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GISLEINE SILVANA GASPAROTTO
OFICINA VIRTUAL DE REDAÇÃO: A PRODUÇÃO DE TEXTOS EM
AMBIENTE NÃO ESCOLAR
Mestrado em Língua Portuguesa
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
2006
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GISLEINE SILVANA GASPAROTTO
OFICINA VIRTUAL DE REDAÇÃO: A PRODUÇÃO DE TEXTOS EM
AMBIENTE NÃO ESCOLAR
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia
Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial
para obtenção do Título de
Mestre em Língua Portuguesa,
sob orientação do Professor
Doutor Luiz Antonio Ferreira.
SÃO PAULO
2006
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BANCA EXAMINADORA
______________________________________
______________________________________
______________________________________
Dedico
Às crianças Cauê e Tainah,
José Renato e Giovanna,
Felipe e Marina.
Ao marido e geógrafo
e professor, Haroldo.
Ao pai Pedro e mãe Ismair.
Porque se chamavam homens, também se chamavam sonhos,
e sonhos não envelhecem. (Milton Nascimento e Lô Borges, em
Clube da esquina 2)
Agradecimentos
Aos professores Ana Rosa Ferreira Dias,
João Hilton Sayeg-Siqueira e, em especial,
Luiz Antonio Ferreira, meu orientador,
pela acolhida.
Às amigas de longa data She Shen, Fran Marques, Patrícia Dinely,
à amiga de curta data Aiolanda Soares,
e ao companheiro de luta Roberto Goulart Menezes,
pela percepção de não estar só.
Ao Ubirajara, por todas as reflexões (que não foram poucas).
Às minhas irmãs (Gi)Zele, (Gis)Meire e (Gi)Zane,
gizes da minha vida.
Ao meu irmão Wilson.
Às minhas avós Fia e Santa, in memorian.
RESUMO
Este trabalho insere-se no universo dos estudos de Língua Portuguesa e
Ensino a Distância (EaD), e consiste na construção e estudo de uma Oficina
Virtual de Redação. Nosso objetivo, a partir de um projeto pedagógico testado em
circunstâncias reais, é oferecer espaço de reflexão e criação a fim de que os
alunos consigam escrever, com competência e adequação, textos necessários às
diversas situações concretas de comunicação, para bem desempenhar suas
funções de cidadãos e de trabalhadores brasileiros.
Mas em que medida uma Oficina Virtual de Redação pode contribuir para o
aprimoramento da escrita de seus alunos? Fortalecer a relação do aluno com a
Língua Portuguesa, sua capacidade de refletir, organizar e expressar opiniões?
Interagir com ele de forma a envolvê-lo, motivá-lo e levá-lo ao aprendizado?
Para realizar nosso intento, estudamos o conceito e as gerações de Ensino
a Distância (Keegan e Rosa e Moreira); tecemos um painel atual sobre a exclusão
digital, distribuição dos jovens pelo mundo e pelo país, acesso à informatização e
ao mercado de trabalho (Pochmann); tratamos das novas demandas
educacionais (Belloni, Trindade e Renner); investigamos abordagens por meio do
computador (Valente), dinâmicas capazes de promover o aprendizado
colaborativo (Palloff & Pratt), ambientes virtuais de aprendizagem (Okada e
Rocha), além de dois fatores indispensáveis à construção do conhecimento a
distância, autonomia e interação (Belloni, Marquesi, Chrysos, Teixeira & Menezes
e Leffa). Por fim, fizemos algumas reflexões sobre produção textual, estratégias e
avaliação (Pécora, Osakabe, Siqueira, Fávero e Koch).
Assim exposto, esperamos com nossa pesquisa contribuir para o
aprimoramento da escrita dos alunos concluintes do ensino médio e pré-
vestibulandos, e para os estudos de Língua Portuguesa e Ensino a Distância
(EaD).
Palavras-chave: Oficina Virtual de Redação, Produção Textual, Educação a
Distância
ABSTRACT
This work is based on the universe of Portuguese Language and Distance
Education studies and it is focused on the construction and studies in a Virtual
Composition Workshop. Our goal, based on a pedagogical project tested in real
circumstances, is to provide a room for reflection and creation, aiming at the
students’ ability to write texts, necessary to the various real situations of
communication, with excellence and adequacy and therefore develop their role as
Brazilian citizens and workers.
However, how much can a Virtual Composition Workshop contribute to
improve the students’ writing? How to improve the students’ relationship with the
Portuguese Language, their ability of thinking, organizing and expressing their
opinions? How to interact with them and make sure to involve them and give them
some enhancement, and finally, leading them to the required knowledge?
To accomplish our goal we study the concept of Distance Education and its
generations (Keegan, Rosa e Moreira, Moore and Nunes); build up the real
situation about the digital exclusion, distribution of the youth generation around the
world and the country, access to computers and to job offers (Pochmann); deal
with the new educational demands (Belloni, Trindade and Renner); investigate
approaches through computers (Valente), tasks capable to improve the
collaborative learning (Palloff & Pratt), virtual learning environment (Rocha and
Okada) and two additional essential factors to build up the knowledge in a long
distance course, self-government and interaction ( Belloni, Marquesi, Chrysos,
Teixeira & Menezes and Leffa). Finally, we considered about text production,
strategies and evaluation (Pécora, Osakabe, Siqueira, Fávero and Koch).
In this way we are expecting to contribute to the improvement of the writing
skills of the high school students, and also to the Portuguese Language and the
Distance Education studies.
Key-words: Virtual Composition Workshop, Textual Production, Distance
Education
Esta é para quem curte surfar na Internet e gosta de saber de onde vieram
as grandes idéias.
Hoje, dia 04 de outubro, faz 48 anos que a União Soviética colocou em
órbita o primeiro satélite artificial. Foi em 1957. Uma pequena esfera, do tamanho
de uma bola de futebol, chamada Sputinik, girou em torno da terra emitindo sinais
de rádio que foram captados em todo mundo. A novidade provocou admiração na
maioria dos países e uma súbita onda de pânico nos Estados Unidos porque, até
então, as guerras aconteciam no solo e proteger as fronteiras era uma ação
horizontal que ia, no máximo, até dez quilômetros de altura.
O Sputnik mudou tudo da noite para o dia Se os soviéticos resolvessem
atacar lá do alto, do espaço sideral, não haveria proteção possível. Preocupados,
os norte-americanos decidiram, entre outras coisas, criar uma rede que pudesse
transferir e guardar informações sigilosas em diversos pontos do país. E essa
rede seria feita através de computadores, capazes de se comunicar entre si, coisa
que na época pouca gente acreditava que seria possível, porque computadores
eram apenas maquininhas de calcular, mas do tamanho de elefantes.
O projeto secreto recebeu o nome de Arpanet
1
. Demorou mais do que os
americanos previam, mas funcionou. Foi apenas em 1969 que dois computadores
se comunicaram pela primeira vez, transferindo dados e informações um para o
outro. Esse sistema de defesa, Arpanet, é que acabaria gerando, em 1989, o
embrião da atual Internet. Curiosamente, a palavra Sputnik queria dizer
companheiro de viagem, mais ou menos o que a Internet é hoje para muita
gente.
Quem está agora surfando tranquilamente na Internet provavelmente nem
imagina que a Internet é filha legítima de um casal estranho: a mãe foi a
tecnologia e o pai foi o medo.
Max Gehringer, na Rádio Cbn, em Mundo Corporativo, no dia 04 de outubro
de 2005, às 6 horas e 59 minutos.
1
Advanced Research Projects Agency – ARPA. Para realizar o primeiro experimento com a rede foram
escolhidas quatro Universidades que seriam conectadas em janeiro de 1970 na rede computacional
ARPANET. Eram elas a Universidade da Califórnia em Los Angeles (centro do desenvolvimento do
``software''), o Stanford Research Institute, a Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e a Universidade
de Utah, todos beneficiários de contratos com a ARPA. Além da comunidade acadêmica a rede original
atendia também à comunidade militar americana. A rede se expandiu rapidamente, incluindo computadores
de variadas plataformas de ``hardware'' e de ``software'', demonstrando que a comunicação e cooperação
entre sistemas até mesmo de concepções muito diferentes era perfeitamente factível. Havia 13 computadores
na rede em janeiro de 1971, 23 em abril de 1972 e 38 em janeiro de 1973. Foi organizada a primeira
demonstação pública da rede em 1972 por ocasião da ``First International Conference of Computer
Communications'', realizada no outono de 1972. Nesta oportunidade a rede já dava suporte a um amplo
conjunto de serviços regulares, entre as quais estavam incluídos o login remoto e o correio eletrônico, cujo
volume de uso surpreendeu os próprios responsáveis pela rede. Ou seja, a rede estava se revelando, desde os
seus primórdios, como um instrumento muito efetivo de cooperação.
www.ime.usp.br/~is/abc/abc/node20.html, acesso em 04/10/2005.
SUMÁRIO
Introdução.............................................................................................................. 1
Capítulo 1 – Da modalidade Ensino a Distância aos resultados do Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Básica - SAEB
1.1 O conceito e as gerações do Ensino a Distância.............................. 8
1.2 Sociedade da Informação X Apartheid Informacional..................... 12
1.3 Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), acesso ao
conhecimento e Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Básica –SAEB................................................................................. 18
Capítulo 2 – Jovem: acesso à informatização, mercado de trabalho e a
métodos e estratégias de Ensino a Distância
2.1 Educação e mercado de trabalho.................................................... 35
2.2 Os Jovens e a inclusão (ou exclusão?) digital................................ 37
2.3 Novas demandas educacionais e o Ensino a Distância.................. 50
2.4 Abordagem Broadcast, Virtualização da Escola Tradicional, e
Estar Junto Virtual........................................................................... 51
2.5 A utilização da abordagem “Estar junto virtual” .............................. 54
Capítulo 3 – Metodologia de pesquisa
3.1 Em busca da construção do conhecimento: Autonomia e
Interação.......................................................................................... 62
3.2 Contexto da pesquisa...................................................................... 64
3.3 Seleção de metodologia.................................................................. 89
3.4 Procedimentos de análise................................................................ 89
Capítulo 4 – Análise de dados e discussão de resultados
4.1 Os alunos participantes do teste-piloto da Oficina Virtual de
Redação........................................................................................... 93
4.2 Produção textual.............................................................................. 95
4.3 Análise da produção textual........................................................... 139
Considerações Finais....................................................................................... 151
Referências bibliográficas............................................................................... 159
Endereços eletrônicos..................................................................................... 165
Anexos............................................................................................................... 169
Introdução
1
Este trabalho pretende colaborar para os estudos sobre o ensino de Língua
Portuguesa no Brasil, sobretudo no que diz respeito às possibilidades de escrita e
revisão de textos por meios eletrônicos. Além do cunho teórico necessário para
atingir os objetivos, sugere-se uma Oficina Virtual de Redação, ainda sujeita a
reflexões, remodelações e aplicação de modo mais expandido entre alunos
concluintes do ensino médio e pré-vestibulandos.
Num país como o Brasil, em que, segundo dados mais recentes do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 32% dos jovens, dos 15 aos
19 anos, têm acesso ao ensino médio, 18%, entre 20 e 24 anos, à universidade,
não há como contrariar a verdade de que o modelo de educação vigente,
enraizado num processo histórico que não prioriza o ensino público, é excludente.
O poder público, ao não se mostrar capaz de garantir a todos a educação plena e
de qualidade, o equivalente à não permissão da ascensão social e econômica da
esmagadora parcela da população, perpetua a existência de desigualdades.
Diante das adversidades educacionais com as quais os nossos jovens se
deparam no Brasil contemporâneo, crescimento econômico com distribuição de
renda, ao lado dos pilares centrais do sistema educacional:
o ensino universal (isto é, concebido para atingir a todas as pessoas),
igualitário (como garantia de que a educação contribua a eliminar
desigualdades), progressista (desencorajando preconceitos e
assegurando uma visão de futuro) (Santos, 1999,
http://www1.folha.uol.
com.br /fol /brasil500 /dc_3_9.htm, acesso em julho de 2005).
são condições indispensáveis para reverter este quadro, conforme argumenta
Pochmann (2000):
A democratização do ensino é urgente e inadiável. A superação do
atraso não será simples, porém é possível. Em duas décadas, países
como a Coréia venceram o analfabetismo e passaram a estar prontos
para procurar vencer o outro desafio do analfabetismo imposto pela
modernização tecnológica e informacional. (Pochmann, 2000, p.15 )
Quando pensamos numa Oficina Virtual de Redação, objeto do nosso
estudo, em que o aluno se depara com a possibilidade de aprimorar seu texto a
distância, vislumbramos a deflagração de um processo de inclusão baseado na
2
escrita, que poderia adentrar as escolas públicas e disponibilizar aos docentes e
discentes uma ferramenta nova de trabalho.
Mais do que uma motivação à utilização das Tecnologias da Informação e
da Comunicação (TICs), entrevemos no envolvimento com esse trabalho o
fortalecimento da relação do aluno com a Língua Portuguesa, da sua capacidade
de refletir, organizar e expressar suas opiniões.
Evidente, sabemos tratar-se de um projeto educacional a longo prazo,
porque os números não nos permitem outra avaliação: no Brasil, apenas 10% das
escolas possuem laboratório de informática e acessam a internet.
(
www.fundacaoitausocial.org.br, acesso em julho de 2005). Todavia, experiências
outras nos fazem acreditar em mudanças desse cenário. É inevitável a
comparação com a Coréia do Sul, por exemplo. Em 1960, Brasil e Coréia do Sul
tinham uma realidade muito semelhante: países subdesenvolvidos, taxa de
analfabetismo na casa dos 35%, com a vantagem de que a renda per capita
brasileira era o dobro da coreana. Quarenta anos depois, praticamente os
coreanos erradicaram o analfabetismo e colocaram 82% dos jovens nas
faculdades. E o Brasil? Com uma renda per capita inferior a metade da coreana,
tem apenas 18% dos estudantes na faculdade, 13% da população é analfabeta e
75% analfabeta funcional, isto é, lê um texto mas é incapaz de interpretá-lo
(Instituto Paulo Montenegro, em “Indicador de Analfabetismo Funcional - INAF”,
http://www.ipm.org.br/an_ind.php, acesso em outubro de 2005).
O que aconteceu foi que, sem desprezar as peculiaridades do país –
competitividade nos estudos, hierarquia, homogeneização cultural e étnica,
tamanho territorial e investimentos externos - os sul-coreanos, diferentemente do
Brasil, investiram dinheiro nas escolas públicas de ensino fundamental e médio e
as proviu de equipamentos tecnológicos e informacionais .
As salas de aula são equipadas com telões de plasma, laboratórios de
computação têm máquinas de última geração conectadas à internet, os
professores são os mais bem pagos do mundo, com dedicação
exclusiva a uma só escola e direito a quatro horas diárias para preparar
aulas e atender os estudantes (Weinberg, 2004, 7 lições da Coréia
para o Brasil. Revista Veja, Edição 1892, de 16 de fevereiro de 2004).
3
Afora isso, o resultado de um investimento maciço no ensino básico das
escolas públicas garantiu a Coréia do Sul estar entre os primeiros lugares no
exame internacional feito, em 2003, pela Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), para avaliar o rendimento escolar em
quarenta países, enquanto o Brasil amargou as últimas colocações.
Na mesma direção dos asiáticos aponta a afirmação do ex-primeiro-
ministro espanhol, Felipe Gonzáles, responsável pelo salto da renda per capita
espanhola, de U$4500 para U$15 mil, em quatorze anos, e pela inserção da
Espanha,em 1986, na Comunidade Européia:
A educação é a única variável estratégica que nunca falha para o
desenvolvimento de um país (Villela, Folha de São Paulo,15/09/2005).
Envolvidos por essas questões, o nosso estudo sobre a criação de uma
Oficina de Redação via internet, voltada para jovens concluintes do ensino médio
e pré-vestibulandos, exigiu que fôssemos além do contexto de Ensino a Distância
e, para tanto, dividimos o trabalho em quatro capítulos.
No primeiro capítulo, “Da modalidade Ensino a Distância aos resultados do
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SAEB”, a fim de
contextualizarmos nossa pesquisa, procuramos conhecer o conceito de Educação
a Distância / Ensino a Distância, baseados nas idéias de Keegan (1996) e Rosa e
Moreira (2002). Em seguida, descrevemos sucintamente as gerações de Ensino a
Distância, com base em autores como Moore (apud Rosa & Moreira, 2002),
Nunes (1994), entre outros. A partir de dados, estudos e pesquisas divulgados
pela União Internacional das Telecomunicações (UIT), Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Instituto Ethos,
também avaliamos e tecemos um painel sobre a inclusão / exclusão digital
mundial e brasileira, acesso ao computador e internet.
Ainda nesse primeiro capítulo, apresentamos o último Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH, 2005) divulgado pela Organização das Nações
Unidas (ONU), interessados, principalmente, em um dos aspectos considerados,
acesso ao conhecimento, que utiliza a taxa de alfabetização dos habitantes com
15 anos ou mais e o percentual de matrículas nos três níveis de ensino. A partir
dos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INEP) ,
4
analisamos os números das matrículas dos alunos brasileiros, de 1999 a 2005,
nos três níveis de ensino da educação básica, assim como os desempenhos em
Língua Portuguesa dos alunos das séries terminais do Ensino Fundamental e
Médio, nas avaliações feitas, de 1995 a 2003, pelo Sistema Nacional de Avaliação
da Educação Básica (SAEB).
No segundo capítulo, “Jovem: acesso à informatização, mercado de
trabalho e a métodos e estratégias de Ensino a Distância”, amparados pelas
investigações de Pochmann (2000, 2002 e 2004), observamos a distribuição dos
jovens pelo mundo e pelo país, acesso à informatização e ao mercado de
trabalho. A seguir, tratamos das novas demandas educacionais nas quais, no
contexto das sociedades contemporâneas, o Ensino a Distância se insere
(Belloni, 2003; Trindade, 1991 e 1992, Renner, 1995), e das abordagens de
Ensino a Distância por meio do computador (Valente, 2004), principalmente a
“Estar junto virtual”, utilizada em pelo menos três centros de referência,
Laboratório de Estudos Cognitivos (LEC), da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS), Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED) da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e no Programa de Pós-
Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP) (Rocha, 2003; Okada, 2003; Moraes, 2002, entre outros).
Identificamos também algumas dinâmicas capazes de promover o aprendizado
colaborativo (Palloff e Pratt, 1999) e alguns ambientes virtuais de aprendizagem
(Mason, 1998; Britaine Líber, 1999, apud Okada, 2003).
No terceiro capítulo, “Metodologia de pesquisa”, à luz dos estudos de
Belloni (2001), Moore (1993), Marquesi (2001), Chrysos (2004), Teixeira e
Menezes (2004), Leffa (2004), entre outros, tratamos de dois fatores
indispensáveis para que os alunos construam conhecimento a distância,
autonomia e interação, e de que forma uma Oficina Virtual de Redação seria
capaz de promovê-las. Prosseguimos com a descrição do contexto da pesquisa,
colocamos à vista cada uma das divisões que compõem a Oficina Virtual de
Redação por nós criada, “Palavra Escrita”, tecemos considerações sobre a
escolha da metodologia e elencamos os procedimentos metodológicos.
5
No quarto capítulo, “Análise de dados e discussão de resultados”,
apresentamos os alunos participantes do teste-piloto da pesquisa, justificamos a
escolha dos cinco critérios de revisão das redações amparados pelas
investigações de Siqueira (1990), Fávero (1993) e Koch (1997), expomos os
dezessete textos produzidos pelos alunos, de junho a outubro de 2005, alguns
problemas de argumentação à luz dos estudos de Osakabe (1977) e Pécora
(1992), bem como o resultado do processo de suas escritas.
Nas considerações finais, retomamos os objetivos da pesquisa e os
confrontamos com os resultados obtidos.
Este estudo visa à resposta a um questionamento inicial: em que medida
uma Oficina Virtual de Redação pode contribuir para o aprimoramento da escrita
dos seus alunos.
A razão que nos move é a de poder oferecer espaço de reflexão e de
criação a fim de que os alunos consigam escrever, com competência e
adequação, textos necessários às diversas situações concretas de comunicação,
para bem desempenhar suas funções de cidadãos e de trabalhadores brasileiros.
Assim exposto, esperamos com nossa pesquisa contribuir para o
aprimoramento da escrita dos alunos concluintes do ensino médio e pré-
vestibulandos, e para os estudos de Língua Portuguesa e Ensino a Distância
(EaD).
6
Capítulo 1 – Da modalidade Ensino a Distância aos resultados do
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
–SAEB
7
Neste capítulo, com o intuito de contextualizar esta pesquisa, inicialmente,
revisamos o conceito de Educação a distância / Ensino a distância, para, em
seguida, descrever sucintamente as gerações que o marcam. Porque o objeto
de nossa pesquisa, Oficina Virtual de Redação, prescreve o acesso ao
computador e internet, a partir de dados, estudos e pesquisas divulgados pela
União Internacional das Telecomunicações (UIT), Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Instituto Ethos, avaliamos
a tecemos um painel sobre a inclusão / exclusão digital mundial e brasileira.
Os números das matrículas, de 1999 a 2005, nos três níveis de ensino da
educação básica, e os desempenhos em Língua Portuguesa dos alunos
brasileiros das séries terminais do Ensino Fundamental e Médio, nas avaliações
feitas, de 1995 a 2003, pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), permitem obtermos uma noção real da parcela infantil e juvenil que tem
acesso ao conhecimento no nosso país, assim como sua habilidade na execução
de exercícios de Língua Portuguesa.
1.1 O conceito e as gerações do Ensino a Distância
O conceito Educação a Distância/ Ensino a Distância vem sendo revisto ao
longo das últimas décadas:
9 Educação a Distância é uma forma de auto-estudo organizada
sistematicamente na qual o suporte ao aluno, a apresentação do
material de ensino e a certeza e supervisão do sucesso do aluno
são conduzidas por um time de professores, cada um com
responsabilidades. Isso é possível a distância por meios de
comunicação que possam cobrir longas distâncias. O oposto de
`educação a distância´ é `educação direta´ ou `educação face a
face´: um tipo de educação que se estabelece com o contato direto
entre professores e estudantes (Dohmen, 1967. Das Femstudium.
Ein neues padagogisches Forschungsund Arbeitsfeld, apud Keegan,
1966: 41).
8
9 Ensino a Distância pode ser definido como uma família de métodos
instrucionais em que os comportamentos de ensino são executados
separadamente dos comportamentos de aprendizagem, incluindo
aqueles que numa situação contígua seriam desempenhados na
presença do aprendiz, de forma que a comunicação entre professor
e aluno deve ser facilitada por componentes impressos, eletrônicos,
mecânicos e outros (Moore, 1973. Toward a theory of independent
study, apud Keegan, 1996: 41-42
9 Sistema tecnológico de comunicação bidericional (e massivo)
utilizado como estratégia preferencial de ensino, substituindo a
interação professor-aluno em sala de aula pela ação sistemática e
conjunta de recursos didáticos, de apoio e de uma organização
tutorial, propiciando a aprendizagem autônoma do estudante (Aretio,
L. G. La educación a distancia y la UNED, apud Rosa & Moreira,
2002)
9 Educação a Distância é uma forma de ensino que possibilita a auto-
aprendizagem, com a mediação de recursos didáticos
sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes
de informação, utilizados isoladamente ou combinados, e veiculados
pelos diversos meios de comunicação (Diário Oficial da União,
decreto 249, de 10/02/1998, apud Rosa & Moreira, 2002).
Entendemos que cada um desses conceitos, pertinentes à época em que
foram elaborados, ao mesmo tempo que presos a um determinado contexto, com
a inserção de novas ferramentas ou recursos tecnológicos, requerem
atualizações.
Apesar de todas serem unânimes no uso mediador das tecnologias - como
impressos, televisão, internet – em que docente e discente fisicamente não
9
ocupam o mesmo espaço, o ensino a distância é uma via de mão dupla, em que
professores e alunos dividem a responsabilidade da construção da aprendizagem.
Encontramos acolhida, por ser esta também nossa visão, na explicação de
Campos (2004):
9 Modalidade de educação em que o professor e aluno não precisam
dividir o mesmo espaço e o mesmo tempo para que o ensino e a
aprendizagem se concretizem, mas que deve propiciar interação
entre os participantes. Trata-se de um processo que exige um aluno
mais autônomo e um professor mais mediador do que detentor do
conhecimento, que saiba propiciar o envolvimento dos estudantes
com o curso em que estão inseridos (Campos, Karlene S. R. Cursos
de língua portuguesa a distância: a interação em foco. Dissertação
de mestrado, PUC-SP, 2004).
Optamos, contudo, pela expressão Ensino a Distância, por entendermos,
como Chaves(2004), que ensinar a distância é perfeitamente possível, já que
aprendemos por meio dos livros, dos filmes, dos programas de televisão, da
internet, em espaços outros e em tempos que também podem ser diferenciados,
ambos distantes do local originário do produto a ser consumido.
As primeiras experiências de Ensino a Distância (daqui por diante: EaD),
por correspondência, surgiram, em decorrência do desenvolvimento dos meios de
transporte e comunicação (trens, correio), na Europa e nos Estados Unidos.
Moore (apud Rosa & Moreira, 2002) denomina esse período, que se estendeu até
a década de 60, de geração textual.
A geração seguinte, analógica, que compreende o período de 1960 a 1980,
dá um grande salto ao introduzir no EaD o rádio e a televisão que, por meio dos
recursos de telecomunicação, possibilitaram a institucionalização de ações no
ensino secundário e superior, começando pela Europa e se expandindo para as
Ilhas Canárias, Costa Rica, Austrália, México, Índia, Venezuela, Colômbia,
Canadá, China, entre outros. (Nunes, 1994)
No Brasil, as experiências em ensino a distância se iniciaram com a
fundação do Instituto Rádio Monitor, em 1939, e do Instituto Universal Brasileiro,
em 1941. Duas instituições, a primeira voltada para os cursos técnicos e a
10
segunda para os supletivos, que ainda hoje transmitem suas aulas por meio de
apostilas enviadas pelo correio, ambas sem exigir escolaridade anterior.
Foi em 1947 que o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac),
junto com o Serviço Social do Comércio (Sesc) e com a colaboração de
emissoras associadas, criou a Universidade do Ar, em São Paulo, com o objetivo
de oferecer cursos comerciais radiofônicos. Três anos mais tarde, segundo dados
divulgados pela Folha Online (2004), atingia cerca de 318 localidades e oitenta mil
alunos.
Em seus estudos, Nunes (1994) cita uma outra experiência brasileira, a do
Movimento de Educação de Base – MEB que, nos anos 60, por meio de suas
escolas radiofônicas, alfabetizou milhares de jovens e adultos, principalmente das
regiões Norte e Nordeste do Brasil.
No final da década seguinte, 1970, foi criado o Sistema Nacional de
Teleducação, programa que operava por meio do rádio e da TV e em 12 anos
somou 1.403.105 matrículas, com cerca de 40 cursos diferentes. Hoje, a
Fundação Roberto Marinho é responsável por um dos maiores empreendimentos
nesta área, o Telecurso 2000 que, estima-se, atende cerca de 20 mil alunos -
jovens e adultos com distorção idade/série (Folha Online, 2004).
A terceira geração, a digital, despontou na década de 1990 trazendo em
seu bojo o computador, nesse momento “popularizado” com o advento da
Internet.
Por fim, a utilização da WWW, multimídia interativa e Computer Mediated
Communication – CMC, que permitem interações simultâneas, têm autorizado a
identificação de uma quarta e quinta gerações de EaD, nas quais se insere a
Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita, objeto de nossa pesquisa.
Embora muito recorrente, a partir de 1990, a popularização do
computador, no sentido de apreciado ou aprovado por larga parcela da
população, entra em choque com os fatos quando nos defrontamos com os dados
apontados pela União Internacional das Telecomunicações (UIT): como falar em
popularização quando em 2003, apenas 14,5 % da população mundial, cerca de
874 milhões de pessoas, eram usuárias da Internet?
11
1.2 Sociedade da Informação X Apartheid Informacional
Segundo os dados divulgados pela União Internacional das
Telecomunicações (UIT) sobre a inclusão digital no mundo, o Brasil, de 64 países,
ficou em 28º lugar. Tal classificação tem como base o Índice de Acesso Digital
(IAD) que considera a disponibilidade de infra-estrutura, o poder aquisitivo e o
nível educacional do usuário, a qualidade dos serviços e o uso efetivo da Internet.
(Cruz, 2004).
Em relação ao número de hosts, computadores que hospedam conteúdo
de internet, um dos indicadores da rede mundial em cada país, o Brasil, em 2002,
segundo dados da empresa Network Wizards, ocupava o 10º lugar, de um total de
65 países. (Cruz, 2004).
Contradizendo essas façanhas, apesar de a Internet comercial existir no
Brasil desde 1995, segundo o Ibope, em 2004, um pouco mais de 14 milhões de
pessoas tinham Internet em casa e 16 milhões a acessavam fora de sua
residência, contra 85% da população, cerca de 153 milhões de brasileiros, que
não tinham acesso a ela.(
www.ibope.com.br, acesso em julho de 2005)
A tabela a seguir, parte integrante da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílio (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
comprova esses números:
12
Figura 1
13
De acordo com os dados da Pnad (2003), 15,03% da população brasileira
dispõem de acesso ao computador (aproximadamente 26 milhões de pessoas,
contra 147 milhões) e 11,1% à Internet (aproximadamente 19 milhões de
pessoas, contra 154 milhões) (Figura 2) - mulheres, 52,11%, homens, 47,89%,
percentuais bastante próximos ao da população total, 51,32% de mulheres e
48,68% de homens (Figura 3).
Taxa de acesso Taxa de acesso
a computador à Internet
População Total 15,03% 11,1%
Fonte CPS/FGV a partir dos microdados da PNAD/IBGE 2003
Figura 2
Participação por gênero
40
45
50
55
Possui
Computador
Possui
Internet
População
Total
Homens
Mulheres
Fonte CPS processando os microdados do PNAD/IBGE 2001
Figura 3
Observemos abaixo o gráfico da participação da população brasileira por
classe de rendimento mensal domiciliar:
14
Participação por classe de rendimento mensal domiciliar
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Com
computador
Com acesso
à Internet
População
Total
Até 10 salários mínimos
Mais de 10 a 20 salários
mínimos
Mais de 20 salários
mínimos
Fonte: PNAD/IBGE 2003
Figura 4
O gráfico acima mostra a discrepância entre as diferentes classes de
rendimento mensal no que se refere ao acesso ao computador e internet: 7,9% da
classe de rendimento mensal domiciliar de até 10 salários mínimos (84,59% da
população brasileira) tinha computador e 4,79% acesso à Internet; 55,64% da
classe de rendimento mensal domiciliar de mais de 10 a 20 salários mínimos
(8,18% da população brasileira) tinha computador e 44,74% acesso à Internet;
80,16% da classe de rendimento mensal domiciliar de mais de 20 salários
mínimos (3,88% da população brasileira) tinha computador e 72,89% acesso à
Internet. Tais números evidenciam a exclusão digital como desdobramento da
exclusão social.
A exclusão digital é uma das muitas formas de manifestação da
exclusão social. Não é um fenômeno isolado ou que possa ser
compreendido separadamente, pois se trata de mais uma
conseqüência das diferenças já existentes na distribuição de poder e
de renda.(...)Para ser incluído digitalmente, não basta ter acesso a
micros conectados à Internet. Também é preciso estar preparado para
usar estas máquinas, não somente com capacitação em informática,
mas com uma preparação educacional que permita usufruir de seus
recursos de maneira plena (Cruz, 2004, p.13).
Vale a pena analisarmos também o gráfico de participação por idade:
15
Participação por idade
0
5
10
15
20
25
Possui
computador
Possui
Internet
População
Total
15 a 20 anos
20 a 25 anos
30 a 35 anos
40 a 45 anos
50 a 55 anos
60 a 65 anos
mais de 70 anos
Fonte: CPS/FGV processando os microdados do PNAD/IBGE 2001
Figura 5
A interpretação do gráfico acima permite concluir que apesar de serem os
maiores excluídos de quaisquer grupos etários no que se refere, por exemplo, à
educação (segundo dados do IBGE 2001, 68% dos nossos jovens de 15 a 17
anos estão do lado de fora das escolas) e trabalho (segundo o estudo
“Tendências Globais do Emprego para a Juventude 2004”, elaborado pela
Organização Internacional do Trabalho (OIT), 85% dos jovens em todo o mundo
vivem nos países em desenvolvimento, onde eles são 3,8 vezes mais suscetíveis
ao desemprego (estimativa de 88 milhões de jovens desempregados no mundo,
em 2004 - OIT) do que os adultos, em comparação a 2,3 vezes nas economias
industrializadas.). No que concerne ao acesso ao computador e à internet, os
jovens têm mais chance de contato com o mundo informatizado. Portanto, para
eles deveriam se voltar as políticas educacionais de EaD, cujo sucesso muito
provavelmente seria alavancado, justamente o que a Secretaria de Educação a
Distância - SEED, subordinada ao Ministério da Educação e Cultura – MEC, se
propõe a fazer:
As metas da SEED são, pois, levar para a escola pública toda a
contribuição que os métodos, técnicas e tecnologias de educação a
16
distância podem prestar à construção de um novo paradigma para a
educação brasileira.
As linhas de ação da SEED fundamentam-se na existência de um
sistema tecnológico - cada vez mais barato, acessível e de manejo
mais simples – capaz de:
- Trazer para a escola um enorme potencial didático-pedagógico.
- Ampliar oportunidade onde os recursos são escassos.
- Familiarizar o cidadão com a tecnologia que está em seu
cotidiano.
- Dar respostas flexíveis e personalizadas para pessoas que exigem
diversidade maior de tipos de educação, informação e treinamento.
- Oferecer meios de atualizar rapidamente o conhecimento.
- Estender os espaços educacionais e
- Motivar os profissionais e alunos para aprender continuamente,
em qualquer estágio de suas vidas (
www.mec.gov.br/seed, acesso em
julho de 2005).
Segundo dados do PNAD, a extensão do acesso a computadores e
internet em nível de unidades da Federação brasileira assim se apresenta:
As cinco unidades da Federação que apresentam maiores graus de Inclusão
Digital
Grandes Moradores Proporção moradores
Regiões em domicílios Acesso a com acesso a compu-
E Unidades particulares Computador tador/ total de mora-
Da Federação permanentes dores
Distrito Federal 2.035.456 485.820 23,87%
São Paulo 36.719.202 6.603.586 17,98%
Rio de Janeiro 14.298.735 2.217.769 15,51%
Santa Catarina 5.319.120 654.177 12,30%
Paraná 9.471.919 1.097.529 11,59%
Fonte: PNAD 2001 / IBGE
Figura 6
17
As cinco unidades da Federação que apresentam menores graus de
Inclusão Digital
Grandes Moradores Proporção moradores
Regiões em domicílios Acesso a com acesso a compu-
E Unidades particulares Computador tador/ total de mora-
Da Federação permanentes dores
Maranhão 5.621.913 115.211 2,05%
Piauí 2.832.095 78.811 2,78%
Tocantins 1.143.283 31.533 2,76%
Acre 552.016 18.881 3,42%
Alagoas 2.797246 100.664 3,60%
Fonte: PNAD 2001 / IBGE
Figura 7
Como podemos observar, as maiores taxas de acesso a computador e
internet são encontradas nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito
Federal. Já as menores, no Maranhão, Piauí e Tocantins. A essas áreas, que
apresentam baixa taxa de acesso, é que deveriam se voltar as políticas que visem
à redução da exclusão digital.
1.3 Índice de Desenvolvimento Humano, acesso ao conhecimento e o
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB)
Obviamente, o não acesso ao computador não é um fato isolado. O Índice
de Desenvolvimento Humano de 2005, divulgado pela Organização das Nações
Unidas (ONU), revela que o Brasil passou da 72ª posição para a 63ª, dentre os
177 países avaliados. Ainda que tal avanço sinalize uma melhoria da qualidade
de vida da população, essa pequena evolução não altera o cenário da
desigualdade social, visto que os 20% mais pobres, quando analisados
isoladamente, colocam o país na 115ª posição, como bem mostra a tabela do
lado direito da imagem abaixo, ao lado de países como Bolívia, Nicarágua ,
Honduras e Guatemala, os piores Índices de Desenvolvimento Humano da
América Latina, conforme representado na figura 8:
18
Fonte: Informe sobre Desenvolvimento Humano da Onu, Folha de São Paulo, 07/08/2005
Figura 8
Esse Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), elaborado anualmente
pelo Programa das Nações Unidas (PNUD) - com uma defasagem média de dois
anos da data da sua publicação - calcula o índice (numa variação de 0 a 1) de
qualidade de vida da maior parte dos países do mundo, considerando três
aspectos:
9 longevidade – medida pela expectativa de vida da população ao nascer;
9 renda – medida pelo PIB (Produto Interno Bruto), dividido pelo número de
habitantes e ajustado ao poder de compra do dólar em cada país.
9 acesso ao conhecimento – que utiliza a taxa de alfabetização dos
habitantes com 15 anos ou mais e o percentual de matrículas nos três
níveis de ensino;
No que se refere a um dos itens considerados pela ONU, o do acesso ao
conhecimento, segundo dados do Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INEP),
do Ministério da Educação e Cultura (MEC), em 2003, assim se apresentaram os
números das matrículas dos alunos brasileiros nos três níveis de ensino da
educação básica:
1ª a 4ª série
ensino
fundamental
5ª a 8ª série
ensino
fundamental
1ª a 3ª série
ensino
médio
1999 20.939.076 15.120.666 7.769.199
19
2001 19.727.684 15.570.405 8.398.008
2003 18.919.122 15.519.627 9.072.942
2005 13.521.834 11.898.908 9.031.302
Fonte: M Daeb
Á luz de bela, v e, de 1 as matr ível
elmente, resultado, segundo o INEP/MEC da
contínua queda da taxa de natalidade e diminuição dos índices de repetência,
especialmente de 1ª a 4ª série do ensino fundamental, enquanto que no ensino
médio
ec/Inep/
Figura 9
ssa ta erificamos qu 999 a 2005, ículas no n
fundamental caíram considerav
aumentaram e no último ano praticamente se mantiveram, um dos
aspectos motivadores do avanço do indicador educação do IDH
brasileiro.(
www.inep.gov.br, acesso em janeiro de 2006)
O INEP responde também pela averiguação do desempenho dos alunos do
Ensino Fundamental e Médio, assim como sobre as condições intra e extra-
escolares que incidem sobre o processo de ensino e aprendizagem. Para tanto,
criou o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) que, com o
objetiv
o de apoiar municípios, Estados e a União na formulação de políticas para
a melhoria da qualidade do ensino, com o foco da aprendizagem de habilidades
básicas e indispensáveis ao cidadão, de dois em dois anos coleta, sistematiza
dados e analisa informações sobre o ensino fundamental e médio em nosso país.
Em 2005, o SAEB avaliou nas disciplinas Língua Portuguesa (Foco: leitura)
e Matemática (Foco: resolução de problemas), pela oitava vez, os alunos
brasileiros da 4ª e da 8ª série do ensino fundamental e da 3ª série do ensino
médio. Os resultados não foram ainda divulgados. Mas, em 2003, em que,
estima-se, 300 mil alunos, 6.270 escolas, 6 mil diretores e 17 mil professores
estiveram envolvidos nesse processo, cuja seleção ocorre de forma aleatória,
estes assim se apresentaram:
20
1.
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 10
Análise:
¾ Em 2001, 59% dos estudantes da 4ª série do ensino fundamental
estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua Portuguesa. Em
2003, esse pe ra 55%, diminuição de 4 pontos
tuais.
Aco
indicados:
rcentual caiu pa
percen
mpanham as tabelas uma explicação do significado dos estágios
21
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 11
2.
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 12
22
Análise:
¾ Em 2001, 25% dos estudantes da 8ª série do ensino fundamental
estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua Portuguesa. Em
2003, esse percentual subiu para 26,8%, aumento de 3,8 pontos
percentuais.
Explicação dos estágios indicados:
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 13
23
3.
