Download PDF
ads:
MARTA THIAGO SCARPATO
EDUCAÇÃO INTEGRAL
E
PRÁTICA DOCENTE
DOUTORADO EM
EDUCAÇÃO:
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
1
MARTA THIAGO SCARPATO
EDUCAÇÃO INTEGRAL
E
PRÁTICA DOCENTE
Tese
apresentada à Banca Examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, como exigência parcial para
obtenção do título de Doutor em
Educação: Psicologia da Educação sob a
orientação da Profa. Dra. Bernadete
Angelina Gatti.
PONTIFÍCIA
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
2006
ads:
2
COMISSÃO JULGADORA
_____________
____________
______________
___________
___________________
______
________________
_________
_________________
________
3
AGRADECIMENTOS
À Prof
a.
-
Dr
a
. Bernardete Gatti que, com muito zelo, me orientou e
mostrou que além de ser docente é preciso ser, também, uma
pesquisadora. Quero manifestar minha sorte de ter sido sua
orientanda.
Aos meus pais q
ue, em todos os momentos, estiveram ao meu lado, e
me fizeram acreditar que temos de ir sempre atrás dos nossos
ideais.
Em especial, ao meu marido Marcos, que conseguiu, nas minhas
ausências e angústias, ser ainda mais compreensivo, cúmplice e
companhei
ro e me proporcionar todo o apoio emocional que
precisei para chegar até aqui.
À direção, coordenação pedagógica e professores da escola
pesquisada que, sem nenhum empecilho, deram oportunidade para
eu realizar a pesquisa de campo.
Aos professores da
Banca de qualificação, que foram muito
atenciosos e criteriosos nas sugestões.
4
RESUMO
Neste trabalho procurei investigar a visão fragmentária que permeia o
processo de ensino-aprendizagem de alunos em sala de aula. Verifiquei como essa
fragmentação
prioriza o aspecto cognitivo em relação ao afetivo e motor, trazendo
prejuízo ao desenvolvimento integral do aluno na sua formação Para a averiguação,
utilizei cinco categorias: os quatro fatores de movimento
tempo
,
espaço
,
peso
e
fluência
, segundo a concepção de Rudolf Laban, mais a categoria
afetividade
,
segundo a concepção de Henri Wallon. Realizei uma pesquisa de campo em uma
sala de educação infantil
no nível pré-
escolar
, com o objetivo de compreender
as inter-relações dessas cinco categorias no processo de ensino-aprendizagem. A
pesquisa demonstrou a necessidade de repensar a formação de professores para
a adoção de uma prática pedagógica que vise à formação integral dos alunos.
Palavras
-chave: visão integral do aluno; processo de ensino-aprendizagem; prática
docente; Laban, Rudolf von; Wallon, Henri.
5
ABSTRACT
In this dissertation I have attempted to investigate the fragmentary view
underlying students learning process in the classroom. I have verified how this
fragmentation prioritizes the cognitive aspect in relation to both the affective and motor
ones, thus harming the full development of the student s education. For such analysis,
I have employed five categories: the four movement factors
time, space, weight and
fluency
- as proposed by Rudolf Laban, as well as Henri Wallon s affection category. I
have conducted field research in a pre-school classroom aiming at understanding how
these five categories relate to one another in the learning process. This study has
proven the need for rethinking teacher education toward the adoption of pedagogical
practice targeting at whole students education.
Key
-words: whole student view; learning process; teaching; Laban, Rudolf von;
Wallon, Henri.
6
SUM
Á
RIO
INTRODUÇÃ
O: ENFOQUES PEDAGÓGICOS PARA A
VISÃO INTEGRAL
DO SER HUMANO
............
...
.....................
...............................................
........
....
...
09
Os cinco sentidos e a educação integral.............
.
................
..............
...
..
20
Uma proposta de educação integral............................................
........
..
..
20
CAPÍTULO I
-
CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DO MOVIMENTO
HUMANO DE LABAN PARA A PRÁTICA DOCENTE
......................
.
............
...
24
1.1. Laban e a educação....................................................
.
................
.
27
1.
2. Fatores de movimento....................
.
.............................
...............
...
..
29
1.
2.1 O fator de movimento
fluê
ncia
e sua relação com o
movimento, o desenvolvimento infantil e o
contexto escolar.....
..
.
30
1.2.2.
O fator de movimento
espaço
e sua relação com o
movimen
to, desenvolvimento infantil
e o
con
texto escolar.....
.
..
.
..
33
1.2.3.
O fator de movimento
peso
e sua relação com o
movimento, o desenvolvimento infantil e o contexto escolar..............
36
1.2.
4
.
O fator de movimento
tempo
e sua relação com o
movimento, o desenvolvimento infantil e o contexto escolar..............
37
CAPÍTULO II
-
A CO
NCEPÇÃO WALLONIANA SOBRE
DESENVOLVIMENTO INFANTIL: AFETIVIDADE, COGNIÇÃO E MOVIMENTO NA
EDUCAÇÃO ESCOLAR
....................
.................................................................
....
.
40
2.1. Emoção no contexto escolar........................................
....................
.
51
2.
1.1
O motor.........................................................................
................
51
2.
1.2
O afeto.........................................................................
.................
53
2.
1.3
A cognição...................................................................
..................
53
2.
1.4
Wallon e o movimento educacional francês...................
...............
54
2.
1.5
Aproximações entre Laban e Wallon..............
................
...........
57
CAPÍTULO III
-
EDUCAÇÃO INFANTIL:
ALGUNS ASPECTOS
............
..................
60
3.1. Fase específica de desenvolvimento.................................................
63
7
CAPÍTULO IV
-
A PESQUISA
...............................................
.......
........
..................
68
66
4.1. Procedimentos de investigação............................................
..................
67
4
.1
.1
. A escola pesquisada...........................................................
.....
69
4.
1.2
. A proposta pedagógica da escola.......................................
..........
69
4.
1.3
O perfil da professora e da classe........................................
70
4.
2
. Considerações gerais quanto ao conteúdo das cate
gorias: afetivi
-
dade, fluência, espaço, peso e tempo
........................................
...
.....................
70
4.3. Apresentação dos dados..................................................................
82
4.3.1 Codificaç
ão e descrição do ob
servado................................
83
4.4.
A
nálise das situações.......................................................................
93
CAPÍTULO V
-
RELAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO INFANTIL E
IMPLICAÇÕES PARA A FORMAÇÃO E PRÁTICA DOCENTE
........
..........................
10
8
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
11
7
8
Í
NDICE DOS QUADROS
QUADRO 1
............................................................................................
87
QUADRO 2
........
....................................................................................
88
QUADRO 3
.....................................................................................
.
......
93
QUADRO 4
..................................................
....................................
..
....
93
QUADRO 5
.....................................................................................
..
.....
94
9
INTRODUÇÃO
ENFOQUES PEDAGÓGICOS PARA A VISÃO
INTEGRAL DO SER HUMANO
10
Educação integral diz respeito a uma concepção de ser humano que
transcende as concepções redutoras que são difundidas no meio social e
educacional. Entre as concepções redutoras, a mais enfatizada é a do humano
apenas como um ser cognitivo, que tem deixado marcas nos processos educativos,
marcas que restringem esse processo à questão do conhecimento intelectual, ao
desenvolvimento estrit
amente cognitivo.
Estamos no início de século XXI e talvez fosse indispensável retomar uma
idéia muita defendida por teóricos dos séculos anteriores, a visão do homem integral
e integrado, que considera e articula os aspectos cognitivo, afetivo, motor e s
ocial.
Essa concepção foi referência para muitos pesquisadores da área da educação, os
quais se preocupavam, em seus escritos e em suas propostas de ensino, com uma
educação voltada para a formação do homem como um todo.
Acredito, ainda, ser necessário, rever e aprofundar essa concepção que por
vezes parece ter sido esquecida na sociedade contemporânea e conseqüentemente
no contexto escolar. Para refletir sobre a visão integral ou holística
1
do ser humano, é
preciso voltar no tempo e rever, na própria história da educação, a concepção de
alguns dos grandes teóricos. Retomá
-
los significa valer
-
se de seus pensamentos, não
como modelos que devam ser imitados, mas como referenciais teóricos que aguçam
a nossa própria reflexão e contextualizam suas idéias no
s dias de hoje.
A
força desses inventores não está em proporcionar exemplos,
mas em nos fornecer argumentos para nossa própria ação em
nossas circunstâncias...
(Sacristán, 2000, p.21)
Seleciono alguns desses grandes teóricos da educação e os apresento. A
linha do tempo, abaixo, mostra o caminho que percorri destacando os educadores e
seus enfoques a respeito da importância de se ter na educação escolar, como ponto
de partida, uma perspectiva integral de homem.
1
O termo holístico apresenta-se como um novo paradigma numa visão sem dualismo, integral
conforme exposto por Weil et al. (1993).
11
Rousseau (1
712
1778), de origem suíça, inspirador de muitos seguidores,
apresenta uma nova visão de educação e de infância, coloca a criança como o centro
da sua teoria. que a política e a educação, se relacionadas, podem ajudar a
repensar o homem integral e a soc
iedade. Essas idéias foram apresentadas nas suas
obras:
Emílio
e o
Contrato
, escritas em 1762.
O pensamento pedagógico de Rousseau pode ser articulado
segundo dois modelos, o de
Emílio
, em que são centrais as
noções de educação negativa e de educação indireta, como
também o papel particular que assume o educador, e o
Contrato
, que versa sobre uma educação totalmente socializada
regulada pela intervenção do Estado. E são dois modelos, como
dissemos, alternativos e, ao mesmo tempo, complementares
entre si
.
(Cambi, 1999, p.344)
Defende a idéia de que é tão importante desenvolver a inteligência quanto o
corpo para a formação de um homem íntegro. Emílio é considerada para a época
uma referência, por tratar de um modo inovador a infância com seus problemas
pedagógicos. Cria um aluno imaginário (Emílio), que, sob a orientação de um
pedagogo, é educado em meio à natureza e afastado de toda a sociedade. Nessa
forma de educar
,
Rousseau
busca apresentar o respeito aos ritmos de crescimento e
desenvolvimento naturais de cada faixa etária, pontuando que a educação deve
ocorrer de modo natural.
Ele apresenta, segundo Cambi (1999, p.346), três grandes contribuições à
pedagogia:
1
a
.) Tratar a infância como idade autônoma na qual é preciso incentivar o
aprendizado
por si próprio. A criança, apesar de apresentar características
específicas, não pode ser vista como um adulto em miniatura;
Séc. XVIII
Rousseau
Pestalozzi
Séc. XIX
Froebel
Séc. XX
Freinet
12
A natureza quer que as crianças sejam crianças antes de serem
homens. Se quisermos perverter essa ordem, produziremos
frutos
temporões, que não estarão maduros e nem terão sabor,
e não tardarão em se corromper; teremos jovens doutores e
velhas crianças. A infância tem maneiras de ver, de pensar e
de sentir que lhe são próprias; nada é menos sensato do que
querer substituir ess
as maneiras pelas nossas ...
(Rousseau, 1999, p.88)
2
a
.) Enfatizar a ligação entre motivação e aprendizagem, considerando
que, ao sentir-se motivado, o próprio aluno busca o conhecimento. É preciso que o
professor selecione conteúdos que estejam relacionados com a vida dos alunos e
proponha métodos de ensino que os motivem.
O adulto se engana quando pretende que a criança preste
atenção a conteúdos distantes de sua realidade, através de
discursos que não compreendem e problemas que não lhe
interessam.
As lições que os estudantes aprendem entre si, nos
pátios dos colégios, lhes são cem vezes mais úteis do que
todas as que se ensinam na classe.
(Rousseau, 1999,
p.
149)
3
a
.) A relação dialética entre liberdade e autoridade no ato educativo, que
gere um
a liberdade bem regrada.
...o maior de todos os bens não é a autoridade, mas a liberdade.
O homem verdadeiramente livre só quer o que pode e faz o que
lhe apraz. É esta a minha máxima fundamental...
(Rousseau, 1999, p.71)
Rousseau propõe um método nat
ural
que propicia à criança a oportunidade
de descobrir por si mesma o mundo que a cerca e construir o seu conhecimento. O
verdadeiro conhecimento, para ele, encontra
-
se na tríade:
13
A partir da tríade, defende ...que a educação de ensinar a viver, de
ser ativa e de realizar-se em ambiente de liberdade... (Luzuriaga, 1984, p.167)
.
Para isso é necessário que a criança seja estimulada, seja livre para selecionar o
que quiser aprender e que construa o seu conhecimento.
Preocup
ado em valorizar no homem o culto ao corpo, os sentidos, a
inteligência, o afeto e a razão, no livro II de
Emílio,
comenta:
... quanto mais seu corpo se exercita, mais seu espírito se
ilumina; sua força e sua razão crescem juntas e se ampliam
uma à outra
.
(Rousseau, 1999, p.130)
Faz críticas à imobilidade da escola tradicional, que deixa os alunos
cansados. Pontua que o conhecimento não se forma sem o corpo, sendo importante
exercitar as crianças. Afirma que o conhecimento passa pelo corpo através dos
sentidos.
As primeiras capacidades que se aperfeiçoam e se formam no ser humano
são os sentidos e, desse modo, é preciso cultivá-los, aprender a usá-los para nos
tornarmos mais sensíveis.
... o que entra no entendimento humano vem pelos sentidos, a
primeira razão do homem é uma razão sensitiva; é ela que
serve de base para a razão intelectual: nossos primeiros
mestres de filosofia são nossos pés, nossas mãos, nossos
olhos... [...] Para aprender a pensar, devemos portanto
exercitar nossos membros, nossos sentidos, nossos órgãos,
que são os instrumentos de nossa inteligência...
(Rousseau, 1999, p.141)
14
Com isso, Rousseau mostra que a verdadeira forma de educar o homem
para viver em sociedade deve ocorrer de uma forma integral.
Pestalozzi (1746
1827),
também suíço, humanista
-
discípulo de Rousseau
-
,
dedica sua vida à educação dos pobres. Sua experiência educacional passa por
quatro fases: a primeira começa em 1774, na fazenda Neuhof, região de Birrfeld, com
uma proposta que une educação e trabalho. Acolhe meninos órfãos e os educa por
meio da leitura, escrita, cálculo e trabalho agrícola. A segunda, em 1798, ao dirigir
um instituto para os meninos órfãos da Revolução Francesa em Stans. Sua terceira
fase é em Burdorf, quando uma culminância de sua atividade educativa e surge
sua obra Como Gertrudes instrui seus filhos (1801). Nessa época, começa a chamar
à atenção dos pensadores europeus na área da educação. Em 1806, vive sua última
fase, no Instituto de Yverdon, organiza de modo mais completo seu método
educativo. Carrega, então, como lema Corpo são e mente (Arce, 2002, p.68), ao
aliar trabalho, educação e exercícios físicos. Revela, com isso, sua inspiração em
Rousseau.
Muitas de suas principais idéias podem ser remetidas à educação:
... da educação humana baseada em a natureza espiritual e física
da criança.
... da educação como desenvolvimento interno, formação
espontânea, embora necessitada de direção.
... da educação baseada nas circunstâncias em que se encontra
o homem.
... da educação social e da escola popular, contra a anterior
concepção individualista da educação.
... da educação profissional, subordinada à educação geral.
... da intuição como base da educação intelectual e espiritual.
... da educação religiosa íntima, não confessi
onal.
(Luzuriaga, 1984, p.178)
O pensamento pedagógico pestalozziano desenvolve a trilogia:
15
Todos esses elementos devem ser desenvolvidos por meio da educação,
de modo harmônico, integral e não parcial. Para ele, ...Tudo quanto não toca a
totalidade de seu ser, não o toca naturalmente e não é humanamente educativo na
extensão da palavra (Luzuriaga, 1984, p.176).
Acredita que um dos objetivos da escola é o de preparar o homem para
a vida, para agir de maneira autônoma, gerando atividades manuais unidas às
intelectuais e à vida em sociedade. O trabalho educa, a atividade forma e a criança
é o centro de todo processo educativo.
Pestalozzi também remete críticas à escola tradicional de sua época, que
só transmite definições e não leva o aluno a desenvolver o seu conhecimento
diretamente com o meio. Luzuriaga (1984, p.177) comenta que, para Pestalozzi:
...Conhecimentos sem atividades práticas constituem o dom mais funesto que um
gênio inimigo tenha dado à nossa época.
Para que o indivíduo construa seu conhecimento, precisa ter oportunidades
de observar, vivenciar, para depois verbalizar. Denomina
intuição
a base de todo
conhecimento, por levar à aprendizagem, por meio do sentir, tocar, ouvir, olhar,
cheirar. Valoriza e acredita nessa forma de aprendizagem.
...tudo o que passa pelos sentidos se constitui em
conhecimento para o homem, a educação deve trabalhar com
eles, que levam o homem a conhe
cer a si mesmo...
(Arce, 2002, p.164)
Seu método de alfabetização, chamado o ABC da intuição ( Arce, 2002,
p.66),
baseia-se no ensino de sons antes do nome das letras, o método de
alfabetização por meio das cartilhas eram, pouco tempo, resultado do m
étodo
pestalozziano. Congrega todo o seu método de orientação da criança no processo
de autoconhecimento e conhecimento do mundo pelos cinco sentidos. Atrela a
educação ao desenvolvimento natural do ser humano.
Na proposta pestalozziana, aprender fazendo é um princípio; a ação é
fundamental para a aquisição de conhecimento. As próprias crianças demonstram
necessidade de agir sobre os objetos para conhecê-los, de forma que a abstração
deve ceder lugar à ação
.
A ação, portanto, não se restringe à atividade
corporal,
mas inclui formação de atitudes e habilidades com base nos desejos e
necessidades humanas.
16
Pelo
ABC da intuição e o ABC das atitudes
que é fazer a criança sair das
atitudes adquiridas para o conhecimento das regras e praticar a virtude
,
Pesta
lozzi acredita que estaremos proporcionando a educação integral do ser
humano.
Nesse mesmo período, Froebel
(1782
1852), educador alemão qualificado
como romântico
discípulo de Pestalozzi , um dos primeiros educadores a
propor um método para a primeira infância, ... pela primeira vez depois de
Rousseau, redefiniu organicamente a imagem da infância e teorizou a da sua
escola (Cambi, 1999, p.427). Foi o criador dos jardins de infância e o fundador da
pedagogia dos brinquedos, em 1840, abre uma escola de educação infantil,
intitulada
Kindergarten
.
Busca uma relação entre infância, natureza e Deus, tríade a qual
denomina
Unidade Vital
:
A educação precisa estar alicerçada nessa tríade para conduzir o homem ao
seu desenvolvimento harmonioso, pleno, e ao autoconhecimento. A tríade, ou seja a
Unidade Vital, considera o processo de interiorização e exteriorização direcionador
para o trabalho educativo com crianças. A interiorização ocorre quando a criança
recebe conhecimentos do mundo exterior que a fazem refletir sobre seu interior, e, a
exteriorização ocorre quando a criança exterioriza o seu interior por meio da arte e de
jogos. Toda a atividade externa de uma criança é resultado de sua atividade interna
e o professor deve estar atento a
esses dois processos.
17
Os fenômenos externos na vida ativa da criança não devem ser
considerados externamente e isoladamente pelo educador. Eles
devem sempre ser estudados em suas relações com a vida
interna como procedendo dela e a ela retornando. As próprias
crianças serão nossos guias e professores nesta consideração
dupla
...
(Pestalozzi, apud Arce, 2002, p.181)
Froebel defende que a educação precisa desenvolver o homem
integralmente: corpo, mente, espírito. Acredita que uma predisposição artí
stica
inata nos seres humanos que precisa ser cultivada. Não que deseje transformá-
los
em artistas, mas que a arte contribua para o desenvolvimento humano integral.
...É necessário, portanto, reforçar na criança a sua
capacidade criativa, a sua vontade de mergulhar no mundo-
natureza, de conhecê-lo, dominá-lo, participando da sua
atividade criativa com o sentimento e pela arte ( com cores,
ritmos, sons, figuras, etc.)...
(Cambi, 1999, p.426)
Considera também que os sentidos da criança devem ser exercitados de
modo que as deixe em liberdade para conhecer o mundo que a cerca. A
aprendizagem deve partir daquilo que a criança possui, pois a educação é um meio
de possibilitar o desenvolvimento livre, espontâneo e a capacidade de criação do
ser humano integral
.
Para que haja o autoconhecimento com liberdade da criança, são
escolhidos o jogo e a brincadeira como uma atividade capaz de ajudar a dinamizar
o processo de interiorização e exteriorização, básico para a constituição do ser
humano.
Adentrando o século XX, Freinet (1896 -1966), um homem do campo,
francês, autodidata, traz em sua proposta pedagógica influências de Rabelais,
Montaigne, Rousseau, Pestalozzi e Adolphe Ferrière. Com inúmeras críticas à
pedagogia tradicional, Freinet revoluciona o modo de ensinar, substituindo a prática
mecânica por uma proposta pedagógica que induz à ação. Pode-se até afirmar que
cria a pedagogia da ação.
Afirma que a escola tem de se modernizar (Freinet, 1977, p.13), atualizar-
se no mundo, para o aluno sentir-se motivado, interessado em aprender, em ir à
escola.
18
... Não devemos acomodar-nos por mais tempo com uma
escola que tem cem anos de atraso, com seu verbalismo,
seus manuais, seus manuscritos, o gaguejo de suas lições, a
recitação de seus resumos, a caligrafia de seus modelos. No
século do reinado inconteste da imprensa, da imagem, fixa e
animada, dos discos, do rádio, da máquina de escrever, da
fotografia, da câmara, do telefone, do trem, do automóvel e do
avião!
Freinet (1996, p.13)
Preconiza que a prática escolar e o processo de ensino-
aprendizagem
devem sempre ser atualizados, ligados aos acontecimentos sociais, ao progresso
tecnológico e vivenciados na escola. Afirma que para o aluno querer aprender é
necessário estímulo, motivação, e isso ocorre, se suas necessidades vitais são
satisfeitas. Segundo Freinet, as necessidades vitais são:
...
-
criar, inata em todo ser humano;
-
expressar
-
se;
-
comunicar
-
se;
-
viver em grupo;
-
ter sucesso;
-
agir
-
descobrir e
-
organizar
-
se.
(apud Sampaio, 1989, p.177)
A criança precisa satisfazer essas necessidades para sentir-se mais
envolvida, interessada, e querer produzir e construir seu conhecimento, sua
autonomia. Propõe um método natural, baseado em aproveitar o meio no qual a
criança vive para, a partir dele, educá-la. Fora da escola a criança corre, salta,
movimenta
-se, observa, vê, pinta, dança, e ao chegar à escola, segundo Freinet,
ela precisa continuar essas experiências e não ser reprimida numa cadeira, ho
ras
seguidas, olhando para um caderno e um quadro
-
negro.
19
Se a criança não compreendeu, é preciso explicar-lhe o que
não entra em seu entendimento. se pode explicar
intelectualmente, como se os mecanismos sensíveis dos
indivíduos funcionassem to
dos em circuito fechado no cérebro
soberano. Nunca ocorreria a um educador tradicional a idéia
de que a criança colocada em certas condições, depois de ter
feito um certo número de observações e de experiências,
possa, por si mesma, resolver certas dificuldades cujo
segredo o professor acredita ser o único a conhecer...
Freinet (apud Freinet, E., 1979, p.145)
A criança quer experimentar, correr riscos, subir em árvores, fazer
desenhos, descobrir o mundo que a cerca e é preciso deixá-la viver isso de mo
do
variado. À escola cabe aceitar e conhecer as experiências do corpo.
A criança tem necessidade de andar e saltar: não a podemos
condenar a ficar imóvel, porque certamente falharíamos e a
prejudicaríamos... Porque a criança tem necessidade de agir,
cria
r e trabalhar, isto é, empregar a sua atividade numa tarefa
individual ou socialmente útil...
(Freinet, 1974, p.49)
Freinet acredita que não educação desvinculada do corpo e
compreendia o homem como um ser integral ...é preciso aprender por meio do
c
orpo...
( apud Freinet, E., 1979, p.87).
Sua proposta pedagógica está baseada na tríade:
A liberdade, como uma manifestação da vida, deve possibilitar que cada
pessoa construa seu conhecimento com respeito, responsabilidade e cooperação. A
escola pode propor que cada aluno exponha de maneira livre seus pensamentos,
20
sonhos e alegrias, por meio de diferentes linguagens, como o desenho, os textos
livres, a pintura, o canto, o teatro, os trabalhos manuais, entre outros.
O teórico cria diferentes procedimentos de ensino, hoje conhecidos como
Técnicas Freinet, que , ao serem vivenciados no cotidiano escolar, possibilitariam
aos alunos seu desenvolvimento integral.
Os cinco sentidos e a educação integral
Esses quatro grandes educadores comentados, com filosofias que têm
pontos convergentes, apresentam reflexões sobre a importância de deixar os alunos
experimentarem e desenvolverem os cinco sentidos, base para aprendizagens e
para a formação humana em geral. Suas considerações teóricas foram feitas para
homens dos séculos passados e, por que não contextualizá
-
las para o nosso século?
