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Este arquivo faz parte do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
A SEDUÇÃO NAS TELAS DO CINEMA:
UMA ANÁLISE DOS TRAILERS DE CAZUZA E OLGA
CÍNTIA LANGIE ARAUJO
Porto Alegre, janeiro de 2006
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
A SEDUÇÃO NAS TELAS DO CINEMA:
UMA ANÁLISE DOS TRAILERS DE CAZUZA E OLGA
CÍNTIA LANGIE ARAUJO
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Cristiane Freitas Gutfreind
Dissertação apresentada como pré-requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Comunicação Social no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
Porto Alegre, janeiro de 2006
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecário Responsável
Ginamara Lima Jacques Pinto
CRB 10/1204
A663s Araujo, Cíntia Langie
A sedução nas telas do cinema: uma análise dos trailers de Cazuza
e Olga/ntia Langie Araujo. Porto Alegre, 2006.
146 f.
Diss. (Mestrado) – Faculdade de Comunicação Social. Programa
de Pós-Graduação em Comunicação Social. PUCRS, 2006.
Orientadora: Profa. Dra. Cristiane Freitas Gutfreind.
1. Sedução (Cinema). 2. Trailers – Aspectos Sociais.
3. Cinema. 4. Percepção Visual. 5. Imagem. 6. Linguagem
Cinematográfica. I. Título.
CDD : 791.43
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Prof
a
. Dr
a
. Cristiane Freitas Gutfreind
Orientadora
________________________________________________
Prof
a
. Dr
a
. Miriam Rossini
Unisinos
________________________________________________
Prof. Dr. Francisco Menezes Martins
Famecos/ PUCRS
Porto Alegre, janeiro de 2006
À Gu e Link
AGRADECIMENTOS
Por falta de espaço,
não é possível agradecer a cada ator
deste filme (ou novela?).
Muitos foram os colaboradores. Houve
irmão que, mesmo de longe, ajudou com as
legendas em inglês (e com muito mais), e
irmã que acompanhou de perto as sinistras
e intermináveis horas em frente à tela.
Houve amigo que estava no set, mesmo nas
piores horas. Amigos que ajudaram a
relaxar, outros, a refletir. Alguns
escreveram o roteiro junto comigo.
Dentre produtores, assessores e assistentes,
três personagens precisam ser lembrados:
Cristiane Freitas,
Manoel e Sonia ...
Obrigada.
Pois, se a maioria das coisas, ai!,
têm um sentido e uma profundidade,
só algumas atingem a aparência,
e estas são absolutamente sedutoras.
A sedução está no movimento de
transfiguração das coisas
em aparência pura.
Jean Baudrillard
RESUMO
Esta pesquisa procura compreender a sedução através do trailer, ou, no reverso das
palavras, procura compreender o trailer através da sedução. De toda forma, o objetivo é
entender como o trailer se torna um objeto sedutor. Parte-se das idéias de Jean Baudrillard
sobre sedução para dizer que um trailer, ao anunciar um filme, conta uma nova história,
história encantada e misteriosa, calcada no segredo e na criatividade.
Como uma forma de melhor refletir sobre essa questão, fala-se também do universo
publicitário e das estratégias sedutoras por ele incorporadas na atualidade. O imaginário
também faz parte da reflexão, que a sedução se quando as imagens do trailer estimulam
o imaginário e provocam os desejos do espectador. O alvo é a mensagem do trailer, portanto
trabalha-se com a noção de percepção, pois a platéia percebe os elementos da história e assim
assimila o sentimento vivido pelo personagem.
Para ilustrar a pesquisa, dois objetos foram selecionados. Os trailers dos filmes
Cazuza- O tempo não pára e Olga serão analisados, auxiliando na tarefa de compreender
como o formato seduz. Interligando vários termos e idéias, a dissertação coroa o trailer como
um misto de cinema e publicidade que, através de sua mensagem, encanta e seduz o público.
Palavras-chave: Trailer. Sedução. Cinema.
ABSTRACT
This research seeks to understand the seduction through the trailer, or, in a reverse of
words, understand the trailer through the seduction. Anyway, the aim is to understand how the
trailer becomes a seductive object. The ideas of Jean Baudrillard about seduction are the
starting point to state that a trailer, when announcing a movie, tells a new story, a charming
and mysterious story, based on secrecy and creativity.
To achieve a better reflection on this matter, the advertising universe and the seductive
strategies that it incorporates nowadays will also be taken into consideration. The imaginary
is also included into this reflection, since seduction happens when the trailer’s images
stimulate the imaginary and provoke the desires of the spectator. The target is the message of
the trailer; therefore, it is necessary to work with the notion of perception, since the audience
perceives the elements of the story, thus assimilating the feelings experienced by the
character.
In order to illustrate this research, two objects were selected. The trailers from the
movies Cazuza- O tempo não pára and Olga will be analyzed, providing help on the task of
understanding how this format seduces. Interlinking several terms and ideas, this work crowns
the trailer as a mix of cinema and advertisement that, through its message, charms and
seduces the audience.
Key-Words: Trailer. Seduction. Cinema.
SUMÁRIO
ENTRANDO NA SALA DE PROJEÇÃO .......................................................................... 11
1 ACOMODANDO-SE NA POLTRONA ........................................................................... 16
1.1 Os filmes ....................................................................................................................... 17
1.2 Justificativa .................................................................................................................. 19
1.3 A compreensão do objeto ............................................................................................ 20
1.3.1 Mapa da análise .................................................................................................... 21
1.4 Alguns termos relevantes ............................................................................................ 25
1.4.1 A sedução ............................................................................................................. 28
1.4.2 O imaginário ......................................................................................................... 31
1.4.3 A percepção .......................................................................................................... 34
1.4.4 O ritual .................................................................................................................. 40
2 VOLTANDO-SE PARA A GRANDE TELA .................................................................. 45
2.1 Resgate histórico do trailer ......................................................................................... 46
2.1.1 Trailers no Brasil .................................................................................................. 54
2.1.2 Peculiaridades dos trailers .................................................................................... 57
2.2 Para mover é preciso comover .................................................................................... 59
2.3 O personagem de ficção ............................................................................................... 67
2.4 A montagem cinematográfica ..................................................................................... 70
3 ASSISTINDO AOS TRAILERS ....................................................................................... 79
3.1 Cazuza ........................................................................................................................... 79
3.1.1 Análise do personagem no trailer Cazuza ............................................................ 80
3.1.1.1 Aprofundando-se nas máscaras de Cazuza .............................................. 85
3.1.2 Análise da montagem no trailer Cazuza ............................................................... 88
3.2 Olga ............................................................................................................................... 92
3.2.1 Análise do personagem no trailer Olga ................................................................ 92
3.2.1.1 Aprofundando-se na saga de Olga ......................................................... 101
3.2.2 Análise da montagem no trailer Olga ................................................................. 105
3.3 Cazuza X Olga: uma comparação entre os trailers ................................................. 110
3.3.1 Narrativa ............................................................................................................. 112
3.3.2 Montagem ........................................................................................................... 114
3.3.3 Personagem ......................................................................................................... 116
NÃO HÁ FILME. DIRETAMENTE OS CRÉDITOS .................................................... 120
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 126
FILMES CITADOS ............................................................................................................ 131
ANEXOS .............................................................................................................................. 133
ENTRANDO NA SALA DE PROJEÇÃO
Mesmo que tenha surgido apenas cerca de duas décadas depois do cinema, o formato
trailer recebeu, ao longo da história, relativamente menos atenção de teóricos e pesquisadores.
Em comparação ao número de livros sobre o filme, o tipo de narrativa aqui enfocado possui
poucos estudos, os quais são também difíceis de encontrar. Esse foi um dos motivos pelos
quais se realizou esta pesquisa.
Considera-se este um formato importante porque ele se apresenta como o mais
fantástico atalho que liga o espectador ao filme. Carro chefe na arte de divulgar uma obra
cinematográfica, o trailer abre o ritual da ida ao cinema, informa às pessoas que um filme em
breve será lançado, enfeita a história do longa-metragem, oferece elementos à percepção,
proporciona emoções e sentimentos vividos por personagens, instiga a curiosidade, mexe com
o imaginário, brinca com os desejos inconscientes, surpreende o indivíduo e cria expectativa.
É como uma amostra grátis da obra, que através de sua mensagem desperta a vontade
de assistir ao filme. O anúncio mistura narrativas visuais e promocionais, a fim de gerar um
efeito. É um misto de cinema e publicidade, porque possui características cinematográficas
conjunto de imagens e sons, que adquire uma narrativa própria e pode ser projetado na sala de
exibição, fazendo parte do ritual – e, ao mesmo tempo, tem uma função publicitária – faz com
que o público conheça o produto que está anunciando.
12
Ao decidir estudar este objeto, alguns enfoques pareceram pertinentes: fazer um
estudo histórico, com o intuito de resgatar os dados referentes ao trailer na realidade
brasileira, visto que não se conhece nenhum material que aborde essa questão; fazer um
estudo apenas de caráter mercadológico, ligado ao universo do marketing ou realizar um
estudo narratológico do trailer, utilizando o suporte da teoria do cinema e da análise lmica.
Excluiu-se a abordagem histórica, pelo curto espaço de tempo de que se dispunha para tais
levantamentos, e ignorou-se o caminho mercadológico porque se descobriu que um trabalho
incorporando essa temática tinha sido concluído
1
. Assim, instigada pela curiosidade de
saber como acontece a sedução através do trailer, esta dissertação valoriza sua mensagem.
Acredita-se que os elementos de sedução encontrados em um trailer são
potencializados quando o anúncio é projetado na sala de cinema, pois nesse ambiente o
espectador encontra-se relaxado, numa atitude propícia à descontração e favorável ao
devaneio.
Sabe-se que o trailer é veiculado em diferentes lugares, além da sala de projeção,
como na televisão, nos VHSs e nos DVDs. Ele pode também ser acessado pela internet e até
mesmo pelo telefone celular. Porém, sugere-se que, dentre esses variados suportes que
transmitem trailers, aquele que melhor valoriza sua mensagem e que, conseqüentemente,
melhor contribui para a sedução, ainda é a sala de cinema. Isso não significa dizer que,
veiculado em outros ambientes, um trailer não possa seduzir. Porém, assistir a um produto
cinematográfico em casa é bem diferente de fazê-lo no cinema, pois a maioria dos lares
domésticos não possui a estrutura mítica e espetacular das salas. É por isso que se trabalha
com a noção de cinema como ritual. Todavia, acreditar que os elementos sedutores presentes
1
A dissertação de mestrado intitulada Trailer: cinema e publicidade no mesmo rolo. Um estudo sobre o trailer e
o movie marketing, ilustrado pela campanha de lançamento do filme Cidade de Deus, foi defendida por Cláudia
Melissa Neves dos Santos, em 2004, na Universidade Federal Fluminense (UFF).
13
no trailer são potencializados pelo ritual da sala de cinema não é a questão fundamental deste
trabalho.
O objetivo é compreender como o trailer seduz. Para isso, as idéias de Jean Baudrillard
sobre sedução serão aqui trabalhadas. Baudrillard (1991) coloca que a sedução é baseada em
um jogo estético de signos. É um artifício que molda as aparências conforme as
circunstâncias, sem necessariamente manter uma relação de fidelidade com a realidade. Nas
palavras do autor:
A sedão é algo que se apodera de todos os prazeres, de todos os afetos e
representações, que se apodera dos próprios sonhos para convertê-los em algo
diferente de seu desenrolar primário, um jogo mais agudo e sutil cuja aposta não
tem fim nem origem, seja o de uma pulsão, seja a de um desejo (BAUDRILLARD,
1991, p. 142).
Posicionando-se ao lado da sedução, o imaginário vem preencher as páginas deste
estudo, contribuindo para que se perceba a força das mensagens visuais no período
contemporâneo. O imaginário é aqui encarado como o lugar comum da imagem e da
imaginação. Ele é tido como um reservatório criativo, que incide em cada ação do ser
humano.
Interligando sedução e imaginário para falar sobre cinema, foi necessário destacar a
percepção como uma terceira categoria para compreender o trailer. Acredita-se que as
imagens percebidas ajudam a transmitir as emoções e os sentimentos vividos na história. Para
completar o time, a quarta grande categoria deste trabalho é a publicidade, que ajuda a
entender as jogadas criativas incorporadas pela maioria dos anúncios de filmes.
Dois objetos foram selecionados para ajudar a compreender essa sedução: Cazuza o
tempo não pára (Sandra Werneck e Walter Carvalho, 2004) e Olga (Jaime Monjardim, 2004),
que representam as duas maiores bilheterias nacionais de 2004.
14
A seleção desses dois materiais ajudou a definir o enfoque da análise, que recai sobre
duas características: a questão do personagem do anúncio e a sua montagem. Destacou-se a
questão do personagem, porque se trata de duas cinebiografias. Além do que, uma história é
sempre vivida por alguém. E o que esse alguém representa e como ele se desloca na trama são
indicativos necessários para compreender a obra.
A questão da montagem foi eleita visto que essa técnica permite ao anúncio transmitir
imagens de um filme de forma atraente. A montagem é a característica mais interessante de
um trailer, pois é pela arte de juntar imagens que ele consegue criar o segredo e elaborar uma
história sedutora. Por ter ligação com movimento, a montagem às imagens uma alma,
facilitando a ilusão do espectador. Além disso, a agilidade do formato possibilita que se passe
muita informação em pouco tempo.
Em outras palavras, parte-se da idéia de que um trailer pode chamar a atenção quando
faz uma construção inteligente de uma história. E essa construção pressupõe dois trabalhos,
que, na realidade, são complementares: selecionar partes que podem formar um todo atraente
e montar essas partes de forma criativa.
Assim sendo, a composição deste texto se divide em três capítulos. O capítulo um se
estrutura em duas grandes partes. A primeira abriga a metodologia do trabalho, as
informações básicas sobre os dois filmes selecionados e a justificativa para tal escolha. Na
segunda parte, o esforço é para esclarecer alguns termos importantes, como a sedução, o
imaginário, a percepção e o ritual. A linha de estudo é a sociologia compreensiva, pois o
intuito é compreender o formato. E a técnica utilizada para investigar os dois trailers é a
análise fílmica.
o segundo capítulo dedica-se exclusivamente a discursar sobre o trailer em si.
Primeiramente, um breve histórico do formato será apresentado. Em seguida, far-se-á uma
contextualização do anúncio no campo publicitário, apresentando algumas estratégias da
15
publicidade. Além disso, esse capítulo visa comentar as duas características aqui destacadas: o
personagem e a montagem.
O terceiro e último capítulo abriga a análise propriamente dita dos materiais. Primeiro
analisar-se-á cada objeto, separadamente, e depois eles serão comparados, sempre derramando
o olhar sobre os dois pontos selecionados o personagem e a montagem. A intenção é
mostrar como cada material utilizou as duas características selecionadas e como ele reuniu as
imagens retiradas do longa-metragem, a fim de encantar a platéia.
Convida-se, assim, o leitor a sentar-se em sua poltrona e preparar-se para uma
experiência que, embora não seja visual, ilustra uma grande parcela do universo
cinematográfico.
1 ACOMODANDO-SE NA POLTRONA
Acomodar-se na poltrona para melhor receber as informações, acomodar-se para
compreender o trabalho, acomodar-se e deixar que alguns termos importantes acomodem-se
na tela. Este primeiro capítulo, além de introduzir o leitor no tema da dissertação,
disponibiliza a base teórica da pesquisa. Ele se divide em duas partes: a primeira trata de
questões metodológicas, e a segunda esclarece alguns termos relevantes do estudo. O intuito é
permitir que os termos aqui trabalhados realmente acomodem-se no pensamento, para que,
futuramente, seja possível compreender a análise feita nos dois objetos.
É preciso, inicialmente, apresentar os dois filmes destacados, a justificativa para essa
escolha, a metodologia da pesquisa e o tipo de análise que será feita nos trailers.
Posteriormente, quatro grandes questões serão trabalhadas: a sedução, o imaginário, a
percepção e o ritual. A sedução representa o destino desta viagem, o imaginário simboliza o
motor que impulsiona o viajante, a percepção equivale ao automóvel que permite a
movimentação e o ritual se apresenta como aqueles trechos mais conservados da estrada, nos
quais a viagem torna-se mais favorável. Os quatro termos convergem para caracterizar o
trajeto no qual o trailer irá passear, ao longo do trabalho.
17
1.1 Os filmes
O filme Cazuza O Tempo Não Pára é uma cinebiografia de um dos líderes do
movimento do rock brasileiro dos anos 80. A obra estreou na maioria dos cinemas nacionais
no dia 11 de junho de 2004, e foi dirigida por Sandra Werneck e Walter Carvalho. O ator
Daniel de Oliveira faz o papel do cantor, e Marieta Severo vive a mãe de Cazuza, Lucinha
Araújo. O filme mostra o percurso profissional e pessoal do músico, desde o início de sua
carreira, em 1981, até sua morte em 1990, aos 32 anos. Apresenta o sucesso do cantor com o
grupo musical Barão Vermelho, a carreira solo, seu comportamento transgressor e a
continuação da jornada, mesmo debilitado pelo vírus da AIDS.
O sucesso de Cazuza foi comprovado pelos números de bilheteria alcançados. O filme
levou 294.194 espectadores aos cinemas no fim de semana de estréia. Por trás da boa
bilheteria, houve uma agressiva campanha de marketing para o lançamento, coordenada pela
Globo Filmes e pela Columbia Pictures, ao custo de R$ 2 milhões, que incluiu até mesmo
uma aparição na novela Celebridade, das 20 horas, horário nobre da TV brasileira.
Olga, por sua vez, retrata a saga de Olga Benário (1908-1942), comunista que viveu
uma história de amor com Luís Carlos Prestes
1
. Ao ser destacada pelo comando comunista de
Moscou para proteger o líder brasileiro, Olga e Prestes se apaixonam e vivem um romance tão
intenso quanto breve, devido às agitações políticas da época. Ambos são capturados e Olga é
deportada para a Alemanha nazista, onde é enviada para um campo de concentração.
A obra estreou nos cinemas nacionais no dia 20 de agosto de 2004 e é o primeiro filme
de Jayme Monjardim, diretor que se notabilizou por conduzir telenovelas de sucesso. O longa-
metragem, distribuído pela Lumiére, custou R$ 8,5 milhões, e no primeiro final de semana
1
Luís Carlos Prestes é um dos maiores mbolos dos ideais da Revolução Socialista no Brasil. Comandou um
movimento contra o governo chamado Coluna Prestes, de 1925 a 1927, que se tornou famoso ao percorrer o
interior do país pregando reformas políticas e sociais e combatendo o governo do então presidente Arthur
Bernardes.
18
levou 385.968 espectadores aos cinemas. De acordo com as críticas, o êxito do filme não se
deve apenas às 263 cópias espalhadas por todo o país, nem aos R$ 3 milhões gastos na
divulgação. Olga agradou ao público porque oferece uma história de amor edulcorada, com
pitadas de heroísmo e sofrimento, e um pano de fundo histórico que a legitima. O viés
luxuoso da trama também contribuiu para o sucesso, visto que sua excelência técnica foi
muito comentada pela mídia. Tanto que foi a produção escolhida para representar o Brasil no
Oscar de 2005, na categoria Melhor Filme Estrangeiro.
Os dois filmes possuem semelhanças e diferenças. O primeiro ponto em comum é o
fato de serem cinebiografias: ambos contam a história de personagens reais, que existiram de
fato e que fizeram parte da história nacional. Outra semelhança é o fato de os dois serem
produções de época, pois contam uma história vivida em outro tempo que não o de agora.
Além disso, a dupla advém de adaptações de livros. O roteiro de Cazuza está baseado no livro
Cazuza, Só as Mães São Felizes, escrito pela jornalista Regina Echeverria, tendo como
origem os depoimentos de Lucinha Araújo. a história de Olga foi inspirada no livro de
Fernando Morais, com o mesmo nome do filme.
Percebem-se, no entanto, algumas diferenças entre eles. A mais interessante delas é
que as obras retratam indivíduos antagônicos. Olga representa o período moderno, por ser
uma mulher que buscava um ideal, que acreditava na idéia de um futuro promissor. Cazuza
representa a transgressão dessa realidade, devido ao seu comportamento desviante: um ser
rebelde, bissexual e usuário de drogas, que tinha apenas o desejo de viver intensamente cada
momento, sem se preocupar com o porvir.
19
1.2 Justificativa
A escolha desses filmes se deu por quatro motivos principais. Primeiramente, por
serem produções nacionais. Delimitou-se o estudo na cinematografia brasileira, pois os filmes
nacionais vêm adquirindo uma imagem mais positiva frente ao público. Em 2003, o número
de espectadores cresceu em torno de 200%: foram 22 milhões contra 7,2 milhões em 2002.
Entre os dez longas mais vistos no país, nesse mesmo ano, três foram brasileiros
2
.
A segunda razão que pautou a escolha foi o fato de que os filmes representam as duas
maiores bilheterias nacionais de 2004. Olga ocupa o primeiro lugar, e Cazuza o segundo no
ranking de abertura de produções brasileiras mais vistas no ano
3
.
Ambas as obras são cinebiografias, e isso representa o terceiro motivo para a seleção
delas. Como os filmes contam a história de um personagem central, torna-se possível focar o
trabalho nessa instância. Será interessante analisar como cada trailer apresentou ao público a
figura-chave da trama.
A quarta e última justificativa para a seleção desses filmes se deve ao fato de que tanto
Cazuza quanto Olga são frutos do mesmo estúdio. A Globo Filmes foi criada no final de
1997, para dar continuidade à estratégia estabelecida pela TV Globo de ampliar a participação
da empresa nas áreas de comunicação e entretenimento.
Quando a Globo Filmes surgiu, os filmes nacionais ocupavam uma faixa de 4% a 5%
do mercado brasileiro. no primeiro semestre de 2003, esse número aumentou para 25%. A
entrada na indústria cinematográfica da maior empresa de televisão do país, com sua
credibilidade e com seu padrão de qualidade já instituído, agradou aos espectadores, visto o
2
Ver: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u40138.shtml. Acesso em: 15 ago. 2004.
3
Dados cedidos por Filme B em dezembro de 2004.
20
sucesso que seus filmes vêm adquirindo frente ao público. Nos seus primeiros anos, a
iniciativa deteve 3% de participação no mercado. Já em 2004, alcançou a marca de 21%
4
.
1.3 A compreensão do objeto
Apresentados os dois filmes e justificada a seleção das obras, parte-se para esclarecer a
metodologia que será aqui incorporada. Lembrando Edgar Morin, a parte está no todo, assim
como o todo está na parte. O trailer é constituído por partes do filme e, então, sabendo-se que
a totalidade da obra pode estar também em alguns fragmentos, acredita-se que a melhor forma
de estudar esse formato complexo é compreendê-lo, sem tentar explicá-lo.
Segundo Michel Maffesoli (1988), optar pela compreensão de uma imagem é aceitar
que a imagem pode receber diferentes interpretações, inclusive a do pesquisador. Assim, antes
de querer criar uma teoria sobre trailer, fundando regras e paradigmas, este estudo investe em
reunir informações a fim de elaborar um ponto de vista interessante sobre o assunto.
“Numerosas obras expressam, com brio, a pretensão de serem frutos de uma teoria ou de um
pensamento, quanto a esta, se contentará com a intenção de fazer pensar” (MAFFESOLI,
2005, p. 09).
Maffesoli sugere que é preciso ser um pesquisador “dionisíaco” e inaugurar linhas
originais de indagação. Para tanto, é evidente que o saber dizer não é de nenhum modo
sinônimo de tudo dizer. “Há imprecisões que o, a um tempo, elegâncias em face da
complexidade das coisas e respeito manifesto ao leitor(MAFFESOLI, 1988, p. 39). Deixar
um problema em aberto, após propor suas linhas gerais, é uma forma de contribuir para o
debate.
4
Ver: http://www.jcnet.com.br/retro2003/mostra_texto.php?codigo=30848. Acesso em: 21 out. 2004.
21
Assim, destaca-se que, devido à novidade de se trabalhar com os trailers, o intuito é
realmente suscitar questões em torno desse tema
5
. A particularidade desta pesquisa deve-se ao
fato de não querer formular uma teoria, mas sim descortinar novos caminhos, novas trilhas e
novas idéias. Não se pretende dar lógica ao objeto de estudo, mas simplesmente analisá-lo e
compreendê-lo. A tarefa se caracteriza por uma busca em levantar questões tão evidentes que
chegam a ficar esquecidas. Trata-se de uma linha de pesquisa que reintroduz na análise do
objeto algumas dimensões imaginárias, que o racionalismo ocidental havia apagado.
A ênfase se concentra na magia das imagens. O foco da atenção será derramado sobre
alguns elementos comunicativos presentes nos dois trailers, destacando aqueles que podem ter
favorecido o processo de sedução. Pretende-se antes compreender a união desses elementos
que comprovar algum efeito por eles gerado. E para melhor compreender o trailer, optou-se
por selecionar dois materiais que servirão como objeto de análise. Portanto, a metodologia
desta pesquisa é a sociologia compreensiva, e a técnica é a análise fílmica.
1.3.1 Mapa da análise
O objeto de estudo desta dissertação é um formato dotado de peculiaridades próprias.
O trailer se apropria da linguagem cinematográfica, mas não é um filme. Ele abusa de
estratégias publicitárias, mas não é um anúncio nos moldes tradicionais. Caracterizado por
essa dupla e complexa identidade, torna-se um formato misto. Desse modo, duas colocações
encontradas nos livros de análise fílmica se encaixam na realidade da pesquisa.
Primeiramente, Martine Joly (1999) aponta que “entre as imagens mais propícias à
análise estão as de publicidade”, pois elas permitem compreender o indivíduo em suas
5
Como já foi relatado na introdução, são raros os materiais que abordam essa temática.
22
relações com seus próprios desejos e motivações e em suas interações com os outros
integrantes da sociedade (1999, p. 69). De acordo com a autora, a imagem publicitária é
essencialmente comunicativa e, por isso, apresenta-se como um campo privilegiado de
observação dos mecanismos de produção de sentido pela imagem.
Joly explica que a análise de um material publicitário consiste em detectar o maior
número de solicitações estabelecidas, levando em conta o contexto e o objetivo da mensagem
visual, “assim como o horizonte de expectativa do espectador” (1999, p. 113).
Além desse ponto de vista, Francis Vanoye e Anne Goliot (1994) indicam que:
Spots, clips, curtas-metragem documentários, “poéticos” ou de ficção, as formas
fílmicas curtas (de 15’’ a 30’) oferecem boas bases para treinar a análise e colocar
certos problemas. Todavia, convém levar em consideração as características
específicas dessas “formas curtas”, diferenciando-as com nitidez dos longas-
metragens de ficção, características devidas à sua duração, decerto, mas também às
condições de produção desses filmes (VANOYE E GOLIOT, 1994, p. 107).
Com essa colocação, os autores referem-se a qualquer forma fílmica curta, menor que
um longa-metragem. É possível, portanto, trazer essas idéias para o trailer, classificando-o,
também, como uma dessas formas fílmicas curtas.
Então, de posse desses dois pontos de vista (de Joly e de Vanoye e Goliot), percebe-se
ser preciso, antes de tudo, saber que o formato aqui analisado é um produto compacto, que se
caracteriza por passar um grande número de informações em um curto espaço de tempo, e que
tem uma função publicitária e, conseqüentemente, visa cumprir objetivos bem definidos.
Ciente dessas peculiaridades, torna-se mais fácil esclarecer de que forma os trailers serão
analisados e o que será priorizado na pesquisa.
Analisar um material imagético é, para Vanoye e Goliot, uma tarefa que “tenta
estabelecer conexões entre o que se exprime e o como isso se exprime’” (1994, p. 52). Os
autores explicam que existe sempre sentido por trás do sentido e, por isso, “cabe ao analista
fazer os sentidos se agitarem, correndo o risco de neles se perder” (1994, p. 67).
23
Em complemento, Jacques Aumont (1993a) salienta não existir um método que,
milagrosamente, permita a todo mundo analisar qualquer tipo de filme. Ele sugere que cada
pesquisador deve construir seu próprio modelo de análise, de acordo com as especificidades
do objeto escolhido. Assim, optou-se por embasar a análise na construção feita nos trailers,
sabendo que dois pontos serão priorizados: o personagem e a montagem.
Cada elemento de uma trama é importante na medida em que funciona na organização
do todo, na medida em que contribui para o equilíbrio da obra enquanto uma estrutura de
significações. Acredita-se que os personagens tomam o controle do jogo, pois é da integração
deles com os demais elementos da narrativa que nasce o conflito.
No momento que um personagem acaba sendo considerado, pelo público, um ser, ele
se torna, implicitamente, um participante, um ser de ação. Então, o modelo de análise de
personagens que esta pesquisa pretende incorporar é em sentido duplo: pretende-se
compreender como o personagem foi apresentado enquanto ser e pretende-se analisar como
esse ser age com os demais elementos do trailer.
Isso significa que se irá levar em consideração não somente o aspecto atuante do
personagem, como também suas características psicológicas, visto que ambos os aspectos se
integram e se completam mutuamente. Para isso, tem-se como base as idéias sobre a
percepção no cinema
6
: é através de gestos, olhares, diálogos, figurino, aparência física e da
postura frente aos conflitos enfrentados que se pode alcançar o estado de espírito de um
personagem.
E como estudar um objeto fílmico é também estudar a sua forma, pretende-se analisar
a montagem dos trailers, investigando como o movimento foi trabalhado e como a ordenação
das imagens ajudou a criar a mensagem final.
6
As idéias sobre percepção encontram-se nas páginas 34-39.