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 14
Análise:
¾ Em 2001, 42,1% dos estudantes da 3ª série do ensino médio estavam
nos níveis muito crítico e crítico em Língua Portuguesa. Em 2003, esse
percentual caiu para 38,6%, diminuição de 3,5 pontos percentuais.
Explicação dos estágios indicados:
24
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 15
Também foi feita, por região, uma análise do desempenho pela qualificação
das habilidades:
25
1.
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 16
Análise:
¾ Na região Norte, em 2001, 67,5% dos estudantes da 4ª série do ensino
fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 66,42%, diminuição de
1,08 ponto percentual.
¾ Na região Nordeste, em 2001, 75,17% dos estudantes da 4ª série do
ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 71,17%, diminuição de
4,0 pontos percentuais.
¾ Na região Sudeste, em 2001, 46,61% dos estudantes da 4ª série do
ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 43,96%, diminuição de
2,65 pontos percentuais.
¾ Na região Sul, em 2001, 49,17% dos estudantes da 4ª série do ensino
fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 47,28%, diminuição de
1,89 ponto percentual.
¾ Na região Centro-Oeste, em 2001, 59,73% dos estudantes da 4ª série
do ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em
26
Língua Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 52,51%,
diminuição de 7,22 pontos percentuais.
2.
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 17
Análise:
¾ Na região Norte, em 2001, 26,75% dos estudantes da 8ª série do
ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual subiu para 29,03%, aumento de
2,28 pontos percentuais.
¾ Na região Nordeste, em 2001, 33,57% dos estudantes da 8ª série do
ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 32,82%, diminuição de
0,75 pontos percentuais.
¾ Na região Sudeste, em 2001, 22,77% dos estudantes da 8ª série do
ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual subiu para 25,80%, aumento de
3,03 pontos percentuais.
¾ Na região Sul, em 2001, 26,07% dos estudantes da 8ª série do ensino
fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
27
Portuguesa. Em 2003, esse percentual subiu para 28,37%, aumento de
2,3 pontos percentuais.
¾ Na região Centro-Oeste, em 2001, 21,94% dos estudantes da 4ª série
do ensino fundamental estavam nos níveis muito crítico e crítico em
Língua Portuguesa. Em 2003, esse percentual subiu para 23,49%,
aumento de 1,55 ponto percentual.
3.
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 18
Análise:
¾ Na região Norte, em 2001, 53,69% dos estudantes da 3ª série do
ensino médio estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 51,14%, diminuição de
2,55 pontos percentuais.
¾ Na região Nordeste, em 2001, 52,43% dos estudantes da 3ª série do
ensino médio estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 48,01%, diminuição de
4,42 pontos percentuais.
¾ Na região Sudeste, em 2001, 38,53% dos estudantes da 3ª série do
ensino médio estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua
28
Portuguesa. Em 2003, esse percentual caiu para 34,51%, diminuição de
4,02 pontos percentuais.
¾ Na região Sul, em 2001, 36,10% dos estudantes da 3ª série do ensino
médio estavam nos níveis muito crítico e crítico em Língua Portuguesa.
Em 2003, esse percentual caiu para 34,65%, diminuição de 1,45 ponto
percentual.
Abaixo, inserimos os gráficos de médias de desempenho em Língua
Portuguesa da série histórica do Saeb, de 1995 a 2003:
1.
4ª série do ensino fundamental
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 19
2.
8ª série do ensino fundamental
29
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 20
3.
3º ano do ensino médio
30
Fonte: Mec/Inep/Daeb www.inep.gov.br/ download/saeb/2004 /resultados /BRASIL.pdf,
acesso em julho de 2005.)
Figura 21
Embora os gráficos da 4ª série do ensino fundamental e 3ª série do ensino
médio tenham apresentado uma ligeira melhora no último exame do SAEB,
enquanto o da 8ª série do ensino fundamental teve uma queda de 3,2 pontos
percentuais, os resultados são assustadores:
¾ Apenas 4,8% de todos os alunos avaliados da 4ª série do ensino
fundamental foram considerados leitores com nível de compreensão de
textos adequado à série.
¾ Apenas 9,3% de todos os alunos avaliados da 8ª série do ensino
fundamental foram considerados leitores com nível de compreensão de
textos adequado à série.
¾ Apenas 6,2% de todos os alunos avaliados da 3ª série do ensino
médio foram considerados leitores com nível de compreensão de textos
adequado à série.
O levantamento desses dados nos oferece uma visão do nível da
(in)habilidade dos alunos brasileiros da série terminal do Ensino Médio com a
Língua Portuguesa. Fez-se necessária a contextualização dessa realidade para,
a partir da constatação dessa frágil relação, pensarmos em estratégias com o
intuito de, por meio da Oficina Virtual de Redação, contribuirmos para a sua
recuperação.
Sobre esses resultados do SAEB, o economista Gustavo Ioschpe (2005)
fez as seguintes observações:
Os resultados do SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Básica) mostram mais da metade de nossas crianças em
situação crítica ou muito crítica. Apenas um quarto (!) dos brasileiros
conseguimos ler uma simples notícia de jornal ou fazer uma pequena
seqüência de cálculos aritméticos. .
(...) O que acontece é que temos um ensino tão ruim nos primeiros
anos do nível fundamental que as crianças progridem aos trancos e
31
barrancos. Acabam repetindo ano; algumas delas, várias vezes.
Quando a distância entre a série ideal para a idade e aquela
cursada é muito alta, a educação deixa de ser investimento no futuro e
passa a ser perda de presente, e o aluno abandona a escola para
entrar no mercado de trabalho. Com o tempo, o funil vai se estreitando,
até que chegamos ao ensino universitário. Enquanto mais da metade
da população de idade universitária dos países desenvolvidos está no
ensino superior, no Brasil estacionamos em 10%. Ou seja, um quinto.
(Ioschpe, “Ignorância, o verdadeiro custo Brasil”, Folha de São Paulo,
em 11 de janeiro de 2005.)
Segundo os dados do próprio SAEB, referentes ao alunos que estavam,
em 2001, nas séries finais de cada ciclo, o desempenho dos que não tinham
computador foi inferior ao dos que tinham.
A noção de que o uso intensivo da tecnologia permitiria à educação
assumir novos conteúdos e novas funções como aparelho de hegemonia (Leher,
1998), pode nos leva a deduzir que todos os que fizerem as escolhas
educacionais corretas, isto é, sintonizadas com o mercado, terão possibilidades
ilimitadas (Barreto, 2003).
Neste capítulo, esboçamos nossa visão de Ensino a Distância, tendo em
vista a inserção de novas ferramentas ou recursos tecnológicos. Assinalamos a
quinta geração como localização da Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita,
objeto de nossa pesquisa. Delineamos um painel da inclusão / exclusão digital
mundial e brasileira, o percentual de matrículas, de 1999 a 2005, nos três
estágios iniciais de ensino, e o desempenhos em Língua Portuguesa dos alunos
das séries terminais do Ensino Fundamental e Médio, nas avaliações feitas, de
1995 a 2003, pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB).
No próximo capítulo, analisaremos a distribuição dos jovens pelo mundo,
pelo Brasil e por São Paulo, cidade em que desenvolvemos nossa pesquisa, seu
acesso à informatização e ao mercado de trabalho. Também trataremos das
32
novas demandas educacionais no contexto das sociedades contemporâneas,
identificaremos algumas abordagens de ensino a distância por meio do
computador, algumas dinâmicas capazes de promover o aprendizado colaborativo
e alguns ambientes virtuais de aprendizagem, métodos e estratégias que
nortearam a construção da nossa Oficina Virtual de Redação.
33
Capítulo 2 – Jovem: acesso à informatização, mercado de
trabalho e a métodos e estratégias de Ensino a
Distância
34
Neste capítulo, por serem os jovens o público-alvo do nosso objeto de
análise, intentamos adquirir uma visão mais significativa da sua distribuição pelo
mundo e pelo Brasil, seu acesso à informatização e ao mercado de trabalho.
Também tratamos das novas demandas educacionais nas quais, no contexto das
sociedades contemporâneas, o ensino a distância se insere, delineando, para
tanto, abordagens por meio do computador, dinâmicas capazes de promover o
aprendizado colaborativo e ambientes virtuais de aprendizagem.
2.1 Educação e Mercado de trabalho
Na sua análise sobre nível educacional e mercado de trabalho, Pochmann
(2002) é categórico em afirmar:
A tese generalizada de que o avanço educacional seria suficiente para
superar as atuais mazelas no funcionamento do mercado de trabalho
brasileiro torna-se cada vez mais uma falácia, especialmente quando
o processo de aprendizagem encontra-se subordinado exclusivamente
a uma funcionalidade do conhecimento. Deve-se adiantar, contudo,
que não se trata de contestar o papel libertador que a educação pode
ter para o conjunto da sociedade quando associada à aprendizagem
das distintas visões de mundo (aprender para fazer, para conhecer,
para conviver e para ser) (Pochmann, 2002, p.78).
Sua opinião é respaldada por Antunes (2005):
O próprio diploma universitário, por si só, não tem garantido inserção
no mercado de trabalho nem ascensão social. Basta observar a
quantidade de pessoas que concluíram um curso superior e
desenvolvem atividades que não exigem esse nível de ensino ou
continuam fazendo exatamente o que faziam antes da diplomação.
(Antunes, “A inclusão no ensino superior público”, Folha de São Paulo,
caderno Brasil, A3, de 11 de novembro de 2005)
Muitas são as previsões sobre as possibilidades do futuro do trabalho.
Independentemente de suas comprovações, o que já se pode constatar é que o
35
modelo de produção industrial, penetrado em todas as esferas sociais, inclusive
na educação, se aplica a uma parcela minoritária da força de trabalho ativa
mundial.
Comparada às tradicionais sociedades industriais que caracterizaram os
séculos XIX e XX (de inclusão do trabalhador porque necessitava de sua força de
trabalho, mas ao mesmo tempo alienante em decorrência da execução de
atividades repetitivas, exaustivas e pouco criativas, típicas da organização
fordista, em que o operário, colocado num ponto da linha de montagem, perde a
noção do produto final ) a sociedade da informação é muito mais desigual.
Primeiro porque, em busca de eficiência e vantagens competitivas, incorpora, no
processo produtivo, tecnologias cada vez mais avançadas, excluindo assim a
grande massa de trabalhadores que não tem acesso a elas. Segundo, por conta
de seu desdobramento social: supressão dos direitos trabalhistas ou desemprego
estrutural, conseqüente aumento da massa de trabalhadores desempregados,
portanto marginalização do trabalho, criando assim uma nova concepção de
exclusão: a digital.
No capitalismo informacional, que vem se constituindo desde a II Guerra
Mundial, desencadeado pela Terceira Revolução Tecnocientífica, das
telecomunicações, da informática, da biotecnologia, há uma busca cada vez maior
da eficiência, das vantagens comparativas, das grandes corporações
transnacionais, da maior interdependência entre as nações, da globalização, das
políticas neoliberais, que contribuirão sobremaneira para o aumento da exclusão
do trabalho.
Não podemos nos esquecer de que colocar o indivíduo acima da
coletividade é um princípio básico do liberalismo econômico, já defendido no
século XVIII por Adam Smith, um dos seus principais pensadores . Tal modelo de
desenvolvimento, responsável pelos milhões de desempregados e excluídos no
mundo todo, ganhou força na América Latina a partir dos anos 90 (Consenso de
Washington), no Brasil, com Collor de Mello (1990-1991) / Itamar Franco (1992-
1994), aprofundado pelo governo FHC (1995-2002) e parcialmente mantido pelo
governo Lula (2003-2006), do Partido dos Trabalhadores.
36
Se, de um lado, o que se vê, em se tratando de força de trabalho, é uma
pequena parcela de trabalhadores elitizada, bem qualificada e remunerada,
beneficiada por acordo coletivos, do outro encontra-se uma grande massa de
trabalhadores excluída dos processos produtivos e submetida a atividades de
baixa remuneração e qualificação.(Sader, 2000).
Sobre esse assunto, acrescenta Edwards (1991):
Os discursos sobre uma força de trabalho flexível e multicompetente
construindo um modo de produção capitalista mais aberto e
democrático (porque baseado na autonomia do trabalhador)
constituiriam então um engodo no sentido de que a experiência da
maioria está sendo construída como a norma.
Porque o Brasil desponta entre as dez maiores economias mundiais é que
não podemos afirmar que a razão de tanta desigualdade se deve à carência de
recursos. Má distribuição de renda somada à falta de qualidade das ações sociais
seriam as verdadeiras causas dos problemas sociais pelos quais passamos,
inclusive o da exclusão digital, que deixam à míngua as principais vítimas da
miséria brasileira: as crianças, os adolescentes e os jovens adultos.
2.2 Os Jovens e a inclusão (ou exclusão?) digital
Considerando o pensamento de Milton Santos (1998), de que “para ter
eficácia, o processo de aprendizagem deve, em primeiro lugar, partir da
consciência da época em que vivemos, isto significa saber o que o mundo é e
como ele se define e funciona, de modo a reconhecer o lugar de cada país no
conjunto do planeta e o de cada pessoa no conjunto da sociedade humana”,
entendemos ser de fundamental importância para este nosso estudo ter
conhecimento sobre a distribuição dos jovens, público-alvo da Oficina Virtual de
Redação Palavra Escrita, pelo mundo, Brasil e São Paulo, local em que
desenvolvemos nossa pesquisa.
Para tanto, acatando sugestão de Santos (1998), dividiremos a nossa
análise em três níveis:
37
1º - nível mundial: a distribuição dos jovens pelo mundo;
2º - nível nacional: a concentração dos jovens brasileiros dentro do próprio
território;
3º - níveis regional e local: a concentração dos jovens no Estado e Cidade
de São Paulo, local em que desenvolvemos nossa pesquisa.
Nível mundial
De acordo com o Fundo das Populações nas Nações Unidas, no ano 2004,
a estimativa da população juvenil (de 15 a 24 anos) era de 1,1 bilhão de pessoas,
quase 20% da população mundial.
Todavia, a sua distribuição pelo mundo não se dá de forma homogênea.
Para se ter uma idéia, em 1999, dez países concentravam mais de 50% da
população juvenil mundial:
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19.5)
Fonte: ONU e OIT, 1999
Figura 22
Nível nacional
Assim se encontra concentrada a população juvenil pelo território nacional:
38
Índice de Concentração de Jovens
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 23
A população juvenil está concentrada no complexo regional Centro-Sul do
Brasil, área de maior desenvolvimento econômico e mais populosa do país, e sua
participação se reduz à medida que se afasta dessa área, notadamente em
direção à Amazônia, área de ocupação recente e menor concentração
populacional.
Podemos comparar essa distribuição com a da população brasileira pelo
território nacional:
39
Fonte: IBGE 2000
Figura 24
Como percebemos, há uma relação direta entre a distribuição da
população juvenil e a distribuição da população total do Brasil pelo território
nacional, ou seja, nas áreas de maior densidade demográfica ocorre maior
concentração de jovens.
Observemos o quadro de exclusão social brasileiro e os índices que,
segundo Pochmann (2004), o compõem: escolaridade, alfabetização, pobreza,
desigualdade social, emprego formal, violência, dos quais os jovens são parte
integrante:
40
Índice de Exclusão Social
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 25
Índice de Escolaridade
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 26
41
Índice de Alfabetização
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 27
Índice de Pobreza
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 28
42
Índice de Desigualdade Social
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 29
Índice de Emprego Formal
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 30
43
Índice de Violência
Fonte: Atlas da Exclusão Social no Brasil. Dados 2000
Figura 31
Com exceção do índice de violência, que tem uma maior difusão pelo
território nacional e afeta tanto as áreas mais desenvolvidas quanto as menos
desenvolvidas do país, observa-se que os maiores índices de exclusão social
concentram-se no Nordeste e na Amazônia.
Ao longo do território do quinto maior país do mundo, há alguns
“acampamentos” de inclusão social em meio a uma ampla “selva” de
exclusão, que se estende por praticamente todo o espaço brasileiro.
Além disso, a exclusão social parece ser especialmente clara em
determinadas áreas geográficas. Por exemplo, observa-se que ela
ocorre de forma mais acentuada nas regiões geográficas localizadas
acima do Trópico de Capricórnio, compreendendo o Norte e o
Nordeste. Aí também são registrados alguns “acampamentos” de
inclusão social, todavia sem menor qualidade (Pochamann, 2004,p.21).
O Brasil ocupava, segundo o IBGE, em 2000, ano do último censo
demográfico brasileiro, cuja periodicidade é de dez em dez anos, o quinto lugar no
44
ranking da população mundial juvenil (de 15 a 24 anos), com cerca de 30,8
milhões de jovens (em 2003, estimava-se, 33,8 mi) quase 20% do total de sua
população (em 2003, estimava-se, 19,5%), 80% no meio urbano e 20% no meio
rural, assim distribuídos:
- 5,5 % na região Norte
- 31,1% na região Nordeste
- 42,3% na região Sudeste
- 13,9% na região Sul
- 7,2 % na região Centro-Oeste
Nor te
Nordeste
Sudeste
Sul
Centro Oeste
Figura 32
Figura 33
45
Desses 30,8 milhões de jovens brasileiros, apenas 32% tinham acesso ao
2º grau, diferentemente de países como Japão e Finlândia, cujos índices eram de
99%, e Itália e Estados Unidos, cujos índices eram de 74%. E entre 20 e 24 anos,
apenas 13% dos jovens brasileiros encontravam-se na universidade.
Pochmann (2000) ressalta três aspectos importantes relacionados à
população juvenil brasileira:
1º- em 1996, 49,8% dos jovens brasileiros eram brancos e 47,6% eram
negros e pardos (em 2003, 53,3% brancos e 46,1% negros e pardos); do total de
alunos de origem pobre, 69% eram negros e pardos; no ensino superior, mais de
82% do total de estudantes eram brancos.
2º- nas últimas décadas, o movimento migratório nacional ocorreu
motivado pelos jovens, na maioria das vezes das regiões Norte e Nordeste;
3º- a mortalidade entre os jovens brasileiros está associada à violência
(homicídio, suicídio, trabalho do menor, prostituição infantil, narcotráfico, crime
organizado, analfabetismo), AIDS (segundo relatório da ONU, os jovens são mais
atingidos pela pandemia de HIV/Aids) e acidentes de trânsito.
Níveis regional e local
A Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) realizou um
estudo sobre a Vulnerabilidade Juvenil (IVJ) e seus Componentes nos Distritos do
Município de São Paulo:
O índice de vulnerabilidade juvenil (IVJ) considerou em sua composição os
níveis de crescimento populacional e a presença de jovens entre a população
distrital, freqüência à escola, gravidez e violência entre os jovens e adolescentes
residentes no local. Este indicador varia em uma escala de 0 a 100 pontos, em
que o zero representa o distrito com menor vulnerabilidade e 100 o de maior.
As variáveis selecionadas para compor o índice são:
taxa anual de crescimento populacional entre 1991 e 2000;
46
percentual de jovens, de 15 a 19 anos, no total da população dos
distritos;
taxa de mortalidade por homicídio da população masculina de 15 a 19
anos;
percentual de mães adolescentes, de 14 a 17 Anos, no total de
nascidos vivos;
valor do rendimento nominal médio mensal, das pessoas com
rendimento, responsáveis pelos domicílios particulares permanentes;
percentual de jovens de 15 a 17 anos que não freqüentam a escola.
A partir desta escala de pontos, foram gerados cinco grupos de
vulnerabilidade juvenil:
Grupo 1: até 21 pontos - engloba os nove distritos menos vulneráveis
do município de São Paulo: Jardim Paulista, Moema, Alto de Pinheiros,
Itaim Bibi, Pinheiros, Consolação, Vila Mariana, Perdizes e Santo
Amaro;
Grupo 2: de 22 a 38 pontos - engloba os 21 distritos que se
classificam em segundo lugar entre os menos vulneráveis: Lapa,
Campo Belo, Mooca, Tatuapé, Saúde, Santa Cecília, Santana, Butantã,
Morumbi, Liberdade, Bela Vista, Cambuci, Belém, Água Rasa, Vila
Leopoldina, Tucuruvi, Vila Guilherme, Campo Grande, Pari, Carrão e
Barra Funda;
Grupo 3: de 39 a 52 pontos – engloba os 25 distritos que se
posicionam em uma escala intermediária de vulnerabilidade: República,
Penha, Mandaqui, Cursino, Socorro, Ipiranga, Casa Verde, Vila Matilde,
Vila Formosa, Jaguaré, Brás, Vila Prudente, Vila Sônia, Freguesia do Ó,
Bom Retiro, São Lucas, Limão, São Domingos, Jaguaré, Rio Pequeno,
Pirituba, Aricanduva, Sé, Artur Alvim e Ponte Rasa;
Grupo 4: de 53 a 65 pontos - engloba os 22 distritos que se
classificam em segundo lugar entre os mais vulneráveis: Sacomã,
47
Jabaquara, Vila Medeiros, Cangaíba, Cidade Líder, Vila Andrade, Vila
Maria, Tremembé, Ermelino Matarazzo, São Miguel Paulista, José
Bonifácio, Jaçanã, Itaquera, Raposo Tavares, Campo Limpo, São
Mateus, Parque do Carmo, Vila Jacuí, Perus, Cidade Dutra, Jardim São
Luís e Jaraguá;
Grupo 5: mais de 65 pontos - engloba os 19 distritos com maior
vulnerabilidade juvenil do município de São Paulo: Cachoeirinha, Vila
Curuçá, Guaianases, Sapopemba, Capão Redondo, Lajeado,
Anhangüera, São Rafael, Jardim Helena, Cidade Ademar, Brasilândia,
Itaim Paulista, Pedreira, Parelheiros, Jardim Ângela, Grajaú, Cidade
Tiradentes, Iguatemi e Marsilac.
Os Mapas abaixo apresentam o Índice de Desenvolvimento Humano,
Exclusão/Inclusão Social e a distribuição espacial dos grupos de Vulnerabilidade
Juvenil, no município de São Paulo:
Índice de Desenvolvimento Humano Exclusão/Inclusão Social
48
Fonte: SDTS/PMSP (IDH), Fundação SEADE (IVJ) e Sposati (2000) (Mapa da Exclusão).
Figura 34
Grupos de Vulnerabilidade Juvenil
Distritos do Município de São Paulo
Fonte: Fundação SEADE
Figura 35
Observação: Todos os dados disponíveis são referentes a 2000, com exceção da
taxa de mortalidade por homicídio entre a população masculina de 15 a 19 anos,
em que foram utilizados os dados de 1999, 2000 e 2001, e do percentual de
jovens de 15 a 17 anos que não freqüentam escola, cujas informações referem-se
a 1996. As fontes de dados utilizadas foram o Censo Demográfico de 2000, ano
do último censo demográfico brasileiro realizado pelo IBGE, cuja periodicidade é
de dez em dez anos, a Contagem da População de 1996, também da Fundação
IBGE e o Sistema de Estatísticas Vitais, da Fundação SEADE.
Os dados sinalizam que a maior sujeição do jovem à vulnerabilidade está
na sua condição de adolescente amplamente potencializada pela sua situação de
49
pobreza. Se, por um lado, tem acesso ao desejo de consumo, por outro, a ele são
negadas as possibilidades, enquanto ainda se encontra na juventude, de alcançá-
lo.
A Inclusão Digital (ID), nesse contexto, pode representar
um canal privilegiado para equalização de oportunidade da nossa
desigual sociedade em plena era do conhecimento. Ela é cada vez
mais parceira da cidadania e da inclusão social, do apertar do voto das
urnas eletrônicas aos cartões eletrônicos do Bolsa-Escola, passando
pelo contato inicial do jovem ao computador como passaporte ao
primeiro emprego (Neri, 2003, www2.fgv.br/ibre/cps/mapa_exclusao/
apresentacao/ apresentacao. htm, acesso em agosto de 2004).
A Oficina Virtual de Redação por nós desenvolvida pode e anseia integrar-
se a projetos de inclusão digital que atendam jovens de comunidades de baixa
renda, a fim de oferecer-lhes oportunidade de diminuir suas dificuldades com a
escrita. Mas não só, porque esta se pretende mais que um aprimoramento de
escrita, entre outras coisas, a criação de um canal de comunicação em que as
vozes dos Fabianos, Macabéas e Severinos
1
brasileiros possam ser ouvidas,
experiências trocadas, pontos de vista discutidos, de forma, quem sabe, a ajudar
na tão sonhada e necessária mudança estrutural da nossa sociedade.
2.3 Novas demandas educacionais e o Ensino a Distância
O Ensino a Distância surge justamente, segundo Belloni (2003), para
atender, no contexto das sociedades contemporâneas, às novas demandas
educacionais, decorrentes das mudanças na nova ordem econômica mundial, que
abarcam uma população-alvo, considerada mais como usuário autônomo do que
como aluno (Trindade, 1991).
1
Referência a personagens principais dos romances brasileiros modernistas “Vidas Secas’, de
Graciliano Ramos, “A Hora da Estrela”, de Clarice Lispector e “Morte e Vida Severina’, de João
Cabral de Melo Neto, respectivamente.
50
Qual o perfil dos que usam ou desfrutam do Ensino a Distância? Alguém
que, como qualquer indivíduo que queira sobreviver à sociedade e integrar-se ao
mercado de trabalho do século XXI, seja capaz de organizar seu próprio trabalho,
resolver problemas, adaptar-se e flexibilizar-se diante de novas tarefas e assumir
responsabilidades (Belloni, 2003).
Considerando o conhecimento como processo e não como mercadoria
(Paul, 1990), numa aprendizagem que exija autonomia, como é o caso do Ensino
a Distância, o estudante não pode ser visto como objeto ou produto –
implicitamente o professor como trabalhador e a tecnologia educacional como
ferramenta (Renner, 1995) – mas sim, como um sujeito ativo que realiza sua
própria aprendizagem. (Belloni, 2003). Isso implica, para além da assimilação /
regurgitação de conhecimentos pontuais sem sentido, que o aprendente deve ser
capaz de abstrair os conhecimentos e aplicá-los em situações novas (Renner,
1995).
O processo de ensino-aprendizagem a distância requer que as reais
necessidades dos alunos sirvam de medida à adoção de métodos e estratégias
de ensino e, consequentemente, possam vir a determinar possíveis adaptações
nos programas e atividades previstas visando à criação de condições, as mais
favoráveis, para a construção do conhecimento.
2.4 Abordagem Broadcast, Virtualização da Escola Tradicional e Estar
Junto Virtual
Há, reconhecidamente, segundo Valente (2004), três abordagens de
Ensino a Distância por meio do computador: “Abordagem Broadcast”,
“Virtualização da Escola Tradicional” e “Estar Junto Virtual”.
A “Abordagem Broadcast” baseia-se na idéia dos tutoriais computacionais
ou nos livros de instrução programada. O professor do curso organiza a
informação de acordo com uma seqüência que ele entende ser a mais adequada
e essa informação é enviada ao aluno, utilizando-se dos meios tecnológicos, via
51
Internet, por exemplo, como já aconteceu com o material impresso, o rádio e a
televisão (Valente, 2004,
www.proinfo.gov.br, p.2, acesso em agosto de 2004).
A figura abaixo ilustra essa abordagem de EAD:
Fonte: www.proinfo.gov.br (acesso em outubro de 2004)
Figura 36
Na “Virtualização da Escola Tradicional” o processo educacional é centrado
no professor, que detém a informação e passa-a para o aprendiz.(...) A interação
professor-aluno resume-se em verificar se o aprendiz memorizou a informação
fornecida ou requer uma aplicação direta da informação, fornecida em um
domínio muito restrito (Valente, 2004,
www.proinfo.gov.br, p.3, acesso em agosto
de 2004).
A figura abaixo ilustra essa abordagem de EAD:
Fonte: www.proinfo.gov.br (acesso em outubro de 2004)
Figura 37
Utilizada em pelo menos três centros de referência, Laboratório de Estudos
Cognitivos (LEC), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS);
52
Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED) da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP); e no Programa de Pós-Graduação em Educação:
Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a
abordagem “Estar Junto Virtual”, segundo Valente (2004), tem causado profundas
mudanças no processo educacional :
Essa abordagem implementa uma solução educacional de alta
qualidade, permitindo a preparação de cidadãos aptos a participarem
da sociedade do conhecimento. Ela nos permite entender como
propiciar as condições para o aprendiz construir conhecimento,
contextualizado na sua realidade e de maneira contínua, como se
espera que aconteça em uma sociedade na qual aprender e gerar
conhecimento serão o grande mote (Valente,2004,
www.proinfo.gov.br,
p.5, acesso em agosto de 2004).
De que forma busca criar condições capazes de promover
satisfatoriamente a construção do conhecimento?
- turmas com no máximo vinte alunos;
- formação de uma equipe que auxilia o professor;
- monitoramento de atividades;
- desenvolvimento de material de apoio.
Para Valente (2004), essas experiências são ótimas oportunidades de
aprendizagem para todos os envolvidos:
Do ponto de vista das universidades, têm permitido a criação de novas
metodologias de formação, usando os recursos da rede Internet; o
desenvolvimento de ferramentas tecnológicas para facilitar a interação
entre os participantes do processo de formação; e a elaboração de
material de suporte às atividades de formação que são realizadas.
(Valente, 2004,
www.proinfo.gov.br, p.6, acesso em agosto de 2004).
A figura abaixo ilustra essa abordagem de EAD:
53
Fonte: www.proinfo.gov.br (acesso em outubro de 2004)
Figura 38
2.5 A utilização da abordagem “Estar junto virtual”
O Projeto TelEduc, do Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED)
da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), iniciado em 1997,
atualmente com cerca de três mil instituições usuárias cadastradas e cerca de
dois mil acessos semanais a sua página de projeto (Rocha, 2003), foi
impulsionado em decorrência da necessidade de capacitação de professores em
seu contexto escolar de trabalho, o que só poderia se realizar a distância.
A arquitetura básica do ambiente TelEduc assim se configura:
Ferramentas de coordenação
Ferramentas de comunicação
Ferramentas de administração
54
Fonte: Educação online. Rocha, Edições Loyola, 2003.
Figura 35
Trata-se de um suporte educacional cujas funcionalidades se dividem em
três grupos: ferramentas de coordenação, de administração e de comunicação.
Como ferramentas de coordenação, entenda-se todas as ferramentas
que de alguma forma organizam e subsidiam as ações de um curso.
No grupo de ferramentas de administração situam-se aquelas
ferramentas de apoio ao formador no gerenciamento do curso.(...) O
conjunto de ferramentas de comunicação engloba: correio eletrônico,
fóruns de discussão, mural, portfólio, diário de bordo e bate-papo
(Rocha, 2003, p.379)
Alguns outros aspectos teriam, segundo Rocha (2003), subsidiado o
desenvolvimento do TelEduc: reflexão constante ao longo do processo de
oferecimento de um curso, a partir do registro de todos os passos dados;
oferecimento de atividades que permitissem a construção do conhecimento a
partir da resolução de problemas; flexibilidade da utilização das ferramentas de
acordo com a intenção do usuário.
Agora, no que se refere à interação didática entre as pessoas envolvidas
no processo de formação, três outros aspectos, levantados a partir do
acompanhamento de cursos de formação usando o TelEduc, passaram a ser
considerados de suma importância: o objeto a ser conhecido (o conteúdo do
curso, propriamente), os meios e materiais que são utilizados (o ambiente de
suporte, bem como os materiais de apoio disponibilizados no curso; os modos de
interação e, conseqüentemente, os modos de mediação envolvidos na elaboração
de conhecimento (Rocha, 2003).
A cooperação entre os aprendizes em decorrência do “Estar Junto”,
segundo Okada (2003), da PUC-SP, pode ser estimulada pelas mais diversas
interfaces do ambiente educacional a distância, a saber: listas de discussão,
fóruns de debates, chats e portfólios individuais e coletivos.
Palloff e Pratt (1999) indicam algumas dinâmicas capazes de promover o
aprendizado colaborativo:
55
- formulação de um objetivo comum para aprendizagem;
- estímulo à busca de exemplos da vida real;
- estímulo a questionamentos inteligentes;
- divisão de responsabilidades;
- estímulo à avaliação;
- compartilhamento de recursos;
- estímulo à escrita coletiva.
Segundo Mason (1998), os ambientes virtuais de aprendizagem podem ser
classificados em três tipos:
-
ambiente instrucionista: centrado no conteúdo e no suporte, cujo
objetivo é transmitir informação, com uma pequena interação entre os
participantes;
-
ambiente interativo: centrado na interação online, cujo objetivo é
atender as expectativas dos participantes, em que o trabalho do
professor é intenso;
-
ambiente cooperativo: centrado no trabalho colaborativo, cujo objetivo é
o da construção de conhecimento, da descoberta de desafios e
soluções, com muita interação entre os participantes e professor.
Para Britain e Líber (1999) (apud Okada, 2003), ambientes
virtuais colaborativos de aprendizagem devem contemplar seis aspectos:
Fonte: Educação online. Okada, Edições Loyola, 2003.
Figura 36
56
1. Adaptação da estrutura do ambiente de acordo com o contexto,
necessidade dos alunos e objetivos do curso.
2. Auto-organização das informações, experiências individuais e do
grupo, independentemente do professor.
3. Coordenação do aprendizado por meio de atividades que requerem o
uso de agenda e calendário.
4. Monitoramento do aprendizado do aluno feito pelo professor.
5. Negociação das atividades a serem realizadas, dos prazos de entrega.
6. Autonomia do estudante na construção do próprio aprendizado e
contribuição para o grupo.
O que se almeja na verdade com a criação de alguns modelos de
ambientes virtuais é uma operacionalização dos trabalhos de forma construtiva,
criativa e reflexiva, na tentativa de se romper com um ensino mecanicista,
centralizador e descontextualizado que restringe a atuação do aluno a um
reviramento automático de páginas e mais páginas eletrônicas, a atividades
maquinais, como se o simples acesso a elas por si só fosse capaz de lhe garantir
a construção do conhecimento (Moraes, 2002).
Uma construção do conhecimento que, se nos permitirmos extrapolar os
limites da educação, com o uso a nosso favor dessas ferramentas digitais,
tornasse possível o desenvolvimento de uma inteligência virtual coletiva assim
como um posicionamento diferente do homem diante do mundo e da vida
(Moraes, 2002).
O Laboratório de Estudos Cognitivos ( LEC), da UFRGS, na página
principal do seu site, assim abre seu breve histórico :
Iniciou em 1973 como um Grupo de Estudos Cognitivos, no
Departamento de Psicologia. Desde 1982, restruturado como
Laboratório, realiza em Escolas da rede pública , e em laboratórios de
informática, estudos e pesquisas sobre o desenvolvimento cognitivo da
criança, na orientação da psicologia piagetiana. Estes estudos mantêm
um caráter inovador, conduzindo a realização de projetos
experimentais na área de Informática Educativa (
www.ead.furg.br,
acesso em julho de 2005).
57
Desperta a nossa atenção um dos seus projetos, o AMADIS –ambiente de
aprendizagem a distância:
O AMADIS é um ambiente onde o usuário encontra
um espaço para o desenvolvimento de projetos de aprendizagem,
publicação de suas próprias produções e de comunicação com seus
pares. Tenta-se quebrar a hierarquia entre professor- aluno, dentro da
perspectiva de que todos tenham algo a contribuir para as
comunidades virtuais onde se inserem. Assim, a aprendizagem não
ocorre apenas por meio do ensino escolarizado, mas, principalmente,
pelas pessoas cooperando em projetos de pesquisa (
www.ead.furg.br,
acesso em julho de 2005).
Sua proposta se avizinha do trabalho que originou a Oficina Virtual de
Redação Palavra Escrita – objeto de análise de nossa pesquisa - “O aluno como
autor e revisor do próprio texto”, uma atividade de produção de textos
desenvolvida em salas de aula do ensino médio, cujo intuito era fazer com que os
alunos, além de autores, desenvolvessem também a função de revisores dos
textos por eles produzidos. Uma vez assimilados todos os critérios pelos quais
suas redações eram inquiridas, se tornariam capazes de, no momento da
produção textual, detectar deficiências e empregar meios para que a sua escrita
chegasse a um patamar no mínimo satisfatório.
A idéia era de algo em construção, que não estava pronto, mas que se
comporia em conjunto. Tratava-se de troca de experiência em que estimulávamos
nossos jovens a vencer o medo de ser criticado, de ser avaliado, de ser lido por
pessoas desconhecidas, desafio este que secundarizou problemas como falta de
idéias, de tempo, de afinidade com a escrita, entre outros.
Foi justamente a partir dessa proposta já testada com sucesso no ensino
presencial, que vislumbramos uma nova possibilidade de ensino de Redação, por
58
meio do computador, o que implicou mudanças significativas de procedimentos,
por nós aqui investigados.
Estudos e pesquisas de centros de referência que adotaram o Estar Junto
Virtual - Laboratório de Estudos Cognitivos (LEC), da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS); Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED) da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); e o Programa de Pós-
Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC-SP) – contribuíram, sobremaneira, na concepção da Oficina Virtual
de Redação Palavra Escrita e podem ser pontualmente percebidos:
¾ organização e estudo do conteúdo do material da oficina (propostas de
redação e respectivas orientações, material de apoio e elaboração de
atividades);
¾ divisão de tarefas em grupos (administração, coordenação,
comunicação);
¾ criação de grupos de discussão, chat e blog;
¾ preocupação com a criação de um ambiente cooperativo (e não apenas
instrucionista e interativo);
¾ preocupação com a navegação no site e visível compreensão dos
objetivos da oficina;
¾ estabelecimento de prazos (produção de texto semanal e reescrita);
¾ valorização da opinião do aluno em relação ao tema da redação e a sua
performance nessa discussão;
¾ registro de todos os passos dados.
Neste capítulo, tivemos uma noção mais abrangente da distribuição do
jovem pelo mundo, Brasil e São Paulo, do seu acesso à informatização e ao
mercado de trabalho. Tratamos das novas demandas educacionais e, porque
nelas o Ensino a Distância se insere, delineamos algumas abordagens de Ensino
a Distância por meio do computador, dinâmicas capazes de promover o
aprendizado colaborativo e ambientes virtuais de aprendizagem.
59
No próximo capítulo, focalizando o aluno, trataremos de dois fatores
indispensáveis à aprendizagem a distância, autonomia e interação, e de que
forma nossa Oficina Virtual de Redação seria capaz de promovê-las.
Prosseguiremos com a descrição do contexto da pesquisa, apresentação da
Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita, e indicação da escolha e
procedimentos metodológicos.
60
Capítulo 3 – Metodologia de pesquisa
61
Neste terceiro capítulo, tratamos de dois fatores imprescindíveis para que
os alunos construam conhecimento a distância, autonomia e interação, e de que
modo uma Oficina Virtual de Redação, por meio da observação minuciosa e
atenta das redações por eles elaboradas e condução de atividades, as
diligenciaria para que se realizassem. Também descrevemos o contexto da
pesquisa, apresentamos a Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita, construída
sob o amparo dos fundamentos teóricos apresentados nos capítulos 1, 2, 3 e 4,
tecemos considerações sobre a escolha da metodologia e elencamos os
procedimentos metodológicos.
3.1 Em busca da construção do conhecimento: Autonomia e Interação
Segundo Valente (2004), “conhecimento é o que cada indivíduo constrói
como produto do processamento, da interpretação, compreensão da informação,
enquanto que informação são os fatos, dados passados e trocados”, do que
depreende-se que abundância de informação não significa pessoas com mais
conhecimento.
O propósito da Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita - de munir os
alunos de ferramentas que lhes permitam discutir temas da pauta dos vestibulares
mais respeitados do país e compreender os mecanismos implícitos na construção
de um texto escrito - depende, obrigatoriamente, para ser atingido - dispondo de
novas ferramentas tecnológicas a apoiar professor e aluno - de dois fatores:
interação e autonomia.
Inferimos autonomia como faculdade de se reger por si próprio, condição
de liberdade a ser alcançada pelo aluno com relação ao professor. E, em
concordância com Belloni (2001), entendemos interação como uma ação
recíproca entre dois ou mais atores onde ocorre intersubjetividade, isto é,
encontro de dois sujeitos – que pode ser direta ou indireta (mediatizada por algum
veículo técnico de comunicação), diferente de interatividade, uma característica
técnica que significa a possibilidade de o usuário interagir com uma máquina.