Estamos no início do século XXI e podemos considerar o quanto ainda é
importante propiciar uma forma de ensino que explore os cinco sentidos, em busca da
educação integral. Damásio (1996) apresenta, a partir da segunda metade do século
XX, uma visão contemporânea, vinda da neurociência, sobre como as sensações
são organizadas, como os sentidos são importantes na aprendizagem.
No início do desenvolvimento, o bebê passa a conhecer o mundo que o
cerca pelos cinco órgãos dos sentidos, a experimentar sensações agradáveis ou não.
E conforme o progresso do seu desenvolvimento, em contato com o meio, os
sentidos vão passando para um segundo plano nesse processo, mas continuam
presentes e importantes para a aprendizagem. Vivemos numa sociedade que não nos
incentiva a explorar, experimentar e até aprender pelos cinco dos órgãos dos
sentidos, o que também se reflete na escola.
Uma proposta de educação integr
al
Como podemos observar, por séculos, a preocupação com a formação
integral e integrada do ser humano tem sido considerada fundamental por
educadores preocupados com o desenvolvimento total das crianças e jovens. A visão
21
de que a criança, além do pensame
nto e dos sentimentos, tem também um corpo que
suporte a ambos, e, pelo qual ela contata o mundo, foi enfatizada pelos teóricos
apresentados nesse capítulo.
Desse modo, relaciono suas tríades, que buscavam sintetizar as visões de
homem, educação e conh
ecimento, ao holismo, termo oriundo do grego
holon
, que se
refere
.. a um universo feito de conjuntos integrados que não pode ser reduzido a
simples somas de suas partes...
(Yus, 2002, p.15).
Ca
Cabeça, mão e coração representam o ser humano em sua totalidade.
Segundo esse entendimento, o ser precisa agir com liberdade e em contato com o
mundo e a natureza, e, por essa interação, surgem o interesse, a responsabilidade
e o aprimoramento de uma consciência mais humana, que
gera a cidadania. Desse
modo, a educação não se pode restringir aos processos cognitivos apenas; para
Rousseau, Pestalozzi, Froebel e Freinet, o desenvolvimento do ser humano ocorre
com base na interação/integração de corpo, mente e sentimentos, e a cons
ciência
pode ajudá
-
los a viver de modo mais harmônico.
Para pensar numa escola, no nosso século, que procure formar alunos a
partir dessas idéias, é necessário repensar e até construir uma prática docente que
propicie, no processo escolar, uma educação integrante. Com essa perspectiva,
realizo este trabalho e conduzo esta pesquisa.
22
O problema que me instiga, denunciado na prática docente, é a
fragmentação da visão integral do aluno, que prioriza o aspecto cognitivo ao afetivo
e motor, e chega a não reconhecer a interligação desses aspectos no processo de
ensino
-aprendizagem em sala de aula. Por esse motivo tomo por base de análise
da ação pedagógica uma visão integral: cognição, afeto e movimento e escolho
como autores inspiradores deste trabalho Rudo
lf von Laban e Henri Wallon.
No capítulo I, incorporo os estudos de Rudolf von Laban relacionados aos
fatores de movimento: peso, tempo, espaço, fluência presentes e expressos nas
ações humanas, demonstro como permitem analisar uma integração estruturada
nos níveis cognitivo, afetivo e motor no ser humano. Enfoco cada um dos fatores no
movimento, no desenvolvimento infantil e no contexto escolar.
No capítulo II, apresento a concepção walloniana de desenvolvimento
infantil, escolhida como inspiração do trabalho, a qual engloba afeto, cognição e
movimento, com enfoque na educação escolar, apontando como o professor pode
propiciar o desenvolvimento integral do aluno. Explicito um quadro com termos-
chave que nortearam a pesquisa e são mostrados como pontos de convergência
entre a teoria labaniana e a walloniana.
Para contextualizar meu campo de trabalho, uma vez que realizei minha
pesquisa em uma escola de Educação Infantil, no capítulo III, resgato
sinteticamente a história da infância no cenário mundial e o surgimento da
Educação Infantil na educação brasileira, sendo esse o meu cenário mais amplo. A
função do capítulo é apenas o de situar historicamente a infância e a Educação
Infantil.
Em seguida, no capítulo IV, apresento a pesquisa de campo feita num
a
sala de Pré - Educação Infantil. De março a junho de 2004, uma vez por semana,
num período de duas horas, observei a sala de aula, a execução do plano de aula,
o modo pelo qual a professora conduzia as atividades, e como isso repercutia nos
alunos em in
ício de alfabetização. Analiso as ações desenvolvidas a partir de cinco
categorias: os quatro fatores de movimento de Laban e mais uma categoria que
denominei afetividade (Wallon), dentro da idéia de trazer a integralidade como
expressão educativa.
A partir da análise dessas categorias, proponho, no capítulo V, orientações
para uma prática docente que tenha como foco a formação de um homem integral,
23
com base nos pressupostos teóricos da educação integral e nas concepções de
Laban e Wallon.
24
CAPÍTULO I
CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DO MOVIMENTO
HUMANO DE LABAN PARA A PRÁTICA
DOCENTE
25
Apresento Laban, com sua teoria do desenvolvimento humano, por tratar
diretamente do
movimento
2
humano, e mostrar seu direcionamento rumo à evolução
psicológica, social e educacional, em uma visão integradora. Refiro-me nesse texto
também à educação escolar mais especificamente à prática docente. Considero,
ainda, que os fundamentos teóri
cos enunciados por Wallon expressados no capítulo
seguinte mostram-se relacionados aos aspectos do movimento tal como tratado por
Laban.
O artista húngaro Rudolf von Laban (1879 1958) estudou pintura, desenho,
arquitetura, dança e dedicou sua vida para a arte do movimento. Fascinado desde
criança pelo movimento, observava-o nas plantas, nos animais, na dança dos
camponeses e, conforme crescia, continuava atento, observando os gestos dos
trabalhadores, o movimento dos pacientes em hospitais, o que o tornou um grande
pesquisador do movimento humano no último século.
Presenciou a transformação mundial do início do século XX na chegada da
Era Industrial, via os gestos humanos iniciarem um processo de mecanização
padronizada decorrente dos movimentos repetitivos nas indústrias, percebeu que
esses restringiriam a expressividade, e, conseqüentemente, tornariam as pessoas
menos sensíveis.
Sua grande preocupação passou a ser, então, o resgate dos atos
espontâneos por meio da dança, motivando as pessoas a aprenderem a pensar em
termos de movimento e a encontrar suas próprias formas de expressão.
Detectou que, pelo movimento, o homem se relaciona e interage com o
mundo que o cerca. Revela aspectos da sua vida interior ao expressar sentimentos,
pensamentos e intenções nas ações. Também os aspectos sociais, culturais,
geográficos e educacionais contribuem para determinar o movimento e
comportamento de cada pessoa.
Durante toda a vida, o homem desenvolve experiências com o movimento.
Sendo assim, precisa aprender a reconhecer seus princípios, experimentar suas
variadas formas e conhecer seu verdadeiro significado nas ações e nas relações
interpessoais.
2
O homem é concebido como ser integral que engloba o afetivo, motor e cognitivo. A partir dessa
premissa a concepção de movimento apresentada nessa tese não se fundamenta em apenas um
fragmento isolado do ser humano, e sim integrado à pessoa e relacionado ao pensamento e à
afetividade.
26
Para Laban, o movimento pode ser definido como mais um sentido e, junto
com os outros cinco, ajudar o ser humano a gerar a autoconsciência, para viver no
meio social.
Na Alemanha, em meados de 1910, elaborou a teoria
effort
shape
, que
resulta num sistema conhecido e aplicado internacionalmente, até os dias atuais, em
diferentes áreas
.
...é um método de descrição das mudanças das qualidades do
movimento em termos de modos de manifestação e em termos
de modos de adaptação do corpo no espaço. Este sistema
permite a análise e a anotação da dinâmica expressiva do
movimento.Esta anotação permite especificar:
1
a qual
idade do movimento= é o
esforço/ effort;
2
a configuração que o movimento toma no espaço
tridimensional=
forma/shape
.
(Rengel, 2003, p.101)
Para Laban, as bases desse sistema são a Corêutica e a Eukinética, termos
referentes às palavras gregas homônimas. A Corêutica estuda o movimento do
corpo no espaço e a Eukinética, as qualidades expressivas do movimento.
Suas pesquisas sempre foram mais voltadas para a criação artística em
dança, dramaturgia e mímica, mas também estuda a relação do movimento com a
saúde, a terapia, o trabalho e a educação. Por isso, toda a sua teoria do movimento
pode ser aplicável a variadas áreas do desenvolvimento humano. Apresenta
aspectos observáveis em diversas manifestações do comportamento humano que
podem ajudar a analisar o movimento nas suas mais variadas implicações e
contextualizações em diferentes áreas, como a dança, o teatro, as artes plásticas, a
educação, a psicologia, a sociologia, entre outras (Cordeiro et al., 1989; Fernandes,
2002; Serra, 1990, etc.)
Quando Laban estava em Paris, no período da Primeira Guerra Mundial,
observou o desequilíbrio motor de pacientes internados num hospício e enveredou
sua pesquisa para a relação entre os distúrbios mentais e o movimento, encontrando
na psicologia junguiana semelhanç
as com a sua teoria.
27
Sua proposta postula que o movimento é uma combinação dos fatores
espaço, fluência, peso e tempo, relacionados às funções da mente. Cada função da
mente seria evidenciada por meio de um fator, afetando sua ação
3
.
...O indivíduo que aprendeu a relacionar-se com o espaço,
dominando
-o fisicamente, tem atenção. Aquele que detém o
domínio de sua relação com o fator peso tem intenção; e
quando a pessoa se ajustou no tempo, tem decisão.
Atenção, intenção e decisão são estágios de prepara
ção
interior de uma ação corporal externa. Esta se atualiza quando
o esforço, através da fluência do movimento, encontra sua
expressão concreta no corpo.
(Laban, 1978, p.131)
Assim, conclui que o caráter, a atitude e o esforço das pessoas são
expressos nos movimentos com esses fatores combinados. Esforço foi uma palavra
empregada por Laban para designar a origem interna do movimento. É importante
ressaltar que essa origem refere-se também aos aspectos intelectual e emocional, e
não apenas físico.
...o ser humano revela sua essência através do acúmulo e
variedade do seu movimento, da sua personalidade.
(North, apud Serra, 1979, p.25)
A concepção labaniana diz que o movimento é a expressão externa do que
ocorre internamente. Comunica e expressa pensamentos e sentimentos que
interferem na formação da personalidade humana. Veremos no capítulo seguinte
que Wallon manteve a preocupação com o movimento como elemento do
desenvolvimento humano integrado à cognição e à emoção.
1.
1
Laban e a educação
La
ban não foi um especialista na área da educação, mas sempre estimulou
seus discípulos a aplicarem sua teoria nessa área. Nas escolas, sua teoria, foi
3
Adiante conceituarei esses fatores e suas relações.
28
primeiramente aplicada na Inglaterra por professores da área da Educação Física e
Arte ( dança e teatro), depois sua proposta foi desenvolvida também nos Estados
Unidos, e, nos dias atuais está presente em vários países, inclusive no Brasil. Os
professores, dessas áreas, apropriam-se da teoria para suas aulas, justamente por
esta apresentar uma visão ma
is holística sobre o movimento humano.
North (1975), uma das discípulas de Laban, estudou o movimento no
âmbito da teoria da personalidade e da psicologia geral, mas também direciona a
análise do movimento para a área da educação (1990), com orientações
didático
-
pedagógicas para as aulas de arte do movimento que são desenvolvidas com
crianças em fase de iniciação escolar até a adolescência. Outros pesquisadores
labanianos também direcionaram suas pesquisas para formações de professores da
arte do movime
nto, entre eles destaco Russel (1992) e
Preston
-
Dunlop
(1980).
Foram as concepções de Dewey e Froebel
4
que influenciaram a visão de
Laban sobre a educação, que surgiu de sua própria experiência como professor da
arte do movimento (Russel, 1958, p.15).
Par
a Laban, a educação é um processo pelo qual as qualidades das
pessoas podem ser desenvolvidas, desde que estejam contextualizadas no meio
social, histórico e cultural. Acreditava ser possível uma educação autêntica e
pioneira, se ensinada de um modo prátic
o, ao contrário do que era feito nas escolas.
Ele chama a atenção para a prática docente e salienta que, ao ministrar
suas aulas, o professor precisa estar atento aos seus gestos porque, por exemplo,
ao se expressar com gestos leves e trêmulos, pode demonstrar aos alunos
insegurança. Precisará, então, aprender a equilibrar os seus esforços de acordo com
a classe, demonstrando gestos firmes e controlando, quando necessário, o
comportamento dos alunos.
Para Laban é fundamental que todo professor aprenda a observar seus
alunos de um modo integral, com consciência de que todas as formas de expressão
escrita, canto, pintura etc.
utilizam o movimento como veículo.
4
Os pressupostos teóricos froebelianos foram apresentados na introdução desse trabalho.
29
...Pode acontecer que uma criança de movimentos vagarosos
e pesados
5
não seja um preguiçoso, mas que sua atitude
revele que está gozando do tempo de que dispõe...
(Laban, 1990, p.101)
A observação deve ser uma prática constante do professor, a fim de obter
dados para uma visão integral dos seus alunos.
1.
2
Fatores de movimento
Toda a pesquisa e a observação das ações humanas fizeram Laban
identificar elementos que compõem os fatores do movimento no ser humano,
denominados por ele de teoria
effort
-
shape
. Como sinalizei, os fatores de
movimento são: a
fluência
, o
espaço
, o
peso
e o
t
empo
.
Num corpo humano inerte, a única movimentação observável
resulta da respiração. O levantar e o abaixar alternados do
peso
do peito ocorrem no
espaço
. Também podemos ouvir
essa respiração nos suspiros. Tanto o levantar quanto o
abaixar do peito, como os sons da respiração, têm uma certa
duração de
tempo
. O movimento todo que se observa está
fluindo
continuamente, o havendo qualquer interrupção
perceptível...
(Laban, 1978, p.113, grifos meus)
Os fatores estão presentes em nossa existência em todo e qualquer
movimento que façamos desde o nosso nascimento, e, para serem expressos e
discriminados, é preciso haver uma atitude interna da pessoa. Laban define
atitude interna como a intenção expressa na ação em relação aos fatores:
espaço
,
peso
,
tempo
e
fluência
. Para North (1990), em cada pessoa, a atitude interna está
relacionada ao peso do corpo, ao tempo, que é sua experiência pessoal subjetiva, à
fluência do movimento no corpo e ao espaço, que é a atitude corporal em relação ao
campo que o
rodeia.
5
O termo pesado foi muito utilizado por Laban até meados da década de 50. Vale ressaltar que hoje
é um te
rmo pouco usado.
30
Conscientemente ou não, nos relacionamos integralmente com os fatores
de movimento e isso se estrutura nos níveis cognitivo, afetivo e motor. É preciso ter
clareza de que eles o podem ser apenas analisados e observados pela função
mecânica do corpo e sim de um modo integrado, porque, segundo Laban, num
movimento uma única pessoa que expressa sua afetividade e cognição. Essa
mesma concepção é apresentada por Wallon que vê no movimento também a
expressão de sentimentos e pensamentos. Isso será aprofundado no próximo
capítulo.
Cada fator de movimento apresenta uma função
6
, que é o aspecto que
cada um ajuda a desenvolver, e uma atitude interna de quem se move.
A citação que se segue, uma explicitação do significado dos fatores no
desenvolv
imento humano.
...os quatro fatores de movimentos caracterizam, uma vez
combinadas suas qualidades, a maneira particular de uma
pessoa se movimentar. O conjunto de padrões de
movimentos que caracteriza o estilo próprio e único de
cada pessoa enquanto anda, gesticula, etc., é o selo
particular que distingue uma pessoa da outra. Esse
conjunto é definido como o Repertório Individual de
Movimentos e ele não se repete em duas pessoas, assim
como as marcas digitais não se repetem em duas mãos.
(Serra, 1990, p.1
12)
Apresento, a seguir, cada fator de movimento com os aspectos que estão
relacionados e considerados importantes para minha pesquisa.
1.
2.1 O fator de movimento
fluência
e sua relação com o movimento, o
desenvolvimento infantil e o contexto
escolar
A
fluência
é a seqüência fácil ou obstruída de um movimento. Ela pode ser
livre
e/ou
controlada
, e, em ambos os casos, presença da tensão muscular, que
6
Os textos teóricos dos pesquisadores labanianos apresentam o termo tarefa em vez de função.
Nessa pesquisa, que possui um viés pedagógico, adotarei o termo função, por ter o termo tarefa
outra conotação na área pedagógica.
31
significa a relação entre os músculos tensionados e não necessariamente a
presença de ten
são no corpo.
A
fluência livre ocorre quando um movimento segue sem interrupção. Para
exemplificar podemos imaginar uma pessoa sentada numa cadeira querendo
alcançar um copo d água que está na sua frente, seu braço se estenderá seguindo a
direção para pegar o copo. O movimento resultante dessa
fluência
demonstra uma
ação progressiva e não apenas contínua.
A
fluência controlada acontece quando um movimento pode ser
interrompido a qualquer momento. Traz a idéia de pausa da ação. Seguindo o
mesmo exemplo d
ado, veríamos a pessoa, ao estender o braço em direção ao copo
para pegá
-
lo, ser chamada por alguém, o que interromperia sua ação.
No desenvolvimento da personalidade humana,
O fator de movimento
Fluência pode ser associado à
faculdade humana de participação com precisão ou, dito
de outro modo, de participar com progressão. Trata-
se
esta habilidade de harmonizar-se com o processo de
realizar algo, ou seja, de relacionar
-
se à ação. O indivíduo
pode controlar e bloquear o fluxo natural deste processo
ou
permitir
-
lhe um rumo livre e sem obstáculos.
(Laban, 1978, p.185)
A atitude interna que precede as qualidades do fator de movimento
relacionadas à
fluência
é a progressão. Sua função é favorecer atitudes de
integração que afetarão a expressão do sentimento. Quando controlamos ou
liberamos a realização de um movimento, estamos querendo demonstrar cuidado,
restrição ou mesmo entrega, extroversão, expansão.
O fator
fluência
sempre apoiará a manifestação da emoção
7
por intermédio
do movimento, ...os extremos e/ou as gradações entre um alto grau de abandono do
controle ou uma atitude de extremo controle, manifestam no movimento os aspectos
da personalidade que envolvem a emoção (Rengel, 2003, p.64). O movimento com
fluência livre
e/ou
controlada sempre manifestará a emoção de quem se move.
A médica psiquiatra e psicanalista Kestenberg (1977) estudou o
desenvolvimento psicossexual infantil relacionado aos quatro fatores de movimentos.
7
Laban não definia a emoção, porém Kestenberg (1977), sua discípula, considerou que desde as
primeiras reações do recém-nascido, como respiração, sucção etc., até todos os gestos mais
coordenados, junto a manifestação de estados emocionais. Na concepção de Wallon, a emoção
pode também ser refletida no próprio corpo
vide capítulo II.
32
Para ela, essa relação surge na primeira infância e favorece o
desenvolvimento
cognitivo, afetivo e motor por meio da interação e comunicação da criança com o
corpo, com a mãe e com o meio.
A
fluência
predomina no período que vai do nascimento aos três meses de
idade
denominada, segundo a visão psicanalítica, de fase oral. É observável na
respiração, na sucção, nos primeiros gestos controlados ou livres do bebê em
diferentes partes do corpo, como as mãos, os pés, o tronco.
Sua função
integração
aparece com a primeira mamada. A boca
progressivamente serve como órgão de exploração e descoberta, quando o bebê
alterna o segurar e o sentir; soltar e parar de sentir integra e regula as fluências de
tensão desorganizadas. O ato de fechar a boca, por exemplo, serve como
mecanismo de defesa na comunicação com o meio.
...Abrir será deixar a fluência livre se expandir para fora,
permitindo a extroversão, a entrega, a projeção de
sentimentos. Fechar será se conter em fluência limitada,
contraindo
-se, retraindo-se do mundo externo, se
recolhendo a uma percepção de si que exclui os outros.
(
Serra, 1996a, p.4)
A
fluência
, no contexto escolar, pode ser associada também com a função de
integrar. No processo de ensino-aprendizagem é necessário existir a possibilidade
de desenvolver a integração.
A disposição física da sala de aula afeta a organização espacial mais do que
a integração, mas a organização espacial também precisa ser considerada, porque
carteiras sempre dispostas de modo enfileirado podem interferir na qualidade
expressiva
livre
e, conseqüentemente, na vontade de querer aprender e envolver-
se
com o que ocorre naquele ambiente.
33
1.
2.2 O fator de movimento
espaço
e sua relação com o movimento, o
desenvolvimento infantil e o contexto escolar
O movimento ocorre quando todo o corpo, ou algumas de suas parte
s,
passa de uma organização espacial para outra. Mesmo sem ação corporal
8
, o corpo
ocupa um lugar no espaço e revela uma atitude latente ou explícita.
Um movimento de qualquer parte do corpo no espaço pode ser
direto/focado
ou flexível/multifocado. O movimento direto mantém uma trajetória e
explora de modo restrito o espaço; o flexível explora de modo tridimensional o
espaço.
Segundo a Corêutica, que estuda as leis que regem o movimento do corpo
no espaço, o espaço interno, que está dentro do nosso corpo e cujo limite é a
pele; o espaço pessoal, que nos cerca e pode ser alcançado pela extensão dos
membros do nosso corpo, chamado de
cinesfera
, e o espaço geral, que é o
ambiente onde nos movemos. O homem carrega o seu espaço pessoal ao mover
-
se
no espaç
o geral.
Serra salienta,
Cinesfera é também o espaço psicológico, a partir do qual
toda expressividade guarda coerência. O movimento mais
integrado e complexo surge a partir da cinesfera-
icosaedro
9
, enquanto o movimento mais primitivo surge a
partir da
cinesfera
-
tetraedro
10
.
(apud Rengel, 2003, p.33)
A cinesfera pode ser dividida em três espaços vitais: interna, média e externa.
A interna está relacionada com o esqueleto ...reflete um pensamento mais rígido e
ao investi
-
la o agente se retrai do cont
ato com outras cinesferas além da pele
(Serra,
apud Rengel, 2003, p.33). A média está relacionada com os músculos ...É gestual e
formal. Reflete um pensamento mais comunicativo, mas não de intimidade. É a
cinesfera usada no espaço social (ibid). E a cinesfera externa está relacionada com
a pele sendo elástica ... A capacidade de elasticidade da cinesfera permite ao
8
Para Laban, toda ação corporal envolve a pessoa como um todo, nos níveis físico, cognitivo e
emocional.
9
Laban escolheu a figura icosaedro, poliedro com vinte faces unidas por doze vértices, para dar
forma à cinesfera no estudo do movimento humano. (Serra , 1996c)
10
Poliedro de quatro faces.
34
agente interagir com o espaço e outras cinesferas. Por exemplo, a cinesfera
encolhe
-se no espaço público do elevador, cheio de gente, garantindo o movimento
e expande
-
se numa praia deserta ou rua com pouca gente em volta
(ibid).
No desenvolvimento da personalidade humana,
O fator de movimento Espaço pode ser associado `a faculdade
humana de participação com atenção. A tendência
predominante
aqui é a de orientar-se a si próprio e a de
descobrir um relacionamento com um objeto de interesse, seja
de modo direto e imediato, seja de modo multifocado flexível.
(Laban, 1978, p.185)
A atitude interna que precede as qualidades do fator de mov
imento
relacionadas ao espaço é a atenção. Sua função é favorecer atitudes de
comunicação que afetam a organização do pensamento. Localizar e situar-se no
espaço exige atenção e comunicação.
Em diferentes momentos da vida, é necessário estar atento tanto num
único, como em dois ou mais focos para comunicar e relacionar-se com o outro e
com o meio. Entretanto Serra (1990, p.121) salienta ...o uso exagerado de multifoco
leva a uma estado de confusão, enquanto o uso extremo de espaço direto orienta o
pensa
mento para a atenção focalizada que, no seu exagero, afeta o pensamento na
rigidez e visão estreita da situação.
Uma pessoa que tem movimentos flexíveis, tem uma atenção multifocada,
aberta ao que a cerca; consegue, por exemplo, estender a mão para cumpr
imentar
um colega e, ao mesmo tempo, acenar com a cabeça para outra pessoa e
continuar andando. Quem tem movimentos mais diretos apresenta uma atenção
concentrada, com foco direto; ela só estenderia a mão para o primeiro colega
olhando em seus olhos e co
m todo o foco do seu corpo para a mesma direção.
Esse indivíduo em movimento indireto pode estar atento a
todos esse focos ...ou pode estar totalmente desatendo a
todos. Neste último caso, ele não apresenta Mudanças na
Qualidade do Foco Espacial. O foco indireto não deve ser
confundido com a falta de atenção ao espaço, que ocorre
quando não se tem nenhum foco
nem um único (direto)
nem muitos simultâneos (indireto)..
.
(Fernandes, 2002, p.108)
35
A ação corporal flexível/multifocada demonstra uma personalidade mais
adaptável, menos rígida, e a direta/focada, mais convencional, objetiva.
Segundo Kestenberg (1977), do 3
o
. ao 5
o
. mês de vida predomina o fator
espaço
no desenvolvimento infantil e se estende mais ou menos até um ano de
idade. Até então, a boca era o órgão de exploração do bebê com o mundo; agora, a
mão sai da cavidade bucal e começa a explorar o espaço em volta do corpo.