24
A montagem será analisada através de sua função de produção de sentido, com ênfase
na intensidade de cortes, fazendo sempre referência a transformações, evoluções,
continuidade e descontinuidade. Aumont alega que “o que se oferece ao espectador de cinema
é sempre um produto acabado, representado em uma ordem e uma velocidade imutáveis”
(1993a, p. 101). Por isso se quer examinar a ordem e a velocidade dos trailers, que servirão de
pista para demonstrar seu ritmo.
Para analisar o trailer é preciso, então, desmontá-lo e depois reconstruí-lo de acordo
com algumas técnicas. O esforço inicial é para descrever as imagens contidas no trailer, para
depois interpretá-las. Como lembram Vanoye e Goliot, “a desconstrução equivale à descrição.
a reconstrução corresponde ao que se chama com freqüência a ‘interpretação’” (1994, p.
15).
Para Aumont (1993a), a boa análise é aquela que não hesita em utilizar a faculdade
interpretativa. Ele afirma que uma imagem veicula sempre elementos informativos e
elementos simbólicos. Relacionar esses elementos, percebendo o que cada cena pode querer
dizer, é interpretar um trailer.
Assim, o trabalho de análise que será aqui desenvolvido se divide em três tarefas. A
primeira equivale à descrição dos anúncios
7
. Descrever os trailers é uma atividade que requer
atenção. Faz-se necessário debruçar-se durante um tempo no objeto para levantar os
elementos mais relevantes. Conforme os ensinamentos de Vanoye e Goliot, é necessário
destacar os dados diegéticos, como os diálogos, as imagens e os títulos gráficos.
Concluída a descrição, torna-se mais fácil analisar cada trailer. Essa segunda tarefa se
divide em dois trabalhos: uma análise do personagem apresentado e outra da montagem
incorporada. Pretende-se perceber as características físicas de cada protagonista, as suas
principais ações e a maneira como ambos interagem com os outros elementos da trama.
7
A descrição dos anúncios está em anexo, nas páginas 133-140.
25
Também se quer dedicar atenção à forma como as cenas foram montadas e às seqüências
exclusivas criadas para os trailers, feitas através da justaposição de imagens do filme.
A terceira e última tarefa consiste na comparação dos dois anúncios. A prévia de Olga
vai encontrar a de Cazuza, para que tudo o que foi dito ao longo da pesquisa seja
exemplificado e melhor assimilado.
O desafio é, portanto, perceber como cada trailer se apresenta e como cada um se
apropria das nuanças imaginárias presentes nos filmes, para depois compará-los e verificar o
que eles trazem de comum e o que têm de diferente. Dois pontos serão priorizados, como
foi dito: a montagem e o personagem. Sempre lembrando que o objetivo é levantar aquelas
características presentes nos anúncios que mais contribuem para a sedução.
1.4 Alguns termos relevantes
Depois da explanação sobre como os dois trailers serão analisados, é interessante dizer
o sentido que será aqui empregado para aqueles termos mais relevantes. Primeiramente, o
próprio trailer precisa receber contornos delimitantes. Ele será trabalhado como um formato
cinematográfico que possui uma função publicitária, ou seja, que visa apresentar ao público as
propriedades do material que está sendo anunciado. É uma forma de comunicação que fala de
um filme, mas ainda não é o filme.
O trailer é uma antecipação de algumas características da obra, sabendo-se que, muitas
vezes, traz informações diferenciadas. Geralmente, ele é feito antes de o filme estar
totalmente pronto, portanto, algumas imagens que são utilizadas no anúncio podem não
aparecer no longa-metragem. casos em que cenas são filmadas exclusivamente para o
trailer, como uma forma de contar algo sobre o filme, que não existe no próprio filme. Além
26
disso, sendo a sica uma excelente estratégia para criar a atmosfera de um material
cinematográfico, em alguns casos a canção usada no trailer não é a mesma da obra. Como
esse formato possui a função de seduzir, suas características são bem diferentes das do
produto final, que não possui essa função de anunciar algo.
Outra diferença entre o filme e seu trailer é o próprio conteúdo da história e o perfil
dos personagens. A imagem anunciada do protagonista não é exatamente a mesma que este
assume durante o filme, até mesmo pelo curto tempo de duração. O trailer é um outro enredo.
Algumas vezes acaba por dar novos contornos à trama e, em outras, minimiza os conflitos do
longa-metragem.
Por ter essa função publicitária, o trailer possui um perfil atrativo, que contribui para o
aquecimento do espectador. Portanto, deve ser percebido como um produto que tem o intuito
de provocar no público o desejo e a curiosidade. Assim, surgem dois outros termos
importantes.
O desejo será aqui encarado como vontade. A vontade de assistir a um filme pode ser
despertada por inúmeras maneiras: pela identificação do espectador com o personagem do
trailer, pela música tocada no anúncio, pelos atores que fazem parte do elenco, pela história
contada ou pelo ritmo empregado às imagens. Ainda, a vontade pode ser provocada
simplesmente por ser um filme de um gênero de que se gosta. O desejo, desse modo,
pressupõe uma aspiração por algo que interessa ao indivíduo.
A curiosidade, por sua vez, será aqui tratada como interesse, como aquilo que o
espectador sente quando é instigado a saber alguma informação que não lhe foi cedida.
Muitos trailers mostram o desenrolar de um conflito, mas não disponibilizam a sua solução. É
nessas ocasiões que a curiosidade do público pode ser acionada.
27
Ligado a tudo isso, uma outra palavra relevante para a compreensão dos objetivos da
pesquisa é a expectativa. Esse termo será utilizado em um sentido similar à espera, porém,
abrange mais que isso: é uma espera potencializada.
A expectativa por um filme pode ser construída de inúmeras formas. Os responsáveis
pela publicidade cinematográfica agem para que todos se sintam atraídos pelos contornos da
ficção. Para cumprir essa tarefa, existem, além dos trailers, outras formas de divulgação.
É possível citar, somente como ilustração, os cartazes, outdoors, anúncios em jornal,
sites da internet, merchandising (livros, camisetas, CD’s de trilha sonora, jogos de
computador, brinquedos), documentários de making of, pré-estréias, fotografias de
divulgação, entre outros.
Mas para esta dissertação, o importante é que a expectativa pode ser despertada
também através do trailer. A expectativa age através da consciência do indivíduo de que, se
existe um trailer, existe também um filme. Dessa forma, os materiais antecipam alguma coisa
que está por vir, provocando, no público, um sentimento de espera. Além disso, o trailer ajuda
o espectador a criar sua própria visão sobre o que virá. Essa visão é a expectativa pelo filme, é
o que se espera da obra.
Por último, é preciso dedicar atenção especial a quatro problemáticas muito
importantes para este estudo: a sedução, o imaginário, a percepção e o ritual. Como essas
questões representam um ponto central de toda a reflexão, optou-se por dedicar maior espaço
a elas.
28
1.4.1 A sedução
A sedução é um artifício utilizado por alguém que quer encantar um outro. Essa é a
tese de Jean Baudrillard (1991). Ele coloca que a sedução está no campo do ritual e que sua
eficácia deve-se à construção das aparências, livre de um comprometimento com a verdade.
O autor sugere que um objeto sedutor não reivindica uma verdade, ele simplesmente seduz.
É nessa perspectiva que se estrutura esta pesquisa. Um trailer joga com o espectador.
Ele não tem a intenção de contar uma verdade e sim de manter um vínculo com o público,
seduzindo-o.
Baudrillard aponta que a estética do sedutor é irônica: “Sua forma não é a do ideal mas
a da tirada de espírito” (1991, p. 131). Com isso, ele quer dizer que para seduzir é preciso ter
criatividade e montar uma aparência estimulante. Essa “tirada de espírito” deve ser encarada
como uma boa sacada, uma articulação espontânea e inteligente dos signos. Então, é possível
sugerir que um trailer seduz pela sua criatividade. Muitos deles são compostos de jogadas
inteligentes, bem construídas e sedutoras.
O autor acredita, ainda, que “a sedução representa o domínio do universo simbólico,
ao passo que o poder representa apenas o domínio do universo real” (1991, p. 13). A sedução
utiliza-se de símbolos para agir. Quem seduz cria uma realidade imaginária calcada num
universo puramente simbólico. Os objetos sedutores não mantêm uma ligação com a verdade,
nem com o sentido, pois permanecem no reino das aparências. Eles tudo subtraem a “sua”
verdade, impondo o jogo àqueles que estão sendo seduzidos. E é através desse jogo das
aparências que os objetos sedutores acabam por frustrar os sistemas de sentido e de poder.
A sedução é mais inteligente, ela o é como que espontaneamente, com uma
fulgurante evidência não tem de se demonstrar, não tem em que se fundar está
imediatamente ali, no avesso de qualquer pretensa profundidade do real, de
qualquer psicologia, de qualquer anatomia, de qualquer verdade, de qualquer poder.
Ela sabe é seu segredo que não anatomia, que não psicologia, que todos
29
os signos são reversíveis. Nada lhe pertence, exceto as aparências – todos os
poderes lhe escapam, mas ela reverte todos os seus signos. Quem se pode lhe opor?
(BAUDRILLARD, 1991, p. 15).
Todos os signos são reversíveis, diz Baudrillard. E como o trailer trabalha com a
construção da aparência, ele reverte os signos conforme a própria vontade. Já que seu objetivo
é seduzir, ele anuncia, às vezes, um filme como sendo melhor do que ele realmente é.
A partir dessas afirmativas, pode surgir uma interpretação apressada dos fatos. Parece,
assim, que o trailer manipula as pessoas. Mas Baudrillard ressalta que essa sedução não é de
forma alguma negativa. Ele garante que “esse jogo não é perverso. Perverso é o que perverte a
ordem dos termos. Mas aqui não há termos a perverter, não mais que signos a seduzir”
(1991, p. 18). O autor explica que o processo de sedução não é o equivalente do processo de
enganação. Na sedução, há uma cumplicidade entre as partes. A lei da sedução é, em primeiro
lugar, a de uma troca ritual ininterrupta, entre quem seduz e quem é seduzido, na qual a linha
divisória que define a vitória de um e a derrota de outro é ilegível.
O fato é que um objeto, quando quer seduzir, deve camuflar o real. Isso porque, de
acordo com Baudrillard, aquilo que tenta se tornar mais real que o real possui total ausência
de sedução. “Um dia todo o universo será real, e quando o real for universal será a morte”
(1991, p. 41). A sedução subtrai uma dimensão do espaço real. É uma criação ilusória,
acompanhada de fantasmas.
Baudrillard esclarece que a sedução tem a forma de um enigma a resolver. “É no
segredo que se ata a sedução” (1991, p. 89). Então, a sedução se faz também na falta de
alguma coisa, na nebulosidade. E o trailer trabalha com essa perspectiva, visto que ele fala do
filme, mas ainda não é o filme. Eles são duas coisas separadas, porém, correspondentes.
Talvez, pela falta de uma resolução para os conflitos apresentados (resolução essa que
aparecerá no filme), o trailer consiga despertar a curiosidade, colorindo o imaginário do
público e provocando o desejo de assistir à continuação daquela pequena amostra. Isso
30
porque, para Baudrillard, seduzir é também não expor tudo, é disponibilizar uma parcela,
deixar apenas uma pequena parte à mostra, estimulando a curiosidade no outro. E é assim na
publicidade cinematográfica. Revela partes de um todo, de forma atraente, para instigar no
público a vontade de pertencer a esse todo.
Aquilo que procura mostrar tudo, exatamente como é, representa, para o autor, uma
simulação desencantada. Como exemplo, ele cita os filmes pornôs, pois esses tendem a ser
mais verdadeiros que a verdade. Isso seria o cúmulo do simulacro. Com o close-up, é possível
ver o sexo de perto, de um ângulo que seja talvez até impossível ver na vida prática.
Em oposição, as coisas que camuflam alguma parte do todo seriam um exemplo de
simulação encantada. São objetos mais falsos que o falso. Esse é o segredo da aparência.
Acredita-se que o trailer faça parte dessa simulação encantada, pois ele não objetiva ser
totalmente fiel à realidade do filme. Ele trabalha com fatos da história, mas cria uma narrativa
diferente, que se baseia em ocultar uma parte do todo. Para Baudrillard, a sedução retira
alguma coisa da ordem do visível, pois ela não se na cultura da demonstração total. É por
isso que um trailer não descortina todo o segredo de um filme. Ele precisa deixar que a
imaginação do espectador seja acionada e reaja à sua estratégia.
Em outras palavras, como a sedução nunca se detém na verdade dos signos e sim no
engano e no segredo, ela inaugura um modo de circulação secreto e ritual, uma espécie de
iniciação imediata que obedece à regra de seu próprio jogo. Assim, é possível dizer que a
sedução está na esfera do ritual e, conseqüentemente, muito próxima do universo mítico.
A maquiagem, por exemplo, é um meio eficaz de sedução. Baudrillard cita que as
mulheres usam maquiagem para criar uma aparência que aproxima o ser humano da estátua,
ou seja, de um ser divino ou superior. Então, uma mulher maquiada, pela parecença com uma
deusa, está próxima do mito. Sendo assim, um anúncio também é mítico, pois trabalha com a
construção da aparência.
31
O trailer é uma criação mítica por maquiar um filme, colaborando para que esse se
torne um objeto divinizado. O formato objetiva anunciar um filme da melhor forma possível.
Por querer mostrar à audiência que o produto é bom, procura reunir as mais bem elaboradas
cenas de um longa-metragem.
Assim, nota-se que um trailer consegue seduzir porque faz uso do audacioso jogo de
estratégia elaborada para camuflar o conteúdo do filme, fazendo com que o sentido lógico do
espectador fique frágil e vulnerável. É criando uma aparência interessante que um trailer pode
despertar o desejo (vontade) no público de saber mais sobre determinado filme, fermentando a
expectativa (espera) do espectador por aquilo que está por vir. Tudo isso só é possível quando
o anúncio consegue acionar um sentimento de curiosidade (interesse) nos indivíduos,
instigando-os a querer desvendar os mistérios de uma história.
Os profissionais desse ramo devem supor aquilo que pode agradar aos indivíduos, e
esse é um trabalho especulativo, para o qual se faz necessário explorar o imaginário coletivo,
ajustando o anúncio de forma a captar a atenção da platéia.
1.4.2 O imaginário
Os mais diversos meios de comunicação da atualidade agem em sintonia, contribuindo
para movimentar o imaginário a cada instante. As mensagens dispersas pela mídia se
amontoam entre os indivíduos, servindo como matéria-prima para a vida social.
O trailer deve ser considerado uma tecnologia do imaginário, pois, assim como um
filme, uma telenovela, um website, um comercial de televisão, ele reúne informações a fim de
gerar um efeito. Em sua base circulam valores, e seu conteúdo expressa um conjunto de
idéias, que irão fazer parte do mundo daquele que assistir a ele.
32
Essa colocação tem como base a visão de Juremir Machado da Silva (2003), para
quem o homem existe na realidade imaginal. O autor defende a tese de que o ser humano é
movido pelos imaginários que engendra.
Para ele, o imaginário não se restringe à formação de imagens (figuras) na mente,
embora também o faça, mas alcança uma dimensão maior, antropológica, de elaboração de
um mundo no mundo. No imaginário, cada ser é autor, co-autor e protagonista. Pelo
imaginário, cada um faz da sua vida uma obra de arte.
Os imaginários difundem-se por meio de tecnologias próprias, que podem ser
chamadas de tecnologias do imaginário. [...] Todo imaginário é um desafio, uma
narrativa inacabada, um processo, uma teia, um hipertexto, uma construção
coletiva, anônima e sem intenção. O imaginário é um rio cujas águas passam muitas
vezes no mesmo lugar, sempre iguais e sempre diferentes (MACHADO DA
SILVA, 2003, p. 08).
Machado da Silva aponta que o imaginário surge da relação entre memória,
aprendizado, história pessoal e inserção no mundo dos outros. Ele afirma que o imaginário é
uma combinação de reservatório + motor. Reservatório porque agrega imagens, sentimentos,
lembranças, experiências e leituras de vida. Motor porque funciona como catalisador,
estimulador, acelerador e estruturador do vivido. É como um sonho que realiza a realidade
(2003, pp. 11-12).
Para o autor, o imaginário é interação, absorção: “os choques perceptivos alteram a
forma de ver o mundo” (2003, p. 58). Acredita-se, dessa forma, que o trailer ajuda a estimular
a efervescência que inter-relaciona o indivíduo com a atividade cinematográfica. Ele libera
informações, que vão depositar-se na imaginação do público e alimentar seu imaginário,
contribuindo ou não com a vontade de assistir ao filme. Isso porque o imaginário não surge do
nada. Ele não é uma aquisição meramente espontânea, pois é, geralmente, induzido.
O imaginário, então, é uma força que impulsiona indivíduos ou grupos, é a impressão
digital do ser no mundo. “O homem age (concretiza) porque está mergulhado em correntes
33
imaginárias que o empurram contra ou a favor dos ventos” (2003, p. 12). O contato com as
imagens veiculadas no trailer faz com que o espectador seja ou não seduzido, podendo
despertar no sujeito o desejo de conhecer mais sobre a história e os personagens ali
apresentados.
De acordo com Gilbert Durand (1998), apesar do espantoso progresso técnico na
reprodução da imagem, o século 20 foi marcado por um iconoclasmo filosófico, o que
impossibilitou a criação de uma “civilização da imagem” (1998, p. 5). A explosão das mais
variadas formas de vídeo (cinema, televisão, videocassete) não pressupõe o desenvolvimento
simultâneo de um pensamento filosófico voltado para a compreensão da imagem, tampouco
do imaginário (e suas questões complexas).
O processo que desencadeou uma maior atenção às imagens foi longo e atravessou
diversas barreiras, quebrando preconceitos lógicos, racionais, cartesianos e dialéticos. Hoje, é
possível dizer que há uma atenção intelectual voltada para esses estudos.
Nas sociologias mais recentes há um esforço para um “reencantamento” do mundo
da pesquisa e seu objeto, tão desencantado pelo conceptualismo e as dialéticas
rígidas e unidimensionais dos positivistas. E este “reencantamento” passa acima de
tudo pelo imaginário (DURAND, 1998, p. 56).
Como conseqüência desse descaso histórico-filosófico, Durand destaca ser o
imaginário, às vezes, confundido com delírio, fantasma do sonho ou fato irracional. Mas, para
o autor, o interessante seria vê-lo como o conector obrigatório pelo qual se forma qualquer
representação humana.
Sucintamente, é possível ressaltar que, para Durand, o imaginário é real. Seria a
capacidade que todos têm de criar imagens, mas não apenas isso. O imaginário é, também, um
produto derivado da soma da cultura, das experiências, dos desejos e anseios de cada um. Para
ele, o imaginário pode ser visto como um “museu de todas as imagens passadas, possíveis,
produzidas e a serem produzidas” (1998, p. 6).
34
O trailer, então, acaba fazendo parte do museu do espectador, bem como ajuda a
enriquecê-lo. A afirmativa de que o trailer alimenta o imaginário gera dois pontos de vista. O
primeiro deles baseia-se na crença de que ao assistir a um anúncio a platéia passa a ter uma
visão sobre o filme. O imaginário do público sobre este filme foi, assim, alimentado. E a
mensagem anunciada passa a soar como uma verdade sobre o longa-metragem. Essa primeira
constatação estaria em ligação com as idéias de Durand, para quem o imaginário é real.
O segundo ponto de vista suscitado é em relação aos desejos e anseios da audiência.
Para que o trailer consiga provocar a curiosidade da platéia, é imprescindível que ele alimente
seu imaginário. E essa afirmativa estaria em ligação com o pensamento de Machado da Silva,
pois este acredita que o imaginário é como um motor que move os seres humanos.
Sintetizando, salienta-se que o trailer, além de acrescentar novas informações para a
bagagem do espectador, aciona tudo o que em sua memória existe. Além disso, como o
trailer é elaborado com o intuito de seduzir, sua narrativa explora os elementos emocionais
presentes no longa-metragem. Ele se apresenta, desse modo, como um formato encantador,
que, através das imagens que oferece à percepção (reservatório), acelera (motor) o interesse
do público.
1.4.3 A percepção
Aprofundar a análise na questão da atenção e da percepção auxilia o processo de
compreensão do trailer, visto que se defende a idéia de que o espectador é seduzido através
daquilo que percebe nas diversas imagens que constituem um anúncio.
35
Como foi colocado anteriormente
8
, o trailer é uma forma fílmica curta. Por este
motivo, a platéia percebe o anúncio, mas não penetra a fundo na história, devido à rapidez
com que as imagens passam a sua frente. Um trailer lança o público para uma curta viagem, e
este vai percebendo os flashes rápidos que piscam a sua frente.
Para melhor ilustrar essa problemática, optou-se por explorar as idéias do psicólogo
alemão Hugo Munsterberg e do filósofo francês Maurice Merleau-Ponty. Ambos falam de
uma psicologia do cinema e das formas de atenção e percepção que envolvem o processo,
visando a compreender as maneiras pelas quais o espectador recebe as imagens fílmicas.
Hugo Munsterberg (1983) coloca que “a atenção é, de todas as funções internas que
criam o significado do mundo exterior, a mais fundamental” (1983, p. 28). Ele salienta que,
selecionando o que é significativo e relevante, o sujeito faz com que o caos das impressões
que o cercam se organize em um cosmos de experiências.
Em outras palavras, a atenção vai percorrendo as inúmeras coisas que aparecem à
frente, a fim de unir aquilo que está disperso pelo espaço. Assim, tudo se regula pela atenção
e pela desatenção. Aquilo que entra no foco da atenção é destacado e passa a irradiar
significados, e o que cai na desatenção é eliminado.
O autor traça uma diferenciação entre atenção voluntária e involuntária, sendo a
primeira uma atitude consciente, que pressupõe um objetivo, ou seja, a pessoa tem idéia do
que quer focalizar. a atenção involuntária é automática, é direcionada para alguma coisa
que provoca o indivíduo, sem ele ter optado por aquilo.
Na atenção voluntária o sujeito só recebe o que vem de fora se isso contribuir para dar-
lhe aquilo que ele está procurando. “Cientes de antemão do objetivo que queremos atingir,
subordinamos tudo o que encontramos à sua energia seletiva” (1983, p. 28).
8
Ver página 22.
36
No lado oposto, a atenção involuntária é caracterizada por ter um ponto de partida que
se localiza fora do indivíduo. O foco da atenção é dado pelas coisas que se percebem. Então,
tudo o que for barulhento, luminoso, diferente, atrai a atenção involuntária. A mente se volta,
automaticamente, para o que está, em dado momento, chamando a atenção. Assim, tudo o
que mexe com os instintos naturais e o que provoca medo, entusiasmo, indignação ou
qualquer outra emoção forte assume o controle do jogo.
No cotidiano, as duas atenções caminham juntas, pois, como lembra Munsterberg, “a
vida é uma grande conciliação entre as aspirações de atenção voluntária e os objetivos
impostos à atenção involuntária pelo mundo exterior” (1983, p. 29).
No cinema, todavia, não atenção voluntária, visto que a platéia está
necessariamente atrelada a uma atenção que recebe pronta, de fora, portanto, involuntária.
Uma experiência cinematográfica comum pressupõe que o espectador siga os fatos conforme
a dança oferecida pelo cineasta. O cinema, com suas diversas possibilidades, proporciona
todos os detalhes ao público.
Na rápida sucessão das imagens na tela, não faltam meios de influenciar e dirigir a
atenção alheia. Para tal, o cinema utiliza a montagem, os enquadramentos e os movimentos de
câmera. Uma ferramenta eficaz na questão da atenção é o close-up, que possibilita a
potencialização da emoção, dando vida à arte do cinema. O close-up supre as explicações.
Quando um objeto é mostrado dessa forma, o público passa a reter o foco somente nesse
ponto, dedicando-lhe toda atenção. A audiência já sabe que se um objeto é mostrado em close
é porque ele irá desempenhar um papel decisivo na próxima seqüência.
Todavia, não só a atenção é acionada nessas horas. A atividade cinematográfica
estimula também a memória e a imaginação da platéia. A memória faz o público lembrar as
outras cenas que viu até o momento e que servem para explicar a seqüência de
acontecimentos; a imaginação preenche os vazios da história, podendo também alimentar a
37
expectativa por aquilo que está por vir. Esses dois fenômenos agem em conjunto, visto que a
experiência cinematográfica pressupõe uma notável atividade psicológica.
A tarefa do espectador não se limita às “meras sensações luminosas e sonoras”, pois
ele pode estar inteiramente fascinado pela ação que se desenrola na tela e mesmo assim “ter a
cabeça cheia de outras idéias” (1983, p. 36). O sujeito a cena e dedica atenção a um ponto
específico. Ponto esse que foi escolhido pelo cineasta como o mais importante, tratando-se,
por isso, de uma atenção involuntária.
Mas as cenas precisam ter significados, receber subsídios da imaginação, despertar
vestígios de experiências anteriores, mobilizar sentimentos e emoções, atiçar a
sugestionabilidade, gerar idéias e pensamentos, aliar-se mentalmente à continuidade da trama
e conduzir permanentemente a atenção para um elemento importante e essencial a ação
(1983, p. 27).
E somente a imaginação pode prever o desenrolar dos acontecimentos. O cinema (e o
trailer, conseqüentemente) pode fazer a ponte para o futuro ou para o passado, em um rápido
instante. Durante a exibição de um filme, eventos muito distanciados e impossíveis de serem
fisicamente presenciados a um tempo misturam-se diante dos olhos. A técnica das rápidas
mudanças de cena implica a existência, em cada extremidade, de elementos sugestivos que,
até certo ponto, passam a unir as cenas separadas.
Assim, o cinema acaba agindo de forma análoga à imaginação: “ele possui a
mobilidade das idéias, que não estão subordinadas às exigências concretas dos
acontecimentos externos, mas às leis psicológicas da associação de idéias” (1983, p. 38).
Dentro da mente do indivíduo, o passado e o futuro se entrelaçam com o presente. O cinema
passa a obedecer às leis não mais do mundo exterior e sim às da mente.
O papel da memória e da imaginação, no cinema, pode ser ainda mais rico e
significativo, pois é através delas que a tela pode refletir a própria mente dos personagens, ou
38
seja, quando um personagem recorda o passado, o espectador adentra em seus conflitos e
passa a fazer parte de suas emoções. O cinema oferece aos olhos da platéia panoramas
variados, mostrando, em cena, a fantasia viva do personagem.
Quando se enquadra um personagem, toda a atenção passa a convergir para a
expressão de seu rosto, ou para seus gestos corporais. O principal objetivo do cinema, para
Munsterberg, deve ser o de retratar as emoções. Na tela, os personagens são, acima de tudo,
sujeitos de experiências emocionais: “a alegria e a dor, a esperança e o medo, o amor e o ódio,
a gratidão e a inveja, a solidariedade e a malícia, conferem ao filme significado e valor”
(1983, p. 46).
Em complemento a essa visão de Munsterberg, Maurice Merleau-Ponty acredita que
os sentimentos não são apenas realidades interiores. Para o autor, o amor, o ódio, a raiva, a
dor não são acessíveis somente para quem os experimenta, mas também para quem
acompanha esses sentimentos em um outro alguém. É então que ele destaca o filme como um
objeto a se perceber: “É mediante a percepção que podemos compreender a significação do
cinema: um filme não é pensado e, sim, percebido” (1983, p. 115).
Quando o cinema deseja mostrar ao espectador um personagem com vertigem, ele
oferece um corpo desequilibrado, a se contorcer, com andar vacilante. Quando se quer passar
a idéia de sofrimento, explora-se a decadência física dos atores. Ao contrário, quando a
proposta é fazer a platéia perceber a felicidade do momento retratado, cria-se um colorido
especial à cena, enquadrando a alegria através do sorriso dos personagens. É através daquilo
que o público percebe, que surge o significado total da cena.
Mas não os personagens expressam sentimentos. O cinema dá vida também aos
objetos: em cena, objetos inanimados passam a mover-se, sugerindo ao espectador que se
concentre num determinado elemento. O cinema se vale de recursos ilimitados para direcionar
o interesse da platéia, suscitando emoção no público. O figurino é um deles, visto que o luto
39
se manifesta pela roupa preta, enquanto a alegria, pelo colorido. O cenário também pode
auxiliar no clima e na fantasia emocional da cena, pois o ambiente no qual se passa a
seqüência pode transmitir o estado de espírito do personagem.
Merleau-Ponty salienta que cada filme narra uma história, isto é, um determinado
número de acontecimentos, que acionam personagens. Mas isso não significa que o filme está
destinado a fazer ver ou ouvir, pois as idéias e os fatos são apenas os materiais da arte. E a
arte consiste na escolha daquilo que se vai dizer e daquilo sobre o que se calar, dentro da
seleção de perspectivas: uma cena é feita a partir do ângulo de um personagem, a outra
segundo o ponto de vista de um outro e assim por diante.
O filósofo coloca que um filme não é uma soma de imagens, e sim uma forma
temporal. Assim, a sucessão dos elementos auxilia o público a perceber as idéias
desenvolvidas na história. O sentido de uma cena depende de todos os outros planos que a
precederam, e a sucessão destes cria uma nova realidade. Conforme revela o autor, trata-se do
privilégio do cinema em demonstrar como qualquer coisa passa a ter significado, não devido a
idéias já formadas, mas através da disposição temporal ou espacial dos elementos.
A ordenação dos planos é que denota sentido à cena, e a forma como os objetos são
enquadrados e mostrados influencia a imaginação do espectador. É percebendo os diversos
elementos que a platéia constrói, em sua mente, o significado da história. É através da
percepção que o público entende os sentimentos projetados na tela. Por ter consciência de
todos esses fatos, esta dissertação defende a idéia de que a grande dimensão da tela, nas salas
de cinema, favorece a atividade perceptiva, facilita o encantamento da platéia e,
conseqüentemente, contribui para a sedução.