62
O estímulo à autonomia do aluno na Oficina Virtual de Redação Palavra
Escrita reside no fato dele poder fazer escolhas, experimentar alternativas e
percursos diferentes para a solução de um problema, de modo a, por meio do
acesso à orientação das propostas de redação, textos modelos, artigos
comprometidos com o assunto abordado e informações sobre a faculdade que
elaborou tal prova, aprimorar seu texto.
No que se refere à interação, contemplamos os estudos de Moore (1993)
que apontam três tipos: interação aluno-conteúdo, interação aluno-professor e
interação aluno-aluno, e os projetamos na Oficina Virtual de Redação Palavra
Escrita da seguinte forma: primeiramente, por meio da revisão do texto do aluno,
das ocorrências nele assinaladas e comentadas e no bilhete que a encerra;
depois, na continuidade do diálogo por meio do fornecimento de material de
apoio, da troca de e-mails, mensagens via blog, participação nos fóruns de
discussão e conversas via chat.
Essa nossa preocupação com a criação de metodologias que garantam a
eficácia da comunicação por meio do computador é, segundo Marquesi (2001),
uma das exigências do ensino via internet, que deve envolver, motivar, levar o
aluno ao aprendizado.
Para tanto, no seu entendimento, dois aspectos devem ser privilegiados na
etapa que antecede o diálogo entre professor e aluno, a subjetividade na
linguagem e a interação.
A autora justifica a importância da subjetividade na linguagem pela
capacidade de o enunciador se propor como sujeito de seu enunciado. Quanto à
interação, seu sucesso dependerá da habilidade do professor em conduzir as
atividades, o que nos remete a Coulthard (1977), que concebe toda interação em
quatro movimentos:
- de estruturação: envolve a criação de um contexto propício à discussão
de um assunto;
- de solicitação e de resposta: em que os participantes devem se posicionar
quando solicitados e responder às questões levantadas
- de reação: gerado por qualquer um dos movimentos acima.
63
Dois princípios educacionais são ainda, por Marquesi (2001), considerados
fundamentais: um em que o aluno deve ser encorajado a participar e extrair de
seu próprio conhecimento e experiência o máximo possível; outro em que o
professor deve estar mais preocupado com o estímulo ao pensamento do que
com a retirada de informações verdadeiras.
Tal estímulo pode advir, por exemplo, de debates eletrônicos que, segundo
a avaliação de Chrysos (2004), permitiriam um maior contato entre aluno-material,
aluno-professor e aluno-aluno.
Essa proximidade, para Teixeira e Menezes (2004), pode minimizar o
sentimento de isolamento, próprio do ensino a distância, e, segundo Leffa (2004),
proporcionar aprendizagem em todos os níveis, incluindo os domínios cognitivo,
psicomotor e afetivo.
3.2 Contexto da pesquisa
Este trabalho insere-se no universo dos estudos de Língua Portuguesa e
Ensino a Distância (EaD) e consiste na construção e estudo de uma Oficina
Virtual de Redação, tendo-se em vista de que forma esta pode contribuir para o
aprimoramento da escrita de seus alunos.
Nosso objetivo, a partir de um projeto pedagógico testado em
circunstâncias reais, é oferecer espaço de reflexão e criação a fim de que os
alunos consigam escrever, com competência e adequação, textos necessários às
diversas situações concretas de comunicação, para bem desempenhar suas
funções de cidadãos e de trabalhadores brasileiros.
Para que se possa compreender o contexto sob investigação, a seguir
apresentamos a Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita. Construída sob as
bases dos fundamentos teóricos apresentados nos capítulos 1, 2 , 3 e 4, é
composta pelas seguintes partes:
¾ Apresentação da oficina
¾ Somos Quem?
¾ Finalidade
64
¾ Deite e Role
¾ Proposta de Redação
¾ Orientação
¾ Material de apoio
¾ Exemplo de um texto revisado, comentado e pontuado
¾ Exemplos de outros textos
¾ Atividades
¾ Informações sobre o vestibular da universidade
almejada
¾ Propostas de Redação
¾ Inscrição
A) Apresentação da oficina
Inicialmente, na página principal do site, dizemos a que viemos,
contextualizando a criação da oficina e expondo os objetivos deste nosso
trabalho.
É com muito prazer que Palavra Escrita oferece a você a oportunidade de
aprimorar a sua escrita. Ler. Interpretar. Compreender. Escrever. Se admitimos o
bombardeio de informação deste nosso tempo, o poder de manipulação dos
meios de comunicação a que estamos expostos constantemente e que tomar
65
conhecimento e articular o pensamento sobre os mais diferentes assuntos é
imprescindível hoje a qualquer pessoa, independentemente do lugar em que
esteja, idade e profissão, eis a proposta do Palavra Escrita: munir nossos alunos
de ferramentas que lhes permitam discutir temas da pauta dos vestibulares mais
respeitados do país e compreender os mecanismos implícitos na construção de
um texto escrito.
B) Somos quem?
Apresentamo-nos, assim como a origem do trabalho: uma proposta de
produção de texto desenvolvida - a partir da experiência como corretora do
vestibular da Unicamp - durante onze anos em salas de aula do ensino médio de
algumas escolas particulares da cidade de São Paulo, intitulada
“O aluno como autor e revisor do próprio texto”, e a intenção de ampliá-la,
estendê-la a alunos de outros lugares e realidades além de São Paulo.
Professores da Língua Portuguesa, sob a orientação da
Profª Gisa Gasparotto ,
cujo trabalho enveredou pelos caminhos da leitura e produção de texto. Depois de
quatorze anos de envolvimento direto com esta prática, corrigindo vestibulares,
66
ministrando aulas de Redação no ensino médio e cursos pré-vestibular,
resolvemos, agora em 2004, ampliar nosso trabalho, estendê-lo a alunos de
outros lugares e realidades além de São Paulo.
De que forma? Por meio do uso das tecnologias de informação disponíveis, em
particular a rede mundial de computadores, com a qual todos nós, homens e
mulheres, vamos nos familiarizando e que pode nos auxiliar no aprimoramento da
nossa capacidade de ler, interpretar, compreender e produzir textos.
B.1) Profª Gisa Gasparotto
Formada em Letras e Artes Cênicas pela Unicamp, desde 1992 vem aplicando
em sala de aula, com alunos do ensino médio, uma proposta de produção de
texto por ela intitulada “O aluno como autor e revisor do próprio texto”.
Atualmente, além de Professora do Colégio São Luiz e Colégio Pentágono, é
mestranda em Língua Portuguesa - Leitura e Redação – da Pontifícia
Universidade Católica (PUC-SP), sob a orientação do Prof. Dr. Luiz Antonio
Ferreira. Sua dissertação de mestrado, “Oficina Virtual de Redação: a produção
de textos em ambiente não escolar”, financiada pela Capes e concretizada neste
site, nada mais é que a extensão de uma atividade redacional em ambiente
presencial que, respeitando as diferenças próprias de cada ambiente, arrisca-se
agora no não-presencial.
B.2) “O aluno como autor e revisor do próprio texto”
Trabalho de produção de textos desenvolvido em sala de aula, cujo intuito é o de
fazer com que nossos alunos, além de autores, desenvolvam também a função de
revisores dos textos por eles produzidos. Uma vez assimilados todos os critérios
pelos quais suas redações são inquiridas, se tornariam capazes de, no momento
da elaboração das próprias, detectar deficiências e empregar meios para se
chegar a um patamar de escrita satisfatório.
Apresentações já realizadas:
67
1998 – 7º Congresso de Educação para o Desenvolvimento, promovido pelo
Grupo Associação de Escolas Particulares de São Paulo.
2000 e 2001 – Cursinho da Poli Faz Escola.
2004 – I Colóquio de Letras do Instituto Superior de Cotia e 18ª Semana UNIP de
Letras, Campus Vergueiro.
C) Finalidade
Esclarecemos que se trata de um espaço destinado à produção de textos
das provas de redação dos principais vestibulares do Estado de São Paulo.
A idéia é que você possa produzir textos, segundo o assunto ou universidade que
lhe interessa. Para tanto, dispomos inicialmente de 68 propostas de redação: 41
dos últimos vestibulares das principais universidades do Estado de São Paulo e
27 elaboradas por nossa equipe, envolvendo questões que estiveram na ordem
do dia neste ano de 2005 e que poderão ser matéria das provas de 2006.
68
Quer ter uma noção do que estamos lhe oferecendo?
Clique em Deite e Role
D) Deite e Role
Apresentamos um exemplo do trabalho por nós desenvolvido, que assim se
configura:
Proposta de redação
Orientação
Material de apoio ( 1 ) ( 2 )
Exemplo de um texto revisado, comentado e pontuado
Exemplos de outros textos: acima da média
Atividade ( 1 ) ( 2 )
Informações sobre a universidade almejada
D.1) Proposta de redação
Escolhemos uma proposta de redação da Fuvest por se tratar do vestibular
mais disputado no nosso país.
69
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO
Instituição: Fuvest Ano: 2003
Modalidade: Dissertação
Leia atentamente os três textos abaixo.
Texto I
Está no dicionário Houaiss:
auto-estima: s. f. qualidade de quem se valoriza, se contenta com seu modo de
ser e demonstra, conseqüentemente, confiança em seus atos e julgamentos.
A definição do dicionário parece limitar-se ao âmbito do indivíduo, mas a palavra
auto-estima já há algum tempo é associada a uma necessidade coletiva. Por
exemplo: nós brasileiros precisamos fortalecer nossa auto-estima. Neste caso, a
satisfação com nosso modo de ser, como povo, nos levaria à confiança em
nossos atos e julgamentos. Mas talvez seja o caso de perguntar: não são os
nossos atos e julgamentos que acabam por fortalecer ou enfraquecer nossa auto-
estima, como indivíduos ou como povo?
Texto II
Estão num poema de Drummond, da década de vinte, os versos:
E a gente viajando na pátria sente saudades da pátria.
(…)
Aqui ao menos a gente sabe que é tudo uma canalha só.
Texto III
Está num artigo do jornalista Zuenir Ventura, de dois anos atrás:
De um país em crise e cheio de mazelas, onde, segundo o IBGE, quase um
quarto da população ganha R$ 4,00 por dia, o que se esperaria? Que fosse a
morada de um povo infeliz, cético e pessimista, não?
Não. Por incrível que pareça, não. Os brasileiros não só consideram seu país um
lugar bom e ótimo para viver, como estão otimistas em relação a seu futuro e
acreditam que ele se transformará numa superpotência econômica em cinco
70
anos. Pelo menos essa é a conclusão de um levantamento sobre a “utopia
brasileira” realizado pelo Datafolha.
Com apoio dos três textos apresentados, escreva uma dissertação em
prosa, na qual você deverá discutir manifestações concretas de afirmação
ou negação da auto-estima entre brasileiros.
Apresente argumentos que dêem sustentação ao ponto de vista que você
adotou.
D.2) Orientação
Analisamos a proposta de redação na tentativa de esclarecer ao aluno qual
era a expectativa da banca examinadora ao elaborá-la.
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br ORIENTAÇÃO
Instituição: Fuvest Ano: 2003
Tema:
Manifestações concretas de afirmação ou negação
da auto-estima entre brasileiros.
Modalidade: Dissertação
Ao solicitar aos seus candidatos que discutissem manifestações concretas
de afirmação ou negação da auto-estima entre brasileiros, a Fuvest trouxe na sua
coletânea três fragmentos:
- o primeiro a define (dicionário Houaiss) ;
- o segundo, do poeta Drummond, fala sobre a saudade que se sente da pátria
quando se está distante, embora ao nela nos encontrarmos saibamos que é “tudo
uma canalha só”;
- o terceiro, sobre a “utopia brasileira”: apesar de todas as mais variadas
pobrezas, nosso povo gosta de aqui viver e é otimista em relação ao futuro.
A partir da leitura e interpretação desses fragmentos, o aluno deveria se
posicionar em relação ao assunto que os envolve e ser capaz de sustentar seu
ponto de vista, tanto no caso da afirmação como no da negação da auto-estima.
71
D.3) Material de apoio
Engloba artigos de jornais e revistas, sugestões de leituras, filmes e
músicas, entre outros, de suma importância nesse nosso trabalho, por oferecer ao
aluno subsídios que o auxiliem na sustentação de uma opinião sobre quaisquer
assuntos.
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br MATERIAL DE APOIO
Instituição: Fuvest Ano: 2003
Tema: Manifestações concretas de afirmação ou negação
da auto-estima entre brasileiros.
Modalidade: Dissertação
1.
Vamos levantar a auto-estima?
Não. É melhor aumentar a competência, que a auto-estima se levanta
sozinha
Por David Cohen -
Uma das unanimidades dos programas de recursos humanos é tentar aumentar a
auto-estima dos funcionários. A lógica é a seguinte: se uma pessoa não tem
respeito por si mesma, perde a autoconfiança. Está começando o jogo derrotada
e dificilmente vai conseguir realizar suas tarefas a contento.
É muito difícil negar essa constatação quase universal: a falta de auto-estima
prejudica o desempenho em qualquer atividade, da cama à escola, das pistas de
corrida aos escritórios. O problema é quando se resolve agir para melhorar a
auto-estima alheia.
De cara, há uma dúvida: é possível mudar a imagem que por definição é aquela
que a pessoa tem de si mesma?
Embora a auto-estima seja um sentimento reflexivo, ele é influenciado pelo
mundo externo. Os sucessos na vida profissional, a admiração dos pares e as
conquistas amorosas fazem aumentar o respeito por si próprio. Tudo isso sugere
que, sim, é possível mexer com a auto-estima de alguém. Basta criar uma "zona
de conforto", um ambiente em que a pessoa receba mais sinais de aprovação.
Nesse ambiente, a tendência é que ela se torne mais ousada, mais criativa, mais
forte.
É isso o que faz a maioria dos programas de elevação de auto-estima. Trabalha
com elogios e incentivos, num ambiente artificialmente protegido. Desenvolve-se
uma espécie de gestão de sentimentos. Dá resultado? Dá. O resultado é bom?
Depende.
Mas disputas envolvem gasto de energia, e um sentimento que indique se aquele
oponente é desafiável ou não pode poupar um bocado de energia ao indivíduo.
Isso acontece com galinhas, por exemplo. Uma vez estabelecida a hierarquia,
basta uma pequena bicada para que cada uma se ponha no seu lugar social, sem
72
novas brigas.
Ora, animais com poucas habilidades para a disputa com seus oponentes tendem
a desenvolver o sentimento de resignação muito mais freqüentemente que o de
desafio. Pronto: aí está, segundo psicólogos evolucionistas, a origem da baixa
auto-estima. "Ela evoluiu como um modo de fazer as pessoas se resignarem com
seu status subordinado, quando essa resignação é de seu interesse genético", diz
Robert Wright, no livro O Animal Moral. (É do interesse genético perceber que
contra o Mike Tyson a melhor estratégia é recolher-se à sua insignificância. Esse
mesmo sentimento se transfere para uma disputa sobre quem sabe mais física,
você ou Einstein.)
Então ter baixa auto-estima é bom? Em alguns casos, sim. Para um indivíduo
cujas habilidades não estão à altura do ambiente em que se encontra, a baixa
auto-estima é um mecanismo de proteção. Fazê-lo desenvolver o respeito próprio
de modo artificial pode prejudicá-lo, em vez de ajudá-lo.
Isso não significa que os programas de melhora de auto-estima não tenham
serventia. Eles têm -- mas apenas se forem um coadjuvante no processo de
melhorar a competência. Como? Apontando, durante o aprendizado, os pequenos
sucessos, para incentivar a superação de obstáculos.
Auto-estima, seja ela alta ou baixa, é um mecanismo inconsciente para avaliar
suas possibilidades no ambiente social. Ela não é melhor quanto mais alta for. Ela
é melhor quanto mais acurada for a previsão que faz das reais possibilidades do
sujeito. Reduzi-la ou aumentá-la artificialmente é como mudar a escala na
balança da sua casa, em vez de fazer regime.
David Cohen ([email protected]) é editor de Exame
vocesa.abril.uol.com.Br, acessado em 08/09/2004
2.
Campanha quer resgatar auto-estima brasileira
DA REPORTAGEM LOCAL
A campanha "Eu sou brasileiro e não desisto nunca", lançada ontem pela ABA
(Associação Brasileira de Anunciantes), tem como objetivo "resgatar os níveis de
auto-estima do brasileiro, que estão em baixa", como destacou o presidente da
entidade, Orlando Lopes, durante o lançamento da propaganda.
A campanha terá quatro comerciais na TV, dois com famosos -o jogador Ronaldo
e o músico Herbert Vianna (Paralamas do Sucesso)- e dois com pessoas comuns
que têm histórias de superação pessoal -casos de Roberto Carlos Ramos
(menino de rua que fugiu várias vezes da Febem até ser adotado por uma
professora francesa; hoje pedagogo, cuida de 12 crianças carentes) e Maria José
Bezerra (moça pobre de Recife que fugiu de casa com a mãe para evitar a
violência paterna; sem recursos, conseguiu se formar em história e hoje faz
doutorado na área).
Além da televisão, a propaganda será veiculada em rádio, outdoors, páginas de
jornais e revistas e no material oficial do governo. A produção foi voluntária, assim
como a veiculação será. Os direitos autorais também foram cedidos, incluindo a
frase "o melhor do Brasil é o brasileiro", do historiador Luís da Câmara Cascudo
73
(1898-1986), slogan da campanha.
Orlando Lopes afirmou que o governo federal vai adotar o slogan em suas
campanhas institucionais, inclusive de suas empresas, como Correios, Petrobras
e Caixa Econômica Federal. "Esta é uma campanha que não tem dono", destacou
Lopes.
Ele disse que no ano passado a ABA realizou uma campanha para incentivar a
indústria a continuar investindo. Neste ano, a intenção era desenvolver
propagandas para estimular os consumidores. Ao invés disso, optou-se pela
difusão da melhora da auto-estima. "Em cada consumidor há um cidadão", disse
Luiz Lara, presidente da Lew, Lara.
Ele disse que o governo também discutia um forma de resgatar a auto-estima dos
brasileiros. "Foi uma grande coincidência." Folha de São Paulo, 20/07/2004
3.
Origem e destino
A inocência da nossa infância descansa numa profunda falta de conhecimento,
sobretudo de nós mesmos. "Quem somos" é uma resposta que só os outros têm.
E nos dão, nunca de vez, mas aos pouquinhos -em notícias, na maioria das vezes
furtivas e emaranhadas nas histórias familiares, na lembrança de um
acontecimento qualquer.
Nossos ouvidos ávidos colecionam esses pequenos cacos preciosos que, ao
longo do tempo, juntamos através de significados particulares. Formamos com
eles mosaicos que nos explicam. Que nos espelham. Uma personagem que ou
aprovamos ou não gostamos de ver.
São figuras que nos marcam em silêncio. Lentes decisivas que se interpõem entre
nós e os outros, entre nós e as situações que enfrentamos dia a dia. Balizam
nossas ações, temperam nossos sentimentos, recrutam nossas possibilidades,
abrem e fecham portas.
A mais forte dessas imagens de nós mesmos é a que fala do nosso nascimento,
pois nela se guarda o segredo da nossa existência.
Nasci surpreendendo a todos. Trazendo o inesperado. Foi o que me contaram.
Minha avó paterna, cuja fama era a de jamais ter errado num prognóstico, foi
desbancada por mim, me disseram. Minha mãe sentia que eu era um menino.
Meu pai achava que eu era menino.
Eu tinha até um nome, José Roberto, uma homenagem a meu avô paterno e a um
irmão de minha mãe, de quem ela gostava muito. Tiveram que sair atrás de um
nome que me servisse.
Mas ninguém se decepcionou pelo fato de eu ser uma menina, é o que me
diziam.
Essa história a respeito do meu nascimento grudou em mim e, enquanto crescia,
eu a interpretei e reinterpretei, distraída, incansavelmente. Às vezes por conta
própria, às vezes ajudada pelos tons e pelos gestos de quem a narrava. Eu tirava
dela a orientação para meus atos, meus desejos e minhas decisões. Por exemplo,
como meu pai ficou feliz por eu ser uma menina, fiquei livre de provar para ele
74
que eu era tão boa quanto um menino.
Quando devia resolver uma questão, todavia, um comando invisível me fazia
buscar a solução inusitada. Caso contrário, eu não acreditava que ela fosse
correta. Sem perceber, eu precisava permanecer trazendo a novidade.
É na história do nosso nascimento que reconhecemos, inocentes, o papel que nos
cabe nesta vida. Nela, a fundação da nossa pessoa, o nosso mito de origem, cuja
força é a de dirigir nosso destino.
Mas a necessidade de uma história que marque e caracterize um começo diz
também respeito à nossa existência coletiva. As nações precisam de um mito de
fundação. Esse mito traduz a alma, a estrutura e o destino de um povo.
É exatamente o que o mito de "Rômulo e Remo" oferece para Roma: a razão e o
sentido da sua existência. Assim como a história de Jesus Cristo oferece aos
cristãos sua identidade.
O mito de fundação brasileiro é o de uma terra descoberta por acaso, por
acidente. Cabral queria ir para as Índias e veio dar aqui. Nosso povo foi formado,
também, por ladrões e marginais dos quais Portugal queria se livrar.
Os índios, a população natural deste país, nunca se constituíram, de fato, como
nossa raça original.
Esse mito povoa o imaginário popular e, certamente, contribui para a baixa auto-
estima da nossa população, para um certo desprezo por nós mesmos e para uma
valorização de tudo o que é estrangeiro.
Enquanto não compreendemos o poder de um mito de origem ou de fundação
nem nos apropriamos dele, esse mito determina, silenciosamente, o sentido da
nossa vida. E a falta de sentido também. Ele é o oráculo soberano da nossa
história.
DULCE CRITELLI , professora de filosofia da PUC-SP, é autora dos livros
"Educação e Dominação Cultural" e "Analítica de Sentido" e coordenadora do
Existentia -Centro de Orientação e Estudos da Condição Humana
@ - [email protected] FSP, junho de 2005
D.4) Exemplo de um texto revisado, comentado e pontuado
A revisão é entendida como um modo de interação entre professor e aluno,
capaz de indicar para o segundo os pontos favoráveis e/ou desfavoráveis de seu
texto e sinalizar aspectos que deverão ser aprimorados na segunda versão. Por
sua vez, o comentário final deverá ser capaz de sintetizar as ocorrências
observadas ao longo do texto. Já a pontuação, com cinco critérios de correção,
segue os moldes da folha de correção da prova de redação do vestibular da
UNICAMP, considerada por nós como uma das mais eficientes por contemplar
aspectos relevantes de revisão de uma redação de vestibular.
75
76
Observação: Passe o mouse sobre o texto para ler os comentários de cada
ocorrência. Se imprimir o texto corrigido, terá acesso aos comentários em
forma de nota de rodapé.
COMENTÁRIO: Wagner, seria interessante reler a proposta. A Fuvest pedia que
se discutissem manifestações concretas de afirmação ou negação da auto-estima
entre os brasileiros e seu texto não atendeu a essa solicitação. Voltemos ao
fragmento 1:
auto-estima: s. f. qualidade de quem se valoriza, se contenta com
seu modo de ser e demonstra, conseqüentemente, confiança em seus atos e
julgamentos.
Você não discute a auto-estima, mas sim o comportamento dos
brasileiros frente à visão que têm do mundo. Consegue perceber a diferença entre
o que foi solicitado e o que foi produzido? Sugiro que você estude esta correção e
reescreva esta proposta. Clique em Deite e Role. Em seguida em Exemplos de
outros textos: acima da média. Você entrará no site da Fuvest, onde se
encontram 48 das melhores redações produzidas neste ano. Divirta-se!
Critérios de Revisão
T: Tema
TT: Tipo de Texto
G: Gramática
Cr: Coerência
Cs: Coesão
Pontuação
TEMA
Nota 2: O tema foi desenvolvido razoavelmente. O autor percebe a questão central, mas
ainda revela dificuldades para explorá-la, ou por falta de conhecimento ou por falta de um
posicionamento mais claramente definido.
TIPO DE TEXTO
Nota 2: O autor comete algum deslize quanto à estrutura da dissertação: não é capaz de
desenvolver uma linha de raciocínio com começo, meio e fim, de expor sua opinião e
sustentá-la, de tirar conclusões.
GRAMÁTICA
Nota 2: Alguns problemas no uso dos recursos sintáticos e vocabulares, como ortografia,
acentuação, regência, concordância nominal, flexão verbal, comprometem a estrutura
gramatical do texto.
COERÊNCIA
Nota 2: O texto se faz confuso, por vezes há fragmentação das idéias e contradições. A
argumentação não é suficientemente clara.
COESÃO
Nota 2: Alguns problemas no uso dos recursos lingüísticos que garantem coesão ao texto
escrito, como pontuação, emprego de vocábulos, relação entre frases e parágrafos e uso
adequado dos termos no contexto. As falhas chegam a comprometer o entendimento do
texto.
TOTAL = 10, de um total de 25, o que equivale a 40% de aproveitamento.
77
D.5)
Exemplos de outros textos: acima da média
A leitura e análise de textos escritos por outras pessoas são exemplos que
podem ajudar o aluno a treinar a sua própria escrita. A Fuvest e Unicamp
costumam divulgar todos os anos as melhores redações ou as consideradas
acima da média no seu último vestibular, material valioso a ser estudado pelo
aluno porque sinaliza o que as bancas examinadoras entendem por um ótimo
texto e o que esperam daqueles que se submetem ao seu vestibular.
A UNICAMP, por exemplo, que tem sua prova de redação na primeira fase,
com um valor que chega a 50% do total, é categórica em afirmar:
As habilidades definidas no perfil do aluno desejado pela UNICAMP
são as seguintes:
I. capacidade de exprimir-se com clareza;
II. capacidade de orgnizar idéias;
III. capacidade de estabeler relações;
IV. capacidade de interpretar dados e fatos;
V. capacidade de elaborar hipóteses.
(Vestibular Unicamp Redação 1993, p. 5)
Sem dúvida que, ao selecionar e divulgar todos os anos as redações
acima da média, que apresentam tais habilidades, as coordenações desses
vestibulares ratificam o perfil de aluno e, por extensão, o nível de escrita,
que consideram ideal para um curso universitário.
Obs. Os textos aqui usados foram extraídos do seguinte endereço:
www.fuvest.br/vest2003/bestred
78
79
80
D.6) Atividade
Visam a permitir que o aluno exercite a atividade da escrita e compreensão
dos mecanismos implícitos na elaboração de um texto escrito, seja por meio de
interpretação de texto, como por meio de identificação de estruturas dissertativas,
cartas argumentativas e/ou narrativas, ainda que essas últimas não tenham sido,
nesse momento, trabalhadas.
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br ATIVIDADE
Instituição: Fuvest Ano: 2003
Tema: Manifestações concretas de afirmação ou negação
da auto-estima entre brasileiros.
Modalidade: Dissertação
1.
Tendo em vista a redação abaixo, leia-a com atenção e responda às
perguntas :
Contentamento próximo
Os brasileiros são considerados receptivos e felizes pelos outros povos. Essa é
uma reputação carregada, no mínimo desde o século XIX. Entretanto, a auto-
estima da nação não esteve sempre elevada.
Os registros literários do próprio século XIX revelam, entre os brasileiros, hábitos
e costumes importados da Europa. Aparentar como latino-americano não era
interessante naquele tempo, portanto, convinha às pessoas ocultar suas raízes
culturais.
A permanência da realeza portuguesa no Brasil durante décadas, certamente
influenciou na valorização dos elementos culturais europeus, afinal, possuir
características dos povos do Velho Mundo significava parecer mais civilizado que
as demais pessoas.
Já na metade do século XX, o fenômeno populista passou a estimular o
nacionalismo do povo. Ainda assim, o “glamour” dos elementos importados foi
coexistente e, tal como se nota atualmente, resistiu bravamente.
Ainda hoje é possível encontrar pessoas que supervalorizam os costumes norte-
americanos e europeus, ao passo de lançarem comentários desmoralizantes
acerca do Brasil.
É certo que a auto-estima anda alta pelo país. A posse de um presidente
esquerdista trouxe esperança às camadas populares. A cotação do dólar,
relativamente estabilizada em relação ao real - embora estejam em patameres
diferentes - e a promessa de uma exportação recordista em 2004, também
81
cooperam para a tranquilidade, que parece estabelecida na União.
Nota-se que, de fato, os brasileiros estão mais esperançosos, ainda que o
progresso seja pouco perceptível. As promessas foram feitas; basta esperar por
seus frutos.
Pergunta-se:
1. Qual o assunto da discussão?
2. Qual o posicionamento em relação ao que está sendo discutido?
3. Quais os argumentos que dão sustentação ao posicionamento adotado?
4. Qual a sua opinião em relação a esse assunto?
5. Que tal escrever uma Redação sobre esse assunto e nos enviar para
correção?
2.
Coloque os parágrafos abaixo em sua ordem original, considerando sua
estrutura dissertativa - tese, argumentação e conclusão.
MEU BRASIL, BRASILEIRO
Por outro lado, são pessoas, apesar de tudo felizes. Que enchem
sambódromos em época carnavalesca e comemoram qualquer feriado ou
comemoração familiar em suas casas, da maneira que a condição financeira lhes
permite.
Muitos lares trazem seu chefe de família desempregado e sem previsão de
encontrar uma nova oportunidade, pois já se encontra “experiente demais”. É
esse o retrato do povo brasileiro em tempos de crise. É esse também um povo
otimista, que mesmo com uma educação precária participou da última ação
democrática de nosso país, escolhendo um líder que, assim como eles, nasceu
humilde e não possui diplomas, quebrando o tabu de se eleger apenas ; grandes
estudiosos para reger o país; na esperança de que seus apelos sejam acolhidos
Valorizar seu país, mesmo em tempos de crise; contentar-se, apesar do
desemprego que ronda a nação; e confiar em suas decisões apesar da educação
precária; são essas as características do povo brasileiro: líderes no quesito auto-
estima.
É por ser assim, conformado com seu modo de ser e viver, que o brasileiro
dribla não só os adversários em uma partida de futebol, mas também as
dificuldades. Ele não perde uma oportunidade de sorrir e não aceita mudar para
outro lugar, pois se orgulha de seu país e tem confiança que, em um futuro
próximo, a situação melhorará. Entretanto , enquanto esse dia não chega, ele
continua vivendo e sofrendo; na certeza de que “um dia” tudo vai ser melhor, e aí
o povo brasileiro atingirá o ápice de sua auto-estima.
Famílias, que sobrevivem com salários miseráveis, são obrigadas a colocar
suas crianças no labor desde muito jovens, deixando para trás a infância e as
perspectivas de um futuro mais digno – afinal abandonam também os estudos.
82
RESPOSTA
MEU BRASIL, BRASILEIRO
Valorizar seu país, mesmo em tempos de crise; contentar-se, apesar do
desemprego que ronda a nação; e confiar em suas decisões apesar da educação
precária; são essas as características do povo brasileiro: líderes no quesito auto-
estima.
Famílias, que sobrevivem com salários miseráveis, são obrigadas a colocar
suas crianças no labor desde muito jovens, deixando para trás a infância e as
perspectivas de um futuro mais digno – afinal abandonam também os estudos.
Muitos lares trazem seu chefe de família desempregado e sem previsão de
encontrar uma nova oportunidade, pois já se encontra “experiente demais”. É
esse o retrato do povo brasileiro em tempos de crise. É esse também um povo
otimista, que mesmo com uma educação precária participou da última ação
democrática de nosso país, escolhendo um líder que, assim como eles, nasceu
humilde e não possui diplomas, quebrando o tabu de se eleger apenas ; grandes
estudiosos para reger o país; na esperança de que seus apelos sejam acolhidos
Por outro lado, são pessoas, apesar de tudo felizes. Que enchem
sambódromos em época carnavalesca e comemoram qualquer feriado ou
comemoração familiar em suas casas, da maneira que a condição financeira lhes
permite.
É por ser assim, conformado com seu modo de ser e viver, que o brasileiro
dribla não só os adversários em uma partida de futebol, mas também as
dificuldades. Ele não perde uma oportunidade de sorrir e não aceita mudar para
outro lugar, pois se orgulha de seu país e tem confiança que, em um futuro
próximo, a situação melhorará. Entretanto , enquanto esse dia não chega, ele
continua vivendo e sofrendo; na certeza de que “um dia” tudo vai ser melhor, e aí
o povo brasileiro atingirá o ápice de sua auto-estima.
E)
Informações sobre a universidade almejada
Visam a inteirar o aluno sobre as particularidades do vestibular que
porventura irá prestar, em especial da prova de redação.
O Vestibular da Fundação Universitária para o Vestibular - que engloba a
Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, a Academia de
Polícia Militar do Barro Branco - será realizado em uma duas fases.
Na primeira fase, o exame consta de testes de múltipla escolha. São 20 questões
de Português, 8 de Inglês e 12 de História, Geografia, Química, Matemática,
Física e Biologia, totalizando 100 questões, para serem resolvidos em 5 horas.
83
Na segunda fase, além das questões que requerem respostas discursivas, será
solicitada uma Redação.
A prova de Redação da Fuvest solicita aos candidatos que escrevam um texto
dissertativo sobre um tema, que pode ou não estar explícito, e que vem
acompanhado de uma coletânea com em média três fragmentos.
QUER ENCARAR?
É um exame que tem variado com frequência, nos últimos anos, o formato de sua
prova de Redação. No entanto, em 2003, resgatou o modelo aplicado até 1998,
de uma forma um pouco mais simplificada, já que explicitava o tema a ser
discutido.
E DAÍ? RECORREMOS AO MANUAL DO CANDIDATO?
Sobre outras informações e exigências, assim consta no manual do candidato da
Fuvest:
A prova de Português visa a avaliar a capacidade de ler, compreender e
interpretar criticamente textos de toda natureza - literários e não literários - bem
como a capacidade de mobilizar conhecimentos lingüísticos na produção de
textos que atendam aos requisitos de adequação, correção, coesão e coerência.
O candidato deve, portanto, dominar a norma culta da língua escrita, reconhecer
outras variedades lingüísticas, assim como possuir um certo repertório de leituras
de textos literários, no nível próprio do concluinte do Ensino Médio.
No que se refere aos conhecimentos lingüísticos, tais competências supõem que
o candidato domine os conteúdos dos itens seguintes:
I. Língua Portuguesa
1. Níveis de significação do texto: significação explícita e significação implícita,
denotação e conotação.
2. Distinção entre variedades do português.
3. Norma ortográfica.
4. Morfossintaxe das classes de palavras:
4.1 . flexão nominal;
4.2. flexão verbal: expressão de tempo, modo, aspecto e voz; correlação de
tempos e modos; 4.3. elementos estruturais e processos de formação das
palavras;
4.4. concordãncia nominal e verbal;
4.5. regência nominal e verbal;
4.6. pronomes;
4.7. advérbios;
4.8. conectivos: função sintática e valores lógico-semânticos.
5. Processos de organização da frase:
5.1. coordenação e subordinação;
5.2. reorganização de orações e períodos.
6. Citação de discursos: direto, indireto e indireto livre.
7. Organização do texto:
7.1. dissertação: fato e demonstração / argumento e inferência / relações lógicas;
7.2. narração: seqüenciação de eventos / temporalidade;
84
7.3. descrição: simultaneidade / espacialidade na ordenação dos elementos
descritores.
8. Estratégias de articulação do texto:
8.1. coesão lexical e gramatical;
8.2. paragrafação.
9. Recursos expressivos:
9.1. ritmo e sonoridade;
9.2. recursos morfológicos, léxicos e sintáticos.
10. Intertextualidade.
Redação
A Redação deverá ser, obrigatoriamente, uma dissertação em prosa, na qual se
espera que o candidato demonstre capacidade de mobilizar conhecimentos e
opiniões, argumentando com pertinência e expressando-se de modo coerente e
adequado.
Na correção da Redação, serão examinados três aspectos que os avaliadores
considerarão, tanto quanto possível, separadamente. A cada um deles podem ser
atribuídos O, 1, 2, 3 ou 4 pontos.
1- Tema e desenvolvimento
Considera-se aqui, por um lado, se o texto elaborado pelo candidato está
adequado ao tema proposto e se, por outro lado, configura-se como uma
dissertação em prosa. A fuga completa ao tema proposto ou a não-observância
do gênero exigido serão tomadas como pressupostos óbvios para que a prova
não seja objeto de correção em qualquer outro de seus aspectos, atribuindo-se-
Ihe nota zero. No que diz respeito ao desenvolvimento, verificar-se-á a pertinência
da elaboração do tema, considerando-se também a capacidade crítica e
argumentativa, bem como a maturidade e a inventividade que no texto se
manifestam.
2- Estrutura
Consideram-se aqui, conjuntamente, os aspectos de coesão lingüística (nas
frases, períodos e parágrafos) e de coerência das idéias.
Maior ou menor coerência reflete a capacidade (ou incapacidade) do candidato
para relacionar os argumentos e organizá-Ios de forma a deles extrair conclusões
apropriadas. Serão considerados aspectos negativos a presença de contradições
entre frases ou parágrafos, a falta de encadeamento argumentativo, a
circularidade ou quebra de progressão discursiva, a falta de conclusão ou a
presença de conclusões não decorrentes do que
foi previamente exposto. I
São aspectos negativos relativos à coesão, entre outros, o estabelecimento de
relações semânticas impróprias entre palavras e o uso inadequado de conectivos.
3- Expressão
Consideram-se aqui o domínio da língua formal e a fluência do discurso. Serão
examinados pontos como a propriedade e a abrangência do vocabulário
85
empregado, além de ortografia, morfologia, sintaxe e pontuação. A ocorrência de
clichês e frases feitas, o uso inadequado de vocábulos são aspectos, em
princípio, negativos.
F) Propostas de Redação
Oferecemos 41 propostas de redação dos principais vestibulares do Estado
de São Paulo e 27 inéditas, sobre temas que estiveram recentemente nas pautas
das discussões, para que os alunos escolham as que forem de seu interesse.
CÁSPER LÍBERO( 2 )
ENEM ( 2 )
ESPM ( 2 )
FATEC ( 3 )
FGV ( 4 )
FUVEST ( 2 )
ITA ( 2 )
MACKENZIE ( 9 )
PALAVRA ESCRITA ( 28 )
PUC ( 2 )
UFSCAR ( 2 )
UNESP ( 3 )
UNICAMP ( 6 )
UNIFESP ( 2)
86
Exemplo:
Palavra Escrita ( 27 ) (Anexo)
2004 – (Dissertação) – Moradores de Rua
2004 – (Carta) –
Moradores de Rua
2004 – (Dissertação) –
Os jovens e a aparência
2004 – (Carta) –
Lei de crimes hediondos
2004 – (Carta) - Amazônia
2004 – (Carta) –
Ministério público e investigações
2004 – (Carta) – Exame de ordem para os médicos
2004 – (Carta) –
Lei do abate
2004 – (Carta) –
Lei de Biossegurança2004
2004 -- (Carta) –
Reforma agrária
2004 -- (Dissertação) –
Clonagem
2004 – (Dissertação) –
Reestruturação das relações humanas
2004 – (Carta) –
Homossexualismo
2004 -- (Dissertação) –
Grandes ídolos x comportamento e influência
2004 – (Carta) –
Classificação indicativa dos filmes
2004 – (Carta) –
Autoridade na universidade
2004 -- (Dissertação) –
Educação
2004 -- (Dissertação) –
Família
2004 -- (Dissertação) –
Voto
2004 -- (Dissertação) –
Democracia
2004 - (Dissertação) -
O que você vai ser quando você crescer?
2005 – (Dissertação) –
Tragédias
87
2005 – (Dissertação) –
Como e o que se fala
2005 – (Dissertação) –
Medo
2005 – (Dissertação) – Metamorfose
2005 – (Dissertação) – Narcisismo
2005 – (Dissertação) – O dia depois de amanhã
G) Inscrição
O aluno tem acesso ao endereço de nosso e-mail para que possa entrar
em contato e fazer sua inscrição.
