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coríntia (em sua variedade compósita) – sucedem-se no tempo, como na arte antiga,
o que indica uma certa lógica evolutiva nessa arte luso-brasileira.
Para julgar a influência do Aleijadinho na arquitetura de Minas, é preferível
estudar, em seu conjunto, sua obra mais original, e que mais lhe pertence, na qual
ele trabalhou de 1766 até 1792, data da entrega. Erguida de um só fôlego, São
Francisco, de Ouro Preto, surge-nos num estilo mais clássico que o Carmo, tal
como ficou depois das modificações que lhe foram feitas em 1770-1771. As
fachadas laterais são bastante sóbrias e dão muito o que pensar com relação a essa
revivescência do Renascimento português que se manifestou em Braga sob o
episcopado de dom Rodrigo de Moura Teles (1704-1728): as janelas retangulares
profundamente alargadas da nave, as gárgulas em forma de cano de canhão no
frontispício, as pilastras jônicas da sacristia, os arcos em plena abóbada sobre
simples imposta das sacadas da capela-mor, estas mesmas sacadas que nos fazem
remontar ao Carmo, de Olinda, traçado no fim do século XVI. A transformação dos
corredores altos em sacadas revela o desejo de suprimir as tribunas, que distraem o
olhar – ainda empregadas por Manuel, no Carmo – a fim de obter, pela redução do
espaço interior, uma concentração de efeitos, característica do estilo do
Aleijadinho.
O modernismo do edifício traduz-se melhor na planta, tornada mais elegante pela
supressão dos corredores da nave, por uma integração melhor dos da capela-mor
ao conjunto, pela incorporação das torres que, em projeção lateral muito
pronunciada, no Carmo, fecham-se para trás no corpo da igreja de São Francisco,
projetando-lhe o frontispício – tal encobrimento das torres é ainda uma tradição
portuguesa antiga, retomada pelo Aleijadinho. Suas formas circulares parecem uma
novidade sem precedentes. Quanto ao frontispício, era, na sua forma primitiva, a do
risco de 1766, mais sóbrio que agora. Com sua ordem jônica na parte inferior, e
toscana na superior, é uma obra de harmonioso efeito arquitetural, concentrando o
efeito ornamental em dois pontos: o medalhão esculpido no cimo e a portada. A
comparação do caderno dos encargos, porém, lavrado em contrato a 27 de
dezembro de 1766, com o do contrato de 8 de outubro de 1774, motivado pelo risco
da nova portada do Aleijadinho, permite facilmente verificarmos que ela era bem
menos importante, apresentando, sem dúvida, poucos elementos esculpidos. Para
encerrar a composição atual, foi preciso recuar lateralmente as duas janelas do
coro. Antes de 1774, a escultura do medalhão de Alverne, expressamente incluída
no contrato de 1766, constituía, portanto, o único destaque da fachada, de caráter,
aliás, puramente plástico, pois os ornamentos concheados que hoje a enfeitam
devem-se à reforma em 1774. Poderíamos, então, imaginar uma fachada de
sobriedade quase plástica, não fosse a posição em ângulo dos campanários,
apresentando no eixo uma pilastra e não uma janela, e esses dois fragmentos de
arquitrave curva dominando as colunas de pedra do Itacolomi, e cujo efeito de
goela aberta é – admitamos – pouco feliz.
Os mínimos detalhes desse monumento são tratados com grande requinte; os vãos
dos campanários são de desenho elegante, ditado por uma espécie de
funcionalismo; cada abertura é feita de duas formas simétricas em relação a um
eixo mediano que põe em relevo o nervo sobre o qual se apóia a armação do sino; o
vão casa-se assim com o traçado geral do sino e do seu contrapeso. As pequenas
pirâmides do cimo das torres derivam das que o arquiteto de Santa Efigênia, sem
dúvida Manuel Francisco Lisboa, plantou sobre os campanários dessa igreja, mas
de proporções audaciosas são mais que simples motivos de coroamento – elas
desempenham o papel de verdadeiras flechas. Quando se olha a igreja de perfil,
admira-se como o Aleijadinho se esforçou em variar a disposição de cada corpo do
edifício: as torres, as naves, a capela-mor, tirando um efeito pitoresco dos
movimentos do telhado, colocando transversalmente a cumeeira da sacristia. Eis
assim um monumento tratado por inteiro como tema arquitetural e não mais urna
edificação ornada de frontispício. (BAZIN, 1971, p.142-143)