40
1.4.4 O ritual
Ao longo dos anos, o cinema somou experiências, desenvolvendo uma linguagem
própria, capaz de transformar uma história em uma nova narrativa: a narrativa
cinematográfica. Porém, ainda assim, defini-lo é uma tarefa complicada. O cinema invade
vários espaços, pode receber funções totalmente distintas, assim como pode ser analisado sob
diferentes pontos de vista. É preciso esclarecer, em face de tantas funções e significados que
ele engloba, como o cinema é aqui encarado.
De forma bem sucinta, é possível indicar que existem, no mínimo, quatro diferentes
funções para o cinema: o cinema como lazer, ligado ao divertimento; o cinema como arte,
ligado ao prazer; o cinema como indústria, ligado ao comércio e o cinema como ritual, ligado
ao espetáculo.
Esta dissertação, por buscar compreender a sedução – e estando a sedução muito
próxima da emoção , percebe o cinema como um ritual. Um ritual que é repleto de
significações, que envolve questões míticas e que prevê uma constante circulação de objetos,
no caso, de filmes e trailers.
O que se defende é que somente o espetáculo na sala faz com que o espectador
participe de uma sessão de cinema bem elaborada nos moldes tradicionais. Acredita-se que o
trailer ganha mais vida quando faz parte do espetáculo, já que sua existência na sala de
cinema potencializa sua performance. A exibição do formato nas salas favorece a sedução,
pois nos entornos do ritual o indivíduo é submetido a uma rie de particularidades. Para
justificar esse ponto de vista, convocou-se, para a discussão, um especialista no assunto.
O psicólogo alemão Hugo Mauerhofer (1983) sugere que o cinema instala um regime
particular de consciência – a situação cinemafenômeno de fronteira entre a vigília e o sono,
41
cuja função básica é oferecer um prazer compensatório, um “alívio imaginativo” que leve o
espectador para longe dos problemas de todo dia.
O autor acredita que, quando o sujeito decide ir ao cinema, menos importa, a ele, as
condições técnicas e socioeconômicas das indústrias que estão por trás do processo, do que a
busca por distração, entretenimento e talvez até por instrução. Entrar na sala de cinema
significa, para Mauerhofer, um isolamento do mundo exterior e de suas fontes de perturbação
visual e auditiva. Uma situação cinema ideal seria aquela onde não houvesse nenhum ponto
de luz, a não ser a que irradia da tela, e nenhum foco sonoro, a não ser o som do filme. Para
embasar sua tese, o autor levanta três efeitos psicológicos causados pela situação cinema.
Primeiro, ele diz que uma pessoa que permanece um certo tempo em um ambiente
escuro sofre uma alteração da percepção de tempo, isto é, começa a sentir um retardamento
no curso normal dos acontecimentos. O segundo efeito que ele destaca é a alteração da
sensação de espaço, anulando a barreira entre o consciente e o inconsciente. “Quanto menor a
capacidade do olho humano de distinguir com clareza a forma real dos objetos, maior o papel
desempenhado pela imaginação, que faz um registro extremamente subjetivo do que ainda
resta de realidade visível” (1983, p. 376).
Mauerhofer aponta que esses efeitos de sensação modificada de tempo e espaço
desempenham papel decisivo na situação cinema, pois quando começa a projeção, a imagem
na tela serve de alívio para o espectador, que adentra uma realidade diferente, a do filme.
Como o indivíduo perde a noção de tempo, o ritmo do filme vem proporcionar um alívio
imediato, visto que as cenas se desenvolvem geralmente de forma mais ágil que na vida real.
Simultaneamente a essas duas sensações, o autor levanta o estado passivo do
espectador como sendo a terceira peculiaridade psicológica que o cinema proporciona.
Anonimamente sentado em uma sala isolada da realidade cotidiana, o indivíduo espera pelo
42
filme em total passividade e receptividade. Para finalizar sua argumentação, Mauerhofer
coloca:
O cinema provoca respostas que substituem aspirações e fantasias sempre
proteladas; oferece compensação para vidas que perderam grande parte de sua
substância. [...] O cinema nos faz ficar tristes e nos faz ficar alegres. Incita-nos à
reflexão e nos livra das preocupações. Alivia o fardo da vida cotidiana e serve de
alimento à nossa imaginação empobrecida. É um amplo reservatório contra o tédio
e uma rede indestrutível para os sonhos (MAUERHOFER,1983, p. 380).
É então, com base nas colocações de Mauerhofer, que se acredita ser esta dita situação
cinema sugestiva para que o espectador fique mais atento às imagens. Sendo assim, dentro da
sala ele está mais suscetível à sedução, e é por isso que se insiste que a exibição de trailers nas
salas potencializa sua eficácia.
Desse modo, trabalha-se com a idéia de cinema como um ritual envolvente. Isso
porque se acredita ser o fato mais destacável do cinema a própria cerimônia que o envolve.
São várias pessoas (desconhecidas) numa sala escura, olhando para uma grande tela branca
que recebe um jato de luz, e, através de pulsações óticas, possibilita a impressão de imagens
registradas de uma pretensa realidade.
Ir até o cinema pressupõe uma atitude consciente do sujeito, para a qual ele deve
disponibilizar tempo (terá de ficar concentrado no filme durante o período aproximado de
duas horas) e dinheiro (para pagar o valor do ingresso). E, até o final da projeção, o público
estará sentado, de forma receptiva, embalado por um conjunto de sons vozes, música,
ruídos.
Faz parte também do ritual a escuridão da sala. Esse fato proporciona características
oníricas para as projeções. A obscuridade deixa o indivíduo relaxado, ajudando-o a se
esquecer das resistências à fantasia que carrega durante o dia. O conforto das poltronas é
outro elemento essencial para que ele se distensione, colocando-se em estado de sonho.
43
A sessão de cinema tradicional das salas de exibição pressupõe a veiculação de trailers
no início do espetáculo. Assim, eles dão o tom de início do ritual. Preparam o público para a
experiência cinematográfica, deixando-o em estado de entrega. Acredita-se que as pessoas
não se dirigem até o cinema só para assistir ao filme, e sim para contemplar todo o espetáculo
envolvente que lhes é oferecido. Os trailers, que são projetados antes do filme, estão
implícitos no ritual. O espectador geralmente quer saber quais as produções que estão por vir.
Além de ser um atrativo a mais, as prévias mostram novas histórias, convidando o público a
voltar ao cinema. O trailer demonstra que um espetáculo está começando, e que se trata de um
espetáculo e não de outra coisa.
Todo ritual tem um começo e, na atividade cinematográfica, a iniciação é feita pelos
anúncios. No entanto, é importante ressaltar que o momento da aparição desse formato é
utilizado de várias formas pelo público. Algumas pessoas prestam atenção, deixando-se
envolver pelo que está sendo mostrado. Muitos trailers conseguem promover a participação
afetiva. Alguns fazem o público rir, exaltar-se, emocionar-se, e a maioria (pelo menos como
deveria ser) deixa o público instigado a conferir o filme. Porém, pessoas que não dedicam
nenhuma atenção a esse formato, aproveitando o momento para conversar com a pessoa ao
lado ou desligar o telefone celular.
Mas, salienta-se que aqueles que assistem aos trailers com bastante atenção, já
mergulham no clima da sala escura. O anúncio é uma preparação, e funciona como tal em
dois sentidos. Em primeiro lugar, seria o fato de ele deixar o espectador no estado de
entrega. Em segundo, o trailer pode ser encarado, também, como uma preparação para a
próxima experiência, isto é, ao apresentar uma nova produção, ele estimula no público o
desejo de voltar ao cinema e participar de um novo espetáculo. E assim acontece centenas de
vezes. Essa é a lógica cinematográfica.
44
Como indica Baudrillard (1991), o ritual implica vários pequenos mitos, como, por
exemplo, o mito do eterno retorno. “O desejo é certamente a Lei do universo, mas o eterno
retorno é sua regra (1991, p. 168). Percebe-se, assim, que o eterno retorno está implícito
também no espetáculo cinematográfico. O sujeito participa várias vezes, e cada novo encontro
estimula nele a vontade de que haja um próximo. Por ser encarado como um ritual, o cinema
precisa de elementos que façam perpetuar sua existência. O trailer, em sintonia com as outras
formas de divulgação, executaria esse papel.
2 VOLTANDO-SE PARA A GRANDE TELA
Esta parte da pesquisa convida o leitor a olhar diretamente para a tela, pois fala-se,
agora, de dentro do trailer. O primeiro capítulo edificou as bases do estudo, e este segundo
permite que se penetre em quatro propriedades do formato: sua história, sua função
publicitária, o personagem e a montagem.
Num primeiro momento, disponibiliza-se a história do trailer nas realidades norte-
americana e brasileira. Foram reunidas informações sobre seus primórdios, desde a época em
que o anúncio de filmes não passava de pedaços da trama exibidos logo ao final da sessão.
Feito esse levantamento histórico, abandona-se o fabuloso mundo do cinema para
recair por um instante sobre a arte de divulgar um objeto. Questões referentes ao universo
publicitário serão discutidas, com o intuito de entender o jogo travado por essa instância para
captar a atenção do público.
Depois, retorna-se ao campo cinematográfico, abordando as duas características
selecionadas para guiar a análise. Apoiando-se nas idéias de Beth Brait (1985) sobre o
personagem de ficção, discorre-se sobre a importância do ser em um material fílmico,
enfatizando sua relevância na construção do vínculo entre a platéia e o produto.
Por fim, dá-se vez para a montagem, buscando clarear a narrativa típica do trailer, que
abusa de cenas curtas e cortes secos. Os anúncios são hoje caracterizados pela dinamicidade,
mas nem sempre foi assim, como se perceberá a seguir.
2.1 Resgate histórico do trailer
Para compreender a situação atual do trailer, é preciso falar de seu passado, apurando
informações históricas e desvendando as facetas que o formato vem assumindo ao longo dos
anos. A fim de oferecer um ponto de vista mais completo, optou-se por traçar um diálogo
entre dois autores que se debruçaram sobre essa questão na realidade hollywoodiana. Trata-se
de Peter Debruge, que escreveu um artigo chamado A brief history of the trailer
1
, e Lisa
Kernan, autora do livro Coming Attractions: reading american movie trailers, publicado em
2004
2
.
Conforme relato de Peter Debruge, o trailer atravessou diversas fases, assumindo
funções e moldes diversificados. Debruge lembra que, nos primórdios da história do cinema,
assim que as salas se popularizaram, duas dificuldades eram enfrentadas pelos profissionais
envolvidos nesse novo contexto. Em primeiro lugar, os donos das salas ainda não tinham
como delimitar uma sessão, ou seja, as pessoas entravam e podiam ficar no local de exibição
quanto tempo quisessem. A segunda dificuldade que Debruge expõe diz respeito aos estúdios.
Esses precisavam achar uma estratégia eficiente para atrair futuros espectadores.
Diante dessa problemática, foi encontrada uma solução: separar dois filmes adjacentes
com informações sobre novas produções. Dessa forma, começaram a ser projetados, entre um
filme e outro, slides referentes aos materiais que seriam lançados futuramente. Assim, nas
primeiras décadas de vida do cinema, nasceram os primeiros anúncios.
Debruge conta que esse anúncio, que ocupava o lugar entre duas obras, tinha por
objetivo principal chatear as pessoas para que elas deixassem as salas livres para próximos
espectadores. De imediato, os profissionais não perceberam o potencial dessa idéia. Mas não
1
Ver: http://www. movietrailertrash.com/views/history.html. Acesso em: 10 jun. 2005.
2
KERNAN, Lisa. Coming Attractions: reading american movie trailers. Austin: University of Texas Press,
2004.
tardou para que se começasse a pensar de forma utilitária, aproveitando essa estratégia para
criar um clima de expectativa. Nesse período, os créditos eram passados no início do filme e,
portanto, os anúncios começaram a ser exibidos após o longa-metragem. Daí advém o nome
trailer, derivado do verbo tail, que significa seguir adiante. Depois de alguns anos, os trailers
passaram para o início do espetáculo, onde permanecem até hoje. O nome, todavia, ainda é
igual.
Lisa Kernan (2004) faz uma análise retórica dos trailers norte-americanos ao longo da
história e, para tanto, estabelece três grandes períodos: era clássica (aproximadamente de
1927 a 1950); era de transição (1950 a 1975) e era contemporânea (1975 até o presente). A
autora se dedica a realçar as formas particulares pelas quais o trailer se dirige à audiência,
classificando-o como "cinema das próximas atrações" (2004, p. 34).
De acordo com Kernan, as primeiras tentativas para promover filmes com a utilização
de trailers foram feitas por volta de 1912. Nesse ano, na Praia Rye, em Nova Iorque, após a
projeção da série As aventuras de Kathlyn, seguia-se um pedaço de filme que pretendia criar
um suspense. Esse pequeno trecho mostrava a protagonista da história sendo jogada aos leões.
Depois disso, aparecia um texto perguntando: “Ela escapará da toca do leão? Veja na próxima
semana as cenas do próximo capítulo”. Segundo Kernan, essa é considerada, na história do
cinema mundial, a primeira propaganda de uma futura obra. Depois dessa tentativa, passou-se
a fazer chamadas semelhantes para grande parte dos filmes. Muitas vezes, os próprios locais
de exibição projetavam a cena inicial de um material que iria estrear futuramente, visto que
nem todos estúdios se empenhavam em criar anúncios mais elaborados.
Como relata Debruge, em 1916 a Paramount tornou-se o primeiro estúdio a
oficialmente lançar trailers, ainda que somente os filmes mais importantes fossem
considerados dignos de um anúncio. Por volta de agosto de 1919, a Paramount havia
estabelecido sua própria divisão de trailers e preparava prévias para todos os filmes que
estavam por vir. Exceto a Paramount, os demais estúdios ainda desprezavam essa estratégia,
classificando-a como uma aventura secundária, que podia ficar a cargo dos exibidores. Mas, à
medida que os estúdios foram comprando os locais e as cadeias de exibição, começaram a
mudar de opinião.
No final de 1919, narra Debruge, três propagandistas de Nova Iorque se juntaram para
formar o National Screen Service (NSS), com a audaciosa meta de supervisionar a
distribuição de material propagandístico para todos os grandes estúdios, que, na sua maioria,
não tinham nem tempo nem pessoal para gerenciar tais questões. Os estúdios logo lançaram-
se a essa oferta, visto que o NSS oferecia uma oportunidade promocional ideal por nada mais
do que o próprio custo de produção dos materiais.
Kernan conta que os estúdios logo perceberam o potencial dos trailers e começaram a
fornecer seus filmes para que o NSS criasse um bom anúncio. Nascia, assim, a lógica do
marketing cinematográfico. Nos anos seguintes, o NSS firmou contrato com os mais
significativos produtores, garantindo a entrega de trailers em troca de exclusividade para
manusear todos os filmes do estúdio que contratava seus serviços.
De 1927 até o final dos anos 70, o NSS distribuiu posters, fotos e trailers para os
filmes dos principais estúdios. Debruge constata que quase todos os trailers produzidos
durante o período de supervisão do NSS se assemelham, soando como “detestáveis banquetes
de espetáculo, repletos de bombásticos títulos e narrações”
3
. Kernan descreve os trailers do
NSS como materiais compostos por títulos deslumbrantes que se moviam – cresciam e
encolhiam –, interagindo com a imagem, com o uso freqüente de um narrador.
Acompanhando o raciocínio dos autores, percebe-se que a chegada do som no cinema
representou uma grande contribuição para os anúncios, visto que, a partir de então, interações
entre o som diegético, a sica e a voz do narrador tornaram-se elemento indispensável. Nos
3
Ver: http://www.movietrailertrash.com/views/history.html. Acesso em: 10 jun. 2005.
anos 30, os trailers utilizavam algumas estruturas rotineiras do discurso: títulos hiperbólicos,
ligações gráficas e visuais entre as cenas e narrações que visavam convencer a audiência a não
perder o filme. Além disso, sempre identificavam os astros do elenco, lembrando aos
espectadores alguns sucessos anteriores dos artistas.
No começo dos anos 50, os trailers ultrapassaram as fórmulas básicas do início de sua
trajetória e assumiram um papel central na tarefa de elevar as bilheterias. Nesse período, os
anúncios eram criados para seduzir o maior número de espectadores possível. Kernan
esclarece que, para os produtores de trailer dessa metade do século XX, a função primeira do
formato não era atrair uma audiência específica, mas sim evitar a alienação de qualquer
audiência em potencial, ou seja, o objetivo era fazer todo mundo saber da obra, evitando que
as pessoas desconhecessem suas características. Por isso, a autora acredita que, até hoje, os
trailers representam o local original de onde o filme “fala” com sua audiência nos termos mais
claros possíveis (2004, p. 26).
De acordo com Debruge, nessa época, Alfred Hitchcock era um dos cineastas mais
perspicazes na elaboração de trailers. Aproveitando-se da sua própria pessoa pública, o diretor
geralmente aparecia nas prévias de seus filmes. No anúncio de Psicose (1960), Hitchcock leva
a audiência para uma turnê na cena do crime, apresentando ao público a mansão de Norman
Bates. Em alguns de seus outros trailers, o diretor fornece seqüências adicionais, ou seja,
mostra cenas que não acontecem no filme. O trailer de Festim Diabólico (1948), por exemplo,
apresenta um diálogo entre Janet Walker e David Kentley, a tima que passa o filme inteiro
guardada dentro de um baú. Na cena seguinte, o ator James Stewart explica: "esta é a última
vez que ela viu ele vivo, e é a última vez que você vai ver ele vivo". Debruge conta que, fora
os anúncios de Hitchcock, os demais seguiam o modelo-padrão estabelecido.
Ainda que certos cineastas estivessem tirando vantagem dessa estratégia
mercadológica, para Debruge poucos trailers demonstravam qualquer tipo de talento original.
Foi por buscar um novo tratamento estético que os estúdios começaram, na década de 60, a se
desvencilhar da dependência do NSS, passando a criar seus próprios departamentos
especializados. Como salienta o autor, “à medida que a audiência começou a exigir mais dos
filmes, ela também se tornou mais crítica em relação às promessas vazias oferecidas pelos
trailers”
4
. Ao passo que os estúdios começaram a procurar outras alternativas, visando escapar
da fórmula batida dos materiais produzidos pelo NSS, novas companhias entraram no
negócio, com o intuito de pôr em prática algumas sofisticadas técnicas que vinham sendo
utilizadas por profissionais da propaganda.
Nos anos 60 toda a indústria de trailers sofreu uma representativa revolução. Os
materiais passaram a contar a história do filme, ao contrário de apenas explorar a divulgação
dos grandes astros e abusar de adjetivos exagerados, como vinha sendo feito. Tentando
acostumar a audiência a ver o ator como personagem, e não mais como uma estrela, os
profissionais começaram a explorar a trama, destacando os conflitos vividos pelos
protagonistas. É desde então que alguns trailers vêm trabalhando com uma (ou mais) figura
central, visando emocionar a platéia.
Nesse período, os estúdios contratavam especialistas com experiência em propaganda
para modernizar os trailers. Como esses profissionais não tinham os vícios de quem fazia
longas-metragens, a nova ninhada abandonou rapidamente a edição continuada tradicional (o
estilo linear clássico de Hollywood, restrito a discretamente fornecer informação narrativa),
por uma nova abordagem estética.
Os profissionais sentiam falta de uma trilha sonora capaz de causar um efeito relevante
e contratavam músicos para criar trechos especiais. Com o passar do tempo, o NSS foi
tornando-se apenas um distribuidor. Muito rapidamente, surgiu um grande número de casas
de trailer, especializando-se em diferentes gêneros e abordagens. Os materiais iniciaram a
4
Ver: http://www.movietrailertrash.com/views/history.html. Acesso em: 10 jun. 2005.
divulgar o nome do diretor e a acrescentar informações referentes a prêmios arrecadados pelos
filmes em festivais, assim como críticas publicadas em jornais.
No final dos anos 60, os estúdios perceberam o impacto potencial da TV, tanto como
uma fonte de competição para o cinema quanto como um local adicional para disseminar
informações sobre os filmes. A partir de então, começaram a fazer trailers para serem
veiculados nesse meio. Kernan destaca que o advento da TV causou uma reconfiguração
econômica no sistema de estúdios, obrigando Hollywood a pensar em novas formas de captar
a audiência. Nesse período, o marketing cinematográfico entrou em uma certa “crise de
identidade” (2004, p. 28).
A indústria cinematográfica se deu conta de que anunciar um filme na TV fazia a
bilheteria crescer consideravelmente, e esse meio passou a fazer parte da rotina de divulgação,
o que significava que o estilo dos trailers teria que evoluir constantemente, em sincronia com
a propaganda televisiva, a fim de não ficar para trás.
Os envolvidos no marketing de cinema notaram que os propagandistas da TV
trabalhavam com um estilo mais rápido, mais agressivo, e passaram a adotar a mesma postura,
aplicando vários cortes nos trailers. Kernan conta que a estrutura de montagem da maioria dos
anúncios, desde então, faz com que a sua temporalidade seja certamente mais importante para
sua significação, do que a sua espacialidade. Então, pode-se inferir que o ritmo acelerado dos
trailers advém, também, desse hibridismo do cinema com a televisão.
No início da década de 80, a televisão lançou um outro formato de duração de dois a
três minutos (assim como os trailers), que resultou por alterar consideravelmente a edição dos
anúncios. Em primeiro de agosto de 1981, a MTV apresentou seu primeiro videoclipe
musical
5
, reestruturando completamente a conexão entre imagem e música. Mesmo sendo
elemento indispensável nos trailers, o uso da música passou a ser ainda mais elaborado.
5
O primeiro videoclipe da MTV foi Video Killed the Radio Star, da dupla inglesa The Buggles.
Essa nova perspectiva contribuiu bastante para a aceleração do estilo arrojado que
vinha sendo aplicado nos trailers. Com o advento da televisão, as pessoas começaram a ser
adestradas na atividade de conviver com imagens, o que facilitou a capacidade do espectador
de absorver um número cada vez maior de informação ao mesmo tempo. De acordo com
Debruge, a MTV mostrou que, quando se trabalha com música, é possível se mover muito
mais rápido. Foi então que o estilo de corte rápido se sedimentou nos anúncios de cinema.
“Hoje, o corte rápido atingiu tal grau extremo, que o método mais antigo de deixar um trailer
se desenvolver silenciosamente pode ter um impacto menos eficaz sobre a audiência do que a
sobrecarga de informações
6
.
Um outro fator que contribuiu para a aceleração no ritmo dos materiais foi o advento
das novas tecnologias digitais e dos novos softwares de edição, a partir da década de 80. A
montagem digital trouxe maior agilidade ao processo, possibilitando aos profissionais fazer
várias tentativas até alcançar uma versão final. Uma outra mudança que deve ser levada em
conta é o advento, da internet, em meados da década de 90, na promoção das obras,
aumentando a interatividade entre produtores e fãs e dando maiores elementos para um
diálogo entre o filme e sua audiência. Como comenta Debruge, hoje a maioria dos estúdios
coloca seus trailers na internet para download. Segundo o autor, o sonho dos profissionais é
criar diferentes trailers, específicos para cada audiência, podendo fazer anúncios regionais e
fazer trailers completamente diferentes para a internet e para as salas de cinema.
Kernan (2004) salienta que, de todas as mudanças na prática de produção de trailers, o
mais surpreendente são as técnicas de continuidade aplicadas nos materiais, como, por
exemplo, utilizar a alternância de diálogos com intertítulos. Ela explica que os títulos gráficos
eram elementos familiares para as audiências do cinema mudo, mas que eles desapareceram
com o advento do som. Porém, essa convenção do cinema mudo, de utilizar textos gráficos,
contribuiu para uma naturalização desse regime aplicado nos trailers, que desde seus
6
Ver: http://www.movietrailertrash.com/views/history.html. Acesso em: 10 jun. 2005.
primórdios usa os títulos para conectar cenas separadas. O elemento gráfico ainda é
encontrado em muitos trailers contemporâneos. Assim como o narrador (que começou a ser
usado por volta dos anos 30), ele envolve as cenas e lembra ao espectador que o filme é um
pacote fechado.
Os títulos, nos anos 50, eram usados somente para abrir e fechar um trailer. Os
gráficos foram sendo substituídos pelo uso intercalado de diálogos, ligados pela narração
não mais uma narração ausente, mas, muitas vezes, feita por um personagem da história. No
final dessa década, os anúncios traziam uma série de pequenas cenas de diálogos,
acompanhadas por uma trilha sonora envolvente.
De uma forma geral, nota-se que desde a era clássica até a atualidade, os trailers
passaram a considerar mais a presença da música e a valorizar um movimento rítmico
dinâmico. Hoje, prevalece um modelo que apresenta um pesado uso de cortes. Os anúncios
trazem um grande número de cenas curtas, interligadas através de diálogos, narração ou
títulos gráficos.
Como destaca Kernan (2004), os trailers, no mercado contemporâneo, representam
uma despesa eficaz, pois eles utilizam, aproximadamente, apenas 4,5% do orçamento de um
filme, enquanto geram, pelo menos, 20% do seu rendimento. Eles também são um dos mais
freqüentes componentes de valorização das obras, sendo incluídos nos DVDs e nos websites
oficiais (ou não) dos filmes. Além de serem elementos primordiais nas salas de cinema,
abrindo o espetáculo.
Desse modo, percebe-se que o trailer vem construindo sua identidade e, para tanto,
dialoga com outros meios e formatos. Apreendendo novas táticas constantemente, ele se
empenha para provocar a audiência com a idéia de que sempre há algo novo para se ver, além
do filme previsto no ingresso.
2.1.1 Trailers no Brasil
Optou-se por partir da história do trailer norte-americano para chegar à esfera
brasileira, porque a prática de anunciar filmes nasceu nos Estados Unidos. O Brasil foi
apresentado ao formato já no modelo que vinha sendo elaborado em Hollywood, visto que os
trailers que aqui chegavam estavam todos enquadrados no padrão vigente da época. Mas isso
não equivale a dizer serem todos os trailers nacionais cópias do que tem sido feito. Cada
cinematografia mantém suas peculiaridades, incorporando, em suas imagens, valores e
costumes sociais próprios.
Disponibilizar informações a respeito da história do trailer na realidade norte-
americana tornou-se importante para o trabalho porque contribui para se conhecer um pouco
mais sobre as facetas do formato. Todos os dados recém-colocados referem-se aos trailers
feitos nos EUA, mas acredita-se que muita coisa foi sendo incorporada pelo mercado
brasileiro. Como exemplo, tem-se o costume de deixar de lado a divulgação dos astros para
dar valor aos personagens, assim como a questão dos títulos gráficos, visto que muitos
anúncios nacionais também fazem uso dessas táticas.
Além disso, foi possível observar que desde muito cedo, nos EUA, a produção de
trailers se tornou industrializada. E talvez essa seja a maior diferença entre o mercado
nacional e o norte-americano. Ainda hoje, a elaboração de trailers no Brasil não é totalmente
industrializada, visto que, muitas vezes, o anúncio é criado por profissionais que trabalham
com longas-metragens ou publicidade.
Essa situação pode indicar uma maior liberdade ou criatividade para os trailers
nacionais. Nos EUA, como se trata de um trabalho mecânico, industrial, acaba resultando em
uma produção massificada, como acontecia no NSS. No Brasil, como esse setor é, em parte,
marginalizado, não se observa a produção dita em série de trailers. O cinema no Brasil nunca
foi tão mecanizado quanto nos EUA, e esse pode ser o fator mais indicativo para entender a
situação artesanal na criação de trailers nacionais.
Os trailers começaram a ser feitos aqui no Brasil um pouco mais tarde que nos EUA.
Conforme disserta Neusa Demartini Gomes (2003), a publicidade brasileira iniciou sua
verdadeira expansão moderna em 1930, momento em que as mudanças políticas, econômicas
e sociais auxiliaram na configuração das bases de um mercado anunciante e de um mercado
consumidor no país (2003, p. 9). Foi igualmente na década de 30 que os primeiros estúdios
brasileiros de cinema começaram a surgir, sendo o primeiro deles a Cinédia (1930). Assim,
esses dois dados levam a crer que também nessa cada os trailers começaram a ser
produzidos no Brasil. Juntamente com a criação dos estúdios e com a incorporação de uma
visão mais mercadológica na economia nacional, os filmes brasileiros passaram a ganhar
anúncios especializados.
Através de pesquisa no acervo da Cinemateca Brasileira
7
, descobriram-se alguns
trailers dessa época: A voz de Bidu Sayão (1934), Fazendo Fita (Vittorio Capellaro, 1935),
Pureza (Chianca de Garcia, 1940), Direito de pecar (Leo Marten, 1940) e Segura essa mulher
(Watson Macedo, 1946). Apesar de terem sido encontrados somente esses, imagina-se que
outros existiram, mas se perderam com o passar dos anos.
A partir da década de 50, acredita-se que a maioria dos filmes recebiam um anúncio,
sabendo-se que um exemplar do trailer de O Saci (Rodolfo Nanni, 1951/53) no acervo da
Cinemateca Brasileira. Esse foi um dos primeiros filmes realizados no Brasil para um público
infanto-juvenil.
Os trailers desse período eram muitas vezes feitos pelo montador do estúdio. Uma
estratégia utilizada pelos editores era trabalhar com as sobras da película, isto é, utilizar no
trailer os negativos que não eram usados no filme. Uma matéria publicada no jornal Folha da
7
Ver: http://www.cinemateca.gov.br. Acesso em: 12 set. 2005.
Tarde, no ano de 1998, apresenta uma declaração que pode ser bem interessante para a
pesquisa, pois se refere à realidade brasileira: “Utilizar no trailer cenas que não compõem o
filme foi um recurso amplamente empregado no Brasil. O objetivo não era o de apresentar
imagens inéditas (de maior impacto), mas sim de economizar no orçamento total da
produção”
8
.
