agressivos, motivados e empreendedores do que os não-migrantes
(os brasileiros que moram no mesmo estado em que nasceram).
Nesse caso, os estados mais ricos teriam alcançado tal condição
também por estarem concentrando, via fluxos migratórios, pessoas
mais capazes, hábeis e, portanto, mais produtivas.
A narrativa
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a seguir foi produzida por Natália Engler Prudêncio, aluna do 3° ano
do curso de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo
(ECA/USP), com base em relatos da vida real da filha de um migrante piauiense. Essa
narrativa pode ilustrar um pouco a chegada do migrante nordestino a uma grande cidade:
“O pai de Deusani foi para São Paulo em um caminhão pau-de-arara. Para driblar o calor, os
viajantes ficavam do lado de fora da lona, e o motorista buzinava para avisá-los que deveriam se
esconder quando fossem passar pela polícia. Às vezes buzinava só para fazer graça, para se divertir
vendo todos se esgueirarem desesperados para dentro da lona. Chegando em São Paulo, arrumou
um trabalho como servente de pedreiro, e logo foi melhorando de função, pois, enquanto
trabalhava, observava todos os outros trabalhos que eram realizados na obra para aprender como
fazê-los. (…) Depois de seis meses, conseguiu juntar dinheiro para buscar a família e alugar dois
cômodos em Campo Limpo. Quando voltou para buscá-los, levou uma blusa de frio para cada
filho, que seria tudo que os protegeria do frio na chegada a São Paulo, em pleno mês de julho de
1971. Só tinha dinheiro para sua passagem e a da mulher, que estava grávida do quarto filho,
Eliezer, que nasceria em São Paulo (teria mais uma filha, Maria Luiza, mas apenas em 1983); as
crianças iam no corredor, passando muito desconforto durante os três dias de viagem. (…) O
ônibus parava em cidades na hora do almoço e do jantar, mas eles não almoçavam e nem jantavam
em restaurantes, só comiam o “frito”. (…) Quando fizeram uma parada no Rio de Janeiro, todo
mundo levantou-se e olhavam pela janela, dizendo “Olha o mar, olha o mar! Meu Deus, a água se
mexe!” E ela, lá em baixo deles, esmagada, não conseguia ver nada”.
Essas histórias se repetem à chegada a duas grandes cidades brasileiras, Rio de
Janeiro e São Paulo, como demonstra o relato de um paraibano que serviu de informante
para esta tese. Este senhor de 60 anos, sem escolaridade, que chegou ao Rio de Janeiro há
28 anos, descreve sua primeira impressão:
Lá no Norte [Nordeste], a gente tinha uma vida muito sofrida, né, e uma vez um colega me deu
uma idéia, que ele já tinha vindo aqui no Rio, e me convidou para vir aqui ao Rio. Eu digo assim:
“Ah, eu vou pensar”. Até que um dia chegou a oportunidade de eu vir. Vim, fiquei sete meses, ai
teve um problema que surgiu comigo aqui, ai fiquei meio desgostoso, voltei. Voltei, ai fiquei
quatro anos lá. Ai, esses quatro anos que eu passei lá foram muito difíceis, né, o que eu levei
durante os sete meses que eu arrumei aqui, fiquei quatro anos lá, gastei tudo e não consegui nada.
Ai, cismei assim e disse: “Oxe, vou embora de novo!” (…) Ai, vim e fiquei quatro anos. (…) Voltei
e fiquei até oitenta e um. Oitenta e um foi que eu voltei lá de novo. Só a passeio. Quando cheguei
lá, não gostei. Tudo difícil. Ai, estou até agora aqui e nunca mais voltei lá. Porque a vida do
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Disponível em: http://www.textovivo-narrativasdavidareal.htm. O site informa que “Esta matéria faz parte de um
projeto narrativo maior, que visa a aplicação de recursos do Jornalismo Literário (JL)”. (pesquisa feita em 16/01/2006)