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Camillo quis reforçar a reflexão de seus leitores, para o fato de que o
criador daqueles desenhos, Fernando Diniz, ser, sim, um sujeito diagnosticado
como louco, interno de um hospício e para esta especificidade não se poderia
desviar a atenção. Quer dizer, o garoto, apesar do claro propósito de irreverência
contra a professora, não estaria errado em dizer: “são rabiscos de um maluco”. Os
desenhos de Fernando Diniz não deixarão de ser desenhos de um louco, por serem
obras de arte ou por estarem simplesmente destacados em um museu, em uma
mostra de prestígio, muito menos Fernando Diniz deixará de ser um louco
diagnosticado, por produzir desenhos e pinturas admitidas como obras de arte.
Em entrevista a mim concedida, Camillo Osorio referiu-se ao caso
supracitado e, assim, desenvolveu sua argumentação:
A chamada da crítica geralmente é feita pelo editor. A
chamada dizia que aquilo não era arte. Mas o meu argumento,
que levou a essa chamada da crítica – e essa chamada, eu acho,
era pertinente, só que ela pode ser lida como um
desmerecimento dos trabalhos “ah, aquilo não é arte, logo
aquilo é ruim”, ou, “logo aquilo é desqualificado” – , mas o teor
do meu argumento era o oposto, falar que aquilo não era arte
era uma maneira de qualificar aquilo, no sentido de que tomar
aquilo como arte, ou, apenas como arte, me parecia reduzir as
possibilidades de relação que aquela aura, aquelas obras, aquela
pintura, tinha com o público.(...) Eu queria, justamente, com
essa observação de que aquilo não era obra de arte, pensar em
que medida essa especificidade psíquica do Fernando Diniz,
catalogada como loucura, ela tem uma potência expressiva, e
como essa potência expressiva da loucura, tangencia a questão
artística, mas ela não se reduz à questão artística, na medida em
que a questão artística implica num quadro de referência
histórico – isso não quer dizer que seja o que interessa nas obras
de arte, o quadro de referência histórico, mas há uma
consciência histórica, há um pertencimento a uma história, há
uma condição de possibilidade, de sentido artístico, que o artista
de certa maneira assume, enfrenta, transforma, que aquela
produção passa ao largo, o que não quer dizer que aquela
produção ao passar ao largo seja menor do que aquelas artísticas
que assumem isso como uma questão pros seus trabalhos. Eu
acho que há uma diferença e quando você chama aquilo,
apenas, de uma obra de arte, você abre mão dessa diferença, que
é uma diferença até pra se potencializar a questão da loucura,
potencializar no sentido de pensar a especificidade, a
singularidade e o canal de expressão que essa consciência
artística não dá conta (...).
O artista está cumprindo determinações de um circuito,
de uma instituição, de um mercado. A diferença é que o artista
produz pra um público e para um conjunto de expectativas que
esse público, seja esse público o cara que vai freqüentar o