Um dos motivos para que assim acontecesse é o fato de que os produtores de cinema
no Brasil estão sempre com o orçamento curto. Então, seria uma maneira de diminuir os
gastos. Utilizar o mesmo negativo representava um processo bem mais caro, visto que para
isso era preciso fazer cópias. Hoje, com o advento das tecnologias digitais, é possível fazer
cópias do negativo de forma mais fácil, agilizando o processo. É por isso que atualmente essa
tendência de usar as sobras do negativo não é mais comum entre os estúdios.
Outro texto, publicado nesse mesmo jornal, no mesmo dia, afirma que “projetadas na
tela, certas histórias se desenvolvem melhor em dois minutos do que em duas horas”
(GUERINI, 1998). No que diz respeito ao Brasil, o texto conta que, na cada de 90, não
existiam, no mercado nacional, produtores especializados em trailers, ficando o trabalho a
cargo de agências de publicidade. A matéria traz o depoimento de Bruno Wainer, da Lumière:
“faltam profissionais no Brasil que sejam realmente especializados. Para ser bom, o trailer
precisa desenvolver linguagem própria, de acordo com o filme que representa” (WAINER,
1998)
9
. Essa colocação também vem dar maior ênfase à questão da não industrialização do
setor no mercado brasileiro.
Hoje existe uma empresa chamada V Filmes, especialista no ramo. Fundada em 1996,
a V Filmes & Comunicação é atualmente considerada a maior realizadora de trailers para o
cinema brasileiro. Desde 1998, ela vem criando trailers para mais de oitenta filmes
10
. Dentre
8
Ver ANEXO E, na página 145.
9
Ver ANEXO F, na página 146.
10
Trailers da V Filmes: A partilha, Abril despedaçado, Avassaladoras, Sexo amor e traição, Diários de
motocicleta, A dona da história, Benjamim, Os dois filhos de Francisco, Casa de areia, Extremosul, entre outros.
os anúncios da empresa, destacam-se as peças promocionais de cinco das seis maiores
bilheterias do país: Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002), Carandiru (Hector Babenco,
2003), Os Normais (José Alvarenga Jr., 2003), Cazuza e Olga. Percebe-se, pois, que os dois
materiais analisados nesta pesquisa foram feitos pela mesma empresa.
Com base nessa realidade, nota-se que está começando a se desenvolver um processo
mais organizado de produção de trailers no Brasil. Porém, nem todos os filmes recebem um
tratamento apropriado, ficando muitos anúncios, ainda, a cargo do montador do longa-
metragem.
2.1.2 Peculiaridades dos trailers
Todo grande estúdio lança, no mínimo, dois tipos diferentes de trailers: o teaser e o
trailer tradicional. Algumas campanhas de marketing chegam a lançar quatro ou mais
versões, visando atingir diferentes tipos de público. Em certos casos, os estúdios costumam
produzir, também, comerciais para a televisão, com duração média de 15 a 30 segundos.
O teaser é uma pequena peça publicitária que possui a função de excitar, provocar. É
possível definir esse formato como pequenas e freqüentes mensagens, que buscam captar a
atenção da platéia para um lançamento. É uma forma de despertar a curiosidade do público
para um determinado assunto. O teaser é o primeiro trailer lançado, sendo exibido meses, ou
até mesmo um ano antes do longa-metragem. Nem todos os filmes recebem essa divulgação,
geralmente só aqueles considerados grandes apostas é que abusam dessa estratégia. A maioria
desses pequenos lembretes, com duração média de um minuto, é bastante imprecisa sobre a
data de lançamento da obra, visto que são exibidos muito cedo, enquanto os estúdios ainda
não têm a melhor data definida.
O trailer tradicional é o que serve de objeto de estudo desta pesquisa e sobre o qual se
vem falando até então. É o mais freqüente nas salas de cinema e costuma veicular de dois
meses a uma semana antes de o filme estrear. Apesar de muitos profissionais almejarem a
criação de diversos trailers, um para cada tipo de público, ainda é mais comum, no universo
brasileiro, o mesmo trailer tradicional circular na internet, fazer parte do CD de divulgação e
ser veiculado nas salas. Em Hollywood, o trailer tem a duração média de dois minutos e 30
segundos, e o Brasil segue essa tendência, não havendo, aqui, nenhuma regulamentação para
isso, tampouco um limite pré-determinado.
Como relata Steve Latham
11
, associações ligadas a segmentos do cinema norte-
americano impuseram padrões para o trailer, tanto na questão do tempo de duração quanto no
volume do som. De acordo com a Motion Picture American Association (MPAA), um trailer
não pode ultrapassar o tempo de dois minutos e meio. Apenas uma vez ao ano é concedido ao
estúdio lançar um anúncio de maior duração. Além disso, como o volume do som dos trailers
estava chegando a níveis ensurdecedores, em 1999, a Trailer Audio Standards Association
estabeleceu um nível máximo de decibéis, forçando os estúdios a reduzirem em três vezes o
volume de seus materiais.
Além dos padrões técnicos, percebe-se que os trailers contemporâneos estão inseridos
também em um padrão estético. Os materiais seguem uma tendência, um modelo, sendo a
maioria deles dinâmico e composto de muitas informações, com o intuito de atingir um
grande número de pessoas.
Talvez a fórmula-padrão seja ainda tão presente porque os estúdios ficam receosos de
arriscar e acabar criando um formato ineficaz. Apesar de presos a esse modelo, os anúncios
continuam agradando aos espectadores. Um fato que comprova a idéia de que eles são um
entretenimento em si é a existência de um programa destinado apenas à exibição de trailers,
11
Ver: http://www.fanmadetrailers.com/latham2.htm. Acesso em: 10 jun. 2005.
chamado Comming Attraction, na televisão por assinatura, no canal E! (Entertainment
Television).
também um festival norte-americano como o Oscar, que no lugar de filmes, os
trailers é que são premiados. É o Annual Golden Trailer Awards
12
. Desde o ano 2000, o
festival vem premiando os destaques do gênero em cerca de dezessete categorias, do melhor
trailer de comédia ao melhor estrangeiro. Em nenhuma das seis edições ocorridas, um
anúncio de filme nacional foi indicado ao prêmio.
Anualmente, o evento reconhece o trabalho de dezenas de profissionais envolvidos
nesse setor da indústria cinematográfica. Os mais variados aspectos são contemplados: melhor
música, melhor locução, anúncio mais original, incluindo, também, o prêmio de pior material.
O júri é composto por importantes pessoas da indústria cinematográfica, entre diretores,
atores e produtores.
Percebe-se, assim, que a existência social dos trailers ultrapassa as janelas tradicionais
e atinge, também, outros setores. Um dos motivos para essa aceitação do formato se deve ao
fato de que ele explora algumas sedutoras estratégias publicitárias, como se verá a seguir.
2.2 Para mover é preciso comover
O sujeito contemporâneo está imerso em um caldeirão de informações, que fervilha
constantemente com novas imagens e conteúdos. A capacidade da mídia de produzir
mensagens não pára de crescer, assim como sua capacidade de distribuí-las. Porém, embora a
quantidade de informação possa continuar aumentando, a capacidade de atenção humana é
limitada, visto que ninguém pode absorver tudo o que recebe. Diante de tais circunstâncias,
12
Ver http://www.goldentrailer.com. Acesso em: 15 set. 2005.
portanto, conquistar a atenção de um grande número de indivíduos revela-se um trunfo
deveras valioso. É então que a publicidade – fórmula massiva mais eficaz na tentativa
anunciar um produto passa a abusar de estratégias sedutoras para alcançar esse audacioso
objetivo: captar a atenção das pessoas.
Pensando de modo prático, o papel da publicidade é simples e direto: transmitir
mensagens cuja intenção seja informar e convencer alguém. Mas, como a audiência em geral
possui pouco interesse por conteúdos meramente informativos, os publicitários precisam ser
inovadores, para que seus trabalhos sejam notados, pois, conforme revela Neusa Demartini
Gomes, “os valores simbólicos dos produtos motivam mais do que os valores econômicos e
funcionais” (2003, p. 207). Assim, o primeiro desafio de um anúncio é atrair o público, para,
em seguida, procurar manter sua atenção.
Nesse jogo de sedução, o uso da criatividade torna-se imprescindível, como forma de
fazer valer seus argumentos no concorrido mercado das idéias. Retoma-se, assim, o
pensamento de Baudrillard, que diz que a sedução é um artifício: consiste na tarefa de moldar
as aparências de forma interessante
13
.
Acompanhando esse raciocínio, percebe-se ter a publicidade se despido de sua função
prática e funcional, assumindo uma postura mais descontraída. Portanto, ela é hoje um
entretenimento em si. Ao abordar essa problemática, Gilles Lipovetsky destaca:
A publicidade libertou-se da racionalidade argumentativa, pela qual se obrigava a
declinar a composição dos produtos, segundo uma lógica utilitária, e mergulhou num
imaginário puro, livre da verossimilhança, aberto à criatividade sem entraves, longe
do culto da objetividade das coisas. [...] E isso influi sobre o imaginário das pessoas,
aguçando-lhes o apetite pelo lúdico, pelo teatral, pelo espetáculo (LIPOVETSKY,
2004a, p. 35).
Lipovetsky (1983), ao dissertar sobre a sociedade contemporânea, fala de um
humorismo exacerbado, que invade todas as áreas da vida prática. Nessa perspectiva, ele
13
Ver página 28.
destaca a publicidade como a maior reveladora desse fenômeno humorístico. Para o autor, os
anúncios estão renunciando os discursos sentenciosos em proveito de um estilo feito jogo de
palavras, de fórmulas indiscretas (1983, p. 137).
O autor propõe que as mensagens publicitárias controlam suas próprias declarações
pela vontade de pôr em evidência o valor positivo do produto e, para isso, abusam do absurdo
e do jogo do sentido e do não-sentido. Ele acredita que grande parte dos anúncios não diz
nada, pois o discurso demonstrativo cedeu lugar ao código humorístico e à irrealidade
espetacular. A publicidade “diverte-se consigo própria”, diz Lipovetsky (1983, p. 138).
O humor publicitário, para o autor, está além do verdadeiro e do falso, para além dos
grandes significantes, para além da busca de um sentido lógico e racional. À glorificação do
sentido substituiu-se uma depreciação lúdica, uma lógica do inverossímil” (1983, p. 139).
Assim, a publicidade, antes de querer convencer e incitar ao consumo, designa-se
imediatamente como publicidade: a mensagem veiculada no anúncio fala menos do produto
anunciado que da própria linguagem sedutora e enigmática da publicidade. Lipovetsky chama
isso de metapublicidade, ou seja, um comercial apela mais para o humor e para a fantasia, que
para as propriedades funcionais do produto. Para o autor, com o código humorístico a
publicidade recorre à cumplicidade espiritual dos sujeitos e dirige-se a eles utilizando
referências sociais e culturais.
É possível, portanto, dizer que as imagens publicitárias revelam a sociedade em que
estão inseridas. Abusando de várias táticas, a publicidade vai firmando-se como um meio
influente no cotidiano social, contribuindo para a sedimentação de alguns valores que vagam
no imaginário coletivo. Partindo dessa premissa, ressalta-se que, dentre as inúmeras imagens
que são espalhadas pelo mundo, a publicitária se destaca por ter uma força muito importante
na atualidade. Ela trabalha com o humor, diverte e encanta o público e assim consegue fazer
com que a imagem do produto ultrapasse a sua funcionalidade, ganhando contornos mais
descontraídos.
Conforme esclarece Gomes (2003), o sentido que se emprega hoje para a palavra
publicidade só veio à tona após a Revolução Industrial. Antes, não havia consumo de massa e
não era preciso anunciar os produtos. Com a Revolução, a oferta passou a superar a demanda,
e a divulgação tornou-se necessária, como forma de enfrentar a concorrência (2003, p. 49).
A autora define a publicidade de hoje como um processo de comunicação persuasiva,
de caráter impessoal e controlado, que a conhecer um produto ou serviço. Compete, desse
modo, a ela, levar alguma coisa do nível do desconhecimento ao nível do conhecimento. “Se a
distribuição trata de eliminar a barreira física que existe entre a empresa e o consumidor, a
publicidade elimina a barreira psicológica” (2003, p. 42).
E é isso que faz um trailer. Ele apresenta para as pessoas a nova produção que será
lançada. Avisa aos espectadores que em breve aquele filme estará disponível. Faz com que o
público tome conhecimento da história e dos contornos da obra. De modo sucinto, pode-se
definir marketing de cinema como o conjunto de atividades que visa transferir os filmes dos
seus produtores ao espectador final. Assim, o trailer, como anúncio publicitário, possui três
funções principais: criar consciência do filme (fazer saber da sua existência); dar uma
impressão global da obra e, por último, estimular interesse e vontade de assistir a ela.
A intenção sedutora de um anúncio não se dirige somente a um indivíduo, mas a
muitos receptores, a uma audiência em massa. Desse modo, torna-se necessário conhecer o
público-alvo. No caso dos trailers, é fundamental saber que tipo de espectador mais se
identifica com a história, para desenvolver uma publicidade capaz de atingir diretamente essas
pessoas. Para fazer o lançamento do filme no mercado, a primeira tarefa do marketing é
determinar as características essenciais do espectador em potencial, em termos de idade, sexo,
perfil socioeconômico, assiduidade às salas, entre outros.
Para Gomes (2003), a publicidade é um sistema, um organismo estrutural composto
por um conjunto de elementos inter-relacionados, mediante processos mais ou menos
complexos. A autora afirma que, em qualquer sociedade, a relação entre pessoas depende em
grande parte da comunicação e, no marketing, o é diferente. Como parte integrante desse
processo, a publicidade firma parceria com os meios de difusão de massa, que transmitem
mensagens simultâneas a um grande número de pessoas. Utilizando as palavras de Gomes,
ressalta-se que “a publicidade se insere dentro do que denominamos de comunicação de
massa, aquela que é a grande fornecedora ao público dos elementos necessários à estruturação
da vida cotidiana” (2003, p. 41).
Para provocar uma grande quantidade de pessoas, cabe a ela usar a técnica da
argumentação, aliando informação e imaginação. Ao relatar as teorias que envolvem a
publicidade, Gomes indica que um anúncio deve sucessivamente chamar a “atenção”, suscitar
o “interesse”, provocar um “desejo” e desencadear uma “ação” (2003, p. 88).
Com base nas idéias proferidas pela autora sobre o campo da publicidade, esta
dissertação elaborou uma lista de táticas empregadas na maioria dos anúncios. Nove
estratégias serão descritas, a fim de melhor iluminar a situação atual da comunicação
publicitária.
1) Agilidade e condensação. Essa estratégia possibilita passar muita informação em
pequeno espaço. Os comerciais de revista possuem, em sua maioria, apenas uma página
(quando não um pequeno quadro no canto dela). No rádio e na televisão, cada anúncio dura,
em média, 30 segundos. E o trailer, por sua vez, possui uma duração média de dois a três
minutos, o que é bem pouco, comparado com a extensão de um filme (duas horas em média).
É por isso que os anúncios são levados a selecionar o que é mais interessante transmitir e a
reunir várias informações em curto espaço.
2) Idealismo. A publicidade trabalha com figuras-modelo. A maioria dos anúncios
mostra pessoas bonitas, jovens, felizes e realizadas. Como lembra Lipovetsky, “a publicidade
funciona como cosmético da comunicação” (2004a, p. 36). Em suma, os anúncios apresentam
ao público um mundo ideal, um mundo quase perfeito, no qual quem bebe coca-cola faz parte
da turma e quem possui um carro zero é mais feliz. O efeito do produto é geralmente melhor
no comercial do que na realidade.
3) Uso de celebridades. Essa tática age através da admiração do público por
personagens famosos. Em muitos casos, a celebridade expõe, de forma convincente
(testemunhal), as vantagens do produto e assume que o utiliza ou apóia.
4) Repetição. A publicidade precisa lembrar constantemente o receptor. Um anúncio é
repetido inúmeras vezes, com o objetivo de se fazer presente na memória do público.
5) Segredo e curiosidade. Criar um anúncio que se apóia no segredo ajuda a
potencializar as mensagens, criando maior expectativa no público. Trabalhar o mistério faz
com que os indivíduos sintam desejo pelo novo, pelo raro. Essa tendência um tom de
espetáculo ao anúncio, despertando a curiosidade inata ao ser humano.
6) Confusão. Quando apresenta uma mensagem confusa, a publicidade aciona, na
audiência, as leis da percepção e um instinto de construção. O indivíduo tenderá, assim, a
construir a mensagem incompleta e a organizar os elementos textuais e icônicos dos quais ela
se compõe.
7) Música. Os anúncios publicitários de TV ou de rádio, e até alguns da internet,
abusam do uso de uma sica relevante para dar maior sentido ao conteúdo. Essa tática está
ligada a um sensualismo atmosférico, pois contribui para criar o clima do comercial.
8) Apelo emocional. Em ligação com as outras estratégias recém-citadas, apelar para a
emoção significa abandonar a racionalidade, deixando de dar apenas informações funcionais
do produto e assumindo uma postura inteligente e comovente.
9) Criatividade. Nesse contexto recém-estabelecido, é vital o uso da imaginação para
criar uma idéia genial, que seja capaz de fazer o produto ficar marcado na memória do
público. A isso pode estar ligado também o humor. “Até mesmo o humor pode ser um
sofisticado instrumento de sedução. Cada um, num tabuleiro de jogadas complexas, perde e
ganha conforme a sua habilidade para mover as peças. Todos, porém, buscam o mesmo
objetivo: gozar” (LIPOVETSKY, 2004a, p. 38).
Essas seriam as nove principais táticas utilizadas pelo mundo publicitário. Claro que
outras estratégias são diariamente descobertas, sempre na tentativa de cativar o maior número
de pessoas. Assim, pode-se inferir que todas essas táticas também são utilizadas nos trailers,
visto que eles têm a mesma função de seduzir.
A primeira estratégia aqui salientada – a agilidade – é típica do trailer, e, para tanto, os
materiais abusam da montagem, o que será trabalhado mais adiante. Percebe-se também a
segunda tática o idealismo nos anúncios de filmes, visto que o cinema geralmente oferece
um mundo ideal, que se propõe mais perfeito, mais belo e mais fácil que o real. Ávidas por
uma utopia, muitas pessoas precisam imaginar um mundo melhor, mesmo que seja durante as
duas horas de projeção. É assim que um trailer acaba por absorver, em seus dois minutos e
meio de duração, grande parte da fantasia que nos filmes. O anúncio muitas vezes acaba
por fazer o personagem parecer perfeito, um mito, para que se ate a sedução.
Muitos trailers anunciam as celebridades que fazem parte do elenco da obra,
utilizando-as como um diferencial e, portanto, uma tática para atrair os fãs. Além disso, os
anúncios são veiculados várias vezes no cinema, abusando da quarta fórmula levantada a
repetição.
Percebe-se, também, o uso do segredo com o intuito de acionar a curiosidade da
platéia. Muitos trailers mostram apenas uma parte do conflito, convidando o espectador a
assistir ao desenrolar inteiro da trama durante o contato com o longa-metragem. Instigam o
público a querer resolver o enigma vendo o filme todo. Alguns materiais não explicam
praticamente nada sobre a trama de um filme, e isso diz respeito à sexta tática publicitária
citada, que abusa da confusão para estimular o instinto de construção na audiência.
O uso de uma música instigante também é uma das especificidades de um trailer. Em
muitos casos, a música do anúncio não é a mesma do filme. duas razões para isso: uma
prática e uma relacionada ao marketing. A primeira é que, geralmente, os anúncios são
produzidos antes da finalização do longa-metragem, numa fase em que a trilha sonora do
filme ainda não foi concluída. A segunda é que, como a música é um aliado na tarefa de
seduzir, os trailers geralmente são potencializados com canções atraentes.
As duas últimas táticas, o apelo emocional e a criatividade, também estão presentes no
trailer. O profissional que monta o anúncio faz uma suposição sobre as preferências do
público, adivinhando que tipo de história a audiência gostaria de ver e com que tipo de
conflito gostaria de se deparar. Os produtores de trailer constroem um mundo narrativo,
baseados na crença de que os espectadores vão querer entrar nesse lugar oferecido.
Assim como a publicidade, o trailer é um entretenimento em si. Muitas vezes, o
espectador não percebe o formato como uma mensagem persuasiva que quer unicamente
vender um produto, e sim como algo interessante e criativo, uma diversão em si.
De acordo com o relato de James Berardinelli
14
, existem pessoas que vão ao cinema
tanto pelos trailers como pelos filmes. Ele conta que toda vez que o trailer de um evento é
exibido como, por exemplo, o de Guerra nas Estrelas (George Lucas) –, newsgroups na
internet se acendem com a novidade, e aqueles fãs mais dedicados chegam a assistir a um
filme pelo qual têm pouco interesse, apenas para ver o trailer em particular. Ele garante que
há pessoas que ficam vagando de sala em sala, assistindo a vários trailers, antes de finalmente
14
Ver: http://movie-reviews.colossus.net/comment/022198.html. Acesso em 10 jun. 2005.
permanecer em alguma delas. Ainda que esse comportamento seja um caso extremo, para
Berardinelli ele não é tão isolado como se poderia pensar. Para alguns cinéfilos, os trailers se
tornaram mais do que simples adicionais em uma experiência cinematográfica, chegando a
representar objetos colecionáveis.
O grande agente que pode influenciar essa admiração pelo formato é o fato de que o
produto que um trailer anuncia é em si diferenciado. Um filme é entretenimento. Sendo assim,
anunciar uma obra é diferente de anunciar um produto de limpeza, por exemplo. Como o
trailer se apropria da linguagem cinematográfica para seduzir, os indivíduos que já têm
familiaridade com as imagens fílmicas serão facilmente atraídos pelos anúncios.
Então, após refletir sobre algumas táticas empregadas pelo formato, confirma-se a
idéia de que para mover o espectador em direção às imagens é preciso comover seus sentidos.
E acredita-se que para comover o público os dois trailers aqui selecionados trabalharam todas
essas estratégias publicitárias e exploraram, principalmente, o personagem e a montagem.
2.3 O personagem de ficção
Uma narrativa pode ser definida como um discurso que integra uma sucessão de
acontecimentos na unidade de uma ou mais ações. E, somente pela relação a um estatuto
humano é que os acontecimentos ganham sentido, de modo que não há narrativa se os
acontecimentos não atravessarem algum sujeito. Assim, o personagem ganha contornos de um
ser vivo, e passa a dar ao espectador uma certa visão de mundo. O personagem não é alguém
que vive no mundo, mas uma rede de funções e qualidades que, quando reunidas, adquirem
uma psicologia própria.
A autora Beth Brait (1985), em seu livro A Personagem, disponibiliza um apanhado
histórico da figura do personagem de ficção. Ela começa sua trajetória na Grécia, com
Aristóteles, para quem o personagem consiste em um ente composto pelo seu criador (autor,
poeta), a partir de uma seleção do que a realidade lhe oferece.
Avançando, Brait cita alguns escritores do século XVI, que acreditavam dever ser o
personagem a reprodução do melhor do ser humano. “A personagem como um ente
semelhante, mas ainda melhor que seu modelo humano” (BRAIT, 1985, p. 36).
Depois, a autora salta para o século XX e comenta a visão dos formalistas russos
(1916), que enxergavam o personagem como um ser de linguagem. Para esses, fábula designa
o conjunto de eventos que fazem parte da obra de ficção e trama seria o modo como os
eventos se interligam. Nesse âmbito, o personagem era encarado como um dos componentes
da fábula, o qual só adquire sua especificidade de ser fictício na medida em que está
submetido aos movimentos, às regras da trama (BRAIT, 1985, p. 43).
É com base nesse ponto de vista que se acredita atingir o personagem a plenitude de
sua significação quando se inter-relaciona com os outros elementos da trama. Ele afirma-se e
torna-se verdade desde que esteja em ação. Assim, investigar o modo pelo qual ele funciona
dentro da estrutura apresentada é fundamental para que o próprio personagem ganhe pleno
sentido.
O protagonista geralmente é o condutor da ação. O enredo de um filme não existe
quando não personagens envolvidos. Quando se quer revelar uma história, os
acontecimentos passam por um ou mais seres, pois, na verdade, são eles que mostram ao
público como se desenvolve o enredo exposto na tela.
Todas essas visões destacadas por Brait auxiliam a compreender o personagem atual,
encontrado nas telas do cinema contemporâneo. A própria autora cita o exemplo do famoso
Indiana Jones
15
, recordando a série de perigos enfrentados por ele.
A personagem Indiana Jones, vivida pelo belo ator Harrison Ford, apesar de todo o
aparato modernoso sustentado pelos efeitos especiais, não deixa de ser o mesmo
mocinho dos filmes de cowboy, o mesmo herói das narrativas tradicionais, cheias de
obstáculos a serem transpostos, o mesmo mocinho romântico, cujo destino é vencer
inimigos e conquistar o coração da mocinha. Ou seja, seu comportamento e o
desfecho das ações por ele protagonizadas estão apoiados nas necessidades do
encaminhamento da história, da fábula, que neste caso é suficientemente redundante,
exaustivamente marcada por traços acumulados por uma tradição narrativa despida
de estranhamento (BRAIT, 1985, p. 32).
Com isso, a autora enfatiza que em toda história existe um herói, que deve vencer o
mal. Esse herói é sempre repleto de qualidades, chegando, em determinados casos, a estar
revestido “do mito do super-homem” (1985, p. 32). Ela coloca, ainda, que como os
espectadores já assimilaram esses traços costumeiros da ficção em outras narrativas,
identificam de imediato o herói e esperam que a narrativa cumpra, assim como o personagem,
o seu conhecido destino. Uma vez que na maioria dos casos a narrativa transcorre dentro da
fórmula tradicional, os espectadores passam a esperar, dos personagens, certas atitudes
instituídas. Por isso a importância dos seres envolvidos na história para criar o interesse do
público pela obra.
Contribuindo para clarear esse ponto de vista, Jacques Aumont (1993a) alega que todo
campo fílmico instaura um campo ausente, que seria preenchido pelo imaginário do público.
O autor fala em identificação secundária, para designar a relação entre imagem e espectador,
que seria estimulada, principalmente, pelos personagens da obra. Ele garante que o filme
através dos personagens – suscita, no público, afetos, simpatias, antipatias (1993a, p. 241).
Portanto, nota-se que o ritual cinematográfico requer elementos de identificação com o
espectador, e, desses elementos, o mais utilizado é o personagem. Na história do cinema
15
Brait refere-se ao filme Indiana Jones and the Temple of Doon (Steven Spielberg, 1984).
percebe-se uma eterna busca: o vínculo permanente com o espectador. E é o personagem o
elemento que vem recebendo maior atenção e elaboração para isso. O vínculo da platéia com
o filme se não apenas pela narrativa, pela música ou pela história, mas principalmente
pelos protagonistas.
Por ser o personagem um elemento tão importante na criação do vínculo com a platéia,
o trailer acaba abusando dessa instância em sua narrativa sedutora. Alguns trailers fazem
questão de apresentar de forma clara e explícita o personagem central da trama. Há outros que
preferem fazer um suspense, deixando pistas no ar, sem entregar de vez o perfil do
protagonista. Lançam o desafio, para que o público só desvende o tipo de personagem
assistindo ao filme por inteiro. Mas a maioria dos trailers procura esclarecer bem qual é a
trama do filme. E a trama do filme é a trama do protagonista.
Conforme foi dito anteriormente
16
, a imagem do personagem no trailer nem sempre é a
mesma do filme. No longa-metragem há um tempo maior para denotar particularidades
próprias para cada integrante da trama. Um trailer reúne apenas alguns momentos do
personagem e assim constrói um novo significado para suas ações. E tudo isso é possibilitado
pela arte de montar as cenas. A montagem liga o personagem e seu olhar aos eventos que o
circundam.
2.4 A montagem cinematográfica
O cinema, para Jacques Aumont (1995), é a arte da combinação e da organização. E o
que possibilita essa mobilidade é a técnica da montagem. A montagem faz dialogar as
imagens, os sons e as inscrições gráficas de um filme, de forma mais amena ou mais
16
Ver página 26.
conflitual, sempre com o intuito de causar algum efeito. Para o autor, a montagem cumpre
duas ações numa obra: organizar a sucessão dos planos e estabelecer sua duração.
Aumont esclarece que a missão principal da montagem é seu papel narrativo. A
montagem seria, então, aquilo que garante o encadeamento dos elementos da ação, sempre
com o propósito de fazer com que a trama seja mais bem percebida pelos espectadores (1995,
p. 64). Esse seria o objetivo primeiro da montagem, mas, às vezes, ela recebe um outro papel.
Essa função “fundamental” e até “fundadora” da montagem é, na maioria das vezes,
oposta a uma outra grande função [...] que seria uma montagem expressiva isto é,
uma montagem que “não é um meio, mas um fim” e que visa a exprimir por si
mesma, pelo choque de duas imagens, um sentimento ou uma idéia (AUMONT,
1995, pp. 64-65).
Existe, portanto, essa distinção entre uma montagem que visa essencialmente ser o
instrumento de uma narração clara e uma que pretende produzir, eventualmente, choques
estéticos, independente de qualquer ficção. Destaca-se que a maioria dos trailers atuais faz uso
desse segundo tipo de montagem, a expressiva.
Para bem entender a importância da montagem, trabalha-se também com as idéias de
Gilles Deleuze (1985). Ao abordar a questão do movimento no cinema, esse autor remete aos
estudos de Bergson, de 1869, sobre a matéria e a memória.
De acordo com Deleuze, para Bergson era impossível opor o movimento, como
realidade física do mundo exterior, à imagem, como realidade psíquica da consciência.
Querendo mostrar que qualquer movimento pressupõe mudança no todo, Bergson cunhou o
termo imagem-movimento. Deleuze apropriou-se das idéias do autor, a fim de transpor essa
realidade para o cinema.
Assim, a tese de Deleuze é a de que o cinema opera com dois dados complementares:
cortes instantâneos, que são chamados de imagens, e um movimento, ou um tempo impessoal,
uniforme, abstrato, invisível ou imperceptível, que existe no aparelho e com o qual se faz
desfilar as imagens. O cinema oferece imediatamente, desse modo, uma imagem-movimento.
Então, imagem-movimento pode ser definida como um conjunto de elementos variáveis que
agem e reagem uns sobre os outros.
O autor ressalta que não existem apenas imagens instantâneas, isto é, cortes imóveis
do movimento.imagens-movimento, que são cortes móveis da duração, imagens-mudança,
imagens-relação, para além do próprio movimento (1985, p. 21).
A imagem-movimento se constitui sob duas formas diferentes: através da mobilidade
da câmera e também através da montagem, isto é, do raccord
17
de planos. Isso acontece nos
dias atuais, pois, antes, com a câmera fixa, o movimento era apenas das pessoas e coisas em
quadro. A liberdade de movimento ocorreu, então, com a possibilidade de mexer a câmera e
com o advento da montagem.
Do começo ao fim de um filme, algo muda. Esse todo que muda é um tempo, uma
duração. O todo é independente de cada imagem-movimento. A montagem é inferida das
imagens e de suas relações. O tempo do todo do filme decorre da articulação das imagens-
movimento. E isso é a montagem.
O movimento exprime uma mudança na duração ou no todo, porque, de acordo com
Deleuze, o movimento é uma translação no espaço. Cada vez que translação de partes no
espaço, também mudança qualitativa no todo. O movimento remete sempre a uma
mudança e a uma migração. “Nosso erro está em acreditar que o que se move são elementos
quaisquer exteriores às qualidades. Mas as próprias qualidades são puras vibrações que
mudam ao mesmo tempo em que os pretensos elementos se movem” (DELEUZE, 1985, p.
18).
Se fosse preciso definir esse todo, ele seria caracterizado pela relação. Deleuze expõe
que a relação não é propriedade dos objetos, ela é sempre exterior: não pertence aos objetos,
17
Qualquer figura de mudança de plano em que há esforço de preservar, de ambos os lados da colagem,
elementos de continuidade (AUMONT, 1995, p. 77).
mas ao todo. Através do movimento no espaço, os objetos mudam sua posição. Mas, através
das relações, o todo se transforma ou muda de qualidade. De acordo com a relação entre uma
imagem e a outra que lhe segue, o conteúdo é modificado, isto é, o sentido se transforma e o
conjunto ganha outras interpretações.
Deleuze explica, ainda, que o cinema é um sistema que reproduz o movimento em
função do instante qualquer, isto é, em função de momentos eqüidistantes, escolhidos de
modo a dar a impressão de continuidade. O instante qualquer é o instante eqüidistante de um
outro. Portanto, define-se o cinema como o sistema que reproduz o movimento reportando-o
ao instante qualquer.
Então, transpondo as idéias de Bergson para a realidade cinematográfica, Deleuze diz
que a montagem é uma operação que recai sobre as imagens-movimento para desprender delas
o todo, a idéia. E é assim também nos trailers, que apresentam um todo diferenciado, de
acordo com a forma pela qual se faz a interação entre as imagens-movimento selecionadas.
Para melhor ilustrar o processo atual da montagem, o autor comenta as quatro
correntes que marcaram os primórdios do cinema: a tendência orgânica da escola americana, a
dialética da escola soviética, a qualitativa da escola francesa e a intensiva da escola
expressionista alemã. A pesquisa se concentrará nas duas primeiras, devido à relevância delas
para a compreensão de uma montagem mais expressiva, como ocorre nos trailers.
A escola americana, mais caracterizada pelos filmes do cineasta D. W. Griffith (1875-
1948), concebia a composição das imagens-movimento como uma grande unidade orgânica,
um organismo, um conjunto de partes diferenciadas. Essas partes eram tomadas em relações
binárias, que constituíam uma montagem alternada paralela, de onde a imagem de uma parte
sucedia à de outra, de acordo com um ritmo (DELEUZE, 1985, p. 53). Essa escola foi a
primeira a utilizar a montagem com o intuito de criar uma unidade orgânica formada por
partes diferentes, advindas de ações distantes. Griffith foi o primeiro cineasta a entender a
importância psicológica da edição, com o filme O nascimento de uma nação (1915). Foi ele
também o precursor do close-up. O cineasta estabeleceu as bases da edição clássica de filmes,
que se apóia no uso de cortes invisíveis, utilizados para que a ação se mantenha contínua. O
objetivo dessa estratégia era ocultar o corte, para que o público nada percebesse.
a escola soviética, marcada principalmente pelas arrojadas inovações de Sergei
Eisenstein (1898-1948), trabalhava em cima de choques perceptivos. A montagem devia criar
oposição entre as cenas, entre duas imagens dialéticas. Eisenstein cunhou o termo montagem
de atração, que não se reduzia a pôr em jogo duas cenas, fazendo comparações entre elas. O
objetivo do cineasta era fazer uma imagem saltar de uma potência a outra, a fim de produzir
choques emocionais no espectador. Em resumo, a montagem de oposição dos russos passou a
substituir a montagem paralela dos americanos. Eles rejeitavam a edição dos cortes invisíveis
de Griffith, acreditando que o significado de um filme não estava em suas partes, mas na
colisão delas.
Optou-se por aprofundar o estudo na montagem de Eisenstein, visto que esse foi um
dos primeiros cineastas a utilizar cortes secos, com a finalidade de causar choques perceptivos
no espectador tendência típica dos trailers atuais. Dessa forma, parte-se para apresentar as
cinco categorias formais de montagem, delimitadas pelo cineasta russo e divulgadas em seu
livro A forma do filme
18
.
A categorização traçada por Eisenstein é um tanto quanto complexa. Os cinco
diferentes tipos de montagem andam juntos, pois um sucede ao outro. Mesmo ciente da
dificuldade de definição (o que implica separá-los), é interessante fazê-lo, para que se torne
possível, posteriormente, analisar o caráter que a montagem assumiu em cada trailer.
A primeira categoria destacada pelo cineasta é a montagem métrica. Nessa
perspectiva, os fragmentos do filme são separados de acordo com uma fórmula esquemática
18
A forma do filme (2002) traz idéias proferidas por Eisenstein por volta de 1946-47.
precisa, correspondente à do compasso musical, ou seja, cada fragmento possui exatamente o
mesmo comprimento (duração) que os demais. Apelando para as idéias do próprio autor,
“neste tipo de montagem métrica o conteúdo dentro do quadro do fragmento está subordinado
ao comprimento absoluto do fragmento” (2002, p. 80).
Quando se quer causar tensão, utilizando esse tipo montagem, basta acelerar
mecanicamente a cena, encurtando os fragmentos. Assim, o ritmo torna-se irreconhecível,
mas indispensável para a “organização” da impressão sensual. Encurtar a duração do quadro
acaba por encurtar também o tempo de que o espectador dispõe para perceber as imagens. E a
diminuição gradativa das durações dos planos vai tornando a seqüência cada vez mais tensa.
A segunda categoria levantada por Eisenstein é a montagem rítmica. Nessa, não a
duração importa, como também o conteúdo dos planos. Os fragmentos devem ser combinados
de acordo com seu conteúdo, e não através da fórmula métrica. Nesse caso, a tensão é obtida
pela transferência do ritmo de uma ação à outra. O conteúdo não precisa estar sincronizado
com o ritmo dos cortes. Tudo é planejado de acordo com a estrutura da seqüência.
A montagem rítmica é usada quando se quer mostrar algum conflito na história, como,
por exemplo, opor planos de um olhar e do que se está olhando, alcançando um ritmo às vezes
tenso. “Na montagem rítmica é o movimento dentro do quadro que impulsiona o movimento
de um quadro a outro. Tais movimentos [...] podem ser dos objetos em movimento, ou do
olho do espectador percorrendo as linhas de algum objeto imóvel” (2002, p. 81). Essa
montagem pode colocar duas forças de ação opostas em diferentes direções no quadro, como
o cineasta relata:
A seqüência da escadaria de Odessa”, em Potemkin, é um exemplo claro disto.
Nela, a marcha rítmica dos pés dos soldados descendo as escadas viola todas as
exigências tricas. Esta marcha, que não está sincronizada com o ritmo dos cortes,
chega sempre fora de tempo, e esse mesmo plano se apresenta como uma solução
completamente diferente em cada uma de suas novas aparições. O impulso final da
tensão é proporcionado pela transferência do ritmo dos pés descendo para outro
ritmo o próximo nível de intensidade da mesma atividade o carrinho de bebê
rolando escada abaixo. O carrinho funciona como um acelerador, diretamente
progressivo, dos pés que avançam. A descida degrau a degrau passa a descida de
roldão (EISENSTEIN, 2002, p. 81).
A terceira categoria de Eisenstein é a montagem tonal, que diz respeito a uma
mudança no tom da cena. Ela pode ser percebida quando alternância nas vibrações ópticas
de luz (graus variados de “sombra” e “luminosidade”). O movimento, assim, trava-se através
das vibrações luminosas. O importante nesse tipo de construção é o que Eisenstein chama de
som emocional do fragmento. São movimentos que progridem de acordo com características
tonais, em vez de espaciais-rítmicas. O conflito pode ser marcado, também, pela mudança de
clima. Quando se corta de uma cena na chuva, para uma outra com ventos fortes, está
fazendo-se uma mudança na tonalidade do quadro. A colisão de tendências age produzindo
dissonância na construção da seqüência.
O desenvolvimento dessa categoria resultaria na montagem atonal. Para explicá-la, o
autor faz novamente uma comparação com a música. Ele diz que a percepção da montagem
atonal se dá da mesma forma que se percebe a entrada de um instrumento de timbre mais forte
em uma melodia. Diz respeito, então, à entrada, em cena, de algum elemento que não era
esperado e que acaba por surpreender o espectador.
A última categoria citada é a montagem intelectual, descrita por Eisenstein como um
conflito advindo da justaposição de sensações intelectuais associativas. A utilização desse tipo
de montagem força o espectador a perceber intelectualmente o progresso apresentado pela
mudança de planos. Porém, isso é praticamente impossível nos trailers, visto que o breve
tempo de duração desse formato não permite uma apropriação de motivos mais aprofundados.
Essas são as cinco diferentes categorias de Eisenstein. Mesmo que cada uma mantenha
suas características próprias, elas agem muitas vezes de forma complementar. O cineasta
esclarece que elas se tornam construções de montagem propriamente ditas quando entram em
relações de conflito umas com as outras (2002, p. 84).
Utilizando como base as idéias de Eisenstein, é possível sugerir que a montagem
representa o elo relacional de um filme, fazendo com que as partes entrem em contato. É
através da montagem que se pode colocar, lado a lado, elementos fílmicos, que, interligados
passarão a oferecer um sentido, diferente daquele que produzem quando estão isolados. A
montagem visa produzir um efeito determinado, e, para tanto, trabalha com o uso de choques
entre elementos diferentes.
Sintetizando todas essas colocações, infere-se que a montagem é a grande aliada de
um anúncio, na arte de seduzir. Um trailer consiste em uma forma altamente complexa, em
cujo interior ações e reações atuam a cada momento. Sua elaboração pressupõe a seleção de
tomadas e a decisão sobre a ordenação e a duração de cada uma delas. A escolha e o
agrupamento das imagens constituem um meio de expressão original. A idéia vem à tona a
partir da estrutura temporal dos acontecimentos.
O anúncio adultera a ordem das cenas para não entregar o segredo completo do filme.
Geralmente, conta uma outra história, uma fábula diferente, autônoma e independente, que
tem por objetivo criar expectativa no público, função essa que o filme em si não tem. Pela
divergência de objetivos, a montagem da película e a de seu trailer são distintas. Muitas vezes,
o trailer mostra uma cena do fim e em seguida uma do início, ignorando a seqüência do filme
e criando uma nova ordem cronológica para a história. O trailer trabalha com uma
justaposição de planos, geralmente muito curtos, que visam formar um sentido sedutor.
Além de mudar muitas vezes a ordem cronológica do filme, um trailer pode
disponibilizar cenas que não aparecem na edição final do longa-metragem. Isso pode ser
resultado de uma questão estrutural, pois o formato deve ser exibido muito antes; então, pela
pressa, às vezes começa-se a pensar no trailer antes de o filme ser concluído. casos,
entretanto, onde cenas são filmadas especificamente para o anúncio.
No trailer, tanto as imagens quanto o som exercem um papel fundamental na
ambientação e construção de sentido. Os diálogos selecionados também são importantes, uma
vez que, em alguns casos, não há narração para explicar a história.
Uma técnica utilizada em muitas prévias, e que possui a função de marcar um certo
grau de continuidade, é o uso de uma mesma música de fundo, enquanto as diversas imagens
são expostas na tela. O acompanhamento musical faz com que o público receba o anúncio
como um produto inteiro, fechado, uma unidade.
Por ser publicidade, o trailer se estrutura de uma forma particular. E é exatamente a
partir da montagem que ele consegue articular várias cenas, criando uma nova mensagem. É
através do domínio sobre a técnica de montar as imagens que um trailer atinge sua grandeza
sedutora. É pela edição que um anúncio consegue camuflar partes do todo, articulando-se em
cima do segredo.
3 ASSISTINDO AOS TRAILERS
Depois de apresentar a sustentação teórica do trabalho (capítulo um) e as propriedades
do trailer (capítulo dois), é hora de analisar os dois objetos selecionados. A análise que aqui
será feita exige um método particular
1
, visto que se trata de um formato que mantém
peculiaridades próprias. Duas questões serão priorizadas em cada um dos materiais: a
trajetória do personagem central e a montagem. Concluída essa tarefa, os dois anúncios serão
comparados, ressaltando os pontos que favorecem a sedução.
Lembra-se que os dois trailers encontram-se anexados em CD e a descrição completa
dos anúncios está anexada no final do trabalho
2
.
3.1 Cazuza
O trailer do filme Cazuza lembra um videoclipe musical, pois consiste em uma
sucessão de imagens embaladas por uma mesma música. Trata-se da canção que deu origem
ao nome do filme O tempo não pára
3
. O anúncio tem duração de um minuto e 25 segundos
1
A tarefa de análise seguirá os passos já traçados no capítulo um, nas páginas 21-25.
2
Ver anexos A e B, nas páginas 133-140.
3
A letra da música está disponível em anexo, juntamente com a descrição detalhada do anúncio.
80
e possui 43 planos, um logotipo e quatro títulos gráficos (todos com fundo preto e letra
vermelha, e todos trazendo dados de produção).
O trailer é um conjunto de imagens desordenadas de diversas fases e momentos do
personagem. Não segue uma ordem lógica de fatos e não conta nenhum conflito do músico,
de forma assimilável. Mas deixa alguns indícios que podem suscitar criativas interpretações,
como se verá a seguir.
3.1.1 Análise do personagem no trailer Cazuza
O trailer inicia quando começa a tocar a música. O anúncio quase não traz informações
verbais, pois utiliza poucos diálogos. A informação verbal que o público recebe advém,
principalmente, da canção que acompanha as imagens.
Na primeira cena, aparece um carro se movimentando dentro de um túnel. Um jogo é
feito com as luzes do teto do túnel e isso ajuda a dar uma idéia de mobilidade. O anúncio
começa salientando o tom movimentado do filme e do personagem. É interessante notar que
essa cena de Cazuza dentro de um carro, junto com os amigos, abre o trailer e também o
fecha. Essa escolha, juntamente com a sica O tempo não ra, indica que a vida do
personagem é agitada e que, para Cazuza, o tempo não pára nunca.
Depois da cena do carro, vem a primeira imagem de show. O trailer é composto por
várias delas: são dez no total. Essa primeira aparição de Cazuza como músico mostra-o
dominando o palco. É uma seqüência constituída de dois planos: um o enquadra de costas e
outro de frente. O cantor está feliz e anima a platéia. Isso se de forma muito rápida e, logo
em seguida, ele surge em outro lugar, entre amigos. Num rápido flash, vê-se Cazuza
pendurado em um trapézio de circo.
81
A idéia que pode ser percebida até esse momento é a seguinte: Cazuza leva uma vida
louca (como ele mesmo descreve, em uma de suas músicas: vida louca, vida, vida breve,
que eu não posso te levar, quero que você me leve), vive cercado de amigos e, assim como
ultrapassa o limite de velocidade (o carro anda rápido), deve ultrapassar outras imposições
sociais. Ele é um astro, um cantor famoso e é aventureiro, pois além das peripécias no palco,
ele as pratica no circo e na rua.
Mas a música que embala o trailer não é vida louca, e sim O tempo não pára. Essas
imagens piscam na tela, acompanhadas por este trecho: Disparo contra o sol, sou forte, sou
por acaso, minha metralhadora cheia de mágoas, eu sou um cara. Até esse momento, o
trailer não apresenta nenhuma fala, somente a letra da música e os ruídos dos personagens. A
música vem fazer o papel de diálogo e embala as imagens: “sou forte, sou por acaso”. Já se
começa a perceber que o cantor tem personalidade forte, é um rebelde.
Eis que surge, então, a primeira fala do anúncio: Eu to cansada de ficar regulando o
Cazuza sozinha”. É a mãe do cantor, Lucinha, quem se manifesta. Essa frase vem comprovar
o rótulo de garoto transgressor, instituído nas imagens anteriores. A mãe, em conversa com
o pai, aparece pela primeira vez no anúncio, e sua fala demonstra que Cazuza se trata
realmente de um sujeito difícil de controlar. Como uma forma de dar uma resposta para essa
colocação de Lucinha, o cantor sobe na mesa e pergunta: “Alguém aqui tem vergonha?”.
A atitude de subir na mesa é em si fora do comum, demonstra a transgressão do
personagem. E a sua fala enfatiza ainda mais essa percepção. Ao perguntar se alguém tem
vergonha, Cazuza parece querer dizer que ele não tem. E que ninguém deveria ter. Soa como
uma resposta atrevida para sua e, que quer controlá-lo. Mas esse jogo não acaba aí. Logo
depois de Cazuza perguntar se alguém tem vergonha, a imagem que surge na tela deixa
explícito que ele é realmente sem vergonha. Uma cena de Cazuza beijando uma menina e
sendo beijado por um menino mostra o lado bissexual do cantor.
82
Uma nova cena de show invade a tela e o sico parece estar à vontade na situação.
Em seguida, ele aparece caminhando na rua e chega ao ensaio do Barão Vermelho. Depois, o
anúncio mostra a fachada do Circo Voador, mas não explica a importância, tampouco a fase
em que Cazuza participou dele.
Mais uma vez a mãe de Cazuza aparece em cena. Agora ela não mais recrimina o
filho, nem lamenta ter que regulá-lo. Ela bate palmas, com semblante orgulhoso. Cazuza, a
seguir, desafia a morte, brincando no beiral de uma ponte. A justaposição dessas duas
imagens mostra Lucinha batendo palmas para as maluquices de seu filho.
Mais uma cena de show. Dessa vez, somente a platéia é enquadrada. Como se o trailer
quisesse mostrar os atores que compõem o elenco, ele apresenta a imagem de Leandra Leal e
de André Gonçalves. Após, Cazuza aparece na praia, beijando uma mulher. É a atriz Andréia
Beltrão. Não resta dúvidas de que essa seleção de imagens responde a estratégias
publicitárias. Não tulos gráficos contendo nome de atores, mas o anúncio faz questão de
exibir imagens dos mais conhecidos.
Uma seqüência de Cazuza com a sua turma vem então tomar conta do espaço.
Novamente, o intuito parece ser o de mostrar a diversão que era a vida do músico e o sucesso
do Barão Vermelho.
É então que o trailer oferece uma cena de show, na qual o cantor apresenta outro
aspecto. O anúncio nem precisa contar que Cazuza adquiriu o vírus da AIDS, porque a grande
maioria da população brasileira sabe disso. Mas a entrada de uma imagem do cantor mais
magro, com os cabelos lisos e com o tom de pele mais bronzeado (efeitos do remédio que ele
estava tomando), provoca um choque perceptivo, visto que, até então, ele vinha sendo
mostrado com outra aparência.
Depois dessa aparição de Cazuza, abalado pelos sintomas da doença, o trailer exibe
uma cena que contradiz tudo o que vinha sendo apresentado, no que se refere à personalidade
83
do cantor. Surge um plano dele mais sereno, digitando na máquina de escrever. Essa inserção
parece indicar que aquele garoto que ia mudar o mundo, agora assiste a tudo em cima do
muro
4
. Ao perceber essa atitude estranha, vinda do músico, instaura-se o segredo e entra em
jogo a curiosidade. Cazuza, que flertava com a ousadia e com a diversão, agora aparece
sentado, escrevendo, totalmente tranqüilo.
A tranqüilidade na vida do astro do rock parece não durar muito tempo, porque logo
depois dessa cena, emerge uma imagem dele bebendo whisky, no gargalo da garrafa. De volta
à sua aparência inicial, ele cospe a bebida, como quem renega qualquer tentativa de levar uma
vida regrada. Com isso, nota-se a grande displicência do trailer com uma ordenação lógica
dos fatos.
A seguir, uma série de imagens dispersas se alternam no trailer: Cazuza gravando em
estúdio, Cazuza brincando com uma vaca no campo, Cazuza correndo entre os carros. Nesse
momento, percebe-se que o personagem está transtornado, chorando e fora de si. Entretanto,
nada indica o que se passa com ele. Depois, entra uma imagem dos pais de Cazuza, que estão
felizes na platéia do show.
Após disponibilizar essa junção de imagens, o trailer parece querer passar uma idéia
de continuidade (o que até agora não estava sendo feito). Uma cena de Cazuza entrando no
palco e pulando no colo de um amigo é seguida por uma dele abraçando seu pai. Na primeira
imagem ele está com a aparência saudável e o espírito transgressor ecoa em seus olhos. na
segunda, ele está com a aparência de doente, usa óculos, e não transparece a mesma força.
São duas imagens de abraço, justapostas uma após a outra: primeiro ele abraça um amigo, no
palco, depois abraça seu pai, em casa. A letra da música, nesse momento, vem reforçar o
sentido que o anúncio quer passar com esse par de abraços: Eu vejo o futuro repetir o
passado. A idéia criada é a de uma fusão no tempo, uma evolução na vida do personagem. A
4
Música de Cazuza chamada Ideologia.
84
primeira imagem, do abraço do cantor no amigo, é o retrato emblemático da figura rebelde e
feliz de Cazuza, o Cazuza da turma, da liberdade. o abraço com o pai representa sua
fraqueza, sua luta contra a AIDS, o Cazuza da família, mais calmo. Assistindo ao trailer, não
se sabe qual é o presente do músico, mas sabe-se que seu passado é marcado pela vida louca
e o futuro, pela indefinição. Mas o futuro repete o passado, e isso fica explícito pela repetição
do mesmo ato: o abraço. Nas duas situações, Cazuza é mostrado como um sujeito amável,
pois sua atitude é instintiva, emocional.
Feito esse jogo de abraços, uma nova pequena construção é criada, para enfatizar ainda
mais essa imagem de garoto amável. Cazuza está numa sala, Frejat (músico do Barão
Vermelho) abre a porta e machuca o amigo. Cazuza fala: “Porra, Frejat”. Em seguida aparece
uma cena dos dois no palco e Cazuza, com o curativo na testa, dá um beijo no amigo. Ele, que
estava zangado, agora perdoa tudo, e o beijo demonstra a personalidade carinhosa do músico.
Mais algumas cenas são exibidas em meio a esse turbilhão de facetas, até chegar
novamente à imagem dos garotos correndo de carro. O trailer praticamente abre e fecha com
essa mesma imagem, passando a noção de ciclo. Depois, uma imagem dele cantando (já
totalmente afetado pela doença e com atitudes de palco bem mais moderadas) pisca na tela.
Imediatamente, ele aparece abraçando Lucinha dentro de um túnel (ainda com a aparência
saudável e confirmando sua personalidade emotiva). É interessante ressaltar que, no começo e
no final do anúncio, uma cena que se passa dentro de um túnel. Essa inserção de duas
cenas no mesmo local pode dar uma noção de que a vida, para o cantor, é tão intensa e rápida
como uma passagem por um túnel.
Um túnel abre e fecha o anúncio. Um túnel pode levantar vários significados. O túnel
pode representar o canal vaginal da mãe, que traz o feto à vida. E um túnel é a imagem mais
comumente associada à morte, para aqueles que acreditam em vida após a morte. Torna-se o
túnel, assim, um elemento muito simbólico, porque se encontra nele o sentido da vida e da
85
morte. As duas cenas que acontecem nesse local dão ao trailer um significado de começo e
fim da vida.
E o mais interessante é que a última cena do anúncio mostra o cantor enrolando-se na
bandeira do Brasil. Cazuza, na frente do palco, abraçado na bandeira nacional, fala:
Obrigado”. O músico entrou na vida e saiu dela, pelo túnel, mas essa última imagem, com a
bandeira nacional, indica que ao passar pelo túnel (morte), Cazuza virou um mito brasileiro,
um imortal.
3.1.1.1 Aprofundando-se nas máscaras de Cazuza
É interessante refletir, agora, sobre como o cantor foi apresentado durante o anúncio,
para compreender de que maneira as imagens podem ter contribuído para a sedução.
De forma sintetizada, é possível dizer que sua evolução foi esta: primeiro surge o
Cazuza rebelde. Ele está dentro de um carro, que anda em alta velocidade. Ele é um
transgressor. Em seguida emerge o Cazuza cantor, carismático, ícone musical, sucesso,
domínio de palco. Em complemento a esses dois rótulos, surge o Cazuza da turma, amável,
amigo.
também o Cazuza aventureiro, do circo. Cazuza sem vergonha, bissexual,
polêmico. Cazuza como uma pessoa normal, simples, que também teve um começo, também
um dia ensaiou na garagem, antes do sucesso alcançado. Cazuza sem medo da morte, livre.
Cazuza popular entre as mulheres. Cazuza que sabe se divertir com os amigos. Cazuza mais
calmo, debilitado pelo conflito que trava contra a doença. Cazuza alcoólatra, novamente
transgressor. Cazuza profissional, gravando em estúdio. Cazuza infantil, brincando com uma
vaca no campo. Cazuza humano, correndo apavorado, também tem receios, também sofre.
86
Cazuza moleque, abraçando um amigo no palco. Cazuza filho, abraçando seu pai em casa.
Cazuza amável, compreensivo, sem orgulho, que perdoa os amigos. Cazuza dedicado à
profissão, que ensaia em casa com os colegas. Cazuza novamente transgressor, dentro do
carro. Cazuza novamente debilitado, mais sereno, no palco. Cazuza novamente filho,
carinhoso, abraça sua mãe. Para finalizar, Cazuza brasileiro!
Como se vê, uma série de Cazuzas aparece em cena, alternando perfis bem
característicos na tela. Uma infinidade de nuances é apresentada, mas nenhuma é em si
aprofundada. Essa peculiaridade do anúncio es ligada a duas estratégias publicitárias
5
: o
idealismo e a confusão.
Idealismo: Ao explorar todas essas caras do músico, o trailer acabou por construir um
personagem ideal, mítico. Um super Cazuza foi apresentado. O trailer quase não explorou o
sofrimento do cantor e não disponibilizou as cenas mais tristes da história. Resultado: a soma
total de todas essas imagens gera uma figura alegre, amável, livre e realizada. E essa
construção de um personagem forte representa uma estratégia atrativa. Reforçando ainda mais
essa percepção, a imagem final do anúncio, na qual o cantor está abraçado na bandeira
nacional, enfatiza, como foi anteriormente colocado, sua coroação como um mito musical
brasileiro.
Confusão: O trailer disponibiliza todas essas imagens do cantor, mas não uma
ordenação, tampouco uma explicação para cada momento. Apresentar um conteúdo confuso é
muitas vezes uma tática publicitária para prender a atenção. Isso está em sintonia também
com a questão da percepção
6
. Munsterberg (1983) coloca que a imagem não é um objeto
isolado, não acaba em si mesma. Ele expõe que o aspecto mais interessante de uma imagem é
exatamente o que ela provoca no indivíduo. A memória e a imaginação, nesse caso,
desempenham um importante papel. A memória ajuda a reunir tudo o que vai sendo percebido
5
Para retomar as estratégias publicitárias descritas no capítulo dois, ver páginas 63-65.
6
Para relembrar as colocações sobre a percepção aqui trabalhadas, ver páginas 34-39.
87
e a imaginação possibilita criar respostas para as lacunas deixadas. O trailer faz despertar a
curiosidade. Receber uma fatia do bolo e ver apenas imagens desconexas reunidas e
embaladas por uma música do cantor, instiga a vontade de querer ver o filme por completo.
O anúncio trabalha com um vaivém de momentos dispersos do músico. E, de forma
sutil, o trailer insere algumas imagens do cantor debilitado, no meio da dança de fases do
Cazuza. Como destaca Munsterberg, “no cinema é possível transportar o ator de um lugar
para o outro num piscar de olhos” (1983, p. 50). Com isso, todos os recursos da imaginação
podem ser acionados. O trailer de Cazuza faz passagens instantâneas de imagens do cantor
ainda saudável para outras dele já doente. Assim, é preciso sugerir que, nesse meio tempo,
alguns fatos se passaram. É por não possuir todas essas respostas que surge a curiosidade e
motivação por assistir ao filme. Os saltos bruscos na história contribuem para mostrar o
tumulto interior do personagem. O cinema, por não estar preso à sucessão física dos eventos,
abre um campo ilimitado para a manifestação da imaginação. O trailer, por ter a função de
seduzir, acaba abusando dessa estratégia.
Portanto, o trailer de Cazuza não conta uma história coerente, ele simplesmente a
ver imagens da vida de um cantor. Essa instância está relacionada à tese defendida por
Baudrillard sobre a sedução. O autor acredita que a circulação aleatória de signos pode ser
extremamente sedutora. Para ele, não é preciso buscar um sentido para encantar, pois a
sedução nada tem a ver com demonstração total. Assim, sob o olhar de Baudrillard, o trailer
de Cazuza representa um objeto sedutor, pois mistura uma série de planos sem criar um
sentido totalmente lógico.
A prévia de Cazuza viaja no tempo, como a imaginação. A imaginação não tem regra,
não tem presilhas, não segue nenhum fuso horário, não respeita fronteiras. A imaginação
permite ao indivíduo liberdade total. O trailer transgride o tempo, assim como a imaginação.
Ele vai, volta, chega, retorna, choca. Apodera-se da trajetória de Cazuza, criada para o filme,
88
e despedaça tudo, unindo as partes de uma outra forma. Sem necessidade de transmitir um
sentido lógico, o anúncio objetiva despertar a emoção. Não intenção de ordem, mas de
devaneio. O significado vai criando-se através da justaposição. Significado livre e nonsense.
O trailer é imaginação. É displicente em relação a regras. Cazuza também era.
3.1.2 Análise da montagem no trailer Cazuza
O anúncio tem duração de um minuto e 25 segundos (total de 85 segundos) e possui
48 fragmentos, incluindo imagens, logotipos e títulos gráficos. Isso resulta em uma média de
1,7 segundos por plano. Retomando tudo o que foi dito sobre a montagem, percebe-se que,
de fato, esse trailer é extremamente dinâmico. A agilidade foi alcançada através da troca
rápida de imagens. A constante alternância das cenas provocou saltos de um clímax
emocional para outro.
Percebem-se dois tipos diferentes de estratégia de montagem nesse anúncio. Em
alguns trechos, o trailer procura criar um ar de complementaridade. Como exemplo dessa
constatação, cita-se a seqüência de abraços, comentada anteriormente. Ligaram-se duas
imagens desconexas, diferentes, mas que mantêm um elemento comum, o mesmo gesto: o
abraço. O abraço no amigo liga-se ao abraço do pai para dar uma noção de passagem de
tempo na vida do músico.
Outro momento do trailer em que se observa o uso dessa estratégia de ligamento é a
seqüência em que Lucinha reclama dos cuidados para com o filho e em seguida ele aparece
perguntando se alguém tem vergonha. Como uma terceira etapa da seqüência criada, Cazuza
aparece beijando uma garota e sendo beijado por um garoto, ao mesmo tempo. A montagem
criou uma seqüência significativa: Lucinha reclama. Mas do que ela reclama? Do filho
89
rebelde, que não possui vergonha. Mas por que dizer que ele não tem vergonha? Porque
mantém um comportamento desviante, polêmico. É isso que se percebe, através da junção
desses três planos.
Em outros trechos, todavia, o trailer parece desconstruir, provocar contraste de
sensações. Isso se faz perceptível na seqüência que mostra Cazuza cambaleante na ponte,
enfrentando o perigo, logo depois de uma imagem de Lucinha aplaudindo. Essa construção,
que mostra a mãe aplaudindo o filho desafiar a morte, provoca estranheza e tudo isso é
possível através da montagem.
Outro fato relevante é que as poucas imagens de Cazuza transparecendo os sintomas
da AIDS surgem subitamente, como um elemento surpresa. Isso pode ser associado a uma das
categorias do cineasta Sergei Eisenstein: a montagem atonal
7
. Ao explicar essa categoria, o
cineasta faz uma comparação com a música. O efeito causado é o mesmo da entrada de um
instrumento de timbre mais forte. Assim, a entrada repentina de uma imagem do cantor
doente provoca um certo susto.
Um outro indicador dessa tendência é o fato de que a grande maioria dos planos do
trailer é autônoma. São imagens soltas, que não formam, com a imagem que lhe segue, um
sentido de continuação. Trata-se, portanto, de uma montagem expressiva, como Aumont
(1995) fala
8
. Para o autor, existem dois diferentes tipos de montagem: a narrativa e a
expressiva. Nesse segundo tipo, a montagem se exprime por si mesma, é um fim em si,
trabalha com o choque de imagens para provocar alguns sentimentos e gerar idéias. E é
exatamente isso que se percebe no trailer de Cazuza, visto que ele não apresenta uma história
nos moldes tradicionais, não objetiva transmitir uma mensagem explicitamente narrativa, e
sim expressar algumas idéias de forma criativa.
7
As categorias de Eisenstein estão descritas nas páginas 74-76.
8
Ver páginas 70-71.
90
Reportando essa realidade aos ensinamentos de Deleuze
9
, e fazendo uma analogia
desses planos autônomos do trailer de Cazuza com as imagens-movimento por ele descritas,
nota-se que o movimento provocado no anúncio advém justamente da junção desses blocos.
Em outras palavras, Deleuze (1985) acredita que a relação entre alguns momentos
eqüidistantes (escolhidos com alguns objetivos bem definidos) cria o todo da mensagem. Por
querer seduzir, o trailer faz a reunião das imagens-movimento de uma forma atraente. Constrói
um conteúdo, valendo-se de algumas estratégias publicitárias, e assim provoca o desejo,
instigando a platéia a querer saber mais sobre o filme e sobre a história do músico.
Um outro recurso de montagem percebido no trailer de Cazuza foi o uso da mesma
música para unir esses pequenos pedaços. O som representa, assim, elemento de ligação de
cenas justapostas. A sonoridade, em complemento com a imagem, cria uma duração, um
tempo específico, que se apresenta como um sistema fechado. A persistência do som sobre
um corte faz com que a cena final mantenha um status de unidade, com a qual a audiência
está acostumada.
Esse fato remete à história do trailer, que foi traçada no capítulo dois. Ao explorar a
influência da televisão no universo cinematográfico, Debruge (2005) coloca que a criação do
formato dos videoclipes veio mostrar que trabalhar com música é trabalhar num ritmo
acelerado
10
. Tanto que foi nessa época (década de 1980) que o estilo dos cortes secos passou a
vigorar nos anúncios de filmes. O trailer de Cazuza pode ser considerado um típico fruto
dessa revolução, visto que várias imagens são interligadas pela mesma música.
Com todos esses apontamentos, é possível dizer que a montagem utilizada no trailer de
Cazuza é tipicamente eisensteiniana, pois o objetivo não parece ser o de criar uma
continuidade, e sim o de provocar choques perceptivos. No capítulo dois, ao apresentar as
9
Ver páginas 71-73.
10
Ver páginas 51-52.
91
correntes que marcaram os primórdios da história do cinema, ofereceu-se um paralelo entre a
escola americana e a escola soviética, identificando uma grande divergência entre elas
11
.
A escola americana procurava fazer com que uma imagem de uma parte sucedesse à
de outra, para que a ação se mantivesse contínua. Enquanto isso, os russos exploravam os
choques perceptivos, pois acreditavam que a técnica da montagem devia ser utilizada para
gerar oposição entre as cenas. O objetivo era justapor duas imagens dialéticas, colocando em
jogo duas ações díspares, para provocar emoção no espectador. Assim, coloca-se que a
montagem do anúncio de Cazuza é tipicamente de atração, pois faz as imagens saltarem de
uma potência à outra.
11
Ver páginas 73-74.
92
3.2 Olga
O trailer do filme Olga tem duração de dois minutos e 44 segundos e possui 67 planos
(imagens sem nenhum corte) interligados por 18 títulos gráficos (sete títulos trazem
informações sobre a história, cinco trazem o nome de atores do elenco, um traz o nome do
filme e cinco trazem dados da produção). O material foi criado em cima de um tripé
explicativo, se assim pode-se chamar, que inter-relaciona imagens + diálogos + títulos
gráficos. Essas três instâncias contam a história, agindo em sintonia para formar o anúncio
todo, tornando-o repleto de informações.
3.2.1 Análise do personagem no trailer Olga
O trailer começa com o som de várias vozes falando alguma coisa em alemão e, assim,
se entra no clima da vivência de Olga. Esse ruído de multidão em polvorosa o tom
inicial, introduzindo a platéia no contexto histórico da trama. A primeira seqüência do trailer
apresenta uma manifestação de militantes rebeldes sendo paralisada pela polícia. Olga está à
frente do grupo e luta contra os policiais. Começar o trailer com essa cena demonstra
explicitamente o perfil contestador da personagem.
Os títulos gráficos usados no anúncio auxiliam a transmitir as qualificações da
personagem. Essa instância foi comentada no capítulo dois. No levantamento histórico do
trailer, falou-se que a tática dos gráficos era já conhecida pelo público que estava acostumado
com os filmes mudos. Tanto que, para Kernan (2004), o uso dessa estratégia é a mais
interessante técnica de continuidade na prática de anunciar filmes
12
.
12
Ver página 52.
93
O primeiro título gráfico do trailer de Olga começa apenas definindo-a como “a
mulher”. Depois, a mulher se torna “líder”, e é nessa hora que uma cena de Olga dando um
soco em um soldado surge na tela. O título conta que a personagem tornou-se líder, e a
imagem mostra sua força e coragem, ambas representadas pela agressão à autoridade.
Já instituída no papel de líder, a personagem torna-se “revolucionária”. Para confirmar
essa informação verbal, Olga agita um tribunal, ameaçando um guarda, com um revólver, para
que este solte o prisioneiro. Olga, segurando a arma que aparece em close, mais uma vez
desafia a autoridade. Faz-se concreto seu rótulo de revolucionária. Como forma de externar a
determinação da personagem, a frase por ela proferida demonstra que ela sabe o que quer:
Mande soltar o preso ou eu atiro”. Com a arma apontada para a cabeça da autoridade, ela se
apresenta, então, comandando a situação.
Depois disso, a cena que surge mostra que a personagem, além de desafiar as
autoridades, possui certa autoridade como revolucionária. Isso é exteriorizado pela imagem de
Olga, com o microfone, num palco, palestrando para uma grande platéia. Nesse local, que
denota superioridade e liderança (já garantida pelos títulos gráficos), Olga profere: Estamos
vivendo um momento decisivo na história mundial”. Ela se refere à história mundial, e não
apenas à alemã, mostrando que a causa pela qual lutavam expande as barreiras nacionais.
Em todo esse enredo, três seqüências se passaram. Primeiro ela luta contra militares na
rua (líder), depois ela liberta o preso do julgamento (revolucionária) e, por fim, comanda a
reunião que pretendia mudar o mundo (mulher que lutou por um ideal). Os títulos classificam
a personagem, os diálogos enfatizam, e as imagens reforçam. Os três elementos, juntos,
apresentam uma personagem facilmente descritível: uma mulher extremamente corajosa que
se importava com as causas políticas mundiais. Fica explícita a força da mulher que queria
mudar o mundo.
94
No entanto, nos entornos imaginários da ficção, essa mulher não estaria completa, até
que surgisse algo que a fizesse mostrar seu lado frágil. É nesse momento que aparece a cena
da apresentação do casal. O líder comunista apresenta Olga a Luis Carlos Prestes, e eles
trocam olhares interessados. Mas quem não conhece a história não sabe por que os dois estão
sendo apresentados. É então que a própria protagonista vem contar sua missão com o
revolucionário brasileiro: Eu farei com que você chegue ao Brasil a salvo”. Mais uma vez, a
imagem vem reforçar a informação verbal, pois, agora, o que se é um navio luxuoso. Essa
imagem cria uma idéia de mobilidade, e faz com que se perceba que Olga deve acompanhar
Prestes em uma viagem até o Brasil.
Os olhares entre o casal, na hora da apresentação, não foram considerados suficientes
para sugerir o romance. Novamente, o recurso do título gráfico é utilizado, para auxiliar o
entendimento das imagens. O título vem explicar que se trata de uma história de amor. E,
dependendo do ponto de vista, é possível dizer que o título surge como mais uma qualificação
de Olga. instituída como mulher, líder, revolucionária, que luta por um ideal, a
protagonista também se torna peça-chave de um grande amor. Como uma quinta característica
de Olga, surge a paixão.
Todo esse clima favorável à Olga termina aí. O aspecto romântico e positivo que até
então vinha acompanhando a personagem desaparece para ceder lugar a tormentas e
agitações. A frase proferida por Prestes Por você eu faço qualquer coisa–, seguida por
cenas românticas do casal, parece coroar a felicidade plena da protagonista, e funciona como
um divisor de águas, pois, depois disso, tudo o que se segue no trailer é tenso, negativo.
Nos primeiros um minuto e cinco segundos do anúncio, Olga foi apresentada como
uma guerreira, uma mulher cheia de vida, repleta de qualificações, sendo sua força exaltada a
todo instante. Como um ápice de seu momento de glória, o amor vivido com Prestes abre a
janela para os desconfortos vindouros. Uma mudança de clima musical mostra que as coisas
95
não estão indo bem, e a cena de homens armados avançando revela que o casal terá alguns
problemas pela frente.
É então que o foco cai um instante sobre Prestes, demonstrando seu lado
revolucionário. Até o presente momento, Prestes era um coadjuvante, era apenas o homem
que Olga deveria cuidar e pelo qual se apaixonou. Mas quando ele fala, com uma postura
decidida: Nós nunca estivemos tão perto da revolução”, a impressão de que o trailer quer
mostrar que Prestes também é um líder, e que ele igualmente possui ideais revolucionários.
Dois diálogos de Prestes fazem essa transição que vai de um momento de glória para
uma zona tumultuosa. Assim que se tem contato com a história de amor dos dois, Prestes fala
que faria qualquer coisa por Olga. A mudança de tom musical ajuda a mostrar que, mesmo
estando disposto a tudo pelo seu amor, existiam agitações políticas em torno do casal que
iriam impedir os dois de viver um romance em paz. É que a segunda fala de Prestes aciona
o sentimento de ansiedade, e por que não dizer de curiosidade: Nós nunca estivemos tão
próximos da revolução”.
Assim que Prestes profere essas palavras, uma outra cena de soldados avançando é
mostrada, seguida pelo rosto apreensivo de Olga, em close, que segura um revólver. Ela está
escondida, em algum lugar, que não se sabe onde. Apenas se a ver o seu rosto, que passa
uma idéia de medo.
Pode-se perceber essa diversidade de imagens da seguinte forma: tudo vinha bem. De
repente a música fica mais pesada e soldados armados tomam a tela inteira. Prestes fala que
está próxima uma revolução. Mais soldados avançam. Olga está escondida com o revólver na
mão. Conclusão: Olga e Prestes estão armando uma revolução, até porque já foi dito que eram
dois revolucionários. As autoridades parecem ter descoberto os planos do casal e estão agora à
procura deles.
96
Olga deixa de ser, por um instante, aquela mulher forte e corajosa do início do trailer,
e passa a ser uma procurada pela polícia. Escondida e fragilizada, ela agora não enfrenta mais
as autoridades: é preciso esconder-se delas.
Mas quem está à caça dos revolucionários? É que, mais uma vez, o trailer vem
esclarecer do que se trata. Logo depois de mostrar o rosto de Olga, escondida, aparece uma
conversa entre três senhores. Não se sabe bem quem são, mas o intuito desse trailer não
parece ser o de deixar espaço para falsas interpretações. A frase que um dos senhores profere
entrega parte da jogada: Posso lhe assegurar, PRESIDENTE, as forças armadas são fiéis ao
governo. Assim, claro está que se trata de três homens do governo, e que um deles é o
Presidente do Brasil. É nesse instante que se tem a noção de que o Presidente é vivido pelo
ator Osmar Prado. Quem conhece um pouco da história do casal, e até mesmo da história do
Brasil, sabe que o Presidente em questão é Getúlio Vargas. Mas isso não fica explícito no
trailer.
Então, dito que o Presidente do Brasil está à captura dos revolucionários, apreende-se
a dimensão do movimento em que estão engajados. E se percebe, também, que escapar não
será uma coisa fácil. Nada fácil, visto que, em poucos segundos, a polícia invade o
esconderijo do casal. É uma caçada extremamente rápida.
Prestes fala que a revolução está iminente, Olga está escondida, policiais avançam,
Getúlio está por trás da jogada, mais policiais avançam, agora um carro de polícia surge no
horizonte. Tudo se dá de forma abrupta, até porque se trata de trailer, e como já foi salientado,
um trailer é dinâmico por natureza. Porém, a questão da montagem será analisada mais
adiante.
Nessa adrenalina de perseguições e fugas, os policiais encontram um esconderijo e
arrombam a porta. Policiais entram, mas não se sabe onde. Ainda no emaranhado provocado
pelo excesso de informações, se é surpreendido com uma cena de tortura. Policiais seguram a
97
cabeça de um homem (que não se sabe quem é) e o afogam num tonel de água. Sabe-se que a
polícia militar brasileira está atrás de Olga e Prestes e que os militares invadiram uma casa.
Mas não se sabe que casa é essa, tampouco quem está sendo torturado. A tortura acontece
dentro da casa? Ou é apenas uma forma de insinuar que, depois de invadir a casa, os
elementos capturados serão futuramente torturados? Parece que o trailer quer agora confundir,
e não mais esclarecer ponto a ponto, como vinha sendo feito.
Mais uma vez, é interessante resumir o que se percebe: o Presidente está na jogada, um
carro avança, militares arrombam uma porta e entram em uma casa, militares capturam uma
mulher, soldados avançam com armas na mão, homens torturam outro homem (que tem os
braços amarrados e es tendo sua cabeça afogada no tonel de água), militares quebram o
vidro de uma casa, Olga abre uma outra porta e um homem lhe diz: “É a polícia”.
É exatamente assim no trailer. Uma seqüência de flashes rápidos, que confunde o
espectador. Mas uma conclusão geral pode ser tirada: acontece uma perseguição. Essa
perseguição é violenta e pode levar a pessoas torturadas. Olga está envolvida. E, de novo, o
diálogo utilizado vem explicar quem está chegando: É a polícia”. Então, a polícia, sob as
ordens do Presidente, vai à procura dos revolucionários. Encontram o esconderijo e invadem a
casa.
Assim que Olga é avisada de que a polícia descobriu seu esconderijo, outra cena de
violência é apresentada. Como forma de mostrar que se trata de repressão, aparece uma outra
imagem de tortura. Dessa vez uma mulher está sendo enforcada. Desconhece-se a mulher e
também o motivo para tal punição. É possível supor que a polícia capturou todos os
revolucionários e está tratando cada um, em particular.
Logo após a cena do enforcamento, surge a imagem de soldados entrando em uma
casa. Um deles aponta o dedo para frente e diz: É Prestes, atirem!”. Nessa hora, percebe-se
que realmente é o esconderijo do casal e que a polícia acaba de capturá-los. Prestes aparece,
98
então, de costas, correndo. O policial mira a arma para o fugitivo. Prestes levanta os braços e
olha consternado. O policial prepara-se para dar o tiro, quando, subitamente, Olga se joga na
frente de Prestes e diz: “Não! Não atirem. Ele está desarmado, não atirem”.
Pronto. Isso foi o suficiente para que se tomasse conhecimento do conflito que se
passa na história. A polícia invade o esconderijo do casal. Está à procura de Prestes, encontra-
o e quer matá-lo. Olga o salva, arriscando a vida para preservar a dele. Tudo isso acontece de
forma muito rápida. Vê-se uma seqüência de planos muito curtos e percebe-se apenas que os
dois estavam sendo perseguidos pela polícia. Como uma forma de voltar ao início do anúncio,
a imagem de Olga na frente de Prestes, impedindo que o matem, sugere devolver à
personagem a coragem e a força. Ela, que estava fragilizada e com medo das autoridades,
volta a enfrentar o perigo. Para salvar Prestes, Olga arrisca sua vida. A personagem aparece
como uma líder, novamente. que essa líder não está mais na situação confortável de antes.
Porém, mesmo sendo alvo da polícia, Olga mantém sua personalidade forte.
É então que os títulos gráficos voltam à tela. Agora eles não vêm mais trazer
informações sobre a trama, e sim sobre o elenco do filme. Essa mudança de função
interrompe a sensação, ou seja, no momento em que a platéia estava deliciando-se com os
percalços da personagem, um título gráfico vem lembrar de que se trata de um anúncio. Até
agora, o trailer vinha privilegiando as questões diegéticas (a história, os conflitos, os
personagens). O título gráfico que traz o nome da atriz surge como estratégia publicitária:
Vocês estão gostando da história? Estão embalados nessa trama empolgante? Mas lembrem-
se de que isto é um trailer. As informações extradiegéticas, como o nome dos atores, lembram
que um filme está sendo anunciado.
O primeiro astro anunciado é Camila Morgado. O título traz o seu nome e em seguida
ela surge na tela. Uma cena da atriz tomando banho. Uma cena de Olga tomando banho. Nua,
acariciando sua barriga. Em seguida, em close, Olga a notícia de que está grávida de
99
Prestes. Mas onde estará Prestes? É então que ele aparece na tela. Sentado em uma cela de
prisão, com um bilhete na mão. Ele o bilhete e sorri, ao mesmo tempo em que chora. O
objetivo do anúncio é dizer que, enquanto Olga anuncia que está grávida, Prestes, isolado em
uma prisão, está recebendo a mesma notícia. Ele um bilhete. Tudo leva a crer que está
lendo um bilhete da própria Olga, contando sobre a gravidez.
Essa seqüência leva a algumas interpretações: Olga anuncia, para jornalistas, que está
grávida de Prestes e que quer ter o filho no Brasil. Prestes está preso, isolado, longe de sua
amada, mas também fica sabendo da notícia, que de forma diferente. Olga e Prestes estão
separados. Mas a notícia da gravidez e o bebê que está por vir continuam a ligar o casal.
Assim que Prestes é mostrado na prisão, lendo o bilhete, o título gráfico com o nome
do ator invade a tela: Caco Ciocler. A tensão volta a dominar o trailer, pois logo após o tulo
gráfico, os olhos de Caco estão gritando. Os olhos de Prestes estão ansiosos. A imagem é de
uma porta. Essa porta tem uma abertura pequena, na qual só se enxergam os olhos do
personagem. a entender que é a porta da prisão e que ele, isolado, procura por sua amada.
Ele grita, está nervoso, pergunta para onde levaram Olga.
É claro que o carcereiro não fala nada, apenas bate com a portinhola na cara de
Prestes. o trailer vem explicar o paradeiro de Olga: surge uma imagem dela caminhando,
sendo escoltada por policiais. Um homem fala: Olga Benário será deportada”. está a
resposta que Prestes queria. Ele não a recebe, mas o espectador sim.
O conflito continua a pairar. Imediatamente após anunciar a deportação de Olga, uma
cena dela com uma amiga vem lembrar que este é um filme tenso. A amiga da comunista fala:
Você é judia, não pode ser mandada para a Alemanha de Hitler”. Instaura-se o clima
agitado mais uma vez. Logo depois dessa frase, um navio com a bandeira nazista toma conta
da tela. A sugestão é de que Olga será enviada para Alemanha, em um navio nazista.
100
Outro título gráfico surge: Osmar Prado. Aparece uma cena em que o Presidente
denota seu ar de superioridade e imediatamente Olga aponta na tela, dentro de um carro.
Enfim, a líder revolucionária, que no início era forte, foi capturada pelas autoridades. Está
agora na condição de prisioneira, com semblante apreensivo. É a derrocada da mulher
guerreira. Primeiro ela viveu sua glória, depois viveu a tensão da perseguição e agora está
totalmente dominada. Nada mais pode fazer contra o destino.
Outro título: Eliane Giardini. Até então Olga não tinha família, nem vínculo, nem uma
história própria, que não fosse a revolução e o amor por Prestes. É então que surge, em close,
uma senhora. Mãe de Olga fala: Olga não é mais minha filha”. O mistério, uma vez mais, se
faz perceptível, pois, até então, não se sabia nada a respeito da mãe de Olga, tampouco que ela
havia renegado a filha. A curiosidade aponta.
Outro título, mais uma estrela no elenco: Fernanda Montenegro. Fernanda fala. Uma
senhora em close fala. Novamente o uso da tática do close para captar a atenção. Essa outra
senhora emerge na história, senhora que não se tem a mínima idéia de quem seja. Até ouvir
suas palavras: Mas a vida dela, e da NOSSA neta, dependem da sua ajuda”. Quando a
senhora refere-se à filha de Olga como “nossa” neta, percebe-se que se trata da e de
Prestes.
Mas de que ajuda fala essa senhora? Por que a mãe de Olga renega a filha? O que leva
a mãe de Prestes a procurar a mãe de Olga? Essas perguntas não são respondidas no trailer.
Entretanto, a imagem que vem depois mostra que Olga está agora totalmente incapaz de
comandar sua vida. A aparência da personagem modificou-se totalmente. Surge na tela uma
mulher com os cabelos curtos, veste roupas sujas, que sugerem uma prisioneira. É Olga. Ela
está derrotada, mas ainda assim luta. As autoridades agora querem levar sua filha. As
autoridades a capturaram e prenderam seu grande amor. E agora precisam levar também
101
o seu neném. Olga tenta impedir, mas nada mais para fazer. Está totalmente de mãos
atadas.
Policiais arrancam a criança dos braços da mãe, que luta desesperada. Levam sua filha
embora. Olga, no chão, é somente aflição e sofrimento. Ela grita: Assassinos!”. Mas de
que vale gritar ou se revoltar? Nada mais pode devolver a vida a essa mulher. Ela está no
chão, caída, atrás das grades. Está presa. Está arrasada. Perdeu sua liderança, sua força, seu
grande amor, seu ideal e sua filha. O trailer mostra tudo isso, deixa explícita a situação
decadente de Olga.
A cena final conclui: Olga, com os cabelos raspados, está agora machucada. Nada tem
em comum com a mulher do início do trailer. Ela caminha, em frente, mas não se sabe para
onde. Para a morte, talvez. Mas tudo é suposição. O que é entregue é que ela está agora
arruinada.
Ela caminha, na neve, junto com outras mulheres na mesma situação. Seu olhar é
triste. Acaba o trailer. O título do filme surge na grande tela: OLGA. Letras brancas no fundo
preto. É o fim da saga. Olga agora é apenas um nome. Aquela heroína, aquela brava guerreira
que defendia com paixão seus ideais, agora não aparece mais na tela. As imagens são
substituídas por quatro letras. O movimento das cenas é trocado pela palavra estática. E o
título do filme, que é o nome da protagonista, toma conta da tela, para que todos levem
consigo, para casa, a trajetória de Olga.
3.2.1.1 Aprofundando-se na saga de Olga
Feita essa análise da personagem Olga, surge uma constatação: o trailer faz questão de
deixar clara a trajetória da comunista. Conta seu início, mostra sua liderança revolucionária,
102
seu amor com Prestes, sua tormenta contra o governo brasileiro e sua derrocada, já na
Alemanha, sem a filha.
De todo o anúncio, foram contados 67 planos diferentes. Na complexidade de
múltiplos e curtos planos, existem 16 seqüências, ou seja, 16 continuações do mesmo enredo.
São seqüências autônomas, isto é, criadas exclusivamente para o trailer. Uma seqüência
montada no anúncio reúne cenas de seqüências diferentes do filme (e muitas vezes distantes
uma das outras). Em outras palavras, o trailer monta uma seqüência e para isso utiliza planos
de diversas seqüências que compõem o filme. Essa característica confirma o que vem sendo
dito sobre o trailer apresentar um novo enredo. Tudo pela função explícita do formato, que é a
de seduzir grande número de pessoas.
É possível, então, ordenar as seqüências da seguinte forma:
# SEQÜÊNCIA 01 – Manifestação na rua, conflito com a polícia
# 02 – Olga libertando réu de um julgamento
# 03 – Discurso de Olga para platéia comunista
# 04 –Apresentação de Olga a Prestes
# 05 – Romance entre Olga e Prestes
# 06 – Revolução no Brasil
# 07 – Reunião de governantes brasileiros
# 08 – Ataque da polícia em esconderijo de Olga e Prestes
# 09 – Anúncio da gravidez de Olga
# 10 – Prestes na prisão
# 11 – Olga sendo deportada
# 12 – Pronunciamento de Getúlio Vargas
# 13 – Chegada de Olga à Alemanha
# 14 – Conversa entre mãe de Olga e mãe de Prestes
103
# 15 – Filha de Olga sendo levada pelos responsáveis do governo
# 16 – Olga fragilizada no campo de concentração
A descrição em seqüências facilita a compreensão da história do trailer, assim como
auxilia a ordenar todos os percalços pelos quais passa a personagem Olga Benário. As
seqüências representam os momentos, os conflitos que Olga vive. Algumas delas não são tão
claras para quem não conhece a história. Quem não sabe que Getúlio Vargas é vivido por
Osmar Prado, pode ficar sem entender algumas nuances. Quem não sabe que Olga está sem
cabelos porque está em um campo de concentração, pode imaginar outras situações.
Resumindo, tendo por base essa divisão em seqüências, a saga da revolucionária, que
foi mostrada no anúncio, é mais ou menos essa: primeiro ela era forte, rebelde, corajosa e
enfrentava a polícia. Ela chega a libertar um acusado em um julgamento. Ela é uma der, que
fala para uma platéia lotada. Ela é então apresentada a Prestes, por quem se apaixona. Mas
uma revolução no Brasil faz com que tudo fique conturbado. O governo procura os
revolucionários. Olga engravida de Prestes, mas não pode aproveitar com ele esse momento,
pois ele está preso. Ela é enviada de volta para a Alemanha, onde também é aprisionada.
Perde sua filha e acaba derrotada e sozinha.
Percebe-se que o trailer é totalmente centrado na protagonista. No capítulo dois, ao
traçar a história do formato nos EUA, foi dito que, na década de 50, os trailers passaram por
uma revolução. Os anúncios deixaram de mostrar somente os astros do elenco e foram dando
mais valor para o perfil dos personagens. Tornou-se comum a promoção de casais,
valorizando a atmosfera romântica e atraente que essa estratégia pode representar
13
. O trailer
de Olga apresenta-se como um exemplo dessa colocação, pois explora o amor vivenciado por
ela e Prestes.
13
Ver página 50.
104
Além disso, falou-se, no capítulo um, que, na percepção de um objeto fílmico, o
espectador possui a atenção involuntária, recebendo o que vem pronto, de fora
14
. Munsterberg
(1983) explica que, quando se enquadra um elemento, toda a atenção do espectador passa a se
posicionar sobre ele. Então, em cada fragmento do trailer, em que Olga faz parte do quadro, o
anúncio provoca a audiência, revelando as facetas da protagonista. Ela aparece em close
diversas vezes, e isso contribui para que se penetre na sua intimidade.
Mas não somente a protagonista aparece em close, como também outros elementos do
trailer. O rosto da mãe de Olga e o da mãe de Prestes, por exemplo, também dominam a tela
inteira. Essas duas personagens só entram em cena no final do anúncio, despertando a
curiosidade. Como se não bastasse a inserção desse momento surpresa, as duas senhoras são
mostradas de uma forma que domina o quadro.
O close-up é uma valiosa arma do cinema para potencializar a emoção das cenas e
para captar a atenção da platéia. O detalhe em questão de repente se torna o conteúdo único da
encenação. No caso específico aqui abordado, o rosto preenche a tela inteira e passa a fluir
dele todo o significado da cena. Isso acaba por envolver a platéia, que fica atenta somente a
esse detalhe.
Para melhor refletir sobre a imagem da protagonista criada no trailer, é interessante
observar sua evolução física. No início do anúncio, Olga tinha os cabelos compridos e usava
roupas pesadas para agasalhar-se. Eram vestimentas estereotipadas de uma revolucionária. Ela
tinha um ar superior, determinado, e mantinha um estilo alemão de se comportar e se vestir.
Na cena em que dança com Prestes, ela está totalmente modificada. Seu cabelo está preso de
outra forma, ela usa brincos elegantes e um vestido de gala. Somente nessa cena seus traços
femininos são salientados.
14
Ver páginas 35-36.
105
Mais adiante na história do trailer, Olga é apresentada com um estilo mais desleixado e
suas roupas não transmitem o frio europeu e sim o calor brasileiro. O mesmo vestido de
mangas curtas é usado nas cenas que se passam no Brasil, mostrando que ela não está mais no
rigoroso inverno alemão. A cena em que ela retorna à Alemanha apresenta uma Olga
fragilizada, seu olhar não é mais aquele forte e determinado do início. A seqüência da tomada
do bebê, pelas policiais, externa uma Olga totalmente aniquilada. Os cabelos longos dão lugar
a curtos. O rosto é pálido e triste. A roupa já não é mais roupa, e sim um roupão velho.
A última cena do anúncio extermina de uma vez por todas a força da personagem.
Olga está careca, seu rosto todo machucado, a neve mostra que está de volta à Alemanha, e
seu semblante é triste e derrotado.
Desse modo, a aparência física da protagonista vai acompanhando sua trajetória e
ajudando a compreender as mudanças de fase (e a perceber a inter-relação de Olga com os
demais elementos da trama). Como diz Merleau-Ponty, os sentimentos são apreensíveis
também por quem a eles assiste, e não somente por quem os vive
15
. É com base nessa
afirmativa que se nota o quanto o trailer pode ter emocionado a platéia. Apodera-se ele, então,
de duas estratégias publicitárias: o idealismo, visto que tudo o que acontece na trama deve-se
ao fato de que o casal lutava por um ideal, e o apelo emocional, pois o trailer explora a força
de Olga, a paixão do casal e o sofrimento de ambos.
3.2.2 Análise da montagem no trailer Olga
A montagem do trailer de Olga faz compreender as colocações feitas durante esta
dissertação, a respeito da agilidade. O material dura dois minutos e 44 segundos (total de 164
15
Ver página 38.
106
segundos), e possui 67 planos. Melhor dizendo, são 67 planos de imagens, mais 18 títulos
gráficos. Somando-se tudo, tem-se 85 planos. Isso resultaria em uma média de 1,9 segundos
por plano. Tudo acontece em rápida velocidade. Mas o trailer não mantém o mesmo ritmo
todo o tempo. E é isso que será analisado agora.
É possível dizer que existem quatro momentos no trailer de Olga. Dois o
explicitamente tensos e agitados e os outros dois são mais serenos. O que marca cada um
desses quatro momentos é o ritmo dos cortes e o tom musical empregado. A música do
anúncio é instrumental, de fundo. Dois tipos de música são utilizados, um mais inquietante e
outro com tom mais sublime. Assim, não resta dúvidas de que a música contribui para criar o
ritmo desse material, pois ela intencionalmente acompanha a velocidade da montagem.
O primeiro momento destacado no trailer dura até os 44 segundos. O anúncio começa
com uma música mais agitada e alterna rapidamente os planos. Esse primeiro momento
mostra os conflitos da protagonista com a polícia alemã. Logo depois que Olga fala: Mande
soltar o preso ou eu atiro”, o ritmo desacelera, o fundo musical é trocado para uma canção
mais calma e as imagens passam a suceder-se de forma mais branda.
Essa calmaria começa, então, no segundo 45 e acaba na marca de um minuto e cinco
segundos. Esse segundo momento, que é bem menos tenso que o primeiro, mostra a líder
palestrando para uma grande platéia e apresenta o relacionamento entre o casal. O final desse
momento é marcado pela cena romântica entre Olga e Prestes. Depois que Prestes diz: Por
você eu faria qualquer coisa”, um som mais tenso (embalado também por ruídos) vem iniciar
um novo ritmo. Outra vez, as imagens passam a se mover mais rápido. Nesse intervalo
agitado, que vai de um minuto e seis segundos a um minuto e 27 segundos, não títulos
gráficos. São somente pequenos flashes de imagens, que procuram contar de forma
angustiante a perseguição da polícia brasileira ao casal de revolucionários.
107
E novamente uma mudança no clima e no ritmo do anúncio. Assim que Olga fala
Não! Não atirem, ele está desarmado, não atirem”, a música tensa deixa de tocar e emerge
uma música melancólica. Surge, então, na marca de um minuto e 28 segundos, um título
gráfico com o nome da atriz que interpreta a protagonista. A partir daí até o final do trailer,
mantém-se o ritmo menos agitado, com trocas rápidas de imagem, mas não tão rápidas quanto
nos outros dois momentos já descritos. Nesse último momento, os títulos gráficos, que tinham
sido deixados de lado no momento tenso anterior, voltam a reinar, trazendo o nome de atores
do elenco.
Essa divisão em quatro blocos pode ser analisada sob a perspectiva do cineasta russo
Sergei Eisenstein. Para ele, existe uma categoria de montagem que se chama montagem
métrica. Segundo Eisenstein (2002), a montagem métrica justapõe fragmentos de acordo com
um ritmo matemático.
No trailer de Olga, desse modo, nota-se que a montagem métrica foi incorporada. No
primeiro momento do anúncio, fragmentos curtos dominam o quadro, depois surge uma
seqüência de planos mais demorados, depois novamente flashes curtos e por fim tudo se torna
menos tenso. pica aplicação da montagem métrica. Nos momentos em que se queria passar
um clima de mais tensão, o trailer acelerou mecanicamente os cortes. Isso foi elaborado com o
intuito de fazer o espectador penetrar na atmosfera do conteúdo dos fragmentos.
Assim, enfatiza-se que são quatro grandes momentos no trailer: Olga se revolta contra
autoridades (mais tenso)/ Olga líder, determinada, vive romance com Prestes (menos tenso)/
Olga e Prestes sofrem confronto com polícia (mais tenso)/ Olga derrotada, sem ter como
lutar, perde tudo o que lhe resta (menos tenso).
Percebe-se, portanto, que as categorias de Eisenstein são aqui misturadas. A
montagem dos quatro momentos do trailer é métrica, porque altera o comprimento dos
fragmentos, mas é também rítmica, porque o conteúdo igualmente contribui para a variação
108
existente entre os climas mais tenso/menos tenso. O conteúdo, em sintonia com o ritmo
temporal da montagem, age como indicador da sensação vivida pelos personagens.
Além desse jogo de vaivém, alternando ritmos mais agitados com menos agitados,
percebem-se outros efeitos causados pela montagem. A chegada de Olga à Alemanha, por
exemplo, é construída através da montagem tonal, também descrita por Eisenstein (2002).
Para o cineasta, uma mudança no clima ou na luminosidade da cena dá um sentido de
movimento. Essa categoria de montagem foi identificada no trailer numa mudança do plano
de Getúlio Vargas para o plano de um desembarque de navio.
A cena de Getúlio falando com seus companheiros se passa no Brasil. Logo depois
dessa imagem, surge um plano de um navio. O clima desse segundo plano é sombrio, e está
nevando. Aparece, então, Olga, dentro de um carro, com o rosto triste, e na rua continua
nevando. Ao se perceber a troca de clima (a entrada da neve), nota-se que Olga não está mais
no Brasil. Tudo vinha indicando que a personagem seria deportada, e essa mudança no
clima auxilia o choque perceptivo, típico da montagem tonal.
Outra passagem interessante é a criação de um primeiro contato entre Olga e Prestes.
Assim que os dois são apresentados pelo líder comunista, Olga fala: Eu farei com que você
chegue ao Brasil a salvo”. Nesse momento, uma imagem de um grande navio em movimento
surge, seguida de um plano dos dois dançando.
Vale, uma vez mais, lembrar as idéias de Deleuze (1985), sobre as imagens-
movimento
16
. Esse jogo de imagens feito no trailer dá um movimento intelectual para a
seqüência. Ou seja, Olga diz que vai levar Prestes e um navio aparece na tela. O diálogo é
reforçado pela imagem. O navio gera a sensação de que eles irão para o Brasil. E a cena da
dança sugere que eles se apaixonam no próprio navio. Uma imagem-movimento (o navio que
se desloca para a direita), seguida de outra imagem-movimento (o casal que dança se
16
Ver páginas 71-73.
109
deslocando para a esquerda), forma um todo repleto de significados, que emerge como uma
sucessão lógica de acontecimentos.
Outro exemplo desse mesmo recurso é a cena em que Prestes, preso, pergunta por
Olga: Pra onde a levaram?. A montagem é generosa, pois logo indica o paradeiro de Olga:
emerge uma cena dela caminhando, em uma prisão. Prestes pergunta onde ela está e,
instantaneamente, ela aparece. Essa também é uma montagem exclusiva do trailer, pois cria
suas respostas através da montagem. O anúncio faz as ligações conforme o interesse, monta
conforme a necessidade de explicações.
A última colocação que se quer fazer é referente à seqüência em que a polícia caça e
captura Olga e Prestes. Essa cena é construída através de um clima tenso. Depois da
concretização do romance entre o casal, a confusão se instaura. Para externar essa atmosfera
tensa, a montagem é explorada. A seqüência foi montada assim: policiais com arma na mão.
Prestes corre, de costas. Policial mira a arma em Prestes. Prestes com as mãos levantadas,
Olga se atira à sua frente. Novamente corta para o policial. E mais uma vez corta para o casal.
Tudo se muito rápido. Esse jogo de troca de perspectivas (a todo instante um outro
ponto de vista é privilegiado) foi construído através da montagem rítmica. Eisenstein (2002)
explica que essa categoria pressupõe choques de conteúdos, sendo recomendada para os
momentos em que o objetivo seja o de externar algum conflito na história. Assim, uma forma
eficaz de aplicação seria construir uma oposição entre planos de um olhar e outros daquilo
que está sendo visto. O trailer apropriou-se dessa estratégia, visto que imagens do olhar de um
policial apontando uma arma foram intercaladas com imagens de seu alvo (no caso, Prestes).
E isso foi construído de forma rápida e dinâmica, intensificando ainda mais a tensão da cena.
O espectador vê o ponto de vista do policial, depois o de Prestes, depois o do policial de novo,
e assim acontece seis vezes. Esse vaivém foi utilizado para demonstrar a aflição do momento.
110
3.3 Cazuza X Olga: uma comparação entre os trailers
Depois de analisar separadamente cada um dos objetos, torna-se relevante compará-
los, procurando responder ao problema desta pesquisa, que é a compreensão de como o trailer
seduz. Para aventurar-se nesta tarefa, é preciso retomar as quatro grandes categorias
levantadas por este estudo e refletir um pouco sobre elas. Trata-se do imaginário, da
percepção, das estratégias publicitárias e da sedução em si.
Em outras palavras, foi preciso, para desenvolver este trabalho, criar categorias para
estudar o trailer, visto que se trata de um objeto pouco explorado, não existindo muitos
estudos que pudessem servir de guia. Foi assim, na falta de uma trilha traçada, que esta
dissertação criou sua própria trilha: o trailer seduz; seduz movimentando o imaginário;
movimenta o imaginário dando imagens à percepção; um conteúdo interessante à
percepção fazendo uso de estratégias publicitárias.
É importante, nesse momento, recordar o que cada categoria traz de contribuição para
compreender o trailer como objeto sedutor.
A Sedução: O trabalho é focado na questão da sedução e essa, de acordo com
Baudrillard (1991), pode se dar, principalmente, de três formas: pela construção interessante
da aparência, sem necessidade de vínculo com a verdade; pela criação de uma simulação
encantada, sem precisar passar algum sentido lógico; pelo segredo, buscando camuflar
algumas partes do todo. Enxerga-se o trailer como um objeto sedutor por se observar nele
essas três realidades. Partindo dessas idéias, salienta-se que a problemática da sedução se
reflete em todos os pontos do trabalho.
O Imaginário: Seduzir, quando se convoca essa noção para compreender o trailer,
significa estimular, no público, o desejo de assistir a um filme. Sabendo-se que as ações do
indivíduo são motivadas pelo imaginário, salienta-se que para mover o espectador em direção
111
ao filme é preciso motivar, antes, o imaginário. Quando quer interessar o público, o anúncio
precisa alimentar seus desejos. Precisa emocionar, chocar, cativar, sacudir, comover o
espectador. Essas constatações calcam-se nas idéias defendidas por Gilbert Durand e Juremir
Machado da Silva. Os dois autores acreditam que as imagens com as quais o espectador
mantém contato contribuem para fervilhar seu imaginário.
A Percepção: Para trabalhar com a noção de percepção, optou-se por buscar, nas
idéias de Munsterberg (1983) e de Merleau-Ponty (1983), as respostas que se procurava.
Ambos salientam que a atividade cinematográfica provoca sensações psicológicas. As
imagens mostradas são percebidas, mas o público não somente percebe, ele também confere
inúmeros significados para a reunião de elementos que lhe é oferecida. É percebendo os
signos na tela que o público apreende o enredo do trailer e o perfil dos personagens. É através
da percepção que se entra em contato com os sentimentos vividos e com as emoções
retratadas. Assim, a sedução se dá através daquilo que o espectador percebe no trailer. Para
que um anúncio estimule o desejo, ele precisa oferecer à percepção um conteúdo atraente.
As Estratégias Publicitárias: Para oferecer à percepção um conteúdo atraente, o trailer
se apodera de algumas táticas sedutoras. O anúncio trabalha com o idealismo, o segredo, a
criatividade, a emoção, e assim carrega muito da alma da publicidade. A proposta do formato
é estimular o desejo e, portanto, procura fazer o filme parecer interessante. Um trailer é
composto por partes de um filme, e sua façanha consiste em selecionar partes significantes
(capazes de emocionar a platéia) e reuni-las através de algumas estratégias publicitárias.
Feita essa rápida revisão sobre as quatro grandes categorias, torna-se mais fácil
comparar os dois objetos e refletir sobre como eles seduzem. O trabalho comparativo levará
em consideração três pontos principais. Primeiramente, optou-se por contrastar a narrativa de
cada anúncio, pois os dois objetos são extremamente diferentes nesse âmbito. Depois,
relacionar-se-á a maneira como cada um trabalhou com a cnica da montagem para, logo em
112
seguida, comentar o modo pelo qual cada trailer explorou o personagem, já que estas foram as
duas características anteriormente analisadas.
3.3.1 Narrativa
Com base na análise de cada objeto, é possível enxergar a grande diferença
narratológica que existe entre eles. Enquanto o trailer de Olga conta uma história coerente,
com início, meio e fim, o de Cazuza constrói-se em cima de uma narrativa desconexa: é
apenas uma junção de imagens. De um lado, o anúncio de Olga transparece cada conflito que
a personagem vive, de uma forma apreensível. Do outro, o de Cazuza não transmite um
enredo, pois somente faz piscar flashes na tela.
Esse contraste pode ser resultado da grande divergência que existe entre os filmes.
Trata-se de duas obras opostas, que possuem formas bem distintas de narrar a história. O
filme Olga é bem estruturado, pois o roteiro vai avançando de forma harmoniosa. O filme
Cazuza é mais livre e trabalha com freqüentes saltos no tempo. Então, é possível dizer que
tanto o trailer de Cazuza quanto o de Olga respeitam a narrativa usada no filme que estão
divulgando.
Um fator que pode soar como uma diferença narratológica entre os trailers, mas que na
verdade indica uma semelhança nas estratégias mercadológicas, é a questão de anunciar os
atores. O trailer de Olga utiliza cinco títulos gráficos com nome de atores. O de Cazuza não
usa nenhum, mas faz questão de encaixar, em seu conteúdo, imagens em que apareçam
aqueles mais famosos. Mesmo que essas imagens não tragam nenhuma informação relevante,
elas lá estão para expor ao público quem faz parte do elenco. Isso é uma forma de provocar o
113
imaginário dos espectadores brasileiros, que possuem uma certa familiaridade com aqueles
rostos e nomes divulgados.
No que se refere aos títulos gráficos, verifica-se que, enquanto o trailer de Cazuza faz
uso de títulos apenas para ceder dados de produção, tais como patrocinador e diretor, o
anúncio de Olga mistura informações diegéticas com extradiegéticas, aproveitando os títulos
para costurar a história.
Como o trailer de Cazuza quase não utiliza diálogos (são apenas quatro frases
proferidas durante o anúncio todo), nem faz aplicação de títulos gráficos para emendar os
contornos da trama, a história é contada, principalmente, pela letra da música. A canção O
tempo não pára, além de embalar o anúncio, também executa o papel de fonte poética de
informação. o anúncio de Olga extrapola no excesso de informações, que são cedidas tanto
pelos títulos gráficos quanto pelos diálogos marcantes oferecidos. Por isso, a música é
somente instrumental, de fundo.
No cinema, procura-se fugir da redundância, isto é, o que está na imagem não precisa
ser repetido no som. Aquilo que é disponibilizado imageticamente deve manter uma relação
dialética com aquilo que é transmitido verbalmente. Parece que o trailer de Olga ignorou esse
ponto de vista, pois as imagens selecionadas repetem constantemente o que vêm sendo dito
através de diálogos e títulos gráficos. E o anúncio de Cazuza acaba por escapar dessa falha,
por se apresentar em forma de um videoclipe.
Devido à individualidade narratológica de cada trailer, é possível descrever o anúncio
de Olga como um resumo do filme, pois resume as partes mais importantes da saga da
comunista alemã e oferece uma história fechada e coerente; o de Cazuza pode ser visto
como uma crônica do longa-metragem, pois faz uma referência livre e criativa da obra.
114
3.3.2 Montagem
Ambos os anúncios se destacam por apresentar diversas cenas curtas, que são
alternadas de forma rápida. Os dois são compostos de pequenos pedaços de imagens,
justapostas umas às outras, criando, assim, um ritmo acelerado.
Todavia, o trailer de Olga é maior que o de Cazuza, o que possibilita fazer uma
construção mais bem elaborada de seqüências. O anúncio sobre a saga da revolucionária
alemã faz um uso muito interessante da montagem métrica de Eisenstein, sabendo, também,
utilizar o som para gerar um ritmo. E, ainda, aproveita-se da montagem para transmitir uma
história bem acabada e compreensível.
Enquanto isso, o anúncio de Cazuza foi reunindo alguns planos do filme, oferecendo
uma mensagem mais descontraída. A justaposição de imagens desconexas provoca choques
perceptivos na platéia e disponibiliza um significado totalmente nonsense para o anúncio.
A montagem foi usada, pelos dois materiais, como uma arma para captar a atenção do
público. Os trailers buscaram organizar uma ordem de imagens que se tornasse atraente e
interessante. É a montagem que vida aos personagens. É ela que possibilita insinuar, no
caso de Olga, e esconder, no caso de Cazuza, os conflitos vividos por essas figuras na tela.
Os dois materiais, por serem trailers e terem o intuito de seduzir, trabalham com o
segredo. Mas cada um explora um diferente tipo de segredo. O anúncio de Cazuza opta pela
confusão. Não esclarece nenhum conflito do personagem e trabalha com saltos no tempo,
misturando as diferentes fases da vida do astro musical. Reúne diversas fotografias em
movimento que são ligadas com uma música do cantor.
A prévia de Olga disponibiliza um pequeno pedaço de cada conflito e introduz, na
trama, elementos que não são evidentemente explicados como, por exemplo, os planos de
115
tortura que são acrescentados no meio da seqüência de perseguição, ou então a conversa entre
a mãe de Olga e a mãe de Prestes. O anúncio de Olga insinua, mas não entrega tudo.
Essa constatação confirma a idéia defendida por Baudrillard, para quem a arte de
seduzir consiste em não entregar todo o segredo. De acordo com o autor, seduzir é
disponibilizar uma parcela, deixando uma parte à mostra, para que o indivíduo queira saber o
restante que não foi divulgado. Não tendo posse de todas as respostas, o espectador fica
curioso.
Além disso, Baudrillard (1991) explica que quando se quer seduzir é preciso criar uma
realidade imaginária calcada em um universo puramente simbólico. Buscando despertar o
interesse alheio, os trailers acabam por construir um novo mundo. Os anúncios criam
minisseqüências independentes das seqüências do filme. Pedaços são retirados do longa-
metragem e agrupados de outra maneira.
Essa instância está ligada à criatividade publicitária e também à sedução. Como diz
Baudrillard, aquele que quer seduzir nenhum nculo precisa ter com a verdade. O autor
explica que aquilo que objetiva ser mais verdadeiro que a verdade representa uma simulação
totalmente desencantada. Ao contrário, os objetos que o mais falsos que o falso,
representam uma simulação encantada. Essas mini-seqüências elaboradas para os anúncios
ilustram a idéia defendida de que é preciso maquiar o longa-metragem para seduzir.
O trailer de Cazuza vale-se da montagem para sacudir o personagem. Mostra planos
do início da carreira, depois do final, depois retorna ao início e assim vai confundindo a
platéia, suscitando a curiosidade. O trailer de Olga utiliza a montagem para contar de forma
idealista e enigmática a trajetória da protagonista. Aproveitando-se da conturbada história de
vida de Olga Benário, o anúncio abusa da edição para criar o clima tenso. Pela montagem,
oferece diversos dados ao espectador, fazendo-o assimilar o enredo e querer saber o que não
foi cedido.
116
Com base nessas observações, salienta-se que o anúncio de Cazuza seduz pelo
mistério, enquanto o trailer de Olga encanta pelo resumo maquiado do enredo do filme.
Portanto, apropriam-se de duas instâncias descritas por Baudrillard: o segredo e a construção
interessante das aparências.
3.3.3 Personagem
Como se trata de duas cinebiografias, o que pode provocar a grande diferença
narratológica entre os anúncios é a individualidade própria de cada uma das figuras centrais.
Cazuza representa a transgressão, a liberdade, o gozo, o instinto de viver cada momento como
se fosse o último. Olga é a representante do período moderno, uma mulher determinada,
centrada em um ideal, que vive o presente pensando no futuro. Cazuza quer uma ideologia
pra viver, pois seus heróis morreram de overdose. Olga tem sua ideologia e batalha por ela.
Assim, os dois trailers contam a história de acordo com a história que é contada, ou
seja, cada material incorpora uma narrativa que acompanha o tom da trama do personagem.
Percebe-se que apesar de contar a história de maneira totalmente diferente, ambos os trailers
são explicitamente focados na figura central. O anúncio de Cazuza, além de ser embalado por
uma música do cantor, mitifica o personagem, transmitindo suas várias scaras. O trailer
conseguiu exibir, no curto espaço de um minuto e 25 segundos, diferentes facetas do sico,
idealizando a figura ali apresentada.
A prévia de Olga mostra os percalços da líder comunista, explorando sua garra e
coragem, e oferecendo uma amostra das tormentas enfrentadas pela personagem. Ao abusar
da história do filme, disponibiliza experiências inéditas e aventureiras. Como estratégia de
sedução, o trailer apoderou-se das questões históricas do longa-metragem. Por anunciar um
117
filme de época, o trailer de Olga enseja a possibilidade de transportar o espectador para um
período histórico particular.
No capítulo dois, ao trabalhar a questão do personagem de ficção, apontou-se que
existem trailers que explicitam o perfil do protagonista e outros que preferem fazer um
suspense
17
. Nesse âmbito, afirma-se que o trailer de Olga revela claramente quem é a mulher
que está em cena. O trailer de Cazuza também é focado no personagem, mas de forma
distinta, menos evidente, abusando da incoerência entre as imagens.
Talvez essa seja a mais interessante diferença entre os dois objetos. A prévia de Olga
disponibiliza quase todos os passos da protagonista, seguindo uma ordem evolutiva. A de
Cazuza, por sua vez, não disponibiliza muitos dados informativos, opta pelos planos
autônomos e não oferece seqüências explicativas bem construídas.
Uma outra peculiaridade perceptível nos trailers é o conflito vivido por ambas as
figuras. De acordo com Beth Brait (1985), no universo da ficção, o personagem representa o
elemento de conexão de toda a trama. Em algumas histórias, ele é levado a se confrontar com
outro personagem. Em outros casos, ele se confronta com o abstrato ou com o coletivo.
também várias espécies de conflitos contra forças alheias ou contra forças naturais.
Transpondo para a realidade dos dois objetos aqui trabalhados, destaca-se que,
enquanto Olga, no trailer, trava um confronto com o governo (coletivo, abstrato), Cazuza se
confronta com a sua natureza, pois enfrenta um problema de saúde. Apesar de serem conflitos
dessemelhantes, os dois entes sofrem agressivas mudanças físicas. Cazuza foi apresentado
com visuais diferentes, sem seguir uma ordem. Olga foi assumindo um novo perfil a cada
instante, mostrando a decadência física da protagonista.
Ambos os atores foram levados a uma profunda imersão na realidade do papel
interpretado, fazendo com que melhor se percebesse a situação do personagem. A atriz
17
Ver página 70.
118
Camila Morgado teve que emagrecer sete quilos, pintar e cortar os cabelos e, para o final das
filmagens, teve que raspar a cabeça. O ator Daniel de Oliveira precisou alisar e cortar os
cabelos, emagrecer e fazer bronzeamento. Ele começou ganhando sete quilos para se parecer
com o Cazuza do início de carreira, e depois perdeu 14 para revelar o definhamento do cantor.
Essas mudanças físicas, quando são exibidas no trailer, indicam que os personagens, durante o
filme, serão expostos a tormentas e agitações e é nessas horas que se passa a querer saber
mais sobre essas questões.
Como foi dito no capítulo um, com base nas idéias de Munsterberg (1983), a atenção
suscitada pelo trailer é sempre a involuntária
18
. Na sala de cinema, todos recebem as mesmas
mensagens e prestam atenção aos mesmos detalhes. A concentração e o foco do indivíduo são
determinados pelo espetáculo. O espectador, dessa forma, agrupa todos seus sentimentos e
impulsos em torno do objeto privilegiado que lhe é imposto de fora. Este se torna o foco de
suas ações, enquanto todos os outros objetos no raio dos sentidos perdem o poder sobre suas
idéias. Assim, quando uma imagem surge na tela a atenção se fixa nesse ponto e todo o resto
desaparece na escuridão.
Em complemento a essa colocação, salienta-se que a forma pela qual o personagem é
mostrado faz o público perceber as imagens de forma emotiva. Os gestos, as expressões
faciais, os movimentos do corpo: o personagem ao espectador um prato cheio de múltiplas
sensações. Como Merleau-Ponty (1983) deixa claro, através da percepção, o espectador
apreende o sentimento e a emoção do personagem.
Nota-se, pois, que de acordo com a aparência dos personagens, pode-se ter uma
impressão mais favorável ou mais desfavorável de seu estado de espírito. Talvez por isso
tenham sido selecionadas estas cenas: Olga dando um soco no soldado (com a aparência forte
e determinada), Olga em close anunciando a gravidez (com ares desgastados), Olga com a
18
Ver páginas 35-36.
119
cabeça raspada, no final do anúncio (totalmente aniquilada fisicamente). Cazuza no palco,
inúmeras vezes, Cazuza com os amigos, Cazuza bebendo, Cazuza beijando na boca (com
aparência feliz e saudável), Cazuza em casa tranqüilo, Cazuza no palco mais sereno (com
aparência mais debilitada).
Entrando em contato com essas imagens, a platéia imagina o que está se passando no
mundo de cada protagonista. Os sentimentos, enredos, tristezas, alegrias, confusões, enfim, a
emoção vivida na história, advém, principalmente, da postura do personagem. É daí que surge
o desejo, a expectativa, a curiosidade, o encantamento pela trama apresentada.
Os dois trailers analisados criaram um perfil para os personagens divulgados. E é esse
perfil que seduz o espectador. Para Baudrillard, seduzir os próprios signos é mais importante
que a emergência de qualquer verdade. O que torna um discurso sedutor é sua própria
aparência, a circulação aleatória de seus signos em superfície. Portanto, para seduzir, basta
criar uma aparência interessante, que desperte no outro a vontade de saber mais.
É por isso que a sedução se dá em um nível imaginário, isto é, menos importa
transmitir um Cazuza e uma Olga estritamente idênticos ao que eles foram na vida (ou a como
eles aparecem no filme), que oferecer imagens que mostrem a emoção, o conflito, as
tormentas dos seres da ficção. O vínculo da platéia com a imagem se dá, principalmente,
através do estatuto humano representado na tela. É a história do personagem insinuada no
anúncio que fisga o público. O espectador passa a apreciar ou desgostar não do filme em si,
mas da imagem que foi divulgada sobre aquele filme, ou seja, não é a história do longa-
metragem que seduz, é a história do trailer.
NÃO HÁ FILME. DIRETAMENTE OS CRÉDITOS
No final de um trabalho, assim como no final de uma sessão de cinema, é preciso
estabelecer os créditos de uma produção. Na sala de cinema, as letrinhas vão passando na tela
para que o espectador conheça quem fez o quê dentro do filme. Aqui, irá retomar-se cada
grande ponto do estudo, para que o leitor perceba o que cada um representa na análise geral.
Espera-se, todavia, que, ao contrário do que geralmente ocorre nas salas tradicionais, o
público não se levante da poltrona e se vire de costas para tais dados.
Para começar esse resgate, é preciso buscar, no início do trabalho, as considerações
sobre a noção de sedução. Ancorando-se nas idéias de Jean Baudrillard (1991), colocou-se
que para seduzir é preciso esconder o segredo e enfeitar a aparência através do agrupamento
inteligente de signos. Assim, toda a pesquisa foi edificando-se em cima da premissa de que
um trailer camufla o conteúdo do longa-metragem. O anúncio escolhe algumas cenas do filme
e faz um remake, abusando de estratégias sedutoras para trabalhar o mistério da trama.
Percebeu-se, portanto, que o formato faz parte daquilo que Baudrillard chama de simulação
encantada, pois mascara alguma parte do todo.
Desenvolvendo essa problemática, chegou-se ao imaginário, termo tão difícil de ser
apreendido e, ao mesmo tempo, tão importante para este estudo. A estrutura desta dissertação
está na compreensão da sedução. E seduzir, no panorama cinematográfico, significa mostrar
ao indivíduo que uma determinada experiência visual vale a pena. Significa provocar o
121
imaginário através de uma reunião inteligente de imagens. É alimentando o imaginário que o
trailer estimula, no espectador, a vontade de ver o filme. Isso porque o imaginário é real
(Gilbert Durand) e porque o homem vive o imaginário (Juremir Machado da Silva).
E para provocar o imaginário, para estimular a vontade no espectador, nada melhor do
que convidá-lo a penetrar em uma sala escura, longe das perturbações cotidianas (Hugo
Mauerhofer). Nada mais interessante do que convidá-lo a sentar em frente a uma enorme tela,
que faz brilhar imagens de um outro mundo, um mundo encantador, onde tudo é possível. Um
mundo que obedece a regras completamente spares daquelas que a sociedade impõe aos
indivíduos. Um mundo que pode pular do hoje para o ontem, ou do agora para o amanhã. Um
mundo onde personagens vivem histórias fabulosas, incrementadas com situações
emocionantes.
Para emocionar a platéia, nada como permitir a ela que participe de um ritual, um
ritual que preserva algumas nuanças míticas, e no qual o indivíduo se mantém concentrado
somente em imagens. Embalado pelo conjunto fantasioso dessas, o indivíduo se torna
vulnerável à sedução, deixa-se encantar pelas fábulas, dentre elas os trailers.
Juntamente à circunstância mítica proporcionada pelo ritual, o trailer em si é promotor
da sedução. O charme de um anúncio está na sua fórmula-base: conjunto de imagens retiradas
de um longa-metragem, emendadas de acordo com estratégias publicitárias. Lisa Kernan e
Peter Debruge fizeram ver, através da trajetória do trailer, que ele aplica inúmeras estratégias
sedimentadas pelo campo da publicidade. Contudo, Gilles Lipovetsky e Neusa Demartini
Gomes ajudaram a compreender que a publicidade não mais se reduz à racionalidade
informativa, pois se tornou um reino de encantamento e criatividade.
O trailer explora os momentos essenciais de uma história, a fim de criar um apelo
emocional. Ele não entrega todos as respostas dos conflitos apresentados, a fim de que o
espectador reaja, juntando os dados e construindo uma mensagem coerente. Ele maquia o
122
enredo, transformando o personagem em um ser mítico, idealizado. Tudo isso, em média, em
menos de três minutos.
Por esse curtíssimo tempo o trailer se a perceber. O espectador o carnaval de
imagens piscando na tela e vai percebendo as diversas mensagens que o anúncio quer passar.
Percebe a história, a evolução dos personagens enquanto elementos de ação, o cenário, a
fotografia do filme, a estética da obra, enfim, algumas propriedades do longa-metragem.
Percebe os elementos e apreende os sentimentos (Maurice Merleau-Ponty). A atividade do
espectador de um trailer não se restringe somente à percepção, visto que as imagens suscitam,
também, a imaginação e a memória (Hugo Munsterberg). Essas duas instâncias são
imprescindíveis para fazer com que os signos se encontrem. O indivíduo capta, através do que
percebe, o estado de espírito dos personagens e, assim, passa a ter uma idéia sobre a história
do filme.
O sujeito se mantém atento à reunião de imagens, porque o anúncio abusa da
montagem para seduzir. É possível dizer que o formato atual do trailer reúne as inúmeras
técnicas de montagem incorporadas pelos profissionais do cinema, em toda a sua história.
Ele é, em si, montagem. É através da oposição entre as cenas que o anúncio provoca choques
perceptivos e emociona a platéia (Sergei Eisenstein). É pelo domínio dessa estratégia que ele
consegue, muitas vezes, fazer o filme parecer melhor do que realmente é. Isso porque o
movimento dos planos cria o todo do objeto fílmico (Gilles Deleuze).
O vínculo da platéia com o trailer surge do sopro de vida que irradia da tela. O
personagem do anúncio interage com uma série de elementos, trazendo à tona os conflitos da
história (Beth Brait). Convida o espectador a entrar no jogo, oferecendo um cardápio de
emoções e sentimentos. Maurice Merleau-Ponty esclareceu que pela imaginação o indivíduo
capta, através do que percebe, o sentimento interno do personagem.
123
Pôde-se pensar todos estes elementos através da análise dos trailers Olga e Cazuza.
Jacques Aumont, Anne Goliot-Lété, Francis Vanoye e Martine Joly foram os autores que
auxiliaram a reflexão. Ensinaram a manusear uma imagem e encurtaram o caminho que levou
aos dois anúncios estudados.
O trailer, assim, foi coroado por diversos autores, apesar de a grande maioria nunca se
ter referido ao formato (somente Kernan e Debruge falam do trailer). Mesmo assim, a reunião
desses nomes e a montagem criada na dissertação mostrou que eles, juntos, conseguiram
retratar o quão encantador pode ser o anúncio de filmes.
Michel Maffesoli auxiliou na compreensão do objeto de estudo, pois é preciso, antes
de tudo, compreender que se trata de um ponto de vista sobre o formato e sobre os trailers
analisados. Diversos dados foram valorizados e pontos específicos foram contemplados.
Diante disso, pode-se dizer que outros pontos de vista podem existir. A análise é múltipla,
ainda mais se tratando de um objeto tão rico e cheio de especificidades, como o trailer. Cada
novo olhar lançado acaba encontrando novos sentidos para as imagens e para a junção delas.
A análise feita nos dois anúncios respondeu às suspeitas deste estudo. Os dois trailers
vieram ilustrar as diversas questões trabalhadas sobre a sedução. O mais destacável é os dois
materiais carregarem características estéticas e narratológicas totalmente distintas e, ainda
assim, conterem estratégias sedutoras que permitem um encanto. Essa divergência
possibilitou que se falasse de uma tendência mais explicativa (Olga) e de outra mais livre e
nonsense (Cazuza).
Resumindo as constatações destacadas na análise, é possível dizer que os dois trailers
seduzem, pois eles criam uma nova mensagem. Como o objetivo era analisar a montagem e o
personagem, conclui-se dizendo que a prévia de Olga seduz, pois abusa do resumo encantado
e o trailer de Cazuza seduz, pois explora uma confusão mitificada (montagem). Ambos
apresentam, assim, uma aparência que ilustra perfeitamente os ensinamentos de Baudrillard.
124
Além disso, eles encantam porque exploram os sentimentos e os conflitos dos
personagens. É através da emoção, proporcionada pela aparência física e pela atitude das
figuras enquadradas, que surge o desejo. A curiosidade é provocada quando alguém quer
saber o que vai acontecer com o protagonista da trama. Nessa esfera, o anúncio de Cazuza
seduz, pois idealiza o cantor e o de Olga porque disponibiliza a tensão romântico-histórica da
comunista (personagem). O fato de os dois materiais disponibilizarem as aventuras de duas
figuras que fizeram parte da história nacional, potencializa essa curiosidade e incentiva o
desejo, instigando o imaginário dos espectadores brasileiros.
Assim, defende-se a tese de que o trailer seduz a platéia através das cenas
emocionantes que ele oferece à percepção. Retomando as quatro categorias deste trabalho,
salienta-se que o indivíduo percebe o conjunto de imagens que são reunidas através de
estratégias publicitárias, e acaba sentindo-se instigado a ver o filme. Isso porque o conjunto
de imagens fermenta seu imaginário e o seduz.
Como foi dito no começo do primeiro capítulo
1
, esta dissertação é como uma viagem,
que tem a sedução como destino. Para atravessar o tortuoso percurso escolhido, o imaginário
foi destacado como o motor, como o acelerador, que impulsiona o indivíduo a seguir adiante.
Como o destino é a sedução, o imaginário passa a representar aquilo que move a vontade do
espectador para ver o filme.
A percepção foi classificada como o automóvel que percorre a longa estrada até a
sedução. É pela percepção que se chega à sedução. Para ser seduzido, é preciso que se entre
em contato com as imagens do trailer. E as imagens oferecidas fazem a platéia perceber os
elementos e assim sentir as emoções retratadas.
1
Ver página 16.
125
O ritual foi descrito como os melhores trechos da estrada. Isso porque se acredita que
apesar de existirem vários suportes que possibilitam alcançar a sedução, o mais favorável
ainda é a sala de cinema.
Então, estando acomodado dentro do automóvel, com o motor aquecido e desfrutando
dos trechos mais conservados da estrada, é hora de se chegar ao destino, de alcançar a
sedução. Mas é preciso deixar claro que esta não é uma aventura daquelas em que se parte de
um ponto para chegar a outro, andando rápido pelo caminho, sem nem reparar na beleza da
paisagem. Ao contrário, essa aventura é como uma excursão de escola.
O veículo lotado leva as crianças para seu destino que, com certeza, trata-se de um
lugar encantador. Mas as próprias crianças dizem que o melhor dessa experiência, muitas
vezes, acontece no trajeto. É dentro do ônibus que ocorrem as melhores piadas, os mais
inesperados romances, as mais divertidas brigas e as mais descontraídas refeições (às vezes,
somente nesse espaço é permitido que os estudantes devorem as saborosas guloseimas, que
estão sempre escondidas nas mochilas). É no ônibus que todos se mantêm juntos, que todos
ficam perto. É também, muitas vezes, no ônibus que vai nascer aquela amizade mais
interessante.
Chegando ao destino tão esperado, muitas crianças estão exaustas, devido ao longo e
movimentado trajeto que acabaram de percorrer. E quando acabar a viagem e os pequenos
estiverem de volta, a experiência que vão contar aos outros não se restringirá aos momentos
passados no local visitado. A experiência narrada abrangerá todas as agitações vividas, desde
a hora em que as crianças saíram de suas casas. É por isso que ao chegar aqui ao final da
viagem, salienta-se que o destino a sedução é o pretexto, o fim e o meio para as melhores
aventuras.
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Tribuna de Imprensa. Em busca da equação perdida. Rio de Janeiro. 15 de setembro de
1988.
FILMES CITADOS
As aventuras de Kathlyn (Francis Grandon, 1912)
O nascimento de uma nação (Griffith, 1915)
Encouraçado Potemkim (Sergei Eisenstein, 1925)
A voz de Bidu Sayão (1934)
Fazendo Fita (Vittorio Capellaro, 1935)
Pureza (Chianca de Garcia, 1940)
Direito de pecar (Leo Marten, 1940)
Segura essa mulher (Watson Macedo, 1946)
Festim Diabólico (Alfred Hitchcock, 1948)
O Saci (Rodolfo Nanni, 1951/53)
Psicose (Alfred Hitchcock, 1960)
Indiana Jones and the Temple of Doon (Steven Spielberg, 1984)
Pequeno Dicionário Amoroso (Sandra Werneck, 1997)
Central do Brasil (Walter Salles, 1998)
Amores Possíveis (Sandra Werneck , 2001)
Abril Despedaçado (Walter Salles, 2001)
A partilha (Daniel Filho, 2001)
Avassaladoras (Mara Mourão, 2002)
Carandiru (Hector Babenco, 2002)
132
Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002)
Os Normais (José Alvarenga Jr., 2003)
Cazuza – o tempo não pára (Sandra Werneck, 2004)
Olga (Jaime Monjardim, 2004)
Sexo amor e traição (Jorge Fernando, 2004)
Diários de motocicleta (Walter Salles, 2004)
A dona da história (Daniel Filho, 2004)
Benjamim (Monique Gardenberg, 2004)
Os dois filhos de Francisco (Breno Silveira,2005)
Casa de areia (Andrucha Waddington,2005)
Extemosul (Mônica Schmiedt e Sylvestre Campe, 2005)
Guerra nas Estrelas (George Lucas)
ANEXOS
ANEXO A – Descrição do trailer de Cazuza
O trailer de Cazuza
Antes de descrever o trailer, é preciso disponibilizar a letra da canção que acompanha
as imagens. É interessante colocar que a letra foi editada para o trailer, isto é, a música que
toca no anúncio não é a versão integral.
O tempo não pára
Cazuza
Disparo contra o sol
Sou forte, sou por acaso
Minha metralhadora cheia de mágoas
Eu sou um cara
Mas se você achar
Que eu to derrotado
Saiba que ainda estão rolando os dados
Porque o tempo, o tempo não pára
Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta
A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára
134
Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára
Descrita a letra da música (que é praticamente a única fonte de informação verbal do
trailer), é hora de descrever as imagens, assim como as únicas quatro frases que são ditas
durante a transição das cenas. Tudo inicia com o logotipo da GLOBOFILMES. Depois,
começa a tocar a música e surge na tela um título gráfico (letras vermelhas em fundo preto)
com a seguinte informação: “LEREBY PRODUÇÕES, GLOBO FILMES, COLUMBIA
PICTURES, PETROBRÁS DISTRIBUIDORA E CINELUZ PRODUÇÕES apresentam”.
Em seguida começam a desfilar as imagens retiradas do filme. Para melhor
compreender como o anúncio se apresenta, descrever-se-á em forma de tópicos. Cada novo
item significa uma seqüência. Cada ponto final representa um corte.
# Luzes brancas passando na tela. Luzes refletidas no capô de um carro. Luzes se mexendo
novamente e então se percebe que são luzes do teto de um túnel. Carro amarelo cheio de
garotos enlouquecidos, atravessando o túnel.
# Cena de Show: Cazuza de costas no palco. Cazuza de frente cantando.
# Cazuza chegando a um lugar que não é possível definir bem, sua amiga (Leandra Leal) vem
recebê-lo, os dois se dão um rápido beijo na boca, seguido de um abraço.
# Cazuza no trapézio do circo.
(Voz de Lucinha, mãe de Cazuza: Eu to cansada de ficar regulando o Cazuza sozinha”).
# Imagem dos pais de Cazuza caminhando (Marieta Severo e Reginaldo Faria).
# Cazuza em um bar, sobe na mesa e diz: “Alguém aqui tem vergonha?”.
# Cazuza beijando uma garota e sendo beijado por um garoto, ao mesmo tempo.
# Cena de show: Cazuza caminhando pelo palco, pega o microfone.
135
# Cazuza caminha na rua, em primeiro plano.
# Ensaio de banda (Barão Vermelho), Cazuza vem chegando.
# Fachada do Circo Voador.
# Lucinha batendo palmas e sorrindo.
# Cazuza caminha na lateral de uma ponte.
# Cena de show: Amigos de Cazuza (André Gonçalves e Leandra Leal) cantam a letra da
música na platéia.
# Cazuza beija mulher (Andréia Beltrão) na praia.
# Cazuza e amigos dentro do carro. Amigo de Cazuza mostra o disco do Barão Vermelho para
a câmera. Cazuza e banda caminham pelo meio fio da calçada.
# Cena de Show: Platéia pula efervescida. Cazuza em primeiro plano cantando com os
cabelos lisos (até então ele só havia aparecido com os cabelos crespos).
# Mão de Cazuza digita no teclado da máquina de escrever. Plano geral de Cazuza (cabelos
lisos) sentado em frente à máquina de escrever.
# Cazuza (cabelos crespos) bebendo whisky no gargalo da garrafa; ele toma um gole e cospe.
# Cazuza (de lenço na cabeça) e banda gravando em estúdio.
# Cazuza no campo (cabelos crespos), brincando com uma vaca.
# Cazuza (cabelos crespos) correndo, entre os carros, com a mão na boca e o rosto apreensivo.
# Cena de Show: Pais de Cazuza na platéia, Lucinha canta a letra da música.
# Cena de Show: Cazuza entra no palco (cabelos crespos), atira-se de joelhos no chão e, após,
pula no colo de um amigo.
# Cazuza (cabelos lisos) abraçando seu pai.
# Cazuza (cabelos crespos) atrás da porta; alguém abre a porta, que atinge a cabeça do
músico, e ele fala: Porra, Frejat”.
136
# Cena de show: Cazuza (cabelos crespos) com curativo na cabeça, um beijo na bochecha
de Frejat.
# Cena de Show: Cazuza fantasiado, na frente do microfone. Menina na platéia (Débora
Falabella) dançando e olhando para ele.
# Cazuza e dois amigos ensaiando em casa.
# Cazuza e amigos dentro do carro.
# Cena de show: Cazuza (de volta aos cabelos lisos) em primeiro plano cantando.
# Cazuza (de volta aos cabelos crespos) abraçando Lucinha dentro de um túnel.
# TÍTULO GRÁFICO: “CAZUZA – O tempo não pára”.
# Cena de show: Cazuza (cabelos crespos), de costas, se enrola na bandeira do Brasil.
# TÍTULO GRÁFICO: “um filme de SANDRA WERNECK e WALTER CARVALHO”.
(voz de Cazuza: “Obrigado!”).
# TÍTULO GRÁFICO: “BREVE NOS CINEMAS”.
Acaba a música. Acaba o trailer.
137
ANEXO B – Descrição do trailer de Olga
O trailer de Olga
Antes de começar o anúncio em si, aparece o logotipo da NEXUS CINEMA, seguido
pelo da GLOBO FILMES, que é por sua vez seguido pelo da LUMIERE. Depois dessas
inserções, vem um título gráfico (fundo preto e letras brancas, que é o modelo padrão usado
em todo o anúncio) com os dizeres: “PETROBRÁS e CREDICARD apresentam”. Assim que
surge esse título, começa o som do trailer. Nesse momento, o que se ouvem são diversas
vozes (sugestão de multidão), proferindo algo em alemão, acompanhadas por ruídos de
marcha (pés batendo no chão). Segue esse mesmo som, e outro título gráfico emerge na tela:
“uma produção NEXUS CINEMA, GLOBO FILMES, EUROPA E LUMIERE”. Isso tudo é
muito rápido. Todas essas informações publicitárias duram 28 segundos. Começam, então, a
surgir as imagens.
A descrição do trailer de Olga será feita de uma forma diferente da de Cazuza, pois o
anúncio carrega muitas informações verbais. O que es em itálico representa o conteúdo
imagético. O restante equivale aos títulos gráficos e aos diálogos.
Imagem de militares alemães marchando de encontro a um grupo revolucionário, do qual
Olga faz a frente.
TÍTULO GRÁFICO (TG): A MULHER
Choque entre manifestantes e militares.
TG: QUE SE TORNOU LÍDER
138
Olga, em primeiro plano, dando um soco em soldado alemão.
TG: A LÍDER
Olga de costas, em plano médio, e à sua frente está um tribunal.
TG: QUE VIROU REVOLUCIONÁRIA
Olga, sentada dentro do tribunal, levanta-se da cadeira e coloca um revólver na cabeça do
policial. Close do revólver. Rosto de Olga que fala:
Olga: “Mande soltar o preso ou eu atiro.”
Mudança de tom musical. Olga, num palco, em frente a uma grande platéia.
TG: A REVOLUCIONÁRIA
Olga, ainda no mesmo palco, fala:
Olga: “Estamos vivendo um momento decisivo na história mundial.”
Olga, junto com um exército, dá tiros de revólver.
TG: QUE LUTOU POR UM IDEAL
Prestes sendo apresentado à Olga:
Líder Comunista: “Camarada Prestes, Camarada Olga.”
Cena de um grande navio, enquanto se ouve a voz de:
Olga: “Eu farei com que você chegue ao Brasil a salvo.
Olga e Prestes dançando.
TG: E VIVEU UM GRANDE AMOR
Cenas românticas entre o casal. Close de Prestes:
Prestes: “Por você, eu faço qualquer coisa.”
Mudança de tom musical. Soldados avançando com armas em punho. Prestes conversa com
seus companheiros:
Prestes: “Nós nunca estivemos tão próximos da revolução.
139
Soldados avançando. Olga escondida, em close, com revólver na mão. Getúlio Vargas
conversa com militares:
Militar do governo brasileiro: “Posso lhe assegurar, Presidente, as forças armadas são fiéis ao
governo.”
Carro de polícia se aproximando. Policiais arrombam a porta e entram. Cenas de tortura.
Policiais quebram o vidro. Revolucionário fala para Olga:
Revolucionário: “É a polícia.”
Cena de enforcamento. Policiais encontram Prestes:
Policial: “É Prestes, atirem.”
Jogo de pequenos flashs alternados entre policial posicionando arma e mirando em Prestes e
Olga se atirando na frente de Prestes:
Olga: “Não! Não atirem, ele está desarmado, não atirem.”
Mudança de tom musical.
TG: CAMILA MORGADO
Olga tomando banho e acariciando a barriga. Olga em close falando para profissionais da
imprensa brasileira:
Olga: “Eu estou grávida de Luiz Carlos Prestes, e quero ter meu bebê aqui no Brasil.”
Prestes na prisão lendo uma carta.
TG: CACO CIOCLER
Olhos de Prestes na pequena janela da porta da prisão:
Prestes: “Pra onde a levaram?”
Olga caminhando em corredor de prisão, sendo escoltada por um grupo de policiais
femininas. Militares brasileiros conversam:
Chefe da polícia brasileira: “Olga Benário será deportada.”
Olga e amiga conversam. Cena de navio com bandeira do nazismo.
140
Amiga de Olga: “Você é judia, não pode ser mandada para a Alemanha de Hitler.”
TG: OSMAR PRADO
Getúlio em primeiro plano:
Presidente Getúlio Vargas: “Não se revolta um país inteiro apenas com a força das idéias.”
Cenas de desembarque de um navio. Rosto de Olga apreensivo, dentro de um carro.
TG: ELIANE GIARDINI
Close de mãe de Olga:
Mãe de Olga: “Olga não é mais minha filha.”
TG: FERNANDA MONTENEGRO
Close de mãe de Prestes:
Mãe de Prestes: “Mas a vida dela, e da nossa neta, dependem da sua ajuda.”
Policiais femininas tiram o neném dos braços de Olga. Ela se debate e tenta evitar que levem
a criança. Policial caminha com criança no colo, que chora. Olga, caída no chão, atrás das
grades, grita:
Olga: “Assassinos!”
TG: Baseado no livro de FERNANDO MORAIS
Cabeça de Olga em close. Ela está caminhando, atrás dela um grupo de mulheres que
também estão se deslocando. Seu cabelo está raspado, e seu semblante aparenta, ao mesmo
tempo, determinação e sofrimento.
TG: OLGA
TG: um filme de JAYME MONJARDIM
TG: Escrito e Produzido por RITA BUZZAR. Produtores Associados CARLOS EDUARDO
RODRIGUES, BRUNO WAINER e MARC BEAUCHAMPS
141
ANEXO C – Ficha Técnica
1
do filme Cazuza – O tempo não pára
Título Original: Cazuza - O tempo não pára
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 96 minutos
Ano de Lançamento (Brasil): 2004
Estúdio: Lereby Produções / Globo Filmes / Cineluz Produções / Columbia TriStar do
Brasil
Distribuição: Columbia TriStar do Brasil
Direção: Sandra Werneck e Walter Carvalho
Roteiro: Fernando Bonassi e Victor Navas, baseado em livro de Lucinha Araújo
Produção: Daniel Filho
Música: Guto Graça Mello
Fotografia: Walter Carvalho
Desenho de Produção: Marcelo Torres
Direção de Arte: Cláudio Amaral Peixoto
Figurino: Cláudia Kopke
Edição: Sérgio Mekler
Sinopse
A vida louca que marcou o percurso profissional e pessoal de Cazuza (Daniel
de Oliveira), do início da carreira, em 1981, até a morte em 1990, aos 32 anos: o
sucesso com o Barão Vermelho, a carreira solo, as músicas que falavam dos anseios
de uma geração, o comportamento transgressor e a coragem de continuar a carreira,
criando e se apresentando, mesmo debilitado pela AIDS.
1
Informações disponíveis no site Adoro Cinema. Ver: http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/cazuza/
cazuza.htm. Acesso em: 30 nov. 2005.
142
Elenco
Daniel de Oliveira, Marieta Severo, Reginaldo Faria, Andréa Beltrão, Leandra
Leal, Emílio de Mello, Cadu Fávero, André Gonçalves, Arlindo Lopes, Dudu
Azevedo, André Pfefer, Eduardo Pires, Pierre Santos, Victor Hugo, Maria Mariana,
Débora Falabella, Maria Flor, Fernanda Boechat.
Premiações
Ganhou sete prêmios no Grande Prêmio Cinema Brasil, nas seguintes categorias:
Melhor Filme, Melhor Ator (Daniel de Oliveira), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Edição,
Melhor Som, Melhor Trilha Sonora e Melhor Fotografia. Recebeu ainda outras seis
indicações, nas seguintes categorias: Melhor Ator Coadjuvante (Emílio de Mello), Melhor
Atriz Coadjuvante (Andréa Beltrão e Leandra Leal), Melhor Figurino e Melhor Direção de
Arte.
143
ANEXO D – Ficha Técnica
2
do filme Olga
Título Original: Olga
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 141 minutos
Ano de Lançamento (Brasil): 2004
Site Oficial: www.olgaofilme.com.br
Estúdio: Globo Filmes, Nexus Cinema e Vídeo, Europa Filmes e Lumière
Distribuição: Lumière
Direção: Jayme Monjardim
Roteiro: Rita Buzzar, baseado em livro de Fernando Morais
Produção: Rita Buzzar
Música: Marcus Vianna
Fotografia: Ricardo della Rosa
Direção de Arte: Tiza de Oliveira
Figurino: Paulo Lois
Edição: Pedro Amorim
Sinopse
Olga Benário (Camila Morgado) é uma militante comunista que é perseguida pela
polícia e foge para Moscou, onde faz treinamento militar. Lá ela é encarregada de
acompanhar Luís Carlos Prestes (Caco Ciocler) ao Brasil para liderar a Intentona Comunista
de 1935, apaixonando-se por ele na viagem. Com o fracasso da revolução, Olga é presa com
Prestes. Grávida de sete meses, é deportada pelo governo Vargas para a Alemanha nazista e
tem sua filha, Anita Leocádia, na prisão. Afastada da filha, Olga é então enviada para o
campo de concentração de Ravensbrück.
2
Informações disponíveis no site Adoro Cinema. Ver: http://adorocinema.cidadeinternet.com.br/filmes/olga/
olga.htm. Acesso em: 30 nov. 2005.
144
Elenco
Camila Morgado, Caco Ciocler, Fernanda Montenegro, Luís Mello, Eliane Giardini,
Jandira Martini, Mariana Lima, Renata Jesion, Werner Schünemann, Guilherme Weber,
Osmar Prado, Floriano Peixoto, Murilo Rosa, José Dumont, Milena Toscano, Oscar Simch,
Odilon Wagner, Eliana Guttman, Paschoal da Conceição, Sabrina Greve, Ranieri Gonzáles,
Raul Serrador, Bruno Dayrrel, Anderson Muller, Gilles Gzwidek, Maria Clara Fernandes,
Leona Cavalli, Eduardo Semerjian, Telmo Fernandes, Helio Ribeiro, Edgard Amorim,
Carlos Machado.
Premiações
Ganhou três prêmios no Grande Prêmio Cinema Brasil, nas seguintes categorias:
Melhor Direção de Arte, Melhor Figurino e Melhor Maquiagem. Foi ainda indicado em outras
seis categorias: Melhor Ator (Caco Ciocler), Melhor Atriz (Camila Morgado), Melhor Atriz
Coadjuvante (Eliane Giardini), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia e Melhor Som.
O filme foi escolhido pela Comissão de Seleção do Ministério da Cultura para
concorrer a uma das cinco vagas do Oscar 2005, na categoria Melhor Filme Estrangeiro.
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