Download PDF
ads:
WANDERLEY BRAGA
AUTORIA E CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL NO AMBIENTE
PEDAGÓGICO COLABORATIVO – APC – DO PORTAL DIA-A-DIA-
EDUCAÇÃO DO PARANÁ
MARINGÁ
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS (MESTRADO)
WANDERLEY BRAGA
AUTORIA E CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL NO AMBIENTE
PEDAGÓGICO COLABORATIVO – APC – DO PORTAL DIA-A-DIA-
EDUCAÇÃO DO PARANÁ
Dissertação apresentada ao curso de Pós-
graduação em Letras, Área de
concentração: Estudos Lingüísticos, Linha
de Pesquisa: Ensino e Aprendizagem de
Línguas, da Universidade Estadual de
Maringá, como requisito parcial à obtenção
do título de Mestre em Letras.
Orientadora: Profª Drª Sílvia Inês
Coneglian Carrilho de Vasconcelos
MARINGÁ
2006
ads:
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
WANDERLEY BRAGA
AUTORIA E CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL NO AMBIENTE
PEDAGÓGICO COLABORATIVO – APC – DO PORTAL DIA-A-DIA-
EDUCAÇÃO DO PARANÁ
Aprovada em_____/_____/_____
Dissertação apresentada ao curso de Pós-
graduação em Letras, Área de
concentração: Estudos Lingüísticos, Linha
de Pesquisa: Ensino e Aprendizagem de
Línguas, da Universidade Estadual de
Maringá, como requisito parcial à obtenção
do título de Mestre em Letras.
Orientadora: Profa. Dra. Sílvia Inês
Coneglian Carrilho de Vasconcelos
_________________________________
Profa. Dra. Sílvia Inês Coneglian Carrilho
de Vasconcelos (UEM)
Assinatura
__________________________________
Profa. Dra. Marilurdes Zanini (UEM)
Assinatura
_________________________________
Profa. Dra. Elvira Lopes Nascimento (UEL)
Assinatura
edico este trabalho a meus pais, Antonio e
Maria Rita; ao meu irmão caçula, Wladimir;
aos meus filhos amados, Tininha e Fernando; a Sônia
Silvério, companheira de longa data, pela força que
sempre me deram.
Dedico ainda a todos os meus amigos e a todos os meus
amores, responsáveis pelas boas lembranças que levo
da vida; especialmente à memória de Elói Lohmman,
amigo que, de onde estiver, deve estar vibrando com
esta conquista.
D
AGRADECIMENTOS
o Criador, por tomar o leme de nossas mãos nos momentos mais difíceis desta
insólita navegação.
Especialmente a minha orientadora, professora amiga, mãe, irmã e cúmplice, Sílvia
Vasconcelos, por acreditar em meu potencial e seguir comigo até aqui. E ainda, por
renunciar a férias, hospedando-me em sua casa na maravilhosa Floripa;
À família de minha Ori (apelido carinhoso que recebeu de nós orientandos),Viviane e Lígia
Vasconcelos, esta por me ceder seu quarto para que eu pudesse repousar da lida de todos
os dias em frente ao computador, também compartilhado;
Aos amigos que não pouparam palavras de incentivo e solidariedade;
Aos professores da UEM, pelas lições e esclarecimentos tão pertinentes na minha
formação;
Às professoras, Elvira Lopes e Marilurdes Zanini, pela leitura e sugestões importantes;
Aos colegas do mestrado, por compartilharem de meus momentos felizes e da minha
angústia nas horas mais decisivas do curso;
Aos meus colegas de profissão, que externaram tanta alegria em saber de meu ingresso (e
permanência) no mestrado;
Aos meus familiares, por compreenderem minha ausência em função dos estudos
empreendidos;
E a todos aqueles irmãos inspiradores, que não estão mais entre nós, porém ligados pelos
laços fraternos do espírito.
A
Porque agora vemos por espelho em enigmas, mas
então veremos face a face; agora conheço em parte,
mas então conhecerei como também sou conhecido.
1 Coríntios 13,12.
AUTORIA E CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL NO AMBIENTE
PEDAGÓGICO COLABORATIVO – APC – DO PORTAL DIA-A-DIA-
EDUCAÇÃO DO PARANÁ. Wanderley Braga. Dissertação de Mestrado. Mestrado
em Letras. Universidade Estadual de Maringá (PR), 2006, 134 fls. Orientação: Profª
Drª Sílvia Inês Coneglian Carrilho de Vasconcelos.
RESUMO
Esta dissertação apresenta os resultados de uma pesquisa que teve como objeto de análise as
produções dos professore de Língua Portuguesa no Ambiente Pedagógico Colaborativo – APC –
disponibilizado através do Portal Dia-a-Dia-Educação do Paraná. Foram analisados todos os 14
APC de língua portuguesa, do Ensino Médio, com enfoque nos gêneros de textos escritos.
Chamados de APC, os Objetos de Aprendizagem (OA), permaneceram com a denominação antiga.
Nossos objetivos nessa investigação foram o reconhecimento da autoria instituída aos
colaboradores pela SEED (Secretaria Estadual da Educação) e a constatação de como se
apresentam, nas proposituras de atividades com a escrita, as condições de produção textual, a partir
das teorias concebidas pelos estudiosos da corrente sociointeracionista de linguagem. Por essa
razão, dialogamos com Bakhtin, Vygotsky, Geraldi, Garcez, Marcuschi, Menegassi, Costa Val,
Bronckart, dentre outros. Dividido em dois capítulos, nosso trabalho trata primeiramente da autoria
sob o prisma das reflexões teóricas de Foucault, estendidas por Gregoli, Coracini e Orlandi , em
que se constatam gestos de autoria e autoria diluída nas múltiplas colaborações. E no segundo
capítulo analisamos especificamente o recurso do APC - Propondo Atividades - no Portal Dia-a-
Dia-Educação do Paraná, em que as proposituras em quase nada conferem com a proposta
sociointeracionista abarcada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais do MEC e pelo (1998)
Básico de Língua Portuguesa do Paraná (1990). Observamos uma baixa ocorrência dos elementos
que compõem as condições de produção textual tomada como processo, como trabalho que exige
reflexões e que só faz sentido acontecer na escola, mas não para ela, e, sim, para o mundo extra-
escolar, no qual a escrita circula com funções socialmente marcadas. Encerramos cada um dos
blocos com um quadro esquemático das análises, apostando na contribuição que esta pesquisa trará
para um ensino que reflete os anseios dos usuários da LP quando da manifestação em seus
discursos.
Palavras Chave: autoria, gêneros, internet, ambiente colaborativo virtual, produção textual.
AUTHORSHIP AND CONDITIONS OF TEXTUAL PRODUCTION IN THE
COLLABORATIVE PEDAGOGICAL ENVIRONMENT OF PARANÁ DAY-TO-
DAY EDUCATION.
ABSTRACT
Results of research on the production of Portuguese language teachers in CPE through the Paraná
Day-to-Day Education are given. Fourteen CPEs of the Portuguese language, secondary school
level, were analyzed with special focus on the genre of written texts. Learning Objects (LO), also
known as CPEs, continued to be called as formerly. Investigation aims at acknowledging the
authorship given to collaborators by the State Secretariat of Education (SEED) and the manner they
are shown within the context of written activities and the conditions of textual production as from
theories of the social and interactional trend in language. Dialogues are held with texts by Bakhtin,
Vygotsky, Garaldi, Garcez, Marcuschi, Menegassi, Costa Val, Bronckart and others. Dissertation is
divided into two sections. Research deals first with authorship following Foucault’s theory,
modified by Gregolin, Coracini and Orlandi. Activities in authorship and diluted authorship have
been found in several collaborations. In the second section CPEs, Suggesting Activities – in Paraná
Day-to-Day Education are specifically analyzed. Statements do not confer with the social and
interactional trends as given by the Brazilian Curricular Parameters of the Ministry of Education
(1998) and by the Paraná Basic Curriculum of the Portuguese Language (1990). Low occurrence of
items that form the conditions of textual production are reported either as a process which requires
reflections and which has meaning if achieved in the classroom. The latter is not made for the
school but for the outside world in which writing is done with socially marked functions. Each
block closes with an analysis scheme. It is expected that current research contributes towards a type
of teaching that reflects the expectations of LP users in their discourses.
Key words: authorship; genres; internet; virtual collaborative environment; textual production.
QUADRO GERAL DOS APC
(com a data de publicação, indicação de colaboração com sua respectiva data e o número de
acessos ao APC até a última data de acesso, em função da pesquisa)
1. APC 575 – Publicado em 14-10-2003 / 1ª Colaboração em 10-02-2005 / 945 acessos.
2. APC 576 – Publicado em 14-04-2004 / 1ª Colaboração em 17-09-2004 / 764 acessos.
3. APC 578- Publicado em 14-10-2003 – 1ª Colaboração em 21-02-2004 / 2ª Colaboração
em 30-04-2005 / 875 acessos.
4. APC 579 – Publicado em 17-10-2003 / 797 acessos.
5. APC 593 – Publicado em 16-03-2004 / 1ª Colaboração em 21/03/2005 / 799 acessos.
6. APC 647 – Publicado em 27-04-2004 / 667 acessos.
7. APC 651 – Publicado em 12-04-2004 / 707 acessos.
8. APC 904 – Publicado em 29-10-2004 / 1ª Colaboração em 29-10-2004 / 2ª Colaboração
em 14-09-2005 / 1266 acessos.
9.
APC 1114 – Publicado em27-09-2004 / 746 acessos.
10.APC 2017 – Publicado em 17-08-2004 / 1ª Colaboração em 14-10-2004 / 2ª e 3ª
Colaboração em 18/10/2004 / 1146 acessos.
11.
APC 2170 – Publicado em 20-10-2004 / 1ª Colaboração em 06-12-2004 / 884 acessos.
12. APC 2602 – Publicado em 17-08-2005 / 632 acessos.
13
APC 2708 – Publicado em 10-06-2005 / 719 acessos.
14.
APC 2929 – Publicado em 25-04-2005 / 702 acessos
SUMÁRIO
1.INTRODUÇÃO..........................................................................................................12
2 MAS, AFINAL, O QUE É UM AUTOR?................................................................23
2.1 APC 575 – Publicado em 14-10-2003 ....................................................................34
2.2 APC 576 – Publicado em 14-04-2004 ....................................................................36
2.3 APC 578 - Publicado em 14-10-2003 .....................................................................40
2.4 APC 579 – Publicado em 17-10-2003 ....................................................................44
2.5 APC 593 – Publicado em 16-03-2004 ....................................................................46
2.6 APC 647 – Publicado em 27-04-2004 ....................................................................49
2.7 APC 651 – Publicado em 12-04-2004 ....................................................................52
2.8 APC 904 – Publicado em 29-10-2004 ....................................................................54
2.9 APC 1114 – Publicado em27-09-2004 .....................................................................58
2.10 APC 2017 – Publicado em 17-08-2004 ..................................................................60
2.11 APC 2170 – Publicado em 20-10-2004 ..................................................................64
2.12 APC 2602 – Publicado em 17-08-2005 ..................................................................69
2.13 APC 2708 – Publicado em 10-06-2005 ..................................................................72
2.14 APC 2929 – Publicado em 25-04-2005 ..................................................................77
Quadro demonstrativo da análise dos APC (2003-2005) – em Língua Portuguesa – Ensino
Médio – Gênero de textos escritos - Autoria.......................................................84
3 CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL EM - FOCO.....................................87
3.1 – APC 575............................................................................................................94
3.2 – APC 576............................................................................................................96
3.3 – APC 578............................................................................................................97
3.4 – APC 579..........................................................................................................102
3.5 – APC 593..........................................................................................................105
3.6 – APC 647..........................................................................................................107
3.7 - APC 651...........................................................................................................111
3.8 - APC 904...........................................................................................................113
3.9 - APC 1114............................................................................................................117
3.10 - APC 2017............................................................................................................120
3.11 - APC 2170............................................................................................................124
3.12 - APC 2602............................................................................................................130
3.13 - APC 2708............................................................................................................131
3.14 – APC 2929...........................................................................................................133
Quadro demonstrativo das Condições de Produção Textual nos APC..........................141
4 CONSIDERAÇÕES QUASE FINAIS...........................................................143
5 REFERÊNCIAS...............................................................................................150
6 ANEXOS...........................................................................................................153
QUADRO GERAL DOS ANEXOS
1- Sobre o Ambiente Pedagógico Colaborativo (APC)
1
2- Acessando e lendo o APC.
3- Criando um conteúdo para o APC
4- Colaborando com um APC
5-
Modelo de APC – (APC 575)
1
Agora denominado OAC (Objeto de Aprendizagem Colaborativo).
INTRODUÇÃO
Poesia mínima
Pintou estrelas no muro
e teve o céu
ao alcance das mãos.
Helena Kolody
esquisas envolvendo questões sobre o ensino da Língua Portuguesa no
Brasil
2
quase sempre revelam o que já é do senso comum: as escolas não
estão formando cidadãos proficientes em leitura e escrita em Língua Materna
(LM). O insucesso que se instaura nos dois níveis da educação básica, por extensão no
nível superior, pode estar, cremos nós, intimamente relacionado, entre outros fatores, à
falta de uma definição quanto à concepção de língua e de linguagem, ou ainda, a
concepções equivocadas desses conceitos, que norteia a prática dos professores de LM. Tal
situação é um indicador de que as metodologias utilizadas pelos profissionais não estão
satisfazendo as reais necessidades daqueles que ocupam os bancos escolares, tampouco
deixam transparecer uma teoria subjacente às mesmas. Como as concepções variam, a
prática é afetada. Ao se tomar a concepção de língua como um fenômeno estático, a
2
Referimo-nos, genericamente, a pesquisas realizadas no Brasil por várias razões que explicitamos agora. A
divulgação de resultados das pesquisas referente ao desempenho de estudantes do ensino fundamental e
médio no tocante à língua, quer em publicações acamicas quer em veículos midiáticos, apresenta
divergências. Ora o desempenho é sofrível, ora os índices apontam para alguma melhora, ou ainda, para
índices surpreendentes. A oscilação de tais índices em matérias publicadas na mídia (particularmente Revista
Veja, Isto é, Exame, Folha de S. Paulo, Estado de São Paulo, O Globo, Jornal do Brasil), parece-nos estar
relacionada a momentos políticos cujos interesses levariam a apresentar índices de alto ou de baixo
desempenho de estudantes. Outra questão que merece nota é que essas pesquisas nem sempre indicam a faixa
sócio-econômica dos estudantes submetidos. Assim, generalizam o baixo desempenho de TODOS os
brasileiros como sendo uma verdade comprovada empiricamente. Como os resultados parecem
contraditórios, até porque as metodologias de pesquisa utilizadas e os órgãos que as realizaram variam,
optamos basear-nos em dados da UNESCO, conforme leitura de texto pelo site abaixo, com acesso
atualizado em 25/01/2006. http://www.unesco.org.br/noticias/opiniao/index/index_2004/ciee_analfabetismo/
mostra_documento
P
13
tendência é realizar uma prática de sala de aula de língua centrada nas noções de certo e
errado, por exemplo.
No entanto, alguns investigadores, já no século passado, tiveram sua atenção
voltada para a língua como fenômeno vivo, como algo que só tem sentido quando em ação,
nas relações interpessoais. A partir daí, a concepção interacionista de linguagem passa a
ser disseminada nos meios acadêmicos e, com ela, o conceito de interlocutor, ou seja, o
outro do diálogo se torna presente.
Precursor dessa nova postura, o russo Mikhail Bakhtin tem sido referência
indispensável nos estudos da linguagem. Concebendo a língua como lugar de interação
social, promove uma reflexão sobre a noção de sujeito e traz contribuições significativas
para a Lingüística da atualidade, bem como para as diretrizes do ensino de Língua Materna
(LM). Tornou-se quase impossível analisar a língua sem considerar o dialogismo
apregoado pelo teórico.
Ao conceber a linguagem como sendo de natureza dialógica, Bakhtin (1992)
embute na palavra “diálogo” um sentido amplo, não apenas nas situações presenciais, mas
em toda comunicação verbal, de qualquer modalidade (caso do texto escrito, que se
caracteriza parte integrante de discussões ideogicas). Essa interação verbal passa, então,
a ser vista como realidade fundamental da língua em que, a cada enunciação, o sujeito
(enunciador) pede como contrapalavra, uma atitude responsiva de seu interlocutor. Para
ele,
a palavra é uma espécie de ponte entre mim e os outros. Se ela se apóia
sobre mim numa extremidade, na outra apóia-se sobre o meu interlocutor.
[...] Através da palavra, defino-me em relação ao outro. [...] A palavra é o
território comum do locutor e do interlocutor (BAKHTIN, 1992, p.113).
14
Dessa forma, o autor dá ênfase ao outro do diálogo, pois que o enunciado tem
sempre um destinatário que, com características variáveis, pode ser mais ou menos
próximo, concreto, percebido com maior ou menor consciência.
Para Bakhtin, o centro organizador de toda enunciação, de toda expressão, não é
interior, mas exterior, uma vez que se situa no meio social que envolve o indivíduo. É,
portanto, “a situação social mais imediata e o meio social mais amplo” que vão determinar
a “estrutura da enunciação”. Assim concebendo,
A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema
abstrato de formas lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada,
nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social
da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações.
(BAKHTIN, 1992, p.122).
A língua, como processo histórico, está sempre em evolução, não podendo ser
compreendida e explicada fora do vínculo com a situação concreta. São essas
características apontadas que fazem da linguagem um produto sócio-histórico.
É a partir da perspectiva interacionista que a Secretaria de Estado da Educação do
Paraná vem, desde a década de 80 do século passado, direcionando o ensino básico. Foram
muitos eventos para que fossem estudadas pelos professores e agentes dessa Secretaria as
novas tendências da educação, considerando a concepção interacionista de linguagem,
nesse caso, com relação ao ensino de língua materna. Isso causou muita polêmica e
resistência entre aqueles que ensinavam nos moldes tradicionalistas; entretanto, trouxe uma
luz para que outros caminhos fossem trilhados e, assim, melhorar a qualidade do trabalho
com a língua(gem), tornando-o acessível e prazeroso aos alunos de diferentes posições
sociais. Começou-se a valorizar a língua em suas variedades, sem deixar de lado a norma
culta padrão, que se deve aprender na escola.
15
Desse tempo para cá, a melhoria na qualidade do ensino de LM tem sido o grande
mote de muitos estudiosos e dos responsáveis pela oferta da educação básica à sociedade.
Mais especificamente no final do século passado, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira (LDB) estabeleceu os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que passaram a
contemplar novas concepções de língua e linguagem, conclamando a todos os professores
a uma reflexão do que se pretendia no ensino, submetendo-os, de certa forma, a uma
“reciclagem”. Adequar-se às novas tendências e atender às exigências da demanda social,
principalmente no que diz respeito à qualificação para o mercado de trabalho, passou a ser
uma preocupação constante nas ações dos governos federal e estadual. O ensino
tradicional, como já se propalou, não estava, nem está formando usuários com proficiência
em leitura e escrita em seu próprio idioma. Especificamente, após o impacto das novas
tecnologias digitais.
Com o advento do computador e da Internet, fomos adquirindo novos
comportamentos, adaptando-nos a essa realidade. Vivemos, hoje, um processo acelerado
de transformação nos mais diferentes aspectos do desenvolvimento humano. Novas
tecnologias têm surgido a todo instante, participando de forma cada vez mais freqüente de
nosso cotidiano. Chegamos a ponto de dizer, sem exageros, que não somos ninguém sem o
auxílio do computador. Necessitamos das ferramentas tecnológicas para realizar tarefas
simples (às vezes nem tão simples para muitas pessoas), como sacar ou depositar dinheiro
no banco, fazer compras, manusear aparelhos eletrodomésticos, enviar mensagens
eletrônicas, manter contato praticamente instantâneo com pessoas do mundo inteiro e
aprender com isso.
Não podemos nos esquecer, no entanto, de que a evolução tecnológica,
principalmente da maneira como se apresenta no início deste terceiro milênio, reflete, ou
16
deveria refletir, também nas práticas pedagógicas adotadas nas instituições escolares,
exigindo novas leituras e/ou novos modos de leitura. As mudanças aconteceram
rapidamente; todavia, observa-se uma certa estagnação ou pouco acompanhamento dos
profissionais envolvidos no processo educacional, que se acham despreparados para o
manuseio dos meios inovadores. A esse respeito, o lingüista Marcuschi assim se pronuncia:
A presença do computador na escola é uma realidade incontornável e seu
uso já vem se tornando um fato corriqueiro até mesmo nas escolas
públicas do interior brasileiro. Escasseiam, contudo, reflexões críticas a
respeito do uso da computação em sala de aula, o qual vem ocorrendo de
modo ingênuo e despreparado. (MARCUSCHI, 2001, p.81)
Conforme o que disse o autor acima, realmente há instalado, nas escolas,
equipamento de informática, porém a sua usabilidade está longe de atingir os fins
educativos, que seriam instrumentalizar os alunos e professores a fim de que esses
pudessem melhorar sua compreensão da realidade social, interagindo como sujeitos ativos
na construção do conhecimento. E corroborando com esse pensamento, Mantoan e
Baranauskas (2002), em seu artigo Novas Mídias na Aprendizagem, abordam a respeito
dessa realidade na educação, em que se verifica uma “rápida expansão das ofertas de
educação on-line” (p.83). Segundo elas, a presença dessa mídia moderna (com destaque
para a Internet) nas escolas deve mudar as formas do pensar e do relacionamento
interpessoal, “afetando subjetiva e objetivamente as relações espaço-temporais e
modificando os processos de ensino e de aprendizagem” (p.83). Dizem ainda que
o nosso desafio, como educadores, não é mais obter meios tecnológicos
para desenvolver projetos educativos, mas o de saber utilizá-los. Por
outro lado, é preciso criar cada vez mais motivos para que a tecnologia e
a educação se encontrem e integrem seus propósitos e conhecimentos,
buscando complementos, uma na outra (MANTOAN e
BARANAUSKAS, 2002, p.83).
17
Na tentativa de melhorar a qualidade do ensino, as atuais políticas pretendem
inovar na educação, apostando em tecnologia para a capacitação docente, ou, numa
linguagem mais adequada aos ventos modernos, apostando em tecnologia como meio para
atingir um fim: investimento na formação continuada do profissional da educação. Criou-
se, logo no início da gestão do governo estadual do Paraná (2003 -2006), o Portal Dia-a-
Dia Educação, com recursos voltados para o interesse (que se espera) dos trabalhadores do
Magistério (pelo menos daqueles em condições de navegar) e para a sociedade em geral.
Um desses recursos é o Ambiente Pedagógico Colaborativo (APC), ambiente virtual
destinado à publicação dos trabalhos dos professores que desejam compartilhar
conhecimentos com seus pares. Segundo o coordenador do Portal
3
, essa oportunidade
concedida pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), além de promover
uma interação significativa entre os professores da rede pública, eleva o colaborador
(simples dador de aulas) à posição de autor.
É nesse contexto que, empenhados na realização de uma pesquisa de cunho
qualitativo-interpretativa (ERICKSON, 1988), propomos fazer uma análise com a
finalidade de investigar as ações do governo do Paraná com relação à formação continuada
dos professores, especificamente, aqui, do professor de Português, por meio das práticas
instauradas no Portal Dia-a-Dia Educação.
E é exatamente aqui que reside nosso objeto de investigação. Sendo um espaço cuja
finalidade está em disponibilizar na Internet os textos elaborados pelos professores, requer,
de nossa parte, fazer uma verificação de sua funcionalidade e da utilidade desses textos
para a comunidade a que se destina. As questões que nortearam inicialmente nosso olhar se
voltam para as seguintes indagações: se esses textos apontam para uma mudança no fazer
pedagógico do professor, ou se apenas ecoam as propostas contempladas no livro didático
3
Entrevista concedida por Glauco Gomes de Menezes ao autor desta dissertação, em março de 2005.
18
oferecido pelo governo; se a qualidade do material compartilhado provoca reflexões aos
usuários no sentido de fortalecer o senso crítico com relação a certas verdades com as
quais nos acostumamos e que constituem nossa formação discursiva enquanto docentes; se
a publicação desse objeto de aprendizagem, em razão de sua natureza, garante ao professor
o estatuto da autoria a que se refere a instituição viabilizadora.
A partir dessas indagações, desenhamos a trilha a ser seguida em nossa pesquisa e a
partir dela esperamos contribuir para a reflexão crítica das ofertas oriundas de políticas que
apontam para o processo de ensino-aprendizagem mediado pelo computador.
Pretendemos, em âmbito geral, com esta pesquisa, trazer para a discussão questões
relacionadas à produção intelectual do professor em Ambiente Pedagógico Colaborativo –
APC, que lhe confere autoridade do dizer, que o torna autor institucionalizado. Como
objetivos específicos, buscamos levantar quais estratégias são usadas pelos professores na
exploração dos recursos desse ambiente e apontar como esses procedimentos ecoam o
imaginário do livro didático (LD) tradicional, confirmando uma repetição e/ou recriação
dessas estratégias (autoria); levantar que concepções de escrita (produção textual) podem
ser percebidas nas atividades propostas pelos professores “autores” de APC com o objetivo
de verificar a relação entre as atividades e as propostas de desenvolvimento de escritor pela
SEED; em outras palavras, investigar se as atividades em que se propõe a escrita
contemplam as condições de produção previstas na base político-teórica da SEED.
Para atingirmos nossos objetivos nessa aventura, em que navegar se torna mais
preciso ainda, percorremos a seguinte rota:
a- Entrevista com o idealizador e coordenador do Portal Dia-a-Dia
Educação para esclarecimento desse projeto voltado para a
democratização da informação no Paraná;
19
b- Levantamento de todos os trabalhos publicados no Portal, para fazer um
recorte e optar por aqueles elaborados pelos professores de LP, que
contemplem conteúdos de LP, na data selecionada (1º semestre de 2005);
c- Análise dos APC propostos pelos professores da rede de ensino público –
ensino médio – do Paraná, em busca de traços de autoria;
d- Análise das propostas de atividades em produção textual elaboradas
pelos professores colaboradores buscando nelas as marcas indicativas das
condições de produção textual;
e- Levantamento de questões que apontem para a avaliação do fazer
pedagógico após essas publicações.
O contexto de investigação.
O processo de circulação de conhecimentos propostos pelo Portal Dia-a-Dia-
Educação ocorre da seguinte maneira:
O APC, além de ser o nome do ambiente virtual, é também o nome atribuído ao
trabalho produzido pelo professor. Depois de validados por agentes validadores,
selecionados pela Secretaria Estadual da Educação (SEED), todos os trabalhos ficam
disponibilizados na rede, podendo ser acessados a qualquer momento por usuários
cadastrados no Portal Educacional. Porém, a colaboração somente é permitida àqueles que
pertencerem ao Quadro Próprio do Magistério (QPM) ou do Quadro Próprio do Poder
Executivo (QPPE) vinculados à SEED e que, por estarem efetivamente atuando na rede
estadual, têm o direito de usufruir das vantagens oferecidas através desse projeto de
20
produção intelectual para sua ascensão na carreira profissional (queremos acreditar que
esse não seja seu único objetivo). Com seu login e senha, o professor-usuário desse
ambiente pode navegar em todos os recursos (campos) de que dispõe; colaborar com um
trabalho pedagógico, aumentando, assim, o acervo de conteúdos postados, e,
conseqüentemente, melhorando o ensino de língua materna.
Os recursos que compõem um APC formam cinco grandes grupos, a saber:
a) De expressão: aqui se faz uma CHAMADA, uma espécie de chamariz para o
tema do trabalho e um RELATO do conteúdo a ser publicado, considerado o coração do
APC.
b) De formação e informação: local em que se deixa pelo menos três
SUGESTÕES DE LEITURA em conformidade com as normas da ABNT;
c) Didáticos: por didáticos são tomados os recursos iconográficos, IMAGENS de
naturezas variadas; as indicações de SÍTIOS com enfoque relacionado com o conteúdo em
questão; SONS e VÍDEOS, que poderão servir de introdução de uma aula; NOTÍCIAS que
venham contextualizar o conteúdo exposto, relacioná-lo com o cotidiano das pessoas;
CURIOSIDADES que apresentem aspectos interessantes relacionados ao conteúdo
apresentado no relato e OUTROS RECURSOS (este recurso é fixo e compõe-se de
dicionário, mapas e tradutores);
d) Metodológicos: sugerindo uma nova proposta aos pesquisadores, aparece o
recurso INVESTIGANDO; a parte prática se faz com PROPONDO ATIVIDADES,
atividades para serem desenvolvidas com os alunos; CONTEXTUALIZANDO ajuda a
estabelecer relações com os temas transversais e PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR
21
convida o autor a se aventurar por outras áreas do conhecimento, dando sempre um novo
enfoque ao seu conteúdo;
e) De interação: trata-se de um ambiente próprio para as discussões que o tema
provoca, com recursos de comunicação assíncrona. As questões para debates vão para o
Fórum por Disciplina, existente no Portal.
E, para que o trabalho seja aceito no sistema, exige-se que contemplem no mínimo
quatro deles: um RELATO, três SUGESTÕES DE LEITURA, três indicações de SÍTIOS e
a postagem de um item (uma atividade relacionada ao tema) no campo PROPONDO
ATIVIDADES.
O professor proponente, alçado à posição de autor (ou aspirante a) pela SEED (cf.
coordenador do Portal), antes mesmo de iniciar o que pretende elaborar, precisará
concordar com um termo de cessão dos direitos autorais. A partir daí, segue os caminhos
em que, para cada um desses recursos apontados acima, abre-se uma tela com vários
campos a serem preenchidos pelo professor-autor. O Relato é, por excelência, o “coração”
do APC por se tratar da fundamentação teórica em que se verifica a proposição do
“criador” em termos de colaboração na rede. Nos outros campos, além das indicações de
referências de leituras, faz-se necessária a elaboração de um sucinto comentário a respeito
desse material. Essas operações serão legitimadas se as sugestões forem pertinentes,
justificadas, servindo de respaldo ao conteúdo relatado (ver exemplos nos anexos). Um
profissional selecionado pela equipe do Portal, atuante no CETEPAR (Centro de
Excelência em Tecnologia Educacional do Paraná), validará o trabalho, conforme os
critérios estabelecidos para esse gênero hipertextual. Somente após a postagem das
informações via Internet (que depende da boa vontade do remetente), é que o validador (e
apenas ele) pode ter acesso ao trabalho em construção. Com a autoridade que lhe confere,
22
fará os devidos apontamentos no texto e o devolverá para que o mesmo seja ajustado aos
padrões exigidos. O comunicado a respeito da correção feita chega via e-mail (do professor
se espera que tenha o hábito de ler suas correspondências eletrônicas). O processo pode se
repetir várias vezes, durante as negociações. Não há um prazo para a finalização. Isso vai
depender da dedicação dos interlocutores, principalmente do pesquisador ou do professor-
autor. Quando tudo estiver pronto e dentro dos padrões, o APC é validado, tornando-se
material público cuja finalidade já é do conhecimento do leitor: compor um acervo teórico
e com sugestões práticas de fácil acesso aos professores, de forma colaborativa, através de
interações que um ambiente como esse que descrevemos viabiliza. Com o intuito de dar
uma visão geral de como esta dissertação se desenvolve, apresentamos, sucintamente, sua
organização. Após esta introdução, no capítulo 1 apresentamos reflexões teóricas sobre
autor/autoria e analisamos sua ocorrência nos 14 APC de LM selecionados.
No capítulo 2, apresentamos reflexões teóricas acerca das condições de produção
textual e as analisamos no item Propondo Atividades, com sugestões de atividades
envolvendo a escrita.
Na última seção, a que chamamos de Considerações Quase Finais, apresentamos
um balanço geral das análises empreendidas. Seguem a essas as Referências e os Anexos.
CAPÍTULO 1
MAS, AFINAL, O QUE É UM AUTOR?
ste tópico de nossa dissertação merece um cuidado especial, uma vez que
navegaremos por mares um tanto revoltosos. As discussões sobre autoria são ainda
muito recentes em nossa sociedade. Bem sabemos que existe na Constituição
Federal uma lei
4
que determina quais são os direitos que amparam aquele que cria um
objeto, seja ele intelectual ou não. Por outro lado, também sabemos que tais direitos,
normalmente, são esquecidos ou até mesmo ignorados por aqueles que deveriam brigar por
eles. A todo momento vemos pessoas negociando coisas, apropriando-se de bens
produzidos por outrem, recebendo benefícios que não lhes caberiam, pelo simples fato de
não serem elas as autoras desses bens.
Não precisamos recuar muito no tempo para lembrarmos o quanto nós nos
apoderamos de obras alheias, que serviram de suporte didático para as práticas pertinentes
ao nosso fazer pedagógico. Copiamos textos na íntegra, adquirimos objetos pirateados para
uso pessoal e comercial, sem qualquer consideração para com os autores dessas obras.
Somente agora, quando as evidências se nos apresentam aos gritos, é que passamos a ter
alguma preocupação com a questão autoral. Mesmo assim, continuamos a fechar os olhos
para muitas situações de contravenção, principalmente quando se trata da autoria dos
textos que reproduzimos, embora tenhamos o cuidado de indicarmos a fonte. Com a
chegada da Internet, fica ainda mais complicada a vigilância quanto a essa questão. Faltam,
4
Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Sancionada pelo então presidente da República, Fernando
Henrique Cardoso, para alterar, atualizar e consolidar a legislação sobre direitos autorais, dez anos após a
promulgação da atual Constituição.
E
24
ainda, na legislação, alguns aspectos que possam esclarecer melhor os direitos autorais,
sobretudo daquilo que encontramos on line e que serve de fonte para nossas pesquisas.
No meio acadêmico e nas instituições escolares é muito comum a utilização de
textos completos, e em grande escala, para atender à demanda estudantil, contribuindo,
assim, para as pesquisas empreendidas. Vêm daí as famosas “apostilas”, utilizadas como
material didático-pedagógico. E é natural que isso ocorra dessa maneira, tendo em vista a
dura realidade que vive nossa sociedade, em que livros custam muito caro e se paga um
alto preço para alcançar uma formão intelectual desejada e ideal.