Envie um e-mail para [email protected] contendo os seguintes
dados: nome, idade, endereço, e-mail e telefone.
Encaminharemos em seguida um e-mail confirmando sua reserva e indicando os
procedimentos necessários para efetuar a sua inscrição.
88
3.3 Seleção de metodologia
A metodologia empregada neste estudo inclui-se na linha de pesquisa
qualitativa ou interpretativa, uma vez que objetiva perceber de que maneira uma
Oficina Virtual de Redação pode ser capaz de contribuir para o aprimoramento da
escrita dos seus alunos, por meio da análise e interpretação de dados em um
ambiente específico, com vistas a facilitar a percepção de um fenômeno como um
todo. (Aldeman et al., apud Campos, 2004)
O fato de este trabalho apresentar como corpus uma Oficina Virtual de
Redação e pretender analisar de que forma esta pode concorrer para o
aprimoramento da escrita dos seus alunos, com vistas também ao
aperfeiçoamento da prática pedagógica, aproxima-o da pesquisa-ação,
combinação, de acordo com Carson et al (1989), de ação e pesquisa.
3.4 Procedimentos para análise
O objetivo deste estudo é investigar em que medida uma Oficina Virtual de
Redação pode contribuir para o aprimoramento da escrita de seus alunos.
Apoiados em leituras sobre Ensino a Distância, inclusão digital, abordagens
por meio do computador, dinâmicas capazes de promover o aprendizado
colaborativo, ambientes virtuais de aprendizagem, interação e autonomia,
elaboramos as seguintes perguntas de pesquisa:
9 em que medida uma Oficina Virtual de Redação pode contribuir para o
aprimoramento da escrita de seus alunos?
9 de que forma uma Oficina Virtual de Redação pode potenciar a capacidade
de reflexão, organização e expressão de seus alunos?
9 com quais tipos de abordagem, dinâmicas e ambientes virtuais uma Oficina
Virtual de Redação deve trabalhar a fim de promover o aprendizado?
9 como interagir com o aluno, por meio de uma Oficina Virtual de Redação,
de forma a envolvê-lo, motivá-lo e levá-lo ao aprendizado?
89
9 como estimular o aluno, por meio de uma Oficina Virtual de Redação, a ter
autonomia?
Para respondê-las, decidimos pelos seguintes procedimentos
metodológicos:
¾ levantamento de estudos que discorressem sobre Ensino a Distância,
inclusive para que tivéssemos uma noção mais depurada do lugar em que
nosso trabalho se encontra;
¾ levantamento de dados, estudos e pesquisas sobre acesso ao computador
e internet, distribuição dos jovens pelo mundo e pelo país, acesso à
informatização e ao mercado de trabalho, que nos permitissem tecer um
painel sobre a inclusão/exclusão digital brasileira;
¾ levantamento de dados, estudos e pesquisas que nos oferecessem uma
visão do nível da habilidade dos alunos brasileiros da série terminal do
Ensino Médio com a Língua Portuguesa, uma vez reconhecida a
necessidade de contextualização dessa realidade para, a partir de um
possível diagnóstico desfavorável, pensarmos em estratégias que, por
meio de uma Oficina Virtual de Redação, pudessem contribuir para a sua
recuperação;
¾ levantamento de estudos que tratassem das mais variadas abordagens por
meio do computador, das dinâmicas capazes de promover o aprendizado
colaborativo e de ambientes virtuais de aprendizagem, a fim de nos
permitirem contemplar as que atendessem aos nossos interesses, ao
mesmo tempo que às novas demandas educacionais;
¾ levantamento de estudos sobre autonomia e interação, indispensáveis à
aprendizagem a distância, a fim de, por meio de uma Oficina Virtual de
Redação, sermos capazes de promovê-las.
¾ construção de uma Oficina Virtual de Redação, elaboração, organização e
digitação do material que a compõe, como propostas de redação, critérios
de revisão, grade de revisão, modelos de redação, orientação de escrita e
revisão, leitura de apoio, entre outros;
¾ lançamento do site experimental,
www.palavraescrita.com.br e contacto
com nove alunos pré-vestibulandos para realização das tarefas propostas;
90
¾ delimitação do corpus de pesquisa, análise e discussão dos resultados.
Neste capítulo, tratamos de dois fatores imprescindíveis para que os alunos
construam conhecimento a distância, autonomia e interação, e de que forma
nossa Oficina Virtual de Redação seria capaz de impulsioná-las. Demos
continuidade com a descrição do contexto da pesquisa, apresentação da Oficina
Virtual de Redação Palavra Escrita, revelação da escolha metodológica e
procedimentos metodológicos. No capítulo seguinte, analisaremos os dados e
discutiremos os resultados.
91
Capítulo 4 - Análise de dados e discussão dos resultados
92
Neste capítulo de análise, apresentamos os alunos participantes do
teste-piloto da pesquisa, justificamos a escolha dos cinco critérios utilizados na
revisão das redações dos dezessete textos por eles produzidos e aqui expostos,
bem como o resultado do processo de suas escritas,
4.1 Os alunos participantes
Nove alunos participaram da Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita, de
junho a novembro de 2005. Desses,
9 cinco são da rede pública e quatro são da rede privada de ensino;
9 seis são de São Paulo, um é da Grande São Paulo e dois são do interior do
Estado de São Paulo;
9 seis cursaram, no ano corrente, o terceiro ano do Ensino Médio, dois
fizeram cursinho pré-vestibular e um apenas trabalhava;
9 sete só estudavam, um estudava e trabalhava e um apenas trabalhava;
9 seis prestaram vestibular e três não;
9 sete têm computador e dois não;
9 seis têm acesso à Internet em casa e três não;
9 dos seis alunos que prestaram vestibular, um ingressou em faculdade
pública ( USP e Unifesp / Medicina) e cinco em faculdade particular, sendo
que desses cinco, três foram para a segunda fase da Fuvest .
93
94
4.2 Produção textual
Expomos agora as dezessete redações produzidas pelos alunos
participantes, a partir da Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita, todas
revisadas, comentadas e pontuadas, acompanhadas do seguinte material apenso:
A. três propostas de redação de vestibular (escolhidas pelos alunos);
B. grade de revisão da dissertação (elaborada para esse fim).
A. PROPOSTAS DE REDAÇÃO
1. FUVEST 2003
Leia atentamente os três textos abaixo.
Texto I
Está no dicionário Houaiss:
auto-estima: s. f. qualidade de quem se valoriza, se contenta com seu
modo de ser e demonstra, conseqüentemente, confiança em seus atos e
julgamentos.
A definição do dicionário parece limitar-se ao âmbito do indivíduo, mas a
palavra auto-estima já há algum tempo é associada a uma necessidade
coletiva. Por exemplo: nós brasileiros precisamos fortalecer nossa auto-
estima. Neste caso, a satisfação com nosso modo de ser, como povo, nos
levaria à confiança em nossos atos e julgamentos. Mas talvez seja o caso
de perguntar: não são os nossos atos e julgamentos que acabam por
fortalecer ou enfraquecer nossa auto-estima, como indivíduos ou como
povo?
Texto II
Estão num poema de Drummond, da década de vinte, os versos:
E a gente viajando na pátria sente saudades da pátria.
(…)
Aqui ao menos a gente sabe que é tudo uma canalha só.
Texto III
Está num artigo do jornalista Zuenir Ventura, de dois anos atrás:
De um país em crise e cheio de mazelas, onde, segundo o IBGE, quase
um quarto da população ganha R$ 4,00 por dia, o que se esperaria? Que
fosse a morada de um povo infeliz, cético e pessimista, não?
Não. Por incrível que pareça, não. Os brasileiros não só consideram seu
país um lugar bom e ótimo para viver, como estão otimistas em relação a
seu futuro e acreditam que ele se transformará numa superpotência
econômica em cinco anos. Pelo menos essa é a conclusão de um
levantamento sobre a “utopia brasileira” realizado pelo Datafolha.
95
Com apoio dos três textos apresentados, escreva uma dissertação em
prosa, na qual você deverá discutir manifestações concretas de
afirmação ou negação da auto-estima entre brasileiros.
Apresente argumentos que dêem sustentação ao ponto de vista que
você adotou.
2. FUVEST 2004
Nos três textos abaixo, manifestam-se diferentes concepções do
tempo; o autor de cada um deles expõe uma determinada relação com
a passagem do tempo. Leia-os com atenção:
Texto I
Mais do que nunca a história é atualmente revista ou inventada por gente
que não deseja o passado real, mas somente um passado que sirva a seus
objetivos. (...) Os negócios da humanidade são hoje conduzidos
especialmente por tecnocratas, resolve dores de problemas, para quem a
história é quase irrelevante; por isso, ela passou a ser mais importante para
nosso entendimento do mundo do que anteriormente.
(Eric Hobsbawm, Tempos interessantes: uma vida no século XX)
Texto II
O que existe é o dia-a-dia. Ninguém vai me dizer que o que aconteceu no
passado tem alguma coisa a ver com o presente, muito menos com o
futuro. Tudo é hoje, tudo é já. Quem não se liga na velocidade moderna,
quem não acompanha as mudanças, as descobertas, as conquistas de
cada dia, fica parado no tempo, não entende nada do que está
acontecendo.
(Herberto Linhares, depoimento)
Texto III
Não se afobe, não,
Que nada é pra já,
O amor não tem pressa,
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário,
Na posta-restante,
Milênios, milênios
No ar...
E quem sabe, então,
O Rio será
Alguma cidade submersa.
Os escafandristas virão
Explorar sua casa,
Seu quarto, suas coisas,
Sua alma, desvãos...
96
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras,
Fragmentos de cartas, poemas,
Mentiras, retratos,
Vestígios de estranha civilização.
Não se afobe, não, Que nada é pra já,
Amores serão sempre amáveis.
Futuros amantes quiçá
Se amarão, sem saber,
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você.
(Chico Buarque, "Futuros amantes")
Redija uma DISSERTAÇÃO EM PROSA, na qual você apontará,
sucintamente, as diferentes concepções do tempo, presentes nos três
textos, e argumentará em favor da concepção do tempo com a qual
você mais se identifica
3. FGV 2003
Instruções: esta prova é constituída de apenas um texto.
Com base nele:
Dê um título sugestivo à sua redação.
Redija um texto a partir das idéias apresentadas.
Defenda os seus pontos de vista utilizando-se de argumentação
lógica.
“Há muita sabedoria pedagógica nos ditos populares. Como naquele que
diz: “É fácil levar a égua até o meio do ribeirão. O difícil é convencê-la a
beber a água”. De fato: se a égua não estiver com sede, ela não beberá
água, por mais que seu dono a surre… Mas, se estiver com sede, ela, por
vontade própria, tomará a iniciativa de ir até o ribeirão. Aplicado à
educação: “É fácil obrigar o aluno a ir à escola. O difícil é convencê-lo a
aprender aquilo que ele não quer aprender”.
Às vezes, eu penso que o que as escolas fazem com as crianças é tentar
forçá-las a beber a água que não querem beber. Brunno Bettelheim, um
dos maiores educadores do século 20, dizia que, na escola, seus
professores tentaram ensinar-lhe coisas que queriam ensinar, mas que ele
não queria aprender. Não aprendeu e, ainda por cima, ficou com raiva. Que
as crianças querem aprender, disso não tenho a menor dúvida. Vocês
devem se lembrar do que escrevi, corrigindo a afirmação com que
Aristóteles começa a sua “Metafísica”: ‘Todos os homens, enquanto
crianças, têm, por natureza, desejo de conhecer”.
Rubem Alves, Folha de S. Paulo, Sinapse, 24 set. 2002
97
B. GRADE GERAL DE REVISÃO DA DISSERTAÇÃO
Os valores atribuídos a cada uma das seis notas dos cinco critérios usados
na revisão dos textos, correspondem à grade geral de revisão da dissertação,
elaborada justamente para esse fim.
A palavra texto, etimologicamente, provém do latim, textu, que significa
tecido. Palavras, frases, períodos, parágrafos se entrelaçam na construção de
uma tessitura de cunho sintático, cognitivo, conceitual e pragmático. (Torres,
2006).
Para Costa (1991), um texto tem de ser avaliado sob três aspectos:
a. o semântico- conceitual: responsável pelo sentido do que está
sendo comunicado, relaciona-se a sua coerência;
b. o formal: garantido por meio de mecanismos gramaticais e
lexicais, diz respeito à coesão;
c. o pragmático: preso à informatividade e contexto, responde por
seu funcionamento.
Seu principal atributo, segundo Siqueira (1990), é a unidade, sem a qual
não poderá ser reconhecido em sua totalidade e com a qual constituirá uma
significação, que tem referência e tematização.
Do grego, thêma, atos, significa ‘aquilo que se propõe’. Trata-se de um
critério de análise de produção textual, por nós observado na revisão dos textos
dos nossos alunos, de suma importância , a ponto de, numa situação de
vestibular, o candidato ter a sua redação anulada caso se desvie do tema
solicitado, sobre o qual deve discorrer, de forma coerente e coesiva.
Coerência caracteriza-se
como o nível de conexão conceitual e estruturação do sentido,
manifestado, em grande parte, macrotextulamente.
(Fávero, 1993, p.59)
Para Beaugrande e Dressler (apud Fávero, 1993, p.59)
texto coerente é aquele em que há uma continuidade de sentidos entre
os conhecimentos ativados pelas expressões do texto.
98
Tais conhecimentos, que determinam a produção de sentido e,
consequentemente, a coerência, estão, segundo Fávero (1993) armazenados na
memória em estruturas cognitivas como:
- frames: modelos globais que contêm o conhecimento comum sobre um
conceito primário (Fávero, 1993, p.63);
- esquemas: modelos cognitivos cujos elementos são ordenados numa
progressão, de modo que se podem estabelecer hipóteses sobre o que será
mencionado ou feito a seguir (Fávero, 1993, p.64);
- planos: modelos cognitivos que podem levar o leitor/alocutário a perceber
a intenção do escritor/locutor (Fávero, 1993, p.65);
- scripts: com uma rotina preestabelecida, são planos estabilizados para
especificar os papéis dos participantes e as ações deles esperadas (Fávero,
1993, p.66);
- cenários: trata-se, de acordo com Sanford e Garrod (apud Fávero, 1993,
p.67) do domínio estendido de referência, que é usado para interpretar textos
escritos.
- superestruturas: forma global do texto, que define sua ordem e as
relações entre seus fragmentos (Fávero, 1993, p.68).
A partir dessa noção básica de coerência, pudemos analisar ocorrências
desse fator nos textos dos alunos.
Coesão, por sua vez, é entendida
como um conceito semântico referente às relações de sentido que se
estabelecem entre os enunciados que compõem o texto, sendo esta
obtida parcialmente através da gramática e parcialmente através do
léxico. (Fávero, 1993, p.9)
Fávero (1993) classifica a coesão em três tipos:
- referencial: obtida por substituição e reiteração, faz referência a
alguma coisa necessária a sua interpretação;
- recorrencial: obtida por meio da recorrência dos termos, paralelismo
ou recorrência de estruturas, paráfrase ou recorrência semântica,
recursos fonológicos segmentais e supra-segmentais, constitui um
meio de articular a informação nova à velha;
99
- seqüencial: por conexão ou temporal, tem por função, sem retomar
itens, sentenças ou estruturas, fazer o texto progredir.
Providos desse conhecimento elementar a respeito de coesão textual,
também analisamos as ocorrências desse fator nos textos dos nossos alunos.
Siqueira (1990), diante de uma produção textual, sugere a seguinte
organização:
- apresentação de uma situação inicial, em que o autor, recuperando um saber
que considera partilhado, apresenta o assunto a ser abordado;
- proposição de uma informação nova, assim considerada no texto;
- busca de justificativas que dêem credibilidade para a informação nova e a
tornem aceita;
- conclusão que apresenta uma nova visão sobre o assunto, uma nova
possibilidade de conceituar a referência e, assim, amplia-la.
(Siqueira, 1990, p.35)
Essa organização é avaliada por nós no critério Tipo de Texto. Segundo
Marcuschi (2001), os tipos textuais, em geral, abrangem cerca de meia dúzia de
categorias conhecidas como narração, argumentação, exposição, descrição,
injunção. Neste momento de nossa pesquisa, nos detemos apenas na
dissertação, por ter sido esta a única modalidade trabalhada pelos alunos,
embora lhes fosse oferecida a possibilidade de escrever uma carta argumentativa
ou narração.
Finalmente, o quinto é último critério por nós avaliado é a Gramática,
conjunto de prescrições e regras (de ortografia, acentuação, regência,
concordância nominal, flexão verbal) que determinam o uso considerado correto
da língua portuguesa escrita.
De acordo com Koch (1997), se quisermos nos fazer compreender
devemos considerar todos esses aspectos sem nos esquecermos de que a língua
só pode ser entendida no nível sócio-cognitivo interacional.
Se como autores sabemos do que vamos falar no genérico, como leitores
procuramos saber do que o texto fala essencialmente. Se como autores
selecionamos para expandir o texto, como leitores vamos em busca do fio
100
condutor do texto. O que isso significa? Que os movimentos de autores e leitores
têm sentidos diferentes e tanto um quanto o outro têm de ter essa noção.
Abaixo, apresentamos a grade geral de revisão da dissertação:
Tema
Nota zero (ANULAÇÃO do texto):
O autor não foi capaz de abstrair o tema a partir dos elementos fornecidos;
deixou de seguir as orientações para o desenvolvimento da proposta.
Nota 1
O texto apresentou uma discussão parcial do tema indicado, deixando
claro, em vários momentos, que o autor desviou-se do assunto.
Nota 2
O tema foi desenvolvido razoavelmente: o autor percebe a questão central,
mas ainda revela dificuldades para explorá-la, ou por falta de
conhecimento, ou por falta de um posicionamento mais claramente
definido.
Nota 3
O autor fez a leitura correta da proposta, soube interpretar os textos da
coletânea, mas faltou explorar seu próprio ponto de vista.
Nota 4
O texto está bem construído: o autor demonstra saber selecionar as
informações ligadas ao tema proposto, ainda que eventualmente perca
uma boa idéia apresentada durante a discussão.
Nota 5
O texto é excelente, o tema é muito bem explorado: o autor, além de saber
selecionar aspectos do tema proposto, demonstra total habilidade e
criticidade ao explorar o assunto.
Tipo de Texto
Nota zero (ANULAÇÃO do texto)
O texto apresentado não atende à modalidade exigida. O autor demonstra
total desconhecimento da estrutura da dissertação.
Nota 1
O autor comete vários deslizes quanto à estrutura da dissertação: ou não é
capaz de desenvolver uma linha argumentativa e/ou não é capaz de expor
e discutir pontos de vista e/ou não é capaz de tirar conclusões.
101
Nota 2
O autor comete algum deslize quanto à estrutura da dissertação: ou não é
capaz de desenvolver uma linha argumentativa, ou não é capaz de expor e
discutir pontos de vista, ou não é capaz de tirar conclusões.
Nota 3
O autor demonstra domínio da estrutura da dissertação: é capaz de
desenvolver uma linha argumentativa, de expor e discutir pontos de vista,
de tirar conclusões.
Nota 4
O autor demonstra bom domínio da estrutura da dissertação: é capaz de
desenvolver uma linha argumentativa, de expor e discutir pontos de vista,
de tirar conclusões.
Nota 5
O autor demonstra excelente domínio da estrutura da dissertação: é capaz
de desenvolver uma linha argumentativa, de expor e discutir pontos de
vista, de tirar conclusões
Gramática
Nota zero
Graves problemas no uso dos recursos sintáticos e vocabulares, como
ortografia, acentuação, regência, concordância nominal, flexão verbal. A
estrutura gramatical está totalmente comprometida.
Nota 1
Quantidade considerável de problemas no uso dos recursos sintáticos e
vocabulares, como ortografia, acentuação, regência, concordância nominal,
flexão verbal. A estrutura gramatical está gravemente comprometida.
Nota 2
Alguns problemas no uso dos recursos sintáticos e vocabulares, como
ortografia, acentuação, regência, concordância nominal, flexão verbal,
comprometem significativamente a estrutura gramatical do texto.
Nota 3
O uso dos recursos sintáticos e vocabulares, como ortografia, acentuação,
regência, concordância nominal, flexão verbal, está adequado, ainda que
um ou outro deslize possa ser identificado.
102
Nota 4
O uso dos recursos sintáticos e vocabulares, como ortografia, acentuação,
regência, concordância nominal, flexão verbal, além de empregados
corretamente, valorizam o texto.
Nota 5
Há evidência de total domínio dos recursos sintáticos e vocabulares, como
ortografia, acentuação, regência, concordância nominal, flexão verbal, que
são empregados para a valorização do texto.
Coerência
Nota zero
O encadeamento das idéias está totalmente desorganizado. Há falta total
de clareza e mal se pode entender o desenvolvimento do texto.
Nota 1
A falta de organização do pensamento prejudica gravemente o
encadeamento das idéias, comprometendo o entendimento do texto.
Nota 2
O texto se faz confuso, por vezes há fragmentação das idéias e
contradições. A argumentação não é suficientemente clara.
Nota 3
O texto mostra um bom encadeamento das idéias. O raciocínio é claro,
embora o autor possa ter alguma dificuldade para empregar recursos que
dariam ao texto uma maior unidade e, consequentemente, maior
objetividade.
Nota 4
O texto está bem estruturado. Há evidências da exploração das idéias que
valorizam a argumentação e levam a uma maior compreensão do
raciocínio.
Nota 5
Ótima articulação. O encadeamento das idéias está muito bem organizado.
Os recursos discursivos estão empregados de forma a valorizar e
enriquecer todo o texto.
Coesão
Nota zero
Desconhecimento total dos recursos lingüísticos que garantem coesão ao
texto escrito, como pontuação, emprego de vocábulos, relação entre frases
103
e parágrafos e uso adequado dos termos no contexto. O texto fica
totalmente comprometido.
Nota 1
Muitos problemas no uso dos recursos lingüísticos que garantem coesão
ao texto escrito, como pontuação, emprego de vocábulos, relação entre
frases e parágrafos e uso adequado dos termos no contexto. As falhas
comprometem em grande medida o entendimento do texto.
Nota 2
Alguns problemas no uso dos recursos lingüísticos que garantem coesão
ao texto escrito, como pontuação, emprego de vocábulos, relação entre
frases e parágrafos e uso adequado dos termos no contexto. As falhas
chegam a comprometer o entendimento do texto.
Nota 3
De modo geral, o texto está bem organizado. Os recursos lingüísticos que
garantem coesão ao texto escrito, como pontuação, emprego de
vocábulos, relação entre frases e parágrafos e uso adequado dos termos
no contexto, estão bem empregados. Apesar de um ou outro deslize que
possa ter ocorrido, o entendimento do texto não fica comprometido.
Nota 4
Uso adequado dos recursos lingüísticos que garantem coesão ao texto
escrito, como pontuação, emprego de vocábulos, relação entre frases e
parágrafos e uso adequado dos termos no contexto. O texto apresenta
clareza, a seleção dos elementos de coesão garantem maior destaque às
idéias.
Nota 5
Além do uso totalmente adequado dos recursos lingüísticos que garantem
coesão ao texto escrito, como pontuação, emprego de vocábulos, relação
entre frases e parágrafos e uso adequado dos termos no contexto, o texto
evidencia a preocupação do autor com a seleção dos elementos de
coesão, a fim de garantir maior valorização das idéias.
C. REDAÇÕES PRODUZIDAS PELOS ALUNOS PARTICIPANTES
A partir da Oficina Virtual de Redação Palavra Escrita, dezessete redações
foram produzidas, de junho a outubro de 2005, pelos alunos participantes do
teste-piloto, e imediatamente revisadas, comentadas e pontuadas:
104
Considerações Finais
151
Mesmo depois de pelos menos onze anos de escolarização formal, a
realidade nos mostra a frágil relação de nossos educandos com a Língua
Portuguesa, tanto dos advindos da rede pública, quanto da rede privada de
ensino. Essa constatação torna-se ainda mais preocupante à vista do
reconhecimento de que não é possível desassociá-la da situação em que se
encontra a educação no Brasil, como avalia Aquino (2005):
“De um lado, o trabalho escolar convertido em assistencialismo para
pobres, por meio de uma oferta pedagógica aligeirada, fracionada e
diluída; de outro, tornado objeto de mercantilização para ricos, por meio
da oferta de mais um produto de grife, pragmático e com destinação
certa: a preparação técnica para os vestibulares (AQUINO, Carta
Capital, 28/12/2005, Ano XII, nº 374).
Sabemos, todos, porém, que existem novas e possíveis demandas
educacionais no contexto das sociedades contemporâneas. Vivemos um
momento histórico fundamentalmente importante para pensarmos sobre elas e
suas repercussões no futuro do ensino no país.
É função da universidade iniciar pesquisas que levem em conta as
possibilidades tecnológicas já exeqüíveis num país em desenvolvimento para,
dessa forma, contribuir para a melhoria do ensino no país. O Ensino a Distância,
por exemplo, pode ocupar um lugar de destaque, pois, segundo a Associação
Brasileira de Educação a Distância (ABED), quase dois milhões de brasileiros
usam, atualmente essa modalidade de ensino (Marques, Takahashi, Folha Online
29/09/2004) e segundo o Ibope/ NetRatings (
www.ibope.com.br, acesso em
janeiro de 2006), o brasileiro é o povo que fica mais tempo on-line no mundo: 17
horas mensais contra 15h40min dos franceses, os campeões da Europa (Barreto,
FSP 18/01/2005).
Se considerarmos o expressivo número de brasileiros mostrado na
pesquisa acima e, ainda, que essa demanda se torna a cada dia mais relevante, é
perfeitamente possível procurarmos antecipar, no plano pedagógico, instrumentos
que possam, à sua maneira, prestar contribuições significativas para o ensino no
país e, sobretudo, possibilitar a inclusão de brasileiros que, hoje, por uma
152
conjuntura de natureza histórico-social, encontram-se impedidos de freqüentar
uma escola nos moldes tradicionais.
Essa reflexão serviu como mote para que começássemos a pensar sobre
novos caminhos de ensino de redação que atendessem a uma gama cada vez
maior de alunos.
A idéia da construção de uma Oficina Virtual de Redação surgiu
concomitantemente ao seu objetivo primeiro: poder oferecer espaço de criação e
reflexão a fim de que os alunos exercitem a escrita e, conseqüentemente,
consigam escrever, com competência e adequação textos necessários às
diversas situações de comunicação, para bem desempenhar suas funções de
cidadãos e de trabalhadores brasileiro.
Estudamos o conceito e as gerações de Ensino a Distância. Ao
contextualizarmos nossa pesquisa, os estudos sobre exclusão digital chamaram,
sobremaneira, nossa atenção. Porque um dos aspectos observados pelo Índice
de Desenvolvimento Humano (IDH) é o acesso ao conhecimento, que utiliza a
taxa de alfabetização dos habitantes com 15 anos ou mais e o percentual de
matrículas nos três níveis de ensino, analisamos tais números, divulgados de
1999 a 2005 pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INEP), bem como,
para que tivéssemos noção dos desempenhos em Língua Portuguesa dos alunos
das séries terminais do Ensino Fundamental e Médio, as avaliações feitas, de
1995 a 2003, pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB).
Nesse momento se fez necessário adquirirmos conhecimento sobre a
realidade desses jovens adultos - nada mais natural uma vez nosso objeto de
pesquisa se tratar de uma Oficina Virtual de Redação voltada para concluintes do
ensino médio e pré-vestibulandos - sua distribuição pelo mundo e pelo país,
acesso à informatização e ao mercado de trabalho. As investigações de
Pochmann (2000, 2002 e 2004), sob a perspectiva de um país periférico como o
Brasil, foram de suma importância.
A implicação do uso da modalidade Ensino a Distância fez com que
atentássemos para abordagens já possíveis por meio do computador (Valente,
2004), dinâmicas capazes de promover o aprendizado colaborativo (Palloff e
Pratt, 1999) e ambientes virtuais de aprendizagem (Mason, 1998; Britaine Líber,
153
1999, apud Okada, 2003). Tais estudos serviram de protótipo para a construção
da nossa Oficina Virtual de Redação, que teve por alicerce primeiro as
experiências reconhecidamente bem sucedidas de utilização em três grandes
centros de referência: Laboratório de Estudos Cognitivos (LEC), da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Núcleo de Informática Aplicada à
Educação (NIED) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e
Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP).
O segundo passo centrou-se na operacionalização da Oficina Virtual de
Reação. Voltamos, então, nossos olhos para o processo de ensino-aprendizagem
a distância, mais especificadamente para dois fatores essenciais a sua
concretização: autonomia e interação. Baseamo-nos, para tanto, nos estudos de
Belloni (2001), Moore (1993), Marquesi (2001), Chrysos (2004), Teixeira e
Menezes (2004), Leffa (2004), entre outros.
Valemo-nos, ainda, das reflexões contemporâneas sobre produção textual,
estratégias e avaliação, contidas nos estudos de Siqueira (1990), Fávero (1993),
Koch (1997), Osakabe (1977) e Pécora (1992), para a revisão dos textos
produzidos pelos alunos participantes da Oficina Virtual de Redação. A realidade,
nesse momento, mostrou-nos os primeiros obstáculos: apesar do estabelecimento
de um calendário de produção de textos - uma redação por semana - com a
concordância de todos os alunos participantes, mesmo com a insistência de
lembretes, apenas três alunos escreveram mais de uma redação.
Por conta disso, não dispusemos de um número suficiente de redações
que nos garantisse uma avaliação mais precisa da aferição destes dois fatores:
autonomia e interação. De certo modo, infelizmente, nesse estágio do projeto
ainda não podemos, por tais motivos, assegurar a plena eficácia da nossa Oficina.
Descrevemos, pois, os resultados possíveis e passíveis de observação
mais acurada no plano da eficácia. Quanto ao primeiro aspecto, autonomia do
aluno - sua condição de liberdade com relação ao professor – o fato de, a fim de
estimulá-la, permitimos que fizessem escolhas quanto às propostas de redação,
experimentassem alternativas e percursos diferentes para a solução de um
154
problema, não foram suficientes para garantir a organização e administração dos
compromissos selados.
Curioso é que, ainda que sem enviar as respectivas produções, nenhum
dos alunos desistiu da Oficina. Muito pelo contrário, as mensagens que
chegavam, em resposta às cobranças dos prazos vencidos, davam conta de que
eles mantinham o desejo de participação, no entanto não conseguiam reescrever
os textos. Essa é, pois, uma das constatações fundamentais para os próximos
passos reflexivos sobre a condução pedagógica de uma Oficina Virtual de
Redação que, em nenhum instante, pode menosprezar as efetivas condições de
tempo dos educandos.
Já a revisão das segundas versões tinha como um dos objetivos o
diagnóstico da nossa habilidade em interagir com os alunos, e, evidentemente, a
verificação do progresso obtido pelo aluno a partir de comentários e
esclarecimentos sobre a pontuação dos critérios inicialmente estabelecidos na
primeira versão. Esse procedimento incluía a orientação da proposta de redação
e a inclusão de material de apoio (artigos de jornais e revistas, sugestão de
filmes) e de atividades associadas à modalidade e tematização do assunto
abordado.
Outro de nossos propósitos ressaltava a necessidade de contato com
redações modelos nos exames da FUVEST, UNICAMP entre outros,
consideradas acima da média pelos examinadores. O conhecer implica, a nosso
ver, uma grande experiência para o desenvolvimento da habilidade de
observação estrutural de um bom texto. Recomendávamos, ainda, a troca de e-
mails entre os alunos participantes, a criação de “blogs” para, sobretudo, permitir
o contato “escrito” e a manifestação criativa e “descompromissada” das idéias dos
educandos. Privilegiamos, também, a participação em fóruns de discussão e
conversas via chat.
Comprovamos, com uma única exceção, a impossibilidade de conseguir,
por esses recursos, o aperfeiçoamento das primeiras versões no que se refere,
substancialmente, à argumentação, ao desbloqueio do acesso do autor às
condições de produção que delimitam a sua efetivação como sujeito de discurso
(Pécora, 1992). Nesse sentido, nossos próximos trabalhos deverão contemplar a
155
natureza desses instrumentos tecnológicos virtuais para que possam, sem
subverter os princípios norteadores que os justificam como tais, de alguma
maneira, contribuir, no plano pedagógico, como ferramentas de ativação do
exercício de argumentar. Há, por exemplo, “blogs” em que o autor, a partir de um
fato polêmico da realidade, suscita discussões acaloradas sobre o tema. Um
caminho possível, portanto, dentro da Oficina Virtual de Redação seria o incentivo
à criação de espaços similares.
Um dado considerável, que descobrimos ao final da experiência, refere-se
à perfórmance dos educandos que não tinham computador em casa e nem
acesso fácil à Internet em outras localidades. Semelhantemente aos resultados do
SAEB, referentes aos alunos que estavam, em 2001, nas séries finais de cada
ciclo, alunos nessas condições, advindos da rede pública de ensino, mostraram
desempenho inferior ao daqueles que dispunham de equipamento e acesso e dos
que advieram da rede particular de ensino.
Tal constatação suscita uma nova questão que precisa ser rigorosamente
pensada por estudos preocupados com a inclusão digital, e que pretendem atuar
cientificamente na criação de cursos pela Internet. É preciso, pois,
necessariamente pensar como transformar uma Oficina Virtual de Redação num
projeto de inclusão digital que, principalmente, adentre as escolas públicas e
disponibilize aos docentes e discentes uma ferramenta nova de trabalho. Cremos
que um projeto desse tipo só pode partir de uma eficaz política pública, cujos
propósitos sejam levar ao êxito a educação de todos os alunos, sem que
computador e internet sejam objetos externos a esse processo.
Já notamos, aqui ou ali, certas iniciativas que buscam soluções, ainda
embrionárias, para essa questão tão nova e simultaneamente tão preocupante.
No segundo semestre de 2005, por exemplo, a Secretaria de Educação a
Distância do Ministério da Educação – SEED/MEC, em parceria com a Fundação
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, abriu
edital para interessados em apresentar projetos e materiais didático-pedagógicos
(objetos de aprendizagem e produtos multimídia) no âmbito do Programa de
Apoio à Pesquisa em Educação a Distância – PAPED:
156
O Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância - PAPED é
desenvolvido pela Secretaria de Educação a Distância-SEED, em
parceria com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior-CAPES, para apoiar projetos que visem ao desenvolvimento
da educação presencial e/ou a distância. O Ministério da Educação, por
meio do PAPED, incentiva a pesquisa e a construção de novos
conhecimentos que proporcionem a melhoria da qualidade, eqüidade e
eficiência dos sistemas públicos de ensino, pela incorporação didática
das novas tecnologias de informação e comunicação (
www.mec.gov.br/
seed/paped, acesso em maio de 2005)
Há, também, programas não-governamentais, que buscam promover a
inclusão digital, por meio do uso de tecnologias da informação e da comunicação
(TICs) como instrumento para a construção e o exercício da cidadania, como se
propõe, por exemplo, o “Comitê para Democratização da Informática –CDI” (em
2004, com uma rede de 837 escolas de Informática e Cidadania), “Sua Escola a
2000 por hora” (parceria entre o Instituto Ayrton Senna e a Microsoft, com 66,3 mil
alunos virtuais), “Associação Meninos do Morumbi” (atende a cerca de 4 mil
crianças e adolescentes de baixa renda, em situações consideradas de risco, ou
seja, expostos às drogas e à delinqüência juvenil), “Cidade do Conhecimento” (da
Universidade de São Paulo, envolve, entre outros, professores dos ensino médio
e fundamental, sobretudo da rede pública).
Não sabemos, ainda, a dimensão dos resultados dessas experiências.
Ressaltamos, entretanto, que, na nossa perspectiva, tais estudos servirão de
base concreta para os empreendimentos de real inclusão digital dos menos
privilegiados socialmente. Esse, aliás, é um de nossos propósitos para a
continuidade da pesquisa que ora apresentamos e que, evidentemente,
representa apenas o primeiro passo no amplo percurso que pretendemos traçar.
Se de fato, como afirma Aquino (2005),
uma transformação educacional concreta e relevante é morosa, fruto
de anos de investimentos pesados não apenas do ponto de vista
material, mas fundamentalmente ideológico, (AQUINO, Carta Capital,
28/12/2005, Ano XII, nº 374).
157
consideramo-nos signatários nessa luta de resignificação da escola pública,
principalmente para o jovem que a freqüenta, e sua recolocação na dianteira, de
forma a ajudar o país sair do suposto “estado de sítio ético-político-educacional”
em que se encontra.
158
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A
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C
Cidade do Conhecimento
www.cidade.usp.br
Comitê para Democratização da Informática
www.cdi.or.br
Cúpula Mundial sobrea Sociedade da Informação
www.itu.int/wsis
D
Digitando o Futuro
www.digitandoofuturo.org.br
E
EducaRede
www.educarede.org.br
Escola do Futuro
www.futuro.usp.br
Escola Virtual
www.escolavirtual.org.br
F
Folha de São Paulo Online
www.folha.uol.com.br
Fundação Getúlio Vargas
www.fgv.br
165
I
Instituto Brasil Digital – Vivo
www.ibd.org.br
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
www.ibge.gov.br
Instituto Ethos
www.ethos.org.br
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
www.inep.gov.br
Instituto Nacional de Tecnologia da Informação
www.iti.br
Instituto Porto Digital
www.portodigital.org/instituto
L
Laboratório Didático Virtual
www.labvirt.futuro.usp.br
Laboratório de Estudos Cognitivos da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul - LEC
www.ead.furg.br
M
Ministério da Ciência e Tecnologia
www.mct.gov.br
Ministério da Educação
www.mec.gov.br
Ministério das Comunicações
www.mc.gov.br
N
166
Network Wizards
www.nw.com
Núcleo de Informática Aplicada à Educação – UNICAMP
www.nied.unicamp.br
O
Organização Internacional do Trabalho
www.oit.org.br
P
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
www.pucsp.br
Projeto Clicar
www.eciencia.usp.br/projetoclicar/
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
www.pnud.org.br
Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância – PAPED:
www.mec.gov.br/seed/paped
Programa Nacional de Informática na Educação
www.proinfo.gov.br
R
Rede Nacional de Ensino e Pesquisa
www.rnp.br
Rede Saci- Solidariedade, Apoio, Comunicação e Informação
www.saci.org.br
S
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica - SAEB
www.inep.gov.br/basica/saeb
Sampa.org
www.sampa.org
167
Secretária de Educação a Distância
www.mec.gov.br/seed
T
Tecnologia da Informação no Desenvolvimento da Internet Avançada
www.tidia.fapesp.br
Telecentros – Prefeitura de São Paulo
www.telecentros.sp.gov.br
U
União Internacional de Telecomunicações
www.itu.int
168
ANEXOS
169
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 1
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Entre os dias 19 e 22 de agosto, quinze moradores de rua foram atacados
enquanto dormiam. Sete mortos foi o saldo dessa chacina de excluídos,
ocorrida no centro da cidade mais rica do Brasil. Tal barbárie escancara as
contradições de uma São Paulo que hospeda em suas ruas cerca de dez mil
moradores. Levando em consideração os fragmentos abaixo, escreva um texto
dissertativo em prosa sobre o seguinte tema:
Quem tem medo dos moradores de rua?
1
1. Gênesis 4, 1-16: Adão e Eva tiveram dois filhos: Caim e Abel. Abel era pastor
de ovelhas e Caim lavrador. Aconteceu que ambos ofereceram sacrifícios ao
Senhor. Caim deu frutos das suas terras e Abel os melhores cordeiros do seu
rebanho. O Senhor viu com prazer o sacrifício de Abel, mas não olhou para a
oferenda de Caim. Este ficou muito irritado. O Senhor disse-lhe:
"Por que estás
irritado? Se praticares o bem serás re ompensado, mas se fize s o mal se ás
castigado. Domina as tuas paixões"
. Depois disto, Caim disse a seu irmão:
"Saiamos"
. E, logo que estavam no campo, Caim lançou-se contra seu irmão
Abel e o matou. Imediatamente o Senhor disse a Caim: "Onde está o teu irmão
Abel?". Caim respondeu: "Não sei. Acaso sou o guarda de meu irmão?. Disse-
lhe Deus: "O que fizeste? O sangue de teu irmão grita da terra por mim. Por
isso serás maldito sobre a terra que bebeu o sangue de teu irmão". Então Caim
disse ao Senhor: "O meu pecado é tamanho que não mereço perdão. Esconder-
me-ei do vosso olhar e quem me encontrar me matará". Disse-lhe o Senhor:
"Não será assim". E marcou-o com um sinal para que ninguém ousasse matá-
lo. Caim afastou-se e andou errante pelo oriente do Éden. Os seus
descendentes foram os maus filhos dos homens.
c re r
il
mmtsantos.vilabol.uol.com.br, acessado em 16/09/2004.
2. A sociedade urbana produziu argumentos para uma valorização social da
riqueza e para que esta pudesse ser tratada como um sinal da graça de Deus.
Conseqüentemente a miséria constituía a prova da falta da ajuda divina e
talvez até da sua ira. No plano societário o pobre era tratado como alguém que
subvertia a ordem social e era socialmente perigoso.
Bronislaw Geremek, em
Os f hos de Caim
, um estudo sobre o fenômeno da
marginalidade nas suas múltiplas dimensões, Companhia das Letras, 1995.
3. Macheath: Pois de que vive o homem? Tão somente de maltratar, morder,
matar como um animal insano, e tendo se esquecido inteiramente de que ele
próprio é um ser humano. Bertold Brecht, em
Ópera dos três vinténs
, 1928.
1
Título do artigo escrito por Contardo Calligaris, da Folha de São Paulo, em 26/08/2004.
170
4. Então, dizia a aluna, eu liguei para o 190 e avisei que tinha um homem
caído na calçada passando mal. Por que vocês não o socorreram? - perguntei-
lhe. Ao que ela respondeu: Professora, mas era um mendigo!
Profª Gisa Gasparotto, em 18/08/2004.
5. Mendigo: indivíduo que pede esmolas, que vive da caridade alheia;
desvalido, esmolador, indigente, lazarone, mendicante, miserável, necessitado,
pedinte, pobre. Dicionário
Houaiss
6. ENTREVISTA com o padre Júlio Lancellotti, o responsável pela Pastoral do
Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo: "Quem são essas pessoas?"
Ombudsman da FSP, Marcelo Beraba - Na sua opinião, os jornais de São
Paulo fizeram uma boa cobertura dos assassinatos ocorridos no centro?
Lancellotti -
Uma das coisas que a gente tem pedido para imprensa, mas
parece que o pessoal não ouve, é não chamar de mendigo. É um pedido deles,
que os chamem de pessoas em situações de rua, moradores de rua, povo da rua.
Quanto mais a gente pede para não chamar de mendigo, mais o pessoal chama.
Ombudsman - O senhor acha que isso altera alguma coisa?
Lancellotti -
Altera na formação da opinião pública. Qual o conceito de
mendicância? Ele tem um certo sentido pejorativo. Entre eles, existem pessoas
que vivem da mendicância. Agora, por que continuam na mendicância? Esse
fenômeno, o drama humano, acaba ofuscado. Quem é essa pessoa? Por que tem
esse comportamento? Nós temos trabalhado muito com o conceito de cidadania.
Seria um avanço para um jornal do porte da Folha ajudar a opinião pública a
perceber que a mendicância não é uma condição social. Há pessoas na rua que
até pedem, mas têm as que pegam latinha, que trabalham com papelão, que
fazem outras coisas. Na verdade, o termo mendicância não mostra a
vulnerabilidade social
. FSP, 28 de agosto de 2004.
7. Seres insanos Por onde vagar
Que vivem a despertar Seus corpos inexistentes
Caminham pelas noites À procura de algo para se apoderar
Vagando solitários Tomam almas
Atrás de quem os desejam E as destroem sem compaixão
Vivem querendo a vida Corpos humanos em noites sombrias
Dos humildes existentes Vagam em desejos
Mas as lembranças são vagas E fantasias
Ficando assim sem saber
anjosgoticos.weblogger.terra.com.br/index.htm, acessado em
16/09/2004.
8. Na São Paulo dos meus sonhos, depois dos acontecimentos da semana
passada, teria acontecido o seguinte. Espontaneamente, na noite de segunda-
171
feira, os edifícios e as casas dos Jardins, de Perdizes, da Mooca, do Tatuapé, da
Lapa, da Vila Mariana, do Sumaré, do Itaim etc. iriam se esvaziando. Um a
um ou em família, os paulistanos sairiam às ruas, com um saco de dormir
embaixo do braço, uma lanterna e uma garrafa térmica. E tomariam o caminho
do centro. Nas praças e nas ruas por onde passaram os assassinos, eles se
espalhariam, para passar a noite. A maioria não dormiria. Conversaríamos
com o vizinho do momento ou ficaríamos acordados por medo dos ratos e das
baratas que circulam nas sarjetas. Tanto faz. Seria um jeito de afirmar que a
cidade é nossa, não da morte, e que, como qualquer cidade, temos nossos loucos
e nossos perdidos: eles abandonaram a corrida, mas continuam parte de nossa
comunidade.
Contardo Calligaris, em
Quem tem medo dos moradores de rua?
, FSP,
26/08/2004.
9.
Por meio deste documentário, a sociedade vai ter uma posição melhor
daquilo que é o povo de rua. Na verdade nós não somos lixo. O pessoal não sabe
disso
. Depoimento sobre o documentário
À Margem da Imagem
, de Evaldo
Mocarzel, Brasil, 2003, app.uol.com.br/tvuol/tvuol.php?categoria=trailer,
acessado em 22/09/2004.
172
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 2
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista o artigo abaixo, escreva uma carta para seu autor, Contardo
Calligaris, respondendo à sua pergunta inicial.
Quem tem medo dos moradores de rua?
Na madrugada de quinta-feira passada, no centro de São Paulo, dez moradores
de rua foram atacados a cacetadas na cabeça durante o sono. Até hoje (terça-
feira, quando fecho esta coluna), quatro morreram.
No domingo, novo ataque, do mesmo jeito e no mesmo lugar: morreram mais
dois.
Fala-se dos mortos e dos que estão por um fio, mas não se fala das seqüelas
para os feridos. Se eles têm pinos que não batem direito, paulada a mais,
paulada a menos, qual a diferença? Quando reconheceremos que os loucos e os
perdidos são sujeitos como nós?
Levantam-se hipóteses: foi a obra de sicários a mando de comerciantes
querendo "limpar" a área? Ou um acerto de contas do tráfico de drogas?
Mas a imagem que me persegue é outra: um pequeno bando de assassinos, na
madrugada, percorrendo o centro da cidade, enfurecidos e jocosos como
personagens de "Laranja Mecânica", de barra na mão. No meu pesadelo, por
escárnio, a primeira matança começou onde nasceu a cidade; vejo eles
descerem pela rua São Bento e pela 15 de Novembro, levarem a morte para a
praça da Sé e para a praça João Mendes, assassinarem com gosto o travesti
Pantera, na esquina com a Tabatingüera. E vão embora pela rua da Glória.
No domingo, os mesmos ou outros voltaram para completar a obra. De onde
veio o ódio necessário para erguer o bordão?
Não penso tanto no massacre da Candelária, que foi a tiros, quase profissional.
Penso no índio Galdino, queimado vivo em Brasília em 1997, e na morte de
Edson Neri da Silva, em 2000, logo na praça da República.
O assassinato de Galdino foi uma diversão para filhos de donos do poder.
Colocaram fogo num índio como amarrariam uma serpentina ao rabo de um
vira-lata: vamos ver se o animal grita e pula quando a coisa esquenta. O
"passatempo" desses adolescentes mimados é diferente do ofício metódico dos
assassinos de hoje.
Mas a história de Edson Neri da Silva pode ajudar a entender o que aconteceu
na semana que acaba. Você lembra? Foi a obra de "skinheads" decididos a
acabar com "uma bicha". Os massacres de homossexuais sempre falam da
homossexualidade reprimida de quem mata. Sem exceção, os assassinos
tentam abolir uma fantasia sua. Batendo no "veado" na rua, querem acabar
com o "veado" que não os deixa dormir, o "veado" que está dentro deles.
173
É o mesmo ódio que anima os idiotas que passam de carro ao lado do Jockey
Clube, à noite, para zombar dos travestis. Gritam injúrias para silenciar sua
própria incerteza de gênero e sexo.
Ora, aposto que os assassinos desta semana são tão próximos dos moradores de
rua quanto eram próximos de suas vítimas os "skinheads" da praça da
República em 2000. Aposto que são sujeitos de uma pequena classe média que
a falta de perspectivas ameaça com o espectro da miséria. Aposto que sua fúria
homicida é a vontade de apagar a imagem de seu próprio futuro possível.
Mataram moradores de rua para "festejar" sua diferença, da mesma forma que
os "skinheads" de 2000 quiseram silenciar um desejo que os assombrava.
Na Folha de domingo, Gilberto Dimenstein citou dados recentes da Fundação
Seade: em São Paulo, desde 1995, o desemprego entre jovens de 18 a 24 anos
subiu de 18% a 30%. Gilberto comentava que tamanho desemprego é um dos
"combustíveis da delinqüência". Esse combustível não leva só a assaltar quem
tem mais; ele também leva a massacrar quem não tem nada, para esmagar a
imagem de um destino que espreita.
O que fazer? Além de prender e punir, podemos inventar uma sociedade em
que ninguém esteja a fim de matar a cacetadas o futuro que ele receia. E
podemos lembrar que, nessa sociedade, alguém pode perder casa, renda,
endereço, identidade e até o nome, mas nem por isso será esquecido, nem por
isso parará de ser dos nossos.
Na São Paulo de meus sonhos, depois dos acontecimentos da semana passada,
teria acontecido o seguinte. Espontaneamente, na noite de segunda-feira, os
edifícios e as casas dos Jardins, de Perdizes, da Mooca, do Tatuapé, da Lapa,
da Vila Mariana, do Sumaré, do Itaim etc. iriam se esvaziando. Um a um ou
em família, os paulistanos sairiam às ruas, com um saco de dormir embaixo do
braço, uma lanterna e uma garrafa térmica. E tomariam o caminho do centro.
Nas praças e nas ruas por onde passaram os assassinos, eles se espalhariam,
para passar a noite. A maioria não dormiria. Conversaríamos com o vizinho do
momento ou ficaríamos acordados por medo dos ratos e das baratas que
circulam nas sarjetas. Tanto faz. Seria um jeito de afirmar que a cidade é
nossa, não da morte, e que, como qualquer cidade, temos nossos loucos e nossos
perdidos: eles abandonaram a corrida, mas continuam parte de nossa
comunidade.
Segunda à noite, centenas de representantes de entidades religiosas e de
direitos humanos organizaram uma vigília pelas ruas do centro. O evento não
ganhou as primeiras páginas, mas foi, até agora, a melhor resposta aos
assassinatos.
Sejamos realistas, peçamos o impossível. Que tal decretar um dia em memória
dos mortos desta semana e instituir uma tradição pela qual, a cada ano,
passaríamos uma noite ao relento, ao lado de nossos moradores de rua?
Contardo Calligaris
Folha de São Paulo, 26 de agosto de 2004.
174
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 3
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os textos abaixo, escreva um texto dissertativo sobre o seguinte
tema:
Para os jovens, a aparência é o requisito da identidade pessoal que mais
importa?
1.Meninas turbinadas
Anestesia, pontos, cicatriz, remédios, inchaço, dor, coceira, muitos dias sem
poder levantar os braços... É preciso ter peito para isso. Apesar dos riscos que
uma cirurgia implica, é cada vez maior o número de meninas que fazem
plástica nos seios para se enquadrar no padrão de beleza encarnado por
"turbinadas" como a atriz Danielle Winits.
(...) O número de adolescentes recorrendo à cirurgia para resolver suas
insatisfações com o próprio corpo tem aumentado significativamente. "A
quantidade de meninas que colocam prótese aumentou mais de 300% nos
últimos dez anos", diz o secretário-geral da Sociedade Brasileira de Cirurgia
Plástica, Oswaldo Saldanha.
(...) Auto-estima em alta, sensação de mais feminilidade e maior poder de
sedução: parece mais resultado do trabalho de psicólogos do que de cirurgiões.
"Nós vivemos um tempo em que a identidade do adolescente depende cada vez
mais do julgamento externo. Mas, se você faz a sua identidade dependente do
olhar do outro, você terá problemas com seio ou sem seio", acredita o psicólogo
Miguel Perosa, professor de psicologia da adolescência da PUC-SP.
O cirurgião plástico Leonard Edward Bannet, um dos donos da clínica Santé,
de São Paulo, acha isso uma "bobagem". "Os psicólogos acham melhor pagar
para fazer anos de terapia e não resolver o problema do que botar na mesa de
cirurgia e resolver na hora", afirma. Pelo jeito, cada vez mais meninas
concordam com ele.
ALESSANDRA KORMANN, FSP 02/08/04.
2.
Fiz a cirurgia com 16 anos. Não fiz pelas outras pessoas, fiz para me olhar
no espelho e me senti bem. Não contei para todo mundo porque muita gente
acha errado e não preciso da opinião dos outros. Acho que essas pessoas que
criticam têm inveja. Pelo menos eu tenho peito bonito. Eu sinto como se o meu
corpo tivesse absorvido o silicone, como se o peito fosse meu mesmo. E é: meu
pai pagou e ele é meu.
CAROLINE SIMÕES, 17.FSP,02/08/04.
r
3. Talvez seja hora de pensar com mais calma nos pedidos de cirurgia plástica
que as filhas fazem. Os médicos que são responsáveis não consideram que esse
procedimento deva ser tão banalizado. Há riscos em viver. Trocamos esses
pelos riscos cirúrgicos. É essa a nossa opção?
ROSELY SAYÃO, FSP, 19/08/2004.
175
4.
VAIDADE DE RISCO - Outro suspeito de usar anabolizante para gado
morre em hospital do DF
Morreu na tarde de ontem, em Brasília, Sílvio Santana de Couto, 19, internado
em estado de coma após suspeita de uso de três doses de anabolizantes
veterinários injetáveis com a intenção de aumentar a massa muscular. Se for
confirmado o uso da substância, será a segunda morte em hospitais do Distrito
Federal em menos de um mês pelo mesmo motivo. No período, outros cinco
jovens foram internados, mas já tiveram alta. Outro continua hospitalizado,
mas não corre risco de morte. FSP, 02 de outubro de 2004.
176
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 4
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a Hélio Bicudo ou a
Luís Flávio Borges D’Urso, discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1.A Lei de Crimes Hediondos deve ser revogada? SIM
Crimes hediondos e direitos humanos
Os chamados crimes hediondos estão mencionados na Constituição de 1988,
curiosamente, no seu título VI, que trata dos direitos e garantias
fundamentais. Mais curioso ainda é que, na qualificação desses delitos, ignorou
por completo o constituinte o disposto no título anterior da Carta Política, que
define os princípios maiores que regem a República, em que vem contemplado
como um dos seus fundamentos o respeito à dignidade da pessoa humana,
fazendo, ademais, tábula rasa da advertência constante de seu artigo 5º, inciso
III, segundo o qual ninguém será submetido a tratamento desumano ou
degradante.
Daí, passou-se à definição, mediante a edição de leis complementares, do que
se considera crime hediondo, guardando um alto grau de subjetivismo na
descrição de figuras penais, circunstância profligada pelo direito penal
moderno. Assim, segundo a legislação brasileira, são crimes hediondos o
homicídio praticado em atividade típica de grupos de extermínio e em suas
qualificações constantes do par. 2º, do artigo 121, do Código Penal (crimes
cometidos por motivo torpe ou fútil, com emprego de meio insidioso ou cruel, à
traição ou emboscada ou para assegurar a impunidade de outro crime), o
latrocínio, a extorsão qualificada pela morte ou mediante seqüestro, o estupro,
o atentado violento ao pudor e outros mais.
Isso sem considerar que recebem o mesmo tratamento os autores de tortura, do
tráfico ilícito de entorpecentes e, por fim, o terrorismo (cf. leis 8.072, de
25/7/90; 8.930, de 7/10/94; e 9.695, de 27/8/98).
Ora, de acordo com o mandamento constitucional, esses crimes são
inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia. Isso quer dizer, em última
análise, que para os autores desses delitos inexiste o direito à ressocialização,
pois nem sequer se admite com relação a eles a progressão da pena
estabelecida na legislação pertinente.
Por outro lado, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, recepcionada
pelo disposto no artigo 5º, par. 2º, da Constituição Federal dispõe que:
1) toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e
moral;
2) ninguém deve ser submetido a penas ou tratos cruéis, desumanos e
177
degradantes;
3) toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à
dignidade inerente ao ser humano (artigo 5º, 2). Daí se infere que o disposto no
artigo 5º, XLVII, letra "b" da Constituição é inconstitucional.
O argumento de que, "se está escrito na Constituição, é constitucional" não se
sustenta diante da consideração de que as normas constitucionais não podem
contrariar os fundamentos do Estado que os editou, dentre os quais figuram,
como se viu, o respeito à dignidade da pessoa humana e, de conseguinte, a
prevalência dos direitos humanos (artigos 1º e 4º da Constituição Federal).
Diante desse quadro, não se vê como a Constituição, que conformou o Estado
democrático segundo aqueles princípios, possa conter um dispositivo que impõe
à pessoa humana tratamento cruel, desumano e degradante. Esses dispositivos
devem ser considerados não-escritos. São írritos, pois a sujeição de uma pessoa
às penas de um crime considerado hediondo qualifica o tratamento cruel,
degradante e desumano, que não é tolerado pela Constituição brasileira e pela
Convenção Americana.
Essa classificação delituosa, que contraria tudo o que até agora se escreveu
sobre o conceito de delito, surgiu para atender à paranóia, que ainda hoje
sobrevive, segundo a qual o delinqüente não merece tratamento humano. É
aquela história de que bandido bom é bandido morto.
Resultados práticos, nenhum. Os índices de crimes violentos só têm aumentado
a partir de sua conceituação. E, em decorrência, a população carcerária cresceu
desmesuradamente, tornando inócuos quaisquer esforços para a melhoria do
setor penitenciário.
É por todos esses motivos -outros mais existem- que devemos concordar com o
ministro da Justiça e com o presidente do Supremo Tribunal Federal quando
propõem o reestudo da questão em nome de uma verdadeira justiça penal.
Hélio Bicudo, 82, advogado e jornalista, é vice-prefeito da cidade de São Paulo.
Foi deputado federal pelo PT-SP (1990-94 e 1995-98) e presidente da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, da OEA (Organização dos Estados
Americanos).
2. A Lei de Crimes Hediondos deve ser revogada? NÃO
Necessária adequação constitucional
De repente, o Brasil passou a discutir, novamente, a revogação da Lei de
Crimes Hediondos. Pondero: é o caso de revogação pura e simples ou da
alteração dessa lei, adequando-a constitucionalmente?
Penso que a simples revogação da Lei de Crimes Hediondos (lei nº 8.072), que
estipula o cumprimento integral da pena em regime fechado para uma série de
crimes de alta lesividade, como homicídio qualificado, tráfico de drogas,
tortura, extorsão mediante seqüestro, estupro etc., poderia deixar um vácuo na
legislação brasileira, com conseqüências imprevisíveis, uma vez que todos os
condenados que já cumpriram um sexto das suas penas podem requerer regime
semi-aberto, sendo muitos de altíssima periculosidade. A lei 8.072/90 tem
178
natureza processual e também penal, e sua simples revogação teria efeito
retroativo no âmbito penal, alterando e alcançando processos e condenações do
passado.
Na verdade, estamos diante de uma lei infeliz, pois, nos últimos 14 anos de sua
vigência, não conseguiu reduzir os crimes graves que contempla. Certamente,
uma lei isolada não possui o poder de fazer recuar os índices de criminalidade,
porque a retração do crime depende de uma série de fatores, alguns de ordem
legal, outros de ordem social e política, além daqueles que impliquem a
eliminação da impunidade, uma vez que somente a certeza da punição vem
conseguindo inibir a prática delituosa em todo o mundo.
Um dos argumentos dos defensores da simples extinção da lei é o de que a
revogação contribuiria para reduzir o déficit nas prisões brasileiras, hoje
estimado em 100 mil vagas. Acredito que isso não pode motivar a extinção da
lei, mas sim a sua alteração. A solução para a superpopulação carcerária
brasileira e para um sistema desprovido de humanidade e capacidade de
reabilitar está nas penas alternativas, com a expansão de suas modalidades e
de sua aplicação, ainda tímida no Brasil, quando nos Estados Unidos já atinge
80% dos processos criminais. A prisão deve ficar restrita aos delinqüentes
perigosos, enquanto poderia se combater a impunidade aplicando-se as penas
alternativas para os demais.
Na verdade, o grande problema da Lei de Crimes Hediondos é de ordem
constitucional, por negar a Carta Magna. Por exemplo, quando impede a
concessão de liberdade provisória para os que foram presos em flagrante delito,
incursos na prática desse tipo de crime. Ora, se a Constituição Federal vigente
consagra o princípio da presunção de inocência -segundo o qual todos somos
inocentes, até a sentença penal condenatória definitiva-, negar a liberdade,
determinando a prisão para quem responde a processo, torna-se a negação de
tal princípio.
No lugar de revogar a Lei de Crimes Hediondos, melhor seria a sua adequação
à Constituição vigente. Para tanto, a OAB-SP espera dar sua contribuição
através da criação de uma comissão de estudos, presidida pelo jurista e
professor titular da USP Vicente Grecco Filho.
Um aspecto importante desse estudo é corrigir as distorções entre delitos e
penas. Um exemplo disso é o crime de tráfico de entorpecente, considerado
hediondo e que, na sua lei própria, não faz distinção entre um megatraficante
profissional, que introduz no país uma tonelada de cocaína, e o jovem que
entrega um cigarro de maconha ao seu colega. Pela lei, estamos diante de dois
crimes hediondos, sem direito a liberdade provisória, sem fiança, sem opção de
responder ao processo em liberdade, o que constitui uma injustiça.
Diante desses pontos, em vez de propor a simples revogação da Lei de Crimes
Hediondos, o caminho mais adequado nos parece a reforma, afastando as
inconstitucionalidades.
Luiz Flávio Borges D'Urso, 44, advogado criminalista, mestre e doutor em
direito pela USP, é o presidente da seccional paulista da Ordem dos Advogados
do Brasil. Folha de São Paulo, 21 de agosto de 2004.
179
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 5
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a Rogério Cezar De
Cerqueira Leite ou a João Paulo R. Capobianco e Tasso Rezende De Azevedo,
discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1. O governo deve conceder terras na Amazônia para exploração florestal?
NÃO
Clima e cataclismo
O alerta vem da competente equipe de pesquisadores especializados em
mudanças climáticas, membros do Cptec (Centro de Previsão do Tempo e
Estudos Climáticos), vinculado ao Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais). Em resumo, concluem eles, de observações realizadas em pelo
menos duas décadas, que, a continuar o desmatamento da Amazônia no ritmo
atual e, simultaneamente, persistir a humanidade no consumo desenfreado de
combustíveis fósseis e conseqüente aumento da temperatura média da
biosfera, ocorrerá em algumas décadas a "savanização" de cerca de 60% da
mata amazônica. Savanização é um eufemismo para desertificação.
A queima de combustíveis fósseis e as queimadas emitem gás carbônico e
outros gases que são os principais responsáveis pelo já comprovado, lento
porém inexorável, aquecimento global, cujas conseqüências para a vida na
Terra são imprevisíveis. Estudos realizados também no Inpe já revelam uma
macabra correlação entre as flutuações da densidade de dióxido de carbono na
atmosfera e o daninho fenômeno denominado El Niño. Anomalias, como a onda
de calor que assolou a Europa no ano passado e que só na França sacrificou
2.000 pessoas, são atribuíveis, em última análise, ao efeito estufa devido ao uso
abusivo de combustíveis fósseis.
Não bastassem essas ameaças, a equipe do Inpe vem nos alertar para mais
uma perspectiva lúgubre, a formação de aerossóis como conseqüência de
queimadas -essas partículas interferem na formação de nuvens, reduzindo
localmente as chuvas e a solaridade, com o que a fitomassa é aniquilada,
podendo mesmo ocorrer queimadas espontâneas, fechando-se assim um ciclo
vicioso catastrófico.
Por outro lado, 60% da Amazônia corresponde a uma quantidade imensa de
fitomassa e, conseqüentemente, a um aumento adicional de dióxido de carbono
na atmosfera que poderá vir a se tornar uma calamidade universal. Senão,
vejamos. De acordo com H. Klinge e outros ("Tropical Ecological Systems",
Springer, Nova York), a densidade média da fitomassa na floresta amazônica é
180
de 740 toneladas por hectare na parte aérea, acrescidas de 255 toneladas de
raízes. Portanto a parcela da Amazônia que desaparecerá por queimas ou
decaimento (apodrecimento) será de 300 bilhões de toneladas de fitomassa, ou
seja, o equivalente, quanto à emissão de gases de efeito estufa, a tudo o que a
humanidade já consumiu, desde o início da Revolução Industrial, de petróleo e
gás natural.
Essa emissão poderá resultar em um acréscimo de gases de efeito estufa na
atmosfera igual ao dobro daquele resultante das queimas de petróleo e gás
natural até o presente, pois os oceanos, que vêm absorvendo generosamente
cerca da metade do gás carbônico emitido, poderão deixar de fazê-lo. Há fortes
indícios de que esse processo está se saturando rapidamente. Podemos, pois,
esperar que, com a continuação das queimadas na Amazônia, haja um
acréscimo de dióxido de carbono na atmosfera igual ao ocorrido desde meados
do século 19 devido à queima de todos os combustíveis fósseis, inclusive o
carvão. Teremos 10%, 20%, talvez mais da superfície da Terra inundada, o fim
da fauna marítima, incêndios urbanos, verões insuportáveis, supressão de
safras etc.
Quando, há um quarto de século, este autor aqui no Brasil e alguns outros no
exterior, principalmente nos EUA, alertaram a opinião pública quanto ao efeito
estufa, o descrédito foi total. E isso é compreensível. Um certo grau de
ceticismo é saudável e mesmo obrigatório para o cientista. Todavia o que se
observou, mesmo quando já não havia dúvidas, foi uma atitude de rejeição
irracional em relação a uma realidade crescentemente adversa.
Foi assim que, insatisfeita com nossa própria capacidade de depredação da
floresta, a administração FHC, assistida por vorazes governadores, facultou a
instalação de madeireiras estrangeiras que haviam exterminado a floresta em
seu país de origem, a Indonésia.
Mas parece que as madeireiras indonésias e brasileiras não estão sendo
suficientemente devastadoras, posto que o Ministério (da devastação) do Meio
Ambiente resolveu alugar a Amazônia para madeireiras "sustentáveis". Há, é
verdade, uma vestimenta ecológica perfumada. Mas, como diz o Mefistófeles de
Goethe, "embora vestida com brocados e lantejoulas, uma pulga ainda é uma
pulga".
O pensamento predominante era, até recentemente, o de que, consumindo
menos que 1% do combustível fóssil do planeta, nada de muito efetivo poderia o
Brasil fazer. Mas agora o desmatamento da Amazônia é problema
exclusivamente nosso, a menos que concedamos a internacionalização da área.
Se não o fizermos, temos de assumir essa responsabilidade. Agora que o Sivam
já realizou o objetivo para o qual foi criado -socorrer uma empresa americana
especializada em espionagem e guerra-, poderia se dedicar principalmente ao
monitoramento de queimadas.
Se a floresta amazônica já foi um generoso e benevolente patrimônio nacional,
ela hoje encerra, antes de tudo, uma ameaça de amplo extermínio de vida
vegetal e animal, inclusive humana, que se estende por todo o globo. Talvez
seja necessário criar um Ministério de Proteção do Meio Ambiente.
181
Rogério Cezar de Cerqueira Leite, 72, físico, é professor emérito da Unicamp e
membro do Conselho Editorial da Folha.
2. O governo deve conceder terras na Amazônia para exploração florestal?
SIM
Uso sustentável, com soberania
O projeto de lei para a gestão de florestas públicas deve ser implementado e
será importante para o Brasil. Primeiro, por uma questão de proteção
ambiental e de respeito à legalidade. Segundo, pela forma democrática e
respeitosa com que esse projeto de lei tem sido construído. E, acima de tudo,
pelo que representará para milhões de brasileiros que dependem diretamente
da floresta e de toda a sua biodiversidade.
A falta de um marco legal que permita a utilização em bases sustentáveis das
florestas que recobrem extensas áreas sob o domínio do poder público tem
levado o Brasil a privatizar suas terras públicas, passando esse patrimônio ao
setor privado a partir da emissão de títulos e documentos de posse. Esse
procedimento alimenta o processo de grilagem e ocupação ilegal, sempre
associado à violência contra populações locais, especulação imobiliária,
desmatamento e exploração predatória e ilegal da madeira e outros produtos
florestais.
Para enfrentar esse problema, que tem gerado enormes prejuízos à sociedade
brasileira, o governo federal decidiu elaborar o projeto de lei, em fase de
ajustes finais pelos ministérios relacionados com o tema, sob a coordenação da
Casa Civil da Presidência da República. Seu objetivo é estabelecer uma
alternativa ao uso sustentável da floresta, sem que o poder público transfira o
domínio que possui sobre as mesmas.
Haverá três modalidades de gestão de florestas públicas. A primeira é a
criação e gestão de unidades de conservação de usos sustentáveis, como as
Florestas Nacionais. A segunda é a destinação para uso comunitário de forma
não onerosa e utilizando instrumentos como a criação de assentamentos
florestais, quilombolas e reservas extrativistas. A destinação para
comunidades não implicará pagamento pelo uso da floresta. E, por fim, a
terceira modalidade é a concessão para manejo florestal através de
concorrência pública com pagamento pelo uso da floresta. Isso será feito por
meio de planos anuais de outorga, com ampla consulta pública, para definir as
áreas passíveis de concessão.
É fundamental destacar que o manejo florestal que está sendo preconizado
nessas áreas, no caso da produção de madeira, significa a extração de 5 a 6
árvores por hectare (ou seja, menos de 3% dos indivíduos) a cada 30 anos, o que
é bem diferente do desmatamento que implica a retirada total da floresta, com
perda de biodiversidade. As concessões não serão apenas para a produção de
madeira, mas também de produtos não-madeireiros (como óleos, resinas e
frutos) e de serviços, como o turismo.
182
O Brasil tem excelentes experiências na área de manejo florestal, fruto de
trabalhos científicos de instituições como Embrapa, Inpa, Ibama, entre outras.
Recentemente, o país ultrapassou a marca de 1 milhão de hectares de florestas
tropicais certificadas pelo FSC (Conselho Mundial de Manejo Florestal), que
requer altos padrões socioambientais para a extração de produtos florestais. Ao
atingir essa marca, o Brasil passou a ter a maior área de floresta tropical
certificada do mundo. É esse modelo que o governo pretende adotar para a
gestão de suas florestas públicas.
O projeto de lei é uma iniciativa que foi amplamente discutida por todos os
segmentos representativos da Amazônia e do setor florestal brasileiro,
incluindo movimentos sociais, ambientalistas, trabalhadores, pesquisadores,
governos estaduais e o setor privado. O projeto foi redigido com o apoio de
representes desses segmentos, debatido em dezenas de reuniões regionais e
setoriais. Além disso, ele foi discutido e aprovado na Conaflor (Comissão
Coordenadora do Programa Nacional de Florestas), que reúne representantes
de todos os setores envolvidos com o tema florestal no Brasil.
Finalmente, é importante destacar que praticamente todos os países com
florestas do mundo possuem uma lei para regular o acesso e o uso dos seus
recursos florestais. No caso da Amazônia, onde mais de 45% das terras são
devolutas, a regulamentação proposta nesse projeto de lei é essencial para
assegurar o controle e a soberania sobre o enorme patrimônio florestal público
do Brasil.
João Paulo Ribeiro Capobianco, 41, biólogo, é o secretário de Biodiversidade e
Florestas do Ministério do Meio Ambiente. Tasso Rezende de Azevedo, 32,
engenheiro florestal, é o diretor de Florestas do Ministério do Meio Ambiente.
Folha de São Paulo, 07 de agosto de 2004.
183
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 6
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a Boris Fausto ou a
Arnaldo Malheiros Filho, discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1. O Ministério Público deve conduzir investigações?
SIM
O risco de um retrocesso
Há o risco de um retrocesso -e dos mais sérios- no combate às violações da lei
penal e especificamente à corrupção, se vier a ocorrer uma decisão do STF que
negue ao Ministério Público (MP) funções investigatórias. Não se trata de
hipótese remota, à vista de dois votos nesse sentido já proferidos por membros
da mais alta Corte de Justiça, em caso que envolve um médico e deputado
acusado de desviar recursos do Ministério da Saúde, estando a decisão
pendente dos demais votos.
A questão tem dois aspectos entrelaçados: o primeiro deles é o jurídico,
envolvendo matéria interpretativa; o segundo diz respeito às conseqüências da
interpretação, no âmbito dos interesses coletivos. Comecemos pelo primeiro. O
artigo 129 da Constituição Federal atribui, privativamente, ao MP promover a
ação penal pública. Essa atividade, como acentua recente acórdão do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), em decisão de 25/5/04, depende, para seu efetivo
exercício, da colheita de elementos que demonstrem a certeza da existência do
crime e indícios de que o denunciado é o seu autor; ou seja, depende de uma
investigação. É certo que, no mais das vezes, essa tarefa é efetuada pela
polícia, mas nada impede atividade isolada ou concomitante por parte do MP.
Tanto assim que o inquérito policial -instrução promovida pela polícia- não é
indispensável ao exercício da ação penal, como diz expressamente o art. 39 do
Código de Processo Penal. Mais ainda, a lei complementar nº 75/90, em seu art.
8, inciso IV, confere ao MP "realizar inspeções e diligências investigatórias",
para o exercício de suas atribuições institucionais. Vemos assim que a
interpretação favorável à competência investigatória do MP não resulta de um
esforço imaginativo, mas do bom entendimento da sistemática jurídica, a partir
da norma constitucional.
Sob o segundo aspecto, deixando de lado interesses corporativos que emergem
de toda parte, penso que o interesse coletivo só tem a ganhar com as atuais
atribuições conferidas ao órgão. Como diz a procuradora-geral da República em
São Paulo, Janice Ascari, em entrevista publicada n" "O Estado de S. Paulo"
184
em 1º/8, desde o caso pioneiro, comandado por Hélio Bicudo, sobre o Esquadrão
da Morte, até os mais recentes, como o do juiz Nicolau dos Santos Neves, o do
Bar Bodega e, especialmente, o de Celso Daniel, o Ministério Público tem
realizado inteiramente investigações, ou tem tido destacada atuação, na
apuração de fatos obscuros.
Isso não significa pretender uma hierarquia em que o MP estaria em nível
superior à autoridade policial, embora seja certo que os promotores têm
garantias constitucionais (inamovibilidade, independência funcional e
vitaliciedade) que os deixam mais livres de pressões do que autoridades
policiais.
Por outro lado, convém lembrar que nem sempre a atuação de membros do MP
pautou-se pelo equilíbrio. Lembremos o encarniçamento de alguns
procuradores contra integrantes do governo Fernando Henrique, praticando
injustiças clamorosas -como se viu, por exemplo, nas acusações infundadas
contra o então secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge.
Entretanto, para enfrentar o problema da politização do MP, a que também
estão sujeitas outras instituições, existe em tese o remédio da
responsabilização contra quem comete abuso de poder. Em tese, porque, como
quase sempre acontece, os caminhos da responsabilização são tortuosos e
lentos. É um assunto que, a meu ver, deve ser cogitado na proposta de reforma
do Judiciário, associado ao da criação de um conselho de controle externo do
MP.
Mas, se há problemas a serem enfrentados, retirar do MP suas funções
investigatórias representaria um nítido retrocesso, num país que se caracteriza
pela quase impunidade de responsáveis por ações delituosas de vulto. Na
divisão entre ricos e pobres, presente na consciência popular, está
profundamente enraizada a noção de que só os pobres vão para a cadeia, pois
os ricos têm bons advogados para defendê-los e a Justiça a seu lado. Essa visão
algo simplista deve ser matizada, sob pena de se atingir indiscriminadamente
os membros do Poder Judiciário.
Entretanto onde há fumaça há fogo: amputar as funções investigatórias do MP,
sob alegação de inconstitucionalidade, só contribuiria para alimentá-lo. Mais
ainda, uma interpretação dessa natureza viria contribuir para o crescente
descrédito das instituições democráticas. Dar efetivo conteúdo à igualdade de
direitos e obrigações, independentemente das condições de riqueza e outras dos
cidadãos, é um objetivo que nunca se alcançará de todo, aqui ou lá fora. Mas é
preciso fazer avançar esse objetivo, com medidas concretas, e não retroceder
em um caminho já trilhado.
Boris Fausto, historiador, é presidente do Conselho Acadêmico do Grupo de
Conjuntura Internacional da USP. É autor de, entre outras obras, "A
Revolução de 30" (Companhia das Letras).
185
2. O Ministério Público deve conduzir investigações?
NÃO
Constituição acima de tudo
Respondo não porque não sou a Assembléia Constituinte. É que, em matéria
regulada pela Constituição, perguntas do tipo "isso é bom para o país?", "é
melhor que seja assim?", "não seria um mal menor?", "isso deve ser feito?" não
podem ser respondidas de acordo com a opinião pessoal de quem é indagado,
mas sim nos termos postos pela Lei Maior. Esta, quando inobservada ou
atropelada por boas intenções (das quais não é o reino dos céus que está
cheio...), leva a sociedade ao caos.
Perguntas como essas são feitas com freqüência, especialmente em momentos
de crise ou diante de problemas graves e sem solução aparente. Há 15 anos,
um presidente que se preparava para assumir reuniu uma plêiade de
economistas bem-intencionados e indagou: "Meu governo deve confiscar a
poupança do público?". A economia, na ocasião, era um descalabro; a inflação
tão alta que as coisas dobravam de preço em pouco mais de um mês. Pois bem,
os economistas bem-intencionados, considerando a gravidade da crise e
esquecendo que o Brasil tinha Constituição, responderam em uníssono: "Sim!".
O resto da história todos conhecemos.
A partir daí era de esperar que os brasileiros tivessem percebido que o
tamanho da crise não é desculpa para que se rasgue a Constituição, pois, se
assim for, teremos crise ainda maior.
Por isso, com todo o respeito às boas intenções dos que acham que realmente
seria bom para o país que o Ministério Público conduzisse investigações, acho
que a pergunta correta a fazer, para que não fiquemos restritos aos palpites
dos curiosos, é "a Constituição permite que o Ministério Público conduza
investigações?".
Essa, e somente essa, é a questão que o Supremo Tribunal Federal deverá
responder, pois não cabe a seus ministros dizer o que lhes parece melhor para o
país, mas apenas estabelecer o que a Constituição permite ou não. Nesse
sentido é claramente abusiva a pressão que se tenta fazer sobre o órgão
máximo do Judiciário (até com o uso indevido de recursos públicos), à base de
que as investigações do MP têm contribuído para o esclarecimento de crimes e
de que seria bom que elas continuassem. O Supremo, repita-se, não vai julgar
se as investigações são boas ou ruins, se têm ou não contribuído para a ordem
pública, mas somente se são ou não admitidas pela Constituição.
E a resposta, conforme o entendimento já antecipado por cinco dos 11
ministros, é negativa.
A Constituição, tão justamente criticada por seu excesso de minúcias, trata da
Polícia Judiciária como a instituição competente para a investigação criminal.
Ainda que carregada de viés incriminatório, a verdade é que a polícia não é o
186
mesmo órgão acusador, o que a deixa mais distante do interesse de uma das
partes e, pelo menos em termos ideais, mais próxima da verdade. Suas
investigações são feitas num procedimento chamado inquérito policial,
regulamentado por uma lei, que é o Código do Processo Penal.
A regulamentação do inquérito, que exige que suas peças fiquem nos autos,
sejam elas favoráveis ao interesse acusatório ou defensivo, dá condições para
que seja avaliada a legalidade da atuação policial -cujo controle externo é
atribuição constitucional do MP- e garantidos os direitos individuais. Já as
investigações dos promotores e procuradores se dão à margem de qualquer
normatização, sem regra nenhuma, dando espaço ao arbítrio e à sonegação das
provas que não convierem à acusação.
A ordem constitucional vigente, contudo, reserva ampla gama de atuação ao
MP nas investigações criminais, tão ampla que fica difícil entender a
verdadeira razão de tanto empenho para as conduzir diretamente. O MP pode
requisitar (leia-se "determinar") a abertura de inquérito policial; pode indicar
as diligências que quer ver realizadas; pode acompanhar, com a presença de
seu representante, a realização dessas diligências; exerce o controle externo de
toda a atividade policial. O que lhe falta?
Com tão vasta competência, bem se vê que, se a vontade do MP é investigar,
ferramentas não lhe faltam, desde que o faça dentro da legalidade. Porém, se o
que lhe interessa é exibir poder e exercê-lo arbitrariamente, à margem de
qualquer regramento, como vem ocorrendo, é preciso mais.
E aí vem o argumento de que "quem pode o mais pode o menos", ou seja, se
pode o MP acusar em juízo, pode também investigar. Fosse assim e o juiz, por
poder o mais, que é julgar, poderia também acusar, e acharíamos muito normal
alguém ser julgado por seu próprio acusador, como nos tempos da Inquisição,
aquela que se dizia santa. Lá um mesmo clérigo investigava, torturava,
acusava e julgava -e ninguém diga que, para os objetivos visados, deixaram de
ser excelentes os resultados...
Se queremos viver num Estado democrático de Direito sob o império da
Constituição, o Ministério Público não deve conduzir investigações criminais.
Arnaldo Malheiros Filho, 54, advogado criminal, é professor de direito penal
econômico na FGV-SP e membro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa.
Folha de são Paulo, 14 de agosto de 2004.
187
paLavra Escrita
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Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a Giovanni Guido
Cerri ou a José Aristodemo Pinotti, discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1. Os médicos recém-formados devem passar por um exame de ordem ou
similar?
SIM
Protegendo pacientes e médicos
A única crítica que fiz ao provão do ministro Paulo Renato foi a da timidez de
não avançar para o exame de Estado, que significa a proteção que o governo
tem obrigação de dar aos cidadãos, garantindo-lhes profissionais competentes
em áreas essenciais -entre as quais a principal é a saúde. Quase todos os
países desenvolvidos já o praticam com muita seriedade. Em vários deles a
permissão do exercício da medicina é renovada periodicamente e um exame é
realizado especificamente para a prática da maioria das especialidades.
Esses cuidados têm também sua razão de ser na constante renovação dos
conhecimentos da medicina. Perdemos 30% do nosso saber a cada cinco anos.
Às vezes, fico imaginando que, se tivesse um longo sono de 20 anos e acordasse
agora, estaria totalmente inabilitado para exercer minha especialidade. Por
isso, além das avaliações, deve-se pensar nas estratégias de atualização e
educação continuada, papel adicional e relevante das universidades.
No Brasil, qualquer médico que se gradua em qualquer faculdade de medicina
pode exercer qualquer especialidade, na cidade que for, pelo tempo que quiser.
Felizmente, a lei moral, que cada médico traz dentro de si, a ética ensinada
pelos mais velhos, a responsabilidade que a vocação acarreta e as sociedades
de especialidades, ao conferirem títulos mediante exames, têm, de alguma
forma, substituído precariamente o papel do Estado -que, há muito tempo, de
comum acordo com a Associação Médica Brasileira e o Conselho Federal de
Medicina, já deveria estar estudando e propondo a implantação gradual e a
oficialização desse tipo de avaliação.
A ausência do exame de Estado e a precária exigência dos títulos de
especialistas permitem critérios aleatórios e oportunísticos de credenciamento
e descredenciamento de médicos pelos planos de saúde, que atendem 40
milhões de brasileiros. Sofrem médicos bons e pacientes incautos.
A Agência Nacional de Saúde não criou tampouco regras para o
descredenciamento, que deveria ocorrer somente para os profissionais que não
188
seguissem os protocolos das diferentes sociedades de especialidade, baseados
na Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos, ou que
infringissem a ética profissional e não se atualizassem.
Não quero parecer reducionista, colocando a ausência do exame de Estado e
suas variantes como a única causa do caos instalado na saúde brasileira. Ele
tem muitas origens: privatização acrítica desde o início dos anos 90;
recentralização do SUS, que existe quase perfeito na Constituição, mas, na
prática, é uma caricatura dele mesmo; incompetência da Agência Nacional de
Saúde para mediar o setor privado; uso político da saúde; modelo arcaico de
organização; falta de valorização dos recursos humanos, que enfrentam
enormes dificuldades também em razão da precariedade do ensino médico na
maioria das escolas e pela ausência de avaliação dos profissionais, que começa
(e termina) com um vestibular -vestibular esse que mede apenas a capacidade
dos pais de pagarem cursinho para os filhos, em vez de analisar aptidões,
vocação e outras características essenciais ao exercício da profissão. Tudo isso
culmina com a ausência do exame de Estado.
Para ser médico e exercer a profissão no Brasil, não é exagero dizer, basta
passar no vestibular. Não há reprovação nas escolas e o Estado não cumpre
seu papel preventivo de proteger o cidadão contra os profissionais mal
preparados.
Esse é um problema que podemos corrigir. Sua solução não depende de
recursos, mas de um diálogo franco com as instituições de classe, com os
profissionais e com a sociedade, além de coragem para implementar uma
política de avaliação justa, porém necessária, para proteger os usuários e os
próprios médicos. Médicos que, com certeza, estarão de acordo, mas que
precisam de condições de trabalho e de estudo para se atualizar continuamente
e fazer o que mais desejam: agir com precisão, modernidade e solidariedade
nesse momento quase divino que é o ato médico, o encontro de quem sofre, está
inseguro e doente com quem detém os instrumentos do saber para aliviar o
sofrimento, a insegurança e, muitas vezes, curar doentes e prevenir doenças.
José Aristodemo Pinotti, 69, deputado federal pelo PFL-SP, é professor titular
de ginecologia da USP e presidente do Instituto Metropolitano de Altos
Estudos. Foi secretário da Educação (1986-87) e da Saúde (1987-91) do Estado
de São Paulo, secretário da Saúde do município de São Paulo (2000) e reitor da
Unicamp (1982-1986).
2. Os médicos recém-formados devem passar por um exame de ordem ou
similar?
NÃO
Exame só ataca o sintoma
Implantar um exame para avaliação dos médicos formados, similar ao da OAB,
não é a solução para o problema que há muito vem sendo denunciado por quem
189
se preocupa com a situação do ensino médico e da saúde no país. A realidade
todos conhecem: excesso de escolas médicas, com baixo nível de qualificação,
má distribuição da rede de ensino e concentração de profissionais nas regiões
Sul e Sudeste.
Não me cabe analisar a estrutura do direito no país nem julgar se o exame da
OAB foi a melhor solução para os profissionais da área.
Formar um médico exige uma preparação diferenciada para salvar vidas. A
começar pelo seu vestibular e duração do processo de sua formação, exige-se do
estudante dedicação exclusiva durante o curso, com bons professores,
atividades práticas, treinamento em serviço, aprendizado junto ao paciente,
bibliotecas e muito estudo. Concluído o período de seis anos, o médico tem de se
submeter a um programa de residência médica de, no mínimo, mais dois anos,
além de participar de um processo contínuo de atualização, que envolve a
participação em eventos, exaustivos plantões e atendimento nos serviços de
emergência e pronto-socorro.
Uma escola médica sempre deve estar ligada a um hospital cuja filosofia de
trabalho priorize o ensino e o atendimento, sem abrir mão do princípio da
qualidade e do respeito ao paciente.
Em todo o país, dos 116 cursos de medicina, 27 são mantidos pelo poder público
e estão ligados a hospitais públicos, outros cursos estão ligados a hospitais
filantrópicos e entidades que atendem as camadas de baixa renda, nos quais se
apóiam para programas de ensino médico e oferecem atendimento de
qualidade. Mas a maioria não possui hospital universitário próprio.
A medicina é uma ciência dinâmica e vive um processo contínuo de
atualização, de descobertas, de pesquisas e desenvolvimento de novas
tecnologias. Acompanhar o seu desenvolvimento nas últimas décadas é tarefa
que exige tenacidade. A prevenção, a profilaxia, a evolução da técnica
cirúrgica, os métodos diagnósticos, as cirurgias minimamente invasivas
trouxeram uma nova realidade para a conduta do médico. Por isso, o ensino
médico na atualidade exige grandes investimentos, não só materiais, mas no
homem.
Hoje o Brasil disponibiliza, em 127 escolas em funcionamento, mais de 10 mil
vagas, das quais 70% nas regiões Sul e Sudeste. Algumas dessas escolas abrem
as inscrições para o vestibular sem ao menos terem o reconhecimento aprovado
e criam um fato consumado. Ao sabor de lobbies poderosos, vão quebrando
resistências e o curso se institui. Exigências elementares, como um corpo
docente graduado e preparado ou um hospital para treinamento dos
acadêmicos, ficam só no pedido original.
Falar em exame para médicos é esquecer a causa da doença e tratar o sintoma.
Não adianta punir o aluno e continuar premiando instituições que só visam
lucro ou que oferecem ensino de má qualidade. Se existe uma situação de
falência na formação do médico, o culpado não é o acadêmico, mas a estrutura
por trás de sua formação.
Para atender a políticas equivocadas, permitiu-se a abertura indiscriminada
de escolas médicas em todo o país, sem preocupações com a qualidade, e,
apesar do empenho das entidades médicas, as iniciativas visando coibir ou
190
melhorar esse quadro de ineficiência não encontram amparo no poder público.
Um exame de ordem dos médicos pode criar um imenso contingente de
"bacharéis" para os quais foram feitos altíssimos investimentos, mas impedidos
de exercer sua profissão. Ou, por outro lado, gerará uma imensa rede de
"cursinhos preparatórios" para aprová-los, sem nenhuma garantia de que o
profissional esteja realmente habilitado.
É preciso criar instrumentos de avaliação e fiscalização das escolas médicas,
estabelecendo metas e padrões rigorosos a serem cumpridos,
responsabilizando-as pela qualidade dos profissionais que diplomam e colocam
no mercado. É preciso, também, que se imponham exigências para oferecer
condições de aprendizado a todos que cursam escolas médicas, como forma de
evitar que, na busca de um ensino adequado, o médico seja obrigado a deixar
sua cidade, engrossando a estatística de mão-de-obra desempregada nas
grandes capitais. Após um vestibular difícil, anos de dedicação exclusiva em
um curso de medicina, uma disputada prova de residência para a realização de
uma especialização, não é justo que apenas uma prova venha decidir se ele
pode ou não exercer a sua profissão de médico.
O papel do médico é salvar vidas, e não se transformar no alvo de processos
judiciais por imperícia ou incompetência, resultante muitas vezes de cursos
deficientes, pela omissão de um controle adequado de sua infra-estrutura de
ensino ou por uma política educacional equivocada que prioriza a quantidade, e
não a qualidade.
Giovanni Guido Cerri, 50, é diretor da Faculdade de Medicina da USP e
presidente do Conselho Deliberativo do Hospital das Clínicas.
Folha de São Paulo, 31 de julho de 2004.
191
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 8
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a José Viegas Filho
ou a Walter Fanganieelo Maierovitch, discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1. A Lei do Abate é uma forma de pena de morte?
SIM
Lula suplanta Bush
Na "war on drugs" (guerra às drogas), o aluno Luiz Inácio Lula da Silva
suplantou o seu professor, George W. Bush. Em menos de uma semana, com
duas "penadas" irrefletidas e flagrantemente inconstitucionais, nosso
presidente acabou legitimando a pena de morte no Brasil. Ou seja,
regulamentou o tiro de abate de aeronaves, por suspeita de narcotráfico, e
regrou o afundamento de embarcações tripuladas em mar territorial brasileiro.
Pior, Lula passa a falsa idéia de estar destruindo meros objetos materiais
quando, na verdade, está a autorizar a morte de pessoas suspeitas e de
tripulantes desavisados, como mulheres, idosos etc. Quanto aos inocentes
tripulantes, usa-se a máxima calhorda de que os fins (repressão ao
narcotráfico) justificam os meios (morte).
Na realidade, tudo não passa de pura militarização, imoderada e excessiva, no
enfrentamento da questão das drogas ilegais, com execuções sumárias e
decorrentes de suspeita. Nem a lição de duas tragédias de repercussão
internacional, ocorridas em 1997 e 2001, sensibilizou o presidente Lula e o seu
secretário nacional de Direitos Humanos.
Em 28 de março de 1997, uma Quinta-Feira Santa, a embarcação albanesa
Kater I Rades foi avistada no mar Adriático pela fragata de guerra Sibilla, da
Marinha italiana. A Kater transportava cerca de 200 imigrantes clandestinos,
famintos e miseráveis. O comandante da Kater entendeu em fugir e, ao desviar
dos tiros, afundou a embarcação. Resultado: 108 pessoas mortas, entre
homens, mulheres e crianças. Apenas quatro corpos foram resgatados.
A outra execução sumária ocorreu no Peru, em 20 de abril de 2001. Uma base
norte-americana avisou as autoridades peruanas sobre uma aeronave suspeita
de narcotráfico. Um pequeno avião Cessna passou, então, a ser perseguido por
dois jatos de guerra, sendo um peruano e o outro, norte-americano. O caça da
Força Aérea do Peru acabou derrubando o Cessna a tiros, pois os oito avisos
não foram atendidos: o rádio do Cessna estava quebrado e os sinais não foram
compreendidos pelo piloto.
192
O avião abatido não transportava drogas ilícitas, mas um casal norte-
americano de missionários metodistas e seus dois filhos. Na tragédia,
morreram a mãe, Roni Bowers, de 35 anos, e o bebê Charity, de 7 meses.
A morte de duas cidadãs norte-americanas repercutiu no Congresso e o
governo Bush suspendeu o fornecimento de informações aos países andinos e
ao Brasil. Agora, o país que quiser deverá comprar informações das empresas
privadas de segurança, tipo DynCorp, ou desenvolver seu próprio sistema de
defesa, como o Sivam.
Os grandes traficantes de drogas e os chefões do tráfico de pessoas não
acompanham os pilotos e os navegadores. Esses são "mulas" com brevês ou
navegadores "laranjas". O megatraficante Pablo Escobar, por exemplo, nunca
viajou nos aéreos do "Expresso da Cocaína". Conseguiu, no entanto, comprar e
renovar a sua frota de aviões Cessna e Turbo Commander, com tanques
adicionais, para a "Rota da Farinha", ou melhor, da Colômbia a Porto Rico,
sem escalas.
Antes da tragédia do Peru, o governo norte-americano, por intermédio do então
presidente Bill Clinton e do secretário Barry McCaffrey, forçou os países da
América Latina a adotarem leis para a derrubada de aeronaves suspeitas de
servirem ao narcotráfico. Durante anos, os EUA forneceram informações das
suas bases de Key West, Aruba, Curaçao e Iquitos. Mais ainda,
acompanhavam os ataques.
Convém observar que os negócios de compra de aeronaves, hidroaviões e
embarcações são realizados por meio de financiamentos, com alienação
fiduciária em garantia e testas-de-ferro. E não há fiscalização. No Brasil, a
maior parte das pistas de uso privado para atividades lícitas é clandestina: a
Aeronáutica não autorizou a construção e não fiscaliza o tráfego.
Com efeito, a solução militarizada aprovada pelo presidente Lula viola direitos
e garantias individuais e atenta contra elementares regras de política criminal:
um avião apreendido é vendido em leilão, financia programas preventivos e
operações repressivas. O piloto preso pode virar colaborador da Justiça. Além
disso, o combustível dos aparelhos termina e, com cooperação e sinergia, os
envolvidos são presos.
Pelo que se nota a carta, subscrita por Lula, com críticas à linha da guerra às
drogas e endereçada ao secretário-geral das Nações Unidas, em junho de 1998,
não era para valer.
Pressionado pelo Congresso, depois da tragédia no Peru, o presidente George
W. Bush suspendeu a oferta de informações para os abates e execuções
sumários. Já o aluno Lula, mais rígido que o professor, passou a acreditar que
matar é a solução.
Wálter Fanganiello Maierovitch, 57, juiz aposentado do Tribunal de Alçada
Criminal de São Paulo, é presidente do Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais Giovanne Falcone. Foi secretário nacional Antidrogas da
Presidência da República (1999-2000).
193
2. A Lei do Abate é uma forma de pena de morte?
NÃO
Questão de soberania
Definitivamente, comparar a recente regulamentação da lei nº 9.614, de 5 de
março de 1998, com a adoção da pena de morte no Brasil é um flagrante
equívoco.
Em primeiro lugar, convém esclarecer que o governo do presidente Lula está
regulamentando uma lei aprovada pelo Congresso Nacional durante o governo
anterior. A lei de 1998 dispõe que, "esgotados os meios coercitivos legalmente
previstos, a aeronave será classificada como hostil, ficando sujeita à medida de
destruição". Portanto sua constitucionalidade já foi avaliada e, mais
importante, seu texto mereceu a aprovação das duas Casas do Congresso,
evidenciando que estamos diante de uma legítima aspiração da sociedade. Para
tornar exeqüível a lei, era necessário regulamentá-la. Foi o que fez o governo.
Essa regulamentação decorre de um processo cuidadoso, metódico, que
envolveu amplas consultas, dentro e fora do país -um processo que combinou a
completa autonomia nacional de decisão com a consciência de que seu objetivo
é o de combater um crime de alcance transnacional, o narcotráfico. Toco aqui,
aliás, em um ponto essencial: a regulamentação do tiro de destruição refere-se,
exclusivamente, a aeronaves suspeitas de envolvimento com o tráfico de
drogas.
Outro ponto fundamental consiste no alto rigor técnico com que foram
delineados os procedimentos cuja observância é imprescindível antes que se
possa chegar à decisão extrema -que, na realidade, ninguém deseja- da
destruição da aeronave suspeita. A medida de destruição é a última etapa de
uma série de nove procedimentos, clara e detalhadamente definidos, ao cabo
dos quais ficaria patente a determinação da aeronave suspeita em resistir, de
modo inequívoco, a comandos da autoridade do Estado brasileiro.
Estaremos, portanto, diante de uma atuação hostil deliberada de uma
aeronave, em que seus tripulantes têm plena consciência das conseqüências
possíveis de seus atos de desrespeito à soberania do país. Só será destruída a
aeronave cujo piloto assim o desejar. Repito: até chegar a isso, terão sido
cumpridas nove etapas, ao longo das quais os responsáveis pela conduta da
aeronave terão tido todas as chances de corrigir a sua ação, ou persistir em sua
intenção hostil de forma deliberada e sistemática.
Creio igualmente relevante destacar que a regulamentação se pautou não só
por apurados critérios técnicos, mas também pelo sentido de respeito aos
direitos humanos que inspira o povo e o governo brasileiros. Esse mesmo
sentido, como é natural, orientará a implementação da norma. Daí por que não
seria concebível destruir aeronave que transportasse crianças,
necessariamente inocentes. Seria situação comparável à da atuação da polícia
diante de um seqüestrador que utilizasse uma criança como escudo. A polícia
194
não atiraria. Há limites -impostos, nesse caso, pela proteção à vida de
inocentes- ao uso da força. Mas vale lembrar que, mesmo nessa hipótese, todos
os demais procedimentos permanecerão em vigor, inclusive o acompanhamento
da aeronave suspeita até que saia do espaço aéreo brasileiro e sua passagem ao
controle das autoridades do país vizinho.
Convém também reiterar que nenhuma aeronave devidamente registrada -e
muito menos a aviação comercial- estará sujeita a nenhum tipo de risco e que
nenhuma aeronave hostil poderá ser objeto de tiro de destruição sobre áreas
densamente povoadas e sobre corredores freqüentados pela aviação civil em
geral. Dificilmente deixará de entender a medida que estamos adotando quem
tenha acesso a filmes e gravações, como os que o Ministério da Defesa já exibiu
publicamente, nos quais pilotos de aeronaves suspeitas demonstram total
desconsideração pelas ordens de aeronaves interceptadoras por terem a certeza
de que, em nenhuma circunstância, poderiam ser abatidas.
Trata-se, assim, de uma decisão histórica do governo brasileiro. Nosso espaço
aéreo não pode continuar a ser violado impunemente por criminosos
internacionais que trazem toda a sorte de prejuízos à sociedade brasileira.
Nossa Força Aérea não pode continuar a ser desrespeitada em uma de suas
atribuições mais nobres, que é a de policiar o espaço aéreo brasileiro. Por essas
razões, concordamos com ilustres juristas, dentre os quais o presidente da
Associação dos Juízes Federais do Brasil, que tem afirmado que,
diferentemente de ser pena de morte, "o objetivo não é matar, e sim a garantia
da soberania".
O Brasil, ao regulamentar o par. 2º do artigo 303 do Código Brasileiro de
Aeronáutica, não está, evidentemente, desejoso de abater aeronaves. Mas
precisa poder contar com instrumentos de dissuasão eficazes contra o tráfico
internacional de drogas e suas nefastas conseqüências no aumento da
criminalidade urbana em nosso país.
José Viegas Filho, 61, diplomata, é o ministro da Defesa. Foi embaixador do
Brasil em Copenhague (1995-98), Lima (1998-2001), e Moscou (2001-2002).
Folha de são Paulo, 24 de julho de 2004.
195
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 9
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a Horacio Lafer Piva
ou a José Sarney Filho, discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS / DEBATES
1. A Lei de Biossegurança deve facilitar a produção de OGMs?
SIM
O teste da confiança
Neste momento em que todas as opiniões convergem para a necessidade de o
Brasil somar maiores doses de inovação tecnológica à sua produção, ganha
urgência a aprovação, pelo Congresso Nacional, do estatuto jurídico para o uso,
pela agroindústria brasileira, dos OGMs, as sementes transgênicas. No quadro
de sua recém-anunciada política industrial, o governo federal já acentuou a
necessidade de encorajar a inovação tecnológica; e a inovação mais competitiva
será aquela que puder ser gerada aqui, dentro do país, pelo trabalho de nossos
pesquisadores -na Embrapa, nas universidades e empresas.
Mas, para que esses esforços nacionais realmente floresçam, eles dependem de
vários fatores positivos, e não somente de apoio financeiro às empresas. Em
primeiro lugar está o fator confiança. É preciso acreditar no progresso da
ciência, na evolução permanente da tecnologia e na responsabilidade e
competência dos pesquisadores e das empresas do nosso país e também do
exterior.
Por isso mesmo, a indústria de São Paulo sente-se convocada a expressar,
publicamente, a sua posição de apoio à adoção dos chamados OGMs, os
organismos geneticamente modificados, como variável de progresso científico,
evolução tecnológica e modernidade. Ela também acompanha com atenção o
cenário internacional e não ignora o avanço dos países que são nossos
parceiros, mas também competidores, nos mercados mundiais.
Ainda há dias a mídia americana notou como a China, apesar de ser grande
importadora de grãos, está desenvolvendo na área agrícola um sofisticado
programa de biotecnologia que já a tornou a maior produtora de trigo do
mundo. A Índia, o outro país-baleia da Ásia, conseguiu tantos progressos no
cultivo de grãos que já se dá o luxo de exportá-los. Agora é também a vez da
Rússia, como sublinhou há dias o "Wall Street Journal": nas terras
historicamente férteis da Criméia, o atual milagre é a explosão da produção do
trigo, com a variedade de semente batizada Don 95 e que já preocupa os
196
agricultores do Meio-Oeste americano.
Esses exemplos internacionais são, por si só, convincentes. E o Brasil, o país-
continente que tem as dimensões físicas para se ombrear aos outros, que
realizou a grande revolução agrícola dos anos 90, com a conquista tecnológica
da região do cerrado, exemplo para o mundo?
A Fiesp, obviamente, cuidou de auscultar, sobre a questão dos OGMs, as
entidades setoriais que diretamente representam o agronegócio brasileiro, que
igualmente se definiram de maneira categórica em favor da introdução dos
OGMs. Os argumentos apresentados pela Abag, a Associação Brasileira de
Agribusiness, e pela Abiove, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos
Vegetais, são lógicos e poderosos.
O ponto-chave da questão, sem dúvida, é que esse segmento precisa se situar
de maneira sólida na vanguarda da tecnologia e possuir a capacitação para
desenvolver aquele "valor adicionado" em seus produtos, que vai diferenciá-los
das commodities e lhes dar vantagem competitiva nos mercados mundiais. Eis
o porquê de uma regulamentação legal que encoraje a inovação e que não dê
abrigo às limitações sugeridas pelas emoções políticas e pelo preconceito.
Se existem certos nichos de mercado na Europa cujos consumidores não
desejam produtos geneticamente modificados, como alegam os adversários dos
OGMs, isso não deve impedir o Brasil de fornecer aos amplos mercados
mundiais que pensam de maneira diferente. Mesmo na Europa, ao mesmo
tempo em que entravam em vigor as regras para a rotulagem de alimentos com
engenharia genética, foram abrandadas, em abril passado, as restrições aos
OGMs. Além do mais, o Brasil possui condições geográficas privilegiadas e
únicas para desenvolver simultaneamente produtos não-modificados,
destinados a nichos diferentes de consumidores.
Por tudo isso, a Fiesp pede ao Congresso que complete rapidamente a
tramitação da nova Lei de Biossegurança, levando em conta os termos
originais do projeto 2.401, como haviam sido relatados pelo então deputado,
hoje ministro, Aldo Rebelo. O relatório Rebelo teve a aprovação das entidades
que representam o agronegócio brasileiro e abre o espaço para discussões em
base científica e para processos de aprovação dos OGMs menos burocráticos e
lentos. Sublinhe-se que a lei criará novas atribuições para a Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança, a CTNBio, cujos especialistas terão a missão de
acompanhar e analisar rigorosamente cada passo da biotecnologia brasileira.
A indústria de São Paulo considera necessárias e indispensáveis as normas
técnicas previstas na nova Lei de Biossegurança e vê como amplamente
suficientes as verificações técnicas nela previstas. Posicionamo-nos, portanto,
em favor dos reais interesses do desenvolvimento nacional, pela inovação
tecnológica em qualquer grau, mas com responsabilidade social e pelo avanço
do agronegócio brasileiro.
Horacio Lafer Piva, 47, é o presidente da Federação e do Centro das Indústrias
do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp).
197
2.A Lei de Biossegurança deve facilitar a produção de OGMs?
NÃO
Evolução responsável
No campo dos OGMs, o Brasil, hoje, vive um duplo dilema: é possível assegurar
o progresso científico e tecnológico sem pôr em risco a saúde da população e o
meio ambiente? Na perspectiva constitucional e moral, seria justificável
estabelecer regimes jurídicos de exceção em favor de poderosos segmentos
econômicos, contrariando procedimentos aplicáveis à generalidade dos
brasileiros?
A resposta a essas questões indicará não só o modelo de ordem jurídica
democrática que queremos para o país, como também o grau de respeito aos
valores, objetivos e princípios estabelecidos na nossa Constituição, em especial
o tratamento isonômico a situações iguais ou similares.
Já de início, quero ressaltar que o Partido Verde não é, por uma simples
questão de cego dogmatismo principiológico, contra os transgênicos. Nossa
preocupação é de outra ordem: opomo-nos à posição de alguns atores
econômicos, e até governamentais, que vêem, nas determinações
constitucionais, regras que valem para uns, mas não para outros.
Da padaria ao posto de gasolina, do aterro sanitário à rodovia, da fábrica de
alimentos ou medicamentos às incorporações imobiliárias, de todos se espera o
cumprimento da legislação de proteção do meio ambiente e do consumidor,
inclusive no que se refere ao adequado licenciamento por órgão ambiental
competente. Obrigações que incidem sobre qualquer atividade econômica, mas
que não seriam aplicáveis aos OGMs. Aqui, diz-se, os riscos ambientais devem
ser previamente identificados pela CTNBio!
Não devemos esquecer que, no Brasil, o critério adotado na escolha do órgão
responsável pelo licenciamento de uma atividade em absoluto não é se lhe cabe
regular ou não regular a atividade em questão, mas, sim, se integra o Sisnama
(Sistema Nacional de Meio Ambiente). A ser diferente, como justificar, então,
não dar ao Ministério da Saúde, o maior especialista em riscos sanitários, o
poder de identificar riscos ambientais em empreendimentos e atividades por
ele disciplinados ou controlados? Por que negar ao Ministério dos Transportes,
conhecedor como ninguém das repercussões de toda ordem da abertura de vias,
a possibilidade de fazer o mesmo com rodovias, hidrovias e aeroportos?
A concentração do licenciamento ambiental em um órgão integrante do
Sisnama visa, numa palavra, conferir independência, transparência e
credibilidade ao processo de avaliação dos riscos ambientais. Excepcionar essa
regra, adotada no Brasil pelo menos desde 1981, é, além de desnecessário e
injustificável, abrir um precedente que certamente não se esgotará com os
OGMs. Este, não custa lembrar, ainda é o país onde o provisório vira
definitivo, o excepcional transfigura-se no ordinário.
Isonomia constitucional, valorização dos órgãos ambientais e reconhecimento
198
do princípio da precaução. Este o compromisso que orientou a Câmara dos
Deputados ao aprovar, com o apoio do Partido Verde, a Lei de Biossegurança,
agora sob apreciação do Senado. Fruto de ampla e exaustiva negociação entre
os deputados, governo federal e Estados, representantes empresariais e ONGs,
equilibrado, o texto busca compatibilizar a necessidade do desenvolvimento
econômico e tecnológico com o respeito à Constituição. Não dificulta, nem
muito menos inviabiliza, a produção e comercialização de transgênicos.
Tampouco impõe moratória ou outro tipo de restrição peremptória aos
transgênicos, como defendiam alguns. Simplesmente exige aquilo que se
espera de qualquer atividade ou empreendimento econômico: licenciamento
ambiental, por órgão integrante do Sisnama.
Nossas politicas públicas, principalmente em área estratégica como a dos
transgênicos, não podem ser erigidas sobre as bases impróprias do casuísmo e
da visão acanhada de curto prazo. Não queremos que o Brasil volte a ser o país
da ordem constitucional simbólica ou mutável ao sabor dos ventos do
autoritarismo econômico, onde os direitos são para poucos e as obrigações,
inclusive a de respeitar o devido processo ambiental, aplicam-se aos que não
têm voz nem poder. A boa pesquisa científica e o avanço tecnológico não
demandam privilégios nem postulam aberrações jurídicas, com o fito de
protegê-los das regras que disciplinam a vida dos outros cidadãos.
Antes de ser um salto no escuro do injusto, do inconstitucional e do desprezo às
gerações futuras, nossa Lei de Biossegurança deve chamar a atenção como um
modelo que garanta previsibilidade jurídica e isonomia, ambas condições
básicas da ordem jurídica do Estado democrático e condicionantes do progresso
da ciência. Só assim a manifestação do Congresso receberá o respeito da
sociedade, pacificará os litígios judiciais e permitirá o fortalecimento da
tecnologia nacional, para orgulho e benefício dos brasileiros, os de hoje e os de
amanhã. Será pedir demasiado?
José Sarney Filho, 47, advogado, deputado federal pelo PV-MA, é o líder do
partido na Câmara dos Deputados. Foi ministro do Meio Ambiente (governo
Fernando Henrique).
Folha de São Paulo, 10 de julho de 2004.
199
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 10
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os dois artigos abaixo, escreva uma carta a Plínio Arruda
Sampaio ou a Xico Graziano, discordando de sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1. A reforma agrária baseada na distribuição de terras é eficiente?
SIM
Os males da estrutura anacrônica
Em outros tempos, qualquer pessoa minimamente informada sobre os
problemas do meio rural simplesmente não entenderia a pergunta acima
formulada. Na literatura especializada, a redistribuição dos direitos de acesso
à terra sempre constituiu a essência mesma da reforma agrária.
Mas estamos vivendo tempos estranhos, de modo que se torna necessário
demonstrar o óbvio: não há reforma agrária sem uma distribuição de terras
que afete significativamente a estrutura agrária do país. Basta perguntar: por
que motivo o Estado decide promover uma reforma agrária? Na literatura
clássica, a resposta é: porque esse Estado defronta-se com uma questão
agrária.
A "questão agrária" tem sido tema de volumosa literatura desde os fins do
século 19, e a discussão sobre ela sempre girou em torno dos entraves que uma
estrutura agrária anacrônica cria para a penetração da modernidade no
campo.
Por estrutura agrária sempre se entendeu o conjunto das relações econômicas,
sociais e políticas derivadas da forma de acesso à terra. Quando a terra é
monopolizada por uma classe de proprietários rurais, as relações que eles
estabelecem com a população rural provocam baixa utilização das terras,
exploração extensiva do solo, rigidez da oferta de produtos agrícolas, pobreza
da população rural, submissão social e política do campesinato.
Não se pode, em um quadro desse tipo, construir uma economia agrícola
dinâmica e um Estado verdadeiramente democrático; e não há como alterar
esse quadro somente com medidas de política agrícola. É fato exaustivamente
documentado que a estrutura agrária concentrada gera, por meio das suas
viciadas relações econômicas, sociais e políticas, mecanismos que anulam
automaticamente os efeitos dos estímulos oferecidos pelas políticas agrícolas.
A necessidade da intervenção direta do Estado na estrutura fundiária surge
dessa rigidez estrutural. Só com uma operação "cirúrgica" consegue-se romper
o monopólio da terra -passo prévio ao surgimento de relações econômicas,
200
sociais e políticas novas, propícias à implantação da racionalidade econômica e
dos direitos democráticos no meio rural. A partir da política de modernização
tecnológica iniciada pelos governos militares, os economistas conservadores
passaram a negar os efeitos nocivos da concentração da terra, pois, sem
distribuí-la, até concentrando-a ainda mais, a modernização tecnológica do
campo possibilitara ao setor agrícola acompanhar a evolução da demanda,
aumentar as exportações e melhorar a produtividade da agricultura.
Concluíram daí que a hora da reforma agrária havia passado.
O que esse discurso ideológico omite é o preço dessa "modernização" -preço
altíssimo em termos de desintegração de sistemas produtivos, empobrecimento
de milhões de famílias rurais, emigração maciça da população do campo para
as cidades, degradação ambiental, aumento da dependência tecnológica,
vulnerabilidade alimentar, agravamento dos conflitos rurais, prepotência de
fazendeiros sobre os trabalhadores rurais, desrespeito aos direitos dos
indígenas sobre suas terras.
Esse conjunto de problemas compõe a "questão agrária" brasileira atual, e
nenhum deles poderá ser resolvido enquanto a atual estrutura agrária não for
substancialmente alterada, sendo certo também que, enquanto tais problemas
não forem resolvidos, o Brasil continuará uma economia subdesenvolvida e sua
democracia, uma ficção jurídica.
Para superar o círculo vicioso do atraso e da pobreza, decorrente em última
instância da absurda concentração da propriedade da terra (43% das terras
agricultáveis estão em mãos de 1,7% dos proprietários), a equipe encarregada
de formular o 2º PNRA (2º Plano Nacional de Reforma Agrária) estabeleceu a
meta de assentar, em quatro anos, 1 milhão de famílias em 36 milhões de ha
de terras desapropriadas das grandes fazendas improdutivas. Essa meta seria
suficiente para provocar os desequilíbrios virtuosos que caracterizam um
processo real de reforma agrária.
A redução da meta para 520 mil famílias, determinada pelo governo, não
provoca uma distribuição de terras de magnitude suficiente para provocar tais
desequilíbrios. Portanto ainda é preciso lutar pela reforma agrária, como o
MST e tantos outros movimentos populares vêm fazendo.
Admitir uma reforma agrária sem distribuição de terras constitui uma forma
de confundir a opinião pública, quando não se quer alterar a situação
estrutural do campo. Sempre se pode dar a uma política agrícola o nome de
reforma agrária, mas não se pode, com esse expediente, resolver os graves
problemas que só uma verdadeira reforma agrária resolveria.
Plinio Arruda Sampaio, 73, advogado e economista, é presidente da Abra
(Associação Brasileira de Reforma Agrária). Foi deputado federal pelo PT-SP
(1985-91) e consultor da FAO (Organização das Nações Unidas para a
Agricultura e Alimentação).
201
2. A reforma agrária baseada na distribuição de terras é eficiente?
NÃO
Reinventar a reforma agrária
O distributivismo agrário encerrou seu ciclo. Tornou-se uma proposta distante
de sua época, uma idéia fora do lugar. Formulado há 40 anos, o modelo de
reforma agrária do Brasil está, claramente, superado. Por quê? Porque no
passado, há 50 anos, imperava a terra ociosa, os famosos latifúndios dos
coronéis do sertão ou das oligarquias da capital. O país era eminentemente
rural e a tecnologia de produção incipiente. A mecanização das lavouras se
iniciou só na década de 70.
Naquela época, bastava vontade de trabalhar e uma boa enxada para
prosperar no campo. Os mercados eram predominantemente locais, as
agroindústrias pequenas. Mandava o armazém e as mercadorias se vendiam a
granel. Hoje tudo mudou. Surgiram as redes de supermercados e suas
gôndolas, que atendem a donas-de-casa exigentes, atrás de padronização e
qualidade. A sofisticação da elite se incorporou na classe popular.
Consumidores seletivos direcionam os canais de comercialização agrícola.
Metrópoles são abastecidas ao mesmo tempo em que o país assume a liderança
mundial nas exportações do agronegócio. Isso só é possível porque a
agropecuária se modernizou.
Nesse fabuloso e rápido processo, os latifúndios se transformaram em
empresas rurais. A terra, antes ociosa, agora bate recordes de produtividade.
Açúcar, café, fumo, soja, carne bovina, frango, suco de laranja, papel e celulose
-em vários setores os concorrentes internacionais tomam poeira do caipira
nacional. Gente simples, porém capaz, domina a tecnologia de ponta e dá show
de competência na lide rural.
Cadê o sem-terra? Mudou para a cidade. Expulso pela mecanização ou
mandado embora devido ao temor da legislação trabalhista, o trabalhador
rural se refugiou no emprego, primeiro, da construção civil. Atraído pela
indústria, buscou qualidade na vida urbana. Assim se inverteu a pirâmide
populacional do país. Nas regiões de agricultura desenvolvida, em todas elas,
inexiste desemprego. Pelo contrário, há escassez de mão-de-obra, desde
colhedores de laranja em São Paulo até tratoristas na Bahia. Goste-se ou não,
o Brasil cresceu, urbanizou-se e virou potência agrícola mundial sem
necessitar da reforma agrária. A tese histórica afirmava que, sem eliminar o
latifúndio, não haveria progresso no campo. Era verdade. Quem, entretanto,
realizou a façanha não foi a esquerda, mas o capitalismo.
A distribuição continua concentrada, porém a terra está produtiva. Melhor
ainda, gerando milhões de empregos, dentro das fazendas e fora de suas
porteiras, nas cadeias produtivas que dela se originam. Sem o pasto do boi não
haveria tantas churrascarias nem seus garçons. Do algodão no Mato Grosso se
originam as vendedoras de jeans do shopping center carioca.
202
O que restou para o distributivismo da terra? Infelizmente, a desilusão
urbana, provocada pelo tremendo desemprego. Tendo perdido seu significado
produtivo, propõe-se a reforma agrária como válvula de escape das tensões
urbanas. Assim, o MST, que nasceu movimento social, transformou-se em
fábrica de sem-terra, marca registrada de sua rígida e fortíssima organização.
Gente boa, miserável, mistura-se aos oportunistas e malandros para ganhar
um lote nos assentamentos. Iludidos com promessas de futuro fácil, massas são
manipuladas e treinadas para invadir fazendas e erguer lonas pretas. A classe
média se apieda, enquanto a burguesia, assustada com a marginalidade, apóia
veladamente: faça o favor de seguir para bem longe daqui! Assim, a favela
mudou de lugar -dos barracos na periferia para os acampamentos rurais.
Imaginar que um pobre alienado, sem aptidão nem cultura adequada, possa se
tornar um agricultor de sucesso no mundo da tecnologia e dos mercados
competitivos significa raciocinar com o absurdo. Para alguns, a ideologia
explica; para outros, impera a ingenuidade.
Abstraindo os picaretas da reforma agrária, que engrossam as invasões
tencionando realizar um pequeno negócio imobiliário, os demais, bem-
intencionados, dificilmente sobreviverão na lide rural. Eles não têm preparo
suficiente para enfrentar as barreiras impostas pela moderna forma de
produzir no campo. Basta ver o fracasso dos assentamentos dos últimos 15
anos.
A maior prova da dificuldade em se manter agricultor no mundo atual está nos
4,5 milhões de pequenos e médios produtores rurais, que lutam para
sobreviver. Peguem o alerta da França: seus 2 milhões de agricultores
reduziram-se, em meio século, a somente 500 mil. Mesmo com tanto
protecionismo.
Aqui reside o fulcro da questão agrária recente: nos trabalhadores "com terra",
esses milhões de agricultores tradicionais, netos, bisnetos, descendentes dos
camponeses de outrora. Eles não invadem nada nem criam confusão. Querem
prosperar, isso sim. E estão esquecidos, porque são pacíficos.
É um tremendo equívoco querer realizar, no presente, a reforma agrária que
não foi esquecida no passado. Quem quer mesmo enfrentar a miséria, que
troque a receita velha pelo remédio novo. A tarefa cabe à esquerda. Há que
reinventar a reforma agrária no Brasil.
Francisco Graziano Neto, o Xico Graziano, 51, engenheiro agrônomo, é
consultor de empresas e presidente da ONG AgroBrasil. Foi presidente do
Incra (1995) e secretário da Agricultura do Estado de São Paulo (1996-98).
Folha de São Paulo, 08 de maio de 2004.
203
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 11
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os textos abaixo, escreva uma dissertação em prosa discutindo
o seguinte tema:
Clonagem humana: rumo ao caos ou à imortalidade?
1. Nasce o primeiro clone humano, diz movimento raeliano
da France Presse,
em Miami (EUA) O primeiro clone humano nasceu ontem, afirmou a química
francesa e integrante da seita raeliana Brigitte Boisselier.
(...) O movimento raeliano foi fundado em 1975 pelo ex-jornalista esportivo
francês Claude Vorilhon, autodenominado Rael. (...) Rael prega que a
humanidade pode atingir a imortalidade por meio da clonagem. Também
professa a "meditação sensual", que "permite aos praticantes alcançar o
orgasmo cósmico", a hierarquia entre as raças humanas e a "eugenia", ou
melhoramento pela manipulação genética.
Folha Online, 27/12/02.
1.Anúncio de nascimento do clone humano repercute em vários setores
da Folha de S.Paulo:
Volnei Garrafa, presidente da Sociedade Brasileira de Bioética:
"Acho isso de uma irresponsabilidade total. Se eles conseguiram um clone, o que eu duvido,
porque a tecnologia não está suficientemente desenvolvida, o que fizeram com os embriões em
excesso e os [fetos] aberrantes? Não consigo entender, a não ser por sensacionalismo, qual é a
utilidade da clonagem reprodutiva, quando ainda há muito o que avançar no campo da
fertilização 'in vitro'. Isso fere todo e qualquer aspecto ético da pesquisa e do desenvolvimento
tecnológico".
Isaias Raw, bioquímico, presidente da Fundação Butantan:
"Se é verdade, ia acontecer mesmo. Se era viável na [ovelha] Dolly, é viável no homem. Mas
qual é a consequência dos monstros que eventualmente vamos criar? Há problemas como o
envelhecimento precoce, por exemplo. Você não tem como saber a curto prazo, porque algumas
doenças hereditárias só aparecem depois de uma certa idade".
Glenn McGee, bioeticista da Universidade da Pensilvânia, EUA:
"É uma bobagem. Acho muito, muito improvável que tenham feito um clone. Estão roubando
dinheiro de vítimas inocentes. Os problemas técnicos com macacos são tão grandes que
ninguém conseguiu cloná-los. E eles são primatas, como nós. Boisselier não disse nada sobre
quantas falhas aconteceram em estágios iniciais do processo. Não disse como obteve o
consentimento esclarecido das voluntárias. E trouxe um jornalista de quem ninguém nunca
ouviu falar para comprovar o feito. No mínimo, esse anúncio traz um problema enorme para o
debate sobre células-tronco e clonagem terapêutica
2
".
Levi Corrêa de Araújo, pastor da 1ª Igreja Batista de Santo André:
"Não há por que se assustar com a clonagem. Ela não impede a minha fé. O desenvolvimento
2
É a transferência de núcleos de uma célula para um óvulo sem núcleo. Nada mais é do que
um aprimoramento das técnicas hoje existentes para culturas de tecidos, que são realizadas
décadas. O Estado de São Paulo, 04/11/2004.
204
da ciência é algo absolutamente oriundo da capacidade que Deus deu ao ser humano. E quem
dá o sopro da vida não é o cientista, e sim Deus. O clone é outro ser".
Eduardo Rodrigues da Cruz, professor do Departamento de Teologia e Ciências da Religião da
PUC de São Paulo:
"Do ponto de vista da moral, não só da igreja, clones humanos são inadmissíveis. Então, a
Igreja Católica condenaria e tentaria evitar que essa experiência se repetisse. Mas, se um clone
nascesse, ele teria o estatuto de qualquer ser humano. A condenação aos pais não é extensível
à criança".
Douglas Johnson, diretor legislativo do NRLC (Comitê Nacional de Direito à Vida), dos EUA:
"O NRLC não tem como avaliar a validade das afirmações de que um bebê humano clonado
nasceu e de que outras mulheres estão carregando clones humanos. Mas o que se sabe é isso:
vários laboratórios nos EUA estão trabalhando na criação maciça de embriões humanos
clonados para uso em pesquisas que irão matá-los. Para evitar esses cultivos de embriões
humanos e os outros horrores da clonagem humana que se seguirão, o Senado [dos EUA]
precisa agir rapidamente para aprovar o banimento da clonagem."
Folha de São Paulo, 28/12/2002.
2. Entenda o processo da clonagem. A palavra "clone" vem do grego "klón",
que significa "rebento" ou "broto". A clonagem é uma forma de reprodução
assexuada, que produz um novo indivíduo usando apenas o DNA de uma
pessoa. Os cientistas removem o material genético de uma óvulo não-
fertilizado e o substituem pelo DNA de uma célula do ser que se deseja clonar.
Sob as condições apropriadas, o óvulo começa a se dividir e formar um embrião,
que é implantado em um útero. Para a criação da Dolly, em 1997, primeira
experiência bem-sucedida de clonagem de um mamífero, foram extraídas
células da mama de uma ovelha e delas retiradas seu núcleo, que contém as
informações genéticas. Esses núcleos foram injetados em oócitos --células que
dão origem ao óvulo--, os quais tiveram sua função reprodutora reativada.
Como só foi usado o DNA de uma fêmea, o resultado foi outra fêmea.
Desde então, os cientistas têm tido sucesso em clonar diversos animais. No ano passado,
cientistas dos Estados Unidos clonaram embriões humanos para retirar células-tronco, sem que
eles se desenvolvessem.
Folha Online, 27/12/02.
205
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 12
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os textos abaixo, escreva uma dissertação em prosa discutindo
o seguinte tema:
Como reestruturar as relações da humanidade sem produzir o caos?
1. Terrorismo: uso da violência, por razões ideológicas ou políticas, para
infundir temor à população e procurar desestabilizar o governo.
Minidicionário Sacconi
2. Número de mortos em Beslan chega a 366
Pelo menos 156 crianças morreram entre as vítimas do banho de sangue que
pôs fim ao seqüestro na escola de Beslan (Ossétia do Norte) por terroristas que
exigiam a saída das forças russas da Tchetchênia, república de maioria
muçulmana. O número de mortos subiu de mais de 200 para 366 e há mais de
500 feridos, segundo os últimos dados divulgados pelo governo russo.
Folha de São Paulo, 05 de setembro de 2004.
3. Derrotando o Terrorismo/Defendendo a Liberdade
Os Estados Unidos e a Campanha Internacional para Por Fim ao Terrorismo
Mundial
Hoje, os Estados Unidos e nações em todo o mundo estão engajados em um
esforço sustentado para identificar e destruir uma rede global de terroristas.
Com nossa fé duradoura no ser humano e na liberdade, derrotaremos aqueles
que, cinicamente explorando os temores de outros, não oferecem nada além de
sofrimento e morte.
"Nossa guerra contra o terrorismo não tem nada a ver com diferenças
religiosas", disse o presidente Bush. "Ela tem tudo a ver com pessoas de todos
os credos unindo-se para condenar o ódio, o mal, o assassinato e o preconceito".
www.terrorismo.embaixada-americana.org.br, acessado em 05/09/2004.
4. Outra pergunta é quem são os terroristas?....os árabes que implodiram as
torres gêmeas; os homens-bombas palestinos; os protestantes da Irlanda que
atacam criancinhas católicas ou IRA que ataca populações civis? Não seria
terroristas, os governantes balcânicos que matavam e estupravam mulheres
na sua assanhada limpeza étnica? Ou quem sabe os terroristas seriam as
milícias de pol pot saneando o Camboja em nome de uma luta contra a
democracia burguesa e a implantação de um Estado essencialmente agrícola?
Poderia também serem estes terrorista, os governos das potências ocidentais
206
encabeçados pelos americanos que interviu em Porto Rico, influenciou na
queda dos sandistas da Guatemala, que se omite diante das desgraças do povo
africano; que nega o acesso a tecnologia farmacêutica aos aidéticos pobres dos
países periféricos. que inventou, armou e treinou Sadam Husseim para
trucidar curdos e iranianos; armou e financiou Bin Laden e os
fundamentalistas do Talibã para que fizessem atos de terror contra os
soviéticos. O próprio Fidel, treinado pelos EUA para derrubar Fulgêncio
Batista, é exemplo. A lista e imensa, variada, sofisticada: Pinochet(Chile),
Videla (Argentina), Noriega (Panamá), Papa Doc (Haiti), Sukarno (Indonésia),
Ferdinand Marcos (Filipinas).......Prof. Eustáquio Lagoeiro CastelBranco
http://www.eduquenet.net, acessado em 05 de setembro de 2004.
5. "A experiência provou que o método mais simples de assegurar uma arma
silenciosa e ganhar o controle do público é mantê-lo indisciplinado e ignorante
dos princípios dos sistemas básicos por um lado, e ao mesmo tempo mantê-lo
confuso, desorganizado e distraído com assuntos sem real importância por
outro... o contador pode se tornar rei se o público for mantido ignorante acerca
da metodologia contábil."
Bill Cooper, em Nova Era, extraído do site
www.espada.eti.br, acessado em
05/09/2004.
6. O Congresso americano aprovou a legislação que concede à administração
Bush os novos poderes ditatoriais desejados. Qualquer pessoa racional sabe
que a maioria dessas medidas será inútil no combate ao terrorismo, mas
poderá ser usada para controlar os "dissidentes" e aqueles a quem o governo
julgar incômodos.
www.espada.eti.br, acessado em 2004.05/09/
207
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 13
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista a discussão abaixo sobre o homossexualismo, redija uma carta
a um dos debatedores, João Silvério Trevisan ou Amaury Castanho,
discordando de suas idéias e tentando convencê-lo a acatar a sua opinião.
1.Por que celebrar o orgulho gay?
Hoje comemora-se o Dia Internacional do Orgulho Gay, a partir das lutas em
torno do bar Stonewall Inn, em Nova York, no ano de 1969, quando uma
multidão se rebelou contra a polícia, que, mais uma vez, tentava prender
homossexuais. Em meio aos carros queimados e à batalha campal que durou
três dias, nasceu o moderno movimento pelos direitos homossexuais.
Não que fosse um dado inédito. A luta pelos direitos homossexuais já existia
desde 1897, na Alemanha. A novidade é que, a partir de agora, o movimento
chegava às massas, e não apenas a grupos de intelectuais.
No Brasil, o início do ativismo gay ocorreu em 1978, com a fundação do grupo
Somos, em São Paulo, e do jornal "Lampião", no Rio de Janeiro. Ainda assim,
restringia-se às classes médias. A guinada para um movimento de massas
começou em meados da década de 90, com as paradas do orgulho gay, que já
existem em mais de 30 cidades do Brasil. O clímax foi a ocorrência em São
Paulo, no dia 13 de junho passado, da maior parada gay do mundo, com pelo
menos 1,5 milhão de participantes, segundo dados da PM. Isso aponta para
uma verdadeira mutação cultural no Brasil, país do "faça, mas não diga".
A dimensão do estigma
transformou o homossexual
numa espécie de leproso moral
Ao contrário dos EUA, nunca tivemos leis que reprimissem a prática
homossexual. No entanto o Brasil é um dos países que mais persegue e mata
homossexuais, segundo as estatísticas existentes. As próprias famílias abafam
os processos policiais, envergonhadas de expor a homossexualidade dos seus
parentes assassinados. A dimensão do estigma transformou o homossexual
numa espécie de leproso moral.
Isso reflete a conjuntura internacional. A ONU continua se recusando a aceitar
a homossexualidade como um direito humano. O vigário de Cristo, João Paulo
2º, usa o nome de Deus para veicular homofobia e reforçar preconceitos,
incentivando a violência contra pessoas cuja única culpa é amar fora dos
padrões impostos. Talvez ele desconheça pesquisas norte-americanas
comprovando que adolescentes homossexuais são sete vezes mais sujeitos a
208
tentativas de suicídio do que seus colegas héteros, por problemas de auto-
estima.
Se homossexuais não precisam de licença do papa para amar, também recusam
a crueldade com que o Vaticano tem condenado o amor homossexual. Tal
intolerância evidencia como a Igreja Católica perdeu a dimensão do amor
humano, mas também denuncia como a homossexualidade é sua grande
sombra. De fato, um dos motivos da Reforma protestante de Lutero foi sua
reprovação à grande incidência da prática homossexual no clero católico de
então.
Tal fenômeno não mudou, se considerarmos os atuais escândalos de padres
pedófilos -que indicam mais uma questão de homossexualidade reprimida, já
que, na imensa maioria dos casos, as vítimas são do sexo masculino. A
clandestinidade a que estão sujeitos os padres homossexuais torna mais fácil
atacar coroinhas do que freqüentar abertamente a cena gay. Não por acaso,
certas dioceses americanas estão à beira da falência, graças aos gastos com
processos movidos contra seus padres ditos pedófilos. É a Igreja Católica
pagando um alto preço por sua homofobia.
A pressão política exercida pelos movimentos homossexuais de massa começa a
surtir efeito também no Brasil, onde a comunidade gay desponta como o mais
novo bloco de importância eleitoral. Por um lado, aumentam no país as cidades
e Estados que implantaram leis anti-homofóbicas. No âmbito do governo
federal, acaba de ser instituído o programa Brasil contra a Homofobia,
elaborado por lideranças homossexuais de todo o país. No bojo da recém-criada
Frente Parlamentar Estadual pela Livre Expressão Sexual, a Assembléia
Legislativa de São Paulo realizou uma inédita sessão solene para celebrar o
orgulho gay, mesmo contra a oposição dos deputados evangélicos. Em Brasília,
terminou há poucos dias o 2º Congresso da Associação Brasileira de Estudos da
Homocultura (Abeh), com representantes universitários de todo o Brasil e do
exterior, tomando de assalto a academia, ainda muito refratária aos estudos
homoeróticos.
Pode-se dizer que, hoje, cidadãos e cidadãs homossexuais estão mais confiantes
na conquista da sua dignidade pessoal. Cada vez mais, sentem orgulho de sua
maneira de amar, ao compreenderem que não há nada de errado com ela. A
solidariedade dos movimentos homossexuais de massa incrementa-lhes a
sensação de pertencerem a uma comunidade e reforça sua auto-estima. A
maior visibilidade social oferece uma auto-imagem positiva às novas gerações
homossexuais. E passa uma lição de tolerância, como na Parada do Orgulho
Gay de São Paulo, pela diversidade crescente de participantes.
A parada é hoje a maior festa política deste país, a favor da liberdade de amar,
contra a culpa. A multidão que lotou a Paulista e a Consolação realizou uma
imensa celebração amorosa, na contramão da cultura homofóbica. Mostrou
homossexuais celebrando uma nova compreensão do amor e ensinando este
país a lutar pelo direito de amar -uma proposta política digna de sociedades
democraticamente sofisticadas. Queremos pão, mas queremos rosas também. É
motivo para nós da comunidade homossexual termos orgulho. E para o Brasil
ter orgulho dos seus cidadãos e cidadãs homossexuais.
209
João Silvério Trevisan, 60, escritor e roteirista, é autor de "Em Nome do
Desejo", "Devassos no Paraíso" e "Ana em Veneza" (todos publicados pela ed.
Record). Folha de São Paulo, 28 de junho de 2004.
2.
Sobre o homossexualismo
A igreja que sirvo há mais de 50
anos cumpre o seu dever
desaprovando o comportamento
homossexual
Há anos venho lendo tudo o que se publica sobre homossexualismo. São temas
sobre os quais tenho refletido, não só como bispo da Igreja Católica, mas como
cidadão. Acompanhei todo o farto noticiário sobre a Parada do Orgulho Gay em
São Paulo e no Rio de Janeiro. Antes de tudo, é necessário distinguir, na
referida parada em São Paulo, os homossexuais dos que estiveram na avenida
Paulista apenas como interessados no espetáculo carnavalesco, prestigiado por
certas autoridades.
Em recente artigo publicado na Folha ("Por que celebrar o orgulho gay?", João
S. Trevisan, pág. A3, 28/6), certo articulista não só congratula-se com a maior
parada gay do mundo (sic), como se isso honrasse a cidade de São Paulo e o
Brasil, mas agride injustamente o papa João Paulo 2º, tido por jornalistas como
L. Bernstein e M. Politi, além de políticos como Mikhail Gorbatchov, como a
mais importante personalidade do século 20. O articulista certamente não leu
nenhuma das alocuções do papa sobre o homossexualismo, desconhecendo as
sempre respeitosas referências que faz aos homossexuais, condenando a
violência contra os mesmos.
A igreja que sirvo há mais de 50 anos cumpre o seu dever desaprovando o
comportamento homossexual. Ela o faz tanto em defesa da dignidade humana,
quanto em atenção à revelação divina. Proclamando o casamento e a família
como a legítima união entre o homem e a mulher, comunidade de amor aberta
ao dom da vida, presta um grande serviço à sociedade e se mantém fiel a
numerosos textos do Antigo e do Novo Testamento, entre os quais o da epístola
do apóstolo Paulo aos romanos:
"A ira de Deus se manifesta do alto do céu contra toda a impiedade e
perversidade dos homens (...) De modo que não se podem escusar (...) Eles [os
romanos e outros] extraviaram-se em seus vãos pensamentos, obscurecendo-se
o seu coração insensato (...) Deus os entregou aos desejos de seus corações e à
imundície, de modo que desonraram entre si os seus corpos (...) Por isso Deus
os entregou a vergonhosas paixões. As suas mulheres mudaram as relações
naturais contra a natureza e, do mesmo modo, os homens, deixando a relação
natural com as mulheres, arderam em desejos uns para com os outros,
praticando torpezas homens com homens e recebendo em seus corpos (sic) a
210
paga devida de seu próprio desvario (...) Apesar de conhecerem o justo decreto
de Deus que considera digno de morte aqueles que fazem tais coisas, não
somente as praticam como, também, aplaudem os que as cometem" (Rm, 2, 18-
32).
As destacadas fotos das paradas mostram não apenas a multidão presente,
mas cenas agressivas e escandalosas. Uma delas apresentava uma lésbica
vestida com o hábito das carmelitas. Foi das menos acintosas, entre outras.
Pedindo a igreja e os seus pastores, até com certa freqüência, respeito aos
homossexuais, têm certamente ela e os heterossexuais indiscutível direito ao
mínimo de respeito tanto às crianças quanto às famílias bem constituídas.
Deixando de lado outras inoportunas e inexatas considerações do referido
articulista, é lamentável o desdém de não poucos homossexuais pelo
casamento, a família e a vida. É oportuno recomendar a todos a leitura de
textos não apenas cristãos, mas judaicos, muçulmanos e budistas,
posicionando-se todos contra o homossexualismo e a igualdade de direitos com
os heterossexuais.
O problema de fundo é, na realidade, o da afetividade e sexualidade humanas.
Afirmando alguém que o sexo é fim, e não meio, legitimando a busca do prazer
pelo prazer, tudo é permitido. Porém os que não se deixam levar por um
discutível relativismo ético e moral estarão sempre reafirmando valores
indiscutíveis, como o do verdadeiro casamento e da família, destinados, no
plano de Deus, a nobres finalidades. Entre elas, vem a propósito destacar duas:
a legítima expressão corporal do amor entre homem e mulher, na intimidade
da vida conjugal, e a abertura e o acolhimento ao dom da vida dos filhos, sem
os quais estaríamos caminhando para a "25ª hora".
Rejeitando o homossexualismo, como é seu dever, a igreja e todos os que têm
como ponto de referência valores como a dignidade humana continuarão
respeitando a opção homossexual de quem quiser usar da própria liberdade,
entendendo-a como o direito de fazer o que quiser, e não como a faculdade de
escolher os melhores caminhos para a própria vida e a sociedade.
Ao que me consta, nenhuma igreja cristã aprovou o procedimento de Hitler
contra os homossexuais. Desafio o articulista a apresentar, nos 20 séculos da
longa história da minha igreja, um texto oficial legitimando o
homossexualismo ou qualquer tipo de agressão aos que se comportam como
homossexuais. É lamentável a agressividade contra a igreja por parte de
grupos gays. Feliz a nação cuja lei protege o casamento, a família e a vida!
Dom Amaury Castanho, 76, jornalista, é bispo emérito de Jundiaí (SP). É autor
de, entre outros livros, "A Serviço do Evangelho, do Reino de Deus e dos
Homens". Folha de São Paulo, 05 de julho de 2004.
211
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 14
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os textos abaixo, escreva um texto dissertativo discutindo o
seguinte tema: ATÉ QUE PONTO O COMPORTAMENTO DOS ÍDOLOS
INFLUENCIA O DOS JOVENS?
Texto I
Psicólogos temem 'baby boom' juvenil
Um ''baby boom'' entre as adolescentes brasileiras pode ser um dos efeitos da
tão comemorada e debatida gravidez da apresentadora de TV Xuxa. (...) O
poder de imitação pode ser potencializado ou neutralizado pela maneira como a
gravidez for trabalhada pela TV. ''Não existe uma relação direta e imediata
entre os meios de comunicação e o público, mas eles são veículos de
identificação em que os espectadores projetam seus sonhos'', disse a psicóloga e
feminista Rosangela Rigo.
Marta Avancini. Folha de São Paulo, 10/12/1997.
Texto II
Violência nunca é a melhor solução! (a respeito do episódio em que Chorão,
líder do Charlie Brown Jr, “meteu o crânio e a mão na cara” de Camelo, de Los
Hermanos)
Um estudo divulgado recentemente nos EUA mostrou que, quando os astros do
cinema americano fumam, esse pode ser um mau exemplo para que os mais
jovens se sintam atraídos pelo cigarro. Será então que os comportamentos
agressivos dos grandes ídolos também não influenciam o comportamento do
jovem? "Já que o cara que eu acho o máximo resolve as diferenças na porrada,
por que eu não posso fazer o mesmo?" E será que esse padrão de
comportamento não é ainda mais copiado pelos garotos, que vivem
influenciados por uma cultura machista, em que ninguém pode levar desaforo
para casa e em que a agressividade serve como reafirmação da masculinidade?
Jairo Bouer. Folha de São Paulo, 26/07/2004.
Texto III
Polícia prende o pagodeiro Belo no Rio
As suspeitas de envolvimento do cantor Marcelo Pires Vieira, 30, o Belo, com
traficantes surgiram a partir de grampos, autorizados pela Justiça, em abril de
2002.
No final de 2002, Belo foi condenado pela 34ª Vara Criminal do TJ (Tribunal de
Justiça) do Rio a seis anos de prisão pelos crimes de tráfico e de associação
para o tráfico de drogas.O desembargador Flávio Magalhães afirmou que Belo
212
teve a pena aumentada ( de 6 para 8 anos) por "sua conduta censurável ter
repercutido de forma desfavorável nos admiradores adolescentes".
Folha Online, 05/11/2004.
Texto IV
Em torno dos “ídolos da juventude”, da sua música, se constitui uma
comunidade que permite a generalização de um vocabulário comum, de uma
panóplia (armadura) comum, de trajes, etc, sendo tudo isto igualmente pontos
de apoio para uma auto-afirmação geral da autonomia do adolescente na
sociedade.
Edgar Morin, em
Não se conhece a canção
, 1974.
213
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 15
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista a discussão abaixo sobre a classificação indicativa dos filmes,
redija uma carta a um dos debatedores, Luiz Flávio Gomes ou Rubens Naves,
discordando de suas idéias e tentando convencê-lo a acatar a sua opinião.
TENDÊNCIAS/DEBATES
1. A classificação indicativa dos filmes deve ser mais flexível?
SIM
Educar, melhor que proibir
O Ministério da Justiça, depois de ter posto em pauta e em discussão o
redimensionamento daquilo que é adequado ou inadequado para ser visto pelos
menores, acaba de autorizar o acesso de crianças e adolescentes, de faixa
etária menor que a indicada, a produções audiovisuais destinadas aos
mercados do cinema e dos vídeos (fitas e DVD). Portaria nesse sentido será
publicada na segunda-feira próxima e terá vigência 30 dias depois da
publicação.
A fundamental exigência estabelecida é a obrigatoriedade de acompanhamento
dos pais ou responsáveis legais ou que eles autorizem expressamente outra
pessoa, maior, a conduzir o menor. De modo nenhum, entretanto, poderá
assistir a qualquer produção inadequada para menor de 18 anos.
O Estado, de acordo com os parâmetros constitucionais e legais, vem
cumprindo seu papel de fiscalizar e classificar os espetáculos ou produções,
mas ao mesmo tempo também vem sinalizando claramente que a
responsabilidade pela seleção daquilo que o menor vai ver (ou não) é dos pais -
ou dos seus detentores legais.
É bem provável que nada seja mais sensato, coerente e oportuno do que essa
nova regulamentação, porque a tarefa de bem educar a criança, cuidando do
adequado desenvolvimento da sua personalidade, bem como do seu equilíbrio
emocional, compete à família e aos professores, que integram as bases
primárias da transmissão dos valores mais importantes da civilização -
liberdade, paz, justiça, solidariedade e respeito aos direitos e à dignidade
alheios.
Mas, depois da revolução comunicacional iniciada há 15 anos, já não podemos
nos comportar como antes. Temos que mudar diametralmente nosso enfoque
em relação ao tema em debate. A postura proibitiva ou puramente repressiva
perdeu quase que por completo sua razão de ser com a enorme facilidade que a
internet e a TV nos proporcionam de acesso a tudo quanto é informação ou
214
imagem, incluindo, obviamente, violência, drogas e sexo.
A lógica prioritária agora já não pode ser a de proibir ou permitir -nada disso
mais funciona-, senão a de preparar espiritual e emocionalmente a criança
para saber se posicionar (sempre que possível, criticamente).
A violência exposta nos cinemas e nos vídeos tornou-se, de certa maneira,
romântica diante do extraordinário bombardeio de palavras, escritos, sons e
imagens nocivos que nos traz diariamente o mundo da web, da diversão
(videogame e desenhos animados) e da televisão.
De qualquer modo, ainda que sejam perniciosos os efeitos da exposição diária
das pessoas às cenas de violência e sexo -isso ficou claro na mais densa
pesquisa já elaborada em todos os tempos sobre o assunto e publicada na
revista americana "Science", em abril de 2002-, é certo que não existe uma
relação direta de causa e efeito entre os meios de comunicação e a violência,
que é um fenômeno muito mais complexo do que parece.
Pais e professores, ao que tudo indica, são a chave do enigma. Cada lar e cada
escola formam a essência da personalidade do indivíduo, que deve interpretar
e reelaborar o mundo que o cerca. Consoante os estímulos que a criança recebe
e sua herança genética é que ela vai crescer saudável ou não, infensa às
agressões diárias ou não, violenta ou não.
Elas aprendem suas habilidades e desenvolvem seus valores pela imitação;
mas a raça humana, de qualquer modo, é a única dotada de razão,
discernimento e censo crítico. A única que pode promover a paz onde só reina a
guerra, a falta de respeito mútuo e de solidariedade e a intolerância.
Confiemos, desse modo, nos homens, na sua capacidade de evoluir e de
transcender suas limitações -na sua responsabilidade, em suma-, porque pouco
podem nos ajudar, no mundo atual, as proibições legais.
Luiz Flávio Gomes, doutor em direito penal pela Faculdade de Direito da
Universidade Complutense de Madri, é diretor-presidente da TV Educativa
Ielf. Foi juiz de direito em São Paulo (1983-98) e presidente do IBCCrim
(Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), do qual é co-fundador.
2. A classificação indicativa dos filmes deve ser mais flexível?
NÃO
A discussão vai além da faixa etária
O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, assinou portaria que muda as
regras de classificação indicativa para cinema, fitas de vídeo e DVDs. A
portaria permite que crianças e adolescentes tenham acesso a salas de cinema
cujo filme tenha recebido classificação imediatamente superior à faixa etária
da criança, desde que acompanhada por seus pais. O principal objetivo das
mudanças propostas pelo Ministério da Justiça seria a divisão da
responsabilidade pelo conteúdo do que assistem crianças e adolescentes entre o
Estado, a família e a sociedade.
215
Sem dúvida, situa-se nesse tripé a rede protetora que toda criança deveria ter,
e isso está expressamente dito em nossa Constituição, no artigo 227. No
entanto, considerando ser esse um tema com alto grau de subjetividade e
delicadeza, já que diz respeito ao acesso a conteúdos que poderiam, em tese,
afetar o desenvolvimento psicológico e emocional da criança e do adolescente,
uma mudança dessa ordem deveria ter sido mais discutida com a sociedade.
O Ministério da Justiça realizou pesquisa, em seu site, com 263 pessoas que,
em sua maioria, foram contrárias a uma versão anterior da portaria, que abria
brecha para que uma criança de 11 anos pudesse assistir a um filme
desaconselhável para menores de 16. A atual portaria representa uma
mudança menos radical, mas não deixa de ser apressada. Certamente, 263
cidadãos são um universo reduzido de consultas, a despeito de terem sido
ouvidos especialistas no assunto.
Sabe-se que o desenvolvimento de cada criança e adolescente é único. Há os
que parecem mais maduros apesar da idade que têm, há os que parecem lutar
contra o amadurecimento. É uma questão com alta dose de arbitrariedade, e a
própria opinião dos pais pode não ser consensual a respeito do grau de
amadurecimento de seus filhos. Qualquer mudança nessa área exigiria um
debate aprofundado com especialistas em educação, em comunicação e com
toda a sociedade.
A súbita liberalização da classificação nos cinemas (que não pode ser
confundida com censura, pois está prevista no próprio Estatuto da Criança e do
Adolescente, como forma de proteger as crianças e adolescentes de conteúdos
perniciosos) pode contaminar a discussão sobre a qualidade da programação
voltada às crianças e adolescentes na televisão brasileira. E esta, sim, é uma
discussão com grande alcance, pois atinge todos os níveis socioeconômicos.
Na 4ª Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes, realizada em
abril deste ano no Rio de Janeiro, especialistas do mundo inteiro debateram
esse conteúdo e a importância de criar marcos regulatórios. Patrícia Edgar,
presidente da Fundação Cúpula de Mídia para Crianças e Adolescentes e uma
especialista nesse tema, analisando a programação televisiva para o público
infanto-juvenil, afirmou que ela "está submetida aos interesses da propaganda,
do merchandising e do consumo, quando deveria tratar de questões
relacionadas à vida humana, ao processo de crescimento e autoconhecimento
das crianças".
A própria carta dos adolescentes presentes ao encontro pediu a
regulamentação dos meios de comunicação de massa a partir da criação, pela
sociedade, de conselhos de ética e denúncias em todos os países, além de espaço
nas escolas para que elas possam receber, buscar e utilizar as informações de
forma crítica e produtiva.
Os marcos regulatórios que vêm sendo discutidos em diversos países devem
levar em conta análises de conteúdo da violência no cinema e nas diversas
mídias. Pais e especialistas, meios de comunicação e Estado, crianças e jovens,
todos precisam ser ouvidos, até que se chegue a um grau consensual de
autonomia, dentro do qual as famílias, tão diferentes entre si, possam avaliar
com algum critério o que seus filhos vêem. Para isso, é preciso discutir mais
216
profunda e abertamente, analisar o tipo de influência que os filmes exercem
em pessoas em fase de formação, os diversos tipos de violência (inclusive as
sutis, como as que envolvem preconceito social ou de gênero).
Uma grande produção atualmente em cartaz mostra como essa questão é
complexa. Muitos pais que levaram seus filhos pequenos para assistir à
terceira aventura de Harry Potter foram surpreendidos com a violência e o
impacto de algumas cenas. Certamente, ao tentarem conciliar o sono de seus
filhos à noite, refletiram sobre a adequação ou não do filme, classificado como
livre.
De tão cercados por imagens violentas, seja em telejornais, seja na ficção, será
que não estamos nos tornando gradativamente insensíveis a elas, esquecendo
que, aos olhos de uma criança ou de um adolescente, uma imagem pode chegar
tão potente como um tiro?
Até que essas influências estejam claras, a medida mais prudente seria
revogar a portaria e reeditá-la mais adiante, enriquecida pela discussão sobre
a qualidade da produção cultural e da programação de mídia que começa a
ganhar corpo na sociedade.
Rubens Naves, 61, advogado, membro do Conselho da Transparência Brasil, é
diretor-presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do
Adolescente.
Folha de São Paulo, 03 de julho de 2004.
217
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 16
Modalidade: Carta
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista a discussão abaixo sobre a autoridade na universidade, redija
uma carta a um dos debatedores, Gil da Costa Marques ou Denis Lerrer
Rosenfield, discordando de suas idéias e tentando convencê-lo a acatar a sua
opinião.
1.Falta de autoridade
Um grupo de encapuzados invade uma sala onde se realiza uma reunião. Os
participantes, atônitos, presenciam um fato que foge do seu alcance, pois uma
tal violência abala qualquer pessoa acostumada com formas pacíficas e
normais de convivência.
Pensaríamos normalmente numa tentativa de seqüestro, como as que povoam
nossas imagens televisivas. De tão acostumados, poderíamos, inclusive,
considerá-las "normais", como se normal fosse o rompimento com as formas
civilizadas de convivência humana. No entanto não estamos falando de um
seqüestro, como os que fazem parte das páginas policiais, mas da invasão, por
um grupo encapuzado de estudantes, do recinto em que se realizava a reunião
da Congregação do Instituto de Física da USP, no dia 8 de junho último.
Um instituto da USP, a mais qualificada das universidades brasileiras,
portadora de uma longa tradição, torna-se assim refém de um grupo de
estudantes, na verdade militantes, que retomam práticas características dos
partidos totalitários de esquerda ou de direita.
A violência irrompe com força num recinto universitário, reproduzindo ações
próprias do crime organizado, como se estivesse na moda o desrespeito à lei e
às instituições em geral. Impedir uma reunião acadêmica é, na verdade, um
seqüestro, porém um seqüestro de outro tipo, o das consciências, como se o
dissenso e a discussão não pudessem mais ter lugar. A força teria então
tomado o lugar da palavra e das regras que disciplinam o seu uso.
A violência irrompe num recinto
universitário, reproduzindo ações
próprias do crime organizado
No momento em que vozes universitárias são assim silenciadas, coloca-se toda
uma questão relativa ao exercício da autoridade. Não se pode, com efeito,
considerar tais práticas violentas como toleráveis, pois o limite da tolerância
218
reside nos princípios que tornam a tolerância possível -no caso, o uso da razão.
São intoleráveis práticas que destroem as condições mesmas da liberdade e da
democracia.
Generaliza-se no país uma determinada postura que tem no desrespeito à lei
um princípio de atuação, como se princípio fosse a eliminação de todo princípio.
Nas universidades públicas federais, por exemplo, há um desrespeito
sistemático à lei que estipula, nas eleições para reitor, a proporção de 70% para
professores, 15% para estudantes e 15% para funcionários. Conselhos
universitários pelo país afora deliberam sobre obedecer ou não à lei,
freqüentemente não o fazendo.
E o que fazem as autoridades universitárias e o Ministério da Educação diante
de uma situação desse tipo? Convalidam as decisões tomadas, como se fosse
uma prerrogativa da universidade obedecer ou não à lei!
Uma instituição que deveria ser um modelo de atuação, que deveria oferecer à
sociedade no seu conjunto um espelho de comportamentos exemplares, repete
em seu universo o que já presenciamos na esfera macro do Estado brasileiro.
Uma instituição que se caracteriza pela hierarquia do mérito e da competência
se vê jogada em lutas desregradas pelo poder, inviabilizando, dessa maneira, o
conhecimento que deve produzir.
O que se passa "intramuros" tende a não ultrapassar as barreiras de uma
instituição infelizmente cada vez mais voltada para si mesma, quando,
paradoxalmente, os seus problemas são os da sociedade em seu conjunto,
quando mais não seja porque se trata de recursos públicos, dos contribuintes.
O inédito nesse caso é que um grupo de professores titulares do Instituto de
Física da USP decidiu se manifestar, mostrando a sua indignação, reclamando
providências e mostrando-se disposto a uma discussão pública. Há esperança
quando vozes não se calam. Contudo o que não se viu até agora foi uma
manifestação pública das autoridades universitárias, que têm em suas mãos
instrumentos que podem tanto punir os responsáveis por tais atos de violência,
quanto impedir que esses atos se repitam no futuro.
A complacência com a violência em nome da concórdia ou outro valor do mesmo
tipo traz consigo o germe de atos semelhantes, enfraquecendo a legítima
autoridade e criando condições para o estabelecimento de formas violentas de
exercício do poder. A falta de autoridade abre caminho para outras formas de
autoritarismo.
Denis Lerrer Rosenfield, 53, doutor pela Universidade de Paris 1, é professor
titular de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e editor da
revista "Filosofia Política".
Folha de São Paulo, 01/07/2004.
2. Autoridade na universidade
A universidade é o espaço da diversidade de opiniões, de idéias e de visões de
mundo. Contestar, gerar idéias e teorias é uma postura requerida para o
219
avanço do conhecimento. A boa universidade é necessariamente plural.
Para valorizar e proteger a enorme diversidade existente na universidade não
devem prevalecer, para efeitos institucionais, as posições individuais ou de
grupos, mas as do coletivo. Por isso, as principais decisões são tomadas em
órgãos colegiados, cuja composição privilegia o mérito acadêmico e contempla
todos os partícipes da universidade. Nesse contexto, o princípio básico de um
bom líder consiste em respeitar as divergências e agir em conformidade com o
interesse da coletividade.
Na academia só é possível que um indivíduo exerça influência, ou autoridade,
por meio dos seus dotes intelectuais. Tradicionalmente, a reputação de um
intelectual é construída de modo lento, pelas avaliações cuidadosas e
criteriosas da sua obra, pelas críticas dos seus pares, pelas impressões dos seus
leitores, alunos e colegas. A autoridade não é imposta, mas decorre da
qualidade de sua produção científica e intelectual, da atuação como docente e
da força dos seus argumentos. A autoridade decorre, enfim, da liderança
acadêmica.
