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SORAIA PINTO SENA
A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DOS ACIDENTES
ESCOLARES POR EDUCADORES EM ESCOLA DE 1ª A 4ª
SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL, BELO HORIZONTE
Belo Horizonte
2006
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SORAIA PINTO SENA
A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DOS ACIDENTES
ESCOLARES POR EDUCADORES EM ESCOLA DE 1ª A 4ª
SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL, BELO HORIZONTE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Saúde da Faculdade
de Medicina da Universidade Federal de Minas
Gerais, como requisito parcial à obtenção do título
de Mestre em Ciências da Saúde da Criança e do
Adolescente.
Área de concentração: Saúde da Criança e do
Adolescente.
Orientadora: Profa. Dra. Janete Ricas.
Belo Horizonte
Faculdade de Medicina da UFMG
2006
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Ao meu filho Augusto, fonte de amor e vida.
A todos os meus alunos de atividades recreativas,
lúdicas e musicais, com os quais vivenciei a
alegria da infância.
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AGRADECIMENTOS
À minha querida mãe, Íris, pelo incentivo e apoio incondicional.
Ao meu pai Hugo, in memoriam, pelo exemplo de trabalho, persistência e amor.
Ao meu irmão Roberto, in memoriam, pelo afeto e amizade.
À minha tia avó Odete, in memoriam, doce saudade e a sua filha Dilcéia, herdeira da
minha amizade.
À Dra. Vanda, pela escuta atenta e pela ética sempre presente em nossa
convivência.
Ao Dr. Rodrigo, pela sensibilidade e inovação.
À minha orientadora, Janete, pela parceria, competência, disponibilidade e paciência
em todos os momentos.
À Profa. Regina, pela rica contribuição no estágio docente.
Ao Prof. Francisco Penna, pela sua disponibilidade em saber ouvir.
A todos os professores da Pós-Graduação, pela ajuda prestada em momentos
importantes, em especial: Joel, César, Fernando, Roberto, Paulo Sérgio, Elizabeth e
Ada.
A todos os meus amigos que me ajudaram dando dicas e enriquecendo este
trabalho, em especial: Eduardo, Eni, Kelen, Juliana e Amarílis.
5
Às amigas diletas e colegas de profissão Ângela Mucida e Suzana Veloso Cabral,
pelo interesse, atenção e colaboração com suas discussões enriquecedoras.
À Cláudia pela sua valiosa objetividade e imenso saber epidemiológico.
À Ana Cristina e Márcia pela ajuda ímpar na revisão deste texto.
A todos os meus colegas da Pós-graduação, em especial: Cristina, Miguir, Tatiana,
Eugênia e Lúcia.
Aos funcionários do Centro de Pós-Graduação, pela eficiência em especial a Egly.
A todos os funcionários da Biblioteca J. Baeta Vianna e à Nancy e Marília do Setor
de Comutação.
À Maria Carmem, por orientar meu filho nos estudos durante minha ausência.
Ao Cláudio, Daniel e Nazaré pela ajuda na hora certa.
Às escolas e aos educadores dessa pesquisa pela disponibilidade e cooperação
durante todo o processo de investigação.
À CAPES, pelo apoio financeiro.
6
RESUMO
Os acidentes na infância além de causarem prejuízo para a vida humana, podem
causar seqüelas, tanto físicas quanto emocionais, na criança e no adolescente. Na
escola, o acidente pode ter como conseqüência o absenteísmo e o insucesso
escolar sendo, portanto, um problema educacional e de saúde pública. O objetivo
dessa pesquisa foi estudar as representações sociais de educadores sobre os
acidentes ocorridos em crianças de 1ª a 4ª série do ensino fundamental em Belo
Horizonte. Foi realizada uma pesquisa qualitativa, com entrevistas semi-estruturadas
com educadores em 17 escolas privadas de nível sócio econômico elevado de Belo
Horizonte. Os entrevistados foram escolhidos por serem pessoas que detinham as
informações privilegiadas do grupo. O número de escolas entrevistadas não foi
previamente definido, tendo sido utilizado o critério de exaustão para interromper a
coleta de dados. Na análise, os seguintes temas foram estudados: impressões
gerais sobre o acidente na escola; conceitos e crenças a respeito do acidente
escolar; capacitação relatada para lidar com a criança acidentada; sentimentos
relativos à autocompetência para lidar com o acidente; concepção de medidas para
evitar e lidar com acidentes e percepção de responsabilidade sobre o acidente. Em
relação ao conceito de acidente observamos nos relatos, que existe ainda, a
concepção da fatalidade ao lado do conceito de acontecimento previsível. Outro
aspecto que chama atenção é o fato de que os educadores não se sentem
preparados para lidar com o acidente relatando capacitação incipiente para o
atendimento da criança acidentada, recorrendo às suas experiências como pais
nesta situação. Percebeu-se heterogeneidade e ambigüidade relativas à questão da
7
responsabilidade pela prevenção e atendimento no acidente, variando desde a
responsabilização da escola, passando pela família e incluindo, em alguns casos, a
criança. A responsabilização de todos os envolvidos também foi aventada. As
soluções apontadas variaram de acordo com a atribuição de responsabilidade,
sendo que destacou-se a vigilância da criança e intervenções no espaço físico.
Apareceram também, expressões de necessidade e desejo de capacitação. Discute-
se no trabalho, determinantes, atuais e históricos, relacionados à educação, família e
criança, da construção das representações do acidente pelos educadores.
Acreditamos que é necessário ampliar a discussão e a realização de mais pesquisas
sobre o tema entre os educadores, abrangendo também a escola pública, a
adolescência e a violência. Recomendamos a implantação de uma Política Pública
de Saúde que estabeleça estratégias preventivas e capacitação dos educadores
visando beneficiar as escolas e os alunos na prevenção dos acidentes.
Palavras-chave: Acidente Acidente escolar Educador Criança Prevenção de
acidentes Família/escola Representação Social.
8
SUMMARY
Acidents in childhood not only threaten human life, but they can also cause both
physical and emotional damage in children and adolescents. Accidents lead to
absenteism from school and academic failure, and are an educational and a public
health problem. The objective of this research was to study the social representations
of educators regarding accidental injuries sustained by children from the 1
st
to the 4
th
grade of elementary schools in Belo Horizonte. The study was qualitative, based on
semi-structured interviews with educators in 17 private schools of Belo Horizonte’s
upper class. The interviewed subjects were chosen because they had priviledged
information regarding their school group. The number of interviewed schools was not
previously defined, exaustion criteria was the criteria used for interruption of data
collection. The following issues were analysed: general impressions regarding
accidents in school; concepts and beliefs regarding accidents in school; reported
training for dealing with the injured child; feelings regarding competence to deal with
the accident; strategies to avoid and deal with accidents and percieved responsability
regarding the accident. Through the reports, we observed that, regarding the concept
and definition of accident, there lingers an idea of fatality even when alongside de
concept of it being a somewhat predictable occurance. Another aspect which is
highlighted is the fact that educators do not feel prepared to deal with the accident
and report incipient competence for ensuring assistance to the injured child, relying
on their own experience as parents. There was heterogenity and relative ambiguity in
the determination of who was responsable for prevention and assistance, varying
from the responsability being of the school, to the family and, including, in some
cases, the child. The responsabilization of all those involved was also mentioned.
9
The solutions proposed by the interviewed subjects varied according to who they
considered responsable for the accident, with emphasis being on watching the child
and interventions in the physical space. There was also mention of the wish and
need for training of educators. The paper discusses current and historical
determinants, regarding education, families and children, in the construction of the
representation of accidents in the minds of educators. We believe that it is necessary
to expand the discussion and further research, including public education, teenagers
and violence in the discussion. We recommend the implementation of a public health
policy with preventive strategies and educator training in order to help schools and
students in accident prevention.
Key Words: Accident School accident Educator Child Accident prevention
Family/school Social Representation
10
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................... 12
1.1 Motivação para a pesquisa.................................................................... 14
1.2 Situação atual dos acidentes na infância............................................... 16
1.3 Definição de acidentes: breve histórico.................................................. 19
1.4 Abordagem epidemiológica do acidente escolar.................................... 22
1.5 Escola, família e educação: aspectos históricos.................................... 34
1.5.1 Aspectos pedagógicos no processo sóciohistórico................................ 42
2 OBJETIVOS............................................................................... 48
2.1 Objetivo geral......................................................................................... 48
2.2 Objetivos específicos............................................................. 48
3 METODOLOGIA.................................................................... 49
3.1 Justificativa do método........................................................................... 49
3.2 Instrumento de coleta ............................................................................ 51
3.3 Formação da amostra............................................................................ 51
3.4 Procedimentos....................................................................................... 52
3.5 Análise dos dados.................................................................................. 55
3.6 Aspectos éticos...................................................................................... 59
11
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO........................... ................. 61
4.1 Características da amostra estudada........................... ......................... 63
4.2 Temas e categorias analíticas e empíricas encontradas........................ 64
4.2.1 Tema 1: Impressões gerais sobre o acidente escolar............................ 65
4.2.2 Tema 2: Conceitos e crenças a respeito do acidente escolar................ 69
4.2.3 Tema 3: Nível de informação sobre acidentes....................................... 86
4.2.4 Tema 4: Sentimentos relativos à auto competência para lidar com o
acidente.................................................................................................. 93
4.2.5 Tema 5: Concepção de medidas para evitar e lidar com acidentes....... 96
4.2.6 Tema 6: Percepção de responsabilidade sobre o acidente................... 100
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................... 114
REFERÊNCIAS....................................................................................................... 118
APÊNDICE A TERMO DE CONSENTIMENTO DA ESCOLA PARA
PARTICIPAÇÃO EM PESQUISA .......................................... 125
APÊNDICE B ROTEIRO DA ENTREVISTA....................................... 127
APÊNDICE C CATEGORIAS ENCONTRADAS NO FORMATO DSC..... 128
ANEXO Parecer n° ETIC 136/04 .................................................. 148
12
1 INTRODUÇÃO
“As crianças têm o direito de ter o amor e o carinho da
sociedade no mundo presente. O futuro é das crianças,
que precisam da proteção da família, de professores e
de médicos, pois têm o direito de viver num mundo
novo, melhor que o atual.”
Wilson Maciel, 2003.
Durante a minha vida profissional de psicóloga e também como professora de
atividades psicomotoras e lúdicas com alunos de diversos estabelecimentos de
ensino de Belo Horizonte, sempre estive atenta à saúde geral do escolar, seu bem-
estar físico e emocional.
A inquietude e a imprevisão inerentes à infância tornam a criança susceptível aos
riscos e, às vezes, o educador não sabe como lidar com essas adversidades. O
ambiente escolar é um lugar propício a acidentes devido ao grande número de
crianças que nele se encontra, interagindo e desenvolvendo as mais diversas
atividades motoras e esportivas. Observei que diante de um acidente, a tendência
dos educadores era acreditar ser esse acidente uma fatalidade, um evento que faz
parte da infância.
Nas reuniões pedagógicas nas escolas, raramente, havia espaço para se falar do
tema, pois havia questões mais importantes a serem tratadas, por exemplo, as
questões relativas ao rendimento cognitivo do aluno e às novas estratégias de
ensino. Assim, em minha experiência como psicóloga da área escolar, sentia-me
incomodada com o silêncio em relação ao tema Acidentes Escolares.
13
Posteriormente, passei a coordenar cursos de aperfeiçoamento, com grupos de
professores da pré-escola e do ensino fundamental. Durante esse período, observei
situações da criança se acidentar em ambiente escolar e a atitude da escola perante
o acontecimento. Essas experiências e inquietações me motivaram a estudar a
problemática dos acidentes de alunos no ambiente escolar.
Os acidentes na infância, além de causarem prejuízo para a vida humana, podem
causar seqüelas, tanto físicas quanto emocionais, na criança e no adolescente. Na
escola, o acidente pode ter como conseqüência o absenteísmo e o insucesso
escolar sendo, portanto, um problema educacional e de saúde pública. Segundo
Eichel e Goldman (2001), a prevenção dos acidentes reduz o sofrimento das
pessoas, a perda de potencial humano e mesmo a morte. Também reduzem os
custos financeiros, que inevitavelmente são arcados pela sociedade como um todo.
Embora, Carvalho Júnior (2000, p. 81) aponte que, em função de escassos
investimentos em pesquisa, o trauma é chamado de doença negligenciada da
sociedade moderna”, existem muitos estudos a respeito do acidente escolar sob a
ótica quantitativa em países desenvolvidos. No Brasil, esse tema não tem sido muito
estudado. Constatou-se, em pesquisas na literatura, que, apesar de sua importância,
são raros os estudos sobre acidentes em ambiente escolar em alunos de 1ª a 4ª
série do ensino fundamental no Brasil. Contudo, observando trabalhos recentes,
principalmente na área pediátrica, percebermos que o assunto é mencionado dentro
dos temas acidentes na infância e idade escolar.
14
É, entretanto, notória a escassez na literatura de trabalhos qualitativos abordando
esse tema, no âmbito nacional e internacional. Constatando a importância do
acidente escolar do ponto de vista epidemiológico, sentimos necessidade de ir além
dos dados quantitativos e buscar as idéias e os sentimentos dos educadores sobre o
assunto, pela suposição de que estes estão entre os determinantes da política da
escola relativa aos mesmos. Assim, a importância dada aos sentimentos e idéias
dos educadores sobre o assunto justifica-se pelo papel que eles desempenham na
organização das escolas e no cuidado diário com as crianças.
Schvartsman (2003, p. 5) afirma que, “[...] qualquer medida preventiva, para ser
eficaz, necessita sempre levar em consideração a percepção da sociedade. Esta,
com freqüência percebe os riscos de modo diferente aos determinados
cientificamente.”
1.1 Motivação para a pesquisa
Este estudo é, assim, motivado pela perspectiva de que o conhecimento da
percepção dos educadores sobre os acidentes poderá subsidiar estratégias de
intervenção preventiva relativas a acidentes escolares. Conhecer acerca da cultura
do acidente na perspectiva do grupo pode ser um caminho na busca da prevenção e
diminuição do número de acidentes escolares.
Nesta pesquisa, pretendemos ir além dos dados estatísticos e visíveis, trabalhando
com a questão da subjetividade. Para esta abordagem, escolhemos um caminho
15
metodológico usado em pesquisas sociais, tomando como referência a teoria das
Representações Sociais.
O conceito de Representação Social foi criado por Serge Moscovici, nos anos 60 do
século passado e, a partir de então, tem sido utilizado nas pesquisas qualitativas
para analisar as categorias de pensamento através das quais o grupo social elabora
e expressa suas teorias sobre um fato social. Elas incluem a maneira de agir, pensar
e sentir de um determinado grupo, manifestando-se por palavras, sentimentos e
condutas. Segundo Jurema e Costa (2004, p. 3), a Representação Social baseia-se
“no indivíduo que apreende, transforma e atualiza, num contexto determinado, os
objetos sociais e é, ainda, o sujeito que os representa e os comunica.”
Nas palavras de Moscovici , Representação Social seria:
[...] um sistema de valores, idéias e práticas, com uma dupla função:
primeiro estabelecer uma ordem que possibilitará às pessoas orientar-
se em seu mundo material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar,
possibilitar que a comunicação seja possível entre os membros de
uma comunidade, fornecendo-lhes um código para nomear e
classificar, sem ambigüidade, os vários aspectos de seu mundo e da
sua história individual e social (MOSCOVICI, 2004, p. 21).
Dessa forma, a pesquisa da Representação Social constitui-se em um instrumento
para análise das idéias, sentimentos e condutas dos educadores a respeito do
acidente escolar, possibilitando a elaboração de um saber sobre o fato por eles
mesmos e pelo pesquisador.
16
1.2 Situação atual dos acidentes na infância
Os acidentes em crianças, adolescentes e adultos jovens são um grande problema
na atualidade, pois existem riscos em todos os lugares, não somente em rodovias,
mas em casa, na escola, nos playgrounds e em outras áreas de lazer (MANCIAUX;
ROMER, 1986).
Segundo Rivara (1999), de acordo com o NATIONAL CENTER FOR HEALTH
STATISTICS, nos Estados Unidos, apesar dos progressos no controle dos acidentes
nos últimos vinte anos, registraram-se em 1995, 13 018 mortes por acidentes entre
crianças e adolescentes, das quais muitas eram evitáveis.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) os acidentes figuram entre as
primeiras causas de óbito nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Dentre
as causas de acidentes violentos, os acidentes de trânsito ocupam a primeira
posição na faixa etária de 5-14 anos, nos países desenvolvidos e a terceira posição,
na mesma faixa etária, nos países em desenvolvimento. As quedas ocupam a 15
a
causa de morte em crianças de 5-14 anos nos países desenvolvidos (KRUG, 2000).
As quedas representam as causas mais comuns de acidentes não-fatais e são
também causas relevantes de morte por acidentes em crianças e adolescentes. A
maioria das quedas ocorre dentro das casas, sendo um quarto em escolas, parques
e clubes (WAKSMAN; GIKAS, 2003). Em 1998, segundo estimativa da Organização
Mundial de Saúde (OMS), as quedas representaram, mundialmente, a principal
17
causa de morbidade por acidentes, em ambos os gêneros, na faixa etária de 5 a 14
anos (KRUG, 2000).
Rivara e Aitken (1998) afirmam que os brinquedos em playgrounds estão entre as
causas comuns de acidente envolvendo crianças, principalmente quedas, ocorrendo
especialmente na escola. Nesse sentido, Sheps e Evans (1987) concluíram que os
playgrounds foram responsáveis pelas maiores taxas de trauma entre alunos da
escola elementar, enquanto que, para os alunos de nível secundário, os ginásios
esportivos e as salas de aula são os locais onde ocorrem os maiores números de
acidentes.
No Brasil, de acordo com o DATASUS, em 2003, ocorreram 401 óbitos na faixa
etária de 0-19 anos devido a quedas. Desses, 20,0% (80) e 18,5% (74) ocorreram na
idade de 5-9 anos e 10-14 anos, respectivamente. Em Minas Gerais, foram
registrados, neste ano, 36 óbitos por queda na faixa de 0-19 anos, equivalendo a
9,0% do total do país.
Em 2004, na faixa etária de 0-19 anos, o SUS internou, devido a quedas, 96 162
crianças e jovens. Na faixa de 5-9 anos, foram 29 883 internações, o que
representou 31,1% das internações gerais e entre 10-14 anos, 26 505 internações
(27,6%). Em Minas Gerais, 11 270 Autorizações de Internações Hospitalares (AIH)
foram pagas devido à internação por queda na faixa de 0-19 anos, ou seja, 11,7%
do total brasileiro.
18
Nos estudos desenvolvidos por Carvalho Júnior et al. (2000) e Donoso (2000), a
queda foi a principal causa de acidente em crianças e adolescentes atendidos no
hospital de Pronto Socorro João XXIII, em Belo Horizonte.
A literatura mostra que grande parte dos acidentes, que requerem atenção médica,
com crianças em idade escolar, ocorre na escola. Mais de um terço dos acidentes
estão relacionados a esportes e atividades recreativas e, próximo a um terço,
resultante de quedas durante outras atividades (COMMITTEE ON INJURY AND
POISON PREVENTION. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS, 1997).
Oliveira et al. (2000), estudando uma amostra de 1 005 escolares de escolas
públicas e privadas de Belo Horizonte, observaram que as fraturas foram o segundo
evento mais freqüente em decorrência do acidente, acrescentando que, dos 1 264
acidentes hospitalizados ou não, 6,7% ocorreram na escola.
O Impacto do acidente escolar é decorrente não só de sua freqüência, mas também
das limitações causadas nas crianças e adolescentes. Um estudo de Di Scala;
Gallagher e Schneps (1997) feito em 74 instituições, abrangendo 30 estados
americanos, além de Escolas do Canadá e Porto Rico, mostrou que as lesões não-
intencionais, ocorridas em alunos desde o nível pré-escolar até o científico, causam
múltiplas seqüelas nas funções motoras, sensitivas, cognitivas e comportamentais. A
maior parte das seqüelas encontra-se nas áreas motoras, ficando a criança com
dificuldades em conseguir se locomover e exercer atividades do seu cotidiano, como
se banhar e vestir.
19
Com a inserção mais precoce e permanência mais tempo da criança na escola, os
acidentes escolares têm aumentado sua importância como causa de
morbimortalidade. Esse fenômeno decorre de mudanças significativas que vêm se
intensificando nas últimas duas décadas, relativas à vida familiar. Uma dessas
mudanças foi o grande aumento do número de mães inseridas no mercado de
trabalho (COMMITTEE ON INJURY AND POISON PREVENTION. AMERICAN
ACADEMY OF PEDIATRICS, 1997).
A conseqüência dessa mudança foi a inserção da criança mais precocemente na
vida escolar e o aumento do seu período de permanência, exigindo dela uma
adaptação à nova realidade familiar e social.
1.3 Definição de acidentes: breve histórico
Por centenas, senão milhares de anos, as comunidades médicas e leigas viam os
acidentes como ato de Deus ou da natureza, ou como eventos aleatórios,
imprevisíveis ou do azar. Essa atitude fatalística dificultou o progresso do controle
dos acidentes e, infelizmente, ainda hoje, persiste em grande extensão (RIVARA;
AITKEN, 1998). Até meados da década de 80, o acidente era definido
cientificamente como um evento fortuito, geralmente danoso, independente da
vontade, provocado por uma força externa, gerando algum comprometimento físico
ou mental (SCHVARTSMAN, 2003).
De acordo com Tursz (1986), a definição do termo originou uma discussão na
modernidade entre diversos autores que consideram que a palavra acidente suscita
20
uma confusão entre o imprevisto e o imprevisível, significando que o mesmo seria
inevitável. Devido ao fato da definição de acidente sugerir o acaso e a
irreversibilidade, os autores de língua inglesa procuraram, então, modificar o
significado associado à irreversibilidade, substituindo o termo acidente pelo termo
injury: machucado, ferimento ou dano. Entretanto, Schvartsman (2003, p. 3) prefere
a expressão non intentional injury, traduzido em português como “injúria não-
intencional”. Para esse autor, nenhum deles expressa bem o significado, permitindo
muitas vezes interpretações equivocadas, pois o acidente não seria a injúria, mas
teria como conseqüência a injúria.
Heredero (1988) ressalta que, onde quer que seja, em qualquer momento, o aluno
está exposto a uma série de riscos: em sala de aula, corredores, escadas,
banheiros, laboratórios, biblioteca, áreas de recreação e esportes, determinando que
o acidente surja subitamente e de um modo repentino, apesar de ser, quase sempre,
previsível. A característica de previsibilidade justifica a investigação de fatores de
risco para o estabelecimento de condutas preventivas para que ocorra sua
diminuição.
Schvartsman (2003) afirma que, apesar das dificuldades nas definições do conceito
acidente, nele existem sempre fatores causais, reversíveis e previsíveis. Qualquer
que seja a definição vale ressaltar, de acordo com Tursz (1986), que o conceito
acidente exclui os atos de violência, suicídio, homicídio e maus tratos.
Segundo Gaspar (2002), a visão equivocada de que os acidentes são inevitáveis e
imprevisíveis teve como decorrência a histórica negligência desse tema em saúde
21
pública. Contudo, nas últimas duas décadas, a comunidade científica tem
demonstrado interesse em seu estudo, visando principalmente a sua prevenção.
No Brasil, segundo a Constituição Federal e a legislação dela decorrente, o acidente
é entendido como evento não-intencional e evitável, causador de lesões físicas e ou
emocionais, que abrange tanto questões médicas e biomédicas relativas ao
atendimento do acidentado, como àquelas relativas a estilos de vida e ao conjunto
de condicionantes sociais, históricos e ambientais que precedem e/ou facilitam a
ocorrência do acidente (BRASIL, 2000b, p. 427).
Em 1998, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) lançou a campanha de
prevenção de acidentes, cujo slogan era: Acidentes são evitáveis... com o objetivo
de despertar a atenção da comunidade médica e da população em geral para a
gravidade do problema.
Como visto, o conceito de acidente tem evoluído ao longo do tempo, incorporando
os aspectos de previsibilidade e determinação. Para Guyer e Gallagher (1985), o
conceito de acidente não-científico vinculado à causalidade, ao destino e ao
inesperado vem sendo substituído pelo modelo científico, agente-hospedeiro-
ambiente, de forma semelhante à utilizada na epidemiologia das doenças.
Nesta pesquisa, utilizaremos o conceito de acidente do Ministério da Saúde “[...] o
acidente é entendido como o evento não-intencional e evitável, causador de lesões
físicas e ou emocionais. Assume-se que tais eventos são, em maior ou menor grau,
perfeitamente previsíveis e preveníveis.(BRASIL, 2000b, p. 247).
22
Além do conceito de acidente de forma geral, o conceito de acidente escolar,
especificamente, é também um conceito que gera certa polêmica. Oliveira (2000)
considera que acidente escolar é aquele que ocorre a partir do momento em que a
criança deixa sua casa para ir à escola até o seu retorno. Bahy et al. (1978, p. 4)
acrescentam que, além dos acidentes produzidos desde a entrada na escola até a
saída da mesma, devem ser considerados também aqueles ocorridos nas atividades
organizadas pela escola, como atividades esportivas externas, campeonatos,
passeios e excursões. Os autores apontam que a incorporação dos acidentes
ocorridos no caminho da escola introduz a mortalidade e morbidade particular aos
acidentes de circulação os quais são muito mais mortais. Nessa perspectiva, existiria
a dificuldade de comparação dos resultados dos trabalhos sobre acidentes escolares
em geral, devido à inclusão dos acidentes de percurso.
Utilizaremos, neste estudo, o conceito de Heredero (1988, p. 134), que define o
acidente escolar como “aquele que ocorre dentro das instalações da escola e fora
dela, em um perímetro de 300 metros ao redor da escola.” A escolha desse conceito
atende aos objetivos desta pesquisa, pois os acidentes ocorridos nas instalações da
escola e em seus arredores estão sob possibilidade de interferência da mesma, ao
passo que os acidentes que envolvem o percurso fogem à sua governabilidade
imediata.
1.4 Abordagem epidemiológica do acidente escolar
Heredero (1988) ressalta que, para a ocorrência do acidente, existem fatores
determinantes que seriam análogos aos fatores epidemiológicos de qualquer
23
doença, ou seja, o hospedeiro, o agente causal e o ambiente. Schvartsman (2003)
acrescenta que o acidente ocorre quando há uma interação entre esses três fatores.