Bem, continuemos a tratar de autoria. Deixemos as lágrimas para quando o motivo
for de felicidade. O que importa para nós não é discutir os direitos, mas, sim, como se
constitui um autor. E pelo que observamos em nosso objeto de pesquisa, a autoria carece
de atenção especial tanto por se tratar de um objeto criado para fins pedagógicos, como
para deslocar a posição do professor, de simples “dador” de aulas, a produtor de material
utilizável no meio educacional, através do acesso ao Portal, como bem disse o criador
5
desse ambiente virtual.
Juntamente com o surgimento dos primeiros trabalhos postados no Portal e
possíveis de serem acessados pela Internet, emerge a preocupação com a legalidade desses.
Em se tratando de ambiente institucionalizado, espera-se que o órgão público que o criou
atenda a todas as exigências estabelecidas pela legislação vigente. Observamos, entretanto,
que alguns detalhes não passaram pelo crivo que legitima ou não um produto e seu criador.
Tal preocupação fez com que os idealizadores desse projeto inovador passassem a investir
em capacitação e na conscientização dos professores.
5
Glauco Gomes de Menezes, idealizador e coordenador geral do Portal Educacional do Paraná.
25
Um ano após a existência desse ambiente e com alguns APC publicados é que se dá
efetivamente esse treinamento, em que são chamados os professores para serem
informados, via palestras, da lei que regulamenta a produção intelectual e que assegura
direitos a quem publica algum trabalho. Os direitos tanto podem ser de ordem moral como
patrimonial, ou seja, o nome do autor não deve ser desvinculado de seu produto nem esse
pode ser usado por outra pessoa, sem que haja legalmente uma permissão. E, sendo assim,
no momento em que um professor acessa o endereço eletrônico, para elaboração e
postagem de um APC, surge uma tela com uma espécie de contrato em que o usuário cede
todos seus direitos à SEED, a fim de que o trabalho enviado possa ser de domínio público.
Se não o fizer, não lhe é permitido dar prosseguimento ao intento.
Mas, afinal, o que é um autor? Para uma melhor compreensão dessa questão, é
necessário que busquemos auxílio entre aqueles que já tiveram esse tema como foco
central em suas discussões acadêmicas. Tomando como alicerce as considerações de
Michel Foucault e de outros que, com ele, dialogam, procuraremos observar, com um olhar
mais atento, a relação que existe entre texto e autor.
Seguindo a trilha desse filósofo, a noção de autoria, no mundo ocidental, “constitui
o momento forte da individualização na história das idéias, dos conhecimentos, das
literaturas, na história da filosofia também e na das ciências” (FOUCAULT, 1992, p.35). O
autor e a obra se constituem como unidade primeira, passando a história de um conceito
para um segundo plano, um “recorte fraco” dessa unidade. Embora pareça estranho falar
em unidade, o autor aparentemente surge primeiro e se posiciona externamente à obra.
Muito bem. Não poderia haver obra, se não existisse um sujeito que a produzisse, que a
tirasse de suas idéias. No entanto, nem sempre foi essa a compreensão que a humanidade
teve de autoria. Sequer se perguntava sobre “quem falou sobre isso?” Não interessava
26
saber, ou não era bom, conhecer a fonte, pois que as escrituras constituíam objeto sagrado,
sendo divulgadas com a finalidade de doutrinar o homem. Aquele que escrevia um texto
passava a exercer uma função, digamos, social, de autor, caracterizando, assim, os
discursos que circulavam na sociedade.
Já na Idade Média, segundo esse pensador, o valor científico de uma proposição só
poderia ser concebido em função de sua autoria. O texto passaria a ter valor de verdade
apenas por pertencer a um autor. A definição de autor, para Foucault, tem a ver, num
determinado momento histórico, com o modo como a tradição cristã o autenticou, sendo
insuportável o anonimato literário. (FOUCAULT, 1992).
Continuando na trilha de suas reflexões sobre a questão do autor, buscamos na
conferência A Ordem do discurso, mais contribuições. Foucault (1999) diz que, pelo
princípio do comentário, “o novo não está no que é dito, mas no acontecimento de sua
volta” (p.26). Ele se refere ao autor como “princípio de argumento do discurso, como
unidade e origem de suas significações, como foco de sua coerência” (FOUCAULT, 1999,
p.26) e não como indivíduo falante que pronunciou ou escreveu um texto. Na
modernidade, os críticos se utilizam de esquemas semelhantes aos da exegese cristã,
quando esta queria provar a autenticidade de um texto, revestindo o autor de uma santidade
considerável tanto na esfera religiosa como na social.
Para Foucault (1992), a noção de autor vem variando: hoje é uma figura jurídica, já
que a ela podem ser imputadas penalidades. Não é porque alguém diz algo que é um
AUTOR (grifo nosso). Autor é aquele que desloca um já-dito. Ullmo sintetiza essa questão
foucaultiana assim se pronunciando:
o que especifica um autor é justamente a capacidade de alterar, de
reorientar o campo epistemológico ou o tecido discursivo, como
formulou. De facto, só existe autor quando se sai do anonimato, porque se
27
reorientam os campos epistemológicos, porque se cria um novo campo
discursivo que modifica, que transforma radicalmente o precedente. (J.
ULLMO debatendo com FOUCAULT, 1992, p. 86).
Como podemos perceber, no que já foi exposto, “seria um absurdo negar a
existência do indivíduo que escreve e inventa” (FOUCAULT, 1996, p.28). Nos dias de
hoje, “o indivíduo que se põe a escrever”, de certa forma, “retoma por sua conta a função
do autor” (p.28-29), ou seja, reproduz, com outras palavras, o que os precursores de
alguma ciência ou de algum movimento literário já disseram. Estes, sim, na visão do
teórico, são considerados sujeitos fundantes, a partir dos quais se escrevem temas
correlacionados, concordando ou divergindo com os mesmos. Poderíamos dizer que estes
são os “verdadeiros” autores?
Até o presente momento, tencionamos retomar uma teoria que pudesse respaldar
nosso trabalho diante daquilo que propusemos analisar aqui. Outras contribuições serão
consideradas pertinentes pelo fato de estarem elas dialogando com o referido autor acima,
como já o dissemos. Reputamos importante acrescentar outras vozes que se reportam ao
pensamento foucaultiano.
Estudiosos como Maria do Rosário Gregolin, Maria José Coracini e Eni Orlandi
têm trazido contribuições para os estudos da linguagem, publicando pesquisas que versam
sobre a discursividade e a problemática em torno da autoria.
Gregolin (2003) corrobora com as idéias de Foucault – e avança - ao comparar as
idéias desse filósofo com o tratamento que Bakhtin dá aos textos produzidos socialmente.
Segundo ela, a marca ou a falta do autor estão ligadas ao gênero do discurso. Essa
pesquisadora assim se pronuncia com relação à função-autor:
28
A “função-autor” é, assim, característica do modo de existência, de
circulação e de funcionamento dos discursos no interior de uma
sociedade, e, por esse motivo, a reflexão sobre a autoria não pode estar
desvinculada , do nosso ponto de vista, da discussão sobre os regimes de
apropriação dos textos e da construção da memória coletiva de uma
sociedade. (GREGOLIN, 2003, p.49).
Para Gregolin, a autoria se dá no entrelaçamento dos gêneros e a interpretação dos
textos, e isso ocorre porque estes já tiveram sua significação no passado que também só foi
possível devido à retomada dos discursos que o precederam. Dessa forma, “o novo desloca
e desregula os implícitos associados ao sistema de regularização anterior”. (GREGOLIN,
2003, p.56). Por ser um sujeito histórico, em sua função autoria, ao mesmo tempo em que
repete o já-dito, desloca-o, movimentando-o sem deixar que se perca a coerência e
unicidade do discurso. Tal contribuição de Gregolin (2003) nos interessa de perto, já que
os APC que analisamos contemplam a produção escrita, representada num dos gêneros que
compõem o eixo dos textos escritos, eleitos pela equipe organizadora do ambiente virtual,
e que apresentam alguma estabilidade formal, elencados na página do Portal Dia-a-Dia-
Educação da SEED-PR.
Voltando à formulação de Gregolin, apresentamos um exemplo de como a relação
entre gênero e autoria é variável: é o caso de textos cujo gênero já se encontra bastante
estável, como procurações jurídicas, memorandos, recibos, requerimentos etc. Nesses
textos, o escrevente apenas repete fórmulas e apõe a sua assinatura, na função apenas de
signatário. Ele não é, por conseguinte, o autor do texto. Esse tipo de gênero impede a
emergência da autoria, por se tratar de cânones da língua escrita. Todavia, é possível
romper com essa fixidez em casos ímpares, como o conhecidíssimo caso de Jânio Quadros,
quando prefeito da cidade de São Paulo, que é o seguinte: houve uma chuva torrencial em
que uma árvore cai sobre um automóvel. O proprietário do auto peticiona junto ao prefeito
o ressarcimento do valor do bem, sob a forma de versos. Jânio respondeu favoravelmente à
29
petição, versejando no mesmo estilo. Esse caso ilustra muito bem como um gênero
altamente fixado socialmente pode ser rompido. No entanto, não é a norma.
Mais um exemplo interessante de deslocamento da fixidez de um gênero é o texto
Lição sobre a água
6
, do poeta português Antônio Gedeão, que Gregolin (2003, p.50)
utiliza para ilustrar seu texto sobre autoria. Nele, os efeitos de sentido podem se constituir
com base nesse deslize. Os primeiros versos do poema descrevem a água em seus estados
físicos e como solvente universal, à luz da ciência; já nos últimos versos, o que era água
passa a ser o rio onde o cadáver de Ofélia (referência a Hamlet, de Shakespeare, final do
Ato IV, cena VII) aparece boiando com um nenúfar na mão. Na visão de Gregolin, trata-se
de um texto híbrido, constituído de três gêneros: didático (por se tratar de uma lição),
científico (por tratar de um objeto das ciências naturais) e literário (por se apresentar na
forma de um poema). Em outras palavras, um gênero híbrido, constituído de três gêneros
de três esferas de circulação diferentes: a escolar, a científica e a da criação literária.
Por outro lado, de acordo com Coracini (1999), na introdução do livro
Interpretação, Autoria e Legitimação do Livro Didático, por ela organizado, o livro
didático é visto como “lugar de estabilização, legitimado pela escola e pela sociedade, que
define, seguindo os parâmetros programáticos do MEC (Ministério da Educação e
Cultura), o quê e como ensinar/aprender” (p.12). Quando se cria um material alternativo
para substituir o livro didático (LD), o que ocorre na verdade é uma “ilusão do novo”.
Observa-se uma “tendência de repetição como forma de exercício de poder e
estabelecimento de verdades” (CORACINI, 1999, p.12).
6
Poema de Antônio Gedeão. In: Poesias Completas (1956-1967). Lisboa: Portugália, 1972. LIÇÃO SOBRE
ÁGUA Este líquido é água. / Quando pura é inodora, insípida e incolor. / Reduzida a vapor, / Sob tensão e a
alta temperatura, / Move os êmbulos das máquinas que, / Por isso, se denominam / Máquinas de vapor. / É
um bom dissolvente. / Embora com exceções mas / De um modo geral, / Dissolve tudo bem, ácidos, bases e
sais. / Congela a zero graus centesimais / E ferve a 100, quando a pressão normal. / Foi nesse líquido que
numa noite cálida de verão / Sob um luar gomoso e branco de camélia, / Apareceu a boiar o cadáver de
Ofélia / Com um nenúfar na mão.
30
Retomando as duas pesquisadores acima mencionadas, podemos dizer que, em
relação à primeira, e antecipando-nos às análises apresentadas mais adiante, só teríamos
autoria se os excertos de textos ou os textos integrais, selecionados pelos professores
proponentes, de certa forma, inaugurassem novos dizeres, novas formas de dizer,
utilizando o deslocamento de gêneros, como no exemplo citado por ela ou no nosso
exemplo ilustrativo (caso do episódio envolvendo o então prefeito de São Paulo Jânio da
Silva Quadros). Em relação à segunda pesquisadora, em se tratando de material didático,
cuja elaboração é sempre uma repetição, não teríamos autoria. Assim, buscando uma
reflexão que procurasse expandir as inquietações foucaultianas, encontramos em Orlandi
as considerações necessárias para enxergar algum movimento de autoria das propostas dos
professores que postam seus APC no Portal Dia-a-dia-Educação do Paraná.
Orlandi (1996), ao refutar – ainda que parcialmente - Foucault, que toma por autor
aquele que desloca o já-dito em um evento novo e para quem a “função-autor limita-se a
um quadro restrito e privilegiado de produtores ‘originais’ de linguagem” (p.69), conduz
nosso olhar para uma nova direção. A autora, sob a luz da Análise do Discurso (AD),
considera a função-autoria um acontecimento histórico e que somente ocorre, se o autor, ao
tempo em que “responde pelo que diz ou escreve, pois é suposto estar em sua origem”,
disser algo que seja passível de interpretação pelo outro, sua compreensão do dizível se
dará dentro de uma rede significativa/discursiva que justifica aquilo que elabora. E esse o
fará sempre de uma determinada posição social na ordem do discurso. Ela diz ainda que:
a função-autor se realiza toda vez que o produtor da linguagem se
representa na origem, produzindo um texto com unidade, coerência,
progressão, não-contradição e fim. Em outras palavras, ela se aplica ao
corriqueiro da fabricação da unidade do dizer comum, afetada pela
responsabilidade social. (ORLANDI, 1993 apud ORLANDI, 1996, p.69)
31
Podemos observar na contribuição dessa pesquisadora que a história é que
possibilitará que algo seja dito, pois “o autor consegue formular, no interior do formulável,
e se constituir, com seu enunciado, numa história de formulações” (p.69). Não se trata,
portanto, de uma repetição que se faz por um processo de memorização de frases já ditas.
Se o “autor” assim o fizer, estará plagiando alguém, estancando o movimento de
interpretação que somente se dará no momento da incompletude da linguagem, ou seja, no
silenciamento, no não-dito. O movimento dos sentidos e a função-autor só são possíveis na
incompletude da linguagem. Visto dessa maneira, o autor não poderá ser a origem do dizer,
como já vimos em Foucault, mas é aquele que se coloca na origem do discurso.
Buscaremos, então, nos APC, verificar como se dá a emergência da autoria. Pelas análises
empreendidas, apontaremos para gestos de autoria, quando vislumbrarmos investimento de
ação do/a proponente na busca de conexões entre áreas e recursos variados; e gestos de
autoria compartilhada quando tais investimentos forem realizados pelo proponente e seus
colaboradores. As análises nos indicam que uma nova modalidade de autoria está se
constituindo num ambiente institucionalizado, que é a autoria compartilhada e, portanto,
diluída. A descrição e análise de cada APC evidenciará isso.
Por menor que seja esse gesto de autoria, deve ele estar embasado nos princípios
que tomamos como garantia para sua ocorrência, quer seja gesto de autoria de um
indivíduo ou gesto de autoria compartilhada. Dessa maneira, para assim o considerarmos,
os documentos publicados no Portal, com o propósito de colaborar para a melhoria do
ensino na educação básica do Paraná, devem apresentar, pelo menos, coerência global em
sua formulação, não havendo contradição, conforme aponta Orlandi (1993, apud
ORLANDI, 1996), entre os textos ou enunciados que o compõem. Em outras palavras, o
objeto de aprendizagem proposto nesse ambiente colaborativo deverá se constituir numa
unidade temática, embora com apontamentos para diversas direções e recursos digitais.
32
Portanto, a incoerência, como preconiza Charolles (1988, p.45), grosso modo, ocorre
sempre que o texto fizer uma ruptura com o recorte (investimento semântico) que se queira
passar a respeito do tema escolhido pelo professor-autor, melhor dizendo, com alguma
destas “meta-regras”: de repetição, de progressão, de não-contradição e de relação.
Segundo esse estudioso,
Para que um texto seja microestruturamente ou macroestruturamente
coerente, é preciso que no seu desenvolvimento não se introduza nenhum
elemento semântico que contradiga um conteúdo posto ou pressuposto
por uma ocorrência anterior, ou deduzível desta por inferência. (...) que
uma mesma proposição seja conjuntamente verdadeira e não verdadeira,
ou falsa e não falsa (CHAROLLES, 1988, p.59-60).
Não vamos, todavia, nos aprofundarmos na explicação das demais meta-regras,
uma vez que nossa intenção é pontuar somente uma delas: a da não-contradição, que não
deve deixar de figurar nos textos elaborados pelos proponentes dos APC, especialmente
aqueles que sustentam os recursos Relato e Propondo Atividades. Apontaremos nas
análises somente quando a contradição ocorrer, dispensando, assim, o registro contrário, ou
seja, quando houver coerência global por não romper com a meta-regra da não-
contradição, não faremos menção.
É com essa visão teórica que pretendemos analisar as propostas validadas como
recursos constitutivos dos objetos de aprendizagem, as quais legitimam a autoria conferida
aos proponentes pela instituição educacional. Analisar, fundamentalmente, o recurso
Propondo Atividades, como indicador da formação discursiva e da concepção de escrita
que dá suporte ao trabalho de quem propõem, a fim de, como já mencionamos, fazer uma
reflexão crítica com relação a essa produção intelectual e sua implicação no ensino de
Língua Portuguesa.
33
É a partir desse conceito, em que defenderemos o princípio da não-contradição, a
partir de Charolles, de que, para haver a função-autor, faz-se necessária a inauguração de
um novo dizer, em outros contextos, cuja posição social do enunciador revele sua
autoridade do dizer coerente e compreensível, que faremos nossa análise. Os APC, agora
chamados de Objetos de Aprendizagem Colaborativa
7
, aparecerão com a numeração com
que foram postados no Portal. Até o presente momento, somam 14 os trabalhos que
colaboram com a melhoria do Ensino Médio, na disciplina de Língua Portuguesa,
validados e publicados no eixo dos textos de gêneros escritos. Alguns deles contam com
uma ou mais colaborações (idéia do projeto). Além disso, indicaremos em cada item a data
da publicação inicial (do proponente principal), seguida da data das colaborações ocorridas
a posteriori, bem como a quantidade de acessos que tiveram os APC até o presente
momento (dezembro de 2005). Vale lembrar que, mesmo com a colaboração de outro
professor em alguns dos recursos do APC, a quantidade de acessos, quer pelo número do
APC ou pelo nome de seu autor primeiro, não revela o momento em que esses se deram. E
na descrição desse material usaremos letra inicial maiúscula quando nos referirmos aos
recursos do APC, negritando para dar maior destaque. Entretanto, quando esses termos
aparecerem flexionado, manteremos apenas o destaque. Segue a análise do nosso corpus,
composto de 14 APC, como já dissemos, de LM do Ensino Médio, gênero de textos
escritos.
7
Quando principiamos esta pesquisa, o trabalho colaborativo recebia o nome de APC, mesmo nome do
Ambiente Pedagógico Colaborativo. Questionado por nós, em eventos dos quais participamos, o coordenador
do Portal resolveu denominar essas produções de Objetos de Aprendizagem Colaborativa. Entretanto,
continuaremos, predominantemente, a nos referir a eles da forma com que foram idealizados. Assim
preferimos em função de o termo OAC não pertencer, ainda, ao senso comum da maioria dos professores da
rede pública estadual do Paraná.
34
Do oceano de enunciados já-ditos, a criação
1) APC 575 – Publicado em 14-10-2003 / 1ª Colaboração em 10-02-2005 / 945 acessos.
O APC 575 segue, como os demais, o modelo padrão de apresentação determinado
pelo Portal, ou seja, preenche os recursos considerados básicos para uma validação.
Relembrando, o ambiente possui 12 recursos e um fórum de discussões; entretanto, é
possível a publicação de um trabalho, se o autor quiser preencher apenas 4 deles (Relato,
Sugestão de leitura, Indicação de sítios e Propondo atividades). Os demais recursos
poderão ser preenchidos com a colaboração de outros professores interessados no tema em
questão (caso deste que conta com a participação de uma colaboradora no recurso
Sugestão de Leituras, acrescentando sugestão às já existentes). A proponente do APC 575
trabalha com conteúdo de imprensa, o gênero
8
crônicas (aqui referimos ao gênero textual
especificamente). No recurso Paraná, a proponente deste APC fala de cronistas
paranaenses, como Dalton Trevisan
9
e Miguel Sanches Neto, que retratam em seus textos,
com freqüência, o cotidiano de quem habita a cidade de Curitiba. Transcreve uma crônica
de Miguel Sanches Neto (colunista da Gazeta do Povo), Clube do Tiro. A fundamentação
de seu relato se dá em torno da crônica e como esse gênero mexe com a vida das pessoas.
Ressalta a importância de se trabalhar com esse tipo de texto com os alunos, a fim de
torná-los críticos em relação ao que acontece na vida real. Também sugere que os alunos
acompanhem a rotina de um cronista, para, desse modo, aprenderem com ele a observarem
melhor os acontecimentos diários. Ressalta ainda que é com a perspectiva no dia-a-dia que
os produtores de matéria televisiva conseguem agradar tanto aos expectadores, como é o
8
Aqui nos referimos ao gênero crônica, diferentemente do que está no ambiente:gênero como eixo que
distingue os escritos dos orais e digitais. Adiante voltaremos a esse assunto que tornará mais clara nossa
posição.
9
Escritor paranaense que, embora citado como cronista, é mais reconhecido pelos seus contos que tomam,
em geral, a cidade de Curitiba como cenário para as histórias que narra.
35
caso de programas como A Grande Família, Os Normais (apresentados pela Rede Globo
de Televisão) e outros.
A proponente do APC 575 faz três sugestões de leitura, todas de cronistas
brasileiros que relacionam a arte com a vida como ela é, utilizando a linguagem do cinema,
inclusive. Um dos livros citados é A Crônica, de Jorge de Sá, que faz uma definição de
crônica enquanto gênero jornalístico. Considera essa última uma obra-base para orientar
professores sobre o gênero, sua estrutura e aspectos lingüísticos.
Em Imagem, mostra uma cena em que se vê um trânsito intenso, em que veículos
trafegam nas condições que a cidade grande permite. A proponente do APC 575 diz que
basta olharmos pela janela de nossa casa ou do carro para flagrarmos algo digno de ser
registrado. Temos a crônica, sempre, aos nossos olhos. O que possibilita que ela venha a se
materializar são os olhos de quem vê.
Ocorrem três indicações de sítios por parte da proponente do APC 575 que
remetem a trabalhos de cronistas como Rubem Braga e sítios cujas crônicas são sempre
atualizadas, trazendo reflexões sobre o papel delas e sua residência nos jornais. Além
disso, em Sons e Vídeos, apresenta a música Domingo na praia, interpretado pelo grupo
Velhas Virgens, a partir da qual ilustra como um passeio pela praia pode ser contado e
cantado, como uma crônica.
A grande Curiosidade é a carta de Pero Vaz de Caminha, considerada o primeiro
texto sobre o Brasil, sob a forma de uma crônica e aparece em obras que falam das
crônicas sobre o Brasil. Em Investigando um pouco mais, a proponente deste APC
procura a origem etimológica da palavra e mais definições para o termo, apresentando as
muitas facetas do gênero.
36
No recurso Propondo Atividades, a proponente do APC 575 sugere a produção de
uma crônica a partir de um fato atual apresentado em um telejornal ou a partir de uma
imagem instigadora, que o professor leve para a sala. Nesse item não fica claro o
interlocutor. Ao usar o verbo de comando no infinitivo, não fica claro a quem a proponente
se dirige. E, além da ausência da notícia e da perspectiva interdisciplinar (recursos que
ficaram em aberto para um outro colaborador qualquer), quem elaborou o APC não deixa
questão para discussões no Fórum. A ausência de um ou mais recursos, como já
mencionamos acima, não impede a publicação de um APC no Portal.
Neste APC, podemos dizer que há um gesto de autoria, porque não temos bases
suficientes para dizer que ele está se constituindo num autor como aquele que, como vimos
em Foucault (1992), desloca o discurso da ordem em que se apresenta. Como há um
deslocamento mínimo, pelas interconexões entre as indicações de sítios, sons e leituras
consideramos, pois, um gesto de autoria. Estamos considerando, também, a não-
contradição de que fala Orlandi, e que buscamos maior aprofundamento em Charrolles.
2) APC 576 – Publicado em 14-04-2004 / 1ª Colaboração em 17-09-2004 / 764
acessos.
O APC 576 que ora passamos a analisar não traz preenchido o recurso Paraná,
aquele que traz uma curiosidade que relaciona o Paraná ao tema do APC. Ele se compõe
(até o momento, podendo se completar ainda) de relato, sugestão de leituras, indicação
de sítios, notícias, imagem/ns, investigando, propondo atividades, contextualizando,
perspectiva interdisciplinar, e questão para o fórum.
37
A proponente do APC 576 sugere uma série de questões a serem trabalhadas, por
meio de tarefas de escrita e de discussões a respeito da nova tecnologia digital-internet e a
língua utilizada pelos internautas. Seu trabalho traz como relato a comunicação entre os
homens, que evolui em função do surgimento das novas tecnologias, exigindo que esses se
adaptem a elas. Ressalta, com base na realidade em que vive, que as escolas não estão
preparadas para as novas tecnologias digitais, mesmo assim, realizam atividades usando a
Internet. Nessas escolas, segundo a proponente, há que se questionar a linguagem utilizada
na Internet. Afirma, ainda, que as metodologias tradicionais - falar, escrever no quadro –
estão em descompasso com o saber dos alunos que já conhecem e usam as novas
tecnologias digitais pelos celulares e pela internet. Lembra que, no Brasil, há milhões de
pessoas usando as tecnologias digitais, e esse assunto é pouco abordado. Observa ela que a
comunicação que impera no virtual é a escrita.
O foco de interesse da proponente do APC são as mensagens escritas trocadas entre
os internautas nas salas de bate-papo (chat). E a língua escrita aí não obedece ao padrão
formal exigido pela escola. A língua escrita nas salas de bate-papo se assemelha à
informalidade da língua falada. O internauta foge das normas rígidas da língua escrita, uma
vez que dispõem de pouco tempo na comunicação em tempo real. Essa comunicação não
tem planejamento como a escrita formal. Não exige o menor trabalho e reflexão. Nas salas
de bate-papo, o internauta abrevia palavras, usa ícones (emoticons)
10
e expressões
onomatopéicas. Finaliza com uma questão: O internetês estaria invadindo a linguagem do
mundo real?
10
Emoticons são ícones criados no ambiente virtual para representar expressões de alegria, tristeza, espanto,
gestos etc. Basicamente são feitos com os recursos gráficos de que dispõe o teclado ( , , =D, :{ ), ou mais
elaborados, como os gifs animados.
38
Nas sugestões de leitura, a proponente do APC 576 elenca textos escritos
impressos e digitais que tratam de educação e investimento em tecnologia, mudanças
ocorridas com o avanço tecnológico na área da comunicação, da alfabetização e variações
lingüísticas. Indica sítios que trazem dicionários, salas de chat, áudio – letra da música
Pela Internet, de Gilberto Gil, com palavras estrangeiras em azul e sublinhadas e outras em
língua materna que se referem a novas tecnologias, com um breve comentário a respeito da
temática da letra da música. Indica ainda uma Revista on-line – que trata dos ícones usados
nas mensagens e um Jornal on-line (Folha de S.Paulo) – que trata sobre os divórcios
ocorridos por infidelidade decorrente de conversas em salas de bate-papo.
No item Investigando – Texto A influência da internet na linguagem escrita - a
proponente do APC 576 apresenta, nesse texto, exemplos criativos do uso da escrita,
mostrando que não há formalização excessiva nas criações.
Em Propondo Atividades, a proponente do APC 576 sugere atividades com os
alunos, dirigindo-se ao professor como seu interlocutor para: mostrar aos alunos como se
utiliza a Internet; realizar atividades no laboratório de informática de forma a preparar o
aluno para o uso de tal ferramenta. Com isso, os alunos passam a freqüentar salas de bate-
papo, observando, assim, o tipo de linguagem utilizada. Somente depois disso poderão
participar das salas de bate-papo. Recomenda que se observem as diferenças em relação à
língua usada e a ensinada na escola. Deverão eles anotar as palavras desconhecidas e os
símbolos utilizados em listas para que os mesmos possam formar um dicionário próprio.
A proponente do APC 576 contextualiza a questão tema Internet - bate-papo –
língua escrita formal x informal – Internetês - e associa a vários objetos informacionais
correlacionados – livro, periódico impresso, periódico digital, música, e propõe vivência
39
em sala de bate-papo. A busca ou o relacionamento do tema com os textos ou sítios de
música é bem diversificado e indica um investimento da proponente do APC 576.
Esse investimento mostra um leque de conexões bem variado, o que aponta para
uma leitura relacional do mundo. Se esse gesto de construção do APC 576 se aproxima do
conceito de autoria, o mesmo não podemos dizer da propositura de atividades, uma vez que
elas repetem o imaginário (ou ecos) do LD, seguindo sempre um roteiro, um manual de
instruções. No entanto, é preciso considerar que, seguindo o critério da não-contradição, o
gesto de autoria se desfaz, já que, no início do APC, a proponente afirma que os alunos
estão bem acostumados com a Internet e depois trata-os como iniciantes. Observemos que
ela assevera que primeiro deve-se preparar o aluno, mostrando como se utiliza a Internet
para, depois, colocá-los em ação.
Como já o dissemos acima, as atividades em nada diferem daquelas que estamos
acostumados a ver nos LD. O que ocorre, porém, é que estamos diante de uma realidade
nova, talvez mais para o professor do que para o aluno. Supor que eles não saibam utilizar
as salas de bate-papo e que não conheçam os vocábulos próprios daquele ambiente seria,
no mínimo, subestimar sua inteligência. Embora seja difícil para a maioria dos alunos da
Rede Pública a aquisição de equipamento de informática, é comum vê-los conversando
sobre jogos e passeios que já fizeram pela internet, dominando, assim, o jargão que se
criou, como professores da rede que somos.
A autoria aqui também se dilui porque não há deslocamentos (FOUCAULT, 1992),
ainda mais que não podemos identificar e separar cada um dos proponentes. Eles se
fundem num único objeto de aprendizagem e, como não participaram do APC como um
todo, no início de sua elaboração, sequer aparecem seus nomes no cabeçalho desse
trabalho.
40
3) APC 578
11
- Publicado em 14-10-2003 – 1ª Colaboração em 21-02-2004 / 2ª
Colaboração em 30-04-2005 / 875 acessos.
O APC 578 preenche todos os recursos; entretanto, dois deles não foram a
proponente principal quem os elaborou. A imagem e sugestão de leitura foram elaboradas
de forma colaborativa por dois outros professores, num espaço de dois anos após a
publicação do APC. A proponente desse objeto de aprendizagem toma como tema Contos
de Fadas, no gênero escrito, literários e de entretenimento. No recurso Paraná, ela toma
como curiosidade os faróis do saber: 45 bibliotecas comunitárias espalhadas pelos bairros
de Curitiba. Fala de como são freqüentados e da faixa etária dos usuários que mais procura
os livros. Embora o relato seja o coração do APC, onde estaria presente a fundamentação
do trabalho, ela apenas ressalta a importância de se contar histórias nas aulas de LP, pois
assim não ficam no esquecimento as tradições populares e ainda proporcionarão (os
contos) uma viagem na imaginação, já que permitem a inserção do leitor num mundo
diferente. A partir disso, os alunos poderão adquirir subsídios para realizarem trabalhos
com literatura. Na verdade, ela expõe a metodologia no seu relato, dizendo como orientaria
os alunos à produção de cartuns e de paródias dos contos de fada.
Os contos, na verdade, são estimuladores para que os alunos produzam textos
criativos e peças para a representação para outros públicos estudantis. Sugere livros como
A Psicanálise dos Contos de Fada, de Bruno Bettelheim; textos da literatura infanto-
juvenil, com comentários sobre a obra. Sugere até mesmo o gibi de Maurício de Souza, que
fala de personagens dos contos de fada, mas não cita o nome da História em Quadrinhos
(HQ) o ano, a página, tampouco a edição.
11
O leitor pode perceber que saltamos do APC 576 para 578. O APC 577, assim como tantos outros que
intercalam a ordem desses que analisamos, provavelmente está em processo de validação, ou esse número foi
tomado por uma outra área. No início, quando da abertura do Portal Educacional, não se exigia prazo para a
postagem de um APC, ficando o proponente registrado com um número no sistema. Atualmente, isso já
mudou, assim como outras exigências a respeito da produção e número de recursos mínimos.
41
No recurso Imagem, outra professora colabora e apresenta como ilustração uma
espécie de caixinha no formato de um coração, como se quisesse representar a caixa de
Pandora. Essa colaboração é uma produção de um outro sujeito que, a partir da proposta
apresentada à página do Portal, faz novas conexões entre o tema tratado no APC e outros
textos – no caso imagéticos – o que lhe confere também um gesto de autoria. Chamaremos
esse agente de autor-colaborador.
Ainda que sua inserção seja tímida, pequena ou pontual, não podemos deixar de
considerá-la. O que temos aqui, então, é uma nova ferramenta, posta pela SEED, à
disposição dos professores do Estado do Paraná, que estimula a produção de textos, aulas,
propostas de trabalho, a partir de uma conexão compartilhada. Ou seja, o trabalho do
professor não é isolado, tampouco individualizado. Como a ferramenta digital prevê a
participação de outros colaboradores, a autoria de um APC se dilui em muitas autorias e
permitem a formação de uma rede colaborativa com autoria coletiva, compartilhada,
propiciando um possível gérmen de diluição da autoria no sentido clássico.
A proponente do APC 578 faz indicações de sítios relacionados ao tema e vídeos
sobre o assunto. Apresenta o endereço de duas notícias sobre os irmãos Grimm e sobre a
luta das mulheres no mercado de trabalho.
