23
criança, nem adulto). A noção de que a experiência da adolescência conduz à vida adulta
também pode ser considerada adultocêntrica, sendo o adulto entendido como o estágio final
de um processo, como se a constituição do sujeito se desse por encerrada com a aquisição de
status de adulto, bem como se, automaticamente, a partir de uma certa idade, os ‘adultos’
passassem a se tornar independentes, autônomos. Neste sentido, destaca-se a fragilidade da
definição de adolescência proposta pela Organização Mundial de Saúde (2004a), embora tal
entendimento seja coerente com uma série de discursos circulantes sobre este fenômeno, tanto
no meio acadêmico quanto entre a população em geral, inclusive entre os adolescentes.
Freqüentemente, é vinculada na mídia uma imagem admirável do adolescente,
caracterizada pela ousadia, liberdade e vigor. Paralelamente, colocada em relação a este
discurso, verifica-se a retórica do terror e da marginalidade, geralmente pautada por
estatísticas que abordam a juventude como um problema social (Lyra e cols, 2002). Quanto às
concepções homogeneizadoras, essencialistas e patologizantes da adolescência, concepções
estas que podem, inclusive, propor a tolerância como alternativa para lidar com os
adolescentes, Medrado e Lyra chamam a atenção para a associação entre esta categoria e a
noção de crise, inconseqüência, irresponsabilidade, agressividade, desordem e problema
social, de sorte que “O risco generalizado parece, assim, definir e circunscrever
negativamente esse período da vida, possibilitando a construção de expressões absurdas como
a própria prevenção da adolescência” (Lyra e Medrado, 1999, p. 231).
Abramo (1997) destaca a questão da crise e da ruptura na caracterização da
adolescência. No âmbito do senso comum, a adolescência é designada pelo neologismo
“aborrecência”, quando considerada como um período de crise e turbulência, face aos
“aborrecimentos” que engendra para os adultos com os quais os adolescentes convivem. Neste
sentido, Lyra e Medrado (1999) afirmam que “mesmo reconhecendo a noção de crise-
problema-desordem como um dos elementos mais marcantes na concepção contemporânea de
adolescência, consideramos que a noção de adolescência associada à concepção de problema
tem fundamentos históricos e, portanto, dista de ser considerada real ou natural” (p. 233).
De acordo com Bock e Liebesny (2003), a contradição entre as condições que
apresentam e o impedimento em ingressar no mundo social adulto “será responsável pelo
surgimento da maior parte das características conhecidas hoje como dos adolescentes:
rebeldia, conflito geracional, indefinição da identidade e onipotência” (p.203). Este trabalho,
por sua vez, é balizado pelo entendimento de que todo processo de constituição dá-se em
meio a transformações e conflitos bio- psico-sociais, não estando o sujeito isento de crises,
mudanças e angústias ao longo de sua existência. Neste contexto, os sujeitos são