Surge a função do espaço
comunicação quando a criança começa a
comunicar
-se com a mãe e com os objetos que a circundam. Ao explorar o espaço
externo, desenvolve a atenção e o início do pensamento.
Não se deve confundir fator
espaço
atitude em relação ao meio
com
organização espacial, ou seja a forma como o corpo se acomoda no espaço. Na
organização espacial focaliza-se a cinesfera e não a atitude interna e, como
conseqüência, podemos ter a presença de outros fatores de movimento que estarão
relacionados. Ressalto que nenhum fator é totalmente isolável, pois as situações
são integradas e interdependentes. Por exemplo, um criança sentada na última
carteira da sala de aula pode apresentar uma reação emocional de encolhimento, se
analisada pelo fator
fluência
.
Os alunos numa sala de aula com carteiras dispostas de modo enfileirado
têm a expressividade limitada, o que gera uma relação com a aprendizagem que
exige concentração pelo uso do espaço direto, pela atenção focalizada na lousa, na
professora, favorecendo a relação vertical mais do que a circular.
Se os alunos estiverem sentados em pequenos grupos ou semicírculo,
será
necessário uma expressividade que flua para fora,
livre,
usando tanto o espaço
flexível
quanto o direto, porque terão que se comunicar e interagir uns com os
outros, numa relação com a aprendizagem de exploração.
O professor deve propiciar momentos no processo de ensino-
aprendizagem
que exijam dos alunos tanto uma atitude de busca e exploração no espaço flexível
quanto uma atitude de concentração fixada mais no
espaço direto
.
36
1.
2.3 O fator de movimento
peso
e sua relação com o movimento, o
desenv
olvimento infantil e o contexto escolar
Um corpo em movimento exerce uma força que pode ser firme ou leve. O
peso
expresso numa ação não tem relação com a quantidade de massa muscular
presente num corpo, porque uma pessoa obesa pode ter gestos leves e uma magra,
gestos fortes.
Pela própria gravidade da Terra, os movimentos firmes tendem a acontecer
na direção de baixo para cima, enquanto os leves tendem a ocorrer do alto para
baixo. A musculatura e o tato possibilitam a produção e a percepção da firmeza no
corpo em movimento.
Todo o corpo ou partes dele movem
-
se de modo
leve
ou
firme
e o uso
apropriado do
peso
favorece a eficiência de energia do movimento.
Ainda,
O fator de movimento-Peso pode ser associado à
faculdade humana de participação com intenção. O
desejo de realizar certa coisa pode apoderar-se da
pessoa às vezes de modo poderoso e firme e, em outras,
leve e suavemente.
(Laban, 1978, p.185)
A atitude interna que precede as qualidades do fator de movimento
relacionadas ao
peso
é a intenção. Sua função é favorecer atitudes de
assertividade e afetar a apropriação da sensação. Os movimentos
leves
revelam
bondade, suavidade ou asuperficialidade, enquanto os
firmes
indicam firmeza,
resistência, determinação e poder.
O fato, por exemplo, de reencontrar um grande amigo muito tempo não
visto provoca uma atitude de abraçar de maneira
firme
ou
leve
, confirmando a nossa
vontade.
Entre um e três anos, a criança descobre o
peso
ao mexer nos objetos que
encontra, jogando-os e pegando-
os
do chão. Experimenta a força da gravidade ao
ficar em pé; desloca
-se no espaço carregando o próprio peso do corpo. Suas pernas
e o tronco são o suporte, enquanto as mãos e os braços deixam de servir apenas
como ferramentas de apreensão dos objetos ou para apoio no engatinhar e ficar em
37
pé. Experimentar a posição vertical, carregar o próprio corpo dão início à
experiência de ser autônomo.
A atitude interna intenç
ão
aparece ao desejar conhecer as partes do
corpo, os objetos que a cercam e ao se confrontar com quem se opuser às suas
vontades. A função assertiva ajuda a desenvolver o sentido de força de vontade e a
aprender a contornar as dificuldades que surgem de maneira firme e sensível, ou de
maneira obsessiva ou frágil, se houver exagero ou falta de intenção apropriada à
intenção. Ao internalizar as qualidades do peso, a criança é capaz de atribuir
qualidades opostas a um mesmo objeto ou pessoa, e aprender a dicotomia: sim ou
não.
No contexto escolar, no ato da escrita, a criança em fase da alfabetiz
ação
está aprendendo a sentir o
peso
da mão no papel e demonstrando a sua intenção. A
força de vontade, a persistência para aprender a escrever podem ser
leves
ou
firmes
e revelar outros aspectos de sua sensação, do seu desejo de autonomia de
expressão.
1.
2.4 O fator de movimento
tempo
e sua relação com o movimento, o
desenvolvimento infantil e o contexto escolar
O movimento tem uma duração para acontecer. A distância na duração
determina a velocidade do movimento, que pode ser acelerada ou desacelerada
.
Os conceitos qualitativos para o fator
tempo
usados por Laban são:
sustentado
e
súbito
. Nesta pesquisa, usarei os termos
lento
e
rápido
, que também
são usados por pesquisadores labanianos.
Um movimento ou ruído com intervalos regulares repetidos
possui um
ritmo
.
Existem diversos ritmos no universo, como o da órbita dos planetas, das estações do
ano, das fases da lua, etc. Toda espécie de vida no planeta Terra procura adaptar-
se a essas variações periódicas, para que possam ocorrer, por exemplo, os ciclos
migratórios das aves, os períodos de acasalamento dos animais etc.
Nós humanos, como parte integrante da natureza, também possuímos um
ritmo interno, expresso na pulsação cardíaca, no ciclo menstrual, no ciclo dos
órgãos
38
vitais etc. O ritmo é único e individual em cada um de s e observável em
diferentes situações do cotidiano.
O ritmo corporal,
...é a adequação do homem`as diferentes situações da
vida, que é diferente para cada pessoa. É a forma de lidar
com o tempo nas transições entre m
ovimentos ou ações.
(Cordeiro et al., 1989, p.54)
Desenvolver a consciência de que temos um ritmo corporal é importante para
buscarmos uma harmonia e um equilíbrio com o ritmo externo da sociedade em que
vivemos.
No desenvolvimento da personalidade,
O fator de movimento-Tempo pode ser associado à
faculdade humana de participação com decisão. As
decisões podem ser tomadas ou inesperada e
subitamente, deixando que uma coisa desapareça e seja
substituída por outra, num dado momento, ou aos poucos,
havendo, neste caso, a manutenção de algumas
condições prévias, por um certo período de tempo.
(Laban, 1978, p.185)
A atitude interna que precede as qualidades do fator de movimento
relacionadas ao
tempo
é a decisão. Sua função é favorecer atitudes de
operac
ionalidade da intenção, que ajudam a execução e afetam o poder de intuição
e da decisão da pessoa. ...o uso do tempo rápido ou acelerado do movimento
outorga à ação a presteza própria das decisões intuitivas enquanto o tempo lento
torna a ação vagarosa e
protelada
(Serra, 1990, p.121).
Quando precisamos dar uma resposta para algo em nossa vida pessoal ou
profissional, e ainda não temos certeza do que realmente desejamos, procuramos
prorrogar o tempo por não ter decidido nada; se temos essa decisão, agi
mos
rapidamente. Um adolescente, por exemplo, que pretende pedir para os pais para ir
a uma festa no final de semana, começa rodeando a mãe, que não está atenta à
ação do filho; ele ainda o faz o pedido, a rodeia; ele desenvolve sua função de
opera
cionalidade: analisa o contexto da situação
é a intuição
e decide fazer o
pedido.
O
tempo
é o último fator observado por Kestenberg (1977) no
desenvolvimento infantil. É predominante dos três ao cinco anos, período em que a
39
criança começa a entender que a sua ação provoca uma reação. Por exemplo, ao
bater num colega na classe e a professora chamar sua atenção depois, a criança
perceberá entre os dois acontecimentos a relação de causa e efeito, duas instâncias
no tempo; construirá uma noção do tempo que envolve seqüência e continuidade
pelas experiências nas relações sociais. Verá posteriormente que suas decisões
provocam uma resposta externa.
A criança, após ter vivenciado cada uma dessas fases e experimentado
cada um dos fatores, inicia um processo de integração, combinando tudo isso, e
delineando seu repertório individual de movimento
11
.
Cada pessoa possui um ritmo corporal interno que precisa harmonizar-
se
com o ritmo externo da sociedade. A criança na escola realiza suas obrigações,
locomove
-
se
pela sala de aula no seu tempo e com seu ritmo? A distribuição das
atividades escolares nem sempre considera essas questões. O
tempo
prevalece de
modo único, para que todos os alunos desenvolvam a mesma atividade no tempo
pré
-determinado pela estrutura escolar, ou pelo professor em sala de aula. Lembro
novamente a integração funcional dos fatores.
No próximo capítulo apresentarei as concepções de Wallon sobre
desenvolvimento infantil direcionadas para a escola, mais especificamente para a
prática docent
e.
11
Segundo Serra (1996b), cada pessoa desenvolve o repertório individual de movimento e os traços
da personalidade duran
te a vida e todas as experiências significativas vividas alterarão a estrutura da
personalidade e o repertório de movimentos.
40
CAPÍTULO II
A CONCEPÇÃO WALLONIANA SOBRE
DESENVOLVIMENTO INFANTIL: AFETIVIDADE,
COGNIÇÃO E MOVIMENTO NA EDUCAÇÃO
ESCOLAR
41
Inspirando
-me em Wallon, abordarei alguns aspectos de sua pesquisa e
teorizações que tê
m relação com minha pesquisa.
O médico psiquiatra francês Henri Wallon (1879 1962) enveredou, no
decorrer dos seus anos como pesquisador, na psicologia da criança. Sua teoria de
desenvolvimento humano nasce na tese de doutorado: A criança turbulenta
,
pu
blicada em 1925.
Wallon é considerado um interacionista, por relacionar o desenvolvimento
humano com o meio. Aponta que todo ser vivo mantém uma relação de troca
evolutiva com o meio e apresenta algumas distinções para os tipos de meios.
Conforme Werebe e Nadel-Brulfert (1986, p.20) explicam: meio físico-
químico
,
básico para todas as espécies vivas; o meio biológico, que propicia o convívio entre
as várias espécies diferentes e ações recíprocas entre elas; e o meio social,
formado em diferentes condições coletivas e carregado de representações
simbólicas e culturais. Todos esses meios estão relacionados e se transformam-
se
na interação.
A escola é definida como um meio funcional (Wallon, 1979, p.164), onde a
criança vai adquirir novas aprendizagens além das adquiridas no meio familiar,
conviver com crianças que vêm de outros meios sociais. Wallon considera o meio
escolar indispensável durante o desenvolvimento da criança, por se compor de
situações bem diversificadas que contribuirão com o seu progresso motor, afetivo e
social.
Na psicologia do desenvolvimento humano, teóricos, como Piaget,
enfatizam as estruturas cognitivas, Vigotsky, a relação cognitivo-social, Wallon
considera os aspectos cognitivo, biológico e social, incluindo também o afetivo. o
há, para Wallon, o predomínio de apenas um aspecto durante o desenvolvimento
humano, mas, em cada fase, o predomínio de um aspecto sem haver a exclusão
dos outros, todos atuam concomitantemente.
Wallon na psicologia genética o ponto de origem para conhecer o que
ocorre no desenvolvimento humano, concebendo-o como uma integração entre o
organismo, o meio e os domínios funcionais. A fim de melhor analisar e
compreender o ser humano, Wallon estabelece categorias, denominadas
domínios
funcionai
s
ou
conjuntos funcionais, que são: a afetividade, o ato motor, o
conhecimento e a pessoa. Ressalta, porém, que:
42
As necessidades de descrição obrigam a tratar separadamente
alguns conjuntos funcionais, o que não deixa de ser um
artifício, sobretudo de início, quando as atividades estão ainda
pouco diferenciadas...
(Wallon, 1995a, p.131)
Os
domínios
ou
conjuntos funcionais estão integrados e são expressos nas
atividades da criança, que conseqüentemente é concebida numa visão integral:
cognição
12
,
afeto
e motricidade, sempre articulados ao meio.
... A ótica walloniana constrói uma criança corpórea, concreta,
cuja eficiência postural, tonicidade muscular, qualidade
expressiva e plástica dos gestos informam sobre os seus
estados íntimos. O olhar se dirige demoradamente para sua
exterioridade postural, aproveitando todos os indícios. Supõe-
se que a sua instabilidade postural se reflete nas suas
disposições mentais, que a sua tonicidade muscular
importantes informações sobre seus estados efetivos.
(Dan
tas, apud Galvão, 2002, p.98)
Compreender o ser humano é observar o seu comportamento que, para
Wallon, é a união dos sentimentos, atitudes e ações expressas no movimento
corporal.
O teórico separa o desenvolvimento infantil em diferentes estágios; afir
ma
que a duração de cada um pode variar de acordo com o meio, com as experiências
de cada indivíduo. Em cada estágio a criança apresenta comportamentos bem
diferentes. Essas fases não se sobrepõem, mas há uma relação de integração nelas.
A cada nova fase
predomina
um
conjunto funcional a que Wallon (1995a, p.111)
denomina
alternância funcional.
A afetividade predomina no estágio do
personalismo
dos três aos seis anos , quando o direcionamento do seu desenvolvimento
13
está
voltado para si próprio. a cognição predomina no estágio
categorial
dos seis
aos onze anos , quando o desenvolvimento dirige-se para o outro, para as
descobertas. Mas há integração contínua dessas fases, cujas características são
intercorrelacionais.
Para esta pesquisa, interessa particularmente o estágio do personalismo,
que
está centrado na formação da personalidade e no qual ocorrem inúmeras
12
A cognição, um dos conjuntos funcionais, se transforma em conhecimento mediante as
experiências concretas vividas.
13
Desenvolvimento para Wallon é um processo constante, contínuo, em aberto, e depende
exclusivamente das exigências do meio.
43
transformações de ordem pessoal. A construção da consciência corporal, segundo
ele, é o primeiro passo para a criança formar-se como pessoa. Ela volta-se para a
construção do eu, passa a ver-se como pessoa, e para isso precisa manter relações
sociais variadas, o que gera, conseqüentemente, uma certa autonomia, uma
consciência individual e a consciência de grupo. Surge aí a distinção eu
-
outro.
A relação com o meio, com a família e a escola contribui para o
desenvolvimento da personalidade. A escola é uma grande influência nesse estágio,
porque a criança está, nessa fase, aprendendo a conviver no coletivo.
Wallon aponta que, ao longo desse estágio, operam três fases:
oposição,
sedução e imitação.
A terceira fase
imitação
ocorre por volta dos cinco anos:
...
Os méritos que a criança encontra em si própria
não lhe chegam; são os méritos dos outros que gostaria
de ostentar. Procura à sua roda, não apenas
admiradores, mas modelos...
(
Wallon, apud Almeida, 1999, p. 75)
A criança, nessa fase, procura no seu meio alguém que admira, e passa a
imitá
-la. Pela teoria walloniana, a imitação é importante para a construção
dos
diferentes papéis que a criança copia e que a auxiliam na formação da
personalidade, além de propiciar uma maior integração no desenvolvimento
perceptivo e motor.
no início do estágio, a criança interessa-se pelo conhecimento do mundo
exterior em di
ferentes campos.
No campo físico, é capaz de diferenciar, assimilar, comparar os elementos
do mundo que a cercam. Socialmente, aprende a viver em grupo. É importante para
a criança viver as relações interpessoais, porque estas auxiliam no desenvolvimento
intrapessoal.
No campo motor, adquire gestos mais precisos e passa a selecionar o mais
adequado à ação a ser realizada. Cognitivamente, aprende a ler, combinar letras e
conhecer quantidades numéricas.
O estágio categorial é o estágio da inserção escolar e contribui para o
desenvolvimento, por levar a criança a aprender a se conhecer como pessoa que
pertence e convive em diferentes grupos.
44
...no início da idade escolar, que a criança se torna capaz
de procurar para si um lugar num grupo cujos membros
o livres de a aceitar ou de recusar.
(Wallon, 1979, p.171)
Nas experiências sociais, repletas de interações diversificadas no meio
escolar, a criança aprende a comportar-se como pessoa, pois tem de desenvolver
variadas condutas sociais, o que contribui para a formação de sua personalidade e
da consciência de si.
Quanto à afetividade, segundo Wallon, pela maturidade dos centros nervosos,
irá preceder a inteligência no desenvolvimento humano, porém, tanto a afetividade
quanto a inteligência evoluem ao longo da vida, conforme a criança se desenvolve.
As necessidades afetivas vêm a se tornar cognitivas e vice
-
versa.
Afetividade e inteligência, na perspectiva walloniana, são inseparáveis,
apresentam funções definidas e, estando integradas, contribuem para o
des
envolvimento infantil. O surgimento e o desenvolvimento da personalidade
ocorrem pela evolução tanto da afetividade como da inteligência.
Afetividade é uma categoria macro em Wallon, que integra relações afetivas,
como a emoção, o sentimento e a paixão. O desenvolvimento da afetividade ocorre
na interação entre o orgânico e o social.
45
As emoções são manifestações orgânicas, os sentimentos são
representados a partir do orgânico, e a paixão, para desenvolver-se, necessita de
um autocontrole dos sentimentos e das emoções. Emoção e sentimento não se
confundem, porque a primeira manifesta um estado subjetivo repleto de
componentes orgânicos e tônicos, que são expressos de modo instantâneo. o
sentimento surge de reações mais p
ensadas, revelando um estado mais durador.
Apesar de Wallon falar de emoção, sentimento e paixão como diferentes
manifestações da afetividade, em seus relatos de pesquisa, dedicou-se muito mais à
emoção.
A emoção é um fato fisiológico em seus component
es humorais e motores...
É uma reação organizada, que se manifesta pelo sistema nervoso central e faz parte
da espécie humana. Mas não é fisiológica, é também social ...é um
comportamento social nas suas funções arcaicas de adaptação, possibilitando a
interação entre o homem e o meio social (Zazzo, apud Wallon, 1995a, p.15).
A emoção apresenta três mecanismos de ação, perceptíveis socialmente, a
contagiosidade
, que é a capacidade de contagiar as pessoas próximas, a
regressividade, que é a possibilidade de regredir um raciocínio, e a
plasticidade
,
que reflete no próprio corpo os sinais da emoção.
Na verdade, a emoção usa o corpo como veículo para expressar-se e o
esculpe no meio social. Isso pode ser observado pelas expressões faciais, posturais
e até pelas expressões menos perceptíveis, como aceleração do pulso, salivação,
sudoração, etc. Desse modo, a expressão corporal atua fortemente nas relações
interpessoais.
Os primeiros atos orgânicos e fisiológicos do recém-nascido apresentam
um caráter emocional;
...desde o início, a aceleração do pulso, a salivação, a
umidade da pele e muitos outros efeitos menos visíveis,
associados às contorções do tronco e dos membros,
confirmam a estreita dependência da emoção frente ao
sistema postural, reações tônicas dos músculos e das
vísceras vegetativas e glandulares
.
(Wallon, 1995b, p.72 )
46
Desde o nascimento, surgem reações orgânicas, fisiológicas e reações por
conseqüência do meio. Elas estão ligadas ao desenvolvimento funcional, que
amadurece em cada indivíduo. as reações de origem
interoceptiva
, relacionadas
ao funcionamento das funções vitais: respiração, movimentos da cabeça, sono,
sucção, visão, grito, etc.; o manifestadas como garantia de sobrevivência nos
recém
-nascidos e permitem sentir nossos órgãos; as
proprioceptivas
,
relacionadas
ao funcionamento do tônus (ligado às vísceras ao sistema muscular), articuladas às
sensações do equilíbrio e do movimento do corpo; e as de origem
exteroceptiva
,
relacionadas ao estímulo do ambiente externo, envolvendo os órgãos dos sentidos
e não somente aos estímulos intra-orgânicas (Wallon, 1995b, p.36, 42, 47). A
emoção une o individual, o social, o corporal e o cognitivo, e essa ligação gera uma
comunicação fusionada.
O que provoca uma emoção são fatores de ordem social e psíquica na vida
de cada pessoa. É a primeira forma de adaptação do homem ao meio e tem um
grande poder de contágio
um mecanismo de ação da emoção , porém, da
mesma forma que contagia o outro, ela necessita dele para expressar-se com mais
ardor. Uma criança, ao chorar, terá o seu estado emocional aumentado na presença
de pessoas e poderá diminuí
-
lo se não houver ninguém por perto.
É preciso crer que esse caráter contagioso e coletivo da
emoção teve, não apenas sobre a sua própria evoluçã
o,
mas na história do homem, uma importância decisiva,
para que tenha sido sistematicamente cultivado, com a
ajuda de práticas primitivas. Nas cerimônias, jogos e
danças que acompanham tantos atos da vida pública ou
individual, é fácil reconhecer simulacros próprios para
suscitar em todos os participantes, sob formas e através
de meios rigorosamente determinados, uma excitação e
arroubos que correspondem às diversas variedades de
emoção. Fazer com que, nas mesmas circunstâncias e ao
mesmo sinal, todos realizem simultaneamente os
mesmos ritmos, gestos e atitudes, é evidentemente
uniformizar, ao mesmo tempo que desenvolver, os efeitos
da emoção; é fazer com que haja identidade de reações e
comunhão de sensibilidade em todos. Assim, cada
indivíduo se unido aos demais pelo gênero de
manifestações que o revelam de imediato a si mesmo. Ele
pertence ao grupo por suas modificações mais íntimas e
pessoais, em lugar de se justapor simplesmente a outros
indivíduos...
(Wallon, 1995b, p.99)
47
Pelo contágio, a emoção provoca reações e propicia relações interpessoais
e a fusão da vida em grupo
14
, tanto para a criança que necessita da presença do
outro para expressar uma forte emoção, quanto para um grupo de pessoas reunidas
com um mesmo objetivo.
Como assinalei, emoção e inteligência são inseparáveis no
desenvolvimento humano; apesar de apresentarem um caráter antagônico,
complementam
-se. Do mesmo modo que a emoção está na origem da produção
intelectual, pode também, em alguns momentos da ação do homem, impedir uma
re
flexão mais objetiva
outro mecanismo de ação da emoção. Isso significa uma
sobressair
-se e a outra, permanecer mais latente, porém, ambas estão sempre
presentes, entrecruzando
-
se.
Numa crise emocional, no caso de adultos, a inteligência pode contribuir
para dissipar a emoção, devido ao surgimento e à conseqüente atuação da razão.
para as crianças, ...é lento o progresso das suas reações puramente ocasionais,
pessoais, emocionais, até alcançar uma representação mais estável das coisas...
(Wallon, 1995a, p.144). Wallon nos alerta que o grande desafio é buscar o equilíbrio
entre a razão e a emoção.
Uma das características marcantes da espécie humana é a linguagem, mas
não o desenvolvimento dela sem as relações sociais. O vínculo que a emoção
provoca
entre os seres humanos propicia o acesso à linguagem, principalmente para
a criança em desenvolvimento. uma estreita relação entre emoção e linguagem,
a primeira precede a segunda, e ambas favorecem o desenvolvimento cognitivo.
O tônus, também, está relacionado à emoção e vice-versa. Para Wallon, o
tônus não é apenas a capacidade de locomoção, ...a emoção, qualquer que seja a
sua nuance, tem sempre como condição fundamental variações no tônus dos
membros e da vida orgânica (Wallon, 1995b, p.74). Assim, as diferentes
manifestações emotivas vividas nas relações sociais, interpessoais e individuais são
perceptíveis no tônus postural.
14
Para Wallon (1986), grupo é uma reunião de indivíduos tendo entre si relações que notificam a
cada um o seu papel ou o seu lugar
dentro do conjunto.
48
Moldado simultaneamente pelas variações produzidas
tanto no ambiente como nas vísceras e na atividade
própria do indivíduo, o tônus é de fato constituído para
fornecer uma base material à vida afetiva...
(Wallon, 1995b, p.141)
Ao estudar o desenvolvimento humano, Wallon observa que o tônus está
presente no domínio afetivo, motor e do conhecimento. Considera-o uma teia
constituída de afeto e de extrema importância para a inteligência. O tônus sempre
reage a variações musculares, viscerais, dos sentidos e do ambiente. Essas
variações podem ser hipertônicas ou hipotônicas:
...
sua diversidade prende-se à hiper ou à hipotensão do
tônus, ao seu livre fluxo em gestos e ações, ou `a sua
acumulação sem saída e utilização in loco por
espasmos...
(Wallon, 1995b, p.161)
Cada pessoa tem características individuais hiper ou hipotônicas,
demonstradas nas relações e ações. No entanto, Wallon ressalta que o fato de uma
pessoa estar hipotônica não significa que nunca experimentará o outro estado,
porque se for exposta a uma situação de perigo, a pessoa hipotônica mudará seu
ritmo interno.
Laban traz uma definição de ritmo similar à concepção walloniana, ao afirmar
que todo ser humano tem um tempo orgânico, corporal e individual e um ritmo
interno único, que pode ser observável em diferentes situações do cotidiano.