A título de curiosidade, essa proponente fala sobre Carlos Daitschman, um
contador de histórias de Curitiba, que conta histórias nos hospitais, para doentes, pois
considera essa arte um alimento vital para os necessitados e para as pessoas em geral. Trata
ainda, de maneira mais aprofundada, sobre os irmãos Grimm, sobre a origem do lobo mau
e por que esse animal foi escolhido para figurar nas histórias, discorre sobre a diferença
entre a fada e a bruxa.
42
O recurso Propondo Atividades conta com a colaboração de um terceira pessoa
(professora). Nesse recurso há seis propostas de trabalho com os alunos. A autoria aqui fica
diluída. Não há marcas de quem propôs qual das atividades. Chamaremos, então, de
proponentes, no plural. As proponentes propõem – usando verbos de comando na forma do
infinitivo – a contextualização (termo esse usado de maneira equivocada) do conto de
Chapeuzinho Vermelho com Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque de Holanda; do
conto Pele de Asno com o poema Eros e Psiquê, do escritor português, Fernando Pessoa,
para, depois, o aluno poder compor seu texto no gênero lírico. Estamos supondo que essa
atividade sirva para sensibilização do educando, em que o mesmo se depara com outras
maneiras de se contar uma história, ou seja, transformando narrativas em prosa em
composições líricas, porque não estão explicitadas as razões de uso de tais textos. Pode ser
decorrente desse pensamento que as proponentes estejam introduzindo o gênero (literário)
lírico nas suas aulas de Português.
A segunda atividade pede uma extrapolação da temática dos textos. As proponentes
orientam que se peça ao aluno para ele dar continuidade ao termo “felizes para sempre”
que caracteriza o final dos contos, discorrendo sobre a realidade da vida moderna. Segundo
elas, o aluno também pode escrever um conto misturando os personagens de variados
outros lidos em sala. Em outras atividades o aluno poderá usar o recurso da paródia para
produzir cartuns; escrever peças teatrais para fixação do gênero dramático; escrever textos
mudando o foco narrativo; exercitar a oratória contando histórias para alunos do ensino
fundamental. Propõem, ainda, uma análise dos contos, observando os princípios do prazer
e da realidade sob a luz da psicanálise freudiana, as metáforas que representam a
sexualidade e o prazer contidos nas entrelinhas dos contos. Ainda sugerem a leitura do
livro Mais contos de fadas politicamente corretos em que aparece a análise de outros
alunos no sentido de incentivar a leitura de obras consideradas, por eles, infantis.
43
No Contextualizando, a proponente do APC 578 traz para a discussão outros
autores que escrevem o mesmo conto, mas de maneira diferente, com outro final, como é o
caso de Charles Perrault, em que Chapeuzinho Vermelho, juntamente com a avó, são
devoradas pelo lobo, o que não ocorre na versão dos Grimm.
A proponente do APC 578 sugere, no recurso Perspectiva Interdisciplinar,
trabalhar a temática em Artes, explorando a dramaticidade; com história, na
contextualização dos fatos; em Sociologia, resgatando os sentimentos e emoções que
ficaram no passado do aluno, no convívio com a ternura dos avós e da infância vivida.
Coloca essa discussão no fórum, questionando “se realmente se vivia mais feliz
antigamente e para sempre”.
As atividades, em sua maioria, são propostas que fazem eco das proposituras a que
estamos acostumados ver nos LD, o que nos indica um proponente-repetidor. Por outro
lado, há propostas que se distanciam da maioria das atividades do LD, como a análise que
relaciona contos de fada com a psicanálise freudiana. É um já-dito lá que ecoa como novo
discurso didático. Essa combinatória e sugestões de indicações de buscas nesse ambiente o
coloca na origem de um novo fio discursivo, que o inaugura, retomando Foucault (1999) e
Orlandi (1993, apud ORLANDI, 1996). Então, podemos atribuir aqui um gesto de autoria,
no entanto, a autoria aqui apresenta-se diluída entre a proponente inicial do APC e a
colaboradora.
4) APC 579 – Publicado em 17-10-2003 / 797 acessos.
O APC 579 também trata do conteúdo de imprensa, gênero crônica. A proponente,
no recurso Relato, traça um paralelo entre os gêneros literários escolares, enfatizando o
44
conteúdo de que irá tratar. Fala da importância da crônica para a formação do leitor
competente. Com base na noção do que seja uma crônica, ela passa a tecer considerações
sobre a crônica jornalística, a fim de analisar esse gênero no decorrer de seu trabalho.
Anuncia que analisará uma crônica de Moacyr Scliar, cronista da atualidade e que fará
sugestões de leitura para o aprofundamento do professor que, por ventura, vier a acessar
esse ambiente. Diferentemente dos outros relatos em que se espera a fundamentação
teórica do conteúdo num todo, ela descreve qual é seu objetivo, prevendo uma contribuição
de recursos metodológicos.
No APC 579, há quatro indicações de leitura, três de livros que versam sobre o
gênero crônica e uma de revista científica que também conta com esse gênero na
apresentação das matérias.
A imagem retrata dois jogadores de futebol, disputando uma bola no gramado do
campo. Tal ilustração se justifica por estar tão presente na vida dos jovens este tipo de
texto: a crônica esportiva. Além disso, há uma indicação de sítio para complementar o
estudo em sala de aula.
Três sítios remetem o professor interessado para obras de escritores de renome
conhecidos por suas composições do gênero abordado nesse documento. Exemplo de sítio,
temos É Vero? Veríssimo? no endereço www.luisfernandoverissimo.hpg.com.br, reunindo
crônicas, curiosidades, obras publicadas e dados biográficos do autor.
A proponente do APC 579 apresenta ainda, no recurso Sons e Vídeos, a música
Pivete, de Chico Buarque, escolhida pela riqueza lingüística que pode ser trabalhada nas
aulas de LP. Aqui também é sugerido ao interessado uma atividade, elencando os
problemas sociais presentes na canção e relacionando com os analisados em crônica de
Scliar.
45
A notícia de que “Rolling Stones podem dispensar banda alemã por racismo” (no
caso, contra turcos), localizada em jornal on-line, pode ser confrontada com essas crônicas
de temas semelhantes no intuito de desmistificar a crença por parte dos alunos de que
existe apenas discriminação da raça negra.
Uma curiosidade interessante para relacionar com o tema foi trazer um texto da
mitologia grega em que Cronos trava luta com Zeus, por conta de uma profecia que se
realiza. Crônica vem desse ser mitológico, que personifica o tempo que tudo engole, sem
nada poupar. Então vem daí a origem do termo, do grego chronos, que significa tempo. A
crônica, por assim dizer, atravessa o tempo. Surge como relatos históricos medievais,
depois assume a vestimenta de folhetins, no século XIX, em notas de rodapés, e evolui
para o que temos hoje, nas colunas sociais, revistas e compêndios em livros específicos do
gênero.
Em Investigando, a proponente do APC 579 apresenta o texto O instante sob um
olhar (sem indicação do autor), que abordará a crônica como o gênero do disfarce, cujo
complicador está em sua definição que titubeia entre o jornalismo e a literatura.
A proposta de atividades toma uma notícia jornalística, da Folha de S.Paulo que
trata sobre o conflito ético, um caso de doação de rins que deu polêmica no Reino Unido
pelo fato de a clínica exigir que o órgão fosse de doador branco, o que originou a crônica
de Scliar, A cor dos nossos rins. Em seguida, a proponente mostra uma análise sua que
servirá de exemplo a quem for pesquisar seu APC. Há a contextualização com um texto
que trata de preconceito, levantando questões para debate, versando sobre ética e
discriminação racial. Na perspectiva interdisciplinar estão contempladas as áreas das
Ciências Biológicas, História, Sociologia e Filosofia e pergunta, para o fórum de
46
discussões, se o professor interessado no tema concorda com que o trabalho realizado no
APC pode contribuir para a formação de um aluno crítico, ético e cidadão.
Esse APC, até o presente momento, não conta com a colaboração de nenhum
professor, prevalecendo, ainda, o uso do singular para se referir à proponente. Como
observamos, em suas propostas de atividades, ocorre também o que já estamos
acostumados a presenciar no LD, que apresenta um modelo de tarefas usuais para o
professor seguir passo-a-passo. Há, entretanto, um leve esboço, um gesto de autoria, pois a
proponente indica caminhos para as leituras necessárias ao professor que desejar preparar
sua aula, cujo tema se encontra analisado e comentado no APC, com pistas que direcionam
para um aprofundamento do mesmo. É aí que está a novidade desse espaço destinado aos
professores. Ao menos agora ele pode se sentir estimulado a produzir textos, e ter esses
divulgados em rede, mesmo que sejam simples comentários em cada recurso que elabora
no APC. A idéia de colaborar com seus pares pode lhe proporcionar prazer e
reconhecimento pelo trabalho que desenvolve e que, muitas vezes não atravessam os
muros da escola em que leciona.
5) APC 593 – Publicado em 16-03-2004 / 1ª Colaboração em 21/03/2005 / 799 acessos.
O APC 593 trabalha o conteúdo literários e de entretenimento. A proponente
desse APC conta com a participação de um colega, professor colaborador, ao realizar
sugestão de leitura. Não aparece o recurso Paraná, e o Relato se dá sob a forma de uma
descrição do que será o APC, ressaltando sempre a importância de se resgatar histórias que
ficaram no imaginário social, recordando a vida como acontecia no passado das pessoas
mais experientes. Aparecem quatro sugestões de leitura, inclusive, sugerindo a obra de
Luis C. Cascudo, grande escritor sobre o folclore brasileiro. Com exceção de Morte e Vida
47
Severina, de João Cabral de Mello Neto, que traz a referência bibliográfica, as demais
sugestões estão (pelo menos estavam) disponíveis na internet até o momento da pesquisa
que originou esse APC.
Em Imagem, há a figura da gralha azul, símbolo do Paraná, que também é
personagem de uma lenda paranaense. Eis a relação com o tema. Três sítios encaminham o
pesquisador para endereços que tratam do assunto, com muitas curiosidades e personagens
folclóricas e caricatas, como o Jeca Tatu, Malasartes, entre outras. No recurso Sons e
Vídeos, a proponente do APC 593 indica um filme de Mazzaropi, música de Tonico e
Tinoco, ícones do sertanejo, sugerindo trabalho com as variações lingüísticas. A notícia foi
retirada de uma revista on-line, acessada em agosto de 2003 pelo endereço
http://www.unicamp.br/folclore/Congresso/congresso.htm, e fala de um congresso em que,
entre outros temas, se discutiram os contos de tradição popular.
Uma curiosidade interessante é o texto Velório, de Alceu Maynard Araújo, que
recorda as cantigas e contos que ocorriam nos velórios antigamente. A proponente sugere
atividades em que se promova encontro de alunos e pessoas mais velhas para que essas
lhes contem as histórias do passado. Sugere, também, trabalhar a linguagem oral e escrita,
lendo e interpretando textos sobre o tema em estudo, bem como análise das figuras de
linguagem. Contextualiza com a sexualidade presente nos contos e propõe mais atividades
(Observamos que ocorrem propostas de atividades em outros recursos e não apenas em
Propondo Atividades.). Diz a proponente que contextualiza com o meio ambiente, com a
vida que temos, na correria do dia-a-dia, com os contos populares/mentira/ética, com a
pluralidade cultural, com a saúde e os processos naturais de cura de nossos antepassados.
Sugere um trabalho interdisciplinar com Biologia, em função do uso de ervas para
tratamento de saúde; com Geografia, procurando localizar onde se encontram as ervas;
48
com Português, na análise de textos que tratam de assuntos dessa natureza. Aqui também a
proponente dá sugestões de atividades, quando diz que “na prática, com seus alunos, o
professor pode fazer um chá na cantina, um calmante, usando, por exemplo, a hortelã. E
explicar para que ele serve e também sua dosagem, além de fazer o experimento claro”.
Ela deixa a seguinte questão para o Fórum de debates: “como é que o conto de tradição
popular pode sobreviver numa sociedade em que apenas algumas pessoas o resgatam?” Em
seguida diz que, por causa da pós-modernidade, essa questão fica difícil de responder.
Partindo dessa questão posta em discussão no fórum, podemos observar que a
preocupação da proponente reside na ausência de memória que as pessoas podem ter em
função da vida agitada que se tem na “pós-modernidade” (sua fala). Os contos conhecidos
no passado vão caindo no esquecimento coletivo. Entretanto, esquece-se a proponente de
que a vida urbana, em todos os tempos, contribui para narrativas que também deveriam
compor o imaginário social coletivo, especialmente as conhecidas lendas urbanas (urban
legends). Os apontamentos nos vários recursos desse APC, assim como as sugestões de
atividade, reproduzem conhecimentos que estão ao alcance de todos. Contudo, pela
iniciativa de tecer essas conexões, as proponentes (agora no plural, considerando a
colaboração na sugestão de leitura), realizam um gesto de autoria, que também se dilui na
parceria. Autoria cuja determinação, especificação, tende a se decompor cada vez mais, a
cada colaboração de um professor nesse trabalho, conforme o que preconiza Foucault
(1992).
6) APC 647 – Publicado em 27-04-2004 / 667 acessos.
O conteúdo do APC 647 é Literários e de entretenimento, focado em peças de
teatro. O Proponente desse objeto não postou material apenas no recurso Sons e Vídeos,
podendo esse ser completado por um colaborador.
49
No recurso Paraná, o proponente apresenta um breve histórico do Teatro Guaíra.
Em seu relato, questiona o fato de a maioria dos trabalhos com teatro não contemplarem a
produção escrita dos alunos. Estes apenas encenam, reproduzindo um texto qualquer.
Dessa forma, o proponente objetiva fornecer elementos que contribuam para que ao alunos
produzam o gênero de texto teatral, utilizando sua estruturação básica.
A bibliografia sugerida pelo proponente do APC 647 contempla textos divertidos e
irreverentes, que auxiliam o professor nessa prática pedagógica, no trabalho com teatro;
textos de releituras de peças famosas, como de Willian Shakespeare, em textos narrativos;
estudos sobre a dramaturgia; livro didático, de João Domingues Maia que, além de abordar
os diversos gêneros discursivos, traz um capítulo somente sobre texto teatral e sobre roteiro
de teatro. Um livro de Boal, que oferece métodos para condicionar o corpo e a mente, não
apenas destinado a profissionais do teatro, mas para todo tipo de leitor que vê no conteúdo
um modo terapêutico para aliviar o estresse do cotidiano: obras infanto-juvenis de fácil
leitura, como coletâneas de Maria Clara Machado e apostilas contendo textos que mostram
a importância da interatividade que deve existir entre teatro e a educação.
Sobre a imagem não há nenhum comentário. Trata-se de uma gravura em que uma
pessoa levanta um tecido esvoaçante e transparente à altura do rosto. Os sítios somam seis
e tratam dos teatros enquanto locais e funções, bem como de peças teatrais. A notícia
aponta para uma reportagem da revista Veja, de junho de 2003, cuja matéria relata o
virtuosismo dos comediantes americanos em programas de TV ao vivo e outra matéria que
mostra o ecletismo de Giulia Gam ao interpretar papéis densos
12
diante das câmaras e no
teatro.
12
Refere-se, por exemplo, à personagem Heloísa, da telenovela da Rede Globo, Mulheres Apaixonadas, de
Manoel Carlos, cujo ciúme doentio pelo marido levava a atos extremos como atentado contra a vida dele.
50
Como curiosidade, a vida de Paulo Autran, considerado o maior ator do teatro
brasileiro, antes da fama, podendo ser acessada no sítio:
www.colmagno.com.br/sampasite/autran.htm. Investiga sobre a importância do teatro,
como esse veículo pode contribuir para a transformação social e humana, derrubando os
muros do preconceito.
No APC 647, as atividades são propostas de forma deôntica, ou seja, a propositura
se dá no imperativo, dirigindo ao interlocutor - professor que acesse o Portal – orientando-
o passo-a-passo como deve fazer para compor uma peça de teatro, tomando, para isso, um
texto curto (como o conto) e de fácil assimilação. Lembra de como se dá o relato do
trabalho. Que os alunos não estão acostumados a produzir peças, e sim, adaptá-las dos
textos. Pois bem, aqui as orientações seguem de modo a atingir o objetivo principal do
proponente. Ele dá os comandos e exemplifica como deve aparecer cada tópico: título,
prólogo, cenário, personagens, montagem dos diálogos, falas dos personagens com
rubricas, seguindo sempre o roteiro da narrativa, apenas o que é de fácil compreensão por
parte dos alunos. E somente após esse exercício é que o professor passa a solicitar dos
alunos a encenação de uma peça de autoria deles mesmos, formando grupos de trabalho,
que montarão suas peças de teatro e as apresentarão entre si. Acreditamos que, se assim
ocorrer, estará atingindo seu objetivo, que se justifica na produção de peças de teatro pelos
alunos.
Segundo esse proponente do APC 647, o professor pode contextualizar o teatro
com as situações de interação verbal que ocorrem, como numa entrevista de emprego, em
que o candidato a uma vaga na empresa saiba ter o controle da situação e manter sempre o
equilíbrio de um ator, ao que nos parece. Também podem-se construir quadros de
exposição (essa contextualização não ficou bem clara), utilizando os alunos como atores,
51
preparando-os para a realidade fora do âmbito escolar. Sugere que o tema pode ser
trabalhado interdisciplinarmente, porém não aponta para nenhuma área do conhecimento
da grade curricular, repetindo o que já disse anteriormente na sua investigação. Propõe
para o fórum uma reflexão sobre a importância ou não da produção do texto teatral para o
crescimento intelectual dos nossos alunos.
A questão da autoria traz à baila outros fatores que carecem de uma análise mais
detalhada, como o que se entende por originalidade e por sujeito fundante. O que ocorre,
pelo que observamos, é um rearranjo das idéias, partindo ou não de uma experiência bem
sucedida por parte do proponente. E, analisando o contexto em que esses trabalhos estão
surgindo, com o uso das ferramentas digitais e com a oferta desse espaço virtual, no Portal
Dia-a-Dia Educação pela SEED, podemos dizer que um novo modo de fazer educação já
não está tão longe do real. E, um pouco mais otimistas, visualizamos, não somente um
acervo de conteúdos disponibilizados aos professores do Paraná, mas também uma nova
maneira de fazer educação, focando sempre a formação continuada dos docentes que não
encontrarão mais tanta dificuldade de compreender o comportamento dos educandos. O
gesto de autoria aqui se revela na maneira criativa e na preocupação do proponente em
fazer algo diferente do que normalmente ocorre no ensino de produções de texto com a
finalidade de dramatização.
7) APC 651 – Publicado em 12-04-2004 / 707 acessos.
O APC 651 traz as canções populares, conteúdo focado para os literários e de
entretenimento. Não preenche todos os recursos e também não conta com nenhuma
colaboração (ficam de fora Sons e Vídeos, Curiosidades, Investigando,
Contextualizando e Perspectivas Interdisciplinares). No recurso Paraná, a proponente
52
apenas fala da importância da música popular brasileira como local em que encontramos
recursos lingüísticos e sonoros, questões sociais interessantes para o trabalho em sala de
aula. Seu relato consiste na sua mudança de postura frente ao estilo musical de preferência
dos alunos. Nele não encontramos qualquer vestígio de fundamentação baseado em alguma
teoria ou em alguma sistematização de conhecimentos. Ao mesmo tempo em que relata
uma experiência que teve com alunos do Ensino Médio, propõe atividades que podem ser
desenvolvidas, entendendo a escola como meio de transmissão e acesso à cultura para os
jovens das escolas públicas, questionando o quanto eles poderão conhecer sobre o que teve
de melhor em nossa música e em outras épocas, levando-os a uma reflexão crítica sobre
suas preferências musicais e sobre as opções existentes em sua realidade. Propõe um
levantamento das preferências em forma de pesquisa quantitativa e diagnóstica, para
apresentá-la posteriormente à comunidade escolar. Essa pesquisa e o paralelo entre
temáticas abordadas nas canções de Cazuza, Renato Russo e Raul Seixas dão lugar à
pesquisa sobre drogas, AIDS, culturas estrangeiras e nacionais para identificação do grau
de influência disso tudo na vida dos alunos. Os resultados são expostos em murais para
conhecimento de todos.
A sugestão de leitura se baseia em livros que trazem a história da MPB em suas
diversas fases, bem como aqueles que trabalham com as paródias e paráfrases, recursos
estilístico e metodológicos e livros que falam ao professor sobre a estética da recepção na
formação do leitor. Além disso, remete à leitura de um livro biográfico sobre o compositor
Cazuza, escrito por Lucinha Araújo e Regina Echeverria, reunindo toda a obra do cantor,
além de fotos e esclarecimentos sobre a ONG Sociedade Viva Cazuza, dirigida por sua
mãe (Lucinha Araújo). Também sugere a leitura de O Trovador Solitário, sobre a vida de
Renato Russo, escrito por Arthur Dapieve.
53
A imagem é aquela mesma do APC analisado anteriormente, a da pessoa que
levanta um tecido transparente e esvoaçante à altura da cabeça, sem comentários. Apenas
fala da bandeira do Paraná que tem notas musicais assim como no mapa (julgamos ser essa
relação uma inferência da proponente). Talvez o tecido, como uma bandeira flamulando,
simulando um ritmo, assim lhe pareça com uma cadência musical. Trata-se, portanto, de
uma dedução nossa.
Os sítios indicados vão falar também da vida dos cantores Cazuza, Renato Russo e
Raul Seixas, mostrando a cara do rock brasileiro.
A propositura de atividades retoma o aspecto da intertextualidade presente nas
canções dos referidos compositores, estimulando uma produção escrita seja sob a forma de
paródia, paráfrase, ou mesmo textos dissertativos que tenham relação com ideologia,
drogas, doenças e violência. Usa, para isso, as músicas Ideologia e Brasil, de Cazuza; Que
país é este? E Geração Coca-Cola, de Renato Russo; Metamorfose Ambulante, de Raul
Seixas. Deixa, para o Fórum, a questão: “Em que aspecto comportamental e social a
música dos anos 70 e 80 influenciaram a sociedade da época e a atual?”
A proponente desse APC reproduz uma experiência, relatando como aconteceram
as aulas em que tentou trabalhar as canções que julgava pertinentes para uma boa aula de
Português e que atendiam suas preferências musicais. No entanto teve de repensar sua
metodologia e propositura, fazendo uma investigação, primeiramente. Depois, então,
passaria a analisar, com os alunos canções que eles mesmos tivessem escolhido. Sem
fundamentação teórica que embasasse seu trabalho, partiu para as ações. Na realidade, esse
procedimento que o professor adota para o preparo de suas aulas, pressupondo uma boa
aceitação por parte dos receptores, sem ao menos considerar a opinião do outro envolvido
nesse processo, é o modelo que está posto na tradição do fazer pedagógico. O impasse
54
decorrente dessa imposição provocou mudança de atitude do professor, bem como um
replanejamento de suas atividades, para que seu objetivo fosse alcançado. Apontamos,
pois, aí um gesto de autoria, considerado pela reorganização dos conceitos de quem ensina.
8) APC 904 – Publicado em 29-10-2004 / 1ª Colaboração em 29-10-2004 / 2ª
Colaboração em 14-09-2005 / 1266 acessos.
O APC 904 contempla o conteúdo de divulgação científica, especificamente o
hipertexto. Um tema que, ao nosso ver, está imbricado com esta investigação que ora
fazemos no ambiente virtual. Apresenta-se completo e sem qualquer colaboração de outro
professor. O recurso Paraná tem Alice Ruiz, poeta haicaísta, que fora casada com Paulo
Leminski, escritor paranaense, como representante de nosso Estado, embora a proponente
não mencione o local de origem de Alice. Toma um de seus haicais para tecer relação com
o tema que abordará em seu trabalho e apresenta uma trajetória cronológica da vida
profissional da escritora, a julgar pela importância de sua obra para o nosso Estado.
No relato, a proponente do APC 904 nos convida a “surfar” nas ondas da Internet,
onde, segundo ela, “navegar é viajar pelo saber”. Considera que essa busca pelas
informações confirma o processo interacionista apregoado por Vygotski, para quem a
aprendizagem se dá como um processo gradual de desenvolvimento por meio da interação
sócio-histórica do indivíduo. Dá a definição de hipertexto como aparece na Enciclopédia
Colúmbia, “técnica que organiza bancos de dados computacionais ou documentos para
facilitar a recuperação não-seqüencial da informação...” A proponente ainda transita pela
definição do termo e ilustra seu comentário com exemplos vistos em obras de Machado de
Assis, como em Memórias Póstumas de Brás Cubas, texto que inicia pelo final e
trabalhado sem preocupação com a linearidade, e sim com elegância em relação ao leitor.
55
Nesse relato ocorre a citação de Barthes quando se refere ao texto ideal, que considera um
entrelaçamento de redes significativas e interdependentes entre si, que proporcionam, desta
forma, múltiplas entradas e saídas. Traz a referência do autor citado e o faz apenas no
corpo do texto.
Na sugestão de leitura, a proponente do APC 904 aponta para Roger Chartier, com
a obra A aventura do livro: do leitor ao navegador; para Ingedore V. Koch, com o livro
Desvendando os segredos do texto, e Joaquim Salvador Lavado Quino, com a obra Toda
Mafalda: Da primeira á última tira; além de endereço na internet que trata sobre hipertexto
e mapas conceituais.
A imagem é de um gráfico, de um mapa conceitual, em que um tema central
remete a vários outros, lincados entre si pela significação e relação temática.
Os três sítios indicados nos remetem a informações sobre a internet e como essa
funciona: hipertexto, web, navegador, URL etc. Pelos sítios podemos ter a noção da
dimensão que tem o livro e da dimensão do hipertexto.
Como uma onda, música de Lulu Santos, é uma das indicações do Sons e Vídeos,
por ter relação direta com navegar, “num indo e vindo infinito”. O filme Minority Report
A nova lei, de Steven Spielberg, mostra um mundo cibernético em que a tecnologia está
muito avançada e serve de referência nesse APC. Com o áudio em MP3, a música Sangue
Latino, da banda Secos e Molhados, fala de quebra de paradigmas, o que ocorre com o
hipertexto em relação à linearidade quase total do texto impresso.
A notícia aparece sob a forma de uma resenha em que Rudney Flores, da Gazeta do
Povo-PR, ressalta a mistura de vários gêneros no filme O Homem que Copiava, uma
viagem pela fragmentada e caótica mente de André, personagem de Lázaro Ramos,
56
dirigido pelo gaúcho Jorge Furtado. Não há, por parte da proponente, comentário da
resenha.
Como curiosidade, a proponente do APC 904 fala do texto Movimento no olhar, de
Humberto Eco, que trata tão bem da obra aberta, o que provoca no leitor o deslocamento
contínuo de um texto a outro, observação de aspectos sempre novos, numa contínua
mutação. Fala ainda de uma matéria da revista Superinteressante sobre o termo hipertexto.
A título de investigação, esse APC não traz novidades, apenas é um espaço a mais
em que a proponente se preocupa com a prática do professor. Propõe, então, que o
professor faça uma interação com o passado, analisando a obra machadiana em que esse
escritor interage com o leitor, a exemplo do intertexto. Não fica claro, entretanto, de que
obra se faz ou se propõe para o trabalho, as respostas a perguntas de Machado de Assis.
Propondo atividades, nesse APC, consiste em que o professor acesse um sítio de
interesse dos alunos para verificar as possibilidades de leitura e de produção textual,
sempre sobre o crivo do educador. A segunda atividade sugere uma simulação do
hipertexto em que a classe, dividida em grupos de 5 ou 6, trabalhe com vários recursos
para leitura: desenhos, colagens, músicas. Cada trabalho funcionará como um linque para
composição do hipertexto. Depois, faz-se uma avaliação sobre o trabalho para que se
percebam as diferentes formas de assimilar uma informação. Outra atividade que se propõe
é a produção de uma narrativa em grupo, subdividido em equipes menores, para que cada
uma delas componha um elemento da narrativa, conforme o mote proposto pelo professor.
Assim a história poderá ser composta de diversas maneiras.
A proponente do APC 904 diz que o hipertexto pode ser contextualizado com o
texto impresso, pois que esse não passa de mais uma ferramenta, um recurso possível em
função do surgimento das novas tecnologias digitais. Não menciona, porém, que também o
57
texto impresso pode ser considerado um hipertexto, pelas referências a outros textos, pela
intertextualidade que apresenta.
Como perspectiva interdisciplinar, a proponente vislumbra um intercâmbio entre
as disciplinas sem que se privilegie uma em detrimento das outras. Afirma a proponente
que qualquer disciplina está atravessada pela hipertextualidade, porém se faz necessária a
intervenção do professor no sentido de os educandos contarem com pelo menos um ponto
de partida.
E a pergunta para o Fórum está na forma como o hipertexto pode contribuir para a
atuação do professor e do aluno no processo de aquisição de conhecimentos. Tal questão
traz como conteúdo o que Nelson de Luca Preto
13
considera sobre a nova escola brasileira,
como aquela em que se possa “trabalhar uma multiplicidade de visões de mundo”.
As proposições aqui parecem bastante provocantes. Terá, o professor, de criar
situações parecidas com a ordem/desordem das múltiplas vias de acesso do internauta. Os
exemplos utilizados para mostrar a fragmentação constituinte de uma obra televisiva ou
literária são pertinentes ao objetivo que se pretende. Por conta das sugestões da proponente
é que podemos dizer que visualizamos algum gesto de autoria. Não podemos negar que
esse modo de organizar o que está posto está para a criança da atualidade da mesma forma
que a linearidade está para as gerações passadas. Atitudes como as que observamos nesse
APC certamente poderão aproximar educandos de educadores no envolvimento com um
trabalho significativo no processo de ensino e aprendizagem.
9) APC 1114 – Publicado em 27-09-2004 / 746 acessos.
13
Em PRETTO, Nelson de Luca. Uma Escola Sem/ Com Futuro. São Paulo: Papirus, 1996.
58
No APC 1114 foram trabalhados todos os recursos, entretanto não conta com uma
questão para discussão no fórum. O conteúdo de imprensa é norteado pelo tema
reportagem. No recurso Paraná, a informação sobre o índice de violência urbana e rural se
dá em função de ser esse um assunto preocupante no Estado. O relato do APC trata do
gênero reportagem como um dos mais “nobres” do jornalismo que, além de evidenciar os
grandes jornalistas, contribui para despertar a criatividade nos alunos em sua produção
escrita. E, com base no que traz o livro de Hermínio Sargentin, Curso Básico de Redação
2, o proponente traça um roteiro das exigências a que se submete esse gênero discursivo,
desde o resumo (lead), passando pela identificação das pessoas envolvidas, o aspecto
peculiar da história, com os fatos recentes da notícia.
O proponente desse APC aponta, além do já mencionado autor, Sargentin, algumas
sugestões de leitura, como Oficina de Redação, de Leila Luar Sarmento; Violência na
Escola, Caos na Sociedade, de Maurício da Silva, livro que trata do tema violência, sob o
prisma da reportagem; Estrutura de textos midiáticos, matéria encontrada no sítio de
jornalismo da UFSC e duas reportagens da Revista Época (edição de abril e julho de 2003).
A imagem se relaciona com o APC por mostrar uma cena do caótico trânsito de uma
cidade grande, não apresentando, contudo, qualquer comentário por parte do proponente
(isso pode ser feito por um outro professor que, por ventura venha a se interessar pelo
tema).
Todos os sítios indicados trazem como tema a violência, o que revela ser esse o
tema preponderante nas matérias jornalísticas do nosso País. Os sons e vídeos seguem o
mesmo caminho, em que a violência ganha caráter imperativo, como nas letras das
músicas: Reféns da violência, do grupo Tribo de Jah; A violência travestida faz seu
Trottoir, do grupo Engenheiros do Havaí e Estado Violência, do grupo Titãs.
59
As notícias são retiradas do Jornal Hoje on-line, veiculado pela Rede Globo de
Televisão, disponível na internet, podendo ser acessado pelo sítio da emissora e também do
jornal on-line da Universidade Tuiuti do Paraná. O proponente apenas apresenta as
notícias, sem tecer qualquer comentário sobre elas.
Como curiosidade, o APC 1114 apresenta alguns dados estatísticos sobre o tema
violência, com base no perfil das vítimas que realizaram exame de corpo delito durante o
ano de 1988, em Curitiba; dados sobre a criminalidade, em Ponta Grossa e sobre a
violência no campo, que aumenta consideravelmente no Paraná. Os textos das curiosidades
encontram-se on-line. O que podemos observar é que o que se considera curiosidade, nada
mais é do que notícia. O recurso Investigando traz, sem dúvida, uma matéria jornalística
para representar o gênero reportagem, contemplando a manchete, lead, desenvolvimento
do texto, elementos básicos de uma reportagem.
Neste APC, fica difícil fazer distinção entre os conteúdos e os recursos, uma vez
que todos tratam de reportagens, matérias sobre a violência, aquilo que mais chama a
atenção da população, o que garante também a vendagem do material informativo.
Como proposta de atividades, o proponente do APC 91114 relata um projeto
elaborado por ele e que possibilita um trabalho interdisciplinar, embora o professor em
questão não faça distinção entre os termos contextualização e interdisciplinaridade. Trata-
se de uma proposta de reportagem em que os alunos, divididos em grupos, farão um
levantamento dos problemas familiares, para entendimento da onda de violência nas
escolas e na sociedade em geral. Os trabalhos produzidos serão reunidos em textos de
reportagens a serem trabalhados nos colégios e divulgados, se possível, na imprensa
escrita, o que garante, segundo o proponente desse APC, a validação do projeto de estudo.
60
Dessa forma, os alunos, sempre na visão do proponente, estarão desenvolvendo
criatividade e autonomia, além de estarem sendo responsáveis por suas idéias e ações.
A contextualização se dá com o texto Ética e Cidadania – A luta contra a
violência, do professor Antônio I. P. Heckler, criador do APC 1114, podendo ocorrer a
interdisciplinaridade com as áreas de Língua Portuguesa, Geografia, Matemática,
Estatística, Ética e Cidadania. Não apresenta questão para o fórum de discussões.
O que nos chama a atenção no recurso que sugere a contextualização é o fato de ser
usado um texto de um outro colega, disponível nesse ambiente colaborativo. Ou seja,
percebe-se que a idéia de colaboração já está acontecendo no próprio espaço ofertado pelo
Portal. É, portanto, a iniciativa do professor-autor-colaborador que o fará mais ou menos
autor, cujo gesto desliza o já-dito para uma nova propositura de fazer pedagógico. Quanto
mais acessos ao ambiente, maiores as chances de diluição do autor, que passará do
individual ao coletivo nesse emaranhado de vias informacionais no ciberespaço.
10) APC 2017 – Publicado em 17-08-2004 / 1ª Colaboração em 14-10-2004 / 2ª e 3ª
Colaboração em 18/10/2004 / 1146 acessos.
O APC 2017 apresenta-se completo, tendo seu proponente recebido a colaboração
de três professores da rede pública, nos recursos Sítio, Propondo Atividades e
Curiosidades. O objeto contempla o conteúdo Instrucionais, com o tema roteiros. Sobre
o recurso Paraná, vemos nesse APC a divulgação do acervo de vídeos que podem ser
acessados pelo Portal Dia-a-Dia-Educação do Paraná e uma informação a respeito do filme
do escritor londrinense, Domingos Pellegrini, que conta a história do café no Norte do
Estado. E traz em anexo um arquivo com maiores detalhes.
61
O relato desse APC faz uma crítica ao mau uso dos recursos tecnológicos que as
escolas possuem, justificando-se, por um lado, pela tecnofobia ou mesmo pela resistência
dos professores diante do novo; por outro lado, pelo descaso proveniente dos maus
políticos e pelo monolitismo dos gestores que trancam o maquinário a sete chaves, com
receio de que seja estragado pelos usuários, professores e alunos. Dessa forma, a tendência
da escola é caminhar pela contramão do progresso, e a prática pedagógica continua se
dando com cuspe e giz. Diante desse quadro, o proponente traz uma proposta para
dinamizar, incentivar e orientar a utilização de programas de TV e vídeo na escola, o que
será feito com a inserção de colaborações nos APC.
Como leituras são sugeridos o artigo da professora Leda Maria Rangearo
Fiorentini, disponível na Internet e que trata de questões pedagógicas e curriculares da
formação continuada de professores a distância, e da mesma autora um trabalho, também
na Internet, falando da série TV na Escola e os Desafios de hoje. Sugere ainda a leitura do
roteiro de documentário sobre a história do café no Norte do Estado, de Domingos
Pellegrini, disponível no Portal. Um livro de Joan Ferrés, Vídeo e Educação, considerado
grande referência em matéria de vídeo na educação, que justifica o uso de vídeo na escola
vinculado a uma base de sustentação teórica.
As seis imagens postadas lembram o uso da tecnologia que auxiliam na
comunicação humana: radares, antenas, observatórios, placa de computador, fotografias do
planeta Terra e de pessoas envolvidas com trabalhos que sugerem envolvimento com essa
tecnologia. No comentário das imagens apenas a lembrança aos professores para que
orientem os alunos desde cedo a fazerem bom uso dos meios de entretenimento de massa,
revertendo o resultado para o fortalecimento de sua identidade enquanto sujeito pensante.
Os sítios visitados e indicados – agora pelos proponentes, no plural, já que esse recurso
62
recebeu colaboração - recuperam o que já foi mencionado no relato, momento em que o
pesquisador se depara com trabalhos voltados para a educação a distância, apresentados
pela TV Escola. Além de promoverem o pensamento crítico sobre a mídia, esses sítios
ensinam como produzir roteiros e filminhos curtos para televisão, assuntos contemplados
nas ações do Ministério da Educação.
Para o recurso Sons e Vídeos, o proponente do APC 2017 se reporta aos trabalhos
já mencionados anteriormente que estão no acervo do CETEPAR – TV na Escola e os
desafios de hoje. Nesse material, o professor terá lições de como compreender o universo
da linguagem audiovisual televisiva, aprofundando, conseqüentemente, o conceito de
interatividade.
Retirada do sítio da prefeitura de Londrina, a notícia que compõe esse APC fala de
um trabalho que a Secretaria Municipal da Educação desse município desenvolveu, com
palestras educativas para os pais. Tal projeto objetiva conscientizar os pais para o controle
do uso da televisão, refletindo sobre os programas de desenhos infantis a que seus filhos
assistem, nos quais, normalmente ocorre o predomínio da violência.
A história da televisão brasileira aparece como curiosidade nesse APC 2017,
destacando o primeiro beijo dado na frente de uma câmara. Uma outra curiosidade foi
postada por um outro pesquisador, que relata uma experiência bem sucedida quanto ao uso
do laboratório de uma escola em que lecionava nas imediações de Maringá-Pr.
O recurso Investigando traz considerações do pesquisador Joan Ferrés e de Maria
Goreti A. Staditlober (proponente do APC 2170 e colaboradora neste) sobre vídeo, escola e
o ambiente de aprendizagem colaborativa com tecnologias interativas.
63
A propositura de atividades consiste em orientação para que o professor se utilize
da função metalingüística das imagens e, assim, propor um trabalho de criação de vídeo,
falando sobre o vídeo e de como se procede para a realização de uma produção televisiva
com conteúdos pertinentes ao currículo escolar. Também são propostas atividades sobre
telejornal, uma adaptação do módulo 3 do curso TV na Escola e os Desafios de hoje, em
que são assistidos a alguns filmes para, depois, a criação e a apresentação de um telejornal
pelos alunos. Segue a essa apresentação uma avaliação em grupo, em que se reflete sobre
as atitudes que ocorreram durante a produção da atividade. A terceira atividade orienta
para a produção de um roteiro para vídeo digital, seguida de uma indicação de sítio que
traz exercícios para aprender a produzir vídeos. Esse recurso também recebeu a
colaboração de outro professor.
O APC 2017 contextualiza-se com a realidade que vivem os alunos, em meio à
exploração do erotismo infantil veiculado pela televisão, o que pode suscitar debates para
reflexão de todos os envolvidos na educação. Segundo o proponente desse APC, o trabalho
com o vídeo precisa ser dinâmico, ter vida, para atrair o interesse dos alunos,
proporcionando um vôo pela imaginação, sendo possível uma abordagem nas múltiplas
disciplinas. Isso também contribui para que os alunos percebam as ideologias presentes
nas produções televisivas de emissores diversos. E termina com uma questão para o
fórum: “Como extimular (sic.) os jovens a expressarem-se pelo audiovisual na escola?”
Possivelmente, essas práticas sugeridas já tenham sido utilizadas pelos professores
no seu fazer de todo dia, entretanto o que se considera aqui é o registro por escrito e
registrado na forma de objeto de aprendizagem no Portal Educacional do Paraná. Os
acervos literários e midiáticos há muito tempo existem na SEED e também nas escolas. O
que não vem acontecendo é o uso satisfatório desse material. Eis que surge o momento
64
para todos os professores “desavisados” ou mesmo desatentos com relação aos meios
disponíveis fazerem bom uso dessa oferta.
A partir do momento em que essas experiências são colocadas em rede e
compartilhadas entre os pares de várias localidades do Estado, a probabilidade de acesso a
elas e, por conseqüência, de melhoria na qualidade de ensino aumenta visivelmente. E
assim podemos nos deparar com os gestos de autoria presentes nos APC, mesmo que
dissolvidos em função das colaborações que acrescentam informações ao já posto.
11) APC 2170 – Publicado em 20-10-2004 / 1ª Colaboração em 06-12-2004 / 884
acessos.
O APC 2170 apresenta-se na íntegra, tendo a colaboração de outro professor na
elaboração do recurso investigando. Esse APC trabalha com o conteúdo Literários e de
entretenimento, focando o poema como tema principal. Paulo Leminski, escritor
paranaense, com seus versos, representa o recurso Paraná. Nas palavras do poema
escolhido está a liberdade do poeta. O que sustenta o trabalho da proponente desse APC,
com base no seu relato, é o argumento que usa para dizer que as “aulas de português
poderão tornar-se vivas, autênticas, quando ancoradas na poesia como conteúdo ou
metodologia de ensino”. Traça considerações sobre o que é poesia e sobre as características
desse gênero, citando um trecho de um texto adaptado de autor desconhecido, In Calkins,
L.M. A arte de ensinar a escrever. O desenvolvimento do discurso escrito. Finalmente
propõe, a quem acessar seu objeto de aprendizagem, uma viagem a algumas possibilidades
metodológicas da poesia.
65
Como sugestão de leitura, recomenda o livro A arte de ensinar a escrever. O
desenvolvimento do discurso escrito, especificamente o capítulo que trata da poesia, pois o
texto propõe desafios possíveis a serem superados no percurso da criação que contará com
a criatividade do aluno. Sugere, ainda, leituras em que são apresentadas experiências
pedagógicas cujo pensamento cognitivo se integra ao pensar poético, emocional e afetivo
do aprendiz. Outro livro sugerido, A Historia Concisa da Literatura Brasileira, de Alfredo
Bosi, é referência tradicional em Literatura Brasileira. Contribui para o aprofundamento
nas leituras de poesia e para o acervo pessoal sobre as tendências contemporâneas na arte
da palavra.
A imagem selecionada para figurar nesse APC é uma composição de cores
sobrepostas, com a inscrição OM no centro, significando o som do Universo e GO nos
quatro cantos, simbolizando a diversidade. É uma figura que se relaciona muito com a
poesia concreta, o que justifica sua presença nesse trabalho. A proponente considera que se
constitui tarefa do professor o despertar do aprendiz para a criação poética, essência de
toda a educação.
Os sítios sugeridos para a pesquisa remetem o pesquisador para material com
riqueza de conteúdo utilizável para o ensino de poesia concreta. Em outro endereço, o
poeta é orientado a buscar a palavra certa para dizer ao outro. E um terceiro sítio a paixão é
o que deve tomar conta do poeta para que esse se reconheça como tal.
No quesito Sons e Vídeos, a proponente desse APC 2170 indica o vídeo Poetas de
Campos e Espaços, de Cristina Fonseca, veiculado na TV Escola e disponível no acervo do
CETEPAR. Trata-se de um documentário, um histórico da poesia concreta no Brasil.
A notícia, Arte na era dos biobots, por Fernanda Nidecker, do Jornal do Brasil,
consiste em uma entrevista que Eduardo Kac concedeu à jornalista sobre a holopoesia,
66
linguagem verbal/visual que explora as possibilidades da palavra/imagem no espaço-tempo
holográfico. Um espaço em que corpo e máquina dialogam possibilitando o surgimento de
um novo tipo de contato: a telepresença. A entrevista vem em anexo, num arquivo que
pode ser acessado pelo URL ou baixado no formato PDF (essa linguagem técnica aos
poucos passará ao domínio do professor que trabalha com o ensino-aprendizagem em
ambiente virtual, utilizando-se das novas tecnologias digitais).
Como curiosidade, a proponente optou pelos textos A literatura de Atílio Bari que
trabalha com textos possíveis de interação, ou seja, o autor dá a vez para o leitor interferir
na leitura, propondo atividades multidisciplinares. E no final é proposta a montagem de
uma peça teatral, com apresentação da mesma e de um álbum das fotos que forem tirando
do cenário e da encenação.
A proponente, no item Investigando, traz para a discussão se as produções poéticas
que aparecem nos meios digitais podem se constituir em um gênero, da forma que Bakhtin
o concebe. Traz também um texto, Ciber e Poesia, acessável pelo sítio
http://www.ciberpoesia.com.br/index2.htm (acessado em setembro de 2004). Outra
ilustração desse recurso é o texto Ouvir poema, de Elena Lanari, poetisa
portuguesa e comentado num ensaio de Ferraz, disponível no sítio
http://www.eucanaaferraz.com.br/ensaio/ensaio_relampago.htm (acessado em setembro de
2004). Traz, ainda, o conceito de Basarab Nicolescu que diz que poetizar é celebrar as
bodas da masculinidade com a feminilidade, uma conciliação dos contrários, dualidade tão
natural na natureza da alma. Finalmente, nos deixa a questão: “Será que entendemos a
profundidade da dimensão criadora como um ato revolucionário, ético-estético, político?”
Houve, nesse recurso, a colaboração de outro professor.
67
No recurso Propondo Atividades, a proponente do APC 2170 trabalha com
sugestões de exercício com poesia. O primeiro deles se faz através da música como
elemento de sensibilização poética e corporal. Enfatiza a utilização da música como
recurso terapêutico, aliviando o estresse e estimulando a produção escrita. Tal recurso, por
si só, segundo o que pondera a proponente, garante a produção criativa de textos escritos.
Depois, acrescenta, a essa atividade, imagens que o professor solicita dos alunos ou que ele
mesmo leve para fazer a leitura de poemas. Essa leitura deve ser dramatizada com
alternância de voz. Como base teórica que valoriza a corporeidade, a proponente sugere a
leitura da obra O Corpo Fala, de Roland Tompakov e Pierre Weil. Outro exercício é a
criação de poema, com base em outros, para decompô-lo, usando o aplicativo power-point,
transparência, poema escrito em cartolina ou no quadro de giz. Sugere, como recurso
metodológico, algo parecido com o poema de Haroldo Campos, Nascemorre, texto que
possibilita diversas maneiras de composição ou decomposição. Esse trabalho está, segundo
ela, ancorado na teoria da complexidade. Avaliam-se os trabalhos pela criatividade nas
novas produções poéticas. Depois a proponente sugere trabalhos que explorem os outros
órgãos dos sentidos, como o olfato, o paladar. Também diz, nesse trabalho, que o ambiente
perfumado ajudará (facilmente) o aprendiz a se revelar como poeta, afirmação baseada no
conceito de dialogia do teórico Bakhtin, sem, contudo, explicitar como isso se dá. Uma
outra atividade consiste em explorar a imaginação com ilustrações (idéia já mencionada
anteriormente) e também um momento para meditação contribui para a criação de poesias.
Mensagens de auto-ajuda são bem vindas para ajudarem os alunos a escrever sobre as
percepções que tiverem.
A proponente contextualiza a poesia concreta com a desconstrução da simbologia
imposta pela censura à liberdade de expressão, valorizando as liberdades individuais.
Contextualiza com a crise política e econômica da década de 80, com inflação em
68
disparada. Ilustra com poema de João Cabral de Melo Neto voltado para essa temática de
crise no País.
Sendo o professor um “facilitador, aquele que desperta para a auto-educação”,
pressupõe a proponente que a poesia pode ser atravessada ou atravessar todas as disciplinas
da grade curricular. Propõe a seguinte questão para o fórum: “O que é conteúdo de Língua
Portuguesa e como desenvolvê-lo numa proposta que considere a expressão poética e
intuitiva do aluno?”. Tal questão se faz em função da confusão que os professores de LP
fazem entre conteúdos da disciplina com conhecimentos de gramática, atribuindo mais
valor a esses últimos.
Pelas conexões propostas que demonstram um investimento do professor
proponente do APC em entrelaçar textos, imagens e atividades que estimulam a
consciência da linguagem corporal, vislumbramos aí um gesto de autoria. No entanto, esse
APC também conta com a presença de um professor-colaborador em um dos recursos,
causando, então, uma diluição no papel de autoria. Apesar disso, preferimos manter o
singular quando nos referimos a quem deu origem a esse objeto.
Aos dois proponentes poderão se somar novos interessados, com idéias conexas ao
tema escolhido: o poema, aumentando, dessa maneira, a rede de possibilidades na hora de
se optar por um caminho.
12) APC 2602 – Publicado em 17-08-2005 / 632 acessos.
O APC 2602 contempla o conteúdo Literários e de entretenimento, focando o
gênero poemas como tema. Apresenta-se completo, contemplando todos os recursos, sem
colaboração até o momento desta análise. O recurso Paraná faz uma homenagem à
69
escritora, poeta do nosso Estado, Helena Kolody, que tão bem explorou a técnica japonesa
do haicai. Em um de seus livros, Música submersa, de 1945, apresenta poemas destacando
a desumanidade da Grande Guerra. A fundamentação do relato se baseia numa obra de
Carlos Drummond de Andrade e sua indignação em relação à II Guerra Mundial é retratada
em alguns de seus poemas de A Rosa do Povo. A proponente faz uma exposição desse
trabalho de Drummond a fim de fundamentar seu APC, ao mesmo tempo analisa alguns
poemas da referida obra. O objetivo desse trabalho, conforme diz a proponente, é
demonstrar aos alunos que escritores como Drummond se utilizam da poesia para
demonstrar seu sentimento em relação aos fatos que ocorrem no mundo.
Como sugestão de leitura não poderia deixar de aparecer a obra de Carlos
Drummond de Andrade citada no relato, A Rosa do Povo. O livro de Alfredo Bosi,
História Concisa da Literatura Brasileira, também é sugerido e traz matéria sobre o poeta
acima. Outro livro de Francisco Achcar, que analisa a obra desse poeta, A rosa do povo e
Claro Enigma.
A imagem é uma fotografia de uma multidão de pessoas tirada pelas costas, dando
a impressão de estarem todos numa concentração, ou à procura de uma ajuda. E a
proponente justifica sua escolha por achar que se parece com um grupo que vai até as
instituições de caridade para receberem alimentos, da mesma forma como ocorria na época
da Grande Guerra.
Os três sítios nesse APC também se reportam a Carlos Drummond de Andrade e
mencionam o poema já comentado anteriormente, seguido sempre de análises dos textos. O
Sons e Vídeos é composto pela indicação de uma áudio-fita em que se ouve a música Rosa
de Hiroxima, de Vinícius de Morais, remetendo ao poema já mencionado, A Rosa do Povo,
de Drummond. Também tem uma referência em que se encontra a letra dessa música.
70
O recurso Notícia fala do centenário de Drummond, em matéria publicada em
agosto de 2002, em O Escritor, jornal da UBE. E como curiosidade, o lançamento pelos
Correios, do selo em homenagem a Carlos Drummond de Andrade no seu centenário,
acontecendo no dia 30 de outubro de 2002 em Brasília (por sua importância e centro
político), e no dia 31, simultaneamente, em Itabira, cidade natal do Poeta, e no Rio de
Janeiro, cidade que o mesmo escolheu para morar.
O recurso Investigando fica por conta de uma pesquisa em que se pede aos alunos
para fazerem um levantamento das conseqüências da II Guerra Mundial na vida das
pessoas em geral, com base nas informações que eles têm das guerras da atualidade,
comparando-as e fazendo a contextualização. Aqui também não deixa de ser uma proposta
de atividades, pois pesquisam para perceberem que o poeta pode fazer versos sobre os
acontecimentos históricos. A proponente sugere que se fale das epopéias, e sugere ainda
uma atividade com o poema Telegrama de Moscou, de Carlos Drummond de Andrade
A proposta de atividades (agora, sim, no recurso destinado para tal) inicia com o
verbo no infinitivo que tanto pode estar dirigida ao interlocutor professor ou aluno. Depois
os comandos ficam mais flexíveis, pois o aluno “poderá” (ou não) segui-los, podendo ser
de outra forma a pesquisa. Todo o trabalho se faz com uma pesquisa em textos da internet
ou de revistas para depois ser apresentado em grupos de cinco ou seis componentes, na
forma de relato ou de dramatização, em sala. Não ocorre aqui uma extrapolação do
conteúdo, sendo a produção escrita (relato ou dramatização) uma atividade para a escola,
especificamente para a sala de aula. Tem a proponente, com isso, o objetivo de despertar
no aprendiz a sensibilidade comum nos poetas que abordam questões que envolvem
conflitos e feitos heróicos.
71
A proponente desse APC enxerga nos poemas algo possível de se explorar em
qualquer disciplina, pois que tratam de assuntos diversos, como é o caso de Os Lusíadas,
de Camões, que narra a viagem de Vasco da Gama às Índias, sendo esse acontecimento
conteúdo de História. Cita também um poema de Millôr Fernandes que fala da Matemática
e um de Olavo Bilac, A Lua, que se insere na área da Geografia, e assim por diante; em
todas as disciplinas tem abordagens sob a forma de poemas.
Como questão para o fórum temos: A literatura e a poesia se caracterizam apenas
como ficção ou atende a muitas outras finalidades? Parece-nos que essa é uma pergunta
com apenas duas possibilidades. Vemos que uma questão para ser debatida, deve suscitar
mais pesquisas, apontar para múltiplas direções, suscitando também mais dúvidas.
As conexões variadas propostas pelo professor, por apontarem para campos
diversos, também indicam um investimento do proponente, o que nos permite considerar
também aqui um gesto de autoria. Nas atividades propostas, no entanto, as fórmulas do
discurso pedagógico se fazem presentes (CORACINI, 1999), constituindo, assim, numa
repetição do mesmo.
Da mesma forma que esse proponente navegou em busca de informações
convergentes ao seu tema escolhido, outros colegas interessados nesse assunto poderão
compartilhar e lançar mais propostas desafiadoras, esboçando também um gesto de autoria.
Acreditamos, pois, que estamos diante de uma nova realidade, condizente com as
transformações por que passa a sociedade e os alunos nela inseridos. Estes já estão, há
muito tempo, em contato com as tecnologias digitas, desenhando no ambiente virtual seu
perfil, revelando seu potencial intimamente relacionado com a escrita. Estranheza causaria
se a escola não mergulhasse nesse contexto do ciberespaço, lugar em que se encontram
produções belíssimas de jovens internautas nos seus diários eletrônicos. Parece-nos que
72
uma nova geração de escritores está gritando para todo o mundo. E o professor só não vê e
não se torna um deles se não quiser.
13) APC 2708 – Publicado em 10-06-2005 / 719 acessos.
O APC 2708 se apresenta completo e não conta com a colaboração, ainda, de outro
professor. Tem como conteúdo o tema epistolares, focando os chats - salas de bate-papo.
Apesar de estarmos analisando apenas os textos do gênero escrito, este conteúdo, ao nosso
ver, poderia fazer parte do eixo dos gêneros digitais, por ser uma modalidade que se torna
viável com a ferramenta digital, não deixando de ser, é claro, também matéria escrita.
Todavia, não vamos entrar nessa discussão de gênero, pois até mesmo na academia esse é
um assunto polêmico, sendo as concepções divergentes. Passemos à descrição e análise do
APC 2708.
O recurso Paraná se apresenta com um pequeno poema da poeta paranaense,
Helena Kolody. Fala da Lua (aqui grafada em maiúscula por representar o astro
responsável por tanta inspiração poética), que uma vez explorada, não é mais a mesma.
Assim o mundo deve ser visto: sempre em transformação. A mesma rapidez deve ser
acompanhada pelas pessoas que agora fazem uso das tecnologias digitais para se
comunicarem. Um pouco da vida da escritora também compõe esse recurso de abertura,
representando o nosso Estado. Traz ainda um sítio onde podemos encontrar a poesia de
outra paranaense, Greta Benitez. Um de seus poemas fala que “ninguém é um ilha”,
provando que, com o acesso à Internet, não há mais distância nem isolamento.
O relato desse APC 2708 tem como chamariz “A tecnologia a seu favor...o mundo
em suas mãos...” A proponente desse objeto de aprendizagem traz para reflexão o tema
73
Internet e a comunicação síncrona que ocorre nas salas de bate-papo e o trabalho que deve
acontecer na escola aproveitando essa realidade tão presente entre os alunos. Chama a
atenção do professor de linguagem para os fatos e que este saiba preparar suas aulas
aproveitando essa modalidade de comunicação pela Internet, podendo explorar diversos
recursos e a variedade lingüística do ciberespaço. Entende a proponente que, se o professor
aproveitar esse material, ele estará contribuindo e ajudando seu aluno a interagir também
na presença física de seu interlocutor. Segundo ela, o aprendiz que fica muitas horas diante
de um computador, teclando com outras pessoas, pode estar querendo dizer que não tem
ninguém para conversar e que o professor pode proporcionar esses momentos em que esse
aluno possa dizer o que sente, ou seja, discutir assuntos relacionados à existência deles.
Trata-se de um boa oportunidade de conquistar a confiança do aluno e ensinar também a
língua culta, conscientizando o educando de que, em cada situação, podemos nos
comunicar de uma maneira, que não podemos ser incoerentes quanto ao uso de uma
determinada forma lingüística.
Como sugestão de leitura, a proponente desse APC indica uma Revista Científica,
Mundo Jovem, que traz um texto de Carlos Theobaldo e Ercília Bittencourt, A internet e o
texto escrito: solução ou simplificação?- uma reflexão sobre essa linguagem da Internet
usada pelos jovens. Faz a distinção entre essa linguagem resumida dos chats e a linguagem
formal, dando exemplos de ocorrências de ambas. Sugere a leitura de um material, acervo
da TV Escola, TV na escola e os desafios de hoje, texto que aparece em outros APC. Indica
a leitura de um arquivo que está anexado ao APC, Mal traçadas linhas, de Sérgio Rizzo e
ainda o livro Norma Culta e Democratização do Ensino, do professor Evanildo Bechara, o
qual fala das modalidades da linguagem como opções que o aluno deve fazer para se
comunicar nos diversos ambientes e diversas situações da vida.
74
A imagem é de uma mão segurando um facho de luz, podendo ser comparada com
a comunicação pela Internet, que se dá por mãos que digitam e por cliques do mouse,
rompendo distâncias através de fibras óticas. Acompanhando essa ilustração temos um
poema de Jane da Silva Scaramal cujo tema é a comunicação pela Internet.
Todos os sítios indicados tratam da comunicação síncrona. Um, da Revista Época,
discorre sobre a linguagem, sua influência nas casas e nas escolas, abordando sobre os
chats, os blogs do ponto de vista divergente de vários estudiosos. Outro com o título
Aprenda Internet Sozinho Agora, com tudo sobre chats: como funcionam, os prós e os
contras, alertando os responsáveis pelos internautas quanto à qualidade do que estarão
acessando. A linguagem dos Chats Desafia os Newbies, por Melissa Elias Viana, mostra
esse universo em que os jovens mergulham ao acessar a rede, tornando-se uma tribo de
individualizados, vivendo as mais incríveis fantasias, na extravagância de seus
personagens, criados para esse mundo virtual. E, finalmente, um sítio que traz um tipo de
pesquisa dessa linguagem que causa tremores entre os professores que só ensinam
gramática nas aulas de língua.
Sons e vídeos podem complementar a aula do professor que busca somar essa
ferramenta, a Internet, aos conhecimentos trabalhados nas aulas de língua. Indica, a
proponente, o vídeo da série Edunet, Escola / Educação; o vídeo Hackers, que mostra
como o uso criminoso do conhecimento em informática pode trazer complicações para a
vida das pessoas. O filme americano, Mensagem para você, que conta a história de um
casal romântico que se conhece pela Internet. Tudo isso para mostrar aos alunos que
apenas relacionamentos pela Internet não é garantia de satisfação na vida pessoal.
Precisamos de contato físico para consolidar uma amizade ou um romance.
75
No item Notícias, a matéria Segredos de computador - parafraseando a música de
Cazuza, Segredos de liquidificador - de Juliana Girardi, da Gazeta do Povo, traz
reportagem interessante sobre os diários, blogs, postados na Internet e que, de certa forma,
estão servindo de meios para se resgatar o hábito da escrita, tão esquecido pelos alunos.
Traz ainda uma reportagem veiculada no programa Fantástico, da Rede Globo de
Televisão, em que o escritor Lêdo Ivo dá seu parecer favorável ao modo como as crianças
e jovens estão se comunicando Internet. Diz que são poetas assim como ele, mas de uma
outra época, com os recursos de que dispõem.
Como curiosidade, uma matéria da Revista Isto é merece nossa atenção, pois fala
da grande mania que toma conta dos brasileiros: acessar as comunidades do Orkut,
ampliando a rede de relacionamentos virtuais. Tal mania supera até mesmo os norte-
americanos, conterrâneos de Bill Gates. E ainda o texto O que isso tem a ver com a
linguagem do ICQ, que fala da linguagem abreviada como algo natural que sempre
aconteceu com aqueles que copiam, para ganhar tempo com as anotações.
O texto do recurso Investigando apresenta-se sem autoria. Ele repete muito do que
já se falou até aqui, do cuidado que os educadores devem ter quanto ao trabalho com essa
forma abreviada de se comunicar. Saber ouvir os alunos, pois esses estão querendo dizer
algo e precisam encontrar na escola alguém que os entenda, sem que isso interfira no
ensino da língua padrão. Fala da língua como algo vivo e dinâmico e que merece atenção
do professor para essas transformações.
A propositura de atividades contém cinco exercícios com comandos para o
professor trabalhar essa variedade lingüística, o internetês. A proponente do APC 2708
sugere que o professor peça aos alunos para trazerem suas falas da Internet para
transcreverem na linguagem padrão. Poderão fazer um poema para postarem nos blogs;
76
pedir que produzam seu próprio texto sobre a linguagem da Internet. Sugere, ainda, uma
gincana em que os alunos pesquisarão sítios indicados previamente pelo professor,
vencendo quem fizer mais acertos. Depois, o professor divide a sala para pesquisarem
sobre as variedades lingüísticas, fazendo depois uma apresentação para o grande grupo, em
debate e na forma de texto escrito.
O trabalho se contextualiza com ética que deve ser uma constante na escola, sendo
o professor um mediador que irá orientar para o uso correto dessa ferramenta, a Internet, a
seu favor. O texto desse recurso vem sem autoria. Supomos que seja de autoria da
proponente.
Na seqüência, esse APC traz alguns textos que remetem a atividades em disciplinas
como a Filosofia, quando se questiona a influência desse meio, discutindo a importância de
SER em detrimento do TER. Jogos matemáticos e na língua inglesa também proporcionam
o estudo dessas disciplinas. Traz para discussão em fórum a questão: Os jovens estão
passando muito tempo na Internet. Como podemos trabalhar essa prática, principalmente
no ensino de língua portuguesa. Mais uma vez acreditamos que essa pergunta não leva a
investigações futuras, uma vez que durante todo o trabalho nos deparamos com indicações
de estudo e idéias sobre como fazer para tornar mais eficiente o ensino de língua diante
dessa nova forma de comunicação.
O gênero discursivo escolhido para a elaboração deste APC tem tudo a ver com o
que estamos pondo em evidência nesta dissertação: o uso das ferramentas digitais para
produções intelectuais em ambiente institucionalizado. O proponente, na sua função-autor,
classifica a linguagem usada na Internet pelos jovens como uma variante da língua que
falamos. Por essa razão, esboça o que parece algo de sua própria autoria, ou, pelo menos
algo concebido de forma a revelar sua idiossincrasia. Aproveitar esse material que se
77
acessa com um clic do mouse poderá ser muito útil aos professores mais renitentes com
relação ao modo como seus alunos escrevem e se comunicam na Internet.
Ainda que o tema deste APC já tenha sido abordado em outro postado
anteriormente (nº 576, postado em 14/04/2004) e as atividades, de certa forma, se
aproximem, as remissões a outros textos, a outras conexões, permitem-nos indicar aqui um
gesto de autoria.
14) APC 2929 – Publicado em 25-04-2005 / 702 acessos.
O APC 2929 tem a leitura e seus procedimentos como conteúdo e tema de estudo.
Não possui nenhuma contribuição de outro professor, porém contempla todos os recursos.
Residindo em Francisco Beltrão-Pr, a proponente homenageia o Paraná com a notícia de
um tradicional concurso de literatura realizado em sua cidade.
O relato do APC fala das pretensões da proponente no sentido de buscar
alternativas que contribuam para o aprimoramento do ensino da língua, que auxiliem no
desenvolvimento intelectual, emocional, crítico, político e cultural do educando. Fala do
professor como mediador, que orienta e aponta os caminhos para os alunos. Dessa forma
estará preparando cidadãos críticos. Entretanto, não traz qual aporte teórico que deve
sustentar a prática.
As sugestões de leitura contam com um livro mais técnico: O texto na sala de
aula, de João Wanderley Geraldi, valorizando os fundamentos do ensino, a prática, a
leitura e a produção escrita como carro-chefe deste APC e do ensino de LP como um todo.
Literatura Brasileira, a arte da palavra, de Francisco Mario V. Costa, também é referência
78
nesse trabalho, além de uma recriação literária de Dom Casmurro, obra de Machado de
Assis, escrita por Lígia Fagundes Telles.
O recurso Imagens conta com uma cena em que há um casal feliz: a moça
segurando o braço do rapaz. Conta também com a figura de um homem de bengala,
levemente curvado para a frente, sem mostrar o rosto. Elas foram selecionadas e postadas
nesse APC pela proponente porque, conforme sua análise, o casal feliz pode se comparar a
Bentinho e Capitu, antes da dúvida, em Dom Casmurro, e o velho de bengala, com o
próprio Casmurro, mostrando o quanto sofreu na história. Considera ela esse um recurso
muito importante para se fazer análise de uma obra.
Os sítios indicados vão falar de obras literárias que o MEC distribui para as escolas,
em programas de incentivo à leitura. Tratam, ainda, de outros projetos como o da
Associação Educativa “Livro em Rodas”, com dicas de atividades para o professor de
literatura. Tem, finalmente, um sítio de interação em que o professor tem espaço de
publicar obras de sua autoria: Leia livro.
Em Sons e Vídeos, a música Fico assim sem você, da dupla Claudinho e Buchecha.
A proponente sugere que os alunos cantem a música como se fosse Bentinho cantando a
Capitu, numa atividade lúdica. Além da indicação do sítio, apresenta a letra da música, na
íntegra.
A notícia Quem tem medo de leitura?- de Claudia Costin, veiculada em O Estado
de São Paulo, mostra como está a leitura na escola e no dia-a-dia das pessoas em geral.
Traz dados estatísticos que mostram um raio-x da realidade do leitor brasileiro. Junto a
essa matéria, podemos acessar o arquivo que está em anexo, contendo o texto na íntegra.
