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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
REINALDA MELO DA MATTA
A UTILIZAÇÃO DA TERAPIA DO SANDPLAY NO
TRATAMENTO DE CRIANÇAS COM TRANSTORNO
OBSESSIVO-COMPULSIVO
SÃO PAULO
2006
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REINALDA MELO DA MATTA
A UTILIZAÇÃO DA TERAPIA DO SANDPLAY NO
TRATAMENTO DE CRIANÇAS COM TRANSTORNO
OBSESSIVO-COMPULSIVO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial
para a obtenção do título de MESTRE em Psicologia Clínica,
sob a orientação da Profa. Dra Denise Gimenez Ramos.
PUC
São Paulo
2006
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BANCA EXAMINADORA
Presidente:__________________________________________
1º Examinador:______________________________________
2º Examinador:______________________________________
AGRADECIMENTOS
As mãos traçam na areia as imagens do nosso inconsciente e trazem para a vida toda a
riqueza dos símbolos. Muitas mãos me acolheram, apontaram caminhos e me afagaram.
Amigos que se foram e com um aceno de mão eu me despedi. Outros estão ao meu lado e
vamos de mãos dadas. Sinto-me feliz de compartilhar com todos, este momento da minha vida
e, hoje ofereço com as minhas mãos este trabalho. Meu muito obrigada.
Aos meus pais e irmã, que com suas mãos me afagaram e me entregaram ao mundo.
Ao Sylvio, Sílvia e Bruno, que de mãos dadas vamos caminhando pela estrada da vida.
À Dra Denise G. Ramos, minha orientadora, que me apontou e me guia nos caminhos da
Terapia do Sandplay.
À amiga de coração Luísa de Oliveira, que com suas mãos desenhou e deu as cores a
este trabalho, muitas vezes abrindo mão de seus momentos de descanso.
À amiga Lury companheira de viagens pelo mundo da areia e pela riqueza da troca de
idéias nos trabalhos com a Terapia do Sandplay.
Aos amigos do Núcleo de Estudos Junguianos, que de mãos dadas nutrem grandes
esperanças: Dado Salem, João Bezinelli, Marilena Dreyfuss, Lygia Molineiro, Maria Lúcia
Ferreira, Márcia Baptista, Marisa Penna e Lígia Bonini.
Aos professores do Núcleo de Estudos Junguianos, que com suas mãos conduziram a
primeira turma.
Ao Professor Dr. Eurípedes Constantino Miguel Filho, que participou da minha mesa de
qualificação e abriu as portas do PROTOC e C-TOC. A Helena Prado, que cuidadosamente me
apontou os caminhos da apostila do C-TOC.
Ao Professor Dr. Fernando Lefèvre, que com suas questões e reflexões colaborou na
construção do método exploratório utilizado neste trabalho.
À CAPES pela bolsa que me foi oferecida no ano de 2004.
Ao ASTOC, em especial à Maria Cecília Labate, Sônia Borcato, Neuza Fioravante e ao
grupo de família que me acolheram e são uma fonte de troca de experiências.
Às “meninas da areia” sempre de mãos dadas e que compartilham o espaço “livre e
protegido”: Ana Colicchio, Cláudia Mosca, Lúcia Azevedo, Marion Anderson, Martha Virgínia,
Sylvia Portella, Suzana Hirata, Virgínia Sant’Anna e Zilda Machado.
À Harriet Friedman, Rie Mitchell e Ruth Ammann pelas preciosas orientações que me
ofereceram nas supervisões dos casos dos pacientes aqui apresentados.
À Susan Albert, pela gentileza da tradução.
À Maria Aparecida Vilhena pela paciência de discutir minhas idéias.
À Leniza Castello Branco e Joyce Cunningham que com suas mãos me ajudaram a
buscar os meus tesouros mais escondidos.
Aos meus pacientes, fonte de aprendizagem diária. Em especial, às três crianças deste
estudo com quem eu compartilhei o processo de transformação e que contribuíram para o meu
aprendizado.
RESUMO
MATTA, Reinalda Melo. A Utilização da Terapia do Sandplay no Tratamento de Crianças com
Transtorno Obsessivo-Compulsivo. São Paulo: PUC, 2006.
Orientadora: Dra Denise Gimenez Ramos.
Este estudo apresentado tem por objetivo observar os resultados da Terapia do Sandplay (TS)
no tratamento de três crianças, entre 6 e 9 anos de idade, com diagnóstico psiquiátrico de
Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC). Trata-se de uma psicopatologia que ocorre tanto em
crianças quanto em adultos, com o mesmo quadro sintomático, sendo que a maioria de adultos
com esse transtorno já manifestava sintomas na infância. A realização do diagnóstico e de
tratamento psicoterapêutico durante esta fase são de grande importância, pela possibilidade de
um tratamento na infância evitar que os sintomas se agravem na idade adulta. A revisão de
literatura a respeito do tratamento psicoterápico em crianças com esse transtorno revela que a
técnica psicológica mais utilizada é a terapia Cognitiva-Comportamental (TCC). Entretanto,
alguns estudos apontam que, no tratamento de crianças, existe uma baixa aderência. A
resistência ocorre devido ao uso de algumas técnicas que incluem exercícios repetitivos, muitas
vezes monótonos, e a anotação das tarefas diárias, que algumas apresentam dificuldades em
executar. Nas outras abordagens psicológicas, poucos estudos de caso foram encontrados. Na
psicologia analítica e na TS, nenhuma referência foi encontrada no tratamento de crianças.
Portanto, o presente trabalho é uma primeira experiência em aplicar a TS. Esta pesquisa foi
desenvolvida com o método qualitativo-quantitativo, que permitiu análise qualitativa das
expressões verbais e imagéticas de cada cenário e, em seguida, quantitativa destes mesmos
dados. O processo terapêutico foi dividido em três momentos: início, meio e fim. A partir do
primeiro cenário de cada sujeito, foi traçada uma linha evolutiva do seu processo e uma
comparação entre os três sujeitos. A confrontação entre os três casos evidencia como o
processo analítico em conjunto com a TS propiciou o desenvolvimento da consciência, a partir
de um estado mais primitivo de identidade: a expressão e utilização dos símbolos; a
transformação dos mecanismos de defesa e o fortalecimento do ego. Observou-se que a
estrutura psicológica das crianças foi transformada e, ao final do processo psicoterapêutico,
elas obtiveram a remissão de seus sintomas e se encontram sem tratamento farmacológico.
Palavras-chave: terapia do Sandplay, transtorno obsessivo-compulsivo, crianças.
ABSTRACT
MATTA, Reinalda Melo: The Use of Sandplay Therapy in the Treatment of Children with
obsessive-compulsive disorder. São Paulo, 2006.
Supervisor: Dra Denise Gimenez Ramos.
The objective of this study is to present the results from using sandplay therapy to treat three
children between the ages of 6 and 9, who received a psychiatric diagnosis of obsessive-
compulsive disorder. This psychopathology occurs both in children and in adults. Both present
the same symptoms, with the majority of adults diagnosed with this disorder suffering from these
symptoms since childhood. Diagnosing this disorder and psychotherapeutic treatment at an
early stage are very important, since it is possible that early treatment could prevent the
symptoms from becoming worse during adulthood.
A review of the literature on the psychotherapeutic treatment of children with this disorder
identified that the psychological technique most frequently used has been Cognitive-Behavioral
therapy. However, some studies have identified that there is a low adherence by children
receiving this treatment. This resistance occurs due to the use of some techniques that include
repetitive exercises, which are often monotonous and also having to note daily tasks, which, for
some children, is difficult to perform. Few case studies were identified based on other
psychological approaches. No reference was found in analytical psychology and Sandplay
therapy for treating children with this disorder. Therefore, this research is the first study to apply
Sandplay therapy for such cases. This research was developed using a qualitative-quantitative
method, which enabled a qualitative analysis of the verbal expressions and images of each
scenario to be made, followed by a quantitative analysis of these data. The therapeutic process
was divided into three periods: start, middle and end. An evolutionary line was drawn of the
process from the moment the first scenario was made by each subject, and a comparison was
made between the three subjects. A comparison between the three cases provides evidence of
how the analytic process together with sandplay therapy enables development of
consciousness from a more primitive state of identity: the expression and use of symbols; the
transformation of defense mechanisms and strengthening of the ego.
The psychological structure of each child was transformed and at the end of the
psychotherapeutic process there was a remission in their symptoms and they were no longer
receiving pharmacological treatment.
Key words: Sandplay therapy, Obsessive-compulsive disorder, children
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Foto 1 – Caso G – Cenário # 1 69
Foto 2 - Caso G – Cenário # 3 71
Foto 3 - Caso G – Cenário # 6 72
Foto 4 – Caso G – Cenário # 10 73
Foto 5 - Caso G – Cenário # 14 74
Foto 6 - Caso G – Cenário # 18 74
Foto 7 - Caso G – Cenário # 20 75
Foto 8 - Caso G – Cenário # 22 76
Foto 9 - Caso G – Cenário # 30 78
Foto 10 - Caso G – Cenário # 33 78
Foto 11 - Caso G – Cenário # 38 80
Gráfico 1 – Evolução dos Temas – Caso G – Fase Inicial 82
Gráfico 2 – Evolução dos Temas – Caso G – Fase Intermediária 83
Gráfico 3 – Evolução dos Temas – Caso G – Fase Final 83
Foto 12 – Caso L – Cenário # 1 90
Foto 13 – Caso L – Cenário # 7 91
Foto 14 – Caso L – Cenário # 18 92
Foto 15 – Caso L – Cenário # 27 93
Foto 16 – Caso L – Cenário # 43 94
Foto 17 – Caso L – Cenário # 44 95
Foto 18 – Caso L – Cenário # 51 96
Foto 19 – Caso L – Cenário # 52 97
Foto 20 – Caso L – Cenário # 97 98
Foto 21 – Caso L – Cenário # 99 99
Foto 22 – Caso L – Cenário # 110 100
Foto 23 – Caso L – Cenário # 115 100
Gráfico 4 – Evolução dos Temas – Caso L – Fase Inicial 103
Gráfico 5 – Evolução dos Temas – Caso L – Fase Intermediária 104
Gráfico 6 – Evolução dos Temas – Caso L – Fase Final 104
Foto 24 – Caso A – Cenário # 1 112
Foto 25 – Caso A – Cenário # 6 114
Foto 26 – Caso A – Cenário # 8 115
Foto 27 – Caso A – Cenário # 10 116
Foto 28 – Caso A – Cenário # 14 117
Foto 29 – Caso A – Cenário # 18 117
Foto 30 – Caso A – Cenário # 31 118
Foto 31 – Caso A – Cenário # 41 119
Foto 32 – Caso A – Cenário # 46 120
Foto 33 – Caso A – Cenário # 48 121
Foto 34 – Caso A – Cenário # 71 122
Foto 35 – Caso A – Cenário # 96 123
Foto 36 – Caso A – Cenário # 101 123
Foto 37 – Caso A – Cenário # 102 125
Foto 38 – Caso A – Cenário # 109 126
Gráfico 7 – Evolução dos Temas – Caso A – Fase Inicial 128
Gráfico 8 – Evolução dos Temas – Caso A – Fase Intermediária 129
Gráfico 9 – Evolução dos Temas – Caso A – Fase Final 129
Gráfico 10 – Gráfico Comparativo Evolução do Tema Defesas 133
Gráfico 11 – Gráfico Comparativo Evolução do Tema Automatismo 135
Gráfico 12 – Gráfico Comparativo Evolução do Tema Centralização 135
Gráfico 13 – Gráfico Comparativo Evolução do Tema Integração 136
Foto 39 – Caso A 6/4/2005 139
LISTA DE TABELAS
Tabela # 1 – Resultados DY-BOCS (Passado) – Caso G 65
Tabela # 2 – Resultados DY-BOCS Avaliação Global (Passado) – Caso G 65
Tabela # 3 – Resultados Avaliação de Gravidade dos Fenômenos Sensoriais-Passado – Caso
G 66
Tabela # 4 – Resultados Yale Global TIC Severity Scale (YGTSS) – Caso L 66
Tabela # 5 – Resultados DY-BOCS (Passado) – Caso L 86
Tabela # 6 – Resultados DY-BOCS Avaliação Global (Passado) – Caso L 86
Tabela # 7 – Resultados Avaliação de Gravidade dos Fenômenos Sensoriais
(Passado) Caso L 86
Tabela # 8 – Resultados Yale Global TIC Severity Scale (YGTSS) – Caso L 87
Tabela # 9 – Resultados DY-BOCS (Passado) – Caso A 108
Tabela # 10 – Resultados DY-BOCS Avaliação Global (Passado) – Caso A 108
Tabela # 11 – Resultados Avaliação de Gravidade dos Fenômenos Sensoriais
(Passado) – Caso A 109
Tabela # 12 – Resultados Yale Global TIC Severity Scale (YGTSS) – Caso A 109
Tabela # 13 – Evolução dos Temas dos Sujeitos por Fases 131
SUMÁRIO
1 Introdução .................................................13
1.1 Características do Transtorno Obsessivo-Compulsivo.............................................15
1.2 Epidemiologia do Transtorno Obsessivo-Compulsivo..............................................17
1.3 Transtorno Obsessivo-Compulsivo em Crianças .....................................................18
1.4 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Possíveis Subtipos ........................................19
1.5 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Genética........................................................21
1.6 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Comorbidade.................................................22
1.7 Aspectos neuropsicológicos do Transtorno Obsessivo-Compulsivo ........................23
2 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Tratamentos Psicológicos .24
2.1 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Psicanálise ....................................................24
2.2 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Terapia Cognitivo-Comportamental...............27
2.3 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Psicologia Analítica .......................................29
2.4. Conclusão ...............................................................................................................32
3 O Desenvolvimento Psicológico da Criança sob a Perspectiva da
Psicologia Analítica...........................................34
4 A Terapia do Sandplay ......................................39
4.1 Definição ..................................................................................................................39
4.2 O Processo de Transferência, Contratransferência e Ressonância.........................40
4.3 Transdução ..............................................................................................................42
5 Objetivo ...................................................43
6 Justificativa ..............................................44
7 Método .....................................................45
7.1 Sujeitos:....................................................................................................................46
7.2 Local.........................................................................................................................47
7.3 Instrumentos:............................................................................................................47
7.4 Procedimento...........................................................................................................50
7.5 Cuidados Éticos .......................................................................................................51
7.6 Método de Análise....................................................................................................51
8 Resultados .................................................53
8.1 Análise qualitativa ....................................................................................................53
8.1.1 Temas.................................................................................................................................. 54
Automatismo ............................................................................................................................................ 54
Celebração............................................................................................................................................... 54
Centralização ........................................................................................................................................... 55
Conflito..................................................................................................................................................... 55
Congestionamento................................................................................................................................... 56
Defesas.................................................................................................................................................... 57
Destruição................................................................................................................................................ 58
Identificação Egóica................................................................................................................................. 58
Integração ................................................................................................................................................ 59
Movimento Ascendente............................................................................................................................ 59
Movimento Descendente ......................................................................................................................... 59
Submersão............................................................................................................................................... 60
Transferência ........................................................................................................................................... 60
Transformação......................................................................................................................................... 61
8.2 Análise quantitativa ..................................................................................................61
8.3 Apresentação e Análise dos Casos Clínicos............................................................62
8.3.1 Caso G................................................................................................................................. 62
8.3.2 Caso L. ................................................................................................................................ 84
8.3.3 Caso A............................................................................................................................... 105
8.4 Análise Comparativa dos Casos Clínicos...............................................................130
8.4.1 Análise das Miniaturas...................................................................................................... 130
8.4.2 Análise dos temas............................................................................................................. 131
9 Considerações Finais ......................................137
Referências.........................................................140
Anexos..............................................................147
Anexo A........................................................................................................................147
Anexo B........................................................................................................................149
Anexo C .......................................................................................................................150
Anexo D .......................................................................................................................152
13
1 Introdução
Essas idéias loucas acabam comigo. Minha mente não pára, corro perigo.
Minha forte insegurança me come vivo, nem um segundo de paz. Estou
perdido. Cadê o remédio para acabar com minha loucura? Alguém, por favor,
encontre alguma cura! Na minha mente, nada está claro. Um bom pensamento
aqui é muito caro. O tempo não pára e a nossa vida é tão rara. (ROF, paciente
de 16 anos).
O estudo do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) em crianças despertou meu
interesse no momento que os sujeitos A. e G. foram encaminhados para tratamento psicológico
por seus médicos psiquiatras. Apesar do meu conhecimento e dos estudos realizados sobre as
técnicas da Terapia Cognitiva-Comportamental (TCC), utilizadas para o tratamento do TOC,
essas crianças apresentavam dificuldades na execução das tarefas propostas. Resolvi, então,
investigar pela conceituação teórica da psicologia analítica a possibilidade da aplicação da
Terapia do Sandplay (TS) no tratamento de crianças com essa patologia.
A pesquisa de técnicas psicológicas na área de tratamento psicoterápico de crianças com
TOC é importante. Trata-se de uma psicopatologia que ocorre também em adultos, com o
mesmo quadro etiológico e de 30 a 50% desses adultos já manifestaram os sintomas na
infância.
Na Psiquiatria e Psicologia, o TOC é considerado, há muito tempo, uma doença em que
o paciente, apesar de ter a consciência da irracionalidade de seus pensamentos e
comportamento, não consegue controlar suas compulsões e obsessões, que surgem de forma
inesperada e incontrolável. O paciente começa a ter uma série de comportamentos repetitivos,
na tentativa de aliviar seus pensamentos obsessivos, e aos poucos se sente aprisionado em
uma rotina desgastante e estereotipada. O medo de que algo ruim possa acontecer impede-o
de buscar uma saída e o resultado é uma vida que leva a perdas nas relações sociais, nos
estudos e dificuldades para as atividades do dia-a-dia.
Jung (1998), ao estudar a psicologia dos neuróticos, relatou que trata-se dos distúrbios
mais paradoxais possíveis. Os sintomas patológicos que surgem são muito estranhos e não é
possível encontrar nenhum problema orgânico. Entretanto, as idéias obsessivas que ocorrem
apresentam características tão absurdas, que o próprio paciente percebe a sua loucura e a sua
incapacidade em controlar seus comportamentos e pensamentos.
Este estudo tem como objetivo a observação e análise dos resultados da utilização da
Terapia do Sandplay (TS) no tratamento de três crianças com diagnóstico psiquiátrico de
14
Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). Considerou-se a compreensão da dinâmica
psicológica do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) do ponto de vista da Psicologia
Analítica. A realização do diagnóstico e o tratamento psicoterapêutico durante a infância são de
grande importância, pois é nessa fase que o desenvolvimento psíquico inicia o seu caminho
rumo à maturidade. A criança necessita fortalecer seu ego para poder lidar com seu mundo
interior e exterior.
A revisão da literatura a respeito do tratamento psicoterapêutico em crianças com TOC
revelou que a técnica psicológica mais utilizada tem sido a terapia Cognitiva-Comportamental
(TCC). Entretanto, alguns estudos apontaram que, no tratamento de crianças, existe uma baixa
aderência. Ela ocorre devido ao uso de algumas técnicas que incluem exercícios repetitivos,
monótonos, e a anotação das tarefas diárias, que algumas crianças sentem dificuldade em
executar. Nas outras abordagens psicológicas, foram encontrados poucos estudos de caso
nesta área. Na psicologia analítica e na TS, nenhuma referência foi encontrada no tratamento
de crianças. Portanto, o presente estudo traz a primeira experiência de aplicação da TS em
crianças com TOC.
A prática clínica e a literatura levaram à reflexão sobre o tratamento do TOC em crianças.
É possível que a prática da TS, por atuar em um nível pré-verbal, possa favorecer o processo
simbólico e a provável transformação dos sintomas.
Para Weinrib (1993) o processo natural da cura pode ser ativado pelo jogo terapêutico e
pela estimulação dos impulsos criativos, expressos no “espaço livre e protegido” da TS. No
ponto de vista da psicologia analítica, o símbolo é um agente criativo que atua como ponte para
conciliar os opostos. A preparação de um cenário na areia é um ato simbólico e criativo.”O
fantasiar simbólico livre e protegido estimula a imaginação, libera a energia neuroticamente
fixada, conduzindo-a através de canais criativos, o que já pode ser considerado cura” (p.34).
Nos trabalhos relacionados com crianças vítimas de agressões (Donald, 2003) quanto
com crianças portadoras de AIDS (Montecchi, 1999) e epilepsia (Reece, 1998), pacientes
esquizofrênicos (Reece, 1995) e pacientes borderline (Oda, 1997), mulheres com síndrome do
ovário policístico (Yoshikawa, 2002) e pacientes orgânicos (Greghi, 2003), a prática e a
pesquisa da TS têm demonstrado que, quando o paciente encontra um canal de comunicação
simbólico no qual possa expressar sua condição emocional, ocorre uma reorganização interna e
a transformação dos sintomas.
A construção do método para a análise dos dados foi baseou-se no Discurso do Sujeito
Coletivo (Lefèvre, 2003). Esta pesquisa parte do ponto de vista qualitativo-quantitativo, e a partir
deste conceito, realizou-se uma análise qualitativa das expressões verbais e imagéticas de
15
cada cenário, assim como uma análise quantitativa desses mesmos dados. Após o
levantamento das miniaturas utilizadas, dos cenários realizados e da verbalização de cada
paciente, foram estabelecidos temas comuns aos casos das três crianças. O processo
terapêutico foi dividido em três fases: inícial, intermediária e final, considerou-se o número de
dias de todo o processo. A partir do primeiro cenário de cada sujeito, foi traçada uma linha
evolutiva do processo de cada um, e depois foi estabelecida uma comparação entre os três.
Os Capítulos 1 e 2 expõem, respectivamente, o Transtorno Obsessivo-Compulsivo do
ponto de vista psiquiátrico e psicológico.
No Capítulo 3, o desenvolvimento psicológico da criança é abordado do ponto de vista da
psicologia analítica.
No Capítulo 4, apresenta-se a Terapia do Sandplay e aspectos teóricos importantes para
este estudo.
Os Capítulos 5, 6 e 7 referem-se ao objetivo do trabalho, sua justificativa e método.
O Capítulo 8 é dedicado aos resultados e apresentam-se três casos clínicos, com sua
respectiva descrição; a impressão clínica da pesquisadora/terapeuta; a avaliação médica,
escolar e a dos pais; os temas e fotos de cada fase do processo de terapia, e no final, uma
análise comparativa entre os três casos.
O capítulo 9 aborda as considerações finais, onde são colocadas as questões que
poderiam contribuir para todos aqueles que se dedicam à prática clínica na psicologia analítica
e aos pesquisadores que se interessem na continuidade dos estudos referentes ao tratamento
do TOC utilizando a TS.
1.1 Características do Transtorno Obsessivo-Compulsivo
Lima definiu os termos obsessão e compulsão como:
Obsessão vem do latim, verbo obsidiare que significa cercar: são pensamentos,
sentimentos, idéias, impulsos ou representações mentais vividos como intrusos
e sem significado para a pessoa, estranhos ao seu próprio referencial, embora
esta pessoa os reconheça como sendo fruto de seu próprio eu; não consegue
eliminá-los de sua consciência apesar do grande desejo de fazê-lo. Compulsão
vem do latim, verbo compulsare que significa compelir: são comportamentos
repetitivos e intencionais, cognitivos ou motores realizados com uma
determinação, ou seja, em resposta a uma obsessão de acordo com certa
padronização e/ou de forma estereotipada. (LIMA, 1996, p.7)
16
Atualmente, o TOC é descrito pelo DSM IV – R (2003) e encontra-se entre os transtornos
de ansiedade. Tem como característica a presença de obsessões, que são pensamentos ou
idéias que invadem a consciência de maneira repetitiva, mesmo contra a vontade do sujeito.
Podem ou não ser seguidos de comportamentos (manias) utilizados para neutralizá-los. Esses
pensamentos são percebidos como estranhos e intrusivos, o que causa um aumento da
ansiedade e um desconforto muito grande. A pessoa tenta não pensar no problema ou eliminar
o desconforto com atos ou com outros pensamentos. Ela percebe que eles vêm da sua mente,
sabe que não fazem sentido, que são irracionais, que passam a ocupar o seu tempo (mais de
uma hora por dia) e atrapalham suas atividades normais (trabalho, escola e relacionamentos).
As compulsões são comportamentos repetitivos ou atos mentais excessivos realizados
pelos sujeitos, com o objetivo de reduzir a ansiedade gerada pelas obsessões. No entanto,
pode haver compulsão sem presença de obsessão, como obsessões de contaminação e
compulsões de limpeza (medo de pegar germes tocando em alguém ou pegando nas
maçanetas, medo de entrar em contato com excrementos, necessidade de lavar repetidamente
as mãos por causa de preocupações com sujeira ou germes, ou porque as mãos não estão
limpas o suficiente), obsessões e compulsões de simetria, ordem, contagem e arranjo (verificar
repetidas vezes enquanto lê ou escreve para se certificar de que não cometeu um erro,
necessidade de entrar/sair de casa várias vezes, ter compulsão após tocar ou fazer algo do
lado direito e precisar tocar ou fazer a mesma coisa do lado esquerdo); obsessões e
compulsões de colecionismo; obsessões com relação à agressão, violência, desastres naturais
e compulsões relacionadas, ter rituais mentais relacionados a obsessões sobre agressão,
violência, desastres naturais; a presença de obsessões sexuais e religiosas e compulsões
relacionadas; obsessões e compulsões diversas (preocupação com certos números, ter de
realizar atividades um determinado número mágico de vezes, escutar palavras, canções ou
músicas que vêm à mente sem conseguir parar, ficar preso ao som de certas palavras ou
músicas, preocupação de que algo terrível possa acontecer com algum parente e que nunca
mais esta pessoa possa ser vista, ter compulsões ou rituais realizados para prevenir a perda de
alguém, por exemplo, telefonar várias vezes).
Torres e Miguel (2001) consideraram o TOC como um transtorno de difícil diagnóstico e
que representa um desafio às categorizações, porque
O TOC é talvez o protótipo do transtorno que desafia as tentativas de
categorização em normal e patológico, neurótico e psicótico, orgânico e
psicogênico e mesmo as fronteiras com outros transtornos psiquiátricos. Além
disso, não há consenso sobre sua manifestação psicopatológica fundamental:
envolveria, em sua essência, alteração de humor – ansioso ou depressivo?-,
17
volição/pragmatismo, memória, pensamento/juízo? (TORRES; MIGUEL, 2001,
p.SII 1)
Considera-se que comportamentos obsessivos e compulsivos são necessários em muitos
momentos da vida, e fazem parte da história da humanidade. Para sobreviver e garantir sua
descendência, o homem tem de lançar mão de alguns comportamentos compulsivos e de
pensamentos obsessivos, como no caso de pais que precisam alimentar e cuidar do bebê para
que ele sobreviva; ou quando estuda-se algo muito difícil e para conseguir realizar competições
de alto nível, é preciso ser um tanto obsessivo e compulsivo.
Por outro lado, o amplo espectro dos sintomas do TOC e a sua interferência na vida
social do sujeito tornam essa patologia objeto de pesquisa e estudo, na tentativa de encontrar
tratamentos que possam auxiliar os portadores. Assim, o diagnóstico precoce do TOC é de
grande importância para o tratamento.
1.2 Epidemiologia do Transtorno Obsessivo-Compulsivo
Del-Porto (2001) verificou que o TOC era considerado, até a última década e meia, uma
doença bastante rara e estudos da década de 1950, nos EUA, apontavam uma prevalência de
cinco pacientes para cada 10.000 pessoas (0,05%). O autor faz referência a um amplo estudo
epidemiológico americano, o Epidemiological Catchement Area Study (ECA), que partiu de uma
amostra populacional de 20.862 indivíduos e constatou que 64% dos portadores de TOC
apresentaram início dos sintomas antes dos 25 anos de idade e 74%, antes dos 30 anos. Esse
estudo encontrou uma taxa de prevalência de 2,5% para o tempo de vida, o que coloca a
doença como o quarto transtorno psiquiátrico mais comum, precedido apenas por fobias, abuso
e dependência de drogas e depressão. Desde então, os médicos psiquiatras e os meios de
comunicação passaram a dar maior importância ao TOC. O autor cita uma publicação da
Organização Mundial da Saúde (OMS), que abordou os custos do transtorno em termos diretos
e indiretos com a doença, tais como a incapacidade para o trabalho, impacto sobre a família e
aposentadoria precoce. A OMS, em colaboração com o Banco Mundial e a Harvard University,
incluiu o TOC na lista de dez doenças com maior impacto sobre a incapacitação social.
Conforme a pesquisa ECA, a prevalência da doença ao longo da vida gira em torno de 2 a 3%
na população geral.
Rosário-Campos e Chacon (2001) relataram que, até a década de 80, as descrições de
casos de TOC na infância e adolescência eram poucas e muitas vezes limitadas a um pequeno
número de pacientes, como as que o NIMH (Instituto Nacional de Saúde Mental, nos Estados
18
Unidos) publicou, considerado o primeiro estudo populacional sobre crianças e adolescentes
com TOC. Nesta pesquisa, foram entrevistados 5.596 estudantes de primeiro grau em oito
escolas de uma cidade próxima a Nova Iorque, dos quais 20 apresentaram diagnóstico deste
transtorno. As autoras alertaram que estes dados poderiam estar subestimados, tendo em vista
que pacientes com quadros muito graves nem freqüentam a escola ou recusam-se a completar
os questionários (557 estudantes recusaram-se a preencher os dados). As autoras citaram que,
em um dos estudos, a taxa de prevalência encontrada foi mais alta, 3% para TOC e 19% para
sintomas obsessivo-compulsivos.
Rosário-Campos (2001) assinalou que as taxas de prevalência da doença na infância e
adolescência são semelhantes às apresentadas na idade adulta, variando de 1,9% a 4%, e que
aproximadamente um terço dos pacientes adultos apresenta o início dos sintomas na infância.
Não existe um padrão único de história natural dos sintomas obsessivo-compulsivos. O início do
quadro pode ser abrupto ou insidioso, relacionar-se a algum fator precipitante e os sintomas
podem se modificar ao longo do tempo. Rosário-Campos observou que as crianças falam
menos dos sintomas do que os adultos, e vivenciam o transtorno como um intruso silencioso.
No Brasil, para a faixa etária de crianças e adolescentes não existem dados quanto à
freqüência dos sintomas relacionados aos transtornos desse espectro. A maioria dos estudos
relatou um intervalo médio entre o início dos sintomas e a data da primeira avaliação, variando
de 1,6 a 2,5 anos em crianças.
Apesar dos resultados dos estudos populacionais mostrarem uma alta freqüência do
TOC, ainda é difícil diagnosticar corretamente o transtorno na infância. Muitas vezes as
crianças podem não reconhecer que seus sintomas são excessivos ou sem sentido e muitas
vezes os escondem por vergonha ou medo.
1.3 Transtorno Obsessivo-Compulsivo em Crianças
Adratt e Derbli (2001) ressaltaram que, na avaliação de crianças com TOC, é importante
uma questão: a semelhança entre os sintomas obsessivo-compulsivos e os comportamentos
repetitivos característicos de algumas fases do desenvolvimento da criança, como os rituais e
as superstições. O profissional que trabalha com crianças precisa ter bom conhecimento sobre
o desenvolvimento infantil para que o diagnóstico seja correto.
Evans et al. (1997) consideraram que, no desenvolvimento normal de uma criança,
alguns rituais e repetições fazem parte do que se espera para cada etapa do desenvolvimento.
No desenvolvimento infantil, crianças de 2 a 4 anos de idade apresentam comportamentos
19
repetitivos mais intensos. Os rituais mais comuns na fase pré-escolar costumam acontecer nos
horários de dormir, comer e tomar banho. A história que precisa ser contada várias vezes da
mesma forma ou a repetição de um mesmo conto por vários dias seguidos; os alimentos que
têm de estar ordenados no prato na forma pré-estabelecida ou a criança que só consome
determinados alimentos e não aceita modificação no cardápio; há também as que só entram no
banho com determinado brinquedo, podem ser alguns dos exemplos considerados normais
para essa fase de desenvolvimento. A partir dos 6 anos, os rituais se manifestam em
brincadeiras grupais: os jogos têm regras rígidas e muitas crianças iniciam coleções de objetos
como figurinhas, moedas etc. Superstições são comuns em todas as faixas etárias. Por
exemplo, levantar do mesmo lado da cama ou colocar algum brinquedo em determinada
posição para se ter sorte naquele dia. Os rituais e superstições são normais para algumas fases
do desenvolvimento e, geralmente, têm por objetivo auxiliar o processo de adaptação da
criança ao seu meio ambiente. No entanto, não interferem na rotina diária da criança e não têm
a freqüência ou intensidade dos sintomas obsessivo-compulsivos. É de grande importância
reconhecer quando os rituais e as superstições tornam-se patológicos e quando a criança
necessita de ajuda. Precisa-se considerar a faixa etária, a duração diária dos comportamentos,
sua intensidade e se estão interferindo nas suas atividades cotidianas e no seu comportamento.
Para haver o diagnóstico do TOC, é preciso que as obsessões e/ou compulsões causem
interferência/limitação nas atividades da criança, que o tempo consumido (ao menos 1 hora por
dia) cause sofrimento ou incômodo ao paciente e aos familiares.
March (1995) relatou que os sintomas mais freqüentes podem ser: medo de
contaminação, de ferir-se ou ferir outras pessoas, obsessões sexuais e de simetria, compulsões
semelhantes a tiques (tick-like), checagem e rituais de tocar em objetos ou pessoas. Na
infância, é comum que as compulsões precedam às obsessões, apesar de a maioria das
crianças apresentarem múltiplas obsessões e compulsões.
1.4 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Possíveis Subtipos
O TOC é semelhante nas diversas faixas etárias e por isso, a grande maioria das
pesquisas considera o transtorno na infância e na idade adulta de uma mesma forma.
Entretanto, alguns estudos mais recentes, em que os dados foram analisados a partir da idade
de início dos sintomas obsessivo-compulsivos, demonstraram que há características distintas
nas apresentações da doença na infância e em pacientes com início do quadro após a
20
adolescência. Esta observação levanta a questão de que o TOC, de início precoce poderia
corresponder a um possível subgrupo de pacientes.
Ainda não existe consenso quanto ao modo de avaliar a idade de início dos sintomas
obsessivo-compulsivos e quando considerar precoce o início do TOC. Alguns estudos sugerem
que a idade de início do quadro deva ser avaliada de acordo com o surgimento dos sintomas,
certos autores consideram a idade em que os sintomas interferem na vida diária e outros ainda
sugerem que poderia ser avaliada quando o paciente procurasse alguma forma de tratamento.
