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MARIA APARECIDA LEOPOLDINO TURSI TOLEDO
A DISCIPLINA DE HISTÓRIA NO PARANÁ: OS COMPÊNDIOS DE HISTÓRIA E
A HISTÓRIA ENSINADA (1876-1905)
Doutorado em História da Educação
Programa de Estudos Pós Graduados em Educação: História, Política, Sociedade
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
2005
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MARIA APARECIDA LEOPOLDINO TURSI TOLEDO
A DISCIPLINA DE HISTÓRIA NO PARANÁ: OS COMPÊNDIOS DE HISTÓRIA E
A HISTÓRIA ENSINADA (1876-1905)
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título
de DOUTORA em História da Educação sob a
orientação do Prof. Dr. Kazumi Munakata
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A Comissão Julgadora
Ao riso de Luz e ao afeto de Marcelo
À Coordenadora do Museu Guido Straub do
Colégio Estadual do Paraná, Professora Márcia Maria
Aguiar, e à Supervisora Técnica da Biblioteca do
Instituto de Estudos Brasileiros da USP, Bibliotecária
Maria Itália Causin, meus sinceros agradecimentos pela
presteza com que fui atendida.
Ao Professor Kazumi Munakata, o meu
reconhecimento pela atenção pormenorizada neste
trabalho.
RESUMO
O propósito fundamental desta pesquisa concentra-se na investigação da História como
disciplina escolar no Estado do Paraná. Trata-se de uma pesquisa histórica que busca
acompanhar a constituição desta disciplina, no interior dos debates sobre a educação escolar
no momento em que o Paraná deixa de ser 5
a
Comarca de São Paulo para tornar-se uma
Província independente. Ao cercar o objeto de investigação, as bibliografias utilizadas
levaram a investigação ao atual Colégio Estadual do Paraná. Antiga instituição de ensino
secundário paranaense, foi criada pela Lei paulista sob nº.33, em 1846, como Liceu de
Curitiba, mas só efetivou-se como ensino regular e localidade própria em 1858, momento
posterior à criação da Província do Paraná. 1858 é também a data da criação da cadeira de
História e Geografia do Liceu. No entanto, por falta de alunos matriculados na cadeira, a
disciplina de História não se legitimou no período de vigência do Liceu. Em verdade, este só
contou com as cadeiras de Francês, Latim e Matemáticas, pelo período de 1858 a 1869,
quando o Liceu é extinto e os professores e alunos passaram a lecionar e cursar o secundário
no Colégio subvencionado Nossa Senhora da Luz. No período de subvenção, que durou um
ano, a cadeira de História também não foi freqüentada. Sua história começa, efetivamente, em
1876 quando se extingue definitivamente o Liceu e se implanta o Instituto de Preparatórios e
Escola Normal. Por se tratar de uma instituição que marca significativamente a História da
Educação paranaense, a pesquisa sobre a disciplina de História no Estado atrelou-se ao trajeto
assumido por essa instituição no período de 1876 a 1905. Nesse sentido, verifica-se como a
História aparece identificada às finalidades do ensino secundário no período de transição da
sociedade imperial para a república brasileira, na criação e seu longo processo de constituição
como disciplina escolar no Instituto de Preparatórios e Escola Normal que, com o advento da
República, passou a denominar-se Ginásio Paranaense e Escola Normal. Vasculhar os
objetivos que a definiram no período de sua constituição, em 1876 até o ano de 1905,
momento importante para a história da disciplina no Paraná, foi o intento deste trabalho.
Palavras-chave: História escolar. Ensino Secundário. Paraná. Século XIX.
ABSTRACT
The present study investigates History as a school subject in the state of Parana. In order to
keep track of the birth and development of the subject, a historical research was conducted
based on debates about school education during the time when Parana had its status changed
from 5
th
Judicial District of São Paulo to an independent Province. The selected bibliography
led the investigation to the State School of Parana. The school was founded in 1846, by São
Paulo State Law n. 33, under the name of Liceu de Curitiba, initially, an institution of high
school education. It was only in 1858, though, after Parana was already a Province, that the
school was effectively recognized as an institution of regular education, with proper locality.
Also, 1858 was the year when History and Geography were created as school subjects at the
Liceu. However, due to lack of students enrolled in History classes, the subject could not be
legitimized at the time. In fact, the only subjects offered were French, Latin and Mathematics,
until 1869, when the school was closed and the teachers and students were then transferred to
a subventionary school, Nossa Senhora da Luz. During the subvention period, which lasted a
year, there was still a lack of students to attend History classes. Actually, effective records of
the subject being taught date back to 1876, when Liceu de Curitiba definitely stopped
existing, and the Preparatory Institute and the Normal School (for teacher development at
secondary level) were created. Because this event marked the History of Education in Parana
in a significant way, this study examined the course of the above mentioned institution from
its creation in 1876 until 1905. Thus, the focus is on how the school subject (History) appears
in relation to the objectives of secondary education during the transition period from the
imperial society to the Brazilian republic, during its creation and the long process prior to
becoming a school subject at the Preparatory Institute and the Normal School (with the
Republic advent this institution was further named Parana Gymnasium – high education from
5
th
to 8
th
grades – and Normal School). Therefore, understanding the objectives that defined
History as a school subject in the state of Parana, which happened from 1876 to 1905, was the
ultimate aim of the present research.
Key words: School history. Secondary education. Parana. 19
th
century.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................................
10
I O LUGAR DA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO ESCOLAR NO
IMPÉRIO BRASILEIRO
1.1 A Corte e o Colégio Pedro II: ordenar e instruir............................................................
32
1.2 Colégio Pedro II: a legitimação do saber histórico escolar no Brasil...........................
39
1.3 Instruir e Civilizar: os compêndios de História adotados no Colégio Pedro II...........
44
II A DISCIPLINA DE HISTÓRIA NO PARANÁ E SUA LEGITIMAÇÃO COMO
SABER ESCOLAR
2.1 Do Liceu de Curitiba ao Ginásio Paranaense e Escola Normal: a disciplinarização
do conhecimento histórico no Paraná....................................................................................
52
2.2 O ensino secundário no Paraná: o padrão ideal e o padrão real não se podem
separar......................................................................................................................................
65
2.3 A afirmação da História como disciplina escolar no Paraná: O Instituto de
Preparatórios e Escola Normal..............................................................................................
71
2.4 O Instituto de Preparatórios e Escola Normal: a composição da elite intelectual
paranaense................................................................................................................................
75
2.5 O predomínio da Escola Normal e o ensino de História................................................
78
2.6 Da crise ao caminho da consolidação do ensino secundário: a disciplina de História
no Instituto Paranaense e Escola Normal..............................................................................
83
2.7 Os letrados paranaenses e o ofício de ensinar História..................................................
86
2.8 A disciplina de História no Ginásio Paranaense e Escola Normal................................
91
III AUTORES E COMPÊNDIOS DE HISTÓRIA NO PARANÁ: A HISTÓRIA
ENSINADA E A FORMAÇÃO DO CIDADÃO
3.1 Compêndios de História no Paraná: conferindo sentidos aos saberes escolares.........
103
3.2 Victor Duruy: o modelo de uma História Universal......................................................
104
3.3 As Lições de Manuel de Macedo: um modelo de História do Brasil............................
113
3.4 As Lições de História do Brasil de Mattoso Maia..........................................................
125
3.5 As Lições de História de Dario de Castro Vellozo..........................................................
131
3.6 Historiografia didática e construção do texto escolar de História no Paraná.............
139
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Compêndios de História e Formação do Cidadão............
144
REFERÊNCIAS.......................................................................................................................
150
ANEXOS
LISTA DE QUADROS
QUADRO I Livros de História adotados no Colégio Pedro II – 1838-1920.....................
165
QUADRO II Livros de História adotados no Instituto Paranaense e Escola Normal/
Ginásio Paranaense e Escola Normal – 1870 – 1905....................................
166
QUADRO III
Regulamento de 10 de Junho de 1858 – Programa do Liceu de Curitiba.....
166
QUADRO IV
Lei n. 290 de 15 de Abril de 1871 – Programa do Colégio Subvencionado.
167
QUADRO V Lei n.456 de 12 de Abril de 1876 – Programa do Instituto de Preparatórios
e Escola Normal............................................................................................
167
QUADRO VI Regulamento do Instituto Normal e de Preparatórios da Província do
Paraná – 1882................................................................................................
168
QUADRO VII
Lei n. 712 de 30 de novembro de 1882.........................................................
168
QUADRO VIII
Regulamento do Instituto Paranaense e Escola Normal –Janeiro de 1884...
169
QUADRO IX
Regulamento do Ginásio Paranaense e Escola Normal – 1892....................
169
QUADRO X Decreto n.06 de 17 de Fevereiro de 1893 – Reforma do Programa..............
169
QUADRO XI
Decreto n.93 de 11 de março de 1901 – Programa do Ginásio Paranaense e
Escola Normal............................................................................................
170
QUADRO XII
Plano de estudos para as Escolas Primária – Regulamento de 1857.............
170
QUADRO XIII Manuais indicados para adoção no ensino primário – 1859.........................
170
INTRODUÇÃO
Siles disciplines scolaires sont le résultat d´une
longue et complexe élaboration colective, d´un
processus localisable et datable, et non la
manifestation d´une Idée intemporalle, [...].
(Annie Bruter)
As reflexões sobre a História como disciplina escolar no Brasil, que se travam
num intenso debate no final dos anos de 1970 e início de 1980 entre os intelectuais
preocupados com a questão da produção e transmissão desse saber escolar, têm no tema
Ensino de História o pilar sob o qual são percebidas as bases teóricas e práticas que
foram identificadas com o projeto educativo do regime militar.
Na ocasião, toda a organização escolar consolidada pela ditadura foi criticada. No
que se refere ao currículo de História, foi denunciada a substituição de História e
Geografia, no ensino fundamental, pelos chamados Estudos Sociais, Organização Social
e Política do Brasil (OSPB) e Educação Moral e Cívica, e, no ensino médio, a diminuição
de sua carga horária.
1
Os trabalhos que faziam as críticas propunham, por sua vez, estudos e pesquisas
que tentavam captar, em suas diferentes possibilidades de pesquisas e relatos de
experiências didáticas, a articulação teoria e prática no ensino; a preocupação com a
formação do professor e do historiador; as relações que se podem estabelecer entre
História e ideologia, especialmente por meio do livro didático, entre ensino e pesquisa; a
produção do conhecimento histórico no ensino fundamental e médio; a ligação entre
universidade e outros graus de ensino; os problemas da escola pública e a qualidade do
ensino; a autoridade do professor em relação à passividade do aluno e, entre outros, o
papel da história como disciplina escolar na construção da sociedade democrática e da
cidadania.
Esse debate encontra-se em diferentes artigos de revistas especializadas e em
anais de encontros de historiadores e professores de História, geralmente organizados
pela Associação Nacional dos Professores Universitários de História (ANPUH) e, ainda,
1
Sobre isso ver: Fonseca(1995); Martins (2002).
11
em coletâneas de textos que, publicados na época, expressavam tentativas de
modificações nas práticas pedagógicas do ensino de Historia
2
.
Concentrada basicamente em estudos preocupados em denunciar o caráter
ideológico e acrítico que envolvia a disciplina e divulgar novas experiências didáticas, a
produção em torno do ensino de História, nesse período, procurou identificar no “sujeito
crítico” a concepção de cidadão desejada, perspectiva compreensível dada a grande
mobilização nacional em torno da “redemocratização” do país, que culminou na
promulgação da Constituição Cidadã de 1988.
Em julho de 1997, a ANPUH organizou o XIX Simpósio Nacional com a
temática “História e Cidadania”. Nesse evento, evidenciou-se não apenas o fato da
complexidade que o tema da cidadania e da formação do cidadão carregava como objeto
de pesquisa, mas, sobretudo,
[...] que a mobilização coletiva de pesquisadores acerca do tema [era] um indicativo de
que, embora a produção em torno da temática da cidadania e da formação do cidadão
tenham sido imensuráveis nos anos subseqüentes à ditadura militar nas ciências sociais,
revelando as diferentes abordagens filosóficas, políticas, sociológicas, antropológicas e
talvez outras mais, o levantamento exaustivo dos títulos acerca da temática na produção
historiográfica, coordenado pela professora Maria Helena Capelato, cobrindo um
período de dez anos (1985-1994) e arrolando a produção de todos os programas, até
então existentes, [acabava] demonstrando a pequena expressão que o tema cidadania,
como objeto principal da pesquisa histórica, detinha naquele conjunto (Martins, 1998,
p.23).
Entretanto, no mesmo encontro, chegou-se à conclusão de que um exame mais
apurado do mesmo material evidenciava que os historiadores participaram da
mencionada produção por várias “outras entradas”, através do estudo de temas,
[...] como exclusão, marginalidade, migração, minorias étnicas, exploração do trabalho,
direitos da classe trabalhadora, da mulher e da criança, formas associativas,
organização sindical, habitação, favela, saúde pública [...], o que, de alguma forma,
relaciona-se com o campo da cidadania como tema de pesquisa, [e] mostra como o
universo textual da cidadania é “essencialmente polifônico” (Falcon, apud Martins,
1998, p.28).
Os estudos que vieram se fazendo desde então têm contribuído para a
reavaliação daquela noção de cidadania, desvendando processos em que o tema se
inscreve e lançando bases para o tratamento da questão sob a perspectiva de sua própria
2
Parte desse debate está publicado nos seguintes livros: Silva (1984); Franco (1982); Cabrini (1982); Pinsky
(1988).
12
historicidade. Pode-se citar o historiador brasileiro José Murilo de Carvalho que,
particularmente, tem demonstrado interesse pelo problema, o que se evidencia pelas
suas publicações sobre o tema
3
.
No que se refere à produção em torno da relação ensino de História e cidadania,
considera-se que se impõe como importante a análise histórica e a própria revisão do
conceito e da relação estabelecida entre essas duas temáticas. É necessário refletir sobre
o quadro teórico pertinente, considerando sobretudo as contribuições da chamada
“História das Disciplinas Escolares”, que têm permitido compreender as questões que
envolvem o ensino de História e a história ensinada em sua historicidade. Longe de estar
superado, fundamentalmente no que se refere à sua relação com a História enquanto
disciplina escolar, só agora sua investigação caminha a livres passos, muito embora as
dificuldades documentais sejam um fato. O tema da formação do cidadão e da cidadania
no Brasil mostra-se atual e inquietante.
Nascido do conteúdo histórico forjado pela colonização, a formação do cidadão
no Brasil esteve determinada pela concepção de direitos civis e políticos que tiveram na
separação desses direitos as diretrizes para as práticas de cidadania. No momento da luta
pela constituição da nacionalidade brasileira, dos esforços empreendidos para a
independência política do Brasil, projeta-se, simultaneamente, a construção do cidadão
que comporia a nova nação civilizada. Naquela conjuntura, constituir um Estado
Nacional independente significava a formação de uma Pátria, com um governo
legitimado pelos representantes do seu povo nos moldes do discurso político e social
europeu. Dessa forma, cidadania e identidade nacional estariam juntas, pois, conforme
indicou Carvalho (1995, p.11):
Cidadania é também a sensação de pertencer a uma comunidade, de participar de
valores comuns, de uma história comum, de experiências comuns. Sem esse
sentimento de identidade coletiva – que conferem a língua, a religião, a história –
não seria possível a existência de nações democráticas. A identidade nacional quase
sempre está estreitamente vinculada aos direitos, sobretudo civis.
Em seu processo histórico de constituição, na Europa ocidental do século
XVIII, a relação autoridade pública e cidadania se integraram no interior de uma
3
Em 1987, publicou Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi, em que dedica dois capítulos
(III e IV) à discussão do conceito de “cidadãos ativos” e cidadãos inativos” . Dando continuidade ao estudo,
publica em 1990 A formação das almas: o imaginário da República do Brasil, no qual discute os principais
conceitos das idéias republicanas no Brasil, entre elas “A cidadania e a Estadania”, no final do primeiro capítulo;
Em 1996, foi editor convidado para fazer a apresentação do nº 18 da Revista Estudos Históricos, que tratou do
13
mudança social onde o exercício do poder democratizava-se à medida que se
organizavam as novas relações sociais. Nesse trajeto, como indica Bendix (1996, p.26),
“o Estado nacional tornou-se uma forma ‘natural’ de organização da comunidade
política, combinando com sucesso dominação e consentimento”. Entendia-se, no Brasil
do mesmo período, no quadro das lutas pela independência do século XVIII, que
[...] a dimensão da cidadania poderia ser definida por dois aspectos de interação
necessária: o referente à independência nacional e o relativo à idéia de a constituição da
nova nação vir a ser elaborada por representantes eleitos pela população do país. Em
outras palavras, a dimensão de cidadania seria estabelecida pelo conjunto das leis que
regeriam os direitos e deveres da população e de um governo soberano. (Neves, 1997,
p.82).
Todavia, tendo sido a independência promulgada e mantendo-se o regime
monárquico e a escravidão, a construção da cidadania e do cidadão brasileiro passou a
significar um desafio para as classes que assumiam a direção do país independente e que
viam na monarquia a única maneira de assegurar a independência política brasileira.
Nesse trajeto, diferentemente do que alguns pensadores do século XIX previam, “[...]
essa trajetória apresentou-se numa infinidade de variações históricas, uma vez que as
experiências modernizadoras se mostraram singulares, apesar das teorias da
modernização se mostrarem universais” (Bendix, 1996, p.27).
No caso da experiência histórica brasileira, o fundamento sobre o qual se
assentaram os princípios lapidares de uma concepção de direitos civis e políticos nasceu
durante o século XIX, na vigência do regime monárquico. As forças predominantes na
condução do processo de emancipação política não objetivavam alterar em suas bases o
caráter da relação colonial e escravista da sociedade brasileira.
As questões e inquietações que inspiram e orientam esta investigação estão
inscritas na procura em compreender como a disciplina de História, em seu processo de
constituição no século XIX, é atrelada ao projeto de formar cidadãos no interior de um
regime político que preserva a monarquia e a escravidão e, na continuidade histórica,
como, com a proclamação da República, o problema toma novos contornos políticos e
sociais.
tema da cidadania, tendo publicado o artigo Cidadania: tipos e percursos. (p.337 a 359). Em 2001, publica o
livro Cidadania no Brasil – o longo caminho, em que sintetiza seu pensamento sobre o tema.
14
1 A História da Disciplina como Referência de Análise.
Chervel (1990, p.78) enfatiza, no texto em que teoriza sobre o campo de
pesquisa, “História das Disciplinas Escolares”, que o historiador tem “a tarefa de definir
a noção de disciplina ao mesmo tempo em que faz a sua história”. Ao indicar o caráter
metodológico da pesquisa histórica sobre as disciplinas escolares, indica como a
atividade do historiador se insere no próprio processo de construção das questões e
elementos que as envolvem em determinado momento. Estudar a história da disciplina
escolar, nessa perspectiva, implica vê-la se construindo num complexo de “teias”
relacionais em que atuam diferentes agentes sociais.
Nesse movimento, em que se pode visualizar a disciplina se construindo, é que
se devem buscar os significados dos termos, expressões, conceitos, noções disseminados
nos documentos da época, para interrogar-se sobre as questões e os elementos
constitutivos de sua forma escolar
4
. Portanto, é nesse exercício de reflexão histórica que
se pode, por exemplo, localizar se determinadas questões que nos move no presente
estavam, a seu modo, em períodos anteriores. Se estavam, como se apresentavam? Que
relações estabeleciam? Se não estavam, o que poderia explicar sua ausência? Essas
seriam, possivelmente, questões que o historiador se colocaria como importantes para
sua análise e definição de conceitos.
Procedente, houve, no final do século XX, o reconhecimento de que o estudo
da história das disciplinas escolares pode esclarecer os fatores que influenciaram os
processos pelos quais passaram os saberes ao se escolarizarem. Explicados em sua
trajetória histórica, esses esclarecimentos indicariam os possíveis padrões de
estabilidade e mudança de conteúdos e método de ensino de determinada disciplina
escolar. Por isso considera-se, atualmente, que a história da disciplina está no centro de
toda história do ensino. Sobre isso, Chervel (1990, p. 17) afirma: “[...] ainda que a
história do ensino possa avocar uma tradição já amplamente secular, o estudo dos
conteúdos do ensino primário ou secundário raramente suscitou o interesse de
pesquisadores”.
Além disso, acrescenta o autor, “[...] limitado em geral às pesquisas pontuais sobre
o exercício ou sobre uma época, ele [o estudo do ensino] não se eleva ao nível de
4
Sobre o conceito de “forma escolar” ver: Vicent (1994).
15
sínteses mais amplas”. Também Julia (2001, p.12-13), observando as contribuições
desse campo de pesquisa para a História da Educação, anuncia:
Sem querer em nenhum momento negar as contribuições fornecidas pelas problemáticas
da história do ensino, estas têm-se revelado demasiado “externistas”: a história das idéias
pedagógicas é a via mais praticada e a mais conhecida: ela limitou-se, por demasiado
tempo, a uma história das idéias, na busca, por definição interminável, de origens e
influências; a história das instituições educativas não difere fundamentalmente das outras
histórias das instituições [...]. A história das populações escolares, que emprestou método
e conceitos da sociologia, interessou-se mais pelos mecanismos de seleção e exclusão
social praticados na escola que pelos trabalhos escolares, a partir dos quais se estabeleceu
a discriminação. É de fato a história das disciplinas escolares, hoje em plena expansão,
que procura preencher esta lacuna [...].
E conclui:
Ela tenta identificar, tanto através das práticas de ensino utilizadas na sala de aula como
através dos grandes objetivos que presidiram a constituição das disciplinas, o núcleo duro
que pode constituir uma história renovada da educação. Ela abre, em todo caso, para
retomar uma metáfora aeronáutica, a “caixa preta” da escola, ao buscar compreender o
que ocorre nesse espaço particular.
Esses estudos têm mostrado que as disciplinas escolares, produzidas pelo
complexo das relações estabelecidas entre os seus diferentes agentes constitutivos, vão
se construindo num campo pedagógico onde a hierarquização dos saberes se faz a partir
das finalidades do ensino que as relações socioculturais lhes imprimem e que se
manifestam na constituição do currículo escolar. Nesse sentido, afirma Goodson (1998,
p.106):
As futuras direções para o estudo das disciplinas escolares e do currículo exigirão o
emprego de um método mais amplo. [...]. Esse trabalho terá que passar por um exame
concreto das relações entre o conteúdo e a forma da disciplina escolar, assim como
temas relacionados com a prática e o processo escolar.
O trajeto escolar passou a ser visto como um elemento conformador dessas
relações que estão no centro da disciplina, mas fora dela também, nas relações sociais e
culturais de que faz parte. A disciplina escolar se torna, dessa forma, um elemento
indivisível das relações que se desenvolvem nos aspectos mais gerais da sociedade e da
experiência escolar, muito embora essa última tenha uma existência singular, conforme
indicou Chervel (1990, p.182) quando se referiu ao caso do ensino da gramática e da
16
matemática escolares na França. Na mesma perspectiva, salienta Goodson (1990, p.
235):
Longe de serem derivadas de disciplinas acadêmicas, muitas matérias escolares
precedem cronologicamente suas disciplinas-mães: nessas circunstâncias a matéria
escolar em desenvolvimento realmente causa a criação de uma base universitária para
“disciplina” de forma que professores secundários das matérias escolares possam ser
treinados.
Essa abordagem tem permitido não só a ampliação da percepção da disciplina
escolar como objeto socialmente construído, mas, fundamentalmente, o diálogo com
outros setores de investigação, como o livro didático. Nesse terreno, as investigações
atuais avançam na crítica de apontar o caráter ideológico dos conteúdos prescritos, bem
como em preocupar-se em verificar “[...] a distância que separa o conteúdo dos livros
(e do próprio ensino) da mais recente produção acadêmica e sobre os modos de saná-
la” (Munakata, 2000, p.303-304). Buscam, sim, trabalhar com a análise histórica do
livro didático, tornando-o fonte de significativa importância para conhecer as
finalidades do ensino e dos conteúdos ensinados em determinado momento histórico de
uma sociedade. Isso porque, tem-se entendido que o
O livro de texto constitui-se, assim, num precioso indicador das relações de força que
se estabelecem em um momento dado e em uma sociedade determinada entre os
diversos atores do sistema educativo, pois o grau de liberdade que gozam seus
redatores e quem os utiliza pode variar consideravelmente. (Choppin, 1997, p.170).
Um outro aspecto importante é a preocupação em identificar as origens do ensino
da disciplina escolar no itinerário institucional e social de sua gênese e
desenvolvimento, fazendo forte parceria com a história das instituições escolares.
Nesse sentido, a pesquisa não está apenas circunscrita em investigar o currículo e
os aspectos que lhe são imanentes, mas a relação que se estabelece entre a constituição
dos saberes científicos e os saberes escolares, no quadro da constituição dos percursos
educacionais mais amplo, que são: as Políticas Públicas; o debate teórico dos conflitos
historiográficos e pedagógicos e a reconstituição de seu trajeto em instituições em que
suas aulas se realizam, localizando, ali, os intelectuais e professores que por elas ficaram
responsáveis bem como suas formações e os materiais didáticos utilizados. No que se
refere a esta relação, afirma Chervel (1990, p. 188):
17
A instituição escolar é, em cada época, tributária de um complexo de objetivos que se
entrelaçam e se combinam numa delicada arquitetura da qual alguns tentaram fazer
um modelo. É aqui que intervém a oposição entre educação e instrução. O conjunto
dessas finalidades consigna à escola sua função educativa. Uma parte somente entre
elas obriga-a a dar uma instrução. Mas essa instituição está inteiramente integrada ao
esquema educacional que governa o sistema escolar, ou o ramo estudado. As
disciplinas escolares estão no centro desse dispositivo. Sua função consiste, em cada
caso, em colocar um conteúdo de instrução a serviço de uma finalidade educativa.
Procurando a apropriação das contribuições dessa perspectiva de análise, este
trabalho tem por objetivo fundamental estudar a disciplina de História no Paraná. Dentre
as possibilidades de estudos que esse campo de pesquisa permite, a que motivou e
possibilitou este trabalho foi a investigação das finalidades de seu ensino, ou seja, o
estudo dos conteúdos ensinados nas aulas de História do Instituto de Preparatórios e
Escola Normal, fundados em 1876 na Província do Paraná, em substituição ao Liceu de
Curitiba. A intenção é ver como ela se constrói no interior das relações sócio-culturais
paranaenses no decorrer de meados do século XIX e início do XX e se torna uma
disciplina escolar legitimada pela conjuntura social brasileira do período.
O século XIX é eleito por dois motivos primordiais: por considerar-se que é na
emergência do Estado Moderno e na forma escolar constituída que se torna inteligível o
significado histórico da História como disciplina escolar e, no que se refere à temática a
ser abordada, é nesse período que se pode verificar como se constrói historicamente a
relação ensino de História e formação do cidadão. Um outro motivo é o reconhecimento
de que, embora já tenha sido objeto de estudos desde os anos de 1950
5
no Brasil, a
investigação da história como disciplina escolar no século XIX pouco interesse tem
surtido do pesquisador da disciplina, resultando que quase nada se sabe sobre sua
trajetória nesse período, em particular nos Estados brasileiros que não estão na rota Rio
de Janeiro e São Paulo, como é o caso do Paraná.
Entendida como um conjunto de conteúdos que vai, ao longo do tempo, se
construindo como escolar, a disciplina escolar percorreu um longo processo para ir se
5
Nos anos 50, aparecem trabalhos importantes que buscam fazer uma “história do ensino de História” no Brasil.
Dentre eles destacam-se: O Ensino da História no Brasil,(1953), uma coletânia que reuniu textos de autores
nacionais (Artur César Ferreira Reis, Ermindo Luis Viana, Helio Viana, Virgilio Corrêa Filho) publicada no
México pelo Instituto Panamericano de Geografia e Historia. Nesse livro, é apresentada, sumariamente, uma
história do ensino de História no Brasil tomando desde o ensino primário, passando pelo curso normal até as
Faculdades de Filosofia, trazendo em anexo os programas estabelecidos para a disciplina. Um outro trabalho de
igual importância foi: Um quarto de século de programas e compêndios de história para o ensino secundário
brasileiros, 1931-1956, de Guy de Hollanda, publicado pelo INEP em parceria com o MEC em 1957.
18
definindo, no século XIX, como uma matéria de ensino e correspondendo à classificação
das matérias de ensino e como “ginástica intelectual” (Chervel, 1990).
Associada a um modo de disciplinar o espírito, quer dizer, de lhe dar “os métodos
e regras para abordar os diferentes domínios do pensamento, do conhecimento e da arte”
(Chervel, 1990, p. 178), cabe ressaltar que, neste estudo, emprega-se o termo disciplina
escolar, para se referir aos diversos níveis de escolarização do ensino básico, e
disciplina acadêmica, para designar o nível superior. Busca-se, no movimento
complexo das relações internas e externas ao espaço escolar da sociedade paranaense,
entender como a história escolar vai se constituindo enquanto resultado de práticas e
representações sociais de conhecimento socialmente válido no conjunto das relações
sócio-históricas da sociedade imperial e sua transição para república, reconhecendo os
agentes constituidores da História como disciplina escolar.
Ao buscar os agentes definidores da disciplina de História no Paraná, levou-se em
consideração as Políticas Públicas para a Educação, desenvolvidas no Império, e a
estrutura organizacional da instituição secundária do período como eixos norteadores da
análise.
1.1 As políticas educacionais e os alunos
Projetado no interior de uma política educacional marcada pelos chamados
cursos de preparatórios, o ensino secundário no século XIX, pela situação estabelecida
no Ato Adicional de 1834, ficou dividido em dois sistemas paralelos de ensino que
perduraram até o período republicano. O sistema regular, seriado, oferecido pelo
Colégio de Pedro II e eventualmente pelos liceus provinciais e por alguns poucos
estabelecimentos particulares, e o sistema irregular, de aulas avulsas, mantido em sua
maioria pelos estabelecimentos provinciais, constituídos pelos cursos preparatórios e
exames parcelados de ingresso ao ensino superior (Piletti,1987, p.35).
A grande predominância dos preparatórios sobre o ensino gradual era
fortalecida pelas próprias normas que regulamentavam o ingresso ao ensino superior. A
não exigência do título de bacharel, ou seja, da conclusão do ensino secundário regular,
para a entrada nos cursos superiores, provocava os candidatos a buscarem a aprovação
direta nos exames parcelados. Essa prática era intensificada na medida que não era
possibilitado aos liceus provinciais darem entrada direta aos cursos superiores sem
19
prestar os exames. Nesses casos, os candidatos deveriam, após terem cursado o
secundário ou parte dele nas províncias, prestar os exames que, no início, se faziam
diretamente nos estabelecimentos de ensino, e depois puderam também serem realizados
junto ao Colégio de Pedro II no município da Corte (Haidar, 1972).
Tal política contribuiu para o esvaziamento e as conseqüentes extinções dessas
instituições de ensino secundário provinciais por dois motivos: primeiro, os candidatos
escolhiam os caminhos mais rápidos de acesso aos cursos superiores; segundo, porque,
prevendo que quem fizesse o curso no colégio oficial da Corte não teria de realizar
novos exames, provocava uma fuga de alunos dos cursos locais para o Centro. Fuga que,
por longo tempo, predominou na história desse ensino no Brasil, pois, embora os
insucessos do ensino secundário provincial tivessem sido discutidos pelas autoridades
no Império, chegando à criação da política de equiparação dos liceus ao padrão seriado
do Pedro II, não foi possível superar os problemas de existência dessas instituições até
fins do período monárquico.
Essas determinações a que as províncias estavam submetidas, bem como a
forma como o ingresso nas faculdades do Império se davam, foram decisivas para a
consolidação das cadeiras de História nessas instituições. Isso porque, no primeiro caso,
a existência do curso secundário através de aulas avulsas determinava que o interesse de
alunos e a existência de professores, para concretizar as aulas da cadeira de História
naquelas instituições de ensino, fossem marcantes em sua constituição e manutenção.
No segundo, a presença dessa matéria escolar nos exames marcava, da mesma forma,
sua procura. Ou seja, os estudantes só se interessavam pela cadeira de História caso ela
estivesse sendo exigida entre as matérias que precisavam ser aprovados para ingressar
no curso cuja vaga estavam disputando.
1.2 A composição da “cadeira” e o professor de História
No período em que a disciplina de História se constitui, o quadro das relações
culturais e da organização do trabalho pedagógico se fazia no conjunto de uma forma
escolar característica da modernidade. Nela, o modelo de instituição de ensino tendia a
ajustar-se à política de centralização empreendida pelo Estado, que se voltava para a
20
regulamentação uniforme do país. Esse processo articulou as práticas ligadas ao
movimento interno das instituições de ensino aos novos encaminhamentos,
determinando a composição dos quadros e a atuação de professores.
No Brasil, apesar do Ato Adicional de 1834 descentralizar a organização do
ensino, dando autonomia às Províncias, as práticas educacionais do curso secundário
foram uniformizadas pela prática dos exames de preparatórios.
Tomando-se por base as práticas que se desenvolveram no século XIX, é
possível perceber que a forma como a organização interna das instituições de ensino
secundário e superior se fez foi determinante para a constituição e afirmação da
disciplina de História e seus conteúdos.
No processo de organização dessas práticas escolares, foram elaborados
diferentes tipos de documentos para a organização e definição dos estudos e do ensino
nas instituições secundárias. Segundo se verifica, o Ministério do Império, por meio de
Regulamentos, aprovava os Planos de Estudos e definia as aulas e o sistema de posse de
professores e respectivas cadeiras.
Gasparello (2004), estudando o caso do ensino de História no Colégio de Pedro
II, indica que “cada aula era composta por várias cadeiras”:
O termo aula teve então um sentido plural, formado por um conjunto de estudos que
eram desenvolvidos em um determinado tempo, por diferentes professores que
ensinavam as matérias de suas cadeiras respectivas. Reunidas às outras aulas, formavam
uma unidade: o curso secundário. (p.64, grifos da autora).
Para assumir as cadeiras, o que designava à época “cargo”, a prática de
contratação previa a nomeação direta ou o concurso de lentes. Diferentes da categoria de
professores, esses regiam a cadeira, enquanto os professores apenas davam aula.
(Gasparello, 2004, p. 69).
A formação humanista que predominava no ensino secundário do período,
somada à política de contratação dos professores, determinavam que os sujeitos que
assumiam as cadeiras fossem, na sua maioria, bacharéis formados em Letras ou nos
cursos superiores, em particular de Direito, de onde saia a maioria dos letrados da época.
Isso teve implicações significativas na constituição e manutenção da cadeira de História,
fundamentalmente no que se referiu a esse ensino nas províncias.
No que diz respeito à primeira situação, a formação fundamentada no
Humanismo indicava que os intelectuais que se dirigiam ao ensino possuíam variada
21
instrução, o que, a princípio, possibilitava-lhes ensinar qualquer matéria do programa.
Era comum nas instituições de ensino provinciais, por exemplo, na falta de lentes para
ocuparem determinada cadeira, um outro assumir, para além da que já ocupava, mais a
cadeira vaga. Também era permitida a permuta com outro lente ou a troca de cadeiras,
dependendo de seus interesses e independente do concurso realizado. Essa prática era
desenvolvida, muitas vezes, para ajeitar a oferta de matérias procuradas nos cursos
avulsos. Dessa forma, o trânsito de lentes e professores nas diferentes cadeiras era
comum nas províncias.
Da mesma forma, como a divisão dos conteúdos da História estava circunscrita
a um momento ainda de definição da área, a matéria de História aparecia, em alguns
momentos, ligada a matérias que, anteriormente, compunham uma cadeira diversa.
Nesses casos, a mudança de lente ou professor que ficava responsável por essa matéria
era muito freqüente. Somente quando a História já estava mais definida em seus
conteúdos e divisões disciplinares que se pode perceber uma maior permanência de
professores ou lentes nas respectivas cadeiras.
Desses eixos, localizaram-se os elementos determinantes também na
constituição e consolidação da disciplina de História na Província do Paraná, definindo
as seguintes questões como condutoras da pesquisa
:
a)- Quando surge a disciplina de História no Paraná?
b)- Ela mantém que tipo de relação com os graus de ensino (primário/secundário) em
seu processo de consolidação?
c)- Como a disciplina de História vai se apresentando, através de seus conteúdos, como
matéria escolar preocupada com a questão da formação do cidadão durante o período
estudado?
2 Das Fontes
A sociedade do Império produziu sobre a escola brasileira da época uma
literatura muito diversificada: textos oficiais, discursos ministeriais, leis, decretos,
instruções, circulares, planos de estudos e programas de ensino. É essa literatura diversa
22
que instrumentalizou a investigação e constituiu-se em fonte de pesquisa. Parte dos
textos oficiais foi encontrada no Arquivo Público do Estado do Paraná.
Nos documentos ali existentes, encontram-se Coleções de Leis, Decretos,
Regulamentos e Atos do Governo, Relatórios de Presidentes da Província e Inspetores
da Instrução Pública, que cobrem o período a ser estudado. Além disso, o Arquivo
Público do Estado conta com uma documentação denominada “AP”, que corresponde à
organização, feita por ano, de Correspondências de Governo, Professores, Diretores de
Escolas, Alunos e Ofícios Diversos que foram trocadas entre esses sujeitos no período
provincial e auxiliaram na organização das fontes para o desenvolvimento deste estudo.
Também constituíram-se em fontes os documentos encontrados no Colégio
Estadual do Paraná, antigo Liceu de Curitiba e posteriormente Instituto de Preparatórios
e Escola Normal, onde localizaram-se Livros-Atas de reuniões da Congregação, Livros
de Posses de Lentes e Professores, Livros de Exames dos alunos, Compêndios e
Manuais de História e alguns Impressos que, a partir do século XX, passaram a divulgar
os Programas de Ensino do Ginásio Paranaense.
No estudo da disciplina no século XIX, os compêndios e manuais tornaram-se
fonte e objetos de análise imprescindíveis. Isso porque eles representaram,
possivelmente, o instrumento mais exato da construção dos programas escolares, nos
quais a disciplina se “revela por inteiro”, visando construir, pelos seus conteúdos, uma
memória escolar.
Do universo documental levantado, foram os compêndios escolares que se
constituíram em fontes e objeto principais da análise. Sua maior parte localizadas no
Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, na biblioteca de
Educação da USP e no Colégio Estadual do Paraná, tornando-se fonte fundamental da
pesquisa, com apoio na qual se pode proceder os recortes necessários para a
investigação.
2.1 Dos compêndios de História
Pareceu-nos que, para uso em todas as escolas normais
primárias, era necessário um manual curto, substancial,
sumário, que contivesse apenas princípios gerais; para as
classes do curso secundário, um pequeno tratado, também
23
sólido porém mais literário. Um deles, para o estudo
puramente prático e útil; o outro, para uma arte ao mesmo
tempo útil e agradável. (Agénor Bardoux, 1878, apud
Chartier e Hébrard, 1995, p. 268, grifo meu)
A declaração de Bardoux, personagem importante das reformas educacionais
da França, registrada numa circular aos reitores de 28 de setembro de 1878, é sugestiva
para a reflexão sobre a criação do livro escolar como um instrumento que, conforme
indicou Hamilton (2001, p.51) “[...] confere identidade cultural tanto à escolarização
moderna quanto à sociedade européia moderna”. Segundo Hamilton, o livro texto, o
currículo, a disciplina e a didática formaram as suas bases no decorrer do processo de
escolarização da sociedade moderna, que, a partir da combinação das novas técnicas de
impressão e das novas técnicas de tradução, teve as bases racionais da tradução
renascentista também transformada gradativamente em intencionais junto às práticas de
adaptação e retificação dos livros de leitura. Nesse período:
Começaram a surgir textos não tanto em diferentes traduções mas também em
diferentes versões. Foram produzidas, por exemplo, na forma de edições, exposições,
paráfrases, catecismo e compêndios paralelos. De fato, muitas dessas versões também
foram produzidas para “uso na sala de aula”, presumivelmente por tradutores que
também atuavam como professores. (Hamilton, 2001, p.53).
Até fins do século XVIII, as questões políticas que se desenvolveram em torno
dos “livros escolares”, com a formação dos Estados Modernos, só existiam para os
estabelecimentos que ofereciam uma educação reservada às elites, as quais, nos colégios
do “Antigo Regime”, tradicionalmente recebiam uma educação clássica fundamentada
na leitura de traduções ou originais dos grandes pensadores antigos. Somente no
decorrer do século XIX quando a educação popular torna-se a preocupação central do
Estado, é que surgirão obras com caráter específico de “escolares”, ou seja, para um
ensino intencional, tanto para as escolas de ensino secundário quanto para as nascentes
escolas populares.
Dessa forma, como indicou Alain Choppin (1997), autor contemporâneo que se
dedica ao estudo histórico dos manuais escolares, com o desenvolvimento dos Estados
Modernos, é possível acompanhar os processos de institucionalização dos
procedimentos educativos. Este processo compreendeu uma transferência, mais ou
24
menos completa, das responsabilidades e dos comportamentos em matéria educativa da
esfera familiar e, pouco a pouco, das autoridades religiosas ao poder público. Nesse
trajeto:
As manifestações mais claras da intervenção deste Poder [público] sobre o objeto e os
conteúdos da educação se encontram nos programas, que constituem seu marco
teórico, e nos manuais que representam sua proposta na prática concreta. (Alain
Choppin, 1997, p.169, grifo meu).
A estreita relação entre a modernização da escola, a escolarização de
determinados saberes sociais, a elaboração dos programas de ensino e a construção dos
compêndios e manuais escolares é um processo que se realiza de forma mais ou menos
generalizada nos países que tiveram os ideais da modernização européia como matrizes
de uma nova educação dos costumes e vivência social, embora cada qual com suas
questões específicas para serem resolvidas.
No Brasil, as aspirações políticas do Estado Moderno foram incentivadas,
inicialmente, pela escolarização do ensino secundário e pelo processo de laicização do
ensino popular. No que se refere à primeira formação, os compêndios de História,
elaborados pelos professores do Colégio Pedro II e legitimados pelo Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro (IHGB), revelam-se particularmente preocupados com a
necessidade de preparar “homens políticos” para dirigir o país independente. E, no que
se refere ao ensino popular, a necessidade de preparar os “cidadãos” para servir ao
Estado. Assim, os compêndios de História adotados no Instituto de Preparatórios e
Escola Normal no Paraná, a partir da década de 1870, foram produzidos para formar
um saber sobre as origens das nações e, nelas, a nação brasileira, enquanto a demanda
pela educação pública indicava a necessidade de manuais que contivessem os princípios
elementares da moral e da constituição histórica e política da Pátria.
O posicionamento disciplinar da História no processo de construção da nação
brasileira tem como importante referência esses novos ordenamentos da cultura escolar
moderna, que traduziram as novas configurações das práticas educacionais, em especial
no que se referiu, nas primeiras décadas do século XIX, às expectativas em relação ao
ensino secundário brasileiro.
É no processo de consolidação da História como disciplina escolar autônoma
no Paraná que se verifica a relação histórica entre os ideais políticos e sociais da
sociedade do Império brasileiro, nesse caso representada pelo Colégio Pedro II e o
25
IHGB. Lugares de onde se elaborou o novo posicionamento da disciplina a partir dos
anos de 1860-70, com a forma institucional assumida pelo educandário paranaense tanto
no que se refere ao ensino secundário como ao ensino primário.
A reflexão comparativa da forma institucional assumida pelo Colégio Pedro II
com a instituição paranaense, neste trajeto, é permitida pela produção da historiografia
didática nacional que, saída do Centro e legitimada pelo IHGB, ao mesmo tempo em
que inaugura um saber histórico, confere sentido à História como saber escolar e à
redação dos livros por personalidades politicamente confiáveis.
Se nessa produção, perfeitamente visualizável na formação oferecida pelo
Colégio Pedro II, é possível reconhecer alguns marcos na história dos usos dos
compêndios
6
, nas províncias, esses marcos são diluídos em função da forma
institucional consolidada.
Verifica-se que a modalidade institucional assumida pela Província paranaense
nos anos de 1870, referenciada para a reflexão histórica dessa disciplina no Paraná, é
produto de práticas específicas que vão, gradativamente, dotando-se de um formato
institucional adequado às novas funções em uma nova ordem política que caracteriza a
escolarização moderna no Brasil, mas que, por dispositivos econômicos, a organização
do tempo e do espaço escolar desenvolve-se, no século XIX, de maneira singular,
embora não estranha, nem contrária às diretrizes normativas do período.
Desempenhando funções que lhes são complementares - a formação para os
cursos superiores e para a profissionalização do magistério - a instituição paranaense
determinou a especificidade do campo institucionalizado em que a disciplina de História
se desenvolveu.
