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MARIA DO CARMO AMARAL ABREU JORGE DE FREITAS
CONFLITO E OCULTAÇÃO EM TEORIAS GERENCIAIS
Maringá
2002
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MARIA DO CARMO AMARAL ABREU JORGE DE FREITAS
CONFLITO E OCULTAÇÃO EM TEORIAS GERENCIAIS
Dissertação apresentada como requisito à
obtenção do grau de Mestre em Administração,
Programa de Pós-Graduação em Administração,
Universidade Estadual de Maringá e
Universidade Estadual de Londrina.
Orientador: Prof. Dr. Hélio Roque Hartmann
Maringá
2002
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MARIA DO CARMO AMARAL ABREU JORGE DE FREITAS
CONFLITO E OCULTAÇÃO EM TEORIAS GERENCIAIS
Dissertação aprovada como requisito para obtenção do grau de Mestre junto ao Programa de
Pós-Graduação em Administração da Universidade Estadual de Maringá e da Universidade
Estadual de Londrina, pela seguinte banca examinadora
_____________________________________
Prof. Dr. Hélio Roque Hartmann (PPA)
__________________________________________
Prof. Dr. Jason Tadeu Borba. (PUC/ SP)
__________________________________________
Prof. Dr. .João Luís Passador (UEM-PPA)
Maringá, 28 de junho de 2002
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho às minhas filhas, Yolanda e Heloisa, que souberam compreender minha
ausência. Ao Pedro, com muito carinho, pela paciência e compreensão. À minha mãe Myrian,
à minha amiga Maria de Annunciação, pela forma carinhosa com que sempre me acolheu, e a
todos os amigos que compartilharam comigo esse momento, incentivando-me em mais uma
conquista.
5
AGRADECIMENTOS
Sou profundamente agradecida a todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram
para a realização e divulgação deste trabalho. Sou particularmente grata ao meu orientador,
Prof. Dr. Hélio Roque Hartmann, por ter acompanhado de maneira constante e minuciosa a
realização deste trabalho.
Ao Prof. Dr. Paulo Grave, pelo carinho com que me acolheu no programa de Pós-Graduação,
pelo estímulo para a realização desta pesquisa, pelas lições que me ensinou e pela amizade
que surgiu.
Ao Prof. Dr. Fernando Prado Gimenez, Coordenador do Programa de Pós-Graduação em
Administração, pelo apoio e compreensão com que me brindou desde o início desta jornada.
A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Administração, que colaboraram
de inúmeras maneiras com esta pesquisa.
Ao Bruhmer, que revisou este trabalho, pela gentileza e paciência com que sempre me
recebeu.
Ao Huber, pela atenção e dedicação com que me ajudou na tarefa de tradução.
Ao Ademir, pelo interesse demonstrado ao tema deste trabalho.
À CAPES – Coordenadoria de Aperfeiçoamento do Pessoal de Ensino Superior, que forneceu
os meios que tornaram possível a realização deste trabalho.
6
RESUMO
O presente estudo centra sua atenção no conflito e sua ocultação nas teorias gerenciais. Nossa
investigação inicia-se com a descrição da origem da organização fabril e da racionalização da
produção no interior da sociedade sob a regência do capital. Nesse processo, enfatiza a luta de
classes que permeia o metabolismo da sociedade capitalista, a existência de interesses
divergentes entre os proprietários dos meios de produção e os detentores da força de trabalho.
Amparada nas teorias administrativas do início do século XX, um conjunto de práticas de
racionalização do trabalho cuja finalidade é aumentar a produtividade, esta pesquisa procura
mostrar como a ideologia subjacente às teorias administrativas, lastro da prática do poder nas
corporações, exerce a função de ocultar os conflitos emergentes no interior das organizações.
O processo de racionalização do trabalho exercido pela gerência científica da produção
revela-se uma prática de adestramento, ao mesmo tempo em que, em conformidade com a
concepção de Maurício Tragtenberg, a burocracia atua na sociedade capitalista como um
instrumento de poder, de dominação e racionalização.
O recente desenvolvimento da base técnica da produção, ancorado na microeletrônica e na
bioengenharia, vem estimulando a reestruturação dos métodos de produção e a superação do
fordismo, abrindo caminhos para uma nova forma de organização do trabalho e da produção,
considerada mais capaz de responder às exigências impostas pela atual fase de
internacionalização de capitais.
Palavras-chave: racionalização, conflitos, poder e burocracia
7
ABSTRACT
The present study focuses its attention on the conflict and its occultation on managerial
theories. Our investigation begins with the description of the origin of the industrial
organization and the rationalization of the production inside society under the control of the
capital. In that process, it emphasizes the class-fight that permeates the metabolism of the
capitalist society, the existence of divergent interests between the owners of the means of
production and the detainers of the working-power.
Aided on administrative theories from the beginning of the XX century, a group of practices
of rationalization of the work whose purpose is to increase the productivity, this research tries
to show how the underlying ideology of these administrative theories, on the grounds of the
practice of power in the corporations, handle the function of hiding the emergent conflicts
inside the organizations.
The process of rationakization of the work handled by the scientific management of the
production reveals itself to be a training practice, at the same time that, in accordance with
Maurício Tragtenberg's conception, the bureaucracy acts towards the capitalist society as an
instrument of power, of dominance and rationalization.
The recent development of the technical base of the production, anchored in the
microelectronics and in the bioengineering, it is fostering the restructuring of the production
methods as well as it has overcome Ford's techniques, providing ways for a new form of
organization of the work and of production, considered to be more capable of answering the
demands imposed by the current phase of internationalization of capitals.
Key-words: rationalization, conflicts, power and bureaucracy.
8
SUMÁRIO
Página
INTRODUÇÃO ......................................................................................................
09
1. A ORIGEM DA ORGANIZAÇÃO FABRIL E A RACIONALIZAÇÃO DA
PRODUÇÃO ............................................................................................................
12
1.1 PRODUÇÃO CAPITALISTA ................................................................................. 12
1.2 A RACIONALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO CAPITALISTA E A EMERGÊNCIA
DA GERÊNCIA CIENTÍFICA ................................................................................. 26
2 RELAÇÕES HUMANAS, IDEOLOGIA E PODER DAS CORPORAÇÕES ..
39
3 A DENÚNCIA DO ADESTRAMENTO DO TRABALHADOR NA OBRA
DE TRAGTENBERG .............................................................................................
58
4 REESTRUTURAÇÃO RACIONAL DO TRABALHO: SUPERAÇÃO DO
MODELO FORDISTA DE PRODUÇÃO ............................................................
71
4.1 PRODUÇÃO DESTRUTIVA ................................................................................... 72
4.2 CRÍTICA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA....................................................... 81
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................
84
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................
88
INTRODUÇÃO
Os paradigmas das revoluções tecno-científicas no mundo do trabalho têm sido alvo de
profundas discussões entre gestores do capital, pensadores de várias áreas científicas e
representantes dos interesses das classes assalariadas. O surgimento de um novo milênio
causou muitas expectativas acerca das mudanças no mundo do trabalho, desencadeando várias
publicações, congressos, seminários, debates, não só no mundo acadêmico como também nas
grandes organizações.
Esse tema já suscitara nosso interesse anteriormente, sendo transformado numa monografia de
especialização intitulada "Conflito e ocultação nas teorias gerenciais". Devido as lacunas
desse trabalho e o caráter atual do tema, entendemos a necessidade de desenvolver outro
estudo, que aprofundasse mais a gênese do conflito e seus desdobramentos, tendo em vista a
realidade da modernização tecnológica e da internacionalização do capital.
A importância de nossa investigação reside no desafio implicado na pontualidade dos fatos
nos conflitos inevitáveis gerados nas grandes transformações ocorridas no mundo do trabalho
contemporâneo. Aspectos como a implementação massiva da microeletrônica, nos mais
variados segmentos produtivos, e das comunicações, culminaram em transformações na forma
de execução do trabalho e no crescimento vertiginoso da capacidade produtiva, fortalecendo
ainda mais a reestruturação racional do trabalho. O entendimento da questão da reestruturação
racional do trabalho tornou-se premissa de uma lógica de produção cujo intercâmbio em
âmbito mundial se estreitou de forma inaudita.
Busca-se, através deste trabalho, descrever e entender conflitos de interesses distintos,
desenvolvidos no interior das organizações e expressos, de um lado, pelo capital e por seus
representantes e de outro, pelos defensores da emancipação do mundo do trabalho em relação
ao capital.
O entendimento das linhas determinantes do processo de produção capitalista é fundamental e
básico, a nosso juízo, para capturar essa questão, visto que não poderíamos analisar
criticamente as teorias administrativas da atualidade sem compreender as bases históricas e os
conflitos que as geraram.
10
Analisar criticamente as doutrinas dos ideólogos das organizações do início do século XX,
que inauguraram uma forma gerencial do processo de trabalho, coloca-se como outro
fundamento básico para alcançar as raízes da atual reestruturação produtiva. Pretende-se, com
isso, superar as críticas superficiais que respaldam essas perspectivas ou que negam a
reestruturação produtiva da sociedade, sem conhecer seus fundamentos.
Debruçar-se sobre autores críticos e de envergadura que analisaram tais processos e sobre
seus mentores intelectuais, também é considerado condição imprescindível para buscar um
posicionamento científico crítico sobre a questão.
Por outro lado, afirmar o papel central do trabalho nessa nova configuração do capital
significa uma afirmação contrária àquelas que o colocam num patamar secundário na
compreensão do mundo atual.
Não são apenas os países capitalistas do terceiro mundo que sofrem com essas
transformações, países capitalistas hegemônicos também padecem com a lógica desse
sistema. Além disso, segundo Antunes (1999, p. 16), “A lógica do sistema produtor de
mercadorias vem convertendo a concorrência e a busca da produtividade num processo
destrutivo que tem gerado uma imensa precarização do trabalho e aumento monumental do
exército industrial de reserva, do número de desempregados”. O autor ressalta que, nesta
perspectiva, é um grande engano pensar a possibilidade do fim do trabalho numa sociedade
produtora de mercadorias, uma vez que para tal produção é utilizada a classe trabalhadora .
Partindo destas considerações, utilizando-nos de uma metodologia analítico-descritiva dos
conflitos e de sua ocultação nas teorias gerenciais, a realização desta investigação busca a
compreensão do desenvolvimento das formas de contradição do capitalismo e de suas
conseqüências na organização do sistema produtivo.
Em vista desse propósito, nosso trabalho será desenvolvido em quatro capítulos, abordando
seletivamente aspectos fundamentais das contradições do sistema capitalista de produção e de
seus efeitos conflituosos na gestão das organizações.
Assim, a descrição da origem da organização fabril e das novas formas de organização do
trabalho, bem como a forma utilizada para organizar a produção são tratadas no primeiro
capítulo. Terá o propósito de localizar o leitor historicamente, através do resgate do
pensamento de autores clássicos, apontando para as contradições, os conflitos e os
11
antagonismos entre as classes sociais. Esse intuito não é fruto de uma perspectiva que
preconiza o fim da história nem faz previsões escatológicas, mas que sinaliza para a
abordagem de acontecimentos reais que somente o homem é capaz de realizar, pois somente
aqueles que constróem são capazes de interpretar e intervir. De acordo com Marx, os homens
fazem a sua própria história, produto de gerações anteriores, mas não a fazem em condições
escolhidas por eles. Pois estas são historicamente determinadas pelas condições em que
produzem suas vidas.
A ideologia da dominação e o poder das corporações são formas e agentes manipuladores da
racionalização da produção, utilizados pelos grandes ideólogos do capital, como mecanismo
para ocultar o conflito e os antagonismos entre capital e trabalho. É esse o tema do segundo
capítulo, que tenta mostrar como a teoria administrativa das Relações Humanas procurou
desenvolver nos trabalhadores um certo espírito participativo.
A denúncia do adestramento do trabalhador será tratada no terceiro capítulo, sustentada por
Maurício Tragtenberg, autor crítico e avesso às teorias administrativas. O pensamento de
Tragtenberg tornou-se referência para pesquisadores que objetivam o estudo e a compreensão
das teorias organizacionais no campo crítico. O autor centrou sua análise no estudo da
burocracia enquanto forma de poder legítimo, apoiado na análise weberiana dos tipos puros
de dominação.
O último capítulo trata da reestruturação do trabalho racional e da superação do modelo
fordista de produção. Analisa também a crise da super produção que culmina na produção
destrutiva, e examina ainda a intervenção e os papéis da ciência e da tecnologia nessa era de
reestruturação racional do trabalho.
1 A ORIGEM DA ORGANIZAÇÃO FABRIL E A RACIONALIZAÇÃO
DA PRODUÇÃO
1.1 A PRODUÇÃO CAPITALISTA
As organizações fabris constituem o cenário da dominação capitalista e, como não poderia
deixar de ser, o lugar onde as contradições de classe se expressam de maneira radical, de um
lado os interesses dos proprietários dos meios de produção, de outro, os interesses do
trabalhador detentor apenas de sua força de trabalho, a sua única mercadoria. Como interesses
tão divergentes podem conviver sem conflitos? Buscando responder a tal problema procurar-
se-á, através de uma análise histórico - descritiva, o ponto de partida que culminou no conflito
nas organizações fabris.
De acordo com Mészáros (1989), distinguir capital e capitalismo é condição essencial para o
entendimento, pois quando Marx escreveu O Capital, o volume primeiro trata do “Processo
de Produção do Capital”, e não o “Processo de Produção Capitalista”. O Capital é uma relação
social que surge, historicamente, muitos antes do Capitalismo. Marx estava interessado em
entender as especificidades históricas dessa relação, do Capital, e suas transições até tornar-se
modo de produção dominante na sua fase clássica, quando assumiu a feição de capital
industrial.
Só após vários séculos de existência do capital teve início a produção capitalista. A produção
capitalista, ou seja, a produção regida pelo capital, surge quando trabalhadores e meios de
produção se reencontram no processo de trabalho, após terem sido violentamente separados
através de um processo histórico que Marx detalhou em sua obra, e que referiu como
“acumulação primitiva” ou o “processo originário do capital”.
A gênese do capitalismo, esse processo de violenta expropriação dos trabalhadores de seus
meios de produção, transformou os meios de produção em meios para extorquir trabalho,
enquanto tornou os trabalhadores proletários, ou seja, indivíduos que possuem apenas a si
mesmos, a sua capacidade de trabalho individual, e a sua prole. Expropriados de seus meios
de produção, restou a esse proletariado, em sua origem, vagar pelas estradas inglesas
13
roubando, mendigando, prostituindo-se. Vítimas da “legislação sanguinária”
1
, seu destino
costumava ser a forca ou outro tipo de morte violenta: “(...) a história da expropriação que
sofreram foi inscrita a sangue e fogo nos anais da humanidade” (MARX, 1982, p. 830).
Pensadores anteriores a Marx criticavam a forma miserável de vida dos trabalhadores,
Thomas More, na obra A utopia retratava uma sociedade de iguais, criticando o poder
arbitrário do rei Henrique VIII:
É possível falar da justiça ou gratidão numa república que recompensa tão
profusamente os chamados nobres, os usuários e outros do mesmo tipo, uma gente
que, quando não é totalmente improdutiva, dedica-se apenas à produção de artigos
de luxo ou ao ramo dos prazeres e das diversões? É possível falar de justiça quando
essa mesma república não demonstra mais a ínfima generosidade para com os
camponeses, os carvoeiros, os operários, os carroceiros ou os carpinteiros, sem os
quais a república não teria condições de existir? E o máximo de ingratidão cai sobre
esses homens quando já estão velhos, doentes e na mais hedionda miséria. Depois de
ter se aproveitado deles quando estavam nos melhores anos de suas vidas, a
sociedade se esquece das incontáveis vigílias em que consumiram suas forças a seu
serviço, e os recompensa pelos trabalhos importantíssimos que realizaram
permitindo que morram na miséria e na indigência. Mas tudo isso é ainda pior: os
salários de fome que os ricos pagam aos pobres são diariamente reduzidos por eles
mesmos, não só através dos mais diferentes tipos se desonestidade, como também
através da extorsão praticada em nome da lei. (THOMAS MORE, Utopia, p. 160-
161).
O início da produção capitalista, amparada no recrudescimento da “legislação sanguinária”,
impôs, na prática, sob pena de morte e de outras medidas violentas, o assalariamento dessa
força de trabalho, ou seja, a venda, mediante remuneração, de um determinado número de
horas por dia, da capacidade, da força física e intelectual desses expropriados. A força de
trabalho tornou-se uma mercadoria, e o salário é seu preço.
O processo que cria o sistema capitalista consiste apenas no processo que retira ao
trabalhador a propriedade de seus meios de trabalho, um processo que transforma
em capital os meios sociais de subsistência e os de produção e converte em
1
Essa legislação começou na Inglaterra no reinado de Henrique VII. "Henrique VIII, lei de 1530.- Mendigos
velhos e incapacitados para trabalhar tem direito a uma licença para pedir esmolas. Os vagabundos sadios
serão flagelados e encarcerados. Serão amarrados atrás de um carro e açoitados até que o sangue lhes corra
pelo corpo; em seguida prestarão juramento de voltar à sua terra natal ou ao lugar onde moravam nos últimos
e anos, ‘para se porem a trabalhar’. Que ironia cruel! Essa lei é modificada, com acréscimos ainda mais
inexoráveis, no ano 27 do reinado de Henrique VIII. Na primeira reincidência de vagabundagem, além de
pena de flagelação, metade da orelha será cortada; na segunda, o culpado será enforcado como criminoso
irrecuperável e inimigo da comunidade.” (O Capital, livro 1 vol. 2, p. 851 e 852).
14
assalariados os produtores diretos. (MARX, 1982, p. 830).
O que caracteriza, portanto, a produção capitalista é a reunião dos meios de produção e dos
trabalhadores sob uma condição historicamente nova. “A separação entre o produto do
trabalho e o próprio trabalho, entre as condições objetivas do trabalho e a força subjetiva do
trabalho, é portanto o fundamento efetivo, o ponto de partida do processo de produção
capitalista” (MARX, 1982, p. 664). Ao se deparar com meios de produção que não lhe
pertencem, o trabalhador não trabalha para si mas para o proprietário desses meios de
produção:
De um lado, o processo de produção transforma continuamente a riqueza material
em capital, em meio de expandir valor e em objetos de fruição do capitalista. Por
outro lado, o trabalhador sai sempre do processo como nele entrou, fonte pessoal da
riqueza, mas desprovido de todos os meios para realizá-la em seu proveito (MARX,
1982, p. 664).
A manufatura é a forma originária da produção capitalista, que chega à sua maturidade com o
advento da indústria moderna. Semelhante à trajetória de uma criança até atingir a idade
adulta, também com a produção capitalista ocorre um processo de desenvolvimento das forças
produtivas que culmina na preponderância da base técnica industrial, fundada no uso
consciente da ciência aplicada às necessidades de incremento da produtividade, base técnica
materializada na maquinaria. Com o advento da maquinaria, a produção capitalista assume
sua feição madura. Como Marx costumava dizer, com a indústria moderna o capital se ergue
sobre seus próprios pés. O incessante objetivo de reprodução ampliada, imanente ao próprio
capital, exige a contínua revolução da base técnica da produção capitalista, que se materializa
na constante modificação dos meios de produção. De acordo com Mészáros:
(...) Uma vez que os meios de produção incorporam uma determinada grandeza de
capital, eles devem crescer ( ou perecer, se incapazes de crescer o suficiente) como
estipulado por esta própria grandeza, quer exista ou não uma justificação produtiva
autêntica (mensurável pela necessidade) para o seu crescimento. A definição circular
de produtividade como crescimento e crescimento como produtividade encontra sua
explicação (e possível correção) na referência a este perverso relacionamento
prático, que bane os produtores (como os " ricos indivíduos sociais” em potencial)
junto com suas necessidades - cujos desenvolvimentos e satisfações liberados
poderiam torná-los verdadeiramente ricos - dos equacionamentos do capital, ao
substituí-los por si mesmo como objetivo final (MÉSZÁROS, 1989, p. 30- 31).
15
A revolução incessante dos meios de produção é a condição vital para a perpetuação do
capitalismo. O caso da empresa Nokia é um exemplo claro. Para sobreviver numa economia
capitalista globalizada, e embora tenha se especializado em papel higiênico e botas de
borracha no início de sua atividade econômica, consagrou-se, na década de 90, como a
segunda maior produtora de telefones celulares do mundo, depois da Motorola, situando-se
em 12
º.
lugar dentre as maiores empresas da área de telecomunicações
2
(KIERNAN, 1998,
p.166).
Quando a produção, regida pela lógica do capital teve início, sua base técnica era aquela já
existente historicamente, ou seja, era pré-capitalista. Por isso, em seus primórdios, a produção
capitalista, para atender às suas exigências de contínuo aumento da produtividade, e dispondo
de uma base técnica ainda artesanal, utilizava como principal recurso para o aumento do
volume da produção e da produtividade, uma estratégia de produção fundada na cooperação.
Na cooperação simples, vários artesãos foram reunidos no mesmo local sob o comando de um
só capitalista, para produzir mercadorias. É o ponto de partida da produção capitalista, no qual
um proprietário particular reúne vários trabalhadores produzindo a mesma espécie de
mercadoria, ampliando a escala e a produtividade de seu processo de trabalho.
Na atividade individual, um só trabalhador terá que desempenhar várias funções combinadas
para chegar ao produto acabado. É importante ressaltar que nesse processo de trabalho, o
trabalhador possuí o controle do que está sendo feito, desde o início até o fim. Ele controla
inclusive o seu raciocínio e o ato de pensar. Um par de sapatos feito por um só trabalhador
poderia levar até oito horas de produção para chegar à sua forma acabada. Todavia, o controle
e as técnicas empregadas pelo trabalhador são frutos exclusivos do seu trabalho, o que
assegurava condições de sustento para si e sua família. A divisão manufatureira do trabalho se
assenta primeiramente na separação entre o trabalho intelectual e o manual. As forças
2
"Desde sua origem, em 1865, como um pequeno engenho na vila de Nokia, norte de Helsinque, Finlândia, a
empresa gradualmente expandiu-se para borracha, químicos, assoalhos, sistemas de ventilação e cabos de
força, servindo grande parte do forte mercado nacional de cinco milhões de habitantes. No início dos anos 60, a
empresa entrou para o setor de telefonia fabricando equipamentos de paging e rádio-telefones para usos militar
e civil"(KIERNAN, J. MATTHEW, 11 Mandamentos da administração do século XXI, São Paulo: Makron
Books, 1998, p. 166).
16
intelectuais da produção são apresentadas aos operários como propriedade de outro e como
poder que os domina.
A cooperação surge quando se tem a união de vários trabalhadores num mesmo local de
trabalho. Do ponto de vista do capital, é mais barato construir uma oficina que agrupa vinte
trabalhadores do que construir dez oficinas para dois trabalhadores. Esses trabalhadores
coletivos, numa ação combinada, demonstraram, atuando em grupo, mais habilidade um, mais
força noutro, mais destreza em um terceiro, mais rapidez nos demais, enfim, num esforço
coletivo, "(...) num mesmo processo de produção ou em processos de produção diferentes mas
conexos" (MARX, 1982, p. 374). Temos assim a cooperação, que se distingue da força
produtiva individual. Aqui, os trabalhadores realizam uma parte do processo do trabalho de
maneira combinada, num espaço de tempo determinado. O produto final do trabalho não será
de conhecimento integral dos trabalhadores que, tampouco, terão a posse desses produtos. O
mesmo sapato que antes era produzido individualmente, agora passa a ser produzido por
vários homens, num tempo relativamente mais curto em relação ao anterior. Se antes
produzia-se um sapato a cada oito horas, com a cooperação poder-se-á produzir no mesmo
período de tempo, uma quantidade maior do mesmo produto.
Isso é conseqüência, nas palavras de Marx (1982), do fato de que com a cooperação, "(...) o
trabalhador coletivo tem olhos e mãos em todas as direções e possui, dentro de certo limite, o
dom da ubiqüidade. Concluem-se ao mesmo tempo diversas partes do produto que estão
separadas no espaço” (p. 376).
Na cooperação é possível, devido a soma de jornadas de trabalho que assume a forma
coletiva, produzir maiores quantidades de valor de uso. Isso é denominado por Marx de a
“força produtiva do trabalho social”. Diferentemente do trabalho individual, a riqueza gerada
por esses trabalhadores não lhe pertence. A força de trabalho é, portanto, do trabalhador, mas
o produto final, as mercadorias que eles produziram conjuntamente, pertencem àqueles que os
empregaram. Em outras palavras, os trabalhadores venderam a sua força de trabalho ao
capitalista em troca de um salário, a fim de garantir não só o seu sustento como também o de
sua família.
É importante saber que nesse processo de cooperação, o número de trabalhadores empregados
dependerá da quantidade de capital que será empregado na compra da força de trabalho. De
acordo com Marx, esse capital chama-se capital variável. Outra forma de capital designada
17
por Marx é o capital constante, aquele empregado para a aquisição de instalações, matéria-
prima, máquinas, enfim meios de produção, também sofre um processo semelhante. É preciso
ter um capital de antemão para iniciar o processo de trabalho, e mais importante, é o que dará
condições materiais para a cooperação entre os trabalhadores. Importante também o papel
desempenhado pelo proprietário dos meios de produção. Nas palavras de Marx:
(...) O comando do capitalista no campo da produção torna-se então tão necessário
quanto o comando de um general diante de uma batalha. (...) Essa função de dirigir,
superintender e mediar assume-a o capital logo que o trabalho a ele subordinado se
torna cooperativo. (...) A direção exercida pelo capitalista não é apenas uma função
especial, derivada da natureza do processo de trabalho social e peculiar a esse
processo; além disso, ela se destina a explorar um processo de trabalho social, e, por
isso, tem por condição o antagonismo inevitável entre o explorador e a matéria-
prima de sua exploração. Com o volume dos meios de produção que se põem diante
do trabalhador como propriedade alheia, cresce a necessidade de controlar
adequadamente a aplicação desses meios ( 1982, p. 379).
Com isso está dada a contradição que permeia toda a história do modo de produção
capitalista: de um lado, os trabalhadores, possuidores de uma só mercadoria, sua força de
trabalho; de outro, o capitalista, proprietário dos meios de produção.
A cooperação se manifestará também na manufatura, porém, abandona sua feição simples e
adquire sua forma clássica, como no processo biológico da adolescência, quando os jovens
vão perdendo suas feições infantis e assumindo formas de adulto.
É uma forma de cooperação para expandir as bases técnicas do capitalismo, fase que data de
meados do século XVI até o último terço do século XVIII.
Segundo Marx (1982),
A manufatura, portanto, se origina e se forma, a partir do artesanato, de duas
maneiras. De um lado, surge a combinação de ofícios independentes diversos que
perdem sua independência e se tornam tão especializados que passam a constituir
apenas operações parciais do processo de produção de uma única mercadoria. De
outro, tem sua origem na cooperação de artífices de determinado ofício,
decompondo o ofício em suas diferentes operações particulares, isolando-as e
individualizando-as para tornar cada uma delas função exclusiva de um trabalhador
especial. A manufatura, portanto, ora introduz a divisão do trabalho num processo de
produção ou a aperfeiçoa, ora combina ofícios anteriormente distintos. Qualquer que
seja, entretanto, seu ponto de partida, seu resultado final é o mesmo: um mecanismo
de produção cujos órgãos são seres humanos (p. 388-389).
18
A forma como se produziam relógios, seguindo o exemplo referido por Marx, consistia em
transformar o produto individual do artífice em produto social de numerosos trabalhadores
parciais, cada um com uma atividade específica. O processo de trabalho não dependia da
necessidade de se passar cada uma das peças que compõe o relógio de mão em mão, mas de
cada trabalhador produzir uma única peça do maquinismo, muitas vezes em seu próprio
domicílio. A montagem do relógio era executada normalmente por um único trabalhador, que
reunia todas as pequenas partes formando o relógio. A produção de agulhas exemplifica uma
outra maneira de se aumentar a produtividade do trabalho na manufatura, através de sua
divisão, do parcelamento das atividades do artesão, e de sua posterior reunião, através da
conexão das diversas atividades executadas pelos trabalhadores parciais. Assume caráter
cooperativo na medida em que um certo número de trabalhadores é empregado de forma
simultânea, realizando simultaneamente atividades parciais que, em conjunto, resultarão em
determinado produto. Essa relação de dependência obriga cada trabalhador a empregar o
tempo certo na execução de suas tarefas, obedecendo princípios de continuidade,
uniformidade, regularidade, ordenamento, tudo isto na mesma intensidade. A cooperação é a
combinação de forças individuais transformadas em forças coletivas, é a união da destreza,
habilidade, rapidez, e da força.
Essa característica polivalente do trabalhador coletivo suprime todas as dificuldades do
trabalhador individual, transformando o trabalhador em órgão infalível e dinâmico,
assemelhado à peça de um maquinismo. O trabalhador assume uma função única, ou seja,
torna-se um trabalhador limitado à realização de uma única tarefa no processo de trabalho,
torna-se um trabalhador parcial, incapaz de realizar o conjunto de tarefas demandadas para a
execução de determinado produto. Não só o trabalho é dividido, subdividido e repartido entre
diversos indivíduos, como também o trabalhador vê-se fragmentado e metamorfoseado em
um trabalhador desqualificado. Quanto mais se divide o trabalho artesanal, mais se
desqualifica o trabalhador, através da redução do valor da força de trabalho, e da contribuição
cada vez maior para a proletarização do trabalhador.
Estabelecer a diminuição do tempo de trabalho na produção de mercadorias, como meio para
reproduzir o capital em escala ampliada, foi possível no período manufatureiro através do
desenvolvimento de várias estratégias de cooperação. Esse meio de aumento da produtividade
não se assemelha em nada ao incremento da produtividade obtido com o uso da maquinaria,
19
embora a contínua divisão do trabalho e aperfeiçoamento dos instrumentos de trabalho na
manufatura tenham contribuído para o desenvolvimento dos primeiros maquinismos:
o período manufatureiro simplifica, aperfeiçoa e diversifica as ferramentas,
adaptando-as às funções exclusivas especiais do trabalhador parcial. Com isso, cria
uma das condições materiais para a existência da maquinaria, que consiste numa
combinação de instrumentos simples (MARX, 1982, p. 392).
A subdivisão do trabalho na manufatura cria condições para aperfeiçoar ainda mais a divisão
do trabalho, permite às manufaturas se transformarem em outras manufaturas, de acordo com
a variedade de matéria-prima. A fiação e tecelagem de seda na França, que em meados do
século XVIII conhecia mais de cem variedades de tecido, obrigava os aprendizes a se
dedicarem a uma única espécie de fiação, conforme a região do país, de tal maneira que cada
região estava especializada em um único tipo de seda.
A manufatura, além de criar a primeira forma tipicamente capitalista de divisão do trabalho, o
trabalhador coletivo, cria também a estruturação fragmentária da classe trabalhadora, ao
transformá-la em “trabalho vivo”. Permitiu a introdução da racionalidade fabril e do sistema
de máquinas nas fábricas, embora não estivesse criado o modo de produção especificamente
capitalista. Podemos dizer que as relações de produção já se dão com base na extração de
mais-valia a partir da exploração do trabalho assalariado, através do prolongamento da
jornada de trabalho. A contradição capital - trabalho ainda não havia se desenvolvido
completamente.
De acordo com Marx [apud GORZ (org.), 1976, p. 27],
A divisão do trabalho na sua forma capitalista- e, nas bases históricas dadas, ela não
poderia assumir nenhuma outra forma- não é mais do que um método particular de
produzir mais-valia relativa ou de, à custa do trabalhador, aumentar o rendimento do
capital, aquilo a que se chama de riqueza social. À custa do trabalhador, desenvolve
a força coletiva do trabalho para o capitalista. Cria circunstâncias novas que
asseguram a dominação do capital sobre o trabalho. Apresenta-se, portanto, como
um progresso histórico, uma fase necesria na formação econômica da sociedade,
e como um meio civilizado e requintado de exploração (...) (grifo do autor).
20
A consolidação da indústria moderna se dá no momento em que o “instrumental de trabalho
se transforma de ferramenta manual em máquina". Ainda nas palavras de Marx (1982), “não é
o trabalho, mas o instrumento de trabalho que serve de ponto de partida para a máquina” (p.
432).
É comum, especialmente nos livros didáticos, indicar a diferença entre a produção
manufatureira e aquela fundada na indústria moderna, pelo fato de ser a primeira movida por
força humana, enquanto a força motriz da segunda é de origem natural, conscientemente
aplicada à produção: “O instrumental de trabalho, ao converter-se em maquinaria, exige a
substituição da força humana por forças naturais, e da rotina empírica pela aplicação
consciente da ciência” (MARX, 1982, p. 439).
Outra diferença, segundo Marx, independentemente da força motriz, está na transferência da
ferramenta manuseada pelo homem para um mecanismo, a máquina, que toma o lugar da
ferramenta, ainda que, inicialmente, o homem permaneça sendo a fonte de força motriz, como
no caso das máquinas de costura domésticas. Mas, com a chegada da Revolução industrial,
torna-se possível adaptar a máquina à ferramenta antes manipulada pelo homem. A habilidade
manual do trabalhador deixa de ocupar posição de destaque, assim como o trabalhador
anteriormente hábil, especializado. Sua atividade passa a ser, nessa fase, a de acompanhar a
máquina, seguindo o ritmo por ela imposto.
Na manufatura, assim como já ocorria nas corporações de ofício, o trabalhador se serve das
ferramentas de trabalho, enquanto na produção fabril, ele serve a máquina. O trabalho vivo
(trabalhadores) é incorporado a um mecanismo morto (máquinas), e sua existência independe
do trabalhador. Segundo Marx [apud GORZ (org.), 1976, p. 29], "O meio de trabalho
convertido em autômato ergue-se perante o operário, durante o próprio processo de trabalho,
sob a forma de capital, de trabalho morto que domina e suga a sua forma viva"
Duas fases de desenvolvimento da indústria moderna são descritas por Marx. Na primeira, a
"cooperação simples", existe apenas "na fábrica um conglomerado de máquinas semelhantes e
que trabalham simultaneamente", usando uma única fonte de energia, e o produto é feito por
inteiro por uma máquina. Na outra, um "complexo sistema de maquinaria", onde o produto
atravessa uma série conexa de processos detalhados, realizado por uma cadeia de máquinas
interligadas. Torna-se um "sistema automático de maquinaria" quando ocorre o
21
aperfeiçoamento desse sistema complexo realizando todo o sistema produtivo, e os
trabalhadores passam a agir como simples apêndices das máquinas.
Conforme observou Marx (1982):
A máquina da qual parte a revolução industrial substitui o trabalhador que maneja
uma única ferramenta por um mecanismo que ao mesmo tempo opera com certo
número de ferramentas idênticas ou semelhantes àquela, e é acionado por uma força
motriz, qualquer que seja sua forma. Temos então a máquina mais ainda como
elemento simples da produção mecanizada.(...) Depois que os instrumentos se
transformam de ferramentas manuais em ferramentas incorporadas a um aparelho
mecânico, a força motriz, o motor adquire uma forma independente, inteiramente
livre dos limites da força humana. (...) Uma máquina motriz, um motor, pode agora
impulsionar ao mesmo tempo muitas máquinas- ferramenta. Com o número das
máquinas- ferramenta impulsionadas ao mesmo tempo, aumenta o tamanho do
motor e o mecanismo de transmissão assume grandes proporções (p. 428-431).
O desenvolvimento e aprimoramento da indústria, a forma com que revolucionou a produção
obrigou vários segmentos do ramo industrial a submeter-se à sua condição. Torna-se
impossível para a indústria manufatureira, com suas máquinas-ferramentas, produzirem
determinados produtos mais pesados e mais complexos. Em meados do século XIX, devido a
esse impulso, máquinas que produzem máquinas são projetadas para suprir essa demanda:
(...) Assim, a mecanização da fiação torna necessária a mecanização da tecelagem e
ambas ocasionam a revolução química e mecânica no branqueamento, na
estampagem e na tinturaria. A revolução na fiação do algodão provocou a invenção
da descaroçadora de algodão, com que se torna possível a produção de algodão na
enorme escala então atingida. A revolução no modo de produção da indústria e da
agricultura tornou sobretudo necessária uma revolução nas condições gerais do
processo social da produção, isto é, nos meios de comunicação e de transporte.(...)
Além das transformações radicais ocorridas na construção de navios a vela, o
sistema de transportes e comunicações foi progressivamente adaptado ao modo de
produção de grande indústria com a introdução dos navios a vapor fluviais, das vias
férreas, dos transatlânticos e do telégrafo. Mas as massas gigantescas de ferro que
tinham então de ser forjadas, soldadas, cortadas, brocadas e moldadas, exigiam
máquinas ciclópicas cuja produção não se poderia conseguir através dos métodos da
manufatura (MARX, 1982, p. 438).
Na indústria, o uso de máquinas obedece a alguns objetivos, como ao da imposição do capital
em baratear o preço das mercadorias, e ao da diminuição do tempo de trabalho socialmente
necessário à reprodução da força de trabalho do operário, a fim de aumentar o tempo de
trabalho excedente fornecido pelo trabalhador gratuitamente ao capitalista. Percebemos aqui,
22
segundo o pensamento de Marx, que o desenvolvimento das máquinas assegura ao seu
proprietário um novo meio para a extração de trabalho excedente.
Não se pode afirmar com precisão a época exata em que a produção capitalista manufatureira
se separou da produção capitalista baseada na indústria moderna, onde uma desapareceu do
cenário produtivo para dar lugar à outra. É inegável, porém, que a maquinaria torna-se o
elemento que revoluciona o modo de produção, à medida em máquinas passam a ser
produzidas por máquinas. Isso liberta o capital definitivamente da base técnica pré-capitalista,
fundada no artesanato: “A indústria moderna teve então de apoderar-se de seu instrumento
característico de produção, a própria máquina, e de produzir máquinas com máquinas. Só
assim criou ela sua base técnica adequada e ergueu-se sobre seus próprios pés” (MARX,
1982, p. 438).
Com o desenvolvimento e aprimoramento da produção capitalista fundada na maquinaria,
transita-se rapidamente a uma maneira mais sofisticada de organização da produção: a
indústria moderna, cuja forma mais acabada é a fábrica. Isso torna viável do ponto de vista do
capital a extração da mais - valia, por meio de prolongamento da jornada de trabalho,
associada a um aumento da produtividade. O que torna possível o aumento violento do
trabalho não pago, assegurando ao trabalhador apenas sua sobrevivência e reprodução,
interesses essenciais do capital.
O advento da produção fabril torna supérflua a força muscular do trabalhador. O trabalhador
qualificado da manufatura é substituído pelo trabalhador semi-qualificado, que precisa
ajustar-se ao ritmo da máquina como condição de ser útil. Qualquer pessoa, mesmo a que
ainda não tenha pleno desenvolvimento físico, pode se adaptar ao ritmo contínuo e uniforme
imposto pelas máquinas. O emprego crescente da mão-de-obra feminina e sobretudo da
infantil realizada pelo capital, barateia a força de trabalho masculina e reduz ainda mais o
salário pago a mulheres e crianças. Sobre a vida nas fábricas, Marx (1982) escreve:
A subordinação técnica do trabalhador ao ritmo uniforme do instrumental e a
composição peculiar do organismo de trabalho, formado de indivíduos de ambos os
sexos e das mais diversas idades, criam uma disciplina de caserna, que vai ao
extremo no regime integral da fábrica. Por isso, desenvolve-se plenamente o
trabalho de supervisão anteriormente mencionado, dividindo-se os trabalhadores em
trabalhadores manuais e supervisores de trabalho, em soldados rasos e em
suboficiais do exército da indústria (p. 485).
23
Alguns registros encontrados sobre a vida dos trabalhadores nas fábricas, sobretudo nas
inglesas, mostram o grau de submissão e exploração que lhes era imposto, além dos contínuos
acidentes de trabalho. Conforme descreve Marx, em 1864, as indústrias de linho da Irlanda,
recrutavam pessoas que trabalhavam nas lavouras:
(...) principalmente menores e mulheres, os filhos, as filhas e as esposas dos
pequenos arrendatários vizinhos sem qualquer experiência de trabalhos com
máquinas, para alimentar as máquinas de estomentar o linho. Os acidentes, pelo seu
número e pela sua espécie, não tem paralelo na história da maquinaria. Num único
estabelecimento de estomentar em Kildinan perto de Cork, houve, de 1852 a 1856,
seis casos de morte e 60 de mutilações graves, que poderiam ter sidos todos eles
evitados por meio de dispositivos muito simples, ao preço de alguns xelins (...)
(MARX, 1982, p. 551).
Os contratos de trabalho firmados quando o operário tinha aproximadamente nove anos de
idade deveriam ser cumpridos rigorosamente. O empregador tinha o direito de punir os
trabalhadores por atrasos de minutos no início de cada jornada de trabalho. Em alguns casos,
se o atraso fosse superior a dez minutos, a entrada do trabalhador na fábrica era barrada e ele
sofria o desconto de um quarto de seu salário. Caso o trabalhador quebrasse o contrato de
trabalho, o tribunal de justiça era o órgão competente para definir e aplicar a penalidade
imposta ao trabalhador; na maioria das vezes, o trabalhador era condenado e sua condenação
implicava em dois anos de prisão, em média.
Com o advento da indústria moderna, origina-se o fenômeno do desemprego, causado pelo
aumento da produtividade, e que não está mais nas mãos do trabalhador, mas no
aperfeiçoamento do instrumental de trabalho (quanto mais se desenvolve a maquinaria, maior
tende a ser a taxa de desemprego) À medida em que o uso de máquinas torna dispensável a
presença de grande número de trabalhadores (o capital constante tende a ser cada vez maior
do que o variável), a tendência dos salários é de queda (quanto maior a oferta de força de
trabalho em relação à demanda, menor o preço do salário). Com a redução do valor dos
salários, o trabalhador assalariado não é mais capaz de promover o sustento de sua família.
Essa situação leva sua mulher e filhos a ingressar no mercado de trabalho. O aumento
crescente de trabalhadores buscando vender sua força de trabalho deprecia ainda mais os
salários, ao mesmo tempo em que amplia a oferta de força de trabalho em relação à procura.
O resultado é a formação de um contingente permanente de desempregados, cuja taxa varia
conforme os períodos de expansão ou de retração da produção capitalista. Marx designa esse
24
contingente como ‘exército industrial de reserva’
3
, um contingente de força de trabalho
sempre disponível para o capital e usado pelo capital para depreciar os salários pagos e para
pressionar o trabalhador a ajustar-se às exigências dos capitalistas individuais, sob pena de
demissão.
(...) A parte da classe trabalhadora que a maquinaria transforma em população
supérflua, não mais imediatamente necessária à auto-expansão do capital, segue uma
das pontas de um dilema inarredável: ou sucumbe na luta desigual dos velhos ofícios
e das antigas manufaturas contra a produção mecanizada, ou inunda todos os ramos
industriais mais acessíveis, abarrotando o mercado de trabalho e fazendo o preço da
força de trabalho cair abaixo de seu valor. Quando a máquina se apodera, pouco a
pouco, de um ramo de produção, produz ela miséria crônica na camada de
trabalhadores com que concorre (MARX, 1982, p. 493).
Em meio a tanto progresso e desenvolvimento do instrumental de trabalho, dos meios de
produção, as condições de vida dos trabalhadores entretanto eram péssimas: crianças eram
obrigadas a trabalhar em ambientes de trabalhos pesados, sacrificando sua infância. Muitas
usavam um palavreado inadequado, pois em sua convivência com adultos era comum a
utilização desse tipo de vocabulário. Quanto às meninas, muitas transformavam-se em
mulheres ainda crianças, o crescimento alarmante da prostituição entre meninas filhas de
trabalhadores era surpreendente. O uso indiscriminado do álcool e de drogas entre os
trabalhadores era algo rotineiro, pois a embriaguez era um recurso necessário para suportar as
condições de trabalho.
Segundo Hobsbawm (1986):
A bebida não era o único sinal desta desmoralização. O infanticídio, a prostituição, o
suicídio e a demência tem sido relacionados com este cataclismo econômico e
social, (...) O mesmo se deu em relação ao aumento da criminalidade e da violência
crescente e freqüentemente despropositada que era uma espécie de ação pessoal cega
contra as forças que ameaçavam engolir os elementos passivos. A difusão das seitas
e cultos de caráter místico e apocalíptico durante este período indica uma
incapacidade semelhante em lidar com os terremotos da sociedade que destroçavam
vidas humanas. As epidemias de cólera, por exemplo, provocavam renascimentos
religiosos na católica cidade de Marselha, bem como no País de Gales, de maioria
protestante (p. 225).
3
"A existência de uma reserva da força de trabalho desempregada e parcialmente empregada é uma
característica inerente à sociedade capitalista, criada e reproduzida diretamente pela própria acumulação do
capital, a que Marx chamou de exército de reserva do trabalho ou exército industrial de reserva".
(BOTTOMORE, T. Dicionário do Pensamento Marxista, Rio de Janeiro, Zahar Ed.: 1988 , p. 144).
25
As condições de insalubridade e o grau de pobreza a que o trabalhador fabril era submetido
vinha desde seus lares até seus postos de trabalho; é conhecida a frase de Fourier
4
, que
nomeou as fábricas de "penitenciárias abrandadas". A falta de ventilação, luz, espaço e
essencialmente de equipamentos de segurança, motivaram algumas revoltas no interior das
organizações fabris, vários casos de sabotagem de máquinas foram registrados nesse período.
A forma com que os trabalhadores reagiam quebrando máquinas demonstra-nos a falta de
organização e até mesmo de consciência de classe. No início do século XIX, na Inglaterra,
considerado o país mais desenvolvido, essas contradições de classe já estavam postas: classe
operária, proletários de um lado, de outro capitalistas, patrões.
Em meio às contradições da sociedade, a sofisticação e o progresso técnico da indústria já
fazem parte do cotidiano. A introdução do vapor proporcionou o rompimento dos limites
anteriores à essa complexidade, e a cada etapa percorrida pelos avanços da ciência
correspondia imediatamente algum progresso da indústria, e, como observou Dobb (1997):
(...) cada avanço da máquina tendia a ter, por conseqüência, uma especialização
maior das unidades da equipe humana que a operava, e a divisão do trabalho,
simplificando os movimentos individuais, facilitava ainda outras invenções, pelas
quais esses movimentos simplificados eram imitados por uma máquina (p. 328).
Várias economias européias e a norte-americana servem como modelo de industrialização e
empreendimentos. A França foi pioneira na criação de loja de departamentos, criação de
produtos de luxo para atender uma demanda mais exigente do que a de consumo em massa,
criação de companhias de gás que abasteciam várias regiões francesas, mas, nunca ocupou o
lugar de destaque ocupado pela Inglaterra. Nos Estados Unidos, a consolidação da indústria
do aço, petróleo, carnes enlatadas, alastrou-se para outros segmentos, como os do tabaco,
máquinas de costura, materiais elétricos e de borracha, entre outros, impulsionado o
4
(...)" Tendia Fourier a ver, na marcha da sociedade, o caminho para o estabelecimento de uma harmonia
universal, a partir do controle das paixões humanas. Estabelece Fourier uma solidariedade básica entre a
sociedade global e os padrões educacionais, ao admitir que um coletivismo social leva a uma pedagogia não
individualista. Inicialmente, Fourier ataca a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão oriunda da
Revolução Francesa, ao denunciá-la como uma 'carta incompleta e desprezível, porque omitiu o direito ao
trabalho, sem o qual todos os outros são inúteis." (TRAGTENBERG, M. Burocracia e Ideologia, São Paulo,
Ed. Ática: 1992, p. 64).
26
crescimento de futuras indústrias norte-americanas, que se tornariam gigantes industriais
(SELLERS, MAY, MCMILLEN, 1985, p. 219).
Assim, no interior destas organizações, à medida que absorvem maiores contingentes
humanos, emergem problemas que se assemelham àqueles apontados ao longo dos séculos,
por teóricos da política e do conflito: como preservar nos membros que compõem esta nova
estrutura organizacional a satisfação de seus interesses individuais, conservando, ao mesmo
tempo, intactos os interesses maiores da organização? É neste contexto que surgem a teorias
voltadas para o equacionamento dos conflitos nas organizações, uma vez que as empresas
reúnem, sob seus tetos, duas classes sociais com interesses sociais, políticos e econômicos
opostos: de um lado o trabalhador assalariado e, de outro, o capitalista.
1.2 A RACIONALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO CAPITALISTA E A EMERGÊNCIA DA
GERÊNCIA CIENTÍFICA
O surgimento da gerência científica, no final do século XIX, através de estudos desenvolvidos
por Frederick Winslow Taylor, que culminou com o trabalho publicado "Princípios de
Administração Científica", no ano de 1911, requer um breve histórico do panorama
econômico dos Estados Unidos com a intenção de localizar o contexto em que esses estudos
efetivaram-se.
Vemos no desenvolvimento capitalista dos Estados Unidos, um forte precursor: a indústria
desse país se tornou a primeira grande potência industrial no período que vai do fim da Guerra
Civil (1861-1865) à Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918).
Com a derrota do Sul, região essencialmente agrícola e de grandes latifúndios, o Norte
manufatureiro passou a dominar. As estradas de ferro que antes transportavam armas,
alimentos, soldados e recursos para as batalhas passaram a transportar outros produtos,
permitindo o intercâmbio das duas regiões, graças entretanto, a extensão da rede ferroviária.
É importante destacar na formação econômica dos Estados Unidos o problema da escassez da
mão-de-obra. O crescimento do Oeste estadunidense oferecia oportunidades para a iniciativa
individual, fato que desviava a mão-de-obra destinada ao setor industrial do Leste. Outro dos
27
fatores, considerado problemático, foi a escassa oferta de trabalhadores e de os salários pagos
nos Estados Unidos serem superiores aos salários europeus.
O sonho de poder ter uma vida próspera, com melhores salários atraiu milhares de pessoas
oriundas de outras partes do globo, sobretudo da Europa, para fazer a América, ocasionando
um rápido crescimento populacional. Com o Homestead Act, assinado em 1862, concedendo
terras na costa oeste, (aproximadamente 160 acres aráveis) juntamente com o crescimento das
ferrovias, fez com que o espaço cultivado crescesse constantemente.
Indústrias siderúrgicas, petrolíferas, energéticas, automobilísticas (Ford), realizaram a
produção em massa através da linha de montagem sustentada por um sistema econômico que
criava condições para esse rápido desenvolvimento. Nesse momento, a concorrência era
mínima, reduzindo o risco de crises, permitindo um planejamento da produção de longo
prazo, impulsionando e fortalecendo as empresas tanto no plano político como no econômico.
Destaca-se também a fragilidade organizacional dos operários, das organizações trabalhistas,
diante da ausência de uma legislação fabril.
Em 1835, na Filadélfia, ocorreu a primeira greve geral e dos trabalhadores, paralisando suas
atividades durante um dia. Mas, sem dúvida, a greve dos trabalhadores de Chicago, no dia 1
de maio de 1886, marcou a história dos trabalhadores em luta por melhorias nas condições de
trabalho, espalhando-se pelo mundo. Um ano antes, facções anarquistas e socialistas
fundaram os Sindicatos Operários e a Federação dos Grêmios, permitindo aos trabalhadores
organizarem-se para a paralisação do dia 1 de maio. Trezentos e cinqüenta mil operários das
fábricas pararam suas atividades protestando contra os baixos salários, a exploração do
trabalho infantil, (crianças oriundas das famílias dos operários), a jornada de 12 horas, e as
péssimas condições de vida que eram obrigados a viver. Os comícios do 1 de maio
transcorreram pacificamente, já no segundo dia houve repressão para conter os protestos. O
saldo foi trágico, ocasionando várias mortes, inclusive por enforcamento e prisões dos líderes
do movimento. Em 1889, quando é fundada a segunda Internacional Socialista, os
acontecimentos de 1886 passam a entrar no calendário como dia do trabalho, uma
homenagem aos trabalhadores mortos de Chicago. Os movimentos surgidos nos anos 1870,
fizeram nascer a primeira grande central sindical, a American Federation of Labor
(AFL).Outra central sindical que surge em 1905 foi a Independent Workers of the World
(IWW).
28
É neste contexto que surge a Gerência Científica, período em que a exploração do trabalho na
sociedade capitalista desenvolvida, sobretudo na economia dos Estados Unidos se torna
bastante acirrada. O capitalismo do final do século XIX organizou novas formas de gestão do
trabalho e da produção, impulsionado pela II Revolução Industrial.
Conforme observou Braverman (1981):
A gerência Científica, como é chamada, significa um empenho no sentido de aplicar
os métodos da ciência aos problemas complexos e crescentes do controle do trabalho
nas empresas capitalistas em rápida expansão. Faltam-lhe as características de uma
verdadeira ciência porque suas pressuposições refletem nada mais que a perspectiva
do capitalismo com respeito às condições da produção. Ela parte, não obstante um
ou outro protesto em contrário, não do ponto de vista humano, mas do ponto de
vista do capitalista, do ponto de vista da gerência de uma força de trabalho refratária
no quadro de relações sociais antagônicas. Não procura descobrir e confrontar a
causa dessa condição, mas a aceita como um dado inexorável, uma condição
‘natura’. Investiga não o trabalho em geral, mas a adaptação do trabalho às
necessidades do capital. Entra na oficina não como representante da ciência, mas
como representante de uma caricatura de gerência nas armadilhas da ciência (p. 82).
Quando nos deparamos com a produção nas sociedades industrializadas sob a organização do
capital, temos que considerar o processo de desenvolvimento do trabalho, as relações entre
trabalhadores e capital, em uma palavra: a supremacia da máquina sobre os trabalhadores. Em
outras palavras: a aplicabilidade da gerência científica depende do controle pelo homem do
processo de trabalho realizado pela máquina. O taylorismo tratou de retirar dos trabalhadores,
passando para as mãos dos capitalistas o controle de cada fase e atividade dentro do processo
de trabalho. Retirou também o controle sobre o modo de execução, pertencia ao trabalhador, e
seu conhecimento prático adquirido da experiência e tradição de seu trabalho.
De acordo com Braverman (1981):
A massa humana está submetida ao processo de trabalho para os fins daqueles que
a controlam mais que para qualquer fim geral de "humanidade" como tal. Ao
adquirir assim forma concreta, o controle humano sobre o processo do trabalho
converte-se no seu contrário, e vem a ser o controle do processo de trabalho sobre
massas de homens. A maquinaria entra no mundo não como serva da "
humanidade," mas como instrumento daqueles a quem a acumulação de capital
proporciona a propriedade das máquinas. A capacidade humana para controlar o
processo de trabalho mediante maquinaria é dimensionada pelo gerenciamento
desde o início do capitalismo como o meio principal pelo qual a produção pode ser
controlada não pelo seu produtor imediato mas pelos proprietários e representantes
do capital (p. 167, grifo do autor).
29
Quando se instaurou o taylorismo, o capitalismo estava numa fase monopolista, fase que
iniciava um novo padrão de acumulação, nos moldes da produção em massa, potencializando
e intensificando o trabalho, a fim de promover a reprodução do capital, consequentemente,
aumentando o desemprego e diminuindo os salários. É a fase do conflito aberto entre capital e
trabalho (HELOANI, 1996). É o momento para a aplicação de novos métodos racionalizantes
na produção, no qual o trabalhador tem que se acostumar ao ritmo constante e uniforme da
máquina, tem que submeter-se docilmente à rotina monótona do trabalho.
Em Princípios de Gerência Científica, Taylor (1970) diz que o objetivo principal da
administração é o de "assegurar o máximo de prosperidade do patrão e, ao mesmo tempo, o
máximo de prosperidade do empregado". De acordo com Taylor (1970), o "máximo de
prosperidade" é bastante amplo, tanto para o patrão como para o empregado. Ao primeiro
cabem grandes lucros e a solidificação nos negócios, para evitar uma prosperidade apenas
momentânea, garantindo a sua permanência. Já para os trabalhadores, salários altos - de
acordo com sua produtividade - e homens eficientes, respeitando a natureza de cada um, (o
homem certo no lugar certo).
Segundo as palavras de Taylor (1970),
No caso de uma indústria mais complexa, estará perfeitamente esclarecido que
poderá ser obtida a maior prosperidade permanente do operário, acompanhada da
maior prosperidade permanente do patrão, quando o trabalho da empresa for
realizado com o menor gasto de esforço humano, combinado com o menor gasto das
matérias-primas, com a menor inversão de capital em instalações de máquinas, em
edifícios etc. Ou, em outras palavras, que a maior prosperidade decorre da maior
produção possível dos homens e máquinas do estabelecimento, isto é, quando cada
homem e cada máquina oferecerem o maior rendimento possível. Assim, a menos
que seus homens e máquinas estejam produzindo mais do que os de seus
concorrentes, é claro que não podem seus operários receber mais do que operários
que trabalham para seus competidores. (...) Em uma palavra, o máximo de
prosperidade somente pode existir como resultado do máximo de produção (p. 25).
Para Taylor (1970), existe uma relação de causa e efeito entre produtividade e salário. Para
ele, o aumento da produtividade garante ao trabalhador um aumento de salário, através do
pagamento por peça. Essa concepção tem um caráter contraditório, pois a partir do momento
em que o operário começa a produzir mais, cabe à gerência reduzir o valor pago pela peça,
submetendo os trabalhadores à super exploração, ou seja, o trabalhador deve produzir mais e
receber menos. Em muitos casos, o gerente ou supervisor tem a função de ajustar a máquina
30
para aumentar a produção, pois se o trabalhador consegue trabalhar naquele ritmo e ainda
assim obter a cota, significa que o trabalho está fácil e é possível torna-lo mais rápido. Na
maioria da vezes era o próprio Taylor quem estabelecia o volume de produção de cada
trabalhador em cada dia de trabalho.
Segundo Tragtenberg (1980),
Taylor tinha o cronômetro como Bíblia, era um tipo compulsivo que passava
contando seus passos, não bebia, não fumava, era vítima de insônias e pesadelos. É
baseada em critérios tayloristas que a General Motors paga sua mão-de-obra
dividindo a hora em 10 períodos de 6 minutos, pagando ao trabalhador pelos
décimos de hora que trabalha; é a realização da transformação da ética puritana "
quem não trabalha não come" em quem não trabalha um dia " justo" não recebe um
salário "justo” (p. 97).
A resposta dos trabalhadores era o descontentamento, gerando entre operários e gerência um
clima hostil, levando muitas vezes à paralisação das máquinas, causada por sabotagens. As
respostas de Taylor se manifestavam através de pesadas multas impostas aos operários e, em
casos mais graves, o trabalhador era sumariamente demitido.
Nas organizações capitalistas, a lógica da reprodução do capital estrutura-se na intensificação
da exploração da força de trabalho, na extração da mais-valia. Nas relações capitalistas de
produção, o tempo de trabalho socialmente necessário tende a se encurtar, diminuir, na
medida em que o tempo de trabalho destinado a produção de mais-valia for aumentando. Com
esse aumento, a lógica capitalista baseada em princípios de racionalização da produção,
proporciona os mecanismos de aumentar a produtividade; sem que o trabalhador receba por
isso. A racionalização da produção, por meio de técnicas gerenciais, proporciona uma
diminuição no tempo de produção de um produto ou de uma peça, aumentando, portanto, a
capacidade produtiva. Segundo Braverman (1981), a administração tem uma função especial
na sociedade capitalista, onde a organização dos trabalhadores é controlada por gerentes,
assistentes de gerentes e supervisores:
(...) A gerência veio a ser administração, que é um processo de trabalho efetuado
para fins de controle no seio da empresa, e efetuado, além do mais, como um
processo de trabalho rigorosamente análogo ao processo da produção, embora ele
não produza artigo algum que não seja a operação e coordenação da empresa.
31
Em O Capital, Marx já chamara a atenção para a forma de extração da mais-valia, condição
vital do sistema capitalista de produção. De acordo com Marx, capitalista é aquele que detém
a propriedade dos meios de produção, portanto, o fato de se produzir mercadorias, quaisquer
que sejam elas: casacos, mesas, bicicletas, não são frutos de uma iniciativa particular, movida
pelo gosto ou "paixões" de produzi-las, mas, nas palavras de Marx (1982), "por puro amor aos
valores de uso" (p. 211), mas sim pelo valor de troca que estas mercadorias adquirem. Ao se
produzir um valor de uso, cria-se um valor de troca, isto é, a condição de uma mercadoria
poder ser vendida. É no processo de produção que se gera a mais valia apropriada pelo
capital, meio para sua reprodução ampliada:
Sabemos que o valor de qualquer mercadoria é determinado pela quantidade de
trabalho socialmente necessário a sua produção. Isso se aplica também ao produto
que vai para as mãos do capitalista como resultado do processo de trabalho. De
inicio temos, portanto de pela quantidade de trabalho materializado em seu valor de
uso, pelo tempo de trabalho quantificar o trabalho materializado nesse produto
(MARX, 1982, p. 211).
A lei do capital, que consiste essencialmente, em criar mais-valia, permeia todo processo de
produção, assumindo uma característica de processo de valorização. Essa lei pode ser
representada por dinheiro transformado em capital, denominada por Marx de renovação
cíclica do processo de produção e circulação capitalista: "por meio do capital é produzida a
mais-valia e da mais-valia mais capital” (FERREIRA, 1992, p. 121). Da transformação inicial
de dinheiro em capital, temos mais capital, que por sua vez gera mais-valia, que se transforma
em mais capital, portanto, realizando seu ciclo em acumulação de capital. MÉSZÁROS
(1989) diz que
(...) o capital auto-expansivo deve mostrar um retorno lucrativo na totalidade de suas
unidades aditivas, compondo assim não só as suas próprias forças, mas também as
complicações (e contradições) que acompanham a necessidade de converter mais-
valia em mero pressuposto do novo ciclo de expansão. E assim esse processo tem de
continuar indefinitivamente, não importa quão imensa já seja a grandeza do capital
acumulado, que precisa ser considerado em todas as suas formas (incluso, é claro, os
meios de produção) como nada mais do que mero ponto de partida do renovado
esforço de expansão (p. 31).
32
Essa forma de acumulação de riqueza, precisa também, para se reproduzir em escala
assombrosa, um "exército industrial de reserva", ou seja, de trabalhadores submetidos às leis
do capital.
Assim é justificada a eficácia desse método de prosperidade proposto por Taylor, "(...) o
máximo de prosperidade somente pode existir como resultado do máximo de produção”. Essa
é a razão também da necessidade de haver, entre trabalhadores e empresários, um espírito de
equipe semelhante ao dos jogadores de basquete norte-americanos, e ao dos jogadores
ingleses de cricket: "Fazem de tudo a seu alcance para conseguir o maior número possível de
pontos. O sentimento de grupo é tão forte que, se algum homem deixa de dar tudo de que é
capaz no jogo, é considerado traidor e tratado com desprezo pelos companheiros" (TAYLOR,
1995, p. 26). Para Taylor, o fato de um trabalhador dar tudo de si para alcançar uma "boa
cota", contagiaria o espírito de outros trabalhadores que também iriam aderir a ideologia da
equipe do máximo rendimento possível. Para o criador da Gerência Científica, a ótima
conduta do trabalhador estaria embebida no sentimento de fazer uma economia própria para
“prosperar”. É o Homo Economicus, ou seja, a idéia de que o homem é motivado por ganhos
financeiros. O que impedia o desenvolvimento desse espírito de equipe, idealizado por Taylor,
era justamente o seu oposto, o “fazer cera”. Taylor resumiu três causas dessa faceta:
Primeira - "O erro, que vem de época imemorial e quase universalmente disseminado entre
os trabalhadores, de que o maior rendimento do homem e da máquina terá como o resultado o
desemprego de grande número de operários.” (TAYLOR, 1985, p. 28).
Segunda - "O sistema defeituoso da administração, comumente em uso, que força os
empregados a fazer cera no trabalho, a fim de melhor proteger seus interesses.” (Idem, p. 28)
Terceira - "Os métodos empíricos ineficientes, geralmente utilizados em todas empresas,
com os quais o operário desperdiça grande parte de seu esforço.” (Id. ibid., p. 28).
A interpretação que Taylor atribui ao pensamento dos operários é equivocada, pois sabemos
que uma maior produção acarreta um menor custo de produção, que implicará diretamente
num custo menor da força de trabalho, na medida em que o mercado está repleto de homens
disponíveis. Esse aspecto possibilita um emprego maior de trabalhadores em outros setores. O
fator preguiça que Taylor atribui aos trabalhadores, classificando-os como indolentes naturais
33
e o seu comportamento como “vadiagem”, resulta do estranhamento
5
. Taylor seria,
certamente, incapaz de chegar a essa conclusão se não fosse um ideólogo comprometido com
o capital. Em seu horizonte, atenuar os conflitos entre capital e trabalho existentes jamais
esteve presente.
A respeito da contradição entre capital e trabalho, Marx (1984) considerava que
O trabalhador se torna tão mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a
sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador se torna uma
mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias cria. Com a valorização do
mundo das coisas aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos
homens. O trabalho não produz só mercadorias; produz a si mesmo e ao
trabalhador como uma mercadoria, e isto na proporção em que produz mercadorias
em geral.
(...) É da mesma maneira a religião. Quanto mais o homem põe em Deus, tanto
menos retém em si mesmo. O trabalhador coloca a sua vida no objeto; mas agora
ela não pertence mais a ele, mas sim ao objeto. Portanto, quão maior esta atividade,
tanto mais o trabalhador é sem objeto. Ele não é o que é o produto do seu trabalho.
Portanto, quão maior este produto, tanto menos ele mesmo é. A exteriorização do
trabalhador em seu produto tem o significado não só de que o seu trabalho se torna
um objeto, uma existência exterior, mas também que ela existe fora dele,
independente de e alheia a ele, tornando-se um poder autônomo frente a ele, //o
significado// de que a vida que ele conferiu ao objeto se lhe defronta inimiga e
alheia (p. 150-151, grifos do autor).
Na tentativa de analisar o pensamento de Taylor, frente ao gerenciamento científico, é
imprescindível resgatar na obra de Marx o papel da alienação
6
. Não é por vontade dos
trabalhadores, mas sim pela condição de subordinação em que estão submetidos, incapazes de
perceber esse caráter corrosivo em que suas atividades laborativas estão inseridas. A
"preguiça" e a "vadiagem" despontam como uma reação natural ao fruto do trabalho que não
lhes pertence, mas sim a um outro.
Outro fator que Taylor discutirá em Gerência Científica é a substituição do trabalho empírico,
aquele que o próprio operário aprende com seus colegas, pressupondo diferentes maneiras de
5
"A referência ao trabalho estranhado, visando ressaltar a oposição entre o operário e a sua criação, que lhe
aparece como um poder irreconhecível e hostil, parece propor um distanciamento em relação à teoria
feuerbachiana da alienação religiosa, ao mesmo tempo em que realça a dominação social inscrita no processo
de produção, diferenciando-a, portanto, daquela alienação que é um produto abstrato, espiritual, da consciência
mitificada" (FREDERICO, Celso. O jovem Marx, São Paulo: Cortez, 1995, p. 131).
6
Marx descobre que a alienação tem origem na vida econômica, ou seja, quando o trabalhador vende no
mercado a força de trabalho e, o produto resultado do seu esforço não lhe pertence e assume uma existência
independente dele. É a dicotomia concepção - execução do trabalho, a separação entre o pensar e o agir.
34
executá-lo, variando de acordo com o saber de cada um, podendo variar de inúmeras maneiras
pelo saber científico. Esta consiste em aplicar uma maneira elaborada no desempenho da
tarefa, através de estudos científicos, e que ao parecer não caberá ao trabalhador desenvolvê-
los. Entra em cena o papel dos engenheiros e dos cronômetros, a clara divisão do trabalho
entre gerência e trabalhadores, que tem por objetivo eliminar "a cera", anunciando o melhor
homem para cada tarefa, resultando numa produção mais eficaz, economizando tempo de
produção e do processo de trabalho. Taylor chama esse processo de "cooperação" estreita,
íntima e pessoal, entre a direção e o trabalhador. Cabe à administração analisar o processo de
trabalho para pôr em prática novas formas eficientes e repassá-las aos operários sob a forma
de padrões hierárquicos rígidos de execução, assegurados pela elaboração de normas,
instruções, regras de procedimentos, prêmios, sanções, etc. (TEIXEIRA, 1985).
Ainda menino, Taylor despontava essa maneira perfeccionista, mesmo em se tratando de jogo
de cricket, observava atentamente os movimentos e estudava a melhor maneira para o
aproveitamento do jogo, medindo rigorosamente o campo, o que irritava profundamente seus
colegas. Nascido em 20 de março de 1856, pertencente a uma família economicamente bem
resolvida que costumava viajar para a Europa, Taylor, sempre que possível, não dispensava
seus cadernos de anotação, onde escrevia sobre extração de sal, preços de seda preta, horários
de chegadas e partidas das carruagens, troca dos cavalos a cada sete milhas, etc. (GABOR,
2001).
A opção por ser aprendiz de uma oficina mecânica se deu pelo fato de, quando menino havia
forçado demais seus olhos, em virtude de muitos estudos, resultando num grau elevado de
astigmatismo, sem condições de tratamento naquela época. Nem mesmo o ingresso em
Harvard foi capaz de tira-lo da condição de aprendiz. Em 1878, entrou na Midvale Steel
Company, onde pode desenvolver seus estudos sobre os cortes de aço. E sem dúvida, a partir
daí, tornou-se cada vez mais obcecado pelos seus estudos.
Segundo a observação de Gabor (2001),
(...) foi na Midvale que ele começou a experimentar os elementos principais do que
viriam a ser as marcas registradas da gestão científica: estudo do tempo, dissecação
de cada tarefa em suas partes componentes, codificação de cada processo e o "pacto
faustiano" pelo qual a gerência imporia exigências e controles cada vez maiores
sobre os trabalhadores em troca de maior pagamento (p. 27).
35
Taylor estabeleceu quatro princípios de Gerência Científica dividindo-os em:
O primeiro princípio, fundamentava-se em “dissociação do processo de trabalho das
especialidades dos trabalhadores". (BRAVERMAN, 1974) Tratava-se da redução do saber do
trabalhador, momento em que o poder do capital apropria-se do saber operário para impor o
método mais lucrativo, restando ao trabalhador cumprir ordens prescritas pelos "gestores do
capital".
Eis um diálogo de Taylor e Schmidt
7
, um trabalhador de origem holandesa, que se submete a
carregar um vagão com ferro gusa, transportando 47 toneladas por dia:
- Bem, se você é um operário classificado deve fazer exatamente o que este homem
lhe mandar, de manhã à noite. Quando ele disser para levantar a barra e andar, você
se levanta e anda, e quando ele mandar sentar, você senta e descansa. Você
procederá assim durante o dia todo. E, mais ainda, sem reclamações. Um operário
classificado faz justamente o que se lhe manda e não reclama. Entendeu? Quando
este homem mandar você andar, você anda; quando disser sente, você deverá sentar-
se e não fazer qualquer observação. Finalmente, você vem trabalhar aqui amanhã e
saberá antes do anoitecer, se é verdadeiramente um operário classificado ou não
(TAYLOR, 1971, p. 46).
Através do diálogo de Taylor com Schmidt, fica evidente que os trabalhadores deveriam ter
esse perfil, ou seja, serem passivos diante das ordens, sem questionamentos, preocupados
apenas com uma perspectiva de prosperidade, garantindo não só ao patrão, como à
organização, a ausência de conflitos e realizando a plena acumulação de capital num clima de
harmonia.
O segundo princípio consistia em "selecionar cientificamente, depois treinar, ensinar e
aperfeiçoar o trabalhador". Na verdade, podemos interpretá-lo como parte integrante do
primeiro princípio, pois aqui, Taylor estabelece a separação entre o trabalho de concepção e o
de execução: o trabalhador, diante da organização do processo do trabalho, está diante de uma
arma contra o capital. Segundo a argumentação de Taylor, o trabalhador não revelaria
qualquer maneira ou método de tornar o trabalho mais produtivo, caso o descobrisse. O
conhecimento era guardado de tal forma que não viria jamais a contribuir para a ciência. Por
7
(...) "um imigrante alemão de inteligência ‘lerda’ mas com força e a energia de uma empilhadeira. Schmidt, de
acordo com Taylor, tinha exatamente a mentalidade ‘bovina’ necessária ao trabalho físico embrutecedor que
Taylor exigia de seus trabalhadores". (GABOR, A. Os filósofos do capitalismo: a genialidade dos homens que
construíram o mundo dos negócios. RJ: Campus, 2001, p. 18.)
36
isso, o trabalho intelectual deveria ser elaborado fora da oficina, por uma equipe de
planejamento, tornando-se gerência científica. É importante destacar que nas relações
capitalistas de produção, o trabalho é parte integrante do capital, é o capital variável
(BRAVERMAN, 1974). Essa discussão, ou seja a apropriação do saber do trabalhador pelo
capital será abordada em outro capítulo, onde tentar-se-á mostrar os mecanismos utilizados
para essa dominação.
O terceiro princípio era o da "utilização do monopólio do conhecimento para controlar cada
fase do processo do trabalho e seu modo de execução". Trata-se de atribuição da gerência
planejar todo o trabalho do operário, de preferência com um dia de antecedência, para que
cada trabalhador já tenha em seu local de trabalho as etapas de cada tarefa, os meios que lhe
são destinados, sejam eles ferramentas ou máquinas.
O papel dos instrutores
8
, segundo Taylor (1995), consistia em fazer com que o trabalhador
cumprisse rigorosamente às fichas de instrução:
Temos assinalado aqui, várias vezes, a necessidade de instruir o homem,
sistematicamente, sobre como realizar o trabalho da melhor maneira. Parece
razoável, entretanto, explicar mais detalhadamente como este ensino deve ser feito.
No caso duma oficina que é dirigida de acordo com o sistema moderno, instruções
escritas, minuciosas, a respeito do melhor processo de fazer cada tarefa, são
preparadas previamente na seção de planejamento. Estas instruções representam o
trabalho combinado de vários homens no planejamento, cada qual com uma
especialidade ou função particular (p. 91).
Taylor classificava como função da gerência moderna em mudar a maneira antiga de
produzir, "seu papel era tornar consciente e sistemática a tendência antigamente inconsciente
da produção capitalista" (BRAVERMAN, 1981).
O quarto princípio, segundo Taylor (1995), consistia em:
(...) manter divisão eqüitativa de trabalho e responsabilidades entre a direção e o
operário. A direção incumbe-se de todas as atribuições para as quais esteja mais bem
aparelhada do que o trabalhador; ao passo que no passado quase todo o trabalho e a
maior parte das responsabilidades pesavam sobre o operário (p. 91).
8
Chamados por Taylor de chefes funcionais.
37
Para Taylor, a mudança de atribuições ao operário pela direção da empresa, torna a
administração mais eficiente do que os antigos sistemas. Observando os quatro princípios
estabelecidos por ele e postos em prática pelas indústrias, percebe-se um caráter centralizador,
onde o poder de decisão está nas mãos da direção, excluindo os trabalhadores de qualquer
processo de produção, em que realizarão apenas a função relativa ao trabalho subordinado e
fragmentado. Para Ferreira (1985), tais princípios podem ser assim resumidos: "dissociar o
processo de trabalho das especialidades dos operários, e separar as fases de concepção e
execução do trabalho, entregando à administração o monopólio do saber (...)" (p.69). O
primeiro aspecto implica o aperfeiçoamento do processo de fragmentação e a desqualificação
do trabalho, já o segundo, contribui para o barateamento da mão-de-obra e o controle do
processo de trabalho pelo capital, sob o papel de gerência, e sobretudo legitimado
cientificamente pela racionalidade do capital.
Alguns estudiosos do taylorismo advertem que o "método" de organização "científica" da
produção, mais do que uma técnica de produção é essencialmente uma técnica social de
dominação (Cf. RAGO e MOREIRA, 1984, p. 25). Para Marx, em O capital, o processo de
trabalho na sociedade capitalista ocorre sob o controle do capital e que os processos de
produção são incessantemente transformados pelo ímpeto da principal força norteadora dessa
sociedade, a acumulação de capital. É aqui que se reconhece o papel da gerência científica, a
fim de:
(...) contribuir para essas transformações, com seus métodos operacionais de
ativação da produção de mais-valia, por meio de uma adequada estratégia que
possibilita a intensificação da dominação do capital e a constituição de um trabalho
rentável por um trabalhador submisso, uma vez que assegura a legitimidade e
normalidade de forma hierárquica administrativa das empresas modernas
(TEIXEIRA, 1985, p. 69).
O papel da Gerência Científica, portanto, está atrelado à lógica e ao interesse do capital,
obedecendo um correto funcionamento e desempenho sem obstáculos, que contribuam para as
organizações, aumentando-lhes a crescente extração da mais-valia, por meio do aumento da
intensidade e do ritmo do trabalho, bem como pela introdução de novas tecnologias. Por isso
nessa perspectiva, imaginar que Taylor pudesse ter elaborado algum estudo que trate da
questão do conflito, causado pelo antagonismo entre trabalhadores e patrões foge à sua ótica.
A problemática do conflito, porém, embora não abordada diretamente por Taylor, subjaz à
compreensão do que ele denominou ‘Homo Economicus’. Movido por incentivos
38
econômicos, o trabalhador se submeteria à disciplina exigida pela produção e, à medida em
fosse financeiramente recompensado, teria suas revoltas e insubordinações pulverizadas.
Segundo Rondeau (1996), os primeiros teóricos da gestão contribuíram para racionalizar a
organização do trabalho, dando pouca importância para a questão do conflito:
(...) Todavia, transpira de seus trabalhos que o conflito é mau porque afeta a
eficiência organizacional e, nesta perspectiva, eles se esforçaram para reduzir,
através de diferentes mecanismos estruturais, as possibilidades de ocorrência do
conflito no ambiente de trabalho. Taylor, por exemplo, via sobretudo na implantação
da organização científica do trabalho um modo de harmonizar as relações entre
patrões e empregados (RONDEAU, 1996. p. 208).
Taylor considerava o trabalhador essencialmente do ponto de vista econômico. A satisfação
não resulta de seu trabalho nem de seu reconhecimento mas sim exclusivamente da
recompensa financeira que lhe poderia advir. Podemos então, a partir da perspectiva que nos
interessa – a do conflito –,afirmar que para a teoria taylorista, o conflito, se é que existe, é
passível de ser evitado pela recompensa material.
Outros teóricos da administração preocupar-se-ão diretamente com a questão do conflito entre
os trabalhadores e a empresa. É a Escola de Relações Humanas, mais precisamente
identificada com a figura de Elton Mayo, que inaugura esse estudo.
2 RELAÇÕES HUMANAS, IDEOLOGIA E PODER DAS
CORPORAÇÕES
Vimos, anteriormente, que a ênfase dada por Taylor voltava-se fundamentalmente para a
racionalização do trabalho, imposta mediante duras rotinas, para se obter a melhor maneira de
se executar uma tarefa e com a divisão do trabalho entre os que executam e os que pensam.
Não é de nosso conhecimento que Taylor demonstrasse preocupação com o lado ‘humano’ do
trabalhador, com suas condições e necessidades psicossociais. Sua única preocupação era a de
tirar o máximo proveito possível do trabalho humano, assegurando à empresa ganhos de
produtividade. Com o pleno desenvolvimento das indústrias, aumentava cada vez mais o
número de operários fabris descontentes com as suas condições de trabalho, provocando um
período de contestações contra essas condições e fortalecendo os sindicatos.
É nesse contexto que surge o pensamento de Elton Mayo, considerado por muitos como
ideólogo da Escola de Relações Humanas. Elton Mayo nasceu em Adelaide, Austrália. Tentou
a carreira da medicina por imposição de seus pais, que queriam que ele tivesse o mesmo
destino de seus outros dois irmãos. A incerteza sobre seu destino profissional fez com que
trabalhasse em minas de diamantes na África. Mais tarde, na Inglaterra, tornou-se jornalista.
Após um período de incertezas e depressão, lecionou gramática inglesa no Working Men's
College e na Universidade de Queensland. Também trabalhou com soldados que sofriam de
distúrbios psicológicos provocados pela I Guerra Mundial. Em 1914 conheceu Malinowski e,
em 1920, o reencontrou em Harvard onde pôde aprofundar seus estudos em antropologia. Sua
obra tornou-se um dos pilares básicos da Escola de Relações Humanas. Nos EUA, direcionou
sua carreira para o pensamento empresarial. Estudou Freud, Jung e Pierre Janet para
compreender a psicologia industrial, sobretudo no que se refere aos problemas humanos no
interior das organizações
9
.
Para Mayo, os problemas de irritabilidade e depressão que tomavam conta dos trabalhadores
nas indústrias eram provocados pela falta de oportunidade de expressão pessoal. Suas
investigações, realizadas através de pesquisas aplicadas nas fábricas, procuravam identificar
9
Cf. GABOR, 2001, p. 122.
40
as causas que tornavam os trabalhadores irritados, interferindo na produção. Sua intenção era
criar uma maior interação entre trabalhadores e organização fabril. Mayo considerava o "(...)
trabalho monótono, [e realizado em condições tais que] os trabalhadores entram em devaneios
hostis que geram ressentimento contra a sociedade que define os termos de emprego e
promove a rebelião e o radicalismo" (GABOR, 2001, p. 122. Os colchetes são meus - MCF).
Mayo realizou uma de suas pesquisas no interior de uma indústria têxtil situada ao norte da
Filadélfia. Sua
[...] idéia original era de tratar a fábrica como se fosse um hospital para 'neuróticos
de guerra' e examinar cada indivíduo com o objetivo de descobrir em que aspecto
sua atitude para com a vida é anormal... e o impacto dessa anormalidade sobre o
trabalho em colaboração da fábrica (GABOR, 2001, p. 123).
A Continental Mills, empresa têxtil no ramo de tecidos de lã, oferecia a seus funcionários
alguns benefícios como plano de saúde, atividades recreativas, bônus, planos de poupança,
mostrando baixa incidência de rotatividade entre os trabalhadores na maioria dos
departamentos, como um reconhecimento pelas práticas de pessoal, que a empresa oferecia.
No departamento de fiação, onde era constante a rotatividade dos funcionários, Mayo iniciou
uma pesquisa das condições de trabalho na empresa, chegando a algumas conclusões
interessantes:
Quando observou a taxa de rotação no departamento de fiação, ele notou que os
fiandeiros eram muito mais irritáveis do que os trabalhadores de outros
departamentos. Os fiandeiros se queixavam de fadiga crônica e depressão. O
alcoolismo também era um problema generalizado ali. Esses problemas existiam
mesmo após a gerência ter tentado instituir " vários esquemas de bônus" no
departamento bem como "recreação e jogos", "um admirável departamento de
pessoal" e um "espírito de cooperação" geralmente elevado.
Mayo concluiu que o problema tinha a ver com a natureza excepcionalmente
monótona do trabalho. (...) Os trabalhadores passavam dez horas por dia andando
entre as máquinas, buscando fios rompidos e torcendo-os para juntá-los de novo.
Para consertar os fios, os fiandeiros tinham que se esticar de forma desconfortável
ao longo das máquinas, o que aumentava a fadiga muscular (GABOR, 2001, p. 124).
Frente a esse problema, Mayo sugere momentos de descanso, constatando em pouco tempo
que a produtividade crescera em 30%; observou também que o clima menos tenso no
41
ambiente fabril contribuíra para melhorar os resultados. De acordo com Tragtenberg (1992, p.
80): "O sucesso deveu-se ao fato de as pausas terem permitido transformar num grupo social
um grupo solitário de trabalho".
O evento mais importante da Escola de Relações Humanas diz respeito às pesquisas de Elton
Mayo, conhecidas como os Estudos de Hawthorne, utilizando a Western Eletric para o
laboratório de experimentos humanos. Com enfoque comportamental, revela a importância
dos grupos para a organização informal. Surge, assim, uma nova visão da fábrica como um
sistema social, formado por pessoas e não só por máquinas, capazes de formar grupos e criar
regras para a convivência, opondo-se ao enfoque do homem econômico da Escola Clássica. O
comportamento humano no trabalho não surge apenas de uma lógica econômico-racional, o
contexto “psicossocial” em que o trabalho está inserido, acaba naturalmente impondo suas leis
às relações organizacionais. A forma de participação das pessoas se dá porque são
reconhecidas como indivíduos integrantes de um grupo e a motivação não se dá apenas pelo
dinheiro mas sobretudo pelo reconhecimento.
A equipe de Harvard, analisando os estudos de Hawthorne, fez observações importantes.
Primeiramente observou que as condições de trabalho, têm em oposição que os dias
trabalhados mais impacto sobre a produção; fatores externos podem influenciar na produção,
criando um clima de satisfação ou de depressão entre os funcionários. Também as influências
causadas por problemas familiares podem afetar a produção do trabalhador e, neste caso, o
papel do supervisor é considerado importante na medida em que se solidariza com os
problemas dos trabalhadores, agindo como mero ouvinte. Além disso, as recompensas
salariais com a ausência de melhores condições de trabalho não desempenham papel
significativo com relação ao aumento da produtividade dos funcionários. Por fim, o que mais
chamou a atenção dos pesquisadores ocorreu quando, no final das pesquisas, os trabalhadores
voltaram para sua jornada de 48 horas semanais sem pausa para descanso; registrou-se o
aumento da produtividade. A explicação para tal resultado, segundo Mayo, é que a equipe de
trabalho correspondeu às atividades com espontaneidade.
Conforme observou Etzioni (1989), em sua obra, os principais resultados e conclusões dos
experimentos de Hawthorne são:
1- o nível de produção é estabelecido por normas sociais, não pela capacidade
fisiológica (...); 2- As recompensas e sanções não-econômicas influem
42
significativamente no comportamento dos trabalhadores e limitam, em grande parte,
o resultado de planos de incentivo econômico (...); 3- Freqüentemente, os
trabalhadores não agem ou reagem como indivíduos, mas como membros de grupos
(...); 4- A importância da liderança para o estabelecimento e imposição das normas
de grupo e a diferença entre a liderança informal e a formal (...); 5- (...) a
importância da comunicação entre as posições (...) (ETZIONI, 1989, p. 46).
A idéia presente na Escola de Relações Humanas considerava, através de vários experimentos
e estudos, que o homem não era motivado apenas pelo aspecto econômico e formal da
organização – distribuição do trabalho e autoridade competentes – mas preocupava-se em
estabelecer uma relação entre o trabalho e a estrutura da organização com necessidades
sociais dos trabalhadores. A harmonia daí resultante iria ao encontro dos objetivos da
organização e dos interesses dos trabalhadores. Mayo procura reconhecer o lado humano do
trabalhador como condição para o aumento da produtividade, o que constitui um tipo de
corporativismo cujo cumprimento cabe à elite dos administradores da indústria. O
administrador da Escola de Relações Humanas, de acordo com Tragtenberg (1992), cumpre a
tarefa de impor um ‘humanismo verbal’, podendo recorrer à autoridade formal, à burocracia,
para satisfazer ao volume de produção exigido.
Mayo e sua equipe observaram que a produtividade crescera e que a solidariedade
desenvolvida no processo de trabalho tornara-se elemento da produção. Observaram também
que a técnica de entrevista provocava alívio das tensões, diminuía o número de queixas e que
os conflitos intra-familiares e emocionais interferiam no trabalho fabril. Outra descoberta
importante dessas pesquisas ocorreu em 1931, quando Mayo e sua equipe estudaram as inter-
relações existentes num grupo de soldadores e constataram que entre eles coexistiam relações
de dois níveis: (...) "as relações condicionadas pela organização técnica da produção e as
relações que constituem a organização social da empresa, constatando o peso do informal e do
espontâneo na organização burocrática” (TRAGTENBERG, 1980, p. 23). Para os estudiosos
de Hawthorne, o grupo informal, formado pelos trabalhadores, influenciava positivamente na
produtividade. Os trabalhadores queixavam-se da monotonia do trabalho, da falta de
perspectiva, mas o que dava suporte para que eles continuassem cumprindo com suas jornadas
de trabalho era o clima de amizade e cumplicidade que havia entre eles. As associações
muitas vezes serviam para a troca de informações sobre a empresa, a respeito de conflitos
internos com a administração, e para elaborar algumas reivindicações, entre outros fatores que
contribuíam para a integração dos trabalhadores. Disso resultava um clima de solidariedade,
que os tornando mais amparados moralmente frente à organização. Esta coesão dos
43
trabalhadores acabava influenciando mais na produtividade do que as ordens da
administração.
A importância da formação de grupos no interior das organizações fabris constitui, no
pensamento de Mayo e de seus colaboradores, a condição de integração do trabalhador na
sociedade. Explicações vindas da Psicologia e da Sociologia
10
apontam que o surgimento dos
grupos informais acontece devido ao fenômeno desintegrador da vida social fora da fábrica.
Para estudiosos dessas áreas,
11
a sociedade industrial seria responsável pelo fenômeno
desagregador dos lares, da comunidade e dos grupos religiosos; apontavam a fábrica como um
agente capaz de realizar a integração, "como uma nova unidade social", capaz de proporcionar
a proteção social e emocional entre os indivíduos, vítimas da industrialização. De acordo com
Rondeau, o modelo de Relações Humanas nos mostra que:
(...) Com a colocação em evidência dos preceitos da dinâmica de grupo, toma-se
consciência das normas e valores sociais e do processo de socialização que
influencia o comportamento individual nas organizações. Reconhecendo-se o poder
das atitudes individuais no trabalho, chega-se a valorizar um ambiente de trabalho
mais humano, mais apto a satisfazer as preocupações profissionais de ordem
individual em relação ao trabalho, e assim, se associam com satisfação e
produtividade, e se tenta maximizar a primeira para atingir a segunda (1996, p. 209).
Algumas mudanças podem ser observadas na medida em que a industrialização torna-se mais
complexa. As famílias modernas diminuem de tamanho e assumem um caráter menos
importante que o da família tradicional. Outros grupos sociais, como comunidade rural e
grupos religiosos, declinam momentaneamente, mas não desaparecem. (ETZIONI, 1989). A
dinâmica da sociedade traz novas bases de relações sociais, fazendo reaparecer novos grupos
religiosos, que ressurgem agora com mais vitalidade e fazem emergir diferentes correntes
10
Foi a habilidade de Mayo de reunir aspectos de várias disciplinas e estimular debates e idéias entre seus
colegas que lançou os fundamentos da Escola de Relações Humanas. Sua jornada da filosofia à psicologia e,
finalmente, à sociologia industrial informou sua abordagem humanística aos problemas industriais. Como
Wallace B. Donham escreveu num prefácio a Social Problems of an Industrial Civilization, "Foi
principalmente com base no trabalho de Mayo que o estudo sociológico do comportamento industrial avançou.
Ele também pavimentou o caminho para a introdução da sociologia nos cursos das escolas de administração de
empresas e no ensino de gestão de modo geral" (apud GARBOR, 2001, p.129).
11
Os estruturalistas, em suas pesquisas sobre a organização, verificaram que os grupos informais de trabalho não
são tão comuns, e que a maioria dos operários não pertence a qualquer um deles. Dubin, em seu levantamento
dos “interesses centrais da vida” de 1200 trabalhadores da indústria, verificou que “apenas 9 por cento dos
operários na amostra preferiam a vida de grupo informal, centralizado no trabalho.” Acrescentou que o
trabalho, especificamente, "(...) não é um interesse central de vida dos operários industriais, quando estudamos
as experiências do grupo informal e as experiências sociais gerais, que tem para eles algum valor afetivo (...)".
Robert DUBIN, apud ETIZIONI, A. Organizações Modernas, São Paulo: Ed. Pioneira, 1989, p. 62.
44
religiosas. Os indivíduos buscam a compreensão e solução para os problemas sociais do
mundo contemporâneo que os afetam diretamente, problemas que nem a sociedade nem as
corporações são capazes de resolver, dado o seu caráter capitalista. Em vista disso, os
trabalhadores muitas vezes buscam na fé religiosa a solução para seus problemas.
Alguns fatos históricos, tais como a consolidação de uma classe operária na Europa e a
Revolução Russa de 1917, desenvolveram-se concomitantemente à formulação da teoria
administrativa de Elton Mayo. Tais fatos revelaram que uma organização deveria incorporar
às suas preocupações os valores e as necessidades de seus trabalhadores e compreender os
mecanismos das relações que estes estabelecem entre si e com membros de outras
comunidades. Esta era, também, a preocupação do sociólogo Émile Durkheim (apud. ARON,
1982): compreender na moderna sociedade quais sãos os mecanismos de solidariedade
capazes de reduzir ao mínimo os estados de anomia.
Para Durkheim, a forma como os homens estão organizados na sociedade moderna demonstra
que na esfera da vida coletiva há ausência de regras. Denomina de anomia social esse estado
da sociedade, situação em que os conflitos permeiam a existência social. A regulamentação é
necessária para impor ordem à sociedade, garantindo assim, a independência econômica dos
indivíduos, condição para a liberdade do homem. As funções econômicas, segundo o
pensamento durkheimiano, assumiram nos séculos XVIII e XIX papel destacado na
sociedade, diferente portanto da função secundária a que se restringiam anteriormente na
sociedade.
Essa mudança, de acordo com Durkheim, decorre do desenvolvimento industrial da sociedade
que coloca as funções militares, administrativas e religiosas em um patamar desigual do
atingido pela ciência; pois esta alcançou o prestígio pela função de servir à pratica, servir
diretamente às profissões econômicas, essenciais numa sociedade de desenvolvimento
industrial. Essa sociedade ocupou uma posição na vida social e não pode permanecer
desregrada. [...] "Para que a anomia tenha fim, é preciso portanto que exista ou que se forme
um grupo onde se possa constituir o sistema de regras que faz falta
atualmente".(DURKHEIM, 1978, p. 5).
A sociedade, a religião, a família e o trabalho são elementos analisados por Durkheim, na
tentativa de reverter a tendência crescentemente desagregadora reinante na sociedade
industrial. Na sua opinião, a família, a religião e o Estado não proporcionam mais o contexto
45
social para que o indivíduo se sinta em coletividade. Quando Durkheim analisa o suicídio, diz
que o fato do indivíduo ser casado e ter uma família não o excluí da corrente suicidógena, e,
por outro lado, a vida na sociedade moderna põe as funções familiares em declínio, uma vez
que seu papel econômico está cada vez mais limitado. A família, portanto, fica fora do papel
de intermediário entre o indivíduo e a coletividade. O Estado, pelo seu caráter abstrato e
autoritário, está muito distante do indivíduo, o que o impossibilita de proporcionar esta
integração. Por fim, as religiões, que nas sociedades modernas se envolvem num aspecto
abstrato e intelectual deixando para trás a função de coerção social, não constituem escolas de
disciplina, no mesmo grau em que o foram no passado, para remediar os males da sociedade
moderna sobre o indivíduo, de acordo com o pensamento de Durkheim, só há uma maneira: a
corporação
12
. É importante ressaltar que não se trata de uma "panacéia", que trará solução
para todos os males da sociedade. A crise de uma sociedade não é de causa única que se possa
tratar especificamente.
[...] Para que ela cesse, não é suficiente uma regulamentação qualquer se estabeleça
onde é necessária; é preciso, além do mais, que ela seja o que deve ser, quer dizer
justa. Ora, assim como diremos mais adiante “enquanto houver ricos e pobres de
nascimento, não se terá contrato justo”, nem uma justa distribuição de condições
sociais A ausência de toda instituição corporativa cria, pois, na organização de um
povo como o nosso, um vazio do qual é difícil exagerar a importância. É todo um
sistema de órgãos necessários ao funcionamento normal da vida comum que nos faz
falta (DURKHEIM, 1978, p. 20).
A idéia que Durkheim estabelece do homem individual é a do homem de desejos, de vontades
e aspirações, por isso a disciplina desempenha um papel importante "a primeira necessidade
da moral e da sociedade" . O homem precisa ser disciplinado por uma força superior,
autoritária e amável, isto é, digna de ser amada. Esta força que ao mesmo tempo se impõe e
atrai, só pode ser a própria sociedade” (ARON, 1982, p. 319).
Frente às idéias de Durkheim acerca do indivíduo, da coletividade e da importância das
corporações sobre os indivíduos, os estudos desenvolvidos por Mayo nos remetem a uma
12
“No prefácio à segunda edição da obra De la Division du Travail Social, Durkheim se refere longamente às
corporações como instituições que consideramos hoje anacrônicas, mas que na realidade respondem às
exigências da ordem atual. Chama de corporações, de modo geral, as organizações profissionais que, reunindo
empregadores e empregados, estariam suficientemente próximas do indivíduo para constituir escolas de
disciplina, seriam suficientemente superiores a cada um para se beneficiar de prestígio e autoridade. Além
disso as corporações responderiam ao caráter das sociedades modernas, em que predomina a atividade
econômica” (Aron, 1982, p. 318)
46
preocupação muito próxima com a demonstrada por Durkheim: sobre as relações sociais e o
fator produtividade. Já que família, religião e Estado não são condições para a interação
homem e sociedade, segundo análise durkheimiana. Numa sociedade moderna, a corporação -
hoje em dia denomina-se "organização"- será o fator decisivo para realizar esta integração. A
semelhança entre o pensamento de Durkheim e Mayo não nos autoriza dizer que ambos
tinham as mesmas preocupações. Para o primeiro, seus estudos analisam , a partir da
separação entre o trabalhador e os seus meios de produção, o nascimento do homem livre. As
revoluções do século XVIII acentuam o problema do indivíduo e da coletividade, portanto,
sua preocupação está na tentativa de saber como garantir a crescente liberdade individual
diante de interesses cada vez mais intensos e mais complexos, oriundos de uma sociedade
industrial. Com uma herança positivista comteana
13
, em que prevalece a premissa da "ordem e
progresso", condição vital no âmbito da sociedade regida pelo capital, Durkheim analisa quais
os mecanismos que possam garantir a coesão social entre interesses tão divergentes.
As pesquisas de Mayo surgem para explicar que o homem não é motivado apenas
economicamente, contrariando os apontamentos anteriores da Escola Clássica. Existe outro
elemento, no caso, a relação entre homens, trabalhadores, e a organização. Se pensarmos nas
preocupações de cada um destes pensadores, Taylor, Mayo, Durkheim, há uma relação entre
eles e o positivismo de Comte, ressalvada a especificidade de cada objeto de estudo, o nódulo
da questão é como produzir numa sociedade industrial, sobretudo capitalista, sem que os
conflitos interfiram no bom andamento da organização. Na preocupação taylorista, "o homem
certo no lugar certo desempenhava sua função da melhor maneira possível", no pensamento
elaborado por Durkheim, o caráter patológico da sociedade leva à "anomia social" e, Mayo, a
fim de sanar os conflitos entre trabalhadores e empresa, tenta promover um equilíbrio entre as
distintas classes, através da colaboração, ou de um de espírito de equipes, em que os
trabalhadores se solidarizam nas relações produtivas, interagindo com seus superiores. A
relação com o positivismo de Comte aproxima estes pensadores no momento em que todas as
preocupações estão voltadas para a produção. A ordem é condição para o progresso. Na
sociedade burguesa moderna, caberá ao Estado o estabelecimento de leis que assegurem a
ordem social para o perfeito desenvolvimento das organizações industriais e de seu progresso.
13
Auguste COMTE, no Cours de philosophie positive, desenvolve a idéia de ordem e progresso, advindas das
leis da física, de estática e dinâmica, "É a partir da ordem de toda sociedade humana que se pode compreender
a história. A estática e a dinâmica levam aos termos de ordem e progresso que figuram nas bandeiras do
positivismo e do Brasil 'o progresso é o desenvolvimento da ordem" (apud ARON, 1982, p. 95).
47
Dentro deste contexto é cabível analisarmos o papel que o Estado desempenha nas sociedades
sob a égide do capital. Não nos limitaremos a um só pensador para tal análise. Trataremos
aqui de alguns pensadores clássicos que enfocam o Estado, com o propósito de enriquecer, e
se possível, de reforçar esta questão.
É da condição humana viver socialmente. Em sua obra Política, Aristóteles dizia que o
homem é um ser político por natureza, que vive e se organiza naturalmente em grupos. A
questão das relações entre sociedade e Estado não estava posta nesse período, fato que
concretizar-se-á apenas com o nascimento da sociedade burguesa, quando a esfera política
atinge, na sociedade capitalista, um grau maior de independência.
A compreensão de Estado expressa no pensamento de Aristóteles, não pode e não deve ser
confundida com a forma de Estado presente na sociedade burguesa. Havia em Aristóteles a
preocupação de garantir à cidade maior felicidade diante de interesses distintos e muitas vezes
conflitantes entre seus habitantes. Aristóteles elabora uma tipologia das formas de governo
que se tornaram clássicas: monarquia, aristocracia e politéia. A primeira, segundo Aristóteles,
refere-se ao governo de um só; a segunda, ao governo de um pequeno grupo, e a terceira, ao
governo da maioria. As três formas de governo podem ser consideradas boas quando visam o
interesse comum, e más quando privilegiam o interesse particular, manifestando-se, de forma
corrompida e degenerada.
Outro filósofo grego, Platão, também se preocupava com as questões que envolviam o
convívio social e o bem estar dos homens. Formula, em A República, sob a fórmula de
diálogo, um roteiro de como a cidade deveria se precaver com respeito `a formação de seus
governantes. O mito das almas, formulado por Platão, descreve como deveria ser o governo
nas cidades. Para ele, os homens seriam diferentes, pois possuiriam almas de ouro, bronze ou
ferro. Cada qual teria sua alma já definida, sendo impossível alterá-la. Através de uma
rigorosa seleção, aqueles que possuíssem almas de ferro desenvolveriam atividades ligadas ao
comércio. O argumento que Platão usava era o de que por possuírem alma pobre, seriam
sempre atraídos pelos bens materiais; por isso, deveriam se dedicar às atividades comerciais,
sendo permitido o enriquecimento. Os que possuíssem almas de bronze seriam atraídos pelas
atividades que exigissem disciplina e esforço físico. A eles caberia a tarefa de proteger a
cidade contra seus inimigos. Por fim, aqueles que possuíssem a alma de ouro sempre se
sentiriam mais atraídos pela pureza das idéias do que pelas riquezas materiais. A eles caberia
o governo das cidades, embora esta tarefa tão prática não lhes agradasse. Não poderiam e não
48
teriam interesse em enriquecimento material; seriam reis filósofos, e deveriam promover o
bem estar de todos.
Para Platão, a cidade precisa se alimentar e comercializar com outras cidades; precisa também
se defender dos inimigos e, finalmente, precisa ser governada. Cada homem com a sua alma
desempenharia um papel importante para a cidade mas, o que não poderia ocorrer é que a
defesa da cidade fosse entregue a um filósofo nem o governo a um comerciante. A ocupação
de uma função pela “alma” inadequada traria os transtornos que Platão via nos últimos anos
da Atenas democrática, exemplificados com a condenação de Sócrates à morte.
Maquiavel, ao escrever em uma Itália fragmentada e convulsionada, sempre sujeita às
agressões que pudessem partir dos Estados europeus em processo de unificação nacional,
preocupava-se em fazer da Itália um Estado forte, unificado, capaz de submeter ao seu poder
os interesses particulares que provocavam sua infelicidade e ruína. Defendia, para isto, a
formação de um aparato estatal, de um governo que estivesse à sua frente mas que não se
confundisse com a sociedade. Como observa Gruppi (1980):
O Estado para Maquiavel, não tem mais a função de assegurar felicidade e a virtude,
segundo afirmava Aristóteles. Também não é mais - como para os pensadores da
Idade Média - uma preparação dos homens ao Reino de Deus. Para Maquiavel o
Estado passa a ter suas próprias características, faz política, segue sua técnica e suas
próprias leis. Logo no começo de O Príncipe, Maquiavel escreve: “Como minha
finalidade é a de escrever coisa útil para quem a entender, julguei mais conveniente
acompanhar a realidade efetiva do que a imaginação sobre esta. (...) Muitos
imaginam repúblicas e principados que nunca foram vistos nem reconhecidos
realmente”; isto é, muitos imaginam Estados ideais, que no entanto não existem, tais
como a República de Platão. 'Pois grande é a diferença entre a maneira em que se
vive e aquela que se deveria viver; assim, quem deixar de fazer o que é de costume
para fazer o que deveria ser feito encaminha-se mais para a ruína do que para a sua
salvação. Porque quem quiser comportar-se em todas as circunstâncias como um
homem bom vai ter que perecer entre tantos que não são bons (p. 11).
Pouco mais de um século depois de Maquiavel, os fundadores das teorias contratualistas
aprofundariam esta separação entre o político e o social. Para Hobbes, por exemplo, o homem
em estado de natureza viveria em constante guerra de todos contra todos. Para assegurar a sua
sobrevivência, consentiria em abrir mão de parte de sua liberdade em favor de uma força
maior que lhe permitiria viver em segurança. O Estado nasceria como essa força, como
limitação da liberdade do homem, na qual cada indivíduo reconheceria algo que, embora
tolhesse a sua liberdade, garantiria a sua segurança. Segundo Hobbes (1979):
49
A única maneira de instituir um tal poder comum, capaz de defendê-los das invasões
dos estrangeiros e das injúrias uns dos outros, garantindo-lhes assim uma segurança
suficiente para que, mediante seu próprio labor e graças aos frutos da terra, possam
alimentar-se e viver satisfeitos, é conferir toda a sua força e poder a um homem, ou a
uma assembléia de homens, que possa reduzir suas diversas vontades, por
pluralidade de votos, a uma só vontade (...). Cedo e transfiro meu direito de
governar-me a mim mesmo a este homem, ou a esta assembléia de homens, com a
condição de transferires a ele teu direito, autorizando de maneira semelhante todas
as suas ações. Feito isto, à multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado,
em latim civitas (p. 104).
Distante de Hobbes em apenas algumas décadas, período de profundas mudanças na vida
política da Inglaterra, Locke também vai admitir a existência de um estado de natureza em
que todos eram livres. Mas, que o homem não criou o Estado para tolher a liberdade do
homem em favor da sua segurança, ao contrário, para garantir a sua liberdade frente aos
outros homens e o seu direito à propriedade, em uma sociedade cada vez mais complexa e
exigente de normas cada vez mais claras. Como afirma Gruppi (1980):
Locke observa que o homem no estado natural está plenamente livre, mas sente a
necessidade de colocar limites à sua própria liberdade. Por quê? A fim de garantir a
sua propriedade. Até que os homens sejam completamente livres, existe entre eles
uma luta que não garante a propriedade, e, por conseguinte, tampouco uma liberdade
durável. Locke afirma que os homens se juntam em sociedades políticas e
submetem-se a um governo com a finalidade principal de conservar suas
propriedades. O estado natural (isto é, a falta de um Estado) não garante
propriedade. É necessário constituir um Estado que garanta o exercício da
propriedade, a segurança da propriedade (p. 15)
O espírito iluminista chegou também à França, onde Rousseau apontou o papel destrutivo que
a sociedade exerceria sobre o indivíduo, nascido bom, e sobre o lugar ocupado pela
propriedade nesse processo de corrupção da bondade original. O filósofo suíço propôs formas
de governo que, na medida do possível, deveriam corresponder à vontade geral. De acordo
com Crossman (1958):
Rousseau inicia segundo a tradição: expõe um contrato social pelo qual o homem
passa do estágio natural para o de respeito às leis do Estado. Mas o seu dominador
não é o leviatã como no caso de Hobbes, nem é o governo civil de Locke. É sim a
“vontade geral”. A partir deste momento, fica evidente: primeiro que o homem
natural de Rousseau não precisa de contrato para participar deste Estado místico.
Ou, caso contrário, se se deseja o contrato social, este deve ser concretizado entre
50
homens voltados para o sistema de direitos racionais, de que tanto se abusou (p. 85 -
86).
Da Antigüidade à Idade Moderna, os homens, ao produzirem e reproduzirem as condições de
sua existência, contraem entre si determinadas relações de produção que são independentes de
suas aspirações individuais. São socialmente construídas, respostas dadas pelo coletivo aos
problemas que afligem a sua existência. Isto não quer dizer que haja uma estrutura exterior
aos homens ou espírito genial que formule tais respostas com um fim pré-determinado. É na
prática social de todo dia que estas respostas são construídas
14
:
... na produção social da sua vida, os homens contraem determinadas relações
necessárias e independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem
a uma determinada fase de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. O
conjunto dessas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a
base real sobre a qual se levanta a superestrutura jurídica e política à qual
correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da
vida material condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral.
Não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas pelo contrário, o seu
ser social é que determina a sua consciência (MARX: 1844, p. 301).
O homem, ao apreender a realidade à sua volta, a reproduz idealmente, identifica suas
necessidades e formula respostas para sua superação. Estas respostas, entretanto, não são
abstratas: elas estão nos limites dados pela realidade em que são formuladas. Como respostas
intelectualmente formuladas, elas norteiam as atividades produtivas dos homens. Dessa
maneira, ao construir seu mundo material, o homem também constrói seu mundo espiritual.
Essas respostas, entretanto, não servem apenas para organizar a atividade do homem frente à
natureza, mas também vão constituindo um conjunto de normas que organizam a relação dos
homens entre si. Ao nascermos, nos defrontamos com um conjunto destas normas elaboradas
pelas gerações anteriores e assistimos/participamos da sua reformulação à medida que suas
respostas tornam-se insuficientes e inadequadas. A estas normas de conduta, quando voltadas
para a resolução de conflitos sociais, damos o nome de ideologias.
14
“Toda vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que levam a teoria para o misticismo
encontram sua solução racional na praxis humana e na compreensão desta praxis”. Marx, K. Teses sobre
Feuerbach. In: Marx, K e Engels, F. A Ideologia Alemã. São Paulo: HUCITEC, 1984, p. 14).
51
Ideologias não são, portanto, um conjunto de idéias falsas usadas deliberadamente por grupos
dominantes para preservar sua dominação, mas respostas formuladas por estes grupos em
defesa de seus interesses particulares, apresentando-os como interesses de toda a sociedade
15
.
Ora, quando falamos de ideologias, de grupos que em defesa de seus interesses específicos as
apresentam como se fossem universais, estamos, com certeza, falando de poder e também de
sua fórmula mais refinada, a política. Como expressão ideológica, a política cumpre seu papel
na medida em que propõe alternativas para a resolução dos conflitos sociais. Mais do que isso,
o conflito é a razão de ser da política, razão pela qual constitui-se no principal tema dos seus
teóricos, de Maquiavel aos nossos dias, passando por Hobbes, Locke, Rousseau, Hegel, Marx
ou Weber.
Vaisman (1989) observa:
Outro modo da ideologia em termos restritos, segundo a concepção lukácsiana, é a
praxis política, forma pela qual conscientizados e enfrentados os conflitos que
concernem à sociedade inteira. O âmbito, pois, da política é aquele que afeta e
envolve a globalidade da formação social. E é o âmbito do conflito. Segundo as
próprias palavras de Lukács: “a política é uma praxis que, em última análise, é
dirigida à totalidade da sociedade, mas de tal modo que, na imediaticidade, coloca
em movimento o mundo social fenomênico como terreno da transformação, ou seja,
de manutenção ou destruição do existente, e, todavia, a prática assim iniciada é
inevitavelmente movida, por via indireta, também pela essência e mira, da mesma
maneira indireta também a essência” (483). Assim, segundo Lukács, “a unidade
contraditória da essência e fenômeno na sociedade assume na praxis política uma
forma explícita” (p. 425).
A partir dessa noção de política, levanta-se um questionamento acerca do papel do Estado. O
modelamento do Estado frente às necessidades da burguesia é o que se pretende enfocar, sem
desviar-nos do processo histórico que nos permite obedecer a uma lógica de acontecimentos.
Esta reflexão será baseada na transformação da sociedade burguesa moderna, no
desenvolvimento do modo de produção capitalista, que, segundo a concepção hegeliana, não é
apenas um modelo econômico e sim um complexo sociocultural para o qual concorrem
diversos elementos extra-econômicos: a religião, o direito, a filosofia e o Estado, e que, ainda
de acordo com Hegel, são as principais manisfestações do espírito, são as grandes obras da
humanidade.
15
Sobre este aspecto da ideologia, ver Vaisman, E. A ideologia e sua determinação ontológica. In: Ensaio
.
52
Segundo Gruppi (1980):
Hegel restabelece plenamente a distinção entre Estado e sociedade civil formulada
pelos pensadores do século XVIII, mas põe o Estado como fundamento da sociedade
civil e da família, e não vice-versa. Quer dizer que, para Hegel, não há sociedade
civil se não existir um Estado que a construa, que a componha e que integre suas
partes; não existe povo se não existir o Estado, pois é o Estado que funda o povo e
não o contrário. É o oposto da concepção democrática, segundo a qual a soberania é
do povo, que a exprime no Estado, mas o fundamento da soberania fica sempre no
povo (p. 29)
Após a morte de Hegel (1831), seu sistema passou a ser disputado pela esquerda e pela direita
hegeliana. Uma frase de Hegel pode resumir essa disputa: “tudo o que é real é racional”. Para
a direita, isso significava que tudo o que existe é racional e deve ser mantido como está. Para
a esquerda, esta frase significava: “tudo o que existe deve ser explicado pela razão para
continuar existindo”. Para a esquerda hegeliana, a negação é a base da filosofia.
16
Um dos
principais filósofos desta linha é Feuerbach. Sua principal contribuição é a crítica materialista
que fará da obra de Hegel e da religião. Para Feuerbach, não é Deus que cria o homem, mas o
homem alienado na sua miséria que cria Deus. Deus é a imagem do homem liberto nas suas
alienações. Essa essência humana procurada por Feuerbach é apenas a inversão materialista
do espírito de Hegel.
Em 1843, Marx, seguindo o exemplo de Feuerbach, resolve fazer a crítica da Filosofia do
Direito, de Hegel. Para Hegel, a existência do Estado - enquanto expressão superior do
espírito - antecedia à da sociedade; através do Estado, a sociedade civil encontraria as
condições de sua existência plena, liberta de suas contradições. O Estado seria a expressão da
razão no controle da vida dos homens em sociedade. A crítica mais contundente que Marx
expõe na Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, é que não é o Estado que cria a sociedade,
mas a sociedade que cria o Estado:
17/18, São Paulo: Ed. Ensaio, 1989, p. 99 e ss.
16
Feuerbach (1804-1872) pertence à ala da esquerda hegeliana. Utilizou o conceito de alienação de Hegel para
explicar ao ateísmo. Foi contra o idealismo de Hegel, quando contestou que a constituição do mundo dependia
do movimento das idéias. Alegou que o verdadeiro conhecimento não é possível senão como conhecimento das
coisas materiais, sensíveis. E que todo conhecimento superior não é mais que um epifenômeno da matéria, ou
seja, um simples reflexo dela. Marx aproveita-se desse momento esclarecendo que :"(...) o homem exterioriza-
se como um ser natural humano, afirmando sua humanidade no relacionamento ativo com o mundo natural. E
agindo sobre a natureza, conclui Marx, 'o homem tem sua gênese, a história; mas este ato genético lhe é
consciente e, enquanto tal, se supera a si mesmo" (apud FREDERICO, 1995, p.191).
53
A idéia é subjetivada. A relação real da família e da sociedade civil com o Estado é
concebida como sua atividade interior imaginária. A família e a sociedade civil
constituem os pressupostos do Estado; são ativas, no verdadeiro sentido da palavra;
mas na especulação sucede o contrário. Ora enquanto a idéia é subjetivada, os
sujeitos reais, a sociedade civil, a família, as “circunstâncias, o arbítrio, etc.”
transformam-se aqui em momentos subjetivos da idéia, não reais, tendo um sentido
diferente (MARX: 1843, p. 11 - 12).
Para Hegel, o controle do Estado deveria ficar a cargo de uma camada de funcionários que
não tivessem interesses próprios que pudessem interferir nas tarefas de governar. Para Marx, o
Estado deveria ser entregue ao povo. Nesta fase democrática, Marx não faz distinção entre
república e democracia. Essa inversão materialista realizada por Marx no campo do
pensamento político segue de perto aquela realizada por Feuerbach no campo do pensamento
religioso. Em 1844, na Introdução à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, Marx afirma
que a crítica da alienação religiosa já fora realizada por Feuerbach. Cabia agora realizar a
crítica da alienação política. Em outros textos do mesmo período, A Questão Judaica e
“Glosas marginais ao artigo ‘O rei da Prússia’...”, Marx salienta que a emancipação política
não é sinônimo de emancipação humana. Marx, não mais um democrata, demonstra que a
emancipação política - a igualdade jurídica, o direito de voto, a liberdade de expressão - nada
mais faz que ocultar a verdadeira dominação: a desigualdade real, o poder da minoria, o
controle da sociedade.
Nesta época, Marx já tomara conhecimento da crítica que Engels fizera à economia política.
Marx chegara à conclusão de que a crítica da alienação política deve ser antecedida por uma
crítica da sociedade civil alienada. Neste momento, Marx deixa para trás suas ilusões
democráticas e a influência feuerbachiana da “essência humana” e passa a querer entender a
realidade social em sua forma mais prosaica, mais 'suja', na expressão empregada por Marx,.
Empenha-se, a partir dali, no estudo da economia política e prepara sua crítica ao pensamento
político-econômico clássico. Essa ampliação de sua temática de pesquisa não significou o
abandono, por parte de Marx, da questão do Estado. Ele apenas passou a priorizar a
problemática da economia política, sem elaborar uma teoria específica do Estado. Isto não o
impediu de elaborar as linhas gerais de sua compreensão do Estado, as quais direcionaram
suas próprias pesquisas e deveriam orientar qualquer estudo que se pretendesse marxista a
respeito da problemática da política e do Estado.
54
Esta é a idéia central da compreensão marxiana do Estado, o bureau que administra os
interesses das classes dominantes. Ou seja, o Estado é sempre o Estado da classe dominante,
como é claramente dito no Manifesto Comunista de 1848:
... a burguesia, desde o estabelecimento da grande indústria e do mercado mundial,
conquistou finalmente a soberania política exclusiva no Estado representativo
moderno. O governo moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns
de toda a classe burguesa (MARX, 1848, p. 23).
Para Marx, portanto, o Estado é sempre o Estado de uma classe. Mesmo que tome uma feição
democrática, continua sendo a ditadura de uma classe sobre a outra. Na sociedade capitalista,
o Estado é o Estado da burguesia, defende sempre, de maneira geral, os seus interesses contra
os interesses das classes não proprietárias. Por mais democrático que seja ou que pareça,
continua sendo uma ditadura de classe.
Trata-se portanto, de um Estado, no qual os não-proprietários, os trabalhadores, não podem
depositar a sua confiança. Seus mecanismos de governo privilegiarão sempre interesses que
não são os seus . Cabe aos trabalhadores não apenas conquistar este poder político, mas
conquistá-lo para destruí-lo. No seu lugar devem, inicialmente, construir um outro Estado, ao
qual Marx chamou de “ditadura do proletariado” cuja finalidade, ao invés de se perpetuar
como qualquer outra forma de Estado, seria a dissolução de si mesma, enquanto forma
específica de Estado e de exercício do poder político, e a dissolução da própria política,
enquanto instrumento “regulador” das relações entre os homens.
Marx propõe o desaparecimento do Estado e da própria política, possível à medida em que a
sociedade elimine sua contradição principal - a relação entre capital e trabalho -, e passe a
prescindir da política e de seu aparato historicamente mais elaborado, o Estado. A eliminação
das contradições sociais seria possível através do resgate do controle social da produção. A
possibilidade de emancipação humana, diretriz de todo o pensamento marxiano, supõe uma
sociedade sem classes, sem política e sem Estado. Nas palavras de Engels:
... As classes vão desaparecer, e de maneira tão inevitável como no passado
surgiram. Com o desaparecimento das classes, desaparecerá inevitavelmente o
Estado. A sociedade, reorganizando de uma forma nova a produção, na base de uma
associação livre de produtores iguais, mandará toda a máquina do Estado para o
55
lugar que lhe há de corresponder: o museu de antigüidades, ao lado da roca de fiar e
do machado de bronze (ENGELS, 1884, p. 196).
Mas, mais do que qualquer autor, foi o processo social das revoluções burguesas que colocou
de forma clara o dilema: como garantir os interesses coletivos e ao mesmo tempo preservar a
liberdade individual finalmente conquistada? O que temos aqui, de forma bem resumida, é a
confirmação de que há pelo menos vinte e quatro séculos o homem se debate com a questão
da política, ou seja, do poder, da regulação dos conflitos, do mandar e do obedecer, buscando
uma razão para fundamentar a política, esse exercício do poder, que não seja apenas a da
utilização da força.
O século XVIII, entretanto, não é apenas o século da mais significativa das revoluções
burguesas – a revolução francesa –, mas também o século das profundas transformações
ocorridas na atividade laborativa dos homens, processo conhecido como revolução industrial.
A partir da segunda metade desse século, quando se dá a passagem do sistema doméstico para
o sistema fabril de produção, surge a civilização urbano-industrial. Na Crítica da Filosofia do
Direito de Hegel, Marx observa que:"(...) a burocracia é o formalismo de Estado, da
sociedade civil. É a consciência do Estado, a vontade do Estado, o poder do Estado, enquanto
corporação, isto é, como sociedade particular, fechada no Estado". (MARX: s.d.p., p.71).
O elemento mais importante dessa nova sociedade ou Estado é a racionalização. Sua forma de
ser está na burocracia. Weber, intelectual preocupado com as questões impostas pelo
nascimento da sociedade industrial, considera que a forma capitalista de produzir sempre
existiu, mas que seus valores só poderiam se universalizar a partir do momento em que uma
idéia, um espírito adequado à racionalidade da produção capitalista - no caso, a ética
protestante - se fizesse presente. Motivado por estas idéias, Weber dedica boa parte de sua
obra a duas questões que muito nos interessam no âmbito deste trabalho: a burocracia e a
legitimidade do poder.
No que diz respeito à burocracia, a posição de Weber é clara: ela corresponde àquele processo
de racionalização das atividades humanas, estabelecendo normas que devem ser seguidas por
todos os membros da organização: critérios hierárquicos e de competência, impessoalidade
das relações. O crescimento inevitável da burocracia poderia, de acordo com Weber, ser
observado nas mais diversas formas de organizações: no Estado, na empresa privada, nos
sindicatos, nos partidos políticos, nos organismos religiosos. Ao apontar o crescimento dos
56
aparelhos burocráticos, Weber limita-se a constatar o fato, não se posicionando em relação a
ele, embora denuncie as suas conseqüências.
A questão da burocracia está ligada, no pensamento de Weber (1994), à questão do poder, do
seu exercício na forma mais racionalizada, a dominação legal. Segundo ele,
Há três tipos puros de dominação legítima. A vigência de sua legitimidade pode ser,
primordialmente: 1. de caráter racional: baseada na crença ou legitimidade das
ordens estatuídas e do direito de mando daqueles que, em virtude dessas ordens,
estão nomeados para exercer a dominação (dominação legal), ou 2. de caráter
tradicional; baseada na crença cotidiana na santidade das tradições vigentes desde
sempre e na legitimidade daqueles que, em virtude dessas tradições, representam a
autoridade (dominação tradicional), ou, por fim, 3. de caráter carismático: baseada
na veneração extra-cotidiana da santidade, do poder heróico ou do caráter exemplar
de uma pessoa e das ordens por esta reveladas ou criadas (dominação carismática)
(p. 141).
No pensamento weberiano, o exercício do poder na sociedade moderna, baseado no quadro
burocrático, assume cada vez mais a característica do tipo “legal-racional”: “O tipo mais puro
de dominação legal é aquele que se exerce por meio de um quadro administrativo
burocrático” (Id. ibid., p.144), estabelecido a partir de um conjunto de normas, onde se
destacam como qualidades do dirigente suas qualidades de homem livre e suas relações
objetivas com o cargo, qualificação profissional, nomeação e não eleição, submissão a um
sistema rígido de disciplina e separação absoluta dos meios administrativos. (Id. ibid., p. 144).
Por estes meios,
(...) se alcança tecnicamente o máximo de rendimento em virtude de precisão,
continuidade, disciplina, rigor e confiabilidade – isto é, calculabilidade tanto para o
senhor quanto para os demais interessados (Id. ibid., p. 145).
Deve-se salientar, ainda segundo Weber, que esta inevitabilidade da dominação burocrática
tornar-se-ia mais evidente à medida em que constatamos que qualquer ordem, na qual
prevalece em larga escala a separação dos funcionários e empregados dos meios
administrativos, só pode continuar existindo se estabelecer mecanismos de disciplina e de
previsibilidade, a tal ponto que mesmo a resistência ao crescente domínio burocrático só
57
poderá se realizar mediante a utilização de instrumentos burocráticos (Id. ibid., p.146). Por
fim, deve-se levar em consideração que o conhecimento é o principal instrumento da
dominação burocrática, mas que a própria burocracia, a partir de sua prática, acrescenta novos
segredos ao conjunto de seus ''conhecimentos”, que consolidam o seu papel dominante:
Administração burocrática significa: dominação em virtude de conhecimento; este é
o seu caráter fundamental especificamente racional. Além da posição de formidável
poder devida ao conhecimento profissional, a burocracia (ou o senhor que dela se
serve) tem a tendência de fortalecê-la ainda mais pelo saber prático de serviço: o
conhecimento de fatos adquirido na execução das tarefas ou obtido via
“documentação”. O conceito (não só, mas especificamente) burocrático do “segredo
oficial” – comparável, em sua relação ao conhecimento profissional, aos segredos
das empresas comerciais no que concerne aos técnicos – provém dessa pretensão de
poder (Id. ibid., p.147 ).
Ao desenvolver sua teoria dos mecanismos burocráticos de dominação, Weber contribui com
uma nova forma de interpretar as práticas administrativas, ao reconhecer desde o princípio, a
existência de conflitos no interior das organizações. A burocratização das relações é uma
forma de conter no interior de determinados parâmetros a disputa entre interesses diversos,
sem eliminá-los. Mas o próprio Weber reconhece que esses parâmetros são cada vez mais
estreitos e dependentes dos interesses do grupo que exerce o domínio burocrático.
Weber salientava a semelhança entre o Estado moderno e uma empresa: a relação de poder
nos diversos níveis pautada pelas idéias de consentimento, mérito e impessoalidade. O
exemplo de Weber é suficiente para o que se quer salientar aqui: no interior das organizações,
além de seu funcionamento material, os mecanismos de dominação contam com fórmulas
ideológicas cada vez mais sofisticadas.
No desenvolvimento das teorias administrativas, do século XX até nossos dias, muitos
teóricos das organizações contemporâneas utilizam-se desses mecanismos ideológicos
manipulatórios, amparados pelo desenvolvimento extraordinário da ciência e da tecnologia
para impor a ordem racionalizadora, como panacéia universal. As teorias administrativas
empregadas pelo capital constituem fatores de adestramento do trabalhador, de acordo com a
concepção de Tragtenberg, que inaugura uma crítica que vem despertando outros
pesquisadores, preocupados em entender seus questionamentos.
3 A DENÚNCIA DO ADESTRAMENTO DO TRABALHADOR NA OBRA
DE TRAGTENBERG
As teorias gerenciais revelam, ao longo de sua história, uma formidável capacidade de
adaptação às condições colocadas pelos novos desenvolvimentos das forças produtivas, das
quais elas fazem parte inevitavelmente. Desde que tornou-se possível ao capital, estabelecer
mecanismos de controle sempre mais sofisticados a partir das oficinas que reuniam algumas
dezenas de trabalhadores, até a grande unidade produtiva mecanizada, o gerenciamento
científico é parte indispensável do processo de produção. Tornou-se instrumental que mescla
conhecimento e poder sempre com vistas à realização de um excedente, de mais valia.
Com facetas diferenciadas, é o que se depreende do estudo das obras de Taylor, Fayol ou
Maio. Repleto de novidades, o mesmo intento se manifesta nos mecanismos de controle
impostos pelas novas tecnologias. A denúncia, portanto, destes mecanismos nunca é
excessiva, jamais se esgota, nem se torna obsoleta. Ao contrário, a constância no seu combate,
contra todos os modismos e conformismos, garante a quem pratica um reconhecimento, que
transcende o muitas vezes pontual e exagerado reconhecimento acadêmico, e que de forma
perene, sem estardalhaços, ocupa um lugar definitivo como referência deste nadar contra a
corrente.
Os escritos de Maurício Tragtenberg colocam-se, indiscutivelmente, nesse patamar.
Expressão ímpar do inconformismo cada vez mais raro no mundo acadêmico, a obra de
Tragtenberg torna-se passagem obrigatória àqueles que desejam enfrentar com coerência o
tema dos conflitos e de sua ocultação no interior das organizações. Nos capítulos anteriores,
realizamos uma primeira aproximação das teorias gerenciais e da teoria política em direção ao
tema de nossa dissertação, com vistas à compreensão da forma com que cada uma delas
desempenha seu papel de ocultação dos conflitos sociais. Compete-nos, agora, compreender
as ligações que existem entre essas duas formas de controle. Nesse sentido, a obra de
Tragtenberg é fundamental. A formulação com que abre o primeiro capítulo do já clássico
Burocracia e Ideologia confirma o que dizemos: "A administração, enquanto organização
formal burocrática, realiza-se plenamente no Estado, antecedendo de séculos ao seu
surgimento na área privada" (1992, p.186).
59
Em Burocracia e Ideologia, Tragtenberg analisa a desvalorização progressiva do trabalho
fabril qualificado, a diluição do sistema técnico do trabalho, valorizando-se simultaneamente
a atenção, a percepção e a comunicação, como elementos que fortalecem e constituem a base
da transição da concepção taylorista-fayolista, para a concepção mayoista, que tende a
substituir o taylorismo e a se tornar hegemônica no pós II Guerra Mundial (MOTTA, 1985,
p.75).
Compreender o surgimento e o desenvolvimento da Teoria Geral da Administração como
"modelo explicativo dos quadros da empresa capitalista", será necessário para Tragtenberg
(1992), analisar o Estado na concepção hegeliana, pois:
(...) Foi Hegel que, no plano lógico, operacionalizou o conceito burocracia em nível
do Estado e da corporação privada. Hegel foi um dos primeiros estudiosos da
burocracia, enquanto poder administrativo e político, formulando o conceito: onde
o Estado aparece como organização acabada, considerado em si e por si, que se
realiza pela união íntima do universal e do individual. (p.21).
Hegel ao contrário das teorias contratualistas do Estado, que afirmam que os homens em
estado de natureza, vivem em comunidades e firmam um contrato entre si, consolidando o
Estado para lhes garantir liberdade individual, expressa na propriedade privada, em troca da
liberdade natural, discorda dos contratualistas acerca da teoria do Estado. Conforme Brandão
(1991):
A teoria contratualista faz do indivíduo o alfa e o ômega da vida social. Toma o Estado como
algo derivado, uma criação artificial, produto de um pacto, ação voluntária pela qual os
indivíduos abdicam de sua liberdade originária em benefício de um terceiro dando vida a um
corpo político soberano que lhes garanta vida, liberdade e bens. Tarefa precípua do Estado é,
então, garantir a liberdade individual e a propriedade privada. Por essa via, entretanto, a teoria
contratualista é incapaz de explicar por que o Estado pode exigir do indivíduo o sacrifício da
própria vida em benefício da preservação e do desenvolvimento do todo. Ao fazer do interesse
particular do indivíduo o conteúdo do Estado, ela está, segundo Hegel, confundindo Estado e
sociedade civil. Na verdade, o indivíduo sequer escolhe se participa ou não do Estado - é
constituído como tal por ele.(...) Somente como membro do Estado é que o indivíduo ascende
à sua 'objetividade, verdade e moralidade (p. 107 e108).
60
A concepção hegeliana acaba por negar a existência prévia do indivíduo ao Estado. Este, para
Hegel, é o Estado que antecede a sociedade, não passa por uma escolha do homem. O homem,
na concepção hegeliana, não escolhe o Estado, mas o constitui, pois o homem é sempre um
indivíduo social:
(...) o Estado, que é a forma de realidade em que o indivíduo tem a sua liberdade e a
goza, mas com a condição de reconhecer, acreditar e querer aquilo que é comum ao
Todo. E não se deve isto entender como se a vontade subjetiva da unidade social
alcançasse a sua realização e satisfação através desta vontade comum; como se isto
fosse um meio concedido para seu benefício; como se o indivíduo, nas suas relações
com os outros, limitasse assim a sua liberdade, a fim de que esta limitação universal
- o constrangimento mútuo de todos - assegurasse um pequeno espaço de liberdade
para cada um. Pelo contrário, afirmamos que a Lei, a Moral e o Governo, e só eles,
são a realidade e acabamento positivos da Liberdade. A Liberdade de uma ordem
mesquinha e limitada é um mero capricho que se realiza na esfera dos desejos
privados e limitados (HEGEL, in Patrick GARDINER (org.), Teorias da História,
1984, p. 81 e 82).
O que nos importa nesta questão do Estado, seguindo o pensamento de Tragtenberg, é
compreender, num primeiro momento que a burocracia pressupõe o espírito corporativo
17
Todavia, ao tratarmos da teoria de Elton Mayo, podemos usar o viés crítico inaugurado pelo
pensamento tragtenberguiano. A outra questão é como “o Estado com seu formalismo pode
opor o interesse geral (com a burocracia) como instrumento às corporações (interesses
privados), representadas por latifundiários, industriais, operários, camponeses”
(TRAGTENBERG, 1991, p. 23). No esquema hegeliano a burocracia representa a articulação
entre interesse privado e o interesse geral consubstanciada no Estado. Para o pensador alemão,
a classe média, devido à suas condições de cultura e condições sociais deveria ser elo entre o
Estado e a sociedade civil, pois:
Na Filosofia do direito Hegel interpreta a burocracia como uma mediação, uma das
diversas pontes que interligam o poder do Estado à sociedade civil. Situada numa
posição estratégica, ela configura-se como um setor particular dentro do Estado,
como o Estado materializando-se em forma de corporação. A burocracia, assim,
apresenta-se como formalismo do Estado, como expressão da essência, do conteúdo
estatal. E como Estado é o espírito idealizado da sociedade, a burocracia expressa a
própria essência espiritual da sociedade. Cabe a ela, segundo a terminologia
17
Os grifos são meus (MCF).
61
hegeliana, defender o " espiritualismo" do Estado contra o "materialismo" existente
no interior da sociedade civil (FREDERICO, 1995, p. 67).
Outro importante fato destacado por Tragtenberg, para os estudiosos e críticos das Teorias da
Administração, é que no regime democrático liberal, o Estado aparece como agente da
vontade gera, como um universal que encobre determinações privatistas.
Atentando agora para as relações que se estabelecem entre a estrutura burocrática e as demais
parcelas da população, vimos que para Hegel o Estado correspondia à esfera dos interesses
coletivos, ao passo que na sociedade civil prevaleciam os interesses particulares. Esta
dicotomia entre interesses coletivos e particulares corresponde, no pensamento hegeliano, ao
esforço realizado pelo espírito no sentido de reinstaurar a sua unidade. Dessa forma, o
conceito elementar que permitiria o desenvolvimento da ciência política seria o conceito de
verdade, que em Hegel aparece como a tendência à coesão presente em todas as formas de
associação humana.
O Estado, entendido desta forma como manifestação do espírito que antecederia à própria
sociedade civil, recorreria a determinadas mediações para realizar-se no contato com a
sociedade civil. Os dois caminhos encontrados para estas mediações seriam a instauração de
uma burocracia e de uma assembléia, compostas, a primeira por um corpo de funcionários
específicos e a segunda pelos grandes proprietários fundiários. Hegel justificava a composição
destes dois corpos, alegando que ambos não teriam interesses particulares a defender e que,
portanto, estariam em condições de assegurar o predomínio dos interesses coletivos.
No caso dos grandes proprietários rurais, Hegel subordinava esta condição ao fato de que os
grandes proprietários (sujeitos na sua relação com suas propriedades ao estatuto do morgadio,
que estabelecia as normas de transferência por herança das terras ao filho mais velho sem
partilha) estariam livres das oscilações da economia e que não se deixariam influenciar por
elas na hora de tomar as suas decisões.
Quanto aos funcionários burocráticos, alegava Hegel, seriam recrutados na classe média a
partir de critérios de competência. Esta burocracia seria uma corporação, mas ao contrário das
corporações da sociedade civil, seria uma corporação do Estado, seus interesses particulares
seriam o bom desempenho de suas funções em defesa dos interesses deste Estado, qual seja, a
defesa dos interesses universais.
62
A crítica de Marx contida nos Manuscritos de Kreuznach procura demonstrar que a burocracia
estatal não comporta estes elementos apresentados por Hegel. Partindo de uma análise
simplista do Estado, que mais tarde abandonaria, Marx não reconhece a burocracia como uma
corporação à parte da sociedade civil. Ao contrário, considera o Estado, enquanto expressão
alienada da essência da sociedade civil, portanto, uma mera abstração, só pode relacionar-se
com esta mediante um esforço lógico. O Estado não trataria da defesa de interesses universais,
cabendo ao seu corpo de funcionários a defesa de seus interesses particulares como ocorria
em qualquer corporação presente na sociedade civil.
Ao contrário de Marx que só retornou ao tema da burocracia de forma incidental, Maurício
Tragtenberg a elegeu como um de seus temas fundamentais. Ao tomá-la como ponto de
partida, podia desferir à burocracia golpes em direções variadas, fossem seus alvos a
experiência de construção do Estado soviético, a prática corrompida da educação ou as
tentativas de harmonização e ocultação da luta de classes.
No primeiro caso, Tragtenberg (1992) observa que:
a direção da industrialização levada a efeito pela burocracia do Partido Comunista
que monopolizou o poder articulando as burocracias ao nível de organização
hospitalar, escolar, militar, tomou a forma de um coletivismo burocrático, onde a
burocracia detém coletivamente a propriedade dos meios de produção e o monopólio
do poder político.
Dessa forma,
há uma fusão do poder político com o poder econômico, confundindo-se no seio da
classe burocrática onde participar da apropriação do sobreproduto eqüivale a
participar do sistema de dominação. (p.187-188).
Crê, portanto, Tragtenberg (1992), que a forma como se organizou o Estado soviético
permitiu o aparecimento de uma burocracia sob a forma de uma classe social que se apropria
do poder político e do sobre produto econômico. Isto o faz considerar a análise de Weber
sobre a burocracia como ineficaz para o entendimento do processo soviético. A diferença está
em que a obra weberiana ocupa-se de uma organização burocrática a serviço dos detentores
do poder econômico e isto lhe permite uma enumeração dos seus critérios formais, ao passo
que a burocracia soviética constitui-se ela própria, no entender de Tragtenberg, em uma classe
63
social detentora do poder econômico, como uma categoria social específica que tende a
autonomizar-se ante a sociedade.
Tragtenberg (1992) reconhece que esta sua formulação da burocracia soviética como classe
encontra resistências quando comparada a outras análises do Estado pós-revolucionário:
Trotsky o caracteriza como "um Estado proletário com deformações burocráticas" (p. 191)
enquanto que para Charles Betelheim ele estaria dominado "por uma burguesia de Estado
(que) mantém as formas de dominação tradicionais e separa o aparelho de Estado das
massas".
Mas, para Tragtenberg (1992), o que ocorre é um retorno de Marx a Hegel depois da
caminhada de Hegel a Marx. Em outras palavras, o que se estabelece na União Soviética é a
pregação hegeliana do Estado como articulador dos interesses universais, exterior à sociedade
civil, capaz de realizar o conceito de vontade superando as desavenças particularistas. A
burocracia “une a sociedade civil ao Estado, efetua a viagem de volta de Marx a Hegel,
converte a sua razão histórica na razão na história, do contingente passa à essencialidade (p.
190).
Age, assim, de forma antitética, pois,
de um lado responde à sociedade de massas e convida à participação de todos, de
outro, com sua hierarquia, monocracia, formalismo e opressão afirma a alienação de
todos, torna-se jesuítica (secreta), defende-se pelo sigilo administrativo, pela coação
econômica, pela repressão política (p. 190).
A antítese aqui mencionada por Tragtenberg é explicada por Mészáros a partir de outra
referência. No seu entender, a constituição do Estado soviético dá-se no interior de um drama
histórico: com o deslocamento já identificado por Marx, a seu tempo, da revolução do
ocidente para o oriente, ou, na formulação de Lênin, ao aparecimento dos elos frágeis da
cadeia imperialista na periferia do sistema. Dá-se a ruptura revolucionária em países pouco
desenvolvidos do ponto de vista capitalista, o que significa dizer, que se deu essa ruptura em
países cujo desenvolvimento das forças produtivas ainda não se mostrava capaz de
prontamente atender às necessidades elementares dos trabalhadores.
A partir desta deficiência, herdada do regime derrubado, impõe-se como tarefa à revolução o
rápido desenvolvimento da capacidade de produzir, o que implica na necessidade de se
manter na esfera da produção um rígido controle sobre o trabalho. Desfazem-se assim, já no
64
início da experiência socialista, as possibilidades de atendimento das necessidades
elementares dos trabalhadores e da instauração da auto-determinação do trabalho, condições
necessárias para a construção de uma sociedade para além do capital.
O que Mészáros procura demonstrar é que, embora haja uma destruição do regime capitalista
com suas normas de mercado e estrutura jurídico-política apoiada na propriedade privada dos
meios de produção, reproduz-se, ao pé da máquina, mecanismos de controle sobre o trabalho
que reinstauram o estranhamento. Assim, convivem apelos a uma vida socialista, emancipada
do mercado e da propriedade privada com a não efetivação da auto-determinação do trabalho,
do que decorre a condição esdrúxula de um capital sem capitalismo, de um capital sem
mercado.
Sob tais condições, sem os estímulos das ilusões do mercado e da ascensão social, mas
também sem a pressão da ameaça do desemprego, torna-se inoperante à opressão econômica
que age sobre os trabalhadores no capitalismo, dando esta lugar a opressão política, como
condição para se manter a produção em níveis satisfatórios.
A hipertrofia do Estado, da qual a burocracia é um sub-produto, seria uma decorrência da
incapacidade demonstrada pelas sociedades de irem para além do capital e não o ponto de
partida de uma deformação burocrática. Isto não invalida, entretanto, as análises que se possa
fazer da burocracia como elemento opressor voltado à ocultação dos conflitos que a sociedade
não conseguiu superar.
Em Delinqüência Acadêmica, demonstra Tragtenberg como o exercício da democracia supõe
responsabilidade política no cumprimento de suas atribuições, devendo garantir a função
social do universal e do particular acima de quaisquer interesses específicos. Tragtenberg, ao
mostrar como o poder se encontra incrustado nas instituições e nas organizações, indica como
se dá a apropriação do saber e a perpetuação dos sistemas de dominação nos diferentes poros
do tecido social.
Quando se refere às universidades e à relação de poder que as compõem, Tragtenberg não
dispensa críticas severas, que muitos acadêmicos - docentes e discentes - têm dificuldades em
digerir, pois não se dão conta de que ideologicamente já estão corrompidos pela "delinqüência
acadêmica". Na denúncia do adestramento, as universidades não estão isentas, pois o papel
que elas desempenham enquanto instituições de classe, não resulta a neutralidade, ao
65
contrário, o saber funciona como elemento que oculta as contradições sociais, surgindo como
ideologia, do "saber neutro". A proposta de Tragtenberg é a destruição do 'saber
institucionalizado', do 'saber burocrático', que segundo o autor:
A apropriação universitária (atual) do conhecimento é a concepção capitalista do
saber, o qual se constitui em capital e toma forma nos hábitos universitários. A
universidade reproduz o modo de produção capitalista dominante não apenas pela
ideologia que transmite, mas pelos servos que ela forma (TRAGTENBERG, 1979,
p. 17).
A denúncia feita por Tragtenberg, no caso das universidades, é o papel que o intelectual
desempenha:
(...) O intelectual orgânico da burguesia, organizador da hegemonia burguesa, a qual
por mediação da universidade inculcará as formas de sentir, pensar e agir como
sendo 'naturais' e' normais'; e o intelectual crítico que, em época de ascensão do
movimento de massas, pode legitimamente representá-las (TRAGTENBERG, 1979,
p. 9).
Isso exemplifica, portanto, o momento em que vivemos, de total ausência de perspectivas para
sanar as contradições sociais. É, conforme o pensamento de Tragtenberg, o momento de
"transformação dos meios em fins", com o refinamento burocrático, gerando em si um
tecnicismo, com práticas inovadoras, seja em empresas, universidades, partidos políticos,
sindicatos, seja em qualquer tipo de organização. Esse fenômeno justifica a ocultação dos
conflitos, sejam eles de natureza administrativa, próprio das corporações, das universidades,
ou sejam de qualquer outra esfera societária, serão sempre ocultados, muitos pela prática
indiscriminada da obtenção de poder, outros pela forma ideológica inerente ao pensamento
dominante.
Nas sociedades capitalistas, o enfoque dado ao saber instrumental é o apogeu da dominação
capitalista, pois Bacon, filósofo da manufatura diz que "saber é poder", quer dizer , o homem
dispõe de mecanismos para transformar a natureza em meios de produção, onde o Estado,
favorece os interesses econômicos de uma classe sobre outra Estão dadas, assim, as condições
para a exploração do homem pelo homem, a idéia de contrato faz sentido, pois representa o
pensamento daqueles que vão gerir as organizações, inclusive o Estado, recorrendo sempre à
66
política como forma de amenizar os conflitos e até mesmo ocultá-los. É o momento em que
vale tudo: Estado democrático, discurso participativo, motivação enquanto elemento eficaz
para a harmonia organizacional, globalização enquanto sinônimo de desenvolvimento,
técnicas gerencialistas readaptadas a um novo milênio, e à academia, "o local onde se pensa"
infectado de idéias inovadoras para o desenvolvimento de técnicas empenhadas no
aperfeiçoamento da dominação produzida pelo capitalismo, disseminando conflitos em todas
as esferas sociais.
O brilhantismo de Tragtenberg em mostrar essa forma de dominação, a transparência da
burocracia enquanto condição vital para o capitalismo, e a pretensa neutralidade dos cientistas
que os desobriga de qualquer crítica, é o pano de fundo que permeia toda a sua obra. É a
denuncia de um "processo de militarização das ciências sociais paralelo ao desenvolvimento
da super-especialização e ao intelectualismo" (TRAGTENBERG, 1979, p. 29). Fala também
sobre:
(...) a utilização das ciências sociais, sociologia, psicologia, história e cibernética,
com a função de (...) caracterizar a sintomatologia para a eclosão da contra-
revolução preventiva - além disso criar uma estrutura de informação que permita
detectar focos de conflitos que possam afetar a ´segurança nacional' dos EUA.. Os
recursos para tais tarefas são captados por intermédio de Fundações, Instituições,
Agências, Universidades, Multinacionais, que por suas subsidiárias canalizam a
´fertilização´ os dólares necessários à desestabilização de determinados governos.
Pratica-se em grande escala o levantamento de dados para os Bancos de Dados
Nacionais, tendo em vista a elaboração de modelos cibernéticos sobre
desenvolvimento econômico, político e social (p. 31).
Após sua morte, ocorrida em finais de 1998, não só a obra, mas a personalidade de
Tragtenberg foram objeto de diversos artigos. Neles, invariavelmente, ficava registrada a
coerência entre prática e teoria na figura do homenageado.
Maurício Tragtenberg dedicou sua vida à carreira acadêmica. Escreveu artigos para vários
jornais, revistas e publicações sindicais. Em sua postura pessoal não havia nenhum tipo de
arrogância ou de vaidade intelectual, embora fosse dotado de indiscutível bagagem
intelectual. Profundo conhecedor da obra de Marx, e fortemente influenciado pelas suas obras,
nunca se declarou marxista, Simpatizante do anarquismo, dedicou alguns de seus estudos a
essa corrente ideológica. Coerente com sua maneira de pensar, sempre se mostrou avesso ao
processo de burocratização no interior das organizações, fosse daquelas pelas quais passou em
sua vida docente, fosse daquelas nas quais via esse processo como uma traição, como no caso
67
dos sindicatos e partidos operários. Da mesma forma apresentava-se no plano teórico,
investindo contra todas as teorias que buscavam legitimar algum tipo de dominação. Jamais
viu o poder como algo natural, inerente à natureza humana. Contestava-o sempre, nunca de
forma banal, nunca desprovido de dados. Em seus livros, artigos para revistas acadêmicas, nas
colunas dos jornais com os quais colaborou ou ainda nas salas de aula, o não conformismo de
Tragtenberg compôs um corpo teórico denso e original, que lhe permitiu atrair respeito e
admiração. Como observa Ricardo Antunes, "a questão da burocracia, da administração, do
poder, das formas de opressão e dominação foi o verdadeiro leitmotif da reflexão de
Tragtenberg” (ANTUNES, 1999, p. 180).
Em recente seminário apresentado na UEL (Universidade Estadual de Londrina) a
personalidade de Maurício Tragtenberg e a grandeza do seu pensamento teórico-político
reuniu professores e pesquisadores que compuseram um relato acerca de suas importantes
contribuições para a educação, a política e o movimento sindical. Catani (2001), em seu artigo
"Maurício Tragtenberg, um intelectual contra o poder intelectual 1929-1998,"nos mostra
como seu pensamento pautou suas ações remando contra o pensamento dominante”
18
. Em
“Sobre Administração e Avaliação: uma conversa com as idéias de Maurício Tragtenberg”,
Agueda (2001) trata do significado das políticas acadêmicas que estão sendo adotadas nas
mais prestigiadas universidades brasileiras, apresentadas como reformas, processos de
modernização e avanços democráticos, quando na verdade não passam de velhas propostas de
um novo tecnicismo
19
. O artigo de Doris (2001), “Autonomia e Solidariedade: o jornalismo
sindical de Maurício Tragtenberg”, resgata o pensamento do autor em sua coluna no Batente,
artigos publicados no Jornal Notícias Populares, a análise do sindicalismo feito por Maurício,
onde percorre a análise da Burocracia, Estado, Sociedade Civil, Problemas de Política
Internacional, relacionados com a situação brasileira
20
Ferreira (2001), escreve sobre a
combinação do pensamento weberiano com o pensamento marxista na obra de Tragtenberg.
“Anotações para um socialismo libertário”, é a obra onde ele analisa a estrutura do
capitalismo de Marx com a superestrutura de Weber, elementos que explicam a dominação do
trabalhador evidenciado na burocracia como constitutivo do político
21
Tomazi (2001), em “A
delinqüência acadêmica”, mostrou os aspectos da crise, reprodução social e o papel do
18
Tudo Flui, Revista da Aduel-Sindiprol/Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Londrina/
Sindicato dos Professores de Londrina, vol. 5 (jan/jun de 2001), Londrina, p. XX.
19
Id., ibid.
20
Id., ibid.
21
Id., ibid.
68
intelectual, elementos conformadores do sistema que Tragtenberg analisa com profunda
crítica à Instituição Acadêmica
22
.
Também a RAE
23
prestou uma homenagem ao saudoso professor Maurício Tragtenberg. Nela,
quatro trabalhos recuperam a personalidade e as idéias de um dos principais pensadores
brasileiros em Administração. Valverde (2001) traz um relato pessoal sobre Tragtenberg, sua
trajetória de vida e seu carisma, no artigo “A inteligência do orientador”. Motta (2001) nos
mostra o lado crítico de seu pensamento em “Maurício Tragtenberg: desvendando
ideologias”; Faria (2001) explora, a partir das idéias de Tragtenberg, os temas poder e
participação, intitulado: “Poder e Participação: a delinqüência acadêmica na interpretação
tragtenberguiana” e, por fim, Paula (2001) propõe uma atualização das idéias de Tragtenberg,
aplicando-as ao “estado das coisas” na área da pesquisa e do ensino em Administração, no
artigo “Tragtenberg e a resistência da crítica: pesquisa e ensino na Administração hoje”.
O resgate do seu pensamento justifica-se,o apenas por sua dimensão acadêmica, pela
influência que teve nesse âmbito, mas pela preocupação sempre presente com a temática
social, pela coragem em lutar na contracorrente, sempre que essa posição era exigida para
salvaguardar princípios lastreados na perspectiva de emancipação humana. Em suas palavras,
O problema dos fins do conhecimento e da responsabilidade do cientista social
coloca-se agudamente para uma época histórica que conheceu o nazismo, a guerra
do Vietnã, o terror policial na América Latina legitimado pela doutrina da
infiltração, a utilização das universidades e do conhecimento das ciências sociais
para o genocídio (TRAGTENBERG
, 1979, p. 32).
Do ponto de vista teórico, Tragtenberg sempre recusou rótulos ou adesões claras a um ou
outro autor, a uma ou outra corrente. Seu interesse pela obra weberiana, sua simpatia pelas
tendências anarquistas, suas passagens pelo marxismo, fazem de Tragtenberg um cativante
emaranhado que parece sempre disposto a zombar de quem pretenda estabelecer um fio da
meada. A crítica que faz das organizações burocratizadas parece-nos, entretanto, um
importante fio condutor na revelação da esfinge tragtenberguiana.
22
Id., ibid.
23
Revista de Administração de Empresas, Escola de Administração de Empresas de São Paulo, vol. 41, nº
.
03,
jul./set.2001
69
Evidente é o seu desconforto perante a crescente influência do espírito burocrático na vida
moderna. Se não pode, pelos motivos que já abordamos, buscar em Marx os elementos
críticos essenciais à sua obra, Tragtenberg fez uso dos conceitos empregados pela sociologia
weberiana. Como se sabe, também este autor alemão incorpora em sua obra diversos matizes
ideológicos que dificultam seu entendimento como um todo. Como observa Lowy (1979),
...é muito difícil definir a sua posição político-ideológica: é um ' liberal' como
pretende Merleau-Ponty, um 'representante ativo da política do capital monopolista',
como pensa a Academia de Ciências da URSS, ou um aristocrata nietzscheano,
como sugere Jean-Marie Vincent? Ele era contrário ou favorável à democracia
parlamentar, ao militarismo, à social-democracia? (p. 32).
Ao apontar estas possibilidade de leitura na obra de Weber, Lowy procura mostrar através de
seu próprio entendimento de que esta modalidade comportaria, como conseqüência de seu
anti-capitalismo romântico. E tendências diversas, que fariam seu autor ora aproximar-se de
pensadores revolucionários, ora de expoentes do reacionarismo alemão do início do século
vinte. De qualquer forma, o que fica evidente é o desconforto de Weber com o que ele mesmo
qualificou como sendo o desencantamento do mundo, sua exacerbada racionalização que o
levaria mesmo a falar em uma futura ditadura do funcionalismo (Weber sobre o socialismo).
Esta sua aversão ao mundo burocratizado, alcança também os partidos políticos e estimula sua
aproximação aos sindicatos e aos anarquistas (LOWY, 1979, p. 35), o que não o impede de
intervir em favor dos social - democratas levados a julgamento pelo governo alemão. Desta
simpatia por sindicalistas e anarquistas nasce o relacionamento com Georg Simmel e Robert
Michels, eles também portadores, assim como os demais participantes do círculo Weber, de
significativo espírito anti-capitalista.
O anti-capitalismo weberiano e de seus companheiros de viagem não pode, entretanto, ser
confundido com qualquer suposta adesão aos princípios marxistas. Ao contrário, ao
privilegiar os aspectos culturais como determinantes da existência social, em prejuízo das
relações sociais concretas, postas pela necessidade de produção e reprodução da vida, priva-se
sua obra, mesmo em oposição ao desejo de seu autor, da capacidade de ir além de "uma
psicossociologia a-histórica, uma filosofia da cultura de tendência profundamente metafísica"
(LOWY, 1979, p. 37) em nítida oposição aos princípios socialistas de Marx.
Quando tomamos estes aspectos específicos da obra de Weber para fazer uma aproximação, e
não mais que isto, para ressaltar a influência que este espírito anti-capitalista desempenhou
70
sobre a obra de Tragtenberg, não podemos deixar de levar em conta que nesta, este espírito
jamais fez vingar qualquer entendimento reacionário ou conservador do mundo. Mas, não se
pode deixar de observar que Tragtenberg, em sua obra, dá acentuada importância aos aspectos
culturais relacionados com a constituição e perpetuação das relações de poder.
Isto o aproxima dos anarquistas, críticos históricos destas relações, ainda mais quando se
observa que também estes recorrem com freqüência à caracterização a-histórica do Estado. E
também, podemos arriscar dizer que Tragtenberg, em muitos aspectos antecipou-se às críticas
feitas às estruturas de dominação pelas teorias pós-modernas.
No conjunto, weberianos, anarquistas ou pós-modernos, têm em comum a recusa da grande
narrativa, do conceito de totalidade, desenvolvido por Hegel e conduzido à condição de
categoria histórica por Marx. Se não há na obra de Tragtenberg uma clara referência a esta
recusa, também não se pode imputar-lhe uma indiscutível adesão aos princípios de Marx.
Antes, ela se faz pontualmente, a partir de categorias bem apontadas, particularmente aquelas
que se remetem à instauração de relações de poder junto à produção, das quais mais-valia e
estranhamento são exemplares, mas também da categorização do Estado e da organização do
poder pós-revolucionário.
Em interessante artigo comemorativo ao centenário da morte de Marx, Tragtenberg dispõe-se
a realizar uma curiosa comparação entre este e seu tradicional adversário M. Bakunin (Ensaio,
Marx Hoje). Engana-se quem espera deste artigo manifestações de simpatia ao articulista
russo. Ao contrário, Tragtenberg elenca aspectos que evidenciam a superioridade de Marx não
só como teórico, mas também como organizador. E para surpresa de muitos, aponta as
concessões que se dispõe a fazer o anarquista à burocracia estatal quando isto se mostra
conveniente.
Por fim, Tragtenberg pode, mediante um estudo posterior, ser qualificado como um intelectual
revolucionário, um crítico do capitalismo, em especial de suas estruturas de dominação, que
reúne em sua obra elementos da crítica culturalista representada em parte pela obra de Weber,
com desenvolvimento nas formulações anarquistas e pós-modernas, mas que nunca abriu mão
do poderosos arsenal analítico proporcionado pelo marxismo.
4 REESTRUTURAÇÃO RACIONAL DO TRABALHO: SUPERAÇÃO
DO MODELO FORDISTA DE PRODUÇÃO
A reestruturação racional do trabalho, especialmente no século XXI, nos obriga a discutir as
mudanças no mundo do trabalho. Cabe uma pergunta: existe, em se tratando do homem, outro
mundo que não seja o mundo do trabalho? A resposta certamente será negativa, pois sabemos
que nós, seres humanos, somos responsáveis por todas as transformações que ocorrem em
nossa sociedade. Basta lembrar das formas primitivas e rudimentares de organizações e
relações em que viviam os homens há algum tempo, do alto índice de mortalidade devido à
proliferação de doenças sem a menor possibilidade de controle, da cooperação enquanto
forma simples de produção capitalista, da inexistência de indústrias, da falta de
conhecimentos de arquitetura e de planejamento urbano. Graças ao avanço e ao
desenvolvimento das ciências e da tecnologia, através do trabalho do homem, colocando
ambas a serviço do bem estar social, pudemos em parte alcançar esse atual grau de
desenvolvimento e civilização.
Isso nos remete, porém, a outra pergunta: é-nos possível afirmar que a ciência e a tecnologia
estão, realmente a serviço do bem estar social? Será que, em geral, não estamos cometendo
um engano ao generalizar tal questão, transmitindo uma falsa ideologia? A tentativa aqui será
de mostrar a importância da discussão dessas questões.
Uma via metodológica para esse estudo, portanto, será resgatar alguns conceitos
epistemológicos, sem os quais cairíamos numa leitura superficial e trivial da soberania do
capital e da perpetuação dos conflitos.
72
4.1 PRODUÇÃO DESTRUTIVA
Uma questão a ser discutida, em se tratando de mundo do trabalho, portanto de homens, e a de
se existiria um outro mundo que não fosse o mundo do trabalho É importante ressaltar,
através dessa análise que se pretende realizar, o papel do trabalho enquanto protoforma da
existência social, constituindo-se, no primeiro pressuposto dessa existência. Lukács (1979)
lança, através da análise do pensamento marxiano, uma luz ontológica completamente nova,
... no momento em que Marx faz da produção e da reprodução da vida humana o
problema central, surge - tanto no próprio homem como em todos os seus objetos,
relações, vínculos, etc.- a dupla determinação de uma insuperável base natural e de
uma ininterrupta transformação social dessa base. Como sempre ocorre em Marx,
também nesse caso o trabalho é a categoria central, na qual, todas as outras
determinações já se apresentam in nuce: ' O trabalho, portanto, enquanto formador
de valores- de- uso, enquanto trabalho útil, é uma condição de existência do homem,
independente de todas as formas de sociedade; é uma necessidade natural eterna, que
tem a função de mediatizar o intercâmbio orgânico entre o homem e a natureza, ou
seja, a vida dos homens (LUKÁCS, 1979, p. 16).
Dessa forma estamos nos autorizando a interpretar o mundo do trabalho enquanto aspecto
determinante da presente forma de sociabilidade, é ele, tudo o que determina a realidade, suas
contradições, e suas possibilidades.
Considerando-se que as contradições insinuadas tenham se acentuado nesses últimos vinte e
cinco anos, em função da própria crise do capital, pensamos que esta é a crise mais profunda e
mais extensa da história sem que o homem, ao parecer, tivesse tomado consciência dela, e
sem ao menos ter realizado a crítica teórico concreta.
Encontramos um dos sintomas da crise na separação entre consciência e realidade social,
consciência que nunca é idêntica à realidade, ou seja, consciência que deve ser entendida aqui
enquanto tonalidade mais clara da realidade, pois não é possível apreender a realidade em sua
totalidade, e sim apreender seus nexos fundamentais (entre o que o mundo é e o que se pensa
dele).
O que queremos explicitar com estas afirmações, é que da profunda crise do mundo regido
pelo capital, seja ele capital de mercado, seja sob a forma de capital coletivo não social, não
emerge sua crítica, mas a reafirmação de sua perpetuidade. Visto de outra forma, existe um
73
abismo entre o que queremos dizer e que o mundo é, suas representações ideais. Desse modo,
enquanto esse mundo é o mundo da crise, a consciência é voz de perpetuidade do capital,
uma vez que a consciência não realiza a crítica teórica da realidade.
Inquirindo mais de perto a origem desta crise, ou esse abismo entre consciência e realidade
social, é possível constatar a existência de uma dupla crise, seja na forma de mercado ou seja
na forma de capital estagnado.
Ao mesmo tempo em se que proclama a liberdade de mercado como panacéia universal, a
crise estrutural do capitalismo atinge uma profundidade e extensão jamais vistas. Não se trata
apenas de sua velha e conhecida incapacidade para equacionar os problemas reais da
humanidade, e sim de seu caráter antropofágico, da miséria que produz e reproduz em escala
crescente. Rifkin (1995), respaldando-se em dados da OIT ( Organização Internacional do
Trabalho) de 6 de março de 1994 afirmou: "O desemprego global atingiu agora o seu mais
alto nível desde a grande depressão da década de 1930. Mais de 800 milhões de seres
humanos estão desempregados ou subempregados" (RIFKIN, 1995, p. XVII).
Os números relativos ao desemprego no mundo são admitidos pelos próprios defensores do
capital que aceitam o fato, argumentando que o desemprego é estrutural. Ocultam o detalhe de
que o desemprego é estrutural do ponto de vista do capital. Podemos ilustra-lo com o
"desemprego tecnológico", que é um fenômeno dos países desenvolvidos ou dos ditos
"emergentes". Existe também o desemprego em massa nas regiões que não conseguem
oferecer infra estrutura para industrialização, ficando relegadas a segundo plano dentro do
quadro de "integração" capitalista, como acontece com grande parte da África, Ásia e
América Latina. Em ambos os casos, ou seja, em países desenvolvidos e subdesenvolvidos, o
imperativo da questão é colocado em termos absolutos sob a lógica da reprodução do capital,
e não do atendimento das reais demandas societárias. O fato de se colocar a questão como
conseqüência do excesso ou da limitação tecnológica já indica a proposição de um falso
problema, pois o que precisa ser investigado é a lógica da produção capitalista, que subordina
os reais interesses humanos em geral à lógica da remuneração do capital, do lucro.
Cabe lembrar, de forma bastante sintética, alguns elementos que julgamos responsáveis pela
crise estrutural do capitalismo. De acordo com Antunes (1999), os primeiros sinais foram
aparecendo a partir dos anos 70, após um longo período de acumulação de capitais, resultante
da produção em massa nos moldes do taylorismo - fordismo. A queda da taxa de lucro,
74
ocorrida devido ao aumento do preço da força de trabalho, a partir do pós 45, e, na década de
60 com a intensificação do controle social da produção, reduziu a produtividade do capital, e
reduziu consequentemente a taxa de lucro. Outro sinal é o esgotamento do modelo de
produção em massa, taylorista-fordista, em que a produção não correspondia ao consumo, e a
retração era a resposta ao desemprego estrutural que iniciava-se nesse período. De acordo
com Gorender (1987):
Os administradores japoneses, no imediato pós-guerra, precisavam dar resposta ao
problema de como produzir para um mercado então muito estreito. O método
fordista seria inaplicável uma vez que se baseia na economia de escala com vistas a
um grande mercado. Seria preciso, por conseguinte, pensar ao inverso do método
fordista. Ou seja, como produzir em pequena quantidade e, assim mesmo, a custos
baixos, apropriados à obtenção de um produto acessível aos consumidores. A
economia de escala deveria ser substituída pela economia de escopo.
O modelo japonês da organização da produção ficou conhecido como toyotismo, pois foi
aplicado na fábrica da Toyota, nos anos 50, pelo engenheiro Taiichi Ohno. A economia de
escopo, as equipes de trabalho, conhecidas também por células de produção e o just in time, se
encarregavam de um conjunto de tarefas para realizar o programa de produção determinado
pela gerência. Segundo Gorender (1987),
(...) cada equipe seria responsável pela qualidade de sua produção, podendo
inclusive paralisar a cadeia produtiva ao notar algum defeito. Em última instância, o
objetivo seria zero - defeitos. Assim eliminava-se todo o setor de reparos ao final da
cadeia de montagem, poupando os gastos que implicava. Também o setor de
manutenção seria eliminado ou significativamente reduzido, na medida em que as
equipes se encarregassem de realizá-la. Os integrantes das equipes de produção
deveriam ser operários polivalentes, com o domínio de vários ofícios, o que lhes
permitia a rotação de uma tarefa a outra, tornando o trabalho mais interessante.
Semelhante divisão do trabalho permitiria ainda que cada integrante da equipe
tocasse não apenas uma, mas várias máquinas ao mesmo tempo. O trabalho por
equipes também possibilitaria sair da camisa-de-força das máquinas dedicadas -
característica do fordismo - e passar a máquina de ajuste flexível e rápido, que
poupariam o tempo requerido a fim de preparar a produção de novos modelos e
introduzir modificações a cada um deles (p.316).
O enfraquecimento do fordismo, segundo Bihr 2000, se dá por quatro fatores: diminuição dos
ganhos de produtividade, visivelmente marcada pela inversão de crescimento contínuo de
produtividade, o taylorismo entra numa fase contraprodutiva; elevação da composição
orgânica do capital, momento em que a capacidade produtiva se amplia em todos os setores -
75
da produção industrial à agrícola, nos serviços, na comunicação,- é um processo de aplicação
tecnológica ampliando-se devido a concorrência entre grandes capitais. O quarto fator trata da
saturação da norma social de consumo, ou seja da saturação do mercado nas décadas de 60 e
70, retraindo as expectativas de vendas; o desenvolvimento do trabalho improdutivo, ou o
nascimento da terceirização.
A discrepância entre a capacidade produtiva e os limites de consumo no interior da lógica
capitalista gerou a hipertrofia da esfera financeira, e a supremacia do capital financeiro, na
nova fase do processo de internacionalização. Levam às fusões entre as empresas
monopolistas e oligopolistas, redundando numa maior concentração de capitais: o fator de
integração industrial "continental", (CHESNAIS, 1996) através da:
(...) implantação de fábricas ou unidades de produção em países diferentes tem por
objetivo aproveitar os diferenciais de níveis salariais, mas também economizar na
especialização. A decomposição técnica dos processos de produção permite, em
determinadas condições, obter ganhos de especialização, bem como maior
homogeneidade de cada segmento produtivo. As atividades podem também ser
espalhadas no espaço e localizadas livremente, seja em nível das filiais, no caso da
integração completa, seja por subfornecimento internacional e suprimento no
exterior (p. 131).
O colapso do “Estado de bem-estar social”, retraindo os gastos públicos, transferindo-os ao
capital privado através do incremento das privatizações, também é conseqüência desse
processo. Conforme Draibe e Henrique (1988):
As raízes estruturais dessa crise do Estado encontram-se na dinâmica subjacente às
funções contraditórias do Estado capitalista. O processo de acumulação do capital
monopolista torna cada vez mais necessária a intervenção do Estado através dos
gastos com capital social (projetos e serviços destinados a elevar a produtividade e /
ou diminuir os custos de reprodução da força de trabalho). Entretanto, a própria
expansão do capital monopolista tende a gerar desequilíbrios econômicos e sociais -
desemprego, pobreza, capacidade excedente, capitalistas excedentes do setor
competitivo da economia etc.- situação que impõe maiores gastos sociais do Estado
para manter a harmonia social (p.:60).
A crise atual do capitalismo é a crise de seus aspectos mais brilhantes, de suas características
mais positivas. A produção capitalista é a produção de valores de uso e de valores de troca,
mas com a predominância da segunda sobre a primeira. O lado cruel é exatamente a
76
subordinação das necessidades humanas (valor de uso ) às necessidades do capital (valor de
troca ). Assim o desequilíbrio entre produção e consumo está dado, tanto o consumo quanto a
produção deveriam ser realizados de acordo com o valor de uso, entretanto, ocorre o
contrário, dificultando assim, a constituição e manutenção de um equilíbrio saudável. Do
ponto de vista da sociedade, o capital se preocupa com a produção dos valores de troca, no
extremo da grande produção, gera um desequilíbrio entre a necessidade de continuar
produzindo e a necessidade de se fazer consumir.
Este desequilíbrio, a crise de superprodução em escala agigantada, equaciona-se, mais uma
vez, com a destruição do capital super-produzido, com o agravamento do que agora, sob a
forma monopolista, são quantidades incomensuravelmente maiores de capital e trabalho
humano, reduzidos a pó. Isto é o que Mészáros (1989) chama de produção destrutiva do
capital, o que torna possível a sobrevivência do capitalismo contemporâneo:
desde a dissipação na forma de sub-utilização, obsolescência planejada ou embutida,
até a produção da destruição, isto é, a nulificação direta de vastas quantidades de
riqueza acumulada e de recursos elaborados - como meio dominante de ordenação
do capital super-produzido. O que se torna possível porque consumo e destruição
são equivalentes funcionais do ponto de vista do perverso processo de “realização”
capitalista (MÉSZÁROS, 1989, p. 12).
Do ponto de vista do capital, consumo (satisfação de necessidades humanas) e destruição são
idênticas nessa escala de valores. Poder-se-ia imaginar que o capitalismo, em vez de destruir
seus produtos aumentasse o consumo universalizando-os, atraindo para o mercado multidões
excluídas. Para isto bastaria reorganizar toda a produção, reestruturar a divisão internacional
do trabalho, adotar uma postura menos concentradora, eliminar a concorrência entre os
diversos capitais, enfim bastaria que o capitalismo se dispusesse de ser capitalismo.
Se esta declaração de princípios ainda encontra adeptos entre os crentes da fé smitheana da
“mão invisível”, isto se dá por ignorância ou má intencionalidade, pois a realidade não
manifesta quaisquer sintomas desta inscrição do capital no "exército da salvação". Ao
contrário, a luta se trava e em escala crescente de ferocidade. A produção destrutiva não só
nega as necessidades humanas como também aniquila parcelas crescentes de capitais cuja
lucratividade, produtividade ou competitividade estejam aquém da corrida capitalista. No
mesmo momento unidades produtivas cujo valor social ainda não se possa considerar
esgotados são reduzidas a sucatas pela "racionalidade" capitalista. Trata-se de um processo
77
que estabelece a obsolescência prematura dos bens produzidos e dos aparatos tecnológicos
utilizados na sua produção como condição de equilíbrio, cada vez mais frágil de ordenação
capitalista.
24
Na sua expressão mais superficial esta luta do capital consigo mesmo na figura de vários
capitais adquire a aparência de um salto tecnológico regenerador, milagre operado pela santa
liberdade de iniciativa. No essencial, entretanto, o que temos, é a tecnologia, ( assim como
toda a produção) afastada das necessidades humanas da maior parte da população, reduzida a
um conhecimento de nível efêmero logo superado no processo autofágico do capital. A
própria noção de tecnologia, a despeito de toda a mitificação atual, é empobrecida se
comparada com o que dela se esperava nos anos inaugurados pela sociedade moderna.
25
O processo de enquadramento da ciência e da tecnologia nos interesses específicos do capital,
coincide com os processos de transferência da capacidade produtiva do trabalhador para o
capital. O ponto de partida desta transferência é, naturalmente, o momento de dissolução entre
produtor direto e os meios de produção, a expropriação que transforma o camponês em
proletário, o cercamento dos campos, a acumulação primitiva. Obrigado a vender sua força de
trabalho para poder sobreviver, o trabalhador submete-se ao trabalho coletivo oferecido pelas
oficinas dos capitalistas. A cooperação simples e suas vantagens para o capitalista (aumento
da produtividade, redução dos custos) representam uma potencialização do trabalho sem que a
isto corresponda progresso humano para o trabalhador.
Ao contrário, a cooperação na sua forma simples, na manufatura, ampliou a degradação dos
reais interesses do trabalhador frente ao capital. Na manufatura, como é sabido, o trabalhador
individual é reduzido a condição de um trabalhador fragmentado. A subdivisão crescente de
sua atividade laborativa transforma-o em uma parte insignificante do processo produtivo ao
24
A crise ecológica é conseqüência de uma sociedade cujos imperativos se pautam pela apropriação privada da
riqueza socialmente produzida, pela concorrência desenfreada no campo do capital e no campo do trabalho, no
tratamento da natureza como meio de produção de lucro e não no trato das reais necessidades humanas a curto,
médio e longo prazo, gerando na relação homem e natureza a poluição generalizada, colocando em risco a
própria existência humana na terra. Até mesmo as medidas paliativas começam a sofrer vetos do capital, basta
constatar a posição do governo Busch com relação ao protocolo de Kyoto.
25
"De acordo com isso, estamos hoje em dia muito longe do diagnóstico de Charles Babbage a respeito do
imperativo capitalista de renovar o maquinário a cada dez anos. É que nossa 'sociedade descartável'
freqüentemente lança mão da desconcertante prática 'produtiva' de sucatear maquinário após um uso muito
reduzido, ou mesmo sem inaugurá-lo, como que para substituir por algo 'mais avançado', ou para deixar seu
lugar vago sob as condições de 'pressão descendente' na economia". Mészáros, I. Produção destrutiva e estado
capitalista, São Paulo: Ensaio, 1989 p.46.
78
mesmo tempo que o trabalhador coletivo, especialista em todas as funções, aparece como
criatura do capital.
O parcelamento de atividade do trabalhador acaba por reduzí-la a um gesto mecânico repetido
ao longo de uma jornada de trabalho, tornando fácil o trabalho nas fábricas, até mulheres e
crianças poderão realizá-lo, barateando o valor da força de trabalho. O caráter repetitivo e
mecânico deste gesto é o que permite a introdução de máquinas-ferramentas e depois de
máquinas mais sofisticadas. É esta militarização da produção que permite a utilização de
novas técnicas e de conhecimentos científicos cada vez mais sofisticados, gerando a
supremacia do trabalho morto sobre o trabalho vivo. É a partir dessa passagem, ou seja, da
substituição do trabalho do homem pela máquina que levará os trabalhadores a condição de
sub-empregados, e, num grau maior de desemprego. Essa é hoje a angústia que assombra os
trabalhadores, Trotski em 1938 dizia que "a catástrofe que se aproxima enche de angústia as
massas mais profundas da humanidade" (apud CHESNAIS, 1997, p. 7) E, conforme Chesnais
(1997), retratando o capitalismo do final do século:
A angústia vivida pelas grandes massas, praticamente no mundo todo, vem da
constatação pela classe operária, a juventude e as massas oprimidas, da degradação
aceleradas das suas condições de existência: ressurgimento e permanência do
desemprego, precariedade das condições primárias de existência, destruição da
proteção social, ressurgimento da fome ou, mesmo onde não há fome, novas
epidemias, nova decadência tanto individual quanto social, arrogância das classes
possuidoras e de uma sociedade que volta a ostentar a riqueza de uns aos olhos de
todos os que não tem nada (p. 7).
Bernardo (2000), diz que o desemprego não se deve somente à introdução de máquinas, mas
que a substituição de pessoas por máquinas, num dado ramo de produção gera desemprego,
como no caso da agricultura, onde antigamente se empregava um número considerável de
trabalhadores, e que fora substituído por máquinas e produtos químicos.
26
O processo de
desenvolvimento da economia capitalista tem crescido porque seus ramos mais antigos vão
necessitando de um número relativamente menor de trabalhadores, gerando um desequilíbrio
quando a economia se retraí, e como conseqüência verifica-se uma defasagem entre capital e
força de trabalho. Bernardo chama a atenção, que uma parte do desemprego atual deve-se à
26
No Brasil, a situação do trabalho rural sofre um processo de (...)"'modernização agrícola', que visa integrar a
agricultura à indústria, tanto no tocante à utilização de insumos e equipamentos quanto em relação ao destino
da produção agrícola". A situação do trabalho no Brasil, São Paulo: DIEESE, 2001.
79
profunda remodelação operada nos sistemas produtivos, que exigem mais trabalhadores com
qualificações superiores, aptos a trabalhar com novas tecnologias.
Segundo Geldens, um dos administradores da McKinsey na Holanda, escrevia:
o setor da informação está crescendo muito rapidamente. Segundo os cálculos de
Daniel Bell, os trabalhadores da informação representavam 17% da força de trabalho
norte-americana em 1950 e podem ter subido agora a 65%. Usando critérios
diferentes Marc Porat afirma que 53% do rendimento pessoal nos Estados Unidos é
desenvolvido pelo trabalhador da informação. A Europa acabará por seguir o mesmo
caminho. Na década de 1970 foram criados 19 milhões de novos empregos nos
Estados Unidos. Destes, só 5% diziam respeito à manufatura, 11% surgiram em
indústria de produtoras de bens, aproximadamente 12% no setor de serviços
tradicional. Cerca de 72%, representando perto de 14 milhões de empregos foram
criados no setor da informação [...]". Mas esta transformação das qualificações não é
imediata e depara-se quer com os obstáculos suscitados pelas inadequações da
instituições de ensino quer com as resistências erguidas pelos trabalhadores em vias
de desqualificação.. As dificuldades na adequação de oferta de trabalho às
exigências empresariais explicariam boa parte do problema do desemprego atual.
Ainda segundo Max Geldens, em ibid, na Europa ocidental a principal defasagem
entre a oferta efetiva de trabalho e a procura potencial resultava no 'insucesso na
adaptação do sistema educacional às habilidades funcionais que agora são
necessárias [...] 75% dos empregos administrativos deviam hoje ser executados com
a ajuda de computadores, mas apenas 25% dos europeus que ocupam esse tipo de
empregos são capazes de manejar computadores, mesmo que de maneira
rudimentar'. E o mesmo autor observa que não parece que os empregos no setor da
informação venham a absorver os operários da indústria com a mesma facilidade
com que os empregos industriais absorveram os trabalhadores agrícolas no século
passado. São necessários programas de formação maciços (BERNARDO, 2000, p.
77).
Devido aos grandes programas de especialização de empregados para se adaptarem a um novo
padrão de exigência, cria-se uma economia informal, dividindo a economia em três partes: um
núcleo de profissionais qualificados e bem remunerados, um núcleo de profissionais
terceirizados ou de part-time, em situações precárias e com baixos salários, e um setor
socialmente marginalizado entregue às formas mais degradantes da mais-valia absoluta. É
nesse eixo que aflora a economia informal. E segundo Bernardo, o desemprego estrutural a
longo prazo não anuncia qualquer declínio do papel central desempenhado pela classe
trabalhadora, ao contrário, o autor confirma a plenitude deste papel, pois a realidade que se
oculta por detrás do desemprego não é o fim do trabalho, mas a reestruturação da força de
trabalho.
Para Singer (2000), a procura por trabalhadores está em queda em setores beneficiados por
inovações tecnológicas, especialmente nas indústrias, abraçando boa parte do setor terciário.
O desemprego, nesse caso, é inevitável, pois as máquinas além de baratearem o custo da
80
produção têm maior exatidão e alcance que o trabalho do homem. Outro fator importante é o
fenômeno da globalização da economia, que está modificando a divisão internacional do
trabalho. E
o perverso nisso é que os capitais estão se deslocando para as áreas em que o custo
da força de trabalho é menor, onde não existem os benefícios sociais já consagrados
em convênios internacionais, o que agrava a perda de empregos nos países em que
os direitos trabalhistas existem e são respeitados (SINGER, 2000, p. 118).
Isso indica que a sociedade vem passando por uma de suas piores crises, e as previsões para o
futuro não são nada animadoras, conforme relatam Martin e Schumann (1999), apontando que
apenas 20% da força de trabalho bastará para fazer girar a roda da economia, e os restantes
80% deverão contentar-se com um pouco mais do que "pão e circo". Esta afirmação foi feita
numa reunião acontecida em fins de 1995, em São Francisco, Califórnia, com 500
representantes da riqueza mundial, presidida por Gorbachev, contava com a presença de
ilustres personalidades. das mais diferentes esferas da sociedade. Expressões como " diversão
anestesiante e alimento suficiente" faziam parte do cardápio O mundo não precisa mais do
que 20% de empregados para produzirem o necessário para a humanidade, enquanto que os
80% restantes contentar-se-ão com entretenimentos. Para Scot MacNealy identificar o
problema do futuro será "almoçar ou ser almoçado". Para Heinrich Von Pierer, presidente da
Siemens, "o vento da concorrência internacional virou tempestade e o verdadeiro furacão
ainda está por vir". Jacques Chirac, presidente da França diz que " a globalização é a AIDS da
economia".
Como vimos, a produção capitalista desde seus primórdios já se colocava como produção
preferencialmente de valor de troca. É inegável que no limiar da idade moderna sua
proximidade com as necessidades humanas fora bastante visível. É importante mostrar, no
entanto, que a sociedade capitalista deu um passo adiante em relação as antigas formas de
sociedade (escravagista/feudal), potencializando as formas de produção enquanto
possibilidade de atendimento das necessidades humanas.
A racionalidade, o pensamento científico, as inovações tecnológicas, ainda podem ter
pretensões emancipadoras, mas em nome da racionalização e da reestruturação racional do
trabalho, vão abandonando toda e qualquer ilusão humanística. De lá para cá, ainda que com
recursos fantásticos, a ciência e a tecnologia não mais fizeram, que prostituir-se frente ao
81
capital. As suas inimagináveis "conquistas" nada mais são que mecanismos de reprodução
ampliada do capital. Seu caráter é cada vez menos humano, sua "racionalidade" é cada vez
menos racional.
4.2 CRÍTICA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA
Do ponto de vista da dicotomia produção social / apropriação privada, ciência e tecnologia só
podem ser entendidas de forma contraditória, isto é, as análises sobre ciência e tecnologia
revelam sempre a contradição entre indivíduo e sociedade, entre aumento de produção social
e ampliação das carências materiais e espirituais humanas. Em outras palavras, ciência e
tecnologia refletem a desumanização da produção. Nesta perspectiva, a crítica da ciência e da
tecnologia, acaba por aceitar apenas um lado de polarização: ou é apologia da capacidade
produtiva do capitalismo apoiada nos conhecimentos científicos tecnológicos ou é a crítica
romântica em que ciência e tecnologia aparecem como mecanismos de opressão.
As leituras apologéticas
27
apostam nas capacidades do capitalismo em superar suas
contradições antagônicas, em seus pólos mais desenvolvidos, os da ciência e da tecnologia.
Da racionalidade, posto que foram levados ao máximo de suas possibilidades. Os pólos
atrasados, onde a miséria permanece, o são porque neles predominaram interesses particulares
que impediram a plena objetividade da relação meios e fins. Ou seja, os pólos atrasados
careceram de ciência e tecnologia, de racionalidade, e de uma administração objetiva.
Ao parecer, nesta ressurreição weberiana, criatividade é o que não falta. Reengenharia,
qualidade total, just in time, são expressões que tentaram dotar de racionalidade o que é
necessariamente irracional. No outro lado da mesma moeda, a crítica romântica é capaz de
apreender os aspectos desumanizantes da ciência e da tecnologia nos limites do capitalismo,
mas não se mostra capaz de propor a superação destes limites.
27
Podemos citar o pensamento de Peter Drucker que vislumbra a construção da "sociedade pós-capitalista"
preservando as estruturas essenciais do mundo capitalista: "A nova sociedade - e ela já está aqui- é uma
sociedade pós capitalista. Repito que esta nova sociedade irá usar o livre mercado como mecanismo
comprovado de integração econômica. Ela não será uma sociedade anticapitalista, as instituições do
capitalismo sobreviverão, embora algumas, como bancos, possam vir a desempenhar papéis bastante
diferentes. (...) Mas igualmente importante é o seguinte: hoje o recurso realmente controlador, o "fator de
produção" absoluto decisivo, não é o capital, a terra ou a mão de obra. É o conhecimento. Ao invés de
capitalistas e proletários, as classes da sociedade pós-capitalista são os trabalhadores do conhecimento e os
trabalhadores em serviço". Drucker, P. A sociedade pós-capitalista. 2ª
.
São Paulo: Enio Matheus Guizzeli e
Cia., 1992, p .XV e XVI.
82
A forma enxuta de produção, o chamado toyotismo chegado ao apogeu nos anos 80,
introjetou na sociedade a mundialização do capital. Conhecida no Japão durante os anos
setenta e oitenta, como a forma mais racional de produção, suplantando as anteriores,
consistia em aplicar técnicas diferentes para diversos países e setores, conhecidas como
CCQ's, Kanban, TQC, Kaizen, técnica dos 5S's, e outras (ZILBOVICIUS, apud ALVES,
1997, p. 286). Essas novas práticas gerenciais:
(...)surgem como uma nova via original de racionalização do trabalho, centrada na
lean production, adequadas a uma nova etapa de capitalismo mundial, onde, a rigor,
a distinção entre 'oriente' e 'ocidente' perde a sua significação central para a lógica da
valorização. (...) Na verdade, o aspecto original do toyotismo é articular a
continuidade da racionalização do trabalho, intrínseca ao taylorismo e fordismo,
com as novas necessidades da acumulação capitalista. (DEL ROYO,1998, in
ALVES: sdp, p. 96 e 98).
Outra questão importante na reestruturação do trabalho racional, conforme Alves (s.d.p.):
(...) um novo tipo de agenciamento da linha de produção subsistiria a necessidade
imperiosa da subsunção da subjetividade real operária à lógica do capital, através de
um tipo de inserção engajada dos trabalhadores no processo de produção,
aumentando suas responsabilidades quanto aos bons resultados do processo
produtivo, e promovendo, por conseguinte, uma intensificação da exploração do
trabalho (os operários atuariam simultaneamente com máquinas diversificadas)
(ALVES, s.d.p., p. 114).
Surge, portanto, um novo perfil do trabalhador É o momento de ruptura do toyotismo com o
taylorismo, substituindo os trabalhadores parcelares por trabalhadores polivalentes. O
taylorismo promovia a separação dos trabalhadores enquanto maneira de racionalizar a
produção, já o toyotismo concebe o trabalhador enquanto polivalente:
O toyotismo adotaria uma solução diversa para a organização da produção, capaz
portanto de recompor uma nova racionalização (e intensificação) do trabalho,
através da " desespecialização dos trabalhadores qualificados", por meio da
instalação de uma certa polivalência e plurifuncionalidade dos homens e máquinas, e
do "tempo partilhado", baseados em tarefas múltiplas e agradáveis, em padrões (de
tempo e de trabalho) flexíveis (ALVES, s.d.p., p. 113).
83
Assim a sociedade industrial aparece como uma criatura fantástica que devora seu criador.
Ciência e Tecnologia aparecem apenas como forças tirânicas que reduzem o indivíduo a sua
insignificância. É a prova definitiva de que a razão humana, autora tão apregoada da
emancipação, nada mais fez, em geral, do que escravizar o homem, reprimir seus desejos,
condená-los `a insatisfação eterna.
Uma alternativa estaria, portanto, em recusar a ciência e a tecnologia, em recusar a razão.
Mostrar que não existe uma hierarquia de conhecimentos, que todas formas de consciência se
equivalem, pois não existe nenhuma consciência verdadeira. Nestas formulações está a vasta
usina do falso, na apologia da "racionalidade", ou na recusa da razão humana revela-se a
incapacidade do homem moderno de superar suas contradições.
A superação destas duas falsas consciências só se dará pela superação teórica das contradições
reais. Em outras palavras, a verdadeira crítica da ciência e da tecnologia, deve
necessariamente ser precedida pelas críticas das condições histórico-concretas da produção
em nossos dias.
Uma vez rompida, ao menos teoricamente, a contradição entre produção e apropriação, uma
vez reformulada ao menos idealmente o controle social da produção, ciência e tecnologia
reaparecerão na sua plenitude, corpo e alma humanos, vigorosas ferramentas a serviço dos
homens, essenciais para a superação das carências e para a construção da realidade social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A origem dos conflitos nas organizações fabris surge a partir do momento em que se
encontram frente a frente duas classes antagônicas, com interesses específicos, convivendo
numa mesma sociedade. As diferenças de interesses de classe, expressas no decorrer deste
trabalho, fundamentalmente, sob a luz do pensamento de Marx, reforçam esta idéia.
Cabe ressaltar que, no desenvolvimento do modo de produção capitalista, o aperfeiçoamento
de técnicas produtivas racionalizadoras de trabalho asseguram, para os proprietários dos
meios de produção, o aumento da mais valia em detrimento dos interesses dos trabalhadores,
detentores da força de trabalho.
O capitalismo do final do século XIX organizou novas formas de gestão do trabalho e da
produção, impulsionado pela II Revolução Industrial. A industrialização, sobretudo no início
do século XX, ganha forças a partir de métodos científicos racionalizadores elaborados com o
objetivo de aumentar a produtividade, intensificando e potencializando com isso o trabalho
para a ampliação do capital. A forma encontrada para essa acumulação de capital pautava-se
na extração da mais valia, prolongando a jornada e intensificando o ritmo de trabalho imposto
ao trabalhador.
O método da gerência científica implantado por Taylor contribuiu para o aumento da
produtividade do trabalho através da padronização das atividades, mediante a contenção de
custos operacionais, e para reduzir os tempos mortos de execução do trabalho por meio do
cronômetro. Ele possibilitou um controle mais eficaz, mais "científico", nas mãos da direção
capitalista.
O conflito não foi abordado diretamente por Taylor em seus escritos. É percebido, porém, na
sua forma de organizar o trabalho, em que tudo era calculado de tal maneira que não deixasse
espaço para o aparecimento do conflito. Para ele, a administração devia ter como objetivo a
análise do processo de trabalho em todas as suas esferas. Tentou sobretudo novas formas de
realizar trabalho, assim como de transmitir essas formas aos operários, de acordo com
padrões hierárquicos rígidos de execução, assegurados por normas, instruções, regras de
85
procedimentos, prêmios, sanções, etc., com a seleção e treinamento do melhor homem que
pudesse realizar cada tarefa do processo de trabalho (Teixeira e Souza, 1985). Era a forma
encontrada para controlar o processo de trabalho nos seus mínimos movimentos, levando o
trabalhador a perder o domínio da produção para o capital, através da subsunção real do
trabalho ao capital e vice-versa.
Elton Mayo, ideólogo da Escola de Relações Humanas, além de se preocupar com o processo
de trabalho, descobriu nos estudos de Hawthorne que o comportamento dos trabalhadores
afetava diretamente a produção. Inaugura com isso uma abordagem que priorizou as relações
sociais e psicológicas dos trabalhadores no ambiente de trabalho, mostrando que o homem
não é motivado apenas por incentivos econômicos como afirmava a Escola Clássica. O fato
de não tratar os operários como parte integrante de um autômato, dando-lhes condições de
participação no processo de trabalho, ouvindo inclusive suas queixas e seus comentários,
fazia com que esses trabalhadores se sentissem valorizados. Dessa maneira estariam
contribuindo para o aumento da produtividade. O reconhecimento de uma personalidade
complexa, capaz de se relacionar com outros trabalhadores, formando um grupo coeso, era o
que lhes conferia reconhecimento social e psicológico, além de propiciar-lhes a satisfação de
suas necessidades materiais.
Essa forma de engenharia social, de compreender os trabalhadores, harmonizando interesses
da reprodução capitalista e da estrutura da organização com as necessidades sociais dos
trabalhadores estaria, de um lado, deixando os trabalhadores satisfeitos não só
economicamente, mas sobretudo emocionalmente, e, de outro lado, parecia satisfazer a
organização, através desse esforço e cooperação social, aumentando-lhes a produtividade.
Isto posto, cabe ressaltar o lado racionalizante da Escola de Relações Humanas, ou seja, seus
esforços intencionais para alcançar a felicidade dos trabalhadores através do discurso de
participação, ocultando o aparecimento de conflitos que pudessem ocasionar uma queda na
produtividade. A partir desse momento entra em cena o papel dos psicólogos e dos
sociólogos no seio das organizações, que passam a gerenciar o estado de espírito dos
trabalhadores, utilizando-se, para isso, de técnicas motivacionais, vistas como responsáveis
pelo bom andamento da produção e pelas relações que se estabelecem a partir delas. Esse
aparato natural, agregado à gerência, faz parte da ideologia do capital, incorporada pelos
diretores das empresas capitalistas. A naturalização surge, portanto, sob a forma de idéias que
86
afirmam que as coisas são como são porque é natural que assim sejam. Dessa perspectiva, as
relações sociais são vistas como naturais, e não como resultantes da ação humana.
Os estudos de Weber com relação à burocracia tornam-se fundamentais para o entendimento
da racionalidade de que o capital necessita. A burocracia passa a ser o alimento do capital,
garantindo sua fecundidade e sendo, sobretudo, instrumento de adequação dos meios aos fins;
constituindo neste caso, a perpetuidade do sistema de produção capitalista. A burocracia
aparece, então, como um tipo singular de dominação, desvendado por Maurício Tragtenberg
em Ideologia e Burocracia. Tragtenberg mostra ao leitor o verniz ideológico presente nas
teorias administrativas, que despontam como uma maneira harmônica de ocultar os conflitos
existentes no interior das organizações. Questiona as razões de como foi possível para as
teorias administrativas, enquanto produtos das relações sócio-econômicas, tornarem-se
interlocutoras e/ou porta-vozes da classe dominante, utilizando o processo de manipulação e
ocultação dos conflitos existentes entre os trabalhadores e a empresa, objetivando o máximo
de produtividade. Esse incremento da produtividade resulta, de acordo com Tragtenberg, da
disseminação de ideologias e do uso indiscriminado do tecnicismo que, orientando as práticas
administrativas modernas, culmina na reestruturação do processo de trabalho. Tudo isso
decorre da conjugação dos avanços da ciência com os da tecnologia no seio das organizações
universitárias, e, com a incorporação de novas estratégias de gerenciamento a produção,
enquanto resposta aos desafios provocados pela globalização.
Não é só na esfera da vida organizacional que nos deparamos com esta ideologia, o Estado
também é parte fundamental para manter a ideologia e a forma de ser do capital. Dessa modo,
falar de ideologia é falar de política, pois esta é a forma de poder em estado mais refinado. A
política como foi apresentada ao longo dos séculos, através de pensadores que se
preocupavam com os antagonismos de classe, não tem resolvido o conflito. A maneira como
a política age na sociedade, se dá de modo semelhante à existente nas organizações, tenta dar
racionalidade ao conflito, administrando-o e não o resolvendo em sua raiz. Funde o conflito
com outras abordagens administrativas, oriundas das teorias clássicas, que trazem em sua
estruturação a mesma raiz norteadora, ou seja, a racionalização e a reestruturação do trabalho
com vista a alcançar ganhos fabulosos para o capital, mesmo que para isso seja necessário
abandonar e destruir formas de produção que não respondam mais àquela realidade.
87
A luta do capital consigo mesmo, emerge sob a aparência de um salto tecnológico, luta
amparada no desenvolvimento da ciência e da tecnologia, momento de supremacia do
trabalho morto sobre o trabalho vivo. É o reflexo da desumanização da produção.
Nesse contexto, assinalamos com as considerações de Teixeira, manifestadas em 1995, que a
ciência é elevada à condição de primeira força produtiva, realizando uma verdadeira
revolução no trabalho, passando este a se fundar em conhecimentos técnico-científicos,
opondo-se por conseguinte ao trabalho repetitivo, monótono e desqualificado do início do
século XX. O trabalhador deixa de ser um autômato e passa a ser o sujeito que regula o
processo de trabalho, não é mais aquele que era regulado por ele.
Entender as diversas fases pelas quais passa o capitalismo é entender seu caráter autofágico,
sua necessidade de auto-destruição, como meio de continuar existindo. As fórmulas cada vez
mais sofisticadas de reprodução e reestruturação da capacidade produtiva, as reciclagens
sofridas pelas teorias administrativas, são decorrentes dessa forma de dominação, mantendo
ocultos os conflitos reais, não só nas organizações como também na sociedade. Dessa forma,
os interesses do capital estão colocados acima de quaisquer interesses do homem.
Discutir as relações de poder assim como são apresentadas pelas teorias administrativas tem
como referencial a problemática da dominação que o capital exerce sobre o conjunto da
existência social. Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é o de contribuir para o debate da
retomada da dimensão econômico-política que constitui o pano de fundo das teorias
administrativas, despindo-as de sua assepsia face à dimensão política e social que ostentam,
apoliticidade equivocadamente identificada com a 'neutralidade axiomática' que deveria
presidir o trabalho e as investigações científicas.
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