É fundamental levar em consideração as necessidades tônico-
posturai
s no
contexto pedagógico, adequando o tamanho de mesas e cadeiras ao tamanho da
criança e variar posições
sentar nas cadeiras, no chão, ficar de - durante a
aula. Wallon ensina que permanecer imóvel por um longo período é prejudicial, o
que é confirm
ado pela fisiologia.
Também a forma de atuação do professor, em alguns momentos da cena
escolar, pode provocar um estado de hipotonia, com espasmos e sentimento de
culpa, e gerar uma inabilidade mental, prejudicando o aluno no prosseguimento das
atividad
es escolares.
49
...Há crianças que se entorpecem quando sua atividade
mental ou sua compreensão são muito diretamente, muito
pessoalmente solicitadas, quando ficam face a face com o
professor ou com aquele que tem o hábito ou a pretensão
de exercer constrangimento sobre sua inteligência ou sua
conduta.
(Wallon, 1995b, p.121)
Podemos considerar diferentes emoções. Wallon, ao estudar o tônus corporal,
relaciona
-o também ao emocional e não apenas a capacidade de locomoção.
Identifica a existência de emoções hipotônicas que reduzem o tônus, como, por
exemplo, a tristeza e o medo, e hipertônicas, que geram o tônus, como a alegria e a
cólera. Destaca diversas emoções e todas são expressas nos dois estados do tônus.
Dentre as diferentes emoções, evidenciam-se as manifestações da alegria,
que surgem primeiramente como um prazer; ela ...nasce com a facilidade dos
movimentos...
(Wallon, 1995b, p.120) e é perceptível nos bebês quando são
acariciados e demonstram uma excitação motora, balbucios, etc. E pode ser
observada nas crianças pequenas, que saltitam quando pegam o brinquedo que
querem, ganham o doce esperado, entre outras. Pelos estudos de Wallon, a alegria
possui uma forte relação com o movimento.
alegrias tranqüilas, como as que se caracterizam ...
me
nos pela
exuberância das manifestações motoras do que pela preservação de um equilíbrio
exato entre as flutuações posturais e a atividade de relação... (Wallon, 1995b,
p.114). Existe a probabilidade de que a alegria seja uma emoção advinda
diretamente da atividade de relação. Ela se expressa num estado de hipotonia,
porque a pessoa está contagiada por uma situação prazerosa, agradável, e seu
tônus fica relaxado.
O medo origina-se da sensibilidade orgânica e se reflete no desequilíbrio
postural, o aparecim
ento de uma cena habitual ou inusitada e representa, tanto para
a criança quanto para o adulto, a sua segurança pessoal ameaçada.
... À medida que o medo se desloca da surpresa causada
pelo evento inesperado para o temor pelo acidente
temido, torna-se menos que fobia, e os efeitos
hipertônicos da angústia substituem os estados de
hipotonia ou de catalepsia que respondem aos casos de
pavor e terror.
(Wallon, 1995b,
p.131)
50
Expresso num estado de hiper ou hipotonia, dialeticamente, o medo pode vir
a gerar emoções agradáveis para algumas pessoas. A criança, por exemplo, na
atividade de jogo, pode transformar o medo em divertimento, como na brincadeira de
esconde
-
esconde.
Diferentes excitações corporais e viscerais originam a cólera, mas ela parece
estar mais relacionada ao interpessoal. Desenvolve-se em duas direções opostas,
centrípeta e projetiva:
A cólera centrípeta é aquela em que domina a angústia. É
mais freqüente na criança do que no adulto, na mulher do
que no homem, porque está mais perto de suas origens
orgânicas. A cólera projetiva, feita de reações sobre o
meio, que faz o ambiente participar de suas
manifestações, que se exterioriza em cenas mais ou
menos expressivas, que pode exercer uma ação de
intimidação sobre os demais, é uma forma mai
s
socializada, mais evoluída
. ...
(Wallon, 1995b, p.126)
A tristeza é para Wallon a mais evoluída e a mais socializada das emoções.
No sofrimento, a pessoa precisa ver a si própria. É como uma volta ao
estágio
personalista
pela consciência antes de si e
depois do outro.
Apesar de haver pouca ação corporal pelo fato de a pessoa triste não querer
se movimentar, e sim permanecer inerte, há um acúmulo de emoção no tônus,
configurando
-
se então como uma emoção hipertônica.
São muito diferentes as manifesta
ções igualmente tônicas
observadas nos emotivos propriamente ditos. Elas m
relações íntimas com a excitação, dela procedem,
desenvolvem
-na e por ela são desenvolvidas. É fácil
reconhecer no emotivo uma sensibilidade amplamente
aberta às influências orgânicas, às impressões obscuras
e confusas que traduzem as modificações viscerais, as
disposições e atitudes pessoais do indivíduo. Essa
sensibilidade retém, a mesmo das impressões
recebidas do exterior...
(Wallon, 1995b, p.115)
51
2.1
Emoção no cont
exto escolar
A escola tem papel fundamental na formação do indivíduo, porque diferentes
situações são vividas, as relações interpessoais são construídas e novas
aprendizagens podem surgir devido à cumplicidade afetiva estabelecida entre o
professor, o aluno e o grupo da classe, o que estimulará o processo de
aprendizagem. Tudo servirá como base para o desenvolvimento dos educandos.
Pela teoria walloniana, o aluno é concebido como uma pessoa integral, na
qual os aspectos cognitivo, afetivo e motor apres
entam
-
se interligados, uma vez que
o desenvolvimento harmônico desses aspectos é o ideal.
...é uma pessoa concreta, constituída tanto de sua
estrutura orgânica como de seu contexto histórico, e traz
inúmeras possibilidades de desenvolvimento que podem
se
r efetivadas conforme o meio lhe ofereça condições...
(Almeida, 2004, p.118)
É preciso considerar que as experiências vividas na escola têm uma grande
influência no desenvolvimento afetivo, motor, cognitivo e também social da criança.
Perceber a existência da relação entre afeto, cognição, movimento e meio social no
desenvolvimento humano é importante, a fim de promover o desenvolvimento
harmonioso de todos na ação pedagógica.
Sem deixar de lado essa integração, abordarei individualmente cada
domínio fu
ncional
(Wallon, 1995a), para refletir sobre a sua percepção por parte da
escola e do professor, na construção da prática pedagógica, e as conseqüentes
interferências na busca de uma formação integral.
2.1.1
O motor
A visão equivocada sobre o corpo e seus movimentos na escola já foi
analisada por muitos teóricos e inúmeras contribuições sobre a questão, algumas
apresentadas na introdução desta tese. Mas isso infelizmente ainda não reflete o
52
modo pelo qual se tem enfrentado o assunto nas salas de aula, pois dos alunos
ainda é exigido que continuem parados, sentados, por horas, ouvindo o professor.
Essa prática reflete uma visão equivocada, que considera o corpo e o
movimento como um empecilho no processo de ensino-aprendizagem: quanto mais
o aluno permanece parado, menos atrapalha o planejamento pedagógico e mais se
acredita na sua possibilidade de produção intelectual. Dentro da mesma ótica, o
movimento, erroneamente, está associado à indisciplina, à falta de atenção.
O movimento, no entanto, por ser uma manifestação da emoção, pode
expressar um estado desencadeado em determinado momento da aula, como a
alegria, que resulta numa agitação corporal, ou o medo, que gera a imobilidade.
Para Wallon o movimento corporal é considerado ...uma atividade de
relação da pessoa consigo mesma, com os outros e com o meio, na qual são
expressos conhecimentos e valores (Limongelli, 2004, p.59). Deve, com isso, haver
um olhar atencioso dos professores aos movimentos corporais dos alunos. O
movimentar
-se faz parte dos processos de desenvolvimento e contribui para a
constituição do cognitivo e do afetivo.
2.1.2
O afeto
Os educadores têm dificuldade, muitas vezes, de interpretar a emoção,
sobretudo por não compreender seu verdadeiro significado e desconhecer seu
fu
ncionamento, tanto fisiológico quanto social. Confunde-se emoção com
sentimento, sendo a primeira mais instantânea, podendo ser observada por reações
tônicas musculares. o sentimento tem uma ação mais duradoura e, ao mesmo
tempo, mais difícil de ser ob
servada por reações tônicas.
O tema emoção raramente é enfrentado e discutido no contexto escolar de
forma mais clara, e desconhece-se seu verdadeiro significado; por isso, muitas
vezes, incertezas de como conduzir e administrar situações emotivas. A es
cola,
com seus atores: direção, coordenação e principalmente corpo docente, precisa
conhecer e refletir sobre o papel da emoção nesse cenário de aprendizagens.
Citando Tran-Thong, aponto os riscos, segundo Wallon, de uma educação que
desconsidere o afeto
.
53
A vida passional afetiva é a origem mais poderosa da
ação. Mas ela obnubila o espírito crítico e pode
desenvolver o fanatismo. Uma educação exclusivamente
intelectualista que a deixaria ao abandono corre o risco de
se tornar o instrumento das conseqüên
cias mais funestas.
O exemplo do país fascista onde a inteligência tem sido
depreciada e o instinto exaltado... mostra a quais
aberrações selvagens ele pode chegar. Para evitar o
retorno de uma barbaridade semelhante, é necessário
educar a sensibilidade co
njuntamente com a razão.
(
apud
Almeida, 2004, p.104
-
105)
Na escola a criança vive diferentes emoções e inúmeras relações
interpessoais são construídas. O professor precisa estar muito atento à observação
de algumas emoções surgidas em meio às relações sociais, que se podem
transformar em sentimentos equivocados, como a inveja, a raiva, e gerar atitudes
como a competição individualizada. Do mesmo modo que se propicia na sala de aula
o desenvolvimento intelectual, também se permite o afetivo, ambos inseparáveis e
interdependentes para se desenvolverem.
Perceber a complementaridade entre emoção e inteligência no contexto
escolar remete a repensar a prática docente, os procedimentos de ensino adotados,
a avaliação. Às vezes, a maneira pela qual o professor chama à atenção um aluno
para determinada atividade em sala, dependendo do seu tom de voz ou postura, o
aluno pode desenvolver uma inibição diante daquele conhecimento, gerando,
conseqüentemente, sentimentos questionáveis. A afetividade sempre permeia a
r
elação pedagógica.
2.1.3
A cognição
Predomina no contexto escolar uma supervalorização do aspecto cognitivo.
O próprio sistema considera que sejam transmitidos inúmeros conteúdos escolares
aos alunos, cobrados por meio de provas e exames. Isso acaba interferindo na
prática pedagógica do professor, pelo fato de atribuir demasiado valor ao
desenvolvimento intelectual dos estudantes.
É preciso aprender a observar os alunos como um todo e não apenas os
seus aspectos cognitivos. É importante perceber a ligação entre afeto, cognição e
movimento, atentar para a postura, o olhar, o cansaço, o excesso ou a falta de
54
movimento, o foco dos alunos no cotidiano da sala de aula, a fim de sempre
reconstruir a prática docente.
2.1.4
Wallon e o movimento
educacional francês
Wallon teve uma participação muito grande no movimento francês da
Educação Nova. Rejeitou as propostas pedagógicas centradas no espontaneísm
o,
por não achar que atividades espontâneas sejam suficientes para a complexidade
da formação do ser humano, mas concebeu a educação como uma possibilidade de
formar pessoas pensantes, com capacidade para participar e construir a sociedade
em que vivem.
Suas obras apresentam inúmeras relações com a educação, com a escola e a
prática docente, a ponto de ter sido convidado, após a Segunda Guerra Mundial, a
participar da Comissão de Reforma do Sistema de Ensino Francês, como
responsável, em princípio, pela subcomissão da formação de professores.
O primeiro presidente da comissão foi o físico La
ngevin. Depois de sua morte,
em 1946, Wallon, que era vice-presidente, foi designado presidente. O projeto da
comissão foi aprovado pelo Ministério de Educação Nacional da França em 1947 e
intitulado Plano Langevin
-
Wallon de Reforma de Ensino.
Wallon analisou com profundidade os teóricos da Pedagogia Nova, como
Makarenko e Decroly
15
e, integrando a isso sua perspectiva de desenvolvimento
humano, elaborou o Plano, norteado pelos seguintes princípios:
1.
Justiça
: Independentemente da origem familiar, cultural
ou
social, toda criança tem direito a se desenvolver integralmente,
a não ser que não tenha aptidão. O ensino, portanto, deve
oferecer o desenvolvimento pleno para todos as crianças.
2.
Todos os trabalhos são dignos
:
Em busca de uma sociedade
democrática, é preciso acabar com a hierarquia entre as
15
Wallon valoriza a importância do trabalho de Decroly. Foi à luz da pedagogia que ele (Decroly)
estudou o desenvolvimento psíquico, a psicogênese da criança, e foi à luz da psicologia que
constituiu seu sistema pedagógico . Os
métodos ativos, bem como a psicopedagogia, devem muito a
Decroly.
(Wallon, apud Werebe, Nadel
-
Brulfert, 1986, p.23)
55
profissões e valorizar tanto os trabalhos manuais quanto os
trabalhos que exigem uma inteligência reflexiva.
3.
Orientação:
A fim de que o ensino valorize as aptidões
individuais e as necessidades sociais, é preciso haver primeiro
uma orientação escolar e depois, uma orientação profissional.
4.
Cultura geral:
A
escola deve ser um centro de difusão da cultura.
É fundamental que tanto o cidadão quanto o trabalhador
busquem um aperfeiçoamento contínuo, uma especialização
pro
fissional com uma ampla cultura.
(Merani, 1969, p.178)
O Plano concebe que o conhecimento se constrói em contato com o
meio
social
e que o ser humano se forma em contato com a cultura. Cabe também à
escola possibilitar a expansão cultural, considerando-se a relação entre aluno e
sociedade para a formação de um homem cidadão. Divide a educação básica em
ciclos, para que se acompanhem os estágios de desenvolvimento dos alunos. São
três os ciclos propostos após a escola maternal:
Escola Maternal
-
dos três
aos sete anos;
Primeiro ciclo
dos sete aos onze anos;
Segundo ciclo
dos onze aos quinze anos;
Terceiro ciclo -
dos quinze aos dezoito anos.
O ensino seria obrigatório, público e gratuito dos seis aos dezoito anos, em
todos os níveis, incluindo o supe
rior.
A escola maternal deveria desenvolver livremente as aptidões das crianças
por métodos ativos, segundo a visão de Decroly. Caso alguma criança não passasse
pela escola maternal antes de ingressar no primeiro ciclo, deveria fazer um curso
preparatório
com uma professora que também adotasse os métodos ativos de
ensino.
56
Os métodos a empregar são os métodos ativos, ou seja
aqueles que se esforçam por acorrer para cada
conhecimento ou disciplina às iniciativas das próprias
crianças. Alternarão o trabalho individual com o trabalho
de grupo, sendo um e outro susceptíveis de r em ação
as diferentes aptidões da criança, quer fazendo-
a
enfrentar com os recursos que lhe são próprios as
dificuldades do estudo, quer fazendo-a escolher um papel
particular e uma responsabilidade pessoal na obra
coletiva. Desta maneira, revelar-
se
-ão as suas
capacidades intelectuais e sociais, e o lugar deixado à
sua espontaneidade fará do ensino recebido um ensino
adequado a elas.
(Merani, 1969, p.206)
O papel do professor é primeiramente olhar seu aluno integradamente nas
dimensões afetiva, motora e cognitiva, e estar consciente da relação afeto-
cognição,
para construir sua prática docente com base não apenas nos livros lidos, mas na
observação diária dos alunos com registro
e análise de suas observações.
Segundo o Plano, o professor precisaria adotar, de modo criativo, diferentes
procedimentos de ensino, a fim de sensibilizar o aluno, canalizar sua afetividade
para a produção do conhecimento.
Os horários de ensino distribuídos para as diferentes disciplinas deveriam
levar em consideração as necessidades fisiológicas e psicológicas de cada fase de
desenvolvimento humano. Da escola maternal ao começo do primeiro ciclo, fase em
que, para Wallon, a afetividade dirige a ação, a grande finalidade da educação seria
formar hábitos físicos, de socialização, respeito, cooperação e de responsabilidade.
A escola e o professor deveriam favorecer ao ximo a formação da personalidade
e do caráter da criança.
Coerentemente, esse Plano reflete, no aspecto pedagógico, o que Wallon
consolidou em pesquisa e teoria sobre o desenvolvimento das crianças. As
contribuições de Wallon dão pistas para melhorar a ação pedagógica nas salas de
aula.
57
2.1.5
Aproximações entre Laban e Wallon
Alguns te
rmos
-chave podem facilitar a compreensão das concepções entre
Laban e Wallon (
vide Quadro na folha a seguir):
58
Laban
Wallon
Ser humano
Corpo, mente e emoção articulados com
o ambiente.
Corpo, mente, emoção
articulados
ao meio.
Emoção
O fator de movimento
fluência
expressa
a emoção, por meio de um movimento
controlado
ou
livre,
nas expressões
faciais, posturais e gestuais.
Manifestação orgânica refletida
no próprio corpo, capaz de
contagiar as pessoas que estão
em volta.
Movimento do
ser humano
Propicia a interação do homem com o
meio e expressa seus sentimentos,
pensamentos e intenções.
Expressa atitudes, sentimentos,
ações e gera as relações
interpessoais e com o meio.
Ritmo
Único e individual em
cada pessoa e
pode ser observável em diferentes
situações do cotidiano.
É preciso buscar um equilíbrio
entre o ritmo interno individual e
o ritmo do meio externo.
Dependendo da situação
vivida pode haver
modificação no ritmo de quem
se move e isso ser
perceptível
nas variações no tônus
corporal
.
A educação
escolar
Possibilita um amplo desenvolvimento
das habilidades humanas, se
contextualizada ao meio.
Contribui para formar um
cidadão que queira construir
uma sociedade democrática.
Prática d
ocente
Aprender a observar o aluno de modo
integral
Observar diariamente os alunos
de modo integral. Registrar e
analisar as observações.
Espaço
Mover
-
se no espaço que nos rodeia
exige atenção em único ou em vários
focos e ajuda a organizar o
pensame
nto.
É importante ter a atenção
concentrada
ou
distribuída
para
mover
-
se no espaço, o que
desenvolve o pensamento.
O tempo
na sala
de aula
Se cada pessoa possui um
ritmo
corporal
que é interno e único, na
distribuição das tarefas escolares, é
um
ponto a ser observado.
Os horários para as diferentes
disciplinas precisam considerar
as necessidades fisiológicas e
psicológicas do aluno.
59
Essas posições levam, com base nos termos selecionados, integrar Laban e
Wallon às seguintes asserções:
Ser humano: deve ser visto sempre numa visão integral.
Emoção: manifesta
-
se no próprio corpo
.
Movimento do ser humano: revela a personalidade e as intenções de
quem se move.
Ritmo: é fruto do meio social e cultural que a pessoa convive
.
Educação escolar
: ajuda a formar o verdadeiro cidadão
.
Prática docente: observar o aluno de modo integral
.
Espaço: desenvolver a atenção num único foco ou em vários focos.
Tempo na sala de aula: respeitar o ritmo interno de cada aluno e suas
fases do desenvolvimento
.
As concepções de Laban e Wallon sobre as relações do movimento, com a
cognição e com o afeto mobilizam o desenvolvimento infantil em articulação com o
meio. Elas apresentam uma progressão complexa das funções cognitivas e afetivas
integradas a partir do movimento corporal no ambiente e podem vir a gerar
compreensões e contribuições para o processo de ensino
-
aprendizagem.
60
CAPÍTULO III
EDUCAÇÃO INFANTIL:
ALGUNS ASPECTOS
61
Concepções de infância só foram tratadas mais diretamente a partir do
século XIII. Antes desse período, a infância era considerada apenas uma fase do ser
humano sem muita importância para a sociedade que, conseqüentemente, não
acreditava que a criança fosse um ser em desenvolvimento e tivesse uma
per
sonalidade. Vigorava aí a idéia de homem em miniatura .
Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a
infância ou não tentava representá-la. É difícil crer que essa
ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade.
É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse
mundo...
(Ariès, 1981, p.17)
Somente a partir do culo XVII é que a infância passa a adquirir algum
significado, despertando novos sentimentos sociais e até ganhando destaque nas
obras de arte como os retratos em que aparecem as crianças sozinhas ou em
destaque em volta da família. Surgem, nesse período, alguns textos que começam a
apresentar o interesse pela psicologia infantil, como por exemplo o
Ratio
dos
Jesuítas de 1586 (Ariès, 1981).
O surgimento da escola na Idade Média revelou um avanço na percepção
da sociedade relacionada à infância, mas, ao mesmo tempo, tornou-se um meio de
isolar as crianças do mundo dos adultos, levando-as a serem tratadas com uma
disciplina mais autoritária. Conseqüentemente gerou-se aí o desenvolvimento de
normas disciplinares bem severas, como o uso dos chicotes e castigos corporais.
Isso não esteve presente na Antigüidade. No século XVII, algumas posições se
contrapõem ao excessivo disciplinamento. Por exemplo,
Na França, a opinião pública manifestou uma repugnância pelo
regime disciplinar escolástico que resultou em sua supressão
por volta de 1763, quando as autoridades tomaram a
condenação dos jesuítas como pretexto para reorganizar o
sistema escolar.
(Ariè
s, 1981, p.118)
Desse período em diante, a infância passou a ser vista de um novo modo.
Montaigne e Rousseau foram os primeiros teóricos da educação que contribuíram
com a noção de infância, apontando direcionamentos pedagógicos para essa fase.
Depois deles, Froebel, inspirado em Rousseau, apresentou uma nova visão de
62
infância e criou uma escola de educação infantil, intitulada jardim da infância.
Somente a partir das contribuições de Froebel, é que na educação infantil se
procurou elaborar propostas pedagógicas que caminhassem ao lado do
desenvolvimento das crianças.
No Brasil, as primeiras propostas de instituições pré-escolares surgem no
ano de 1899, com a fundação do Instituto de Proteção e Assistência à Infância (IPAI
-
RJ) e da creche da Companhia de Fiação e Tecidos Corcovado, ambos no Rio de
Janeiro (Kuhlmann Jr, 2004). Mas somente nas primeiras décadas do século XX,
que foram implantadas as primeiras instituições pré-
escolares assistencialistas.
As instituições de educação infantil no Brasil, passaram gradativamente, a
ser valorizadas, mas em alguns períodos, ainda, prevaleceu uma concepção
educacional mais assistencialista, afinal algumas dessas instituições estiveram
diretamente vinculadas aos órgãos de saúde e de assistência, e apenas
i
ndiretamente vinculadas com a área da educação.
... a partir da década de 1960, que se ampliou o
reconhecimento das instituições de educação infantil como
passíveis de fornecer uma boa educação para as crianças que
as freqüentassem. A demanda desses setores promoveu uma
recaracterização das instituições que passaram a ser vistas
como apropriadas a crianças de todas as classes sociais.
(Kuhlmann Jr, 2004, p.199)
O movimento em prol da educação infantil somente ganhou força com a
Constituição
Federal de 1988 que reconheceu, no artigo 208, inciso IV, como dever
do Estado o atendimento em creches e pré-escola às crianças de zero a seis anos
(Vários autores, 1999, p.203). O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) de
1990, no artigo 54, também reassegurou o mesmo dever do Estado. E finalmente a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 apresentou vários artigos
que reconheceram a educação infantil como primeira etapa da educação básica,
pontuando diretrizes da Política Nacional para esse nível de ensino, que ganhou
importância e passou a desempenhar o papel de conduzir as crianças para se
integrarem e participarem de modo criativo e produtivo na sociedade, como
verdadeiros cidadãos.
Todos os avanços nas políticas públicas educacionais, geraram, nas
últimas décadas, um crescimento da discussão sobre a infância e a educação
63
infantil. Hoje dispomos de uma produção científica e literária com inúmeras
pesquisas acadêmicas voltadas para a educação infantil. Vários desses estudos têm
apontado a importância e a necessária atenção que deve ser dada à fase de zero a
seis anos, para um sadio e completo desenvolvimento humano.
3.1
Fase especí
fica de desenvolvimento
O período de zero a seis anos é a fase do desenvolvimento humano
em que
todos os canais de aprendizagem, referentes à linguagem, ao pensamento, à
afetividade, ao movimento corporal e às relações sociais estão em desenvolvimento
e em formação. A criança, nesse período, pode ser considerada um
aprendiz
intuitivo
(Gardner,
1994b, p.9) por estar apta a se desenvolver e aprender.
Segundo a concepção walloniana,
... o desenvolvimento é um processo ininterrupto de
transformações provocadas pela interação das predisposições
determinadas geneticamente e dos fatores ambientai
s. Ou seja,
a programação biológica de cada um encontrará no meio
condições para se concretizar ou não. É esse meio que,
apresentando sucessivamente novas possibilidades e novas
necessidades, vai provocar sucessivas aprendizagens.
(Almeida, 2004, p.125)
Para que a criança se desenvolva e aprenda, precisa viver num meio que a
estimule, que lhe propicie diferentes experiências e vivências, as quais exigirão
sempre outras aprendizagens. Caso não tenha essa oportunidade em tal fase da
vida, o processo de desenvolvimento poderá ser bem mais lento, podendo mesmo
vir a ser prejudicado.