March e Leonard (1996) revisaram a literatura pediátrica relativas ao TOC a partir de
1985 e usaram informações relevantes registradas no American Board of Psychiatric and
Neurology. Além de considerarem pesquisas clínicas, artigos de diagnóstico e tratamentos
pediátricos relacionados ao tema, para chegar às seguintes conclusões:
é um transtorno neuropsiquiátrico comum;
a comorbidade é comum, especialmente com tiques, déficit de atenção,
ansiedade e desordens afetivas;
pode ser causado por infecção de streptococo, o que definiria um subgrupo auto-
imune;
terapia Cognitiva-Comportamental (TCC) e farmacoterapia com IRSS definem o
tratamento psicológico e farmacológico de primeira escolha.
O estudo realizado por Hounie et al. (2001) indica que o TOC é um transtorno
heterogêneo, pelas diferentes taxas de resposta ao tratamento, pelos diferentes cursos
evolutivos e pelas diferentes formas de apresentação da síndrome, que sugerem a existência
de diversos subtipos com bases fisiopatológicas diferentes. Os autores enfatizaram alguns
subgrupos, delimitados de acordo com a presença de características importantes na expressão
do fenótipo. Algumas diferenças clínicas, como presença de tiques, idade de início dos
sintomas, presença de febre reumática, crítica do paciente (insight) foram consideradas. Os
autores concluíram que o TOC, associado a tiques, pode representar um dos possíveis subtipos
clínicos, de início precoce e aquele associado à febre reumática (FR). Todos têm um início
precoce dos sintomas, são mais comuns em homens e mais freqüentemente associados a
tiques. Eles assinalaram que pacientes com início precoce parecem ter pior prognóstico e
deveriam merecer maior atenção em termos de políticas de saúde.
Mercadante (2001) apresentou uma série de estudos que têm como hipótese a
possibilidade de haver um subtipo de TOC causado por mecanismos imunológicos. Este campo
de pesquisa está fundamentado nos estudos de crianças com Coréia de Sydenham (CS), a
manifestação no sistema nervoso central da febre reumática, que apresentaram sintomas do
transtorno. Este modelo foi expandido e atualmente inclui um grupo de pacientes designados
21
Pandas (Pediatric Autoimmune Neuropsyquiatric Disorders Associated with Streptococcal
Infections). Segundo o autor, se confirmada essa conexão entre quadros infecciosos, resposta
imunológica e transtornos neuropsiquiátricos de evolução crônica, poder-se-á estabelecer um
dos modelos mais relevantes para a neurociência dos tempos atuais.
Outro estudo realizado por Scahill et al. (2003) confirmou o de Hounie et al. (2001), ao
verificar que o TOC é um transtorno heterogêneo e que a idade de início dos sintomas pode
definir importantes subgrupos. O estudo foi realizado com 80 crianças, sendo 50 meninos e 30
meninas, de 4 a 18 anos. Verificando-se o tipo de sintoma, a severidade, a idade de início e a
presença de tiques. As obsessões mais comuns foram de contaminação e preocupação com
ferir-se; as compulsões incluíram lavagem e rituais para prevenir ferimento. A única diferença
significativa em relação à idade do grupo foi a preocupação religiosa presente no grupo de
adolescentes. Os tiques associavam-se ao aumento da freqüência e repetição do
comportamento de esquiva do ferir-se. Os autores concluíram que parece haver diferenças
fenotípicas nas crianças acima e abaixo de 11 anos. Segundo eles, a diferença na distribuição
dos sintomas do transtorno, de acordo com a presença ou não de tiques, tem sido
documentada nos estudos de adultos e aqui ficaram evidentes.
1.5 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Genética
Alguns estudos apontam o surgimento precoce dos sintomas como possível evidência de
implicação genética na etiologia do transtorno. Entretanto, estudos genético-familiares
realizados até o momento apresentam resultados discordantes, pois, apenas três coletaram
dados a partir de crianças e adolescentes.
Lenane et al. (1990) estudaram os parentes de 46 crianças e adolescentes com a doença
e encontraram um risco mórbido de TOC e TOC subclínico (indivíduos com sintomas
obsessivos e compulsivos que não preenchiam critérios diagnósticos de TOC) de 35%, sendo
que 25% dos pais, 9% das mães e 5% dos irmãos apresentavam TOC.
Riddle et al. (1990) entrevistaram os pais de 21 crianças e adolescentes e observaram a
presença de TOC e TOC subclínico em 35,7% desses.
Belodi et al. (1992) observaram apenas 3,4% de TOC entre os parentes de 1º grau de 92
pacientes, mas o risco mórbido foi de 8,8% quando se consideraram apenas os pacientes com
idade de início do TOC inferior a 14 anos.
Leonard et al.(1992) verificaram que 13% dos parentes de 1º grau dos pacientes com
início do transtorno na infância preenchiam critérios diagnósticos para o TOC.
22
Gonzalez, em 2001, descreveu os métodos de estudo de aspectos genéticos no
transtorno além de principais estudos realizados na área e seus resultados. Na pesquisa em
andamento, no Brasil, sobre Estudo Familiar do Transtorno Obsessivo-Compulsivo, os
pesquisadores observaram uma prevalência de 6,9% da doença entre 173 parentes de 1º grau
de 30 probandos com o transtorno e 1,4% de TOC entre os controles (n=348). Assim como os
estudos citados estão relacionados à família, há outros em andamento, como estudos de
gêmeos, de análise de segregação e de associação. Gonzalez concluiu que na maioria dos
estudos de gêmeos e de famílias confirma-se a hipótese de que o TOC é familiar e que fatores
genéticos são importantes. Alguns estudos de análise de segregação parecem sugerir o
envolvimento de um gene de efeito maior na questão relacionada à suscetibilidade ao
transtorno.
A questão genética no TOC apresenta um campo a ser mais pesquisado para uma
melhor compreensão da patogênese da doença, pois existem pacientes que apresentam
histórico familiar e associação a tiques; outros história familiar sem associação a tiques e,
ainda, aqueles que não apresentam nenhuma descrição de TOC em sua história familiar.
1.6 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Comorbidade
Petribú (2001) definiu etimologicamente o termo “comorbidade”,: formado pelo prefixo
cum, de origem latina - que significa contigüidade, correlação, companhia -, e pela palavra
“morbidade”, que se origina de morbus - estado patológico ou doença -, que é utilizado para
descrever a coexistência de transtornos ou doenças e não de sintomas. Para haver
comorbidade, é necessária a relação e a continuidade temporal entre dois ou mais transtornos,
que podem surgir simultaneamente ou um preceder o outro.
Algumas pesquisas demonstram que as crianças costumam apresentar alta taxa de
comorbidade, como as de Geller et al (1996) com 90% das crianças que apresentavam outros
transtornos co-mórbidos, e 70% preenchiam critérios para transtornos disruptivos de
comportamento, além de quadros depressivos, fobias simples, ansiedade de separação e
tiques.
Estudou-se a possibilidade de determinar subgrupos a partir dos quadros co-mórbidos,
entretanto, apenas a associação entre TOC e tiques foi comprovada por estudos clínicos,
genéticos e de neuro-imagem (Miguel et al. (2000).
O transtorno raramente ocorre sozinho, por isto é muito importante uma avaliação médica
criteriosa em relação ao diagnóstico e à comorbidade. As futuras pesquisas na área deverão
23
ser importantes para determinar os possíveis subtipos e os tratamentos mais indicados para os
pacientes com essas doenças.
1.7 Aspectos neuropsicológicos do Transtorno Obsessivo-Compulsivo
Fontenelle (2001) ressaltou que interesse peos aspectos neuropsicológicos dos pacientes
com TOC aumentou após estudo de sujeitos com sintomas subclínicos, especialmente
relacionados às compulsões de verificação, uma vez que apresentam sintomas semelhantes
aos de paciente com o transtorno e são mais freqüentes na população. Estas mesmas pessoas
apresentariam comprometimento das funções executivas, habilidades relacionadas com os
lobos frontais. Na pesquisa neuropsicológica sobre pacientes com TOC, as áreas que têm
despertado maior interesse são:
identificação das funções neuropsicológicas comprometidas, que podem ser:
memória para ações, monitorização da realidade, memória não-verbal,
habilidades visoespaciais, velocidade na realização dos testes e funções
executivas;
relação entre essas disfunções e as características clínicas;
comparação entre as disfunções de pacientes com o transtorno e aquelas de
pacientes com outros diagnósticos psiquiátricos;
relação entre essas disfunções e as teorias neuroquímicas do transtorno.
Soprano (2003) definiu funções executivas como habilidades vinculadas à capacidade
de organizar e planejar uma tarefa, iniciar um planejamento e mantê-lo em mente enquanto se
executa, inibir as distrações e mudar de estratégias de maneira flexível, quando exigido. Em
resumo, organização, antecipação, planejamento, inibição, memória de trabalho, flexibilidade,
auto-regulação e controle constituem requisitos importantes para resolver problemas de
maneira eficaz. Pois as alterações da função executiva ocorrem com bastante freqüência em
vários quadros neurológicos e psicopatológicos, incluindo o TOC. O autor ressaltou que termos
como controle executivo remetem mais diretamente ao conceito psicológico do que ao
transtorno do lobo frontal que estaria associado a estas funções. No caso dos pacientes com o
transtorno, pode-se observar certos comprometimentos de alguma das funções executivas,
como a inflexibilidade da resposta que se evidencia por meio de comportamentos não
adaptados, perseverações, estereotipias e dificuldade em regular e modular atos motores.
24
2 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Tratamentos Psicológicos
2.1 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Psicanálise
Freud escreveu nos seus trabalhos iniciais a respeito das manifestações neuróticas, e
atenta para a compreensão psicogênica desses quadros:
Toda obsessão neurótica que emerge na esfera psíquica decorre de repressão.
As idéias obsessivas têm, de fato, uma circulação psíquica compulsiva
(obsessiva), não devido à fonte de que derivam ou que acrescentou uma
contribuição a seu valor. (FREUD, 1976a, p.196)
Freud (1973), quando escreveu “Obsessões e Fobias”, tentou discriminar os quadros
fóbicos dos obsessivos, utilizando a teoria das emoções. Nessa época, ele apontou diferenças
entre fobias e obsessões. Em toda obsessão existiriam dois elementos importantes: uma idéia
que se impõe ao paciente e um estado emotivo associado. Para o autor, as psiconeuroses se
diferenciam das neuroses clássicas ou atuais por apresentarem uma etiologia psíquica e não
somática. Ele também definiu o conceito e classificou as neuroses como de conversão histérica,
obsessiva-compulsiva e de ansiedade. Durante sua vida, Freud lidou com a questão das
emoções e dos afetos. As suas observações de pacientes obsessivos permitiram a identificação
de vários mecanismos de defesa utilizados pelo ego para lidar com a angústia, tais como a
formação reativa, o deslocamento e o isolamento. Os sintomas da neurose obsessiva, para
Freud, seriam decorrentes de restrições no funcionamento mental, levando a pessoa
progressivamente à incapacidade para lidar com a angústia. Diante desta dificuldade, o ego
utiliza suas defesas de uma forma completa ou parcial, podendo ocorrer retorno a um nível mais
antigo de organização libidinal, a fase anal-sádica. Muitas vezes o paciente tenta controlar cada
uma de suas idéias pelo trabalho lógico e pelo recurso de lembranças conscientes. Este tipo de
comportamento levaria a um pensamento obsessivo, a uma compulsão de testar as coisas e à
dúvida. A defesa secundária contra os pensamentos obsessivos leva a um conjunto mais vasto
de medidas protetoras, que poderiam ser agrupadas em penitenciais (cerimoniais opressivos,
observação de números), precaução (todas as espécies de fobias, superstições, minuciosidade)
e medo de delatar-se (colecionar aparas de papel). Na linguagem psicanalítica, o ego procura
afastar os derivados da lembrança que foi inicialmente reprimida e, frente a essa luta defensiva,
cria sintomas que podem ser classificados como defesa secundária. Todos esses sintomas são,
25
na opinião de Freud, medidas protetoras que entram na luta contra as idéias e afetos
obsessivos.
Ajuriaguerra (1977) observou que o núcleo obsessivo é o resultado de uma regressão de
estruturas da libido, com pontos de fixação pré-genital e a emersão de impulsos, desejos e
fantasias sexuais agressivas unidas à angústia e culpa, que mobilizam reações de defesa por
parte do ego sob influência do superego. O paciente obsessivo lutaria contra a expressão de
seu desejo e da angústia associada, utilizando alguns mecanismos de defesa como o
isolamento, a negação, a formação reativa e a racionalização.
Uchoa (1979), autor da psicanálise, analisou que Freud se referia à neurose obsessiva-
compulsiva colocando em destaque a libido que, depois de atingir a fase fálica, regredia para a
fase pré-genital anterior, isto é, anal-sádica, que é um nível mais antigo de organização libidinal.
Para o autor, é provável que haja uma fraca organização fálica, que o ego não tenha forças e se
abandone com relativa facilidade à influência dos conflitos edipianos e ao medo de castração.
Na opinião do autor, quando Freud descreveu a fase anal, percebeu também fenômenos
acentuados de agressão, daí a designação anal-sádica. Nesta fase, não existe fusão dos
instintos parciais, o que explicaria a irrupção fácil dos impulsos de agressão ainda não ligados
pela libido (como é o caso da fase fálica). Esta seria uma característica importante que
diferencia os pacientes compulsivos dos histéricos, pois nestes não existe o fenômeno da
regressão.
Hashimoto (1996) defendeu a importância do processo de transferência no tratamento de
um caso de neurose obsessivo-compulsiva. O autor assinalou a existência de três formas que
podem ocorrer no processo psicanalítico: neurótica, borderline e psicótica. Estas três formas
podem aparecer no tratamento da neurose obsessiva-compulsiva, e o autor descreveu o caso
de um paciente adulto que foi tratado com sucesso, por meio da regressão ao estado de
transferência psicótica.
Ierodiakonou e Ierodiakonou-Benou (1997) escreveram a respeito do tratamento
psicoterápico breve de pré-adolescentes obsessivos e apontaram diferenças no tratamento de
adultos e adolescentes. São necessários tratamentos específicos para esta idade, tendo em
vista as características da puberdade e as relações ambivalentes do grupo com seus pais.
Karush (1998) assinalou que, assim como em adultos, os sonhos das crianças oferecem
um acesso direto ao inconsciente, e, na psicanálise de crianças, este aspecto tem sido
negligenciado. Ele apresentou o caso de análise de um menino de 9 anos com TOC, que
esteve em tratamento durante dois anos e meio, e demonstrou como a análise dos sonhos foi
26
de grande importância para esclarecer o conflito e os mecanismos de defesa utilizados no
transtorno.
Pontes (1998), psicanalista, definiu obsessão e compulsão da seguinte maneira:
Obsessão diz respeito às idéias de forma incoercível e, com seu automatismo,
impõe uma consciência enferma. A compulsão é a representação das idéias
através do comportamento repetitivo ritualístico. (PONTES, 1998, p.73).
Para este autor, Freud considerava a neurose obsessiva-compulsiva de acordo com três
fatores:
uma regressão dos sintomas funcionais a uma fase sádico-anal;
as excessivas defesas do Ego contra as pulsões instintivas;
os imperativos inconscientes do Superego.
Arruda (1999) examinou a importância da função de continência no atendimento de
pacientes com quadros graves, e assinala que existem formas de amar que podem aparecer de
forma idealizada ou de maneira extremamente sádica e perversa. Citou como exemplo
pacientes com TOC que necessitam de uma atitude continente, pois eles têm momentos de
desespero, em que predominam sentimentos de vazio total, de desinteresse, algo como uma
ausência de mente ou uma mente incapaz de pensar. Diferentemente de Hashimoto, Arruda
considerou que essas sensações não seriam decorrentes de um ataque do paciente à relação
analítica, mas de uma rejeição a qualquer relação que se apresente criativa. A autora
descreveu momentos nos quais foram observados fatos clínicos resultantes do mecanismo de
identificação projetiva: houve uma dificuldade na fixação da libido e no desenvolvimento da
capacidade de amar, que foi representada por ataques que o paciente fazia à relação
terapêutica, nos quais ele expressava o desejo de impedir o desenvolvimento do vínculo
transferencial positivo, com medo dos sentimentos de liberdade e de criatividade.
Darcourt (1990) questionou em seu artigo se haveria possibilidade de um encontro entre
a psicanálise, o biológico, o cognitivo e o comportamental, tendo em vista a variedade dos
métodos terapêuticos das diferentes abordagens psicológicas. Entretanto, ele acredita que
poderia haver uma discussão a respeito de dois pontos importantes no TOC:
as desordens obsessivas seriam de origem psicogenética ou organogenética;
estudos de casos clínicos. A psicanálise apresenta um modelo psicopatológico
adequado para a prática clínica no tratamento do transtorno que poderia ser
integrado às técnicas comportamentais.
Na opinião desses autores da abordagem psicanalítica, as idéias de Freud a respeito da
neurose obsessiva-compulsiva são de grande importância para o tratamento psicológico do
27
TOC e, dentro dela, alguns autores apresentam questões teóricas importantes que abrem a
possibilidade de um diálogo maior entre as diferentes abordagens psicológicas.
2.2 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Terapia Cognitivo-
Comportamental
Atualmente, um dos recursos mais utilizados para o tratamento psicológico do TOC tem
sido terapia com abordagem cognitiva e comportamental.
March (1995) apresentou uma revisão crítica da literatura publicada sobre a TCC no
tratamento do transtorno em crianças e adolescentes. Das 32 investigações de crianças e
adolescentes analisadas, a maioria era constituída de estudos de casos com algumas
diferenças de terminologia e estrutura teórica, todos eles mostraram alguns benefícios
decorrentes das intervenções cognitivo-comportamentais. A exposição gradativa e a prevenção
de resposta formam o núcleo do tratamento. O manuseio e o tratamento da ansiedade no TOC,
junto à intervenção familiar, pode ser uma ajuda. A pouca aderência, a documentação
inadequada e inconsistência na aplicação do tratamento são problemas recorrentes. Como
conclusão, o autor citou abundante material clínico e empírico que sugere que a TCC sozinha
ou em combinação com a farmacoterapia, é um tratamento efetivo do transtorno em crianças e
adolescentes. O autor ressaltou que futuras pesquisas na área necessitam comparar os
resultados dessa terapia aos de outros tratamentos.
Wielenska et al (1995) consideraram o TOC um transtorno de esquiva fóbica, em que se
pode identificar uma intensa reação de ansiedade (disforia) com manifestações autonômicas.
Na teoria cognitiva, as percepções humanas se estruturam a partir de esquemas cognitivos
básicos, aprendidos e formados por meio de experiências de socialização, que abrangem
questões pessoais, culturais, de gênero e religiosas. Os transtornos de ansiedade, incluindo o
transtorno, são estabelecidos a partir da aprendizagem de esquemas cognitivos inadequados
que, na presença de eventos estressantes, eliciam pensamentos disfuncionais automáticos. A
soma desses fatores significa uma ameaça e perigo contínuo. Ao perceberem os sinais de
ansiedade, os indivíduos tornam-se hipervigilantes em relação às ameaças ou possibilidades.
Com a intensificação desse estado, a pessoa passa a enxergar perigo onde não existe. O
modelo cognitivista, segundo esses autores, embora descreva com precisão grande maioria dos
eventos privados do indivíduo com ansiedade, não explica de maneira adequada quais são as
condições para o estabelecimento de cada transtorno de ansiedade específico e não esclarece
os procedimentos terapêuticos eficazes. Alguns procedimentos de reestruturação cognitiva
28
podem assumir a função de ritual cognitivo encoberto, o que neutralizaria a ansiedade eliciada
pela obsessão. Os autores asseguram que, no modelo comportamental, os comportamentos
obsessivo-compulsivos desenvolvem-se para reduzir um estado de ansiedade. As atitudes
positivamente reforçadas no passado podem atuar como uma resposta redutora de ansiedade
quando, em uma situação qualquer, o indivíduo experimenta uma ansiedade ou alguma emoção
negativa de medo, vergonha, raiva e etc.
A terapia comportamental conta com um amplo conjunto de técnicas que procura enfocar
comportamentos que a pessoa considera disfuncionais. Ela se baseia na análise funcional do
comportamento e de contingências. As técnicas comportamentais visam a diminuição ou
extinção da esquiva, por meio do confronto ou exposição repetida ao estímulo temido e do
impedimento do comportamento compulsivo e ritualístico. Esta exposição promove a
habituação, declínio da resposta da ansiedade, toda vez que o estímulo é reapresentado. A
técnica de prevenção de resposta promove a aprendizagem de que a ansiedade se reduz por si
só, o que não confirma a crença de que o ritual alivia a ansiedade. A pessoa fixa metas e
desenvolve exercícios individualmente ou com o terapeuta, no sentido de atingir os objetivos.
Ito (1996) evidenciou que o modelo da teoria da aprendizagem foi o responsável pela
evolução das técnicas comportamentais. A teoria comportamental reconhece que o medo e a
esquiva são elementos centrais no TOC, adquiridos e mantidos por meio de um processo que
envolve duas etapas: a) condicionamento clássico e b) condicionamento operante. Segundo
esta abordagem, a esquiva e o comportamento compulsivo impedem a exposição aos estímulos
temidos e não permitem a desconfirmação do perigo, contribuindo para a manutenção das
obsessões. A eliminação da ansiedade leva à extinção do comportamento de esquiva.
Lotufo-Neto e Baltieri (2001), seguindo o modelo cognitivo, sugeriram que os
pensamentos disfuncionais sem base integral na realidade influenciam de forma significativa o
humor e o comportamento do indivíduo, pois a intensidade dos sentimentos depende, em
grande parte, da forma como a situação é avaliada. Uma análise parcial da realidade gera
sentimentos desproporcionais ou inapropriados para lidar com a situação e criar alternativas.
Pessoas com TOC apresentam fenômenos cognitivos que podem contribuir para o
desenvolvimento do transtorno e ter influência no tratamento, com seis tipos de domínios
cognitivos associados:
Responsabilidade.
Estimativa de ameaça.
Perfeccionismo.
Supervalorização do papel dos pensamentos.
29
Controle sobre os pensamentos.
Tolerância por ambigüidade.
Para os autores, a idéia central da Terapia Cognitiva-Comportamental é que na base do
problema do paciente estaria o seu modo de pensar sobre si mesmo, a realidade e os
acontecimentos.
March et al. (2001) reconheceram que, durante os últimos 15 anos, a TCC tem
conseguido espaço no tratamento psicossocial para o TOC porque “apresenta uma lógica
consistente e uma relação adequada entre o transtorno, o tratamento e os resultados
específicos” (p.8). Apesar do consenso de que a TCC é de grande ajuda, é comum a baixa
aderência de crianças ao tratamento pelo uso repetitivo das mesmas técnicas. Entretanto, como
o resultado é positivo para a maioria das crianças e adolescentes, essa terapia continua sendo
a primeira escolha no tratamento do transtorno. Os autores fazem, neste artigo, uma revisão
dos princípios e aspectos práticos da TCC no tratamento do TOC e discutem estudos empíricos
em que foi utilizada a terapia em crianças.
Benazon et al. (2002) confirmaram o estudo de March et al. (2001) quanto à eficácia
terapêutica da TCC em pacientes pediátricos com diagnóstico do transtorno, que não foram
medicados durante o processo terapêutico. O total de pacientes era 16: oito destes com 17
anos de idade foram tratados durante 12 semanas com a terapia e os sintomas diminuíram.
Análises estatísticas mostraram um resultado positivo significativo em relação ao tratamento.
Os pacientes tiveram 50% de redução nos sintomas e 7 pacientes estavam assintomáticos.
Estes resultados, conforme os autores, demonstram que a TCC é eficaz no tratamento
pediátrico do TOC e que o tratamento é benéfico no alívio dos sintomas do transtorno, mesmo
sem medicação.
Atualmente, a terapia tem sido a primeira escolha de tratamento psicológico para a
doença e, na revisão de literatura, foi encontrado um grande número de estudos de caso com
resultados positivos.
2.3 Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Psicologia Analítica
Em 1910, Freud ao escrever sobre as neuroses afirmou:
[...] Seja-me permitido neste ponto expor o principal resultado da investigação
psicanalítica dos neuróticos: as neuroses não têm um conteúdo psíquico
especial que não possa ser encontrado também nos indivíduos sãos, ou, como
expressou C.G. Jung: os neuróticos adoecem em conseqüência dos mesmos
30
complexos contra os quais lutam os indivíduos sãos. De circunstâncias
quantitativas da proporção das forças que lutam entre si resultará a saúde, a
neurose ou a sublimação compensadora. (FREUD, 1976b, p.166)
Ao final do século XIX, Freud e Jung delinearam dois caminhos para a compreensão da
doença mental. Freud introduziu na ciência a consideração de uma esfera inconsciente da
psique e Jung (1997) defendeu suas idéias. Nas suas pesquisas, buscava confirmar ou refutar
as hipóteses freudianas a respeito do inconsciente, desenvolvendo um método experimental
objetivo, que permitisse acesso aos conteúdos irracionais da psique. Um deles é o Teste de
Associação de Palavras, utilizado até hoje, no qual o sujeito é instruído a responder a uma
palavra-estímulo com uma palavra-resposta que primeiro lhe ocorra à mente. O aplicador anota
o tempo entre ambas, e em certas situações-resposta, ocorre modificação na freqüência
cardíaca. Após inúmeras aplicações, Jung percebeu que algumas palavras-estímulo
influenciavam tempo entre o estímulo e a resposta. Após estudar a história de vida do
participante, ele chegou à conclusão de que esse aumento de tempo estava relacionado a
temas de grande fator emocional da vida do participante. Estes aspectos estavam relacionados
à existência de outras “personalidades” no inconsciente de seus pacientes. A partir dessas
observações, surgiu a Teoria dos Complexos, que é base da teoria analítica.
Para Jung (1989), o termo neurose indica um estado psíquico intermediário entre o
campo da normalidade e o da patologia. A neurose é a manifestação de um distúrbio psíquico
sem qualquer causa orgânica, cujos sintomas são ativados por uma situação presente, esses
são considerados expressão simbólica de um conflito que coloca em evidência dois elementos
psíquicos correlacionados de forma contraditória.
Não é possível encontrar a verdadeira etiologia da neurose nas mais variadas
manifestações do desenvolvimento sexual infantil e nas fantasias a que elas
dão origem. O fato de essas fantasias serem exageradas na neurose e
ocuparem o primeiro plano é conseqüência da energia acumulada ou libido. A
perturbação psicológica na neurose e a própria neurose podem ser qualificadas
como um ato de adaptação que fracassou. (JUNG, 1989 § 574).
Ao contrário de Freud, Jung (1998) relatou que o caminho para o inconsciente não é o
sonho, mas o complexo. Ele é fundamental à teoria analítica e, dependendo de sua autonomia,
intensidade energética e conteúdo, pode manifestar-se em oposição ao ego. O complexo
apresenta uma energia própria e, muitas vezes, mostra-se como um corpo estranho, vivo e com
características próprias.
Stein (1998) relatou que os complexos possuem uma energia, e muitas vezes são
capazes de irromper de maneira súbita e espontânea na consciência e de se apossar das
31
funções do ego. A origem dos complexos deve ser procurada na história de vida da pessoa,
porque eles se formam a partir de uma experiência traumática, pela repressão ou pelo fato de
alguns conteúdos do inconsciente não entrarem em contacto com o consciente. Neste
momento, é como se não existisse uma ponte entre o inconsciente e o consciente.
Costa (2005) apresentou um estudo de caso de um paciente com TOC, e conta que o
seu trabalho partiu de uma entrevista clínica, do Teste de Associação de Palavras e de algumas
pranchas do Teste de Apercepção Temática (TAT). Após a coleta dos dados, iniciou-se o
tratamento e a compreensão psicológica sob a perspectiva da teoria analítica de Jung, que
contribuiu significativamente para a compreensão do caso, e o paciente obteve uma melhora de
70% de seus sintomas. O autor ressaltou as semelhanças entre as características dos sintomas
obsessivos e compulsivos e a fenomenologia dos complexos proposta por Jung (1986),
concluindo que novos estudos devem ser realizados, a fim de estabelecerem relações entre o
universo simbólico, a história de vida e a doença mental.
Para Byington (1996), a elaboração simbólica é o principal trabalho exercido pela
articulação criativa do córtex cerebral com o resto do sistema nervoso, por meio dos símbolos e
funções estruturantes. Reconheceu o espectro obsessivo-compulsivo como uma síndrome
patológica ligada a uma disfunção do arquétipo patriarcal. Na psicologia analítica simbólica,
tanto os símbolos quanto as funções psíquicas são considerados estruturantes e coordenados
pelos arquétipos. O conceito de mecanismos de defesa é diferente da psicanálise. Aqui, eles
são descritos como funções estruturantes criativas e defensivas, consideradas de natureza
arquetípica e de atuação na elaboração simbólica, essas ligadas às funções da vida e da
natureza. Quando ocorre uma fixação na elaboração simbólica, elas operam defensivamente.
Estruturalmente, as funções estruturantes criativas e defensivas são as mesmas, mas a
diferença está na elaboração simbólica da consciência, para a primeira, ou no impedimento de
seu acesso a ela e mantê-la na inconsciência, para a segunda. Para o autor no TOC, as
funções estruturantes defensivas disputariam a elaboração dos símbolos com as criativas,
coordenadas pelo arquétipo patriarcal, e esta separação em dois gêneros é de grande
importância para discriminar normal do patológico. É provável que, no transtorno, as funções
estruturantes defensivas predominem sobre as criativas, dificultando ou impedindo a elaboração
do símbolo que, assim, apresentar-se-ia de forma repetitiva e compulsiva. As estruturas
defensivas impediriam a livre elaboração dos símbolos levando-os à compulsão e à repetição
inconsciente dos sintomas. O paciente com TOC não atribuiria significados às suas obsessões
e compulsões nem à sua agressividade. Para o autor, a abordagem exclusivamente verbal e
ideativa psicanalítica e analítica tem pouco efeito terapêutico sobre o TOC, mas reconheceu
32
que a TCC tem um efeito significativo no tratamento desse transtorno. Explicou que esta
abordagem não considera uma teoria de desenvolvimento normal e patológico da personalidade
como referência teórico-psicodinâmica para uma possível compreensão da transferência, das
defesas, da resistência e da elaboração simbólica. O autor considerou a simplicidade da TCC a
sua maior desvantagem por tornar concretos os sintomas, o tratamento e as pessoas. Neste
momento, para Byington, ocorre a perda da percepção simbólica, que é a nossa capacidade de
inserção no todo humano.
2.4. Conclusão
Após a revisão do TOC, sob o ponto de vista da psiquiatria e da pesquisa, das principais
abordagens psicológicas utilizadas no tratamento desse transtorno, nota-se que foi a partir do
século XX, com a presença da psicanálise na psiquiatria, que inicia-se um campo de pesquisa e
conhecimento dedicado ao estudo da doença mental. Os sintomas passaram a ser explicados
como sendo resultado de conflitos durante o desenvolvimento da personalidade. O tratamento é
exclusivamente verbal, com o trabalho dos fenômenos do inconsciente. Em contraposição ao
movimento psicanalítico, surgem as terapias de abordagens comportamentais, centradas nos
fenômenos conscientes, que não pretendem atingir conteúdos mais profundos da psique.
Conforme verificou-se no levantamento da literatura em relação ao tratamento do TOC há
poucos trabalhos com terapias exclusivamente verbais em comparação à TCC. March et al.
(2001) relataram que algumas crianças portadoras de TOC apresentam dificuldades de
aderência ao tratamento em função do uso repetitivo das técnicas. Além disso, a TCC, ao
trabalhar apenas os aspectos cognitivos e comportamentais, não permite uma transformação da
estrutura psíquica em nível mais profundo.
Parece necessário, portanto um referencial teórico e prático que possibilite trabalhar nos
níveis consciente e inconsciente para o tratamento de crianças com TOC.
Na psicologia analítica, Byington (1996) compreendeu que, no TOC, as funções
estruturantes defensivas disputariam a elaboração dos símbolos com as criativas, que são
coordenadas pelo arquétipo patriarcal, e é provável que, no transtorno, as funções defensivas
tenham predominância sobre as criativas, dificultando ou impedindo a elaboração do símbolo,
que se apresenta de forma repetitiva e compulsiva. As estruturas defensivas impediriam a livre
elaboração dos símbolos levando-os à compulsão e à repetição inconsciente dos sintomas.
Para Costa (2005) o tratamento de um sujeito adulto envolve a simbologia dos sintomas
33
obsessivo-compulsivos e a história de vida do sujeito. Assim, existem semelhanças entre as
características dos sintomas obsessivos e compulsivos e a teoria dos complexos de Jung.
No próximo capítulo serão examinados alguns pontos importantes para este estudo, para
uma melhor compreensão do desenvolvimento psicológico da criança sob a perspectiva da
psicologia analítica.
34
3 O Desenvolvimento Psicológico da Criança sob a Perspectiva
da Psicologia Analítica
Jung (1986) destacou em sua obra que, desde o nascimento da criança, existe a
influência dos pais, ao mesmo tempo em que ela está mergulhada no inconsciente dos pais. Na
grande maioria das vezes a interação da individualidade da criança com o seu ambiente será
adequada e, em outros momentos, não será tão satisfatória, gerando frustração, importante ao
desenvolvimento da consciência. Este ponto de vista é importante para se entender o processo
de individuação que se inicia na infância e é essencial na abordagem moderna do
desenvolvimento.
Samuels (1989) ao rever alguns estudiosos da teoria de desenvolvimento infantil, relatou
que o desenvolvimento de uma personalidade individual resulta da articulação de potenciais
inatos em resposta a fatores ambientais encontrados pelo indivíduo. Se o ego for forte para
permitir o confronto de conteúdos do inconsciente com o mundo externo ele acabará se
fortalecendo. O autor considerou que grande parte desta relação saudável entre consciente e
inconsciente depende da qualidade dos primeiros relacionamentos e do estabelecimento da
confiança na relação mãe-filho, pois “essencial é como a mãe e filho lidam com a frustração”.
(Samuels, 1989: p. 163). Ressaltou alguns pontos importantes na obra de Jung que contribuem
para a compreensão da psicologia do desenvolvimento:
Ênfase na mãe: o relacionamento mãe-filho é profundo e tem uma intensidade tão
grande, que leva a criança a se apegar à mãe. Neste relacionamento existem três
aspectos muito importantes a serem considerados: o primeiro é a regressão que
ocorre em função das exigências externas e internas feitas ao bebê para se
adaptar. Pode-se entender a regressão não apenas em relação à mãe pessoal,
mas também à imagem arquetípica inconsciente da mãe. A regressão não fica
presa à mãe, vai além dela, até o arquétipo do “Eterno Feminino”. O segundo
aspecto é a luta da criança para se separar da mãe, que inclui uma iniciação em
um novo estado, como se uma parte da criança quisesse desenvolver para o
mundo externo e a outra necessitasse retornar às origens para o fortalecimento.
Nesse momento de luta a mãe aparece como elemento regenerador, ao passo
que o mundo externo chama para novas experiências. O terceiro aspecto a ser
considerado na relação mãe-bebê diz respeito à alimentação, à nutrição,
35
relacionada aos primeiros anos de vida, uma fase importante ao desenvolvimento
do ser humano.
Mecanismos psicológicos primitivos podem ser considerados uma antecipação à
teoria das relações objetais. O primeiro é o mecanismo da divisão em relação à
imagem da mãe, que se pode entender como a dualidade entre a mãe pessoal e o
arquétipo materno e, também, como a dualidade entre as versões boas e más da
mãe real ou da mãe arquetípica. No momento da luta pela separação da mãe, a
criança busca uma transformação que se torna necessária a uma nova
adaptação.
Neste momento se o consciente conseguir interpretar o arquétipo de maneira
apropriada esta transformação ocorre e o novo processo de adaptação é
iniciado, então a relação mais importante da infância, que é a relação com a
mãe, é compensada pelo arquétipo da mãe. (JUNG 1999, § 351).
O segundo mecanismo é nomeado de “identidade primitiva” que, para Jung, corresponde
a uma tendência inata para a identidade descoberta pela experiência ou fantasia. O termo
utilizado por Jung, “participação mística”, descreve a relação mãe-bebê como um estado em
que ambos estão ligados, com um estado de indiferenciação psíquica entre sujeito e objeto. A
“participação mística” ou identificação projetiva é uma das defesas que aparece na
psicopatologia do adulto
A libido pré-edipiana para Jung é percebida de uma maneira diferente de Freud.
Jung observou que o afeto em uma criança é tão intenso quanto em um adulto e
de uma certa forma, ele descaracteriza a libido como algo apenas instintivo. Jung
confere à libido uma carga emocional, e seu maior enfoque é a transformação da
libido que ocorreria em movimento ascendente, partindo do instinto para a
espiritualidade.
Diferenciação é um termo que foi muito utilizado por Jung. Na psicologia do
desenvolvimento, pode-se compreender como os momentos em que na psique da
criança ocorre o movimento da separação de partes a partir do todo. O processo
de diferenciação consiste em separar as funções uma das outras e seus
elementos individuais uns dos outros, o que permitiria o processo de individuação.
A diferenciação daria a oportunidade de se falar em indiferenciação e pré-
diferenciação, que seriam estados psicológicos, sendo a pré-diferenciação um
aspecto normal do desenvolvimento e a indiferenciação ligada à psicopatologia.
36
No esquema psicossomático, em 1913, Jung propõe um modelo de crescimento
psicossomático que conecta a maturação fisiológica ao simbolismo psicológico.
A libido, como energia do processo vital em geral, nós a encontramos atuando
na criança principalmente no âmbito da função de nutrição. No ato de mamar a
criança absorve alimento, através de um movimento rítmico, acompanhado de
sinais de satisfação. Com o crescimento do indivíduo e desenvolvimento de
seus órgãos, a libido cria para si novos rumos de necessidade, de atividade e
de satisfação. (JUNG, 1989, § 290).
Formação do ego: Jung não vincula o desenvolvimento da consciência do ego a
qualquer esquema de desenvolvimento ou maturação da personalidade. O ego se
fortalece na medida em que existe o choque entre as limitações corporais do
indivíduo e o meio ambiente. A formação e a transformação do ego ocorrem
durante toda a vida.
Símbolos: Jung considerava os símbolos como a melhor formulação possível de
um conteúdo psíquico não conhecido. O símbolo tem a capacidade de transformar
energia desviando-a para outros canais e a formação do ego será ou não capaz
de sustentar o novo padrão de energia. Durante o desenvolvimento psicológico
infantil, os símbolos são importantes, pois servem de ponte entre o inconsciente e
o consciente que vai sendo confrontado.
A partir das afirmações de Jung a respeito do desenvolvimento infantil, outro autor
dedicou seus estudos à infância e propôs uma teoria a respeito do desenvolvimento Fordham.
Médico psiquiatra, na década de 30, trabalhou com crianças e realizou coleta de material
clínico. Em sua teoria ele considera três conceitos de Jung importantes para a sua base teórica:
o ego, os arquétipos e o Self.
Fordham (2001), em suas observações, confirmou a presença de imagens arquetípicas
no mundo interno da criança e elaborou a hipótese de um Self primário, original e presente e
ativo no nascimento, que se divide em partes na medida em que se desenvolve o
relacionamento com o mundo externo, permitindo o surgimento da consciência. A esse
processo denominou de-integração e reintegração, que descrevem a flutuação de um estado de
aprendizagem que se abre para novas experiências e durante estas experiências, a criança
mantém contacto com o seu Self, ao mesmo tempo, que se aventura pelo mundo externo para
acumular experiências em ação motora e estimulação sensorial. O conceito de Fordham trouxe
uma nova dimensão para a psicologia analítica e o desenvolvimento psicológico da criança,
pois a psique passou a ser concebida como uma estrutura dinâmica, em cuja atividade
acontece o desenvolvimento do ego e o desenvolvimento emocional da criança. Fordham
37
considera o ego “como a soma dos atos da percepção e das descargas motoras que são ou
podem tornar-se conscientes”. (FORDHAM, 2001, p.81), constituindo o de-integrado mais
significativo do Self.
O conceito de ego foi ampliado por Fordham (2001). que discrimina algumas qualidades
encontradas em um ego amadurecido:
Percepção: a consciência baseia-se na consciência, entretanto nem todos os
estímulos são totalmente percebidos pelo sistema nervoso e atingem o limiar da
consciência.
Memória: apesar de ser um elemento essencial ao funcionamento mental deve
ser abordada com cuidado, pois algumas manifestações podem ser registradas
com realismo, enquanto outras são estruturas complexas que mudam com o
tempo.
Organização de conteúdos mentais: relaciona-se às atitudes (introversão e
extroversão) e às funções (pensamento, sentimento, sensação e intuição).
Controle sobre a mobilidade: seria o controle sobre os atos impulsivos e os
movimentos comuns.
Teste de realidade.
Fala.
Defesas: incluem várias estratégias que são o resultado de situações conflitantes,
e têm como conseqüência a ansiedade. Algumas defesas na primeira infância têm
origem em estados muito primitivos do Self, que são a identificação projetiva e
introjetiva e a idealização. Outras defesas surgem à medida que o ego se
fortalece como o isolamento, formação reativa e a racionalização.
Em termos de psicopatologia, Fordham (2001) argumentou que a frustração e o choque
entre as funções arquetípicas e o mundo externo são necessários e estimulam o aumento da
consciência. Entretanto, quando surge um grande sentimento de raiva e decepção que o bebê
não consegue suportar, ele se sentirá fragmentado e incapaz de lidar com seus impulsos
internos ou exigências externas. Os distúrbios ocorreriam no fracasso da integração dos
processos de-integrativo e reintegrativo, ocasionando duas possibilidades: ou enfraquece-se o
ego ou cria-se uma couraça contra o mundo.
Como visto no capítulo anterior, há pouca contribuição da psicologia analítica para a
compreensão dos distúrbios psicopatológicos, em especial do TOC. É possível que nos
portadores de TOC ocorra um distúrbio na relação primal, e os processos de-integração e
reintegração não ocorram adequadamente, gerando um ego fragilizado e ameaçado por
38
conteúdos do inconsciente. Os sintomas podem agir como uma couraça protetora que se
manifestar sob a forma de obsessões e compulsões. Essa possibilidade será averiguada na
análise do estudo dos casos clínicos.
A terapia analítica junguiana utiliza técnicas que favorecem o contato mais profundo com
o inconsciente, com a finalidade de promover uma maior integração de conteúdos inconscientes
no ego, tais como técnicas interpretativa e redutivista, e técnicas construtivas, que promovem a
expressividade da psique.
Dentre as técnicas, a TS, por atuar no nível pré-verbal, permite o aprofundamento
necessário para que ocorra uma transformação na psique das crianças. Além disso, é possível
que a utilização da TS com crianças possa promover maior aderência ao tratamento por permitir
às crianças a possibilidade de expressar sua criatividade sem ter de obedecer a regras pré-
estabelecidas. A partir desta colocação, no próximo capítulo serão expostos alguns conceitos a
respeito dessa técnica terapêutica.
39
4 A Terapia do Sandplay
4.1 Definição
A TS é uma terapia não-verbal e criativa. Os sujeitos criam cenas ou desenhos com suas
mãos, utilizando caixa de areia seca ou molhada, água, miniaturas, sucatas e objetos da
natureza. Vale aqui citar que a TS oferece um espaço livre e protegido em que, por meio de
representações verbais e não-verbais, a criança pode representar e expressar sua dinâmica
psicológica, conforme a descrição de Weinrib (1993: p.19).
A terapia na caixa de areia é uma
forma de terapia não-verbal e não-racional, que atinge um nível profundo pré-verbal da psique”
A autora descreve como são realizados os cenários: em uma caixa de areia, com o auxílio das
mãos, o paciente procura modelar a areia e busca miniaturas que façam sentido para ele. Kalff
(1993), em suas reflexões sobre a interpretação da TS, verifica que o ato de brincar na areia
possibilita que conteúdos inconscientes profundos possam ser expressos e, desta forma,
tornam-se conscientes em nível pré-verbal da consciência. Relata, ainda, que o resultado do
processo dessa terapia em diferentes pessoas, independentemente de seu conteúdo, sugere
transformação pessoal, assim como mudanças do estar e se relacionar no mundo, com os
outros, de maneira mais positiva, que podem acontecer por meio da experiência de imagens
individuais internas e, muitas vezes, não há necessidade dos conteúdos internos tornarem-se
conscientes em nível verbal.
Ammann (2002: p.31), ao escrever a respeito da experiência com a TS, relata que esta
[...] ”mobiliza o analisando em todos os níveis do seu ser, confrontando-o com seus lados
consciente e inconsciente e, ao mesmo tempo, mostrando, em sentido construtivo e de
religação, suas possibilidades e capacidades para o desenvolvimento”.
Friedman e Mitchell (2003) ressaltam alguns atributos da TS:
Possibilidade de se voltar o foco para o interior. No momento em que coloca as
mãos e brinca com a areia, o paciente tem uma experiência sinestésica, que
promove um deslocamento da atenção do mundo externo (consciência) para o
mundo interno (inconsciente).
Esse tratamento dá expressão ao inconsciente. O material utilizado oferece uma
oportunidade para que componentes psíquicos inconscientes, muitas vezes
40
mantidos sob controle por mecanismos de defesa, possam surgir e serem
simbolicamente revelados nas cenas de areia.
A terapia proporciona ao sujeito a oportunidade para entrar em contato com sua
criatividade. Neste momento, ele se torna mais consciente de sua capacidade
psíquica.
O terapeuta oferece continência para que os símbolos possam emergir em um
espaço livre e protegido. O terapeuta que reflete e aceita sem julgamento ou
análise o que a psique apresenta, facilita o processo de transferência e
contratransferência.
A criação das imagens na TS na presença do outro (o olhar do terapeuta)
promove a ampliação da consciência e a integração do material do inconsciente.
Rever e refletir uma série de cenários anteriormente realizados permite ao sujeito
apropriar-se de seu próprio processo.
Esse tratamento fornece um espaço continente que pode transformar a fantasia ilimitada
em uma energia focalizada e criativa. A confecção de um cenário é um ato formador e criativo.
O espaço livre e protegido da caixa de areia propicia expressão e exteriorização de
necessidades agressivas reprimidas.
Considerando a aplicação da TS em outras patologias e pelas peculiaridades desta
técnica, a sua utilização pode produzir resultados significativos no tratamento do TOC em
crianças.
Para uma melhor compreensão da utilização dessa terapia nos estudos de caso, alguns
conceitos serão apresentados a seguir.
4.2 O Processo de Transferência, Contratransferência e
Ressonância
O processo de transferência ocorre quando o sujeito vivencia uma relação amorosa com
o terapeuta, que pode ser representada como a mãe sempre amorosa ou má, o pai rígido ou
semi-deus, entre outros tipos de relação. A respeito da transferência e suas razões, Jung
escreveu:
A razão psicológica geral da projeção é sempre um inconsciente ativado que
procura expressão. Sua importância é equivalente ao conteúdo projetado. E
uma transferência de natureza violenta corresponde a um conteúdo incendiário,
41
contém alguma coisa de importante, alguma coisa realmente de grande valor na
vida do paciente. (JUNG, 1997 § 352).
Bradway. (1991) aponta que, na TS, uma das presenças da transferência pode ser
percebida na coleção de miniaturas que são uma extensão do terapeuta, porque foi ele quem
as escolheu. Muitas vezes, a simples visão das miniaturas expostas propicia uma relação
transferencial mais rápida do que na terapia verbal.
Essa transposição ocorre de forma mais concreta, quando, o sujeito escolhe miniaturas
que representam o terapeuta ou utiliza a areia para revelar seus sentimentos. Freqüentemente,
a criança convida o terapeuta para participar do processo de construção dos cenários. Várias
vezes ocorrem o pedido de ajuda para retirar miniaturas da prateleira e a participação nos
cenários de guerras. Em outros momentos há os pedidos de resgate e socorro representados
pelos cenários de destruição e caos que permeiam a relação sujeito-terapeuta. De fato, a visão
do cenário após a sua realização por parte da criança e do terapeuta pode ser considerada um
dos momentos em que a transferência e contratransferência estão presentes.
O terapeuta também pode ver o sujeito em sentido positivo ou negativo este fenômeno e
chamado de contratransferência. Pode-se considerá-la o momento em que a experiência
subjetiva do terapeuta faz-se presente no campo de relação terapêutica, entendida por qualquer
experiência em relação ao sujeito como sentimentos, pensamentos, sensações no corpo,
imagens, lembranças, sonhos sobre o paciente, devaneios e fantasias.
Cunningham (2005) considera a contratransferência importante para o conhecimento
mais profundo do paciente e, quando ela ocorre, sugere que a dinâmica da relação sujeito-
terapeuta estaria ativada. Na TS o termo ressonância seria mais adequado que
contratransferência e salienta a importância da experiência do psicoterapeuta na prática clínica,
ou seja, a necessidade do terapeuta ter ampla percepção no campo das relações entre sujeito-
terapeuta, pois a técnica apresenta-se como uma terapia não-verbal e o material simbólico é
visível, diferentemente da terapia verbal.
Ammann (2004) ressalta que os sentimentos transferenciais e contratransferenciais são
importantes no processo da TS, porque esta terapia apresenta-se como uma técnica na qual a
verbalização não é o foco principal. Assim como Bradway (1991), Ammann (2004) afirma que o
terapeuta está conectado ao material, tanto à areia como às miniaturas de sua coleção, e que a
interação entre o sujeito e o local de trabalho do terapeuta é um aspecto importante no
processo analítico. Para a autora, terapeuta e sujeito transferem entre si, no processo de
terapia, diferentes vibrações, comparáveis às cordas de um instrumento musical. Muitas vezes
o terapeuta sente no seu corpo repercussões do cenário e essa ligação especial é diferente da
42
que ocorre na terapia convencional, já que na TS a pessoa do terapeuta e suas preferências
estão mais evidentes assim como a exposição das miniaturas, presente desde o momento em
que o paciente entra na sala onde se encontra o material da TS. Este momento é denominado
“Ressonância”.
4.3 Transdução
Jung (1999) aponta a importância do símbolo como agente de transformação da libido.
Os símbolos funcionam como transformadores, conduzindo a libido de uma
forma “inferior” para uma forma superior [...].O símbolo age de modo sugestivo,
convincente, e ao mesmo tempo exprime o conteúdo da convicção. (JUNG,
1999 § 344).
A partir da função do símbolo proposta por Jung, Ramos (1994) considera a teoria da
transdução como a conversão da informação de uma forma para outra. Assim, o afeto e o
humor, que anteriormente encontravam-se mergulhados no inconsciente, podem se apresentar
no plano consciente de outra forma.
Os autores consideram o símbolo como o elemento que pode transformar ou transduzir
os conteúdos inconscientes para o consciente, com algumas técnicas utilizadas na psicologia
analítica para que ocorra a transdução ou transformação dos sintomas para o plano consciente.
Conforme apontado, a TS atua no plano não-verbal e simbólico representando uma das
técnicas que mais propicia o aparecimento deste fenômeno que possibilita a transdução dos
sintomas.
43
5 Objetivo
O objetivo desse trabalho é a observação e a análise dos resultados terapêuticos da
Terapia do Sandplay (TS) no tratamento de três crianças com o diagnóstico de Transtorno
Obsessivo Compulsivo (TOC).
44
6 Justificativa
O presente trabalho se justifica porque:
Existem referências na literatura de que a TCC, no caso de algumas crianças, não
apresenta o resultado esperado, devido à pouca aderência dos sujeitos.
Na pesquisa de literatura em psicologia analítica, não foram encontrados estudos
específicos sobre o TOC em crianças.
Na revisão de literatura não foram encontradas referências da utilização da TS no
tratamento de crianças com TOC, embora essa terapia seja utilizada em outros
casos de psicopatologia, de distúrbios neurológicos e psicossomáticos.
45
7 Método
Na escolha do método desta pesquisa considerou-se, inicialmente, a característica do
trabalho, que foi exploratório. Sugeriu-se que a TS seria uma técnica eficaz para o tratamento
do TOC e que cada caixa de areia de cada sujeito significou um sistema de atribuição e uma
representação que dizia respeito ao contexto de suas relações subjetivas. Esta representação,
por meio dos cenários, pode conduzir a um processo dinâmico e transformador.
A técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) pareceu a mais apropriada e foi utilizada
de forma experimental. Nesse trabalho, consideraram-se as expressões verbais e as não-
verbais (imagéticas) produzidas pelos sujeitos, as quais foram analisadas em conjunto no
decorrer do processo terapêutico.
A partir dessa consideração, o método escolhido para a análise dos dados dos estudos
de caso foi qualitativo, porque houve análise e interpretação das expressões verbais e
imagéticas de cada cenário realizado. O quantitativo foi utilizado no momento em que as
expressões verbais e imagéticas foram agrupadas por temas e quantificadas. Para este fim,
utilizaram-se técnicas metodológicas do DSC, porque,
De fato, quando se quer conhecer o pensamento de uma comunidade sobre um
dado tema, é preciso realizar, antes de mais nada, uma pesquisa qualitativa já
que, para serem acessados, os pensamentos, na qualidade de expressão da
subjetividade humana, precisam passar, previamente, pela consciência
humana. (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2003, p.9).
Lefèvre (2003) considera que as representações sociais, processadas pela técnica da
DSC, transformadas em idéias centrais e expressões-chave e finalmente em Discursos do
Sujeito Coletivo, permitem e requererem um tratamento quantitativo.
Para a realização do levantamento dos dados deste estudo, foi utilizada e adaptada uma
das técnicas do método do DSC.
Expressões-Chave: No discurso verbal, foram consideradas as transcrições
literais da expressão verbal de cada paciente ao realizar o cenário, as quais foram
agrupadas em temas comuns a cada sujeito. Em outro momento, as expressões
não-verbais (imagéticas) foram agrupadas em temas, submetidos a um trabalho
analítico e interpretativo. Os temas vindos das expressões verbais e imagéticas
foram reunidos na medida do possível. Os processos foram divididos em três
fases para uma melhor observação da evolução de cada sujeito em cada tema e
para que houvesse a possibilidade de comparar os três em seus processos. Na
46
análise quantitativa dos dados, considerou-se a freqüência dos temas nas
diferentes fases do processo de cada sujeito. Procurou-se averiguar se existiam
temas comuns para os três sujeitos portadores do TOC.
Ao juntar expressões verbais e expressões imagéticas, consideraram-se os
seguintes pontos:
Coerência: reunião das expressões verbais e imagens, de modo a formarem um
todo discursivo e coerente.
Posicionamento próprio: cada sujeito apresentou um discurso que expressasse
seu próprio posicionamento, distinto e original, frente ao tema.
Os temas apresentaram complementariedade (Celebração-Centralização-
Transformação) e diferença ou antagonismo (Movimento Ascendente-Movimento
Descendente/Submersão).
7.1 Sujeitos:
Três crianças do sexo masculino, encaminhadas por médico psiquiatra.
Caso G: Com 8 anos e 10 meses, 2º filho tem uma irmã de 11 anos de idade. Cursa a 3ª
série do ensino fundamental. Classificação socioeconômica (critério ABIPEME): Classe B. Pais
divorciados, curso superior completo. Religião: católica praticante. Natural de São Paulo.
Histórico médico: não apresenta nenhuma descrição de doença. Tratamento psiquiátrico:
18/3/2002. Diagnóstico: TOC. Encaminhamento para psicoterapia: 1/4/2002.
Caso L: Com 8 anos e 1 mês, 1º filho tem uma irmã de 4 anos de idade. Cursa a 1ª série
do ensino fundamental. Classificação socioeconômica (critério ABIPEME): Classe A. Pais com
curso superior completo. Religião católica praticante. Natural de São Paulo. Histórico médico:
não apresenta nenhuma descrição de doença. Tratamento psiquiátrico: setembro/1998.
Diagnóstico da última médica: TOC, Tiques e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade
(TDAH). Encaminhamento para psicoterapia: 7/10/2002.
Caso A: Com 6 anos e 10 meses, 2º filho tem um irmão de 8 anos. Cursa o 3º período da
pré-escola. Classificação socioeconômica (critério ABIPEME): Classe B. Pais com curso
superior completo. Religião católica praticante. Natural de São Paulo. Histórico médico: não
apresenta nenhuma descrição de doença. Tratamento psiquiátrico: fevereiro/2001. Diagnóstico:
TOC e Transtorno de Ansiedade de Separação (TAS). Encaminhamento para psicoterapia:
26/3/2001. Os pais recusaram o tratamento psiquiátrico e foram procurar tratamento
homeopático.
47
7.2 Local
O local foi o consultório particular da pesquisadora, em São Bernardo do Campo em uma
sala com estantes, miniaturas e as duas caixas de areia. Nesta sala encontra-se material
gráfico como papel A-4, tintas, lápis de cor, massa de modelar e jogos que as crianças podem
utilizar.
7.3 Instrumentos:
Relatório médico de encaminhamento.
Entrevista inicial realizada com os familiares (pais): queixa livre e história de vida
de cada sujeito.
Avaliação de cada sujeito individualmente, por meio de:
9 entrevista não estruturada com o sujeito;
9 Raven: teste de matrizes progressivas para a medida da capacidade intelectual –
escala especial;
9 Bender Infantil: avaliação do índice de maturação viso-motora;
9 HTP-F: técnica projetiva de desenho não verbal.
Entrevista devolutiva com os pais e os sujeitos com diagnóstico psicológico.
Entrevista retrospectiva com os pais, que foi realizada em março de 2005. Com o
roteiro da Apostila de 1º atendimento, do PROTOC (C-TOC) de Miguel E.C et al.
(1/2005), que compreende:
Questionário médico e fatores de risco: para a obtenção de informações sobre a
história pessoal e familiar, desde a gestação até a atualidade. Este questionário
contém:
9 histórico escolar: perguntas relacionadas à escolaridade;
9 histórico médico: perguntas relacionadas desde a gravidez, parto do paciente,
desenvolvimento neuropsicomotor e história médica geral;
9 questionário de febre reumática;
9 tratamento psiquiátrico.
Classificação socioeconômica: critério ABIPEME.
Escala Dimensional de Avaliação da Gravidade de Sintomas Obsessivo-
Compulsivos (Dimensional Yale-Brown Obsessive-Compulsive Scale, DY-BOCS),
48
uma extensão da escala Y-BOCS original, com algumas modificações importantes
para que os sintomas obsessivo-compulsivos (SOC) sejam avaliados de forma
dimensional. Os SOC são investigados de acordo com dimensões específicas, e a
gravidade de cada uma delas é quantificada de forma independente.
Comportamentos de evitação, rituais mentais e rituais de repetição são também
investigados para cada uma das dimensões. O DY-BOCS apresenta um escore
parcial de 15 para cada uma das dimensões, além de um escore para a gravidade
global dos SOC, variando de 0 a 15. O escore de gravidade dos SOC é somado
ao escore de comprometimento na vida do paciente (variação de 0 a15). O DY-
BOCS tem um escore total máximo de 30 pontos, mediante a avaliação das
Dimensões:
9 I Obsessões de Contaminação e Compulsões de Limpeza.
9 II Obsessões e Compulsões de Colecionismo.
9 III Obsessões e Compulsões de Simetria, Ordem, Contagem e Arranjo.
9 IV Obsessões sobre Agressão. Violência, Desastres Naturais e
CompulsõesRelacionadas.
9 V Obsessões Sexuais e Religiosas e Compulsões Relacionadas.
9 VI Obsessões e Compulsões Diversas.
Yale-Brown Obsessive-Compulsive Scale (Y-BOCS), é um instrumento clínico,
semi-estruturado, para avaliar a presença e gravidade dos SOC. Apresenta
características psicométricas bem estabelecidas, com escores máximos de 20
para obsessões e 20 para compulsões, com um escore máximo total de 40.
Escala para Avaliação da Presença e Gravidade de Fenômenos Sensoriais da
Universidade de São Paulo: é uma escala semi-estruturada para avaliação da
presença e gravidade dos fenômenos sensoriais. A USP-SPS é composta de
duas partes: na primeira, investigam-se os diferentes tipos de fenômenos
sensoriais divididos em sensações físicas e/ou mentais. Para cada tipo de
sensação são fornecidos exemplos e não há nenhuma pontuação. Na segunda
parte, que investiga a freqüência, incômodo e prejuízo, é de alternativas
escolhidas pelo sujeito. Freqüência: 0 = nenhum incomodo (0%); 1 = raramente
(1% a 20%); 2 = ocasionalmente (21% a 40%); 3 = freqüentemente (41% a 60%);
4 = quase sempre (61% a 80% e 5 = (81% a 100%). Incômodo: 0 = nenhum; 1 =
raramente; 2 = médio; 3 = moderado; 4 = grave e 5 = extremo. Interferência: 0 =
49
nenhuma interferência; 2 = leve; 3 = moderada; 4 = interferência grave e 5 =
extrema.
Questionário sobre História Natural de TOC – Yale: possui quatro conteúdos para
investigar o início, curso e a pior fase dos SOC. Na parte final investiga-se a
história familiar.
Questionário TS-OC (Yale Global Tic Severity Scale (YGTSS) e Y-BOCS: é uma
entrevista semi-estruturada, que consta de duas partes desenvolvida para avaliar
a natureza e gravidade dos tiques motores e vocais, de acordo com seu número,
freqüência, intensidade, complexidade e interferência; com escore máximo para
tiques de 50 (25 para tiques motores e 25 para os tiques vocais) e escore para
comprometimento de 50. O escore total máximo da YGTSS é de 100.
Escala de Depressão de Beck (BDI).
Escala de Ansiedade de Beck (Beck-A).
MTA SNAP – IV Escala de pontuação para pais e professores.
Questionário do Transtorno de Ansiedade de Separação (TAS): pesquisa
sentimentos de ansiedade e nervosismo, que as crianças sentem quando estão
separadas de seus pais. Os sintomas pesquisados devem estar presentes por
pelo menos duas semanas, ocorrendo com mais freqüência ou não.
Questionário SF-36: a respeito da saúde do paciente, como ele se sente e o quão
bem ele é capaz de fazer as atividades da vida diária.
Entrevista sobre familiares: realizada com o paciente e um dos progenitores ou
outro familiar sobre cada um dos membros nucleares da família do paciente para
pesquisa de doenças relacionadas a transtornos psiquiátricos do eixo 1.
Duas caixas retangulares rasas, com dimensão de 72 x 50 x 7,5 cm e com areia
até a metade. O lado interno das caixas é revestido de fórmica azul-clara.
Afastando-se a areia do fundo da caixa, tem-se a impressão de água azul que
pode servir de lagoa, rio ou oceano. Uma das caixas de areia contém areia
molhada e a outra areia seca. Miniaturas colocadas em prateleiras abertas
disponíveis para os sujeitos relacionadas no Anexo C.
Máquina fotográfica digital.
Aplicação de escalas realizada em fevereiro 2006.
Escala de Adequação Social (EAS): auto-avaliação que verifica a melhora dos
pacientes em função do seu tratamento, medicamentoso ou psicoterápico.
50
Escala de Avaliação de Crenças de Brown: caracteriza o paciente durante a
última semana que passou e sua crença específica a respeito dos seguintes itens:
convicção, percepção da visão dos outros, explicação das diferenças de visão,
rigidez de idéias, tentativa de invalidar as crenças, capacidade de crítica (insight)
e idéias/delírios de referência.
7.4 Procedimento
Entrevista inicial realizada com os familiares (pais): queixa livre e história de vida
de cada sujeito.
Avaliação individual de cada sujeito com os seguintes testes:
9 entrevista com o sujeito;
9 Raven;
9 Bender;
9 H.T.P.-F.
Entrevista devolutiva com os pais e sujeitos com diagnóstico psicológico.
Proposta de tratamento baseado na avaliação psicológica e no relatório médico
com freqüência semanal e duração de 50 minutos das sessões.
Início do tratamento: pediu-se aos sujeitos que criassem livremente na caixa de
areia. Eles poderiam fazer uma paisagem, qualquer cenário, esculpir na areia ou
apenas brincar com ela.
A pesquisadora/terapeuta ficou sentada a uma pequena distância, observando as
reações e comportamento do paciente e também o desenvolvimento do cenário.
Ao mesmo tempo, desenhou um esboço para identificar a ordem em que os
objetos foram colocados, para estudo posterior. O paciente podia falar ou não. A
pesquisadora também anotava as expressões verbais espontâneas dos sujeitos
durante a sessão. No caso dos sujeitos atendidos, na maioria das vezes, eles
falavam, contavam estórias e faziam descrições do que estava acontecendo ou do
que estavam fazendo. Em outros momentos, eles falavam de suas lembranças
pessoais e de suas preocupações atuais. Algumas vezes, após o término do
cenário, eles decidiam mudá-lo ou mesmo destruí-lo.
A terapeuta escutou, observou e participou empática e cognitivamente, com o
mínimo de verbalização possível. Quando o paciente terminava o cenário, a
51
terapeuta pedia ao paciente para contar a história do cenário e fazia perguntas
que pudessem esclarecer o cenário realizado. Em todo o processo, houve a
preocupação de preservar o espaço livre e protegido da TS.
Após a saída dos sujeitos, os cenários foram fotografados e desfeitos. As fotos e
a desmontagem dos cenários eram realizadas pela própria
pesquisadora/terapeuta para manter o sigilo terapêutico. Os pacientes, em vários
momentos, referiam-se ao cenário anterior e contando que aquele que estavam
realizando uma continuação. Às vezes, eles planejavam o próximo cenário. Os
cenários foram fotografados em diferentes ângulos. A primeira foto sempre era
feita na posição em que o sujeito realizou o cenário. A segunda, na posição em
que a pesquisadora/terapeuta estava sentada e outras fotos eram tiradas em
outros ângulos ou de detalhes importantes.
Os médicos, os pais e as escolas passavam informações a respeito da evolução
dos sujeitos. Em função dessas informações, e de acordo com as datas, foi
possível relacionar determinados cenários com a diminuição dos sintomas.
Ao final do tratamento realizou-se uma entrevista devolutiva com as crianças e os
pais. Às crianças foram mostradas as fotos do processo na TS.
Em março de 2005 foi realizada a entrevista retrospectiva com os pais seguindo o
roteiro da Apostila de 1º atendimento do PROTOC (C-TOC) de Miguel et al.
Em fevereiro de 2006 realizou-se a aplicação da Escala de Adequação Social
(EAS) e a Escala de Avaliação de Crenças de Brown com os sujeitos.
7.5 Cuidados Éticos
Firmou-se um termo de consentimento com cada um dos sujeitos e dos pais
responsáveis (Anexo A).
Cuidados éticos: autorização do Comitê de ética em pesquisa – PUC-SP (Anexo
B).
7.6 Método de Análise
Para o tratamento dos dados, utilizou-se a técnica de análise temática de discurso
baseada e adaptada do DSC.
52
Em uma primeira etapa procede-se ao levantamento das expressões verbais, por meio
da transcrição literal das expressões verbais espontâneas e das estórias que os sujeitos
relatavam. As expressões verbais são agrupadas por temas.
A segunda etapa consiste na análise qualitativa das fotos tiradas após cada sessão, de
cada sujeito. Nesta etapa consideram-se:
o levantamento das miniaturas de cada cenário, agrupadas por categorias;
a observação e descrição dos cenários (fotos);
na análise qualitativa dos cenários observa-se como cada cenário foi montado.
Por exemplo: areia seca ou molhada, escavações ou elevações na areia, posição
das miniaturas no cenário. Esta análise permite o levantamento de temas. A
pesquisadora também atribuiu temas aos cenários, de acordo com a dinâmica do
cenário, o uso das miniaturas e a verbalização dos sujeitos;
os temas encontrados nas expressões verbais e nas expressões imagéticas são
agrupados segundo as suas características em comum. Para permitir uma análise
mais apurada, só se consideram os temas possíveis de agrupamento e os temas
que não forem agrupados não foram considerados na análise final.
Após a análise qualitativa será realiza-se a terceira etapa: a análise quantitativa dos
temas comuns aos três sujeitos, considerando-se:
a divisão do processo de cada sujeito em três fases, de acordo o número total de
dias do processo de cada sujeito. Fases: inicial, intermediária e final;
a distribuição dos temas em cada fase, com a observação do número de vezes
que cada tema aparece em cada fase do processo;
a evolução de cada tema para cada sujeito nas três fases;
a análise do processo de cada sujeito;
a comparação evolutiva dos temas entre os três sujeitos.
Ao final desta análise pretende-se chegar aos temas que podem ser considerados a
reconstituição discursiva verbal e imagética deste grupo de crianças portadoras de TOC.