Tradicionalmente dirigida à formação de uma elite intelectual que viesse a
dirigir a nova nação, a educação escolar secundária brasileira se desenvolve por meio de
projetos de constituição de um curso “regular”, “seriado”. No entanto, o peso das aulas
avulsas foi predominante, o que determinou o fracasso do projeto educacional regular de
humanidades nas províncias.
As dificuldades de implantação desse projeto fizeram com que poucos jovens se
interessassem pelo Liceu de Curitiba e preferissem seguir por outros caminhos,
propiciados pela política educacional dos exames parcelados. O curso para a formação
de professores, surgido no interior do curso secundário, não se constitui numa
6
Sobre isso, ver: Gasparello (2004).
26
experiência diferente, ficando seus ideais, durante o período imperial, apenas projetados
nas propostas.
Dessa maneira, enfrentando as diferentes dificuldades para a modernização do
modelo escolar brasileiro, algumas das províncias tiveram que acomodar, junto ao
ensino secundário, um curso normal, dividindo os professores, espaço físico e materiais
pedagógicos. Essa situação cria práticas específicas no uso dos compêndios indicados
pelo colégio da Corte.
Portanto, considera-se que a orientação majoritariamente favorável a certa
“unificação” dos livros utilizados nos cursos secundários do Império enfrentou entraves
particulares a depender da forma institucional assumida pelas províncias. No entanto, a
política que dificultava a autonomia das províncias comprova uma mudança importante
que se processava, a partir de meados da década de 1870, nas representações de políticos
e intelectuais brasileiros: o quadro nacional passava a ser a referência comum para todos
que de certa forma, legislavam sobre as questões educacionais.
Nesse caso, embora os usos dos livros pudessem ser variados nas províncias, é
no terreno das obras escolares que o Estado deposita, no campo educacional, sua
intenção de unidade nacional; permitindo a todos que, por intermédio da narrativa
histórica escolar, se reconhecessem na gesta nacional e construíssem sua identidade
como membros de um país independente.
3 Dos Procedimentos
Tomando-se por base os conteúdos expressos e impressos nos compêndios
escolares utilizados na instituição paranaense Instituto de Preparatórios e Escola
Normal, fundada em 1876 e que, com a mudança de regime político em 1889, passou a
denominar-se de Ginásio Paranaense e Escola Normal, busca-se analisar o trajeto da
constituição da História como disciplina escolar no Paraná. A intenção é verificar como
as finalidades do ensino dessa disciplina se modificam a depender das relações sociais
em que está inserida e do trajeto institucional a que está circunscrita.
As relações históricas estabelecidas neste trabalho foram construídas valendo-se
das pistas encontradas nas leituras das fontes levantadas. Embora lacunar e bastante
fragmentária, não só pela dificuldade de tratar de um passado complexo como foi a
27
transição do século XIX para o XX, porque todo o passado o é, mas fundamentalmente
pela dificuldade de localizar fontes e dados para o estudo deste objeto, apresenta-se,
aqui, uma história da disciplina no Paraná, construída a partir dos quebrados indícios de
uma parcela do que deve ter sido produzido no período com relação ao tema.
Sobre esse fato, permite-se um adendo provocado pela leitura de Roger Chartier.
No “preâmbulo” de seu livro Leituras e leitores na França do Antigo Regime (2004), o
autor, ao esclarecer no que constitui a coletânea de textos ali reunidos, indica que eles
devem “ser compreendidos como passos sucessivos de uma caminhada que, pouco a
pouco, desenhou seu território”, afirmando que, por esse motivo, “[...] de um texto para
outro, aumentou a distância tomada em relação às certezas e às abordagens mais
amplamente compartilhadas, [e anteriormente] consideradas como evidentes [...]”
(Chartier, 2004, p. 7).
Parodiando Chartier, pode-se dizer que o presente trabalho seguiu e deverá
seguir esses “passos sucessivos”, uma vez que a “[...] aceitação dos modelos e das
mensagens propostas opera-se por meio dos arranjos, dos desvios, às vezes resistências,
que manifestam a singularidade de cada apropriação (Chartier, 2004, p.14). Daí, várias
precauções são, de fato, necessárias para explicitar a apropriação feita, neste trabalho, de
uma História Cultural e, em particular, de uma História da Disciplina Escolar. Fazem
parte dessas precauções os esclarecimentos que se seguem.
3.1 Periodização
A periodização (1876-1905) foi eleita porque, como indicaram as fontes e o
objeto deste estudo, trata-se de um período em que a disciplina de História, ao se
constituir em matéria escolar no Instituto de Preparatórios e Escola Normal em forma de
aulas avulsas, percorre caminhos específicos, característicos do quadro das relações
sócio-culturais da Província, posteriormente Estado do Paraná, e da organização de seu
aspecto pedagógico naquela instituição de ensino escolar.
Em 1876, é criado o Instituto de Preparatórios em substituição ao Liceu de
Curitiba para atender às necessidades de um curso de preparatórios aos cursos superiores
do Império. Na ocasião, as autoridades consideraram conveniente aproveitar os
28
professores e as instalações do Instituto e a ele anexar uma Escola Normal destinada à
formação de professores primários na Província.
Pelo Regulamento de 16 de Julho de 1876, a cadeira de História Universal foi
criada na instituição em meio à intensificação da dualidade que caracterizou o ensino
secundário naquela Província: o desejo expresso de criar um curso regular de
humanidades, e a necessidade, impulsionada pela política educacional do Império e a
constante falta de professores para assumirem todas as cadeiras de um curso de
humanidades, de oferecer as matérias exigidas nos exames gerais em forma de aulas
avulsas aos candidatos aos cursos superiores. A cadeira de História Universal no
Instituto de Preparatórios, que já aparece, nesse regulamento, separada da cadeira de
Geografia, por esses motivos, ficou na permanente dependência dos alunos interessados
nas aulas e, sempre que funcionou, foi freqüentada por poucos alunos se comparada às
cadeiras de Latim e Francês.
A História do Brasil funcionou junto com a Universal até 1878, na instituição,
quando se criou a cadeira de História nacional independente. Durante o período que se
estendeu de 1876 a 1889, foi indicado, para adoção no Instituto de Preparatórios e
Escola Normal, o Compêndio de História Universal de Victor Duruy, já mencionado em
1870 nos documentos oficiais; e, em 1882, as Lições de História do Brasil de Joaquim
Manoel de Macedo.
Após esse período, por se tratar de décadas marcadas por inúmeras mudanças
políticas, econômicas e culturais, como a abolição da escravidão, o movimento
imigratório, o debate em torno do trabalho livre, a proclamação a República e, com ela,
os discursos em torno da redefinição da idéia de nação e ampliação das práticas de
cidadania nos seus anos iniciais, houve uma redefinição da produção didática.
Um estudo mais detido de cada período deixou entrever a complexidade
existente no interior do universo social paranaense e sua relação com as questões mais
gerais que eram construídas na sociedade brasileira, que marcou a transição do Império
para a República. Nesses dois momentos, as obras que se consolidaram no ensino de
História no Paraná foram: o compêndio Lições de História do Brasil de Matosso Maia,
em substituição às lições de Manoel de Macedo em 1899 e as Lições de História Geral
de Annibal Mascarenhas em 1898, em substituição ao compêndio de Victor Duruy.
O recorte efetuado para finalização desta investigação se fez em 1905 quando é
adotado no Ginásio Paranaense e Escola Normal as Lições de História do paranaense
Dario de Castro Vellozo, em substituição a Annibal Mascarenhas, marcando um período
29
de estabilidade no que se refere a mudanças no programa e à adoção de compêndios.
Após 1905, só houve novas propostas em 1926, quando “acordaram os lentes que os
livros a serem adoptados deveriam ser qualquer, mais faceis de serem obtidos na praça,
uma vez que os programas fossem cumpridos integralmente” (Acta da Congregação de
1
o
de abril de 1926, p.59).
A partir dessa proposta, a congregação do Ginásio Paranaense e Escola Normal
fez mudanças em maio de 1928, quando adotou, para História Universal, o livro
Epistome de História Universal de Jonathas Serrano e, para História do Brasil, o livro de
Veiga Cabral. (Acta da Congregação de 26 de maio de 1928, p.32). Considera-se,
portanto, que, no ano de 1905, encerram-se as primeiras mudanças efetuadas na história
da disciplina no Paraná, desde as suas origens em 1876.
3.2 A divisão dos capítulos
A História nos programas curriculares definiu-se, inicialmente, como matéria a
ser ensinada no curso secundário. Em seu processo de constituição como disciplina
escolar autônoma no Brasil, nos contornos sociais do século XIX, estabeleceu relações
com a ação do Estado que buscava, naquele momento, criar instituições formadoras de
uma elite intelectual, capacitando-a para seguir os cursos superiores e assumirem os
cargos políticos e administrativos do Império. Com esse objetivo, criou-se o Imperial
Colégio de Pedro II, no município da Corte, Rio de Janeiro, instituição que, quando não
havia um “sistema” de ensino nacional, tornou-se no colégio oficial da Corte e modelo a
ser seguido pelas demais escolas secundárias do Império.
Centro irradiador das propostas educacionais no período imperial, de seu papel
na constituição da História como disciplina escolar no Brasil, tratou-se o capítulo I: O
Lugar da Produção do Conhecimento Histórico Escolar no Império Brasileiro.
A disciplinarização do conhecimento histórico no Paraná foi assunto do capítulo
II: A Disciplina de História no Paraná e sua Legitimação como Saber Escolar. Nele,
procura-se mostrar como a história dessa disciplina no Paraná se articula à construção e
definição de um curso secundário na Província na década de 1870, sob a direção do
Colégio de Pedro II. As determinações políticas em que as províncias estavam
submetidas, bem como a forma como os ingressos nas faculdades do Império se davam,
30
foram decisivas para a consolidação e legitimação das cadeiras de História no curso
secundário no Paraná que, naquela ocasião, se fez também no mesmo programa
curricular da Escola Normal.
Na continuidade do estudo, o esforço enfrentado foi na identificação dos autores
e os compêndios de História adotados na instituição. A predominância das diretrizes
encaminhadas pelo Colégio Pedro II marcou, também, a adoção dos compêndios no
ensino secundário paranaense, que sempre procurou estar de acordo com o programa do
colégio oficial da Corte. Dentre os vários livros que foram arrolados para uso dos alunos
do colégio oficial, os que se firmaram como compêndios nacionalmente reconhecidos
como habilitados para o ensino de História chegam ao Paraná.
Na análise desses compêndios, que contou com a obra de um autor paranaense,
Dario de Castro Vellozo, buscou-se perceber como a questão da formação do cidadão
relacionou-se com a própria formação da nacionalidade brasileira. Ao construir as
origens do Brasil, tema fundante da historiografia didática nacional do período, ainda
que os autores não falassem em formação de cidadãos nos conteúdos do ensino de
História, o modo de sua construção e exposição dos temas, procurando definir o “Povo”
brasileiro e suas virtudes patrióticas e cívicas, atingia a temática do cidadão. São dessas
relações que trata o capítulo III: Autores e Compêndios de História no Paraná: a
História ensinada e a formação do cidadão.
CAPÍTULO I
O LUGAR DA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO ESCOLAR NO
IMPÉRIO BRASILEIRO
32
1.1 A Corte e o Colégio Pedro II: ordenar e instruir
Esse amontoado de campanários dourados, de torres,
de tetos, de cúpulas sem caráter sério é sem dúvida
atraente, mas não encanta o olhar. A moldura é bela
demais, resplandecente demais, para que a tela tenha
seu efeito. (Charles Expilly).
O Rio de Janeiro, ao tornar-se Corte real, ascender à condição de Corte
imperial em 1822, não apenas monopolizou a cena da vida cotidiana, ocupando o espaço
habitável, modificando a tela colonial, criando praças, ruas e estradas, iluminação e
calçamento, como também monopolizou a ação de montar o aparelho de Estado. Os
ministérios foram sendo criados para dar funcionalidade aos diversos setores de suas
principais áreas de atuação, como: justiça, fazenda, segurança e área militar. Entretanto
não eram apenas esses setores que precisavam estar organizados para que o Rio de
Janeiro sintetizasse o caráter nacional do período, ocultar a cidade colonial, defender e
“inventariar” o Império por meio das mutações do cenário, criando o patrimônio
cultural da nação, pareceu fundamental. (Mattos, 1987).
A vida cultural também deveria passar por profundas modificações, nesse
sentido, uma observação como a do viajante Expilly
1
, em 1862, era preocupante
porque, de fato, embora sede do Império, o município da Corte permanecia com ares de
colônia, não apenas porque apresentava problemas de insalubridade e saúde pública
2
.
Ainda que o Rio estivesse em processo de urbanização e num quadro político novo, seus
edifícios e sua estrutura urbana em nada lembravam Lisboa e as principais cidades da
Europa com suas grandes construções, monumentos que revelavam o brilhantismo
cultural da “civilização moderna”
3
. Afinal, “a cidade do Rio de Janeiro deveria estar
apta para cumprir o seu papel de sede da monarquia e cartão-postal do Império”
1
Personagem citado por Frédéric Mauro (1991) cuja citação é retirada do livro Le Brésil tel qu´il est, Paris,
1862,p.50.
2
Sobre essas questões ver: Costa (1999) especialmente o capítulo 6 Urbanização do Brasil no século XIX;
Mauro (1991) O Brasil no tempo de Dom Pedro II.
3
No estudo de Malhano (2002), a autora indica que durante a vinda da família real para a Colônia o interesse de
D.Pedro pelos aspectos culturais da então sede do futuro Império redundou na criação da Biblioteca Nacional em
1810, do Arquivo Nacional em 1824, da Academia de Medicina em 1829, do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro em 1836 e a construção de vários outros monumentos, em particular aquele dedicado à memória de
D.Pedro I, em 1862, estátua eqüestre na atual Praça Tiradentes, antigo Largo do Rossio, seriam exemplos de
manifestação do interesse em apresentar um Império mais próximo da mentalidade européia.
33
(Schwarcz,2002, p.256); para tanto, apresentar uma sede com ares de metrópole e ter
uma classe dirigente “ilustrada” eram imprescindíveis.
No esforço pela instituição de uma ordem pública com aspectos mais
comprometidos com uma paisagem de sociedade civilizada, a Coroa reserva ao Centro –
à Corte – o papel não apenas de gestor de uma metrópole com toda pompa de civilidade
necessária ao seu reconhecimento como nação moderna
4
, mas também de centro
ordenador da vida social.
Mas a Coroa era apenas um símbolo do poder. A essência da coesão residia em
uma rede nacional de clientelismo e patrocínio, baseada nos princípios gerais da
hierarquia social característica da sociedade imperial, na qual a classe dominante era
formada fundamentalmente por grandes proprietários rurais, negociantes bem sucedidos
e um grupo de intelectuais ligados à classe senhorial, que compunham, no dizer de
Mattos (1987), a “boa sociedade”. Essa classe, no momento de constituição do país
independente, serve-se do Estado Imperial para construir a sua unidade e levar a efeito
sua expansão. Para Malerba (2000, p.224): “ foram os homens de “grosso trato” o
suporte da coroa portuguesa no Brasil e que não ficaram de fora da estrutura do Estado
brasileiro, recebendo seu quinhão em títulos e cargos, conforme seu prestígio e seu lugar
em relação ao príncipe”.
Nessa perspectiva, as elites imperiais, que através da Coroa procuravam
proceder os ajustes econômicos e políticos para o funcionamento e ordenação do Estado,
criam o Imperial Colégio de Pedro II com o fim de formar “homens de letras” capazes
de administrar o novo Estado, assumindo a política imperial de manutenção da estrutura
agrário-exportadora e instruí-los nos ideais civilizadores que os homens do Império
idealizaram. A inauguração do Imperial Colégio de Pedro II, em 1838, foi planejada e
acompanhada pelo imperador dada sua importância política no quadro do Império
brasileiro de facilitar a “missão civilizadora” mediante a formação de um grupo de
intelectuais voltados para assumir os encargos públicos.
Gasparello (2002) exemplifica a posição que o Colégio ocupava na sociedade
imperial registrando que o próprio imperador e outras personalidades políticas do
Império participavam das cerimônias mais importantes da instituição. Nesse sentido,
diz a autora:
4
Modernização concebida como as mudanças que a industrialização, o comércio e a urbanização
desencadearam, a partir do século XVII, na Europa e, no século XIX, nos EUA.
34
O simbolismo do nome Imperial Colégio de Pedro Segundo expressa a importância que
o governo imprimiu àquela instituição, sob a administração vigilante do Ministro do
Império e da Inspetoria Geral da Instrução Pública, que respondiam, perante o
Imperador, sobre as questões relativas ao bom andamento das coisas do Colégio,
verificadas muitas vezes pelo próprio D. Pedro II, que não só comparecia regularmente
à instituição, nas cerimônias de abertura dos exames e de concursos de professores,
como fazia visitas inesperadas às dependências do Colégio e salas de aula, observando e
fazendo perguntas aos alunos. (p.32, grifo da autora).
Com objetivo bem definido – a instrução da elite – o Colégio de Pedro II
assegurava seu privilégio como padrão ideal por meio da política de “equiparação”,
empreendida pelo governo central, para assegurar certa uniformidade do ensino
secundário no Império.
De acordo com Doria (1997), os bacharéis em letras formados por esse Colégio
tinham o privilégio de livre acesso a qualquer curso superior sem prestar exames, posto
que era considerado o centro de uma cultura letrada, ao redor do qual deveriam girar os
liceus provinciais. Seu papel de mediador da passagem direta para o curso superior lhe
garantia tal status.
Nesse sentido, a criação do Colégio Pedro II ligava-se ao processo de
construção do Estado Imperial e à instrução das classes dirigentes que, oriundas ou
ligadas às famílias de posses, vinham de várias províncias para cursar o secundário no
colégio da Corte. O curso lhes garantia ao final o título de bacharel em letras, ou apenas
freqüentar as aulas avulsas para se prepararem nas matérias exigidas nos exames de
preparatórios, que então se faziam diretamente nos institutos de ensino superior nos
quais os examinados desejavam ingressar
5
.
Monopolizar a formação desses sujeitos que poderiam chegar a postos de
administração na burocracia do Estado e desempenhar as funções do judiciário,
“contando com funcionários e burocratas que tinham uma alta estima por uma
autoridade central firme” (Carvalho, 1996), foi uma tarefa que a Coroa se dedicou
mediante o controle do processo de recrutamento e seleção dos candidatos ao ensino
superior, conforme já observou Haidar (1972) em seu clássico trabalho sobre o ensino
secundário no Império.
5
A partir de 1851, passaram também a ser realizados na Corte, perante a Inspetoria de Instrução Pública e,
depois, no Colégio de Pedro II, através dos exames gerais de preparatórios. Com o Decreto n.5429 de 1873, os
exames tiveram lugar nas províncias onde não existiam cursos superiores. (Cf. Haidar,1972, p.19).
35
Destinando-se precipuamente ao preparo de candidatos para as escolas superiores do
Império, o ensino secundário em todo o país, com um ou outro acrescentamento, com
uma ou outra lacuna, reproduzia em seu currículo o conjunto de disciplinas fixadas
pelo Centro para os exames de ingresso nas Academias. Por outro lado, a avaliação dos
candidatos realizada inicialmente junto aos próprios cursos superior, e posteriormente,
também através dos famosos exames gerais, foi tarefa da qual o governo central
jamais abdicou. (Haidar, 1972, p.19, grifo meu) .
A Corte, além de centro de decisões políticas e econômicas, tornou-se o centro
cultural do país com a criação do Imperial Colégio e o Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (IHGB) em 1838, uma vez que já contava como a Escola de Belas Artes
(1826) e a Biblioteca Real (1810). Instituições que tinham por objetivo não só ligar o
Império ao projeto civilizador da sociedade, que ainda apresentava características
coloniais, mas também servir de instrumentos de distinção de classe pela instrução da
elite, num período em que o atributo “letrado” também estabelecia lugares de definição
de papéis na sociedade.
Nesse aspecto, o Colégio teve papel fundamental num momento em que as
divergências políticas e os conflitos sociais, ocorridos durante a primeira década do
século XIX, como as insurreições de escravos
6
, atestavam a fragilidade do Império e
colocavam em “xeque” a competência da classe senhorial de governar. Diante de uma
situação cujo clima na Corte pedia reformas, resultado das mudanças políticas e
econômicas que então se processavam após a independência para levar adiante o
“governo da casa”
7
, a classe senhorial compreende que:
[...] para facilitar a hierarquização e a concentração do poder, para cumprir sua missão
civilizadora, [acaba] sendo indispensável que as cidades, que eram a sede da delegação
dos poderes, dispusessem de um grupo social especializado ao qual encomendar esses
cargos (Rama, 1985, p.41).
Em cada Província do Império, elegeu-se uma capital onde se pretendia, pela
indicação dos seus presidentes, garantir a unidade imperial e ver delinear-se os
primeiros contornos de sua “civilização”, organizando a estrutura econômica e
6
Segundo Emilia Viotti da Costa (1998, p. 13), em 1823, ocorre em Demerara uma das maiores revoltas de
escravos “na história do Novo Mundo”. Demerara foi o cenário em que de 10 a 12 mil escravos se sublevaram
contra o regime de escravidão.
7
Conceito utilizado por Ilmar Mattos (1987) para definir a atuação política da classe senhorial no período do
Império.
36
educacional de cada região para delas fazer emergir os agentes condutores do progresso,
ou seja, os letrados de “mais altos espíritos”.
8
A idéia de civilização e modernidade que, então, se construía estava associada à
de apropriação de uma cultura considerada superior, capaz de alargar o horizonte dos
indivíduos, fornecendo-lhes os instrumentos intelectuais que os levassem ao
entendimento da necessidade de sua integração cultural e nacional. Isso porque, os
conflitos entre os membros da classe dominante, que surgiram na década de 1830 e que
culminaram com a abdicação de D. Pedro I, anunciavam a crise aberta do regime que, só
na década de 1850, com o período conhecido como “Conciliação”, entraria numa fase de
certa estabilidade política (Costa, 1999, p.158).
Esse conjunto de acontecimentos foi o referencial utilizado pelas elites
imperiais para pensar nas finalidades educacionais do Colégio Pedro II. Nelas, o tema
do nacional e da nacionalidade, em seu progresso e desenvolvimento material,
construíram os princípios educativos que definiriam os “homens de letras” da nova
nação. Seriam esses letrados os sujeitos políticos que, através dos cursos jurídicos
9
,
garantiriam a unidade do império, necessária à preservação dos valores
aristocráticos, e, ao mesmo tempo, os contornos civilizados das elites nacionais.
Essa trilogia (unidade do império; preservação dos valores aristocráticos;
contornos civilizados das elites) marcou o projeto educativo do Colégio Pedro II no
decorrer do século XIX e traduziu os conflitos internos de uma política que associava
interesses, muitas vezes conflitantes, advindos de ideários políticos liberais e
conservadores, para garantir um corpo político “soberano e uno”. Sobre essa associação
de interesses, Mattos (1987, p.126) anuncia que:
Para conviver em suas diferenças, senhoriato, profissionais liberais, comerciantes e
capitalistas tiveram, então, que sublinhar com maior ênfase os monopólios que os
fundavam e os distinguiam como classe dirigente: os monopólios da mão-de-obra e da
terra, dos negócios e da política.
No que se refere às finalidades da instrução secundária, aquela trilogia buscou
responder aos próprios alicerces que fundamentaram a sociedade do Império, alicerces
8
Expressão uitilizada pelo inspetor de ensino da Província do Paraná ao se referir ao ensino de Humanidades no
Liceu de Curitiba para classificar as capacidades a serem desenvolvidas nos sujeitos que frequentariam o ensino
secundário.
9
Haidar (1972, p.77), explica que, após a independência, o centro da vida cultural, que antes estivera ligada aos
conventos e seminários, de onde saiam parte dos letrados brasileiros, vai se deslocar para as faculdades de
Direito e Medicina. Esse tipo de formação, notamente em Direito, facilitava o acesso no privilegiado mundo
político e o contato direto com as estruturas de poder.
37
que fizeram parte do “longo e tortuoso processo no qual os setores dominantes e
detentores de monopólios construíram a sua identidade enquanto classe senhorial”
(Mattos, 1987, p.126). Ao se lançarem na tarefa de organizar e dirigir a sociedade,
construíram, por intermédio da educação secundária, uma imagem de sociedade e
política que se impôs a todo conjunto social e criou a hierarquia das classes
características de época. Rezende, um autor do período, esclarece em suas
“Recordações”:
Naquele tempo a desigualdade ou distinção das classes era de tal natureza que não só cada
uma das classes procurava ter sempre a sua igreja própria, mas que ainda os próprios
santos dos céus pareciam não pertencer a todos; pois que ao passo que os brancos podiam
pertencer a todas as irmandades sem a menor exceção, e tinham algumas que
exclusivamente lhes pertenciam, [...]; por outro lado os pardos parece que não tinham
licença senão de serem irmãos das Mercês e da Boa Morte [...] parece que eram os únicos
santos que os pobres pretos tinham o direito de adorarem ou pelo menos de tomarem por
patronos. (Apud, Mattos, 2000, p.22).
Nessa construção de representações de mundo e sociedade, a vida cultural da
Corte e o Colégio de Pedro II ocuparam, no conjunto social, o lugar central, restritos aos
membros da elite imperial, na tarefa de ordenar, instruir e civilizar os membros da “boa
sociedade”.
No projeto de pensar o Estado imperial como nação, encontra-se a via
educacional, criada pela classe dirigente, para garantir sua distinção como classe que
governa e construir um ideal de nação capaz de trazer unidade ao Estado nacional.
Diante da necessidade de criar a unidade da nação, pensou-se na formação cultural da
classe dirigente. É assim que o ensino secundário brasileiro, no período imperial
considerado como uma educação de elites (Xavier, 1980), soma-se à busca pela
formação do sujeito político.
Na cultura educacional e política do século XIX, a educação humanista
consolidou-se como a cultura do mundo dos bacharéis. Através da formação humanista,
atendiam-se às necessidades de uma elite cujo objetivo com a educação escolar era o
reconhecimento social de pertencer ao mundo letrado. Nessa característica educacional,
verifica-se o peso dos valores aristocráticos e da cultura das “belas letras”, na qual os
cursos jurídicos, como já foi mencionado, constituíam uma via de acesso privilegiado
aos cargos e funções de prestígio.
Nesse sentido, é importante ressaltar que, numa sociedade na qual cursar o
ensino secundário definia papéis no interior das classes sociais, o trabalho estava,
38
geralmente, reservado à massa de escravos e aos homens livres e pobres
10
do Império.
Estudar na Corte tornou-se, dessa maneira, privilégio de poucos jovens aspirantes ao
título de doutor que, dentre eles, sairiam os “iluminados” para assumirem cargos
políticos e dirigirem a nação
11
.
Homens que procuravam inscrever suas biografias pessoais na tradição nobre e
prestigiosa da história da intelectualidade brasileira, aspirando, muitas vezes, a uma
cadeira no colégio da Corte, conforme registrou Gomes (1996, p. 44):
Muitos desses homens tiveram sua vida ligada ao prestigioso colégio Pedro II, quer
como alunos, quer como professores. Tão ou talvez mais importante do que uma escola
superior, o Pedro II é um lugar vital na sociabilidade intelectual dos que vivem no Rio
da virada do século
.
No interior do movimento cultural que se seguiu à autonomia política brasileira,
percebe-se o espaço do saber histórico construído, inicialmente, junto com as
humanidades. Sobre esse aspecto, o discurso de Bernardo Pereira de Vasconcelos, de 25
de março de 1838 no Colégio Pedro II, é revelador:
Qual será o homem tão insensível às idéias liberais, aos sentimentos generosos que não
adote as grandes idéias que sôbre o amor da pátria se lê nos oradores da
antiguidade: sôbre os deveres do homem nos filósofos; e sôbre as ações dos grandes,
nos poetas? Quando estas idéias são exprimidas na linguagem, permita-se-me dizer, de
Deus? O que cumpre ao governo em caso tal? O fato o prova: consta do mapa que na
escola de grego há um só discípulo!!... Tanto nos vai trabalhando o progresso, que
dentro em pouco tempo, ficaremos barbarizados
. (Apud Haidar, 1972, p.100).
A preocupação com o programa curricular do colégio nesses termos endossava a
idéia de conservação de um curso de humanidades, no qual a História aparece à margem
do estudo das línguas latina e grega. A necessidade de definir o nascente Estado e, na
continuidade, criar uma memória sobre a origem da nação, por sua vez, serão as
diretrizes que vão dar forma e conteúdo à disciplina de História, que se torna autônoma
da cultura clássica nesse processo.
Como instituição oficial e modelo para as demais, o Colégio Pedro II foi o “lugar
institucional” de onde se originou a organização dos primeiros conjuntos de saberes que,
ao se desligarem das humanidades, constituiriam-se em disciplinas escolares no Brasil.
10
Sobre essas relações ver: Franco (1983); Dias (1998)
11
Melo (1997,p.82) apresenta um quadro estatístico que revela o diminuto número de bacharéis que, até 1860, o
Colégio Pedro II tinha formado: de 1843 a 1860 o total foi de 221 bacharéis em letras.
39
O curso de humanidades, verificado no Colégio com o predomínio das letras clássicas,
não impediu, como apontou Haidar (1972, p. 100), que “as matemáticas, as ciências
naturais e física e a história” figurassem no programa da instituição.
Em sua história
12
, verifica-se como os saberes, das humanidades e científicos,
concorreram, no século XIX, em meio à disputa da Igreja e do Estado, para a
institucionalização das disciplinas escolares, no curso do colégio oficial, em seu projeto
de instruir e civilizar a “boa sociedade” do Império e, nesse processo, os conteúdos de
História como matéria de ensino autônoma.
Através dessa instituição oficial de ensino secundário, criaram, inicialmente, as
condições necessárias para dar materialidade e forma ao nascente ensino de História no
Brasil. Os escritos de seus professores, que se transformaram em compêndios, tornaram-
se esforços pioneiros na tarefa de institucionalização da História como disciplina
constituída de conteúdos úteis aos novos contornos sociais e legitimaram o saber escolar
no Brasil com o fim de instruir as elites num saber histórico sobre as nações e a pátria.
1.2 Colégio Pedro II: a legitimação do saber histórico escolar no Brasil
O século XIX é marcado pela emergência das instituições de ensino
caracterizadas pela lógica da seriação, tempo ordenado a partir de uma estrutura
programática do ensino dos saberes que se escolarizavam e se tornavam disciplinas. O
ensino secundário é resultado de um amplo conjunto de práticas que fundamentaram, no
interior desse processo de modernização das práticas educativas, as noções ligadas à
escolarização tendo por base a idade escolar, o sistema de classe e a seriação. (Hamilton,
2001, p.46 a 70).
No palco europeu, onde esse processo se visualiza mais claramente (Hébrard,
1990, 2001; Hamilton, 1992; Petitat, 1994; Compère, 1995; A. Chartier e Hébrard,
1995, especialmente o cap.III), esse movimento se fez na emergência dos Estados
Nacionais e no desenvolvimento das relações capitalistas.
12
Vários estudos trataram da história do Colégio Pedro II. Além de diferentes teses de doutoramento, o trabalho
mais divulgado é o de Escragnolle Doria (1997) Memória Histórica do Colégio de Pedro Segundo.
Brasilia:INEP.
40
De acordo com Petitat (1994), a partir do movimento que resultou na
supressão do monopólio da Companhia de Jesus, o lugar dos jesuítas foi substituído pelo
Estado. Nas mãos dos reformadores europeus, o ensino jesuítico foi considerado
inadequado aos novos tempos e o Estado ganhou legitimidade para organizar a educação
escolar. La Chalotais (1701-1785) traduz bem esse sentimento da época nessas palavras:
O ensino das leis divinas é assunto da Igreja, mas o ensino da moral é atributo do
Estado [...]. Como se pode ter pensado que homens que não são vinculados ao Estado,
que estão acostumados a colocar um religioso acima do chefe do Estado [...] seriam
capazes de educar e instruir a juventude de um reino? [...] Assim, o ensino de todas a
nações, esta porção da legislação que é a base e o fundamentos dos Estados, permanece
sob a direção imediata de um regime cujo centro se encontra para além dos Alpes,
necessariamente inimigo das nossas leis. Que inconseqüência e que escândalo
. (apud
Petitat, 1994, p.141).
A instituição escolar chamada “Colégio” faz parte dessa longa história de
construção de saberes escolares que se vinculou aos poderes religiosos e,
posteriormente, mais diretamente ao Estado.
Em seu livro Du Collège au Lycée, Compère (1985, p.11) informa que os
colégios, como lugar de instrução, começaram a ser esboçados no princípio do século
XVI com uma estrutura escolar diferenciada da dos períodos anteriores. Ela é marcada
pela criação das séries e classes, organização das matérias em programas e controle
exercido sobre os estudantes que são separados por idade.
Essa forma de ensino, afirma Compére, marca o nascimento de um modelo
pedagógico novo que será o pilar sobre o qual se erguerão as idéias pedagógicas
características da modernidade: gradação do ensino, ordenação por classes e, ao fim de
cada ano, declara-se o aluno aprovado ou reprovado, de acordo com os resultados nos
exames que ele deve enfrentar regularmente. Um outro aspecto de igual importância são
os conteúdos divulgados nesse período. Sobre suas finalidades educacionais, esclarece
Geraldo Bastos Silva, numa perspectiva histórica:
O motivo primordial da colocação da cultura geral como objetivo do ensino secundário
reside no fato histórico de, com o Renascimento, ter surgido a tentativa de fazer do estudo
dos elementos da alta tradição intelectual clássica, em tôda sua pureza e máxima
integridade, o conteúdo do trabalho escolar. Tal tentativa representava um protesto contra
a estreiteza e formalismo como que elementos daquela mesma alta tradição tinham
chegado a constituir o currículo escolar nos quadros da educação burocrático-clerical e no
espírito do teocentrismo medieval
. (Silva, 1959, p.141,grifo meu).
41
O século XIX europeu é conhecido como o século em que os grandes debates
pedagógicos se travam intensamente em torno desses princípios educativos. O debate se
fez não apenas nas idéias dos reformadores, mas também entre os parlamentos,
resultando em diferentes projetos para a reorganização do ensino, desde o primário ao
universitário. Nesse período, houve um importante debate em torno dos ensinamentos da
instrução secundária, que se fazia nos Colégios, Ginásios e Liceus
13
, que se ligava à
questão de manter ou não a educação clássica diante da valorização dos conhecimentos
científicos e nacionais que se processava no decorrer do século XIX.
Essas questões vão envolver a matéria de História. Na década de 1830, a História,
na França, assume, nos liceus e colégios da época, uma nova perspectiva fundada sobre a
restauração das humanidades clássicas adequada aos tempos modernos (Compère, 1985,
p.187). No interior das humanidades “modernas” a História vai ficar ligada às chamadas
“disciplinas literárias”, das quais se desliga a partir de 1830.
No Estado francês, a década de 30 é o momento, segundo Furet (s/d), em que, sob
o regime de Julho, abre-se um período decisivo para o ensino de História. Nesse período,
a História torna-se um dos centros essenciais do debate político e intelectual francês
(Furet, s/d, p.124). Também Hery (2000, p.27) data os anos de 1830 como o “tempo da
organização dos conteúdos de história”:
A valorização da História se inscreve em uma política de valorização da memória e
do patrimônio, a serviço do poder instituído que lhe confere legitimação do passado,
e procede com a mesma intenção com a criação em 1834 da Comissão de
Monumentos Históricos e o emprego de uma política de arquivo de grande amplitude
patrocinado pelo Estado. Como disse Guizot: ela atende a uma necessidade social: o
conhecimento do passado e do progresso da civilização para iluminar a ação humana.
Nessa lógica, a História adquire uma função cívica.
Pelo estudo de Hery (1999), percebe-se que a História, ao se desligar das
humanidades clássicas, torna-se numa disciplina escolar voltada para o ensino da nação,
sendo a história nacional a primeira, segundo essa autora, a alçar os primeiros “vôos”
em direção à autonomia. A partir de então, hinos, bandeiras, festas cívicas, feriados
13
Geraldo Bastos Silva (1959, p.144) sinaliza para o fato de que na construção desse currículo clássico, com
predominância da língua e literatura latina, com a influência das religiões dominantes, terá significados
diferentes em diferentes países: “na Inglaterra a grammar school, que será transplantada à América do Norte; na
Alemanha o Gymnasium de Sturm, que será o modelo do tipo mais tradicional da escola secundária até o século
XX, nesse país; na Suiça o Colégio de Calvino, em Genebra, na França as escolas secundárias da Universidade
de Paris, o Colégio de Gyénne e os Colégios Jesuítas, os quais, presentes também em outros países católicos,
serão transplantados para o Brasil”.
42
nacionais, livros escolares, foram produzidos como rituais que reafirmavam a identidade
da nação, naquele momento, em construção na França.
No Brasil, a trajetória de constituição da História como disciplina escolar,
embora se faça com os mesmos sentidos nacionalistas que se desenvolveram na França,
assume diferente trajetória em função da forma como o curso secundário aqui se
estruturou.
Projetado no interior de um ensino de caráter humanístico, o ensino de História
no Colégio Pedro II legitimou-se, a exemplo do caso francês
14
, na sua identificação com
as humanidades clássicas. No entanto, o ensino secundário ofertado no Colégio Pedro II
teve uma trajetória marcada pelo embate dos sistemas chamados exames parcelados
preparatórios e o sistema seriado, regulamentados e fiscalizados pelo governo imperial,
o que imprimiu determinado caráter ao ensino de História em todo o Império. Essas
foram as primeiras vias de acesso às instituições seguidas pelos estudantes brasileiros a
uma educação humanística após a expulsão da Companhia de Jesus no Brasil
15
.
Os objetivos específicos de uma educação clássica se esvazia na medida em que
o interesse da maioria dos alunos não era concluir o curso seriado, mas receber aulas
avulsas das matérias que iam prestar exames para o ingresso nos cursos superiores do
Império. Mesmo no Colégio Pedro II, que tinha um programa seriado em que, ao final
do curso, o estudante receberia o título de bacharel em letras, a evasão ocorreu,
conforme aponta Haidar (1972, p.53):
No próprio Colégio de Pedro II, comparado com a cifra dos matriculados nos primeiros
anos do curso, era insignificante o número dos bacharéis. O decréscimo da matrícula nas
últimas séries do colégio da Côrte mostrava que a maior parte dos alunos, após alguns
anos de estudos regulares, recorria aos exames de preparatórios a fim de ingressar mais
rapidamente nos cursos superiores
.
Embora tenha sido a partir dos programa de estudos do Colégio Pedro II que as
demais instituições de ensino secundário do país criaram suas cadeiras de História
Universal e do Brasil no século XIX, as províncias que mantiveram algumas cadeiras
no curso secundário enfrentaram grandes dificuldades em se equiparar ao colégio
oficial, justamente pelo predomínio das aulas avulsas sobre o ensino regular. Por isso,
14
Sobre o caso francês ver: Bruter (1997) que trata do período clássico, século XVII, quando a história estava no
interior das humanidades clássicas e sob a orientação jesuítica.
15
Depois da extinção do modelo educacional dos jesuítas, a colônia brasileira continuou com a política das aulas
avulsas, implantadas pelo governo Português. Sobre esse período, ver: Cardoso (2004).
43
Haidar (1972, p.95) afirma: “O ensino ministrado no Colégio de Pedro II foi, portanto,
durante todo o Império um padrão ideal. O padrão real forneceram-no [...] os
preparatórios e os exames parcelados”.
No entanto, como a História constituiu-se numa disciplina que, na sua trajetória,
manteve-se atrelada aos compêndios didáticos no secundário, aos manuais na Escola
Normal e aos livros de leitura no primário (Bittencourt, 1993). Os compêndios utilizados
no Colégio de Pedro II legitimaram a História como saber escolar no Brasil através da
produção didática produzida pelos “homens de letras” que a ele estavam ligados.
Os compêndios ali adotados tornaram-se fontes de referências ao estudo da
História escolar no país, posto que “foi uma prática corrente de outros estabelecimentos,
particulares e liceus oficiais, adotarem os compêndios utilizados pelos alunos do
Colégio de Pedro II” (Gasparello, 2004, p.21). Esta instituição se destacou na elaboração
de compêndios escolares de História, sendo responsável pelos trabalhos pioneiros, na
área da historiografia didática nacional, que se fizeram por professores daquele colégio.
Além disso, dada a conjuntura educacional da época, utilizar os livros adotados pelo
colégio modelo significava, segundo Gasparello (2004), garantir certa conexão com os
exames preparatórios que constituíram a forma institucional de acesso aos cursos
superiores que, a partir da segunda metade do século XIX, passaram a ser realizados
também naquele estabelecimento oficial de ensino secundário.
Personagens como Justiniano José da Rocha, Joaquim Manoel de Macedo, José
Maria Berquó, Capistrano de Abreu, João Ribeiro, Jonathas Serrano, Mattoso Maia,
entre outros, foram autores que se destacaram por terem pertencido ao quadro de
professores do Colégio Pedro II ou membros do IHGB. Em sua maioria formados pelas
Faculdades de Direito e Escolas Militares da Corte, estavam ligados aos projetos
políticos do Estado e atuaram no sentido de imprimir forma e conteúdos ao ensino de
História no Brasil, buscando recuperar o passado a fim de obter uma definição para a
identidade nacional.
Dessa forma, embora a legitimação do passado não tenha sido realizada apenas
pela via educacional e pela produção de textos didáticos, estando ela também
materializada em construção de monumentos e comemorações cívicas
16
, no caso do
ensino de História, foi através da produção didática que se legitimou um saber histórico
escolar, cristalizado no interior da tarefa de pensar a nação brasileira, inicialmente, no
16
Sobre a momumentalidade como legitimação do passado, ver: Malhano (2002).
44
conjunto das relações sociais do Império do início do século XIX e, na continuidade, no
interior dos debates republicanos. Nesse sentido, os compêndios de História adotados
no Colégio de Pedro II serviram de fontes para instruir e civilizar a elite intelectual no
momento de constituição do Império brasileiro.
1.3 Instruir e Civilizar: os compêndios de História adotados no Colégio Pedro II
Entre as diferentes possibilidades de definir objetos e estratégias de intervenção
na construção da memória nacional, os compêndios de História adotados no Colégio
Pedro II, como já foi mencionado, tornaram-se fonte fundamental na construção de uma
história da disciplina de História no país. Na avaliação de Gasparello (2004), eles
contribuíram, em sua expressão pedagógica, para a construção de identidades nacionais.
Entretanto um longo trajeto se fez para que, no século XIX e nos anos iniciais do XX ,
se construísse um conjunto de obras que sintetizasse a história ensinada nos dois
períodos.
Conforme atesta Escragnolle (1937, p.42, apud Vechia, 2003, p.28), com base
nos “planos” de estudos que se desenhavam nos diferentes textos didáticos do século
XIX, na ausência de uma produção genuinamente nacional, foram as fontes francesas
que se concretizaram na composição dos compêndios de História, quando não foram os
próprios originais utilizados na tarefa de pensar o passado das nações e do nacional. O
próprio ministro da Instrução do Império, em 1838, no discurso de inauguração da
instituição, declara:
O discurso era meu mas o regulamento é alheio: em quase tôdas as suas disposições é
copiado dos regulamentos dos colégios de França, apenas modificado por homens que
gozam da reputação de sábios, e entendem o que deve alterar-se nas disposições dêsses
estatutos
. (Vasconcellos, 1838 apud Haidar, 1972, p.56)
Vechia informa que, além do regulamento nos compêndios arrolados para uso
dos alunos, também se registrou a presença da historiografia francesa:
45
O Précis de L´Histoire Ancienne foi escrito por dois renomados historiadores franceses
e professores de História, respectivamente, do Collège Royal Henri IV e do Collège
Royal Carle Magne, em Paris.[...] O segundo livro adotado História Romana foi escrito
por De Rozoir, professor do Lycée Louis Le Grand e por Dumont, professor do Lycée
Saint Louis, em Paris. O livro era adotado pelo Conselho Real da Universidade de Paris,
para o ensino dos Collegios Reais e outros estabelecimentos de instrução pública.
(Vechia, 2003, p.28).
As duas obras citadas teriam sido traduzidas e adotadas por Justiniano José da
Rocha, professor de História e Geografia do Colégio de Pedro II, que realizou seus
estudos secundários no Lycée Henri IV em Paris (Rajagabaglia, apud Vechia, 2003). As
idéias e a adoção dos autores franceses por Justiniano José da Rocha teriam começado a
dar o tom aos estudos de História no Brasil, determinaram a escolha das matérias e de
seus conteúdos, notadamente em relação à História Romana. (Vechia, 2003, p.28).
Sobre a presença da literatura francesa na adoção dos manuais do Colégio, também
informa Bittencourt (1993, 172):
[...] a escolha dos manuais correspondeu aos pressupostos dos programas escolares
calcados no ideário da França: “Adaptou o Conselho os últimos programas publicados
para os liceus nacionais da França, fazendo-lhes as modificações e alterações que
exigiam a organização diferente dos estabelecimentos públicos de instrução secundária
desse país e do Colégio de Pedro II, e a falta de livros apropriados para a diferença das
matérias indicados nos mesmos programas.[...] na falta de obras nacionais, adotaram-se
para o estudo das ciências fisicas e naturais, da historia e da geografia e da filosofia,
compêndios franceses
.
Estudos
17
já mostraram como a França representou uma referência cultural
preponderante na formação da intelectualidade brasileira. A própria “Missão Francesa”
que, em 1816, chegou ao Brasil é exemplo dessa relação cultural entre os dois países.
Mas, no que se refere às suas relações com os conteúdos arrolados nos programas
escolares e a produção didática de livros de História, ela ainda não foi suficientemente
esclarecida. Tem-se apenas referências dessa relação, mas nenhum estudo que
aprofundasse tal questão.
Encontra-se, entre os trabalhos disponíveis, a tentativa de justificar a
predominância das idéias francesas, como é o caso de Carelli. Em sua análise, sintetiza
os seguintes os motivos:
17
Ver: Carelli, (1994); Ortiz, (1991).
46
[...] o lugar excepcional da França não lhe foi outorgado por suas veleidades coloniais,
mas sim por sua irradiação intelectual. Aos Filósofos do Progresso, é necessário
adicionar a importância da língua francesa, enquanto a França permanece a “mãe das
Artes, das Armas e das Leis”, e o gosto pelos produtos de Paris, a fim de conceber hoje
a preponderância cultural desta nação, que apesar disso é claramente menos presente, de
um ponto de vista comercial, do que a Inglaterra
. (Carelli,1994, p.18)
Como também apontou Mattos (1987, p.90-99), na ação transformadora ocorrida
no Império no momento do “jogo de inversões”, a Inglaterra e a França ocuparam
posição privilegiada na nova articulação no sentido da “restauração da moeda colonial”
dentro da perspectiva civilizatória da nação. Com a Inglaterra, redefinem-se as novas
formas de articulação comercial, cujo modelo de industrialização e investimentos
capitalistas – como a construção de ferrovias – propiciava uma mudança no padrão de
modernização do Império; enquanto a França transformava o colono em cidadão e fazia
construir no Império uma auto-imagem civilizadora.
Parte dos trabalhos que tratam da questão, o faz nesse sentido, apontando o
caráter civilizador do modelo francês que foi apropriado pela intelectualidade brasileira.
Ao analisar esse aspecto, no que se refere à história da História ensinada no Brasil no
período inicial, localizam-se indícios dessa relação, nos compêndios de História do
Brasil utilizados no Colégio de Pedro II, para além dos já mencionados.
Na elaboração de textos didáticos de História do Brasil, a interferência de
Aphonse de Beauchamp e Ferdinand Dénis foi registrada nos primeiros compêndios
didáticos de História do Brasil, o Resumo da História do Brasil de Henrique Luiz de
Niemayer Bellegarde e no Compendio da História do Brasil de José Inácio de Abreu
Lima. (Gasparello, 2004).
O francês Ferdinand Dénis teria sido, segundo Carelli (1994, p.61), “sem
contestação o iniciador dos estudos portugueses e brasileiros na França”, cujo trabalho
Résumé de l´histoire littérarie du Brésil (1826) foi traduzido em português em 1835 e
adotado em escolas do Império; e, de acordo com (Gasparello 2004, Bittencourt
1993,Vechia 2003) foi inspiração de Bellegarde.
Em seu Resumo, que teve duas edições (1831 e 1834), Bellegarde revela que a
primeira edição foi uma tradução com muitas adaptações de textos do autor francês. Na
segunda edição, a que passou a ser considerada como didática e “adotada pelo governo
como compêndio escolar para instrução pública” (Frontispício do livro, apud
Melo,1997, p.196), teria sido modificado, deixando de ter o caráter de uma mera
tradução adaptada.
47
Analisando o quadro I (anexo), que descreve os compêndios utilizados no
Colégio Pedro II, verifica-se que, no período que cobre a época imperial, o livro mais
tempo adotado para as matérias de História Antiga, Idade Média e História Moderna,
foi o Manual du Baccalauréat, que correspondeu ao Compêndio de História Universal
de Victor Duruy. O Compêndio de Abreu e Lima, que teria sido uma tradução do
francês Aphonse de Beauchamp e adotado em 1856, também foi um livro adotado por
longo período para o ensino da História do Brasil.
Mesmo no plano de 1862, observa-se a presença francesa nas obras de autores
brasileiros que escreveram sobre a História Universal, como é o caso de Justiniano José
da Rocha que, como já se mencionou, escreveu sobre a História Antiga e Idade Média
sob orientação de autores franceses. Foi indicado, em 1862, o retorno da tradução do
Compêndio de De Rosoir e Dumont. Para História da Idade Moderna e Contemporânea,
o Manuel d´estudes pour la préparation au Baccalauréat en lettres – Histoire de Temps
Modernes, do Compêndio de Victor Duruy e, para História do Brasil, Abreu e Lima
mantém-se como sugestão a ser adotada..
Somente em 1865, consta a adoção de obras de autores exclusivamente
nacionais, com o Compêndio de História Antiga de Moreira de Azevedo (1883 5
a
edição) e o Compêndio de História Média de J. B. Calógenas (1859) e, para a História
do Brasil, passou-se a adotar Lições de História do Brasil de Joaquim Manuel de
Macedo. Entretanto, mesmo nesse período, como afirma Bittencourt (1993, p.173), não
se “conduziram a outras transformações frente ao predomínio francês em relação ao
ensino de História”.
Tomando-se por critério esses estudos, é possível afirmar que os primeiros
autores nacionais que escreveram sobre a História Universal e Nacional formaram uma
geração que teve em escritores franceses sua inspiração, seja por terem complementado
sua formação na Europa, como é exemplo José da Rocha, ou seja porque, como
considerou Bittencourt (1993, p.178), aos
[...] intelectuais brasileiros faltava erudição e condições efetivas para se aventurar em
estudos de uma documentação ampliada, no sentido de elaborar pesquisas próprias.
Podiam apenas valer-se de uma bibliografia européia permeada de valores e
ideologias e acabaram por submeter-se ao domínio dos franceses.
Uma interpretação dos fatos sob o ponto de vista francês se desenvolveu nesse
período através de obras que se tornaram célebres na tarefa de ensinar História e
48
continuou, embora de forma mais tênue, no período republicano. Para auxiliar no
esclarecimento dessa relação, Gréard, que estudou o curso secundário na França, é aqui
refenciado.
Gréard, ao indicar os programas para o curso secundário na França, no período
de 1830, aponta para o fato de que os conhecimentos históricos aparecem como:
[...] um conhecimento um pouco mais aprofundado sobre a nação particularmente a
que nos pertence; um curso de História Geral que compreende, de forma simples, as
grandes datas, os grandes fatos, as grandes épocas, as grandes revoluções da história
até os nossos dias, com um curso especial, substancial e sumário da História da
França. Da mesma maneira a Geografia: um resumo da geografia geral com a
geografia da França. (Gréard, 1912, p.68).
No Colégio Pedro II, em linhas gerais, os mesmos encaminhamentos
pedagógicos podem ser visualizáveis na organização da cadeira. A cadeira de História e
Geografia abrangia os estudos de Geografia e História Antiga, Romana, Geografia e
História Média e Moderna e História Contemporânea em cada ano do curso, que contava
com a cadeira de Corografia e História do Brasil (Gasparello,2004, p.68).
Nela, a História Antiga, seguida pela História Romana, ganham destaque e os
livros adotados foram as traduções de Justiniano José da Rocha dos compêndios já
citados de Poirson e Cayw para História Antiga e o compêndio de De Rozoir e Dumont
para História Romana. Dessas obras mais gerais, chega-se aos conteúdos da História
Nacional que, se ficaram claramente explicitados anteriormente, foram estudos que
levaram em conta os escritos franceses.
No período inicial da República, volta a História Universal que, nos moldes da
historiografia francesa, inaugurada por Victor Duruy, reintroduz a História Nacional
como anexa à História Universal e, posteriormente, à História da Civilização.
No plano de estudos de 1890, no entanto, ocorrem mudanças. Embora contasse
como sugestão a História da Civilização, 2 volumes, de Charles Seignobos, e História
Universal de Webber, ambos autores franceses, a História Antiga de João Ribeiro que,
ao que consta, foi crítico da “influência” francesa, e a História Universal (1887) de
João Maria da Gama Berquó foram também arrolados para adoção. Na História
Nacional esse é o momento de revisão da historiografia do período imperial com João
Ribeiro e Capistrano de Abreu que, como indicou Artlette Gasparello (2004), ao
assumirem a cadeira de História do Brasil, trabalharam no sentido de buscar sua
autonomia frente à História Geral.
49
No decorrer dos anos que se seguiram às décadas iniciais do período
republicano, a interferência do corpo docente na tradução das obras e, posteriormente,
em sua escolha ajustava as obras francesas aos ideais do projeto político brasileiro.
Outro fator de importância para a discriminação da questão foi a existência
dos cursos preparatórios realizados em forma de aulas avulsas que , como apontou
Bittencourt (1993, p.174), foram responsáveis por uma produção diferenciada dos mais
densos compêndios adotados no Colégio de Pedro II. “Eram textos preparados e
concebidos segundo técnicas para a retenção rápida dos conteúdos exigidos pelas bancas
examinadoras”, afirma a autora.
Também no que se refere à produção da historiografia nacional sobre o ensino
de História, as iniciativas, no sentido de se estabelecer um saber histórico escolar do
Brasil, ocorreram pela edificação discursiva da nação brasileira valendo-se da
materialização de uma idéia de nação em processo de civilização, procurando, nesse
trajeto, traçar direções para o nacionalismo brasileiro. Essa preocupação específica
sinaliza para outras referências que não a francesa.
Gasparello (2004) ao estudar os compêndios de História do Brasil do Colégio
Pedro II, aponta três fases na história desta disciplina naquela instituição.
O primeiro momento, identificado com a produção de uma História pátria
(1831-1861), corresponde à época do nascimento do Estado-nação brasileiro e, por isso,
a produção didática, iniciada nesse momento com o Resumo de História do Brasil de
Henrique Luiz de Niemeyer Bellegarde, publicado em 1831, e o Compêndio de História
do Brasil de José Inácio Abreu e Lima, de 1843, surge referenciada em autores
estrangeiros.
O segundo momento é conhecido pela “legitimação do modelo nacional”
(1861-1900), cuja obra de Joaquim Manoel de Macedo, Lições de História do Brasil, de
1861, caracteriza o projeto de nação legitimado pelo IHGB, que cunhou o caráter de
uma história da nação oficial, assumindo o controle da produção historiográfica
nacional. Nesse momento, enquanto o IHGB legitimava a produção nacional, o Colégio
Pedro II assumia a liderança da produção didática nacional. A primeira geração de
autores de compêndios didáticos nacional sai dessa instituição, como Manoel de Macedo
e Luis de Queirós Mattos Maia com suas “lições”. Nesse período, a produção didática
estaria fundamentada na tese do bávaro Martius e do brasileiro Varnhagen.
O terceiro momento trata dos compêndios republicanos que, com a mudança
de regime político, marca a fase de renovação do campo historiográfico e do ensino de
50
História no Brasil. Esse período conta com a contribuição de uma segunda geração de
professores do Colégio de Pedro II, João Ribeiro e Capistrano de Abreu que são
reconhecidos pela crítica ao predomínio do modelo historiográfico francês e a
submissão da História Nacional à História das Civilizações.
Ao que parece, tratou-se da História Universal e, depois, da História das
Civilizações, que foram norteadas pelo paradigma francês, enquanto que a História
Nacional, fundamentalmente a partir dos anos de 1860, teve, também, outras referências.
Mas o que interessa neste trabalho não é buscar as raízes do pensamento brasileiro na
produção didática do ensino de História, mas somente registrar que os compêndios
adotados serviram de veículo para instruir e civilizar os estudantes do curso secundário
no Brasil e que, nessa tarefa, a referência mais adotada foi as diretrizes conceituais
francesas.
CAPÍTULO II
A DISCIPLINA DE HISTÓRIA NO PARANÁ E A SUA LEGITIMAÇÃO COMO
SABER ESCOLAR
52
2.1 Do Liceu de Curitiba ao Ginásio Paranaense e Escola Normal: a
disciplinarização do conhecimento histórico no Paraná
[...] o ensino secundário deve ter por base os estudos
literários, que engrandecem a esfera do pensamento,
inspiram as idéias e os sentimentos generosos, e são
indispensáveis à educação moral de uma nação.
A literatura, a história, a eloqüência e a filosofia, que
constituem as grandes forças intelectuais e morais da
humanidade e que formam, por isso, os homens de
influência sobre seu século e seu país, não podem ser
compreendidas senão a luz dos elementos, que compõem
a civilização geral do mundo: a antigüidade e o
cristianismo. (Bento Fernandes de Barros, 1870, grifo
meu)
.
Criado no século XIX, em 1846, pela Lei Paulista n.33, o curso secundário
paranaense tem seu início como Liceu na então 5
a
Comarca de São Paulo. O Liceu de
Curitiba tornou-se, após a emancipação da Província, ocorrida em 29 de agosto de 1853
pelo Decreto Imperial n. 704, um importante marco cultural da recém-criada Província
do Paraná. Manteve-se como principal referência da formação intelectual na sociedade
paranaense, servindo como instrumento de distribuição privilegiada de instrução à
classe senhorial, numa sociedade de economia agro-exportadora cuja base de produção
se fazia com o trabalho escravo
1
.
Sua criação efetiva fez parte de um conjunto de medidas que, no quadro da
formação de uma política nacional, visava organizar a instrução na recém-criada
Província na década de 1850 e a preparar os seus intelectuais para exercerem funções
políticas locais e nacionais. Com a emancipação política do Paraná, as autoridades
governamentais que assumiram os encargos da nova Província traçaram planos para a
organização da Instrução Pública provincial. Tais planos de reforma e organização da
estrutura escolar tiveram seu início com a nomeação de Zacarias de Goés e
1
Considerando que a capital tinha, na época, pouco mais de 6.000 habitantes, compondo-se de 57,2% de brancos
e 42,9% de negros, mulatos e pardos, entre escravos e libertos (Martins, 1999, p.36;51), o Liceu destinava-se a
uma pequena parcela da população senhorial.
53
Vasconcellos para presidente provincial e sua atuação nas questões educacionais da
nova Província.
A história dessa instituição, que se articula ao movimento de constituição e
consolidação de uma educação voltada para a formação das elites locais e nacionais
após a emancipação política do país, tem uma trajetória institucional marcada pela
conjuntura sócio-cultural da sociedade do Império, cuja política educacional
empreendida pelas autoridades imperiais para o ensino secundário do país, revela-se no
trajeto de contínua criação e extinção do Liceu de Curitiba.
A observação de seu, ainda hoje, imponente prédio, situado há mais de 60 anos
na Avenida João Gualberto, não permite imaginar que, por um longo período, a
instituição esteve numa situação de instabilidade em relação à sua localidade,
professores, matérias de ensino e alunos. Situação que, por vezes, contribuiu para
condená-lo a uma freqüente história de extinção e restauração de suas atividades, posto
que, no decorrer de sua existência, esta instituição passou por diferentes dificuldades
para consolidar-se como um curso secundário regular.
A sua instabilidade se revela inclusive nas mudanças de nome que a instituição
sofreu ao longo de sua existência - Liceu, Colégio Subvencionado, Instituto de
Preparatórios, Instituto Paranaense, Ginásio - para adequar-se às políticas educativas do
período imperial e republicano.
Em sua concepção, o Liceu de Curitiba não esteve voltado exclusivamente para o
encaminhamento de candidatos às academias do ensino superior do Império. Esta
questão vai tornando-se mais definida no decorrer de sua trajetória. A intenção inicial
era oferecer um “curso completo de Humanidades” e
[...] fazer surgir do meio d´esse povo uma minoria de homens capazes de se elevarem
a altura dos conhecimentos do mundo civilisado, para dignamente concorrerem aos
cargos elevados e á direcção dos negocios do Estado
. (Paraná, Relatório do inspetor
geral do ensino Mota de 1856, p.36-37).
A Instrução Pública secundária paranaense, pensada como um curso regular de
humanidades, não se realizou. Como parte de um projeto político específico para o curso
secundário, o Liceu de Curitiba não conseguiu desenvolver-se em função da falta de
alunos matriculados nas aulas e professores para ocuparem as cadeiras que deveriam ser
providas.
54
Não sendo capaz de produzir os resultados esperados pelo primeiro regulamento
que normatizou a Instrução Pública Secundária na Província
2
, teve uma história de
freqüentes insucessos até sua extinção definitiva como Liceu, cujos principais
instrumentos de sua fragilidade foram as políticas dos exames preparatórios e a
instituição da categoria de instituições equiparadas.
A instrução secundária, que não recebe tamanha proteção, e pouco apresenta ao geral da
população, custa, entretanto, não pequeno dispendio. As esperanças depositadas pela
prosperidade do Liceu não tem correspondido á frequencia que se nota. No ano passado
o movimento das aulas foi o seguinte: 9 alunos na 5
a
classe, 8 na 4
a
. A retirada de alguns
alunos para a Côrte e São Paulo onde se vão preparar nos estudos superiores, confirma a
minha posição.[...]. Os moços preferem fazer estudos preparatórios com os
professores que mais tarde tem de julgar, ganhando assim a vantagem de se
habilitar no metodo de ensino de cada um deles.
(Paraná, Relatório do presidente
José Francisco Cardoso da Costa, 1860, p.22, grifo meu).
Além disso, por vezes, sua existência esteve comprometida diante da
necessidade provincial de melhorar a qualidade da educação primária, através do
aperfeiçoamento dos professores que já se encontravam em exercício e da formação de
novos professores para naquele grau de ensino atuarem, buscando incluir aulas de
Pedagogia no programa do Liceu
3
. Essa dupla característica, vinculada diretamente às
necessidades do governo provincial, marcou a história dessa instituição que, na metade
da década de 1870, passou a abrigar um curso de formação de professores com uma
Escola Normal em anexo.
Entretanto o fato de abrigar uma Escola Normal não deixou que a instituição
fugisse ao quadro geral de falência dessas escolas provinciais, o que indica que, embora
a questão de preparar candidatos para os cursos superiores estivesse diluída em outros
interesses, seu itinerário encontrava-se em íntima conexão com a conjuntura social que
norteava a instrução e o projeto político que orientava a sociedade imperial brasileira.
Nesse sentido, parece fértil pensar que tal falência se situa na procura do Centro
em controlar o processo de recrutamento e seleção dos candidatos ao ensino superior.
Pois, se a função do secundário e do ensino superior era formar uma elite intelectual à
2
Regulamento de 10 de Julho de 1858. Nele, o Liceu foi organizado em um curso gradual de cinco anos (ver
anexo- quadro III)
3
Kulesza (1998) informa que, antes de fundarem propriamente uma Escola Normal, muitas províncias criaram
um curso normal anexo ao Liceu simplesmente pela adição de uma cadeira de Pedagogia ao currículo. Solução
encontrada pelas autoridades na falta, segundo diz a autora, de recursos provinciais para se criar uma Escola
Normal independente.
55
qual fosse delegada a condução dos negócios públicos, o controle desse processo se
fazia importante.
Pela via dos exames de preparatórios, o Centro fornecia não só as diretrizes
culturais aos candidatos, mas também, às autoridades provinciais a política que
orientaria a organização escolar do secundário para a formação dessa elite.
Dessa maneira, o Paraná não fugiu à tradição do ensino secundário no país. Com
a crescente procura dos jovens paranaenses pelos cursos de preparatórios, a idéia de
tornar o liceu um curso completo de humanidades esbarrava na praticidade dos exames
preparatórios avulsos. Por isso, o Liceu de Curitiba foi extinto por duas vezes, na
terceira, criou-se em seu lugar o Instituto de Preparatórios e mais tarde o Instituto
Paranaense, caracterizado pela manutenção das aulas avulsas e sem regularidade em seu
funcionamento.
Na história do ensino secundário no Paraná, é possível identificar alguns desses
momentos marcantes. Seu início, com a implantação de algumas cadeiras, Latim e
Francês, no Liceu de Curitiba em 1857; a ampliação de cadeiras em 1858, quando nela
se inclui a História Sagrada; a sua extinção e a imediata subvenção em um colégio
particular (1869); sua retomada como Liceu (1871) e posterior extinção (1876). Após
essa data, criou-se, no lugar do Liceu, o Instituto de Preparatórios (1876), ficando a ele
anexada uma Escola Normal a fim de preparar professores para atuarem no ensino
primário.
Em 1882 a ênfase da instituição recai sobre a Escola Normal, passando a
chamar-se de Instituto Normal e de Preparatórios do Paraná. Mais tarde (1883), retorna
a ênfase no curso de preparatórios, passando a chamar-se Instituto Paranaense e Escola
Normal. Essa denominação permanece até a proclamação da República que, com a
mudança de regime político, passa a denominar-se Ginásio Paranaense e Escola
Normal em 1890.
O fato de essa instituição existir oferecendo dois cursos ao mesmo tempo – um
de nível secundário e outro de formação profissional – marcará a trajetória assumida
pelo ensino secundário na capital do Paraná e, nela, a história da disciplina escolar
História. Através da estrutura institucional e da prática educativa da instituição
paranaense, verifica-se como essa disciplina escolar, no ensino secundário e normal,
relacionava-se com as finalidades educacionais da instrução primária paranaense, que
se definia como forma escolar no período.
56
As determinações a que as províncias estavam submetidas, bem como a forma
como o ingresso nas faculdades do Império se dava foram decisivas para a consolidação
das cadeiras de História nessas instituições. Ou seja, os estudantes só se interessavam
pela cadeira de História caso ela estivesse sendo exigida entre as matérias em que
precisavam ser aprovados para ingressar no curso cuja vaga estavam disputando.
O ensino secundário oferecido no Liceu, quando de seu curto período de
funcionamento, contou apenas com a cadeira de Latim, Francês e Matemáticas, ficando
a cadeira de História e Geografia, embora prevista em lei
4
, sem legitimação disciplinar,
uma vez que funcionou temporariamente, entre 1858-1859, apenas a cadeira de História
Sagrada.
O predomínio das cadeiras de Latim e Francês levou à supressão das outras
cadeiras previstas, entre elas a de História e Geografia, em 1861, pela falta de professor
para ocupar a cadeira e de alunos nela matriculados
5
. Após a extinção, só se terá notícia
desta cadeira em 1870, quando o curso secundário passa a funcionar através de um
Colégio Subvencionado em Curitiba.
Em 24 de janeiro de 1870, o então inspetor geral da Instrução Pública, Ernesto
Francisco de Lima Santos, envia correspondência ao presidente da Província, Antonio
Luiz Affonso de Carvalho, relatando o estado da educação no Paraná. Nesse documento,
pontua as dificuldades com o ensino secundário que a Província vinha enfrentando e a
solução encontrada na subvenção.
Até a época em que se reuniu a ultima assembleia legislativa provincial tinha a
instrucção secundaria na provincia por mananciaes as seguintes cadeiras: tres no
extincto Lyceu, sendo uma de francez, outra de latim e outra de mathematicas
elementares; duas em Paranagua sendo uma de francez e outra de inglez, e duas em
Antonina, sendo uma de latim e outra de francez.
As leis, porem, ns.182, de 30 de Abril e 203, de 5 de Junho, supprimiram todas essas
cadeiras, restando a autorisação da lei n.167, de 7 de Abril de 1868, modificações pela
de n.204, de 5 de junho de 1869, para subvencionar um collegio particular onde se
ensinasse diferentes materias componentes da instrucção primaria e secundaria.
Tendo o antecessor de V.Ex, Ilm. Sr. Fonseca determinado em data de 2 de Julho, que
esta Inspetoria fizesse com o proponente Jacob Muller o contracto pelo qual este se
obrigasse, mediante a subvenção marcada no art.2
o
da lei n.204, já citada, a manter um
collegio nas condições prescritas pela lei de 7 de Abril de 1868, celebrou-se este
4. O ensino de História no Paraná, em seu início, assumiu, no Programa do Liceu em 1858, a seguinte divisão:
Antiga, Moderna, Moderna e do Brasil, dividindo seu campo disciplinar com a História Sagrada e a Geografia.
(cf. Programa
de Estudos do Liceu de 1858, anexo – quadro III).
5
Em 1858, o Liceu de Curitiba obteve a sua primeira turma, constando de 18 alunos matriculados nas aulas da 5
a
classe. Desses alunos, somente três prestaram exames e foram aprovados: Joaquim Ignácio Silveira da Motta,
Generoso Marques dos Santos e Francisco Alves Guimarães (Livro de Actas de Exames do Liceu – 1858-1861).
57
contracto no dia 11 de setembro, depois de approvado e expedido o regulamento de 3 do
mesmo mez, que por ordem do mesmo Ex.Ilm.Sr. organisei.
Em data de 1
o
de setembro comunicou-me o referido Muller ter começado o seu collegio
a funcionar
. (Correspondência de governo, AP. 324, vol.1,1870, p.267-274, grifo
meu).
A referência à subvenção do ensino secundário no Paraná é importante porque é
nesse período que aparece o registro da compra do compêndio de História Universal de
Victor Duruy (Ofício n.89 de 24 de março de 1870), marcando os primeiros indícios da
prática do ensino dessa disciplina no Paraná no curso secundário, em meio a
dificuldades de consolidação do curso, fundamentalmente por causa da falta de
professores para ocuparem as cadeiras que precisavam ser criadas para atender aos
exames de preparatórios.
Subvencionado ao diretor de um colégio particular já existente na província,
Colégio Nossa Senhora da Luz, o alemão Jacob Müller deveria seguir as seguintes
disposições para manter a subvenção
6
pelo governo.
Art.1
o
O Colégio subvencionado na forma do art.1
o
da Lei n.196 de 31 de maio
deste ano terá a seu cargo o ensino das matérias de que trata o art.5
o
da de n.167,
de 7 de abril de 1868, e funcionará n´um edifício espaçoso e arejado que contenha
as acomodações necessarias para o número de alunos que o frequentarem.
Art.2
o
As matérias desse ensino serão divididas em oito cadeiras pela forma
seguinte: 1
a
cadeira – Lingua nacional, leitura, calegrafia e religião, 2
a
cadeira –
Gramatica filosofica; 3
a
cadeira – Latim; 4
a
cadeira – Frances; 5
a
cadeira – Ingles;
6
a
cadeiraHistoria Universal e geografia; 7
a
cadeira – Aritmética e geometria
plana; 8
a
cadeira – Filosofia racional e moral. (Correspondência de Governo,
Ofícios, v.15, AP. 312, 1870, fls.113-118, grifo meu).
No entanto, verifica-se, pelas correspondências diversas que foram trocadas entre
Müller e o inspetor geral da instrução pública, Ernesto Lima Santos, e até o presidente
da província, Afonso de Carvalho, que diferentes dificuldades estavam sendo
enfrentadas pelo diretor do colégio para cumprir o contrato firmado em 1868. Nos
documentos analisados, encontra-se uma correspondência de Müller, enviada em 1
o
de
novembro de 1869, ao inspetor geral da instrução pública, solicitando aprovação de
alguns dos arranjos feitos por ele entre os professores para atender às cadeiras do curso.
6
Em 11 de setembro de 1869, foi celebrado contrato entre o senhor Jacob Müller, professor de alemão e diretor
do Colégio Nossa Senhora da Luz em Curitiba, e o inspetor geral da instrução pública, Ernesto Francisco de
Lima Santos, para dar provimento ao curso secundário subvencionado.
58
Ilmo. Sr.Dr. Inspector Geral da Instrução Publica do Paraná – Para o melhor
adiantamento dos alunmos acho conveniente que V.Ex. me autorize a continuar
eu a lecionar francez a seis alumnos, usando-nos de uma grammatica franceza-
allemã; que o Professor Ohecio (?) continue com a sua classe de francez, que
tinha até o fim do mez de Setembro; que eu alem disso ensine gramatica
portugueza, segundo o Compendio de Gramatica portugueza por Coruja aos
alumnos que formarão a dita classe até o fim da Setembro, e tudo isto até o fim
do corrente anno lectivo. Mais peço a V.Ex. que se Designe mandar pagar-me a
subvenção vencida no fim do mez de Outubro. Deus Guarde a V.Ex.. Curityba,
1
o
de Novembro de 1869 – Jacob Müeller, Professor. (Correspondência de
governo, AP.317, vol. 20, 1869, fls. 95).
Em seis de novembro do mesmo ano, o diretor recebe resposta do inspetor geral
da instrução pública, Ernesto F. de Lima Santos, negando seu pedido:
Inspectoria Geral da Instrucção Pública do Paraná, 6 de Novembro de 1869 – Ilm.Sr. –
Baseado em que seis dos seus alumnos de francez, aprendendo esta lingua por uma
grammatica allemã, não podiam sem inconveniente passar a ser lecionadas pelo
Professor João Manuel da Cunha, por isso que com elle teriam de fazer uso de algum
methodo portuguez-francez, pediu-me V.Sr. verbalmente concepção para continuar a
ensinal-as até o fim do anno, no que não tive duvida em concordar considerando que
não seria muito conveniente transtornar a marcha do ensino que levavam, obrigando-
os a uma mudança repentina para uma lingua diversa. – Era um caso não previsto no
Regulamento que rege o collegio, mas ante o qual o bom senso não podia hesitar em
adoptar a medida que autorisei. – Entre isto, porem, e a providencia por V.Sr. agora
proposta em seu officio de 1
o
do corrente há uma differença notavel, e duas vezes seis
violada a disposição daquelle Regulamento se se levasse elle a effeito. – O art.8
o
do
Regulamento estatue que nenhum professor poderá leccionar mais de duas cadeiras, e
o art.7
o
que V.Sr. não poderá admittir indivíduo que não seja brasileiro ou portuguez
para professor de lingua nacional. – Ora, na distribuição das materias pelos
professores por V.Sr. feita segundo o seu officio de 27 de setembro ultimo, e em
virtude do qual começara a funccionar o seu collegio na esfera que lhe traçou aquelle
Regulamento, ficou o Professor Otto Finkensieper encarregado da direcção das
cadeira 5
a
e 6
a
e V.S. das cadeiras 2
a
e 4
a
/7
a
. E pois, admittindo a adopção de medida
apresentada por V.S., não só se daria a infracção do mencionado art.8
o
por accumular
o Prof. Ottão tres cadeiras, como a dos arts. 7
o
e 8
o
a um tempo por acumular V.S.
quadro cadeiras, sendo uma de lingua nacional, para o que não é apto em vista do
Regulamento. – Consentir nisso, concordará V.S., fora estabelecer uma pratica
abusiva na applicação do Regulamento ao seu Collegio, e vicial-o já na sua origem,
sem que ao menos os resultados tenham tido tempo de apontar-lhe defeitos ou
lacunas, caso único em que seria rasoavel qualquer modificação dentro das orbitas da
lei. – Cumpre, portanto, que V.S., fiel ao que lhe accordou na conformidade de seu
referido officio de 27 de Setembro, empregar no collegio o pessoal conveniente para,
de harmonia com o mencionado no art.8
o
, dar execução o contracto de 3 do mesmo
mez, sem a que não lhe posso attestar o direito á prestação marcada; advertindo que,
não considero, á vista do que acularmente observei e deprehendo do contido do ultimo
dos seus citados officios, que seu collegio funccionou segundo as disposições que lhe
dizem respeito. –Deus guarde a V.S. Ilmo.Sr.Professor Jacob Müller, Diretor do
collegio subvencionado. O Inspetor Ernesto Francisco de Lima Santos
(Correspondência de Governo, AP.317, vol.20, 1869, fls.96-96-v).
59
O maior problema quanto ao funcionamento do colégio subvencionado parecia
estar em atender ao contrato no que se refere à oferta das cadeiras exigidas, em função
da falta de professores para ocuparem as cadeiras. É o que se percebe nas
correspondências trocadas com as autoridades e no Relatório enviado à Assembléia
Legislativa em 15 de fevereiro de 1870 pelo presidente Antonio Luiz Affonso de
Carvalho, quando se refere à instrução secundária:
Não é mais animador o seu estado. Em toda a provincia só existe um collegio, em que
se lecciona um curso de humanidades, esse mesmo incompleto, pelas difficuldades no
preenchimento das cadeiras [...]. Este collegio, está debaixo da direcção do allemão
Jacob Müller, que aceitou a subvenção de 4:000$000 marcada na lei n.204, de 05 de
Junho do anno passado, obrigando-se a tel-o nas condições definidas pela lei n.167, de
07 de Abril de 1868. (Paraná, Relatório de 15 de fevereiro de 1870, p.12).
Em correspondência ao presidente da Província, assim se posicionava o inspetor
da instrução pública, Lima Santos, com relação ao Colégio:
Devo aqui consignar minha opinião acerca da existencia deste estabelecimento.
Muito se há dito sobre as vantagens dos internatos: a experiencia das nações da culta
Europa e Estados Unidos, e os importantes resultados no nosso paiz obtidos desse
systema de educação fallam bem alto e me despensam de largos commentarios a
respeito.
É incontestavel que a Allemanha, a Suissa e a Belgica são as nações onde a instrucção
publica é mais cuidadosamente derramada por todas as classes da sociedade e onde o
estudo de um assumpto de tão vital interesse para o engrandecimento dos povos tem
sido nestes ultimos tempos tratados com maior perseverança e reflexão.
Esse numero de todas as reformas feitas no intuito de aperfeiçoar o ensino publico
aquelle que os mais notaveis directores de instrucção e publicistas prosectos na materia
tem considerado o melhor meio diffundir a luz no seio da mocidade que se levanta, é a
creação de internatos.
É portanto meu parecer que se empregue todos os meios para ser realizada a idea que
creou o collegio subvencionado, não devendo influir para o seu abandono as
difficuldades deparadas no curto espaço de tempo decorrido desde a extincção de
Lyceu.
A experiencia de longos anos indicou os mil defeitos adistrictos ao simples externato,
como era esse estabelecimento. Verificou-se que quase nenhum fructo resultava da
manutenção de um estabelecimento apparatoso com grande lezão dos cofres publicos e
cuja existencia não era secundada pelo systema adoptado. Verificou-se que os allumnos
do Lyceu desperdiçavam o melhor de seus annos em apoderar-se de uma, duas ou mais
materias, sem exibir por fim um gráo de adiantamento proporcional ao tempo da
frequencia.
Não faço cargo desses resultados aos professores em quem sempre reconheci dedicação
de uma plena proficiencia: attribu-o só e unicamente a vicios da instituição.
A idea pois, de um internato ou semi-internato nas condições mais ou menos da lei de 7
de Abril de 1868 me parece que deve ser pelo menos estudada, remettendo ao tempo e
a experiencia a resolução do problema que por ventura encerre, o que se conseguirá
desde que disso esteja incumbindo quem assinado de melhores intenções do que o
professor Muller se esforce em realidade por alliar os interesses individuaes
60
empenhados na empreza com os da Provincia. (Correspondência de governo,
AP.324, vol.1,1870, fls.267-274).
No entanto, quando o inspetor geral da Instrução Pública passa a ser Bento
Fernandes de Barros, as críticas se avolumam. Em Relatório de 1871, assim se
expressava com relação ao colégio subvencionado:
O collegio subvencionado apresenta ainda em sua organização elementos diversos que
significam a sua impotencia para satisfazer a missão a que é destinado. Nelle funcionam
professores remunerados pelo director e sujeitos ao regulamento especial do
estabelecimento, e professores do extinto lyceu, pagos pelo governo e sujeitos ao
regulamento de 10 de Junho de 1858. Assim os proprios legisladores, que mandaram
funccionar no collegio os professores de latim e francez, e de geometria do lyceu,
reconheceram que aquelle estabelecimento, alias obrigado a manter aulas para o ensino
das referidas materias, não tinha um pessoal sufficiente para isso. Esse facto é a um tempo
a significação legal da fraqueza do mesmo estabelecimento que a provincia subvenciona, e
da ausencia de um pensamento systematico na organização do ensino.
(Paraná, Relatório
de 1871, p.24).
As críticas endereçadas à administração do colégio subvencionado eram
respondidas por Müller. Este buscava justificar as iniciativas tomadas para resolver o
problema da falta de professores, como no exemplo abaixo citado:
Ilm.Sr.Dr. Inspetor Geral da Instrução Publica do Paraná – Respondendo ao officio
n.74, que V.S. dignou-se dirigir-me no dia 8 do corrente mez, confesso não estar eu de
conformidade com a letra da lei, que regula o collegio, tendo-se incumbido junto o
professor Ottão F. de leccionar a primeira cadeira desde o dia 4 até o ultimo do corrente
mez. Mas attentos as circunstancias reaes, que derão motivo a esse meu procedimento
estou certo de que V.S. não há de imputar a mim uma infração á lei. – Já comuniquei a
V.S. no dia 5 do corrente o que se tem passado entre o cidadão Ferdinando da Cunha
Marques, o ex-Professor da primeira cadeira do collegio e entre mim, do que V.S. tem
de deduzir que eu não tenho culpa alguma de ter-se esse Professor affastado do collegio
de uma maneira desacostumada, não cumprindo elle com a palavra que se deu entre nós
reciprocamente.- Mas repito hoje o que já tive a honra de dizer a V.S., que convidei para
Professor da 1
a
cadeira o cidadão portuguez Francisco Xavier de Almeida Garrett, o
qual, porem, não pode aceitar, segundo elle me declarou no dia 7 do corrente.- Nem
mesmo consta do conteudo das duas cartas inclusas que me forão dirigidas das duas
cidades maritmas desta Provincia, que ali não se achou pessoa que quizesse leccionar a
1
a
cadeira. Resta-me ainda que convido para esse fim o Sr.Professor João de tal, o que
faço hoje, meu visinho, a única pessoa talvez que esteja em caso de aceitar.- Não tendo
eu podido ao dia 5 do corrente mez, dia da retirada repentina do dito Ferdinando
Marques, - cuja retirada, porem, não temos de lastimar quanto aos progressos dos
alumnos – preencher logo essa cadeira vaga, ficou-me só a alternativa, ou fechar as
aulas, ou continuar eu a leccionar essa cadeira, o que realmente fiz. E como se deve
escolher sempre o melhor dous males, eu procedi nessa colisão de deveres da mesma
maneira, como já officiei no dia 5 do corrente.- Essa accumulação de cadeiras feita por
mim cedendo á mais urgente necessidade, da qual ninguem podia nos livrar por estes
dias de Novembro, não será mais nociva ao bom aproveitamento dos alumnos da 1
a
61
classe – nos quaes se dá mais uma lição das 4 até 5 horas da tarde, do que a confusão de
3 classes em francez que o Professor João Manuel da Cunha por ora tem de ensinar em
uma hora. Se este Professor puder ensinar mais de uma classe em uma hora e isso,
segundo as proferidas palavras de V.S., com bons resultados, V.S., poderá, nas
circunstancias actuais, attribuir-me uma infracção á lei só se quizer negar-me a aptidão,
o zelo e a diligencia, que V.S. não hesita em vindicar a um outro Professor.- Espero,
portanto, que V.S. attentas todas as circunstancias, não achará cousa alguma occasionão
a por minha culpa que esteja contra a lei, e peço a V.S de comunicar tudo a respeito á
Presidencia da Provincia para a final decisão, afim que se pague com urgencia a
prestação da qual o Ex.Sr. Vice presidente da Provincia achar por bem ter eu direito.-
Deus guarde a V.S.- Curityba, 11 de novembro de 1869. Jacob Müller – Diretor do
collegio.
(Paraná, Relatório de 1871, p.99-99-v).
Mas nenhuma das justificativas oferecidas pelo diretor do Colégio pode reverter a
situação que estava prevista: o fim da subvenção. O registro dessas correspondências é
significativo porque confirmam as dificuldades que o curso secundário provincial
enfrentava para constituir-se num curso de caráter público e regular, por isso se manteve
com poucas aulas avulsas nas cadeiras de Latim e Francês até 1871, quando, pela Lei de
290, acabava-se com a subvenção e criava-se novamente o Liceu na capital.
O Liceu retomou seu funcionamento em 3 de julho de 1871, na mesma sala do
prédio da Assembléia, enquanto o governo providenciava uma nova sede, com oito
professores responsáveis pelas seguintes cadeiras: Joaquim Dias da Rocha, Ciências
Naturais; José Antonio Galvão, Matemáticas; João Manuel da Cunha, Latim; Ernesto
Dias Laranjeira, Francês e Inglês; Eusébio Silveira da Motta, Filosofia e Retórica;
Joaquim de Almeida Faria Sobrinho, História e Geografia; Antonio Ferreira da Costa,
Gramática Geral e Otto Finkensieper, Alemão (Straub, 1999,p 21).
Apesar de ter professores para atender as oito cadeiras previstas na lei, algumas
matérias deixaram de funcionar porque o curso teve seu início em princípios de julho e,
segundo o então presidente da Província, Venâncio José de Oliveira, por escassez de
tempo, tais matérias não funcionaram, conforme anuncia em seu Relatório de 15 de
fevereiro de 1872 à Assembléia Provincial. As demais aulas do Liceu teriam funcionado
regularmente em seis cadeiras: Francês e Inglês, Latim, Alemão, Ciências Naturais,
Gramática Geral e, entre elas, a cadeira de História e Geografia.
Porém, de acordo com o inspetor geral da instrução João Franco de Oliveira
Souza, que assumiu a inspetoria em 1873, ao prestar informações ao Ministério do
Império em março de 1873, a freqüência dos alunos não foi a esperada. Considerou que
27 alunos, freqüentando aulas de Latim, eram poucos diante do otimismo que reinou
62
entre os envolvidos com a instrução pública no Paraná no restabelecimento do Liceu.
(Departamento do Arquivo Público, códice 115, 1873, fls.102-117).
Na ocasião da correspondência, Oliveira Souza apontou suas suspeitas sobre o
insucesso do Liceu:
Pelo que tenho observado as principais causas a que se deve atribuir a pouca
concorrência de alunos e a fraca animação que tem tido o Liceu são o estado
defeituoso do edifício, a desconfiança que reina na população criada pelas
freqüentes alterações nos estudos secundários e as dificuldades dos pais de família
que residem fora da capital de manterem aqui os filhos em casas particulares para
cursarem as aulas do Liceu
. (Departamento do Arquivo Público, códice, 115,
fls.102-117).
Embora esses elementos tenham sido freqüentemente citados como causadores
do fracasso do curso secundário no Paraná, o que se verifica era que a pouca freqüência
de alunos nas aulas, o que afirmava, de fato, o seu declínio. Em Relatório de 15 de
fevereiro de 1874, o presidente da província Frederico José Cardoso de Araújo
Abranches lembrava à Assembléia provincial: “A frequencia do lyceo foi durante o
anno findo de 26 alumnos, dos quaes 12 prestaram exames, sendo 11 approvados.
[Sendo que] As cadeiras de geographia e historia, philosophia e rethorica não
foram frequentadas” (Paraná, Relatório de 15 de fevereiro de 1874, p.26, grifo meu).
Considerando essas informações, conclui-se que o secundário em Curitiba
funcionou nesse período, na verdade, apenas com as “cadeiras isoladas” de Latim e
Francês; Alemão e Inglês e Matemáticas Elementares; essa última voltou a funcionar
em 1874.
Dessa maneira, o que caracterizava o real funcionamento do ensino secundário
no Paraná da época era o predomínio de tais cadeiras e a dificuldade de implementar as
demais que eram exigidas nos exames de preparatórios para os cursos superiores.
Essa situação trazia lamentações do grupo de intelectuais que se propunha a
“ilustrar” a sociedade paranaense através de um curso “completo de Humanidades”,
como a do então inspetor geral João Manoel da Cunha. Em Relatório ao presidente da
Província Araujo Abranches, em 15 de janeiro de 1875, Manoel da Cunha argumentava
que as “cadeiras isoladas”, por mais que tentassem guardar um nexo e ordem de um
curso secundário seriado, perdiam a unidade de ação, o “concatenamento indispensável
na marcha regular que deve levar um programa racional de ensino” (Paraná, Relatório
do inspetor geral de Instrução Pública de 1875, p.19).
63
A situação do secundário no Paraná parecia ser, naquele momento, ainda mais
grave, visto que, pelo Decreto n.5429 de 2 de outubro de 1873, o governo Imperial
havia concedido às províncias o privilégio de estabelecer bancas de exames de
preparatórios. (Cunha, de 15 de janeiro de 1875, apud Jornal Dezenove de Dezembro
de 3 de abril de 1875).
Para isso, entretanto, era necessário manter o programa do curso do Liceu
equiparado ao do Colégio Pedro II. Esse fato trazia para o debate entre as autoridades
paranaenses o papel do Liceu diante dos exames preparatórios.
Nesse sentido, considerava o inspetor geral da instrução pública, Manoel da
Cunha, que o declínio da instituição se revelava nas poucas aulas que oferecia em
comparação às exigidas nos exames para o ingresso nos cursos superiores. Na mesma
ocasião, queixava-se o presidente da Província, Araujo Abranches, da dificuldade em
fazer aumentar a procura de candidatos às cadeiras oferecidas no Instituto.
Vae em sensivel declinio o unico estabelecimento publico de instrucção
secundaria. Á mais de uma causa se deve attribuir a decadencia desta instituição. A
primordial desappareceu com o decreto n.5429 de 2 de Outubro do anno passado
[1873] que considera validos nas faculdades os exames prestados nas provincias
em que não existem taes estabelecimentos.
É também grande na provincia a negação para os estudos das materias
seccundarias, de modo que, em regra, os pais encaminham os filhos á outras
profissões, logo que saem das escolas primarias.
Qual será, entretanto, o meio de collocar o lyceu na verdadeira altura de um
concurso de instrucção secundaria, é o que estou certo perscrutareis com
cuidado.
Entende o Dr. Inspetor da instrucção publica que chegar-se-ha a esse resultado com
a creação de um internato.
Esta idéa, seria esposavel se contra ella não militasse a crise financeira que a
provincia atravessa, ou se pudesse garantir um numero de pensionistas sufficiente
para que os seus sacrificios não fossem empregados em pura perda
. (Paraná,
Relatório do presidente da província de 1874, p.26, grifo meu).
Diante de tal situação, concluía:
Em taes conjunturas, parece-me que o melhor alvitre a seguir, é adoptar-se no
lyceo o ensino das disciplinas
7
que constituem o curso de preparatórios para as
academias do imperio deixar-se pleno arbitrio ao presidente para reformar o
pessoal.
A não serem tomadas sérias providencias tendentes a rehabilitar aquelle
estabelecimento da decadencia em que jaz será mais utilidade transformal-o em
uma escola normal de que tanto necessita a provincia. (Paraná, Relatório de 1874,
p.26, grifo meu).
7
Esta é a primeira vez que aparece o termo disciplina nos documentos analisados.
64
A força do decreto imperial de 2 de outubro de 1873, acima citado, indicava
para as autoridades paranaenses que o melhor caminho para manter o curso secundário
na Província seria concentrar esforços em fundar um Instituto de Preparatórios e
acabar, de vez, com o Liceu de Curitiba que, na opinião do inspetor geral da instrução
pública, do presidente da Província e dos membros da Assembléia Legislativa
Provincial apenas havia trazido despesas. Sua extinção se deu em 06 de abril de 1874
sob a lei n.381.
Em 1875, o presidente da Província, Frederico José de Araújo Abranches,
salientava que o estado financeiro do Paraná não permitia a fundação de um instituto
que pudesse oferecer aos alunos as disciplinas exigidas nos exames preparatórios e
concluía: “Com os restos desorganizados do nosso antigo Liceu é evidente que não se
pode preparar alunos para os cursos superiores”. (Paraná, Relatório do presidente
Abranches a Assembléia Legislativa Provincial em 11 de fevereiro de 1875).
O argumento de Abranches se fundamentava no fato de que, em princípios de
1875, o secundário em Curitiba contava com apenas cinco cadeiras: latim, francês,
inglês, alemão e matemáticas. De acordo com o Relatório do presidente da Província
Adolpho de Lamenha Lins, de 1876, faltava oferecer várias outras cadeiras como, por
exemplo, Física, Química e História e Geografia, para que o pensado Instituto se
efetivasse como instituição equiparada ao colégio oficial da Corte
8
.
Refletindo sobre a situação e os lamentos para que se acompanhassem as
diretrizes da educação imperial, ou seja, do Colégio Pedro II, Lamenha Lins buscava
justificar, para a Assembléia Legislativa Provincial, a fundação de um Instituto de
Preparatórios.
Um curso de preparatórios, habilitando ao ingresso dos cursos superiores no império;
perfeitamente válidos os respectivos exames obtidos diante de uma comissão que, por
funcionar na mesma província, é assunto de elevada economia e incentivo ao estudo,
parece-me cousa mais necessária a por-se em imediata execução. As despesas
extraordinárias, as longas ausências dos filhos, os incômodos de toda a espécie que
dali emanam: tudo isto evitado, e, em troco, os mesmos resultados para uns; o
aumento de idéias que para todos deve provir de contato com os próprios
freqüentadores da nova instituição, eis aí resultados, cujos méritos são indubitáveis
.
8
Em 1876, o Colégio Pedro II oferecia as seguintes cadeiras, desde 1862, em seu curso: Noções de Physica a
Chimica; História Natural (zoologia e botanica) e também Geografia e História Antiga; Geografia e História
Romana; História da Idade Média; História Moderna e Contemporânea; Corografia e História do Brasil. (Vechia
e Lorenz,1998).
65
(Paraná, Relatório do presidente Adolfo de Lamenha Lins, de 15 de fevereiro
de 1876, p.56).
Convencidos de que o caminho para colocar o secundário na trilha da “ordem”
e a província não ficar na “retaguarda do progresso”, os membros da assembléia
provincial em exercício concordaram com a necessidade da reformulação do
regulamento da Instrução Pública, autorizando expedir-se um “Regulamento
Orgânico”, pela Lei n.456 de 12 de abril de 1876.
Por esse regulamento, ficava criado o Instituto de Preparatórios e a ele anexo
uma Escola Normal. Instituição de ensino compondo-se de dois cursos, ficou assim
denominada: Instituto de Preparatórios e Escola Normal.
2.2 O Ensino secundário no Paraná: o padrão ideal e o padrão real não se podem
separar.
A década de 1870 foi marcada no Brasil pela generalização dos debates em torno
da necessidade de reformar a estrutura da escola brasileira, impulsionados pelos ideais
republicanos de realizar a educação escolarizada, que ia se desenhando entre os
princípios educacionais da monarquia. Estudando esse período, Hilsdorf (2003, p.49-50)
afirma que, por volta dessa década, firmou-se
[...] um ambiente social e cultural rico não só em debates e polêmicas que discutiam a
educação necessária para realizar o país moderno e livre, como também em iniciativas e
realizações que encaminham um intenso movimento de escolarização da sociedade
brasileira
.
Em São Paulo, província estudada pela autora, havia em 1862, segundo seus
dados, 79 escolas de primeiras letras, dez aulas avulsas de latim e francês e uma de
desenho e pintura, dez anos depois, a disseminação das instituições elementares e
secundárias era um fato. Em 1872,
[...] já haviam sido criadas 314 escolas públicas elementares masculinas e 197
femininas, e estavam registradas na Inspetoria da Instrução 46 escolas particulares
[...] mais 24 colégios e dez aulas avulsas de estudos secundários, para única aula
pública de latim e francês
(Hilsdorf, 2003, p.50).
66
E conclui: “isso significa que a escola era, simultaneamente, uma instituição de
educação procurada e oferecida à população, o que justificava que os diferentes grupos
socioculturais disputassem o seu controle” (Hilsdorf, 2003, p.50).
Diante de um quadro sócio-cultural favorável à expansão da escola pública, a
crise enfrentada pelo curso secundário na Província do Paraná advinha,
fundamentalmente, do predomínio da cultura clássica num momento em que os
conhecimentos científicos, considerados modernos, tornavam-se valorizados pela
população escolar.
No Paraná, a historiografia regional tem apontado para a presença de um “forte
anticlericalismo” como a causa principal da crise monárquica que marcou as idéias
republicanas no período. Marchette (1996, p.31), ao desenvolver sua tese sobre o
anticleticalismo em Curitiba, afirma:
[...] as grandes e negras abas dos chapéus dos padres e suas vestes também escuras
cristalizaram, no discurso anticlerical, a imagem metafórica dos padres como corvos
encobrindo o mapa republicano brasileiro e ameaçando, com seu pouso, as árvores-
símbolo da liberdade de pensamento, as acácias. Ao defender a emancipação do
homem da tutela da religião, os anticlericais curitibanos colocaram-se como
opositores das doutrinas da Igreja Católica Romana que, a partir da metade do século
XIX, visavam combater o mundo moderno e suas filosofias: liberalismo,
evolucionismo, naturalismo, racionalismo, positivismo e maçonaria[...]. No
movimento anticlerical curitibano duas eram as bandeiras essenciais na luta
contra a tutela da religião e a favor da autonomia e individualização do homem
moderno: a educação laica e o combate à influência do padre na esfera privada,
principalmente através do confessionário e seu poder de adentrar nos segredos
íntimos da família
. (grifo meu).
Endossando essa perspectiva de análise, Pereira (1998, p.27), ao tratar da
“cultura e imaginário no Paraná da I República”, afirma não ser “[...] à toa que o
anticlericalismo no Paraná também marcará praticamente toda a produção literária da
sociedade paranaense da época”, fins dos anos 1880. Não sendo à toa, também, que
anuncia em sua tese:
[...] a idéia que mais refletirá a base cultural do Estado, será o republicanismo radical, o
positivismo ortodoxo. Base cultural porque se enquadra enquanto elemento
diferenciador e determinante da identidade cultural paranaense. Não é um ponto de
ligação do Paraná com outros territórios nacionais, mas sim um elemento que permitirá
sua diferenciação e a delimitação dos fatores responsáveis pela integração do Paraná.
Uma força centrífuga de união dos grupos regionais do Estado, ao moderno tempo que
centrípeta em relação à Nação e às outras regiões
(Pereira, 1998, p.29, grifo meu).
67
Da perspectiva educacional, é no final dos anos de 1870 e início dos 80 que
ocorre a intensificação dos debates educacionais em torno dos valores, da maneira de
organização das escolas e dos saberes escolares no Paraná, revelando-se, na prática, do
ponto de vista dos saberes a serem ensinados, em propostas de criação de novas
cadeiras para o Instituto e Escola Normal, além da ampliação das escolas primárias
9
.
Nesse trajeto, a elite intelectual paranaense, que se propunha a “ilustrar” o país,
a “libertar” a sociedade das velhas instituições religiosas e da ignorância, em nome da
ciência e das propostas republicanas que valorizavam os conhecimentos científicos
como prática de uma renovação social, conforme indicou Pereira (1998), conviveu com
o predomínio da cultura clássica, que então representava a tradição do ensino
secundário. Exemplo disso é o relato do inspetor geral em 1876:
Não compreendi no sistema dos estudos clássicos ciências físicas e naturais,
embora seja seu ensino reclamado pelas necessidades atuais da civilisação,
porque os recursos da provincia ainda não são grandes e não convém dificultar a
creação de uma instituição indispensavel ao ensino, que para o futuro pode
desenvolver
-se. (Paraná, Relatório do inspetor geral de ensino Bento
Fernandes de Barros, 1876, p.23).
Na definição de um modelo de curso secundário no Brasil, afirma Gasparello
(2004) que o debate em torno das humanidades e dos saberes científicos acompanhou as
transformações sociais ocorridas na transição do século XIX para o XX, que, em meio a
dificuldades de mudanças em sua estrutura, define o quadro elitista do secundário.
A tendência à transformação das finalidades do ensino secundário, que também
na Europa encontrava fortes restrições, enfrentou aqui, no paradoxo do
movimento social-histórico, o peso dos valores aristocráticos e da cultua das
belas letras, fortalecidos com a permanência de uma hierarquia social
excludente. Tais condições ajudaram a configurar uma realidade social que
construía fortes barreiras ao acesso e permanência de alunos não pertencentes às
famílias abastadas nos estudos secundários [...]
(Gasparello, 2004, p.61, grifo
meu).
No caso do Paraná, o confronto entre os valores aristocráticos e as novas
diretrizes sociais culminou na institucionalização do curso secundário separado do curso
normal, com programa regular e seriado da década de 20 do século XX. Antes desse
9
Sobre as escolas primárias no Paraná, ver: Oliveira (1986; 1994).
68
momento, porém, os programas dos cursos demonstraram a predominância da cultura
clássica que, embora acrescesse a presença das ciências, seu conteúdo estava ligado à
idéia de formação humanística, conforme se observa nesse discurso dos professores do
Instituto e Escola Normal, na ocasião da visita do imperador à Província paranaense em
1880:
Sabe-se, pois, que a verdadeira riqueza de um povo regula-se pelo gráo de força
pensante de que dispõe. Sabe que um povo inactivo, possua embora o solo mais
vigoroso, é um povo cujas ambições não excedem os limites da falta e grosseiro
instinticto que o impelle para a vida. Sabe, porém, que a actividade exclusiva, isolada,
não é riqueza; que as industrias, as artes correspondentes que délla dependem, só são
possiveis, crescem, progridem, quando se lhes ajustam as leis do pensamento que
organiza. Com esta crença teme os administradores da província procurando educar os
espíritos, preparar a intelligencias, quebrar o obstinado circulo da fatalidade.
Começando pela aprendizagem dos symbolos da linguagem, conseguiram fundar a
educação primaria, fraca, imperfeita, limitada. Um dos primeiros problemas de que se
ocuparam, comprendendo que em materia de ensino a quantidade mede-se pela
qualidade, foi o de recrutamento dos professores. Todavia, a solução correspondente, só
pude tornar-se efectiva, vinte annos depois de descoberto.
Temos uma escola normal cuja organização não é completa, cujos resultados não são
animadores. Entretanto, qual a importancia de tão útil instituição, todos comprehendem.
Mas a instrucção primaria, não merece outro titulo que o que deriva de seu proprio
destino: não passa de uma preliminar indispensavel para a verdadeira educação do
espírito. Os estudos secundarios são, como se denomina, meros preparatórios de
estudos superiores, únicos capazes de vigorar e distender as disposições mentáes.
(Proclamação dos mestres do Instituto Paranaense e Escola Normal, 1880,
Boletim do Arquivo Público do Paraná, grifo meu).
A perspectiva de restabelecer o ensino secundário sob as novas diretrizes, que
não a de “meros preparatórios”, trazia para o centro do debate as finalidades desse
ensino. Sobre esse assunto, assim se expressava o então inspetor geral da instrução
pública, Bento Fernandes de Barros, ainda em 29 de dezembro de 1870:
Considerando o homem nas posições elevadas ou intermediárias, em que não é
condenado a viver pelo trabalho de suas mãos, o ensino secundário propõe-se como
fim à alta educação intelectual. Abrangendo os estudos próprios para essa alta
educação, o ensino secundário é o que prepara para todas as profissões liberais.
Estas só podem ser nobremente exercidas pelo espírito que, preparando-se bem para
todas, habilita-se a escolher a que lhe for adequada.(...).
(Paraná, Relatório de 29 de
dezembro de 1870, p. 23, grifo meu).
Com essa afirmação, Barros lembrava que o ensino secundário era necessário
às classes dirigentes, àquelas que não estavam submetidas à escravidão e, exatamente
69
por isso, deveriam aspirar a uma formação intelectual que os preparassem para as
profissões imanentes ao período imperial.
Vê-se aqui a definição do ensino secundário como um curso que, na extensão
da educação letrada, quando “nobremente exercida”, habilitava os estudantes a escolher
uma profissão liberal. O secundário desejado era aquele capaz de
[...] educar a inteligência para as mais elevadas funções, para os serviços
intelectuais, morais, políticos e religiosos da sociedade, que deve formar homens aos
quais serão confiados os mais altos interesses, o governo do Estado, a educação e a
religião.
(Paraná, Relatório do inspetor geral Bento Fernandes de Barros, 29 de
dezembro de 1870, p.23, grifo meu).
Isso porque:
A civilização e a dignidade humana não podem ser mantidas sem que a sociedade
tenha à sua frente homens de uma capacidade superior, de idéias elevadas e grande
alcance.
Assim, pois, o desenvolvimento do ensino secundário, como preparação para as
carreiras sábias e as funções sociais, constitui uma das necessidades mais
imperiosas que devem ser satisfeitas pelo governo de uma nação livre e
progressiva
. (Paraná, Relatório de 29 de dezembro de 1870, p.23).
O plano de estudos que levaria o aluno a atingir tal “grau de inteligência” seria
aquele fundado no saber das humanidades. “Humanidades”, nestes termos entendida:
A alta educação intelectual, já o disse, é o fim do ensino secundário.
Que meios conduzem a tão grande fim?
Quais são as forças educadoras dos espíritos destinados aos mais nobres exercícios?
São as letras, e sobretudo as letras clássicas, dizem a Alemanha, a Inglaterra e a França,
os três países que marcham à frente da civilização.
A Literatura grega e a literatura latina são, e serão sempre, as fontes de um ensino que
deve elevar o homem à sua maior altura, formar nele uma humanidade superior [...] O
estudo das letras clássicas, fazendo conhecer o verdadeiro e o belo, reúne todos os
elementos para formar uma razão poderosa, sentimentos honestos e delicados, um
caráter forte, uma imaginação viva e feliz, assim como a mais variada instrução [...].
É justamente isso que dá todo o mérito ao ensino secundário, o qual vale menos pelos
conhecimentos que transmite do que pela capacidade de aprender e obrar que
desenvolve. As ciências matemáticas, físicas e naturais, que têm feito imensos
progressos e são indispensáveis para satisfazer às exigências das sociedades modernas,
devem indubitavelmente ocupar um lugar importante no ensino secundário, e mesmo
fornecer noções para o desenvolvimento do ensino primário.
Mas essas ciências, considerando exclusivamente a natureza material, suas dimensões,
suas modificações, suas transformações, não podem substituir o estudo que dá ao
homem a aptidão para as funções da vida, os meios de esclarecer-se e dirigir-se nas
70
relações com seus semelhantes, as quais lhe importam mais que as coisas do mundo
sensível.
Fazendo uma larga e justa parte no estudo das ciências positivas, o ensino secundário
deve ter por base os estudos literários, que engrandecem a esfera do pensamento,
inspiram as idéias e os sentimentos generosos, e são indispensáveis à educação
moral de uma nação.
A literatura, a história, a eloqüência e a filosofia, que constituem as grandes forças
intelectuais e morais da humanidade e que formam, por isso, os homens de influência
sobre seu século e seu país, não podem ser compreendidas senão a luz dos elementos,
que compõem a civilização geral do mundo: a antigüidade e o cristianismo.
A educação moral das nações modernas, que elas devem procurar obter com o
desenvolvimento intelectual, sob pena de decadência, tem nos estudos clássicos o
verdadeiro meio de realizar-se
. (Paraná, Relatório do inspetor geral da Instrução
Pública, Bento Fernandes de Barros, de 29 de dezembro de 1870, p.34, grifos
meus).
Como outros dirigentes da educação do império, Barros esperava que a instrução
secundária desempenhasse o papel de preparação para as “profissões liberais”,
correspondente às profissões imperiais
10
, e, ao mesmo tempo, para ser um sujeito de
livre pensamento, capaz de dirigir o pensamento e suas ações. Ou seja:
Se o ensino deve ser antes de tudo uma educação, como bem compreenderam os
ingleses, para os quais a escola é aprendizagem da vida, o ensino secundário é o que
melhor apresenta esse caráter. Constituindo o tipo de educação humana por excelência,
pois forma, desenvolve e completa em toda a sua extensão as mais nobres faculdades do
homem.
Compreendido assim à sua verdadeira luz, esse ensino não é o que deve assegurar ao
discípulo a aptidão para uma profissão, mas fazê-lo aprender o seu – mister de
homem – para viver como um ser pensante e livre [....].
Desenvolver no homem a razão, que faz o seu mérito: fortificar a vontade, que faz o seu
poder: cultivar a imaginação e sensibilidade, que fazem o gozo e o encanto de sua vida:
tal é o objeto de um ensino, que deve, a um tempo, exercer e aperfeiçoar as grandes
faculdades do homem e enriquecer a memória com o mais belo tesouro dos
conhecimentos. Essa educação dá a cada faculdade a seiva que a nutre e expande
.
(Paraná, Relatório do inspetor geral da Instrução, Bento F. de Barros, de
dezembro de 1870, p.34, grifos meus).
Entretanto, como já se observou em períodos anteriores, a exemplo do Liceu de
Curitiba e do Colégio Subvencionado, estabelecer a íntima relação entre o idealizado
para a educação escolar e sua realização no cotidiano das instituições ainda era uma
tarefa a ser cumprida. Dessa forma, verifica-se que o padrão ideal de curso secundário
gradual – do Colégio Pedro II – e o padrão real – dos exames preparatórios – não se
separavam com tanta facilidade. Na história do secundário na Província do Paraná, o
desejo confesso de criar um curso “completo de humanidades”, somava-se às
71
dificuldades em manter todas as cadeiras exigidas, tanto para esse objetivo quanto para
atender aos exames de preparatórios. O resultado foi a permanência das cadeiras de
Latim e línguas em detrimento de outras, entre elas Geografia e História. Somente a
partir de 1876, com a criação do Instituto de Preparatórios, é que se verificará uma
maior presença dessa disciplina nos programas e nas aulas.
Entre os elementos que contribuíram para sua paulatina legitimação, identificou-
se: a presença da História nos exames de preparatórios
11
; a afirmação da História como
disciplina escolar autônoma da Geografia, no Colégio Pedro II; o crescimento da
necessidade de um saber histórico da Pátria, que culminou com a criação da cadeira de
História do Brasil em 1849 no colégio oficial da Corte.
Uma síntese desse período mostra que, nas relações sociais que se estabeleceram
após a autonomia política brasileira, a classe dominante, formada principalmente por
fazendeiros, bem sucedidos comerciantes e uma camada de profissionais liberais,
marcou o movimento cultural que se construiu em meados do século XIX. Esse
movimento tem na necessidade de definir o nascente Estado, seu ponto inicial e, na
criação de uma memória sobre a origem da nação, seu fim a atingir.
Impulsionadas pelos interesses econômicos e políticos da nova classe senhorial,
as instituições criadas para o desenvolvimento cultural do Império (Bibliotecas,
Colégios, Seminários), e organizadas para a divulgação de saberes considerados
socialmente necessários, vão imprimir forma e conteúdo ao conhecimento histórico
escolar.
2.3 A afirmação da História como disciplina escolar no Paraná: O Instituto de
Preparatórios e Escola Normal.
O Instituto paranaense, fundado em 1876, não
pode como a Escola Normal apresentar o resultado
que deve produzir para o futuro; entretanto, ele
satisfaz a necessidade que se sentia de um curso
regular de instrução secundária.
(Oliveira Belo, 1878).
10
O sentido empregado aqui de “profissões imperiais” é o mesmo empregado por Coelho (1999).
11
De acordo com a Lei de 1827, que criou os cursos jurídicos em São Paulo e Olinda, os estudantes que por eles
se interessassem não precisariam saber História e Geografia. Somente em 1831, com a criação de cursos
preparatórios anexos às Academias é que aumentou o número de matérias exigidas para os exames de
preparatórios, entre elas História e Geografia. (Piletti, 1987, p.35-36).
72
A proposta inicial, Lei n.456 de 12 de Abril de 1876, de organização do
programa do Instituto de Preparatórios se fez com o predomínio das humanidades,
através das seguintes cadeiras oferecidas em caráter de aulas avulsas: Gramática
Nacional, Latim, Francês, Inglês, Alemão, Geografia e História, Filosofia, Retórica e
Matemáticas. Por essa lei, a História unida à Geografia compunha o Programa de Ensino
do Instituto de Preparatórios. A Escola Normal, normatizada pela mesma lei, originou-se
com o seguinte programa a ser dividido em dois anos: Pedagogia e Metodologia,
Gramatica Nacional, Aritmética e Geometria, compreendendo Desenho Linear,
Geografia e História, principalmente do Brasil. (Paraná, Lei n. 456 de 12 de Abril de
1876). Nesse curso, a cadeira de Geografia e História privilegiava os conteúdos
nacionais.
No processo de criar novas cadeiras para compor o Instituto de Preparatórios com
o número de cadeiras exigidas pelos exames parcelados, verifica-se a História firmando
seu espaço nos programas da instituição, no lastro da política de equiparação ao colégio
oficial da Corte.
Em conformidade com a Lei de 12 de abril, o ensino secundário no Paraná seria
ofertado em seis cadeiras, sendo Geografia e História uma delas. No Regulamento de 16
de julho de 1876, assinado pelo então presidente da Província Adolpho Lamenha Lins,
no entanto, aparece uma proposta diferente. Nela, a disciplina de História está separada
da Geografia e com o complemento “Universal”:
Parágrafo 1
o
. Em um estabelecimento publico de linguas e sciencias preparatorias, o
qual fica desde já creado nesta capital com a denominação – Instituto Paranaense.
Parágrafo 2
o
Em aulas avulsas nas cidades que mais as exigirem a juizo do conselho
litterario.
[...]
Art.12. O curso do Instituto comprehenderá as seguintes aulas:
1
a
. De grammatica philosophica da lingua nacional e analyse de classicos.
2
a
. De grammatica e traducção da lingua latina.
3
a
. De grammatica e traducção da lingua franceza.
4
a
. De grammatica e traducção da lingua ingleza.
5
a
. De grammatica e traducção da lingua allemã.
6
a
. De arithmetica e algebra.
7
a
. De geometria e trigonometria.
8
a
. De geographia e cosmographia.
9
a
. De historia universal.
10
a
. De philosophia racional e moral, comprehendendo a esthetica e a historia da
philosophia.
11
a
. De rhetorica e poetica.
73
Art. 13. As aulas secundarias do Instituto serão consideradas avulsas, enquanto não
se poder regularisar o curso de humanidades, dividindo-o por annos. [grifos nosso]
(Paraná, Regulamento de 16 de julho de 1876).
Com relação a esse novo regulamento, considerava Lamenha Lins que, “[...] se é
obra imperfeita, não deixa, todavia, de acompanhar os progressos os mais realizaveis em
materia de ensino”, (apud Moacyr, 1940, p. 298). Acompanhar os progressos do ensino
na época era, então, acompanhar as determinações do Colégio Pedro II.
No Programa do Colégio da Corte de 1877, organizado a partir do Decreto
Imperial de 1
o
de Março de 1876, a cadeira de História aparece separada da de
Geografia. Com a denominação História Universal e assim dividida: História Antiga e
Média para o 4
o
ano; História Moderna e Contemporânea para o 5
o
ano; História do
Brasil para o 7
o
ano (Vechia, 2003, p.32). Predominante por todo o período imperial, o
programa do colégio oficial da Corte consolidava a História Universal em seu curso de
humanidades como disciplina autônoma da Geografia na década de 1870.
No Paraná, o ensino de História desenvolveu-se no final dos anos de1870 em
meio à intensificação da dualidade que caracterizava o ensino secundário naquela
província: o desejo expresso de criar um curso regular de humanidades, que sempre
esteve nos ideais das autoridades paranaenses, e, ao mesmo tempo, oferecer as matérias,
que fossem exigidas nos exames, em forma de aulas avulsas e mediante a criação de
uma instituição para esse fim. Daí a constituição do Instituto de Preparatórios que, na
lei, reservava a possibilidade de um dia criar um curso regular seriado, mas que, na
prática, o que o sustentava mesmo era o já antigo sistema de aulas avulsas.
A situação de dependência em relação ao Colégio Pedro II, por causa da
exigência da política de equiparação, provocava constantes mudanças nos programas do
Instituto de Preparatórios que, por sua vez, afetava o programa da Escola Normal anexa.
Por vezes, mudaram-se as cadeiras de acordo com a disponibilidade de professores e a
intenção de oferecer o maior número possível de disciplinas para os candidatos aos
exames das academias ou aos gerais, que, depois de 1873, puderam ser realizados
também nas províncias onde não existiam cursos superiores.
Dentre essas mudanças, é significativo registrar a criação da cadeira de História
do Brasil, que ocorreu pelo Decreto Imperial de 25 de março de 1849, e que no Paraná
aparece como cadeira autônoma em 1878.
74
Outro aspecto a ser observado é o movimento de alunos do Instituto no período de
sua instalação até 1877. Nele, verificou-se a seguinte freqüência:
Cadeiras Nº de Alunos
Gramática filosófica da língua nacional e análise dos clássicos 35
Latim 13
Francês 31
Inglês 12
Alemão 18
Matemáticas 30
Geografia e Cosmografia 9
Historia Universal 9
Filosofia 4
Direito Público 1
Fonte: Relatório do presidente Adolpho Lamenha Lins, de 15 de fevereiro de 1877, p.62.
A estatística apresentada é importante no que se refere às intenções mais
específicas deste trabalho. Permite observar que a cadeira de História Universal foi
freqüentada e que, portanto, houve aulas de História nesse período para atender a
estudantes desse estrato social. Na Escola Normal, que manteve o programa previsto
pela Lei de Abril de 1876, o presidente Oliveira Junior, em 1878, relatava que “[...]
matricularam-se no 1
o
ano seis alunos, dos quais foram aprovados cinco, deixando de
comparecer o sexto por motivo justificado. No 2
o
ano, dos dois matriculados um foi
inhabilitado” (Paraná, Relatório do presidente da Província Oliveira Belo de 15 de
fevereiro de 1878, p.42).
Conclui-se por esse relato que a História no curso normal mantém-se unida à
Geografia pela cadeira denominada Geografia e História, principalmente do Brasil, e
teve funcionamento para atender esses poucos alunos matriculados.
As aulas de História no curso secundário e normal têm seu início na década de
70 e se fizeram por meio de aulas avulsas. No entanto, pouco se sabe como elas se
deram no cotidiano escolar, apenas que foi registrada a compra do compêndio de Victor
Duruy para História Universal e que ocupou a cadeira de História e Geografia até 1877
o bacharel em Direito João Pereira Lagos Junior. Após essa data, teve uma nova
reordenação e passou a ser denominada cadeira de Geografia, Cosmografia, História
Universal e do Brasil, e ficou a cargo de Previsto Gonçalves Columbia. Em 1878, esteve
75
ocupando essa cadeira Orlando Manoel Ericksen. (Livro de Posses de Lentes e
Professores do Instituto e Escola Normal, 1876-1890).
Para o ensino da História do Brasil não foi encontrado nenhum registro sobre
qual teria sido o compêndio ou manual que foi utilizado nos anos de 1870. Consta, em
relatório de inspetor geral da instrução que se fizesse uso, nas escolas primárias, do
manual de Antonio Alvares Pereira Coruja, Lições de História do Brasil. Entretanto
nenhum registro confirma o uso desse manual na Escola Normal.
2.4 O Instituto de Preparatórios e Escola Normal: a composição da elite intelectual
paranaense.
O quadro estatístico anteriormente descrito é importante para mostrar não só
quais as cadeiras que foram mais procuradas em relação à História Universal,
confirmando a procura pelos conteúdos clássicos, mas, do ponto de vista das relações
sociais, visualizar o caráter elitista predominante no Instituto.
No Paraná nesse período, estima-se que a população total correspondia a um
montante de 126.722 habitantes
12
. A esse número de habitantes somavam-se, também, o
contigente de imigrantes que vivia na Província há décadas
13
e os escravos que foram
sendo alforeados
14
. Nesse aspecto, o que chama atenção é o fato dos imigrantes pouco
participarem do círculo de letrados do período
15
, fruto de uma situação em que
12
Estimativa apresentada por Ricardo Costa de Oliveira (2001, p. 63).
13
Desde a emancipação da Província do Paraná, o governo imperial exerceu uma política de incentivo ao
processo de imigração para a Província com aberta correspondência do governo provincial. A Lei n. 29 de 21 de
março de 1855 trata desta questão já em seu artigo 1
o
: “Fica o governo autorizado a promover a imigração de
estrangeiros para esta província, empregando neste sentido os meios que julgar mais convenientes, e preferindo
sempre atrair os colonos e demais estrangeiros que já se acharem em qualquer das províncias do Brasil”
(Martins, 1999, p.78). Acrescenta ainda que um primeiro contigente imigratório foi registrado por João da Silva
Machado em 1829. Era um núcleo de imigrantes alemães que se estabeleceram às margens do rio Negro, situado
no caminho de tropas que fazia a ligação de São Paulo ao Rio Grande. Era um total de 238 alemães que viviam
de atividade agrícola (Wachowicz, 2001, p.146). Em 1875, registram-se os seguintes contingentes imigratórios
na região do Assugui: 875 franceses; 338 ingleses; 221 italianos; 202 alemães; 171 espanhões e 16 suecos. ( p.
49).
14
A historiografia regional registra que, no Paraná, a escravidão negra teve seu início com a mineração de ouro
no litoral entre os séculos XVII e XVIII. No decorrer do século XVIII, o escravo foi transferido para a
agricultura e a pecuária no planalto, chegado o século XIX trabalhou com o cultivo da erva-mate (Wachowicz,
2001, p. 139).
15
Pelos registros que se têm do padrão de representação política no fim do Império entre deputados provinciais,
membros da assembléia legislativa provincial e geral, senado, todos que pertenciam à elite política do Paraná
eram também pertencentes do quadro senhorial, dividindo-se entre as grandes famílias proprietárias de terras e
76
[...] as famílias tradicionais e históricas participam e promovem aspectos
fundamentais no processo de modernização e industrialização regional. Com isto, a
continuidade da classe dominante vinda do período colonial será muito mais
substancial no Paraná. (Oliveira, 2001,p.68).
Esse fato confirma a hipótese da historiografia paranaense de que o padrão de
continuidade social, organizado num “modelo fundiário” de produção rural,
fundamentou uma prática de exclusão acentuada ao ingresso de indivíduos na política e
na atuação do Estado.
O domínio das famílias tradicionalmente ligadas a um “modelo fundiário” de
produção rural da erva mate significou, sobretudo, um padrão de continuidade de poder
local mais fechado ao ingresso de imigrantes na política regional, o que teria levado à
permanência de grupos sociais de estrutura fundiária no controle político e no processo
de “modernização conservadora”. Em interessante trabalho sobre a genealogia da classe
dominante no Paraná, Oliveira (2001, p.66) informa:
Basta analisarmos as genealogias das famílias que estiveram à frente dessas atividades
econômicas. Por exemplo, dos Rodrigues França para os Correia e de Domingos
Cardoso Lima, possuidor de minas de ouro em Morretes e Anhaya, avô de Maria
Magdalena de Lima, casada com Manoel Gonçalves Guimarães, que, por sua vez, seria
o avô de Manoel Antônio Guimarães, o Visconde de Nácar. Há uma conexão familiar
entre as atividades mineradoras de Domingos Cardoso de Lima com as grandes
famílias ervateiras do século XIX: os Antonio Ricardo dos Santos, os Modesto
Gonçalves Cordeiro, os Nascimento, os Loyola e os Miró. (
grifo meu).
Desse estrato populacional, saíam os jovens aspirantes aos cargos públicos ou
simplesmente ao título de doutor. Pequeno percentual da população livre preferia seguir
seus estudos na Corte, então, cedo abandonavam a Província para se dirigirem,
geralmente, aos cursos do Colégio Pedro II e para a Faculdade de Direito em São
Paulo.
Na realidade, como ocorria na sociedade brasileira do período, no Paraná, o
funcionalismo dos setores públicos foi ocupado pelos homens de letras
16
. Dessa forma,
de beneficiamento da erva mate, conforme estudo de Oliveira (2001) que, na parte II do seu livro apresenta entre
as p.148 a 169 um quadro estatístico com os nomes e suas filiações econômicas.
16
Passaram a ocupar os seguintes cargos públicos na Província, após sua emancipação: Bacharel Augusto Lobo
de Moura – Administrador Geral do Correios - que mais tarde dirigiu a Colonia Assungui, tendo posteriormente
se dedicado a Magistratura; Bacharel Jesuíno Marcondes de Oliveira e Sá – Inspetor Geral da Instrução. Além
desses à frente do cargo de Vacinador Provincial encontrava-se o médico José Candido da Silva Murici e, para
realizar as obras de abertura de estradas, o engenheiro Saturnino Francisco de Freitas Vilalva. (Moreira, 1933,
p.25-26).
77
a política local desenvolvia-se pelo diálogo dos jovens bacharéis (a quem o senhor
fazia eleger) com os velhos senhores, entre os ramos citadinos das famílias e os ramos
que permaneciam rurais. Tratando da questão, Morazé (apud Westphalen, 1969, p.90),
constatou que “praticamente as famílias poderosas davam-se a elas próprias o direito de
votar; elas o recusam ao estranho e ao infiel. A escolha do eleito é feita, na realidade,
em tôrno da poltrona do chefe local [....]”.
Esse foi também um dos aspectos que ligava a elite paranaense aos projetos
civilizadores das elites imperiais, de tal modo que foram suas visões de sociedade que
forjaram os encaminhamentos administrativos e sociais da nova Província, sempre no
sentido de somar-se à consolidação do Estado Imperial ou como disse Moreira (1933,
p.9) “o desenvolvimento deste pedaço do Império”.
Tratava-se de um conjunto de agentes sociais que buscavam, em sua maioria,
qualificação para os quadros jurídicos, médicos, militares e cargos na burocracia do
Estado. Esses motivos fariam com que o curso de preparatórios, com caráter
propedêutico, se tornasse o mais procurado por longo período e aquelas formações as
mais disputadas para a entrada nos cursos superiores.
No século XIX, ter um curso superior numa Faculdade de Direito, por exemplo,
era a certeza de pertencer ao quadro intelectual da “boa sociedade”; ser membro de uma
elite intelectual, era mais desejado que ministrar aulas nas escolas primárias, dado o
status que era garantido pelo diplomado.
Além disso, a política de apadrinhamento que existia para a nomeação de
professores primários, bem como as chamadas “regalias” que, pela escassez de
profissionais, se criavam entre os que se dispunham a ensinar, também não incentivava
o interesse pela profissionalização. Daí a grande diferença na procura pelo curso normal
nesse período em relação às aulas do Instituto de Preparatórios. A observação de
Oliveira Belo é exemplar:
O resultado não é animador por enquanto, sobretudo acrescentando-se, sem ofensa ao
conselho examinador, que houve excessiva benevolencia no julgamento de quatro
normalistas que frequentaram o 1
o
ano, e que a meu ver, apresentaram habilitações
apenas iguais as de qualquer aluno de uma escola primária. (apud Moacyr, 1940, p.300).
A busca, entretanto, das autoridades em adotar novas diretrizes educacionais,
como a expansão da escola primária e sua obrigatoriedade, transformavam-se em
78
incentivos para, constantemente, se pensar em uma reforma da Escola Normal que, por
um curto período, esteve na dianteira da instituição.
2.5 O predomínio da Escola Normal e o ensino de História
Verifica-se, no movimento de busca por reformas sociais desenvolvidas a partir
do final dos anos 1870 no Paraná, uma recorrência teórica em torno de unir
pedagogicamente os conteúdos das matérias ensinadas com uma prática que se efetivaria
numa “Escola Modelo”, anexa à Escola Normal. Nessa escola os alunos deveriam se
exercitar nos conteúdos a serem ensinados no cotidiano das escolas primárias da
Província. Por essa proposta, a cadeira de Geografia do Brasil estaria separada da
História do Brasil, por se entender que a cada uma caberia um método específico de
ensino.
O ensino de História na Escola Normal, embora se fizesse como no Instituto,
com os mesmos professores e compêndios e, por suposto, com os mesmos
encaminhamentos didáticos, passa, no final da década de 1870, a visar conteúdos mais
específicos aos interesses de uma formação mais adequada ao processo de ensinar
vinculado às finalidades do ensino primário.
Nesse trajeto, apesar de a Escola Normal não ter sido consolidada, funcionando
por curto período com poucos alunos, percebe-se a história pátria surgindo como
disciplina autônoma e centro do programa de civismo no curso normal, juntamente com
a Geografia que, também, passava pelo processo de ligar-se mais ao estudo da Pátria.
No entanto, a autonomia da História do Brasil, freqüentemente ameaçada pela
magnitude exercida pela História Universal no curso secundário, por um longo período,
foi mantida como matéria central no projeto civilizador da Escola Normal.
Em 1878, ocorreu a primeira tentativa de aumentar as matérias do curso normal,
“dando-lhe caráter mais específico”, criando entre outras matérias a Pedagogia Prática.
Nessa cadeira seria, segundo ponderava o inspetor de ensino: “[...] conveniente que no
estudo de cada uma das demais matérias se fizesse efetiva a aplicação do método
correspondente”. (Relatório do Inspetor Geral da Instrução, 1878, apud Moacyr, 1940,
p.300, grifo meu).
Tal perspectiva, no entanto, não receberia o apoio financeiro necessário para
sua realização, assim como a Escola Normal não funcionou por falta de alunos,
79
conforme indica o Relatório do Presidente da Província Carlos Augusto de Carvalho.
Sugere, na tentativa de resolver o problema, a criação de um “pensionato normal”
destinado às moças pobres.
Nesse pensionato serão recebidas meninas pobres que se queiram dedicar ao
magisterio. A provincia encarregar-se-á, de fornecer-lhes os meios necessarios á vida
e á instrução conveniente na Escola Normal. As que chegarem ao fim serão obrigadas
a ensinar na provincia por certo numero de anos, e se possivel, de seus ordenados
futuros serão descontados, pouco a pouco as despesas que com elas fez a provincia
.
(Paraná, Relatório do presidente Carlos Augusto de Carvalho, 1882, p.95).
Por essa mensagem governamental, notam-se as vias de acesso que iam se
abrindo para tentar resolver o problema da falta de alunos no curso normal. Os
professores não deveriam mais apresentar apenas boas condutas, idoneidade moral,
crença em Deus ou apadrinhamento político como era previsto no início do século, mas
estarem instruídos nas verdades da ciência e serem competentes para aplicar os métodos
eficazes de ensino.
Ao que parece, como os membros do círculo de letrados preferiam dirigir-se aos
cursos superiores do que lecionarem nas escolas primárias, um projeto para tornar o
magistério atrativo se desenhava e junto com ele as mudanças nas características de seus
alunos. Às moças pobres, abria-se a oportunidade de seguir a carreira do magistério.
Enquanto se pensava na reorganização “curricular” da Escola Normal, que nos
anos de 1880 retorna para o centro de debate, o Instituto tornava-se alvo de severas
críticas. Consideravam as autoridades um “desrespeito às leis” o fato de não se ter, até
aquela data, introduzido no programa as matérias de ciências naturais, como Física e
Química, entre outras. Nesse sentido, afirmava o então presidente da Província Augusto
de Carvalho em seu relatório à Assembléia Provincial em 1881, “[...] vi no Instituto
paranaense o exemplo de desrespeito ás leis e aos interesses fiscais” (apud Moacyr,
1940, p.302-303), ao referir-se à necessidade de ensinar “todas as matérias exigidas nos
cursos preparatórios”, para que o Instituto se ajustasse ao determinado pelo Decreto
Imperial n.7247 de 19 de abril de 1879
17
e continuassem as vantagens dos exames gerais
na Província. (Straub, 1999,p.32).
17
Esse Decreto previa a participação do Poder Central no desenvolvimento da instrução nas províncias, abrindo
inclusive mesas de exames de preparatórios, entretanto era preciso: que os professores mantivessem aulas ou
cursos de instrução primária ou secundária; comunicar, dentro de um mês da abertura dos mesmos, o local em
que funcionariam, se receberiam alunos internos, semi-internos ou somente externos, as condições de admissão
ou matrícula, programa do ensino e os professores encarregados deste; ensinar todas as matérias exigidas como
preparatórios para matricula nos cursos superiores do Império, funcionar regularmente por mais de cinco anos e
80
Em 10 de dezembro de 1881, foi designada uma comissão para apresentar um
projeto de reorganização do Instituto de Preparatórios e da Escola Normal. O trabalho da
comissão, organizada em dezembro de 1881, traduziu-se no Regulamento do Instituto
Normal e de Preparatórios da Província do Paraná, datado de 18 de janeiro de 1882.
A mudança na nomenclatura da instituição indica a ênfase que se passava a dar ao curso
normal, que era reafirmado no “capítulo Único” do Regulamento, que diz:
Fica instituída na Província do Paraná uma Escola Normal destinada ao preparo de
professores de instrução primária e secundária. À mesma escola continua anexado o –
Instituto Paranaense, sob a denominação comum de Instituto Normal e de
Preparatórios da Província do Paraná. (Miguel, 2000, p.254).
Desta feita, a divisão das matérias da instituição Instituto Normal e de
Preparatórios da Provincia do Paraná ficou distribuída por cadeiras e aulas práticas das
matérias, tendo como preocupação central a formação pedagógica. Por isso, o curso da
instituição foi dividido em primário e secundário, sendo que a cadeira de História estava
prevista como: História Universal, incorporando a História do Brasil:
Primário Secundário
Portugues e religião (livre). Matemáticas, álgebra
e escrituração mercantil. Geometria e desenho
linear. Cosmografia, geografia geral e do Brasil.
Historia Universal e do Brasil. Elementos de
físicas naturais, de psicologia e higiene.
Princípios de lavoura e horticultura. Filosofia,
princípios de Direito natural, público e
constitucional. Princípios de economia social e
doméstica. Francês. Italiano. Latim. Inglês.
Alemão. Retórica. Pedagogia: teoria e pratica
aplicadas às matérias do curso, e do ensino
intuitivo ou lições de coisas.
Caligrafia. Música vocal. Ginástica.
Ofícios manuais para alunos. Prendas
domésticas para as alunas.
Fonte: Regulamento de 1882, apud Miguel, 2000, p.254.
apresentar pelo menos 60 alunos aprovados em todas essas matérias, correndo o risco de tais instituições serem
cassadas pelo Governo. (Brasil, Coleção de Leis e Decretos Imperial, 1879).
81
As matérias previstas no Regulamento formariam as cadeiras, associadas ou
isoladas. A História Universal e do Brasil
associada à Geografia Geral e do Brasil,
constituíram a terceira cadeira do curso com a seguinte nomenclatura: Cosmografia,
Geografia Geral e do Brasil e História Universal e do Brasil. (Miguel, 2000, p.269,270).
Duas observações são importantes a esse respeito: a primeira de que a História
Universal e do Brasil, embora mantivesse autonomia em relação à Geografia, por
motivos de encargos financeiros e a nova forma administrativa da instituição, ficou
associada à cadeira de Geografia; o que significava, na prática, a nomeação de um lente
ou professor para assumir ambas cadeiras. E a outra observação é que, além de voltar a
unir-se à cadeira de Geografia, por essa proposta, volta a História do Brasil a ficar anexa
à História Universal.
Aos alunos do curso de preparatórios, o regulamento resguardou a possibilidade de
estudar as matérias livremente, “seguir nas matrículas a ordem em que se acham,
distribuí-las ou alterá-las” (artigo 104), reafirmando, dessa forma, a manutenção das
aulas avulsas. Quanto aos professores e pessoal administrativo, formariam uma
corporação comum a ambos os cursos” (art.105). À Congregação de Lentes e
Professores da instituição, caberia, entre outras tarefas importantes, a adoção de
compêndios e manuais escolares.
Essa mudança de ênfase no curso foi feita porque se acreditava que o Instituto,
por não conseguir oferecer todas as matérias exigidas na aprovação dos exames para o
ingresso nos cursos superiores, não cumpria a contento suas finalidades.
Os sacrificios que custa à provincia o Instituto Paranaense, seriam justificados, no
estado actual, se esse estabelecimento estivesse em condições de satisfazer às
necessidades intellectuais dos moços que o procuram, correspondendo assim aos fins
para os quaes foi creado, o que seria uma remuneração das despezas que sua existencia
exige dos cofres provinciais.
Infelizmente, isso não se dá, e, para só discutir o que os algarismos provam, passo às
mãos de V.Ex., os dados que se seguem, que poderão servir para dar a V.Ex., uma idéa
sobre o estado geral e inutilidade desse estabelecimento
. (Paraná, Relatório do
Diretor Geral da Instrução Pública Moyses Marcondes, 1881, p.8)
Isso provocava uma paulatina queda na freqüência dos alunos que procuravam
cursar as cadeiras oferecidas no Instituto em menor prazo possível e, na seqüência, se
deslocar para os centros onde havia oferta das demais cadeiras. Em 1878, o Presidente
da Província já relatava esse fato:
82
O mappa de 1876 mostra que do anno passado dão 3,22, matriculas para cada um dos 46
individuos que as effectuaram. Mas essa média que por si mesma deixa significar um
phenomeno ordinario, perfeitamente proporcional às forças de um estudante, não
exprime a verdade.
O mappa de 1876 mostra que havia estudantes matriculados em 5 e 6 aulas diversas.
Este facto, que não póde ser aceito sem que deixe a convicção do pouco aproveitamento
a que sujeitavam-se os que assim praticam, determinou como medida de bom senso,
limitar ao rasoavelmente possivel o numero de materias que podiam ser estudadas
.
(Paraná, Relatório do Presidente da Província Bento de Oliveira Junior de 7 de
fevereiro de 1878, p.42).
Com a extinção temporária do Instituto de Preparatórios, os professores
passaram a lecionar na Escola Normal. Essa situação de acomodar todos os professores
na Escola Normal possibilitou a expansão das matérias oferecidas no curso normal,
embora não correspondesse ao projeto de especializar tal curso, já que os professores
ofertariam aquelas mesmas matérias destinadas ao curso secundário de caráter
propedêutico. Mas tal proposta também não vingou. Em setembro de 1882, o próprio
Moysés Marcondes informava que a Escola Normal deixara de funcionar por falta de
alunos e o Instituto de Preparatórios apresentava uma
[...] grande confusão que resulta da variedade das épocas em que as diversas matrículas
foram feitas, da freqüência temporária de alguns alunos, que cedo abandonaram as
aulas e da completa ausência de outros, que matricularam-se e não frequentaram,
[tornando] bastante difícil, o estabelecer-se a média exata da freqüencia de cada uma
das aulas
. (Relatório do diretor geral da Instrução Publica de 17 de setembro de
1882, apud Straub, 1993, p.33).
A “grande confusão” a que se referiu Marcondes acima, passava a se revelar
também no curso normal que, ao invés de concretizar sua especificidade, tornava-se,
pela formação que os lentes e professores tinham na época, um curso de humanidades. A
respeito disso afirmava o presidente provincial Brasílio Machado em 1885:
A escola normal, tal como está constituída, não preenche os fins que inspiraram
a sua creação muito embora tenha passado por muitas transformações; é uma
escola de retorica, nada mais; o plano em que está assento outra cousa não
permite. Entretanto, a verdadeira Escola, a escola pratica, onde o candidato
adquire a sua aprendizagem do mesmo modo porque vai infundir o ensino,
intuitivamente, experimentalmente, essa não existe. [...] É portanto, a primeira
necessidade suprimir a atual Escola levantando outra que visse mais
propriedade na reforma que se inaugurar; com os normalistas teoricos não se
pode aviventar o processo intuitivo, cujos princípios são desconhecidos por
eles, e de cujas regras nunca souberam a aplicação. Por isso, e como primeiro
passo, depois de delineado o programa de ensino, projetei a creação de uma
83
Escola modelo cuja pedra angular é a instrução prática e, mandei, segundo o
esboço por mim organisado, levantar a planta do edificio que tanto se prestasse.
(apud Moacyr, 1940, p.336-36, grifo meu).
O debate em torno das questões educacionais leva à reorganização da instrução
pública em 1882. Dizia o presidente da Província que, em virtude “do estado geral da
instituição” em novembro de 1882, pela Lei provincial n.712 do dia 30, autorizava a
reforma do ensino público. Na ocasião, extinguiu o Instituto Normal e de Preparatórios,
sob o argumento de que “para o Instituto não [havia] reforma possível” (apud Moacyr,
1940, p.307), conservando avulsa a aula de latim e línguas vivas e reorganizando a
Escola Normal.
Ao que parece, embora os discursos e propostas de renovação e reestruturação
dos programas da escola normal e do ensino primário estivessem borbulhando entre os
políticos paranaenses, a situação em que se encontravam as práticas educativas nas
instituições de ensino ainda não satisfazia as exigências governamentais da Província.
Por isso, meses depois da aprovação da Lei de 1882, em 1883, tem-se novamente uma
tentativa de reorganização da Escola Normal e do Instituto de Preparatórios.
2.6 Da crise ao caminho da consolidação do ensino secundário: a disciplina de
História no Instituto Paranaense e Escola Normal
Pela nova regulamentação, ocorre o retorno ao Regulamento que cria o Instituto
de Preparatórios e a Escola Normal em 1876, mantendo-se o programa de ensino (ver
quadro V em anexo).
Em 1886, afirma Straube (1993, p.33), estavam matriculados 30 alunos nas
diferentes disciplinas do Instituto, mas destes, apenas 18 eram freqüentes. As baixas
freqüências nas aulas preocupavam o Diretor Geral da Instrução Pública, que solicitava
reformular o regulamento do secundário para impor penas severas aos infreqüentes e
prêmios que recompensassem a assiduidade e o aproveitamento dos freqüentes.
Para esse fim, foi organizada em 1887 uma comissão especial para reorganizar o
ensino público na Província. A comissão sugeriu a criação de novas cadeiras para o
Instituto Paranaense: Ciências Naturais, Física e Química, e de Corografia e História do
84
Brasil, esta última autônoma da História Universal. Segundo o Diretor Geral da
Instrução Pública, a criação dessas novas cadeiras atendia à programação dos exames
gerais dos Preparatórios.
Em fins dos anos de 1880, embora a questão das presenças nas aulas fosse
considerada um problema de razoável proporção, nota-se que não se cogitava mais a
idéia da extinção do Instituto, pelo contrário, as cadeiras de ciências naturais foram
criadas, conforme consta em Ata de 28 de maio de 1888 do Presidente da Província
Faria Sobrinho.
[...] preenchidas urgentemente, apóz a respectiva creação, as cadeiras de
chorographia e historia do Brasil, physica, chimica e sciencias naturaes, que
figurão no novo programma de preparatórios exigidas para matricula nos cursos
superiores do Império. (Ata n.34, Livro 2, p.34-v).
Essa solicitação foi atendida em julho de 1888 e o ensino secundário no Paraná
adentraria no novo regime político, procurando se equiparar ao Colégio Pedro II, o que
não ocorreu em todo o período imperial. As sucessivas reformas, entretanto, não
significaram um aumento na procura pelas cadeiras na Escola Normal.
Em 1887, o presidente Faria Sobrinho informava à Assembléia que “[...] em
1886 a Escola Normal não teve alunos prontos para exames”, e complementava:
Parece incrivel que uma província com fóros de adiantada esteja essa Escola em tão
grande decadencia tendo sido frequentada apenas por dois alunos, e destes nenhum se
haja preparado; cumpre para sanar males inevitaveis que possa advir para instrução
pela falta de professores habilitados, que se cerque os normalistas de mais regalias
além das que gozam e se negue aos não diplomados a obtenção de certos privilegios
que de alguma sorte molestam aqueles que se vêm preteridos por estes ou a eles
equiparados
. (Relatório do Presidente da Província de 1887, apud Moacyr, 1940,
p.342).
Enquanto o Instituto Paranaense lutava para manter a freqüência mínima exigida
nas aulas avulsas e nas novas cadeiras implantadas, o curso normal no Paraná não se
sustentava. Somente com a mudança de regime político, essa instituição entraria numa
nova fase.
O Instituto Paranaense, passando a denominar-se Ginásio Paranaense, conheceria
uma expansão significativa em sua história, organizado em forma de curso regular e
equiparado ao Colégio Pedro II, que, durante o período inicial da República, passou a
chamar-se Ginásio Nacional. A Escola Normal seria, a partir da década de 20, reformada
85
em suas bases, separando-se definitivamente do Ginásio Paranaense em 1923, e
firmando-se como uma instituição de formação de professores primários.(Rocha, 2003,
p.150).
Nesse trajeto, a disciplina de História vai seguindo as mudanças estruturais da
instituição e as reformas sociais que implicaram em mudanças nas suas finalidades e
objetivos educacionais. Com a Reforma de 1892, a História, no Ginásio Paranaense, é
ensinada nos anos finais do curso – 6
o
ano, História Universal, 7
o
ano História do
Brasil. Na Escola Normal, que mantém o mesmo programa, a História é ensinada no 3
o
ano com a denominação da cadeira de História Universal e do Brasil (ver quadro IX em
anexo).
No que se refere aos conteúdos, a mudança de regime político implica na
revisão historiográfica da História Nacional. Nesse aspecto, como se verá a seguir,
embora os compêndios de História produzidos no período do Império foram utilizados
nos anos inicias da República, surgiram obras didáticas de autores nacionais que, ao
incorporarem novos temas aos consagrados pela historiografia didática imperial,
fizeram críticas ao modelo anterior.
Um outro aspecto que se verifica com relação aos conteúdos do ensino de
História, nesse período no Paraná, é a relação História Universal X História das
Civilizações e o espaço da História Nacional entre elas. Ou seja, tratou-se de encontrar
o espaço dos conteúdos universais e nacionais na instituição que, no início da
República, ainda permanecia com a dupla finalidade educativa de formar normalistas e
candidatos aos cursos superiores.
Constata-se, no século XX, o debate entre a História Universal e a História das
Civilizações (Bittencourt,1993, p. 170) e o espaço da História do Brasil tanto no curso
secundário como na Escola Normal. Além desse dilema, um outro elemento se
apresentou no Paraná: o debate e a procura pela identidade do Paraná e a construção de
uma História regional para ser ensinada na escola primária.
Esse fato se deveu a “experiência de construção do regionalismo paranaense
[que] sofrerá um grande impulso no período correspondente ao da I República (1889-
1930)” (Pereira, 1998, p.19). Com a consagração da Constituição de 1891, permitiu-se
a descentralização administrativa num momento em que o Paraná, por intermédio de
sua capital, passava por uma efervescência cultural que, iniciada nos anos de 1870,
86
como já foi mencionado, mostrava-se adaptada ao universo da “cidade das letras”
18
.
Esse processo estimulou o desenvolvimento das idéias, as quais ficaram conhecidas
como Paranistas.
Para explicar as transformações ocorridas na disciplina nesse período, exige
identificar os agentes condutores dessas transformações. Nesse sentido, foram os
intelectuais que se tornaram professores da disciplina, suas ações como atores políticos,
reveladas por meio de seus escritos e na produção de compêndios e manuais escolares,
que se constituíram numa significativa referência para o estudo dessas mudanças.
Portanto, entender tais mudanças pressupõe reconhecer que elas estão representadas
nos papéis sociais de diferentes sujeitos, algumas vezes confrontando-se, outras vezes
complementando-se na definição dos saberes escolares, seus programas de estudos e os
livros didáticos.
2.7 Os letrados paranaenses e o ofício de ensinar História.
Embora já se possa localizar, no período do Império, o rol de intelectuais que
ocuparam a cadeira de História, iniciando uma prática de ensino no Instituto e Escola
Normal quando esta funcionou, é nos anos finais do século XIX que se encontra
material - literatura, escritos diversos, documentos do Ginásio Paranaense e Escola
Normal, periódicos e compêndios didáticos - para uma referência aos professores que
praticaram o ensino de História nessa instituição. Será também por essas fontes que o
ensino de História se deixará apreender com maior clareza em suas dimensões
pedagógicas e finalidades educativas no Paraná.
Ao estudar esses intelectuais, verifica-se o debate em torno das finalidades do
ensino de História que se processou, naquele Estado, na transição do período imperial
para o republicano.
É nos anos 1870 que Curitiba, a modesta capital do Paraná, inicia seus
impulsos no processo de urbanização, acrescida pela corrente imigratória. Ermeliano de
Leão, ao se referir ao desenvolvimento da cidade, assim o descreveu:
18
Termo utilizado conforme estudo de Rama (1985).
87
Em 1878 [...] a cidade já apresentava indícios de crescente prosperidade; surgiam ruas
novas, a dos Alemães, a do Riachuelo e tantas outras. A cidade propriamente dita
ficava entre as ruas do Imperador, antiga do Comércio e a de São Francisco; fechavam
a quadra as ruas do Riachuelo, do Rosário e a Dr.Muricy, até a praça Zacharias de onde
se prolongava o casario pela rua da Entrada, hoje Aquidaban.[...] Sem calçamento
algum, iluminada a gaz, sem diversões permanentes, era Curutiba um vilarejo
que mal merecia o nome de capital da Província
. (Dicionário Histórico e
Geografico do Paraná, 1929, p.26,grifo meu).
As alterações da estrutura da cidade somada ao aumento populacional com a
vinda de imigrantes europeus, passaram a movimentar a então pacata capital paranaense,
inclusive com o aumento de diversos problemas sociais que o crescimento urbano
também provoca
19
. Mas, de fato, em fins da década de 1870, Curitiba revelava-se
integrada ao mundo do livro e da leitura. Esse movimento se deveu a criação de clubes
que foram inaugurados para esse fim, bem como a existência de cinco livrarias, nove
tipografias e oito jornais
20
que foram surgindo como equipamentos culturais que se
faziam com sujeitos cuja vida era marcada pela leitura e escrita e desempenhavam
importante papel na vida política e cultural da Província.
Vivendo o período de mudanças nos ideais da sociedade brasileira, a capital
paranaense adentra no clima da grande metrópole, os letrados passaram a vê-la como
mais próxima da dinâmica cultural e urbana da cidade do Rio de Janeiro, centro cultural
e político do Império.
Nesse sentido, considerou-se que, com o presidente Alfredo D´Escragnole Taunay,
o impulso modernizador tinha se realizado no Paraná. Taunay foi considerado o
responsável pelas seguintes mudanças na capital, consideradas “modernizadoras”:
[...] fez do charco marginal do rio Belém o explêndido parque do Passeio Público,
transformou o “imenso potreiro de animais” que era a Praça D.Pedro II (hoje Tiradentes)
um largo modesto mais limpo, vedado a pastagem de animais, de linhas regulares com
relação às ruas laterais; fez projetar e contratar a ponte de cobertura do rio Ivo em toda a
extensão desse rio em seu percurso pela Praça Zacharias; fez projetar e deu começo à
abertura da Avenida Imperatriz (atual 15 de Novembro) prolongando-a ao alto dos dois
outeiros a N.E e S.O , reencetou as obras da Catedral, fez rever os projetos e confiou sua
execução ao notável engenheiro arquiteto João Lazarim, reorganizou e regulamentou a
Biblioteca Pública [...].
(Martins, s/d, p.37).
19
Dois trabalhos tratam especificamente dos conflitos e problemas sociais que surgiram o decorrer do processo
de urbanização de Curitiba. São eles: De Boni (1998); Lamb (1999)
20
Conforme Rocha Pombo (1980)
88
Homens que viveram esse período com certo entusiasmo pelas mudanças que se
processavam no campo intelectual e material de Curitiba, por entender que estavam
diante de uma cidade “onde se encontrava concretizado o projeto político da classe
dominante, ou seja, “a” civilização (De Boni, 1998, p.14). O Instituto Paranaense e
Escola Normal configuram-se como a principal instituição de ensino no quadro das
mudanças socioculturais que atravessava a Província.
Desse universo de práticas culturais, saíram os letrados (especialmente
advogados) que ocuparam a cadeira de História e Geografia naquela instituição e cujos
nomes ficaram registrados nos livros de posses daquele educandário: João Pereira
Lagos Junior, Previsto Gonçalves F. Columbia, Orlando Manoel Ericksen, Generoso
Marques Santos e Pedro Ribeiro Moreira.
Como pioneiros do ensino, foram esses letrados que iniciaram práticas de ensino
de História no Paraná, possivelmente baseando-se nos compêndios adotados no
Colégio Pedro II para sua retórica em sala de aula.
Se, por um lado, é possível registrar esses nomes como os “pioneiros” do
ensino de História no Paraná, da mesma forma é preciso mencionar que, nesse início de
oferta do curso de preparatórios e da Escola Normal, em que os professores eram os
mesmos, observa-se que a cadeira de História e Geografia, entre 1877 a 1882, quando
funcionou regularmente, foi ocupada por cinco professores que não permaneceram por
mais de um ano em seu cargo. Com muita rapidez, os lentes nomeados abandonavam a
sua cadeira de origem para assumirem uma outra, seja por permuta ou por um período
de licença do titular da cadeira. Por esses motivos, não foi possível, nessa fase inicial,
definir um grupo de professores interessados em responder efetivamente pela cadeira,
nem identificar suas práticas educativas desde a sua criação em 1858, dado os
freqüentes pedidos de transferência e de permuta das cadeiras.
Por outro lado, é bem possível que a freqüente rotatividade de professores nas
diferentes cadeiras, apesar dos concursos, fazia-se por falta de alunos matriculados nas
aulas, o que interferia significativamente na criação e extinção de cadeiras no Instituto
de Preparatórios e Escola Normal, juntamente com a demanda dos exames gerais,
conforme se observa no quadro abaixo.
Período Matrículas Alunos que prestam exames
1858-1861
18 – 5
a
classe 03
89
1873-1874∗∗
27 – aulas avulsas 12
1876-1877∗∗∗
35- aulas avulsas ___
Fonte: Livro de Actas de Exames do Liceu
∗∗DEAP, códice de 1873, n.115, fls.102; Relatório do Presidente da Província Araújo Abranches, de
fevereiro de 1874
∗∗∗ Relatório do presidente Lamenha Lins, de fevereiro de 1877
(___) resultado não encontrado.
Ao longo desse período pouco se sabe como se efetuaram as aulas de História,
seja no Instituto como na Escola Normal. Sabe-se somente que os compêndios
adotados foram, para o estudo da História Universal, o Compêndio de História
Universal de Victor Duruy em 1876 e, para a História do Brasil, Lições de Manuel de
Macedo em 1882.
No período republicano é possível verificar que os professores das cadeiras de
História mantêm-se por mais tempo no exercício de ensinar essa matéria. A constante
especialização dos conhecimentos históricos, que se evidenciou nesse período, leva os
professores a se ocuparem de algumas matérias com afinidades entre si, conforme se
observa no quadro abaixo.
Lente/Professor Cadeira Período de atuação
João Heating Francês e História do Brasil 30 de março de 1896 a 5 de maio
de 1899
Geraldo Ribas Francês e História do Brasil Maio de 1889 a 19 de Julho de
1899
Manoel Gomes Viegas Francês e História do Brasil Julho de 1899 a 2 de Outubro de
1908
João Pereira Lagos História Universal Janeiro de 1890 a 1899
Dario de Castro
Velloso
História Universal, Noções de
Sociologia e Moral, Direito Pátrio
e Economia Política
Abril de 1899 a ______
Fonte: Livros de posses de Lentes e Professores do Ginásio Paranaense
(___) resultado não encontrado.
Nesse trajeto, a História sofre alterações não só nos programas e nos conteúdos
diante das novas exigências sociais, mas também em seu estatuto científico, na medida
em que vai definindo um grupo de professores que se especializavam no ensino da
História, de que é exemplo o professor Dario de Castro Vellozo que escreveu o
90
compêndio Lições de História e foi adotado no Ginásio Paranaense e Escola Normal
em 1905.
Com a mudança de regime político, a efervescência cultural mencionada,
marcada pela emergência de personalidades ligadas à política e, sobretudo, à arte e ao
ensino, atingirá o imaginário da população de letrados ao anunciar a República como
uma forma mais “evoluída” de governo do que a Monarquia.
No Paraná, embora não houvesse um Partido Republicano organizado, conforme
mostrou Pereira (1998, p.23), em Curitiba, existia um clube que se denominava
“republicano”, composto de intelectuais que publicavam trabalhos críticos sobre a
Monarquia. Parte das críticas que se desenvolveu na Província em fins dos anos 80
encontra-se registrada no jornal A República, cuja existência é um exemplo de meio de
comunicação utilizado para esse fim. Os artigos que ali se publicaram eram ácidas
críticas ao regime monárquico, que o apresentava como “arcaico” e a República como
“progresso”, como é o exemplo o excerto que segue:
Já disse alguém que no Paraná só progride a Indústria dos foguetes, a arte pyrothecnica.
É isso o elemento principal de nossa vida, a manifestação estrondosa do nosso
progresso no atrazo [...]. Somos um povo de foguetório, na expressão clara da palavra:
o que quer dizer que somos um povo atrazadíssimo. Não temos indústrias, não temos
artes, não temos sciência. Em política sofremos de paralysia completa. Temos
apenas a política do foguetório. Deixemos os velhos partidos de lado[...]
Trabalhemos pela República. ( A República, Coritiba, p.01, agosto de 1889, apud
Pereira 1998, p.26, grifo meu).
Na geração de críticos da monarquia, verificam-se, entre outros, nomes como:
Eusebio Silveira da Mota
21
, Emiliado David Pernetta
22
, Generoso Marques dos Santos
23
,
Justiniano de Mello e Silva
24
e Dario Velloso. Intelectuais atuantes nas questões
21
Nascido em Curitiba em 1847, formou-se em direito em São Paulo em 1870. Foi desembargador do Supremo
Tribunal de Justiça do Paraná de 1892 até 1917. Nesse intervalo, exerceu a advocacia e lecionou psicologia,
lógica e pedagogia no Ginásio Paranaense e na Escola Normal de Curitiba. (Martins, sd, p.85)
22
Nascido em Campo Largo, em 1869. Fez curso acadêmico na Faculdade de Direito de São Paulo, desde então,
afirma Romário Martins (sd, p.81) foi “revelando-se os mais brilhante dos oratórios e poéticos e intervindo nas
lutas pelo abolicionismo e pela República. Sua irreverente “Carta à Condessa D´Eu” foi um luminoso e
trovejante petardo que percorreu explodindo pelo país inteiro. Por feliz coincidência, o ardoroso propagandista
republicano formou-se a 15 de novembro de 1889”. No Paraná foi lente de português do Ginásio Paranaense,
onde ocupou o cargo até falecer em 1921. (Martins s/d, p. 81).
23
Nascido em Curitiba em 1844, faleceu em 1919. Segundo Romário Martins (sd, p.96), deputado à Assembléia
Legislativa Provincial em vários biênios, onde sempre foi o presidente ou o líder da oposição. Presidente do
Estado, deputado geral e senador da República. Foi um dos signatários do projeto Dantas, abolindo a escravidão
no Brasil. Autor da lei da organização judiciária do Paraná de 1891. Além desse trajeto, esqueceu-se Martins de
mencionar seu período no Instituto Paranaense e Escola Normal como professor de História.
24
Nascido em Sergipe veio para o Paraná em 1876, como Secretário da Província na presidência de Lamenha
Lins. Exerceu o cargo de Diretor Geral da Instrução Pública e professor do Instituto Paranaense; foi diretor do
91
políticas da Província terão suas idéias difundidas no jornal A República e nos clubes
republicanos fundados respectivamente em 1885 e 1887 (Martins s/d). Maior parte
pertencente ao quadro de professores do Ginásio Paranaense e Escola Normal, entre eles
o que mais denota atenção aqui, além de Generoso Marques dos Santos, que foi
professor de História no Instituto, é Dario Vellozo, nome importantíssimo para a história
da disciplina no Paraná no período republicano, desde quando foi aprovado em concurso
para o preenchimento da cadeira de História Universal, Noções de Sociologia e Moral,
Direito Pátrio e Economia Política, e nomeado para o cargo em 22 de abril em 1899.
A história da disciplina de História no Paraná no período republicano não se fez
sem a direta intervenção desse personagem paranaense, que sucedeu ao professor João
Pereira Lagos na cadeira que compunha a História Universal. Pelo que consta nas atas
do Conselho Literário, trabalhou com Lições de História Geral de Annibal Mascarenhas
até a adoção de seu próprio compêndio a Lições de História em 1905 e dois compêndios
complementares: Revoluções Brasileiras de Gonzaga Duque e Curso de História do
Estados Americanos de João Manoel da Silva. (Acta da Congregação de 25 de fevereiro
de 1899).
2.8 A disciplina de História no Ginásio Paranaense e Escola Normal.
“História é o estudo da civilização através dos tempos”.
(Dario Velloso, 1948, Lição I).
“O Autor serviu-se, além de obras especiais, das seguintes
que o aluno inteligente e ávido de mais amplos
ensinamentos, fora das normas do programa, consultará com
proveito. Ch. Seignobos – Histoire de la civilisation
(Nota da Biblioteca Neó-Pitagórica, p.136 apud
Vellozo, 1948).
A mudança de regime em que o país adentra no final do século XIX não trouxe,
em geral, mudanças significativas para as atividades educativas do ensino secundário
“Jornal do Comércio” e fundou o “Sete de Setembro, órgão do Partido Conservador que, no período que se
92
no Paraná, nem a mudança de nome da instituição representou grandes transformações
nos objetivos principais delegado a esse grau de ensino.
O curso secundário oferecido no antigo Instituto Paranaense manteve a Escola
Normal em anexo e, ainda, permaneceu com as características de atender aos exames de
preparatórios, embora com plano de curso seriado e anual. Em meio à mudança do
regime imperial para o republicano, o Instituto continuou suas atividades normalmente,
criando em 11 de abril de 1890 a cadeira de Física e Química, sendo designado para sua
ocupação o capitão de engenheiros Dr. Arthur Pereira de Oliveira Durão (Straub, 1993,
p.37).
Com a Proclamação da República, o Presidente da Província passa a ser
denominado de Presidente do Estado do Paraná. Por meio do Decreto n.31 de 29 de
janeiro de 1890, o contra-almirante José Marques Guimarães, nomeado Presidente do
Estado, apresentou novo Regulamento para a Instrução Pública do Estado, aprovado em
1891.
Por esse Regulamento, o Instituto Paranaense passou a denominar-se Gymnasio
Parananese, mantendo em anexo a Escola Normal, mas tendo no horizonte a intenção
de separar os cursos assim que fosse financeiramente possível. A mudança de nome da
instituição se fez porque os republicanos tinham como tarefa “sobrepor a representação
do Império” (Costa & Schwarcz,2000). Isso porque, no final do século XIX com o
regime republicano, impuseram-se novas imagens para representar a nação.
Sua história é, em síntese, uma história de tentativa de equiparação ao Ginásio
Nacional, nome que o Colégio Pedro II passou a ter com a reforma Benjamin Constant
e, posteriormente, voltou a denominar-se Colégio Pedro II. O artigo 27 do Regulamento
de 1891 estipulava que o programa das cadeiras seria modelado de acordo como o
Ginásio Nacional do Rio de Janeiro, que se manteve como padrão para os demais
ginásios do país.
As dificuldades em organizar a instituição nos moldes do colégio oficial
provocaram a elaboração de um novo regulamento para o ensino no Paraná em 1892.
Por esse Regulamento, ficou determinado que o curso do Gymnasio funcionaria
simultaneamente com a Escola Normal enquanto não fosse possível a separação dos dois
cursos e que o curso secundário estaria “[...] destinado a ministrar a mocidade
paranaense os elementos fundamenaes da sciência geral e habilital-a para a matricula
seguiu as idéias republicanos, passou a circular como “Òrgão das Reformas Sociais” (Martins, sd p.124-125).
93
nos estabelecimentos de ensino superior da República”. (Paraná, Coleção de Leis e
Regulamentos do Estado do Paraná, 1892, grifo meu).
O Curso de Estudos Secundários continuou com o objetivo de organizar um
curso regular de humanidades, oferecendo cadeiras de ciências naturais, mas tendo as
“letras” como norte do programa. No entanto, a dificuldade de pôr em prática o ideal de
curso regular continuava a existir, uma vez que o curso regular concorria com as aulas
de preparatórios, conforme observou em seu Relatório o Superintendente do Ensino
Público Victor Ferreira do Amaral e Silva:
O Ginásio Paranaense, como curso regular de humnanidades, não tem dado resultado
consentâneo com a sua organização, pela continuada prorrogração, feita pelo Governo
Federal, do prazo para exigência do exame de madureza para matrícula nas escolas
superiores do ensino da Republica, preferindo os alunos frequentarem as aulas dos
preparatórios, sob a inspeção do Comissário Fiscal do Governo Federal.
(Relatório citado por Straub, 1993, p.46, grifo meu)
O curso no Ginásio Paranaense passou a completar-se no período de sete anos.
Nele, a disciplina de História, que ficou prevista para ser ensinada no 6
o
ano História
Universal e 7
o
ano a História do Brasil, foi se adequando aos novos contornos políticos
e pedagógicos que se desenhavam no final do século XIX através da criação de novas
disciplinas e novas abordagens aos temas.
O programa proposto para o Ginásio Paranaense apresentava-se, em relação ao
do Instituto, mais próximo de um curso regular de humanidades como se pensava desde
os tempos do Liceu. Mais voltado para as aulas de preparatórios aos exames, o Instituto
oferecia as disciplinas consideradas básicas para tal fim, enquanto que no Ginásio,
embora a procura pelas aulas de preparatórios ainda fosse maior que a do curso regular,
havia uma oferta maior de disciplinas, distribuídas nos anos previstos para a conclusão
do curso, o que, no entender das autoridades, possibilitava uma formação mais completa
naquilo que se previa para um curso secundário de humanidades.
A mudança no programa da instituição paranaense, bem como a separação dos
cursos oferecidos, traziam para o nomeado Superintendente Geral do Ensino Público do
Estado, Victor Ferreira do Amaral e Silva, a esperança de aumentar o estímulo dos
moços a freqüentarem o curso seriado, o que para ele era prejudicado em favor das aulas
e exames de preparatórios:
94
Emquanto houver exames de preparatorios avulsos, não haverá estimulo para os
alumnos do Gymnasio frequentarem as aulas; portanto, si perderem o anno do curso,
encontrarão com facilidade de quem lhes forneça attestados para se inscreverem nos
exames de preparatórios, em que contão quasi sempre com a benevolencia dos
examinadores. Si o Governo me facultar os meios [...], e eu continuar na direcção do
Gymnasio, nutro a esperança de, no proximo anno vindouro, ver funccionar este
estabelecimento de instrucção com toda a ordem e disciplina, para proveito dos
alumnos, satisfação de seus paes e honra para o Estado, que o sustenta com bastante
sacrificio pecuniario
. (Paraná, Relatório do Superintendente Geral do Ensino
Publico do Estado, de 1
o
de novembro de 1893, p.19).
Para Amaral e Silva, projetar o futuro em uma cidade como Curitiba, capital do
Estado, implicava tomar contato com novas experiências que se apresentavam nas
grandes capitais e com expectativas positivas de projeção daquele Estado para graus
cada vez mais elevados de civilização. Entendia que o progresso desejado era
ambicioso, mas absolutamente necessário para o “bem e honra de todos”.
Nesse sentido, estar em um cargo como o de Superintendente Geral do Ensino
Público do Estado era o mesmo que estar à frente de uma batalha contra a ignorância do
povo e em favor de seu preparo como “bons cidadãos da Pátria”. Para tanto, considerava
ser necessário investir na Escola Normal para a melhor formação dos professores porque
“é mais difficil se obter professores bons em lugares pouco prosperos”; melhorar os
edifícios escolares em seu tamanho, higiene e estética, “de maneira que a escola seja
para a infância uma especie de templo que lhe estimule o gosto para o estudo”; fornecer
em abundância necessária mobílias e livros escolares, e, fundamentalmente, trabalhar
para o aumento da frequencia escolar em todos os seus níveis, para que “os sacrifficios
pecuniarios que o Estado faz em manter as escolas sejão bem compensados” (Paraná,
Relatório de 1
o
de novembro de 1893).
O ensino secundário nesse conjunto de idéias não deixou de corresponder a esse
momento em que setores da sociedade estavam otimistas em relação ao futuro ao se
deparar com as novidades que se desejava implantar, como, um maior equilíbrio entre as
disciplinas chamadas científicas e as humanidades, a inclusão das aulas de desenho e
música e as incansáveis “revisões”, no final de cada ano, das diferentes disciplinas do
curso seriado.
A ascensão e o privilégio que a disciplina de História incorporou nesse processo
foi por suas ligações com a temática política. A necessidade de um conhecimento mais
apurado das nações, num momento em que se procurava rediscutir a construção de uma
identidade nacional, era bastante óbvia. Um saber sobre as nações e sobre o passado
95
nacional parecia essencial no quadro do século XIX, pois, como diz Burke (2003,p.96):
“A política começava a ser considerada menos uma “arte”, a ser aprendida na prática, e
mais uma “ciência” que podia ser sistematizada e ensinada[...]”.
Aos “aprendizes do poder”, tornava-se fundamental não só a construção de um
saber sobre a pátria, mas uma revisão da História Nacional que havia sido ensinada nos
tempos do Império. Tal empreendimento, no entanto, não era tarefa simples, as reformas
começaram pela constante mudança nos programas.
Em 1893, com o Decreto n. 6 de 17 de fevereiro, mencionaram-se novas
diretrizes para o curso do Ginásio. Nele, aparece para o ensino no quarto ano: História
Geral (antiga e média); no quinto ano: História Geral (moderna e contemporânea) e no
sexto ano: História do Brasil. Após essa data, somente com o Decreto de 1901, que dava
novo regulamento à Instrução Pública no Paraná, é que se verifica a indicação, no
Programa, dos conteúdos das disciplinas e os modos de organizar o ensino desses
saberes. Com relação à História, o Decreto de 1893 descreve:
Na historia mencionar-se-ão, sem jamais descer a minudencias, os acontecimentos
politicos, scientificos, litterarios e artisticos de cada época memoravel; serão expostas
as causas que determinarão o progresso ou o estabelecimento da civilisação nos
grandes periodos historicos, apreciados os homens que concorrem para as revoluções
beneficas ou perniciosas da humanidade, mórmente os da America e sobretudo os do
Brazil, agrupando-se em torno delles os factos caracteristicos das phases em que
dominaram o espirito publico, devendo ser principal escopo do programma e do
ensino, na historia patria particulamente instruir a historia educativa e
vivificadora do sentimento nacional.
(Paraná, Decreto de 1893, p.115-116, grifos
meus).
Embora ainda permanecessem separadas as cadeiras, a História Nacional
continuava sendo vista em uma perspectiva universalizante. Nessa nova orientação, o
predomínio da História das Civilizações incorpora a História do Brasil através do estudo
da América. Isso é verificado no excerto acima descrito, em que se percebe a
manifestação dos conteúdos de História se definindo entre o saber universal e o
nacional. No caso da instituição do Paraná, como eles vão diferenciando-se de acordo
com o destino final a que os saberes do ensino de História se comportavam em relação
ao secundário e ao primário.
Nesse sentido, a concepção de História que estava em voga no início da
República era de uma “História Geral”, que jamais deveria descer a “minudências”.
Com base nela, foram elaborados os demais conceitos: acontecimentos, época
96
memorável e grandes períodos; causas e conseqüências; progresso; civilização;
revoluções benéficas ou perniciosas; estudo da América com ênfase na História pátria,
que deveria ser uma “história educativa do sentimento nacional”.
No caso do ensino secundário, os livros indicados em 1898 para serem adotados
na instituição paranaense foram: História do Brasil de Mattos Maia, Lições de História
Geral de Annibal Mascarenhas e dois compêndios complementares: Revolução
Brasileira de Gonzaga Duque e Curso de História dos Estados Americanos de João
Manoel da Silva, estes revelam o estreito relacionamento dessa concepção de História
com os conteúdos dos livros adotados.
O Curso de História dos Estados Americanos de Manoel da Silva indica porque
a História do Brasil deveria ser vista na perspectiva geral. Segundo seu entendimento, a
História é a história do progresso das civilizações e só é possível conhecer a nação mais
civilizada na comparação com outras nações. Desse modo, seriam encontrados os
rumos para avaliar o grau elevado da nação entre as nações.
As sociedades herdam principios, idéas, elementos materiaes, factos e opiniões; tem
obrigação de augmentar o peculio e thesouros que receberam do passado, afim de
melhorados transmitti-los aos descendentes.
Não se censura e condemna o pai de familia que estraga a fortuna legada por seus
maiores em vez de accrescental-a para seus filhos? Não se critica e estigmatisa o que em
vez de dar mais lustra ás tradições de sua genealogia, transmite nos posteros seu nome
envergonhado?
O que cumpre portanto ás sociedades é conhecer e apreciar o seu estado e situação,
comparando-os com o seu passado e com o dos outros povos, afim de, notadas as
differenças, empregar todos os esforços tendentes a lucrar maiores melhoramentos,
e preparar mais venturoso futuro a seus successores. (Silva, 1876, p.9, grifo meu).
Gonzaga Duque (1898, p.1) é esclarecedor no sentido de apresentar as novas
perspectivas para o ensino da História.
O conhecimento histórico das origens republicanas é um dever da educação de um povo
livre, alenta a alma patriotica da mocidade e desenvolve a crença na politica no coração
dos cidadãos.
A história do Brazil, que até hoje tem sido escripta para uso das escolas e para a leitura
dos nossos jovens patricios, não attende a este desideratum porque ficou restricta aos
estreitos moldes convencionaes do ensino monarchico; é omissa e deficiente na
referencia ás sucessivas e sangrentas guerras que vieram conduzindo a nova nação sub-
americana á posse do governo do povo e pelo povo.
È esta, precisamente, a parte da sua historia que o povo, representado na sua mocidade,
precisa de conhecer, porque ahi estão os exemplos de civismo dos seus antepassados
que, sem medir esforços, luctaram pela liberdade e pela civilisação a que conseguimos
chegar
.
97
No ensino secundário, embora ainda preparando para os cursos superiores ou
para o colégio oficial, a História recebe conteúdos novos: a abolição da escravidão e as
chamadas “revoltas” do período imperial (mascates, emboabas e outras), e seu
desdobramento com a História da América pode ser entendido como um processo de
especialização do objeto de estudo em diversos ramos de saber histórico.
As mudanças que se processam na nomenclatura da disciplina de História e em
seus conteúdos, bem como nos manuais adotados no período republicano, tanto nos
programas do Colégio Pedro II quanto do Ginásio Paranaense e Escola Normal, é
exemplo desse processo de definição da disciplina no século XX.
A partir do final do século XIX, várias possibilidades teóricas de se encaminhar
o ensino da História, no curso secundário, vão surgir, não só pelo fato de que escrever
uma nova História do Brasil fazia-se imprescindível, mas também porque a História
Universal, com a sua expansão como saber científico, recebe outras abordagens e temas,
surgindo a idéia de História Geral e História das Civilizações.
No século XIX, os conteúdos da História Universal, que anteriormente era de
domínio de uma “historiografia cristã”, passam a ter uma concepção laica do movimento
geral da humanidade, mantendo, entretanto, o princípio filosófico cristão de processo
histórico de criação e evolução da humanidade, conforme indica Veit Valentin (s/d,
p.18):
Em se escrevendo a História Universal sempre se procurou encontrar uma divisão
significativa de épocas para assim estabelecer ordem no caos da tradição. Os
Padres da Igreja distinguiram os seis dias da criação do mundo ou da idade natural
da vida na História Universal; para êles a evolução da humanidade foi a evolução
do Reino de Deus na terra, o desenrolar dos divinos planos de salvação, no sentido
dum crescente processo de beatização de tôda a humanidade até ao triunfo final
do Dia do Juízo. O cisma da Igreja mundanizou a história, introduzindo nela a
política. Assim como os novos corpos estatais tinham antes de tudo que cuidar
dêles próprios, assim também a historiografia se especializou tornando-se
absolutista, céptica e pragmática. Só no século dezoito foi que se ousou voltar ao
universalismo e tentar o triunfo do espírito, o crescente poder do saber, a transição
progressiva da natureza para a razão – tudo no sentido do grande escopo, a cultura
abrangendo e felicitando tôda a humanidade
.
Ou seja, para a “historiografia cristã”, tratava-se
[...] de situar a vida de Jesus Cristo na história judaica, de certa maneira
“demonstrar” os nexos entre as profecias messiânicas contidas no Antigo
Testamento e sua realização no Novo Testamento, mostrá-lo também nos quadros
da antigüidade romana e sobretudo a ultrapassagem destes marcos fundando uma
98
historiografia própria, com uma periodização e historicidade específicas que se
pretendiam universais.
(Silva, 2001, p.33)
No lastro do estudo de Valentin, pode-se afirmar que o conceito de Universal, no
século XIX, não tem o caráter de um saber generalizante, geral, mas uma concepção que tem
no Universo, no Mundo, o centro de sua preocupação. É o estudo da humanidade, da terra, de
seus habitantes, de seu processo de criação e desenvolvimento, onde a evolução da
humanidade se confunde com a evolução do Reino de Deus. (Valentin, s/d).
É uma concepção que se concilia com a História Sagrada, para a qual, “Graças à
revelação, o cristão possui um fio condutor que lhe permite pensar a totalidade da história.
Sabe que o universo tem uma história que começa na criação, que acabará no juízo final”.
(Marrou, apud Tértar, 2000, p.35).
Considerando a análise historiográfica de Valentin e Tértar, pode-se afirmar que a
divisão em dois grandes períodos, Antiga e Moderna, da História Universal é característica
de uma tradição historiográfica em que o cristianismo era soberano e por isso o conhecimento
histórico estava enraizado numa Antigüidade Cristã. A modernidade sinaliza o limite dessa
concepção e marca o posterior desenvolvimento da História, que ocorre com o cisma da Igreja
e a sua conseqüente emancipação da tutela cristã. A História recebe uma tendência
completamente distinta com a sua laicização e a preocupação voltada para os fatos políticos.
No período moderno, a História Universal incorpora os fatos econômicos e sociais no
estudo do progresso científico da humanidade. Além disso, com o desenvolvimento dos
Estados nacionais, a História passa a preocupar-se também com a idéia de História Nacional,
inserindo-se, nesse trajeto, a História Nacional no quadro de uma História Universal laica
(Hery,1999, p.67).
No decorrer do século XIX e início do XX, o desenvolvimento das ciências, por meio
da especialização dos seus conhecimentos e de seus princípios “civilizadores”, trouxe para o
campo historiográfico e para o ofício do historiador a idéia de História das Civilizações,
preocupada particularmente com uma história da evolução das artes e das ciências dos povos.
A História Universal é criticada pelos autores que se propuseram a escrever uma
História das Civilizações em termos temáticos. No prefácio do Compêndio da História da
Civilisação do historiador francês Seignobos, encontra-se a seguinte observação feita pelos
editores brasileiros:
99
A narração de guerras, de conquistas, e de revoluções politicas, que constituía a
parte principal da história, podia parecer sufficiente n´uma epoca em que só as
aventuras de reis, de generaes e de grandes personagens offereciam interesse.
Hoje que tem a menor instrucção deseja comprehender a sociedade em que vive e
saber como se formaram os costumes do meio que o rodeia. Já não nos
contentamos com as narrações dos acontecimentos da historia politica social,
queremos conhecer tambem os acontecimentos da historia moral, religiosa e
material da humanidade. A par das grandes acções dos personagens celebres,
queremos fazer uma idea perfeita da vida dos milhoões de homens de que a
historia politica não resa e que em seu tempo formaram a massa das nações e
foram nossos predecessores.[...] se a historia dos acontecimentos politicos é o
estudo favorito dos homens de Estado, a historia da civilisação é que é a
verdadeira historia do povo. É ella que mostra como os povos sahiram do estado
selvagem, como pouco a pouco se foram libertando da miseria e da oppressão, e
quaes os esforços por meio dos quaes conquistaram o seu bem estar e a sua
liberdade. A historia da civilisação é o quadro dos progressos da humanidade e
com justo titulo interessa a todos os que creem na humanidade e no progresso.
(Seignobos, 1914, prefácio, grifo meu).
A partir da crítica que os historiadores das civilizações faziam aos historiadores
universais, propuseram uma história de cunho científico e menos filosófica. Para os
críticos, estudar a arte, a ciência e a religião dos povos era estar em sintonia com os
tempos do progresso. Essas reflexões em torno do caráter da história enquanto
conhecimento científico deu origem a polêmicas em torno do tema, conforme se observa
nas reflexões de Valentin (s/d) no prefácio de seu livro:
A necessidade hodierna que se sente de uma História Universal é um
movimento contra a especialização cujo propósito de exatidão se relaciona
íntimamente com o industrialismo e as pesquisas especializadas das ciências
naturais. O novo pendor para o essencial, o geral, psicológica é
fundamentalmente valioso dá também um novo impulso à História Universal.
(grifo meu)
Na continuidade, expressa seu ponto de vista:
História Universal continua sendo uma boa denominação. O universo - o mundo – não
significa naturalmente êsse cosmos das ciências naturais dentro do qual a terra é só um
pequeno astro, e dentro do qual destinos da humanidade que nos são conhecidos nêsse
astro representam só uma parte insignificante numa imensa série de acontementos
absolutamente ultrapessoais. Existe porém um Cosmos íntimo. O mundo é qualquer
coisa espiritual – tudo o que se tem firmado na consciência da humanidade atual, o
conjunto da herança viva de que dispõe, com a qual trabalha e da qual o seu futuro
destino provávelmente depende. História Universal pode ser escrita em geral, só sob um
determinado ponto de vista da atualidade. Foi sempre assim; quanto mais vigorosa fôr a
sensação de recomeçar tanto mais fortemente se imporá a necessidade de História
Universal. Cada geração tem de formar a sua História Universal. Agora estamos
100
formando a nossa. Por isto a História Universal é para nós uma confissão, uma prestação
de contas e um programa. Ousamos enfrentar uma História Universal porque nos dará
uma concepção do mundo.
No conjunto desse debate, elaborou-se o conceito de História Geral que, ao que
tudo indica, foi a manifestação dessa polêmica na organização dos programas escolares
de História. História Geral pode ser entendida, portanto, como uma concepção de
História que se define por um critério pedagógico de organização do texto escolar. Por
ela, incorporam-se aspectos da História Universal e da História das Civilizações,
incluindo aí a História Nacional. Isso porque, com o domínio do saber específico no
campo acadêmico, o discurso da História escolar construiu um saber fundamentalmente
próprio que não se deixaria “dominar pela tirania adstrita” a todo conhecimento
especializado (Valentin, s/d).
Tais facções do saber histórico estiveram presentes nos programas do Ginásio
Paranaense (ver quadro X e XI anexo), nos quais os conteúdos apareciam elencados
através dos seus Programas a partir de 1890. Verifica-se que nem sempre seus
programas estiveram em fina correspondência com o colégio modelo
25
, apesar das
constantes exigências para a equiparação.
Na Escola Normal, embora nos anos iniciais da República sua matrícula
continuasse reduzida a uma procura mínima, cerca de dois a três alunos, como observou
Victor Ferreira do Amaral e Silva, em 1894: “primeiro ano, 3 alumnas e 1 alumno, no 2
o
ano, 2 alumnas” (Paraná, Relatório do presidente da província Amaral e Silva de Janeiro
de 1895, p.12), o ensino de História a ser ensinado no primário recebe orientação mais
específica com base na produção didática que surge para esse grau de ensino. Com a
mudança política, a produção didática assume novas características.
No que se refere à adoção das obras, em 1898, é sugerido, pela Congregação do
Ginásio Paranaense e da Escola Normal, o compêndio Lições de História Geral de
Annibal Mascarenhas e, História do Brasil, de Mattos Maia, indicado em 1899. Na
25
Pelo Regulamento de 1892, a História está prevista, no Ginásio Paranaense, no 6
o
ano, na 3
a
cadeira, denominada somente de História Universal, e, no 7
o
ano, na 2
a
cadeira, como História do Brasil.
Com o decreto de 28 de dezembro deste mesmo ano, ela vai aparecer no 4
o
ano, na 5
a
cadeira, como História
Geral, a ser dividida em História Antiga e Média; no 5
o
ano, na 5
a
cadeira, continuando História Geral, com
divisão entre Moderna e Contemporânea, com conteúdos que tratam dos países americanos; nos 6
o
e 7
o
anos,
na 4
a
cadeira como História do Brasil. No entanto, quando se vai aos documentos da instituição, como é o
caso dos livros de posse dos lentes do Ginásio Paranaense, verifica-se que a nomeação é feita na cadeira que
compõe também outras matérias.
101
seqüência, em 1905, sugere-se Lições de História do paranaense Dario Velozzo e
indicação de mudanças nos compêndios só vai surgir após a década de 1920, quando a
Escola Normal passa por uma grande reforma e ocorre a separação física do Ginásio
Paranaense.
CAPÍTULO III
AUTORES E COMPÊNDIOS DE HISTÓRIA NO PARANÁ: A HISTÓRIA
ENSINADA E A FORMAÇÃO DO CIDADÃO
103
3.1 Compêndios de História no Paraná: conferindo sentidos aos saberes escolares
Inclinados a um projeto social de grandes proporções de reforma social
1
, parte
dos intelectuais paranaenses da década de 1870 voltou-se para o fluxo cultural carioca e
paulista e com ele se identificou, propondo um projeto de reforma da sociedade
paranaense para o desenvolvimento nacional. Essa ambição representou, no campo
educacional, a busca em colocar o Instituto de Preparatórios e a Escola Normal em
funcionamento, atendendo, apesar das críticas que teciam aos exames de preparatórios,
às demandas dos cursos superiores e às diretrizes republicanas relacionadas à
constituição das escolas primárias.
Nesse sentido, a política de curso equiparado foi assumida pelas autoridades
paranaenses para o curso secundário e, para o curso primário, a criação de uma Escola
Normal com o fim de melhorar a formação dos professores primários, dando-lhes
formação profissional em consonância com os novos princípios educativos para a
modernização da escola primária paranaense
2
.
Ao adotar a política de equiparação, o Colégio Pedro II e os compêndios ali
adotados tornaram-se a referência para o ensino de História que se fazia naquela
instituição com duplo objetivo: preparar para os exames nos cursos superiores e formar
normalistas para atuarem nas escolas primárias da Província.
A História, como disciplina escolar no Colégio Pedro II, fazendo-se através do
discurso fundador da nacionalidade (Bittencourt, 1993, Gasparello, 2004, Melo, 1997),
estava voltada para o conhecimento e estabelecimento dos elementos importantes para a
formação e transmissão da idéia de nação. Nessa perspectiva, o Compêndio de História
Universal do francês Victor Duruy tornou-se um modelo de História Universal por um
longo período, essa obra era o ponto de referência para seu ensino no Paraná. No caso da
História Nacional, o compêndio Lições de História do Brasil de Joaquim Manoel de
Macedo tornou-se o modelo idealizado no período imperial para ensinar a História da
Nação no Colégio Pedro II e se difundiu por todo o Império.
1
Ver capítulo II.
2
Com relação a esse movimento de busca pela reforma da escola paranaense é importante a referência aqui à
Escola Neutralidade que, criada em São Paulo, foi modelo a ser seguido pelas autoridades paranaenses em fins
do Império. Sobre isso, ver: Barbanti (1977).
104
Obras de grandes dimensões política e pedagógica foram também adotadas no
Instituto de Preparatórios e Escola Normal e, no inicio da República, autores como
Annibal Mascarenhas, Mattoso Maia e o paranaense Dario de Castro Vellozo conferiram
sentido aos saberes históricos escolares no Paraná, através de seus compêndios: Lições
de História Geral; Lições de História do Brasil e Lições de História, respectivamente.
Nesse trajeto, em que formar uma nação era constituir uma nacionalidade pela
qual se integrassem os seus elementos formadores, ainda que não se falasse em
formação de cidadãos nos compêndios do império, o modo de sua construção e
exposição no texto, centrado na análise da busca das virtudes patrióticas e cívicas,
atingia, pelo discurso da constituição do povo, a temática do cidadão. No período
republicano, o termo vai aparecer com maior clareza em sua relação com o ensino de
História, exatamente por se tornar uma das questões centrais do projeto político do novo
regime.
3.2 Victor Duruy: o modelo de uma História Universal
L´histoire, plus discréte, a bien des doutes sur cette période royale,
quélle n´entrevoit que´à travers des récits complaisants. Cependant
elle admet la fondation sur le Palatin d´une ville dont on vient de
retrouver les murailles, Roma Quadrata, que exerça, contre ses
voisins du Latium, de la Sabine, deÉtrurie, sa robuste jeunesse,
et qui grandit au point que Servius fut obligé de lui donner
l´enceinte qu´elle garda pendant toute la république. Ou constate
des moures, des institutions, une organisation politique qui ont eu
besoin de deaucoup de temps pour se développer [...]Elle avait
comme deux peuples:le patriciat et la plébe. (V. Duruy, Abregé
d´histoire universelle, 1878).
No quadro das relações sociais do século XIX no Brasil, verifica-se a
construção teórica das origens do Brasil como uma nação. Na construção desse conceito,
que se fez tanto na história como na literatura nacional, as diretrizes européias nortearam
a compreensão de nação como um aspecto particular de um movimento universal
3
.
No campo da história, à História Universal do francês Victor Duruy (1811-
1894), coube oferecer o movimento geral da constituição das nações para o ensino
3
Conforme escreveram Von Martius (1845) e Vanhagen (1854)
105
escolar. Num momento em que a Europa estava construindo o conceito de nação e seus
critérios estavam ainda sendo “intensamente debatidos pelos teóricos do século XIX,
tais como etnicidade, língua comum, religião, território e lembranças comuns”
(Hobsbawm, 1990,p.33), esse conceito só poderia ser visto num registro universal,
incluindo, necessariamente, a formação histórica dos povos antigos como princípio de
civilização. Para Hobsbawm, as concepções surgidas no século XIX faziam parte da
“ideologia liberal” porque:
[...] o desenvolvimento das nações era inquestinavelmente uma fase do progresso ou da
evolução humana que ia do pequeno ao grande grupo, da família à tribo, à região, à
nação e, em última instância, ao mundo unificado do futuro no qual [...] “as barreiras
da nacionalidade que pertenciam à infância da raça irão dissolver-se e fundir-se no
brilho da ciência e da arte”. (Hobsbawm, 1990, p.50).
Por isso, na perspectiva de Duruy, as grandes nações representavam os estágios
de evolução alcançados pela humanidade na metade do século XIX. O compêndio desse
autor é marcado pelo ideário de que as sociedades antigas, dos gregos e romanos,
tornam-se o princípio a partir do qual se pensa, contemporaneamente, na organização de
uma nação civilizada, conforme se verifica na epígrafe citada no início deste ítem. Na
forma de organização social e política dos antigos, ele buscou encontrar os fatores do
desenvolvimento dos impérios. São enfatizadas as possessões territoriais, a constituição
das classes sociais na formação do povo para explicar os estados de civilização de uma
organização nacional.
Em março de 1870, um ofício da Tesouraria Provincial do Paraná - Ofício n.89
de 24 de março - para o Presidente da Província, Antonio Luiz Affonso de Carvalho,
informava os custos com compras de livros realizados na Corte. Nele, encontra-se o
registro da compra do “Compêndio de História Universal” de Victor Duruy. (Paraná,
Correspondência de Governo,AP.331, vol.08, 1870, p.132).
Nascido em Paris aos 11 de setembro de 1811, Duruy teve uma vida norteada
pelos debates em torno da constituição da Escola Pública na França. Foi inspetor geral
do ensino secundário e publicou dois livros de História para as escolas de ensino
secundário; foi ministro da instrução pública de 1863 a 1869, foi senador em 1869, foi
escolhido para membro do conselho superior de instrução pública de 1881 a 1886.
Membro da Academia das Inscriptions em 1873, participou da Academia de Ciências
106
Morais e Políticas em 1879 e, em 4 de dezembro de 1884, da Academia Francesa, entre
outras designações exercidas até sua morte em 25 de novembro de 1894.
Foi também autor de obras de história: Histoire des Romains et des peuples
soumis è leur dominations, 7 volumes (1843); Histoire sainte d´aprés la Bible (1845);
Atlas de géographie historique universelle (1846); Histoire romaine depuis les temps les
plus reculés jusqu´a l´invasion des barbares (1847); Chronologie de l´atlas historique
de France (1849); Abrégé de l´histoire de France (1850); Abrégé des histoires
ancienne, du moyen âge et moderne (1852) 3 volumes; L´Univers pittoresque: Italie
ancienne, 2 vol. (1855), entre outras
4
.
Suas obras expressam as vivências políticas de um período em que o projeto de
constituição da escola pública laica se confrontava com os poderes religiosos na França.
Nesse sentido, esteve ligado diretamente com a História como disciplina escolar nas
propostas de laicização do ensino público, que empreendeu naquele país. (Hery, 1999;
Ponteil, 1966). O processo de laicização do ensino se deu paralelamente, entre outros
fatores, com o debate sobre a separação dos estudos literários dos científicos, o que
culminou no Decreto de 10 de abril de 1852, responsável por “colocar em equilíbrio as
ciências e as letras”. (Ponteil, 1966, p.256,257). Autor muito conhecido desse debate é
Fortoul que, na ocasião, anunciava:
Nós queremos um ensino científico apropriado às disposições dos alunos consagrado ao
sabor da cultura das letras. Nós queremos um ensino literário que convide os
matemáticos [...] Pelos novos programas se atende a esse ponto, o exame do bacharelato
às ciências compreende as provas literárias, como o exame do bacharelato às letras
compreende as provas científicas
. (apud Ponteil, 1966, p.259).
O registro desse excerto é significativo para mostrar a inovação que se
processava no curso secundário francês, palco das atuações de Duruy. Essa remodelação
dos programas vai trazer para o campo da História novidades. Sobre isso afirma Furet
(s/d, p.126):
A história sagrada é daí em diante reservada para os mais jovens, na terceira e quarta
classes. Os primeiros, segundo e terceiro anos do secundário são dedicados à história de
França até 1815. Por fim, nos quartos, quinto e sexto anos, a tríade já clássica:
Antigüidade, Idade Média, Tempos Modernos.
4
Informações do site: www.academie-francaise.fr/immortels/base/academiciens/fiche. Nele, encontram-se,
também, discursos e relatórios do autor.
107
Iniciado o processo de mudanças no programa de História por Fortoul, Duruy, na
proposta de 1865, foi ainda mais longe. Manteve a História Sagrada apenas para a
terceira classe e a História da França passou para os estudantes da quarta. Além disso,
indicou a Antigüidade para ser ensinada do primeiro ao terceiro ano; a Idade Média para
o quarto; os Tempos Modernos para o quinto; o período 1661-1815 para o sexto ano, e o
século XIX até o Segundo Império, para o sétimo ano, chamado de filosofia. (Furet, s/d,
p.126).
Na apreciação do historiador Furet, a divisão instaurada por Duruy é muito
moderna, posto que
Ganha a batalha da história contemporânea, que anexa ao ensino secundário. Ao
mesmo tempo que dá ao século XIX a dignidade histórica, estende, graças ao século
XIX, o campo escolar da história aos factos econômicos e sociais. Com efeito, a
história não é só a genealogia da nação, mas também o estudo do progresso
científico e material da humanidade. E é assim que se prepara, em novas
condições, a reconciliação da idéia nacional com a idéia enciclopédica
. ( Furet, s/d,
p.126,grifo meu).
Esse princípio enciclopédico e universal vai caracterizar a institucionalização do
ensino de História no Brasil no ensino secundário. Ao se ensinar História Universal,
nela se incluirá a História do Brasil, vista como apêndice da História Universal. Esses
princípios são visualizáveis na proposta efetivada pelo Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (IHGB), criado em 1838, incrementada na tese do naturalista bávaro Karl
Friedrich Philipp Von Martius (1845) e do historiador brasileiro Francisco Adolfo
Varnhagen (1854).
Em Martius, a escrita da História do Brasil só pode se fazer em relação com os
acontecimentos da Europa:
As mesmas razões gerais e poderosas, que imprimiram a uma das nações mais pequenas
da Europa um movimento tão poderoso, que impeliram a uma atividade que faz época
na história universal, indusiram-na igualmente à emigração para o Brasil.
Com esta observação quero indicar que o período da descoberta e colonização
primitiva do Brasil não pode ser compreendido, senão em seu nexo com as
façanhas marítimas, comerciais e guerreiras dos portugueses, de que modo algum
pode se reconsiderado como fato isolado na história desse povo ativo, e que sua
importância e relações com o resto da Europa está na mesma linha com as
emprêsas dos portuguêses.
Assim como estas tiveram a maior influência sobre a política e comercio da Europa,
aconteceu o mesmo da parte do Brasil
. (Martius, 1845, p.195, grifo meu).
108
Varnhagen entendia a História Nacional como integrante de um movimento
geral:
[...] a integridade do Brasil, já representada no Estado e no Universo pela monarquia,
vai agora, bem que muito humildemente, ser representada entre a História das
nações por uma História nacional. Péssimo era não possuir a nação uma História
Geral, digna deste nome, e sisuda e imparcialmente escrita
(1854, p.VI, grifo meu).
Essa perspectiva teórica, de ver a História Nacional no interior da História
Universal, permanecerá por um longo período no Colégio Pedro II, pois, mesmo quando
ocorre a separação das cadeiras e a História do Brasil ganha autonomia frente à História
Universal (1849), do ponto de vista dos conteúdos ela ainda manterá esse caráter de
construir-se no interior do movimento mais geral da História das nações. Isso porque, a
tendência de manter a História Universal e, posteriormente, História das civilizações,
como a âncora do curso secundário, instituirá a História Nacional, mesmo no período
republicano, como de domínio de uma História Geral.
Essa situação de dependência da História do Brasil, mesmo nos momentos em
que ficaram com cadeiras separadas, será fator de desacordos entre os professores do
Colégio Pedro II, particularmente entre aqueles que ocupavam a cadeira de História do
Brasil e tinham por objetivo defender a plena autonomia da História Nacional.
Na proposta pedagógica de Joaquim Manuel de Macedo, através da sua obra
didática Lições de História do Brasil (1861- 1
o
volume - 1863- 2
o
volume), marcou-se a
legitimação do modelo nacional de produção didática brasileira no período imperial,
assumindo o lugar privilegiado e autorizado pelo IHGB para a descrição da gênese de
uma memória da História da nação.
Pelo projeto do IHGB e pela produção nacional que se seguiu à sua constituição,
surgido num momento em que a História estava consolidando-se como disciplina
escolar dentro de uma tradição elitista (de que o ensino secundário é tributário), a
História Nacional integrou-se à civilização ocidental, cujo modelo é a obra de Duruy,
porém, com uma identidade singular, emancipada politicamente da antiga metrópole,
tendo, no entanto, simultaneamente sua continuidade, com a prevalência das qualidades
da raça branca, civilizadora por excelência. Em Martius (1845, p.196), assim aparece
esse pressuposto:
109
Daqui o historiador deverá passar para a história de legislação e do estado social
da nação portuguesa, para poder mostrar como nela se desenvolveram pouco
a pouco tão liberais instituições municipais, como foram transplantadas
para o Brasil, e quais as causas que concorreram para o seu
aperfeiçoamento nesse pais. Mostrar em quanto aqui a legislação antiga
portuguesa (de D.Diniz) ficou mais exenta da influencia do direito romano, que
os reis espanhões propagaram em Portugal, seria uma tarefa de sumo interesse,
para o historiador, que na legislação reconhece o espelho de uma época. ( grifo
meu).
No Colégio Pedro II, concretiza-se esse ensino, a partir do qual se estabeleceram
os objetivos a serem perseguidos por seus professores e a idéia do esclarecimento das
elites que, em seguida, se encarregariam de divulgar seus conhecimentos para o restante
da sociedade sobre o como pensar o Brasil, sua constituição geográfica, seu povo, sua
gênese, enfim, sua identidade com relação às outras nações.
Na proposta de ensinar uma História do Brasil vinculada a uma perspectiva
civilizadora do povo brasileiro, o ensino de História do Brasil, como proposta
educacional, generaliza-se também nas instituições de ensino primário, porque torna-se
importante que o povo conheça o seu próprio país. Na conjuntura política e social do
Império brasileiro, era necessário um saber histórico da nação não apenas à elite, que
estava destinada a conduzir o país, mas também ao povo, cuja memória nacional deveria
estar personificada na monarquia e no Império.
Pela difusão da educação das primeiras letras, pensava-se em afirmar os
princípios e virtudes morais, nos quais se materializariam os ideais de “despertar” pelo
ensino da História Nacional - numa escrita de “estilo popular”, portanto “simples”
(Martius, 1845) - o “amor à Pátria” e todas as virtudes cívicas.
Nessa tarefa de apresentar a nação como unidade capaz de enfrentar as
divergências regionais para a grandeza do Império, verifica-se as preocupações em
construir um programa de História Universal adaptado aos contornos específicos de uma
Monarquia na dianteira da difusão da modernidade.
Essas informações são importantes na medida em que permitem relacionar a
trajetória da disciplina no Brasil com a França e entender por que a tradução do livro de
Duruy, feita pelo clérigo Francisco Bernardino de Souza, professor do Colégio Pedro II,
não obedeceu exatamente aos princípios do historiador francês, conforme apontou
Bittencourt (1993).
Segundo essa autora, a intervenção do tradutor foi responsável por algumas
alterações importantes na obra. Houve uma redefinição dos capítulos iniciais do livro.
110
No capítulo inicial, o tradutor “procurando acentuar a origem sagrada do homem”
modificou a lógica do autor. Evidencia Bittencourt (1993,p.176):
No original, [...] Duruy buscou apresentar uma configuração geral dos continentes e as
formas de comunicação estabelecidas entre os diferentes povos. No capítulo II,[...], o
autor apresentava as tradições bíblicas sobre os primeiros homens para explicar que as
3 raças humanas estavam presentes na versão religiosa católica,[...].O tradutor
brasileiro inverteu a apresentação dos capítulos. Iniciou o livro com o Tempos
primitivos – Tradições bíblicas – fundação dos impérios e no final incluiu,
resumidamente os limites do mundo conhecido pelos antigos. A inversão dos temas,
[...] indicou um reforço quanto à versão cristã da história do homem, interpretação que
Duruy atenuou ao enxertar os pareceres científicos quanto à origem das raças humanas.
Além disso:
No livro de Duruy há um total de 62 capítulos organizados em 340 páginas. A versão
brasileira é de 433 páginas onde houve mudanças na disposição e apresentação dos
capítulos (20 capítulos para cada período), com omissões de alguns sub-ítens e há
acréscimos de conteúdos com a inclusão de um capítulo do final da História da Idade
Média, XX -Portugal- Breve resumo da história de Portugal até o reinado de Afonso V
e outro ainda sobre o reino português durante o período da História Moderna, desde o
reinado de D.João II até o de D.Pedro V
. (Bittencourt, 1993,p.177)
Enquanto na França se atenuava o espaço da História Sagrada em relação à
história laica, de que a obra e a atuação de Duruy é exemplar, no Brasil, a presença da
História Sagrada mantém-se por mais tempo e, nesse momento, 1865, quando a obra,
original de 1855 é traduzida, é ainda forte. A Igreja, ao longo do século XIX no Brasil,
continuaria a ser uma instituição fundamental, embora, como afirmou Miceli (1988),
passasse por profundas transformações decorrentes dos embates em torno da definição
dos papéis da religião e do clero no Brasil independente.
Um outro aspecto que se pode extrair dos excertos acima descritos é a tentativa
de iniciar um conhecimento sobre Portugal, o colonizador da Pátria. Ele aparece no
interior da História Universal e parece ter sido o principal objetivo dos autores nacionais
nesse período. Mesmo nas obras de autores brasileiros que escreveram sobre a História
Universal, como, por exemplo, o trabalho de Justiniano José da Rocha, as origens do
colonizador brasileiro e, por extensão, do Brasil aparecem nesse registro universal
5
e
sob a orientação universalista da historiografia francesa.
A obra de Duruy foi importante para apresentar um saber sistematizado sobre as
origens das nações num momento em que a elite intelectual brasileira necessitava de
5
Ver Bittencourt (1993, p.177-178)
111
conhecimentos sobre a organização de uma entidade política autônoma e civilizada.
Trata-se de uma história política que procura as marcas iniciais dos povos em sua
trajetória na terra e suas formas de organização social. Mesmo com as modificações
efetuadas na tradução do original, mantém-se o pressuposto básico da obra que é narrar
a constituição dos grandes impérios, suas formas de organização social, governo e as
causas de sua decadência.
A História Antiga resume-se ao estudo de Roma no compêndio de Duruy. A
partir do ítem nove “A Grécia reduzida a província romana”, enfatizou as lutas, as
guerras que os povos travaram na constituição de sua forma social. Como, nesse
período, as guerras têm papel fundamental na organização dos Impérios, devem ser
estudadas em sua composição geográfica e política. Da “Fundação da República
romana” (ítem 11) até a “Queda do Império do Ocidente” (ítem 20) ganhou relevo na
obra de Duruy a história das conquistas romanas e seus principais imperadores (Cesar,
Augusto), bem como de sua administração do poder público.
Na História da Idade Média, manteve o estudo do “mundo romano” e seu
processo civilizatório, incluindo a fundação dos “Principais Estados fundados pelos
bárbaros no império romano, nos séculos V e VI” (ítem 2) e as monarquias constituídas
com a “invasão” dos povos bárbaros (ítem 1). Nesse período, iniciou-se o estudo da
França em seu “desdobramento em grandes feudos” (ítem 7) e sua constituição como
uma das “grandes nações modernas” (ítem 10).
Nessa época histórica, não se tratava mais de “guerras de conquistas”, como foi
no período antigo, mas de “invasões” de territórios já definidos e consolidados em sua
geografia e política, em forma de repúblicas ou monarquias. Definição territorial
consolidada de tal modo que foi possível a Duruy esboçar uma “geografia política da
Europa em 1453” (ítem 19). O período medieval encerra, na versão brasileira, com um
“breve resumo da história de Portugal” (ítem 20) com o objetivo de resgatar a
“evolução” que culminou no descobrimento do Brasil.
A História dos Tempos Modernos mostrou a continuidade do desenvolvimento
político e geográfico das chamadas “grandes nações” (França, Inglaterra, Alemanha,
Espanha,). Enfatizou os conflitos políticos e religiosos ocorridos entre estas nações nos
séculos XVII e XVIII nos ítens 2, 3, 4, 5 e 7. A “descoberta da imprensa” (ítem 6) e a
reforma religiosa (ítem 10, 11) foram apontados como importantes acontecimentos
desse período.
112
Da “Revolução inglesa de 1648” e da “Revolução Francesa de 1789” até o
“Diretório” é que trataram os itens seguintes. Entre um assunto e outro, encontra-se uma
breve história de Portugal “desde o reinado de D.João II até o de João VI”, (ítem 19),
compondo os capítulos finais do compêndio.
Na conjuntura da sociedade brasileira do século XIX, as marcas definidoras do
desenvolvimento material e científico da humanidade, indicadas por Duruy, nortearam
os conhecimentos da nacionalidade brasileira, conduzindo a produção da historiografia
didática a se definir em duas frentes de saberes que se relacionavam mutuamente no
ensino secundário: um saber Universal e um Nacional. No período imperial, foram os
conteúdos de sua obra que desenvolveram uma História Universal no Instituto e na
Escola Normal no Paraná, com os mesmos objetivos definidos pelo Colégio Pedro II.
A obra traduzida e adaptada aos interesses da política brasileira, que foi lida no
Paraná, cumpria o papel de apresentar aos jovens da “boa sociedade” do império o
processo universal pelo qual os povos se desenvolveram, formando as nações modernas.
Um saber sobre as nações da Europa está nela empreendido, que se fazia importante
para permitir a identificação da elite intelectual ao mundo civilizado e a construção de
uma identidade nacional no conjunto das nações civilizadas. Destaca-se, entretanto, que
o papel de buscar uma “identidade nacional” foi constituída especificamente por
Joaquim Manoel de Macedo três décadas depois.
A relação ensino de História e formação do cidadão foi feita, nesse compêndio,
de forma velada. Ao tratar da construção de uma genealogia da nação brasileira, as
Lições de Macedo necessariamente passavam pela discussão das raças que se
envolveram nesse processo: o colonizador, os índios e os negros. Base da organização
social do Império, verificar qual o papel de cada elemento desses na formação do povo
brasileiro foi uma tarefa de difícil execução, sobretudo em relação ao negro, num
período em que as teorias científicas delegavam para ele um papel inferior nessa
constituição
6
.
6
Autora que estuda essa questão é Lilia Mortz Shwarcz. Em seu livro O Espetáculo das Raças, 1993, dedica um
capítulo (4) ao papel dos IHGB(s), considerando-os como “Guardiões da História Oficial”. Sobre a questão
racial e sua relação com o progresso do país, afirma: “As posições acerca desses dois grupos [índios e negros]
não eram, no entanto, idênticas. Com relação à população negra vigorava uma visão evolucionista mas
determinista no que se refere ao ‘potencial civilizatório dessa raça’: ‘Os negros representavam um exemplo de
grupo incivilizável’, afirmava um artigo publicado em 1891. Os índios, no entanto, ‘[...] provocavam opiniões
variadas, tanto que era possível acomodar no interior do IHGB, seja uma perspectiva positivista e evolucionista,
seja um discurso religioso católico, seja uma visão romântica, em que o indígena surgia representando enquanto
símbolo da identidade nacional’ ”. (p.111).
113
De qualquer forma, essas questões foram enfrentadas por Manuel de Macedo
que se fundamentou na reconhecida autoridade de Vanhagen.
3.3 As Lições de Manuel Macedo: um “modelo” de História do Brasil
Professando desde alguns annos a Historia do Brazil no
imperial Collegio de Pedro II, reconhecemos no fim de
breve experiencia que se fazia sentir a falta de um
compendio dessa materia que fosse escripto e
methodizado de harmonia com o systema de estudos
adopatados naquelle importante estabelecimento, e
tambem comprenhendemos que á nós como professor da
cadeira respectiva, cumpria mais que á outros qualquer
procurar satisfazer uma tal necessidade
. (Macedo, 1861,
Prefácio, grifo meu).
Na tarefa de criar uma História da Nação, importantes construções foram
elaboradas sobre o povo e a constituição da nacionalidade brasileira no século XIX. Na
perspectiva histórica, verifica-se o surgimento de construções marcantes no sentido da
constituição de um passado, de uma história da formação brasileira e de suas origens se
desenharem tanto no campo da produção acadêmica, pelo IHGB, como no campo
escolar, no Colégio Pedro II. Duas obras são referências nesse período: a tese de
Martius, Como se deve escrever a história do Brasil (1845) e o livro História Geral
(1854) de Adolfo Varnhagen.
Nas duas referências encontra-se a incorporação da natureza tropical como
ambiente, moldura e personagem em que se desenrola a história da formação nacional.
Isso porque, nessas formulações, a influência da natureza foi fortemente considerada na
formação do povo, com base nela se explicou o comportamento do nativo
(gentios/indíos) e a ação desbravadora e civilizadora do homem branco (português).
Conceito que escapa à explicação sobre o negro que, vindo de outro continente, teria
outro perfil que deveria ser estudado, conforme já havia ensinado Martius que, no item
“a raça africana em suas relações para com a História do Brasil”, afirma:
[...] no atual estado das coisas, mister é indagar a condição dos negros importados, seus
costumes, suas opiniões civis, seus conhecimentos naturais, preconceitos e superstições,
os defeitos e virtudes próprias à sua raça em geral, etc. etc. se demonstrar quisermos
como tudo reagiu sôbre o Brasil
(Martius, 1845, p.200).
114
Considerando, no entanto, a década em que Macedo escreve, a presença de
“homens de ciências”, que também eram das letras no IHGB, conforme indicou
Gasparello (2004, p.116), tinham sua inserção na política do Império. Com “[...]seus
membros imbricados no jogo de conflitos e contradições desse campo”, permaneceram
associados ao poder político na primeira metade do século XIX e mantiveram seus
conceitos raciais advindos da antropologia, que resultou na abordagem histórica em
relação ao índio, mas não fundamentalmente ao negro, que era visto, pela antropologia
positivista, conforme afirmou Schwarcz (2000, p.111), “como impedimento à
civilização”.
É isso que pode explicar, ao menos parcialmente, porque, nas obras didáticas,
está presente a idéia de encontrar formulações que escapassem ou adiassem o
enfrentamento com relação à escravidão. Por isso, ao olhar para o passado e procurar a
representação simbólica do povo brasileiro, Manuel de Macedo e seus contemporâneos
o fizeram como uma nação com identidade própria, na qual o Brasil não era nem
português, nem indígena, nem negro, mas a mistura dessas raças.
A mestiçagem carrega a composição racial desses três elementos, com
prevalência das qualidades do elemento superior, o homem branco, civilizado por
natureza, portanto, destinado a impor-se sobre as raças inferiores, porque não
civilizadas, e conhecer, dominar e apropriar-se dos recursos da natureza tropical em prol
do progresso e constituição de um povo.
O esforço de construção da nação brasileira, que tem como fio condutor a
elaboração de uma imagem que consolide o Brasil como parte integrante da cultura
ocidental civilizada, teve em Joaquim Manoel de Macedo, no campo pedagógico, o
elaborador de um modelo de História do Brasil que, como já foi mencionado,
contemplou em seus escritos as teses de Martius e Vanhagen ao escrever sua obra
didática Lições de História do Brasil.
Estudado por autores nacionais preocupados com o ensino de História no Brasil
e do Brasil, Bittencourt (1993); Mattos (2000); Gasparello (2004); Melo (1997), sua
biografia é bastante conhecida entre os pesquisadores do período, o que dispensa a
necessidade de arrolar, demoradamente, sua trajetória como intelectual. Indica-se apenas
que a recorrência a este personagem revela sua importância na história da disciplina.
Como membro do IHGB e professor do Colégio de Pedro II de 1849 até 1883, quando
veio a falecer, sua obra de história para o curso secundário cumpriu papel de legitimação
115
da História ensinada na ordem imperial, cuja posição política era conciliadora, de
“concentrar-se nos interesses da nação e da monarquia”. (Melo, 1997, p.126)
Autor de obras de grande repercussão nacional não só no campo da história,
como também na literatura, elas marcaram a produção didática nacional do ensino
secundário e primário. Sua obra de maior abrangência no campo pedagógico foi Lições
de História do Brasil, que escreveu, em dois volumes, como compêndio de História para
os alunos do Imperial Colégio de Pedro II e como manual, em um volume, para as
escolas de instrução primária do Império
7
.
Em 1882, na Ata do Conselho Literário do Instituto e Escola Normal consta a
adoção das Lições de História do Brasil de Joaquim Manoel de Macedo. Embora não se
faça menção sobre qual edição foi adotada e nem constam informações a respeito do uso
que se fez ou deveria fazer do compêndio em relação à sua adoção no Instituto e na
Escola Normal, seus conteúdos formaram o programa de História na instituição
paranaense por todo o período imperial.
Sendo uma obra especialmente publicada para atender aos alunos do Colégio
em que lecionava, a 1
a
edição (1861) indicada para os alunos do 4
o
ano e a segunda, de
1863, uma continuação das lições para o 7
o
ano, consta em suas páginas iniciais da 1
a
edição que estava “de acordo com o plano de estudos do Colégio”. Essa era, inclusive,
uma forma de garantir a aprovação da obra nos trâmites em que ela deveria passar até
chegar à adoção.
Escrito na década de 1860, o livro atendia a uma dupla necessidade que se fazia
sentir, na opinião de seu autor: organizar um compêndio de História nacional para
determinado grupo estudantil e uma determinada instituição de ensino secundário e, ao
mesmo tempo, construir um método de ensinar História para o curso secundário e
primário. Ambos volumes constam de lições sobre os momentos considerados mais
importantes para a História da Pátria.
Pensado num momento em que as finalidades educacionais eram fazer uma
História adequada aos princípios políticos do Império, os conteúdos das Lições visavam
não simplesmente o ambiente escolar, como o autor escrevia, mas a sociedade em que
estes eram produzidos. Nesse aspecto, no Compêndio, encontram-se os conteúdos que
7
No Paraná, ao que consta, seu manual para as escolas primárias não teve grande repercussão, pelo
menos não é indicado na lista de manuais para serem adotados nas escolas primárias nesse período.
116
sintetizaram uma época e se consolidaram como constituinte dessa disciplina escolar no
Brasil.
No que tange à proposta deste trabalho, o compêndio de Macedo traz clara e
explicitamente uma preocupação com um ensino que tendia a apresentar a “biografia da
nação”, conforme indicou Selma Mattos (2000), e implicitamente um conceito de
“povo”. No que se refere a apresentar uma biografia da nação, seu roteiro é desenhado
tomando por princípio a “evolução” dos fatos que marcaram a construção do país como
nação independente:
Ha mais de trez seculos que teve lugar o descobrimento do Brazil, ha perto de meio
seculo que a terra da Santa Cruz regenerou-se e escreveo o seo nome na lista das
nações do mundo e suas variadas fontes de riqueza, e seos numerosos productos
naturaes não estão ainda reconhecidos e explorados, e menos ainda aproveitados, senão
em uma parte, que pouco a pouco se vai engrandecendo, e que mal deixa calcular o
todo dos prodigiosos thesouros, que Deos semeou nella com mão bemfazeja e prodiga.
( Macedo, 1861, p.57, grifo meu).
Na descrição dos elementos formadores do povo brasileiro e da nação,
encontra-se uma seleção de temas que, na seqüência temporal, desenvolve-se conforme
os acontecimentos políticos. Dessa maneira, tem-se o início da História do Brasil a partir
da ocupação do litoral brasileiro e da relação mercantil estabelecida com o índio.
Em seu trajeto de busca para estar entre as nações civilizadas, o Brasil foi sendo
reconhecido aos poucos, uma vez que, para os civilizadores, “[...] o que se apresentou
menos digno de admiração, mais pequeno, mais mesquinho foi o homem que habitava, e
senhoreava esta vasta região” (Macedo, 1861, p.58). Sobre o estranhamento em relação
ao gentio que os “descobridores” tinham, o que os levava a crer que deveriam ser os
primeiros a serem civilizados, entendia Macedo (1861, p.58):
O gentio do Brazil, como o encontrárão os portuguezes, apenas póde ser julgado e
representado na historia por deducções nem sempre muito seguras tiradas da
comparação e critica de informações de escriptores e chronistas que são muitos, mas que
se contradizem nos pontos mais importantes. Alguns poetisárão a vida e os costumes do
selvagem, e como encanto do romanesco o elevárão muito acima da esphera em que elle
estava: muitos quasi que o confundirão com os animaes, quasi que lhe negárão todas as
faculdades, e sómente, como a os brutos, lhe concedêrão notavel apuramento do
instincto. A verdade não póde estar em nenhum destes extremos, e para acertar ou
pelo menos escapar mais vezes ao erro, o estudo e a critica dos escriptos antigos
dão em resultado uma apreciação, que se afasta de ambos esses extremos
. (grifo
meu).
117
Para Macedo, todos os costumes e usos dos gentios denunciavam “[...] um povo
na sua infância, homens rudes e selvagens, alheios á civilização; mas de nenhum modo
apenas um gráo acima do bruto, e incapazes de alguns nobres e generosos
sentimentos” (grifo meu) e justifica seus argumentos:
Vivendo vida de guerras e combates, que erão tanto mais encarniçados e horriveis,
quanto menos recente era a inimisade entre as hordas belligerantes, o gentio do Brazil
habituou-se á vingança, e quando a exercia, requintava na crueldade, levando-a até a
antropophagia; (que aliás, em algumas tribus não se observava) mas por maior que fosse
o gosto que achasse nesses horrorosos banquetes, jamais devorou um cadaver, que não
fosse de inimigo. Era antropophago por vingança
. (Macedo, 1861, p.65-66, grifo
meu).
Na defesa que faz do gentio, o objetivo era enfatizar que seus atos de crueldade
se faziam não por sua natureza, mas por necessidades ou regras tribais. Nos aspectos da
vida social, punha em relevo os valores de união e independência que neles via, o que
lhes garantia o prestígio de serem comparados, por Macedo, como um “povo guerreiro e
defensor de seu território”, passíveis de emergir “nobres e generosos” sentimentos de
amor à pátria, uma vez completamente civilizados.
Finalmente, agreste, simples, inculto e barbaro em seos uzos e costumes, [porém] zeloso
mais que tudo de sua independência, audaz e bravo nos combates, cruelissimo na
vingança, astucioso, sagaz e desconfiado pela necessidade, com todos os defeitos e
vicios do selvagem, com alguns sentimentos nobres e generosos, indolente na paz, e
impávido e grande em face da morte dada pelo inimigo, eis o que era o gentio do Brazil
debaixo de um ponto de vista geral.
(Macedo, 1861, p.66, grifo meu).
Ao tentar caracterizar o papel do gentio na formação do povo brasileiro,
identifica, em sua formação social, o sentimento de pertencer a uma nação, o que seria
um indicativo de virtude, mas que o estado de atraso civilizatório em que se encontrava
não permitia localizar no gentio um corpo político. Esse seria o único fator realmente
passível de deixar dúvidas ou não permitir esclarecer qual foi o peso da participação
efetiva do índio na formação da nacionalidade brasileira:
Mas apezar d´essa guerra interminavel, com que se dilaceravão as numerosas cabildas,
advinha-se que erão quasi todas ramos de um unico tronco: muitos dialectos de uma
mesma lingoa, que se chamou geral, erão faltados por um grande numero das hordas
encontradas no litoral, e ainda no interior do paiz: além d´isso a similitude mais ou
menos completa dos costumes, o mesmo horisonte limitado de idéa, a mesma indole, os
mesmos vicios, e as mesmas virtudes indicão que todas ellas formavão uma só nação;
não formavão porém um só corpo, ou se hostilizavão como inimiga encarniçada;
118
porque o atrazo immenso que mostravão em civilisação, condenava-as a viver sem
um governo sufficientemente regular e sem fôrtes laços sociaes. (Macedo, 1861,
p.72-73, grifo meu).
O colonizador, por sua vez, tinha em seu espírito civilizado os princípios
necessários a esse desenvolvimento. A ação dos colonizadores do Brasil entendida como
civilizadora e cheia de patriotismo, era vista como o único caminho para construção do
governo nacional:
[...] certo é que antes mesmo da volta de Martin Affonso de Souza para Portugal, D.
João 3
o
já se achava resolvido a effectuar a colonisação do Brazil, dividindo este paiz
em extensas capitanias hereditárias, e concedendo aos donatarios dellas previlegios de
uma importancia consideravel, para que assim viesse a ambição e a cubiça auxiliar o
seo governo naquella obra de patriostismo; e de feito poz em pratica este plano desde
o anno de 1534:
Cada um dos donatarios dessas capitanias recebeo à sua carta de doação, cada uma
desas capitanias e seo foral e nas disposições de uma e de outro ficarão marcados os
direitos e previlegios dos donatarios, os fóros dos colonos, e as reservas das
prerrogativas e do poder do soberano: fôrão immensos e apenas francamente limitados
os primeiros, sem duvida importantes os segundos, e indubitavelmetne bem fracas as
ultimas; e nesses direitos, previlegios, fóros e reservas achárão-se determinados todos os
fundamentos do primitivo systema de colosinação do Brasil
. (Macedo, 1861, p.84,
grifo meu).
A formação de um governo se iniciava no Brasil com a implantação das
capitanias hereditárias, permitia as primeiras manifestações de “núcleos de população
que tendião a desenvolver-se” acrescentava Macedo. No entanto, faltava a centralidade
do governo para organizar as capitanias de forma hegemônica.
Uma das primeiras e mais essenciais falhas da instituição das capitanias hereditárias, era
a independência e isolamento de cada uma dellas, era a falta completa de um laço
comum, que lhes assegurasse a garantia de um centro protetor, de uma cabeça que
pensasse nas providencias geraes, de um braço que por todos se armasse, e a cada uma
dellas deffendesse na hora do perigo. Esta falta as expunha aos mais serios riscos
tanto em relação ao exterior como ao interior. No proprio seio do paiz as sortidas e a
guerra feita pelos indios erão uma calamidade que ou se repetia ou podia-se repetir todos
os dias: do exterior vinhão frequentemente os francezes, e quiçá alguma vez os
castelhanos ameaçar os novos estabelecimentos, zombando dos fracos recursos dos
donatarios, acrescendo ainda que os francezes contavão em diversos pontos do litoral
com as sympathias do gentio
. (Macedo, 1861, p.108, grifo meu).
O combate aos “invasores” do território brasileiro foi também de fundamental
importância para a unidade do país, que viria a ser o Império, com seu povo e uma
identidade comum:
119
A expulsão dos francezes do Rio de Janeiro foi um acontecimento feliz e de maxima
importancia. O domínio da França em uma parte do Brazil importava uma divisão do
paiz nessa época, bem como no futuro, e portanto a quebra desse todo immenso e
prodigioso que fórma hoje o vasto imperio do Brazil, grande pela extensão e pelas
riquezas e não menos grande pela identidade da religião, dos costumes, da lingoa, e das
tendencias do seo povo, identidade que não existiria, se mais de uma nação o tivesse
colonisado
. (Macedo, 1861, p.34-135, grifo meu).
Ao colonizador que lutou pela unidade nacional, deve-se o registro honroso na
História da nação e a legitimação de suas ações de conquistas. Isso porque sua ação
contribuiu decisivamente para a construção da nação brasileira, que nasceria desse fato.
A magnitude dos perigos e difficuldades que em seo governo teve Mem de Sá de
vencer, os abuzos e vicios que soubre atacar e corrigir, a importancia da victoria que
alcansou sobre os francezes, as derrotas que fez provar os aymorés, e outros
selvagens, as aldêas em que reunio os indios amigos, e as providencias que tomou a
respeito das diversas capitanias, são serviços que não pódem ser esquecidos, e que
dão á Mem de Sá um logar honrozo e distincto na historia do Brazil colonial
.
(Macedo, 1861, p.135, grifo meu).
As Lições do volume I levam o leitor a uma idéia de que ao índio faltava
civilização, o elemento português teria vindo para civilizar esse grupo social e colocá-
lo na ordem moderna. Aí estaria a grande contribuição do colonizador, do homem
branco, para o progressivo desenvolvimento de um sentimento de unidade e
patriotismo, formando a base do que viria a ser “povo brasileiro”.
No volume II, encontram-se os demais elementos e fatos que levariam o Brasil a
constituir-se como nação independente. Nesse volume, há referências aos jesuítas, aos
negros e aos letrados. Por meio da narração de Macedo, verifica-se como ele definia o
papel de cada um na construção da nação brasileira.
Os jesuítas não teriam deixado uma memória importante na formação do Brasil,
dado suas atitudes de desafiadores da autoridade, o que tornava a sociedade instável
[...] por causa da gravíssima questão da liberdade e do cativeiro dos indios, servindo a
estes o proprio interesse dos jesuítas que em tais conflitos ai sempre brilhando com as
cores de uma santa filantropia
. (Macedo, 1863, p.103) .
Para encerrar os atritos entre os colonos e os padres, justificou a expulsão dos
últimos: “Sem discutir o direito inconstestável que assistia ao governo de Portugal para
120
tornar essa transcedente medida, é fácil demonstrar que ela foi útil e necessária ao
Brasil”. (Macedo, 1863, p.205, grifo meu).
Nessa linha de argumentação, de que os conflitos internos seriam e foram
prejudiciais à construção do Estado brasileiro e de sua identidade, é que os conflitos que
envolvem a escravidão não aparecem como temática importante.
Sempre numa atitude conciliadora dos acontecimentos políticos, ao referir-se ao
episódio “Quilombo de Palmares” assim se expressou Macedo (1863, p.166): “[...]
combates numerozos e profiados ilustram o valor dos paulistas e deram também
testemunho da constancia e da valentia dos atacados quilombolas”. (grifo meu).
Embora não tenha sido considerado um tema de significativa importância, o
texto de Macedo, no acontecimento de Palmares, exalta a ação dos negros, vista como
valentia e coragem, virtude que é diminuída ao longo do texto para atribuir aos paulistas
o louvor da vitória contra os escravos fugidos. Necessário arranjo discursivo para
mostrar a importância de desarticular qualquer conflito entre os integrantes da sociedade
brasileira na busca de sua unidade.
A guerra, no entanto, era bem vinda e necessária quando se tratava de defender o
território nacional. Por isso, o tema das invasões dos povos europeus teve maior espaço
na produção de Macedo, envolvendo questões que mereciam destaque por permitir,
segundo seu entendimento, ampla discussão sobre a noção de união e patriotismo.
Toma-se, aqui, o exemplo da invasão dos holandeses.
A luta contra os holandeses, em Pernambuco, é identificada como o marco
principal da existência de um sentimento de nacionalidade entre o colono, os índios e
inclusive os negros. Se esse sentimento não estivesse presente,
[...] hoje não formaria, como forma, um império vastíssimo e forte e unido pela
homogeneidade da religião, da língua, da educação, dos costumes, das aspirações e
tendências, da história de todas as suas provincias, laços de admirável e providencial
fraternidade, que podem ser invejado pelos mais orgulhozos imperios do mundo
.
(Macedo, 1863, p.145-146, grifo meu).
Num episódio de tão grande proporções para a História do Brasil, verificou-se,
segundo Macedo, o desabrochar das qualidades positivas (civilizadas) das duas raças
inferiores que, nesse episódio, manifestaram-se em alguns de seus representantes.
Um ano marcado por tão brilhante e inesperada vitória, acabou infelizmente cheio de
luto para os Pernambucanos porque em um dos últimos meses de 1648 faleceu no
121
Campo Real de Bom Jesus o bravo D. Antônio Filipe Camarão, vítima de uma febre
violenta, índio tão ilustre, tão hábil capitão e intrépido soldado, tão notável pelos
seus serviços, que merecera do rei Filipe IV a graça do título de Dom para ele e seus
herdeiros, o foro de fidalgo, o hábito da ordem de Cristo, com uma pensão pecuniária,
e a patente de capitão-mor dos índios
. (Macedo, 1863, p.168, grifo meu).
O nobre negro chefe [...] recebeu uma bala na mão esquerda, e continuou a bater-se
depois de amputar a mão ferida. (Macedo, 1863
, p.167, grifo meu).
Ao enaltecer a guerra contra os holandeses nesses aspectos e no número de
páginas dedicadas ao acontecido, Macedo estabeleceu esse episódio como o primeiro
momento em que, na História do Brasil, pôde ser visto o início da uma “consciência
nacional” se criando nessa união entre as raças, que formariam a nacionalidade
brasileira, cada um, no entanto, a seu modo e hierarquicamente constituída (Macedo,
1863, p.186-187).
Se esse acontecimento teria sido o ponto inicial, no qual as raças, transformada
em povo, uniram-se para o bem comum da nação, o próximo e de maiores proporções
foi a “Guerra de Independência” do Brasil. No espaço de tempo que integra o
nascimento do sentimento nacional e sua consolidação no “Dia do Fico”, Macedo
preencheu com os argumentos abaixo para justificar as primeiras guerras pela
independência que surgiram no século XVIII:
O Brasil tinha progredido muito no século décimo oitavo; os jovens brasileiros,
ambiciosos de instrução e de ciência corriam aos conventos, aos seminários, e às aulas
de humanidades que havia, para beber conhecimentos que aspiravam, e muitos deles
iam cursar a universidade de Coimbra, e outras academias da Europa; homens
notáveis como estadistas, poetas, oradores, artistas davam lustra e glória à
grande colônia, sua bela pátria; as comunicações do novo com o velho mundo
tinham-se tornado mais fáceis, livros franceses penetravam no pais e se espalhavam
por ele idéias novas, civilizadoras e livres enfim, a revolução emancipadora das
colônias inglesas da América era um exemplo que devia inflamar os corações dos
filhos das outras colônias européias do mundo de Colombo.
Assim, pois, não é de admirar que aparecesse no último quartel desse século a idéia de
independência de seu país, no espírito de alguns Brasileiros.
(Macedo, 1863, p.267-
268, grifo meu).
E aqui se completa o quadro da busca pelos elementos constituidores da
formação da nação, do Estado, do povo do Império brasileiro: os homens de saber, os
intelectuais, os estadistas, os homens políticos completam a noção de brasileiros. Esses
que, nascidos no solo americano, teriam seu sentimento nacional aguçado pelas leituras
que faziam sobre os idéias de liberdade, pátria e nação em seus estudos na Europa.
122
À coragem do colono, à valentia dos nativos e negros, somava-se o espírito
culto da geração que lutaria pela independência embora num momento em que ela ainda
não estava pronta a ser dada ao povo brasileiro. Exemplo máximo dessa manifestação
foi a Conspiração malograda em Minas Gerais de 1786-1792 que, apesar de não estar
em concordância com as circunstâncias do país, pois o “sistema de governo [se
apresentava] em manifesta desarmonia com a educação” (Macedo, apud Selma Mattos,
2000, p.116), tratava-se de um momento que mereceria o apreço dos brasileiros por seu
sentimento de patriotismo.
Plantavam-se, pois as idéias da independência, que germinaram ainda mais depressa
pela influencia da recente revolução, da nobre constância, do heroísmo e dos triunfos
das colônias anglo-americanas: o influxo desse patriotico acontecimento propagou-
se pelo mundo de Colombo, e veio excitar o ardor de alguns intrépidos e generosos
brasileiros. (Macedo, 1863, p.217, grifo meu).
Quanto aos seus integrantes, deveriam ser lembrados, pois, embora seus atos
tornassem os ideais de liberdade violentos e conflituosos, contrários “às conveniências
futuras do Brasil” (Macedo, 1863, p.225), suas ações foram por causas nobres.
[...] o alferes Joaquim José da Silva Xavier, Tiradentes, que considerado pela alçada
criminosos imperdoável [...] subiu à forca no dia 21 de abril de 1792, mostrando antes
e durante a execução a mais inabalável coragem, legando o seu nome ou antes sua
alcunha a essa conjuração, e ficando sua memória elevada acima de todos os seus
companheiros, pelo fulgor da coroa do martírio
. (Macedo, 1863, p.269, grifo
meu).
No conjunto dos conceitos que desenvolveu nas Lições de 1863, a idéia de Povo
é mais uma que vai se configurando paralelamente e à medida que o sentimento
patriótico vai ganhando força. Tal sentimento conduziria, enfim, ao processo de
independência em 1822. Caminho natural, porque conduzido pela vontade da
Providência, o Brasil seguiria nos seus objetivos de progresso e aspirações de liberdade
política. Esse povo, que deveria escolher o governo, necessitava fazê-lo no estado de
civilização em que se encontrava e, nesse caso, não era a república, mas, diante da
tradição que formava a identidade nacional, com índole passiva, amor pela natureza e
virtude civil e religiosa, era ainda a Monarquia o regime político mais adequado ao
povo brasileiro.
123
Um povo que se emancipa, tem de escolher o seu governo, e só acerta, quando o
governo que escolhe é a expressão das conquistas a civilização da época, e também
da sua índole dos seus costumes, da sua educação, porque está preparado para o
governo que se adota
. (Macedo, 1863, p.299, grifo meu).
A vinda da Família Real Portuguesa para o Brasil confirmaria o pressuposto de
que o percurso natural para a independência se fazia e de acordo com a índole do povo.
Povo, aliás, em processo de constituição e que tinha em seu tronco viril o português
civilizado. Por isso,
O Brasil [deveria] ser grato à memória do príncipe regente João que o amou, que lhe foi
útil, desejou-sê-lo ainda mais, que o elevou à categoria de reino pelo decreto de 26 de
dezembro de 1815, e que sempre manifestou a maior estima pelo país onde veio
encontrar mais sossego e independência, e que o surpreendeu em 1808,
apresentando-lhe, entre os seus filhos, estadistas, oradores, e artistas de um
merecimento superior e inconstável
. (Macedo, 1863, p.180, grifo meu).
Nessa passagem, inicia-se uma redução da presença e importância dos demais
elementos que integrariam o povo do Brasil. Os intelectuais, os estudantes, agora
tornados como “estadistas”, passavam a se configurar como os verdadeiros agentes que
levariam à emancipação política e à sua consolidação.
No final das Lições, aprende-se que a formação do povo se fez com os
portugueses – o civilizador – os habitantes naturais – os gentios e os africanos. Mas,
ainda que a nação é fruto da ação do colono que sempre defendeu o território e civilizou
os índios e os negros. A relação entre o colono português e o reino de Portugal dava a
prever as manifestações do nascimento de uma nova nação que, por sua singularidade,
integrar-se-ia ao grande movimento das nações européias pelo único elemento capaz de
realizar tal tarefa, o próprio colonizador.
Preparados, também, já se encontravam alguns ilustrados brasileiros, cujos
princípios de progresso e civilização seriam a causa de sua adesão aos ideais de
liberdade dos países da América. Ou seja, com a vinda da família real, desenvolvia-se,
aqui, uma forma de fazer política por homens ilustrados, capazes de representar o povo e
que teciam alta estima pelo país. Patriotas pela escolha, a eles caberia a tarefa de dirigir
o novo país sob a tutela do grande representante da genealogia da nação: D. Pedro.
[...] reconheceu [D.Pedro] que não lhe era possível contemporizar mais, que todos os
laços de união do Brasil com Portugal deviam ser definitivamente quebrados, e logo
alçou o grito majestoso Independência ou Morte! Grito que ali soltado no sempre
124
memorável 7 de setembro de 1822, retumbou dentro em pouco em todas as províncias
do Brasil
. (Macedo, 1863, p.328, grifo meu).
Esse modelo de escrita de uma História do Brasil feita em lições influenciou
vários outros autores do período, entre eles Luis de Queiróz Mattoso Maia e Annibal
Mascarenhas, que tiveram suas Lições adotadas no Paraná em 1898. Mattoso Maia
escreveu as Lições de História do Brasil a partir das aulas proferidas no Internato do
Imperial Colégio de Pedro II, quando ocupava a cadeira de História e Corografia do
Brasil, e Mascarenhas as Lições de História Geral, na década de 1890.
Como não se encontrou nenhuma edição da obra de Mascarenhas, ele não poderá
ser comentado neste trabalho. As únicas informações que se conseguiu a respeito desse
livro encontram-se na contracapa de um outro compêndio de sua autoria, o Curso de
História do Brasil publicado em 1898.
A Livraria Quaresma & Cia – Livreiros editores, por onde publicou o Curso,
referem-se às Lições no espaço reservado à divulgação de “obras do mesmo autor”.
Nele, informam que as Lições de História Geral foram “organisadas de acordo com o
actual programma approvado pela Inspectoria Geral de Instrucção Publica para os
Exames Gerais” e, sobre o compêndio, anunciam:
Este trabalho, que anda em manuscripto recebeu a approvação de numerosos e
habilitadissimos professores aos quaes foi apresentado, é o único que póde servir aos
examinandos de história, pois nelle encontrarão claras dissertações sobre todos os
pontos do programma para os exames, dissertações estas escriptas de accordo com o
espírito que dictou aquelle programma, e que tende a dar nova orientação dos estudos
históricos
. (Mascarenhas, 1898, nota dos editores)
Sobre os conteúdos das Lições relata:
Os pontos mais difficeis do programma, taes como os que se referem a prehistoria, aos
primeiros typos sociaes, a sciencia da historia, da qual se deduzem os dados
cosmologicos, physicos e payehologicos, foram tratados com toda a proficiencia e
orientação didactica pelo sr. ANNIBAL MASCARENHAS que, sem refolhos,
explanou esses variados assumptos de modo a facilitar a sua compreensão a todas as
intelligencias.
Descrevendo as antigas civilisações, o autor, para se conformar com o programma e
poder offerecer um livro de utilidade real aos estudades de historia, poz em evidencia a
influencia do habitat e a razão do apparecimento dos diversos factos historicos.
Podemos assegurar que sobre o assumpto não foi até hoje entre nós publicado trabalho
de tanta importancia, quer pelo methodo de exposição quer pela clareza da linguagem.
(Mascarenhas, 1898, nota dos editores)
125
O não acesso ao compêndio de Mascarenhas, por não ter sido localizado nos
centros de pesquisa em que se investigou, não permitiu sua análise, por isso passa-se
agora ao texto de Mattoso Maia.
3.4 As Lições de História do Brasil de Mattoso Maia
Embora Mattoso Maia tenha seguido o modelo pedagógico de Manuel de
Macedo, com a denominação dos capítulos e o princípio pedagógico de um compêndio
feito a partir de lições, ligando os conteúdos de História diretamente à sua prática
pedagógica, seu texto é diferente no que se refere à narrativa e opinião em torno de
alguns temas da História do Brasil.
Contemporâneo de Macedo, mas vivendo o período final do Império, a Maia é
permitido um olhar para o passado mais crítico, embora não divirja no fato de apoiar o
Império, no processo de constituição da História Nacional, como único caminho para a
unidade da nação.
Nascido no Rio de Janeiro e formado em medicina, Maia foi, além de professor
do Internato do Colégio desde 1876, Oficial da Imperial Ordem da Rosa, “por serviços
prestados em campanha na guerra contra o Paraguai como Cirurgião-Mor de Brigada em
comissão e Chefe da Ambulância Volante da 1
a
Divisão da Cavalaria” (Gasparello,
2004, p.133).
Suas Lições, publicadas na década de 1880, constam indicadas nos Programas de
Ensino do Colégio desde então até o final do século. No que se refere ao texto, Maia é
mais denso que Macedo, seu compêndio é composto por com mais de 400 páginas, é
minucioso, preocupa-se em apresentar divergências existentes entre autores com relação
às datas dos eventos considerados importantes.
Na descrição da origem e natureza dos índios, concorda com Macedo ao dizer
que a maior parte deles eram selvagens, hostis e bárbaros, embora com capacidades para
assimilar costumes civilizados. A diferença é que, para Maia, havia duas categorias de
índios: os de boa e os de má índole que concorreram positiva ou negativamente para o
processo civilizatório do branco.
126
Sem querermos adiantar sobre o que em lição especial temos de dizer sobre os
costumes dos Indios do Brazil, seja-nos licito referir desde já que os Guayanazes, a
cujas hordas pertenciam também, os Guarulhos, os Moramomis e os Ururahys, eram
uma das tribus menos ferozes que então dominavam no littoral e
circumvisinhanças. Não eram antropophogos, como a maior parte das tribus, que
devoraram os seus prisioneiros: habitavam em cavernas, onde entretinham sempre o
fogo acceso; tinham costumes brandos: acreditavam n´uma outra vida; dormiam no
chão em cima de folhas, e não em redes; viviam da caça e de pesca, não tendo
agricultura, nem animal domestico de qualidade alguma
. (Maia, 1886, p.42, grifo
meu).
Esses índios de boa relação aparecem desde o início do descobrimento do
Brasil, quando Maia relata os primeiros contatos que eles fizeram com os portugueses:
Dous indios, apanhados por Affonso Lopes em uma almadia, foram apresentados a
Pedro Alvares Cabral, que os tratou de melhor forma [...]. O bom acolhimento dado a
esses dous indios concorreu para que elles, quando foram postos em terra,
contribuissem para que se estabelecessem bôas relações entre os seus compatriotas e os
navios, ajudando mesmo os selvagens aos marinheiros no serviço de fazer aguada e
lenha para a esquadra. (
Maia, 1886, p.18).
A singularidade de Maia está na explicação que dá ao tratar do “estado de
civilização do índio”, ele o vê como um grupo social em sua fase pré-histórica.
Considerados nessa perspectiva, os índios teriam uma maior possibilidade de ter
contribuído mais diretamente para a nacionalidade brasileira do que em Macedo:
Em relação ao periodo de civilisação em que se achava o selvagem do Brazil na época
da chegada dos Portugueses, é versão corrente que elle achava-se no periodo da
chamada Pedra Polida, conhecendo o uso do fogo, e a arte ceramica, mas sem saber
fundir os metaes, [...]
Entre os monumentos pre-historicos da civilisação dos indigenas brazileiros,
citaremos a celebre collina artificial Ilha do Pacoval, na ilha de Marajó
[...]. (Maia,
1886, p.50).
Em Maia, o contato do índio com o branco civilizado permitiu aos primeiros
uma entrada mais rápida numa civilização mais avançada, esse seria o contributo da
“raça superior” à civilização nacional. Em algumas tribos, considerava ele que já existia
a noção de autoridade, de governo, um assunto que merecia atenção dada sua
importância para o conhecimento das diferentes formas de organização política de uma
sociedade:
127
O que mais deve admirar em todos esses assumptos de religão das diviersas tribus era a
autoridade absoluta que os pagés exerciam tanto no espiritual como em muitas
circumstancias temporaes, inclusive na maneira de viver da tribu a que pertenciam [...]
(Maia, 1886, p.60).
Mais a frente conclui:
Teria sido um bom meio de reconstruir em grande parte a história dos indios do Brazil a
coadjuvação dos pagés n´esse sentido; em algumas expedições guerreiras os
Portuguezes não se dedignaram de recorrer à influencia d´esses feiticeiros sobre os
indios alliados. (p.61).
O pajé era o governo da tribo:
Assim como os indios não tinham uma religião igual para todas as tribus, o mesmo lhes
acontecia quanto á fórma de governo. Em geral o chefe ou morubichaba, que
commandava com autoridade absoluta na guerra, durante a paz tinha também igual
infuencia
(p.61, grifo meu).
Para o processo de “evolução” da civilização indígena, concorreram
positivamente os jesuítas, que “desenvolviam o maior tino na cathequese e civilisação
do gentio” (p.96). Por isso, Maia foi contrário à expulsão da Companhia de Jesus do
Brasil.
Partilhamos nós a opinião d´aquelles que pensam que a Companhia de Jesus não devia
ser abolida, e sim reformada, não podemos deixar de apreciar o juizo de um historiador
insuspeito, tanto mais que era protestante, Roberto Southey, em relação á falta sensivel
que essa suppressão occasionou no Brazil, principalmente em referencia aos Indios,
muitos dos quais abandonaram a aldeia em que se tinham fixado e voltaram de
novo para a vida nomade e selvagem
. (Maia, 1886, p.222-223, grifo meu).
Na seqüência dos fatos, a guerra contra a invasão holandesa é assunto que, por
“[preludirem] acontecimentos de maior monta” (p.140), tomou grande espaço nas
páginas do compêndio de Mattoso Maia, iniciou na Licção XV e foi até a Lição XXI.
Nelas, a referência à união entre as raças marcou, também, o progresso do sentimento de
nação e unidade nacional na luta pela defesa da Pátria: “ [...] começou a guerra activa e
proveitosa de guerrilhas na qual foram brilhando o indio D.Antônio Filippe Camarão,
o preto Henrique Dias e os Capitaes Rebello, Souto e André Vidal de Negreiros” (Maia,
p.143, grifo meu).
No final da batalha, ganhou a Pátria com a união dos brasileiros:
128
A 27 de Janeiro de 1654, João Fernandes Vieira, André Vidal de Negueiros e outros
heroicos chefes da Insurreição Pernambucana entravam no Recife, onde se arvorava a
bandeira portugueza, e a História do Brazil registrava nos seus annaes uma das
brilhantes epopéas de amor da liberdade
(Maia, 1886, p.169, grifo meu).
A referência ao negro foi feita, além daquela linha em que se refere ao “preto
Henrique Dias” na luta contra os holandeses, apenas no acontecimento “Quilombo de
Palmares”. Como em Macedo, fez elogio à coragem dos escravos fugidos, embora
enaltecesse a ação dos paulistas:
Só em fins de 1695 ou principios de 1696 foi que o valente emprehendedor paulista
pôde concluir a sua tarefa, exterminando os quilombos. Para conseguir tão completa
victoria foi preciso que o governador e capitão general de Pernambuco, Caetano de
Mello e Castro, mandasse um corpo de exercito de 6 a 7000 homens com artilharia,
dispostos em 3 columnas [...]. O Zumbi, trahido afinal por um mulato, e atacado no
seu mucambo, onde lhe restavam apenas 6 homens, morreu pelejando com a maior
coragem
. (Maia, 1886, p.184, grifo meu).
Também no que se refere aos inconfidentes de Minas, destacou a influência
sofrida pelas idéias de liberdade vinda da Europa e dos Estados Unidos. Concordou com
Macedo quanto aos “nobres ideais”, ainda que não era tempo da liberdade no Brasil.
Entretanto, em Maia, esse fato ganhou uma explicação voltada para uma maior
exaltação dos sentimentos de patriotismo dos mineiros.
Eis a história resumida da primeira tentativa mallograda pela independência nacional, a
que tão injustamente se tem dado o nome de conjuração, emquanto não foi mais do
que um projecto de conspiradores, sem um plano definitivamente concertado [...] A
independência do Brazil era uma questão addiada para melhores tempos: não se
effectuou pelas combinações phantasticas dos patriotas mineiros
(Maia, 1886,p.235,
grifo meu).
Segue-se o registro dos acontecimentos que desencadearam o movimento da
independência em 1822, no qual se verifica o destaque à atuação dos homens políticos,
letrados que, junto com a figura de D. Pedro, tornaram-se personagens importantes na
constituição da nova nação. Considerados representantes legítimos da nacionalidade
brasileira, porque, oriundos dos colonos, eram portadores do progresso e da civilização,
elementos indispensáveis à formação de um povo civilizado.
Compêndio adotado no Paraná em 1898, nove anos vivendo a República, a
História Nacional foi, ainda, ensinada pelo compêndio de Maia nos moldes da
historiografia didática nascida no Império. Nele, reafirmam-se os princípios formadores
129
da nacionalidade que se encontram em Macedo: a nação é construída pelo português –
os colonos – raça superior e civilizada que, no processo de colonização do pais, integra-
se com o habitante natural – os gentios – e, mais tarde, com os negros trazidos da África
e seus descendentes.
Dessa junção de raças teria surgido o “povo” brasileiro, mestiço por sua
singularidade histórica e cuja índole e virtude fez do regime monárquico a opção mais
acertada para a consolidação de sua independência, sua nacionalidade, o Império do
Brasil.
No desenvolvimento dessas relações, no entanto, ganha destaque o homem
branco culto, o estadista, a quem deveria caber o exercício da representação política da
nação. Afasta-se do centro das decisões os “não civilizados”, constrói-se o conceito de
“cidadão ativo” e “não ativo” para designar as práticas de cidadania no período imperial.
Com a Proclamação da República, novos contornos foram dados a essa
produção didática. Os acontecimentos que se fizeram, como a abolição da escravatura, o
processo migratório e, entre outros, o desenvolvimento da indústria, acrescentaram
novos elementos para se pensar a nação e o povo brasileiro. A temática da formação da
nacionalidade ganhou centralidade a partir de 1900 no discurso historiográfico. Com
João Ribeiro, por exemplo, o tema da mestiçagem é tomado como ponto central de
análise em sua História do Brasil. Diz o autor: “O Brasil, o que ele é, deriva do colono,
do jesuíta e do mameluco, da ação dos índios e dos escravos negros”. (Apud,
Gasparello, 2004, p.168).
A questão étnica tornou-se complexa nesse novo quadro de relações sociais.
Porém necessitava ser enfrentada, dada a imperiosa tarefa de apontar o caráter nacional,
o que se faria através da definição do que era o povo que, a partir de 1889, adentrou num
novo regime político e que, embora com os traços da sociedade anterior, trazia os
libertos e os imigrantes como prelúdio para se repensar a formação do povo e sua
incorporação na nação republicana.
A nação, já existente como território independente, traz para o centro do debate
a existência do ser nacional, do cidadão da república. Nesse aspecto, supostamente
composta de “homens livres” estava, enfim, a sociedade brasileira, restava apenas, no
entender de parte dos republicanos, que os homens de letras ampliassem a discussão em
torno da nacionalidade e da cidadania.
O tema da incorporação do povo às práticas de cidadania encontra-se nos
diferentes discursos republicanos e, com ele, as propostas de redefinição de nação e de
130
pátria. Segundo Rocha (2004, p.20), isso ocorreu já no debate que a primeira geração de
críticos da monarquia fez em torno da “incorporação do povo à nação”.
Um conceito ainda em construção, dado às mudanças que se processavam no
final do Império, é o que faz entender, por exemplo, a preocupação de Alberto Torres,
político republicano e crítico da chamada primeira república (Rocha, 2004), que, em
1902, reclamava: [...] este Estado não é uma nacionalidade, esse país não é uma
sociedade, essa gente não é um povo. Nossos homens não são cidadãos”.(apud
Schwarcz, 2001, p.53, grifo meu).
Verifica-se que esses debates que se travavam em torno da idéia de povo, nação,
pátria e cidadão, nos anos iniciais da República, tinham como conseqüência, diferentes
concepções criadas em torno desses conceitos, que variavam a depender da imagem que
se tinha de uma prática política republicana, de tal forma que Alberto Torres é apenas
um exemplo dessa manifestação teórica e política.
Nesse sentido, vários trabalhos, Carvalho (1987;1990); Perissionotto (1994);
Costa (1999); Oliveira (1990), entre outros, já mostraram como era abrangente o
conjunto de teorias em torno de questões como a manutenção da ordem pública, o papel
do governo nos diferentes setores da sociedade, os limites da ação social, incluindo do
movimento operário, dos partidos políticos e da administração burocrática.
Ao procurar formar a República brasileira, as classes dominantes retomaram o
tema da nacionalidade e da identidade nacional e construíram conceitos baseados em
visões particularizadas desses temas. Levando em conta o papel dos letrados nesse
sentido, de acordo com Oliveira (1990, p.76), a eles coube a reflexão sobre a questão:
“desde quando somos uma nação?”. Ou seja, no pensamento de autores que produziram
seus trabalhos entre 1870 e 1914, entre eles Tobias Barreto e Araripe Junior, só para
citar nomes conhecidos, foi dominado pelo sentimento de atualização e pela idéia de
modernização do país.
Verifica-se, na construção teórica desse período, que a temática da nacionalidade
e seus congêneres não estava apenas nos textos de historiografia, mas em todos os
campos de produção do conhecimento. É nesse quadro de produção intelectual que se
configura uma nova historiografia em torno da questão nacional e, nela, o tema da
formação do cidadão. No campo da produção da historiografia didática, o termo povo
passa a ser mais presente nos textos de História, mas ainda sem nenhuma ligação direta
com o conceito de cidadão, embora, em Martius, o termo apareça claramente e
relacionado ao colono:
131
O historiador deve transportar-nos à casa do colono e cidadão brasileiro; êle deve
mostrar-nos como viviam nos diversos séculos, tanto nas cidades como nos
estabelecimentos rurais, como se formavam as relações do cidadão para com seus
vizinhos, seus criados e escravos; e finalmente com os fregueses as transações
comerciais
. (Martius, 1845, p.198, grifo meu).
A preocupação com a formação da nacionalidade renasce com a República
porque parecia necessário para a classe dirigente reforçar a coesão nacional, agora em
torno dos valores republicanos. Embora as propostas de formação e ampliação da vida
cívica tenham sido pauta dos debates, a Constituição de 1891, apesar de afirmar que são
cidadãos brasileiros todos os nascidos no Brasil, naturalizados brasileiros, pontua, ao
mesmo tempo, que nem todos poderiam ser eleitos
8
. Nesse sentido, a República
eliminou o voto censitário, mas limitou as práticas de cidadania aos analfabetos que era
a maior parte da população.
No Paraná, será com Dario de Castro Vellozo e seu impulso republicano que o
termo cidadão se ligará mais claramente aos conteúdos da História escolar. Esse autor
envolveu-se com o movimento abolicionista e com o republicano; iniciou uma carreira
como homem de letras e adquiriu grande reputação literária entre os letrados
paranaenses. Como professor do Ginásio Paranaense e Escola Normal, atuou na cadeira
de História Universal e escreveu um compêndio didático que foi adotado na instituição
por um longo período. Por esse motivo, é tido como um representante da produção
didática de História no Paraná no período inicial da República, juntamente com outros
autores, como Rocha Pombo e Sebastião Paraná.
5. As Lições de História de Dario de Castro Vellozo
O Paraná, no final do Império, assistiu a uma significativa expansão editorial,
para a qual coincidiram motivações econômicas e culturais que possibilitaram maior
8
A Constituição Política do Estado do Para, promulgada em 7 de abril de 1892, anuncia em seu Título V,
Capítulo I, art.108: “Terão direito de voto nas eleições acima mencionadas (para deputados, governador, vice-
governador, membros dos governos municipais e juizes distritais) os cidadãos brazileiros, maiores de 21 annos,
que souberem ler e escrever”. No artigo seguinte lê-se: “São elegiveis todos que podem ser eleitores, salva as
restricções estabelecidas nesta Constituição e lei regulamentar” (Freire, 1898, p.553)
132
produção intelectual seja no campo jornalístico, com a ampliação desse meio de
comunicação
9
, seja no campo da leitura e ensino, realizado por uma pequena parcela da
população que tinha acesso à leitura de uma forma ou de outra
10
. Segundo DeNipoti,
(1998, p.12)essa expansão que se verificou, no Paraná, no período republicano, “[...]
[assumiu] uma aura sacralizada, à medida que o livro e a leitura eram enquadrados em
esquemas de salvação nacional, ou de caminhada rumo ao progresso inevitável da
civilização”.
Com os ideais republicanos de construir uma sociedade representada pelo seu
povo, a vida intelectual tornou-se um “fazer político” e aqueceu os debates em torno das
idéias de liberdade, progresso, democracia e cidadão. Esse clima de “efervescência
intelectual”, serviu “como causa e sintoma da agitação intelectual pela qual o Estado
passou, tanto no campo político, quanto no estético e no social” (DeNipoti, 1998, p.13).
Na capital do estado paranaense, vivendo essa “efervescência cultural” de que fala
o autor, Dario Persiano de Castro Vellozo tornou-se, segundo os seus biógrafos
11
, um
atuante intelectual voltado para as idéias de mudanças sociais. Nascido no Rio de
Janeiro em 1869, cursou o Liceu de São Cristóvão de 1880 a 1883. Seu primeiro contato
com o universo da prática da escrita foi como encadernador e tipógrafo naquele
município. Veio para Curitiba em 1885, quando tinha 16 anos, e continuou seus estudos,
de 1886 a 1889, no Partenon Paranaense e no Instituto Paranaense. (Martins, s/d, p.77)
No Paraná, exerceu a burocracia do Estado de 1889 até 1898 em Curitiba. Deste
ano em diante, foi professor, no dizer de Romário Martins (s/d, p.78), “dos mais
notáveis entre nós” no Ginásio Paranaense e Escola Normal. Intelectual renomado pelas
atividades de leitura, escrita, ensino e debates desenvolvidos em torno de temas de sua
época, em função de ter vivido num momento marcado por um complexo de idéias
republicanas e de liberdade. São de sua autoria: Primeiros Ensaios (contos); Efêmeras
(versos); Esquifes (contos); Voltaire (polêmica e crítica); Moral dos Jesuitas (polêmica);
Sólio do Amanhan (romance); Da tribuna e da Imprensa; Pelo Aborígene (em
colaboração com Júlio Perneta): Pour l´Humanité; Compêndio de Pedagogia; Templo
Maçonico; Alma Penitente (poema); Rudel (poema); O Habitat e a Integridade
9
Após a Proclamação da República, surgem novos jornais no Paraná, além do Dezenove de Dezembro, pode-se
citar: A Tribuna, fundada em 13 de julho de 1889, dirigido por Benedito Carrão; A República, que fundado em
15 de março de 1886, continuou a publicar no período republicano; Pátria Livre, de Albino Silva; Quinze de
Novembro, iniciado em 24 de novembro de 1889 e tendo como redator-chefe Leôncio Correia. (Pilotto, 1976).
10
Nos fins do século XIX e início do XX no Paraná, verificou-se um relativo aumento na procura do curso
secundário no Ginásio Paranaense, que passa a ser organizado pelo tempo de sete anos.
11
Pereira (1998); DeNipotti (1998): Cordiolli (1989).
133
Nacional; Livro de Alir; Atlântida e, entre outros, Lições de História (Martins, s/d,
p.78), que foi adotado no Ginásio Paranaense e Escola Normal em 1905. Não é mero
acaso o fato desse paranaense estar sendo estudado por alguns pesquisadores
conterrâneos atualmente.
Pereira (1998, p.29), preocupado com o desenvolvimento das idéias positivistas no
Paraná da I República, refere-se a Dario com essas palavras:
Fundador do Instituto Neopitagórico
12
: o Templo das Musas, apaixonado pela beleza
helênica desde os tempos em que foi professor de História Universal no ginásio do
Estado, foi também fundador do Centro de Letras do Paraná, e será um dos principais
escritores paranaenses a defender a forma republicana e a tecer uma série de críticas
com base no positivismo, à Monarquia. Não bastassem tais elementos a 13 de maio de
1891 Dario Veloso faz um pronunciamento no Club Curitibano sobre a abolição da
escravatura e sobre a República, segundo ele as duas grandes idéias cívicas da
mocidade brasileira da época.
(grifo meu).
Também DeNipoti (1998) dedicou várias páginas a Vellozo em sua tese de
doutoramento ao tratar do “mundo da leitura” no Paraná da virada do século. Identifica-
o como um importante intelectual na difusão de saberes e idéias republicanas pela sua
atuação como membro de clubes de leitura (Club Litterario, Club Coritibano); fundador
do Instituto Neopitagórico; do periódico Cenaculo e como professor e autor de obras
didáticas e de literatura. Em trecho de sua tese, lê-se: “Embora nem todos os leitores
fossem tão profícuos ou dedicados como Dario Vellozo, muitos deles deixaram pistas
sobre suas leituras nessas instituições [...]” (DeNipoti, 1998, p.104, grifo meu).
O período cultural em que Vellozo viveu foi marcado por leituras, que faziam
nos clubes e nos encontros no Instituto Pitagórico, de autores como: Bernardin de Saint-
Pierre; Lycio de Carvalho, Guglielmo Libri; Silveira Neto, Andrade Muricy; Stuart-
Mill; Joaquim Manoel de Macedo e José de Alencar; Machado de Assis; João Ribeiro;
Joaquim Lacerda; além dos clássicos da Antigüidade como Cícero, Tito Livio, Sócrates,
Pitágoras, entre tantos outros (DeNipotti, 1998, p.158 a 177).
O compêndio Lições de História foi publicado em 1902 pela primeira vez.
Informa DeNipotti (1998, p. 45) que a segunda edição foi de 1904 e a terceira de 1919,
12
Instituição fundada por Dario Vellozo em Curitiba cujo fim era o “estudo [do] desenvolvimento das faculdades
superiores do Ser, ao altruismo, inspirado nos Versos de Ouro de Pitágoras, para a Cultura, para a Verdade, para
a Liberdade, para a Paz, para a Fraternidade e para a Harmonia. [Não conhecendo] o I.N.P. distinções de raça,
nacionalidade, fortuna e posição social, nem de credo religioso, filosófico ou político, [tendo] como princípios
fundamentais: A Amizade – por base; O Estudo – por norma; O Altruismo – por fim” ( Vellozo, 1948, contra-
capa).
134
com reedições subseqüentes em 1943, 1944, 1948 e 1949. DeNipotti informa, ainda, que
as três primeiras edições do compêndio traziam impressa a aprovação da Congregação
do Ginásio Paranaense e Escola Normal.
A origem da obra, entretanto, foi anterior a 1902. Ela teve início em 1900
quando, em ata da Congregação de 16 de março, é nomeada uma comissão para “dar
parecer a respeito da sumula da Historia Universal de Dario, que requereu auxilio para
publicar a mesma. O Título da obra seria Lições de História Universal” (Acta da
Congregação de 16 de março de 1900, p.47). Três dias depois, a comissão apresentou
seu parecer favorável a Dario. “Considerou-se uma síntese brilhante, escrita em
linguagem simples e luminosa, ao alcance da mocidade e organizada de accordo com o
programma oficial da matéria” (Acta da Congregação de 19 de março de 1900, p.52).
Após a aprovação da Congregação, o livro seria publicado dois anos depois com o título
Lições de História, mas só apareceu como livro a ser adotado no Ginásio Paranaense e
Escola Normal em 1905 (Acta da Congregação de 1905, p.32).
Seu compêndio de História encontrou eco em um meio bastante fecundo, no qual
a palavra impressa marcava o comprometimento com idéias de nação, pátria,
civilização, arte, ciência, progresso, civismo. Segundo DeNipotti (1998, p.44): “Seus
esforços pedagógicos, aliados às suas preocupações com a formação teórica e prática do
cidadão, além de seu perfil intelectual, levaram-no a fundar, em 1913, a Escola Brazil
Civico, na cidade de Rio Negro, ao sul de Curitiba”.
Essa observação é importante porque indica que, ao tentar compreender a relação
que se estabeleceu entre ensino de História e formação do cidadão no Paraná, encontra-
se nesse intelectual, que atuou ativamente no campo educacional, uma concepção de
História que permeou o universo cultural da sociedade paranaense no início do XX.
Nela, pode-se localizar mais explicitamente indícios dessa relação, uma vez que Dario
era representante das idéias de incorporação do povo à vida política da nação.
Sua importância como personalidade intelectual de uma época, evidenciada pelos
autores que estudaram sua trajetória intelectual e por seus contemporâneos letrados,
permite reconhecer em sua obra a veiculação de idéias que se processavam no Paraná e
que marcaram os novos ideais de nação e identidade do povo brasileiro.
O livro didático Lições de História, que neste trabalho se analisou, corresponde à
edição de 1948. Nele, seus conteúdos são estruturados de forma a mostrar como, na
história da humanidade, os homens foram passando de um estado primitivo e pré-
histórico para um estado mais evoluído, constituindo-se de diferentes estágios de
135
civilização. Trata-se de um compêndio de História Universal que, de acordo com a
cronologia clássica, divide a história da humanidade em pré-história, História Antiga;
Idade Medieval e Tempos Modernos. Diz Dario: “História é o estudo através dos
tempos. Divide-se a História em: Antiga, Média e Moderna” (Vellozo, 1948, p.3).
As principais lições que compõem o livro referem-se aos diferentes momentos
ou estágios de civilização pelo qual passaram os povos, desde a pré-história até a
modernidade, introduzindo, no decorrer na narrativa, conhecimentos sobre a América
nessa história geral.
A História escolar é entendida como uma matéria dotada de conhecimentos do
passado, mas útil para o presente. De cunho positivista, ao estudar a evolução e o
progresso científico e material dos grupos sociais, ensina ao aluno como os homens se
desenvolveram política, social, econômica e culturalmente, bem como os erros e acertos
cometidos nessa evolução.
Voltada para os fatos políticos, é através das ações de grandes figuras humanas
que vão se formando as grandes civilizações como a Grécia e Roma. Na cronologia
desenvolvida por Vellozo, seria na Antigüidade clássica que estaria o exemplo mais
acabado da constituição de uma vida política organizada nos moldes da mais avançada
civilização. Em sua compreensão, na Antigüidade, encontrava-se o princípio de união
como força do Império, encontrava-se ciência desenvolvida, regime de governo
democrático e vida pública plena.
Pretendia Alexandre reunir o Oriente ao Ocidente, estabelecendo império universal.
Fundara 70 cidades; buscava difundir a língua grega; assimilava a civilização dos
povos Orientais. Sábios gregos classificavam as plantas e os animais, e estudavam as
regiões que o exército macedônio percorria. A morte veio cortar os projetos de
Alexandre, desmembrou-se o império, repartidos pelos generais: a Ptolomeu coube o
Egito; a Seleuco a Síria; a Lisímaco a Trácia.
(Vellozo, 1948, p.44).
No aspecto da vida política, é ressaltado o papel dos compatriotas como
fundamental para o desenvolvimento da Pátria, do sentimento de patriotismo e a
construção de um centro político forte:
A divindade revela-se amiga dos mortais; a Grécia é feliz, porque é amada dos deuses.
Orfeo institue os Mistérios, estabelece o culto, faz da religião fator da Pátria. O culto é
nacional, os heróis são celebrados nas festividades públicas, nos Jogos Olímpicos
.
(Vellozo, 1948, p.36).
136
Mais a frente complementa: “O espartano educa-se para a Pátria”; “O
espartano apenas conhece uma carreira digna do cidadão: a das armas; não teme o
inimigo, despreza a morte”. (p.37, grifo meu). Em Atenas, o princípio cívico era o
mesmo:
O povo exercia soberano influxo. A família tornou-se mais íntima; o casamento
constituia a base da família; a criança recebia no lar bons exemplos e sadios
ensinamentos; os cidadãos trabalhavam pela dignificação da Pátria
. (Vellozo, p.38,
grifo meu).
Por esses motivos, a Grécia era uma grande nação guerreira, uma grande Pátria militar:
Quando Xerxes, sucessor de Dario, invadiu a Grécia, 481 a.C., com um exército de um
milhão e setecentos mil homens e uma esquadra de cerca de mil navios, encontrou a
Grécia aliada, na defesa do solo pátrio, contra o inimigo comum. Espartanos,
Tebanos, Atenienses estavam coligados; a Helade fizera-se autônoma: seria invencivel
.
(Vellozo, 1948, p.39-40, grifo meu).
Roma também tornou-se um grande império da Antigüidade porque “todo
romano válido tomava armas na defesa da pátria”. (Vellozo, 1948, p.54). A
decadência, por sua vez, ocorria por causa das rivalidades entre os povos, a guerra civil
e o desmembramento do território pátrio. Ao relatar o declínio de Roma, anota Vellozo
(1948, p.61): “De Cômodo a Diocleciano são guerras civis, é anarquia militar.
Imperadores indignos sucedem-se arrastando o Império a todas as degradações. É a
agonia”.
No feudalismo, o fator de civilização foi encontrado na cavalaria:
Surgiu a cavalaria na sociedade feudal; foi fator de civilização: suavisou os costumes,
dignificou a mulher, honrou a amizade. Era pacto estabelecido entre juventude para
render culto à bravura, ao brio, à lealdade.[...]. A Cavalaria tornou a guerra menos
cruel, defendeu os oprimidos e os humildes, exaltou os sentimentos afetuosos.
(Vellozo, 1948, p.83).
Com a “queda do feudalismo”, uma nova era se instaura e a principal mudança
que a memória do estudante deveria reter eram as novas relações sociais que, aos
poucos, constituíam-se baseadas em novas leis e num contrato social entre as classes:
Variavam os direitos dos burgueses; algumas cidades tinham obtido o de si mesma se
governarem. Assim se estabeleciam as comunas. Os direitos da burguesia aumentavam á
proporção que enfraquecia o poderio dos senhores.
137
A comuna tem o direito de guerra [...].Possue um selo para autenticar seus atos, [...] O
conselho comunal reune-se em edifício próprio. Há tribunal de justiça que julga os
delitos e impõe penas. A comuna melhora a condição do servo que vai conseguindo
carta de franquia; contribui para a formação do povo
. (Vellozo, 1948, p.86-87,
grifo meu).
Mais a frente, uma referência à formação do povo no desenvolvimento das
cidades modernas e uma crítica à Monarquia:
O povo, que se formava, graças á liberdade que os antigos servos gozavam nos burgos,
entra a sofrer a opressão e o despotismo, dos burgueses ricos. Este despotismo,
intensificado no regime monárquico que lhe seguiu, congraçadas as duas nobrezas em
causa comum, criou na plébe células de reação, que se foram propagando atravéz dos
séculos e constituiram um dos fatores da grande revolução de 1789
. (Vellozo, 1948,
p.87).
Considerado a “aurora dos tempos modernos”, o tema “Descobrimentos
Marítimos” abre o período moderno com a Lição XXVII. Nela, uma síntese de alguns
fatos da História de Portugal é elaborada até chegar ao descobrimento da América e do
Brasil, que também é tratado de forma sintética na Lição XXVII ( p.92 a 95).
Faz parte do período “Tempos Modernos” o movimento da Renascença e as
Lutas Religiosas, onde ganha destaque e mais laudas na lição o aspecto cultural e
artístico desses eventos. No entanto, é a “Revolução Francesa”, Licção XXXII, que é
considerada o grande marco do processo civilizatório da humanidade nesse período,
visto que foi com ela que
A ciência expandia-se; ideais surgiram, libertários e generosos. O povo interessava-se,
aplaudia, seguindo a nova corrente de opiniões, fator precioso de sua emancipação, de
seus direitos. Esse intenso reagir contra os abusos do antigo regime, contra os
prejuizos de classes, contra a suzerania; em pról do povo que sofria e tinha igual
direito à vida, à liberdade, à civilização: chamou-se Revolução Francesa
.
(Vellozo, 1948, p.110, grifo meu).
Na narração dos acontecimentos de 1789, verifica-se a crítica à Monarquia e o
favoritismo pela República como princípio político de Vellozo. Na passagem em que
trata da ação de Napoleão I em 1804, transparece sua opção:
A república era extinta; mas, os ideais dos Enciclopedistas e as conquistas
emancipadoras da Revolução se perpetuariam, constituindo inalienavel dote da
Humanidade.
As grandes reformas não foram anuladas, os direitos do homem entraram na
constituição dos paises modernos.
138
Foi o início da nova ordem social, a base da civilização do século XIX. (Vellozo,
1948, p.112-113).
As lições terminam com informações sobre a América. Na Lição XXXIV,
destacam-se as civilizações consideradas mais avançadas do continente, entre elas a dos
Incas é a indicada como a mais evoluída em civilização. Na seqüência, critica a
“exploração” que ocorre no continente americano pelo europeus.
Bandos armados de aventureiros, algumas vezes impelidos pelo amor da glória, sempre
pelo ouro, foram avassalando a América, reduzindo as populações aborígenes à
servidão, empregando-as no trabalho das minas. A crueldade era norma
. (Vellozo,
1948, p.126).
No mesmo tom, trata da escravidão negra:
Procuraram os colonizadores substituir o braço indígena por outro instrumento de
trabalho que fizesse prosperar a lavoura. Começou o tráfico, uma das páginas mais
negras da história da humanidade. Os africanos eram arrancados à terra natal e trazidos
à América, em grandes levas, distribuidas pelos engenhos e fazendas
. (Vellozo, 1948,
p.128).
Na pequena passagem do texto que segue, nota-se o princípio da mestiçagem
como constituição do povo americano:
O cruzamento com os naturais estabeleceu-se aparecendo o mestiço, em cujas veias
corria não raro o sangue europeu.
A população das colônias crescia, em grande parte composta de mestiços.
(Vellozo, 1948, p.129, grifo meu).
A esse povo mestiço, é atribuída a virtude da luta pela independência que se
processou no século XVIII:
Os laços com as metrópoles afrouxavam, à proporção que novos elementos de
vitalidade se formavam, e usos e costumes divergiam. Reações foram surgindo, a idéia
de emancipação acentuou-se, proclamando as colônias a independência
. (Vellozo,
1948, p.129).
Ao encerrar sua lições com o tema da independência, o caso Norte Americano é
tratado com profunda admiração: “Washington, alma e cérebro da causa emancipadora,
num belo surto de entusiasmo e gratidão nacional, foi eleito por unanimidade, primeiro
presidente dos Estados Unidos, 1789”. (Vellozo, 1948, p.132).
139
Quanto à independência sul-americana, poucas palavras resumem sua história.
Em apenas uma página relata o acontecido: “à independência dos Estados Unidos,
seguiu-se a emancipação da América Latina. A grande revolução francesa levara
intensas vibrações a todos os povos que se orientavam, procurando fazer-se autônomos
e livres”. (Vellozo, 1948, p. 133).
A referência ao Brasil se faz nessa frase: “O Brasil, em 1822” (Vellozo, 1948,
p.133).
Não parece duvidoso afirmar que a Revolução Francesa e seus ideais de
constituição de povo soberano, de nação livre e direitos humanos sejam as bases do
pensamento histórico de Vellozo para identificar uma grande nação civilizada. A
nação, por sua vez, exprimiu-se no grande sonho humanitário da existência do cidadão
republicano, é nesse sentido que, inicialmente, liga-se o tema da formação do cidadão
ao ensino de História no Paraná através de Dario de Castro Vellozo.
3.6 Historiografia didática e construção do texto escolar de História no Paraná
A conjuntura social e institucional da produção da História escolar no Brasil no
século XIX permitiu identificar que a construção do discurso da historiografia didática
se fez numa perspectiva política. Com base na vida política do país, os demais aspectos
da vida social parecem dela derivar, por isso a historiografia didática faz inúmeras
referências ao povo brasileiro em formação. Isso explica a perspectiva que a análise
tomou quando procurou relacionar discurso político e educação escolar.
Considerando, no entanto, que a historicização da disciplina não se esgota na
apresentação de seus conteúdos, mas deve incluir também a abordagem dos seus
diversos elementos constituintes, como os objetivos e o método de ensino presentes na
materialidade do livro didático, segue uma sumária reflexão em torno desses aspectos.
Nesse sentido, os objetivos da História, explicitados na análise dos conteúdos dos
compêndios, revelaram, também, o método de ensino fundamentado pela estratégia
discursiva do livro texto, organizado em forma de Lições.
O modelo de livro didático de Duruy e Macedo marcou a forma metodológica
do ensino no curso secundário e da Escola Normal no Paraná. Integrada num currículo
de formação e preparação da elite para seguir os cursos superiores, a disciplina de
140
História nessa instituição, que unia os dois cursos, passou a ter uma função pedagógica
mais definida no decorrer do final do século XIX. Com o predomínio do curso de
preparatórios, o método de ensino desenvolvido nas Lições se integrava aos objetivos
específicos do curso de formação política dessa elite.
Diante desse objetivo que fundamentou a instituição, a História Universal e,
posteriormente, das Civilizações, norteou os conteúdos ensinados na História nacional,
informando como se constituíram as nações européias, e História do Brasil, em seu
destino como nação civilizada. Nesse trajeto, a organização textual do compêndio de
Duruy e das Lições dos compêndios brasileiros analisados foi examinada em relação à
estratégia textual de construção do discurso da formação do povo brasileiro.
O modelo elaborado por Macedo, por meio de lições, aproxima-se da estratégia
de organização textual do autor francês. Na versão traduzida do Abrégé d´histoire
universalle, embora não esteja explicitado que sua divisão se faz por lições, trata-se da
prática de anunciar, logo após o título da lição ou aula, os tópicos de que tratará o tema,
construindo assim, unidade ao discurso pedagógico da disciplina escolar. Essa forma
pedagógica, pode-se afirmar, tornou-se uma característica da materialidade dos
compêndios do século XIX, nos quais ficaram reunidos o texto construído e a forma de
ensinar.
No caso do Compêndio da História Universal de Victor Duruy, os conteúdos
foram organizados tomando-se por base os grandes tempos históricos pelos quais se
ordenou o processo linear de desenvolvimento dos fatos considerados centrais na
constituição das nações. No índice do texto em francês, a forma como os temas foram
apresentados é reveladora. O título Table des Matières comunica ao leitor como está
organizado o Abrégé d´histoire universalle, como segue:
TABLE DES MATIÈRES
HISTOIRE ANCIEENE DE L´ORIENT
I - Les Origines – La terre. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1
L’ homme. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
Les races humaines et les langues. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
La race noire et la race jaune. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 6
Le race blanche:Aryens et Sémites. . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 7
Premiers foyers de civilisation. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
Les livres primitifs. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Fonte: Victor Duruy, Abrégé d’ histoire universalle.
141
No final de cada unidade ou período da História, encontra-se um Résumé (da
História Antiga, Média, Moderna e Contemporânea), sintetizando a história política
daquele período estudado. Estratégia textual que visa a compreensão mais rápida e
sumária do conteúdo escolar.
A estrutura das Lições de Macedo já foi analisada por autores como Selma
Mattos (2000); Melo (1997) e Gasparello (2004). Todos eles concordam que sua
organização textual materializa seu método de ensino. Esse possui, na apreciação de
Gasparello (p.131), dois movimentos principais: a exposição da matéria e a síntese, que
seriam
Movimentos ou atividades mentais que corresponderiam aos momentos da aula: uma
leitura do texto e um resumo do mesmo em forma de quadro sinótico, com os principais
elementos e seus atributos contidos na lição. Assim, a cada texto da lição, segue-se um
Quadro Sinótico, com as seguintes colunas: “Personagens”; “Atributos”; “Feitos e
acontecimentos” e “Datas”. (Grifos da autora).
O registro dessa análise indica e reafirma o suposto apontado por Goodson
(1990) e Chervel (1990) de que a disciplina escolar tem um perfil próprio se observado
em sua relação com a “ciência de referência”. A disciplina escolar, embora possam ser
verificadas inter-relações com o conhecimento científico ou acadêmico, resulta das
práticas educativas cotidianamente desenvolvidas por professores e alunos no processo
de difusão de seus conteúdos e de sua apropriação no ambiente escolar.
Neste trabalho, apesar de não se ter realizado essa comparação, verificou-se, no
que se refere às relações entre as propostas para o ensino da História no curso
secundário e normal no Paraná, que mesmo que ambos os cursos tenham, na prática,
utilizado os mesmos professores e compêndios, no campo do debate e do discurso
político havia sempre a preocupação em oferecer um caráter mais específico ao curso
normal. Ainda que não tenham sido encontrados dados das práticas conjuntas, é possível
supor, pela organização curricular e a legislação que normatiza os cursos, que o ensino
de História do Brasil na Escola Normal assumiu um caráter específico de preparação
para a prática no ensino primário quando de seu curto período de funcionamento.
A articulação entre as disciplinas escolares na instituição paranaense mostrou-
se complexa não só em relação às disciplinas acadêmicas, mas também no que se refere
a suas relações nos diferentes graus de ensino. Nesse caso, o que definiu ou marcou as
finalidades do ensino de História, pondo em relevo determinados conteúdos e na
142
“sombra” outros, foi a esfera de aprendizagem e os objetivos mais gerais da disciplina
escolar.
Nesse sentido, a História do Brasil no curso secundário serviu para possibilitar
às futuras gerações pertencentes à elite informações sobre como conduzir a pátria ao
destino de uma “grande nação”, não sendo possível construir um conteúdo de História
nacional fora das suas relações com a Europa. Na Escola Normal, por sua vez, a História
do Brasil constituiu-se no locus do ensino dos saberes históricos, destinada,
fundamentalmente, a construir um discurso de formação da identidade nacional valendo-
se do desenvolvimento dos sentimentos de “amor à Pátria”. Nesse aspecto, a
memorização dos fatos considerados importantes, como o “descobrimento do Brasil”, a
“Independência brasileira”, a “Proclamação da República”, tornaram-se os temas
clássicos do ensino de História para a escola primária.
No que se refere ao método, verifica-se, nos autores que escreveram suas lições
posteriormente a Macedo que, em seus compêndios, a presença de atividades ou
resumos das lições nem sempre ocorre. Embora a escrita da história escolar continue a
obedecer as exigências do ensino, mantendo um texto compacto, objetivo e resumido, o
desenvolvimento e a verificação da aprendizagem (avaliação) não aparecem
explicitamente, é o caso, por exemplo, do autor paranaense.
Nas lições de Vellozo, o texto é simples no sentido de apresentar uma lógica
seqüencial a todos os temas das aulas e uma linguagem sintética dos fatos considerados
marcos principais dos estudos. Em geral, aparece o tema da lição e seus desdobramentos
temáticos, conforme no quadro que segue:
Lições de História
PRÉ-HISTÓRIA
LIÇÃO I
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA HISTÓRIA
PRELIMINARES
DO HOMEM PRÉ-HISTÓRICO
AS IDADES PRÉ-HISTÓRICAS
MONOGENISMO E POLIGENISMO
FONTES HISTÓRICAS
143
HISTÓRIA ANTIGA
(A) Antiguidade Oriental
LIÇÃO II
EGÍPCIOS
VIDA POLÍTICA: Antigo império (da 1
a
à 10
a
dinastia); Médio Império (11
a
à 17
a
até a expulsão
dos hicsos); Novo império ( da 18
a
à 26
a
até a conquista pérsia)
CIVILIZAÇÃO: Religião, Literatura, Ciência, Arte
Fonte: Lições de História, 1948.
Ainda que não traga sugestão de atividades ou resumos, a organização textual das
lições permite elaborar sínteses, questionários, quadro sinótico, uma vez que o próprio
texto apresenta-se de forma compacta e sumária.
Conclui-se deste aspecto que, no século XIX e início do XX, no Paraná e no Brasil,
o ensino dispensado pelos professores foi, grosso modo, idêntico para a disciplina de
História nos diferentes níveis de ensino. Todos os manuais ou compêndios construíram, a
seu modo, o mesmo discurso para a História escolar no período, qual seja: voltado para o
conhecimento e estabelecimento dos elementos considerados importantes para a
formação e transmissão da idéia de nação e povo brasileiro, com um caráter pedagógico
proposto para o ensino das elites, fundamentado na memorização, que foi, gradualmente,
sendo assimilado pelo restante da população escolar no decorrer do século XX.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Compêndios de História e Formação do Cidadão
No processo de constituição do ensino secundário brasileiro, marcado por uma
educação clássica de cultura humanista e de cursos preparatórios aos estudos superiores,
constituiu-se a disciplina de História como matéria escolar no Paraná no Instituto de
Preparatórios e Escola Normal em 1876.
O
ensino de História, proposto em meados do século XIX n
aquela Província, embora
no interior do
s discursos
de modernização das
práticas e políticas educacionais do período,
teve de se conciliar com a tradição de um curso centrado no Latim e nas chamadas línguas
vivas
1
, que dominaram o programa do curso secundário por um longo período. Isto justifica
sua posição marginal nos programas de ensino, juntamente com as dificuldades estruturais
enfrentadas pela instituição paranaense para implementar as cadeiras de História num período
de predomínio da cultura clássica.
Expo
sta, entretanto, aos efeitos das mudanças políticas que se processavam no Brasil
no final dos anos de 1870
, das forças que impulsionavam o movimento interno da disciplina
no sentido de relacionar-se
, profundamente, com temas políticos e nacionais porque o Estado
tinha de cuidar de seus interesses, os conteúdos históricos foram apartando-se do domí
nio das
Huma
nidades, laicizando-se dentro de um projeto civilizador
da nação. Passou a ser
prioridade educacional
estudar a constituição política e geográfica das grandes
nações,
construir um ideal de
nação e identidade nacional, produzir uma memória da pátria e educar
para a cidadania
.
Na conjuntura do século XIX, construir um Estado independente significou construir a
Pátria brasileira como nação civilizada no processo de constituição das nações européias. Os
conteúdos do ensino de História nasceram oficialmente desse ideal; a princípio no Colégio de
Pedro II situado no município da Corte e, no decorrer do século, nos cursos secundários e nas
Escolas Normais das diferentes províncias brasileiras, e tiveram suas bases teóricas
fundamentadas pela historiografia nacional oriunda do IHGB.
Nesse trajeto, o
período moderno ganha força nos programas do ensino secundário.
A
História
Moderna,
que, no programa do Liceu de Curitiba em 1858, assume a divisão média,
1
As “línguas vivas” compunham-se pelo ensino de línguas estrangeiras, como Inglês, Alemão, Francês, entre
outras que, conforme indicaram Chervel e Compére (1999, p.166), tornaram-se a contraposição das línguas
antigas, como Latim, numa “concepção utilitarista, privilegiando a aptidão para a comunicação”.
145
nova e novíssima (o que depois se denominará de contemporânea)
, passa a se preocupar
especialmente com o estudo político das nações.
Nesse momento, em que formar uma nação era constituir uma nacionalidade, o ensino
de História, voltando-se para a análise do processo universal de construção das nações, cujo
Compêndio de Victor Duruy é exemplo, i
ntroduz em seus conteúdos a preocupação com a
origem da Pátria. Desse modelo, o ensino de
História no Paraná,
a partir de sua constituição no
Instituto de Preparatórios e Escola Normal em 1876,
marca o seu desenvolvimento com a
preocupação voltada
essencialmente
para
os conhecimentos históricos da Pátria, nessa época,
vista como partícipe do processo universal de constituição das nações modernas.
Em seu trajeto disciplinar, a História Nacional contou com o reforço dos saberes
geográficos na tarefa de construir um caráter nacional de cunho histórico. Os estudos
geográficos (para o conhecimento do espaço físico do país), diante da necessidade de garantir
a definição do vínculo nação-território, mantiveram-se, mesmo em cadeiras separadas no
programa de estudos do Instituto, em sintonia com a História Nacional para legitimar, no
discurso escolar, as formas de conquista do Brasil. Esses conteúdos irão fundamentar o saber
sobre as origens da nação e tornarem-se o locus desse ensino no curso normal.
A finalidade de fornecer uma formação cívica, embora presente em documentos mais
gerais sobre a instrução escolar, como as propostas de organização do ensino público, não se
revela diretamente nos planos e programas do curso secundário no século XIX. Inicialmente,
os conteúdos não são listados nos programas e planos de estudos; neles, aparece apenas a
matéria, seguindo uma lógica hierárquica na distribuição das disciplinas na organização
“curricular”.
Mesmo quando os conteúdos passam a ser indicados, estes aparecem obedecendo a
uma lógica programática na qual não se fixam claramente as finalidades de cada matéria
escolar e os objetivos de cada conteúdo. Isso porque, no conjunto de práticas cuja finalidade
mais ampla da ação educativa do ensino secundário era a preparação para os exames gerais, a
prática pedagógica utilizada dispensava a descrição dos objetivos e finalidades mais gerais de
cada disciplina.
Somente a partir do início do século XX é que se verifica, em alguns documentos, a
narração de conteúdos seguida de uma descrição mais detalhada de seus objetivos e
finalidades educativas. Nesse período, com horário, manual ou compêndio didático e
professores definidos, é que, ao mesmo tempo, vai se tornando mais clara também a prática
educativa de cada matéria escolar criada para atender aos cursos preparatórios.
146
Os compêndios didáticos tornaram-se, por esses motivos, a fonte mais segura, no
século XIX, para a análise dos conteúdos e finalidades disciplinares de uma época, porque
eles apresentavam, mais diretamente, os objetivos da disciplina escolar. Tornaram-se um
veículo privilegiado da instituição escolar na tarefa de dinamizar os conceitos e ideais que se
queria pela prática de ensino. Nesse sentido, atribuindo a tarefa de produção de livros
escolares a personalidades politicamente confiáveis e anunciando, nas páginas iniciais dos
livros, códigos que declaravam a aprovação dos compêndios, as autoridades manifestaram a
intenção de controlar os conteúdos do ensino no século XIX e início do XX no Brasil.
Diante das finalidades de formação cívica, ainda que os autores do período imperial
não se referissem à formação de cidadãos, o modo de construção e exposição no texto dos
conteúdos, centrados na análise das virtudes patrióticas, atingia, pelo discurso da civilização e
da constituição do povo brasileiro, essa temática. Nesse particular, embora fossem raras as
referências ao conceito de cidadão nos textos escolares do século XIX no Brasil
2
, os ideais de
civilizar e civilização carregavam os conteúdos que procuravam, pelo ensino da História,
nacionalizar e formar cidadãos do país independente.
Nascido do conteúdo histórico forjado pela colonização, a formação do cidadão
brasileiro não aparece nos compêndios escolares nessa fase inicial. A noção de cidadão
encontra-se diluída no conceito de “formação do Povo” nos compêndios de História, como é o
caso das Lições de História do Brasil de Manuel de Macedo e Matosso Maia.
Publicados para o uso de alunos e professores, esses compêndios de História
atenderam às exigências específicas da escola secundária. Em forma de “Lições”, construiu-se
um discurso sobre a formação da pátria e de seu povo para ser apropriado por estudantes com
facilidade e, ao mesmo tempo, contribuir para que enfrentassem os exames gerais para os
cursos superiores. Um livro escolar com objetivos definidos, o modelo de “lições”,
inaugurado por Macedo, no caso da História nacional, apresenta, logo após a descrição do
tema da lição, os ítens ou títulos de que trataria aquela aula. “Estratégia didática” que dava
unidade à lição e à construção discursiva do tema.
Nos textos dos compêndios de Macedo e Maia, ao colono foi creditado o atributo de
cidadão. Ao colonizador, civilizado por excelência, coube o processo de civilizar o país. Seus
atributos de patriotismo e moral cívica formaram os princípios do povo brasileiro que teve, na
exclusão das “raças inferiores”, os princípios lapidares da formação da cidadania e do cidadão
2
Martius é exemplo singular do período. Ao redigir sua tese de “Como se deve escrever a História do Brasil”
(1845), utiliza o conceito de cidadão para referir-se ao colono português.
147
brasileiro. É nesses termos que, no início se manifestou a temática do Estado na formação do
cidadão por meio da escola e do ensino de História no Brasil.
Esta tendência, nascida no período imperial, manteve-se durante o regime republicano
no Paraná, período em que se percebe um desenvolvimento
disciplinar que vai caracterizando
a História
como disciplina escolar com maior rigor e clareza dos
objetivos políticos e
culturais.
No período republicano, a temática tornou-se presente e mais claramente identificável
nos textos didáticos de forma geral. Nesse período, o discurso presente na escola, viabilizado
pelos compêndios didáticos, desempenhou papel fundamental na formação do cidadão e da
cidadania. Pelos compêndios de História, constata-se a difusão de idéias de patriotismo e
civismo ligadas aos conteúdos elencados para o ensino secundário e primário.
Após a Proclamação da República, entendia-se como necessário reforçar a coesão
nacional em torno dos valores republicanos, renovar ou rediscutir o papel dos conteúdos de
História na formação do cidadão da República brasileira e no despertar à adesão aos
princípios fundadores da democracia.
No compêndio de Vellozo, o discurso cívico apresenta-se mediante temas ligados à
formação e emancipação dos povos. Neles, é ressaltada a ação patriota dos que se envolvem
em lutas pela liberdade da pátria. Nesse aspecto, o autor paranaense exaltou a Revolução
Francesa e a declaração dos direitos do homem e do cidadão como um momento marcante na
história da humanidade em sua marcha em direção a sociedades livres e democráticas da
época moderna.
Cidadão passa a ser todos os membros de um país livre na construção de Vellozo. Não
deveria haver distinção de raça, religião ou classe social. Em seu texto, ao mencionar o
conceito de mestiçagem, o povo brasileiro se harmonizaria pela mistura das raças e a
República, como forma de governo idealizada, ampliaria as práticas de cidadania, sejam civis
ou políticas. Nesse sentido, as necessidades e interesses individuais precisariam ser
sucumbidos para que o princípio do interesse público se completasse na busca pelo progresso
da pátria.
A análise dos compêndios referenciados indicou, nesse sentido, a forte relação
estabelecida entre a constituição do Estado nacional brasileiro e as idéias motrizes da unidade
da nação. À escola secundária coube, por meio dos conteúdos do ensino de História, a
construção de uma memória nacional formada pela procura em saber qual o papel de cada
grupo social (índio, branco, negro) na formação do povo brasileiro.
148
No período do Império, pelos conteúdos dessa disciplina escolar, construiu-se uma
memória histórica em que a base da formação nacional estava no homem branco, civilizado e
portador do espírito do progresso. Uma concepção de cidadão se formava nesse momento em
que, excluindo os não civilizados, fundamentalmente, índios, negros e mestiços, a prática de
cidadania se restringiria apenas aos “cidadãos ativos”, enquanto que, aos “cidadãos comuns”,
homens livres e sem propriedade, entre eles os imigrantes, cabia, após serem civilizados e
nacionalizados, a prática limitada da cidadania civil.
Com a abolição da escravidão e a mudança de regime político, a República trouxe
novos elementos para se pensar a formação de cidadãos no Brasil. Conferiu-se, nesse trajeto,
um novo significado à idéia de nação. O objetivo de formar uma República colocou em cena,
no campo educacional, as finalidades de transformar o povo brasileiro em cidadãos da
nascente República.
Na escola, foram depositados os princípios da nova sociedade; compreendeu-se que,
pela sua expansão, haveria a consolidação da demanda do exercício dos direitos civis e
políticos do povo brasileiro. Esta se tornou uma característica recorrente da escola republicana
que, ao longo de sua história, traduziu-se no permanente desafio referente à consolidação da
democracia, uma vez que, em sua origens, a questão da liberdade e formação do povo
incorporou os conflitos sociais de um país que, ao se tornar independente, manteve as práticas
de cidadania restritas ao atributo de posse de propriedade.
A idéia de nação que se construiu com a República foi a de uma nação livre,
constituída de um povo também livre. É assim que a mística da nacionalidade republicana se
fez acompanhar por um projeto pedagógico que traduzia, enquanto tal, a suposta feição de um
caráter nacional a ser divulgado também pela escola, fundamentalmente a primária, ao povo
brasileiro.
A formação do cidadão e da cidadania mostrou-se, portanto, como um produto
histórico, resultado de um complexo de relações que se configura no século XIX e início do
século XX, entre o Estado nacional e a formação histórica da sociedade civil brasileira. A
escola aparece enredada nesse trajeto; em tempos e espaços específicos, institucionaliza-se
nos processos econômicos, políticos e culturais do período.
No Paraná, os debates e discursos provinciais e, posteriormente, estaduais seguiram,
grosso modo, a orientação educativa nacional, por esse motivo não pôde ser entendida
isoladamente. Nesse sentido, a definição e a constituição de cidadãos no Paraná e suas
relações com o ensino de História vincularam-se aos processos históricos mais amplos da
formação da escola primária e secundária na sociedade brasileira.
149
Nesse aspecto, ainda que não passasse de uma declaração de intenções na ausência de
concretização de um projeto democrático, no qual fosse incorporada toda a população às
práticas de cidadania, no Paraná, a escola foi vista como a principal forma de aquisição de
conhecimentos e valores de uma sociedade livre e civilizada.
Analisada em sua prática escolar pelo discurso presente nos comndios de História, a
escola secundária e normal estiveram associadas à política e ao poder instituído, tornando-se
um meio de assegurar maior controle sobre os saberes ensinados. Não se esgotando, por sua
vez, na referência ao conteúdo dos compêndios escolares, o conhecimento que se escolarizava
era submetido a regras pelo poder instituído para constituir-se como escolar e ser ensinado e
difundido pela disciplina.
É dessa maneira que o projeto político de formação de cidadãos se relacionava com as
práticas pedagógicas da escola secundária e primária e com o ensino dos conteúdos históricos
no século XIX e início do XX no Paraná e no Brasil.
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7. Relatórios e Mensagens Governamentais
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________. Relatório do Inspetor Geral da Instrução Publica, Joaquim Ignacio Silveira da
Motta de 1856. Curityba: Typ. C.M. Lopes, s/d.
_________. Relatório do Inspetor Geral da Instrução Pública, Joaquim Ignacio Silveira da
Motta, 1858. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1858.
_________. Relatório do Presidente da Província Francisco Liberato de Mattos de 07 de
Janeiro de 1859. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1859.
_________. Relatório do Presidente da Província José Francisco Cardoso de 1
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de Março de
1860. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1860.
_________.Relatório do Presidente da Província José Francisco Cardoso de 18 de Março de
1861. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1861.
_________. Relatório do Inspetor Geral da Instrução Publica, José Lourenço de Sá Ribas de
15 de Fevereiro de 1862. Curityba: Typ. C.M. Lopes, s/d.
__________. Relatório do Vice-Presidente da Provincia, Agostinho Ermelino, 1867.
Curityba: Typ. C.M. Lopes, s/d.
__________. Relatório do Inspetor Geral da Instrução Publica, Ernesto Lima Santos, 1867.
Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1867.
__________. Relatório do Presidente da Província, Antonio Luiz Affonso de Carvalho, à
Assembléia Legislativa em 15 de fevereiro de 1870. Curityba: Typ. C.M. Lopes. 1870.
__________. Relatório do Inspetor Geral da Instrução Publica, Bento Fernandes de Barros
de 29 de Dezembro de 1870. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1870.
__________. Relatório do Inspetor Geral da Instrução Publica, Bento Fernandes de Barros,
1871. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1871.
__________. Relatório do presidente da Província Venâncio José de Oliveira, de 15 de
Fevereiro de 1872. Curityba: Typ. C.M. Lopes, 1872.
__________. Relatório do presidente da Província Frederico José Cardoso de Araújo
Abranches de 15 de Fevereiro de 1874. Curityba: Typ. Viúva Lopes, 1874.
__________. Relatório do inspetor Geral da instrução publica, João Manuel da Cunha, de 15
de Janeiro de 1875. Curityba: Typ. Viúva Lopes, 1875.
155
__________. Relatório do presidente da Província Frederico Jose Araujo Abranches de 11
de Fevereiro de 1875. Curityba: Typ. Viúva Lopes, 1875.
__________. Relatório do presidente da Província Frederico Jose Araujo Abranches de 15
de Janeiro de 1875. Curityba: Typ. Viúva Lopes, 1875.
__________. Relatório do Presidente da Província Adolpho Lamenha Lins de 15 de
Fevereiro de 1876. Curityba: Typ. Viúva Lopes, 1876.
__________. Relatório do Inspetor Geral de Ensino, Bento Fernandes de Barros de 1876.
Curityba: Typ. Viúva Lopes, 1876.
_________. Relatório do Presidente da Província Manuel Pinto de S. Dantas Filho, 1878.
Curityba: Typ. Lopes, 1878.
__________. Relatório do presidente da Província Bento de Oliveira Junior de 07 de
Fevereiro de 1878. Curityba: Typ. Lopes, 1878.
__________. Relatório do presidente da Província João José Pedrosa de 16 de Fevereiro de
1881. Curityba: Typ. Perseverança, 1881.
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1895. Curityba, Typ. Modelo, 1915.
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de Outubro de
1896. Curityba, Typ. Modelo, 1915.
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de Fevereiro de
1903. Curityba, Typ. D’ Republica, 1903.
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ANEXOS
165
LISTA DE QUADROS
QUADRO I
Livros de História adotados no Colégio Pedro II- 1838-1920
Ano Título Autor Origem
1838 Compêndio de História Antiga -
Compêndio de História Romana
Poirzon e Caiz
Derozoir e Dumont
França-tradução
1841 Resumo da História do Brasil Henrique Bellegarde Nacional- tradução
1855 Manuel du Baccalauréat—(correspondendo ao
compendio “História Universal” – dividida em
Antiga, Média e Moderna
Compêndio da História do Brasil
Victor Duruy
Abreu Lima
França
Nacional
1858 Idem
Resumo da História Moderna e
Contemporanea
Idem
Gonçalvez & Tautphoeus
Idem
nacional
1862 História Antiga
História Romana
Histoire de Temps modernes – Manuel du
Baccalauréat
Compêndio de História do Brasil
Justiniano José da Rocha
De Rosoir e Dumont
Victor Duruy
Abreu Lima
Nacional
Tradução
Francês
Nacional
1877 Compendio de História Antiga
Lições de História da Idade Media
Histoire de Temps modernes – Manuel du
Baccalauréat
Lições de História do Brasil
Moreira de Azevedo
Domingos Ramos Mello
Victor Duruy
Joaquim Manoel Macedo
Nacional
Nacional
Francês
Nacional
1878 Idem Idem idem
1882 Idem
Lições de História do Brasil
Idem
Luiz de Queiroz Mattoso Maia
Idem
Nacional
1892 História Antiga
História Universal
História da Civilização
História do Brasil
João Ribeiro
G. Berquó
Siegnobos
Mattoso Maia
Nacional
Nacional
Francês-tradução
Nacional
1893 Idem Idem idem
1895 Historia do Oriente e Grecia
Historia Universal
História do Brasil
João Ribeiro
Weber – adaptada por João Ribeiro
Mattoso Maia
Nacional
Adaptação
Nacional
1898 História Universal
Histoire de la civilisation, 2 vol.
Lições de História do Brasil
Weber
Seignobos
Mattoso Maia
Adaptação
Francês
Nacional
1912 Não cita
166
QUADRO II
Livro de História adotado no Instituto Paranaense (Antigo Liceu de Curitiba) e Escola Normal
Ano Título Autor origem
1870* História Universal
Victor Duruy Francesa-tradução
1882 Lições de História do Brasil
Joaquim Manoel de Macedo nacional
1884 História Universal
Victor Duruy Francesa-tradução
1898 Lições de História Geral
Anibal de Mascarenhas nacional
1899
História do Brasil
Revoluções Brasileiras
Curso de História dos Estados
Americanos
Matosso Maia
Gonsaga Duque
João Manoel Pereira da Silva
nacional
1905 Lições de História Dario Valeozzo Nacional- paranaense
*Fonte: Ofício n.89 de 24 de março de 1870.
Fontes: Actas da Congregação do Instituto e Escola Normal (1876-1889) e Actas da Congregação do Ginásio
Paranaense e Escola Normal (1889-1920)
QUADRO III
Regulamento de 10 de Junho de 1858 do Liceu de Curitiba
5
a
classe 4
a
classe 3
a
classe 2
a
classe 1
a
classe
Historia Sagrada
Velho Testamento
Historia Sagrada
Novo Testamento
Religião. Notícia
desenvolvida da
historia da Igreja
Religião
(recordações).
Religião –
continuação da
recordação.
Lingua Nacional Latim Latim Latim Latim
Latim e Francês Francês Francês Trigonometria
Retilínea
Historia resumida
dos sistemas
comparados de
Filosofia
Matemáticas Inglês Inglês
Historia Moderna e
continuação do curso
da patria.
Exercicios práticos
de eloquência
Álgebra- até equação
de 2
o
grau
Geometria
Geografia.
Matemática ou
Astronomia.
Noções de Química
Historia. Noções
preliminares, grandes
períodos da Hist.
Universal e Antiga
Historia Moderna.
Curso de Historia
Politica
Moral
Geografia. Noções
preliminares, geografia
política e histórica,
antiga e moderna,
especialmente do Brasil
Geografia fisica
Historia da
Literatura, em
particular da
nacional.
Lógica Metafísica Noções de física
Botânica Zoologia
Noções gerais
Retórica e Poetica
Geologia
Fonte: Miguel, Maria Elisabeth Blanck (org.) 2000. Coletânea da Documentação Educacional Paranaense no
Período de 1854 a 1889, p.52.
167
QUADRO IV
Lei n.290 de 15 de abril de 1871
1
a
cadeira Gramática Geral aplicada a língua portuguesa; Literatura nacional e Religião
2
a
cadeira Línguas e Literatura Latina
3
a
cadeira Línguas e literatura Francesa e Inglesa
4
a
cadeira Línguas e literatura Alemã
5
a
cadeira Matemáticas Elementares (Aritmética, Geometria, Álgebra e Trigonometria)
6
a
cadeira Geografia e História , especialmente do Brasil
7
a
cadeira Filosofia e Retórica
8
a
cadeira Princípios gerais das ciências físicas e naturais
Fonte: Miguel, Maria Elisabeth Blanck (org.) 2000. Coletânea da Documentação Educacional Paranaense no
Período de 1854 a 1889, p.140.
QUADRO V
Lei n.456 de 12 de abril de 1876
Presidência artigo Instituto de Preparatórios Escola Normal
Adolpho Lamenha Lins 1
o
Cadeiras: gramática nacional, latim,
francês, inglês, alemão, geografia,
história, filosofia, retórica e álgebra,
geometria e trigonometria
Disciplinas: pedagogia e
metodologia, gramática
nacional, aritmética e
geometria,
compreendendo
desenho linear,
geografia e história,
principalmente a do
Brasil
Fonte: Miguel, Maria Elisabeth Blanck, 2000,p. 207.
168
QUADRO VI
Regulamento do Instituto Normal e de Preparatórios da Província do Paraná (18 de janeiro de
1882) – Lei n.603 de 16 de abril 1880.
Presidência Artigo Curso Normal Curso de Preparatórios
Carlos Augusto de
Caralho
3
o
Cadeiras: Portugues e religião (livre);
Matemática, álgebra e escrituração
mercantil; geometria e desenho linear;
cosmografia, geografia geral e do Brasil;
História Universal e do Brasil;
Elementos de físicas naturais, de
psicilogia e higiene; princípios de lavoura
e horticultura; filosofia, princípios de
Direito natural, público e constitucional;
princípios de economia social e
doméstica; francês, italiano, latim, ingles,
alemão, retórica.
Prática: Teoria e prática aplicadas as
matérias do curso, e do ensino intuitivo
ou lições de coisas; caligrafia, musica
vocal, ginástica, ofícios manuais para
alunos, prendas domésticas para as alunas
Previstas as mesmas
disciplinas, sendo
permitido aos alunos
estudá-las
separadamente das que
constituem o curso
normal.
Fonte: Relatório do presidente Carlos Augusto de Carvalho de 1882
QUADRO VII
Lei n.712 de 30 de novembro de 1882
Presidencia artigo Instituto Escola Normal
Carlos A.
Carvalho
1
o
– Parágrafo
1
o
Extinto.
Aula avulsa
de Latim
Reformado
Parágrafo 2
o
1
o
ano: princípios da lingua portuguesa; francesa;
artimética e álgebra; escrituração mercantil;
cosmografia e geografia física; princípios de física,
quimica, mineralogia; zoologia, botanica, principios
de pedagogia e caligrafia; musica e ginastica
2
o
ano: estudo complementar da lingua portuguesa;
da francesa; geometria e trigonometria; geografia
política, principalmente do Brasil; estudo
complementar da história; de mineralogia, de
geologia e de fisiologia, de higiene e de agricultura;
estudo complementar de pedagogia e administração
escolar; instrução moral e civica, compreendendo
noções de economia política, exercícios
pedagógicos.
Fonte: Miguel, Maria Elisabeth Blanck, 2000, p.252 a 270.
169
QUADRO VIII
Regulamento do Instituto Paranaense e Escola Normal de janeiro de 1884
Presidencia Artigo Instituto Escola Normal
Oliveira Belo Disciplinas: portugues, latim, francês,
inglês, alemão, matemáticas, geografia
e cosmografia, história, retórica,
filosofia
1
o
ano: português, aritmetica e
algebra, cosmografia e geografia,
história, pedagogia.
2
o
ano: portugues, geometria e
trigonometria, geografia, historia,
pedagogia compreendendo:
metodologia, administração de
escola, instrução moral e civica.
Fonte: Moacyr, 1940, p.318
QUADRO IX
Regulamento do Ginásio Paranaense e Escola Normal de 1892.
Ginásio Paranaense Escola Normal
Composto de 07 anos Composta de 03 anos
Cadeira de História Cadeira de História
6
o
ano: 3
a
cadeira
Historia Universal (estudo concreto);
3
o
ano: História Universal e do Brasil
7
o
ano: 2
a
cadeira
Historia do Brazil
Fonte: Coleção de Leis do Estado do Paraná – Regulamento de 1892.
QUADRO X
Decreto n.06 de 17 de fevereiro de 1893 – reforma
Ginásio Paranaense Cadeira de História
4
o
ano 5
a
cadeira: História Geral: Antiga e Média (estudo
concreto)
5
o
ano 5
a
cadeira: História Geral: Moderna e
Contemporânea – particularmente dos paizes
americanos.
6
o
ano 4
a
cadeira: História do Brasil
7
o
ano 4
a
cadeira: História do Brasil
Fonte: Coleção de Leis do Estado do Paraná – Regulamento de 1893.
170
QUADRO XI
Decreto n. 93 de 11 de março de 1901
3
o
ano 4
o
ano
5
o
ano 6
o
ano
Historia Historia
Historia
Historia do Brazil
Fonte: Decreto n.93 de 11 de março de 1901
QUADRO XII
Plano para as Escola Primárias – Regulamento de 1857
1
a
ordem – meninos 1
a
ordem meninas
Leitura e calegrafia, gramática da lingua nacional
religião, princípios da moral cristã e da doutrina,
noções gerais de geometria teoria e prática da
aritmética até regra de três, sistema de pesos e
medidas do Império.
Constará das mesmas matérias, com a exclusão da
gramática e limitando a aritmética, à teoria e
prática das quatro operações de números inteiros,
completando com o ensino de trabalhos de
agulhas.
2
a
ordem – meninos 2
a
ordem meninas
Adicionar: noções gerais de história e geografia,
especialmente do Brasil; noções das ciências
físicas aplicáveis aos usos da vida.
Adicionar: noções gerias de história e geografia e
música e língua francesa.
Fonte: Paraná, Leis, Decretos, Regulamentos de 1857, p.61-82
QUADRO XIII
Manuais indicados
Matéria Obra e autor
Geografia e história Geral Obras de Coruja
Geografia e História do Brasil Obras do Padre Pompeu
Religião Compêndio de Moral Religiosa, traduzido do
Manual de Instrução Primária de Lunel
Fonte: Paraná, Leis, Regulamentos... Instruções sobre o plano e divisão do ensino das cadeiras de
ensino primário, 1857; Relatório do Inspector Geral da Instrução Pública, Mota, 1859.
QUADRO XIX
Regulamento de 1876 – Reforma
Disciplinas Livros escolares
Inclusão de: desenho linear fazendo parte da
aritmética, geografia e história relativas à
Província
Seriam adquiridos pelo governo e aceitos os
doados pela Corte
Fonte: Oliveira, Maria Cecília Martins de, 1986, p.99
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