Quanto maior a variedade de oportunidades que a criança tem
à sua disposição para exercitar as funções que amadurecem a
cada estágio, melhor o desenvolvimento de suas aptidões para
enfrentar as exigências do meio...
(Mahoney, 2004, p.22)
É, portanto, na educação infantil que a criança deve encontrar condições
materiais, pedagógicas, sociais, humanas que melhor garantam seu
64
desenvolvimento e a aquisição de aprendizagens que contribuam para seu
desenvolvimento integral. A própria Lei 9.394/96, de Diretrizes e Bases da
Educação, salienta, no artigo 29:
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem
como finalidade o desenvolvimento integral da criança até
seis
anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual
e social, complementando a ação da família e da comunidade.
Assim sendo, cabe à escola cumprir seu papel social de ...valorizar os
conhecimentos que as crianças possuem e garantir a aquisição de novos
conhecimentos...
(Kramer, 1989, p.22), desenvolvendo um trabalho que contemple
os aspectos cognitivos, afetivos, motores e sociais articulados à visão da criança
como um ser social.
...significa considerar que ela tem uma história, que vive uma
geografia, que pertence a uma classe social determinada, que
estabelece relações definidas segundo seu contexto de origem,
que apresenta uma linguagem decorrente de suas relações
sociais e culturais estabelecidas, que ocupa um espaço que
o é só geográfico, mas também de valor, ou seja, ela é
valorizada de acordo com os padrões do seu contexto familiar e
de acordo também com sua própria inserção nesse contexto...
(Kramer, 1989, p.23)
Considerar a criança como esse ser social que aprende e
se desenvolve em
contato com o meio, requer uma visão de que cada aluno advém de diferentes
realidades socioculturais, e que adquire novos conhecimentos para realizar
aprendizagens significativas. Mas, para isso, será necessário um processo de
ensino
-a
prendizagem que propicie a educação integral.
...É contra a Natureza tratar a criança fragmentariamente. Em
cada idade, ela constitui um conjunto indissociável e original.
Na sucessão das suas idades, ela é um único e mesmo ser em
curso de metamorfoses. Feita de contrastes e de conflitos, a
sua unidade será por isso ainda mais susceptível de
desenvolvimento e de novidades.
(Wallon, 1995, p.215)
65
A idéia de educação integral tem sido revista em nossa sociedade. As
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil apontam a importância de
uma formação integral para os educandos.
3
-
As Propostas Pedagógicas para as instituições de Educação
Infantil devem promover em suas práticas de educação e
cuidados, a integração entre os aspectos físicos, emocionais,
afetivos, cognitivos/lingüísticos e sociais da criança,
entendendo que ela é um ser total, completo e indivisível.
Desta forma ser, sentir, brincar, expressar-se, relacionar-
se,
mover
-se, organizar-se, cuidar-se, agir e responsabilizar-se são
partes do todo de cada indivíduo, menino ou menina, que
desde bebês vão, gradual e articuladamente, aperfeiçoando
estes processos nos contatos consigo próprios, com as
pessoas, coisas e o ambiente em geral.
(Brasil, 1998, p. 5)
Mas, para propor uma educação integral na escola é preciso também
considerar, segundo Didonet que,
... A visão abrangente dos processos formativos é um forte
instrumento para se contrapor à tendência homogeneizante da
globalização que conduz à imposição de modelos e cultur
as
hegemônicas. A heterogeneidade social e a diversidade cultural
terão que estar presentes na educação infantil, porque esta se
levanta do chão que abriga as raízes culturais de cada criança
e de cada comunidade...
(2000, p.22)
A educação infantil como a base da formação humana precisa
proporcionar um ensino de qualidade, que ajude a atingir o pleno desenvolvimento
do educando. Para isso é preciso refletir sobre a formação do profissional para atuar
nessa fase, a fim de que possa contribuir, pelo processo de ensino-
aprendizagem,
para a visão integral e integrada do aluno.
66
CAPÍTULO IV
A PESQUISA
67
O problema que me instiga, trazido pela experiência docente e por relatos
de trabalhos de pesquisa, é a fragmentação que permeia o processo de ensino-
aprendizagem na sala de aula.
Estabeleci categorias, para averiguar se o processo de ensino-
aprendizagem ajuda a desenvolver uma formação integral nos educandos. As cinco
categorias consideradas foram: os quatro fatores de movimento
tempo
,
espaço
,
peso
e
fluência
, segundo a concepção labaniana, mais uma categoria que
denominei
afetividade
, segundo a concepção walloniana.
Fiz observações
in
loco
, em uma classe de educação infantil
do nível pré
-
es
colar
, da prática cotidiana da professora com seus alunos, com o objetivo de
compreender as inter-relações das cinco categorias no processo de ensino-
aprendizagem em sala de aula.
4.
1
Procedimentos de investigação
Optei pela observação
16
como metodologia para investigar o problema a
que me propus pesquisar, da mesma forma que os dois pesquisadores
Wallon e
Laban
, referenciais teóricos dessa pesquisa, também iniciaram suas descobertas a
respeito do desenvolvimento e movimento humano a partir da observação. Esta é
um recurso valioso para a pesquisa em psicologia genética. Wallon afirma que ela
ajuda a conhecer a criança em seu meio contextualizado.
É naturalmente verdade que, para conhecer o seu
comportamento, é indispensável observá-lo nos seus
diferentes campos e nos diferentes exercícios de sua
atividade cotidiana, quer dizer, na escola em particular.
Mas não é menos verdade que cada meio o modifica
momentaneamente...
(Wallon, 1979, p.20)
Esta pesquisa foi realizada em uma escola particular da cidade de São
Paulo que oferece cursos da educação infantil ao ensino médio. Tive abertura para a
realização da pesquisa pelo fato de ter tido contatos anteriores com essa instituição,
16
A observação que realizei foi naturalista (Vianna, 2003, p.47).
68
como ex-aluna do Curso Normal e posteriormente tendo ministrado aulas para a
educação infantil, ensino fundamental e médio.
A sala foi observada num total de treze períodos durante um semestre. De
março a junho de 2004, uma vez por semana, por um período de duas horas,
observei a prática docente e a execução do plano de aula. Contei com o
consentimento da direção, da coordenação pedagógica e da professora para a
realização desse trabalho.
A coleta de dados foi feita mediante anotações cursivas de campo durante e
após cada observação. Assim, eu permanecia na sala de aula desde o momento de
entrada dos alunos até a hora do lanche, registrando de modo discursivo, num
caderno de campo, a execução das atividades de aula.
Os sujeitos da pesquisa foram a professora e os alunos do pré
educação infantil
na faixa etária de 6 a 7, anos em processo de alfabetização.
Escolhi esse nível de ensino pelo fato de os alunos estarem sendo alfabetizados e
por acreditar que é uma fase, no desenvolvimento humano, importante para a
aprendizagem. Concordo com Rego (2003) que as experiências escolares vividas
podem afetar e comprometer o desempenho na formação de cada pessoa. Essas
experiências não se restringem apenas ao aspecto cognitivo, mas também ao afetivo
e social
neste ponto, faço um adendo e incluo o motor, o movimento corporal.
Como seres humanos as crianças são um todo, e a situação escolar as envolve
também como um todo. Em contrapartida, temos que considerar a classe. Conforme
Gatti, cada classe precisa ser olhada
...como um grupo cuja dinâmica o pode se
r
desconhecida nem esquecida pelo professor, uma vez
que é neste processo dinâmico de relação que seu
trabalho se desenvolve.
(1970, p.35)
69
A autora complementa afirmando que
A situação ambiente de classe gerada pela inter-
relação
professor
-
alunos
é, assim, bastante complexa. Se o
professor pretende ser um educador, também cabe a ele
criar um ambiente propício ao desenvolvimento dos
alunos e isto não depende simplesmente da boa
utilização de um cartaz, de um projetor, mas de suas
disposições mais
profundas...
(op.cit., p.38)
A análise da coleta de dados apóia-se nos registros feitos durante as
observações e pretende buscar as possíveis relações estabelecidas no processo de
ensino
-aprendizagem em sala de aula com cada um dos fatores de movimento de
Laban, complementados pela perspectiva walloniana, nas questões sobre a
afetividade.
4.1.1
A escola pesquisada
Situada na Zona Norte da cidade de São Paulo é uma escola particular,
mantida e dirigida por congregação católica, e oferece cursos da educação infantil
ao ensino médio.
4.1.2
A proposta pedagógica da escola
A educação infantil com duração de três anos, nessa escola, possui uma
proposta pedagógica que, em seu texto de apresentação, concebe o homem como
um ser sociocultural que aprende em contato com o meio, que o conhecimento se
desenvolve a partir de situações que sejam significativas e construídas com o outro.
A proposta considera como fatores fundamentais para o bom
desenvolvimento dos alunos as relações de confiança e de convivência propiciadas
pela socialização entre educandos e educadores; parte da concepção que os
vínculos afetivos e as trocas socialmente construídas fortalecem a auto
-
estima.
70
O processo de ensino-aprendizagem é proposto com base na observação e
exploração do ambiente, gerando atitudes de pesquisa, troca de informações e
brincadeiras, para que os alunos possam expressar sentimentos, emoções e
pensamentos.
4.
1.3
O perfil da professora e da classe
A professora da classe observada tinha trinta e dois anos, foi ex-aluna do
Curso Normal da escola pesquisada e tinha experiência docente nessa
instituição.
Graduada em Pedagogia pelas Faculdades Hebraico-
Brasileira
Renascença, trabalha com a educação infantil cinco anos, mas leciona
ra
durante nove anos na 3
a
. série, e quatro anos na 4
a
. série do ensino fundamental.
A sala de aula observada tinha dezenove , sendo nove meninos e dez
meninas. O nível socioeconômico dos alunos é de classe média.
4.
2 Considerações gerais quanto ao conteúdo das categorias:
afetividade, fluência, espaço, peso e tempo
Tendo discutido nos capítulos I e II as questões referentes às categorias
que abordei tal como tratadas por Laban e por Wallon, apresento, a seguir, o que
considerarei para a análise das observações, em cada categoria, destacando as
intersecções de tais categorias. Este detalhamento é importante e permite que se
tenha uma visão mais clara sobre os fatos, situações e comportamentos observados.
Dentro das categorias especifiquei subcatego
rias.
71
Afetividade
A categoria afetividade se fundamenta na concepção walloniana e está
integrada, segundo essa abordagem, com a emoção e o sentimento. A emoção se
manifesta nos estados orgânicos e tônicos gerados por experiências sociais ou
psíquic
as e usa o corpo como veículo de expressão.
Com essa perspectiva, considerarei, nessa categoria, a presença de três
mecanismos de ação: a
plasticidade
que revela os sinais da emoção no próprio
corpo; a
contagiosidade
que é a capacidade de contagiar as pessoas que estão
por perto; e a
regressividade
- que faz regredir o raciocínio (Almeida, 1999, p.72).
Esses mecanismos são expressos em variações tônico-
posturais
hipertônica ou
hipotônica.
Fluência
A categoria fluência, segundo Kestenberg (1977), apóia sempre a
manifestação da emoção pelo movimento. É perceptível nas mais variadas
manifestações corporais e situações vividas. Como explicitei no Capítulo I, a
fluência é a seqüência fácil (
livre
) ou obstruída (
controlada
) de um movimento. Se a
fluência for
livre,
pode querer expressar entrega, extroversão, abandono, e se for
controlada
, retraimento, contenção, cuidado. A atitude interna, ligada à fluência, é de
progressão e possui a função
17
de integrar, o que afeta a expressão de
sentimentos.
No contexto escolar, temos de considerar, a partir dessas idéias, que o
aluno pode estar ou não se sentindo integrado ao processo de ensino-
aprendizagem. Por exemplo, uma distribuição de carteiras enfileiradas, pode
interferir na qualidade expressiva livre e fazer com que os alunos que estão
sentados nas últimas carteiras sintam-se excluídos do processo de ensino-
aprendizagem, o que pode ser manifestado pelo retraimento do corpo, encolhendo-
se na carteira. Ou, apela postura do professor que, enquanto ministra a aula, não
17
Conforme apresentado no capítulo I, cada fator de movimento tem uma função, que é o aspecto
que ajudará a desenvolver na relação da pessoa com o meio social e físico.
72
envolve esses alunos no que ocorre na sala por sempre direcionar seu foco de
atenção aos alunos que estão sentados mais próximos dele.
Laban afirma que as mudanças na qualidade dessa categoria são mais
visí
veis no movimento do que os outros fatores. Isso se relaciona com a plasticidade,
e com as variações do tônus: hiper e hipotônus, apresentados por Wallon. Sendo
assim, pode-se observar a presença dessa categoria, manifestada pelo corpo, nas
diferentes si
tuações do cotidiano, uma vez que se expressa pela tensão muscular.
Espaço
A categoria espaço parte da premissa, segundo a concepção labaniana, da
organização espacial da
cinesfera,
ao buscar enfatizar o espaço no corpo
definindo lugares no espaço da perspectiva do corpo , e o corpo no espaço
sendo que o espaço físico é o referencial de direção para o corpo ( Rengel, 2000,
p.36).
O espaço não é neutro, ele sempre educa.
... ele carrega, em sua configuração como território e
lugar,
signos, símbolos e vestígios da condição e das
relações sociais de e entre aqueles que o habitam. O
espaço comunica; mostra, a quem sabe ler, o emprego
que o ser humano faz dele mesmo. Um emprego que
varia em cada cultura; que é um produto cultural
específ
ico, que diz respeito não às relações
interpessoais
distâncias, território pessoal, contatos,
comunicação, conflitos de poder -, mas também à liturgia
e ritos sociais, à simbologia das disposições dos objetos
e dos corpos
localização e postura -, à sua hierarquia e
relações.
(Frago, 2001, p.64)
Nos diferentes contextos socioculturais, o espaço mostra seu valor
relacionado às hierarquias sociais, às relações interpessoais, à postura corporal. No
contexto escolar, ele carrega as mesmas configurações; transmite valores
hierárquicos de movimentação, de gestos, tem sentidos. Delimita quem pode e
quem deve se movimentar no espaço de sala de aula, delimita os modos, a
73
distância que se deve manter do professor e colegas da classe, se pode ou não
tocá
-los, a postura corporal socialmente aceita para sentar, o que facilita, ou não, o
processo de ensino-aprendizagem. Essas ordenações são transmitidas e
aprendidas ao longo dos anos que passamos na escola.
Assim como nas outras categorias, o espaço na escola também é uma
fonte de experiências e aprendizagens sensoriais e motoras que levam à
interiorizações de comportamentos e à criação de representações. Muitas dessas
aprendizagens estão diretamente relacionadas às imposições de leis que
aprisionam, que definem organizações disciplinares, que fazem da escola, em caso
extremo, um
locus
de controle, como salienta Foucault (1987), a fim de tornar
dóceis
os corpos dos alunos, e, ao tornar esses corpos dóceis, formamos indivíduos
disciplinados, indivíduos qu
e obedecem, que não questionam, que são submissos.
Algumas propostas pedagógicas, conforme Escolano, que são denominadas
ativas,
planejam melhor utilização didática do ambiente, do espaço na escola, na
sala de aula, compreendendo o aluno como parte co
nstitutiva desse processo
...todas as psicologias contemporâneas da vertente
fenomenológica, perceptualista ou cognitivista
enfatizaram a função desempenhada pelas experiências
espaciais primárias na construção das estruturas
sensoriais e intelectuais d
a infância.
(2001, p. 48)
Tsoukala (1994, p.361), apresentou um estudo comparativo com dois
grupos de alunos, de oito a onze anos, que freqüentaram escolas com diferentes
propostas pedagógicas e apresentavam diferentes distribuições espaciais na sala
de aula, a Pedagogia Freinet e a Pedagogia Formal. Analisou as representações
topográficas dos grupos, relativas às escolas freqüentadas. Observou que
interação na aprendizagem dos alunos e o espaço circundante da sala, que auxilia
o processo de pe
rcepção espacial de cada um deles.
Existem maneiras diferentes de distribuição espacial das carteiras na sala
de aula. Essa distribuição em geral é formal, instituída pela escola ou pelo bito
de trabalho do professor, entre outros.
O modelo mais conhecido é o da distribuição convencional com carteiras
dispostas de modo enfileirado, a mesa do professor posicionada à frente da sala, em
destaque, para que ele ocupe este lugar.
74
É claro que o professor não fica o tempo todo na frente da sala sentado,
ele
às vezes, circula. Os alunos, pela distribuição espacial de carteiras enfileiradas, têm
pouco espaço geral para circularem. Assim, fica a idéia de estarem
propositalmente dispostas desse modo para impedir os alunos em seus
movimentos a fim de d
iscipliná
-los. Recorro novamente a Foucault (1987, p.130), a
disciplina procede em primeiro lugar à distribuição dos indivíduos no espaço...
Para Laban, o espaço desenvolve a função de comunicar. Numa sala de
aula com distribuição das carteiras e móveis dispostos de modo convencional, a
comunicação passa a ocorrer numa direção retilínea, predominando mais nas
direções verticais. A figura 1 exemplifica essa distribuição espacial e a comunicação.
Fig. 1
A letra P simboliza o lugar de permanência mais freqüente do professor, e a
letra
A,
os alunos sentados em suas carteiras. As flechas simbolizam a
comunicação, o diálogo estabelecido nesse espaço, que vai do professor para os
alunos, do aluno para o professor, sendo mais difícil que ocorra entre alunos pela
própria distribuição espacial, como também entre alunos e professores quando os
alunos ficam mais distantes da mesa do professor.
diálogo vertical, mas a comunicação entre os alunos está dificultada
pela posição das carteiras, havendo bloqueios nesta comunicação, por exemplo,
entre os alunos da primeira fileira com os da terceira, ou outros. o facilitação
de fala ou movimentação, o que dificulta a participação e a partilha entre alunos e,
também, com o professor. Esta disposição das carteiras cria, no espaço da sala
aula, uma representação de obstáculo .
P
A A A A A
A A A A A
A A A A A
75
Numa distribuição espacial, que denomino interativa, as carteiras são
dispostas em semi-círculo (figura 2) ou círculo ( figura 3). A comunicação ocorre
numa direção retilínea vertical, horizontal e diagonal. Ou seja, perpassa todos os
presentes naquele espaço.
Fig. 2
Fig. 3
A letra P simboliza o lugar do professor, a letra A dos alunos em suas
carteiras. As flechas simbolizam a comunicação que ocorre neste esquema. Uma
comunicação facilitada, que favorece a integração e a troca.
Esse tipo de distribuição espacial possibilita maior movimentação corporal,
tanto do professor quanto dos alunos. O espaço geral é maior e facilita o ir-e-
vir
dentro da sala. Sua representação é de se ter menos obstáculos . Simboliza a
concepção pedagógica de que o processo de ensino-aprendizagem não pode partir
apenas do professor para o aluno, mas, sim, ser circular, dialógico, processa
ndo
-
se
entre o professor e os alunos.
Outro dado considerado nessa categoria, é a direção espacial do foco de
atenção, e sua função, a comunicação. Mover-se no espaço que nos cerca exige
atenção que, dependendo da situação, pode ser focada
direcionada num ponto
ou multifocada
focalizando mais de um ponto ao mesmo tempo.
A estruturação espacial da sala de aula está relacionada à idéia de atenção
e de disciplina mental
18
: organizar em fileiras, voltadas para o professor, pondo um
18
...Essa capacidade está ligada ao amadurecimento dos centros de inibição e discriminação
situados no córtex cerebral, que se dá por volta dos seis, sete anos. Antes dessa idade, a
possibilidade de a criança controlar voluntariamente suas ações é pequena. Isso se reflete, por
exemplo, na capacidade em permanecer numa mesma posição ou fixar a atenção sobre um foco
(Wallon, apud Galvão, 2002, p.76).
P
A A
A A
A
A
A
P
A
A
A
A
A A
A
76
só foco de atenção pa
ra a criança. Quanto à questão do foco e do multifoco, verifica
-
se que, no início do estágio categorial, a criança consegue espontaneamente se
manter concentrada na mesma atividade, resistindo às distrações. Essa disciplina
pode
-se apresentar de diversas maneiras: atenção concentrada, quando se
mantém num único objeto, excluindo outros que apareçam; atenção distribuída ou
borboleteante,
quando se mantém sobre objetos e situações simultaneamente.
Como exemplo da
atenção
distribuída,
Wallon cita a atividade de um maquinista de
trem, que enquanto executa suas manobras precisa estar alerta aos imprevistos que
possam vir a surgir. E, como exemplo da borboleteante, cita a atividade de um
porteiro de hotel que precisa dividir sua atenção em diversas tarefas, reparar em
tudo e responder e ou atender a todos.
Na sociedade contemporânea em que vivemos, com a quantidade e
velocidade de informações que nos chegam de ltiplos espaços-tempos somos
exigidos a ter atenção focada e multifocada ao mesmo tempo, a fim de
criarmos
melhor comunicação e movimentação com o meio. Por exemplo, uma pessoa que
circula pelas ruas da cidade de São Paulo precisa ter sua atenção num único e em
vários focos ao mesmo tempo, para que realize o percurso desejado e ao mesmo
tempo não esbar
re em nada, não tropece e nem seja atropelada.
Na escola, muitas vezes, a aprendizagem da disciplina mental é lenta e
dolorosa. É somente por volta dos seis anos que ela surge, justamente quando a
criança começa a controlar suas próprias ações.
As dificuldades da criança em permanecer parada e
concentrada como a escola exige testemunham que a
consolidação das disciplinas mentais é um processo lento
e gradual, que depende não de condições
neurológicas, mas também está estreitamente ligada a
fatores de origem social, como desenvolvimento de
linguagem e aquisição de conhecimento. Assim, a escola
tem um importante papel na consolidação das disciplinas
mentais.
(Galvão, 2002, p.76)
O importante papel da escola na consolidação das disciplinas mentais é be
m
delicado. A criança na fase de alfabetização permanece muito tempo na mesma
posição, quase sempre com a atenção num único foco. O professor ao planejar
suas atividades precisa estar atento à grande exigência da imobilidade e se
77
conscientizar de que isso pode provocar um obstáculo para o processo de leitura e
escrita das crianças.
...
As exigências da escola, por vezes tão mal suportadas,
demonstram os difíceis progressos da focalização na
criança. Com que dificuldade se torna capaz de deixar o
que
está a fazer para se acomodar a outra tarefa e para
se consagrar a ela exclusivamente, sem lhe misturar
elementos estranhos. É por graus muito lentos que ela
deixa de ser refractária às tarefas impostas.
(Wallon, 1995, p.100)
Para o processo de ensino
-aprendizagem, é importante haver situações que
exijam tanto a atenção quanto a comunicação com único foco e com multifoco, sem
esquecer de considerar o desenvolvimento do aluno e sua faixa etária. A própria
natureza do trabalho escolar exige essa dupla focalização, necessitamos da atenção
direcionada a um ou mais focos. Wallon (apud Pereira, 1992), considerando a
existência da atenção concentrada e
distribuída
em relação ao espaço, fez crítica à
escola que não propicia atividades com atenção distribuída, e conseqüentemente, a
equivocada visão de que estar atento exige uma única postura
sentada. uma
relação de causalidade recíproca entre atenção e aprendizagem, e ressalta que a
atenção é uma habilidade a ser desenvolvida. Pereira (ibid.) apresenta uma
re
clamação comum feita por professores da 1
a
. série que cobram dos professores do
pré a realização com trabalhos de atenção concentração (ibid.), como um pré-
requisito para ingressar na próxima série e não como habilidade que necessita ser
desenvolvida em
todas as séries no processo de educação das crianças.
A realização da maior parte das tarefas propostas
costuma exigir que as crianças fiquem sentadas, paradas
e com a atenção concentrada num único foco. São
demandas posturais que implicam elevado grau de
controle do sujeito sobre a própria ação, dependendo,
assim, do tardio e custoso processo de consolidação das
disciplinas mentais. Em geral, a intensidade com que a
escola exige essas condutas é superior às possibilidades
da idade, o que propicia a emergência de dispersão e
impulsividade, que o cansaço provocado flexibiliza
ainda mais o domínio da criança sobre sua atenção e
suas reações motoras.
(Galvão, 2002, p.109)
78
Wallon considera que a origem do pensamento está também associada à
origem do movimento. Conforme a criança se movimenta no espaço, vai
construindo sua percepção de espaço e suas representações. A construção do
espaço mental é uma condição para o desenvolvimento do pensamento, mas não
está ligada apenas ao movimento, há uma rela
ção com a afetividade.
O espaço não é primitivamente uma ordem entre as
coisas, é antes uma qualidade das coisas em relação a
nós próprios, e nessa relação é grande o papel da
afetividade, da pertença, do aproximar
-
se ou do evitar, da
proximidade ou do a
fastamento.
(Wallon, 1979, p.209)
Peso
Para Laban a categoria peso
leve
ou
firme
agrega uma atitude de intenção,
sua função é a assertividade que pode ajudar a desenvolver o sentido de força de
vontade, de persistência, de aprender a superar as dificuldades que surgem de
maneira firme ou de maneira frágil.
Todas as experiências que vivemos, os gestos que expressamos afetam a
apropriação da sensação. No nosso dia-a-dia enfrentamos situações difíceis,
complicadas de serem resolvidas e precisamos se
r
firmes
, agir com determinação.