Garcia; Solis Albarran e Vasquez Cabrera (1998, p. 20) afirmam que “os acidentes
não são acidentais e sim o resultado de uma série de fatores.” Esses autores
apontam que, nos acidentes escolares, existe sempre um agente causal térmico,
químico ou mecânico, causador direto de dano sobre o hospedeiro, neste caso o
aluno, atuando em um ambiente propício, a escola.
Segundo essa linha de pensamento, teríamos três fatores inter-relacionados:
a) o aluno, considerado como um hospedeiro, ou seja, o indivíduo vitimado.
Nesta vertente, é de suma importância avaliar as fases do desenvolvimento
infantil, os fatores cognitivos, físicos e emocionais, próprios, ou não, da idade
que devem ser ressaltados como determinantes do acidente;
b) o agente causal que é a forma de energia que lesa os tecidos orgânicos,
levando à classificação dos acidentes em mecânicos (quedas), térmicos
(queimaduras), elétricos (queimaduras por eletricidade), químicos
(queimaduras, intoxicações);
c) o ambiente, no qual se pode considerar a existência de dois tipos:
?? ambiente físico: a arquitetura, que inclui aspectos ergonômicos
(HEREDERO, 1988),
?? ambiente humano: considera-se como constituído pelas pessoas mais
próximas à criança, dentre elas, as mais importantes seriam a família, os
24
educadores e os colegas de escola (GARCIA; SOLIS ALBARRAN;
VASQUEZ CABRERA , 1998).
Com relação ao hospedeiro, os progressos das pesquisas sobre o tema nas últimas
duas décadas têm apontado a faixa etária e as suas características psicossociais
como um fator importante de conhecimento, para que se previna o acidente.
A faixa etária de maior ocorrência de acidentes é a de 6 a 11 anos, o que poderia
ser devido ao fato de ser uma fase em que a criança apresenta maior autonomia e
maturidade motora, estando portanto, sob menor controle do cuidado adulto.
Segundo Oliveira (2000, p. 27) “a criança na idade escolar é aventureira e destemida
com a tendência a auto afirmar-se e a afirmar-se entre os amigos”, o que a leva
muitas vezes a uma exposição a situações de risco.
Piaget (2005, p. 42) afirma que a criança no estágio pré-operatório, no qual já possui
capacidade perceptivo-motora, apresenta uma transição do egocentrismo intelectual
para assimilação de regras, ou seja, “pensa antes de agir” começando, assim,
gradualmente a conquista da reflexão. O desenvolvimento, a partir da faixa etária
dos seis anos seria, assim, sensível à introdução de regras, o que depende também
de condições favoráveis do seu desenvolvimento dentro da família, que devem
torná-la uma pessoa consciente das regras e socialmente integrada na vida e na
escola. Assim, em vez das condutas impulsivas da primeira infância, a criança de
sete, oito anos, começa a apresentar a capacidade de julgamento, processo este
que irá desenvolver-se de acordo com a sua evolução cognitiva/afetiva. Entretanto, a
25
colocação em prática dessa capacidade de julgamento incipiente está ainda
dependente da interação no momento com o adulto.
Ultrapassando o interacionismo piagetiano, Vigotsky (1984) salienta que os outros,
família, educadores ou companheiros, são mediadores de conhecimento e condutas,
inclusive em relação aos riscos de acidentes. O autor ressalta a importância dessa
mediação no processo ensinoaprendizagem e acrescenta que toda criança possui
“uma zona de desenvolvimento proximal” que, com a mediação do adulto, ou
crianças mais velhas, pode ser estimulada e desenvolvida em diversos aspectos.
Oliveira (2000, p. 72) conclui em seu estudo sobre acidentes em escolares que
“grande parte das crianças e adolescentes no momento do acidente estava
desacompanhada”, ou seja, sem a presença de familiares ou professores.
A literatura na área aponta, assim, que a faixa etária desta pesquisa necessita de
uma supervisão e de um aconselhamento de um adulto responsável, para que as
crianças possam, gradualmente, assimilar os valores relativos a condutas
preventivas de riscos. Nessa perspectiva, Cabral (2001) acrescenta que, de acordo
com a teoria piagetiana, a ação da criança deve ser estimulada no nível intelectual
para novas descobertas. Em contrapartida, no nível psicomotor, é imprescindível a
participação e o olhar de um adulto, enquanto a criança ousa as condutas de risco
relativas a cada etapa do desenvolvimento.
Jukemura (2000) aponta predomínio de acidentes nesse grupo etário, fora do
domicílio. A habilidade motora apresenta-se bem desenvolvida enquanto a cognitiva
26
ainda está em desenvolvimento, faltando-lhes, assim, independência com relação às
habilidades perceptivo-motoras e julgamento (SANCHEZ; PAIDAS,1999).
Gesell (1998) destaca, em seus trabalhos, a existência de uma agitação motora que
surge repentinamente na criança a partir dos seis anos de idade, com durabilidade
transitória, manifestando-se por ciclos, com momentos de tranqüilidade e de picos
de agitação.
Com relação a essa transição da criança da família à escola, Nicolaci-da-Costa
(1987, p. 39) acrescenta que se houver “uma proximidade de sistemas de valores
entre família e escola, a adaptação da criança à segunda se dá de forma natural e
sem maiores dificuldades”, mas, se ocorrer o contrário, ou seja, se houver a
“existência de diferenças entre os sistemas de valores da família e da escola, o
processo de adaptação da criança à rotina escolar é dificultado [...]” podendo
aumentar, também, os riscos de acidentes.
A maturidade afetiva, cognitiva e os aspectos inter-relacionais - família, escolas,
colegas - devem, portanto, ser considerados na avaliação dos acidentes escolares.
A organização da escola, no entanto, dividindo os grupos por faixa etária, espera
que a criança se adapte ao seu grupo específico, desconsiderando as
características particulares de cada criança. Muitas crianças têm dificuldade de fazer
a transição da vida familiar para a escolar, provocando uma desadaptação que as
tornam muitas vezes mais vulneráveis aos acidentes.
27
De acordo com Freud (1982, p. 162):
[...] As crianças são graduadas segundo a maturidade, na acepção de que
diferentes padrões são aplicados a diferentes grupos de idades, mas, dentro
do grupo etário, espera-se que todos os indivíduos aceitem uma norma
comum, seja qual for o sacrifício que isso possa significar para as respectivas
personalidades. Por essa razão, muitas crianças têm dificuldades em realizar
a transição dos padrões familiares para os escolares [...].
É consenso entre as comunidades psicológica e pedagógica o papel crucial da
família no desenvolvimento emocional, cognitivo e social da criança. Constata-se no
mundo contemporâneo uma crise da família e uma modificação da instituição
familiar, decorrentes dos novos valores relativos à tradição, papéis desempenhados
pelo homem e a mulher no trabalho, casamento, amor sexualidade, etc. Segundo
Giddens (1993 apud SARTI, 2005, p. 44) “quando grandes áreas da vida de uma
pessoa não são mais compostas por padrões e hábitos preexistentes, o indivíduo é
continuamente obrigado a negociar opções de estilo de vida [...].”
Nessas mudanças do padrão tradicional de composição e relação familiares para o
atual, percebe-se uma confusão no exercício da autoridade no seio familiar, levando
muitas vezes a uma permissividade excessiva, prejudicando as crianças e o trabalho
da escola. Nesse universo de variáveis, a relação família-escola-criança apresenta
inúmeras dificuldades em relação aos limites, autoridade, autonomia da criança,
entre outros, dificultando a condução de seu desenvolvimento.
Além das características gerais da idade e dos aspectos psicossociais
contemporâneos da relação família/escola, as características específicas de
28
maturidade afetiva, cognitiva e psicomotora individuais de cada criança devem ser
levadas em conta.
A família e outros grupos sociais tais como a escola e amigos se inter-relacionam e
influenciam de maneira decisiva a formação das crianças. É através da relação com
seus pais, parentes e pessoas significativas, como o professor e seus colegas, que
ela irá organizar as percepções a respeito de si mesma. Nessa inter-relação, muitas
vezes seu comportamento é estabelecido de acordo com o que os outros esperam
dela. Conforme Coutinho e Moreira (2004, p. 189) “quando um rótulo lhe é dado, ela
acaba, muitas vezes, comportando-se de acordo com aquele rótulo. É o caso de
crianças que apresentam um desenvolvimento tardio por serem tratadas como
incapazes e dependentes.”
Os comportamentos de risco, a falta de limite e a sua relação com os acidentes ou a
implicação da criança com a sua conduta são também influenciados pela relação da
mesma com a família, escola e o meio social. Seguindo essa linha de pensamento,
Zagury (2000, p. 218) afirma que “desde bem pequena a criança, em interação com
o meio, através das experiências vivenciadas (especialmente em contato com os
pais), vai incorporando idéias sobre si que influenciarão atitudes posteriores [...].”
Coutinho e Moreira (2004) acrescentam que, quando a interação com o outro é
insatisfatória devido à ausência da família em momentos importantes do
desenvolvimento infantil, ocorrem muitas vezes comportamentos inadequados da
criança, inclusive na escola. Em contrapartida, as experiências positivas de presença
e aceitação da criança pelos familiares e pelo grupo social no qual ela está inserida,
29
geram sentimentos de segurança e adequação da mesma. Além da fase de
desenvolvimento e a busca do conhecimento a ela relacionada, a estrutura psíquica
da criança tem efeitos na sua vida inter-relacional e na ocorrência de acidentes.
Segundo Winnicott, (1980, p. 33-34):
[...] cada indivíduo surge, desenvolve-se e torna-se maduro; não
existe maturidade adulta isolada de um desenvolvimento prévio. Esse
desenvolvimento é extremamente complexo, é contínuo desde o
nascimento ou os primeiros anos até a vida adulta e através dela até a
velhice [...]. Não podemos, sem prejuízo, deixar nada de fora, nem
mesmo os acontecimentos da infância, nem mesmo aqueles da
infância mais tenra.
Portanto, para que a criança se adapte à realidade e sobreviva no mundo é
necessário que ela vença as etapas do seu desenvolvimento físico, cognitivo e
emocional e ultrapasse a dependência completa do outro, tornando-se autônoma.
Este processo evolutivo ocorre de uma maneira singular para cada ser humano.
Winnicott (1980) introduziu o conceito de mãe suficientemente boa, para se referir às
funções cruciais desenvolvidas pela mãe ou por quem a substitua em sua função.
Essa mãe adequada, descrita pelo autor, seria a responsável pela realização de três
funções primordiais que estimulariam o crescimento e desenvolvimento do bebê de
modo satisfatório: o segurar ou holding, o tocar ou manejo e a apresentação de
objetos ou objet-presenting. Esses acontecimentos da infância, ressaltando
principalmente os ocorridos na fase mais primitiva, são registrados psiquicamente e
serão ser base para a constituição da estrutura egóica do ser humano.
30
O vínculo mãe-filho seria o cerne da estruturação da criança e através dele ela
estabeleceria outros vínculos afetivos que a fariam funcionar adequadamente em
situações que exigem cuidado, atenção consigo mesma e com os outros; condutas
que certamente influenciam na ocorrência ou não dos acidentes.
Após a primeira fase do desenvolvimento, na qual a influência da família, em
particular da mãe ou de quem exerce a sua função, é decisiva na formação global da
criança, a escola passa também a ocupar um papel significativo no processo de
adaptação da criança ao mundo.
O surgimento da psicanálise demonstrou que as instâncias consciente e
inconsciente constituem bases dialéticas no processo da formação da personalidade
da criança. O advento da linguagem representa, no desenvolvimento da criança,
uma nova etapa, traduzindo e determinando a transição do comportamento biológico
para o estado da cultura, no qual ocorrerá a constituição e introjeção da autoridade,
da lei e dos limites. Não nos cabe aqui entrar na teoria psicanalítica, contudo
julgamos importante incluí-la neste estudo como um referencial adequado para
reflexão sobre as questões subjetivas, relativas aos comportamentos e atitudes da
criança e à sua interação família /escola.
Ao ingressar na escola, a criança, através de suas identificações anteriores com os
pais, estará de alguma forma reeditando na figura do professor essas relações. Seu
dinamismo no processo de aprendizagem dependerá da qualidade desta interação
professor/aluno, principalmente no que diz respeito à autoridade. A psicanálise
31
ressalta a importância da introjeção da autoridade e da lei na formação de laços
sociais.
É conhecido o fato de que os acidentes se repetem com algumas crianças. Esse
fenômeno pode ser decorrente, dentre outros fatores, das habilidades motoras e
cognitivas da criança, mas também, devido a questões subjetivas marcadas em seu
inconsciente.
Sabe-se que crianças intrépidas, mais impulsivas, mais agitadas corporalmente,
sendo ou não consideradas hiperativas, correm mais riscos e podem se acidentar
com mais freqüência. Crianças mais bloqueadas corporalmente com atividades
preferencialmente simbólicas e mais paradas terão menos oportunidade de se
confrontar com obstáculos e se acidentar.
Araújo et al. (2001) relatam um estudo sobre a percepção dos educadores sobre
alunos hiperativos, no qual, as dificuldades dos mesmos com alunos da 1ª a 4ª série
do ensino fundamental são devido a três fatores característicos deste tipo de
comportamento: desatenção, agitação e impulsividade, o que favorece que o aluno
vivencie no ambiente escolar situações claramente inapropriadas.
Araújo (2005) alerta que, mesmo apresentando esses comportamentos, algumas
crianças diagnosticadas como hiperativas são apenas imaturas ou possuem
dificuldades na inter-relação família/escola. De qualquer forma, é importante a
avaliação individual de cada caso para inclusive preservá-las de condutas de risco
relativas a acidentes.
32
Oliveira (2000), por sua vez, acrescenta que não é rara a repetição de acidentes e
algumas crianças, mesmo sem apresentarem defeito físico, são mais susceptíveis
aos mesmos. Nos acidentes repetidos em crianças, Husband e Hinton (1972)
ressaltam que é de suma importância a análise de dois fatores importantes: a
personalidade da criança e a sua interação familiar.
Ainda nas questões referentes ao hospedeiro, a criança, deve-se levar em conta o
seu momento de vida e sua situação emocional. Guyer e Gallagher (1985) afirmam
que situações de estresse e mudanças na vida, por exemplo, para outra casa ou
escola, hospitalização de ente querido, entre outras situações de vida da criança,
são aspectos psicossociais que podem influenciar a ocorrência do acidente.
Como parte do ambiente humano, o professor ocupa um lugar de suma importância
na vida do aluno. Assim, Garcia; Solis Albarran e Vasquez Cabrera (1998) nos
mostram que, devido ao fato do trabalho do educador ocupar uma posição
estratégica, ele pode atuar nos fatores determinantes citados (hospedeiro, agente
causal, ambiente), como um agente de saúde. Dessa maneira, o trabalho do
educador teria uma função de proteção. Pelo fato dele compartilhar com as crianças
várias horas diariamente e pelo tipo de relação estabelecida com os alunos e suas
famílias, ocorre entre eles uma interação contínua, possibilitando-lhe influenciá-los.
O educador não apenas auxilia no desenvolvimento cognitivo da criança, como
também tem um importante papel na formação de suas atitudes e condutas com ela
própria, com seus colegas e com seu ambiente.
33
A interação professor-aluno implica, assim, processos educativos tanto na
perspectiva cognitiva quanto na afetiva. O professor tem o poder de influenciar o seu
aluno em nível de conduta, devido ao seu vínculo afetivo diário com ele. Ressalta-se
ainda que o educador é a pessoa mais adequada para identificar situações de risco,
prevenindo assim a ocorrência de acidentes escolares, constituindo-se também a
primeira pessoa a ter contato com o aluno acidentado e a formar uma opinião sobre
os fatores relacionados ao acidente.
Donoso (2002) considera que a questão da prevenção dos acidentes na infância
envolve principalmente o fator educação, importando mais as mudanças de atitudes
dos pais ou responsáveis e educadores do que da criança em si.
A criança educada em um ambiente tanto físico quanto humano adequado estará se
identificando com os pais ou pessoas cuidadosas e, posteriormente, aprenderá
gradualmente a se cuidar ao invés de apenas ser cuidada. A postura pedagógica
moderna inclui a participação da criança como sujeito em tudo que se refere a ela na
sala de aula e escola. Uma das formas de participação é aquilo que os educadores
chamam de combinados nos procedimentos pedagógicos e nas pautas de condutas
da criança.
Segundo Nicolaci-da-Costa (1987), essa nova perspectiva do ensino teve como
conseqüência uma nova postura pedagógica, na qual a criança é incluída nos
processos escolares, o que provavelmente a levaria a participar de forma mais ativa
na questão de estratégias preventivas de acidentes, em que ela também faria parte
do processo e não apenas os pais, os educadores ou responsáveis.
34
Todo esse universo de idéias em relação ao compromisso da educação com o bem-
estar da criança, com sua integridade, inclusive física, o que leva à prevenção de
acidentes, traduz não só uma evolução historicamente construída do pensamento
social sobre a criança, mas também sobre o educador e a escola.
Por isso, é interessante abrir um espaço nesta pesquisa, como mais um referencial
para análise dos nossos dados, para a história da Escola e o desenvolvimento da
abrangência da educação da criança.
1.5 Escola, família e educação: aspectos históricos
Segundo Ariès (1981, p. 111), os colégios desde o século XII, na Europa, eram uma
espécie de asilo para crianças pobres. Do século XV ao XVII, proliferaram colégios
do estilo dos Jesuítas, como os que já conhecemos aqui no Brasil. Diz o autor que “o
colégio tornou-se então um instrumento para a educação da infância e da juventude
em geral”, sendo que os elementos básicos de disciplina eram considerados
primordiais.
Segundo Cunha (2000), historicamente, a escola surgiu como uma instituição de
apoio à família, utilizada para complementar e auxiliá-la na educação e transmissão
de valores sociais, possibilitando maior disponibilidade de tempo aos pais ou
responsáveis para exercerem outras atividades na sociedade.
Ariès (1981) relata que o extraordinário desenvolvimento da escola no século XVII
adveio das lições dos eclesiásticos e juristas, os quais ensinavam aos pais a
35
importância de enviar seus filhos à escola, impondo uma nova concepção de
educação das crianças. A escola teria confinado a infância, outrora livre, num regime
disciplinar cada vez mais rigoroso, resultando, nos séculos XVIII e XIX, no
enclausuramento total através dos internatos.
A partir do século XIX, os pais que enviavam seus filhos à escola passaram a ser
mais valorizados socialmente, sendo um exemplo a educação dos gentleman na
Inglaterra. O autor assinala, ainda, mudanças concomitantes, relativas ao conceito
de infância: passou-se a admitir que a criança não estava madura para a vida e que
era preciso submetê-la a um regime especial, uma espécie de quarentena, ou seja,
os colégios, antes de deixá-la unir-se aos adultos na sociedade.
Em torno de 100 anos atrás, a escola ocupava um lugar de apoio à família. A
sociedade esperava que a escola educasse as crianças além de transmitir
conhecimentos. Contudo, ao longo de sua trajetória, a escola foi incorporando
saberes científicos e se contrapondo aos saberes domésticos tradicionais. Assim, a
escola instaurou-se como instância de poder, na qual o discurso da ciência se
contrapôs ao da família, desqualificando-a no tocante à educação do corpo e do
espírito, desequilibrando a relação de complementaridade e apoio.
Segundo Cunha (2000, p. 449),
[...] no mundo atual os conhecimentos se tornaram tão variados,
diversificados e especializados que é impossível a família ensinar tudo
o que é necessário para a vida futura de seus filhos [...]. A escola é
indispensável não só para a formação profissional, mas principalmente
para a integração de pessoas ao mundo da comunicação escrita que
domina o cenário cotidiano.
36
A mentalidade que passou a vigorar era que o discurso científico tinha mais status
do que o da família. Essa tendência ocorre até os dias de hoje. Um exemplo disso é
a programação escolar de palestras de profissionais das mais diversas áreas nas
reuniões de pais e mestres, como verdadeiros rituais de transmissão do saber
científico interdisciplinar desenvolvido ao longo dos anos.
No Brasil, a primeira grande intervenção relativa à escola foi dos padres jesuítas que
trouxeram uma educação tradicional, de forte cunho religioso e catequético, no
século XVII.
No início do século XIX, a educação era ministrada ainda no âmbito familiar colonial,
no interior dos lares. Apenas o pai tinha acesso ao mundo externo. Essa situação foi
sendo modificada devido à influência dos costumes citadinos que ocorriam com a
chegada da corte portuguesa ao Brasil. As famílias coloniais, restritas à fazenda e ao
engenho, foram substituídas socialmente pela família colonizada, devido ao término
da escravidão e à instauração gradual das cidades nas quais elas foram se
estabelecendo. Como conseqüência, elas foram diminuindo em seu formato, devido
ao afastamento dos escravos e também de familiares distantes até adquirir
posteriormente características da família nuclear atual. Para esse processo
contribuiu também a revolução industrial, que criou nova diferenciação entre vida
urbana e rural, com predomínio cada vez maior da primeira e restringiu, ainda mais,
o número de pessoas constituindo o núcleo familiar. A influência dos costumes
burgueses e dos modismos desta sociedade urbanizada causaram efeitos na
relação pais e filhos, principalmente com relação aos cuidados.
37
No século XIX, a instituição familiar era caracterizada por um permanente estado de
mau funcionamento; ela era considerada pelas instâncias do poder como
incompetente, incapaz e sem qualidades para educar as crianças. Fazia-se urgente
inseri-la nos padrões da normalidade. À escola, representante do poder estatal,
delegou-se o objetivo de educar segundo os saberes da ciência, em oposição a um
saber desqualificado da família. Nessa fase, não havia propriamente uma distinção
entre os vários tipos de família, como ocorre hoje no mundo contemporâneo. O
desenvolvimento histórico havia consumado uma certa ordenação social que atingia
todas as famílias; portanto, essa representação de família/ideologia atingia as
camadas sociais altas ou baixas.
Cunha (2000, p. 450) acrescenta:
O problema é que, ao longo de sua evolução, a escola tornou-se mais
do que uma simples instituição de apoio à família: ela posicionou-se
contra a família! Todos já ouvimos a expressão “a escola é um
segundo lar”,como se a instituição de ensino fosse uma extensão
pública dos cuidados maternos. Nada mais falso!A escola jamais foi
norteada pelos mesmos princípios vigentes no lar.
No Império, uma emenda à Constituição, o Ato Adicional de 1834, coloca a
educação infantil sob coordenação das províncias e só o ensino superior é
controlado pela coroa, de certo modo desprivilegiando a criança.
A educação nacional inicia o século XX com pretensões de ampla abrangência e o
espírito do positivismo, tentando reparar o imenso fosso entre letrados e analfabetos,
considerando o ensino elementar leigo, gratuito e obrigatório.
38
A cientifização do meio educacional foi marcada também pelas campanhas
instaladas pelos médicos higienistas para promover a modernização da família
brasileira. Cunha (2000, p. 452) ressalta que “do combate contra a família
empreendido pelos médicos, representantes da ciência da época, surgiu um novo
modelo de indivíduo, o indivíduo urbano típico de nosso tempo.”
Nessa fase, os médicos higienistas se posicionaram contra as famílias tanto colonial
que, por ignorância não sabiam gerir a saúde física dos filhos, como também a
colonizada que, submissa às demandas sociais, descuidava-se da higiene, da moral
e dos bons costumes, em relação à educação dos filhos.
O início da Primeira República ocorreu numa época de conturbação marcada por
movimentos sociais e ideologias diversas, influenciadas pelas mudanças na
sociedade em seus aspectos econômicos e culturais. Propunha-se a necessidade de
instituições de ensino para promover a educação dentro dos moldes ideológicos da
época, em especial para atender aos pobres e aos imigrantes que surgiam devido à
grande urbanização. Nesse contexto, foram criados os primeiros Grupos Escolares.
Exemplos do pensamento estatal e social sobre a escola na época foram as
medidas saneadoras emergenciais no combate às doenças, ressaltando a
importância da arquitetura no projeto do Major Vidal, na década de 10. Os prédios
escolares, denominados “higiênicos”, constituíram uma busca de soluções para a
presença de doenças, tendo sido, inclusive, elogiados pelo próprio Oswaldo Cruz,
embora essa solução não tenha se concretizado (NUNES, 2000, p. 381).
39
A modernização do Brasil sofreu a influência dos países considerados mais
desenvolvidos tanto econômica como culturalmente. Isso teve repercussão na área
pedagógica influenciada pelas discussões teóricas e pelas inovações práticas
realizadas na educação européia e norte-americana, como também pelo surgimento
de recursos técnicos, conceitos e práticas validados pela ciência.
O movimento da moderna pedagogia instaurou a crença nas influências positivas
das novas compreensões psicológicas, biológicas e sociais sobre o indivíduo
submetido à situação escolar, o que levou a escola a ver o aluno com novo olhar.
Esse modelo conhecido como Escola Nova, tinha como cerne o trinômio: saúde,
moral e trabalho.
A família tornou-se alvo privilegiado, pois se constatou, com a interação das novas
teorias psicológicas e sociais desenvolvidas nas primeiras décadas do século
passado, a necessidade da inclusão da família no processo dos procedimentos
pedagógicos desenvolvidos com a criança na escola.
No avanço do processo de modo de produção capitalista, foi desenvolvida a idéia de
que a nova estruturação familiar, como um núcleo mais reduzido, com pais
trabalhadores inseridos na vida urbana, impedia as famílias de educarem
corretamente seus filhos. Isso forjou um movimento no sentido de tornar a educação
um assunto de estado, acentuando a desqualificação dos pais por não possuírem os
saberes científicos dos professores. Segundo Cunha (2000 p. 458) “Nenhum pai ou
mãe, rico ou pobre, ficava imune à superioridade das agências especializadas em
educar.”
40
Segundo Nunes (2000, p. 378), ao final dos anos 20 do século passado, 70% das
instituições de ensino privadas, em funcionamento no país, eram vinculadas à Igreja
Católica. A autora acrescenta ainda que “em nome da virtude e do combate aos
excessos, essa organização enquadrou o moderno e controlou, enquanto foi
possível, os costumes.” Concomitantemente, a escola nova enfatizava os aspectos
psicobiológicos e sociais do educando, visando, sobretudo direcionar-se a partir de
seus princípios socializadores. Assim, de acordo com essa perspectiva, em primeiro
plano, estariam a sociedade e suas ordenações, inclusive as crenças e teorias
científicas da época e, em segundo, a liberdade individual e a família, considerada
desqualificada desse status científico.
Os anos 50 caracterizaram-se pelo auge do movimento de modernização da
sociedade brasileira. O discurso renovador do final da década 50 visava, sobretudo,
delegar à escola a missão de normalizar as famílias excluídas da modernização,
enfatizando as questões sociais.
Os anos 60/70 não prosseguiram com as lições desenvolvidas pelos estudiosos da
década 50. Houve uma incapacidade, por parte da escola, em pensar criticamente o
seu papel como geradora de desigualdades e diferenças sociais, talvez pelo novo
contexto político que se instaurou no Brasil.
No final do século XX, o cenário social internacional e nacional tornou-se mais
complexo devido a grandes transformações tecnológicas, políticas e econômicas,
com grande incremento da urbanização, da violência, sobretudo a juvenil. Esse
41
período foi marcado pelo aumento da incidência e prevalência de morbimortalidade
por causas externas, incluindo os acidentes.
De acordo com Cunha (2000), no Brasil, surgiu, nessa época, um novo discurso em
que os agentes sociais, tradicionalmente encarregados de normalizar crianças e
jovens a serviço da ordem social, não seriam apenas os professores, mas também
juízes, policiais e outros. Mas, também, começa-se a elaborar um discurso que
devolve às famílias a responsabilidade pela educação. Na atualidade, nas
discussões sobre as problemáticas de questões ligadas à infância e à juventude,
ouve-se cada vez mais que cabe aos pais mostrarem a seus filhos os valores
corretos que regem a vida em sociedade.
Com a complexidade das relações e possibilidades tecnológicas atuais há uma
tendência das famílias de camadas sociais mais altas isolarem a criança no
domicílio, ao mesmo tempo que promovem seu acesso ao conhecimento e ao
entretenimento. A rede de telecomunicações torna-se uma verdadeira máquina de
educar, porém, sem a mediação da família ou dos educadores.
A história estimula-nos a reflexão sobre o lugar da família e da escola neste novo
contexto e sobre os desafios apresentados para cada uma dessas instituições
sociais, que, de acordo com o autor citado anteriormente, gravitam em torno de um
mesmo centro: “o educando [...] o ser social envolvido nas tramas culturais e
políticas de seu meio.” (CUNHA, 2000, p. 447).
42
Família e escola, ao longo de sua história, sofreram e influenciaram o contexto
sóciohistórico. Essa história constitui a memória discursiva sobre a educação na
nossa época, estando presente, de forma consciente ou não, na fala dos
educadores e em outras formações discursivas.
As representações sociais dos acidentes escolares, na atualidade, trazem a marca
de passadas interagindo com as questões e ideologias da vida moderna.
Ressaltamos que, neste estudo, trabalharemos com a concepção de ideologia no
sentido mais amplo, definida na perspectiva de Ricoeur (1977 apud BRANDÃO,
2004, p. 30) como: “uma visão, uma concepção de mundo de uma determinada
comunidade social numa determinada circunstância histórica.”
Hoje, dada a inserção cada vez mais precoce das crianças em instituições de
ensino, devemos avaliar a competência que cabe a cada uma dessas duas
instituições que estão interligadas nos aspectos educativos, de proteção e de
formação da criança.
1.5.1. Aspectos pedagógicos no processo sociohistórico
Segundo Nicolaci–da–Costa (1987), até a década de 70, a pedagogia que
predominou em nossas escolas se caracterizava pelos seguintes aspectos:
1. O controle da criança por parte do professor é explícito e fundamentado
numa hierarquia e em regras também explícitas. Esse controle é efetuado
43
num contexto homogeneizador, em que a criança tem pouca liberdade
para explorar e/ou alterar.
2. Os espaços e horários de trabalho e de lazer são segregados.
3. Há grande ênfase na transmissão de conteúdos.
4. A eficácia da transmissão de conteúdos é aferida através de provas e
outras formas de avaliações uniformes, comparativas e mensuráveis
através de notas, forma do socializado acompanhar seu progresso
escolar.
Em síntese, a criança, em uma escola tradicional, socializa-se num mundo onde
cada coisa, cada pessoa, cada comportamento tem seu lugar e sua hora. Ela
percebe que o professor lhe transmite conhecimentos, controla o comportamento e
avalia o seu desempenho e o de seus colegas, tendo como parâmetros valores bem
definidos e explícitos.
Na década de 50 do século passado, uma escola das mais tradicionais de Belo
Horizonte, tinha o seguinte lema: Melhor do que ontem, pior do que amanhã! O lema
sugere um alto nível de exigência e busca de um ideal de perfeição, coerente com o
pensamento positivista que também determinou o lema da nossa Bandeira Nacional:
Ordem e Progresso.
Outro aspecto relevante da pedagogia tradicional, segundo Nicolaci–da–Costa
(1987, p. 83) seria que,
44
[...] não há muita ambigüidade entre espaços e horários destinados ao
trabalho (a sala de aula na hora de aula, por exemplo) e ao lazer (o
pátio de recreio na hora de recreio, entre outros). A visibilidade destes
e de outros aspectos da pedagogia tradicional facilita a apreensão, por
parte do socializado, do que se espera dele enquanto aluno.
As pedagogias experimentais, segundo a autora são definidas principalmente por
procurarem conhecer as características individuais de cada criança e por
incentivarem o desenvolvimento de suas diferentes potencialidades. Elas emergiram
a partir da década de 70 e foram denominadas também de novas pedagogias.
Apesar de estarem calcadas em diferentes teorias psicopedagógicas, suas principais
características são as apontadas a seguir:
1. O controle da criança por parte do professor baseia-se numa hierarquia e
em regras que são elaboradas com a participação do grupo de alunos sob
a forma de combinados.
2. Esse tipo de controle é levado a cabo num contexto preparado pelo
professor para que a criança explore e re-arrume seu material didático,
sendo incentivada a utilizá-lo como e quando quiser.
3. Dentro desse contexto, a criança tem liberdade sobre o que seleciona e
sobre como organiza e estrutura as sua atividades.
4. Há pouca segregação de espaços e horários de trabalho e lazer, brinca-se
aprendendo e aprende-se brincando, descobertas podem ser feitas no
“parquinho” de recreio e brincadeiras podem acontecer na sala de aula.
45
5. A criança aparentemente regula seus próprios movimentos e relações
sociais em direção aos lugares e a interação com os colegas e
professores.
6. Há pouca ênfase na transmissão de conteúdos, a criança, por exemplo,
poderia aprender a fazer cálculos sem saber o que é um algarismo.
7. Os critérios de avaliação são múltiplos e difusos, o que dificulta ao
socializado acompanhar seu progresso escolar.
A prática da pedagogia experimental exige um número menor de alunos por
professor.
Observa-se em ambas pedagogias a emergência e/ou fortalecimento de diferentes
tipos de subjetividade, para o que é fundamental a ênfase no grupo pela pedagogia
tradicional e nos aspectos individuais pela pedagogia experimental. As questões
ideológico-pedagógicas apesar de não serem objeto desta pesquisa, são refletidas
nas representações sociais que os educadores constroem sobre a escola, o
processo educativo e sua relação com o acidente escolar.
Madeira (2001, p. 140) afirma que “a representação social expressa a construção do
conhecimento teórico-prático de determinado grupo humano sobre um dado objeto,
vivido e construído em circunstâncias históricas precisas” e que “[...] a prática
pedagógica não é a resultante de um impulso individual que se poderia adjetivar
como bom ou mau, mas uma construção social e histórica.”
46
Dessa forma, podemos compreender como os rituais religiosos estavam presentes
no dia-a-dia da maioria das escolas primárias, na primeira metade do século XX.
Nunes (2000) afirma como era comum, de acordo com Ramos (1944 apud NUNES,
2000), as crianças serem submetidas a castigos físicos bastante rígidos, tanto nos
lares como nas escolas.
[...] em casa, bordoadas, socos, o uso do chicote, pancadas com cabo
de vassoura, tamanco, correias e tábuas. As crias também eram
amarradas ao pé da mesa, despidas de suas roupas, presas em
cafuas. Nas escolas: palmatória, com várias modalidades (palmatória
furada, bolos com milho na mão), cascudos, puxões de orelhas,
beliscões, permanência de joelhos em cima de grãos de milho ou
feijão, permanência em pé em cima de um banco, orelha de burro,
dentre muitos outros [...]. (NUNES, 2000, p. 379; RAMOS, 1944, p.
457 apud NUNES, 2000).
Em oposição ao autoritarismo da escola tradicional, que se exprimia na relação com
os alunos nas mais diversas atividades, fossem estas estritamente de aprendizagem
ou não, surge a nova escola. Nessa, várias teorias pedagógicas e psicológicas
geram um contexto em que o papel do professor é minimizado em detrimento da
maior valorização da criança. Teóricos tidos como antiautoritários como Montessori,
Decroly, Carl Rogers, Piaget, Vygotsky trouxeram suas influências e contribuições
ao ensino brasileiro. Mundialmente, era inaugurado o pensamento liberal-
democrático, o qual traria para a ideologia brasileira, nas décadas de 50/60, grandes
transformações educacionais.
A Constituição Federal de 1988 é um marco no processo de educação brasileiro,
pois nela a criança adquire o título de cidadã, e está inserida e participa como sujeito
do seu processo sociohistórico.
47
Consideramos que o pensamento atual sobre a relação com a criança na escola, e
dela com a família nas mais diversas atividades e funções de ambas, trazem a
marca da história da educação e da criança, embora atualizada pela realidade social
contemporânea e pela evolução do conhecimento científico. Além disso, como toda
representação social também é marcada pela vivência do grupo considerado e pela
individualidade daquele que fala.
48
2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Estudar as representações sociais de educadores sobre os acidentes ocorridos em
crianças de 1ª a 4ª série do ensino fundamental em Belo Horizonte.
2.2 Objetivos específicos
?? apreender e discutir os conceitos e crenças dos educadores sobre
os acidentes na escola,
?? apreender e discutir as informações dos educadores sobre os
acidentes na escola,
?? apreender e discutir a percepção dos educadores sobre a atribuição
de responsabilidades frente aos acidentes na escola.
49
3 METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, na qual foram realizadas entrevistas semi-
estruturadas com coordenadores e supervisores de escolas privadas de 1ª a 4ª série
do ensino fundamental.
3.1 Justificativa do método
A pesquisa qualitativa em saúde baseia-se no princípio de que a medicina e as
demais profissões da saúde não se apóiam de forma exclusiva nas ciências
biológicas. Ao tomarem o ser humano como “sujeito do cuidado”, os aspectos
psicossociais necessitam ser abordados. Segundo Minayo (2004b), a metodologia
qualitativa responde a questões muito particulares, preocupando-se com um nível de
realidade que não pode ser quantificado, ou seja, trabalha com um universo de
significados, motivações, aspirações, crenças, valores e atitudes, aspectos cada vez
mais valorizados na atenção à saúde. Trata-se de um espaço mais profundo das
relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser percebidos pela
operacionalização quantitativa de variáveis. A autora acrescenta ainda que:
[...] a polêmica quantitativo versus qualitativo, objetivo versus subjetivo
não pode ser assumida simplistamente como uma opção pessoal do
cientista ao abordar a realidade. A questão, ao nosso ver, aponta para
o problema fundamental que é o próprio caráter específico do objeto
de conhecimento: o ser humano e a sociedade (MINAYO, 2004b, p.
36).
Embora, esse tipo de metodologia ainda seja pouco usado na área da pesquisa em
saúde, vários trabalhos têm sido feitos, mostrando a sua importância e a sua
contribuição em relação à produção de conhecimentos na mesma (ALVIM, 2001). A
50
abordagem qualitativa vem preencher lacunas do conhecimento não-exploráveis
pelos métodos tradicionais na área. Segundo Minayo (2003), a “diferença entre
quantitativo e qualitativo é de natureza”, isto é, enquanto os métodos quantitativos,
através da utilização de estatísticas, apreendem dos fenômenos somente:
[...] a região visível, ecológica, morfológica, concreta”, a abordagem
qualitativa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e
relações humanas, um lado não perceptível e não captável em
equações, médias e estatísticas. Contudo, precisamos ressaltar que o
conjunto de dados quantitativos e qualitativos não se opõem, ao
contrário, se complementam, pois a realidade abrangida por eles
interage dinamicamente, excluindo qualquer dicotomia.” (MINAYO,
2003, p. 22).
Dada à especificidade dos conhecimentos buscados, a objetividade e neutralidade
pretendida nos métodos quantitativos não é realizável, ou seja, o pesquisador não
deve se abstrair dos conceitos, sentimentos e idéias próprias, pois deve usar a sua
vivência e subjetividade para percepção do significado do discurso do interlocutor.
Por outro lado, a objetivação é possível de ser obtida com a explicitação e o uso
rigoroso de instrumental teórico e técnico adequados. A objetivação permite ao
pesquisador tornar explícito aquilo que estava subjetivo, valorizando a subjetividade
(MINAYO, 2004b).
Considerando que esta pesquisa se propõe a estudar a percepção subjetiva dos
profissionais de educação sobre os acidentes na escola, optamos pela pesquisa
qualitativa, uma vez que as percepções e idéias são impossíveis de se medir por
números e que a pesquisa qualitativa se preocupa justamente com aquilo que não
pode ser quantificado, trabalhando com o universo de significados.
51
3.2 Instrumento de coleta
Como instrumento da pesquisa, optamos por utilizar entrevistas semi-estruturadas,
considerando sua melhor adequação aos objetivos da mesma. Nesse tipo de
entrevista, um roteiro curto contendo indicações gerais, é predefinido e busca
desencadear a fala do entrevistado sobre o assunto, mas sem sugerir ou limitar as
respostas. As questões são apresentadas como uma conversa com objetivo, na qual
o entrevistado terá a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto sem respostas
ou condições prefixadas pelo pesquisador. Dessa forma, a entrevista semi-
estruturada permite o diálogo entre entrevistador e entrevistado, de tal forma que a
percepção emocional, gestual e contextual possibilita a aproximação das respostas
dos entrevistados com o que é realmente perguntado. Assim, de acordo com Minayo
(2004b), por visar apreender o conjunto de idéias e atitudes dos atores sociais, o
roteiro da entrevista semi-estruturada deverá conter poucas questões e ser um
instrumento para orientar a entrevista, facilitando a abertura, a ampliação e o
aprofundamento da comunicação.
3.3 Formação da amostra
Procuramos estudar escolas que fossem semelhantes do ponto de vista do perfil
socioeconômico, porque partimos do pressuposto de que essa característica é
determinante na formação das representações sociais sobre o objeto estudado.
Selecionamos escolas privadas da Região Centro Sul de Belo Horizonte, que
atendem alunos provenientes de classe média e alta de Belo Horizonte. A escolha
52
desse perfil das Escolas se deu pelo fácil acesso às mesmas pela pesquisadora que
já havia trabalhado em algumas delas.
O critério de escolha dos entrevistados foi propositiva (HIGGINBOTTOM, 2004), isto
é, os entrevistados foram escolhidos por serem os que, de acordo com a nossa
análise, detinham as informações privilegiadas do grupo. Assim, diretores,
coordenadores ou supervisores foram escolhidos devido ao fato de os julgarmos
representativos do pensamento e atitudes do grupo de educadores e funcionários de
cada instituição escolar da amostra e por serem ativos na determinação da política
pedagógica e administrativa das mesmas.
O número de escolas entrevistadas não foi previamente definido, tendo sido utilizado
o critério de exaustão para interromper a coleta de dados. Segundo Minayo (2004b),
esse critério é preenchido quando se julga que as informações buscadas são
satisfeitas a partir das entrevistas realizadas, ou seja, a interrupção das entrevistas
se dá quando o pesquisador considera que os conceitos foram todos saturados e
novas entrevistas não acrescentam mais informações diferentes daquelas já obtidas
nas entrevistas anteriores.
3.4 Procedimentos
A partir de uma lista das 22 escolas privadas dessa região, contatamos, inicialmente,
as escolas de mais fácil acesso geográfico para a pesquisadora ou escolas nas
quais a pesquisadora já tinha trabalhado na formação docente em musicoterapia e
psicomotricidade, na década de 90.
53
Foi elaborado um roteiro curto, com questões abertas, num total de seis. Para cada
objetivo específico foram criadas duas perguntas, cada uma correspondente a um
tema. Uma entrevista-piloto foi realizada, com o objetivo de avaliar o roteiro, que foi
adaptado de acordo com os problemas verificados na mesma.
As seis questões do roteiro foram agrupadas em pares de acordo com os objetivos
específicos conforme o quadro abaixo:
QUADRO 1
Relação entre os objetivos específicos e as questões do roteiro de entrevistas
PERGUNTAS
OBJETIVOS
1
Você, durante a sua vida profissional de
educador, já vivenciou algum acidente com
aluno nesta ou em outra escola? Como foi
para você?
2
Na sua opinião, porque os acidentes
acontecem?
Apreender e discutir os
conceitos e crenças dos
educadores sobre os
acidentes na escola
3
Você já teve algum treinamento sobre
prevenção de acidentes ou como lidar com a
criança acidentada?
4
Você se sente preparado para lidar com esta
situação?
Apreender e discutir as
informações dos educadores
sobre os acidentes na
escola
5
Você acha que alguma coisa pode ser feita
para que o acidente na escola seja evitado?
(Estratégias frente ao acidente).
6
Quando acontece um acidente, de quem você
acha que é a maior responsabilidade?
Apreender e discutir a
percepção dos educadores
sobre a atribuição de
responsabilidades frente aos
acidentes na escola
54
O primeiro contato com as escolas foi feito via telefone. Após a concordância da
mesma foi deixado com a secretária o termo de consentimento para a direção
(APÊNDICE A), solicitando avaliação do mesmo e posterior comunicação de
assentimento.
Após realizadas 11 entrevistas, estas foram avaliadas e observou-se a necessidade
de inclusão de mais escolas para que fosse atingido o critério de saturação. Ao ser
atingido o número de dezessete escolas o processo foi então concluído.
As entrevistas ocorreram na própria escola, mediante agendamento prévio. Como
algumas diretoras solicitaram o roteiro da entrevista para que fosse lido antes da sua
realização. Foi-lhes explicado o tema e esclarecido que, caso houvesse uma leitura
anterior do roteiro, o objetivo da pesquisa seria prejudicado, havendo,
conseqüentemente, a concordância delas.
O gravador foi utilizado em todas as entrevistas e, em geral, ele foi bem aceito. No
entanto, alguns educadores, ao final da entrevista quando o aparelho já estava
desligado, relataram algumas experiências mais espontaneamente.
As entrevistas estão disponíveis para outros pesquisadores e para a banca de
exame desta dissertação.
55
3.5 Análise dos dados
Primeiramente, foram feitas leituras repetidas e flutuantes das entrevistas transcritas.
Após esse primeiro reconhecimento do texto, procuramos organizá-lo, através das
idéias gerais surgidas, a partir de temas relacionados aos objetivos propostos. As
categorias foram delimitadas após o agrupamento das idéias centrais.
Nessa primeira fase, seis grandes temas surgiram dos textos. Foram então
identificadas as idéias centrais referentes a cada um desses temas, que, agrupadas,
configuraram as categorias. Buscamos, então, as expressões-chave que melhor
expressavam as idéias de cada categoria específica. Essas foram utilizadas para
exemplificação do conteúdo das representações sociais sobre cada tema, na
discussão dos resultados e para elaboração do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC),
uma forma de apresentação das representações sociais encontradas, sugerida por
Lefèvre e Lefèvre (2003) e colocadas no APÊNDICE C. Para tanto, extraímos de
cada uma das 17 entrevistas da pesquisa, as idéias centrais e suas expressões-
chave correspondentes, referentes aos temas e categorias predefinidas. O Discurso
do Sujeito Coletivo (DSC) foi formado pela construção de um texto com as
expressões-chave das idéias centrais de cada categoria. As categorias foram
formadas pelo agrupamento das idéias centrais dentro de cada tema.
O Discurso do Sujeito Coletivo é uma proposta criada por Lefèvre e Lefèvre (2003, p.
16) cujo conceito é definido por eles como:
56
[...] uma proposta de organização e tabulação de dados qualitativos de
natureza verbal, obtidos de depoimentos, artigos de jornal, matérias de
revistas semanais, cartas, papers, revistas especializadas.
Segundo essa proposta, o material transcrito é analisado extraindo-se, de cada
entrevista, as idéias centrais referentes aos temas predefinidos. Entende-se por idéia
central a expressão lingüística que traduz de maneira sintética e fidedigna o
pensamento do entrevistado referente à resposta ao que lhe foi perguntado. Após
extrair-se da entrevista as expressões-chave correspondentes às idéias centrais de
cada tema. Essas são trechos, fragmentos literais do discurso que melhor
expressam a essência do depoimento. O objetivo da identificação da idéia central é
definir as categorias que podem ser formadas em cada tema.
No presente estudo, após extrair as expressões-chave de cada categoria, construiu-
se um pequeno texto com as mesmas, como se fosse a fala de uma única pessoa. O
resultado final foi um discurso emitido na primeira pessoa do singular, mas que
reflete o pensamento coletivo das escolas sobre cada tema.
Para a interpretação das falas foi utilizada a Análise do Discurso, a qual, segundo
Minayo (2003), visa ampliar a compreensão de contextos culturais com significações
que ultrapassam o nível espontâneo das mensagens.
Nesta pesquisa, utilizaremos alguns elementos da Análise do Discurso que, segundo
nossa visão, têm interface com a teoria das representações sociais.
57
Especificamente, procuramos olhar o discurso produzido pelos educadores,
considerando algumas dimensões ressaltadas por Maingueneau (1987 apud
BRANDÃO, 2004, p. 17):
?? o quadro das instituições em que o discurso é produzido, as quais
delimitam fortemente a enunciação,
?? os embates históricos, sociais, etc. que se cristalizam no discurso,
?? o espaço próprio que cada discurso configura para si mesmo no interior
de um interdiscurso.
No caso deste estudo, consideramos que os enunciados contidos nas falas dos
entrevistados estão delimitados pelo que pode ou não, deve ou não ser dito, em
2005, por um coordenador ou diretor de uma Escola Privada, em seu ambiente de
trabalho, a um pesquisador, psicólogo, vinculado à UFMG e cujo objetivo explicitado
é saber o que a Escola pensa sobre acidentes com alunos aí ocorridos.
Consideramos também que os enunciados revelam o processo histórico-social, de
forma mais marcada, ocorrido no Brasil, e, especificamente, relacionados à criança,
à educação e à saúde.
Finalmente, consideramos que os discursos dos educadores configuram um espaço
próprio, constituindo uma formação discursiva ligada à pedagogia e à psicologia,
como áreas de conhecimento científico, mas também uma construção própria
derivada das especificidades e experiências na área educativa, sendo que, no caso
dos acidentes escolares, em sua interface com a saúde, em sua vertente de
conhecimento científico e em sua vertente de senso comum.
58
O Objetivo primordial da Análise do Discurso é buscar, de acordo com Minayo
(2003), uma reflexão geral sobre as condições de produção e apreensão da
significação de textos realizados e produzidos nos mais diferentes setores da
sociedade. Assim, a análise do discurso iria além da compreensão objetiva,
sistemática e pontual de um texto, buscando conhecer o seu modo de
funcionamento, os princípios de organização e as formas de produção social do
sentido.
Orlandi ressalta na Análise do Discurso a importância da inter-relação entre os
interlocutores, da situação, do contexto histórico-social e das suas condições de
produção, no resultado final da análise do discurso produzido. A autora afirma que:
“Quando se diz algo, alguém o diz de algum lugar da sociedade para outro alguém
também de algum lugar da sociedade e isso faz parte da significação.” (ORLANDI,
1996, p. 26).
Segundo Maingueneau (1998, p. 30) a noção de “condições de produção” foi
reelaborada por Pêcheux para designar, no campo da Análise do Discurso, “não
somente o meio ambiente material e institucional do discurso, mas ainda as
representações imaginárias que os interactantes fazem de sua própria identidade.”
Dessa forma, o sujeito falante sofre influências dos saberes, crenças, valores,
dispositivos de comunicação do seu grupo social, do lugar que ocupa e da função
dentro da instituição, bem como das formações imaginárias do outro. Tudo isso se
refere tanto ao entrevistador quanto aos entrevistados.
59
Portanto, dentro dessa perspectiva, procurou-se ir além do contexto real da pesquisa
para as questões imaginárias, mas subjetivamente reais, que permearam a relação
locutor/interlocutor.
3.6 Aspectos éticos
Julgamos que este estudo foi pautado pela ética, tendo se buscado não lesar, em
hipótese alguma, os participantes em seus sentimentos e em seus aspectos moral,
físico ou material. Pensamos que este estudo poderá trazer benefícios à população
estudada, em particular aos entrevistados, pois o fato em si, de conversar sobre o
acidente escolar poderá ajudá-los a refletir e a esclarecer a questão estudada.
Todos os entrevistados participaram da pesquisa por livre vontade, tendo-lhes sido
fornecidas todas as informações necessárias acerca da mesma. Foi lhes informado,
também, que os dados coletados após a análise e discussão serão encaminhados
para publicação como forma de colaboração científica, visando à prevenção de
acidentes e que os resultados da pesquisa serão apresentados na forma de
relatórios e artigos, sem constar nenhum dado do entrevistado, preservando sua
identidade.
Após o esclarecimento sobre o estudo, os entrevistados assinaram o termo de
consentimento (APÊNDICE A), elaborado de acordo com as Diretrizes e Normas
Regulamentadoras de Pesquisa em Seres Humanos, aprovadas através da
Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) de número 196, de 10 de outubro
de 1996.
60
O projeto de pesquisa foi submetido à aprovação do Comitê de Ética da
Universidade Federal de Minas Gerais (ANEXO).
61
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A coleta de dados foi realizada em duas etapas. Na primeira, dentre as 22 escolas
que constavam na lista elaborada pela autora, segundo critérios de perfil e facilidade
de acesso geográfico, houve a adesão de apenas 12 escolas, ou seja, 57,1%. As
escolas não se recusaram formalmente, entretanto, criaram várias dificuldades, por
exemplo, não retornando o contato no prazo combinado e quando a pesquisadora
telefonava para saber do agendamento da entrevista, diziam ainda não terem uma
posição com relação ao consentimento da diretoria da escola. Apenas uma escola
comunicou de forma explícita à orientadora que não participaria do estudo por
questões de normas internas, que não admitiam participação em pesquisa.
Pressupomos que a dificuldade de adesão vincula-se, em primeiro lugar, ao receio
inespecífico de exposição por parte das escolas. Pode-se inferir, também,
dificuldades específicas relativas ao tema do acidente escolar, por ser uma questão
polêmica, toca diretamente na estrutura e funcionamento da escola e pode suscitar
sentimentos de culpa e inadequação por parte dos educadores e responsáveis.
Além disso, mesmo tendo se assegurado o sigilo, constituindo-se escolas da rede
particular, pressupõe-se um receio que a pesquisa pudesse colocar em jogo a
imagem da empresa.
Finalmente, pensamos que a maneira como as escolas foram convidadas a
participar possa, também, ter influenciado na adesão. Inicialmente, os termos de
consentimento foram deixados na secretaria para serem posteriormente
encaminhados à diretoria. Dessa maneira, dez escolas não responderam. Já na
62
segunda etapa, a pesquisadora contatava diretamente a coordenadora das séries e
pedia-lhe para, pessoalmente, levar o termo de consentimento à diretoria. Desta
forma, a adesão ocorreu de forma integral.
Todas as dez escolas que não aderiram, ou seja, 42,9% das convidadas, são,
segundo nosso critério de classificação, de grande porte. Essas escolas possuem
espaço físico superior a 5 000 metros quadrados e a maioria delas possui um corpo
discente superior a 1 000 alunos. Pensamos que a não adesão dessas escolas não
levou à alteração dos resultados finais, devido ao fato de outras escolas com
características semelhantes terem aderido.
Nessa primeira etapa, as entrevistas iniciaram-se em 31 de agosto e terminaram em
03 de dezembro de 2004.
Considerando o critério de exaustão, observou-se, numa primeira análise das
entrevistas dessa etapa, que o mesmo não fora atingido, tendo sido necessária uma
2ª etapa, na qual retomou-se o contato com algumas escolas da lista após,
aproximadamente, dois meses, devido ao período de férias escolares.
Nessa nova fase, todas as 10 escolas que não retornaram a resposta foram
novamente contatadas, da mesma forma. Dessas, duas aderiram, enquanto a
maioria continuou sem se posicionar. Foi necessária, então, a elaboração de uma
nova lista de escolas com o perfil semelhante às anteriores. Dessa nova lista, todas
as escolas contatadas aderiram à pesquisa. Como exposto acima, nessa nova fase,
a pesquisadora fez algumas mudanças na maneira de contatar as escolas.
63
A diferença entre as escolas da primeira e da segunda lista foi somente de acesso
geográfico para a pesquisadora. Assim, em ambas as listas, todas as escolas se
situam na Região Centro Sul de Belo Horizonte.
O critério de saturação foi preenchido com os dados da 17ª escola.
4.1 Características da amostra estudada
O grupo de escolas e entrevistados pesquisados apresentam as características a
seguir:
QUADRO 2
Características da amostra segundo informações dos entrevistados e das escolas
Características Número
Espaço físico
Pequeno (<2 000 m
2
) 3
Médio (2 000 a 5 000 m
2
) 5
Grande (=5 000 m
2
) 9
Número de alunos
1 a 500 5
500 a 1 000 8
> 1 000 4
Gênero dos entrevistados
Feminino 16
Masculino 1
Função do entrevistado
Psicóloga da escola 2
Supervisor/Coordenador 14
Diretora 1
Experiência profissional
1 a 5 anos 2
Maior de 5 anos 15
Número de Escolas
17
Número de Ent
revistados
17
Número de Não Adesão
9
64
Como pode ser observado no QUADRO 2, a maioria das 17 escolas da pesquisa
têm espaço físico superior a 5 000m
2
. A maior parte dos 17 entrevistados é do
gênero feminino e apenas um do gênero masculino. É importante ressaltar que cada
escola foi representada por um educador. Mais da metade tem cargo de
coordenador pedagógico. A maioria possui experiência educacional superior a cinco
anos. Dentre as dezessete escolas, oito têm um corpo discente entre 500 e 1 000
alunos. Todas pertencem à Região Centro-Sul de Belo Horizonte, tendo o mesmo
perfil socioeconômico.
4.2 Temas e Categorias analíticas e empíricas encontradas
A partir da leitura e análise das entrevistas e da revisão dos objetivos propostos,
organizamos o conteúdo das mesmas em grandes temas. Para cada tema criado,
buscou-se agrupar em categorias as representações sociais dos entrevistados.
Os seguintes temas foram criados:
1. Impressões gerais sobre o acidente na Escola.
2. Conceitos e crenças a respeito do Acidente Escolar.
3. Capacitação relatada para lidar com a criança acidentada.
4. Sentimentos relativos à autocompetência para lidar com o acidente.
5. Concepção de medidas para evitar e lidar com acidentes.
6. Percepção de responsabilidade sobre o acidente.
65
As categorias criadas dentro de cada tema serão apresentadas a seguir e ilustradas
com expressões-chave usadas pelos entrevistados. Além dessa apresentação,
visando dar ao leitor uma visão panorâmica do discurso do grupo, organizamos suas
falas de acordo com a proposta do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), APÊNDICE
C, conforme exposto na metodologia (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2003).
4.2.1 TEMA 1: Impressões gerais sobre o acidente escolar
Essas impressões apareceram, sobretudo, como resposta à primeira questão: Você
já vivenciou algum acidente com aluno nesta ou em outra escola? Como foi para
você? O objetivo foi iniciar uma conversa, abordar o assunto de uma forma mais
ampla para que o locutor (entrevistado/educador) pudesse expor suas idéias e
pensamentos mais gerais e menos elaboradas a respeito do acidente escolar.
Considerando tais características, optamos por não subdividi-lo em categorias,
apresentando-o em bloco.
Observa-se que, nos relatos, os termos:’ susto, medo e estresse relacionam-se com
o imprevisto presente em todo acidente.
“[...] na hora só um susto, né?... Porque já tive assim cabeça cortada, é... Dente que
cai, né?... e a gente passa um aperto [...]. ” (Entrevista 3)
“A gente toma atitudes sérias e rápidas demais. Porque eu tenho muito medo de
acontecer alguma coisa.” (Entrevista 14)
66
“Um minuto que eu virei, tal e coisa, ela tropeçou na escada e arranhou aqui a perna
toda. Eu quase que morri. Um minuto [...]. Ela estava do meu lado, eu preocupada o
tempo todo. Quer dize, você vê... Não é por falta de cuidado, mas uma distraída sua
acontece. Eu realmente não podia esperar [...].” (Entrevista 14)
Os entrevistados demonstram dificuldades, expressas sob forma de falha de
memória, hesitação, etc., para falar do acidente:
“[...] É difícil essa pergunta [...]. Não, não dentro da escola não. [...] Dentro da escola,
nunca, nunca. Eu particularmente, não. [...] Não. Tem acidente aqui é... Menino
quebra dente, essas rotina de todo dia mesmo. Mas fora disso não tem muita coisa
não. [...] É... um bater na testa do outro,né?... Então, eu acho que eu respondi errado
pro cê,não? [...] então deleta isso aí [...] .” (Entrevista 15)
Essa fala sugere que o entrevistado acha que existe um certo para o outro
(entrevistador). Imagina que existe uma resposta certa a ser respondida e supõe que
o pesquisador saiba o que é certo. Além disso, configura uma situação utópica no
discurso, quando afirma que o acidente nunca acontece dentro da escola. Nota-se
aqui a interferência das condições de produção do discurso: o representante da
escola (entrevistado) dirige-se para o entrevistador, ou seja, o representante da
comunidade científica, UFMG.
Há no discurso a concepção de que o acidente sob a responsabilidade da escola é
apenas na sua área física interna:
67
“Aconteceu um acidente aqui na porta da escola, a criança soltou da mãe e entrou no
carro pelo lado da rua, aqui os carros vêm em alta velocidade Apesar dela já ter sido
entregue a mãe nós chamamos a ambulância.” (Entrevista 16)
Normalmente são relatados os acidentes classificados pelos como não graves ou
corriqueiros:
“Agora, no nosso dia-a-dia aqui, o que a gente tem mesmo é trombada, aqui no
futebol, passa um Gelol [...].” (Entrevista 1)
Nos relatos, apenas eventualmente, apareciam situações de acidentes graves:
“Teve também aqui nesta escola, tô lembrando, uma criança que fechou uma porta
no dedinho da outra. Esse dedinho esmagaçou mesmo teve uma deformação no
dedinho, caiu a unha,sabe? Foi uma coisa bem feia mesmo. Sabe quando corta e a
gente teve até que segurar a pontinha do dedo. Foi algo que tô lembrando também
de acidente.” (Entrevista 1)
Os entrevistados em seus relatos demonstram ficar afetados após a experiência do
acidente:
“Resolvemos tudo da melhor maneira. Eu depois que passa é que eu como pessoa é
que fico, é... mais.... Aí é que vem aquela questão de estar realmente pensando no
perigo, naquela coisa.” (Entrevista 12)
“[...] eu só desmaiei depois que eu entreguei o menino na mão do médico, aí eu
desmaiei (risos).” (Entrevista 17)
68
“Tanto a coordenação, quanto os funcionários, né? Apavoravam, o menino quebrava
dente, apavorava, né?” (Entrevista 15)
O relato abaixo exemplifica as condições de produção do discurso. O entrevistado
dirige-se ao entrevistador pedindo uma confirmação (“...né?”). É como se ele
pedisse a confirmação, de algo óbvio, contudo, de repente, ele, por ansiedade,
duvida desse óbvio. No momento em que ele olha para a entrevistadora e
interrompe a frase, ele muda a direção da fala; é como se houvesse nesse
instante uma interdição da fala, ou seja, não se pode naquele momento dizer tudo
que se pensa. O lugar do locutor e do interlocutor encontra-se estabelecido na
inter-relação de ambos; no contexto estabelecido pela situação da entrevista,
constata-se que os papéis, tanto do entrevistado como do entrevistador, já se
encontram definidos. A escola está falando para a universidade. A censura, as
proibições determinam o que deve ou não ser dito, levando a hesitações na fala:
“Eu acho que o próprio nome já diz: acidente, né? Não tem como você... (pausa)
você pode prevenir sim, você pode tomar determinadas precauções, né?” (Entrevista
17)
O entrevistado também busca saber quem é o entrevistador para poder adequar o
discurso dele e, ao mesmo tempo, busca nele uma identificação para que haja
respaldo no discurso produzido:
“Acontece, você tem filhos? [...] Então, você sabe o que é muito bem!” (Entrevista 14)
69
O acidente mobiliza a escola devido ao seu caráter de “inesperado”. Conforme
Palonsky et al. (1991, p. 1) “De repente, um fato inesperado irrompe na vida do
sujeito, causando uma ruptura em sua rotina, pegando-o de surpresa e em total
despreparo para lidar com a nova situação [...].”
Como na vida em geral, o acidente escolar também causa uma ruptura na rotina da
escola e da família, salientando o despreparo para lidar com a nova situação.
Portanto, pensamos que, além dos fatores citados relacionados à situação e
condições de produção do discurso, essa característica do acidente determinou que
a primeira pergunta fosse de difícil resposta para a maioria dos entrevistados que,
muitas vezes, preferiram o silêncio demonstrando dificuldade em respondê-la, como
se as experiências vividas ainda demandassem uma elaboração cognitiva/afetiva.
4.2.2 TEMA 2: Conceitos e crenças a respeito do acidente escolar
Categorias:
A Acidentes como fatalidade/acaso
B Acidentes como conseqüência das atividades próprias
da infância
C Acidentes como conseqüência da condição de
desenvolvimento físico e/ou mental da criança
D Acidentes como conseqüência do descaso ou
negligência
70
E Acidentes como conseqüência do ambiente físico
inadequado para a criança
F Acidentes como conseqüência dos hábitos da vida
moderna
G Acidentes como conseqüência da superproteção
H Acidentes determinados por multicausalidade
A primeira categoria mostra a vinculação do acidente, nos relatos dos entrevistados,
à idéia de fatalidade. Podemos interpretar tal associação como uma tentativa de se
ausentar da responsabilidade diante dos mesmos. Entretanto, historicamente, como
assinalado na introdução, esse conceito, mesmo dentro da ciência, está ligado à
idéia de fatalidade.
“É mesmo assim coisas inevitáveis [...].” (Entrevista 1)
“É porque foi acidente mesmo. Foi por acaso mesmo, tá?” (Entrevista 3)
“Mas, realmente é muito difícil, não é? A gente é [...] achar, porque que isto
acontece? Eu acho que fatalidade. Eu acho que, por mais que você queira evitá-los,
eles ocorrem.” (Entrevista 14)
Em oposição à corrente epidemiológica do acidente, a qual acredita que o acidente
pode ser previsto e evitado, nos relatos dos educadores aparecem idéias nas quais
o acidente é visto como algo inevitável, ocorrendo em qualquer lugar, de forma
imprevisível: não se pode ter controle dos acidentes, eles sempre ocorrerão. Nessa
71
perspectiva, o discurso científico de previsibilidade não funcionaria, pois, para essa
vertente, a fatalidade não tem explicação, ela é da ordem do real e, portanto, não
pode ser simbolizada, ou seja, explicada.
[...] eu acho, assim, que não tem explicação pra isso, não, como diz: é fatalidade
mesmo, porque tinha que acontecer são coisas inevitáveis.” (Entrevista 14)
Nota-se também nos relatos as crenças e idéias religiosas inseridas nas
representações sociais dos educadores:
“Graças a Deus, (risos) [...].nos proteje, né?” (Entrevista 15)
“[...] eu dou graças a Deus pelo número de alunos que a gente tem, pela idade que
eles têm porque realmente não tem muito perigo nem nada, nós temos pouquíssimos
acidentes, pra dizer que realmente... é Deus que protege.” (Entrevista 14)
“[...] Não existem acidentes mais graves, né? Nós temos assim... um arranhão,
tombo, um galo na testa, nada, nenhum tipo de acidente assim, uma fratura, um
corte mais profundo... Então assim, os acidentes mais graves, eu nunca tive... graças
a Deus.” (Entrevista 8)
Constata-se que essas expressões são comuns na nossa cultura devido à tradição
cristã, como vimos no Item 1.5, a educação tradicional brasileira foi introduzida pelos
jesuítas no século XVII, apresentando, portanto, forte cunho religioso e catequético.
De acordo com Nunes (2000), 70% das escolas privadas brasileiras eram vinculadas
à Igreja Católica no final da década de 20. Os relatos acima sugerem influência, nas
escolas, do discurso religioso em relação à visão do acidente. A idéia de fatalidade é
72
coerente com o discurso religioso: “o que o homem não pode evitar, recorre-se a
Deus.”
“O que é da minha competência com minhas grandes limitações, da minha
responsabilidade eu tento procurar fazer da melhor maneira possível, o que não é,
entrego pra Deus.” (Entrevista 15)
Podemos supor que o progresso tecnológico, permitindo maior controle dos
acontecimentos e do ambiente e os avanços da saúde na área de promoção e
prevenção, impulsionados pelos altos custos da medicina curativa e reparadora, vão
diversificar as representações sobre os acidentes, minimizando o componente
religioso e fatalístico.
A representação social do acidente na escola como fato inerente às atividades
próprias da infância, mesmo buscando justificativa nos conhecimentos do senso
comum, aproxima-se dos conceitos da ciência naquilo que concerne o
desenvolvimento da criança.
“[...] Menino machuca mesmo, menino não presta muita atenção, eles são muito
impulsivos, saem correndo e vão subindo aonde der vontade, daí eles se
machucam.” (Entrevista 3)
“[...] O acidente eventualmente acontece [...]. E é esperado que isso aconteça. [...].
próprio da idade, né? Criança é assim [...].” (Entrevista 5)
73
A literatura científica na área da psicologia e pedagogia ressalta a necessidade de
brincar, como um fator fundamental na sua vida psíquica. Nos relatos, os
entrevistados afirmam que as crianças têm de extravasar mesmo, correr, brincar,
sugerindo que essas condutas seriam inerentes à própria infância.
Segundo Gesell (1998), a criança vive momentos nos quais há picos de uma
exuberância motora que vêm e que passam. Isso, em suas observações, seria
comum nas crianças, principalmente a partir dos seis anos de idade.
Não sabemos se existe nas falas a intenção ou não de apontar para os meninos
uma tendência maior para a exposição a situações de risco; no entanto essas
atitudes e comportamentos das crianças aparecem nos relatos dos educadores
quase sempre no gênero masculino.
“[...] porque menino sozinho, ele vai ousar, vai tentar fazer aquilo que for muito
atraente pra ele.” (Entrevista 2)
Menino machuca mesmo, menino não presta muita atenção, eles são muito
impulsivos, saem correndo e vão subindo aonde der vontade, daí eles se
machucam.” (Entrevista 3)
Existe na literatura a constatação de maior incidência de acidentes nos meninos do
que em meninas (JUKEMURA, 2000; CARVALHO JUNIOR, 2000), como também
uma diferença no brincar dos meninos em relação ao brincar das meninas. Segundo
Oliveira (2000a), os primeiros teriam tendência a um temperamento mais agressivo e
como conseqüência maior risco em suas atividades cotidianas.
74
Os entrevistados absorvem as informações divulgadas pela mídia em relação ao
tema dos acidentes em sua prática cotidiana; contudo, às vezes, essas informações
se contrapõem à vivência do educador.
[...] Outro dia eu tava lendo uma... porque saiu uma noticia no jornal : a criança mais
vigiada, ela tem probabilidade de menos acidentes.” É lógico, se eu tô ali 24 horas te
vigiando, é lógico que as coisas podem não acontecer [...] mas ocê tá às vezes com
a criança do seu lado, cê , virou pra cá, acontece alguma coisa [...].“ (Entrevista 14)
Nos relatos aparecem as idéias da imaturidade das crianças que, associadas à
necessidade de experimentação, expõem a criança às situações de risco.
“Crianças são pessoas em fase de desenvolvimento, em fase de construção de um
esquema corporal, de percepção temporal e espacial deste corpo atuando no espaço
e no tempo. Então, muitas vezes existe um erro de cálculo, na questão de
motricidade fina, na questão de motricidade grossa, que expõe essas crianças a
situações as mais diversas possíveis. Com relação à experimentação, a maturação
do sistema nervoso central, do cerebelo, aquela questão de noção de profundidade,
então a criança tá correndo, muitas vezes ela não calcula.” (Entrevista 4)
A experimentação do mundo, vivenciando situações novas também é fundamental
para propiciar o desenvolvimento cognitivo da criança. Assim, para Piaget (1972), a
ação é o elemento crucial para que o indivíduo se desenvolva como unidade. O
autor define inteligência como a solução de um problema novo para o sujeito. Dentro
dessa perspectiva, vemos a inquietude e a agitação das crianças presentes nas
falas dos entrevistados como inerentes a essas descobertas.
75
“[...] Então, na verdade, ela faz as coisas porque ela tem que experimentar, né? Na
verdade, ela só vai conhecer depois que ela experimentar, por isto que ela arrisca
tanto [...].” (Entrevista 12)
Experimentar e descobrir o mundo implica risco. Os entrevistados parecem perceber
os riscos decorrentes da imaturidade da criança, mas, ao mesmo tempo,
concordando com as teorias de desenvolvimento infantil citadas, demonstram estar
conscientes do papel essencial da brincadeira, da ação e da curiosidade para o seu
desenvolvimento.
De acordo com a teoria piagetiana, Pulaski (1986, p. 25) assinala que:
Uma criança não é capaz de pensar como um adulto porque ainda
não dispões das estruturas lógicas, das organizações de pensamentos
e dos métodos de raciocínio que lhe permitam lidar com problemas
adultos. Essa é a razão pela qual não se pode ensinar cálculo a uma
criança de cinco anos, diz Piaget; ela simplesmente não dispões de
estruturas para assimilá-lo.
Portanto, segundo Piaget “o desenvolvimento das funções cognitivas é caracterizado
por uma sucessão de etapas [...]. O autor, ao comparar o desenvolvimento da
criança ao do adulto, nos assinala ainda que” a criança não é um pequeno adulto.”
(PIAGET, 2005b, p. 92; 2005a, p. 14).
Oliveira (2004, p. 62) ressalta o risco de se fazer uma interpretação distorcida das
posições de Piaget o que freqüentemente pode ter como conseqüência uma postura
espontaneísta, a qual permite que “a criança deve ser deixada livre em sua interação
com os estímulos do mundo físico para que possa amadurecer, desabrochar.” O
discurso abaixo nos mostra isto:
76
“Então, eu acho que os acidentes também acontecem porque as crianças estão
muito super protegidas. Então, você não dá pra ela a possibilidade dela aprender a
lidar. Se a gente for buscar em Piaget, Piaget fala isto, né? De você está em contato
com o objeto do conhecimento pra ser possível você conhecer. Se você não der
nenhuma possibilidade pra que esta criança conheça, como que ela vai se defender
disto, né? [...]. Eu nunca tirei a faca do lugar da faca, né? Muito pelo contrário,
sempre ensinei meus filhos usarem a faca, né? O remédio no banheiro está no
banheiro.A gente tem que educar. (Entrevista 11)
A afirmação acima implica deixar a criança exposta a situações de risco. Pode-se
inferir uma assimilação do discurso científico sobre o desenvolvimento da criança, no
entanto re-significado, isto é singularizado de acordo com a experiência do grupo e
do indivíduo, mas também pelos demais fatores que determinam a natureza
polifônica do discurso.
No relato seguinte, já existe a preocupação de uma vigilância dos adultos em
relação à autonomia da criança, mostrando a heterogeneidade das representações
sobre o acidente no grupo estudado:
[...] Quer dizer, a gente diz que ela (criança) arrisca, mas pra ela não é risco; pra ela
é uma procura de concretizar algo que ela viu, que ela olhou, que se interessou. Eu
acho que cabe nós adultos é que estarmos cercando, é [...] evitar de todas maneiras,
criar situações, criar ambientes, que não favoreçam a este tipo de acidente mais
grave [...].” (Entrevista 12)
Estender a compreensão da ação da criança do nível cognitivo para o motor e
afetivo pode implicar algum risco se não for avaliada tanto a autonomia da criança,
sua respectiva fase do desenvolvimento, como também a necessidade da presença
de um adulto responsável.
77
De acordo com a literatura (OLIVEIRA, 2000; HUSBAND; HINTON, 1971), os
acidentes infantis às vezes tendem a se repetir num determinado grupo de crianças.
Nos relatos abaixo, os educadores percebem quando a incidência de acidentes é
maior em alguns alunos do que em outros:
“Nós tivemos um acidente ano passado, uma criança que subiu numa torneira, ali no
jardim, ela subiu em cima da torneira, pisou na torneira, a torneira girou, ela caiu e
cortou a perna, a própria torneira cortou a perna dela num horário de entrada, ele
ainda nem tinha chegado, ele tava lá fora e subiu em cima da torneira. [...] a criança
mordeu a própria língua, eu nunca tinha visto... e atravessou a língua. Ela estava
dentro da sala, parece que trombou com o colega uma colisão e a língua furou,
perfurou a língua, o mesmo aluno da torneira, que subiu em cima da torneira [...].
(Entrevista 2)
“Tem uma menina que é minha aluna, [...] é a terceira vez que essa menina quebra a
perna, fora da escola, mas é uma coisa que a gente percebe, que [...]. (Entrevista
15)
Outra categoria surgida nos relatos dos entrevistados refere-se à implicação do
educador na ocorrência de acidente. Este é visto como decorrente de negligência:
“Alguém que seria o tutor dessa criança, o mantenedor da ordem, que está cuidando
dessa criança foi relapso em determinado ponto e expôs a criança a um perigo
desnecessário [...], mas um erro onde tem um ser humano, o erro é fatal. Então a
gente tem que ficar meio que obsessivo, trabalhando nesta direção.” (Entrevista 4)
Chama-nos a atenção o termo meio obsessivo expressando o esforço e a dificuldade
de se manter o tempo todo em alerta e o estresse que isso provoca nos educadores.
Já o termo relapso sugere uma associação entre o acidente e o erro de quem cuida,
78
ou seja, a negligência. Nesse caso, para não ser negligente, há que ser meio
obsessivo, o que sugere um nível significativo de auto-exigência da escola.
Por serem escolas privadas, de nível socioeconômico médio e alto, existe a
implicação mais individualizada dos educadores no acompanhamento dos alunos.
Os pais, também, fazem mais cobranças aos profissionais da educação privada, já
que pagam pelo serviço prestado. Além disso, pensamos que a escola incorpora,
mais rapidamente que o restante da sociedade, as mudanças conceituais sobre a
criança mesmo que as mesmas não se tenham refletido, ainda, em mudanças na
legislação.
Santoro Júnior (2003, p. 151) define negligência como “falha na proteção da criança
a qualquer espécie de dano”. Onde inclui ainda a falha em prover as “necessidades
de alimentação, segurança física e emocional bem como outros aspectos
importantes dos cuidados necessários, resultando em prejuízo à saúde da criança.”
Voltando ao tema dos direitos da criança, cabe ressaltar a grande transformação do
pensamento contemporâneo sobre o que pais e escola podem exigir das crianças,
ou mesmo do modo que podem agir para lhes dar limites. As palmatórias, aceitas no
passado, são consideradas, abuso de autoridade e maus tratos, hoje em dia, e, até
mesmo, condutas de negligência são vistas como uma espécie de injúria à criança,
mesmo que sejam involuntárias. Isso se reflete na Lei Federal nº 8069 de 13/7/90,
mais conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e às leis de
diretrizes e bases da escola brasileira (LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE
1996) que exigem o lidar com a criança, respeitando-a como cidadão.
79
Pereira (2004, p. 205) chama atenção sobre o ECA:
Como texto normativo, o ECA é reconhecido como um dos mais
avançados do mundo e tornou-se uma referência internacional. Tem
sido modelo de inspiração para quase todos os países da América
Latina. Na França, há livro comentando nossa avançada e exemplar
lei.
O autor ainda parece sugerir que o avanço normativo contido no ECA não
necessariamente, reflete a prática social com a criança. No entanto, pensamos que
a vanguarda da aplicação da norma se dá na escola, em parte por sua missão, em
parte porque sobre ela existe um controle social mais evidente que sobre a família e
outros lugares sociais.
Nos relatos, o ambiente físico inadequado é apontado, também, pelos educadores
como causador de acidentes passiveis de prevenção:
“[...] Eu acho que cabe nós adultos é que tamos cercando, é... Pra que isto não
venha acontecer, a gente é... evitar de todas maneiras, criar situações, criar
ambientes, que não favoreçam a este tipo de acidente mais grave.” (Entrevista 12)
Como já dissemos anteriormente, de acordo com Heredero (1988), o aluno, durante
a sua permanência na escola, encontra-se exposto a uma série de riscos nos mais
diversos locais internos e externos às suas instalações e arredores. Os entrevistados
demonstram consciência de que o acidente pode ser causado por negligência com
relação ao espaço físico:
80
“Às vezes, é por algum problema físico do ambiente [...]. Teve uma vez que o extintor
de incêndio caiu no pé do menino, o parafuso tava um pouco solto, o menino passou,
esbarrou, o parafuso caiu.” (Entrevista 9)
A consciência da possibilidade de controle do ambiente, dos riscos em geral,
coexiste com a idéia de fatalidade, como no relato abaixo:
“[...] no recreio [...] nós estamos tendo um problema de muita abelha lá perto da
cantina [...]. Um menino trouxe de casa dentro de uma garrafinha destas
pequenininhas de plástico, coca-cola; botou na mesa e deixou aberta, entrou quatro
abelhas e ele não viu. Na hora que ele virou [...] um ferrão, mordeu o céu da boca
dele [...] nós estamos preocupados em limpar todas as mesas e pedimos inclusive
ajuda pra dona da cantina lá limpar [...]. Procurar a colméia [...] é um negócio que
incomoda. Tem crianças, super alérgicas [...] ele (o aluno) me fez o favor de não
tampar [...] a abelha entrou. Entendeu? Então, quer dizer, como a gente podia
imaginar disso acontecer? Agora, diante disso... Vou argumentar o seguinte:
enquanto, ainda a gente não consegue exterminar as abelhas (os alunos) vão ter,
que manter (as garrafas) fechadas. [...]. Evitar, né? Mas, realmente é muito difícil,
não é? A gente é... achar, porque que isto acontece?Eu acho que fatalidade [...].”
(Entrevista 14)
A coexistência das duas representações pode significar um conflito entre uma
exigência interna/externa de controle e a experiência da dificuldade de exercício do
mesmo, tanto objetiva quanto subjetiva, em função da situação de transição de
valores que vivenciamos relativos à criança e ambigüidades relativas às funções da
escola.
Os relatos revelam preocupações relativas à arquitetura da escola, ressaltando a
questão da adaptação dos prédios onde as escolas funcionam:
81
“A escola é muito recortada (reformada), foram residências que foram emendando os
espaços, nós temos escadas, pátios em desníveis, então neste caso, nós desde o
início nós temos que ter muito cuidado.” (Entrevista 17)
Outros relatos apontam que a escola tem consciência dos riscos de determinados
ambientes:
“A construção é muito antiga desse prédio, então o piso não favorece; que é aquele
mamorite, aquilo ali vira um sabão, né? Então, é um perigo!” (Entrevista 2)
Um aspecto importante é que aproximadamente um terço das escolas da amostra é
constituída de escolas que anteriormente eram antigas residências, sendo, então,
adaptadas ao se tornarem escolas e quase dois terços da amostra são colégios, em
sua maioria apresentando uma arquitetura antiga:
“A escola aqui, é uma escola com arquitetura antiga, se tá escorregando, o problema
foi passar a bendita cera, então o problema é da escola, né?” (Entrevista 14)
[...] Então, tem a questão do chão não ser [...] não deveria ser de ardósia [...].
(Entrevista 16)
Outro aspecto relevante é que, geralmente, nos relatos, após a ocorrência do
acidente devido à falha no ambiente físico, este é então, modificado:
[...] Porque, os vidros, por exemplo: às vezes o menino [...]. O que aconteceu? Ele
não foi... a porta não tava aberta, não tinha vidro quebrado, ele foi se escorar na
porta. O que quê a gente fez? Imediatamente passou a [...]. Tirou o vidro todo e nós
82
colocamos uma porta de metal, entendeu? Mas assim: é [...]. Quando colocou a
gente imaginou? Essa porta é de vidro, aquela é de vidro, nunca teve nada,
entendeu? A outra lá, aconteceu. Nessa ali aconteceu.” (Entrevista 14)
“[...] a gente tem dois playgrounds aí eles vão ser trocados de uma maneira que não
tem problema em machucar pela própria arquitetura do projeto. Então, vai ser bem
mais seguro e isto já vai evitar muitos acidentes. (Entrevista 13)
Foi mencionada a ocorrência de alguns acidentes no playground, o que levou a
escola a realizar a sua reforma.
Donoso e Chianca (2002, p. 52) destacam que, “em condições ideais, creches e
escolas são locais onde deveria existir a preocupação com uma estrutura física que
busque um ambiente livre de riscos e acidentes.”
Historicamente a escola evoluiu ao longo dos anos, passando de um espaço físico
improvisado a espaços mais adequados, tanto na perspectiva arquitetônica como na
ergonômica, para receber a criança. Segundo Nunes (2000), no começo do século
XX, as escolas das principais cidades brasileiras eram antigas residências alugadas.
A partir da década de 30, surgiram os prédios escolares com novas configurações
arquitetônicas, visando principalmente evitar a propagação de doenças da época,
que atingiam as crianças e jovens, independentemente da condição social. A partir
da década de 50, com o processo de modernização do país, as escolas foram cada
vez mais ampliando e adaptando sua infra-estrutura às necessidades pedagógicas e
sociais das crianças. As exigências arquitetônicas vão se transformando com a
mudança da visão pedagógica e incorporação de tecnologia, fazendo com que
83
mesmo os prédios de destinação específica sofram adaptações. No entanto, ainda
hoje, inúmeras escolas, sobretudo privadas, funcionam em prédios não projetados
para essa finalidade.
Percebeu-se nos relatos uma distinção entre prevenção e superprevenção, no
sentido de superproteção, conduta esta que não daria à criança condições para que
ela possa aprender, também, sobre os riscos inevitáveis da vida.
“Eu penso desta forma, que existe uma coisa que é prevenção e existe uma coisa
que é superprevenção, né? A gente dizer, em casa tem que tirar as coisas da altura
das crianças? -Não! Será que a gente não tem que educá-las pra que elas aprendam
a conviver com as coisas?” (Entrevista 11)
Nesta perspectiva, Araújo (2005, p. 88) afirma,
Na psicologia, a superproteção é vista como uma condição patológica,
ou seja, uma doença, uma vez que debilita a criança. Sem dúvida há
um componente patológico na mãe (ou no pai) também, já que o
comportamento superprotetor só pode vir de uma pessoa que não se
sente segura no mundo e se torna refém dos fatores de risco.
Contudo, averiguar os fatores de risco através de uma vigilância adequada e
consistente, observando as singularidades de cada faixa etária é uma estratégia na
prevenção dos acidentes. Portanto, é fundamental a distinção entre uma proteção
adequada e um excessivo controle da criança e do ambiente.
Percebe-se que a representação social da superproteção da criança está
relacionada à prevenção do acidente:
84
“A gente tem que educar [...]. Será que a gente também não tem que educar a
criança, pra que ela saiba que ali é uma janela, que ela não pode, né? Porque risco a
gente corre o tempo todo em todos os lugares. [...] eu tenho um pouco de dúvida a
respeito desta super proteção de alguns anos, né? A chamada prevenção, que vem
se fazendo, porque eu acho que cada vez mais a gente tá distanciando as crianças
do real [...].” (Entrevista 11)
Os hábitos de vida moderna também foram apontados pelos entrevistados como
associados aos acidentes:
[...] A vida hoje, os meninos parecem que já nascem apressados. Querem correr,
tudo é corrido, até a linguagem. Hoje com a linguagem da Internet, eles são
apressados pra escrever. [...]. Outra coisa, os meninos ficam muitos sozinhos hoje. É
a sociedade, o contexto social. Hoje o pai e mãe precisam trabalhar fora. Então eu
vejo assim que algumas crianças, elas são terceirizadas [...].” (Entrevista 15)
Nas últimas décadas, parece estar havendo uma aceleração nas transformações
culturais, em parte devido ao fenômeno da globalização, possibilitado pelo rápido
desenvolvimento tecnológico. Hoje, crianças têm acesso à Internet, ao celular, à tv a
cabo, modificando as relações interpessoais, sobretudo dos pais com os filhos e a
escola. Um dos efeitos observados dessa nova forma de organização familiar é a
“falta de tempo” no contato entre eles.
“Então, eu acho que isto é uma questão de hábito. As crianças entram correndo na
escola, saem correndo. Ás vezes, o pai tá aí na porta, eu falo assim: - ‘Seu pai tá na
porta, por que você tem que correr?’ ‘Ah não, ele tem que trabalhar’. Então, isso aí
tá virando...sabe? Precisa da família, precisa da escola, fazer um trabalho [...]”
(Entrevista 15)
85
No discurso das escolas, esse aspecto surge com freqüência: crianças apressadas,
os pais ausentes e a escola aturdida com esses “hábitos” que surgem na vida
moderna.
“Eu acho que a palavra certa é essa: eles precisam desapressar. Eles são muito
apressados. Volta e meia eu tenho que pedir pra um: ‘-vão com calma! desce com
calma!’ Então, acidente que a gente tem na escola é pela pressa... deles. [...] Dentro
da escola é... a escola também tem o seu despreparo, suas limitações, suas grandes
limitações,né? Não acho que a gente tem que falar que isto tudo é a família não. A
gente... É um contexto social de um país de uma gestão econômica, social, política
que nós ainda não chegamos lá.” (Entrevista 15)
Segundo Zagury (2002b, p. 85), existe em determinadas famílias a ilusão de que a
escola ocupe o lugar dos pais com relação à ausência e aos limites. A autora afirma
que: “É sempre bom repetir que ninguém substitui os pais na tarefa de educar,
socializar, de ensinar o que é certo e o que é errado [...].”
“Agora, claro que indiretamente [...] as famílias das crianças que não têm limite, elas
tem uma parcela de culpa sim, eu não sei dizer a porcentagem. Mais sim, porque
elas não dão esse limite em casa e acaba sobrando para a escola, não é?”
(Entrevista 17)
Pensamos que, nesse sentido, a escola irá apoiar a família com relação à educação
da criança, contudo, dentro de outra perspectiva, a do enfoque do grupo.
Conforme o item 1.5, na introdução, vimos ao longo dos tempos o direcionamento e
o re-direcionamento da relação família/escola e a suas expectativas com relação à
educação da criança no Brasil desde o período colonial até a atualidade.
Presenciamos, em nossa época, mais uma vez, a conformação da relação
86
escola/família e suas respectivas expectativas, pelos movimentos sociais mais
amplos, determinados pelas transformações econômicas e políticas.
Finalmente, os educadores apontam para a multicausalidade do acidente:
[...] Então, eu vejo que são várias causas. Não vou falar que é só culpa do menino,
nem só culpa da escola, nem só do professor, mas é um conjunto, aí no caso.”
(Entrevista 9)
“É... Bom, é... eu acho que tem duas... Três vertentes [...] Então, é fundamental a
gente contextualizar a cena do acidente. Então, sempre que o menino machuca, a
gente intera do assunto primeiro, né?” (Entrevista 4)
Frisamos que, na perspectiva coletiva, os acidentes são sempre multicausais.
Mesmo considerados isoladamente, para Duarte Filho (1999), a maioria apresenta
mais de uma causa e estas devem ser investigadas para que haja segurança.
4.2.3 Tema 3: Nível de informação sobre acidentes
Categorias:
A Teve treinamento em Primeiros Socorros
B Não teve treinamento
C Palestras e orientações eventuais
Do ponto de vista da capacitação para lidar com o acidente, esse parece ser
classificado pelos entrevistados em duas categorias: o corriqueiro que se sabe como
lidar a partir de conhecimentos advindos das experiências, inclusive da função
87
materna, e o acidente grave que causa pânico. Na primeira situação, os educadores
parecem se sentir de posse de uma competência para atender à criança, enquanto
que, no segundo caso, a prática é recorrer à família, ao hospital.
“[...] na verdade, é a gente não tem, é [...] uma coisa bem básica, porque a gente não
interfere naquele momento, né? Assim de tá sendo paramédico, no sentido não,
sabe? Então, é só uma coisa que... Na verdade, houve esse mais grave, né? Que
nós chamamos na mesma hora a família e eles vieram e tal, mas os outros são
coisas corriqueiras do dia-a-dia, que isso a gente, né? Pela própria vida familiar a
gente tem bom senso pra tá atendendo essas crianças.” (Entrevista 5)
A escola distinguiria, assim, sua função daquilo que a ultrapassa, encaminhado e
deixando à prática médica os cuidados com o corpo da criança. Percebe-se um
receio muito grande do educador em ações que para ele são de responsabilidade
médica, mesmo em casos nos quais os primeiros socorros poderiam ser cruciais à
sobrevivência da criança, demonstrando que a assunção de responsabilidade e
preparação da escola voltada para o atendimento emergencial é parcial:
“[...] Primeira área descartado na minha vida profissional foi, não faço nada ligado a
biologia, eu não dou conta de ver sangue, tenho pânico [...].(Entrevista 17)
“[...] Eu não sou médica. Se eu fosse médica eu acho que aí eu ia falar com firmeza,
com segurança, né? [...]. Eu acho que eu sou preparada para a minha profissão, né?
Mas pra essa situação assim, eu não diria que eu sou preparada. Eu acho que só um
profissional da área mesmo, né?” (Entrevista 3)
88
Nos discursos dos entrevistados, os temas treinamento e socorro aparecem
relacionados. A existência ou não do treinamento acarretará diferentes percepções
de atitudes a serem tomadas frente ao socorro inicial, prestado à criança acidentada:
“Já, já (teve treinamento). E aqui na escola, uma vez por ano vem o médico e faz
um... a gente tem umas três horas mais ou menos de conversa com ele, pra
esclarecimento de dúvidas... Por exemplo: um... um braço que quebrou, o que, o quê
que é ideal de fazer, né? Que às vezes tem fraturas assim, que pegam um osso aqui,
pela metade do osso, em vez de ser nas... Nas juntas, mas, mas quebra o osso,
como é que faz? A gente não pode botar isso. A gente tem que botar uma tábua
grande por baixo, pra levar pro... pro hospital. Então a gente tem... que tipo de
medicamento que pode colocar nos machucados, essas coisas a gente, a gente tem
sim [...].” (Entrevista 9)
“Não treinamento assim, se for uma coisa mais séria, aí realmente vai me pegar de
surpresa, né? [...] O que acontece que a gente vê que foi um coisa assim,né? Que
não tá suportando a dor ou tudo, a gente geralmente liga pros pais e tudo, né? Pra
saber se quer que busca [...].” (Entrevista 7)
De forma geral, nos relatos observa-se que o espaço ocupado pelo treinamento é
pequeno. Expressões como fazer um cursinho, conversar com um médico três horas
por ano para esclarecer dúvidas ou utilizar uma apostila que está sempre a mão
para uma olhada rápida denotam a inexistência de um treinamento mais sistemático,
conforme os relatos abaixo:
“Não. Eu especificamente, da supervisão pedagógica, não. Mas nós temos
funcionários aqui que fizeram, né? Um cursinho de primeiros socorros, mas assim,
mais básicos mesmo.” (Entrevista 8)
89
“Já, já. E aqui na escola, uma vez por ano vem o médico e faz um [...]. A gente tem
umas três horas mais ou menos de conversa com ele, pra esclarecimento de dúvidas
[...].” (Entrevista 9)
“E no caso de queda,... Em caso de... Bater cabeça,... Quais seriam as providências
mais, mais claras. É, em caso de corte, em caso da criança engolir alguma coisa,
algum objeto. Aí nós tínhamos as noções básicas e tínhamos também um material
que era uma apostila que estava sempre à mão, quando a gente pudesse também,
dá uma olhada rápida.” (Entrevista 10)
Os relatos abordam o treinamento de forma muito evasiva, superficial ou se encontra
num passado distante ou num futuro indefinido.
“Olha, eu tive uma vez, mais foi uma experiência muito superficial, nada que tenha
me ajudado, que eu tenha realmente tomado isso como referência para um trabalho.”
(Entrevista 17)
[...] Tivemos há muitos anos atrás um profissional da área da medicina que veio aqui
pra falar dos primeiros socorros. Mas, não tem uma freqüência grande na escola,
não. Acho que faz mesmo falta, a gente ter pelo menos uma vez por ano uma
pessoa que venha no início do ano pra falar pra toda equipe [...].(Entrevista 16)
Alguns entrevistados, enquanto respondem, buscam a confirmação do entrevistador
(“...né?”), ocorrendo também interrupções na seqüência da frase. Considerando as
condições de produção do discurso, isso seria indicativo de que o seu lugar na
instituição e a relação imaginária deste lugar com aquele ocupado pelo entrevistador
- “a escola” falando para a “universidade -” seria um dos determinantes da forma que
assume o seu discurso naquele momento.
90
“É... eu, especificamente não, né? Mas nós temos as pessoas que trabalham na
secretaria que pas ... fizeram um treinamento, assim né? Pra... pra, pra atender a
esses casos mais simples mesmo, né? Agora a gente, nós nunca tivemos nenhum
caso gravíssimo não, assim grave ou gravíssimo.” ( Entrevista 8)
“Não.... Eu já tive um treinamento no geral, né? Assim...Não especificamente com
criança, mas é... É.... Nós já tivemos a visita de bombeiros, então da toda aquele...
aquela noção, né? Mais assim é específico com criança, não. Eu já tive sim um
treinamento, uma... Uma ...orientação, né? Não vamos dizer treinamento não; uma
orientação, mas assim, visando o adulto, ta?” (Entrevista 12)
As falas deixam transparecer despreparo e pânico quando o acidente acontece. O
acidente emerge impondo uma ação e o educador enlouquece.
“[...] Na hora que a coisa acontece mesmo aí... aí a gente enlouquece mesmo [...].
(Entrevista 17)
Existe a crença de que a experiência em ser mãe gera uma confiança para lidar com
as situações de acidentes ocorridos na escola:
“[...] E também tem a facilidade de que eu sou mãe, então, você já lida de outra
forma, mas normalmente, eu me sinto sim, à vontade...com segurança para dar este
atendimento, no momento de necessidade [...].” (Entrevista 2)
“[...] Já, já aqui na escola mesmo já foi oferecido um curso disso, mas eu acho que a
maior escola que a gente tem é a experiência do dia-a-dia mesmo e ser mãe [...].”
(Entrevista 14)
91
Novamente existe no entrevistado uma busca de identificação com o entrevistador
(“...tá?”) numa tentativa de validação do discurso apresentado:
“[...] eu acho assim que muita coisa que a gente faz por intuição, também, ou por
leitura, ou até mesmo porque eu sou mãe, tá? De cuidados que a gente tem com o
filho da gente ,né? Que o pediatra já passou, então eu vejo que isso interfere no meu
dia-a-dia. No modo de como que eu vou proceder.” (Entrevista 3)
Chamamos a atenção também para a polifonia constitutiva do discurso, que revela
desde antigas ideologias de nossa tradição histórica, inclusive a religiosa, o discurso
científico, de divulgação científica através da mídia até o discurso do senso comum
em que a experiência materna assimila e é assimilada pelos demais.
Conforme Feldman et al. (1983) e Boyce (1984), metade dos acidentes ocorridos na
escola são tratados na própria escola e 20% dos acidentes escolares são atendidos
em hospitais.
“[...] O acidente mais grave que eu já vi aqui na escola foi uma criança que estava
correndo no pátio e o colega a empurrou de frente, bateu de frente com ela [...] e ele
caiu pra trás. Ele caiu na quina do degrau onde tinha uma ardósia e a quina macerou
o tecido, [...] e abriu aqui atrás, perto da nuca, então, como a pele é esticada na
cabeça, e abriu aqui e é muito vascularizada, foi aquela sangueira. Eu estava
inclusive no pátio na hora, conversando com os recreacionistas, nós tivemos que
carregá-lo no colo e subimos com ele correndo para a coordenação pra gente ligar
para os pais. Mas eu acho que foi o caso mais... grave que nós tivemos aqui, isso já
faz seis anos [...].” ( Entrevista 4)
Nota-se nos relatos uma certa consciência do que se deve fazer no caso do acidente
escolar, inclusive com incorporação no discurso de terminologia médica
92
especializada (“macerou o tecido... muito vascularizada”) : atitudes como levar a criança
vitimada para o hospital, acionar a família, não mexer ou medicar até o resgate
chegar.
“[...] porque nós não tomamos muitas medidas aqui na escola, não. Nós levamos
imediatamente pro hospital e acionamos a família. Então, fica mais ao cargo mesmo
do médico, do hospital de fazer esse primeiro atendimento. (Entrevista 16)
Apesar disso, parece não haver um preparo para atendimentos nos quais não é
possível aguardar o socorro hospitalar, quando é necessária a intervenção em
minutos. Esses tipos de acidentes são então, nos relatos, vinculados à fatalidade, à
surpresa, havendo uma dificuldade muito grande de se falar sobre eles.
“[...] porque a gente não interfere naquele momento, né? Assim de tá sendo
paramédico, no sentido não, sabe? [...] Na verdade, houve esse mais grave, né? Que
nós chamamos na mesma hora a família e eles vieram e tal [...] foi um aluno que caiu
realmente e machucou a cabeça, foi encaminhado, né? [...].” (Entrevista 5)
“[...] porque nós não tomamos muitas medidas aqui na escola,não. Nós levamos
imediatamente pro hospital e acionamos a família. Então, fica mais ao cargo mesmo
do médico, do hospital de fazer esse primeiro atendimento. A escola, o que ela tem
que fazer, é levar imediatamente pro hospital, ou mais próximo ou o que a família
indica, na ficha da criança [...].” (Entrevista 16)
Percebemos consciência da necessidade do treinamento, mas não ainda suficiente
para que isso aconteça de forma sistematizada. Em parte, isso poderia ser devido à
inexistência no Brasil de uma Política Pública de Saúde vinculada ao MEC que
estabeleça a exigência de um treinamento formal e formação em estratégias
93
preventivas, incluindo primeiros socorros, para situações emergenciais dos
profissionais ligados à educação.
“A gente tava pensando, já vem algum tempo pensando nisso, é uma reivindicação
dos funcionários, e aí então a direção pensou em pedir à..., nem que fosse..., que a
Cruz Vermelha montasse um curso e oferecesse pra escola,com relação a primeiros
socorros, né?. Mas ainda não foi efetivado não. Tem essa pretensão, talvez no
próximo ano a gente consiga organizar isso aí, essa questão. É fundamental.”
(Entrevista 4)
“Até acho que faz mesmo falta, a gente ter pelo menos uma vez por ano uma pessoa
que venha no inicio do ano pra falar pra toda equipe. Porque não só a supervisora
tem que ter o conhecimento, mais o professor, o auxiliar de limpeza que às vezes é o
que vai socorrer o menino imediatamente.” (Entrevista 16)
4.2.4 Tema 4: Sentimentos relativos à autocompetência para lidar com o
acidente
Categorias:
A Sente-se tranqüilo, preparado.
B Sente-se parcialmente preparado para coisas mais simples
C Não se sente preparado, qualificado.
D Sente-se inseguro
E Não precisa estar preparado porque o atendimento não é
feito na escola
94
O discurso dos entrevistados apresenta uma polifonia (várias vozes) e os
sentimentos oscilam entre o auxílio ao aluno, mesmo que improvisado, até um não
envolvimento com a situação do acidente. Os aspectos relativos ao treinamento
vinculados aos da responsabilidade parecem ter uma inter-relação com as emoções
e sentimentos desencadeados pelo acidente em si.
Os relatos revelam sentimentos e atitudes relativos à responsabilidade do socorro
que ora recai sobre a família ora sobre a escola:
“Mas eu acho que o mais importante é você estar calma, pra manter a cabeça fria e
ver o que tem que fazer, né? Normalmente, assim, quando é caso que tem que ir
para o hospital correndo, a gente já vai e liga para os pais depois. Mas quando é algo
que dá tempo da gente ligar, né? Pro pai vir buscar, a gente liga, né? E se os pais
estão calmos, a gente vê que estão em condições de ir sozinho pro hospital a gente
deixa ou a gente acompanha. A escola ta sempre indo lá pra apoiar.” (Entrevista 1)
“E assim, eu sou bem tranqüila, pra estar atendendo esses meninos, junto com a
pessoa responsável. [...].” (Entrevista 8)
Nos relatos dos entrevistados, apesar da presença de diferentes emoções fortes,
diante do acidente, prevalece o controle, com ações racionais de socorro:
“[...] eu tenho uma tranqüilidade para resolver e para tomar assim providências, com
tanta tranqüilidade, com tanta precisão, que eu me estranho e eu falo assim: gente
será que sou eu mesmo, que estou dando conta disso? [...] Acaba que a gente tem
uma... Que precisa ter uma frieza, né? A gente acha força que não sabe da onde
também, assim, né?” (Entrevista 17)
95
“No acidente, às vezes vem uma força que eu não sei de onde [...]. Porque a
adrenalina da gente na hora tomou uma proporção diferente, que eu não sei de onde
que vem não,sabe? É realmente é assim: no momento você tem que tomar uma
atitude, cê acaba fazendo [...].” (Entrevista 14)
Entretanto percebe-se nos relatos o estresse vivenciado sob o controle racional e
sentimentos de despreparo para lidar com ele.
“Agora eu sinto assim que todas as vezes eu nunca passei aperto e nunca assim,
nenhum momento alguma situação que o médico ou a família falasse: ‘-Ah, você
não agiu certo e tal.’ Graças a Deus, tá? Mas dizer que eu sou preparada, não [...].
Eu acho que só um profissional da área mesmo, né?” (Entrevista 3).
Embora sem uma preparação formal, percebeu-se também a existência entre os
entrevistados de um certo conhecimento sobre o acidente que os induz à prudência,
por exemplo, a não movimentação aleatória do acidentado. É provável que esse
conhecimento seja formado pela divulgação na mídia, pelos órgãos responsáveis
pelo trânsito que divulgam condutas básicas a serem seguidas, relativas aos
acidentes. Assim, mesmo sem possuírem uma capacitação formal e sistemática, os
educadores possuem noções a respeito de como agir com a criança acidentada.
“[...] Em termos de qualificação eu prefiro usar a regra máxima que é a questão da
prudência assim: ‘o que eu não sei eu não mexo’ [...] se você mexer na pessoa antes
de imobilizar isso pode dar um dano irreversível, por exemplo: amassar a medula, a
gente tem que aguardar o resgate. [...].” (Entrevista:4)
96
4.2.5 Tema 5: Concepção de medidas para evitar e lidar com acidentes
Categorias:
A Vigilância da criança:
?? recreio supervisionado
?? recreio monitorado
B Treinamento dos educadores
C Ambiente físico seguro
D Educação da criança: conscientização e orientação
E
As ações de prevenção são limitadas ou pode-se prevenir
mas há um limite para a prevenção
F Ter um ou mais profissionais preparados para atender
crianças acidentadas
G Encaminhamento para serviço de saúde ou para a família
Está muito presente nas falas preocupações relativas ao ambiente físico, que vão
desde os cuidados com o piso, com os móveis, com playgrounds, interligando-os
aos aspectos da vigilância constante e à educação dos alunos.
Termos como vigiar, monitorar, estar presente surgem demonstrando a existência
de preocupação com acidentes.
97
“Então assim, eu penso que a escola vem é... cumprindo isso aí assim de ter um
olhar cuidadoso, de ter sempre adultos por perto, de estar atentos, de vão [...] assim,
né? de cuidar pra num, num subir, né?” (Entrevista 8)
“Pequenos e grandes cuidados ao mesmo tempo, mais esses acidentes do cotidiano,
assim de socar, essas colisões, eh... de empurrões, isto não tem como você
prevenir, você tem como alertá-lo, assim se você vê uma criança fazendo isso, o
adulto chega e intervém lá naquela situação, mas como um alerta, às vezes já
aconteceu, você tem que mostrar que você sabe contar como que foi.” (Entrevista 1)
A frase acima, “você tem que mostrar que você sabe contar como que foi” sugere
que há uma satisfação a ser dada à família implicando que a escola como empresa
educacional saiba agir de acordo com o esperado, relatando o ocorrido de modo
coerente, de forma a demonstrar correta proteção e vigilância.
“[...] a escola fica naquela situação, sempre a culpada. Assim, a família sempre
culpa, procura saber quem é que tava perto, o que é que aconteceu, quer saber
detalhes, né?” (Entrevista 3)
O recreio constitui-se no momento de maior ocorrência dos acidentes. Observou-se
que, em certas escolas, há supervisão e monitoramento do mesmo, buscando
detectar situações de risco que ocorrem preferencialmente nesse espaço e nesse
momento. Esse procedimento é validado pela pesquisa de Di Scala, Gallagher e
Schneps (1997), que indica como estratégia preventiva um aumento da vigilância
nas áreas de recreação, apesar de que as diferenças estatisticamente significantes
entre acidentes na parte interna da escola e nessas áreas serem pequenas .
“Porque as crianças estão correndo muito, normalmente estão no recreio, numa aula
de educação física, em que ela está em uma atividade física, e aí ela bate, ela
98
tromba em outro colega.O acidente acontece nesse [...]. Dentro deste quadro.”
(Entrevista 2)
“Nós temos uma maior quantidade de acidente na escola é na hora do recreio.
Então, nós resolvemos fazer esta experiência, tá? De colocar na hora do recreio é
[...]. Um recreio dirigido com os professores de educação física, de educação
artística, desenvolver na criança na hora [...].O departamento de educação artística
tem feito isso também. Então é uma experiência nova pra nós, tá?” (Entrevista 15)
Nota-se nas falas uma preocupação das escolas em adequar seu ambiente físico,
visando torná-lo mais seguro, inclusive com auxílio de especialistas para resolverem
aspectos arquitetônicos e ergométricos do ambiente escolar:
:
“Eu acho que a escola por ser um espaço coletivo tem que ser adaptado para
receber criança pra não acontecer os acidentes. [...].” A gente tem que programar um
ambiente pra onde as crianças vão ficar, que não tenha tanto obstáculos externos,
assim, remodelar o playground, por exemplo, se os equipamentos não estão em
boas condições [...].” (Entrevista 13)
“[...] Tem visitas de pessoas especializadas, de médicos da área de prevenção,
medicina de segurança [...]. Às vezes tem um toco fora de lugar, alguma coisa que
eles ajudam [...]. A questão da ergonomia também, dos materiais que são usados no
ambiente [...].” (Entrevista 9)
No discurso, prevalece a consciência da importância das medidas preventivas a
serem tomadas com relação ao acidente; contudo, há uma discordância em relação
ao que se espera como resultado dessas medidas, por exemplo, uns acham que o
acidente pode ser totalmente controlado se o ambiente físico for adequado e outros
consideram que o acidente sempre irá ocorrer apesar de todas as medidas
preventivas:
99
“[...] Então, isso tudo são pequenos e grandes cuidados que você faz para que as
coisas sejam planejadas de uma maneira segura. Assim, os acidentes podem ser
definitivamente prevenidos [...].” (Entrevista 13)
“Esse é o grande segredo. Não acho que a gente evita acidente tirando o risco.”
(Entrevista 11)
“Eu acho que fatalmente vai acontecer, mesmo com toda prevenção. Realmente
evitar, mas acabar jamais [...].” (Entrevista 14)
Nos relatos, os entrevistados colocam a importância da conscientização e orientação
da criança como medidas importantes nas estratégias de prevenção:
“Conscientização das crianças, quanto à necessidade de não correr tanto. Aqui, no
corredor mesmo a gente fala, que apesar de ser corredor, é, andador.” (Entrevista
14)
No discurso, a escola tende a se isentar de falhas ligadas à negligência, fazendo
com que os relatos sempre retomem à questão da fatalidade em relação aos
acidentes:
“A gente aqui se cerca de tanto cuidado e acho que os acidentes que acontecem,
realmente não foram por negligência, é porque aconteceu mesmo [...]. (Entrevista
14)
100
4.2.6 Tema 6: Percepção de responsabilidade sobre o acidente
Categorias:
A Da família
B Da criança
C Da escola e dos educadores
D Não há responsável
E Responsabilidade múltipla
Na atribuição de responsabilidades à família, surgem questões relativas ao
vestuário, material adequado da criança e às regras apresentadas pela família. Essa
última questão implica dificuldades da escola com relação ao limites dos alunos,
pois, segundo os entrevistados, a família moderna tem ficado muito alheia à
educação dos filhos, havendo uma tentativa de jogar a responsabilidade de
colocação dos limites para a escola que se ressente disso:
“[...] da família, de tá mandando a criança com o calçado adequado, com a roupa
adequada, pra correr,né?, não machucar, não cair, não machucar os joelhos, né?”
(Entrevista 1)
“[...] muitas vezes, você vê as crianças, assim, fazendo coisas que você não acredita.
Você fica até [...] fazendo coisas assim que tá na cara que vai dar problema e o pai
ta ali do lado e não fala nada. Aí você enxerga assim, que é uma criança que
também nunca foi alertada, nem limitada pela família [...].” (Entrevista 17)
101
“[...] as famílias das crianças que não têm limite, elas têm uma parcela de culpa sim,
eu não sei dizer a porcentagem [ risos]. Mais sim, porque elas não dão esse limite
em casa e acaba sobrando para a escola, não é? Então fica mais complicado pra
gente.” (Entrevista 17)
Outro aspecto relevante, citado em relação à responsabilização da família, refere-se
à falta de tempo dos pais para os filhos na vida contemporânea, afetando a sua
educação.
A inserção da mulher no mercado de trabalho teve como conseqüência a ausência
de ambos os pais no dia-a-dia dos filhos, levando a uma terceirização, ou seja, os
filhos foram delegados a outros, por exemplo, às babás e aos motoristas, o que,
muitas vezes, dificulta a imposição de limites e regras.
“[...] que a questão de trabalhar fora pai e mãe hoje é a realidade, não é nenhum
hoby, né? [...] às vezes que vem até em reuniões de pais na escola, ou quando
acontece alguma coisa, briga que a gente chama; sabe é o motorista, não é? Os pais
também delegam para um outro muitas funções, não, é? [...].” (Entrevista 15)
O modelo tradicional da família nuclear modificou-se ao longo dos anos, na nossa
sociedade. Devido à fundamental importância da família no desenvolvimento da
criança, Lima (2003, p. 36) sugere que precisamos “[...] abrir nosso conceito de
família, considerando também as composições familiares contemporâneas que muito
diferem do modelo tradicional.”
Eu já tive caso de uma criança que quebrou o braço, os pais tinham separado e o
pai tinha tirado o plano de saúde em rivalidade com a mãe, tá?” (Entrevista 17)
102
No discurso dos entrevistados, as escolas parecem preocupadas com as crianças,
de certo modo “abandonadas” a seus cuidados e que entram no turbilhão da vida
moderna, segundo as atitudes dos pais, ficando sem limites, porque recebem
demais do lado material e pouco do lado da segurança no seio da família.
“A gente imaginou que logo que os pais chegassem, que eles tomassem o lugar da
gente e ficassem ali com a filha, mas eles não tomaram, sabe? Não sei se por não
estarem emocionalmente preparados, ou não sei, maneira de lidar mais, assim... fria.
Eu sei que a gente teve que ficar lá até fazer tudo. Depois de ficar tudo pronto é que
a família ficou com a criança.” (Entrevista 1)
[...] os pais trabalham fora e as crianças assistem muito é... no computador, na
televisão, vídeo game é... jogos, com muita violência, jogos com muita violência...
jogos apressados; a...a... violência com muita pressa, a violência é...é... muito
violenta, não sei se tá dando pra você entender, tá?” (Entrevista 15)
De acordo com Dias; Ricas; Dias; Silveira (2005, p. 1) a sociedade, na atualidade,
vem sofrendo diversas modificações culturais: “[...] as crianças dos estratos sociais
privilegiados enfrentam situações de mudanças de valores e hábitos sociais,- como
novas estruturações familiares [...].”
Essas mudanças fogem ao controle das instituições escola e família. Tais
transformações da sociedade contemporânea são expressas pelas altas taxas de
divórcio e separação, como também pela perda da autoridade paterna e inversão
dos papéis tradicionais do casal parental. Segundo Bilac (2005), essa crise leva ao
esvaziamento da instituição familiar, no sentido de que, gradativamente, suas
103
funções se minimizam devido às mudanças ocorridas nas relações intrafamiliares e
desta com outras instituições sociais.
Para Kehl (2003, p. 164), existe um discurso institucional em nossa sociedade cujos
enunciadores seriam provenientes de várias vertentes, entre elas a pedagógica e a
psicológica. Esse discurso tem na imprensa o seu veículo divulgador privilegiado,
onde, a cada momento surgem entrevistas com profissionais das áreas “para
enfatizar a relação entre a dissolução da família tal como a conhecíamos até a
primeira metade do século XX e a delinqüência juvenil, a violência, as drogadições,
a desorientação dos jovens, etc.” Nessa perspectiva, teríamos também as questões
da falta de limite ou declínio das regras familiares indiretamente associadas nas
falas ao acidente escolar:
“Em relação aos pais, por exemplo, tem situações de crianças sem limite mesmo [...]
são meninos que têm uma liberdade em casa, e que chegam na escola e acham que
vão ter o mesmo tipo de liberdade [...].” (Entrevista 17)
Está colocada em questão a função e responsabilidade da escola e da família, suas
complementaridades, superposições e conflitos. Para Zagury (2002, p. 67), o limite
na escola se dá de maneira diferenciada do limite da família: “a escola faz um tipo de
trabalho e a família outro. Ambas se complementam [...]”.
Às vezes, nos relatos, aparece a necessidade de uma interação família-escola:
104
“Os meninos ficam muitos sozinhos hoje. É necessário que a família também, que a
escola também [...] Eu acho que não é só a família, né? A escola tem mania de achar
que tudo é a família, mas né não, né?” (Entrevista 15)
Cunha (2000) salienta que, independente da classe social, as famílias querem que a
escola assuma uma educação mais ampla, incluindo transmissão de valores morais,
princípios éticos e padrões de comportamento. Entretanto, para o autor, a idéia da
escola como segundo lar perdeu-se historicamente já que a escola foi incorporando
o saber científico, afastando-se e contrapondo-se aos valores domésticos
tradicionais, provocando conflito entre uma instituição e outra.
No discurso do grupo, a criança é também apresentada como tendo alguma
responsabilidade pelo acidente, acentuando a importância de um trabalho de
conscientização do aluno. Para algumas escolas, a criança é responsável e
simultaneamente se preocupam com a sua formação em relação ao acidente:
“[...] um menino que, insiste em brincar de gominha na sala e que acerta a gominha
no olho de um colega. Claro que ele é responsável por isso! Mas, a natureza da
responsabilidade que você tem que colocar sobre a criança, não pode ser a mesma
natureza que você tem que colocar sobre o adulto. É mais no sentido da formação da
criança e não no sentido da punição.” (Entrevista 4)
Não há, entretanto, homogeneidade discursiva, também, no que diz respeito à
responsabilidade da criança no acidente:
“[...] um menino que, insiste em brincar de gominha na sala e que acerta a gominha
no olho de um colega. Claro que ele é responsável por isso! [...].” (Entrevista 4)
105
“[...] A criança tem uma responsabilidade, mas que responsabilidade é essa, se ainda
não domina esse controle de corpo? [...].” (Entrevista 17)
Algumas escolas expressam a preocupação com a formação da criança para
autoproteção contra o acidente.
“[...] Então, eu acho que os acidentes também acontecem porque as crianças estão
muito super protegidas. Então, você não dá pra ela a possibilidade dela aprender a
lidar. Se a gente for buscar em Piaget, Piaget fala isto, né? De você tá em contato
com o objeto do conhecimento pra ser possível tu conhecer. Se você não der
nenhuma possibilidade pra que esta criança conheça, como que ela vai se defender
disto, né?” (Entrevista 11)
.
“Então, eu penso desta forma, eu acho que existe uma coisa que é prevenção, e
existe uma coisa que é super prevenção, né? A gente dizer, é... em casa ah... tem
que tirar as coisa da altura das crianças? -Não!” Será que a gente não tem que
educá-las pra que elas aprendam a conviver com as coisa, né? Assim... Um
pouco...E tenho três filhos e eles... Eles tem consciência das coisas, né? Eu nunca
tirei a faca do lugar da faca, né? Muito pelo contrário, sempre ensinei meus filhos
usarem a faca, né? O remédio no banheiro está no banheiro. A gente tem que
educar.” (Entrevista 11)
Oliveira (2004, p. 62) alerta para os riscos de interpretações distorcidas da teoria
piagetiana que levam à idéia de que a criança deve ser deixada completamente livre
para interagir com os estímulos do mundo físico com o objetivo de se desenvolver e
adquirir autonomia. Retomando o que já falamos antes, no item 1.3, voltamos a citar
a teoria de Vigotsky segundo a qual o único bom ensino é aquele que se adianta ao
desenvolvimento, ressaltando a importância da estimulação da criança para sua
106
autonomia, observando-se seu potencial de desenvolvimento e grau de maturidade,
mas com a presença de um adulto mediador.
Esses autores nos dão indicações da importância da mediação do educador tanto no
desenvolvimento da criança quanto na prevenção de acidentes. A fala seguinte
mostra que esta idéia também faz parte do universo de representações sociais da
escola sobre o acidente:
“[...] A criança é um... ser em crescimento , em potencial, quer dizer... Ela tá ali o tempo
todo é... se movimentando e não tem noção do perigo, o que eu acho mais, por exemplo:
quando o adulto já tem essa noção do perigo, a criança não tem. Então, na verdade, ela
faz as coisas porque ela tem que experimentar, né? Na verdade, ela só vai conhecer
depois que ela experimentar, por isto que ela arrisca tanto. Quer dizer, a gente diz que
ela arrisca, mas pra ela não é risco; pra ela é uma procura de concretizar algo que ela
viu, que ela olhou, que se interessou. Eu acho que cabe nós adultos é que estarmos
cercando, é ... Pra que isto não venha acontecer, a gente é... evitar de todas maneiras,
criar situações, criar ambientes, que não favoreçam a este tipo de acidente mais grave.”
(Entrevista 11)
Em alguns momentos, aparece uma iniciativa da escola de inclusão do aluno nas
medidas preventivas, visando conscientizar a criança dos riscos. Segundo Piaget
(2005), a criança na faixa etária de 6 a 10-11 anos já apresenta uma capacidade de
julgamento e introjeção de regras, portanto, ela poderia se adequar às medidas de
segurança na sua rotina escolar.
Como vimos anteriormente no item 1.3, o trabalho do educador teria, também, a
função de proteção, no sentido da proteção direta da criança em risco, como indireta
através da sua formação. Ele convive com a criança durante horas diariamente e
107
não apenas auxilia no desenvolvimento cognitivo da criança, como também tem um
importante papel na formação de suas atitudes e condutas com ela própria, com
seus colegas e com seu ambiente.
Percebe-se no discurso que os educadores muitas vezes não expressam a
consciência do prestar socorro à criança acidentada como parte de suas funções de
proteção à criança.
“[...] Eu não sou médica. Se eu fosse médica eu acho que aí eu ia falar com firmeza,
com segurança, né? [...] Eu acho que eu sou preparada para a minha profissão, né?
Mas pra essa situação assim, eu não diria que eu sou preparada. Eu acho que só um
profissional da área mesmo, né?” (Entrevista 3)
Os entrevistados relataram, algumas vezes, delegar o atendimento da criança para
um profissional da própria escola que poderia ser julgado mais competente para lidar
com o acidentado.
[...] machucou mais, ou um braço que tá quebrado, a gente leva primeiro para eles,
para eles darem uma olhada, os professores de educação física, e aí depois a gente
comunica com os pais [...].” (Entrevista 6)
Nos relatos, às vezes, a escola demonstra um não envolvimento no pós-acidente
delegando isso para a família a qual fica responsável pelas providências ao
atendimento a criança:
108
“[...] Porque se fosse um atendimento dentro da escola, aí eu acho que, vão falar, a
turma, nós é que devíamos estar preparados para isso. Mas, o atendimento não é
feito na escola. O atendimento, a gente só, vão falar, comunica com o pai que
aconteceu o ocorrido, e o pai é que leva e que toma providência.” (Entrevista 6)
Em relação à responsabilização direta da escola nos acidentes, observou-se
também um discurso heterogêneo, às vezes, mostrando conflitos de idéias. As
escolas assumem diferentes níveis de responsabilização.
“Não sei se cabe a palavra responsabilidade... Não é? Porque este tipo de acidente
que acontece conosco pode acon... Acontece com pai e mãe.” (Entrevista 15)
“Isso é até uma questão muito discutida, a responsabilidade civil. De quem é a
responsabilidade quando o aluno está a [...]? Nós acreditamos que enquanto, ele
está sob nossa guarda, a responsabilidade é nossa, a responsabilidade é nossa.
Porque, como é que o pai vai se responsabilizar por quem ele não está tomando
conta, não tá guardando?” (Entrevista 2)
Quando, nos relatos, a escola coloca, concomitantemente, a responsabilidade
dividida entre escola, professor e criança, corre-se o risco de haver diluição da
responsabilidade da mesma quanto à ocorrência de acidentes:
:
“Eu acho que é de todo mundo. Eu acho que eu não vou... atribuir nenhuma
responsabilidade... Acho que é da criança, acho que é da professora e acho que é da
escola. É, é do, é do conjunto. Eu num, num atribuiria, iria fazer nenhuma atribuição
única só não, porque a escola é um conjunto, a escola não é, não são segmentos
separados, a criança é responsável por ela e a gente trabalha pra isso, pra
desenvolver a autonomia. Mas o professor também é responsável, o coordenador
109
também é responsável, então a gente, eu acho que seria do conjunto da escola.”
(Entrevista 9)
Embora, como já citado, os determinantes de um acidente sejam múltiplos, essa não
definição clara de responsabilidades poderia ser, mais uma vez, reflexo do estágio
atual de definição social das funções da escola e da família relativas à proteção e
educação da criança, no sentido mais abrangente.
Há no discurso dos educadores uma distinção entre responsabilidade e culpa:
“[...] Não culpa nossa, mas responsabilidade. Eu acho que o menino, tá jogando bola
e quebrar o dedo... Isso não é culpa de ninguém, mas a responsabilidade é nossa.
Não sei nem se isso é considerado um acidente, é?” (Entrevista 11)
O conceito de culpa do ponto de vista jurídico, segundo Ferreira (1988, p. 190) é
definido como: “Violação ou inobservância duma regra de conduta, de que resulta
lesão do direito alheio. Estar implicado em delito ou falta. (Exemplo: ter culpa no
cartório).”
Já o conceito de responsabilidade na vertente jurídica, segundo o autor, refere-se à
“capacidade de entendimento éticojurídico e determinação volitiva adequada, que
constitui pressuposto penal necessário da punibilidade”. Ressaltando ainda que se
entende por responsável àquele que responde legal ou moralmente pela vida, pelo
bem-estar, etc. de alguém (FERREIRA, 1988, p. 567).
110
“Acidente é acidente. Eu não posso dizer, se é acidente eu não posso dizer que é
responsabilidade de alguém. Mas se alguém é responsável, eu acho que é a escola.”
(Entrevista 14)
“[...] Depende da, né? Da situação em que... Em que aconteceu o acidente, né? Acho
assim, que, por exemplo: uma distração, é... não existe aí um, né? Assim, um
culpado, né? Vamos dizer, um responsável, né? Numa brincadeira, às vezes a
criança tá brincando, correndo numa “queimada”, vira um dedo, né? A bola bate.
Então, isso aí, num... num existe assim, né? Um... um... um responsável.” (Entrevista
8)
Contudo, é impossível dissociar os conceitos de responsabilidade e culpa na
perspectiva psicológica e metapsicológica do indivíduo, na qual ambos têm sua
gênese. Na perspectiva psicanalítica, Winnicott (1980) afirma que tanto a culpa
quanto a responsabilidade são inerentes a todos os seres humanos. Esses
sentimentos irão adquirir no adulto uma conformação que depende da história e
cultura do grupo social mas também da singularidade de cada ser humano. Não
iremos, contudo, nos aprofundar nesses processos do campo da metapsicologia que
teriam como origem as relações intrapsíquicas conscientes ou inconscientes, pois
essa questão ultrapassa o objetivo da nossa pesquisa.
Entretanto, esses conflitos característicos da evolução da pessoa e de sua
socialização serão trabalhados, segundo esse autor, internamente pela pessoa, a
qual, em boas condições, nos estágios iniciais poderá desenvolver um senso de
segurança que terá como conseqüência a instauração de um autocontrole. Nesse
processo, seria comum, as crianças e os jovens, constantemente submeterem os
111
pais, a família, os professores e os amigos a testes que reforçam este senso de
segurança já introjetado.
As boas condições de cuidado com a criança permitiriam que a mesma
desenvolvesse a segurança do eu Eu sou. Isso precederia a possibilidade de
assumir Eu sinto Culpa! No desenvolvimento afetivo da criança, o controle dos
impulsos agressivos e da ansiedade geraria o sentimento de culpa. Esse controle
seria impulsionado pelo temor que a sua agressividade possa prejudicar a mãe,
levando a criança a se conter e originando os primórdios do sentimento de culpa: se
destruir o outro com sua agressividade será culpado. Citando Winnicott, Davis e
Wallbridge (1982, p. 89) afirmam que: “a ansiedade contida dessa forma altera-se
em sua qualidade e se transforma num sentimento de culpa.”
A responsabilidade como um valor social se originaria desse sentimento de culpa e
da possibilidade de se preocupar (pré-ocupar) com o outro.
Davis e Wallbridge (1982, p. 89) acrescentam, na perspectiva psicanalítica, que, de
acordo com Winnicott :
[...] o sentimento de culpa em relação aos impulsos-id se altera ainda
mais, e nós necessitamos de um termo mais positivo como
‘preocupação’. O bêbê agora está começando a ser capaz de se
preocupar, de aceitar a responsabilidade pelos seus próprios impulsos
instintivos e as funções que a eles correspondem.
Winnicott (1980, p. 46) ressalta ainda que:
112
O crescimento verdadeiro, pouco a pouco e no decorrer do tempo,
leva a criança ou o adolescente ao senso adulto de responsabilidade,
especialmente a responsabilidade pela provisão de condições seguras
para as crianças pequenas de uma nova geração.
Para Piaget, é no período operatório, por volta dos sete anos, que a criança é capaz
de aceitar regras a partir do ”jogo de regras” e torna-se capaz de se colocar no lugar
do outro, surgindo a reciprocidade. Há então uma moral de cooperação. Antes dessa
etapa, o autor acrescenta que a noção de moral e, portanto, de culpa da criança está
direta e completamente referenciada aos limites e regras estabelecidos pelo adulto:
Quando o adulto se irrita, porque as leis que edita não são
observadas, sua irritação é tida como “justa” devido ao respeito
unilateral do qual os grandes são objeto e do caráter sagrado da lei
editada (PIAGET, 1994, p. 179).
Nessa perspectiva, Piaget (1994, p. 250) ressalta que “[...] a criança aceita do adulto
um certo número de ordens às quais deve submeter-se, quaisquer que sejam as
circunstâncias.”
É um respeito unilateral, próprio à coação. A criança ainda não se sente
responsável. A Cooperação sucede, assim, segundo Piaget, à coação. A
responsabilidade passa a ser internalizada pela criança. Ao sentir-se responsável
por seus atos, a criança também assume o sentimento de culpa quando faz algo
errado.
A partir do momento em que percebe a reciprocidade e é capaz de cooperação para
o reconhecimento da responsabilidade por algum ato ou fato, o ser humano torna-se
113
ético, o que implica reconhecer sua parte e a de outrem diante desse ato ou fato, e
em se sentir culpado se algo é socialmente desaprovado.
As contradições, as pausas e interrupções das falas e a idéia que teriam de dar
respostas certas ao pesquisador sugerem que as escolas avaliadas lidam com a
culpa e a responsabilidade em todos os sentidos. No sentido jurídico, a culpa e
responsabilidade seriam uma resposta a uma “quebra de contrato” implícita na
expectativa dos pais que “contratam” seus serviços pedagógicos. No sentido
subjetivo, o fato dos educadores se colocarem como pessoas, leva-os a viver
ansiedades frente a possíveis culpas por ações ou omissões diante de pessoas
pelas quais se assumem como responsáveis, como uma exigência interna.
114
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
“O que chamamos começo é freqüentemente o fim
E chegar a um fim é chegar a um começo
O fim é de onde começamos.”
T. S. Eliot, 1980.
Este estudo apresenta como principal característica o fato de ter sido realizado em
escolas da rede de ensino privado, o que, sabidamente, atende uma classe social
específica, minoritária na nossa sociedade. Por outro lado, pensamos que o setor
privado, em função de disputa no mercado e melhores condições financeiras de
acesso à informação e a novas tecnologias, poderia mais facilmente nos revelar as
tendências à formação de novas representações sociais nesse campo de estudo.
Uma limitação é a ausência de uma triangulação de procedimentos de coleta de
dados. No entanto, foi feita uma triangulação de análise e discussão com o
orientador, com um profissional da área da psicanálise e com um profissional da
área de psicologia clínica infantil e psicomotricidade relacional.
Dentre as dificuldades encontradas, podemos citar a ausência de estudos similares
que nos dessem subsídios específicos para permitir uma melhor comparação.
Em relação aos nossos resultados, ressaltamos os dados apontados a seguir.
Observa-se nos relatos que ainda existe no conceito de acidente uma forte
concepção de fatalidade, contraditório com estudos das últimas décadas que
115
demonstram a previsibilidade do acidente. Contudo, em alguns relatos, pode-se
observar que essa nova concepção começa a ser instaurada em algumas escolas.
Portanto, essas duas concepções coexistem nos relatos dos educadores, apesar da
primeira aparecer na grande maioria das escolas entrevistadas.
Algumas falas mostram, entretanto, que o grupo já se preocupa em avaliar o porquê
e as condutas adequadas para diminuir os acidentes, demonstrando o início de uma
coerência com a evolução do conceito acidente vinculado a estudos
epidemiológicos.
Outro aspecto que chama atenção é o fato de que os educadores não se sentem
preparados para lidar com o acidente, embora tenham sido encontrados relatos de
que a experiência materna aliada à vivência educacional os tornariam aptos para
enfrentar situações causadas pelo acidente. Os educadores que declaram se
sentirem preparados em seus relatos referemse aos acidentes corriqueiros,
delegando para a família ou para o socorro médico os casos graves. Aliando esse
fato à heterogeneidade do discurso sobre atribuição de responsabilidade, explica-se
que o discurso do grupo mostre ambigüidades no que se refere ao treinamento dos
educadores para esse fim.
Considerando a percepção da responsabilidade sobre o acidente, observa-se uma
tendência da escola de assunção da responsabilidade, porém minimizada pela
crença de que o acidente é inevitável e pela implicação da família e da própria
criança em sua ocorrência. Essa responsabilidade é direcionada principalmente para
o ambiente físico da escola, demonstrando que existe uma preocupação em oferecer
116
uma boa infra-estrutura para as crianças. Adicionalmente observa-se em alguns
discursos que a responsabilidade do acidente é atribuída também à criança e à
família.
Com relação à responsabilização da criança, percebeu-se nos relatos duas posturas
diferentes, a primeira ligada à concepção de que o acidente é inerente à infância,
cabendo aos adultos protegê-la e a segunda que se preocupa com a formação e
conscientização da criança diante dos riscos de sua rotina escolar. Isso nos aponta a
questão ideológica das diversas posturas pedagógicas, as quais se dividem em
escolas tradicionais ou modernas e sua relação com a inclusão do aluno de forma
participativa ou não nos processos de aprendizagem, inclusive com relação à
detecção de condutas de risco e a prevenção com relação aos acidentes.
Nossa posição é contrária às interpretações distorcidas da teoria construtivista, que
considera que a criança deve experimentar e até errar em sua busca do
conhecimento, sem o cuidado protetor do adulto. Estamos de acordo com a teoria
piagetiana, mas consideramos que a busca intelectual da solução de problemas não
é incompatível com a prevenção de acidentes.
Nas falas, a culpa atribuída à família vai na direção da ausência dos pais devido às
questões profissionais que, segundo os entrevistados, têm como conseqüência a
ausência de colocação de limites nas crianças, que apesar de serem de uma
camada social alta, encontram-se carentes de apoio familiar.
117
Para finalizar, esta pesquisa suscita algumas discussões interessantes que devem
ser exploradas em estudos futuros:
?? Estudos que incluam o sistema público de ensino.
?? Estudos que explorem outras faixas etárias, sobretudo adolescentes.
?? Estudos que englobem a violência nas escolas, sobretudo na faixa dos
adolescentes.
Do nosso ponto de vista, a escola deve continuar evoluindo no sentido de tomar o
acidente como acontecimento passível de prevenção e no sentido de capacitação
dos educadores para procedimentos mais simples de cuidados aos acidentados,
mas também para suporte básico de vida que, em alguns países, já é extensivo a
qualquer cidadão.
A implantação de uma Política Pública de Saúde vinculada ao MEC, que estabeleça
a exigência de um treinamento sistemático e formação em estratégias preventivas,
poderá beneficiar as escolas e os alunos na prevenção dos acidentes.
118
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125
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO DA ESCOLA PARA PARTICIPAÇÃO EM PESQUISA
Prezado(a) Diretor(a),
A Escola sob sua direção está sendo convidada a participar da pesquisa A percepção dos acidentes
escolares pelos educadores em escola de 1ª a 4ª série do ensino fundamental, Belo Horizonte realizada com o
apoio da Universidade Federal de Minas Gerais.
O objetivo desta pesquisa é estudar os acidentes ocorridos na escola e a opinião dos educadores
sobre os mesmos. Para a coleta dos dados, serão realizadas entrevistas pela pesquisadora com os
educadores. As entrevistas serão gravadas de modo a facilitar a análise. O material produzido
ficará sob a guarda da pesquisadora, não sendo utilizado para nenhum outro fim. Ao termino da
pesquisa, todo o material será inutilizado.
Solicito, portanto, o seu consentimento para a participação desta escola nesta pesquisa.
Os resultados da pesquisa serão usados apenas para fins científicos e serão publicados na forma
de relatórios e artigos em revistas especializadas, sem nenhuma identificação pessoal ou do
estabelecimento de ensino. Estes resultados também serão usados para propor medidas
preventivas nas escolas.
Se o Sr(a) estiver suficientemente esclarecido(a) e concorda com a participação desta escola, favor
assinar as duas vias deste termo de consentimento, sendo que uma das vias ficará com Sr(a).
Eu __________________________________________________________________, da
Escola
___________________________________________________________________________
______, cargo _____________________________________, informo que fui suficientemente
esclarecido sobre a investigação científica e concordo com a participação desta escola neste
estudo.
Belo Horizonte, ________ de ____________________________ de ___________
____________________________________
Assinatura do Diretor ou representante
_______________________________
Assinatura da pesquisadora
_____________________________________________________________________________________
Telefone da pesquisadora responsável Soraia Pinto Sena: (31) 3287-0080
Telefone da orientadora responsável, Janete Ricas: (31) 3248-9636 / 9637
Órgão da Universidade Federal de Minas Gerais (Comitê de Ética em Pesquisas) que autoriza e fiscaliza a realização de
pesquisas: (31) 3248-9364
126
TERMO DE CONSENTIMENTO PARA PARTICIPAÇÃO EM PESQUISA
Prezado(a) educador(a),
O Sr(a) está sendo convidado a participar da pesquisa A percepção dos acidentes escolares pelos educadores em escola
de 1ª a 4ª série do ensino fundamental, Belo Horizonte realizada com o apoio da Universidade Federal de Minas
Gerais.
O objetivo desta pesquisa é estudar os acidentes ocorridos na escola e a opinião dos educadores. Para
coleta dos dados, será realizada uma entrevista, com um roteiro, contendo algumas questões, a fim de
investigar aspectos relacionados com a percepção dos acidentes escolares pelos educadores, elaborado pela
pesquisadora baseado na experiência profissional e nos conhecimentos da literatura.
Solicito, portanto, o seu consentimento para a participação nesta pesquisa.
As entrevistas serão gravadas de modo a facilitar a análise.O material produzido ficará sob a guarda da
pesquisadora, não sendo utilizado para nenhum outro fim. Ao término da pesquisa, todo o material será
inutilizado.
O Sr(a). poderá se recusar a responder ou interromper a entrevista a qualquer momento sem nenhum
prejuízo pessoal ou profissional. Além disso, há a garantia de manter em sigilo todos os dados coletados.
Deve ficar claro que a participação será voluntária e não ocasionará nenhum benefício financeiro ou
despesa para o entrevistado.
Os resultados desta pesquisa serão usados apenas para fins científicos e serão publicados na forma de
relatórios e artigos em revistas especializadas, sem nenhuma identificação pessoal ou do estabelecimento
de ensino. Estes resultados também serão usados para propor medidas preventivas nas escolas.
Se Sr(a) estiver suficientemente esclarecido(a) e concordar com a utilização destas informações para
estudo científico, favor assinar as duas vias deste termo de consentimento, sendo que uma das vias ficará
em seu poder.
Eu __________________________________________________________________, da Escola
_________________________________________________________________________________,
cargo _____________________________________, informo que fui suficientemente esclarecido sobre
a investigação científica e concordo com a participação desta escola neste estudo.
Belo Horizonte, ________ de ____________________________ de __________
____________________________________
Assinatura do Diretor ou representante
_______________________________
Assinatura da pesquisadora
_____________________________________________________________________________
Telefone da pesquisadora responsável Soraia Pinto Sena: (31) 3287-0080
Telefone da orientadora responsável, Janete Ricas: (31) 3248-9636 / 9637
Órgão da Universidade Federal de Minas Gerais (Comitê de Ética em Pesquisas) que autoriza e fiscaliza a
realização de pesquisas: (31) 3248-9364
127
APÊNDICE B
ROTEIRO DA ENTREVISTA
1 Você, durante a sua vida profissional de educador, já vivenciou algum acidente
com aluno nesta ou em outra escola? Como foi para você?
2 Na sua opinião, por que os acidentes acontecem?
3 Você já teve algum treinamento sobre prevenção de acidentes ou como lidar
com uma criança acidentada?
4 Você se sente preparado (a) para lidar com esta situação?
5 Você acha que alguma coisa pode ser feita para que o acidente na escola seja
evitado?
6 Quando acontece um acidente, de quem você acha que é a maior
responsabilidade?
128
APÊNDICE C
CATEGORIAS ENCONTRADAS NO FORMATO DSC
Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) das categorias :A,B,C,D,E,F,G,H da
pergunta 2:
DSC 2A Acidentes como fatalidade/acaso
“Acredito que seja a questão do acaso mesmo, assim, da possibilidade de um episódio infeliz, por
mais que você queira evitá-los, eles ocorrem. E não é por falta de atenção, por falta de cuidado ou
por falta de alguém estar olhando. Não tem isso, não. Eu acho que é fatalidade.
O que a gente vê mais comum são acidentes que acontecem aqui, que acontecem em casa, que
acontecem em qualquer lugar. O menino passou, por exemplo, e o coleguinha foi e empurrou por
querer ou sem querer, e ele bateu a cabeça e deu um galo. Isso acontece.
Outro dia eu tava lendo uma reportagem no jornal: a criança mais vigiada, ela tem probabilidade de
menos acidentes. É lógico, se eu tô ali 24 horas te vigiando é lógico que as coisas podem não
acontecer. Mas você tá ás vezes com a criança do seu lado, você virou pra cá, acontece alguma
coisa. Então, eu acho, assim, que não tem explicação pra isso, não, como diz: é fatalidade mesmo,
porque tinha que acontecer, são coisas inevitáveis.” (Entrevistas:10,14,1,4)
DSC 2B Acidentes como conseqüência das atividades próprias da infância
“Eu acho que os acidentes acontecem na escola como acontecem em qualquer lugar, porque os
meninos são crianças, são agitados, gostam de fazer arte, gostam de subir em determinados lugares
que não deveriam. Andam sempre correndo. Então eu acho que isso acontece...é eu acho que é mais
por agitação dos meninos na hora de recreio, numa aula de educação física, em que eles estão em
uma atividade física como chutar a bola e bater no rosto do outro. Isso acontece mesmo. É corte no
queixo, supercílio, porque as crianças estão correndo muito, normalmente, quando estão no recreio.
Então o acidente acontece, ás vezes dentro de uma brincadeira ou por uma distração, ou mesmo, por
129
um mal entendido entre um colega e outro. Menino machuca mesmo, menino não presta muita
atenção, eles são muito impulsivos, saem correndo e vão subindo aonde der vontade, dai eles se
machucam.O acidente acontece dentro deste quadro. Apesar da escola ter toda uma segurança, ter
sido vistoriada até pelo Corpo de Bombeiros, estar dentro dos padrões: escada com corrimão, todo
aquele controle que tem que seguir na própria idade das crianças.
Então, o acidente eventualmente acontece...na hora de recreação mesmo ou na própria educação
física; e é esperado que isso aconteça porque eles acham a escola, um lugar, um momento que eles
têm, principalmente na hora de recreio e tal, que eles têm que extravasar mesmo, correr, brincar. É
próprio da idade, né? Criança é assim!” (Entrevistas:1,2,5,6,,9,10,13)
DSC 2C Acidentes como conseqüência da condição de desenvolvimento
físico e/ou mental da criança
“A criança é muito descomprometida, ela não tem o medo de perigo. Então, de repente ela enfrenta
situações, que normalmente, o adulto poderia não enfrentar. Às vezes uma distração, ou mesmo uma
curiosidade com alguma coisa, vai mexer com um negócio e machuca. Eu já presenciei em outra
escola que eu trabalhei, uma criança cortar a pontinha do dedo com a tesoura. A tesoura era nova,
ele tava deslumbrado com a tesourinha, a pontinha. Claro que não decepou, mas chegou a ferir
porque quis mostrar para o colega como que a tesoura cortava bem, como que o corte tava afiado.
A criança não tem muito juízo, é aventureira, por mais que a gente olhe o local, que prepare, pense
as vezes que isto não é bom para eles e tal, acontece, né? O menino sobe em lugares, na hora que
você olha, às vezes tem duas três pessoas dentro de sala e acontece ás vezes, né?
Crianças são pessoas em fase de desenvolvimento, em fase de construção de um esquema corporal,
de percepção temporal e espacial deste corpo atuando no espaço e no tempo. Então, muitas vezes
existe um erro de cálculo, na questão de motricidade fina, na questão de motricidade grossa, que
expõe essas crianças a situações as mais diversas possíveis.
Com relação a experimentação, a maturação do sistema nervoso central, do cerebelo, aquela
questão de noção de profundidade, então a criança tá correndo, muitas vezes ela não calcula, às
vezes o menino diz: "eu não queria machucar ele assim".
Eu entendo que isso faz parte do processo de aprendizagem da questão do corpo, da questão de
tônus muscular, essas questões todas. Vejo muito nos meninos o uso da força, o controle motor,
130
alguma questão de equilíbrio, que eu vejo assim: num jogo de futebol tem aqueles que tem pouca
habilidade, que ainda tão com esse movimento super descontrolado.
Eu acho então que onde tem criança o acidente acontece em razão até da própria vitalidade da
criança que é um ser em crescimento, em potencial. Ela faz as coisas porque ela tem que
experimentar. Na verdade, ela só vai conhecer depois que ela experimentar, por isto que ela arrisca
tanto. A gente diz que ela arrisca, mas pra ela não é risco; pra ela é uma procura de concretizar algo
que ela viu, que ela olhou, que se interessou.” (Entrevistas: 3,7, 12, 17,4,14,18)
DSC 2D Acidentes como conseqüência do descaso ou negligência
“Alguém que seria o tutor dessa criança, o mantenedor da ordem, que está cuidando dessa criança
foi relapso em determinado ponto e expôs a criança a um perigo desnecessário, deixando álcool em
uma altura acessível, ou produto químico ou mesmo o descaso como por exemplo, aquela coisa de
cabo de panela do lado de fora do fogão.
Pode acontecer também da professora não estar atenta na hora do recreio, ela tá conversando ou
brincando com uma turma e fica desatenta a um grupinho, e esses meninos ou sobem num lugar que
não devem ou começam a correr demais e eles acabam machucando. Professor, ás vezes, deixa um
aluno no espaço sozinho e não tem como socorrer a tempo. Também acontecem acidentes por
funcionários não estarem supervisionando as crianças suficientemente para evitar que elas façam o
que não deveriam. Então, essas coisas acontecem por causa disto.
Todas estas coisas a gente discute, mas um erro onde tem um ser humano, o erro é fatal. Então a
gente tem que ficar meio que obsessivo, trabalhando nesta direção”.
(Entrevistas: 4,9,13,16)
DSC 2E Acidentes como conseqüência do ambiente físico inadequado para a
criança
“Tem situações que o ambiente não era adequado pra criança e então o acidente pode acontecer por
algum problema físico do ambiente ou por ter objetos que favoreçam isto dentro do ambiente de sala
de aula. Uma vez o extintor de incêndio caiu no pé do menino, o parafuso tava um pouco solto, o
menino passou, esbarrou, o parafuso caiu. Outro dia um menino se cortou porque um vaso lascou
131
uma pontinha, o menino escorregou, caiu e se cortou nessa lasquinha. Eventualmente um arame
soltou uma ponta, alguma coisa, então, aí também acontece.
Até aqui na escola, a gente tem poucos acidentes, nesse sentido, mas eventualmente acontece,
porque é um lugar grande. A escola procura cada vez mais fazer a manutenção do ambiente.”
Cabe nós adultos tarmos cercando, pra que isto não venha acontecer, a gente evitar de todas
maneiras, criar situações, criar ambientes, que não favoreçam a este tipo de acidente mais grave.
(Entrevistas: 16,3,9)
DSC 2F Acidentes como conseqüência dos hábitos da vida moderna
“Eu acho que hoje acontece por vários motivos. Um, é a falta de espaço. As crianças da capital ficam
muito afoitas com a liberdade por serem crianças de apartamento. Elas ficam muito deslumbradas
com espaço físico, então não têm muito controle sobre isso, e elas querem brincar muito, querem
subir, querem ousar nessas brincadeiras e, ao ousar, não têm um limite do perigo.
É o mau hábito que eu acho que tem desde de cedo: a correria, a pressa. A vida hoje, os meninos
parecem que já nascem apressados. Querem correr, tudo é corrido, até a linguagem. Hoje com a
linguagem da Internet, eles são apressados pra escrever.
Hoje, menino não sabe ler, não sabe escrever, porque ele não para pra pensar, não para pra
raciocinar. A criançada nossa hoje tem um leque grande aí do mundo. A impressão que eu tenho, é
que elas querem ver tudo de uma vez, fazer tudo de uma vez.
Não é nenhuma crítica a elas.É que eu acho que o mundo oferece coisas demais pra nossa
meninada. Então, isto é uma questão de hábito. Elas entram correndo na escola, saem correndo.
Uma outra coisa também que eu percebo é que as pessoas hoje andam correndo na rua , saem
correndo, é pela própria questão social.
Outra coisa, os meninos ficam muitos sozinhos hoje. É a sociedade, o contexto social. Hoje o pai e
mãe precisam trabalhar fora. Então eu vejo assim que algumas crianças, elas são terceirizadas. Os
pais delegam para um outro muitas funções: as vezes em reunião de pais na escola , ou quando
acontece alguma coisa, briga e a gente chama, sabe, é o motorista que vem. Mas a questão de
trabalhar fora pai e mãe hoje é a realidade, não é nenhum hobby...”
(Entrevistas: 15,17)
132
DSC 2G Acidentes como conseqüência da superproteção
“Eu acho que os acidentes também acontecem porque as crianças estão muito super protegidas O
tempo todo tem que estar cada vez aumentando mais os cuidados e cada vez menos oferecendo pro
menino a possibilidade dele ser responsável pela atitude dele. Cada vez mais se coloca situações
pra que não ocorra nada. Assim, a meu ver, acho que é super importante a criança brincar no pátio,
subir na árvore, correr. Eu penso desta forma, que existe uma coisa que é prevenção e existe uma
coisa que é super prevenção, né? A gente dizer, em casa tem que tirar as coisa da altura das
crianças? -Não!" Será que a gente não tem que educá-las pra que elas aprendam a conviver com as
coisa? A gente tem que educar, mas cada vez menos a família e a própria escola faz isso. Portanto,
eu acho que hoje os acidentes acontecem porque a gente está num processo de super proteção.”
(Entrevista:11)
DSC 2H Acidentes determinados por multicausalidade
“Eu acho que tem três vertentes de explicação do porque os acidentes ocorram: uma, o descaso;
outra coisa é que as crianças são pessoas em fase de desenvolvimento, em fase de construção de
um esquema corporal e uma terceira vertente, que eu acredito que seja a questão do acaso mesmo,
assim, da possibilidade, de um episódio infeliz. Então, eu vejo que são várias causas. Não vou falar
que é só culpa do menino, nem só culpa da escola, nem só do professor, mas é um conjunto.”
(Entrevistas: 4,9)
Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) das categorias :A,B,C da pergunta 3:
DSC 3A: Tiveram treinamento em primeiros socorros
“Nós temos funcionários aqui que fizeram. Um cursinho de primeiros socorros, mas assim, mais
básicos mesmo pra atender a esses casos mais simples mesmo. Aqui na escola, uma vez por ano
vem o médico e faz (um treinamento), a gente tem umas três horas mais ou menos de conversa com
ele, pra esclarecimento de dúvidas. Por exemplo: um braço que quebrou, o que é ideal de fazer, nas
juntas, quebra o osso, como é que faz? A gente tem que botar uma tábua grande por baixo, pra levar
pro hospital.
133
Também que tipo de medicamento que pode colocar nos machucados, essas coisas a gente tem sim.
No caso de queda, em caso de bater cabeça, quais seriam as providências mais claras, em caso de
corte, em caso da criança engolir alguma coisa, algum objeto. Aí nós temos as noções básicas e
também um material, uma apostila que esta sempre à mão, quando a gente pode dá uma olhada
rápida.
Depois um professor de educação física aqui da escola, ele deu pra gente também essas
orientações, pra nos orientar assim nos primeiros socorros inclusive, modéstia à parte, eu acho que
eu faço um atendimento bacana, eu tenho muita tranqüilidade para agir nessa hora, de tranqüilizar as
crianças, as famílias, eu consigo assim conduzir, já fui até bem elogiada em hospitais pela conduta
que eu tive.”
(Entrevistas: 2,3,5,8,9,10,11,13,14,15,17)
DSC 3B: NÃO TEVE TREINAMENTO
“Não treinamento assim, se for uma coisa mais séria, aí realmente vai me pegar de surpresa, né?...
Eu acho assim que muita coisa que a gente faz por intuição, ou por leitura, ou até mesmo porque eu
sou mãe, tá? De cuidados que a gente tem com o filho da gente, né? Que o pediatra já passou, então
eu vejo que isso interfere no meu dia a dia. No modo de como que eu vou proceder.
Pela própria vida familiar a gente tem bom senso pra tá atendendo essas crianças...
É a experiência mesmo, um pouco de manha, um pouco de muitos anos lidando com criança, né?
Eu acho que a maior escola que a gente tem é a experiência do dia a dia mesmo e ser mãe. Porque
eu acho que a minha visão mudou muito depois que a gente é mãe. Porque, a gente passa assim,
uns apertos com as crianças que, se a gente já tiver uma experiência em casa, alguma coisa fica
muito mais fácil.
Quanto à prevenção eu não recebi nenhum treino formal em como prevenir um acidente. Eu
simplesmente comecei a perceber como os acidentes acontecem e prevenir as crianças de se
comportarem numa maneira que poderia causar acidentes. Eu tento melhorar as coisas que
faço....Não, mas a direção tava tentando fazer contato com o pessoal da Cruz Vermelha, pra ver a
possibilidade. A gente tava pensando, já vem algum tempo pensando nisso, é uma reivindicação dos
funcionários.É, aqui na escola a gente até tá tentando fazer isso, além de treinamento propriamente
dito. E agora eu recebi até uma proposta bem interessante dum grupo de biologia que trabalha
134
justamente isto, que vem dar palestra pra funcionários e professores gratuitamente sobre estes
temas, então, eu até tenho interesse em chamá-los. Acho que faz mesmo falta, a gente ter pelo
menos uma vez por ano uma pessoa que venha no início do ano pra falar pra toda equipe. Porque
não só a supervisora tem que ter o conhecimento, mais o professor, o auxiliar de limpeza que às
vezes é o que vai socorrer o menino imediatamente.”(Entrevistas: 1,3,4,5,7,11,14,16)
DSC 3C: PALESTRAS E ORIENTAÇÕES EVENTUAIS
“Há muito tempo atrás já tivemos sim, sabe, mas recentemente não tivemos não. Eu já tive um
treinamento no geral, não especificamente com criança. Nós já tivemos a visita de bombeiros, então
dá toda aquela noção.
Tivemos há muitos anos atrás um profissional da área da medicina que veio aqui pra falar dos
primeiros socorros. Mas, não tem uma freqüência grande na escola, não.
O treinamento que tive foi alguma coisa que muito superficial, nada que tenha me ajudado, que eu
tenha realmente tomado isso como referência p’rum trabalho mais a nível informativo do que prático
que pudesse ser efetivo em termos de prevenir determinadas coisas:foi informação e na hora que a
coisa acontece mesmo aí a gente enlouquece mesmo....” (Entrevistas: 1,12,16,17)
Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) das categorias :A,B,C,D,E, da pergunta 4:
DSC 4A SENTE-SE TRANQÜILO, PREPARADO
“Eu me sinto sim, me acho tranqüila. Acho que passo uma tranqüilidade para os pais. Eu acho que o
mais importante é você estar calma, pra manter a cabeça fria e ver o que tem que fazer. Até hoje,
com o tipo de acidente que eu tive aqui nunca me pegou de surpresa: "-Nossa, o que que eu faço!?!
Mesmo sendo assim, acidentes simples, um tombo nós somos comunicadas. E assim, eu sou bem
tranqüila, pra estar atendendo esses meninos, junto com a pessoa responsável.
A gente tem um compromisso com o aluno e compromisso com as famílias. Porque se eles entregam,
confiam os filhos à escola, então a gente tem que fazer por onde também, né?
Preparada, eu acho que a gente nunca se sente plenamente, mas eu me sinto tranqüila, com o
mínimo de conhecimentos necessários pra poder atender duma forma correta; quando eu chego com
135
os meninos no pronto-socorro o médico que atende ele elogia o procedimento da escola.
Normalmente no pronto-socorro, eles elogiam a conduta da escola.
No acidente, às vezes vem uma força que eu não sei de onde, se você parar pra imaginar, será que
eu faria tudo de novo? Provavelmente. Porque a adrenalina da gente na hora tomou uma proporção
diferente, que eu não sei de onde que vem não,sabe? É realmente é assim: no momento você tem
que tomar uma atitude, cê acaba fazendo.
Engraçado eu me acho como pessoa, eu não gosto de ver sofrimento, eu jamais seria uma médica,
mas eu já me coloquei assim muito em xeque-mate neste sentido, que eu tenho uma tranqüilidade
para resolver e para tomar assim providencias, com tanta tranqüilidade , com tanta precisão, que eu
me estranho e eu falo assim: gente será que sou eu mesmo, que estou dando conta disso?”
(Entrevistas: 1,2,8,9,14,18,17,4,15)
DSC 4B: SENTE-SE PARCIALMENTE PREPARADA, PARA COISAS MAIS
SIMPLES
“Sim, com situações mais simples. Com situações mais simples, sim Tem muitos anos que eu
trabalho em escola com criança. Então, graças a Deus, nunca aconteceu nada de mais grave. Mas
nesses cortes ou quebrar alguma coisa, a gente se sente preparada: mas sempre a primeira
providência imediata é socorrer a criança e ligar pros pais
Arranhou, machucou, ás vezes, essas coisas mais simples não tem problema nenhum, a gente
resolve e tudo. Mas se, Deus que me perdoe, se um dia acontecer uma coisa mais séria eu não me
sinto preparada, não.
Então eu me sinto mais ou menos preparada, dependendo do caso, não é? Graças a Deus, São
Francisco (risos) nos protege. Mas dizer que eu estou totalmente preparada, eu vou mentir pro cê,
né? Eu não tô, não. Preparada, eu acho que a gente nunca se sente plenamente.”
(Entrevistas: 10,11,15,9)
DSC 4C: NÃO SE SENTE PREPARADA OU QUALIFICADA
“De jeito nenhum. Primeira área descartado na minha vida profissional foi: não faço nada ligado a
biologia, eu não dou conta de ver sangue, tenho pânico.
136
Eu acho que a gente não sente preparado não. Eu não sou médica. Se eu fosse médica eu acho que
aí eu ia falar com firmeza, com segurança dizer que eu sou preparada, não. Eu acho que eu sou
preparada para a minha profissão.Mas pra essa situação assim, eu não diria que eu sou preparada.
Eu acho que só um profissional da área mesmo.
Em termos de qualificação eu prefiro usar a regra máxima que é a questão da prudência assim: "o
que eu não sei eu não mexo”4,14,6 e se você mexer na pessoa antes de imobilizar isso pode dar um
dano irreversível, por exemplo: amassar a medula, a gente tem que aguardar o resgate.Eu acho que
em termos de formação e preparo eu não me considero suficientemente preparada Em se tratando de
acidente e vida de uma criança eu nunca falaria com você que eu estou preparada, não. Porque a
gente na verdade tá com um ser humano ali uma criança da responsabilidade da gente.”
(Entrevistas: 17,3, 4,14,16)
DSC 4D: SENTE-SE INSEGURA
“Se for uma coisa mais grave, realmente o que eu vou fazer, é na hora, ligar pros pais, mesmo:
aconteceu isso, o que a gente faz? Que providência que toma? Se leva pra um hospital.. Mas, graças
a Deus, igual eu te falei, ainda não aconteceu nada assim que fosse mais sério, sabe, geralmente a
gente comunica pra família, na mesma hora.”
(Entrevista: 7)
DSC 4E: NÃO PRECISA ESTAR PREPARADA PORQUE O ATENDIMENTO NÃO
É FEITO NA ESCOLA
“Não temos que ter esse atendimento aqui dentro da escola. Porque se fosse um atendimento dentro
da escola nós é que devíamos estar preparados para isso: a gente só comunica com o pai que
aconteceu o ocorrido, e o pai é que leva e que toma providência.Mas e se o pai virar pra nós e falar
assim: " ah, leva pra tal hospital assim, assim que eu já tô indo!" tudo bem, a escola leva.
O quê que a gente tem na escola que é uma coisa boa: acontece um acidente o primeiro momento é
ligar pra família. Não achando a família, imediatamente a gente leva pro hospital mais próximo e a
escola tem um convênio. Os meninos têm um convênio que fazem no ato da matrícula, esse
convênio, é pra todos os alunos, tá? Seguro escolar, e aí se não acha a família e se for uma coisa
137
assim gravíssima, imediatamente a gente leva pro primeiro hospital, pro mais próximo e aciona a
família.”
(Entrevistas: 6,15,5)
Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) das categorias :A,B,C,D,E, da pergunta 5:
DSC 5A: VIGILÂNCIA DA CRIANÇA
“Então assim, eu penso que a escola tem é de ter um olhar cuidadoso, de ter sempre adultos por
perto, de estar atentos, de vigiar. A escola tem esse olhar.
A gente tem que estar sempre por perto, olhando para quando começa uma briga ou uma alguma
confusão, porque a criança é muito rápida, são detalhes que a gente tem que ter muita atenção.
Uma segunda coisa é a disciplina. A escola tem um pessoal que fica lá em baixo observando o
recreio, resolvendo algum conflito, olhando se a brincadeira está perigosa, se a brincadeira tá
inadequada. Então, isso tem que ter também. Já tem pontos estratégicos onde os disciplinários ficam,
pra fazer a intervenção na hora em que eles não dão conta, às vezes na hora de uma briga, né? Que
um às vezes pode empurrar e machucar o outro. Qualquer confusão que dá, qualquer coisa, eles são
encaminhados pra gente. Os disciplinários trazem na nossa sala, pra gente ajudar a resolver porque
criança nem sabe exatamente a noção do perigo.
Aqui na escola, criança não fica sozinha em momento algum. A vigilância é constante. Quando a aula
termina, ele vai ter alguém para cuidar dele, ele não fica esperando o pai, e aí vai na cantina, vai na
biblioteca. Então, ele (o aluno) vai estar sempre sendo monitorado. Isso facilita muito, isso diminui
muito a incidência de acidente. Isso aí é imprescindível. Não largar o menino solto, de jeito nenhum!
Nem na sala, nem no pátio. O menino tem que ter adulto por perto, supervisionando. Claro que aqui
ninguém vai botar ninguém numa redoma não, mas o menino não pode ficar solto no pátio não, tem
que ter um professor, alguém, pra poder ficar de olho ali, pra até na hora, mesmo se machucar, pra
prestar um socorro necessário.Porque se deixar, o papel do menino é ousar, ele vai subir em algum
lugar, vai querer correr. Enfim, a atitude da criança é essa.”
(Entrevistas: 8,1,3,10,6,18,2,9,6,2)
138
Subcategoria:
DSC 5A1: RECREIO SUPERVISIONADO
“As pessoas tomam conta na hora do recreio, então é aquele cuidado, tá atento. No recreio,
ficam duas professoras, ficam o disciplinário, um disciplinário num espaço o outro na quadra.
Então, a todo o momento aquilo ali tem uma vigilância mesmo, se houver uma brincadeira
que está extrapolando, que a gente pensa que vai acontecer uma coisa mais séria, fazer uma
intervenção ali para dar uma orientada. Por isso, que as professoras andam no recreio lá fora
com os meninos, aqui na escola, as professoras é que descem e ficam com os meninos...
Elas fazem o lanche na sala junto com os meninos e descem no recreio. É o horário de
trabalho delas.”
(Entrevistas:7,5,9)
Subcategoria:
DSC 5A2: RECREIO MONITORADO
“Nós temos uma maior quantidade de acidentes na escola na hora do recreio. Eu acho que
muitos fatores ajudam e um deles é aglomeramento grande demais no recreio, porque é
menino demais num ambiente que não comporta tanto menino.
Nós temos o cuidado de não fazer recreio com todo mundo junto, porque aí perde o controle.
Também, nós resolvemos colocar na hora do recreio filmes não violentos, a gente tá tentando
criar neles essa política para ficar mais calmos, assistir um filme, um documentário; dançar
uma música que eles podem dançar, mas não essas músicas que despertam na criança
desde cedo a sexualidade. Essa obrigação a escola tem, não é porque tá na mídia, tá na
moda e a escola vai repetir; jogos interessantes, tem o dia do brinquedo, no qual, eles podem
trazer um brinquedo, uma vez por semana. Com isto a escola tá incentivando um recreio
dirigido com os professores de educação física, de educação artística para desenvolver na
criança habilidades de desenho e de pintura. A escola tem feito isso este ano, é uma
experiência nova pra nós. O recreio é monitorado pela própria professora, tem atividade que é
proposta pro aluno, ele não vai ficar somente correndo na escola.
Também tem o recreio na quadra, uma turma está jogando futebol, uma turma jogando
queimada, uma pulando corda, mas tá todo mundo sendo monitorado.”
(Entrevistas:1,15,2)
139
DSC 5B: TREINAMENTO DOS EDUCADORES
“Nós também deveríamos treinar os funcionários. Treinamento não só o que diz respeito aos
primeiros socorros, mas também, um curso que trabalhe essa questão da prevenção, que possa
orientar melhor com relação a índices de acidentes ou procedimentos pra evitá-los. Uma outra
medida, eu acho, é essa coisa da conscientização do próprio profissional para ter um certo
procedimento padrão, um certo cuidado pra lidar com determinadas coisas, por exemplo, se as
crianças tão trabalhando numa mesa de artes, onde tem um banco, e há possibilidade deste banco
virar, da criança virar. Essa professora tem que fazer um controle desta atividade no que diz respeito
assim, à postura da criança.
Também, ter um plano de emergência no caso de acidentes acontecerem. Temos um plano de
evacuação de emergência, e eu acho que sempre temos que ver o que pode ser feito a mais.
Conscientização do professor pra poder ficar muito atento às crianças. Enfim, preparar essas pessoas
que vão trabalhar com crianças.”
(Entrevistas: 13,3,4,,5,9)
DSC 5C: AMBIENTE FÍSICO SEGURO
“Eu acho que a escola por ser um espaço coletivo tem que ser adaptado para receber criança.pra não
acontecer os acidentes.Eu acho que todo lugar que a criança vai, tem que ser um ambiente
cuidadoso. O espaço físico é muito importante e às vezes algumas escolas que a gente vai tem um
pátio muito interessante mas aí, você começa observar alguns detalhes e acha que não é apropriado
pra criança. Assim, eu acredito que tenha situações que são perfeitamente preveníveis e possíveis de
tomar medidas para que não aconteçam.
Então a gente tem este tipo de cuidado: o piso que eu tenho em volta do playground é um piso de
EVA, que na época nós ficamos entre grama sintética e qualquer outro tipo de piso, e foi esclarecido
pra nós por uma pediatra que a grama sintética queima quando a criança escorrega e ela raspa no
chão.
Os materiais que são usados no ambiente, inúmeras providências podem ser tomadas. Por exemplo,
banco com ponta com as quinas arredondadas, piso antiderrapante. Aqui na escada da escola nós
temos aquela tira de lixa pra evitar que derrape nos degraus da escada. A piscina ela é fechada,
colocar antiderrapante nas escadas, se choveu enxugou o chão, né? Nós temos esse cuidado, não
140
existe por exemplo: fios desencapados, não existe produto químico á vista. Nós temos um laboratório
muito bacana aqui, mais os produtos que são usados eles são guardados em cima e fechados, as
crianças não tem acesso. A gente tem que programar um ambiente pra onde as crianças vão ficar,
que não tenha tanto obstáculos externos, assim, remodelar o playground, por exemplo, se os
equipamentos não estão em boas condições.
Tem visitas de pessoas especializadas, de médicos da área de prevenção, medicina de segurança.
Essas pessoas dão ótimas dicas pra gente também. Eles vêm na escola e têm um olhar diferente do
que a gente têm. Às vezes tem um toco fora de lugar, alguma coisa que eles ajudam.
A escola tem que pensar em termos de não poder ter nenhum brinquedo mais perigoso e isso a gente
tá sempre atento; se não têm nenhum tipo de farpa; brinquedo que estragou tem que ser
imediatamente consertado. Não deixar a criança ir pro fogão, não usar objetos cortantes, todos os
brinquedos aqui são de plástico de formas arredondadas. A questão da ergonomia também, dos
materiais que são usados no ambiente, onde que ela tá. Por exemplo, banco com ponta, por
exemplo, o caso da minha filha, poderia ter sido evitado, o banco com as quinas arredondadas, talvez
o acidente fosse de menor natureza... sei lá... piso antiderrapante.
Então, isso tudo são pequenos e grandes cuidados que você faz para que as coisas sejam
planejadas de uma maneira segura.Assim, os acidentes podem ser definitivamente prevenidos.”
(Entrevistas: 18,3,11,4,18,12,9,10,16,13)
DSC 5D: EDUCAÇÃO DA CRIANÇA: CONSCIENTIZAÇÃO E ORIENTAÇÃO DA
CRIANÇA
“Educação, eu parto deste princípio, eu acho que o grande ponto pra qualquer coisa dentro da escola
ou dentro da relação de um grupo de pessoas é educação.
Meus alunos, desde aluno de 1 ano e meio até aluno de 15 anos, eles se encontram na escola e a
gente educa eles pra isso. Então, aqui tu vai ver os meninos pequenos descendo a escada e jamais
os grandes empurrando ou correndo, às vezes os grandes inclusive pegam a mão dos pequenos e
dizem: "-ah, vem que eu vou descer contigo", eu acho que isso é educação. A escola tem escada, a
escola tem árvore, a escola tem obstáculos, e a gente ensina os alunos a conviverem nesses
espaços. Esse é o grande segredo. Não acho que a gente evita acidente tirando o risco. Essa é a
minha questão hoje com a prevenção: que ele (a criança) saiba se comportar diante do risco.
141
Meninos que não tem contato, quando tem, não sabe lidar e daí que acontece o acidente. Agora, se
tu tiver trabalhando pra que ele seja educado, pra cuidar disso, eu tenho certeza que ele vai
usar.Também acho que nós temos aqui uma prevenção boa e tudo, uma orientação com as próprias
crianças com atenção a respeito das atitudes com os colegas, da correria. Conscientização das
crianças, quanto à necessidade de não correr tanto. Aqui, no corredor mesmo a gente fala, que
apesar de ser corredor, é, andador. Enfim, Orientar os alunos quanto ao uso de todo o espaço da
escola. A gente pede pra num subir numa escada, na jabuticabeira. Assim, esses combinados a
gente tem com os alunos e também para poderem se cuidar tá trazendo proteção: uma joelheira, ou
cotoveleira. Pode correr, brincar e tudo, mas às vezes eles saem sem nem olhar pra frente, do jeito
que tá correndo vai, ... É, prevenir. Mostrar: "- olha, não faz isso que pode acarretar isso assim...”
(Entrevistas: 11,14,9,8,7)
DSC 5E: As ações de prevenção são limitadas ou Pode-se prevenir, mas há um
limite para a prevenção
“A gente aqui se cerca de tanto cuidado e acho que os acidentes que acontecem, realmente não
foram por negligência, é porque aconteceu mesmo. É muito difícil de falar sobre isso porque o
acidente não acontece só na escola. Eu acho que é difícil que não aconteça nunca. Eu acho que
fatalmente vai acontecer, mesmo com toda prevenção. Realmente evitar, mas acabar jamais.
Eu não acho possível que a gente consiga evitar esse tipo de coisa assim, o jogo, o esporte o uso do
corpo. Acho mais essa questão do uso do corpo, porque na verdade nós tamos tratando de sujeitos
que ainda não tem esse domínio perfeitamente. Não dá pra gente colocar eles como um robozinho.
Também, acidentes do cotidiano, colisões, empurrões, isto não tem como você prevenir. Você tem
como alertá-los, mas ás vezes já aconteceu, não é? Você tem que saber contar como que foi e tal.”
(Entrevistas: 2,6,7,14,17,5,18)
142
Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) das categorias: A,B,C,D,E,F,G da
pergunta 6 :
DSC 6A: A RESPONSABILIDADE DA FAMÍLIA
“A gente pede a participação da família de tá mandando a criança com o calçado adequado, com a
roupa adequada, pra correr, não machucar, não cair, não machucar os joelhos. Os pais, que a gente
tá sempre orientando, que mandem a criança com um sapato que não tenha saltinho, porque se
deixar elas preferem estar na moda, todas bonitinhas com saltinhos e com sapatos que não trazem
segurança. As famílias das crianças que não tem limite têm uma parcela de culpa sim, porque elas
não dão esse limite em casa e acaba sobrando para a escola.Os pais, eles vão ser comunicados,
depedendo da gravidade,ou então da preferência, é ele que vai tomar a medida de socorrer, que vai
no caso. Tem pai que gosta dele mesmo levar, tem pai que não,
mas ele sempre é avisado imediatamente.”
(Entrevistas: 1, 17, 2)
DSC 6B: A RESPONSABILIDADE DA CRIANÇA
“Aqui não tem lugar que cê fala assim: "Nossa, isso aqui é perigoso! Pode cair! Não tem! Então eu
acho que é da própria criança! Se ela tropeçou, se ela foi jogar uma bola, caiu. Acontece às vezes
empurrar o outro, tá na educação física, na hora do recreio, ou quando eles fazem um torneio de
futebol entre eles, aí acontece de machucar. Eu que digo é de criança com criança, porque ela é o
sujeito do acidente. Por exemplo: um menino que, insiste em brincar de gominha na sala e que acerta
a gominha no olho de um colega. Claro que ele é responsável por isso!Mas, a natureza da
responsabilidade que você tem que colocar sobre a criança, não pode ser a mesma natureza que
você tem que colocar sobre o adulto. É mais no sentido da formação da criança e não no sentido da
punição.”
(Entrevistas: 6,1,2 ,4)
143
DSC 6C: DA ESCOLA E DOS EDUCADORES
“De quem é a responsabilidade quando o aluno está sob nossa guarda? A responsabilidade é nossa!
Porque, como é que o pai vai se responsabilizar por quem ele não está tomando conta, não tá
guardando?Então, nisso eu sou bastante rígida, eu acho que o que acontece aqui é responsabilidade
nossa. Não culpa nossa, mas responsabilidade. Eu acho que o menino, tá jogando bola e quebrar o
dedo... Isso não é culpa de ninguém, mas a responsabilidade é nossa.
Agora, na verdade, eu acho que a responsabilidade é dos adultos das pessoas que estão ali, que
deveriam estar. Não que existe culpado, mas existem pessoas que são responsáveis, então alguém
tem que ser realmente responsabilizado.A gente está procurando oferecer um ambiente que não
ocorra acidentes, na qualidade dos brinquedos, do espaço, tudo.Se ele (aluno) está aqui na escola a
responsabilidade é da escola, claro! Pode ter sido alguma coisa acidental, mas a escola , já que ele tá
aqui, tá sob os cuidados da escola. Então, a escola tem que tá ajudando, vendo o que quê pode ser
feito pra poder tá solucionando aquele acidente. Assim, as pessoas é que são responsáveis, no caso
eu, as professoras, os disciplinários que tomam conta.
Agora, tá sempre retomando com os meninos os combinados, "- cuidado com as boladas", “ao subir e
descer a escada”, "ficar mais atento". “Cuidado com a circulação na escola, não circular correndo,
procurar andar mais devagar. Pra poder tá evitando. Ocorre muito de criança para criança, nas
brincadeiras, tem que ter a intervenção do adulto sempre. Se alguém é responsável, eu acho que é a
escola. Por que? Se eu puder evitar tudo. Eu não ter escada, não ter quadra(risos) não ter um
corredor, não ter portas de vidro, entendeu? Aí, eu estaria assim, eliminando todas as possibilidades
de acidente.Os pais em momento algum. Então, eu digo aqui, na realidade aqui, não é pai, não é
criança, então, eu diria a escola. Porque tem uma escada que de repente não tem um...aquele
negócio...anti-derapante, então quer dizer que, quem é que é culpado? A escola. Porque a gente
devia ter prevenido, contra isto. Se tá encerrando, aqui é taco, né? A escola aqui, é uma escola com
arquitetura antiga, se tá escorregando, o problema foi passar a bendita cera, então o problema é da
escola.
Enfim, a escola é responsável porque: precisa de uma orientação dos funcionários, pro professor, um
acompanhamento mais próximo. Acaba sendo todo um sistema, que a gente tem que acompanhar
tudo isso. Nós educadores, se a nossa proposta é trabalhar com criança, nós somos responsáveis
por elas sim; tanto que não tem como ás vezes prevenir determinado acidente, mas você pode, evitar
144
que este acidentes aconteçam com mais constância. Eu acho que é esse cuidado, esse olhar mesmo,
um olhar raio x. A escola, os educadores, todas as pessoas envolvidas, desde à faxineira, o pessoal
da manutenção, á direção. A escola tem que estar atenta pros acidentes e sempre preocupar em
prevenção. O que pode ser feito pra que eles não ocorram. Não ficar só tomando iniciativas nas
medidas que tem que ter diante de um acidente. Que a preocupação tem que ser maior é na
prevenção. Por exemplo, aqui na escola, a gente via que no final da aula os meninos ficavam muito
no pátio que tinha de brinquedos, que é o pátio de recreio. Nós víamos que aí os pais buscavam os
meninos seis e meia, sete horas da noite e eles ficavam, então, o número de acidentes que pode
acontecer, (acontecia até muito pouco) mas o número que podia acontecer é grande, em vista que, os
professores já tinham ido embora...tomamos uma atitude. Então, a gente vai observando e vai
mudando. Nós fechamos esse pátio. Então, elas vão embora mais cedo, né? Ou elas ficam com
brincadeiras mais restritas. Então, eu acho que a gente sempre tem que tá observando o quê que é
mais seguro pros meninos e tá tomando providência. Os meninos não gostaram, os pais também não,
mas era mais seguro pra eles.”
(Entrevistas: 2,11,12,1,7,8,14,16, 17, 10)
DSC 6D: NÃO HÁ RESPONSÁVEL
“Será que a gente pode por responsabilidade? Porque assim, eu acho que nem a criança tem às
vezes noção do ocorrido. Na escola, as coisa acontecem: a criança às vezes tá sentada na roda,vai
conversar com um colega ao lado, escorrega com o corpo e bate o queixo no chão e corta. Então, eu
posso responsabilizar, por exemplo essa professora? Eu não chamaria responsabilidade, tá? Assim,
essa responsabilidade fica parecendo culpa. De quem que é...quem é o responsável? Não, na
verdade, a responsabilidade a gente não pode nem classificar eles acontecem casualmente.Acho
assim, que por exemplo: uma distração,não existe aí um culpado, um responsável. Uma brincadeira:
às vezes a criança tá brincando, correndo numa “queimada”, vira um dedo, a bola bate. Então, num
existe assim um responsável.Não sei se cabe a palavra responsabilidade. Não, é? Porque este tipo
de acidente que acontece conosco, acontece com pai e mãe, acontece em casa. Eu não sei se eu
chamaria isto de fatalidade. Eu não acho que tem aí responsabilidade, num não acho que a
responsabilidade é da escola, não. Eu acho que é próprio da pessoa humana. Acontece... Eu
costumo dizer o seguinte: "- O que é da minha competência com minhas grandes limitações, da
145
minha responsabilidade eu tento procurar fazer da melhor maneira possível, o que não é, entrego pra
Deus."Como eu posso fazer? Mais nada, né? Eu acho que tem que confiar na escola. Então, eu não
sei se eu posso falar que acidente da escola é responsabilidade da escola, né?Eu não acho que
ninguém tem responsabilidade nenhuma.Porque aconte... ...Acidente é acidente. Eu não posso dizer,
se é acidente eu não posso dizer que é responsabilidade de alguém. Eu acho muito difícil também,
você, sanar todas, todos os problemas, todas as possibilidades de acidente. Seria uma coisa assim:
quase que impossível. Mas realmente, se você pudesse evitar todas as possibilidades, seria o céu.”
(Entrevistas: 5, 3, 8, 15, 14)
DSC 6E: RESPONSABILIDADE MÚLTIPLA
“Eu acho que é de todo mundo. Eu acho que eu não vou atribuir nenhuma responsabilidade. Acho
que é da criança, da professora e acho que é da escola. É do conjunto. A escola, não são segmentos
separados. A criança é responsável por ela e a gente trabalha pra isso, pra desenvolver a autonomia.
Mas, o professor também é responsável, o coordenador, também é responsável. Então, eu acho que
seria do conjunto da escola.Eu acho difícil responder... ser a responsabilidade só de um... pode
acontecer na escola que seja uma criança que caiu é, porque tava num brinquedo inadequado, aí a
responsabilidade seria da escola, ou se a criança cai porque simplesmente tava correndo e
escorregou, não é responsabilidade da escola, é um, um, como é que eu diria? É uma infelicidade
que aconteceu.
Eu acho que há estudantes que às vezes estão fazendo o que definitivamente não deveriam, e
algumas vezes os funcionários não estão supervisionado da maneira adequada, e eu acho que às
vezes são ambos.É difícil dizer se é um ou o outro.
A criança tem uma responsabilidade, mas que responsabilidade é essa, se ainda não domina esse
controle de corpo? O adulto também tem uma questão, poder tá olhando, poder tá enxergando a
situação de risco e tirando a criança dessa situação de risco antes de acontecer alguma coisa. Em
relação os pais por exemplo tem situações de crianças que são crianças sem limite mesmo, são
meninos que tem uma liberdade em casa, e que chegam na escola e que acham que vão ter o
mesmo tipo de liberdade, a escola em contrapartida tem que tá olhando esse menino e tem que tá
colocando um limite, mas assim: é o tipo da criança que muitas vezes tá na escola, e se você
desprega dele um minuto, daqui a pouco você olha e ele tá lá em cima da árvore. Eu acho que está
146
todo mundo envolvido, a escola, nesta coisa do olhar e do limitar; família, em relação aquele tipo de
limite também, que tipo de formação que já deu pra esta criança e a própria criança, pensando até na
condição dela de ser criança. Acho que é todo mundo, todo mundo faz parte.”
(Entrevistas: 9, , 13, 17)
DSC 6F: EXISTEM PROFISSIONAIS OU FUNCIONÁRIOS PREPARADOS PARA
ATENDER CRIANÇAS ACIDENTADAS
“Não, eu não, geralmente os professores de educação física. Quando acontece algum acidente,
quando chega um menino com um dedinho doendo porque a bola bateu, uma perna que a gente
acha que machucou mais, ou um braço que tá quebrado, a gente leva primeiro para eles, para eles
darem uma olhada e aí depois a gente comunica com os pais”.
(Entrevista: 6)
DSC 6G: ENCAMINHAMENTO PARA SERVIÇOS DE SAÚDE OU PARA A
FAMÍLIA
“Nós levamos imediatamente pro hospital e acionamos a família. Então, fica mais ao cargo mesmo do
médico, do hospital de fazer esse primeiro atendimento. A escola, o que ela tem que fazer, é levar
imediatamente pro hospital, ou mais próximo ou o que a família indica, na ficha da criança.
Nós temos a ficha da criança com os medicamentos que a criança pode usar ou os que ela não pode
usar de maneira nenhuma, o hospital indicado, o plano de saúde, quem da família a gente vai
acionar, se não encontrar essa primeira pessoa, qual que é a segunda pessoa indicada e nós
encaminhamos pro hospital que está indicado na ficha, ou no momento o que a família indicou por
telefone.
Nos não damos medicamento nenhum dentro da escola, mesmo se estiver na ficha, a gente só dá
com autorização da família, mesmo porque a gente não sabe se a criança já foi medicada naquele dia
ou alguma coisa assim, então a gente só dá esse medicamento se tiver autorização da família,
naquele momento.
Na verdade, é, a gente não interfere naquele momento, assim de tá sendo paramédico. Na verdade,
esse acidente mais grave, nós chamamos na mesma hora a família, mas os outros são coisas
corriqueiras do dia-a-dia.
147
Realmente nunca tive um acidente maior. A gente (nesses casos) geralmente liga pros pais, pra
saber se quer que busca ou se é pra passar alguma coisa, pra dar algum remedinho pra dor.”
(Entrevistas: 1,2,5,7,16)
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