A produção de idéias, de representações e da consciência está em primeiro lugar directa
e intimamente ligada à actividade material e ao comércio material dos homens; é a
linguagem da vida real. As representações, o pensamento, o comércio intelectual dos homens
surge aqui como emanação directa do seu comportamento material. O mesmo acontece com a
produção intelectual quando esta se apresenta na linguagem das leis, política, moral, religião,
metafísica, etc., de um povo. São os homens que produzem as suas representações, as suas
idéias, etc., mas os homens reais, actuantes e tais como foram condicionados por um
determinado desenvolvimento das suas forças produtivas e do modo de relações que lhe
corresponde, incluindo até as formas mais amplas que estas possam tomar. [...]
Contrariamente à filosofia alemã, que desce do céu para a terra, aqui parte-se da terra para
atingir o céu. Isto significa que não se parte daquilo que os homens dizem, imaginam e
pensam nem daquilo que são nas palavras, no pensamento na imaginação e na representação
de outrem para chegar aos homens em carne e osso; parte-se dos homens, da sua actividade
real. É a partir do seu processo de vida real que se representa o desenvolvimento dos reflexos
e das repercussões ideológicas deste processo vital. Mesmo as fantasmagorias correspondem,
no cérebro humano, a sublimações necessariamente resultantes do processo da sua vida
material que pode ser observado empiricamente e que repousa em bases materiais. Assim, a
moral, a religião, a metafísica e qualquer outra ideologia, tal como as formas de consciência
que lhes correspondem, perdem imediatamente toda a aparência de autonomia. Não têm
história, não têm desenvolvimento; serão antes os homens que, desenvolvendo a sua produção
material e as suas relações materiais, transformam, com esta realidade que lhes é própria, o
seu pensamento e os produtos desse pensamento. Não é a consciência que determina a vida,
mas sim a vida que determina a consciência (pp.25-26, grifo meu).
Se a consciência é produzida a partir das relações materiais que os homens
historicamente estabelecem com a natureza e entre si, pode-se afirmar que a consciência dos
sujeitos produzidos no sistema capitalista – que é, como se viu, pautado na divisão do
trabalho, na alienação do homem (de si mesmo, da sua atividade, do produto da sua atividade
e dos outros homens) e na luta de classes – tornou-se uma consciência também cindida,
alienada e de classe, que se mantém nestas condições pela ação das inversões ideológicas. As
representações conscientes que predominam nos sujeitos engendrados pelo modo de
produção capitalista são invertidas e imaginárias:
[Passagem cortada no manuscrito:] As representações aceites por estes indivíduos são idéias
quer sobre as suas relações com a natureza, quer sobre as relações que estabelecem entre si ou
quer sobre a sua própria natureza. É evidente que, em todos estes casos, tais representações
constituem a expressão consciente – real ou imaginária – das suas relações e da sua
actividade reais, da sua produção, do seu comércio, do seu (organização)
comportamento político e social. Só é defensável a hipótese inversa se supõe um outro
espírito, um espírito particular, para além do espírito dos indivíduos reais, condicionados
materialmente. Se a expressão consciente das condições de vida reais destes indivíduos é
imaginária, se nas suas representações consideram a realidade invertida, este fenómeno é
ainda uma conseqüência do seu modo de actividade material limitado e das relações sociais
deficientes que dele resultam (p.25, nota de rodapé, grifo meu).
Assim, para o materialismo histórico dialético, as representações conscientes dos
homens podem ser reais ou imaginárias. Na sociedade de classes, eles imaginam serem livres
dentro de relações materiais que, na realidade, são de sujeição. O proletariado pode se