Podemos numa situação assim, não agir com determinação, e dar uma resposta
frágil. Ambas as situações são visíveis na expressão corporal. em outros
momentos poderemos encontrar situações que exigirão
leveza,
uma certa
suavidade. As duas expressões se traduzem por um peso diferenciado nos
movimentos.
O aluno em fase de alfabetização se depara com essas diversas situações.
Está começando a sentir o peso da mão, no ato da escrita, ao tentar construir as
primeiras palavras, o que demonstra a sua participação com intenção, o desejo
aprender, expressando-se pela escrita com firmeza ou leveza. A função do
peso
ajuda
-o a adquirir mais força de vontade, a persistir para aprender a escrever, a
saber contornar as dificuldades qu
e surgem de modo firme ou suave.
Wallon salienta que no estágio categorial, os gestos que a criança expressa
têm uma intenção intelectual, ou seja, ela é capaz de planejar mentalmente a
execução de uma seqüência de movimentos, e isto pode ser associado à atitude de
79
intenção, apontada por Laban, que fundamenta a aprendizagem da superação de
obstáculos, de auto
-afirmação, da própria educação da vontade.
Tempo
Conforme apresentado no capítulo I, o tempo é o último fator a ser
experimentado pelas crianças, e é fundamental na fase de idade em que se
encontravam as crianças desta pesquisa.
O homem contemporâneo, diferente do homem de outras épocas históricas,
adquiriu grande consciência e dependência do tempo.
...não apenas povos primitivos, mas civilizações relativamente
avançadas atribuíram diferentes graus de significação ao modo
temporal de existência e valorizaram mais ou menos a
perspectiva temporal. Em suma, o tempo, em todos os seus
aspectos, foi considerado de muitas maneiras conceitualmente
dis
tintas.
( Whitrow, 1993, p.23)
Elias nos apresenta a idéia de que o tempo é uma instituição com
características que variam de acordo com as sociedades.
...O indivíduo, ao crescer, aprende a interpretar os sinais
temporais usados em sua sociedade e a orientar sua conduta
em função deles. A imagem mnêmica e a representação do
tempo num dado indivíduo dependem, pois, do nível de
desenvolvimento das instituições sociais que representam o
tempo e difundem seu conhecimento, assim como das
experiências que o indivíduo tem delas desde a mais tenra
idade.
(1998, p.15)
Todas as sociedades possuem ritmos próprios, os quais podem variar de
região para região ou de cultura para cultura. Sendo assim é preciso que o homem
adapte o seu ritmo interno ao ritmo externo, ao ritmo da sociedade. Poder-
se
-
ia
pensar aqui numa conciliação equilibrada.
80
...toda criança vai-se familiarizando com o tempo como
símbolo de uma instituição social cujo caráter coercitivo ela
experimenta desde cedo. Se, no decorrer de seus pr
imeiros dez
anos de vida, ela não aprender a desenvolver um sistema de
autodisciplina conforme a essa instituição, se não aprender a se
portar e a modelar sua sensibilidade em função do tempo, ser-
lhe
muito difícil, se o impossível, desempenhar o papel de
um adulto no seio da sociedade
.
(Elias, 1998, p.14)
um processo de internalização da noção de tempo. A sociedade em que
vivemos nos leva, diariamente, a agir num tempo cronometrado. Novaes (1992, p.9)
diz que na contemporaneidade temos uma experiência de um tempo
fragmentado,
deslocado, modelado, repetitivo-
veloz
-volátil, sem memória. Realizamos nossas
tarefas sempre rapidamente, muitas vezes sem pausa, sem perceber as idéias e os
sentimentos surgidos, agindo de modo mecânico.
Somos muitas vezes induzidos a realizar as ões numa corrida contra o
nosso relógio biológico, contra o ritmo interno individual. Temos que realizar nossas
atividades num ritmo universal, em que todos devem exercer suas atividades num
mesmo tempo, pré-determinado para as diversas atividades, dentro de uma
padronização que maximiza o uso do tempo.
No contexto escolar, o tempo tem essas mesmas conotações existentes no
contexto social. Ele não é irrelevante, não possui um caráter apenas organizador e
distribuidor das tarefa
s escolares, mas,
...os tempos escolares são regidos por uma lógica rígida,
gradeada, disciplinada, na crença de que tudo é
previsível, que o futuro é certo, que a seqüenciação é
inexorável
...
(Arroyo, 2004, p.23)
O tempo escolar é um tempo de construção cultural e pedagógica e, desse
modo, precisaria ser flexível e adaptável aos diferentes contextos e situações
escolares.
Louzada (2004) nos apresenta, outras considerações sobre o tempo na
escola. A primeira, é sobre a cronometragem do tempo das aulas, o que faz com
que, muitas vezes, a mesma disciplina, dada em duas horas/aulas
equivalente a
90 minutos
exija do professor um cuidadoso planejamento de aula, a fim de manter
81
a atenção dos alunos. A segunda consideração ressalta que as escolas de
período
integral precisam estar atentas sobre a importância da sesta para as crianças no
início da tarde. Cita um estudo, feito com crianças da educação infantil de uma
escola de São Paulo, no qual se verificou que a introdução do cochilo após o
almoço não modificou o sono noturno dos alunos, e o desempenho escolar
melhorou. E a terceira, nos alerta para os horários escolares que ainda
desconsideram o ritmo interno, individual e biológico dos alunos, principalmente dos
adolescentes.
Esses horários são estruturados tendo a referência externa do currículo
obrigatório e outras normas, e desconsideram as crianças e jovens como seres em
desenvolvimento com características específicas. Não levam em conta as mudanças
orgânicas dos jovens que adentram a puberdade, fase em que sofrem mudanças
nos organismos e também desprezam as condições físico-neurológicas das
crianças.
Para Laban cada pessoa tem um ritmo corporal interno e individual e, de
acordo com as situações vividas do cotidiano, ela age com uma certa
temporalidade. Por exemplo, se estamos em casa num domingo ou feriado,
podemos calmamente acordar, tomar o café da manhã, ler o jornal e conversar com
a família sem a
preocupação
de fazer tudo rápido. Respeitamos o nosso ritmo
corporal interno
. Em dia de trabalho, é diferente.
Se aprendêssemos desde pequenos a conhecer e lidar com nosso ritmo
interno individual a fim de buscar um equilíbrio com o ritmo externo da sociedade
em que vivemos, talvez, levássemos uma vida com menos enfermidades, do
res,
enxaquecas, estresse, etc. A criança precisa desenvolver a capacidade de lidar com
o tempo. Porém é preciso cuidar do que se propõe para ela, no seu tempo. Não se
pode massacrar a criança em seu ritmo interno.
Laban alerta sobre essas questões ao qualificar o fator tempo em
lento
e
rápido
. O tempo do movimento possui três atributos (Rengel, 2003, p.70): duração
(de curta a longa), velocidade (de rápida a lenta) e, não constância na velocidade
do movimento, com momentos acelerados e outros não
.
Essas duas formas qualitativas de experienciar o tempo:
lento
ou
rápido
,
dependem do ritmo interno de cada um, das experiências vividas no meio, etc. A
qualidade de tempo é a urgência do movimento, resultado de uma atitude interna em
relação ao tempo. A urgência não é o mesmo que a velocidade, embora
82
compartilhem da categoria rápido e lento. No contexto escolar podemos verificar
que cada aluno para desenhar, escrever ou mesmo locomover-se na sala de aula o
faz com seu ritmo interno
lento
ou
rápido
.
Wallon apresenta uma concepção de ritmo interno similar ao de Laban. Ele
ressalta que é importante respeitar cada uma das características individuais, porque
cada pessoa tem seu ritmo interno e não se pode exigir que isso seja transformado
apenas pelas exigências da vida em sociedade. que se considerar a busca de
um estado de equilíbrio entre o ritmo interno e o ritmo do meio em que se vive, sem
privilegiar nem um nem o outro.
Wallon também ressalta variações no tônus corporal:
hipotônico
ou
hipertônico
. A primeira, mostra uma pessoa mais lenta, que consegue ficar mais
tempo parada, enquanto a segunda, é de alguém mais agitado. No contexto escolar
percebemos muitas vezes que uma criança hipertônica não consegue ficar muito
tempo fazendo a mesma atividade. Muitas vezes os alunos carregam rótulos de
preguiçosos, agitados ou indisciplinados, quando na verdade estão apenas agindo
de acordo com seu ritmo, com seu tônus. E, nessa situação, ocorre também a
dificuldade de concentração, o que está relacionado ao fator espaço e não ao
tempo.
4.
3
Apresentação dos dados
Com base nas observações coletadas, organizei os dados, qualificando-
os
nas categorias examinadas, e, em subcategorias mais específicas.
O Quadro 2, que apresento mais adiante, sintetiza minhas categorizações.
Para uma mesma situação pode-se ter a emergência de mais de uma categoria ou
subcategoria. Explicarei, antes, as categorizações e subcategorizações, cujas siglas
serão sintetizadas no Quadro 1.
Por ter percebido, durante a coleta, que algumas situações aconteciam
diariamente de modo rotineiro e outras aconteciam em razão de atividades
diversificadas, subdividi o Quadro 2 em três colunas: a primeira coluna apresenta
subconjuntos denominados: rotina diária
para as situações ocorrida
s
diariamente;
atividades escolares
para as situações que envolvem diferentes
83
conteúdos escolares; datas comemorativas
para as situações específicas que
comemoraram datas.
A segunda coluna apresenta, descritivamente, as situações selecionadas
como expressões típicas da aula ministrada pela professora com sua classe. Elas
não são apresentadas em uma ordem cronológica de fatos, mas foram selecionadas
como relevantes para minha análise categorial.
Na terceira coluna, apresento as várias subcategorias implicadas nas
situações, uma vez que as situações sempre são integradas e interdependentes.
Após a coleta de dados, senti necessidade de codificar as subcategorias para
facilitar a análise. Represento-as em siglas, significando a relação da teoria com os
diversos dados colhidos, o que resulta na criação dos conceitos apresentados a
seguir, para a análise das 27 situações observadas e selecionadas do diário de
campo.
4.
3.1 Codificação e descrição do observado
Ao analisar o uso, pela professora, da cate
goria
tempo,
nas observações
selecionadas, classifiquei seus modos de distribuir as atividades das crianças de três
formas, com o objetivo de enfatizar o ritmo corporal nas diversas situações do
processo de ensino-aprendizagem, são elas:
Ritmo
-
Externo
(
RE
),
Ritmo
-
Interno
(
RI
),
Ritmo Externo-
Interno
(
REI
).O
RE
mostra a professora propiciando situações
que exigem que todos os alunos executem as mesmas ações num tempo pré-
determinado por ela. No
RI,
a professora respeita o ritmo interno e individual de
cada aluno durante a execução de diferentes atividades. E, no
REI
, a professora
propõe o mesmo tempo de execução das atividades para todos os alunos, mas
chama um aluno ou um pequeno grupo de alunos para realizar uma determinada
tarefa, enquanto os outros ficam apenas olhando dos seus lugares.
Durante a coleta de dados, pude observar e analisar, em relação à categoria
espaço
, a distribuição espacial das carteiras na sala de aula associada à
possibilidade de movimentação tanto dos alunos quanto do professor. E, também, a
direção do foco ou multifoco da atenção e sua função: comunicação no processo
de ensino
-
aprendizagem.
84
Quando os alunos entravam na sala encontravam as carteiras arrumadas e
distribuídas. Eles sempre se dirigiam aos seus lugares, que haviam sido
demarcados e estabelecidos pela professora. Encontrei três maneiras diferentes de
disposição das carteiras. O primeiro modo, observado em seis encontros, no qual os
alunos estiveram sentados em pequenos grupos de três ou quatro carteiras
dispostas pela sala (Figura 4), chamo distribuição em pequenos grupos e
represento pela sigla
DPQ.
Fig. 4
Os alunos que sentavam nas carteiras da frente, representados pela letra
B,
permaneciam de costas para a lousa e posicionados de frente para os colegas. Em
muitas atividades eles precisavam virar e olhar na direção da lousa, o que exige
deslocamento corporal nem sempre confortável, por todo o tempo em que a
professora exigisse que mantivessem a atenção nesse foco. A mesa da pro
fessora
sempre esteve no mesmo lugar conforme represento com o símbolo
Mesa P
.
No segundo modo, observado em cinco encontros, as carteiras estavam
dispostas enfileiradamente em distribuição convencional, estando as crianças
sentadas em duplas. Represento com a sigla
DC
. O terceiro modo, observado
apenas em dois encontros, a distribuição estava na forma interativa em semi-
círculo
.
Represento pela sigla
DI,
ver figuras 1 e 2.
Ao considerar a possibilidade de movimentação dos alunos pela sala,
detectei três ocorrências. Na primeira ocorrência, observei, em algumas atividades
B
B
A
A
A
A
B
B
B
A
A
A
A
LOUSA
Mesa
P
85
propostas pela professora, o movimento de todos ou, em alguns casos, de alguns
alunos que transitavam pela sala para pegarem seus materiais; ou para levar até a
mesa da professora a atividade a ser corrigida. Essa classificação tem a sigla
M
movimento
. Na segunda, presenciei atividades nas quais todos os alunos
permaneceram totalmente parados em suas carteiras enquanto trabalhavam, o que
represento com a sigla
P
parados
. E, na terceira, houve momentos em que os
alunos puderam, durante as atividades, sentar em outros lugares da sala
estabelecidos pela professora (exemplo: sentar no fundo da sala, etc.). Uso a sigla
ELS
explorando lugares da sala
.
Quanto à exigência das direções espaciais de foco ou multifoco de atenção,
verifiquei que a professora explorou tanto a atenção focada quanto a multifocada
dos alunos nas diferentes atividades propostas.
As situações em que a atenção dos alunos era direcionada a um único foco
e nas quais era exigido pela professora que mantivessem a direção do olhar para
um determinado foco ( exemplo, ela mesma enquanto explicava uma atividade, a
lousa, ou os cartazes expostos na sala), represento com a sigla
AF
atenção num
foco único
.
As situações de multifoco faziam com que alunos tivessem que distribuir
suas atenções nos mais variados acontecimentos que ocorriam ao mesmo tempo:
por exemplo, fazer o trabalho proposto pela professora e ouvir outra orientação
durante a atividade; muitas vezes um aluno ia ao encontro da professora para
esclarecer uma dúvida; enquanto fazia sua lição e ela respondia em voz alta,
todos os outros ouviam a resposta da professora para aquele aluno que perguntou
e, enquanto isso, continuavam fazendo suas lições sentados nas carteiras;
conforme iam terminando a lição levavam para a professora ver e retornavam aos
seus lugares para corrigir o que foi feito. Essa situação aparece classificada com a
sigla
AMF
atenção multifocada
.
A categoria
fluência
se apresenta relacionada à categoria afetividade pelos
mecanismos de ação da emoção: plasticidade, e, as variações do tônus: hiper e
hipotônus. Represento
-
a com a sigla
PL
plasticidade
.
A categoria
peso
manifesta-se, conforme foi dito, nas situações em que
os alunos mostram persistência para aprender a escrever, ler e falar as palavras e
os numerais, descobrir a sensação do peso da mão no papel no ato da escrita e
contornar as dificuldades surgidas nesse processo. Aparece classificado com a sigla
86
PA
persistênc
ia para aprender. Essa categoria também mostra a aptidão para
planejar mentalmente a execução de uma seqüência de movimentos, quando a
professora, por exemplo, pedia para pegarem diversos materiais nas gavetinhas e
depois nas suas malas. Classifico com a sigla
PSM
planeja uma seqüência de
movimentos
.
Procurei observar durante toda a coleta de dados, a presença da categoria
afetividade pelos mecanismos de ação da emoção: plasticidade, contagiosidade e
regressividade,
expressados em diferentes manifestações e reações dos alunos. A
subcategoria
plasticidade
PL
está sinalizada no quadro, porém não as outras
duas condições que aparecerão na análise das situações, uma vez que implicam
inferências diferentes em relação ao descrito anteriormente, o mesmo o
correndo
com a fluência. Explorarei as categorias
fluência
e
afetividade
pelas suas
intersecções.
Especifico, no Quadro 1, a seguir, as siglas utilizadas para cada
subcategoria.
87
Quadro 1
Categorias, subcategorias e siglas
Categoria
Subcategoria
Sigla
Tempo: ritmo corporal
Ritmo Externo
Ritmo Interno
Ritmo Externo
-
Interno
RE
RI
REI
Distribuição
Espacial
Distribuição em Pequenos Grupos
Distribuição Convencional
Distribuição Interativa
DPQ
DC
DI
Movimentação
Movimento
Parado
Exploran
do Lugares da Sala
M
P
ELS
Espaço
Focos de atenção
Atenção num Foco Único
Atenção Multifocada
AF
AMF
Peso
Persistência para aprender
Planeja uma seqüência de
movimentos
PA
PSM
Fluência/Afetividade
Plasticidade
PL
88
89
90
91
92
93
4.
4
A análi
se das situações
Para melhor visualizar a intersecção das categorias, elaborei três quadros
que representam cada subconjunto. Cada quadro apresenta o número da situação e
as categorias observadas, representadas pelas siglas.
Quadro 3
Subconjunto: Rotina Diária
Situação
1 2 3 4 5
Tempo: ritmo corporal
REI
RE
REI
REI
REI
Espaço: distribuição espacial
DC
DPQ
DI
DPQ
DC
DPQ
DC
DPQ
DC
Espaço: movimentação
M M M M M
Espaço: foco de atenção
AMF
AF
AF
AF
AF
Peso: persistência/pla
neja seqüência de
movimento
PSM
PSM /
PA
PA
PA
PA
Fluência afetividade
PL
Quadro 4
S
ubconjunto: Atividades Escolares
Situação
6 7 8 9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
Tempo: ritmo
corporal
RE
RE
RE
RE
RI
RI
RI
RI
RI
RI
REI
REI
REI
RI
Espaç
o:
distribuição
espacial
DI
DPQ
DPQ
DC
DC
DC
DPQ
DPQ
DPQ
DI
DPQ
DPQ
DPQ
DPQ
Espaço:
movimentação
P M P
ELS
P M
P /
ELS
M M M M M P
ELS
Espaço: foco
de atenção
AF
AMF
AF
AF
AMF
AMF
AMF
AMF
AMF
AMF
AF
AF
AMF
AMF
Peso:
persistência/
planeja
seqüência de
m
ovimento
PSM
PA
PSM
PA
PA
PA
PA
PA
PA
PA
PA
Fluência/
afetividade
PL
PL
PL
PL
PL
PL
94
Quadro 5
Subconjunto: Datas Comemorativas
Situação
20
21
22
23
24
25
26
27
Tempo: ritmo corporal
RE
RI
RI
RI
REI
RI
RI
REI
Espaço: distribui
ção espacial
DC
DC
DC
DC
DPQ
DPQ
DPQ
DI
Espaço: movimentação
ELS
P M P ELS
M P ELS
Espaço: foco de atenção
AF
AMF
AMF
AF
AMF
AMF
AMF
AMF
Peso: persistência/planeja seqüência de movimento
PA
PA
PSM
PSM
Fluência/afetividade
PL
Apresento abaixo uma análise mais específica de cada categoria em cada
subconjunto e em cada situação observada. Em alguns subconjuntos não apresentei
a análise de determinadas categorias porque estas não foram representativas para
o contexto do subconjunto. Considero, nestas análises, as anotações feitas no
caderno de campo. Seguem as análises por categoria.
A. Categoria Tempo: ritmo corporal
Analisei três aspectos:
1.
ritmo externo
RE
: o tempo era pré-determinado pela
professora para que todos os alunos rea
lizassem as mesmas atividades;
2.
ritmo interno
RI
: a professora procurou respeitar o ritmo
interno de cada aluno durante as atividades que eles realizavam;
3.
ritmo externo-
interno
REI
: o mesmo tempo era destinado
para que todos os alunos realizassem as mesmas atividades, mas na maioria
das vezes, apenas um aluno ou um pequeno grupo de alunos participava
ativamente, os outros ficavam sentados em seus lugares.
No Quadro 3
Subconjunto: Rotina Diária
prevaleceu a presença do
REI
.
Havia os alunos que a professora chamava para participar das atividades, como: ler
o cartaz da seqüência numérica, o alfabeto de referência, o dia da semana, ou pegar
95
seus materiais nas gavetinhas. Somente para esses alunos, seus ritmos internos no
momento da realização da ação era respeitado pela professora, conseqüentemente
eles se mostravam, nessa hora, mais participativos e envolvidos no processo de
ensino
-aprendizagem, enquanto os outros, que apenas assistiam de seus lugares,
se mostravam inquietos, agitados na carteir
a, buscando outras distrações.
Na Quadro 4
Subconjunto: Atividades Escolares e no Quadro 5
Subconjunto: Datas Comemorativas, observei a presença do
RI
em equilíbrio com o
RE
e
REI
. Houve um certo respeito ao ritmo interno e individual de cada aluno e ao
mesmo tempo eles foram levados a se adaptarem ao ritmo externo.
Assim, nas situações 2, 6, 7, 8, 9, 20, houve o predomínio do
RE
. Claro
que devam existir situações escolares em que haja o
RE
, porque é importante para
os alunos vivenciarem
-
no,
a fi
m de que iniciem uma aprendizagem individual que os
ajude a buscar um equilíbrio entre o próprio ritmo interno e individual (pessoal) e o
ritmo externo da situação vivenciada (social), porém ela não pode ser a única forma
de trabalho imposta pela professora. É necessário que os alunos aprendam a
conviver harmonicamente com o ritmo externo do meio em que vivem, o que
significa buscar esse equilíbrio e não mera adaptação ou sujeição. Essa é uma
questão considerada tanto por Wallon quanto por Laban, conforme expliquei nos
capítulos I e II.
Outro aspecto a se ter em mente é a observação de que, levar os alunos a
executarem as mesmas ações, sempre juntos, traz atos totalmente mecanizados, o
que apareceu nas situações 2 e 8. Os alunos, automaticamente respond
iam
inúmeras perguntas feitas pela professora, muitas vezes sem ouvi-las atentamente.
Apenas repetiam as palavras que ouviam, não se concentravam todo o tempo que a
professora estipulava para a atividade, o que gerou a inquietude, a agitação. A
mecânica da atividade nessas situações, num ritmo imposto, com a atenção num
foco único
AF
, levou à dispersão. A professora percebeu a inquietude e agitação
de alguns alunos, pois começavam a se mexer, olhar para os lados, levantar e pedir
para ir ao banheiro. Diante desse fato, ela apenas ordenou silêncio e atenção sem
modificar o procedimento de ensino adotado e sem perceber que seria necessário
reduzir o tempo de atenção e não conter os movimentos dos alunos nesses
momentos.
Nessas situações que exigiram muito mais, para as atividades realizadas, o
RE
e a atenção num foco único (
AF)
, observei diversas manifestações corporais
96
dos alunos que não resistiam ao tempo destinado pela professora para as tarefas,
desconcentravam
-se, ficavam inquietos, procuravam buscar outros focos de
atenção, mesmo porque, nessa fase ainda está-se consolidando o desenvolvimento
da
disciplina mental.
Para as situações 10, 11, 12, 13, 14, 15, 19, 21, 22, 23, 25, 26 houve a
presença do
RI
, o que necessariamente não significa que a
pr
ofessora reconhece o
ritmo interno e individual das crianças e tem consciência de como trabalhá-lo. Isso
porque a mesma proporção de situações
RE
e
REI
. A professora mostrou
preocupação em observar o empenho individual ou grupal, nas situações 10, 12,
21,
25. Nas situações 25 e 26 a professora deixou-os livremente para atuarem na
criação dos seus trabalhos, o que foi raro.
Observei, nas situações 11, 13 e 22, que as crianças ficavam bem à
vontade depois que levavam a folha para a professora corrigir, algumas ao voltar
para suas carteiras, paravam e conversavam com os colegas sentados em outros
lugares, iam até suas gavetinhas pegar ou guardar algum material. Enquanto isso, a
professora corrigia as lições e não exigia total silêncio ou imobilidade dos al
unos que
terminavam antes.
Para as situações em que claramente prevaleceram o
RI
, percebi que,
apesar de toda dispersão, as crianças que eram solicitadas, de um modo geral,
ficaram muito mais livres e envolvidas no processo de ensino-
aprendizagem.
Dialo
gando entre si, buscando apoio, dando apoio aos colegas, focando-se bem
mais nas atividades, individualmente, em grupo ou com parceiros.
Para as situações 1, 3, 4, 5, 16, 17, 18, 24 e 27 predominou o
REI
. Para o
aluno ou para o pequeno grupo de alunos que realizavam as atividades, seus ritmos
internos eram respeitado e como estavam mais diretamente partilhando do
processo, mostravam-se mais envolvidos com o que ocorria. No entanto, o restante
da sala, que ficava apenas olhando para aquele colega, ou grupo, que fazia ou
respondia a atividade, após alguns minutos da sua execução, começava a se
desinteressar, muitas vezes porque esse restante estava sentado distante do
cartaz, tinha dificuldade para olhar o que estava escrito, e, mecanicamente
repetia
o que ouvia. Esses alunos que apenas observavam, ficavam corporalmente
inquietos nas carteiras, e procuravam se distraírem com outras coisas, conversando
e brincando com o colega que estava sentado ao lado.