53
8 Resultados
8.1 Análise qualitativa
Foram encontrados 30 temas na expressão verbal entre os três sujeitos, como resultado da
análise das expressões-chave encontradas nas verbalizações espontâneas dos três
sujeitos: Transformação, Sensações, Possibilidades de Solução/Caminho, Valores, Medo,
União/Integração, Delimitação de Espaços, Celebração, Referências ao Passado,
Proteção/ Socorro/ Resgate, Referências a Afundamento/Afogamento, Homenagem
(estátuas), Vitória, Obstáculos/ Dificuldades, Desconhecido, Autoridade, Animais, Auto-
referência/Consciência de si mesmo e do processo, Competição, Transferência, Luta/
Conflito/Ameaça, Movimento, Identidade/Rostos, Caminhos/ Possibilidades de Solução,
Futuro/Tecnologia, Construção de Cenário/Local, Perigo/Ameaça, Destruição/
Confusão/Caos, Automatismo, Movimento Ascendente e Descendente. (Vide Pasta Geral
Quadros de 1-30 das Expressões Verbais dos casos G., L. e A. no CD anexo).
As miniaturas existentes no consultório. (Anexo C) foram agrupadas por categorias. O caso G.
teve 35 categorias de miniaturas; o caso L. teve 45 categorias e o caso A. 41 categorias
de miniaturas. Verificou-se a porcentagem de uso de cada categoria para cada sujeito e
as três maiores categorias de porcentagem de cada sujeito são interpretadas ao final de
cada estudo de caso. (Vide pastas dos casos G., L. e A.: Agrupamento de Miniaturas,
Gráficos Porcentagem da Utilização das Miniaturas dos casos. no CD anexo).
Foi realizada a descrição de cada cenário a partir das imagens das fotos. (Vide pastas dos
casos G., L. e A. : Descrição Geral no CD anexo).
Foi atribuído um ou mais temas a cada um dos cenários, observando-se a sua dinâmica, as
expressões verbais, as miniaturas e as construções na areia, por meio da compreensão
simbólica do material psicoterapêutico dos sujeitos. Após a escolha dos temas, realizou-se
uma análise dos símbolos encontrados nos cenários e a sua provável relação com o TOC.
A avaliação conjunta das expressões verbais e imagéticas tornou possível a identificação de 14
temas presentes nos três sujeitos. (Vide pastas dos casos G., L. e A. : Resumo dos
Temas no CD anexo).
54
8.1.1 Temas
Os critérios adotados para a determinação dos temas estão descritos a seguir:
Automatismo
A utilização de expressões verbais e imagens de cenário que sugerem estado ou atributo
do que é automático. A máquina ou engenho composto de mecanismo que imprime
determinados movimentos (relógio, placa eletrônica), ou aparelho com aparência humana que
reproduz seus movimentos por meios mecânicos (robôs). É o que se move por si próprio, e a
atividade ou movimento devido a estímulos internos/externos independe da vontade e é de
certa forma inconsciente.
Exemplos de expressões verbais: termos relacionados a automatismo e à repetição de
atos ou comportamentos. “É o relógio mais antigo do mundo” (Caso G., cenário 2), “O relógio é
da China” (Caso L., cenário 4). (Vide Quadro 27 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas como: robôs, relógios, placa eletrônica.
O tema Automatismo é uma série de atividades realizadas sem intenção consciente e em
relação à psicopatologia podem ser compreendidas como sinal de perturbação entre o
acontecimento voluntário e o involuntário. A repetição de um mesmo comportamento inúmeras
vezes e o tempo gasto na realização dos rituais podem ser simbolizados, por exemplo, pelo
relógio e pelos robôs.
Celebração
As expressões verbais e imagens de cenários nas quais existiu o ato ou efeito de
celebrar. A homenagem, comemoração ou festejo de uma data. O enaltecimento, a realização
de um ritual, louvação pública, festividade e solenidade.
Exemplos de expressões verbais: termos relacionados a datas (festivas como Natal e
aniversário “Aqui lembra o Natal”. (Caso G., cenário 30). “Aqui vai ser uma festa” (Caso L.,
cenário 53). “Parece uma estrela, e é uma estrela. E um monte de gente comemorando” (Caso
A., cenário 22). (Quadro 8 Expressões Verbais). Termos relacionados a poder e realeza:
“Grande estátua do rei que morreu” (Caso L., cenário 16). “Uma estátua do rei” (Caso A.,
cenário 48). (Quadro 12 Expressões Verbais). Termos relacionados a valores: “Aqui são pedras
preciosas do fundo do mar”. (Caso G., cenário 7). “São bolas oficiais da copa do mundo”. (Caso
L., cenário 24). “Estas moedas são de antigamente”. (Caso A., cenário 16). (Quadro 4
Expressões Verbais). Termos relacionados à referência ao passado e aos valores a ele
associados: “Museu de coisas valiosas” (Caso G., cenário 11). “Vou fazer um museu de
55
antiguidades”. (Caso L., cenário 4). “Esta estória é de antigamente”. (Caso A., cenário 16).
(Quadro 9 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas de presentes ou símbolos de datas
comemorativas (árvore e bolas de Natal, presépio, mandacaru, bumba-meu-boi), miniaturas
douradas e brilhantes, personagens que simbolizam sentimentos de alegria ou diversão
(palhaço), acessórios (cordões dourados ou coloridos, bijuterias) e instrumentos musicais;
penas coloridas; figuras mitológicas e bolas de vidro.
Pode-se considerar a Celebração como um momento em que o ser humano expressa
sentimentos de alegria e vitória. O ato de celebrar uma conquista pode ser considerado como
uma das expressões do reconhecimento do esforço e trabalho despendidos em busca de um
objetivo.
Centralização
As expressões verbais ou imagens dos cenários em que apareceu a reunião ou
concentração de areia no centro da caixa de areia, com a colocação e a convergência de
objetos em direção ao centro da caixa de areia.
Exemplos de expressões verbais: termos relacionados a movimento em direção ao centro
da caixa. “É um farol” (Caso G., cenário 18). “É a montanha onde as pessoas pulam de
paraglider (Caso L., cenário 114). “Vou fazer uma montanhona” (Caso A., cenário 16). (Quadro
22 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas no centro da caixa de areia, lâmpada,
velas, bolas de vidro, moedas, mundo, meios de transporte; construção de ilhas, elevações
(montanhas) e círculos.
O processo de centralização no contexto da psicologia analítica representa um dos
pontos mais importantes do processo terapêutico relacionada ao processo de individuação.
Pode-se considerar a Centralização como o lugar da transformação criadora, o encontro do
inconsciente e do consciente.
Conflito
Considerou-se como conflito as imagens dos cenários com uma oposição de miniaturas
em posição ameaçadora, e um enfrentamento: a presença de batalhas entre soldados e índios,
as possibilidades de ameaça, o confronto entre animais selvagens predadores e não
predadores. O enfrentamento entre animais e robôs foi uma das expressões deste tema.
Exemplos de expressões verbais: termos relacionados a um estado de choque ou
enfrentamento: ”O leão tem que abrir o caminho. Tem que achar os amigos”. (Caso G., cenário
56
27). “Vou fazer uma guerra aqui” (Caso L., cenários 13,14 e 26). “O elefante e a girafa iam lutar”
(caso A., cenário 24). (Quadro 21 Expressões Verbais). A verbalização do desconhecido e do
medo: “De repente os animais e objetos começaram a entrar sem o mínimo sentido” (Caso G.,
cenário 26). “Vou fazer uma guerra contra a casa do mal” (Caso L., cenário 9). “Este pingüim
está com a cara de assustado” (Caso A., cenário 10). (Quadro 5 e 15 – Expressões Verbais). A
possibilidade de ameaça e destruição: “A cobra roubou uma churrasqueira, todo mundo
começou a procurar a cobra. Acharam e caíram em cima dela” (Caso G., cenário 25). “Esta bola
é uma bomba” (Caso L., cenário 1). “Todos atacavam o cavalo verde porque ele é do mal”
(Caso A., cenário 78). (Quadro 21 Expressões Verbais). Foram consideradas as expressões
verbais com o significado de oposição:
ameaça x proteção;
medo x coragem;
perigo x segurança;
desconhecido x conhecido;
dificuldades x facilidades;
luta/guerra.
Construções na areia e utilização de miniaturas de bola chinesa (bomba); animais
selvagens, aves selvagens, insetos, animais marinhos, animais predadores e animais pré-
históricos em posições ameaçadoras; armas e arsenal de guerra; soldados, índios e guerreiros
em posições ameaçadoras ou de ataque; miniaturas caídas/viradas em posição de destruição;
palitos/paus usados como espetos.
O Conflito indica uma oposição, contradição ou luta entre estruturas, princípios ou
atitudes diversas. Na psicologia analítica, o conflito psíquico é um estado de colisão entre
consciente e inconsciente. A partir desse estado, existe a possibilidade do reconhecimento de
conteúdos do inconsciente, para que posteriormente ocorra o processo de integração.
Congestionamento
As imagens de cenários e expressões verbais com referência a miniaturas ou
construções na areia que impediam ou dificultavam a livre circulação, com mistura de
miniaturas em total desequilíbrio, desarrumação (caos), e dificuldade em conseguir visualizar
objetos ou objetos ocultados por outros na superfície da areia.
Exemplos de expressões verbais: termos relacionados à construção do cenário e
superposição de objetos, por exemplo: “Um monte de coisas valiosas“. (Caso G., cenário 7).
"Todo o dinheiro está dentro do cofre” (Caso L., cenário 9). “Todas estas moedas são de
57
antigamente” (Caso A., cenário 16). (Quadro 26 Expressões Verbais). Obstáculos e
dificuldades: “Enfrentaram vários obstáculos para chegar até lá” (Caso G., cenário 28). “Este é
um lago com pedras (Caso L., cenário 25). “Era no Egito, quem subisse pela pedra tinha que
passar pelas grades” (Caso A., cenário 35). (Quadro 14 Expressões Verbais). Movimento
desordenado e caótico: “Eu jogo as coisas que eu gosto” (Caso G., cenário 22). “È o caminho
da favela” (Caso L., cenário 37). “Tinham outros que iam andando”. (Caso A., cenário 35).
(Quadro 22 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas como caminhos obstruídos e
superposição de objetos.
O Congestionamento pode ser comparado à estagnação do fluxo da energia psíquica. A
energia não tem um caminho de saída, e apresenta-se estagnada e sem permitir a criatividade
e produtividade.
Defesas
As expressões verbais e imagens dos cenários relacionam-se à separação da
construção, fechamento e delimitação de espaços dentro da caixa de areia. Nas imagens dos
cenários foi possível visualizar a ação de defesa e resistência a ataques. A presença de
miniaturas utilizadas que sugerem equipamento ou estrutura defensiva e de proteção.
Exemplos de expressões verbais relacionadas à separação e delimitação de espaços:
“Aqui é a cidade Springfields”. ”A cidade separada da floresta”. (Caso G., cenário 1). “Vou fazer
uma floresta, vou fazer um museu diferente”.(Caso L., cenário 5). “A corrente cerca a cidade
deles” (Caso L., cenário 13). “Isto era onde é o deserto”. “Todas as grades são para defender as
plantas”.(Caso A., cenário 8). (Quadro 25 Expressões Verbais). Proteção, socorro ou resgate:
“O beija-flor te ajuda a mostrar o caminho”. (Caso G., cenário 27). “Tenho que esconder a usina
elétrica” (Caso L., cenário 15). “Vou ter que fazer uma proteção para o pato não passar” (Caso
A., cenário 11). (Quadro 10 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas como: Miniaturas de cercas, redomas,
caixas abertas ou fechadas, caixa aramada, caixas, jaulas, cofre, paus/palitos demarcando
espaço, sombrinha, estante, gaiolas e espinhos.
Na psicologia analítica, defesa significa o ato ou efeito de se defender para que não
ocorram mudanças. Para Jung, o termo tem sentido de defesa ou proteção de alguma coisa,
“Trata-se de formações protetoras as quais têm o mesmo objetivo da consolidação interior”.
(JUNG, 2002, § 576). Neste estudo, por exemplo, as cercas fechadas podem ser consideradas
como defesas mais rígidas e as cercas com aberturas e saídas, mais flexíveis e adaptadas.
58
Destruição
As expressões verbais e imagens de cenários nas quais observou uma ação ou efeito de
colocar abaixo o que está construído, demolição, eliminação, devastação, ruína, extinção total,
aniquilamento e fim.
Exemplos de expressões verbais com termos relacionados a desastres da natureza
(terremoto, furacão, vulcão, tempestades, maremotos, avalanches e inundações): “Era um tipo
de zoológico com areia movediça”. (Caso G., cenário 14). “Houve uma inundação e destruiu
tudo”. (Caso L., cenário 40). “Houve uma grande enchente e todos morreram”. (Caso A., cenário
23). (Quadro. 27 Expressões Verbais). Termos relacionados à demolição (desconstrução) e fim:
“A caverna desmoronou e matou o inimigo”. (Caso G., cenário 36). “Aí houve uma catástrofe e
tudo acabou”. (Caso L., cenário 74). “Tinha que pular e podia bater a cabeça e estourar”. (Caso
A.,cenário 35). (Quadro 28 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas enterradas ou semi-enterradas; jogadas,
caídas ou reviradas e areia revolvida.
A Destruição pode significar o momento em que o sujeito sente-se ameaçado pelos seus
impulsos que provocam ansiedade. Pode-se considerar os impulsos como os processos
psíquicos que a consciência não controla. O reconhecimento do conflito pode provocar uma
situação perigosa, expressa por atos destrutivos que não apresentam controle externo, como
por exemplo, desastres da natureza.
Identificação Egóica
A utilização de expressões verbais e miniaturas relacionadas ao próprio sujeito. O uso de
uma mesma miniatura em vários cenários.
Exemplos de expressões verbais com termos relacionados à auto-referência, consciência
de si mesmo e do processo. “Adoro cachorro, não tenho porque moro em apartamento”. (Caso
G., cenário 1). “Eu vou fazer biologia, porque eu gosto de plantas e animais”. (Caso L., cenário
7). “Estou nervoso com meu pai, porque ele está sempre me lembrando da minha doença.
Assim desse jeito eu não esqueço a minha doença”. (Caso A., cenário 24). (Quadro 18
Expressões Verbais). Termos relacionados à competição: “Ela era a moto mais forte de todas
elas”. (Caso L., cenário 23). “Vamos ver quem destrói o monte de areia com bolas de gude”?
(Caso A., cenário 91). (Quadro 19 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas que se repetiram como função da
representação de si mesmo (animais/ objetos com os quais o paciente se identifica).
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Pode-se entender o processo de identificação como o momento em que o sujeito coloca
em um objeto externo algo que ele não apresenta condições de reconhecer em si próprio,
importante para o desenvolvimento da personalidade infantil.
Integração
As expressões verbais e as imagens de cenário que representavam ligação entre as
várias partes do cenário formando um todo coerente e harmonioso.
Exemplos de expressões verbais com termos relacionadas à união: “Aqui é uma ponte”.
(Caso L., cenário 52), “Aqui eu vou fazer uma ponte”. (Caso A., cenário 49). (Quadro 6
Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de pontes, rios e barreiras como elementos de ligação.
Miniaturas iguais colocados em lados opostos. Construção de círculos ou mandalas na areia.
Traçado de caminhos na areia.
Pode-se considerar a Integração como a capacidade de uma maior organização da
personalidade e uma maior interação entre os conteúdos conscientes e inconscientes.
Movimento Ascendente
As expressões verbais e imagens de cenários com deslocamentos de areia de um lado
para o outro na caixa de areia (o mover a areia em diferentes sentidos ou direções). A
construção de montes de areia (elevação) fora do centro da caixa de areia. A utilização da areia
para provocar ou ter uma reação física (jogar areia ou miniaturas para o alto).
Exemplos de expressões verbais com termos relacionados a acidentes geográficos,
como montanhas: “Eu quero fazer uma montanha para o carro ir subindo”. (Caso L., cenário
30). (Quadro 30 Expressões Verbais). Termos relacionados a caminhos; “Aqui tem vários
caminhos”. (Caso G., cenário 15). “Aí tinha que atravessar o deserto do Saara”. (Caso L.,
cenário 82). “Aqui é uma pista”. (Caso A., cenário 14). (Quadro 24 Expressões Verbais).
Construções na areia de ilhas/elevações fora do centro da caixa de areia.
Considera-se Movimento Ascendente o momento em que a energia psíquica que
impulsiona a consciência do ego e os complexos responsável pela dinâmica da psique,
apresenta o movimento de progressão, quando a libido é utilizada para a adaptação à vida e ao
mundo, e a pessoa a utiliza para funcionar no mundo. Esta energia apresenta-se em diferentes
atividades produtivas e criativas.
Movimento Descendente
As expressões verbais e imagens de cenários com a realização de buracos
(escavação/abaixamento) na areia com ou sem presença de água.
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Exemplos de expressões verbais com termos relacionados a acidentes geográficos como
rios, cavernas e grutas: “Eles tinham descoberto uma mina de esmeraldas”. (Caso G., cenário
7). “Os dois homens estão mergulhando com as baleias”. (Caso A., cenário 2). (Quadro 30
Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas de escavações na areia seca/molhada
formando buracos com ou sem água simulando rios, mar, lagos, cavernas e grutas. Presença
de bolas de vidro simbolizando água (rio e lago). Miniaturas de poço de água, piscina e vaso
sanitário.
No Movimento Ascendente, a energia psíquica apresenta progressão, entretanto, a
progressão da libido pode ser interrompida, a energia perde a sua força de ir em frente e o fluxo
dessa energia inverte sua direção. Nesse momento, entra em regressão e vai para o
inconsciente, onde estão os complexos, e pode haver divisão nas polaridades, que antes
estavam juntas e, que a partir de agora, se transformam em opostos em conflito, constituindo o
Movimento Descendente.
Submersão
A utilização de expressões verbais e imagens relacionadas a miniaturas mergulhadas ou
afundadas na água. A areia inundada de água como se formasse um pântano. Miniaturas
colocadas no fundo da lama e enterradas na areia.
Exemplos de expressões verbais com termos relacionados a afogamento e
afundamentos em atoleiro, pântanos, alagamentos e inundação por rios e mar: “Deste lado é
um pântano”. (Caso L., cenário 20). “Tudo do mar, faz de conta que aqui é a areia do mar”.
(Caso A., cenário 36). (Quadro 11 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas de areia encharcada de água, miniaturas
mergulhadas ou afundadas na areia, miniaturas no fundo da lama e enterradas na areia.
Assim como o Movimento Descendente, a Submersão pode significar um movimento de
regressão da energia psíquica e um retorno a conteúdos inconscientes mais profundos. Os
alagamentos e inundações são ameaçadores para o homem, pois a água apresenta um poder
destrutivo, carregando as coisas boas e ruins.
Transferência
Considerou-se transferência o processo que ocorreu no setting analítico, quando o sujeito
coloca no terapeuta os seus sentimentos e atitudes em relação a outros objetos. A transferência
pode ocorrer de maneira positiva (amorosa) ou negativa (raiva).
61
Exemplos de expressões verbais com termos relacionados a sentimentos de amor ou
raiva em relação à terapeuta: “É um coração para você”. (Caso G., cenário 3). “A Reinalda é
toda delicada” (Caso L., cenário 10). “Estou jogando bombas na Reinalda e ela não reage”.
(Caso L., cenário 10). “A minha psicóloga sabia de tudo e era bom vir aqui” (Caso A., cenário
28). Expressões verbais relacionadas à curiosidade sobre a terapeuta: “Quantos anos você
tem?” (Caso G., cenário 29). “Para quem você vai deixar as miniaturas quando parar de
trabalhar?” (Caso L., cenário 61). “Quantas fotos você tem que tirar de cada cenário?” (Caso A.
cenário 12). (Quadro 20 Expressões Verbais).
Construções na areia de: coração e nome da terapeuta.
Transformação
As expressões verbais e imagens de cenários com modificação de uma forma de energia.
Por exemplo o uso do fogo com a presença de velas e lamparinas. O transformador que altera a
tensão elétrica e permite o uso da energia em postes de iluminação que conduzem a energia
elétrica de um lugar para o outro e as lâmpadas que iluminam.
Exemplos de expressões verbais com termos relacionados a mudanças no estado físico
das matérias (líquido, gasoso, pastoso e sólido). “O vidro vem da areia”. (Caso G., cenário 38).
“Onde está aquela panela que evapora água e é da hora?” (Caso L., cenário 76). (Quadro 1
Expressões Verbais). Termos relacionados à substituição da função real do uso do objeto:
“Estas pedras são lentilhas”.(Caso G., cenário 10). “As pedras azuis são água”. (Caso L.,
cenário 3). “Esta areia é a neve”. (Caso A., cenário 8). (Quadro 1 Expressões Verbais).
Construções na areia e utilização de miniaturas de velas acesas, lamparinas, fogueiras,
transformador, postes de iluminação e lâmpadas.
Pode-se considerar que, na Transformação, o impulso se altera e deixa de perturbar, por
se transformar em algo construtivo e útil.
8.2 Análise quantitativa
A partir da análise qualitativa e dos temas encontrados, procedeu-se à análise
quantitativa, com a divisão dos processos de cada sujeito em três fases (inicial, intermediária e
final), desde o primeiro até o último cenário e o número total de dias do processo de cada
sujeito. A partir desse momento houve a distribuição dos temas em cada fase.
O sujeito G. teve um total de 816 dias, que correspondem à data do primeiro cenário
(9/4/2002) até a data do último cenário (28/7/2004). Ele realizou um total de 38 cenários. Foram
62
consideradas fases inicial: 9/4/02-29/10/02 (total de 12 cenários); intermediária: 3/2/2003-
29/09/03 (total de 15 cenários) e final: 3/11/2003-28/7/2004 (total de 11 cenários).
O sujeito L. teve um total de 855 dias, a data de início do primeiro cenário (9/10/02) até a
data do último (11/2/05). Realizou um total de 115 cenários. Fase inicial: 9/10/02-23/6/03 (total
de 40 cenários); intermediária: 29/7/03-26/4/04 (total de 44 cenários) e final: 3/05/04-11/2/05
(total de 31 cenários).
O sujeito A. teve um total de 846 dias, do início do primeiro cenário (28/2/02) até a data
do último (2/6/04). Realizou um total de 109 cenários. Fase inicial: 28/2/02-26/11/02 (total de 29
cenários); intermediária: 3/12/02-20/8/03 (total de 65 cenários) e final: 1/10/03-6/04/05 (total de
15 cenários). (Vide Tabela Resumo dos Temas Caso G., L. e A. no CD anexo).
A análise quantitativa permitiu a construção de gráficos de distribuição e de evolução dos
temas nas três fases de cada sujeito, conforme a apresentação dos casos.(Vide Gráfico
de Evolução dos Temas nas fases Caso G., L. e A. após a apresentação de cada caso),
assim como a elaboração de tabela e gráfico comparativo da evolução dos temas dos
sujeitos por fases, que se encontram na análise comparativa. (Vide pastas dos casos G.,
L. e A. : Resumo dos Temas no CD anexo).
8.3 Apresentação e Análise dos Casos Clínicos
Cada caso consta de resumo da queixa livre, resultado dos testes realizados na
avaliação psicológica, resultados da entrevista retrospectiva realizada em março/2005 e das
escalas realizadas em fevereiro/2006, e uma síntese do tratamento psicológico com a TS. Essa
apresentação segue a divisão em três fases, mostrando cenários exemplares de cada tema.
Cada cenário contém um ou mais temas comentados e relacionados entre si. Ao final da análise
de cada caso há um breve comentário a respeito das três categorias de miniaturas de maior
porcentagem no processo de cada sujeito, e os gráficos da evolução dos temas com os
respectivos comentários.
Depois da apresentação dos três casos, há uma análise comparativa dos processos dos
três sujeitos tendo como objetivo a compreensão da dinâmica psicológica do TOC, do ponto de
vista da psicologia analítica.
8.3.1 Caso G.
HISTÓRICO
63
G. é um menino de 8 anos e 10 meses. O processo iniciou-se em 1/4/2002 e terminou em
28/7/2004. Após este período houve encontros quinzenais até dezembro de 2004, passando a
mensais de fevereiro/2005 a julho/2005. A partir de agosto/2005 os encontros tornaram-se
bimestrais até dezembro/2005.
Resumo da queixa livre e dados da história de vida do sujeito: segundo a mãe de G. a
gravidez não aconteceu em um bom momento, no meio de uma crise financeira e de
relacionamento. Nos primeiros três meses, ela não queria a gravidez, não falava para as
pessoas e tinha muito enjôo. Após esse período, começou a gostar de estar grávida, “curtiu” a
barriga. O parto foi normal, amamentou durante 2 meses, mas sentia muita dor nos seios e não
conseguia relaxar para amamentar. Em relação à alimentação G., nunca recusou comida,
aceitava alimentos novos. Tinha dificuldade em ter o peso ideal para o desenvolvimento, sem
ser obeso, com desenvolvimento motor adequado à idade, e.desenvolveu a linguagem antes de
andar. Sempre dormiu bem até abril de 2002, quando apresentou dificuldades em conciliar o
sono, porque ficava com medo dos pensamentos. G. sempre se destacou em relação às outras
crianças por ser muito tranqüilo, sorridente e excelente aluno. Em fevereiro de 1998, o avô
materno, que era muito ligado a G. faleceu por causa de câncer no intestino e, em agosto de
1998 o casal se separou. Na época do tratamento, o pai era ausente na relação com o filho, não
cumpria os horários de visita, prometia presentes e nunca entregava, não dava ajuda financeira
para os filhos. Neste ano de 1998, a mãe teve um processo de anemia e desmaiava com
freqüência. G. presenciou várias vezes e achava que a mãe estava morrendo. No período de
separação, G. dormiu muitas vezes com a mãe e fazia declarações de amor para ela. Em
novembro de 2000, G. começou a lavar as mãos muitas vezes e a fazer contagem de tudo,
sempre o número 4, além da mania de bater um cotovelo depois o outro nas pessoas ou nas
paredes. Nunca fez tratamento, fazia terapia e a psicóloga indicava florais de Bach. Em 2002,
G. queria todo mundo ao redor dele e perguntava sem parar, fazia as mesmas perguntas várias
vezes até as pessoas perderem a paciência e mandarem ele calar a boca. Não conseguia
entrar na escola e estava há um mês sem freqüentar as aulas. A seguir alguns pensamentos e
comportamentos de G, por ele relatados:
“Fico pensando, tenho que fazer 4 vezes a mesma coisa, se eu não faço aí tem
que ser 8 vezes. Se eu não fizer eu viro outra pessoa que eu não gosto, ou a
minha mãe morre”.
“Na escola, quando tenho que repetir algo, eu fico na entrada da porta sem
conseguir entrar, não consigo pisar em pisos quadrados, não posso encostar o
lápis nas linhas do caderno, fico abrindo e fechando o estojo (a ponto de quebrá-
64
lo), 8 vezes, perfazendo 32 vezes, senão eu posso virar uma pessoa que eu não
gosto”.
“Não consigo entrar na classe, porque se entro sofro muito, as minhas manias
ficam me atrapalhando, não consigo assistir às aulas porque choro”.
“Esses pensamentos são desde o final do ano passado, não quis mais ir à escola,
fico o dia inteiro chorando e ligando para a minha mãe com medo de que ela
possa morrer”.
“Tudo que eu pego tenho que bater na mesa o número 4 ou 8 ou 16...”.
“Eu subo e desço o mesmo degrau, se eu não fizer isto acontece algo ruim com
minha mãe ou minha avó”.
“Quando assisto desenho de bruxa, não posso beber nada, senão eu me
transformo em bruxa”.
“Tenho que abrir a torneira muitas vezes, umas 8 vezes antes de lavar a mão ou
escovar os dentes. Tenho que reler o que eu escrevi umas 4 vezes. Tenho que
escrever tudo muito certinho, senão tenho que apagar tudo e começar tudo de
novo”.
“Se alguém falou no orelhão, eu não pego no telefone, porque senão eu me
transformo naquela pessoa que eu não conheço”.
“Quando eu jogo game-boy, eu tenho que deixar no canal que está passando
coisa legal, senão até eu fico contaminado com coisa ruim”.
“Às vezes eu fico pensando como eu vou conseguir dar um beijo em uma
menina”.
“Estava na praia, aí baratas voadoras pousaram no pão Seven Boys, eu nunca
mais comi o pão. Tenho nojo da comida. Tenho nojo da empregada, ela tem um
cheiro de suor que me dá nojo”.
“Eu tenho pensamento que se eu não fizer alguma coisa, por exemplo, tirar o telefone da
base 4 ou 8 vezes a minha mãe ou minha avó vai morrer”.
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Raven: 24 pontos (capacidade intelectual superior à média. Percentil: 95). Normas
padronizadas à população brasileira.
Bender: idade visomotora adequada à idade.
HTP-F: G. não apresentou confiança no seu desempenho, pelo sentimento de
inferioridade e pela dificuldade em se arriscar, com indícios de repressão da
agressividade. Nível de ansiedade acima do esperado. G. encontrou dificuldades
na realização do desenho da figura humana, perguntou como fazer; ficou indeciso
e apagou várias vezes.
65
RESULTADO DA ENTREVISTA RETROSPECTIVA
A entrevista foi realizada em Março/2005 com a mãe seguindo o roteiro da apostila de
atendimento. (MIGUEL, et al., 2005):
Questionário médico e fatores de risco: não houve intercorrência durante a
gravidez, no parto e do primeiro ao quinto ano de vida. Desenvolvimento
neuropsicomotor dentro do esperado para a idade. Não foram relacionadas
doenças na história médica geral. Não apresentou diagnóstico de febre reumática.
Tratamento psiquiátrico:
9 Medicação: 18/3/2002 - Sertralina 50 mg (1/2 cp/dia)
25/3/2002 - Sertralina 50 mg (1 cp/dia)
15/4/2002 - Sertralina 50 mg (1 cp/dia)
10/5/2002- Sertralina 50 mg (1 cp/dia).
A medicação foi mantida até 26/5/2003, quando a médica iniciou a
retirada. Em agosto de 2003, G. teve alta psiquiátrica.
Classificação socioeconômica critério ABIPEME: 76 pontos – Classe B.
Escala Dimensional de Avaliação da Gravidade de Sintomas Obsessivo-
Compulsivos (DY-BOCS).
Tabela 1 Resultados DY-BOCS – Passado – Caso G
Dimensões de sintomas Tempo
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
Total
(0-15)
Agressão 5 5 4 14
Sexual e Religião 0 0 0 0
Simetria, Ordem, Contagem e Arranjo 5 5 4 14
Contaminação e Limpeza 2 3 4 9
Colecionamento 0 0 0 0
Diversas 5 5 5 15
Fonte: Miguel, 1/2005: p.40.
Apresentou critérios para o diagnóstico de TOC.
Tabela 2 Resultados DY-BOCS Avaliação Global – Passado – Caso G
Tempo
(0-5)
Incomodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
Prejuízo
(0-15)
Total
(0-30)l
Todas as obsessões e
compulsões
4 5 5 15 29
Fonte: Miguel, 1/2005: p.40
Apresentou critérios para o diagnóstico de TOC e comprometimento na vida do sujeito.
66
Escala Obsessivo-Compulsivo de Yale-Brown – Y-BOCS:
Escore Total: Obsessões (15) + Compulsões (16) = 31. Preencheu
os critérios para o diagnóstico de TOC.
Escala para Avaliação da Presença e Gravidade de Fenômenos Sensoriais da
Universidade de São Paulo. O sujeito respondeu uma vez positivamente ao item
“estar em ordem” diante de estímulo visual. Teve duas respostas positivas em
relação ao “estar em ordem” relacionado a estímulo tátil e também ao item “estar
em ordem internamente”.
Tabela 3-Resultados: Avaliação de Gravidade dos Fenômenos Sensoriais – Passado-
Caso G
Passado Freqüência
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
2002 4 5 3
Fonte: Miguel, 1/2005: p.48
Apresentou resultado significativo em relação aos fenômenos sensoriais. A resposta em
relação à intensidade dos fenômenos sensoriais descritos e a intensidade das obsessões
apresentadas foi da mesma
intensidade/gravidade. Quanto ao Questionário TS-OC (YGTSS e
Y-BOCS),
A.1. – Lista de Sintomas (Tiques):
A.2. – Escala de Avaliação de Tiques:
Tabela 4 Resultados: Yale Global TIC Severity Scale (YGTSS) – Caso G
Número Freqüência Intensidade Complexidade Interferência Total
a.Tiques motores 4 4 4 2 0 14
b.Tiques fônicos 0 0 0 0 0 0
c.Total para todos
os tiques
4 4 4 2 0 14
Fonte: Miguel, 1/2005: p.78
Preencheu alguns critérios relacionados aos tiques e Síndrome de Tourette. Tiques motores:
movimentos dos braços, mãos, pernas e pés. Tiques relacionados com comportamentos
compulsivos: tocar e bater na madeira várias vezes, arrumar os livros e emparelhar, rodar e
fazer piruetas.
67
Escala de Depressão de Beck (BDI). Total: 6. Não preencheu os critérios para
depressão.
Escala de Ansiedade de Beck (Beck-A). Total: 23. Apresentou critérios
relacionados a ansiedade.
MTA SNAP – IV Escala de pontuação para pais e professores: a mãe respondeu
e a escola apresentou relatórios em 2002 que confirmaram: falha em prestar
atenção aos detalhes por falta de cuidado em trabalhos escolares e tarefas;
parece não escutar quando lhe falam diretamente; não segue instruções e falha
em terminar temas de casa, tarefas ou obrigações; dificuldade para organizar
tarefas e atividades; evita ou não gosta e reluta em envolver-se em tarefas que
exijam manutenção de esforço mental; é distraído por estímulos alheios; é
irrequieto com as mãos e pés; remexe-se na cadeira; abandona sua cadeira em
sala de aula ou em outras situações nas quais se espera que permaneça sentado;
dá respostas precipitadas antes das perguntas serem completadas; tem
dificuldade para aguardar a sua vez; interrompe ou se intromete com os outros; é
sensível ou facilmente incomodado pelos outros.
Transtorno de Ansiedade de Separação (TAS): não apresentou critérios
relacionados à ansiedade de separação.
SF-36: as respostas foram relacionadas com saúde boa e não apresentou
dificuldades nas atividades da vida diária.
Entrevista sobre familiares: as questões que apresentaram resposta positiva
foram: Resposta 7:
(medo especial como voar, ver sangue, tomar injeção, lugares
fechados) mãe. Resposta 8:
(alguém da família nas últimas semanas estado
nervoso ou ansioso) mãe. Resposta 11:
(alguém na família com problemas de
atenção e hiperatividade) irmã.
CONCLUSÃO DA AVALIAÇÃO
G. apresentou critérios para o diagnóstico de TOC e a presença de tiques motores.
ENTREVISTA REALIZADA EM MARÇO/2006
Social Adjustment Scale (SAS), Escala de Adequação Social (EAS): total de 1,6,
apresentou resultado relacionado a uma boa adequação social.
Escala de Avaliação de Crenças de Brown: não apresentou respostas
relacionadas a crenças. Apresentou boa capacidade de crítica e não teve
68
pontuação nos itens de convicção, percepção da visão dos outros, explicação da
diferença de visão, rigidez das idéias e tentativa de invalidar as crenças.
TRATAMENTO PSICOLÓGICO COM A TS.
Aqui destacam-se algumas caixas para ilustrar o processo. Os temas foram escolhidos
de acordo com a evolução e a dinâmica do processo, o uso das miniaturas, assim como a
avaliação da terapeuta. Vários temas surgiram em cada cenário, os quais terão uma breve
descrição, análise e observações clínicas e a sua importância no desenvolvimento do processo
de cada caso sujeito. As observações do médico, da escola e dos pais serão inseridas na
descrição do processo.
FASE INICIAL
9/4/02-29/10/02 (total de 12 cenários).
Temas: Automatismo, Celebração, Conflito, Defesas e Identificação Egóica
G. realizou 2 cenários com o tema Automatismo e Celebração, 6 cenários com o tema
Conflito e Identificação Egóica e 5 cenários com o tema Defesas. A cena #1 foi selecionada por
apresentar temas que estarão se repetindo no decorrer do processo e para mostrar como G.
realizou sua primeira cena no processo.
#1 (9/4/02)
Areia seca. Cenário dividido em duas partes. No canto inferior, animais selvagens e
marinhos. No canto superior, símbolos natalinos (árvore de Natal cercada de presentes e
presépio). Uma construção com relógio. Este é o primeiro cenário do processo de G. A bola
chinesa que G. considera uma bomba colocada próxima ao presépio poderia simbolizar a
ameaça e o perigo que impedem o nascimento do novo. Nesse momento, G. sente-se
ameaçado e em situação de perigo com as obsessões e compulsões que o cercam. A estátua
da Liberdade dentro da pirâmide, poderia simbolizar os rituais que o aprisionam e a perda da
liberdade de ir e vir. O sujeito verbaliza que a cidade é separada da floresta e que se chama
Springfields. Ele conta que era Natal, uma festa cristã relacionada ao nascimento, e que nesta
cidade existe um museu (local onde se guardam objetos antigos e valiosos). Os presentes ao
redor da árvore poderiam significar o que está por vir, as surpresas e felicidades. Neste
momento, G. faz uma referência aos seus afetos quando diz que adora cachorro, mas que não
pode ter porque mora em um apartamento. A referência à cidade, aos personagens infantis a
69
ela relacionados e ao museu poderia simbolizar os conteúdos mais arcaicos do inconsciente
que poderiam emergir. Podemos interpretar este cenário e as expressões verbais associadas
aos sintomas do TOC que aprisionam G e podem ser uma ameaça à sua liberdade Na parte
inferior da caixa, animais selvagens podem representar os instintos que neste momento
surgem. Seus medos em relação à perda da mãe e os medos de ser transformado em algo de
que não goste. Na construção, o relógio poderia simbolizar o tempo que ele se dedica aos
rituais do TOC e esse objeto repete mecanicamente as horas, assim como G. precisa repetir os
comportamentos compulsivos para aliviar sua ansiedade.
A presença da bomba (bola chinesa) ao lado do presépio e da estátua da Liberdade
aprisionada em uma redoma pode evidenciar a falta de movimento e a contenção das emoções.
A ameaça da bomba ao que está para nascer e a liberdade aprisionada podem simbolizar o
momento que G. está vivendo: não consegue entrar na escola e fica o dia inteiro em casa,
preso às suas obsessões e comportamentos. A árvore de Natal com os presentes ao redor
podem simbolizar a possibilidade de coisas boas e surpresas acontecerem na vida. É
importante lembrar que esta cena foi realizada no mês de abril, época distante da festa de
Natal.
Foto 1 Caso G Cenário #1
Na parte inferior do cenário estão os animais selvagens. A girafa foi um animal que
apareceu em vários cenários de G. no decorrer do processo. Esse animal, devido a sua altura,
pode ver de longe os perigos que se aproximam. G. sentia-se ameaçado pelos pensamentos e
o alto nível de ansiedade (23 – Escala Beck) era similar à situação da girafa na selva, que es
sempre alerta em relação aos perigos e pronta para correr. Segundo Chevalier e Gheerbrant
(2002), no Egito, o hipopótamo era considerado uma manifestação das forças negativas do
mundo, símbolo dos impulsos humanos e dos vícios que o homem não consegue eliminar.
Nesse momento de início do processo, podia significar um tema que G. lidaria na terapia. Para
70
Weinrib (1993), o elefante é o único dos animais selvagens que pode colocar sua força e
energia a serviço dos homens, simboliza um instinto que permite ser guiado. Nesse cenário, o
elefante encontra-se no meio dos animais selvagens e na direção da árvore de Natal com os
presentes. É possível que as possibilidades de comemoração e de coisas boas possam surgir
por meio do processo de terapia e que a força do elefante pudesse ajudar G. a reconhecer seus
instintos e a guiá-los. A águia pode representar o início de uma consciência instintiva masculina
inata à própria personalidade do homem, uma energia masculina de grande força natural, que
neste momento é de grande importância, porque G precisa de coragem para poder enfrentar
todos os pensamentos que o incapacitam nas atividades diárias. A baleia poderia significar o
símbolo do tesouro escondido, a mãe-útero mergulhada no inconsciente. Após esta
interpretação da primeira caixa e os temas que surgiram (Conflito e Defesas), percebe-se que a
potencialidade de G. estava ligada aos seus instintos ainda de modo primitivo e que haveria
necessidade de uma transformação para que os sintomas não o impedissem de realizar suas
atividades diárias. A presença de pequenos sinais, simbolizada pelas figuras colocadas no
cenário, pode representar um futuro renascimento.
Temas: Centralização e Transferência
G. realizou 3 cenários com o tema Centralização e 5 cenários com o tema Transferência.
#3 (13/5/02)
Areia molhada. G. realizou a construção de um coração no centro da caixa de areia.
Pediu para que a terapeuta ficasse de costas para ele e ao final pediu que ela se virasse e falou
que o coração era para a terapeuta. O processo de transferência de G. foi muito intenso.
Nesses momentos, ele se sentia feliz em poder falar de seus sentimentos, e curiosidade a
respeito da terapeuta. O que se pode observar é que entre as caixas 5 e 9 os conflitos
emergem. Entre a 12ª e a 29ª, a seqüência de cenários expressa o conflito e a sua
simbolização. É como se a relação de transferência estabelecida nesses cenários pudesse
ajudar a proteger e a defender G. de qualquer conteúdo ameaçador que pudesse emergir do
inconsciente.
71
Foto 21 – Caso G - Cenário #3
Temas: Movimento Ascendente, Movimento Descendente e Submersão
G. realizou 3 cenários com o tema Movimento Ascendente, 4 cenários com o tema
Movimento Descendente e 2 com o tema Submersão.
#6- (17/6/02)
Areia molhada. No canto superior direito, uma barreira de areia que contém água.
Bolas de vidro semi-enterradas. No canto superior esquerdo, areia encharcada de água.
Elevação com areia no centro da caixa.
Bolas de vidro estão semi-enterradas na areia e G verbaliza que são pedras preciosas,
como se fossem tesouros que fossem emergir. Conteúdos do inconsciente poderiam tornar-se
conscientes e seriam como uma descoberta. Nesse momento, G. estava indo à escola e não
ligava para a mãe o dia inteiro, e contou que não tinha pensamentos obsessivos todo o tempo,
como no início do tratamento.
O movimento da areia para baixo e para cima poderia ser comparado ao caminho da
energia psíquica: regressão e progressão. Em progressão, a energia é utilizada para a
adaptação ao mundo e à vida. Nesse momento, 8 semanas após o início do tratamento G.
freqüentava a escola, com uma boa evolução no tratamento. A falta de movimento que
apareceu no cenário #1 foi substituída por Movimentos Descendentes e Ascendentes e as
pedras parecem emergir do fundo da areia.
72
Foto 3 Caso G Cenário #6
Tema: Congestionamento
G. realizou 2 cenários com este tema.
#10- (9/9/02)
Areia molhada. No canto inferior direito, cesta de vime com vários objetos superpostos:
pedras, sementes, bolas de vidro, placa eletrônica, bala e carro com palhaço. Ao lado da cesta,
a estátua da Liberdade dentro da pirâmide. No canto inferior esquerdo: peixes, flor branca,
cisnes em fila em direção ao centro e escorpião. G. buscou água e colocou na metade superior
da caixa. Inicialmente, disse que iria fazer um estúdio de TV, depois, uma comida e que as
pedras dentro da cesta eram lentilhas. Após 5 meses de tratamento, G. não apresentava
sintomas. No mês anterior, a médica psiquiatra que o tratava havia falecido e foi um momento
muito emotivo no processo terapêutico, porque eu a conhecia e durante muitos anos tivemos
um intenso relacionamento profissional. Eu falei da sua morte e juntos choramos a perda da
amiga em comum. O Congestionamento pode ser observado na cesta carregada de pedras e
outros objetos, mas há uma possibilidade de serem transformados em comida. Outros temas
estão presentes nesse cenário, e pode-se perceber a evolução: Defesas (as pedras contidas
dentro da cesta e a estátua da Liberdade), os cisnes parecem em movimento, em direção ao
centro da caixa. O confronto entre o escorpião e os cisnes que vão na sua direção pode
significar a possibilidade de um conflito agora mais visível.
73
Foto 4 Caso G Cenário #10
Nessa fase, G. apresentou todos os temas com exceção de Destruição, Integração e
Transformação.
FASE INTERMEDIÁRIA
3/2/2003-29/9/03 (total de 15 cenários).
Temas: Automatismo, Conflito, Identificação Egóica, Integração, Movimento Descendente
e Submersão
G. realizou 4 cenários com o tema Automatismo, 8 cenários com o tema Conflito, 11
cenários com o tema Identificação Egóica e 4 cenários com Movimento Descendente e
Submersão.
#14 (10/2/03)
Areia molhada. Areia encharcada de água. Animais atolados. Caixa de areia dividida ao
meio por bolas de vidro. De um lado, animais predadores e, do outro lado, robôs, cavalo e
girafa. A possibilidade de um conflito entre os dois lados pode ocorrer. As pedras parecem fazer
o curso de um rio e os animais predadores podem atacar a girafa, o cavalo e os robôs. A girafa
continua olhando de longe como no cenário #1, o cavalo encontra-se em posição de fuga e os
robôs parecem esperar o ataque. Nesse momento, G. não apresentava os pensamentos de
74
transformação. Não tinha comportamentos compulsivos e os pensamentos obsessivos
diminuíram, às vezes apareciam uma vez por semana.
Foto 5 Caso G Cenário #14
Temas: Centralização e Submersão
G. realizou 5 cenários com o tema Centralização e 4 com Submersão.
# 18- (14/4/03)
Areia molhada. Água contida no canto superior da caixa uma barreira de areia que
contém água. Construção de uma elevação de areia. Para G., este cenário era o mar e o farol.
Entende-se que a função de um farol é o de guiar o barco/navio por lugares perigosos e apontar
um caminho mais seguro. É como se o ego de G. tivesse condições para dar passagem a
conteúdos do inconsciente, mesmo se ameaçadores, aqui simbolizados pela luz que guia os
barcos perdidos na noite escura à procura de um porto seguro.
Em relação ao cenário # 3, percebe-se que a relação de transferência que serviu de
apoio para a busca da centralização apresenta-se como um farol. Esta cena ocorreu 5 meses
após o último cenário com o tema.
Foto 6 Caso G Cenário #18
75
Temas: Defesas, Destruição, Identificação Egóica e Movimento Ascendente
G. realizou 4 cenários com o tema Defesas, 5 com Destruição, 11 com Identificação
Egóica e 1 com Movimento Ascendente.
#20 (12/5/03)
Areia revolvida. Bolas de vidro semi-enterradas e espalhadas por toda a caixa. Miniaturas
caídas, animais semi-enterrados (girafa e leão). Caixa aramada aberta. Sombrinha caída.
Homem caído. Um momento muito difícil para G., pois seu pai estava se mudando para o
interior. O pai ausente no relacionamento prometia presentes de Natal e aniversário e não dava,
não cumpria os horários de visita e desmarcava em cima da hora. Todas as vezes que a
terapeuta marcava orientações com o pai, ele não comparecia e alegava compromissos
importantes. Apesar de todas as dificuldades, G. disse que gostava do pai e tinha boas
lembranças com ele. O fato da mudança deixou G. bastante triste e conversou sobre o assunto
como seria o novo relacionamento com o pai. Esta foi a primeira vez que ele usou figura
humana em seus cenários. O homem está deitado, o que poderia simbolizar a queda da figura
paterna. Esse cenário, com todas as figuras caídas e viradas, remete à imagem de destruição.
Os animais (leão e girafa) que ele mais usou estão enterrados. O tema Defesas, aqui
representado pela caixa aramada aberta, pode simbolizar que conteúdos destrutivos do
inconsciente não estão sendo contidos. Os vidros de remédio podem simbolizar a medicação
retirada. O caos e a bagunça parecem ganhar espaço em sua vida e ele tem de se adaptar a
essa nova situação.
Foto 7 Caso G Cenário #20
76
Temas: Automatismo, Centralização, Congestionamento, Defesas, Destruição e
Identificação Egóica
G. realizou 4 cenários com o tema Automatismo, 5 com Centralização, 3 com
Congestionamento, 4 com Defesas, 5 com Destruição e 11 com Identificação Egóica.
#22 (16/6/03).
Areia seca. Areia revolvida. Bolas de vidro espalhadas por toda a caixa.Moedas no
centro da caixa. Pingüins e tartarugas caídos. Robôs e objetos caídos. Caixa aramada fechada.
Nesse momento, G. não apresentava nenhum sintoma do TOC. A medicação fora reduzida e na
escola apresentava excelente desempenho, considerado um dos melhores alunos da sua sala,
com bom relacionamento com os colegas e, em casa, estava calmo, conforme relato da mãe.
Conseguia expressar verbalmente sua decepção em relação à figura paterna, que continuava
ausente. Este cenário, como os anteriores, apresenta miniaturas caídas e uma visão de caos. A
caixa aramada encontra-se fechada; em outros momentos ela apareceu aberta. Pode-se pensar
que essa caixa permite a visão do que está dentro e do que está fora, pode-se pensar que
conteúdos do inconsciente podem ser transduzidos por este símbolo e se tornarem conscientes.
As bolas de vidro parecem fazer um caminho no cenário e as moedas no centro nos remetem
ao cenário #1, no qual se referiu ao museu com coisas valiosas que agora se encontravam
espalhadas.
A presença de bolas de vidro fazendo um caminho pela caixa de areia sugere um maior
grau de organização da personalidade, uma interação das diferentes partes psíquicas entre si.
As bolas de vidro azuis maiores parecem indicar o caminho a ser seguido. O movimento
realizado na areia, em sentido ascendente, parece indicar o movimento da transformação da
energia da psique.
Foto 8 Caso G Cenário #22
77
G. apresentou todos os temas com exceção de Celebração, Transferência e Transformação.
FASE FINAL
3/11/2003-28/7/2004 (total de 11 cenários).
Temas: Celebração, Centralização, Integração e Submersão
G. realizou 3 cenários com o tema Celebração, 10 cenários com o tema Centralização, 9
cenários com o tema Integração e 1 cenário com o tema Submersão.
#30 (1/12/03).
Areia molhada. Areia encharcada de água. Bolas coloridas. Símbolos Natalinos (árvore
de Natal e presentes). Velas acesas espalhadas pela caixa. G. verbalizou que 4 velas são o
símbolo do Natal. As velas foram colocadas em uma areia onde, inicialmente, ele colocou
bastante água. Ao final, ele apagou as velas com água. A árvore de Natal foi colocada na
mesma posição que na caixa #1. A data desse cenário tem relação com o Natal. Nesse
momento, é como se G. permitisse que os conteúdos do inconsciente entrassem em contato
com o consciente. A ameaça que existia anteriormente com a presença da bomba aparece aqui
com maior controle por parte de G, pois é ele quem coloca a água na areia e apaga as velas
com água. Um ego amadurecido, que permite um melhor controle sobre a mobilidade.
G. estava há 4 meses sem medicação e sem sintomas. Este cenário realizado no início
de dezembro pode remeter à festa cristã que é o Natal. Comparando com o cenário #1, pode-se
observar a evolução no processo psicoterapêutico. A árvore de Natal encontra-se na mesma
posição, as velas acesas por toda a caixa, nos cantos pares de velas iluminam, dando uma
impressão de um todo coeso. As bolas coloridas espalhadas e, no centro, uma vela acesa.
Neste dia, G. pediu à terapeuta que tirasse uma foto com ele apagando a vela com a água.
Para G., a comemoração do Natal está acontecendo, o símbolo do nascimento de uma nova
consciência está presente neste momento.
78
Foto 9 Caso G Cenário #30
Temas: Centralização, Conflito, Congestionamento, Destruição e Integração
G. realizou 10 cenários com o tema Centralização, 5 com Conflito, 4 com
Congestionamento, 2 com Destruição e 9 com Integração.
#33 (3/3/04).
Os temas Congestionamento, Conflito e Destruição apresentam-se nesse cenário.
Todas as bolas de vidro existentes no consultório foram usadas. O caos que antes não era
permitido manifesta-se no espaço livre e protegido da TS. A possibilidade de simbolizar e
vivenciar o símbolo da bagunça e destruição que antes não eram possíveis possibilitou a
transformação dos sintomas.
Foto 10 Caso G Cenário #33
# 38 (28/7/04)
Areia seca. Bolas de vidro espalhadas por toda a caixa e no centro. No canto superior
direito, bola chinesa (bomba). Velas acesas. No canto superior, no centro, um conjunto de
79
casas. G. comentou, quando estava fazendo o cenário, que “o vidro vem da areia”, referindo-se
às bolas grandes de vidro azul. A transformação da areia em vidro ocorre depois de elevadas
temperaturas, o que leva a pensar na transformação interna ocorrida em G., com as elevadas
pressões internas e externas, o choque entre as funções arquetípicas e o mundo externo que
propiciaram e estimularam o aumento da consciência.
Este é o último cenário realizado por G., com as pedras espalhadas por toda a caixa, de
uma maneira uniforme. As quatro bolas azuis grandes parecem fazer um movimento, as velas
acesas nos quatro cantos da caixa levam a pensar na interação entre as diferentes partes
psíquicas. A casa poderia ser o símbolo de um ego mais integrado, a bola chinesa (bomba) que
apareceu no primeiro cenário como ameaça ao presépio, neste momento, é colocada próxima
às casas, mas G. não fez nenhuma referência a ela. Pode ser que neste momento seu ego
mais integrado consiga suportar melhor as ameaças. Em relação ao primeiro cenário, pode-se
notar a evolução na realização do cenário, com os elementos integrados e as velas acesas para
simbolizar algo que ilumina e mostra o caminho, que, internamente, o inconsciente está guiando
o processo de renovação. A presença da bomba poderia ser o símbolo de que a ameaça está
presente, mas, no mesmo lugar onde se encontrava a árvore com os presentes, neste
momento, encontra-se o conjunto de casas, e os presentes são bolas de vidro coloridas. Neste
momento observa-se uma maior integração e centralização.
Na análise de todo o processo, existem indicadores de defesas que passam por uma
transformação. Inicialmente apresentavam-se com rigidez e, ao final, surgiam como um “mar”
de pedras coloridas. Assim como o tema Defesas, o do Automatismo não aparece na fase final
do processo, o que leva a considerar que no desenvolvimento psicológico da criança houve um
processo de diferenciação de sua psique com o desenvolvimento da consciência do ego, que
lhe propiciou condições para lidar com suas obsessões e compulsões.
Por fim, após a seqüência dos cenários nas diferentes fases, pode-se notar o processo
de centralização ocorrer de diferentes maneiras: no processo de transferência, o inconsciente
ativado busca uma expressão amorosa; em um segundo momento, o farol mostra o caminho e,
finalmente, as velas e todo o simbolismo do Natal.
Ao comparar o primeiro e o último cenários, as informações dos relatórios enviados pelos
profissionais envolvidos no processo de G. e as observações dos familiares, percebe-se que o
processo de diferenciação foi estabelecido, e o ego de G. fortaleceu-se. A utilização dos
símbolos propiciou que a energia contida pudesse fluir em diferentes canais e os sintomas do
TOC fossem transduzidos em comportamentos verbais, mais conscientes.
80
Foto 11 Caso G Cenário #38
G. apresentou todos os temas com exceção de: Automatismo, Defesas, Movimento
Ascendente e Movimento Descendente.
MINIATURAS
Durante o processo, o uso de algumas miniaturas merece ser discutido, em particular
aquelas que apareceram com maior freqüência. As miniaturas utilizadas em todo o processo
assim como a freqüência de uso podem ser vistas no CD anexo: Miniaturas Caso G, percentual.
Bolas de vidro: usadas a partir do cenário #6 (17/6/02), foram uma presença constante no
processo de G. e se apresentavam com diferentes significados como: pedras preciosas (cenário
#6), água e pedras preciosas no fundo do mar (cenário #7), alimento (cenário #10), elemento de
proteção (cenário #11). Delimitação de espaços: rio (cenário #14), cantos da cidade (cenário
#19 e #25), lago (cenário # 28) e sítio arqueológico (cenário # 35). A referência ao valor das
pedras relatadas por G. remete à própria história das pedras para a humanidade. As pedras
sempre ocuparam um lugar importante nas civilizações e os homens as utilizaram para
construções de casas (para se abrigar), como amuletos, objetos de adoração e como símbolo
da terra-mãe. As pedras para G. tinham uma qualidade mágica e de transformação, com a
possibilidade de integração entre o consciente e inconsciente.
Animais selvagens: esta categoria de miniaturas esteve presente no processo de G. a
partir do cenário #1 (9/4/02) até o cenário #28 (3/11/03). Os animais selvagens podem
representar simbolicamente a vida instintiva e a identidade com impulsos inconscientes. Muitos
dos nossos impulsos, quando inconscientes, são animalescos, primitivos, compulsivos e
potencialmente destrutivos para a nossa consciência. O uso de animal selvagem na TS pode
auxiliar na expressão dos conteúdos inconscientes profundos e na conscientização dos
significados simbólicos.
81
Animais domésticos: a partir do cenário #2 até o cenário #32, G. fez uso dos animais
domésticos, especialmente o cachorro e o personagem de desenhos infantis, Pluto. O uso
esporádico desses animais muitas vezes em um mesmo cenário poderia significar o esforço de
G. em confrontar, aceitar e tentar disciplinar seus impulsos. Um confronto não apenas no
sentido de conhecer os impulsos, mas de tornar-se responsável por sua expressão criativa por
meio da TS.
Análise Evolutiva do Processo
Os resultados das três fases de G. mostram a evolução de seu processo. Com o auxílio
da análise quantitativa, foi possível estabelecer a distribuição dos temas ao longo das fases,
conforme Gráfico 1 (a seguir) que evidencia a presença ou a ausência, a diminuição ou
aumento de um determinado tema em cada fase.
Os resultados obtidos permitem concluir que houve mudanças na qualidade dos temas.
Se na fase inicial os temas Identificação Egóica e Conflito foram predominantes, na fase final
eles sofreram sensível diminuição, possivelmente relacionada ao processo de diferenciação,
fortalecimento do ego e à integração entre o consciente e inconsciente. Na fase final, ocorreu
um aumento dos temas Centralização e Integração, de 15,8% e 20,9% respectivamente. De
acordo com a teoria de Fordham, os processos de-integração e reintegração do Self
propiciaram um melhor desenvolvimento do ego.
O tema Defesas e Movimento Descendente sofreram uma diminuição gradual da fase
inicial para a fase final, perfazendo um total de 12,5% e 10% respectivamente na fase inicial
para 0% na fase final. Ao mesmo tempo que o tema Conflito sofreu uma diminuição gradual de
15% na fase inicial, para 11,6% na fase final. Pode-se pensar que G. apresentou uma estrutura
psíquica mais coesa para lidar com seus conflitos e houve uma diminuição das defesas
anteriormente rígidas, o que leva a pensar que G. saiu de sua condição de defesa rígida
expressa nos pensamentos obsessivos e comportamentos compulsivos.
O tema Automatismo apresentou na fase intermediária um aumento em relação à fase
inicial de 2,7%, e os sintomas do TOC não estavam mais presentes. Essa fase coincidiu com o
início da retirada da medicação, o que leva a refletir a respeito da possibilidade da transdução
dos sintomas proporcionada pelo processo da TS.
Vale ressaltar que o tema Transformação que não esteve presente nem na fase inicial e
intermediária, mas surgiu na fase final, com 9,3%, fato que sugere uma transformação interna
nas estruturas da psique.
82
No início do processo de G. existiam a involuntariedade e automatismo, caracterizados
pelas obsessões e compulsões, além da presença de defesas rígidas, criando uma couraça
contra o mundo e um complexo do eu autônomo em relação ao resto. Percebia-se a
fragmentação e a cisão entre consciente e inconsciente. O processo de deintegração e
reintegração possibilitou o desenvolvimento de um ego mais amadurecido e em condições de
mediar os conteúdos do inconsciente e do consciente.
Ao final, pode-se afirmar que houve mudanças na expressão dos temas Automatismo e
Defesas, Centralização e Integração, com diminuição e mudança de qualidade ao longo do
processo, tendo sido possível relacionar tais mudanças à transdução dos sintomas.
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0%
Destruição
Integração
Transformação
Automatismo
Celebração
Congestionamento
Submersão
Centralização
Movimento Ascendente
Movimento Descendente
Defesas
Transferência
Conflito
Identificação Egóica
Gráfico 1: Evolução dos Temas
Caso G - Fase Inicial: de 9/4/2002 a 29/10/2002
83
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0%
Celebração
Transferência
Transformação
Movimento Ascendente
Congestionamento
Integração
Automatismo
Defesas
Movimento Descendente
Submersão
Centralização
Destruição
Conflito
Identificação Egóica
Gráfico 2: Evolução dos Temas
Caso G - Fase Intermediária: de 3/2/2003 a 29/9/2003
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0%
Automatismo
Defesas
Movimento Ascendente
Movimento Descendente
Submersão
Transferência
Destruição
Celebração
Congestionamento
Identificação Egóica
Transformação
Conflito
Integração
Centralização
Gráfico 3: Evolução dos Temas
Caso G - Fase Final: de 3/11/2003 a 28/7/2004
84
8.3.2 Caso L.
HISTÓRICO
L. é um menino de 8 anos e 1 mês, cujo processo durou de outubro de 2002 a maio de
2005. A partir de junho de 2005, os encontros passaram a ser quinzenais e, em 2006, tornaram-
se mensais.
O resumo da queixa livre e os dados da história de vida do sujeito, segundo a mãe de L. a
gravidez foi desejada, e ela engordou 20 quilos e teve pouco enjôo.O parto foi cesárea, e a
amamentação ocorreu durante dois meses, porque a mãe sentia muita dor nos seios e não
conseguia relaxar para amamentar. L. tinha muita fome e ela começou a dar mamadeira. L.
chorava muito, dia e noite. Em relação à alimentação L. nunca recusou comida, aceitava
alimentos novos. O desenvolvimento motor foi adequado à idade. Sempre foi muito
“estabanado”, “não consegue comer sem fazer sujeira, derruba comida na mesa e no chão”,”L.
mexe em toda a casa e tudo que acha guarda porque acha que vai ter uma utilidade”. Na época
da avaliação, L. comia muito chocolate, e sempre ficava irritado e bravo quando exagerava na
quantidade. O desenvolvimento da linguagem foi anterior ao andar, e aos três anos de idade,
falava tudo errado e fez tratamento de fonoaudiologia. No primeiro trimestre de vida tinha
dificuldade para dormir e, após este período, até o ano de 2003, L. dormia no quarto com a
mãe, e era carregado para o seu quarto depois que adormecia. Teve enurese noturna até os 5
anos de idade. A mãe teve síndrome do pânico em 1997, e a mãe relatou que o avô materno
tem “diagnóstico esquizoafetivo”, toma medicamentos e que a tia materna tem “distúrbio
bipolar”. A mãe relatou que tem diagnóstico de TOC desde a adolescência, com obsessões e
compulsões de simetria, ordem, contagem e arranjo, assim como compulsão a comprar o que
não precisa. Na época do início do tratamento de L., a mãe fazia tratamento com TCC e
medicamentos. L., durante o ano de 2002, apresentou dificuldade de concentração na escola e
em casa, na hora de fazer a lição. Alguns pensamentos e comportamentos de L.:
“Eu não tenho nada para fazer. Aqui não tem o que fazer”.
“Dói aqui”.
“O sol vai engolir os planetas e a terra será um deles, eu acho que a temperatura
da terra vai subir muito”.
“Quando começa a chover eu fico pensando que os rios vão subir tanto que vão
inundar tudo”.
“Eu não gosto de feijão no prato, ele suja o meu prato e suja o meu arroz”.
“Eu tenho medo de faltar o ar e eu não conseguir respirar mais e aí eu morro”.
85
“A palavra professora e a palavra faca me deixam com muito medo”.
“Se eu fico com uma idéia na cabeça eu tenho que piscar os olhos e piscar com
muita força para que a idéia possa ir embora”.
“Eu não consigo me limpar sozinho, tenho nojo, acho que vou ficar com mau
cheiro se eu me limpar e ficar com a mão suja”.
Eu olho debaixo da cama do meu sítio para ver se não tem aranha, tenho pavor
de aranha”.
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Raven: 18 pontos (Capacidade intelectual superior à média. Percentil: 75).
Normas padronizadas à população brasileira.
Bender: idade visomotora adequada à idade.
HTP-F: L. apresentou sentimento de inferioridade, sensação de ser inadequado
para o cumprimento da tarefa, muito ansioso, apagou várias vezes os desenhos
propostos e sempre os criticava. Indícios de conflito, medo e insegurança.
RESULTADO DA ENTREVISTA RETROSPECTIVA
A entrevista foi realizada em março de 2005 com a mãe, seguindo o roteiro da apostila de
1º atendimento. (MIGUEL, et al., 2005).
Questionário médico e fatores de risco: não apresentou intercorrência durante a
gravidez, no parto e do primeiro ao quinto anos de vida. Desenvolvimento
neuropsicomotor dentro do esperado para a idade. Não foram relacionadas
doenças na história médica geral. Não apresentou diagnóstico de febre reumática.
Tratamento psiquiátrico com medicação:
1998 – Imipramina (Tofranil) (2 semanas)
1998 – Carbamazepina (Tegretol) (2 semanas)
1998 – Haloperidol (Haldol) (2 semanas)
1998 – Olanzapina (Zyprexa) (2 semanas). (Mudança de médico
psiquiatra).
2000 – Metilfenidato (Ritalina) medicação utilizada de forma
intermitente.
Em outubro de 2003, teve alta psiquiátrica.
Classificação socioeconômica: critério ABIPEME – 97 pontos – Classe A.
86
Escala Dimensional de Avaliação da Gravidade de Sintomas Obsessivo-
Compulsivos (DY-BOCS).
Tabela 5
Resultados DY-BOCS – Passado – Caso L
Dimensões de sintomas Tempo
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
Total
(0-15)
Agressão 3 3 3 9
Sexual e Religião 0 0 0 0
Simetria, Ordem, Contagem e Arranjo 2 1 1 4
Contaminação e Limpeza 2 3 0 5
Colecionamento 0 0 0 0
Diversas 2 2 3 7
Fonte: Miguel, 1/2005, p.40.
Apresentou alguns critérios relacionados ao diagnóstico do TOC.
Tabela 6 Resultados DY-BOCS Avaliação Global – Passado – Caso L
Tempo
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
Prejuízo
(0-15)
Total
(0-30)
Todas as obsessões e
compulsões
2 2 3 6 13
Fonte: Miguel, 1/2005, p.40.
Apresentou critérios relacionados ao TOC.
Escala Obsessivo-Compulsivo de Yale-Brown – Y-BOCS: escore total: Obsessões
(9) + Compulsões (7) = 16. Preencheu os critérios para o diagnóstico de TOC.
Escala para Avaliação da Presença e Gravidade de Fenômenos Sensoriais da
Universidade de São Paulo. O sujeito respondeu uma vez positivamente ao item
sensação física tátil. Uma vez, à sensação física músculo-esquelética ou visceral.
Uma vez, ao “estar em ordem” relacionado a estímulo visual. Teve uma resposta
positiva em relação a incompletude e ao “ter que”.
Tabela 7
Tabela de Resultados: Avaliação de Gravidade dos Fenômenos Sensoriais –
Passado- Caso L
Passado Freqüência
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
2002 2 2 2
Fonte: Miguel, 1/2005, p.48.
87
Apresentou alguns critérios relacionados aos fenômenos sensoriais.
A resposta em relação à intensidade dos fenômenos sensoriais descritos e a
intensidade das obsessões apresentadas: os fenômenos sensoriais são
menos
.intensos/graves (ou incomodam menos) que as obsessões.
Questionário TS-OC (YGTSS e Y-BOCS)
A.1. – Lista de Sintomas (Tiques):
A.2. – Escala de Avaliação de Tiques:
Tabela 8
Resultados: Yale Global TIC Severity Scale (YGTSS) – Caso L
Número Freqüência Intensidade Complexidade Interferência Total
a.Tiques motores 2 3 3 2 1 11
b.Tiques fônicos 1 3 2 0 1 7
c.Total para todos
os tiques
3 6 5 2 2 18
Fonte: Miguel, 1/2005, p.78.
Preencheu alguns critérios relacionados aos tiques. Presença de tiques motores:
movimento de olhos, nariz, boca, língua ou faciais (caretas); movimentos com a cabeça, com os
ombros, de braços e mãos; movimentos dos pés e pernas e passar as mãos no lábio.
Apresentou tiques fônicos: tossir e fungar.
Escala de Depressão de Beck (BDI): total de 8. Não preencheu critérios para
depressão.
Escala de Ansiedade de Beck (Beck-A): total de 9. Não preencheu critério para a
ansiedade, apesar de ter componentes relacionados à ansiedade acima do
esperado.
MTA SNAP – IV Escala de pontuação para pais e professores: os pais
responderam e a escola também, por meio dos relatórios apresentados em 2002,
que confirmaram: falha em prestar atenção aos detalhes por falta de cuidado em
trabalhos escolares e tarefas; dificuldade em manter atenção em tarefas; evita ou
não gosta e reluta em envolver-se em tarefas que exijam manutenção de esforço
mental; é distraído por estímulos alheios e esquecido nas atividades diárias; é
irrequieto com as mãos e pés; remexe-se na cadeira; abandona sua cadeira em
sala de aula ou em outras situações nas quais se espera que permaneça sentado;
está a mil e freqüentemente age como se estivesse “a todo vapor”; dá respostas
precipitadas antes das perguntas serem completadas; tem dificuldade para
88
aguardar a sua vez; descontrola-se e faz coisas de propósito que incomodam os
outros.
Transtorno de Ansiedade de Separação (TAS): não apresentou critérios.
SF-36: as respostas foram relacionadas com saúde boa e sem dificuldades em
relação às atividades da vida diária.
Entrevista sobre familiares: Resposta 4
(alguém na família teve ataque de pânico
e desenvolveu sintomas físicos) mãe. Resposta 11
(alguém da família tem ou teve
problemas de atenção ou hiperatividade) pai. Resposta 12
(alguém na família teve
períodos maiores do que duas semanas em que se sentisse deprimido, triste,
desanimado) tio materno. Resposta 16
(alguém na família se sente ou sentiu-se
incomodado por pensamentos que não faziam o menor sentido e que
continuavam vindo na mente mesmo quando tentava evitá-lo, obsessões) mãe.
Resposta 17
(alguém na família tem ou teve algo que tivesse que fazer várias
vezes e que não conseguia evitar, compulsões) tio-avô materno e mãe.
CONCLUSÃO DA AVALIAÇÃO
L. apresentou critérios para o diagnóstico de TOC e a presença de tiques motores e
fônicos.
ENTREVISTA REALIZADA EM MARÇO DE 2006
Social Adjustment Scale (SAS), Escala de Adequação Social (EAS): total 2,1
apresentou resultado de uma boa adequação social.
Escala de Avaliação de Crenças de Brown: não apresentou respostas
relacionadas a crenças. Apresentou boa capacidade de crítica e não teve
pontuação nos itens de convicção, percepção da visão dos outros, explicação da
diferenças de visão, rigidez das idéias e tentativa de invalidar as crenças.
TRATAMENTO PSICOLÓGICO COM A TS.
Aqui destacam-se algumas caixas para ilustrar o processo. Os temas foram escolhidos
de acordo com a evolução e a dinâmica do processo, o uso das miniaturas, assim como a
avaliação da terapeuta. Vários temas surgiram nos cenários, que serão objeto de uma breve
descrição, análise e observações clínicas a respeito dos temas e a sua importância no
desenvolvimento do processo do sujeito. Quando houver observações do médico, da escola e
dos pais, serão inseridas na descrição do processo.
89
FASE INICIAL
9/10/02-23/6/03 (total de 40 cenários).
Temas: Automatismo, Conflito, Defesas e Transformação
L. realizou nesta fase 18 cenários com o tema Automatismo, 17 cenários com o tema
Conflito, 21 cenários com o tema Defesas e 16 com o tema Transformação.
#1 (9/10/02)
L. colocou as grades ao redor de toda a caixa de areia, como que para reforçar a
proteção. Ele não conversou com a terapeuta e demorou 40 minutos para realizar o cenário.
Procurou as miniaturas nas prateleiras com atenção. Escolheu a caixa com areia molhada.
Inicialmente, colocou as cercas semi-abertas ao redor da caixa de areia, depois a caixa aberta
com sementes que poderiam significar a possibilidade de algo germinar e nascer. As figuras
estão colocadas sem conexão umas com as outras. Pedras de vidro foram colocadas como se
fossem água, em cima delas barcos.
De acordo com Bradway &MacCoard (1997), as pedras de
vidro antecipam a possibilidade de se encontrarem tesouros do inconsciente.
O transformador encontrava-se semicoberto por vegetação, podendo significar o que está
escondido e que pode ser transformado. A placa eletrônica, relógio e espelho foram colocados
próximos, que poderiam simbolizar o início de um processo de tomada de consciência dos seus
impulsos, relacionado ao TOC, aos tiques e ao TDAH. Para Weinrib (1993), o espelho é um
símbolo do inconsciente, que permite a reflexão daquilo que não se vê e representa um impulso
em direção à consciência, a potencialidade de se conhecer. O cofre foi colocado próximo ao
computador e sentado em frente ao computador, há um guerreiro. Quando L. pegou a bola
chinesa, ele disse que era uma bomba. Animais selvagens (elefante e a águia) estão presentes.
Foi citado anteriormente, no caso G., ser o elefante, o símbolo da força e energia a serviço dos
homens e a possibilidade de um instinto a ser guiado. Existe a possibilidade de nascimento
(sementes) e do reconhecimento de impulsos (espelho) que poderiam surgir por meio do
processo de terapia, o que poderia ajudar L. a reconhecer seus instintos e a guiá-los. A águia
representa o início de uma consciência instintiva masculina inata, uma energia de grande força
natural, que neste momento é importante, porque ele precisa de coragem para poder enfrentar
todos aqueles pensamentos que lhe causam tanta ansiedade. A presença de animais pré-
históricos (dinossauro) pode simbolizar conteúdos muito antigos e agressivos do inconsciente,
assim como jacaré que parece ir ao encontro do dinossauro. Animais selvagens (onça e tigre)
são animais ferozes e caçadores. A cobra foi colocada próxima à águia e L. fala “que aqui
90
dentro é o veneno da cobra”. A motocicleta é um meio de transporte rápido e quando a colocou,
ele fala “que é para ir embora” Segundo relato da mãe, L., antes de entrar na sala, falou que
não queria fazer terapia e que não iria conversar com a terapeuta. O processo de terapia
poderia ser uma ameaça ao ego de G. As armas e canhão (arsenal de guerra) podem
simbolizar ameaça e destruição e, no decorrer do processo de L., surgiram constantemente.
Neste cenário, L. colocou uma ponte que não leva a nenhum lugar que poderia simbolizar a
falta de conexão entre consciente e inconsciente. O gorila que representa o primata mais
próximo do ser humano poderia simbolizar a possibilidade do início do processo de
desenvolvimento do ego. Próximo às armas, L. colocou uma casa de papelão, que poderia
significar a fragilidade do ego perante tantas figuras ameaçadoras presentes na caixa de areia.
Foto 12 Caso L Cenário #1
Temas: Identificação Egóica, Integração, Movimento Ascendente, Movimento
Descendente e Transferência
L. realizou 28 cenários com Identificação Egóica, 9 com Integração, 19 com Movimento
Ascendente, 22 com Movimento Descendente e 6 com Transferência.
#7 (18/11/02)
Areia molhada. L. divide a caixa, e, no centro coloca bolas de vidro coloridas; no canto
superior direito, ramo de trigo; no canto superior esquerdo, ancinho; no canto inferior direito,
navio. A ponte liga as duas partes da caixa. Na parte inferior, elevação de areia, que L. diz ser
uma montanha. Quando realizou o cenário, L. escavou um buraco, Movimento Descendente, e
depois colocou as pedras como se fossem água, que simbolizam um mergulho mais profundo
no inconsciente. A ponte no cenário #1 não fazia uma ligação e, nesse momento, une dois
91
lados da caixa. Na parte inferior, L. fez uma montanha e, na parte superior, deixou um ancinho,
que poderia simbolizar o potencial de construção de suas potencialidades. O ramo de trigo,
assim como as sementes do cenário #1 poderiam simbolizar as potencialidades que ainda são
sementes, mas podem se transformar. É oportuno lembrar que em vários cenários L. deixou
uma ferramenta de trabalho na areia, que poderia simbolizar a possibilidade um ego ainda em
construção. Outra miniatura bastante utilizada na fase inicial do processo foi o navio, algumas
vezes colocado na água outras vezes em lugares onde não é possível navegar. Percebe-se a
dificuldade de L. em lidar com suas frustrações, e os sintomas de TDAH, muitas vezes,
impedem um movimento mais adequado nas diferentes situações externas que lhe são
impostas. O processo de transferência ocorreu de maneira mais direta, por meio de questões
relacionadas ao tempo de trabalho da terapeuta e o quanto ela gostava do seu trabalho. A
construção desse cenário apresentou indicadores de um bom prognóstico em relação ao
processo terapêutico.
Foto 13 Caso L Cenário #7
Temas: Automatismo, Celebração, Conflito, Congestionamento, Defesas, Identificação
Egóica, Integração, Movimento Ascendente, Movimento Descendente, Submersão e
Transformação
L. realizou 18 cenários com Automatismo, 7 com Celebração, 17 com Conflito, 13 com
Congestionamento, 21 com Defesas, 28 com Identificação Egóica, 9 com Integração, 19 com
Movimento Ascendente, 22 com Movimento Descendente, 8 com Submersão e 16 com
Transformação.
#18 (24/2/03)
Na areia molhada, L. colocou as cercas, delimitando espaços com saídas; no canto
inferior direito, dentro das cercas, computador, fax/telefone, relógio, bomba, cofre e o mundo; o
92
espelho em frente à elevação de areia; na elevação de areia, avião, torre Eiffel, canhão, placa
eletrônica, estátua da Liberdade dentro da pirâmide; no canto inferior esquerdo, corrente
dourada superposta à vegetação que encobriu o transformador, pedras e sacrário (objeto
religioso), sugerindo o que está escondido e poderia ser transformado; no lado direito superior
da caixa, uma barreira de areia com água; bolas de vidro dentro e fora da água e uma ponte
que liga os dois lados, assim como no cenário #7, mostrando a possibilidade da integração.
Atrás do espelho, Shiva, figura mitológica que tem como um de seus atributos o constante
movimento, que poderia simbolizar aqui os sintomas do TDAH e os tiques de L. Como o mundo
que não pára de girar, quando os sintomas de L. surgiam, ele não conseguia se controlar e
ficava muito nervoso. As ameaças estavam presentes e existia a possibilidade de conflito.
Alguns dos símbolos relacionados ao Automatismo, como a placa eletrônica e o relógio,
estiveram presentes na grande maioria dos cenários da fase inicial. Ao comparar este cenário
com o #1, percebe-se uma grande diferença, um movimento na psique de L., com Movimentos
Ascendente e Descendente apontando para o movimento da energia psíquica.
Foto 14 Caso L Cenário #18
Temas: Centralização, Destruição, Identificação Egóica, Movimento Ascendente,
Movimento Descendente e Submersão
L. realizou 9 cenários com Centralização; 6, com Destruição; 28, com Identificação
Egóica; 19, com Movimento Ascendente; 22, com Movimento Descendente e 8, com
Submersão.
93
#27 (14/4/03)
Na areia molhada, L. fez uma barreira de areia que contém água; no centro da caixa,
uma ilha, e os carros ao redor, dentro da água; sinais de trânsito (avisos de passagem proibida
e contra-mão); na parte superior da caixa; construções (casas e igreja). Após ter feito o cenário,
pediu que a terapeuta tirasse a foto do cenário, brincou e depois destruiu o que havia feito. Ao
final ele falou: ”todos os carros estão afundados e tudo está afundado”.
Em algumas situações, após a construção e o brincar com cenário, na hora de ir embora
L. destruía todo o cenário. Este comportamento sugeria que as estruturas psíquicas não eram
fortes o suficiente para se manter. Nesse momento, ele fez um movimento muito importante
relacionado ao processo de de-integração e reintegração.
Foto 15 – Caso L - Cenário #27
FASE INTERMEDIÁRIA
29/7/03-26/4/04 (total de 44 cenários)
Temas: Conflito, Integração, Movimento Ascendente, Movimento Descendente e
Transferência
94
L. realizou 9 cenários com Conflito; 2, com Integração; 15, com Movimento Ascendente;
29, com Movimento Descendente e 5, Transferência.
#43 (4/8/03)
Areia molhada. Barreiras de areia (muros) semelhantes nos dois lados da caixa. Arsenal
de guerra na parte inferior e superior da caixa.
De ambos os lados da caixa, inferior e superior, há construções similares. Na parte
inferior, a lâmpada e o canhão apontavam em direção à parte superior da caixa. Pode-se
pensar que o processo de integração apresenta-se ameaçado por conflitos. Entretanto, a
presença da pá, do barril de petróleo e da lâmpada mostra as possibilidades de transformação:
a pá que pode construir ou enterrar, o petróleo que é a matéria-prima de vários produtos e a
lâmpada, que é a energia transformada, podem simbolizar algumas das expressões dessas
possibilidades. Esse é um dos muitos cenários que L. realizou: ”este lado é meu e o outro é
seu”. “Eu tenho mais tecnologia que você”. Neste estágio do processo, a transferência no nível
verbal contém uma carga de ameaça, destruição e competição.
Foto 16 Caso L. Cenário #43
Temas: Automatismo, Celebração, Congestionamento, Defesas, Identificação Egóica,
Movimento Ascendente e Movimento Descendente
L. realizou 8 cenários Automatismo; 2, Celebração; 1, Congestionamento; 8, Defesas; 30,
Identificação Egóica; 15, Movimento Ascendente e 29, Movimento Descendente.
95
#44 (11/8/03)
Areia molhada. Cercas delimitando espaços com saídas. Na parte inferior da caixa,
privada e bomba com cercas ao redor; cofre, relógio, cadeiras, árvore de Natal, meio de
transporte (navio), bolas de vidro, fogão e panelas; no centro da caixa, répteis (cobras),
vegetação, gaiola com passarinho, bicicleta, sombrinha e ave selvagem (gavião); na parte
superior da caixa, piscina, animal doméstico (cavalo); no canto superior esquerdo,
transformador coberto pela vegetação. Em relação ao cenário #2, percebe-se uma evolução: as
cercas têm abertura e pode-se transitar entre as diferentes partes do cenário. Existem alguns
elementos comuns aos dois cenários: o fogão neste momento tem comida, a piscina tem uma
bóia, o transformador está na mesma posição que no cenário #2, só que coberto pela
vegetação. Pode-se pensar em conteúdos inconscientes processados e integrados. A miniatura
do navio, que apareceu pela primeira vez no cenário #2, encontra-se em uma posição mais
relevante, em cima de uma mesa, impossibilitado de navegar. A questão do movimento da
energia psíquica é representada pelos répteis que caminham em uma mesma direção. O cavalo
e a águia, animais fortes, podem representar a possibilidade de um ego mais forte. L. disse:
”tem que ter código para entrar neste lugar e que eu gosto de lugar apertado e com muito
objeto”. Neste momento, L. não apresenta mais sintomas. Os pensamentos obsessivos não o
incomodam mais. A mãe relata que ele está mais ansioso desde que as aulas começaram.
Foto 17 Caso L Cenário #44
Temas: Conflito, Destruição e Submersão
L. realizou 9 cenários com Conflito; 8, com Destruição e 15, com Submersão.
96
#51 (9/10/03)
Na areia molhada, L. fez uma guerra e depois deixou todos os soldados caídos. Ele
jogou bastante água e acendeu as velas como se fossem bombas. Os temas Conflito,
Destruição e Submersão continuam presentes no processo de L. Os sintomas dos tiques não
estão mais presentes, mas os temas dos cenários evidenciam agressividade. Na escola, a
informação é que L. apresentou uma boa evolução, conseguiu prestar mais atenção em sala de
aula. Nesse momento, L. havia iniciado um tratamento de psicopedagogia. Segundo o relato
dos pais, L. estava mais feliz e relacionando-se melhor com os colegas e com a irmã. Pode-se
sugerir que os temas de Destruição e Conflito que surgiram nos cenários possibilitaram a
transdução dos sintomas e transformação da energia da psique.
Foto 18 Caso L Cenário #51
Temas: Centralização, Movimento Descendente e Transformação
L. realizou 12 cenários com Centralização; 17, com Movimento Descendente e 7, com
Transformação.
#52 (9/10/03)
Na areia seca, L. fez uma elevação de areia e colocou paus e velas acesas. Trouxe de
casa um carro azul e o colocou saindo do centro da elevação, onde L.construiu cuidadosamente
uma plataforma. As velas acesas podem simbolizar uma luz para o desenvolvimento do ego.
Após a confecção do cenário, L. não retirou de dentro da caixa o material utilizado, o que
poderia simbolizar um cenário de construção do ego. É interessante observar que, nesse dia, L.
realizou dois cenários, o #50 e o #51, ambos com imagens relacionadas a conflito e destruição.
Fazia um mês que L. não apresentava mais os sintomas do TOC e os tiques.
97
Foto 19 Caso L Cenário #52
FASE FINAL
3/5/04-11/2/05 (total de 31 cenários).
Temas: Destruição, Identificação Egóica, Movimento Ascendente e Movimento
Descendente
L. realizou 9 cenários com Destruição; 25, com Identificação Egóica; 12, com Movimento
Ascendente e 17, com Movimento Descendente.
# 97 (12/7/04)
Na areia molhada, no canto inferior direito, buraco com água e barcos dentro; no canto
inferior esquerdo, carros e caminhões; na parte superior da caixa, construções (casas e igrejas).
Após brincar com as miniaturas, L. destruiu o cenário e disse: “Este é o aeroporto Minusculitus,
na cidade de Townville”. Brincou com os aviões e depois destruiu o cenário dizendo: “Tudo caiu,
até a igreja e houve a maior destruição”. É interessante observar que no cenário #27, a igreja
não caiu e ficou preservada. Considerando a igreja como um dos símbolos da mãe, pode-se
pensar na luta de L. para se separar da mãe. Sabe-se que um dos pontos importantes na
psicologia do desenvolvimento diz respeito ao relacionamento mãe-filho. Nesse momento esta
separação foi expressa em destruição, que poderia simbolizar uma iniciação de um novo
estado. Ao mesmo tempo em que falava de destruição, L. passava por cima dos objetos caídos
com os caminhões e carros. Surgiram, novamente as duas polaridades: de um lado, o cenário
98
bonito e bem-feito e, do outro, todo o potencial destrutivo e ameaçador. Pode-se pensar que a
possibilidade de expressar as duas polaridades na TS propiciou uma transformação em L.
Nesse momento ele parecia uma criança mais segura e capaz de expressar seus sentimentos e
emoções, que anteriormente não eram reconhecidas por ele.
Foto 20 Caso L Cenário #97
Temas: Congestionamento, Conflito, Identificação Egóica, Movimento Ascendente e
Movimento Descendente
L. realizou 3 cenários com Congestionamento; 11, com Conflito; 25, com Identificação
Egóica; 12, com Movimento Ascendente e 17, com Movimento Descendente.
# 99 (2/8/04)
Areia seca. No canto inferior esquerdo: meios de transporte (aviões e carros), plantas; no
canto superior esquerdo: vela, figura de um mago, casa e bola de vidro grande; do lado direito:
buraco na areia; na parte externa esquerda: soldados e tanque de guerra; dentro do buraco:
barcos e bolas de vidro coloridas; no lado externo superior: plantas, casa, bolas de vidro e
canhão; do lado direito externo: miniatura de um monstro. L conta uma história a respeito do
cenário: “Era uma vez um reino muito distante, que tinha um rei com seus soldados, eles não
99
conheciam nenhuma tecnologia. Eles jogavam bombas. Aí veio um furacão que os deuses
mandaram e destruíram a minha tecnologia. Mas algumas coisas se salvaram: transformador,
canhão e alguns soldados”. Ao sair da sala, ele apagou as velas que haviam ficado acesas
durante a guerra. O mundo externo parece ser uma ameaça ao ego de L., no entanto, ele
consegue lutar e salvar alguns objetos, que podem simbolizar as condições de lutar e lidar com
as frustrações impostas ao ego. Ao lembrar os cenários anteriores, percebe-se uma evolução,
uma diminuição na fragmentação do cenário.
Foto 21 Caso L Cenário #99
Temas: Centralização, Defesas, Identificação Egóica e Transformação
L. realizou 7 cenários com Centralização; 5, com Defesas; 25, com Identificação Egóica e
7, com Transformação.
# 110 (8/11/04)
Areia seca. Índios e árvores espalhados pela caixa; no centro: índio debaixo de folhas
secas, como se fosse tenda; no canto inferior direito: jaula com guerreiros dentro; no canto
superior direito: oca; no canto superior esquerdo: caixa de tesouro. L. falou que era na época da
colonização portuguesa na América do Norte. O índio no centro da caixa debaixo da tenda pode
simbolizar os conteúdos inconscientes e instintivos mais integrados. Os índios estão exercendo
diferentes funções. Neste momento, a diferenciação das funções e a consciência de suas
possibilidades propiciam a L. uma auto-estima que anteriormente não possuía. Segundo relato
da escola, L. conseguiu atingir os objetivos propostos para a série em que se encontrava. A
psicopedagoga que o acompanhava desde agosto de 2003 contou que L. estava apresentando
uma boa evolução, com melhor capacidade de concentração e mais responsividade em relação
às tarefas escolares.
100
Foto 22 Caso L Cenário #110
Temas: Conflito, Identificação Egóica, Integração, Movimento Descendente e Submersão
L. realizou 11 cenários com Conflito; 25, com Identificação Egóica; 9, com Integração; 17,
com Movimento Descendente e 5, com Submersão.
# 115- (11/2/05)
O cenário foi realizado na areia molhada e a caixa dividida ao meio por um buraco com
água. Dentro do buraco colocou o cordão dourado; no lado esquerdo da caixa: meios de
transporte (caminhões, trilho e trem); no lado direito: canhão, caminhões e carro azul; bomba
com areia carregada por um caminhão; na parte superior, uma caixa de tesouro aberta. Dois
lados opostos unidos, pela linha do trem e o cordão dourado dentro da água podem simbolizar
um novo momento de L., uma evolução positiva, pois o colar no fundo da água pode ser indício
de que ainda existam tesouros escondidos no inconsciente. No entanto, a caixa de tesouro
encontra-se aberta na parte superior da caixa, revelando tesouros encontrados. Os carros estão
circulando, parece que está ocorrendo o movimento da energia da psique. A bomba levada para
o outro lado aponta que existe a possibilidade de que o confronto com os conteúdos mais
agressivos do inconsciente não seja mais tão ameaçador como até então.
Foto 23 Caso L Cenário #115
101
Nesta fase, L. apresentou todos os temas com exceção de Automatismo e Celebração.
MINIATURAS
Meios de transporte: em todo o seu processo, L. usou os diferentes meios de transporte.
Pode-se dividir o tema Identificação Egóica do processo de L. por meio dos meios de
transportes. Inicialmente, barcos e aviões, depois carros e caminhões. Com estas miniaturas,
simulava desastres da natureza, tais como ondas gigantescas, maremotos, terremotos,
furacões, tempestades e inundações. Vale lembrar aqui que um dos pensamentos obsessivos
de L. estava relacionado a desastres. As corridas e competições ocorreram entre os diferentes
carros e barcos. O carro azul, seu preferido e com o qual se identificava, sempre era o mais
forte e poderoso. Simbolicamente, pode-se considerar o carro azul como uma identificação com
um ego inflado, relacionado ao mito de origem do nascimento do ego. Além disso, a energia de
L., que muitas vezes não se apresentava disponível de maneira adequada, na caixa de areia
era representada por um carro com motor forte e possante. Pode-se pensar que o carro azul
estaria personificando sua energia agora libertada e conduzida de forma segura pelos caminhos
que traça na areia. O “fusca” muitas vezes representava a terapeuta e recebia o seu nome. A
possibilidade de expressão da competição e da agressividade, o ganhar e o perder, a alegria e
a frustração foram simbolizados nas cenas da TS. O trabalho criativo de L., muitas vezes
expresso após o caos e destruição, propiciou que as sementes do cenário #1 pudessem
germinar e fazer que os sintomas do TOC desaparecessem.
Construção: em seus cenários, L. usou casas, igrejas, padarias e posto de gasolina. Com
essas miniaturas, ele construía cidades e depois as destruía. A partir do cenário #25 (31/3/03)
até o cenário #46 (25/8/03), esse movimento de construção e destruição foram uma constante.
A partir do cenário #50, antes de destruir o cenário, L. pedia para que a terapeuta tirasse as
fotos. Esse movimento de registrar a construção na sua presença pode apontar para o
movimento similar na formação do ego, ou seja, a construção e destruição; pólos opostos onde
o choque do fazer e desfazer permitiria uma maior estruturação do ego.
Armas e bombas: a presença dessas miniaturas acompanhou L. por todo o processo, e
elas exerciam, por vezes, o papel de proteção e defesa durante um ataque que ele simulava na
caixa de areia, e, em outras vezes, no pólo oposto representavam ataque e destruição. Por
meio do uso dessas figuras, L. teve a possibilidade de expressar as dificuldades em lidar com
suas frustrações e seus limites. Várias guerras foram realizadas nas caixas de areia e o brincar
na areia possibilitou que estruturas defensivas “congeladas” conseguissem ser transformadas.
102
ANÁLISE EVOLUTIVA DO PROCESSO
Com a análise quantitativa, foi possível perceber a evolução dos temas no decorrer do
processo, assim como a sua presença ou ausência.
Os temas Identificação Egóica e Movimento Ascendente apresentaram, respectivamente,
um aumento de 7,1% e 0,7% da fase inicial para a fase final.
O tema Conflito, na fase intermediária, diminuiu 2,9% e, na fase final, aumentou 0,8% em
relação à fase inicial e 3,7% em relação à fase intermediária. Ao mesmo tempo, o tema Defesas
diminuiu gradualmente em 6,4% no decorrer das fases.
O tema Automatismo teve uma diminuição e 9% da fase inicial para a fase final e o tema
Congestionamento diminuiu 4%.
O tema Centralização apresentou um aumento de 3% da fase inicial para a fase
intermediária e, em seguida, uma diminuição de 1,6% para a fase final. Ao mesmo tempo, o
tema Movimento Ascendente apresentou uma diminuição de 0,1% da fase inicial para a fase
intermediária e um aumento na fase final de 0,7% em relação à fase inicial. Concluindo, o tema
Centralização diminuiu na fase final, mas o Movimento Ascendente aumentou o que leva a
pensar que os temas Centralização e Movimento Ascendente podem ser complementares. Essa
relação mereceria ser pesquisada com mais aprofundamento para que se pudesse estabelecer
uma melhor relação entre o Movimento Ascendente e a Centralização.
Os temas Integração e Destruição tiveram um aumento da fase inicial para a final de
3,1% e 4,6%, respectivamente, enquanto o tema Identificação Egóica apresentou um aumento
gradual de 7,1% da fase inicial para a fase final, o que poderia significar que, nesse momento, o
ego mais forte poderia suportar aspectos destrutivos do inconsciente e L não apresentaria os
sintomas do TOC e os tiques.
O tema Celebração teve uma diminuição gradual da fase inicial para a fase final,
enquanto o tema Transformação apresentou um aumento de 2% da fase inicial para a fase
intermediária e uma diminuição de 4,1% desta fase para a fase final. Ao mesmo tempo, o tema
Submersão apresentou um aumento de 5,4% da fase inicial para a fase intermediária e, em
seguida, uma diminuição de 5,2% desta fase para a final.
O tema Transferência apresentou um aumento de 3,8% da fase inicial para a fase final, o
que poderia simbolizar a importância do setting como um lugar no qual suas emoções podiam
ser expressas.
Pode-se observar que existe um movimento de aumento e diminuição da freqüência dos
temas nas diferentes fases. Os temas que apresentaram este resultado são: Movimento
103
Descendente, Centralização, Submersão, Congestionamento, Integração, Transferência e
Transformação.
Sem dúvida, a possibilidade de expressão na TS propiciou um desbloqueio da energia
que se encontrava estagnada e impedia a expressão. É interessante observar que L.
apresentava os sintomas de TDAH e após seu processo terapêutico, estes sintomas não
estavam mais presentes, o que leva a levantar a questão: os sintomas do TDAH estariam
ligados ao TOC e, no momento em que os pensamentos obsessivos e tiques do TOC não
estivessem mais atuantes os sintomas do TDAH, desapareceriam?
Pode-se observar que o processo de diferenciação e desenvolvimento do ego nesse
caso apresentou momentos de grande tensão psíquica. O fato de as Defesas e Automatismo
terem diminuído favoreceu a remissão dos sintomas e possibilitou, na fase final, o aumento dos
movimentos de Centralização e Integração no final do processo, sugerindo uma mudança
psíquica estrutural e dinâmica, que propiciou a remissão dos sintomas.
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0%
Destruição
Transferência
Celebração
Submersão
Centralização
Integração
Congestionamento
Transformação
Conflito
Automatismo
Movimento Ascendente
Defesas
Movimento Descendente
Identificação Egoíca
Gráfico 4: Evolução dos Temas
Caso L - Fase Inicial: de 9/10/2002 a 23/6/2003
104
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0%
Congestionamento
Celebração
Integração
Transferência
Automatismo
Defesas
Destruição
Conflito
Centralização
Movimento Ascendente
Submersão
Transformação
Movimento Descendente
Identificação Egoíca
Gráfico 5: Evolução dos Temas
Caso L - Fase Intermediária: de 29/7/2003 a 26/4/2004
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0% 35,0% 40,0%
Automatismo
Celebração
Congestionamento
Defesas
Submersão
Centralização
Transformação
Transferência
Destruição
Integração
Conflito
Movimento Ascendente
Movimento Descendente
Identificação Egoíca
Gráfico 6: Evolução dos Temas
Caso L - Fase Final: de 3/5/2004 a 11/2/2005
105
8.3.3 Caso A
HISTÓRICO
A. é um menino, de 6 anos e 10 meses de idade, O processo teve início em 26 de março
de 2001 e concluiu-se em 02 de junho de 2004. Após este período, de junho a dezembro de
2004 os encontros passaram a ser quinzenais e, de fevereiro a julho de 2005, mensais. A partir
de agosto de 2005, os encontros tornaram-se bimestrais.
Resumo da queixa livre e dados da história de vida do sujeito, segundo relato dos pais: a
gravidez foi planejada e o parto foi normal; a mãe amamentou A. até os 8 meses. Em relação à
alimentação A. nunca recusou comida e aceitava bem os alimentos novos. O desenvolvimento
motor foi adequado à idade e A. foi para a escola com 1 ano e 8 meses, porque a mãe começou
a trabalhar. O sujeito teve muitas dificuldades para se adaptar, chorou bastante nas primeiras
semanas e, até o meio do ano, ao se despedir dos pais, chorava. Teve enurese noturna até 3
anos e 6 meses. Em relação ao sono, A., desde pequeno, acordava à noite com pesadelos e ia
para a cama dos pais. Em 2001 apresentou dificuldades em conciliar o sono, porque ficava com
medo dos pensamentos. A. sempre apresentou dificuldades de relacionamento com os colegas,
chegando a agredi-los fisicamente. Os pais relataram que ele agrediu a avó materna algumas
vezes. Segundo os pais, desde que A. começou a andar tinha como característica agarrar-se
aos pais e se enrolar nas pernas do pai ou da mãe. A. chorava quando precisava se separar
deles e os agarrava, não ia para o colo de pessoas estranhas. Em fevereiro de 2001, os pais
começaram a perceber que A. apresentava alguns comportamentos estranhos, tais como bater
as mãos na mesa mantendo um ritmo e A. não podia ser interrompido, caso contrário,
recomeçava e ficava muito nervoso. De acordo com o relato dos pais,
“A. fica parado nas soleiras das portas e diz que não consegue passar, chora
bastante. Fica parecendo uma estátua”.
“Pula todo os pisos, não pisa nos riscos e linhas. Muitas vezes ele dá dois passos
para frente e um para trás. Para percorrer um piso ladrilhado, demorou 15
minutos, pois evitava pisar nos desenhos”. O pai tinha de carregar A. no colo.
“A. tira toda a sujeira que encontra no chão, qualquer que seja, desde papel,
tampa de garrafa ou saco plástico. Ele parece o lixeiro da cidade”.
“Quando tudo começou, A. dizia que tinha de contar até 6 e que não podia ser
interrompido. Ele fala que se esquecer tem que voltar e começar tudo de novo”.
“Para andar ele vai até um pedaço do caminho e volta para o início”.
“Ele não consegue parar mais de contar”.
106
“Fala o tempo todo que quer morrer, porque não consegue mais andar”.
“Quando esbarra o rosto ou qualquer parte do corpo de um lado tem que esbarrar
o outro lado”.
“Ele só desce e sobe do carro de um mesmo lado”.
“Passa a mão na mesa, cadeira e no rosto das pessoas, tem que passar 6 vezes,
ele fala que tem que ser este número, que não pode se outro número”.
“Às vezes fica parado num local e não avança, como se estivesse engaiolado,
como se houvesse uma barreira invisível à sua frente”.
“A. dá passos bem curtinhos e com as mãos faz gestos como se freasse algo, fica
balançando a cabeça para frente e para trás”.
“Outro dia cismou que o tapete da sala estava sujo, encostou o rosto no tapete e o
foi empurrando como se fosse um cachorro vira-latas”.
“Passou a alisar a franja do tapete com a ponta dos pés”.
“Passou a se incomodar com vincos em tecidos, tenta desamassá-los com as
mãos”.
“A. fala o tempo todo que não vai conseguir melhorar”.
“Repete 3 vezes algo que fala”.
“Desde que tinha uns 3 anos de idade, gostava de enfileirar os bonecos lado a
lado, no chão, bem arrumadinhos”.
“Morde as roupas até furá-las”.
“Ano passado precisava acender e apagar a luz do quarto, várias vezes”.
“Pergunta o que significa a junção de determinadas letras, por exemplo: arch”.
Os pais relataram que ele estava muito agressivo, gritava muito, ofendia pessoas
estranhas com palavrões quando alguém estava tentando ajudar. Apresentava dificuldades de
relacionamento na escola, e dizia que a professora não gostava dele. A mãe e a avó materna
apresentavam sintomas de TOC. A mãe tinha compulsão com limpeza e estava em tratamento
psicológico, a avó-materna tinha medo de se ferir e pensamentos de contaminação.
As primeiras oito sessões de A. foram dedicadas à formação de vínculo terapêutico.
Inicialmente, ele não aceitava conversar com a terapeuta, não entrava na sala e não a olhava.
Tentou agredir fisicamente a terapeuta, que o conteve e falou: “Você não pode fazer isto”. Ele
tentou mais três vezes, depois não repetiu mais. As conversas se iniciaram na garagem, depois
na sala de espera. A partir da 9ª sessão, a terapeuta e o sujeito jogavam apenas um jogo (Can-
Can) e A. jogava compulsivamente, contando e recontando. Ele evitava contato visual e
corporal. Os rituais surgiam nas sessões, em algumas vezes ele prestava atenção nas minhas
107
observações e em outras as ignorava e até tampava os ouvidos. O jogo Can-Can foi jogado
durante 9 meses, algumas vezes ele se recusava a conversar comigo e ficava lendo revistas
infantis durante o tempo da sessão. Não se despedia e muitas das vezes permanecia mudo
durante as sessões de terapia.
Até dezembro de 2001, foi convidado várias vezes para fazer cenários na caixa de areia
e ele se recusava. Em fevereiro de 2002, espontaneamente, A., começou a fazer TS.
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Os testes foram realizados dois meses após a entrevista com os pais, porque A.
recusava-se a entrar na sala de terapia. Nesse período, a terapia ocorria inicialmente na
garagem do consultório depois, na sala de espera.
Raven: 21 pontos (Capacidade intelectual superior à média: Percentil 90) Normas
padronizadas à população brasileira.
Bender: idade visomotora adequada à idade.
HTP-F: A. apresentou sentimento de inferioridade, atitudes de negativismo e
oposição em relação ao ambiente. Inicialmente negou-se a realizar qualquer
desenho, depois concordou e os realizou de uma maneira extremamente rápida.
Apresentou indícios de impulsividade, ansiedade excessiva, insegurança, medo e
falta de auto-confiança ao se defrontar com situações novas. Os desenhos
sugeriam regressão, conflitos e fixação em estágios mais primitivos.
RESULTADO DA ENTREVISTA RETROSPECTIVA
A entrevista foi realizada em março de 2005 com a mãe, seguindo o roteiro da apostila de
1º atendimento. (MIGUEL, et al., 2005).
Questionário médico e fatores de risco: não apresentou intercorrência durante a
gravidez, no parto e do primeiro ao quinto anos de vida. Desenvolvimento
neuropsicomotor dentro do esperado para a idade. Não foram relacionadas
doenças na história médica geral. Não apresentou diagnóstico de febre reumática.
Tratamento médico homeopático realizado com medicação:
março de 2001: Stramonium
novembro de 2001: Stramonium
julho de 2002: Veratrum álbum
janeiro de 2003: Hyosciamus niger.
Tratamento psiquiátrico: os pais recusaram o tratamento.
108
Classificação socioeconômica: ABIPEME – 82 pontos – Classe B.
Escala Dimensional de Avaliação da Gravidade de Sintomas Obsessivo-
Compulsivos (DY-BOCS).
Tabela 9
Resultados DY-BOCS – Passado – Caso A
Dimensões de sintomas Tempo
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
Total
(0-15)
Agressão 3 2 2 7
Sexual e Religião 0 0 0 0
Simetria, Ordem, Contagem e Arranjo 3 2 2 7
Contaminação e Limpeza 0 0 0 0
Colecionamento 0 0 0 0
Diversas 3 2 3 8
Fonte: Miguel, 1/2005, p.40.
Apresentou alguns critérios relacionados ao diagnóstico do TOC.
Tabela 10 Resultados DY-BOCS Avaliação Global – Passado – Caso A
Tempo
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
Prejuízo
(0-15)
Total
(0-30)l
Todas as obsessões e
Compulsões
2 2 3 9 16
Fonte: Miguel, 1/2005, p.40.
Apresentou alguns critérios relacionados ao diagnóstico do TOC.
Escala Obsessivo-Compulsivo de Yale-Brown – Y-BOCS:
Escore Total: Obsessões (13) + Compulsões (14) = 27. Preencheu os critérios
para o diagnóstico de TOC.
Escala para Avaliação da Presença e Gravidade de Fenômenos Sensoriais da
Universidade de São Paulo. O sujeito respondeu uma vez positivamente ao item
sensação física tátil; duas vezes ao “estar em ordem” relacionado ao estímulo
auditivo e ao estímulo tátil; três vezes, positivamente, ao “estar em ordem”
109
internamente. Teve uma resposta positiva em relação a incompletude e ao “ter
que” apresentou duas respostas positivas.
Tabela 11
Resultados: Avaliação de Gravidade dos Fenômenos Sensoriais – Passado –
Caso A
Passado Freqüência
(0-5)
Incômodo
(0-5)
Interferência
(0-5)
2002 3 4 4
Fonte: Miguel, 1/2005, p.48.
Apresentou alguns critérios relacionados aos fenômenos sensoriais.
A resposta em relação à intensidade dos fenômenos sensoriais descritos e a
intensidade das obsessões apresentadas foi com a mesma
intensidade/gravidade.
Questionário TS-OC (YGTSS e Y-BOCS)
A.1. – Lista de Sintomas (Tiques)
A.2. – Escala de Avaliação de Tiques
Tabela 12 -
Resultados: Yale Global TIC Severity Scale (YGTSS) – Caso A
Número Freqüência Intensidade Complexidade Interferência Total
a.Tiques motores 1 2 2 1 1 7
b.Tiques fônicos 0 0 0 0 0 0
c.Total para todos
os tiques
1 2 2 1 1 7
Fonte: Miguel, 1/2005, p.78.
Preencheu alguns critérios relacionados aos tiques e Síndrome de Tourette. Presença de
tiques motores: movimentos dos pés e pernas e dedos dos pés, tiques relacionados com
comportamentos compulsivos (tocar, bater, arrumar e balancear).
Escala de Depressão de Beck (BDI): total de 8. Não preencheu critérios para depressão.
Escala de Ansiedade de Beck (Beck-A): total de 13. Preencheu critérios para
ansiedade.
MTA SNAP – IV Escala de pontuação para pais e professores: os pais
responderam e a escola também, por meio dos relatórios apresentados em 2002
e confirmaram: falha em prestar atenção aos detalhes por falta de cuidado em
trabalhos escolares e tarefas; dificuldade em manter a atenção durante as tarefas;
110
parece não escutar quando lhe falam diretamente; não segue instruções e falha
em terminar temas de casa, tarefas ou obrigações; tem dificuldade para organizar
tarefas e atividades; evita ou não gosta e reluta em envolver-se em tarefas que
exijam manutenção de esforço mental; perde coisas necessárias para suas
atividades; é distraído por estímulos alheios e esquecido nas atividades diárias; é
irrequieto com as mãos e pés; remexe-se na cadeira; abandona sua cadeira em
sala de aula ou em outras situações nas quais se espera que permaneça sentado;
corre ou escala em demasia em situações nas quais isto é inapropriado; tem
dificuldade para brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer;
está “a mil” e freqüentemente age como se estivesse “a todo vapor”; fala em
demasia; dá respostas precipitadas antes das perguntas serem completadas; tem
dificuldade para aguardar a sua vez; interrompe ou se intromete com os outros;
descontrola-se e discute com adultos; ativamente desafia ou se recusa a seguir os
pedidos dos adultos ou as regras; faz coisas que incomodam os outros de
propósito; culpa os outros pelos seus erros; é sensível ou facilmente incomodado
pelos outros; é raivoso ou ressentido.
Transtorno de Ansiedade de Separação (TAS): nº de sintomas: 9 Preencheu
critérios para TAS.
SF-36: as respostas foram relacionadas com saúde boa e sem dificuldades em
relação às atividades da vida diária.
Entrevista sobre familiares: Resposta 4:
(alguém na família teve ataque de pânico
e desenvolveu sintomas físicos) mãe e avó materna. Resposta 5:
(alguém da
família tem ou já teve ataque de pânico e desenvolveu vários sintomas físicos)
mãe. Resposta 6:
(alguém na família que tenha ou teve medo de fazer alguma
coisa ou se sentiu desconfortável na frente de outras pessoas, como falar,
escrever ou comer) avó materna. Resposta 7:
(alguém na família que tenha ou
teve algum medo especial, como voar, ver sangue, tomar uma injeção, lugares
fechados ou certos tipos de animais ou insetos) avó materna. Resposta 8:
(alguém na família que tenha estado nos últimos seis meses nervoso ou ansioso)
mãe. Resposta 17:
(alguém na família tem ou teve algo que tivesse de fazer
várias vezes e que não conseguia evitar, compulsões) avó materna.
CONCLUSÃO DA AVALIAÇÃO
A. apresentou critérios para o diagnóstico de TOC e a presença de tiques motores.
111
ENTREVISTA REALIZADA EM MARÇO DE 2006
Social Adjustment Scale (SAS), Escala de Adequação Social (EAS): total de 2,1
apresentou resultado relacionado a uma boa adequação social.
Escala de Avaliação de Crenças de Brown: não apresentou respostas
relacionadas a crenças. Apresentou boa capacidade de crítica e não teve
pontuação nos itens de convicção, percepção da visão dos outros, explicação da
diferenças de visão, rigidez das idéias e tentativa de invalidar as crenças.
TRATAMENTO PSICOLÓGICO COM A TS
Aqui destacam-se algumas caixas para ilustrar o processo. Os temas foram escolhidos
de acordo com a evolução e a dinâmica do processo, o uso das miniaturas, assim como a
avaliação da terapeuta. Vários temas surgiram nos cenários, que serão descritos e analisados,
além das observações clínicas a respeito dos temas e a sua importância no desenvolvimento do
processo do sujeito. Quando houver observações do médico, da escola e dos pais, serão
inseridas na descrição do processo.
FASE INICIAL
28/2/02-26/11/02 (total de 29 cenários)
Temas: Identificação Egóica, Movimento Descendente e Submersão
A. realizou 16 cenários de Identificação Egóica; 25 de Movimento Descendente e 5 de
Submersão.
#1 (28/2/02)
Areia seca. Na parte superior da caixa: casa com menino na frente, galinha d'angola, dois
jogadores de futebol, cada um com uma bola de futebol, igreja e burro com carga; na parte
inferior da caixa: casa e dois fazendeiros (um homem e uma mulher), embaixo do fazendeiro
um dinossauro enterrado; no lado direito, um buraco na areia com um hipopótamo na borda e
uma pequena tartaruga; no lado esquerdo, móveis (sofá e poltronas) e gato no meio dos
móveis. Nesse momento, A. verbalizou que “Os jogadores estavam jogando bola”. O cenário
mostra elementos de uma possibilidade de emersão do inconsciente e dos impulsos. A.
verbalizou que “o hipopótamo está afundado na areia”, que indica a dificuldade do animal na
locomoção. O hipopótamo à beira da água poderia simbolizar conteúdos do inconsciente que
112
necessitam de ajuda para serem trabalhados, que se encontram paralisados e sem condições
de movimento. O dinossauro, que irá aparecer em outros cenários, encontra-se aqui enterrado
debaixo do homem, podendo simbolizar, nesse momento do processo, que conteúdos antigos
do inconsciente poderiam emergir de forma agressiva e violenta. A igreja é um dos símbolos da
mãe e encontra-se ao lado do burro de carga. Segundo Ammann,
O burro é o irmão menosprezado do cavalo. Quem não pode ter um cavalo, ao
menos tem um burro, sobre o qual pode colocar toda a carga e que pode fazer
o trabalho por ele. O burro é resistente e persistente, mas também teimoso e
obstinado. Essa é sua maneira de se defender dos maus tratos. (AMMANN,
2002. p.135).
Os dois jogadores de futebol estão cada um com sua bola caminhando em direções
opostas. Apesar da ameaça escondida do dinossauro enterrado e do hipopótamo à beira do
lago, existe a possibilidade de transformação, aqui representada pelo burro, que poderia
simbolizar o quanto A., assim como o burro, é um garoto resistente e persistente para enfrentar
sua carga, que são os seus pensamentos obsessivos e comportamento compulsivo.
Foto 24 Caso A - Cenário #1
Tema: Conflito, Destruição e Movimento Descendente
A. realizou nessa fase 14 cenários de Conflito, 8 de Destruição e 25 de Movimento
Descendente.
#6 (18/6/02)
113
Cenário realizado em areia molhada, com a caixa de areia dividida ao meio por um
buraco com água. Dentro da água há animais marinhos (baleia, focas e peixes) e aves (cisnes);
na parte inferior da caixa há índios em diferentes atividades de trabalho; no canto inferior
esquerdo há dois jacarés (um pequeno e um grande); na parte superior da caixa, soldados,
arsenal de guerra (canhão); no canto superior esquerdo, sapo com filhote nas costas; ao lado,
escorpião semi-enterrado (cabeça do lado de fora); no canto superior direito, uma pedra e sobre
a borda da caixa, um índio. Inicialmente, A. fala que vai fazer uma praia, depois muda de idéia.
É a primeira vez que A. expressa verbalmente o conflito: “Vai ter uma guerra e os verdes são
contra os índios. Os soldados vão atirar em direção aos índios. O índio debaixo está protegido
pelo cavalo e o índio na beirada da caixa é o juiz, e é ele quem decide a hora de parar”. Os
conflitos e a possibilidade de destruição são expressos verbal e imageticamente: “O escorpião
está se protegendo da guerra, ele estava com medo da guerra”. Para Chevalier e Gheerbrant
(2002), o escorpião é um animal noturno e está sempre pronto para picar fatalmente quem o
tocar com a sua cauda cheia de veneno; é um artrópode que simboliza o espírito de briga, mal-
humorado, vive escondido e é rápido para matar. Pode-se pensar que A. atuava como o
escorpião: estava sempre de mau-humor e brigava em casa com os pais e o irmão. Esse
cenário aponta um momento no processo de A. em que ele expressou o medo dos conflitos que
poderiam surgir quando disse: “O guerreiro pode pisar na bomba que está enterrada no chão”.
Os perigos podem estar escondidos e, quando não são visualizados, podem destruir. Jung
explica que:
O conflito estanca todo o progresso e a detenção da vida que disso resulta é
sinônimo de neurose. Em conseqüência dessa paralisação, a energia psíquica
transborda em muitas direções, aparentemente inúteis. (JUNG, 1991, § 206).
O autor ressalta que essa energia, que transborda em muitas direções, pode ocorrer
como fantasias e lembranças supervalorizadas, causando uma obsessão na consciência. No
caso de A., uma criança com medo e que se sente ameaçada pelos conteúdos do inconsciente,
reagindo agressivamente em situações de frustração, haverá necessidade de um novo motivo
que elimine o transbordamento da energia, e pode ocorrer na situação de transferência do
processo terapêutico.
114
Foto 25 Caso A Cenário #6
Tema: Defesas
A. realizou 6 cenários com o tema Defesas.
#8 (6/8/02)
A. realizou esta cena na areia seca, no lado direito da caixa, com cinco fileiras de cercas sem
saída. No lado esquerdo da caixa, há vegetação (plantas). No momento em que vai fazendo o
cenário A. verbalizou: “Aqui era onde é o deserto e as grades são para defender as plantas, se
não tiver grades, eles podem roubar as plantas e tem que chamar a polícia”. Ao apontar um
local da cerca que se encontrava próximo ao local onde a terapeuta estava sentada, ele disse:
“A saída é só aqui e que do lado de lá só podem passar as formigas”. Ele apontou a primeira
fileira de cercas próxima às plantas e disse: “Aqui tem o portão que é o mais forte e quem pode
tocar no portão são os donos, e existe o perigo de se alguém espetar pode morrer”.
Neste cenário, pode-se perceber que as defesas são fortes e podem até matar. Existe a
possibilidade de destruição da vida. A., por várias vezes, verbalizou para os pais que queria
morrer, porque os sintomas do TOC o incapacitavam de fazer o que gostava. As cercas
(defesas), ao mesmo tempo que protegem, também isolam. Por mais que A. se defendesse
dentro de suas cercas psicológicas, os seus sintomas ficavam aprisionados e ele não conseguia
lidar com eles.
115
Foto 26 Caso A Cenário #8
Temas: Celebração, Centralização, Congestionamento, Defesas, Identificação Egóica,
Integração, Movimento Ascendente e Descendente
A. realizou cenários com os seguintes temas: 8 Celebração, 10 Centralização, 4
Congestionamento, 6 Defesas, 16 Identificação Egóica, 2 Integração, 6 Movimento Ascendente
e 25 Movimento Descendente.
#10 (13/8/02)
Na areia molhada, A. fez no centro da caixa uma elevação de areia com bolas de vidro
verdes e um pingüim no meio das bolas. No momento em que estava colocando as pedras,
disse: “Aqui vai ter uma nova saída e as pedras verdes são de choque de 100 volts”. Ao redor,
ele colocou animais marinhos, como baleias, tubarão, leão-marinho e focas; no lado externo,
tartarugas e arraia. A. falou: ”Os pingüins estão falando para as focas e o pingüim que está no
meio está com a cara de assustado”. No canto superior esquerdo, dentro do buraco com água.
A. colocou conchas do mar e bote. Uma ponte une a elevação de areia ao lado externo da ilha.
Existe um princípio de integração simbolizado pela ponte que une os dois lados, no
entanto, é muito perigoso sair do meio porque as pedras verdes que cercam o pingüim dão
choque. Os pingüins são animais bastante usados por A. na fase inicial do seu processo. Esses
animais andam com desenvoltura no gelo, o que pode simbolizar o início da capacidade de A.
para conseguir lidar com suas estruturas defensivas “congeladas”. Nesse momento, ele não
está realizando os rituais, mas, quando fica muito ansioso, morde a camiseta. Por ocasião
desse cenário os pais comentaram que A. melhorou em relação à insistência e que não repetia
sem parar as perguntas.
116
Foto 27 Caso A Cenário #10
Temas: Automatismo, Destruição, Integração e Movimento Descendente
A. realizou cenários com os temas: Automatismo 2, Destruição 8, Integração 2 e
Movimento Descendente 25.
#14 (3/9/02)
Areia molhada. Caixa dividida ao meio por uma barreira que contém água. No meio dos
dois buracos: robô, presentes e bolas de vidro. A. contou que era uma ponte, mas que ela tinha
um buraco, ele jogou água em um dos buracos e ficou olhando a água encher o outro lado. “Ao
redor é uma pista e os presentes são bombas e as pedras são presentes”. Pode-se observar
que os dois buracos têm uma comunicação indicando a possibilidade de integração. Há
também quatro bombas dos dois lados, representadas pelos presentes. E as pedras, que no
cenário #10 eram de choque, aqui são presentes. Houve uma troca de significado dos símbolos,
o que poderia indicar a ambigüidade dos sentimentos de A.: se ele aceitasse o afeto, poderia
correr o risco de sofrer. Esse cenário parece apontar a constelação do conflito. Após o cenário
#6, o processo de de-integração e reintegração ocorrido indicava que conteúdos do
inconsciente emergiam e que ocorria um movimento da energia psíquica.
117
Foto 28 Caso A Cenário #14
Temas: Centralização e Movimento Descendente
A. realizou cenários que foram: 10 com Centralização e 25, Movimento Descendente.
#18 (1/10/02)
Na areia molhada, A. trabalhou com a areia em diferentes direções. Realizou uma elevação de
areia no centro da caixa, e no topo colocou uma bola de vidro azul grande. Buscou água para
colocar ao redor e falou que era um vulcão. Na execução desse cenário, A. jogou bastante areia
fora da caixa e, depois de uma conversa a respeito, e ele se propõe a ajudar na limpeza da
sala. Ao final, pediu que a terapeuta tirasse uma foto do cenário com ele junto. Pode-se
observar, por meio das seqüências das caixas anteriores (que tinham cenas de explosão e
vulcão), que estava ocorrendo uma gradual liberação da agressividade de A., e ele relatou que
fazia quinze dias que os seus pensamentos não ocorreriam mais.
Foto 29 Caso A Cenário #18
Nesta fase, A. apresentou todos os temas, com exceção de Transformação.
FASE INTERMEDIÁRIA
118
3/12/02-20/8/03 (total de 65 cenários)
Temas: Centralização, Defesas e Movimento Descendente
A. realizou 26 cenários com Centralização, 6 com Defesas e 51 com Movimento
Descendente.
#31 (3/12/02)
Na areia seca, A. realizou um movimento com a areia em várias direções, construindo
no meio da caixa uma elevação de areia e um círculo com cercas sem saída. Neste mesmo dia,
A. fez dez cenários, este é o segundo realizado. Ele falou: “Houve um terremoto no deserto, no
Egito”. Enquanto isto, ele foi até a caixa de areia molhada e realizou três cenários em seqüência
e foi pedindo para que a terapeuta tirasse as fotos após cada montagem. Depois retornou à
caixa #31 e derrubou todas as grades. Pode-se observar o movimento da energia psíquica em
movimentos de contenção, destruição e construção em busca pela integração. Jung ao
escrever sobre a energia psíquica, apontou:
A libido nunca pode ser apreendida, senão numa forma determinada, isto é, ela
é idêntica às imagens da fantasia. Só podemos libertar a libido do inconsciente,
permitindo que aflorem as imagens da fantasia que lhe correspondem. (JUNG,
1991, § 345).
Na seqüência realizada por A., em um mesmo dia, pode-se perceber que, por meio da
construção das imagens, houve a possibilidade de elaboração de seus conflitos e dos seus
mecanismos de defesa, levando à remissão dos sintomas do TOC e do TAS.
Foto 30 Caso A Cenário #31
119
Temas: Congestionamento, Movimento Ascendente e Movimento Descendente
A. realizou cenários com os seguintes temas: 1 Congestionamento, 24 Movimento
Ascendente e 51 Movimento Descendente.
#41 (10/12/02)
Areia molhada. Barreira de areia que contém água. No lado esquerdo da caixa, uma
elevação de areia com uma pedra de vidro verde no topo. No canto inferior direito, bolas de
vidro. Esse é o segundo cenário de uma série de sete, realizados no mesmo dia. A.verbalizou:
“Esta é a cabana da fazenda que é uma continuação da fazenda da semana anterior”. Vale
ressaltar que na semana anterior A. não havia realizado cenário com fazenda, o único cenário
de fazenda no processo de A. até o momento havia sido o #1. A. contou que “Os fazendeiros
moram nela e que ela foi vendida para outro fazendeiro. Em cima da cabana tem um brilhante e
as mulheres só cozinhavam e os homens trabalhavam. Estas pedras aqui são o caminho”.
Pode-se pensar no movimento da energia psíquica nesse momento. Os movimentos de
progressão e regressão podem estar simbolizados pela cabana da fazenda com o brilhante em
cima e a escavação na areia com água dentro. As pedras, anteriormente perigosas, foram
colocadas no caminho. Ao fazer a comparação desse cenário com o #14, percebe-se uma
diferença em relação ao movimento na psique de A., com a presença do Movimento
Ascendente e a presença de um brilhante, importantes no processo de A.
Foto 31 Caso A Cenário #41
Temas: Integração, Movimento Ascendente e Movimento Descendente
A. realizou, nessa fase, cenários com os seguintes temas: 6 Integração, 24 Movimento
Ascendente e 51 Movimento Descendente.
#46 (10/12/02)
120
Esse é o último cenário de uma série de sete caixas realizadas no mesmo dia. Este cenário é
uma modificação do #44. Ele colocou pedras e conchas do mar na areia e contou que ia fazer
uma caixa só de pedras. No lado direito, construiu uma elevação de areia com pedras. Apesar
de haver uma separação entre os dois lados, porções de areia faziam a integração entre os dois
lados. Na história do desenvolvimento do homem, as pedras exerceram um fascínio, como os
totens e talismãs confeccionados de pedras. Aqui, neste processo, as pedras foram usadas
com várias finalidades: às vezes como bombas e, outras vezes, como jóias preciosas. No
cenário #16 A. colocou uma pedra em cima de um vulcão, no #41 ele usou a pedra preciosa, e
neste, percebe-se a presença de pedras que brilham, o que poderia apontar que conteúdos do
inconsciente estão integrando-se à consciência. Por esta ocasião, segundo relato da escola,
informação dos pais e do médico pediatra, A. encontrava-se bem e não apresentava mais os
sintomas do TOC e do TAS.
Foto 32 Caso A Cenário #46
Temas: Celebração, Centralização, Identificação Egóica e Movimento Descendente
A. realizou nessa fase cenários com os seguintes temas: 26 Centralização, 8
Identificação Egóica e 51 Movimento Descendente.
#48 (17/12/02)
A. usou a areia seca. No centro, uma elevação de areia com um gorila no topo. A. falou
“Que era lá no Egito e que no topo tinha um gorila que é uma estátua do rei”. Este é o segundo
cenário de uma série de cinco realizados no mesmo dia. Pode-se perceber a presença do
gorila, elemento masculino, forte e poderoso. É oportuno lembrar que a inflação é uma das
fases do desenvolvimento do ego. O ego em desenvolvimento necessita liberar-se da fase
mágica para se fortalecer. Os impulsos e afetos, que poderiam dissolver o ego nascente,
121
aparecem como figuras ameaçadoras nos cenários anteriores e, nesse momento, surgem como
estátua do rei.
Foto 33 Caso A Cenário #48
Temas: Conflito, Destruição e Submersão
A. realizou 10 cenários de Conflito, 3 de Destruição e 22 de Submersão.
#71 (11/2/03)
Cenário realizado na areia molhada. No lado esquerdo da caixa: uma pequena elevação
de areia com dinossauros semi-enterrados pela cabeça. Pedras espalhadas pela caixa. As
pedras usadas no cenário #46 surgem novamente na areia molhada. Esse é o primeiro cenário
de uma série de cinco realizados no mesmo dia. A pá encontra-se semi-enterrada, que pode
indicar para algo a ser terminado. Montecchi (1999) escreveu a respeito da utilização dos
animais pré-históricos nos cenários da TS, e sugere que eles podem simbolizar conteúdos
devastadores da pré-história da vida inconsciente dos pacientes, alguma coisa anterior ao
nascimento. Assim, os dinossauros enterrados pela cabeça deste cenário podem ser a
expressão e exteriorização de necessidades agressivas e reprimidas, porque A., na fase inicial,
utilizou animais pré-históricos que podem ter concorrido para a liberação de impulsos
destrutivos, tendo como conseqüência uma mudança no humor, uma comunicação mais direta
de suas emoções. Nessa época, os pais contaram que A. apresentava-se mais alegre e
aceitava brincadeiras das outras pessoas. Na escola, conseguiu vários amigos e conversava
com os professores e funcionários.
122
Foto 34 Caso A Cenário #71
Nessa fase, A. apresentou os temas, com exceção de Automatismo e Transformação.
FASE FINAL
1/10/03-6/4/05 (total de 15 cenários).
Temas: Celebração, Centralização, Conflito, Identificação Egóica, Integração e
Movimento Descendente
A. construiu os seguintes cenários: 7 com Celebração, 11 com Centralização, 6 com
Conflito, 7 com Identificação Egóica, 10 com Integração e 12 com Movimento Descendente.
# 96 (1/10/03)
Areia molhada. Refez o cenário #95. A. utilizou os mesmos animais da caixa anterior:
hipopótamo, focas, golfinhos, pingüins, arraia e baleia. Acrescentou os animais dourados e
brilhantes (gorila, galo e elefante), o Buda dourado, o escorpião e os soldados. Separou as
penas e colocou duas em cada lado da caixa. Dividiu a elevação da terra em duas partes e
colocou por cima o cordão dourado. Nesse dia, A. realizou duas caixas. Ele falou que era uma
guerra. Fazendo a comparação desse cenário com o #6, percebe-se que houve uma
diferenciação em relação ao tema Conflito. Aqui aparecem elementos que surgiram em cenários
anteriores o gorila, galo e o elefante brilhante, colocados próximos às bolas azuis. O cordão
dourado, que em cenários anteriores apareceu como tesouro sendo desenterrado, aqui está
unindo os dois montes de areia. O monte de areia e o cordão podem evidenciar aquilo que
Fordham define como reintegração, com uma mudança no caminho da energia na psique de A.
123
Foto 35 Caso A Cenário #96
Temas: Centralização, Defesas e Integração
A. realizou nessa fase cenários com os seguintes temas: 11 Centralização, 1 Defesas e
10 Integração.
# 101 (3/12/03)
A. usou a areia seca. Colocou no centro da caixa várias casas cercadas por palitos
coloridos, formando um círculo. No lado esquerdo, uma máscara. É o segundo cenário
realizado no dia. A. falou que a aldeia era amaldiçoada e que as cercas eram para proteger as
casas. O uso de cercas como proteção têm a finalidade de mostrar a flexibilização das defesas,
e as cercas são usadas como delimitação não rígida de espaços e podem ser consideradas
como fortalecimento do ego e diminuição dos impulsos destrutivos.
Foto 36 Caso A Cenário #101
124
Temas: Centralização, Movimento Ascendente e Movimento Descendente
A. realizou 1 cenário de Movimento Ascendente e 12 cenários de Movimento
Descendente.
# 102 (7/1/04)
Na areia molhada, A. trabalhou uns 10 minutos, levando a areia de um lado para o outro. No
centro, fez uma elevação de areia, e disse: “Vou fazer uma montanha bem alta e a bicicleta vai
sair lá do topo e eu vou fazer um caminho para a bicicleta”. Ao redor da montanha, colocou
aves domésticas (cisnes, patos e gansos) e tartaruga. Pegou um barbante e amarrou na ponta
um beija-flor e ficou girando em cima da montanha. Enquanto brincava, pediu à terapeuta para
tirar a foto com ele segurando o barbante.
Chevalier e Gheerbrant (2002) mostram que a bicicleta é um meio de transporte
impulsionado pela própria pessoa que a usa e exige um esforço individual. O equilíbrio se
realiza com a pessoa olhando para a frente, assim como no processo psíquico.
Simbolicamente, pode-se perceber neste cenário o esforço do ego de A. para se equilibrar no
alto da montanha. A presença do beija-flor, voando em cima da bicicleta confere a esse
momento uma leveza e um humor que se tornaram marca da personalidade de A. Os animais
ao redor apresentam características interessantes: o ganso, os cisnes e o pato são aves que
conseguem se movimentar em terra firme, na água e no ar. A tartaruga é o animal que
consegue viver na água e na terra, além de precisar da areia para colocar seus ovos, e os
filhotes precisam da água para sobreviver. A ligação areia e água foram elementos importantes
durante o processo. Observa-se que A. conseguiu lidar com seu mundo interno e externo,
assim como esses animais, apresentando uma maior capacidade para integrar suas novas
necessidades de adaptação. Segundo relato dos pais, A. tornou-se uma criança divertida, que
conversa com as pessoas e gosta de contar piadas.
125
Foto 37 Caso A Cenário #102
Temas: Centralização, Conflito, Movimento Descendente, Submersão e Transformação
A. realizou nessa fase cenários com os seguintes temas: Centralização (11), Conflito (6),
Movimento Descendente (12), Submersão (2) e Transformação (6).
# 109 (2/6/04)
Areia molhada. No centro, A. colocou uma elevação de areia, como uma barreira que
contém água. No topo, aranha e louva-deus; no canto inferior esquerdo, um lagarto; ao redor,
carros atolados; fez escavação de um túnel e acendeu as velas. A. colocou a aranha da qual
ele tinha muito medo no centro da caixa. Da mesma forma que ele conseguiu pegar a aranha
sem medo, assim também convive melhor com as situações no mundo externo, que antes lhe
eram tão ameaçadoras.
Depois de 2 anos de processo de terapia, pode-se observar a diferença, nesse cenário,
sem animal escondido ou enterrado como em cenários anteriores e com a possibilidade de
enfrentamento. A aranha é ameaçadora, mas o lagarto pode enfrentá-la. Os carros estão
atolados, mas têm a possibilidade de sair para lugares mais secos.
Neste sentido, pode-se pensar que o confronto com o material do inconsciente pôde
ocorrer, sem causar medo, como na caixa inicial.
126
Foto 38 Caso A Cenário #109
Nesta fase A. apresentou todos os temas, com exceção de Automatismo,
Congestionamento, Destruição e Transferência.
MINIATURAS
Animais marinhos: a presença de baleias, arraias, tubarão, golfinhos, tartarugas, focas, pingüins
e leões-marinhos ocorreu a partir do cenário #2. Pode-se observar que esses animais são
importantes no processo de A., e que, algumas dessas miniaturas, como o pingüim, as focas e
os leões-marinhos podem simbolizar a dificuldade dele em lidar com suas próprias emoções e
medos. No cenário #2, o mergulhador está ao lado da baleia, no #10, o pingüim está cercado de
pedras que dão choque. Os pingüins e as focas conversam no cenário #7, que é anterior às
cercas que dão choque. Lembre-se que focas e animais são animais que se locomovem no gelo
com facilidade, e esse momento poderia simbolizar o início de movimento da energia psíquica
que se encontrava estagnada. Ao mesmo tempo, a presença de golfinhos pode simbolizar a
inteligência observadora e instintiva, o brincar e a rapidez apontam características de A. que,
muitas vezes, não acredita possuir. As tartarugas são animais que podem ir para a terra e para
a água, significando a possibilidade de A. conseguir relacionar seus conteúdos do inconsciente
e consciente. A utilização dessas miniaturas pode simbolizar o contato mais profundo com o
inconsciente. Assim, o tubarão e a arraia são animais que habitam as profundezas do mar e os
outros animais, como as baleias e os golfinhos podem ficar na superfície da água, enquanto
focas, pingüins, leões-marinhos e tartarugas fazem a ponte entre as profundezas e a terra. O
contato com os conteúdos do inconsciente pode gerar medo e as ameaças são perigosas.
Animais selvagens: esta categoria de miniaturas esteve presente no processo de A. a partir do
cenário #7 (22/7/02) até o cenário #28 (26/11/03), e podem simbolizar a vida instintiva e a
identidade com impulsos inconscientes.
Muitos dos nossos impulsos, quando inconscientes,
127
são animalescos, primitivos, compulsivos e potencialmente destrutivos para a nossa
consciência. O uso dos animais selvagens nos cenários da TS pode indicar a expressão dos
conteúdos inconscientes profundos e a conscientização dos significados simbólicos.
Bolas de vidro: usadas como minerais raros, duros, resistentes e brilhantes. Em diversos
cenários utilizou-as como algo precioso ou como objeto ameaçador. A partir do cenário #7
(22/7/02), passaram a ser uma presença quase constante em seu processo, com diferentes
significados: pedras que dão choques (cenário #10), presentes (cenário #14), alimento (cenário
#15), pedra preciosa que sai do vulcão (cenário #18 e #41), caminho (cenário #28). No decorrer
do processo, pode-se perceber que as bolas de vidro vão mudando de função. A partir do
cenário #91, após um período sem o uso das pedras, elas retornam, com um caráter de enfeite
no cenário ou como tesouros desenterrados. No cenário #97, elas parecem brilhantes, e é
interessante observar que nesse cenário ele usou as mesmas miniaturas do cenário #1, mas
agora mostrando um novo movimento de Integração e Centralização. Houve o afloramento e a
transformação dos conteúdos do inconsciente: do dinossauro enterrado para as pedras
espalhadas pela caixa.
ANÁLISE EVOLUTIVA DO PROCESSO
Ao analisar os resultados quantitativos, foi possível perceber a evolução dos temas no
decorrer do processo. Assim, os temas Identificação Egóica e Conflito apresentaram,
respectivamente, uma diminuição de 3,6% e 3,3% da fase inicial para a fase final.
O tema Movimento Ascendente, na fase intermediária, teve um aumento de 8,6% em
relação à fase inicial, e, na fase final, uma diminuição de 12,5% em relação à fase intermediária.
O tema Centralização aumentou gradualmente de 9,2%, na fase inicial, para 17,5%, na
fase final. Este tema apresentou um aumento da fase inicial para a fase intermediária de 6,1% e
desta fase para a fase final um aumento 2,2%.
O tema Movimento Descendente teve um aumento, da fase inicial para a fase
intermediária, de 7,1% e desta fase para a final teve uma diminuição de 11%. Enquanto o tema
Submersão teve um aumento de 8,3%, da fase inicial para a fase intermediária, e uma
diminuição de 9,7% desta fase para a fase inicial.
Ao mesmo tempo, o tema Defesas e Transferência diminuíram, respectivamente 3,9% e
2,8% no decorrer das três fases, e o tema Destruição teve uma diminuição de 7,3% da fase
inicial para a fase final. A diminuição desses temas podem indicar uma maior capacidade de A.
para lidar com seus impulsos.
128
O tema Automatismo teve, na fase inicial, 1,8% enquanto na fase intermediária e final
não apresentaram nenhuma resposta. O tema Congestionamento teve na fase inicial 3,7%, na
fase intermediária 0,6% e nenhuma resposta na fase final.
O tema Celebração teve uma diminuição de 0,8%, da fase inicial para a fase
intermediária, e desta fase para a final um aumento de 4,6%.
Pode-se observar que o tema Integração teve um aumento significativo da fase inicial
para a fase final de 14,1%. E o tema Transformação que nas fases inicial e intermediária não
apresentaram resultados, na fase final teve 9,5%.
É oportuno lembrar que os temas Conflito, Defesas, Automatismo, Congestionamento,
Destruição, Submersão e Transferência apresentaram uma diminuição da fase inicial para a
final. Alguns deles como Destruição, Automatismo e Congestionamento estão ausentes na fase
final do processo de A., o que permite considerar que houve uma transformação interna de
conteúdos da psique que propiciaram a transdução dos sintomas.
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0%
Transformação
Automatismo
Integração
Transferência
Congestionamento
Submersão
Defesas
Movimento Ascendente
Celebração
Destruição
Centralização
Conflito
Identificação Egóica
Movimento Descendente
Gráfico 7: Evolução dos Temas
Caso A - Fase Inicial: de 28/2/2002 a 26/11/2002
129
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0%
Automatismo
Transformação
Congestionamento
Transferência
Destruição
Defesas
Integração
Identificação Egóica
Conflito
Celebração
Submersão
Movimento Ascendente
Centralização
Movimento Descendente
Gráfico 8: Evolução dos Temas
Caso A - Fase Intermediária: de 3/12/2002 a 20/8/2003
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0% 30,0%
Automatismo
Congestionamento
Destruição
Transferência
Defesas
Movimento Ascendente
Submersão
Conflito
Transformação
Celebração
Identificação Egóica
Integração
Centralização
Movimento Descendente
Gráfico 9: Evolução dos Temas
Caso A - Fase Final: de 1/10/2003 a 6/4/2005
130
8.4 Análise Comparativa dos Casos Clínicos
8.4.1 Análise das Miniaturas
Na análise comparativa entre os três sujeitos, considerou-se o uso de miniaturas que
foram comuns aos três processos, independentemente da freqüência que este uso ocorreu. Em
seguida, foi realizada a análise comparativa dos temas nas diferentes fases dos três sujeitos e
uma discussão a respeito dos temas destacados.
Nos três processos analisados, observa-se primeiramente a existência de miniaturas em
posições escondidas ou enterradas. Nos primeiros cenários dos três sujeitos, pode-se observar:
no caso G., ele colocou todas as figuras dentro do presépio, inclusive os pequenos animais; no
caso L., ele tentou esconder o transformador e, no caso A., o dinossauro estava enterrado
debaixo do homem. Pode-se pensar na possibilidade de conteúdos do inconsciente escondidos,
talvez por terem potenciais ameaçadores e haveria a necessidade de um espaço para que
pudessem emergir.
As miniaturas comuns aos três processos foram cercas, robôs, dinossauros, bola chinesa
(bomba), bolas de vidro azuis grandes, bolas de vidro colorido, burro de carga, bicicleta, águia,
o cordão dourado e as velas acesas.
Para uma melhor compreensão dos significados simbólicos que essas miniaturas contêm,
alguns citados anteriormente, caberia neste momento aglutiná-las em função das fases em que
mais ocorreram, como no caso das cercas, dos robôs, dinossauros, da bola chinesa, que
estiveram mais presentes na fase inicial. As cercas podem simbolizar as defesas que os três
sujeitos precisavam erguer, na tentativa de conter os impulsos ameaçadores e destrutivos que
emergiam do inconsciente. Inicialmente, as defesas surgem nos cenários de forma rígida:
cercas ou espaços delimitados sem saída ou abertura. As cercas fechadas podem ser
consideradas como defesas mais rígidas e as cercas com aberturas e saídas, como mais
flexíveis e adaptadas. No decorrer do processo de terapia, houve modificação nessa direção da
expressão simbólica das defesas.
A bola chinesa, sempre considerada como uma bomba, poderia ser a representação da
ameaça que os sujeitos sentiam de serem destruídos pelos pensamentos obsessivos e
compulsivos. Da mesma forma, os dinossauros simbolizam conteúdos arcaicos e destrutivos do
inconsciente.
Os robôs são máquinas, às vezes com aparência humana, que reproduzem seus
movimentos por meios mecânicos. O movimento dessas máquinas independe da vontade.
131
Assim como os robôs os sujeitos tinham comportamentos compulsivos que independiam de sua
vontade, e eles tinham a consciência do não querer fazer, mas os movimentos aconteciam
como nos robôs, sempre de uma forma repetitiva.
As bolas de vidro foram colocadas nos cenários no decorrer do processo como pedras
preciosas ou bombas. Algumas vezes eram espalhadas pela areia e, outras, colocadas semi-
enterradas. Na fase inicial, poderiam simbolizar a possibilidade de emersão de tesouros do
inconsciente. Em alguns momentos, o “congestionamento” das bolas de vidro poderia
simbolicamente ser comparado à estagnação do fluxo da energia psíquica. A energia não tem
um caminho de saída. Nessas condições, ela se apresenta estagnada e não geradora de
criatividade e produtividade. Na fase final dos processos, elas parecem indicar caminhos e
poderiam simbolizar uma ligação entre consciente e inconsciente.
Em relação aos animais, águia e burro de carga, que já foram interpretados
anteriormente, parecem apontar o potencial de cada um dos sujeitos em relação ao seu
processo. O burro de carga aparece no início do processo e a capacidade de simbolizar o peso
dos sintomas foi importante na transformação dos mesmos. Para Ammann, “o burro geralmente
significa sofrer e suportar os próprios lados sombrios que, no entanto, conduzem à redenção, à
consecução da totalidade”. (AMMANN, 2002, p.136).
Desta forma, a transdução dos sintomas com TS pode estar relacionada aos símbolos
utilizados no decorrer do processo terapêutico.
8.4.2 Análise dos temas
A Tabela, a seguir, permite uma análise comparativa da evolução dos temas entre os três
sujeitos. Pode-se observar que a evolução de alguns temas é similar aos três, enquanto em
outros há diferenças.
TABELA 13
- EVOLUÇÃO DOS TEMAS DOS SUJEITOS POR FASES
Inicial Intermediária Final Inicial Intermediária Final Inicial Intermediária Final
Automatismo 5,0% 7,7% 0,0%
9,0%
5,0% 0,0% 1,8% 0,0% 0,0%
Celebração 5,0% 0,0% 7,0%
3,5%
1,3% 0,0% 7,3% 6,5% 11,1%
Centralização 7,5% 9,6% 23,3%
4,5%
7,5% 5,9% 9,2% 15,3% 17,5%
Conflito 15,0% 15,4% 11,6%
8,5%
5,6% 9,3% 12,8% 5,9% 9,5%
Congestionamento 5,0% 5,8% 9,3%
6,5%
0,6% 2,5% 3,7% 0,6% 0,0%
Defesas 12,5% 7,7% 0,0%
10,6%
5,0% 4,2% 5,5% 3,5% 1,6%
Destruição 0,0% 9,6% 4,7%
3,0%
5,0% 7,6% 7,3% 1,8% 0,0%
Identificação Egoíca 15,0% 21,2% 9,3%
14,1%
18,8% 21,2% 14,7% 4,7% 11,1%
Integração 0,0% 5,8% 20,9%
4,5%
1,3% 7,6% 1,8% 3,5% 15,9%
Movimento Ascendente 7,5% 1,9% 0,0%
9,5%
9,4% 10,2% 5,5% 14,1% 1,6%
Movimento Descendente 10,0% 7,7% 0,0%
11,1%
18,1% 14,4% 22,9% 30,0% 19,0%
Submersão 5,0% 7,7% 2,3%
4,0%
9,4% 4,2% 4,6% 12,9% 3,2%
Transferência 12,5% 0,0% 2,3%
3,0%
3,1% 6,8% 2,8% 1,2% 0,0%
Transformação 0,0% 0,0% 9,3%
8,0%
10,0% 5,9% 0,0% 0,0% 9,5%
Fases
Temas
Sujeitos
GLA
132
É importante notar que cinco desses temas tiveram aumento para o sujeito L. (Conflito,
Identificação Egóica, Movimento Ascendente, Movimento Descendente, Submersão e
Transferência) o que poderia sinalizar esforço egóico para suportar as pressões advindas do
mundo externo. Não se pode esquecer que ele tinha o diagnóstico de TOC, TDAH e, pelo
roteiro de 1ª entrevista, apresentou tiques motores e fônicos. Haveria necessidade de maiores
estudos para um possível relacionamento entre TDAH com estes temas. A questão do tema
Conflito diminuir para G. e A. leva a pensar que houve uma maior capacidade de enfrentar os
próprios conflitos e, com isto, deparar-se com as suas próprias limitações. O tema
Congestionamento, que aumentou para o sujeito G., pode ser compreendido como uma maior
capacidade do sujeito em lidar com a desorganização e o caos. Ao final do processo, ele
conseguia lidar com o fato de nem tudo estar certo e perfeito.
O tema Destruição diminuiu apenas no sujeito A. enquanto aumentou para os sujeitos G. e L.,
indicando que o sujeito A., inicialmente, apresentou um alto nível de destruição e conseguiu, de
uma certa forma, lidar com esse sentimento. É oportuno lembrar que A. agredia seus colegas,
familiares e tentou agredir a terapeuta.
Os temas descrevem o processo e quatro entre eles merecem ser destacados, pois podem ser
indicativos de uma evolução positiva no tratamento desse grupo de sujeitos portadores de TOC.
Os temas são: Automatismo, Defesas, Centralização E Integração.
Os critérios de melhora foram dados pelos médicos dos três sujeitos, relatórios das escolas,
entrevistas com os pais, observações psicoterapêuticas e pelas escalas EAS e Crenças de
Brown.
Os temas Defesas e Automatismo corroboram a idéia de que a presença de um ego fraco e
fragmentado leva à formação de defesas que surgem sob forma de sintomas obsessivo-
compulsivos. É como se os sintomas agissem como uma couraça protetora em relação aos
impulsos. Em todos os três casos, as crianças apresentavam em sua dinâmica dificuldade em
lidar com aspectos destrutivos e agressivos do inconsciente.
133
0,0% 2,0% 4,0% 6,0% 8,0% 10,0% 12,0% 14,0%
Período Inicial
Período Intermediário
Período Final
Gráfico 10: Comparativo da Evolução do Tema Defesas
Casos G, L e A
G L A
Na análise quantitativa do tema Defesas, pode-se considerar que houve uma modificação
do período inicial para o período final. Pela evolução do processo, percebe-se que as defesas
passam por uma transformação, ou seja, o que anteriormente se apresentava como defesa
rígida ao final aparece mais flexível. Pode-se considerar um trabalho de adaptação que se
processou com a mudança de atitude frente ao mundo externo. As defesas que, inicialmente,
tinham por função o controle dos impulsos, passam a funcionar como condição de adaptação
ao meio em que essas crianças vivem. Os relatórios das escolas nas diferentes fases, e as
observações dos familiares comprovam a modificação de comportamento dos sujeitos. A
possibilidade de simbolização na TS permitiu que o fluxo da energia psíquica conseguisse ser
retomado. Os movimentos de progressão e regressão da libido, que se encontravam
bloqueados pelas defesas rígidas e que se manifestavam pelos sintomas, conseguiram
encontrar uma direção e uma finalidade. Jung (1998) compara a mudança do fluxo da energia a
uma queda de água que pode divertir por um pequeno período de tempo em um fim de semana,
mas, ao ser transformada em usina elétrica, só se consegue aproveitá-la de uma maneira muito
mais completa por meio da energia elétrica. Nos casos apresentados, pela evolução visualizada
no gráfico, pode-se perceber a modificação ocorrida nos sujeitos. O controle sobre os atos
impulsivos desenvolveu nessas crianças defesas rígidas, que podiam estar associadas aos
sintomas do TOC. Assim, quanto mais elas se defendessem dos sintomas, mais apareceriam.
O processo de diferenciação não ocorria e não havia a superação da unilateralidade, o que
gerava uma grande ansiedade e os sintomas do TOC surgiam.
134
Ao escrever sobre a conscientização das fantasias e da participação ativa do paciente
nesse momento Jung verificou que:
A contínua conscientização das fantasias (sem o que, permaneceriam
inconscientes) com a participação ativa nos acontecimentos que se desenrolam
no plano fantástico, tem várias conseqüências. Em primeiro lugar, há uma
ampliação da consciência, pois inúmeros conteúdos inconscientes são trazidos
à consciência. Em segundo lugar, há uma diminuição gradual da influência
dominante do inconsciente; em terceiro lugar, verifica-se uma transformação da
personalidade. (JUNG, 1991, § 358).
Para Byington (1996), as funções estruturantes defensivas no TOC disputariam a
elaboração dos símbolos com as criativas, que são coordenadas pelo arquétipo patriarcal. No
caso dessas crianças, a utilização dos símbolos propiciou que a energia, antes contida,
pudesse fluir em diferentes canais e os sintomas do TOC fossem transduzidos.
Após a análise dos temas anteriores, ficou bastante evidente a relação estabelecida entre
Defesa e Automatismo nas diferentes fases, temas presentes nas fases inicial e intermediária
do processo dos três sujeitos. O que se nota em relação ao tema Automatismo é que não surge
no período final em nenhum cenário dos sujeitos (vide Gráfico 11). Os resultados não deixam
dúvidas de que houve uma modificação de comportamento, uma mudança de percepção, assim
como uma maior organização de conteúdos mentais e controle sobre a mobilidade, que
permitiram que os sintomas fossem transformados e concorressem para o desenvolvimento de
um ego mais forte.
O processo terapêutico desenvolvido por meio da TS permitiu que os sujeitos, ao mesmo
tempo em que transformavam seus sintomas, conseguissem reconstruir o ego que se
encontrava fragmentado e incapaz de lidar com seus impulsos internos e as exigências
externas. A clara diminuição do tema Automatismo coincide com as observações da escola e
dos pais, que relataram a diminuição dos comportamentos compulsivos.
135
0,0% 1,0% 2,0% 3,0% 4,0% 5,0% 6,0% 7,0% 8,0% 9,0% 10,0%
Período Inicial
Período Intermediário
Período Final
Gráfico 11: Comparativo da Evolução do Tema Automatismo
Casos G, L e A
G L A
No gráfico 12, observa-se que, no período final, os três sujeitos apresentaram uma maior
produção de cenários relacionados ao tema Centralização, em comparação ao período inicial
da terapia. Jung (1998) considera a centralização como o ponto mais alto e importante do
processo terapêutico.
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0%
Período Inicial
Período Intermediário
Período Final
Gráfico 12: Comparativo da Evolução do Tema Centralização
Casos G, L e A
G L A
Foi possível observar, na apresentação dos casos, que os sujeitos identificavam-se com
seus sintomas, estado que significa uma ausência de diferenciação, ou seja, as crianças não
conseguiam separar-se dos impulsos caracterizados pelas obsessões e compulsões, não
136
podiam fazer uma escolha consciente entre as motivações do ego e os impulsos. Whitmont
(2000) afirma que, quando somos iguais ao impulso, não existe uma diferença entre a reação
consciente e o impulso. No caso desse grupo de crianças portadoras de TOC, não havia esta
separação. O consciente e o inconsciente não apresentavam harmonia, com conflitos intensos
e ativados inconscientemente. Observando-se o Gráfico 13, destaca-se a idéia de que esses
sujeitos, inicialmente, não apresentavam condições para integrar necessidades de adaptação e
novos significados em suas vidas e, na fase final, apresentaram um movimento de adaptação.
Havia uma paralisação do fluxo de novas experiências e um congelamento das potencialidades,
talentos e habilidades não realizadas. No período final do processo, o ego mais forte e as
defesas mais flexíveis permitiram a transdução dos sintomas, com a conseqüente remissão dos
sintomas e retirada total da medicação.
0,0% 5,0% 10,0% 15,0% 20,0% 25,0%
Período Inicial
Período Intermediário
Período Final
Gráfico 13: Comparativo da Evolução do Tema Integração
Casos G, L e A
G L A
Assim, houve mudanças qualitativas e quantitativas dos temas no decorrer do processo.
O tema Defesas diminuiu ao longo do processo. O tema Automatismo não apareceu na fase
final do processo dos três sujeitos. Os temas Centralização e Integração tiveram um aumento
na fase final em relação à fase inicial de cada criança. Estes resultados comprovam as
mudanças ocorridas nos três sujeitos, a remissão dos sintomas, a transformação da
personalidade e a eficácia da TS.
137
9 Considerações Finais
Este estudo mostrou que com a utilização da TS foram encontrados temas comuns às
três crianças portadores de TOC. Destacam-se temas que revelam um processo de
transformação e de renovação de estruturas internas.
O TOC é definido neste estudo como um transtorno de ansiedade, com a presença de
pensamentos obsessivos, sentimentos, idéias, impulsos ou representações mentais vividos
como intrusos e sem significado para a pessoa, entretanto, ela não consegue eliminá-los de sua
consciência apesar do grande desejo de fazê-lo. Os pensamentos obsessivos podem estar
acompanhados de comportamentos compulsivos, que são repetitivos e intencionais, cognitivos
ou motores, realizados com uma determinação, muitas vezes em resposta a uma obsessão, na
tentativa de aliviar a ansiedade provocada pelos pensamentos obsessivos.
Nos casos apresentados, havia um colapso na capacidade de integrar o fluxo da energia
psíquica. As estruturas defensivas rígidas impediam a elaboração de estruturas criativas que
ocorrem por meio dos símbolos. As crianças não tinham acesso a suas potencialidades
saudáveis, devido à incapacidade de integração do inconsciente com o consciente.
O espaço livre e protegido da TS propiciou que estruturas defensivas pudessem ser
transformadas, por meio da expressão concreta que é a imagem de cada cenário. As crianças
puderam dirigir as tendências destrutivas e desorganizadoras da estrutura defensiva para uma
estrutura criativa. Por meio da TS, os sujeitos puderam expressar sua agressividade e emoções
explosivas, transformando o núcleo das estruturas defensivas em estruturas criativas, por meio
das quais seu ego foi gradativamente modificado e se fortalecendo. A evolução dos temas
Conflito, Destruição e Submersão e seus aumentos e diminuições nas diferentes fases parecem
indicar que a TS propiciou a estes sujeitos condições para construir, destruir e reconstruir
núcleos internos de grande agressividade e destruição assim como transformá-los.
Os temas Centralização e Integração apontam o esforço do ego para estabelecer uma
nova ordem, ou seja, uma grande quantidade de energia envolvida para as mudanças e
alterações dos modelos e hábitos de vida. Pode-se pensar, assim, na transformação da
consciência, com a transdução e a remissão dos sintomas.
As crianças puderam incorporar o processo da TS e a possibilidade de brincar revelou
não somente a psicodinâmica da psicopatologia, como também refletiu as habilidades e as
capacidades de cada um para a transformação. A construção de cada cenário permitiu integrar
novas necessidades de adaptação. As miniaturas, com seu potencial simbólico, e o brincar na
138
areia facilitaram a conexão e integração com aspectos desconhecidos deles mesmos. O brincar
explorou a criatividade e a imaginação e o uso de uma variedade de símbolos possibilitou que
os sujeitos conseguissem expressar seus sentimentos com maior capacidade de conectar-se ao
mundo interno, que conduziram ao processo de transformação interna.
Ao analisar os resultados, destaca-se que a TS propiciou às crianças deste estudo usar a
sua própria criatividade e trabalhar no plano não-verbal favoreceu o processo de de-integração
e reintegração do Self. A possibilidade de lidar com os conflitos favoreceu o desenvolvimento do
ego e o processo de diferenciação. Sob essa perspectiva, simbolicamente, a TS também
promoveu uma espécie de degelo das imagens congeladas (complexos), por meio da relação
transferencial. É importante ressaltar que a contratransferência e a ressonância foram
marcantes e funcionaram como ponte entre o simbólico e o consciente, e com os três sujeitos,
houve uma sintonia afetiva que permeou todo o processo.
Importante ressaltar que, para estes sujeitos, a remissão dos sintomas não estava
condicionada a um tempo de quatro ou cinco semanas, mas a um movimento interno de
“centralização e integração”, que ocorreu de forma intensa na fase intermediária e final do
processo. As transformações foram ocorrendo em vários níveis com o campo de percepção dos
sujeitos sendo alterado, a organização de conteúdos mentais relacionada às atitudes e as
dificuldades de atenção e concentração em atividades rotineiras não estavam mais presentes,
com um controle sobre os atos impulsivos. Essas transformações foram corroboradas pelo
relato dos pais e da escola das três crianças.
A integração poderia significar a capacidade de uma maior organização da personalidade
e uma maior interação entre os conteúdos conscientes e inconscientes. É como se o processo
de construção da identidade psicológica de cada um dos sujeitos apresentasse um grau de
diferenciação em relação ao mundo externo. Jung detectou que o trabalho de psicoterapia feito
pelo paciente “[...] conduz através da assimilação progressiva do inconsciente, à integração final
de sua personalidade, e com isso à eliminação da dissociação neurótica”. (JUNG, 1988, § 27).
Fica claro que o objetivo da terapia é ajudar na cura e no desenvolvimento da própria
personalidade dos sujeitos, significando ampliação e desdobramento dos talentos, habilidades e
potencial de cada um.
Finalizando este estudo, três pontos merecem destacados:o primeiro ponto refere-se à
psicodinâmica. A transdução dos sintomas nas caixas de areia e uma certa repetição de
padrões nos três processos permitem levantar a hipótese de um padrão psicodinâmico nos
pacientes portadores de TOC.
139
O segundo ponto refere-se à proposição de um novo referencial para atender crianças
com esta psicopatologia na psicologia analítica. A TS favoreceu a remissão dos sintomas e
nesse sentido foi bastante eficaz.
Por fim, o terceiro ponto refere-se à aplicação da metodologia qualitativa e de técnicas do
Discurso do Sujeito Coletivo, que permitiram uma análise quantitativa e contribuíram para a
construção de uma análise mais profunda do processo da Terapia do Sandplay. Com o intuito
de sistematizar a riqueza e a quantidade de dados existentes nesse trabalho e tendo, ao
mesmo tempo, a necessidade de garantir uma análise mais ampla e profunda, as técnicas do
DSC permitiram esta análise. A partir desse momento, houve uma adaptação da técnica em
caráter inovador, exploratório e experimental. A forma como ocorreu foi satisfatória e merece
maior estudo para ser ampliado.
Ao finalizar esta pesquisa com a utilização da TS no tratamento de crianças com TOC,
ressalta-se que os pacientes tiveram a remissão dos sintomas até a presente data, o que
demonstra existir um caminho promissor para futuras pesquisas com a TS no tratamento de
outras psicopatologias em crianças e também para a compreensão da psicodinâmica dos
transtornos. Outro caminho diz respeito ao novo método aqui desenvolvido em caráter
exploratório, que possibilita a utilização de instrumentos cada vez mais sólidos para a
investigação da eficácia da TS.
Foto 39 Caso A. 6/4/2005.
140
Referências
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147
Anexos
Anexo A
TERMO DE CONSENTIMENTO
Título da pesquisa
: A utilização da Terapia do Sandplay no tratamento de crianças com
Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC).
Instituição: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Pesquisador responsável: Reinalda Melo da Matta.
Telefone para contato: XX(11)4368-2611.
Local onde será desenvolvida a pesquisa: Consultório particular da pesquisadora.
-
Resumo: Serão realizados atendimentos psicoterápicos utilizando a Terapia do
Sandplay com crianças que apresentem o diagnóstico médico de TOC. O objetivo é
a investigação dos resultados psicoterapêuticos da utilização da Terapia do
Sandplay no tratamento do TOC.
-
Riscos e benefícios: O procedimento não envolve nenhum risco ao paciente, sendo
que o benefício será a continuidade do tratamento psicoterápico.
-
Custos e pagamentos: os honorários serão estipulados entre os responsáveis e a
pesquisadora.
-
Confidencialidade: Os dados da pesquisa que possam identificar os sujeito
sofrerão um procedimento de descaracterização, desde que este não interfira na
verdade da pesquisa, se a descaracterização não for possível, estes dados serão
desprezados.
-
Direito da desistência: O sujeito ou seus responsáveis poderão recusar a
participação da pesquisa ou desistir da mesma a qualquer momento.
-
Consentimento voluntário:
.................................................................e....................................................................
responsáveis por................................................................................entendemos que
qualquer informação obtida sobre nosso filho será confidencial. Nós entendemos
que os dados da pesquisa estão disponíveis para a revisão da pesquisadora. Ficou
esclarecido para nós que a identidade de nosso filho não será revelada em nenhuma
148
publicação desta pesquisa; em conseqüência, concordamos com a publicação para
propósitos científicos.
Certificamos que este termo de consentimento nos foi lido e entendemos seu conteúdo.
Uma cópia deste termo nos será fornecida. Nossa assinatura e a de nosso filho demonstram a
nossa aceitação e a livre concordância na participação deste estudo.
Assinatura do sujeito da pesquisa
...........................................................................................
Assinatura dos responsáveis
................................................................................................
................................................................................................
Data: / /
Eu certifico que expliquei ao sujeito.........................................................................e aos
seus
responsáveis.......................................................................e....................................................., a
natureza, o propósito e os benefícios associados à sua participação nesta pesquisa. Respondi a
todas as questões que me foram feitas e testemunhei a assinatura acima.
Assinatura da pesquisadora:.................................................................................
Data: / /
OBS. O presente termo consta de duas páginas e encerra-se aqui.
FONTE: Greghi, 2003, p.271
149
Anexo B
150
Anexo C
Agrupamento Miniaturas
Acessórios
Bijuterias (brincos, colares, anéis e pulseiras)/bolsa marrom/colares dourados
e prateados/sombrinha e chapéu/vidro de perfume/batom
pequeno/pentes/sandálias/sapatos
Anfíbio
Tartarugas/sapo com filhote/sapos
Animais domésticos
Bois/vacas/burro com
carga/burros/jumento/cabras/ovelhas/porcos/cavalos/cachorros/gatos
Animais marinhos
Arraias/baleias/golfinhos/peixes/tubarão/caranguejo/cavalo-
marinho/focas/lagosta/conchas /estrelas do mar/leão-marinho
Animais mitológicos
Pégasus/Unicórnio
Animais pré-históricos
Dinossauros (grandes e pequenos)/fóssil de dinossauro
Animais selvagens
Elefantes/alce/camelo/bisão/girafa/tigre/leão/onça/gorila/macacos/hipopótamo/
porco-espinho/canguru/lobo/ursos/javali/veado/zebra/
Animal urbano
Rato
Arsenal de guerra
Armas brancas/revólveres/metralhadoras/fuzis/balas/canhões/tanques de
guerra/jeep de guerra/caminhões de guerra
Aves domésticas
Ganso/marreco/galo/galinha/cisnes/pato/pata/peru/galinha d'angola/ninhos
com passarinho
Aves selvagens
Avestruz/falcão/condor/coruja/abutre/papagaio/pelicano/garças/tucano/águia/g
avião/condor
Bolas
Bola chinesa com dentes/futebol/Yin e Yang/bolas de vidro coloridas
(pequena,média e grande)
Bonecas
Bonecas de pano/típicas/madeira
Caixas
Caixas de bala/cofre/estojos de porcelana
Cercas/Barreiras
Cercas
Comemoração
Presentes/bolas de Natal
Comida
Comida(tortas, ovo, pastel, arroz, sanduíches)/balas de vidro
Comida
Lata cerveja
Comida
Frutas (limão, laranja, uva, coco, pinhas, nozes)
Construção
Casas (madeira, barro, pedras, papel machê)/vila de
pescadores/fazenda/padaria/posto de gasolina/cabine telefônica.
Construção
Igreja/castelo/presépio
Construção
Piscina
Construção
Torre de petróleo/moinho
Elementos da natureza
Flores/folhas secas/paus de canela/trigo/sementes/pé de
pimenta/café/semente
Elementos da natureza
Plantas/grama/árvores/árvores de pedra/pinheiro
Elementos da natureza
Gruta
Elementos da natureza
Pedras brasileiras, de rio
Elementos de construção
Mosaicos/tijolos de montagem (Futuro
Engenheiro)/madeiras/palitos/paus/papéis coloridos/fitas/tecidos/sucatas
Elementos de ligação
Ponte/trilho de trem
Elementos de proteção
Escudo
Espelho
Espelho
Miniaturas disponíveis entre 2002 e 2004
151
Ferramentas de trabalho
Prensa/pá/ancinho/alicate/termômetro/otoscópio/pincéis
Figuras da realeza
Reis/rainhas/princesas
Figuras douradas e brilhantes
Elefante/gorila/galo/cobra
Figuras heróicas
Personagem Sr.dos Anéis/Personagens Harry Potter
Figuras mitológicas
Bruxas/fantasma/cérbero/dragão/cavaleiro
negro/anjos/anões/duendes/fadas/papai noel
Figuras mitológicas
Deuses egípcios/viking
Figuras mitológicas
Máscara bumba-meu-boi/máscara africana
Figuras religiosas
Sacrário/cruz/terço/diversas imagens de santos/bíblia
Figuras religiosas
Shiva/iogue/buda
Figuras religiosas
Totem/orixás do candomblé/carranca/figa de madeira
Insetos/artrópodes
Aranha/barata/louva-a-
deus/cigarras/besouros/moscas/formiga/escorpião/borboletas.
Jaula
Jaula/gaiola
Meios de transporte aéreo
Avião/helicóptero/foguete
Meios de transporte marítimo
Navio/barco/bote/jet-ski/veleiro
Meios de transporte terrestre
Bicicleta/motocicleta/ônibus/bonde/trem/caminhão/carros/trator/carroça
Moedas
Moedas
Monumento
Pirâmide com estátua da liberdade/pirâmide/estátua da liberdade/torre Eiffel
Mundo
globo terrestre
Objetos de iluminação
Lamparina / Lâmpada/postes de iluminação
Objetos domésticos
cama/armário/fogão/churrasqueira/mesa/cadeira/sofá/poltronas/abajur/cadeira
de piscina/mesas pequenas/cadeiras de plástico/criado-mudo/cadeira de
bebê/cadeira de escritório/estante com diversas miniaturas/guarda-
roupa/penteadeira com banqueta e espelho/vassouras/vasos/canecas/cesta de
vime/panelas/tachos/pratos/talheres/copos/taça/bules/cuias/xícaras/pote de
leite/bandejas/batedeira de bolo/balança
Objetos eletrônicos
Transformador / Filtro transformador
Objetos eletrônicos
Computador/fax/telefone/telefone celular/filmadora/televisão
Objetos mecânicos
Robôs/relógio/placa eletrônica
Objetos mortuários
Sarcófago / múmia / ossos / cripta / urna funerária/morte/fantasma/esqueleto
Objetos musicais
Instrumentos musicais(piano, violino, berimbau, sax, tambor,
clarineta,trompete,fagote)
Penas de aves
Penas
Personagens heróicas
Batman,super-homem, homem-aranha
Personagens infantis
Pluto/Mickey/Flinstones/Superpoderosas/Palhaço no carro/tartaruga
ninja/alfie/personagens do sítio do pica-pau amarelo
Pessoas
Homem e mulher agricultores/mergulhadores/guerreiros/jogadores de
futebol/índios/negros/asiáticos/soldados/pessoas dançando mandacaru/mulher
grávida/meninos de porcelana/casais de noivos/meninas no balanço/casais de
idosos/casal se beijando/figuras representando diferentes profissões:
médico,dentista,cabeleireira,músicos,cozinheira,secretária,aluna,homens
dançando capoeira,dançarina de frevo,policial,retirantes,bonecos
(Lego),jogadores de futebol,escravos acorrentados
Poço
Poço
Répteis
Cobra/lagarto/crocodilo/jacaré
Sinalização
Sinais de trânsito
Vaso sanitário
privada
Velas acesas
Velas coloridas
Vidro de remédio
Vidro de remédio
Miniaturas disponíveis entre 2002 e 2004
152
Anexo D
CD em anexo com as seguintes pastas:
Pasta Geral:
9 Quadros 1-30: Expressão Verbal – Casos G., L. e A.
Pasta Caso G:
9 Quadro 31: Descrição Geral.
9 Quadro 34: Resumo do Temas.
9 Tabela 1: Agrupamento de Miniaturas.
9 Gráfico 1: Gráfico de Porcentagem de Utilização de Miniaturas.
Pasta Caso L:
9 Quadro 32: Descrição Geral.
9 Quadro 35: Resumo do Temas.
9 Tabela 2: Agrupamento de Miniaturas.
9 Gráfico 2: Gráfico de Porcentagem de Utilização de Miniaturas.
Pasta Caso A:
9 Quadro 33: Descrição Geral.
9 .Quadro 36: Resumo do Temas.
9 Tabela 3: Agrupamento de Miniaturas.
9 Gráfico 3: Gráfico de Porcentagem de Utilização de Miniaturas.
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