34
necessária como as partes das formas cíclicas a têm, as suas análises e as
considerações levantadas por este trabalho pretendem fazer crer que o
reaparecimento de um fragmento na coleção, de forma tão livre, porém com uma
enorme coerência estrutural, pode fazer com que estas sejam consideradas como
tal. Observe-se também que manipulação deste tipo de forma partida, porém densa
e profunda a cada número, é a que melhor atende à necessidade do compositor
19
,
uma vez que este não é, basta observar a sua produção musical, adepto a grandes
estruturas. Vejamos o que diz um autor sobre a forma cíclica nas mãos dos
compositores românticos:
“Forma cíclica” é um termo tão ambíguo quanto vago – ele possui
um outro significado que o de um conjunto de peças, aparentemente
díspares, a serem executadas ou compreendidas como um todo:
também significa, tradicionalmente, uma obra de grandes
proporções em que o movimento inicial reaparece como parte de um
outro mais tardio. [....].
Nesse sentido, a forma cíclica não é propriamente uma forma, mas
a perturbação de uma forma estabelecida. Um retorno não será
cíclico se requerido pela tradição – em suma, se for esperado; um
retorno cíclico tem de ser uma surpresa. Quando uma forma
estabelecida requer um retorno, temos então a reexposição de
sonata ou uma ária da capo ou um minueto ou trio ou a retomada de
um tema no final de um conjunto de variações. Uma forma cíclica,
ao contrário, faz com que um movimento anterior seja inserido no
âmbito de um posterior. Foi, justamente, esse deslocamento de uma
forma aceita que teve um tal apelo para o compositor romântico:
permitiu que ele utilizasse uma forma tradicional de um modo mais
pessoal
As interrupções cíclicas sofrem uma transformação radical nas mãos
dos compositores românticos. [....] são incorporadas à textura sem
qualquer costura. Pelo fato de ainda reconhecemos a presença de
um movimento anterior, elas ainda nos surpreendem , e o ponto de
junção é habitualmente disfarçado.
O sentido de retorno cíclico, tanto interna quanto externamente à
obra, relaciona-o diretamente ao fragmento. Pelo fato de ser
percebido, simultaneamente, como citação de um movimento
anterior e como tema derivado de um novo contexto, ele tanto ataca
quanto reafirma a integridade da estrutura musical individual,
18
Cf. em LEMOS, 2003, p. 47.
19
Veja, nas pp. 40 e 41, referências ao compositor como miniaturista e poeta.