97
A situação não é propícia à aprendizagem e ao de
senvolvimento integrado e
integral das crianças. Surge-me, novamente, a necessidade de questionar esses
procedimentos de ensino, adotados pela professora, que priorizavam a ação de um
aluno, deixando os outros apenas olhando. É importante considerar, nas
crianças
do estágio categorial, a atitude de não resistir às distrações surgidas e o poder de
selecionar onde deseja ou não se concentrar. O fato de os alunos não conseguirem
ficar parados e concentrados apontam o lento processo de desenvolvimento da
disc
iplina mental e, sendo assim, a professora precisa ter em conta esse processo
no momento do trabalho com os alunos.
Desse modo, quanto à categoria
tempo
, os dados coletados e analisados,
mostram a professora, na rotina da classe e na execução do seu plano de aula,
transitando pelos diferentes modos de utilização dessa categoria nas suas
integrações com as outras categorias. Prevaleceram as formas de
RE
e
REI
, ambas
levando à desatenção, inquietação e agitação dos alunos, em conseqüência do
trabalho parcel
ado com um aluno, ou pequeno grupo.
Reitero que essas formas podem ser vivenciadas na aula, porém, segundo
as concepções labaniana e walloniana, é preciso considerar, no desenvolvimento
dos alunos, os efeitos desses dois ritmos.Também é preciso atentar para a
afetividade que permeia o processo de ensino-aprendizagem, porque, muitas vezes,
o ambiente de aprendizagem se dilui em desconforto e desinteresse de modo tal que
acaba por gerar nos alunos uma dificuldade para aprender a tomar decisões, a fazer
es
colhas, vindo a prejudicar os verdadeiros objetivos. Ilustro essa questão com um
desenho apresentado por Tonucci (1997, p.128).
98
B. Categoria Espaço: distribuição espacial
Nessa categoria procurei, durante a coleta de dados, observar como as carteir
as
estiveram dispostas no espaço de sala de aula. Sempre que os alunos entravam na
sala, encontravam as carteiras arrumadas e tinham seus lugares demarcados
para sentar. Analisei três modos de disposição das carteiras:
1.
distribuição em pequenos grupos
DPQ
: as carteiras estiveram
dispostas em pequenos grupos (
vide
figura 4);
2.
distribuição convencional
DC
: as carteiras estiveram enfileiradas
em duplas (
vide
figura 1);
3.
distribuição interativa
DI
: as carteiras estiveram em semi-
círculo
(
vide
figura 2
).
Nas situações de 1 a 5, de 7 a 14, e de 16 a 26, a professora privilegiou a
DPQ
ou a
DC
. Esses dois modos de distribuição das carteiras são pouco interativos
99
e pode perceber que predominaram nas situações de aula. Eles geram um diálogo
mais verticalizado (professor/alunos) e a comunicação entre todos os alunos da
classe fica difícil pela própria posição das carteiras e porque o espaço para se
movimentarem fica bem reduzido.
O modo
DI,
que pode facilitar a interação e a comunicação entre todos
prese
ntes, foi pouco utilizado pela professora. Essa disposição apareceu nas
situações 2, 6, 15, 27. Sempre era a professora quem mais se movimentava pela
sala, deixando a entender que a necessidade da ação corporal dos alunos no
processo de aprendizagem desta fase não foi um fator considerado no plano de
aula. Parece predominar a antiga concepção de que, para haver aprendizagem, o
aluno precisa estar quieto no seu lugar.
Observei que, para a professora, não importava, para os diferentes
momentos de trabalho, a disposição e organização das carteiras, deixando
transparecer que as carteiras estavam ali representando apenas um acessório
naquele espaço. Este, conseqüentemente, não contava como fator interveniente na
situação de ensino. Não procurava melhor
acomodação entre todos os alunos e nem
manifestava consciência das possíveis interferências da influência do espaço nas
suas experiências e aprendizagens. Isso esteve bem marcado nas situações 9, 12,
19, 20, 24, pois as carteiras estavam dispostas no modo DPQ
ou
DC,
e os alunos
tiveram de sentar desconfortavelmente amontoados no pequeno espaço que
sobrava da sala. Nas situações 2, 6, 15 e 27, as carteiras estiveram no modo DI,
no
entanto
a professora o explorou o espaço vazio que ficava na sala, com
exceção
da situação 27 em que ela tirou proveito disso, sendo essa, também, a única
situação em que os alunos ficaram mais confortavelmente acomodados.
Um sentido pedagógico que procure articular a distribuição espacial das
carteiras, gerar o sentimento de integração e a possibilidade de movimento na sala
de aula, relacionado ao processo de ensino-aprendizagem, não estava construído
na consciência profissional dessa professora. E, de modo geral, é assim nas
escolas. Isso sinaliza uma concepção não integral, mas fragmentária das crianças.
Talvez uma boa imagem seja a visão de cabeça/mentes sem corpos .
100
C. Categoria Espaço: movimentação
Procurei observar e analisar a possibilidade de os alunos se movimentarem
quando estavam dentro da sala de aula. Como descrevi, classifiquei esse
movimento de três modos:
1.
movimento
M: os alunos podiam se movimentar pela sala para
pegar algum material, ir até a mesa da professora, etc;
2.
parado
P: os alunos permaneciam totalmente parados em suas
carteiras
enquanto trabalhavam;
3.
explorando lugares da sala
ELS
: os alunos podiam sentar em
outros lugares da sala, desde que estes fossem estabelecidos pela
professora.
No Quadro 3
Subconjunto: Rotina Diária
vê-se que prevaleceu a
presença do M, porém quero ressaltar que podiam se movimentar pela sala, os
alunos convocados para participar das atividades propostas. Alguns desses
movimentos estiveram associados a rotinas: ir à mesa da professora entregar
trabalho, ou pegar trabalho, buscar materiais, se sol
icitado,
pegar materiais nas
gavetinhas ou em suas malas, alguns alunos em pequenos grupos ou
individualmente podiam ir a um determinado local que a professora mandava. Os
demais alunos mantinham-se sentados, olhando, esperando, e logo iam ficando
inquieto
s.
Conforme o Quadro 4
Subconjunto: Atividades Escolares
e o Quadro 5
Subconjunto: Datas Comemorativas , prevaleceram as presenças do M, como
descrito anteriormente, e do
ELS
. O
ELS
mostra que, durante essas atividades, os
alunos puderam sentar e
m diferentes lugares, como na frente das carteiras, no fundo
da sala, e tiveram mais possibilidades de se movimentaram entre uma atividade e
outra do que permanecerem sempre parados. Isso ocorreu poucas vezes,
relativamente. A grande possibilidade de movimento e exploração dos diferentes
lugares da sala, nesses subconjuntos, não me revelou que a professora tivesse
consciência do quão importante isso vem a ser para o pleno desenvolvimento dos
alunos.
101
Quando, por vontade própria, os alunos resolviam circular pela sala, ou ir
até a carteira de algum colega, a professora, assim que notava, mandava-
os
retornarem aos seus lugares. E nas situações 9, 12, 19, 20, 24 e 27, em que
predominou o
ELS
, ainda o local da sala para os alunos sentarem sempre era
definido
pela professora.
Percebi forte controle do espaço e do movimento dos alunos, o que de certa
forma os comprime, constrangendo suas expressividades corporais, verbais e
relacionais. Conforme Wallon, a percepção espacial se constrói pelo movimento,
associado
ao desenvolvimento da disciplina mental, trazendo progressos ao
pensamento; essa ligação, no entanto, não se faz apenas relacionada ao
movimento, mas também às conotações afetivas a ele integradas. Os alunos, ao
transitarem pelo espaço da sala de aula, experimentam sensações afetivas
decorrentes das interações, seja por proximidade, seja por distanciamento, com os
colegas, o professor, fazendo suas escolhas, concessões ou negociações. De outro
modo, quando se lida com o espaço de maneira rígida, os alunos aprendem, ao
experimentar sensações do seu corpo em movimento, que esse espaço é
comandado por alguém hierarquicamente mais poderoso e por isso não podem se
mover quando querem, precisam ser obedientes, dóceis. Todas as aprendizagens
vividas na interação com o espaço manifestam estados emocionais e geram
sentimentos, infelizmente, por vezes dolorosos ou repressores.
A repressão ao uso e exploração do espaço da classe mostra um enorme
contra
-senso, porque a sala de aula deveria ser um espaço dos alunos, feito para os
alunos, deixando
-
os também se sentirem co
-responsáveis por sua organização, sua
decoração. Um local, afinal, em que os alunos permanecem quatro horas diárias, e
poderiam explorar, criar, movimentar e conseqüentemente aprender de forma
mais
prazerosa e envolvente, especialmente na faixa etária que estou considerando
nessa pesquisa. O que é preciso buscar são situações pedagógicas em que se
equilibrem todos esses aspectos, aqui apresentados, em processo de
desenvolvimento salutar.
Wallo
n nos alerta sobre a
oportunidade de criarmos movimentações em sala
de aula durante uma atividade e outra, a fim de não sobrecarregar o tônus e,
também, de auxiliar no processo de consolidação da disciplina mental. Esse
processo precisaria ser conhecido e considerado pela professora na execução das
tarefas diárias escolares, não se interpretando como desinteresse a inquietação
102
corporal dos alunos, como por exemplo a movimentação da cabeça em várias
direções, a interrupção da explicação da professora para pedir para ir ao banheiro,
conforme se constatou nas situações 2, 6, 7, 9, 20 e 27, em que também
prevaleceram a atenção num foco único
AF
. Mas esse movimento pode ser visto
como uma necessidade da criança para compensar o excesso de concentração e
sede
ntarismo vivido, porque as atividades propostas demandaram um autocontrole
das próprias ações, do tônus e, ainda, como um interesse dos alunos por outros
estímulos que os rodeiam.
D. Categoria Espaço: foco de atenção
Essa categoria mostra o foco de atenção exigido dos alunos durante as
atividades. Encontrei duas maneiras:
1.
atenção num foco único
AF
: os alunos tinham que estar com o
olhar direcionado para o foco sugerido pela professora;
2.
atenção multifocada
AMF
: os alunos tinham que estar atentos ao
s
variados acontecimentos que ocorriam na sala de aula, o que exigia
uma atenção em vários focos ao mesmo tempo.
No Quadro 3
Subconjunto: Rotina Diária , prevaleceu a presença da
AF
.
Para as situações que fora exigida a
AF:
2, 3, 4, 5
,
8, 16, 17 e 20, percebi a
inquietação, a busca dos alunos por outros focos de atenção. A inquietação aparecia
principalmente quando a professora chamava apenas alguns alunos para irem ler e
os outros tinham que ficar sentados nos seus lugares e acompanhar a atividade.
Es
ses alunos que ficavam sentados rapidamente focalizavam suas atenções para
outras coisas, mexendo nos materiais, cutucando ou conversando com o colega, até
porque o cartaz que estava sendo lido, muitas vezes estava localizado num ponto da
sala em que era impossível a boa visualização para os que estavam sentados no
fundo da sala. A professora percebia essas distrações e as considerava como
transgressões. Logo repreendia os alunos sentados e dizia que todos deviam olhar e
prestar atenção, desconsiderando o fato, por exemplo, da localização do cartaz, da
103
distribuição espacial das carteiras nessas atividades e do desenvolvimento da
disciplina mental
.
Especificamente nas situações 3, 4 e 5, a professora antes de iniciar a
atividade sempre pedia silêncio e atenção a todos os alunos. Esse pedido da
professora vinha acompanhado da exigência que o foco do olhar dos alunos
estivesse voltado para onde ela apontava. Isso pode ser traduzido como uma
mecanização de atos e o desconhecimento do processo de amadurecimento
da
disciplina mental
.
No Quadro 4
Sub-conjunto: Atividades Escolares
e no Quadro 5
Sub-
conjunto: Datas Comemorativas
, prevaleceram situações com a presença da
AMF
.
Para Wallon, é fundamental no processo de desenvolvimento de aprendizagens dos
alu
nos, apesar do avanço lento da disciplina mental nessa faixa etária, propor
atividades que exijam a atenção distribuída. Também é preciso considerar que, para
vivermos na sociedade contemporânea, temos que ter também a atenção
multifocada, num contrabalan
ço da focada.
O foco da atenção quase sempre foi algo imposto pela professora. O aluno,
no período em que permanecia em sala de aula, não tinha muita oportunidade de
dirigir sua atenção para onde quisesse, por ter sempre que estar ocupado e com a
atenção direcionada. Aliás, havia uma grande preocupação em mantê-los fazendo
alguma atividade para que não se gerasse a indisciplina . Também houve grande
cobrança da imobilidade e da atenção focada, sempre que a professora precisava
transmitir um recado ou aviso, exigindo que os alunos direcionassem seus focos do
olhar para ela e ficassem parados.
E. Categoria Peso: persistência/planejamento de uma seqüência de movimentos
Essa categoria revela nos alunos a direção da vontade para querer
aprender, para superar as dificuldades surgidas no seu processo de alfabetização,
bem como sua capacidade de planejar seqüências de movimento. Classifiquei-a em
dois aspectos:
104
1.
persistência para aprender
PA
: os alunos tinham que superar a
dificuldade para ler, falar e escr
ever as palavras e numerais;
2.
planeja uma seqüência de movimentos
PSM
: os alunos
precisavam ser capazes de planejar suas ações, pois a professora
pedia para lidarem com vários materiais ao mesmo tempo.
Pelos Quadros 3, 4 e 5, vemos que prevaleceu a presença da
PA
, o que
mostra os alunos contornando as dificuldades surgidas, querendo aprender a ler e
escrever, envolvendo-se no processo de ensino-aprendizagem, muitas vezes de
modo penoso.
A presença do
PSM
, nos Quadros 3, 4 e 5, em algumas das situações,
mostrou a capacidade de os alunos planejarem uma seqüência de movimentos
quando a professora, por exemplo, dizia que precisariam pegar determinados
materiais em suas gavetinhas e depois realizar outra ação. A capacidade de
planejar mentalmente os movimentos surge, segundo Wallon, no estágio categorial.
Isso aconteceu em menor freqüência nas situações do que a
PA
, notando-se mais
demanda da professora para as atividades de escrita ou leitura como exercício de
carteira.
Em quase todas as situações há a presença da
PA
, mas houve momentos
em determinadas situações, como as: 3, 4, 5, 16, 17, nas quais se exigia a
participação de apenas um aluno ou um pequeno grupo, ficando o restante da sala
apenas olhando para o foco sugerido, repetindo mecanicamente o que ouvia.
Portanto, uma situação de
PA
relativa.
Na situação 14 observei um aluno escrever sua frase: o pato ele é amarelo,
e levá-la até a mesa da professora para corrigir, ouvindo-a dizer em voz alta que
dessa maneira não podia escrever a frase, teria de ser: o pato é amarelo. O aluno,
ao ouvir isso da professora, foi retornando para seu lugar e apresentou uma
reação tônico-postural tensa. Sua expressão facial demonstrava contração. Ele
permaneceu algum tempo sentado, sozinho em sua carteira, olhando para a sua
agenda com o lápis na mão, persistindo em conseguir escrever corretamente a
frase
. Ficou balançando o tronco durante todo o tempo que esteve em sua carteira
e, até retornar para a mesa da professora, sua expressão facial continuou tensa e
seu tônus rígido. Pode-se ver nesse aluno, além da presença da categoria
PL
-
plasticidade
, evidenciando forte emoção, com a expressão facial tensa e agitação
105
corporal, a presença da
PA
ao retornar ao seu lugar e esforçar-se para conseguir
escrever
a frase corretamente.
F. Categoria Fluência/Afetividade
Englobei as categorias fluência e afetividade para a análise, em razão das
fortes ligações entre elas. Com essas duas categorias procurei observar a presença
dos mecanismos de ação da emoção expressos pela:
plasticidade
manifestação
da emoção do aluno, vivida durante todo o processo de ensino-aprendizagem, com
diferentes reações tônico-posturais do corpo; a contagiosidade
em que se
observou o contágio emocional de um grupo de alunos que estava em volta de um
aluno, ou de um pequeno grupo que viveu uma emoção como o medo, a alegria etc.;
e
regressividade
na qual se observou a regressão de um pensamento mais
objetivo, quando o aluno sentiu medo ou raiva da professora.
Para essas subcategorias farei uma análise de cada situação e não dos
subconjuntos porque as manifestações da emoção foram expressas em situações
individuais.
Observei, nas situações 2, 6, 7, 9 e 20, as crianças sendo apressadas pela
professora para realizarem determinada ação. Elas, sentindo-se pressionadas e
dominadas interiormente pela situação, mostraram o que Wallon chama de
sentimento de ansiedade. Apareceu, a manifestação corporal desse sentimento,
com reações corporais dos alunos do tipo correr pela sala de aula para pegar os
materiais nas gavetinhas ou retornar às suas carteiras, às vezes trombando-
se,
contagiando
-se uns aos outros a fazerem tudo rapidamente, sacudindo as mãos,
chacoalhando o tronco nas carteiras. Essa manifestação dos alunos nessas
situações,
levou
-me a fazer a leitura da categoria fluência pela
plasticidade
e da
afetividade pela
contagiosidade
.
Nas situações 6, 9 e 20, a pré-determinação do tempo pela professora
gerou a pressa e conseqüentemente a ansiedade nos alunos. Isso, muitas vezes,
fe
z emergir a
regressividade
, com a realização de trabalhos inconclusos ou
malfeitos.
106
Na situação 15, observei um aluno que não conseguiu escrever o
antecessor e o sucessor do número proposto e a professora, ao olhar seu caderno,
num tom de voz áspero, man
da
-o procurar no cartaz da seqüência numérica, fixado
ao lado da lousa, o número que precisava encontrar. Toda a classe observava essa
situação. O aluno dirigiu-se ao cartaz, com expressão facial de choro, e não
conseguiu encontrar e dizer em voz alta os números pedidos. A professora, ao notar
sua face de choro, muda sua entonação de voz e a criança automaticamente reage,
consegue encontrar o número e dizê
-lo em voz alta. Essa situação revela a presença
da
plasticidade
com o choro da criança e da
regres
sividade
quando ela sentiu-
se
exposta diante da classe, ficando incapaz, por alguns minutos, de ter uma reflexão
mais objetiva; assim que ela se sentiu acolhida pela professora reagiu e, por sua
vez, a professora, com a atitude mais racional, de modificar o tom de voz, acabou
obtendo uma reação diferente desse aluno. A ação-reação tanto do aluno quanto da
professora
...apóia
-se no pressuposto de que, para algumas crianças, a
aprendizagem depende da elevação da temperatura afetiva ( isto é, da intensific
ação
do vínculo)...
(Galvão, 2003, p.83).
A situação 18 apresenta o início da representação de ser/estar
comportado que os alunos têm aprendido no contexto escolar. No caso, quando a
professora avisou que chamaria os alunos que estivessem quietos, suas reações
imediatas foram enrijecer o tônus e abaixar as cabeças na carteira a fim de
mostrarem que realmente estavam quietos, comportados, o que revela a presença
da
plasticidade
. Ao ver essa reação, parecendo um movimento em grupo
sincronizado e combinado da grande parte da sala abaixando as cabeças, o que
representa uma reação de
contagiosidade
, veio-me à tona as discussões de
Foucault (1987) no texto Corpos dóceis. Apesar de saber que muitos alunos, nessa
situação, abaixaram as cabeças porque fora
m contagiados pelos colegas, presenciar
isso me deixou muito inquieta. Muitos desses alunos, de apenas 6 anos, estão no
início de um processo de escolarização, o que significa que freqüentam a escola
dois ou três anos, isso vem demonstrar o quanto o meio escolar reprime as
ações corporais, com a concepção equivocada de que, para aprender, é preciso
estar corporalmente quieto, imóvel. Entre outros fatores, esse tipo de entendimento
não considera que muitas horas de imobilidade podem impedir um bom
desenvolvimento intelectual, ao mesmo tempo em que revela o desconhecimento da
107
possibilidade de explorar o movimento em diversas situações do processo de
ensino
-
aprendizagem.
Na situação 27, enquanto a professora relatava a história de São Pedro, um
alu
no a interrompeu por duas vezes, pedindo para ir ao banheiro. Isso mostra a
...
visível divergência entre as intenções do professor
conter
e a dos alunos
escapar ao controle
...
(Galvão, 1995, p.108).
Acredito que seja possível propiciar situações, dentro do processo
educativo que levem os alunos desde a educação infantil a aprender a equilibrar os
ritmos, os tempos, os espaços, a fluência e a afetividade que são aspectos da
consciência humana, de si, do outro, do mundo, para que comecem a desenv
olver
suas autonomias e tenham uma formação mais integral. Porém, para que isso
ocorra, precisamos repensar a formação dos professores.
108
CAPÍTULO V
RELAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO
INFANTIL E IMPLICAÇÕES PARA A
FORMAÇÃO E PRÁTICA DOCENTE
109
As premissas apresentadas na introdução deste trabalho relativas aos
pensadores em educação, Rousseau, Pestalozzi, Froebel e Freinet, tiveram o intuito
de trazer as reflexões desses para o culo XXI, retomando a visão integral do
ho
mem. Os a
utores, mesmo em diferentes perspectivas, procuraram mostrar o quão
importante é o processo de formação do ser humano
por inteiro - em contato
com o meio, e o quão fundamental é o papel, também, da educação escolar.
Trazem a importância de haver, na educação, consciência da integração dos
aspectos cognitivos, afetivos, motores e sociais que formam um cidadão.
Wallon e Laban, em tempo histórico mais recente, insistiram também na
visão de que o ser humano é afeto, cognição e movimento integradamente. Como
vimos, ambos têm pontos de contato semelhantes. Wallon dedicou-se à psicologia
da criança, sempre concebendo o desenvolvimento afetivo, motor e cognitivo de
modo integrado e contextualizado ao meio. Trouxe estudos de grande contribuição
sobr
e a integração desses três aspectos no desenvolvimento humano, com as
possíveis implicações na prática pedagógica. Laban, no entanto mais voltado para
as questões relacionadas ao movimento humano, fez sempre questão de deixar
claro que o movimento não é u
m fragmento isolado do homem, mas está integrado à
existência humana, que o movimento expressa sentimentos e pensamentos e que o
meio também contribui para delimitá-lo, assim como ao comportamento da pessoa.
Com sua sensibilidade artística, Laban teve um novo olhar para o movimento, para
muito além do viés da biomecânica. Os próprios fatores de movimento por ele
criados:
fluência, espaço, peso e tempo, presentes sempre em nossos
movimentos, ajudam a compreender o ser humano em sua integralidade, po
rque
eles expressam intenções, comunicam pensamentos, sentimentos e emoções.
Além da visão integral de homem defendida por todos esses teóricos, eles
também enfatizaram o grande papel da educação escolar e do professor no
processo de formação do ser humano, considerando-se essa integralidade a
interação do conjunto de características que o definem. A escola é um
meio
funcional
(Wallon, 1979, p.164), mediada pela prática docente, que ajuda o aluno a
viver com responsabilidade, cooperação, interesse e liber
dade.
O esquema abaixo
sintetiza a concepção
do homem cidadão como um ser que, em contato com o meio,
se desenvolve integradamente e integralmente.
110
Pelos estudos em educação, especialmente as análises
e pesquisa relativas
ao cotidiano escolar, sabe-se da ênfase das escolas nos aspectos cognitivos dos
alunos, em detrimento da atenção a outros aspectos do ser humano. Justamente o
problema que me instigou foi observar em que condições e aspectos se concret
iza
ou não a visão fragmentada do aluno no processo de ensino-
aprendizagem em sala
de aula. Procurei compreender isso, de uma perspectiva integrada do ser humano
em pedagogia, tornando o corpo humano como elemento integrador, expressivo,
ponto de síntese, da cognição, mais afetividade, motricidade, expressividade e
consciência.
As cinco categorias selecionadas para essa pesquisa procuraram
considerar a visão integral do ser humano. O estudo mostrou que cada uma das
categorias, tomada como referência, não apontou a dimensão relacional e educativa
humana como linear ou pontual, mas todas elas se mostraram integradas e
articuladas nas ações escolares, com impacto no desenvolvimento infantil. Cada
uma delas se apresentou com possíveis implicações no processo de ensino-
HOMEM
CIDADÃO
CABEÇA
MÃO
CORAÇÃO
SER HUMANO INTEGRAL:
AFETO, COGNIÇÃO E
MOVIMENTO
EDUCAÇÃO
ESCOLAR
PRÁTICA
DOCENTE
COOPERAÇÃO
RESPONSABILIDADE
INTERESSE
LIBERDADE
111
aprendizagem, sempre associada às outras. A fluência e a afetividade mostraram
as variações tônico
-
posturais e a expressão das diferentes manifestações e reações
corporais dos alunos durante todo o processo de aprendizagem; o espaço mostrou
se a distribuição das carteiras possibilitava ou não a movimentação dos alunos,
suas representações de expressão, e qual era a exigência do foco de atenção; o
peso revelou o esforço dos alunos para aprender a ler e escrever
suas vontades, o
que implica escolhas; o tempo apresentou o ritmo proposto pela professora para as
atividades que os alunos realizavam.
Algumas perguntas inquietantes percorreram esta pesquisa e procurarei, a
seguir, apresentar algumas considerações finais, a partir de
algumas delas.