Qualquer denúncia deve ser feita
com apego total e exclusivo a
fatos, interpretados dentro de
contextos específicos
Desnecessário fazer aqui uma apologia do papel da intelectualidade no
desenvolvimento da cultura de um país e na formação de uma consciência
nacional. Não é inadequado, assim, afirmar que também da qualidade dos seus
intelectuais dependem os destinos de um país. Cabe aos intelectuais, através
da busca da verdade, contribuir para a construção de uma sociedade
desenvolvida e embasada no conhecimento e na justiça. A ética não permite
que um intelectual terceirize o seu papel ou veicule versões de fatos dos quais
tem informações apenas parciais.
A universidade é avessa à intolerância e à coerção. O desafio dos seus
dirigentes é mantê-la em funcionamento, como a sociedade precisa, sem violar
os princípios que norteiam a academia. Para tanto, são indispensáveis
serenidade e sabedoria, como têm demonstrado, por exemplo, os reitores das
universidades paulistas na presente situação de greve.
Volto-me agora para os episódios recentes ocorridos no Instituto de Física da
USP, do qual sou o diretor, e que foram tratados de maneira equivocada, nessa
prestigiosa coluna, como exemplo de falta de autoridade na universidade
("Falta de autoridade", Denis L. Rosenfield, pág. A3, 1º/7).
Há cerca de um mês, alguns docentes propuseram uma alteração do regimento
do instituto que mudaria substancialmente a composição da Congregação, seu
órgão colegiado máximo. Tinham pressa e, por isso, exigiram uma reunião num
prazo máximo de oito dias. Nessa reunião extraordinária, outros membros da
220
Congregação, incluindo docentes e alunos, contestaram a urgência da
deliberação sobre tema de tal relevância. Em particular, os representantes dos
alunos defenderam a insuficiência da discussão sobre o tema. Num dado
instante, outros estudantes, que estavam reunidos do lado de fora, invadiram,
de forma ruidosa, o recinto no qual a reunião transcorria. Ainda que não
tenham utilizado para isso de força física contra pessoas ou o patrimônio, tal
atitude é intolerável e nada a justifica, uma vez que desrespeita a diversidade
de opiniões e as regras explícitas ou tácitas de funcionamento institucional. A
invasão impossibilitou o prosseguimento daquela reunião.
Cerca de 15 dias depois, a Congregação se reuniu novamente para deliberar
sobre o tema, cuja discussão fora interrompida. A nova reunião ocorreu com a
presença dos representantes dos estudantes e de forma tranqüila. Todavia,
para surpresa de muitos, os mesmos docentes, que antes tinham pressa na
votação do assunto, agora pleiteavam um prazo maior para a apreciação do
tema. Dessa forma, a Congregação decidiu, afinal, praticamente por
unanimidade de votos, pelo adiamento da discussão.
Essa é a forma com que, na universidade, usa-se de autoridade numa situação
de conflito: são criadas as condições para que os mecanismos institucionais de
deliberação possam ser acionados com racionalidade e, preferencialmente,
concórdia.
Esses são os fatos que ocorreram no Instituto de Física e o seu contexto. Eles
diferem, na completeza e na contextualização, dos relatados nessa coluna por
acadêmico distante 1.000 km deles. Em particular, a comparação das ações dos
estudantes com as praticadas pelo crime organizado é ofensiva e totalmente
descabida. Com essa comparação, o acadêmico mostrou desconhecimento dos
estudantes da USP.
Qualquer denúncia deve ser feita com apego total e exclusivo a fatos,
interpretados dentro de contextos específicos. A análise dos fatos pode se
tornar complexa em função das suas várias versões, inevitáveis em situações
de conflito. A prudência recomenda que essa complexidade seja devidamente
considerada. É por esse motivo que os dirigentes devem ser responsáveis
quanto ao exercício de sua autoridade, respeitando os valores institucionais e
de convivência. É assim que é estabelecida e reconhecida a autoridade na
universidade.
Gil da Costa Marques, 58, é diretor do Instituto de Física da USP. Foi
presidente da Sociedade Brasileira de Física e prefeito do campus da USP na
capital.
Folha de São Paulo, 07/07/2004.
221
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista o texto abaixo, escreva um texto dissertativo discutindo o
seguinte tema:
Escola, Comercialização e Pobreza.
"Escola não expande valores humanos", afirma pensador húngaro
FERNANDA MENA , enviada especial da Folha de S.Paulo a Porto Alegre -
01/08/2004
Principal conferencista do 3º Fórum Mundial da Educação --que terminou
ontem, em Porto Alegre (RS), o húngaro István Mézáros, professor emérito da
Universidade de Sussex (Reino Unido), é um dos principais pensadores
marxistas da atualidade.
Leia, a seguir, trechos da entrevista concedida por Mézáros à Folha, em Porto
Alegre.
Folha - Qual é a relação entre educação e pobreza?
István Mézáros - É a relação de um círculo vicioso. A pobreza impede as
pessoas de se educarem e se desenvolverem. E, por outro lado, se as pessoas
não participam e remodelam a sociedade, a pobreza e a exclusão continuam a
crescer. Por muito tempo, ouvimos que a pobreza desapareceria gradualmente
com o desenvolvimento do homem e da sociedade. Hoje, sabemos que isso é
uma fantasia.
Por conta desse círculo vicioso, o contrário está ocorrendo. Nos anos 60, havia
30 pobres na base da pirâmide socioeconômica para cada rico no topo dessa
estrutura. Hoje, contamos 74 pobres para cada rico. No ano 2015, a previsão é
que essa relação alcance cem pobres para cada rico no mundo. Essa é uma
previsão oficial das Nações Unidas. Através da educação você pode tornar as
pessoas capazes de contribuir para a solução de problemas da nossa sociedade,
que tem muitos. Então dá para imaginar a tragédia que significa ter a maioria
absoluta da população mundial hoje sem acesso ao menos à educação primária.
Isso é muito irresponsável. Educação é algo absolutamente vital para o futuro.
Folha - A educação enquanto direito universal não tem sido respeitada por
muitos Estados e, por outro lado, há uma tendência de comercialização do
ensino. Como reverter esse processo?
Mézáros - Há essa tendência de tirar proveito material da educação, assim
como de outras áreas, como a saúde. É preciso haver uma reivindicação social
desse direito. Primeiro porque o Estado sozinho não financia estudo algum. O
Estado é financiado com os recursos que a sociedade transfere a ele, e é desse
dinheiro que tem de aumentar o investimento em educação. A educação
222
privada, comercializada como serviço, só serve para comprar privilégios. E, no
caso das universidades brasileiras [que cresceram mais de 116% durante o
governo de Fernando Henrique Cardoso], tenho certeza de que elas não
sobrevivem sem algum tipo de benefício do Estado, como isenções.
Folha - No que essa onda mercantilizadora da educação influi no conteúdo do
ensino?
Mézáros - A nova escola está orientada para o mercado, para aquilo que se
pode aprender para vencer. Essa orientação da educação é um canal para os
propósitos expansionistas da produção de commodities. Expandir valores
humanos, nesse sentido, se torna algo irrelevante, porque não gera lucro
direto. O interesse hoje é de criar meios de expansão do capital. O que as
pessoas aprendem para sua realização pessoal, os chamados valores úteis, tem
cada vez mais sido compreendido como valores comerciais ou valores de troca.
A grande reforma será redirecionar o conceito de valor útil para eliminar as
condições miseráveis da humanidade hoje.
223
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista o texto abaixo, escreva um texto dissertativo discutindo o
seguinte tema:
Interação entre família, aprendizagem e saúde da criança.
1.Escola pública boa deve começar em casa
A receita para uma boa escola pública é simples e dá resultados. Seus
principais ingredientes são a participação dos pais, o interesse da família pela
vida escolar do aluno, o estímulo à leitura e o hábito de fazer e corrigir o dever
de casa. Junta-se a isso a vontade do diretor em colocar em prática essas lições
e, como resultado, há uma melhoria no desempenho.
O efeito positivo das práticas acima vem sendo comprovado cientificamente.
Pesquisa com 26 mil alunos de 200 escolas públicas de São Paulo e Santa
Catarina que fazem parte do projeto Gestão para o Sucesso Escolar (voltado
para diretores) mostra que os ingredientes citados melhoram o desempenho
dos estudantes.
Para chegar a essa conclusão, foi feito um cruzamento da nota de alunos de 4ª
e 8ª série em provas de português e matemática com respostas dadas por eles a
um questionário socioeconômico.
A pesquisa mostrou que alunos da 4ª série que afirmaram que os pais tinham o
costume de perguntar se eles estavam indo bem na escola tiveram média de
acertos de 62% na prova de português.
Entre os estudantes que disseram que os pais quase nunca faziam essa
pergunta, a média cai para 47%. O resultado foi parecido entre filhos de pais
que costumam participar de reuniões da escola. Nesse grupo, a média de
acertos foi de 62%. Se os pais quase nunca vão às reuniões, a porcentagem cai
para 48%.
Para Rose Neubauer, diretora-presidente do Instituto Protagonistés e
coordenadora da pesquisa, ela mostra que mesmo pais com pouca escolaridade
podem ajudar os filhos a ter boas notas se demonstram interesse pela vida
escolar da criança e participam das atividades do colégio. "Se o pai estimula o
filho a não faltar e ter boas notas, faz muita diferença entre as crianças da 4ª
série."
Um estudo divulgado em julho pelo Inep, do Ministério da Educação, a partir
de dados do Saeb (exame que avalia a qualidade da educação), chegou a
conclusão idêntica: alunos cujos pais se preocupam com o que acontece na
escola e que cobram os deveres de casa têm médias maiores.
A pesquisa nas escolas de São Paulo e Santa Catarina mostra que o hábito de
fazer dever de casa é uma das variáveis que mais têm impacto positivo. Se o
aluno tem o hábito de fazer dever e os professores cobram dele que o faça, a
224
média de acertos é de 63% em português na 4ª série.
Se o aluno faz pouca lição de casa, a média cai para 44%; quando os professores
não cobram, para 43%.Para Neubauer, pesquisas que analisam os fatores de
sucesso do aluno dão um instrumento para as escolas melhorarem. Para
Francisco Poli, secretário da Udemo (sindicato dos diretores em São Paulo), os
resultados da pesquisa mostram que a escola precisa trabalhar não só com o
aluno mas também com os pais e trazê-los para o ambiente escolar.
Ele diz também que é importante que a escola esteja preparada e equipada
para oferecer aos alunos mais carentes o que eles não têm em casa: "A escola
não substitui a família, mas pode ajudar se os mais carentes tiverem aulas de
inglês, informática ou passarem mais tempo nela".
Folha de S.Paulo, 01 de agosto de 2004.
2.Instituto vai estudar a interação entre família e saúde da criança
Um local dedicado ao estudo da interação entre pais e filhos e da sua influência
na saúde física e mental das crianças e adolescentes. É o que pretende o recém-
criado Instituto da Família, que reunirá especialistas em pediatria, psicologia,
pedagogia, filosofia, entre outras áreas. As atividades começam no próximo
ano.
Dirigido pelo pediatra Leonardo Posternak, 57, do Hospital Israelita Albert
Einstein e do Comitê de Saúde Mental da Sociedade de Pediatria de São Paulo,
o instituto oferecerá cursos de especialização a médicos e atenderá famílias que
estejam vivenciando situações de conflito. Mas ainda depende de parcerias
para a viabilização de alguns projetos.
Segundo Posternak, a criança é vista hoje de forma fragmentada e, muitas
vezes, doenças inexplicadas ou atitudes problemáticas são resultado de um
conflito intrafamiliar. O médico é autor de dois livros, o último --"O Direito à
Verdade - Cartas para uma Criança"-- foi vencedor do prêmio Jabuti de
psicologia de 2003.
A seguir, alguns trechos da entrevista dada à Folha
Folha - A curto prazo, é mesmo possível fazer com que os pediatras, durante
uma consulta, avaliem essa relação entre pais e filhos e detectem possíveis
conflitos?
Leonardo Posternak - Se não mudar o currículo do médico, ele não muda a
maneira de enxergar a medicina. Hoje ele não considera que as relações
familiares têm um peso importante no aparecimento de doenças físicas ou
psíquicas na criança. O instituto quer estar ao lado das faculdades de
medicina, extracurricularmente, trabalhando com a promoção e a prevenção da
saúde familiar, mostrando que o pediatra é muito mais que um médico de
criança.
Ele é o primeiro profissional que a família chama para cuidar do crescimento
familiar. Por isso é preciso que ele tenha um currículo que extrapole o
conhecimento biológico da criança. O mesmo objeto de estudo tem que ser
olhado de vários lugares porque senão acontece a fragmentação da criança, que
passa por neuropediatras ou fonoaudiólogos porque tem dificuldade escolar. Às
225
vezes, quando vemos isso integrado à família, descobrimos que a dificuldade de
aprender é resultado de um conflito
intrafamiliar. Folha de S.Paulo, 01 de agosto de 2004.
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista o texto abaixo, escreva um texto dissertativo discutindo o
seguinte tema:
Voto: direito ou obrigação?
O exemplo mais claro, porém também um pouco enganoso, da relação
entre direitos e deveres, ou da idéia de que a democracia não se resume nos
direitos humanos, mas implica as questões da participação e do poder do povo,
está na discussão sobre a obrigatoriedade do voto. Muita gente diz: se o voto é
um direito, como pode ser uma obrigação? Pois ele é exatamente essas duas
coisas, ilustrando muito bem essa síntese que vem de Roma, da cidadania como
direito e obrigação. Se, por hipótese, todos nós, estando isentos da obrigação
de votar, não votássemos, a sociedade deixaria de ser democrática, pois
deixaria de haver governo eleito. O voto é interessante, talvez sobretudo para
minha geração, que só veio votar de verdade quando tinha mais de quarenta
anos. Entre 1960 e 1989, nenhum brasileiro, salvo poucos generais, votou para
presidente! É claro que, mais importante que votar a cada dois ou quatro anos,
é a pessoa atuar, constantemente, na defesa dos direitos seus e dos outros.
Mas, com isso, minha posição na questão do voto é a mais oposta possível à dos
defensores de seu caráter facultativo. Eles acham que votar já é muito. Eu
acho que é pouco. E o cerne do erro deles está em conceberem a liberdade e o
direito como bem privado. Nesse sentido, aliás, captam muito bem um traço
freqüentíssimo no Brasil, que consiste em considerar as coisas do ponto de
vista do indivíduo, de sua vantagem, de seu patrimônio. Pensa-se, então: "se
tenho um direito, posso fazer uso dele da maneira como eu quiser, inclusive
não fazendo uso". Assim como o direito de guiar um carro inclui o direito de
não guiar carro, imagina-se que o direito de votar, ou de participar da coisa
pública, inclua o direito de não fazer nada disso. Mas são direitos diferentes,
um de claro perfil privado, outro de caráter público. Ou, para usar a linguagem
do pensador liberal Isaiah Berlin, o direito de ter carro, e em suma os direitos
de ter, pertencem ao mundo da liberdade negativa (
freedom from...)
, que é
tanto maior quanto menos houver interferência do outro ou do setor público, ao
passo que o direito de votar, diria eu, pertence à esfera da liberdade afirmativa
ou positiva (
freedom to...
). Se não tivermos isso claro, não construiremos uma
sociabilidade democrática. Vejam bem, nem mesmo estou defendendo a
obrigatoriedade do voto. Estou apenas, mas é isso o essencial, levantando o que
226
está por trás dessa discussão de uma classe média que não quer perder alguns
minutos num domingo, cada dois anos. E que por isso mesmo difunde uma
mentira extraordinária, segundo a qual "só no Brasil" haveria o voto
obrigatório, esquecendo que existem países chamados Argentina, Austrália,
Bélgica, Costa Rica, Itália, entre outros, que também exigem do eleitor que vá
votar.
É claro que não será obrigando as pessoas, com penalidades, que se
construirá uma sociedade democrática e republicana. Apenas acredito que
deveríamos ter uma educação – não apenas na escola, mas na sociedade como
um todo – que sensibilizasse mais as pessoas para a necessidade de atuarem,
coletivamente, em favor do bem comum. Até porque isso reverte para elas
próprias. E aí, de novo vem a questão da obrigação política, da obrigação de agir
e da responsabilidade pela sociedade em que se vive.
Renato Janine. Professor titular de Ética e Filosofia
Política na Universidade de São Paulo. Entrevista à Revista Interface.
www.renatojanine.prof.br, acesso em 01/08/2004.
227
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os fragmentos abaixo, escreva um texto dissertativo discutindo
o seguinte pensamento de Renato Janine:
NÃO HÁ INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS SEM PESSOAS
DEMOCRÁTICAS.
Texto I
Caco Galhardo
Os Pescoçudos (Folha de São Paulo, 06/11/2004)
Texto II
Não há instituições democráticas sem pessoas democráticas. É preciso,
pois, mexer na
psique
das pessoas e, sobretudo, ver como se dá a tradução do
ideário democrático em cada coisa. Por exemplo: é democrática a eleição do
chefe de departamento, diretor de faculdade e reitor da universidade? Isso é
complicado; há os que acham que eles têm que ser eleitos pela comunidade
acadêmica – o que traz um grande efeito positivo, que é tornar mais
transparentes, mais explícitas, mais públicas as relações, criar um
commitment
, um compromisso de parte a parte; mas, por outro lado, nenhuma
universidade, sobretudo a pública, tem por fim a comunidade que está nela. A
finalidade da universidade é a sociedade como um todo. Então, se as direções
são eleitas por quem está dentro desse processo, corre-se o risco de fazer
prevalecer o egoísmo dos membros do grupo, que se beneficiam com salários ou
com o ensino, sobre a sociedade, que é o fim efetivo da universidade. Discutir
como traduzir essa questão democrática na prática cotidiana é muito
complicado, mas já é importante fazê-lo.
228
Notemos, também, que a palavra
democrático
3
assumiu sentidos muito
amplos. Costumo lembrar que falamos em pais democráticos sem imaginar que
tenham sido eleitos pelos filhos – e o mesmo vale para o patrão, para o
professor, para o chefe: democrático, nesses casos, é quem age com educação,
com respeito ao outro. Aqui estão envolvidos alguns valores básicos. O valor do
respeito ao outro é uma expressão do valor da igualdade. Quando se fala em
igualdade, abstratamente, ela se realiza na hora em que eu respeito o outro,
apesar de toda a desigualdade social, etária, intelectual que possa haver entre
nós. Mas penso que, até por causa da conversão do Brasil (e do mundo todo) em
sociedade de massas, está havendo um clamor tão forte por igualdade, que é
bastante positivo.
Renato Janine. Professor titular de Ética e Filosofia Política na USPaulo.
Entrevista à Revista Interface. www.renatojanine.prof.br, acesso em
01/08/2004.
3
Democracia: aceitação e prática de princípios de igualdade de direitos, oportunidade e
tratamento numa comunidade.(Sacconi) Antônimo: Totalitarismo: intolerância às opiniões
divergentes.
229
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Redija uma dissertação a tinta, desenvolvendo um tema comum aos textos
abaixo.
Texto I
"Os jovens escolhem o caminho profissional movidos por três razões básicas:
porque gostam, pelo dinheiro que podem ganhar ou pelo que se denomina
`profissão do futuro´ - a tendência de crescimento de determinado campo de
trabalho nos próximos anos. Poucos levam em conta se têm talento, ou não,
para exercer a profissão".
(por Inês Pereira Bermann e Beth Klock - Como os jovens escolhem sua
profissão –Universiabrasil.Net)
Texto II
Quando eu crescer, vou ser cantarina (ops!) cantora.
Tainah, 5 anos.
Texto III
Raul Seixas - Quando Você Crescer
O que que você quer ser quando você crescer?
Alguma coisa importante / Um cara muito brilhante
Quando você crescer / Não adianta, perguntas não valem nada
É sempre a mesma jogada / Um emprego e uma namorada
Quando você crescer
E cada vez é mais difícil / De vencer
Pra quem nasceu pra perder / Pra quem não é importante...
É bem melhor / Sonhar, do que conseguir
Ficar em vez de partir / Melhor uma esposa ao invés de uma amante
Uma casinha, um carro à prestação / Saber de cor a lição,
Que no / Que no bar não se cospe no chão, nego
Quando você crescer
Alguns amigos da mesma repartição / Durante o fim-de-semana
Se vai mais tarde pra cama /
Quando você crescer
E no subúrbio, com flores na sua janela / Você sorri para ela
E dando um beijo lhe diz: / Felicidades
E uma casa pequenina / É amar uma menina
E não ligar pro que se diz / Belo casal que paga as contas direito
Bem comportado no leito / Mesmo que doa no peito / Sim...
Quando você crescer
230
E o futebol ter faz pensar que no jogo / Você é muito importante
Pois o gol é o seu grande instante /
Quando você crescer
Um cafezinho mostrando o filho pra vó / Sentindo o apoio dos pais
Achando que não está, só /
Quando você crescer / Quando você crescer
Quando você crescer / Quando você crescer
231
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os fragmentos abaixo, escreva um texto dissertativo em prosa, sobre
o seguinte tema: Qualquer homem é nosso semelhante, nosso vizinho?
1.
6 de agosto de 1945: O avião americano B-29 Enola Gay larga uma bomba atômica
de urânio, apelidada de Little Boy, sobre Hiroshima. A explisão mata um total de 140
mil pessoas.
9 de agosto de 1945: Uma segunda bomba atômica americana, contendo plutônio,
atinge Nagasaki, matando cerca de 80 mil pessoas
2.
(...)Mas não se esqueçam da rosa, da rosa, da rosa de Hiroshima,a rosa
hereditária,a rosa radioativa,estúpida e inválida,a rosa com cirrose,a
anti-rosa atômica,sem cor sem perfume,sem rosa, sem nada. Secos e
Molhados,em Rosa de Hiroshima
3.
Alemanha, 06/08/2005 - Ativistas do Greenpeace ergueram a Estátua da Liberdade
americana dentro de uma bomba atômica em manifestação em frente à embaixada
americana em Berlim
232
4.
Atentados terroristas nos EUA:11/09/2001 Estimativa:10 mil mortos
5.
2004
1º de fevereiro -- Um tumulto mata 251 peregrinos islâmicos na Arábia Saudita,
durante o ritual de apedrejamento do demônio, parte da peregrinação do Haj.
08/09/2004 Todos os culpados pela tragédia em Beslan Por Alcino Leite Neto
Quantas pessoas foram feitas reféns por terroristas em Beslan, Ossétia do
Norte?Importa se seriam 500, 600, 1.000, 2.000?
6.
2005
25 de janeiro de 2005 -- Pelo menos 257 peregrinos hindus, inclusive várias
mulheres e crianças, morrem pisoteadas perto de um templo remoto no Estado de
Maharashtra, na Índia.
Primeira metade de 2005 - cerca de 2.700 pessoas morreram nas minas de carvão
chinesas devido a explosões, deslizamentos, incêndios e outros acidentes.
7.
"Hotel Ruanda" e o espírito de porco da razão
O que você estava fazendo entre abril e junho de 1994? (...) Pois bem, enquanto
tocávamos nossa vida, em Ruanda (um pequeno país que até então mal sabíamos
situar no mapa da África) 1 milhão de homens, mulheres e crianças foram
assassinados (em cem dias). Uma média de 10 mil por dia, a golpes de facão. Graças
à estréia do filme (imperdível) "Hotel Ruanda", de Terry George, muito está sendo
escrito, nestas semanas, sobre a história do massacre e suas "causas" absurdas. Mas
quero apenas pensar no grito das vítimas pedindo ajuda e na nossa capacidade (ou
incapacidade) de ouvir e intervir. No caso de Ruanda, a intervenção foi nula: depois
do assassinato de dez soldados da força que devia manter a paz no país, as Nações
Unidas evacuaram os ocidentais e diminuíram sua presença armada até à
insignificância. O maior esforço da ONU, durante a crise, consistiu em evitar qualificar
os acontecimentos como genocídio, pois esse termo teria forçado o conselho de
segurança a recorrer à força para pôr fim ao massacre e punir os responsáveis. As
hesitações do mundo inteiro eram compreensíveis: uma expedição militar apropriada
custaria caro em fundos e vidas. Agir sem a coragem de encarar baixas seria uma
estupidez; a prova já fora feita em 1993: depois da morte de 18 soldados americanos
em Mogadício (narrada em "Falcão Negro em Perigo", de Ridley Scott), a ONU,
simplesmente, voltou para casa, deixando a Somália nas mãos de hordas de bandidos.
Obviamente, qualquer governo, na hora de oferecer meios e tropas, prefere sentir-se
legitimado pela opinião de seu povo: se não pela voz das massas, ao menos pela das
elites pensantes.(...) Ora, freqüentemente, durante as tragédias dos últimos anos, as
elites intelectuais ocidentais se esqueceram daquela idéia da razão moderna que diz
assim: qualquer homem é nosso semelhante, nosso vizinho. Com isso, recusaram-se a
ser porta-vozes do grito das vítimas. (...) Assim, as tropas brasileiras estão no Haiti
para servir à política escusa (e fracassada) do Itamaraty. Imaginar que elas estejam
233
salvando vidas, por mais que seja um fato, seria um conto para boi dormir. Se houver
baixas brasileiras, só ouviremos críticas à política do governo; nenhuma palavra sobre
o grito dos haitianos: será que ninguém ouve? Fsp 25/08/2005 CONTARDO
CALLIGARIS
8.
Iraquianos passam ao lado de pilha de calçados das vítimas de tragédia (motivada
pela suspeita de um homem bomba entre eles) em ponto sobre o rio Tigre, em que
p
elo menos 1.030 pessoas morreram e outras 322 ficaram feridas, em uma avalanche
de peregrinos em uma ponte de Bagdá.
Folha Online 31/08/2005
234
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os fragmentos abaixo, escreva uma dissertação em prosa sobre o
seguinte tema: O que é mais importante: O QUE se fala ou COMO se fala?
1. As mariposa – Adoniran Barbosa
(falado): “Boa noite lâmpida , Boa noite mariposa , permita-me oscular-lhe sua face? Pois
não, mas rápido, eihn, pois daqui a pouco eles me apagam” As mariposas quando
chega o frio, fica dando vorta em vorta da lâmpida prá se esquenta. Elas roda, roda,
roda e despois se senta em cima dos prato das lâmpida prá discansá. Eu sou a lâmpida e
as muié é as mariposa que fica dando vorta em vorta de mim tudo as noite só pra me
beijá
(falado): “Tá muito bom mas num vai se acostumá ouviu mariposinha”
2. penSo, logo EXistO deUS é brAsileiro
Marcelino Freire
3. Você fala bonito e eu acredito. Ditado Popular
4. O maior pedantismo do brasileiro anual é escrever português de lei: academia, Revista
da Língua Portuguesa. (...) Agora, a ocasião era boa para eu satirizar os cronistas nossos e
o estado atual de São Paulo, urbano, intelectual, político, sociológico. (...) Fiz tudo isso em
estilo pretensioso, satirizando o português nosso, e pleiteando subrepticiamente pela
linguagem lépida, natural (literatura) simples dos outros capítulos. Fragmento de carta de
Mário de Andrade a Manuel Bandeira, sobre a carta pras Icamiabas, em Macunaíma, o
Herói sem Nenhum Caráter, de 1928.
5. Se não sabe falar, melhor ficar de boca fechada pra não passar vergonha. (Bié, 38)
5. Ai Se Sêsse – Cordel do Fogo Encantado (Produtor: Gutie Gutierrez)
A gente vem lá do sertão de Pernambuco, cidade chamada Arco Verde
Poeta Zé da Luz, o poeta Zé da Luz no início do século escreveu uma poesia
Porque disseram pra ele que pra falar de amor era necessário um português correto tal
Aí Zé da Luz escreveu uma poesia chamada Ai Se Sêsse que diz assim:
Se um dia nóis se gostasse Se um dia nóis se queresse Se nós dois se empareasse
Se juntim nóis dois vivesse Se juntim nóis dois morasse Se juntim nós dois drumisse
235
Se juntim nóis dois morresse Se pro céu nóis assubisse
Mais porém se acontecesse de São Pedro não abrisse a porta do céu
E fosse te dizer qualquer tolice E se eu me arriminasse
E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse
E a minha faca puxasse e o bucho do céu furasse
Tavéz que nóis dois ficasse Távez que nóis dois caísse
E o céu furado arriasse E as virgi toda fugisse
236
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 24
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Considerando os textos transcritos abaixo como ponto de partida para a sua
redação, elabore um texto dissertativo em prosa sobre o seguinte tema: Medo
1. Quem de nós confessa o seu medo? Roland Barthes, 1973.
2. Pequeno mapa do tempo – Belchior
Eu tenho medo e medo está por fora / O medo anda por dentro do meu coração
Eu tenho medo de que chegue a hora / Em que eu precise entrar no avião
Eu tenho medo de abrir a porta / Que dá pro sertão da minha solidão
Apertar o botão: cidade morta / Placa torta indicando a contramão
Faca de ponta e meu punhal que corta / E o fantasma escondido no porão
Medo, medo. Medo, medo, medo, medo
3. Pesadelos mais íntimos da civilização ocidental do século XIV ao XVIII: o mar,
os mortos, as trevas, a peste, a fome, a bruxaria, o Apocalipse, Satã e seus
agentes (o judeu, a mulher, o muçulmano). Jean Delumeau, em “História do
medo no Ocidente”, 1989, Cia das Letras.
4. O medo é a extrema ignorância em momento muito agudo. Guimarães Rosa,
em Famigerado.
5. Congresso internacional do medo – Carlos Drummond de Andrade
Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os braços.
Não cantaremos o ódio porque esse não existe.
Existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro.
O medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos.
O medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas.
Cantaremos o medo dos ditadores.
O medo das democracias.
Cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo.
E sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.
6. É claro que as paixões positivas são mais bem vistas, mas dentre as negativas,
a mais vil sempre foi o medo. É um dos grandes temas recalcados de nossa
237
cultura. Como ler sem notar, no romance, na poesia, no teatro, a força do
medo? Conhecer o medo, devassar seus arcanos não é só atender a uma
curiosidade particular. É ampliar nossas consciências para reconhecer um
fantasma, cuja força está em ser inconfesso.
Renato Janine, 1989, comentando o livro “História do medo no Ocidente”,
de Jean Delumeau, Cia das Letras.
238
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 25
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os textos abaixo, escreva um texto dissertativo discutindo as idéias neles
apresentadas:
1. É preciso que ocorram as mudanças para que tudo volte a ser exatamente como
antes. Lampedusa, em O Leopardo, 1958.
2. No presente a mente, o corpo é diferente, e o passado é uma roupa que não nos
serve mais. (...) Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo, tudo, tudo
que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais. (...)Você pode
até dizer que eu estou por fora ou então que eu estou inventando. Mas é você que
ama o passado e que não vê que o novo sempre vem.
Elis Regina – em Velha Roupa Colorida e Como nossos pais
3. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser; muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Luís de Camões
4. Mas eu mudei. Pra você ter uma idéia, eu era a favor da pena de morte. Hoje não
sou mais. Evoluí. Antes eu era ridículo. Evoluí. Ratinho, no programa Provocações, da
TV Cultura, com Antonio Abujamra.
5.Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
Eu quero dizer agora o oposto do que eu disse antes
Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
Sobre o que é o amor, sobre o que eu nem sei quem sou
Se hoje eu sou estrela amanhã já se apagou
Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor
Lhe tenho amor, lhe tenho horror Lhe faço amor, eu sou um ator
É chato chegar a um objetivo num instante
Eu quero viver nessa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
Sobre o que é o amor, sobre o que eu nem sei quem sou
Se hoje eu sou estrela amanhã já se apagou
Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor
Lhe tenho amor, lhe tenho horror Lhe faço amor, eu sou um ator
Eu vou desdizer aquilo tudo que eu lhe disse antes
Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
do que ter aquela velha velha velha velha velha
opinião formada sobre tudodo que ter aquela velha opinião formada sobre tudo
239
Raul Seixas - Metamorfose Ambulante
paLavra Escrita
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Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os fragmentos abaixo, escreva um texto dissertativo em prosa sobre o seguinte tema: É que Narciso
acha feio o que não é espelho.
4
1.
Narciso era um jovem de singular beleza, filho do deus-rio Cefiso e da ninfa Liríope. No dia de seu nascimento, o
adivinho Tirésias vaticinou que Narciso teria vida longa desde que jamais contemplasse a própria figura. Indiferente aos
sentimentos alheios, Narciso desprezou o amor da ninfa Eco - segundo outras fontes, do jovem Amantis - e seu
egoísmo provocou o castigo dos deuses. Ao observar o reflexo de seu rosto nas águas de uma fonte, apaixonou-se pela
própria imagem e ficou a contemplá-la até consumir-se. www.nomismatike.hpg.ig.com.br/Mitologia/Narciso.html
2. Há quanto tempo eu vinha me procurando Quanto tempo faz , já nem lembro mais Sempre correndo atrás de mim
feito um louco Tentando sair desse meu sufoco Eu era tudo que eu podia querer Era tão simples e eu custei prá
aprender Daqui prá frente nova vida eu terei Sempre a meu lado bem feliz eu serei Refrão Eu me amo , eu me amo
Não posso mais viver sem mim }Ultraje A Rigor - Eu Me Amo
3. O narcisismo é bom desde que se permita escutar do outro o seguinte: Olha, querido, essa imagem é sua. Sem ele a
humanidade teria sucumbido (ou sequer teria existido?). Prof. Luiz Octávio, em 17/11/2005.
4. Várias vezes, nos últimos meses, fui entrevistado sobre o estado de espírito dos brasileiros nas circunstâncias atuais.
A pergunta, quase sempre, sugeria a resposta esperada: "Quais são os efeitos em seus pacientes da decepção e da
depressão nacionais?". Em geral, respondi, preguiçosamente, que, de fato, os acontecimentos são tristes e
deprimentes. Mas essa resposta óbvia (para a qual não seria preciso de um especialista) é falsa.
Em regra, o narcisismo da gente funciona assim: quanto maior a imperfeição do mundo, quanto maior a decepção que
nos é imposta pela conduta dos outros, tanto maior é nossa exaltação narcisista. No caso, atrás das queixas, a
constatação de que nossos representantes e governantes seriam todos corruptos está longe de ser depressiva.
É lógico: acreditar que os outros sejam todos deficientes morais é o melhor jeito de afirmar que nós, ao contrário e em
comparação, somos gigantes da moralidade.
4
Inspirado na música “Sampa”, de Caetano Veloso
240
Contemplar o mundo como um vasto teatro de defeitos equivale a erigir um monumento à nossa suposta integridade,
graças ao seguinte raciocínio implícito (capenga, mas gratificante): se podemos constatar que todos os outros são
corruptos, é porque somos os ÚNICOS limpos. De repente, confirmar nossa grandiosa unicidade se torna nossa
ocupação principal. Com isso, é paralisada nossa capacidade de transformar o mundo.
A psicologia do self (esta foi, ao meu ver, sua maior contribuição à psicanálise) mostrou o seguinte: temos acesso ao
mundo e a uma ação minimamente eficaz para transformá-lo quando paramos de contemplar sua imperfeição
(celebrando a unicidade de nossa diferença) e enxergamos na realidade algo (diferente de nós) que possamos idealizar.
Por exemplo, se vivo numa cidade em que acho horríveis todas as habitações salvo a minha, dedico-me integralmente
a caiar de branco a fachada de minha casa, na qual, aliás, fecho-me como num sepulcro. Mas se reconheço que, na
cidade, há outras moradias que são mais bonitas do que a minha, há chances que um dia eu queira sair de pincel e
vassoura na mão para pintar de branco as fachadas da cidade inteira e para lavar as calçadas.
O que vale para as casas vale para os outros. Se acho que todos os outros são imperfeitos, considero-me como a
única exceção, torno-me meu próprio ideal, ou seja, só idealizo (e amo) a mim mesmo. É a razão pela qual, em geral,
um terapeuta se abstém de julgar moralmente seus pacientes: quem julga está quase sempre mais preocupado em
comemorar sua própria integridade do que em entender o outro.
Contardo Calligaris (FSP 03/11/2005)
241
paLavra Escrita
www.palavraescrita.com.br PROPOSTA DE REDAÇÃO 27
Modalidade: Dissertação
Autoria: Profª Gisa Gasparotto
Tendo em vista os textos abaixo, escreva um texto dissertativo em prosa sobre o seguinte
tema:
Como evitar “o dia depois de amanhã?”
5
1. Do ponto de vista de uma formação econômica superior da sociedade, a propriedade
privada do globo terrestre, por parte de alguns indivíduos, parecerá tão absurda como a
propriedade privada de um homem, por parte de outro homem. Mesmo uma sociedade
inteira, uma nação, e mesmo todas as sociedades de uma mesma época, tomadas em
conjunto, não são propriedades da terra. São somente seus possessores, seus usufrutuários
e têm o dever de deixa-la melhorada, como boni patres famílias, às gerações sucessivas.
Karl Marx, em O Capital, 1845.
2. A Conferência da Nações Unidas para o meio ambiente e desenvolvimento,
promovida em 1992, no Rio de Janeiro (ECO 92), foi orientada pela idéia da busca do
Desenvolvimento Sustentável: modelo de desenvolvimento baseado no uso racional e
conservacionista dos recursos naturais, de forma a garantir às futuras gerações o direito
de usufruir também desses recursos. Prof. Haroldo, 2005.
3. O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um
terreno, lembrou-se de dizer ISTO É MEU e encontrou pessoas suficientemente simples para
acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não pouparia ao
gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado
a seus semelhantes: “Defendei-vos de ouvir esse impostor; estareis perdidos se
esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém”. Jean-
Jacques Rousseau, em Discurso sobre a desigualdade, 1)
4. O modelo de desenvolvimento capitalista vigente é ambientalmente insustentável (ao
se apropriar de forma predatória dos recursos naturais) e socialmente injusto (porque os
seus benefícios e riquezas produzidos atendem a uma parcela reduzida e privilegiada da
população mundial). Prof Haroldo, 2005.
5. O aquecimento global é resultante da emissão de gases-estufa, como Co2 e metano,
liberados pela queima de combustíveis fósseis e pela destruição de florestas. Tais gases
têm a propriedade de reter o calor e aumentar a temperatura média do planeta, o que
vem provocando uma desregulação climática global, gerando ou intensificando
catástrofes, como: derretimento das calotas polares, e consequente elevação do nível
dos oceanos e desaparecimento de ilhas e regiões costeiras; resfriamento de correntes
marítimas, como a do Golfo, que transportam calor dos trópicos para zonas temperadas
que, se desligadas, jogariam as áreas por elas influenciadas em temperaturas glaciais;
maior intensidade e freqüência de tempestades e furacões; secas catastróficas e estresse
hídrico; desertificações, enchentes e redução de áreas agricultáveis em algumas áreas
do planeta.
5
Inspirado no texto do Prof. Gilberto Andrade de Abreu e no filme do mesmo nome, USA,
2004, direção de Roland Emmerich. Uma série de mudanças climáticas que dão início, nos
EUA, a uma nova era glacial.
242
Tratados internacionais, como Protocolo de Kioto, de 1997, impõem cotas de redução
de emissão de gases-estufa aos países industrializados (responsáveis por 75% dos 16,5
bilhões de toneladas de gases de origem fóssil lançados na atmosfera), e abrem a
possibilidade de se estabelecer um comércio de carbono através de certificados de
mecanismo de desenvolvimento limpo, que prevê a compra, pelos países ricos, de cotas
de redução de emissões de carbono dos países subdesnvolvidos, por meio de
investimento em projetos ambientais. Prof. Haroldo, 2005.
6. O consumismo desenfreado, atrelado à ganância dos produtores, ensejou o fim da
durabilidade e da reutilização dos produtos, situação agravada pelo advento de uma
infinidade de produtos sintéticos, transformando a Terra, os rios e os mares em lixeiras, que
comprometem a vida das atuais e das futuras gerações. Prof. Gilberto Andrade de Abreu,
2005
7. A própria natureza poderá impor limitações à existência da vida humana no planeta,
sobretudo se a nossa espécie representar uma série ameaça ao desenvolvimento das
demais formas de vida. James Lovelock, em Hipótese Gaia
6
, 1986
8. Terra, terra, em por mais distante o errante navegante, quem jamais te esqueceria.
Caetano Veloso
6
Gaia corresponde ao antigo conceito da Mãe Terra, divindade que também recebia o nome de
Gaia ou Gea.
243
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