79
A proponente desse APC traz como curiosidade um exemplo de recriação na obra
Amor de Capitu, de Fernando Sabino, que pode servir de apoio ao professor e ao aluno,
pois ensina como produzir um texto criativo com base em outro texto lido, sem
comprometer o original.
A proposta de investigação é dirigida ao professor no sentido de observar os pontos
comuns entre o adolescente e as obras literárias, através de entrevistas e debates. Agindo
assim, o professor estará se aproximando do universo do jovem, sendo mais fácil conseguir
bons resultados nas produções escritas dos mesmos.
As atividades que a pesquisadora propõe nesse APC 2929 contemplam concursos
de poesias, jograis, pesquisas em cartazes, produção de poesias e teatro. O concurso
acontece após leituras de obras literárias, de debates e produções escritas, sempre com
orientação do professor na questão da ortografia, oratória etc. Depois passa para a
apresentação que será avaliada assim como a letra do poema. Nessa atividade, percebemos
que o fim de tudo é a atribuição de uma nota pela produção do aluno. No jogral, os alunos
lêem sobre a vida dos autores clássicos da literatura brasileira e depois apresentam esses
vultos em cartazes, com as caricaturas dos mesmos. A pesquisa em cartaz consiste em que
o aluno obtenha conhecimentos sobre as particularidades dos escritores pesquisados,
surgindo daí frases originais para serem apresentadas oralmente e expostas em cartazes e
espalhadas pela escola. A proponente sugere que essa atividade se estenda a lugares
públicos para que outras pessoas vejam as frases criadas e fiquem por dentro do que os
alunos estão estudando, sensibilizando-se. Outra atividade propõe um diálogo literário, em
que os alunos produzam seus poemas com base nas histórias de que mais gostaram,
passando, a seguir, à troca de seus trabalhos. Isso oportuniza a troca de opiniões e todos
podem falar sobre o que aprenderam. Por fim, o teatro com fim avaliativo. Os alunos,
80
depois de muitas leituras, podem fazer releituras e apresentar seus textos de modo a
compartilhar com os colegas suas idéias, sua arte. Isso também pode ser usado como tarefa
nas gincanas escolares, como incentivo à leitura na escola.
A contextualização, a despeito dessa proposta, se dá pelo conhecimento de várias
culturas que se presentificam nas obras literárias trabalhadas nas aulas de LP. A
proponente do APC 2929 considera a pluralidade cultural uma forma de contextualizar o
que se vê nos livros da literatura clássica. Com a perspectiva interdisciplinar ocorre o
mesmo, pois a proponente considera a leitura uma necessidade em todas as áreas do
conhecimento, atribuindo, desse modo, a responsabilidade de se trabalhar leitura a todos os
professores envolvidos com o ensino, independentemente da disciplina que ministram.
Também diz ela que esse trabalho não deve se limitar apenas à decodificação das
“letrinhas”. É preciso que a leitura favoreça a interpretação crítica do aluno. Depois
relaciona as disciplinas mais afins, que são: Arte e História, por serem elas importantes,
pois o visual e a história compõem a obra e são recursos indispensáveis para uma boa
compreensão do mundo da ficção.
A questão desafiadora, para discussão no fórum não se constitui especificamente
numa pergunta, e sim, numa assertiva em que se diz que “todas as atividades a partir de
obras lidas desencadeiam outras leituras, pois aguçam a opinião crítica e a criatividade.”.
Tomando a leitura e interpretação como tema para esse APC, a proponente deixa
transparecer, ainda que de modo tímido, a sua concepção de escrita, quando sugere as
leituras das obras de autores sociointeracionistas. Pensamos que nesse momento ocorre a
transferência da posição de sujeito-professor para professor-autor, o que se coloca como
resultado de suas leituras, ao tempo que revela sua visão de mundo.
81
Neste último APC, o mesmo gesto se evidencia: a partir de um tema bastante
comum: a proponente busca novas conexões disponíveis no mundo escrito-gráfico e no
mundo digital, o que nos permite considerar um gesto de autoria.
Encerrando este primeiro capítulo, focado na autoria, assim como entendem os
teóricos e estudiosos que consultamos, pudemos verificar, em função desse projeto
inovador na Educação do Paraná que, sem dúvida, o Portal se constitui em um ambiente
muito profícuo para um fazer pedagógico de qualidade. Pudemos constatar, na leitura que
fizemos dos 14 APC e de suas proposituras, que o professor, apesar de ceder todos seus
direitos autorais no momento de sua inserção nesse ambiente do Portal, consegue,
individualmente ou com o auxílio de um colaborador, esboçar no ciberespaço um gesto de
autoria. Ele aciona uma rede de conhecimentos interessantes, ao mesmo tempo em que
possibilita inúmeras conexões com o mundo da Ciência, das Artes, da Literatura, na
atualidade. Há professores da Rede Pública do Paraná que são conhecedores ou
especialistas auto-didatas em algum tema e que, se esse conhecimento é disponibilizado,
ele pode entrar em circulação facilitando sua vulgarização. E mais: com isso, a instituição
SEED abre inúmeras possibilidades de tornar públicos os talentos desses professores que
mergulham em temas de seus interesses e que nem sempre são pesquisados no mundo
acadêmico das universidades. Esses talentos podem se constituir em focos de consultas se
devidamente conhecidos. E o Portal é um excelente ponto de encontro. Com isso ganham
os professores da rede pública de ensino do Paraná e os alunos.
Passemos, agora, para o segundo momento de nossa análise, que é verificar qual a
importância dada à produção textual, de que perspectiva se vislumbra essa produção nas
proposituras de atividades nos APC. Em se tratando de um objeto de aprendizagem que
contempla o eixo dos gêneros textuais escritos, o que esperamos, no mínimo, é que os
82
proponentes façam bom uso do recurso Propondo Atividades. Esperamos, na verdade,
encontrar propostas de produção de texto articuladas de modo a não apenas fazer cumprir
uma seqüência semelhante à que observamos nos LD: leitura, estudo do vocabulário,
interpretação e compreensão do texto, exercícios gramaticais e, por fim, em 5º lugar, a
produção de texto. Uma produção, conseqüência da leitura em que, normalmente,
prevalece o ponto de vista do professor, quando este faz as correções dos exercícios de
interpretação (se é que podemos dizer que isso seja uma interpretação). Todavia,
esperamos encontrar nesse recurso propostas que priorizem as condições de produção, que
tornam o texto um veículo significativo na interação social. Que se leve em consideração o
outro a quem o texto se destina, justificando a necessidade dessa escrita, num contexto
condizente com o momento da produção, e que a linguagem também seja adequada à
situação pois o que se espera do sujeito é que ele seja capaz de, em sua língua, utilizar os
recursos lingüísticos pertinentes ao seu propósito como autor de um texto.
Segue abaixo o quadro ilustrativo que demonstra o resultado de nossa análise.
Apresentaremos, de forma esquemática, os 14 APC analisados, de uma maneira geral, em
todos os recursos, além de pontuarmos as questões para as discussões em fórum (campo
não obrigatório). Antecede, todavia, a legenda com o código explicativo em cada situação,
a saber:
Os números, em preto, marcam a quantidade de proposituras no recurso pelo
primeiro proponente, aquele que deu origem ao APC; em vermelho, as colaborações de
outros proponentes.
X: Marcamos com um X, em preto, os recursos preenchidos pelo primeiro
proponente. Em vermelho, uma colaboração.
-: Os recursos em branco se apresentam com um traço.
83
GA: Ocorrência de gestos de autoria.
R: Repetição do LD.
NA: Não ocorrência de autoria.
AC: Ocorrência de autoria compartilhada.
84
Quadro demonstrativo da análise dos APC (2003-2005) – em Língua Portuguesa – Ensino Médio –
Gênero de textos escritos – Autoria.
RECURSOS DO AMBIENTE – APC
Fórum
Autoria
Nº DO APC
CONTEÚDOS
Paraná
Relato
Sug.Leit.
Imagens
Sítios
Sons/Vídeos
Notícias
Curiosidades
Investigando
Prop. Atividades
Contextualizando
Persp. Interdisc.
..............................
..............................
575 De imprensa
(crônicas)
X
X
3
X
3
X
-
X
X
2
-
-
-
GA
576 Epistolares
(chat/bate-papo)
X
X
3
X
3
X
2
-
X
X
X
X
X
NA
578 Lit. /Entret. (contos
de fada)
X
X
11
X
3
2
2
2
3
6
X
X
X
AC
579 De imprensa
(crônicas)
-
X
4
X
3
X
X
X
X
X
X
X
X
GA
593 Lit./Entrt.(contos
Trad.Pop.)
-
X
5
X
3
2
X
X
X
X
6
X
X
AC
647 Lit./Entret. (peças de
teatro)
X
X
10
X
6
-
2
X
X
X
X
X
X
GA
651 Lit./Entret. (Canções
pop.)
X
X
7
X
3
-
-
-
-
X
-
-
X
GA
904 De divulgação
científica
X
X
5
X
3
3
X
2
X
2
X
X
X
GA
1114 De imprensa:
(reportagens)
X
X
6
X
3
3
4
3
X
X
X
X
-
AC
2017 Instrucionais
(roteiros)
X
X
4
6
5
X
X
3
2
3
X
X
X
AC
2170 Lit./Entret. (poemas)
X
X
4
3
3
X
X
X
X
3
6
X
X
AC
2602 Lit./Entret. (poemas)
X
X
3
X
3
X
X
X
X
X
X
X
X
GA/
R
2708 Epistolares
(chat/bate-papo)
X
X
4
X
4
3
2
2
X
X
X
3
X
GA
2929 Leitura e
procedimentos
X
X
3
2
3
X
X
X
X
5
X
X
X
GA
85
Ao longo deste capítulo, preocupamo-nos com a apresentação do ambiente virtual
colaborativo, idealizado pela atual política educacional do Paraná, cujo espaço viabiliza
produções de objetos de aprendizagem pelos professores da rede pública. Fizemos uma
descrição, pormenorizada, das especificidades desse ambiente disponível no Portal Dia-a-
Dia-Educação. Da mesma forma, julgamos necessário relatar os trabalhos (APC, ou como
já se pode dizer, OAC) tomados como corpus para a análise, em razão do pouco
conhecimento desse recurso pela instituição acadêmica, bem como entre os professores
atuantes no ensino básico.
Movidos pelo discurso dos organizadores do Portal, em que se considera o
professor que produz um APC, não mais aquele que dá aulas, e sim, o que se reveste de
importante valor pela contribuição na educação, tendo instituída, em função disso, uma
autoria do objeto de aprendizagem, julgamos imprescindível que discorrêssemos sobre o
que se pronuncia, a respeito desse assunto, entre alguns teóricos e estudiosos da linguagem.
Fomos beber em Foucault, que considera autor aquele que desloca o discurso alheio
para atender a uma necessidade sua, em determinado momento histórico. Segundo essa
visão, pudemos constatar que, nas colaborações apresentadas como APC, isso se manifesta
sutilmente, quando se considera o contexto dessas publicações, porém, a tendência de uma
diluição da autoria se evidencia quanto mais ocorre a participação dos pares que colaboram
com o mesmo objeto.
Dos quatorze APC publicados, apenas em um deles (576), ocorreu a ausência total
de autoria, por reproduzir propostas de outros recursos para esse ambiente novo de maneira
contraditória, ferindo o princípio da não-contradição – uma condição posta por Orlandi -
uma meta-regra importante para garantir a coerência do texto, segundo Charolles (1988).
Oito trabalhos apresentaram gestos de autoria, em razão da busca e das proposituras de
86
atividades pelos proponentes, e que deslocam um já dito em evento novo (FOUCAULT,
1999; ORLANDI, 1993 apud ORLANDI, 1996). Dentre esses oito, em pelo menos em um
deles ecoam proposituras que constituem o imaginário histórico/cultural do LD, podendo
ser verificadas claramente pela maneira em que se são formulados os enunciados.
Uma vez reconhecidas essas marcas em que buscamos visualizar a presença do
autor, tal como o concebem os teóricos em quem nos baseamos, realizaremos, agora, a
ancoragem nos pressupostos da concepção de texto defendido como espaço de interação
social, porque é ali que a autoria se constitui uma unidade.
Iniciaremos um novo capítulo, de cunho investigativo, para verificar se os
proponentes priorizam, em seu trabalho colaborativo nesse ambiente, as condições de
produção textual, tais como propalam os estudiosos a quem referendamos. Se são
condições propícias para que haja uma produção textual significativa, envolvendo os
usuários da língua nas suas mais variadas situações de comunicação. E, considerando que o
que se propõe aqui seja uma ferramenta de pesquisa para os profissionais da educação
básica, que atuam, principalmente, na rede pública, pensamos que seja imprescindível
haver propostas em que se verifica um mínimo de originalidade dentro da concepção
interacionista de linguagem, pontuando as condições de produção, conforme discorreremos
a seguir.
CAPÍTULO 2
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL EM FOCO
s pesquisadores para os quais direcionaremos nossa atenção agora não
poderiam deixar de ser mencionados uma vez que seus textos trazem
subsídios para a análise que faremos das propostas de atividades de
produção textual em ambiente digital.
Com relação às condições de produção dos textos, Bronckart (1999, p.91) confirma
a teoria ao dizer que as ações de linguagem externa ou interna exercem influência sobre a
produção textual, pois representam as propriedades dos mundos formais nas versões
particulares de cada falante. Ainda segundo o autor, o agente (termo usado para se referir a
locutor, sujeito), ao produzir um texto, seja ele oral ou escrito, toma suas decisões a partir
de suas representações dos mundos físico, social e subjetivo. Escolhe, entre os modelos
disponíveis no intertexto (conjunto de textos elaborados pelas gerações precedentes), o
gênero de texto que lhe parecer mais adaptado às características da situação interiorizada.
Levam-se em conta alguns parâmetros contextuais, como: local de produção, o momento
da produção, o emissor, o receptor, a interação comunicativa, a posição social do emissor,
a posição social do receptor, o objetivo da interação. Bronckart diz que “são infinitos os
objetivos para a produção de um texto” (p.96). Portanto, é com base nas ações de
linguagem e no “seu conhecimento efetivo dos gêneros e de suas condições de utilização,
que o agente escolhe um modelo textual” (p. 101). De acordo com ele, “o gênero adotado
O
88
para realizar a ação de linguagem deverá ser eficaz em relação ao objetivo visado”, pois
que definirá os “espectros das ações de linguagem possíveis” (p.101).
Para Bakhtin (1992, p.113), a interação verbal (dialogia) constitui a realidade
fundamental da língua. A palavra está sempre em função do interlocutor, comportando
duas faces: ela procede de alguém e se destina a alguém. Dessa forma, “a palavra é o
território comum do locutor e do interlocutor” (p.113). E numa outra oportunidade, vamos
ver que esse autor reafirma esse fenômeno tão natural da comunicação humana, quando diz
que “O locutor termina seu enunciado para passar a palavra ao outro ou para dar lugar à
compreensão responsiva do outro.” (BAKHTIN, 1997, p.294).
Menegassi, em seu artigo, Professor e escrita: a construção de comandos de
produção de textos, analisa comandos de professores, relativo a atividades escolares, a fim
de verificar se neles estão contempladas as condições de produção escrita que, conforme
preconizam os PCN (1998) – e também presentes no Currículo Básico do Paraná – LP
(1990) - contam com quatro elementos básicos: finalidade, especificidade do gênero,
lugares preferenciais de circulação e interlocutor eleito. Constata o autor que nem sempre
esses elementos fazem parte do “processo de produção escrita em situação de ensino”
(MENEGASSI, 2003, p.55).
E baseado nisso, o autor acima citado, compactuando com Bronckart, considera que
“a finalidade da produção está ligada ao objetivo do texto e, normalmente, em situação de
ensino é oferecida pelo professor” (p.57). Menegassi diz ainda que “ao se definir a
finalidade da produção, opta-se pelo tipo de gênero textual, que, por sua vez, abarca o
lugar de circulação do texto e, conseqüentemente, impõe um tipo de interlocutor” (2003,
p.57). Dessa forma, ao se encomendar uma produção de um determinado gênero, deve-se
89
prever um veículo no qual esses textos possam circular, atingindo, por conta disso, sua
função social (para quê se escreve) de fato.
Do ponto de vista de Costa Val,
os gêneros estabelecem pautas temáticas e formas típicas de tratamento
do tema, padrões de estrutura composicional, e definem o estilo,
orientando o processo de seleção de recursos lexicais e morfossintáticos
no interior de cada frase e nas relações interfrasais (COSTA VAL, 2003,
p.127).
Todo texto, segundo ela, pertence a um certo gênero e corresponde a um certo
padrão social. Gêneros diferentes podem apresentar seqüências composicionais e traços
lingüísticos comuns. “Produzir um texto escrito implica escolher um determinado gênero
discursivo e essa escolha se faz em função de para quê se escreve, em que esfera e sobre
que suporte deverá circular o texto produzido” (COSTA VAL, 2003, p.128-129).
Retomando a concepção de língua como processo histórico, que está sempre em
evolução, não podendo ser compreendida e explicada fora do vínculo com a situação
concreta, faz da linguagem um produto sócio-histórico. É nessa trilha que buscamos,
também nos autores que se seguem, as bases para nossas análises.
Garcez (1998), ao traçar um paralelo entre Vygotsky e Bakhtin, reporta-se ao
primeiro, cujas formulações sobre internalização “demonstram o trajeto do social para o
individual, sempre mediado pelo signo e pelo outro” (p.45). Nisso, os dois autores citados
por ela, cada uma a sua maneira, concordam. A aquisição da língua se dá em função do
externo. Segundo essa autora, “a linguagem é uma atividade humana cujas categorias
observáveis se modificam no tempo e apresentam um funcionamento profundamente
interdependente do tipo de contexto social em que ocorrem” (GARCEZ, 1998, p.46).
90
Com relação ao texto escrito, que é o nosso objeto de investigação nesta pesquisa,
Garcez compreende que é o conceito que se tem de linguagem que vai dizer os modos de
participação dos interlocutores na constituição do discurso escrito. Considera escritor
competente todo aquele que torna seu texto adequado à situação, “tendo o que dizer,
quando, com quem, onde, escolhendo o modo como dizer aquilo que diz” (p.46). “A
experiência social, as necessidades e as motivações alimentam a aquisição da língua”
(p.47), que, por sua vez, renova as experiências. Conseqüentemente, as necessidades
passam a ser outras bem como as motivações, num círculo infinito. Confirma-se a tese de
que a língua funciona num universo social, coletivo, que se expande tanto na modalidade
oral como na escrita, conforme as experiências vão acontecendo. A expansão que se dá no
universo da linguagem, segundo essa concepção, se caracteriza no objetivo do ensino da
língua. E ela só acontece se forem proporcionadas situações de aprendizagem concretas em
que se produzam textos significativos para o aluno.
Geraldi (1993), por sua vez, considera a produção de texto ponto de partida e ponto
de chegada de todo o processo de ensino/aprendizagem da língua. “Tomada como objeto
de estudos, é no texto que a língua se revela em sua totalidade.” (p.135). E ao assumir-se
como locutor, o texto passa a estar numa relação interlocutiva. O autor aposta em que “o
sujeito, para se constituir como tal” (p.135), deve “comprometer-se com sua palavra e de
sua articulação individual com a formação discursiva de que faz parte, mesmo quando dela
não está consciente” (p.135). A novidade do discurso, segundo ele, está nesse
compromisso, nessa articulação que dá novos sentidos a expressões antigas. Para ele, “a
devolução da palavra ao aluno faz deste condutor de seu processo de aprendizagem,
assumindo-se como tal. Caso contrário, seria a negação ao direito de proferir” (GERALDI,
1993, p.160).
91
Fiad e Mayrink-Sabinson (1991), em seu artigo A escrita como trabalho, partem do
pressuposto de que “a linguagem é construída pela interação entre os sujeitos” (p.55) e que
na modalidade escrita da linguagem, essa construção envolve momentos
diferentes, como o planejamento de um texto, o da própria escrita do
texto, o da leitura do texto pelo próprio autor, o das modificações feitas
no texto a partir dessa leitura (FIAD E MAYRINK-SABINSON, 1991,
p.55).
Partindo dessa perspectiva, Geraldi faz, no interior das atividades escolares, uma
distinção entre produção de textos e redação. Esta se produz para a escola, e aquela, na
escola. Centraremos a atenção na produção textual
14
, que é o que nos interessa. Para que se
produzam textos na escola, de acordo com ele, são necessárias algumas condições básicas:
que se tenha o que dizer; que se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer; que se
tenha para quem dizer o que se tem a dizer; que o locutor se constitua como tal, enquanto
sujeito que diz o que diz para quem diz; que se escolham as estratégias para realizar esse
dizer. Essas condições de produção de textos normalmente não ocorrem na realidade do
ensino, em que se constata muita redação e pouco texto. Ou seja, a escrita direcionada
somente para a escola, sem função social real, sem que seja do interesse do outro, algo
distante daquilo que ele vivencia. Deve-se ter algo a dizer, para que a escrita não se torne
artificial. Infelizmente ainda se escreve porque alguém (o professor) mandou, embora,
segundo o que se vê em Geraldi, muitas vezes a criança, diante de uma proposta de
produção textual, cria outras razões, que se sobrepõem à razão artificial apresentada.
Normalmente o que os alunos fazem é “imitar formalmente um texto” (p.139). Sem uma
razão para dizer alguma coisa, não teria o menor sentido escrever. Assim, só se está
preparando a criança para depois escrever, e isso pode nunca acontecer. Uma outra questão
14
Estaremos usando o termo produção textual por ser o mais comum no meio escolar atual. No entanto,
acreditamos ser importante apontar que tal termo, em substituição à “redação”, não se constitui numa troca
mais adequada, porque tal termo – produção textual – (pode) se filia(r) ao universo industrial capitalista. E,
como tal, pressupõe um procedimento regulado por normas de produção (como a de bens, de mercadoria)
num caldo cultural tecnológico, que visa eficiência, lucro, mecanização, controle.
92
se refere a: Mas para quem dizer? “O grande problema é que o leitor de redações é sempre
a função-professor e não o sujeito-professor." (p.143).
Britto (1997), nas reflexões que faz sobre a escrita, em O texto na sala de aula,
constata que o que se vê nas escolas é algo parecido com “serviço à la carte”, em que o
aluno escreve em função da imagem que cria do “gosto” e da “visão do professor”
(BRITTO, 1997, p.120). Logo, sem um interlocutor real e significativo, não há qualquer
comprometimento com o que se diz, uma vez que se está atendendo apenas a uma cobrança
(ao gosto do freguês), para fins de avaliação dos conhecimentos transmitidos pela escola.
É somente nessas circunstâncias e sob essas condições que o autor de um texto se
constitui como sujeito de seu discurso, comprometendo-se com o que diz, ressignificando,
dessa forma, o ato da escrita. Este sujeito, ao anunciar, enuncia-se como ser ideológico,
possuidor de história e saberes que deseja compartilhar com seus interlocutores.
Respaldado por essas investigações, procuraremos conduzir nossa análise.
Ainda que esses autores em que nos baseamos para fundamentar nossa pesquisa
tratem mais profundamente sobre a teoria do desenvolvimento das funções psicológicas
superiores de Vygotsky (autor não mencionado nas referências deste trabalho), assumidas
pelo grupo de Bronckart, em Genebra, vamos nos ater mais especificamente nas condições
de produção textual da forma como vimos em Geraldi (1993), por ser esse autor ainda o
mais recorrente no imaginário educacional de língua portuguesa, quer pelos enunciados
presentes nos APC, quer nos enunciados correntes dos professores a que temos tido acesso
em nosso fazer diário de professor de língua portuguesa.
Dos 44 APC de Língua Portuguesa e Literatura, publicados nos anos de 2003 a
2005, 11 deles são do Ensino Fundamental (contemplando apenas o gênero de textos
escritos, em LP) e os outros 33 são do Ensino Médio (sendo 14 deles com conteúdos da
93
disciplina de Literatura); e na disciplina de LP, 14 pertencem ao eixo do gênero de textos
escritos; 4 do eixo do gênero de textos orais e apenas 1 do eixo do gênero de textos digitais
– sobre os blogs). Reafirmamos aqui que o nosso corpus abarca tão somente os 14 APC de
Língua Portuguesa do Ensino Médio focados para o gênero de textos escritos.
Neste momento de nossa pesquisa, em que já discorremos sobre os gestos de
autoria percebidos nas proposituras dos APC, principalmente no recurso Relato (coração
do APC), retomaremos apenas um dos 12 recursos que podem compor esse objeto de
aprendizagem: Propondo Atividades. Embora tenha sido mencionado em algum momento
do trajeto já percorrido neste trabalho, temos como objetivo, verificar se essas propostas
contemplam uma sustentação teórica interacionista de linguagem. Verificaremos, também,
se nelas estão presentes as condições de produção de texto defendidas pelos autores acima
citados e assumidas por nós e que concebem a língua como lugar de interação social.
O modo como faremos a análise dependerá da quantidade de proposituras que
constituem esse recurso. Cada uma delas se apresenta (ou deveria se apresentar) com título
e um texto explicativo, além das propostas em si. Naqueles em que esse recurso tiver
alcançado proporções maiores, decorrentes ou não das colaborações de outros professores,
as análises serão divididas em blocos, para uma compreensão mais detalhada do que
pretendemos com esta investigação.
Os professores-autores serão identificados, como já vimos fazendo desde o início
do primeiro capítulo, pelo número de seu APC, para que se mantenha a salvo sua
privacidade, apesar de se tratar de uma produção pública, exposta ao mundo inteiro pela
conexão viabilizada em função do acesso à Internet.
94
2.1 - APC 575
A proponente desse APC aborda um conteúdo da esfera jornalística (de imprensa –
crônica), detalhe que já consta dos campos em que escreve. Observe:
Proposta de atividade:
1. Assistir ao jornal da noite e a partir de um fato interessante, uma notícia chocante, uma
informação que provoque reflexões e que trate da realidade brasileira, estimulando assim o desejo de contar,
comentar e, por conseguinte, produzir uma crônica.
2. A partir de uma imagem, selecionada pelo professor em uma revista semanal que registre um
flagrante da realidade mundial, produzir uma crônica. Pode ser uma imagem que mostre uma cena de guerra,
uma cena de violência, um acidente, um ato em nome da paz, uma manifestação de protesto (...).
Os comandos acima propõem atividades de produção textual. Todavia, o primeiro
deles não deixa muito claro se é para o aluno escrever efetivamente. O texto deve
acontecer (pelo menos se espera) em conseqüência da notícia, e se essa lhe chamar a
atenção.
Dos elementos esperados para a produção de texto, conforme vimos em Menegassi
(2003), Costa Val (2003), Geraldi (1993) e Bronckart (1999) e que propõem os PCN
(1998) e o Currículo Básico do Paraná para Língua Portuguesa (1990), aparece apenas a
definição de gênero (crônica) que poderá ser produzida se o aluno se sentir estimulado a
escrever após ter assistido ao noticiário da noite, ou seja, se ele encontrar uma finalidade
para tal. Não se estabelece um objetivo, tampouco o destinatário dessa crônica. Temos a
impressão, a partir das práticas comuns de sala-de-aula, de que o texto será apenas um
instrumento de avaliação, cujo objetivo é verificar se o aluno consegue produzir uma
crônica. Um texto como esse deveria ser usado para despertar no educando a criatividade
ou vivência com a escrita, podendo ser circulado pelo colégio, até mesmo publicado na
imprensa local, tendo como interlocutores seus pares e comunidade escolar.
95
O segundo comando sugere que se produza um texto inspirado por uma imagem
qualquer. Da mesma forma estão ausentes as condições (GERALDI, 1993) de para quê se
escreve, para quem se escreve, com que estratégias se escreve, quem estará escrevendo e o
que estará escrevendo. E ainda: onde deverá circular o texto produzido e em qual veículo?
(PCN, 1998)
O que (se deve) escrever, conforme podemos verificar, também depende da escolha
do professor que, neste caso, não atende os pressupostos básicos da escrita que circulam na
atualidade. Parte dele a seleção da imagem. Certamente, muitos alunos terão dificuldades
em se situarem na cena, ou mesmo em apresentar qualquer identificação com a gravura,
mas ao final da aula poderão realizar o milagre esperado. É possível que tenham uma
redação para apresentar ao professor, já que é uma redação para a escola (GERALDI,
1993) cujo professor-leitor se posiciona como avaliador, aquele que dará uma nota pelo
produto.
A presente situação confirma o que disse Menegassi (2003) a respeito da atuação
do professor com relação à escrita do aluno. Aquele participa tão somente de dois
momentos: da elaboração do comando e da avaliação.
São as experiências sociais que alimentam a aquisição da língua. Sem a interação
social (ausente nessa proposta), torna-se impossível a expansão no universo da linguagem
(GARCEZ, 1998).
2.2 - APC 576
Nesse APC a proponente não sugere produção textual, ordinária, comum, como a
redação escolar, apenas atividades nas salas de bate-papo para que o aluno possa se
96
familiarizar com o ambiente, comparar a linguagem do internetês com a língua padrão.
Depois sugere a montagem de um dicionário com palavras usadas pelos internautas nos
chats e dos símbolos gráficos criados para demonstrar emoções. Veja:
Propondo Atividades
Título: Dicionário de chat
Texto: Inicialmente o professor poderá mostrar aos alunos como se utiliza a Internet. A seguir serão
realizadas atividades no laboratório de informática demonstrando na prática os conhecimentos adquiridos,
com o intuito de verificar se os mesmos estão aptos para iniciar a participação nas salas de bate-papo.
Quando os alunos estiverem preparados, passarão a freqüentar diversas salas onde poderão,
inicialmente, observar o tipo de linguagem utilizada pelos internautas. Somente a partir daí os alunos poderão
participar das conversas, buscando observar as mudanças na linguagem utilizada em relação à língua
portuguesa ensinada na escola. Os alunos deverão anotar as palavras desconhecidas e os símbolos utilizados
em listas, que posteriormente serão transformadas em um dicionário montado pelos próprios alunos.
Entendemos que, ao solicitar aos alunos que comparem o internetês com a língua
padrão, pressupomos que eles devam ter capacidades para agir com o gênero relatório; e
ao solicitar a esses a montagem de um dicionário, também pressupomos que eles tenham
capacidades para agir com o gênero verbete de dicionário. Entretanto, esses
conhecimentos prévios não são tomados como pontos de partida, nem ao menos cogitados
pela proponente desse APC.
Como podemos observar, não estão explicitados os elementos que compõem o
quadro das condições de produção textual. Primeiramente o professor transmite o
conhecimento (mostra como se utiliza a Internet), sem levar em conta se os alunos
conhecem ou não os diferentes gêneros textuais que atravessam essa proposta mediada
pelos instrumentos tecnológicos digitais considerados nesse ambiente. Em seguida, é a vez
do aluno demonstrar na prática) os conhecimentos que adquiriu (como se esse
conhecimento fosse uma novidade para todos os educandos), em que não se prioriza
97
inicialmente a transformação dos gêneros textuais da práxis escolar em objeto de
ensino/aprendizagem.
2.3 - APC 578
Nesse APC, a leitura e a oralidade convivem intimamente com a escrita. São
elencadas pelas proponentes, ao todo, 10 atividades, como veremos a seguir, analisando
por partes:
Propondo Atividades
Título: Contextualização
Texto: Contextualizar o conto " Chapeuzinho Vermelho", com a música de Chico Buarque de
Holanda "Chapeuzinho Amarelo". Também o conto "Pele de Asno" com o poema de Fernando Pessoa "Eros
e Psique". Depois pedir aos alunos que escrevam outros textos no genêro (sic) lírico, baseando-se nesses já
trabalhados, com um conto de fadas escolhido por eles.
Considerando a instabilidade das palavras, as proponentes usam o termo
“contextualizar” quando sugerem a possibilidade de se traçar um paralelo entre o conto
Chapeuzinho Vermelho e a música Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque de Holanda.
Embora haja no ambiente virtual um recurso próprio para essa finalidade
(Contextualizando), em que se busca um assunto condizente com o tema e o momento
atual (situação espaço-temporal em que se dá o discurso), supomos que esse deslocamento
do termo aconteça em função de sua não-clareza por parte da Equipe do Portal que valida
os APC. Sendo assim, uma vez aceita nesse contexto, a palavra ganha novo sentido,
ampliando seu campo semântico.
98
Ao sugerir a produção de um texto (gênero lírico) parodiando um conto (gênero
narrativo), observamos que a concepção que as proponentes têm de gênero alicerça-se
apenas nos gêneros escolares (narrativo, lírico e dramático). Tal concepção se contrapõe ao
atual conceito que a academia vem cunhando para gênero do discurso e que se distingue de
tipologia textual, de composição mais fixista, mais estática, incompatível com a
mobilidade ou fluidez dos “modelos” textuais da atualidade. E, recordando o que já
dissemos, para desenvolver um trabalho eficaz com a língua escrita, em consonância com a
vertente sociointeracionista de linguagem adotada nesta pesquisa e assumida pelos PCN e
pelo CBP-LP, a decisão pelo gênero de texto é uma das condições fundamentais para que o
sujeito (agente) produza seu texto (BRONCKART, 1999).
A atividade seguinte não sugere uma produção escrita, o que nos faz supor tratar-se
de um aquecimento, supomos, uma reflexão com intuito de despertar o senso crítico dos
alunos para futuros embates com o texto.
Título: Ficção e realidade
Texto: Os contos da literatura infantil partem de um problema vinculado à realidade, como a
carência afetiva, conflito entre mãe e filha, desequilibrando assim a tranquilidade
15
(sic) inicial do conto. A
partir desses problemas, surgem em cena fada e outros elementos mágicos para mudar o rumo da mesma.
Lançar questões provocadoras envolvendo a atualidade, como na história de Chapeuzinho Vermelho: O que a
mãe teria vivenciado, para ter tanto medo do que pudesse acontecer a filha se esta encontrasse o lobo,
significando perigo? Qual foi a intenção do lobo de fazer Chapeuzinho Vermelho ir até a casa da avó se ele
teve condições de matá-la ainda na floresta?
Essas questões provocadoras que partem das proponentes revelam o ponto de vista
a respeito da estrutura composicional do gênero que pressupõe um texto constituído por
um discurso do NARRAR e a sua organização em uma seqüência narrativa, digamos
assim, dos elementos que compõem a narrativa. Elas podem, se bem conduzidas, suscitar
15
Preferimos, no momento da transcrição dos trabalhos postados no Portal Dia-a-Dia-Educação do Paraná,
manter fidelidade aos aspectos formais, garantindo, assim, sua originalidade.
99
outras do imaginário dos alunos, o que poderá contribuir para o enriquecimento das
atividades provenientes das leituras e inferências compartilhadas, permitindo evidenciar as
interconexões entre gêneros em circulação social.
Passemos à análise destas proposituras:
Título: Modernização e mistura dos contos
Texto:
1. Dar continuidade aos contos depois do felizes para sempre; trazendo-os para a realidade da vida
moderna: trabalho, casa, filhos.
2. Escolher alguns contos de fadas e reescrevê-los fazendo a mistura dos mesmos.
Os comandos desses enunciados são elaborados com os verbos no infinitivo
impessoal, comprometendo, desse modo, a compreensão do leitor. Sabemos, pela lógica
que, quem deve “dar” continuidade aos contos são os alunos, entretanto, a oração
subordinada inicia-se com o verbo transitivo direto (trazendo) no gerúndio, seguido do
complemento verbal – os – pronome que se refere a “alunos”. Logo, quem dá continuidade
não pode ser o mesmo sujeito que traz os alunos. (estes funcionam como complemento do
verbo). Enunciados incoerentes causam falhas nas intenções de quem propõe o trabalho.
Deparamo-nos agora com um rol de proposituras as quais analisaremos sob esta
mesma ótica: a da coerência.
Título: Oratória e escrita
Texto:
1. Trabalhar com cartuns, parodiando contos de fadas.
100
2. Gênero narrativo dramático, com peças teatrais elaboradas pelos alunos, mostrando a comicidade
dos contos de fadas, tendo como exemplo o livro "O Fantástico mundo de Feiurinha" de Pedro Bandeira e "O
príncipe desencantado" de Flávio de Souza.
3. Mudança de foco narrativo. Reescrevendo os contos em primeira pessoa, dando versões diferentes
da obra. Ex: Conto "João e Maria", escrevendo a versão da bruxa, versão do pai, ou dos dois irmãos.
4. Trabalhar oratória, onde alunos serão contadores de histórias para o ensino fundamental - quinta e
sexta séries - pois é ouvindo que se sente emoções como o bem-estar, alegria, tranqüilidade, vivendo
profundamente tudo o que as narrativas provocam em quem as ouve.
Os comandos acima também não esclarecem muito bem a quem se dirigem as
proponentes. O primeiro deles pede para se trabalhar com cartuns, tanto podendo ser uma
proposta para os alunos realizarem, como uma sugestão para o professor usar os cartuns na
metodologia de sua aula. O segundo não diz como proceder (se são usadas as peças de
teatro que os alunos tenham produzido em outras aulas, ou se o farão agora). A mudança
de foco narrativo não se destina a ninguém, especificamente. E, por último, um trabalho
com oratória, sem antes prever um estudo de técnicas que auxiliem o aluno a como se
comportar em público, na situação de contador de história, que não é a mesma coisa de,
simplesmente, ler o texto para outros ouvirem.
As atividades seguintes propõem uma leitura dos contos infantis em que se analisa,
pela compreensão das metáforas e sob o prisma da psicanálise freudiana, o comportamento
dos personagens.
Título: Prazer X Realidade
Texto: Analisar alguns contos de fadas conforme a divisão estabelecida por Freud: o princípio do
prazer (excesso de gula, de avareza, de curiosidade) e o princípio de realidade (aprender a protelar o prazer, a
moderar os impulsos, a discriminar os afetos).
Título: Psicanálise nos contos
101
Texto: Trabalhar com metáforas e sexualidade que aparecem nas formas indiretas ou disfarçadas da
genitalidade, como nos contos: Chapeuzinho Vermelho, o lobo (sedução), a menina (incauta). Gata
Borralheira (baile), não fica até o final (relação sexual), príncipe (desejo). Bela Adormecida (curiosidade) ,
objeto proibido(o fuso) , onde se fere (fluxo menstrual).
Título: Mais contos de fadas politicamente corretos
Texto: Este livro nos revela uma outra persceptiva (sic) de alguns contos famosos. É muito
interessante a análise feita pelos alunos que, criticamente analisam as histórias antes tidas por eles como
"muito infantis".
Mais contos de fadas politicamente corretos - James finn Garner - Ediouro.
As leituras e análises sugerem, como podemos verificar, uma discussão sobre o
comportamento dos personagens dos contos infantis; a continuação da narrativa de um
conto depois do “felizes para sempre”, trazendo o enfoque para a realidade, com inserção
de elementos do nosso dia-a-dia; reescrita de contos de fada, com mistura de personagens
de vários contos
16
; uma produção de cartuns, baseada nos personagens dos contos lidos;
produção de texto no gênero dramático, sem contudo, apresentar uma instrução de como
fazer roteiros para teatro; reescrita de contos com mudança de foco narrativo; exercício da
oratória em que os alunos contam histórias para os alunos do ensino fundamental; análise,
oral, de contos sob a perspectiva da psicanálise de Freud; trabalhar a simbologia que as
metáforas dos contos Chapeuzinho Vermelho e A gata borralheira, e A bela adormecida.
Todas essas atividades propostas estão somente elencadas. Não há explicações das
condições de produção que guiam a prática da escrita.
16
O que as proponentes sugerem é colocar para a discussão o que está em voga no momento, como é o caso
da produção cinematográfica, Shrek que, além de fazer alusão aos personagens dos clássicos da literatura
infantil, desconstrói a idéia de beleza e de personalidade forte dos heróis desses clássicos.
102
2.4 - APC 579
A proponente desse APC sugere atividades com o gênero textual, crônica, a fim de
despertar o senso crítico nos alunos.
Título: Um olhar captando o "Cotidiano Imaginário"
Texto: Fatos inverossímeis, narrados a partir de uma notícia, fazem com que os alunos percebam a
fantasia e a ironia, marcas sempre presentes nas crônicas de Scliar.
Na análise da crônica, no entanto, podemos levá-los a concluírem que é no discurso que se denota
(sic) as questões éticas e ideológicas.
Refletir sobre essas marcas linguísticas (sic) sempre presentes, em qualquer texto, é necessário para
que nossos alunos se tornem mais críticos.
A título de exemplificar o que acima foi exposto, segue a notícia que deu origem à crônica, a crônica
e a análise da mesma, feita por mim, podendo o professor questionar os pontos levantados, verificar junto
com seus alunos uma outra leitura possível, e ainda, propor a análise de outras crônicas, previamente
selecionadas. Poderá ser um trabalho bem interessante.
CONFLITO ÉTICO
A doação de um rim aceita por um hospital da cidade de Sheffield, Reino Unido, com a condição de
ser transplantado "apenas para brancos" levantou uma discussão ética no país e fez com que o governo
abrisse uma investigação sobre a discriminação racial na rede de atendimento público. O transplante ocorreu
em julho de 98 no Northern Hospital, mas o caso só foi revelado há dois dias, pela TV britânica BBC. Nem o
nome do doador nem o do receptor foram divulgados. A imposição da condição racial teria sido feita pelos
familiares do morto. O transplante seguiu os passos exigidos pela lei de doação de órgãos do Reino Unido: ao
saber da disponibilidade do rim, os médicos avisaram a Unidade de Transplante da região que, ciente da
restrição, indicou um receptor. O diretor do hospital, Paul Taylor, disse que não ficou sabendo da decisão dos
médicos. "Ainda que os médicos tenham agido em nome da urgência em salvar uma vida, este tipo de
discriminação é inaceitável e não condiz com o altruísmo da doação", disse Vivienne Nathanson, da
comissão de ética da Associação dos Médicos Britânicos. O ministro da Saúde, Frank Dobson, anunciou
ontem o início de investigações oficiais. segundo o Ministério do Interior, se confirmado racismo, os
responsáveis podem ser processados com base na Lei de Relações Raciais, que proíbe no país todo tipo de
discriminação racial. A lei britânica
que regula as doações de órgãos reforça a voluntariedade da doação.
Coloca, porém, restrições inter-raciais sob o argumento de que "em alguns casos pode haver rejeição do
órgão por parte do receptor". Ainda segundo a lei, cabe aos médicos decidir se o transplante pode ser feito ou
não. O que a investigação do Ministério da Saúde quer descobrir é se os médicos estavam observando esse
detalhe ao fazer a restrição ou obedecendo simplesmente a um pedido da família do doador. A falta de órgãos
é um problema crescente no reino Unido. em 98, houve 822 doações. em 99, só 212, até agora. O número de
pessoas que estão aguardando transplante atualmente é de 6.628 pessoas, que representa 5% a mais do que na
mesma época do ano passado. Do total na fila de espera, 13% são de origem asiática, o que fez com que o
governo lançasse, em fevereiro, uma campanha para estimular a doação de órgãos por parte de pessoas dessa
origem.
( Sylvia Colombo, Folha de São Paulo, 08/07/99)
103
A COR DOS NOSSOS RINS
De posse do rim a ser transplantado, eles foram imediatamente ao hospital, em busca do receptor
adequado. Que teria que preencher várias condições. A mais importante: só poderia ser branco.
Já de início cometeram um erro. Foram à enfermaria onde estavam os pacientes mais pobres, alguns
dos quais esperavam o transplante havia anos. Os três primeiros foram eliminados de saída: eram pretos
retintos, vindos das antigas colônias da África. Constatação que fez suspirar um dos membros do grupo:
“Bom era quando eles ficavam lá na terra deles”. Seguiam-se quatro indianos e três paquistaneses,
automaticamente excluídos. Alguém comentou, bem-humorado, que eles poderiam se distrair com uma
guerrinha particular enquanto aguardavam um novo rim.
Com os dois seguintes, a coisa começou a melhorar. Eram mulatos, um deles bastante claro, o que
provocou uma discussão: o que é, exatamente, ser branco? Como caracterizar tal condição? A que grau
deveria chegar a palidez da pele, para que a diretriz relativa ao transplante só para brancos fosse cumprida?
Como não chegaram a um acordo, criaram ali mesmo uma norma que poderia ser resumida assim: na dúvida,
contra o réu. Ou seja: brancura, só imaculada.
O último paciente era branco. Inegavelmente branco. Mas aí o faxineiro do hospital, que estava por
ali, fez uma grave denúncia: branco, sim, mas avó dele havia sido mulata, do Caribe. O paciente foi rejeitado.
Foram aos quartos particulares, e lá, sim, havia um branco autêntico, em estágio final de
insuficiência renal, o que só lhe acentuava a palidez.
O transplante foi feito, mas o paciente morreu logo depois.
- Culpa dos negros - comentou um dos membros do grupo.
- Eles nos atrasaram tanto que chegamos tarde demais.
(Moacyr Scliar, Folha de São Paulo, 12/07/99)
Segue a análise da proponente:
Scliar inicia o seu texto chamando a atenção do leitor para essa questão:
De posse do rim a ser transplantado, eles foram imediatamente ao hospital, em busca de um receptor
adequado. Que teria que preencher várias condições. A mais importante: só poderia ser branco.
Se tomarmos a reportagem, veremos, que a polêmica da notícia está justamente no fato de que o rim
doado, só poderia ser transplantado se o paciente fosse branco. Quando Scliar termina esse primeiro
parágrafo, ele quer chamar a atenção do leitor para o fato, que certamente marcou todos os que leram a
notícia. Até onde pode chegar o homem com seu preconceito?
Scliar faz uma crítica, já no começo da crônica, e passa a ironizar o fato no parágrafo seguinte.
Podemos perceber que a ironia se dá na maneira como o autor utiliza as palavras nessa crônica: eliminados,
pretos retintos, excluídos...conferindo um tom sarcástico às circunstâncias onde deveria predominar o
humanitarismo, ou pelo menos, o bom senso. O fato das personagens não terem nomes e o uso da terceira
pessoa do plural, mostra justamente a indeterminação e o pouco caso com que muitas pessoas, repartições ou
locais públicos, armam-se de preconceitos que foram incutidos nos seres humanos por questões ideológicas.
O homem perdeu suas raízes, e muitas vezes entra em conflito com seu próprio meio. A esse
respeito, vamos notar a ironia fortemente presente.
104
Com os dois seguintes, a coisa começou a melhorar. Eram mulatos, um deles bastante claro, o que
provocou uma discussão: o que é, exatamente ser branco? Como caracterizar tal condição? A que grau deve
chagar a palidez da pele, para que a diretriz relativa ao transplante só para brancos fosse cumprida?
Nessa crônica, Scliar carrega nas tintas surreais, ao enfocar os absurdos que a realidade manifesta. O
que chama a atenção no texto é que o autor tece a narrativa de tal maneira que, além de nos envolver com a
história, leva-nos a refletir profundamente sobre o tema abordado: até que ponto isto pode corresponder à
realidade?
Parece-nos tão real a história, por mais absurda que se apresente, que no desfecho, uma grande
impotência toma conta do leitor, constatando a necessidade urgente de uma reação positiva, por parte do
cidadão comum.
Scliar termina a crônica de uma maneira imprevisível, mas nos chamando para a realidade,
convocando-nos a rever conceitos e preceitos, mobilizando-nos não por meio de emoção, mas por meio da
incômoda sensação de incredulidade e de pasmo que a situação descrita provoca.
Foram aos quartos particulares, e lá, sim, havia um branco autêntico, em estágio final de
insuficiência renal, o que só lhe acentuava a palidez. O transplante foi feito, mas o paciente morreu logo
depois. - Culpa dos negros - comentou um dos membros do grupo.- Eles atrasaram tanto que chegamos tarde
demais.
É interessante observar que o raciocínio lógico das personagens em questão tem um desfecho
igualmente lógico, revelando o seu caráter mesquinho e medíocre. Habilmente, Scliar consegue captar esta
nota inverossímel, a conduzi-la através do relato, até às últimas conseqüências.
Para raciocínio tão tacanho não poderia haver outro desfecho. Como se vê, ao descrever o episódio
com ironia, naturalmente o autor convida o leitor a repensar seus pontos de vista.
A proponente desse APC propõe analisar questões de ordem ética e ideológica
presentes nas crônicas e uma reflexão sobre as marcas lingüísticas que aparecem nesse
gênero textual, apesar de não deixar bem claro o que quer, o que nos sugere uma confusão
do termos ética, ideologia. Temos a impressão de que se refere às marcas lingüísticas.
Como segunda atividade, dá um exemplo de como uma crônica pode originar, nesse caso,
de uma notícia de jornal, mostrando a notícia, uma crônica de Scliar e uma análise dela
mesma sobre essa matéria: a crônica. Além de sugerir a leitura dos textos escolhidos, traz
publicado um de sua autoria, como exemplo de trabalho.
Não podemos negar a importância de sua sugestão, assim como de seu texto-
análise, todavia entendemos que seria interessante, também, visualizarmos aqui exemplos
resultantes das produções dos alunos. Da maneira como se apresentam suas propostas, não
105
vemos explicitadas as condições de produção. A proponente apenas dá a receita,
demonstrando como fazer, ecoando a prática que normalmente se presentificam nos LD.
Tal ocorrência se aproxima das observada por Menegassi (2003). A proponente considera,
pelo que observamos em sua análise, o seu ponto de vista sobre os fatos do cotidiano, o
que serve, como já o dissemos, de exemplo para os alunos se sentirem estimulados a olhar
com mais atenção para os acontecimentos do cotidiano “imaginário”.
2.5 - APC 593
Propondo Atividades
Título: De um modo geral: contos
Texto: Cotidianamente convivemos com os contos, principalmente porque nossa cultura é
extremamente rica nesse aspecto. Podemos então fazer um encontro com pessoas mais experientes, na sala de
aula ou no pátio, para que contem algumas narrativas que seus avós ou pais lhe falavam quando eram
crianças. Temos autores ótimos dos quais podemos nos servir na comunicação e na informação, dentro da
sala de aula, além de aplicarmos no trabalho ou em outra situação na vivência de seu aluno. Nesse espaço, ele
terá a total liberdade de se comunicar e falar o que achar interessante como experiência para seus colegas de
classe. Podemos também trabalhar a linguagem oral e escrita, detectando suas diferenças e semelhanças,
além de descobrirmos o que está atrás das entrelinhas, usando a interperetação (sic) textual, não ficando
somente em textos, mas também em figuras e "fragmentos chaves".
Os proponentes desse APC trabalham com contos de tradição popular. Sugerem um
encontro entre os alunos e pessoas mais experientes para que se faça uma roda de contos.
Em sua proposta, entretanto, não sabemos se quem irá contar narrativas são os
alunos ou os convidados. O pronome de referência, “seu”, tanto pode apontar para essas
pessoas convidadas ou para os alunos, gerando ambigüidade. Também não ficam muito
claras, para nós, suas argüições no que se refere à autoria de contos. Veja:
“Temos autores ótimos dos quais podemos nos servir na comunicação e na informação, dentro da
sala de aula, além de aplicarmos no trabalho ou em outra situação na vivência de seu aluno.”
106
Se atentarmos para seqüência frasal, podemos dizer que esse trecho se apresenta
comprometido na sua coesão e que afeta a coerência. De que autores falam os
proponentes? Autores de contos já publicados em livros trabalhados em sala ou de seus
alunos, em função da produção escrita deles? Evidenciamos nessa passagem outra
ocorrência de ambigüidade. E, na seqüência, ao mesmo tempo em que os proponentes se
incluem na propositura (temos, podemos, aplicarmos), ficam de fora quando dizem “seu
aluno”, incorrendo igualmente em incoerência local. Depois voltam a dizer:
“Podemos também trabalhar a linguagem oral e escrita, detectando suas diferenças e semelhanças,
além de descobrirmos o que está atrás das entrelinhas, usando a interpretação textual, não ficando somente
em textos, mas também em figuras e ‘fragmentos chaves’ ”
Ainda que mencione em sua propositura o trabalho escrito, os proponentes mais
uma vez não esclarecem se esses textos são resultado da escrita dos alunos ou se são textos
de autores lidos nos livros.
Ao que se observa, o trabalho que eles sugerem prioriza a linguagem oral, no
momento dos contos, e a leitura de textos fazendo a interpretação dos mesmos, com
atenção no sentido conotativo das palavras. Novamente são focalizadas as interações na
esfera de criação literária. As outras esferas de comunicação humana parecem ser
esquecidas. A produção escrita aqui não é levada em conta. E mesmo as sugestões com as
quais nos deparamos não apresentam nenhuma fundamentação. São postas sem reflexão,
sem clareza, nem objetivo. As condições de produção não aparecem explicitadas,
conferindo com o resultado das análises de Menegassi (2003).
2.6 APC 647
Propondo Atividades
107
Título: Construir peça teatral a partir de uma narração
Texto: Para efetuar essa atividade com sucesso, primeiramente, deve-se escolher uma narrativa de
fácil assimilação por parte dos alunos, a sugestão é que se escolha para uma primeira abordagem uma crônica
ou um conto, que são textos curtos e de melhor aceitação entre os jovens. Leia com os alunos o texto
escolhido, de forma que se familiarizem com o texto para o trabalho de construção da peça. Feito isto, siga os
passos:
1. Título - coloque o título da peça (pode ser o mesmo da narrativa).
2. Prólogo - Solicite que os alunos escrevam onde se passará a peça. Pode-se normalmente utilizar o
primeiro parágrafo para introduzir a entrada das personagens.
3. Cenário - Peça para que descrevam o ambiente onde ocorre a narrativa, este será o cenário da
peça.
4. Personagens - identifique as personagens, descreva como são e o que fazem na narrativa,
normalmente nas crônicas e nos contos, há poucos personagens.
5. Monte os diálogos - para cada fala de personagem é colocado, no início, o nome da personagem,
e, normalmente, o estado em que se encontra. Este recurso é denominado de didascálias (indicação cênica),
normalmente destacada entre parênteses. ex:
João(cansado): Corri demais!
6. Siga o percurso da narrativa, excluindo partes que se tornarem difíceis para transpor para a peça.
7. Após este trabalho coletivo, o professor poderá formar grupos de trabalho, sendo que cada grupo
poderá montar a sua própria peça teatral e estes poderão encenar uns para os outros.
O proponente desse APC sugere a construção de uma peça teatral a partir de uma
narração, ou seja, transformar o gênero escolarizado (narrativo) em peça de teatro. Sua
orientação é que se tome uma crônica como leitura prévia, em função de ser esse um
gênero de fácil assimilação pelo aluno. Um texto curto fica mais fácil de encenar. Depois
segue com as instruções de como construir uma peça teatral. Todavia, alterna o interlocutor
108
na hora de dar as instruções de como fazer um roteiro de teatro. Ora se dirige ao professor,
como em:
“Leia com os alunos o texto escolhido pelo professor...”
O comando nº1 que pede: “coloque o título da peça (pode ser o mesmo da narrativa)” parece
estar se dirigindo ao aluno, no entanto o comando nº2, no prólogo, retoma a interlocução
com o professor: “
Solicite que os alunos...”, o mesmo ocorrendo no nº3, cenário: “Peça para que
descrevam...”
Nos comandos de 4 a 6, volta a se dirigir ao aluno: “Identifique as personagens
(4)...monte os diálogos (5)...siga o percurso (6)...”
A próxima atividade fica por conta dos alunos, que poderão formar grupos e
construírem sua própria peça teatral, para encenarem uns aos outros.
Todos os comandos, com exceção do nº7, são construídos de maneira imperativa,
deôntica
17
, em que a ação resultará sempre de uma ordem, sem que haja abertura para
discussão e planejamento conjunto. A maneira pela qual esses enunciados são introduzidos
na propositura de trabalho com produção textual nos deixa margem para comparações com
as atividades presentes no livro didático, cujos comandos são quase sempre imperativos,
não restando outra opção para o aluno responder ao proposto.
Bem sabemos que é o aluno que está aprendendo a escrever uma peça de teatro,
seguindo um roteiro instrucional passado pelo professor. Isso também nos dá a garantia de
que o destinatário privilegiado (mesmo que o trabalho final seja apresentado entre os
colegas da sala), é o professor, quem atribuirá uma nota para o texto. Temos aqui um
interlocutor real com estatus de superioridade, e os interlocutores reais, mas que figuram
num segundo plano. Mesmo que a peça seja apresentada para os colegas assistirem, é com
17
Entendidas como discurso imperativo, de obrigação.
109
o professor que os alunos podem estar preocupados. Querem agradar, fazer bonito, pois
disso dependerá sua nota final nessa atividade.
Mais uma vez podemos dizer que estamos diante de uma atividade em que não se
consideram explicitamente as condições de produção. Escreve-se para a escola, para uma
avaliação, e não na escola, o que poderia garantir, segundo Geraldi (1983), a função social
do texto. Acreditamos que os alunos não conseguiriam entender ainda, a julgar por essa
atividade, qual a razão de se produzir um texto como esse. Numa ocasião como essa, o
professor poderia trabalhar melhor esse gênero discursivo – roteiro de uma peça teatral - e
a esfera social em que este circula.
O gênero escolhido para essa proposta é a peça teatral que os alunos deverão
produzir, adaptada de um texto do interesse deles, de uma crônica ou de um conto, textos
que o professor considere mais apropriados para os jovens. Pressupõe-se que tais gêneros
já sejam do conhecimento dos alunos, embora não parta deles essa opção. Portanto, o
sucesso do trabalho dependerá da escolha (provavelmente do professor) do texto-base. A
relação professor-aluno desenha-se numa assimetria, a qual dificulta qualquer manifestação
dialógica (BAKHTIN, 1992).
As instruções dadas para a composição da peça são pontuais e sem explicitação de
como realizá-las, posto que indicam o que fazer, como ocorre na atribuição do título e na
construção do prólogo. Talvez isso aconteça em razão de se estar pensando no professor-
colega e não no próprio aluno. Nesse sentido, o proponente do APC age da mesma maneira
que muitos autores de livros didáticos na condução das atividades.
Novamente aqui, o professor proponente não se decide pelo seu interlocutor. Não se
decide por quem deverá seguir os passos: ora dirige-se ao seu par, como em “solicite que os
110
alunos escrevam onde se passará a peça”
, ora ao aluno que produzirá o texto, o que se observa em
“identifique as personagens”.
Mais uma vez, o que se constata, nesta proposta, é a presença do gênero, porém se
não for uma escolha eficaz (BRONCKART, 1999) – não resultará em qualquer objetivo.
Não há, como se vê, em momento algum, uma definição da finalidade desse trabalho, o
que seria suporte para as outras condições necessárias (MENEGASSI, 2003).
A julgar pelo último item, o que se propôs não passa de um modelo a ser seguido
posteriormente, em que se observa, de forma tênue, uma preocupação com o destinatário
(os colegas de turma). “Essa razão artificializada só pode levar o aluno a imitar os textos
formalmente, para, quem sabe um dia, virem a aprender como se faz” (GERALDI, 1993).
Os textos que porventura surgirem serão encenados na sala, para a própria turma. A
produção escrita, no entanto, não será socializada. A autora do APC poderia, nesse
momento, levar os alunos a vivenciarem a escrita de forma reflexiva, trocando textos entre
os colegas, aos pares, dando oportunidade para a discussão/reflexão/transformação/
refacção. Esse seria o momento de vivenciar a escrita, de forma reflexiva sobre a ação da
escrita, de trocar os textos com outras turmas, para que fossem escolhidos os melhores. E
aí, sim, transformá-los em trabalhos encenados.
2.7 APC 651
Propondo Atividades
Título: Intertextualidade e produção textual
Texto:
A partir da intertextualidade predominante nas músicas da MPB, tanto antigas quanto atuais, que
tratam de temas como: drogas, ideologias, miséria, violência, falta de perspectiva dos cidadãos, resistência
aos padrões sociais impostos, entre outras questões sociais polêmicas, os alunos, após contextualizarem a
111
música trabalhada com sua época, partem para uma produção textual de temas propostos, seja em forma de
paródia, paráfrase ou mesmo textos dissertativos relacionados aos seguintes aspectos:
- A ideologia do jovem frente aos seus desejos de liberdade, status e consumo;
- Qual a atitude do jovem sobre fatos relacionados à violência e à falta de oportunidade de melhoria
da qualidade de vida;
- Como o jovem encara a realidade social violenta com relação ao tráfico e uso de drogas.
MÚSICAS PARA SEREM TRABALHADAS
IDEOLOGIA (Cazuza)
Meu partido é um coração partido E as ilusões estão todas perdidas. Os meus sonhos foram vendidos
Tão barato que nem acredito. Eu nem acredito que aquele garoto Que ia mudar o mundo Freqüenta agora
festas do “grand monde”. Meus heróis morreram de “overdose” Meus inimigos estão no poder. Ideologia, eu
quero uma pra viver. O meu prazer agora é risco de vida Meu “sex and drugs” não tem nenhum “rock’n roll”
Eu vou pagar a conta do analista Pra nunca mais ter que saber quem eu sou. Pois aquele garoto que ia mudar
o mundo, Agora assiste a tudo em cima do muro.
BRASIL (Cazuza)
Não me convidaram Pra essa festa pobre Que os homens armaram pra me convencer A pagar sem
ver Toda essa droga que já vem malhada antes de eu nascer Não me ofereceram Nem um cigarro Fiquei na
porta estacionando os carros Não me elegeram Chefe de nada O meu cartão de crédito é uma navalha Brasil
Mostra a tua cara Quero ver quem paga Pra gente ficar assim Brasil Qual é o teu negócio? O nome do teu
sócio? Confia em mim Não me convidaram Pra essa festa pobre Que os homens armaram pra me convencer
A pagar sem ver Toda essa droga Que já vem malhada antes de eu nascer Não me elegeram A garota do
“Fantástico” Não me subornaram Será que é meu fim Ver TV a cores Na taba de um índio Programada pra só
dizer sim, sim Brasil Mostra a tua cara Quero ver quem paga Pra gente ficar assim Brasil qual é o teu
negócio? O nome do teu sócio? Confia em mim Grande pátria desimportante Em nenhum instante Eu vou te
trair ( Não vou te trair)
QUE PAÍS É ESTE? (Renato Russo)
Nas favelas, no senado Sujeira pra todo lado Ninguém respeita a constituição Mas todos acreditam
no futuro da nação. Que país é este? No Amazonas, no Araguaia, na Baixada fluminense No Mato Grosso,
nas Gerais e no Nordeste tudo em paz Na morte eu descanso, mas o sangue anda solto Manchando os papéis,
documentos fiéis Ao descanso do patrão Que país é este? Terceiro mundo se for Piada no exterior Mas o
Brasil vai ficar rico Vamos faturar um milhão Quando vendemos todas as almas Dos nossos índios num
leilão Que país é este?
112
GERAÇÃO COCA-COLA (Renato Russo)
Quando nascemos somos programados A receber o que vocês nos empurram Com os enlatados dos
USA, das nove às seis Desde pequeno nós comemos lixo Comercial e industrial mas agora chegou nossa vez
vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês Somos os filhos da revolução Somos burgueses sem religião
Somos o futuro da nação Geração Coca-Cola Depois de vinte anos na escola Não é difícil aprender Todas as
manhas do seu jogo sujo Não é assim que tem que ser? Vamos fazer nosso dever de casa E aí então, vocês
vão ver Suas crianças derrubando reis Fazer comédia no cinema com as suas leis
METAMORFOSE AMBULANTE (Raul Seixas)
Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter
aquela velha opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Eu quero dizer
agora o oposto do que eu disse ontem Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha
opinião formada sobre tudo Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo Sobre o que é o amor Sobre
o que eu nem sei quem sou Se hoje eu sou estrela Amanhã já se apagou Se hoje eu te odeio Amanhã lhe
tenho amor Lhe tenho amor, lhe tenho horror Lhe faço amor, eu sou um ator É chato chegar a um objetivo
num instante Eu quero viver essa metamorfose ambulante Do que ter aquela velha opinião formada sobre
tudo Eu vou te dizer aquilo tudo que eu lhe disse antes Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante Do que ter
aquela velha opinião formada sobre tudo.
A proponente desse APC sugere a produção textual a partir do confronto de várias
canções dos anos 70, 80 e da atualidade, e que tratam de temas do cotidiano do aluno. Essa
produção pode ser feita, segundo ela, sob a forma de paródia, paráfrase ou mesmo
dissertações relacionadas à ideologia do jovem, a sua reação frente às adversidades da
vida. Como compositores, apresenta Cazuza, Renato Russo e Raul Seixas. Todos com
canções consideradas polêmicas e que agradam aos jovens.
Mais uma vez não vemos aqui qualquer preocupação em se produzir texto como
atividade reflexiva, em que se priorizem certas condições que justifiquem a necessidade da
escrita, que não seja apenas para a escola. Esta, sim, deve ser o lugar em que se escreve,
mas com algum objetivo. A produção de texto, segundo os pesquisadores que consultamos
aqui, deve ser encarada como trabalho, e não como conseqüência de uma leitura feita, ou
ainda como fruto de uma inspiração, algo semelhante ao que se dá em um transe
mediúnico. Escrever é trabalhoso e deve acionar muitos mecanismos que remetem a
113
conhecimentos de mundo e de funcionalidade da linguagem. E é tarefa do professor,
enquanto mediador do conhecimento, explorar esses meios nos textos (letras de música)
que sugere como leitura prévia.
2.8 - APC 904
Propondo Atividades
Título: NAVEGANDO SOBRE O HIPERTEXTO ELETRÔNICO
Texto: Acessar um sítio, cujo tema seja de interesse da turma. Nesta viagem o aluno poderá pôr em
prática o seu lado leitor, assim como o seu lado produtor, e ver as potencialidades do hipertexto. Utilizar o
buscador para encontrar uma sugestão de viagem com a qual os alunos concordem e sobre o crivo do
educador.
Título: SIMULANDO UM HIPERTEXTO I
Texto: Coloco como desafio conhecer
18
o hipertexto com ou sem a ferramenta tecnológica, através
de simulações que dêem uma boa noção sobre a relevância do texto de divulgação científica - o hipertexto.
SIMULANDO UM HIPERTEXTO I (Sem computador):
Dividir a turma em 5 ou 6 grupos. Escolher, com a participação deles, um tema (pode ser um
conteúdo se que esteja trabalhando). Distribuir a cada equipe canetas, lápis-de-cor, pincéis atômicos e papel.
Todos os alunos estudam o tema a partir de um texto impresso e, com a mediação do professor, expressam o
que aprenderam, usando recursos variados: desenho, música, colagem, expressão corporal (dança, gestos),
palavras, gráficos. Cada grupo escolhe o recurso que mais vier ao encontro com suas habilidades. Terminada
a montagem, cada trabalho funcionará como um link (ligação), os alunos revezam-se na sua apreciação e
participam com sugestões, críticas e elogios – que podem ficar registrados e alterar a primeira configuração
de cada trabalho. Neste momento eles estarão “navegando por um hipertexto”. A atividade é, também, uma
oportunidade de incorporar ao texto escrito outras linguagens, levando-se em conta que cada um tem
diferentes formas de aprender.
Título: SIMULANDO UM HIPERTEXTO II
Texto:Dado o MOTE, os alunos dividem-se em grupos. Na seqüência se subdividem em equipes
pequenas e de preferência com o mesmo número de integrantes. Cada grupo de equipes fica com uma das
etapas da narrativa:
18
Acreditamos que aqui seria melhor o termo “construir” ou “elaborar” uma vez que, conforme as instruções
que se seguem, estão propostas ações ou atividades de composição de um hipertexto.
114
• 1º grupo de equipes criará, a partir do mote, a situação inicial;
• 2º grupo de equipes criará, a partir do mesmo mote, o desenvolvimento (criação de conflito);
• 3º grupo de equipes criará, ainda com o mesmo mote, o desfecho.
Terminado o momento de produção, reestrurar (sic) e passar os textos a limpo. Os textos,
seccionados, circulam entre os alunos e estes devem encontrar as ligações mais adequadas para formar
narrativas completas. No caso de alguma equipe não conseguir a combinação entre as partes da narrativa,
cria-se o momento de interação entre as equipes. Elas terão que adequar os textos, escolhendo, suprimindo,
concordando e coordenando palavras e idéias até chegarem a um texto final. Neste momento é bom que os
alunos percebam que embora tenham dado um fim ao texto, ele ainda poderá ser mudado e se transformar
num texto mais rico ou até mesmo num outro texto – como exemplo do que acontece com o hipertexto.
Os proponentes desse APC sugerem uma navegação pelo hipertexto eletrônico, em
que o professor acessa um sítio de interesse da turma. Na viagem que fará, o aluno,
segundo a professora-proponente, porá em prática “seu lado leitor e produtor” (não
esclarecendo do quê; supomos ser do hipertexto) como se vê neste enunciado:
“Acessar um sítio, cujo tema seja de interesse da turma. Nesta viagem o aluno poderá pôr em prática
o seu lado leitor, assim como o seu lado produtor, e ver as potencialidades do hipertexto. Utilizar o buscador
para encontrar uma sugestão de viagem com a qual os alunos concordem e sobre o crivo do educador
”.
Cada aluno segue o trabalho proposto, escolhendo um caminho pelo qual “viajará”,
ao mesmo tempo em que observa as potencialidades do hipertexto, mas sempre sob o crivo
do professor. Além disso, os proponentes sugerem um desafio aos alunos, em grupos de 5
ou 6, a fazerem atividades que simulem um hipertexto com ou sem o auxílio do
computador. Os alunos fazem várias atividades como desenhos, colagens, e outras
conforme suas habilidades. Depois tentam cruzar e construir um hipertexto a partir de uma
temática sempre proposta pelo professor.
115
A outra atividade é com um texto, também em grupo, em que o professor divide a
classe novamente e pede que os grupos se subdividam e cada subgrupo produza uma parte
do texto (situação inicial, conflito e desfecho). As secções escritas circulam entre os
alunos, que farão a montagem dos textos com narrativas completas, de várias maneiras
possíveis, como um hipertexto, que é o resultado de uma rota escolhida.
Segundo os proponentes desse APC, o trabalho com hipertexto “com ou sem
ferramenta tecnológica” (aqui se referindo à tecnologia digital), dará aos alunos “uma boa
noção sobre a relevância do texto de divulgação científica – o hipertexto”, como um novo
gênero discursivo. Percebemos, por essa razão, que ocorre um equívoco na concepção do
hipertexto, uma vez que este não é em si mesmo um texto de divulgação científica, como o
artigo, paper, ensaio etc.
A fim de reforçarmos o que estamos dizendo, buscamos em Marcuschi (2002) sua
concepção dos novos gêneros que surgem no ambiente digital. Para ele, esses gêneros se
constituem de uma plasticidade e maleabilidade incomuns, pois
eles são dinâmicos e prioritariamente caracterizados por seus aspectos
sócio-comunicativos e funcionais, logicamente sem deixar de levar em
conta seus aspectos lingüísticos e estruturais. Algumas vezes, a forma
determina o gênero; em outras, sua função, ou ainda o próprio suporte ou
ambiente em que aparece (MARCUSCHI, 2002, P.70).
Não são, portanto, as tecnologias que determinam um tipo específico de gênero,
“mas condicionam as mudanças na medida em que criam condições para que elas
ocorram” (LÈVY, 1999, p.109). Elas favorecem o “surgimento de formas inovadoras, mas
não absolutamente novas” (p.109) segundo a teoria bakhtiniana. As peculiaridades
lingüísticas e estruturais contam bem menos que suas “funções comunicativas, cognitivas e
institucionais” (MARCUSCHI, 2002, p.20).
116
Essa possibilidade de leitura de textos, em que se abre um leque de direcionamentos
de leitura não é nenhuma novidade, ou seja, não surgiu com a tecnologia digital, como nos
parece ser a concepção da proponente. Nosso cérebro age dessa forma quando acionamos a
memória. Vamos “abrindo arquivos”, trilhando caminhos para nos lembrar de algo de que
precisamos, quer seja numa situação de produção intelectual, quer seja nos momentos em
que desejamos recordar de algo importante. O hipertexto sempre esteve presente, também,
de certa forma nos livros que lemos, quando fazemos a leitura das notas de rodapé, quando
nos aprofundamos mais na leitura, buscando as fontes a que os textos remetem nas
referências, ou mesmo quando nosso conhecimento de mundo faz os linques com
elementos provenientes da intertextualidade. Nesse momento, acionamos as informações
do arquivo mental (embora de maneira natural), divagamos um pouco para, em seguida,
mergulhar novamente no texto, ressignificando-o em função desse dialogismo, conceito
que tomamos de Bakhtin (1992).
Novamente, o que vemos nessas propostas são técnicas de construção de textos. O
professor lança um desafio, que é o de construir hipertextos no coletivo, sem o uso da
ferramenta tecnológica digital. São dadas, aos alunos, instruções de como fazer um texto,
resultado de fragmentos que se encaixam de forma coerente, sem fugir ao tema dado
inicialmente aos grupos. A grande finalidade é, como pudemos ver nas propostas, dar aos
educandos uma noção de como se constrói um hipertexto, fazendo uso de várias
linguagens, que se conectam pelo princípio da coerência, da não-contradição (como vimos
no primeiro capítulo) local ou global.
Ao se trabalhar os diversos gêneros textuais, inclusive os gêneros digitais, o
professor estará proporcionando uma imersão no universo da escrita, entretanto não vemos
contempladas as condições de produção de texto, cuja finalidade consiste em atender a
117
uma necessidade da escrita nas relações sociais. Vemos, sim, o predomínio da
metalinguagem e o hipertexto como um fim em si mesmo.
Nas palavras de Marcuschi (2002), é difícil uma definição formal para gêneros
textuais, que não devem ser contemplados fora de seus “usos e condicionamentos sócio-
pragmáticos caracterizados como práticas sócio-discursivas” (p.20).
Fica-nos claro que o hipertexto não pode ser classificado como gênero textual de
divulgação científica, e que se utilizarmos essas estratégias de composição de um grande
texto oriundo de múltiplas conexões com fim em si mesmo, estaremos apenas transferindo
as velhas práticas frente ao quadro negro para o quadrante da tela do computador.
2.9 APC 1114
O proponente deste APC propõe um texto (de imprensa- reportagens), também da
esfera jornalística.
Título: PROJETO Violência na Família / Violência na Escola
Texto:A proposta de atividade a seguir visa desenvolver um trabalho contextualizado, abrangendo
basicamente as disciplinas de Língua Portuguesa, Geografia, História, Matemática, Estatística, Ética e
Cidadania.
Objetiva-se fazer um levantamento estatístico dos problemas familiares, ou equivalentes, para
entender a incontrolável onde de violência nas escolas e na sociedade. Os trabalhos obtidos serão reunidos
em textos de reportagens a serem trabalhados nos colégios e divulgados, dentro do possível na imprensa
escrita, retratando assim o gênero reportagem que é tema de todo projeto de estudo.
Com a presente proposta de reportagem pretende-se levar os alunos do Ensino Médio a um
pensamento mais crítico, um ser criativo e autônomo e responsável nas (sic) suas idéias e ações.
A - ROTEIRO
1- Conceituação de reportagem e formação de grupos (4 a 5 alunos);
118
2- Escolha do tema/título acima ou equivalente para ser desenvolvido (violência, drogas,
prostituição...);
3- Investigações;
4- Recursos necessários ao centro de documentação, pesquisas/ internet...;
5- Exame dos documentos e definição do roteiro com os locais e as pessoas a contactar.
B - PROCEDIMENTOS E REDAÇÃO
1- Alternância dos planos (principais planos/
19
planos gerais);
2- Ações/reflexões;
3- Descrições/citações;
4- Imagens/histórias;
5- Discurso(direto/indireto)
20
;
6- Frases curtas/períodos longos;
7- Quadros percentuais.
C - AVALIAÇÃO
1- Estruturação da pesquisa num texto final, observando o Título/Manchete, o Lead e o
Desenvolvimento;
2- Apresentação escrita do texto ao professor;
3- Apresentação via jornal falado aos demais colegas de colégio;
4- Divulgação dos trabahlos (sic) nos colégio (sic)
21
e na imprensa.
19
Os APC, antes de serem publicados, são revisados por uma equipe que cuida da ortografia, digitação,
regras do padrão culto da LP. Procuramos deixar o máximo original possível (salvo alguns ajustes de fonte) a
transcrição das proposituras. Doravante indicaremos os equívocos ortográficos apenas com o termo “sic”.
20
Idem.
21
Idem.
119
Nessa proposta podemos ver claramente que a finalidade da produção do texto
precede a definição do gênero reportagem. Primeiramente se faz uma conscientização dos
problemas sociais causadores da violência, apostando-se no desenvolvimento do senso
crítico dos alunos e desejando que estes se tornem autônomos e responsáveis por seus atos.
O destinatário primeiro é, ainda, o professor, depois os colegas de sala, alunos de outros
colégios e, por fim, a sociedade em geral. Contemplam-se aqui os três tipos de
destinatários de Bakhtin (1992): o real (normalmente o professor que avaliará o texto), o
virtual (esse destinatário é todo aquele que, porventura, venha a ler o texto) e o superior
(que é a instituição social: todos os segmentos que representam a sociedade). O texto
veiculará nos colégios, no formato de jornal falado, depois na imprensa, através do jornal
impresso ou, supostamente, da mídia televisiva.
Por estar se dirigindo a um colega seu, o professor esboçou um projeto em tópicos,
dando uma seqüência das ações a serem desenvolvidas, sem se preocupar com a orientação
subsidiária para a pesquisa e demais procedimentos. Pontua os itens para a avaliação do
texto: título, manchete, lead, e desenvolvimento.
Embora, o proponente cometa alguns equívocos ao se referir ao gênero reportagem
como se fosse estruturado da mesma maneira que uma notícia (gênero da mesma esfera
social, porém com estruturas composicionais diferentes). Das três atividades propostas,
essa é a que mais se aproximou da teoria interacionista de linguagem, por considerar as
condições essenciais para que um texto desempenhe a sua função social. Melhor dizendo,
apresenta um tema (pesquisa sobre problemas familiares) interessante, direcionado a
alguém (todos da comunidade em que se insere a escola), uma razão (para compreender a
origem da violência que afeta a escola e a sociedade em geral), uma adequação (no formato
de reportagem) e estratégias lingüísticas condizentes com a intencionalidade do seu autor
120
(elaboração do texto dentro dos procedimentos que o gênero – reportagem – requer). O
proponente leva em consideração esses elementos realizando, dessa forma, uma prática
coerente com a concepção de linguagem discutida aqui.
2.10 - APC 2017
Os proponentes
22
desse APC optam pelo conteúdo Instrucionais, focando o gênero
roteiro de vídeo. A primeira atividade propõe a exploração da função metalingüística das
imagens, ou seja, o uso do equipamento de produção televisiva para falar sobre o próprio
roteiro de vídeos que faz uso desse equipamento. O desafio nessa atividade é a criação de
“mensagens audiovisuais, que tenham como tema o próprio vídeo”. Segundo os
proponentes, “é um excelente meio de se promover aprendizagem significativa a partir da
pesquisa e da investigação”.
Título: Explorar a Função Metalíngüística das Imagens
Texto: Falamos em função metalíngüística quando falamos do código explicando o próprio código.
Logo, no caso do vídeo, falar de função metalíngüística é falar da linguagem audiovisual como função
esclarecedora do próprio audiovisual.
O vídeo permite que seja analisado (sic) a sua concepção de construção, dando ao aluno a noção de
sua estrutura e organicidade. Isto ocorrerá de forma mais acentuada se o professor proporcionou
anteriormente a ele a noção de como se constrói (sic) roteiros de vídeos.
Desafiar o aluno a criar mensagens audiovisuais, que tenham como tema o próprio vídeo, é um
excelente meio de se promover aprendizagem significativa a partir da pesquisa e da investigação.
A segunda atividade é sobre telejornalismo, adaptada, como disseram os
proponentes, do módulo 3, do curso TV na Escola e os Desafios de Hoje, em que se
22
Este APC recebeu colaboração nos recursos Sítio, Propondo Atividades e Curiosidades. Por essa razão,
falaremos em proponentes, no plural.
121
discutem alguns filmes que tratam de algum aspecto do cinema
23
(metalinguagem). Em
seguida fazem esta propositura:
Título: Atividades sobre telejornal
Texto: Esta atividade foi adaptada do módulo 3 do curso Tv na Escola e os Desafios de Hoje.
Filmes como Quarto Poder (EUA, 1997), direção Costa-Gravas, e Thruman, o Show da Vida (EUA,
1997), direção Peter Weir, que mostram os recursos técnicos e também a linguagem na produção de um
programa de TV, serve para provocar a reflexão junto aos alunos sobre o papel da mídia, sua tendência para
jogar, manipular, convencer, esclarecer e, ainda, "editar a realidade".
Após discutir com os alunos alguns destes filmes propor a seguinte atividade:
a) Criando e apresentando em sala de aula um telejornal (5 min)
1) ler um jornal impresso e selecionar de duas a cinco notícias.
2) Estabelecer os critérios para essa seleção.
3) Redigir as notícias que serão narradas.
4) Imaginar que se destina ao grande público da TV aberta.
5) Apresentar o telejornal (apresentadores não precisam imitar os dos telejornais existentes).
b) Reflexão sobre o telejornal apresentado.
1) Que notícias escolheu? Por quê?
2) Explicar como selecionou essas notícias?
3) Apresentam temas polêmicos, úteis, atraentes de grande audiências (sic)?
4) O que se aprende com o telejornal criado?
5) A que tipo de público essas notícias interessariam?
6) Escrever essas reflexões e entregar ao professor.
As instruções confirmam o gênero a que se propõem trabalhar os professores-
proponentes desse APC. Dividida em duas partes, a atividade se constituirá na criação e
reflexão de um telejornal. Supomos que deva ter ocorrido um equívoco na cronologia
23
Como sugestão de metalinguagem, o proponente poderia ter sugerido aqui uma análise do filme do italiano
Giuseppe Tornatore – 1989, Cinema Paradiso, que conta sobre a amizade de um menino com um projetor de
filmes, mergulhados no universo mágico do cinema.
122
sugerida aqui (a apenas em um único momento do trabalho), em que se notam reservados
apenas 5 minutos para a elaboração e apresentação do telejornal pelos alunos. Criar e
apresentar um telejornal em cinco minutos seria impossível. Uma atividade como essa
ultrapassa o tempo de duas aulas de 50 minutos. A leitura dos jornais impressos e a
discussão dos critérios para a seleção das notícias demandam um tempo considerável. O
aluno ainda redigirá (o que nos parece uma cópia) as notícias que serão narradas. Tendo
em vista tal impertinência, podemos considerar que a indicação do tempo (5 min) refira-se
ao da apresentação do telejornal. De qualquer forma, o comando não é claro, o que
interfere na explicitação eficaz das condições de produção textual.
Voltando à análise da atividade, essa contará com a imaginação do aluno. Melhor
dizendo, o aluno imaginará um público espectador para recepção do seu telejornal. Nesse
caso, observamos que o aluno escreve ou apresenta para um leitor/espectador virtual. O
faz-de-conta que se instaura aqui transforma os receptores reais em personagens de ficção.
Temos, portanto, como possível interlocutor real a pessoa do professor da turma.
No momento seguinte, discutem-se os procedimentos utilizados na produção do
trabalho proposto pelo professor. Para que serve esse trabalho, se os temas são polêmicos e
que tipo de público essas notícias interessariam? Encerram-se as atividades com um
relatório escrito das reflexões, que deverá ser entregue ao professor (interlocutor real como
já o mencionamos). Tal atividade reflexiva parece-nos útil ao processo de conscientização
do ato de produzir textos em sua plenitude.
O que vem a seguir são apenas instruções de como o professor pode intervir nessas
atividades pedagógicas em que se utilizam roteiros para a execução de uma obra televisiva.
E o professor “deve atuar falando sobre a arte da criação de roteiros”.
123
Título:Produção de roteiro para vídeo digital
Texto: Muitas são as possibilidades pedagógicas neste universo digital. O professor de Língua
Portuguesa pode enriquecer muito suas aulas, principalmente quando estiver trabalhando com narrativas.
Para isto basta propor atividades onde os alunos serão estimulados a produzirem seus próprios filmes ou
vídeos digitais.
O filme ou o vídeo não precisam necessariamente ser de 24 ou 30 quadros por minuto, como no
cinema, ele pode ser com imagens estáticas seqüenciadas como uma história em quadrinhos, que estará
contando uma história. As revistas em quadrinhos estão aí para atestar o que estou dizendo.
Assim como para histórias em quadrinhos, o filme ou o vídeo digital também requer roteiro e neste
ponto é que o professor deve atuar falando sobre a arte da criação de roteiros.
Veja em anexo o roteiro de um documentário de Domingos Pellegrini
Clique para visualizar o arquivo
Os proponentes, como observaremos a seguir, sugerem ao professor interessado por
essas proposituras alguns endereços em que aparecem modelos de atividades práticas que
podem ser usadas para o “aprimoramento” da técnica de filmagem. Essa indicação, embora
atenda aos propósitos estabelecidos pela equipe organizadora do Portal, não garante o
sucesso da ação pedagógica. Ela é apenas uma referência para quem “deseja” aprender
técnicas de filmagem, não necessariamente somente o aluno.
Título: Exercícios para aprender a produzir vídeos
Texto: Veja que no sítio http://www.internetcampus.com/port/tvp_ind.htm existem diversos
exercícios que podem ser feitos por quem deseja aprimorar seus conhecimentos sobre a produção de vídeos.
Você poderá selecionar algumas dessas atividades e fazer as adaptações necessárias para usar em sala de
aulas na produção de roteiros e mesmo no aprimoramento da técnica de filmagem.
Deparamo-nos, a julgar pelas evidências presentes nos enunciados desse APC, com
a concepção de ensino que diz que o conhecimento é transmitido. O professor, e apenas
ele, é o detentor do conhecimento. As leituras complementares acessáveis em alguns
endereços eletrônicos e arquivos anexados voltam-se para o tema em si e dão, tão somente,
exemplos de como fazer. Apesar de prática comum a exposição de conteúdos, para
posteriores atividades, os alunos precisam ter desenvolvido capacidades para interagir com
diferentes gêneros: roteiro de vídeo, discussão oral, notícia, telejornal, exposição oral,
124
reportagem, entrevistas, história em quadrinhos, documentários. Principalmente, que se
reconheçam as funções sociais de cada um desses gêneros.
2.11 - APC 2170
As proponentes desse APC sugerem várias atividades, dentre elas, uma “aula-
oficina” de poesia em que se colocam músicas clássicas de fundo como recurso
pedagógico para a inspiração tomar conta dos alunos e que, segundo elas, “garantirão a
produção criativa de textos escritos”
. Além desse recurso, sugere ao professor um “aporte teórico”,
para um ambiente propício à “construção dessa aula”
.
Título: Desenvolver a sensibilidade poética e corporal através da música
Texto: A música new age de Kitaro, Enia, assim como clássicos de Verdi, Bach poderão ser
utilizados como recurso de sensibilização poética, ao lado das múltiplas funções que exerce nos organismos
vivos. A ciência e a mística nos informam que a música tem propriedades terapêuticas não somente sobre os
humanos, mas também sobre os animais e os vegetais. Por isso ela é tão utilizada nos consultórios, nos locais
de espera, em ambientes de psicoterapia, na recuperação de pessoas e animais debilitados, nas estufas de
flores, etc.
Uma aula-oficina de poesia que tem como recurso pedagógico, a música, trará ao ambiente um
clima de saudosismo, de fortes emoções, de sentimentos inesperados, que garantirão a produção criativa de
textos escritos.
Através das imagens, que também poderiam ser solicitadas aos alunos no dia anterior, o professor
sugere a leitura de poesias que ele mesmo trouxe ou que seus alunos trouxeram. Essa leitura deve ser
dramatizada com alternância de voz: voz alta, voz baixa, de gestos sincronizados com a fala. O aporte teórico
para essa metodologia pode estar em obras que valorizam a corporeidade, como por exemplo: O Corpo fala
de Roland Tompakow e Pierre Weil . Isto quer dizer que todo o ambiente deve estar preparado, para a
construção dessa aula.
Julgamos de bom senso a atitude de tomarmos a música como recurso pedagógico,
todavia discordamos com a afirmação de que esse recurso, por si próprio, se converta na
garantia suprema da produção “criativa de textos escritos”. Em conformidade com o
pensamento de Fiad e Mayrink Sabison (1991, p.55), que tomam a escrita como trabalho,
125
esperar que surjam produções criativas nesses ambientes sonoros é, no mínimo, julgar que
se escreve em função de um dom inato. Para essas autoras, como já vimos anteriormente,
“a escrita é uma construção que se processa na interação” (p.55). Conseqüentemente, quem
não tiver dom, sequer poderá esboçar uma escrita sobre qualquer tema proposto nas aulas
de LP.
Nas demais atividades, a proponente considera que a exploração dos órgãos dos
sentidos - audição, olfato, visão, paladar e tato – podem ser eficientes como estratégias de
sensibilização, que colaboram para a ambientalização na criação de poemas. Com
ancoragem na teoria da complexidade (sem, no entanto, explicitá-la), a proponente sugere
a criação de um ou vários poemas baseados em outros (de autor publicado), para a
decomposição que resultará em algo significativo para o aluno. Toma, por exemplo, o
poema Nascemorre, de Haroldo Campos, que possibilita diversas composições de acordo
com a sensibilidade de cada um. A seguir, o projeto para a prática de produção de poemas:
Título: Criação de poemas
Texto:
a) Tipo de Atividade: Criação de poemas
b) Objetivos a serem alcançados: Criar um ou vários poemas observando outro poema e descompô-
lo criando algo significativo a partir de uma atividade de sensibilização.
c) Recursos: Power-point, transparência, poema escrito em cartolina ou no quadro-de-giz.
d) Propostas de Método e Metodologia: Essa abordagem de método admite que se construa o
método no decorrer da aula. Trata-se de um método que também é uma metodologia. O pressuposto teórico
dessa abordagem ancora-se na teoria da complexidade.
Feita a sensibilização parte-se para a criação do próprio poema a partir de outras formas ou
construindo formas; descompondo e compondo algo significativo para os alunos, algo que faz parte do
cotidiano deles, sem preocupação com rimas ou qualquer forma. Criar desenhos significativos é também
outra alternativa de expressão da criatividade, conforme a sugestão:
Se
Nasce
Morre nasce
Morre nasce
126
Morre nasce morre
Renasce remorre renasce
Remorre renasce
Remorre
Re
Re
Desnasce
Desmorre desnasce
Desmorre desnasce desmorre
Nascemorrenasce
Morre
Se
Fonte: Campos, Haroldo “nascemorre”. In Revista Relâmpago. Revista de poesia. Lisboa, n. 7,
outubro 2000.
Esclarecimentos a respeito da Vanguarda Concretista estão disponíveis em:
http://www.casaruibarbosa.gov.br/julio_guimaraes/main_juliovanguarda.htm
Seqüências das vanguardas de Júlio Castañon Guimarães
Acesso em 24/09/2004
Avaliação: Avaliação qualitativa, que significa analisar o processo de construção de poemas, o
interesse dos alunos, o espírito de colaboração. Sobretudo, avaliar tendo em vista a continuidade, a
realimentação do processo; isto é, a criação de novos e significativas produções poéticas.
.................................................................................................................................................................
Título: Sensibilizar o olfato para a criação da poesia.
Texto: A utilização de varetas de incenso, de flores que podem ser colhidas no campo, ou qualquer
essência, despertará o sensor do olfato, além do sensor da visão e do tato.
Ao fluir com o perfume do ambiente, o aprendiz facilmente se revelará; esta é uma das funções da
dialogia de Bakhtin, grande teórico da linguagem.
Eu me revelo e me desvelo ao considerar o outro na relação dialógica (Bakhtin, M. Marxismo e
filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1986).
.................................................................................................................................................................
Título: Explorar a imaginação com ilustrações.
127
Texto: Imagens da poesia concreta que despertem o interesse dos alunos podem ser utilizadas como
estratégia de sensibilização para o ato de leitura e escrita.
Proponho que nesse espaço desenvolva-se a oralidade e a escrita. Ler e escrever poesias são
atividades que requerem preparo pela imaginação. Quem lê viaja pela imaginação, faz conexão psicológica
consigo próprio, com o mundo todo e com todo o conhecimento.
Recomendo o sítio de Augusto de Campos, um panorama ilustrativo do universo poético.
http://www2.uol.com.br/augustodecampos/poemas.htm
.................................................................................................................................................................
Título: Sensibilizar o paladar para a criação da poesia
Texto: A organização e oferta de um lanche especial pelo professor ou pelos próprios alunos,
poderia despertar a sensibilidade de ambos para o paladar, a consciência do paladar. O incentivo ao toque no
próprio corpo, no corpo do colega, como recurso pedagógico acompanhado pelo docente, contribui para um
momento raro de aprendizagem e sensibilização para a criação da poesia.
.................................................................................................................................................................
Título: Reprogramar o pensamento para a atividade poética
Texto:
Objetivos:
Os alunos poderão exercitar a reprogramação do campo psíquico para solução de dificuldades
através da meditação orientada. O corpo físico estando relaxado favorece a mente para vôos criativos e
facilita a solução de problemas.
Facilitar a solução de problemas com a abordagem da aprendizagem criativa empregada.
Proporcionar a aplicação do ato criativo a outros tipos de arte literária no espaço escolar, como:
Haicai, cordel, etc. Melhor explicado por adquirir novas competências.
Um ambiente propício para a criação não somente induz o aluno a desenvolver a arte da criação
verbal como a criação oral, pelo repente, entre outros.
Metodologia
Sugestão de meditação para desenvolver a criatividade:
Duração: 5 a 10´
Ambiência: Alunos sentados na sala de aula.
Vareta perfumada, música suave.
Induzir à atitude de relaxamento físico começando pelos pés e subindo pelo corpo e cabeça.
128
Quando estiverem bem calmos, trabalhar a imaginação, convidando-os a entrar em uma semente
enterrada em lugar morno e fértil.
Nesse espaço a semente se contorce e vai superando as dificuldades do sair da casca, começa a
brotar e as raízes expandem-se, verticalizam-se, as folhas se desenrolam e a semente transforma-se em uma
bela folhagem com flores vermelhas que se desenvolvem se transformam em frutos...e, assim por diante.
A continuidade dependerá do professor em co-participação com os alunos.
Mensagem de auto-ajuda
As mesmas dificuldades que a semente encontra para sair da casca, também encontra o nosso
intelecto, para aprender. Se persistirmos diante dos obstáculos, e lembramos dos conflitos da semente que
não estaciona, que persiste, também nós daremos belas flores e saborosos frutos de criatividade, fazendo do
viver uma constante poesia.
Após essa atividade, os alunos poderão escrever sobre as percepções que tiveram.
Avaliação:
Para esse tipo de atividade propõe-se tarefa diversificada. Desde uma produção individual
observando o sentido do que foi produzido, até uma construção coletiva, com auxílio do professor.
Adaptação de Delatorre, S. Dialogando con la Creatividad. Espanha: Barcelona, 2003.
Na verdade, são técnicas, como as que vemos nos LD. As proposituras dão
orientação ao professor de como ele deve proceder e que recursos utilizar para o
desenvolvimento de uma aula como essa. Ao final das instruções de como fazer, faz-se
uma avaliação qualitativa.
...significa analisar o processo de construção de poemas, o interesse dos alunos, o espírito de
colaboração. Sobretudo, avaliar tendo em vista a continuidade, a realimentação do processo; isto é, a criação
de novos (sic) e significativas produções poéticas..
Ou diversificada.
Para esse tipo de atividade propõe-se tarefa diversificada. Desde uma produção individual
observando o sentido do que foi produzido, até uma construção coletiva, com auxílio do professor.
Adaptação de Delatorre, S. Dialogando con la Creatividad. Espanha: Barcelona, 2003.
Não visualizamos nessa segunda proposta de avaliação uma finalidade outra que
não seja para produzir por produzir. Os aparatos metodológicos por si mesmos não
129
garantem a funcionabilidade desse gênero textual no meio em vive o educando, quer dentro
ou fora do espaço escolar. É uma produção para a escola, sobressaindo-se aquele que for
mais criativo e colaborador nesse processo.
“Ler e escrever poesias são atividades que requerem preparo pela imaginação. Quem lê viaja pela
imaginação, faz conexão psicológica consigo próprio, com o mundo todo e com todo o conhecimento”
.
Dessa forma, sob a ótica da proponente, podemos inferir que apenas os que mergulham no
universo imaginário, fictício, conseguem ler e escrever poemas. Poesia aqui, ao que parece,
deve ser sempre encarada como uma fantasia que se faz da realidade, através dos diversos
sentidos que nos permitem compreender esse mundo paralelo, o da ficção.
Em outro momento, a proponente sugere a meditação, com mensagens de auto-
ajuda em que a avaliação se dá pela diversificação das atividades.
“Para esse tipo de atividade propõe-se tarefa diversificada. Desde uma produção individual
observando o sentido do que foi produzido, até uma construção coletiva, com auxílio do professor.”.
Propostas como essas povoam o LD e trazem as orientações do passo-a-passo. O
professor, que auxilia na produção dos poemas, individuais ou no coletivo, deve seguir as
instruções da forma como se apresentam no manual. A crença é: se assim o fizer,
conseguirá êxito em seu trabalho, nesse conteúdo.
2.12 - APC 2602
A proponente desse APC sugere uma análise de obras literárias para que se observe
o posicionamento do escritor frente aos problemas de sua época. A seguir, sua proposta na
íntegra:
Propondo Atividades
Título: A influência dos acontecimentos nas produções literárias
130
Texto: Pesquisar poemas, romances ou outras produções literárias, em sítios ou livros, nos quais o
aluno encontre composições em que o escritor se posiciona diante de um acontecimento da época, com o
objetivo de analisar o ponto de vista do autor e, através dele, o sentimento de muitos homens em relação ao
acontecimento. Poderão ser utilizados textos extraídos de livros ou Internet. Os alunos poderão ser
organizados em grupos e, em conjunto, analisar o texto, com acompanhamento do professor. Posteriormente,
cada grupo seleciona o que for de seu interesse e apresenta a análise para a turma. A apresentação pode ser
realizada em forma de relato ou dramatização. Cada grupo poderá ser constituído por cinco alunos, de modo
que todos os alunos da turma realizem a atividade. A avaliação se dará mediante observação do professor
quanto ao envolvimento do aluno na atividade e pela apresentação aos outros alunos da turma.
O enunciado nos impele a fazer algumas considerações. Primeiramente, o verbo no
infinitivo impessoal confunde-nos: não sabemos se são os alunos ou o professor que fará a
pesquisa aos livros e sítios. Depois, não fica claro se desse trabalho surge uma produção
textual, pois um relato tanto pode ser oral ou escrito. As instruções se apresentam
desordenadamente. Inicialmente se diz onde pesquisar, reaparecendo essa instrução após o
objetivo.
Avalia-se, também neste APC, o desempenho do aluno, a julgar pelo seu
envolvimento no trabalho e apresentação do mesmo. Outra proposta com o fim na
avaliação, acompanhada e mensurada pelo professor. Ou seja, um trabalho para a escola,
sem considerar o texto como veículo de interação social, como um conjunto de muitas
vozes que clamam uma atitude responsiva (BAKHTIN, 1992) de seus interlocutores reais.
2.13 - APC 2708
A proponente desse APC sugere trabalhos de linguagem a partir dos textos que os
alunos produzem na internet, em salas de bate-papo e nos blogs quando postam um
comentário sobre o que está posto na página acessada.
Propondo Atividades
131
Título: Trabalhando com a Internet
Texto:
1- Sugiro que o professor utilize textos dos alunos, os diálogos produzidos pelos jovens ao “teclar”.
Os alunos trazem para a sala de aula e em dupla, vão reescrever os textos usando a norma culta. É uma forma
de mostrar a diferença das linguagens. Abaixo, há um texto anexado para ilustrar a atividade.
Após reescrever o texto, chamar a atenção dos alunos quanto a rima, que só é percebida após a
reescrita do texto.
2- Solicitar aos alunos que produzam seu próprio texto, sobre a linguagem da Internet, dissertativo,
augumentativo (sic), apontando os prós e contras dessa linguagem.
3- Montar um blog (sic) de poesia. Cada um produz o seu texto poético, publica e ao mesmo tempo
escolhe o de um colega para comentar. Esta atividade exercita a escrita, promove a socialização e permite
trabalhar a sensibilidade, a afetividade, já que estarão falando para o colega, estarão comentando seu texto.
4- Gincana de Pesquisa
O professor, previamente, pesquisa sites, lista e propõe as atividades para as equipes que terão que
pesquisar na Internet.
Vence a equipe que terminar e acertar todas as atividades propostas.
Com essa atividade o aluno poderá estar acessando a informação previamente determinada pelo
professor, terá conhecimento da amplitude das informações e terá noção do que é pesquisar e navegar na
Internet em busca do conhecimento, estará aprendendo a aprender.
5- O professor divide a sala em equipes de 4 alunos. Determina que algumas equipes pesquisarão
sobre a linguagem culta e onde deve ser usada; a outra equipe pesquisa sobre a linguagem coloquial, sobre as
variedades lingüísticas e em que locais pode ser usada.
A apresentação será em forma de debate, inclusive apresentando um texto escrito pela equipe,
retratando a linguagem pesquisada.
As cinco propostas de atividades contemplam a produção escrita. A primeira delas
solicita aos alunos que tragam impressos, para a escola, os bate-papos que realizam na
Internet, para que façam a transcrição, em dupla, usando a língua culta. O objetivo dessa
atividade é confrontar as duas variedades lingüísticas. A segunda orienta os alunos a
escreverem um texto dissertativo sobre essa linguagem da Internet, apontando os prós e os
contras dessa variedade.
132
A terceira sugere a montagem de um blog de poesia. Pelo que entendemos, cada
aluno terá seu blog com objetivo de desenvolver a escrita que acontecerá em função dos
comentários que cada um fará sobre os poemas dos colegas. A quarta atividade sugere uma
gincana de pesquisa em que o professor distribui tarefas aos grupos e estes deverão
navegar pelos sítios, vencendo quem mais acertar os desafios. Na quinta atividade, após a
pesquisa sugerida aos alunos, esses terão de apresentá-la sob a forma de debate e de um
relato escrito a respeito da linguagem estudada.
A produção escrita nessa última atividade resulta da pesquisa em grupo sobre as
linguagens culta e coloquial e sua empregabilidade. O texto deve ser apresentado ao
professor logo em seguida do debate para que o trabalho seja avaliado. A escrita tomada
como registro para avaliação deixa evidente que o destinatário não é outro senão o
professor que vai dar a nota pelo trabalho. Não se cumpre aí a função social da escrita,
tampouco se levam em conta as condições de produção, exceto em relação à atividade nº3.
Por se tratar de construção de um blog, o interlocutor possível encontra-se fora dos muros
escolares. Para os alunos que vivenciam a Internet, o interlocutor – ainda que não visível –
existe. E é para ele que o aluno-internauta escreve. Em relação às demais atividades, o
conhecimento de mundo do aluno se resume em dados de uma pesquisa sobre as variantes
da língua para uma avaliação final. Onde ficam as atividades com a linguagem, que
acionam os elementos e estratégias de comunicação e que precisam ser trabalhadas nos
exercícios de reflexão quando se está usando a escrita como veículo para se estabelecer o
diálogo com outros textos? Não se leva em conta ou se desconhece a concepção de Bakhtin
– presente nos PCN (1988) e no Currículo Básico do Paraná – LP (1990) - que considera o
dialogismo na interlocução dos sujeitos em um dado momento de discurso.
133
2.14 - APC 2929
A proponente desse APC trabalha com procedimentos de leitura, partindo das
leituras de obras literárias para um diálogo (literário).
Propondo Atividades
Título: Concurso de poesias
Texto: Após a leitura de obras literárias, comenta-se fazendo um diálogo literário. Os alunos contam
a história, dizem para os colegas o que gostaram e o que não gostaram; comentam sobre os personagens, suas
características físicas e psicológicas; enfatizam o que perceberam ser a mensagem do livro.
Se for possível (sic) após esse trabalho (sic) pode-se fazer a sessão literária que consiste em assistir
aos filmes referentes às obras lidas e comentadas.
A partir dessas obras os alunos produzem poesias críticas. (Ver atividade "produção de poesias"
neste APC).
Quando a poesia estiver pronta, o professor orienta na correção ortográfica, coesão e coerência.
Sugere-se após a produção, que as poesias sejam declamadas. O professor nesse momento também orienta
quanto a forma de apresentação oral, a entonação de voz, gestos, expressão corporal e facial.
Depois dessa fase, propõe-se o Concurso. O Concurso de poesia deve ter critérios previamente
estabelecidos para que tudo aconteça na ordem prevista. Um dos critérios que se sugere nesta atividade é que
as poesias declamadas tenham suas produções a partir de obras literárias e sejam de autoria dos alunos.
(Inéditas).
A letra da poesia e a declamação no Concurso, demonstram se o objetivo de leitura e compreensão
foi atingido, por isso representam a avaliação dessa atividade.
Tal atividade, nos parece, necessita de um tempo longo. Não se desenvolve em
apenas em uma aula (se bem que a proponente não se refere à cronologia). Aqui o aluno
deverá ter lido pelo menos um livro para poder discorrer sobre a leitura realizada. Esse
diálogo nos parece frutífero se as discussões forem além de uma apresentação da ficha
técnica da obra e opiniões pessoais. O trabalho com leitura também deve exercitar os
134
mecanismos e estratégias que o leitor se utiliza para interpretar, fazer inferências, refutar,
concordar, sem deixar de considerar as condições em que esse texto lido foi produzido
(retomando as condições de produção da escrita: quem escreve, o que escreve, para quem
escreve, com que estratégias trabalha, e por que o faz).
O trabalho com a escrita surge em função desse diálogo literário (termo cunhado
pela proponente para se referir à técnica utilizada para o desenvolvimento do trabalho com
literatura) “A partir dessas obras os alunos produzem poesias críticas”. De que maneira?
Objetivando o quê? Para quem escreverá? Nada disso a proponente considera nas
atividades que sugere.
Em certos momentos aparece a intervenção do professor, como se vê: na correção
ortográfica, quanto à coesão e a coerência, bem como nos procedimentos de apresentação
oral (declamação em situação de concurso). E a atividade só terá valor se o objetivo de
leitura e compreensão for atingido. Nada lemos a respeito daqueles que fracassarem nessa
atividade, todavia pensamos que, no mínimo, uma nova chance de apresentação ocorra em
seu favor.
A próxima atividade propõe a elaboração de um jogral, sendo realizada
previamente uma pesquisa sobre os literatos e suas obras, para conhecimento da biografia e
bibliografia dos mesmos, bem como suas características marcantes. Veja:
Título: Jogral
Texto: Para esta atividade o professor deve proporcionar previamente uma aula de metodologia de
pesquisa para que o aluno conheça a vida dos autores e possa criticamente apresentá-la.
A pesquisa consiste em conhecer a biografia e bibliografia dos autores clássicos, enfatizando a
característica marcante na vida do autor e o que o influenciou na produção de suas obras.
Ao término da pesquisa, o aluno a transforma em um jogral. Essa atividade é feita em grupo que
escolhe um autor para pesquisar, produze o texto e o apresenta para a turma. (Essa é a avaliação).
135
A sugestão é que sejam usados cartazes com caricaturas dos autores (ver atividade "Pesquisas em
cartaz" neste APC) para a apresentação dos jograis; a atividade também pode ser filmada para a turma assistir
e perceber o que pode ser melhorado.
O texto (obviamente um jogral escrito que precede a apresentação do jogral), como
podemos verificar, mais uma vez é tomado como instrumento de avaliação. O grupo deve
apresentar um autor da literatura clássica, utilizando-se de vários recursos, como cartazes
contendo as caricaturas dos literatos pesquisados e gravações em vídeo para posterior
análise de sua atuação. O local da produção é a escola. Uma produção para a escola, cuja
finalidade reside na avaliação (Parece-nos que ocorre aqui uma ambigüidade, pois não se
esclarece se é o jogral ou o texto escrito que é apresentado, a fim de que seja feita a
avaliação dos trabalhos). Os interlocutores são os alunos (colegas) e o professor (que avalia
o trabalho). Não conseguimos detectar a intermediação do professor ou qualquer outra
intervenção durante essa atividade. Vimos, sim, sua atuação como transmissor de
conhecimento, pois que dará uma aula sobre metodologia de pesquisa, distribuirá as tarefas
e fará a avaliação final.
Os trabalhos prosseguem com confecção de cartazes ilustrados com caricaturas dos
autores (charges). A proponente parte do pressuposto de que os alunos já dominem
técnicas de pesquisa.
Título: Pesquisas em cartaz
Texto:
Pesquisa biográfica e bibliográfica de obras e autores
Conforme sabemos, para desenvolver a pesquisa é necessário que os alunos já conheçam técnicas
básicas de como pesquisar e obter melhores resultados.
Quando encaminhada a atividade, sugere-se dar preferência aos autores da escola literária que se
está trabalhando no período.
136
A atividade consiste em pesquisar vários materiais sobre autores e obras clássicas para se obter o
máximo de informações. Por isso, seria interessante instruir os alunos para que durante a pesquisa atribuam
prioridade às particularidades sobre o autor ou a obra.
Sugere-se usar o resultado da pesquisa com frases originais para desenvolver junto aos alunos a
confecção de cartazes, ilustrando-os com caricaturas dos autores.
Agora, com a pesquisa e cartazes prontos, sabendo várias particularidades de autores e obras, a
sugestão deste APC é propor aos alunos uma apresentação oral, uma explanação da pesquisa para os colegas.
Quanto à apresentação oral, aos cartazes que apresentam resultado da pesquisa e caricatura dos
autores, pode-se dizer que são excelentes formas de avaliação. Através das atividades o professor conseguirá
avaliar se o objetivo de leitura e interpretação está sendo alcançado.
Esse trabalho pode não terminar na avaliação escolar, se o professor levar a atividade ao
conhecimento da comunidade, propondo aos alunos a exposição dos cartazes em locais como: rodoviárias,
prefeitura, Bancos...
Observe que o objetivo dessa atividade está atrelado ao cumprimento de um
conteúdo do programa escolar como o que se confirma nesta orientação: “...sugere-se dar
preferência aos autores da escola literária que se está trabalhando no período.”
. A leitura procede em
função dos conteúdos programáticos para um determinado período do ano escolar.
Dessa pesquisa surgirão as frases e caricaturas com as particularidades dos autores
para serem apresentadas em cartazes, e estes exibidos não somente no espaço da escola,
como também em outros locais da comunidade. Visualizamos, nessa derradeira sugestão,
atitudes coerentes com a proposta sociointeracionista de ensino da língua. Contudo, não
podemos deixar de pontuar que o objetivo principal é verificar se o “objetivo da leitura e
interpretação está sendo alcançado”. Ainda que muito vago o real sentido do que se
pretende verificar na leitura. Em relação à avaliação, a proponente sai do lugar-comum –
avaliar para a escola – e a amplia para a comunidade.
A produção de poesias nas sugestões abaixo ocorrerá na culminância de mais um
trabalho com leitura de obras literárias bem como de ilustrações que também contam a
história.
137
Título: Produção de poesias
Texto: Após a leitura de uma obra literária o aluno produz uma poesia que pode ser sobre a história,
o que mais gostou ou não gostou na leitura. Pode também ser sobre a biografia do autor, ou o contexto
histórico em que se insere o livro.
O objetivo a alcançar é sem dúvida o comentário da leitura. Ler por ler não proporciona prazer. O
aluno tem deverá ter a oportunidade de apresentar de alguma forma ao colega a sua opinião para uma
possível troca, um diálogo literário.
Uma sugestão de apresentação da poesia a partir do livro é a de usar também o desenho. Ilustrar a
poesia colocando uma figura de fundo é sem dúvida uma maneira lúdica de apresentação de trabalho. Dessa
forma o livro é duas vezes representado: pela poesia e pela figura de fundo.
A produção da poesia é uma avaliação do grau de compreensão do aluno referente a leitura de obras,
assim como a sua capacidade de atribuir opinião crítica sobre assuntos diversos.
Sugere-se ainda que, com as folhas de poesia e ilustrações seja produzido o livro da turma. Esse
pode ficar na biblioteca, ou ainda, ter suas poesias publicadas em jornais e livros. É importante sempre
colocar em cada texto poético o nome do livro e o autor a que ele se refere.
A produção da poesia, como a que sugere a proponente, acontecerá em
conseqüência de uma leitura, de um aspecto interessante, do que o aluno mais tenha
gostado ou não. O objetivo é o comentário da leitura, sem o qual, conforme o que diz a
proponente, não proporciona prazer. A avaliação em si mesma (ainda na visão da
proponente) não só dá ao professor condições de medir o grau de compreensão dos alunos
sobre as obras literárias lidas, como também os transforma em sujeitos mais críticos. Como
última orientação, sugere que as folhas com a composição dos poemas se transformem em
um livro da turma, o qual poderá ser deixado à disposição dos alunos na biblioteca,
podendo também ser publicado em um jornal de circulação na comunidade. Embora essa
sugestão fique em último plano, seria, ao nosso ver, a ação pedagógica mais eficaz, aquela
que realmente fará o aluno tomar suas decisões conforme suas “representações dos mundos
– físico, social e subjetivo” – tendo “o que dizer, a quem dizer e por que dizer”
(BRONCKART, 1999 e GERALDI, 1993).
138
Como última sugestão, os alunos deverão formar grupos para apresentarem as obras
lidas em forma de teatro.
Título: Teatro
Texto: Após a leitura e comentário de obras literárias, os alunos são convidados a formar grupos. De
preferência os alunos que leram o mesmo livro compõem o mesmo grupo.
Neste momento o professor proporciona uma aula sobre textos teatrais.
Sugere-se aos alunos transformar o livro lido em um teatro. O texto pode ser crítico e não
necessariamente ser resumo da história narrada na obra. É interessante também fazer um texto modificando a
obra, sem interferir no tema e no objetivo de sua mensagem. Transformar o final e dar personalidade
diferente aos personagens é uma sugestão.
O teatro pode ser ensaiado pelo grupo e apresentado. A avaliação vem da integração do grupo na
maneira de conciliar suas idéias a respeito do livro, do texto teatral e da apresentação do teatro.
Sugere-se incluir esta atividade nas gincanas escolares para aquisição de pontos para a equipe. É
uma maneira de valorizar as atividades referentes à leitura que estão sendo vistas em sala.
A atuação do professor consiste em ensinar sobre textos teatrais para que o aluno
transforme a narrativa do livro em um roteiro de teatro (embora não use essa terminologia).
Os alunos serão avaliados segundo a compreensão do livro lido, o que se verifica na sua
participação nos trabalhos que o grupo desenvolve e apresenta. A proponente sugere que
essa atividade seja escolhida como tarefa para numa gincana cultural. Segundo ela, os
pontos obtidos é uma maneira de valorizar as atividades que tiveram a leitura como base.
Os alunos quando escrevem esperam uma resposta sobre o que produziu. E isso não
é característica apenas de quem freqüenta o ensino básico. Nós também, quando
escrevemos, aguardamos, ansiosos, por uma resposta. É a atitude responsiva que Bakhtin
comenta em seu texto sobre a interação verbal, e lembrada por nós na fundamentação que
precede esta análise.
Observamos, de um modo geral, uma profusão de atividades propostas, mormente,
para o cumprimento dos recursos que estruturam o ambiente virtual, e quase nenhuma
139
preocupação com as bases teóricas que tecem essa corrente filosófica do ensino da língua.
Sentimos a necessidade de uma maior reflexão sobre tantas atividades em que os agentes
devem ter se apropriado (devem conhecer), os instrumentos necessários, ou seja, os
gêneros textuais citados.
Finalizando este item de análise, desenhamos abaixo a situação dos APC ante a
proposta interacionista de ensino da Língua Portuguesa defendida pelos autores em cuja
fonte fomos beber.
O quadro das análises que mostraremos a seguir aponta para as condições de
produção textual que tomamos emprestadas dos autores por nós pesquisados, da forma que
julgamos pertinente para sua compreensão. Antes, porém, consideramos importante a
retomada dessas condições para cada autor abaixo:
Bronckart (1999): local de produção, o momento da produção, o emissor, o
receptor, a interação comunicativa, a posição social do emissor, a posição social do
receptor, o objetivo da interação.
Menegassi (2003): prioridade para quatro elementos básicos: finalidade,
especificidade do gênero, lugares preferenciais de circulação e interlocutor eleito.
Garcez (1998): considera escritor competente todo aquele que torna seu texto
adequado à situação, “tendo o que dizer, quando, com quem, onde, escolhendo o modo
como dizer aquilo que diz.”.
Geraldi (1993): tem como condições básicas: que se tenha o que dizer; que se tenha
uma razão para dizer o que se tem a dizer; que se tenha para quem dizer o que se tem a
dizer; que o locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que diz para quem
diz; que se escolham as estratégias para realizar esse dizer.
140
As condições de produção textual que adotamos para a visualização na tabela
abaixo são, ao nosso ver, uma generalização a partir dos teóricos com quem dialogamos ao
longo desse percurso.
141
Quadro Demonstrativo das Condições de Produção Textual nos APC.
Quem? O quê? /Gênero Para quem? Onde?/ Local de
circulação
Para quê?
Aluno
Crônica
Professor
Classe
Avaliação da escrita
Aluno
Conto
Professor e
alunos
Escola
Avaliação da escrita e oralidade
Aluno
Crônica
Professor
Classe
Avaliação da escrita
Alunos e
comunidade
Conto
Professor,
alunos e
comunidade.
Escola
Avaliação da oralidade/ socialização
Aluno
Peça de teatro
Professor e
alunos
Classe
Avaliação da oralidade e escrita
Aluno
Paródia, paráfrase,
(dissertação)
Professor e
alunos
Classe
Avaliação
Aluno
Construção do
hipertexto
Professor e
alunos
Classe e Lab. de
informática
Avaliação da construção do hipertexto
Aluno/ sujeito
Reportagem
Professor,
alunos e
comunidade
Classe, escola e
comunidade
Avaliação e denúncia da violência
Aluno
Roteiros de TV
Professor e
alunos
Classe
Avaliação da escrita –reflexão.
Aluno
Poema
Professor e
alunos
Classe
Avaliação da escrita e sensibilização
poética.
Aluno
Resenha de obras
literárias
Professor e
alunos
Classe
Avaliação da oralidade e/ou escrita
Aluno
Escolar
(dissert./narração)
Professor e
alunos
Classe
Avaliação da oralidade e escrita
Aluno
Oratória
Professor e
alunos
Classe
Avaliação da leitura.
142
Os APC assinalados por uma tarja amarela mereceram o destaque por serem os
únicos de nossa análise que contemplaram as condições de produção num grau satisfatório,
principalmente nos campos referentes ao destinatário e finalidade da produção. Tais
condições, da forma como discutimos aqui, traduzem uma preocupação com o ensino
efetivo de língua portuguesa, em que se produzem textos na escola a fim de que os mesmos
possam fazer sentido na esfera social a que pertencem os envolvidos no processo, nesse
caso, os alunos que escrevem.
CONSIDERAÇÕES QUASE FINAIS
hega, enfim, um momento que mais se parece com uma despedida. Uma alma
que deixa seu corpo para seguir a marcha iniciada em algum ponto da
eternidade. Assim nos encontramos diante desta situação em que
abandonaremos nossa escrita para que a mesma prossiga, enriquecida por
outros olhares, num continuum ad infinitum. Mais uma vez a analogia parece fazer sentido,
pois normalmente se diz que nos derradeiros segundos que precedem ao desenlace da alma,
uma espécie de tela de cinema se lhe apresenta com flashes dos acontecimentos pontuais
daquela existência, talvez para que o espírito retome a consciência de suas ações, cuja
reação podem causar alento ou desespero.
Ao final de uma viagem por mares caudalosos como os que navegamos,
atravessados pela pertinência das correntes filosóficas e lingüísticas, é mister que façamos
uma avaliação de tamanha bravata. Eis que passamos a apresentar nosso diário de bordo,
comentado e discutido com tripulantes e passageiros que tomaram essa embarcação, sem
destino certo.
Quando principiamos esta dissertação não suspeitávamos do resultado a que
chegaríamos. O caminho foi sendo construído ao caminhar (ou, como nos convém dizer,
navegar). Tomamos a linguagem em curso, eximindo-nos de sua origem. As conexões que
fomos fazendo certamente acionarão muitas outras na cabeça de quem agora nos lê. Bem,
atentemos para o que realmente temos de fazer: uma retrospectiva de todo o percurso que
trilhamos, bem como dos desvios e atalhos, dos tropeços e deslizes na palavra do outro.
Por assumirmos como nosso o discurso alheio, no propósito de comunicar essa
experiência, desvelamo-nos e nos colocamos diante do julgo do leitor.
C
144
Dois foram os pilares de ancoragem para que esse empreendimento investigativo
pudesse se sustentar, o que nos deu margem para seguir as trilhas que percorremos em cada
um dos capítulos a saber:
1) No primeiro capítulo, tratamos da autoria instituída aos professores pela
elaboração de seus objetos de aprendizagem – denominados de APC na sua origem - com
base na teoria interacionista de ensino da língua. Dentre todos os aspectos da produção em
ambiente virtual, proposta pelo governo de estado, representado pela SEED-PR, a autoria,
nessa modalidade de trabalho, foi nosso primeiro grande desafio. Por se tratar de uma
atribuição institucionalizada, que principia com a cessão dos direitos autorais do professor
proponente, causou-nos uma curiosidade inusitada, uma missão a cumprir. E nessa jornada
procuramos detectar traços que pudessem validar a autoria desses proponentes. O que
constatamos, com olhos desbravadores, não foi uma autoria da forma como estamos
acostumados a atribuir no caso de uma criação intelectual ou de uma invenção qualquer.
Vislumbramos, sim, um novo conceito de autoria que, antagonicamente, se explica pela
liquidez e concretude. Algo que se dilui nas conexões emaranhadas do mundo virtual e que
se inscreve como documento autorizado pela política educacional do atual governo.
Dos 14 APC analisados, a metade deles contava
24
(ou ainda conta) com a
colaboração de outros professores, o que parece causar uma diluição do sujeito proponente.
Passamos, por conta disso, a nos referirmos aos proponentes quase sempre na primeira
pessoa do plural, conforme a participação nos recursos com os quais colaboraram.
Entendemos que o surgimento de um sujeito diluído, disperso pelo e no discurso
(FOUCAULT, 1992) é a grande contribuição que esse processo de fazer educação dará à
sociedade, principalmente ao ensino e à aprendizagem como um todo. Por outro lado,
quanto mais colaborações surgirem, mais difícil se torna estabelecer o conceito de autoria,
24
Referimo-nos à data do último acesso ao Portal.
145
nos moldes que conhecemos. Os proponentes conseguem, individualmente ou com o
auxílio de um colaborador, esboçar no ciberespaço um gesto de autoria. Gesto esse que
pudemos constatar pelas indicações de leitura e outras conexões que fazem em seus
comentários, proporcionando múltiplos conhecimentos e, por extensão, o enriquecimento
de uma aula baseada em algum tema gerador do APC.
Embora esse gesto de autoria apareça em todos os trabalhos, elegemos alguns
critérios para sua categorização, em conformidade com a predominância de aspectos
relevantes na constituição do sujeito-autor. Quanto maior a idiossincrasia observada no
gesto do proponente, mais próximo da posição de autor esse se enquadra. Ficamos atentos,
também, às propostas de atividades que reproduzem práticas corriqueiras presentes nos
livros didáticos. E ainda, se as proposituras, em algum momento, se mostraram incoerentes
em sua apresentação. Em função disso, desenhamos o quadro das análises ao final do
capítulo, onde pudemos conferir o que acabamos de dizer aqui.
O APC 576 (ver tabela), ferindo o princípio da não-contradição (ORLANDI, 1993
apud ORLANDI; 1996; CHAROLLES, 1988) teve anulada sua autoria (NA). Em cinco
deles, encontramos sujeitos no plural, decorrente da colaboração de outros proponentes. O
APC 2602, por apresentar propostas como as que vemos no LD, se distanciou da maioria
dos demais em que constatamos gestos de autoria bem definidos. Por isso, o classificamos
como GA/R (gesto de autoria e repetição evidente do LD).
Conforme o que constatamos nessas análises, o professor, que navegar nesse
ambiente, terá condições de visualizar, com maior precisão, novos horizontes, bem como
disponibilizar os seus conhecimentos que não estão sistematizados, mas que podem
propiciar efeitos positivos no trabalho com o ensino da língua. O Portal, que se abre pela
tela do computador, poderá se constituir (como já pontuamos) em um ambiente muito
146
profícuo para um fazer pedagógico de qualidade, assim como nos lembram Mantoan e
Baranauskas (2002, p.83).
É a oportunidade de a instituição SEED tornar públicos os talentos dos seus
professores, conhecedores ou especialistas auto-didatas em algum tema. que nem sempre
se constitui objeto de pesquisa nas universidades. A disponibilização desses conteúdos,
reconhecidos institucionalmente, enriquece o acervo para as pesquisas no meio
educacional do Paraná, da mesma forma que possibilita ponto de encontro para os
educadores através do Portal.
Estamos escavando, na arqueologia
25
dos discursos, uma camada em que emerge
uma nova concepção de autoria, que se visualiza nas ofertas de capacitação e incentivo à
formação continuada dos profissionais do magistério. Como se pode verificar nas
constatações acima, em alguns casos, percebemos a repetição das propostas dos livros
didáticos num geral. Em outros, a julgar pelas experiências dos professores proponentes,
notamos gestos de autoria, muitas vezes diluídos pela participação de mais colaboradores
em alguns dos recursos dos APC. E o único princípio de que não abrimos mão e que
anulou a autoria em um dos APC foi o princípio da não-contradiçao, indicado por Orlandi
(1993 apud ORLANDI, 1996) e formulado por Charolles (1988).
2) No segundo capítulo, nossa atenção voltou-se para a propositura de atividades,
com enfoque especial direcionado às condições de produção do texto assim como o que
observamos nas reflexões de Geraldi (1993), Garcez (1998), Bronckart (1999), Menegassi
(2003), entre outros que abordaram esse tema em suas pesquisas.
25
Termo cunhado por Foucault (1987) e que dá nome a uma de suas obras.
147
Fizemos um apanhado geral das condições de produção textual da maneira como
concebem esses estudiosos, compondo um quadro no final do capítulo. Esse quadro
representa a situação em que se encontram os APC segundo os pressupostos que tomamos
como apoio.
Adotamos, nessa etapa da pesquisa, critérios semelhantes aos utilizados no primeiro
capítulo, em que vislumbramos proposituras muito próximas daquelas a que estamos
acostumados a ver em material didático-pedagógico, utilizado pela grande maioria dos
professores a cada ano que passa. Investigamos em cada APC o recurso Propondo
Atividades, com olhares muito atentos às sugestões de trabalhos com a escrita. Um fato
curioso e que nos chamou a atenção é que dentre os 14 objetos, um deles contemplava a
leitura e seus procedimentos, embora o eixo escolhido tenha sido o dos gêneros de textos
escritos, da forma como concebem os idealizadores do Portal. Retomando o início da
descrição do APC, falamos que trataríamos dos objetos que abordam o gênero de textos
escritos. Todavia o APC 2929 (ver tabela) tem como finalidade principal a avaliação da
leitura, apesar de que o texto deva ser considerado ponto de partida e de chegada,
ocorrendo atividades de leitura para o esboço de uma produção escrita que, no processo,
sofre muitas interferências e reflexões.
Quase que unanimemente foram sugeridas produções de textos com o intuito de
avaliar uma outra atividade. Pede-se um quantum de atividades, com ou sem dinamismo,
para, no final, cobrar um texto, em forma de relatório, ou contemplando um dos gêneros
escolarizados (narração, descrição e dissertação). O interlocutor acaba sendo a pessoa do
professor, aquele que avalia e atribui notas. Confirmamos o que vimos em Geraldi (1993),
texto como conseqüência, ou até mesmo como dom, e conforme observamos nas palavras
148
de Britto (1997), um fazer em função do “gosto” do professor, algo que, de repente, só
apetece a esse interlocutor.
Presenciamos, na postura do professor, nem sempre um mediador do processo da
escrita, e sim, uma autoridade que estipula regras, transmite conhecimentos e cobra um
retorno na modalidade de escrita padrão da língua, sem, muitas das vezes, considerar o
domínio dos diferentes gêneros por parte dos aprendizes. E, ao nosso ver, agindo dessa
maneira, estaremos amputando os sentidos e a liberdade do aluno de poder se tornar sujeito
de seu discurso. Um texto que circula (se circular) apenas na sala, quando muito na escola,
não se constitui num instrumento ideológico, de transformação social.
Verificamos, contudo, nas propostas de produção textual alguns esforços em
consonância com a teoria interacionista em que nos baseamos, e que se constitui no carro-
chefe da fundamentação dos PCN (1998) e do Currículo Básico da Educação do Paraná
(1990).
26
Como apresentamos nas considerações anteriores e no quadro das análises, em
função do fazer pedagógico habitual e da formação acadêmica que tiveram, alguns
professores repetiram as propostas contidas nos livros didáticos, procedendo-se da mesma
forma nos comandos que orientam o pesquisador para desenvolver determinadas
atividades.
26
Neste governo, com atividades específicas nos diversos Núcleos Regionais de Educação do Paraná se está
discutindo a reformulação do Currículo Básico Educacional do Paraná. Porém, a base teórica permanece a
mesma do modelo que vigorou nas gestões passadas, especificamente nos anos 90.
149
Deparamo-nos, também, com atividades bem criativas, reveladoras do potencial de
muitos profissionais anônimos, que viram, nesta oferta, a oportunidade de compartilhar
suas descobertas e resultados de experiências bem sucedidas (o que se verifica, por
exemplo, nos APC 593 e 1114). Constatamos, por assim dizer, uma claridade que revela
talentos de quem se esmera pelo ensino de qualidade. Um jeito novo de dizer a mesma
coisa – o que demonstra no enunciador que ele teve um gesto de autoria. Toda autoria
pressupõe uma produção e, do contrário isso também se verifica. Embora tenhamos
vislumbrado produções/reproduções, isso também pressupõe autoria. Por essa razão,
consideramos louvável a atitude dos representantes desse projeto que muito beneficiará a
categoria. Tendo fontes mais precisas e especificamente voltadas para o auxílio no trabalho
do professor, todos podemos ganhar com isso. Reduzem os custos com a formação
continuada; sobram mais recursos para investimento em salários e em tecnologia na
educação; aproxima todos os professores, mesmo de longínquas regiões do Estado, do
conhecimento compartilhado. E tudo isso ao alcance das mãos, como já dissemos em
algum momento dessa odisséia .
E, à guisa de interrupção textual, deixamos o leme desta nau, conduzida a muitas
mãos e olhares atentos, a fim de que esta dissertação possa servir de ponto de partida para
outras naveganças pela vastidão desse mundo tão virtual quanto real. Desse mundo
(in)visível pelas telas dos computadores e pelas lentes daqueles que se sentem
incomodados. Deixamos a palavra carregada de sentidos, tomados das palavras dos outros
navegadores que, como tais, experimentaram sabores e brisas na direção do desconhecido.
A todos, uma boa e inusitada aventura.
Praia do Campeche, Florianópolis-SC, tarde nublada, 25 de janeiro de 2006, com
tempo sujeito a chuvas e trovoadas.
REFERÊNCIAS
BAKHTIN, M. Estética da criação Verbal. (Tradução feita a partir do francês por Maria
Ermantina Galvão G. Pereira). 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997)
BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. Trad. de Michel Lahud e Yara
Frateschi Vieira. 6. ed. São Paulo: Hucitec, 1992.
BRASIL, Ministério da Educação e Cultura. Secretaria da Educação. Parâmetros
Curriculares Nacionais. V. 2 – Língua Portuguesa.
BRITTO, L. P. L. Em terra de surdos-mudos: um estudo sobre as condições de produção
de textos escolares. In: GERALDI, J. W. O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, p.
117-126. 1997.
BRONCKART, J. P. Atividade de linguagem, textos e discursos. Trad. de São Paulo:
EDUC, 1999.
CHAROLLES, M. Introdução aos Problemas da Coerência dos Textos (Abordagem teórica
e estudo das práticas pedagógicas). In: GALVES, Ch. et alii (Orgs.).O Texto: escrita e
leitura. Campinas (SP): Pontes, 1988.
CORACINI, M. J. (Org.). Interpretação, Autoria e Legitimação do Livro Didático:
língua materna e língua estrangeira. Campinas (SP): Pontes, 1999.
COSTA VAL, M. G. Atividades de produção de textos escritos em livros didáticos de 5ª a
8ª séries do ensino fundamental. In: ROJO, R.; BATISTA, A. A. G. (Orgs.). Livro
didático de língua portuguesa, letramento e cultura da escrita. Campinas (SP):
Mercado de Letras, 2003.
ERICKSON, F. Métodos cualitativos de investigación sobre la enseñanza. In:
WITTROCK, M.C. (Ed.). La investigación de la enseñanza, II. Métodos cualitativos y de
observación. Buenos Aires: Piados, 1988. p. 195-301.
151
FIAD, R. S. e MAYRINK-SABISON, M. L. T. A escrita como trabalho. In: MARTINS,
M, H. (Org.). Questões de Linguagem. São Paulo: Contexto, 1991.
FOUCAULT, M. As Palavras e as Coisas. Uma arqueologia das Ciências Humanas. Trad.
de Salma Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. Trad. de Lígia Fraga S. de Almeida. 5 ed. São
Paulo: Loyola, 1999.
FOUCAULT, M. O que é um autor? Trad. António Fernandes Cascais e Eduardo
Cordeiro. 3 ed. Portugal: Veja, 1992.
GARCEZ, L. H. do C. A escrita e o outro: os modos de participação na construção do
texto. Brasília: Editora da UNB, 1998.
GERALDI, J. W. Portos de passagem. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
GREGOLIN, M. do R. e BARONAS, R. (Orgs.). Análise do Discurso: as materialidades
do discurso 2 ed. São Carlos (SP): Claraluz, 2003.
LÉVY, P. As tecnologias da inteligência. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993.
MANTOAN, M. T. E. e BARANAUSKAS, M. C. C. Novas mídias na aprendizagem
escolar. In: GHILARDI, M. I. e BARZOTTO, V. H. (Orgs.). Nas telas da mídia. p. 75-95.
Campinas (SP): Alínea, 2002,
MARCUSCHI, L. A. O Hipertexto como um novo espaço de escrita em sala de aula.
Linguagem & Ensino, Vol. 4, nº1, p. 79-111, 2001.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, A. P.;
MACHADO, A. R. & BEZERRA, M. A. (Orgs.). Gêneros Textuais & ensino. Rio de
Janeiro: Lucerna, 2002.
152
MENEGASSI, R. J. Professor e escrita: a construção de comandos de produção de textos.
Trab. Ling. Aplic., Campinas, (42): 55-79, Jul./Dez.2003.
ORLANDI, E. P. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólicos.
Petrópolis (RJ): Vozes, 1996.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Currículo básico para a escola publica do
estado do Paraná. Curitiba: SEED, 1990.
Sítio: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br – acessado em 28/12/2005.
153
ANEXOS
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo