certas atividades o setor privado é mais próprio, outras são
inerentes ao setor público
175
.
De qualquer forma, a natureza jurídica do seguro de acidentes do
trabalho é a disposta na Constituição Federal, em seu art. 7º, XXVIII, e 201, I.
Mesmo que a regulamentação tenha deixado bastante a desejar, desde a redação
original em 1991, com maior distanciamento do preceito constitucional após as
alterações de 1995. A Lei 8.213/91 em sua redação original mantinha um mínimo
de diferenças mais favoráveis aos benefícios acidentários e a contribuição
exclusiva dos empregadores. Era alguma diferença, mesmo que se critique a
contribuição como mera sobretaxa e os valores mais favoráveis enquanto
mínimos como indenizações. As mudanças produzidas pela Lei 9.032/95
aproximaram mais o acidente do trabalho dos demais riscos sociais, mas ao
mesmo tempo criaram uma lacuna, um descumprimento de norma constitucional.
175
Celso Barroso LEITE, Seguro de acidentes do trabalho, RPS 212, p. 544.
141
Os valores mais favoráveis nos cálculos do auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez e pensão por morte, quando decorrentes de acidentes
do trabalho, efetivamente faziam alguma indenização; e o auxílio-acidente para
seqüelas redutoras da capacidade laborativa, exclusivo para decorrências de
acidentes do trabalho, convalidava o seguro indenizatório para sinistros laborais,
baseado na responsabilidade objetiva, sem importância para a culpa. E esta é a
natureza jurídica preconizada na Carta Magna.
Portanto, o acidente do trabalho está incluído nos riscos sociais
listados na Carta Magna, cobertos pela previdência social, conforme o art. 201, I.
Mas ao mesmo tempo, o Diploma Máximo exige um seguro indenizatório a cargo
do empregador (art. 7º, XXVIII, 1ª parte). A Constituição Cidadã promulgada em 5
de outubro de 1988 acompanha a teoria do risco social quando inclui o acidente
do trabalho na cobertura previdenciária, e, a um tempo só, opta pela teoria do
risco profissional por dispor um seguro compulsório sob responsabilidade
patronal.
A nova norma constitucional a ser regulamentada no futuro, § 10
do art. 201, confirma a necessidade de um seguro específico para acidentes do
trabalho, de caráter indenizatório. Importante ressaltar que admitir e entender a
obrigação constitucional de formar um seguro diferenciado e compulsório sob
responsabilidade patronal não significa concordar com a administração
concorrente entre o regime geral e as seguradoras privadas, ou seja, não equivale
a aceitar a privatização.
Por parte da previdência social, cumprindo o art. 201 da
Constituição, a cobertura de algo próximo à remuneração do acidentado, sem
qualquer diferença, é o que basta – pelo auxílio-doença, aposentadoria por
invalidez ou pensão por morte. Um valor além em qualquer destes casos, e
também uma indenização mensal para reduções laborais que não atingem a total
incapacidade, seriam as indenizações para quando a ocorrência é um acidente do
trabalho ou doença laboral. Indenizações estas que devem ser pagas pelo seguro
específico a cargo do empregador.
142
Pelo risco social a previdência garante igual cobertura em
qualquer ocorrência que incapacite, temporária ou permanente, o trabalhador. E,
por ser acidente do trabalho, ainda deve haver uma indenização que independa
de culpa e deve ser paga pelo seguro compulsório. Sem invalidar, quando da
ocorrência com dolo ou culpa do patrão, mais uma indenização, desta vez com
base na responsabilidade civil, subjetiva.
Em suma, para cumprimento das determinações da Carta Magna,
o sistema previdenciário inclui os acidentes do trabalho em sua obrigação de
cobertura, devendo ainda existir um seguro obrigatório diferenciado, e, na
ocorrência de dolo ou culpa, cabe outra indenização a cargo do empregador.
Na atual redação da legislação infortunística, Leis 8.212/91 e
8.213/91, conforme demonstrado no capítulo 3, os benefícios são calculados no
mesmo valor, dependendo apenas da necessidade do segurado, da comprovação
da incapacidade laboral da vítima, sem ter que comprovar o nexo de causalidade
entre o sinistro e a atividade.
Sem diferenças e sem exclusividade em qualquer benefício,
poderão diminuir consideravelmente os interesses processuais dos trabalhadores.
Para perceber benefício com o mesmo valor, apenas com título e código
diferentes, não valerá a pena os gastos e os desgastes para comprovação do
nexo causal, principalmente no ajuizamento de ações.
A equiparação dos benefícios previdenciários e acidentários
representava a inclusão absoluta dos acidentes do trabalho no sistema
previdenciário, com base na teoria do risco social. E assim seria bem provável o
fim das ações acidentárias específicas contra o instituto previdenciário. O período
em que a legislação foi alterada, entre 1995 e 1998 é, processualmente, ainda
bastante recente, com pouquíssimas estatísticas disponíveis. E com as
transformações que podem ocorrer pelo cumprimento da norma constitucional e a
143
privatização do seguro de acidentes do trabalho por novas leis, as lides judiciais
que se conformarão são ainda imprevisíveis.
Assim, vale um exame na jurisprudência atual sobre acidentes do
trabalho e a aplicabilidade das transformações na legislação. O conflito de
competência para julgamento das ações indenizatórias por danos morais e
patrimoniais decorrentes de acidentes do trabalho ajuizadas por empregados
contra empregadores também merece conhecimento, e ainda importa observar a
tramitação dos projetos de lei relacionados aos acidentes do trabalho e à
disposição constitucional contida no § 10 do art. 201.
144
5.1 Benefícios atuais
Os benefícios acidentários existentes atualmente, regulamentados
pela Lei 8.213/91, em sua redação atual, são idênticos, inclusive em valores,
apenas com títulos e códigos diferentes no regulamento da autarquia, a saber:
O auxílio-doença acidentário, código 91, consiste numa renda
mensal correspondente a 91% do salário-de-benefício; sendo o mesmo valor e as
mesmas condições para concessão do auxílio-doença previdenciário, código 31,
(artigos 59 a 63 da Lei 8.213/91). Conforme descrito nos Capítulos 2 e 3, as duas
pequenas diferenças, mantendo o auxílio-doença acidentário mais favorável que o
auxílio-doença previdenciário são: a garantia de emprego por um ano (art. 118 da
Lei 8.213/91), e o depósito relativo ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
durante o período de afastamento (art. 4º, parágrafo único, CLT).
A aposentadoria por invalidez acidentária, código 92, será a renda
mensal igual a 100% do salário-de-benefício, novamente com iguais condições e
valores que a aposentadoria por invalidez previdenciária, código 32, (artigos 42 a
47 da Lei 8.213/91). Neste benefício não sobra qualquer diferença monetária que
possa gerar interesse para processo contra a autarquia federal; a não ser que a
caracterização do nexo causal possa ser proveitosa para outras contendas, como
por exemplo questionando a responsabilidade civil do empregador.
A pensão por morte acidentária, código 93, será de cem por cento
do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito
se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento,
independentemente do número de dependentes. E, desde 1995, a pensão por
morte previdenciária, código 21, tem o mesmo valor (artigos 74 a 79 da Lei
8.213/91). Da mesma forma que a aposentadoria por invalidez, o interesse
processual pode existir se for relacionado a outras ações.
145
Por fim, o auxílio-acidente, código 94, teria caráter indenizatório e
era exclusivo para acidentes do trabalho e seus equiparados. As transformações
a partir da Lei 9.032/95 descaracterizaram este benefício como acidentário. Pelas
regras atuais, deve ser concedido ao segurado quando, após consolidação das
lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que
impliquem redução da capacidade para o trabalho que o segurado habitualmente
exercia. Desta forma, uma fratura tanto quando resultante do futebol na praia
durante o fim de semana quanto de um acidente na área industrial, caso reduza a
capacidade laboral, produzirá a mesma renda mensal complementar, no valor de
50% do salário-de-benefício. Com estas novas características, o código 94
continua para o auxílio-acidente acidentário (por mais que seja um pleonasmo),
com o novo auxílio-acidente denominado previdenciário, com o código 36.
O auxílio-acidente passou a ser inacumulável com outro de igual
espécie, mesmo se decorrente de sinistro diferente, e também se tornou vedada
sua acumulação com qualquer tipo de aposentadoria, conforme descrito nas
análises do Capítulo 3, tópicos 3.4 e 3.5. A partir da Lei nº 9.032, de 28/04/1995, o
art. 124 da Lei nº 8.213/91 passou a conter o inciso V, impedindo o recebimento
conjunto de mais de um auxílio-acidente. E a partir de 10/11/1997, através da
Medida Provisória nº 1.596-14, o benefício acidentário passou a ter o seu
pagamento até a véspera do início de qualquer aposentadoria (art. 86, § 1º),
conforme narrado no Capítulo 2, item 2.1.8.
A inacumulabilidade do auxílio-acidente com a aposentadoria
estaria reforçado no mesmo art. 86, § 2º, da Lei 8.213/91, também a partir de
10/11/1997. E suscita alguma disputa jurídica. Da mesma forma é importante
estudar como a jurisprudência recebeu o § 4º do art. 86 da Lei 8.213/91, restritivo
à concessão do benefício acidentário especificamente em casos de disacusia
neurosensorial bilateral.
146
5.1.1 Jurisprudência – aplicabilidade e interpretação das
transformações legais
Sobre o seguro compulsório de acidentes do trabalho ainda com a
administração monopolizada pela autarquia previdenciária federal, alguns pontos
merecem exame na jurisprudência, porquanto as alterações na lei poderiam exigir
mudanças em pontos consolidados nos tribunais e na doutrina. É preciso
ressaltar, de plano, que não aconteceram mudanças na jurisprudência, como
pareciam pretender os legisladores.
O auxílio-acidente acumulado com a aposentadoria fazia parte da
evolução da legislação infortunística. A vitaliciedade da indenização mensal
continuada representa a reparação por perda contínua causada pelo sinistro, com
a irreversível redução da capacidade laboral do trabalhador. Os benefícios
concedidos enquanto o texto legal determinava a vitaliciedade, até 10/11/1997,
não poderiam ser alterados por qualquer lei posterior; o art. 5º, inciso XXXVI, da
Carta Magna, garante que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada”. Porém, assim não pensa o instituto previdenciário,
interrompendo benefícios que foram concedidos enquanto vitalícios e sofrendo
razoáveis revezes em tal assunto.
A partir de 11/11/1997, com a vigência da nova redação legal, §§
1º e 2º do art. 86 da Lei 8.213/91, a interpretação literal do texto legal poderia
indicar que o auxílio-acidente passaria a ser concedido com o impedimento à
acumulação com qualquer tipo de aposentadoria, quando na realidade o que fica
impedido é a recepção de aposentadoria pela mesma razão, pelo mesmo
acidente.
Existe uma determinação constitucional de um seguro de
acidentes do trabalho, específico, sob responsabilidade exclusiva do empregador,
e, portanto, com contribuições próprias, com benefícios também próprios,
147
específicos. E a aposentadoria, não sendo por invalidez decorrente do mesmo
acidente do trabalho, teria o seu custeio no sistema previdenciário diverso, com
contribuições do empregado e do empregador; enquanto o auxílio-acidente
estaria custeado pelo seguro de acidentes do trabalho, outro sistema securitário.
Desta forma se entende que a vedação à acumulação de auxílio-
acidente com aposentadoria só se aplica se a aposentadoria tiver como
fundamento o mesmo fato gerador; conforme exposto no Capítulo 3, item 3.4,
mais de um benefício em relação ao mesmo acidente nunca foi possível. Além
disso, o art. 124 da Lei 8.213/91 é o que dispõe os benefícios que são
inacumuláveis, e neste não consta tal condição de inacumulabilidade entre
auxílio-acidente e qualquer aposentadoria.
No extinto Segundo Tribunal de Alçada Civil, atualmente integrado
ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, existem importantes julgados
formando entendimentos mais favoráveis aos trabalhadores. Bom exemplo se
encontra, na 6ª Câmara, em embargos de declaração (nº 755.973-01/0) com
julgamento em 06/04/2005, com o voto da lavra do Desembargador Andrade
Neto, confirmando o caráter vitalício do auxílio-acidente:
É aplicável à espécie a lei 8.213/91, com as alterações
dadas pelas Leis 9.032/95 e 9.528/97, mantendo o benefício
do auxílio-acidente seu caráter vitalício, não podendo ser
cancelado em caso futuro de concessão de aposentadoria
previdenciária, por tempo de serviço ou especial. É inaplicável
o IPCA-E para atualização do débito inscrito no precatório a
ser expedido.
Trata-se de um julgado de embargos de declaração, em que o
instituto previdenciário busca o reconhecimento de que o benefício auxílio-
acidente concedido após a promulgação da Lei 9.528/97 cessaria em caso de
148
eventual aposentadoria do segurado, qualquer que seja sua natureza, posição da
qual divergiu o digno Relator:
No intuito de não sobrepairar nenhuma dúvida a respeito,
inclusive para evitar cancelamento administrativo do benefício pela autarquia, há
que se consignar expressamente que o benefício do auxilio acidente concedido
tem caráter vitalício, não devendo ser cancelado em caso de eventual advento
de aposentadoria previdenciária, seja por tempo de serviço, seja a especial,
porque inaplicáveis, por inconstitucionalidade, os artigos §§ 1º e 2º do artigo 86
da Lei 8.213/91, modificados pela Lei 9.528/97.
Segundo entendimento consolidado na 6ª Câmara do extinto 2º
TAC/SP a inacumulabilidade pretendida pelo instituto não consta no art. 124 da
Lei 8.213/91 e assim o art. 86, § 2º, veda apenas a cumulação de auxílio-acidente
com aposentadoria que tenha por fundamento o mesmo fato gerador. Afinal, em
outras hipóteses se trataria de benefícios com causa e fonte de custeio diversos.
O acórdão citado colaciona importantes julgados:
“Mesmo após a vigência da Lei 9.528/97, que alterou a redação
do artigo 86 da Lei 8.213/91, é possível a cumulação de aposentadoria
previdenciária com auxílio-acidente, pois a referida alteração legislativa,
interpretada em conjunto com o art. 124 do mesmo diploma, conduz à
conclusão de que é vedada, apenas a cumulação daquele benefício com
aposentadoria que tenha por fundamento o mesmo fato gerador, o que não
ocorre na espécie” (Apelação nº 553.169/2, Rel. Juiz Thales do Amaral, v.
1469).
“Não há vedação à cumulação dos benefícios mencionados
porque oriundos de fatos geradores diversos, não se cogitando de aplicação, à
espécie, do artigo 86 da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.528/97”
(Apelação nº 557.484/5, Rel. Juiz Luiz de Lorenzi, v. 1297)
149
“(...) a Lei 9.528 não revogou o art.124 da Lei 8.213/97, ao qual,
ao elencar os benefícios inacumuláveis, não exclui a possibilidade de
cumulação de aposentadoria por tempo de serviço com auxílio-acidente, o qual
leva interpretar-se o art. 86, § 2º, na sua redação modificada, como estando a
vedar a cumulação do auxílio-acidente com aposentadoria que tenha por
fundamento o mesmo fato gerador” (Apelação nº 546.487/2, Rel. Juiz Lino
Machado, v. 547).
A admissão da cumulabilidade de auxílio-acidente com
aposentadoria também está presente em julgados do Superior Tribunal de
Justiça. Alguns, acompanhando a fundamentação do tribunal paulista, admitem a
acumulação de benefícios que contenham pressupostos fáticos e fatos geradores
diversos. Nos dois julgados apresentados como exemplo, ainda vale a pena
provar o nexo causal, sem qualquer proibição de cumulação entre o auxílio-
doença e a aposentadoria:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. AUXÍLIO-ACIDENTE.
POSSIBILIDADE.
- Em tema de acumulação de benefícios previdenciários que apresentam
pressupostos fáticos e fatos geradores, é pacífico o entendimento desta
Colenda Corte no sentido de que é legítima e legal a percepção cumulativa
da aposentadoria especial por tempo de serviço e do auxílio-acidente, desde
que comprovado o nexo de causalidade entre a doença adquirida e o efetivo
desempenho das atividades funcionais.
- Recurso Especial conhecido e provido
(STJ – 6ª Turma – REsp 164662/SP, Rel. Min Vicente Leal, DJ 01.06.1998, p.
214)
9.528/97PREVIDENCIÁRIO. – CUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE E
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO – POSSIBILIDADE – ART. 86
DA LEI 8.213/91 – RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO.
150
- A Lei nº 8.213/91, através do art. 86 e seus parágrafos, unificou o
regramento dos benefícios previdenciários de auxílio-suplementar e auxílio-
acidente.
- A terceira Seção deste E. Tribunal já firmou entendimento no sentido da
possibilidade de cumulação de Aposentadoria Especial e Auxílio-Acidente,
desde que comprovado o nexo causal entre a doença e a atividade
laborativa, o que é o caso dos presentes autos.
- Em face à possibilidade legal de cumulatividade dos benefícios, faz jus o
recorrido ao restabelecimento de seu benefício, desde a data da suspensão,
bem como à devolução dos valores indevidamente descontados, atualizados
monetariamente.
- Recurso conhecido e desprovido.
(STJ – 5ª Turma – REsp 321524/RS, Rel. Min Jorge Scartezzini, DJ 20.08.2001,
p. 530)
Em outros julgados, a Corte entendeu que realmente a alteração
legislativa tornava o auxílio-acidente inacumulável com qualquer tipo de
aposentadoria, mas para manter a vitaliciedade do benefício, admite-se que o
acidente ou a moléstia geradores da redução na capacidade laboral da vítima
possam ter ocorrido ou surgido anteriormente à edição da Lei:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. LEI 9.032/95. ART. 86 DA LEI
8.213/91. AUXÍLIO-ACIDENTE. 50%. LEI PREVIDENCIÁRIA MAIS BENÉFICA.
SEGURADO. RETROATIVIDADE. CUMULATIVIDADE. AUXÍLIO-ACIDENTE.
APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO CONFIRMA MOLÉSTIA
ANTERIOR. JUROS. CITAÇÃO.
- O percentual de 50% referente ao auxílio-acidente, estabelecido pela Lei nº
9.032/95, que altera o § 1º do art. 86 da Lei nº 8.213/91, tem aplicação
imediata, aplicando-se sobre os benefícios concedidos sob o pálio da
legislação anterior.
- Esta Corte já pacificou o entendimento de que o benefício acidentário,
anteriormente indenizatório e vitalício, devido independentemente de
qualquer outra verba percebida pelo segurado, com a edição da Lei
9.528/97, passou a ser inacumulável com o benefício aposentadoria.
151
- Entretanto, conforme o entendimento assentado neste Tribunal, quando o
acórdão recorrido confirmar que a moléstia ocorreu antes do advento da lei
que vedou a cumulação é possível perceber, conjuntamente, os referidos
benefícios.
- É pacífico o entendimento de que a incidência dos juros de mora, nas ações
previdenciárias, ocorrerá a partir da citação.
- Recurso do obreiro conhecido e provido.
- Recurso do INSS conhecido e desprovido.
(STJ – 5ª Turma – REsp 705635/SP, Rel. Min José Arnaldo da Fonseca, DJ
11.04.2005, p. 377)
A outra alteração legal que merece ser analisada através da
jurisprudência é a atual redação do § 4º do art. 86 da Lei 8.213/91, dispondo:
Art. 86 (...)
§ 4º A perda da audição, em qualquer grau, somente
proporcionará a concessão do auxílio-acidente, quando, além do
reconhecimento de causalidade entre o trabalho e a doença, resultar,
comprovadamente, na redução ou perda da capacidade para o trabalho que
habitualmente exercia.
Neste caso, a alteração na lei não teve qualquer conseqüência na
jurisprudência. O Superior Tribunal de Justiça continua aplicando sua Súmula 44:
A definição, em ato regulamentar, de grau mínimo de disacusia,
não exclui, por si só, a concessão do benefício previdenciário.
É preciso observar, conforme descrito no capítulo 3, item 3.5, que
a concessão do auxílio-acidente nos casos de disacusia neurosensorial bilateral
consolidou-se visando impedir o agravamento da moléstia. Desde a Lei 6.367/76
e prosseguindo na redação original do art. 86 da Lei 8.213/91, o auxílio-acidente
no valor de 40% da base mais favorável era devido quando a redução da
capacidade laborativa do acidentado o obrigava, com a reabilitação profissional, a
152
mudar de atividade. Portanto, na ocorrência de surdez profissional, mesmo em
grau mínimo, mas com certo agravamento se o trabalhador continuar submetido a
ruídos excessivos, deve ocorrer a concessão do auxílio-acidente, atualmente em
50% do salário-de-benefício, com as restrições médicas necessárias para que a
disacusia não tenha o seu certo agravamento.
O Instituto Nacional do Seguro Social continua não admitindo a
concessão de auxílio-acidente em razão da disacusia; assim, sempre restou a via
judicial. Em casos de maior gravidade a incapacidade pode levar à concessão da
aposentadoria por invalidez, mas o auxílio-acidente em razão da disacusia na
grande maioria das vezes ocorre pelo ajuizamento de ações. Os tribunais sempre
entenderam a necessidade de mudança de atividade – para retirar o obreiro dos
locais ruidosos e assim evitar o agravamento – enquanto incapacidade laborativa.
O instituto pretendeu uma interpretação da atual redação da lei
como se fosse um impedimento ao caminho forense. Mas o Superior Tribunal de
Justiça, em julgados recentes, ocorridos 2004 e 2005, continua aplicando a sua
Súmula 44, mantendo o conceito de incapacidade laboral mesmo com a disacusia
em grau mínimo, como demonstra o exemplo de três julgados já na vigência da
atual redação da lei:
PROCESSO CIVIL – RECLAMAÇÃO – PREVIDENCIÁRIO – RECURSO
ESPECIAL – DISACUSIA EM GRAU MÍNIMO – SÚMULA 44/STJ –
APLICABILIDADE – PEDIDO PROCEDENTE.
1 A Reclamação tem por escopo a preservação da competência desta Corte,
bem como a garantia da autoridade de suas decisões (art. 105. I, “f”, da
Constituição Federal c/c art. 187, do RISTJ). Tendo sido determinado um
novo julgamento, evidente que o acórdão ora apontado como desobedecido
anulou o acórdão do Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São
Paulo, que ratificou a sentença de primeiro grau, e, por celeridade
processual, devolveu-o ao juízo monocrático, que é o que tem competência
para reapreciar a questão. Desta forma, resta evidente o intuito
procrastinatório da autoridade coatora ao não julgar novamente a ação, de
153
acordo com a existência ou não do nexo de causalidade entre o prejuízo e o
trabalho realizado.
2 Precedentes (EREsp 327.681/SP, EDREsp 327.684/SP e REsp
304.570/SP).
3 Reclamação procedente, determinando-se à autoridade reclamada o
imediato cumprimento do decidido no julgamento do REsp 57.315-7/SP,
julgando a causa na primeira instância, desconsiderando-se o limitativo do
grau de disacusia e verificando-se a existência ou não do nexo de
causalidade entre o dano e o trabalho realizado.
(STJ – 3ª Seção – Rcl 543/SP, Rel. Min Jorge Scartezzini, DJ 26.04.2004, p.
142)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. DISACUSIA EM GRAU MÍNIMO.
INCAPACIDADE INDENIZÁVEL. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO
TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA Nº 44/STJ.
1. Se o Tribunal de origem, ao negar o benefício previdenciário, invocou
somente a perda auditiva do trabalhador, sem manifestar-se expressamente
sobre os outros requisitos legais, contrariou o enunciado nº 44 de nossa
Súmula.
2. Recurso parcialmente provido.
(STJ – 6ª Turma – REsp 705635/SP, Rel. Min Paulo Gallotti, DJ 04.10.2004, p.
342)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. DISACUSIA. SÚMULA Nº 44/STJ. INAPLICABILIADE.
AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA E DE NEXO CAUSAL
CONSTATADA PELA CORTE DE ORIGEM, NÃO EM DECORRÊNCIA DO
GRAU MÍNIMO. REVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. ANÁLISE DE
MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA Nº 07 DO STJ. PRECEDENTE.
1. Quando o motivo da denegação do auxílio-acidente for tão-somente o grau
mínimo da perda auditiva – estando presentes o nexo causal e a
incapacidade laborativa –, o benefício acidentário não pode ser recusado ao
obreiro. (Inteligência da Súmula nº 44 desta Corte).
2. Todavia, in casu, a Corte de origem reconheceu a inexistência tanto de
incapacidade laborativa quanto do nexo causal, não em decorrência do grau
154
mínimo, mas sim, em face da análise do conjunto fático-probatório dos
autos. Desse modo, é inviável a pretensão recursal no sentido de se reverter
o julgado, em razão do comando contido na Súmula nº 07 do STJ.
3. Agravo regimental desprovido.
(STJ – 5ª Turma – AgRg no REsp 762741/SP, Rel. Min Laurita Vaz, DJ
17.10.2005, p. 350)
O período contabilizado desde o início das alterações da atual
legislação infortunística, então pela Lei 9.032/95, possivelmente ainda é pequeno,
e, como leciona Carlos Maximiliano, “parece preferível só chamar jurisprudência
ao uniforme e constante pronunciamento sobre uma questão de Direito, da parte
dos tribunais”; porém, o citado processualista também confirma que “a
jurisprudência é a causa mais geral da formação de costumes jurídicos nos
tempos modernos”
176
.
De qualquer forma, os julgados apresentados – tanto em relação
à cumulabilidade de auxílio-acidente e aposentadoria quanto à concessão de
auxílio-acidente em razão da surdez profissional – acompanham a consolidada
jurisprudência formada antes das alterações legislativas; confirmam os
entendimentos formados nos tribunais, interpretando as modificações legais com
análise sistemática. Entendimentos humanitários consolidados na jurisprudência
não foram alterados com as novas redações da lei. No Direito Social as
mudanças devem ser favoráveis aos trabalhadores e não restritivas como
poderiam dar a entender equivocadas interpretações da redação atual.
Conforme ensina Wagner Balera, o método sistemático deve levar
em conta os demais recursos da exegese, e é o melhor dentre os métodos de
interpretação, especialmente no direito previdenciário
177
.
176
Carlos MAXIMILIANO, Hermenêutica e aplicação do direito, p. 186-187.
177
Cf. Wagner BALERA, Sistema de seguridade social, p. 133-160.
155
5.2 Responsabilidade civil
É matéria bastante atual a indenização que o empregador fica
obrigado a pagar nos casos de acidentes do trabalho ocorridos por sua culpa ou
dolo. O Capítulo 4 deste trabalho expõe e analisa tal indenização de forma
bastante restrita, enquanto complemento do seguro compulsório. As obras citadas
neste texto, da lavra de Maria Helena Diniz, Silvio Rodrigues e Sílvio de Salvo
Venosa, entre outros, analisam a responsabilidade civil com estudos completos e
de diversos pontos de vista.
Este trabalho trata de indenização por acidente do trabalho. A
indenização pelo seguro obrigatório corresponde à responsabilidade objetiva. A
indenização por responsabilidade civil significa um complemento, com caráter
subjetivo, dependente da culpa do empregador e não incluído na cobertura do
seguro obrigatório.
Considerando a culpa simples (item 4.2), e a cumulatividade com
o benefício do seguro compulsório, as ações judiciais com este fundamento
ocupam um lugar de razoável destaque no moderno mundo jurídico.
Conforme descrito no item 4.4, apesar de algum entendimento
divergente, a possibilidade de cumulação da indenização do empregador,
fundamentada na responsabilidade subjetiva, com outra indenização decorrente
do seguro compulsório, baseado na responsabilidade objetiva, continua a atual
doutrina majoritária.
Recentemente resolvidas as questões acerca da competência
para a apreciação das ações indenizatórias contra os empregadores, estas
adquirem um veio próprio, construindo seus procedimentos e valores e suscitando
questões e contradições que apenas o tempo e a prática irão solucionar.
156
5.2.1 Competência para julgamento e outras considerações
Datada de 14 de novembro de 1990, a Súmula 15 do Superior
Tribunal de Justiça dispunha que “compete à Justiça Estadual processar e julgar
os litígios decorrentes de acidente do trabalho”. E o Supremo Tribunal Federal
confirmava este ditame, com base na aplicação do art. 109, inciso I, da Carta
Magna:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa
pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou
oponentes, exceto as de falência, as de acidentes do trabalho e as (...).
Pois entendiam os tribunais a aplicação da exceção prevista no
artigo 109, I, também quando a União, entidade autárquica ou empresa pública
federal, não fossem interessadas, em qualquer condição.
Instigaram muitas dúvidas as confirmações por parte do Supremo
Tribunal Federal sobre a Súmula 15 do Superior Tribunal de Justiça. Afinal, o art.
109 da Carta Magna determina a competência do juiz federal nas ações em que a
autarquia federal seja parte, com exceção das que se relacionam com acidentes
do trabalho. Utilizar a exceção em ações do empregado contra o empregador,
significava o derivado sem o principal.
A Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004,
dispôs algum reforço para o art. 114, com a redação do inciso VI, mas sem
qualquer alteração que se referisse ao art. 109 ou sua interpretação.
157
Assim, o art. 114, inciso VI, da Carta Magna traz a seguinte
redação:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
(...) VI. as ações de indenização por dano moral ou patrimonial,
decorrentes da relação de trabalho;
Se a exceção dos acidentes do trabalho continuar valendo, nada
estará modificado quanto a competência para julgamento das ações
indenizatórias por perdas e danos morais e materiais decorrentes de acidentes do
trabalho e seus equiparados, doenças ocupacionais, acidentes in itinere e tudo o
mais. Continuariam na Justiça do Estado; mesmo com a determinação presente
na Emenda Constitucional 45/04.
Acatando as transformações do Direito, o Supremo Tribunal
Federal, no julgamento do Conflito de Competência nº 7.204, em 29 de junho de
2005, tendo como Relator o Ministro Carlos Britto, alterou a interpretação sobre o
art. 109, I da Carta Magna, efetivando (pelo menos por enquanto), “a transposição
da competência para julgar as ações de indenização por acidente do trabalho da
Justiça Comum dos Estados para a Justiça do Trabalho”, como afirma Sebastião
Geraldo de Oliveira
178
.
Muito importante também o julgado sobre o Conflito de
Competência nº 7244/MG, em 08 de novembro de 2005, tendo como Relator
também o Ministro Carlos Britto, valendo destacar dois tópicos:
(...) 2. Por meio dele, conflito, discute-se a competência para
processar e julgar ação indenizatória por danos morais e patrimoniais
decorrentes de acidente do trabalho, quando tal ação é proposta por empregado
178
Sebastião Geraldo de OLIVEIRA, Cumulação da indenização por acidente do trabalho com os benefícios
acidentários, Revista LTr, 69, 11, p. 1304.
158
contra o seu empregador. Donde a controvérsia: competente é a Justiça comum
estadual, ou a Justiça especializada do trabalho?
3. Este é o aligeirado relato do feito. Passo a decidir. Ao fazê-lo,
anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do CC 7204,
de que fui Relator, revisou sua interpretação do inciso I do art. 109 da
Constituição Federal. E o fez para concluir que as ações de indenização por
danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que
movidas pelo empregado contra seu empregador, são da competência da
Justiça do Trabalho, o que já transparecia da redação originária do art. 114 da
Lex Legum. Nada obstante essa revisão jurisprudencial, por uma questão de
imperativo de política judiciária (haja vista o significativo número de ações que já
tramitaram e ainda tramitam nas instâncias ordinárias, bem como o relevante
interesse social em causa), o Plenário decidiu, também no sobredito julgamento,
que o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento da EC
45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laboral na matéria em
apreço.
Portanto, apesar da alteração no art. 114 da Carta Magna não
tratar diretamente da competência para processar e julgar ações indenizatórias
com relação ao acidente do trabalho, a mudança no entendimento da Suprema
Corte utiliza a data da Emenda Constitucional nº 45, 08/12/2004, para a
transposição da competência.
Sem colocar em discussão o que seria melhor para os
trabalhadores acidentados, mesmo porque não seria cabível debater conjecturas,
parece bastante evidente que a exceção do art. 109, I, da Constituição Federal,
não é aplicável em ações em que o instituto previdenciário não participa.
Com a Justiça do Trabalho, em seus procedimentos mais céleres
e informais, talvez se resolvam alguns problemas que recentemente têm surgido e
valem algumas considerações.
159
Nas ações indenizatórias relacionadas aos acidentes do trabalho
e doenças ocupacionais são necessários os seguintes componentes: o sinistro e
o nexo causal com a atividade, a seqüela com redução ou supressão da
capacidade laboral, a culpa da empresa e as perdas morais e patrimoniais
decorrentes.
A culpa da empresa pode ser presumida, por negligência ou
omissão, porque somente a própria empregadora pode e deve provar o contrário;
e perícias nos locais de trabalho em nada constrangem ou agridem aos
trabalhadores acidentados. Porém, os exames médicos, quando desnecessários,
são agressivos e praticamente coagem os trabalhadores a evitar o ajuizamento de
ações. Vale o aproveitamento de todos os processos administrativos da autarquia
previdenciária – principalmente quando o próprio instituto previdenciário tenha
admitido o acidente do trabalho, com seu nexo causal e com a seqüela que restou
ao obreiro, aposentando-o por invalidez ou concedendo o auxílio-acidente – e
mesmo as perícias que possam ter sido realizadas em ações acidentárias contra
o Instituto Nacional do Seguro Social. Basta imaginar os trabalhadores
acometidos pelas doenças profissionais, como as intoxicações por benzeno ou
outros produtos químicos, ou as tendinites, denominadas Distúrbios
Osteomusculares Relacionados ao Trabalho – DORT, sofrendo toda a espécie de
constrangimentos próprios de perícias médicas...
Nas ações indenizatórias por responsabilidade subjetiva também
se discutem formas e valores de indenizações. Danos morais são de difícil e
subjetiva avaliação, enquanto danos patrimoniais relativos ao tratamento médico,
hospitalar e farmacêutico, mas principalmente sobre a redução da capacidade
laborativa, necessitam de apreciação técnica.
Da mesma forma que no futuro próximo estará em discussão um
seguro de acidente do trabalho obrigatório, administrado pelo regime público ou
pelas seguradoras privadas, caberá também definir a melhor forma de
indenização: por pagamento único de maior valor ou por pagamentos mensais
160
continuados que suplementem a condição de vida do trabalhador. Na indenização
por responsabilidade civil do empregador existe a mesma dúvida.
O pagamento mensal continuado, mesmo com período de
duração predeterminado, pode ser maior garantia para o trabalhador acidentado,
mas é claro que este tipo de indenização por longos anos não se consegue
executar sobre pequenas empresas sem estabilidade econômica.
A competência para processar e julgar as ações indenizatórias
por perdas morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho ajuizadas
pelo empregado contra o seu empregador está resolvida. O autor desta
dissertação, um otimista inveterado, acredita que rapidamente se consolidará um
procedimento específico na Justiça trabalhista, com a adoção de mecanismos que
resguardem os direitos dos trabalhadores.
161
5.3 Projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional
Até a última pesquisa realizada para este trabalho
179
, o
atendimento concorrencial do seguro contra acidentes do trabalho, entre o regime
geral de previdência social e o setor privado, ainda não está disciplinado por lei.
Tramita no Congresso Nacional um bom número de projetos de lei, alguns
merecendo exame e talvez nenhum representando o que será um novo tipo.
Importante, portanto, uma rápida análise de alguns projetos:
O Projeto de Lei nº 325, de 1999, de autoria do deputado Cunha
Bueno, apresenta o seguro de acidentes do trabalho, “de contratação obrigatória
pelo empregador”, “no Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, numa
companhia seguradora privada ou numa cooperativa, autorizadas a operar nessa
modalidade de seguro, em igualdade de condições técnicas, respeitados os
princípios da livre iniciativa”. Com a intenção de regulamentar a privatização do
Seguro de Acidente do Trabalho, SAT, define a cobertura através de seguradoras
ou cooperativas, além do INSS, que estará automaticamente cobrindo os
empregadores que não efetuem contrato com aquelas. Sem grandes novidades,
envia “condições, tarifas, limites e critérios de indenização, bem como as normas
disciplinares aplicáveis” para regulamentação “pelo Conselho Nacional de
Seguros Privados”. Segundo o projeto de Cunha Bueno “o contrato de seguro terá
como cobertura básica o acidente que se verifique em razão do exercício do
trabalho, que provoque lesão corporal, perturbação funcional, perda ou redução
(permanente ou temporária) da capacidade laboral, ou morte do trabalhador, bem
assim as doenças profissionais do trabalho”. O acidente de percurso “poderá ser
objeto de contratação complementar pelo empregador”, o que significa conceitos
diferentes da tradicional legislação infortunística brasileira, que consolidou o
acidente de percurso enquanto acidente do trabalho.
179
As informações deste tópico foram prestadas pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar,
DIAP, em Brasília.
162
O Projeto de Lei nº 325/99 está anexado ao Projeto de Lei nº
4.881/98, de autoria de Joana D’arc e Walter Pinheiro. Este projeto pretende
obrigar “os empregadores a manter medidas preventivas contra acidentes do
trabalho e dá outras providências”. Assim, regulamenta medidas preventivas, que
“devem ser objeto de negociações coletivas”, e aponta que o “ambiente de
trabalho insalubre, periculoso ou penoso, amplia a responsabilidade civil do
empregador, para efeitos de pagamento de indenização por perdas e danos ao
empregado acidentado”. Apresenta ainda sanção (impedimento de participação
em concorrências públicas) para “empresas que apresentarem alto índice de
acidentes do trabalho”, que seria “a ocorrência de dois acidentes ao ano para
cada grupo de cem trabalhadores, ou até cem trabalhadores, aí incluídos os
empregados de empresas prestadoras de serviço”.
De autoria do deputado Antônio Medeiros, o Projeto de Lei nº
2.037, de 1999, apresenta o “seguro obrigatório de acidentes do trabalho (...)
executado por entidades de direito privado, sem fins lucrativos, denominadas
Mútuas de Acidentes do Trabalho e Doenças Ocupacionais – MAT”. Seriam
criadas as “Mútuas”, por “organizações ou grupos privados”, que garantiriam “em
ação conjunta com as empresas filiadas, a proteção integral aos empregados
beneficiários, promovendo e executando, diretamente ou mediante contratos ou
convênios, ações de prevenção, e, às vítimas de acidente do trabalho,
reabilitação profissional e social, assistência médica e reparação dos danos
advindos de acidente do trabalho, e concessão de benefícios temporários e
permanentes”. Este projeto apresenta ainda a forma de organização das Mútuas
de Acidentes do Trabalho e Doenças Ocupacionais – MAT e o cálculo da
arrecadação e de sua distribuição. A criação de Mútuas sem fins lucrativos por
organizações ou grupos privados pode não corresponder ao ideal de previdência
privada estampado na Lei Complementar n. 109, de 12.07.2001. Este Projeto de
Lei nº 2.037/99 também foi anexado ao Projeto de Lei nº 4.881/98, da ex-
deputada Joana D’arc.
O Projeto de Lei nº 3.101-A, de 2000, de Simão Sessim,
apresentava uma idéia de assistência médica custeada, “direta ou indiretamente”,
163
pelo empregador, mas já foi arquivado. Afinal, o artigo 196 da Carta Magna
prescreve que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”.
Dois Projetos de Lei, 4.030 e 4.038, ambos de 1997 e de autoria
de Paulo Paim, buscavam alguma recomposição do auxílio-acidente, disposto no
artigo 86 da Lei 8.213/91, frente às alterações desde 1995. Estes e mais dois
Projetos de Lei, 2.330 e 3.020, de 2.000 e autoria de José Carlos Coutinho,
visando a extensão do benefício auxílio-acidente ao empregado doméstico, foram
anexados ao Projeto de Lei nº 9.864, de 1998 e de autoria da ex-senadora
Marluce Pinto.
Como se depreende, por um lado a falta de regulamentação do
novo tipo de seguro de acidentes do trabalho suscita dúvidas que se expressam
bastante através de ações judiciais, ou de falta delas; por outro ainda podem ser
esperados debates e civilizadas altercações, em busca dos melhores caminhos
para proteção aos trabalhadores.
164
Conclusões
As indenizações, por mais que tentem tornar indene, incólume,
ileso, o trabalhador acidentado, dificilmente poderão sanar integralmente seqüelas
de acidentes do trabalho ou de doenças ocupacionais. Até porque os sinistros
laborais exigem muito mais do que qualquer tipo de indenização. Exigem
prevenção, condições dignas de trabalho, equipamento de proteção coletivos e
individuais, estudos ergonômicos dos locais de trabalho e todas as melhorias
tornadas possíveis com a evolução tecnológica. De qualquer forma, as
indenizações, até para auxiliar na prevenção, são sempre louváveis.
Os acidentes do trabalho passam a contar como importantes
ocorrências a partir da Revolução Industrial, com o surgimento das linhas de
montagem. E a construção doutrinária sobre o tema se desenvolve pela
imputação de responsabilidade. A responsabilidade é do patrão, com culpa ou
sem culpa, ou a responsabilidade é da sociedade? No início a responsabilidade
patronal era de caráter subjetivo, pela culpa aquiliana, acompanhando o Direito
Civil. Em uma primeira etapa define-se a culpa contratual, com a atribuição do
onus probandi para o empregador, mas o mais importante foi alcançar a teoria da
responsabilidade objetiva, prescindindo da culpa, o que se deu aqui no Brasil pelo
Decreto Legislativo nº 3.724/19.
Segue a legislação brasileira, atingindo o seguro compulsório e o
monopólio estatal, entre o Decreto-lei nº 7.036/44 e a Lei 5.316/67. No presente
momento de transição, ainda se aguarda a regulamentação da disposição incluída
pela Emenda Constitucional nº 20/98 (art. 201, § 10), que deverá dispor sobre a
165
cobertura do risco de acidente do trabalho, atendida concorrentemente pelo
regime geral de previdência social e pelo setor privado.
A contenda doutrinária que ainda acontece se refere ao acidente
do trabalho enquanto risco profissional ou risco social. Que o seguro contra
acidente do trabalho é responsabilidade objetiva, sem necessidade de culpa,
ninguém mais tem dúvidas; o acidente do trabalho é um fantasma que segue
assolando as áreas laborais, e ainda mais quando se tem em conta as doenças
ocupacionais. O acidente do trabalho é igual a qualquer outro risco social quando
se pensa em garantias de sobrevivência, em condições dignas, quando falta ao
trabalhador exatamente a sua força de trabalho, mas é diferente quando se
observa a origem do risco.
Sendo o acidente do trabalho um risco social, o sistema
previdenciário deve dar cobertura às necessidades do trabalhador, qualquer que
seja a origem do sinistro; porém, como risco profissional, é necessária uma
indenização diferenciada, mediante seguro a cargo do empregador, sob
responsabilidade objetiva. Assim estipula a Constituição Federal promulgada em
1988.
As alterações na legislação ordinária a partir da Lei 9.032/95,
retiraram quaisquer diferenças entre os benefícios previdenciários e os
acidentários. Em suma, impuseram na prática, pouco a pouco, a extinção do
seguro acidentário obrigatório e diferenciado. Por outro lado, a Carta Magna de
1988 também garante mais uma indenização por acidente do trabalho, no caso de
dolo ou culpa do empregador. Poderia significar que a extinção prática do seguro
compulsório administrado pelo instituto previdenciário suscitasse maior
ajuizamento de ações de responsabilidade civil contra o empregador, agora
tramitando na Justiça trabalhista.
Uma análise da Constituição Federal, em particular os artigos 7º,
inciso XXVIII e 201, inciso I, observará o acidente do trabalho coberto junto com
166
os demais riscos sociais, mas também terá que atentar para a garantia de um
seguro indenizatório específico e compulsório a cargo exclusivo do empregador,
além da possível indenização na responsabilidade subjetiva. Portanto, a
Constituição brasileira, em relação aos acidentes do trabalho, tem sua
fundamentação em três teorias da doutrina: teoria do risco social quando engloba
acidente do trabalho na cobertura pelo sistema previdenciário; teoria do risco
profissional porque exige um seguro a cargo do empregador contra acidentes do
trabalho; e, por fim, a responsabilidade da culpa ou dolo para mais uma
indenização, desta vez não coberta pelo seguro.
Com todas as falhas e malformações que o seguro de acidentes
do trabalho previsto na redação original da Lei 8.213/91 pudesse ter,
minimamente cumpria o disposto no art. 7º, XXVIII, 1ª parte, da Constituição
Federal. As diferenças entre os valores dos benefícios, mais favoráveis quando
decorrentes de acidentes do trabalho, e o benefício indenizatório exclusivo para
seqüelas relativas a sinistros laborais, o auxílio-acidente, eram indenizações
suplementares, além dos benefícios oferecidos pelo regime geral de previdência
social.
As alterações legislativas entre 1995 e 1998, equiparando os
benefícios e ampliando a aplicabilidade do auxílio-acidente para seqüelas de
acidentes de qualquer natureza, culminava a integração dos acidentes do trabalho
aos demais riscos sociais. Restava apenas a contribuição patronal diferenciada
para o seguro de acidentes do trabalho, muitas vezes acusada de ser apenas
uma sobretaxa e não uma contribuição exclusiva para o seguro infortunístico.
Convalidando a obrigação de constituir seguro contra acidente do
trabalho a cargo exclusivo do empregador (art. 7º, XXVIII, 1ª parte, CF), a
Emenda Constitucional nº 20/98 incluiu um novo parágrafo na Carta Magna (§ 10
do art. 201), que aguarda uma lei regulamentar para inaugurar uma nova fase do
seguro de acidente do trabalho, administrado concorrentemente pelo regime geral
de previdência social e por seguradoras privadas.
167
Admitir o novo § 10 do art. 201, CF, como convalidação da teoria
do risco profissional para o seguro de acidente do trabalho – sem qualquer
impedimento à inclusão do acidente do trabalho aos riscos sociais, com a
cobertura mínima pelo regime previdenciário –, não quer dizer, absolutamente, a
concordância com a privatização de tal seguro.
A história constrói o futuro, e as lembranças que se espalham
sobre o seguro contra acidente do trabalho nos tempos de administração privada
não são nada agradáveis. Pode ser que um controle estatal garanta digna gestão
do seguro compulsório através de institutos financeiros privados, mas,
novamente, apenas o tempo – após a promulgação de lei disciplinando (§ 10 do
art. 201, CF) e razoável período de aplicação – poderá dizer o que é melhor.
Conforme se observa nas explanações sobre a evolução da
indenização por acidente do trabalho, o seguro infortunístico sempre foi objeto de
cobiça das instituições financeiras. Entre 1944, Decreto-lei nº 7.036, e 1967,
Decreto-lei nº 293 e Lei nº 5.316, o seguro de acidente do trabalho foi se tornando
monopólio do regime público de previdência social; monopólio definido na batalha
de 1967 e mantido pela legislação ainda vigente. A regulamentação do disposto
pela Emenda Constitucional 20/98 provavelmente produzirá um novo tipo de
seguro de acidente do trabalho, com a administração concorrente do regime geral
e do setor privado.
É preciso ressaltar que a Constituição brasileira preconiza as
garantias relativas aos acidentes do trabalho com a utilização conjunta, híbrida,
de teorias diversas:
A indenização dos acidentes do trabalho tem sua fundamentação
principal na responsabilidade objetiva, tanto na teoria do risco profissional quanto
na do risco social. A inclusão do acidente do trabalho aos demais riscos sociais
está presente no art. 201, I, com a cobertura atendida pelo sistema previdenciário,
conforme legislação ordinária atual, sem diferença quanto aos demais sinistros.
168
Porém, além do atendimento do acidentado pelo instituto previdenciário público, a
Constituição, agora segundo o art. 7º, XXVIII, também exige um seguro
indenizatório a cargo do empregador, fundamentando na teoria do risco
profissional, ubi emolumentum, ibi onus.
A indenização pela responsabilidade subjetiva também está
disposta no mesmo artigo constitucional (7º, XXVIII) garantindo a cumulabilidade
da indenização do seguro obrigatório com outra devida pelo empregador nos
casos de seu dolo ou sua culpa. Saliente-se que na maior parte das lides o onus
probandi incumbe ao empregador.
Pela Carta Magna brasileira, o acidente do trabalho está incluído
nos riscos sociais, mas, além disso, ainda é obrigatório um seguro indenizatório a
cargo do empregador, sob o manto do risco profissional. Em debate está a
privatização do seguro obrigatório (§ 10 do art. 201, CF) e também, privatizando
ou não, como serão as normas para o novo seguro, os prêmios e as
indenizações, em que valores e de que formas.
Estudar acidentes do trabalho, especificamente a história de suas
indenizações, mesmo que alguns quadros apresentem cenas bastante
deprimentes, deve ocorrer sempre. A obrigação é conhecer para evitar, buscando
os avanços sociais e econômicos para toda a humanidade, inclusive para os
trabalhadores. Na atualidade, a produção se utiliza de todas as vantagens
tecnológicas, reduzindo custos e crescendo os resultados. Porém, torna-se grave
e cada vez mais complexa a dicotomia capital versus trabalho, compondo
relações diferentes de produção, diminuindo os vínculos empregatícios e,
consequentemente, reduzindo também as garantias contratuais dos
trabalhadores. Apontam-se crescimentos econômicos para futuro próximo, mas
sempre às custas da saúde e segurança dos trabalhadores, mantendo como
objetivo apenas o lucro do capital. As relações de trabalho em todo o mundo
passam por transformações, tanto pelas diferenças econômicas, tecnológicas e
demográficas, quanto pelas novas ordens políticas e sociais que detêm o poder.
169
Os acidentes do trabalho necessitam de muito maior atenção, em
todas as áreas científicas. Além do seguro indenizatório cumulado com a
indenização por responsabilidade civil, as normas preventivas devem ser
aprimoradas de forma contínua.
Encerrado o século das grandes guerras, a situação política,
econômica e social é paradoxal e contraditória. O crescimento tecnológico é
inegável e cada vez se processa com maior rapidez, mas a lógica do capital
dominante cria um cenário muito próximo ao da primeira crise após a Revolução
Industrial. Quando pela primeira vez, na metade do século XIX, os patrões se
viram obrigados a ceder no tocante às condições laborais, originou-se o Direito do
Trabalho, normatizando as relações entre capital e trabalho. Na atualidade o
desenvolvimento do capitalismo, em sua forma neoliberal, conduz à uma crise do
Estado, em sua função e competência. A proposta desregulamentadora das
relações de trabalho significa a retirada de normas mínimas para a convivência
entre capital e trabalho. A falta de legislação garantindo condições dignas de
labor, invariavelmente produzirá maiores ocorrências de acidentes do trabalho, e
possivelmente ainda com maiores falhas nas obrigatórias comunicações.
Na Grã-Bretanha de meados do século XIX o trabalho infantil
estava presente, provavelmente em sua pior forma, nas minas: os trappers,
crianças de 5 a 10 anos de idade, passavam sozinhos doze horas por dia
sentados nos escuros túneis, abrindo e fechando as portas, das quais dependia a
ventilação das minas, para a passagem dos hurries, também crianças,
empurrando carrinhos com até 400 quilos, em caminhos de 6 quilômetros por dia.
Neste princípio do século XXI jornais televisivos mostraram crianças brasileiras
recolhendo gravetos e queimando-os em fornos para produzir carvão para
siderurgia, setor de ponta da economia, com todos os riscos e desgastes que tal
trabalho pode provocar, especialmente em crianças. Com certeza as imagens
diariamente transmitidas para todo o mundo produzirão exigências da
humanidade no tocante às relações de trabalho e produção.
170
Desta vez as velocidades estão em outra casa decimal, e os
choques da crise sócio-econômica são presenciados por todos através dos órgão
da mídia. Os meios de comunicação e transportes no final do século XIX,
revolucionários para a época, foram suficientes para compor, pelas exigências da
moralidade, melhores condições de trabalho e moradia. Atualmente, a
informalidade das relações de trabalho não consegue esconder as condições
indignas em que estas são praticadas. Os números estatísticos (empregos,
remunerações, acidentes do trabalho) com certeza são menos exatos, justamente
por informais, mas o lixo nas ruas e o sangue nas fábricas nem sempre é fácil
esconder. É de se esperar que a atual excessiva velocidade de comunicação não
tenha transformado a humanidade em seres imunes às mínimas normas de
alguma Moral.
171
Anexo ao Capítulo 2, tópico 2.1, evolução legislativa
180
2.1.1. Decreto Legislativo nº 3.724, de 15/01/1919 (excertos)
Art. 1º. Consideram-se acidentes no trabalho, para os fins da presente lei:
a) o produzido por uma causa súbita, violenta, externa e involuntária
no exercício do trabalho, determinando lesões corporais ou perturbações funcionais, que
constituam a causa única da morte ou perda total ou parcial, permanente ou temporária,
da capacidade para o trabalho;
b) a moléstia contraída exclusivamente pelo exercício do trabalho,
quando este for de natureza a só por si causá-la, e desde que determine a morte do
operário, ou perda total, ou parcial, permanente ou temporária, da capacidade para o
trabalho.
Art. 2º. O acidente, nas condições do artigo anterior, quando ocorrido pelo fato do
trabalho ou durante este, obriga o patrão a pagar indenização ao operário ou à sua
família, excetuados apenas os casos de força maior ou dolo da própria vítima ou de
estranhos.
Art. 3º. São considerados operários, para efeito da indenização, todos os indivíduos, de
qualquer sexo, maiores ou menores, uma vez que trabalhem por conta de outrem, nos
seguintes serviços: construções, reparações e demolições de qualquer natureza, como
de prédios, pontes, estradas de ferro e de rodagem, linhas de “tramways” elétricos, redes
de esgotos, de iluminação, telegráficas e telefônicas, bem como na conservação de todas
essas construções; de transporte, carga e descarga; e nos estabelecimentos industriais e
nos trabalhos agrícolas em que se empreguem motores inanimados.
Título II, Da Indenização
Art. 5º A indenização será calculada segundo a gravidade das conseqüências do
acidente, as quais podem ser:
a) morte;
b) incapacidade total e permanente para o trabalho;
c) incapacidade total e temporária;
d) incapacidade parcial e permanente;
e) incapacidade parcial e temporária.
Parágrafo único. Os casos de incapacidade serão definidos e especificados no
regulamento desta lei. Entende-se permanente a incapacidade que durara mais de 1 ano.
Art. 6º O cálculo da indenização não poderá ter por base quantia superior a 2:400$000
anuais, embora o salário da vítima exceda dessa quantia.
Art. 7º Em caso de morte a indenização consistirá em uma soma igual ao salário de três
anos da vítima, a qual será paga de uma só vez à família, cônjuge sobrevivente e
herdeiros necessários, observadas as disposições do Código Civil sobre a ordem da
vocação hereditária e mais 100$000 para as despesas do enterramento.
§ 1º O cônjuge sobrevivente terá direito á metade da indenização e os herdeiros
necessários à outra metade, na conformidade do direito comum.
§ 2º Deixando a vítima somente cônjuge, ou somente herdeiros necessários, a
indenização será reduzida a uma soma igual ao salário de 2 anos. A mesma redução terá
180
Toda a legislação, com exceção da Lei 8.213/91, foi consultada na obra de Teresinha Lorena Pohlmann
SAAD, Responsabilidade civil da empresa: acidentes do trabalho, em seu Capítulo III, Todas as leis de
acidentes do trabalho no Brasil.
Para a Lei 8.213/91, com todas as suas alterações, foi consultado o trabalho da ANFIP, Previdência social:
Regime Geral, legislação atualizada, remissões e notas, 2004.
172
lugar se o cônjuge sobrevivente estiver divorciado por culpa sua ou estiver
voluntariamente separado.
§ 3º Na falta de cônjuge, ou estando este por culpa sua ou voluntariamente separado, e
não havendo herdeiros necessários, se a vítima deixar pessoas cuja subsistência
provesse, a essas pessoas deverá ser paga a indenização reduzida nesse caso à soma
igual ao salário de 1 ano.
Art. 8º Em caso de incapacidade total e permanente, a indenização a ser paga à vítima
do acidente consistirá em uma soma igual à do seu salário de três anos.
Art. 9º Em caso de incapacidade total, mas temporária, a indenização a ser pago à vítima
será de metade do salário diário até o máximo de 1 ano. Se a incapacidade exceder
desse prazo será considerada permanente, nos termos do parágrafo único do art. 5º e a
indenização regulada pelo disposto no artigo anterior.
Art. 10. Em caso de incapacidade parcial permanente, a indenização a ser paga à vítima
será de 5 a 60% da que teria direito se a incapacidade fosse total e permanente
atendendo-se no cálculo à natureza e extensão da incapacidade, de acordo com a
classificação que será estabelecida no regulamento dessa lei.
Art. 11. Em caso de incapacidade parcial temporária, a indenização a ser paga à vítima
será da metade da diferença entre o salário que vencia e o que vencer em conseqüência
da diminuição da sua capacidade de trabalho, até que possa readquirir esta.
Art. 12. Quando a incapacidade total ou imparcial durar mais de 1 ano, a vítima deixará,
findo esse prazo, de receber diária, passando a receber a indenização devida em caso de
incapacidade permanente.
Parágrafo único. A vítima do acidente perderá também o direito à diária desde o dia em
que ficar completamente curada ou apta para o trabalho habitual, ou for atingida por uma
incapacidade permanente. Neste último caso, receberá a respectiva indenização.
Art. 13. Em todos os casos o patrão é obrigado à prestação de socorros médicos e
farmacêuticos, ou, sendo necessários, hospitalares, desde o momento do acidente.
§ 1º Quando, por falta de médico ou farmácia, o patrão não puder prestar à vítima
imediata assistência, fará, se o estado da mesma o permitir, transportá-la para o lugar
mais próximo em que for possível o tratamento.
Art. 14. As indenizações e diárias recebidas pela vítima em virtude de qualquer
incapacidade, serão deduzidas das indenizações que forem devidas por motivo de seu
falecimento ou por se tornar permanente a incapacidade temporária.
Art. 15. Entende-se por salário anual 300 vezes o salário diário da vítima na ocacião do
acidente.
Parágrafo único. Tratando-se de aprendizes, entende-se que o seu salário diário não é
inferior ao menor salário de um operário adulto, que trabalhe em serviço da mesma
natureza. Todavia, em caso de incapacidade temporária, a diária do aprendiz não
excederá à que ele efetivamente percebia.
Art. 16. As indenizações a que esta lei obriga serão pagas no lugar do estabelecimento
em que ocorreu o acidente, sendo que as diárias serão pagas semanalmente. Em caso
de morte, o pagamento aos beneficiários será feito após a apresentação de todos os
documentos necessários, que serão indicados no regulamento desta lei.
Art. 17. Quando, depois de fixada a indenização, a vítima vier a falecer em conseqüência
do acidente, a incapacidade se agravar, se atenuar, se repetir, ou desaparecer, ou se
verificar no julgamento um erro substancial de cálculo, poderão o patrão, a vítima, ou
seus representantes, pedir a revisão do julgamento que determinou as conseqüências do
acidente e fixou a indenização.
§ 1º Não será considerada como conseqüência do acidente a agravação da enfermidade
ou morte provocada por culpa exclusiva da vítima.
§ 2º A revisão de que trata esse artigo, só poderá ser pedida dentro do prazo de 2 anos,
contados da data do julgamento.
Art. 18. Os operários da União, Estados ou Municípios, que tenham direito a montepio,
aposentadoria ou pensão, não poderão pedir a indenização de terminada nos arts. 7º e 8º
173
desta lei; nem os que tenham direito à licença remunerada, a indenização estabelecida
nos arts. 9º, 10 e 11.
174
2.1.2 Decreto-lei nº 24.637, de 10/07/1934 (excertos)
Art. 1º Consideram-se acidente do trabalho, para fins da presente lei, toda lesão corporal,
perturbação funcional, ou doença produzida pelo exercício do trabalho ou em
conseqüência dele, que determine a morte, ou a suspensão ou limitação, permanente ou
temporária, total ou parcial, da capacidade para o trabalho.
§ 1º São doenças profissionais, para os efeitos da presente lei, além das inerentes ou
peculiares a determinados ramos da atividade, as resultantes exclusivamente do
exercício do trabalho, ou das condições especiais ou excepcionais em que o mesmo for
realizado, não sendo assim consideradas as endêmicas quando por elas forem atingidos
empregados habitantes da região.
§ 2º A relação das doenças profissionais inerentes ou peculiares a determinados ramos
de atividades será organizada e publicada pelo Ministério do Trabalho, Indústria e
Comércio, e revista trienalmente, ouvidas as autoridades competentes.
Art. 2º Executados os casos de força maior, ou de dolo, quer da própria vítima, quer de
terceiros, por fatos estranhos ao trabalho, o acidente obriga o empregador ao pagamento
de indenização ao seu empregado ou aos seus beneficiários, nos termos do capítulo lll
desta lei.
§ 1º Não constitui força maior a ação dos fenômenos naturais quando determinada ou
agravada pela instalação ou localização do estabelecimento ou pela natureza do serviço.
§ 2º A responsabilidade do empregador deriva somente de acidentes ocorridos pelo fato
do trabalho, e não dos que se verificarem na ida do empregado para o local da sua
ocupação ou na sua volta dali, salvo havendo condução especial fornecida pelo
empregador.
Art. 3º Empregado é, para os fins da presente lei, todo indivíduo que, sem distinção de
sexo, idade, graduação ou categoria, presta serviços a outrem, na indústria, no comércio,
na agricultura, na pecuária, e de natureza doméstica, a título oneroso, gratuito ou de
aprendizagem, permanente ou provisoriamente, fora de sua habitação, com as exceções
constantes do art. 64.
Art. 64. Ficam excluídos da presente lei, muito embora não percam, para outros efeitos, a
qualidade de prepostos, agregados ou dependentes:
1º Na indústria e no comércio:
a) os empregados que tiverem vencimentos superiores a 1: 000$000 ( um conto de
réis) mensais, e os técnicos, ou contratados, aos quais forem asseguradas, Poe
meios idôneos, vantagens superiores às estabelecidas, na presente lei, para os
demais empregados;
b) os agentes e prepostos cuja remuneração consiste, única e exclusivamente, em
comissões, ou em gratificações pagas pelos clientes;
c) os profissionais de qualquer atividade que, individual ou coletivamente,
empreitarem, por conta própria, serviços de sua especialidade, com ou sem
fiscalização da outra parte contratante;
d) os consultores técnicos inclusive advogado e médicos, que, embora
remunerados, não trabalharem efetiva e permanentemente no estabelecimento ou
estabelecimentos do empregador, exercendo somente funções consultivas e
informativas;
e) os domésticos e jardineiros que, em número inferior a cinco, residirem com o
empregador, percebendo, cada um, salário mensal inferior a 50$000 (cinqüenta
mil réis);
f) cônjuges, ascendentes, descendentes, colaterais e afins, quando tendo em
domicílio comum com o proprietário, explorarem pequenas indústrias, ou
estabelecimentos comerciais, sob o regime familiar.
2º Na agricultura e na pecuária:
a) os que explorarem terrenos, com ou sem benfeitorias, e os guardadores de
semoventes, que participarem dos resultados da produção ou reprodução, tanto
175
nos trabalhos decorrentes daqueles misteres, como em outros que realizarem
para o possuidor dos terrenos, benfeitorias ou semoventes, sempre que tais
trabalhos representarem um encargo vinculado à exploração agrícola ou parcial;
b) os parentes, até ao segundo grau, em linha reta ou colateral, do proprietário
agrícola ou pastoril, que com ele tenham a mesma economia doméstica.
Art. 12. A indenização estatuída pela presente lei exonera o empregador de pagar à
vítima, pelo mesmo acidente, qualquer outra indenização de direito comum.
Art. 13. A indenização devida pelo empregador não exclui o direito da vítima, seus
herdeiros ou beneficiários de promover, segundo o direito comum, ação contra terceiro
civilmente responsável pelo acidente.
§ 1º A ação contra terceiro, responsável pelo acidente terá curso sumário e poderá ser
proposta pelo empregador ou pela vítima, seus herdeiros e beneficiários, ou por um e
outra ou outros, conjuntamente.
§ 2º O empregador ou a vítima, seus herdeiros ou beneficiários, propondo ações em
juízos diferentes, ficará perempta a jurisdição do juízo a que for distribuída a primeira
ação.
§ 3º Na mesma sentença em que condenar terceiros, o juiz adjudicará ao empregador a
importância por este paga à vítima, seus herdeiros ou beneficiários,, computando-se,
igualmente, na conta do empregador tudo quanto este houver despendido por motivo do
acidente.
Art. 14. A indenização será calculada segundo a gravidade das conseqüências do
acidente, assim classificadas:
a) morte;
b) incapacidade permanente e total;
c) incapacidade permanente e parcial;
d) incapacidade temporária e total;
e) incapacidade temporária e parcial.
Art. 15. Entende-se por incapacidade permanente e total a invalidez absoluta e incurável
para qualquer serviço.
Parágrafo único. São casos de incapacidade total e permanente, entre outros, os
seguintes:
a) alienação mental incurável;
b) perda ou impotência funcional, em suas partes essenciais, de ambos os
membros, quer superiores, quer inferiores;
c) perda ou impotência funcional, em suas partes essenciais, de membro superior e
de outro inferior;
d) cegueira de ambos os olhos, com ou sem perda dos órgãos;
e) cegueira de um olho, com ou sem perda do órgão, e diminuição importante da
força visual do outro;
f) lesão irreparável do sistema nervoso ou de um dos aparelhos: circulatório,
respiratório, digestivo e gênito-urinário, conforme o grau.
Art. 16. Entende-se por incapacidade temporária e total a que impossibilita o empregado
de exercer qualquer trabalho durante certo tempo.
Parágrafo único. Sempre que durar mais de um ano, a incapacidade temporária, parcial e
total, cessando em tal caso, com o pagamento da indenização devida, o encargo da
prestação de tratamento médico, farmacêutico e hospitalar.
Art. 17. Entende-se por incapacidade permanente e parcial a diminuição, por toda a vida,
da capacidade de trabalho do empregado.
Art. 18. Entende-se por incapacidade temporária e parcial a diminuição da capacidade de
trabalho do empregado, durante certo tempo, sem que o impossibilite de exercer
qualquer trabalho.
Art. 20. Em caso de morte, a indenização consistirá em uma soma calculada entre o
máximo de três anos e o mínimo de um ano de salário da vítima e, salvo a hipótese do
art. 23, será paga de uma só vez, na forma dos parágrafos seguintes.
176
§ 1º Na base do salário de três anos:
a) à esposa ou ao marido, total e permanente inválido, a metade da indenização e
aos filhos menores de 21 anos a outra metade, na conformidade do direito
comum;
b) na falta do cônjuge sobrevivente, aos filhos menores, quando em número inferior
a três;
c) aos filhos maiores, na falta do cônjuge sobrevivente, quando não possam prover à
sua subsistência, por incapacidade física ou mental; e, neste caso, para o efeito
da indenização, repartida segundo o § 1º deste artigo, alíneas a e b, serão
equiparados a menores;
d) aos pais da vítima, na falta de cônjuge sobrevivente, de filhos menores ou de
maiores incapazes, quando não possam prover à subsistência, por incapacidade
física ou mental, e vivam as expensas da vítima.
§ 3º Na base do salário de um ano: à pessoa cuja subsistência esteja a cargo da vítima,
somente no caso em que a indenização não deva ser paga a pessoas enumeradas nas
alíneas dos §§ 1º e 2º.
§ 4º Para os efeitos desta lei, equiparam-se aos legítimos, os filhos naturais e à esposa a
companheira mantida pela vítima, que hajam sido declarados na carteira profissional.
Art. 21. Não terão direito à indenização:
a) o cônjuge desquitado por culpa sua, ou voluntariamente separado;
b) os beneficiários que estiverem nas condições dos arts. 1.744 e 1.745 do Código
Civil;
c) o cônjuge sobrevivente cujo matrimônio houver sido contraído depois do acidente,
salvo se já era mantido pela vítima, nos termos do § 4º do art. 20.
Art. 22. Além da indenização prevista no art. 20, o empregador abonará 200$000
(duzentos mil réis) para as despesas do enterramento da vítima.
Art. 23. Sempre que a vítima, tendo herdeiros ou beneficiários, estiver inscritas em
instituição de seguro social oficialmente reconhecida que lhes garanta pensão, à mesma
instituição reverterão dois terços da indenização a ser paga, cabendo aos herdeiros ou
beneficiários o terço restante, nos termos desta lei.
Parágrafo único. A pensão, no caso deste artigo, será concedida aos herdeiros ou
beneficiários independentemente dos prazos de carência em vigor na legislação das
caixas de aposentadoria e pensões, ou outros que forem fixados no seguro social.
Art. 24. Em caso de incapacidade permanente e total, a indenização consistirá em soma
igual ao salário de três anos, calculando-se o salário de um ano conforme prescreve o
art. 10.
Art. 25. Em caso de incapacidade permanente e parcial, a indenização será equivalente à
importância de 5% a 80% (cinco por cento a oitenta por cento) daquela a que a vítima
teria direito se a incapacidade permanente fosse total de acordo com a tabela que
expedir o ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, a qual fixará percentagem para
cada incapacidade, tendo em vista a natureza da lesão, a idade e a profissão da vítima.
Art. 26. Estando a vítima inscrita em instituição do seguro social oficialmente
reconhecida, que garanta pensão por invalidez, e sendo a indenização superior a 30%
(trinta por cento) de 900 (novecentos) salários, dois terços desta reverterão a favor da
instituição referida, como auxilio ao pagamento daquela pensão.
Parágrafo único. Não tendo direito à aposentadoria imediata, a vítima ficará, na hipótese
deste artigo, isenta da sua contribuição para o seguro social, possua este o título de caixa
de aposentadoria e pensões ou outro.
Art. 27. Em caso de incapacidade temporária e total, a indenização será durante o
período dessa incapacidade e até o máximo de um ano, equivalente a uma diária de duas
terças partes do salário diário, não podendo este, para os efeitos de cálculo, exceder de
18$000 (dezoito mil réis), tendo em vista o disposto nos arts. 6º a 11.
Art. 28. Em caso de incapacidade temporária e parcial, a indenização será equivalente à
metade da diferença entre o salário que a vítima vencia e o que vier vencer em
177
conseqüência da diminuição da sua capacidade no trabalho, até que possa readquiri-la
integralmente.
§ 1º Na hipótese deste artigo e na do art.27, a diária será abonada desde o dia seguinte
àquele em que se verificar o acidente.
§ 2º O salário do dia do acidente será integralmente pago, qualquer que seja a hora em
que o acidente haja ocorrido.
Art. 29. Durando a incapacidade total ou parcial mais de um ano, a vítima, findo esse
praxo, deixará de receber a diária estabelecida no art. 27, passando a receber a
indenização devida pela incapacidade, então considerada permanente.
Art. 30. As indenizações recebidas pela vítima em virtude de qualquer incapacidade,
inclusive a do art. 27, serão deduzidas da indenização final devida por se ter agravado a
incapacidade permanente, por se tornar permanente a incapacidade, ou por motivo de
falecimento.
Art. 36. Para garantir a execução da presente lei, os empregadores sujeitos ao seu
regime, que não mantiverem contrato de seguro contra acidentes, cobrindo todos os
riscos relativos às várias atividades, ficam obrigados a fazer um depósito, nas repartições
arrecadadoras federais, nas Caixas Econômicas da União, ou no Banco do Brasil, em
moeda corrente ou em títulos da dívida pública federal, na proporção de 20:000$000
(vinte contos de réis), para cada grupo de 50 (cinqüenta) empregados ou fração, até ao
máximo de 200:000$000 (duzentos contos de réis), podendo a importância do depósito, a
juízo das autoridades competentes, ser elevada até ao triplo, se se tratar de risco
excepcional ou coletivamente perigoso.
§ 1º Para isenção do depósito a que se refere este artigo, será permitido o seguro em
companhias ou sindicatos profissionais legalmente autorizados a operar em seguros
contra acidentes do trabalho, na forma do art. 40, constando das respectivas apólices,
expressa e discriminadamente, todos os ramos de atividade incluídos no seguro, bem
como o número dos empregados e os seus salários.
§ 2º Segurando o empregador somente o pagamento de indenizações, o depósito ficará
reduzido a três quartos da sua importância.
§ 3º A realização do depósito ou à instituição do seguro, precederá sempre o início dos
trabalhos, ficando fixado o prazo de trinta dias, contados da data em que entrar em vigor
a presente lei, para que os empregados que lhe estiverem sujeitos, satisfaçam uma das
exigências deste artigo, sob a pena cominada no art. 66, alínea c.
§ 4º Os depósitos será feitos mediante guias especiais, fornecidas pelas repartições
arrecadadoras federais, Caixas Econômicas da União, ou Banco do Brasil, e preenchidas
e assinadas pelo empregador.
§ 5º Realizado o depósito, a repartição ou estabelecimento onde o mesmo tiver sido feito
expedirá dois certificados, isentos de selo, que reproduzirão na íntegra as declarações de
guias, sendo um dos certificados remetidos ao Departamento Nacional do Trabalho e o
outro entregue ao empregador, o qual poderá obter, da mesma repartição, mediante o
pagamento de 5$000 (cinco mil réis), pela expedição de cada um, tantos certificados
quantos necessários forem para efeito da fiscalização.
§ 6º Os empregadores sujeitos ao regime desta lei deverão, sob pena de incorrer na
multa cominada no art. 66, alínea d, manter afixados nos seus escritórios ou nos locais
de trabalho dos seus empregados, de modo perfeitamente visível, exemplares dos
certificados a que se refere o parágrafo anterior, os atestados dos sindicatos e
companhias em que tiver sido realizado o seguro.
§ 7º Não estão sujeitos ao depósito de garantia de que trata este artigo, os empregados
de serviços domésticos.
178
2.1.3. Decreto-lei nº 7.036, de 10/11/1944 (excertos)
Art. 16. A indenização de que trata a presente lei será calculada segundo as
conseqüências do acidente, assim classificadas:
a) morte;
b) incapacidade total e permanente;
c) incapacidade parcial e permanente;
incapacidade temporária.
1
Decreto-lei 7.036/44
Art. 17. Entende-se por incapacidade total e permanente a invalidez incurável para o
trabalho.
§ 1º Dão lugar a uma incapacidade total e permanente:
a) a perda anatômica ou impotência funcional em suas partes essenciais, de mais de
um membro, conceituando-se como partes essenciais a mão e o pé;
b) a cegueira total;
c) a perda de visão de um olho e redução simultânea de mais da metade da visão do
outro;
d) as lesões orgânicas ou perturbações funcionais graves ou permanentes de
qualquer órgão vital, ou quaisquer estados patológicos reputados incuráveis, que
determinem idêntica incapacidade para o trabalho.
§ 2 º Quando do acidente resultar uma incapacidade total e permanente, a indenização
devida ao acidentado corresponderá a uma quantia igual a quatro (4) anos de diária,
calculada esta segundo o prescrito no parágrafo único do art. 19.
§ 3º Nos casos de cegueira total, perda ou paralisia dos membros superiores e inferiores
e de alienação mental, receberá o acidentado, além da indenização de que trata o
parágrafo anterior, a quantia de Cr$ 3.200,00, paga de uma só vez.
Art. 18. Entende-se por incapacidade total e permanente, a redução, por toda a vida, da
capacidade do trabalho.
§ 1º Quando do acidente resultar uma incapacidade parcial e permanente, a indenização
devida ao acidentado variará, em proporção ao grau dessa incapacidade, entre três (3) e
oitenta (80) centésimos da quantia correspondente a quatro (4) anos de diária,
observado, quanto a esta, o disposto no parágrafo único do art. 19.
§ 2º A indenização devida ao acidentado será fixada de acordo com a tabela que for
expedida e as alterações nela posteriormente estabelecidas pelo diretor do Serviço
Atuarial do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio.
§ 3º Na elaboração da tabela de que trata o parágrafo anterior, o grau de redução de
capacidade do acidentado será sempre calculado atendendo-se à natureza e gravidade
da lesão por ele sofrida, à sua idade e profissão.
Art. 19. Entende-se por incapacidade temporária a perda total da capacidade do trabalho
por um período limitado de tempo, nunca superior a um (1) ano.
Parágrafo único. Quando do acidente resultar uma incapacidade temporária, a
indenização devida ao acidentado corresponderá, durante todo o período em que
perdurar essa incapacidade, a uma diária igual a 70 centésimos de sua remuneração
diária, calculada esta conforme o disposto no Capítulo Vl, excetuados os domingos e
feriados, e observando ainda o que dispõe o art. 27.
Art. 20. Permanecendo por mais de um (1) ano, a incapacidade temporária será
automaticamente considerada permanente, total ou parcial, e como tal indenizada,
cessando desde logo para o empregador a obrigação do pagamento da indenização
correspondente à incapacidade temporária, bem como da prestação da assistência
médica, farmacêutica e hospitalar.
Art. 21. Quando do acidente resultar a morte, a indenização devida aos beneficiários da
vítima corresponderá a uma soma calculada entre o máximo de quatro (4) anos e o
mínimo de dois (2) anos da diária do acidentado, e será devida aos beneficiários, (...)
179
Art. 30. As indenizações concedidas por força desta lei, nos casos de incapacidade
permanente ou morte, não excluem os direitos aos benefícios do seguro-invalidez e do
seguro-morte assegurados pelas instituições de previdência social.
Art. 31. O pagamento da indenização estabelecida pela presente lei exonera o
empregador de qualquer outra indenização de direito comum, relativa ao mesmo
acidente, a menos que este resulte de dolo seu ou de seus prepostos.
Art. 94. Todo empregador é obrigado a segurar os seus empregados contra os riscos de
acidente do trabalho.
Parágrafo único. Os empregadores sujeitos ao regime desta lei deverão, sob pena de
incorrerem na multa cominada no art. 104, manter afixados nos seus escritórios e nos
locais de trabalho de seus empregados, de modo perfeitamente visível, exemplares dos
certificados das entidades em que tiverem realizado o seguro.
Art. 111. A partir da data da publicação desta lei, não poderão ser concedidas
autorizações a novas entidades seguradoras, cabendo tão somente às instituições de
previdência social, às sociedades de seguro e às cooperativas de seguros de sindicatos,
que atualmente operam em seguro contra o risco de acidente de trabalho, a cobertura
desse risco, de acordo com as normas que forem fixadas em regulamento.
Art. 112. A partir de 1º de janeiro de 1949, as instituições de previdência social, então
existentes, e que à data da vigência desde Decreto-lei ainda não possuíssem carteiras de
acidentes do trabalho, providenciarão a criação de órgãos destinados ao seguro de
acidentes do trabalho, aos quais passará, paulatinamente, o seguro das
responsabilidades atribuídas aos empregadores, de forma que, a 31 de dezembro de
1953, cessem definitivamente as operações de seguro contra o risco de acidente do
trabalho, pelas sociedades de seguro e pelas cooperativas de seguro de sindicatos.
Parágrafo único. O Serviço Atuarial do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio,
determinará a ordem em que as instituições de previdência social devem passar a operar
em seguros de acidentes do trabalho e da data do início das operações de cada uma
delas.
180
2.1.4. Decreto-lei nº 293, de 28/02/1967 (excertos)
Art. 9º O pagamento das indenizações de acidentes do trabalho será feito de acordo com
os princípios seguintes:
l. no caso de morte, mediante uma renda mensal reajustável, paga aos beneficiários da
vítima, segundo as normas estabelecidas pelo CNSP, em complemento à pensão
concedida pelo INPS;
ll. no caso de incapacidade total e permanente mediante uma renda mensal reajustável,
paga ao acidentado, segundo as normas estabelecidas pelo CNSP e complementar à
aposentadoria concedida pelo INPS;
lll. No caso de incapacidade parcial e permanente, quando for superior a 25% (vinte cinco
por cento), mediante escolha do acidentado:
a) de renda mensal reajustável, fração da prevista no inciso precedente, em função
do grau dessa incapacidade e segundo as normas estabelecidas pelo CNSP;
b) do pagamento de uma só vez de importância fixada em tabela expedida pelo
CNSP, ouvido o Ministério do Trabalho e Previdência Social, variando em função
do grau dessa incapacidade, até 100 (cem) centésimos da quantia
correspondente a 1.1440 ( mil quatrocentos e quarenta) diárias, definidas estas no
inciso V;
lV. no caso de incapacidade parcial e permanente, quando a incapacidade resultante for
igual ou inferior a 25% (vinte e cinco por cento), mediante o pagamento ao acidentado, de
uma só vez, de importância fixada em tabela expedida pelo CNSP, ouvido o Ministério do
Trabalho e Previdência Social, variando em função do grau dessa incapacidade, entre 1
(um) e 80 (oitenta) centésimos da quantia correspondente a 1.440 (mil quatrocentos e
quarenta) diárias, definidas estas no inciso V;
V. no caso de incapacidade temporária, mediante o pagamento ao acidentado, a partir do
dia seguinte ao do acidente de uma diária igual à trigésima parte da remuneração da
vítima durante o período de incapacidade.
§ 1º No caso de morte, será paga aos beneficiários da vítima também uma importância
de 30 (trinta) diárias, a título de auxílio-funeral.
§ 2º no caso de incapacidade total e permanente, se do acidente resultar cegueira total,
perda ou paralisia dos membros superiores ou inferiores e de alienação mental, a renda
mensal, será majorada de 25% (vinte cinco por cento).
181
2.1.5. Lei nº 5.316, de 14/09/1967 (excertos)
Art. 2º Acidente do trabalho será aquele que ocorrer pelo exercício do trabalho, a serviço
da empresa, provocando lesão corporal, perturbação funcional ou doença que cause a
morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
§ 1º Doença do trabalho será:
a) qualquer das chamadas doenças profissionais, inerentes a determinados ramos
de atividade e relacionadas em ato do Ministro do Trabalho e Previdência Social;
b) a doença resultante das condições especiais ou excepcionais em que o trabalho
for realizado.
§ 2º Será considerado como do trabalho o acidente que, embora não tenha sido a causa
única, haja contribuído diretamente para a morte ou a perda ou redução da capacidade
para o trabalho.
Art. 3º Será também considerado acidente do trabalho:
l. o acidente sofrido pelo empregado no local e no horário do trabalho, em conseqüência
de :
a) ato de sabotagem ou de terrorismo por terceiro, inclusive companheiro de
trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada
com o trabalho;
c) ato de imprudência ou de negligência de terceiro, inclusive companheiro de
trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação ou incêndio;
f) outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
ll. o acidente sofrido pelo empregado, ainda que fora do local e do horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa, para lhe evitar prejuízo
ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, seja qual for o meio de locomoção utilizado,
inclusive veículo de propriedade do empregado;
d) no percurso da residência para o trabalho ou deste para aquela.
Parágrafo único. Nos períodos destinados a refeições ou descanso, ou por ocasião da
satisfação de outras necessidades fisiológicas, no local de trabalho ou durante este, o
empregado será considerado a serviço da empresa.
Art. 4º Não será considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho que haja
determinado lesão já consolidada outra lesão corporal ou doença que, resultante de outro
acidente, se associe ou se superponha às conseqüências do anterior.
Art. 5º Para os fins desta Lei:
l. equipara-se ao acidente do trabalho a doença do trabalho;
ll. equipara-se ao acidentado o trabalhador acometido de doença do trabalho;
lll. Considera-se como data do acidente, no caso de doença do trabalho, a data da
comunicação desta à empresa.
Art. 6º Em caso de acidente do trabalho ou de doença do trabalho, a morte ou a perda ou
redução de capacidade para o trabalho darão direito, independentemente do período de
carência, às prestações previdenciárias cabíveis, concedidas, mantidas, pagas e
reajustadas na forma e pelos prazos da legislação de previdência social, salvo no tocante
ao valor dos benefícios de que tratam os itens l, ll e lll e que será o seguinte:
l. auxílio-doença – valor mensal igual ao do salário-de-contribuição devido ao empregado
no dia do acidente, deduzida a contribuição previdenciária, não podendo ser inferior ao
seu salário-de-benefício, com a mesma dedução;
ll. aposentadoria por invalidez – valor mensal igual ao do salário-de-contribuição devido
ao empregado no dia do acidente, não podendo ser inferior ao seu salário-de-benefício;
182
lll. Pensão – valor mensal igual ao estabelecido no item ll, qualquer que seja o número
inicial de dependentes.
§ 1º O pagamento dos dias de benefício, quando sua duração for inferior a um mês, será
feito na base de 1/30 (um trinta avos) de seu valor mensal.
§ 2º A pensão será devida a contar da data do óbito e o benefício por incapacidade, do
16º (décimo sexto) dia seguinte ao do acidente, cabendo à empresa pagar o salário
integral do dia do acidente e dos 15 (quinze) primeiros dias seguintes, ressalvado o
disposto no art. 10.
§ 3º A assistência médica, aí incluídas a cirúrgica, a hospitalar, a farmacêutica e a
odontológica, bem como transporte do acidentado, será devida em caráter obrigatório, a
partir da ocorrência do acidente.
§ 4º Será majorado de 25% (vinte cinco por cento) o valor da aposentadoria por invalidez
do empregado que, em conseqüência do acidente, necessitar da permanente assistência
de outra pessoa.
§ 5º Quando a morte do empregado aposentado por motivo de acidente do trabalho não
resultar deste, o valor estabelecido no item ll servirá de base para o cálculo da pensão
§ 6º Quando a perda ou redução da capacidade para o trabalho puder ser atenuada pelo
uso de aparelho de próteses, eles serão fornecidos pela previdência social,
independentemente de prestações cabíveis.
§ 7º Nenhum dos benefícios por acidente do trabalho de que trata este artigo poderá ser
inferior ao salário mínimo do local de trabalho do acidentado.
§ 8º O direito ao auxílio-doença, à aposentadoria por invalidez ou à pensão, nos termos
deste artigo, exclui o direito aos mesmos benefícios nas condições da Lei Orgânica da
Previdência Social (Lei n. 3.807, de 26 de agosto de 1960), sem prejuízo de qualquer
outro benefício assegurado pela legislação de previdência social.
§ 9º O auxílio –doença, aposentadoria por invalidez e a pensão de que tratam os itens l, ll
e lll darão direito também ao abono especial previdenciário.
Art. 7º A redução permanente da capacidade para o trabalho em percentagem superior a
25% (vinte e cinco por cento) garantirá ao acidentado, quando não houver direito a
benefício por incapacidade ou após sua cessação, e independentemente de qualquer
remuneração ou outro rendimento, um “auxílio-acidente”, mensal, reajustável na forma da
legislação previdenciária, calculado sobre o valor estabelecido no item ll do art. 6º e
correspondente à redução verificada.
Parágrafo único. Respeitado o limite máximo estabelecido na legislação previdenciária, o
auxílio de que trata este artigo será adicionado ao salário-de-contribuição para o cálculo
de qualquer outro benefício não resultante do acidente.
Art. 8º A redução permanente da capacidade para o trabalho em percentagem igual ou
inferior a 25% (vinte e cinco por cento) garantirá ao acidentado um pecúlio resultante da
aplicação da percentagem da redução à quantia correspondente a 72 (setenta e duas)
vezes o maior salário mínimo mensal vigente no País na data do pagamento do pecúlio.
Art. 9º O pecúlio de que trata o art. 8º será também devido, em seu valor máximo:
l. em caso de morte;
ll. em caso de invalidez, quando a aposentadoria previdenciária for igual ou superior a
90% (noventa por cento) do benefício previsto no item ll do art. 6º.
183
2.1.6. Lei nº 6.367, de 19/10/1976
Art. 1º O seguro obrigatório contra acidentes do trabalho dos empregados segurados do
regime de previdência social da Lei n. 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da
Previdência Social), e legislação posterior, é realizado pelo Instituto Nacional de
Previdência Social (INPS).
§ 1º Consideram-se também empregados, para os fins desta lei, o trabalhador
temporário, o trabalhador avulso, assim entendido o que presta serviços a diversas
empresas, pertencendo ou não a sindicato, inclusive o estivador, o conferente e
assemelhados, bem como o presidiário que exerce trabalho remunerado.
§ 2º Esta lei não se aplica ao titular da firma individual, ao diretor, sócio-gerente, sócio
solidário, sócio-cotista e sócio de indústria de qualquer empresa, que não tenha a
condição de empregado, nem ao trabalhador autônomo e ao empregado doméstico.
Art. 2º Acidente do Trabalho é aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da
empresa, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, ou
perda, ou redução permanente ou temporária, da capacidade, para o trabalho.
§ 1º Equiparam-se ao acidente do trabalho, para os fins desta lei:
l. a doença profissional ou do trabalho, assim entendida a inerente ou peculiar a
determinado ramo de atividade e constante de relação organizada pelo Ministério da
Previdência e Assistência Social (MPAS).
ll. o acidente que, ligado ao trabalho, embora não tenha sido a causa única, haja
contribuído diretamente para a morte, ou perda, ou redução da capacidade para o
trabalho;
lll. O acidente sofrido pelo empregado no local e no horário do trabalho, em conseqüência
de:
a) ato de sabotagem ou de terrorismo praticado por terceiro, inclusive companheiro
de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada
com o trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro, inclusive
companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação ou incêndio;
f) outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
lV. a doença proveniente da contaminação acidental de pessoal de área médica, no
exercício de sua atividade;
V. o acidente sofrido pelo empregado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo
ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, seja qual for o meio de locomoção utilizado,
inclusive veículo de propriedade do empregado;
d) no percurso da residência para o trabalho ou deste para aquela.
§ 2º Nos períodos destinados à refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de
outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado será
considerado a serviço da empresa.
§ 3º Em casos excepcionais, constatando que doença não incluída na relação no item l
do § 1º resultou de condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se
relaciona diretamente, o Ministério da Previdência e Assistência Social deverá considera-
la como acidente do trabalho.
§ 4º Não poderão ser consideradas, para os fins do disposto no § 3º , a doença
degenerativa, a inerente a grupo etário e a que não acarreta incapacidade para o
trabalho.
184
§ 5º Considera-se como dia do acidente, no caso de doença profissional ou do trabalho, a
data da comunicação desta à empresa ou, na sua falta, a da entrada do pedido de
benefício do INPS, a partir de quando serão devidas as prestações cabíveis.
Art. 5º Os benefícios por acidente do trabalho serão calculados, concedidos, mantidos e
reajustados na forma do regime de previdência social do INPS, salvo no tocante aos
valores dos benefícios de que trata este artigo, que serão os seguintes:
l. auxílio-doença – valor mensal igual a 92% (noventa e dois por cento) do salário-de-
contribuição do empregado, vigente no dia do acidente, não podendo ser inferior a 92%
(noventa e dois por cento) de seu salário-de-benefício;
ll. aposentadoria por invalidez – valor mensal igual ao do salário-de-contribuição vigente
no dia do acidente, não podendo ser inferior ao do seu salário-de-benefício;
lll. pensão – valor mensal igual ao estabelecido no item ll, qualquer que seja o número
inicial de dependentes.
§ 1º Não serão considerados para a fixação do salário-de-contribuição de que trata este
artigo os aumentos que excedam os limites legais, inclusive os voluntariamente
concedidos nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao início do benefício, salvo
se resultante de promoções reguladas por normas gerais da empresa admitidas pela
legislação do trabalho, de sentenças normativas ou de reajustamentos salariais obtidos
pela categoria respectiva.
§ 2º A pensão será devida a contar da data do óbito, e o benefício por incapacidade a
contar do 16º (décimo sexto) dia do afastamento do trabalho, cabendo à empresa pagar a
remuneração integral do dia do acidente e dos 15 (quinze) dias seguintes.
§ 3º O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que em conseqüência do
acidente do trabalho necessitar de assistência permanente de outra pessoa, segundo
critérios previamente estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social,
será majorado em 25% (vinte e cinco por cento).
§ 4º No caso de empregado de remuneração variável e de trabalhador avulso, o valor dos
benefícios de que trata este artigo, respeitado o percentual previsto no seu item l, será
calculado com base na média aritmética:
l. dos 12 (doze) maiores salários-de-contribuição apurados em período não superior a 18
(dezoito) meses imediatamente anteriores ao acidente, se o segurado contar, mais de 12
(doze) contribuições;
ll. dos salários-de-contribuição compreendidos nos 12 (doze) meses imediatamente
anteriores ao do acidente ou no período de que trata o item l, conforme for mais
vantajoso, se o segurado contar 12 (doze) ou menos contribuições nesse período.
§ 5º O direito ao auxílio-doença, à aposentadoria por invalidez ou à pensão, nos termos
deste artigo, exclui o direito aos mesmos benefícios nas condições do regime de
previdência social do INPS, sem prejuízo porém dos demais benefícios por este
assegurados.
§ 6º Quando se tratar de trabalhador avulso referido no § 1º do art. 1 desta lei, o benefício
por incapacidade ficará a cargo do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), a
partir do dia seguinte do acidente.
§ 7º Nenhum dos benefícios por acidente do trabalho de que trata este artigo poderá ser
inferior ao salário mínimo do local de trabalho do acidentado, ressalvado o disposto no
inciso l deste artigo.
Art. 6º O acidentado do trabalho que, após a consolidação das lesões resultantes do
acidente, permanecer incapacitado para o exercício da atividade que exercia
habitualmente, na época do acidente, mas não para o exercício de outra, fará jus, a partir
da cessação do auxílio-doença, ao auxílio-acidente.
§ 1º O auxílio-acidente, mensal, vitalício e independente de qualquer remuneração ou
outro benefício não relacionado ao mesmo acidente, será concedido, mantido e
reajustado na forma do regime de previdência social do INPS e corresponderá a 40%
(quarenta por cento) do valor de que trata o inciso ll do art. 5º desta lei, observado o
disposto no § 4º do mesmo artigo.
185
§ 2º A metade do valor do auxílio-acidente será incorporada ao valor da pensão quando a
morte do seu titular não resultar de acidente do trabalho.
§ 3º O titular do auxílio-acidente terá direito ao abono anual.
Art. 7º Em caso de morte decorrente de acidente do trabalho, será também devido aos
dependentes do acidentado, um pecúlio no valor de 30 (trinta) vezes o valor de
referência, fixado nos termos da Lei n. 6.205, de 29 de abril de 1975, vigente na
localidade de trabalho do acidentado.
Art. 8º Em caso de aposentadoria por invalidez, decorrente de acidente do trabalho, será
devido, também, ao acidentado, um pecúlio de 15 (quinze) vezes o valor de referência,
fixado nos termos da Lei n. 6.205, de 29 de abril de 1975, vigente na localidade de
trabalho do acidentado.
Art. 9º O acidentado do trabalho que, após a consolidação das lesões resultantes do
acidente, apresentar, como seqüelas definitivas, perdas anatômicas ou redução da
capacidade funcional, constantes da relação previamente elaborada pelo Ministério da
Previdência e Assistência Social (MPAS), as quais, embora não impedindo o
desempenho da mesma atividade, demandem, permanentemente, maior esforço na
realização do trabalho, fará jus, a partir da cessação do auxílio-doença, a um auxílio
mensal que corresponderá a 20% (vinte e cinco por cento) do valor de que trata o inciso ll
do art. 5º desta lei, observando o disposto no § 4º do mesmo artigo.
Parágrafo único. Esse benefício cessará com a aposentadoria do acidentado e seu valor
não será incluído no cálculo de pensão.
186
2.1.7. Lei nº 8.212, de 24/07/1991 (excertos com remissão)
Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do
disposto no art. 23, é de:
(...) II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24
de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de
incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das
remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e
trabalhadores avulsos:
(Redação alterada pela MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98).
ORIGINAL - II - para o financiamento da complementação das prestações por acidente
do trabalho, dos seguintes percentuais, incide sobre o total das remunerações pagas ou
creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:
Alteração - II - para o financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de
incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho,
conforme dispuser o regulamento, nos seguintes percentuais, sobre o total das
remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e
trabalhadores avulsos:
(Redação alterada pela MP nº 1.523-9/97, reeditada até a conversão na Lei nº 9.528/97)
a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de
acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco
seja considerado médio;
c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco
seja considerado grave.
187
2.1.8. Lei nº 8.213, de 24/07/1991 (excertos com remissão)
Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações,
devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas
em benefícios e serviços:
I - quanto ao segurado:
a) aposentadoria por invalidez;
b) aposentadoria por idade;
c) aposentadoria por tempo de serviço; (A partir da EC nº 20/98, esta aposentadoria
será por tempo de contribuição)
d) aposentadoria especial;
e) auxílio-doença;
f) salário-família;
g) salário-maternidade;
h) auxílio-acidente;
i) REVOGADA pela Lei nº 8.870/94.
ORIGINAL - i) abono de permanência em serviço;
II - quanto ao dependente:
a) pensão por morte;
b) auxílio-reclusão;
III - quanto ao segurado e dependente:
a) REVOGADA pela Lei nº 9.032/95.
ORIGINAL - a) pecúlio;
b) serviço social;
c) reabilitação profissional.
§ 1º Somente poderão beneficiar-se do auxílio-acidente os segurados incluídos nos
incisos I, VI e VII do art. 11 desta Lei. (Redação alterada pela Lei nº 9.032/95)
ORIGINAL - § 1º Só poderão beneficiar-se do auxílio-acidente e das disposições
especiais relativas a acidente do trabalho os segurados e respectivos dependentes
mencionados nos incisos I, VI e VII do artigo 11 desta lei, bem como os presidiários que
exerçam atividade remunerada.
§ 2
º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social–RGPS que permanecer em
atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da
Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família
e à reabilitação profissional, quando empregado. (Redação alterada pela MP nº 1.596-
14/97, convertida na Lei nº 9.528/97)
Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da
empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11
desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a
perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
§ 1º A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de
proteção e segurança da saúde do trabalhador.
§ 2º Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as
normas de segurança e higiene do trabalho.
§ 3º É dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da
operação a executar e do produto a manipular.
§ 4º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social fiscalizará e os sindicatos e
entidades representativas de classe acompanharão o fiel cumprimento do disposto nos
parágrafos anteriores, conforme dispuser o Regulamento.
Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes
entidades mórbidas:
188
I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do
trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada
pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de
condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente,
constante da relação mencionada no inciso I.
§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:
a) a doença degenerativa;
b) a inerente a grupo etário;
c) a que não produza incapacidade laborativa;
d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se
desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto
determinado pela natureza do trabalho.
§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista
nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é
executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la
acidente do trabalho.
Art. 21. Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos desta Lei:
I - o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja
contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua
capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua
recuperação;
II - o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em conseqüência
de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de
trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao
trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de
trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força
maior;
III - a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua
atividade;
IV - o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou
proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta
dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do
meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que
seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.
§ 1º Nos períodos destinados a refeição ou descanso, ou por ocasião da satisfação de
outras necessidades fisiológicas, no local do trabalho ou durante este, o empregado é
considerado no exercício do trabalho.
§ 2º Não é considerada agravação ou complicação de acidente do trabalho a lesão que,
resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às conseqüências
do anterior.
Art. 29. O salário-de-benefício consiste: (Redação alterada pela Lei nº 9.876/99)
(...) II - para os benefícios de que tratam as alíneas "a", "d", "e" e "h" do inciso I do art. 18,
na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a
oitenta por cento de todo o período contributivo. (Acrescentado pela Lei nº 9.876/99)
189
Art. 31. O valor mensal do auxílio-acidente integra o salário-de-contribuição, para fins de
cálculo do salário-de-benefício de qualquer aposentadoria, observado, no que couber, o
disposto no art. 29 e no art. 86, § 5º. (Redação alterada pela Lei nº 9.528/97. O § 5º do
art. 86 foi revogado pela Lei nº 9.032/95).
Art. 44. A aposentadoria por invalidez, inclusive a decorrente de acidente do trabalho,
consistirá numa renda mensal correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-
benefício, observado o disposto na Seção III, especialmente no art. 33 desta lei.
(Redação alterada pela Lei nº 9.032/95)
ORIGINAL - Art. 44. A aposentadoria por invalidez, observado o disposto na Seção III
deste capítulo, especialmente no artigo 33, consistirá numa renda mensal correspondente
a:
a) 80% (oitenta por cento) do salário-de-benefício, mais 1% (um por cento) deste, por
grupo de 12 (doze) contribuições, não podendo ultrapassar 100% (cem por cento) do
salário-de-benefício; ou
b) 100% (cem por cento) do salário-de-benefício ou do salário-de-contribuição vigente
no dia do acidente, o que for mais vantajoso, caso o benefício seja decorrente de
acidente do trabalho.
Art. 57. A aposentadoria especial...
§ 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da
contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991,
cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a
atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de
aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição,
respectivamente. (Redação alterada pela Lei nº 9.732/98. Ver art. 6º da Lei nº 9.732/98 e
arts. 1º e 6º da MP nº 83/02, convertida na Lei nº 10.666/03)
§ 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a
remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput.
(Acrescentado pela Lei nº 9.732/98)
Art. 61. O auxílio-doença, inclusive o decorrente de acidente do trabalho, consistirá numa
renda mensal correspondente a 91% (noventa e um por cento) do salário-de-benefício,
observado o disposto na Seção III, especialmente no art. 33 desta Lei. (Redação dada
pela Lei nº 9.032/95)
ORIGINAL - Art. 61 O auxílio-doença, observado o disposto na Seção III deste capítulo,
especialmente no artigo 33, consistirá numa renda mensal correspondente a:
a) 80% (oitenta por cento) do salário-de-benefício, mais 1% (um por cento) deste, por
grupo de 12 (doze) contribuições, não podendo ultrapassar 92% (noventa e dois por
cento) do salário-de-benefício; ou
b) 92% (noventa e dois por cento) do salário-de-benefício ou do salário-de-contribuição
vigente no dia do acidente, o que for mais vantajoso, caso o benefício seja decorrente
de acidente do trabalho.
Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será de cem por cento do valor da
aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse
aposentado por invalidez na data de seu falecimento, observado o disposto no art. 33
desta Lei. (Redação alterada pela MP nº 1.523-9/97, reeditada até a conversão na Lei nº
9.528/97)
ORIGINAL - Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será:
a) constituído de uma parcela, relativa à família, de 80% (oitenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado recebida ou a que teria direito, se estivesse
aposentado na data do seu falecimento, mais tantas parcelas de 10% (dez por cento)
do valor da mesma aposentadoria quantos forem os seus dependentes, até o máximo
de 2 (duas);
190
b) 100% (cem por cento) do salário-de-benefício ou do salário-de-contribuição vigente
no dia do acidente, o que for mais vantajoso, caso o falecimento seja conseqüência
de acidente do trabalho.
Art. 81. REVOGADO pela Lei nº 9.129/95.
ORIGINAL - Art. 81. Serão devidos pecúlio:
I - ao segurado que se incapacitar para o trabalho antes de ter completado o período de
carência;
II - ao segurado aposentado por idade ou por tempo de serviço pelo Regime Geral de
Previdência Social que voltar a exercer atividade abrangida pelo mesmo, quando dela se
afastar; (Revogado pela Lei nº 8.870/94)
III - ao segurado ou a seus dependentes, em caso de invalidez ou morte decorrente de
acidente do trabalho.
Art. 83. REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
ORIGINAL - Art. 83. No caso do inciso III do artigo 81, o pecúlio consistirá em um
pagamento único de 75% (setenta e cinco por cento) do limite máximo do salário-de-
contribuição, no caso de invalidez e de 150% (cento e cinqüenta por cento) desse mesmo
limite, no caso de morte.
Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem
seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente
exercia. (Redação alterada pela Lei nº 9.528/97)
ORIGINAL - Art. 86. O auxílio-acidente será concedido ao segurado quando, após a
consolidação das lesões decorrentes do acidente do trabalho, resultar seqüela que
implique:
I - redução da capacidade laborativa que exija maior esforço ou necessidade de
adaptação para exercer a mesma atividade, independentemente de reabilitação
profissional;
II - redução da capacidade laborativa que impeça, por si só, o desempenho da atividade
que exercia à época do acidente, porém não o de outra, do mesmo nível de
complexidade, após reabilitação profissional; ou
III - redução da capacidade laborativa que impeça, por si só, o desempenho da atividade
que exercia à época do acidente, porém não o de outra, de nível inferior de
complexidade, após reabilitação profissional.
Alteração 1 - Art.86 - O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado
quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza
que impliquem em redução da capacidade funcional. (Redação alterada pela Lei nº
9.032/95)
Alteração 2 - Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado
quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza,
resultar seqüelas que impliquem redução da capacidade funcional. (Redação alterada
pela Lei nº 9.129/95)
Alteração 3 - Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado
quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza,
resultar seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que
habitualmente exercia. (Redação alterada pela MP nº 1.523-9/97, reeditada até a MP nº
1.523-13/97)
Alteração 4 - Art. 86. O auxílio-acidente será concedido ao segurado quando, após a
consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem
seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente
exercia. (Redação alterada pela MP nº 1.596-14/97. A Lei 9.528/97 alterou o texto)
§ 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do salário-de-
benefício e será devido, observado o disposto no § 5º, até a véspera do início de
191
qualquer aposentadoria ou até a data do óbito do segurado. (Redação alterada pela Lei
nº 9.528/97. O § 5º esta revogado)
ORIGINAL - § 1º O auxílio-acidente, mensal e vitalício, corresponderá, respectivamente
às situações previstas nos incisos I, II e III deste artigo, a 30% (trinta por cento), 40%
(quarenta por cento) ou 60% (sessenta por cento) do salário-de-contribuição do segurado
vigente no dia do acidente, não podendo ser inferior a esse percentual do seu salário-de-
benefício.
Alteração 1 - § 1º O auxílio-acidente mensal e vitalício corresponderá a 50% (cinqüenta
por cento) do salário-de-benefício do segurado. (Redação alterada pela Lei nº 9.032/95)
Alteração 2 - § 1º O auxílio-acidente mensal corresponderá a cinqüenta por cento do
salário-de-benefício e será devido até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou
até a data do óbito do segurado. (Redação alterada pela MP nº 1.596-14/97. A Lei nº
9.528/97 alterou o texto)
§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-
doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo
acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria. (Redação alterada
pela MP nº 1.596-14/97, convertida na Lei nº 9.528/97)
ORIGINAL - § 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação
do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido
pelo acidentado.
§ 3
º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria,
observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-
acidente. (Redação alterada pela Lei nº 9.528/97. O § 5º esta revogado)
ORIGINAL - § 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício não
prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente.
Alteração - § 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de
aposentadoria, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente.
(Redação alterada pela MP nº 1.596-14/97)
§ 4º A perda da audição, em qualquer grau, somente proporcionará a concessão do
auxílio-acidente, quando, além do reconhecimento de causalidade entre o trabalho e a
doença, resultar, comprovadamente, na redução ou perda da capacidade para o trabalho
que habitualmente exercia. (Restabelecido pela MP nº 1.523-9/97, reeditada até a
conversão na Lei nº 9.528/97)
ORIGINAL - § 4º Quando o segurado falecer em gozo do auxílio-acidente, a metade do
valor deste será incorporada ao valor da pensão se a morte não resultar do acidente do
trabalho.
Alteração - § 4º REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
§ 5º REVOGADO pela Lei nº 9.032/95.
ORIGINAL - § 5º Se o acidentado em gozo do auxílio-acidente falecer em conseqüência
de outro acidente, o valor do auxílio-acidente será somado ao da pensão, não podendo a
soma ultrapassar o limite máximo previsto no § 2º do artigo 29 desta Lei.
Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo
de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação
do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.
192
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