Os alunos no processo de ensino-aprendizagem são vistos de modo
integral: cognição, afeto e movimento?
Observei durante a pesquisa de campo essa questão porque cognição,
afeto e movimento são dimensões integradas e fundamentais do ser humano. No
entanto, no cotidiano da sala de aula, passam a ser tomadas de modo isolado, como
características independentes e não interdependentes, o que afeta o
desenvolvimento integral das crianças. Foi o que observei.
A análise dos dados mostrou que a professora da escola pesquisada não
tinha uma compreensão integral dos alunos no processo de ensino-
aprendizagem,
pois sempre priorizava o cognitivo, reprimia o motor e em geral, com exceção de
poucos momentos, desconhecia o afetivo. Infelizmente, isso não é um dado
particular da professora observada, mas está presente em âmbito mais geral das
escolas nas quais muitos professores não consideram ou desconhecem a
integralidade dos seres que estão formando, assumindo posturas e atitudes nem
sempre condizentes com as necessidades da criança em seu processo formativo e
de desenvolvimento. tolhimentos, incompreensões, restrições, repetições, com
alguns momentos de estímulo e percepção mais integrada.
112
O que se passa numa sala de aula a partir dessa
visão?
A sala de aula deveria ser um
locus
fértil de aprendizagem, mais do que
isso, de desenvolvimento humano, na relação entre professor e alunos, onde se
poderia possibilitar um encontro para aprender, refletir e crescer num clima de
parceria, diálogo e respeito, ao permitir que os alunos trouxessem suas informações
e conhecimentos externos, se sentissem acolhidos, podendo expressar-se de
diferentes modos.
Para que a sala de aula seja esse espaço que propicie aprendizagens
significativas e integrais, é preciso considerar pelo menos dois tópicos. O primeiro,
refere
-se à exploração de diferentes ambientes do espaço escolar, para que os
alunos não fiquem sempre confinados em espaços restritivos à sua expressividade:
de comunicação, movimento, busca. A sala de aula pode ser estruturada de modo a
oferecer as condições favoráveis ao aluno. Além disso, muitas escolas possuem
pátios, quadras, outros espaços abertos e até arborizados que podem ser
aproveitados para o desenvolvimento de um plano de aula do professor com mais
criatividade. Vivemos num país tropical e às vezes as salas de aula são mal
ventiladas, com um número excessivo de alunos e, diante disso, propiciar um clima
prazeroso e acolhedor de aprendizagem é fundamental. A professora da classe que
analisei, e as das outras classes, durante todo o tempo de minha observação,
permaneceram na sala de aula, sem explorar outros ambientes escolares, exceto as
aulas de educação física que sempre ocorriam no pátio.
O segundo, refere-se à própria fisionomia da sala de aula. Pelo que
analisei na pesquisa de campo, o espaço de sala de aula pareceu ser um espaço
construído, enfeitado e comandado pela professora. É ela quem define a distribuição
das carteiras e o lugar que os alunos sentam, os cartazes que ficam expostos nas
paredes, o local para fixar os trabalhos dos alunos, os materiais que ficam nas
estantes, entre outros; os alunos não tiveram nenhuma participação, não foram
consultados, por exemplo, onde gostariam de fixar seus trabalhos. Uma grande
incoerênci
a, por que a sala de aula também não é um espaço deles?
A dinâmica em sala sempre ficou a cargo da professora, que estipulava o
tempo e o ritmo dos alunos para a execução das tarefas, fazia a distribuição
espacial das carteiras e definia o lugar em que os alunos sentariam, direcionava
113
para onde o foco de atenção dos alunos deveria estar, possibilitava ou não a
movimentação em sala de aula.
Esse procedimento acaba passando aos alunos os valores hierárquicos do
espaço, valores que ensinam o que se pode ou não fazer, e quem pode fazer ou
não. Os alunos acabam apreendendo que sala de aula não é um espaço deles, mas
um espaço do professor, em que eles trabalham, mas é o professor quem manda.
Diante desses dados, considerar a sala de aula um espaço de troca, construção e
parceria entre professor e alunos parece ser utópico e de uma enorme divergência
com o
status quo
. Este é um ponto de reflexão importante.
Em minha observação, a professora, com o total domínio das dinâmicas
ocorridas em sala, acabava t
ambém controlando as ações corporais dos alunos, não
percebendo emoções, tônus, e enfatizando muito mais resultados e participações
obedientes nas atividades escolares, o que mostrou uma grande ênfase apenas na
dimensão cognitiva dos alunos.
Quais as
implicações para o desenvolvimento infantil integrado?
Seria necessário, primeiramente, que a professora adquirisse uma nova
forma de olhar os alunos, mudar aspectos de sua própria representação de sala de
aula e de ensino, construindo uma perspectiva consciente de integralidade do
desenvolvimento infantil, e o que essa integralidade demanda da sua ação
educativa. Que conhecesse melhor a fase de desenvolvimento dos alunos, os
diferentes comportamentos, a fim de planejar atividades mais adequadas e tornar o
processo de ensino
-aprendizagem mais eficaz.
Na teoria walloniana, a cada fase há o predomínio de um
conjunto
funcional
(Wallon, 1995, p.111) e eles não se sobrepõem ou se sucedem, mas se
integram. Para a faixa etária da classe pesquisada, os alunos, segundo ele,
estavam no final do estágio do
personalismo
e início do
categorial,
em que a
integração entre o afetivo e o cognitivo é mais visível. Aliás, segundo essa teoria, a
afetividade e a inteligência podem ser compreendidas numa relação d
e
reciprocidade e interdependência, sendo papel do professor criar um clima afetivo
para o aluno se desenvolver no cognitivo e vice
-
versa.
Considerando para essa fase, a afetividade como a coluna vertebral no
desenvolvimento da criança, a relação do professor com os alunos deve ser
114
pessoal, carinhosa e com criação de vínculos. O aluno precisa se sentir seguro,
acolhido na escola, como também precisaria se sentir no meio familiar, para que
toda essa sensação o ajudasse em seu desenvolvimento e em seu processo de
aprendizagem escolar. No entanto, observei que a professora não reconhecia, não
se preocupava, não cuidava da relação de interdependência entre afeto e cognição,
e, conforme relatei no capítulo anterior, somente em uma situação (situação 15), el
a
conseguiu mudar sua postura, por meio de sua entonação de voz, ao perceber a
expressão do choro de um aluno que não conseguia realizar uma tarefa. Almeida
faz um alerta, dizendo que,
... o professor pode ler seu aluno: o olhar, a tonicidade, o
can
saço, a atenção, o interesse são indicadores do andamento
do processo de ensino que está oferecendo.
(
2004,
p.126)
A professora sempre demonstrou muita segurança na execução do seu
plano de ensino, domínio nas questões técnico-pedagógicas do processo de
alfabetização. Relatou-me dados sobre os problemas de ordem familiar e as
inseguranças de alguns alunos, que resultavam em dificuldades para aprender,
porém considerando tudo como causa-efeito, numa visão determinista. Assim, não
conseguia integrar esses dados ao processo de ensino-aprendizagem, não percebia
a relação afeto-
cognição
-movimento no desenvolvimento infantil, e com isso, os
alunos acabavam sendo tratados de modo fragmentado, com a visão do plano de
aula dominando com seus aspectos mais té
cnicos.
Como a prática docente se mostrou adiante da perspectiva
educacional estudada ?
A prática dessa professora se apresentou ao mesmo tempo com o domínio
de alguns quesitos de ordem pedagógica, mas com problemas, no que diz respeito
à visão integral dos alunos no processo de ensino-aprendizagem, em seu processo
de desenvolvimento e formação como seres humanos. Os alunos sempre foram
formados de modo fragmentário nesse processo. É possível perceber, pela análise
das categorias em que me baseei, como o movimento sempre foi um ponto com o
qual a professora não lidava de modo adequado, parecendo incomodada. Ela
115
sempre tentava controlar as reações corporais dos alunos, seu trânsito pelo espaço
da sala de aula, suas inquietações corporais, os olhares para os lados, tentativas de
conversas com os colegas, pedidos para ir ao banheiro. A consciência de que o
aluno tem um mundo emocional relacionado intimamente ao cognitivo e ao motor
não foi mostrado em nenhum momento pela professora, ela apenas tinha a
pre
ocupação de que os alunos fossem alfabetizados, de qualquer jeito, claro que
isto é importante, porém, é condição que pode ser atingida de modo mais adequado,
quando se lida nesse processo com todos os aspectos envolvidos nas
aprendizagens.
Se a aprendizagem e o ensino formam de modo fragmentado, os alunos,
conseqüentemente formaremos seres incompletos e fragmentados, mesmo porque o
professor tem um grande papel na formação e constituição da pessoa do aluno. É
fundamental que o professor crie uma visão integrada da criança. Wallon, por essas
mesmas razões, insistiu para que seus estudos a respeito da teoria do
desenvolvimento orientassem e ajudassem o professor no processo educativo.
Procurei
investigar e refletir sobre o processo de formação integral do ser
humano na escolarização. A instituição escolar com sua função social, política e
pedagógica deixa marcas positivas ou negativas que contribuem para a formação
do homem na sociedade. Para formarmos o homem cidadão, é preciso que, na
escola, além de o aluno aprender a viver em grupo, aprenda a viver com
democracia, mas para isso é importante que o professor não apenas conheça seus
alunos no contexto escolar, mas também que conheça o meio sociocultural em que
vivem, porque o meio, seja o societário mais geral, seja o mais próximo, é
fundamental no desenvolvimento do ser humano e pode ajudar a compreender os
alunos nos contextos que estão inseridos, em sua integralidade.
As possíveis repercussões e contribuições que todos os aspectos, aqui
apresentados, trazem para o processo de ensino-aprendizagem e que podem
contribuir para a melhoria da prática docente, na perspectiva desenvolvida, apontam
a real necessidade de repensar a formação dos professores.
Os professores, não obstante conseguirem
avanços nos conhecimentos dos
alunos, geram também nestes impasses, dificuldades, bloqueios de
desenvolvimento, pela falta de uma visão integral e integrada dos alunos, que
desarticula cognição-
afeto
-movimento nas situações de sala de aula. Resta a esses
profissionais aprender a olhar os alunos nas três dimensões, em suas relações,
116
estar atentos às manifestações corporais que expressam muito do que os alunos
estão sentindo, pensando e querendo. O processo de ensino-
aprendizagem
ganharia muito se pudesse ser reorientado em relação ao grupo-classe e
conseguisse superar o pensamento meramente técnico.
117
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
118
AJURIAGUERRA, Juan de; AUZIAS, M. La Escritura del
niño
: la evolución de la
escritura y sus problemas. Barcelona: Editorial Laia, 1980.
ALMEIDA, Ana Rita Silva. A Concepção walloniana de afetividade: uma análise a
partir das teorias do desenvolvimento e das emoções
. São Paulo, 1999. Tese (dout.)
Programa
de Psicologia da Educação, PUC/SP.
________ .
A Emoção na sala de aula.
4.ed. Campinas: Papirus, 2004.
ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. Ser professor: um diálogo com Henri Wallon. In:
MAHONEY, Abigail A.; ALMEIDA, Laurinda R. (orgs.) A constituição da pessoa na
proposta de Henri Wallon.
São Paulo: Loyola, 2004. p.119.
ANAIS DO 1
º
. SIMPÓSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL. Brasília:
MEC/SEF/DPE/COEDI, 1994. 190 p.
ARCE, Alessandra. A Pedagogia na era das revoluções : uma análise do
pensamento de Froebe
l e Pestalozzi. Campinas: Autores Associados, 2002.
ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família.
2.ed.
Rio de Janeiro: LTC,
1981.
ARROYO, Miguel G. Imagens quebradas: trajetórias e tempos de alunos e mestres.
Petrópolis: Vozes, 2004.
BANKS
-LEITE, Luci; GALVÃO, Izabel. A Educação de um selvagem: as
experiências pedagógicas de Jean Itard. São Paulo: Cortez, 2001.
BRASIL.
Ministério da Educação e do Desporto. Conselho Nacional de Educação.
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infa
ntil.
Brasília, 1998.
________.
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Brasília, 1996.
119
________. Secretaria da Educação Fundamental. S
IMPÓSIO
NACIONAL DE E
DUCAÇÃO
I
NFANTIL
, 1
.
Anais
... Brasília, 1994. p. 87, 124, 153.
BONDIOLI, Anna (org.) O tempo no cotidiano infantil: perspectivas de pesquisa e
estudo de casos. São Paulo: Cortez, 2004.
BUFFA, Éster. Arquitetura e educação: organização do espaço e propostas
pedagógicas dos grupos escolares paulistas, 1983
1971.
São Carlos: EdUFSCar,
INEP, 2
002.
BURGENER, Louis. L Éducation corporelle selon Rousseau et Pestalozzi
Paris:
Librairie Philosophique J. Vrin, 1973.
CAMBI, Franco.
História da pedagogia. São Paulo: Editora UNESP, 1999.
CORDEIRO, Analívia et al.
Método Laban:
nível
básico
.
São Paulo
: LabanArt, 1989.
DAMÁSIO, António R. O Erro de Descartes: emoção, razão e cérebro
humano.
São
Paulo: Companhia das Letras, 1996.
________.
O Mistério da consciência: do corpo e das emoções ao conhecimento de
si.
São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
DIDONET, Vital. A LDB e a política de educação infantil. In: MACHADO, Maria Lucia
de A. (org.)
Educação infantil em tempos de LDB.
São Paulo: FCC/DPE, 2000. p. 13.
ELIAS, Marisa Del Cioppo. De Emílio a Emília: a trajetória da alfabetização. São
Paulo: Sc
ipione, 2000.
ELIAS, Norbert.
Sobre o tempo.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
ESCOLANO, Augustín. Arquitetura como programa. Espaço-escola e currículo. In:
FRAGO, Antonio Viñao; ESCOLANO, Augustín. Currículo, espaço e subjetividade:
a
arquitetura como
programa
.
Rio de Janeiro: DP&A, 2001. p. 48.
120
FARIA FILHO, Luciano Mendes de; VIDAL, Diana Gonçalves. Os Tempos e os
espaços escolares no processo de institucionalização da escola primária do Brasil
.
In:
Revista Brasileira de Educação.
ANPED, n. 14, p. 19
, maio/ago. 2000.
FERNANDES, Ciane. O Corpo em movimento: o sistema Laban/Bartenieff na
formação e pesquisa em Artes Cênicas
.
São Paulo: Annablume, 2002.
FOUCAULT, Michel.
Vigiar e punir.
Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1987.
FREINET, Célestin; SALENGROS, R. Conselho aos pais. 2.ed. Lisboa: Estampa,
1974.
FREINET, Célestin.
Modernizar a escola.
Lisboa: Dinalivro, 1977.
________________.
Para uma escola do povo.
São Paulo: Martins Fontes, 1996.
FREINET, Élise. O Itinerário de Célestin Freinet: a livre expressão na pedagogia
Freinet.
Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.
FROEBEL, Friedrich.
La Educación del hombre
. Madrid: Daniel Jorro, 1913.
GALVÃO, Izabel. Expressividade e emoções segundo a perspectiva de Wallon. In:
ARANTES, V. A. (org.)
Afe
tividade na escola: alternativas teóricas e práticas
.
São
Paulo: Summus, 2003. p. 71.
________.
Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento infantil.
10.ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
GARDNER, Howard. A Criança pré-
escolar
: como pensa e como a escola pode
ensiná
-
la.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1994a.
________.
Estruturas da mente: a teoria das inteligências múltiplas. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1994b.
121
GATTI, Bernardete A. Psicologia social aplicada à didática de sala de aula.
Educação
H
oje
, n.9, p.35-
39, maio/jun.1970.
HODGSON, John; PRESTON-
DUNLOP,Valerie.
Rudolf Laban: an introduction to his
work & influence
.
UK: Northcote House, 1990.
HOUSSAYE, Jean. Quinze pedagogues.
Paris: Armand Colin, 1995.
INCONTRI, Dora.
Pestalozzi
: educação e ética.
São Paulo: Scipione, 1997.
KESTENBERG, Judith S.
The Role of movement patterns in development.
New York:
Bureau Press, 1977.
KRAMER, Sonia. O Papel social da pré-escola: 1985. In: ROSEMBERG, Fúlvia.
(org.)
Creche.
São Paulo: Cortez, 1989.
__
_______.
A Política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce
.
3.ed. Rio de
Janeiro: Dois pontos, 1987.
KUHLMANN JUNIOR, Moysés. História da educação infantil
.
In:
Revista Brasileira
de Educação.
ANPED, n.14, p. 5, maio/ago. 2000.
________.
Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. 3.ed. Porto Alegre:
Mediação, 2004.
LABAN, Rudolf.
Dança educativa moderna.
São Paulo: Ícone, 1990.
________.
Domínio do movimento
. São Paulo: Summus, 1978.
LANE, Silvia T. Maurer; SAWAIA, Bader Burihan (orgs.) Novas Veredas da
psicologia social.
São Paulo: Brasiliense: EDUC, 1995.
LA TAILLE, Yves de.
Piaget, Vygotsky, Wallon
:
teorias psicogenéticas em discussão.
São Paulo: Summus, 1992.
122
LIMONGELLI, Ana Martha de A. A Constituição da pessoa: dimensão motora. In:
MAHONEY, Abigail A.; ALMEIDA, Laurinda R. (orgs.) A Constituição da pessoa na
proposta de Henri Wallon
. São Paulo: Loyola, 2004. p. 47.
LOUZADA, Fernando. Relógios biológicos e aprendizagem. o Paulo: Ed. do
Instituto Esplan, 2004.
LUZURIAGA, L
orenzo.
História da educação e da pedagogia. 15.ed. São Paulo:
Nacional, 1984.
MAHONEY, Abigail Alvarenga. A Constituição da pessoa: desenvolvimento e
aprendizagem. In: MAHONEY, Abigail A; ALMEIDA, Laurinda R. (orgs.)
A
Constituição da pessoa na proposta de Henri Wallon. São Paulo: Loyola, 2004. p.
13.
________.
Henri Wallon: psicólogo e educador. São Paulo, 2002 ( Anotações da
disciplina do Programa de Pós- Graduação em Educação: Psicologia da Educação
da PUC/SP).
MAHONEY, Abigail Alvarenga; ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. (orgs.) Henri
Wallon: psicologia e educação. São Paulo: Loyola, 2000.
MERANI, A. L. Psicologia y pedagogia: las ideas pedagógicas de Henri Wallon
.
México: Grijalbo, 1969.
MESQUITA, Rosa Maria.
Comunicação não
-
verbal
: atuação profi
ssional e percepção
da psicodinâmica do movimento expressivo. São Paulo, 1997. Tese (dout.) Instituto
de Psicologia/USP.
NEWLOVE, Jean.
Laban for actors and dancers.
London: Nick Hern Books, 1993.
NORTH, M.
Movement and dance education.
UK: Northcote
House, 1990.
________.
Personality assessment through movement.
Boston: Plays,
1975.
123
NOVAES, A. (org.) Sobre tempo e história. In: Tempo e história. São Paulo: Cia das
Letras, Secretaria Municipal da Cultura, 1992. p. 9.
PÁTIO. Porto Alegre: Artmed, n
.30, maio/jul. 2004.
PEREIRA, Dulce Krock Rodrigues. Inteligência Expressiva: origens, direções e
integrações
a partir da teoria psicogenética de Henri Wallon. São Paulo, 1994.
Tese (dout.) Faculdade de Educação/USP.
PEREIRA, Maria Izabel Galvão Gomes
.
Emoções e conflitos: análise da dinâmica
das interações numa classe de educação infantil. São Paulo, 1998. Tese (dout.)
Faculdade de Educação/USP.
________. O Espaço do movimento: investigação no cotidiano de uma pré-escola à
luz da teoria de Henri Wallon. São Paulo, 1992. Dissert. (mestr.) Faculdade de
Educação/USP.
PILETTI, Nelson. Estrutura e funcionamento do ensino fundamental.São Paulo:
Ática, 2002.
PINTO, Heloysa Dantas de Souza; PRADO, Elisabeth Camargo. Alfabetização:
responsabilidade do professor ou da escola. In: PRADO, E. C.; AZEVEDO, M. A.;
MARQUES, M. L. (orgs.)
Alfabetização hoje.
4.ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 93.
PONCE, Branca Jurema. O Tempo na construção da docência. In: ROMANOWSKI,
J. P.; MARTINS, P. L. O.; JUNQUEIRA, S. R. A.
(orgs.)
Conhecimento local e
conhecimento universal: pesquisa, didática e ação docente. Curitiba: Champagnat,
2004. p. 99.
PRESTON
-
DUNLOP, V.
A Handbook for dance in education.
2.ed. UK:
Longman,
1980.
PRÜFER, Johannes.
Federico Froebel
. Barcelona: La
bor, 1930.
124
REGO, Teresa Cristina. Memórias de escola: cultura escolar e constituição de
singularidades.
Petrópolis: Vozes, 2003.
RENGEL, Lenira.
Dicionário Laban.
São Paulo: Annablume, 2003.
ROLLAND, Romain.
O Pensamento vivo de Rousseau
. São Paulo: Mar
tins, 1940.
ROSEMBERG, Fúlvia. (org.)
Creche.
São Paulo: Cortez, 1989.
ROUSSEAU, Jean Jacques. Emílio, ou, da educação. 2.ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1999.
RUSSEL, Joan.
Modern dance in education.
London: Mac Donald and Evans, 1958.
_____________.
Creative dance in the primary school. United Kingdom:
Northcote
House, 1992.
SACRISTÁN, José Gimeno. Os inventores da educação. In: SEBARROJA, Jaume,
C. et al.
Pedagogías do século XX.
Porto Alegre: Artmed, 2003. p. 15.
SAMPAIO, Rosa Maria W. F.
Frein
et
: evolução histórica e atualidades. São Paulo:
Scipione, 1989.
SERRA, Sylvia Monica Allende. Análise do movimento expressivo.
Campinas,
1996d. (Anotações da disciplina do Programa de Pós-Graduação do Instituto de
Artes da Unicamp.)
____
_
____.
Analysis
of expressive movement qualities in the creative personality.
Philadelphia, 1979. Dissert. (mestr.) Dept. of Mental Health Sciences, Hahnemann
University.
__________.Empatia
: um estudo da comunicação não-verbal terapeuta cliente
.
São
Paulo, 1990. Tese (
dout.) Instituto de Psicologia/USP.
125
_____
_
___.
Laban
: a versatilidade expressiva e a integração da forma e do
conteúdo do movimento. Campinas: U
NICAMP
, Instituto de artes, jun.1998 (Relatório
de pesquisa artístico
-
didática.)
__
___
_
___.
O Movimento e o desenvolvimento da criança.
In:
ENCONTRO LABAN,
São Paulo,
1996a. (mimeo)
_________.
Movimento e personalidade
. Campinas: UNICAMP, 1996b. (mimeo)
______
_
__.
O Paradigma holográfico e a interpretação da harmonia espaço-
temporal
nas condutas humanas.
In:
ENCONTRO LABAN, 1996c, São Paulo.
(mimeo)
THORNTON, S. A Movement perspective of Rudolf Laban. London: MacDonald &
Evans, 1971.
TONUCCI, Francesco.
Com olhos de criança.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
T
RAN
-
THONG.
Estádios e conceitos de estádio de desenvolvimento da criança na
psicologia contemporânea.
Lisboa: Afrontamento, s.d.. [Tradução: Manuel Maia.]
TSOUKALA, Kiriaki. La Perception de l espace scolaire par les écoliers, étude
comparative, pédagogie Freinet, pédagogie formelle. In: CLANCHÉ, Pierre et al.
La
Pédagogie Freinet, mises à jour et perspectives. Bordeaux: Presses Universitaires
de Bordeaux, 1994. p. 361.
VÁRIOS AUTORES. Estrutura e funcionamento da educação básica. 2.ed.. São
Paulo: Pion
eira, 1999.
VIANNA, Heraldo M. Pesquisa em educação: a observação. Brasília: Plano Editora,
2003.
WALLON, Henri. L Enfant turbulente: étude sur les retard et les anomalies du
développment moteur mental. Paris: Presses Universitaire de France, 1984.
126
___
_____.
Evolução psicológica da criança.
Lisboa: Edições 70, 1995a.
________ . Os Meios, os grupos e a psicogênese da criança. In: WEREBE, Maria
José G.; NADEL-BRULFERT, Jacqueline.
(orgs.)
Henri Wallon. São Paulo: Ática,
1986. p. 168.
________.
As Orig
ens do caráter na criança.
São Paulo: Nova Alexandria, 1995b.
________.
Psicologia e educação da criança.
Lisboa: Vega, 1979.
WEIL, Pierre et al. Rumo à nova transdisciplinaridade: sistemas abertos de
conhecimento.
São Paulo: Summus, 1993.
WEREBE, Maria
José G.; NADEL
-
BRULFERT, Jacqueline. (orgs.)
Henri Wallon.
São
Paulo: Ática, 1986.
WHITROW, G. J. O Tempo na história: concepções de tempo da pré-história aos
nossos dias. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
YUS, Rafael. Educação integral: uma educação holística para o século XXI
.
Porto
Alegre: Artmed, 2002.
This document was created with Win2PDF available at http://www.win2pdf.com.
The unregistered version of Win2PDF is for evaluation or non-commercial use only.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo