Download PDF
ads:
1
JONAS SIMAS CUSTÓDIO
CAMINHOS DA PRODUÇÃO FAMILIAR ARTESANAL EM GOVERNADOR
CELSO RAMOS/SC: da Pesca Maricultura
Florianópolis, 2006
Universidade Federal de Santa Catarina
Centro de Filosofia e Ciências Humanas
Programa de Pós-graduação em Geografia
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
CAMINHOS DA PRODUÇÃO FAMILIAR ARTESANAL EM GOVERNADOR
CEELSO RAMOS/SC: da Pesca a Maricultura
Orientador: Professor Doutor Clécio Azevedo da Silva
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Área de Concentração: Desenvolvimento Regional e Urbano
Florianópolis/SC, janeiro de 2006
ads:
3
CAMNHOS DA PRODUÇÃO ARTESANALGOVERNADOR CELSO
RAMOS/SC: da Pesca a Maricultura
Jonas Simas Custódio
Coordenador: Professor Doutor Carlos José Espíndola
Dissertação submetida ao programa de Pós-Graduação
em Geografia, área de concentração Desenvolvimento
Regional e Urbano, do Centro de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina, em
cumprimento aos quesitos necessários à obtenção do
grau acadêmico de Mestre em Geografia.
Presidente: ___________________________________
Prof. Dr. Clécio de Azevedo da Silva (GCN/UFSC)
Membro ______________________________________
Prof. Dr. Lauro Mattei (CSE/UFSC)
Membro: ______________________________________
Prof. Dr. Carlos José Espíndola (GCN/UFSC)
Membro: _______________________________________
Prof. Dr. Roland Luiz Pizzolatti (GCN/UFSC)
Florianópolis – SC, de 11 de Janeiro de 2006.
4
Este trabalho é dedicado aos meus
familiares a e amigos, que durante
esses dois últimos anos,
compreenderam a minha constante
ausência.
5
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Dr. Clécio Azevedo da Silva por ter aceito a orientação e
apoiado integralmente este projeto. Ao Dr. Roland Luiz Pizzolatti, amigo
constante nas discussões sobre os temas tratados nesta pesquisa, bem como
na leitura e correções.
Aos professores que ao longo do curso ministraram suas aulas com
maestria e competência, dando-me o conhecimento necessário da embasar
minha tese.
A Secretária do curso, Marli Terezinha Costa, que foi também uma
grande amiga e incansável em prestar esclarecimentos, bem como a todo
Departamento de Pós Graduação – Mestrado da Geografia.
As amigas, Celeste Maria Gracick pelo apoio e ajuda na compilação dos
dados estatísticos e a leitura e correção final da Dissertação e ainda, o
companheirismo incondicional nos momentos de angustia e incertezas. A
Rosana Mussi Jendiroba, pelas aulas de inglês, para que pudéssemos ser
aprovados na prova de proficiência.
Aos colegas de Mestrado em Geografia pela convivência do dia-a-dia
durante o curso, e após, e pelo alto nível das discussões acadêmicas.
6
Pescador: Mestre, admiro-me de como
podem os peixes viver na água. Pescador
mestre: Ora, do mesmo modo que os
homens vivem na terra: os grandes
devoram os pequenos.
Shakespeare, Ato II de Péricles.
7
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo analisar as mudanças ocorridas no
espaço de Governador Celso Ramos/SC, desde a pesca da baleia e a
agricultura de subsistência, passando pela manufatura dos engenhos e das
salgas, a industrialização da pesca e o turismo. Posteriormente a falência da
indústria pesqueira com a manutenção das produções artesanais da pesca e a
maricultura. Nossa análise recai sobre o processo de mudanças sócio–
espaciais, de comportamento das inter-relações de trabalho e renda. A
discussão principal desta pesquisa consiste em saber em que medida estas
relações vem ocorrendo e que estratégias de desenvolvimento estão sendo
implementadas pelos poderes constituídos a partir da dinâmica, principalmente
da pesca e da maricultura familiar com as demais atividades. Portanto,
constatamos que as atividades que antes eram somente artesanais e de
subsistência, incorporam outras atividades que chamamos de pluriativas, que
tem abarcado mão-de-obra em horário disponível tanto dos trabalhadores da
pesca e maricultura bem como de seus familiares. Dessa forma buscamos
entender como essas atividades praticadas no mar e que tem a família como
suporte, vem respondendo ao processo de desenvolvimento que se encontra
estabelecido, e quais as estratégias necessárias para a manutenção das
atividades artesanais. Estes processos vêm gerando novas dinâmicas e
técnicas produtivas, que tem causado fortes impactos sobre o trabalho
artesanal. Todavia, podemos ressaltar que a integração produtiva tem elevado
as oportunidades de trabalho e o aumento de renda, embora as técnicas
desenvolvidas tragam consigo empresários que se envolvam na produção e
excluam o pequeno produtor como ocorreu no passado.
8
ABSTRACT
The aim of this study was to identify the changes that took place in Governador Celso
Ramos – SC , since the catching of whales , agriculture for subsistence , factory for
production of manioc flour , factory of salted fish , the beginning of industrial fishing ,
tourism , the ruin of the fish industry and the maintenance of the production by
artisanal fishing and the culture of shellfish. Our analysis was done on the social and
demographic changes , related to the behavioral changes of the relationship work and
income. The principal discussion of this research consists of the knowledge of to what
extent these relationships occur and what developmental strategies are being
implemented by the authorities as a result of these changes mainly the fishing and the
shellfish culture carried out by families with the other activities.Therefore we observed
that the activities that were before artisanal and of subsistence incorporated other
activities that we call pluralistic activities , which have obtained labor in available hours
with fishermen and workers from the shellfish culture and also there families. In this
way we try to understand how these activities done at sea and have families as a support
are responsible for the process of development that has been established and what
strategies are necessary for the maintenance of the artisanal activities. These processes
have generated new dynamics and productive techniques which have caused strong
impacts on the artisanal labor. Nevertheless we can emphasize that the productive
integration has increased work opportunities and income, although the techniques that
were developed bring new investors who will get involved with the production this
may lead to the exclusion of the small producer as took place in the past.
9
LISTA DE MAPAS
FIGURA 1 Mapa de Localização de Governador Celso Ramos, ex-Ganchos
.....................................................................................................................pg. 22
FIGURA 2 Mapa de Localização dos Principais Portos Pesqueiros de Santa
Catarina - no período...................................................................................pg. 42
FIGURA 9 Mapa do Pólo de Aqüicultura (maricultura) do Estado de Santa
Catarina.......................................................................................................pg. 85
FIGURA 10 Mapa da Distribuição Geográfica da Maricultura de Santa Catarina
– 2004.........................................................................................................pg. 8 7
FIGURA 11 Mapa da Geografia de Localização dos Parques Aqüicolas em
Governador Celso Ramos...........................................................................pg. 93
FIGURA 12 Mapa da Distribuição Geográfica no Mundo da Espécie do
Mexilhão Perna perna................................................................................pg. 102
LISTA DE FOTOS
FIGURA 3 – Foto aérea (1938) de Canto dos Ganchos mostrando a tênue
ocupação das encostas...............................................................................pg. 51
FIGURA 4 – Foto aérea (1957) de Canto dos Ganchos - neste período a
agricultura entrou em decadência em detrimento da ascensão da
pesca...........................................................................................................pg. 51
FIGURA 5 – Foto aérea (1979) de Canto dos Ganchos. a pesca industrial
encontrava-se no seu auge.........................................................................pg. 52
FIGURA 6 – Foto aérea (2000). aqui o asfalto tomou lugar da estrada de barro
e a expansão urbana subiu as
encostas.......................................................................................................pg. 52
FIGURA 7 – Foto atual do adensamento populacional nas encostas dos morros
– 2005..........................................................................................................pg. 53
FIGURA 16 – Banco natural de sementes em Governador Celso
Ramos........................................................................................................pg. 111
FIGURA 17 Coletor artificial de sementes.................................................pg. 112
10
FIGURA 18 Àrea de produção long line (espinhel)....................................pg. 114
FIGURA 19 Pedaços de redes de pesca usados para fazer bolsas de
mariscos......................................................................................................pg.115
FIGURA 20 Corda com sementes prontas para ser colocada no
espinhel......................................................................................................pg. 116
FIGURA 21 Acompanhamento do crescimento do marisco e retirada dos
predadores naturais...................................................................................pg. 117
FIGURA 22 Bolsa de mariscos pronta para
comercialização.........................................................................................pg. 118
LISTA DE GRÁFICOS
FIGURA 8 Gráfico dos principais países produtores de mexilhão cultivados,
2004 (em toneladas)....................................................................................pg. 80
FIGURA 13 Gráfico da composição bioquímica relativa (%) mexilhão Perna
perna...........................................................................................................pg.104
FIGURA 14 Morfologia externa do mexilhão Perna
perna..........................................................................................................pg. 105
FIGURA 15 morfologia interna do mexilhão Perna
perna..........................................................................................................pg. 106
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Manufaturas de engenhos de farinha e
açúcar..........................................................................................................pg. 24
TABELA 2 Progressão do aumento do número de pescadores artesanais do
município de Governador Celso Ramos, ex-Ganchos - período compreendido
entre 1963 até 1979.....................................................................................pg. 29
TABELA 3 Condição do produtor de acordo com o número de estabelecimentos
- Governador Celso Ramos – 1975 –
1995.............................................................................................................pg. 33
11
TABELA 4 Estrutura (barcos) na cidade de Santos nos anos de 1944, 1950,
1975.............................................................................................................pg. 37
TABELA 5 Embarcações acima de 20 toneladas brutas por região –
proprietários – 1977.....................................................................................pg. 38
TABELA 6 Incentivos governamentais da SUDEPE – por
região...........................................................................................................pg. 38
TABELA 7 Produção de pescados em Santa Catarina (em quilos) – 1966 a
1970.............................................................................................................pg. 43
TABELA 8 Produção (em quilos) de pescados – de 1972 a
1974.............................................................................................................pg. 45
TABELA 9 Evolução da população de Governador Celso Ramos, segundo
situação de domicílio...................................................................................pg. 73
TABELA 10 Número de estabelecimentos, segundo a categoria – 1990 a
2003.............................................................................................................pg. 75
TABELA 11 Número de empregos, segundo a categoria – 1990 a
2003.............................................................................................................pg. 75
TABELA 12 Índice de desempenho do programa da cadeia de moluscos
bivalves cultivados no Brasil........................................................................pg. 82
TABELA 13 Associações e cooperativas com unidades que possuam
beneficiamento (UB) de moluscos em Santa Catarina – dados de
2004.............................................................................................................pg. 89
TABELA 14 Áreas de produção de mexilhões em Governador Celso Ramos em
2004 por localidade......................................................................................pg. 94
TABELA 15 Custo de produção de um módulo de mexilhões com 5.000 m
2
sistema “long line...”...................................................................................pg. 119
TABELA 16 Outros materiais utilizados na produção de
mariscos.....................................................................................................pg. 120
TABELA 17 Produção de bolsas de mariscos produzidos por localidades no
município – dados coletados com os
entrevistados.......................................................................................pg.121/ 122
TABELA 18 Apuração de resultados – produção “in natura” -
2005...........................................................................................................pg. 123
TABELA 19 Apuração de resultados – produção desmariscado -
2005...........................................................................................................pg. 124
12
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACARPESC - Associação de Crédito e Assistência Pesqueira de Santa
Catarina
ACT – Admitido em Caráter Temporário
AMJG – Associação de Moradores do Jardim Gaivotas
ART – Anotação de Responsabilidade Técnica
CEPSUL – Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral
Sudeste
CEPA/SC – Comissão Estadual de Planejamento Agrícola de Santa Catarina,
ou ainda pode-se ler: ICEPA – Instituto.
COOALIMAR – Cooperativa de Mulheres Produtoras de Alimentos da
Maricultura
CEPASA – Centro de Treinamento de Pesca da Penha/SC
CTTMar/UNIVALLI – Centro de Ciências Tecnológicas de Terra e Mar da
Universidade do Vale o Itajaí
DEOH – Departamento de Edificações e Obras Hidráulicas
DP/MM – Departamentos de Portos do Ministério da Marinha
EPAGRI – Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa
Catarina
FAMASC – Federação das Associações de Maricultores de Santa Catarina
FATMA – Fundação de Amparo à Tecnologia e Meio Ambiente
GRANFOPLIS – Grande Florianópolis
HACCP – Cerificação Sanitária de Reconhecimento Internacional
ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio ambiente e dos Recursos Renováveis
INPS – Instituto Nacional de Previdência Social
LAMEX – Laboratório de Mexilhões
LCMM – Laboratório de Moluscos Marinhos
NAPESCA – Indústria e Comércio de Pescados Ltda.
PEA – População Economicamente Ativa
13
PEGAN – Pescados Ganchos
PNADs – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio
PLAMEG – Plano de Metas do Governo do Estado de Santa Catarina –
1961/65
PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento Familiar
RAIS – Relatório Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho
SABAP – Sociedade Amigos do Bairro de Armação da Piedade
SPU – Serviço do Patrimônio da União
SIF – Serviço de Inspeção Federal
SUDEPE – Superintendência de Desenvolvimento da Pesca
SULBRAS – Industria Sulbrasileira de Pesca
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
UNIVALI – Universidade do Vale do Itajaí
14
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.............................................................................................pg. 15
1. A FORMAÇÃO SÓCIO-ECONÔMICA DE GOVERNADOR C.
RAMOS.............................................................................................pg. 22
1.1 Da Pesca da Baleia a Manufatura dos
Engenhos...........................................................................................pg.22
1.2 Salgas...............................................................................................pg. 26
1.3 O Desenvolvimento da Atividade Industrial Pesqueira .....................pg.32
1.4 O Desenvolvimento da Indústria Pesqueira no Brasil.......................pg.35
1.5 O desenvolvimento da Pesca em Sta. Catarina e em Governador Celso
Ramos............................................................................................. pg. 34
1.6 As Transformações do Espaço de Governador Celso Ramos, de 1960
até o final da década de
1970..................................................................................................pg. 48
1.7 A Falência da Indústria Pesqueira em Governador Celso
Ramos...............................................................................................pg.55
2. A MARICULTURA COMO ESTRATÉGIA DE REPRODUÇÃO DO
PESCADOR
ARTESANAL.................................................................pg.689
2.1 Atividade no Mundo e no Brasil.........................................................pg.79
2.2 Santa Catarina e Governador Celso Ramos....................................pg.68
2.3 A Caracterização e Legitimização da Área de Cultivo de Mexilhões
(mariscos).........................................................................................pg. 83
2.4 Da Legalização do Parque Aqüícola................................................pg. 86
2.5 Mexilhão Produzido no Município de Governador Celso Ramos –
espécie Perna perna..........................................................................pg.90
2.6 Reprodução e Desenvolvimento da Larva........................................pg. 91
2.7 Composição Bioquímica do Mexilhão Perna perna..........................pg. 92
2.8 Fixação do Mexilhão Perna perna.....................................................pg.95
15
2.9 Disponibilidade da produção de sementes...................................pg. 97
2.10 O sistema de Produção do Mexilhão - Estrutura de Produção.....pg.102
2.11 Custos da Implantação da Estrutura da Produção.......................pg. 107
2.12 Retorno Financeiro........................................................................pg.110
2.13 Agregação de Valores na Maricultura e Tributação.....................pg. 114
3. A PLURATIVIDADE NA PESCA E MARICULTURA EM GOVERNADOR
CELSO RAMOS....................................................................................pg.117
3.1 Caráter Pluriativo da Pesca e Maricultura
artesanal..........................................................................................pg.117
3.2 A Evolução das Ocupações não Formais da
Pesca...............................................................................................pg.125
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................pg.130
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................pg. 145
6 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................pg. 148
16
INTRODUÇÃO
As produções artesanais familiares de pesca e de maricultura
encontram-se com significativas transformações. A forma como vem se
processando e a amplitude das mutações que, ao longo das últimas décadas
vem ocorrendo, tem acentuado o caráter heterogêneo e complexo das
atividades no mar.
Diante desta panorâmica acerca da problemática de nosso interesse,
pretendemos analisar a reprodução econômica familiar, frente à implementação
das atividades de pesca e maricultura, em substituição à falência da indústria
pesqueira e as relações pluriativas do município de Governador Celso
Ramos/SC.
Assim sendo, diante da necessidade de se entender as implicações de
processos na atualidade, o olhar sobre as atividades familiares artesanais de
pesca e maricultura vem se tornando menos condescendente e mais
interrogativo. As atividades que se processam no mar vêm se tornando lócus
de onde tem emergido questões que dizem respeito a toda a sociedade local e
não mais apenas aos pescadores e maricultores. Entretanto, essas relações
vêm se alterando na medida em que novas formas de reprodução social do
trabalho e renda têm se inserido no município em estudo.
Devemos observar que apesar da diversidade de relações de trabalho
formais surgidas paralelamente com a pesca e a maricultura, tema de análise,
vem alimentando possibilidades reais de mudanças em curso. Dessa maneira,
novas formas pluriativas nas relações de emprego, bem como estratégia de
desenvolvimento hegemônica vem se concretizando. Além disso, sob as
diversas formas e proporções, a maioria dos assuntos discutidos, procura dar
uma visibilidade da importância dessas atividades nas possíveis reformas e
projetos que melhorarão sensivelmente o desenvolvimento das atividades
artesanais no município. Com isto, poderá dar suporte e estruturação a outros
17
ramos do mercado de trabalho que se inserem na localidade, como exemplo, o
turismo.
Entretanto, as experiências descentralizadas e inovadoras de
desenvolvimento precisam ser aprimoradas e ampliadas a partir da ação
política para o setor, não ficando somente no discurso, dessa forma
melhorando as condições de vida, principalmente de maricultores e suas
famílias envolvidas. Destacamos a necessidade de um redimensionamento dos
espaços produtivos para não causar a eutrofização das áreas produtivas.
Quanto às mudanças na estrutura da pesca e maricultura artesanal familiar,
não se deve restringir a produção primária, mas melhorar as formas de captura
do pescado e produção de mexilhões bem como de processamento e
comercialização como exercício de atividades não artesanais.
Outro ponto a ser ressaltado quanto à pesquisa realizada refere-se às
limitações e potencialidades dos contextos de desenvolvimento voltado à
atividade familiar. Tal fato se faz cada vez mais premente, quando
consideramos o caráter incipiente das estratégias usadas pelos poderes
constituídos, seja o município, o governo estadual e o governo federal, além
das associações e cooperativas.
Também lembramos que até pouco tempo, parte dos estudos
realizados sobre a pesca e maricultura no município se dedicavam
basicamente aos processos de ordem geral, a dinâmica do capitalismo, como
exemplo, SILVA, (1992). Os mesmos hesitam muito em considerar e se
interessar pelas especificidades e as questões relacionadas ao espaço de
produção e todo intricamento nas relações de trabalho e renda extra-atividade
artesanal, bem como da sua permanência como reprodução e inclusão social.
Estamos convencidos que é necessário atentar para essa escala de análise a
fim que possamos avaliar não somente o sentido dos atuais contextos em que
vem se desenvolvendo as relações na dinâmica e na reestruturação das
atividades pesqueiras.
18
Quando começamos nosso estudo, não tínhamos como objetivo
específico analisarmos o tema pluriatividade, mas sim as relações de pesca e
maricultura familiar na vida das comunidades pesqueiras do município de
Governador Celso Ramos/SC, o futuro desta atividade como fonte de renda e
inclusão social. Outra preocupação da pesquisa seria traçar subsídios para
servir de base para a definição das linhas gerais de intervenção da
administração pública no desenvolvimento do meio pesqueiro artesanal, bem
como servir de alerta, principalmente aos maricultores e pequenos pescadores,
no sentido da intervenção iniciada por empresários na atividade.
Por ocasião das entrevistas, nos deparamos com outras formas de
relações e ocupações por trabalhadores da pesca e maricultura, que se
inseriam nas atividades formais, ocupando dessa maneira a mão-de-obra
artesanal. Isso, entretanto, não invalida as análises que apresentaremos
adiante. O estudo foi realizado no sentido de diagnosticar a diversidade de
situações encontradas no município. Para tanto, foram aplicadas entrevistas
diretas às famílias dos pescadores maricultores, visando identificar as
características básicas dos grupos familiares. Além de entrevistas diretas com
os pescadores e maricultores, também entrevistamos os presidentes das duas
Colônias de Pescadores, ex-gerentes das indústrias, ex-donos de salgas e
pescadores que trabalharam na indústria pesqueira e artesanal.
Foram entrevistados 146 pescadores maricultores de um total de 264
pescadores que compõem o universo da pesca e maricultura no município.
Essas famílias foram escolhidas aleatoriamente dentro de uma lista ampla
elaborada pelos Órgãos de pesquisa e de assistência técnica no meio, como a
EPAGRI e as Colônias de Pescadores, que nos orientaram nesse sentido.
Com base nas entrevistas, ficou difícil estimar, em valores médios, o
retorno financeiro. Durante o levantamento das informações junto aos
maricultores, alguns nem sempre se mostraram solícitos em responder. Outros se
negaram a dar entrevista e, quando se falava em valores de produção, ficou
explícito que muitos mascararam as respostas.
19
Durante a sistematização das informações, tivemos alguns problemas
em relação aos dados coletados, o que prejudicou a análise de alguns
aspectos que faziam parte do instrumento de pesquisa, com destaque para as
questões relacionadas às rendas da população envolvida nas duas atividades.
Anteriormente, quando fizemos outra pesquisa, em 2000, este foi o fator de
truncamento do trabalho. Houve e ainda existe um receio em informar os
valores de ganho, que quase sempre foi informado como referência o salário
mínimo. Tais informações, baseadas no salário mínimo, têm como base o
defeso, quando são cadastrados e recebem os salários por três meses.
Também se mostram desconfiados e com medo que as informações possam
se traduzir em impostos.
Ressaltamos que as dificuldades encontradas foram inúmeras.
Inicialmente, encontramos reduzida bibliografia que nos desse embasamento
para que melhor pudéssemos estudar o espaço da pesca, no sentido restrito. O
que buscamos na economia, sociologia, engenharia de aqüicultura e em outros
campos da ciência. Em segundo, os órgãos oficiais que controlam a atividade
pesqueira nos últimos anos não têm dados estatísticos referentes a esse
assunto. E, por último, o relacionamento com os produtores familiares que
quando não se negam a dar informações, as mascaram. Por isso tivemos que
recorrer a outras fontes, para não correr o risco de compilarmos dados
imprecisos.
Enfatizamos que a escolha do espaço para estudo e as suas relações
deveu-se ao fato do conhecimento que adquirimos ao longo do tempo
vivenciado junto às comunidades de pesca e maricultura do município. Por
conseguinte, nosso trabalho procurou compreender o processo histórico da
produção da baleia e a agricultura, as manufaturas de engenho, as salgas, a
indústria pesqueira e o turismo, a chegada da maricultura e as atividades
atualmente empreendidas.
Cada estratégia de desenvolvimento que vem incidindo sobre as
dimensões específicas do espaço de Governador Celso Ramos na atividade de
20
trabalho no mar tem se redefinido e atualizado o modo como os pescadores e
maricultores familiares se relacionam dentro da atividade artesanal e fora dela.
Nesse sentindo a maricultura é mais uma dessas formas de relação, o que nos
levou a escrever o segundo capítulo.
No Terceiro, discutimos a pluriatividade nas atividades de pesca e
maricultura e tratamos do embasamento teórico deste trabalho, na medida em
que o espaço pesqueiro vem ampliando o leque de atividades e estruturas
produtivas artesanais familiares e não artesanais. No capítulo segundo,
buscamos resgatar o processo histórico econômico partindo da pesca da baleia
e agricultura de subsistência, as manufaturas dos engenhos e das salgas até o
processo de industrialização da pesca, conjuntamente com o turismo e
posteriormente a decadência da indústria da pesca.
No quarto e último capítulo, as considerações finais, discutiremos o
espaço mobilizado atualmente, as suas limitações e dificuldades. Estas
necessidades e interesses de boa parte dos produtores artesanais familiares
passam a conceber e realizar outras possibilidades de reprodução dentro do
trabalho formal tentando melhorar sua inclusão social no município.
Por fim gostaríamos de ressaltar que neste estudo estamos
considerando como variável chave a ocupação dos membros familiares, como
forma de caracterizar a pluriatividade. Em parte, isso se justifica pelo fato de
que os objetivos iniciais da pesquisa não se restringiam à questão da
pluriatividade, conforme já foi citado anteriormente. Com isto, nota-se a
tipologia das atividades que serão apresentadas nos capítulos posteriores que
constam das atividades econômicas do município, paralelamente às atividades
de pesca e maricultura que vem se estruturando no mercado econômico e
social do espaço de estudo.
Frente a estas mudanças no espaço em estudo, o mais importante não
é mais definir a sociedade e as relações ideais que queremos, mas sim gerar
nesta sociedade os mecanismos de regulação que permitam ir se
transformando e reconstruindo de acordo com seus desejos e necessidades. O
21
que estamos propondo aqui é recuperar as implicações práticas de um objetivo
social que seja razoável entre a mão-de-obra disponível ativa e os meios de
produção existentes no município, dando a todos a oportunidade de trabalho e
inclusão social.
22
CAPÍTULO I
1 - A FORMAÇÃO SÓCIO – ECONÔMICA DE
GOVERNADOR CELSO RAMOS
1.1 - Da Pesca da Baleia à Manufatura dos Engenhos
Em 1747, o Conselho Ultramarino de Lisboa determinou a aplicação de
editais nas Ilhas do Arquipélago de Açores e, a quem quisesse vir estabelecer-
se no Brasil, o governo facultava o transporte às custas da Fazenda Real.
Saindo de sua terra natal, açorianos e madeirenses, poderiam se transformar
em pequenos produtores, em áreas cedidas no espaço catarinense, em
meados do Século XVIII, (1747 – 56) que, por orientação daquele Conselho,
deveriam acomodar-se nos setores correspondentes entre São Francisco do
Sul até São Miguel, atual distrito do município de Biguaçu.
Desse modo instalaram-se vários povoados, nos núcleos de São Miguel
como Armação Grande, Ganchos, Bombas, Zimbros e Tijuquinhas, além da
Enseada do Brito, São José, Palhoça, Paulo Lopes, Garopaba e Vila Nova,
mais para o Sul. A partir daí poderemos descrever a ocupação econômica do
atual município de Governador Celso Ramos, ex-Ganchos, que teve seu
assentamento populacional a partir de Armação Grande, sendo chamado
posteriormente de Nossa Senhora da Armação da Piedade e hoje Armação da
Piedade, conforme figura 01.
23
Figura 01: Mapa de Localização de Governador Celso Ramos, ex –
Ganchos.
Fonte: Adaptado do Projeto Coleta e Tratamento de Esgoto de Governador Celso Ramos.
Pertencente à Freguesia de São Miguel, Armação da Piedade tinha sua
economia atrelada à captura e manufatura de baleias, que na época apareciam
em grande quantidade em todo o litoral de Santa Catarina. Segundo afirma
SILVA, (1992) a localidade tornou-se o maior e mais importante posto de pesca
e manufatura do Brasil Colônia. Vale lembrar que além da captura de baleias
como atividade pesqueira mais importante, praticava-se também a pesca
artesanal de subsistência e as encostas dos morros eram utilizadas para a
agricultura, com plantações de café, banana, algodão, milho, feijão, mandioca e
a cana-de-açúcar. Estes dois últimos eram transformados em farinha de
24
mandioca e açúcar, ainda de forma artesanal sem os processos das
manufaturas dos engenhos. Com a decadência da pesca da baleia, a
população de Armação da Piedade diminuiu significativamente. Existem dados
que indicam que em 1883 apenas 42 (quarenta e duas) pessoas lá ficaram em
detrimento de 149 (cento e quarenta e nove) moradores em 1824. A
Comunidade de Ganchos contava com 208 (duzentos e oito) moradores.
As pessoas se mudaram, estabelecendo-se em outras comunidades
vizinhas fortalecendo-as como núcleo de produção de gêneros agrícolas. A
partir daí surgiram as grandes plantações e intensificaram as manufaturas de
mandioca e de cana de açúcar, principalmente nas comunidades de Palmas,
Ganchos do Meio, Canto dos Ganchos e Jordão.
No período compreendido entre 1847/51, mudanças ocorriam no espaço
mundial, com lutas, principalmente no continente europeu, para disputar o
controle político-econômico, despontando a Inglaterra como liderança,
configurando-se um novo centro hegemônico internacional. Segundo
GUIMARÂES (1982), em 1876, a Inglaterra já dispunha de um Império colonial
de 22,5 milhões de quilômetros quadrados de território e 252 milhões de
habitantes.
No mesmo período a crise agrária mundial espalhou-se por toda a
Europa e já havia atingido também os Estados Unidos. Mas, ao analisar essas
crises nos países europeus e americanos, GUIMARÃES (1982, p.13 a 22),
argumenta que: “Em todos os países mais desenvolvidos da Europa e da
América, a crise geral, que já se tornava crônica, não chegou a constituir um
obstáculo ao desenvolvimento do capitalismo no campo”. O contrário ocorreu
nos países subdesenvolvidos, pois a sobrevivência pré-capitalista e
conseqüentemente as resistências às novas mudanças, impediram que a
produtividade aumentasse. Desse modo, no Brasil, as Oligarquias Cafeeiras,
principalmente caracterizadas pelos cafeeiros do estado de São Paulo e do
leite de Minas Gerais permaneceram ditando as regras da economia nacional
até o início do Século XX, quando houve a substituição da política do café com
leite pelo processo das indústrias de manufaturas internas em função da crise
25
mundial de 1929. O Governo Vargas, 1930, determinou o corte da maioria dos
pés de café e mandou queimar 80 mil sacas de todo o estoque interno pela
falta de compradores no exterior.
Toda essa crise na agricultura mundial e nacional refletiu na estrutura
local do município. O declínio das manufaturas (engenhos) foi sentido na
medida em que a industrialização do campo se acentuou juntamente com os
problemas advindos de técnicas totalmente obsoletas do uso do solo e as
pragas que assolaram a região. Segundo dados coletados por SILVA (1992),
entre 1917/18, o Município possuía 46 engenhos de farinha e açúcar,
distribuídos conforme tabela 01.
Atualmente não encontramos nenhuma dessas manufaturas em
atividade, apenas resquícios de construção e de peças em algum local ou
museu. Tanto a farinha de mandioca, açúcar e a cachaça consumida no
município vêm de outros municípios de Santa Catarina.
Tabela 01: Manufaturas de Engenhos de Farinha e Açúcar
Localidade 1917/18 1936
Jordão 16 11
Caeira da Armação 06 -
Areias 03 01
Armação da Piedade 09 -
Palmas 07 -
Ganhos 05
TOTAL 46 13
Fonte Prefeitura Municipal de Biguaçu. Adaptação de SILVA. – 1992.
A crise agrária local também teve problemas com o tratamento do solo e
de pragas, como explica LAGO & GOUVEIA, (1961) com relação à atividade
agrícola na Ilha de Santa Catarina, quando se referiu sobre a evasão das
atividades agrícolas para a pesca. Tal fato também ocorreu em Governador
Celso Ramos, pela facilidade da ligação entre a Ilha de Santa Catarina com o
lado norte de Governador Celso Ramos, próximo à localidade de Armação da
Piedade. Esta ligação era efetuada pelo mar por lanchas a remo e a vela
26
através da Baia dos Golfinhos que separa a Ilha do município, facilitando o
contato entre os dois locais. Em segundo lugar a troca existente de mudas de
plantas traziam consigo os problemas advindos das doenças (pragas) que se
proliferavam nas lavouras dos dois locais. Por último, o esgotamento do solo
causado pelas técnicas obsoletas utilizadas. Além disso, a baixa renda que era
auferida pela atividade da agricultura não mais satisfazia as necessidades tanto
da economia quanto da sobrevivência desses agricultores. Desse modo, as
pessoas se transferiram para a atividade pesqueira. Esse processo se deu
dentro de um espaço em constante transformação, seguindo as diretrizes e
volatilidade da economia mundial, onde as mudanças eram constantes nas
relações de produção.
1.2 - As Salgas
No Século XIX, sobretudo no período compreendido entre 1873-1896,
surgiram no litoral de Santa Catarina e acanhadamente no antigo Ganchos, as
salgas, que eram manufaturas utilizando o sal para conservação do pescado
em tanques. Naquele período, houve uma reorganização econômica da
localidade, pois grande parte do excedente de mão-de-obra dispensada do
setor agrícola se transferiu para a atividade da salga. Como esta atividade de
manufatura de pescado foi crescendo ao longo do tempo, houve uma
poupança financeira para fortalecer um novo segmento social.
Devemos levar em consideração que a atividade era artesanal, tanto na
manufatura como na forma de captura. Havia o processamento de matéria
prima do mar como bagres, tainhas, anchovas, corvinas, mangonas (uma
espécie de tubarão), sardinhas e camarão, entre outras. O dono da salga
comprava o produto da pesca do pescador artesanal e o processava em sua
pequena unidade. Às vezes isso era feito no rancho destinado ao abrigo de
canoa e, no período de repressão e fiscalização, quando ocorreu a
industrialização da pesca, em sua residência.
27
Toda a produção das manufaturas pesqueiras, salgas, era vendida
através do porto de Tijucas e Florianópolis, isto até a década de 1950-60. Com
a abertura e melhoramento das estradas e com a construção da BR-101, o
produto processado nas salgas começou a ganhar os mercados do interior do
Estado de Santa Catarina e Região Sul.
A produção artesanal da pesca contava com dois setores. Um, referente
a venda do produto capturado aos “pombeiros”, como eram chamados os
donos das salga. O outro setor; o pescador que produzia os seus meios de
produção. Neste caso, a divisão do pescado era efetuada entre os demais
trabalhadores e o produto era destinado ao consumo ou vendida a parte
excedente. Também trocavam por produtos que necessitavam. Às vezes, o
pescador artesanal salgava uma parte do seu produto para vendê-lo no
momento em que o tempo não permitia sua ida ao mar.
A composição da família definia os limites de sua atividade. Nesta
análise WILKIMSON, (1986 p. 10), com relação à atividade familiar de
agricultura e que transpomos para a atividade familiar da pesca, pois é a
família que define o número de horas trabalhadas e o número de membros
necessários à execução da atividade, coloca que: “Desta maneira, no âmbito
da exploração familiar, o trabalho não tem preço fixo por unidade, uma vez que
seu valor só pode ser determinado em relação ao resultado do balanço global
trabalho-consumo”. A família definia os limites de sua capacidade de produção.
A força de trabalho da unidade de pesca artesanal familiar era determinado
pelo número de membros que se encontravam capacitados para a produção,
trazendo, desse modo, os benefícios materiais essenciais à sobrevivência.
Todavia, torna-se necessário salientar que as salgas perduraram até a
década de 1960. Segundo SILVA (1992), eram em número de 17 no período
compreendido entre 1957-1962 e, com a modernização da indústria pesqueira,
apenas 03 (três) sobreviveram. Naquele período, houve um aumento
populacional nas comunidades localizadas junto ao mar. Conforme dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, no final da década de
28
1960, mais de 52,61%, da população de Governador Celso Ramos, já viviam
na área litorânea.
Desse modo, acerca das salgas, alguns estudiosos inclusive a própria
autora citada acima, afirma que essas unidades, em sua maioria, foram se
extinguindo na medida em que novas técnicas foram implementadas pelo
processo modernizante da atividade pesqueira, ocorrido no município referido.
Mas também algumas dessas pequenas unidades sobreviveram à
modernização, bem como à perseguição e fiscalização patrocinada pelo
Governo Federal e imposto ao pequeno produtor artesanal familiar, a partir da
década de 60.
Conforme alguns donos de salgas e pescadores artesanais, quando não
podiam manufaturar seus produtos nas unidades de salgas, o faziam
escondidos em suas residências ou em edículas atrás de suas casas. O
resultado de sua produção era transportado em ônibus em caixas de isopor, e
vendido no Mercado Público de Florianópolis ou, como informaram dois donos
de manufatura, (um com 86 e o outro com 82 anos), que até hoje ainda atuam
no mercado de pescado, esperávamos anoitecer e levávamos até Tijucas onde
havia um comprador. O horário sempre era depois das vinte e duas horas e,
muitas vezes, à meia noite. O informante de 86 anos, já aposentado, ainda
mantém a atividade de comprar e vender camarão no mercado local e em
Florianópolis. Toda a sua família, desde então, sempre esteve atrelada à pesca
industrial e artesanal, inclusive sua mulher. Já o informante de 82 anos,
também aposentado, desde aquele período ainda ajuda o filho na salga, e tem
um outro filho que processa o produto em casa e vende em vários locais.
Ambos disseram que essa era uma praxe de todos que possuíam salga no
período de repressão.
Em entrevista com um ex-funcionário do extinto Departamento de Caça
e Pesca, este afirmou que havia repressão, mas que pequenas manufaturas e
pescadores artesanais conseguiam burlar a fiscalização. Falou de alguns casos
em que um pescador ficava no mar como “isca” para que a fiscalização
retirasse e prendesse seus petrechos, enquanto os demais pescadores que se
29
encontravam espreitando, avançassem sobre a fiscalização, fazendo-os recuar.
Muitas vezes não foi possível a fiscalização no mar, pois os barcos eram
inadequados, com motores pifados ou até com buracos em seus cascos, tendo
que colocar o pé para não afundar. A área fiscalizada abrangia o litoral de
Florianópolis se estendendo até Joinville. Em função da extensão e o número
reduzido de funcionários para dar conta do trabalho da fiscalização no mar,
favorecia a manutenção da atividade pesqueira artesanal clandestina. O que
corrobora o discurso de SILVA, (1992 – p.176):
“Por volta de meia noite vieram com lanchas baleeiras e uma lancha.
Gritaram para que parássemos a pesca, enquanto isso cortei o cabo
da rede para fugir, mas não adiantou. Armados de pistola, revolveres
e porretes e até facas, 11 civis e 2 soldados da Polícia Militar,
começaram a bater e só foram embora depois de meia hora de
pancadaria. Quebraram o leme do barco e ameaçaram colocar fogo
nos barcos, caso continuássemos pescando”.
Não ignoramos o fato de que no período citado havia a repressão
institucionalizada implementada pelo Poder Público. Mas também não
podemos ignorar os relatos do fiscal citado e de outras entrevistas com os
pescadores e donos das salgas. Havia uma desobediência civil que quebrava
toda a rigidez da proibição pública. E, corroborando com o discurso do fiscal,
afirmamos que o pescador artesanal se estruturava naquele momento e se
defendia dos ataques da fiscalização e continuava com a sua atividade. Em
outra entrevista com a esposa de um pescador artesanal que vivenciou aquele
momento, ela nos contou que, além de burlarem a perseguição implementada,
também fizeram manifestação na porta do Palácio do Governo exigindo a
retirada da fiscalização, o que veio a abrandar a perseguição.
Ainda complementando, nos livros da Colônia de Pescadores Z-9 e Z-
10, estão registrados que a cada ano daquele período houve um aumento do
número de pescadores artesanais. Segundo informação do Presidente da
Colônia de Pescadores, com 60 (sessenta) anos de idade e que trabalhou na
pesca artesanal e industrial desde os 15 anos, naquele período (tabela 02),
havia obrigatoriedade de registro de pescador artesanal e do pagamento de
30
taxa anual. Esta obrigatoriedade permaneceu até a promulgação da
Constituição Federal de 1988 e, atualmente, essa obrigatoriedade do
pagamento não existe, sendo cobrada uma taxa anual no valor de R$ 60,00
(sessenta reais) em 2005, para a manutenção da Colônia.
Tabela 02: Progressão do Aumento do Número de Pescadores Artesanais
do Município de Governador Celso Ramos/SC, ex – Ganchos – período
compreendido de 1963 até 1979.
1963 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970
198 600 429 429 627 650 726 726
1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979
759 858 990 1.000 1.122 1.088 1.221 1.177 1.245
Fonte: Livros de registro dos Pescadores da Colônia de Pescadores de Governador Celso
Ramos.
Os dados da tabela 05 apontam uma progressão no aumento do número
de pescadores no Município. Entre os anos de 1965-66, houve uma
estagnação desse número. Este fato ocorreu quando houve maior perseguição
ao pescador artesanal. O aumento de quase 300% do número de pescadores
artesanais nos anos de 1963-1964 ocorreu em função da instalação das
primeiras indústrias no município, que passaram a exigir um maior número de
pescadores com o aumento da produção, principalmente as empresas LA
SERENA e SILVA/FILHOS, que trabalhavam preferencialmente com o
processamento de camarão, instaladas as duas em Canto dos Ganchos.
E ainda, SILVA, (1992, p.175) ao colocar que: “Expropriados das
condições objetivas de seu trabalho, estes pescadores passaram a se
submeter aos interesses mercantis, deparando-se, então com outros conflitos,
entre os quais se pode destacar a redução do produto a ser capturado”. E
também argumenta:
“Esta redução não está relacionada com o” falacioso“ discurso de
esgotamento dos recursos, mas com a desigual concorrência que se
estabelece, de forma conflituosa, com a pesca industrial, visto que a
31
potência das grandes embarcações permite a realização do processo
de captura em alto-mar, enquanto que as condições tecnológicas das
pequenas embarcações não permitem a extrapolação das
proximidades do litoral”.
No entanto, é preciso ressaltar que a redução do produto capturado,
naquele período, não significou a extinção absoluta da produção artesanal.
Outro fato a ser ressaltado é que, se o esgotamento dos recursos foi
“falacioso”, havia matéria prima suficiente tanto para a indústria quanto para a
pesca artesanal, pois a afirmativa nos leva a crer que enquanto um pescava
dentro de baías em baixa profundidade, o outro pescava em alto mar. Desse
modo, contrariando a afirmação de que a pesca industrial extinguiu os recursos
naturais locais em função da pesca predatória.
Outro fato constatado no trabalho de SILVA, (1992 - p. 175) também
contraria as recentes pesquisas quando salientou que:
“É neste espaço marítimo, portanto, que o trabalhador ”repousa”, à
espera de pescado, há muito capturado. Na década de 1980, estes
homens já não conseguiam nem mesmo pagar o fisiologismo
“emprestado” pela Associação de Créditos e Assistência Pesqueira de
Santa Catarina - ACARESC, que lhes destina redes cobrando um
aluguel em forma de produto: 2 quilos de Camarão”.
A pesca artesanal existia paralela à pesca industrial, mesmo sob
condições adversas. E, quanto aos recursos destinados pela ACARESC, eram
a fundo perdido. Muitos pescadores mais antigos entrevistados, nunca
pagaram os empréstimos recebidos para aquisição de redes e outros
petrechos. Por isso interpretamos como fantasioso este tipo de pagamento,
mesmo porque o pagamento deveria ser executado junto à instituição e não a
servidores da mesma. Naquela época e até pela grande quantidade de
pescados capturados, era de praxe e inerente ao pescador artesanal dar como
presentes peixe e camarão a amigos, vizinhos e visitantes, principalmente se
este lhe prestasse algum favor. E vale ressaltar como exemplo, que no período
em análise, uma funcionária do Instituto Nacional de Previdência Social - INPS,
32
conhecida como Dona Maria, que facilitava o acesso rápido a fichas para
consultas médicas, evitando o enfretamento das filas em Florianópolis,
semanalmente era presenteada pelos favores prestados.Ou, ainda, todos
aqueles que iam com a citada senhora a Ganchos, pois se tornavam partes
integrantes dessa amizade consolidada.
1.3 - O Desenvolvimento da Atividade Industrial Pesqueira.
Não pretendemos aqui fazer um resgate ou discutirmos a reorganização
da formação econômica do Brasil, e nem tampouco tentarmos explicar as mais
diversas teorias econômicas. Faremos uma análise do que foi não somente o
desenvolvimento da indústria e a estagnação da agricultura que sofreram os
reveses da modernização implantada a partir de 1950, mas também a pesca no
Brasil, Santa Catarina e em Governador Celso Ramos. Desse modo,
propormos a discussão sobre a falência da indústria pesqueira, a manutenção
da pesca artesanal, a chegada da maricultura e as mudanças que se
processaram a partir dessa reorganização espacial local a partir do processo
histórico econômico.
Para entendermos melhor estas mudanças, tentaremos resgatar as
realizações acontecidas na economia do município com a ascensão da
indústria pesqueira até os momentos atuais. Como coloca SANTOS, (1980): O
espaço pode ser considerado como um conjunto de relações que tem como
testemunho uma história que foi escrita no passado e no presente. Por isso
resgataremos o processo histórico econômico local para entendermos o
presente.
Logo após a Segunda Guerra Mundial ocorreram mudanças no espaço e
nas articulações das relações de produção da economia mundial, o seu
desenvolvimento estendeu-se para as economias dos países
subdesenvolvidos. No território brasileiro, em particular, ocorreu modificação na
estrutura econômica com mudanças radicais no processo de substituição das
importações, principalmente a partir de 1950. As grandes multinacionais se
33
instalaram no território brasileiro e a produção de bens duráveis como
máquinas e tecnologias teve seu grande impulso, pois seriam usadas na
modernização do setor produtivo nacional.
Naquele período expandiram-se consideravelmente as indústrias
básicas como siderúrgica de metais ferrosos pesados, petróleo, papel e
celulose. Mas, para que isso ocorresse, o Estado teve que aumentar a carga
tributária e o déficit fiscal como fontes de financiamento, e assim, em curto
prazo, atrair investimentos estrangeiros diretos, crédito oficial subsidiado para
estimular a acumulação do setor privado. Este momento econômico vigoroso
de grandes expansões que começou em 1967, sob a influência da política do
segundo governo militar teve seu término em 1973, em confronto com o
processo anterior que compreendeu o período de 1956-1961. O Estado esteve
a serviço das classes dominantes na busca do controle e apropriação dos
meios de produção, como coloca MENDEL, (1978 – p.22): “Se o aparecimento
de um Estado permite às classes dominantes conservarem a apropriação do
subproduto social, esta apropriação do subproduto social permite, por sua vez,
pagar aos membros do aparelho do Estado”.
Desse modo foi a indústria manufatureira que, segundo SERRA, (1992,
p.35), cresceu a uma taxa de 12,7%,nos anos de 1960 e nos primeiros anos de
1970, sendo que os setores mais dinâmicos eram os da indústria de bens de
consumo duráveis e o de bens de capital. Quanto ao desenvolvimento da
produção agrícola, nos períodos, manteve-se modesto embora sendo muito
mais elevado do que acontecia antes da Guerra.
Inicialmente, foram pequenos os investimentos na agricultura e um
aumento sensível da produção industrial que se instalava nas áreas urbanas,
principalmente nas Regiões Sudeste e Sul. Houve também um remanejamento
da mão–de-obra da agricultura para a indústria, o que levou a um aumento
gradativo da população urbana naquele período. Mas também a concentração
de terras nas mãos de grandes latifundiários que se instalavam através de
incentivo governamental, principalmente nas regiões Nordeste e Norte, o que
OLIVEIRA, (1999 p.85), ao analisar o crescimento dos latifúndios no Brasil
34
escreveu que: “O traço essencial da estrutura fundiária brasileira é o de caráter
concentrador da terra e, contraditoriamente, o crescimento/formação do
campesinato brasileiro”. Essa concentração nas duas pontas do processo está
expressa na distribuição da terra no Brasil que compreendeu o período de 1950
e 1985. E, ainda analisando as desigualdades na distribuição regional
brasileira. OLIVEIRA, (1999 - p.83), argumenta que:
“A Região Sul conheceu no período entre 1970-85 um grande
declínio dos mais variados tipos de produtores, ficando assim
estabelecidos os dados. O total caiu 6%(seis por cento); os
arrendatários, menos 17 %(dezessete por cento); os parceiros,
menos 28% (vinte e oito por cento); e os posseiros, menos 2%(dois
por cento). Com essa análise na região Sul o processo de
expropriação do homem da terra foi praticamente absoluto”.
Além de ocorrer um aumento na expulsão do homem da terra, houve
também uma grande concentração de grandes latifúndios. Mais à frente o
autor coloca que Santa Catarina teve um processo inverso ao da região, ou
seja, houve um grande aumento nas relações de pequenos produtores. O
Estado é conhecido por não ter grandes concentrações de terra. Predominaram
os pequenos e médios produtores, intensificando as relações de produção. Em
Governador Celso Ramos, o setor agropecuário sofreu um declínio na medida
em que a pesca teve seus incentivos. A tabela 03 apresenta dados sobre a
condição de produtor de acordo com o número de estabelecimentos.
Tabela 03: Condição do Produtor de Acordo com o Número de
Estabelecimentos – Governador Celso Ramos -1975-1995
Município
PROPRIETÁRIO ARRENDATÁRIO PARCEIRO OCUPANTE
TOTAL
ANOS
1975
1995
1975
1995
1975
1995
1975
1995
1975
1995
G.C.R.
154
85
12
06
-
-
21
05
187
92
FONTE: Anuário Estatístico do IBGE – Censo Agropecuário
35
Como observamos nos dados acima, no período compreendido entre
1975 a 1995 na medida em que a pesca foi crescendo no município, a
atividade de agricultura foi decaindo, dando lugar ao desenvolvimento de
atividade mais rentável para o homem que vivia nas localidades rurais. Neste
sentido foi a revolução agrícola que deu impulso para que a indústria se
estabelecesse no Brasil. E no presente a indústria vem revolucionando a
agropecuária. Mas também não podemos deixar de relatar que este
crescimento do campo através do processo de mecanização patrocinado pelo
desenvolvimento tecnológico proporcionou também a exclusão do pequeno
produtor do campo para a atividade agrária pesqueira.
Atualmente, quanto mais cresce a população mundial, maiores estímulos
são dados para que a agricultura se desenvolva. Para Malthus parecia uma
tarefa difícil alimentar a população mundial na medida em que essa fosse
crescendo, mas, atualmente, a tecnologia inventa e reinventa formas de
produção no campo, aumentando a quantidade de alimentos além do
necessário para alimentar a população mundial.
1.4 - O Desenvolvimento da Indústria Pesqueira no Brasil
Dentro de uma análise histórica de políticas adotadas junto às atividades
pesqueiras no Brasil, duas situações se apresentam: Num primeiro momento,
todo o processo se deu pelo estudo e regulamentação do setor, e, em
segundo, a atividade pesqueira cresceu através dos investimentos na
produção. A regulamentação da atividade pesqueira data de muito tempo, e,
principalmente no governo Vargas em 1930, que regulamentou o setor
extrativista animal, mineral e vegetal. A regulamentação autorizava a extração
de madeira, extração mineral, principalmente o carvão mineral e a inclusão da
atividade pesqueira, como atividade extrativa, na costa brasileira, como forma
de aumentar a produção de alimentos para consumo interno.
Mas foi a partir da década de 1960, que os estudos tomaram corpo e em
1967 o Governo Federal criou um órgão específico, a Superintendência de
36
Desenvolvimento da Pesca – SUDEPE, com a finalidade de desenvolver o
setor pesqueiro no país. O setor tomou impulso através de incentivos fiscais e
tecnologias desenvolvendo toda a atividade no litoral brasileiro.
A partir do Decreto-Lei nº. 221/67 iniciou-se a política de incentivos à
produção pesqueira. Vale lembrar que até meados dos anos de 1960,
predominou no litoral do Brasil a atividade pesqueira artesanal e basicamente
voltada ao consumo interno. Desde então, através daquela política
governamental implementada, promoveu-se à chamada pesca industrial,
voltada para o abastecimento da indústria nacional e do mercado externo.
O Decreto-lei instituído trouxe aos industriais da pesca incentivos como
deduções tributárias para investimentos em projetos pesqueiros. Houve
também a isenção de impostos e taxas federais, principalmente para as
importações de máquinas, equipamentos e todos os tipos de petrechos, como
radares, sonares, entre outros, necessários à modernização da produção
pesqueira. Os incentivos fiscais atuaram durante o período compreendido
entre 1967 a 1986, que veio contribuir para ampliar a quantidade da captura de
pescado no Brasil. Como conseqüência dessa atuação governamental, houve
um aumento expressivo do parque industrial tanto na captura da matéria –
prima, quanto das estruturas de terra para processar o produto.
Segundo dados da SUDEPE, entre 1967 a 1972, do total dos recursos
que foram captados, seja em forma de incentivos governamentais ou de
empréstimos ao setor privado, 91% foram investidos na indústria, captura,
administração e comercialização. Os outros 9% foram investidos em bens
pessoais. E em momento algum encontramos dados quanto a investimentos
em pesquisa científica no sentido de dimensionar os ecossistemas e suas
capacidades produtivas, bem como seus estoques ao longo do processo de
captura. Diante dessa análise, o governo, ao incentivar a indústria pesqueira a
desenvolver grandes estruturas de pesca, não levou em consideração a
capacidade de suporte do ecossistema aquático. Adentrando nas baías e
enseadas pescavam com suas redes todos os tipos de peixes, jogando ao mar,
já mortos, os pequenos não servíveis para a industrialização. Assim, houve
37
alteração do ecossistema local diminuindo a quantidade de pescado no
município.
Mas mesmo assim, a SUDEPE, por desconhecimento ou por não investir
em pesquisa, autorizou os grandes barcos a se lançarem no mar, e foi sensível
o aumento da produção pesqueira no Brasil. Com isso houve uma
desorganização da sociedade agrária pesqueira, com o aparecimento de um
excedente enorme de ex-agricultores pescadores que foram viver
exclusivamente da pesca industrial.
Assim ocorreu também na pesca industrial com as traineiras e
camaroeiro, parelhas que, instrumentadas com tecnologias empregavam
grande parte dessa mão-de-obra que chamamos de artesanais, iniciando um
sistema pluriativo na produção da pesca. O pescador artesanal divide sua
atividade no trabalho formal industrial da pesca seja nas estruturas de terra
como no mar nos grandes barcos. Ainda na pesca industrial temos os atuneiros
e os que pescam tubarão com linhas. Mas esta atividade de pesca somente
acontece em águas profundas em alto mar.
A pesca industrial se fez com o desenvolvimento dos armadores e
dos grandes industriais que se inseriram na atividade tendo um crescimento
sem precedentes. Um exemplo de grandes investimentos no setor pesqueiro é
citado por DIEGUES (1982, p. 129), “são as empresas multinacionais como a
Atlantic S/A e a Wolkswagem do Brasil”. A duas empresas, em 1975, detinham
mais de 50% de todo o capital investido através dos incentivos fiscais dos
setores pesqueiros, oferecidos pelo Governo Federal.
Mas o que chama atenção refere-se à extensão dessas empresas que
ultrapassaram os limites do Estado de São Paulo, abrindo escritórios nos
principais portos brasileiros, como no Rio Grande/RS, Itajaí/SC, Salvador/BA e
Recife/PE. A finalidade desses escritórios era a compra da produção dos
pequenos armadores e até de pescadores artesanais para abastecer a
indústria pesqueira de processamento e a exportação.
38
O citado Decreto-lei 221/67 tinha a finalidade de ativar os incentivos
fiscais, inclusive com a aplicação de 25% do Imposto de Renda na compra de
tecnologias. A proposta do governo era acelerar outros tipos de investimentos
na pesca como a compra de equipamentos modernos e dar ao setor privado a
velocidade e aumento da produtividade da pesca. Na medida em que as
empresas eram beneficiadas com os incentivos fiscais, o número de barcos
pertencentes a elas aumentava consideravelmente. A frota pesqueira em
Santos/SP, maior porto do País tinha entre os anos de 1944 e 1975, a seguinte
estrutura de pesca, conforme tabela 7. Essa estrutura foi aumentando na
medida em que, a partir da década de 1960, os incentivos eram oferecidos e
facilitados pelo governo. No período compreendido entre 1944 e 1950, houve o
aumento do número de barcos pela grande quantidade de matéria–prima
encontrada no mar e, com a revenda desse produto no mercado, aumentou a
poupança desses ainda considerados pequenos empresários da pesca.
Somente após a década de 1960 foi que o governo investiu maciçamente no
aumento da produção pesqueira, incentivando a compra de barcos de grande
porte equipados com tecnologias de ponta para época.
Tabela 04: Estrutura (barcos) na cidade de Santos nos anos de 1944, 1950
e 1975.
Barcos 1944 1950 1975
Pequenos: menos de 11 m 25 50 100
Médios: entre 11 m e 20 m 51 106 222
Grandes: maiores de 20 m 00 02 14
Total 76 158 366
Fonte: Adaptado de DIEGUES – Instituto de Pesca
Percebemos na tabela 05 que, diferentemente do que acontecia nas
décadas anteriores, os dados aqui apresentados se caracterizam por estruturas
de pesca bem maiores, com tonelagem para trabalho e alcance de dias de
pesca em grandes profundidades.
39
Tabela 05: Embarcações acima de 20 Toneladas Brutas por Região –
Proprietários - 1977
Região
Proprietários
com 1 barco
Armadores
Empresas c/barcos
acima de 20 toneladas
Média
Norte 11 06 07 04
Nordeste 29 02 28 03
Sudeste 142 35 53 04
Sul 06 01 43 03
Total 188 44 131 14
Fonte: Dados coletados em documentos da SUDEPE.
O que se evidencia foi que naquele ano as empresas aparecem todas
com frotas de barcos próprios e ainda que a concentração aconteceu em
grande escala nas regiões Sudeste/Sul. Isto demonstra que essas empresas
foram as que mais se beneficiaram dos incentivos fiscais. Desse modo,
podemos citar alguns estados que mais captaram recursos como Rio de
Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
E, complementando nossas informações sobre a industrialização da
pesca no Brasil, através da tabela 06, verificamos os recursos captados em
dólar de cada Região Brasileira através de incentivos fiscais em 1977.
Tabela 06: Incentivos Governamentais – da SUDEPE– por Região (*)
Região Nº. de Empresas que
receberam incentivos
Valor em dólar
Produção
desembarcada em (t)
Norte 03 26.765 62.000
Nordeste 01 2.197 157.000
Sudeste 62 624.240 191.000
Sul 51 375.708 231.000
Total 117 1.046.910 641.000
Fonte: SUDEPE – 1977
(*) Valores também incluem a pesca artesanal
Nos dados da tabela acima constatamos que houve uma grande
concentração de capital nas regiões Sul e Sudeste, refletindo o fato de que a
aquisição dos barcos de pesca necessitavam das grandes estruturas de terra
como cais de atracação, fábricas de gelo, câmaras de congelamento, etc.
40
Ressaltamos que parte dos investimentos, mesmo que ínfimos, eram
destinados à pesca artesanal. Em Santa Catarina muitos desses pequenos
empréstimos para compra de petrechos para a pesca se dava através da
Associação de Crédito e Assistência Pesqueira de Santa Catarina –
ACARESC.
Como percebemos, em nível de Brasil, estes investimentos foram se
particularizando para as mais diversas regiões. Desse modo, modificaram o
espaço social outrora concebido apenas como espaço de subsistência. A partir
da inserção desse capital disponibilizado pelos órgãos governamentais e
capital privado, levou estas comunidades pesqueiras a terem uma participação
global na sociedade mais externa, com a movimentação do produto pescado
nos mais diversos cantos do Brasil e exterior. Essa participação, positiva ou
negativa, teve seus reflexos em locais como nos municípios de menor porte.
Do ponto de vista positivo, os investimentos na pesca industrial trouxeram
dividendos ao município estudado, como o aumento na arrecadação de
impostos, infra-estrutura como luz elétrica, aberturas de estradas, colégios,
aumento do comércio. No sentido negativo, podemos afirmar que a indústria da
pesca tornou mais difíceis as relações na produção artesanal, mas não a sua
extinção.
1.5 - O Desenvolvimento da Pesca em Santa Catarina e em
Governador Celso Ramos
Como vimos, a política governamental nacional tinha como objetivo o
desenvolvimento da pesca em todo o território nacional, sendo que as regiões
Sudeste e Sul receberam maiores incentivos em detrimentos de outras. Essa
política se fez no sentido e como proposta de aumentar a produção pesqueira,
dando impulso à indústria de processamento da produção além da exportação
de produtos in natura e de pequenos manufaturados.
Em Santa Catarina, além da Política Nacional para a pesca, através da
SUDEPE, se fez concomitantemente das ações implementadas pelo governo
41
estadual. O Plano de Metas do Governo (PLAMEG), no período de 1961/65
tinha como objetivo seguir paralelamente as políticas desenvolvimentistas de
planos econômicos do Governo Federal. Em Santa Catarina, como disse
(COSTA - p. 301), se fez como:
O planejamento estadual pode ser concebido com o objetivo de
manter um ritmo de desenvolvimento considerado satisfatório, ou
desenvolver o desenvolvimento, ou ainda facilitar as relações com o
Governo Federal, quando este age através de planos”.
Como forma de aumentar a produtividade da pesca na década de 1960
foi criado o Centro de Treinamento de Pesca da Penha – CEPASA, com a
finalidade de habilitar o maior número de pescadores para atender a atividade
da pesca que se industrializava. Os cursos eram para habilitar motoristas de
pesca e mestres, promovendo o aperfeiçoamento da mão-de-obra exigida pelo
novo mercado de trabalho que se instalava. Vale lembrar aqui que muitos
pescadores mesmo com formação profissional, também quando estavam em
terra desembarcados trabalhavam na pesca artesanal.
Santa Catarina, por possuir uma costa marítima de 531 km de extensão,
com baias, enseadas e áreas de mar calmo, tem favorecido a atividade da
pesca bem como a construção de estrutura de embarque e desembarque de
pescado, além de outras estruturas de terra. Além disso, o litoral catarinense
tem se caracterizado pela diversificação de espécies que se presta à
comercialização, como sardinhas, enchovas, camarões, cação, tainha,
pescadinha, corvina, bagres e outros tipos considerados importantes para a
comercialização, seja in natura (congelado ou salgado), ou para atender a
indústria de conservas.
A partir da década de 1960 a atividade artesanal sofreu concorrência
dos grandes barcos que adentravam nas baías e viam muitas das vezes suas
redes e espinhéis sendo arrastados sem que houvesse a quem reclamar.
Mesmo assim a pesca artesanal coexistia paralelamente à pesca industrial.
Desse modo, o capitalismo, na medida em que deixa as empresas se
42
organizarem da melhor forma que lhe convier, no caso os grandes barcos de
pesca, acabaram por atingir uma eficiência indiscutível. Mas, ao mesmo tempo
em que dinamizaram a produção, geraram estruturas de poder que acabaram
por tornar inviável a distribuição equilibrada de renda no município,
conseguindo com isso reduzir a sua utilidade social.
O desembarque da produção podia acontecer em vários pontos da costa
catarinense e muitas vezes serem entregues em horários não convencionais.
Tudo isso dependia do grau de fiscalização dos órgãos oficiais. O
desembarque do produto da pesca artesanal podia ainda ocorrer no mesmo
local onde havia ocorrido a captura e vendido aos “pombeiros”. Quando não
podia ocorrer livremente por causa da fiscalização, a venda era feita na
residência do pescador.
A pesca artesanal, naquela época e ainda nos dias atuais, tem se
caracterizado por embarcações de pequeno porte, que, segundo dados da
Secretaria da Agricultura e do Abastecimento – Comissão Estadual de
Planejamento Agrícola CEPA/SC, (1977) a pesca acontecia a poucas milhas da
costa, utilizando-se de aparelhos como tarrafas, redes de emalhar, de arrasto
de portas, espinhéis, linhas, etc.
Já a pesca industrial acontecia com os investimentos e incentivos
governamentais ou privados. Em 1975, a frota catarinense, segundo o CEPA,
era composta por 189 barcos de pesca entre barcos de grande porte e
pequenas embarcações. As mesmas tinham como finalidade atender a
demanda das indústrias pesqueiras do estado e a exportação. Enquanto isso,
parte da pesca artesanal abastecia a subsistência familiar e o excedente o
mercado local. Figura 02.
43
Figura 02: Mapa de Localização dos principais Portos Pesqueiros de
Santa Catarina no período.
Fonte: Adaptado do Mapa de Regionalização de Maricultura da EPAGRI.
Todo o produto da pesca era desembarcado através dos diversos portos
pesqueiros de Santa Catarina, tendo como principal porto o de Itajaí, seguido
de Ganchos, que teve seu nome mudado, em 1967, para Governador Celso
Ramos, Navegantes, Penha, Florianópolis, Laguna, Garopaba, entre outros.
Mas para entendermos melhor a questão da produção em Santa Catarina
apresentamos a tabela 07 com os dados da produção de pescado no período
compreendido entre 1966 a 1970.
44
TABELA 07: Produção de Pescados em Santa Catarina em (quilos) – 1966
a 1970.
1966 1968 1970
MUNICÍPIO
PRODUÇÃO
% PRODUÇ
ÃO
% PRODUÇÃO %
Araquari - - 785.213 0,53%
Araranguá 421.491 1,96% 767.460 2,57% 471.163 0,34%
Bal. Camboriú - 483.374 1,62% 232.240 0,17%
Barra Velha - 332.914 1,11% 723.757 0,52%
Biguaçu - - 389.624 0,28%
Florianópolis 3.437.184 15,97% 4.439.100 14,85% 5.903.267 4,28%
Garopaba 877.271 4,08% 1.448.669 4,85% 2.110.612 1,53%
Garuva - - -
Gov. Celso
Ramos
5.514.882 25,62% 4.109.024 13,75% 7.935.304 5,75%
Içara - - -
Imarui 616.369 2,86% 1.327.201 4,44% 1.388.154 1,01%
Imbituba 1.040.365 4,83% 1.168.805 3,91% 1.184.870 0,86%
Itajaí 7.299.510 33,91% 10.616.69
7
35,52% 15.428.933 11,18%
Itapema - - 377.866 0,27%
Jaguaruna 114.770 0,53% 153.287 0,51% 97.277 0,07%
Laguna 590.680 2,74% 1.651.793 5,53% 2.167.921 1,57%
Navegantes - - 1.784.962 1,29%
Palhoça 279.345 1,30% 577.633 1,93% -
Penha 771.613 3,58% 1.898.231 6,35% 3.091.612 2,24%
Piçarras - - -
45
Porto Belo (*) 512.847 2,38% 674.903 2,26% 1.454.132 1,05%
São Fco. do
Sul
- 164.503 0,55% 683.817 0,50%
Tijucas 48.169 0,22% 69.560 0,23% -
TOTAL 21.524.946 29.893.15
4
137.997.901
FONTE: Anuários Estatísticos, Florianópolis: SUDEPE.
(*) o Município de Bombinhas pertencia a Porto Belo à época, por isso não aparece na
relação.
(-) Dados inexistentes
Conforme demonstram os dados, Governador Celso Ramos, de 1966 a
1970, aparece como o segundo produtor de pescados em Santa Catarina,
incluindo a produção artesanal. Itajaí manteve-se na hegemonia da produção
de pescado no período e até os dias atuais. È o maior porto pesqueiro de
exportação de Santa Cataria e de produção de pescados com frotas de barcos
atuando na captura.
Outro dado que chama atenção é o do município de Navegantes que,
até 1968, não tinha expressividade como porto pesqueiro, sendo monopolizado
por Itajaí, embora o município localiza-se no lado oposto do Rio Itajaí Açu.
Atualmente, Navegantes ocupa lugar importante como porto pesqueiro junto
com Itajaí, por possuir a infra-estrutura portuária para o desembarque da
pesca. Em 2007 estará pronto um atracadouro de navios para importação e
exportação de produtos do Estado.
Os dados indicam aumento expressivo da produção da pesca na maioria
dos municípios litorâneos do Estado, com a captação de incentivos
governamentais para a Região Sul, em que Santa Catarina aparece como um
dos estados que foram fortemente beneficiados, DIEGUES, (1992). Conforme a
tabela 8 foram poucos os municípios que tiveram um decréscimo na produção.
46
Desse modo e na medida em que a política industrializante imposta pelo
Governo Militar se voltava para o aumento da produção pesqueira do país,
eram computados os números do crescimento em quilos dos mais variados
tipos de pescados.No município eram desembarcados nos portos pesqueiros,
de Ganchos do Meio, Ganchos de Fora, Canto dos Ganchos e Armação da
Piedade. Como percebemos, Governador Celso Ramos obteve um crescimento
na produção e na captura de pescado no período compreendido entre 1972/74,
ficando em segundo lugar na produção da pesca no estado. A partir de 1977, o
município começou a conhecer o declínio da atividade pesqueira, que
trataremos mais à frente, com suas causas e conseqüências.
Crescia a estrutura de terra, como a construção de trapiches para
atracação e desembarque dos barcos, fábricas de gelo, câmeras frigoríficas e
estrutura de terra com grandes galpões para a manipulação e o processamento
da pesca. Diante disso e como vimos na tabela 08, que Itajaí e Governador
Celso Ramos mobilizaram a produção pesqueira do Estado. E nos anos
posteriores, compreendidos entre 1972 até 1974, mantiveram o aumento da
produtividade como mostram os dados a seguir:
Tabela 08: Produção em (quilos) de Pescados no Período de 1972 – 1974
Município 1972 1974
Governador Celso Ramos 13.610.607 16.341.822
Itajaí 22.311.609 63.377.532
TOTAL 35.922.216 79.719.352
FONTE: Anuários Estatísticos: Florianópolis – SUDEPE
Na medida em que havia uma elevação da produtividade da pesca
também ocorria um aumento da qualidade material e social que aconteceu com
a distribuição de renda daqueles que trabalharam em barcos e dos que
venderam sua mão-de-obra nas unidades industriais de terra.
Os trabalhadores do mar tem tido seus ganhos divididos em partes.
Segundo informação de um mestre de pesca que teve como resultado de 22
(vinte e dois) dias no mar pescando camarão, a conta final atingiu a cifra de R$
47
60.000, 00 (sessenta mil reais) em 2005. Tirando todas as despesas da viagem
como o óleo consumido pelo barco durante a pescaria, alimento, gelo, entre
outras, 50% é do patronal, dono dos meios de produção, e os outros 50% é
dividido entre os pescadores. Na verdade, este tipo de pescador profissional
tem sua carteira de trabalho assinada normalmente, sendo que mestre e
motorista com três salários mínimos e os demais tripulantes um salário mínimo,
apenas para fins de contribuição social. Os ganhos da tripulação embarcada
são efetuados de acordo com a produtividade da pesca: quanto maior for a
produção pescada, maior será a renda.
De acordo com os valores acima, o resultado da conta para distribuição
entre a tripulação foi de 50%, representando uma quantia de R$ 30.000,00
(trinta mil reais). Sendo o barco camaroeiro, a tripulação é de 06 homens e 18
partes, distribuídas da seguinte maneira: uma parte significaria 1.666,70
(30.000,00: 18 = 1.666,70). No caso, o Mestre responsável por toda a estrutura
tem direito a 06 partes e receberá a importância de R$ 10.020,00 (dez mil e
vinte reais); o Motorista, que tem direito a 04 (quatro) partes, receberá R$
6.666,80 (Seis mil seiscentos e sessenta e seis reais e oitenta centavos); o
Contra Mestre (homem encarregado de localizar o cardume), o Gelador,
(homem encarregado de gelar a produção pescado), o Cozinheiro e o
Tripulante, concomitantemente tem direito a 02 (duas) partes e recebem R$
3.333,40 (três mil trezentos e trinta e três reais e quarenta centavos), cada.
Enquanto isso, nas unidades de terra, os carregadores e geladores, com
carteira assinada, recebem salários fixos. Os que processam a matéria-prima,
como as sardinhas, as anchovas e outros peixes, são assalariados. Se o
produto for camarão ou a retirada da carne de siri, o pagamento das (os)
descascadeiras ainda é por produtividade, por quilo.
A divisão de trabalho nas unidades artesanais e as suas relações
ocorrem, em alguns casos, paralelo à atividade industrial. Principalmente no
caso das descascadeiras de camarão e siri. O pagamento tem sido por
produtividade, não havendo o registro em carteira, podendo ser um trabalho
temporário. Mas nesta atividade nem todos se caracterizam como assalariados,
48
mesmo porque muitas das unidades de processamento se constituem em
ranchos de canoas ou lanchas de praia ou na edícula de casa com a inserção
da família no trabalho.
A pesca do camarão de forma artesanal sempre aconteceu dentro das
baías, inicialmente em lanchas e, posteriormente, em embarcações chamadas
de bateiras a motor, onde normalmente o mestre podia ser ou não o dono da
embarcação e sempre levava mais um ajudante que podia ser ou não ser um
membro da sua família. A distribuição ainda acontece pelo sistema de partes,
retirando ai todas as despesas, principalmente o óleo usado para impulsionar o
motor.
No setor de terra, da produção artesanal, o processamento do pescado
pode ser executado por familiares ou por contratação de mão-de-obra
temporária, que não possui vínculo empregatício. O trabalho ainda vem
acontecendo nas unidades de salgas, rancho da própria embarcação ou em
uma edícula na sua própria residência. Vale ressaltar que no período de maior
repressão da fiscalização, o pescado era levado até sua casa em balaios feitos
de taquara de bambu, hoje caixas de plástico e processado no fundo do
quintal.
1.6 - As Transformações no Espaço de Governador Celso
Ramos, de 1960 até Final da Década de 1970.
Governador Celso Ramos se caracterizou pelas atividades extrativas,
seja na agricultura de subsistência como o milho, feijão, batata, cana de açúcar
e mandioca ou na atividade da pesca. O município, desde a chegada dos
portugueses, passou por períodos de crescimento ou estagnação econômica
com a decadência da pesca da baleia, sendo um porto importante do Brasil
Colônia, das manufaturas dos engenhos e das salgas. Dessa forma, alteraram-
se as relações sociais na medida em que as atividades produtivas de trabalho
se sucediam.
49
Concomitantemente as técnicas aceleravam as mudanças criando novos
fatos no trabalho, no consumo e na renda. Com isso, a sociedade vai criando
uma consciência, na medida em que o espaço econômico e social se
transforma. Conforme argumenta CORREA,(1995) as mudanças espaciais
resultam da consciência que o homem tem dessa diferença de espaço.
Também coloca que essa consciência espacial está diferentemente ligada aos
padrões de cultura e das possibilidades de técnicas a serem usadas em cada
momento evolutivo dessa sociedade.
Assim foi ocorrendo no espaço do município na medida em que novas
técnicas se inseriram alternadamente nas relações sociais. Vale lembrar que as
mudanças também foram substanciadas por alterações culturais, que foram se
firmando com a chegada, dentre outros, do sinal de televisão. A partir daí, há
uma mudança na relação de visão de espaço, que não é apenas uma
delimitação de território como aconteciam no campo da agricultura e na pesca
artesanal.
A visão de espaço, muito mais amplo, deu aos munícipes uma
perspectiva, do seu ponto de vista de ver o mundo lá fora, como de ter uma
vida melhor, quando aos poucos foi incorporando novas informações. Outra
visão é da possibilidade de consumir novos produtos oferecidos pelos
mercados. Alguns venderam seus terrenos próximos ao mar a preços irrisórios
a empresas de exploração imobiliária. Posteriormente, empresários do turismo
começam a investir naquele município no final da década de 1970,
principalmente nas localidades de Palmas e Armação da Piedade.
Dessa forma o sistema produtivo, a tecnologia e todas as orientações se
encaminharam para investimentos de grandes grupos dominantes, com base
na acumulação de capital. Desse modo a classe trabalhadora local, ao incluir
novas informações, alterou a sua consciência, tendo o moderno e novo como
progresso e desenvolvimento. Isso corroborado com o discurso e as práticas
políticas do governo municipal. Assim o espaço local foi se produzindo dentro
das relações econômicas, articulando mudanças no espaço natural com
aberturas de estradas, ruas, nova arquitetura, etc. Principalmente na alteração
50
espacial e na organização das novas formas de fixar o homem. As atividades
nas relações produtivas vêm modificando o espaço como afirmou
BERNARDES, (1995, p.247):
“A desigualdade espacial se vincula a divisão do trabalho, a qual é
um meio para articular as relações sociais, sendo esse
mecanismo socialmente utilizado de forma distinta em sua
adaptação a cada momento histórico em sua articulação social do
espaço”.
Na medida em que as técnicas artesanais iam sendo substituídas pela
máquina com motores mais possantes, aparelhos de localização do pescado, e
em terra com infra-estrutura moderna como indústrias com frigoríficos entre
outros, novos espaços foram aflorando nas relações sociais do trabalho.
Enquanto a produção artesanal usava pequeno barco com pouco alcance, com
motor de pouca potência e mão-de-obra familiar, e em algum momento
contratava pessoas sem vínculo empregatício para o processamento, a
indústria proporcionava trabalho assalariado a grande parte dessa mão-de-
obra.
Para entendermos este processo de mudanças, alguns pontos devem
ser levados em consideração: o crescimento econômico gerado pela indústria
pesqueira, os problemas enfrentados pelas pequenas manufaturas, a
movimentação tanto de “Gancheiros” que venderam suas áreas de terra junto
ao mar (como é o caso específico de Palmas), como aqueles que viviam da
agricultura e se transferiram para a pesca, aumentando a população dessas
localidades litorâneas. Destacam-se ainda os problemas ambientais sem
precedentes causados aos ecossistemas locais.
Na década de 1960, a BR-101 atravessou os limites de Governador
Celso Ramos. E com isso mudanças ocorreram nas relações econômicas e
sociais no município. O comércio anteriormente era efetuado pelo mar através
de lanchas e pelas estradas de barro, cortando morros, com os municípios de
Tijucas, Biguaçu e Florianópolis. A rodovia tornou-se um facilitador do
51
escoamento da produção. Na época, Ganchos era apenas um distrito de
Biguaçu e somente em 1963 passou á categoria de município. Em 1967, o
tradicional nome de Ganchos foi mudado para homenagear o então
Governador do Estado Celso Ramos. Até os dias atuais a alteração não tem
sido bem aceita pela comunidade. Há uma discussão no sentido de se fazer
um referendo para retornar ao nome de Ganchos. Os empresários da área do
turismo têm também interesse no antigo nome por achá-lo mais forte como
logomarca.
Entre a década de 1960 e até final da década de 1970 o Município tinha
08 (oito) indústrias pesqueiras instaladas nas localidades de Ganchos do Meio,
Ganchos de Fora, Canto dos Ganchos, Calheiros e Armação da Piedade,
tornando-se o segundo produtor pesqueiro do Estado, como citamos
anteriormente. Naquele período o comércio teve um crescimento gradativo, e
as relações de consumo também. O município se supria dos meios de
transporte que se instalaram, facilitava a ida e vinda à Capital do Estado, que
possuía um comércio variado. Dessa forma, o pescador adquiria
eletrodomésticos, principalmente o aparelho de televisão e a geladeira após a
instalação da energia elétrica, no final da década de 1960.
O crescimento industrial da pesca e a reorganização espacial trouxeram
como ponto de vista negativo a expropriação das pequenas manufaturas, no
sentido legal das atividades, não no seu desaparecimento como produção
clandestina. A perseguição foi um fato e isto criou sérios problemas para as
pequenas manufaturas, mas não afastou os pequenos produtores artesanais
das atividades no mar. Este fato também causou uma mudança interna da
população. Os que venderam suas terras próximas às áreas litorâneas,
buscaram uma mudança de vida e se afastaram da praia perdendo seus meios
de produção e acabaram por vender sua mão-de-obra na pesca industrial, ou
em outros municípios próximos.
Mas também houve uma movimentação interna de trabalhadores da
agricultura para a pesca, que como já foi demonstrado anteriormente pelos
52
dados, aumentou sensivelmente a ocupação das encostas, com mais de 50%
da população local, neste período, vivendo próximo ao mar.
Figura 03: Foto aérea de Canto dos Ganchos mostrando e a tênue
ocupação das encostas no ano de 1938. A estrada de barro cortando o
morro e as plantações de café.
Fonte: DEGE (1938), aerofoto 398.
Figura 04: Foto aérea de Canto dos Ganchos (1957) - neste período a
agricultura entrou em decadência em detrimento da ascensão da pesca.
Fonte: Foto DEGE (1957), aerofoto 1624.
53
Figura 05: Foto aérea de Canto dos Ganchos (1979). Naquele ano a pesca
industrial encontrava-se no seu auge. As encostas foram ocupadas
desordenadamente com a abertura de ruas.
Fonte: DEGE (1979), aerofoto 39-01.
Figura 06: Foto aérea Canto dos Ganchos (2000). Aqui o asfalto tomou o
lugar da estrada de barro e a expansão urbana subiu as encostas.
Fonte: DEGE (2000), aerofoto 39-01.
54
Figura 07: foto atual do adensamento populacional nas encostas dos
morros em canto dos ganchos – 2005.
Fonte: Foto cedida por Wiliam Wollinger
Por último, os problemas ambientais advindos do crescimento do
número de indústrias e da população junto ao mar desse município, trouxeram
problemas na produção de pescado. As instalações das indústrias criaram ali
grandes índices de poluição, nas baias e enseadas. Com esta pressão urbana,
todos os dejetos residenciais foram jogados ao mar, além dos resíduos da
produção industrial, como vísceras, escamas, casca de camarão e sangue de
peixe e tudo que era inservível para a manufatura. A introdução de maquinaria
e técnicas predatórias fez com que a produção da pesca fosse escasseando,
além da pressão urbana com seus dejetos lançados ao mar provocaram a
eutrofização das águas, que significa a redução de oxigênio.
Estes efeitos ainda são sentidos em algumas localidades de Governador
Celso Ramos, tendo em vista o descaso do poder municipal em implementar
políticas de saneamento básico, tratando os dejetos residenciais que ainda são
jogados ao mar. Tanto que quando perguntamos a um extensionista da
EPAGRI sobre a qualidade da água, nos referindo à produção de mariscos, a
resposta foi a seguinte; “Não posso te disponibilizar os dados da coleta e
análise da água”. Lhe perguntei: por quê? Disse-me que havia problemas na
55
qualidade da água e esses dados não poderiam vir a público, pois criariam
óbices à comercialização dos moluscos, vindo a afetar as famílias que
produzem e vendem.
Este fato foi sentido como forma negativa desse crescimento econômico
desordenado nas áreas onde houve maior aporte de indústrias de
processamento, bem como um grande aumento populacional. Isso nos faz
lembrar um morador que quando foi interpelado, jogando lixo no mar,
respondeu: “o mare dá conta meu filho”.
1.7 - A Falência da Indústria Pesqueira em Governador Celso
Ramos.
Na década de 1980, houveram problemas advindos da economia
nacional. Os índices de inflação foram elevados, chegando em 1987,
oficialmente a 87% ao mês. Os Planos Cruzados I e II, o dólar subindo a
patamares proibitivos dificultando a compra de novas tecnologias, e ainda
outros fatores, que veremos mais a frente, levaram a falência as indústrias
pesqueiras em Governador Celso Ramos.
A atividade pesqueira encontrava-se fundamentada na extração
predatória, sem se preocupar em preservar as espécies através da obediência
das espécies, da época indicada para a captura, contribuindo assim, para o
decréscimo gradativo do volume capturado e concentrando a produção. Tal
qual aconteceu no Brasil e Santa Catarina, o município também apresentou
problemas com a falta de preservação das espécies, como analisou DIEGUES,
(1992, p. 135), com relação à queda do produto para a manutenção da
indústria pesqueira, quando diz:
“Se analisarmos as artes de pesca desses grandes barcos,
notadamente observamos um outro tipo de concentração: aquelas
exercidas sobre determinadas espécies de recursos marinhos
(camarões, lagostas, pitanutabas, etc.)”.
56
Trata-se de espécies vendidas no mercado externo. Efetivamente, após
os incentivos fiscais acentuou-se ainda mais a depredação de algumas
espécies de alto valor de mercado e que não se destinam ao consumo
interno. Na ânsia de recuperar o capital investido nos meios de produção, as
empresas, de uma só vez, lançaram-se na captura de camarão, sardinhas
entre outros tipos de peixes, que em poucos anos sofreu os efeitos dessa
sobre pesca. Das 131 empresas que se estabeleceram no litoral brasileiro e
receberam incentivos fiscais, nos dez anos entre 1970/80, cerca de 40%, foram
à falência na década de 1980. Ocorreu também à falta de formação de
recursos humanos que possuíssem conhecimento mais detalhado sobre
espécies existentes e ainda, a falta de conscientização e educação no sentido
da preservação.
Para tanto a Secretaria de Estado da Agricultura do Abastecimento,
através da Associação de Crédito e Assistência Pesqueira de Santa Catarina -
ACARPESC desenvolveu trabalhos na tentativa de alertar e alterar o modo de
produção do pescador artesanal, principalmente realizando cursos de
aperfeiçoamento e especialização, com a intenção de valorizar e congregá-lo
mostrando-lhe a importância da preservação do meio com o respeito ao defeso
bem como do seu papel junto à comunidade.
Foram criados cursos com a finalidade de inserir na cultura do pescador
artesanal, a preservação e a exploração mais racional das espécies. Com isso,
a SUDEPE, através da Coordenadoria Regional, estabeleceu o “defeso”
principalmente para a captura de sardinha, produto representativo
economicamente, do setor pesqueiro industrial, entre os meses de dezembro a
janeiro. O defeso procura preservar a desova dessa espécie.
A ACARPESC órgão criado em 1979, para ser consultor da pesca
artesanal, ao longo de seus 15 anos de atuação, não correspondeu com a
finalidade para o qual foi criado. Segundo a SUDEPE que tinha por finalidade
supervisionar as atividades do órgão citado, constatou a deterioração na
qualidade da Assistência Técnica, uma vez que não cumpria sua finalidade, ou
seja, de assessorar o pescador artesanal. Por questões políticas, segundo a
57
SUDEPE, direcionou-se mais para a “aqüicultura continental”, o que foi
verificado mais de 56 escritórios no interior, contra 19 no litoral. Sendo que no
período compreendido, havia um escritório no município de Biguaçu que
atendia toda a Região da Grande Florianópolis, incluindo Governador Celso
Ramos.
Entretanto, não havendo a receptividade esperada e o êxito nas suas
medidas corretivas, no estado catarinense, principalmente porque tinha muito
mais cunho eleitoreiro, a SUDEPE, em 1984, suspendeu o convênio com a
entidade por entender que não atendia mais os objetivos propostos e por
alterar definitivamente suas tendências para as quais foi criada. Com a falta de
uma política adequada para a pesca em Santa Catarina, e em Governador
Celso Ramos, vimos à produção decaindo passo a passo. Ainda segundo a
SUDEPE, (1980) afirmou que:
“Particularmente, desde 1980, assistimos a decadência acelerada
de seus serviços, junto as Comunidades Pesqueiras: Primeiro, pela
ineficácia de suas atividades junto aos problemas vitais pela classe
principalmente no que se refere à sua organização político - social e
econômica”.
Além da ineficiência do órgão público responsável por melhorar a vida
do pescador, observamos, por outro lado, a falta de organização dos
pescadores que, pela sua ascendência étnica (portuguesa), mantiveram um
caráter de desconfiança em tudo que é apresentado como novo. Desse modo,
apresentaram suas próprias deficiências por não perceberem a importância de
melhoramentos na atividade da pesca, que os cursos podiam proporcionar.
Também houve uma preocupação com a exploração constante do
intermediário, sejam os “pombeiros” que sobreviveram à perseguição
governamental, assim como o Mercado Público de Florianópolis, onde alguns
pescadores comercializavam o pescado. Ao longo dos anos, estes pescadores
se transformaram como um segmento sem força e representação política para
defender seus interesses mínimos. Sempre estiveram sujeitos às ações
paternalistas, geralmente de políticos que se aproveitam da situação,
prestando pequenos favores, em troca de votos.
58
Um outro fato ocorrido em Governador Celso Ramos foi que muitos dos
empresários ali instalados não tinham tradição na pesca. DIEGUES (1992 – p.
139) chamou de “aventureiros”, que se aproveitaram do dinheiro fácil da
SUDEPE, e considerou Santa Catarina como um dos Estados em que mais
surgiram empresas com o dinheiro distribuído pelo órgão. Salienta, contudo,
que no Estado foi onde ocorreu o maior número de falências. Das oito
indústrias instaladas no município, com toda a estrutura de terra e barcos de
pesca, todas entraram num processo de falência. A NAPESCA, unidade de
Ganchos do Meio encontra-se arrendada para os Pescados Chico da Peixaria
Chico de Florianópolis; a NAPESCA, unidade de Ganchos de Fora atualmente
funciona um laboratório da UFSC, onde trabalha com o processamento de
casca de camarão na produção de remédio; a NAPESCA, estaleiro
desapareceu completamente. A estrutura física da Silva & Filhos ficou inativa
por muitos anos e foi comprada por empresário da pesca do Município de
Biguaçu e passou a Chamar-se Florimar Comércio de Pescados S/A. Nos dias
atuais as empresas, a Pescados Chico e a Florimar, para sobreviverem, tem
buscado o pescado, como peixes e as vezes camarões em outros portos
pesqueiros para manufaturar, trazendo de caminhão baú até as localidades do
município.
As grandes empresas que faliram, como a Indústria e Comércio de
Pescados Ltda. – NAPESCA, com uma unidade em Ganchos do Meio e outra
em Ganchos de Fora, com grandes barcos de pesca e manufatura, foi a maior
do município e captou grandes investimentos no mercado. Não podemos
precisar valores, pois não nos foi informado. Após o falecimento de seu
proprietário, seus filhos decidiram investir em bens pessoais ao invés da
produção. Aos poucos foram depredando todo o patrimônio, sendo arrendado o
espaço físico, conforme citamos. Vale ressaltar que o proprietário dessa
empresa, desde a idade de 16 anos, foi pescador artesanal, trabalhou na pesca
industrial e posteriormente foi dono de salga.
Esta empresa de pesca e manufatura, a NAPESCA, possuía estrutura
de terra de grande porte, como atracadouros, fábrica de gelo, frigorífico e toda
59
a técnica e maquinário para o processamento do pescado, conforme
relacionamos abaixo:
a) Pescado refrigerado – compreende o pescado inteiro ou não
conservado através do gelo e comercializado nessas condições.
b) Pescado congelado – Está enquadrado nesta categoria o pescado
inteiro, descabeçado e eviscerado que pode ser em postas, filés com
ou sem pele (individualmente ou em blocos), camarão nu
descabeçado, camarão descabeçado individual ou em bloco, carne
de siri congelada ou em bloco, etc.
c) Pescado Salgado – Trata-se do pescado proveniente da salga úmida
(em tanques) e salga seca (em pilha). No comércio, esses produtos
podem ser apresentados de forma espalmada, que são os peixes
magros provenientes da salga e os prensados, como a sardinha que
é vendida a granel ou envolta a vácuo em embalagem de polietileno,
como sacos plásticos, a partir de 1960. Existe ainda sardinha em
salmoura, acondicionada em latas, e os cações que se apresentam
em mantas ou pedaços já pesados e envoltos em embalagens de
polietileno.
d) Conservas de pescado – As conservas mais comuns são as de
sardinhas, tendo como líquido de cobertura o óleo de soja e o molho
de tomate, em latas que podem variar de 130 a 140 gramas, ou
ainda, de 500 gramas. Também se produzem sofisticações desses
produtos, aos quais podem ser acondicionadas cebolas, limão,
pimentão, mostarda, entre outros. O produto abastecia o mercado
regional e nacional.
e) Farinha de pescado – Trata-se de produto destinado à elaboração de
farinha de vísceras de peixe que servem de fertilizantes na
agricultura ou como alimento para o gado.
f) Óleo de pescado – Esse produto foi vendido diretamente a outras
indústrias para seu aproveitamento, principalmente, na produção de
tintas.
60
Localizada na comunidade de Ganchos do Meio, a Indústria de Pescado
Rocha Ltda., constituiu-se numa das grandes empresas de pesca do Município.
Possuía toda a estrutura de terra como atracadouro, grande espaço físico de
manufaturas, frigoríficos, e tinha na sardinha sua matéria-prima. Como as
demais empresas, recebeu também incentivos fiscais do Governo Federal para
investir na produção. Tivemos dificuldades de conseguir informações e
detalhes sobre a empresa, tendo em vista não localizarmos a família que não
reside mais no município.
A empresa Pescados Ganchos – PEGAN, instalada em Canto dos
Ganchos, possuía atracadouro e frigoríficos, e um posto de gasolina para
abastecer as pequenas embarcações que trabalhavam com camarão.
Processavam sardinhas, atuns e todos os tipos de peixes e camarões, que
vendiam congelados. Também recebeu investimentos da SUDEPE, conforme
nos informou o ex-gerente da empresa. Disse-nos que a empresa fechou as
portas porque a produção não correspondia em valores aos investimentos que
foram efetuados na estrutura de processamento, nem tão pouco para o
pagamento de salários da mão-de-obra contratada, e que a concorrência com
outras empresas na obtenção do produto capturado foi muito intensa. O
proprietário era um grande empresário do ramo imobiliário e político de
Florianópolis e que não tinha nenhum conhecimento no ramo da atividade
pesqueira.
A SILVA E FILHOS teve sua origem na produção familiar. Pai e filhos
trabalharam na pesca artesanal, inicialmente. Posteriormente conjugavam a
pesca artesanal e a industrial até que surgiu a manufatura da pesca a salga.
Com o advento da industrialização da pesca, essa pequena manufatura captou
recursos incentivados pelo governo e transformou a sua salga numa empresa
de porte médio. Possuíam atracadouro, e trabalhavam com peixes e camarões
congelados que eram levados até São Paulo para revenda. Dessa maneira,
para fazer o comércio do pescado em São Paulo, montaram um escritório e
transferiram dois filhos para a capital paulista, aumentando as despesas da
empresa com aluguel, alimentação, carros, pagamentos dos empréstimos. Os
demais membros da família dependiam dos rendimentos da empresa. Como a
61
produção de pescado não correspondia aos gastos que a empresa incorporou,
acabou por falir. Também o informante nos disse que houve apropriação
indébita, de valores, pelo gerente geral, o que gerou um processo e
condenação desse gerente.
Outra empresa que surgiu em Canto dos Ganchos foi a LA SERENA. O
proprietário já trabalhava no ramo de alimentos no Rio Grande do Sul. Esta
empresa inicialmente recebia o camarão e o transportava em caminhões com
gelo até Florianópolis. Posteriormente, captando recursos, comprou um terreno
onde tinha uma casa e um rancho de lancha e construiu uma unidade de
processamento com frigorífico, atracadouro, processando unicamente os
camarões pré-cozidos e crus descascados. Segundo informações do ex-
gerente, também pescador artesanal, que já trabalhou na indústria da pesca,
foram vários os motivos que levaram a falência dessa empresa. Em primeiro
lugar, por ter deslocado capital da empresa da pesca para uma outra empresa
de alimentos. Em segundo, por ter feito investimentos pessoais e, por último, à
concorrência das demais empresas na aquisição da matéria-prima.
A Indústria Sul Brasileira de Pescado – SULBRAS encontrava-se
localizada em Armação da Piedade. Como as demais, não resistiu aos reveses
do mercado. Possuía toda estrutura de uma grande empresa, mas a
concorrência na compra da matéria-prima fez com que fechasse suas portas.
Segundo as informações, seus bens ficaram indisponíveis pela justiça. O
proprietário não tinha conhecimento sobre a atividade da pesca. A outra,
Indústria de Pescado Hoepcke Ltda., também localizada em Armação da
Piedade, não conseguimos informações sobre sua falência. Apenas que foi
uma grande empresa e que tinha fábrica de gelo.
Por último, a Indústria de Pescados Silveira, na localidade de Calheiros,
mantinha a família na estrutura de trabalho e contratavam empregados.
Possuía atracadouro com água para abastecer os barcos, fábrica de gelo e sua
matéria-prima, em maior escala, foi a sardinha. Trabalhavam também com
enchovas, corvinas, bagres, tainhas e camarão. Esta empresa também captou
recursos financeiros no mercado. Aos poucos foi desativando suas unidades de
62
produção até fechar por completo. Segundo informação do próprio filho do
empresário, a falta de matéria-prima não justificava os custos de manutenção
da estrutura daquele porte. Ressaltamos também que essa empresa começou
com seu dono na pesca artesanal, posteriormente a salga e, finalmente, com a
indústria pesqueira. Hoje todos os filhos trabalham no emprego formal.
A falha na política de incentivos adotada pela SUDEPE, que não
empreendeu um estudo detalhado e acompanhamento das estruturas, partindo
da capacidade de produção e da preservação de algumas espécies dos
ecossistemas marinhos, levaram a maioria das empresas no município a
“quebrarem”. Também houve uma concentração de grandes empresas em um
espaço de pequena escala, e todos retirando matéria-prima do mesmo local,
principalmente a sardinha e o camarão.
Outro fato relevante que ocorreu em Governador Celso Ramos,
conforme os dados apresentados, no período que compreendeu 1967 a 1972,
referem-se aos investimentos que foram captados no mercado e tiveram sua
divisão da seguinte maneira: Industrialização 51%; captura do pescado,
entende-se aqui tecnologia e aumento do tamanho dos barcos, 29%;
administração 13% e comercialização 7%. Nota-se que a importância com
gastos na estrutura dos processos de industrialização pesqueira constituiu mais
da metade dos recursos captados para a atividade, não levando em
consideração as possibilidades de aumento da matéria prima, que aos poucos
foi se esgotando, na medida em que a pressão aumentava sobre os recursos
naturais.
O aumento desenfreado da pesca seletiva de peixes de alto valor
comercial criou um grande problema na produção, pois, os peixes que não
eram servíveis para comercialização, pelo seu tamanho, eram jogados ao mar.
Dessa maneira a depredação de certas espécies ajudou a causar o
esgotamento.do ecossistema. Outro fato levantado e que se explica pela
política de aumento da produção pesqueira foi a depredação de certas
espécies através da cadeia alimentar. Como exemplo: a sardinha verdadeira
serve como “isca viva” para a pesca do peixe, bonito e atum. Ao serem
63
pescadas, são depositadas vivas em tanques com água em grandes barcos. O
atum, por ser um peixe de alto valor comercial, vem ao longo do período
estudado abastecendo a indústria de transformação, como a de enlatados,
contribuindo dessa forma para a diminuição da quantidade de alimentos de
outras espécies. Além de não respeitarem o defeso da mesma, com a
conseqüente diminuindo de sua reprodução e acarretando a extinção de outras
espécies por falta de alimento, podendo favorecer alteração todo o
ecossistema, além de criar problemas econômicos para os pescadores
artesanais.
Este fato gerou inclusive conflitos entre a pesca do bonito e do atum e a
pesca artesanal da sardinha verdadeira, levando os mais diversos órgãos
como: Colônias de Pescadores de Governador Celso Ramos Z-9, do Município
de Bombinhas Z-22, que compõem a Baia do Tijucas, Federação dos
Pescadores de Santa Catarina, Ministério Público Federal e Estadual, Polícia
Ambiental, IBAMA, Centro de Ciências Tecnológicas de Terra e do Mar da
Universidade do Vale do Itajaí – CTTMar/UNIVALI a reunirem nos períodos de
21 e 22 de novembro de 2003, na cidade de Itajaí, no auditório do Centro de
Pesquisas e Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral Sudeste e Sul –
CEPSUL. Posteriormente, no dia 04 de dezembro de 2003, na Assembléia
Legislativa do Estado de Santa Catarina, de onde saiu a “Carta de Itajaí”. O
documento regulamentou o uso de (isca viva) sardinha verdadeira na pesca
dos peixes, atum e bonito, na perspectiva do aumento desse tipo de peixe que
já começava a se tornar escasso no litoral.
Além dos fatos levantados e que teve conseqüências na desestruturação
da pesca, as várias crises do aumento do petróleo também ajudaram a criar
problemas, conforme foi levantado por DIEGUES – (1992 p. 140): “A pesca
seletiva aumentou os custos operacionais, sobretudo os dos combustíveis, que
representam mais de 60% dos gastos totais de uma viagem de pesca”.
Também podemos anotar como uma das conseqüências da desestruturação
da pesca, que, em 1973, tivemos a primeira crise internacional do petróleo e,
posteriormente da década de 1980, com reflexos na economia interna,
atingindo diretamente a atividade da pesca no município. O preço do produto
64
teve aumentos expressivos, agravando ainda mais os problemas de uma
indústria mal dimensionada. Dessa maneira, os barcos atuneiros e camaroeiro
têm em média 22 dias de pesca em mar aberto, às vezes muitas milhas longe
da costa, para conservar o pescado, o motor tem que ficar ligado 24 horas por
dia. O consumo do óleo combustível é intenso e sai caro, principalmente no
caso dos barcos frigoríficos. Mas mesmo os barcos que não possuem
frigoríficos como os de camarão, trabalham sem parar em períodos de
revezamento de turnos da tripulação.
Os barcos de 20 (vinte) até 90 (noventa) toneladas pescavam em águas
profundas, principalmente os atuneiros, o que trouxe o insucesso, pois as
águas tropicais e subtropicais são de limitada produtividade natural. Em
contrapartida a pesca exploratória, artesanal, era feita por pequenos barcos,
próximo à costa, tripulados por força de trabalho familiar. Além do que não
possuíam tecnologia como sonares, radares e que era usada pela pesca
industrial.
Esse tipo de atividade pesqueira tinha e tem como fundamento o fato de
que os pescadores são proprietários dos meios de produção como redes,
espinhéis, anzóis, linhas, entre outros petrechos. Tem como objetivo a captura
de pescado para comercialização, associado à ajuda da família e de seus
participantes, ou ainda grupos de vizinhança. A embarcação da pesca
artesanal não é exclusivamente um meio de produção, mas foi um dia,
também, um meio de locomoção.
Já a frota pesqueira considerada industrial, ou empresarial, é composta
de subfrotas especializadas que atuam na exploração de determinados grupos
formados por uma ou mais espécies de pescado com alto valor comercial e de
grande aceitação nos mercados especializados. Essa frota também atua sobre
os recursos costeiros (camarões, lagostas, sardinhas, etc.) como também
sobre os recursos considerados oceânicos, tais como atuns, peixe sapo, além
de outras espécies de profundidade.
65
A pesca industrial desenvolvida por armadores de pesca, pessoas
físicas ou jurídicas, caracteriza-se pelo fato de os proprietários das
embarcações e dos petrechos de pesca, no caso os armadores, não
participarem de modo direto do processo produtivo. Tal função é delegada ao
mestre da embarcação. Estas embarcações são de grande porte com um raio
maior de ação para a atividade de pesca que pode ser em milhas e em
profundidade. Exigem uma certa divisão de trabalho entre os tripulantes:
mestre, cozinheiro, gelador, maquinista, pescador. São motorizadas, e
dispõem, ainda, de equipamentos auxiliares para a pesca, exigindo algum
treinamento formal para determinadas funções. A mão-de-obra é remunerada
pelo sistema de partes, ainda que, para algumas funções, possam existir
formas de pagamento do tipo assalariado. Na pesca industrial ou empresarial,
a empresa é proprietária, tanto das embarcações, como dos petrechos de
pesca. É organizada em diversos setores e, em alguns casos, congrega
verticalmente as etapas de captura, beneficiamento e comercialização do
pescado.
As embarcações dispõem de mecanização não somente para o
deslocamento, mas também para o desenvolvimento das fainas de pesca como
o lançamento e recolhimento de redes, e, em alguns casos, beneficiamento do
pescado a bordo, o que não acontece com as artesanais. A mão-de-obra,
embora recrutada, em sua maioria, entre pescadores de pequena escala, ou
nos barcos armadores, necessitam de treinamento específico para a operação
da maquinaria que vem substituir o conhecimento adquirido pela tradição.
Neste caso é comum o regime de salário mensal ou semanal, embora ainda
predomine o pagamento de partes calculado sobre o valor da produção.
Havia uma exploração da mão–de-obra embarcada no sentido da busca
dos mais qualificados, como mestres e motoristas, que tinham como finalidade
fazer com que os demais tripulantes trabalhassem até o esgotamento físico,
chegando a trabalharem 24 horas por dia. A finalidade era a busca em
quantidade máxima de pescado e o aumento do lucro das empresas que
contratavam essa mão – de - obra.
66
Como vimos, as transformações econômicas do setor pesqueiro e dos
outros setores, influenciaram e afetaram a pequena pesca artesanal. No
município, isso se traduz na saída de pescadores artesanais para a pesca
industrial em outros portos como o de Itajaí/SC, Rio Grande/RS, Santos/SP e
Rio de Janeiro/RJ. Desse modo, os problemas advindos da falência das
indústrias locais deixaram “órfãos”, não somente os que dependiam da grande
produção industrial onde vendiam sua mão–de–obra, mas também o pescador
artesanal que ao retornar às suas atividades, não encontrava muito a capturar.
Assim sendo, o município passou por uma reorganização espacial
traduzida na busca de alternativas como forma de sobrevivência. Os problemas
econômicos e sociais provocados pela falência da indústria pesqueira afetaram
muito mais a questão de sobrevivência do pescador artesanal na busca de sua
subsistência do que a ascensão dessas mesmas empresas industriais.
Dessa maneira, com a falência da indústria pesqueira, principalmente as
estruturas de terra que compravam a produção do pescador artesanal,
provocou um excedente de mão–de-obra, bem como para aqueles que
trabalhavam no processamento do produto. A pesca artesanal encontrou-se
prejudicada, não houve uma efetiva política de desenvolvimento para a
atividade, as baías e enseadas encontravam-se poluídas e os ecossistemas
afetados. A pesca artesanal encontrava-se insuficiente. Um ou mais membros
da família foram buscar a complementação de renda embarcando em barcos
das indústrias pesqueiras em portos de outros Estados ou ainda em outros
municípios portuários de Santa Catarina. Quando, por algum motivo estão em
descanso da pesca industrial, os pescadores retornam à pesca artesanal,
mantendo desse modo o caráter pluriativo da família.
Mestres e motoristas de barcos, que tem seus ganhos traduzidos em
partes, venderam suas propriedades e mudaram para as cidades onde tinha
portos de descarga da pesca, principalmente Itajaí/S e Santos/SP. Jovens
romperam a tradição de seus pais na pesca, pela falta de expectativa do setor,
complementando a renda familiar buscando emprego formal em centros como
Biguaçu e Florianópolis. Também se matricularam no ensino médio, criado no
67
final da década de 1960 no município, com a expectativa de, futuramente,
trabalhar em outras atividades. Foram poucos os que conseguiram dar
continuidade após terminarem os estudos na escola local tendo em vista as
dificuldades de transporte e horários compatíveis para vir até Florianópolis.
Continuaram a ter na pesca, seja artesanal ou industrial, a sua melhor forma de
sobrevivência. Outro fato a ser destacado é que estes jovens, pela falta de
oportunidade de diversão, casam cedo e constituem família, aumentando ainda
mais as dificuldades e a oportunidade de estudar e conseguir trabalho em outro
local.
Pequenos pescadores artesanais que conseguiram acumular alguma
poupança financeira passaram a investir em comércio como padarias, mini-
mercados, lojas de conveniência, restaurantes e bares, entre outros. Enquanto
a família cuidava do comércio, o chefe da mesma estava na pesca. A atividade
turística tem trazido uma população flutuante ao município, com uma exigência
de um comércio mais variado. Vale lembrar que essa mão–de–obra inicial no
comércio foi eminentemente familiar e pesqueira.
No final da década de 1980 e início da década de 1990, foi inserida no
Município a atividade da Maricultura, que tem como objetivo a busca do resgate
da dignidade econômica e social dos pescadores artesanais.
68
CAPITULO II
2 - A MARICULTURA COMO ESTRATÉGIA DE
REPRODUÇÃO DO PESCADOR ARTESANAL.
2 .1 – Atividade no mundo e no Brasil
Desde os tempos pré-históricos, o homem vem utilizando-se dos moluscos
indivíduos que apresentam corpo mole, não segmentado, protegido ou não por uma
concha (calcárea) que, ao longo dos tempos, tem servido como fonte de alimentos.
Este fato pode ser observado pela existência de grandes sambaquis, palavra como
marisco que deriva do Tupi, e Ki = amontoado. Segundo PROUS, (1992 – p. 204):
“Trata-se, portanto, de uma acumulação artificial de conchas de moluscos, vestígios
da alimentação de grupos humanos”. Os sambaquis datam de 8000 a 2000 anos
a.C. e ainda hoje são encontrados como fonte de renda e de alimentação para as
populações carentes, nas mais variadas regiões do mundo. Na América do Sul,
especialmente no sul do Brasil, a quantidade é bastante significativa.
A militicultura, ou seja, o cultivo de mexilhões (termo utilizado na língua
portuguesa para denominar as diversas espécies de moluscos bivalves da família
Mytilidae) recebe várias denominações populares como marisco da pedra, sururu e
ostra-de-pobre. O termo marisco tem significado literal mais amplo, incluindo
diversos invertebrados. O cultivo de mexilhões teve início, na Europa, há cerca de
760 anos. Em 1235, um náufrago holandês, Patrick Walton, instalou redes com
estacas de madeira na Baía de L´Àiguilon (França), para capturar gaivotas. Com o
tempo, observou a fixação de mexilhões que lhe serviram de alimento. Esse modo
de produção com estacas tem sido praticado na Bretanha e na Normandia.
Na Europa e Ásia essa atividade vem sendo desenvolvida há centenas de
anos e é caracterizada como atividade industrial. Dos vários tipos de mexilhões
encontrados na natureza, dois são produzidos na Europa: o “Mytilus edulis” e o
“mytilus galloprovincialis”. A primeira espécie é encontrada de Portugal até o mar do
Norte, e ocupa as costas da França, Grã Bretanha, Irlanda e Holanda e também
69
encontramos no Brasil. Já a segunda espécie é cultivada em todo o Mar
Mediterrâneo, que vai de Marrocos, Portugal até a Galícia, na Espanha, entre outros
países. Na América Latina, países como o Chile e o México possuem tecnologia
avançada no cultivo e produção de moluscos. Várias espécies têm sido cultivadas,
mas as ostras e os mariscos são mais os produzidos no Brasil.
Como atividade de valor econômico e social, a maricultura está incluída nos
programas de desenvolvimento dos principais países, pois utiliza técnicas simples
de cultivo com baixo investimento. Podem ser produzidas em bateias – que são
sistemas de produção ou plataformas flutuantes, em que são colocadas as cordas
para fixação das sementes dos mexilhões, proporcionando a fixação de uma grande
quantidade de bolsas de sementes. Mas foi somente a partir da metade desse
século XX, que a maricultura se tornou uma das atividades mais econômicas e
produtivas, sendo intensificada em vários países, tanto da América Latina, como na
Europa e Ásia, conforme dados contidos na figura 08.
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
PRODUÇÃO
China
França
Espanha
Tailândia
Holanda *
Nova Zendia
Itália
Chile
Figura 08: Gráfico dos Principais Países Produtores de Mexilhões Cultivados
onte: Manual de Cultivo do Mexilhão Perna-Perna editado pela EPAGRI
nar-se o grande
filão econômico das comunidades pesqueiras artesanais do litoral.
2004 (em toneladas).
F
A figura 08 apresenta os maiores produtores de mexilhões do mundo. O
potencial da maricultura é inegável. A grande produção internacional,
principalmente da China, tem repercussão econômica e social. Também no Brasil,
se for adotada uma política de expansão da atividade, poderá tor
70
O Brasil não aparece entre os grandes produtores mundiais por ser uma
atividade ainda em desenvolvimento. Sua produção ainda é bastante insignificante
em comparação aos países que dominam a tecnologia, como em águas profundas.
No Brasil, a maricultura é recente e teve seu início na década de 80, por institutos
de pesquisas, universidades e secretarias de agricultura de diversos estados.
A atividade de maricultura no Brasil, em sua grande maioria, se caracteriza
como uma atividade extrativa. A produção pode ser subdividida em dois grupos
distintos:
1 - Comercial: feita principalmente por familiares, para complementação da renda
familiar.
2 - Subsistência: Complementação da dieta alimentar dos membros da família,
mas no presente pouco praticado, tendo em vista que os estoques são utilizados
como sementes, muitas vezes não conseguindo chegar à maturidade.
A maricultura ainda é pouco representativa no Brasil, desde a implantação
até a representação do produto final em sistema industrial. Alguns resultados são
obtidos por alguns grupos de pesquisa que buscam conhecimento na biologia das
espécies cultivadas, como também o desenvolvimento e adaptação de tecnologias
de cultivo. Os pesquisadores levam em consideração condições ambientais e a
disseminação da pesquisa dos produtores.
A tendência da maricultura no Brasil é crescer nas próximas décadas,
tendo em vista os investimentos que os governos federal e estadual tem buscado
em tecnologias para a produção, principalmente da Nova Zelândia e Espanha.
Mas esta importação de tecnologia não tem o intuito de atender aos pequenos
pescadores artesanais, pois os seus altos custos dificultam o acesso dos mesmos.
Segundo o Ministério da Agricultura e do Abastecimento, a maricultura
tem atendido a proposta para a qual foi implementada, gerando empregos diretos
e indiretos bem como o aumento de renda do pescador artesanal. Em algumas
71
áreas do litoral brasileiro, a maricultura encontra-se totalmente capitalizada, não
tendo mais nem resquício de atividade artesanal. A tabela a seguir apresenta a
evolução do programa da cadeia de produção de moluscos bivalves cultivados no
Brasil. Entenda-se ai a produção de mariscos (Perna perna), ostras, vieiras, entre
outros. Todos os moluscos bivalves são moluscos que possuem duas conchas.
Na tabela 09, os dados nos remetem à importância da atividade na
geração de renda e empregos, diretos e indiretos. Se a atividade fosse atendida
por incentivos governamentais e um planejamento racional na cadeia produtiva,
poderia se tornar uma fonte de divisas no mercado internacional. Como
percebemos, somente a partir de 2002, que a produção tomou um caráter
industrial, ainda que insignificante, tendo em vista a extensão do litoral brasileiro.
Tabela 09: Índice de Desempenho do Programa da Cadeia de Moluscos
Bivalves Cultivados no Brasil. (*)
1998 2000 2001 2002 2003
Produção (t) 8.300 11.000 14.000 17.000 20.000
Empregos diretos (nº) 4.500 6.000 7.600 9.200 10.800
Empregos indiretos (nº) 18.000 23.800 30.300 36.800 43.300
Área implantada (há) 150 170 200 250 320
Renda da cadeia mercado
interno (US$1.000)
6.111 8.300 9.800 11.000 13.500
Renda total (US$1000) 6.111 8.300 9.800 12.850 16.650
Divisas (US$1000) - - - 1.850 3.150
Fonte: Ministério da Agricultura e do Abastecimento – 2005.
(*) Os dados de 2004 e 2005 não estão disponíveis.
Como demonstram os dados da tabela 12, a atividade é um grande
gerador de empregos diretos e indiretos. Mas o que nos chama a atenção são os
empregos indiretos, principalmente quando o produto deixa o seu local de
produção e começa a atividade do atravessador. Desse modo a geração de
empregos na cadeia produtiva nem sempre vem atender a demanda de
trabalhadores disponíveis. A maricultura teve seu início no final de década de
1980, e somente a partir de 2002 é que o produto começa a ser exportado,
72
enquanto países como o Chile tem toda a sua produção de moluscos vendida
para o exterior, principalmente ao Japão.
Outro ponto a ser destacado no Brasil é que, mesmo com sua vantagem
de produção de 8.300 toneladas em 1988 e tendo aumentado progressivamente,
importou no mesmo ano 550 toneladas de mexilhão (principalmente da Espanha,
Nova Zelândia e Chile), sem exportar um quilo sequer. Conforme dados do
Ministério da Agricultura, o Chile exportou 700 toneladas, totalizando US$ 1,98
milhões. Em alguns casos, o preço do mexilhão importado se iguala aos preços do
produto produzido no Brasil. A vantagem alegada pelos importadores é que o
produto comprado no exterior apresenta uma qualidade superior caracterizada por
uma certificação sanitária de reconhecimento internacional (HACCP), tamanho
padronizado, embalagem apropriada e oferta regular. Além disso, para que o
produto nacional chegue a este mesmo nível de qualidade, estima-se a adição de
um custo de processamento (congelamento e embalagem) de aproximadamente
U$ 0,41/kg ao preço do nosso produto, mais a incidência de impostos, o que vem
aumentar substancialmente seu preço no mercado.
2 . 2 Santa Catarina e Governador Celso Ramos
Atualmente Santa Catarina se destaca como o primeiro produtor nacional,
seguido dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. As principais pesquisas
tiveram início no ano de 1986, no Laboratório de Moluscos Marinhos (LCMM),
vinculado ao Departamento de Biologia com o Laboratório de Mexilhões (LAMEX),
da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
Em 1989, a Associação de Crédito e Assistência Pesqueira de Santa
Catarina – ACARPESC, atual Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão
Rural de Santa Catarina – EPAGRI, vinculada à Secretaria de Estado da
Agricultura, repassou tecnologia de cultivo de mexilhões aos moradores das
comunidades pesqueiras. Através dos funcionários extensionistas foram
introduzidos cultivos experimentais em áreas piloto determinadas. Os resultados
iniciais foram animadores. Assim sendo, o órgão estatal criou escritórios de
assessoria técnica em vários municípios do Estado.
73
Com resultados altamente favoráveis, a atividade da maricultura vem
crescendo significativamente no litoral do Estado. O pólo catarinense de
maricultura compreende a linha de costa à qual a EPAGRI denominou de Zona
Costeira Catarinense, que mede cerca de 561,4 km de extensão, iniciando ao
norte do Estado em 25º 58’ 41“ e 29º 23’ 55” de latitude sul e 49º 42’ 57” e 53 de
50’ 00” de longitude oeste.
O referido pólo engloba 28 municípios que se limita com o Oceano Atlântico
ou com lagoas, lagunas, baías e enseadas com alta produtividade natural,
caracterizando como uma formação espacial diferenciada do restante do estado.
Com isto, os elementos físicos favorecem o ingresso de inúmeras pessoas
interessadas na atividade do cultivo de moluscos.
Tendo em vista as peculiaridades e oportunidades da área para o
desenvolvimento da aqüicultura maricultura, a EPAGRI dividiu a Zona Costeira em
três grandes regiões, a do Litoral Norte, Litoral Centro e Litoral Sul, conforme
veremos na figura 09.
74
Figura 09 – Mapa do Pólo de Aqüicultura (Maricultura) do Estado de Santa
Catarina.
Fonte: Adaptado do Pólo de Maricultura de Santa Catarina – EPAGRI.
Essa expansão deu a Santa Catarina um novo e considerável destaque na
atividade da maricultura no Brasil. Na metade dos anos de 1990, ainda não tinha
uma expressividade e nem representava uma fração de importância comercial. No
final desta década a maricultura teve novo impulso, inclusive nos Municípios de
Florianópolis, Palhoça e Bombinhas, onde a atividade tornou-se industrial.
O Estado ostenta sua superioridade a nível nacional quer na produção de
ostras quer na produção de mariscos do tipo Perna perna. Este fato tem colocado
Santa Catarina na imprensa brasileira, como uma atividade lucrativa, despertando o
interesse de vários estados da Federação na busca de informações por esta
atividade econômica.
75
Ainda segundo ICEPA, (2005) e LCMM, (2005), Santa Catarina continua
sendo o maior produtor de mexilhões do Brasil, tendo um crescimento na sua
produção de mexilhões Perna perna, no período, de cerca de 1,72% com relação a
2004. A atividade da maricultura tem se transformado em uma importante fonte de
proteínas para as populações pobres, como também de empregos em grande
quantidade. No período relativo a 2005 os empregos totalizavam aproximadamente
2000 diretos e 5000 indiretos. Estes dados são oficiais, não constando neste
trabalho os que são clandestinos na produção, e que não são contabilizados pelos
órgãos que controlam a produção de mariscos. Segundo as estimativas da
EPAGRI, os produtores clandestinos podem chegar a 50% dos números constantes
dos dados oficiais. No caso do município em estudo, temos 34 (trinta e quatro)
produtores clandestinos. Se levarmos em consideração uma família média local de
04 (quatro) pessoas, composta por pai, mãe e 02 (dois) filhos, teremos 136 (cento e
trinta e seis) pessoas no trabalho clandestino, representando uma média de 20%
dos produtores cadastrados. Neste caso, não foi possível contabilizar os empregos
indiretos. Na figura 10, apresentamos os principais municípios produtores de
mariscos no Estado.
76
Figura 10: Mapa da Distribuição Geográfica dos Principais Pólos de
Maricultura em Santa Catarina – 2004.
Fonte: EPAGRI – www.intergate.com.br/macologia
Conforme coloca VINATEA, (2000) o crescimento de mexilhões em águas
catarinenses tem um ritmo diferenciado de alguns países. As condições de nossas
baías e enseadas são favoráveis, e fazem com que os mariscos cresçam num
período de 6 a 11 meses de dois para oito centímetros. Para obter o mesmo
desempenho, na Espanha, é necessário o tempo de 18 meses, de 24 na França e
36 na Holanda.
77
O autor alerta que existe a possibilidade de que as superpopulações em
algumas áreas de produção podem trazer problemas de poluição das águas, devido
ao acumulo de dejetos, distúrbios das comunidades naturais dos fitoplâncton e
contaminação dos estoques. Dessa maneira, deve-se tomar os devidos cuidados
com os indivíduos, pois podem vir a morrer ou levar mais tempo para crescer, em
função da grande quantidade deles num mesmo espaço aquático. Ainda segundo o
autor, em Santa Catarina os impactos ambientais são relativamente inócuos, exceto
quando há uma prática intensiva e desordenada das áreas de cultivo. Este fato
precisa ser revisto pelos órgãos responsáveis, pois detectamos que, junto aos
maricultores autorizados existem pessoas que implementam a atividade no mesmo
parque aqüícola, sem controle das autoridades. Esta prática irregular no futuro
poderá trazer problemas, tanto para quem está regulamentado quanto para aquele
que é clandestino, podendo trazer como conseqüência a diminuição da produção.
Para chamarmos atenção para a gravidade desse problema na cadeia
produtiva, se não houver um redimensionamento dos espaços de produção no
município, provavelmente a atividade poderá vir a se esgotar. Desse modo,
usaremos como exemplo as experiências negativas ocorridas nas áreas dos
maiores produtores mundiais. A Espanha, país de maior tradição no cultivo de
mexilhões, iniciou seu cultivo há cerca de 50 anos, tendo alcançado uma produção
de 245.500 (duzentos e quarenta e cinco mil e quinhentas) toneladas em 1987.
Entretanto, devido a problemas causados pela superação da capacidade de carga
do ambiente, levando a um afloramento de marés vermelhas, sua produção baixou
para 90.500 (noventa mil e quinhentas) toneladas em 1993. Nos últimos anos vem
se recuperando e redimensionando os espaços de produção. Outro exemplo é a
China que, por não observar as limitações de carga do ambiente, em 1992 produziu
538.895 (quinhentos e trinta e oito mil e oitocentos e noventa e oito) toneladas,
reduzindo gradativamente até o presente para 361.261 (trezentos e sessenta e um
mil e duzentas e sessenta e uma) toneladas. Um exemplo de caráter positivo e
observância na cadeia produtiva, com respeito aos limites do ecossistema é o da
Nova Zelândia, que tem apenas 20 (vinte) anos de atividade. Vem aumentando
gradativamente sua produção e, inclusive, exportando tecnologia para o Brasil e
demais países.
78
Ainda com relação à maricultura, um aspecto importante a ser levantado é
o envolvimento de um órgão estatal com relação à organização dos produtores em
associações e em cooperativas. Segundo dados da EPAGRI, (2004) Santa Catarina
apresenta 18 associações de produtores de moluscos, distribuídos ao longo da
costa catarinense, entre a região da Grande Florianópolis até São Francisco do Sul,
no extremo litoral norte. Alguns desses municípios possuem várias associações,
como São Francisco do Sul e Florianópolis.
Vale assinalar que o tamanho de cada uma das associações é variável,
pois depende do interesse do produtor em assimilar que a melhor forma de se
manter a atividade é impedindo a interferência de grandes grupos econômicos na
produção. O município de Governador Celso Ramos possui uma única Cooperativa,
com a unidade física de processamento instalada na localidade de Fazenda da
Armação, com 230 produtores cadastrados oficialmente, trinta e quatro produtores
clandestinos, totalizando 264 produtores. Três municípios produtores não constam
da tabela 13, como Biguaçu, Itapema e Balneário da Barra do Sul, por começarem a
produzir somente em 2004 e não terem disponíveis dados como: número de
associados, unidades de beneficiamento, entre outros. Ainda conforme dados da
tabela, o município de Penha que possui 250,82 hectares de área para a produção
de moluscos, não se caracteriza como o maior produtor do Estado. Tabela 10.
Tabela 10 – Associações e Cooperativas com Unidades que possuem
Beneficiamento-(UB) de moluscos em Santa Catarina – dados de 2004 da
EPAGRI. (*)
Município
A
ssociaçõe
s
Associados
Unidades de
Produção
(Nº. de Lote
s
Parque
Aqüícola
(área total)
Cooperativa
s
com (UB) e
m
2004
Florianópolis 03 106 119 225,21 01
São José 02 82 56 109,66 00
Palhoça 02 147 182 203,27 00
Gov. Celso
Ramos
02 (**) 230 110 106,95 01
Porto Belo 01 56 18 57,85 00
Bombinhas 02 107 54 88,35 01
79
Balneário
Camboriu
01 03 04 3,90 00
Penha 01 102 112 250,82 01
S. Fco. do Sul 05 78 49 66,40 01
TOTAL 18 915 709 1.112,41 05
Fonte: Os dados foram computados pelo autor com base em dados da EPAGRI – 2004.
(*) – Os municípios de Jaguaruna e Itapoá tem área disponibilizada para produção,
respectivamente, 60,00 e 34,08 hectares, mas não possuem ainda produtores interessados.
(**) No município os produtores se congregam em 01 (uma) associação e 01 (uma)
cooperativa.
Na localidade da Fazenda da Armação foi construída uma unidade de
beneficiamento com investimentos financeiros do Canadá. A finalidade era
congregar o maricultor e sua cooperativa, fazendo com que houvesse a
oportunidade de melhorar a qualidade do produto, através da decantação e
manuseio dos mexilhões, mas não funciona há mais de 10 (dez) anos.
Com a pressa de inaugurar as instalações, o governo municipal da época
recebeu o empreendimento sem que a obra estivesse concluída, com a conivência
do órgão estadual fiscalizador, o Departamento Edificações e Obras Hidráulicas –
DEOH. Também houve a questão da localização da estrutura física, por estar
distante da área de produção cerca de 05 quilômetros. Assim, o marisco teria que
ser transportado em algum tipo de caminhão até a unidade de processamento,
acarretando em aumento de custo da produção.
A Maricultura no município de Governador Celso Ramos teve seu início no
final da década de 1980 e início de 1990, quando um projeto em conjunto da
EPAGRI (na época ACARESC) com a UFSC criou técnicas para a implementação
da maricultura junto às famílias dos pescadores artesanais. Os técnicos decidiram
instalar essa nova atividade econômica, sendo pioneira no Município. O município
de Governador Celso Ramos foi contemplado com a instalação de um escritório de
atendimento ao produtor, que funciona na localidade de Canto dos Ganhos, junto ao
prédio da Colônia de Pescadores Z-9. Desde então, os pescadores puderam contar
com a criação e transmissão da idéia do cultivo de mariscos.
80
A princípio houveram grandes dificuldades de encontrar pescadores
artesanais interessados na idéia do cultivo de mariscos. Havia uma incredulidade a
respeito da “nova” atividade econômica proposta. Para o pescador artesanal, o
marisco encontrava-se disposto a qualquer momento e hora, em quantidade, nos
costões. Conforme expressão usada pelo pescador local, não havia necessidade de
“plantá-los”. Eles não acreditavam que seria possível cultivar algo que a natureza
benevolamente os dispunha. Assim não seria necessária a intervenção humana.
Após várias tentativas, os técnicos conseguiram convencer apenas 03 (três)
pescadores de comunidades diferentes do Município. Um deles residia na
comunidade de Calheiros, outro na de Ganchos de Fora e, o último, em Armação
da Piedade. Com esses três pescadores interessados, os técnicos implantaram
experimentalmente o projeto. Após oito meses, ocorreu a primeira colheita com
0,03 toneladas de mariscos cultivados. No ano seguinte, em 1991, a produção
atingiu a marca de 0,30 toneladas e, nos anos seguintes, aumentou
significativamente, até 1997. Nos anos de 1997/99 a produção manteve o mesmo
patamar de crescimento com 2.300 toneladas e em 2000 atingiu a 2.600 (duas mil
e seiscentas) toneladas. Caiu para 1500 (mil e quinhentas) toneladas no período
de 2001 a 2004, voltando a crescer, sendo que em 2005 a estimativa é de
aumentar 1,72%. Este fato ocorreu em função da falta de uma política de
investimentos na atividade, principalmente do governo municipal, uma vez que,
por ser uma atividade artesanal extrativa, o maricultor é isento de imposto.
De acordo com a pesquisa, a comunidade que mais tem prosperado e
otimizado em termos de produtividade, é a de Ganchos de Fora. Cerca de 90%
dos membros desta comunidade trabalha na nova atividade econômica
paralelamente à pesca artesanal.
Na época da implantação, a EPAGRI encontrou problemas para
desenvolver seu projeto. Além de encontrar a resistência do pescador, ainda
bastante incrédulo com que estavam lhe oferecendo, ou seja, “plantar mariscos”, o
órgão estatal não encontrou, na época, respaldo municipal e estadual. Não havia
uma legislação que regulamentasse a atividade do cultivo de mariscos, que ao
longo dos anos foi sendo criada.
81
Este fato foi “correndo de boca em boca”, pois as comunidades são
bastante pequenas e de fácil comunicação entre as pessoas. A partir da primeira
experiência começaram a aparecer pescadores interessados em aderir ao
programa de cultivo de mariscos. Na época, a pesca artesanal passava por uma
reestruturação tanto do ponto de vista de sua organização quanto da quantidade
de peixes e camarões existentes a ser capturado. Outros membros das
comunidades, antes com seus pescadores incrédulos, como Canto dos Ganchos,
Ganchos do Meio, Fazenda da Armação e Costeira, passaram a adotar o novo
processo de produção familiar.
No período, da sua implantação até meados de 1990, a EPAGRI teve que
fazer negociações com o Governo do Estado, Prefeitura Municipal, Capitania dos
Portos (Ministério da Marinha) Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos
Renováveis – IBAMA. Na década de 1990, através de Decreto-Lei, o Serviço do
Patrimônio da União – SPU, regulamentou as áreas com mais de três anos de
atividade de produção. A seguir, na figura 11, estão assinaladas as áreas onde se
encontram os parques aqüícola do município de Governador Celso Ramos.
82
Figura 11: Mapa de localização dos Parques Aqüícola em Governador Celso
Ramos – 2004, EPAGRI
Fonte: Mapa adaptado do município, para mostrar as áreas de produção de mariscos em
Governador Celso Ramos.
Em Governador Celso Ramos encontramos duas situações adversas. Uma,
corresponde à cooperativa e a outra, à Associação de Maricultores. A associação
precede a Cooperativa, sendo que os associados se integram à cooperativa. A
diferença entre a associação e a cooperativa é que somente esta poderá, caso um
dia vier a funcionar, ter o direito legal de comercializar os produtos (mariscos) para
outros estados e para exportação, conforme estabelecido por legislação do SIF e
Sanitária. Os cooperados são os detentores da unidade de processamento.
83
Em 2004, se a unidade de processamento estivesse funcionando, poderiam
ser processados em torno de 05 a 06 toneladas/mês, e com isso haveria o
recolhimento de ICMS, aos cofres municipais. Havia 80 cooperados e 230
aqüicultores oficialmente cadastrados, e mais de 34 sócios produtores não
cadastrados, que atuam em uma área de 106,950 m2, distribuídos nas mais
diversas localidades litorâneas, conforme tabela 11.
Tabela 11 – Áreas de Produção de Mexilhões em Governador Celso Ramos
em 2004 por Localidade.
Localidade Área de
Cultivo (m
2
)
Aqüicultores
oficialmente cadastrado
Maricultores
não Cadastrad
o
Canto dos Ganchos 17.900 16 02
Calheiros 25.600 14 00
Ganchos do Meio 37.800 34 12
Ganchos de Fora 60.00 63 05
Palmas 11.150 06 01
Armação da Piedade 28.500 14 02
Fazenda da Armação 14.000 77 10
Costeira da Armação 12.000 06 02
TOTAL 106.950 230 34
Fonte: Dados fornecidos pela EPAGRI – 2005.Pesquisa de campo efetuada nos meses de
janeiro e fevereiro de 2005.
2.3 - A Caracterização e Legitimação da Área de Cultivo de Mexilhões
(mariscos).
Para entendermos todo o processo de legitimação do uso do mar, bem
como o uso comum para o cultivo de mexilhões marinhos, há a necessidade de se
analisar a legalidade do Estado de Direito. Mesmo que as ocupações das áreas se
concretizem, levando em consideração a concessão do uso de direito, como
ocorre na liberação de áreas para a agricultura, o uso somente pode ocorrer com
a devida autorização, para que não caracterize domínio privado. Dessa forma,
isso terá que ser analisado em função das áreas marinhas serem um bem público
84
e ao longo dos tempos ter sido explorado por pequenos pescadores e
maricultores. MACHADO, (2002, p. 34) coloca a respeito:
“A idéia central é a de que, sendo as águas brasileiras públicas, a sua
incorporação ao patrimônio privado poderá implicar em sua privatização
para uso futuro como ocorreu com as terras brasileiras desde a
colonização”.
Outro fator, com relação à legalidade de uso de áreas de cultivo está
implícita ao adensamento dos parques de produção, que vão sendo ocupados por
pessoas não cadastradas. Para o maricultor existe a necessidade de legalizar o
uso das áreas onde implantarão o Parque Aqüícola. Ao pescador artesanal, ao se
interessar pelo cultivo de mariscos, é recomendado procurar o escritório da
EPAGRI, órgão estadual, que tem a função de orientar e delimitar as áreas
potenciais.
O fato de o interessado estar junto a um extensionista da EPAGRI se faz
necessário, pois o mesmo, conhecendo o local pela prática da pesca artesanal,
ajuda a identificar as áreas onde ainda se processam a pesca, o tráfego marítimo
e a atividade turística. A atividade do cultivo não deve entrar em conflito com
outras atividades já existentes. Assim, o extensionista e o produtor interessado,
fazem o mapeamento da área e levam para análise e parecer do Ministério da
Marinha. Este órgão dará o retorno com aprovação ou não do uso daquela área,
principalmente no que tange a questão do transporte marítimo. Após a aprovação
pelo Ministério da Marinha, a EPAGRI encaminhará a documentação necessária
para que o pescador artesanal interessado em lote marinho possa efetivamente
construir sua estrutura. No início da atividade cada produtor artesanal de
mexilhões podia utilizar no máximo 03 (três) hectares, após a sua legalização e a
necessidade de aumentar o espaço produtivo, passou para 05 (cinco) hectares.
Após a escolha do local, para a atividade obter êxito, torna-se necessário
levar em consideração alguns itens importantes que vão muito além do tráfego
marítimo como a atividade da pesca ou a atividade turística. Com relação à
atividade turística em hotéis, alguns reclamaram de que as bóias utilizadas para
manter os long lines (espinhéis), acima da linha de água deixa o ambiente
85
marinho com um aspecto feio. Com relação a essa crítica o Presidente da Colônia
de Pescadores Z-9, localizada em Canto dos Ganchos, informou que em uma
reunião no Município de Porto Belo com autoridades municipais e estadual, para
discutir a atividade de maricultura, na baía do Tijucas, que o Prefeito a época,
estava em conflito com os maricultores, pois havia queixa dos turistas com relação
ao aspecto que deixava no mar, das bóias de sustentação dos espinhéis.
Entendemos com uma represália aos pescadores artesanais que tem na
maricultura o aumento de renda. O local por ser uma região com atividades
turísticas e a mesmo sendo sazonal, não consegue dar conta da manutenção
dessa mão-de-obra crescente que se insere na produtividade da maricultura.
Também há a preocupação por parte de órgão estatal de se verificar se o
ambiente encontra-se livre de poluição, como efluentes domésticos e industriais,
metal pesado, agrotóxico, longe de desembocadura de rios, pois os mexilhões são
por natureza grandes filtradores de todas as impurezas que encontrão no mar. A
atividade a princípio tem sido praticada em locais abrigados como baías e
enseadas, com pouca correnteza marítima. Outro item a ser levado em
consideração é a profundidade natural exigida, no mínimo de 02 (dois) metros de
profundidade para instalação da estrutura de cultivo, evitando dessa maneira que
as cordas toquem o fundo do talude.
2.4 - Da legalização do parque aqüícola
Outro item importante para a instalação da área de uma unidade de
produção e cultivo de mariscos, refere-se à legalização. O cultivo deve ser
legalizado junto aos seguintes órgãos competentes, que exigem uma série de
documentos:
a) Fundação de Amparo à Tecnologia e Meio-Ambiente – FATMA;
b) Instituto Brasileiro do Meio-Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis – IBAMA;
c) Ministério da Marinha – via Capitania dos Portos.
d) Patrimônio da União – Caso concessão de uso.
86
Junto a FATMA, a emissão de Certidão ou Licença Ambiental Provisória -
LAP, está relacionada ao tamanho das áreas de cultivo. A certidão definitiva é
expedida quando as áreas não ultrapassem a 0,5 ha. (5.000 m2).
O valor para obtenção de cada documento está fixado em Unidade Fiscal
de Referência (UFIR), estabelecido pelo Governo Federal, ficando estipulado os
valores da implantação de um Parque Aquícola junto a FATMA:
- Certidão – 30 UFIR.
- Licença Ambiental Prévia – LAP – 75 UFIR.
- Licença Ambiental de Instalação – LAI – 225 UFIR.
- Licença Ambiental de Operação – LAO – 150 UFIR.
Além da exigência pela FATMA dessas Licenças e Certidão, a um custo
elevado, para que o maricultor obtenha a LAP é exigida a seguinte documentação:
a) Registro Cadastral em duas vias;
b) Declaração da Prefeitura Municipal, comprovando que a atividade a ser
implantada está de acordo com o Plano Diretor e não fere o Código de
Postura do Município;
c) Declaração da Colônia de Pescadores comprovando que a localização
de sua unidade de cultivo não interferirá na atividade de pesca do
município;
d) Laudo de análise da água do local de cultivo, principalmente referente
aos índices (coliformes fecais), que é emitido pelo Ministério da
Agricultura ou laboratório por ele credenciado;
e) Memorial descritivo da unidade de cultivo indicando espécie(s) a ser
(em) cultivada(s); área ocupada por espécie; sistema de cultivo; método
para obtenção de sementes necessárias; quantidade de sementes
necessárias; período de cultivo dos mexilhões e descrição da área. No
caso do cultivo ser orientado pela EPAGRI, o memorial é assinado pelo
extensionista de pesca local, através da Anotação de Responsabilidade
Técnica – ART;
f) Planta de localização da Unidade de Cultivo dentro das áreas
mapeadas;
87
g) Croqui de modelo de cultivo pretendido;
h) Croqui do(s) modelo(s) de coletor(es) artificial(is) de sementes de
mexilhão, quando for o caso. Muitas vezes este item não é solicitado ao
candidato a aqüicultor, por já vir discriminado no memorial descritivo.
A legalização de uma unidade de cultivo de mexilhões, junto ao IBAMA,
refere-se às condições ambientais já assinaladas pela FATMA, mediante a
emissão de Certidão ou Licença Ambiental, anexada na documentação. Segundo
as Resoluções de Conama de nº 01/86; 237/97; 312/2002, para que o pequeno
produtor instale seu parque aqüícola, as Resoluções regulamentam: “localização,
construção, instalação, ampliação, modificação e operação de empreendimentos e
atividades utilizadores de recursos ambientais, quando consideradas efetiva ou
potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes de causar
degradação ambiental”.
Junto ao IBAMA o aqüicultor recebe a emissão do registro e os valores são
estabelecidos em UFIR, dependendo da área cultivada:
- áreas com até 02 (dois) ha. – fica isento de pagamento;
- áreas de 02 (dois) a 05 (cinco) ha. – 08 a 12 UFIR;
Quanto à documentação exigida para obter o registro de aqüicultor, é
necessário obedecer ao estabelecido na Portaria nº 95 de 30 de agosto de 1993,
do IBAMA:
a) Preenchimento de formulário de Cadastro (modelo do próprio IBAMA);
b) A cópia da Certidão de Licença Ambiental expedida pela FATMA;
c) Apresentação de projeto que permita a identificação da unidade de
cultivo (pode ser a mesma da FATMA);
d) Quando se tratar de pessoa jurídica, apresentar cópia de documento
que comprove a existência jurídica da empresa.
Com relação à legalização do cultivo marinho, o Ministério da Marinha,
através da Capitania dos Portos, exigem documentos comprobatórios de que a
88
atividade de aqüicultura não implicará em falta de segurança para a navegação
marítima local. Dessa forma, regulamentando a atividade, temos a Portaria de
Portos e Costas (DP/MM) nº. 52 de 30/10/95 que define as normas para emissão
de pareceres sobre atividades em áreas sob fiscalização do Ministério da Marinha;
Decreto Federal nº 1747 de 22/10/96 que regulamenta a exploração de
aqüicultura em águas públicas pertencentes à União; Lei Federal nº. 7.661 de
16/05/88, que institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e o Decreto
Federal nº. 2.869 de 09/12/98, que regulamenta a cessão de águas públicas
pertencentes à União para a exploração da Aqüicultura. Para isso, exige-se que
sejam cumpridas algumas formalidades, tais como:
a) Requerimento ao Ministério da Marinha;
b) Planta de localização, com escala entre 1:100 e 1:50 especificando
dimensões e confrontações do imóvel em relação aos logradouros
próximos, como ruas, estradas, etc. E com distâncias conhecidas,
indicando, se for o caso, claramente os acessos públicos às praias;
c) Planta de situação, com escala entre 1:500 e 1:2000, estabelecendo a
posição do imóvel em relação á área mais ampla, que possa ser
influenciada ou influenciar na obra projetada;
d) Planta de construção, com escala entre 1:50 a 1:200;
e) Memorial descritivo da obra pretendida (deve ser o mais abrangente
possível) discriminando as coordenadas geográficas da região de
acordo com a Carta Náutica da Área;
f) Cópia do contrato de aforamento ou autorização para ocupação ou
similares, expedidos pelo Serviço do Patrimônio da União, ou
documento habitual de comprovação ou posse (escritura de compra e
venda registrada em cartório, certidão de registro de imóveis, etc.);
g) Três fotos tamanho postal, mostrando o terreno;
h) Uma pasta de cartolina, com elástico;
i) Os documentos exigidos nos itens b, c, e, deverão ser assinados por
engenheiro responsável pelas obras, deles contendo seu nome e
registro do Conselho Regional de Engenharia – CREA, sendo que as
plantas não poderão apresentar correções que alterem sua
originalidade. O requerimento deve ser assinado pelo proprietário da
89
obra e seu representante legal, anexando cópia da procuração ou
contrato social (no caso de firma)
j) Uma Carta Náutica da Região.
Também é exigido pelo Ministério da Marinha que todos os documentos
sejam originais, e, no caso de cópias, devem ser autenticadas e em três vias.
Como vimos, há uma grande burocracia a ser cumprida e custos elevados na
implantação de um Parque Aqüícola. Ter que reunir os documentos exigidos pelos
órgãos da esfera federal e estadual torna-se difícil para o entendimento de um
pescador. O máximo permitido por área de cultivo é de 05 hectares. No início da
implantação, toda a documentação ficava por conta da EPAGRI. A Capitania dos
Portos exige uma distância mínima para a implantação desse Parque que
corresponde de 500 a 800 metros, partindo da Linha do Preamar em direção ao
Oceano.
Caso o produtor aumente sua área cultivada, estará fugindo ao previsto na
implantação do projeto pela UFSC e EPAGRI, que tem como princípio a não
entrega da atividade a indústrias, mas sim manter a produção familiar, inclusive
incentivando a criação do sistema de cooperativas. Também é meta do projeto
proteger o pequeno produtor da concorrência com o grande empresário para não
ser excluído da atividade. Para ser maricultor, é exigida a carteira de pescador
artesanal e a inscrição na Colônia de Pescadores. Este é o princípio básico da
implantação da maricultura, a de atender o pescador artesanal, na
complementação de renda. Em pesquisa na área produtora, encontramos como
maricultores, além dos pescadores artesanais, um Vereador, um Corretor de
imóveis e um Funcionário Público Estadual.
Outro aspecto importante que foi levado em conta pela UFSC e EPAGRI
refere-se à possibilidade da atividade de maricultura evitar o êxodo dos
habitantes. Como a atividade é familiar, os componentes trabalham em conjunto
na produção mantendo-os na comunidade. Além disso, evita que se intensifique a
atividade predatória da pesca já bastante prejudicada ao longo dos anos.
90
2.5 - Mexilhão produzido no Município de Governador Celso Ramos –
espécie Perna perna
A partir da implantação dos cultivos em Governador Celso Ramos, tem sido
possível observar grande evolução dessa produção, desde a sua implantação até
o primeiro semestre de 2005. Todo o cultivo é da espécie Perna perna,
proveniente de pequenos produtores familiares, geralmente pescadores
artesanais. O cultivo de moluscos no Brasil é responsável por 22% de toda a
produção aqüícola mundial. Os mexilhões tipo Perna perna representam cerca de
40% da produção geográfica mundial por serem, na maior parte do seu ciclo de
vida, organismos sésseis – que se locomovem sobre superfícies consolidadas
duras, compactas e, na maioria das vezes, ocorrem na zonas entre marés. Esse
tipo de mexilhão é encontrado na costa Atlântica da América do Sul, da Venezuela
ao Uruguai, na costa Africana do Mediterrâneo Ocidental, de Gibraltar ao Cabo de
Bom (Tunísia), costas Européias do Mediterrâneo Espanhol, na região de Málaga,
Costa Atlântica da África do Norte (Senegal, Mauritânia e Marrocos) e na costa da
África do Sul e Angola, Costa Índica da África do Sul, conforme demonstrado na
figura 12.
91
Figura 12: Mapa da Distribuição Geográfica no Mundo da Espécie do
Mexilhão Perna perna.
Fonte: Manual de Cultivo do Mexilhão Perna perna – EPAGRI.
2.6 - Reprodução e Desenvolvimento da Larva
O mexilhão Perna perna é o grupo de indivíduos que apresentam sexos
diferenciados. Externamente não há como distinguir o macho da fêmea. No
entanto, após a abertura das conchas, a separação entre macho e fêmea torna-se
possível graças à diferença de coloração das gônolas dos animais sexualmente
maduros. Nos machos, as gônolas apresentam uma coloração branca leitosa e,
nas fêmeas, vermelho alaranjado.
A fecundação é externa, com os mariscos produzindo grandes quantidades
de gametas e eliminando-as na água. As fêmeas eliminam ovócitos e, os machos,
espermatozóides. Normalmente a eliminação ocorre pelos estresses ambientais,
entre eles a temperatura da água. A primeira clivagem ocorre cerca de meia hora
depois e a larva está formada cerca de 6 horas após. A larva pode ser observada
24 horas após a fecundação. A partir desse ponto a larva apresenta uma concha
rudimentar e passa a formar mais estrutura como pé (predivéliger) para formar um
jovem mexilhão. Esta fase dura de 22 a 40 dias, dependendo, principalmente, da
92
temperatura da água do mar. A dispersão das larvas ocorre de acordo com as
correntes marinhas, os ventos e as marés. Após essa fase, o mexilhão, com a
forma mais característica, tem capacidade de procurar ativamente o substrato e se
fixar.
2.7 - Composição Bioquímica do Mexilhão Perna perna
A composição bioquímica do mexilhão Perna perna, como em muitas
espécies, varia com o sexo e a fase do ciclo produtivo em que os indivíduos se
encontram. As fêmeas, quando ovadas, tem um teor de proteínas superior ao dos
machos.
Os mexilhões, no estágio em que estão repletos de gametas, apresentam
teor protéico significativo, em torno de 10%, importante para a complementação
alimentar, conforme demonstra o gráfico 13. Este gráfico representa os
componentes químicos do mexilhão Perna perna, apresentando os teores de sua
composição química. As fêmeas possuem teor protéico em maior quantidade que
os machos, representando uma fonte de alimentos nutritiva em glicogênio,
servindo de complemento alimentar para as famílias carentes em várias regiões
do planeta.
93
10,0%
3,5%
83,0%
1,5%
2,0%
Água
Cinzas Proteínas Carboidratos Lipídeos
Fonte: Mexilhões – Biologia e Cultivo/UFSC – 1997.
Figura 13: Gráfico da Composição Bioquímica Relativa (%) Mexilhão Perna
perna.
Fonte: Mexilhões – Biologia e Cultivo/UFSC – 1997.
Nas figuras 14 e 15 salientamos a morfologia externa e externa do
mexilhão Perna perna. Entretanto, na figura 14, na morfologia externa, um ponto
importante a ser observado é o das linhas de crescimento – que representam
etapas mas ainda é desconhecida sua relação com o tempo de vida do animal.
Essas linhas são mais demarcadas em animais que sofrem estresse ambiental e,
quando em locais protegidos, são suaves ou até difíceis de serem identificadas. O
Bisso serve para se fixar no substrato e para seu deslocamento - é o ligamento
que é constituído de material com consistência fibrosa que tem a função de
manter as duas valvas unidas e o umbo, que se localiza na região anterior junto
ao vértice. As valvas ou conchas depois de desmariscadas tem se constituído
num dos grandes problemas ambientais, pois são jogados no mar ou nas
encostas dos morros.
94
Figura 14: Morfologia Externa do Mexilhão Perna perna
Fonte: Manual de cultivo do mexilhão Perna Perna/Epagri – 1994.
A figura 15 apresenta a parte interna do mexilhão Perna perna. Para a
obtenção de alimentos esses animais dependem do batimento dos cílios
branquiais, criando correntes de água do mar no seu interior e de um sistema de
seleção das partículas que serão encaminhadas ao tubo digestivo. As partículas
de alimentos são envolvidas por muco, produzido na brânquia, que selecionam e
regulam a quantidade de alimento que passa para a boca. O material ai rejeitado é
lançado ventralmente para o meio externo, sendo chamado de fezes. Estudos já
efetuados indicam que estas fezes que se depositam no fundo do mar causam
problemas ambientais com a sedimentação, principalmente quando os parques
aqüícolas são superpovoados. O que não é o caso, ainda, da área de estudo.
95
Figura 15: Morfologia Interna do Mexilhão Perna perna
Fonte: Manual de Cultivo do mexilhão Perna perna/Epagri – 1994.
2.8 - Fixação do mexilhão Perna perna
A fixação do mexilhão, especialmente o Perna perna, objeto de nossa
pesquisa, ocorre em duas etapas:
a) - Fixação Primária – O marisco se fixa em substratos, filamentos e
macios que contenham algas. Estes filamentos com algas podem ser rochas,
madeira, plásticos, nylon e outros materiais. Essa fixação depende ainda da
existência desses materiais e de uma camada de microorganismos que parece ser
96
fundamental como atrativo químico e ponto de apoio para a formação de
filamentos do bisso;
b) – Fixação Secundária – em substratos duros, considerados como a
fixação “definitiva”, embora o mexilhão seja capaz de pequenos deslocamentos ou
mesmo o total desprendimento do substrato, na tentativa de alcançar um local
com melhores condições de vida.
Uma vez estabelecidos os bancos de mexilhões, os mesmos têm
crescimento gregário como também crescimento individual. O mexilhão tem uma
capacidade dinâmica de mover-se extensivamente sobre o substrato, mesmo
após a colonização inicial. Os mexilhões, na parte superior do substrato, crescem
mais vagarosamente do que aqueles encontrados mais ao fundo. Tal fato reflete o
reduzido tempo disponível para a alimentação e a exposição ao ar durante os
períodos de baixa-mar.
Este fator provavelmente determina também a extensão vertical dos
mexilhões somente se um dos pontos for atingido onde a demanda de energia
para o metabolismo durante a exposição exceda as calorias obtidas durante o
período de alimentação. Este nível varia de um local para outro, dependendo das
condições existentes. O seu crescimento diz respeito ao borrifo das ondas e as
formas de retenção da água, características da praia, constituição das rochas, dos
sedimentos, existência de gretas de contrações, entre outros.
O nível de maré possui também uma marcante influência entre a concha e
o peso dos tecidos. O tempo de exposição ao ar influi, pois o peso da concha
geralmente incrementa seu tamanho, mas o peso do tecido diminui. Do ponto de
vista do cultivo, o conhecimento das épocas em que ocorrem os picos de fixação
primária em bancos naturais ou coletores artificiais é importante. Nestas épocas
ocorre a adaptação das larvas em estruturas coletoras e que mais tarde serão
utilizadas no cultivo, constituindo-se sementes. Ainda há outros fatores naturais
que podem influenciar no crescimento dos mexilhões como: luz, temperatura,
salinidade, exposição à poluição, grau de exposição ao ar, quantidade de
alimento, competidores e parasitas.
97
2.9 - Disponibilidade da Produção de Sementes
Segundo o Manual de Mexilhões: Biologia e Cultivo, UFSC/1997, na
mitilicultura chamam-se de semente ao jovem mexilhão que é utilizado no sistema
de engorda. O tamanho desse jovem varia dependendo do local e método de
obtenção. De maneira geral, pode-se considerar como animais entre 20 e 30 mm
de comprimento.
Existem três formas básicas de obtenção de sementes de mexilhões. A
primeira corresponde à produção em laboratório, que depois de induzida a
fecundação e criação das larvas, o estágio vai até a sua fixação. A segunda
maneira seria em coletores de sementes e, por último, extração e monitoramento
a partir de estoques naturais, como a produção em costões. Essa última forma é
regulamentada pela Portaria IBAMA nº 808 de 01/06/90, que disciplina a extração
de mexilhões em bancos naturais ou na própria estrutura montada para a
produção do molusco.
A extração a partir de estoques naturais pode trazer sérios prejuízos para
esses estoques e, conseqüentemente, para as comunidades em geral. Desse
modo, para que não ocorra prejuízo torna-se necessário o monitoramento
constante da reprodução desses animais. Um dos grandes conflitos no início da
produção de mexilhões em cativeiro aconteceu entre os produtores de mariscos e
os moradores das localidades costeiras do município. Essas comunidades tinham
nos mariscos, ostras e caramujos uma fonte de alimentos e não os encontrava
nos costões em função da extração desordenada. O produtor de mariscos em
cativeiro extraia as sementes nos costões e não se preocupava em deixar para
atender as necessidades comunitárias.
Desde a implantação da atividade, até 1990, não havia uma
regulamentação do uso de estoques naturais, quando então a Portaria nº. IBAMA
nº. 808 de 01/06/90 e, posteriormente, a Portaria IBAMA nº. 009/03-N, de 20 de
março de 2003, que em seu art. 1º. regulamentou a extração de sementes em
estoques naturais, quando disse:
98
“Proibir, anualmente, a extração de mexilhão nos costões naturais, sob
qualquer método, da espécie Perna-perna (marisco), no litoral dos estados
do Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul, no período de 01 de setembro a 30 de novembro e de
01 de janeiro a 28 de fevereiro de cada ano”.
E, ainda essa Portaria, além de limitar a quantidade a ser extraída das
sementes, por produtor, também legislou sobre a quantidade e a necessidade da
autorização (licença) do IBAMA. Essa quantidade não permite ultrapassar os 70%
(setenta por cento) da quantidade de sementes de mexilhão prevista no projeto
aprovado. Os demais 30% (trinta por cento) deverão ser conseguidos por meios
artificiais.
Estes 70% colhidos em bancos naturais, somente acontecem no momento
em que é constituído o seu parque aqüícola. Numa segunda necessidade de
sementes a quantidade normatizada diminui, passando para 40% (quarenta por
cento) em estoques naturais e 60% (sessenta por cento) artificialmente. Caso haja
o descumprimento da norma, os infratores serão penalizados de acordo com o
previsto no Decreto nº 3.179 de 21 de setembro de 1999, que “dispõe sobre a
especificação das sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas ao meio
ambiente”. E em seu art. 2º, fala sobre as infrações administrativas para aqueles
que infringem ou maculam o meio ambiente com as seguintes sanções: I –
advertência; II – multa simples; III – multa diária; IV – apreensão dos animais,
produtos e subprodutos da fauna e da flora, instrumentos, petrechos,
equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; V –
destruição ou inutilização do produto; VI – suspensão de venda e fabricação do
produto; VII - embargo de obra ou atividade; VIII - demolição da obra; IX –
suspensão parcial ou total das atividades; X – restritiva de direitos; XI – suspensão
dos danos causados.
Nem sempre estas punições, constantes do Decreto acima citado e
também da Lei nº. 9.605 de 12/02/98, conhecida como Lei da Vida ou dos Crimes
Ambientais, são respeitadas.A pena estabelecida pode chegar a até R$ 10.000,00
(dez milhões de reais) para aqueles que disseminam doenças por transferências
99
de espécies aquáticas para fins de cultivo. Mesmo assim, muitos dos maricultores,
ignorando a lei, ainda buscam nos estoques naturais as sementes para colocar
nas bolsas de cultivo. Como a fiscalização não é efetiva, fica difícil prender ou
multar os infratores. A costa catarinense tem 561,4 quilômetros de extensão para
ser fiscalizada pelos órgãos responsáveis. Além dessa dificuldade, quando ocorre
alguma apreensão, pode ser utilizado o “jeitinho” político de resolver e burlar o que
prescreve a lei. Também a prisão ou apreensão é relevada em função do
desconhecimento de alguns produtores sobre o que determina a lei. Ainda existe
uma característica muito forte na personalidade dos moradores das localidades do
município, que os levam à desobediência civil ignorando, inclusive, as leis
conhecidas.
Em conversa com produtores, alegaram que o defeso não tem sido
respeitado e que os estoques naturais sofrem de carência de sementes, tendo que
recorrer à produção artificialmente. Eles podem comprar as sementes de cultivo
de laboratório da UFSC, de estoques de outros municípios, ou ainda, importadas
do Chile, principalmente quando se trata de ostras.
Como nos explicou um pescador e produtor de mariscos, ultimamente
estava investindo mais na produção de sementes para a venda do que em
mariscos adultos para comercialização. Ao invés de esperar de 08 a 11 meses
pela produção do marisco adulto, informou que as sementes, quando prontas para
serem colocadas nas bolsas de cultivo, têm de um e meio a dois centímetros e
leva apenas dois meses para estar pronto para a venda. Portanto, prefere essa
atividade por ser lucrativa. Uma caixa de plástico com capacidade de 25 (vinte e
cinco) quilos é vendida por R$ 2,50 (dois e cinqüenta) o quilo e, nos momentos de
escassez de sementes, pode chegar a R$ 4,00 (quatro reais) o quilo.
De acordo com um extensionista da EPAGRI, se for respeitado o defeso, a
própria estrutura artificial pode alimentar os costões de sementes. Os mariscos,
depois de fecundados e alcançarem o tamanho de 20 a 30 mm de comprimento,
tornam-se livres natante, procurando um local para se fixar. Dependendo das
correntes, ventos e ondas, o pequeno marisco chega aos costões se fixando, e
dessa forma poderá aumentar os estoques. No município de Governador Celso
100
Ramos, a produção de sementes ocorre de duas maneiras: através das sementes
encontradas nos costões, figura 16, ou fixadas na estrutura de produção como
bóias, cordas de nylon, bambus, figura 17.
Figura 16: Banco Natural de Sementes em Governador Celso Ramos
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos, SC.A foto mostra uma das maneiras de obter sementes com a retirada dos costões
rochosos, utilizando instrumentos simples como facão, pedaço de madeira, cavadeira, pá e
outros.
A figura 17 apresenta uma das formas de coletar sementes artificialmente.
No caso apresentado, é feita uma estrutura de cano de PVC, e ao centro será
colocada uma rede ou cordas esticadas que com o tempo, na água, vai criando
um tipo de limo aonde as sementes de mexilhões vão se fixar. Posteriormente,
estas sementes serão retiradas e colocadas em cordas e fixadas nos espinhéis
para o crescimento. Este procedimento está se tornando corriqueiro em função da
proibição de captação de sementes em estoques naturais.
101
Figura 17 : Coletor Artificial de Sementes.
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório de Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos/SC. Esta estrutura é feita de PVC, na parte central amarra-se uma rede e é colocado
no mar para fixação das sementes.
O mexilhão Perna perna tem apresentado eliminação de gametas e
reprodução ao longo de todo o ano, tanto para animais de cultivo quanto de
costão. Os mariscos tem três picos mais intensos de eliminação de gametas: maio
e junho, setembro e outubro e dezembro e janeiro.
Os entrevistados afirmaram que, desde a implementação dos parques
aqüícolas no município, nas áreas que outrora eram de pesca predatória, como
arrastão de peixes e camarões, além do processo industrializante e aumento de
poluição, hoje se pode constatar uma recuperação do ecossistema. Muitas
espécies desaparecidas voltaram a coabitar com os mexilhões, pois como
organismos filtradores, alimentam-se de todas as impurezas que porventura
estejam nas águas, deixando o ambiente livre de contaminação. Segundo
informações obtidas, a atividade de produção de mariscos tem trazido
contribuição favorável ao meio ambiente.
102
2.10 - O Sistema de Produção do Mexilhão – Estrutura de Produção
Depois de cumpridas as exigências iniciais, como escolha do local,
legalização da unidade de cultivo, infra-estrutura necessária como barco a remo
ou a motor, estrutura para manejo (rancho ou outro local), e estrutura para
captação de sementes e engorda, além da montagem do long line (espinhel),
ocorre a construção da área de produção.
Entre os métodos de produção no município de Governador Celso Ramos o
mais utilizado é o long line ou espinhel. Trata-se do método mais indicado para
profundidades superiores há 03 (três) metros e, também, para áreas abrigadas.
Este método consiste em cabos dispostos na superfície da água, fixados nas
extremidades por “poitas”, estacas de ferro ou de concreto. Ao longo do cabo são
colocados flutuadores de plástico com tamanho entre 12 a 20 litros e,
posteriormente, penduradas as cordas de cultivo e coletores de mariscos. O
espinhel deve ficar esticado, reto, obedecendo ao sentido da direção da corrente
principal. Os tamanhos dos espinhéis são variados e dependem das condições do
local de cultivo, mas geralmente não ultrapassam a 100 metros, ficando a critério
do produtor de mariscos. As linhas mestras podem ser simples ou duplas,
amarradas paralelamente e, nas extremidades, são colocados os flutuadores,
chamados de bóias.
Abaixo, a figura 18 apresenta um long line onde são colocadas as bóias
que podem ser as industrializadas ou confeccionadas pelo maricultor com garrafas
de refrigerantes PET, para manter suspensas as cordas. Para segurar os
espinhéis usam estacas de ferro e poitas (seixos, ou seja, pedaços de rochas que
servem para segurar o espinhel na água). O correto seria utilizar estacas de
concreto.
103
Figura 18: Área de Produção long line (espinhel).
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório de Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos/SC.
Depois de montada a estrutura de produção, ou seja, o espinhel, começa
outra etapa, que implica na colocação das cordas com as bolsas de sementes,
que devem ficar distantes uma da outra acima de cinqüenta centímetros de
distância. Estas bolsas são feitas de restos de redes, figura 19, doadas por
mestres de embarcações de grande porte ou compradas em casas
especializadas, o que é raro. No caso de fabricação caseira, as redes que formam
as bolsas são cortadas com 1,50 a 2,00 metros de comprimento e 20 centímetros
de diâmetro, sendo costuradas nas laterais e no fundo formando um tubo,
mantendo o mesmo tamanho e padrão das compradas no comércio.
104
Figura 19 – Pedaços de Redes de Pesca usados para fazer Bolsas.
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório de Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos – SC.
Após a colheita da semente nos vários locais, conforme citamos
anteriormente, as mesmas são colocadas através de um pedaço de cano de PVC
embutido na abertura da bolsa. Colocada a semente e amarrada, a corda é presa
no espinhel para crescimento e engorda , conforme apresenta a figura 20.
105
Figura 20: Corda com sementes prontas para ser colocada no espinhel.
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório de Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos/SC.
O preenchimento dessas bolsas pode ocorrer em qualquer local como na
praia, no barco do produtor, na sua própria casa ou ainda em seu próprio rancho
de canoas. Percebemos a falta de cuidado com a questão da contaminação que o
ambiente pode causar a essas sementes.
Durante o período em que as bolsas estão na água, há a necessidade de
cuidados como a visitação ao local, que por vezes ocorre diariamente. A visita
deve ser mais constante quando o marisco está crescido, para efetuar sua
limpeza. Muitas parasitas e algas se agregam à produção e torna-se necessário
extraí-las. A retirada destas possibilita que o marisco cresça sem sofrer ataques
dos predadores naturais, (figura 21).
106
Figura 21: Acompanhamento do Crescimento do marisco e retirada dos
predadores naturais.
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório de Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos/SC.
Alguns maricultores freqüentam diariamente a área de cultivo; outros
informaram que visitam de duas a quatro vezes por semana, mas que, próximo à
colheita, as idas se intensificam, perfazendo um total de 04 a 08 horas por dia.
Estas idas ao parque aqüícola se fazem necessárias para acompanhamento das
bolsas no sentido de retirar os predadores que se alimentam dos mariscos,
evitando dessa forma uma grande perda. Uma área maior necessita de cuidados
mais intensos até que os mariscos estejam prontos para comercialização, figura
22.
107
Figura 22: Bolsa de mariscos pronta para comercialização.
Fonte: Foto cedida pela EPAGRI – Escritório de Canto dos Ganchos – Governador Celso
Ramos/SC.
2.11 – Custos da Implantação da Estrutura da Produção
Os custos dos módulos de estrutura de cultivo são determinados pela
quantidade de alças de mexilhões, capaz de ser administrado por um único
produtor. Como exemplo usaremos um sistema de produção suspenso – flutuante
do tipo espinhel (long line) com cinco linhas mestras de 100 metros de
comprimento cada uma, com espaços entre si de 10 metros de largura, somando
5.000 m
2
, com dados expressos na tabela 15.
Na tabela 12, os produtos apresentados são fáceis de ser encontrados.
Mas para o pequeno produtor, dependendo da área de produção, isso pode se ter
um custo elevado. Alguns materiais, ao longo do tempo, necessitam ser
substituídos, principalmente as redes tubulares e as luvas.
108
Tabela 12: Custo de produção de um módulo de Mexilhões com 5.000 m
2
Sistema “long line”.
Material Implantação Valor Reposição Valor
Estacas de PVC e concreto 12 360,00 - -
Cabos poliuretano trançados 25 m
m
100 kg 700,00 20% 140,00
Cabos poliuretano 41 mm 200 kg 140,00 20% 28,00
Corda poliuretano trançada 10 mm 30 kg 210,00 20% 42,00
Rede tubular externa (**) 1500 m 750,00 20% 150,00
Rede tubular de algodão (***) 20 kg 90,00 100% 300,00
Bombonas plásticas 100 lt 10 um 40,00 20% 8,00
Bombonas plásticas 20 lt 125 unid. 437,50 20% 87,50
Luvas (*) 20 pares 60,00 100% 60,00
Total 2.997,5
0
815,50
Fonte: Pólo de Maricultura do Estado de Santa Catarina/EPAGRI.
(*) a reposição é constante, pois as luvas usadas são confeccionadas em algodão.
(**) Pode ser reaproveitada caso na hora de despencar os mariscos o faça com cuidado.
Senão é substituída a cada 8meses.
(***) Sempre será substituída no período de colocar as bolsas no mar.Os demais materiais
dentro dos percentuais indicados são repostos a partir do quinto ano de produção.
Neste orçamento apresentado, estima-se que cada corda em média
produzirá em torno de 15 (quinze) a 20 (vinte) kg de mexilhões, num total de
15.000 (quinze mil) kg/ano. Se o produto for comercializado “in natura”, ao preço
de R$ 1,50 (um real e cinqüenta centavos) a R$ 2,00 (dois) o quilo, obteria uma
renda bruta de R$ 7.500,00 (sete mil, quinhentos reais), não levando em conta a
perda de produção, que pode chegar até 15%, ocorrida por intempéries climáticas
ou, conforme queixas dos produtores, por roubos.
Além dos materiais citados na tabela 15, outros instrumentos de trabalho
são necessários para complementar a atividade da maricultura. Relacionamos os
mais importantes, bem como o preço médio levantado em junho de 2005,
expresso na tabela 13.
109
Tabela 13: Outros materiais utilizados na produção de Mariscos.
Materiais
Unidade
Preço
Unitário
Preço
Total
Barco a remo (bateira) 01 500,00 500,00
Barco a motor tipo (bateira) 01 5.000,00 5.000,00
Caixas Plásticas 05 15,00 75,00
Fogão a lenha 01 150,00 150,00
Fogão a gás metano (tipo industrial com
duas bocas)
01 350,00 350,00
Panelões de alumínio 50 litros 02 150,00 300,00
Roupas plásticas 01 120,00 120,00
Sacos plásticos para embalagens 4.500 0,05 88,50
Tanque ou pia de concreto 01 70,00 70,00
Jato de água tipo doméstico 01 450,00 450,00
Total 7.103,50
Fonte: Dados coletados em 2005 no comércio de Florianópolis.
Dos entrevistados, cerca de 70% possue barcos a motor e 30% barco a
remo. Os proprietários de barco a motor gastam em média R$ 100,00 (cem reais)
a R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais) por mês de combustível, dependendo dos
dias em que o maricultor vai até a área de produção. Quando o motor for óleo
diesel, os gastos podem ser reduzidos. No caso do maricultor não possuir barco a
motor ou a remo, que representa menos de 0,01 dos maricultores, eles usam
emprestado de um amigo ou de um familiar.
Um dos instrumentos necessários para carregar os mariscos da praia até o
rancho ou a sua casa, são as caixas plásticas que nem sempre são compradas.
Elas vieram substituir os balaios feitos de cipó e taquaras de bambu. Dificilmente
compram, pois recebem como doação por parte dos donos de barcos de pesca
que durante o ano aportam nas localidades. O cozimento dos mariscos pode
ocorrer numa edícula no rancho de canoa em fogão a lenha ou gás metano. A
prática do fogão a lenha é mínima. Constatamos é 95% (noventa e cinco por
cento) dos entrevistados usam o fogão a gás. Quando usa fogão a lenha, o
combustível é sempre resto de pedaços de madeira da construção civil.
110
Alguns possuem panelões de alumínio comprados no comércio. Outros se
utilizam tambores de 200 (duzentos) litros de óleo diesel, cortados ao meio e
usam como panelões. Quase sempre esses tambores são conseguidos em postos
de gasolina ou, se comprados, os valores não são expressivos. Para lavar e
escovar os mariscos usa um tanque de concreto, do tipo tanque de lavar roupas.
Uma pequena quantidade 10% (dez por cento) utiliza os jatos de água a motor
para lavagem e escovação dos mariscos. A limpeza normalmente é efetuada
manualmente, com escovas de aço.
Os locais para processar a produção, pode ser o rancho de canoa, a sua
própria residência, ou ainda uma edícula muito comum na casa dos pescadores.
Com a montagem da estrutura, o maricultor faz seus arranjos para tentar diminuir
seus gastos. Também nos materiais necessários empregados para a sua
atividade o produtor usa a criatividade. Sempre procurando diminuir o desembolso
de dinheiro.
2.12 - Retorno Financeiro
Como já citamos na introdução, tivemos dificuldades em precisar com
exatidão os valores de ganhos com a atividade de pesca e maricultura. Ao
entrevistarmos os maricultores, um dos itens perguntado foi: quantas bolsas de
mariscos o senhor tem implantado na marisqueira. Portanto, tabela 14,
expressamos em valores as informações prestadas pelos maricultores com
relação à quantidade de bolsas por produtor que podem não apresentar a
realidade.
Tabela 14: Produção de bolsas de mariscos produzidos por localidades no
município – dados coletados com os entrevistados.
Número de
Entrevistados
Localidade Número de
Produtores
Quantas bolsas
possuem
Valor geral
25 Ganchos do Meio 01 1.500 1.500
01 1.180 1.180
01 800 800
04 200 800
111
04 400 1.600
12 500 6.000
01 50 50
01 50 p/consumo 50
17 Canto dos Ganchos 01 1.500 1.500
01 800 800
02 400 400
05 200 1.000
03 300 900
05 Não respond. Não respond.
40 Ganchos de Fora 02 1.000 2.000
08 800 6.400
24 600 14.400
05 400 2.000
01 (*)30 30
09 Calheiros 02 500 1.000
02 700 1.400
01 800 800
02 1.000 1.000
02 2.000 2.000
03 Palmas 01 500 500
01 800 800
01 1.500 1.500
04 Armação da piedade 01 1.600 1.600
01 500 500
02 400 800
03 Costeira da Armação 01 1.000 1.000
01 800 800
01 700 700
45 Fazenda da Armação 01 5.000 5.000
02 3.000 3.000
01 1.500 1.500
05 1.000 1.000
20 600 12.000
03 500 1.500
02 300 600
01 60 60
146 08 137 - 80. 470
Fonte: Pesquisa elaborada no período de Janeiro/fevereiro de 2005.
(*) Começou a plantar mariscos em 2005. Está em experimento.
112
Partindo dessa premissa e conversando com alguns maricultores,
perguntamos quem era o maior produtor de mariscos da localidade e do
município. Eles responderam que se tratava do produtor (A), proprietário de 3.000
(três mil) a 5.000 (cinco mil) cordas de mariscos na água. O produtor (A), ao ser
entrevistado, afirmou que suas cordas não passavam de 2.000 (duas mil). Assim,
com as informações desencontradas, ficamos com dificuldade em mostrar uma
contabilidade com dados confiáveis. Posteriormente, através de informações do
extensionista EPAGRI, ficamos sabendo que o produtor (A), tinha 5000 (cinco mil)
bolsas de mariscos nos long line.
Considerando que o Produtor (A) em 2005 possua mesmo 3.000 (três mil)
cordas de mariscos com 15 quilos cada, e o preço de venda com o menor preço
pesquisado, R$ 1,50 (um real e cinqüenta centavos) “in natura”, terá no final safra
de 45.000 (quarenta e cinco mil) quilos de mariscos o valor na venda da produção
de R$ 67.500,00 (sessenta e sete mil e quinhentos reais). Entretanto, não
estamos levando em consideração as perdas da produção por predadores
naturais; perdas no período em que ocorre a colheita por manejo inadequado, ou
ainda as intempéries climáticas, que podem chegar a 15%. Contabilizamos uma
produção de mariscos, cuja área do Produtor (A) produziu em nove meses 45.000
(quarenta e cinco mil) quilos, e teve um resultado bruto de R$ 67.500,00 (sessenta
e sete mil e quinhentos reais), conforme tabela 15.
Tabela 15 : Apuração de resultado – Produção in natura -2005.
Quadro de
vendas/custo
Margem de
contribuição
Despesas
Resultado
Líquido
3000 cordas com 15 quilos cada
a
custo de R$ 1,50 o quilo
67.500,00
Gasolina/Diesel (*) 150,00
Mão-de-obra 100,00
Total 67.500,00 250,00 67.250,00
(*) Média entre o preço da gasolina e óleo diesel.
113
O marisco processado custava, em 2001, em torno de R$ 2,50 (dois reais e
cinqüenta centavos) a R$ 3,00 (três reais) o quilo. Em 2005, quando voltamos a
campo, pesquisamos os preços do marisco desmariscado, e teve um aumento
médio nestes últimos anos de 250% (duzentos e cinqüenta por cento), ficando o
preço do produto entre R$ 6,00 (seis reais) a R$ 8,00 (oito reais). Para produzir
01(um) quilo de marisco limpo (desmariscado) são necessários uma média de 05
(cinco) quilos de mariscos com casca. Se o marisco for vendido ao menor preço,
R$ 6,00 (seis reais) o quilo, a produção de 45.000 (quarenta e cinco mil) quilos do
produto chegaria a 9000 (nove) quilos de mariscos processados, conseguindo um
ganho médio de R$ 54.000,00 (cinqüenta e quatro reais). Tabela 16.
Tabela 16: Apuração de resultado – Produção desmariscado
Quadro de
vendas/custos
Margem de
contribuição
Despesas
Resultad
o
Líquido
3.000 cordas com 15 quilos cada ao custo de
R$ 6,00 o quilo
54.000,00
Gás metano 2,1/2 botijões – R$ 35,00 80,00
Combustível vegetal – lenha 10,00
Gasolina/óleo diesel - média 150,00
4.500 sacos plásticos p/embalagens 88,50
Contratação de mão-de-obra temporária (*) 1.350,00
Gelo 30 cx. De 25 kg a R$ 5,00 cada 150,00
Total 12.600,00 1.828,50 52.111,50
(*)Contratação de mão-de-obra temporária de 03 (três) pessoas ao custo de R$ 1,50 por
quilo de marisco descascado. No caso 3.000 quilos de marisco cada uma.
Entre os produtores entrevistados, cerca de 95% utilizavam mão-de-obra
familiar. A produção vem sendo efetuada pela família, e os ganhos são usufruídos
por todos, segundo as suas necessidades. Utilizam muito pouca mão-de-obra de
terceiros, 5% no processo de desmariscar o mexilhão. Os produtores reclamaram
do preço cobrado por quilo de marisco limpo (desmariscado), que equivale a R$
1,50 (um real e cinqüenta centavos), como também a mão-de-obra disponível é
escassa, por ser utilizada na sua própria produção não ficando disponível para
114
trabalhar com outros produtores.Também esse membro da familia pode se inserir,
às vezes, em outras atividades como no comércio, turismo, etc.
2.13 – Agregação de Valores na Maricultura e Tributação
Até o momento do término de nosso trabalho, a produção de mariscos era
vendida diretamente para comerciantes de várias cidades. A comercialização, no
período de verão, época em que os moluscos estão com ótimo rendimento de
carne e quando o afluxo dos turistas é intenso, são vendidos a proprietários de
restaurantes, hotéis, bares, peixarias, tanto do Município como do Distrito de São
Miguel (Biguaçu). O município chega a absorver 20% da produção,
aproximadamente. Além disso, fornecem para as indústrias instaladas no Distrito
de Santa Luzia (Tijucas); para a AMAREPESCA, situada no município de Imaruí,
que, leva ao mercado paulista o produto desconchado e para a MOLUSKUS
LTDA, localizada na Praia do Sonho, município de Palhoça, onde os cooperados
estão fazendo um convênio com uma empresa norte americana. O Mercado
Público de Florianópolis tem sido um dos grandes compradores de mariscos
produzidos em Governador Celso Ramos. A maior peixaria do mercado informou
que, no verão, chega a comprar 400 (quatrocentos) quilos por semana. As outras
peixarias informaram que compram de 250 (duzentos e cinqüenta) a 300
(trezentos) quilos por semana, e que, no inverno, estes valores baixam, pois a
procura pelo marisco é menor, ficando em torno de 150 (cento e cinqüenta) quilos.
Outras cidades, tais como Balneário de Camboriú, Itapema, Itajaí,
Blumenau e Joinville, também compram os mariscos produzidos no município.
Alguns intermediários fazem com que o produto chegue a outros municípios do
Estado de Santa Catarina, bem como a outros estados brasileiros. Eles adquirem
o produto e vendem clandestinamente para os principais mercados como Curitiba,
São Paulo e Rio de Janeiro. Ressaltamos que o mercado regional não consome a
produção total na forma de mexilhão vivo (mariscado). Parte dessa produção de
mariscos é vendida desmariscada sendo fresca ou gelada. Um dos problemas da
comercialização do marisco deve-se ao fato de que não há indústria que beneficie
o produto no município. O produto tem um tempo muito curto de prateleira, de 3 a
115
5 dias, o que exige um esquema de distribuição extremamente ágil e muito bem
organizado, que até o momento não existe. Desta forma, o maricultor desmarisca
o mexilhão em sua propriedade, em condições precárias, utilizando muita mão-de-
obra familiar ou contratada. Fazem isso contra a vontade, pois como nos foi
informado por boa parte dos produtores, preferem vendê-los em concha. O
produto não possui inspeção federal, impossibilitando a exportação e a colocação,
legalmente,em outros Estados. Isto vem ocorrendo através de atravessadores.
Como vimos, toda a produção é vendida a intermediários que vão agregar valores,
em prejuízo do produtor. Somente a partir do funcionamento da estrutura física de
beneficiamento dos moluscos é que os órgãos oficiais, como a Vigilância Sanitária
e o Serviço de Inspeção Federal - SIF, darão autorização ao produtor cooperado,
para que possa exportar sua produção bem como colocar no mercado nacional.
Desse modo agregará valor e aumentará sua renda, acabando por fim com o
mercado atravessador.
As alíquotas do imposto, nas operações de venda das mercadorias no
Estado de Santa Catarina e na entrada de produtos interestaduais, correspondem
a 17%, em relação a tudo que compramos e consumimos. Com relação à
atividade artesanal familiar da maricultura, o Ministério da Agricultura e do
Abastecimento firmou com os estados o convênio ICMS 60/91,121/95 e 23/98,
isentando de tributação os moluscos, desde que comercializados no estado
natural, resfriado ou congelado.
Desse modo, o maricultor pode usar a Nota Fiscal de Produtor, mas são
poucos os que os fazem. Com a nota emitida, haveria o recolhimento do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias - ICMS, retornando em benefícios aos cofres do
município. Como os produtores de marisco não tem essa praxe por serem isentos,
o imposto acaba por ser recolhido à cidade ou município onde o intermediário
comercializa. Outro fato a considerar nesta pesquisa, quanto à nota de produtor, é
que o fato de o maricultor não usar a nota tem impedido a comprovação de sua
renda, muitas vezes dificultando a obtenção de empréstimos junto às instituições
financeiras para melhorar seu parque aqüícola produtivo. Entretanto, essa falta de
interesse também está atrelada ao descaso dispensado pelo poder público
116
municipal aos produtores, não levando em consideração o potencial econômico
que poderia trazer dividendos aos cofres públicos.
Como não há o recolhimento direto do imposto, o município de Governador
Celso Ramos tem usufruído o ICMS, por recolhimento indireto com o que os
maricultores e sua família consomem nos supermercados, farmácias, lojas de
conveniências, lojas de materiais de construção, lojas de revenda de motos, lojas
de roupas entre outros. Assim, a arrecadação é feita através do consumo dos
produtos comercializados no município.
117
3 - A PLURIATIVIDADE NA PESCA E MARICULTURA
EM GOVERNADOR CELSO RAMOS
3.1 – O Caráter Pluriativo da Pesca e Maricultura Artesanal
Atualmente existe um consenso na literatura especializada de que
existem diversas atividades econômicas nos espaços de produção artesanal.
Segundo SCHNEIDER, (1999), a literatura sobre a discussão de agricultura em
tempo parcial e concomitantemente a pluriatividade encontra-se difundida nos
países desenvolvidos, e que seu estudo já ocorriam nos anos 1930,
principalmente pelos economistas americanos, que atuavam nos land grand-
colleges. Neste caso é o estudo dos sistemas de expansão rural estatal que se
desenvolveu nas pesquisas agropecuárias nos campos norte americano. Os
estudos tinham os formatos tecnológicos pela maneira como treinavam os seus
recursos humanos. Ainda coloca que o mesmo ocorreu com a terminologia
pluriactivité na Europa, onde os técnicos e organismos públicos franceses vem
utilizando para caracterizar as propriedades rurais que possuem múltiplas
atividades.
No Brasil o assunto pluriatividade é bem mais recente e SACCO DOS
ANJOS, (2001, p. 55) argüiu sobre o assunto:
“É sobretudo a partir da segunda metade da década de 1990 que o
tema “agricultura familiar” passa a constituir-se em matéria obrigatória
presente, tanto no plano das agendas de pesquisa institucional, como
no âmbito das propostas dirigidas ao desenvolvimento da agricultura e
do mundo rural do Brasil. Neste sentido, a própria criação do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) surge
como corolário de um amplo
debate nacional, que repercute tanto do
ponto de vista eminentemente acadêmico quanto político e
institucional”.
Desse modo tem sido percebido no Brasil quanto em Santa Catarina,
novas formas de relações no campo que vem criando novas integrações nas
118
relações de trabalho. Famílias que se dividem nas atividades artesanais
familiar e nas unidades de produção industrial. Neste caso MATTEI (1999)
(resumo), argumentou a respeito do dessa forma de relação no campo:
“Este processo gera novas dinâmicas técnico-produtivas que causam
fortes impactos sobre o mundo do trabalho rural. Por outro lado, a
modernização e a integração produtiva elevaram a produtividade do
trabalho liberando mão-de-obra no interior das famílias. Por outro,
aumenta o número de agricultores e de seus familiares ocupados em
atividades que não estão mais diretamente relacionadas à
agricultura”.
Assim sendo, tanto na agricultura familiar bem como na produção
familiar da pesca e maricultura, as relações de trabalho familiar vêem
ultrapassando a esfera do mundo agrícola e o mundo das atividades que se
desenvolvem no mar. Por sua vez, não podemos mais reduzir este estudo a
uma única função, que inicialmente era de produzir alimentos. Entretanto,
impõem-se as necessidades de se fazer algumas análises das dimensões que
ultrapassam essas atividades especificamente de produção artesanal familiar.
O estudo sobre a pluriatividade somente pode ser tornar relevante a
partir das pesquisas das atividades de trabalho das famílias que produzem
artesanalmente e a suas relações com as demais funções as atividades
formais de trabalho. O que na agricultura familiar esta diretamente atrelada as
agroindústrias como coloca SCHNEIDER (1999), no caso: Agricultura familiar e
industrialização: Pluriatividade e descentralização industrial do Rio Grande do
Sul, e com outras atividades institucionalizadas. Na pesca e na maricultura, as
atividades artesanais familiar estabelecem sua relação de trabalho com a
indústria além do turismo, comércio e o setor de serviços. Assim sendo
segundo MATTEI (1999), “surgem as famílias pluriativas”, que combinam
atividades agrícolas com atividades não-agrícolas, tanto dentro como fora de
suas propriedades.
Desse modo, como na agricultura, a idéia que fundamentou a
modernização da pesca era de que sua industrialização levaria
119
necessariamente ao desenvolvimento do espaço em estudo. Desse modo, o
crescimento das atividades da pesca seria o resultado obtido mediante
implementação de políticas públicas que incentivassem a sua modernização. A
partir da década de 1960, o desenvolvimento da pesca no Brasil passou a ser
pensado em termos de eficiência dos sistemas técnicos de produção
pesqueira. Esses sistemas tecnológicos estavam baseados no uso intensivo
dos fatores de aumento da produção, principalmente para exportação. Para
tanto, foi necessário o uso da força das máquinas em detrimento da força de
trabalho humano. Foram utilizadas tecnologias como radares, sonares para
localização de cardumes, aumento das potências dos motores com alcance
maior para os dias de pesca em alto mar e outros petrechos.
Conseqüentemente visavam conformar economias de escalas cujos objetivos
eram a obtenção de uma produção constante, com a massificação da alta
competitividade na produção pesqueira.
Neste sentido, faz-se necessário uma análise da articulação entre o
espacial e sócio-econômico, o que vem revelando alguns elementos
importantes das novas funções do espaço pesqueiro. As articulações ocorrem
por um lado pela forma e intensidade do uso das técnicas que foram
empregadas na produção da pesca industrial. Por outro lado, pelo intricamento
das práticas sociais que se inserem com a modernidade alterando
sobremaneira as relações culturais e econômicas do município de Governador
Celso Ramos.
Segundo Gama, (1978), o espaço assume uma dimensão importante
nas transformações sócio-econômicas, principalmente quando se trata dos
recursos, e ainda como elemento simbólico. Neste sentido, a relação entre a
sociedade e espaço pode se expressar através de três aspectos básicos: nas
estratégias de sobrevivência criadas pelos atores sociais, na maneira como se
processou a produção e, por último, no uso do próprio espaço que se
transformou na medida em que as técnicas da pesca industrial foram
introduzidas.
120
Em Governador Celso Ramos essas transformações se processaram da
seguinte maneira:
a) a implementação da indústria pesqueira gerou uma demanda os meios
de transportes, permitindo o acesso aos locais de trabalho e aos
mercados consumidores, com a criação de infra-estruturas como
estradas, linhas de ônibus, etc;
b) a chegada da energia elétrica, alterou as relações produtivas das
comunidades pesqueiras com o mundo exterior;
c) a implementação dos meios de comunicação, em especial com a
chegada do telefone e dos sinais de televisão, que influiu na vida cultural
das comunidades pesqueiras;
d) a expansão rápida das novas técnicas provocaram mudanças
substanciais diretas, influenciando o espaço produtivo pesqueiro. E
também outras atividades econômicas no município.
Neste contexto, algumas empresas industriais se instalaram em
Governador Celso Ramos visando reduzir principalmente o custo e
aproveitando a disponibilidade da mão-de-obra existente. Esse movimento teve
uma outra conseqüência, pois com a infra-estrutura instalada para a pesca,
redimensionou outras atividades decorrentes das características físicas do
município, tais como baías, enseadas e praias. Uma dessas atividades é o
turismo, com seus hotéis e restaurantes, além do crescimento do comércio
para atender essa nova demanda.
Dessa maneira, a pesca e outros setores surgiram cerzidos através
das diversificações do mercado de trabalho que foram surgindo ao longo das
últimas décadas e que tem congregado toda a família na produção em busca
pelo aumento da renda. Por isso, não é mais possível delimitar o espaço de
produção de Governador Celso Ramos, pelos critérios das relações de pesca e
maricultura artesanal e pesca industrial, sem analisarmos as relações com as
atividades não artesanais. Com isso, o intricamento dessa sociedade pesqueira
deve suas transformações também ao crescimento de outras atividades,
através de novas oportunidades de trabalho para os pescadores e maricultores
121
e suas respectivas famílias. Também não podemos deixar de ressaltar as
indústrias que se instalaram nos municípios de Biguaçú e Tijucas, hotéis e
restaurantes em Florianópolis que tem buscado mão-de-obra na atividade de
pesca e maricultura, regionalizando as atividades.
Entendemos também que a continuidade da pesca artesanal e
maricultura não podem mais ser explicado apenas pelo defeso, ou mesmo pela
desobediência civil deste defeso. Torna-se necessário perceber conjunto de
novas atividades não artesanais que se inseriram na pesca e maricultura e que
vem respondendo cada vez mais pela dinâmica populacional em Governador
Celso Ramos. E isto nos leva a um outro ponto. Mesmo com as atividades não
artesanais reordenando o mercado de trabalho, como aconteceu com a
indústria pesqueira gerando novas técnicas produtivas e causando forte
impacto sobre a atividade, ainda é premente o trabalho familiar na pesca e
maricultura no município.
Por outro lado, a diversificação das atividades em direção ao setor de
serviços ( comércio, turismo) tende a provocar um crescimento nos índices de
informalização do trabalho artesanal, o que MATTEI (1999, p. 2), diz o seguinte
a respeito das relações no campo:
“Na verdade, as diferenciações dos processos econômicos e sociais
locais e regionais conduzem a uma heterogeneidade muito grande do
uso da terra e da ocupação do território rural. Com isso, essas novas
formas de utilização do espaço rural provocam a desarticulação
dos
laços tradicionais da agricultura enquanto uma atividade
soberana no
mundo rural fazem emergir formas diversificadas de produção, que vão
desde a produção agrícola até um conjunto de atividades relacionadas
aos serviços de lazer, proteção ambiental e industrialização dos
produtos agropecuários”.
Tal fato tem se traduzido em um aumento do número de pescadores e
maricultores com seus familiares que vem se ocupando em atividades que não
estão mais diretamente relacionadas à produção pesqueira. Surge daí as
famílias pluriativas, as quais passam a combinar as atividades da pesca e
122
maricultura com as atividades formais, tanto interno como externamente ao
município, trabalhando em cidades próximas.
Como vimos este processo tem possibilitado as famílias que trabalham
na atividade artesanais de pesca e maricultura, conjugar vários papéis, dando
aos seus membros um duplo caráter como o de empregado e de trabalhador
por conta própria. Neste caso, os trabalhos artesanais e a pluriatividade não
são, como coloca MATTEI (1999) um resíduo, mas um fenômeno. Assim,
podemos considerar que as atividades estudadas estejam diretamente
intricadas aos processos de desenvolvimento que tem se inserido cada vez
mais nas localidades pesqueiras do município.
Como já argüimos, nas últimas décadas, o debate sobre a
pluriatividade nos países desenvolvidos tem sido analisado por uma série de
questões, as quais estão diretamente relacionadas às novas funções da
atividade familiar artesanal rural. Desse modo, estamos nos apropriando desse
debate para explicar as relações de trabalho familiar artesanal da pesca e
maricultura com as atividades formais do mercado. Esta discussão vem
acontecendo de forma a explicar as novas funções do rural e as relações
técnico-produtivas, que redimensionam o papel dos atores sociais rurais, em
especial dos artesanais, considerando a inserção da família nas atividades
formais.
Um dos elementos desta discussão é a diversidade de relações com
que os processos de trabalho artesanal vêm englobando a noção de
pluriatividade. Concordamos com CARNEIRO, (1996), que emprega o termo
pluriatividade como uma noção ampla, onde os processos sociais distintos
encontram-se referenciados aos contextos sócio-econômicos que ao longo do
processo histórico onde foi gerado. Neste caso, a pluriatividade pode ser
utilizada para analisar a reestruturação ocorrida no setor técnico-produtivo e as
mudanças que se processaram no mercado de trabalho dos pescadores e
maricultores a partir do processo da modernização da atividade pesqueira na
década de 1960. A partir de sua industrialização no pós-guerra e das
alterações que se processaram nos sistemas econômicos. E ainda, conforme
123
BLANC (1987, p.89-109), que considera a pluriatividade como um rearranjo do
setor agrário e as transformações provocadas no setor macroeconômico
e nas
relações macrosociais, em que as famílias têm procurado diversificar suas
fontes de rendas, diversificam suas atividades e com isso, aumentando sua
jornada de trabalho nas atividades formais.
Neste caso, as economias de mercado aonde as unidades familiares
vêm se inserindo tem aparecido como um dos elementos decisivos para a
pluriatividade. Contudo, o fenômeno não é novo e o clássico CAHYANOV
(1974), no início do século passado, estudou o que vinha acontecendo com os
agricultores russos. O autor (1974, p. 117), com respeito as unidades familiares
que se inserem em outras atividades não agrícolas, argumentou o seguinte:
“Hemo señalado que la feurza de trabajo de la família, al no encontrar
ocupación em la empresa agrícola, se vuelva a lãs actividades
artesanales y comerciales. Es muy importante estabelecer si la
insificiencia de tierra y la feurza de trabajo campesina hacia esas
actividades. Em otras palabras, debemos explicar qué determina
quantitativamente la división del trabajo campesino entre ofícios no
agrícolas y trabajo agrícola”.
Assim, a mecânica das forças externas que vem redefinindo o contexto
em que a família toma suas decisões e determina suas estratégias de
produção. Sua teoria tem se baseado entre o trabalho e consumo e dos
aspectos e das diferenças especificamente demográficos. Cada local tem suas
especificidades próprias e combinam relações diferenciadas. Para o
pensamento marxsista as formas contemporâneas influenciam os sistemas
econômicos global que aparecem como para explicar as forças que se
oponham à reprodução de toda e economia mercantil simples.
Neste trabalho em que investigamos a organização interna da
exploração da pesca e maricultura familiar, não podemos tratar das condições
que determinam o nível de produção do trabalho, posto que não dependem dos
fatores da unidade familiar, mas sim das novas relações de trabalho que estão
se inserindo. Por isso, a explicação das formas contemporâneas da
124
pluriatividade encontra-se amparada na reestruturação das formas capitalista e
na mudança dos cenários econômicos e nas relações sociais que ocorrem,
locais específicos, pelas suas especificidades. Desse modo podemos definir a
pluriatividade como uma mecânica que se caracteriza em um espaço definido
com atores próprios que definem seu espaço sócio econômico. Entretanto, a
pluriatividade mesmo que dentro de um processo capitalista, não deve ser
definido como um processo globalizador, mas analisado do ponto de vista de
cada sociedade, de cada relação e do estágio em que se encontra a produção
familiar.
Desse modo, a pluriatividade gera uma ocupação da mão-de-obra,
abrindo novas fontes de rendas e faz subsumir diante de si os demais termos
que vem procurando descrever este fenômeno, como apresenta SCHNEIDER,
(1999, p. 180):
“As diferenças etimológicas devem-se ao fato de que antes da metade
dos anos 70 poucos pesquisadores, técnicos de governo, políticos e
representantes dos agricultores aceitavam a idéia de uma agricultura a
part-time ou de uma agricultura não profissional (full-time), como
preferem os franceses”.
E o autor ainda salientou que as autoridades governamentais
pensavam em relação à agricultura em tempo parcial, colocando que se
apresentavam como um
obstáculo à modernização produtiva das unidades agrícolas. Foi
partir da década de 1980 que o termo pluriatividade passou a tomar corpo no
campo das ciências sociais, isto porque o estudo de agricultura em tempo
parcial limita a sua análise. Desse modo, não se pode ignorar por completo as
demais atividades e o envolvimento dos membros dessas nas demais
atividades que compõem o contexto familiar. Dessa forma, a pluriatividade
passou a compor as discussões no âmbito dos governos, bem como assunto
de interesse de estudiosos das academias de ciências, principalmente por se
tratar do envolvimento das atividades produtivas familiares artesanais nas
atividades formais do mercado de trabalho.
125
Esta passagem das designações acima para a noção de pluriatividade
foi marcada por importantes discussões acadêmicas. Na Europa,
especialmente na França, a partir de 1970; nos Estados Unidos, com BUTTEL
(1982); e tem tomado corpo no Brasil a partir da década de 1990, com
SCHNEIDER (1994) e, em Santa Catarina, DOS ANJOS (1995), MATTEI
(1999); entre outros. Entretanto, tem se discutido o processo de transição
desse conjunto de famílias pluriativas, buscando entender o sentido da
inserção dos trabalhadores artesanais no mercado de trabalho industrial, lazer
entre outras atividades, sem perder sua condição de produtor artesanal seja na
agricultura seja na pesca e na maricultura, caso de estudo nesta pesquisa.
No Brasil, vale ressaltar que o tema pluriatividade vem aprofundando
seus estudos a partir do Programa Nacional de Fortalecimento Familiar –
PRONAF, primeiramente a agricultura, e posteriormente a pesca artesanal
como forma de resgatar a dignidade dessas comunidades e oferecendo-lhe
oportunidades de buscar financiamentos para aumentar a produção.Este
assunto tem levado pesquisadores a debater o assunto e entender essas
relações do trabalho artesanal e seus resultados com as atividades do mercado
formal que a princípio, trata-se da busca de complemento de renda e inclusão
social.
3 . 2 - A Evolução das Ocupações não Formais da Pesca
As transformações que se processaram ao longo das últimas décadas
levaram a população economicamente ativa de Governador Celso Ramos/SC a
se transferir das atividades de agricultura para as atividades da pesca,
conforme mostram os dados da tabela 17. O período compreendido entre os
anos de 1960 a 1980, que se caracterizou com a ascensão e decadência da
atividade industrial pesqueira, e, posteriormente, em 1990, com a chegada da
maricultura e as atividades do mercado formal como as indústrias, comércio e
os serviços. A industrialização da pesca, ocorrida a partir da década de 1960,
foi notável e colocou o município como um dos mais importantes em termos de
126
produção de alimentos, disputando mercados com outros municípios do litoral
de Santa Catarina.
Tabela 17: Evolução da População de Governador Celso Ramos, segundo
situação de domicílio.
Ano Total Urbana Rural Total Urbana Rural
1960 4.107 2.342 1.765 100,00 57,02 42,97
1970 7.521 3.957 3.564 100,00 52,61 47,39
1980 7.814 4.317 3.497 100,00 55,25 44,75
1991 9.629 7.472 2.157 100,00 77,60 22,40
1996 10.864 7.869 2.995 100,00 72,43 27,57
2000 11.598 10.842 756 100,00 93,48 6,52
Fonte: FIBGE – Censo Demográficos, vários anos.
O aumento populacional nas localidades litorâneas do município ocorrido
nas últimas décadas foi inegável, tendo em vista os processos migratórios da
agricultura. Ao longo do tempo foram se formando aglomerados populacionais
e ocupando as encostas. A partir de então, conjuntamente com outros
municípios próximos à Capital do Estado, passou a formar a Grande
Florianópolis – GRANFOPOLIS. Essa tendência pode ser observada através
da tabela 09 corresponde a evolução do crescimento populacional por situação
de domicílio nas últimas décadas. Conforme revelam os dados da tabela 09,
percebemos uma retração da população rural, principalmente a partir da
década de 1970, e em contrapartida, um forte crescimento da população com
domicílio nas localidades onde a pesca tomou impulso.
As informações constantes da tabela acima, também nos levam a uma
outra análise, a pesca e posteriormente da maricultura caminhou no sentido da
especialização das atividades que congregam a família e vem sendo também
atreladas às novas técnicas, bem como às demais atividades. Entretanto,
essas mudanças poderão levar a uma marginalização produtiva das áreas
tipicamente artesanais familiares, como ocorreu nos períodos em que
predominou a industrialização da pesca. Observamos que esse processo veio
acontecendo em algumas localidades do município. Ainda em relação às
127
pessoas com domicílio rural no município, observa-se também semelhança que
ocorreu no conjunto do Estado e do País, numa tendência de queda do PEA,
em função da tecnicidade.
Nas décadas de 1960/70, as técnicas produtivas substituíram as
formas artesanais de produção e, de certo modo, a marginalização da
produção artesanal que atuou de forma acanhada para não ser extinta.
Posteriormente, na década de 1980, com a falência das indústrias pesqueiras,
outras atividades formais surgiram no município, como o comércio e as
atividades públicas. O pescador artesanal passou se relacionar também com
essas atividades formais, que na última década vem experimentando um
crescimento gradativo. A partir da década de 1990, atrelada a pesca artesanal
e as demais atividades institucionalizadas, surgiu a maricultura, inicialmente
totalmente artesanal, mas que com as exigências do mercado, vem tentando
se modernizar.
Com a crescente redução da contribuição do setor agrário na
ocupação de mão-de-obra da (População Economicamente Ativa – PEA, rural,
IBGE, (1975 a 1995), cresceram outras ocupações em atividades não
tradicionais para a população que vive das atividades do mar. Isso pode
significar que as mudanças, sobretudo aquelas que tem sua base tecnológica,
ainda estão em curso e deverão se aprofundar muito mais nas próximas
décadas, principalmente com as atividades de lazer como o turismo, por
exemplo).
Desse modo o espaço pesqueiro do município reordenou as novas
formas econômicos, criando outras relações sociais, principalmente no que se
refere a inserção no campo do trabalho, onde temos verificado um número
crescente de famílias que estão se tornando pluriativas. Isso denota os
impasses do modelo de pesca e maricultura na produção familiar, conforme foi
colocado pelo gerente de pesca do IBAMA, que “o governo, mesmo chamado
pelo setor a investir na produção das atividades artesanais do mar, tem ficado
mais no discurso do que nas ações propriamente ditas”. Como a política não
128
tem atuado neste setor, o local vai se tornando mais um espaço de novas
relações sociais e de trabalho.
Em função destas mudanças a partir dos anos 1990, os dados da
tabela 18 indicam informações sobre atividades econômicas de
estabelecimentos e empregos que surgiram no município, a partir de mudanças
do setor econômico produtivo, especialmente a partir da chegada da atividade
do turismo.
Tabela 18: Número de Estabelecimentos (*), segundo a categoria – 1990 a
2003.
Município
Industria
Consrução
Civil
Comércio
Serviços
Agropecuária
Total
G.C.R.
09
03
51
31
08
102
Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações sociais/Miinistério do trabalho.
(*) Estabelecimentos formalmente constituídos, cadastrados junto ao Ministério do
Trabalho e Emprego.
Tabela 19: Número de Empregos (*), segundo a categoria – 1990 a 2003.
Município
Industria
Construção
Civil
Comércio
Serviços
Agropecuária
Total
G.C.R.
165
04
133
263
20
585
Fonte: Rais – Relatório Anual das Informações Social/Ministério do Trabalho.
(*) Empregos = Vínculo empregatício estabelecido quando há trabalho remunerado com
submissão hierárquica ao empregados e horário pré-estabelecido por este (CLT).
Em relação às funções formais de emprego, os dados da Prefeitura
Municipal de Governador Celso Ramos indicam a existência de 340 (trezentos
e quarenta) servidores públicos municipais (2005), entre os efetivos, os
admitidos em caráter temporário – ACT, neste caso os professores e os cargos
em comissão. Não nos foi informado o total de funcionários de cada categoria,
mas segundo o informante a predominância de empregos encontra-se nos
cargos efetivos.
129
Também constatamos que algumas empresas que tem seu registro
junto aos órgãos oficiais e vivem na informalidade na questão da contratação
de mão-de-obra, como o setor da construção civil. Este setor contrata
trabalhadores como serventes e pedreiros sem assinar a carteira de trabalho,
com pagamento semanal. Estes têm relação direta com a pesca e a
maricultura, mas que em alguns momentos buscam o aumento da renda
familiar nesta atividade.
Em relação ao turismo, dos seis hotéis entrevistados, cinco utilizavam
mão-de-obra remunerada e contratavam pessoal na temporada, e em apenas
um deles a família trabalha no estabelecimento. No caso dos restaurantes, a
maioria utilizava mão-de-obra familiar, e contratava apenas nos períodos de
alta temporada, ou seja, no verão. Ainda houve casos de trabalhadores do
comércio que usavam a família como mão-de-obra e não registrados no
Ministério do Trabalho. Encontramos também pescadores maricultores, que
trabalhavam como vigilantes em Florianópolis. Trabalham 12 (doze) horas por
36 (trinta seis) horas de descanso, quando então exerciam suas atividades de
pesca e maricultura. Constatamos a existência de pescador artesanal que é
dono de restaurante, mas que estava na pesca industrial em Santos/SP,
enquanto a mulher e filhos trabalhava no estabelecimento. Dos 146
maricultores e pescadores artesanais entrevistados, 98% (noventa e oito por
cento) responderam que iniciaram na pesca artesanal, mas se dedicavam
também nas atividades da pesca industrial. Dessa maneira, o ambiente
produtivo formal onde se insere a atividade pesqueira familiar vem sofrendo
algumas alterações, inclusive com a probabilidade da sua desestruturação.
130
CAPÍTULO IV
4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o intuito de finalizar este trabalho e tecer algumas considerações,
faremos uma análise daquilo que consideramos importante para a continuidade e
perpetuação dessa fonte econômica: a pesca e maricultura artesanal, desde os
seus primórdios, e a maricultura, com as suas implicações nas relações de
trabalho formal.
A pequena produção mercantil foi passando por vários momentos
diferenciados desde a ocupação na comunidade de Armação da Piedade; com a
agricultura de subsistência e a ascensão e a decadência da pesca da baleia, além
das manufaturas agrícolas que perpetuaram no litoral do município em estudo até
a década de 1950. Após, o pescador acabou por ter que enfrentar a
industrialização das atividades da pesca, se submetendo às novas relações de
produção de trabalho e renda impostas ao mercado de Governador Celso Ramos.
No final da década de 1980 e início da década de 1990, como forma de congregar
o pescador artesanal, agora sem a indústria, que faliu, foi inserida a atividade de
maricultura no município.
Como vimos nos capítulos anteriores, a pesca no litoral de Governador
Celso Ramos tem sido uma atividade realizada tradicionalmente, em escala
artesanal, menos no período de 1960 ao final da década de 1970, com a pesca
industrial. Como conseqüência dessa atividade as relações de trabalho e
produção e renda neste setor sempre estiveram relacionadas às demais
atividades formais que se instalaram no município.
A pesca artesanal, desde os primórdios, tem ocorrido com pequenas
embarcações, desde as canoas feitas de um tronco só, como o garapuvu,
nogueira e outras árvores, e lanchas a remo e a vela, até as pequenas lanchas,
botes e pequenos barcos a motores. Por terem pouco alcance, estas
131
embarcações trabalham em regiões costeiras e estuárias, enquanto que a
pesca industrial abrange, além das regiões costeiras, as regiões oceânicas
mais profundas, com embarcações de maior porte, podendo chegar até 90
toneladas, com grande autonomia de navegação e totalmente modernizadas.
Na pesca industrial, os barcos possuem uma divisão interna chamada
porão, para resfriamento do produto, com autonomia de 04 a até 20 dias no
mar. Já a pesca artesanal é efetuada da noite para o dia, descarregando sua
produção imediatamente, para que seja processada e colocada no freezer ou
no gelo para conservação e posterior comercialização.
Outro fato que diferencia a pesca industrial é o descarregamento da
produção. Pelo volume pescado, e por serem barcos de 20 (vinte) a 90
(noventa) toneladas, suas operações se concentram em cidades portuárias
com a infra-estrutura e navegabilidade local com profundidade razoável. Assim,
essa infra-estrutura pode se traduzir em atracadouro para abastecimento de
água, combustível, gelo, supermercado, etc. Diferentemente, a pesca artesanal
pode descarregar sua produção com o encalhe de sua pequena embarcação
na praia, não necessitando da estrutura de operacionalização.
No município existem três barcos de pesca em escala industrial, sendo
02 (dois) adquiridos com renda proveniente da pesca industrial. Os
proprietários eram mestres de pesca que acumularam poupança. O terceiro é
empresário do Município de Biguaçu e já atuava na atividade de pesca.
Segundo informações do Presidente da Colônia de Pescadores Z-9, é
raríssimo haver desembarque do produto pescado desses barcos em Ganchos
do Meio, o que ocorre sempre no porto de Itajaí. Ainda segundo o informante,
existe no Município cerca de 300 (trezentas) pequenas embarcações, com
suporte de 0,5 a 1,5 toneladas. Essas embarcações trabalham na Baía de
Tijucas, Baía Sul e Norte de Florianópolis e nas atividades diárias da
aqüicultura (produção de mariscos).
O maior problema encontrado para a contabilização da produção do
desembarque de peixes e camarões que são processados nos ranchos de
132
praia ou residências está no fato de não existir controle da produção artesanal
pelos órgãos oficias. Segundo informação da Gerência de Pesca do IBAMA,
órgão responsável pela contabilização da produção no Estado, nos últimos
anos esta pesquisa não tem sido efetuada, pois falta pessoal também verba
financeira para investir neste trabalho de pesquisa. Também afirmou que os
governos, tanto estadual quanto municipal, não tem se interessado em manter
controle da produção. As últimas pesquisas sobre a produção da pesca no
município ocorreram no período de 1988 a 2000, somente na Colônia de
Pescadores Z-10, que abrange as localidades de Armação da Piedade,
Costeira da Armação e Palmas. De 2000 até o presente momento nada mais
foi pesquisado nas localidades compreendidas pelas Colônias de Pescadores
Z-9 e Z-10.
Com relação à Colônia de Pescadores Z-9, que abrange as localidades
de Areais, Jordão, Canto dos Ganchos, Calheiros, Ganchos do Meio e
Ganchos de Fora, não encontramos, no IBAMA, nenhum dado sobre a
produção pesqueira, nem anterior ou posterior a 2000. Tivemos que recorrer à
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, que faz uma pesquisa da produção
da Baia do Tijucas, em função do Projeto “Pesca Responsável na Baía do
Tijucas”. Este projeto, criado a partir dos problemas com os pescadores
artesanais, que compõem esta baia, quando da criação da Reserva Biológica
Marinha do Arvoredo, em 12 de março de 1990. A UNIVALI possui somente
dados de 2004 e alguns meses de 2005. Como vimos, com relação à pesca
artesanal em Governador Celso Ramos, não será possível precisar os valores
pescados nos últimos anos. Como apontamos, os dados são irregulares e por
isso decidimos não expressá-los em números, mas entendemos que a pesca
artesanal tem sido bastante expressiva no município. Também lamentamos
que os órgãos que controlam a produção não tenham interesse por este
segmento da economia.
O que nos chama a atenção com esse descaso para com as
atividades artesanais no município, é que não há “tempo” nem verba para o
controle e redimensionamento das atividades. O próprio governo tem buscado
fórmulas de colocar o pequeno produtor na marginalidade. Assim sendo, mais
133
uma vez as comunidades pesqueiras artesanais de Governador Celso Ramos,
e municípios circunvizinhos se vêem alijados dos seus meios de produção. Não
fosse o caráter de desobediência civil dessas comunidades, o pescador
artesanal estaria novamente sem ter como viver da pesca. Foi priorizado o
meio ambiente em detrimento da sobrevivência desses pescadores, mesmo
estando a mais de 10 (dez) quilômetros de distância da Ilha do Arvoredo, foi
proibida a atividade da pesca.
O Governo, em 12 de março de 1990, através do Decreto Federal nº
99.142, instituiu a Reserva Biológica Marinha do Arvoredo como uma unidade
de proteção integral, impedindo qualquer tipo de pesca em seu entorno, e isto
compreende a Baía do Tijucas, com seus municípios: Tijucas, Governador
Celso Ramos, Bombinhas e Porto Belo, e ainda o município de Florianópolis,
incluindo as Baías Norte e Sul.
Segundo o IBAMA, são classificadas como reservas biológicas áreas
que têm como objetivo a preservação da biota e demais atributos naturais
existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações
ambientais. Excetuam-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas
alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o
equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais.
Na década de 1960, o próprio governo que hoje se preocupa em
preservar, permitiu que barcos de todos os tamanhos e potências, quase
extinguissem as reservas de pescados próximo à ilha do Arvoredo bem como
nas baías, quase levando o pequeno pescador a não ter o que pescar, como já
vimos em capítulo anterior. Portanto, com a criação da reserva, o objetivo tem
sido outro, buscando a preservação. Com 17.600 (dezessete mil e seiscentos)
hectares de superfície e 54,8 (cinqüenta e quatro mil e oitocentos) quilômetros
de perímetro, a reserva engloba as ilhas do Arvoredo, Galé e Deserta, o
Calhau de São Pedro, constituindo-se num aglomerado de rochas de área
protegida. A Ilha do Arvoredo encontra-se a 11 (onze) quilômetros do lado
Norte da Ilha de Santa Catarina.
134
Como no passado, a fiscalização e a perseguição também se
impuseram no período compreendido entre a década de 1990 e início da
década de 2000. O jornal O FAROL, editado pela entidade “Aprender
Ecológico” na página 03, diz o seguinte:
“O patrulhamento na área da reserva e seu entorno é feito desde 1995
pela Companhia de Polícia Ambiental - CPPA, da Polícia Militar de
Santa Catarina. E continua, durante a ronda os policiais abordam as
embarcações, prestam informações, e quando necessário, expedem
auto de infração e apreendem materiais utilizados em
desconformidade com a lei. Além da Polícia Ambiental, abordagens
são feitas também pelas lanchas da Capitania dos Portos de Santa
Catarina - CPSC, que colaboram com patrulhamento da reserva
realizada pela Polícia Ambiental e o IBAMA”.
O problema estava lançado: o que fazer agora com as comunidades
do município que sempre viveram da pesca? Os pescadores passaram a
“roubar” (termo usado pelos pescadores artesanais), retirando peixes e
camarões às escondidas dos órgãos de fiscalização. Novamente encontraram-
se fora da lei e sujeitos às penalidades das mesmas. Alguns pescadores
tiveram seus petrechos apreendidos e respondem por crime ambiental. Um
policial ambiental nos colocou que os “Gancheiros” são difíceis de lidar, dessa
forma caracterizando o enfrentamento que os policiais e os pescadores têm
travado.
Diante dessa situação, algumas entidades de representação dos
pescadores começaram a procurar os órgãos ambientais e colocar a angústia
daqueles que sempre dependeram da atividade da pesca. Em especial, o
Presidente da Colônia de Pescadores Z-9 foi incansável nesta luta. Entidades
como a UFSC, UNIVALI, EPAGRI, Prefeitura Municipal de Bombinhas e de
Governador Celso Ramos, Federação das Associações de Maricultores de
Santa Catarina – FAMASC, engajaram numa luta sem precedente para que os
órgãos ambientais, em especial o IBAMA e as demais organizações não
governamentais de preservação ambiental se unissem e criassem uma
alternativa para que a pesca artesanal continuasse, estudando um plano de
135
manejo para as Baías do Tijucas e Baías Norte e Sul de Florianópolis. Já os
presidentes da Associação de Moradores do Jardim Gaivotas – AMJG, em
Palmas e o da Sociedade Amigos de Bairro de Armação da Piedade – SABAP
que fez parte das reuniões para a criação da área de manejo do arvoredo,
empresários do ramo imobiliários, vindos do Rio Grande do Sul, tem-se
expressado contrário as atividades artesanais na Baia do Tijucas. Se postam
como defensores do meio ambiente mas, em momento algum, respeitaram o
meio ambiente nas duas localidades as quais se situam as duas associações.
Destruíram mangues, vegetação da mata atlântica, e as mais diversas de
preservação permanente com a conivência, inclusive, do poder público
municipal.E, ainda, a Associação dos Amigos de Bairro da Praia de Bombinhas
que também vindos do Rio Grande do Sul e Paraná, têm principalmente na
maricultura o foco de resistência para a sua permanência, em função de
acharem “feio” as bóias artesanais no mar.
Depois de muitas reuniões e discussão, criou-se o Plano de Manejo, o
que o Diretor Presidente da Aprender Entidade Ecológica e Coordenador –
Geral do Projeto de Elaboração do Plano de Manejo e Rebio Arvoredo disse o
seguinte a respeito: COSTA, (2005): “Após 14 anos de conflitos de interesse e
opiniões, o grau de efetividade da Reserva do Arvoredo ainda deixa muito a
desejar. Isso ocorre devido a obstáculos políticos, econômicos, administrativos,
jurídicos e sociais”.
Como fomos informados, foi necessária muita luta das entidades
representativas dos pescadores e muitas reuniões com os órgãos
governamentais e entidades de representação não governamental,
ambientalistas, para que entendessem que toda uma sociedade estaria fadada
à miséria ou sujeita a sofrer as penalidades, caso não fosse possível reverter à
situação que estava posta. Após 20 (vinte meses) de muita discussão com a
sociedade civil e os órgãos interessados na reserva, o projeto de manejo
ambiental foi elaborado e encaminhado à Brasília, para ser analisado e
aprovado pelo IBAMA. Após mais 14 (quatorze) meses, foi aprovado, causando
grande expectativa nas entidades pesqueiras interessadas.
136
Desse modo, Presidente da Colônia de Pescadores Z-9, resumiu o
sentimento geral, quando disse: “O trabalho de preparação do plano foi
importante porque todos se uniram, mas só vou acreditar que nosso empenho
foi respeitado quando eu vir na minha mão a portaria assinada”. Em 10 de
setembro de 2004, foi assinada a Portaria nº. 81 – N, pelo Presidente do
IBAMA. Neste caso foram criadas áreas de zoneamento em torno da área de
preservação, bem como a chamada “Zona de Amortecimento” em torno da
reserva, onde as atividades humanas, neste caso os pescadores, estão
sujeitos a normas específicas, como o respeito ao defeso, tipo de malhas de
redes, motores que estejam em boas condições evitando que óleo polua as
águas, entre outros. O propósito dessa zona é minimizar os impactos negativos
sobre a unidade de conservação. No caso da pesca de arrasto, somente é
permitido embarcações pequenas, com até 10 (dez) toneladas de arqueação
bruta.
Entretanto, conforme foi constatado durante o período em que fizemos a
pesquisa, os pescadores e maricultores não se encontravam desamparados.
Existem duas entidades de classes representativas, dirigidas por pessoas
conscientes dos problemas da cadeia produtiva das atividades artesanais, bem
como dos problemas sociais local em que vivem os pequenos produtores, que
são as Colônias de Pescadores do Município.
A Colônia de Pescadores é uma entidade sem fins lucrativos, que tem
por finalidade representar e defender os pescadores artesanais e os
maricultores junto aos órgãos municipais, estaduais e federais, como:
Secretaria de Pesca Municipal, Secretaria de Pesca Estadual, EPAGRI,
Capitania dos Portos (Ministério da Marinha), Ministério da Agricultura,
Ministério do Trabalho, Ministério do Meio Ambiente, entre outros.
As duas Colônias de pescadores tem a equivalência de um sindicato,
mas estão ligadas a uma Federação de Pesca a nível estadual, com sede em
Florianópolis. A Colônia de Pescadores Z-9 foi criada em 1920, e abrangia todo
o Município. Posteriormente, por interesse em atender melhor as localidades
próximas à Armação da Piedade e pelas dificuldades de acesso à Z-9, que se
137
encontra instalada de Canto dos Ganchos desde a sua fundação, foi criada em
1937 a Z-10. Além de defender os pescadores e maricultores junto aos órgãos,
as colônias também procuram trazer para os pescadores e maricultores, cursos
de aperfeiçoamento bem como cursos de pescadores para os novos que estão
se inserindo na pesca e assim poderem tirar suas carteiras de pescadores. A
Z-9 mantém um consultório médico e dentário para atender aos seus
associados.
Em conversa com os presidentes das duas colônias, foi argüido sobre
a preservação do defeso. Eles falaram sobre suas preocupações no sentido da
permanência da atividade artesanal. Informaram que o pescador não respeita o
defeso pelo fato de que a Portaria IBAMA nº 074 de 13 de fevereiro de 2001,
de cunho nacional, favorece o camarão rosa e não o de sete barbas, pescado
em grande quantidade no município, prejudicando o pescador artesanal de
Governador Celso Ramos.
A citada Portaria estipula que o defeso vai de março a maio, mas para
o camarão rosa (que não é produzido na Baía do Tijucas), enquanto o camarão
pescado em Governador Celso Ramos, o sete barbas, a desova ocorre de
novembro a fevereiro. Esta é outra luta que está sendo travada junto ao IBAMA
pelos presidentes das colônias no sentido de se criar uma portaria específica
para evitar que os pescadores não se envolvam com problemas da
fiscalização, ainda que precária, do IBAMA e da Polícia Ambiental.
Pela pouca formação educacional desses pescadores, conforme
entrevistas, quando fizemos a pergunta: grau de escolaridade, 90% (noventa
por cento) tinha apenas da primeira à oitava série e 10% (dez por cento), entre
o segundo grau completo e incompleto. Este fato dificulta as relações com os
órgãos de todas as esferas, por isso os presidentes das colônias agem como
intermediários, fazendo inclusive o papel de consultores. Como não são
assalariados, eles tem um trabalho que poderíamos chamar de assistencialista.
E, como afirmou o presidente da Z-9, de toda a dimensão dos associados,
apenas 300 (trezentos) pagam a anuidade de R$ 60,00 (sessenta reais), o que
não cobre as despesas com um funcionário e material de escritório, etc. E
138
disse também que muitas vezes tem que colocar dinheiro do seu bolso.
Perguntamos então porque se mantém nessa atividade, o que respondeu:
Alguém tem que fazer algo por estes pescadores e maricultores, já que os
órgãos da municipalidade não dão atendimento e a importância para as
atividades artesanais. Também afirmou sobre a necessidade de “andar de
porta em porta” de deputados e órgãos governamentais em busca de
subvenção para cobrir as despesas da Colônia.
O Presidente da Colônia Z-9, no intuito de melhorar a renda da família do
pescador e maricultor artesanal, foi buscar no Canadá recursos, através de
convênio com o Ministério da Agricultura, viabilizando o projeto de mulheres
produtoras de alimentos. No município foram criadas duas cooperativas, na
tentativa de aumentar a oferta de trabalho e renda daqueles que tem sua
sobrevivência no mar. A primeira já citada, até o presente, continua sendo
meramente uma instituição física e juridicamente constituída. A segunda,
Cooperativa de Mulheres Produtoras de Alimentos da Maricultura – COOALIMAR,
foi implementada em 2004, como um projeto de viabilidade econômica de
produção de alimentos processados a partir de peixes, camarões e mariscos.
A Cooperativa congrega 40 mulheres das mais diversas localidades
costeiras do município tendo sua sede produtiva na localidade de Calheiros. As
dificuldades encontradas pelas mulheres produtoras ainda são muitas, conforme
entrevista com a Presidente da Cooperativa, que transcreveremos: ao ser
perguntada de que modo surgiu a cooperativa, respondeu que foi uma iniciativa do
Presidente da Colônia de Pescadores Z-9 e da EPAGRI, e que houve muitas
reuniões até chegarem a um consenso e congregarem as interessadas. Disse-nos
que “juntar” as mulheres não foi um trabalho tão árduo, o difícil está em mantê-las
na atividade. Quando perguntada sobre a questão dos ganhos financeiros,
respondeu que é muito pequeno, pois trabalham com reposição dos produtos, não
sabendo informar quanto de ganho cada cooperada tem tido. Entendemos que
existe uma margem de ganho, mas que não tem satisfeito as necessidades para
as quais se propuseram. Ao ser argüida sobre a quantidade de alimentos que
processam em cada mês, informou que às vezes pode chegar até 1200 (um mil e
duzentos) salgadinhos por semana, não precisando a produção mensal, mas que
139
pode ocorrer não terem nenhum pedido naquele período. Seguindo nossas
perguntas, solicitamos informações sobre o mercado consumidor desses
salgadinhos e os tipos de alimentos produzem, o que respondeu que são vendidas
em supermercados de Itajaí, Tijucas, para revenda a turistas, restaurantes e bares
e público em geral. Produzem salgadinhos a partir de mariscos, peixes e camarão
como, ostras gratinadas, camarão no palito, bolinho de peixes, empadas de
marisco e camarão. Informou que trabalham em turno de 04 (quatro) horas
revezando entre as cooperadas. E, por último, quando solicitamos informações
sobre as perspectivas futuras da atividade, percebemos um desânimo com as
atividades, e disse-nos que o futuro é incerto, pois muitas mulheres desistiram.
Novamente fala sobre o pouco ganho financeiro. E foi além: muitas vezes não
trazem nada para casa. O dinheiro fica todo na cooperativa para repor produtos e
despesas como a compra de materiais como freezer, etc. Ainda colocou que, se
não tivessem que adquirir os eletrodomésticos para a produção o retorno
financeiro seria em torno de R$ 400,00 (quatrocentos reais) mensais, com a
possibilidade de melhorar.
Vale lembrar que estas mulheres cooperativadas, na sua maioria,
possuem uma carteira de mulher pescadora por ajudar o marido nas fainas da
pesca em terra. Também recebem o salário mínimo durante o período de defeso.
Constatamos que algumas também trabalham na atividade formal conjugando o
trabalho na cooperativa em um período com outras atividades. Percebemos na
conversa com a presidente da mesma, que as expectativas de rendimento fácil e
rápido estava inserido e impregnado na concepção destas trabalhadoras. Como
isso não aconteceu rapidamente, algumas cooperadas foram desistindo.
Ainda foi colocado pela entrevistada que, a cooperativa tem potencial,
mas com a compra de alguns equipamentos necessários, o ganho foi muito
pequeno. Caso houvesse linha de crédito e mais clientes, com o tempo ganhariam
dinheiro. Percebemos a falta de gerenciamento e a probabilidade desta
cooperativa dar certo, pela qualidade do que produzem. Outro fato também
constatado refere-se ao medo de contrair empréstimos para adquirir todos os
equipamentos e, desse modo, aumentar a produção. Algumas cooperadas
140
entendem que esse será o caminho, mas outras que não concordam com esse
tipo de investimento.
Observamos, ainda, que há uma certa ingerência negativa de alguns
maridos, influenciando algumas cooperadas no sentido da não autorização para
contrair algum tipo de empréstimo financeiro para a atividade. Em conversa com o
presidente da colônia, disse que para que o produto seja aceito precisariam
atender as necessidades do mercado, como padronização do produto como peso
e embalagens. Ressaltamos que, a respeito da cooperativa de alimentos, o que
está faltando é a união das cooperadas, pesquisa de mercado consumidor e, por
ultimo, investimento na cadeia produtiva. Pois, conforme a entrevistada as
possibilidades de ganhos são muitos.
Dessa forma, não foi possível precisar as implicações que terão no futuro
estas mudanças de comportamento com novas formas de trabalho para as
atividades artesanais no conjunto do emprego de pesca e maricultura. Também os
efeitos negativos da queda que paulatinamente estão ocorrendo nas ocupações
exclusivamente artesanal, em função das ofertas de trabalho formal. Em termos
numéricos, essa redução de trabalho ainda não atingiu de forma expressiva a
mão-de-obra das atividades de pesca e maricultura, durante o período
considerado. Durante a pesquisa de campo, observamos que a redução da PEA
das atividades artesanais do mar, não foi tão importante com relação ao
crescimento da PEA das atividades formais de trabalho e renda. Ainda existe um
número expressivo de pescadores e maricultores bem como seus familiares
atrelados às atividades praticadas no mar.
De maneira geral a queda das ocupações estritamente artesanais não
tem afetado de maneira direta, as categorias de trabalhadores que fazem parte da
chamada produção de pesca e maricultura familiar, principalmente aqueles que
trabalham por conta própria e os não remunerados. Isto porque o trabalho no mar
em Governador Celso Ramos é amplamente dinamizado pelas unidades
familiares de produção. Desse modo, a família, mesmo sendo responsável pela
maioria da produção artesanal no município, também tem se integrado ao trabalho
141
formal da indústria da pesca, em algum momento, ou para outros setores de
atividades econômicas assalariadas.
As informações até agora comentadas dão uma dimensão apenas
individualizada das mudanças em curso do nível das ocupações artesanais. Para
se ter uma noção mais completa do fenômeno pluriatividade não pode ser deixada
de fora a participação dos membros da família na composição do trabalho e
renda. Neste caso, quando agregamos informações dos membros no âmbito do
grupo familiar, torna-se possível avaliar o comportamento de duas variáveis
fundamentais envolvidas da discussão pluriatividade: como a força de trabalho de
todos os membros da família e as diferentes fontes de renda que compõem a
renda do grupo familiar. Em Governador Celso Ramos os membros da família
além de trabalharem na pesca e maricultura se relacionam com atividades não
formais. Portanto é neste contexto que a pluriatividade tem assumido certa
relevância para o trabalhador artesanal das localidades do município,
principalmente no que diz respeito ao aumento da renda.
De modo geral esse estudo nos remete a considerar que as relações no
meio da pesca e maricultura familiar encontram-se sensíveis às alterações, as
quais coloca em debate um conjunto de inúmeras questões ainda ausentes de
uma discussão que deve ser efetuada com os diversos atores sociais destas
localidades. A participação das atividades não artesanais na PEA da atividade
pesqueira de Governador Celso Ramos vem crescendo, tanto nas relações de
trabalho quanto nas relações de renda. Como já citamos anteriormente, estas
relações ainda não tem afetado de forma relevante a atividade da pesca e
maricultura. Entretanto, se não houver um redimensionamento das relações das
atividades artesanais, o setor formal poderá excluir esta mão-de-obra, que mesmo
sem o apoio governamental ainda consegue viver de forma digna.
Por outro lado, na crise que em alguns momentos ocorre quando há a
baixa da produção ou no defeso, essas ocupações formais estão sendo decisivas
para amenizar os impactos negativos da queda das ocupações exclusivamente
artesanais familiares. Outro ponto que devemos considerar e que foi informado
142
por alguns jovens, membros destas famílias, é que não vêem grandes
perspectivas de apoio ao crescimento das atividades no mar.
Assim sendo, esse conjunto de informações vem colocando em xeque a
visão tradicional do desenvolvimento das formas de relações artesanais da pesca
e maricultura, e que deveria estar associada à idéia de desenvolvimento das
atividades pesqueiras. Tais atividades encontram-se deficitárias por estarem
diretamente ligadas aos órgãos públicos responsáveis no tratamento dessa fatia
econômica e de congregação social da atividade. A falta de iniciativa poderá levar
os descendentes a se afastarem das atividades de seus avós e pais, não
perpetuando as formas de produção familiar. E poderemos ver o espaço do
município se tornando mais uma vez, empresarial, seja na pesca e,
principalmente, na maricultura e os atores artesanais sendo subjugado pelo
capital, tendo que vender sua mão-de-obra em troca de um salário.
Diante disso, o desenvolvimento das atividades pesqueiras não pode
mais ser analisada como um setor específico, mas tem que ser estudado como a
soma de relações de um conjunto de atividades, onde as inter - relações entre as
atividades do mar e as atividades formais se agregam. Outro ponto relevante é
que a identificação do trabalho de pesca e maricultura, na medida em que o
trabalho formal cresce, as atividades artesanais vão ficando mais tênues, uma vez
que a PEA artesanal vai tendo grandes possibilidades de trabalhar em diversos
setores de atividades.
Para finalizarmos nossas alocações, entendemos que para que as
atividades continuem, é premente que o poder público crie efetivamente
programas de desenvolvimento para as atividades do mar. Haverá necessidade
de aplicação de recursos em tecnologias, constantes cursos de treinamentos,
funcionamento das cooperativas, consciência ecológica através da educação
ambiental, redimensionamento das áreas para a maricultura evitando a ocupação
desordenada, e impedir que empresas com grande capital se instalem nas
atividades concorrendo com o pequeno produtor familiar; Ainda serão necessários
o aumento substancial do maior número de empregos na pesca e maricultura
aos produtores e aos seus familiares.
143
Assim, estaremos elencando os principais entraves para consolidação
competitiva e sustentável da cadeira produtiva da pesca e dos mexilhões e que
vem impedindo seu aproveitamento como atividade totalmente geradora de
divisas e empregos no Município, que são: Em primeiro lugar observamos a falta
de tecnologia e a sua variação empregada, ainda muito artesanal, com o uso de
materiais, que na maricultura são reciclados, no processo produtivo, em função do
não apoio dos órgãos competentes tanto no aspecto financeiro como ambiental.
Outro ponto a ser destacado está relacionado à questão da certificação sanitária
para o escoamento da produção, principalmente, de mexilhões, para outros
estados de forma que não seja através do atravessador, carecem de
equipamentos adequados, como câmaras de congelamento, aproveitando ao
máximo a qualidade dos produtos. Também foi sentida a falta de capacidade
gerencial dos produtores para operar as unidades de beneficiamento, tanto das
salgas como da estrutura física da cooperativa, bem como do pescador para
trabalhar em caráter cooperativo.
Para tanto, foi constatada a falta de um esquema de distribuição do
produto, mariscos, de maneira ágil e com alcance aos grandes centros
consumidores, aliados a campanha de marketing caracterizando o molusco de
cultivo como um produto de excelência. Ainda com relação a maricultura,
entraves como a poluição visual causada pela falta de padronização das
estruturas artesanais, prejudicando no entender de alguns a exploração do
turismo no local. Outros problemas existem, relacionados à navegação,
provocados pela falta de sinalização adequada dos cultivos e distribuição
desordenada das estruturas. Outro fator a considerar é a inexistência de estudos
para determinação da capacidade de carga das áreas de cultivo, levando a
prejuízos ambientais, incidência de doenças, aumento de tempo de cultivo e
mortalidade dos mariscos. Também foi sentida a falta de desenvolvimento e
transferência de tecnologia para a mecanização dos cultivos, que tem um custo
bastante elevado, impossibilitando aumento do volume de produção e redução de
custos para competir com os produtores de outras regiões e mesmo os
importados. Além dos problemas de saúde acarretados aos maricultores pela
posição em trabalham no mar. Problemas com produtores irregulares nos parques
144
de cultivo, aumentando as áreas e, desse modo, aumentando o tempo de
crescimento do mexilhão. Quanto maior o volume de bolsas de mariscos
próximas, menor se torna a quantidade de alimentos aos mariscos.
Conforme pesquisamos, percebemos uma significativa margem de lucro
dos pontos de venda. Se fizermos a diferença entre os preços médios recebidos
pelos produtores e os valores de comercialização nas peixarias, mercados
públicos e outros estabelecimentos. Esta margem de lucro é da ordem de 40%.
Foi notado um problema de caráter ambiental bastante sério, resultante da etapa
do produto desmariscado, das escamas e vísceras de peixes bem como das
cascas de camarões que, depois de tirada a carne, são jogados ao mar ou nas
encostas dos morros na orla marítima.
A partir de 1977, a União incluiu a pesca e a maricultura no Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, com o propósito
de estender a estas áreas. As condições especiais de crédito oferecidas para a
Agricultura Familiar, fica atrelada às normas e exigências bancárias. O mesmo
programa é ainda bastante incipiente, sobretudo por não dispor de aportes de
recursos específicos como créditos com juros baixos e longo prazo para
pagamento. Por último, além da necessidade de solucionar os entraves para o
desenvolvimento do setor, em Governador Celso Ramos, é de fundamental
importância que seja observado os efeitos deletérios causados pela
ultrapassagem da capacidade de suporte do ambiente para a atividade.
Desse modo, não entendemos este trabalho de pesquisa como finalizado,
nem tão pouco o detalhamento do estudo dessas políticas públicas para o setor.
Entretanto, esta pesquisa deve continuar e ser acompanhado este assunto, para
novos estudos da pluriatividade e suas conseqüências nas atividades de pesca e
maricultura em Governador Celso Ramos bem como em Santa Catarina.
145
6 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BLANC, M. (1987) Pluriactividad Y Mobilidad del Trabajo: um enfoque
macroeconômico. In Arkleton Reserach. Câmbio Rural en Europa. Colóqui de
Montpelier, p. 89 -109.
BERNARDES, Júlia Adão. Mudança Técnica e Espaço: uma proposta de
investigação. Ed. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro, 1995, p. 47.
BUTTEL, f. (1982) The Political Economy of Part-time farming. In: Geo journal.
pp. 293-300.
CARNEIRO, M. J. (1996) Pluriatividade no Campo: O caso Francês. In: Revista
Brasileira de Ciências Sociais, nº 32, pp. 89 -104.
CEPA/SC – Comissão Estadual de Planejamento agrícola de Santa Catarina.
Florianópolis, 1977.
CORREA, Roberto Lobato. Um conceito chave da Geografia. Ed. Bertrand Brasil
Rio de Janeiro, 1995.
COSTA, Rafael Goidanich. Coordenador Geral do Projeto e Elaboração do
Plano de Manejo do Rebio Arvoredo. Artigo para o Jornal “O Farol”.
Florianópolis – 2005, p. 02.
COSTA, J. Gustavo da.Planejamento governamental: experiência brasileira.
Ed. Fundação Getúlio Vargas. Rio de Janeiro, 19971, p. 301.
DIEGUES, Antônio Carlos Sant’Ana. Pescadores, camponeses trabalhadores
do mar. Editora Ática. São Paulo 1983, p. 129, 135,139.
GAMA, A. (1987) Industria Crítica e Produção de um Espaço Peri-urbano. In:
Revista Crítica de Ciências, nº 22. pp. 33-53.
146
GUIMARÃES, Alberto Passos. A crise Agrária. Paz e Terra, - 2º edição. Rio de
Janeiro, 1982 p. 13 a 22.
LAGO, Paulo Fernandes. Contibuição geográfica ao estudo de pesca dm
Santa Catarina. Revista Brasileira de Geografia, janeiro/março. Rio de Janeiro,
1961.
MENDEL, Ernest. Introdução ao Capitalismo. Tradução Mariano Soares.Editora
Movimento. Porto Alegre, 1978, p. 22.
MACHADO, Márcia. Maricultura como Base Produtiva Geradora de Emprego e
Renda: Estudo de Caso para o Distrito de Ribeirão da Ilha no Município de
Florianópolis – SC – Brasil. Tese de Doutorado apresentada ao Departamento
de Pós Graduação em Engenharia de Produção/UFSC. Florianópolis, 2002, p 34.
“O FAROL” – Informativo da Reserva Biológica Marinha do Arvoredo. Ano 3 –
nº 2 – maio/2005.
OLIVEIRA. Ariovaldo Umbelino. A Geografia Agrária e as Transformações
Territoriais Recortes no Campo Brasileiro. Novos Caminhos da Geografia/
organizadora Ana Fani Alexandri Carlos. Editora Contexto. São Paulo,1999, p. 83
E 85.
SACCO DOS ANJOS, F. (1995) – A agricultura Familiar em Transição: o caso
dos colonos operários de Massaramduba (SC). Editora Universitária.
UFPEL/Pelotas.
SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova. 4. ed. HUCITEC. São Paulo, 1990.
SERRA, José. Ciclos e Mudanças Estruturais. Revista de Economia. Vol.2/2. Nº
6 – abril/junho. São Paulo, 1982.
147
SUDEPE, 1974. Relatório da Primeira Reunião de Grupo de Trabalho e
Treinamento (G.T.T.) sobre avaliação de estoques. Série DOC. Téc. SUDEPE
– PDP nº. 07, 149 p.
SCHNEIDER, Sérgio. Os colonos da indústria caçaldista: expansão industrial
e as transformações da agricultura familiar no Rio Grande do sul.
Campinas:IFCH/UNICAMP. Dissertação de Mestrado, 1994.
SILVA, Célia Maria e. GANCHOS/SC: ascensão e decadência da pequena
produção mercantil pesqueira. Editora; FCC e UFSC. Florianópolis, 1992, p. 175,
176.
MATTEI, Lauro Francisco. Pluratividade e Desenvolvimento Rural no Estado de
Santa Catarina. Tese de Doutorado. Campinas, SP, 1999.
WILKINSON, John. O Estado, a Agroindústria e a Pequena Produção.
Fundação Centro Estadual de Planejamento agrícola – CEPA/BA. São Paulo,
1986 p. 10.
148
7 – BILBIOGRAFIA
ALENTEJANO, Roberto R. O que há de novo no rural brasileiro? Terra Livre.
São Paulo 2000.
ANDRADE, H. A. (1998). A produção da pesca industrial em Santa Catarina.
Not. Tec. FACIMAR 2::1-16. 2:17-27.
BARLETT, P. Part Time Farming: saving the farm or saving the life-style? Rural
Sociology, v.51, n. 3, p. 289-313, 1986.
BECK, Anamaria – Comunidades pesqueiras e a expansão capitalista, in O
Mar e seus recursos ícticos. NEMAR/UFSC, 19984
BOLETIM DE PRODUÇÃO PESQUEIRA: Projeto: Pesca Responsável na Baía do
Tijucas.. UNIVALI, 2204.
CARLOS, Ana Fani Alessandri (org.). Novos Caminhos da Geografia. Editora
Contexto. São Paulo, 1999.
CHAYNOV,Alexander V. La organizacion de la unidad econômica campesina.
Traducción de Rosa Maria Rússovich. Ediciones Neuva Visión SAIC. Tucumán –
Buenos Aires, 1974.
CLAÚDIA, Queirós. Cultivo de Ostras. Centro de Ciências Agrárias –
Departamento de Aqüicultura – Projeto Ostra. Universidade Federal de Santa
Catarina. Florianópolis, 1990.
CERGOLE, Maria Cristina e WONGTSHOWSKI – Coordenadores. Avaliação do
Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona Costeira Econômica Exclusiva.
Área de Dinâmica de Populações e Avaliação de Estoques. Análise das
Principais Pescarias Comerciais do Sudeste – Sul do Brasil. Dinâmica das
149
Frotas Pesqueiras. Ministério do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis.
Brasília, 2003.
CUSTÓDIO, Jonas Simas. A Maricultura em Governador Celso Ramos.
Monografia apresentada no Departamento de Geografia/UFSC, para o título de
Bacharel em Geografia. Florianópolis, 2000.
CRUZ, Olga. A Ilha de Santa Catarina e o continente próximo: um estudo de
Geomorfologia costeira. Editora da UFSC. Florianópolis 1998.
DEALANDES, Suely Ferreira. Pesquisa social: teoria, método e criatividade.
Editora Vozes. Petróplis/RJ, 1994.
DOWBOR, Ladislau. A reprodução Social. Vozes – Vol. I, II e III. Petrópolis/RJ,
2003.
Empresa de Pesquisa Agropecuária e Difusão de Tecnologia de Santa Catarina
S/A. Manual de Cultivo de Mexilhões Pena perna. Florianópolis 1994.
EPAGRI E BLUWATER aquaculture ltda. Pólo de Maricultura do Estado de
Santa Catarina. Florianópolis, 2000.
FAO/INCRA (Agosto de 1996). Perfil da agricultura familiar no Brasil: dossiê
estatístico. Projeto UFT/BRA/036/BRA
Federação Catarinense de Associações de Municípios da Grande Florianópolis –
FECAM. Plano Básico de Desenvolvimento Ecológico e Econômico. Editora
própria. Florianópolis, 1991.
FRÊMONT, Armand. A Região, Espaço Vivido. Tradução de Antônio Gonçalves.
Livraria Almedina. Coimbra/Portugal, 1980.
150
Geografia: Conceitos e temas. Organizado por Iná Elias Castro, Paulo César da
Costa Gomes, Roberto Lobato Corrêa – Rio de Janeiro: Beltrand Brasil, 1995.
GODOY, M. P. de. Peixes do Estado de Santa Catarina. Co-edição,
UFSC/FURB/ELETROSUL – Fpolis, 1987.
GUIMARÃES, Alberto Passos. A crise Agrária. PAZ e Terra, - 2º. Edição. Rio de
Janeiro, 1982.
HAIMOVICI, M. Recursos pesqueiros demersais da Região Sul. REVIZEE –
Femar, Rio de Janeiro/RJ, 90 p.
IBAMA. 2000. Relatório da reunião técnica sobre o estado da arte e
ordenamento da pesca de sardinha verdadeira (Sardinella brasiliensis) nas
regiões sudeste e sul. IBAMA/CEPSUL. Itajaí, SC:23p.
IBAMA, 1992. Relatório da reunião técnica sobre sardinha. IBAMA/CEPSUL.
FERREIRA, Jaime Fernando. Laboratório de Cultivo de Mexilhões – LCMM.
Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis 1997.
HÜBNNER, Laura Machado. Caminhos de Santa Catarina na visão de viajantes
estrangeiros. Editora da UFSC. Florianópolis, 1990.
MARX, Karl, 1818-1883. O Capital: crítica da economia política. Apresentação
de Jacob Gorender; coordenação e revisão de Paul Singer; tradução de Regis
Barbosa e Fávio R. Kothe. 2. ed., vol. I e IV. Nova Cultural. São Paulo, 1985.
KOTAS, J. A fauna acompanhante nas pescarias de Camarão em Santa
Catarina. Coleção Meio ambiente. Série Estudos Pesca. 24, IBAMA, Brasília, 75
p.
151
LAGO, Paulo Fernando. Comunidades pesqueiras catarinenses. Ed. SAI/MA,
Rio de Janeiro, 1968.
LAGO, Paulo Fernando. Gente da Terra Catarinense: desenvolvimento e
educação ambiental. UFSC/FCC/Lunardelli. Florianópolis 1988.
LAGO, Paulo Fernando. Santa Catarina: A transformação dos espaços
geográficos. Verde água Produções Culturais, Florianópolis, 2000.
LAMARCHE, Hugues. Agricultura Familiar: comparação internacional.
(coord.); tradução: Fréderic Bazin. Editora da UNICAMP – vol. I e II. São Paulo,
1998.
PIAZZA, Walter Fernando: Santa Catarina: sua história. Ed. UFSC/Editora
Lunardelli, Fpolis, 1991.
PIZZOLATTI, Roland Luiz. Os pequenos produtores do Oeste catarinense:
integrados ou entregados? – Tese de Doutorado em Geografia, USP, 1996.
MANDEL, Ernest. Introdução ao Marxismo. Tradução de Mariano Soares.
Editora Movimento. Porto alegre 1978.
MAGALHÃES, Aimê Rachel M. Laboratório de Mexilhões – LAMEX.
Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1997.
MARX, Karl, 1818-1883. O Capital: crítica da economia política. Apresentação
de Jacob Gorender; coordenação e revisão de Paul Singer; tradução de Regis
Barbosa e Fávio R. Kothe. 2. ed., vol. I e IV. Nova Cultural. São Paulo, 1985.
MAZZALI, Leonel. O Processo recente de reorganização Agroindustrial: Do
Complexo à Organização “em rede”. UNESP. São Paulo 2001.
152
MINISTÉRIO DA AGRICULTURA. Superintendência do Desenvolvimento da
Pesca – SUDEPE. Extensão Pesqueira: Levantamento Sócio – Econômico
Ilha de Santa Catarina. Florianópolis 1986.
NEVES, Delma Pessanha, e outros. Para pensar outra agricultura. Acordo
CAPES/COFECUB. Organização: Ângela Duste Madaceno Ferreira, Alfio
Branderburg. Editora da UFPR. Curitiba, 1981.
OLIVEIRA NETO, Francisco Manoel de. Diagnóstico do Cultivo de Moluscos
em Santa Catarina. EPAGRI. Florianópolis, 2005.
PERTILE, Noeli. A integração e a agricultura familiar no município de
Quilombo, SC. Blumenau em Cadernos – Tomo XLIII – nº 10 – setembro/outubro
– 2002.
PELUSO JÚNIOR, Victor Antônio. Estudos de Geografia Urbana de Santa
Catarina. Editora da UFSC. Florianópolis 1991.
PINTO, Luís Carlos Guedes. Reflexões sobre a Política Agrária Brasileira no
Período 1964-1994. UNICAM. São Paulo, 1991.
PROUS, André. Arqueologia Brasileira. Editora Universidade de Brasília.
Brasília, 1992 – p. 204 -209.
RANGEL, Ignácio. Economia: Milagre e anti – Milagre. Jorge Zahar. Rio de
Janeiro, 1985.
Revista Economia Política. Vol.2/1, nº 6, abril-junho/1982.
ROSA, Rita de Cássia Gordini. Projeto de Coletores Artificiais de Sementes de
Mexilhão. Relatório parcial convênio EPAGRI?IBAMA nº 40/92. Florianópolis. 61
paginas.
153
SCHMITZ, Sérgio. Planejamento Estadual. A experiência do PLAMEG –
1961/1965.Ed. da UFSC, FESC/UDESC. Florianópolis 1985.
SCHNEIDER, Sérgio. Agricultura familiar e industrialização: Pluriatividade e
descentralização industrial no Rio Grande do Sul. Ed. Universidade/UFRGS.
Porto Alegre, 1999.
SCHNEIDER, Sérgio. O Desenvolvimento Agrícola e as Transformações da
Estrutura Agrária nos Países do Capitalismo Avançado: A Pluriatividade.
Trabalho apresentado na Reunião anual do projeto de Intercâmbio de Pesquisa
Social na Agricultura – PIPSA – IV Encontro da Região sul. Porto Alegre,
Novembro/93.
SCHNEIDER, Sérgio. A Pluriatividade como Estratégia de Reprodução social
da agricultura familiar no Sul do Brasil. Revista de Estudos Sociedade e
Agricultura nº 16, Rio de Janeiro, abril de 2001.
SACCO DOS ANJOS, Flávio. Pluriatividade e ruralidade: Enigmas e falsos
dilemas. Revista de Estudos Sociedade e Agricultura nº 17 Rio de Janeiro,
outubro de 2001.
SANTOS, Milton. Pensando o Espaço do Homem. 2. ed. Hucitec. São Paulo
1986.
SANTOS, Milton. Sociedade e Espaço: A Formação Social como teoria e
como Método. Boletim Paulista de Geografia/AGB nº 54 – jun.1977, São Paulo.
SANTOS, Milton. Território e Sociedade. Editora Fundação Perseu Abramo. São
Paulo, 200.
Secretaria da Agricultura e do Abastecimento. Comissão Estadual de
Planejamento Agrícola – CEPA/SC. Síntese Anual da Agricultura e Pesca de
Santa Catarina. Anos: 1985, 1977, 1980, 1981, 1982, 1999, 2000, 2001, 2002,
2003, 2004. Instituto CEPA – Florianópolis.
154
Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca: Relatório Final da I Conferência
Estadual de Aqüicultura e Pesca de Santa Catarina. UNIVALI, Itajaí – agosto
de 2003.
Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico e Integração do Mercosul.
Projeto de Gerenciamento Costeiro: Diagnóstico ambiental do Litoral de
Santa Catarina. IBGE. Florianópolis, 2000. 53 páginas.
Secretaria de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão. Caracterização
Regional – Secretaria Regional de São José. Florianópolis, 2003.
SILVA, Célia Maria de. Ganchos (SC): ascensão e decadência da pequena
produção mercantil pesqueira. Editora da UFSC. Florianópolis, 1992.
SILVA, José Graziano. O novo rural Brasileiro. Instituto de Economia –
IE/UNICAMP. São Paulo 1999.
SILVA, José Graziano. Tecnologia e Agricultura Familiar. Editora
Universidade/UFRGS. Porto alegre.
SILVA, Harrysson Luiz da. A gestão do território pelo grupo Sadia no
município de Concórdia – SC. UFSC. Fpolis.
SINGER, Paul. Desenvolvimento econômico e evolução urbana. 2. ed.
Nacional. São Paulo, 1977.
SUDEPE/DPD, 1985. Relatório da IV Reunião do Grupo Permanente de
Estudos sobre Camarão, realizada em setembro de 1983 em santos/SP.
Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Pesqueiro/ Série Documentos Técnicos,
Brasília, 33:129-173.
SUDEPE: Relatórios de Pesca em Santa Catarina dos anos de 1963 a 1970.
Diretoria Regional de Florianópolis.
155
WILKINSON, John. O Estado, a Agroindústria e a Pequena Produção.
Fundação Centro Estadual de Planejamento agrícola – CEPA/BA. São Paulo,
1986 p. 10.
WILKINSON, John. Estado e Agricultura no Brasil. Política Agrícola e
Modernização Econômica Brasileira, 1960-1980. Editora Hucitec. São Paulo,
1977.
VINATEA, Arana Luís. Fundamentos de Aqüicultura. Ed. Da UFSC.
Florianópolis, 2004.
VINATEA, Arana Luís. Aqüicultura e Desenvolvimento Sustentável: subsídios
para formulação política de desenvolvimento da aqüicultura brasileira.
EDFSC. Florianópolis 1999.
THOMAZ JÚNIOR, Antônio. Geografia e trabalho no século XXI. Centelha.
Presidente Prudente, 2004.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo